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Programa de Estudos Pós-Graduados em Economia Política
Departamento de Economia
Grupo de Pesquisas sobre Desenvolvimento Econômico e Política Econômica
Boletim DEPE, Ano I, n.3 – Maio 2016
Os recentes desdobramentos da crise
política apontam para a aprovação pelo Senado
Federal da admissibilidade do processo de
impeachment da presidente Dilma. A
probabilidade de um governo provisório
comandado por Michel Temer aumentou. Na
área econômica, Henrique Meirelles segue
sendo o mais cotado para vir a comandá-la.
Embora conte com amplo trânsito no mercado
financeiro e junto a empresários, Meirelles
comandou o BCB em um quadro econômico
bastante diverso, com cenário externo benigno
e espaço para as políticas econômicas
domésticas. Hoje o quadro é outro e terá que
mostrar que sabe navegar em mares revoltos.
Terá repertório para isso? A pergunta é
pertinente porque a situação exige mais
ousadia e criatividade nas políticas
macroeconômicas. O discurso de Temer tem
ainda ressaltado uma visão conservadora que
prevê cortes de gastos incluindo programas
sociais, todas de difícil aceitação por parte da
população.
Os indicadores antecedentes seguem
demonstrando uma piora na atividade
econômica, com destaque, para a rápida e
elevada deterioração do mercado de trabalho.
Mesmo com a gravidade da crise econômica e
com a tendência de queda da inflação, o Copom
manteve a taxa Selic em 14,25%a.a
1. Brasil: Nível de atividade
Indústria e Varejo
Na Pesquisa Mensal do Comércio
(PMC), o comércio varejista registrou
um avanço de 1,2% no volume de
vendas em fevereiro de 2016 em
comparação ao mês anterior. Destaca-
se o resultado de Móveis e
eletrodomésticos (+5,0%). Já no
comércio varejista ampliado,
observou-se uma variação de 1,8% no
volume de vendas em relação a
janeiro, com aumento de 3,8% em
Veículos e motos, partes e peças e de 3,3% em
material de construção. No acumulado no ano e
em 12 meses, o comércio varejista ampliado
apresentou respectivamente quedas de 10,1% e de
9,1%.
A Pesquisa Industrial Mensal Produção Física
(PIM-PF) registrou um avanço de 1,4% em março
de 2016 frente ao mês anterior, considerando a
série livre de influências sazonais. Dentre as
grandes categorias econômicas, bens de consumo
duráveis (+0,3%), bens intermediários (+0,1%),
bens de consumo semi e não-duráveis (+0,9%) e
bens de capital (+2,2%) registraram aumentos. No
acumulado de 2016, o setor industrial total teve
queda de 11,7%. Já no acumulado dos últimos 12
meses, o recuo foi de 9,7%.
O Índice de Confiança do Empresário
Industrial, divulgado pela Confederação Nacional
da Indústria (CNI), registrou 36,2 pontos em abril
de 2016, apresentando uma queda de 1,2 ponto em
comparação com o mês anterior e de 2,3 pontos
em relação a abril 2015. O indicador permanece
abaixo de 50 pontos pelo 25º mês consecutivo,
indicando a baixa confiança do empresariado.
Mercado de trabalho: emprego e renda
Segundo a PNAD, divulgada pelo IBGE, no
período entre janeiro a março de 2016, a taxa de
desocupação foi de 10,9%, ficando acima da taxa
de 10,2% referente ao trimestre móvel
Gráfico 1 Brasil: Evolução do saldo líquido de empregos gerados
(em mil)
Fonte: CAGED / Elaboração: DEPE *acumulado em 12 meses até março.
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imediatamente anterior. Assim, cerca de 11,1
milhões de pessoas sem emprego representam um
aumento de 39,8% em comparação ao mesmo
período de 2015. Um dos reflexos do aumento do
desemprego é o aumento do número de brasileiros
que trabalham por conta própria. Houve elevação
de 1,2% em comparação com o trimestre anterior
e de 6,5% em relação ao trimestre de janeiro a
março de 2015, representando um acréscimo de
1,4 milhão a mais de trabalhadores.
O rendimento médio real foi estimado em
R$1.966,00, mantendo-se estável ante o registrado
no trimestre anterior e apresentando uma queda de
3,2% em comparação com o mesmo período do
ano anterior. A massa de rendimento real foi
estimada em R$173,5 bilhões, tendo uma redução
de 4,1% em relação ao mesmo trimestre de 2015.
De acordo com os dados do CAGED de
março de 2016, os postos de trabalho formais
tiveram uma redução de 118,8 mil em todo o país.
No mês anterior, o saldo foi negativo em 104,6
mil postos. No acumulado do ano, houve um saldo
negativo de 319,2 mil empregos e, no acumulado
dos últimos 12 meses, foi registrado o fechamento
de 1.853 mil postos de trabalho. Por setor de
atividade econômica, destaca-se que, no mês de
março de 2016, o setor mais atingido foi o do
comércio (-42 mil), seguido pela indústria de
transformação (-25 mil), pela construção civil (-24
mil) e serviços (-19 mil). A Administração Pública
foi novamente o único setor que apresentou saldo
positivo, com 4 mil novos postos. Após 2010,
quando houve um saldo positivo de
2,6 milhões de postos de trabalho
formais, houve uma constante queda
na capacidade de geração de vagas
de empregos formais. Já em 2015, o
saldo foi negativo em 1,5 milhão de
postos e para 2016 o fechamento de
postos de trabalho deve ser superior
ao do ano anterior. (Gráfico 1)
2. Inflação
A inflação brasileira possui
uma tendência de queda durante o
ano de 2016, mostrando que caminha para um
patamar mais reduzido neste ano comparado ao
ano de 2015. O IPCA mensal em janeiro foi de
1,27%, reduzindo-se em fevereiro para 0,9% e
chegando a 0,43% em março. Em todos os meses
de 2016, o grupo de maior impacto na formação
inflacionária foi o de Alimentação e bebidas,
com 2,28% em janeiro, 1,06% em fevereiro e
1,24% em março. O grupo de habitação teve
uma desaceleração inflacionária registrando
queda de 0,15% em fevereiro e de 0,64% em
março. No acumulado ano de 2016, o índice geral
foi de 2,62% e, no acumulado em 12 meses,
registrou 9,39%. Pode-se explicar o menor nível
de inflacionário deste ano em relação ao ano
anterior através de fatores como: menor impacto
do câmbio e das correções dos preços
administrados e de uma queda adicional na
demanda devido ao agravamento da crise.
3. Juros e crédito
O Comitê de Política Monetária (Copom)
realizou reunião no último dia 26 e decidiu
novamente manter a taxa de juros em 14,25% em
votação unanime. Em breve nota divulgada, a
decisão é justificada pelo nível de inflação do
último período de 12 meses, mais alto do que os
objetivos do regime de metas. Assim, perante a
autoridade monetária, ainda não há espaço para
baixar o nível da taxa de juros. Segundo última
divulgação do boletim Focus, a expectativa é de
que o ano se encerre com uma taxa de juros Selic
Gráfico 2 Brasil: Juros nominais, inflação e juros reais
Fonte: BCB; IBGE / Elaboração: DEPE *Considera a expectativa do boletim Focus de abril/16.
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de 13,25% a.a. e de que o IPCA de 2016 seja de
6,98% a.a., projetando uma relevante queda da
inflação. Mesmo com as fortes evidências de uma
continuidade da queda da inflação ao longo do ano
e da piora da crise econômica, o Copom mantém
uma política monetária extremamente restritiva,
tentando utilizar como justificativa a inflação.
Considerando-se que a decisão de alteração da
taxa básica de juros só apresentará impacto nas
atividades econômicas após alguns meses, não é
possível adiar mais o início dos cortes da taxa
Selic. Com base nas expectativas do boletim
Focus para 2016, os juros reais serão de 5,9% a.a.
no final do ano, mantendo o maior nível do
mundo. Historicamente nossos juros reais são
muito elevados, impactando nas decisões de
consumo, de investimento, de produção e de
crédito. (Gráfico 2)
Nas operações de crédito, a taxa média de
juros foi de 32% em março, sendo decomposta em
taxas médias de 22,2% para pessoas jurídicas e de
40,6% para pessoas físicas. O saldo da carteira de
crédito para pessoas jurídicas sofreu redução de
fevereiro para março de 1,6%, seguindo um
comportamento de retração iniciado em dezembro
de 2015. Já o saldo referente a pessoas físicas teve
elevação de 0,3%, seguindo sua tendência de
aumento, conforme dados do BCB. Assim, houve
uma redução do saldo total da carteira de crédito
de 0,7%, que se encontra no patamar de 3,16
trilhões de reais. Já nos últimos doze meses
ocorreu uma elevação de 3,3%. O crédito
destinado a recursos livres teve redução de 0,6%
em março, apesar de não ter apresentado retração
nos últimos doze meses. Dentro desse resultado,
houve recuo tanto no saldo de pessoas jurídicas
como físicas, porém, este último em menor
proporção e influenciado por declínio do crédito
referente à aquisição de veículos em detrimento de
aumento do crédito consignado. O crédito
direcionado teve retração mensal de 0,7% no mês
de março apesar de aumento de 5,8% nos últimos
doze meses. Pode-se notar que a expansão do
crédito está limitada e oferece com condições
piores aos tomadores.
4. Contas públicas
No mês de março, o déficit primário do setor
público consolidado foi de R$10,6 bilhões, o pior
para meses de março desde o início da série em
2001. No ano, o déficit primário acumulado foi de
R$5,8 bilhões. Já no acumulado em 12 meses,
esse indicador atingiu um déficit de R$136 bilhões
(2,3% do PIB). Para os próximos meses, a
tendência é de manutenção dos resultados
deficitários. Esses resultados seguem frustrando
ainda mais qualquer tentativa de ajuste fiscal.
Os juros nominais registraram receita líquida
de R$ 0,6 bilhões em março, devido, sobretudo, ao
resultado positivo de R$ 42,7 bilhões nas
operações de swap cambial no mês. Porém, no
acumulado do ano, a conta de juros já atingiu
R$85,4 bilhões e, em 12 meses acumulados,
R$443,3 bilhões (7,4% do PIB). No ano de 2015,
82% do déficit nominal (R$613 bi) resultou de
pagamentos de juros sobre a dívida
pública (R$501 bi) e, de acordo
com o cenário apresentado para as
contas públicas deste ano, a
situação tende a continuar se
agravando. Em março de 2016, o
déficit nominal acumulado em 12
meses foi de R$ 579,3 bi (9,7% do
PIB).
A persistente queda da
atividade econômica, somada à
alta da taxa de desemprego
provocou nas receitas uma
Gráfico 3 Brasil: Dívida pública bruta (em % do PIB)
Fonte: BCB / Elaboração: DEPE
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retração na arrecadação da ordem
de 8,19% em termos reais no
primeiro trimestre de 2016, em
relação ao mesmo período do ano
passado. Em março, a queda real
foi de 6,96% em comparação a
março de 2015, o que reforça a
deterioração das condições de
retomada da economia.
A dívida bruta do governo
geral (governo federal, INSS,
governos estaduais e municipais)
atingiu R$4,0 trilhões em março de
2016, equivalente a 67,3% do PIB.
Em janeiro de 2015, esse indicador era de
58,1% do PIB. Assim, a dívida bruta segue
apresentando uma rápida e contínua piora,
tendo, como principal fator de impacto
negativo, a elevada taxa básica de juros.
(Gráfico 3)
5. Câmbio e contas externas
Câmbio
A taxa de câmbio (R$/US$) fechou em 3,45
em abril de 2016, apresentando uma valorização
em relação ao mês anterior, cuja a taxa foi de
3,56. Considerando a taxa do fechamento do
mês, foi registrada em abril a menor taxa dos
últimos 9 meses. Após uma forte e rápida
desvalorização do câmbio ao longo de 2015,
chegando a atingir 4,04 no final de janeiro de
2016, iniciou-se novamente uma revalorização
mantendo uma grande volatilidade, o que
dificulta os diversos processos de tomada de
decisão dos agentes econômicos. Destacam-se
os desdobramentos da crise política, com a
aprovação do prosseguimento do processo de
impeachment da presidente Dilma pela Câmara,
como um dos principais fatores que influenciou
o mercado cambial em abril. (Gráfico 4).
No início de maio, o Ministério da Fazenda
anunciou um aumento de 0,38% para 1,1% da
alíquota do Imposto sobre Operações
Financeiras (IOF) sobre a compra de moeda
estrangeira em espécie. Essa medida visa a
atender não só a questões regulatórias, mas
também a aumentar a arrecadação fiscal.
No mês de abril, o Banco Central manteve
intervenções no mercado cambial com
operações que ultrapassaram os US$ 30 bilhões
em swap reverso (compra futura de derivativos
de dólares), tentando conter a valorização do
real. Os estoques de swap do BCB estão
próximos de US$ 70 bilhões no fechamento do
mês, registrando uma grande queda, observando
o mês de março quando os estoques estavam em
US$ 105 bilhões. Isso demonstra o alto grau
especulativo do mercado financeiro sobre a
moeda brasileira.
Balanço de Pagamentos
A balança comercial brasileira, divulgada
pelo MDIC, registrou saldo superavitário de US$
4,9 bilhões em abril de 2016. Em abril de 2015 o
saldo havia sido positivo em US$ 0,5 bilhão. No
acumulado do ano, o saldo é superavitário em
US$ 13,2 bilhões.
A conta de transações correntes segue
registrando uma melhora, tendendo ao equilíbrio
nos seus saldos. Em março de 2016, houve um
déficit de US$ 0,9 bilhão, saldo superior ao
resultado negativo de US$ 5,8 bilhões para o
mesmo período de 2015. O déficit acumulado
durante o ano de 2016 é de US$ 7,6 bilhões,
superior ao resultado negativo de US$ 25,1
bilhões acumulado para o mesmo período em
Gráfico 4 Evolução mensal da taxa de câmbio (R$/US$)
Fonte: BCB / Elaboração: DEPE
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2015. No acumulado em 12 meses, o déficit é de
US$ 41,4 bilhões (2,4% do PIB).
Quanto à conta financeira, as captações
líquidas em março de 2016 superaram as
concessões líquidas em US$ 0,4 bilhão. No mês
equivalente do ano anterior, o saldo foi de US$
4,2 bilhões. Nota-se o Investimento Direto no País
(antigo IDE), que registrou a entrada líquida de
US$ 5,6 bilhões em março e de US$ 78,9 bilhões
(4,6% do PIB) em doze meses.
As reservas internacionais somaram US$
376,2 bilhões no final do mês de abril de 2016,
mantendo um nível muito confortável. Em
comparação ao mês anterior, houve um aumento
de US$ 1 bilhão. Em relação ao mês equivalente
do ano anterior, o nível das reservas teve elevação
de US$ 3,2 bilhões.
6. Bolsa de valores
No atual cenário de crise econômica, de
grande influência dos desdobramentos políticos e
com elevada incerteza futura, os aplicadores no
mercado financeiro buscam na alta volatilidade
dos mercados, cambial, acionário e de títulos,
obter retornos principalmente em movimentos
especulativos. Houve uma relevante entrada de
capital estrangeiro para o mercado acionário
brasileiro. O Ibovespa fechou o mês de abril em
53.910 pontos, com ganho de 7,7% no mês e de
24,4% no acumulado do ano.
7. Economia internacional
Nos últimos meses, o FED tem adotado um
discurso mais cauteloso em relação à alta de juros
esperada. Entretanto, desde março essa sinalização
tem sido mais enfática, não apenas pela opção de
manter os juros estáveis, mas também com tom
mais ameno sobre o ajuste na política monetária,
indicando através das projeções do próprio FED,
que ocorrerá de forma mais gradual ao longo de
2016 e 2017. Essa revisão de expectativas causou
uma euforia nos mercados financeiros globais,
sinalizada através de uma redução expressiva da
aversão a risco, impulsionando as negociações nas
bolsas internacionais.
Esse fato é identificado no recente rali com
valorização de preços de commodities como, por
exemplo, o petróleo, o cobre, o minério de ferro e
a prata, apesar dos fundamentos em direção oposta
nos seus mercados físicos, sobretudo devido à
desaceleração da China, grande consumidora
desses produtos para fins industriais. Já os
mercados de ouro e outros metais preciosos
também foram impulsionados por um dólar mais
fraco. No entanto, vale pontuar que as
commodities mantêm um nível de preços
desvalorizado em comparação com o passado
recente.
Por outro lado, as valorizações das
commodities no curto prazo podem estar atreladas
à elevação da especulação chinesa sobre o
mercado financeiro em geral. Volumes
expressivos de capital migraram dos mercados de
bonds (títulos de dívida) e ações para o de
commodities, trazendo preocupações sobre esse
fenômeno, dado o recente frenesi que impulsionou
o mercado de ações da China em 2015 e que, em
sua correção, eliminou US$ 5 trilhões, assim
como bolhas anteriores em distintos setores.
Destaca-se ainda a atuação do Banco Central
Europeu (BCE), que tem anunciado novas
medidas monetárias para estimular a demanda e,
em consequência, os preços e a economia na
região. Em 21 de abril, o BCE manteve suas taxas
historicamente baixas, demonstrando que está
determinado a usar todos os instrumentos
disponíveis para estimular a atividade econômica
na zona do euro. Por conta disso, o BCE sinalizou
que a partir de junho iniciará um programa de
compra de títulos de dívida de empresas
europeias, complementar à estratégia já existente
em relação à dívida pública, com objetivo de
estimular a circulação de dinheiro no bloco,
através de crédito, investimentos e consumo.
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Espaço Opinião*
Cavalo de Troia derruba o Governo
Prof. Dr. Rubens Sawaya
Professor do Depto. de Economia e da Pós-graduação em Economia Política da PUCSP
Desde o início de seu primeiro mandado em 2011, o Governo Dilma tenta contentar gregos e
troianos. E não foi por falta de aviso dos economistas heterodoxos, dado os inúmeros artigos escritos. Ao
aceitar a pauta dos inimigos provocou uma enorme desaceleração da economia. Serve de apoio ao golpe.
É interessante como em nenhum momento o Governo percebeu que, ao aceitar a agenda da FIESP
de corte de juros em 2012 e a ‘doação’ de incentivos fiscais aos empresários – segundo matéria do Valor
Econômico, eles aplaudiram em pé as medidas – estava iniciando sua queda. O aprofundamento do
processo veio com a aceitação da agenda dos bancos, ao promover corte nos gastos públicos desde 2011 e
reverter a política de juros em 2013. O Governo estava jogando gasolina no fogo que agora o queima. A
estratégia política da presidente de contentar os inimigos para ser aceita a destruiu. Entrou na falsa onda
de uma “expectativa de inflação” explosiva já em 2011; caiu no ‘conto dos bancos’ que a convenceram
disso. Assim, provocou sucessivas quedas do PIB que culminaram em 2015 com 3,8% negativos.
Portanto, brutal recessão de 2015 não pode ser considerada exceção, mas o recrudescimento contínuo de
uma trajetória que, ao aceitar a pauta do inimigo, provocou a completa derrota do Governo.
Hoje, o governo está totalmente acuado e não tem poder para governar enquanto durar o impasse
do impeachment, golpe que, ao que tudo indica, parece estar se consolidado politicamente. Na verdade, a
força para o impeachment nada tem a ver com questões jurídicas como os debates na própria imprensa,
Congresso e Senado tem deixado claro. As acusações de ‘pedaladas fiscais’ têm se mostrado
inconsistentes. A força para o golpe está na enorme crise econômica acima resumida, provocada pelo
próprio governo, que abriu espaço político para que os inimigos, de assalto e de forma oportunista,
desfechassem o de fato golpe final sobre o governo.
O problema ainda para a conjuntura econômica de 2016 é o tempo que o processo levará –
durante o qual não haverá possibilidades de realizar políticas de qualquer natureza. A taxa de crescimento
deste ano ainda será negativa. Após o desfecho do processo, a questão que se coloca é qual será o poder
de governabilidade de um novo governo com pouca ou nenhuma legitimidade, ainda mais, diante de um
Congresso independente, controlado por outro político que anda com suas próprias pernas e que, portanto,
não cabe no novo acordo político. Talvez o resultado final seja caótico, o que será ruim para a conjuntura
econômica.
De qualquer forma, o golpe abre a oportunidade para que a pauta dos inimigos seja totalmente
levada à cabo. Vale lembrar que o Governo já vinha implantando partes dessa mesma pauta recessiva para
tentar se segurar no cargo e por isso já havia acelerado ainda mais essas reformas em 2015 com uma
brutal austeridade fiscal.
O problema é que a pauta que não é nova continuará sendo recessiva. Deve acelerar a política de
cortes em gastos sociais e perdas de direitos, provocando ainda maior diminuição da renda média. A
política cortes de gastos públicos com investimentos e de juros altos deve continuar a elevar o
desemprego bem como aprofundar a recessão. Toda a culpa do corte nos gastos sociais será posta sobre o
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governo anterior. Os processos de privatização também continuarão e se ampliarão principalmente
aqueles ligados às atividades da Petrobrás. A diminuição do tamanho dos bancos públicos será uma
consequência da própria crise de crédito que já está aparecendo pelo crescimento da inadimplência das
famílias (casa própria) e empresas (BNDES). Toda essa pauta será imputada como algo necessário devido
à má administração do Governo anterior. Assim, não haverá perspectivas sólidas de reversão das taxas de
crescimento do PIB até pelo menos fins de 2017 quando então o novo Governo deverá pensar nas eleições
de 2018.
O que parece claro nesse processo é que desde o início as políticas de austeridade nada tinham a
ver com ‘inflação explosiva’, mas com a pauta política. Não será fácil controlar a inflação provocada,
antes (2013-14) por pura propaganda repetitiva na mídia, mas que depois se materializou na elevação de
abrupta das tarifas de forma desnecessária – poderia ter sido feito gradualmente. De outro lado, a recessão
brutal está cuidando para arrefecê-la. Mas, chegar aos níveis anteriores históricos de 6,5% será difícil e
talvez nem seja desejável. A queda nas taxas de inflação pode ‘obrigar’ o Banco Central a baixar as taxas
de juros. Mas não se deve esperar muito. É quase que um consenso entre os analistas de banco que a taxa
de juros deve ser superior a 10% para manter a rentabilidade e estabilidade das operações bancárias,
patamar que esteve por anos antes do novo governo. Esse nível pressiona a necessidade de superávits
fiscais para fazer frente ao déficit nominal, garantindo a transferência de renda do Estado aos rentistas,
bem como a necessidade de cortes nas políticas sociais. Talvez seja esse o desejo final: o retorno ao
‘normal’ antes dos governos PT.
Alguns poderiam perguntar como os industriais se comportariam diante deste cenário. Ao
contrário do que se poderia imaginar eles também o desejam. Há anos as indústrias brasileiras ou
instaladas no Brasil tornaram-se importadores de partes peças e componentes e diminuíram sua base
produtiva nacional. Ao tornarem-se montadores ou quase ‘comerciantes’ passaram a aplicar seus recursos
nos mercados financeiros. Assim, desejam o retorno à política de taxas de juros elevadas em conjunto
com os bancos privados. Por outro lado, também vale lembrar que se desejam investir, têm o BNDES
como fonte de recursos baratos, isso se não acabarem também com ele, coisa muito difícil de acontecer.
A indústria também tem uma reação contraditória diante da necessidade de desvalorização da
moeda nacional. Teriam que passar de importadoras para a reconstrução de uma base produtiva interna.
Se de um lado isso provocaria uma reindustrialização, de outro as obrigaria a uma mudança estrutural.
Assim, há setores que podem apoiar a desvalorização cambial, e outros que não a desejam. De qualquer
forma, como a desvalorização nos últimos meses deixou claro, diversas empresas foram obrigadas a
reagir, substituindo importações por produção nacional. Esse é o fato mais positivo que impediu uma
queda ainda maior do PIB recentemente.
A crítica à “nova matriz econômica” que na verdade durou poucos meses (queda nos juros e
incentivos fiscais), bem como a crítica ao Governo nos últimos anos, está muito mais relacionada ao
desejo de volta da ‘normalidade’ dos anos 90 e mesmo primeiro mandado do Governo Lula. Na teoria
econômica isso aparece como retorno à ortodoxia. Dar espaço para uma estratégia nacional, distribuição
de renda e desenvolvimento, nem pensar, quanto mais a tornar o país um pouco mais ‘civilizado’. A
disputa pela renda nacional por grupos que detém o poder é mais forte.
*os artigos desta seção visam estimular o debate e não representam, necessariamente, a visão
da equipe de redação.
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Expediente
Boletim DEPE, Ano I, n.3
Editor responsável: Antonio Corrêa de Lacerda, Prof. Dr. da PUCSP
Equipe de redação:
Ana Paula Negreli Persici Vassallo, advogada e mestre em Economia Política pela PUC-SP; André Luis Campedelli, professor substituto de Economia da UNIFAL-MG e mestre em Economia Política pela PUC-SP; André Schneider Dietzold, economista, cientista político e mestrando em Economia Política pela PUC-SP;
André Paiva Ramos, economista e mestre em Economia Política pela PUC-SP (Coordenador); Eline Emanoeli, economista pela UFSCar e mestre em Economia Política pela PUC-SP;
Fabrício Silva de Sousa Machado, economista e mestrando em Economia Política pela PUC-SP;
Luiz Ricardo Alves, economista e mestrando em Economia Política pela PUC-SP;
Marcos Henrique do Espírito Santo, economista e mestrando em Economia Política pela PUC-SP
Grupo de Pesquisas em Desenvolvimento Econômico e Política Econômica (DEPE)
Programa de Estudos Pós-graduados em Economia Política da PUC-SP (PEPGEP)
Rua Ministro Godoi, 969, Perdizes, São Paulo/SP
Tel. 11-3670-8516 Site www.pucsp.br/ecopol E mail ecopol@pucsp.br
Edição elaborada com informações disponíveis até 03/05/2016.