Universidade Metodista de São Paulo
Faculdade de Humanidades e Direito
Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião
Religião e Periferia Urbana: as dinâmicas entre os processos urbanos e migratórios na Igreja Mundial do Poder de Deus em
Vila Alpina
Daniel Santana Camuçatto
São Bernardo do Campo, Agosto de 2014
Universidade Metodista de São Paulo
Faculdade de Humanidades e Direito
Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião
Religião e Periferia Urbana: as dinâmicas entre os processos urbanos e migratórios na Igreja Mundial do Poder de Deus em
Vila Alpina
Dissertação de mestrado apresentado em cumprimento parcial às exigências do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião para a obtenção do grau de Mestre. Orientador: Prof. Dr. Dario Paulo Barrera Rivera.
São Bernardo do Campo, agosto de 2014
FICHA CATALOGRÁFICA
C159r
Camuçatto, Daniel Santana Religião e periferia urbana: as dinâmicas entre os processos urbanos e migratórios na Igreja Mundial do Poder de Deus / Daniel Santana Camuçatto -- São Bernardo do Campo, 2014. 191p. Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) – Faculdade de Humanidades e Direito, Programa de Pós Ciências da Religião da Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo Bibliografia Orientação de: Dario Paulo Barrera Rivera
1. Igreja e problemas sociais 2. Igreja Mundial do Poder de Deus - Fluxo migratórios 3.Identidade (Religião) 4. Redes sociais 5. Periferia – São Paulo (Vila Alpina) - Urbanização I. Título
CDD 261.8
A dissertação de mestrado sob o título de “Religião e Periferia Urbana: as dinâmicas
entre os processos urbanos e migratórios na Igreja Mundial do Poder de Deus em
Vila Alpina”, elaborada por Daniel Santana Camuçatto foi apresentada e aprovada
em 18 de setembro de 2014, perante a banca examinadora composta por Dario Paulo
Barrera Rivera (Presidente/UMESP), Nicanor Lopes (Titular/UMESP), Ricardo
Bitun (Titular/Mackenzie)
Prof. Dr. Dario Paulo Barrera Rivera Orientador e Presidente da Banca Examinadora
Prof. Dr. Helmut Renders Coordenador/ Programa Pós-graduação
Programa: Pós-Graduação em Ciências da Religião Área de Concentração: Religião, Sociedade e Cultura
Linha de Pesquisa: Religião e Dinâmicas Socioculturais
DEDICATÓRIA
A Josiene e Débora Camuçatto, amor da vida, poesia plena,
inspiração continua.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente gostaria de agradecer ao Conselho Nacional de Desenvolvimento
Cientifico e Tecnológico (CNPq) cujo apoio financeiro possibilitou esta pesquisa,
incentivando o avanço nos estudos em ciência da religião.
A Universidade Metodista de São Paulo que me acolheu desde a formação em
bacharel em teologia.
Ao professor, já aposentado, Geoval Jacinto da Silva, que acolheu, incentivou e
orientou nos estágios inicias da pesquisa.
Ao meu orientador Prof. Dr. Paulo Barrera Rivera, pela paciência e carinho na
orientação, respeitando, motivando e desafiando a um olhar mais profundo perante a
realidade social.
Ao programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião, bem como seu quadro
docente, que empenham-se em aperfeiçoar os alunos e mantê-los sempre atualizados
com olhares críticos na sociedade.
Aos grupos de pesquisa REPAL, MIRE, GETEP e Religião e Educação, por
sempre trazerem visões novas nos mais variados assuntos.
Aos colegas Flavia Medeiros, Igor Marques, Elton Alves e Rodrigo Follis,
porque rir é bom e faz parte.
A Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina, que abriram as portas para a
pesquisa, no qual sentirei saudades.
A Igreja Metodista em Belém pelo apoio, orações, conversas e
companheirismos.
A Minha Família Josiene, esposa amada, companheira para todas as horas, a
Débora, inspiração e transpiração, alegria e amor indescritível.
A minha sogra Luci, que dedicou meses da sua vida em me ajudar na conclusão
da pesquisa, no qual sou imensamente grato, pelo afeto.
Aos meus pais Silas e Lucilene, sustento, carinho e fundação das minhas ideias e
ideais. A Gabriela, minha irmã, sempre presente, motivos de alegria e orgulho.
A Deus, que guiou meus passos (inclusive os acadêmicos) para prosseguir
explorando o mundo criado por Ele e trabalhando para que sua vontade prevaleça, paz,
justiça e bem.
Se vi mais longe foi por estar de pé sobre ombros de Gigantes (Isaac
Newton)
Resumo
Esta dissertação estuda as dinâmicas entre religião, urbanização, migração e periferia
urbana na Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina. O processo de urbanização
brasileiro inicia na década de 1930 e transforma profundamente a sociedade brasileira,
especialmente a região sudeste do país. A urbanização incentivou importantes
fenômenos sociais como: os fluxos migratórios, alta densidade demográfica e
especulação imobiliária que ao colidiram nas grandes metrópoles criaram polos de
segregação, exclusão e anomia social. O estudo análise em quais aspectos a Igreja
Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina exerce papel de emancipadora da população
migrante, reconstruindo identidades fragmentas pelos constantes fluxos migratórios e a
adaptação a inadequação das novas culturas. São estudados os indicadores sociais da
Igreja Mundial do Poder de Deus, a partir do campo estatístico, vinculando e
comparando os dados obtidos com as estatísticas realizadas pelo Censo 2010 da cidade,
do distrito e do bairro. A partir de uma observação densa é levantado aspectos
etnográficos dos cultos da igreja a fim de estabelecer uma análise das práticas da igreja,
mensagem e identidade religiosa de seus participantes. Por fim é elaborada, a partir de
aplicação de questionários, realização de entrevistas e densa observação de campo
aspectos etnográficos dos adeptos da igreja, e verificação da existência de redes sociais
abarcadas na igreja, associativismo religiosos e o acumulo do capital simbólico, visando
a emancipação e reestruturação do sujeito migrante.
Palavras Chave: Igreja Mundial do Poder de Deus; identidade religiosa; fluxos
migratórios; redes sociais; urbanização; periferia urbana.
ABTRACT
This dissertation studies the dynamics between religion, urbanization, migration and
urban sprawl in the Igreja Mundial do Poder de Deus in Vila Alpina, a neighborhood in
the city of São Paulo. The Brazilian urbanization process that began in the 1930s
profoundly changed society, especially in the southeastern region of the country.
Urbanization encouraged another important Brazilian phenomenon, migration flows,
which collided to create in large cities centers of segregation, exclusion and social
anomie. The present study analyzes which aspects of the Igreja Mundial do Poder de
Deus em Vila Alpina exerts an emancipatory role on the migrant population,
reconstructing identities that were fragmented by constant migration and adaptation to
new, and often, inadequate cultures. The social indicators of the Igreja Mundial do
Poder de Deus are studied, obtained from the statistical field, and are also linked and
compared to the data with the statistics collected by the city, district and neighborhood
Censo 2010. From this dense analysis, ethnographic aspects of church services are
observed in order to provide an study on the practices of the church, its message, as well
as to describe the religious identity of its participants. Lastly, questionnaires, interviews,
and field observation of dense ethnographic aspects of the supporters of the church are
investigated to verify the existence of sociais networks embraced by the church,
religious associations and the accumulation of symbolic capital, aimed at emancipation
and restructuring of the migrant subject.
Keywords: Igreja Mundial do Poder de Deus; religious identity; migration; social
network; urbanization; urban periphery.
Sumário Créditos dos Gráficos, Tabelas e Fotos. ........................................................................... 4
Lista de Abreviaturas e Siglas .......................................................................................... 7
Introdução ......................................................................................................................... 8
Capitulo 1: Urbanização, Migração e Periferias Urbanas: a situação do migrante
marginalizado no Brasil. ................................................................................................. 15
1.1. As Relações Dinâmicas entres os processos de Urbanização e Migração. ......... 15
1.1.1. Organização Interna: a cidade desordenada, aspectos de segregação e
exclusão nas metrópoles. ............................................................................................ 19
1.1.2. Espraiamento Urbano: tensões entre migração, especulação imobiliária e
urbanidade. ................................................................................................................. 21
1.2. A urbanização em São Paulo ............................................................................... 26
1.2.1. A periferia Paulista ....................................................................................... 28
1.2.2. O Migrante na Periferia Paulista .................................................................. 33
1.3. Os Primórdios da Zona Leste de São Paulo, João Ramalho e os Jesuítas. .......... 36
1.4. Considerações ...................................................................................................... 45
Capítulo 2: Urbanização e Migração no Distrito de Vila Prudente ................................ 47
2.1. Migração e identidade ...................................................................................... 48
2.1.1. Migração e Identidade Religiosa. ................................................................. 51
2.2. A Relação entre Processos de Mobilidade Humana e Redes Sociais. ................. 52
2.2.1. Redes Sociais e Associativismo em São Paulo ............................................ 54
2.3. A Família Pedroso ............................................................................................... 57
2.3.1. Os Irmãos Falchi, e a construção do bairro. ............................................. 59
2.3.2. Crescimento Urbano no Século XX ......................................................... 62
2
2.4. Vila Prudente e a Religião. .............................................................................. 71
2.5. Considerações. ..................................................................................................... 78
Capitulo 3:Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina: estudo de caso .............. 80
3. Igreja Mundial do Poder de Deus. Da gênese do movimento ao fenômeno de
tempos recentes............................................................................................................... 80
3.1. A cura divina na Igreja Mundial do Poder de Deus. ........................................ 85
3.2. Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina: aspectos históricos. ......... 92
3.3. Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina Indicadores Sociais. ......... 93
3.3.1. Faixa etária ............................................................................................... 94
3.3.2. A distribuição por Cor .............................................................................. 95
3.3.3. Escolaridade.............................................................................................. 96
3.3.4. Rendimento ............................................................................................... 98
3.3.5. Sobre a Migração .................................................................................... 100
3.3.6. Domicílios alugados e próprios .............................................................. 103
3.4. Análise dos indicadores sociais ..................................................................... 105
3.5. Perfil Religioso dos membros da Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila
Alpina ....................................................................................................................... 107
3.5.1. Permanência na igreja e estado de pertença. .......................................... 107
3.5.2. Frequência nas reuniões.......................................................................... 108
3.5.3. Origem Religiosa .................................................................................... 110
3.6. Análise do perfil religioso .............................................................................. 111
3.7. O culto da IMPD em Vila Alpina: espaços, Usos e Costumes ...................... 112
3.7.1. O espaço Cúltico ..................................................................................... 113
3.7.2. Novo Templo, Antigos Elementos. ........................................................ 117
3.8. Etnografia da Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina. ................. 118
3.9. Meu Negócio é com Deus. ............................................................................. 123
3.9.1. O Pastor do Amor ................................................................................... 126
3.10. Considerações. ............................................................................................... 128
3
Capítulo 4:A Dinâmica do Poder Simbólico na Igreja Mundial do Poder de Deus em
Vila Alpina ................................................................................................................... 129
4.1. Análise do culto ............................................................................................. 129
4.1.1. O poder pela palavra. ................................................................................. 138
4.2. Redes Sociais e o Corpo de Obreiros na Igreja Mundial do Poder de Deus em
Vila Alpina. .................................................................................................................. 149
4.2.1. Capital Social .......................................................................................... 154
4.3. Considerações. ................................................................................................... 156
Considerações finais ..................................................................................................... 158
Referências Bibliográficas ............................................................................................ 163
Anexos .......................................................................................................................... 177
Roteiro Para observação dos cultos .......................................................................... 177
Roteiro da Entrevista. ............................................................................................... 177
Questionário aplicado na igreja. ............................................................................... 178
Local e data da realização das entrevistas e aplicação dos relatórios. .......................... 184
Aplicação do Questionário ........................................................................................... 185
4
Créditos dos Gráficos, Tabelas e Fotos.
O gráfico 1: Elaborado pelo DIEST/IPEA, Fonte: MS/SVSDASIS – Sistema de
Informação Sobre Mortalidade, Período 1996 a 2010.
O gráfico 3: Elaborado pela Subprefeitura de Vila Prudente, baixando da internet pelo
programa Spark Browser, Fonte: IBGE, Censo 2010.
Os gráficos de 2, 4-16, são de minha autoria, Fonte: Censo demográfico 2010,
Microdados do Censo 2010, Publicados pelo IBGE, elaborados com o programa Excel
365, versão 2013.
As Tabelas 1 a 13, são de minha autoria, Fonte: Censo demográfico 2010, Microdados
do Censo 2010, Publicados pelo IBGE, elaborados com o programa Excel 365, versão
2013.
Figuras
Figura 1: Baixado da internet pelo programa Google Maps.
Figura 2: Baixado da internet pelo programa Google Maps.
Figura 3: Baixado da internet pelo programa Spark Browser. Fonte: FILHO, Mario
Ronco. O Bairro Vila Prudente, Um Gigante Paulista, sua história e sua gente.
Prefeitura de São Paulo, 1990.
Fotos
Foto 1: Baixado da internet pelo programa Google Maps.
Foto 2: Minha autoria. Arquivo pessoal.
5
Lista de Tabelas
Tabela 1:Brasil, população total e urbana, grau de urbanização e incremento médio
anual da população urbana ............................................................................................. 16
Tabela 2:Brasil e Grandes Regiões – População Residente segundo os Censos
Demográficos 1940/2010 ............................................................................................... 18
Tabela 3:Pessoas não naturais da Unidade da Federação de residência e pessoas naturais
da unidade da federação que residem em outra, segundo as Unidades da Federação –
2010. ............................................................................................................................... 25
Tabela 4:Crescimento demográfico absoluto e taxa geométrica anual por tipo de
componente – Região metropolitana de São Paulo- 1940 a 2010 .................................. 34
Tabela 5:Populações por sexo, percentual e total, segundo condição de naturalidade-
região Metropolitana de São Paulo-2010 ....................................................................... 35
Tabela 6:Vila Prudente – Capão da Invernada, Capão, Embiriva, Embahú ................... 40
Tabela 7:Vila Prudente (Tapera ou Mato das Simbarivas) – atual favela V Prudente e
parque da Mooca. ........................................................................................................... 41
Tabela 8:Vila Zelina – Baixos do Zimbaúba .................................................................. 41
Tabela 9:Domicílios segundo Tipo de Ocupação: Distrito de Vila Prudente – 2010 .... 67
Tabela 10:Domicílios segundo Tipologias Residenciais: Distrito Municipal de Vila
Prudente -2010 ................................................................................................................ 67
Tabela 11:Estabelecimento educacionais em Vila Prudente – 2010 .............................. 69
Tabela 12:População de 10 anos ou mais de idade, por nível de instrução em Vila
Prudente – 2010. ............................................................................................................. 70
Tabela 13:Empregados por Escolaridade, segundo os Distritos Administrativos – Vila
Prudente .......................................................................................................................... 70
Lista de Gráficos
Gráfico 1:Padrão de vitimização dos Jovens em Relaçao a escolaridade ...................... 32
Gráfico 2:Pirâmide Etária dos Membros da Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila
Apina .............................................................................................................................. 94
Gráfico 3: Pirêmide Etária do Bairro de Vila Alpina ..................................................... 94
Gráfico 4:Distribuição Percentual por Cor ou Etnia os Grupos Religiosos – Brasil-2010
........................................................................................................................................ 96
Gráfico 5:Percentual de Pessoas de 15 ou mais de idade por nivel de instrução ........... 97
6
Gráfico 6:População de 15 anos ou mais por nivel de instrução – Vila Prudente .......... 98
Gráfico 7: Rendimento Domiciliar – Pessoas com 10 anos ou mais .............................. 99
Gráfico 8:População residente Migrante em Vila Alpina ............................................ 100
Gráfico 9:População Migrante e de Origem Migratoria ............................................... 101
Gráfico 10:População em (%) com tempo initerrupto de residencia............................ 101
Gráfico 11:Porcentagem de Membros da IMPD em Vila Alpina Nascido em Outras UFs
...................................................................................................................................... 102
Gráfico 12: Domicilios Próprios e Alugados pelo Número de Amostra frequente na
IMPD em Vila Alpina .................................................................................................. 103
Gráfico 13: Domicílios por número de cômodos por família ....................................... 104
Gráfico 14: Tempo de Permanência (em anos) dos Fiéis da IMPDVA ....................... 107 Gráfico 15: Número de fiéis que Frenquantam a IMPDVA ........................................ 109 Gráfico 16: Frequência de Fiéis da IMPDVA em Transito Religioso ......................... 109 Gráfico 17: Origem Religiosa dos Fiéis da IMPDVA ................................................. 111
Figuras
Figura 1:Planta do Bairro de Vila Prudente em 1980-dividido segundo os loteamentos
os irmãos Falchi. ............................................................................................................. 59
Figura 2:Pedra de Mármore tamanho 0,89 cm x 0,57 cm fixada na praça Irmãos Falchi
em homenagem à Prudente de Moraes em 21 de Dezembro de 1989 ............................ 61
Figura 3:Orfanato de Vila Prudente 1897....................................................................... 74
Lista de Fotos.
Foto 1:Antigo Templo da Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina .............. 114
Foto 2:Novo Templo da Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina ................ 114
7
Lista de Abreviaturas e Siglas ABC Santo André, São Bernardo do Campo e São Caetano.
AMA Assistência Médica Ambulatorial
AMOVIZA Associação de Moradores e Comerciantes do Bairro de Vila
Zelina.
APEOESP Sindicato de professores do ensino oficial do Estado de São
Paulo.
CAPS Centro de Atenção Psicossocial
COHAB-SP Companhia Metropolitana de Habitação de São Paulo.
CRAVI Centro de referência e apoio a vítima.
CUT Central Única dos Trabalhadores.
FASFIL Fundação Privada e Associações Sem Fins Lucrativos.
IMPD Igreja Mundial do Poder de Deus
IMPDVA Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina.
IURD Igreja Universal do Reino de Deus.
LEMAD Laboratório de ensino e material didático.
LIT Levantamento de informações territoriais.
MDF Movimento de Defesa do Favelado.
MST Movimento do Sem Terra.
ONG Organização Não Governamental.
PIB Produto Interno Bruto.
RMSP Região Metropolitana de São Paulo.
SAB Sociedade Amigos do Bairro.
SECOVI-SP Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e
administração de Imóveis Residenciais e Comerciais de São Paulo.
SIDRA Sistema IBGE de Recuperação Automática.
UBS Unidade Básica de Saúde.
UF Unidade Federativa.
ZL Zona Leste.
8
Introdução
Este estudo tem como objeto a Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina,
nosso foco está na observação das dinâmicas entre a igreja em questão e espaços de
segregação, visando, principalmente os adeptos da igreja em situação de vulnerabilidade
social.
A Igreja Mundial do Poder de Deus localizada em Vila Alpina, bairro de São
Paulo é marcada por processos migratórios complexos, desde a presença dos italianos,
passando pelos refugiados de guerra provenientes do leste europeu até fluxos
migratórios inter-regionais.
A mobilidade humana influenciou o bairro de Vila Alpina, a disparidade nas
moradias do operariado e a classe burguesa, as linhas de ônibus que conscientemente
escolhem passar naquela rua em detrimento de outra, a presença ou a ausência de
iluminação pública em algumas ruas, a organização das escolas privadas e públicas que
privilegiam determinadas pessoas, são somente reflexo das estruturas segregatórias e
excludentes que os processos de migração e a urbanização caótica causaram no bairro,
no distrito e na cidade ao longo dos anos.
Em espaços onde a escassez de muitos confronta-se com a abundância de poucos
a religião pode assumir um papel essencial, sendo, ou reprodutora das lógicas
dominantes, ou emancipadora delas, ajudando a amenizar a distância social entre os
sujeitos urbanos. Dessa maneira a religião em ambientes de alta vulnerabilidade social
funciona como redes de ajuda mútua, onde a pessoa carente de recursos busca aparo
comunitário.
É a instituição religiosa responsável pela regulação do crer e da tradição, esses
dois aspectos somados estabelece e reestabelece o equilíbrio sempre ínfimo entre
comunitário, ético e emocional, para isso a instituição religiosa articula as identidades
de seus adeptos impondo normas e práticas que regulam o cotidiano, ou seja, a
identidade religiosa, assume contornos não somente em ambientes eclesiais e privados,
mas garante um mínimo de obediência civil e cidadã.
9
A partir de uma pesquisa quantitativa na região metropolitana de São Paulo,
constatou que 70% das pessoas entre as mais pobres participavam de associação
religiosas (LAVALLE,2001). Das associações religiosas a maioria encontrava-se
vinculadas as igrejas evangélicas. A densa rede que abriga os templos evangélicos
assume o papel de estruturas de oportunidades, onde os fiéis encontram-se para trocar
informações diversas que os ajudem frente a anomia social no qual vivem.
Isso ocorre por ser a migração um elemento ambíguo, ao mesmo tempo que o
indivíduo em mobilidade humana busca novos espaços, que por muitos motivos em seu
habitat não existe mais, por outro incorre de, na procura por novos espaços o
acolhimento social seja restritivo na vida do migrante.
Destarte o migrante relaciona-se com sentimentos contraditórios, o passado,
muitas vezes longínquo e idealizado, em muitos casos até utópicos, e o presente
conflituoso, volátil e fugidio. A não representação na nova cultura, ou a representação
de forma vexatória e burlesca, gera nos sujeitos em mobilidade urbana o sentimento de
não pertença a aquela cultura, aquele espaço, aquela cidade, o indivíduo, alheio a
cultura, sem uma representação identitária acaba sendo excluído socialmente.
Não é somente na possibilidade do mau acolhimento, mas da própria estrutura
citadina, principalmente em São Paulo, o acelerado crescimento urbano atropelou a
chance de uma urbanização organizada e projetada, dessa forma, as políticas públicas
geraram mais incentivos as industriais, aos polos comerciais, e a estrutura para sua
locomoção massiva, do que uma preocupação integral em envolver urbanisticamente
toda a cidade.
A falta de planejamento suscitou grandes distancias entre as classes de operários,
burgueses e afins, enquanto os primeiros padeciam com parcos recursos residenciais,
morando em cortiços, periferias e favelas, os outros gozavam de plenos recursos
citadinos. Portanto os migrantes ao estabelecerem ao sudeste do país encontravam uma
realidade bem distante do que era esperado, em muitos casos pessoas em mobilidade
humana acabavam em cortiços e favelas espalhadas pela cidade.
Assim a situação do migrante torna-se quase insustentável, se por um lado o
sentimento de inadequação se faz presente, por outro a falta de recursos, moradias,
lazer, trabalho, são escassos e precários. Com um quadro tão alarmante a religião torna-
se uma opção, das poucas, que sujeitos migrantes possuem.
No largo espectro da vivencia e reconstrução identitária que o processo de
migração necessariamente implica, a dimensão religiosa concatena a sociabilidade
10
indispensável ao convívio social, o acolhimento espiritual e sentimental de uma
comunidade, a dimensão das trocas simbólicas, matérias e de informação que somente
uma rede de ajuda mútua é capaz de oferecer.
Assim a religião periférica é produtora de interação social, na religião os laços
familiares, o sentimento de pertença, o acesso a uma cultura comunitária não
excludente, transformam o fenômeno religioso em um insubstituível estabilizador
social, construindo identidades e comunidades humanizadas dentro de periferias e
esquemas urbanos desumanos. A religião, nesse caso, não é apenas uma abstração da
realidade social, mas um grito dos excluídos e segregados buscando o bem viver.
Ao contrário de outras entidades religiosas como os católicos e kardecistas, onde
as redes sociais são estruturadas em programas filantrópicos, as redes evangélicas
associam-se pelas relações de confiança e trocas de utensílios, informações,
recomendações de trabalho etc. além disso, a lógica de “ajudar o irmão da fé em
primeiro lugar” é essencial para uma aproximação maior dos membros das comunidades
evangélicas.
Assim o foco no estudo da Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina é
pesquisar as relações entre periferia, migração e religião, compreendendo em quais
aspectos as redes sociais associativas estabelecem-se como elemento fundamental para
o bem viver metropolitano, onde a escassez de recursos, políticas e direitos sociais se
faz ausente.
A Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina, reside no bairro desde
2004, tem em média de 50 pessoas em seus cultos semanais, enquanto aos domingos, há
em seu templo uma frequência de 200 pessoas. A igreja segue o modelo de outras
igrejas evangélicas encontradas no país, com três cultos diários, ela não dispõe de um
templo próprio, assim, nesses dez anos a igreja mudou quatro vezes de lugar buscando
espaços que comporte o número de fiéis e caiba no orçamento comunitário.
O limite desse estudo encontra-se na observação e análise da Igreja Mundial do
Poder em Vila Alpina, bem como na apreciação da relação entre religião e periferia,
compreendendo em quais aspectos da Igreja Mundial do Poder de Deus é produtora de
identidades, facilitando a coesão social dos seus membros, em especial, pessoas com
altos índices de vulnerabilidade social, aferir se a existência de pessoas em mobilidade
humana garante aos adeptos recursos simbólicos e matérias necessários para uma
melhora em sua condição de vida e se houver a existência de redes sociais, em que
11
sentido elas corroboram para uma construção e reconstrução da identidade do migrante,
que possibilite a obtenção e o acumulo de capital social.
É objetivo geral da pesquisa analisar o papel exercido pela Igreja Mundial do
Poder de Deus em contexto periférico, intentando compreender se há alguma relevância
na interação entre religião e indivíduos em contextos periféricos que possibilite uma
identidade religiosa entre seus membros.
Dessa maneira podemos elaborar que os objetivos específicos é a identificação
de aspectos associativos de redes sociais religiosas que cooperam para a formação
comunitária da Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina, bem como sua coesão
social diante dos desafios empregados pelo cotidiano entre os moradores de áreas
periféricas, excluídos e segregados.
Levantar o perfil socioeconômico dos fiéis da Igreja Mundial do Poder de Deus
em Vila Alpina, visando conhecer as características dos sequazes da instituição
religiosa, bem como pesquisar o perfil religioso dos sujeitos da igreja, afim de entender
qual a população que congrega naquele espaço.
Identificar se o espaço cúltico, tanto em sua liturgia, quanto em sua mensagem
comtempla o cotidiano especifico dos adeptos da igreja, permitindo uma construção ou
reformulação de identidades religiosas que permitam o sentimento de pertença
comunitária, aderência dos sistemas de valores da igreja e a formulação de uma
comunidade coesa dentro de uma realidade fragmentada inserida em um contexto de
privação de direitos de cidadania.
Constatar se há presença de migrantes entre os prosélitos da Igreja Mundial do
Poder de Deus em Vila Alpina, estabelecendo em qual nível a relação entre
religiosidade, comunidade religiosa, e indivíduos em mobilidade humana apresenta-se
como aparadora das dificuldades encontradas por eles em ambientes migratórios,
restaurando e resinificando a identidade do sujeito, gerando um sentimento de pertença
no seio de uma comunidade religiosa e das redes sociais que ali se formam.
Em seguida apresentarei a metodologia usada na pesquisa elencando os
principais aspectos e descrevendo as partes que constituíram cada etapa do estudo.
Considero a metodologia usada como explorativa, uma vez que analiso os dados obtidos
no último Censo (2010) realizado pelo IBGE, com dados etnográficos levantados na
pesquisa de campo, dessa forma os dados estatísticos na presente pesquisa são
relacionados entre a Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina, aos dados
12
levantados pelo IBGE em escala, Brasil, Estado de São Paulo, cidade de São Paulo,
Zona Leste paulista, Distrito de Vila Prudente e Vila Alpina.
O perfil social do local, tanto do bairro quanto do distrito foram compilados
mediante aos Microdados estatísticos disponibilizado pelo IBGE através do site do
Censo de 20101, nesses Microdados, as tabelas e gráficos contemplam as Áreas de
Ponderação da região, assim os dados quantitativos levantados são completados por
dados qualitativos coletados em entrevistas e conversas informais.
As entrevistas foram todas realizadas nas dependências da igreja, ao total foram
doze entrevistados, em sua maioria homens e mulheres participantes do corpo de
obreiros da igreja, elas oito delas ocorreu antes do culto noturno, duas delas foram
realizadas após os cultos noturnos, uma depois do culto vespertino dominical e uma ao
sábado depois da reunião com os obreiros.
Houve também a aplicação de questionários nos membros da igreja, ao todo
vinte e uma pessoas responderam aos questionários que foram distribuídos em cinco
dias distintos de cultos em horários distintos, afim de contemplar o maior número de
adeptos da igreja, os questionários eram entregues seguindo os seguintes critérios,
homens e mulheres maiores de quinze anos, quem tinham ao menos três meses de
frequência na igreja.
Concomitantemente as entrevistas e aplicação dos questionários, foi observado
etnograficamente trinta e seis cultos realizados na Igreja Mundial do Poder de Deus em
Vila Alpina, seis cultos matutinos, oito cultos vespertinos, quatorze cultos noturnos,
dois cultos sabáticos e seis cultos dominicais.
A observação dos cultos ocorreu com a permissão do pastor local, depois de um
mês visitando a igreja e conversando com o mesmo e com os obreiros sobre a finalidade
acadêmica da pesquisa. O acesso a igreja foi-me oferecido por uma amiga que é
voluntaria do corpo de obreiros da igreja em questão, facilitando meu acesso ao pastor
local e aos adeptos da igreja, o agendamento de entrevistas com os membros e obreiros
da igreja também foi facilitado, infelizmente o acesso ao corpo pastoral não ocorreu de
forma esperada, sendo impossibilitado em pleno trabalho da pesquisa de campo, com
um acidente automotivo do pastor que sucedeu em seu falecimento.
O estudo etnográfico dos cultos deu-se através da elaboração de um roteiro de
pesquisa e observação dos cultos, dessa forma, o roteiro consistia na anotação
1 IBGE, Censo 2010. Disponível em: http://censo2010.ibge.gov.br/. Acesso em 23 de Julho de 2013.
13
sistemática de cada bloco do culto, que foram divididos em quatro momentos distintos,
músicas e orações, testemunhos e relatos de cura, pregação, ofertório e produtos
religiosos. Para cada momento as anotações eram feitas com a hora de início e termino,
conteúdo exposto, quem estava à frente comandado cada momento em questão, as
músicas cantadas e seus conteúdos, além dos conteúdos das mensagens e dos
testemunhos.
Além dos aspectos litúrgicos, horários e conteúdo dos cultos, o roteiro
comtemplava a anotações referentes a gênero, cor, etnia, número de pessoas
participantes, faixa etária de cada participante dos cultos, roupas que estavam vestindo,
tanto dos pastores, obreiros como dos membros, gestos feitos por eles durante os cultos,
quais eram os lugares preferidos da maioria ao sentarem, número de obreiros por culto e
algumas considerações feitas na observação de campo.
As anotações eram feitas em um caderno e logo após o culto passadas para um
gravador, a seguir, no mesmo dia, os dados eram transcritos no qual incidiria para uma
planilha ao final de cada semana de pesquisa de campo. Com isso os dados obtidos
foram o suficiente para elaborar uma análise abrangente dos cultos da igreja
Com os dados quantitativos obtidos, a analise etnográficas e as entrevistas em
mãos considerei suficiente para a elaboração das tabelas e gráficos a fim de comparar
com a análise obtida em campo, tentando averiguar se o apresentado nos gráficos e
tabelas acareavam nas observações feitas em campo. Com as todas essas informações
disponíveis concentrei-me na elaboração da dissertação, utilizando os referenciais
teóricos anteriormente já pesquisados e a bibliografia já consultada.
A dissertação é dividida em quatro capítulos, sua divisão dá-se da seguinte
maneira: o primeiro capitulo elabora os conceitos necessários para uma análise mais
aprofundada das dinâmicas e processos entre a urbanização, migração e periferia
urbana, esses conceitos permitiram revisar a história urbana recente do país com
enfoque no estado e na cidade de São Paulo, bem como identificar em que sentido o
processo de urbanização acelerada e os fluxos migratórios contribuíram para a produção
de áreas periféricas e exclusão social.
O segundo capítulo apresenta e problematiza os conceitos da identidade do
migrante, relacionando-os com os processos de urbanização e os fluxos migratórios
presentes no bairro. É no secundo capítulo que expomos o distrito de Vila Prudente de
maneira mais completa possível.
14
O terceiro capítulo consiste na explanação da história da Igreja Mundial do
Poder de Deus, de seu líder apóstolo Valdemiro Santiago, as mensagens mais comuns
utilizadas por ela, em seguida abordamos os aspectos da Igreja Mundial do Poder de
Deus em Vila Alpina, tantos os aspectos históricos quanto os indicadores sociais e
etnográficos provenientes das entrevistas, questionários e observações dos cultos.
Finalmente o quarto capítulo analisa sistematicamente o culto da IMPDVA, bem
como os atores sociais e sua dinâmica nos cultos, compreendo como as relações entre os
atores sociais da igreja contribuem para um desenvolvimento do capital social dos
participantes da comunidade religiosa, assim como a explanação das dinâmicas
simbólicas presentes nos cultos, e as possíveis relações advindas dessas práticas entre o
pastor local e os membros da igreja.
15
Capitulo 1: Urbanização, Migração e Periferias Urbanas: a situação do migrante marginalizado no Brasil.
O primeiro capitulo tem como finalidade analisar os fenômenos de migração e
urbanização em território brasileiro compreendendo em como essa dinâmica resulta nas
periferias urbanas e em processos de exclusão social e segregação humana.
Em um primeiro momento será discutido em que medida uma acelerada
urbanização vivenciada pelo país a partir da década de 1930 resulta em grandes fluxos
migratórios para o sul e sudeste do Brasil.
Em um segundo momento, analisaremos a urbanização paulista compreendendo
em que aspecto o fenômeno massivo migratório contribui para o espraiamento da
cidade, como também para a criação de bolsões de pobreza e exclusão social,
principalmente enfrentados pelos migrantes recém chegados a capital paulista.
Em seguida será apresentado conceitos que guiarão este estudo, portanto, a
realidade social será analisada a partir de conceitos sociológicos e antropológicos
relacionais, compreendendo o mundo social como processos de relações fluidas entre
indivíduos, Estado e Instituições, capazes de moldar as dinâmicas sociais e sedimentar
as ações dos atores em contexto urbano.
Explanaremos na parte final do capitulo aspectos históricos sobre a Zona Leste
paulista, bem como os processos que marcaram seu curso transformando a região em
uma das mais importantes da capital. A importância da compressão histórica Zona Leste
acontece pela influência advinda desses processos que ecoam até os dias presentes, em
bairros como Vila Alpina.
1.1. As Relações Dinâmicas entres os processos de Urbanização e Migração.
O processo de urbanização acontece em meio a transição de um sistema agrícola
para um industrial, as profundas transformações causadas pela mudança rural/urbano
criam desafios nos mais variados setores promovendo grandes alterações nas estruturas
sociais. Ao longo do tempo o entendimento da dualidade entre rural e urbano vem
16
perdendo força, a urbanização, agora, não é entendida, apenas como contraponto da vida
rural, mas apresenta aspectos próprios. O espaço urbanizado não é um aspecto imediato
das relações sociais de produção, nem a urbanização deveria ser entendida, somente,
como processo de disseminação do urbano, que amplia-se em escala global, ao
contrário, a urbanização deveria ser entendida como expressão das relações sociais ao
mesmo tempo que incidiria sobre elas (LEFEBVRE, 1972)
A urbanização está além dos limites citadinos, ela seria, na verdade, uma
condensação dos processos sociais e espaciais que permitiria ao capitalismo sua
manutenção e crescimento. O espaço não tem em si um papel transformador, mas
interativo nas relações sociais.
As práticas espaciais regulam a vida – não a criam. O espaço não tem poder em si mesmo, nem o espaço enquanto tal determina as contradições espaciais. Estas são contradições da sociedade – contradições entre uma coisa e outra no interior da sociedade. (LEFEBVRE, 1974:105)
Dessa forma, tanto o rural quanto o urbano são qualidades das relações sociais e,
por isso, o local rural/urbano não deve ser um espaço delimitado, mas sua delimitação
deve existir na análise cuidadosa das relações sociais empregadas nesse espaço. De
modo geral, no Brasil, embora exista experiências citadinas antes do século XIX, é
apenas no século XX que a urbanização adquiri as caraterísticas que conhecemos hoje.
O processo de urbanização brasileira desenvolve-se de maneira acelerada
quando comparado a outros países. O CENSO de 1970 registrava pela primeira vez o
aumento da população urbana frente a rural. A população urbana passou de 19 milhões
para 138 milhões, com uma taxa de crescimento anual de 4,1% ao ano, assim a média
de crescimento populacional é de 2.378.291 habitantes, aumentando a população urbana
em 7,3 vezes em meio século, como mostra a tabela 1.
Tabela 1:Brasil, população total e urbana, grau de urbanização e incremento médio anual da população urbana
Período Total Urbana Grau de urbanização
Incremento
1940 41.236.315 12.880.182 31,24 - 1950 51.944.397 18.782.891 36,16 590.271 1960 69.930.293 31.214.700 44,64 1.243.028 1970 93.139.037 52.084.984 55,92 2.087.028 1980 119.502.716 80.436.419 67,31 2.835.144 1991 146.825.475 110.990.990 75,59 2.777.688
17
2000 169.544.443 137.697.439 81,22 2,967,383 2010 190.755.799 160.925.792 84,36 2,322,835
Fonte: IBGE, Censos demográficos de 1940,1950,1960,1970,1980,1991,2000,2010.
Obviamente a população não é o único fator determinante para o crescimento
urbano, mas ao estudarmos os aglomerados populacionais através de suas características
eles apresentam-se como elemento dotado de autonomia e indicador válido para
compreensão e análise do desenvolvimento urbano nacional.
A composição da população desempenha um papel muito concreto em cada fase de sua evolução, assim como de sua distribuição. Na América Latina, temos de analisar o papel da presença comum de estrangeiros e nativos, dos “crioulos” e dos índios, na população, assim como as formas do seu crescimento: natural ou vegetativo, migratório ou social. (MILTON, 1982:20)
Um dos aspectos de maior influência na composição da urbanização é a
migração. Em todas as épocas existiu contingentes populacionais migratórios, a
população em mobilidade espacial são de extrema importância para o desenvolvimento
da história humana, contudo, a migração não é um fenômeno isolado, nem existe um
automatismo campo-cidade, em muitos casos a migração para centros urbanos pode ser
direta ou indiretamente forçada, quase compulsória, alheia a vontade dos migrantes.
Com efeito se, de um lado, as migrações enriqueceram os povos reforçando lhes mutualmente a solidariedade, de outro, podem ter caráter acentuadamente compulsório, obrigando grandes contingentes populacionais a deslocamentos forçados e penosos [...] neste caso, as migrações aprofundam, não um reciproco desenvolvimento dos povos, mas o abismo entre o mundo da riqueza e da pobreza; ou seja, os homens se deslocam contra a própria vontade, têm seu nível de vida empobrecidos e deteriorado. (CNBB, 1987:74)
A migração brasileira2 transita por ciclos migratórios, esses fenômenos são
associados, em muitos casos ao desenvolvimento econômico nacional, na década de
1930 a migração brasileira acentua-se, com o aumento dos incentivos industriais,
principalmente em São Paulo e Rio de Janeiro, a falta de políticas públicas para o
pequeno e médio agricultor, e os incentivos fiscais para as industriais, geraram grande
demanda migratória nos centros urbanos.
O êxodo rural para áreas urbanas transforma a vida citadina, que cresce
desordenadamente, a incapacidade de absorção do contingente populacional, a falta de
2 Sobre a questão do processo migratório abordaremos mais adiante.
18
políticas públicas eficazes e o não planejamento urbano, geram na malha metropolitana
uma alta segregação social.
Em 1960 a população urbana era de 45% dos habitantes brasileiros, em 1970,
56% dos recenseados pelo Censo já habitavam em cidades metropolitanas, em 2010, são
160 milhões de pessoas vivendo na urbanidade, ou seja, 84,33% das pessoas
recenseadas no país segundo demostra a tabela 1. O rápido crescimento é, em grande
medida, movido pelas migrações interestaduais, a principal responsável pelo aumento
desse contingente populacional.
A irregularidade não está somente na aglomeração da malha urbana, mas
também na localização e distribuição da densidade demográfica que acentua-se mais no
sudeste do país como demostra a tabela 2:
Tabela 2:Brasil e Grandes Regiões – População Residente segundo os Censos Demográficos 1940/2010
Brasil Grandes Regiões
População Residente
1940 1950 1960 1970 1980 1990 2000 2010 Brasil 41.165.
289 51.941.
767 70.070.
457 93.139.
037 119.002.
706 146.825.
475 169..799.
170 190.732.
694 Norte 1.467.9
40 1.834.1
85 2.561.7
82 3.603.8
60 6.619.15
2 10.030.5
56 12.900.7
04 15.865.6
78 Nordeste
14.426.185
17.992.094
22.181.880
28.111.927
34.812.356
42.497.540
47.741.711
53.078.137
Sudeste 18.304.317
22.594.386
30.630.728
39.853.498
51.735.125
62.740.401
72.412.411
80.353.724
Sul 5.722.018
7.835.418
11.753.075
16.496.493
19.031.162
22.129.377
25.107.616
27.384.815
Centro-oeste
1.244.829
1.730.684
2.942.992
5.073.259
6.805.911
9.427.601
11.636.728
14.050.340
Fonte: IBGE, Censos demográficos de 1940,1950,1960,1970,1980,1990,2000,2010
A distribuição heterogênea da densidade demográfica e o aumento do
aglomerado urbano no sudeste do Brasil passa pelas políticas públicas que beneficiam
maciços investimentos industriais, principalmente em São Paulo e Rio de Janeiro, o
sudeste do país tem uma grande constância migratória, estados mais urbanizados, mais
industrializados, com técnicas agrícolas mais avançadas, demanda por mão de obra, seja
especializada ou não, são vistos pelos migrantes como “terra de oportunidades”, uma
espécie de “terra prometida”, no qual emanava, emprego, casa e estabilidade social.
19
Não resta dúvida de que a integração da população em sistemas mais produtivos, tanto urbanos como rurais, comanda a orientação e provavelmente o volume dos deslocamentos. E é nesse sentido que as migrações inter-regionais assumem especial relevância [...] É que elas representam o polo extremo de um processo através do qual a população das áreas menos favorecidas do país busca beneficiar-se do desenvolvimento econômico, transferindo-se para as regiões mais ricas onde se concentram as oportunidades de melhoria de vida. (DURHAN, 1973:34)
Com o aumento do aglomerado populacional as metrópoles crescem
desordenadamente, segundo Milton Santos, somente nos anos de 1970-1980 o sudeste
do país absorveu 11,61% do incremento demográfico (1996:76), embora atualmente o
sudeste vem experimentando saldos migratórios cada vez menores, ainda é a região
onde a mobilidade foi mais intensa, segundo o Censo 2010 os estados com maior saldo
de migração são: São Paulo (255.796), Goiás(207.827), Santa Catarina(172.453).
Com a concentração de grande contingente populacional nas metrópoles do país,
outros elementos somam-se as características urbanas complexas, segregação, miséria,
pobreza, violência, elementos que as regiões metropolitanas, agora inchadas com altos
índices populacionais, sem um planejamento urbano adequado, sem políticas públicas
assertivas, precisam relacionar-se com novos modelos citadinos.
1.1.1. Organização Interna: a cidade desordenada, aspectos de segregação e
exclusão nas metrópoles.
Do ponto de vista político e ideológico, o desenvolvimento físico-social das
metrópoles depende de um “otimismo exagerado”, ou seja, fabricado e estetizado, para
promover a consciência auto regulatória da tolerância, do respeito pela diferença e das
assimetrias do poder. (DEAR, 2000:144)
Essa modalidade de urbanização depende de estratégias de desenvolvimento que
buscam no mundo empresarial o modelo para sua operacionalização. Dessa forma as
metrópoles passam a ser territórios de ocultamento de lógicas assimétricas de poder,
confundido público/privado e mascarando distúrbios sociais.
A formação de espaços urbanos funcionais e eficientes como indústrias, polos
tecnológicos, centos comerciais, condomínios fechados, entre outros, gera grandes
custos a maioria da população, tornando a metrópole um ambiente onde anula-se a
coletividade em prol da eficiência financeira. Obviamente o espaço de produção precisa
20
ser estabelecido e garantido dentro da metrópole, porém a busca por alternativas menos
excludentes e segregativas, precisam ser afiançados no convivo urbano.
A racionalização da metrópole acontece entre o final do século XIX e o começo
do século XX, pretendia-se promover o seu melhoramento físico-espacial para a
acomodação do seu potencial produtivo. Assim o nascimento da mentalidade do
planejamento urbano surge com a urbanização capitalista unificadora, que veicula a
utopia da emancipação humana pela racionalidade técnica.
A concepção da cidade funcionalista era a salvação de suas mazelas pela
naturalização de modelos universalistas, que pretendida controlar e gerenciar os
antagonismos citadinos pala racionalidade3.
Essa prática prova que há muito os modelos urbanos de metrópole unificada
deixaram de ser o conceito diretor da administração urbana nacional. Assim, tanto o
padrão de cidades industriais do hemisfério norte, quanto o de cidades planejadas, como
Brasília, não dão mais conta da pluralidade e complexidade urbana recente (LIMA,
2005). A globalização, o neoliberalismo, e as novas dinâmicas sociais, marcam uma
cidade-metrópole definida pela superposição espacial, imagens e realidade complexas
no mesmo emaranhado de redes urbanas.
Com diferenças de grau de intensidade, as cidades brasileiras apresentam
problemas similares. Problemas com transporte, seja público ou privado, especulação
imobiliária e fundiária, violência, precariedade da infraestrutura como: saúde, educação,
saneamento básico, periferização da população.
O crescimento urbano é sistêmico e retroalimentado pelos problemas citadinos.
Como Milton Santos afirma: As cidades são grandes porque há especulação e vice-
versa; há especulação porque há vazios e vice-versa; porque há vazios as cidades são
grandes. (SANTOS, 1996:96).
O modelo rodoviário urbano é um dos fatores de crescimento disperso, tornando
assim o espraiamento da cidade mais recorrente; havendo especulação há criação
mercantil da escassez, e o problema da moradia agudasse, assim como o déficit de
residências, que entram no comercio da especulação imobiliária, somando todos esses
elementos, o resultado dá-se na condução de periferização, havendo periferização a
malha urbana cresce, e vice-versa, dessa forma a o deslocamento populacional para
3 LIMA, Zeuler. Enclaves globais em São Paulo: Urbanização sem urbanismo? Disponível em: http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/05.059/471, acessado em 25 de fevereiro de 14.
21
áreas periféricas é um efeito cíclico causado por inúmeros fatores que giram entorno do
eixo urbano.
A organização interna de nossas cidades, grandes, pequenas e médias, revela um problema estrutural, cuja análise sistêmica permite verificar como todos os fatores mutuamente se causam perpetuando a problemática. (SANTOS, 1996:97)
O problema, nesse caso, está na condução organizacional e a falta de
planejamento urbano, sem esses aspectos essenciais a alta migração para o sudeste do
país, o aumento da força de trabalho e a falta de estrutura gera um superávit
populacional, ou seja, quanto menos investimento e mais contingente populacional, a
metrópole acaba segregando, excluindo e conduzindo os migrantes as periferias
urbanas.
1.1.2. Espraiamento Urbano: tensões entre migração, especulação imobiliária e urbanidade.
É a partir da década de 70 que os problemas urbanos passam a ganhar destaque
social, e configuram-se como problemática central na agenda nacional, principalmente
pela noção de desenvolvimento do país. Durante o século XX o destaque está somente
nos problemas habitacionais, principalmente as habitações das pessoas com maiores
indicadores de vulnerabilidades sociais.
Dessa forma a expansão das cidades com uma intensa abertura de loteamentos
suburbanos é vista como uma solução habitacional, sendo inclusive valorizada pelo
poder público (BONDUKI, 1998:14).
O migrante recém chegado as grandes cidades, em sua maioria, sem emprego
formal e mão de obra especializada, encontra-se com a especulação imobiliária, que aos
poucos leva-os as camadas mais pobres da população a bolsões periféricos, em sua
maioria, loteamentos clandestinos, sem ajuda do estado e qualquer infraestrutura.
Assim a obtenção de casa própria na periferia é a formula encontrada pelo
trabalhador para subsistir em uma situação onde o salário encontra-se abaixo do custo
de produção da força de trabalho. (BONDUKI & ROLNIK, 1979:128)
A obtenção da moradia, vem pela compra de lotes e autoconstrução, ou seja, a
construção da casa é feita pelo próprio morador nas horas livres, realizadas em etapas
espaçadas, dependendo do tempo e do dinheiro obtido pelo trabalhador.
22
A vantagem desse tipo de construção é a obtenção de um bem de consumo
próprio, com um custo relativamente barato. A casa como mercadoria é um bem
essencial, pois não tem seu custo reduzido com o passar do tempo, nem seu valor
mercadológico é defasado, a casa torna-se um patrimônio que pode ser vendido ou
alugado.
Outra forma de renda comumente encontrada é o aluguel informal, pela
defasagem de locação imobiliária e os altos preços para aluguel, cada vez mais a
locação informal cresce, principalmente na periferia, cômodos nos fundos e quartos
sobressalentes são alugados visando uma renda extra familiar.
A medida que o espaço vai se solidificando e adquirindo infraestrutura, há
também um aumento do custo de vida, com a elevação do custo de vida os moradores
iniciais do loteamento vendem suas residências a fim de procurar bairros mais afastados
da cidade com custos de vida compatíveis com sua renda familiar, há também aquelas
famílias que não conseguem mais arcar com as parcelas do terreno, e buscam na venda
deste, a única alternativa para o não endividamento.
A consequência desse processo é, pessoas com um poder aquisitivo mais
elevado habitando nos antigos loteamentos de classes mais baixas da população, com o
passar do tempo, esse processo altera as características na composição social do bairro,
à medida que estes loteamentos são mais integrados a malha urbana com mais
infraestrutura, as famílias com menos capacidades aquisitivas vão sendo conduzidas a
áreas mais distantes das cidades.
Assim se configura uma cidade ocupada diferencialmente pelas classes que se apropriam de parcelas do território de acordo com o nível de renda a que têm acesso. Uma cidade, enfim segregada. (BONDUKI & ROLNIK, 1979:147)
Podemos definir a periferia como segregação espacial, que diferentemente da
noção geográfica, que caracteriza a periferia como áreas distantes dos centros urbanos,
ou mesmo de uma sociologia que conceitua a periferia em locais onde a força do
trabalho se reproduz em péssimas condições de habitação, sem levar em consideração
os processos urbanos. A periferia urbana está relacionada a vinculação da ocupação do
território urbano à estratificação social, dessa forma, existem inúmeras periferias para
23
onde a população carente se desloca, no sentido gradiente da renda diferencial4, ou seja
o deslocamento acontece de uma periferia carente para outra, reproduzindo seu espaço
para reproduzir sua força de trabalho.
Essa definição, embora não seja única, vai de encontro ao conceito atual de
periferia urbana, que não está somente na distribuição dos espaços marginais nas
metrópoles, mas acontece em espaços de segregação, onde, de maneira substancial,
condomínios fechados concorrem com espaços periféricos, criando uma complexidade
ainda maior nos espaços urbanos.
O conceito de “periferia urbana” é complexo e relacional. Complexo porque sua explicação exige diversos fatores, não apenas econômicos, mas, sociais e culturais. Relacional porque a periferia só se explica em oposição ou como contraparte dos centros urbanos privilegiados. Do sentido amplo do conceito “periferia” destacamos a pobreza, como destituição dos meios de sobrevivência física e a insuficiência de renda e de trabalho. Também a inexistência de infraestrutura física nos locais de moradia. (RIVERA, 2012:20-21)
Para Maricato periferia caracteriza-se como:
Espaço da residência da classe trabalhadora ou das camadas populares, espaço que se estende por vastas áreas ocupadas por pequenas casas em pequenos lotes, longe dos centros de comércios ou negócios sem equipamentos ou infraestrutura urbanos, onde o comércio e os serviços particulares também são insignificantes enquanto forma de uso de solo. [...] são bairros que se assemelham a canteiros de obras, e mantêm essas características por muitos anos, não raramente por mais de vinte anos, até chegar os primeiros elementos de infraestrutura (1979:82-87)
Já para Singer:
Uma área onde ainda não chegaram os serviços urbanos, por isso tem estrutura urbana precária, e nela se instala a população que não pode pagar para ter acesso à uma propriedade em melhores localizações (1979:33)
Mesmo que o conceito de Singer, hoje esteja defasado em relação aos conceitos
mais contemporâneos, ele nos mostra fatores essenciais que contribuem com o aumento
da segregação nas malhas urbanas. Para compreendermos esse aspecto precisamos
entender a terra como propriedade privada e fonte de renda do sistema capitalista.
4 Segundo os autores renda diferencial é o componente da renda fundiária que se baseia nas diferenças entre as condições físicas e localização dos terrenos e nos diferencias dos investimentos sobre eles, ou no seu entorno, dessa forma esse componente soma-se a renda absoluta no qual é, propriamente, a remuneração pela existência da propriedade privada (BONDUKI & ROLNIK, p. 147, 1979)
24
O espaço urbano é condição necessária para a realização de atividades e não um
meio de produção, ou seja, a terra na urbanidade entra no custo que absorve parte do
lucro. Na cidade há uma disputa pela ocupação da terra gerando valorização da mesma,
assim sendo, o mercado imobiliário assume um capital especulativo, pois sua
valorização não está na produção do solo, mas na monopolização do acesso as
condições necessárias para a atividade capitalista.
A localização da propriedade é essencial para essa especulação e possível
valorização, definindo vantagens locacionais determinantes para cada atividade
capitalista. Para a indústria é necessário ter acesso a matéria prima e ao mercado
consumidor, seu valor precisa ser compatível com os lucros obtidos na produção. Já
para fins habitacionais o valor implícito está nos serviços urbanos relacionados ao
prestigio social da área em relação a renda da população habitante, e assim por diante.
A formação de áreas periféricas está relacionada a áreas que por alguma razão,
os direitos de propriedade não vigoram: áreas de propriedade pública, terrenos em
inventario, glebas, mantidas vazias com fins especulativos, etc. (SINGER, 1979:33)
assim forma-se espaços periféricos de aglomerados subnormais, formando as invasões,
favelas, mocambos, bairros e prédios deteriorados enquanto não há novos investimentos
nos imóveis desvalorizados, há também cortiços, que são alugados pelos moradores
igualmente em condições precárias de habitação.
Embora os fluxos migratórios no país encontrar-se diminuindo
progressivamente, as taxas ainda se mantêm elevadas. Segundo dados do IBGE nos
últimos dados censitários de 2010, as grandes regiões têm um acúmulo de 17,8 milhões
de pessoas residindo fora de seu lugar natal. A maioria composta de nordestinos, com
9,5 milhões de indivíduos, correspondendo há 53,6% do total dos residentes não
naturais nessas regiões.5
O sudeste do país foi a principal região a absorver esse fluxo, ali habitavam
66,6% da população nordestina que vivam fora do Nordeste, também observou-se que
600 mil pessoas que nasceram fora dos limites territoriais brasileiros procuraram a
região sudeste como lugar de habitação6.
Conforme indica a tabela 3 cerca de 26,3 milhões de pessoas eram migrantes,
resultado histórico das migrações interestaduais brasileiras nas últimas décadas. 5 IBGE, Censo Demográfico 2010. Sem paginação. Disponível em: ftp://ftp.ibge.gov.br/Censos/Censo_Demografico_2010/Nupcialidade_Fecundidade_Migracao/censo_nup_fec_mig.pdf. Acesso em: 2 de fevereiro de 2014. 6 Ibidem
25
Podemos verificar que os estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e Goiás
acumularam os maiores contingentes migratórios. Outros estados como: Minas Gerais,
Bahia, São Paulo, Paraná, contribuíram para maior volume populacional residindo em
outra Unidade Federativa.
Tabela 3:Pessoas não naturais da Unidade da Federação de residência e pessoas naturais da Unidade da Federação que residem em outra, segundo as Unidades da Federação – 2010.
Unidades da federação
Pessoas não naturais da Unidade da Federação de
residência
Pessoas naturais da Unidade da
Federação que residem em outra
Diferença
Rondônia 668 309 135 328 532 981 Acre 72 843 70 606 2 237 Amazonas 333 950 180 856 153 094 Roraima 167 770 23 322 144 448 Pará 1 112 348 715 308 397 040 Amapá 207 556 36 176 171 380 Tocantins 427 966 267 852 160114 Maranhão 484 116 1 537 034 (-) 1 052 918 Piauí 262 592 956 470 (-) 693 878 Ceará 385 112 1 491 976 (-)1 106 864 Rio Grande do Norte 265 628 445 172 (-) 179 544 Paraíba 292 134 1 179 592 (-) 887 458 Pernambuco 561 411 1 954 939 (-) 1 393 528 Alagoas 233 774 787 539 (-) 553 765 Sergipe 222 890 364 416 (-) 141 526 Bahia 838 815 3 069 213 (-) 2 230 398 Minas Gerais 1 339 230 3 582 579 (-) 2 243 349 Espirito Santo 648 520 497 785 150 735 Rio de Janeiro 2 147 186 866 220 1 280 966 São Paulo 7 994 351 2 243 906 5 572 147 Paraná 1 670 599 2 243 906 (-) 573 307 Santa Catarina 1 078 204 636 168 442 036 Rio Grande do Sul 347 036 1 066 500 (-) 719 464 Mato Grosso do Sul 609 435 362 175 283 260 Mato Grosso 1 121 084 291 639 829 445 Goiás 1 610 830 712 629 898 201 Distrito Federal 1 175 247 417 332 757 915 Total 26 278 936 26 278 936 - Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2010.
A grande maioria dos migrantes ao ingressar nas grandes metrópoles deparam-se
com os baixos salários, especulação imobiliária, custo de vida elevado etc. o que faz,
normalmente, o migrante encontra-se em agrupamentos subnormais expostos as
26
intempéries citadinas, mas o que a princípio seria provisório, torna-se permanente,
sedimenta o migrante a grandes áreas de aglomerados subnormais, ou mesmo a um
deslocamento rumo a áreas cada vez mais periféricas.
1.2. A urbanização em São Paulo
No contexto da urbanização brasileira, marcada por grandes deslocamentos
populacionais, pela organização e reorganização espacial e transformações nos
processos de divisão do trabalho e especulação imobiliária, o sudeste do país, em
especial São Paulo, o fenômeno foi mais agudo.
A partir de 1930, após a Grande Depressão, a economia paulista consolidou-se
com proeminência no cenário nacional. Ao contrário das demais regiões, São Paulo
contou com elementos fundamentais para sua expansão diversificada e concentradora:
avançadas relações capitalistas de produção, amplo mercado interno, e uma avançada
agricultura. (BÓGUS, 1992:30)
É importante ressaltar que a capital paulista como centro integrador regional se
deu a medida em que as relações capitalistas de produção se estenderam e
diversificaram, intensificando a divisão do trabalho e o crescimento do pequeno
comerciário, da classe média profissional e dos primeiros núcleos de operários.
Até os anos 30, São Paulo era uma cidade pouco segregada, embora com padrões de segregação bastante marcados. Nesse sentido, havia uma discriminação das áreas habitadas por operários em relação à localização dos serviços e da infraestrutura urbana. Eram áreas de várzea, próximas às fábricas, onde havia as piores condições de serviços e transporte. (BÓGUS, 1992:30-31)
Na década de 20 a indústria paulista passa por grandes processos de expansão,
iniciado na 1° Guerra Mundial, com o aumento e diversificação do polo industrial,
intervenções públicas passaram a ser constantes no setor, as políticas protecionistas do
governo, juntamente com o acumulo de estoque, aliando a bons preços e capitais em
novas lavouras, fariam parte da grande crise financeira mundial de 1929.
Houve também grande expansão das redes de transportes coletivos,
principalmente com o surgimento do ônibus em 1924, que permitiu acesso a novos
loteamentos que gradativamente foram ocupadas, já em 1926 circulavam na cidade
27
cerca de 200 ônibus, ainda existia um constante aumento de automóveis particulares e
caminhões, que aos poucos impunham transformações nos sistemas rodoviários.
(BÓRGUS, 1992:36)
Tentando acompanhar as crescentes mudanças, ainda na década de 20, surgiram
dois planos para a reforma do sistema viário, o projeto de lei da Light (1927) e o plano
de Avenidas de Prestes Maia (1930), os dois planos tinham visões diferentes, quase
antagônicas sobre a forma com que a cidade deveria expandir.
A prefeitura optou pelo Plano de Avenidas, que propunha grandes mudanças na
áreas centrais, desapropriação e abdicação do bonde e linhas ferroviárias, esse plano
estava em sintonia com a política de expansão rodoviária vigente no país.
Importantes rodovias foram abertas nesse período como Anchieta, Anhanguera e
Presidente Dutra (1940), que permitiam um fácil escoamento de mercadoria e sua rápida
circulação, essas rodovias abriram novas áreas industriais, que não precisavam mais
estar presente somente na capital, mas buscam nos bairros satélites melhores condições,
como é o caso da indústria automobilística em São Bernardo do Campo.
Se as aberturas de novas rodovias firmavam o compromisso com os setores
industriais, por outro lado, houve uma preocupação com as questões das moradias,
como o estabelecimento do salário mínimo para o trabalhador, apontando a moradia
como item de maior peso na renda familiar e políticas públicas que tentavam amenizar
as exclusões existentes.
Nesse período houve reivindicações, nos meios trabalhistas, para que o estado
subsidia-se aos trabalhadores habitação, principalmente aqueles de baixa renda. Foi
somente em 1937 que as primeiras carteiras prediais do Instituto de Previdência,
primeira ação efetiva do Estado no setor da habitação popular, mas mesmo assim, essa
política pública demostrou ineficácia para atender a alta demanda existente.
A intervenção do estado no setor habitacional, embora muito restrita acabou por elevar o novel de aspiração dos trabalhadores em ralação à propriedade da casa. Tal fato, aliado às possibilidades de acesso a novas áreas da cidade [...], ao rebaixamento salarial, à especulação imobiliária e à expansão industrial, produziu a conjugação de fatores que, combinados, conduziram ao surgimento de um novo padrão de estruturas urbanas (e de segregação), assentando nos elementos periférico e casa própria autoconstruída. (BÓGUS, 1992:33)
28
Com desenvolvimento da cidade, a especulação imobiliária exagerada, que aos
poucos conduzia pessoas de baixa renda aos loteamentos mais afastados, a
industrialização junto as ferrovias tornado as habitações dos operários junto as estações
externas à cidade, vai ampliando as delimitações citadinas em um processo cada vez
maior de crescimento urbano.
No processo de loteamentos os especuladores imobiliários deixaram de vender
grandes áreas centrais e começaram a investir nos loteamentos para trabalhadores, que
geralmente eram mais afastados dos centros urbanos, bem como de parcos recursos
estruturais, tornando assim o crescimento urbano paulista um emaranhado de teias
urbanas espaçadas e sem lógica para um desenvolvimento urbano planejado.
As décadas de 40 e 50 foram marcadas pela expansão da cidade em direção ao
que podemos denominar de primeira periferia ou periferia próxima (BÓGUS, 1992:34),
essa época foi ocupada as áreas mais distantes, porém ainda nos limites do município de
São Paulo com exceções feitas para Guarulhos, São Bernardo do Campo, São Caetano
do Sul e Santo André, no qual já absorviam aglomerados populacionais graças as
indústrias que se instalaram nos municípios.
O deslocamento para áreas mais periféricas da cidade, atingiu principalmente as
pessoas com maior vulnerabilidade social, que, em grande medida, representavam
famílias em mobilidade espacial, de primeira e segunda geração, pois ao chegarem nos
grandes centros metropolitanos encontravam-se com um mercado imobiliário
inflacionado, baixos salários, custo de vida elevado e um ambiente cultural distinto do
vivenciados em sua terra natal.
1.2.1. A periferia Paulista
O fenômeno da “aglomeração subnormal”, ocorreu devido a diversos fatores,
entre eles a expansão industrial e sua descentralização, a intensa migração e a
especulação imobiliária, garantiram a criação de periferias na cidade. Dessa forma, a
história da construção dos espaços em São Paulo está vinculada ao processo de
diferenciação das áreas habitáveis e sua integração distinta na divisão do trabalho,
entretanto, deve-se o processo de ocupação do solo urbano, sob a égide das regras
capitalistas, a heterogeneidade uma das mais marcantes características da metrópole
paulista.
29
Segundo dados do IBGE a população paulista em 2010 era de 11.253,503
milhões de pessoas, sendo a densidade demográfica de 7.398,3 hab./km2. Existe hoje na
cidade de São Paulo 2.715.067 milhões de pessoas que residem em domicílios ocupados
em aglomerados subnormais, distribuídos em 2.087 mil lugares por toda a cidade.
Mesmo com valores relativamente elevados a população favelada de São Paulo é
uma das menos populosas, o México possui um número muito maior, 45% de sua
população habitam em aglomerados subnormais, em Lima, Peru quase metade da
população mora em barriadas. (Davis. 2006)
No cenário nacional, metrópoles como Belém (PA), Salvador (BA) e Recife
(PE) apresentam uma população periférica muito mais expressiva, respectivamente
52,5%, 25,7% e 22,4% da população residem em aglomerações subnormais, como
aponta o estudo feito pelo IBGE em 2010.
Indiferente da metrópole estudada os processos característicos de segregação e
favelização permanecem essencialmente os mesmos. Em São Paulo, embora existam
registros de favelas desde a década de 1940, foi somente nas décadas de 1950 e 1960
que as aglomerações apresentaram um aumento substancial.
De fato, desde cedo, além das vilas operarias construídas pelas empresas, foi grande a quantidade de cortiços que proliferaram nos bairros operários da época, Brás, Belém, Barra Funda e em zonas mais centrais tais como Santa Cecilia. Não se tratava apenas de moradias deterioradas que passaram a ser alugadas aos trabalhadores que em grande número afluíram para a cidade. Eram, sobretudo, casas construídas com a finalidade especifica de alojar em pequenos cubículos os operários, cujos alugueis uma vez somados propiciavam retornos ponderáveis aos empreendedores imobiliários dos períodos iniciais da industrialização. (KOWARICK, 1993:83)
Com o passar do tempo, especialmente depois da Segunda Guerra Mundial, a
classe trabalhadora passou a habitar em casas precárias, situadas nas periferias citadinas.
Com a especulação cada vez maior do setor imobiliário, o incremento de grandes
contingentes populacionais, como é o caso dos fluxos migratórios, e pouca força de
trabalho disponíveis, a autoconstrução da residência era a forma mais viável de
obtenção de moradia.
Os assim chamados problemas habitacionais, entre os quais a própria favela, devem ser entendidos no âmbito de processos sócios-econômicos e políticos abrangentes, que determinam a produção do espaço de uma cidade e refletem sobre a terra urbana a segregação que caracteriza a excludente dinâmica das classes sociais. (Ibidem)
30
Na cidade de São Paulo a terra é fonte de volumosos e rentáveis negócios,
mesmo com projetos governamentais de incentivos de créditos para pessoas de baixa
renda, como Minha Casa Minha Vida, Casa Paulista, entre outros, podemos notar que a
especulação imobiliária aumentou substancialmente o preço dos mesmos, uma vez que
mercado comportou acréscimos também na obtenção de créditos.
O investimento e a fácil obtenção de crédito superaram a rentabilidade de todos
os outros investimentos financeiros de 2008 a 2013 o setor mobiliário rendeu cinco
vezes acima da inflação, deixando o valor médio dos imóveis paulistas 195% mais caros
segundo o Fipe/Zap.
Esses processos marcam nitidamente a segregação da produção do espaço
urbano em São Paulo, se por um lado cria periferia cada vez mais afastadas dos centros
de empregos, gerando um crescimento desordenado, criando padrões de sedimentação
habitacional descontinuado, impedindo o beneficiamento coletivo, principalmente com
meios de consumo e infraestrutura urbana. De outro a associação entre vazios urbanos,
especulações imobiliárias e serviços públicos tem fundamental importância no preço da
terra que é aumentado dependendo de sua localidade e dos serviços em seu entorno.
Numa metrópole em que a produção de espaço se faz sem a existência de uma sociedade civil vigorosa na defesa dos interesses básicos da maioria dos seus habitantes, as transformações urbanas só podem se realizar como um rolo compressor que esmaga todos aqueles que não têm recursos para conquistar os benefícios injetados na cidade. (Ibidem:84)
Com as melhorias feitas por diversos governos, como por exemplo as linhas
metroviárias, ao mesmo tempo que beneficiam uma grande parcela da população, gera
especulação imobiliária, encarecendo alugueis e vendas de apartamentos e casas, milhares de
pessoas que veem-se obrigadas a ceder o espaço, por não ter mais como sustentar o novo custo
de vida do local, colocando-as cada vez mais para áreas distantes da cidade.
Na luta pela sobrevivência na metrópole as favelas ainda são consideradas fontes de
economia às famílias mais vulneráveis socialmente, isso porque há um controle financeiro
maior nas casas autoconstruídas, principalmente em terrenos ocupados, evitando assim entrarem
no mercado de aluguel, muitas vezes inflacionado pela baixa demanda de imóveis.
Outra fonte variável de economia é a localização das aglomerações subnormais,
dependendo da localização, se perto de centros empregatícios, a economia com transporte ganha
31
importância dentro da cesta de consumo das famílias trabalhadoras, podendo ser fator de
economia ou de gasto excessivo.
Mesmo as áreas periféricas significando uma solução barata e rápida de moradia para
seus habitantes, elas ainda são loteamentos precários, localizado, em muitos casos, em áreas de
litigio leitos de rios e córregos, terrenos e construções temporariamente desabitados, mesmo
assim, o número de saneamento básico em áreas de aglomerações subnormais tem, em São
Paulo, um índice bastante elevado se comparado ao resto do país.
Segundo dados censitários de 2010 o abastecimento de água em áreas de aglomerados
subnormais chegam a 68,4% das residências, e 94,7% das residências regulares, o norte do país
possui as menores taxas, aglomerados subnormais em Amapá, Roraima e Tocantins não chegam
a atingir 8% de adequação dos domicílios com abastecimento de água7.
Esse número inverte-se quando pensamos na distribuição de energia elétrica, em São
Paulo apenas 65,9% das residências em aglomerados subnormais são abastecidas por elas, o
mais baixo da região sudeste, tanto no Rio de Janeiro quando em Minas Gerais os valores são
bem maiores 71% e 75,4% respectivamente8.
Embora os problemas com o saneamento básico nas periferias paulistas sejam menores
que no resto do país, ainda existem outros fatores que contribuem para o estado de
vulnerabilidade social, as periferias urbanas precisam lidar com outras questões que carecem de
atenção popular, problemas como violência, pouco acesso à cultura e lazer, etc.
Segundo pesquisas realizadas pelo CRAVI em quatro bairros periféricos entre a Zonal
Sul e Norte da capital revela que a maior parte dos homicídios ocorre perto da residência das
vítimas, 47,5% na rua, 20,4% no hospital, 9,4% na própria casa e 7,4% em bares. Das 391
famílias entrevistadas 10,9% relataram ter sofrido mais de um homicídio na família9.
Segundo o mapa da violência (2010) o número de vítimas brancas caiu de 18.852 para
14.308, o que representa uma queda de 24,1%, ao contrário, entre os negros o número de mortes
por homicídio aumentou 12,2% de 26.915 para 30,19310.
O problema da violência não está somente na população periférica negra, mas também
nos jovens, principalmente os negros, habitantes desses lugares, embora o Mapa da Violência
2013: Mortes Matadas por Armas de Fogo, apontem um decréscimo no número de mortes em
São Paulo, ainda assim em 2010, 3.845 homicídios foram causados por arma de fogo, a cada
100 mil habitantes entre 15 e 29 anos, desse número 16,6% por armas de fogo, sendo que o total 7 Censo 2010. Acesso a informação. Disponível em: http://www.censo2010.ibge.gov.br/agsn2/. Acesso em 18 de maio de 2014 8 Ibidem. 9LOMBARDI, Renato. Quem são as Vítimas de Homicídios na Periferia. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/dimenstein/noticias/gd181103f.htm. Acessado em: 25 de maio de 2014. 10 WAISELFISZ, Júlio Jacob. Mapa da Violência 2010: Anatomia do homicídio no Brasil. Disponível em: http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2010/MapaViolencia2010.pdf. Acessado em: 25 de maio de 2014
32
de mortes violentas foi de 63,3%, incluindo mortes violentas, homicídio, homicídio por arma de
fogo, suicídio, acidente de transporte.
A vitimização dos jovens constitui grave problema econômico, além da perca de
estimativa de vida ao nascer, cerca dois anos e sete meses para os homens, e quatro meses para
as mulheres, ainda indica que o custo de “bem estar” é de 79 bilhões anualmente, o que
equivaleria a 1,5% do PIB do país, ainda afirmam que em cada estado o custo da vida pode
corresponder a 6% do PIB estadual, como é o caso de alagoas. (MOURA, 2013)
Os jovens de cor parda são as maiores vítimas de homicídios, de mortes violentas com causa determinada e de acidentes fatais [...]. A parcela de mortes indeterminadas trata-se na verdade, de homicídios não classificados como tais, isto implica dizer que [...] as vítimas de homicídios, de mortes indeterminadas e de acidentes, possuem baixa escolaridade, tipicamente de 4 a 7 anos de estudo11.
O gráfico abaixo relaciona escolaridade e causas de morte juvenil, podemos
notar que os maiores índices de homicídio estão em indivíduos que possuem de quatro a
sete anos de estudo. A violência perpetrada entre jovens, pardos e negros de baixa
escolaridade é um fenômeno que tem influenciado diretamente a vivência nas periferias
paulistas, uma vez que expõe a população, e principalmente o jovem e adolescente, a
um ambiente de alta vulnerabilidade social.
Gráfico 1
As mazelas periféricas paulistas não acabam aqui, há diferenças claras também
na distribuição de renda e de trabalho entre os moradores de áreas regulares e áreas 11 MOURA, Daniel Cerqueira Rodrigo. Custo da Juventude Perdida no Brasil. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/130712_custo_da_juventude_perdida_no_brasil.pdf. Acessado em 26 de maio de 2014.
33
irregulares. Segundo dados do SIDRA, o rendimento médio de pessoas em aglomerados
subnormais é de R$ 817,58, enquanto em áreas citadinas a média foi de 2.547,24, uma
diferença de 67,9% de renda média. Pessoas que frequentavam ou frequentam escolas
também são diminutas nas favelas paulistas somente 11,43%, enquanto em áreas
residenciais nominais 88,54 frequentam ou frequentam escolas.
Sem nenhuma dúvida a moradia reflete todo um complexo processo de
segregação e exclusão, a cidade olha a favela como uma calamidade pública, uma
doença patológica que precisa ser exterminada, segregando, assim, todos os moradores,
que são vistos como marginais, malandros, prostitutas e as mais variadas formas de
preconceitos, de tal modo criam políticas públicas de repressão e opressão, forçando o
favelado a sair de sua residência, essas famílias, outrora expulsas ou removidas são
obrigadas a migrar para lugares ainda mais periféricos.
A favela seria um estágio temporário no percurso do migrante, uma espécie de período de poupança forçada que lhe permitiria trocar o barraco por uma habitação de melhores condições. Nessa concepção, a favela seria uma espécie de trampolim pelo qual os recém chegados a cidade, após certo tempo, penetram em patamares caracterizados pelo usufruto de níveis de consumo superiores, inclusive com uma moradia com padrões mais elevados de habitabilidade. (KOWARICK, 1993:94)
Obviamente o migrante que ingressa nas grandes metrópoles, em sua maioria,
acabam em situações de vulnerabilidade social, e muitos procuram residência nas
periferias da cidade, mas não podemos deixar de considerar que a favelização não é algo
passageiro, ou seja, embora o sentimento seja de uma habitação por um curto período de
tempo, muitos sedimentam-se nas periferias, pois nada indica que períodos de tempo na
favela gera algum acréscimo econômico ou capital que indicam um movimento
ascensional para benefícios socioeconômicos.
1.2.2. O Migrante na Periferia Paulista
Uma das grandes características da cidade de São Paulo é seu alto contingente
migratório, principalmente entre 1960 a 1980. Na década de 80 o migrante representava
51,6% da população paulista. A migração acontecia em municípios de base industrial e
cidades dormitórios próximos a São Paulo, sendo que alguns deles tinham altas taxas de
migração, que chegavam até 75% de sua população, como é o caso de Carapicuíba,
34
Embu, Francisco Morato, Jandira, Taboão da Serra e Rio Grande da Serra. (BÓGUS,
1992:38)
Como demostra a tabela 4, embora São Paulo tenha experimentado um grande
contingente populacional, hoje ela não é mais o grande polo de atração migratória,
considerando que até mesmo cidades interioranas do estado tem um índice mais
elevando do que a capital. Ainda assim São Paulo é um dos estados e cidade mais
importantes do país concentrando escritórios de empresas internacionais e nacionais,
centros empresarias e o gerando 443.600 Bilhões de PIB ao ano (IBGE 2010).
Tabela 4:Crescimento demográfico absoluto e taxa geométrica anual por tipo de
componente – Região metropolitana de São Paulo- 1940 a 2010 Período Crescimento Taxa Geométrica anual de Crescimento da
População (%) Total Vegetativo % Migratório % Total Vegetativo Migratório
1940-1950 1.094.741 293.437 26,8 801.304 73,2 5,53 1,48 4,05
1950-1960 2.076.290 840.583 40,5 1.235.707 59,5 5,83 2,38 3,47
1960-1970 3.400.834 1.369.950 40,3 2.030.884 59,7 5,56 2,24 3,32
1970-1980 4.448.815 2.153.238 48,4 2.295.577 51,6 4,46 2,16 2,30
1980-1990 2.856.216 3.130.908 109,6 -274.692 -9,6 1,88 2,06 -0,18
1990-2000 2.431.771 2.212.180 91 219.591 9 1,64 1,49 0,15
2000-2010 1.805.272 2.104.952 116,6 -299.680 -16,6 0,97 1,13 -0,16
Fonte: IBGE, Censos demográficos de 1940 a 2010; Fundação SEADE, 1993, 1998, 2011.
Pelos processos históricos de industrialização, êxodo rural e etc. a constituição
da população em São Paulo é marcada por um número significativo de migrantes como
demostra a tabela a seguir. Observa-se que os não naturais em São Paulo representam
39% do total da população residente, desse número 1,28 milhões de migrantes habitam
35
comunidades empobrecidas, ou seja 34% da população de aglomerados subnormais são
migrantes interestaduais, segundo o LIT com base no Censo 2010.
Tabela 5:Populações por sexo, percentual e total, segundo condição de naturalidade- região Metropolitana de São Paulo-2010 Condição de naturalidade (nasceu nesse
município?) Sexo Total %
Masculino % Feminino %
Sim 5.309.762 27 5.525.148 28 11.878.925 55
Sim, mas morou em outro lugar município ou país estrangeiro
421.249 2 502.831 3 1.142.973 6
Não 3.702.594 19 4.222.391 21 7662.077 39
Total 9.433.602 48 10.250.370 52 19.683.975 100
Fonte: IBGE, Censo demográfico 2010.
O crescimento populacional, o espraiamento urbano, a especulação imobiliária
transforma a vida urbana em uma luta pela sobrevivência, neste caso, a vivencia
metropolitana é marcada por altos contrastes entre aqueles que usufruem do direito de
ser cidadão na metrópole, e aqueles no qual o mesmo direito é negado.
A precariedade das condições de vida, por si só, já torna temerário classificar o favelado como um cidadão urbano, mas não é somente sob esse aspecto que a cidadania, entendida como um rol mínimo e imprescindível de direitos, está ausente. (KOWARICK, 1993:91)
Se para o morador urbano existe alternativas de reivindicar melhorias públicas
para seus bairros, os moradores favelados são alienados de seus direitos como cidadão
urbano. Dessa forma, em princípio, se o cidadão urbano não tem pleno gozo das
infraestruturas citadinas, ele, ao menos, pode avoca-las para si.
36
Mesmo com altos índices de urbanização a cidade paulista ainda é extremamente
defasada no fornecimento de benefícios urbanos mínimos a população em aglomerados
subnormais.
O fato de ser favelado tem desqualificado o indivíduo da condição de habitante urbano, pois retira-lhe a possibilidade de exercício de uma defesa que se processa em torno da questão da moradia. Ocupante de terra alheia, o favelado passa a ser definido por sua situação de ilegalidade, e sobre ele desaba o império draconiano dos direitos fundamentais da sociedade, centrados na propriedade privada. (KOWARICK, 1993:93)
No imaginário popular o morador da favela pode ser removido de sua moradia
pela ilegalidade de sua situação, revoga-se seu direito de cidadão pela prerrogativa da
posse de terra, dessa forma anula-se os direitos de cidadãos urbanos de uma quantidade
significativa da população em São Paulo. Dessa forma a política governamental visando
a desaceleração do crescimento das favelas permitem ao proprietário privado autonomia
absoluta para desagregar o morador de sua residência.
O morador favelado e habitante de áreas ilegais adquirem uma consciência da
eventualidade sempre presente de serem obrigados a abandonar os aglomerados. Com o
quadro formado, os moradores procuram polos agregadores para resistir à pressão
social, imposta pela máquina capitalista, um desses polos de resistência é o
associativismo e as redes sociais.
No processo de migração, muitas vezes forçado pelas circunstâncias, a luta pela
sobrevivência nas metrópoles acaba, em muitos casos, conduzindo o migrante para
espaços periféricas e de favelização. Nessas áreas o migrante vê seus direitos
deliberadamente anulados e sua força de trabalho reduzida, além disso, as parcas
estruturas públicas, a dificuldade de anexar novas formas culturais, o sentimento de
retorno a sua terra natal e a instabilidade, sempre presente, de sua situação, fazem do
migrante que vem para capital paulista um cidadão com altas taxas de vulnerabilidade
social, que busca o convívio mútuo e no associativismo para amenizar as intempéries da
vida.
1.3. Os Primórdios da Zona Leste de São Paulo, João Ramalho e os
Jesuítas.
37
Em 1549 chega ao Brasil, mais precisamente na Bahia o governador geral Tomé
de Sousa acompanhado do padre Manuel da Nobrega, lá o padre enfrenta inúmeros
problemas, existia uma relação conflituosa com os pajés locais que apregoavam a
disseminação de doenças e mortes entre os índios trazida pelos missionários
portugueses, para os pajés as doenças eram causadas não somente pelo contado dos
indígenas com os lusitanos, mas também pela adesão ao cristianismo e o batismo
indígena. A missão católica enfrenta duras resistência e evasão massiva na missão
indígena.
Além disso Nobrega também enfrentou e condenou práticas de antropofagismo,
poligamia, venda de índios como escravos, os problemas não eram somente dos
conflitos com os indígenas, mas das relações com os capitas-gerais, que exerciam poder
na ausência dos donatários, muitos deles, inclusive, nunca visitaram nenhuma de suas
terras no Brasil, para o padre era dever do donatários cuidar de seu quinhão de terra
pessoalmente.
Nobrega relata ao rei D. João III sua insatisfação com seus patrícios, para ele as
casas estavam cheias de “pecados mortais”, cheias de adultérios, fornicações, incestos,
enganos, ódio, roubos e outros pecados. Com a crescente insatisfação do padre Nobrega
e prevendo um conflito mais sério por parte dos residentes na Bahia, Tomé de Sousa,
governador geral, convida o padre para uma inspeção às capitanias ao sul da colônia, e o
padre aceita a missão de bom grado.
Ao chegar Tomé de Sousa e o padre Nobrega decidem subir a serra, ali encontra
um povoado, espaço já anteriormente organizado pelo padre nunes, dessa forma o
governador decide elevar Santo André da Borda do Campo a vila. E nomeou João
Ramalho alcaide-mor e capitão-mor do campo mesmo com as relações tensas entre
Ramalho e os jesuítas.
Foram muitas vezes tensas as relações entre João Ramalho e os padres. As divergências começavam pelo modo de vida do patriarca, dado a ter muitas mulheres e andar livre e solto como um índio, e terminavam pelas atividades, digamos assim, profissionais, de Ramalho, que não eram outras senão o apresamento de índio e sua exploração ou venda, como cativos. (TOLEDO, 2012:81)
A intencionalidade da nomeação de João Ramalho a um posto militar de alta
importância é cooptar a ajuda do patriarca para a proteção dessas terras, afinal ou Tomé
de Sousa contaria com a ajuda de Ramalho, ou não contaria com ninguém mais. Dessa
38
forma Ramalho passou a ser responsável pela segurança do local e pelo cumprimento
das ordens emitidos peça coroa.
Mesmo com a pouca simpatia do padres jesuítas João Ramalho ajuda o padre
Nobrega a subir e fixar-se no planalto, há ponto de transferir o colégio da vila São
Vicente, fundado pelo padre Nunes; Nobrega enxergava com maus olhos a “população
branca” do local, para ele só era possível fazer o evangelho longe da degradação moral
de seus patrícios, os “brancos” eram má influência e por isso tomou a decisão de
transferir o colégio para outro espaço, longe das figuras danosas, a fim de construir uma
comunidade “verdadeiramente cristã”.
Em outubro, escrevia ao rei D. João III que num determinado local do Planalto, situado a dez léguas pouco mais ou menos do mar, e dias de uma povoação de João Ramalho – Santo André, da qual o patriarca era alcaide – ia ajuntando-se todos os que Nosso Senhor que trazer à sua Igreja [...] Dessa maneira, segundo Nobrega, numa frase famosa “uma fermosa povoação”. Era o embrião daquela que viria a ser São Paulo. (Ibidem:93)
Outro personagem importante dessa história é José de Anchieta, ele chega na
vila de São Vicente na véspera de natal de 1553, encontra-se com Nobrega que estava
no afã de sua nova empreitada no planalto, com ajuda dos índios os padres jesuítas
constroem, uma casa rustica com paredes de barro, pau e telhado de palha, existia
somente um cômodo, multiuso, que abrigará a escola, cozinha, enfermaria, dormitório,
refeitório e despensa, existiam cerca de 13 jesuítas habitando o local.
Em 25 de Janeiro de 1554 é celebrado a missa de inauguração da missão jesuíta
no planalto, bem como assinalava o começo das atividades do colégio, a dedicação à
São Paulo foi feita no dia 25 de Janeiro, considerado o dia de sua conversão.
Posteriormente esse momento ficou marcado na história como o nascimento da cidade
São Paulo.
Na verdade, o momento é mais solene para a posteridade do que para quem o viveu de corpo presente. Que aconteceu, naquele dia? Uma missa, numa casa paupérrima, plantada no meio de uma aldeia de índios. Quase nada, nem foi a primeira missa no Planalto. O padre Leonardo Nunes, desde quatro anos antes, vinha visitando a região. Nobrega desde o ano anterior. Como é praxe, entre os padres, os dois não deixavam de celebrar missas, estivessem onde estivessem. Era inauguração de um colégio, mas outros colégios já haviam sido inaugurados no Brasil. A rigor nem novo este era, mas continuação de um de ali perto, em São Vicente. (Ibidem:100)
39
A criação do colégio no centro da vila indígena foi chamada de Piratininga e
estava em franco crescimento, contando com a benção e a proteção de Tibiriçá, cacique
influente e poderoso da região, sogro de João Ramalho. Mesmo assim em apenas dois
anos Piratininga sofreu com guerras, invasões e esvaziamento dos indígenas que se
mudaram para o local. Influenciado por outros caciques da região que diziam que os
índios batizados serviriam como escravos e os que não fossem seriam mortos, a maioria
dos índios não permaneceu na região.
Em 1560 chega a São Vicente o terceiro governador-geral do Brasil, Mem de Sá,
para uma inspeção na região, Mem de Sá atendendo aos pedidos feitos muda a vila de
Santo André para outro local, uma colina conhecida como Anhangabaú, para lá foram
removidas as casas, a câmara e o pelourinho, símbolo de autonomia da vila, o nome
Santo André deixaria de existir para agregar-se a São Paulo de Piratininga.
Aos poucos a influência dos jesuítas no local é menor, com a transferência da
vila de Santo André, São Paulo de Piratininga deixa se der povoação e eleva-se a vila, é
agora um centro português, o destaque na defesa na vila não está mais em Tibiriçá, que
não a defende mais de dentro, mas de fora com índios arregimentados de outras vilas.
Cabe a João Ramalho a defesa da vila, o domínio da vila é agora de Ramalho e não mais
de Nobrega ou Anchieta.
O colégio jesuíta é desmontado e transferido novamente para São Vicente,
voltará somente no final do ano com outra função, de escola indígena para escola dos
filhos dos portugueses. Os padres que permaneceram na vila também alteraram sua
função, passam, agora a ser párocos, vigários etc. não exercendo mais a função de
catequizadores indígenas.
Embora João Ramalho acumulasse cargos entorno de si, ele nunca teve a
intenção de morar, nem em Santo André da Borda do Campo, nem em São Paulo de
Piratininga, permanecendo em sua sesmaria, doação de Martin Afonso pelos serviços a
ele prestado. Mesmo de posse da sesmaria, a terra dada não tinha o objetivo de cultivo,
mas de povoamento, dessa forma os limites delas não eram especificamente escritos,
geralmente obtinha-se apenas uma simples cópia em pequena escala do foral.
As maiores extensões de terras de João Ramalho estão, hoje, localizadas em
grande parte da Zona Leste de São Paulo, bairros como Vila Prudente, Vila Zelina, Vila
Ema, Parque da Mooca, Vila Alpina, Sapopemba, são todas terras onde Ramalho, suas
mulheres, e sua prole residiam.
40
Contudo, as terras ainda eram para povoamento sem intenção de cultivo o que,
após a morte de João Ramalho em 1580, causa a seus descendentes alguns
contratempos. Além do não reconhecimento da grande extensão de terra deixada por
Ramalho e a falta de cultivo da mesma, a doação de uma sesmaria a aldeia de São
Miguel de Ururaí que invadia uma parte da sesmaria de João Ramalho causa grande
conflito entre eles. (DELI, 2005:35)
Uma parte da sesmaria de Ramalho é dividida. Ela é cedida para o padre
Matheus Nunes de Siqueira em 1650, com o objetivo de cultivo da terra, manutenção e
ampliação da capela da Nossa senhora da Penha de França, construída em cima de uma
lenda local, o que mais tarde originaria o bairro Penha.
A sesmaria de João Ramalho tinha como finalidade a povoação e portanto não representavam uma coisa individual [...] tanto que Mathias Oliveira que era neto de João Ramalho, em Janeiro de 1609 pediu ao tenente Gaspar Coqueiro, que lhe concedesse as terras que tinha cercado com os valos, dados por seu avô João Ramalho e mais ainda um capão com mais 200 braças de campo ao redor para fazer um quintal. A petição foi deferida e ele recebeu o que pediu nas mesmas condições de sesmaria comum. (FILHO, 1990:18)
Mesmo que a sesmaria de João Ramalho não fosse um título de domínio
privado, no qual seus descendentes tivessem total usufruto, ou mesmo que
posteriormente uma grande parte de suas terras fossem fragmentadas para cultivo, ainda
assim, os descendentes de Ramalho continuaram de posse dos terrenos aludidos e
passaram a constituir a sesmaria que foi doada em 1601 a eles por Roque Barreto, então
tenente do capitão Governador Lope de Souza à Francisco Ramalho e Antônio Macedo
Neto, respectivamente filho e neto de João Ramalho.
Com o tempo a sesmaria fragmenta-se e sofre gradativos processos de grilagem,
dessa forma, a propriedades das terras passam por inúmeros donos ao longo dos anos,
como mostra a tabela abaixo, essa situação ira permanecer até 1829 com a aquisição de
uma grande quantidade terra por João Pedroso12.
Tabela 6:Vila Prudente – Capão da Invernada, Capão, Embiriva, Embahú Proprietários Ano de aquisição Capitão Jose Gonçalves Coelho 1750 Capitão Joaquim Gonçalves de Oliveira 1810 Ten. Cel. Jose Maria de Mello 1830
12 Em 1829 João Pedroso adquiri uma boa quantidade de terra, que posteriormente se tornaria a região da Vila Prudente, abordaremos melhor esse assunto no 2° capitulo desta dissertação.
41
Felício Antônio Mariano Fagundes 1837 João Pedroso 1848 Martinha Maria Pedroso 1874 Maria do Carmo Cyparisa Rodrigues 1880 Irmãos Falchi 1890 Dados: Revistas Históricas – Vila Prudente sua História.
Tabela 7:Vila Prudente (Tapera ou Mato das Simbarivas) – atual favela V Prudente e parque da Mooca.
Proprietários Ano de aquisição Capitão José Rodrigues da Silva 1801 Felício Mariano Fagundes 1846 Francisco Antônio Mariano Fagundes 1856 Martinha Maria Pedroso 1874 Benedicto Antonio 1878 Antonio Dafré 1893 Dados: Revistas Históricas – Vila Prudente sua História.
Tabela 8:Vila Zelina – Baixos do Zimbaúba
Proprietários Ano de aquisição Tem. Col. Francisco de Salles 1804 Ephigenia Maria do Glycerio 1823 João Pedroso 1836 Martinha Maria Pedroso 1858 Benedita Maria da Silva 1870 José Antônio Borba 1889 Dados: Revistas Históricas – Vila Prudente sua História.
O caminho indígena pré-cabraliana, onde hoje é conhecido como Tatuapé e
Penha, exercia um papel importante ligando a Vila de São Paulo à sede do aldeamento
de São Miguel, essas rotas com pousadas ao longo do caminho, primeiro para quem ia
em direção a Mogi das Cruzes, aos aldeamentos e ao Vale do Paraíba, depois às Minas
Gerais dos Guataguazes, facilitavam o comercio entre elas. (DELI, 2005:89)
Com o passar dos anos e a implantação da rota São Paulo – Rio de Janeiro, o
caminho do Ururaí, embora continua-se a ser utilizado, aos poucos perde importância
devido ao paralelismo com a nova rota. O caminho que passa pelo outeiro da Penha
começa a destacar-se como local de pouso para os viajantes, concomitantemente a
Penha enfrenta intensa peregrinação religiosa ao pequeno templo local, que colabora
para a formação e consolidação de um núcleo ao redor da capela Nossa Senhora da
Penha. O núcleo formado ganha tamanha importância que em 1796 é elevado à
categoria de freguesia, acentuando ainda mais sua função religiosa. (Ibidem:91)
42
Podemos então perceber que a importância da zona leste de São Paulo,
conhecida como bacia do Aricanduva estava calcada em três aspectos, a ligação entre
São Paulo e o litoral (porto) que ficava em Santos, as rotas entre São Paulo e o Vale do
Paraíba, as peregrinações religiosas para a freguesia da Penha. As vias de circulação que
existiam na bacia do Aricanduva permitiram um aglomerado entorno dela gerando
organizações e ocupações espaciais diversificadas.
Hoje a região é a mais populosa da capital chegando a 4 milhões de habitantes
espalhadas em uma área de 326,8 km2, 40% da população paulistana reside em uma área
que corresponde a 21% do território paulistano, segundo dados do Censo 2010
divulgado pelo IBGE.
Atualmente a prefeitura de São Paulo dividiu a Zona Leste entre um e dois, e
ainda sudeste leste, elas são divididas em sudeste leste: Mooca, Aricanduva, Vila
Prudente e Ipiranga; Zona Leste 1: Penha, Ermelino Matarazzo, Itaquera e São Mateus;
Leste 2: Itaim Paulista, Guaianazes, São Miguel Paulista e Cidade Tiradentes.
A Zona Leste de São Paulo foi ocupada por uma constelação de núcleos que se
espalhavam ao longo do caminho que ligava São Paulo ao Rio de Janeiro. Dessa forma
as autoconstruções e os loteamentos clandestinos na ZL sempre foram vistas como uma
área de trabalhadores braçais, pessoas de baixa renda que exerciam sua força de trabalho
nas indústrias paulistanas.
Acompanhando o crescimento populacional da Zona Leste, vê-se a necessidade
de construção de uma via, assim cria-se a Radial Leste. Com as avenidas Celso Garcia e
Rangel Pestana congestionadas a implantação da Radial Leste torna-se essencial, ao
longo de seu trajeto ela recebe vários nomes, Avenida Alcântara Machado, Viaduto
Pires do Rio, Rua Mello Freire, Avenida Conde de Frotin, Avenida Antonio Estevam de
Carvalho, Avenida Doutor Luís Aires, Avenida José Pinheiro Borges. Todas elas
formas a ligação do centro da cidade a região leste de São Paulo, realizada em parcelas,
com seu projeto aprovado em 1945 pelo, então prefeito Prestes Maia, porém a obra de
início aconteceu somente em agosto de 1957, com retomada e ampliação das obras em
1966 e 196713.
Já em 1970 a linha de metrô, é implementada na região, conhecida como linha
vermelha, que vai das estações Corinthians-Itaquera até Palmeiras-Barra Funda.
13 SACONI, Rose. Como era São Paulo sem a Radial Leste. Estadão. Disponível em: http://acervo.estadao.com.br/noticias/acervo,como-era-sao-paulo-sem-a-radial-leste,9129,0.htm. Acesso em: 14 de maio de 2014.
43
Essa estruturação em torno de um forte eixo na direção Leste-Oeste, que liga o centro à periferia próxima e distante, reflete a história da exclusão territorial que teve lugar a cidade de São Paulo e que encontra paralelos em todas as grandes cidades brasileiras. (ROLNIK & FRÚGOLL, 2001:45)
A exclusão na Zona Leste, como já discutido anteriormente, acontece não
somente pela valorização imobiliária dos bairros paulistas empurrando as famílias de
baixa renda para as bordas das cidades e espaços de segregação, mas também através
das políticas públicas que priorizaram a concentração de investimentos no chamado
centro expandido protegendo-o através de complexo regulatório urbanístico,
resguardando o patrimônio imobiliário das camadas da população com rendas mais
elevadas, em detrimento as áreas periféricas, onde priorizava-se investimentos em
sistemas viários e de transporte, que basicamente, funcionavam para mover a população
trabalhadora para o centro empregatício.
O crescimento periférico na Zona Leste de São Paulo, até meados de 1970
abarcou boa parcela da classe trabalhadora que via somente a possibilidade de
aquisições de terrenos distantes e relativamente baratos, de modo geral, essas novas
habitações eram desprovidas de infraestrutura básica, onde os próprios morados
utilizavam-se da autoconstrução para, assim, garantir um lugar no chão paulista.
Segundo Bonduki sobre o mesmo período analisa:
Durante os anos 70 este quadro se altera, revelando um crescimento de opções não baseados na casa própria, ao mesmo tempo em que se acentuou o pauperismo em consequência do arrocho salarial. Crescem os núcleos de favelas, entre 1970 e 80 o número de favelados cresce 45% ao ano, índice quase dez vezes superior taxa de incremento populacional na região metropolitana de São Paulo. Neste período ocorre também uma elevação do número de moradores em cortiços e casas precárias de aluguel na periferia. (1987:36)
A política habitacional adotada também não consegue atender as necessidades
da demanda cada vez maior da população, dessa forma começa a atuação da COHAB –
SP (Companhia Metropolitana de habitação de São Paulo) construindo grandes
conjuntos habitacionais em áreas da zona leste.
As construções dos conjuntos habitacionais feitas pela COHAB-SP eram quase
que exclusivamente atendidas na região leste e a procura excedia em muito a oferta, a
44
ponto de existirem 300.000 mil inscritos sem previsão para serem atendidos
(BONDUKI, 1987:55)
O discurso das autoridades da COHAB-SP aponta a Zona Leste como área mais propicia de São Paulo, à construção de grandes conjuntos habitacionais. Além de enormes terrenos disponíveis como região pobre e pouco desenvolvida fez parte do escopo da administração Olavo Setúbal (1975 -1978) o desenvolvimento dessa região. Um componente de fixação desse desenvolvimento seria justamente a parte da implantação de soluções habitacionais. Essa administração municipal inicia francamente o caminho para a construção de grandes conjuntos habitacionais em São Paulo especialmente na Zona Leste (DAMIANI, 1993:31)
Recentemente a região da ZL de São Paulo, assim como toda a cidade, passa por
um processo econômico diferenciado, com as novas dinâmicas, há uma verticalização
dos bairros da ZL, com a supervalorização imobiliária subsidiada pelas políticas
públicas governamentais e a facilidade de obtenção de credito, bairros como Tatuapé,
Mooca, Belém, Braz, Penha, Vila Formosa, Vila Prudente e Anália Franco. Torna-se
reduto residência de classes de renda média e alta. Por outro lado ainda há pouco
impacto em áreas de mais segregação como Lajeado, Guaianazes, Itaim Paulista, Cidade
Tiradentes, etc.
São Paulo passa por uma transição econômica, embora ainda existam muitas
indústrias na cidade e com isso massivos investimentos por parte delas, é notável que a
cidade paulistana sofreu com a desindustrialização, dessa forma, São Paulo passa de
uma cidade basicamente industrial para a metrópole de serviços terceirizados,
comércios e negócios financeiros.
De toda a forma, a nova economia que surge produz efeitos contraditórios sobre o espaço da cidade: por um lado, vai sendo esvaziada a fissura interna que caracteriza a cidade industrial, que traçava uma barreira fabril entre a periferia precária a Norte-oeste-Leste-Sudeste e a cidade rica e equipada a Sudeste. A medida que as indústrias saem da cidade, os bairros onde elas se localizam podem ser repovoados para usos residenciais, comerciais e de lazer. (Ibidem: 48)
Outro aspecto que merece destaque no cenário contemporâneo da Zona Leste é o
efervescente cenário religioso abarcado nela, a avenida Celso Garcia é um exemplo
concreto disso. Quem passa pela avenida consegue identificar inúmeras igrejas, seja das
novas igrejas “neopentecostais”, ou mesmo igrejas mais tradicionais no bairro.
Pode-se dizer que a história da Avenida Celso Garcia começa ainda no tempo do
Brasil colônia, com as romarias que seguiam para a capela da Penha, em 1667, nesse
45
tempo era conhecida como Estrada da Penha e Caminho do José do Brás.14 O nome
Celso Garcia foi colocado em homenagem ao homem que dedicou-se a causa operaria,
defendendo o direito do operariado no bairro.
O caminho que era conhecido pelas suas romarias, hoje, abriga inúmeras igrejas
e mega-templos, como é o caso do Templo de Salomão, construído pela IURD. A
Celso Garcia conta também com outros templos de credos diferentes, eles estão a menos
de 400 metros um do outro, competindo pela atenção dos sequazes que utilizam a via.
Com tantas igrejas e religiões a Avenida Celso Garcia, torna-se um exemplo da
pluralidade religiosa encontrada em toda a extensão da ZL.
É nesse contexto que está nosso objeto de estudo, um bairro de convivência
multi-classes onde se disputa espaço com condomínio de alto luxo, casas da classe
média e favelas, onde reside a camada de maior vulnerabilidade social, nesse sentido a
região traz um mosaico rico e interessante para o estudo sobre a influência da religião
nas periferias urbanas, mostrando ao mesmo tempo as disputas entre as classes, as redes
sociais e os associativismos abarcados nela.
1.4. Considerações
Nossa intenção nesse capitulo foi explanar sobre o processo de urbanização
brasileiro, observamos que a rápida urbanização, especialmente no sudeste do país,
incentivado pelo momento econômico favorável e desenvolvimento industrial
favorecido pelo governo, trouxe ao sudeste uma demanda grande por mão de obra. Essa
demanda é suprida pelos fluxos migratórios e êxodo rural que chegam a RMSP e Rio de
Janeiro.
Os migrantes a procura de emprego e moradia encontram uma São Paulo
desestruturada para receber um enorme contingente populacional, assim com a
especulação imobiliária, os subempregos, sem força de trabalho necessário para uma
qualificação melhor no trabalho, o migrante vai deslocando-se progressivamente para
áreas periféricas, onde não existe estruturas urbanas que encarecem a terra, e baixa
especulação imobiliária. Infelizmente nessas áreas sem estruturas urbanas, o estado
também não se faz presente existindo índices de violência altos, como assassinatos,
roubos etc. 14 LEMAD – Laboratório de Ensino e Material Didático: História de São Paulo: Av. Celso Garcia. Disponível em: http://lemad.fflch.usp.br/node/260. Acesso em 21 de maio de 2014.
46
Dessa forma os sujeitos em mobilidade espacial apresentam índices elevados de
vulnerabilidade social, uma vez que, a violência, a moradia precária, as parcas estruturas
urbanas em que é submetido, a força de trabalho reduzida e o preconceito social
garantem a perpetuação da exclusão desses indivíduos, que sem forças para resistir as
dinâmicas da cidade sucumbem perante os contingentes urbanos.
Em seguida abordamos pontos históricos e contemporâneos da Zona Leste
paulista, que foi marcada por processos de grilagem, espoliação, exclusão, disputas de
terras, fenômenos religiosos, e, recentemente verticalização e transição de zona
industrial para espaços de terceiro setor15.
A análise das estruturas citadinas em São Paulo é essencial para a compreensão
dos aspectos no distrito de Vila Prudente, uma vez que a região, ainda hoje, evidencia
aspectos dos fluxos migratórios, tanto interestaduais quanto internacionais, assim como
convive em meio a estados de precariedade urbana e espaços urbanos privilegiados. Em
seguida o foco da pesquisa se ateará a urbanização e migração no distrito de vila
prudente, e, como esse fenômeno adquiri relevância dentro do bairro e, principalmente
influencia as dinâmicas religiosas nesse contexto.
15 É uma terminologia sociológica que indica todas as iniciativas privadas de utilidade pública com origem na sociedade civil.
47
Capítulo 2: Urbanização e Migração no Distrito de Vila Prudente
Neste capitulo continuaremos analisando as relações entre urbanização,
migração e religião, mas, agora de uma maneira mais especifica, uma vez que nosso
foco está no distrito de Vila Prudente. Como veremos nesse capítulo a região de Vila
Prudente possuiu um longo histórico de processos migratórios, começando com a
imigração Italiana, passando pelas imigrações do leste europeu e por último dos
processos migratórios inter-regionais.
Assim nossa análise começa examinando a história da construção da Vila
Prudente, expondo aspectos importantes sobre a vila, que a princípio, era quase
exclusivamente um reduto da comunidade imigrante italiana, aos poucos abre-se
espaços para novos imigrantes como pessoas do leste europeu que chegam no distrito
fugindo da Primeira Guerra Mundial.
A segunda parte do capitulo é a análise da urbanização do distrito e
posteriormente sua verticalização, entendendo que como já citado no capítulo anterior,
quanto maior o investimento público em benefícios para o indivíduo, mais há
especulação imobiliária e aumento do custo de vida da família, o que consequentemente
conduz famílias com baixo capital econômico e social para lugares mais distantes e com
menos infraestrutura.
Por fim, destacaremos as relações entre o distrito/bairro e a religiosidade, em um
primeiro momento elencamos as igrejas com maior destaque no bairro e, se possível,
48
uma breve explicação de sua história, em seguida discutiremos o papel da religião como
agregador das pessoas em mobilidade espacial e a sua função de gerir e estabelecer
coesão a pessoas em transitividade, construindo ou reconstruindo uma identidade capaz
ganhar a subjetividade do migrante a fim de transformar seu habitus.
Ao final do capítulo nosso objetivo é oferecer um panóptico sobre o distrito e o
bairro, a fim de compreender as ações dos membros da Igreja Mundial do Poder de
Deus, entendendo que as ações dos fiéis da igreja, bem como as ações da própria igrejas
estão relacionadas ao contexto social presente no bairro e no cotidiano dos adeptos da
IMPDVA.
2.1. Migração e identidade
O processo de “tornar-se humano” somente é possível via cultura, essa cultura16
é transmissível e modificável, ou seja, o indivíduo é submergido em uma cosmovisão
simbólica, cheia de significações e representações. Assim a visão de mundo de um
indivíduo, a moral, os comportamentos sociais e a própria expressão corporal são
produtos de herança cultural, tanto do convívio familiar quanto da vivencia em
sociedade. Geertz (1989)
Sendo assim a cultura é subjetiva, ou seja, não é sempre manifesta
conscientemente pelo indivíduo ou pelo grupo social, mas pode ser moldada por eles,
construída e reconstruída na relação com os grupos sociais no qual interagem.
A cultura é ação, interação, comunicação. O indivíduo não é somente produto da cultura, mas também a constrói, a recria, em função das problemáticas e das estratégias diversificadas e num contexto marcado pela diversidade e pela pluralidade. (RAMOS, 2001:165)
A cultura não é uma instância estática da vida humana, mas uma obra em
constante mudança e adequação, Berger & Luckman (1999) afirmam que o ser humano
é produto e produtor da sociedade na medida em que a sua ação produz uma ordem
16 Stuart Hall define cultura como toda a ação social e práticas sociais que expressam ou comunicam um significado. In: Media and cultural regulation ,1997.
49
institucionalizada, uma certa forma de agir que é interiorizada no processo de
socialização. Nesse processo as imagens, ações, símbolos e sentidos são subjetivados
tornando-se uma parte de nossa cultura.
Destarte a realidade quotidiana tem dois aspectos que se completam, uma
realidade objetiva e interpretada por cada ator social, e um mundo subjetivo com origem
nos pensamentos e simbolismos dotados de sentido. Nesse aspecto a identidade é,
também, uma construção social, são representações, através da cultura, sobre o modus
operandi daqueles indivíduos sociais. (HALL, 2005: 57)
As identidades são representações construídas através da cultura, são elementos
subjetivados através das relações sociais entre os indivíduos, assim a identidade é
produzida através de sistemas discursivos, dialógicos, imagens e símbolos que
corroboram para a subjetivação da identidade social.
As pessoas em mobilidade urbana têm sua identidade permeadas de contradição,
uma vez que elas trabalham com sistemas de valores e símbolos diferentes dos
apreendidos em sua terra natal. Dessa forma a origem passa a ser um lugar mítico, uma
vez que é impossível de ser resgatada plenamente, nem encontrará mais a realidade que
deixou a tempos atrás, além disso o lugar de destino nunca acolherá, ou mesmo, o
satisfará inteiramente. A identidade do migrante fica fragmentada, esta é exatamente a
experiência de diáspora, longe o suficiente para experimentar o sentido de exilio e
perda, perto o suficiente para entender o enigma de uma ‘chegada’ sempre adiada.
(HALL, 2006:393)
A vivencia cotidiana em um ambiente de múltiplos pertencimentos forma uma
base cultural hibrida, compartilhada a partir de inúmeros referenciais. Esses ambientes
fronteiriços podem ser encontrados principalmente em ambientes eclesiais. Assim ter
uma identidade seria pertencer a um país, a uma cidade ou um bairro, uma entidade que
seja compartilhada por todos aqueles que ocupam o mesmo espaço, de forma a
tornarem-se idênticos. É também compartilhar os mesmo símbolos e objetos, rituais e
costumes, e aqueles que não compartilham tais coisas, são outros, os diferentes.
(COLFEIRAI, 2010:08)
Quando analisamos os indivíduos migrantes em 2° geração percebemos que essa
relação é ainda mais conflituosa, pois o próprio processo de construção de sua
identidade é problemático, uma vez que ela é estabelecida em cima de duas culturas, no
qual muitas vezes não se aceitam mutuamente, embora dividam o mesmo espaço.
50
Dessa forma a pressão sobre o migrante de 2° geração é enorme, uma vez que o
grupo dominante, muitas vezes, desqualifica e desvaloriza culturas diferentes,
construindo imagens caricatas e exóticas dessa cultura, pressionando o indivíduo a
aculturar-se, na mesma medida sofre pressão de seu grupo de origem para que se
mantenha fiel à cultura de suas raízes.
A construção da cultura em migrantes de 2° geração, principalmente em idade
infantil ou adolescente é especialmente cruel, onde o indivíduo é mais fragilizado
emocionalmente, principalmente por passar pelo processo de aceitação do grupo, que
nesse caso possui a cultura dominante, o que ocorre, normalmente, é a estigmatização
do migrante de 2° geração, que cresce enquanto se constrói em uma cultura que lhe é
hostil, ou seja, encontra-se no “limbo” identitário, uma vez que não se apropria
plenamente da cultura materna e nem reconhece a nova cultura como sendo
integralmente participante dela.
Estranhos – não são os prussianos na Prússia, mas sim os prussianos na Bavária (...) estranhos não são os turcos na Turquia, mas sim os turcos em Berlim – Kreuzberg. Estranhos são os turcos alemães, filhos de turcos, nascidos e crescidos na Alemanha, onde também foram à escola (...), mas que viajam com o passaporte turco e se sentem como turistas em sua “pátria” (terra natal), na Turquia. (Beck, 1996:320)
Nesse contexto a identidade estabelece-se em contraste com o que é semelhante
e diferente de seu sistema de valores e crenças, a socialização primaria (fundamentos
culturais na infância) e a socialização secundaria (viver em sociedade) são dois
elementos importantes na elaboração e identificação daquilo que é semelhante e díspar
na cultura vivenciada, em processos migratórios a identidade estabelece-se como
memória mitológica de descendência e histórica.
Nenhum indivíduo é pleno em sua identidade, todos sofrem de rupturas
anexando ou substituindo sistemas de valores, crenças, mitos, cosmovisões, dependendo
do local em que se encontra, ou mesmo das pessoas presentes naquele momento. Mas
no caso dos sujeitos em mobilidade humana, a identidade passa a ser nevrálgico, uma
vez que, o indivíduo precisa assumir modelos dispares ao seus, e em muitos casos, uma
identidade coagida pelos contingentes da migração forçada, em busca de melhores
formas de vida.
51
2.1.1. Migração e Identidade Religiosa.
Entre as religiões e migrações populacionais existem laços históricos e
simbólicos. Não são poucos os fundadores de tradições religiosas que passaram, de
alguma forma, por processos migratórios, exemplo disso é o êxodo de Moises, a fuga de
Jesus para o Egito, Égira para Maomé. Com o passar do tempo, o processo de
mobilidade humana, nas tradições religiosas acabam ganhando conotações simbólicas
interpretativas, não é incomum a migração em ambientes religiosos serem interpretados
como caminho, passagem, processo de morte para a vida, escravidão para libertação etc.
Além do processo histórico-simbólico, a migração possibilitou um maior alcance
da mensagem de muitas tradições religiosas, principalmente o cristianismo,
recentemente com a intensificação de processos de mobilidade humana internacional
proliferou-se diversas manifestações religiosas ao redor do globo terrestre.
Dessa maneira as tradições religiosas usufruíram do deslocamento humano para
aumentar a fluidez de suas fronteiras religiosas, Berger expõe que: a conversão é
sempre possível, mas é mais provável em contextos migratórios, pois aumenta com o
grau de instabilidade ou descontinuidade da estrutura de plausibilidade em questão.
(1985:59-60)
Contudo, as religiões não somente interferem na religiosidade do migrante, mas
ela também articula mudanças na sua estrutura por influência migratória, Pace (2009),
sociólogo da religião, assevera que as religiões são sistemas dinâmicos que se
modificam constantemente em comunicação com o ambiente social, a religião interage
na sociedade buscando gerenciar a pluralidade urbana e a imprevisibilidade dos
ambientes externos em que se desenvolvem.
As religiões são como grandes compassos: partem de um ponto gerador e depois, à medida que se abrem em círculos cada vez mais amplos, aceitam os caminhos sempre novos dos ambientes que se alternam (cultura, populações, línguas distintas). (PACE 2009:12)
Podemos assim considerar que a religião não é um sistema totalmente estável e
rígido, mas, em algum grau, é dinâmico em sua interação com o ambiente, nesse caso, o
processo religioso é uma estratificação de crenças, rituais e símbolos, que, no decorrer
dos anos, foram estruturando-se mediante a processos de fronteiras fluidas para
responder as demandas da atualidade em contato com o ambiente externo.
52
Em ambientes migratórios a dinâmica religiosa é produtora de sentidos
metafísicos que encarnam no objetivismo cotidiano, em muitos casos, as religiões em
processos migratórios produzem experiências simbólicas que reconfiguraram e adequam
o fenômeno de mobilidade humana no escopo dos planos divinos. Eximindo, pelo
menos em parte, a culpa associada ao abandono da família, parentes, amigos e o alivio
da frustação do não pertencimento de uma realidade utópica.
A capacidade de dilatar suas fronteiras simbólicas permite aos sistemas
religiosos auxiliar os indivíduos em mobilidade humana na reinterpretação de suas
próprias biografias, além de integrar-se aos aspectos culturais do lugar de destino, por
sua vez, o migrante interagem com a religião modificando-a e atualizando suas
estruturas e simbolismo a novas demandas e desafios sociais presentes no cotidiano.
2.2. A Relação entre Processos de Mobilidade Humana e Redes Sociais.
As pessoas em mobilidade espacial estão fadadas a viverem em uma situação
que as expõe cotidianamente a duas logicas distintas, assim elas são obrigadas a fazer
malabarismos com dois sistemas de valores. (BOURDIEU & SAYAD, 1964). Desde os
primeiros contatos com uma nova cultura, principalmente a metropolitana, elas têm a
sensação de viver no interregno de dois universos diferentes, aqueles nas quais são
originárias, cujas normas habituais já não gerenciam mais as situações cotidianas atuais,
e as novas normas no qual devem aprender a relacionar-se socialmente no espaço que se
encontram.
Dessa maneira, a identidade do migrante encontra-se em ambivalência,
enquanto, de maneira consciente, permanecem ligado a sua cultura natal,
inconscientemente apropriam-se de uma nova cultura, mesmo que no princípio haja
certa rejeição aos novos hábitos adquiridos. Nesse sentido quanto mais o migrante
permanecer no local, mais a cultura, de forma osmótica, fará parte de seu cotidiano, o
ritmo diário, a noção de tempo e de espaço serão reformuladas em contraste com cultura
natal.
Uma das formas mais encontradas nos grupos migratórios para se referir ao
lugar de residência é o conceito de comunidade, que diferentemente da convivência
53
social, é um laço de ordem afetiva, emocional que comporta aspectos de solidariedade
mecânica. Todos os grupos em mobilidade espacial, quaisquer que sejam, apresentam
tendências à reconstrução desse tipo de laço, tentando, dessa maneira, manter sua
coesão social. (BRITO,2010)
A tentativa de preservar uma maneira comum a todos, tendo a mesma visão de
mundo, passa pela criação de diversas redes de ajuda mútua, esse espaço caracteriza-se
pela noção de semelhança, relações frequentes interindividuais, estratégia de proteção
contra as contingências citadinas, são as causas mais frequentes para a criação de redes
sociais.
As redes sociais ajudam o indivíduo a manter-se estável, principalmente em
situações de transitividade, onde, rotineiramente existe a privação de laços familiares
amistosos e relações profissionais, onde há perda de identidade e de status. As redes
sociais contribuem para a preservação da sociabilidade e manutenção das identidades
dos migrantes, os laços entre indivíduos que encontra-se em mobilidade humana é uma
fonte de escape para a solidão das cidades.
Uma rede consiste em:
Um conjunto de atores ou nós (pessoas, objetos ou eventos) ligados por um tipo específico de relação. Os diferentes tipos de relação correspondem a redes diferentes – ainda que o conjunto de atores seja o mesmo. A rede, porém, não é consequência, apenas, das relações que de fato existem entre outros atores; ela é também o resultado da ausência de relações, da falta de laços diretos entre dois atores [...]do buraco estrutural. (SOARES. 2002: 13)
Em contraste com as relações sociais urbanas que apresentam atributos
diferentes das organizações das redes sociais, elas adquirem forma e conteúdo. O
conteúdo é dado pela natureza do laço (parentesco, amizade, troca de bens simbólicos,
materiais e afetivas); e a forma compreende dois aspectos específicos, a intensidade dos
relacionamentos entre atores, a frequência e o grau de reciprocidade dedicado a esses
relacionamentos.
Uma rede migratória não se confunde como redes pessoais. Essas redes precedem a migração e são adaptadas a um fim especifico: a ação de migrar. Quando suas singularidades dependem da natureza dos contextos sociais que ela articula, uma rede migratória é, também, um tipo especifico de rede social que agrega redes sociais
54
existentes e enseja a criação de outras: portanto consiste de uma rede de redes sociais.17
As redes sociais são imprescindíveis para se estudar os fenômenos migratórios,
elas são canais essenciais de informação, e determinam a conquista de emprego,
moradias etc. Portanto as informações tornam-se um trunfo para os migrantes, que,
inseridos em uma rede podem usufruir desse recurso que gera certo poder aos seus
detentores.
São as redes de relações sociais que formam parte, e que constroem e que estruturam as oportunidades. É nesse sentido que certas oportunidades estão socialmente determinadas (...) A análise da composição das redes e de suas formas se torna o ponto central porque nos parece a chave explicativa. Em efeito, são esses elementos que abrem e fecham o acesso às oportunidades (RAMELLA, 1995:21)
Podemos considerar que as redes sociais são teias urbanas que integram
migrantes e não-migrantes a complexidade dos papeis sociais e relações interpessoais,
através de experiências cotidianas. Nessa perspectiva as redes sociais estão na base de
uma conexão entre os territórios, tanto os de origem, quanto os de destino. A produção
dessas redes está vinculada a um processo histórico de migração, onde a
territorialização é a base para o surgimento de grupos de solidariedade mútua, capazes
de criar identificação, informação, representações conflituosas, cooperações,
redefinições e um pouco de alento aos migrantes e não-migrantes que vivem na
urbanidade de forma desconexa.
2.2.1. Redes Sociais e Associativismo em São Paulo
É quase um consenso que a formação do indivíduo está atrelada em categorias
relacionais que amalgama sua persona e constrói sua biografia, seja em decisões
voluntarias, aspectos herdados ou mesmo em influências determinadas por lugares,
regiões, religião e pessoas.
A vida na cidade de São Paulo é, muitas vezes, determinada pelas dimensões
excessivas da metrópole, características como migração, cosmopolitismo, mercado de
trabalho, são em suma, categorias extremamente atomizadas e impessoais, dessa forma, 17 SOARES & RODRIGUES, Weber, Roberto Nascimento. Redes Sociais e conexões prováveis entre migrações internas e emigração internacional de brasileiros. São Paulo em Perspectiva. São Paulo, Vol 19, julho/setembro de 2005. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-88392005000300006&script=sci_arttext. Acesso em: 11/06/2013.
55
forças vinculativas como linhagem, sexo, religião, família, etc. ganham nas cidades
metropolitanas lugares secundários.
Entretanto, em lugares de exclusão social e segregação as dinâmicas das forças
vinculativas tendem a aumentar mostrando mudanças nos relacionamentos sociais e
acumulo no capital social
Dessa forma, ainda que sob o acúmulo de fatores que incidem na pobreza, o potencial de solidariedade inerente às diversas dimensões do capital social pode ser atualizado de forma eficiente pela interação de uma série de circunstancias. Nesse sentido, a favela constitui um "microcosmo" à feição para examinar em camadas de baixa renda os efeitos de inclusão social atribuíveis a participação em associações em face da tendência de exclusão oriundas do mercado de trabalho. (LAVELLE & CASTELLO, 2004:79)
A importância das redes sociais e do associativismo estão ligados a uma nova
forma em mutação nas sociedades contemporâneas. (CASTELLS, 1999:497), ou seja a
compreensão de uma complexa vida social passa pelo estudo sistemático das redes
sociais e do associativismo como demostra Martins em “as redes sociais, o sistema de
dadivas e o paradoxo sociológico”.
As redes podem envolver os mais variados setores, elas são fontes cruciais para
a transformação e dominação da sociedade. Para Castells as redes possibilitam os fluxos
do capital através da inter-relação permitido a sociedade global uma maior fluidez na
dinâmica socioeconômica. (1999:497)
A relevância das redes sociais está na capacidade de produção de benefícios para
seus membros, seja eles matérias ou simbólicos, desse modo as dinâmicas das relações
sociais modelam as estruturas de oportunidades dos indivíduos à medida que o capital
social é vinculado entre os relacionamentos interpessoais.
O associativismo e as redes sociais formadas em seu contorno tem, em princípio,
a capacidade de amenizar os problemas sociais das pessoas que vivem em situação de
vulnerabilidade social, além da produção de alternativas para a sobrevivência nas
grandes metrópoles, que, em muitos casos, principalmente de migrantes e aglomerados
subnormais excluem, segregam e monopolizam os espaços urbanos.
São Paulo é um grande campo para práticas associativas e desenvolvimento de
redes sociais, a cidade abriga um número considerável de projeto em áreas diversas,
desde Sociedade Amigos do Bairro (SAB’s), entidades de cunho religioso da mais
56
diversas, com um número enorme de obras sociais, além de ONG’s, com atuação
nacional movimentos como MST (Movimento do Sem Terra), CUT (Central Única dos
Trabalhadores), sindicatos como APEOESP (Sindicato de Professores do Ensino oficial
do Estado de São Paulo) etc.
Segundo pesquisa realizada por Marques em “Pobreza, sociabilidade e tipos de
redes sociais em São Paulo e Salvador”18, constatou-se que as práticas associativas
paulistas tendem a ser baixas, apenas 12% dos entrevistados declararam vinculo a
alguma ação associativa.
Dessa porcentagem 20% declaram-se evangélicas e 63% afirmaram ser
católicas, 12% do público entrevistado afirmou não ter religião. Outro dado importante
é a presença de migrantes 70% da amostra são migrantes interestaduais, sendo que em
sua maioria (72%) chegaram a São Paulo a mais de 10 anos.
Em suma, as redes de indivíduos pobres tendem a ser menores, menos variadas em termos de sociabilidade, mais locais e mais baseadas em vizinhança do que as redes dos indivíduos de classe média. No entanto, elas apresentam características semelhantes em São Paulo e Salvador, com exceção do maior localismo e da maior atividade relacional em Salvador e das redes um pouco maiores e mais variadas em São Paulo. Essas diferenças podem ser causadas pela menor oferta de vínculos devido ao maior localismo, levando a redes menores, porém mais densamente conectadas. (MARQUES, 2013:05)
Segundos dados da FASFIL19 existem no Brasil 290.692 associações sem fins
lucrativos, delas 44% estão na região sudeste do país, sendo que 28% tem cunho
religioso 82.853 entidades.
O predomínio de associativismos religiosos no Brasil não é novidade, já em
1975, autores como Michel Coniff estudavam o fenômeno. O motivo do predomínio de
associativismos religiosos está focando na obtenção de elementos espirituais e matérias,
para o autor o indivíduo que a ela se associa busca o benefício de sua comunidade
(56%), transformando a religião em instrumento para tal fim. (AVRITZER, 2005:20) O
autor continua, declarando que a maioria das participações em associativismos
18 MARQUEZ, Eduardo. Pobreza, sociabilidade e tipos de redes sociais em São Paulo e Salvador. Disponível em: http://www.fflch.usp.br/centrodametropole/upload/aaa/273-Marques_VisioniLA_8_2013.pdf. Acesso em: 1 de abril de 2014. 19 Mapeamento das Fundações Privadas e Associações Sem Fins Lucrativos. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/imprensa/ppts/00000011164912102012492305590017.pdf acessado em: 2 de Abril de 2014.
57
religiosos são experiências coletivas voltadas para ação social, e não para acumulação
de bens espirituais individuais.
É possível, portanto, apontar as seguintes características no associativismo paulistano: ele é predominantemente religioso, ainda que nossos dados permitam apontar importantes diversificações no padrão e associativo, expresso principalmente no chamado associativismo popular. (AVRITZER, 2004:20)
Tanto o associativismo religioso, quanto as redes sociais provenientes delas
geram impacto na vida das pessoas em vulnerabilidade social. Normalmente as pessoas
buscam relacionar-se com seus pares, ou seja, manter contato com indivíduos com
características sociais e atributos similares (MARQUES, 2007:36). Dessa forma,
indivíduos que conseguem estabelecer contatos entre círculos sociais diferentes,
normalmente adquirem mais capacidade de mobilidade social.
A relevância das redes sociais e o associativismo religioso está anexo a fatores
identitários, principalmente para pessoas em vulnerabilidade social. Em uma cidade que
lhes nega cidadania, o associativismo e as redes sociais servem como estruturas
auxiliares na aquisição da luta pela cidadania, sobrevivência metropolitana, ajuda
mutua, aquisição de bens simbólicos e matérias, além de estruturas de oportunidades e a
possibilidade de ascensão social.
Em seguida analisaremos a história da origem do distrito de Vila Prudente,
focando nos fluxos migratórios existentes na região e sua adequação dentro do contexto
de mobilidade espacial, dessa forma, podemos adiantar que a existência de migrantes na
região foi essencial para a formação do distrito e do bairro, assim como a formação dos
núcleos urbanos que ainda hoje fazem parte do local.
2.3. A Família Pedroso
O capitão José Gonsalves Coelho proprietário das grandes terras que pertenciam
a João Ramalho, resolve em 1829, vender parte de suas propriedades a um negociante
ligado ao império português, dessa forma João Pedroso adquire as terras para cultivo de
frutas e gado, a área adquirida por ele corresponde hoje a Vila Ema, Vila Diva, Vila
58
Guarani, Vila Zelina, Vila Bela, Jardim independência, Vila Alpina, Parque São Lucas,
Parque Santa Madalena, Fazenda da Juta, Vila Industrial e Jardim Guairaca20.
Após a sua morte as terras foram dividas e administradas pelos seus herdeiros,
Antônio Pedroso, filho de João Pedroso, adquire como herança as terras de capão da
Invernada, que hoje está alocada em Vila Prudente, as outras partes do terreno de João
Pedroso foram vendidas por seus filhos e herdeiros ao longo dos anos.
Em 04 de junho de 1871 Antônio Pedroso falece deixando as terras para
Martinha Maria Soares, sua esposa, e seus 6 filhos. Com o falecimento de Antônio
Pedroso, Martinha Pedroso começa a ter dificuldades para administração das terras, a
grilagem, a criação de gado, o plantio, criação dos filhos etc. é uma tarefa
demasiadamente exaustiva, por isso resolve vender as terras.
Suas raízes como negociante, sua inteligência e habilidade que adquiriu do pai no comércio de madeira, ela colocou em ação em suas terras. Com a morte de seus pais em Santa Izabel, estes lhe deixaram uma herança de quinze alqueires da fazenda de madeiras e muitos carros de boi para o transporte das mesmas, os seus irmãos que lá conviviam e muitas condições de levar avante o seu intento comercial. Martinha Maria não recuou e começou a negociar suas madeiras de Santa Izabel para os industriais em São Paulo, pois o progresso era crescente e a madeira era de importância vital nas construções, principalmente na cidade que crescia vertiginosamente. (FILHO, 1990:29)
Com o dinheiro que recebia pela venda de madeira Martinha Maria negociava
novas terras, não muito distantes das suas propriedades, dessa forma Maria adquire
extensas quantidades de terras, entre elas as de seu esposo, do seu sogro João Pedroso,
de sua sogra e de seus pais, todas por herança, além daquelas que ela havia adquirido.
Nos anos entre 1870 e 1885 Martinha Maria era proprietária de mais da metade
das terras que hoje estão alocadas em Vila Prudente, Mooca, Agua Rasa e Belenzinho.
Em 12 de Julho de 1885 Martinha Maria vende parte de suas terras para Maria do
Carmo Cypariza Rodrigues, por novecentos mil réis localizada no que futuramente seria
Vila Prudente.
Martinha Maria morre aos 102 anos, no dia 28 de janeiro de 1920, deixando
filho, netos e bisnetos Maria Martinha Pedroso Leite poderia ser aqui apelidada de
‘Eva’ deste paraíso vila prudentino, pois dela, nasceram os frutos para o progresso de
hoje. (Ibidem.)
20 Ver Tabelas 6 e 8.
59
2.3.1. Os Irmãos Falchi, e a construção do bairro.
O bairro de Vila Prudente tem seu início com a compra de terras efetuadas pelos
irmãos Falchi em 1890. Os irmãos Bernardino, Pamphilio e Emigdio Falchi, são de
grande importância para a construção do bairro, provenientes da Itália, resolvem montar
uma confeitaria em São Paulo, negocio esse, que teve um rápido desenvolvimento,
dessa forma os irmãos Falchi procuravam um espaço fora do centro comercial da cidade
que abrigasse uma fábrica que atendesse as novas demandas de seu produto.
Foi quando visitando vários lugares, encontraram uma colina, ainda inexplorada, inculta, cheia de grandes arvoredos, rodeada por vários pequenos sítios e que distavam dois quilômetros das colinas do Ypiranga, o que sem dúvida era um lugar muito aprazível e de localização excepcional para p empreendimento que desejam realizar e expandir. (FILHO, 1990:33)
A terra pertencia a Maria do Carmo Ciparyza Rodrigues, que aceitou vender a
terra por vinte contos de réis. Os irmãos Falchi lotearam grande parte do terreno para os
funcionários construírem suas casas, na ausência de serviços públicos de transporte
naquela região.
O projeto desse loteamento foi entregue ao amigo do Emigdio Falchi, Antônio
Prudente de Moraes, primo do Dr. Pudente José de Moraes Barros que nessa época já
era um político de muito prestigio. Conforme a indústria dos irmãos Falchi toma forma,
paralelamente os loteamentos e construções das casas operarias eram construídas como
demostra a figura abaixo, e isso, só foi possível, muito pela estrada de ferro Ypiranga,
como o processo de construção poderia demorar mais que o planejado, puxaram trilhos
para que o vagão pudesse chegar mais perto da fábrica, dessa forma, os operários iriam
trabalhar com mais rapidez na construção do empreendimento.
Figura 1:Planta do Bairro de Vila Prudente em 1980-dividido segundo os loteamentos os irmãos Falchi.
60
Fonte: Google imagens.
Os irmãos Falchi optavam na contratação de imigrantes italianos em suas
fábricas, assim, Houve nessa época um aumento significativo de imigração formando
grandes comunidades de imigrantes italianos, vindo de várias partes para trabalhar na
fábrica a troco de um salário digno e uma terra para construir sua casa.
Com o crescimento da comunidade de imigrantes, da fábrica de chocolates e a
necessidade cada vez maior da construção de mais casas para os operários, os irmãos
Falchi viram uma oportunidade de investimento, construíram na região uma fábrica de
alvenaria, cuja finalidade era vender tijolos e telhas aos operários da fábrica com
desconto na folha de pagamento.
Em 1891 numa área de 1.200.000 m2 a população era de 400 famílias. A administração de todos os negócios ficava divididos para Pamphilio, que cuidava das construções nos arredores da fábrica; Bernardino cuidava da parte de produção industrial da fábrica de doces e Emigdio da parte da política na sociedade. Emigdio fazia muitas viagens pelo país todo, incrementando o seu comércio de doces e dando apoio incomensurável aos italianos recém chegados ao Brasil. (ibidem: 34)
Graças a sua participação efetiva na sociedade paulista Emegdio Falchi, foi
eleito diretor na associação comercial de São Paulo, vice presidente da comissão de
construção do hospital italiano Humberto I e eleito tesoureiro da Sociedade Italiana de
61
Beneficência. Também recebeu diversas homenagens como comendas, ilustre cidadão
brasileiro, Cavalheiro da Coroa Italiana, uma delas em especial, foi entregue pelo
próprio Dr. Prudente de Moraes, os irmãos Falchi, que já nutriam admiração pelo
presidente do país, decidem homenageá-lo colocaram o nome da vila de Prudente de
Moraes e mandaram esculpir em uma pedra de mármore no dia e ano que receberam
visita tão ilustre.
Figura 2:Pedra de Mármore tamanho 0,89 cm x 0,57 cm fixada na praça Irmãos Falchi em homenagem à Prudente de Moraes em 21 de Dezembro de 1989
Fonte: Google Mapas.
Para fins históricos a data oficial de fundação de Vila Prudente é 4 de Outubro
de 1890, com a compra do terreno pelos irmãos Falchi. Pela proximidade da família
Falchi com a família Prudente de Moraes, foi colocado o nome Vila Prudente de Moraes
em homenagem ao Dr. Prudente de Moraes, então presidente do Brasil. Como muitos
outros bairros da cidade paulista Vila Prudente cresce incentivado pela imigração, a
princípio e em maior número a italiana, porém, mais tarde a região se beneficiaria pela
imigração de outros países e pela industrialização crescente no país.
Os irmãos Falchi ficaram conhecidos pelo seu tino empreendedor, no qual
transformou um campo de pastos e colheitas em uma vila industrial, primeiramente com
a fábrica de Chocolate e Confeitos, e depois a expansão para outras áreas, além da
formação de loteamentos para os trabalhadores das fábricas.
A famosa indústria de chocolate dos irmãos Falchi, foi aos poucos abrindo
caminho para outros empreendedores instalarem-se na região como: fabrica de sabão,
um pequeno mercado que vendia utensílios domésticos, fabrica de fumo e pente de
62
osso, uma olaria, dos irmãos Saccoman, que compraram dos irmos Falchi a fábrica de
alvenaria e tantos outras indústrias e comércios que transformaram a região.
2.3.2. Crescimento Urbano no Século XX
Após a construção da Vila Prudente pelos irmãos Falchi, a região ingressa no
século XX com uma rápida expansão, principalmente entre as décadas de 30 e 50, nos
primórdios do século, o bonde chega como novidade em Vila Prudente, no dia 19 de
julho de 1912 é inaugurada a rota do Bonde 32 que saía do centro de São Paulo e
percorria 16 km para chegar a Vila Prudente.
Dessa forma os moradores do bairro testemunharam grandes melhorias, com a
Light abastecendo a região com luz elétrica, o surgimento de encanamento de esgoto, as
primeiras linhas telefônicas, oficialização dos correios, etc.
A explosão populacional experimentada pela região de Vila Prudente está
relacionada não só as melhorias significativas na região, mas também a continuação do
processo de migração, principalmente com a Segunda Guerra Mundial ameaçando
países do continente europeu, como é o caso dos italianos.
A comunidade estrangeira, e de um modo especifico a italiana, crescia e escolhia
o bairro, muito pelo preconceito dos brasileiros, que os consideravam ladrões de
emprego e invasores de terra21. Dessa forma os imigrantes buscavam lugares perto de
seus patrícios, onde a rivalidade era menor e as ofertas de emprego e moradia eram
melhores.
Em 1934 duas grandes empresas começam seus trabalhos no bairro, Matheus
Bei Construtora e Parque da Mooca Construções, ambas construíam e vendiam casas na
região o que tornou a especulação imobiliária mais acirrada, nesse processo era comum
a grilagem de terras e golpes em pessoas analfabetas.
As vendas proliferaram tanto em pouco tempo nada mais havia para ser vendido. Houve também em outros locais do bairro verdadeiros problemas, por vendedores desautorizados e pessoas sem escrúpulos que arrebanhavam os terrenos dos próprios donos e assim conseguiam assinaturas, recibos, documentos e toda a sorte de papeis falsos criando uma calamidade nesse setor. Muitas
21 MEDEIROS, Marcos Vinicius Gomes. O Crescimento Urbano e Industrial do Bairro da Vila Prudente Através dos Clubes Desportivos locais. Disponível em: http://lemad.fflch.usp.br/sites/lemad.fflch.usp.br/files/Marcos%20jun%202010%20Trabalho%20V.%20Prudente%20final.pdf acessado em: 18 de abril de 2014.
63
mortes pudemos constatar durante esses anos devido as brigas de terras. (FILHO,1990: 87)
De todas as fabricas construídas em Vila Prudente as que mais se destacaram
nessa época eram a Tecelagem Vania e as indústrias de louça Zappi. A tecelagem Vania
comprou o prédio de outra tecelagem que estava falindo, assim com uma forte
propaganda no rádio e uma estratégia comercial diferenciada conquistou os moradores
da região e de outras localidades de São Paulo, que faziam filas nas madrugadas para
poder adquirir seus produtos.
Outra empresa que merece destaque é a indústria de Louças Zappi. Jose Zappi
um conceituado ceramista italiano vem ao brasil para conhecer e estudar novas formas
industriais, a pedido do cônsul brasileiro em Milão é designado para manter a primeira
fábrica de louças no Brasil, que localizava-se em São Paulo, fundada no Bairro da Água
Branca, com a administração de Zappi a fábrica de louças cresce e se expande rumo ao
interior de São Paulo.
Zappi decide montar sua própria fábrica de louças e escolhe o bairro de Vila
Prudente para tal, assim começa-se a produção de jogo de mesa para café, azulejos,
artigos sanitários, objetos de adorno, suas obras eram reconhecidas mundialmente,
ganhando prêmios em exposições e posteriormente importando seus produtos.
José Zappi doou ao Círculo Operário de Vila Prudente, uma área de dois mil
metros quadrados, cuja finalidade era construir uma sede e escolas profissionalizante
para os operários, contribuindo diretamente para a formação de novos profissionais e
aumento da demanda da força de trabalho.
Uma terceira indústria que merece algum destaque é a Papaiz, inaugurada em
Vila Prudente por Luigi Papaiz, italiano nascido em Bologna, vem ao Brasil fugindo a
Segunda Guerra Mundial, em busca de melhores condições de trabalho. Aqui ele inicia
a fabricação e o fornecimento de fechaduras para industrias de moveis, posteriormente
investe na fabricação de cadeados e fechaduras residenciais, hoje a fábrica está alocada
em Diadema.
Os italianos não foram os únicos a imigrar para o bairro e seus arredores, Vila
Prudente também recebia ucranianos, lituanos, húngaros, russos etc. a geração de
imigrantes que chega no final dos anos 40 são chamados de ‘Russos Brancos’ são
técnicos e comerciantes, não investem, a exemplo dos italianos, em empreendedorismo,
mas ajudam a fortalecer o comercio, por isso se concentram mais nos grandes centros
urbanos.
64
A distribuição das nacionalidades pelos bairros de São Paulo, primeiro quanto as empresas empregadoras e depois quanto ao local de residência, auxilia na compreensão das aglutinações. De uma forma ou de outra, as regiões Centro, Oeste, Leste, Sul apresentam as maiores concentrações no que se refere às empresas, [...] nesse processo merece destaque a tendência à industrialização que incorpora regiões suburbanas. (SALLES, 2013:190)
A importância da participação de imigrantes de diversas nacionalidades na
cidade de São Paulo está relacionada a ocupação do espaço urbano e a evolução da mão
de obra qualificada, especialmente na formação dos bairros industriais. Embora seja
aceita a ideia que na cidade de São Paulo, não há um bairro com uma formação étnica,
como é o caso da cidade de New York, Salles orienta que:
Talvez a não visibilidade desse grupo de nacionalidades na cidade de São Paulo e no interior se deva exatamente ao fato de que se tratam de grupos menos expressivos numericamente. A localização desses imigrantes na cidade de São Paulo evidencia aglomerações que nos ajudam a entender as aproximações a determinados grupos, como os de mesma nacionalidade ou religiosas. (2013:183)
Com o aumento da população, expansão industrial e a acelerada urbanização, as
primeiras favelas paulistas começam a constituir-se. Na década de 1940 em pesquisas
feitas pela Divisão de Estatísticas e Documentação da Prefeitura de São Paulo
enumeram informações sobre as favelas de São Paulo, sendo elas: Mooca (Favela do
Oratório), Lapa (na rua Guaicurus), Ibirapuera, Barra funda (Favela Ordem e Progresso)
e Vila Prudente. Em 1957 na capital paulista estimava-se um total de 141 núcleos, com
8.488 barracos.
Foi na favela de Vila Prudente, na década de 1970 que surge o Movimento de
Defesa do Favelado (MDF), o movimento origina-se nas reuniões da Legião de Maria,
grupos religiosos que rezavam de casa em casa na Favela da Vila Prudente. Com a
influência da Teologia da Libertação no final da década de 70 as reuniões passaram a
discutir política, além das orações.
A opção preferencial pelos pobres professada pelos novos padres e irmãs, agora também moradores das periferias urbanas, encontravam um solo propicio para se desenvolver. Além dos pobres serem muitos, os vínculos entre a religiosidade e a celebração do trabalho e do progresso, presente nesta narrativa, casavam-se perfeitamente com a utopia privada das famílias que chegavam as periferias. (FELTRAN, 2007:89)
Nesse contexto a ação religiosa foi uma tentativa de organização popular para
melhorias concretas do bairro, e mais especificamente, da favela que ali estava inserida.
65
Assim grupos de jovens, estudantes e moradores passaram a auxiliar os religiosos em
ações comunitárias, sendo a primazia a alfabetização de adultos seguindo o método de
Paulo Freire.
No começo dos anos 80 as notícias de greves que estouravam no ABC, onde
alguns moradores trabalhavam chegaram as reuniões religiosas, o que trouxe discussões
sobre o sindicalismo, também falava-se sobre a criação de um partido político de
trabalhadores.
Além dos sindicalistas do ABC, como Lula. Muitos dos personagens que voltavam do exilio político também se empenharam na criação do partido em São Paulo, como Paulo Freire, que passou a frequentar assiduamente as reuniões da ‘comunidade’ da Vila Prudente. (Ibidem: 90)
Com a conscientização política os moradores favelados passaram a frequentar
espaços de luta social, passeatas, sindicatos e manifestações eram corriqueiros na vida
deles, dessa forma, sem nenhuma organização previa ou formalizada, eles passaram a
identificar-se como MDF.
O MDF foi conhecido pela sua luta em levar água canalizada, esgoto, luz e lutas
por taxas mínimas de água e luz, para moradores em contexto periférico. O movimento
dos favelados mobilizados construía poder político e, portanto: as mazelas sociais das
maiorias deixavam de ser figuradas como fracasso pessoal ou familiar e passavam a
ser vistas como injustiça social. (Ibidem:94)
Enquanto o MDF lutava pelas melhorias nas favelas, em especial a de Vila
Prudente, o bairro sofria processos de verticalização, acompanhando a urbanização
paulista nas décadas de 60 e 70 onde os edifícios eram símbolos de modernização,
progresso e êxito econômico.
Edifícios altos e verticalização não são consequências naturais da urbanização, mas opções possíveis de configuração no largo espectro das soluções urbanas. A verticalização constituiu um dos traços característicos da urbanização brasileira22.
A verticalização do bairro só foi possível pelo período econômico vigente no
país, o chamado Milagre Econômico. A situação econômica desfavorável do início da
década de 60 é superado com ajuda dos investimentos internacionais, a procura por
22 SILVA, Luís Octávio. A Constituição da Bases para a Verticalização na Cidade de São Paulo. Disponível em: http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/07.080/280. Acesso em 21 de abril de 2014.
66
investimentos externos, e a busca de países desenvolvidos por matérias primas, mão de
obra barata e novos mercados em países periféricos.
Esse novo momento da economia brasileira permitiu o aumento da demanda
interna por bens de consumo, devido a maior concentração de renda, crescimento de
credito ao consumidor, expansão do setor de construção civil, aumento das exportações
etc.
Dessa forma a verticalização do distrito de Vila Prudente torna-se um fenômeno
relevante para as novas dinâmicas urbanas implementadas partir de 67. Embora o
existiu um esgotamento do Milagre Econômico e uma certa paralização da
verticalização do distrito o fenômeno nunca de desfez por completo, em 2000 o número
de apartamentos no distrito era de 23.508 mil, em 2010 esse número sobe para 28.777
mil apartamentos.
Como no período anterior os bairros que mais se verticalizaram entre 1968 e 1972 foram Pinheiros, Cerqueira Cesar e Santa Cecilia. Durante este novo período, surge um novo bairro vertical, o Itaim, que alcança números similares à verticalização nos centros da cidade de São Paulo. Além do Itaim, surge mais 5 bairros com relevante crescimento vertical, destaca-se Indianópolis (atualmente denominado como Moema). Os outros bairros que surgem na lista são; Penha, Vila Madalena, Sumaré e Vila Prudente. (GAGLIOTTI, 2012: 18)
O aumento da verticalização em áreas mais periféricas da cidade deve-se
também a criação de novas centralidades urbanas, o zoneamento mais permissivo do
centro se deslocou para a avenida paulista, e com isso, o aumento dos preços fundiários
aliado as ofertas e demandas deslocou o centro para novas áreas como a Faria Lima,
Berrini, Marginal Pinheiros entre outras.
Segundo o SECOVI-SP, em seu levantamento anual a Vila Prudente foi o bairro
campeão de lançamentos imobiliários em 2013 com cerca de 2.297 unidades lançadas23.
Atualmente os investimentos imobiliários no bairro são elevados, muito pelos
constantes investimentos em infraestrutura, o que estimula a especulação imobiliária e a
segregação espacial, criando espaços distintos de pobreza e riqueza em convivência
mútua.
Atualmente o distrito de Vila Prudente é o 49° mais populoso da cidade de São
Paulo com a população de 531.113 mil habitantes, com uma taxa de crescimento de
23 CORREIA, Vanessa. Vila prudente teve o maior número de lançamentos em 2013. Folha de São Paulo. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/saopaulo/2014/02/1410819-vila-prudente-teve-o-maior-numero-de-lancamentos-imobiliarios-em-2013.shtml. Acesso em: 28 de abril de 2014.
67
0,14% anual, a taxa demográfica é 159,49 pop/ha24, uma das regiões mais densas da
cidade de São Paulo, superando por exemplo Vila Mariana, São Miguel, Santo Amaro,
Penha etc., ficando apenas atrás dos distritos da Campo Limpo e Sé, respectivamente
165,42 e 164,54 pop/ha.
Tabela 9:Domicílios Segundo Tipo de Ocupação: Distrito de Vila Prudente – 2010 Bairros Total de
Domicílios Domicílios Particulares Permanente
Ocupado
Domicílio Particular
Improvisado Ocupado
Domicílio Coletivo com
Morador
São Lucas 45.960 45.788 11 161
Sapopemba 84.805 84.700 16 89
Vila Prudente 35.527 34.708 0 819
Total 166.292 165.196 27 1.069 Fonte: IBGE Censo 2010, Infocidade
Tabela 10:Domicílios Segundo Tipologias Residenciais: Distrito Municipal de Vila
Prudente -2010 Bairros Total de
Domicílios Casa Casa de Vila
ou Condomínio
Apartamento Habitação em Casa de
Cômodos, Cortiços ou
Aglomerados subnormais
São Lucas 45.788 36.645 350 8.530 263
Sapopemba 84.700 71.332 1.168 11.948 251
Vila Prudente
34.708 25.012 528 8.298 870
Total 165.196 132.989 2.046 28.777 1.385 Fonte: Infocidade, IBGE, * Total de Domicílios: Base universo do Censo 2010. Dado levantado apenas para os domicílios particulares permanentes. As tabelas 9 e 10 acima, demostram a ocupação e as tipologias do distrito de
Vila Prudente, embora tradicionalmente fosse um refúgio operariado e de imigrantes, o
24 Infocidade, Prefeitura da cidade de São Paulo, baseado nos dados censitários de 2010. “População Recenseada, Taxa de Crescimento Populacional e Densidade Demográfica. Município de São Paulo, Subprefeituras e Distritos Municipais, 1980, 1991,2000,2010. Disponível em: http://infocidade.prefeitura.sp.gov.br/htmls/7_populacao_recenseadataxas_de_crescimento_1980_701.html. Acesso em 1 de maio de 2014.
68
que podemos constatar que atualmente o perfil, tanto do bairro quanto do distrito, tem
se alterado, em grande medida pelos investimentos públicos e privados no local, quer
seja pela construção de metrôs e monotrilhos, quer seja por grandes inaugurações de
shoppings center e condomínios fechados, as melhorias tem atraído cada vez mais
classes médias e altas para o local.
Vila Prudente tem sofrido um processo de modificação histórica, antigamente o
bairro que era quase que exclusivamente de trabalhadores e imigrantes, tem se
reformulado em uma grande área de serviços terciários, assim fenômenos como a
verticalização e a especulação imobiliária são, na verdade, um processo dinâmico de
reorganização espacial no qual toda a cidade de São Paulo tem experimentado.
Atualmente faz parte da infraestrutura de Vila Prudente a Linha 2 – Verde do
metrô de São Paulo, Terminal Vila Prudente, além do Monotrilho que passará na região
e será inaugurado em breve, a última estimativa de inauguração seria no final do mês de
março de 2014. Além do transporte há também o centro comercial Central Plaza
Shopping, inaugurado em setembro de 1999 e conta com 240 lojas, um crematório Dr.
Jayme Augusto Lopes, implementado em 1974, sendo um dos maiores da América
Latina e pioneiro em seu tempo.
O distrito é bem atendido quando instituições de saúde, ele contém uma UBS,
três AMAs, três CAPS, um hospital público e dois particulares.
Ainda reside na região o Parque Ecológico Professora Lydia Natalízio Diogo, o
parque ecológico de Vila Prudente, situado nos limites dos bairros de Vila Zelina, Vila
Alpina, Vila Ema, Jardim Independência e Jardim Avelino. O perfil industrial do
distrito bem como o uso lúdico do córrego já ocorria em 1969. Contudo, somente com a
desindustrialização das de áreas da várzea do córrego foi cedido, pela futura instalação
do cemitério de Vila Alpina um espaço para a construção de um parque para o distrito.
Dessa forma em 27 de dezembro de 2004 a realizou-se a inauguração do parque, cerca
de mil e quinhentas pessoas utilizam-se diariamente do parque, desse número 80% são
moradores de áreas próximas25.
Ainda hoje existem cerca de 500 indústrias instaladas no distrito, mas esse
número tem diminuído gradativamente, muitos dos lotes que pertenciam as indústrias
25 HONÓRIO, Rosely Marchetti. Contribuição da Historia Oral. Disponível em: http://each.uspnet.usp.br/gephom/encontroregional2011/Anais_IX_ERSHO.pdf#page=176. Acessado em 1 de maio de 2014.
69
tem servido como cortiços, loteamentos clandestinos ou na construção de prédios e
condomínios fechados.
As zonas industriais em 1972 eram cerca de 1000 há, em contraposição aos 513 das atuais. As restantes ainda se concentram ao longo da linha férrea e se localizam nos distritos da Mooca, Ipiranga e de Vila Prudente. Avaliou-se que para as áreas que tiveram seu zoneamento alterado em zona mista a realização do levantamento do uso e ocupação atual alimentaria, com dados primários, o entendimento das dinâmicas de transformação e da reprodução urbana. Pode-se antecipar que esta alteração estimulou a atuação do setor privado que realizou nos lotes de ex industrias a substituição rápida das edificações, propondo um produto residencial de médio alto padrão que não dialoga com o entorno, sendo a ocupação do lote condomínio fechado vertical.26
As indústrias estão cada vez mais deixando espaços, não somente para mordias,
mas também para estabelecimentos comerciais, são cerca de 758 atividades comerciais
no distrito, 635 espaços para o terceiro setor de serviços, e 56 empresas de construção
civil.
Tabela 11:Estabelecimento educacionais em Vila Prudente – 2010 Instituições de Ensino Publicas Privadas
Creches 8 7
Educação Infantil 5 18
Ensino Fundamental 16 12
Ensino Médio 7 10
Universidade/ Faculdade 0 1
Fonte: São Paulo Bairros – estáticas de Vila Prudente, Dados censitários 2010
Na Vila Prudente também há um significativo número de instituições de ensino
infantil, fundamental e médio, faltando uma representatividade maior de cursos
superiores através da faculdades e universidades. Mesmo com a verticalização do
bairro, e a mudança de um espaço do operariado para um a bairro de serviços, as
populações residentes que concluiu um curso universitário é ainda baixo, como
demostra a tabela abaixo:
26 GARRAFOLI, Fábio Takayama, VITALE, Letizia. Áreas industriais em obsolescência: Potencialidade para reconversão urbana ou mera mercadoria imobiliária? Disponível em: http://www.ppgau.ufba.br/urbicentros/2012/ST229.pdf. Acesso em 1 de maio de 2014.
70
Tabela 12:População de 10 anos ou mais de idade, por nível de instrução em Vila Prudente – 2010.
São Lucas Sapopemba Vila Prudente Sem Instrução e
fundamental incompleto
43.135 111.931 31.695
Fundamental Completo e Médio
Incompleto
25.352 53.581 16.071
Médio Completo e Superior
Incompleto
38.735 64.499 27.108
Superior Completo 17.201 11.683 17.362 Não determinado 1.086 2.865 1.307
Total 125.509 244.560 93.543 Fonte: Infocidade, IBGE Censo 2010.
O nível de escolaridade interfere de maneira significativa na aquisição de
emprego e na renda familiar a tabela a seguir demostra a o emprego por escolaridade no
distrito.
Tabela 13:Empregados por Escolaridade, Segundo os Distritos Administrativos – Vila Prudente
Vila Prudente
N° %
Ensino Fundamental Incompleto
5.295 16,89
Ensino Fundamental Completo 6.322 20,17
Ensino Médio incompleto 2.882 9,20
Ensino Médio Completo 12.653 40,37
Ensino Superior Incompleto 1.024 3,27
Ensino Superior Completo 3.165 10,10
Total 31.341 100
Fonte: Observatório do Mercado de Trabalho, Relações Anuais de Informação Sociais.
71
Tantos os indicadores educacionais relativamente baixos para o distrito de Vila
Prudente não refletem no rendimento familiar, segundo o Observatório Cidade Nossa
São Paulo, o rendimento médio dos moradores Vila Prudente/Sapopemba em 2012 era
de 1.922,76, rendimento esse superior a muitos distritos da capital, superando Ipiranga,
Casa Verde/Cachoerinha, Freguesia/Brasilândia, Pirituba etc. Ficando, inclusive, maior
que o rendimento médio da cidade de São Paulo, que em 2012 era de 1.839,98.
Desde 2008 o distrito de Vila Prudente conta com a AMOVIZA, eles são
responsáveis pela organização de grandes eventos na região, principalmente a festas
típicas de cultura do leste–europeu, além disso, organizam junto a órgãos públicos
benefícios para o bairro de Vila Zelina e seus entornos.
Atualmente a AMOVIZA é a grande responsável pela discussão da tematização
do bairro em Vila Zelina, a ideia é barrar a pujante verticalização e tematizar o bairro e
adjacentes com construções que beneficiariam a cultura, culinária, festas, religião entre
outras coisas dos imigrantes do Leste Europeu.
2.4. Vila Prudente e a Religião.
Outra faceta importante para uma análise mais completa do distrito de Vila
Prudente é a integração entre imigração e religião. Como já citado, pelos incentivos dos
irmãos Falchi os antigos descampados da Vila Prudente, usada para cultivo de
hortifrútis, bovinos e suínos, transforma-se em um bairro fabril –operário com grande
penetração de imigrantes italianos.
Historicamente o imigrante em um país desconhecido, sem domínio da língua
oficial, ou mesmo, sem amigos e familiares ou coisas habituais, procura em redes
sociais, um grupo que partilhe do mesmo sentimento, sonhos, projetos, um grupo no
qual o imigrante possa identificar-se.
A religião é uma derivação dos modelos sociais, ou seja, a própria sociedade em
forma de símbolos, assim as religiões são representações coletivas que exprimem, em
formas simbólicas, realidades coletivas (DURKHEIM, 2008: 13).
As religiões trazidas pelos imigrantes formaram alguns bolsões que, pelo menos a princípio, eram numericamente insignificantes. Com o tempo, porém, estes bolsões cresceram, deram origens às
72
novas religiões e participaram do processo de transição de uma sociedade hegemonicamente católica para uma sociedade pluralista do ponto de vista religioso (DECOL, 2001)
Os imigrantes que utilizam a cosmovisão religiosa, não raramente atribuem os
desafios da imigração como simbolismo religioso para sua trajetória, comumente o
imigrante estigmatizado como clandestino, invasor etc, encontra em comunidades
religiosas acolhida e identificação, assim a religião funciona como instituição para apoio
e emancipação.
Com a fábrica de chocolate dos irmãos Falchi e os grandes incentivos por parte
deles em empregar e disponibilizar moradias aos italianos, não é de se espantar que, o
“gueto’ italiano construindo no bairro de Vila Prudente, Mooca, Braz entre outros,
trouxe embarcada o catolicismo. A Igreja Católica sendo pioneira no bairro, possibilitou
um enorme trabalho social e espiritual com seus moradores, influenciando nas lutas
sociais, na promoção humana, assistência social.
Com o passar dos anos e a heterogeneidade dos imigrantes na região o
catolicismo deixou de ser uma religião exclusiva, abriu-se espaço para novas formas
religiosas ligado a diversidade dos grupos ali representados. As novas religiões em Vila
Prudente serviram como agente agregador, identificador e emancipador dos novos
grupos presentes na região.
Na história da Vila Prudente podemos identificar inúmeras influências
religiosas, a ligação entre o distrito e práticas religiosas acontece pelos próprios
fundadores. No ano de 1893 os irmãos Falchi constroem uma capela em homenagem a
Santo Emídio, protetor dos terremotos, enchentes e chuva, no qual Emigdio Falchi era
devoto.
Além do terreno, que depois seria construída a Igreja Matriz, e o aporte
financeiro promovido pelos irmãos Falchi, o próprio Emigdio encomendou e trouxe
uma estátua de tamanho real do Santo protetor Emídio. Nessa nova paroquia foram
enviados quatro religiosos, entre eles o Padre Damião Kleverkamp, como primeiro
pároco em 31/12/1939. (Filho, 1990:125)
A capela construída, com o passar do tempo ficou pequena para as atividades
realizadas, sendo necessária a criação de um espaço maior para as atividades religiosas,
com o espaço vago o Padre Damião conhecendo o problema do operariado no bairro,
resolveu fundar uma entidade afim de ajuda-los, surge o Círculo Operário Cristão de
Vila Prudente, em 02 de junho de 1940. (Ibidem:127)
73
O Círculo Operário Cristão de Vila Prudente contava com atendimento médico-
ambulatorial, cursos de formação profissional, lazer e entretenimento, em Julho de 1940
o Padra Damião implantou uma escola nos fundos da casa paroquial, integrando mais
um serviço em benefício dos operários e suas famílias.
O Círculo Operário ligado as ações da Igreja Católica era uma mensagem
poderosa na luta em favor do operariado brasileiro, vinculando-se também as ações e
discursos dos sindicatos, que resistiam para conseguir melhores condições de trabalho e
aumento salarial, em Vila Prudente a criação do Círculo Operário trouxe, além dos
incentivos estruturais como médicos, escolas, cursos e lazer, ações efetivas na luta
contra a exploração do trabalho.
Em 30 de abril de 1965 a entidade mudou o nome de denominação para Círculo
de Trabalhadores Cristãos, a resolução da mudança de nome foi requerida tanto pela
confederação brasileira como a federação paulista do Estado de São Paulo. O governo
militar nessa época não permitia que entidades tivessem nomes aparentemente
subversivos para a época, pois tanto sindicalistas como operariado eram considerados
subversivos, grupos organizados contra as ações governamentais do regime.
Mesmo com a imposição da mudança de nome as ações do, agora, Círculo de
Trabalhadores Cristãos, conseguiram manter a essência política que o originou, com as
assistências médicas, espaços de lazer e cursos profissionalizantes, além do apoio as
ações favoráveis ao operariado.
Outro projeto social/religioso envolvendo a Igreja Católica foi a construção do
orfanato Cristóvão Colombo pelo padre José Marchetti, o orfanato ficava no bairro do
Ipiranga, tinha como função cuidas das crianças órfãs, principalmente filhos de
imigrantes, negros, crianças abandonadas e recolhidas pelas autoridades por baderna e
“vagabundagem”.
Nesse mesmo sentido, imbuído pelas ideias do projeto de reforma da igreja e para outros, ideologia ultramontana, Marchetti empenhou-se na consolidação do orfanato do Ipiranga e planejou a construção do segundo orfanato em Vila Prudente27.
27 OLIVEIRA, Lúcia Helena de Medeiros; LOMBARDI, José Claudinei. Instituições Educativas - Projeto Scalabriano no Brasil. Disponível em: http://sbhe.org.br/novo/congressos/cbhe_2008/pdf/644.pdf. Acesso em 6 de maio de 2014.
74
Figura 3:Orfanato de Vila Prudente 1897
Fonte: FILHO, Mario Ronco. O Bairro Vila Prudente, Um Gigante Paulista, sua história e sua gente. Prefeitura de São Paulo, 1990
O orfanato construído em Vila Prudente no ano de 1904 era direcionado as
mulheres, a instituição católica alfabetizava as meninas, bem como as ensinava
trabalhos manuais e prendas domesticas, normalmente elas eram dirigidas a casas de
famílias para casarem.
Embora os imigrantes italianos tenham sido os primeiros a residirem no distrito
de Vila Prudente, outros imigrantes, fugitivos de guerras encontraram no distrito um
lugar para recomeçar a vida.
No final do século XIX a cidade de São Paulo recebe ucranianos, poloneses,
russos, húngaros, lituanos e outras populações do centro-leste europeu. Os lituanos em
Vila Zelina, situado no distrito de Vila Prudente formam a segunda maior comunidade
lituana do mundo, perdendo apenas para a cidade de Chicago nos EUA, tendo chegado
até 1930 com cerca de 20.000 lituanos em São Paulo, sendo boa parte deles moradores
de Vila Zelina28.
28 RAPCHAN, Eliane Sebeika. Lituano e seus descendentes, reflexões sobre a identidade nacional numa comunidade de imigrantes. Disponível em: http://www.historica.arquivoestado.sp.gov.br/materias/anteriores/edicao10/materia01/texto01.pdf, acesso em: 7 de maio de 2014.
75
A igreja São José de Vila Zelina, foi fundada em 1936, pelo padre Benediktas
Sungintas, que veio ao Brasil em 1931 para acompanhar a comunidade lituana. No
mesmo ano o padre Sungintas organiza a comunidade lituana para a construção da
igreja lituana no bairro, em um terreno cedido por Claudio Soares Monteiro Filho, dessa
forma a inauguração da igreja de São José aconteceu no ano de 1936. Até hoje existe
uma missa especial feita em lituano todo domingo as 11hs00, foi ao redor da igreja que
o bairro começou a crescer e se desenvolver.
A igreja teve um papel crucial no período da Segunda Guerra Mundial servindo
como ponto de encontro para os imigrantes conseguirem informações sobre seus
familiares e seu país invadido pela antiga União Soviética.
Além da comunidade lituana, os russos construíram sua própria comunidade
religiosa a Igreja Batista Russa da Mooca, a princípio situada no bairro da Mooca, em
um salão pequeno com a capacidade para 20 pessoas apenas.
Com o crescimento da igreja decidem mudar para um local com maior
capacidade, a igreja, agora, em Vila Bela, ainda estava em franco crescimento, com o
espaço cada vez mais apertado decidem mudarem para outro local, em 1946 adquirem
um terreno em Vila Prudente, os próprios membros assumem a construção do templo,
que é inaugurado em 26 de julho de 1953. Na inauguração, além do novo espaço
decidem alterar o nome da igreja que passa a chamar Igreja Batista Boas Novas.
O primeiro dirigente da missão paulista da ucrânia foi o padre brasiliano29
Nicolau Ivaniu, veio para São Paulo em 21 de janeiro de 1954, a princípio o padre
Nicolau realizava as celebrações na cidade de São Caetano do Sul, em uma Igreja
Latina conhecida como Matriz Velha.
A pedido da comunidade o padre Nicolau adquiri um terreno especifico para as
celebrações das missas, dessa forma com o apoio da comunidade ucraniana em maio de
1954 inicia a construção da Igreja Imaculada Conceição. Somente em 1960 a paroquia é
inaugurada por Dom José Martenetz.
Outra importante igreja no distrito de Vila Prudente é a Igreja Ortodoxa Russa,
sua inauguração foi no ano de 1931 com o nome de Igreja da Santíssima Trindade,
inicialmente a comunidade russa não frequentava a igreja, a igreja residia em um lugar
de difícil acesso para a o grupo, somente com a abertura do mosteiro, que
29 A ordem Brasiliana de São Josafat é uma congregação religiosa pertencente à Igreja Católica do Rito Oriental Bizantino.
76
posteriormente foi transferido para o Canada, a comunidade passou a integrar-se de
maneira satisfatória.
Inicialmente com uma frequência baixa, a Igreja ortodoxa russa foi importante
para a comunidade pois ela preservou todo o conjunto de tradições culturais sufocadas
pela Revolução socialista de 1917, ou seja, língua, calendário, folclore, entre outros
elementos culturais de um povo que foi forçado a migrar. Dessa forma, na ausência de
outras instituições associativas, tais como clubes, agremiações e centros culturais,
delegou-se as igrejas russas o papel da manutenção da identidade desse povo.
(LOIACONO, 2005:128)
A comunidade russa conta com outra igreja de mesma tradição, a Igreja
Assembleia de Deus Russa no Brasil, fundada em 1936, umas das famílias fundadoras e
a mais conhecida é Minczuk, seu mais ilustre membro Roberto Minczuk é regente
associado da filarmônica de New York, passando também pelas filarmônicas de
Londres, na Inglaterra, Toronto no Canadá e a Osesp (Orquestra Filarmônica de São
Paulo)30.
As igrejas de cunho étnico no distrito, principalmente no bairro de Vila Zelina
serviram como agregador para os imigrantes que se estabeleceram no bairro a partir da
Primeira Guerra Mundial e da Revolução Bolchevique de 1917, uma segunda onda de
imigração no distrito acontece na década de 1920, a variedade das igrejas representa, as
várias culturas migratórias presentes no distrito, como russas, ucranianas, lituanas e
tantas outras provenientes do Leste-europeu.
O sentido de comunidade é, por norma, um dos atributos das minorias religiosas. A comunidade – em especial se tem um espaço físico para o encontro - possui a virtualidade de reforçar a posição do grupo dentro do campo religioso e de o projetar na sociedade. A comunidade de crentes é um recurso que potência a visibilidade pública da minoria religiosa na sociedade em que se insere e principalmente, a reprodução de sua identidade. (Vilaça, 2008:32)
A imigração, ao longo do tempo requer um processo adaptativo, dessa forma a
construção de identidades sociais está vinculada tanto ao reconhecimento dos seus
pares, quanto as novas adaptações e rearranjos em uma sociedade essencialmente
heterogênea.
30QUENTAL, Paula. Batuta Brasileira: o paulistano Roberto Minczuk, regente assistente da Filarmônica de Nova York, é escolhido o mais brilhante jovem artista nos EUA. Isto é Gente. Disponível em: http://www.terra.com.br/istoegente/41/reportagem/rep_roberto.htm, acesso em: 26 de Março de 2014.
77
Embora o predomínio religioso do distrito ainda seja católico, outras religiões
têm constante presença, como Candomblé, Umbanda e Espiritismo, essa última,
fundada em 1964, pela Guiomar de Oliveira Albanesi e presidente do Centro Espirita
Perseverança. O centro espírita possui e mantêm diversas obras sociais, entre elas o
Clube de Mães Lírio do Vale, dedicado a oferecer cursos profissionalizantes.
Em 1972 é criado pela instituição espirita o Serviço Social Perseverança com
foco no trabalho com crianças e adolescentes, segundo o site do Serviço Social
Perseverança, são atendidas 2 mil crianças, com práticas de esporte, reforço escolar,
artes e creches para crianças de 0 a 5 anos, sem custo nenhum para as famílias
cadastradas.
Atualmente as comunidades religiosas com vinculação imigratória precisaram
adaptar-se a novos tempos, somente algumas igrejas ainda mantêm uma parte de suas
celebrações na língua original, uma vez que muitos dos filhos e netos dos imigrantes do
leste-europeu não falam a língua pátria.
Além disso a competição no campo religioso ficou mais acirrada, gradualmente
muitas igrejas migraram para o bairro, Metodistas, Presbiterianos, Batistas, Igreja
Universal do Reino de Deus, Igreja do Evangelho Quadrangular, Comunidade da Graça,
Igreja Mundial do Poder de Deus, e tantas outras fazem frente as igrejas mais
tradicionais da região, transformando as relações religiosas e influenciando o campo
religioso existente no distrito.
As mudanças do campo religioso experimentados em Vila Prudente não difere
em nada das experiências contidas em São Paulo ou em território nacional. As relações
entre religião e sujeito, são, predominantemente, guiadas pelas prioridades do indivíduo,
ou seja, o papel da religião é na construção de uma identidade pessoal, que não
necessariamente passa por uma constituição da identidade comunitária religiosa, nesse
sentido há uma privatização da identidade do sujeito.
Nas sociedades tradicionais, era a sociedade ou a “cultura” que determinava a identidade do indivíduo. No mundo moderno, pluralista, é o indivíduo que pode e de algum modo deve escolher a sua identidade, determinar quem ele é. Dessa forma, é claro que as opções religiosas serão marcadas pelo subjetivismo, o que poderá inclusive aumentar (como de fato aumentaram) as chamadas “adesões parciais”: o indivíduo aceita uma parte dos dogmas e da disciplina da religião institucionalizada, mas discorda e rejeita outra parte (ANTONIAZZI, 1998:13)
78
As mudanças no campo religioso em Vila Prudente, são reflexo da
contemporaneidade, ou seja, as identidades imigratórias, não estão mais associadas aos
antigos modelos das igrejas tradicionais, a adesão dos novos sequazes depende da
construção subjetiva da identidade pessoal dos adeptos que, não necessariamente, está
relacionado com outros participantes da mesma comunidade.
Se as igrejas de cunho imigratório tinham a função de mantenedoras das práticas
culturais e identitária, as novas igrejas adaptam-se as transformações do tempo presente,
tanto na inovação de práticas religiosas, quanto na rápida resposta as mudanças sociais.
Dessa forma o domínio religioso das novas igrejas não está na enunciação tradicional
religiosa, mas no carisma do líder, ou seja, na capacidade de comunicar-se com os
sequazes da comunidade.
As novas igrejas dinamizam as relações entre migração, cosmovisão e
sociedade, assumindo que as características do distrito têm se alterado ao longo das
décadas, essa “nova cara” da região altera as relações religiosas, abrindo espaço para
igrejas e religiões que antes não tinham lugar no distrito.
Novas igrejas como a Mundial do Poder Deus, com a expansão cada vez mais
latente das novas tecnologias das informações, e a aceleração dos conteúdos midiáticos,
a IMPD nasce em um ambiente midiatizado, dinâmico e plural em sua estrutura.
Nativamente a linguagem utilizada pela IMPD comunica de maneira mais abrangente e
dinâmica com o novo perfil de fiéis existentes no bairro, que não mais tem uma
condição identitária a preservar como dos primeiros imigrantes, mas estabelece-se por
meios de novas formas subjetivas de identidade e construção do ser.
Assim podemos dizer que a IMPD é um espelho social das constantes
transformações sofridas em Vila Prudente ao longo dos anos, ela representa a novidade
inserida no bairro com a verticalização, novos migrantes, nova distribuição de renda e
ascensão do poder de compra da classe c brasileira, além de uma era onde a lógica
midiática tem dominado em todos os aspectos sociais.
2.5. Considerações.
A função desse capítulo foi problematizar o processo de identidade e sua
reconstrução em indivíduos em mobilidade espacial, entendendo como aspectos
79
essenciais os relacionamentos comunitários, que em geral, são encontrados pelos
migrantes nas instituições religiosas.
Passamos então a analisar aspectos históricos do distrito de Vila Prudente, no
qual desde sua formação possui forte ligação com os fluxos migratórios, nos fenômenos
dinâmicos desses fluxos o bairro contém números elevados de comércios, festas,
especiarias e igrejas voltadas, quase que exclusivamente ao uso de migrantes da região.
Com o crescimento o distrito, sua urbanização e inclusão na metrópole, uma
série de benefícios foram realizados no bairro, principalmente em transporte, com isso,
tanto a especulação imobiliária quanto o custo de vida aumentaram, dessa maneira,
aspectos como a verticalização do distrito, a segregação e as dicotomias entre áreas
urbanizadas e periferias urbanas passaram a conviver juntos.
Em novos tempos as antigas igreja já não garantem recursos simbólicos
satisfatórios, nem para os migrantes em situações delicadas por causa do crescimento da
região, nem para os migrantes de segunda geração, que possui sua identidade
fragmentada, e nem para os sujeitos que vivem em altos índices de vulnerabilidade
social, dessa forma, as novas igrejas presentes no distrito estabelecem sistemas
simbólicos e cosmovisões muito mais condicionadas aos novos tempos do que as igreja
migratórias em passado recente.
Nesse prospecto o capítulo situa-nos do ambiente encontrado entorno da
IMPDVA, esse capítulo demostra que o discurso da igreja torna-se forte a medida que
se relaciona com pessoas migrantes e indivíduos com alta vulnerabilidade social.
Evidenciando que o projeto urbano no distrito e o fluxo migratório presente no mesmo é
reflexo da urbanização paulista, onde há incentivos a industrias, obras para melhorias de
deslocamento urbano, especulação e verticalização imobiliária, mas ainda, poucos
investimentos nas classes menos favorecidas socialmente.
Nesse sentido o próximo capitulo denota de que forma a mensagem, os vínculos,
as redes sociais existentes na IMPDVA modelam seus adeptos, ainda no capitulo vamos
levantar os dados e os indicadores sociais obtidos durante as pesquisas de campo,
entrevistas e aplicação dos questionários.
80
Capitulo 3:Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina: estudo de
caso
Este capítulo estrutura-se da seguinte forma: em um primeiro momento, expõe o
a gênese da Igreja Mundial do Poder de Deus articulando entre seu discurso, teologias e
mensagens no campo religioso brasileiro, em seguida abordaremos o início da Igreja
Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina, e apresentaremos os indicadores sociais da
igreja relacionando-os com os dados obtido do Censo 2010 e os Microdados censitários
da região. Assim a construção dos gráficos apresentados nessa parte é híbrida, incluindo
os dados obtidos na pesquisa de campo, nos questionários aplicados e os dados
censitários de 2010.
Outro aspecto que precisa ser esclarecido todas as entrevistas, questionário e
observações de campo, só puderam ser feitos mediante ao compromisso de assegurar o
sigilo identitário do indivíduo, portanto não usaremos nomes, apenas pseudônimos para
identificar os sujeitos.
3. Igreja Mundial do Poder de Deus. Da gênese do movimento ao
fenômeno de tempos recentes.
Nascido em 2 de novembro de 1963 em Cisneiros, distrito de Palmas, Minas
Gerais, Valdemiro Santiago cresceu na zona rural da cidade. Aos 12 anos de idade
Valdemiro acompanha a doença de sua mãe que acaba falecendo, naquela época seu pai
e seus dezessete irmãos e irmãs ficaram perdidos, situação que culmina na tentativa de
suicídio de Santiago31.
31 Entrevista Apóstolo Valdemiro Santiago. Luciana by Night. São Paulo: Rede TV, 15 de abril de 2014. Programa de Televisão.
81
Aos quatorze anos Valdemiro muda-se para Juiz de Fora com um dos seus
irmãos mais velhos, logo, envolve-se com drogas, roubos e passa a morar na rua32. Aos
dezesseis anos de idade, em um dos templos da Igreja Universal do Reino de Deus,
acontece sua primeira experiência religiosa.
Na Igreja Universal do Reino de Deus Valdemiro Santiago percorre um longo
caminho, um ano após sua conversão, aos dezessete anos Santiago realiza sua primeira
cura divina. Em uma visita a um hospital ora por uma jovem, que estava em uma
cadeira de rodas, segundo Santiago após a oração a jovem levanta da cadeira de rodas
para espanto de Valdemiro, dos familiares e dos próprios médicos.
O futuro apóstolo, na IURD tem uma trajetória proeminente ocupando vários
cargos ao longo dos dezoito anos em que permaneceu na igreja, passando por cargos de
obreiro, pastor, líder regional entre tantos outros até ser consagrado bispo e
posteriormente pertencendo ao conselho de bispos do Edir Macedo, um seleto grupo
que desfruta da confiança do chefe da IURD.
As relações entre IURD e Santiago teriam fim, logo após sua experiência de
naufrágio, o grande marco em sua vida, história que seria usada por ele para credibilizar
sua imagem messiânica de uma pessoa escolhida e vocacionada por Deus, é através da
história do “Grande Livramento” que o Valdemiro Santiago morre como bispo iurdiano
e renasce como apóstolo de Igreja Mundial do Poder de Deus.
Em 1996 realizando um trabalho missionário em Moçambique Valdemiro e
alguns pastores saem para pescar, segundo Valdemiro o barco no qual estavam foi
sabotado, estando o grupo já a quilômetros da costa de Moçambique o barco naufragou,
ele deu os únicos 3 coletes salva-vidas para seus colegas, e saiu nadando a procura de
ajuda, com cerca de 153 quilos, nada por cerca de 8 horas, entre tubarões e barracudas,
que não o atacaram pela provisão de Deus, quando todas as suas forças já tinham se
esgotado exausto clama por socorro e Deus responde enviando anjos em seu auxilio,
que o levam a praia resgatando milagrosamente do mar.
Após a experiência em Moçambique decide voltar ao Brasil e recomeçar sua
vida, sem espaço na IURD, decide romper com a igreja em abril de 1998. Pouco tempo
depois Valdemiro Santiago funda a Igreja Mundial do Poder de Deus, dia 8 de março de
32 REGINA, Silvia. Apóstolo Valdemiro Santiago – De menino pobre a apóstolo de Deus. [Documentário]. Produção: Igreja Mundial do Poder de Deus. São Paulo. 2011, DVD/NTSC, 2hs40. Color. Son.
82
1998, na cidade de Sorocaba em São Paulo, com sua esposa Franciléia, suas duas filhas
e um pequeno grupo de membros, cerca de dezesseis pessoas.
Inicialmente a divulgação era feita através de panfletos, testemunhos pessoais e
anúncios sobre os horários de cultos nas ruas. Porém somente no ano de 2008 a IMPD
ganha relevância no cenário religioso brasileiro, dia 1 de agosto de 2008 Valdemiro
Santiago aluga 22 horas de programação na Rede 21, ocupando o espaço com
transmissões ao vivo dos cultos em sua igreja.
A primeira transmissão realizada pela igreja, 10 de agosto de 2008 foi em sua
sede no Brás conhecida como o Templo de Milagres que fica na rua Carneiro Leão 439.
Ao contrário de sua rival, a IMPD não investiu em uma programação variada, ao
contrário o espaço alugado era dedicado quase exclusivamente a transmissão dos cultos,
a imagem do apóstolo era divulgada a exaustão, dificilmente a figura de outros pastores
apareciam na programação, exceto de alguns poucos de sua confiança, entre eles, o
bispo Josivaldo Batista, homem que consagrou Valdemiro a apóstolo e braço direito do
líder da IMPD.
Com o apoio de Ronaldo Didini que já atuou como pastor da IURD e
conselheiro direto de R.R Soares, Apóstolo Valdemiro investe em uma serie de centros
televisivos pelo país, em 2009 inaugura a Cidade Mundial, na cidade de Guarulhos,
complexo de estúdios de televisão de 400 m2, onde possui diversos cenários para
gravações, painéis com o logotipo da igreja e uma réplica de uma montanha.
Em pouco tempo o apóstolo Valdemiro expande seus programas para outros
estados brasileiros, transmitindo em sinal aberto e fechado, a IMPD ainda conta com
rádios, revistas, jornais, blogs, páginas do Facebook, sites e tantas outras formas
midiáticas de divulgação de sua imagem.
Com a exposição permanente da imagem de Valdomiro Santiago, a IMPD ganha
novos adeptos e notoriedade no cenário religioso nacional, competindo diretamente com
a Igreja Universal do Reino de Deus. A disputa pelo campo religioso entre as igrejas é
acompanhada através dos veículos midiáticos.
Em seus programas de televisão, Bispo Waldemiro tem insistido na tese de que muitos desejam “fechar as portas” da igreja, segundo ele, homens que se dizem “de Deus” têm perseguido a igreja, mas ele não é covarde, reafirmando sua disposição de continuar na briga por “um lugar ao sol”. Bispo Waldemiro insiste dizendo que “se por acaso tirarem a sua igreja, ele irá para as praças, se o prenderem, ele pregará nas prisões, ninguém o fará parar”. (BITUN, 2007: 49-50)
83
Claramente Valdemiro faz referência a disputa por fiéis entre IURD e IMPD, a
“guerra” acirra-se cada vez mais, se por um lado Valdemiro acusa a IURD de
perseguição, por outro, a IURD acusa o apóstolo de falta de fé e caráter. Não é raro ver
em seus programas entrevistas com ditas “entidades demoníacas” que afirmam controlar
e dominar o Apóstolo da IMPD33.
De fato a disputa entre as duas igrejas e a necessidade de mais investimentos
para manter-se no mercado religioso, tornou a venda de artigos religiosos e campanhas
para arrecadação lugar corriqueiro nas Igreja Mundiais. Meias, martelos, tijolos, fronha,
palmilhas, chaves, tijolinhos, colher de pedreiro e tantos outros utensílios contribuíram
com a expansão de Valdemiro Santiago.
A IMPD em franco crescimento, em 2012, já tinha inaugurado 3.200 templos34,
é atingida por dois grandes golpes, a reportagem da Record intitulada “O Apóstolo
Milionário” faz graves acusações a Valdemiro Santiago. Na reportagem veiculada no
programa Domingo Espetacular foram apresentados documentos de compras de duas
fazendas no Mato Grosso, em nome da Igreja Mundial do Poder de Deus, arrendadas
pela empresa W.S Music Ltda., de propriedade de Valdemiro e sua esposa, o valor da
compra era de 49 milhões de reais.
A reportagem explicou que quando uma propriedade é arrendada o movimento
financeiro, assim como seu lucro, fica a cargo de seu arrendador, que no caso é a família
Santiago. A reportagem calcula que Valdemiro lucra aproximadamente 6,5 milhões com
as fazendas. Na matéria, ainda foram mostrados supostos bens do apóstolo, entre eles
estavam, carros de luxo, helicópteros, aviões, mansões etc.35
Valdemiro não demorou para responder as acusações feitas a ele e sua família,
alegou que era inocente de todas as acusações, e todos os bens patrimoniais mostrado na
reportagem eram da igreja e a serviço somente dela, ainda assim acusou a Rede Record
de receber 800 milhões anualmente da IURD, contra “apenas” 50 milhões da IMPD,
também convidou o jornalista Marcelo Rezende a visitar um dos templos da IMPD,
segundo o apóstolo o jornalista estaria precisando de oração, uma vez que não se
estabelece em nenhuma emissora.
33O chamado. Absurdo: Edir Macedo entrevista demônio que acusa Valdemiro Santiago e a Igreja Mundial. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=NbWXLgEEFJk. Acesso em: 5 de junho de 2014. 34 Segundo publicação no site oficial da Igreja Mundial do Poder de Deus. Disponível em: http://www.impd.org.br/portal/index.php?link=institucional. Acesso em: 26 de Maio de 2012 35 O Apóstolo Milionário. Domingo Espetacular. São Paulo: Rede Record. 18/03/2012. Programa Televisivo.
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Mesmo com as respostas a IMPD sentiu um golpe forte, que foi procedido de
outros, como o fechamento de inúmeros templos por falta de pagamento. Em Janeiro de
2013 o Ministério Público paulista inicia uma investigação por suposto crime de
lavagem de dinheiro e sonegação fiscal, com problemas financeiros a IMPD corta vários
canais televisivos e desiste das Cidades Mundiais de São Paulo e Paraná, que fecharam
por decreto de órgãos públicos pela inadequação as leis estaduais36.
Além das “perseguições públicas” o apóstolo precisou lidar com o desvio de
verba de sua própria igreja, segundo a revista “Isto É”, cerca de trinta milhões de reais
são desviados pelos pastores todo o mês, um esquema que envolve até mesmo o seu
braço direito bipo Josivaldo Batista, responsável pela administração financeira de IMPD
e amigo pessoal do apóstolo. O bispo foi afastado de seu cargo e transferido para a filial
da igreja em Portugal.
Em 21 de outubro de 2013 a Rede 21 rompe o contrato com a IMPD alegando
falta de pagamento das 22 horas alugadas por eles, em 8 de novembro a Rede 21 para de
exibir as programações da TV Mundial para exibir programações do mesmo grupo
Terra Viva. No fim de 2013 os dividendos da IMPD eram enormes, dados do Serasa
apontavam a existência de 378 protestos contra a igreja, em uma dívida total de R$
9.478,900, 195 pendencias financeiras, no valor de R$ 127.109,00; ainda existia 20
cheques sem fundos e 13 sustados nos últimos meses.37
A inadimplência da IMPD com as programações da Rede Bandeirantes, geram
atritos com a família Saad, dona da rede, tornando inviável o processo de compra da
Rede 21, ou mesmo qualquer outra negociação desse tipo. Ainda segundo a matéria da
“Isto É Independente”, a Igreja Mundial do Poder de Deus pede uma indenização de
200 milhões, alegando rompimento unilateral de contrato, afirmando que uma clausula
possibilitava honrar o compromisso em até 45 dias após da data de vencimento38.
Enquanto o apóstolo Valdemiro lutava contra rachas na igreja, desvios de dinheiro,
inadimplência, a IURD aluga o espaço da Rede 21, dando a impressão que, pelo menos
nessa batalha, o bispo Macedo sagrou-se vencedor.
36 CARDOSO, Rodrigo. A Espera de Um Milagre. Disponível em: http://www.istoe.com.br/reportagens/331588_A+ESPERA+DE+UM+MILAGRE, acesso em 5 de junho de 2014. 37 CARDOSO, Rodrigo. Uma Igreja com Contas Bloqueadas. Disponível em: http://www.istoe.com.br/reportagens/350111_UMA+IGREJA+COM+CONTAS+BLOQUEADAS+, acesso em: 5 de junho de 2014. 38 Ibidem.
85
Atualmente a Igreja Mundial transmite seus cultos na TVZ filiada a Top Tv com
sinal somente digital no canal 55.1, emissora nova inaugurada em 04/06/2013, mas as
transmissões realizadas pela Mundial Tv, hoje são menos expressivas do que no
passado, somente duas horas e meia de programação diária. Para tentar superar a crise,
Valdemiro Santiago constantemente apresenta-se em programas dedicados a classe C,
público alvo da Igreja, ele já apareceu no programa de seu antigo desafeto Ratinho,
Luciana Gimenez, Silvio Santos, entre outros.
3.1. A cura divina na Igreja Mundial do Poder de Deus. Afim de compreendermos melhor todo o prospecto da IMPD é necessário
discutir suas crenças e teologias, a intenção do tópico é apropriar-se do discurso da
IMPD para comparamos em qual grau existe a reprodução do mesmo na igreja local em
estudo, se há alguma modificação e adequação da mensagem, ou se ele é reproduzido de
maneira integral.
Sendo impossível abordar todas as doutrinas e teologias empregadas nos cultos
da igreja, optamos por escolher as doutrinas e práticas mais recorrentes nos programas e
mensagens do apóstolo, dessa forma observando a teologia da cura divina dentro do
escopo do discurso da IMPD. A cura preconizada pela IMPD acontece em um ambiente mágico, os sequazes
ali presentes, inseridos na cosmovisão encantada do mundo, acreditam na ideia de duas
forças antagônicas que disputam a alma humana, explicam o mundo através da
dominação dos deuses e entendem que o apóstolo tem poder para dominar tais forças.
Aliais é possível que o próprio título apostólico remeta a construção mítica
entorno do sujeito Valdemiro Santiago, não é à toa que, assim como todos os heróis
mitológicos, Valdemiro possui um chamado especial por Deus, dificuldade em aceitar
esse chamado, um mito fundador, o naufrágio, um nêmeses bispo Edir Macedo e IURD,
além de sofrer, segundo ele, constante perseguição, mas tudo em prol de sua missão
Santigo não desiste afirmando que o povo precisa dele.
A prática de cura é antiga e faz parte do imaginário social, todos os povos e
civilizações tinham pessoas especializadas e separadas para curar, e normalmente elas
representavam forças sacralizadas, espíritos, homens e mulher que poderiam manifestar
o divino.
86
A cura divina não é algo novo nem na magia, nem na religião, muito menos no cristianismo. O próprio Cristo, em vários relatos bíblicos demostrou seu poder de cura por onde que andasse. Curou paralíticos, cegos, surdos, mudos e toda a sorte de doenças características em seu tempo. (BITUN, 2010:128)
O movimento pentecostal surge como uma nova interpretação da cura divina,
essa interpretação distancia-se tanto dos católicos como dos protestantes históricos e
inaugura um novo modelo de igreja.
Paul Freston propõe uma tipologia baseada em três ondas no desenvolvimento
do pentecostalismo, essa tipologia ajuda-nos no entendimento esse desenvolvimento ao
longo dos anos. (1996)
A primeira onda do movimento pentecostal é de 1910 a 1950, as principais
representantes desse período são: Congregação Cristã do Brasil e a Assembleia de Deus,
para Mariano suas principais características são: “anticatolicismo, pela ênfase no dom
de línguas e por radical sectarismo e asceticismo de rejeição do mundo” (MARIANO,
2004). Embora a ênfase dessas igrejas constituísse na ação do Espirito Santo nenhuma
delas ainda realizava curas divinas, foi apenas na segunda onda que a prática passa a ser
exercida e difundida.
A segunda onda, também chamada de pentecostalismo da cura divina, inicia nos
anos de 1950 e começo da década de 1960 com as igrejas: Igreja do Evangelho
Quadrangular, Igreja Evangélica Brasil para Cristo e Igreja Pentecostal Deus é Amor.
Os quarentas anos que separam o início destas duas ondas –primeira e segunda – justificam o corte histórico-institucional proposta para distingui-las. Quanto à teologia, entretanto, as duas primeiras ondas pentecostais apresentam diferenças apenas nas ênfases que cada qual confere a um ou outro dom do Espirito Santo. A primeira enfatiza o dom de línguas, a segunda, o de cura. (MARIANO, 1999:31)
Outra diferença entre igrejas da segunda onda e da primeira onda são os meios
evangelísticos, igrejas de segunda onda usam constantemente o rádio, cruzadas
missionarias, teatros e estádios para evangelização, além disso o espirito apolítico delas
é deixado de lado, ao contrário, as igrejas de segunda onda promovem política e
discursam que “crente vota em crente”.
A terceira onda é marcada no final de 1970, mas ganha força somente na década
de 80 com o surgimento das igrejas denominadas de neopentecostais, elas possuem uma
forte ênfase na teologia da prosperidade, a IURD é um ícone desse novo movimento,
87
embora alguns autores a consideram como pentecostalismo tardio como é o caso de
Campos:
Em todos os modelos construídos, a Igreja Universal do Reino de Deus, como parece ser obvio para todos, é classificada como uma igreja “neopentecostal”. Preferimos considerá-la também como um pentecostalismo tardio, cuja especificidade está justamente em adequar a sua mensagem às necessidades e desejos de um determinado público. Trata-se de uma igreja que atua dentro de um quadro de pluralismo religioso, cuja estratégia é localizar nichos de pessoas insatisfeitas, provocando nelas estímulos diferenciados a fim de atrai-las para novas experiências religiosas. (CAMPOS, 1997:52)
Outras igrejas da terceira onda são: Igreja Internacional da Graça de Deus, Igreja
Renascer em Cristo, Comunidade Paz e Vida, Igreja Sara Nossa Terra, entre outras. As
igrejas de terceira onda, seguindo o exemplo das igrejas de segunda onda, concentraram
seus investimentos em compras e alugueis de horários televisivos, o grande apelo a
teologia da prosperidade e o crescimento do mercado “gospel”, com produtos voltados
inteiramente para os fiéis.
A mídia, o mercado e o entretenimento – indicam que o gospel não se restringe a um movimento musical; ele tem sim, na música um elemento forte, articulador, mas é muito mais do que isso. O que ocorreu nos anos 90 no Brasil foi uma explosão do gospel como um movimento cultural religioso, de um modo de ser evangélico, com efeitos na pratica religiosa combinadas em contextos socioculturais os mais variados, o que torna possível uma unanimidade evangélica não-planejada sem precedentes na história do protestantismo no Brasil. Essas vivencias são expressas por meio da música, do consumo e do entretenimento. (CUNHA, 2007:231)
A IMPD mescla aspectos de igrejas da segunda e terceira onda, o que o autor
Ricardo Bitun chamou de “Remasterização”, a IMPD apresenta a cura divina aliada a
uma forte teologia da prosperidade, o que possibilita uma convergência entre esses dois
aspectos, por isso a necessidade de esboçar algumas palavras sobre tais teologias.
Já é aceito que não há possibilidade de definir uma teologia para o movimento
pentecostal e neopentecostal, o mais aceito é a existência de pentecostalismos e
neopentecostalismos, cada qual com suas especificidades, a cura divina surge como uma
inovação nascida nos Estados Unidos da América e influencia os movimentos
pentecostais.
88
O grande pregador desse movimento é Kenneth Hagin, nasceu em McKinney,
Texas. Tornou-se pastor da Igreja Assembleia de Deus americana, igreja que se desligou
para seguir um ministério independente. É autor de 52 livros, entre eles o mais celebre
“O Nome de Jesus” que tem influenciado muitos líderes religiosos como: Missionário
R.R Soares, Apostola Valnice Milhomens, Apóstolo Rene Terra Nova, Pastor André
Valadão, etc.
Ela foi trazia em solo pátrio por meio de pregadores, livros e cursos que eles realizam aqui ou até mesmo por líderes neopentecostais que, indo aos Estados Unidos em busca de direitos autorais em feiras e congressos, tomam conhecimento da literatura e do impacto que eles estão causando por lá e trazem exemplares para o Brasil. (BITUN, 2010:135)
O movimento da Cura Divina credita a doença, a pobreza, os males humanos nas
ações demoníacas, cujo foco é tirar todo o potencial humano que Deus estabeleceu. Por
esse pensamento, constantemente a cura divina está ligada a práticas de exorcismo.
Coloque a mão no seu coração e faça silencio [...] a presença de Deus é forte em nosso meio, e as doenças e demônios estão sendo sufocados pelo poder de Deus. Onde tiver um espirito mau, você vai ouvir o seu grito de derrota. Espirito de morte, de câncer, suicídio, depressão, espirito de miséria, separação, destruição, dê seu grito de derrota demônio! (ALMEIDA, 2010:08)
Essa alocução do próprio Valdemiro em um culto da IMPD demonstra a ligação
entre cura e exorcismo, associa-se doenças a obras demoníacas. As igrejas
neopentecostais, nesse caso a IMPD usam formas maniqueístas e atribuem o corpo
humano como território dessa luta, não é à toa que Kenneth Heign diz:
Deus quer que vivamos o período integral da nossa vida, aqui em baixo, sem enfermidades e sem doenças [...] não é da vontade de Deus que fiquemos doentes [...] não disse que o diabo não me atacou. Mas antes de findar o dia, já estou curado. Quando o diabo me ataca, digo-lhe: “satanás, estas enfermidades foram carregadas no corpo de Jesus. Você não tem o direito de trazer a imagem delas para cá a fim de me assustar. Agora pegue as suas coisas, ponha-as na mala e sai daqui”. (1985:222-225)
Edir Macedo afirma em seu livro: “Orixás, Caboclos e Guias: Deuses ou
demônios” que todo o mal proveniente desse mundo é originário do diabo. O pregador,
nesse sentido trabalha como mediador do sagrado, é ele que conhece as palavras certas
89
para a ministração da cura, é ele que tem o poder de manifestar o sagrado expulsando o
mal do fiel.
Não é difícil imaginar por que a teologia da cura divina, atrelada ao problema do mal, é um dos meios de crescimento mais utilizados pelos pregadores neopentecostais, em particular a Igreja Mundial do Poder de Deus. Estamos em um país onde o atendimento público é precário, o “bom atendimento médico” é quase inacessível por grande parte da população e as políticas públicas de saúde são fundamentadas em um modelo excludente. Essas situações ainda são agravadas por diversas violações às leis ambientais, poluição, falta de saneamento básico, altíssimas taxas de doentes mentais, neuroses, psicopatias e sociopatias de uma população submetida a um estado de miséria, violência, além de diversos distúrbios sociais. (BITUN, 2010:135)
Muito por influência da Igreja Universal do Reino de Deus, os relatos de curas
na IMPD sempre vêm acompanhados de fotos, documentos, laudos médicos do antes e
depois, que comprovaria a veracidade do poder da cura realizada na igreja. A cura na
IMPD é muito mais que uma dadiva divina, mas também simboliza salvação, doenças
que são consideradas incuráveis pela medicina como: câncer, leucemia, paralisia, entre
outras, na igreja de Valdemiro encontram seu final, constantemente há relatos de
pessoas “desenganadas” pela medicina, declaradas mortas pelos médicos, que ao
ouvirem ou tocarem em algum objeto consagrado da Igreja Mundial do Poder de Deus,
são milagrosamente curadas.
A cura pregada pelo apóstolo Valdemiro, não vem somente através de
exorcismo e orações, mas de símbolos “ungidos” como a fronha dos sonhos, que
garante uma noite de descanso ao fiel, martelo da justiça, capaz de dar “causa ganha” a
qualquer julgamento na justiça, toalhinha embebida no suor de Valdemiro Santiago, que
possui poderes curativos, além desses existem rosas, tijolos, chaves, cajados e inúmeras
outras formas de objetos, que fetichizados contribuem para a ambientação da cura.
O cristão deve, portanto, colocar sua fé em ação e se tornar um sócio de Deus. Isso é feito quando o adorador se compromete a “devolver” aquilo que é de Deus, ou seja, o dizimo. Deus, em contrapartida, garantirá as bênçãos da cura e o sucesso no empreendimento. (CAMPOS, 1997:368)
Valdemiro Santiago garante que a cura não acontece somente pela fé do sequaz,
mas também através da sua própria fé. Não é incomum ouvi-lo dizer “se não tem fé para
ser curado, venha pela minha”, essa atitude reforça ainda mais o carisma dele com os
adeptos que buscam e depositam no apóstolo Valdemiro e na Igreja Mundial do Poder a
esperança para a cura de suas mazelas.
90
Nas práticas de cura utilizada por muitas igrejas o paralelo entre magia e religião
se estabelece quase que inevitavelmente, obviamente não queremos aqui identificar, ou
estabelecer que a prática de cura no xamanismo39 e no neopentecostalismo sejam iguais,
entendemos que religiões diferentes produzem conceitos e práticas de curas diferentes,
mas é inegável que o neopentecostalismo possui seus próprios ritos mágicos.
No neopentecostalismo as fronteiras entre religião e magia são fluidas:
Neopentecostalismo, ao integrar largamente o uso de símbolos aos seus rituais, e ao enfatizar interpenetrações e influências reciprocas entre campos e esferas de uma lógica mais formalista havia demarcado como espaços separados, torna também fluidas as fronteiras da magia e religião40
No neopentecostalismo o ato de cura é associado ao exorcismo de demônios,
esse poder geralmente é coligado ao pastor, bispo, apóstolo, obreiro, missionário etc.
Eles são elementos centrais é através deles que todo o processo de cura se inicia,
podemos dizer que: esse mago não é uma pessoa qualquer, mas aquele que possui um
determinado poder e que através de técnicas especificas controla forças ocultas
direcionando-os a fins específicos como, por exemplo curar doenças. (GUERREIRO,
2003:13)
Podemos observar isso nos relatos dos fiéis que são curados nas igrejas da
IMPD, a cura é sempre atribuída ao apóstolo Valdemiro Santiago ou um dos bispos e
pastores da IMPD, em um programa da Igreja Mundial do Poder de Deus uma mulher
afirma: é só a unção do apóstolo que pôde curar minha irmã41, segundo o relato sua
irmã foi curada de câncer e HIV pela IMPD.
A eficácia das práticas magicas na IMPD só é funcional à medida que os adeptos
da igreja assumem a crença na qual o apóstolo Santiago possui força o suficiente para
realizar tal ato. Levi-Strauss afirma que a crença na magia acontece em três aspectos, a
crença do feiticeiro na eficácia de suas técnicas, a crença do doente que o feiticeiro é
39 Xamanismo é um conjunto de crenças ancestrais que engloba práticas de magia e evocações para estabelecer contato com o mundo espiritual. O xamanismo é um fenômeno religioso que confere ao xamã a capacidade de entrar no mundo espiritual, assim, ele adquiri a habilidade de curar doenças, afastar o mal, predizer o futuro, etc. 40ORO, Aro Pedro. Neopentecostalismo: dinheiro e magia. In. ILHA- Revista de antropologia, v.3, n°1, novembro. 2001,p.71-85. Disponível em: http://www.periodicos.ufsc.br/index.php/ilha/article/view/14957/15665. Acesso em 22 de julho de 2013.p.83. 41 Cura de Câncer e HIV. 2009.IMPD Mundial. Visto em 22 de julho de 2013. Proveniente da World Wide Web. http://www.youtube.com/watch?v=U6-PpLcPCcM.
91
capaz de cura-lo e a crença coletiva no poder do feiticeiro (1985:194). Assim de forma
análoga, as curas procedentes da IMPD acontecem pela crença do apóstolo Valdemiro
em suas técnicas, a crença dos prosélitos que vão até seus templos e cultos, e a crença
dos fiéis da igreja na magia/fé empregada por Valdemiro Santigo na vida daqueles em
que ele toca.
A cura não acontece somente pelos ritos mágicos da IMPD, mas pela
legitimação na pessoa de Valdemiro Santiago, tanto o fiel, quanto a comunidade
precisam estabelecer um contrato com o apóstolo, esse contrato coletivo sanciona e
legitima as ações mágicas de Santiago, esse por sua vez franqueia o poder creditado
para seus obreiros, pastores e bispos. Os sequazes que procuram a Igreja Mundial do
Poder de Deus já vão condicionados e esperando que aconteçam curas, milagres e
manifestações do poder divino pelo apóstolo Valdemiro, e consequentemente estão
propensos a pagar, doar, ofertar e dizimar em busca dos milagres oferecidos pela igreja.
Nesse sentido nos lembramos das reflexões de Max Weber: a religião se
caracteriza pela submissão e serviços prestados à divindade, enquanto a magia é uma
coerção de Deus (1991:294), essa coerção é encontrada nas práticas do apóstolo
Valdemiro, seja no sopro na cabeça dos fiéis, na oração com imposição de mãos, na
consagração de óleo e águas “oradas” ou em inúmeros objetos veiculados pela IMPD.
Tudo contribui magicamente para a coerção da vontade divina em prol de benefícios
para os adeptos, ao mesmo tempo em que garante ao apóstolo capital simbólico e
legitimidade no campo religioso.
As relações entre magia e religião são às vezes muito mais continuidades e
complementariedades do que de exclusão. A visibilidade do mágico e a tensão existente
entre ambos os polos sejam mais perceptíveis porque o seu público alvo é formado de
pessoas em situações limites. Tais indivíduos experimentam as incertezas da vida
urbana, isso tudo cria oportunidade para o emprego de rituais que reduzem as incertezas
e restauram nos indivíduos a crença de que o mundo pode deixar de ser não-
manipulável e arbitrário. (CAMPOS, 1997:42)
A magia é elemento presente e recorrente na IMPD, Santiago usa do imaginário
simbólico e social para construir sua imagem de “homem divino” por meio de ritos de
cura e objetos que garantam ao fiel à continuidade da magia apresentada na igreja para
seu cotidiano, assim não existe um rompimento entre religião, magia e cura, o que
existe é uma amálgama desses elementos em favor do domínio do campo religioso
brasileiro.
92
3.2. Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina: aspectos
históricos.
Em nossa pesquisa podemos perceber a inexistência de registros sobre a Igreja
Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina. A igreja em estudo não possui nenhuma
Ata, documento de reuniões, assembleias, nada que possua uma memória institucional
que remontem ao passado recente da igreja. Nesse caso a pesquisa se apoiou nas
declarações de membros mais antigos da igreja, que ajudaram parcamente, a remontar
aspectos da constituição da história da igreja.
Segundo o obreiro 142, que está a dez anos congregando na igreja, desde 2004, a
igreja é fruto da necessidade de expansão. Segundo ele, quando chegou na igreja está
era autônoma e respondia somente a igreja sede, localizada em São Caetano do Sul,
mas, que antes disso, existia somente um pastor que administrava tanto a Igreja Mundial
do Poder de Deus em Vila Alpina, quanto em Vila Prudente.
O obreiro ainda relata que a igreja, como não tem um templo próprio, já passou
por muitos lugares, segundo ele, nesses dez anos a igreja já havia mudado 4 vezes de
lugar, principalmente em busca de alugueis mais baratos. As mudanças de espaços,
embora, sempre bem planejadas, pensando no acesso dos fiéis, sempre perto de pontos
de ônibus, lugares centrais e de fácil acesso, gera dificuldade em um trabalho continuo.
Eu não gosto de mudança, isso atrapalha muito, dá a impressão que sempre que mudamos de igreja o trabalho começa do zero, eu acho que o pastor devia comprar um terreno e ficar lá, mas as coisas não dependem dele né, daí a gente fica assim igual cigano. (Obreiro 1)
Nesse tempo de igreja o obreiro 1, e nenhum entrevistado, soube precisar
quantos pastores já passaram pelos púlpitos da igreja, mas todos afirmaram que o pastor
MN foi o primeiro que ficou anos à frente da igreja. Foi através do obreiro 1 que
soubemos a razão da vinda do pastor local e a baixa frequência de pessoas, segundo ele:
Antes do pastor (MN) tinha outro pastor na igreja, estava aqui a um ano, mais ou menos, mas ele saiu porque foi acusado de desvio de dinheiro, ele pegava os carnes do apóstolo (ofertas e dízimos dedicados ao pagamento do programa televisivo) e colocava a conta dele, tirava dinheiro do caixa da igreja e tudo mais. O bispo veio aqui e conversou com ele e tirou ele da igreja, alguns obreiros espalharam isso para a igreja e muita gente saiu. (Obreiro 1)
42 Entrevista realizada dia 15/04/2013, nas dependências da IMPDVA as 18:20.
93
O pastor MN assume a igreja com o objetivo de apaziguar a situação e
reestruturar a igreja que estava prestes a fechar, o obreiro comenta que o pastor MN
pegou uma igreja administrativamente difícil, devendo muito dinheiro de aluguel, água,
luz, com poucas pessoas e menos ainda dizimistas.
Com essa situação a igreja sede decide formar uma parceria com eles, arcando
com as despesas do aluguel, pagando as contas essenciais como luz e água, mas
anualmente essa ajuda iria diminuir, a ideia é que a igreja conseguisse de reerguer, com
a ajuda do pastor em pouco tempo.
Dessa forma a Igreja Mundial do Poder de Deus passa por uma reestruturação,
comandada pelo pastor MN, que tem como objetivo entregar essa igreja revitalizada,
além disso, é preciso fidelizar novos adeptos, que não possuem o ranço das pessoas que
saíram, enquanto estimula-se as pessoas que ficaram a permanecer na igreja, ganhando
sua confiança.
3.3. Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina Indicadores
Sociais.
O distrito de Vila Prudente abarca uma serie de bairros: Jardim Avelino, Parque
Vila Prudente, Quinta da Paineira, Sítio da Figueira, Vila Alpina, Vila Bela, Vila
Califórnia, Vila Lúcia, Vila Prudente, Vila Zelina. Como bairro Vila Alpina não se
diferencia muito de suas coirmãs, as características herdadas do distrito, ou até mesmo
da cidade, Vila Alpina sofre do retrato das desigualdades, visivelmente, podemos
perceber casas e condomínios de alto padrão cercados por residências de autoconstrução
e loteamentos clandestinos.
Nos próximos parágrafos analisaremos os indicadores socioeconômicos obtidos
na pesquisa de campo, através das entrevistas e questionários, aspectos como:
escolaridade, idade, etnia, local de nascimento, renda familiar e moradia. É nosso
objetivo ainda explanar sobre o perfil religioso dos adeptos da IMPD em Vila Alpina,
que analisaremos mais afrente.
94
3.3.1. Faixa etária Gráfico 2
Gráfico 3: Pirâmide etária – Vila Alpina
Fonte: IBGE: Censo 2010, Subprefeitura de Vila Prudente.
3%
15%
12%
6%
3%
6%
9%
12%
15%
18%
20% 15% 10% 5% 0 0 0 0 0
0 a 9 Anos
10 a 19 Anos
20 a 29 Anos
30 a 39 Anos
40 a 49 Anos
50 a 59 Anos
60 a 69 Anos
70 a 79 Anos
Mais de 80 Anos
Pirâmide Etária dos Membros da Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina
95
Ao comparamos a pirâmide etária de Vila Prudente com a IMPDVA podemos notar que
a igreja tem maior número de indivíduos adultos em relação ao bairro. As crianças e os
jovens possuem muito mais densidade do que na igreja, onde quase não existe jovens e
a ausência de um grupo considerável de crianças.
Embora não se tenha entrevistado nenhuma criança na pesquisa, e com isso, elas
não apareceram durante a confecção do gráfico, podemos salientar que, durante as
pesquisas de campo, não se notou a presença significativa de crianças e jovens, durante
os cultos e reuniões, a média da frequência de jovens e crianças está em 5 por culto,
número ainda muito baixo se comparado a outras religiões e igrejas.
Ainda assim existe um adensamento de mulheres na igreja acima de 40 anos,
enquanto os homens se sobressaem como grupo característico acima dos 30 anos, ou
seja, dez anos a menos que o grupo das mulheres. Como já é característico em muitas
igrejas, a proporção entre mulheres e homens não é balanceada, existindo mais
mulheres, quase o dobro delas, frente aos homens. Característica essa, que na pirâmide
demográfica do bairro não é destacada, principalmente porque tanto, homens como
mulheres estão em proporções equivalentes.
A pirâmide etária nos traz um indicativo importante, pois expressa quem são as
pessoas que frequentam a IMPDVA, o público majoritário da igreja é constituído de
mulheres em meia idade, algumas mulheres idosas, poucas jovens e crianças, do lado
masculino o público de maior composição está entre os 30 e 49 anos, igualmente com
poucos jovens, adolescentes e crianças.
3.3.2. A distribuição por Cor
Comparando as médias nacionais étnicas, a IMPD em Vila Alpina tem um
número significativo de pessoas que se declaram pardas 51%, como demostra a tabela
abaixo. Ao contrário do que popularmente se considera, os pardos não se localizam
entre os grupos de brancos e negros, geralmente, nos indicadores socioeconômicos, os
pardos encontram-se um pouco acima dos negros, mas muito distantes dos brancos.
(BRANDÃO, 2004:16)
96
Gráfico 4
Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2010. Pesquisa de Campo.
Ainda sobre essa questão Oracy Nogueira relata que questões étnicas no brasil
estão mais vinculadas com a cor da pele do que propriamente com a origem de sua
ascendência. Segundo essa interpretação, a concepção brasileira da cor da pele definiria
socialmente o indivíduo, e serviria de base para preconceitos e discriminações. Segundo
Schwartzman: Isto permitiria que as pessoas “passassem” com mais facilidade de uma
categoria racial a outra e, ao mesmo tempo, reduziria a coesão e identidade interna
dos grupos étnicos ou raciais. (1999:84).
Embora Schwartzman afirme que a passagem de “categoria” possa servir como
fator inibidor da coesão social, o alto índice de pardos na IMPD em Vila Alpina,
demonstra sinais diferentes, talvez a identidade com a cor de pele do apóstolo
Valdemiro Santiago, ou mesmo com a presença do pastor carinhosamente apelidado de
MN, tenha incentivado uma coesão identitária diferente de outros grupos religiosos.
Portanto a igreja mostrar uma quantidade significativa de pardos, que
apresentam-se nos indicadores sociais mais próximos dos pretos, desse modo, os
pardos, de maneira geral, expõem uma taxa de vulnerabilidade social maior em relação
ao grupo branco.
3.3.3. Escolaridade
0
10
20
30
40
50
60
Branca Preta Parda
Distribuição Percentual por Cor ou Etnia, Segundo os Grupos Religiosos - Brasil - 2010
Catolica Evangelica de Missão Evangelica Pentecostal IMPD em Vila Alpina
97
Ao analisar o nível de escolaridade da IMPD em Vila Alpina notamos que está
bem abaixo das médias do bairro, mesmo assim o nível de escolaridade da igreja é
superior à média nacional de igrejas evangélicas de tradição pentecostal. A escolaridade
paterna e materna nos membros da IMPD também se destacou pelo baixo índice de
escolaridade, somente 29% tinham completado o ensino fundamental.
Para Bourdieu os recursos culturais familiares possuem preponderância sobre os
econômicos na definição do desempenho e dos percursos escolares (1998:89), dessa
forma o capital social adquirido, os bens culturais objetivados, os valores e disposições
com relação a cultura, somam-se na aquisição, ou não, de uma cultura escolar, que, por
sua vez, influência nos índices de vulnerabilidade social.
Embora os indicadores de escolaridade apresentam-se como uma significativa
evolução em relação aos pais, ainda é baixa a adesão escolar por parte da maioria das
pessoas pesquisadas na IMPD em Vila Alpina, o número obtido no campo da pesquisa
apresenta-se no gráfico abaixo.
Gráfico 5
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2010. Pesquisa de Campo
6,8
3,6
6,2
1,8
6,7
6,4
39,8
30,7
42,3
15
39,2
38,4
18,3
19,7
21,3
14,7
20,2
32,5
25,1
33,4
25,5
36,5
25,2
17,3
9,3
12,1
4,1
31,5
8,2
5,4
0,5
0,6
0,7
0,5
0,5
0
0 5 10 15 20 25 30 35 40 45
Católicos
Evangelicos de Missão
Evegelicos Pentecostais
Espiritas
Sem Religião
IMPD Vila Prudente
Percentual de pessoas de 15 Anos ou mais de idade por nivel de intrução (%)
Não Determinado Superior Completo
Médio Completo e Superior Incompleto Fundamental Completo e médio incompleto
Fundamental Incompleto Sem Instrução
98
O nível de instrução da igreja, mesmo sendo melhor que a média nacional entre
das igrejas de origem pentecostal, ou mesmo, maior que a escolaridade paterna ainda
está aquém das perspectivas do bairro como mostra o gráfico abaixo:
Gráfico 6
Fonte: Infocidade, Censo demográfico 2010
Em quanto a média do distrito para pessoas que concluíram o ensino
fundamental está em 20% de sua população, somente na IMPD em Vila Alpina esse
número sobe para 32,5%. O número de escolaridade também é baixo nos índices do
ensino superior, enquanto a porcentagem do distrito é de 10,10 % completaram o ensino
superior, somente 5, 4% das pessoas da igreja completaram o ensino superior.
3.3.4. Rendimento
O indicador social de rendimento é influenciado pelos anos de estudo, não é
surpresa que o rendimento de cada família tende a ser menor quanto menor for a média
de tempo estudado pela família. A IMPDVA tem rendimento domiciliar entre 1 e 3
salários mínimos compatível com a média de anos de estudo familiares.
Mesmo em um lugar central no bairro, fácil localização e transporte, de maneira
geral, é uma igreja empobrecida, sem uma arrecadação expressiva, com dificuldades
para quitações de despesas básicas como: água, luz, telefone e aluguel. Nessa
perspectiva os pastores muitas vezes apelam para contribuições mais constantes e
17%
20%
9%
41%
3% 10%
População de 15 anos ou mais por nivel de instrução - Vila Prudente
Fundamental Incompleto
Fundamental completo
Médio Incompleto
Médio Completo
Superior incompleto
Superior Completo
99
ofertas mais opulentas, não é raro ouvir dos pastores e obreiros que a igreja sede,
localizada em São Caetano, arcou com as despesas, existe uma grande pressão, da parte
do bispo e pastor, para que a igreja desenvolva-se para ser autossustentável, as ameaças
de fechamento do templo ou mesmo um lugar menor e mais longe são permanentes nos
cultos.
Como demostra o quadro abaixo o rendimento dos adeptos da IMDPVA é bem
inferior se comparado a outras religiões, como os adeptos do espiritismo, também é
inferior aos evangélicos de origem pentecostal, evangélicos de missão e da média do
próprio bairro. Dessa forma o grupo de IMPDVA tem seu poder de compra reduzido em
relação aos outros grupos, o que garante, um quadro a ser formado de pessoas em alta
vulnerabilidade social.
Gráfico 7
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
Rendimento Domiciliar - Pessoas com 10 anos ou mais (%)
Catolicos Evangelicos de Missão Evangel. De Origem Pentecostal
Espirita Sem Religião Distrito de Vila Prudente
IMPD em Vila Prudente
100
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2010, Fundação SEADE, Pesquisa de Campo.
3.3.5. Sobre a Migração
A questão da migração foi medida sobre dois aspectos, a origem de nascimento
dos pais e local de nascimento do entrevistado, portanto consideramos migrantes nessa
pesquisa, as pessoas dos dois grupos, ou seja, tanto aquelas que nasceram na UF, mas
seus pais não, quanto aquelas que efetivamente não nasceram na UF, mas em um
determinado momento mudaram-se para São Paulo.
Segundo os dados do censo 2010 existem hoje no bairro 46.940 mil pessoas,
dessas 46.530 mil são homens e mulheres nascido no país, portanto, 6.901,00 mil
pessoas não nasceram na cidade de São Paulo, ou seja apenas 14,8% da população
residente em Vila Alpina são pessoas em mobilidade migratórias.
Quando analisamos o contexto dos membros da IMPDVA notamos que esse
número é o dobro do apresentado no bairro, 30,3% dos membros da igreja não nasceram
na cidade, o número pode ser maior quando comparamos com o lugar de nascimento
paterno e materno 57,5% das pessoas tem em sua origem outras localidades como
mostra o gráfico.
Gráfico 8
Fonte: IBGE, Censo demográfico 2010, Pesquisa de Campo
85,2
14,8
POPULAÇÃO RESIDENTE MIGRANTE EM VILA ALPINA
População Residente em Vila Alpina Migrantes Residentes em Vila Alpina
101
Gráfico 9
Outro indicativo importante pesquisado é o tempo de residencia de cada
participante, que permite ao pesquisador estabelcer um parametro de assentamento ao
migrante, bem como, relacionar o nivel de vulnerabilidade e compreender as redes
sociais presentes entre eles.
O grafico abaixo demonstra os anos de residencia em comparação com os
migrantes em Vila Prudente.
Gráfico 10
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2010, Pesquisa de Campo
53%
16%
31%
População Migrante e de origem Migratória
IMPD Vila Alpina
Migrantes em IMPD
De origem migratoria
3,40%
2,80%
5,63%
5,20%
82%
10%
0
30%
40%
20%
0,00% 20,00% 40,00% 60,00% 80,00% 100,00% 120,00%
Menos de 1 ano
De 1 a 2 Anos
De 3 a 5 Anos
de 6 a 9 Anos
Mais de 10 Anos
População em (%) com tempo ininterrupto de residencia
Migrantes em Vila Alpina Migrantes em IMPD
102
Embora a grande maioria da população residente em vila Alpina esteja morando
no bairro a mais de 10 anos, não podemos considerar que o maior índice entre os
membros da IMPDVA de 6 a 9 anos seja exatamente baixo, mas a relação entre
residência e tempo de moradia pode gerar estigmatização pelos moradores mais antigos,
aqueles indivíduos que não faziam parte do grupo, simplesmente são excluídos.
(NORBERT e SCOTSON, 200:66) a grande maioria dos membros pesquisados
declarou não morar no bairro de Vila Alpina, somente 39% dos entrevistados moram no
bairro, sendo que 61% deles afirmam morarem nos bairros satélites, como Vila Zelina,
Jardim Avelino, Sitio da Figueira, Vila Lucia, Vila Califórnia.
A pesquisa também aferiu a origem dos migrantes da IMPD tanto de sua UF
natal, a seguir demostramos o resultado colhido:
Gráfico 11
O resultado encontrado entre os membros da IMPDVA demonstra um elevado
índice de pessoas provenientes do UF do Espirito Santo, isso pode ser explicado pela
rede familiar encontrada na igreja, onde o contato familiar, bem como a facilidade já
encontrada de alguns recursos facilita a escolha do destino do migrante, pois, já
encontra no destino uma estrutura já formada, mesmo que ela seja parca.
103
A população pesquisada na IMPD de Vila Alpina é um exemplo do que os
estudos censitários e PNAD tem demostrado ao longo dos anos, um arrefecimento das
migrações inter-regionais e um assentamento dos migrantes, podemos sinalizar que a
população estudada da IMPD é migrante, em sua maioria já estabelecidos, nos bairros
com domicílios próprios ou alugados a bastante tempo, em muitos casos em processo de
autoconstrução. A seguir demostraremos os números obtidos da residência dos
pesquisados.
3.3.6. Domicílios alugados e próprios.
Ainda que a casa própria seja maioria no total de domicílios no País, o ritmo de
crescimento no número de casas ou apartamentos alugados teve um destaque no cenário
nacional nos últimos anos, segundo informado pelo IBGE, em um universo estimado de
58,5 milhões de unidades domiciliares, foram registrados 43,136 milhões de domicílios
próprios, o que representa cerca de 73,6% do total. Os números de domicílios próprios
representam um aumento de apenas 0,6% em relação ao ano anterior, no caso dos
domicílios alugados, o número chegou a 9,952 milhões somente no ano passado, o que
representa 17% do total e 4,3% a mais que o registrado anteriormente.
Seguindo a tendência, o grupo pesquisado da IMPD em Vila Alpina, conforme
os dados coletados representam 51,5% residem em casa aluga, os membros da igreja
dividem-se dessa maneira:
Gráfico 12
48% 52%
Domicilios Próprios e Alugados pelo Número de Amostra frequente na
IMPD em Vila Alpina (%)
Residentes em DomicíliosPróprios
Residentes em DomicíliosAlugados
104
Para fins metodológicos consideramos cômodos domiciliares, todas as divisas de
espaços construídos no limite espacial da habitação do pesquisado, isso inclui, quartos,
salas, cozinhas, banheiros e todo espaço que o indivíduo utilize em sua residência. Na
pesquisa de campo notamos que havia muita confusão em diferenciar os cômodos, por
isso optamos por um questionário que abrangesse todas as divisas residenciais
mencionadas pelo pesquisado.
Os estudos contemporâneos frequentemente associam as características da
moradia à saúde dos seus moradores, a literatura nacional apresenta uma boa quantidade
de bibliografia a esse respeito (VALLADARES & MEDEIROS, 2003), além disso,
destacam-se trabalhos que associam moradia e políticas públicas habitacionais ao
escopo da vulnerabilidade social e a exclusão do migrante e pobre, sendo uma prática
histórica da formação de zonas urbanas, como já discutimos no 1° e 2° capítulo dessa
dissertação.
Nessa ótica os dados obtidos na pesquisa de campo apresentam-se conforme o
gráfico abaixo:
Gráfico 13
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2010, Pesquisa de Campo
Os gráficos supracitados não demostram uma disparidade em relação a
população de Vila Alpina, ainda é importante notar que a maiorias das pessoas
entrevistadas consideram adequada sua situação domiciliar, cerca de 74% dos
0,94%
4,60%
16,89%
22%
20,73%
14,09%
8,56%
12,19%
0,00%
3%
15,15%
30,30%
24,40%
12,12%
15,15%
0,00%
D O M I C Í L I O S C O M 1 C Ô M O D O
D O M I C Í L I O S C O M 2 C Ô M O D O S
D O M I C Í L I O S C O M 3 C Ô M O D O S
D O M I C Í L I O S C O M 4 C Ô M O D O S
D O M I C Í L I O S C O M 5 C Ô M O D O S
D O M I C Í L I O S C O M 6 C Ô M O D O S
D O M I C Í L I O S C O M 7 C Ô M O D O S
D O M I C Í L I O S C O M 8 C Ô M O D O S O U M A I S
DOMICÍLIOS POR NÚMERO DE CÔMODOS POR FAMÍLIA (%)
Vila Alpina IMPD em Vila Alpina
105
entrevistados responderam positivamente a sua situação residencial, a considerando
adequada para sua condição, 83% respondeu que não consideram uma mudança de
domicilio nos próximos anos.
Mesmo com esses números altos de satisfação residencial, é possível detectar
um elevado número de famílias que vivem em privação intradomiciliar, segundo os
critérios comumente utilizados na construção de índices de necessidades habitacionais,
considera-se domicílios superlotados aqueles que possuem três ou mais moradores por
dormitório (RICCI, 1973).
Ao total de dormitórios são acrescentados dois outros cômodos de apoio, que serviriam como cozinha e sala. Nota-se, entretanto, que as questões sobre idade e composições familiares não nucleares não são captados. Entende-se que a saída precoce da casa dos pais, no caso Holandês, justificaria o pressuposto de um dormitório para cada dois filhos e também a abordagem da idade dos membros da família nuclear. Mas, no Brasil, em consequência da frequente coabitação familiar e da postergação da saída da casa dos pais, será necessário considerar um maior número de dormitórios para as famílias grandes, bem como a análise da idade dos membros. 43
Dessa forma, mesmo levando em consideração acréscimos de mais cômodos na
contagem final dos membros da IMPD, cerce de 39% dos entrevistados moram em situação de
privação domiciliar, ou seja, sua residência possui mais de 3 pessoas por cômodo. A pesquisa
realizada não acusou nenhuma falta de infraestrutura na residência dos pesquisados, as
infraestruturas de agua, luz, esgoto, pavimento encontram em plena ordem de todas as
residenciais pesquisadas.
3.4. Análise dos indicadores sociais
Consensualmente a noção de vulnerabilidade socioeconômica vem sendo utilizada por
diversos autores como sinônimo de risco social, fragilização, exclusão, entre outros. De fato a
noção de vulnerabilidade resulta no não atendimento às necessidades de sobrevivência dos
indivíduos, principalmente no que diz respeito a precariedade habitacional, seja em virtude das
condições socioeconômicas, perda dos vínculos sociais ou na negação da aquisição dos direitos
sociais.
43 GIVISIEZ, OLIVEIRA. Gustavo Henrique, Elzira Lucia. Privacidade Intradomiciliar: um estudo sobre as necessidades de ampliações em residências. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-30982013000100010. Acesso em 10 de junho de 2014.
106
Sarah Escorel afirma que a vulnerabilidade social é uma possibilidade de transição da
condição de pobre para indigente, (1999:17), nesse caso a vulnerabilidade social pode ser
entendida como mobilidade social descendente, onde o indivíduo, em geral, desloca-se para a
condições mais extremas da vida humana.
Kowarick se refere a vulnerabilidade social como “vulnerabilidade civil”, demostrando
a existência de condições decorrentes da perda ou da ausência de direitos na sociedade (2002),
segundo ele, os indivíduos vivenciam a vulnerabilidade, pois, não teriam alcançado direitos
sociais básicos. A vulnerabilidade, dessa forma, não pode ser considerada como uma exclusão
social de fato, mas um processo complexo de fragilidades que ao longo dos anos, gera exclusões
sociais.
Os indicadores sociais obtidos através dos questionários respondidos pelos fiéis da
IMPD em Vila Alpina demostram a existência de processos de vulnerabilidade civil, a baixa
renda familiar, a migração interestadual, a pouca instrução educacional e a densidade domiciliar
corroboram para um quadro de fragilidade social.
Desses processos da vulnerabilidade o que carece de mais atenção é a questão salarial,
sem um rendimento familiar adequado muitos membros da IMPD passam por dificuldades
financeiras, muitos deles caminham até suas casas para evitar gastar em condução, soma-se a
isso a pressão feita pelo pastor para alcançar as metas estabelecidas como o pagamento do
aluguel, que constantemente atrasa.
Embora os membros saibam de sua fragilidade financeira não existe qualquer comoção
entre eles para ajuda mutua, quadros de serviço, dicas de onde trabalhar, comuns em muitas
igrejas, na IMPD em Vila Alpina são inexistentes, apenas há algumas poucas cestas básicas
destinadas aqueles que são obreiros, mas de forma geral isso não é oferecido a todos, fica a
critério e disposição do pastor.
Nos parece que não existe laços fortes o suficiente para que haja uma construção social
que mobilize o grupo a reivindicar seus direitos, ou mesmo na organização de qualquer projeto
que estimule o aumento do estudo e do rendimento familiar. Quando perguntados sobre o baixo
rendimento, muitos deles repetiram o discurso do pastor, atribuindo a questão salarial a
condições metafisicas, obediências a ritos pré-definidos pela igreja, testemunhos inspiradores e
vontade divina.
Por outro lado a IMPD funciona como coesão social, os fiéis da IMPD em Vila Alpina
identificam-se com o apóstolo, para eles Valdemiro Santiago é um homem que venceu na vida,
identificação é estabelecida pela construção imagética do líder da IMPD. Com o seu chapéu, sua
fala crua, seu jeito “roceiro”, além da sua história no campo mineiro, muitos dos migrantes
reconhecem nele um par, uma pessoa que assim como eles, lutou para vencer os obstáculos
paulistas. Dessa forma Valdemiro é ungido, não somente pelos milagres, curas e historias
maravilhosas, mas pelo fato de ter vencido a metrópole, ter conquistado seu espaço, e, de certa
107
forma, assim como Cristo em meio a tempestade, colocado ordem ao caos urbano, no qual o
migrante é jogado todos os dias.
3.5. Perfil Religioso dos membros da Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina
Ainda nos debruçamos sobre os dados obtidos na pesquisa de campo, mas agora com
um enfoque especifico na análise do perfil religioso dos membros da IMPDVA. Esses dados são
importantes para uma melhor analise de quem é fiel da igreja, e sua trajetória religiosa. Com os
dados obtidos esperamos compreender melhor o funcionamento dos símbolos e signos religioso,
além de como eles interagem com os fiéis.
Consideramos então que o perfil sociológico amalgamado com a perfil religioso nos
dará noção, ou menos captação da tendência de quem são os fiéis, para com isso uma elucidação
prática cúlticas vivenciadas no ambiente eclesial.
3.5.1. Permanência na igreja e estado de pertença. A tabela a seguir indica o tempo de permanência do fiel na IMPDVA, em uma
perspectiva de transito religioso, saber a permanência desse fiel a igreja constitui-se em um
indício importante para o sentimento de pertença vivenciado pela comunidade.
Gráfico 14
Os resultados demostram a existência de um grande grupo que está a pouco tempo
participando das atividades na igreja, a pesquisa apontou que esse grupo é formado por pessoas
58%
15,15%
21,21%
6,06%
0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7
DE 0 A 3 ANOS
DE 4 A 6 ANOS
DE 7 A 9 ANOS
10 ANOS
Tempo de Permanência (em anos) dos Fiéis da IMPDVA
108
membros da igreja, enquanto o grupo com a segunda maior presença de pessoas é formado,
exclusivamente por obreiros e obreiras da igreja.
Podemos notar que quanto maior os anos dedicados a IMPDVA mais denso é o
sentimento de pertença, sendo maior também o nível de comprometimento com a igreja, ou seja,
é bem provável que o grupo maior tenha um baixo nível de associativismo e pertença religiosa,
diferentemente do segundo grupo, maior, no qual todos participam, de alguma forma, para a
manutenção e conservação da IMPDVA.
Por isso é importante considerar não somente o tempo de permanência dos fiéis da
IMPDVA, mas também sua frequência nos cultos e reuniões semanais, para dessa forma,
considerar a existência de pessoas em mobilidade religiosa.
3.5.2. Frequência nas reuniões
Uma das muitas heranças deixadas pela IURD para a igreja do Valdemiro tem sido sua
forma organizacional dos cultos, igualmente os cultos na IMPDVA são realizados três vezes ao
dia, as 08hs00, as 15hs00 e as 19hs00, exceto aos sábados e domingos que possuem um horário
diferenciado.
Com a quantidade ofertada de cultos e reuniões religiosas os adeptos da IMPDVA não
ficam sem horários disponíveis, esse aspecto muda a dinâmica eclesial, uma vez que não existe
um horário, ou dia da semana especifico para o culto. O poder clerical em determinar os
horários e dias de cultos em favor de sua demanda, passa, agora, pela mão dos leigos, são eles
que determinam os horários que irão frequentar, adaptando sua rotina aos horários estabelecidos
de culto.
109
Gráfico 15
Assim como o gráfico anterior podemos dividir os frequentadores da Igreja
Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina em dois grupos, o primeiro, a maioria
54,54% formado por pessoas que frequentam a igreja, mas não necessariamente
possuem um maior vínculo religioso com a vida eclesial, o segundo grupo, aqueles e
aquelas que frequentam a igreja 3 vezes na semana e somam-se em 31% são
constituídos, basicamente de obreiros/as da igreja, com uma responsabilidade maior e,
inclusive, trabalhando voluntariamente em favor do culto.
Gráfico 16
3% 6%
27%
27%
31%
3%
3%
Número (%) de fiéis que Frenquantam a IMPDVA
1 Vez por Mês
2 Vezes por Mês
1 Vez na Semana
2 Vezes na Semana
3 Vezes na Semana
4 a 5 Vezes na Semana
Todos os Dias
36,00%
30,00%
21,00%
3,00%
10,00%
NÃO FREQUENTA OUTRAS IGREJAS OU RELIGIÕES
FREQUENTA REGULARMENTE OUTRAS IGREJAS OU RELIGIÕES
FREQUENTA ESPORADICAMENTE OUTRAS IGREJAS OU RELIGIÕES
VISITA OUTRAS IGREJAS OU RELIGIÕES REGULARMENTE
VISITA OUTRAS IGREJAS OU RELIGIÕES ESPORADICAMENTE
Frequência de Fiéis da IMPDVA em Transito Religioso
110
O maior grupo é de pessoas quem não frequentam nenhuma outra igreja além da
IMPDVA, notamos que a maioria dele é constituído de homens e mulheres que fazem
parte do corpo de obreiros da igreja, porém ainda existe um grupo que declara que visita
outras igrejas, tanto esporadicamente, quanto regularmente. Demostrando assim que o
quadro de membros da IMPDVA é bem rotativo.
Essa rotatividade pode estar relacionada a muitos fatores, desde as mudanças do
quadro pastoral, a mudanças de local da própria igreja, a vulnerabilidade no qual o
membro é submetido (embora na pesquisa do perfil sociológico demostre que não é esse
o caso), mudança de casa, bairro e cidade, enfim, uma série de fatores que corroboram
para um aumento da mobilidade religiosa da igreja.
Essa mobilidade religiosa influência diretamente a dinâmica da igreja, uma vez
que seus líderes são forçados a trabalhar variados aspectos e víeis religiosos, a
desqualificação de outras igrejas e religiões por parte pastoral é um indicio de um
campo religioso em constante disputa pelo cooptação do sentimento de pertença e
subjetividade do fiel que adentra no templo.
As igrejas ou religiões que aparecem frequentemente como visitadas pelos
membros são: Assembleia de Deus (34%), Igreja Universal do Reino de Deus (22%)
Igreja Internacional da Graça (22%), Igreja Pentecostal Deus é Amor (12%),
Comunidade Paz e Vida (10%).
3.5.3. Origem Religiosa
Outro ponto importante para uma maior compreensão dos membros da
IMPDVA é sua origem religiosa, ou seja, qual a religião ou igreja de origem desse fiel,
infelizmente não há tempo hábil para estabelecermos um itinerário religioso de cada
fiel, permitindo uma análise mais precisa da história desse individuo, mas nos
questionários apresentados pudemos notar que, em alguns casos, existe um longo trajeto
religioso antes de chegar na IMPDVA.
Dessa forma pudermos constar que a origem religiosa do IMPDVA provém das
seguintes igrejas ou religiões:
111
Gráfico 17
Através do gráfico podemos perceber que a maioria dos membros da IMPDVA proveem
de uma cultura religiosa, mais precisamente, de uma cultura evangélica ou gospel, entretanto
existe outro grupo que proveem de outras religiões ou, ainda não possuía anteriormente nenhum
vínculo religioso, criando um grupo heterogêneo dentro da igreja.
O mosaico religioso encontrado na igreja assume grupos distintos, o grupo que está em
mobilidade religiosa encontrado na IMPDVA tem sua pertença já absorvida pela cultura gospel,
ou seja, o sentimento de pertença dessas pessoas é muito mais através da cultura que permeia o
cenário religioso brasileiro do que um vínculo associativo a uma só igreja, o que garante sua
transitividade por várias denominações ou mesmo religiões.
Quase que o oposto, as pessoas que proveem de origens não cristãs ou do catolicismo
nominal, aderem à igreja e seus sistemas de valores de maneira muito mais aguda, dando
primazia a IMPDVA ou mesmo exclusividade, pode-se contatar que a maioria das pessoas que
possuem vínculos religiosos mais densos, como é o caso dos obreiros e obreiras (66%) não
possuem uma origem religiosa vinculada as principais igrejas pentecostais.
3.6. Análise do perfil religioso
Podemos destacar que o perfil religioso da IMPDVA é multifacetado, contudo,
destacamos, o que nos parece, a existência de três grupos que predominantes, o primeiro, e
maior, é constituído de pessoas que frequentam a igreja a pouco tempo, e portanto ainda não
possuem um sentimento de pertença em relação a igreja, foi verificado que esse grupo possui
uma longa trajetória na cultura gospel, frequentando várias denominações ao longo dos anos.
21%
18%
15%
9%
12%
9%
3%
11%
IGREJA CATOLICA APOSTÓLICA ROMANA
IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS
IGREJA ASSEMBLÉIA DE DEUS
IGREJA SÃO JOSÉ DE VILA ZELINA (IGREJA …
IGREJA INTERNACIONAL DA GRAÇA DE DEUS
ESPIRITISMO
ESOTERISMO
SEM VÍNCULO RELIGIOSO DE ORIGEM
Origem Religiosa dos Fiéis da IMPDVA
112
Dessa forma, esse grupo tem a tendência de transitar entre as instituições religiosas44, não se
apoiando exclusivamente em uma denominação especifica, ou mesmo em uma única religião.
O segundo grupo, bem menor que o primeiro, é formado de pessoas, em sua maioria,
que não possuem uma experiência religiosa anterior, ou seja, sua conversão se deu através dos
cultos na IMPDVA, convite de um dos membros, ou mesmo de algum culto televisionado do
apóstolo Valdemiro, assim sua pertença religiosa está mais associada aos valores, éticas e moral
empregado pela igreja, mesmo assim, encontramos algumas pessoas que declaram visitar outras
denominações que estão mais próximas de sua residência.
O terceiro grupo encontrado na igreja é formado estritamente por obreiros e obreiras,
eles são o grupo que possui maior vínculo com a igreja, doando seu tempo, com maior número
de frequência na igreja, dispostos a despenderem de maior quantidade de dinheiro, com maior
tempo de permanência entre todos os grupos, é com esse grupo que o pastor tem mais abertura e
influência, mas esse tipo de atitude não tem, necessariamente paralelo com ser obreiro ou não,
na pesquisa de campo notamos que pessoas que apresentam esse comportamento tendem a ser
convidadas pelo pastor para torna-se obreiro/a da igreja.
Entendemos que não existe um perfil único de fiel na igreja, capaz de abarcar
um modelo arquétipo, dessa forma, a intenção é compreender como, e, de que forma, os
modelos cúlticos estabelecem um sentimento de pertença e geram uma identidade
religiosa em relação aos outros grupos, ou modelos religiosos.
3.7. O culto da IMPD em Vila Alpina: espaços, Usos e Costumes
A seguir analisaremos um culto típico na IMPD, considerando ser típico, uma descrição
construída a partir de vários elementos que aconteceram ao longo de diversas visitas a igreja45.
Segundo Weber o uso do conceito de tipo ideal é:
A sociologia constrói [...] conceitos de tipos e procura regras gerais dos acontecimentos [...] A sociologia deve delinear tipos “puros” (“ideias”) dessas configurações, os quais mostram em si a unidade consequente de uma adequação de sentido mais plena possível, mas que, precisamente, por isso, talvez sejam tão pouco frequentes
44 Infelizmente por absoluta falta de tempo e espaço nessa pesquisa, não nos ateremos ao transito
religioso encontrado entre os frequentadores da igreja, por isso, uma maior explicitação ou análise do
porquê da existência de um transito religioso tão intenso dentro da igreja, será apresentado em pesquisas
futuras, apenas nos ateremos em apontar a presença desse grupo.
45 No total foram trinte e seis cultos acompanhados em um total de 6 meses acompanhando a comunidade em vários cultos e reuniões distintas.
113
na realidade quanto uma reação física calculada sob o pressuposto de um espaço totalmente vazio. (1991:12)
Na IMPD os cultos ocorrem em vários horários ao longo do dia, normalmente as
8hs00, as 15hs00 e as 19hs30, seu público possa variar ao longo dos períodos do dia e
dias da semana, eles, basicamente seguem uma mesma ordem e um mesmo tom, sendo
direcionado para o mesmo “público alvo”. Dessa forma uma “tipologia ideal” parece
plausível de ser feita, uma vez que as estruturas dos cultos não diferenciam, apenas
mudam de acordo com o tema proposto para aquele dia ou mesmo aquele culto
especifico.
3.7.1. O espaço Cúltico
Em nossa pesquisa de campo frequentamos dois templos diferentes da Igreja
Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina, o primeiro encontrava-se na rua Costa
Barros, n° 63, uma das ruas principais do bairro, por onde passa diversas pessoas ao dia.
Já seu novo templo está localizado na mesma rua, mas em local diferente, no número
296 ao lado da Igreja Universal do Reino de Deus.
114
Foto 1:Antigo Templo da Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina
Antigo Templo da Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina. Foto tirada do Google Maps. Abril
de 2013
Foto 2:Novo Templo da Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina
Camuçatto, Daniel. Arquivo pessoal, 2014
Primeiro lugar analisarei o antigo templo, e posteriormente discorrerei sobre o
novo templo, acrescentando elementos que mudaram pela vinda desse novo templo.
A IMPD em Vila Alpina é parecida arquitetonicamente com as diversas Igrejas
Mundiais do Poder de Deus espalhadas pelo país, basicamente tem um formato
115
retangular, com o púlpito no fundo da igreja, suas portas são de aço e não tem qualquer
tipo de pintura e identificação. A identificação fica por conta de adesivos colados na
porta de vidro que dá para a igreja, ou para os banners com a imagem do apóstolo
Valdemiro.
Ao entrar na igreja pode-se perceber uma velha pintura azul e branco precisando
de retoques, com o branco já amarelando, essas cores já são características da IMPD
simulando, no coletivo social, o habitat de Deus. Nota-se também a existência de
espaços sem reboco, ou mesmo no cimento puro, o chão da igreja, também não está em
boas condições, focos de umidade, lâmpadas queimadas dão um tom de um lugar mau
cuidado, a pergunta que se segue é se a igreja não tem condições de fazer a manutenção
regular do templo, ou se é apenas uma má organização por parte da liderança local.
Observa-se também que a igreja possui duas alas de cadeiras de plástico com
forros personalizados da IMPD em Vila Alpina, novamente os tons azuis e brancos se
repetem, o número de cadeiras é de trezentas pessoas, embora nenhuma vez em minhas
visitas tenha visto o espaço lotado com as trezentas pessoas.
Não havia nenhum tipo de janelas nas paredes, para circulação de ar eram
usados ventiladores brancos, eles estavam instalados nas paredes três de cada lado,
como eles eram de uso doméstico com um volume maior de pessoas os ventiladores não
conseguiam, de forma bem-sucedida, fazer o ar circular. Ainda na parte da frente da
igreja, ao lado do púlpito, ficava uma porta, ali as pessoas não tinham acesso, era a
cozinha, existia geladeira, fogão armário, uma pequena despensa, era destinado ao uso
do pastor, sua família os obreiros. Na parte do fundo ficavam os banheiros, separados
entre mulheres e homens, eram grandes com duas divisórias de vaso sanitário, dois
mictórios, e duas pias, papel para enxugar a mãos e avisos para não sujar o banheiro
pois era pecado, havia um aviso para usar somente duas folhas para secar a mão porque
a igreja estava cortando custos e quem pagava por tudo aquilo era os dízimos e ofertas
dos irmãos da igreja.
No púlpito, dois metros acima do nível do chão, existe um painel mostrando uma
imagem com águas e arvores, em seu centro uma grande mesa com um vidro cheio de
azeite, algumas flores num vaso, e um pano branco sobre a mesa. Na frente do púlpito
as pessoas colocam fotos de parentes, casas, roupas próprias ou de outras pessoas, com
a finalidades do pastor e dos obreiros orarem sobre esses objetos. Perto do púlpito na
parte de baixo, existia uma mesa com CDs, DVDs, livros e outros objetos que são
116
entregues aos visitantes pela primeira vez, ou ofertados mediante a uma quantia de
oferta para ajudar no pagamento do aluguel.
Não existe qualquer recurso de músicas como instrumentos, todas as músicas
tocadas durante as reuniões são reproduzidas em um computador ligado nas caixas de
som da igreja ao lado do altar, o pastor tem a função de conduzir as músicas e escolhe-
las para tocarem no culto, sem qualquer auxilio de Datashow ou retroprojetor,
comumente usados nas igrejas, as músicas são escolhidas durante o culto, o pastor
simplesmente seleciona as músicas em uma lista do computador.
A baixo podemos perceber um simples esquema da estrutura da igreja:
É interessante notar que o templo da IMPD em Vila Alpina é unidirecional, logo
sua utilização está vinculada somente ao ato cúltico, não existe nenhuma outra ocasião
em que a igreja é utilizada, festas, casamentos, palestras, cursos, reuniões, não são nem
sequer mencionados, essas interações sociais não existem na vida eclesial da IMPDVA.
Sem a utilização do espaço da igreja para outros fins o senso comunitário tende a
enfraquecer-se, em geral o enfoque dado nos cultos é sempre sobre espiritualidade e
vida privada, poucas vezes a noção de igreja e comunidade foi mencionado, também
não há nenhum ambiente que possibilite um convívio mais íntimo, ou que estimule o
117
diálogo, entre os membros da IMPD, é natural as pessoas que frequentam a igreja
saírem ao final do culto sem nenhum tipo de interação intrapessoal.
Mesmo que não haja uma interação entre os sequazes, a classe obreira da
IMPDVA goza do privilégio de acesso a lugares como copa e cozinha, lá eles podem
comer e ter um momento para conversar, além disso, ainda contam com um espaço de
cursos direcionados para eles e ficam após os cultos para arrumar o templo e ouvir a
orientação do pastor para os próximos cultos, em geral, eles são mais próximos e
convivem mais uns com os outros.
3.7.2. Novo Templo, Antigos Elementos.
Com os constantes atrasos e o aumento do aluguel, ficou inviável a permanência
da igreja no mesmo local, o pastor MN, em conversa informal, revelou-me que essa era
uma orientação do bispo, eles precisavam sair do espaço até fevereiro de 2014. A
mudança aconteceu antes que o previsto, janeiro de 2014, o templo muda para a mesma
rua Costa Barros, no mesmo lugar, mas agora no n°296, ao lado da Igreja Universal do
Reino de Deus. Onde, antigamente funcionava uma loja de acessórios.
Em termos de espaço é notável que a novo templo é menor, herdando diversos
elementos da antiga igreja como, as cadeiras, o púlpito, o altar, o painel, os
equipamentos de som, etc. a diferença está no cuidado do espaço, agora as paredes
apresentam tintura nova, nenhum tipo de mofo ou ponto descascando, não há
desbotamentos visíveis, além do aspecto interno, foi trabalhado a fachada da igreja,
trocando as portas de vidro por novas, banners com a imagem do apóstolo Valdemiro e
placas e faixas na igreja.
Ao analisar o novo espaço, não existe novidade em sua essência, apenas
mudanças estéticas, a igreja é ainda usada somente para finalidades cúlticas, não há
nenhum espaço de socialização entre a membresia, em suma, o novo local é muito
parecido com o anterior, só não é exatamente igual devido ao tamanho reduzido e a
disposição dos banheiros que agora ficam na frente, no lado direito do púlpito.
Se não houve mudanças significativas em relação ao uso espacial, ao menos
pudermos corroborar com a tese que apresenta-nos o espaço como uma construção
social (ABUMANSSUR, 2004:70), a percepção do espaço como ambiente diferenciado,
ou exclusivo para cultos, por parte da membresia, ou mesmo sem o apoio da liderança
118
religiosa é um habito adquirido, subjetivado, no qual mantêm-se uma relação de
reverencia, santificando o espaço e a quem nele domina.
3.8. Etnografia da Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina.
A fim de demostrar o que é um culto típico da IMPDVA considero ser a sexta-
feira a reunião ideal para isso, embora os cultos aos domingos de manhã tenham uma
maior quantidade de pessoas, é na sexta feira que a maioria dos membros frequentes da
igreja se reúnem, em relação as demais reuniões da semana é o culto com maior apelo,
tanto sobre as práticas espirituais de curas e milagres, carro chefe das Igrejas Mundiais,
quanto nas práticas de consumo de quinquilharias religiosas.
Em um dia normal chego na IMPDVA as 19hs00, trinta minutos antes do culto
dar início, a igreja, embora não possua um estacionamento, muitas pessoas estacionam
seus carros dentro do templo, entre as cadeiras e o banheiro, há espaço para 10 carros, e
um lugar especial para o carro pastoral. Mesmo de carro, e com lugares a disposição,
percebi que os membros que tinham veículos não estacionavam seus carros na igreja,
apenas alguns obreiros e membros que possuíam motos, que ocupam bem menos
espaço.
Ao entrar na igreja sou recebido por um obreiro que me dá as boas-vindas,
pergunta como tenho passado e me dá uma toalhinha com as inscrições da igreja e um
copo de água, esse objeto pode variar dependendo do dia, ou mesmo da temática do
culto, houve momentos em que recebi um pedaço de peixe frito, algemas feitas de
cartolina, pão, e muitos outros objetos dependendo da dinâmica do culto.
Ainda com meia hora para começar o culto quase não há pessoas na igreja, em
minha primeira contagem existiam dez pessoas, contanto com a presença dos obreiros.
Normalmente as pessoas que chegam a igreja tem uma das três reações, oram em voz
baixa ou em silencio, conversam, principalmente se estão acompanhadas, leem a bíblia,
muito embora essa atitude seja mais rara de se ver, pois a maioria não carrega a bíblia.
Os obreiros circulam entre os bancos conversando com as pessoas, é comum ver
pessoas chegarem mais cedo para pedir oração para os obreiros/as, ou mesmo colocar
fotografias, peças de roupas, chaves de casas e carros, carteiras de trabalho, no púlpito,
as orações feira pelos obreiros/as são rápidas, não duram mais que um minuto, e é
119
sempre por algo especifico, mesmo quando os membros pedem orações pela vida delas,
os obreiros/as pedem para que eles especifiquem o pedido.
Aos poucos as pessoas vão chegando na igreja, muitas mulheres, algumas
acompanhadas de crianças, poucos homens, e quase nenhum jovem, suas vestimentas
são simples, calça jeans e camiseta, algumas mulheres usam saias, alguns homens as
vezes vão de camisa, mas em geral a roupa padrão é jeans e camiseta, nenhuma roupa é
chamativa, todos procuram estar com roupas neutras sem nenhuma marca de grife ou
algo do tipo.
Aos obreiros/as é reservado uniformes, calça preta ou azul escuro, camisa branca
ou azul, gravata vermelha para os homens e lenço vermelho para as mulheres e sapato
preto, obreiros/as que vem diretamente do trabalho, vestem-se rápido, na maioria das
vezes não conversam com ninguém sem o uniforme, muitos já comparecem as reuniões
com o uniforme, ao serem questionados sobre o uso dos uniformes eles responderam
que “ é motivo de orgulho”, a maioria possui mais que dois conjuntos de uniformes em
suas palavras “o uniforme é o reconhecimento que somos obreiros, sem ele somos
pessoas comuns”(obreira 8).
As 19hs28 o pastor aparece da cozinha e começa a conversar com as pessoas, ele
faz brincadeiras, conta piadas e provoca um clima de descontração. As 19hs28 o pastor
coloca uma música instrumental baixa e as pessoas começam a ficar em silencio,
algumas baixam a cabeça, aquelas que estavam orando de joelhos sentam nas cadeiras e
os obreiros/as que circulavam entre as pessoas posicionam-se no corredor ou na frente
perto do púlpito.
O culto tem início as 19hs40 minutos, com cerca de 35 pessoas, até o final do
culto esse número sobe para 42 em média, o pastor vai até a mesa do notebook muda a
música, mas ainda é instrumental, e com a voz empostada começa a orar, o conteúdo da
oração é sua petição e abnegação diante de Deus, de não ser merecedor de estar ali, faz
referência ao seu “passado pecador” e insiste não ser digno de conduzir o culto, mas
reconhece que ele está ali somente pela graça e misericórdia de Deus, e que se Deus
levantou-o para ser pastor e o “tirou do lamaçal de lama” que Deus podia usá-lo
poderosamente para realizar milagres.
Em meio as orações pastorais o grupo fecha os olhos, pessoas gritam “amém”
outros “gloria a Deus e “misericórdia”, pela sugestão pastoral há um clima de contrição,
algumas pessoas choram, outras balbuciam frases, mas ninguém fica aquém ao clamor e
oração feita pelo pastor.
120
Logo após a oração o pastor MN diz “eu tenho um leão dentro de mim, e hoje
quero passar esse leão o rei da natureza para vocês, vocês confiam em mim? Acreditam
no meu ministério? Acreditam que sou um verdadeiro servo de Deus?” Para todas as
perguntas feitas pelo pastor MN as pessoas diziam “amém”, com uma resposta de
confirmação e apoio, ele pede para que as pessoas formem uma fila para que pudesse
abraça-los, enquanto um dos obreiros coloca uma música sobre força e confiança, as
pessoas formam um fila e vão ao encontro do pastor, ele as abraça e unge suas cabeças.
Após abraçar a última pessoa da fila o pastor diz “vamos louvar” e coloca uma
música de autoria do compositor e cantor Regis Danese “faz um milagre em mim”, em
seguida o pastor coloca uma música do grupo Trazendo a Arca que se chama “Marca da
Promessa”, o pastor escolhe uma terceira música, agora da pastora Ludmila Ferber
“Sonhos de Deus”.
É interessante notar que todas as músicas fazem referência a curas e milagres, o
pastor acompanha a música cantando junto, e muitas vezes, usa palavras ou frases de
efeito da canção antecipando e dando destaque a frase, contribuindo para que as pessoas
cantem com mais animo, é bastante comum o pastor MN pedir para as pessoas
realizarem ações no intervalo das canções, seja repedir uma frase, que pode ser da
música ou não, mas sempre é uma frase de efeito, ou algum gesto, como bater palmas
para Jesus, levantar a mão bem alto, etc.
Os fiéis da igreja geralmente fecham os olhos, levantam as mãos para cima,
batem palmas e repetem todas as ações pedidas pelo pastor, mesmo aquelas pessoas
com uma clara dificuldade de ficar em pé por longos períodos permanece em pé durante
as músicas. Diferente dos fiéis da igreja, os obreiros/as permanecem de olhos abertos
durante todas as músicas, eles também circulam pela igreja, entre as cadeiras e oram
aleatoriamente pelas pessoas, colocando a mão em suas cabeças, costas, ombros, olhos,
boca, etc. existe, ao que parece uma orientação de cada obreiro/as somente orar com
pessoas do mesmo sexo. Ao contrário dos fiéis os obreiros sabem as músicas de cor e
cantam em voz alta, mesmo aquelas canções que o pastor toca pela primeira vez nos
cultos, demostrando que há um preparo dos obreiros/as sobre as músicas tocadas.
Com o termino da música o pastor MN começa a orar, mas agora pedindo a
Deus que expulse toda a enfermidade e “sorte de doenças”, ele pede para que cada
pessoa coloque uma das mãos no lugar enfermo, e as pessoas que não tem enfermidade
coloque uma das mãos no coração, com a outra pede para que levantemos “bem alto” o
121
copinho com água que recebemos na entrada46. O pastor MN volta a orar, mas dessa vez
o enfoque está no copinho com água, ele pede para Deus ungir, abençoar, consagrar
esse copo com água, e mais uma vez faz menção de exortação de demônios e curas pela
fé dele e dos fiéis, pede também pelas famílias das pessoas que estão presentes e
intercede pelas fotografias, chaves de casas e carros e peças de roupas que estão sobre o
altar. Para finalizar a oração o pastor e todas as pessoas colocam suas mãos na cabeça e
repetem “sai” três vezes, movimentando com as mãos para traz da cabeça, o ritual
termina em uníssono “sai e não volte nunca mais”.
A rotina normal do culto estabelece que o pastor comece a pregar, mas também
pode ocorrer um testemunho de algum membro ou obreiro/a, ao contrário do esperado, a
IMPDVA não dedica muito tempo para os testemunhos, como acontece com a igreja
sede e nos programas televisivos do líder Valdemiro, dessa maneira os testemunhos são
esporádicos tendo mais espaço nas reuniões vespertinas.
É interessante notar que, embora o “carro chefe” da IMPD seja os testemunhos
públicos de curas e milagres, na igreja em Vila Alpina, esse tipo de narrativa é bem
pequeno, somente em dois cultos foi possível observar testemunhos de pessoas que
declararam curas milagrosas. Na maioria das vezes, os cultos que o pastor convida a
testemunhar, os relatos de cura são de: dores de cabeça, dores nas costas e pernas,
mudanças de empregos, cirurgias bem sucedidas, ou seja, testemunhos quase
corriqueiros em ambientes eclesiais.
O pastor MN abre a bíblia e pede para as pessoas abrirem no texto de Isaias
43.1-14, enquanto isso reconto o número de pessoas no local, dessa vez há 8
obreiros/as, 4 crianças, 17 homens e 22 mulheres, apenas duas adolescentes com cerca
de 14 a 16 anos. No total de 53 pessoas.
A maioria das pessoas não trazem a bíblia, os obreiros/as distribuem algumas
para que os fiéis possam acompanhar o pastor na leitura bíblica, o pastor lê de forma
pausada e emposta a voz, em determinados momentos ele para a leitura, e interage com
as pessoas “vocês estão entendo do texto?”, repete a pergunta três vezes durante a
leitura.
Após a leitura o pastor começa a ler novamente versículo por versículo e
vaguear pelas palavras, percebe-se que não existe um roteiro programado sobre a 46 Esse ritual dependendo do dia da semana, da temática do culto, ou mesmo daquilo que é entregue na entrada pode variar, mas o comum é usar os itens recebidos após três cânticos, o pesquisador já presenciou algumas variações do mesmo rito como: peixe frito, mel, sal, corrente de papel, etc. embora diferentes todos representavam a libertação do mal, a cura sobrenatural e a prosperidade financeira.
122
pregação, nem tampouco um estudo mais aprofundado do texto, para preencher as
lacunas o pastor conta histórias de vida dele e do apóstolo Valdemiro, a mensagem em
si tem vários tons, começa com foco em animo, sobre como Deus não permitirá nada
toca-lo pois você é filho Dele, passa por âmbitos familiares como o cuidado com o
marido, arrumar a casa e cuidar das crianças, fala-se das boas práticas que a pessoa
cristã precisa ter no trabalho.
Em determinado momento da mensagem, o pastor pergunta quem é migrante,
muitas pessoas levantaram a mão, a maioria, ele diz ser filho de migrante e portanto
migrante também, ele então bate o pé no chão e diz “quem construiu São Paulo fomos
nós, São Paulo é nossa, Deus quer que tomemos posse de todas as coisas, inclusive de
São Paulo”, os presentes respondem amém, batem palma e vibram, indicando sua
aprovação e concordância com a pregação pastoral.
Com a mensagem concluída o pastor pergunta “posso pedir seu dizimo?”, nesse
momento os obreiros começam a bater palmas e excitar a congregação fazer o mesmo, o
pastor MN fala sobre como tem sido difícil pagar o aluguel de vinte e dois mil reais,
afirma que muitas pessoas tem lutado contra ele e contra a igreja, mas “em nome de
Jesus vamos vencer”, o pastor segue dizendo que com sua vinda a igreja, ela tem
economizado em água, luz e telefone, mas isso não basta, por isso a necessidade da
contribuição dos fiéis.
Ainda sobre os dízimos o pastor alega que eles precisam ajudar o programa do
apóstolo, mas que em primeiro lugar vem os carnes da própria igreja, chega a citar o
texto bíblico “primeiros os da família da fé”. O pastor continua, apresentando uma
toalha de rosto com a mão dele e de sua esposa pintada (lembra muito as toalhas que as
crianças de 1° serie fazem para suas mães), ele afirma que como servo de Deus sua mão
simboliza a mão de Deus, bem diferente da oração feita por ele no começo do culto,
sendo assim quando as pessoas limparem suas mãos, seu rosto, sua casa “estarão
invocando a benção de Deus na sua casa”, ele oferece as toalhas “gratuitamente”, mas
pede para aqueles/as que pegarem contribuíram com um valor mínimo de trinta reais,
em pouco tempo todas as toalhas se esgotam.
O pastor MN pede para que as pessoas segurem suas ofertas e dízimos na mão,
ou mesmo aqueles/as pessoas que não trouxeram nada ergam as mãos para cima, os
obreiros ficam perfilados na frente com as sacolinhas, envelopes de dízimos, cds, dvds,
e diversos outros produtos, apenas dois obreiros ficam na porta, o pastor chama uma
123
obreira para orar sobre os dízimos e ofertas, ao final da oração as pessoas formam uma
fila para entregarem seus dízimos enquanto o pastor coloca uma música para tocar.
Quanto todos já estão sentados o pastor MN troca a música pela mesma do
começo do culto, mas dessa vez mais baixo ainda. Ele se despede e diz “digam tchau
para o pastor” as pessoas fazem o gesto de despedida balançando as mãos, mais uma
vez ele entrega o microfone para um obreiro para fazer a oração final, enquanto as
pessoas fecham seus olhos para a oração, o pastor sai da igreja rumo a cozinha/copa, ao
final da oração o obreiro se despede das pessoas e diz “até amanhã, a reunião será ainda
mais abençoada”.
São 21hs15 minutos quanto a oração acaba, os fiéis saem apresados, muitas
moram longe e apresam-se para pegar o ônibus em um ponto em frente à igreja, os
obreiros não conversam com ninguém, nem entre si, começam logo a arrumar as
cadeiras e recolher algumas coisas, algumas pessoas que querem falar com o pastor MN
vão a frente e esperam, outras caminhão até a esposa do pastor que está vendendo panos
de prato, bijuterias e peças de roupas intimas, ao sair da cozinha o pastor brinca com as
pessoas que estão comprando da sua esposa, ele diz “pode comprar na fé que já é
ungindo por mim”, vira-se para as pessoas que estão esperando por ele e começa a
conversar, geralmente são conversas rápidas e orações mais rápidas ainda, se ele
percebe que vai demorar pede para marcar um horário de atendimento com um dos
obreiros.
Terminado os atendimentos pastorais os obreiros/as já tinham fechado a igreja e
arrumado o templo, ele se reúne com o grupo e instrui para as reuniões de sábado e
domingo, instrui também sobre como proceder com uma obreira que “está dando
trabalho”, embora todos soubessem do que se tratava ele não tornou o assunto explicito.
Uma das obreiras traz um caderno de anotações com pedido de orações, outro obreiro
pega as roupas e fotos deixadas no púlpito e formam uma roda, colocam os objetos no
centro e oram, todos, em voz alta, sobre os pedidos, após isso o pastor MN despede-se
de cada um, entra no carro com sua esposa e vai embora, muitos seguem o pastor e fica
apenas uma pessoa para terminar de fechar a igreja e ver se está tudo apagado, desligado
e fechado.
3.9. Meu Negócio é com Deus.
124
Não pudermos levantar mais dados sobre o pastor MN, isso porque o mesmo,
juntamente com sua esposa, faleceu no início do ano causado por um acidente
automobilístico47, dessa forma, embora tenha marcado várias vezes entrevistas com o
pastor, infelizmente ele nunca teve um espaço na agenda. O texto apresentado a seguir é
uma compilação de conversas informais com o pastor MN, observação de campo e
perguntas aos obreiros mais próximos dele. A notícia de sua morte, foi divulgada
principalmente através do Facebook da IMPD em nota oficial, algumas emissoras de
televisão e jornais na época também emitiram uma nota como o diário do vale.
Até onde pudermos averiguar o pastor MN transitou por muitas denominações
antes de chegar a ser pastor na IMPD, em sua trajetória estão a Igreja Assembleia de
Deus e a Igreja Universal do Reino de Deus. Quando pastoreava a IURD, segundo ele já
insatisfeito com a igreja, um amigo que trabalhava diretamente com o apóstolo
Valdemiro convidou-o para pastorear uma igreja.
A primeira igreja que foi nomeado foi uma pequena igreja que estava
começando na serra do estado do Rio de Janeiro, segundo o pastor MN, seu ministério
nessa igreja floresceu e, em pouco tempo a igreja estava cheia, com isso foi realocado
em uma igreja maior, agora, uma IMPD em São João do Meriti, ainda no estado do Rio
de Janeiro.
Sua nomeação para a IMPDVA foi inesperada, ele afirma que não queria vir
para São Paulo e que pegou a igreja em péssimas condições, mas revelou que o bispo
regional conversou com ele e disse que precisava dele nesta igreja para levanta-la, assim
ele aceitou o desafio.
Nos cultos o pastor MN estava sempre muito bem vestido, trajando terno, sapato
e gravata, todas de ótima qualidade, as vezes até incondizente aos seus apelos pelas
questões financeiras da igreja. Não era raro ver o pastor com abotoaduras, coletes,
47Um dos acidentes foi no início de sábado, no quilometro 329, próximo ao distrito de Engenheiro Passos. Duas das vítimas fatais estavam no Vectra, placa DYC-1730 (Santo Andrés), que era conduzido pelo pastor “MN”, de 42 anos. Ele morreu na hora, junto com sua mulher, “Florzinha”, de 36 anos. Segundo parentes, o casal morava em Jundiaí (SP). Agentes da PRF apuraram que o pastor seguia sentido São Paulo quando teria perdido a direção do Vectra, atravessando o canteiro central e batido de frente na ambulância, placa KZT-7699, que prestava serviços a prefeitura de Resende. O motorista da ambulância, “A.V” da Costa, de 49 anos, também morreu no local. O corpo de foi liberado para sepultamento. No veículo estavam ainda Valdinei Augusto da Silva, de 31 anos, e o irmão dele, Sebastião Luiz da Silva, de 46 anos. Os policiais, porém, não souberam informar qual dos dois era o paciente que estava sendo transportados. Eles foram socorridos com ferimentos e levados ao Hospital de Emergência de Resende. (Diário do Vale, 2014)
125
relógios ostentosos e anéis brilhantes, em um contraste grande entre aquilo que o pastor
vestia e as roupas simples dos fiéis da igreja. Quando perguntado o porquê das roupas a
resposta do pastor foi categórica: “as pessoas precisam saber que seu pastor é próspero e
essa prosperidade vem de Deus”, esse tipo de pensamento parece não ser tão verdade
quando comparado a sua esposa, mais conhecida como “missionaria Florzinha”, ela, ao
contrário do marido, vestia-se de forma muito mais simples, normalmente, nos cultos
diurnos e vespertinos acompanha as roupas padrões das pessoas da igreja, uma blusa ou
camiseta e calça jeans, somente nos cultos noturnos, ou aos domingos pela manhã havia
uma produção, no sentido de maquiagem, cabelo e roupas, mas ainda assim fica muito
aquém se comparada ao seu marido.
Na condução dos cultos o pastor MN procurava imitar o apóstolo Valdemiro, em
vários aspectos: a voz embargada e chorosa, a voz rouca, simulava muito bem
características do líder maior da igreja, além disso, era comum ver o pastor com uma
toalhinha passando em seu rosto, mesmo que ele quase não suasse.
Suas mensagens também se aproximavam daquilo que o apóstolo fazia nos
programas televisivos, uma mensagem simples, fazendo associações com o cotidiano,
assim como Valdemiro Santiago, durante as mensagens interagia muito com a igreja,
perguntando e afirmando “verdades bíblicas” ou “leis espirituais” como um processo de
repetição ou esperava que os fiéis completassem a frase e ditos populares expressados
por ele. O pastor alega que essa dinâmica é essencial no sermão “assim as pessoas
entendem melhor a pregação e saem daqui com a palavra na cabeça”. O processo de
repetição não está somente presente na mensagem, mas em todos os momentos do culto,
desde oração a palavras de efeito o pastor MN pede para que as pessoas repitam, as
vezes mais de uma vez as frases de efeito utilizadas por ele.
Em sua mensagem as referências sobre seu passado são comuns, geralmente
sempre cita a IURD em algum momento do culto, a referência, nesse caso é “a igreja da
pombinha”, é comum também ouvir sobre suas histórias antes da conversão,
normalmente contando alguma vantagem, sobre quantas pessoas ele já bateu na rua
lutando capoeira, quantas garrafas de cerveja ele conseguia beber, quanto ganhava em
seu emprego anterior ou mesmo com quantas mulheres já se relacionou, em todas as
narrativas ele termina dizendo “misericórdia Senhor, ainda bem que agora sou seu” ou
ainda “graças a Deus que eu me livrei disso tudo”.
Ainda em seus sermões há sempre uma forte afirmação de etnia, em uma de suas
mensagens ele diz: “quem disse que Jesus não era negro, igual nesses quadros ai que
126
vemos um Jesus branquinho e olho azul, ele passou muito tempo no sol, era preto igual
eu, igual o apóstolo”, em outro culto afirma “quem trabalhou nessa vida foi os negros,
meus avós e bisavós, eles construíram isso aqui, os negros construíram o brasil e o
mundo, as pessoas tem preconceito, acham que aqueles que vem de fora não trabalham,
mas é essas pessoas que trabalham mais to errado? Não to não”.
Durante os cultos uma constante era a frase: “meu negócio é com Deus”, a
frequência com que o pastor usa essa frase é tão grande que podemos considera-la um
jargão. A expressão idiomática é usada principalmente para reafirmar uma ideia ou uma
independência de atitudes em relação as pessoas, ou modelos sociais já estabelecido
socialmente, mas que aos olhos pastorais não estão em conformidade com a palavra de
Deus, quando perguntado sobre a origem da frase o pastor respondeu “não sei, acho que
sempre falei ela, não é nada novo, nada demais, é somente algo que digo para expressar
minha fé em Deus”.
Ainda que o pastor MN diga que não é algo intencional, ou mesmo não
represente “nada demais”, a frase é marcante para os obreiros e fiéis da igreja, que a
repetem entre eles, em alguns momentos, e identificam a frase com a pessoa do pastor.
O pastor MN abre muito espaço para a participação dos obreiros, eles oram no
culto pelas ofertas e intercedem pelas pessoas da comunidade, em alguns casos podem
até mesmo pregar, caso esse do obreiro 1048, que pregava constantemente na igreja em
Vila Alpina. Talvez pelo tempo que o pastor MN ficou na igreja, cerca de quatro anos,
tempo incomum para a permanência de pastores na igreja, dessa forma percebe-se que
as relações de confiança, cumplicidade e afeto entre o pastor e os obreiros tenha
aumentado.
3.9.1. O Pastor do Amor
Como dissemos a pouco, infelizmente não acompanhamos a transição entre o
pastor MN e o pastor PL, porém podemos elencar algumas diferenças claras de atitudes
em relação a eles.
É importante ressaltar que em nenhum momento o pastor PL permitiu prosseguir
com a pesquisa, orientando que devíamos conversar com o bispo regional, do qual
nunca obtivemos resposta, o pastor PL recusou-se a ceder uma entrevista, ou mesmo 48 Todos da IMPDVA chamavam NL de pastor, somente com a vinda de outro pastor para a igreja, esclareceu-se que na verdade NL era um obreiro, e não tinha nenhum privilégio em relação aos outros.
127
que continuasse acompanhando os cultos de forma sistemática, não permitindo qualquer
tipo de anotação49.
Mesmo com alguma dificuldade pudermos notar que sua condução pastoral é
bem diferente, embora vestia-se bem, não chega a ser como o pastor anterior,
normalmente usa camisa e calça social, sapato e gravata, sem terno, mesmo em cultos
considerados mais formais, ele também não usa nenhum acessório, relógios,
abotoaduras, anéis, nada chamativo ou que provoque alguma ostentação.
O pastor PL é caucasiano, aparenta ser mais novo que o pastor MN, e,
diferentemente do antigo pastor, ele é nascido e criado em São Paulo. Além da diferença
estética, o pastor PL não dá espaço nenhum para os obreiros/as, é o pastor que faz as
orações do culto, há somente uma exceção, para sua esposa, que intercala com ele a
condução dos cultos e sermões.
Outro elemento diferente é o jargão, o pastor PL não possuiu nenhuma frase de
efeito própria que o identifique, mas ao longo de todo o culto pede para que as pessoas
coloquem a mão no coração, sua insistência nesse gesto é tão comum que as pessoas em
pouco tempo já se acostumaram, algumas pessoas já colocam as duas mãos sobre o
peito assim que começa uma música ou oração.
Em sua mensagem é comum ouvi-lo dizer “eu amo essa igreja, eu amo esse
bairro”, palavras de tão repetidas lhe rendeu o apelido de pastor do amor entre os
obreiros50. Ao final do culto ele se despede das pessoas, mas permanece na frente para
quem quiser aconselhamento pastoral, em todos os cultos na despedida canta-se
“espirito enche minha vida” e após isso a impetração da benção, algo que até então não
tinha presenciado em uma Igreja Mundial.
Embora existam todas essas diferenças, em geral, há mais semelhanças do que
rupturas, os modelos esquemáticos dos cultos, o enfoque em curas e milagres, a
utilização de objetos fetichizados para obtenção de dinheiro, a pressão institucional para
que os membros sejam dizimistas e contribuintes regulares, além de ameaças de
fechamento da igreja são ações de praxe entre os dois pastores.
Dessa forma, embora o pastor MN tenha alterado alguma coisa nos cultos da
IMPDVA, foram alteração pequenas, porém com bastante significado, principalmente
49 Sempre que começava o culto um obreiro “sentava” ao meu lado. Claramente essa era uma instrução pastoral, uma vez que os obreiros durante os cultos tinham por responsabilidade ficarem em pé e ajudarem o pastor em tudo. 50 Em conversa com um dos obreiros ele me revelou esse apelido, creio que não seja algo carinhoso, mas em tom de chacota.
128
entre os obreiros/as, cabe observar se de fato essas alterações nas mensagens e a
abertura para a participação dos obreiros mais ativa vai influenciar posteriormente nas
ações deles diante de um novo pastor.
3.10. Considerações.
A IMPDVA situa-se em um ambiente marcado pelas diferenças sociais, nesse
aspecto, embora exista um mosaico de adeptos na igreja, a maioria de seus membros são
pessoas em vulnerabilidade social. Aspectos como migração, renda familiar,
escolaridade, moradia, são mais baixos entre os sujeitos da igreja, do que no próprio
bairro em que estão inseridos, dessa forma, podemos estabelecer que, existe uma
tendência entre os membros da IMPDVA, são eles em sua maioria, mulheres,
migrantes, adultas, pardas, com baixa escolaridade, com baixa renda ou nenhuma,
residindo a mais de cinco anos no local.
Podemos também considerar uma tendência o perfil religioso, pessoas que em
sua maioria já frequentaram outras instituições religiosas, provenientes do catolicismo,
hoje frequentam três vezes por semana as reuniões na IMPD, estão vinculadas a igreja a
mais de três anos e frequentam esporadicamente outras igrejas.
Os dados obtidos dos questionários e entrevistas nos mostraram que aspectos
migratórios dentro dos cultos da IMPDVA tem um grande peso, seja pela identificação
do carisma pastoral, que se assume migrante, ou pelas mensagens impactantes do pastor
MN que articula entre as dificuldades do cotidiano do migrante e as soluções
metafisicas que são inseridas nesse contexto, com a finalidade de melhorar a autoestima
e promover o bem estar dos fiéis. Dito isto no capítulo a seguir vamos nos concentrar na
análise dos cultos e atores sociais encontrados na igreja.
129
Capítulo 4:A Dinâmica do Poder Simbólico na Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina
O capítulo pondera sobre os atores sociais presentes no culto da IMPDVA, o
foco é analisar a participação, articulação e práticas dos diversos segmentos encontrados
na igreja, entendendo como as dinâmicas atribuídas a esses agentes contribuem para o
incremento das redes de ajuda mútua, do capital social e do desenvolvimento humano a
elas relacionadas.
Em seguida abordaremos a questão da formação e reformulação da identidade
religiosa, principalmente migratória, afim de compreender como os sistemas
simbólicos, valorativos incidem na vida dos membros da IMPDVA, cooptando o
sentimento de pertença do fiel.
4.1. Análise do culto
Estruturalmente a IMPDVA apresenta-se em três classes distintas, os fiéis, os
obreiros/as, e o pastor. Os fiéis são aqueles/as que assistem os cultos de maneira
passiva, a pesquisa de campo revelou que há um grande número de pessoas em transito
religioso, como mostrou o gráfico 15, é rotineiro ouvir reclamações sobre as pessoas
que não se fidelizam com a igreja.
É interessante notar que há um grupo de fiéis que transitam entre as igrejas
Mundiais, ou seja, de tempos em tempos frequentam uma IMPD diferente, na pesquisa
foram encontradas pessoas que declararam frequentar mais de uma IMPD por semana.
Se existe um grupo grande em transito religioso na igreja, há também fieis que formam
um núcleo permanente (CAMPOS, 1997:193).
130
Neste núcleo permanente todas as pessoas pesquisadas responderam que estão
satisfeitas com os cultos, mensagens e atividades da IMPDVA, e em sua maioria
participam da igreja a mais de 4 anos, mesmo assim, quando perguntados sobre as
relações com os demais membros da igreja 87% responderam não possuir nenhum tipo
de vínculo sendo sua relação exclusivamente por meio da denominação.
A coesão vivenciada pelo núcleo permanente da IMPDVA não está relacionada
a uma experiência comunitária, mas na identificação com os líderes da igreja. Foi
perguntado a eles em quais aspectos identificavam-se com os líderes da IMPD, tanto
pastor local, quanto o apóstolo, 72% das pessoas declaram identificar-se com a trajetória
de vida, todas as pessoas que assinalaram essa questão fazem parte de migrantes
interestaduais, 66% afirmaram que identificam-se com mensagem do apóstolo
Valdemiro e do pastor MN por ser facilmente assimilada, e 53% afirmaram que o
principal motivo é a identificação da cor da pele.
Pelo menos em relação aos membros da IMPDVA apresenta um modelo de
igreja personalista, que expressa-se em muito no carisma pastoral, fugindo da
concepção quase universalmente aceita de igrejas franqueadas, isto parece ser relevante,
uma vez que o “sucesso” da igreja depende muito mais da ação pastoral de ganhar a
subjetividade dos fiéis do que propriamente apenas uma imagem midiatizada do
apóstolo Valdemiro Santiago.
A fidelização dos sequazes independe de um senso comunitário, ou mesmo de
atividades lúdicas, mas da identificação e reconhecimento da ação do pastor, que de
certa forma, passa a exercer a alcunha de um mágico e feiticeiro, ou mesmo como
Campos afirmou um pastor-ator, pessoas que se colocam no limite entre o sagrado e
profano.
O pastor-ator, por meio de suas palavras e gestos, procura integrar todos os presentes no processo de exteriorização-interiorização coletiva da fé. Como tal, ele é um personagem limítrofe, que se desloca entre as fronteiras do sagrado-profano e detém, por isso mesmo, as técnicas de bem conduzir a todos nesse processo de êxtase. (1997:94)
O caminho mais comum encontrado entre os membros da IMPDVA é o
conhecimento da igreja através dos programas televisivos, eles passam um tempo
acompanhando os programas televisivos, ao verem relatos de curas e milagres, ou
mesmo impactadas pela mensagem do apóstolo Santiago procuram uma Igreja Mundial
próxima a casa, o trabalho, ou mesmo no caminho entre ambos. Alguns dias depois,
131
após estarem familiarizados com a igreja são convidados a se batizarem. Não existe
qualquer voto, ou regras, em sua maioria, as condutas de um membro da igreja são
passadas nos sermões pastorais de forma osmótica, ou na convivência com o corpo de
obreiros/as da igreja.
Como não existe um livro de regras claras e objetivas, ou um conjunto de
normas, os membros a igreja, já acostumados ao mundo evangélico assumem a moral e
a ética que foram aprendidas em outras ocasiões, enquanto as pessoas que são
provenientes de outras religiões ou mesmo é recém convertido assume o critério de
tentativa e erro, sendo “educados” ou “elucidados” durante as pregações pastorais,
conversas com os obreiros e orientações em atendimento pastorais depois ou antes dos
cultos.
A segunda classe facilmente distinguível e presente em todas as reuniões da
igreja são os obreiros. Eles têm a função de garantir o bom funcionamento do culto e
auxiliar o pastor em tudo que ele precisa, além disso, são eles que preparam as
dinâmicas dos cultos limpam o templo aos sábados, e se reúnem para avaliação semanal
, in loco, presenciamos obreiras fritarem peixes para serem comidos durante os cultos,
enfeitarem a igreja, dobraram barcos de papel e várias outras atividades usadas nos
cultos, na maioria das vezes a esposa do pastor, missionaria florzinha acompanhava as
atividades coordenando os obreiros/as.
Os obreiros da Igreja Mundial do Poder de Deus assumem outras funções, ajudando na distribuição de envelopes de ofertas, Jornais da igreja, distribuição de panfletos, cuidando da manutenção e da ordem do templo ao longo de toda a reunião. Chegam aos cultos com certa antecedência, a fim de se prepararem para a reunião, orando, lendo a Bíblia, sempre alerta para qualquer eventualidade, podendo dar conselhos e expulsar demônios dependendo da ocasião. Os obreiros não são remunerados, todo o seu trabalho é voluntario, a não ser nos casos especiais. (BITUN, 2007:68)
A primeira vista o grupo de obreiros/as parecem ser homogêneos, sem divisões
internas, isso porque não existe um livro de regras ou cargos delimitados entre eles,
entretanto para o bom andamento do corpo é necessária uma certa divisão interna,
mesmo que velada. Existem pelo menos três funções principais, os obreiros que cuidam
da segurança e manutenção, normalmente homens, os obreiros/as que fazem trabalhos
manuais para usar nos cultos e enfeitar a igreja, normalmente mulheres, e um grupo
mais misto que acompanhas as pessoas da comunidade em dificuldade e agenda visitas
para oração.
132
Para cada grupo mencionado existe uma pessoa de referência, que faz as vezes
do coordenador, muito embora esse cargo não exista formalmente, da mesma forma o
secretario pastoral, ele é responsável pela agenda do pastor e tudo passa por ele, alguém
escolhido pelo próprio pastor para isso, mas que detém o prestigio dos outros obreiros,
que o procuram regularmente para esclarecer dúvidas.
Outra função do corpo de obreiros/as da IMPDVA é o acompanhamento do
grupo de fiéis da igreja, normalmente são eles que visitam os membros e atualizam o
pastor de qualquer situação não rotineira, ou que exija atenção pastoral principalmente
sobre insatisfação com a igreja ou brigas internas entre os membros.
Durante os cultos eles se dividem, o padrão é sempre dois obreiros na porta, são
eles que recepcionam as pessoas e entregam o que será usado no dia, óleo, flor, água
etc. eles também são responsáveis por encaminhar a pessoa a sentar-se quando
necessário, existe alguns cultos que um obreiro e uma obreira revezam, mas na porta da
igreja precisa, necessariamente ficar um homem, a justificativa para isso é a segurança :
as vezes entram pessoas bêbadas, drogadas, nós precisamos ficar de olho, a presença
de um homem ajuda a inibir (Obreiro 4).
Aqueles obreiros/as que não são escalados para a porta ficam no corredor na
parte da frente, nota-se que sempre tentam dividir em números iguais, se estão em oito,
quatro em cada corredor, intercalados entre homens e mulheres, quando perguntados o
porquê dessa disposição respondem “Não sei porque fazemos assim, costume eu acho”
(obreira 10).
Os obreiros que estão nos corredores têm a função de ajudar na boa condução do
culto, são eles que batem palmas primeiro, que cantam as músicas em voz alta quando
ninguém conhece, eles também dançam, levantam as mãos, fecham os olhos, repetem
prontamente todas as palavras que o pastor pede.
Segundo um dos obreiros entrevistados: nós fazemos isso para animar o povo,
as vezes as pessoas vêm do trabalho desanimadas, cansadas e precisam de um animo
para participar do culto, elas olham para nós e ficam mais animadas (Obreiro 1). As
atitudes dos obreiros/as nos cultos não são espontâneas, na verdade eles são instruídos a
agirem de maneira mais animada possível, também são instruídos a serem acolhedoras
com os visitantes reservando um tempo para conversar com eles, saberem de onde vem
e etc.
Desta forma os obreiros/as representam parte da constituição do ambiente
cúltico/cênico.
133
Na magia e na religião, para a captura ou contato com o sagrado, há rituais, espaços e objetos próprios, assim como meios apropriados para unir atores e plateia[...] se a religião começa com a delimitação do espaço, o culto acontece num cenário material, onde entre objetos demarcadores, os atores executam ações especificas. (CAMPOS, 1997:74)
Nesse caso as ações especificas dos obreiros/as captam a atenção dos fiéis da
igreja, em um primeiro momento, é deles o maná necessário para contagiar a igreja.
Em culturas da Oceania, os objetos têm mana quando possuem uma qualidade ou um estado diferenciado dos demais, cujas características são expressas pelas palavras “poder espiritual”, “força sobrenatural”, “influencia não-física”. Os melanésios acreditavam que tais objetos eram dotados de um “fluido vago e impessoal”, o que lhes garantia a capacidade de gerar impressões favoráveis no decorrer de um rito mágico ou religioso. (Ibidem:75)
A racionalidade entre o objeto que possui mana e os obreiros/as da IMPDVA
nos parece funcionar com a mesma lógica, são eles que garantem as impressões
favoráveis no decorrer do culto, assim como são eles que legitimam a qualidade do
líder, garantindo a transmissão do poder mágico.
Essa impressão parece contagiar a igreja, uma vez que em muitos testemunhos
são citadas as orações dos obreiros/as da igreja: Graças a Deus e a oração da obreira
que minha filha voltou para a casa depois de 3 meses na rua, ela orou e pelo poder da
fé dela na mesma noite minha filha voltou para a casa, glória a Deus. (Fiel da igreja,
em 11/10/2013)
A orientação para os obreiros não se restringe nas interações e dinâmicas dos
cultos, há um cuidado sobre as vestimentas dos mesmos na igreja, eles são proibidos de
realizarem qualquer ação durante os cultos sem que estejam com as vestimentas
apropriadas, os obreiros/as que não estão com os uniformes assistem o culto e de
nenhuma maneira podem ajudar em sua condução. Há casos que o pastor pede para a
pessoa não participar do culto por estar mal trajada, ou sem alguma peça do uniforme
A imagem pessoal de cada obreiro/a passa por uma sofisticação que tenta
acompanhar a imagem pastoral, para os homens os cabelos bem aparados e barba feita
são essenciais, enquanto para as mulheres o conselho é batom ou rímel, unhas sempre
feitas e de preferência cabelos presos.
Quando questionados sobre as práticas das vestimentas eles respondem: as
roupas são importantes, não podemos vir na casa de Deus de qualquer maneira,
entenda que, nós somos exemplos, estar bem arrumado é testemunho daquilo que Deus
134
pode e faz em nossa vida, como o pastor fala: a primeira impressão é a que fica.
(Obreiro 4)
Ao contrário dos fiéis da igreja os obreiros possuem mais integração entre eles, a
sua coesão não está somente na identificação pastoral, mas no ativismo da igreja,
gerando assim espaços integradores que possibilitam trocas de informações, dessa
forma, os obreiros/as na IMPDVA funcionam como uma rede social. Assunto que
abordaremos mais adiante.
Na pirâmide social construída na IMPDVA podemos dizer que o cargo pastoral
está no topo, é ele que aglutina todas as funções essenciais para o andamento da igreja,
seja na função de administrador dos recursos financeiros e patrimoniais, ou mesmo na
gestão de pessoas. Na igreja local é o pastor que detém o poder e autonomia para quase
tudo, permitindo a ele uma grande gama de possibilidades de trabalho dentro da igreja.
É dever do pastor recolher os dízimos e ofertas, assim como administra-los, e
encaminha-los para a sede. Também fica a cargo pastoral a realização dos cultos e
reuniões, bem como a fidelização dos membros na igreja. Regularmente o pastor
participa de reuniões com o bispo regional para informar as especificidades da igreja,
nessa reunião é passado os temas para o próximo mês e as metas a serem atingidas pelas
igrejas locais da IMPD.
Embora o destaque do poder administrativo seja relevante, é na dominação
simbólica a maior ênfase do ministério pastoral na IMPDVA. Segundo Pierre Bourdieu
os sistemas simbólicos como instrumentos de conhecimento e de comunicação, só
podem exercer um poder estruturante porque são estruturados (1998:09). Os símbolos
permitem o consenso de sentidos do mundo social, contribuindo para reprodução da
ordem comunitária.
Enquanto instrumentos estruturados e estruturantes de comunicação e de
conhecimento os sistemas simbólicos cumprem sua função política, a legitimação,
dominação e imposição para assegurar a subserviência de outras classes sociais ao seu
domínio, o que Bourdieu chama de violência simbólica, ou segundo as palavras de Max
Weber domesticação dos dominados.
Desse modo, existe uma luta simbólica de classes que intentam impor as
definições do mundo social mais condizentes com seus interesses. Quando essa luta
passa para o âmbito religioso, ou mesmo ideológico devemos entender que sua
produção e resultado em dois aspectos, muitas das vezes distintos entre si, as
características não somente são pelos interesses das classes concorrente na
135
monopolização dos sistemas simbólicos, mas também o exercício de interesses
específicos daqueles que o produzem, bem como as especificidades do campo de
produção simbólico.
O poder simbólico como poder de construir o dado pela enunciação, de fazer ver e fazer crer, de confirmar ou transformar a visão de mundo e, desse modo, a ação sobre o mundo [...] poder quase mágico que permite obter o equivalente daquilo que é obtido pela força (física ou econômica), graças ao efeito específico de mobilização, só se exerce se for reconhecido, quer dizer, ignorado como arbitrário. Isto significa que o poder simbólico não reside nos sistemas simbólicos em forma de uma illocutionary force, mas que se define numa relação determinada – e por meio dessa – entre os que exercem o poder e os que lhe estão sujeitos. (Bourdieu, 1998:14)
Os símbolos somente exercem poder à medida que a crença nos sistemas
simbólicos é legitimada socialmente, dessa forma o poder simbólico é um poder
subordinado ao capital simbólico adquirido individual ou coletivamente.
O poder simbólico do pastor da IMPDVA vem por meio da dominação
carismática. Para Weber dominação é a probabilidade de encontrar obediência para
ordens específicas (ou todas) dentro de um determinado grupo de pessoas (Weber,
1991:139). Entretanto o conceito de dominação não significa total subserviências aos
desejos dos dominantes, em cada caso a dominação/autoridade, pode basear-se nos mais
variados motivos para a subordinação, seja ela, habito inconsciente ou consciência
deliberativa, ou seja, interesse utilitários e vantajosos, ou mesmo relação de obediência.
Embora não exista uma dominação arquetípica pura, a dominação do pastor na
IMPDVA se aproxima muito da dominação carismática. Para Weber a dominação
carismática é proveniente de uma virtude especial, no qual o devoto atribui ao
dominador, seja por algum feito único, como é o caso dos heróis e guerreiros ou de
dotes sobrenaturais, caso dos profetas, sacerdotes, magos etc.
Assim como a dominação carismática, é função do pastor local escolher seu
quadro administrativo, ou seja, seus obreiros/as, aquelas pessoas que vão dedicar-se ao
trabalho eclesial. Nesse quadro administrativo o pastor preza pela dedicação dos
obreiros/as dispensada a ele, normalmente um dos sinais de preferência pastoral em
detrimento a outros obreiros/as é a escolha de um grupo limitado para acompanha-lo ao
monte, vigílias ou mesmo em algumas reuniões da igreja.
136
Mesmo a dominação carismática denotando um relacionamento íntimo com o
líder carismático, podemos presenciar que o pastor da Igreja Mundial é extremamente
impessoal com os fiéis da igreja, não existe qualquer relação de proximidade, na
maioria das vezes o pastor não sabe o nome das pessoas presentes. A princípio a
resposta lógica dessa situação é o grande fluxo de transito religioso, mas nem as pessoas
do núcleo permanente gozam da presença pastoral.
O apelo da dominação carismática é estabelecido em primeiro lugar através da
construção imagética-carismática do apóstolo Valdemiro Santiago, motivo original das
pessoas congregarem na IMPD, em segundo da institucionalização desse carisma
fraqueando para bispos e pastores através de práticas ritualísticas, gestos análogos aos
do apóstolo Valdemiro, estilo de pregação simples e de fácil memorização.
Obviamente existe um carisma proprietário do pastor local da IMPDVA,
entretanto, este sempre parte do carisma “original”, contudo, ao contrário do carisma de
Santiago que pauta pelas manifestações de curas e milagres em detrimento das
mensagens bíblicas, o pastor MN, vai em um caminho oposto, nos cultos não há a
ênfase das transmissões televisivas em cura e milagres, mas há uma homilética muito
persuasiva, nela o pastor constrói, ou ao menos contribui para uma consciência
comunitária, explorando alguns assuntos em comum.
É comum ouvir em seus sermões aspectos como luta contra o racismo,
dificuldade de adaptação em São Paulo entre outras tantas. No culto de 15 de outubro de
2013 em sua mensagem diz: é fácil morar em São Paulo? Eu digo que não, quando
mudei do Rio (de Janeiro) para cá estranhei muito, as pessoas daqui são fechadas, mas
Deus nos leva onde Ele quer e não onde queremos (pastor MN, 17/082013)
Ainda em outro culto diz: uma vez me perguntaram se eu não me importo de me
chamarem de negão, disse que não, ou sou mesmo, se você olhar para mim você vai ver
o que um branco? Um japonês? Sou preto ué não tenho problema com isso, sabe
porquê? Meu negócio é com Deus. (MN, 22.07.2013)
Podemos também elencar outro extrato de suas mensagens:
Graças a Deus hoje eu moro bem, tenho um carro, uma casa, mas quando cheguei em São Paulo, só Jesus na causa, agente já morou em cada barraco né florzinha? (Virando para a esposa) ela está de prova perguntem para ela, Deus faz a obra meu irmão a pessoa precisa é trabalhar se esforçar que Deus faz a parte Dele isso é que é fé. (MN, 13.09.2013)
137
Ao contar histórias de sua vida, dialogando com a rotina dos membros da
IMPDVA, mesmo com atitudes impessoais, as pessoas sentem que o conhecem bem,
uma vez que ele “transparece” quem é no púlpito, dessa maneira, o pastor MN ao
mesmo tempo que ganha a subjetividade desses indivíduos, também adquire
legitimidade como, ao exemplo de Valdemiro Santiago, “alguém que venceu na vida, o
migrante pobre que deu certo” etc.
Os enfoques de tais narrativas sobre intimidades, banalidades e vida cotidiana do indivíduo parecem enquadra-lo na mesma perspectiva dos personagens dos folhetins. São, principalmente, ‘produtos’ da subjetividade da celebridade – como casamento gravidez, a briga, a moral, a personalidade, a paquera, o estilo de vida, as festas, etc. – que vão construindo, ‘capitulo a capitulo’, o seu mito, sua lenda. (PIMENTEL, 2005:195)
Assim a dominação do pastor da IMPDVA está interligada em vários níveis, em
primeiro lugar, dominação por meio da hierarquização, ele é quem administra os bens
da igreja, com autonomia para vetar ou aprovar algumas ações, também é o pastor
responsável pelos pagamentos e movimentações financeiras da igreja.
A dominação do pastor passa a ser mais que simplesmente ação administrativa,
uma vez que é ele quem dá sentido aos diversos símbolos e bens da igreja,
empoderando-os com força espiritual metafisica, para Campos:
Um objeto não possui valor em si mesmo, mas tão somente quando representa e contribui para localizar e dar status ao homem, num determinado espaço social, isto é pelo seu valor de uso. O indivíduo não deseja ardentemente o objeto em si, mas tão somente o bem inatingível do qual se acredita ser ele portador. (1997:78)
Em outras palavras o pastor MN é envolto de dominação simbólica pelo poder
imanente de fetichizar os objetos, através de rituais mágicos. Esse poder é estabelecido
por outro agente apóstolo Valdemiro Santiago, que possui o carisma original, ou seja, o
carisma que levou grande parte, se não todos, os membros da IMPDVA a participaram
das reuniões. Para fidelizar a clientela/fiéis na igreja o pastor precisa manter um carisma
próprio, que acarrete, ao adepto, identificação com seu líder, ao mesmo tempo que
legitime sua autoridade no ambiente local, dessa forma expressões idiomáticas como
“meu negócio é com Deus” e narrativas que o apontam como minoria, mas que “venceu
na vida” ajuda a estabelecer um diálogo, criar subjetividade e construir um senso de
comunidade negra, pobre e migrante, entorno do seu líder carismático.
138
4.1.1. O poder pela palavra.
A perspectiva desse tópico é extrair da experiência de culto discursos e
mensagens de si mesma, um autorretrato religioso que tem como função promover a
adesão da membresia ao ciclo de vida eclesial, ou mesmo, gerar uma consciência
identitária capaz de uma coesão social.
Segundo Riesebrodt o culto como propaganda religiosa é:
Um sentido de esforço de motivar pessoas a uma conversão no sentido amplo da palavra... no caso destes textos se trata de uma auto-representação ... as perguntas centrais são, portanto: o que é representado como motivo da nova orientação religiosa? Quais resultados as religiões reclamam para si nestes discursos de conversão? E quais promessas elas fazem para o caso da conversão? Apelos a conversão ou testemunhos de uma vida transformada podem-se dirigir a membros da própria comunidade religiosa, para orienta-la no sentido de um seguimento mais rigoroso dos compromissos religiosos. Eles podem ter a intenção de convencer não-pertencentes à membresia (apud FOERSTER, 2007:211)
A priori o culto possui dois elementos básicos, a manutenção da membresia, ou
do núcleo permanente e a construção de um sentimento de pertença comunitária às
aquelas e aqueles que estão em transito religioso, ou não participam do núcleo
permanente. Dessa forma a propaganda cúltica é simultaneamente cooptação e
manutenção de subjetividade.
Embora o culto seja uma importante ferramenta de propagação da mensagem na
IMPD, é na mídia televisiva que sua mensagem ganha força. A maioria dos visitantes,
entram na igreja motivados pelos cultos televisionados do apóstolo Valdemiro, e
esperam que o culto local, possa entregar a mesma experiência midiática vivenciada por
eles, espera-se que a IMPDVA seja uma extensão dos cultos televisionados, por isso
existem cartazes e panfletos com a imagem de Santiago, pinturas dos templos
padronizadas, referencias e citações diretas sobre as ações de Valdemiro durante os
cultos, tudo isso denota uma preocupação de identificação direta da igreja com os cultos
ministrados pelo apóstolo, mesmo que ali não tenha um enfoque tão grande nos
testemunhos de curas e milagres.
Ao entrar no templo o visitante logo identifica-se com a imagem do Valdemiro e
as cores azuis e brancas da igreja tentando estabelecer um simulacro do céu no
139
inconsciente religioso cristão, sacralizando o espaço cúltico. A sacralização espacial não
é algo novo, ao contrário, ela expressa-se desde a formação societária humana, quando
os seres humanos separam o espaço em profano e sagrado.
Há, portanto, um espaço sagrado, e por consequência, “forte”, significativo, e há outros espaços não-sagrados, e por consequência sem estrutura nem consistência, em suma, amorfos... Experiência de uma oposição entre o espaço sagrado - o único que é real, que existe realmente – e todo o resto, a extensão informe, que o cerca (ELIADE, 1992:20)
As pessoas falam em tom baixo, oram e curvam a cabeça antes do culto
começar, essa preparação, momentos antes do culto, indica uma passagem da vida e
tempo profano, para um tempo sagrado, assim a igreja coloca-se no limiar dicotômico
entre a representação do sagrado em um mundo profano.
O limiar que separa os dois espaços indica ao mesmo tempo a distância entre os dois modos de ser, profano e religioso. O limiar é ao mesmo tempo o limite, a baliza, a fronteira que distinguem e opõem-se dois mundos – e o lugar paradoxal onde esses dois mundos se comunicam, onde se pode efetuar a passagem do mundo profano para o mundo sagrado. (Ibidem:29)
A igreja transcende o espaço profano, lá as comunicações com Deus são
possíveis, nesse lugar as hierofanias são perceptíveis e aceitáveis, ou seja, uma rotura do
tempo e do espaço profano, para um tempo e espaço sacralizado.
A importância simbólica do espaço (em suas diferentes “modalidades” de céu-e-terra, de pluridimensionalidade, de imensidão etc.) é expressa de uma maneira particular nos ritos, já que eles desenvolvem-se no âmbito físico, considerado sagrado. O lugar sagrado é um espaço “recortado” dentro do grande espaço cósmico ou telúrico. (CROATTO, 2001:53)
A música inicial também ajuda no processo de reflexão, momento antes do
início do culto o pastor coloca uma música calma, instrumental com o objetivo de
incentivar a oração e obter um estado de tranquilidade. Nos cultos a música é um
instrumento quase onipresente, ela serve como construção do ambiente, como é o caso
dos dízimos e ofertas, onde a música é mais alegre motivando um estado de euforia nas
pessoas, em outros ela se torna a atração principal, principalmente durante o momento
de louvor e orações com músicas mais lentas incitando um estado de contrição e
contemplação.
Centrada na ênfase intimista de Deus, que faz da adoração por meio da música um modo de vida, a cultura gospel passa a
140
representar uma forma mais eficiente de avivamento religioso. Essa renovação deve refletir-se na vida pessoal. Com a busca do alcance das bênçãos materiais na vida coletiva, com as formas de culto marcada pela liberação das emoções, com expressão corporal e menor rigor litúrgico. (CUNHA, 2007:185)
As mensagens das músicas tocadas na igreja baseiam-se em uma tríade, vitória,
cura e prosperidade. Dos temas apresentados há sempre uma interpelação entre o pastor
e a comunidade, a mensagem não é muito diferente das encontradas em outras
denominações evangélicas, de fato, a cultura gospel (CUNHA,2007) torna as
mensagens evangélicas homogêneas.
Nos momentos de louvor as ações corporais são libertas, bem diferente da
herança puritana dos grupos evangélicos protestantes, há na IMPDVA uma liberdade do
uso corporal, na verdade, boa parte do culto a linguagem é muito mais corporal que oral.
Contraditoriamente, os evangélicos chegaram ao final do século XX desejando e
desenvolvendo processos do novo modo de ser em construção – a cultura gospel – a
valorização do corpo. (CUNHA, 2007:179)
Como tendência nos tempos contemporâneos marcado pela busca hedonista, o
corpo passou a ter um espaço central dentro da sociedade influenciando diretamente o
culto evangélico. A questão corporal do culto não está somente na liberdade para mexe-
lo, dançar, levantar as mãos, rodopiar etc. Mas como fonte de disputa simbólica.
Influenciado pelo movimento da cura divina, a IMPDVA estabelece que a
doença é culpa de ações demoníacas, por isso exige-se um ritual de exorcismo.
Coloque a mão no seu coração e faça silencio [...] a presença de Deus é forte em nosso meio, e as doenças e demônios estão sendo sufocados pelo poder de Deus. Onde tiver um espirito mau, você vai ouvir o seu grito de derrota. Espirito de morte, de câncer, suicídio, depressão, espirito de miséria, separação, destruição, dê seu grito de derrota demônio! (ALMEIDA, 2010:08)
Para a IMPD e seus fiéis o corpo é território de luta entre duas forças opostas,
dessa forma o pastor é um agente capaz de controlar tais forças por meio do exorcismo,
um paladino divino, que impede, ou extingue ações contrarias ao povo de Deus, essa
luta pode ter haver com desemprego, doença, qualquer dificuldade financeira, falta de
fé, desentendimento com a família etc.
Por isso sempre durante os momentos de louvor o pastor ora expulsando o mal
da vida dos fiéis e seus familiares, depois do ritual ter terminado as pessoas jogam suas
141
mãos três vezes para traz e dizem “sai, sai, sai e não volte nunca mais” simbolizando
que através do exorcismo pastoral toda a força maligna contraria foi embora.
A metáfora da luta permeia todo o ritual: a cura marca a vitória do bem sobre o mal. Assim, ao invés de constitui-se exclusivamente em assunto privado – busca de melhoria pessoal neste mundo – faz parte do projeto coletivo do culto – construção de um subuniverso de ordem em meio ao caos circundante. (RABELO, 1993:58)
Aqui existe uma diferença clara dos momentos de cura na IMPD ou na Igreja
Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina e a IURD. Na IURD os momentos de
exorcismos são demorados, os pastores e obreiros entrevistam o dito “demônio”, na
IMPD Valdemiro Santiago chama as pessoas a testemunhar aquilo que Deus (ele) fez na
vida das pessoas, enquanto as ações iurdianas demostram a força do pastor em controlar
forças metafisicas, o culto do apóstolo Santiago legitima sua imagem de taumaturgo, a
mensagem é clara, mais que um exorcista ele trabalha de maneira integral na saúde de
seus adeptos.
Já na IMPDVA esse momento é rápido comparado a outros momentos do culto,
em média gasta-se apenas 15 minutos em oração e exorcismos, a fim de comparação o
tempo reservado aos dizimo na igreja chegam a ser o dobro do tempo gasto com os
exorcismos e curas.
Ainda sobre a ação do corpo, o pastor tem grande importância, afinal, suas
palavras incitam as pessoas a fecharem os olhos, levantarem as mãos e coloca-las em
cima de suas cabeças ou no peito perto do coração, para Mauss isso é uma técnica
corporal, ou seja:
Um ato tradicional eficaz (e vejam que, nisto, não difere do ato mágico, religioso, simbólico). É preciso que seja tradicional e eficaz. É nisso que o homem se distingue sobretudo dos animais: pela transmissão de suas técnicas e muito provavelmente por sua transmissão oral. (1988:217)
As técnicas corporais são tradicionais porque são transmitidas pela educação, de
maneira repetitiva, e eficaz porque responde a um efeito prático, mesmo assim a
performance de uma técnica corporal está longe de ser apenas uma reprodução entre
emissor e receptor, pois a cada nova reprodução nova significação pode ser atribuída a
mesma.
Exemplo disso é o pastor bater com o pé três vezes no chão com veemência afim
de demostrar que “estão pisando na cabeça da serpente”, e no culto da semana seguinte
repetir o mesmo gesto alegando que “São Paulo é nosso, nós o construímos”, uma clara
142
referência ao processo de migração inter-regional, para eles os migrantes, maioria na
igreja, deveriam “tomar posse” da cidade de São Paulo.
Nesse sentido a dança, as orações, as ações corpóreas são resultado de um
processo de inscrição histórico-cultural da sociedade sobre o corpo humano. Nisso os
obreiros/as são os que mais assumem culturalmente as expressões corporais dirigidas
pelo pastor, entendendo que já compartilham da mesma cultura e estão inseridos no
mesmo contexto histórico.
Se Mauss alegava a importância do corpo no rito mágico, Turner define o ser
humano como um animal auto performático (1988:81). Para o autor o ser humano é
capaz sentir experiências dramáticas de profunda reflexividade, na qual os agentes
envolvidos transmitem suas emoções e avaliam o significado de suas identidades
sociais.
Via de regra as experiências performáticas produzem situações de reflexividade
nos quais os atores sociais relativizam a estrutura social criando, temporariamente e
parcialmente, realidade alternativa preenchida pelas experiências de limites. Para Turner
os dramas sociais são, em suma, construções de identidades, ou adequações de suas
identidades para a realidade que se faz presente.
Nas performances os grupos refletem sobre eles mesmos e a sociedade da qual são parte, podendo nesse momento, serem agentes ativos de mudança social. Será junto aos rituais que as performances se mostram mais eficazes... na medida que expressão uma sequência complexa de símbolos. Em outras palavras... o rito não é conceituado como uma mera repetição de atos em sequência, mas como um ato performático com poder de transformar o indivíduo e a sociedade. (ROCHA, 2008, p 11)
De certa forma, a formação corporal da IMPD e seus usos tem centralidade
dentro do culto, uma vez que eles são canais para ações metafisicas, curas e bênçãos
divinas, campo de batalha espiritual, todos ritos performáticos capazes de estabelecer
identidades comunitárias e pessoais, assim sendo, as expressões corpóreas são mais do
que um simples ato de repetição, ou êxtase religioso, é, em geral, uma legitimação
comunitária, onde, somente as pessoas que culturalmente estão inseridas naquele
contexto são capazes de compreender e apreender a mensagem implícita.
Outra parte essencial do culto é a retorica, que nesse caso assume quase como
exclusividade pastoral, é somente o pastor, com algumas poucas exceções, que possuem
o poder ou a permissão para subir no púlpito da IMPD, como anteriormente citado o
143
pastor MN ganha destaque nesse quesito, não só porque é dele o protagonismo da
retórica, mas porque o faz muito bem, principalmente em uma igreja que não é
conhecida por pastores exímios na arte da homilia.
A priori o objetivo de toda a retorica é o convencimento do indivíduo através de
signos e símbolos, ou mesmo argumentos lógicos, a retorica religiosa, usada pelo pastor
da Vila Alpina, não difere em seus objetivos do culto supracitado, ele quer criar um
estado de pertença a pessoa que por alguma razão ainda não fidelizaram sua
participação nos cultos, assim como precisa manter o fiel do núcleo permanente
interessado em sua mensagem, e consequentemente nas reuniões da igreja.
Pelo seu envolvimento anterior com a IURD sua mensagem anexa formas
retoricas encontradas nos templos iurdianos. Dessa forma, as mensagens do pastor MN
são quase hibridas, tendo modelos irudianos como forte influência retorica e novos
modelos homiléticos exigidos pela liderança da IMPD.
A retorica iurdiana é baseada na construção de representações simbólicas, que
ao concorrer no mercado religioso e ganhar a preferência do público precisa,
necessariamente de uma oratória capaz de desqualificar outros agentes e instituições
religiosas, assim como extrapolar em simbolismo de guerra.
Por esses e outros motivos, a retórica iurdiana apresenta como credenciais de sua legitimidade, exemplos de milagres e prodígios, palavras de ordem, slogans e narrações, devidamente arranjadas na forma de “histórias de vida” ou de “testemunhos de fé”, largamente apresentados em seus meios de comunicação de massa. (CAMPOS, 1997: 301)
Nesse aspecto o pastor MN cumpre a risca a cartilha iurdiana, em suas
mensagens é comum ele desqualificar outras igrejas, incluindo a própria IURD, outras
como Assembleia de Deus, Evangelho Quadrangular e Batista, são consideradas, por
ele, igrejas sem o Espirito Santo, enquanto exalta o líder Valdemiro Santiago.
Vou contar para vocês porque eu mudei de igreja, eu percebi que essas igrejas eram falsas, não tinham o Espirito Santo. Quando eu me converti queria ir para uma igreja, era terça-feira, procurei a Batista, que era a igreja que eu conhecia e sabe o que encontrei? A igreja fechada, é por isso que na Mundial nos nunca fechamos nossa igreja, vocês podem vir em qualquer horaria a igreja sempre estará aberta para vocês. (Pastor MN, 15.05.2013)
Em outro momento alega:
Quando eu era pastor da igreja da pombinha (referência a Igreja Universal do Poder de Deus) os pastores só pensavam em dinheiro,
144
não importava as pessoas da igreja, se eles estavam testemunhando no mundo, se a pessoa contribui era o que importava, aquilo não é uma igreja é um comércio. Diferente do apóstolo Valdemiro, esse sim é homem de Deus, alguém já chegou perto do apóstolo? (Levantando as mãos, algumas pessoas o acompanham e levantam também as mãos), então agente a te sente algo especial não é verdade? (Buscando confirmação das pessoas que levantaram as mãos) é disso que estou falando, o apóstolo tem intimidade com Deus, por isso ele é uma pessoa diferente, ele quer ajudar as pessoas, não há ganancia em seu coração. (Pastor MN, 30.08.2013)
A desqualificação de outros agentes religiosos é principalmente voltada a IURD,
em determinados momentos faz graves acusações contra a igreja rival:
Quando uma pessoa é boa no que faz, ou de alguma forma ela se destaca, as pessoas ficam com inveja, vou dar um exemplo, não sei se vocês sabem, mas a igreja da pombinha contratou um matador para matar o apóstolo, daí quando ele chegou no carro do apóstolo, apontou a arma. (Risos), vocês conhecem o apóstolo ele tem um gênio difícil, o apóstolo olhou a arma apontada para ele e disse: “e ai vai atirar ou não, porque estou atrasado para uma vigília”, ... no fim o matador entrou no carro junto com o apóstolo e foram os dois para a vigília e ele se converteu. (Pastor MN, 29.10.2013)
O discurso pastoral tem um claro objetivo, a exaltação e a legitimação da IMPD
como sendo diferenciada, ou mesmo escolhida por Deus em detrimento de outras
igrejas, e como recurso para isso é o que Campos chama de inventio, argumentos
utilizados para comover os receptores e conquistar sua subjetividade. Dessa forma, a
coleta de exemplo do cotidiano, tirado principalmente da rotina do seu auditório sai do
nível concreto para o abstrato, podendo, assim, ser mais manipulável nas mãos do
pastor, além de uma identificação clara com o ouvinte, a história e exemplo pastoral
passam a envolver a audiência que aos poucos assume a história, o exemplo e o
testemunho pastoral como próprio.
Obviamente a Igreja é apresentada como responsável pelo desencadeamento daquela ação e por ter criado condições para a inibição das forças contrárias ao processo de transformação. Por isso, é fundamental “colocar a fé em ação” e isso acontece graças a um forte choque retórico. O pastor é o “homem de Deus” encarregado de seduzir o público, despertar esperanças de uma vida melhor, enquanto vai afastando tudo que obstaculariza o progresso do fiel no novo caminho de fé. (CAMPOS, 1997: 306-307)
O pastor MN avoca para si o papel de sedutor, constantemente durante os cultos
ele estimula a esperança, sonhos e desejos nas pessoas.
145
Deus é quem determina sua vitória, e não a situação em que você vive, as pessoas tem a mania de se fazer de coitadas, ó como eu sofro, olha onde eu moro, que salario miserável eu ganho, pois hoje é o dia da mudança, eu declaro em sua vida que Deus tem algo para você esta noite, será tremendo, só peço que você acredite, quando eu entrei na Igreja Mundial pela primeira vez eu não acredita, daí o bispo fez uma oração e as coisa começaram a melhor, hoje eu vou orar por você e as portas do céu vão se abrir na sua vida.(pastor MN, 5.5.2013)
As elocuções do Pastor MN tornam-se poderosas a medida que usa exemplos
bíblicos como afirmação do seu ponto de vista, construindo, ou ao menos,
identificando-se com a comunidade em volta. Existe uma constante em sua retórica, o
uso de personagens bíblicos em situação migratória. Temas como o povo de Israel no
Deserto51, o chamado de Abrão52, além de outros temas que falam sobre a
transitoriedade como Rute, Isaque, Neemias, etc.
Em discursos sem narrador explicito, em que os acontecimentos são apresentados objetivamente, como se desenvolvessem por si mesmo. Nesses discursos, constrói-se, com efeito, um único lugar de observação em que enunciador e enunciatário se encontra sincretizados, trata-se da figura de um observador, entendido como agenciador dos pontos de vista que regulam os modos pelos quais o enunciado pode ser apreendido, e os pontos de vista são, as perspectivas que exploram a orientação discursiva para fazer face à imperfeição constitutiva de toda a percepção (FONTANILLE, apud SARAIVA & LEITE, 2011:6)
Em outros termos o recurso do qual o enunciador, no caso pastor MN, lança mão
para manipular o enunciatário, ou construir coesão comunitária, difundindo um ponto de
vista generalizante ou particularizante, omitindo sua opinião pessoal e, segundo ele,
atentando-se somente a narrativa bíblica, extraindo do texto “somente o que Deus quer
falar para igreja”.
Para esclarecermos em que medida a retórica do pastor MN produz construção
de identidade e coesão comunitária na IMPDVA, precisamos refletir sobre o que é
identidade, segundo Landowski (2002) ao falar de construção identitária, ela precisa,
simultaneamente produzi um sentido, sem esses elementos a experiência de alteridade
fica comprometida.
Condenado, aparentemente, a só poder constituir-se pela diferença, o sujeito tem necessidade de um ele – dos “outros” (eles) – para chegar à existência semiótica, e isso por duas razões. Com efeito, o que dá forma à minha própria identidade, não é só a maneira pela
51 O tema foi usado quatro vezes por ele nos dias 18/07/2013, 10/08/2013, 27/08/2013, 05/11/2013 52 Texto em Genesis 12 foi usado três vezes pelo pastor nos dias 26/05/2013, 14/06/2013, 10/10/2013
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qual, reflexivamente, eu me defino (ou tento me definir) em relação à imagem que outrem me envia de mim mesmo; é também a maneira pela qual, transitivamente, objetivo a alteridade do outro atribuindo um conteúdo especifico à diferença que me separa dele. Assim, quer a encaremos no plano da vivencia individual ou ... da consciência coletiva, a emergência do sentimento de identidade parece passar necessariamente pela intermediação de uma alteridade a ser construída. (LANDOWSKI, 2002:4)
Se a constituição do sujeito ou mesmo comunitária está em dicotomia entre
identidade e alteridade dissociados entre si, e do qual todos dependem, o discurso
religioso torna-se vigoroso pois ao mesmo tempo que define um inimigo em comum,
“ações da carne” e estabelece regras objetivas, “ações do espirito”, cria-se uma
identidade religiosa, um modus operandi em todos aqueles/as que são subjetivados pelo
discurso religioso.
Ainda em Landowski, as dinâmicas identitárias estabelecem uma tensão sempre
instável envolvendo quatro elementos, conjunção, disjunção, admissão e segregação
(2002:52). Os quatro elementos são processos dinâmicos em que os atores sociais
definem-se mutuamente de maneira dinâmica.
Esses processos dinâmicos, são definidos, em muito pelo enunciado discursivo,
que nesse caso, é promovido pelo pastor, é através de sua retorica que se obtém a
capacidade de estabelecer qual o processo mais apropriado para cada situação. Dessa
forma, o processo de construção identitária assumido quase que plenamente pelos fieis
da IMPDVA, e mais intensamente pelas pessoas participantes do núcleo permanente e o
corpo de obreiros/as da igreja.
Podemos considerar que na dinâmica da construção da identidade, o
enunciador/pastor se faz conhecido através do enunciado de suas digressões criando um
simulacro entre emissor e receptor, a força de sua mensagem é na desqualificação de
outros segmentos religiosos enquanto exalta as qualidades imanente da igreja, criando,
dessa forma, enunciados que expressão as situações particulares dos membros da
comunidade, tornando o concreto em abstrato, podendo, dessa forma, manipula-lo ao
seu bel prazer, nesse sentido o pastor MN é um hábil sedutor capaz de geral sentido aos
fiéis, coesão social e produção de identidades religiosas.
Objetivamente o receptor não é apenas um sujeito impassível aos apelos
pastorais, mas reage aos estímulos do emissor, nesse caso, é essencial ganhar a
subjetividade dessa audiência, fato atenuado pelo programa de televisão, pois antes
mesmo da pessoa encaminhar-se para um dos templos da IMPD já identificou-se, em
147
alguma medida com a mensagem, com os testemunhos e narrativas de milagres
proferidas pelo apóstolo Valdemiro Santiago.
Por isso a retorica do pastor MN, já parte de um ambiente comum, não há uma
preocupação de explicar as minucias dos simbolismos evangélicos, nem ao menos uma
pregação convercionista, sua mensagem é cooptação desse público para fidelizar na vida
eclesial, entendendo, de ante mão, que as pessoas que entram nos templos Mundiais, já
são evangélicos, ou pelo menos possuem similaridade com a cultura dos símbolos e
ritos gospel.
Para pessoas não familiarizadas com a cultura gospel as mensagens do pastor
MN não têm o apelo necessário para a cooptação de subjetividade, mas em uma
comunidade migrante, empobrecida, com poucos recursos educacionais e em situação
de alta vulnerabilidade social, é um oásis no deserto metropolitano, a identificação de
um líder carismático, legitimado pela comunidade e manipulador do sagrado, que
entende as lutas cotidianas da comunidade, e as usa em favor de uma cosmovisão
sedutora, é fortemente aceita entre os fiéis, que veem no pastor alguém capaz de ajuda-
los na dura jornada de transitoriedade da vida migratória.
Assim como outras igrejas na contemporaneidade a IMPDVA também oferece
aos seus fiéis produtos religiosos. Esse espaço é inserido no final do culto,
concomitantemente com pedidos de ofertas e dízimos, é quase um fechamento de
círculo, os fiéis entram na igreja e adoram ao Senhor, pedem e são curados das suas
mazelas, escutam a mensagem divina, as vezes em forma de oraculo, com instruções
práticas para o cotidiano, e por último, contribuem ou pagam pelos “serviços
prestados”, pagando eles levam para casa “suvenires” que representam e simbolizam a
ação de Deus naquele dia.
Leonildo Campos ao discutir os produtos dentro do ambiente da Igreja Universal
do Reino de Deus afirma:
Essa grande linha de “produtos” liga práticas mágicas e comuns na religiosidade popular a “produtos” típicos da pós-modernidade, que enfatiza o bem-estar psicológicos e social dos indivíduos. A diferença está na habilidade da propaganda em combinar o “velho” com o “novo”, permitindo a construção de pontos de ligação da magia e religião, do pentecostalismo com as antigas formas de religiosidade cristã ou não-cristã. (1997:224-225)
O modelo da IMPD é bem parecido com o modelo iurdiano, uma vez que ambos
assimilam o pensamento mágico popular para criar produtos que atinjam a necessidade
de sua clientela/fieis. Embora na IMPD exista uma gama de produtos fetichizados para
148
os mais variados fins, na IMPDVA os produtos parecem ser mais direcionados para a
cura e bem estar pessoal.
Produtos voltados a prosperidade como a chave que representa a abertura das
portas da prosperidade ou o martelo da justiça que visa a “quebra” de qualquer
problema que o fiel esteja passando, não são ao menos mencionados na igreja, mesmo
que no programa televisivo estes objetos estejam em franca campanha.
Isso denota uma certa autonomia entre as IMPD que alinham seus produtos
conforme a necessidade da clientela naquele momento. Autonomia essa, que permite
criar produtos próprios, exemplo disso é a toalhinha com as mãos do pastor MN e
missionaria Florzinha pintadas nela, segundo o pastor, com uma oferta de cinquenta
reais as pessoas poderiam levar a toalhinha “orada” para a casa, que tem por função,
curar os fiéis, trazer paz a casa e afastar qualquer presença demoníaca.
A toalhinha com a mão do pastor e de sua esposa é para o fiel que contribui a
extensão da igreja, ou nesse caso do pastor, em sua casa, o pensamento mágico mais
uma vez se faz presente, pois a toalhinha não é mais um simples objeto, entretanto, um
talismã. Enquanto o amuleto é considerado um objeto de propriedade mágicas, o talismã
é um objeto consagrado magicamente pela pessoa que o cria. Assim o amuleto é usado
de forma geral, enquanto o talismã tem uma finalidade especifica (GONZALEZ,
WIPPLER, 2001:10)
Não é somente a toalhinha que serve como talismã, mas uma boa parcela dos
produtos comercializados pela igreja, coluna gregas pintada a mão pelos obreiros,
chaveiros com a foto do apóstolo Valdemiro, são alguns dos exemplos. A função dos
produtos religiosos está na imanência do poder pastoral frente ao desejo e necessidade
do fiel de consumir as benesses dessa ação.
Além do discurso mágico-simbólico utilizado pelo pastor na venda de produtos
religiosos, existe uma coerção para que os membros contribuam regularmente com a
igreja, segundo o pastor MN, a igreja tem arrecadado menos que deveria, e por isso,
precisa da ajuda da igreja sede, que fica em São Caetano, segundo ele a igreja sede quer
fechar as portas do templo de Vila Alpina, uma vez que o investimento não tem dado
resultado.
É interessante ressaltar que, diferentemente de sua dissenção a IMPDVA não
atribui os dízimos e ofertas ao aspecto religioso, em relação a isso eles são pragmáticos,
dízimos e ofertas é para manutenção da igreja. Nessa atitude existe uma crítica aos
modelos de outras igrejas, principalmente as IURD, quase diariamente o pastor repete
149
em suas falas: eu não negocio com dízimos e ofertas, o que gera um dissenso quando o
próprio pastor fetichiza um objeto e o sacraliza.
Quando todos terminam de ofertar ou pegar os produtos comercializados pela
igreja, o culto termina, o que dá a ideia de pagamento por um serviço prestado, ao
perguntar aos obreiros porque o momento de ofertório fica no final do culto obtive a
seguinte resposta:
O pastor diz que é no final do culto onde as pessoas já estão curadas, já receberam o alimento espiritual, elas ficam mais dispostas a contribuir para a igreja, as vezes as pessoas vêm aqui desanimadas, não querem nada com nada, depois do culto quando já está mais animada e aliviada ela nota a diferença e contribui com alegria. (Obreira 6)
O comércio na IMPDVA é muito mais que um objeto mágico-simbólico, ou
seja, o consumo dos fiéis acontece no próprio culto, a dimensão comercial, nesse caso,
não é focada em um modelo simples de escambo, mas uma prestação de serviço, aos
moldes de “pague quanto acha que vale”, as pessoas contribuem a medida em que saem
satisfeitas, emocionadas, aliviadas e curadas, quanto maior a sensação de bem estar
maior será a contribuição financeira da parte dos fiéis.
Se a mensagem cúltica surte algum resultado na membresia é a instauração de
um sentimento indenitário entre os fiéis, principalmente aqueles e aquelas que tem sua
subjetividade cooptadas pela retorica pastoral. Ele atua como um sedutor criando um
simulacro, tirando exemplos concretos enfrentado pelas pessoas, que em sua maioria
são pobres, pardos e migrantes, para áreas subjetivas podendo controla-las e sublima-
las. Dessa forma, não existe um nível único de comunicação entre o receptor e emissor,
tanto os elementos mágicos, as retoricas pastorais, as músicas e as expressões corporais
são elementos comunicacionais que visam, por meio de cooptação da identidade,
estabelecer estados de pertença eclesial.
4.2. Redes Sociais e o Corpo de Obreiros na Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina.
O termo rede social é aplicado a um padrão articulado de conexões nas relações
sociais de indivíduos, grupos e outras coletividades. (FOERSTER, 2009:69). As
relações apresentadas em uma rede social podem, e de certa forma devem, ter diversas
150
implicações e formas variadas de interdependências, seja, pessoais, econômicas,
políticas, religiosas etc. fazem parte do cimento das redes sociais.
Nas redes sociais há uma grande valorização dos elos informais e das relações,
em detrimento das estruturas hierárquicas. (MARTELETO, 2001:72), os estudos
sistemáticos das redes sociais evidenciam um dado importante sobre a organização e
divisão dos relacionamentos humanos em sociedade, assim, mesmo tendo seu
nascedouro em ambientes informais de relacionamentos, os efeitos das redes sociais são
percebidos em diversos setores sociais pelas interações entre Estado, sociedade,
empresas, instituições religiosas, entre outros.
Podemos então nos apropriar das palavras de Degenne e Forse quando
explicitam que:
A análise de redes não constitui um fim em si mesma. Ela é o meio para realizar uma análise estrutural cujo objetivo é mostrar em que a forma de rede é explicativa dos fenômenos analisados. O objetivo é demostrar que a análise de uma díade (interação entre duas pessoas) só tem sentido em relação ao conjunto das outras díades da rede. Porque a sua posição estrutural tem necessariamente um efeito sobre sua forma, seu conteúdo e sua função. Portanto, a função de uma relação depende da posição estrutural dos elos, e o mesmo ocorre com o status e o papel de um ator. Uma rede não se reduz a uma simples soma de relações, e sua forma exerce uma influência sobre cada relação. (Apud MARTELETO, 2001:72)
As interconexões entre os indivíduos são o que as mantém coesas, segundo
Junqueira: as redes sociais só se sustentam se tiverem um objetivo em comum e se estes
objetivos forem suficientemente intensos para que os atores continuem a investir
energia na trama reticular (2006). Os estudos das redes sociais focam na relação entre os
atores baseando-se no pressuposto que os relacionamentos são constitutivos da natureza
humana e, por isso, são elementos definidores de identidade dos atores sociais.
A IMPDVA é uma comunidade religiosa, portanto pode ser identificada como
uma rede social, mesmo assim seus relacionamentos interpessoais não têm força
necessária para causar coesão social. Em grande medida isso acontece pela falta de
investimento da liderança em ambientes menos formais que vão além dos cultos e
reuniões da igreja, outra razão a ser considerada é a própria cultura contemporânea que
relega a religião a puramente entretenimento, onde não há um estado de pertença ou
uma responsabilidade com a instituição denominacional.
Contudo, na pirâmide da IMPDVA existe uma rede social que vai na contramão
das experiências dos seus membros, o corpo de obreiros/as da IMPDVA relaciona-se de
151
forma orgânica, além disso, apresentam-se com objetivos em comum e sentimento de
pertença e responsabilidade frente a IMPDVA.
Seguimos estabelecendo que tipo de relacionamento interpessoal existe entre os
obreiros/as. Granovetter divide os laços sociais existentes em dois tipos, laços fortes,
onde os indivíduos despendem mais tempo, intensidade emocional e trocas simbólicas.
Ou laços fracos, onde o investimento é menor ou nulo. (1973)
As relações fracas que ampliam os limites da rede, isso porque quando os
indivíduos possuem relações fortes, é provável que haja uma superposição em suas
relações deixando a rede limitada. Por sua vez as relações fracas que ampliam os limites
da rede, conectando indivíduos e grupos que aparentemente não possuem ligação entre
si. Dessa forma, a existência de laços francos é fundamental para que a rede possa
atingir mais pessoas sem que haja perda de confiança.
Consideramos o grupo de obreiros/as da IMPDVA uma rede social de vínculos
fracos, embora muitos deles cheguem a conviver quase diariamente, a maioria não
desenvolve um relacionamento forte, isso porque o ativismo religioso dita as intenções
de cada indivíduo da rede, eles convivem e se relacionam mutuamente mais consideram
isso somente no campo religioso e não fora dele.
Quando perguntados sobre o nível de interação social e relacionamentos entre si,
os obreiros respondem:
Nós nos encontramos somente na igreja, não há uma amizade maior, mas também não dá muito tempo, “mó” correria no dia-a-dia com trabalho e família. Agente vem para a igreja e até conversa da vida, mas só isso. (Obreiro 6)
Quando eu chego na igreja converso com todo mundo, conto do meu dia, peço oração para o pastor, acho que a gente precisa se unir mais, as vezes a gente não visita os outro porque não comunicamos entre si. (Obreira 10)
Acho que poderíamos ser mais unidos, agente como liderança da igreja precisa dar o exemplo, mas a vida é muito corrida né, as vezes quando acaba o culto eu quero somente ir embora pra casa e descansar, acho que isso atrapalha um pouco o convívio (Obreiro 1)
Os laços fracos do corpo de obreiros permitem a inserção de novos obreiros pelo
pastor local, mas isso não garante uma extensão ou ampliação da rede social, em
primeiro lugar porque o comum é o obreiro/a ser escolhido pela assiduidade nos cultos e
reuniões da igreja, o que garante que ele ou ela já faziam parte do grupo permanente de
membros antes de ser vinculado aos obreiros/as da igreja. Em segundo é a disposição
152
desse novo indivíduo em apresentar novos vínculos sociais que não estão associados
ainda a igreja, sendo que a maioria dos obreiros entendem seu trabalho como vocação
pessoal e com isso garante uma baixa adesão de seus familiares e vizinhos na igreja.
Para isso elaboramos duas questões: por que eles/elas aceitaram o cargo de
obreiros/as? E quantas pessoas de sua casa frequentam a igreja?
Não é um trabalho ou cargo, ser obreiro é um chamado de Deus, como o pastor diz, não é qualquer um que pode trabalhar na obra, tem muita gente que entra e desiste logo, todos os obreiros são vocacionados para isso. (Obreiro 7)
Meus filhos não participam muito, mas eles vão em outras igrejas estão está tudo bem, Deus é o mesmo não é mesmo? Eles fazem a parte deles e eu a minha. (Obreiro 7)
Ser obreiro é vocação, não é fácil a gente tem que fazer um monte de coisa, arrumar a igreja, chegar mais cedo, é uma doação, mas vale a pena, só de estar na casa do Senhor ajudando no culto é um privilégio (Obreira 9)
Eu oro muito para que meu marido e minha filha frequentem a igreja, eles não gostam muito, principalmente meu marido que diz que eu fico mais tempo na igreja do que com ele, mas eu preciso servir a Jesus se ele está me chamando, Jesus precisa estar em primeiro lugar em nossas vidas. (Obreira 9)
Eu não sou obrigado a estar aqui, ninguém é obrigado, ser obreiro não é um cargo é serviço, igual àquela vez que Jesus lavou os pés dos discípulos, ele serviu e todos os crentes deveriam ser assim, o pastor fala que na verdade o correto é que todos deveriam ser obreiros, mas infelizmente muita gente não tem maturidade para isso. (Obreiro 5)
Só minha esposa frequenta a igreja, ela também é obreira, mas meus filhos não frequentam igreja nenhuma, eu acho que cada um deve escolher o quer para sua vida, eu espero que eles decidam seguir a mim e a mãe deles, mas... bom Jesus sabe, se não vem por amor as vezes vem pela dor. (Obreiro 5)
O ativismo religioso encontrado nos obreiros/as da igreja tem como função,
quase exclusiva o cuidado com a igreja e sua manutenção impedindo um convívio
comunitário mais intenso e uma ação proselitista mais ativa. A rede de obreiros
apresenta uma densa dinâmica de relacionamentos, mas ao mesmo tempo limitam-se ao
espaço eclesial, uma vez que seu objetivo é a priori a sustentação do espaço sacro.
Embora a rede social em destaque não estruture seus relacionamentos em
vínculos diretamente migratórios, uma grande parcela de seus indivíduos vem de
ambientes de transitividade, 47% dos obreiros/as da igreja são migrantes ou de origem
migratória. Esse elemento é essencial para a compreensão das relações interpessoais,
153
apesar do intuito da rede não ser uma ajuda mutua em relação aos indivíduos em
mobilidade espacial, 72% dos obreiros/as declararam já ter ajudado parentes e pessoas
da igreja, indicando trabalho, casas para alugar, terrenos a venda, ou algum programa
governamental como o Bolsa Família e Minha Casa Minha Vida.
Existe na vida da rede social uma relação de reciprocidade, estruturado sobre
normais sociais de confiança mutua, nessa relação as pessoas trocam informações sobre
trabalho, consumo, moradia, enfim tudo que contribua em algum modo para a melhora
ou a facilidade da vida. Dessa forma mesmo a rede social em questão tendo limites
geográficos estabelecidos e ações determinadas, as relações entre os atores, em
situações especificas, de ajuda, cuidado, proteção a rede dos obreiros/as tem a
plasticidade necessária para se reestruturar em favor dos seus pares.
A relação de reciprocidade funciona como um sistema de trocas, portanto na
reciprocidade sempre existe três momentos que seguem em um mesmo ato: dar, receber
e retribuir, nessa troca não existe nada de simplista, mas carrega a potencialidade da
sociabilidade humana, assim a solidariedade, a integração social e as obrigações mutuas,
estruturas de sociedade simples. (MAUSS, 1974:185)
Para Randomsky:
A reciprocidade pode sedimentar as relações sociais, pois vincula os sujeitos por meio de condutas (isto é, das obrigações morais e da liberdade do agir reciproco) e da carga simbólica que contém o dar e o retribuir (2007:255)
Se a noção de reciprocidade geralmente é entendida como conservação dos laços
sociais por um contíguo de sujeitos, as redes seriam a materialização das interações
empreendidas coletivamente. Dessa forma, a rede formada pelos obreiros/as da
IMPDVA nasce não de uma imposição estrutural ou hierárquica, nem ao menos de uma
vocação religiosa, mas ela é espontânea, formada por similaridades, que, aos poucos
moldam o ethos do sujeito e estabelece seu vínculo cultural, simbólico e indenitário.
A identidade atribuída a rede social acontece não pela forma de alteridade já
supracitada, usada principalmente na desqualificação do outro, mas na similaridade de
suas condições humanas, ou seja, a experiência do corpo de obreiros/as da igreja
acontece de duas formas distintas; em primeiro lugar pela retorica pastoral, que
desqualifica as experiências religiosas fora do âmbito da IMPD; em segundo pelas
similaridades sociais entre seus membros.
154
As experiências relacionais entre os obreiros/as da IMPDVA geram um
sentimento de pertença bem mais sólido do que encontrado em outros grupos da igreja,
isso porque os atores sociais partilham de solidariedades, reciprocidade e similaridades.
Essa rede social espontânea abarca múltiplas experiências culturais, mas que dentro do
âmbito simbólico-magico-religioso promovido dento da IMPDVA transforma-se
homogêneos, assim sendo, a cultura religiosa subjetivada pelos obreiros/as da igreja
resulta em construção ou reconstrução de uma identidade pessoal e comunitária,
transformando migrantes, marginalizados, segregados e excluídos em atores sociais
relevantes, ao menos para a manutenção dos espaços sacros e os relacionamentos
presentes dentro dele.
4.2.1. Capital Social
Intimamente ligado ao conceito de redes sociais o capital social indica a força do
indivíduo dentro da rede social, bem como a influência de um grupo social. Marteleto
evidencia que a literatura econômica reconhece a existência de diferentes formas de
capital, que em comum tem a possibilidade de serem acumulados. (2004:45) outra
característica do capital é a ideia que ele pode ser transacionado e valorado, fazendo
com que o mercado determine seu preço e disponibilidade.
O capital social é uma das formas de capital, mas diferentemente de outros
modelos de capital, ele não deprecia com seu uso, é um produto coletivamente
produzido resultado das interações sociais e seus benefícios não podem ser mensurados
previamente.
O capital social gera externalidades, mas sua análise deve transcender esse ponto, isto é, o capital social entendido como um conjunto de redes e normas, permitindo a redução dos riscos decorrentes das relações entre desconhecidos, e consequentemente, dos custos das transações. (Ibidem:45)
Em decorrência disso a mensuração do capital social é problemática, embora
possa ser associada ao desenvolvimento ela não é evidente, principalmente do ponto de
vista das pesquisas econômicas, isso porque a sua não alienação nas redes sociais
configura muitas vezes em um adensamento da rede, ou seja, conceitos como confiança,
comunidade, bem estar, reciprocidade, são difíceis de serem calculadas, quantificadas e
qualificadas.
155
Pois há um acordo entre os estudiosos do tema, segundo o qual não basta identificar o número de componentes das redes (ligações e nós), mas sim apreender a sua importância para a comunidade. Trata-se de um desafio para os pesquisadores e, principalmente, para aqueles interessados em usar o capital social para promover o desenvolvimento. (Ibidem)
Uma das maiores dificuldades apresentadas quando analisamos o capital social é
que o verdadeiro detentor do capital não é um indivíduo em si, mas a comunidade ao
seu redor. Dessa maneira, é a comunidade que exerce a autonomia para tomar decisões
e, por isso, precisa ser tratada como um bloco heterogêneo, o que nem sempre acontece
na prática.
Além da dificuldade em mensurar o capital social, armadilhas como atribuir ao
capital social a matéria de extirpador dos males excludentes e segregados, precisa ser
considerado, uma vez que a própria rede social em algum grau exclui determinados
indivíduos ou grupos, portanto cabe aqui destacar que nem toda a forma de capital
social é positiva, podendo ocorrer situações desestimuladoras e restritivas quanto a
liberdade pessoal.
Para Bourdieu a reprodução da desigualdade inerente ao capital social é uma
resultante das inter-relações dos atores sociais.
O conjunto de recursos atuais ou potenciais que estão ligados à posse de uma rede durável de relações mais ou menos institucionalizadas de interconhecimento e inter-reconhecimento, ou em outros termos, à vinculação a um grupo, como conjunto de agentes que não somente são dotados de propriedades comuns (...) mas também, são unidos por ligações permanentes e uteis. (NOGUEIRA, CATANI, 2008:67)
O capital social é atribuição das ligações permanentes e úteis entre os agentes de
um campo, dessa forma o volume do capital social atribuído a um indivíduo ou rede
depende da extensão das relações que o grupo ou o ator pode mobilizar, existe, portanto
dois elementos em questão, a própria relação social que dá aos indivíduos acesso a
recursos na posse dos membros do grupo, e a quantidade e qualidade desses recursos.
Ao analisarmos o capital social presente na rede social dos obreiros/as da
IMPDVA notamos que, por si só, não existe uma chance de mobilização de recursos.
Em grande medida esse aspecto se dá pelo objetivo da rede, que é exclusivamente
voltada as ações eclesiais. Nem mesmo em aspectos simbólicos o grupo de obreiros/as
não possuem os louros das ações diante da comunidade, neste caso todo capital
156
simbólico da IMPDVA tende a ficar restrito ao ambiente pastoral, e esse, por sua vez,
abarca para si qualquer tentativa de divisão do capital simbólico.
Podemos notar também que existe uma barreira a ser transposta pelos novos
obreiros que querem entrar na rede social, embora o grupo não arbitre sobre as escolhas
de novos obreiros e obreiras, o grupo decide com quem compartilhar ou não diversas
informações, por isso é comum reclamações de “panelinhas” na igreja ou a desistência
de pessoas que não se adequam as especificações do grupo, mesmo que ela tenha sido
escolhida pelo pastor.
Os conflitos existentes nos obreiros/as da igreja limam a rede de ampliar suas
conexões relacionais, dessa forma a rede social limita seu capital em um número restrito
de indivíduos cujo a relação é permanente e útil. Existe na rede de obreiros/as um certo
protecionismo limitando, além do alcance da rede um maior acumulo de capital social.
Por esses aspectos encontrados nas visitas em campo, podemos identificar que o
desenvolvimento da rede e seus atores é comprometido, pois inviabiliza novos
relacionamentos, e com isso, a rede fica escassa de novas frentes de capital social.
O desenvolvimento, dessa forma, não pode ser medido no acumulo desse capital
social, mas no acesso as oportunidades exercidas pelos obreiros. Nesse sentido ao serem
perguntados se conseguiram algum benefício ao entrarem para o corpo de obreiros/as da
igreja 52% responderam que conseguiram informação para empregos, 36% declararam
que conseguiram casas para alugar, 38% indicações de escola para os filhos.
A rede social exercida pelos obreiros/as da IMPDVA não acumula um capital
social amplo, nem existe uma gama variada de atores sociais que conectam outras redes
a ela, contudo o desenvolvimento da rede pode ser percebido, mesmo com o baixo
capital social presente, através de trocas de informações pertinentes a realidade dos
obreiros/as igreja, o que diante da realidade da maioria dos membros da IMPDVA pode
ser considerado um avanço significativo.
4.3. Considerações.
O capítulo explanou sobre a dinâmica encontrada nos cultos da IMPVA, nesse
sentido a pesquisa encontrou uma igreja multifacetada, no qual possui muitas formas de
comunicação, entre elas, e talvez a principal, os discursos simbólicos adotados pelo
157
pastor, que gera coesão social e identificação com sua figura, mas tende a tornar-se
extremamente personalista, uma vez que se coloca como figura central dos sistemas
simbólicos, identitárias e relacionais exercidos pela igreja.
O segundo ponto abordado no capítulo é não intencionalidade da rede social, embora
não exista uma rede social que perpassa por todos os indivíduos da igreja, ao menos,
podemos considerar a existência de uma rede social funcional entre o corpo de
obreiros/as, obviamente, por ser restritiva na quantidade de pessoas e no local onde ela é
exercida a rede configura-se de muitas limitações, mas ainda assim, a ajuda mútua
empregada pelos participantes dessa rede é beneficiada com trocas de informações
importantes entre eles, onde já representou resultados entre seus membros,
principalmente em relação a oportunidades de emprego e escolas para os filhos.
Dessa maneira, em seguida apresentaremos as considerações finais, entendo que
as relações entre religião, migração e periferia urbana, ao menos na IMPDVA acontece
em momentos distintos, o primeiro momento, mais contundente, é na obtenção de
capital simbólico proporcionado pelo pastor MN, onde procura criar nos adeptos da
igreja, sentimentos de pertença, adoção dos sistemas de valores preconizados pela
IMPD e a cosmovisão da igreja, afim de garantir uma reconfiguração identitária do fiel
migrante, que garanta ao pastor, a fidelização dele nas atividades da igreja, bem como
nos dízimos e ofertas.
O segundo momento, bem mais restritivo do que o primeiro acontece na rede
social de ajuda mútua empregada pelos obreiros/as da igreja, para os agentes que já se
fidelizaram com a igreja e associaram-se a ela, é possível ser ajudado pelas pessoas
desse grupo, que embora seja limitada em conteúdo, garante um mínimo de informação
que auxiliam pessoas em vulnerabilidade social, como é o caso dos fiéis da IMPD.
158
Considerações finais
O foco nessa parte do estudo é relacionar as análises feitas ao longo da pesquisa
aos objetivos propostos no projeto. A urbanização, em especial a paulista, acorreu de
maneira mais intensa a partir de 1940, transformou plenamente as relações entre rural e
urbano, assim com o crescimento do técnico/industrial, as fabricas ganham subsídios
governamentais dispares em relação aos encontrados em outros setores sociais.
A “corrida pelo ouro” urbano e a escassez de investimentos em setores rurais,
motivaram o êxodo rural e fluxos migratórios nas regiões industriais do país, que
localizavam-se no sudeste, em especial São Paulo e Rio de Janeiro. O rápido
crescimento urbano, os grandes fluxos migratórios e a falta de um planejamento público
159
adequado geraram espaços de segregação, principalmente em famílias migrantes,
tornando-os marginalizados.
Os reflexos da relação urbanização e migração podem ser medidos até nos dias
atuais. O distrito de Vila Prudente é uma das muitas expressões dessa dinâmica. Como
vimos na pesquisa esse distrito é fruto da compra dos irmãos Falchi, que constituíram
uma fábrica e lotearam seu terreno para seus operários. Assim Vila Prudente foi
construída, urbanizada e dívida. Ao longo dos anos sua história foi aglutinando fluxos
migratórios, assim, o distrito constitui-se de elementos ambíguos, se a verticalização
estabeleceu investimentos na região, por outro lado em alguns pontos transformou-se
em verdadeiros guetos, excluídos das vantagens advindas do metrô, monotrilho,
terminal de ônibus, participantes dos aumento do custo de vida na região, os migrantes
se viram forçados a mudarem para bairros mais periféricos, onde o custo de vida era
menor, mas em compensação sem os atrativos do bairro anterior.
O distrito de Vila Prudente é um pequeno holograma da realidade paulista,
assim, estudando uma parte, podemos compreender melhor o todo, a periferia não está
apenas relacionada a lugares distantes da metrópole, mas em espaços onde acontecem
exclusão e segregação da população. Nesse aspecto o distrito de Vila Prudente demostra
a existência de grandes guetos periféricos, espaços dicotômicos marcados pela
modernização e verticalização de prédios públicos e residências, mas que também
convivem com ruas sem asfalto, esgoto, iluminação pública e mecanismos básicos para
a vida na metrópole.
Podemos considerar que as interações da Igreja Mundial do Poder de Deus entre
pessoas inseridas em contextos periféricos, pode variar bastante, isso porque, a
IMPDVA não é uma extensão direta dos cultos da sua sede, não há uma preocupação de
transformar a igreja em franchising, obviamente alguns elementos precisam ser iguais,
para criar a identificação da igreja com aos cultos do apóstolo Valdemiro Santiago,
entretanto o pastor local possui autonomia o suficiente para adequar a mensagem, os
bens religiosos e os cultos a realidade em que a igreja está inserida.
Embora a mensagem religiosa e os produtos simbólicos-fetichistas sejam
inseridos no contexto dos adeptos da igreja, ainda assim, não existe qualquer
preocupação em oferecer ao fiel projetos e atividades que possa auxilia-lo na obtenção
de uma melhor condição de vida, não há encaminhamentos para cursos especializantes,
indicações de estudos, nada que contribua para a diminuição dos índices de
vulnerabilidade social. A relevância encontrada na interação entre IMDPVA e os
160
migrantes, acontece somente no âmbito do discurso religioso, ela não se concretiza em
ações assistenciais ou apoio institucional para que haja uma diminuição e amenização
de condições precária, segregadoras e excludentes de seus sequazes.
A formação da identidade religiosa na igreja se concretiza somente em parte, em
um campo religioso marcado pela transitividade plurirreligiosa, a dimensão do discurso
não é suficiente para cooptar a subjetividade dos indivíduos que perpassam a igreja,
exatamente por isso, a IMPDVA enfrenta problemas de grande rotatividade em seus
cultos, não há atividades que incluam ou estimulem novos fieis a relacionamentos
comunitários garantindo um sentimento de pertença aos mesmos.
Os fieis encontrados ali são, em sua maioria, já participantes de uma cultura
gospel multifacetada, a experiência religiosa deles não garante um apelo comunitário ou
adesão ao sistema de valores da igreja, mas a busca pelas benesses prometidas pelo
apóstolo Valdemiro Santiago nos programas televisivos. Considero que o alto nível de
transito religioso encontrado na IMPDVA carece um estudo mais aprofundado, que
focalize essa perspectiva entre os membros da igreja.
Se as homilias inflamadas não são um ponto de conversão entre os participantes
dos cultos da Igreja Mundial, a identificação com o pastor local e o próprio apóstolo
Valdemiro Santiago se faz presente, os “causos” contados pelo pastor sobre como
chegou em São Paulo, torna sua figura simpática as pessoas migrantes da região. Não é
à toa que, a igreja possui um índice alto de homens e mulheres em mobilidade espacial.
Ou seja, muito mais do que mero discurso e ações assistencialistas a relevância da igreja
não está explicitamente nos cultos, mas na centralização da figura pastoral como
integrante e consciente das dificuldades dos deslocamentos humanos, assim, nos parece
que o cuidado que o pastor tem com sua imagem, aliado ao discursos de conquista e
prosperidade e o capital simbólico empregado pelo pastor, abstrai a realidade concreta
da experiência migratória para o campo metafisico, nesse sentido o pastor funcionaria
como elo entre aquele que domina as forças caóticas da urbanidade, o campeão dos
povos migrantes, um Moises, que abre os mares citadinos para que seu povo passe
tranquilamente pelos oceanos urbanos, um divisor de aguas entre o passado idealizado,
o presente sofrido e um futuro incerto.
Entretanto, mesmo com o protagonismo pastoral, a rede social que se constrói
não apresenta interferência eclesial. Ao contrário, sem a existência de espaços de
convivência, sem o conceito de igreja como comunidade de fé e sem nenhum apoio
pastoral ou institucional para que haja qualquer tipo de interação entre os fiéis, a rede
161
social abarcada na IMPDVA formula-se de maneira gradual e espontânea, nos espaços
que lhe é propicio ao seu crescimento.
A rede de ajuda mútua acontece de maneira limitada, entre o corpo de
obreiros/as da igreja, e ela somente é possível pelo associativismo religioso praticado
entre eles, assim como o tempo de dedicação a igreja é alto, o convívio passa a ser
elevado, dessa forma as relações entre o grupo de obreiros, são maiores e mais intensos
que o grupo de membros ativos e os indivíduos em rotatividade religiosa. Nesse formato
as redes sociais dentro da IMPDVA, são de exclusividade do corpo de obreiros/as, são
eles que usufruem da rede de contatos e das estruturas de oportunidades, e
consequentemente, são eles que detém maior acumulo de capital social.
Mesmo os obreiros/as da IMPDVA beneficiando-se das estruturas de
oportunidades, a exclusividade da rede social torna-se um obstáculo, pois, ao mesmo
tempo que fortalece os laços sociais, limita-os a somente algumas fontes de informação,
contato, conhecimento etc. Ainda que haja limites visíveis a rede social dos obreiros/as,
eles mantem-se em vantagem contra aqueles e aquelas que não usufruem das mesmas
estruturas de oportunidades, dos relacionamentos interpessoais, do sentimento de
pertença e das dinâmicas provenientes deles.
A pesquisa aponta que a vinculação do migrante em instituições religiosas
garante, ao menos em parte, uma (re)configuração de sua estrutura natal, desse modo, o
associativismo religioso e as redes sociais provenientes dela, exercem papel
fundamental, se na urbanização a metrópole ganha contornos impessoais, excludentes e
massacrantes, a dimensão religiosa avaliza a permanência do crer, o sentimento de
pertença e a construção de uma identidade coesa criando lações fraternais entre os
membros da rede social.
A idiossincrasia da IMPDVA frente a essa realidade torna-se visível quando
analisamos o comportamento dos obreiros da igreja local, se por um lado a igreja
consegue gerar uma identificação pelo carisma pastoral, por outro somente aqueles que
realmente se envolvem com os trabalhos da igreja, podem gozar dos benefícios dela. O
sentimento de pertença do migrante, bem como a reformulação de sua identidade
acontece em dois níveis, o primeiro por intermédio pastoral, o segundo, muito mais
denso e restrito, através do relacionamento e inserção no grupo de obreiros/as da igreja.
A dinâmica entre as relações da IMPDVA com pessoas em contexto periférico e
mobilidade humana denota que, em sua maioria, os frequentadores obtêm recursos
simbólicos-mágicos para sustentar-se ante as vicissitudes da urbanidade, porém, elas
162
ocorrem somente no âmbito discursivo-narrativo. Apesar de não estar claramente
perceptível, essa relação poderia ser melhor explorada, se existisse um aporte nos
relacionamentos interpessoais e um anseio de articulação enquanto comunidade de fé.
Na IMPDVA, os relacionamentos que garantem estruturas de oportunidades, laços
sociais sólidos e redes sociais agregativas ainda é experiência para um grupo seleto.
Ainda referente a pesquisa há alguns elementos que não puderam ser
aprofundados, mas que ao certo podem ser alvos de estudos e pesquisas em futuras
oportunidades. Tem-nos chamado atenção em que medida o transito religioso prejudica
as ações da IMPD, visto que na igreja local, esse fenômeno é motivo de tensão entre o
corpo pastoral, os obreiros e os membros. Embora exista uma gama de estudos nessa
área, considero ser interessante uma pesquisa mais aprofundada. Uma hipótese plausível
é que a Igreja Mundial do Poder e Deus tem sido beneficiada pelo processo de transito
religioso. Talvez, o incomodo gerado pelo fenômeno do transito na igreja local seja um
indicio que a IMPD tenha caminhado a passos largos para uma institucionalização e
burocratização de suas estruturas, ou mesmo, tenha perdido a força e sentido um
arrefecimento de sua expansão eclesial.
Outro elemento encontrado na pesquisa, que certamente merece ser estudo é o
número significativo de igrejas migrantes, como: Assembleia de Deus Russa, Igreja São
José de Vila Zelina, da comunidade Lituânia, Igreja Batista Russa, Igreja Ortodoxa
Russa, encontradas no distrito, um estudo que viabilize uma compressão maior de quem
são, levante sua etnografia e relacione os fluxos migratórios do bairro com as histórias
das igrejas com certeza traria boas contribuições acadêmicas.
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177
O Apóstolo Milionário. Domingo Espetacular. São Paulo: Rede Record. 18/03/2012. Programa Televisivo. Documentário
REGINA, Silvia. Apóstolo Valdemiro Santiago – De menino pobre a apóstolo de Deus. [Documentário]. Produção: Igreja Mundial do Poder de Deus. São Paulo. 2011, DVD/NTSC, 2hs40. Color. Son.
Anexos
Roteiro Para observação dos cultos Musica Silenciosa Abertura Oração Música 1 Música 2 Música 3 Oração/Intercessão/Exorcismo Testemunhos Mensagem Pastoral Oração Dízimos/Ofertas Oração Musica Final Despedida Número de pessoas presentes Número de pessoas por gênero Número de Pessoa por faixa etária Vestimenta do pastor e membros Número de obreiros Posturas corporais Ocupação do espaço físico Houve curas e milagres? Referências ao bairro de Vila Alpina Referências aos migrantes
Roteiro da Entrevista.
178
1. A respeito do(a) entrevistado (a)
a. Quanto tempo está na IMPD?
b. Como conheceu a igreja?
c. Quantas pessoas da sua família participam da igreja?
d. Se converteu em São Paulo?
e. Frequência da participação?
f. Função na igreja?
g. Como é seu relacionamento com o Pastor?
h. O que pensa sobre ele?
i. A quanto tempo é obreiro(a)?
j. Por que aceitou ser obreiro(a)
k. Como se relaciona com outros obreiros?
l. Visitas outras igrejas?
m. Quais e quantas vezes?
n. A igreja já te benefício em alguma coisa?
o. Em que?
p. Qual é o seu nível de satisfação com a igreja e o pastor?
q. Porque?
r. Além da igreja possui outra atividade?
s. Quais?
2. Dados sobre o entrevistado.
Idade Estado civil Quantas pessoas moram na casa Quantos cômodos tem em casa Quantos filhos e seus gêneros Posição na Família Escolaridade Profissão Renda Familiar em salário mínimo Migrante? Se for, de onde? Quando migrou Se não, filho (a) de Migrante? Religião dos familiares?
Questionário aplicado na igreja.
179
Perfil Socioeconômico e Religioso da Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina
Perfil Sociológico
1. Dados pessoais
a. Sexo do/a respondente
Masculino ()
Feminino ()
b. Estado Civil
Casado/a ()
Solteiro ()
Divorciado ()
Amigado ()
c. Faixa etária
18- 20 anos 21- 30 anos 31- 40 anos 41- 50 anos 51 – 60 anos + de 60 anos
d. Você se considera?
Branco Preto Pardo Indígena Outros
e. Qual o local de seu nascimento? Município e Estado
__________________________________________________________
f. Qual o local de nascimento de seus pais? Município e Estado
Pai________________________________________________________
Mae_______________________________________________________
180
Cônjuge____________________________________________________
g. Profissão: __________________________________________________
Profissão do cônjuge _________________________________________
h. Renda familiar:
Menos de 1 salário mínimo De 1 a 3 salários mínimos De 4 a 6 salários mínimos De 7 a 9 salários mínimos De 10 a mais salários mínimos
i. Você mora em:
Casa Própria ()
Casa Alugada ()
De favor ()
j. Quantos cômodos?
De 1 a 2 De 3 a 4 De 5 a 6 De 7 a 8 Mais de 9
k. Quanto tempo você mora lá? ___________________________________
l. Em que bairro? ______________________________________________
m. Quantas pessoas residem com você? _____________________________
n. Escolaridade:
1° grau incompleto ()
1° grau completo ()
2° grau incompleto ()
2° grau completo ()
181
Superior incompleto ()
Superior completo ()
Pós-graduado ()
No caso de superior ou pós-graduação: Qual curso?
__________________________________________________________
o. Escolaridade do pai:
1° grau incompleto ()
1° grau completo ()
2° grau incompleto ()
2° grau completo ()
Superior incompleto ()
Superior completo ()
Pós-graduado ()
No caso de superior ou pós-graduação: Qual curso?
__________________________________________________________
p. Escolaridade da mãe:
1° grau incompleto ()
1° grau completo ()
2° grau incompleto ()
2° grau completo ()
Superior incompleto ()
Superior completo ()
Pós-graduado ()
No caso de superior ou pós-graduação: Qual curso?
__________________________________________________________
q. Escolaridade do cônjuge:
1° grau incompleto ()
1° grau completo ()
1° grau completo ()
2° grau incompleto ()
2° grau completo ()
182
Superior incompleto ()
Superior completo ()
Pós-graduado ()
No caso de superior ou pós-graduação: Qual curso?
__________________________________________________________
2. Perfil Religioso
a. Porque frequenta a Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina?
__________________________________________________________
__________________________________________________________
__________________________________________________________
__________________________________________________________
b. A quanto tempo frequenta a igreja?
De 0 a 3 anos De 4 a 6 anos De 7 a 9 anos Mais de 10 anos
c. Com que frequência vai a Igreja Mundial?
Todos os dias 4 a 5 vezes na semana 3 vezes na semana 2 vezes na semana 1 vez na semana 2 vezes por mês 1 vez por mês Esporadicamente
d. Quantos pessoas de sua casa frequentam a igreja?
_____________________________________________________________
_____________________________________________________________
e. Em quais atividades costuma participar na igreja?
Culto Grupo de oração Escola dominical
183
Festas/ eventos Atividades assistenciais Atividades culturais (teatro, música) Evangelismo
Outros_____________________________________________________
f. Já frequentou outra igreja ou religião?
Sim () Não ()
Quais?
__________________________________________________________
_________________________________________________________
g. Porque mudou para a Igreja Mundial do Poder de Deus em Vila Alpina?
__________________________________________________________
__________________________________________________________
__________________________________________________________
h. Quais atividades (fora da igreja) costuma participar?
Partido político Assoc. cultural/ esportiva Sindicato/assoc. de classe Grupos de 3° idade Associação de bairro Trabalho voluntario/
assistencial
Assoc. amigos/ comunitária Conselhos de saúde, educ.etc. Associação profissional Org. não governamental Assoc. de luta/moradia Outro (especificar) Assoc. acadêmica Não participa
Outros: ___________________________________________________
i. Há quanto tempo participa dessas atividades?
De 0 a 3 anos De 4 a 6 anos De 7 a 9 anos De 10 a 12 anos 13 a 15 anos Mais de 15 anos
j. Ocupa algum cargo?
184
Sim () Não ()
Qual?
______________________________________________________
k. Qual a importância a Igreja Mundial do Poder de Deus tem em sua vida?
É o mais importante ()
É muito importante ()
É importante ()
É importante mais não muito ()
l. Qual o benefício que a Igreja Mundial do Poder de Deus lhe traz?
Muito Regular Pouco Nada Realização espiritual Conhecimento sobre a Bíblia Harmonia/ equilíbrio pessoal Valores morais e éticos Vivencia em comunidade/ fazer amigos
Relacionamento com pessoas de outras comunidades/ espaços sociais
Auxilio em problemas familiares/conjugal
Auxilio em questões profissionais Auxilio em questões materiais Poder ajudar outras pessoas Outros (especifique)
Outros: ____________________________________________________
Local e data da realização das entrevistas e aplicação dos relatórios. Todas as entrevistas e aplicação de questionários foram na Igreja Mundial do
Poder de Deus em Vila Alpina, Rua Costas Barros, n°63, Vila Alpina.
Entrevistado Dia Horário Obreiro 1 15/04/2013 18hs30
185
Obreira 2 22/05/2013 21hs00 Obreira 3 31/05/2013 17hs20 Obreiro 4 04/06/2013 21hs30 Obreira5 22/06/2013 11hs30 Obreiro 6 08/08/2013 15hs45 Obreira 7 19/08/2013 18hs30 Obreira 8 21/08/2013 18hs30 Obreiro 9 11/10/2013 18hs30 Obreiro 10 23/10/2013 21hs20 Obreira 11 22/11/2013 11hs20 Obreira 12 08/12/2013 11hs30
Aplicação do Questionário Dia Culto 21/08/2013 Culto Matutino 16/10/2013 Culto Noturno 23/10/2013 Culto Vespertino 09/11/2013 Culto sabático 15/12/2013 Culto Dominical
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