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Artesanato do Candeal-Olaria: resistência e
Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas
Ano 8 • nº1789
Julho/2014
Januária
Artesãs da Comunidade de Candeal e seu tradicional artesanto
A delicadeza e a firmeza de criar peças através do barro
preservação cultural e Arte no barro Buscar a matéria prima: o barro. Colher, deixar secar,
quebrar, peneirar. Ao fino pó misturar de volta os grãos,
amolecer com água, amassar bem para formar uma pasta
uniforme e assim dar início aos contornos. Sujar as mãos,
sem pressa, moldar. Com calma, equilíbrio, ritmo. Nas
mãos.
Assim, nascem as peças do Candeal, artesanato de barro
tradicional da Comunidade de Candeal, conhecida também
como Olaria, no município de Cônego Marinho, em Minas
Gerais. A tradição lá passou de família para família, de mãe
para filho, de geração em geração. Dona Emilia Nunes de
Souza, 76 anos, hoje a mais velha na arte de produzir peças
através do barro é a encarregada de passar sua
experiência, ajudar os mais novos a construir suas
histórias com o barro. “Isso aqui é bonito demais”, confessa dona Emília que pinta desde os 13 anos e que
aprendeu a ser artesã com sua mãe.
Santa Silva Leite, 55 anos, a Dona Santinha, disse que Dona Emilia tem mais experiência, mais sabedoria
para passar para os mais novos. Santinha aprendeu o ofício do barro com a tia do ex-marido, Dona
Senhorinha, quando tinha 18 anos. Maria do Socorro Leite Durões, 45 anos, aprendeu com uma tia, a finada
Dona Odília da Conceição quando tinha 12 anos e passou o ofício para sua filha Roseli Leite Durões, 13
anos. Nilda Nuniz Farias, 37 anos, aprendeu com a avó aos 20 anos de idade. Hoje Nilda ensina as 3 filhas, ,
Laiane Farias Almeida, 13 anos, Larissa Farias Almeida, 11 e Laísa Farias Almeida, 7 anos, a criar peças a
no antigo, tradicional, para criar a arte do hoje. A artesã Nilda conta que a marca do artesanato do Candeal
são os desenhos. “Os desenhos pintados a mão por cada artesã traz os traços indígenas aprendidos com o
índio caboclo há anos atrás”. A senhora Socorro relembra que indígenas da região visitaram o galpão uma
vez e que se surpreenderam em ver os desenhos. “Os índios acharam nossos desenhos muito parecidos
com os desenhos feitos em pedras por eles antigamente”, disse Socorro.
partir do barro. Maria Benita Pinheiro, 56 anos, aprendeu com sua mãe,
quando tinha 12 anos, a arte de fazer peças com barro e também
ensinou sua filha, Marina Pinheiro Lisboa de 13 anos.
Conta a lenda que há mais de 200 anos, os moradores do Candeal
encontraram um velho índio caboclo perdido no mato. E que os
moradores alimentaram o índio com comida de sal, vestiram e cuidaram
dele. O índio então ensinou sua arte: criar peças em barro e pintar com
o tauá ou toá, como dizem as artesãs (uma coloração mineral em tom
alaranjado).
As peças, criadas no Candeal, são únicas; os traços são feitos
pacientemente e mostra toda a delicadeza de artistas que se inspiram
Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Articulação Semiárido Brasileiro – Minas Gerais
Realização Apoio
Artesãs trabalhando para manter viva a arte do Candeal
Antes cada artesã fazia suas peças em casa, debaixo de uma
árvore, na cozinha, perto do fogão de lenha. Mas as peças
sempre quebravam com as travessuras dos meninos e meninas
das casas que teimavam em brincar ou simplesmente quebrar
com as peças prontas. Hoje elas contam com uma estrutura, o
Galpão dos Oleiros do Candeal. O espaço foi conseguido por
meio do projeto “Comunidade Solidária”, que apoiou o
artesanato do Candeal no ano de 1999. Além do espaço, as
artesãs aprenderam a comercializar suas peças, a melhorar sua
arte. O Galpão pertence à Associação dos Pequenos Produtores
Rurais e Artesãos da Comunidade de Olaria e Adjacentes.
Para eternizar todas as artesãs que criaram e continuam criando
suas peças de barro o galpão tem uma linha na parede dedicada
a cada artesã, que de posse de seus pinceis pintaram com o tauá
desenhos tradicionais de um lado a outro do galpão. Cada
desenho foi assinado por sua autora e guarda a lembrança de
suas artistas.
Mesmo com uma arte única e tradicional, o artesanato do
Candeal corre o risco de acabar. Dona Emília, dona Santinha,
Socorro, Benita e Nilda contam que o artesanato não é muito
O artesanato do Candeal
“valorizado na comunidade e que as vendas são muito
baixas. “A comunidade não ajuda muito, às vezes eles
trazem visitantes aqui no Galpão para conhecer o
artesanato”, conta Nilda.
Viver do artesanato não é uma realidade para as artistas do
Candeal. Elas lembram que antes negociantes passavam e
compravam várias peças para revender em outras cidades e
estado, porém hoje isso é raridade. Por falta de mercado as
filhas das artesãs, que aprenderam o oficio, saem da
comunidade ou passam a se dedicar a outros trabalhos para
tentar uma renda e poder comprar suas coisas e sustentar
suas famílias.
E com todas as dificuldades, Emilia, Santinha, Socorro,Peças feitas a partir do barro
comunidade não possam voltar com a possibilidade de
viver do artesanato e sua arte”.
Desistir é uma palavra que as artesãs não usam. Elas
lutam para que mais gente possa se interessar em
aprender a criar peças no barro e que mais gente possa
conhecer esta arte delicada que encanta tantas
pessoas. “Minhas filhas sempre vem para o Galpão me
ajudar, elas criam suas peças, pequenas, as vezes em
um formato diferente. Eu gosto de ter elas aqui, ajudo
no que posso, ensino esta arte”, disse Nilda, que tenta
ensinar suas filhas seu oficio.
Benita e Nilda não perdem as esperanças. Elas acreditam que as coisas vão melhorar e que a arte não vai
morrer. Emocionada, Santinha, confessa que sonha que a cultura do artesanato no barro se fortaleça e
mais artesãs trabalhem para manter viva esta cultura. “Quem sabe as pessoas que foram embora da