Antropologia Médica: Retornando ao Doente · concepção médica do ser humano mecânica...

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Antropologia Médica:

Retornando ao Doente

Abram Eksterman

Abram Eksterman

CMP-Santa Casa

Desafios: Crítica necessária aos postulados básicos atuais:

concepção médica do ser humano mecânica concepção etiológica doença consequente a uma causa concepção terapêutica eliminar a causa concepção de saúde funcionamento normal

Abram Eksterman

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O corpo humano é formado por partes articuladas.

A doença, localizada numa parte do corpo, é necessariamente resultante de uma causa.

O tratamento consiste em combater a causa.

A cura ocorre quando se restabelece o estado anterior à eclosão da doença.

Crítica aos parâmetros metodológicos

Abram Eksterman

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O Ser Humano como Sistema

Conceito

Humano como ser compreende e significa um sistema complexo estendido em dimensões interdependentes, biológicas, culturais e psicológicas

Corolário

O ato terapêutico exclusivo a qualquer uma dessas dimensões isoladas descaracteriza a humanidade do Homem.

Em consequência cabe a pergunta: Praticamos mesmo Medicina ou Iatropatogenia no que se refere ao humano?

Abram Eksterman

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Preparando o médico para tratar doentes

Conceitos

O doente é uma PESSOA. Pessoa é um sistema bio-psico-social, organizado como ser histórico e interdependente do mundo que o cerca.

Interagir com pessoas não é uma dádiva espontânea da Natureza. É indispensável a aprendizagem

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Preparando o médico para tratar doentes

Portanto:

Humanizar a Medicina, torná-la antropológica, é tarefa urgente e resume-se no preparar o profissional para interagir com pessoas.

A interação do médico com pessoas se efetiva no espaço do diálogo terapêutico.

Abram Eksterman

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O médico diante do século XXI

Novas tecnologias

Medicina Social e Conveniada

Perda do Espírito Clínico

A necessidade do humano

Abram Eksterman

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Desafios atuais

A condição humana é

problema de saúde?

O conflito social é

problema de saúde?

A realização humana é

problema de saúde?

Qualidade de vida é

problema de saúde?

Tudo isso nos leva a conjecturar... Abram Eksterman

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Se o Curso de Medicina deveria ainda começar assim.

(“Uma Lição de Anatomia” do Dr. Nicolaes Tulp, Rembrandt, 1632) –

Abram Eksterman

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Ou numa sala de parto !?... Medicina atua no começo até o termino da vida; não com a morte

Abram Eksterman

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E aprender a conhecer a pessoa do doente ao invés de apenas um corpo com lesões produzindo sofrimentos Abram Eksterman

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O que nos conduz a uma Antropologia Médica,

que dando vida ao doente – objeto

transfigura-o em ...

Sujeito Pessoa

Ação Terapêutica

Interdisciplinar

Consciência

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O beijo, 1866 Auguste Rodin, 1840 -1917

Talvez a grande descoberta médica do século XX, e ainda não concluida, deve ter sido o próprio homem, esse notável desconhecido

Abram Eksterman

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Patologias Antropogênicas

Estresse Social

Conflitos

Interpessoais

Destruição do

Ecossistema

Autoenvenenamento Abram Eksterman

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Antropologia Médica

O Que é?

Estudo do Ser Humano doente.

Para que serve?

Singularizar o caso clínico

Como o médico utiliza?

Interagindo na relação médico-paciente

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Os usos perversos e desafios atuais da Prática Assistencial

A assistência médica como negócio

A doença como “commodity” (dinheiro)

O uso político do sofrimento (poder)

O tratamento como moeda de troca

Os mitos atuais de cura e o xamanismo redivivo

O mito dos índices de saúde biológica

As cirurgias promotoras de juventude e a promessa do comprimido do prazer e da felicidade

O uso de estatísticas como instrumento de simplificação assistencial

As distorções da especialização e da vulgarização

A concepção do corpo humano como máquina

A informação como conhecimento

O paciente como “cliente”

Abram Eksterman

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Estudo crítico dos usos perversos da prática assistencial

Laboratórios de acesso:

História da Medicina Antropologia Médica (Estudo do homem, de seu

pensamento e da sua cultura) Saúde e Sociedade Psicologia Médica Filosofia Médica Ética e Deontologia

Abram Eksterman

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Estudo crítico dos usos perversos da prática assistencial

Fator desencadeante: a crise do século XX

O homem ante sua intimidade (Psicanálise) O homem ante suas relações (carência afetiva) O homem ante sua família (a ascenção social da mulher e

da criança) O homem ante seu passado (etologia) O homem ante seu habitat (ecologia) O homem ante seu futuro (angústia) O homem hiperinformado (desidentificado) O homem ante suas máquinas (desumanizado)

Abram Eksterman

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... é a corrente da

Antropologia Médica

resgatar o doente / pessoa

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Antropologia Médica: conceitos

Clássico

Renascimento

Moderno

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Antropologia Médica: conceitos clássicos

Na Medicina Hipocrática de Cós

Na Medicina da Roma Clássica: Galeno

Na Idade Média: Paracelso

Na Idade Moderna: Harvey

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Antropologia Médica: conceitos em uso

A doença sob a ótica cultural – fisiopatologia transcultural

A doença sob a ótica biográfica – Adolf Meyer e a Psicobiologia

A doença sob a ótica de doente – o ser doente

O doente e a relação médico-paciente (M. Balint, I. L. Luchina, D. Perestrello)

Abram Eksterman

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Medicina Hipocrática: Hipócrates (460,Cós-377,Tessália A.C.)

A doença como produto da Physis (Natureza)

Etiologia básica: teoria dos humores:

(fleuma, sangue, bile amarela, bile negra)

Obs.: Teoria humoral = Balanço entre sentimentos (vínculos). Teorias psicossomáticas atuais. Psicanálise e conflito psíquico.Estresse e adaptação.

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Antropologia Hipocrática

Segundo uma famosa sentença do autor dos Preceitos , o fundamento do amor do médico a sua arte é a filantropia. “Onde há amor ao homem (philanthropie), há amor à arte (philotekhnie)”.

Pedro Lain Entralgo: La Medicina

Hipocrática,pg.111 (La Antropologia Hipocrática).

Hipocrates 460-370 a.C

Pedro Lain Entralgo 1908-2001

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Roma Clássica: Galeno (129,Pérgamo – 216, Anatólia)

Continuou as concepções hipocráticas e a teoria do balanço humoral.

Aplicação de princípios gerais ao paciente singular. Saúde = Balanço dos humores (sangue/infância/primavera; bile amarela/juventude/verão; bile negra/maturidade/outono; fleuma/velhice/inverno.)

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Diverge. de Aristóteles, Galeno e Avicena.

Cada doença tem seu remédio. Extrai o láudano

do ópio.

As substâncias são compostos por“princípios”.

O “princípio” da saúde é o archeus.

A doença no ser humano ocorre por desequilíbrio dos três princípios: enxofre, da combustão; mercúrio, da liquidez; e sal, da solidez.

O profissional médico age no sentido de auxiliar o archeus a recuperar o equilíbrio.

Escreve em 1520 Archidoxis (mistérios da Natureza).

“A Medicina não é somente uma ciência: é também arte. Não consiste em compor pílulas e emplastos; lida com o próprio processo da vida, que precisa ser conhecido antes de intervirmos sobre ela.”

Idade Média/ Renascimento Paracelso(Theophrastus Bombastus von Hohenheim)

(1493,Einsiedeln,Suissa-1548,Salzburg,Austria.)

Para entender o ser humano é preciso en- tender a Natureza

A Medicina repousa sobre quatro pilares: Filosofia, Alquimia, Astronomia e as Virtudes do Médico

Abram Eksterman

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Idade Moderna William Harvey (Folkestone, Eng.1578-Roehampton,Eng.1657)

Pai da Fisiologia moderna

O Movimento do coração e do sangue nos

animais (1628)

. O Motu Cordis marca a ruptura do espírito

moderno com a velha tradição. O homem não

mais se satisfazia senão com observações

cuidadosas e com descrições acuradas; já não

se contentava com teorias e sonhos

cuidadosamente tecidos, que serviam mais a

um subterfúgio comum à ignorância; mas

aqui, pela primeira vez, um grande problema

fisiológico foi examinado pela perspectiva

experimental por um homem com mente

moderna e científica, que podia avaliar a

importância da evidência e não subestimá-la,

e que possuía a sensibilidade para permitir

que as conclusões emergissem natural e

firmemente das observações.." (Atribuido a

Sir William Osler, 1849-1919.)

Percebi que a tarefa era árdua... Eu estava a ponto de pensar... que o movimento do coração só poderia ser compreendido por Deus. Pois eu mal podia perceber quando a sístole e quando a diástole aconteciam tal a rapidez do movimento.

Abram Eksterman

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Conceitos atuais de Antropologia Médica

Estudos Descritivos

Medicina Antropológica é uma disciplina interdisciplinar que estuda a saúde e a doença, os sistemas assistenciais e a adaptação biocultural. Ann McElroy (1996)

Medicina transcultural

O normal e o patológico

Estresse social

Conflitos psicológicos

Estudos Filosóficos

Medicina Antropológica é o estudo do ser humano doente;

Escola de Heidelberg: Ludolf Krehl e Viktor von Weizsäcker

V.E. Freiherr von Gebsattel

Pedro Laín Entralgo

Estresse social e Lennart Levi

Medicina da Pessoa e Danilo Perestrello

Antropologia Médica e Medicina Psicossomática.

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Medicina Antropológica Aplicações dos estudos descritivos

A influência relativa dos fatores genotípicos e fenotípicos na formação da personalidade e na patogenia de certas formas de doença, especialmente psiquiátricas e psicossomáticas.

A influência cultural no que a sociedade considera normal ou patológico.

A universalidade nas diferentes culturas das categorias nosológicas na biomedicina e na psiquiatria.

A identificação e descrição de doenças específicas de certas culturas que não estavam ainda descritas pela medicina clínica. Estas doenças são conhecidas como distúrbios derivados de determinadas etnias e, mais recentemente , como síndromes ligadas a culturas específicas, que incluem o olho maligno e o tarantismo entre camponeses europeus, possessões ou num estado de transe em várias culturas, anorexia nervosa, nervosismo e síndrome premenstrual em sociedades ocidentais.

Abram Eksterman

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Medicina Antropológica Aplicações das reflexões filosóficas

• O holismo na fisiologia e na patologia

• O humanismo na terapêutica

• A visão estrutural da patogenia

• As concepções anti-psiquiátricas

• A atenção singular na terapêutica

• A medicina de grupos sociais e a medicina de família

• A Medicina da Pessoa

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Medicina da Pessoa

Danilo Perestrello 1916-1989

Relação transpessoal

“A doença, portanto, não é algo que vem de fora e

se superpõe ao homem, é sim um modo peculiar

de a pessoa se expressar em circunstâncias

adversas.

É, pois, como suas várias outras manifestações

um modo de existir, ou melhor, de coexistir, já

que, propriamente, o homem não existe,

coexiste.

E como o ser humano não é um sistema fechado,

todo o seu ser se comunica com o ambiente, com

o mundo, e mesmo quando aparentemente não

existe comunicação, isto já é uma forma de

comunicação, com o silêncio, às vezes, é mais

eloqüente do que a palavra.”

Abram Eksterman

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Lennart Levi 1930 - ...

FATORES PSICOSSOCIAIS

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FATORES - Capacidades

Físicos e Químicos

Físicos que levam a lesão

Microorganismos e parasitas

Agentes que lesam o SNC

ESTRESSE PSICOLÓGICO

Perdas ou ameaças de perdas

Lesão ou ameaça de lesão

Frustração de desejos

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INDIVÍDUO Personalidade

Hábitos Atitudes

Lennart Levi

DOENÇA

SAÚDE

FATORES PSICOSSOCIAIS

AMBIENTE Rápida Mudança Social

Ou Modelo Cultural

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“Nada orgânico carece

de sentido

nada psíquico carece

de corpo”

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Viktor von Weizsäcker 1886-1957

Medicina Antropológica

Alerta-nos sobre a desumanização da Medicina quando a pessoa do doente e do médico não estão explicitamente presentes em seu encontro terapêutico. A ideia de pessoa, que se realiza na transcendência, ao responder a chamada do outro, ao romper os próprios limites na entrega a um “tu” para realizar assim uma unidade superior... A pessoa é o “homo viator”...(A psicopatologia é o resultado das deformações do curso da vida) ´

Viktor E. von Gebsattel 1883-1974

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“entre em contato

com o doente”

Ludwig

Binswanger

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1881- 1966

Adolf Meyer (1866-1950

e a Psicobiologia

• “Com frequência o desenvolvimento mental e os fatores mentais são postos de lado, ou são incompreendidos, ou mal avaliados. Alguns pacientes, que estão seriamente doentes, são tratados como meros queixosos, ou como histéricos ou hipocondríacos; em outros casos, sérios distúrbios mentais são ocultados ou menosprezados. Muito disso é devido a tendências profundamente arraigadas em considerar mente e corpo como separados e ser incompetente para perceber que tais divisões do funcionamento humano nos aliena da realidade. Quando falamos de problemas emocionais, sabemos muito bem que isso inclui tensão no coração, nas funções viscerais, no apetite, digestão e funções intestinais, sono e recreação. Portanto passamos a falar de Psicobiologia, que inclui um corpo vivo em ação e descreve todo aquele comportamento que exige nossa atenção.”

• (Adolf Meyer, Objetivo do Ensino da Psicobiologia, in “Collected Papers, vo.II,pg.87, 1935)

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“Clínica autêntica

é a que exercita

um homem

frente a outro

homem”

Dr. Jiménez Díaz 1898-1967

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Antopologia Médica: Esboço para uma pograma de ensino

Temática básica:

• 1. Antropologia e Medicina. O homem e sua realidade.

• 2. O homem e sua dinâmica.

• 3. A intimidade como realidade.

• 4. As tipificações da realidade humana.

• 5. O homem e sua etnia.

• 6. O homem e sua cultura.

• 7. Saúde como problema antropológico.

• 8. Doença no contexto humano.

• 9. A configuração do quadro mórbido.

• 10. O ato médico como ato cultural.

• 11. O ato médico na relação ética.

• 12. O processo terapêutico na perspectiva antropológica.

• 13. O nascimento e a morte.

• 14. A intervenção sobre o curso da vida. Eugenesia.

• 15. Antropologia da angústia.

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a economia se tornou

mais importante que o cidadão

a escola, mais importante que o aluno

o sistema de saúde e seus gestores,

mais importantes que o doente

a quantidade substitui a qualidade

o tipo substitui a característica singular

o protocolo substitui a clínica

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A.Eksterman

Novas questões incluídas na ação terapêutica

Compromisso terapêutico tradicional e corrente: Lesão somática (funcional e anatômica) e

sofrimento físico Tendência ao compromisso antropológico Identidade (do Eu e da Consciência)

Alienação Integridade

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Medicina Antropológica bibliografia

• Boixareu, RM (ed.) (2008) De la antropología filosófica a la antropología de la salud. Barcelona, Herder.

• Cassirer,Ernst (1944)- Antropologia Filosófica,Trad.brasil.,Ed.Mestre Jou, São Paulo

• Comelles, J.M. & Martínez-Hernáez, A (1993) - Enfermedad, sociedad y cultura, Madrid: Eudema

• Foucault, Michel (1963) - Naissance de la clinique, Presses universitaires de France

• Henkelman,Thomas (1986)-Viktor von Weizsäcker,Springer,Berlim

• Lain Entralgo,Pedro (1970)-La Medicina Hipocrática - Alianza Ed. Madrid

• ________________ (1961)- Enfermedad y Pecado – Edic.Toray,Barcelona

• ________________ (1984)- Antropologia Medica – Salvat Edit.,Madrid

• _____________,Org. (1972)- Historia Universal de la Medicina, 7 vols.- Salvat,Edit.Madrid

• ________________ (1964)-La Relación Médico-Enfermo-Revista de Occid., Madrid

• McElroy, A (1996), “ Medical Anthropology” in D. Levinson & M. Ember, Encyclopedia of Cultural Anthropology

• Meyer,Adolf – The Collected Papers of Adolf Meyer”, vol. II, The John Hopkins Press, Baltimore, 1951

• Perestrello,Danilo (1974)- A Medicina da Pessoa-Livr.Atheneu,5ª Ed.,Rio de Janeiro

• Von Gebsattel,V.E. (1953) – Antropologia Medica – Trad.Esp.(1966),Edic.Rialp, Madrid.

• von Üexküll, Jacob (1922)-Ideas para uma Concepción Biológica del Mundo-Calpe,Madrid

• von Weizsäcker, Viktor (1956) - Patosofia– Trad. cast. Bs Aires: Ed Zorzal, 2005

• _________________(1932)- El´Círculo de la Forma,Trad.Esp.,Ed.Morata,Madrid (1962)

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