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Crises do Capitalismo, Estado e Desenvolvimento Regional
Santa Cruz do Sul, RS, Brasil, 4 a 6 de setembro de 2013
GLOBALIZAÇÃO E ESPECIALIZAÇÃO PRODUTIVA REGIONAL: UMA
ABORDAGEM SOBRE O AGRONEGÓCIO CAFEEIRO NA REGIÃO COMPETITIVA DO SUL DE MINAS
Henrique Faria dos Santos1
Resumo: O presente trabalho tem como objetivo apresentar uma abordagem sobre o desenvolvimento do agronegócio do café na região do Sul de Minas no atual cenário da globalização econômica e dos efeitos da especialização produtiva regional. A modernização da atividade agrícola fez com que este espaço se tornasse competitivo para a produção e exportação de café, tendo o agronegócio como expoente e destaque em sua economia. Tal fato ocorre juntamente com as recentes mudanças da agricultura brasileira, a partir da integração das atividades agrícolas com a indústria e com os capitais comerciais e financeiros, nos quais espaços rurais e urbanos tendem a ser estruturados ou reestruturados para se adaptarem a nova condição econômica. A constituição de municípios funcionais a produção moderna do café é um dos fatores mais evidentes, cujas mudanças históricas se processaram em virtude das novas relações campo-cidade resultantes da intensa tecnificação das atividades agrícolas. A partir de análises e discussões acerca das transformações da dinâmica territorial, o estudo contempla exemplos locais de alguns processos que vem ocorrendo com esta nova realidade produtiva. Palavras chaves: globalização; modernização da agricultura; especialização produtiva regional; região competitiva; circuito espacial produtivo do café.
Introdução
O presente trabalho tem como objetivo apresentar uma abordagem sobre o
desenvolvimento do agronegócio do café na região do Sul de Minas no atual cenário da
globalização econômica, a partir de alguns conceitos empregados na Geografia Econômica e
Geografia Agrária. Os estudos se pautam nos principais impactos da modernização da agricultura
e nas transformações verificadas a partir das novas dinâmicas territoriais dentro do atual período
do meio técnico-científico-informacional (SANTOS, 2008b), que tem o poder de impor novos
modelos de produção e promover a especialização produtiva de lugares ou regiões.
1 Licenciado em Geografia e graduando Geografia Bacharelado, Membro pesquisador do Grupo de Estudos
Regionais e Socioespaciais – GERES. Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL-MG) livehenriquefariasantos@hotmail.com
Crises do Capitalismo, Estado e Desenvolvimento Regional
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A partir do potencial dos lugares para determinada forma de produção agropecuária,
grandes investimentos em capital e tecnologia são empregadas nas diversas atividades do
segmento, resultando na modernização do arranjo produtivo local e tornando tal ponto do território
comumente competitivo, com grande capacidade de atender as demandas de consumo do
mercado internacional. Este fato ocorre explicitamente na região do Sul de Minas, cuja vocação se
volta para a produção e exportação de café. Desde 1970, esta área do território vem sendo
constantemente transformada, com a concentração de diversos sistemas técnicos e normativos
que tem o intuito de tornar eficiente a produção e a logística do segmento cafeeiro. Assim, todas
as etapas do circuito espacial produtivo do café, como a pesquisa, a produção e fornecimento de
insumos e implementos agrícolas, produção da matéria prima, comercialização, beneficiamento,
armazenagem, transporte, importação e exportação e consumo final, são profundamente
organizadas e articuladas, tornando fluido os elementos materiais e imateriais da produção
(SANTOS, 2012).
Este contexto ocorre concomitantemente com as recentes mudanças da agricultura
brasileira, a partir da integração das atividades agrícolas com indústria e com os capitais
comerciais e financeiros, nos quais espaços rurais e urbanos tendem a ser estruturados ou
reestruturados para se adaptarem a nova condição econômica (SILVEIRA, 2007). Tal fato faz
surgir inúmeros municípios que se mostram funcionais à produção agrícola, com algumas
características próprias, consideradas não como fator de regra, mas possível de serem analisadas
a partir do contexto regional abordado. Neste sentido, é possível reconhecer vários municípios na
região do Sul de Minas que servem de aporte produtivo e/ou logístico e comercial da produção
cafeeira, como é o caso de Alfenas – MG e Machado – MG, exemplificados numa breve análise
de suas características socioeconômicas vinculadas aos aspectos do agronegócio.
A metodologia empregada para a elaboração dos trabalhos de pesquisas consistiram na
realização de levantamento bibliográfico, leituras e fichamentos de textos (livros, artigos,
dissertações e teses) relacionados a teorias da geografia agrária e regional, ao agronegócio do
café, as desigualdades no espaço agrário, as cidades do agronegócio e as relações cidade-
campo; tendo como fontes de pesquisa a biblioteca da UNIFAL - MG, bibliotecas virtuais de teses
e dissertações de universidades brasileiras, especialmente as da USP, Unicamp e UNESP, e
artigos disponíveis em sítios e revistas eletrônicas na internet. Além disso, se fez necessário, para
melhor analisar as discussões, levantamento e interpretação de dados em diversos sites
governamentais, como IBGE, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Secretaria de
Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Minas Gerais, Ministério do Desenvolvimento, Indústria
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e Comércio Exterior, Ministério do Trabalho de Emprego, Banco Central do Brasil, entre outros; à
respeito sobre produção e comércio do café, dados demográficos e de mercado de trabalho,
cursos de nível técnico e superior, etc. O trabalho contempla também a apresentação de alguns
resultados de pesquisas de iniciação científica realizadas durante a graduação em Geografia, que
tratou sobre as análises de Alfenas – MG e Machado – MG como importantes municípios
produtores de café no Sul de Minas.
A especialização produtiva regional no atual período técnico-científico-
informacional
O processo de especialização dos lugares ou dos espaços tem se intensificado nos últimos
anos devido às conseqüências do fenômeno da globalização, cujos atores desta nova época
ocupam, usam e transformam os diversos espaços geográficos, principalmente em detrimento dos
interesses do capital aplicado. Segundo Milton Santos e Maria Silveira (2001, p. 105), “graças aos
progressos da ciência e da técnica e à circulação de informações, geram-se as condições
materiais e imateriais para aumentar a especialização do trabalho nos lugares. Cada ponto do
território modernizado é chamado a oferecer aptidões específicas à produção”.
Essa nova condição dos espaços está inserida dentro da época na qual Milton Santos
(1997b, p. 45) chama de período técnico-científico-informacional, a qual se “caracteriza pela
presença constante dos sistemas técnicos de produção, da ciência, que aprimoram as técnicas, e
da informação, responsável pelo avanço das técnicas e da ciência e da maior fluidez e controle
dos territórios por meio das ações”. Tal fato precede na facilidade e necessidade de especializar
territórios para a produção a fim de atender mais eficientemente as demandas do mercado
mundial, ao mesmo tempo que determinadas regiões se tornam espaços internacionalizados.
A natureza deste espaço funcional se baseia em elementos materiais e imateriais, que
capacitam estes lugares a desenvolverem e a realizarem de forma eficiente os processos
produtivos. Santos (1996a, p. 63) nos explica que “o espaço é formado por um conjunto
indissociável, solidário e também contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações, não
considerados isoladamente, mas como o quadro único no qual a história se dá”. Os objetos como
sendo parte dos elementos materiais, ou seja, objetos criados e fabricados pelo homem, fixados
em cada lugar; enquanto ações como parte dos elementos imateriais, ou seja, o conjunto de
normatizações e leis que controlam e criam novos objetos, através de fluxos materiais e
informacionais diversos.
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Tal realidade é bem vista nos espaços que desenvolvem a atividade do agronegócio, onde
os objetos ou fixos são todos os meios de produção envolvidos, como as fazendas, armazéns,
beneficiadoras, maquinários, implementos, insumos, sistemas de transportes e comunicação,
sistema de eletrificação, empresas de assistência técnica e financeira, instituições de pesquisa,
cidades adaptadas ao ramo agrícola, etc.; enquanto as ações dizem respeito a todo aporte
normativo e regulatório desses meios de produção, constituídos por conteúdo informacional e
científico existente, envolvendo os modos de produção, as atividades de comercialização e
logística, as operações bancárias, as exigências e apoios de governos, empresas e
consumidores, etc.
Assim, na medida em que se intensificam as ocorrências destas dinâmicas, mais estes
espaços vão se tornando fluídos e tecnicamente artificializados, dotados de grande potencial
produtivo e comumente competitivo. E esta fluidez espacial é um dos fatores mais importantes
para gerar competitividade a um lugar, pois como diz Milton Santos (1996a, p. 275), “não basta,
pois, produzir. É indispensável pôr a produção em movimento. Em realidade, não mais a produção
que preside à circulação, mas é esta que conforma a produção”.
Neste sentido, Müller (1989) nos revela a importância e os efeitos desta condição dos
lugares para a revolução do espaço agrícola ou rural:
A circulação em geral, o comércio e as comunicações, revolucionadas pela acumulação de capital, aumentam a dependência da agricultura. A aplicação das conquistas da ciência moderna na agricultura provoca uma revolução na organização rural, suprimindo o divórcio entre agricultura e indústria. Em outras palavras, o capital se apodera da agricultura, inicialmente, pelas vias de circulação, e, posteriormente, revolucionando seu modo de produzir (MULLER, 1989, p. 27).
Estas mudanças são afirmadas também, de modo contundente, por Silveira (2007) dentro
do âmbito da agricultura no país, quando diz que a agricultura brasileira tem experimentado, nas
últimas três décadas, um intenso processo de transformação, a partir da globalização da
economia. Este fato tem sido um vetor importante de mudanças, na medida em que tem levado à
reestruturação produtiva, especialmente daqueles cultivos direcionados à exportação. Sobre estas
transformações, o autor nos menciona que:
Essa reestruturação tem significado a fragmentação e a crescente especialização dos espaços agrícolas, a promoção de inúmeras inovações no processo produtivo e de alterações nas relações sociais de produção, bem como a adoção de um crescente e seletivo conteúdo técnico-científico, informacional e normativa nas atividades do setor. Essas mudanças têm sido possibilitadas, principalmente, por meio da ampliação da industrialização da agricultura e da
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integração de capitais (agrário, comercial, industrial e financeiro), através da criação e consolidação, nesse período, dos chamados complexos agroindustriais (CAIs)
2 (SILVEIRA, 2007, p. 215).
Esses novos espaços, qualificados ou requalificados, se constituem, segundo Ricardo
Castilho (2008) como “regiões competitivas”. Apoiado em Santos (1997b), o autor nos menciona
que “o conceito de região competitiva deriva diretamente da idéia de coesão regional decorrente
de vetores externos e fundamentados em arranjos organizacionais”. Trata-se de um
compartimento geográfico caracterizado pela especialização produtiva obediente a parâmetros
externos (em geral internacionais) de qualidade e custos. Assim, a competitividade se estabelece
na região por ser esta funcional aos mercados internacionais, na forma como bem explica
Castilho:
A competitividade deixa de ser apenas um atributo das empresas e passa também a se expressar em frações do espaço (através de intervenções materiais e densidades normativas), organizadas para produzir de forma obediente aos parâmetros de qualidade e custos estabelecidos pelos mercados internacionais. Essas regiões, preferencialmente, são as que atraem os investimentos públicos e privados, transformando grandes porções do território em áreas de exclusão (CASTILHO, 2008, p. 8).
Nas regiões de produção especializada, “a competitividade é possível por meio de uma
eficiência imprescindível da logística, que passou a ser um dos pontos centrais do ordenamento
dos movimentos que perpassam os diversos circuitos espaciais produtivos” (FREDERICO, 2009a,
p. 5). A logística, neste viés, é denominada por Castilho como:
o conjunto de competências infra-estruturais (transportes, armazéns, terminais intermodais, portos secos, centros de distribuição, etc.), institucionais (normas, tributação, etc.) e estratégicas/operacionais (conhecimento especializado detido por prestadoras de serviços ou operadores logísticos), que reunidas numa dada região, conferem competitividade aos agentes econômicos e aos circuitos espaciais produtivos (CASTILHO, 2008, p 9).
No Brasil, são várias as regiões especializadas na produção e exportação de café e, por
tanto, competitivas no mercado. São áreas onde prevalecem fatores como o domínio de uma
agricultura moderna e de um sistema logístico altamente eficiente, complementadas por um
2 De acordo com Müller (1989, p. 45), o conceito de CAI é semelhante ao do agronegócio (ou agribusiness)
e, portanto, possui as mesmas atividades. Segundo ele, “o complexo agroindustrial, CAI, pode ser definido como um conjunto formado pela sucessão de atividades vinculadas à produção e transformação de produtos agropecuários e florestais. Atividades tais como: a geração destes produtos, seu beneficiamento/transformação e a produção de bens de capital e de insumos industriais para as atividades agrícolas; ainda: a coleta, a armazenagem, o transporte, a distribuição dos produtos industriais e agrícolas; e ainda mais: o financiamento, pesquisa e a tecnologia, e a assistência técnica.
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conjunto de fatores produtivos que são responsáveis pela constituição do agronegócio
globalizado. De acordo com Frederico (2009):
no território brasileiro existem diversos exemplos de constituição de regiões competitivas. Os casos mais emblemáticos são as grandes regiões produtoras de commodities agrícolas e minerais. O destino à exportação da maioria da produção, a presença de firmas transnacionais, a criação de sistemas técnicos e normativos com o intuito de viabilizar a produção, a especialização funcional das cidades locais são características comuns presentes na maioria dessas regiões (FREDERICO, 2009a, p. 5).
No caso do café, várias regiões do Brasil são competitivas por serem altamente
especializadas neste ramo de produção, contando desde a qualidade das lavouras, as formas de
colheitas e beneficiamentos até as formas de escoamento, comercialização e melhoramento dos
aportes que constituem o circuito produtivo, como é o caso da região do Sul de Minas.
O seu potencial produtivo é justificado pela concentração de diversos sistemas técnicos e
normativos com o intuito de tornar eficiente a produção e a logística do segmento cafeeiro,
constituído de várias competências infraestruturais (sistemas de transporte, de armazenamento e
de comunicação), institucionais (criação de Estações Aduaneiras do Interior, Recintos
Exportadores, associações de produtores, selos de denominação de origem, cooperativas,
incentivos fiscais, leis de desoneração das exportações, incentivos governamentais para
produção, acordos e realização de pesquisas em instituições e empresas) e estratégico-
operacionais (conhecimento técnico sobre a produção, presença de operadores logísticos e
transportadores especializados no transporte do café) que dão competitividade ao circuito espacial
produtivo do café e, conseqüentemente, aos seus principais agentes econômicos (FREDERICO,
2009, p. 2). Além dessa reunião de fatores importantes, as condições naturais para plantio da
lavoura, relacionados ao clima, aos solos e ao relevo propício, se torna extremamente importante
para determinar a especialização do Sul de Minas como a maior região produtora de café do país.
Estudando o conceito de agronegócio, percebe-se que deriva de uma atividade de grande
complexidade e que envolve diversos agentes, que atuam em vários setores econômicos.
Segundo Pizzolatti (2004, p.1), “agribusiness é um sistema integrado; uma cadeia de negócios,
pesquisa, estudos, ciência, tecnologia, etc., desde a origem vegetal/animal até produtos finais com
valor agregado, no setor de alimentos, fibras, energia, têxtil, bebidas, couro e outros”. Sobre a
origem do termo agribusiness, Silveira (2007) explica que:
Uma primeira formulação conceitual é a idéia de agribusiness (ou agronegócio) elaborada pelos norte americanos Davis e Goldberg em 1957, no qual seria a
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totalidade das atividades referentes o processamento e distribuição de insumos agrícolas, à produção agrícola realizada nas propriedades rurais e ao armazenamento, processamento e distribuição dos produtos agrícolas e seus derivados (SILVEIRA, 2007, p. 218).
Segundo o mesmo autor (2007) o sistema agroindustrial é constituído por quatro
segmentos: o segmento de produção de insumos e serviços à montante da atividade agropecuária
(crédito, assistência técnica, máquinas e equipamentos, insumos); de produção agropecuária das
matérias primas; de beneficiamento e de transformação industrial das matérias primas a jusante
da sua produção; e o de comercialização e distribuição dos produtos finais.
Assim, nos espaços aonde as atividades da cadeia produtiva se encontram sobremaneira
organizada, articulada e modernizada, a competitividade econômica possibilita uma maior
integração com o sistema exterior e abre portas para constantes investimentos do capital em
setores como o de produção, industrialização e comercialização do café. Tal contexto pode ser
bem observado na região competitiva do Sul de Minas, cujo segmento cafeeiro é estritamente
vinculado aos ditames do mercado internacional, através de várias empresas do ramo.
A importância do agronegócio do café para o Brasil e para a região do Sul de Minas
O Brasil participa no mercado mundial como o maior produtor e exportador de café. Sua
produção corresponde em média a 35% da produção mundial, produzindo anualmente pouco mais
de 45 milhões de sacas de 60 Kg. Desse montante, 60% dos grãos são destinados à exportação,
sendo o país responsável por 30% das exportações mundiais. Os maiores importadores do café
brasileiro são principalmente os países desenvolvidos, como a os Alemanha, Estados Unidos,
Itália e Japão, respectivamente (MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E
ABASTECIMENTO, 2012a).
Em 2011, o Brasil colheu 50,8 milhões sacas de 60 Kg (35,2% da produção mundial) e
exportou mais de 28,7 milhões de sacas (27,2% das exportações mundiais do produto), ficando
bem a frente da participação do segundo maior produtor e exportador do planeta, o Vietnan, que
participou com aproximadamente 15% da produção e 17% do total das exportações mundiais de
café. Além disso, o agronegócio cafeeiro participa com 6,7% das exportações totais de produtos
agropecuários do país. Há 11 regiões e 1.850 municípios envolvidos na cafeicultura brasileira, que
ocupa 2 milhões de hectares plantados, com aproximadamente 8 bilhões de pés – pouco mais da
metade só no Estado de Minas Gerais (ANUÁRIO BRASILEIRO DO CAFÉ, 2012).
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O desempenho da economia cafeeira pode ser medido através da expansão da produção
e da produtividade de café no país e do aumento da participação das exportações brasileiras no
mercado mundial nos últimos 12 anos. Em 2000, o Brasil só produzia 31,1 milhões de café, com
uma produtividade de 15,7 sacas por hectare, contribuindo com 20,3% do total das exportações
mundiais de café. Parte deste crescimento se deve, principalmente, pelo aumento do repasse de
recursos oriundos do Funcafé (Fundo de Defesa da Economia Cafeeira) para custear despesas
como o de financiamentos, pesquisas, publicidade e promoção dos cafés pelo país. O orçamento
aprovado para este fim passou de 746 milhões de reais em 2000 para 2,8 bilhões em 2012,
contribuindo, assim, para a expansão dos processos produtivos (plantação e manutenção de
lavouras, colheitas, beneficiamentos, armazenamento e transporte); do comércio cafeeiro, das
pesquisas e desenvolvimento do setor, entre outras atividades (MINISTÉRIO DA AGRICULTURA,
PECUÁRIA E ABASTECIMENTO, 2012b).
Na região do Sul de Minas, o agronegócio cafeeiro é a principal atividade agropecuária e
se destaca por produzir cafés de ótima qualidade e voltados para exportação. Desde a década de
1970, quando houve a decadência da produção de café no estado de São Paulo e Paraná, o
estado de Minas Gerais passou a produzir a maior quantidade de café no Brasil, respondendo por
mais de 50% de toda a produção e do parque cafeeiro nacional, e o Sul de Minas, se tornou a
principal região brasileira produtora de café, representando a metade da produção mineira e um
quarto da produção nacional (ANUÁRIO BRASILEIRO DO CAFÉ, 2012).
Nas exportações do agronegócio brasileiro, Minas Gerais teve uma participação de 10%,
gerando uma receita de U$ 9,7 bilhões, montante que representou 23,4% do total das exportações
gerais do estado. Neste comércio, o café participou 60%, somando mais de US$ 5,8 bilhões de
dólares em 2011 (66,5% do total das exportações brasileiras de café). Entretanto, a região do Sul
de Minas, em comparação com as outras regiões mineiras, contribuiu com a maior parte das
exportações agropecuárias do estado (participação de 50,7% e geração de US$ 4,7 bilhões),
tendo o café e derivados como os principais produtos de comercialização, destinadas
principalmente para Alemanha (22,4%), EUA (22,2%), Japão (9,9%), Itália (9,6%) e Bélgica (8,2%)
(SECRETARIA DE ESTADO DE AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO DE MINAS
GERAIS, 2011).
Em 2011, a região produziu mais de 13,7 milhões de sacas de café de 60 Kg (27% do total
produzido no país), ou seja, metade da produção do estado de Minas Gerais (26,6 milhões de
sacas) e mais que a produção do segundo maior estado produtor do país (Espírito Santo, com
12,5 milhões de sacas). O Sul de Minas conta também com a maior área de produção de café,
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cujo parque cafeeiro totaliza 620.782 ha de lavouras (26,6% do total de área cafeeira do país)
como se pode observar na tabela 1. De acordo com dados do IBGE, a cultura de café ocupa mais
da metade do total das lavouras agrícolas da região (figura 1), evidenciando a sobremacia da
atividade para a economia do Sul de Minas.
Tabela 1 - Produção de café e área plantada por regiões mineiras e principais estados produtores em 2011.
UF/REGIÃO
Produção
(mil sacas beneficiadas)
Área plantada
(em hectares)
Minas Gerais 26.944 1.028.425
Sul e Centro-Oeste 13.792 518.082
Cerrado 6.231 168.463
Zona da Mata 6.921 341.880
Espírito Santo 12.502 450.128
São Paulo 5.357 175.137
Paraná 1.580 67.177
Bahia 2.150 138.213
Rondônia 1.367 125.667
Mato Grosso 124 21.028
Goiás 247 6.320
Pará 167 10.249
Rio de Janeiro 262 13.325
Outros 126 14.169
BRASIL 50.826 2.049.838
Fonte: Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, 2012a.
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Figura 1 - Participação das principais culturas na área das lavouras agrícolas na região do Sul de Minas em 2011. Fonte: SIDRA – Sistema IBGE de Recuperação Automática, 2013.
Constituição de municípios funcionais a produção cafeeira no Sul de Minas
No Brasil, a reestruturação produtiva da agropecuária tem promovido profundos impactos
socioespaciais, quer no campo, quer nas cidades. Isto explica em parte a reestruturação do
território e a organização de um novo sistema urbano, muito mais complexo, resultado da difusão
da agricultura científica e do agronegócio globalizado, que têm poder de impor especializações
produtivas ao território.
Como mencionado anteriormente, as regiões competitivas são dotadas de fatores e
condições especiais que conferem às atividades produtivas, engajadas na modernidade, uma
maior eficiência nas formas de produção e de circulação, por meio da inserção de atores que
transformam os espaços com a aplicação de capital e seus respectivos produtos de
desenvolvimento: técnica, ciência e informação. Com a existência desses novos fatores, ocorre
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uma intensa estruturação de áreas recentemente ocupadas e utilizadas ou uma reestruturação de
áreas que há algum tempo já desenvolvem alguma forma de uso.
Este processo, então, ocorre tanto no meio rural, com a entrada de sofisticadas técnicas de
produção, como maquinários, insumos e implementos agrícolas, tecnologia em produção de
sementes e nas diversas etapas de plantio, colheita e beneficiamento, etc.; quanto no meio
urbano, com a presença de uma rede de serviços e sistemas de armazenagem, de
comercialização, de assistência técnica, de produção e vendas de insumos e implementos
agrícolas, de financiamentos, etc. Características que beneficiam o arranjo produtivo local e que
oferecem vantagens e maior eficiência à região a qual determinada atividade produtiva esta
instalada. Assim, as relações que mais se alteram com a agricultura moderna são os vínculos, as
funções e o uso do espaço urbano e do campo. Sobre isto, Santos (1997b) nos menciona que:
Ciência, tecnologia e informação fazem parte dos afazeres cotidianos do campo modernizado, através das sementes especializadas, da correção e fertilização do solo, da proteção das plantas pelos inseticidas, da superimposição de um calendário agrícola inteiramente novo, fundado na informação, o que leva para as cidades médias do interior um coeficiente de modernidade. Não raro, maior que o da metrópole (SANTOS, 1997b, p. 41).
Neste contexto, Denise Elias (2007) nos explica que o agronegócio globalizado promove o
processo de urbanização e de crescimento das áreas urbanas, principalmente das cidades médias
e locais, cujos vínculos principais se devem às inter-relações cada vez maiores entre o campo e a
cidade, fortalecendo-as seja em termos demográficos ou econômicos. Assim, “é na cidade que se
realizam a regulação, a gestão e a normatização das transformações verificadas nos pontos
luminosos do espaço agrícola” (ELIAS, 2007, p. 115).
A partir disto, Frederico (2009b, p. 4) nos aponta que “quanto maior a especialização
produtiva do campo e seu respectivo conteúdo em ciência e informação, maior serão a
urbanização e a inter-relação entre o campo e a cidade.” Os núcleos urbanos surgidos ou
adaptados à demanda do campo moderno são denominados, por Elias (2007, p.120), de “cidades
do agronegócio”. Estas são aquelas “cujas funções de atendimento às demandas do agronegócio
globalizado são hegemônicas sobre as demais funções”. Sobre a constituição das cidades do
agronegócio, a autora nos explica que:
A produção agrícola e agroindustrial intensiva exige que as cidades próximas ao campo se adaptem para atender às suas principais demandas, convertendo-as no seu laboratório, em virtude de fornecerem a
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grande maioria dos aportes técnicos, financeiros, jurídicos, de mão-de-obra e de todos os demais produtos e serviços necessários à sua realização. Quanto mais modernas se tornam essas atividades, mais urbana se torna sua regulação (ELIAS, 2007, p. 118).
No caso da região do Sul de Minas, presenciamos que grande parte dos municípios
produtores de café com meios urbanos adaptados ao campo moderno possuem como principais
atividades econômicas uma complexa rede de serviços que servem tanto para o atendimento das
demandas da cafeicultura quanto para outros setores da economia, nos quais incluem as várias
funções associadas as necessidades da população local. Entretanto, quando analisamos o
comércio destes municípios, bem como a circulação de cargas, movimentação de trabalhadores
rurais e outros fatores, observamos a hegemonia do café como grande propulsora de
desenvolvimento local, tornando-se em vários municípios como atividade de destaque. Alguns
municípios se encarregam ou se especializam na produção. Outras tendem a realizar a parte da
produção e/ou da comercialização, em razão da presença de empresas voltadas para exportação,
como a Cooxupé (Cooperativa Regional de Cafeicultores em Guaxupé Ltda.), a Outspam Brasil
Importação e Exportação Ltda. e a Sara Lee Cafés do Brasil Ltda.
As tabelas 2 e 3 mostram os principais municípios produtores de café no estado de Minas
Gerais e na região do Sul de Minas.
Tabela 2 - Ranking dos 20 maiores municípios produtores de café do estado de Minas Gerais em 2011.
Posição Município Produção de café (em toneladas)
1º Patrocínio - MG 31.435
2º Três Pontas - MG 27.750
3º Manhuaçu - MG 26.136
4º Monte Carmelo - MG 23.040
5º Nepomuceno - MG 22.074
6º Carmo da Cachoeira - MG 21.600
7º Rio Paranaíba - MG 19.236
8º Campos Gerais - MG 18.110
9º Boa Esperança - MG 17.880
10º Araguari - MG 17.302
11º Espera Feliz - MG 16.704
12º Carmo do Paranaíba - MG 16.425
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13º Piumhi - MG 15.964
14º Carmo do Rio Claro - MG 15.836
15º Machado - MG 15.570
16º Alfenas - MG 15.049
17º Coromandel - MG 13.840
18º Mutum - MG 13.822
19º Campos Altos - MG 13.608
Santa Margarida - MG 13.608
Fonte: SIDRA – Sistema IBGE de Recuperação Automática, 2013.
Tabela 3 - Ranking dos 20 maiores municípios produtores de café da região Sul/Sudoeste de Minas em 2011.
Posição Município Produção de café (em toneladas)
1º Três Pontas - MG 27.750
2º Carmo da Cachoeira - MG 21.600
3º Campos Gerais - MG 18.110
4º Boa Esperança - MG 17.880
5º Carmo do Rio Claro - MG 15.836
6º Machado - MG 15.570
7º Alfenas - MG 15.049
8º Nova Resende - MG 13.336
9º Cabo Verde - MG 13.320
10º Elói Mendes - MG 11.160
11º Três Corações - MG 10.873
12º Campestre - MG 10.350
13º Poço Fundo - MG 9.687
14º São Sebastião do Paraíso - MG 9.627
15º Santana da Vargem - MG 9.240
16º Andradas - MG 8.976
17º São Gonçalo do Sapucaí - MG 8.777
18º Varginha - MG 8.716
19º Conceição da Aparecida - MG 8.578
20º Ibiraci - MG 8.565
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Fonte: SIDRA – Sistema IBGE de Recuperação Automática, 2013.
De acordo com os dados do IBGE, 7 dos 20 maiores municípios produtores de café em
Minas Gerais se localizam no Sul de Minas (Três Pontas, Carmo da Cachoeira, Campos Gerais,
Boa Esperança, Carmo do Rio Claro, Machado e Alfenas), comprovando, portanto, mais um dado
que revela o potencial da região para o agronegócio cafeeiro.
Mas quando analisamos as atividades de comercialização, percebemos que não são todos
os municípios que são os maiores exportadores de café no estado de Minas Gerais, exceto
Machado. Isto por que estes municípios, junto com Varginha, Guaxupé e Poços de Caldas, são
especializados dentro do contexto regional como importantes centros logísticos de escoamento e
comércio da produção, em detrimento da presença de empresas e Estações Aduaneiras no
interior, como o Porto Seco de Varginha, que possuem fortes vínculos internacionais. A tabela a
seguir resume bem as características dos 10 maiores municípios exportadores de produtos
agropecuários no estado de Minas Gerais, no qual metade tem como principal produto de
comercialização o café e seus derivados.
Tabela 4 - Ranking dos 10 maiores municípios exportadores do setor do agronegócio no estado de Minas Gerais em 2011.
Municípios Região US$ FOB
2010
(MILHÕES)
Part. % Principais Produtos
1º Varginha Sul de Minas 2.091,83 22,5% Café e derivados; complexo
soja; grãos e cereais; produtos
florestais; e frutas e derivados
2º Guaxupé Sul de Minas 872,54 9,4% Café e derivados.
3º Poços de Caldas
Sul de Minas 777,04 8,3% Café e derivados; cacau e produtos de confeitaria e produtos florestais.
4º Belo Oriente Rio Doce 663,46 7,1% Produtos florestais.
5º Piumbí Centro-Oeste
de Minas
530,59 5,7% Café e derivados; complexo
sucroalcooleiro e complexo
soja.
6º Araguari Triângulo 322,79 3,5% Carnes; café e derivados; complexo de soja; grãos e cereais; rações para animais;
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bebidas; frutas e derivados e produtos têxteis.
7º Uberlândia Triângulo 307,51 3,3% Complexo soja; couros e peleteria; grãos e cereais; outros produtos de origem vegetal; ovos e seus derivados; açúcares (Exc. de cana); cacau e produtos de confeitaria; carnes e produtos florestais.
8º Ituiutaba Triângulo 249,71 2,7% Carnes; complexo soja; complexo sucroalcooleiro; grãos e cereais; outros produtos de origem animal e gorduras e óleos de origem animal.
9º Delta Triângulo 233,01 2,5% Complexo sucroalcooleiro e
outros produtos de origem
animal.
10º Machado Sul de Minas 220,85 2,4% Café e derivados; complexo
soja e outros produtos de
origem vegetal.
Outros Estado MG 3.047,35 22,7% Agronegócio
Total das Exportações do Agronegócio de MG
9.316,68 100%
Fonte: Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Minas Gerais, 2012.
Comparando com as 10 maiores empresas exportadoras do agronegócio mineiro,
percebemos que metade delas tiveram como principal produto de venda ao exterior, café e seus
derivados, todas localizadas em municípios da região do Sul de Minas, sendo também que 3
dessas se localizam entre os principais municípios exportadores do agronegócio listadas na tabela
anterior (Varginha, Guaxupé e Poços de Caldas). Tal fato nos denota então que a presença das
grandes empresas influencia de maneira significativa para o desenvolvimento de um agronegócio
voltado para o mercado internacional. São consideradas importantes agentes no circuito espacial
produtivo do café, que determinam as regras de mercado e estabelecem forte domínio econômico
nos espaços competitivos de agricultura moderna.
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Tabela 5 - Ranking das 10 maiores empresas exportadoras do setor do agronegócio no estado de Minas
Gerais em 2011.
Empresas Município Produtos
Exportados
1º Cooxupé - Cooperativa Regional de
Cafeicultores em Guaxupé Ltda.
Guaxupé e Monte
Carmelo
Café e derivados
2º Genibra – Celulose Nipo-Brasileira S/A Belo Monte Produtos florestais
3º Terra Forte Exportação e Importação de
Café Ltda
Poços de Caldas Café e derivados
4º Sadia S/A Uberlândia Carnes
5º Usina Coruripe Açúcar e Álcool S/A Iturama e Campo
Florido
Complexo
sucroalcooleiro
6º Sara Lee Cafés do Brasil Ltda. Piumbí, São
Sebastião do Paraíso
e Varginha
Café e derivados
7º JBS S/A Ituitaba e Uberlândia Complexo
sucroalcooleiro
8º Usina Caeté S/A Conceição das
Alagoas e Delta
Complexo
sucroalcooleiro
9º Louis Dreyfus Commodities Brasil S/A Varginha Café e derivados
10º Unicafé Companhia de Comércio
Exterior
Varginha e
Manhumirim
Café e derivados
Fonte: Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Minas Gerais, 2011.
Contudo, Segundo Elias (2007, p.125), para analisarmos as cidades funcionais ao campo
moderno, denominadas “Cidades do Agronegócio”, devemos levar em consideração três eixos de
temas e processos: 1) as novas relações cidade-campo, pautadas, sobretudo, na funcionalidade
dos núcleos urbanos às demandas do campo moderno; 2) na identificação do mercado de
trabalho agropecuário e na dinâmica populacional; 3) e o aprofundamento das desigualdades
socioespaciais inerentes à modernização do modo de produção capitalista. Os eventos
representativos dos três eixos se inter-relacionam e são ao mesmo tempo causa e conseqüência.
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Para o agronegócio cafeeiro, é imprescindível a constituição de cidades funcionais ao
campo moderno para ofertar toda uma rede de serviços e infraestruturas necessárias para a
produção, logística, comercialização e consumo dos produtos agrícolas. Além disso, se torna
importante analisar, além das empresas e instituições relacionadas direta ou indiretamente ao
agronegócio do café, também identificar os fluxos financeiros destinados as atividades agrícolas,
os fluxos de exportação de café, a logística de transporte, distribuição e armazenamento de café,
os cursos superiores associados com o potencial de pesquisa agrícola e da execução de funções
da cadeia produtiva e comercial do agronegócio, a dinâmica do mercado de trabalho
agropecuário, o uso e distribuição das terras e propriedades agrícolas, os fatores demográficos e
demais aspectos que revelem as desigualdades socioespaciais inerentes às conseqüências da
modernização das atividades do campo.
Exemplo de Alfenas e Machado
Os municípios de Alfenas e Machado possuem vários atributos e características
consideradas por Elias (2007) como municípios funcionais à produção e logística cafeeira. Embora
a autora enfatize mais os aspectos e funcionalidades urbanas como referência a explicação das
“Cidades do Agronegócio”, termo mais adequado aos municípios de expansão recente da
agricultura moderna brasileira, como o complexo da soja no Centro-Oeste e no Nordeste, alguns
parâmetros de análise nos servem como forma de contextualizar tal dinâmica para com os
municípios em regiões de agricultura moderna consolidada, como é o caso do café no Sul de
Minas.
Alguns dados se fazem importante para indicar a importância da cafeicultura para estes
municípios, apresentados na tabela a seguir.
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Tabela 6 – Algumas informações sobre a importância do agronegócio do café para os municípios de
Alfenas e Machado.
Informações Alfenas Machado
Posição no ranking de produção de café no estado de Minas Gerais em 2011*
16º 15º
Posição no ranking de produção de café na região do Sul de Minas em 2011*
7º 6º
% do total das lavouras agrícolas com plantação de café em 2010* 47% 68,3%
% da participação do comércio do café nas exportações totais do município em 2011**
98% 84%
% da participação da agropecuária no PIB municipal em 2010*** 10,2% 16,5%
*Fonte: SIDRA – Sistema IBGE de Recuperação Automática, 2013. ** Fonte: Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, 2012. Disponível em: http://www.mdic.gov.br//sitio/sistema/balanca/arquivo/2011-12/MG/201112_MG_3101607.zip. *** Fonte: IBGE Cidades, 2013.
A partir das considerações da autora, percebemos então que ambos os municípios
possuem intensas relações campo-cidade em detrimento da modernização da cafeicultura. Com
as novas demandas de consumo da agricultura cientificada, ou seja, processos produtivos
dotados de conteúdo tecnológico, científico e informacional, representada pelas inovações nos
cultivares, uso intensivo de insumos e implementos agrícolas de alta tecnologia (como
agrotóxicos, fertilizantes, maquinários e demais equipamentos), conhecimento do terreno, do
clima e das demais técnicas de rendimento e produtividade; houve uma adaptação do meio
urbano para atender a essas novas necessidades. Nesta condição, a ampliação e a instalação de
novas empresas associadas ao ramo produtivo são marcantes na dinâmica do agronegócio local,
além daquelas que são responsáveis pela comercialização e logística da produção.
Considerando as funcionalidades dentro do circuito espacial produtivo do café, é possível
classificar as empresas e instituições enquadradas direta ou indiretamente ao agronegócio em
pelo menos 5 categorias de sistema secundário e terciário: fornecimento de insumos e
implementos agrícolas, assessoria técnica e administrativa, comercialização e logística,
beneficiamento e processamento agroindustrial, e financeiro.
Muitas empresas possuem destaque regional e nacional pelas atividades que realizam,
como a Cooxupé (Cooperativa Regional de Cafeicultores em Guaxupé Ltda.), maior exportadora
de café do mundo e que desde 1985 vem contribuindo também para a assistência técnica,
financeira, de beneficiamento, armazenagem e comercialização de café de vários, senão a
maioria, dos produtores; a Outspan Brasil Importação e Exportação Ltda., instalada desde 2006
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em Alfenas; a Casa Nobre Comércio e Armazenagem de Grãos Ltda., instalada desde 2010 em
Alfenas, que além de compra e exportação, trabalha com armazenagem, preparação e
certificação de café; a Exportadora e Importadora Marubeni Colorado Ltda., 10º maior exportadora
do agronegócio no estado em 2010 (SECRETARIA DE ESTADO DE AGRICULTURA, PECUÁRIA
E ABASTECIMENTO DE MINAS GERAIS), localizada em Machado; e a Associação Brasileira de
Cafés Especiais (BSCA - Brazil Specialty Coffee Association) instalada desde 1991 em Machado
e tem como objetivo congregar produtores de cafés especiais, difundir sua produção e estimular o
constante aprimoramento técnico e a maior eficiência nos serviços referentes à comercialização
(Fonte: site da empresa BSCA).
Dentre outros serviços funcionais ao agronegócio do café observados nos municípios de
Alfenas e Machado são os fluxos financeiros, que podem ser considerados os mais importantes
por anteceder e serem fundamentais à produção, ofertados tanto pelo Estado quanto pelos
bancos, cooperativas de crédito e empresas privadas, cuja movimentação só fez crescer entre os
anos observados de 2005 a 2010 (de 9 para 145 milhões e de 40 para 110 milhões, nos
respectivos municípios) (BANCO CENTRAL DO BRASIL, 2012); a qualificação da mão-de-obra
por meio de cursos de formação técnica e superior voltada à agropecuária moderna, vinculados
direta e indiretamente ao agronegócio, por meio das instituições de ensino técnico e superior
(UNIFAL – MG e UNIFENAS em Alfenas e IFSULDEMINAS, FUMESC e CESEP em Machado); e
as unidades armazenadoras de grãos, responsáveis pelo setor de transporte, armazenagem e
comercialização de café (15 unidades em Alfenas e 19 em Machado) (CONAB – Companhia
Nacional de Abastecimento, 2012).
Em relação a dinâmica do mercado de trabalho, percebe-se que nos dois municípios há
uma grande movimentação de trabalhadores do café em épocas de safra, oriundos tanto do
município, da região ou de outras localidades do país. O fluxo de admissões neste período é bem
maior (março a julho) do que no restante do ano, caracterizado por demissões em massa de mão
de obra com o fim das colheitas, de acordo com os dados da RAIS/CAGED do Ministério do
Trabalho e Emprego.
Já sobre a dinâmica populacional, os estudos revelam que tal fator está muito associado
às desigualdades socioespaciais presenciadas em regiões de agricultura moderna. De acordo
com dados do IBGE, nos dois municípios em questão houve uma redução drástica da população
rural e um aumento da taxa de urbanização, sobretudo devido à modernização das atividades do
circuito espacial produtivo do café. Em Alfenas, o percentual de população rural diminuiu de
25,6% em 1970 (7.264) para 6,2% em 2010 (4.595), considerando um aumento de quase 3 vezes
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da população absoluta (de 28.331 para 73.722 habitantes) no período. Em Machado houve a
redução de 46,6% em 1970 para 17,1% em 2010 da população do campo, sendo que o que a
quantidade de habitantes quase dobrou nos últimos 40 anos (de 11.491 para 32.877).
Tal fato se alia ao motivo de haver nos últimos anos uma intensa modernização da
agricultura na região, no qual muitos camponeses acabam não conseguindo se modernizar como
deveriam (para se tornarem competitivos no mercado) e sobreviver no “novo padrão agrário”. O
campo aos poucos passa a ser dominado por médios e grandes fazendeiros dotadas de alta
capacidade produtiva e a mecanização substitui a mão de obra rural, que passa a viver nas
cidades em busca outras alternativas de trabalho e renda. Isso contribui para elevar o fluxo do
êxodo rural e a concentração de terras. De acordo com dados do Censo Agropecuário do IBGE de
2006, 78% das áreas de produção de café são representadas por médios e grandes propriedades,
ou seja, com estabelecimentos com acima de 100 hectares, enquanto que em Machado o valor é
de 74%.
Atualmente, os agricultores familiares possuem muitas dificuldades para continuarem a
produzir café, por falta de recursos suficientes para modernizarem suas propriedades e
competirem com os seus produtos no mercado. Descapitalizados pela impossibilidade de obterem
maiores recursos junto às linhas de financiamento e a quitação das mesmas, em decorrência da
baixa produtividade e lucratividade, esses produtores não conseguem investir em suas
propriedades e lavouras (compra de insumos e implementos em quantidades adequadas) e
vender o café a preços lucrativos no mercado, em detrimento da baixa qualidade do café e as
épocas de oscilações de valores reduzidos de comercialização.
Considerações finais
De acordo com a abordagem adotada e as análises aferidas, é evidente que a região do
Sul de Minas se constitua como um espaço aonde reina a especialização na produção e
comercialização do café, dentro do contexto do modo de produção capitalista e da economia
globalizada. A modernização agrícola se enquadra nas características atuais do meio técnico-
científico-informacional, cujo modo produção e as relações de trabalho são constantemente
transformados. Nesta dinâmica territorial, é possível aferir a eminente competitividade e vocação
regional quanto ao agronegócio cafeeiro, que atende os mercados distantes por meio de uma
articulação moderna e eficiente da logística em meio ao circuito espacial produtivo do café.
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Muitos agentes atuantes neste espaço, como as empresas, tem papel significativo na
organização e ordenamento das atividades envolvidas no agronegócio, muitas vezes ditando
regras nos modos de produção e ao mercado (de qualidade e custos). Tal fato contribui ainda
mais para o aumento das exigências, vindas de ordem internacional, e conseqüentemente, da
modernização dos processos produtivos, logísticos e de comercialização. Neste sentido,
presencia-se uma reestruturação dos espaços rurais e urbanos como forma de adaptação ao novo
padrão agrário de produção, intensificando ainda mais a especialização produtiva dos espaços
locais e regional. A consolidação então de municípios funcionais à produção e comercialização de
café é uma realidade, podendo tal fenômeno ser identificadas através de suas recentes
transformações ocorridas nas atividades econômicas e nos aspectos sociais.
Nos exemplos abordados sobre Alfenas e Machado, é indiscutível a idéia da cafeicultura
ser a atividade tradicional e de destaque na economia desses municípios, acompanhando o
mesmo contexto da dimensão regional. Estes são municípios que dependem em muito das
atividades do agronegócio, cujo circuito espacial produtivo encontra empresas e instituições
funcionais ao desenvolvimento do arranjo produtivo local. Portanto, o meio urbano é dotado de
uma rede de serviços e infraestruturas que complementam direta ou indiretamente o setor. A
concentração de terras e o êxodo rural observados revelam que a modernização do espaço nem
sempre traz prosperidade, mas condiciona também a várias desigualdades socioeconômicas,
representadas tanto por atores quanto por espaços marginalizados.
Referências
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