Entrevista Prof. Paulo Otero

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GRANDE ENTREVISTA a Paulo Otero, professor catedrático e autor de um estudo sobre o antigo Presidente do Conselho, Doutor Oliveira Salazar.

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5/13/2018 Entrevista Prof. Paulo Otero - slidepdf.com

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Entrevista   Professor catedrático salienta dimensão

" Ainda somos herdeiros do período históricodeMarcello Caetano" 

DUARTE BRANQUINHO

Paulo Otero é professor catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa,leccionando Direito Administrativo e Direito Constitucional. Defende um modelo presidencialistapara Portugal e, em 2010, um exame seu que referia o casamento homossexual gerou polémica.Entre outras obras, é autor dos livros "A Democracia Totalitária" e "Os Últimos Meses de Salazar".O DIABO foi à Faculdade entrevistá-lo.

Por que escolheu o períodofinal da vida de Salazar comoobjecto do seu livro?

Porque está pouco estudado emerece alguma reflexão, porque éo período da transição do EstadoNovo, da transição do longo consulado do Doutor Salazar para ogoverno do Prof. Marcello Caetano.O que eu procuro defender no livroé o protagonismo do AlmiranteAmérico Thomaz. Ao contrário daquilo que se possa ter pensado, elenão foi um Almirante "de opereta",

apenas às ordens do presidente doConselho de Ministros.

Foi para além das anedotasque se contavam...

Exactamente. Ele teve, defacto, um protagonismo central,que se começou a acentuar a partirda tentativa de golpe de BotelhoMoniz, em 1961. A partir daí, oDoutor Salazar deveu a permanência em funções à confiança quelhe foi reiterada pelo AlmiranteAmérico Thomaz. E em 1965,

quando se trata da recandidatura,há a ideia de que o Dou tor Salazarnão quer ser o nomeador do seusucessor, mas confia em AméricoThomaz nessa escolha. Algo queocorre em 1968, com a chamadado Prof. Marcello Caetano para oGoverno e a imposição de condições para ele aceitar e continuarno Governo feitas pelo AlmiranteAmérico Thomaz.

Há um aspecto a que chamaa "farsa nacional" da ocultação

Parece um argumento paraum filme...

E verdade. Salazar recebia ministros, jornalistas e outros, comose pensasse que ainda exercia funções. E como se não acreditasseque o Presidente da República seriacapaz de o substituir em vida. Elepensaria, creio eu, que o Presidenteda República acumularia as funções de Presidente do Conselhode Ministros,

Os últimos meses de Salazar são os últimos meses deum Portugal?

Sim, ainda que tenham duasparticularidades. Penso que Salazarcontinuou presente no Governode Marcello Caetano através deAmérico Thomaz. Isto é, as grandes linhas da política interna e dapolítica externa, designadamenteas de defesa, foram as definidaspor Salazar. Significa que nesteperíodo tivemos Salazarismo semSalazar. O segundo aspecto impor-tante é que nós hoje ainda somosherdeiros do período histórico deMarcello Caetano.

Como assim?Por estranho que possa pare

cer, ainda somos herdeiros e, dealgum modo, ainda estamos noperíodo pós-salazarista. Ainda não

encontrámos um mmo para o País,não obstante a integração europeia e a ausência da componenteultramarina. Vivemos hoje, ainda,de algum modo, o drama de umacerta orfandade política.

Se o Marcellismo foi umSalazarismo sem Salazar, seráque hoje estamos a viver oMarcellismo?

De algum modo, a classe política da segunda década do séculoXXI é a classe política daquelesque não foram alunos, herdeiros

14 d

ética do modo como Salazar exerceu o poder Entre

ou opositores de Marcello Caetano.Temos vivido os últimos trinta anosem continuidade ou em oposiçãoa Marcello Caetano, mas ainda emdiálogo com Marcello Caetano.

Estamos na casa de ondesaíram muitas dessas figuras...

É verdade, tanto aqui como emCoimbra. De algum modo, as pessoas que saíram daqui e de Coimbrae foram constituintes reflectiram osensinamentos de Direito Público doProf. Marcello Caetano na Constituição de 1976. Há um aspectocurioso, a Constituição de 1976, nasua versão inicial, estava bem maispróxima da Constituição de 1933,na versão resultante da revisão de1971 do Prof. Marcello Caetano,do que da Constituição de 1933quando ela entrou em vigor e queestava, por sua vez, mais próximada de 1911.

Como comenta aqueles quehoje clamam por um Salazar?

É significativo, seja uma vozpopular, seja o caso do concursotelevisivo "Grandes Portugueses",onde Salazar ganhou com umgrande número de votos. Pensoque é significativo por duas razões.Primeiro, pela dimensão ética domodo como exerceu o poder, istoé, sem ser em proveito próprio, masexercido ao serviço da comunidade.Independentemente da discussãose foi bem ou mal exercido. Essadimensão ética é algo que podecontrastar com alguns comportamentos dos últimos 36 anosem Portugal. Em segundo lugar,mostrou uma autoridade que emcertos momentos de crise o País, apopulação, continua a pensar que épreciso um homem no leme.

Talvez explique o resultado de um estudo recente querevelou que grande parte dosportugueses não se identificacom a democracia...

É verdade, mas o preocupante

é que os portugueses identificama democracia com este modelo dedemocracia. E é possível a construção de uma democracia que nãopasse por este modelo, que é umapartidocracia.

E por isso que defende ummodelo presidencialista?

Sim, porque o presidencialismopode ser uma forma de desvitalizareste sistema partidário.

Como?Há que devolver o poder às

pessoas e para isso e necessário acabar com o monopólio dos partidospolíticos no acesso à Assembleiada República.

Acredita que é possíveluma alteração constitucionaldesse tipo?

Acredito que não é possívelatravés dos partidos políticos, masé possível através de um mecanismo que copie o modelo da V República francesa. Isto é, é possívelatravés de um futuro Presidenteda República, sendo eleito com opropósito da mudança do sistema,e o Presidente da República com opropósito de criar um novo partidopolítico, à semelhança do que fezSarkozy, que procure reconstruir osistema partidário e permita a dissolução da Assembleia. Para tentardevolver ao eleitorado uma novaescolha à luz de uma nova maioria,que seja uma maioria presidenciale uma maioria parlamentar.

Diz-se que na Europa háuma viragem "à direita". Conceitos como esquerda e direitaainda fazem sentido?

Penso que não. Os partidossocialistas democráticos todos seconverteram ao neoliberalismo. Ficaram fascinados por aquele que erao tradicional âmbito da direita, queera a aposta em políticas económicasliberais. Por paradoxal que pareça, adireita dos valores é hoje mais apostada numa dinâmica social do queo socialismo democrático. Há umainversão curiosa. Hoje, a preocupaçãocom o estado social, com condiçõesque permitam uma vida humanadigna, está mais nas forças que serevêem à direita do que propriamentena sedução económica neoliberal queapanhou todos os partidos sociais-democratas, socialistas democráticose trabalhistas da Europa.

É curioso que "neoliberal"seja usado como um insultopor esses partidos...

E possível, mas com certezavêem-se ao espelho nesse insulto,quando o dirigem.

Porquê esta direita dos valores com essa visão de matrizsocial?

Penso que a razão se filia nadoutrina social da Igreja.

Temos visto algumas tentativas do CDS nesse sentido...

Exactamente. Penso até que háuma tensão dentro deste Governo.Há uma parte do Governo profun-

damente neoliberal e outra compreocupações de natureza social.Acredito que também exista estatensão dentro do PS, mas nos últimos anos, goste-se ou não, a quevingou foi a neoliberal.

Qual é então hoje a grandediferença entre a esquerda ea direita?

Tem a ver com os valores emtomo da família. A importância docasamento. A importância que tema família como instituição nuclearda sociedade, é um elemento queé acarinhado pela direita e que temsido pura e simplesmente desprezado, se não mesmo vítima de gravesatentados, por parte da esquerda,nos últimos anos.

Foi bastante noticiado e gerou alguma polémica o seuexame sobre a inconstitucionalidade do casamento homossexual. As pessoas aindaassociam o seu nome a essecaso?

E possível que associem e eunão renego aquilo que escrevi. Agora, é preocupante que ainda existaem Portugal uma mentalidade, porparte de alguns universitários, ou depseudo-intelectuais, que têm umamentalidade do "Portugal dos pequeninos". Isto é, a ideia de que asuniversidades não devem discutirtodos os assuntos, que devem estar

fechadas, ou a ideia de que só élegítimo e lícito discutir o que époliticamente correcto.

Tal não é o contrário deuma Universidade? Mais parece uma Academia Soviética...

Exactamente. E o contráriode uma Universidade. Penso quealgumas pessoas que defendemessa restrição e essa censura nãoestão muito longe de uma Academia Soviética. Talvez um poucodesesperadas por hoje não teremuma pátria, mas talvez a Coreia

do Norte as possa acolher debraços abertos.

Depois do casamento homossexual, há quem queiralegalizar a adopção de criançaspor casais homossexuais. Noestado em que se encontra oPaís, faz sentido esse debate?

Podemos ter dinheiro sem terpão, mas à luz do pensamento dosúltimos anos, todos podem viverfelizes porque o leque de opçõespara cada um contrair matrimónioalargou significativamente. Há claramente o ditar da agenda políticado Partido Socialista pelo Bloco deEsquerda. O Bloco comanda - nãoo parlamento, felizmente - mas aagenda política do PS em matériasde índole social.

É para se poderem afirmarde esquerda?

Talvez, se bem que é uma esquerda muito estranha. Antes, a esquerda batia-se pelo divórcio, agorabate-se pelo casamento. Será que seestá a converter às instituições típicas da direita? Há um outro exemplo, que é o das chamadas "barrigas de aluguer". Duvidosamenteconheço algo que possa ser maisaviltante da qualidade da mulherque transformá-la em mero objecto.Noutros tempos, a esquerda lutavapela dignificação da mulher, hojetrata a mulher como máquina repro

dutora passível de pôr o seu corpoao serviço daqueles que mais dinheiro têm. Não deixa de ser estranho,mas são cedências ao capitalismo...

Escreveu um livro chamado"Democracia Totalitária". Achaque hoje as democracias seestão a tornar totalitárias?

O problema da democraciatotalitária pode ter duas vias. Porum lado, a democracia vive hoje,em certos casos, com partidos quereclamam modelos totalitários. Ogrande problema é sabe como é que

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da sucessão ao próprio Salazar.Acha que aconteceu?

Penso que sim. Na altura todosos órgãos de soberania, todos ostitulares, criaram uma convenção,um acordo, que era não revelar aSalazar que ele tinha sido substituído.

Porquê?Num primeiro momento, por

que em final de 1968 ninguém acreditava que Salazar sobrevivesse. Porisso nem se colocava a questão de