UNIVERSIDADE VALE DO RIO DOCE - UNIVALE
FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS – FHS CURSO DE PSICOLOGIA
Andréia Ribeiro Alves Josiani de Oliveira
Mirélli Oliveira Torrezani Salessa Sathler Garcia dos Santos
TRANSTORNO DE PERSONALIDADE ANTI-SOCIAL
Governador Valadares 2009
ANDRÉIA RIBEIRO ALVES JOSIANI DE OLIVEIRA
MIRÉLLI OLIVEIRA TORREZANI SALESSA SATHLER GARCIA DOS SANTOS
TRANSTORNO DE PERSONALIDADE ANTI-SOCIAL Monografia para obtenção do grau de Bacharel em Psicologia, apresentada à Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Vale do Rio Doce.
Orientador: Roberto Jório Filho
Governador Valadares 2009
ANDRÉIA RIBEIRO ALVES JOSIANI DE OLIVEIRA
MIRÉLLI OLIVEIRA TORREZANI SALESSA SATHLER GARCIA DOS SANTOS
TRANSTORNO DE PERSONALIDADE ANTI-SOCIAL
Monografia apresentada em ____________________________________ tendo sido considerada _________________________________.
Professor Omar de Azevedo Ferreira
Professora Adelice Jaqueline Bicalho
Professor Roberto Jório Filho (orientador)
Dedicamos este trabalho monográfico aos nossos pais e ao nosso amigo, professor e orientador Roberto Jório Filho pela paciência, amizade e compreensão. A vocês a nossa eterna gratidão por participarem da realização deste sonho.
AGRADECIMENTOS Esta conquista não é resultado somente dos últimos cinco anos de
nossas vidas acadêmicas, mas do imprescindível esforço de nossos
pais, por toda uma vida, que com perseverança, coragem e fé,
conduziram nossa educação. Por isso agradecemos a Deus pelas suas
vidas e pela enorme felicidade de podermos concluir essa etapa.
Nosso carinho aos nossos irmãos, que contribuíram de forma efetiva
para essa vitória. Obrigado por estarem ao nosso lado em todos os
momentos!
A felicidade aparece para aqueles que choram para aqueles que se
machucam, para aqueles que buscam, para aqueles que tentam
sempre e para aqueles que reconhecem a importância das pessoas
que passaram por suas vidas. Neste percurso encontramos força e fé
bastantes para fazer das adversidades momentos doces, dificuldades
para tornar-nos mais forte, tristezas para fazer-nos mais humanos,
perseverança e resignação para seguir em frente e esperança
suficiente para realizar um sonho.
Agradecemos aos Mestres por compartilharem seus conhecimentos,
pela dedicação, persistência e paciência no exercício da arte de
educar, em especial ao professor Roberto Jório.
RESUMO
O presente trabalho tem como propósito apresentar as características básicas dos diversos transtornos específicos da personalidade, centrando no transtorno de personalidade anti-social; esclarecendo as possíveis causas biopsicossociais que podem favorecer o aparecimento do transtorno. Uma personalidade pode ser definida como a soma total da interação e reação do indivíduo em relação aos demais é também uma organização interna e dinâmica de todo o sistema psicológico que cria os padrões de comportamento, possuindo em sua estrutura certa flexibilidade, onde o sujeito transita entre a flexibilidade e a rigidez para interagir com certas experiências adquiridas. Os transtornos de personalidade se caracterizam quando o indivíduo possui certa rigidez da personalidade estando inflexivelmente em um dos extremos de comportamento, transtorno de personalidade é um padrão persistente e relativamente estável ao longo do tempo, no modo de pensar, sentir e se comportar. Nos últimos anos, tem havido um interesse crescente a respeito de uma melhor compreensão sobre o transtorno de personalidade anti-social. O aumento da criminalidade e violência urbana pode ter contribuído para esse maior interesse. O comportamento anti-social ao extremo é classificado como Transtorno da Personalidade Anti-Social (conhecido também como psicopatia, sociopatia ou transtorno da personalidade dissocial), é caracterizado como um padrão invasivo de desrespeito e violação dos direitos dos outros, que inicia na infância ou começo da adolescência e continua na idade adulta. Para receber este diagnóstico, o indivíduo deve ter pelo menos 18 anos e/ou ter tido uma história de alguns sintomas de Transtorno da Conduta na infância. As pessoas com este transtorno desrespeitam os desejos, direitos ou sentimentos alheios. Freqüentemente enganam ou manipulam os outros, a fim de obter vantagens pessoais. Podem mentir repetidamente, usar nomes falsos, ludibriar ou fingir. Será utilizada uma pesquisa qualitativa com levantamento bibliográfico e análise de provas documentais, visto que são inúmeros fatores que influenciam tal comportamento. O tratamento recomendado para o Transtorno de Personalidade Anti-social é a terapia Cognitivo Comportamental e de grupo, pois promove a reestruturação do modo desses indivíduos processarem as informações do meio em que está inserido. Palavras-chave: Personalidade. Transtorno. Anti-social.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.....................................................................................................................7 1 CONCEITO DE PERSONALIDADE............................................................................10 2 TRANSTORNOS DE PERSONALIDADE ..................................................................16 3 TRANSTORNO DE PERSONALIDADE ANTI-SOCIAL..........................................24 4 SUGESTÕES TERAPÊUTICAS E ANÁLISE DE CASOS........................................29 CONCLUSÃO.....................................................................................................................36 REFERÊNCIAS .................................................................................................................38
INTRODUÇÃO
O termo personalidade deriva do latim persona, com significado de máscara, assim, pode-
se definir também personalidade por um conceito dinâmico que descreve o crescimento e o
desenvolvimento de todo sistema psicológico de um indivíduo. Personalidade pode também
ser definida como sendo a totalidade dos traços emocionais e de comportamento de um
indivíduo, ou seja, seu caráter. Logo, poderia ser a maneira de ser e agir de cada um, ou
seja, sua conduta.
Um transtorno de personalidade aparece quando esses traços são muito inflexíveis e mal
ajustados, ou seja, prejudicam a adaptação do indivíduo às situações que enfrentam,
causando a ele próprio, ou mais comumente aos que lhe estão próximos, sofrimento e
incômodo. Geralmente esses indivíduos são pouco motivados para tratamento, uma vez que
os traços de caráter pouco geram sofrimento para si mesmo, mas perturbam suas relações
com outras pessoas, fazendo com que amigos e familiares aconselhem o tratamento.
Todavia, esses transtornos, aparecem no início da idade adulta, mas ocorrem indícios dos
mesmos na infância e na adolescência e são crônicas, permanecendo por toda a vida do
indivíduo se estes não forem tratados.
Para Trindade (2009) et al, o indivíduo com Transtorno de Personalidade Anti-social revela
uma insuficiência permanente de caráter. A sua inadaptação social é acompanhada de
ausência de sentimento ético e morais e pode impulsioná-lo para atividades delituosas
manifestas através de crimes cruéis. Com habilidade, o indivíduo com Transtorno de
Personalidade Anti-social costuma recorrer a mentiras sistemáticas para alcançar o que
deseja sem vivenciar sentimento de arrependimento e culpa. (p.18).
Trata-se de um tema relevante, pois atualmente vivenciamos uma onda de violência que
ocorrem em todos os contextos: nas escolas, nas empresas, no meio familiar e social,
estando presente em todos os poderes econômicos, sendo a violência e a criminalidade
discutida em todos os seguimentos da sociedade. Uma pequena contribuição para facilitar a
compreensão, pelo menos em menor escala, da mente desses sujeitos poderia auxiliar e
8
alertar a população no sentido de agir com cautela diante de qualquer fato criminoso,
realizado por indivíduos com transtorno de personalidade anti-social.
A metodologia utilizada na realização deste trabalho é a revisão bibliográfica qualitativa e
análise de provas documentais, o que consiste na seleção, leitura e sistematização de todo o
material de pesquisa em pauta. Com isso pretende-se caracterizar o Transtorno de
Personalidade Anti-social também denominado de (transtorno) amoral, dissocial, associal,
psicopática e/ou sociopática (segundo a descrição da CID-10). Procura explicar o
comportamento de indivíduos com transtorno de personalidade anti-social, a partir de
referencias teóricas publicadas em documentos, busca também perceber e compreender a
natureza geral do tema, abrindo espaço para interpretações.
Os objetivos deste trabalho, além de conhecer os aspectos psicossociais que influenciam no
comportamento de indivíduos com Transtorno de Personalidade Anti-social; é apresentar as
características básicas dos diversos transtornos específicos da personalidade, centrando no
transtorno de personalidade anti-social; esclarecendo as possíveis causas biopsicossociais
que podem influenciar, ou seja, favorecer o desenvolvimento do Transtorno de
Personalidade Anti-social e como esse indivíduo se comporta perante a sociedade.
Mesmo com a improbabilidade de mudanças no transtorno de personalidade anti-social, o
terapeuta tem como função orientar os familiares (que terão que conviver com o portador
deste transtorno) de como minimizar o efeito destrutivo desta patologia. É de grande
importância que os pais não neguem os problemas de conduta que um filho começa a
apresentar, é necessário que coloquem limites e procurem ajuda para lhe dar com possíveis
problemas, pois a intervenção precoce aumenta a probabilidade de reduzir o problema antes
que ele seja instalado.
Para melhor entendimento este trabalho de conclusão de curso foi desenvolvido em três
capítulos.
9
No primeiro capítulo conceituaremos a personalidade, utilizando as três abordagens:
psicanálise, comportamental e a humanista (centrada na pessoa), para melhor entendermos
o que é e no que consiste a personalidade humana.
No segundo capítulo vamos fazer um breve levantamento dos Transtornos de Personalidade
Paranóide, Esquizóide, Esquizotípica, Borderline, Narcisista, Histriônica, Obsessivo-
compulsiva, Esquiva, Dependente e a Anti-social conforme o DSM IV (Manual diagnóstico
e estatístico de transtornos mentais) e a CID 10 (Classificação Internacional dos
Transtornos Mentais e de Comportamento) com suas principais características. As causas
desses transtornos, na maioria das vezes, são múltiplas, mas relacionadas com as vivencias
infantis e as da adolescência do indivíduo, ou seja, a influência dos fatores biopsicossociais.
No terceiro abordaremos o Transtorno de Personalidade Anti-social, o qual explanaremos
de forma mais abrangente, conceituando detalhadamente este transtorno.
No quarto e último capítulo explanaremos possíveis tratamentos de Transtorno de
Personalidade Anti-social usando alguns casos como exemplo.
10
1 CONCEITO DE PERSONALIDADE
O termo personalidade deriva do latim persona, com significado de máscara, assim pode-se
definir também personalidade por um conceito dinâmico que descreve o crescimento e o
desenvolvimento de todo sistema psicológico de um indivíduo. Outra definição poderia ser
a organização dinâmica interna dos sistemas psicológicos do indivíduo que determina o seu
ajuste individual ao ambiente. Mais claramente, pode-se dizer que é a soma total de como o
indivíduo interage e reage em relação aos demais. Personalidade é então uma organização
interna e dinâmica dos sistemas psicofísicos que criam os padrões de comportamento, de
pensar e de sentir característicos de uma pessoa. É fruto de uma organização progressiva do
ser humano e não apenas entendida como um fenômeno em si, ela evolui de acordo com a
organização interna do indivíduo.
A busca por explicações sobre a personalidade tem mobilizado diversas áreas do
conhecimento humano, e a tendência em classificar pessoas é tão antiga quanto a
humanidade. Segundo Ballone (2008), na Grécia, Hipócrates (460-377 a.C.), considerado o pai
da medicina, classificava a personalidade em quatro tipos (sangue, fleuma, bile branca e bile
negra), de acordo com a presença de determinadas substâncias no organismo, segundo a qual, a
predominância de qualquer um desses quatro humores caracterizaria o temperamento das
pessoas, bem como a inclinação para determinadas doenças. No século XVII, o filósofo John
Locke foi um dos primeiros a teorizar que a mente humana nasce vazia, como uma folha de papel
em branco e que a personalidade seria fruto das experiências. Logo depois, o francês Jean Jaques
Rousseau criou o conceito do bom selvagem inspirado nas descobertas de povos indígenas nas
Américas. Para ele os humanos nasceriam inocentes e pacíficos. Males como ganância e a violência
seriam produtos da civilização, ou seja, isso caracterizaria o bom selvagem.
A partir da descoberta da estrutura do DNA pelo americano James Watson e pelo inglês
Francis Crick em 1953 até o mapeamento completo do genoma humano em 2003, abriu-se
um campo de exploração sem precedentes para entender as origens biológicas da
personalidade. Hoje se sabe que os comportamentos dependem da interação entre fatores
genéticos e ambientais. Além disso, as descobertas mais recentes mostram que as
influências dos hábitos e do estilo de vida de cada um na ação dos genes é maior do que se
11
pensava. Questões vivenciais podem servir como gatilho para disparar certas
predisposições geneticamente determinadas.
Segundo Ballone (2008), os genes herdados se apresentam como possibilidades variáveis
de desenvolvimento em contato com o meio e não como certeza inexorável de
desenvolvimento. O ser humano não deve ser considerado nem exclusivamente ambiente,
nem herança. Não deve ser considerado um produto exclusivo do seu meio, tal como um
aglomerado dos reflexos condicionados pela cultura que rodeia e despido de qualquer
atributo mais nobre de sentimentos e vontade própria. Não pode ser considerado um
punhado de genes, resultando numa máquina programada a agir, desta ou daquela maneira.
(Disponível em: www.psiqweb.med.br em 16 de outubro de 2009 às 23:30)
De maneira geral, o estado em que se apresenta o indivíduo num dado momento, deve ser
entendido como uma conjunção entre seu patrimônio genético e a influência ambiental a
que se submeteu. É uma somatória daquilo que ele trouxe para a vida com aquilo que a vida
lhe concedeu. Considerando então a personalidade como sendo composta de elementos
constitucionais e/ou de elementos ambientais. A discussão sobre a força do ambiente é
antiga, acirrada, infindável e inclusiva. A tendência correta é entender o sujeito como um
todo.
A Psicologia da Personalidade estuda as estruturas componentes da personalidade, e esta
procura sistematizar e conjugar as semelhanças e diferenças das estruturas mentais e
comportamentais dos seres humanos. Em função disso, cria métodos terapêuticos para
corrigir distúrbios e perturbações que possam ocorrer. Muitas vezes, essas perturbações,
podem estar relacionadas com a forma como se processou a formação da personalidade. A
Psicologia é uma ciência que tem sob alguns aspectos uma estrutura filosófica baseada em
modelos mentais e comportamentais; existem correntes de pensamento e teorias
psicológicas que realçam determinados aspectos concretos da personalidade, sobre como se
organizam, desenvolvem e manifestam os mecanismos mentais no comportamento. Para o
senso comum, a personalidade é atribuída a uma pessoa sendo definida como boa ou má.
Para psicologia a personalidade seria um conjunto de características que diferenciam os
indivíduos, evitando assim, este juízo de valor.
12
Para se falar de personalidade é preciso entender o que vem a ser um traço de
personalidade. O traço é um dos aspectos do comportamento duradouro da pessoa; é a sua
tendência à sociabilidade ou ao isolamento; à confiança ou à desconfiança nos outros.
Assim sendo, a personalidade é definida pelos traços emocionais e de comportamento de
um indivíduo. O comportamento final de uma pessoa é o resultado de todos os seus traços
de personalidade e o que diferencia os indivíduos é a amplitude e intensidade com que cada
traço é vivido.
É fácil e rápido tentar somar o conjunto das características de personalidade de uma pessoa utilizando termos vagos como extraordinária e horrível. O assunto personalidade é complexo demais para uma descrição tão simplista, pois os seres humanos são demasiadamente complexos e mudam em situações diferentes e com pessoas também diferentes. Nós temos de ser mais precisos na nossa linguagem para definir e descrever adequadamente a personalidade. Por esse motivo, os psicólogos vêm se esforçando consideravelmente para elaborar testes que avaliem a personalidade. (SCHULTZ, 2006, p.4)
Para a psicanálise a personalidade é constituída por três estruturas: o ID que consiste em
tudo o que é psicológico, herdado. Está relacionado à satisfação das necessidades corporais.
Ele é o reservatório de energia psíquica e fornece energia para a operação dos outros dois
sistemas. Freud chamou o ID de “a verdadeira realidade psíquica” (HALL, 2000, p.53). O
EGO é o mestre racional da personalidade, está ciente da realidade. O EGO decide quando
e como os instintos do ID podem ser satisfeitos da melhor maneira. (SCHULTZ, 2006,
p.50). O SUPEREGO representa mais o ideal do que o real e luta mais pela perfeição do
que pelo prazer, inibi os impulsos do ID e persuadi o EGO. Ele busca pela perfeição moral.
Freud foi provavelmente o primeiro teórico da psicologia a enfatizar os aspectos
desenvolvimentais da personalidade. Ele considerava que a personalidade já estava muito
bem formada pelo final do quinto ano de vida e que o desenvolvimento subsequente era
praticamente só a elaboração dessa estrutura básica. Ele chegou a essa conclusão com base
em suas experiências com pacientes que se submetiam à psicanálise. O conceito original de
Freud dividia a personalidade em três níveis: o consciente, o pré-consciente e o
inconsciente. Freud considerava o consciente um aspecto limitado da personalidade, porque
há somente uma pequena parte de nossos pensamentos, sensações e lembranças na
consciência todo o tempo. O consciente corresponde ao seu significado normal, o cotidiano.
13
O pré-consciente é o depósito de lembranças, percepções e idéias das quais não estamos
cientes no momento, mas que podemos facilmente trazer para o consciente. O inconsciente
contém a força propulsora por trás de todos os comportamentos e é o depósito de força que
não conseguimos ver ou controlar. Embora cada uma dessas partes da personalidade como
um todo, tenha suas próprias funções, propriedades e componentes, elas interagem tão
estreitamente que é difícil, desemaranhar seus efeitos e pesar sua relativa contribuição ao
comportamento humano.
A personalidade se desenvolve em resposta a quatro fontes importantes de tensão: (1) processo de crescimento fisiológico, (2) frustrações, (3) conflitos e (4) ameaças. Como uma conseqüência direta de aumentos de tensão emanando dessas fontes, a pessoa é forçada a aprender novos métodos de reduzir a tensão. Tal aprendizagem é o que seria o desenvolvimento da personalidade. (HALL, 2000, p.61)
Segundo Jung, a personalidade é determinada pelo que esperamos ser e pelo que fomos.
Acreditava que nos desenvolvemos e crescemos independentemente da idade e estamos
sempre indo para um grau mais completo da realização do self. (SCHULTZ, 2006, p.99).
Segundo ele os pais podem ampliar ou impedir o desenvolvimento da personalidade da
criança, isso se dá de acordo com o modo que os pais se comportam em relação a criança.
A partir disso, ele defende que a personalidade na infância nada mais é que o reflexo da
personalidade dos pais.
Para Jung na puberdade a psique ainda não assume forma diferente da infância, mas,
contudo é citado por ele como nosso nascimento psíquico, apresentando dificuldades e
necessidades de se adaptar, pois as fantasias infantis se acabam e o adolescente se depara
com as demandas da realidade. O foco se torna externo e o consciente predomina
geralmente a atitude consciente principal nesta fase é de extroversão. O início da idade
adulta é marcado por um período emocionante e de desafio, repleto de novos horizontes e
realizações, pois temos como objetivo atingir as nossas metas e criar uma posição segura
para nós no mundo. A meia-idade é um período de transição no qual o foco e os interesses
das pessoas mudam, elas diminuem seus interesses na educação, carreira e família e passam
a se dedicar ao mundo interior e subjetivo. Conclui-se então que: Para ele, “a meta principal
14
da vida é a individuação. As experiências da infância são importantes, mas a personalidade
é mais afetada pelas experiências da meia-idade e pelas esperanças para o futuro. A
personalidade é singular na primeira metade da vida, mas não na segunda”. (SCHULTZ,
2006, p.111)
A teoria Freudiana difere-se da Junguiana, pois Freud tinha uma visão pessimista da
natureza humana. Para ele o ser humano está fadado à ansiedade, a tensão, a frustração dos
impulsos e aos conflitos. Esta natureza em grande parte é herdada, mas parte da mesma é
aprendida por meio da interação pais e filhos. Já Jung tinha uma imagem da natureza
humana mais otimista e menos determinista, pois acreditava que parte da personalidade é
inata e parte aprendida. As experiências da infância são importantes, mas a personalidade
em si é mais afetada pelas experiências vividas na meia-idade e pelas perspectivas para o
futuro.
Na visão comportamental, o comportamento é o acúmulo de respostas aprendidas por meio
de estímulos ou hábitos. Refere-se apenas ao que pode ser observado e manipulado de
maneira objetiva. Para Skinner a personalidade é definida como “uma coleção de padrões
de comportamento” (FADIMAN, 2002, p.193) e argumenta que, se você basear sua
definição do eu em um comportamento observável, não é necessário discutir o eu ou a
personalidade.
Skinner negava a existência de uma entidade chamada personalidade e não buscava causas para o comportamento dentro do organismo. Os processos mentais e psicológicos não são observáveis objetivamente e, portanto, não tem relevância para a ciência. (SCHULTZ, 2006, p.382)
Para a teoria humanista, centrada na pessoa, o único modo de avaliar a personalidade é em
termos das experiências subjetivas e os eventos na vida da pessoa como ela os percebe e
aceita como reais. Carl Rogers acreditava que seus pacientes eram capazes de examinar a
raiz de seus problemas e redirecionar o desenvolvimento da personalidade que poderia ter
sido impedida por alguma incongruência entre o seu autoconceito e suas experiências.
Rogers tinha uma visão otimista do ser humano que englobava uma crença no livre arbítrio.
Segundo ele indivíduos e sociedade podem se desenvolver livremente sem empecilhos
15
causados por eventos do passado. Na abordagem centrada na pessoa o terapeuta fornece
considerações positivas incondicional ao cliente. Nesta teoria supõe-se que o cliente é
responsável pela mudança de sua personalidade.
A personalidade pode apenas ser compreendida por meio de uma abordagem fenomenológica, ou seja, a partir do ponto de vista do próprio individuo, baseado em suas experiências subjetivas (seu campo experiencial). Nosso objetivo é a auto-realização, uma tendência inata de crescer e se desenvolver. (SCHULTZ, 2006.p.331)
Em psicopatologia, as anormalidades da personalidade se reportam, principalmente, à
possibilidade que se tem de classificar determinada personalidade como sendo desta ou
daquela maneira de existir, enquanto o normal seria a pessoa ser "um pouco de tudo", ou
seja, ter um pouco de cada característica humana sem prevalecer patologicamente nenhuma
delas.
Em suma, a relação entre a interação com o meio e as experiências adquiridas nos primeiros
anos de vida; as formas como os indivíduos percebem as vivências do presente e a
capacidade de encontrar as raízes de seus problemas; são fatores que influenciam na
caracterização e formação de nossa personalidade, tanto quanto os estímulos que recebemos
do mundo externo e os comportamentos, que ao sermos inseridos nele, aprendemos.
16
2 TRANSTORNOS DE PERSONALIDADE
O transtorno de personalidade ao longo dos séculos, já foi nomeado de diversas formas:
insanidade moral, monomania moral, transtorno ou neurose de caráter, dentre outros.
Entretanto o termo que mais se popularizou entre os profissionais de saúde mental foi
psicopatia. Tal termo foi utilizado com várias denominações, às vezes sendo identificado
como personalidade sociopática, outras vezes transtorno de personalidade em geral, tais
como: anti-social e até mesmo dissocial.
Não existe consenso sobre o conceito de transtorno, porque além de ser objeto de estudo
científico, médico e psicológico é também objeto de consideração social, político e jurídico.
A CID-10 o considera como “a existência de um conjunto de sintomas ou comportamentos
clinicamente reconhecíveis, associado na maioria dos casos a sofrimento e interferência
com funções pessoais” (1993, p.5) segundo Schneider apud Dalgalarrondo (2000), o
elemento central dos transtornos de personalidade é que o indivíduo apresenta as seguintes
características básicas: sofre e faz sofrer a sociedade, assim como não aprende com a
experiência. (p.165).
Isso quer dizer que, no transtorno de personalidade há uma marcante desarmonia que se
reflete tanto no plano intrapsíquico como no plano das relações interpessoais. Embora de
modo geral os transtornos de personalidade produzam consequências muito penosas para o
indivíduo, familiares e pessoas próximas, não são facilmente modificáveis por meio das
experiências; tende antes a se manter estável ao longo de toda a vida.
A etiologia dos transtornos da personalidade deve ser buscada tanto em aspectos internos
quanto externos de seu portador (COID,1999). Os aspectos internos são representados pelas
características constitucionais, genética ou biológica do indivíduo, enquanto os externos são
representados por características adquiridas, decorrentes de sua interação tanto física
quanto psíquica ao longo da vida. Na interação física, observa se há ou não traumatismo
craniano ou infecções cerebrais, já a interação psíquica é representada inicialmente pelo
relacionamento com os pais, depois com os outros familiares, e também pela relação social.
17
A existência de um vínculo familiar consistente nos primeiros anos de vida, está associada
a um comportamento de confiança em relação a si mesmo. Isso revela como os
relacionamentos primitivos são importantes no desenvolvimento da personalidade. Quando
há uma ruptura precoce no vínculo afetivo, deve-se valorizar a pesquisa etiológica dos
transtornos da personalidade, porque exerce um efeito prejudicial no desenvolvimento da
personalidade. A capacidade de vincular-se efetivamente está ligada aos primeiros anos de
vida do indivíduo.
A Organização Mundial de Saúde trata os Transtornos da Personalidade e de
Comportamentos, especificando-os nos títulos de F60 até F69 na Classificação
Internacional dos Transtornos Mentais e de Comportamento (CID-10). Descreve tais
transtornos da seguinte maneira:
Estes tipos de condição (Transtornos de Personalidade) abrangem padrões de comportamento profundamente arraigados e permanentes, manifestando-se como respostas inflexíveis a uma ampla série de situações pessoais e sociais. Eles representam desvios extremos ou significativos do modo como o indivíduo médio, em uma dada cultura, percebe, pensa, sente e, particularmente se relaciona com os outros. Tais padrões de comportamento tendem a ser estáveis e abranger múltiplos domínios de comportamento e funcionamento psicológico. Eles estão frequentemente, mas não sempre, associados a graus variados de angústia subjetiva e a problemas no funcionamento e desempenho sociais. (p.196 Jorge, Miguel R 2000).
Muitas vezes o comportamento de alguém passa a não corresponder a determinadas
expectativas dos padrões culturais atualmente em vigor, tanto na área da impressão de si
mesmo e das outras pessoas; quanto no campo afetivo das relações, bem como no freio dos
impulsos. Outras vezes, suas atitudes tornam-se intransigentes, com sérias consequências.
Outra característica transtorno de personalidade é a ausência de bem-estar nas interações
sociais e profissionais. Este processo tem início, geralmente, na fase da adolescência, no
máximo assim que o sujeito se torna adulto. Ao realizar o diagnóstico, é necessário ter
certeza que não há a ocorrência de nenhuma outra patologia, o uso excessivo de
determinadas substâncias químicas, nem mesmo a incidência de problemas orgânicos ou de
18
lesões cerebrais. Certas perturbações desta natureza não devem ser analisadas como
transtorno de personalidade em menores de 18 anos.
A Associação Norte-americana de Psiquiatria, através de seus critérios de classificação e
diagnóstico de transtornos mentais, o DSM-IV descreve os Transtornos da Personalidade da
seguinte forma:
Um Transtorno da Personalidade é um padrão persistente de vivência íntima ou comportamento que se desvia acentuadamente das expectativas da cultura do indivíduo, é invasivo e inflexível, tem seu início na adolescência ou começo da idade adulta, é estável ao longo do tempo e provoca sofrimento ou prejuízo. (2000, p.593)
Os transtornos de personalidade afetam os relacionamentos interpessoais de um indivíduo,
o modo como ele vê o mundo, a maneira como expressa as emoções e seu comportamento
social. Caracterizam um estilo de vida mal adaptado, inflexível e prejudicial a si próprio; e
mais comumente aos que lhe estão próximos causando sofrimento e incômodo. Está
relacionado a padrões de pensamentos, sentimentos e comportamentos que de forma
consistente é exibido por uma pessoa durante um longo período e que representa uma forma
desadaptativa de atuar no mundo, pois gera distúrbios psicológicos e de enfrentamento de
conflitos.
Devem-se distinguir os transtornos de personalidade, dos transtornos de alteração da
personalidade, que ocorrem a partir de certo momento, desencadeados normalmente por um
evento traumático ou um estresse grave, tendo curta duração. As causas destes transtornos
geralmente são múltiplas e relacionadas com as vivências infantis e da adolescência do
indivíduo.
Após um breve esclarecimento do que pode vir a ser um Transtorno da Personalidade,
segue alguns tipos de transtornos que serão explicitados de forma breve, através da
subdivisão em tipo de transtorno de personalidade, com critérios de diagnóstico próprios e
bem definidos tanto pelo DSM-IV, quanto para a CID-10 respectivamente. Para
posteriormente especificarmos o transtorno de personalidade anti-social, que é a base do
presente trabalho.
19
O DSM-IV inclui dez tipos de transtornos de personalidades distintos e a CID-10 inclui
doze tipos de transtornos específicos de personalidade, sendo:
Transtorno de Personalidade Paranóide segundo o DSM IV: a característica essencial deste
Transtorno é um padrão invasivo de desconfiança e suspeita quanto aos outros, de modo
que seus motivos são interpretados como malévolos.
Segundo a CID-10 este transtorno é caracterizado por:
Sensibilidade excessiva a contratempos e rejeições;
Tendência a guardar rancores persistentemente, isto é, recusa a perdoar insultos e
injúrias ou desfeitas;
Suspeitas recorrentes, sem justificativa, com respeito à fidelidade sexual do cônjuge
ou parceiro sexual.
Transtorno de Personalidade Esquizóide segundo o DSM IV: as características essências
desse Transtorno é um padrão invasivo de distanciamento de relacionamentos sociais e uma
faixa restrita de expressão emocional em contextos interpessoais.
Segundo a CID-10 este transtorno é caracterizado por:
Frieza emocional, afetividade distanciada ou embotada;
Indiferença aparente a elogios ou críticas;
Falta de amigos íntimos ou de relacionamentos confidentes (ou ter apenas um) e de
desejo de tais relacionamentos.
Transtorno de Personalidade Esquizotípica segundo o DSM IV: as características essências
desse Transtorno é um padrão invasivo de déficits sociais e interpessoais marcado por
agudo desconforto e reduzida capacidade para relacionamentos íntimos, além de distorções
cognitivas ou perceptivas e comportamento excêntrico.
Segundo a CID-10 este transtorno é caracterizado por:
Pobre relacionamento com outros e uma tendência a retraimento social;
Suspeitas e idéias paranóides;
20
Ruminações obsessivas sem resistência interna, frequentemente com conteúdos
dismorfofóbicos, sexuais ou agressivos.
Transtorno de Personalidade Borderline segundo o DSM IV: as características essências
desse Transtorno é um padrão invasivo de instabilidade dos relacionamentos interpessoais,
auto imagem e afetos, e acentuada impulsividade que começa no início da idade adulta e
está presente em uma variedade de contextos.
Para a CID-10, existem várias características de instabilidade emocional que estão
presentes; em adição, a auto-imagem, objetivos e preferências internas (incluindo a sexual)
do paciente são com freqüência pouco claras ou perturbadas. (1993, p.200)
Transtorno de Personalidade Narcisista segundo o DSM IV: as características essências
desse Transtorno é um padrão invasivo de grandiosidade, necessidade de admiração e falta
de empatia, que começa no início da idade adulta e está presente em uma variedade de
contextos.
Segundo a CID-10 este transtorno é caracterizado por: Outros transtornos de personalidade
que não se enquadra em nenhuma das rubricas específicas F60.0 – F60.7 (1993, p.202)
Transtorno de Personalidade Histriônica segundo o DSM IV: as características essências
desse Transtorno consiste de um padrão invasivo de emocionalidade excessiva
comportamento de busca de atenção, que começa no início da idade adulta e está presente
em uma variedade de contextos.
As características desse transtorno segundo a CID-10 são:
Auto dramatização, teatralidade, expressão exagerada de emoções;
Afetividade superficial e lábil;
Preocupação excessiva com atratividade física.
Transtorno de Personalidade Obsessivo-Compulsiva segundo o DSM IV: a característica
essencial desse Transtorno é uma preocupação com organização, perfeccionismo e controle
mental e interpessoal, à custa da flexibilidade, abertura e eficiência. Este padrão começa no
início da idade adulta e está presente em uma variedade de contextos.
21
As características desse transtorno segundo a CID-10 são:
Sentimento de dúvida e cautela excessiva;
Preocupação com detalhes, regras, listas, ordem, organização ou esquemas;
Rigidez e teimosia.
Transtorno de Personalidade Esquiva segundo o DSM IV: a característica essencial desse
Transtorno é um padrão invasivo de inibição social, sentimentos de inadequação e
hipersensibilidade à avaliação negativa, que começa no início da idade adulta e está
presente em uma variedade de contextos.
Para a CID 10 esse transtorno é classificado em F60.8: outros transtornos de personalidade
que é caracterizado como um transtorno de personalidade que não se enquadra em nenhuma
das Nosologias definidas.
Transtorno de Personalidade Dependente segundo o DSM IV: as características essenciais
desse Transtorno é uma necessidade invasiva e excessiva de ser cuidado, que leva a um
comportamento submisso e aderente e ao medo da separação. Este padrão começa no início
da idade adulta e está presente em uma variedade de contextos. Os comportamentos
dependentes e submissos visam a obter atenção e cuidados e surgem de uma percepção de
si mesmo como incapaz de funcionar adequadamente sem o auxilio de outras pessoas.
As características desse transtorno segundo a CID-10 são:
Encorajar ou permitir a outros tomarem a maioria das importantes decisões da vida
do indivíduo;
Relutância em fazer exigências ainda que razoáveis às pessoas das quais depende;
Sentir-se inconfortável ou desamparado quando sozinho por causa de medos
exagerados de incapacidade de se auto cuidar.
Transtorno de Personalidade Anti-social segundo o DSM IV: a característica essencial
desse Transtorno é um padrão invasivo de desrespeito e violação dos direitos dos outros.
Este padrão também é conhecido como psicopatia, sociopatia e transtorno de personalidade
dissocial. Uma vez que o engodo e a manipulação são aspectos centrais do transtorno da
22
personalidade anti-social, pode ser de especial utilidade integrar as informações adquiridas
pela avaliação clínica sistemática com informações coletadas a partir de fontes colaterais.
As características desse transtorno segundo a CID-10 são:
Indiferença insensível pelos sentimentos alheios;
Atitude flagrante e persistente de irresponsabilidade e desrespeito por normas,
regras e obrigações sociais;
Incapacidade de experimentar culpa e de aprender com a experiência,
particularmente punição.
Outros transtornos que não são encontrados no DSM-IV, portanto a CID-10 os classifica da
seguinte forma:
F60.3 – Transtorno de Personalidade Emocionalmente instável: um Transtorno de
Personalidade no qual há uma tendência marcante a agir impulsivamente sem consideração
dos conseqüências, junto como instabilidade afetiva. A capacidade de planejar pode ser
mínima e acessos de raiva intensa podem com freqüência levar à violência ou as “explosões
comportamentais”: estas são facilmente precipitadas quando atos impulsivos são criticados
ou impedidos por outros. Duas variantes desse transtorno de personalidade são específicas e
ambas compartilham esse tema geral de impulsividade e falta de autocontrole.
F60.30 – Tipo Impulsivo: As características predominantes são instabilidade emocional e
falta de controle de impulsos. Acessos de violência ou comportamento ameaçador são
comuns, particularmente em resposta a críticas de outros.
F60.6 – Transtorno de Personalidade Ansiosa (de evitação): Transtorno de personalidade
caracterizado por:
Sentimentos persistentes e invasivos de tensão e apreensão;
Crença de ser socialmente inepto, pessoalmente desinteressante ou inferior aos
outros;
Preocupação excessiva em ser criticado ou rejeitado em situações sociais.
23
Alguns destes estados e tipos de comportamento aparecem precocemente durante o
desenvolvimento individual sob a influência conjunta de fatores constitucionais e
emocionais, enquanto outros são adquiridos mais tardiamente durante a vida.
É importante lembrar que, os Transtornos de Personalidade não são considerados doença
mental na psiquiatria forense brasileira, mas sim perturbação da saúde mental.
Os Transtornos da Personalidade, são maneiras problemáticas de ser, constantes e perenes, enquanto as Doenças Mentais ocorrem e se desenvolvem a partir de um momento definido da vida, tal como são as crises, reações, processos, episódios e surtos, enquanto os Transtornos da Personalidade são e as doenças mentais surgem.(BALLONE, 2005, p.30)
Para melhor entender o Transtorno de Personalidade Anti-social que é a base do presente
trabalho, enfatizaremos no próximo capítulo sua definição, características e possíveis
causas.
24
3 TRANSTORNO DE PERSONALIDADE ANTI-SOCIAL
Desde os primórdios o ser humano se adaptou para viver em sociedade, sociedade essa que
pode ser resumidamente e entendida como a junção de pessoas que cooperam para a
manutenção de uma mínima harmonia. Segundo Souza (2009) o ser humano tem como um
dos dispositivos de sobrevivência a capacidade de se colocar no lugar do outro, o que
chamamos de empatia, que é o freio da vontade de posicionarmos um contra o outro sem
medir os danos e consequências, que podem ocorrer no meio em que vivemos. Os
indivíduos com transtorno de personalidade anti-social não têm esse freio, agem conforme
suas vontades, ou seja, sem normas, regras ou valores éticos e morais.
Pessoas que possuem uma personalidade rígida, indiferente e insensível diante dos
sentimentos alheios, têm atitudes persistente de irresponsabilidade e desprezo por normas,
regras e obrigações, inabilidade de manter relacionamentos estabelecidos, baixa tolerância a
frustração, incapacidade de experienciar culpa e grande dificuldade de aprender com
punição que lhe é aplicada, podem ser caracterizadas com transtorno de personalidade anti-
social.
Os portadores deste transtorno não apresentam quaisquer sinais de anormalidade mental
(alucinações, delírios, ansiedade excessiva, etc.) o que torna o reconhecimento dessa
condição muito difícil. (Disponível em: www.inef.com.br/psicopatia acessado em 5 de
novembro as 11:30). O conceito de transtorno de personalidade anti-social ainda não esta
muito claro devido a diferentes descrições e denominações recebidas ao longo do tempo.
Para chegar ao conceito que temos hoje de transtorno de personalidade anti-social devemos
voltar um tempo atrás para entender como se chegou a essa classificação.
Lombroso (2001 apud Trindade, 2009, p.27), por exemplo, dedicou seu estudo de
delinquência através da medida dos traços anatômicos e fisiológicos dos criminosos
(fatores endógenos). Segundo ele para erradicar o delito deve-se buscar a eventual causa no
próprio delinquente. Parmelee (1925 apud Trindade, 2009, p.30) considerou que todos os
delinquentes que cometem delitos sob influência de uma psicose estão incluídos na classe
25
de delinquentes psicopáticos. Para Parmelee o delinquente psicopático inclui todos os
delinquentes que manifestam uma maior ou menos grau anormalidade mental, excluindo os
dementes (fatores exógenos).
Uma das primeiras descrições registradas pela medicina que deu a entender sobre a
Personalidade Psicopática foi descrita por Girolano Cardamo que descreveu uma
“improbabilidade”, um quadro que não obtinha a insanidade total, mas a pessoa mantinha a
aptidão para administrar sua vontade. (Disponível em: < www.psiqweb.med.br, revisto em
2006> acesso em 28 de outubro, as 22:30)
Koch (1988) fala de Inferioridades Psicopáticas, mas se refere a inferioridade no sentido
social e não moral. Para ele as inferioridades psicopáticas eram congênitas e permanentes.
(Disponível em: < www.psiqweb.med.br, revisto em 2006> acesso em 28 de outubro, as
22:30). Pinel (1988 apud Trindade 2009, p.31) descreveu que “a falta de educação, uma
educação mal orientada ou traços perversos e indômitos naturais, podem ser as causas desta
espécie de alteração”.
Para Hare (1993 apud Trindade 2009, p.33) foi na Segunda Guerra que ouve a necessidade
de discutir e entender sobre o diagnóstico dos indivíduos com transtorno de personalidade
anti-social. Neste período surgiu a necessidade por parte do exército em identificar,
diagnosticar e tratar indivíduos potencialmente perigosos, que pudessem ameaçar ou
desestruturar o controle militar. Para Hare, Hervey Cleckley conseguiu impactar a
sociedade com sua obra A máscara da Saúde, em 1941, que causou um grande impacto
psicológico e social. Em sua obra Cleckley (1941 apud Trindade 2009, p.34) caracterizou o
transtorno de personalidade anti-social como funesto (cruel) problema social. Descreveu
detalhadamente o quadro de seus pacientes em sua obra, possibilitando aos clínicos
diferenciar com certo assombro o transtorno de personalidade anti-social dos demais
transtornos mentais.
Karpaman (1961 apud Trindade 2009, p.69) havia caracterizado o indivíduo com transtorno
de personalidade anti-social como uma pessoa cruel, capaz de simular emoções e ligações
26
afetivas quando se trata de obter vantagem. As relações sociais são superficiais, prejudiciais
e manipulativas. Possui capacidade de julgamento pobre, é guiado pelo impulso com
resultados problemáticos para os outros. Nas décadas sucessivas continuaram definindo os
traços característicos do transtorno de personalidade anti-social como: perturbações, baixa
tolerância a frustrações, tendência a viver só, entre outros.
O termo personalidade psicopática foi adotado no Manual Diagnóstico e Estatístico de
Transtornos Mentais (DSM-I) até 1980 quando o DSM-IV utilizou a expressão
Personalidade Anti-Social. A Classificação Internacional dos Transtornos Mentais e de
Comportamento (CID), até sua nona revisão utilizava o termo psicopata foi em 1989 em
sua Décima Revisão que o termo Transtorno de Personalidade Anti-social passou a ser
utilizado.
Estudos científicos têm sido desenvolvidos com o intuito de chegar a uma definição mais
clara das principais características de um individuo com transtorno de personalidade anti-
social e de quais as contribuições da genética, do meio social e familiar que influenciam tal
comportamento. Até o presente momento não foi encontrada uma causa específica para o
transtorno de personalidade anti-social, pois este transtorno pode ter múltiplas causas que o
determina (determinantes). Isso significa que é o resultado de uma somatória de fatores
desde o funcionamento cerebral, genética, até do meio social e familiar ou que podem
contribuir para a aparição destes comportamentos de forma observável para a sociedade e
para profissionais de um modo geral que lidam com esse indivíduo.
Segundo Amaral (2002):
Fatores genéticos (os parentes em 1º grau do portador tem 5 vezes mais possibilidades de desenvolver o transtorno que pessoas da população em geral).Fatores próprios da mente de cada indivíduo; cada pessoa tem uma conformação própria que é resultado da interação de fatores inatos com as experiências e relações de cuidados (físicos e afetivos) no início da vida.Há internalizações dos vínculos primários, o que ocorre de forma diferente em cada indivíduo, determinando que cada pessoa tenha uma arquitetura interior diferente. Fatores de ordem neurológica, que mostram alterações já bem estudadas do sistema nervoso.Fatores de ordem social também participam. Vivemos uma época que aspira liberdade e distância de imposições autoritárias e isto influencia o desenvolvimento dos
27
psicopatas. Os psicopatas interpretam a falta de normas que temos no mundo atual como licença para violentar os direitos dos outros e não como espaço para a cidadania. (Disponível em: www.inef.com.br/psicopatia acessado em 5 de novembro as 11:30)
Um exemplo das possíveis interferências do funcionamento cerebral na personalidade do
indivíduo é o caso do Phineas Cage, que em 1908 sofreu um acidente no qual um barra de
ferro invadiu sua face esquerda e atravessou crânio, saindo no topo da cabeça e caindo a
mais de trinta metros de distância. Cage que antes era descrito como alguém responsável,
eficiente, capaz, inteligente passou a demonstrar comportamento caprichoso, irreverente,
impaciente grosseiro com os colegas, e repertório verbal repleto de palavrões, o que
chamou a atenção para a relação existente entre as lesões da região frontal do cérebro e o
comportamento disfuncional apresentado posteriormente por Cage. Anos mais tarde fora
feito um estudo em 3D do crânio de Cage, que revelou danos mais extensos no hemisfério
esquerdo, atingindo mais setores anteriores do que posteriores da região frontal, notou-se
que a lesão ocorreu principalmente, nos córtices pré-frontais na superfície ventral, ou
orbital, interna de ambos os hemisférios. Estudos de neuroimagens apontam para o
envolvimento de estruturas cerebrais, como possíveis causadoras de prejuízos na função
serotoninérgica o que pode estar associada á ocorrência do comportamento anti-social.
Exames de neuroimagem funcional em indivíduos normais com julgamentos morais, revela
a ativação das mesmas áreas cerebrais que, quando lesadas, dão origem a condição de
transtorno de personalidade anti-social adquirida. Segundo Trindade et al (2009):
Psicopatas apresentam grande dificuldade em reconhecer e atribuir valor emocional a estímulos sejam estes palavras ou imagens, assim como apresentam muitos erros de valoração emocional. Estas pessoas precisariam investir mais energia psíquica no processamento de informações com conteúdo emocional do que pessoas sem esse diagnóstico. (p.57)
Embora existam fundadas bases biológicas que podem explicar de certa forma a
personalidade anti-social, não se pode esquecer que também é possível uma predisposição
hereditária, dependerá dos fatores do ambiente, relacionado a vários fatores sociais,
econômico, educacionais, familiares, etc. Para Abdalla Filho (2009) há um considerável
número de portadores de transtorno de personalidade anti-social filhos de pais que possuem
28
essa mesma personalidade rígida. Há também aspectos que não são hereditários que é a
influencia dos fatores externos que se dá primeiramente a partir da interação do individuo
com o meio familiar, as experiências ocorridas nos primeiros anos de vida merecem uma
atenção especial, devido sua importância na formação do núcleo da personalidade. E
complementa: A existência de um vínculo familiar consistente nos primeiros anos de vida está associada a um posterior comportamento de confiança em relação a si mesmo. Esta associação revela como os relacionamentos primitivos são importantes no desenvolvimento satisfatório da personalidade. Experiências precoces de rupturas de vínculos afetivos devem ser valorizadas na pesquisa etiológica dos transtornos de personalidade, por exercerem um efeito prejudicial no desenvolvimento da personalidade. (p.283)
Situações sociais também podem estar ligadas a etiologia de comportamentos anti-sociais,
pois em alguns casos crianças com comportamento anti-social tiveram família com baixo
status socioeconômico, características de atrevimentos e concentração precária. Tiveram
escassez de supervisão parental números elevados de membros na família, desinteresse
familiar, pares com comportamento anti-social, preferência por atividades de risco, baixa
inteligência e fraco desenvolvimento escolar, agitação e um considerável desrespeito por
regras, o que pode ser compatível com o desenvolvimento do transtorno de personalidade
anti-social na vida adulta.
Enfim, entende-se que não há uma normatização ou diagnóstico preciso sobre quais fatores
especificamente podem estar ligado ao desenvolvimento do transtorno de personalidade
anti-social, contudo diversas pesquisas estão sendo desenvolvidas sobre quais as possíveis
formas de tratamento ou uma amenização dos comportamentos desses indivíduos com esse
transtorno, o que será abordado no próximo capítulo.
29
4 SUGESTÕES TERAPÊUTICAS E ANÁLISE DE CASOS
No final dos anos 80 e meados dos anos 90, havia a crença de que os indivíduos com
transtorno de personalidade anti-social eram intratáveis, que nada poderia ser feito no
campo dos tratamentos psicológicos; partindo do pressuposto de que e para que o
comportamento humano se modifique mediante a terapia, é necessário que haja um vínculo
emocional entre terapeuta e paciente, mútua cooperação e sinceridade. Os indivíduos com
transtorno de personalidade anti-social extraem pouco proveito dos programas de
comunidade terapêutica, planejado para tratar delinqüentes com transtorno de
personalidade, isso acontece porque não possuem nenhum tipo de envolvimento afetivo,
fazendo com que estes não apresentam sucesso no tratamento terapêutico. Segundo
Trindade (2009) os indivíduos com transtorno de personalidade anti-social são
pedagogicamente refratários ás terapias disponíveis e de difícil aderência ao tratamento (p.
141).
Ainda na década de 90, foram identificados alguns efeitos positivos da psicoterapia para o
individuo com transtorno de personalidade anti-social. Hare (1970, apud Trindade 2009,
p.141) refere-se a comunidade terapêutica como um dos mais populares tratamentos para
indivíduos com transtorno de personalidade anti-social, pois indivíduos que participaram
deste programa se tornaram mais capazes de respeitar os sentimentos e os direitos dos
outros, mas contudo é preciso ter cautela, pois a aquisição de novas habilidades podem se
transformar em instrumento de manipulação e exploração dos outros por parte desses
indivíduos.
A terapia cognitiva comportamental é um dos recursos recomendados para indivíduos com
transtorno de personalidade anti-social, pois promove uma reestruturação no modo desses
indivíduos processarem as informações. (...) A fraca resposta de psicopatas às abordagens psicoterapêuticas tradicionais não decorrem apenas e tão somente das características próprias da psicopatia. Certamente pode haver fatores relacionados com a figura do terapeuta. Ademais, não existe grande confiabilidade nas terapias que enfatizam motivação para mudança, pois psicopatas não se sentem internamente impelidos a fazer mudanças. (TRINDADE, 2009 p.142)
30
Morana (2003 apud Trindade 2009, p.144) relata que, estudos de psicofarmacologia
sugerem que a intervenção medicamentosa pode ser positiva para os tratamentos de
transtornos de personalidade. Apesar de não haver uma droga específica para o tratamento
de transtorno de personalidade anti-social alguns fármacos podem ser usados, que é o caso
do uso de substâncias capazes de inibir o comportamento impulsivo e agressivo que podem
estar relacionados com a baixa atividade serotoninérgica. Segunda ela os inibidores de
recaptação de serotonina tais como: fluoxetina e congêneres são os que oferecem melhores
resultados. Alerta também para a cautela na seleção desses fármacos, pois os usos de
sedativo estão contra-indicados para pessoas com transtorno de personalidade anti-social,
sendo que os benzodiazepínicos podem desencadear comportamentos agressivos e
descontrolados.
Os indivíduos com transtorno de personalidade anti-social geralmente não procuram
tratamentos psicológicos com iniciativa própria, mas quando solicitado pela justiça ou
familiares eles podem vir a freqüentar a terapia, porém com uma baixa adesão. Para Soares
(2007) o tratamento desses transtornos é bastante difícil e igualmente demorado, pois em se
tratando de mudanças de caráter, o indivíduo terá que mudar o seu próprio "jeito de ser"
para que o tratamento seja efetivo.
No geral não há nenhuma prova científica de que há um ótimo tratamento para transtorno
de personalidade anti-social, mas algum tratamento é melhor que nada, devido o fato de
desencadearem probabilidades de redução da agressividade, da reincidência de atos ilícitos
e violação das normas de conduta social. No momento a prevenção de tais comportamentos
é o método mais aconselhável para a redução deste transtorno. Para Trindade:
As características psicopáticas se formam na infância, embora se aperfeiçoem ao longo da vida, a prevenção e a intervenção precoce parecem ser as modalidades que apresentam melhor relação custo-benefício. O transtorno de conduta (TC) pode evoluir para o transtorno de personalidade anti-social (TPAS), numa trajetória em que a psicopatia pode representar “o grau mais avançado da carreira”. Para interromper esse evolutivo, quanto mais precoce a intervenção, menos sombrio o prognostico. (2009, p.147)
31
Mesmo com a improbabilidade de mudanças no transtorno de personalidade anti-social o terapeuta
tem como função orientar os familiares (que terão que conviver com o portador deste transtorno) de
como minimizar o efeito destrutivo desta patologia. É de grande importância que os pais não
neguem os problemas de conduta que um filho começa a apresentar, é necessário que coloquem
limites e procurem ajuda para lhe dar com possíveis problemas, pois a intervenção precoce aumenta
a probabilidade de reduzir o problema antes que ele seja instalado.
Para melhor entender sobre este tema, vamos agora relatar alguns casos exemplificando em
fatos reais com relatos pessoais de indivíduos com Transtorno de Personalidade Anti-social.
Na história de vida de Pedro Rodrigues Filho (Pedrinho Matador) a violência apareceu
antes mesmo de seu nascimento. Ele veio ao mundo em 1954, numa fazenda em Santa Rita
do Sapucaí, sul de Minas Gerais, com o crânio ferido, resultado de chutes que o pai desferiu
na barriga da mãe durante uma briga. Pedrinho Matador relata que teve vontade de matar
pela primeira vez aos 13 anos. Numa briga com um primo mais velho, empurrou o rapaz
para uma prensa de moer cana. Ele não morreu por pouco.(Disponível em:
<www.revistaepoca.globo.com.> Acesso dia 08 de novembro as 15:25min) Como a
maioria dos presidiários brasileiros, Pedrinho tem baixa escolaridade. Nunca foi à escola e
caiu precocemente na bandidagem. Seu primeiro crime foi aos 14 anos, quando o pai foi
demitido do cargo de vigia da escola municipal, sob a acusação de roubar merenda.
Pedrinho matou a tiros o prefeito da cidade, que havia ordenado a demissão, e depois outro
vigia que supunha ser o verdadeiro ladrão. Fugiu para Mogi das Cruzes, na Grande São
Paulo. Lá, conheceu a viúva de um líder do tráfico, apelidada de Botinha, e foram viver
juntos. Assumiu as tarefas do falecido e logo foi obrigado a eliminar alguns rivais,
matando três ex-comparsas. Morou ali até que Botinha foi executada pela polícia. Certo
dia, ao entrar em casa, Pedrinho encontrou-a morta a tiros. Pedrinho e quatro amigos em
busca de vingança mataram e torturaram várias pessoas em um casamento, tentando
descobrir os responsáveis (antigos rivais); deixando um rastro de sete mortos e dezesseis
feridos. Pedrinho escapou, mas não deixou a venda de drogas. Arregimentou soldados e
montou o próprio negócio. Pouco depois de completar 18 anos, com várias mortes nas
costas, Pedrinho finalmente foi preso.
32
Sua especialidade é esfaquear a vítima no abdome. Já matou na rua, no refeitório, na cela,
no pátio e até no 'bonde' - o camburão, na linguagem dos bandidos. Perante o juiz, afirmou
ter eliminado um detento porque 'não ia com a cara dele'. Em outro caso, foi um colega de
cela que roncava demais. O bandido ganhou notoriedade por essas matanças. Gosta de
reforçar sua fama contando outras histórias, muitas das quais não se sabe ao certo se
aconteceram ou não. Pedrinho conta, com orgulho, que matou o próprio pai, depois que ele
matou sua mãe, desconfiado de traição. Diz que, para vingar, rasgou o peito do pai a
facadas e comeu um pedaço de seu coração. Como muitos assassinos em série, seus
depoimentos costumam misturar realidade e fantasia e boa parte dos cadáveres que se
orgulha de ter produzido nunca foi encontrada. Não se sabe ao certo quantas pessoas ele
assassinou. Em alguns crimes, simplesmente não há registro documental. Na penitenciária,
segundo diz, matou um preso apelidado de Raimundão, que extorquia familiares de
detentos, e jogou-o no fosso do elevador. Funcionários da instituição se lembram do caso,
mas Raimundão não aparece na lista de condenações de Pedrinho. Tudo mostra que o
inquérito não identificou o assassino ou a morte foi assumida por outro preso - 'favor' que
os líderes da bandidagem costumam pedir a membros menos importantes das quadrilhas.
Em sua estadia no presídio de segurança máxima, Pedrinho tatuou em seu braço esquerdo
os seguintes dizeres: MATO POR PRAZER. Pedrinho Matador pode ser considerado um
exemplo fidedigno de um indivíduo com Transtorno de Personalidade Anti-social, pois o
mesmo apresenta: falta de empatia, insensibilidade diante dos sentimentos alheios,
incapacidade de sentimentos de culpa e dificuldade de aprender com punição.
POR ALGUNS DÓLARES A MAIS Antônio (nome fictício) chegou à entrevista trajando camisa preta de mangas longas, jeans
surrado, botas de boiadeiro. Um homem medindo 1,70cm, entra na sala e coloca sobre a
mesa duas pistolas “ponto 40”. Sobre a cabeça, Antônio trás uma camisa enrolada como se
fosse capuz e pergunta ao entrevistador se está com medo, essa é sua primeira frase, e
estende a mão em cumprimento. Na cintura, trás uma terceira pistola da qual não se separa.
Olhos castanho-claros, a voz rouca e o sotaque mistura o modo de falar nordestino com
algumas palavras em castelhano. O repórter pergunta: “Qual é a sua profissão?” A resposta
vem sem hesitação: “Eu mato”. Antônio tem 35 anos, e mata média de 15 pessoas por ano,
33
é responsável por pelo menos 300 mortes. Conta que começou cedo no ofício, cometeu seu
primeiro assassinato quando tinha 15 anos, em Alagoas. Foi em uma briga de família,
matou numa emboscada com um tiro de espingarda calibre 12, um homem de 58 anos,
depois ainda descarregou um revólver 38 nele. “Não sentiu nada” alega Antônio. Desde
então, coragem e disponibilidade passaram a ser seu cartão de visita. Os clientes eram
geralmente políticos e fazendeiros da região, e diz que “nunca mais parou.” A confusão na
região começou há 35 anos, quando João Morel, um fazendeiro mato-grossense,
assassinado em 2001 no presídio de Campo Grande. Pioneiro no tráfico, Morel abriu
caminho para os grandes “comerciantes” de hoje como: Pavão, Pingo, Cabeza Branca,
Líder Cabral e o carioca Fernandinho Beira Mar. No fim dos anos 90, quando o tráfico
pulverizou, apareceram os matadores de aluguel, desde então a coisa saiu do controle.
Antônio é um dos integrantes da sangrenta engrenagem que envolve policiais, militares,
promotores, juízes e políticos paraguaios, todos corrompidos pelos gordos “pedágios” que
os bandidos alegam pagar nas diversas fases do tráfico e de crimes adjacentes. “Tenho três
processos no Brasil por porte de arma e homicídio, mais dois no Paraguai. A única maneira
de permanecer solto e trabalhando é pagando propinas a esses filhos da puta. Pago de
meganha a juiz 1.000 a 2.000 reais, quanto pedirem”, reclama Antônio.
Antônio reclama que o mercado de trabalho não é mais o mesmo. O aumento da demanda
de assassinatos trouxe à região uma legião de jovens matadores. “Nos últimos anos, isto
aqui virou uma bagunça. Aceitam matar por qualquer trocado. Eu só recebo em dólar e
adiantado,” conta. Os valores variam de acordo com a importância da vítima. “Já matei
político grande da região por 10.000 dólares, mas, se for peixe pequeno, a gente negocia
um preço menor, 1.000 ou 2.000.”
O velho pistoleiro também se irrita com o comportamento dos novos matadores, geralmente
jovens com menos de 20 anos. “Eu não bebo, não fumo, vivo sozinho, tenho horror a
drogas. Saio de casa, trabalho e volto sem perturbar a vida alheia. Mas como age a
meninada hoje? Na desordem, no barulho. Matam e comemoram, saem dando tiro a torto e
a direito, e tem uns que ainda roubam. Não gosto de gente assim. Onde já se viu roubar o
que é dos outros? Na vida, a gente tem de ter disciplina”, filosofa em tom austero. Em sua
34
disciplina com traços de superstição, Antônio inclui jamais assassinar policiais (“Dá um
azar danado!”), carregar a arma apenas quando está efetivamente saindo para executar um
serviço e nunca tratar diretamente com o contratante. “Não quero saber da vida da vítima,
se é novo, velho, se tem família, nada. O que me interessa é o dinheiro adiantado, o dia e o
local para eu fazer o trabalho”, sentencia.
Os contratantes de Antônio são na maioria das vezes, grandes traficantes da fronteira, mas
também médios e insuspeitos. O contato com os profissionais é feito por agentes como
Carlos, que mantém uma carta de matadores para que o cliente escolha. Foi por meio dele
que a reportagem da Playboy chegou até Antônio. Carlos, 26 anos, trabalha como assessor
parlamentar de um deputado paraguaio. Para a conversa, escolheu aquele que considera seu
melhor profissional. “Este nunca errou um tiro e jamais deixou de entregar as
encomendas”, diz sem disfarçar o orgulho.
Para Antônio pouco importa o poder do traficante que o contrata. “É um trabalho como
outro qualquer, como o de pedreiro, pintor, médico. Alguém precisa fazer o “serviço”,
então vou lá e faço”. Remorso, culpa e medo são sentimentos estranhos para ele, que diz
ter apego a apenas duas coisas: a chácara de dois hectares nos arredores de Pedro Juan
Caballero, que comprou com dinheiro dos homicídios, e seu cavalo (“Bonito que só o
senhor vendo!”). Indagado sobre se pensa em ter uma família e largar o trabalho, Antônio
ressente-se. “É algo que não espero. Minha vida é essa, é assim que ganho dinheiro.
Qualquer um que se encoste em mim vai ter a vida desgraçada. Prefiro viver sozinho.
Mulher para mim é puta de zona, vou lá e pago. Não tenho pai, mãe, nada. Tenho minhas
armas, e só”. Os instrumentos de trabalho são: uma escopeta calibre 12, três pistolas
automáticas e um revólver calibre 38. “A minha preferida é essa “ponto 40”, nunca me
deixou na mão”, diz empunhando a arma e simulando posição de tiro diante da reportagem
da Playboy.
As mãos macias não denunciam a lida com armas, tampouco o cuidado de terra a que se
dedica no intervalo das mortes. “Quando não tem serviço, fico na chácara, plantando,
vendo televisão, de preferência documentários do Discovery Channel e do canal Infinito,
35
que trata de fenômenos sobrenaturais. Música, só caipira de raiz. Se eu não danço, não faz
sentido ouvir música para dançar”. Devoto de São Jorge, Antônio nunca sai para matar
sem antes rezar pedindo proteção ao santo guerreiro para que mantenha seu corpo
fechado. Parece funcionar, ele nunca foi alvejado. A conversa termina, Antônio levanta-se
e segue em direção ao corredor escuro da casa. Antes de sumir por completo, volta-se com
as pistolas em punho. “Precisando de qualquer “serviço”, já sabe onde me encontrar. As
características que comprovam o Transtorno de Personalidade Anti-social neste caso são:
inabilidade de manter relacionamentos, falta de sentimentos (culpa, remorso e medo) e
desprezo por algumas normas.
Por tanto conclui-se que indivíduos com transtorno de personalidade anti-social são de
difíceis adesão ao tratamento, por não possuírem envolvimento afetivo e devido ao longo
tempo das terapias. Porém estudos recentes sugerem que a intervenção medicamentosa
pode ser positiva para o tratamento deste transtorno, sendo o caso de alguns fármacos que
inibem o comportamento agressivo e impulsivo, alertando-se para a cautela na seleção de
tais medicamentos.
36
CONCLUSÃO
Personalidade como vimos ao longo do trabalho pode ser entendida como a organização
dinâmica interna dos sistemas psicológicos do indivíduo que determina o seu ajuste
individual ao ambiente. Mais claramente, pode-se dizer que é a soma total de como o
indivíduo interage e reage em relação aos demais. Personalidade é então uma organização
interna e dinâmica dos sistemas psicofísicos que criam os padrões de comportamentos, de
pensar e de sentir característicos de uma pessoa. É fruto de uma organização progressiva do
ser humano e não apenas entendida como um fenômeno em si, ela evolui de acordo com a
organização interna do indivíduo.
Ao pesquisar sobre o tema proposto verificamos a não existência de um consenso sobre o
termo transtorno, porque além de ser objeto de estudo científico, médico e psicológico é
também objeto de consideração social, político e jurídico. Apesar de não existir um
consenso sobre o termo constatamos que para entender o tema proposto seria necessário
classificá-lo como: uma personalidade rígida com comportamento que se desvia do padrão
de normalidade dos indivíduos no geral, pois o normal seria que o sujeito possuísse uma
personalidade que se estruturasse numa escala mediana, onde o indivíduo situa-se entre os
extremos, nem tudo rígido nem tudo flexível, em suma o transtorno de personalidade é um
padrão persistente e relativamente estável ao longo do tempo, no modo de pensar, sentir e
se comportar.
O transtorno de personalidade anti-social pode ter diversas etiologias, desde causas
genéticas até a interação do sujeito com meio. Indivíduo com estes transtornos é desprovido
de qualquer tipo de sentimento (remorso, incapacidade de se preocupar com os sentimentos
dos outros, culpa dentre outros), o que pode reduzir a eficácia do tratamento por meio de
psicoterapia convencional. No entanto demonstra maior resultado com o tratamento por
meio da terapia cognitivo-comportamental e uso de psicofármacos inibidores da recaptação
da serotonina. Sendo importante ressaltar que o indivíduo com transtorno de personalidade
anti-social não é um insano: sabe o que faz, e alguns deles tiram seu prazer exatamente da
37
dor que provoca no outro, tendendo a repetir seus crimes pela vida a fora, enquanto tiver
oportunidade para isso.
Sobre o transtorno de personalidade anti-social constatamos também que a melhor forma de
redução deste transtorno é a prevenção e a intervenção precoce, ou seja, na infância, e que
quanto mais precoce a intervenção menos sombrio pode ser o diagnóstico. Apesar de que
na infância as crianças apenas apresentarem com precisão o desvio de conduta, que é um
prognóstico para o transtorno de personalidade anti-social na vida adulta, pois as
características de um transtorno de personalidade geralmente se tornam reconhecíveis
durante a adolescência ou início da vida adulta.
38
REFERÊNCIAS
AMARAL, Osvaldo Lopes. Psicopatia – Inep, disponível em: <www.inef.com.br, revisto em 2002>. Acesso em: 25 de outubro de 2009 ás 09:45 min.
Ballone GJ - Personalidade Psicopática Psiqweb, disponível em: <www.psiqweb.med.br, revisto em 2006>.Acesso em 28 de outubro, as 22:30 min.
Ballone GJ, Meneguette JP- Teoria da Personalidade Geral - Psiqweb, disponível em: <www.psiqweb.med.br, revisado em 2008>. Acesso em: 16 de outubro de 2009 às 23:30 min. Ballone GJ - Transtornos da Linhagem Sociopática - Psiqweb, disponível em: <www.psiqweb.med.br, revisto em 2005 >. Ballone GJ, Meneguette JP - Transtornos da Personalidade - Psiqweb, disponível em <www.psiqweb.med.br, revisto em 2009>. Acessado em: 11 de setembro de 2009 ás 17:10 min. Ballone GJ, Ortolani IV – Crime sexual – Psiqweb, disponível em:< www.psiqweb.med.br, revisto em 2005 >. Acesso em: 05 de novembro de 2009 ás 08:30 min. DALGALARRONDO, Paulo. Funções psíquicas compostas: a personalidade e suas alterações. In: Psicopatologia e Semiologia dos Transtornos Mentais. Porto Alegre: Artmed, 2000.cap.22,p.159-170. FADIMAN, James; FRAGER, Robert. B. F. Skinner e o Behaviorismo Radical. In: Teorias da Personalidade. São Paulo: Harbra, 1986. cap.7, p187-220. HALL, Calvin S.; LINDZEY, Gardner; CAMPBELL, Jonh B. A teoria psicanalítica clássica de Sigmund Freud. In:Teorias da Personalidade. Porto Alegre: Artmed, 2000.cap.2,p.50-78. JORGE, Miguel R (Coord.). Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais: DSM-IV. 4. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000. 845 p. LEVINO, Rodrigo. Por alguns dólares a mais. Playboy. ano 35 –n.441, p. 101 a 106. agosto 2009. MORANA, Hilda C. P.; STONE, Michael H;ABDALLA-FILHO, Elias. Transtornos de personalidade, psicopatia e serial killers. Rev. Bras. Psiquiatria. [online] Scielo, disponível em:<www.scielo.br>. Acesso em: 11 de setembro de 2009 ás 16:50 min.
39
MENDONÇA, Ricardo. O monstro do sistema. Revista Época, disponível em: <www.revistaepoca.globo.com/Epoca >. Acesso dia 08 de novembro de 2009 as 15:25min ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. (Coord.). Classificação de transtornos mentais e de comportamento da CID-10: descrições clínicas e diretrizes diagnósticas. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993. xviii, 351 p. SOARES, Layla Cangussu. Os aspectos psicossociais do comportamento dos assassinos em série. 2007. 35f. Monografia. Faculdade de Ciências Humanas e Sociais – FHS, Curso Psicologia, Universidade Vale do Rio Doce, Governador Valadares, 2007. SCHULTZ, Duane P; SCHULTZ, Sydney Ellen. B.F.Skinner. In:Teorias da Personalidade. São Paulo: Thompson Learning Edições, 2006. cap. 2 , p.41-83. SCHULTZ, Duane P.; SCHULTZ, Sydney Ellen. Carl Jung. In: Teorias da Personalidade.São Paulo: Thompson Learning Edições,2006. cap.3, p.87-112. SCHULTZ, Duane P.; SCHULTZ, Sydney Ellen. Carl Rogers. In:__Teorias da Personalidade.São Paulo: Thompson Learning Edições,2006. cap.12, p.313-333. SCHULTZ, Duane P.; SCHULTZ, Sydney Ellen.B.F.Skinner. In:__Teorias da Personalidade.São Paulo: Thompson Learning Edições,2006. cap.14,p.361-383. SOUZA, Ricardo Oliveira. Todos nós somos um pouco psicopatas. Mentes Psicopatas: Superinteressante. n. 267-A,2009 p.6-7.Entrevista concedida a Mariana Sgarioni. TRINDADE, Jorge; BEHEREGARAY, Andréa; CUNEO, Monica Rodrigues. Psicopatia – a máscara da justiça. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p.179
Top Related