Post on 24-Mar-2016
description
DEMÉTRIO DE AZEREDO SOSTER
DAIANA STOCKEY CARPES
DIANA AZEREDO
RICARDO DÜREN
RODRIGO BARTZ
VANESSA COSTA DE OLIVEIRA
Apropriações jornalísticas no campo literário: reconfigurações narrativas
identificadas na obra não-biográfica de Fernando Morais
Nossa busca: compreender o que ocorre com a
narrativa não-biográfica de Fernando Morais, no
contexto midiatizado.
Corações Sujos (Companhia das Letras, 2000)
Cem quilos de ouro (Companhia das Letras, 2003)
Os Últimos Soldados da Guerra Fria (Companhia dasLetras, 2011)
Apesar de sua origem nos séculos XVI e XVII, essa
imbricação de Jornalismo e Literatura, no contexto
midiatizado, significa o quê?
Vamos considerar o fenômeno a partir de três teorias.
Teoria da Narrativa
“A narratividade constitui uma qualidade
reencontrada nos textos narrativos de todas as épocas,
do mesmo modo que ela não se ativa apenas em textos
literários, mas também em textos não-literários (e até
não-verbais)” (REIS e LOPES, 1988, p. 71).
O jornalismo é um texto não-literário e “se articula
necessariamente com os veículos que tornam públicas
suas mensagens”, atendo-se ao “real, exercendo um
papel da orientação racional” (MARQUES DE MELO,
2003, p.12).
Teoria do Jornalismo
É na narrativa jornalística que se encontram as
categorias propostas por Marques de Melo (2010):
Informativo, Opinativo, Interpretativo, Utilitário ou
Diversional, subdividido em subcategorias ou gêneros.
Nossa perspectiva: gêneros operam como indexadores
na narrativa.
Teoria dos Sistemas
A partir da proposta de Niklas Luhmann (2009),
consideramos o Jornalismo e a Literatura como
sistemas distintos que dialogam entre si em suas
operações por meio do acoplamento estrutural
(SOSTER, 2009, 2009-a, 2009-b, 2011 e 2012).
Esse procedimento provoca reconfiguração em ambos.
A dialogia, depois da autorreferência, correferência e
descentralização, é a quarta característica do
jornalismo midiatizado, conforme Soster (2012).
Midiatizado: esse momento marcado por uma
profunda imersão tecnológica da sociedade
É aí que emergem categorias como Interpretativo e
Diversional.
A natureza diversional desse novo tipo de jornalismo
está justamente no resgate das formas literárias de
expressão (MARQUES DE MELO, 1994, p. 22).
Corações Sujos
Percebemos exemplos das categorias Informativo e
Opinativo, mas o que predomina nesta obra é
Interpretativo, com os gêneros perfil e cronologia.
Na categoria Diversional, há exemplos de história
colorida e história de interesse humano.
As primeiras instruções eram dadas nos salõesdos tanques de tingimento, espalhados pelosporões de várias casas geminadas. A precáriailuminação do lugar vinha da luz mortiça dealgumas lâmpadas penduradas no teto. Sob umcalor insuportável, dezenas de japonesesseminus, com as cabeças protegidas porturbantes, molhados de suor, passavam dia enoite num trabalho que parecia não ter fim.Correndo de um lado para outro, baixavam elevantavam varais cobertos de peças de tecidofumegante que eram mergulhadas nos tanquesonde fervia a anilina – em cada tanque, uma cordiferente (MORAIS, 2000, p. 158)..
História colorida:
Hipérbole:
Alguns presos mofavam semanas na fila antes de ser
qualificados” (MORAIS, 2000, p. 179).
Gírias:
“Até hoje cheio de dedos, temendo mexer numa ferida
já cicatrizada, ele reconhece que o surto coletivo de
violência contaminou todos os brasileiros” (MORAIS,
2000, p. 240).
“Melo Viana estava disposto a se livrar logo daquele
abacaxi” (MORAIS, 2000, p. 293).
Cem quilos de ouro
Identificamos a presença das cinco categorias de texto
jornalístico, mas destacamos a predominância do
Jornalismo Diversional.
Enquanto toma café com leite, bolachas, mel,queijos Polenghinho e Catari, faz anotações àmargem do clipping para cobrar mais tarde dosministros e auxiliares. (...) No fim da refeição,toma um copo de suco – uma mistura de cenoura,mamão e maçã, batida num dia com suco delaranja, no outro com suco de limão. De vez emquando turbina a mistura com um pouco deguaraná em pó (MORAIS, 2003, p. 217).
História colorida:
Hipérbole:
“Quando o dia clareou, fazíamos ginásticas com o
Xavante para evitar atoleiros” (MORAIS, 2003, p. 72).
Metáfora:
“O movimento vitorioso aumenta a hostilidade com que a cidade e a
família viam a ovelha negra, e Tony e Aleida decidem mudar para
Havana” (MORAIS, 2003, p. 114).
Anacoluto:
“Filmes, Collor só assiste quando os lançamentos chegam às
videolocadoras de Brasília” (MORAIS, 2003, p. 249).
Os Últimos Soldados da Guerra Fria
Identificamos a presença de quatro categorias:
Informativo, Opinativo, Interpretativo e Diversional.
Hipérbole:
“A notícia da derrubada dos dois aviões e da morte dos quatro
pilotos desabou sobre a Flórida” (MORAIS, 2011, p. 192).
Prosopopeia:
“cinegrafistas apontando ameaçadoras câmeras contra portas e
janelas do simpático sobrado amarelo” (MORAIS, 2011, p. 195).
Prosopopeia e Metáfora:
“Quando a diáspora cubana abriu os olhos, o
dinossauro cuja morte iminente era brindada todas as
noites no restaurante Versailles, na Little Havana,
dava os primeiros sinais de que saíra do coma”
(MORAIS, 2011, p. 240).
Considerações finais
Com esse trabalho que aqui se encerra, é possível
perceber o diálogo da literatura com o jornalismo, e
que empresta, ao dispositivo livro-reportagem, dessa
maneira, forma e identidade específicas.
Compreender o que essa hibricação, em tempos
midiatizados, representa para além de sua estrutura e
matriz genética é o desafio que se apresenta daqui para
frente.
Referências:
CHAPARRO, Manuel Carlos. Sotaques d'aquém e d'além mar:travessias para uma nova teoria de gêneros jornalísticos. SãoPaulo: Summus, 2008.CHARAUDEAU, Patrick; MAINGUENEAU, Dominique.Dicionário de análise do discurso. Coord. Trad. FabianaKomesu. 2.ed. São Paulo: Contexto, 2006.COSTA, Lailton Alves. Gêneros jornalísticos. In: MELO, JoséMarques de; ASSIS, Francisco de. Gêneros jornalísticos noBrasil. São Bernardo do Campo: Universidade Metodista de SãoPaulo, 2010.LUHMANN, Niklas. Introdução à teoria dos sistemas. Rio deJaneiro: Vozes, 2009.MELO, José Marques de. A opinião no jornalismo brasileiro. Riode Janeiro: Vozes, 1994.
MELO, José Marques de. Jornalismo Opinativo: gêneros opinativosno jornalismo brasileiro. 3.ed., rev. e ampl. Campos do Jordão:Mantiqueira, 2003.MELO, José Marques de; ASSIS, Francisco de. Gêneros jornalísticosno Brasil. São Bernardo do Campo: Universidade Metodista de SãoPaulo, 2010.MOISÉS, M. Dicionário de termos literários. 12. ed. São Paulo: Cultrix,2004.MORAIS, Fernando. Cem quilos de ouro (e outras histórias de umrepórter). São Paulo: Companhia das Letras, 2003.MORAIS, Fernando. Corações sujos: a história da Shindo Renmei. SãoPaulo: Companhia das Letras, 2000.MORAIS, Fernando. Os últimos soldados da guerra fria: a história dosagentes infiltrados por Cuba em organizações de extrema direita nosEstados Unidos. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.
PEREIRA LIMA, Edvaldo. Páginas ampliadas: o livro-reportagem como extensão do jornalismo e da literatura. Barueri, SP: Manole, 2009.PICCININ, Fabiana. O (complexo) exercício de narrar e os formatos múltiplos: para pensar a narrativa no contemporâneo. In: SOSTER, Demétrio de Azeredo; PICCI-NIN, Fabiana. Narrativas Comunicacionais Complexificadas. Santa Cruz do Sul: Edunisc, 2012.REIS, Carlos; LOPES, Ana Cristina M. Dicionário de teoria da narrativa. São Paulo: Ática, 1988.SODRÉ, Muniz. A narração do fato: notas para uma teoria do acontecimento. Petrópolis, RJ: Vozes 2009.SOSTER, Demétrio de Azeredo. Sistemas, Complexidades e Dialogias: Narrati-vas Jornalísticas Reconfiguradas. In: SOSTER, Demétrio de Azeredo; PICCININ, Fabi-ana. Narrativas Comunicacionais Complexificadas. Santa Cruz do Sul: Edunisc, 2012.
Perguntas?
Agradecemos a atenção!
Boa tarde!