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Mestrado em Educação Pré-Escolar e
Ensino do 1º Ciclo do Ensino Básico
Relatório de Estágio da Prática
de Ensino Supervisionada
Fernanda Maria da Cruz Brás Cardoso
setembro | 2015
Escola Superior de Educação, Comunicação e Desporto
© Fernanda Cardoso (2015) I
Escola Superior de Educação, Comunicação e Desporto Instituto Politécnico da Guarda
R E L AT Ó R I O D E E S T Á G I O D A P R Á T I C A
D E E N S I N O S U P E R V I S I O N A D A
Mestrado em Educação Pré- Escolar e Ensino do 1.º Ciclo do Ensino Básico
Fernanda Maria da Cruz Brás Cardoso
Setembro de 2015
© Fernanda Cardoso (2015) II
Escola Superior de Educação, Comunicação e Desporto
Instituto Politécnico da Guarda
R E L AT Ó R I O D E E S T Á G I O D A P R Á T I C A
D E E N S I N O S U P E R V I S I O N A D A
Fernanda Maria da Cruz Brás Cardoso
Mestrado em Educação Pré- Escolar e Ensino do 1.º Ciclo do Ensino Básico
Orientadora: Professora Doutora Urbana Cordeiro
Setembro de 2015
© Fernanda Cardoso (2015) III
AGRADECIMENTOS
São inenarráveis as circunstâncias que em determinados momentos cruzam as vidas de cada um de
nós. Caminhos que a vida traça e nos obriga a percorrer sem nos consultar se estamos, ou não,
prontos para aquela jornada. Mas, eis que é necessário caminhar, simplesmente caminhar para que
não se nos escape do horizonte o caminho que a tanto custo tentamos seguir. E por fim,
percebemos que no final dessa longa jornada nos espera um momento de tranquilidade indescritível
e que, afinal, outros passageiros fizeram connosco essa comprida viagem.
Aos que comigo caminharam, tanto àqueles que estiveram no banco ao lado, como aos que
esperaram pelo final da viagem, quero agora agradecer:
-À Prof.ª Doutora Urbana Cordeiro, pela sabedoria, conselhos, atenção, apoio,
disponibilidade, companheirismo e por ter aceitado ser a orientadora do meu Relatório de Estágio.
-À Prof.ª Doutora Elisabete Brito, pela orientação, sensibilidade, disponibilidade, partilha
de experiências, tolerância, sorriso calmo e encorajamento durante o desenvolvimento da Prática de
Ensino Supervisionada.
- À Prof.ª Doutora Filomena Velho, que me acompanhou na formação inicial e me prestou
toda a atenção quando no início da frequência deste Curso pedi aconselhamento, por me encontrar
indecisa no caminho a seguir.
- Os meus afetos incondicionais à Professora Esmeraldina Vicente que me aceitou como
estagiária na escola onde lecionava.
- Aos professores que aceitaram constituir o júri de avaliação deste trabalho e se revelaram
pessoas sensíveis para a temática abordada.
- Aos responsáveis pela coordenação do Mestrado, pelas informações céleres e oportunas,
sempre que foram solicitadas.
- Aos professores que lecionaram o Curso de Mestrado por terem contribuído para me
enriquecerem como pessoa e como profissional.
- À Psicóloga e Terapeuta da Fala que aceitaram ser entrevistadas.
- Aos meus alunos.
- Às colegas de turma: Ana Carolina, Ana porteiro e Susana Pires, por fazerem a “ponte”
entre a mim e a escola, quando por incompatibilidades horárias não me era possível assistir às
aulas.
- A todos os que de algum modo me ajudaram,
Muito obrigada.
© Fernanda Cardoso (2015) IV
E, at last but not the least…
A Deus: que me concedeu o dom da fé e da perseverança.
A Santo António de Lisboa, meu padrinho espiritual.
A meu marido.
A meus pais: a minha mãe que rezou por mim
e a meu pai que me acompanhou com o olhar.
© Fernanda Cardoso (2015) V
RESUMO
O Relatório de Estágio que a seguir se apresenta pretende divulgar o desenvolvimento da Prática de
Ensino Supervisionada de uma aluna do Curso de Mestrado Habilitador para a Docência em
Educação Pré-Escolar e Ensino do 1º Ciclo do Ensino Básico, ministrado pela Escola Superior de
Educação, Comunicação e Desporto do Instituto Politécnico da Guarda, estágio esse, efetuado na
Escola Básica da Póvoa do Mileu, na cidade da Guarda.
Tem como principal objetivo refletir sobre a realidade de uma escola de ensino regular do primeiro
ciclo, da qual faziam parte dois anos de escolaridade e na qual estavam integrados três alunos com
Necessidades Educativas Especiais. Nesse sentido é apresentado um estudo de caso sobre a
inclusão de uma aluna portadora de deficiência mental em sala de aula. O Relatório contempla três
vertentes essenciais:
-Enquadramento institucional (Organização e Administração Escolar) e caraterização
socioeconómica e psicopedagógica da turma onde foi realizado o estágio;
- Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada (reflexão auto e heteroavaliação);
- Proposta de uma prática docente relacionada com a superação do problema que deu mote ao
estudo.
Na pesquisa, agora estruturada em capítulos temáticos, sistematizam-se conhecimentos teóricos,
procedimentos metodológicos e éticos que sustentam a prática profissional. Nas reflexões,
equacionam-se complexidades, limites, condicionamentos e possibilidades de intervenção dos
docentes.
Reforça de forma impressiva e consistente, o caráter necessariamente reflexivo do agir do
professor, especificamente do professor de educação especial, e a sua forte componente ética,
mediando de forma cidadã e humanista as políticas educativas e sociais.
Os resultados da investigação aclaram fragilidades do sistema e apontam críticas ao atual modelo
de escola inclusiva, que fracassa o seu papel enquanto modelo integrador na redução das
desigualdades sociais. A pesquisa desencadeia futuras investigações que permitam produzir novo
conhecimento contextualizando-nos no âmbito educativo e social do século XXI, hoje considerado
o século da pobreza e da desigualdade social, que poderá aportar grandes desafios para a educação.
O trabalho desenvolve-se com rigor concetual, espírito científico e sentido de inovação.
Palavras-chaves: Educação, Reflexão, Inclusão, Deficiência Mental
© Fernanda Cardoso (2015) VI
ABSTRACT The Internship Report that here is presented aims to promote the development of Supervised
Teaching Practice of a student of the Enabler Master Course for Teaching in Pre School and
education in 1st cycle of basic education, taught by the School of Education, Communication and
Sports of the Polytechnic Institute of Guarda, internship performed at the Basic School of Póvoa do
Mileu, in the city of Guarda.
Its main objective is to reflect on the reality of a mainstream school of the first cycle, with two
years of schooling and in which three students with special educational needs were integrated.
Accordingly a case study is presented on the inclusion of a student with mental disabilities in the
classroom.
The report includes three main areas:
- Institutional framework (Organization and School Administration) and socio-economic and
psycho-pedagogical characterization of the class where the internship was carried out;
- Description of the supervised teaching practice process (self reflection and self assessment);
- Proposal of a teaching practice related with the resolution of the problem that set the theme forthe
study.
In the survey, now structured in thematic chapters, theoretical knowledge and methodological and
ethical procedures that support professional practice were systematized. On the reflections,
complexities, boundaries, constraints and possibilities of teachers’ interventions were considered.
It reinforces impressively and consistently, the necessarily reflective character of the act of the
special education teacher and its strong ethical component, mediating in a citizen-based and
humanist way the educational and social policies.
The research results clear up system weaknesses and point criticism of the current inclusive school
model, which fails its role as integrator model in reducing social inequalities. The research triggers
future investigations to produce new knowledge contextualizing us in the educational and social
context of the twenty-first century, now considered the century of poverty and social inequality,
which could contribute to major challenges for education. The work develops with conceptual
rigor, scientific spirit and sense of innovation.
Keywords: Education, Reflection, Inclusion, Mental Disability.
© Fernanda Cardoso (2015) VII
SIGLAS
Art.º - Artigo
CEB – Ciclo do Ensino Básico
CERCI – Cooperativa para a Educação e Reabilitação de Cidadãos Inadaptados
DEB – Departamento da educação básica
Dec. – Decreto
DM – Deficiência Mental
EB – Escola Básica
ECD - Estatuto da Carreira Docente
ME – Ministério da Educação
OCDE- Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico
OMS – Organização Mundial de Saúde
PAA – Plano Anual de Atividades
PEI – Programa Educativo Individual
PES – Prática de Ensino Supervisionada
UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
UNICEF - Fundo das Nações Unidas para a Infância
© Fernanda Cardoso (2015) VIII
ÍNDICE DE FIGURAS
Figura 1: Localização geográfica da Guarda e concelhos adjacentes ............................................. 19
Figura 2: Caracterização da escola ............................................................................................... 24
Figura 3: Implicações do modelo reflexivo ao nível das atitudes dos professores .......................... 39
Figura 4: Alguns conceitos básicos da teoria de Ausubel .............................................................. 45
ÍNDICE DE GRÁFICOS
Gráfico 1: Caracterização da turma por género ............................................................................. 27
Gráfico 2: Distribuição de alunos por género e ano de escolaridade .............................................. 27
ÍNDICE DE QUADROS
Quadro 1: Recursos humanos ....................................................................................................... 25
Quadro 2: Situação educativa dos alunos ...................................................................................... 29
Quadro 3: Organização do estágio ................................................................................................ 36
Quadro 4: Estratégias de reflexão ................................................................................................. 41
Quadro 5: Níveis de deficiência ou de comportamento deficitário ................................................. 98
Quadro 6: Registo das respostas às entrevistas ............................................................................ 121
Quadro 7: Descrição da situação da aluna ................................................................................... 129
Quadro 8: Relatório Técnico Pedagógico ................................................................................... 130
© Fernanda Cardoso (2015) 11
INDICE
SIGLAS ................................................................................................................................................... VII
ÍNDICE DE FIGURAS .......................................................................................................................... VIII
ÍNDICE DE GRÁFICOS ........................................................................................................................ VIII
ÍNDICE DE QUADROS ........................................................................................................................ VIII
Introdução ................................................................................................................................................. 14
Capítulo I - Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar ........................................ 18
1.1 Caracterização do meio envolvente................................................................................................... 18
1.2 Localização geográfica da escola ...................................................................................................... 23
1.3 Caraterização da escola .................................................................................................................... 24
1.3.1 Caracterização da sala de aula ....................................................................................................... 26
1.3.2Caracterização socioeconómica e psicopedagógica da turma ........................................................... 27
Capítulo II – Descrição do processo de prática de ensino supervisionada .................................................... 30
2.1 Articulação entre ciclos .................................................................................................................... 30
2.2. Funcionamento da prática de ensino supervisionada......................................................................... 35
2.3 Análise reflexiva à luz do nosso quotidiano ...................................................................................... 37
2.4 Outros pressupostos importantes na nossa prática educativa .............................................................. 44
Capítulo III – A Educação Especial e a Criança com Necessidades Educativas Especiais ............................ 56
3.1 Da segregação à inclusão ................................................................................................................. 56
3.2 Síntese histórica da evolução da educação especial ........................................................................... 58
3.3 Políticas da educação inclusiva ......................................................................................................... 60
3.4 A educação inclusiva em Portugal .................................................................................................... 63
3.4.1 Situação atual ................................................................................................................................ 66
3.4.1.1 Modalidades específicas de educação e respostas educativas especializadas................................. 68
Capítulo IV – Caminhos para a Inclusão .................................................................................................... 71
4.1 A escola inclusiva: pressupostos básicos ........................................................................................... 71
4.2 Os professores – a sua formação e o seu papel na construção de uma escola inclusiva ....................... 74
4.3 O papel das lideranças e do gestor escolar ........................................................................................ 77
4.4 Escola inclusiva e multiculturalidade ................................................................................................ 79
4.5 A importância do currículo na escola inclusiva ................................................................................. 83
4.6 O papel da ética nas políticas educativas duma escola inclusiva ........................................................ 86
Capítulo V – A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular ...................................... 91
5.1 Conceito de deficiência .................................................................................................................... 91
© Fernanda Cardoso (2015) 12
5.1.1 Definição de deficiência mental ..................................................................................................... 92
5.1.2 Diagnóstico ................................................................................................................................... 94
5.1.3 Etiologia ....................................................................................................................................... 96
5.2 Graus de deficiência mental e características de cada grupo .............................................................. 98
5.3 Características evolutivas da deficiência mental e implicações educativas ....................................... 100
5.3.1 Desenvolvimento da personalidade na pessoa com deficiência mental .......................................... 102
5.4 A abordagem educacional da criança com deficiência mental .......................................................... 103
5.5 A Educação Pré-Escolar ................................................................................................................. 105
5.6 A educação no 1.º Ciclo do Ensino Básico ...................................................................................... 106
5.7 Programas Educativos Individuais .................................................................................................. 108
5.8 O papel da família .......................................................................................................................... 110
Capítulo VI – Organização e desenvolvimento do estudo experimental ..................................................... 113
6.1 Justificação do estudo .................................................................................................................... 113
6.2 Problemática .................................................................................................................................. 114
6.3 Objetivos do estudo........................................................................................................................ 115
6.4 Opções metodológicas ................................................................................................................... 117
6.5 Técnicas de recolha de dados ......................................................................................................... 118
6.6 Apresentação e análise de conteúdo ................................................................................................ 120
6.7 Principais ilações ........................................................................................................................... 125
6.8 Limitações do estudo ..................................................................................................................... 127
6.9 Apresentação do estudo de caso ..................................................................................................... 127
6.10 Situação educativa atual ............................................................................................................... 132
Conclusões .............................................................................................................................................. 133
Referências Bibliográficas ....................................................................................................................... 136
Anexos .................................................................................................................................................... 146
© Fernanda Cardoso (2015) 13
Cada ser humano trilha o seu próprio percurso de formação,
fruto do que o contexto vivencial lhe permite que seja,
fruto do que quer e do que pode ser.
Isabel Alarcão (1997)
Introdução
© Fernanda Cardoso (2015) 14
Introdução
A educação é um acto de amor, por isso um acto de coragem.
Não pode temer o debate. A análise da realidade.
Não pode fugir à discussão criadora, sob pena de ser uma farsa.
Paulo Freire (1979)
O presente trabalho desenvolve-se à volta da temática “Inclusão de alunos com deficiência mental
no 1.º CEB – Um estudo de caso”.
A escolha do tema prende-se com a conceção de educação, especificamente de educação especial,
que hoje exige novas respostas interventivas. Na generalidade dos países observa-se uma
progressiva tomada de consciência de que o atendimento das crianças e jovens que são excluídos
da escola regular e, em particular daqueles a quem é imposto um percurso educativo paralelo
segregado, constitui uma prioridade.
A grande produção de documentos de cariz científico, realizados individualmente ou por
organizações mundiais, que dão origem a orientações de política educativa a nível internacional,
expressa bem a urgência do combate à exclusão e a necessidade de serem criadas disponibilidades
e condições de operacionalização de inclusão social e escolar. Efetivamente, em termos de política
educativa, o novo paradigma assenta agora na inclusão. Como nos diz Miranda Correia (2008a) Em
Portugal, hoje em dia, quando se fala em educação, a palavra de ordem parece ser sempre
inclusão, um conceito “salva-vidas” dos alunos com necessidades educativas especiais
significativas (NEES)1” (Correia, 2008a:7).
No entanto, a experiência profissional e as constatações que efetuamos na prática educativa,
obrigam a uma mais profunda reflexão. Da mesma, surge a temática desta investigação, que
consideramos com relevância e interesse para a área da Educação.
Desta forma, vemos como preocupação central neste contexto, o ser humano, e as problemáticas
que lhe dizem respeito nas diferentes dimensões. Por consequência a criança ou jovem com
Necessidades Educativas Especiais (NEE), integra-se no grande grupo das questões do ser humano
na medida em que, sendo frágil, é alvo da intervenção de uma equipa interdisciplinar e
1 De uma forma original, Correia adota a nomenclatura NEES (Necessidades Educativas Especiais Significativas) para se referir a esta população. Mas, efetivamente, a maioria da bibliografia consultada, inclusive o próprio em obras anteriores, usa apenas a sigla NEE`s ou NEE. Nós optaremos por esta última.
Introdução
© Fernanda Cardoso (2015) 15
multidisciplinar constituída por diferentes técnicos: professores, psicólogos, assistentes sociais,
profissionais de saúde, sociólogos e outros elementos da comunidade educativa.
No seguimento da temática, articulando inúmeras ideias e situações, surgiu-nos o interesse
específico em investigar quais as representações que diferentes autores têm acerca da inclusão de
alunos com necessidade de respostas educativas diferenciadas e da forma como esta inclusão se
está a verificar. Após isso, construiu-se a seguinte pergunta:
– Quais os principais obstáculos que se colocam à escola, quando procura dar resposta a
todas as crianças – especificamente à criança portadora de deficiência mental – e como
poderemos dar o nosso contributo para minimizar esta problemática?
Decorrentes da pergunta que identificamos como questão de partida e problematizando o contexto
educativo em que a escola atual se desenvolve, emergiram questões como:
– Será, efetivamente, possível ao professor de ensino regular atender com eficácia todos os
alunos em sala de aula?
– Qual a perceção da comunidade científica em geral face à inclusão?
– Estará o modelo de escola atual adequado ao conceito de escola inclusiva?
– A criança portadora de deficiência mental, quando integrada em turmas regulares, correrá
risco de exclusão social?
– Como é perspetivado o futuro da criança portadora de deficiência mental?
– A presença de uma criança com NEE implica organização e funcionamento diferentes? Em
que aspetos?
– Qual a perceção que os técnicos especializados têm acerca do processo de inclusão?
A constituição deste corpo de perguntas, funcionaram como ponto de reflexão e referência para
posterior definição dos rumos da investigação (teórica e prática). Foi, também, com base nelas que
delineámos os objetivos, geral e específicos que apresentamos em espaço e momento próprios.
Após a clarificação dos mesmos definimos como objeto de estudo a integração de uma criança com
Deficiência Mental (DM) numa escola regular. As linhas orientadoras que subjazem ao
desenvolvimento da investigação estarão patentes ao longo de três Partes, cada uma delas
organizada na continuidade da anterior. Foram distribuídas em seis capítulos que passamos a
enunciar:
Introdução
© Fernanda Cardoso (2015) 16
A primeira Parte engloba dois capítulos. No primeiro, abordam-se aspetos da organização e
administração escolar, através de um enquadramento institucional. No segundo, descreve-se o
processo da Prática de Ensino Supervisionada (PES). São, também, apresentadas relevantes
perspetivas teóricas relacionadas com a área da Educação em geral e da Educação Pré-Escolar e 1.º
CEB, em particular.
A segunda Parte abrange três capítulos. No terceiro capítulo é dada uma visão do problema abstrato
da investigação e revistos os fundamentos do ensino inclusivo. Pela sua importância, passaremos
em revista as principais diretrizes e estratégias nacionais e internacionais produzidas nesta matéria,
fazendo-o de modo a dar-se uma visão histórica internacional (ancorada nos primórdios das
respostas educativas a estas populações) e fazendo-se também um relance do seu desenvolvimento
em contexto nacional. No quarto capítulo, analisamos uma série de pressupostos que consideramos
fundamentais para a verdadeira inclusão de todos os alunos na escola dita regular e que,
acreditamos, poderão fornecer um importante suporte ético e pedagógico à nossa prática
profissional. No capítulo quinto, são tratados os conceitos relacionados com o problema a ser
investigado relevando-se significativamente os termos deficiência mental e necessidades educativas
especiais, por serem o fio condutor desta abordagem.
Por fim, na terceira Parte, mostramos como organizámos e desenvolvemos o estudo experimental.
Esta terceira Parte, por se constituir de pontos tão interligados, apresentamo-la num único capítulo:
o capítulo sexto. Neste, é apresentada, de forma mais explícita a justificação do estudo, a
metodologia adotada e as técnicas de recolha e tratamento de dados. Procede-se, ainda, à
sistematização e apresentação dos resultados da pesquisa, fazendo-se a análise e interpretação da
informação. Identificam-se as limitações do estudo e, por fim, faz-se a apresentação do estudo de
caso propriamente dito. Por último são apresentadas as conclusões e a bibliografia.
Capítulo I Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar
© Fernanda Cardoso (2015) 17
PARTE I
Qualquer situação de ensino-aprendizagem é complexa e apresenta aspectos sociológicos,
biológicos e psicológicos diferentes de qualquer outra, pelo que os professores devem conhecer
e dominar inúmeras estratégias didácticas e complementares, para poderem fazer face às várias
situações que podem surgir (Borrás, 2001:92).
Capítulo I Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar
© Fernanda Cardoso (2015) 18
Capítulo I - Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar
(…)os
edifícios escolares devem ser planeados na óptica de um equipamento integrado e ter
suficiente flexibilidade para permitir, sempre que possível, a sua utilização em
diferentes actividades da comunidade e a sua adaptação em função das alterações dos
diferentes níveis de ensino, de currículo e métodos educativos.
(LBSE, artigo 39.ºalínea a).
1.1 Caracterização do meio envolvente
Não existem dúvidas, todos o sabemos, O meio circundante é a casa, o bairro, os campos, os prados, os bosques,
as lojas e as oficinas, os monumentos e os edifícios públicos, tudo quanto o pequeno citadino ou o pequeno
aldeão vêem na vida de todos os dias (Dottrens,1974a:10).
O conhecimento das instituições assim como o seu enquadramento institucional, bem como a caraterização
socioeconómica e psicopedagógica das turmas, sem perder de vista os normativos nacionais, deverão estar na
base do planeamento para o processo de ensino e de aprendizagem.
Com base nesse pressuposto, recolhemos a informação que considerámos necessária sobre a cidade da Guarda,
localidade onde se desenrolou o nosso estágio, apresentando na figura que se segue a sua localização geográfica.
Capítulo I Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar
© Fernanda Cardoso (2015) 19
Figura 1: Localização geográfica da Guarda e concelhos adjacentes
Fonte: www.destinoportugal.pt-tur.com
A Guarda é uma cidade portuguesa, capital de distrito situada a 1056 metros de altitude, sendo a cidade mais alta
de Portugal. Tem 26.565 habitantes no seu perímetro urbano2 e uma população residente de 173 831 habitantes.
Como se pode observar, o município é limitado a nordeste pelo município de Pinhel, a leste por Almeida, a
sudeste pelo Sabugal, a sul por Belmonte e pela Covilhã, a oeste por Manteigas e por Gouveia e a noroeste por
Celorico da Beira.
Até um passado recente, cada concelho estava organizado integrando diversas freguesias. Por força da nova
reorganização administrativa do território das freguesias (Lei n.º 11-A/2013 de 28 de janeiro), as diferentes
freguesias urbanas e rurais sofreram transformações a partir das quais muitas delas foram agregadas entre si, e
outras foram mesmo extintas em função da alteração dos limites territoriais.
Decorrente dessa legislação a cidade da Guarda deixou de se subdividir em duas freguesias (Sé e São Vicente)
encontrando-se atualmente restrita a uma única: freguesia da Guarda. No que concerne à sua localização, o
concelho da Guarda encontra-se na província da Beira Alta e pertence à sub-região estatística da Beira Interior
Norte, sofrendo visivelmente a desertificação constante de um interior que, apesar de bem servido ao nível viário,
assume-se carente de infraestruturas económicas, não despertando nas famílias o interesse e garantias suficientes
para aqui se instalarem. Contudo, a cidade da Guarda com a Torre de Menagem a 1056 metros acima do nível do
mar, está rodeada de depressões, onde correm rios como o Mondego, o Zêzere e o Côa que, desde os alvores da
2 Fonte: https://ptwikipédia.org/WIKI/Guarda (acedida em 14/05/2015)
Capítulo I Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar
© Fernanda Cardoso (2015) 20
Humanidade, facilitaram a vida aos seus habitantes, pela generosidade de recursos; encontrando-se numa área de
comprovada ancestralidade humana (Rodrigues, 1977). De salientar que a partir do rio Mondego, foi criada a
Barragem do Caldeirão que abastece água para toda a cidade e algumas zonas rurais.
Culturalmente, a Guarda distingue-se por ser conhecida como a cidade dos cinco “F`s"3: Forte, Farta, Fria, Fiel e
Formosa. A explicação para a curiosa adjetivação da cidade, citamo-la apenas para que o leitor mais curioso e,
eventualmente, menos informado satisfaça a sua curiosidade. No entanto, fixamo-nos no último adjetivo que aqui
enumerámos, para que, aquele que ler o nosso trabalho possa - de forma breve - criar a sua própria ideia sobre a
cidade e, também, acompanhar a nossa visão sobre a mesma. Então, a sua formusura deve-se à riqueza
paisagística, histórica e patrimonial que a caracterizam. Torna-se visível que existe na Guarda, conjuntamente
com todas as freguesias que lhe estão anexas, um vasto património cultural, com vestígios de comunidades
humanas desde tempos remotos. Nestes destacam-se: igrejas, pelourinhos, solares, cruzeiros, pontes, achados
arqueológicos e ruínas de castelos. O seu conhecimento e estudo são essenciais na tomada de consciência do
passado que, como sabemos, é de todo o interesse preservar.
Como exemplos mais significativos destacamos, alguns monumentos situados na sede do Concelho: Sé Catedral,
Igreja da Misericórdia, Igreja de S. Vicente e a Capela do Mileu (…). Sediada no mesmo espaço geográfico do
último monumento mencionado, figurando paredes meias com a referida capela, encontra-se a Estação
Arqueológica do Mileu, descoberta em Agosto de 1951, aquando de obras efetuadas pela Junta Autónoma de
Estradas.
i) Caracterização socioeconómica do concelho da Guarda
Sob o ponto de vista económico, o concelho da Guarda caracteriza-se como um concelho rural e na maior parte
das suas freguesias a agricultura e a criação de gado ocupam lugar preponderante na economia familiar de tipo
tradicional. Há, também, grupos de famílias que residindo em espaços rurais se deslocam diariamente para a
cidade para desenvolverem atividades profissionais em serviços hoteleiros ou outros afins.
De salientar que, devido à atual conjuntura económica e à nova realidade social que tem conduzido à emigração,
muitas destas atividades também deixaram de ter peso na economia local. Por outro lado, na sede do concelho
existe alguma indústria que, também se revela escassa:
Plataforma Logística de Iniciativa Empresarial (várias empresas);
Parque Industrial (várias empresas).
3 ->Forte: a torre do castelo, as muralhas e a posição geográfica demonstram a sua força; -> FARTA: devido à riqueza do vale do Mondego; ->FRIA: a proximidade à Serra da Estrela explica este F; ->FIEL: porque Álvaro Gil Cabral – que foi Alcaide-Mor do Castelo da Guarda e trisavô de Pedro Álvares Cabral – recusou entregar as chaves da cidade ao Rei de Castela durante a crise de 1383-85. Teve ainda Fôlego para combater na batalha de Aljubarrota e tomar assento nas Cortes de 1385 onde elegeu o Mestre de Avis(D. João I) como Rei; -> FORMOSA: pela sua natural beleza.
Fonte: https://ptwikipédia.org/WIKI/Guarda (acedida em 14/08/2013).
Capítulo I Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar
© Fernanda Cardoso (2015) 21
Na vida da cidade, um pouco à semelhança do que acontece no resto do país, o setor dos serviços ocupa um lugar
predominante:
Câmara Municipal – serviços municipalizados;
Conservatória: registo civil e predial;
Tribunal Judicial;
Finanças;
Notários;
Segurança Pública (Polícia de Segurança Pública, Guarda Nacional Republicana,
Policia Judiciária);
Saúde: Hospital Sousa Martins, Centros de Saúde (várias extensões), Unidade de Cuidados
Continuados e várias clínicas de iniciativa particular.
Na área da cultura e lazer relevam-se o Teatro Municipal da Guarda (TMG) e o espaço Parque Urbano do Rio Diz
(Pólis), situado na zona da Guarda Gare.
No que respeita ao setor do comércio há uma relativa diversidade de oferta (respeitante ao comércio tradicional),
que tem sofrido algum decréscimo. Por outro lado, embora limitadamente, a cidade tem também beneficiado de
alguma modernidade. Podemos destacar o Centro Comercial VIVACI, que comporta salas de cinema e o
comércio tradicional.
Como ponto de grande valorização da cidade, destacam-se as boas vias de comunicação; ligada a Espanha e ao
Distrito de Viseu pela designada A25 e ao Distrito de Castelo Branco pela A23. A nível ferroviário, possui a
Linha da Beira Baixa (encerrada para obras de modernização com abertura prevista para o ano 2020)4 e a linha da
Beira Alta que se encontra completamente eletrificada permitindo a circulação de comboios regionais, nacionais
e internacionais, constituindo "o principal eixo ferroviário para o transporte de passageiros e mercadorias para o
centro da Europa" com ligação a Hendaye (França, via Salamanca-Valladolid-Burgos).
O ar, historicamente reconhecido pela salubridade e pureza, foi distinguido pela Federação Europeia de
Bioclimatismo em 20025, que atribuiu à Guarda o título de primeira "Cidade Bioclimática Ibérica". A Guarda foi
também pioneira na rádio local, sendo mesmo a Rádio Altitude considerada a primeira rádio local de Portugal. As
suas origens prendem-se com a existência de um Sanatório dedicado à cura da tuberculose.
Toda a região é marcada pelo granito, pelo clima contrastado de montanha e pelo seu ar puro e frio que permite a
cura e manufatura de fumeiro e queijaria de altíssima qualidade. É também a partir desta região que vertem as
4 Fonte: https://ptwikipédia.org/WIKI/Guarda (acedida em 14/08/2013) 5 Fonte: https://ptwikipédia.org/WIKI/Guarda (acedida em 14/08/2013)
Capítulo I Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar
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linhas de água subsidiárias das maiores bacias hidrográficas que abastecem as três maiores cidades de Portugal:
para a bacia do Tejo que abastece Lisboa, para a Bacia do Mondego que abastece Coimbra e para a bacia do
Douro que abastece o Porto. Existe mesmo na localidade de Vale de Estrela (a 6 km da cidade da Guarda) um
padrão que marca o ponto triplo onde as três bacias hidrográficas se encontram.
ii) Oferta Educativa
Relativamente ao ensino oficial, e em consequência da nova rede escolar, por força da legislação (Dec.-Lei n.º
75/2008 de 22 de abril) que determinou a agregação dos agrupamentos transformando-os em unidades
administrativas de maior dimensão, os anteriores agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas - Área Urbana
de Santa Clara, Escola Secundária Afonso de Albuquerque, Escola Secundária da Sé, Agrupamento de Escolas de
S. Miguel e Agrupamento de Escolas Carolina Beatriz Ângelo, foram aglomerados em dois únicos Mega
Agrupamentos: Agrupamento de Escolas Afonso de Albuquerque (e escolas adjacentes nas quais se incluem a EB
de Santa Clara e a anterior Escola Secundária Afonso de Albuquerque) e o Agrupamento de Escolas da Sé (que
integrou a EB de S. Miguel e escolas adjacentes); a Escola Carolina Beatriz Ângelo (e escolas adjacentes) e a
Escola Secundária da Sé; ficou, assim, a designar-se Agrupamento de Escolas da Sé. Para um melhor
conhecimento poderá adiantar-se que grosso modo o primeiro Agrupamento absorveu as escolas do primeiro ciclo
de áreas mais urbanas, e o segundo, as escolas de meio mais periférico ou rural.
Os alunos (jovens ou não) podem contar com o Ensino Superior – Instituto Politécnico da Guarda que tem sido,
ao longo dos anos, uma mais valia para a cidade, tanto na sua vertente cultural como económica, na medida em
que aporta uma série de infraestruturas necessárias ao seu funcionamento.
Paralelamente ao ensino oficial, a Guarda oferece hoje, aos jovens, mais oportunidades no complemento de
atividades escolares, ocupação de tempos livres, terapias e, a todos em geral, a possibilidade de participação em
atividades de índole cultural. Lembra-se a existência de alguns Centros de Estudos, Escola de Línguas, Centros de
Intervenções Psicopedagógicas (Centro de Formação Assistência e Desenvolvimento – CFAD, Núcleo
Desportivo e Cultural – NDS, Psycofoz…), Conservatório, Grupo de Teatro Aquilo, Paços da Cultura, Museu e
Piscinas Municipais, entre outros.
A par da oferta educativa da rede pública, também existem estruturas de iniciativa privada que prestam um
importante suporte educativo. No âmbito do ensino particular e cooperativo podemos mencionar Infantários, a
Cooperativa para a Educação e Reabilitação de Cidadãos Inadaptados (CERCIG) e a Escola Regional Dr. José
Dinis da Fonseca.
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1.2 Localização geográfica da escola
A escola é, por excelência, o lugar onde a aprendizagem formal, dita académica, acontece. Se recuarmos aos
nossos tempos de infância e fizermos emergir da memória imagens da escola, decerto enumeraremos, num
primeiro momento: o professor, o livro, o caderno, o quadro e a escola. As gerações mais novas acrescentariam a
esta lista, seguramente, o computador. No quotidiano de cada criança estas mesmas componentes interferem,
fortemente, no desenvolvimento das suas aptidões naturais e poderão, por isso, predispor a disposição infantil
para o facto de gostar ou não gostar de ir à escola, condicionando, provavelmente, no futuro o comportamento do
adolescente e do adulto face a novas experiências de aprendizagem.
Considerando que a escola constitui uma organização em que há dependência entre a estrutura formal e as
interações produzidas (Nóvoa, 1992), e que as características organizacionais distinguem alguns aspetos que se
interligam: a estrutura física, a administrativa e a social, compreenderemos a importância e respetivas implicações
que cada um destes aspetos desempenha na vida dos alunos. É partindo desta convicção que passamos a
apresentar a escola onde realizámos a nossa Prática de Ensino Supervisionada: a Escola Básica da Póvoa do
Mileu. Esta, encontra-se localizada na rua da Escola numa zona urbana da cidade da Guarda - a já identificada
Póvoa do Mileu - que fica na periferia da cidade, a cerca de 2Km do centro.
Na antiguidade era uma área essencialmente agrícola com habitações antigas denominada, ainda hoje, de Póvoa
Velha. Atualmente, tem vindo a evoluir com a construção de grandes bairros, que servem de residência a casais
jovens. Apesar do seu crescimento, não foram criadas infraestruturas que proporcionassem bem-estar aos seus
habitantes, pois existem poucos espaços verdes e espaços adequados a práticas lúdicas e desportivas das crianças.
De certo modo, é fácil perceber pelas vivências transmitidas pelos alunos que esta ausência é compensada com a
frequência assídua do Pólis.
Esta escola pertence ao Agrupamento de Escolas da Sé. Relativamente próximo da mesma, encontra-se o Jardim
de Infância da Póvoa do Mileu com o qual tem realizado, conjuntamente, atividades pedagógicas e recreativas
devidamente planificadas no Plano Anual de Atividades (PAA) das duas instituições6. Os restantes
estabelecimentos educativos encontram-se dispersos por toda a área geográfica abrangida pelo Agrupamento
concentrando-se na cidade da Guarda, bairros periféricos e localidades rurais.
6 Informação apurada a partir do Plano Anual de Atividades da EB da Póvoa do Mileu.
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1.3 Caraterização da escola
A escola é um edifício pré-fabricado; visto exteriormente não corresponde à imagem/construção mental que, de
modo mais ou menos coerente todos fomos criando relativamente a estes edifícios. É de estrutura térrea e baixa,
com uma configuração pouco assimétrica. Tem duas salas bem iluminadas, onde à data da PES, funcionavam
respetivamente 1.º/4.ºano e 2.º/3.ºano; um pequeno hall de entrada que dá acesso às duas salas e às casas de
banho. No seguimento desse hall, mas direcionando-se para as traseiras do edifício, existe um pequeno espaço
amplo onde estão, naturalmente privados, dois sanitários destinados aos rapazes, dois para as raparigas e um a
adultos. Estes, dão para um espaço onde existem quatro lavatórios.
É, também neste mesmo sitio que se encontra o telefone. Já no decurso da nossa PES foi construída, no interior
daquele espaço, uma subdivisão de áreas minúsculas que se destina a terapias e apoios especializados, prestados
a alunos com NEE.
Figura 2: Caracterização da escola
Fonte: Elaboração própria
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Funciona de apoio à escola - mas localizado noutra zona próxima - um edifício onde é servida a refeição do
almoço e se desenvolvem outras atividades habitualmente designadas, Atividades de Tempos Livres (ATL),
frequentadas pelas crianças que o desejarem. No que respeita aos recursos, iremos apresentá-los subdivididos em
recursos humanos e recursos materiais.
Recursos humanos
Relativamente aos recursos humanos, é largamente reconhecida a importância que os diferentes mediadores da
orientação educativa desempenham no desenvolvimento da personalidade dos educandos, relevando na formação
dos mesmos a promoção de valores que ajudem os alunos a integrarem, de forma responsável, a comunidade a
que pertencem e a orientá-los no serviço do bem comum (Fernandes, 1990). Decorre daí o relevado interesse em
que todos os agentes educativos funcionem em estreita cooperação e harmonia.
Assim, passamos a referir, os recursos humanos que prestavam serviço na EB de Póvoa do Mileu (duas salas) à
data da realização da PES:
Quadro 1: Recursos humanos Corpo docente Técnicos especializados Pessoal auxiliar
Professora titular de turma (uma) – 1.º/4.º ano - Terapeuta da Fala -Assistente operacional
- Professora titular de turma (uma) – 2.º/3.º ano - Formadora de Língua
Gestual
- Professora de apoio educativo (uma) - Psicóloga
-Professora de atividades extra curriculares
(uma)
- Professoras de Educação Especial (duas)–
Grupo 9107
-Professoras (duas) de Educação Especial –
Grupo 9208
-Professores das Expressões (três)
(EM/EP/AFD) em coadjuvação
Fonte: Elaboração própria
7 Professora que presta apoio pedagógico personalizado a crianças com NEE, com dificuldades no domínio cognitivo. 8 Professora que presta apoio pedagógico personalizado a crianças com NEE, com dificuldades no domínio da comunicação e da linguagem.
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Recursos materiais
Ao nível dos recursos materiais, podemos dizer que a escola dispunha daqueles que se podem considerar
essenciais. Incluímos nestes, equipamento informático, mobiliário e material didático. Consideramos que este
aspeto é significativamente importante na medida em que A diversidade de espaços equipados com materiais
próprios, cuja utilização seja regulada por regras adequadas às circunstâncias, promove a autonomia dos
alunos e é um recurso indispensável para por em prática a diferenciação pedagógica (Reis et al.; 2009: 68).
Respeitante ao equipamento informático, cada sala estava equipada com computador, impressora e respetivo
software educativo. Sempre que se tornava necessária a utilização do retroprojetor, o mesmo tinha de ser
previamente requisitado na EB de S. Miguel. Para lá do material já referido existiam ainda outros materiais
didáticos, jogos e livros que serviam de apoio às necessidades diárias das professoras e dos alunos, quer na
compreensão e concretização das tarefas educativas, quer na prática das atividades lúdicas. Regra geral, o
material informático era utilizado com a orientação da professora.
1.3.1 Caracterização da sala de aula
A sala de aula apresentava dimensões que poderemos considerar exíguas para o número de alunos que a
frequentavam e que poderiam ser um obstáculo à prática educativa. Como preconiza Arends (1998) A gestão da
sala de aula é, possivelmente, o desafio mais importante que os professores principiantes têm de enfrentar
(Arends,1998:186). Contudo, a experiência e o saber da professora titular de turma facilitaram a disposição dos
materiais de modo a permitir o máximo de otimização das condições existentes. Ciente de que a forma como o
espaço está organizado influencia a comunicação e a relação entre o professor e os alunos, as carteiras foram
colocadas acautelando, ao máximo, a possibilidade de que todos, à vez ou ao mesmo tempo, quando necessário,
focalizassem a atenção no professor, no quadro, ou em qualquer outro suporte essencial à prática educativa.
Para melhor organização, as carteiras foram alinhadas umas atrás das outras e os alunos foram agrupados por ano
de escolaridade, havendo o cuidado de, na proximidade com os pares, salvaguardar as caraterísticas
comportamentais de cada um e potenciar as experiências pedagógicas a que frequentemente chamamos “tutoria
de pares”. Dependendo das respostas dos alunos, ao longo do ano, sempre que necessário, foram realizados
ajustes.
Ainda no interior da sala de aula, os armários, secretárias (da professora e do computador) e mesas de apoio
foram acomodados nos espaços mais propícios. Todavia, pese embora a adequada gestão de todo o material
existente na sala de aula, tornava-se difícil circular na mesma pois o número de alunos e o mobiliário ocupavam,
Capítulo I Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar
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inevitavelmente, o espaço. Esta situação agudizava-se nos dias de chuva pois, como já foi referido, não existia um
espaço coberto e amplo, e tornava-se por essa razão inevitável que os alunos de cada sala permanecessem no seu
respetivo espaço. Lembramos que, na sequência da realização da sala para apoio ao aluno com NEE no âmbito da
Comunicação e Linguagem, o espaço existente na zona dos sanitários, embora exíguo mas amplo, deixou de
poder ser utilizado para fins lúdicos.
1.3.2Caracterização socioeconómica e psicopedagógica da turma
As informações respeitantes a este ponto foram apuradas a partir da observação direta, dados facultados pela
professora titular de turma e dados constantes nas fichas de inscrição. A turma era constituída por um total de
dezanove alunos distribuídos, por género, da forma que a seguir se apresenta:
Gráfico 1: Caracterização da turma por género
Fonte: Elaboração própria
Para melhor perceção apresentamos a constituição da turma organizada por género e ano de escolaridade como se
pode ver no gráfico número dois:
Gráfico 2: Distribuição de alunos por género e ano de escolaridade
Fonte: Elaboração própria
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No que respeita à proveniência sociocultural dos alunos, poderemos dizer que a esmagadora maioria reside na
Póvoa do Mileu e vive relativamente próximo da escola, sendo acompanhados, até à mesma, pelos pais ou avós.
Em termos gerais, os agregados familiares possuem um nível socioeconómico e cultural médio baixo, sendo
muitos deles subsidiados o que reflete, à semelhança do que se passa noutras zonas do país, a crise social que
assola a atualidade e da qual emergem, entre outras situações, famílias monoparentais e casais desempregados.
Ainda respeitante à zona de residência, excetua-se o caso de uma menina que estava institucionalizada na Aldeia
SOS.
Por outro lado, a escola da Póvoa do Mileu, revelava também a tendência multicultural que nos faz sentir hoje
“cidadãos do mundo”, pois na turma em questão, estavam integradas duas meninas de nacionalidade estrangeira:
uma brasileira e outra muçulmana.
Por força da legislação específica (Dec.-Lei n.º 3/2008 de 7 de janeiro) que reconhece a todas as crianças, sem
exceção, o direito a frequentar a escola dita regular estavam, também, integradas na turma, três crianças
portadoras de Necessidades Educativas Especiais (NEE) de caráter permanente, duas das quais tipificadas com
deficiência no domínio mental e uma terceira com deficiência ao nível da Comunicação e Linguagem, mas
também com deficiência mental. Careciam de respostas específicas de educação, beneficiando por isso de
adequações no processo de ensino e de aprendizagem ao abrigo da legislação supramencionada. Nas duas
primeiras situações os alunos eram escolarizados com as medidas educativas: Apoio pedagógico personalizado
(Art.º17.º); Adequações curriculares individuais (Art.º18.º); Adequações no processo de avaliação (Art.º20.º) e
Tecnologias de apoio (Art.º22.º). De igual modo, o terceiro aluno beneficiava de: Apoio pedagógico
personalizado (Art.º17.º); Adequações no processo de matrícula (Art.º19); Adequações no processo de avaliação
(Art.º20.º); Currículo específico individual (Art.º21.º) e Tecnologias de apoio (Art.º22.º).
Os três discentes eram acompanhados por docentes especializadas nas respetivas áreas de deficiência e técnicos
especializados, em conformidade com o que estava definido no seu Programa Educativo Individual (PEI).
Existiam, ainda, na turma, mais três alunos que apresentavam necessidades educativas diferenciadas e
beneficiavam de apoio educativo ao abrigo do Despacho normativo n.º50/2005. Estes, tinham um Plano de
Acompanhamento Pedagógico Individual e acompanhamento por parte de uma professora que prestava apoio
educativo.
Para melhor visualização dos dados apresentamos um quadro síntese onde se encontram assinaladas as
particularidades que respeitavam a cada um e que, em nossa opinião, relevam para a nossa análise. Salientamos a
existência de dois anos de escolaridade a serem lecionados na mesma sala de aula. Por razões éticas optámos por
não colocar os nomes dos alunos.
Capítulo I Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar
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Quadro 2: Situação educativa dos alunos
Ano Sexo Retenções Apoios Terapias
F M Sim Não Educativo Ed. especial Sim Não
2.º x x x 2.º x x 2.º x x 2.º x x 2.º x x 2.º x x 3.º x x x x 3.º x x x 3.º x x x x 3.º x x 3.º x x 3.º x x 3.º x x 3.º x 3.º x 3.º x x x x 3.º x x 3.º x x 3.º x x
Fonte: Elaboração própria
Sentimos que não será, aqui, descabido referir que foi este quadro de exigência de múltiplas respostas educativas
diferenciadas, prestadas por diferentes professores e técnicos, confinados a um restrito espaço físico, que deram
mote para que partíssemos para uma reflexão mais aprofundada de como gerir esta realidade educativa, atendendo
a todos, sem descurar nenhum, centrando a nossa preocupação nos mais vulneráveis: os alunos com necessidades
educativas especiais de caráter permanente.
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
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Capítulo II – Descrição do processo de Prática de Ensino Supervisionada
(…)o dizer não é apenas a expressão do pensamento, mas também a sua realização.
Do mesmo modo, o caminhar não é apenas a expressão do desejo de alcançar uma meta, mas
também a sua realização.
(Benjamin, citado em Leite e Kramer, 1999:73)
Este capítulo dedicamo-lo aos aspetos organizativos e ao desenvolvimento da PES, articulando
estes com uma forte componente reflexiva.
2.1 Articulação entre ciclos
Versando este curso de mestrado sobre os dois níveis de educação: Educação Pré-Escolar e o 1.º
Ciclo do Ensino Básico, entendemos que se justifica plenamente um momento de reflexão sobre a
articulação entre ciclos.
Esta temática adquiriu, nos nossos dias, um lugar de destaque no sistema educativo pela
necessidade de implementar espaços colaborativos e de intercâmbio entre os diversos níveis de
escolaridade, para que as transições entre si se tornem processos mais harmoniosos e promovam a
sequencialidade do processo de ensino e de aprendizagem.
Esta sequencialidade, entendemo-la como uma continuidade educativa como condição de base para
o sucesso, na convicção de que a educação é um processo que conduz ao sucesso global do
indivíduo, que deve contribuir para um desenvolvimento adequado das competências que lhe
permitam ser, num futuro próximo, um cidadão responsável, solidário e participativo, verdadeiro
agente do progresso da comunidade em que se insere.
Efetivamente, a aprendizagem é um processo contínuo e continuado do ser humano ao longo da
vida, pelo que a continuidade educativa, condição de um desenvolvimento harmonioso,
equilibrado, e de qualidade, implica uma articulação sistémica e sistemática entre os vários
subsistemas educativos, condição sina quo non a educação deixará de ter qualidade. Partindo destas
considerações gerais, passamos, de seguida, a focalizar-nos mais especificamente nos níveis de
educação abrangidos pelo nosso estudo: Pré-Escolar e 1.º CEB.
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
© Fernanda Cardoso (2015) 31
Com a integração da Educação Pré-Escolar no Sistema Educativo, através da Lei 46/86 de 14 de
outubro, e do Dec.- Lei n.º147/97 de 11 de junho, que determina que a Educação Pré-Escolar seja,
hoje, considerada a primeira etapa da educação básica no processo de educação ao longo da vida, o
1.ºCEB passou de ciclo inicial e ciclo terminal, para ciclo intermédio da Educação Básica. Tal
realidade faz com que haja necessidade de uma articulação educativa entre este ciclo e a Educação
Pré-Escolar que o precede.
Tradicionalmente a viver num isolamento organizacional - embora com práticas mais ou menos
regulares de atividades pedagógicas e recreativas conjuntas - educadores de infância e professores
do 1.ºCEB encontram-se, agora, num novo modelo organizativo que os vincula a uma prática de
continuidade educativa, sustentada numa efetiva articulação de desenvolvimento curricular. Esta
nova realidade é claramente reforçada em normativos estruturantes do sistema de ensino, dos quais
salientamos o, já citado, Dec.-Lei n.º75/2008 de 22 de abril que determina que O agrupamento de
escolas é uma unidade organizacional, dotada de órgãos próprios de administração e gestão,
constituída por estabelecimentos de educação pré-escolar e escolas de um ou mais níveis e ciclos
de ensino, com vista a (…) proporcionar um percurso sequencial e articulado dos alunos
abrangidos numa dada área geográfica e favorecer a transição adequada entre níveis e ciclos de
ensino (art.º6). No mesmo sentido, também o Despacho n.º 11120-A/2010 de 06 de julho
determina: Na programação das reuniões de avaliação, devem os directores dos agrupamentos de
escolas e dos estabelecimentos de educação pré-escolar e escolas não agrupadas assegurar a
articulação entre os educadores de infância e os docentes do 1.º ciclo do ensino básico de modo a
garantir o acompanhamento pedagógico das crianças no seu percurso da educação pré-escolar
para o 1.º ciclo do ensino básico.
Deste modo, no âmbito do tema em debate neste ponto do nosso trabalho, a articulação/transição
entre ciclos reveste-se de uma particularidade que, em nosso entendimento, obriga a atenção
redobrada: estamos a referir-nos à tenra idade das crianças que frequentam estes níveis de
educação.
Na verdade, a transição das crianças do jardim de infância para o 1º CEB constitui um momento de
alguma apreensão, pese embora a preparação feita pelos educadores de infância no sentido de
proporcionar uma boa integração. Logo de imediato, verificam-se diferenças na perceção que a
sociedade cria sobre a Educação Pré-Escolar e o 1º CEB; temos como ponto de partida e de grande
diferença, o facto de a primeira etapa de educação ser facultativa e a segunda ser obrigatória.
Seguem-se, posteriormente, as aquisições a realizar. Na frequência da Educação Pré-Escolar, a
aquisição de competências é feita de forma globalizada por Áreas de Conteúdo. No 1º CEB a
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
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enfase é colocada na aquisição de competências a nível do Português, Matemática e Estudo do
Meio duma forma mais individualizada e compartimentada. Por outro lado, a metodologia de
ensino e de aprendizagem é também diferente nos dois níveis: no primeiro, privilegia-se a relação
entre pares e o trabalho de grupo; no segundo, valorizam-se estas relações mas privilegia-se,
particularmente, a relação professor/aluno. Por sua vez, ao transitarem para o 1.º CEB, as crianças
mudam comportamentos relacionais com o professor, com os pares e com as tarefas. São
observáveis, também, descontinuidades experimentadas ao nível das regras, das posturas, do
horário e da sequencialidade das atividades, entre outras.
Estas transições e mudanças não são, necessariamente, aspetos negativos. Pelo contrário, como
sabemos, desempenham importantes papéis no processo de maturação e crescimento do ser
humano. A este propósito Castro e Rangel (2004) referem que as transições e as mudanças se
constituem como oportunidades para o crescimento pessoal, tendo em conta as continuidades e
descontinuidades que as caracterizam. No entanto, alertam para a existência de rupturas e
contradições nas práticas que se verificam nas instituições educativas que são um forte obstáculo
ao desenvolvimento das crianças (Castro e Rangel, 2004:135).
Para que a passagem seja – como se pretende – harmoniosa, obriga a uma estruturação de um
percurso educativo. A articulação entre ciclos obedece a uma sequencialidade progressiva,
conferindo a cada ciclo a função de completar, aprofundar e alargar o ciclo anterior, numa
perspectiva de unidade global do ensino básico (Lei de Bases do Sistema Educativo, 1997, Artº 8).
A possibilidade de transição de docentes entre níveis de ensino está contemplada no Estatuto da
Carreira Docente (ECD), artigo 72º alínea 2), A transição fica condicionada à existência das
qualificações profissionais exigidas para o nível, ciclo de ensino ou grupo de recrutamento a que o
docente concorre (Dec.-Lei nº15/2007:514).
Tendo como direção a concretização das metas atrás enunciadas, as Orientações Curriculares para
a Educação Pré-Escolar determinam que o educador deve proporcionar condições para que cada
criança tenha uma aprendizagem com sucesso na fase seguinte competindo-lhe, em colaboração
com os pais e em articulação com os colegas do 1º ciclo, facilitar a transição da criança para a
escolaridade obrigatória (Departamento da Educação Básica, 1997:28). Por sua vez, o professor
do 1º CEB, deve promover a integração de todas as vertentes do currículo e a articulação das
aprendizagens do 1º ciclo com as da educação pré-escolar e as do 2º ciclo (Dec.-Lei
241/2001:574).
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
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Como temos vindo a debater, o processo educativo é cumulativo e sequencial, daí a necessidade
dos docentes prestarem especial atenção aos momentos de transição entre níveis de educação,
eliminando as descontinuidades existentes nas programações e nos métodos de ensino. Para uma
melhor operacionalização torna-se necessário, por parte dos docentes, a preocupação com a
atualização dos seus conhecimentos profissionais. Prevendo essa realidade, o próprio ECD
consagra no Capítulo II – Direitos e Deveres, o Direito à formação e informação para o exercício
da função educativa (Decreto-Lei nº 15/2007:526). Esta ideia é reforçada na mesma legislação, ao
inscrever nos deveres dos docentes a obrigação de actualizar e aperfeiçoar os seus conhecimentos,
capacidades e competências, numa perspectiva de desenvolvimento pessoal e profissional
(Idem:527).
Retomando de novo a ideia da preocupação na continuidade educativa insistimos em referir aspetos
legislativos que têm atenuado a descontinuidade entre os dois níveis de educação. Nomeamos,
nesse sentido, a publicação de enquadramento legal relativamente à Educação Pré-Escolar, Lei -
Quadro da Educação Pré-Escolar (1997), a publicação de Orientações Curriculares para a
Educação Pré-Escolar (OCEPE), e uma circular sobre a Gestão do Currículo na Educação Pré -
Escolar (2007), emitida pela Direção Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular (DGIDC).
Nestes documentos fica bem explícita a responsabilidade dos educadores e professores do 1.ºCEB a
quem compete ter uma atitude proactiva na procura desta continuidade/sequencialidade, não
deixando de afirmar a especificidade de cada etapa, porém criando condições para uma
articulação co-construída escutando os pais, os profissionais, as crianças e as suas perspectivas
(Gestão do Currículo na Educação Pré-Escolar, 2007:6). Adianta este documento que A
planificação conjunta da transição das crianças é condição determinante para o sucesso da sua
integração na escolaridade obrigatória (Ibidem). Aponta, ainda, como estratégias de articulação as
que passam não só pela valorização das aquisições feitas pela criança no jardim de infância, como
pela familiarização com as aprendizagens escolares formais (Op. Cit.:6). Como estratégias são,
também, referidos o Processo Individual da Criança (que a acompanhará na sua transição para o
1.ºCEB); reuniões envolvendo docentes, encarregados de educação e crianças, para troca de
informações sobre como se faz e aprende no Jardim de Infância e na Escola do 1º CEB;
planificação e desenvolvimento de projetos/atividades comuns a realizar ao longo do ano letivo que
impliquem a participação dos educadores, professores do 1º CEB e respetivos grupos de crianças;
organização de visitas guiadas à Escola do 1º CEB e ao Jardim de Infância de docentes e crianças
como meio de colaboração e conhecimento mútuo; troca de informação sobre o trabalho
desenvolvido no Jardim de Infância, de modo a que, o professor, ao construir o seu Projeto
Curricular de Grupo/Turma possa assegurar a continuidade e sequencialidade do percurso escolar
das crianças; troca de informações sobre a criança, o seu desenvolvimento e as aprendizagens
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
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realizadas; partilha de informações sobre o decorrer do 1º ano na escolaridade das crianças que
transitaram do Jardim de Infância para o 1º CEB, de modo a que ao acompanhar o seu percurso, o
educador possa continuar a articular com o professor tendo em vista o sucesso escolar da criança.
O documento em questão recomenda, ainda, que os educadores participem na elaboração do
Projeto Educativo (PE) do Agrupamento/Instituição e dos Projetos Curriculares de
Estabelecimento/Escola. Deverão, igualmente, conceber e gerir o Projeto Curricular de
Grupo/Turma, inserindo-se nas linhas de orientação definidas nos projetos anteriormente referidos,
de acordo com as orientações emanadas pelo Conselho Pedagógico e em articulação com o
Conselho de Docentes, no caso da rede pública, ou com a equipa de educadores, no caso da rede
privada.
Por fim, salienta que os Projetos Curriculares de Grupo/Turma devem articular-se entre si e com os
outros níveis de ensino, o que poderá dar aso a que se verifiquem situações pontuais de trabalho em
colaboração com outros docentes em áreas especializadas, como por exemplo a música ou as
ciências experimentais, cabendo ao educador em conjunto com o outro docente, planear,
desenvolver e avaliar as actividades, nunca perdendo a perspectiva globalizante da acção
educativa na Educação Pré-Escolar (Ibidem:7).
Na conclusão deste ponto, retemos como ideia chave o importante papel que a planificação
conjunta entre os docentes destes dois níveis de educação desempenham (principalmente no último
ano de frequência do Jardim de Infância) na articulação entre ciclos, na medida em que facilita a
adaptação emocional, social e intelectual das crianças a um novo nível de ensino. Salienta-se a
participação em projetos abrangentes (onde os intervenientes pertencem aos dois níveis de
educação e se incluem as famílias) e flexíveis que permitem ir adaptando os meios aos fins,
imprimindo sequencialidade no processo de ensino e de aprendizagem.
Quanto à nossa PES propriamente dita, assumimos que não tivemos muitas oportunidades de
praticar - com atividades concretas - a articulação entre ciclos na medida em que os anos que
lecionámos (2.º e 3.º), não constituíam nem um ano inicial, nem um ano terminal.
No entanto, ao longo de todo o ano letivo colaborámos com a professora titular de turma nas
atividades que envolviam outros níveis etários e também a Educação Pré-Escolar; e, de forma
geral, tentámos sempre apelar para conhecimentos que envolviam os pressupostos que abordámos
ao longo deste ponto.
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
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Para lá disso, por força das funções profissionais que desempenhamos, Educação Especial,
acompanhamos os alunos num processo longitudinal que pode ir, ininterruptamente, desde a
Educação Pré-Escolar, até ao 2.º/3.ºCiclo ou Secundário, o que nos permite de forma direta refletir
e intervir de modo alargado sobre este assunto. Acresce a isso o facto de no presente ano letivo
desempenharmos as funções de Coordenadora da Equipa de Articulação entre Ciclos, no
Agrupamento de Escolas onde desempenhamos funções profissionais.
2.2. Funcionamento da Prática de Ensino Supervisionada
A nossa experiência profissional cruzada com ideias-chave recolhidas a partir de diferentes leituras
guiaram a narração que se segue, filtrando ideias e sugerindo o modo da respetiva articulação nas
vertentes docente de educação especial vs aluna estagiária. Na prática, a nossa experiência
profissional enquanto Educadora de Infância durante os primeiros anos de exercício e docente de
educação especial há quase duas décadas, será percetível em dois sentidos diferentes: em alguns
momentos servirá para, com base nela, ajuizarmos e tecermos comentários, quer sobre as práticas
por nós adotadas, quer sobre o sistema instituído; noutros momentos servirão para realçar
concretamente o modo como entendemos e desenvolvemos a nossa atividade educativa.
Relevantes foram, também, os vários e profícuos cursos de formação que realizámos e que
inevitavelmente servem de filtro e referência a qualquer juízo de valor ou abordagem que façamos.
Posto isto, é chegada a hora de expor a forma como se desenrolou a prática de estudos
supervisionada.
Num primeiro momento, foi-nos atribuída a escola Augusto Gil para a realização da PES. Na
mesma, ainda desenvolvemos algumas sessões de observação e também, regências. Por
incompatibilidades profissionais, especificamente relacionadas com horário de trabalho, tornou-se,
absolutamente, necessário interromper o estágio e procurar outro estabelecimento de educação mais
compatível com o nosso estatuto de trabalhador estudante. É nesse contexto que surge a já
mencionada Escola da Póvoa do Mileu. O estágio, propriamente dito, viria a iniciar-se e
desenvolver-se já no segundo período letivo.
Após devida autorização da professora supervisora e da professora cooperante, os momentos de
intervenção educativa da aluna estagiária foram articulados de modo a causar o mínimo prejuízo
possível no desempenho das suas funções profissionais e otimizar ao máximo a sua presença como
aluna estagiária e docente de educação especial minimizando o mais possível o “incómodo” que,
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
© Fernanda Cardoso (2015) 36
por vezes, a presença de tantos adultos, em sala de aula, num espaço tão diminuto poderia trazer ao
contexto educativo. Para melhor conhecimento registamos a organização do estágio que assentou
em diferentes momentos e atores, como se pode constatar no quadro que a seguir se apresenta:
Quadro 3: Organização do estágio
Planificação
Momento 1:
Definição dos momentos e
estratégias de intervenção
pedagógica.
Auscultação da Professora Supervisora;
Auscultação da Professora Cooperante;
Informação e troca de pareceres com a Professora de Apoio
Educativo;
Troca de pareceres com o nosso par pedagógico a realizar estágio na
mesma EB;
Troca de informação com as técnicas que fazem acompanhamento
aos alunos com NEE: Psicóloga e Terapeuta da Fala.
Partilha de informação com a Assistente Operacional.
Momento 2:
Informação aos alunos. Breve apresentação da situação da aluna estagiária aos alunos.
Momento 3:
Observação Turma do 2.º/3.ºano.
Momento 4:
Planificação
De acordo com a sequência das regências da Professora Titular e os
conteúdos das diferentes áreas curriculares.
Momento 5:
Reflexão/auto-avaliação
Das atividades desenvolvidas pela aluna estagiária.
Momento 6:
Hétero avaliação
Pela Professora Supervisora
Pela Professora Cooperante
Fonte: Elaboração própria
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
© Fernanda Cardoso (2015) 37
Como podemos constatar, após a delineação de importantes pontos de partida, principiámos a nossa
prática partindo da observação, analisando e refletindo; cruzando a teoria e os conceitos educativos
como suporte teórico para a adequada perceção do que pretendíamos ver, compreender e analisar.
Apesar de a turma já nos ser muito familiar (porque aí acompanhávamos dois alunos com NEE),
reconhecemos que foi profícuo um olhar mais atento, que nos permitiu apurar dados a partir de
outro ângulo. Observávamos a professora titular e admirávamos a perícia com a qual fazia a gestão
de diferentes recursos na sala de aula (a nível dos dois anos de escolaridade e a nível do espaço
físico e recursos materiais…).
No desenvolvimento da PES cada contexto determinou os respetivos intervenientes, onde o
trabalho colaborativo e o diálogo crítico e reflexivo foram uma constante. Este aspeto foi tanto
mais importante pelo facto de, como já foi referido, o espaço físico da sala ser reduzido e nos
encontrar-mos, nela, em simultâneo, com relativa frequência, muitos dos agentes educativos
previstos no quadro anterior.
O processo reflexivo propriamente dito foi norteado pelas orientações das professoras que nos
acompanharam e por um conjunto de informações construídas a partir de todas as vivências pelas
quais já passámos, nas quais se incluem diversas leituras e reflexões intencionalmente realizadas a
partir da nossa atitude introspetiva. Como se depreende, o processo desenrolou-se de forma cíclica,
ou seja, cada planificação era prosseguida da respetiva reflexão/avaliação e colocadas em Dossiê
próprio.
2.3 Análise reflexiva à luz do nosso quotidiano
A condição de professor, queiramo-lo ou não, obriga-nos a permanente reflexão. Questionamos o
nosso desempenho, questionamos as aprendizagens dos alunos – as causas que conduzem ao
sucesso, ou os fatores que levaram ao fracasso.
Este processo, que implica um profundo desenvolvimento humano e pessoal, inicia-se com a
formação inicial e, deve prolongar-se sem quebra de continuidade, para que, enquanto profissionais
de educação, possamos ser uma verdadeira mais valia para as instituições em que desempenhamos
funções. Este aspeto é tanto mais importante porque na época atual os conhecimentos são o activo
principal das organizações e (…) estes rapidamente se desatualizam (Tavares, 2011:223).
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
© Fernanda Cardoso (2015) 38
E é em toda esta envolvência, no desabrochar de capacidades reflexivas e no repensar de atitudes,
contribuindo para uma prática de ensino mais eficaz, mais comprometida, mais pessoal e mais
autêntica que enquadramos a nossa atitude de profissional reflexivo9 que, como defende Alarcão
(2001), se emoldura na conceção de escola concebida por alguns como uma organização que
continuadamente se pensa a si própria, na sua missão social e na sua organização, e se confronta
com o desenrolar da sua atividade num processo heurístico simultaneamente avaliativo e formativo.
Estas vertentes, formação, avaliação e reflexão, precedidas da observação, constituíram os pilares
em que a nossa prática pedagógica, enquanto aluna estagiária e simultaneamente enquanto docente
de educação especial, se fundamentou. Ainda que o queiramos, sendo docentes, mesmo ocupando
outro papel, não conseguiremos alhear-nos das nossas funções profissionais e a reflexão é uma
constante nas nossas atitudes. É desta reflexão e necessidade de melhorar as nossas práticas que
surge, frequentemente, a necessidade de formação. Esta atitude, tem sido suportada, teoricamente,
por importantes nomes.
Donald Schõn (1930-1997), influenciado por John Dewey, é o principal autor da corrente que
perspetiva a prática profissional, enquanto reflexiva. Esta abordagem na formação profissional veio
a ter enorme repercussão na formação de professores; baseia-se no valor da reflexão na e sobre a
ação com vista à construção situada do conhecimento profissional que apelidou de epistemologia
da prática (Alarcão, 2003:35).
A natureza construtivista está na base da abordagem reflexiva e assenta na consciência da
imprevisibilidade dos contextos de ação profissional e no entendimento da atividade profissional
como atuação inteligente e flexível, situada e reativa. Perante a imprevisibilidade que carateriza
grande parte do quotidiano profissional a competência para agir implica ciência, técnica e arte, que
se evidencia num know-how inteligente e socialmente relevante.
O processo formativo inerente a este cenário combina ação, experimentação e reflexão sobre a
ação. Segundo Zeichner (1993), Dewey define três atitudes imprescindíveis à ação reflexiva:
Abertura de espírito - Desejo de receber diversas informações provenientes de várias
fontes, admitindo possíveis erros, mesmo naquilo que acredita como certo, procurando
alternativas;
9 O conceito de profissional reflexivo foi introduzido por Schõn (1983) e expandido para o campo da docência através da caraterização do conceito de professor reflexivo.
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
© Fernanda Cardoso (2015) 39
Responsabilidade - Implica a ponderação das consequências que podem advir de
determinada ação. Esta atitude responsável impõe que o professor reflita nas consequências
pessoais, académicas, sociais e políticas dos efeitos da sua ação sobre os alunos;
Empenhamento - O professor assume a responsabilidade pela sua aprendizagem,
predispondo-se a enfrentar as atividades com capacidade de renovação e energia.
Com a figura que a seguir apresentamos, pretendemos agrupar informação que nos evidencie as
implicações que o modelo reflexivo traz ao nível das atitudes dos professores. Deste modo, os
pressupostos explícitos neste modelo implicam que o professor:
Figura 3: Implicações do modelo reflexivo ao nível das atitudes dos professores
Fonte: Elaboração própria
Por sua vez, como apontam Zeichner (1993), Sá-Chaves (2000) e Alarcão (2003), a prática
refletida precisa de ser acompanhada por supervisores experientes que detenham as competências
para orientar, estimular, exigir e avaliar, sendo ao mesmo tempo treinadores, companheiros e
conselheiros. Se nos é permitido, gostaríamos de abrir um parenteses para dizer que, neste domínio,
nos congratulamos pelo facto de as nossas professoras, supervisora, orientadora e professora
cooperante se enquadrarem, largamente, nestes pressupostos.
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
© Fernanda Cardoso (2015) 40
Na formação de professores reflexivos (professores que examinam, questionam e avaliam a sua
prática de forma crítica), algumas estratégias emergem como mais adequadas. Schõn (Cit. in
Alarcão, 2003), identifica três: a experimentação em conjunto; a demonstração acompanhada de
reflexão e a experiência multifacetada.
Alarcão (Ibidem), apresenta-nos também no âmbito da reflexão sobre a prática profissional
proposta por Schõn as seguintes noções:
Conhecimento na ação: Conhecimento que os professores manifestam no
momento da execução da ação. Este conhecimento é dinâmico e consiste na reformulação
da própria ação.
Reflexão na ação: O professor reflete no decorrer da própria ação, reformulando
as situações novas e imprevistas que surgem.
Reflexão sobre a ação: O professor reconstrói, mentalmente, a ação e analisa-a
retrospetivamente, tomando consciência do que aconteceu.
Reflexão sobre a reflexão na ação: Consiste numa meta-reflexão que permite ao
professor novas formas de pensar e de agir.
As estratégias formativas que Schõn preconiza incluem a verbalização do pensamento como
expressão da reflexão na ação, diálogo com a situação e envolvimento do estagiário nesse diálogo,
esclarecimentos sobre as várias contribuições que os diferentes domínios do saber podem trazer
para a compreensão e solução da problemática em questão; crítica, reformulação e apropriação de
todo um conjunto de saberes inerentes ao desempenho da profissão que o estagiário deverá
dominar.
Na prática orientada, o professor supervisor deve apoiar o confronto com problemas reais que
necessitam de tratamento, proporcionando o levantamento de hipóteses, experimentação e
verificação. Na sequência de uma pesquisa mais pormenorizada sobre o que acabamos de expor,
foi-nos possível construir o quadro de estratégias - que emergem como adequadas ao modelo
reflexivo – que a seguir apresentamos:
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
© Fernanda Cardoso (2015) 41
Quadro 4: Estratégias de reflexão
- As perguntas pedagógicas
(a reflexão introduz no
discurso do professor uma
preocupação com as
questões éticas, pessoais, e
políticas podendo suscitar
problemas no ensino),
(Smith, 1989).
Estas perguntas podem
incidir em diferentes tópicos:
Na relação professor
-aluno (questões
práticas vividas em
sala de aula);
Conteúdos (centra-se
na seleção de
recursos a utilizar,
sequência curricular,
seleção de textos e
forma de suscitar
interesse por parte
dos alunos;
Relação entre o
ensino e os
processos de
escolarização (foca
questões mais
abrangentes e que se
inserem no âmbito
da sociedade).
- Descrição: O que faço? O que penso?
- Interpretação: O que significa a minha ação?
- Confronto: Como me tornei assim?
- Reconstrução: Como me poderei modificar?
- As narrativas: Traduz-se
no relato de acontecimentos,
feito pelo professor sobre a
Segundo Holly (1991) existem três tipos de narrativa:
- Diário de bordo (é um diário objetivo);
-Diário intimo (é um relato subjetivo);
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
© Fernanda Cardoso (2015) 42
sua prática pedagógica. -Registo quotidiano (integra características dos dois tipos
anteriores, contudo mais abrangente pois permite tomar
consciência do que foi mais objetivo e subjetivo).
- A análise de casos.
- Os casos são registos de acontecimentos reais e
problemáticos da sala de aula.
- Promovem a reflexão sobre a ação, incutindo nos professores
o hábito de pararem para refletir sobre um acontecimento,
retirando ilações da sua atuação.
- Possibilita a partilha de diferentes pontos de vista sobre uma
mesma situação, na qual se incluem os conhecimentos
pedagógicos.
- A observação de aulas.
Segundo Allwright (1998), Richards (1990) e Day (1990)10, os
objetivos da observação de aulas são os seguintes:
- Promover nos formandos a capacidade de compreender os
princípios e processos institucionais subjacentes à sua prática
educativa;
- Aquisição de conhecimentos científico-pedagógicos;
- Recolher feedback sobre comportamentos de modo a intervir
na inovação do seu desempenho;
- Refletir de forma crítica sobre a sua prática;
- Passar a responsabilidade de melhorar a qualidade das
práticas do ensino do supervisor para o formando;
- Promover uma atitude investigativa.
Estrela (1994) subdivide a observação de aulas em:
- Observação naturalista (o observador regista tudo o que
ocorre dentro da sala de aula, feito durante determinado
período de tempo);
- Observação ocasional (centra-se num “incidente crítico”).
- Observação sistemática (cada comportamento individual
constitui objeto de registo).
- O trabalho de Projeto
(consiste numa metodologia
De acordo com Leite et al. (1989) tem as seguintes finalidades:
- Produzir conhecimento;
10 Allwright (1998), Richards (1990) e Day (1990), in Tavares (2012), materiais policopiados durante a lecionação da Unidade Curricular de Supervisão I. ISCE/Odivelas.
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
© Fernanda Cardoso (2015) 43
que se centra no estudo de
problemas de interesse
coletivo, implicando o
envolvimento de todos os
participantes e promovendo
momentos de reflexão sobre
a ação).
-Sensibilizar para uma metodologia de resolução de problemas;
- Estabelecer relações entre teoria e prática;
- Desenvolver capacidades de investigação nos formandos;
- Implicar uma conceção ativa de aprendizagem;
- Saber observar e questionar;
- Compreender a realidade como um campo de saberes
interdisciplinar;
- Experimentar métodos e técnicas diversas;
-Desenvolver capacidades de trabalho em equipa.
- A investigação – ação
(nesta metodologia verifica-
se uma permanente
dinâmica entre teoria e a
prática, na medida em que o
professor interfere no
próprio campo de pesquisa,
analisando as consequências
da sua ação).
Tendo como suporte Nunan (1989) e Correia e Canário (s/d),
as vantagens da investigação realizada pelo professor são as
seguintes:
- Centra-se nos problemas do professor e orienta a ação para a
sua resolução;
-Desenvolve-se a partir do conhecimento acumulado pelo
professor, alargando esse conhecimento;
- Desenvolve as capacidades de observação e análise critica;
- Aproxima teoria e prática, permitindo uma melhor
interpretação do que ocorre em sala de aula;
- Ajuda o professor a articular processos de ensino-
aprendizagem;
- Facilita a participação do professor na sua própria formação;
- Desenvolve a função crítica da formação.
Fonte: Elaboração própria
A partir da reflexão sobre as suas práticas, os profissionais desenvolvem aquilo que Shõn
(1983,1987), (Cit. por Alarcão, 2003) denominou de epistemologia da prática. Considerando os
professores como co-construtores da escola, é de crer que a sua participação ativa e crítica na vida
escolar conduzirá a uma epistemologia desenvolvida a partir da co-construção reflexiva sobre a sua
missão, as suas atividades e as consequências delas decorrentes.
Foi ancorados em tudo o que acabámos de expor que desenvolvemos a nossa intervenção educativa
como aluna estagiária.
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
© Fernanda Cardoso (2015) 44
2.4 Outros pressupostos importantes na nossa prática educativa
Como bem refere Dottrens (1974b), Um aluno é um ser complexo; o produto daquilo que é como
criança e do que chega a ser como aluno é uma criação fictícia e temporal da organização escolar
(Dottrens, 1974b:28).
Porque nem sempre será fácil demonstrar em plenitude, através das planificações ou reflexões, ou
mesmo através da observação direta os referenciais teóricos que influenciam as nossas práticas,
consideramos que será importante debruçarmo-nos mais especificamente - ainda que de forma
resumida - um pouco mais sobre os mesmos.
Com o objetivo de mostrar de que modo absorvemos as teorias que revisitámos e até que ponto as
leituras realizadas nos influenciaram, e, ainda, de que forma articulámos a teoria com a prática,
apresentamos alguns dos importantes pressupostos em que focalizámos a nossa Prática de Ensino
Supervisionada e a nossa atitude reflexiva.
Apesar de termos consciência da importância de que se revestem as estratégias de ensino e de
aprendizagem quando focadas em termos de estímulos, respostas e reforços positivos (sobretudo
quando direcionados para crianças de tenra idade), reconhecemos que, atualmente, no contexto
educativo as palavras de ordem são: aprendizagem significativa, mudança conceitual, ensino
centrado no aluno e construtivismo. Ou seja, acreditamos totalmente na premissa de que o
conhecimento humano é construído e a aprendizagem significativa é a pedra angular dessa
construção. Nesse sentido, um bom ensino deve ser construtivista, estar centrado no estudante,
promover a mudança conceitual e facilitar a aprendizagem significativa (Moreira, 2006). Moreira
(Ibidem), remete-nos deste modo para a Teoria de Aprendizagem Significativa de David Ausubel
(Ibidem:2006). Não sendo nova, esta teoria, é de extrema atualidade e é comumente aceite como
uma importante e válida explicação teórica do processo de aprendizagem.
O objetivo maior do ensino é que todas as ideias sejam aprendidas de forma significativa, isso
porque é somente desta maneira que as novas ideias serão “armazenadas” por bastante tempo e de
maneira estável. Além disso, a aprendizagem significativa permite ao aprendiz o uso dos novos
conceitos de forma inédita, independentemente do contexto em que os conteúdos foram
primeiramente aprendidos. Cabe, aqui, lembrar que pode conseguir-se aprendizagem significativa
tanto por meio da descoberta como da repetição. Aprendemos a partir do que já sabemos. Os
conceitos que já adquirimos, os esquemas de assimilação que já construímos, os nossos constructos
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
© Fernanda Cardoso (2015) 45
pessoais, enfim, a nossa estrutura cognitiva prévia é o fator isolado que mais influencia a
aprendizagem significativa de novos conhecimentos.
Na aprendizagem significativa o novo conhecimento nunca é interiorizado de maneira literal,
porque no momento em que passa a ter significado para o aluno entra em cena a componente
idiossincrática da significação. É no curso da aprendizagem significativa que o significado lógico
do material de aprendizagem se transforma em significado psicológico para o sujeito. Aprender
significativamente implica atribuir significados e estes têm sempre componentes pessoais;
aprendizagem sem atribuição de significados pessoais, sem relação com o conhecimento
preexistente, é mecânica, e não é, portanto, sob o ponto de vista desta teoria, significativa.
A teoria de Ausubel oferece, assim, diretrizes, princípios e estratégias que são fortemente
facilitadores da aprendizagem significativa. Moreira e Buchweitz (1993) propõe-nos sob a forma
de esquema, que a seguir se apresenta, alguns conceitos básicos desta teoria:
Figura 4: Alguns conceitos básicos da teoria de Ausubel
Fonte: Adaptado de Moreira e Buchweitz (1993)
Seguindo Ausubel (Cit. por Moreira e Masini, 2006), aprendizagem significativa é o processo
através do qual um novo conhecimento se relaciona de maneira não arbitrária e substantiva à
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
© Fernanda Cardoso (2015) 46
estrutura cognitiva do aprendiz; é o mecanismo humano, por excelência, para adquirir e armazenar
uma vasta quantidade de ideias e informações representadas em qualquer campo de conhecimento.
Nesta linha, a não arbitrariedade e a substantividade são as características básicas da
aprendizagem significativa. É importante reiterar que a aprendizagem significativa se caracteriza
pela interação entre conhecimentos prévios e conhecimentos novos, e que essa interação, como
temos vindo a sublinhar, é não arbitrária e não literal. Nesse processo, os novos conhecimentos
adquirem significado para o sujeito e os conhecimentos prévios adquirem novos significados ou
maior estabilidade cognitiva.
Neste contexto, a não arbitrariedade significa que o material potencialmente significativo se
relaciona de maneira não arbitrária com o conhecimento já existente na estrutura cognitiva do
aluno, e a substantividade significa que o que é incorporado à estrutura cognitiva é a substância do
novo conhecimento, das novas ideias; o mesmo conceito ou a mesma proposição podem ser
expressos de diferentes maneiras, através de distintos signos ou grupos de signos, equivalentes em
termos de significados (caráter não literal). Compreende-se assim, que a aprendizagem significativa
pressuponha que no processo de ensino e de aprendizagem, o conhecimento prévio do educando
interage, de forma significativa, com o novo conhecimento que lhe é apresentado provocando
mudanças na sua estrutura cognitiva. No entanto, existem condições prévias para que a
aprendizagem significativa aconteça: o material tem de ser potencialmente significativo e o aluno
tem de estar recetivo a novas aprendizagens, deve apresentar uma predisposição para aprender,
com ideias, conceitos e proposições, especificamente relevantes e adequadamente claros e
disponíveis na sua estrutura cognitiva que funcionem como pontos de “ancoragem” aos primeiros;
ou seja, terá de ter um conjunto de conhecimentos que sirvam de âncora à aprendizagem do novo
conteúdo.
Nesse sentido, como se pode apurar, a organização cognitiva do educando é relevante para a
aprendizagem de conceitos que formam um conjunto de novas relações que interagem com uma
estrutura de conhecimento específico a que Ausubel (Cit. por Moreira e Masini, 2006) denomina de
“subsunçor”; quer isto dizer que o material potencialmente significativo se relaciona de maneira
não arbitrária com o conhecimento já existente na estrutura cognitiva do aluno (princípio da não
arbitrariedade). Tal significa que, o relacionamento não é com qualquer aspeto da estrutura
cognitiva, mas sim com conhecimentos especificamente relevantes. Ainda segundo a mesma fonte
(Op. cit.; 2006), “subsunçor” é uma estrutura específica na qual uma nova informação se pode
agregar ao cérebro humano, que é altamente organizado e detentor de uma hierarquia conceitual,
que armazena experiências prévias do sujeito.
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Na perspetiva de que a aprendizagem é uma organização e uma integração do conhecimento na
estrutura cognitiva por meio de uma estrutura hierárquica de conceitos, Moreira (2006), citando
Ausubel, sugere o uso de organizadores como importante estratégia pedagógica para manipular a
estrutura cognitiva; ajudando o aluno a estabelecer uma ligação entre o que já sabe e aquilo que
precisa de saber caso necessite de adquirir nova informação de forma ativa ou, ainda, quando for
constatado que os subsunçores existentes na sua estrutura cognitiva não são satisfatórios e estáveis
para desempenhar as funções de ancoragem do novo conhecimento.
Estes organizadores são designados de organizadores prévios ou avançados. Assim, organizadores
prévios são materiais introdutórios, destinados a facilitar a aprendizagem de tópicos específicos ou
conjunto de ideias consistentemente relacionadas entre si. São apresentados no início das atividades
mas, precisam de ser formulados em termos familiares ao estudante, devendo, também, permitir ao
aluno o aproveitamento das características de um subsunçor, caso ele já exista.
A função do organizador prévio é, assim, potencializar a criação de relações não arbitrárias e
substantivas entre os novos conceitos e as ideias que lhes servirão de apoio na estrutura cognitiva
do aluno, através da “inserção” ou da explicitação destas ideias. Dizem-nos as fontes que temos
vindo a citar (Moreira, 2006; Moreira e Masini, 2006) que estes mecanismos (organizadores)
funcionam, utilizando o método expositivo ou comparativo, consoante as opções que o professor
fizer na sua prática profissional. Como importantes ferramentas facilitadoras de uma aprendizagem
significativa apontam-se, ainda, a condução de aulas e os mapas concetuais. Estes últimos, têm-se
revelado muito úteis, em contexto de sala de aula, no estabelecimento de ideias e conceitos.
Segundo Moreira e Masini (Ibidem), os organizadores prévios podem apresentar-se, entre outros,
sob a forma de textos, filmes, esquemas, desenhos, fotos, perguntas ou mapas conceituais, que são
apresentados ao estudante, em primeiro lugar, em nível de maior abrangência, permitindo a
integração dos novos conceitos aprendidos, tornando mais fácil o relacionamento da nova
informação com a estrutura cognitiva já existente.
À medida que o conhecimento prévio serve de base para a atribuição de significados à nova
informação, ele também se modifica, ou seja, os subsunçores vão adquirindo novos significados,
tornando-se mais diferenciados, mais estáveis. Assim, os resultados das experiências de
aprendizagem de uma pessoa vão sendo organizados em blocos hierarquizados de conhecimentos.
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
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Tendo como base estes e outros importantes pressupostos na prática pedagógica, tentámos que a
nossa PES se norteasse o mais possível pelos princípios que temos vindo a expor e que
continuamos a explanar, remetendo, agora mais especificamente para a vivência de algumas
situações concretas, respeitantes às diferentes áreas, Português, Matemática e Estudo do Meio e
também Expressões, vividas aquando da nossa intervenção pedagógica como aluna estagiária.
Seguindo as decisões da professora titular de turma demos aos alunos a possibilidade de participar
em projetos já calendarizados, promovidos em articulação com outras entidades e realizados fora
do ambiente normal das aulas, conduzindo-os na aquisição de saberes e competências várias,
estimulados por espaços e tempos de saberes múltiplos e que lhe são externos, contribuindo de
forma decisiva para um maior compromisso na sua caminhada no processo de ensino e de
aprendizagem. Deste modo, os discentes foram convidados a participar em atividades que,
estimulando o seu lado mais criativo, os solicitavam ao confronto com os saberes veiculados em
sala de aula, alargando assim as competências que lhe são veiculadas pelo professor. Pretendíamos,
desta forma, que os alunos tivessem possibilidade de operar a transferência das aprendizagens
adquiridas.
De acordo com as proposições de Ausubel (Cit. por Pelizzari: 2001), quanto mais se relaciona o
novo conteúdo com alguma estrutura cognitiva prévia relevante para o aluno, mais próximo se está
da aprendizagem significativa; a aprendizagem é mais significativa à medida que os novos
conteúdos se incorporam às estruturas do conhecimento do aluno e adquirem significado para ele
a partir da relação com o seu conhecimento anterior (Ibidem, 2001:39). Sabemos que sempre que
existe aprendizagem significativa ocorre um processo de transferência. As aprendizagens
significativas são sempre passíveis de transferir para outras situações de aprendizagem, o
conhecimento que se adquire de maneira significativa é retido e lembrado por muito mais tempo
(Op. Cit.:39), mesmo havendo alterações do meio ambiente ou do contexto. Seguindo a mesma
fonte (Ibidem:2001), Diz-se que ocorre transferência, ou transfert sempre que aquilo que
aprendemos anteriormente influencia uma aprendizagem posterior. Essa influência pode
manifestar-se de forma positiva ou negativa, considerando-se que ocorre transferência positiva
quando uma aprendizagem anterior ajuda a resolver um problema atual; em contrapartida verifica-
se transferência negativa quando uma aprendizagem anterior prejudica uma nova aprendizagem,
designando-se o facto, nesta situação específica, como interferência proactiva. Quando pelo
contrário, uma nova aprendizagem dificulta uma aprendizagem anterior, denomina-se interferência
retroativa.
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
© Fernanda Cardoso (2015) 49
Nas aprendizagens significativas impõe-se a participação ativa do aluno. Pretende-se que estas
participações na aquisição de conhecimentos não sejam apenas uma repetição formulada pelo
professor, mas antes um processo interno em que cada aluno constrói o conhecimento de uma
maneira específica e individual.
Durante o nosso tempo de intervenção tivemos, também, a preocupação de que a aquisição de
conhecimentos fosse realizada partindo de conceitos chave, menos complexos que gradualmente
iriam aumentando o grau de complexidade pois sabemos que as relações entre conceitos têm uma
natureza hierárquica, vão do mais simples para o mais complicado, a partir dessa especificação, a
aprendizagem escolar passa a caracterizar-se globalmente como a assimilação a essa rede de
determinados corpos de conhecimentos conceituais, seleccionados socialmente como relevantes e
organizados nas áreas de conhecimento (Pelizzari, 2001-2002:38).
De igual modo, como válida estratégia no processo de ensino e de aprendizagem, entendemos que
o professor deve ter sensibilidade na lecionação dos conteúdos a lecionar. Esta sensibilidade deve
fazer-se sentir, em nossa opinião, particularmente, nos conteúdos/áreas onde os alunos revelem
mais dificuldades. Sendo a matemática, regra geral, uma dessas áreas, o seu ensino deve (como
acontece com outras áreas), ter conexões com a realidade dos alunos, com as suas experiências
anteriores e com os seus centros de interesse. Para uma melhor apreensão das matérias, nas
situações de aprendizagem a concretização deve ser feita através de materiais manipuláveis
(estruturados e não estruturados) que facilitem a compreensão de conceitos e das ideias
matemáticas (DEB, 2004:14). Ainda assim, diz-nos Palhares (2004) para uma boa interiorização
dos conteúdos não basta apenas compreendê-los; é também necessário que os alunos realizem
exercícios que os envolvam pois a realização de exercícios é relevante, uma vez que permitem aos
alunos uma repetição e mecanização dos conceitos que têm de aprender (Palhares, 2004:70). De
igual modo, É, também, necessário proporcionar aos alunos situações diversas que lhes permitam
desenvolver o cálculo mental, para isso, devem ser trabalhadas diferentes estratégias de cálculo
baseadas na composição de números, nas propriedades das operações e nas relações entre
números e entre operações (DEB, 2004:14).
No desenvolvimento das nossas práticas, também tivemos presente o modelo de trabalho que
envolve o Trabalho de Projeto11, enquanto método centrado na planificação e pesquisa do aluno,
onde o professor assume o papel de guia e orientador. Tomamos como exemplo a realização, pela
11 Projeto, segundo definição da UNESCO (Glossaire des termes de technologie educative), é uma atividade prática significante, de valor educativo, visando um ou vários objetivos. Implica pesquisas, a resolução de problemas e, muitas vezes, uma produção. Costuma fundamentar-se nas teorias construtivistas de Piaget e Vigotsky e nas teorias e práticas pedagógicas de Dewey, Kilpatrick e Freinet.
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© Fernanda Cardoso (2015) 50
turma, de uma maquete (no âmbito do tema «Itinerários») obedecendo a um mapa. Nesta atividade,
os alunos tiveram oportunidade de, num primeiro momento planificar indagando sobre o que
precisavam de saber e como iriam sabê-lo; depois, num segundo momento, trabalhar em pequenos
grupos para responder às questões por eles levantadas e por fim, num terceiro momento, fazerem a
apresentação do trabalho realizado, sistematização dos conhecimentos, relacionando e organizando
a informação recolhida pelos diversos grupos e também a avaliação do trabalho desenvolvido.
Estes passos enquadram-se nos três níveis de desenvolvimento do método de Trabalho Projeto
(Pires, 2009).
Sempre com o objetivo de tornar a nossa intervenção pedagógica, válida, significativa e apelativa
recorremos a técnicas de ensino diversificadas que pretendiam desenvolver as competências
previstas nas diferentes áreas curriculares e não curriculares, tendo em conta a interdisciplinaridade
e transversalidade. Nesse sentido, não nos poupámos esforços na utilização, elaboração e
preparação de materiais pedagógicos pois deve considerar-se a importância da motivação, como
elemento básico que proporciona a compreensão da aprendizagem individual e coletiva
(Borrás,2001:190).
Cientes - por um lado - do impacto que os audiovisuais têm junto dos discentes porque Os
multimédias, as suas possibilidades educativas podem aproximar os alunos da aprendizagem de
conteúdos concretos, contribuindo para o seu desenvolvimento, fomentando aspectos como a
expressão e a comunicação (Op. Cit.:138); e também porque A linguagem audiovisual aproxima-
nos de novas formas de ver e compreender o mundo e conduz-nos a uma nova maneira de
trabalhar com a informação (Ibidem:150) e - pelo outro - das dificuldades que, por vezes,
implicam no momento de serem utilizados (no nosso caso específico obrigavam à sua requisição
prévia na escola sede e traziam algum incómodo no momento de os utilizar e por essa razão se
tornavam menos utilizados em sala de aula), não hesitámos e socorremo-nos, em diferentes
momentos, das novas tecnologias da comunicação e da informação para imprimir na aula uma nova
dinâmica. A partir da projeção de filmes e de imagens, com ou sem texto, os alunos foram
convidados a ler, comentar, contar ou recontar diferente informação. Este processo foi ao encontro
da ideia de que a criança deve ser estimulada à expressão oral mediante conversas, relatos,
narrativas, etc., pois só assim usará largamente a língua em diversas situações, descobrindo o
prazer de falar com os outros, de ser ouvida e atendida, de se relacionar, de conviver (Rebelo e
Atalaia, 1978:33). Na verdade, aos professores é claramente atribuída a função de não restringir a
aprendizagem da língua aos momentos da aula de Português, mas sim aproveitar as outras áreas
para, numa perspetiva transversal, trabalhar a língua portuguesa (Valadares, 2003).
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
© Fernanda Cardoso (2015) 51
Ainda na prossecução do desenvolvimento da linguagem oral, revendo o Currículo Nacional do
Ensino Básico encontramos a iniciar as metas do currículo de Língua Portuguesa, as competências
das quais destacamos, Compreender e produzir discursos orais formais e públicos, seguida de
Interagir verbalmente de uma forma apropriada em situações formais e educacionais (DEB,
s/d:31).
Assim, a construção do discurso da criança poderá fornecer importantes elementos relevantes
quanto ao estádio de desenvolvimento em que se encontra na medida em que quando narra,
informa, esclarece, pergunta, responde, convence, o aluno inicia-se nas regras de comunicação oral,
enquanto descobre o prazer de comunicar com os outros (DEB, 2004:139). Desta forma a oralidade
permite ao aluno integrar, mas também integrar-se na comunidade que o rodeia.
Aquando de diferentes iniciativas realizadas na sala de aula, por entidades exteriores, ou de visitas
programadas a espaços existentes no meio envolvente, demos aos alunos a possibilidade de usarem
um discurso formal obedecendo a temáticas e contextos específicos. Estas competências têm como
modos de operacionalização, assumir o papel de ouvinte atento, de interlocutor e locutor
cooperativo em situações de comunicação que exijam algum grau de formalidade (Currículo
Nacional do Ensino Básico - Competências Essenciais).
Também em sala de aula, à segunda feira, desenvolvemos a rotina de relatar o fim de semana,
convidando os alunos a narrarem acontecimentos vivenciados o que nos permitiu apurar muitos
dados relativos às suas vivências familiares, sociais, culturais e inclusive emocionais. Através da
voz nós transmitimos a maior parte das nossas emoções (Andrea, 2009). Todos sabemos como é
frequente alguém que está calado, aparentemente sem nada de maior para transmitir, emocionar-se
no momento de tomar a palavra e deixar transparecer estados emocionais verdadeiramente
preocupantes. Nós vivenciámos com os nossos alunos algumas dessas situações que nos ajudaram a
perceber a existência de graves conflitos familiares e emocionais. Estes, influenciavam,
seguramente, a capacidade de aprendizagem dos alunos. Dentro do que nos foi possível, ajudámos
a regularizar as emoções e solicitámos o apoio de técnicos especializados nesse âmbito. No entanto,
nem sempre a intervenção dos técnicos é um processo fácil na medida em que obedece a uma série
de burocracias administrativas e financeiras por vezes inultrapassáveis.
Também não nos foi alheio o facto de termos na turma duas alunas de nacionalidade estrangeira;
sabemos que estes alunos podem sentir dificuldades acrescidas na compreensão e produção de
textos que respeitem as regras de concordância. De igual modo, sabemos que é objetivo da escola
corrigir assimetrias imputáveis a diferentes condições socioculturais de origem, por outro lado o
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
© Fernanda Cardoso (2015) 52
sistema educativo tem de ser capaz de lidar com a heterogeneidade social, cultural e linguística
que caracteriza a comunidade escolar da nossa sociedade (Sim-Sim, 1997:33).
Contudo, cumpre-nos dizer que não foi necessário adequarmos de forma sistemática a oralidade no
discurso na medida em que as crianças em questão estavam muito bem integradas na turma e
dominavam, com mestria, a língua portuguesa. Todavia, foi importante e necessário ter presente
diferentes noções relativas à multiculturalidade e à pluralidade de valores, particularmente quando
se aproximavam datas festivas ou abordagem de conteúdos específicos que poderiam interferir com
alunos cujos credos e práticas religiosas poderiam ser diferentes daquelas que a cultura portuguesa
tradicionalmente cultiva.
Ainda na sequência do desenvolvimento da oralidade na sala de aula, destacamos uma estratégia da
qual nos servimos frequentemente: a voz. A oralidade na sala de aula prende-se com a utilização da
voz e com a capacidade de falar, de nos fazermos ouvir. Esse aspeto aplica-se tanto a alunos como
a professores. Às crianças notamos-lhe na voz (acompanhada de outros sinais) a alegria e o
entusiasmo ou o desinteresse e a apatia. Esses dados permitem-nos, por isso, alterar estratégias e/ou
motivações; ou podemos, simplesmente, mudar o ritmo da aula sem que a criança perceba a razão
das alterações. Por outro lado, a voz do professor, quando se dirige às crianças, transmite o seu
empenho, dedicação e gosto pela atividade que realiza, ou o seu contrário. Como nos alerta
Dottrens (1974b), reportando-se à atitude do educador que deve revelar doçura e firmeza
inseparáveis uma da outra se se quer que reinem ao mesmo tempo na aula a confiança, a ordem e
o respeito pelas indicações dadas pelo professor (Dottrens, 1974b:58). Como sabemos, os alunos
“leem” as nossas expressões e comportam-se em conformidade com elas, daí a importância de
adotarmos uma atitude empenhada e meiga mas também apelativa à disciplina pois A disciplina
escolar deve considerar-se, (…) como um aspecto particular da ação educativa (Op. Cit.:61).
O facto de termos consciência desses aspetos motivou-nos a que, em todos os momentos da nossa
PES, sobretudo em contexto de sala de aula, usássemos a voz e o discurso oral como um
importante instrumento pedagógico. Contudo, sabemos que a aprendizagem formal se socorre,
obrigatoriamente, de registos escritos e que a escrita contribui, decisivamente, para o processo de
apreensão de conhecimento. Como preconiza Sim-Sim (2007) Tal como é importante que antes de
iniciar a leitura de um texto o aluno se centre nos objetivos da leitura que vai relizar e
antecipadamente se prepare para a escolha das estratégias mais apropriadas, após terminar a
leitura é fundamental que automonitorize o que compreendeu sobre o texto lido (Sim-Sim,
2007:21). Como tal, em muitos e variados momentos, solicitámos, como complemento da
aprendizagem, a redação de documentos escritos, adequando o grau de exigência ao ano de
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
© Fernanda Cardoso (2015) 53
escolaridade dos alunos. Nestes, incluímos a construção de composições escritas e a redação de
cartas a familiares e amigos, e recados, entre outros.
Desenvolvemos por parte dos alunos a capacidade de comunicação escrita. Diversificámos as
propostas de atividades apresentando-as de modo a permitir a redação de diferentes textos em
extensão, tema e natureza do suporte escrito. Quando necessário, apelámos, também à capacidade
de síntese, sabendo que para que o aluno conseguisse criar textos pequenos com sentido necessita
ter adquirido mestria linguística. Cumprimos deste modo, uma das competências estabelecidas no
domínio da expressão escrita O aluno poderá ainda desenvolver a compreensão textual, como se
referiu anteriormente, através de: competências de resumo, identificação de partes estruturais que
organizam o texto (Salema, 1997:29). Com a frequência e o sentido de oportunidade que a situação
pedagógica permitiu, realizámos, com os alunos, exercícios de avaliação das atividades
desenvolvidas e ainda exercícios de auto e hétero avaliação.
Paralelamente, nas nossas práticas tivemos em conta a importância da metacognição no processo de
aprendizagem dos alunos; não esquecendo que a metacognição foi considerada como infundida e
envolvente de todas as situações de ensino e de aprendizagem; o que significa que o
desenvolvimento da metacognição, embora possa também ser conseguido diretamente, é antes
suscitado, inspirado, estimulado, tanto através dos procedimentos metodológicos como da própria
pessoa do professor (Op. Cit.).
Nas nossas intervenções tivemos, também, em conta a noção de que cada aluno tem especificidades
e ritmos de aprendizagem diferentes. Na verdade, como também já referimos, lecionámos dois anos
de escolaridade, sendo que cada um integrava alunos que apresentavam um significativo desnível
de conhecimentos face ao ano de escolaridade que frequentavam. Por essa razão, subdividiam-se
em “subgrupos” quanto ao nível de desempenho e capacidade de aprendizagem. Este aspeto foi
tanto mais importante porque, como já tínhamos referido, tínhamos na sala de aula três alunos com
NEE, portadores de deficiência Mental (DM) dos quais um estava escolarizado com um Currículo
Específico Individual (CEI). Deste modo, legalmente, faziam parte da turma apenas dois anos de
escolaridade, mas na verdade, na prática, coexistiam na sala uma grande heterogeneidade ao nível
dos conhecimentos de que cada aluno é detentor. Sabemos que esta realidade não é exclusiva desta
escola, no entanto, também somos de opinião que há contextos institucionais que, em sequência de
um conjunto de fatores específicos, dificultam o processo de aprendizagem dos alunos (voltamos a
lembrar o importante papel que o meio envolvente desempenha no sucesso escolar).Todos estes
aspetos impeliam a que refletíssemos nesta realidade educativa.
Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada
© Fernanda Cardoso (2015) 54
A transferência de papeis de docente de educação especial que presta apoio pedagógico
personalizado para “professora” que rege dois anos de escolaridade, num total de dezanove
discentes, nos quais estão incluídos alunos que necessitam de apoio educativo ao abrigo de
legislação específica e alunos com NEE, também escolarizados ao abrigo da respetiva legislação
permitiu-nos sentir, intensamente, as dificuldades que aquele papel impõe. Na verdade, é nossa
obrigação dizê-lo, já em diferentes momentos havíamos refletido sobre essa realidade, sobre as
verdadeiras dificuldades que a inclusão de alunos portadores de deficiência colocam aquando da
sua integração em turmas, ditas, regulares; porém, para ilustrarmos os nossos sentimentos,
permitimo-nos usar uma expressão popular: uma coisa é ver as coisas e outra é vivê-las. Face à
população escolar que tínhamos, diferenciámos, pela positiva, sempre que foi necessário,
adaptando fichas, outros materiais de trabalho e abordagens pedagógicas. Esforçámo-nos por dar à
diferença o que a diferença exigia.
Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais
© Fernanda Cardoso (2015) 55
PARTE II
A educação que visa o pleno desabrochar da personalidade humana esforça-se (…) por agir sobre
as componentes desta para aumentar os poderes de que o indivíduo dispõe e que têm origem no
seu equipamento biológico, mental e afetivo (Dottrens, 1974c:31).
Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais
© Fernanda Cardoso (2015) 56
Capítulo III – A Educação Especial e a Criança com Necessidades Educativas Especiais
“Não há, não,
Duas folhas iguais em toda a criação,
Ou nervura a menos, ou célula a mais,
Não há, de certeza, duas
Folhas iguais”.
António Gedeão
A relação entre a educação especial e inclusão é tão estreita que nos sentimos tentados a
transcrever a afirmação de Correia (2003) dando mote ao título do seu próprio livro “A Educação
Especial e Inclusão: Quem disser que uma sobrevive sem a Outra Não Está no seu Perfeito Juízo”.
3.1 Da segregação à inclusão
A educação é hoje tida como um valor inquestionável, contudo, o que não deixa de ser significativo
é que a educação das populações especiais só venha a ser objecto de estudo do pensamento
educacional universal, a partir do séc. VIII (Vieira, 1996:15) como a seguir se verá.
Desde os alvores da Humanidade que as sociedades recorreram a práticas reguladoras face ao
“diferente”. A preocupação pela conduta que se afasta da normalidade, foi uma constante histórica,
embora nem sempre desenhada com rigor conceptual (Serra, 2002). O conceito de criança com
deficiência e o atendimento prestado a estas crianças sofreu ao longo do tempo, grandes mudanças
passando a sua compreensão, necessariamente, por uma abordagem dos grandes períodos históricos
que marcaram o percurso do seu desenvolvimento. A história da Educação Especial é feita de
exclusão, de segregação, de institucionalização de pessoas, tantas vezes com aptidões para serem
autónomas, independentes e plenamente envolvidas no mundo do trabalho e na participação social
(Baptista, 2011:35).
Nesse sentido, pareceu-nos importante dar uma visão da forma como esta evolução se processou.
Com o objetivo de situar o leitor nos acontecimentos a nível nacional e internacional, iremos
oportunamente estabelecendo um paralelismo entre Portugal e os outros países, especialmente os
que pertencem à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE).
Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais
© Fernanda Cardoso (2015) 57
Praticamente toda a bibliografia consultada no âmbito desta temática, converge ao aceitar que o
modo como a sociedade ao longo da História foi encarando esta população, está intimamente
ligado a fatores sociais, económicos e culturais próprios de cada época (sendo que o problema da
deficiência mental, foi o mais tardiamente atendido e severamente punido).
Bastará recordar que estas pessoas foram desde sempre objeto de tratamento especial: desde serem
consideradas como possuídas pelo demónio na Idade Média, ou produto de transgressões morais no
século XVIII, até serem tratadas como loucas e internadas em hospícios nos séculos XVIII e XIX.
Afortunadamente, um notável médico francês, Jean Marc Itard (1774-1838), veio alterar esta
ideologia, desenvolvendo importantes estudos no intuito de provar que “todo o ser humano é
educável”. Este, foi considerado por alguns como o pioneiro da história da educação especial
(Vieira, 1996).
Mais tarde, um outro seu aluno, Séguin, seguiu-lhe o exemplo. Aos trabalhos de Itard e Séguin
seguiram-se muitos outros. Porém, só na primeira metade do séc. XX é que se verificaram grandes
desenvolvimentos teóricos, em muitos campos directamente relacionados com a educação e com os
cuidados gerais prestados à pessoa com deficiência (Op. Cit.; 1996:19). Estes desenvolvimentos
tiveram como base a filosofia de pedagogos tão importantes como, Rosseau, Montessori, Decroly e
Frobel, onde é consolidada a ideia de necessidade de um ensino para todos (Veiga, 2000).
Ao longo de todo este período o conceito de criança com deficiência, sofre, como veremos, grandes
mudanças.
Orientam-se as políticas no sentido de “separação” das pessoas com deficiência ou consideram-nos
membros da sociedade, ainda que necessitando de certos apoios para nela totalmente participarem.
Basicamente as fases históricas da educação especial, seguiram esta orientação: da exclusão à
segregação; da segregação à integração e da integração à inclusão (Correia, 1999). Tal como nos
refere Pereira (1996) Ao longo do séc. XX, nos países ocidentais, a evolução dos conceitos e das
práticas relativos ao atendimento educativo de crianças e jovens com deficiência tem evoluído de
forma semelhante: da iniciativa privada à intervenção do Estado, das instituições de assistência à
criação de estruturas educativas, das políticas de segregação às medidas de integração escolar
(Pereira, 1996:3).
Portugal, embora de uma forma mais lenta e com uma abrangência menor, seguiu a mesma
tendência de outros países membros da OCDE, tendo uma evolução complexa, semeada de avanços
e recuos.
Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais
© Fernanda Cardoso (2015) 58
3.2 Síntese histórica da evolução da educação especial
A maioria dos autores, Pereira (1996), Afonso (1997), Bautista (1997), Bairrão (1998) e Veiga
(2000), divide esta abordagem histórica em três fases distintas com contornos bem diferenciados.
Para os ilustrar adotaremos as designações utilizadas por Veiga (2000), mencionando Jiménez
(1993) por, de entre eles, ser a abordagem mais recente.
A 1.ª Fase, dos esquecidos e dos escondidos situa-se no início deste século e prolonga a tradição
asilar e segregadora do séc. XIX. As crianças apelidadas de deficientes são vistas como
“anormais”, pelo que deviam ser protegidas, agrupando-se em instituições separadas, longe da vista
do público. O ensino é ministrado em escolas especiais, também chamadas centros médicos
terapêuticos. Em Portugal, este período manifesta-se pela criação dos primeiros asilos para cegos e
surdos, criados geralmente por iniciativa privada e com fundos próprios. É a fase que alguns
autores designam de pré-história da educação especial.
A 2.ª Fase, do despiste e da segregação vamos encontrá-la já nos anos 50 e 60 com o apogeu das
técnicas psicométricas e do modelo diagnóstico que conduz sobretudo à preocupação em classificar
e diagnosticar, em vez de educar. Neste período em que vigora a conceção da deficiência como
doença, as crianças eram classificadas através de diagnósticos complexos, para serem em seguida
segregadas em recursos educativos e terapêuticos especiais.
A comunidade científica acreditava que prestava um melhor serviço às crianças com deficiência,
protegendo-as das crianças ditas “normais”. Nesta época os médicos desempenham um papel
decisivo nos processos de avaliação, diagnóstico e colocação destas crianças nas instituições.
Contudo, as transformações sociais ocorridas após a primeira Guerra Mundial, começam a
modificar os pensamentos de então. Começa a ser aceite o direito à diferença, implementando-se a
prevenção de doenças e deficiências. Assiste-se ao desenvolvimento das preocupações educativas
com os cidadãos com deficiência e ao nascimento do movimento em defesa da integração.
Em Portugal nos anos 60, a oferta na área da educação especial das crianças e jovens com
deficiência, era muito escassa. Foi assim, que face à insuficiente resposta das instituições oficiais se
assistiu nesta década, a um movimento de organização de pais que está na base da criação de várias
instituições sociais e mecanismos de apoio a instituições particulares, no âmbito do Ministério da
Segurança social.
Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais
© Fernanda Cardoso (2015) 59
Paralelamente às escolas especiais, aparecem outras formas de atendimento. É o primeiro passo a
caminho da desinstitucionalização das pessoas portadoras de deficiência. Foi nesta altura que em
Portugal surgiram os centros de observação e orientação, bem como as classes especiais do
Instituto Aurélio da Costa Ferreira. Entra-se no início dos anos 70, na 3.ª Fase, de identificação e
ajuda, marcada pelo surgimento de uma nova conceção do conceito e da prática da educação
especial caracterizada, predominantemente, pela integração escolar das crianças com deficiência
em conjunto com os seus pares.
Os anos 70 marcam a generalização do conceito de normalização por toda a Europa e América do
Norte. Destaca-se em 1975 nos EUA a Public Law 94-142, “The Education for All Handicaped
children Act” que confere o direito à educação pública de todas as crianças portadoras de
deficiência dos 4 aos 21 anos. Em 1978 surge no Reino Unido o Warnock Report que vem
introduzir o conceito de Necessidades Educativas Especiais (NEE)12.Do ponto de vista político e
social, o novo paradigma assenta na conceção de que todos os cidadãos têm os mesmos direitos,
nomeadamente o direito à educação e ao ensino que se deve adaptar às suas necessidades.
Do ponto de vista científico, é contestado o papel exclusivo do diagnóstico médico para o ensino
desta população. Passa a valorizar-se a educação como forma de mudança e a integração como
forma de normalização. Neste sentido, o termo normalizar, significa aceitar a própria criança tal
como é, com a sua individualidade, reconhecendo-lhe os mesmos direitos dos outros e
possibilitando-lhes serviços que lhe permitam desenvolver ao máximo as suas capacidades.
É neste período que em Portugal a educação especial ensaia os primeiros passos (Serra, 2002). São
criadas as Equipas de Educação Especial, a primeira medida prática que veio permitir, primeiro o
apoio a crianças com deficiências motoras e sensoriais integradas no sistema regular de ensino, e só
mais tarde, a crianças com deficiência mental.
Contudo, é no início dos anos 90 que a política educativa portuguesa, através de importantes
diplomas legais, se torna mais clara quanto à responsabilização da escola na educação dos alunos
com NEE. A garantia e a gratuitidade da escolaridade obrigatória de todas as crianças, incluindo as
que apresentam deficiência e a introdução e a adequação de medidas a aplicar de acordo com as
necessidades educativas especiais, foram alguns dos aspetos contemplados na legislação que se
consideram relevantes para uma política integradora.
12 Por ser tão comummente aceite esta abreviatura, também nós nos apropriámos dela e a utilizamos ao longo de todo o documento.
Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais
© Fernanda Cardoso (2015) 60
Atualmente encontramo-nos naquilo que a Organização das Nações Unidas para a Educação,
Ciência e Cultura considera o limiar da 3.ª Fase – a fase de “plena cidadania” – em que a pessoa
portadora de deficiência é considerada, de facto, como pessoa com a sua autonomia, vontade,
individualidade e com um projeto de vida próprio (UNESCO, 1994). Não gostaríamos, no entanto,
de concluir este ponto, sem refletirmos conjuntamente com (serra, 2002): A educação especial é
uma inquestionável realidade em contínua evolução (Serra, 2002:49) .
3.3 Políticas da educação inclusiva
Como vimos, ao longo da História da Humanidade foram diversas as atitudes assumidas pela
sociedade, para com as pessoas com deficiência; utilizando uma terminologia mais recente, e
situando-nos no contexto educativo, diremos, para com as crianças e jovens com NEE. A
bibliografia consultada revelou-nos que a evolução do atendimento a esta população tem
prosseguido ao longo das últimas décadas um caminho centrípeto, passando das escolas especiais,
para as classes especiais, destas para as salas de apoio e finalmente para o seu enquadramento na
sala de aula do ensino regular.
Na base desta mudança esteve o desenvolvimento de uma cultura mais humanista, com a crescente
valorização dos direitos humanos e dos conceitos de igualdade de oportunidades, do direito à
diferença, da solidariedade e justiça social que lhe são inerentes (Vieira, 1996:15). Neste contexto,
começam a surgir textos, leis, conferências e declarações mundiais que mudaram o rumo da
educação para um novo paradigma: o paradigma da inclusão. Neste, a organização da educação
escolar foi marcada por marcos históricos, muitos deles já aqui anteriormente referidos, mas que
urge agora enfatizar.
Segundo Baptista (2011:43)13 O espírito de inclusão e de educação inclusiva começa a desenhar -
se com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, adoptada e proclamada pela Assembleia
13 O autor (Baptista, 2011: 41-73) baliza, cinco marcos históricos fundamentais na educação inclusiva:
1- 1948: Declaração Universal dos Direitos Humanos;
2- 1975: Lei 94-142, sobre a Educação de Todas as Crianças com necessidades Educativas
Especiais (Public Law);
3- 1978: Relatório Warnock e as suas recomendações;
4- 1990: Conferência Mundial sobre Educação Para Todos;
5- 1994: Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais.
Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais
© Fernanda Cardoso (2015) 61
Geral das Nações Unidas em 10 de Dezembro de 1948. A partir desse passo, sob a liderança da
Organização das Nações Unidas os países, quer individualmente, quer em conjunto, souberam
construir todo um quadro normativo que pretendia a universalização teórica e prática da inclusão.
As profundas transformações nas práticas educativas permitiram a passagem de modelos mais
segregadores para modelos mais inclusivos. Na intervenção educativa, os aspectos clínicos
deixaram de ser uma prioridade, verificando-se uma ênfase maior nas capacidades e competências
da criança. Na continuidade do que anteriormente foi referido, realçamos aqui as décadas de 60 e
de 70, nomeadamente na preocupação com a igualdade de oportunidades e com a
consciencialização de que havia nas classes regulares crianças que não progrediam
satisfatoriamente (Ainscow, 1996). Surgiram então ideias novas que iriam pôr em causa as crianças
referidas como tendo NEE. Espalha-se um pouco por todo o mundo um movimento – em termos de
política de integração escolar – apoiado por fortes pressões sociais, políticas e educacionais. A
tendência é a de colocação e integração da criança com NEE na escola pública. Destacam-se aqui
as já mencionadas, Lei americana Public Law n.º 94-142 (1975) que propõe o ensino de crianças
com deficiência com os seus pares de forma universal e gratuita no ensino integrado e o Relatório
Warnock Report (1978), que propõe que a deficiência seja atendida como um contínuo de
necessidades educacionais específicas e introduz o conceito de NEE (Correia, 1999). 14
O Relatório Warnock desloca de forma clara o enfoque médico nas deficiências dos educandos,
para um enfoque na aprendizagem escolar de um currículo ou programa e sublinha ainda que,
sempre que possível as crianças com NEE devem frequentar as escolas regulares. Em consonância
com os documentos anteriores, o Relatório Warnock reforça a necessidade de uma viragem a nível
político, social e educativo. Parafraseando Serra (2002), Estas posturas tornaram-se a base de uma
profunda mudança nas orientações que até ao momento tinham presidido à organização e prática
da educação especial, que progressivamente se vai tornando extensiva e reconhecida na legislação
de muitos países (Serra, 2002:60).
No início da década de 90 realiza-se em Jomptien, na Tailândia, a Conferência Mundial sobre
“Educação para Todos” que aprovou a Declaração Mundial sobre Educação para Todos:
Satisfação das Necessidades Básicas de Aprendizagem. Esta Conferência foi organizada, em
conjunto, pelos responsáveis do Fundo das Nações Unidas para o Desenvolvimento, da
Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) e do Banco
14 Miranda Correia estabelece um conjunto de definições que dizem respeito à criança com NEE: com atraso mental; surda ou hipoacúsica; cega ou portadora de visão parcial ou reduzida; com problemas motores; com outros problemas de saúde; com problemas de linguagem e fala; com perturbações emocionais; com traumatismo craniano. Define ainda se estas NEE são temporárias ou permanentes.
Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais
© Fernanda Cardoso (2015) 62
Mundial, com o patrocínio de diferentes Governos e Organizações. Cerca de 60 países propõem-se
elaborar programas que permitam a todos aceder à educação.
Juntamente com a Declaração, foi também concebido e aprovado um Plano de Ação, que pretendia
ser um guia para governos e organismos internacionais, com sugestões de ação direta em cada país.
Dando lugar a uma política educativa integrada decorre em 1994, em Salamanca, a “Conferência
Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais: Acesso e Qualidade” organizada pelo Governo
Espanhol em cooperação com a UNESCO com a participação de 92 países, entre eles Portugal,
onde é assinada uma Declaração de princípios.
Esta Declaração situa a questão dos direitos das crianças e jovens com NEE no contexto mais vasto
dos direitos do homem e por isso, refere a Declaração Universal dos Direitos do Homem, a
Conferência Mundial sobre Educação para todos e as Normas das Nações Unidas sobre igualdade
de oportunidades para Pessoas com Deficiência. O documento acolhe as novas conceções sobre a
educação dos alunos com NEE, expressa a opção pela escola inclusiva e traça as orientações
necessárias para a ação a nível nacional e internacional, com o objetivo de implementar, uma
escola para todos UNESCO (1994).
Desta Declaração advém uma nova conceção sobre a educação de alunos com NEE pois a
designação abrange todos os portadores de deficiência, passando pelos sobredotados e incluindo
aqueles que pontualmente evidenciam dificuldades de aprendizagem em algum momento do seu
percurso escolar (Veiga, 2000:24). Neste conceito devem ainda incluir-se, crianças de populações
remotas ou nómadas, crianças de minorias linguísticas, étnicas ou culturais e crianças de áreas ou
grupos desfavorecidos.
O texto apela ainda a todos os governos a adotar como política, o princípio da educação inclusiva,
admitindo todas as crianças - com as características, interesses, capacidades e necessidades de
aprendizagem que lhe são próprias - nas escolas regulares; por sua vez, devem estas (escolas),
desenvolver sistemas de educação planeados e com programas educativos implementados de modo
a atender adequadamente a todas estas diversidades. Surge assim o conceito de escola inclusiva
independentemente das condições físicas, sociais, linguísticas ou outras, que os alunos possam ter.
Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais
© Fernanda Cardoso (2015) 63
3.4 A educação inclusiva em Portugal
Portugal, embora não se assumindo predominantemente numa linha integradora, adotou, embora
tardiamente, esta nova perspetiva de integração de alunos com NEE nas escolas regulares. Numa
fase ainda um pouco remota, no início da década de 70, o Ministro Veiga Simão (1973) apresenta
uma política educativa que integrou pela primeira vez, nos objetivos da educação em geral, o
atendimento educativo de crianças, inadaptadas, deficientes e precoces (Serra, 2002).
A partir de 1975 um novo período desponta para a educação destes cidadãos. Segundo Carvalho
(2000), os movimentos internacionais que vinham proclamando os princípios da integração,
chegam ao nosso país, aclamados pelos ideais da Revolução de Abril. A Constituição da República
estabelece então que o ensino básico será universal e gratuito e todos os cidadãos terão acesso a ele.
O mesmo pode claramente, ler-se no seu Art.º74.º. Estas alterações despertam a consciência de
alterações profundas no domínio da educação especial. Mas é só em 1986, com a – já citada - Lei
de Bases do Sistema Educativo (LBSE), que as tendências integrativas são já mais visíveis
(Bairrão,1998). Nela estabelece-se um conjunto de meios destinados a concretizar o direito à
educação. Dado o relevo de que se reveste esta medida passamos à sistematização de alguns pontos
mais importantes da referida Lei, segundo Pires (1987):
a educação especial (…) integra atividades dirigidas (17.º-2):
a) Aos educandos;
b) Às famílias;
c) Aos próprios educadores;
d) Às comunidades;
• a educação especial realiza-se segundo modelos diversificados (…):
a) Em estabelecimentos regulares de ensino (…), (18.º-1);
b) Em instituições específicas (…), (18.º-2);
• a escolaridade básica para crianças e jovens deficientes deve ter currículos e programas
devidamente adaptados às características e a cada tipo e grau de deficiência (…), (18.º-
4);
• é estabelecida uma unidade de orientação de educação especial, que passa a pertencer a
um único Ministério, o Ministério da Educação (…), (18.º-7).
Decorrentes desta importante lei, são publicados vários diplomas que consagram medidas de
atuação junto de crianças com NEE. Referimos a título de exemplo apenas alguns: Despacho
Conjunto 36/SEAM/88 (cria as equipas de Ensino Especial); Dec.-Lei n.º 35/88 (veio permitir a
colocação de professores com funções de apoio a alunos com deficiência); Dec.-Lei n.º 43/89
Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais
© Fernanda Cardoso (2015) 64
(exige como competência da escola a deteção de necessidades educativas dos alunos e organizar e
gerir as modalidades de apoio e o encaminhamento dos alunos); Dec.-Lei n.º 35/90 de 1 de janeiro
(estipula de novo o cumprimento da escolaridade obrigatória para todos os alunos qualquer que seja
o grau de deficiência); Dec.-Lei n.º 6/2001 de 18 de Janeiro (o governo assume a garantia de uma
educação para todos, objetivo que implica conceder uma particular atenção às situações de
exclusão).
Ainda na sequência da LBSE, a educação especial foi objeto de um importante normativo legal
específico (Dec.-Lei n.º 319/91 de 23 de agosto) que vem dar corpo aos princípios consagrados na
já referida LBSE, tendo como fundamentais as orientações do seu art.º 59, isto é:
• fomentar uma igualdade de oportunidades a todas as crianças e jovens deficientes;
• permitir que as necessidades educativas especiais correspondam, no âmbito das escolas
regulares a intervenções específicas adequadas.
Como se sabe, esta tomada de posição do governo português não acontece isoladamente. De facto
ela é fruto de todo um envolvimento internacional que – tal como já foi referido – surgiu nos anos
90 em torno da escola para todos e reforça a política da educação inclusiva. Decorrente disto, este
Dec.-Lei (n.º 319/91) é nitidamente influenciado pela legislação americana e inglesa e estabelece o
regime educativo especial que consiste na adaptação das condições em que se processa o ensino-
aprendizagem dos alunos com NEE.
Subsequente a esta legislação, surgem outras medidas legais, com acentuado relevo na temática em
questão como seja, o despacho n.º 173/ME/91, que funciona como instrumento determinante para a
normalização do conceito de inclusão (Serra, 2002). Destacamos ainda a Portaria n.º 611/93, de 29
de Junho que estabelece as normas técnicas, de execução, necessárias à aplicação das medidas
previstas no, já citado, Dec.-Lei n.º 319/91, destinadas às crianças com NEE a frequentar os jardins
de infância da rede pública do Ministério da Educação. Os alunos com NEE ficam obrigados ao
cumprimento da escolaridade obrigatória pelo Dec.-Lei n.º 301/93.
Na senda destes ideais, a escola inclusiva veicula, um sistema de educação e ensino onde os alunos
com NEE (incluindo os portadores de deficiência) são instruídos com os outros, no seu ambiente de
escola regular. Ora, um programa inclusivo pressupõe serviços organizados nesse sentido. Com o
objetivo de melhor gerir e organizar as condições em que se processa o ensino-aprendizagem, surge
o Despacho Conjunto n.º 105/97 de 1 de julho, ao enunciar princípios como, centrar nas escolas as
intervenções diversificadas necessárias para o sucesso educativo de todas as crianças e jovens
(Serra, 2002). Nesta perspetiva emerge o enquadramento normativo dos apoios educativos, que se
Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais
© Fernanda Cardoso (2015) 65
materializa no conjunto de medidas que constituem uma resposta articulada e integrada aos
problemas e necessidades, nas e pelas escolas, de acordo com um conjunto de princípios
orientadores.
Em 1999 é finalmente publicado o Despacho Conjunto n.º 819/99, no domínio da intervenção
precoce, para crianças com deficiência ou em risco de atraso grave de desenvolvimento que ações
específicas de apoio para crianças dos 0 aos 3 anos (excecionalmente até aos 6 anos) e suas
famílias. Não deixa de ser curioso que este Despacho, que remetia para uma intervenção o mais
precoce possível no despiste de problemas da criança, seja das últimas medidas a publicar pelo
governo no âmbito da educação especial.
Atualmente estes serviços são designados por Intervenção Precoce na Infância (IPI) e têm a missão
de garantir um conjunto de medidas de apoio integrado centrado na criança, com limitações ao
nível da atividade e de participação num ou vários domínios de vida e na família. Funciona através
da atuação coordenada dos Ministérios da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, da
Educação e Ciência e da Saúde (SNIPI), conjuntamente com o envolvimento das famílias e da
comunidade. O Programa SNIPI tem como finalidade contribuir para a promoção da universalidade
do acesso aos serviços de intervenção precoce, através do reforço da rede de Equipas Locais de
Intervenção (ELI), (Portaria n.º 293/2013 de 26 de setembro). Não tanto na linha da legislação,
mas na linha dos Planos, é de referir também o Plano Nacional de Ação para a Inclusão (PNAI`s)
enquanto eixo de ação orientado para o combate às formas de pobreza e exclusão social, incluindo-
se aqui as pessoas com deficiência como um dos quatro grupos de intervenção.
Contudo, com o balanço efetuado do PNAI (2006-2008), conclui-se que o cumprimento das metas
ficou aquém do projetado pelo que, de acordo com Caleiras (2008), posteriormente, a estratégia
nacional do mesmo Plano, colocou o seu enfoque em quatro pilares específicos de intervenção
local, de entre eles, a necessidade de respostas reforçadas no apoio aos cidadãos “portadores de
deficiência”. Acolhendo o enunciado nestes pilares, foram definidas pelo governo medidas e
prioridades que pretendiam superar as discriminações e reforçar a integração dos cidadãos
portadores de deficiência, bem como dos imigrantes e de outras minorias étnicas, implementando
programas a eles direcionados.
Todavia, na prática, as medidas dirigidas a crianças/alunos com deficiência continuam a ser regidas
por instrumentos legislativos dos quais sobressai o já referido Dec.-Lei n.º 3/2008 de 7 de janeiro,
que norteia hoje de forma decisiva o atendimento às populações escolares - desde a Educação-Pré
Escolar ao Ensino Secundário - com deficiência. O mesmo, remete para os Projetos Educativos das
Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais
© Fernanda Cardoso (2015) 66
escolas as adequações relativas ao processo de ensino e aprendizagem necessários à resposta
educativa aos alunos que se enquadram nessa modalidade de educação. A legislação em questão
prevê, além de outras medidas, o desenvolvimento de respostas diferenciadas, orientadas para a
especificidade destas populações.
A acompanhar este processo, estarão os docentes de educação especial recrutados através da
publicação, em 2006, do Dec.-Lei n.º20/2006 de 31 de janeiro. Analisada a escola atual - no âmbito
da inclusão – sob o ponto de vista deste modelo, dir-se-ia que está atingido o desejado patamar da
“escola para todos”. Contudo, uma análise mais atenta poderá trazer-nos informação contrária,
como de seguida veremos.
3.4.1 Situação atual
A entrada em vigor do Dec.-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro, permitiu que Portugal alinhasse as suas
políticas educativas, não apenas com aquilo que se constitui, hoje, como matéria largamente
consensual no seio da comunidade científica sobre esta matéria, mas também com os princípios e
recomendações contidos nos diversos tratados e declarações de direito internacional a que o Estado
Português está vinculado em matéria de necessidades educativas especiais e de não discriminação
em razão de deficiência e saúde (Declaração de Salamanca sobre Princípios, Políticas e Práticas
na Área das Necessidades Educativas Especiais, 1994, da UNESCO; Convenção sobre os Direitos
das Pessoas com Deficiência, 2007, e Protocolo Opcional, 2009, das Nações Unidas).
Depois de todo este percurso no caminho de políticas de inclusão fará sentido, continuarmos a
interrogar-nos (detendo-nos mais particularmente na “inclusão educativa”), se a inclusão será já
uma realidade, ou se pelo contrário, permanecerá ainda no horizonte das promessas? É com o
intuito de percebermos a realidade atual que passamos em revista o que alguns autores de
referência nos dizem a este respeito.
Antes de avançarmos com qualquer consideração, pensamos ser importante esclarecer que neste
ponto, apoiamo-nos em Correia (2008a) quando analisa a relação existente entre inclusão e Escola
Contemporânea e ainda em Baptista (2008, 2011), por ambos fazerem uma análise bastante crítica
da situação atual.
Começamos então por referir que o princípio da inclusão apela, para uma escola que Correia
(2008a) designa de Escola Contemporânea, que tenha em atenção a criança - todo,
Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais
© Fernanda Cardoso (2015) 67
proporcionando-lhe uma educação apropriada que respeite três níveis de desenvolvimento
essenciais: académico, socioemocional e pessoal. O autor reitera, ainda, o que a escola inclusiva
não deve ser, e passamos a citar: mera colocação de todos os alunos com NEES nas classes
regulares sem que um conjunto de pressupostos seja assegurado (legislação, recursos,
colaboração, etc.), (Correia, 2008a:13). Na mesma obra, Correia, continua a defesa desta ideia,
remetendo para aquilo que a educação inclusiva é sem os apoios necessários: educação
irresponsável. Aliás, Miranda Correia tem sido uma das vozes mais críticas no estado atual da
educação especial em Portugal, com atribuição direta de responsabilidades ao já referido Dec.-Lei
n.º3/2008 de 07 de janeiro. Afirma mesmo que não se coaduna com os interesses dos alunos a
quem se destina por não precisar um processo de atendimento eficaz para os mesmos. De entre
alguns dos aspetos que enumera como geradores de insucesso nas respostas a estes grupos, refere o
facto de recorrer a uma classificação (Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade
e Saúde, vulgo CIF), desaconselhada em educação. Esta classificação, volta (como já tinha
acontecido no passado), a colocar o enfoque no diagnóstico realizado na área da saúde.
No mesmo contexto, mas situando a crítica em duas questões fundamentais15, chega mesmo a
propor uma alteração significativa do documento ou mesmo a sua suspensão.
Perante esta afirmação, não será de estranhar que Correia (2008a) conclua que, no que respeita a
respostas educativas para alunos com NEE, a política seguida pelos governos, tem sido desastrosa,
culminando em atendimentos deficitários a estes alunos ou, pura e simplesmente na falta deles
(2008a:81), devendo por isso, repensar-se com urgência os serviços de educação especial.
Por sua vez, Baptista (2008), aponta críticas idênticas referindo a ausência de consenso nesta
matéria (Ibid.:2011), refere que Muitas escolas e muitos professores queixam-se de que a aplicação
da CIF como instrumento de identificação e elegibilidade das crianças com necessidades
educativas especiais deixa de fora muitas crianças, nomeadamente as que se situam na área das
dificuldades de aprendizagem (Baptista,2011:96). Acrescenta ainda que A igualdade de
oportunidades, o sucesso de todos e a inclusão continuam a ser uma miragem, ou um luzeiro
distante, que estamos ainda longe de alcançar (Op. Cit.; 2011:29).
Concluem os autores, que a inclusão não deu resposta aos problemas com que nos debatemos na
sociedade e na escola. Nas palavras de Baptista (2008; 2011) a escola inclusiva incorpora um 15 A primeira que denomina como condição restritiva e discriminatória da lei, por parecer limitar o atendimento às necessidades educativas especiais dos alunos surdos, cegos, com autismo e com multideficiência, discriminando a esmagadora maioria dos alunos com NEE permanentes (como alunos com problemas intelectuais, dislexia, disgrafias…) e a segunda que relaciona com o uso da CIF, para determinar a elegibilidade do aluno com possíveis NEE para os serviços de educação especial e posterior elaboração do programa educativo individual, sem que a investigação assim o aconselhe.
Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais
© Fernanda Cardoso (2015) 68
conjunto de promessas incluídas num movimento de reorganização, reestruturação e melhoria de
escola, mas que, de acordo com o seu ponto de vista, se encontra nesse mesmo estado: promessas.
Como vinha antevendo o autor (Ibidem:2008) A inclusão, o eco da democracia na educação, vem
prometendo a mudança de uma escola que existe por outra que não existe (Baptista,2008:213).
Baptista (2011) reflete ainda: A nível mundial, os objectivos estão definidos, e bem definidos. Falta
criar as condições concretas, em cada país, em cada escola, que permitam levar à prática esses
objectivos (Baptista,2011:29) e conclui este raciocínio interrogando: Que limites, que obstáculos,
que dificuldades se levantam para a realização deste desígnio? (Ibid:29).
Juntando-nos a estas preocupações, gostaríamos de indagar acerca de como poderemos contribuir,
nas escolas, por forma a esclarecer esta questão e colaborar no sentido de minimizar esta
problemática.
3.4.1.1 Modalidades específicas de educação e respostas educativas especializadas
Com a caducidade dos Dec.-Lei n.º 319/91 de 23 de agosto e n.º105/97, algumas competências a
eles inerentes transitaram (com a redação legislativa necessária) para o Dec.-Lei n.º3/2008 de 7 de
janeiro. Como já tem vindo a ser notificado é ele, agora, o documento estruturante que norteia os
diferentes aspetos que regem toda a dinâmica e organização da educação especial.
Este decreto determina que as modalidades e estratégias do acompanhamento a alunos com
necessidades educativas se inserem no Projeto Educativo (PE) da escola e como tal, as respostas
não se restringem a adaptações pontuais numa ou noutra sala de aula; mas pressupõem uma
abordagem global. Assim, também os apoios educativos foram redefinidos. O mesmo Decreto
reconhece que “todos os alunos têm necessidades educativas, trabalhadas no quadro de gestão da
diversidade”, mas que “existem casos que se revestem de contornos muito específicos, exigindo a
ativação de apoios especializados”16 Esses apoios especializados visam responder às necessidades
educativas especiais dos alunos com limitações significativas ao nível da atividade e participação,
num ou vários domínios de vida, decorrentes de alterações funcionais e estruturais, de caráter
permanente, resultando em dificuldades continuadas ao nível da comunicação, da aprendizagem,
16 Nestes apoios especializados, incluem-se outros que não apenas os recursos humanos na área da docência, nomeadamente psicólogos e terapeutas da fala.
Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais
© Fernanda Cardoso (2015) 69
da mobilidade, da autonomia, do relacionamento interpessoal (Dec.-Lei n.º3/2008 de 7 de janeiro),
promovendo o desenvolvimento biopsicossocial do aluno.
De acordo com a mesma legislação, estes apoios, podem implicar a adaptação de estratégias,
recursos, conteúdos, processos, procedimentos e instrumentos (Dec.-Lei n.º3/2008 de 7 de janeiro),
competindo às escolas, incluir nos seus PE as adequações relativas ao processo de ensino e de
aprendizagem, de carácter organizativo e de funcionamento para responder adequadamente às NEE
das crianças e jovens por forma a assegurar a sua maior participação na escola e na comunidade em
geral. Aquela legislação, estipula, no seu Capítulo II, uma série de procedimentos de referenciação
e avaliação, com vista a aferir se se está, ou não, perante uma situação de necessidades educativas
que justifiquem a intervenção dos serviços de educação especial, aconselhando o encaminhamento
do aluno para os apoios disponibilizados pela escola que melhor se adequem à sua situação
específica.
Em situação do processo merecer parecer favorável o aluno passará a beneficiar das medidas
educativas previstas no âmbito da Educação Especial, mediante a sua situação educativa. Ainda no
âmbito das respostas educativas especializadas, ao abrigo da mesma legislação, enquadram-se
também as escolas de referência para a educação bilingue de alunos surdos (Art.º 23); as escolas de
referência para a educação de alunos cegos e com baixa visão (Art.º 24); as unidades de ensino
estruturado para a educação de alunos com perturbações do espectro do autismo (Art.º 25); as
unidades de apoio especializado para a educação de alunos com multideficiência ou surdocegueira
congénita (Art.º 26) e ainda no domínio da Intervenção Precoce na Infância são criados
agrupamentos de escolas de referência para a colocação de docentes (Art.º27). Tais respostas
concentram alunos com problemáticas afins, oriundos do concelho em que essas unidades estão
sediadas e ainda de outros concelhos.
Por sua vez, estas respostas reclamam as funções dos respetivos profissionais dotados de
competências específicas e vocacionados para o trabalho junto dos alunos da educação especial,
como exemplo: docentes e técnicos que exercem funções nas escolas de referência para a educação
bilingue de alunos surdos – docentes e intérpretes de Língua Gestual Portuguesa (LGP) –,
terapeutas da fala e psicólogos escolares dos Serviços de Psicologia e Orientação (SPO); para lá
disso tornam-se necessários espaços físicos selecionados mediante a natureza da problemática e a
necessidade da resposta específica.
A implementação dos apoios especializados pode compreender, ainda, a colaboração de outros
técnicos oriundos de entidades externas com as quais a escola estabelece parcerias e protocolos.
Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais
© Fernanda Cardoso (2015) 70
Face ao exposto podemos concluir que O incremento de uma rede de apoios educativos, centrados
na escola e orientados para uma acção multifacetada, constitui parte de uma estratégia global de
combate à exclusão escolar e de construção de uma escola inclusiva (Vasconcelos, 1998:1).
Capítulo IV Caminhos para a Inclusão
© Fernanda Cardoso (2015) 71
Capítulo IV – Caminhos para a Inclusão
Ultrapassados - pelo menos teoricamente - os anteriores conceitos que apontavam como desejável a
prévia classificação dos alunos, o debate centra-se no momento, nas estratégias capazes de facilitar
esta aprendizagem a grupos de alunos em que a inevitável diversidade é considerada como um fator
de enriquecimento e de desenvolvimento (Ainscow, 1995).
Decorrente disto, a maioria dos governos europeus estão agora empenhados numa política de
inclusão, que como vimos, tem sido controversa. De facto, existe frequentemente uma carência de
clarificação entre o significado dos termos «inclusão» e «integração». Existe ainda muita
resistência na educação regular face à inclusão de jovens que desafiam o funcionamento da escola
e causam perturbações no sistema (Ainscow, 2001:111).
Os vários autores consultados são unânimes em afirmar que os caminhos para a inclusão são lentos
e complexos e que o progresso em direção às escolas inclusivas exige mudanças; deste modo, As
avaliações até agora realizadas evidenciam que a integração dos alunos com NEE na escola
regular não está isenta de problemas, e que é imprescindível realizar mudanças profundas para
conseguir escolas abertas para todos (Marchesi, 2001), (Cit. por David, 2001:95).
Estas mudanças são necessárias, tanto ao nível do sistema, como das mentalidades e exigem uma
série de pressupostos, que de forma mais ou menos evidente temos vindo a referir mas que
gostaríamos de explicitar.
4.1 A escola inclusiva: pressupostos básicos
As tendências atuais em matéria de princípios e práticas educativas - já o vimos - vão no sentido da
promoção de que a escola seja entendida como uma estrutura educativa de suporte social que se
ajuste a todos os alunos independentemente das suas condições físicas, sociais, religiosas, étnicas e
linguísticas; que responda às necessidades individuais deixando assim de ser segregadora.
Lembremo-nos que a Declaração de Salamanca, (UNESCO, 1994) realça claramente o direito de
todas as crianças a serem incluídas no sistema de educação.
Contudo, a flexibilidade que foi exigida à escola como resposta a uma população tão diversificada
implicou uma acentuada flexibilização da organização escolar, das estratégias de ensino, da gestão
Capítulo IV Caminhos para a Inclusão
© Fernanda Cardoso (2015) 72
de recursos e do currículo, de modo a proporcionar o desenvolvimento maximizado de todos. Mas,
como temos vindo a perceber, esta reforma nem sempre foi de fácil implementação.
Concordando com Cadima (1998) uma das maiores dificuldades que decorrem da
operacionalização dos princípios inerentes à escola inclusiva, diz respeito à concretização de um
ensino diferenciado e à planificação e gestão dos recursos humanos e técnicos, para lhe dar
coerência e viabilidade. Carvalho (2000), sublinha também esta posição, ao referir que as
mudanças conceptuais, assim como as práticas decorrentes, que sustentam uma escola inclusiva
põem à prova relações humanas e competências profissionais que enfrentam – resistências
pessoais e de grupo, criando desânimo em muitos professores, especialmente nos de apoio
educativo (Carvalho,2000:92).
No sentido de enfrentar estes desafios, realizaram-se nas últimas décadas, múltiplas investigações
(Miranda,1994; Ainscow,1997; Marchesi,2001) sobre as condições mais favoráveis ao sucesso de
aprendizagem na sala de aula; também surgiram outro tipo de estudos relacionados com novas
formas de organização da escola e tem-se procurado ainda desenvolver o aperfeiçoamento dos
professores através de estratégias capazes de implicar uma real transformação das suas conceções e
das suas práticas (Ainscow,1997).
Neste contexto vale a pena referir o Projeto da iniciativa da UNESCO “Necessidades Especiais na
Sala de Aula”, que visa o desenvolvimento de escolas inclusivas (Ainscow,1997). O mesmo, reúne
três artigos de nomes muito conceituados neste âmbito: os professores Mel Ainscow, Gordon
Porter e a professora Margaret Wang (1997). No primeiro destes artigos, Ainscow diz-nos que
tornar uma escola inclusiva não é uma tarefa fácil (Ainscow, 1997:27), mas admite que parece
existirem condições que contribuem para a sua realidade. Formula assim uma tipologia de seis
“condições” que parecem ser fatores de mudanças nas escolas:
• Liderança eficaz;
• Envolvimento da equipa de profissionais, alunos e comunidade nas orientações e
decisões da escola;
• Um compromisso relativo a uma planificação realizada colaborativamente;
• Estratégias de coordenação;
• Focalização da atenção nos benefícios potenciais da investigação e da reflexão;
• Uma equipa de valorização profissional de toda a equipa educativa.
Capítulo IV Caminhos para a Inclusão
© Fernanda Cardoso (2015) 73
Na realidade, os autores consultados convergem ao aceitar que as escolas não se tornam inclusivas
de um dia para outro e que, pelo contrário, necessitam de transformações profundas ao nível da sua
cultura, dos seus professores e da sua prática. Neste sentido, as escolas inclusivas, necessitam de
sociedades e políticas inclusivas, de modo a que os seus esforços possam ser impulsionados e
continuados por forças que existem antes e depois de si. Numa tentativa de complementar as
“condições” necessárias para que se construam escolas inclusivas, referimos Marchesi (2001), (Cit.
por David, 2001) que refere:
• o contexto político e social: os valores cívicos e morais da sociedade e o enquadramento
legal necessário de forma a regulamentar situações como a detecção precoce de NEE,
atenção educativa inicial, modelo de avaliação, sistema de provisão de recursos,
definição do currículo escolar, formação de professores e participação dos pais nos
processos educativos dos filhos.
• o contexto do centro pedagógico: as tendências atuais da escola para todos, que aceite as
diferenças, apoie as aprendizagens e promova uma educação diferenciada, isso
implica alterações no plano da organização e gestão curricular, no plano da formação
dos docentes e outros técnicos, numa liderança efetiva e no desenvolvimento de um
clima e de uma cultura para a inclusão.
• o contexto da sala de aula: o trabalho do professor dentro da sala de aula é fundamental
para a inclusão dos alunos com NEE. O professor deve veicular um ensino eficaz
ajustado às necessidades e possibilidades dos alunos, com estratégias de ensino-
aprendizagem que incluam, entre outras: aprendizagem cooperativa, ensino preciso,
acompanhamento individualizado, treino de competências sociais e ajustamento e
desajustamento gradual.
Ainda dando continuidade à mesma linha de pensamento, referimos Correia (1994) quando defende
que há um conjunto de características que uma escola inclusiva deve englobar. A saber: um sentido
de comunidade e de responsabilidade, liderança, padrões de qualidade elevados, colaboração e
cooperação, mudança de papéis por parte dos professores e demais profissionais da educação,
disponibilidade de serviços, parcerias com pais, ambientes de aprendizagem baseadas na
investigação, novas formas de avaliação e desenvolvimento profissional adequado. À semelhança
de Marchesi (2001, Op. Cit) também este autor (Correia:1994), considera que, para que, se fale em
inclusão, terão que considerar-se alguns pressupostos, de entre os quais enumera:
• As atitudes: tanto de profissionais como da sociedade em geral, que servirão de alicerce a
este grande edifício que se pretende construir e que é a inclusão;
• A formação: de profissionais de educação e de pais. Alerta especialmente para a formação
de profissionais ao nível inicial, especializada e contínua;
Capítulo IV Caminhos para a Inclusão
© Fernanda Cardoso (2015) 74
• A colaboração: grande esforço no sentido da comunidade escolar, onde todos funcionem
em parceria;
• Recursos: sejam eles humanos ou materiais. Realça aqui, que “A liderança da escola
desempenha um papel crucial na implementação de uma escola inclusiva”. Alerta para
a importância de neste contexto repensar o papel dos professores e demais
profissionais de educação.
Face ao exposto, apoiamo-nos em Correia (1994) quando refere que quando falamos em inclusão
estamos a falar numa reestruturação bastante significativa do nosso sistema, reestruturação essa
que terá fundamentalmente de apoiar-se num conjunto de pressupostos (Op. Cit:128). Baseando-
nos nas leituras realizadas destacaremos destes pressupostos aqueles que nos parecem essenciais.
4.2 Os professores – a sua formação e o seu papel na construção de uma escola inclusiva
De acordo com Pereira (1996b) a mudança para a concretização da escola inclusiva implica
alterações profundas no plano da organização e da gestão curricular, no plano da formação dos
docentes e de outros técnicos; implica ainda uma atenção especial à individualização e
diferenciação curricular e às estratégias de aprendizagem; implica, também, entender as estratégias
pedagógicas em termos de gestão e organização dos processos comunicativos e interativos entre
professor e aluno.
Na terminologia de Carvalho (2000), o professor é o principal protagonista desta mudança,
cabendo-lhe o principal papel como ponte sobre margens de um rio (Carvalho, 2000:93). Dele,
cada vez mais se espera que seja um conselheiro, um orientador com uma profunda dimensão
humana, ética, social, crítica, política e pedagógica, capaz de transformar a escola de muitos, na
escola de cada um. Decorrente disto, esta (escola) terá que se adaptar para receber e dar resposta a
todos os alunos que a frequentam de modo a que estes construam neste período da sua vida, as
bases para o seu melhor desempenho, na sociedade e em sociedade.
O papel desempenhado pelos professores nesse contexto, é relevado amiúde, por vários autores
Correia (1997), Costa (1999), Nielson (1999), Vieira e Silva (1999), Serra (2002), Pereira (2004), e
Baptista (2011). Neste sentido, vai também a opinião de Eduardo Marçal Grilo (1996) quando
refere que: o professor é o elemento essencial de qualquer projecto na escola, de qualquer
inovação, de qualquer processo de mudança. Sem os professores não há processo de inovação (…)
Capítulo IV Caminhos para a Inclusão
© Fernanda Cardoso (2015) 75
nem funcionamento da escola (Grilo,1996:25). De facto, não fará sentido falarmos em educação
inclusiva, se não houver da parte dos professores uma total adesão a este projeto. Nunca é demais
lembrar que o simples facto de uma criança com NEE frequentar uma escola, dita regular, não
significa por si só que haja inclusão. Mais do que aceitar a sua frequência, é necessário que a escola
centre a sua atividade na aplicação de um vasto conjunto de estratégias pedagógico-educativas que
desenvolvam todo o potencial do aluno.
A adequação da prática educativa e o estabelecimento de relações interpessoais empáticas serão
determinantes na promoção desse desenvolvimento; mas muito especificamente no que respeita aos
alunos com NEE. A este propósito Nielson (1999), professora qualificada na formação de docentes,
no âmbito desta temática diz-nos o seguinte: O meio educativo tem um enorme impacto, tanto nos
alunos com NEE como em todos os outros. No decorrer do processo de inclusão de alunos com
NEE nas classes regulares, o professor não só lhes deve transmitir sentimentos positivos como
deve também revelar-lhes afecto (Nielson, 1999:23).
Se o aluno não se sentir aceite, amado, respeitado e valorizado, que tipo de benefício lhe pode
advir, só pelo simples facto de frequentar, como todos os outros, uma escola “normal”?
Poderíamos, parafrasear Iturra (2001), (Cit. por Rodrigues, 2001), quando “veste a pele” de uma
criança que se lamenta Ai de mim (…)Como poderia ficar calmo e feliz quando os meus modelos de
vida não riem? (Iturra, 2001:71). É que, na verdade num mundo que com frequência se assemelha
tão confuso e gélido mesmo para os adultos, o que não parecerá a uma criança se se sentir
esquecida e hostilizada?
Faz por isso todo o sentido que aos professores, seja exigido o desenvolvimento de uma pedagogia
centrada na criança, atendendo a que as diferenças são normais e que por consequência, a
aprendizagem deve ser adaptada às necessidades de cada criança (Declaração de Salamanca). Deste
modo, para que se possa falar verdadeiramente em sistemas educativos regidos por princípios
integradores torna-se imprescindível repensar e adequar a prática educativa dos profissionais à
nova realidade social.
Como opinam Ainscow, (1997) e Bénard da Costa (1999), entre outros, avançar para a mudança
envolve algumas formas de turbulência que vão surgindo à medida que se introduzem alterações
nas dimensões organizacionais, psicológicas, técnicas e políticas. A questão que se coloca agora
será como capacitar os profissionais (professores de apoio e de ensino regular) para apoiar a gestão
destes períodos de turbulência e de confusão que vão surgindo à medida que se vão introduzindo
alterações no status quo da escola e dos professores. Numa primeira instância, a resposta parece
Capítulo IV Caminhos para a Inclusão
© Fernanda Cardoso (2015) 76
ser: apostar na sua formação, inicial e contínua. Relativamente a este aspeto, a bibliografia
consultada, diz-nos que há um grande consenso entre os autores.
Nessa interpretação, quando falamos em formação de professores, referimo-nos efetivamente, a
todos os professores, pois como escreveu Serra (2002): Houve a coragem de responsabilizar a
escola regular pela educação das crianças com necessidades educativas especiais (Serra,
2002:235); logo, todos os professores se devem encontrar preparados para assumir essa
responsabilização, procurando soluções operacionais para os problemas que surjam na sala de aula
e para a identificação de situações que mereçam especial atenção. Nessas situações destacamos,
naturalmente, os alunos que apresentem necessidades específicas de educação.
Do despiste à intervenção com crianças com patologias, decorre todo um percurso que implica um
conjunto de medidas e decisões sobre as quais o professor deve conscientemente refletir, para
evitar consequências a nível das atitudes dos técnicos e de todos os elementos envolvidos com
repercussões graves nas crianças e nas famílias (Correia, 1999).
Em suma, os professores deverão, então, ter conhecimentos para identificar e avaliar as
necessidades especiais que algumas crianças apresentam e efetuarem o planeamento e programação
de atividades educativas, intervindo diferenciadamente. Mas intervir, só, não basta. É também
necessário saber avaliar o resultado dessa intervenção, para a corrigir, se necessário. Todos estes
pressupostos, como estamos a constatar, comprometem tanto o professor de educação especial,
como o professor do ensino regular. Aliás, em muitas situações este é sem dúvida a força motriz
para desencadear um processo. Dele se espera atitudes de intervenção, que passam pela utilização
de estratégias e desenvolvimento de actividades focalizadas na diferença e individualidade,
mantendo um programa eficaz para o grupo/turma (Carvalho, 2000:46).
Baptista (2011), relevando o importante papel da formação na construção de uma escola inclusiva
(articulando-o com a avaliação formativa), afirma: É nos professores que está a solução do
problema. Muitos já estão preparados e são motores dessa mudança. Mas uma grande parte ou
resiste ou está à margem do problema (Baptista,2011:101). Após análise destes desafios que se
colocam à escola, o autor deixa uma porta aberta e diz que a experiência mostra que uma escola,
qualquer escola, com uma liderança forte e qualificada é o melhor espaço para enfrentar esses
desafios (Op. cit:102).
Capítulo IV Caminhos para a Inclusão
© Fernanda Cardoso (2015) 77
4.3 O papel das lideranças e do gestor escolar
Não restam, pois, quaisquer dúvidas que, para que a escola seja efetivamente inclusiva é essencial
que todos os seus profissionais possam atender todas as crianças diferentes e que os gestores
escolares saibam como modificar a organização do estabelecimento (Quintas, 2001). A história diz-
nos que a escola enquanto organização é bastante recente (Sousa, 1995). Seja como for, aceitemos
neste contexto o conceito de escola como um conjunto de atividades que são coordenadas no
tempo, nos conteúdos e no espaço para a realização de objetivos (Sanches,1996). Como qualquer
outra organização, a escola necessita de estrutura, pessoas, tecnologia e tarefas, quer de conceção,
quer de execução.
Contudo, a existência de uma matéria-prima humana, confere à escola um carácter especial. A este
propósito sublinhamos Ainscow (1996) quando afirma Acima de tudo, temos que nos lembrar que
as escolas não são simplesmente edifícios, horários e planos curriculares. Em primeiro lugar e
antes de tudo o mais, são relações e interacções entre as pessoas (Ainscow, 1996:37). Por este
motivo, é fundamental que a escola seja uma organização de facto “organizada”, “autónoma”, e
“produtiva”. Mas para que isso seja possível é necessário alguém que empreenda, apoie e estimule.
Este trabalho, compete com acrescida responsabilidade a quem exerce um papel de
administração/gestão/ liderança. Sabemos, no entanto, que agir para melhorar é em si uma tarefa
complexa e por vezes frustrante. A mudança, especialmente quando ela implica pessoas que são
levadas a adotar novas maneiras de pensar e de agir, é difícil e morosa.
Apoiando-nos em Sampaio (1998), concordamos que não se pode intervir face a um problema
escolar, sem se ter uma teoria sobre mudança (Sampaio, 1998:29). Fullan (1982), defende que
para ser atingida com êxito a mudança tem de ser compreendida e aceite pelos que estão
implicados nela. Compreensão e aceitação levam tempo e precisam de ser encorajados (Fullan,
Cit. por Ainscow 1996:35). O autor , defende, ainda, que a mudança para ser bem sucedida requer
uma combinação de pressão e de apoio: pressão para encorajar e apoio para permitir suportar as
dificuldades sentidas no processo de adaptação a novas ideias. Dando continuidade a esta posição
Ainscow (1996), fala da mudança como sendo mais um processo do que um acontecimento. Daí,
que gradualmente, se a mudança tiver êxito, o processo conduz a sentimentos de maior confiança e
aceitação pessoal.
No caso concreto da problemática em questão, para que a perspetiva da escola inclusiva possa ser
adotada por todos com êxito, torna-se necessário o envolvimento de todos os professores da escola,
pois concordando com Campos (1996) É uma mudança radical, relativamente à perspectiva
Capítulo IV Caminhos para a Inclusão
© Fernanda Cardoso (2015) 78
tradicional, que tem reforçado a ideia de que as crianças com necessidades especiais são da
responsabilidade de especialistas (Campos, 1996:41). Tal como a revisão bibliográfica refere, e o
nosso testemunho pessoal – pela prática pedagógica – confirma, o simples facto de uma criança
com NEE estar matriculada e frequentar a sala de aula do ensino regular, por si só não garante, que
se aderiu à mudança e está feita a inclusão. Esta, como temos estado a constatar, pressupõe
mudanças valorativas e atitudinais profundas e envolve transformações dos padrões curriculares da
escola, que convencionalmente tende a reificar os estigmas associados às pessoas com deficiência.
A mudança, pode parecer difícil, mas não é impossível. Ainscow (1997), dá-nos o seu contributo,
formulando seis “condições”, a partir de um conjunto de escolas que fizeram progressos
consideráveis em direção a políticas inclusivas:
• Envolvimento de toda a comunidade educativa nas orientações e decisões da escola.
• Compromisso relativo a planificação realizada colaborativamente.
• Estratégias de colaboração.
• Focalização da atenção nos benefícios potenciais da investigação e da reflexão.
• Política de valorização profissional de toda a equipa educativa.
• Liderança eficaz.
Baseando-nos no que acabamos de referir, não podemos ignorar que, para que se operem mudanças
contributivas no sentido de construir uma verdadeira escola inclusiva, é fundamental uma força
motriz humana com perfil e papel bem definido. Não vamos problematizar aqui a questão das
lideranças e dos gestores escolares (nem a redefinição dos seus papéis, à luz das últimas reformas
educativas), pois não é esse o nosso objetivo; mas também não poderíamos falar em escola
inclusiva, sem que – ainda que brevemente – realçássemos o contributo positivo de uma eficaz
liderança na construção desta escola.
A este propósito lembramos a afirmação de Porter (1994): A liderança administrativa é uma das
condições essenciais do sucesso de um programa educativo inclusivo (Porter,1994f:39).
Efetivamente, o papel das lideranças nesta perspetiva, com qualidade, inovadora e aberta a todos é
amplamente valorizado pelos vários autores. Reforçamos a nossa opinião transcrevendo a posição
firme de Campos (1996) quando afirma que a liderança é talvez o factor central do funcionamento
das escolas” e chega mesmo a acrescentar: As escolas que têm lideres funcionam, as que não têm
líderes não funcionam (Campos, 1996:22).
As perspetivas teóricas, mais recentes, de liderança e de escola, procuram cada vez mais,
fundamentos em domínios como os da antropologia cultural e correntes internacionalistas e
cognitivas (Sanches, 1996). Isto faz todo o sentido na medida em que a escola é cada vez mais “um
Capítulo IV Caminhos para a Inclusão
© Fernanda Cardoso (2015) 79
espaço de convivência intercultural”. Assim, podemos falar em “líder intercultural”, a quem
compete liderar uma escola, sentida como comunidade. Este líder, tem a difícil tarefa de superar as
antinomias derivadas de uma liderança cultural centrada na gestão de uma cultura organizacional
forte e coesa versus liderança de culturas multifacetadas (Sanches, 1996).
Nesta aceitação de escola, como espaço de valores plurais, com uma dimensão expressiva e
multicultural, parece-nos que a aceção de “líder intercultural” é aquela que melhor se adapta e que
sem dúvida é essencial à escola inclusiva que quase todos desejamos, pois ser líder intercultural
significa ter sempre presente as questões da equidade, de exclusão sócio-cultural e de
solidariedade (Sanches, 1996:27).
Nesta perspetiva, liderar uma escola, significa educar para a autonomia e para o exercício da
reflexividade crítica; contudo, embora atualmente se fale muito de educação inter/multicultural,
cremos que pouco se diz sobre liderança educativa intercultural.
4.4 Escola inclusiva e multiculturalidade
Afirmar que a nossa sociedade é marcada por uma diversidade cultural, significa reconhecer a
pluralidade de grupos sociais, étnicos e culturais que a compõem. Basta olharmos à nossa volta
para nos apercebermos que a sociedade em que vivemos é multicultural: há pessoas com a pele
mais branca, outras com a pele mais escura; os hábitos de vida são muito variados; as
manifestações religiosas, rituais culturais e outras características de alguns grupos são bastante
distintos de outros; os hábitos alimentares e as tradições culinárias são diversos (Serra, 2002).
Reconhecer que paralelamente a esta diversidade cultural existe uma outra diversidade: de género,
de capacidade orgânica ou funcional, ou de reação às situações de aprendizagem, significa que
temos de estar duplamente preparados para lidar com a diversidade. E se, face à diversidade
cultural, a proposta é a educação intercultural, face ao segundo grupo de diversidade acima
referido, a proposta é a educação/escola inclusiva. Os dois conceitos – interculturalidade e
inclusividade – não se excluem; da sua deliberada aproximação aqui feita, espera-se resulte uma
fecundação mútua (Campos, 1996:30).
Esta nova visão sobre educação e sobre o ser humano, num sentido mais abrangente – em que todo
o contexto existencial do aluno é considerado – não pode ser vista como um “fenómeno” isolado.
Evocamos a teoria ecológica de Bronefenbrenner (1979, 1996) que proporciona a compreensão de
Capítulo IV Caminhos para a Inclusão
© Fernanda Cardoso (2015) 80
vários sistemas de influência, desde os mais distantes até aos mais próximos, que acabam por
formar o contexto ecológico do sujeito (Bronefenbrenner, 1996).
De facto, não nos podemos esquecer que até um passado relativamente recente, o (in)sucesso do
aluno era da responsabilidade exclusiva deste (questionava-se então a sua carga genética…). Hoje,
pelo contrário tudo se questiona: as condições sociais das famílias, a escola e os conteúdos
manifestos e latentes ou inconscientes do ensino. Assim, a organização do ensino recebe
forçosamente influência dos fenómenos sociais mais vastos e abrangentes e o sistema escolar é
posto em causa:
– por razões objetivas de mau rendimento, sobretudo repetências e fracassos nas
aprendizagens fundamentais;
– pelos pais dos alunos, que se encontram frequentemente preocupados. A fadiga, a
instabilidade, o excesso de trabalho das crianças e dos pais, são denunciadas pelos
encarregados de educação, bem como casos de orientação que não conseguem corrigir
os efeitos das desvantagens sócio – económicas e culturais;
– pelos alunos, oriundos dos mais diversos meios socioculturais, para quem a escola não
é a única forma do saber. A evolução das suas relações com o mundo envolvente torna
cada vez menos aceitáveis atitudes tradicionalistas de autoridade, por vezes praticadas;
– pelos professores, cujo estatuto se desvaloriza e a quem são cada vez acometidas mais
responsabilidades.
– pelos psicólogos, psiquiatras e sociólogos que denunciam todo um rol de carências, seja
a nível pessoal, social ou escolar.
Face aos problemas e dificuldades com que se defronta a escola, e à urgência de agir que é exigida
aos professores, torna-se cada vez mais difícil a estes, terem uma prática pedagógica adequada, que
respeite as diferentes formas de olhar e trabalhar com o “outro” no processo de ensino –
aprendizagem. Em teoria diz-se que todas as crianças devem ter a mesma igualdade de
oportunidades. Contudo, A observância do princípio da igualdade de oportunidades, obriga os
sistemas político-sociais e, nomeadamente o sistemas educativos, a rever as suas atitudes e a sua
organização, de forma a respeitar toda e qualquer diversidade, individual e colectivamente
considerada (Serra, 2002:84).
Mas a observância deste princípio não parece muito clara e há quem a este propósito teça algumas
advertências; Cardoso (2002), diz-nos que: A preocupação com a realização das escolas de massa,
(…) em Portugal, fez com que o conceito de igualdade de oportunidades tenha estado demasiado
circunscrito ao acesso de todos ao sistema educativo, com pouca ou nenhuma consideração pela
Capítulo IV Caminhos para a Inclusão
© Fernanda Cardoso (2015) 81
igualdade de circunstâncias com que nele participa a diversidade pessoal, social e étnica dos
alunos e pelo impacto social resultante dessa participação (Cit. por Serra, 2002:84).
Defende-se ainda que ninguém, seja qual for a sua condição sócio-económica, política, cultural ou
religiosa pode ser prejudicado no que diz respeito ao acesso e aos meios necessários para conseguir
beneficiar das competências essenciais impostas pela sociedade. À sociedade em geral e à escola
em particular compete fazer cumprir este preceito, dando ao aluno a possibilidade de ser ele
mesmo, nas suas origens e na sua essência. Nessa medida, o professor não pode centrar a sua
atividade na quantidade de informação que o aluno possa recolher, mas sim na tentativa de criar
uma relação pedagógica dialogante. Neste sentido, um primeira atitude será a de aceitar e valorizar
a cultura 17 do aluno e comunicar com ele utilizando a mesma “linguagem”. O primeiro passo nesse
domínio poderia ser o da integração dessa cultura com a da instituição e não com a imposição da
cultura padrão.
Tendo como referência o que acabamos de expor, podemos dizer que, as crianças ao chegarem à
escola levam com elas diferentes “bagagens socioculturais” que são previamente determinadas pelo
meio familiar. A este propósito Serra (2002), comenta: lado a lado, nas salas de aula, estão alunos
entre os quais há significativas discrepâncias causadas por possuírem diferentes níveis de
linguagem, diferentes apoios em livros e outros materiais escolares, ambientes familiares diversos
onde existe ou não estimulação e envolvimento potenciadores de desenvolvimento (Serra, 2002:85).
Lembramos a este propósito Pierre Bourdieu e Claude Passeron (1970) para quem os modelos
culturais qualitativamente distintos das diversas classes sociais colocam as crianças oriundas de
cada uma destas classes em relações desiguais com a cultura valorizada e transmitida pela
instituição escolar.
O professor consciente e responsável, como docente e como ser humano, não pode ficar alheio a
estas questões. Impõe-se, assim, uma reflexão já, mais do que generalizada: se a cada criança
corresponde uma realidade específica que em conjunto com a carga genética faz de cada um, um
ser diferente, a nova cultura humanista não pode fundar-se na hegemonia de nenhuma imagem do
homem, mas antes no génio da diferença. Recordemos então que é nesta corrente existencialista
que a escola inclusiva alicerça as suas bases. Neste sentido, nunca é demais lembrar que a proposta
da chamada “Escola Inclusiva”, pressupõe pensar sobre novas questões que se impõem como as
identidades minoritárias, os hibridismos culturais e as diversas facetas, do chamado
multiculturalismo. 17 Moreira e Canen (1999:14) alertam que para referir-se ao multiculturalismo é necessário ter clareza de que ao termo cultura pode ser dado vários significados; neste contexto a palavra cultura evoca, o conjunto de práticas por meios das quais significados são produzidos e compartilhados em um grupo.
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© Fernanda Cardoso (2015) 82
Bairrão e outros autores, referindo Hallahan e Kauffman (1991) salientam a analogia entre situação
de “ensino integrado” e o “ensino multicultural” e realçam que Hoje, a educação multicultural é
decisiva em educação tendo em vista a sociedade em que vivemos (Bairrão, et. al.1998:35). Neste
novo modelo de escola aberta à diferença, tenta-se que as minorias encontrem uma resposta
adequada às suas necessidades, beneficiando todos os alunos em geral, por tudo o que traz a
mudança e a renovação e pelos recursos e serviços com que a escola pode contar.
A escola inclusiva, propõe, então, uma escola que possa atender às exigências da sua “clientela”,
possua ou não deficiências. Deste modo, o enfoque inclusivo pretende lidar com as necessidades
educativas temporárias ou permanentes dos alunos conceito que engloba, desde o relatório de
Warnock, todos os tipos e graus de dificuldades que se verificam em seguir o currículo escolar
(Rodrigues, 2001:19).
Estas dificuldades, como temos vindo a analisar não se situam só ao nível das deficiências, situam-
se também ao nível do contexto sócio cultural do aluno, que pode ser muito diferente do da escola.
Com a rápida massificação do ensino, e o facto de Portugal ser um país de acolhimento para
diferentes emigrantes, as escolas públicas, acolhem hoje populações cada vez mais heterogéneas, o
que transforma a escola numa instituição multicultural nas múltiplas dimensões da diversidade –
classe social, nacionalidade, língua, etnia e religião. Serra (2002), alerta-nos para o facto de que: A
escola portuguesa é uma escola multicultural onde se encontram crianças e adolescentes de muitas
origens, culturas, cores, nacionalidades e diferentes níveis culturais. Isto constitui um desafio para
uma urgente educação intercultural (Serra, 2002:243).
Nestes contextos multiculturais, com uma ampla diversidade de públicos, surgem novos e difíceis
desafios para os agentes educativos. Assim, no currículo desenvolvido nas escolas que se
pretendam inclusivas, devem ser travadas discussões pertinentes à formação das identidades numa
perspetiva dinâmica que encare os preconceitos e estereótipos como algo com múltiplas
representações e desdobramentos a serem questionados. Então, lidar com os “diferentes” na sala de
aula, significa necessariamente romper com as conceções estereotipadas sobre grupos
marginalizados. Mas não chega apenas tolerar. É que o problema de viver e conviver com o outro,
demarcado de uma matriz racional, tem o registo profundo dos afetos. Para haver de facto inclusão
é importante eu aceitar que a cultura do outro é tão importante como a minha e é necessário eu ter a
capacidade de ver no outro, diferente de mim, a continuação de mim, sentindo que o que se passa
com os outros também me diz respeito.
Capítulo IV Caminhos para a Inclusão
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Nesta perspetiva, o poeta afro–americano James Weldon Jonhson que cantou e denunciou a
exclusão do seu grupo étnico pode mostrar quão necessário é o olhar multicultural no processo de
construção da educação inclusiva:
Como nos aceitarias? Assim como somos?
Nosso olhar em êxtase preso a uma estrêla?
Ou estupefacto e vazio ante o desespero?
Ascendendo ou tombando? Homens ou coisas?
(Jonhson, 1989:93).
Neste sentido, a discussão sobre a multiculturalidade se torna tão necessária na educação escolar,
porque esta impõe inter–relações entre diversas culturas e os seus variados saberes, compreendendo
o palco da vida e o palco da escola, como instâncias carregadas de complexidades; assim a
abordagem multicultural em educação, procura articular pela via da interculturalidade, saberes e
conhecimentos que estão fragmentados e dispersos entre várias culturas maioritárias e minoritárias.
A este respeito, Cortesão (2001), (Cit. por Rodrigues, 2001), chama a atenção para o facto de um
conjunto de práticas contraditórias que por vezes coexistem em muitas salas de aula e que tanto
podem ajudar a promover a confiança e a auto – estima de todos os alunos, como podem contribuir
para marginalizar e inferiorizar grupos minoritários.
Em Portugal, a prática atenta às problemáticas interculturais está ainda a ser consolidada e como
refere Cortesão (Ibidem) é importante que estejamos atentos aos riscos que corremos aquando da
abordagem desta temática e se de facto não estaremos a contribuir para uma maior “guetização” e
marginalização dos alunos desses grupos minoritários (Cortesão, 2001; Op. Cit.). Numa tentativa
de prática educativa multicultural crítica, deve recorrer-se a dispositivos de diferenciação
pedagógica que contribuam para que os grupos com que se trabalha adquiram estatuto de cidadania
na sociedade dominante, sentindo-se cidadãos iguais de facto, com direito a uma vida de
participação e interferência na organização da nossa sociedade, sem que isso implique a destruição
da sua identidade e das suas raízes culturais, para que não assistamos a um risco de exclusão, pela
inclusão.
4.5 A importância do currículo na escola inclusiva
É já comummente aceite que as necessidades educativas formam um verdadeiro continuum a que a
escola se deve ir adaptando, admitindo a diferença como uma necessidade a que é preciso dar
Capítulo IV Caminhos para a Inclusão
© Fernanda Cardoso (2015) 84
resposta, numa linha integradora. Neste sentido, a diversidade das pessoas e das inserções culturais
e sócio-económicas conduz-nos obrigatoriamente a uma diversidade de currículos. Por esta razão,
como refere Campos (1996), a escola inclusiva não significa currículo único, mas sim diversidade
de currículos.
Este importante papel desempenhado pelo currículo na escola inclusiva é sobejamente relevado,
por vários autores, Pereira (1998), Correia (1999), Leite (2000), Rodrigues (2001) e Baptista
(2011). De uma forma simples sintetizaremos as suas opiniões, na afirmação que se segue: O
currículo escolar transformou-se no referente básico da educação especial (Manjón, 1997), (Cit.
por Rodrigues, 2001:53). Segundo Baptista (2011) Um currículo inclusivo visa o desenvolvimento
cognitivo, emocional e criativo da criança e baseia-se nos ´quatro pilares`para a Educação no
século XXI (Unesco, 2004, Ten questions on inclusive education): aprender a conhecer, a fazer, a
ser e a viver em comum (Baptista, 2011:87).
Antes de avançarmos, parece-nos agora, bastante oportuno apresentar a definição de currículo.
Rodrigues (2001), autor muito conceituado nesta área das Necessidades Educativas Especiais,
define-o como sendo todo o conjunto de experiências planeadas proporcionadas a um indivíduo ou
grupo, (…) com vista a melhorar a sua inclusão social e a sua qualidade de vida (Rodrigues,
2001:29). Este autor adverte para a necessidade de o currículo ser flexível e respeitar os princípios
da individualização e da funcionalidade.
Baptista (2011), alerta-nos a esse respeito que o termo curricular se reveste de alguma
ambiguidade; pois em sentido amplo abrange os conteúdos, os métodos de avaliação e a
aprendizagem. Em sentido restrito, refere-se apenas aos conteúdos. Rodrigues (2001), diz-nos
ainda que o currículo escolar entendido como todas as oportunidades de desenvolvimento e
aprendizagem que, formal ou informalmente, o aluno usufrui na escola é concebido dos valores e
das práticas emanadas de conceitos tão importantes como: educação, diferença e habilitação.
De facto o currículo é o ponto de convergência e de aplicação de toda a informação, metodologias,
oportunidades e intervenções habilitativas. Mas falar de currículo em educação, não é tão simples
como possa parecer. Basta recordarmo-nos da polémica de que se revestiu a “Reforma Curricular”.
No contexto desta polémica, Formosinho (1985) teceu duras críticas ao sistema, utilizando uma
terminologia como “currículo pronto a vestir tamanho único”. Foi para fazer face a esta rigidez de
currículo que se opõe claramente à flexibilização de currículo desejável para a escola inclusiva, que
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surgiu o projeto de “Gestão flexível do currículo” 18 (Despacho N.º 9590/99, de 14 de maio) que
visa promover nas escolas do ensino básico, uma mudança gradual, com vista a melhorar a eficácia
da resposta educativa aos problemas surgidos da diversidade dos contextos escolares, fazer face à
falta de domínio de competências elementares por parte de muitos alunos sobretudo assegurar que
todos os alunos aprendam mais e de modo mais significativo.
Neste âmbito, o Dec.-Lei N.º6/2001, de 18 de janeiro (que define os princípios orientadores a que
deve obedecer a organização e a gestão do currículo no ensino básico) confere à escola liberdade
para adaptar a estrutura curricular nacional aos diferentes contextos locais, permitindo assim
respeitar a diversidade de alunos. Nesta perspetiva, a escola deve ser uma organização sistémica,
correspondendo a um quadro de referência que traduz os valores, intenções e necessidades dos
elementos que a constituem. Ao organizar-se e tentar encontrar respostas para os seus próprios
problemas está a dar um sentido próprio à melhoria educativa; com vista a cumprir a sua finalidade
básica: o sucesso escolar de todos os seus alunos. Neste contexto as adaptações curriculares são a
mais importante estratégia de intervenção na resposta às necessidades educativas especiais
(Bautista, 1997:15). Referindo esta estratégia de intervenção, Correia (1999), aponta três níveis de
concretização das adaptações curriculares:
1. O primeiro é realizado pelas escolas com base numa análise detalhada das suas
características, condições e possibilidades, interesses e expectativas dos seus clientes.
2. O segundo realiza-se ao nível da turma de acordo com o seu perfil (características sócio-
económicas e culturais dos alunos, o seu grau de motivação, as expectativas e interesses).
O professor deve considerar a presença de alunos com NEE e analisar as implicações
curriculares daí decorrentes.
3. O terceiro considera cada aluno individualmente, em termos de necessidades educativas.
Para tal, o professor deve recolher o máximo de informação do aluno, suas potencialidade
e necessidades, acedendo a todo o tipo de documentos que lhe possam facultar essa
informação e realizando avaliações diagnosticas e especializadas.
As adaptações individuais devem ser realizadas de acordo com as necessidades, potencialidades e
expectativas dos alunos e ter em consideração aspetos que a investigação e a prática têm posto em
destaque relativamente às incidências específicas de alguns défices (sensoriais, motores,
intelectuais, emocionais, de comportamento), nas aprendizagens escolares. Estas adaptações
18 Entende-se por gestão flexível do currículo a possibilidade de cada escola, dentro dos limites do currículo nacional, organizar e gerir autonomamente todo o processo de ensino/aprendizagem. Este processo deverá adequar-se às necessidades diferenciadas de cada contexto escolar, podendo contemplar a introdução no currículo de componentes locais e regionais (Departamento da Educação Básica, Ministério da Educação, Despacho n.º 9590/99 de 14 de Maio).
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curriculares partem, segundo os vários autores, do PE que surge como um instrumento aglutinador
que mobiliza os diferentes elementos da comunidade educativa (…) inventariando os problemas e
os modos possíveis da sua resolução (Cadima, 1998:139); o docente de educação especial tem um
papel importante no levantamento de necessidades, das situações problemáticas que a escola
identifica na elaboração do seu PE, bem como das propostas de solução a desenvolver.
Atualmente, a maior diferenciação curricular para alunos com NEE, encontra-se prevista no Dec.-
Lei n.º3/2008 de 7 de janeiro, especificamente no seu Artigo 16.º, alíneas b)Adequações
curriculares individuais e e)Currículo específico individual, sendo que é menos restritiva a primeira
(na medida em que não compromete as competências previstas para o ciclo de ensino que o aluno
frequenta) e mais específica a segunda pois, pressupõe alterações significativas no currículo
comum, podendo as mesmas traduzir-se na introdução, substituição e ou eliminação dos objectivos
e conteúdos, em função do nível de funcionalidade da criança ou jovem (Dec.-Lei n.º3/2008 de 7
de janeiro).
Importante esclarecer que apesar da terminologia “currículo funcional” ter sido substituído por
“currículo específico individual”, a verdade é que são as orientações que deles provêm que, ainda
hoje, norteiam as respostas curriculares alternativas a prestar a este tipo de populações.
Alternativas, deve entender-se aqui, como resposta diferenciada. Assumindo a importância que o
currículo desempenha neste contexto, Rodrigues (2001) diz-nos que: Três aspectos assumem uma
importância particular no desenvolvimento curricular de alunos com NEE: a selecção do modelo,
a diferenciação e a funcionalidade (Rodrigues, 2001:29). As necessidades de um currículo
funcional para alunos com deficiência intelectual acentuada, parece unanimemente aceite por todos
os autores; apoiamo-nos em Rodrigues, quando fazemos esta afirmação Os currículos funcionais
têm tido uma grande disseminação e a sua aplicação tem sido feita de uma forma quase
indiscutível (Op. Cit.:31).
4.6 O papel da ética nas políticas educativas duma escola inclusiva
A ética, palavra de origem grega (ethos através do latim mos), é uma das grandes áreas em que se
divide o pensar do ser humano desde os primórdios da filosofia, na Grécia Antiga. E desde essa
origem a ética teve uma íntima ligação com a política chegando mesmo a uma quase identificação
naquele momento da Antiguidade (Caeiro; 2008). É que a ética é um conceito eminentemente
ligado ao coletivo (ao social), seja esse coletivo a corporação (o caso das éticas profissionais), a
nação ou a humanidade (onde se colocam todas as questões dos direitos humanos).
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Por sua vez, a política desdobra-se em conceitos que na sua essência remetem para o empenho na
realização do bem comum, do bem da coletividade ao qual se aplica como a um propósito final.
Partindo desta articulação, entendemos que não deveríamos desenvolver o nosso estudo, sem nos
determos no papel que a ética deve ocupar nas políticas de inclusão.
Assim, invocamos o artigo primeiro da Declaração dos Direitos do Homem (1948) que refere
“todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos”. O mesmo documento,
no seu preâmbulo, precisa “o reconhecimento da dignidade a todo o ser Humano e dos seus direitos
iguais para todos” e proclama como direitos fundamentais do homem a dignidade e o valor da
pessoa humana.
Nesta perspetiva, deve o profissional ter em conta os princípios aqui expressos e por consequência
desenvolver uma prática consentânea com o quadro da nova sociedade, mas também com as ideias
de coerência filosófica e ética do ser humano. Este sentido ético só se compreende se corresponder
à sua plena utilização ao serviço, não dos “indivíduos”, mas sim das pessoas, em especial das mais
vulneráveis. Ora, se considerarmos que a nossa prática profissional se desenvolve junto destes
grupos, melhor se compreende a necessidade de no nosso estudo, não passarmos ao lado dum ponto
tão importante quanto este.
A prática do professor, mormente do professor de educação especial, tem um carácter
necessariamente reflexivo, validado com uma forte componente ética, na interiorização e procura
de modelos de bem-estar para com os sujeitos da intervenção mediando de forma cidadã e
humanista as políticas sociais. Presentemente este ponto, parece-nos tanto mais relevante que na
sociedade atual, marcada pela globalização, a ética é chamada ao debate da nova questão social.
A crise económica e mundial que aniquila o mundo atual produz o aumento de problemas sociais
tanto a nível individual como coletivo, particularmente no que respeita aos grupos dos mais frágeis,
expondo também com maior visibilidade as desigualdades sociais relativas à exclusão social. Por
outro, lado o facto de termos cada vez mais acesso à informação, associado à ampla divulgação das
novas tendências humanistas conduz a que se assista cada vez com maior frequência, por parte dos
cidadãos, a atitudes que reclamam novos direitos como penhor ao bem-estar social. E é lícito,
parece-nos, que as sociedades evoluam nesse sentido.
Neste quadro, a intervenção do professor, e volta a insistir-se, especificamente do professor de
educação especial, tem toda a legitimidade. No primeiro caso, a sua matéria prima são seres em
devir e no segundo mantém-se a primeira circunstância e acumula-se com o facto de pertencerem
Capítulo IV Caminhos para a Inclusão
© Fernanda Cardoso (2015) 88
aos grupos mais vulneráveis. Por outro lado, a atuação docente desenvolve-se com uma
multiplicidade de agentes que integram o processo educativo do aluno. No caso do aluno com NEE
esta interdisciplinaridade acentua-se e foi já largamente referida como uma constante no Dec. -Lei
n.º 3/2008 de 7 de janeiro. Assim, as diferentes pessoas que neste contexto desenvolvem funções,
orientam-se segundo o princípio da interdisciplinaridade, onde, naturalmente se espera que presida
não apenas, a necessidade de responder às necessidades do aluno, mas também o código da ética.
No desempenho das suas funções o profissional está obrigado a refletir sobre e para agir. Este agir,
obriga ao cruzamento e gestão de um grande conjunto de informações em que têm de se articular
uma multiplicidade de fatores que obrigam - entre muitos outros procedimentos - à relação de
confiança, e ao sigilo profissional. Lembramos que o referido Dec.-Lei (n.º3/2008), no seu Art.º2.º
ao definir os princípio orientadores que prossegue a educação especial, remete para a
confidencialidade da informação toda a informação resultante da intervenção técnica e educativa
está sujeita aos limites constitucionais e legais, em especial os relativos à reserva da intimidade da
vida privada e familiar e ao tratamento automatizado, conexão, transmissão, utilização e proteção
de dados pessoais, sendo garantidos a sua confidencialidade (ponto 5); o artigo referido termina
dizendo expressamente: Estão vinculados ao dever do sigilo os membros da comunidade educativa
que tenham acesso à informação referida no ponto anterior (ponto 6). Enquanto elemento
integrante duas equipas multidisciplinares distintas, no âmbito das nossas funções profissionais,
conhecemos bem a importância destas recomendações, assim como a importância de um
comportamento ético para com os nossos alunos e suas famílias.
Se entendermos a ética como conjunto de princípios orientadores do agir humano, aceitamos que
para realizarmos uma reflexão ética, precisamos de compreender o Homem como sujeito racional
capaz de escolher valores e ações que conduzam à liberdade entendida como um bem. Na nossa
prática pedagógica, interiorizamos bem a ideia de que como pessoas e como profissionais compete-
nos estabelecer uma apreensão global do saber e da técnica a favor do homem, numa perspetiva
ética.
Contudo, a modernidade vive atualmente numa economia de mercado assente, supostamente, no
princípio geral da igualdade de direitos; no entanto, o problema surge quando as limitações
administrativas colocam restrições que se transformam em dilemas. Cada um de nós como
trabalhador social sofre dilemas, vive dilemas profissionais. As instituições em que as pessoas se
situam têm uma política, uma cultura, que força os profissionais a inscrever as suas práticas no
interior do organismo sendo que, estes poderão, ou não, estar de acordo com o que aí se perfilha.
Poderá daqui resultar um conflito para a resolução do qual a sabedoria prática (phronesis), tão
Capítulo IV Caminhos para a Inclusão
© Fernanda Cardoso (2015) 89
divulgada pelo senso popular, a prudência e a virtude serão de um valor inestimável. Todos nós em
algum momento precisamos de encarnar a importante (neste contexto) personagem mítica
“Antígona”19, questionando-nos: “Como devo agir”?
Sabemos, por experiência própria que a ética não é via de dois caminhos e trilhar um caminho ético
pode ser difícil. Sobretudo situando-nos na tendência atual em que tudo se relativiza, torna-se mais
fácil viver ao abrigo dos códigos deontológicos do que das teorias éticas. Lembremo-nos que numa
perspetiva ética, o fim da ação é o que determina todo o agir, e o fim último, o mais importante é a
felicidade, aqui associada ao bem e à virtude. Nesta abordagem, não poderíamos ignorar o grande
filósofo Aristóteles. Entendia ele que, todos os homens se devem reger por esta finalidade e que
nos atos humanos devemos agir de modo a não prejudicar os outros, numa perspetiva ética e
comunicativa.
Então, nas práticas profissionais é importante acreditar no princípio do diálogo: Nem todas as
necessidades resultam em conflitos e nem todas as opiniões têm de provocar desavenças (Cunha,
1996). Isto é tanto mais importante porque não podemos ignorar que estando a escola centrada no
movimento do mundo encontra-se diretamente confrontada com as preocupações éticas que hoje
atravessam as sociedades e os indivíduos, não sendo – tal como nas outras instituições - o seu êxito
possível à margem da ética. Assim, todos estaremos de acordo se dissermos que um docente mais
ético será certamente um melhor cientista e um melhor pedagogo.
Remetendo esta reflexão para as funções específicas do docente e a sua missão enquanto educador,
este deve, não apenas trilhar um caminho ético, mas assumir a formação ética dos alunos, na
medida em que a escola tem a responsabilidade de construir a autonomia do sujeito. Referimos a
propósito, o professor Cassiano Reimão (2000): Os docentes como profissionais são sujeitos
morais que realizam a ética como referência responsável e modelos de equilíbrio transformador.
No mesmo contexto, o autor (2000) acrescenta que A profissionalidade, o sentido social e a
humanidade, serão as três “virtudes” nucleares que integrarão a ética do docente (Cit. por Brito
2005:54). A sua prática, diz, será assente em premissas como, dedicação e competência,
compromisso e responsabilidade, prática da justiça, recusa da banalização da vida. O seu
compromisso é ajudar os outros a viver com dignidade a sua humanidade, em ordem à construção
de um modelo de vida pessoal.
19 Antígona, figura da mitologia grega, do dramaturgo Sófocles, representa entre outros, ideais humanitários como justiça, piedade, leis eternas.
Capítulo IV Caminhos para a Inclusão
© Fernanda Cardoso (2015) 90
Num momento em que a tecnologia tem instrumentalizado cada vez mais o ser humano, em que a
globalização submerge a humanidade, em que apenas somos números que não temos rosto, impõe-
se cada vez mais uma postura crítica que se insurja contra esta visão, atualmente tão divulgada de
“homem - objeto”.
Nesta crise de sentido, justifica-se cada vez mais a necessidade da ética, que nos aponte uma
direção, um sentido que nos ajude a apreender a técnica e o saber a favor do homem, de modo a
que, cada um encontre as suas próprias respostas para um percurso existencial autêntico, ético,
definindo a sua identidade e autonomia. Na sociedade atual, nos nossos contextos pessoais e
profissionais, torna-se urgente revisitar a herança do grande pensador Aristóteles e tomarmos
decisões numa perspetiva ética, dirigindo-nos ao alcance de uma vida boa com e para os outros nas
instituições justas. Especificamente ao docente exige-se competência que lhe permita responder
com eficácia de resposta às solicitações do aluno e da sociedade; contudo, entendemos que o
profissional, embora devendo caminhar nessa direção, deverá fazê-lo mas sem renegar a sua
autoridade profissional.
Por fim, gostaríamos de refletir que para bem da Humanidade, revela-se importante que as
Instituições, sejam lideradas por pessoas virtuosas, de sabedoria prática, de phronesis; que saibam
liderar corretamente, sabendo o que é bom e o que convém à natureza humana em cada
circunstância. Conhecendo, como já vimos anteriormente, o importante papel que as lideranças
detêm na construção de uma escola para todos, compreenderemos a acrescida importância de que,
essa mesma escola, seja liderada por alguém íntegro que perfilhe na teoria e na prática valores
autênticos de respeito pela individualidade de todos e de cada um.
Uma liderança eficaz deve favorecer o desenvolvimento da ética individual em articulação com a
ética coletiva. Basicamente deve ter a capacidade de provocar nos seus colaboradores a adesão a
um projeto pelo qual vale a pena lutar, favorecer a participação na tomada de decisões, aprovar ou
reprovar as condutas avaliando constantemente, sempre orientado por princípios éticos.
Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
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Capítulo V – A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
A deficiência é uma de entre todas as possibilidades do ser humano, portanto, deve ser
considerada, mesmo se as suas causas e consequências se modificam, como um factor
natural que nós mostramos e de que falamos do mesmo modo que o fazemos em relação a
todas a outras potencialidades humanas (Unesco, 1977).
A deficiência é como todos sabemos, algo que, afetando profundamente o homem na sua dimensão
individual e social, não reduz a sua dimensão humana e por isso há que reclamar em nome dos
direitos do Homem, o direito à diferença.
Este direito – como temos estado a constatar – está já adquirido (pelo menos em teoria) assim como
está, também já definido o quadro de direitos/valores em que decorre a condição do cidadão com
deficiência. Ultrapassado isso, façamos agora, ainda que de relance, uma abordagem, sobre o
conceito de deficiência.
5.1 Conceito de deficiência
A revisão bibliográfica diz-nos que não é fácil apresentar um conceito, porque depende do critério,
pelo qual analisemos “a deficiência”; critério sócio-cultural, educativo, físico?
Optamos por nos apoiar em Vieira (1996) para apresentarmos uma definição. Este autor, baseando-
se na definição da Organização Mundial de Saúde - OMS - (1980), diz-nos que a deficiência é uma
perturbação ao nível do funcionamento de um órgão resultante de uma doença que o afetou e que
gera incapacidade nos desempenhos funcionais da pessoa, deixando-a em desvantagem nas suas
relações com o meio físico e social que a envolve; mas que pode ser reduzida com o auxílio de
meios adequados. No contexto educativo, estes “meios adequados” traduzem-se nas respostas que a
escola deve dar, a estes cidadãos.
Remetendo-nos agora, especificamente, para o contexto escolar, parece-nos oportuno referir um
conceito, que nos parece completo, de criança com deficiência. Moita (1993:14), citando Kirk’s
Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
© Fernanda Cardoso (2015) 92
(1972), diz-nos que a definição de “criança deficiente” mais aceite internacionalmente é a seguinte:
“A criança deficiente é a criança que se desvia da média ou das crianças normais em:
– Características mentais
– Aptidões sensoriais
– Características neuromusculares e corporais
– Comportamento emocional e social
– Aptidões de comunicação
– Multi-deficiência
até ao ponto de justificar e requerer a modificação das práticas educacionais ou a criação de
educação especial no sentido de desenvolver ao máximo as suas capacidades (Moita,1993:14).
Como já tivemos oportunidade de constatar, em termos educativos, o conceito de deficiência tem
vindo a ser substituído pelo conceito de NEE, aceitando que, há uma necessidade educativa
especial quando uma deficiência (física, sensorial, intelectual, emocional, social ou qualquer
combinação destas) afeta a aprendizagem até ao ponto de serem necessários alguns ou todos os
acessos especiais ao currículo (Vieira, 1996).
5.1.1 Definição de deficiência mental
A evolução histórica do conceito de deficiência mental (DM), demonstrou que as suas definições
foram consideravelmente influenciadas por exigências sociais, culturais, políticas e
administrativas. Certo é que a definição da DM permanece controversa, apesar dos progressos
notáveis nos conhecimentos teóricos e nas práticas reabilitativas verificadas nas últimas décadas.
De acordo com Domingo e Valença (1997), (Cit. por Bautista, 1997), a DM é definida
fundamentalmente pelas correntes seguintes:
- Corrente Psicológica ou Psicométrica
Segundo esta corrente, é deficiente mental todo o indivíduo que apresenta um défice ou
diminuição das suas capacidades intelectuais (medida através de testes e expressa em termos de
Q.I.). Os principais impulsionadores desta corrente foram Binet e Simon.
- Corrente Sociológica ou Social
Esta corrente defende que o deficiente mental é aquele que apresenta, em maior ou menor medida,
dificuldades para se adaptar ao meio social em que vive e levar a cabo uma vida autónoma.
- Corrente Médica ou Biológica
Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
© Fernanda Cardoso (2015) 93
De acordo com esta corrente, a deficiência mental teria um substrato biológico, anatómico ou
fisiológico e manifestar-se-ia durante o desenvolvimento (até aos 18 anos). Para Lafon (Cit. por
Bautista, 1997:210). A debilidade mental é a deficiência congénita ou precocemente adquirida da
Inteligência .
- Corrente Comportamentalista
Esta corrente põe a sua tónica na influência do ambiente sobre a DM. O défice mental é um défice
de comportamento que deverá ser interpretado como produto da interação dos quatro fatores
determinantes (fatores biológicos passados; fatores biológicos atuais; história anterior de interação
com o meio e condições ambientais presentes ou outras situações atuais).
- Corrente Pedagógica.
Esta corrente defende que o deficiente mental será o indivíduo que tem uma maior ou menor
dificuldade em seguir o processo regular de aprendizagem e por isso tem necessidades educativas
especiais, ou seja, necessita de apoios e adaptações curriculares que lhe permitam seguir o
processo regular do ensino.
Ainda segundo Domingo e Valença (1997), (Cit. por Bautista, 1997), as primeiras três correntes
aqui expostas são as mais aceites pelos diversos autores. Com base nestas, a Associação
Americana para a Deficiência Mental (AADM), apresentou em 1992, uma definição que é
atualmente a mais conceituada e segundo a qual: Deficiência mental refere-se a limitações
substanciais na funcionalidade presente. É caracterizada por um funcionamento intelectual
significativamente abaixo da média, que é concomitante com limitações em duas ou mais das
seguintes áreas das competências adaptativas: comunicação, autonomia pessoal, autonomia em
casa, competências sociais, auto-direcção, saúde e segurança, funcionamento académico, lazer e
emprego. A deficiência manifesta-se antes dos 18 anos (Reis.1999:23).
Esta nova classificação de DM, proposta pela AADM (1992), baseia-se num ponto de vista
multidimensional – requer que se descreva a pessoa com DM de um modo compreensivo e global
– e engloba três passos. É o chamado “O processo dos três passos” (Alonso, 2001), (Cit. por
Bautista, 1997):
1.º - Diagnóstico da DM (Engloba os pressupostos. É o momento do diagnóstico da
Deficiência Mental e determina a elegibilidade dos apoios).
2.º - Classificação e Descrição (identifica áreas fortes e as áreas fracas, bem como as
necessidades de apoio).
3.º - Perfil e intensidades de apoio necessários (identifica o tipo e a intensidade dos apoios
necessários para cada uma das quatro dimensões seguintes:
Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
© Fernanda Cardoso (2015) 94
Na identificação de crianças com DM dá-se assim atenção a duas áreas: o funcionamento
intelectual e os comportamentos adaptativos. O funcionamento intelectual está relacionado com as
áreas académicas; a capacidade de um indivíduo resolver problemas e acumular conhecimentos e
que é medido pelos testes de inteligência. O comportamento adaptativo prende-se com as
capacidades necessárias para um indivíduo se adaptar e interagir no seu ambiente de acordo com o
seu grupo etário e cultural. Este, é hoje designado - no contexto de educação especial - como
“Perfil de funcionalidade”.
No entanto, e apesar da evolução positiva acerca do conceito de DM, os critérios da sua definição
permanecem discutíveis pelas implicações determinantes do carácter estigmatizante das
classificações. Neste âmbito parece certo que um dos objetos de estudo mais polémicos da
investigação tem sido a questão da avaliação da inteligência. Neste sentido, e de acordo com Pedro
Morato (1995) a perspetiva de classificação da Deficiência Mental (AADM), deve considerar-se
clássica uma vez que se mantém fundamentada essencialmente na perspetiva psicométrica da
inteligência (ainda que sucessivamente revista e melhorada).
Em resumo, a designação de DM estabelecida em 1992 pela AADM é hoje em dia –
indiscutivelmente – a melhor e mais completa e apresenta aspetos inovadores que implicam a
adoção de práticas pedagógicas coerentes por parte dos pais e educadores.
5.1.2 Diagnóstico
A bibliografia consultada no âmbito das NEE sublinha a importância de um bom diagnóstico,
rigoroso e válido, Vieira (1996), Contreras (1997), (Cit. por Bautista, 1997), Reis (1999) e Verdugo
(2001). No entanto, o diagnóstico na DM continua – apesar de ser objeto de estudos e preocupações
– a ser um problema; sobretudo pela dificuldade em diagnosticar uma deficiência que é
caracterizada, entre outras coisas, pela falta de uma sintomatologia específica, tanto mais difícil de
detetar, tanto mais jovem é a criança. De acordo com Reis (1999) em muitos casos, quando o atraso
mental é muito ligeiro, o diagnóstico é feito nas idades pré – escolar ou escolar, quando a criança
falha na psicomotricidade, no desenvolvimento percetivo motor, na criatividade, na expressão
gráfica, no jogo, à medida que vai havendo uma maior exigência nos processos de raciocínio
abstrato.
Não obstante toda a problemática do diagnóstico, este é necessário, para facilitar a intervenção
pedagógica; pois quanto mais tarde se puserem em prática programas de intervenção pedagógica,
Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
© Fernanda Cardoso (2015) 95
tanto maior será a extensão da deficiência em questão. De acordo com Alonso (2001) um
diagnóstico válido de atraso mental deve basear-se em três critérios (em nossa opinião, baseados na
definição de DM que anteriormente apresentámos - confirmar):
1. Nível de funcionamento intelectual
Este deve ser determinado por um profissional qualificado e com experiência de trabalho com
pessoas com atraso mental, que deve realizar um exame psicológico da inteligência conceptual do
indivíduo. Em alguns casos pode ser necessária uma avaliação interdisciplinar. O funcionamento
intelectual do indivíduo é aproximadamente 70 a 75 de Q.I. ou menor.
2. Nível de competências adaptativas.
O termo “competências adaptativas” veio substituir o termo “comportamento adaptativo”. Dizia-se
que o indivíduo deve também apresentar um défice no seu comportamento adaptativo em
simultâneo com o défice intelectual. Neste sentido propõem-se dez áreas de competências
adaptativas: comunicação, independência pessoal, vida diária, capacidades sociais, utilização da
comunidade, autonomia, saúde e segurança, capacidades académicas funcionais, tempo livre e
trabalho. O diagnóstico deve referir que existem limitações significativas em duas ou mais áreas de
capacidades adaptativas.
3. Idade cronológica do aparecimento
A idade de aparecimento é inferior aos 18 anos.
Pese embora o facto de o diagnóstico da DM ainda ser um problema, parece não haver dúvidas que
a sua aplicação implica quatro pressupostos (Vieira, 1996):
1 – Uma avaliação válida tem em conta a diversidade cultural e linguística e também as
diferentes capacidades de comunicação e fatores de comportamento.
2 – As limitações no comportamento adaptativo ocorrem nos contextos e ambientes sociais
que são típicos para os colegas da mesma idade do indivíduo. Estas limitações formam o índice das
necessidades individuais de apoio.
3 – As limitações específicas em algumas capacidades de adaptação coexistem muitas
vezes com outras capacidades por vezes bastante desenvolvidas.
4 – Com os apoios adequados, durante o tempo necessário, o funcionamento da pessoa
com deficiência mental será, no geral melhorado.
No plano pedagógico, importa entre outras, reter as ideias, que:
- Qualquer diagnóstico deve ser sempre formulado como diagnóstico conjetural e de caráter
provisório;
- Os diagnósticos devem ser regularmente verificados depois de terem sido tomadas
medidas intensivas de estimulação;
Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
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- Em nenhum caso se deve considerar um diagnóstico de incapacidade de instrução ou de
educação, como se se pudesse definir um limite inferior para a capacidade de
educação.
- Um diagnóstico claro é um bom ponto de partida para ações pedagógicas interventivas,
nomeadamente, medidas pedagógicas especiais.
É também muito importante lembrar que muitas vezes, a DM aparece associada a outro tipo de
deficiência e pode ser consequência desta, sendo portanto muito importante a avaliação da criança
por parte de uma equipa multidisciplinar, apta a detetar os vários problemas do desenvolvimento
da criança. No caso de não haver dúvida e efetivamente a DM ser diagnosticada, é muito
importante a avaliação da criança (por parte da equipa multidisciplinar) no seu contexto familiar, a
fim de avaliar as causas possíveis e estabelecer um programa de intervenção/estimulação e apoio
familiar.
5.1.3 Etiologia
A DM pode ter diversas etiologias e infelizmente algumas delas ainda não estão identificadas;
contudo, poderemos com base nas leituras efetuadas, mas seguindo de forma mais próxima
Pacheco e Valencia (1997), citados em Bautista (1997), fundamentalmente, classificá-las da
seguinte forma:
1. Fatores genéticos (Intrínsecos);
2. Fatores ambientais (Extrínsecos); e
3. Fatores de causa desconhecida ou mista
1 – Fatores genéticos
Estes fatores atuam antes da gestação. A origem da deficiência está determinada por uma herança
genética. São fatores do tipo endógeno e os dois tipos mais conhecidos são:
a) Genopatias – Alterações genéticas que produzem: síndrome de Rett, síndrome de Prader –
Willi, Hidrocefalia, Espinha Bífida (e outros…).
b) Cromossomopatias – Anomalias ou alterações nos cromossomas. Podem causar:
Trimossomia 21, Trimossomia 18, Trimossomia 13 (e outras alterações como: síndrome
do Grito do Gato, Klinefelter…).
Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
© Fernanda Cardoso (2015) 97
2 - Fatores Ambientais
São fatores do tipo exógeno.
Nestes fatores, as causas podem ser Biológicas ou Psico – sociais afetivas.
Dos fatores biológicos, faz-se a classificação que a seguir se apresenta, respeitando a
ordem cronológica em que eles podem acontecer:
a) Fatores pré-natais
- Atuam antes do nascimento e podem ser infeções, ingestão de substâncias
potencialmente perigosas, exposição a radiações, perturbações psíquicas ou
perturbações da tiróide.
b) Fatores peri-natais
- Estes fatores atuam imediatamente antes, durante ou após o parto – primeira semana
de vida. Alguns dos mais comuns são: prematuridade, anoxia, gravidez múltipla, idade
da mãe e traumatismo obstétrico.
c) Fatores pós – natais
- Eis alguns deles: lesões cerebrais, hidrocefalia, convulsões febris, anoxia (paragem
cardíaca…), intoxicações e fatores ambientais.
Fatores sócio afetivos
Hoje em dia não existe qualquer dúvida que os fatores sócio - económicos desfavoráveis,
favorecem o aparecimento do atraso mental. Contudo, muitas vezes é difícil estabelecer uma
relação causa – efeito, devido aos múltiplos fatores adversos.
As investigações provam que a falta de estímulos afetivos (seja por negligência,
internamentos hospitalares ou ausência de figuras parentais) pode afetar seriamente o
desenvolvimento intelectual da criança.
Fatores de causa desconhecida ou mista
Estes fatores constituem ainda hoje, motivo de estudo por parte de um grande número de
especialistas, mas apesar de todos os progressos a nível de investigação, muitas questões
estão ainda sem resposta.
Respeitante a esta problemática Reis (1991), afirma Se definir a deficiência mental é
difícil, classificar as suas causas não é mais fácil (Reis, 1991: 31).
Fazendo um comentário às tendências atuais relativamente à etiologia da DM, dir-se-á
que de alguma forma se pode diminuir o número de pessoas afetadas por este sintoma.
Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
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Para tanto são fundamentais, cuidados ao nível de:
- Prevenção genética;
- Melhoria dos cuidados obstétricos e neonatais;
- Diagnósticos pré – natais;
- Aconselhamento e planeamento familiar;
- Melhoria das condições sócio-económicas das famílias mais desfavorecidas;
- Intervenção educativa o mais precoce possível no caso em que haja suspeitas.
5.2 Graus de deficiência mental e características de cada grupo
Embora existam diferentes correntes para determinar o grau de Deficiência Mental, são as técnicas
psicométricas que mais se impõem, utilizando o Q.I. (Quociente Intelectual) para classificação
desse grau. O conceito de Q.I. é o resultado da multiplicação por cem do quociente obtido pela
divisão da I. M. (Idade Mental) pela I.C. (Idade Cronológica).
Em função do exposto, a AADM (Cit. por Morato, 1995:1) apresenta uma proposta, onde os níveis
de deficiência ou de comportamento deficitário se podem escalonar em função duma
correspondência entre o critério psicométrico e adaptativo.
Quadro 5: Níveis de deficiência ou de comportamento deficitário
Comportamento
adaptativo
Q.I.
Níveis
Ligeiro
Moderado
Grave
Profundo
Q.I. (Stanford – Binet e
Cattel)
(s. d. 16)
67-52
51-36
35-20
19-<19
Q.I. (Wechesler)
(s. d. 15)
69-50
54-40
39-25
24-<24
Fonte: Morato (1995) Adaptado
É importante referir que a abordagem psicométrica da inteligência continua a ser controversa e
motivo de extensa investigação. Inclusive há autores que consideram um outro nível que neste
quadro estaria em primeiro lugar, pois antecede todos os outros. Estamos a falar da:
Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
© Fernanda Cardoso (2015) 99
Deficiência limite ou de bordeline
Este grupo foi recentemente introduzido nesta classificação e ainda não há consenso entre os
diferentes autores sobre se deverá ou não fazer parte dela.
De facto, não se pode dizer que sejam deficientes mentais, já que são crianças com muitas
possibilidades, manifestando apenas um atraso nas aprendizagens ou algumas dificuldades
concretas. Muitos dos indivíduos provenientes de ambientes socioculturais desfavorecidos
poderiam aqui ser incluídos.
- Deficiência mental ligeira
Neste grupo está incluída uma grande maioria de pessoas com deficiência que, não são claramente
deficientes mentais, mas pessoas com problemas de origem cultural, familiar ou ambiental.
Podem desenvolver aprendizagens sociais e de comunicação e têm capacidade para se adaptar e
integrar no mundo laboral. Apresentam um atraso mínimo nas áreas percetivas e motoras. Surgem,
também, algumas alterações ao nível da motricidade fina.
É na escola onde geralmente são detetadas as suas limitações intelectuais, porque apresentam
geralmente dificuldades de aprendizagem das técnicas instrumentais, mas podem chegar a alcançar
um nível escolar equivalente ao 1.º CEB.
Normalmente, não apresentam problemas de adaptação ao ambiente familiar e social.
- Deficiência mental moderada ou média
Podem adquirir hábitos de autonomia pessoal e social, tendo maiores dificuldades para os últimos.
Podem aprender a comunicar pela linguagem verbal, mas apresentam frequentemente dificuldades
na expressão oral e na compreensão dos convencionalismos sociais. Apresentam um razoável
desenvolvimento motor e têm capacidade para adquirir alguns conhecimentos pré – tecnológicos
básicos que lhes permitem realizar algum trabalho. Dificilmente chegam a dominar as técnicas
instrumentais de leitura, escrita e cálculo.
- Deficiência mental grave
Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
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Necessitam, geralmente, de proteção ou ajuda, pois o seu nível de autonomia tanto social, como
pessoal, é muito pobre. Apresentam muitas vezes problemas psicomotores importantes. Poderão
aprender algum sistema de comunicação, mas a sua linguagem verbal será sempre muito
deficitária. Podem ser treinados em algumas atividades da vida diária básicas e em aprendizagens
pré – tecnológicas muito simples.
- Deficiência mental profunda
Este grupo apresenta grandes problemas sensório – motores e de comunicação no relacionamento
com o meio. São dependentes dos outros em quase todas as funções pois as suas limitações físicos
e intelectuais são gravíssimos. Excecionalmente terão autonomia para se deslocar e responder a
treinos simples de auto – ajuda.
De uma forma complementar, será importante referir que, hoje, não faz sentido, atribuir a uma
pessoa um nível determinado segundo uma escala rígida, uma vez que a importância é dada à
forma como cada pessoa se adapta às condições de vida e às exigências do seu meio social.
Mais do que classificar as pessoas, interessa identificar os apoios de que elas necessitam para
melhorarem a sua forma de vida. De acordo com este pressuposto a AAMR (Luckasson et. al., Cit.
por Hallahan e Kauffman, 1997), apresenta os seguintes níveis de apoio:
Intermitente (Apoio apenas quando necessário, episódico);
- Limitado (Apoio durante um período de tempo determinado, para realizar uma tarefa
específica);
- Moderado (Apoio regular em alguns ambientes e sem prazo determinado);
- Difusivo (Apoio constante de alta densidade, em vários ambientes, mais intrusivo que
os anteriores).
5.3 Características evolutivas da deficiência mental e implicações educativas
Podemos considerar que a evolução global da pessoa com Deficiência Mental se processa segundo
as mesmas etapas consideradas normais no desenvolvimento e evolução de qualquer outra pessoa:
- Sensoriomotora
- Operações concretas
- Operações formais
Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
© Fernanda Cardoso (2015) 101
Tal como em qualquer outro indivíduo, neste, o comportamento pessoal e social é muito variável e
não se pode, portanto, falar de características iguais em todos os indivíduos com DM.
Contudo, através de alguns estudos experimentais, foi demonstrada a existência de algumas
características que distinguem as pessoas com DM, das outras. Estas características diferenciadas
devem ser tidas em conta, pois qualquer programa educativo será condicionado por elas e se elas
forem ignoradas, podem, em muitos casos, ser um entrave para o desenvolvimento dessas crianças.
Quiroga (Cit. por Bautista, 1997), destaca como mais significativas as seguintes:
a) Físicas:
Falta de equilíbrio.
Dificuldades de locomoção.
Dificuldades de coordenação.
Dificuldades de manipulação.
b) Pessoais:
Ansiedade.
Falta de controlo.
Tendência para evitar situações de fracasso mais do que para procurar o êxito.
Possível existência de perturbações da personalidade.
Fraco controlo interior.
c) Sociais:
Atraso evolutivo em situações de jogo, lazer e atividade sexual.
Por sua vez, Sainz e Mayor (1989), (Cit. por Bautista, 1997), falam dos défices mais cognitivos nos
deficientes mentais, que segundo eles, serão:
Ativa
- Problemas de memória
Semântica
- Problemas de categorização
- Dificuldade na resolução de problemas
- Défice linguístico
- Problemas nas relações sociais
Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
© Fernanda Cardoso (2015) 102
Uma outra característica a referir é que na fase, em que a criança começa a desenvolver a
linguagem, o atraso mental manifesta-se essencialmente por atraso na compreensão e expressão
verbal (Reis, 1999:30). Finalmente – seguindo o mesmo autor – lembramos que a criança com
atraso mental manifesta sempre uma lentidão na aquisição da independência nas Actividades da
Vida Diária (AVD): comer só, vestir-se e controlar os esfíncteres (Op. cit.:30).
5.3.1 Desenvolvimento da personalidade na pessoa com deficiência mental
Dottrens (1974c) define a personalidade como sendo o conjunto de caraterísticas que diferenciam
um ser humano dos seus semelhantes no plano da constituição, do temperamento, da inteligência,
do caráter, do comportamento (Dottrens, 1974c:31).
Embora, como vimos, a evolução global da pessoa com DM siga as mesmas pegadas das etapas
consideradas normais na evolução de qualquer outra pessoa, ao falar-se do desenvolvimento de um
deficiente mental, não se deve enquadrá-lo em períodos concretos de aprendizagem, tendo em
conta exclusivamente as correntes psicométricas. É então necessário realizar-se uma avaliação
cuidadosa, para o poder situar no processo geral do desenvolvimento, tendo em conta as suas
caraterísticas, realçando os aspetos positivos.
Pacheco (1993), (Cit. por Bautista, 1997), refere que o deficiente mental se depara com uma série
de dificuldades na formação da sua personalidade e que se podem classificar desta forma:
- Dificuldades psicomotoras
- Dificuldades sensoriais
- Dificuldades nas relações sociais
- Dificuldades na linguagem
Em primeiro lugar a pessoa com esta deficiência tem dificuldade em estruturar as suas
experiências; ele pode ter as mesmas capacidades percetivo motoras de qualquer outro indivíduo,
mas tem problemas em construir o seu próprio mundo dos objetos.
O segundo problema que se coloca quanto ao desenvolvimento da sua personalidade, é a sua
educação. Mas a comunicação que é necessária para que a educação possa ter lugar, pode estar
Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
© Fernanda Cardoso (2015) 103
comprometida. Assim sendo, o tipo de educação que lhes dermos deve basear-se numa série de
estratégias diferentes das utilizadas normalmente com as crianças não deficientes.
Maistre (1981), (Cit. por Bautista, 1997), chama a atenção para estratégias que permitam educar
para a percepção, motricidade e linguagem e que consistirão no treino da capacidade para
efectuar as diferenciações e estruturações necessárias para que as aprendizagens escolares
possam ter significado para as crianças (Bautista, 1997:219).
A terceira dificuldade no desenvolvimento da pessoa com DM é derivada do seu reconhecimento
como pessoa. A ausência de determinados mecanismos para se afirmar como pessoa pode conduzir
a que não seja tratado e respeitado como tal.
Neste sentido, a ajuda a prestar-lhe pode, ser:
- Evitar atitudes de superproteção (da parte da família) e atitudes de discriminação (por parte da
sociedade).
- Ajudá-lo na integração do seu esquema corporal.
- Auxiliá-lo no processo de elaboração e desenvolvimento da linguagem (para que utilizando-a
se possa fazer compreender e tomar as iniciativas necessárias à sua vida em sociedade).
- Ter sempre presente a sua idade cronológica e proporcionar estratégias de forma a que nas
atividades desenvolvidas ela acompanhe – sempre que possível – os seus pares.
5.4 A abordagem educacional da criança com deficiência mental
Acreditando com Correia (2008b), que Não há criança nenhuma que não queira aprender
(Correia, 2008b:7), teremos uma ampla margem para educar a criança com deficiência mental.
Lembramos com Dottrens (1974b) que Educar significa: ex ducere! – tirar para fora de! Criar,
ajudar a viver melhor! (Dottrens, 1974b:13).
Face às abordagens que temos estado a registar, e tomando como ponto de partida a educabilidade
de todo o ser humano, incluindo as crianças e jovens com deficiência mental profunda (Vieira,
1990:90), importa agora definir etapas e traçar metas educativas no sentido de intervir o mais
adequadamente possível junto destas crianças. Segundo Fonseca (1999), (Cit. por Ferreira, 2008),
as alterações que o conceito de deficiência mental foi sofrendo, ao passar do enfoque na doença
para um enfoque na capacidade adaptativa, altera as expectativas relativas ao desenvolvimento e
ajustamento social e consequentemente acentua o aspecto educacional (Ferreira, 2008:67)
Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
© Fernanda Cardoso (2015) 104
Nessa linha, poderíamos debruçar-nos sobre as diferentes etapas educativas (mais ou menos
generalizadas), que podem ser estabelecidas para potencializar ao máximo o seu desenvolvimento e
que abrangeriam desde a Intervenção Precoce para a Infância ao ensino secundário. No entanto,
para não nos alongar-mos excessivamente, não o faremos. Contudo, não poderemos deixar de
sublinhar a relevante importância que a intervenção precoce (em casa ou numa ama), representam
na educação da pessoa com Deficiência Mental, e que deve corresponder às primeiras etapas da sua
vida. É nesta fase de desenvolvimento que a ação pedagógica tem maiores hipóteses de eficácia,
pois, como sabemos, é nos primeiros anos que se estabelecem os padrões iniciais de aprendizagem
e comportamento, que vão determinar o desenvolvimento posterior. Nunca mais haverá um tal
potencial para estabelecer as formas básicas de compreensão e aprendizagem através da
experiência. As primeiras experiências são assim a matriz primária a partir da qual todo o
desenvolvimento posterior se vai gerar.
Como vimos, a primeira vez que se pensou educar uma criança com atraso mental foi com o
médico Itard que investiu na educação de uma criança “selvagem” de 11 ou 12 anos. Não obstante
o programa de tratamento intensivo com a criança, as mudanças que se operaram não
corresponderam às expectativas.
De facto, 11 ou 12 anos é já uma idade “terrivelmente tardia”, para se iniciar uma intervenção junto
de uma criança que apresenta necessidades educativas especiais. A este respeito, toda a bibliografia
consultada é convergente: O apoio educacional às crianças deficientes (ou em risco ambiental)
deve iniciar-se o mais precocemente possível. Citamos como referência Vítor da Fonseca, quando
no seu livro “Reflexões sobre a educação especial em Portugal” afirma: A estimulação e a
intervenção precoces devem iniciar-se a partir dos primeiros momento de vida (Fonseca, 1980:77).
Contudo, para não nos afastarmos dos níveis de educação em que situámos o nosso curso de
formação ficar-nos-emos pela abordagem educacional na Educação Pré Escolar e no 1.ºCEB,
apresentando uma ligeira resenha sobre ambos. Para tanto, seguimos muito de perto Pacheco (Cit.
por Bautista, 1997). Pela nossa parte, tentaremos completar esta abordagem, articulando-a com o
Dec.-Lei n.º3/2008 de 7 de janeiro.
Atendendo à necessidade de o ensino ser encarado numa perspetiva individualizada, de forma a
servir melhor as necessidades específicas de cada criança – mesmo sabendo que não há fórmulas –
é importante, partindo das características gerais comuns a este grupo, enunciar alguns princípios
educativos a ter em conta durante a programação e implementação de programas educativos junto
destes alunos.
Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
© Fernanda Cardoso (2015) 105
Por fim, tendo sempre presente que todas as aprendizagens têm como objetivo principal o
desenvolvimento da vida futura numa perspetiva funcional, ou seja permitir uma inclusão e
participação ativa e válida na vida em sociedade visando sempre uma progressiva autonomia do
indivíduo, podemos concluir da necessidade de uma significância eminentemente prática destas
aprendizagens.
5.5 A Educação Pré-Escolar
Pelas afirmações que temos vindo a debater, afirmamos que as capacidades humanas e a
inteligência não são fixas ao nascimento, mas são moldadas até certo ponto por fatores ambientais.
O ambiente e as primeiras experiências particularmente na medida em que são, ou não,
estimulantes têm um efeito importante na capacidade da criança atingir o seu potencial.
A investigação sugere a existência de períodos críticos em que o desenvolvimento ocorre mais
rapidamente. Nestes períodos há uma maior suscetibilidade e vulnerabilidade ao efeito das
experiências no desenvolvimento e também pela mesma razão ao efeito da sua privação. As
deficiências e outros fatores de risco podem interferir com o desenvolvimento de tal forma que um
problema original não incapacitante por si só pode dar origem a deficiências secundárias muito
graves. Decorre daí, a importância que as experiências e estimulação potencialmente ricas podem
aportar à criança em idades mais novas.
Embora a Educação Pré-Escolar não seja obrigatória no nosso sistema educativo, um grande
número de crianças com idades compreendidas entre os 3 e os 6 anos, frequentam Jardins de
Infância. Como, também já foi abordado, por força da legislação existente, mormente do Dec. Lei
n.º3/2008 de 7 de janeiro, muitas crianças com DM (e/ou com outras deficiências) estão integrados
em grupos regulares de Educação Pré-Escolar e beneficiam de apoio especializado. Nesta etapa
educativa já há uma atuação pedagógica orientada e uma aprendizagem organizada.
Segundo Speck, (Cit. por Bautista, 1997) as tarefas fundamentais que a Educação Pré-Escolar deve
abranger, são:
- Estimulação e motivação para a aprendizagem e para atividades relacionais.
- Educação sensoriomotora e psicomotora.
- Treino de autonomia e hábitos de higiene.
- Educação rítmica.
Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
© Fernanda Cardoso (2015) 106
- Iniciação à comunicação social.
- Educação verbal elementar.
Como, também já foi referido, em Portugal, estas aprendizagens estão contempladas nas
“Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar”, documento que constitui o principal
suporte legal para as práticas pedagógicas neste nível de Educação e que contempla áreas mais
abrangentes como: Formação Pessoal e Social (decorre da perspetiva que o ser humano se constrói
em inter-acção social), Área da Expressão e Comunicação (engloba as aprendizagens relacionadas
com o desenvolvimento psicomotor: inclui domínio das expressões, domínio da linguagem oral e
abordagem à escrita, domínio da matemática) e Área do Conhecimento do Mundo (parte da
premissa que os seres humanos se desenvolvem e aprendem em inter-acção com o mundo que os
rodeia e a criança tem uma curiosidade natural em conhecer), (ME:1999).
Para as situações individuais em que se verifique – por parte das crianças – dificuldade em
desenvolver normalmente o processo de ensino-aprendizagem, o Decreto-Lei n.º3/2008 de 7 de
janeiro, estabelece - no seu Art.º 1.º (Objeto e âmbito de aplicação) - tanto para este nível de
educação como para os Ensino Básico e Secundário, a possibilidade de serem criadas condições
para a adequação do processo educativo às necessidades educativas especiais dos alunos com
limitações significativas ao nível da atividade e participação num ou vários domínios da vida
decorrentes de alterações estruturais e funcionais de caráter permanente.
Deste modo, e ao longo de todo o texto, o referido documento normativo aponta a sua abrangência
para as diferentes situações em que as crianças portadoras de NEE que frequentam a Educação Pré-
Escolar sejam beneficiadas por medidas educativas e condições de aprendizagem especiais.
5.6 A educação no 1.º Ciclo do Ensino Básico
A educação no período escolar deve investir no desenvolvimento de todas as potencialidades da
criança com deficiência, com o objetivo de a preparar para enfrentar sozinha o mundo em que tem
de viver. Neste sentido, devem ser favorecidas todas as atividades que a ajudem a adquirir as
capacidades necessárias para se desenvolver como ser humano. Speck (1978) apresenta-nos as
seguintes áreas:
- Sociabilização.
- Independência.
- Destreza.
Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
© Fernanda Cardoso (2015) 107
- Domínio do corpo.
- Capacidade percetiva.
- Capacidade de representação mental.
- Linguagem.
- Afetividade.
A escolha dos objetivos e dos conteúdos dos programas de aprendizagem terá como referência o
currículo nacional para o ensino básico e dependerá da situação individual de cada criança. Speck
(Ibidem) lembra que na educação dos deficientes mentais, não podem ser esquecidos os princípios
estabelecidos por Piaget. Apresentamos, de seguida estes princípios os quais vamos reforçando
com os nossos pontos de vista:
- Princípio ativo:
Deve fugir-se do ensino meramente teórico. Para que se produza aprendizagem; a criança tem de
ser posta numa relação direta com os objetivos. Quanto a nós, aproveitamos para enfatizar a
importância da aprendizagem significativa, especificamente para estas crianças.
- Princípio de estruturação
O ensino deve ser subdividido em pequenas etapas para que seja possível à criança, avançando a
pequenos passos, alcançar os objetivos propostos. Apropriando-nos das teorias de Speck, nós
diríamos que devemos graduar a dificuldade das aquisições tornando-as mais acessíveis e positivas,
tendo sempre presente que o sucesso gera sucesso e o insucesso gera desmotivação.
- Princípio de transferência
A transferência é uma tarefa difícil, especialmente para os doentes mentais. Por isso, para que as
aprendizagens possam ser utilizadas em situações análogas, é necessário muita repetição.
Nós acrescentamos que, tendo em conta as dificuldades destas crianças em efetuar a aquisição de
conceitos abstratos bem como generalizar e transferir os comportamentos e aprendizagens
adquiridos para novas situações, é necessário que estas aquisições se processem nos contextos e
situações o mais variadas e naturais possível.
- Associação da linguagem e da ação
Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
© Fernanda Cardoso (2015) 108
Para que haja associação entre o sistema de sinais verbais e a experiência em curso, toda a ação
deve estar ligada à palavra correspondente.
- Motivação para as aprendizagens sociais
Na educação dos alunos com DM é preciso criar situações positivas de aprendizagem nos aspetos
sociais e afetivos. O contrário pode afetar, acentuadamente, a disponibilidade do aluno para as
aprendizagens e logicamente os resultados a obter. Lembrar ainda que as aprendizagens processam-
se de uma forma lenta, pelo que é importante focarmos a atenção apenas nos objetivos que
realmente queremos ensinar, criar situações de aprendizagem positivas e significativas,
preferencialmente nos ambientes naturais do aluno e de uma forma o mais concreta possível, para
que este se sinta motivado e com predisposição para aprender. Em relação a estes princípios, nunca
é demais lembrar que eles são válidos em todos os níveis de ensino.
5.7 Programas Educativos Individuais
Como temos estado a verificar, os conceitos de integração/inclusão e/ou de preparação para a vida
ativa têm sido largamente discutidos e estão presentes na maioria dos técnicos que trabalham com
crianças e jovens com DM. Do mesmo modo, todos sabemos que, o futuro desses jovens e a sua
integração social passam por uma preparação cuidada e essencialmente adaptada às suas
características.
Compete aos técnicos de educação especial, e à equipa pluridisciplinar, desde muito cedo, ter em
conta as necessidades prospetivas da criança ou jovem, ou seja, preverem de forma o mais correta e
realista possível, o que, no futuro, aquele indivíduo vai necessitar para a sua plena inserção na
sociedade. Essa prospeção, numa primeira fase exige que se avalie e avaliar implica conhecer, pois
para poder decidir o que o aluno, necessitará no futuro temos que primeiramente saber o que
necessita agora.
Para reforçar esta posição parafraseamos Vieira (1996) quando afirma: Para poder decidir o que o
aluno, agora, necessita para prosseguir o seu desenvolvimento de uma forma harmoniosa,
precisamos de reunir informação sobre as realizações actuais do aluno nos diversos ambientes de
vida, as suas dificuldades específicas, o tipo e grau de deficiência e ainda sobre o seu meio
familiar e cultural, tendo sempre como referência a sua idade cronológica (Vieira, 1996: 93).
Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
© Fernanda Cardoso (2015) 109
Podemos, então, dizer que em todo este processo de avaliação importa recolher todos os dados que
nos permitam estabelecer com rigor quais são as reais necessidades e competências do aluno.
Competências, não tanto em termos de potencialidades, mas de desempenhos. Aliás, como refere
Ferreira (2008)20, na actualidade, salienta-se a necessidade de avaliar fundamentalmente o
desempenho actual do aluno e não o seu potencial (Ferreira, 2008:67).
Esta tarefa tão importante e complexa não pode ser levada a cabo exclusivamente pelo docente de
educação especial. Neste processo é obrigatório o envolvimento da família e outros técnicos
(médico, psicólogo, terapeutas…) cuja formação ou informação de que dispõem complementa a do
educador/professor. Como já referimos a legislação atual (Dec.-Lei n.º3/2008) prevê, para efeitos
da sua aplicabilidade, tendo por referência o Sistema de Classificação Internacional de
Funcionalidade, Incapacidade e Saúde da OMS (CIF, 2001) a constituição de equipas
pluridisciplinares. Estas, terão um papel fundamental no processo de avaliação, planificação e
recolha de informação dos alunos com necessidades educativas especiais.
Neste processo de recolha de informação a CIF parece apresentar algumas lacunas,
nomeadamente na subjetividade da avaliação e na ausência de instrumentos específicos para
determinadas categorias. Feita a avaliação pela equipa pluridisciplinar, e ultrapassadas as medidas
necessárias e legais, mormente aferindo-se que efetivamente o aluno apresenta Necessidades
Educativas Especiais de Carácter Permanente, passar-se-á à elaboração do Programa Educativo
Individual (PEI). Nele se identifica e caracteriza o aluno (assinalando indicadores de
funcionalidade e nível de aquisições e dificuldades), se registam os fatores ambientais que
funcionam como facilitadores ou barreiras, se discriminam os objetivos gerais e específicos a
atingir, assim como estratégias e recursos a utilizar, se precisa a orientação geral do respetivo
processo educativo, se definem e registam as medidas do regime educativo especial que são
aplicadas e se determinam os momentos de avaliação do próprio PEI.
As medidas educativas expressam-se da seguinte forma:
a) Apoio pedagógico personalizado;
b) Adequações curriculares individuais;
c) Adequações no processo de matrícula;
d) Adequações no processo de avaliação;
e) Currículo específico individual;
f) Tecnologias de apoio.
20 Ferreira (2008) desenvolveu um interessante estudo sobre o processo de transição destes jovens para a vida ativa.
Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
© Fernanda Cardoso (2015) 110
É importante salientar que as medidas previstas nas alíneas b) e e) não são cumuláveis entre si.
Na Educação Pré Escolar e no 1.ºCEB, aquele documento, é elaborado conjunta e obrigatoriamente
pelo docente titular de grupo ou turma, pelo encarregado de educação e sempre que se considere
necessário, pelo Departamento de Educação Especial e SPO. Carece da assinatura de todos os
participantes, assim como da aprovação do Conselho Pedagógico e homologação do Conselho
Executivo.
5.8 O papel da família
Historicamente, o papel atribuído aos pais foi mudando, de acordo com o que se foi pensando ser o
seu papel fundamental (Pereira, 1996). Atualmente, quer profissionais, quer os próprios pais
reconhecem e enfatizam o seu papel no sucesso educativo dos seus filhos, pois sabe-se que,
geralmente. Pereira (Ibidem) e outros autores, demonstraram que, o papel dos pais como
participantes ativos na educação dos seus filhos, sobretudo no caso de crianças com deficiência, é
um fator gerador de sucesso. Citando Pereira (1998), recordemo-nos que: Se queremos que o aluno
aprenda o que é necessário em situações do seu quotidiano de vida, em casa, na escola, nos seus
tempos livres, na comunidade, não é possível fazer programas sem o envolvimento das famílias
(Pereira, 1998:5). Reveste-se aqui de acrescido valor a Intervenção Precoce na Infância, que tem
como um dos principais objetivos, capacitar as famílias no sentido de melhor desempenharem o seu
papel nas interações que estabelecem com os seus filhos.
Por outro lado, também convém recordar que, frequentemente, os pais das crianças com problemas
necessitam de ajuda especial para estabelecer padrões adequados de interação com os filhos e para
lhes prestarem os cuidados e estimulação adequada.
Reconhecida a importância dos pais na educação dos seus filhos, é justo respeitar os seus direitos
que vinham sendo, desde há tempos reclamados. O Dec.-Lei n.º 319/91 recomendava “Um mais
explícito papel dos pais na orientação educativa dos seus filhos” e estabelecia formas de
participação e colaboração obrigatórias da família, havendo que cumprir estas diretivas e ampliar
os campos de cooperação (Pereira,1998). Esta autora aconselha a que os profissionais aproveitem
os “Apoios Naturais” que a comunidade oferece. Lembra ainda que os pais têm direito a ter a
possibilidade de legalmente escolher uma escola para os seus filhos. Compete aos técnicos
aconselhá-los, de forma isenta, e informá-los sobre os recursos disponíveis (Ladeira, 1999).
Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular
© Fernanda Cardoso (2015) 111
O Dec.-Lei n.º3/2008 de 7 de janeiro, dedica todo o seu Art.º3.º à “Participação dos pais e
encarregados de educação”, iniciando no ponto número 1 com a seguinte redação: os pais e
encarregados de educação tem o direito e o dever de participar activamente, exercendo o poder
paternal nos termos da lei, em tudo o que se relacione com a educação especial a prestar ao seu
filho acedendo a toda a informação constante no seu processo. Deste modo, esta legislação plasma
e invoca claramente o papel dos pais e encarregados de educação no processo educativo do aluno.
Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental
© Fernanda Cardoso (2015) 112
PARTE III
O professor para poder intervir no real de modo fundamentado, terá de saber observar e
problematizar. Intervir e avaliar serão acções consequentes das etapas precedentes (Estrela,
1986).
Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental
© Fernanda Cardoso (2015) 113
Capítulo VI – Organização e desenvolvimento do estudo experimental
Concluída a parte do trabalho, onde foi apresentada a informação considerada relevante para o
enquadramento teórico do presente estudo, inicia-se, aqui um novo capítulo cuja finalidade
consiste, sumariamente, em:
- Delimitar e definir o problema
- Identificar os objetivos do estudo
- Fundamentar e explicitar o processo de recolha de informação
- Sistematizar os resultados e principais reflexões
6.1 Justificação do estudo
Como bem sabemos, Exige-se aos professores o conhecimento de certas estratégias que
contribuam para alcançar o grande único objetivo estabelecido: facilitar ao aluno uma
aprendizagem significativa, dentro de um clima de motivação e esforço. Porém, como nos
encontramos perante uma impressionante diversidade de alunos, uma das grandes propostas
inovadoras apostou na abertura à diversidade e no prolongamento do prazo da educação
obrigatória. Todo o professor reflete permanentemente sobre esta abertura à sociedade , a todos
os tipos de crianças, com a bagagem que trazem consigo e que é fruto da sua família e do seu
ambiente socioeconómico. Coloca-se a si próprio uma destas três perguntas, ou talvez as três:
Que tipo de estratégias didáticas serão mais adequadas para facilitar ao máximo a
aprendizagem de todos e de cada um dos alunos?
Como organizar a escola de modo a acolher um determinado aluno?
Como assegurar a atenção individual e a atenção ao grupo-classe sem prejudicar
o avanço de nenhum dos dois? (Borrás,2001: 92-93).
Considerando-se a inclusão uma política da escola globalmente entendida, a gestão dos recursos
materiais e humanos da escola permitirá rentabilizar esses mesmos recursos de forma a responder a
necessidades e problemas que possam surgir e onde possam surgir.
Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental
© Fernanda Cardoso (2015) 114
Embora em teoria o professor de educação especial – por força da lei - já não tenha o mesmo
estatuto de outrora (na medida em que é o professor titular de turma quem coordena o PEI, na
prática ainda é ele quem, na grande maioria dos casos, desenvolve e gere todo um conjunto de
saberes multidisciplinares e articula diretamente com os restantes profissionais .
Face ao exposto e considerando a situação educativa atual em que as nossas funções profissionais
se desenvolvem, os Mega Agrupamentos que funcionam numa ótica de redução de recursos, as
equipas multidisciplinares que integram diferentes grupos de profissionais e os saberes
multidimensionais que são exigidos aos professores titulares de turma e de apoio especializado,
considerámos pertinente que este estudo se desenvolvesse partindo de uma reflexão mais profunda
– como, aliás se foi tentando ao longo de todo o documento – sobre a prática profissional docente,
quando colocada perante grupos de alunos tão heterogéneos ao nível da idade, dos níveis de
escolaridade e das diferenças físicas e intelectuais, que partilham a mesma sala de aula; dando uma
visão mais abrangente de alguns dos problemas reais com que a escola em geral se debate no
momento de dar o seu contributo para uma escola realmente inclusiva.
Porque já em diferentes momentos da nossa vida académica e profissional realizámos estudos21 que
versavam auscultar a perceção dos professores acerca da inclusão de alunos com NEE na sala de
aula de ensino dito regular, optámos, agora, por experienciar - como também já tem vindo a ser
debatido ao longo deste documento - como aluna estagiária as dificuldades que a inclusão coloca,
para podermos, com propriedade, ajuizar e ajudar a melhorar as práticas educativas. Como
inovação na nossa prática, optámos por seguir o que o próprio coração pedia e quisemos ouvir as
opiniões de outros profissionais, especificamente técnicos especializados, hoje tão implicados no
processo educativo de alunos com NEE e que incorporam as equipas multidisciplinares. Estamos a
referir-nos a psicólogos e terapeutas da fala.
6.2 Problemática
O carácter polémico de que se revestem os debates em curso sobre as vantagens da inclusão de
crianças com NEE na sala de aula do ensino dito regular (especificamente da criança com
21 Entre outros: - Projeto Final de Curso Pós-Graduação, de Formação Especializada em educação Especial (2002). Viseu: Universidade Católica Portuguesa. - Tese de Mestrado em Ciências da Educação – Domínio Cognitivo e Motor (2011). Viseu: Universidade Católica Portuguesa.
Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental
© Fernanda Cardoso (2015) 115
deficiência mental), e a realidades profissionais com que nos deparamos, suscitaram em nós o
desejo de nos debruçarmos sobre esta problemática.
Tendo sempre presente que a escola inclusiva não se limita só aos professores de apoio
especializado, mas pelo contrário, cada vez mais são atribuídas responsabilidades a um conjunto de
profissionais (professor do ensino regular, encarregados de educação, técnicos especializados,
assistentes operacionais…) considerámos fundamental sair da nossa zona de conforto e
direcionarmos, também, a nossa atenção para outros grupos profissionais, eventualmente com
menos destaque do que os docentes - no plano do que frequentemente é discutido no campo
educativo - mas nem por isso menos importantes no processo de inclusão destes alunos.
Tivemos, também, presente que o comportamento dos professores no processo de ensino, não pode
ser entendido sem se ter em consideração os contextos em que se insere. De facto a sua formação,
as condições de exercício profissional e as características da população escolar são elementos
importantes no quadro em que ele se move (Pereira, 1996).
A vasta revisão bibliográfica existente na área da inclusão revelou-nos que, na verdade, muitos são
os estudiosos que teoricamente se têm debruçado sobre o assunto, o que, entendemos nós, reforça e
justifica a atualidade e pertinência do tema. Pelo sobejo de informação, tornou-se mesmo
necessário fazer uma gestão da mesma, que considerámos adequada, na medida que nos orientámos
preferencialmente por autores de referência.
Contudo, cremos que a situação se inverte se pensarmos em trabalhos de investigação prática que
versem sobre a perceção que os diferentes profissionais (não docentes) têm sobre a problemática da
inclusão, pois ficamos com a ideia que estes existem em número bastante mais limitado.
Neste contexto, as importantes leituras realizadas despertaram-nos, num primeiro momento, para a
importante questão de partida, já identificada na Introdução do presente trabalho e que, tal como foi
referido, se desdobrou automaticamente em muitas outras que vieram a constituir o papel de guia
de toda a investigação.
6.3 Objetivos do estudo
Reafirmando o nosso desejo de construir uma cultura de resistência às desigualdades e à exclusão
escolar e social, aceitamos sensatamente que, no caminho a seguir os obstáculos serão muitos, mas
Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental
© Fernanda Cardoso (2015) 116
não serão impeditivos de darmos o nosso contributo no sentido de os ultrapassar e destruir. Neste
sentido, o nosso primeiro objetivo é identificá-los, procurando conhecer a realidade presente, pois
concordando com Freire (1979), quando o homem compreende a sua realidade, pode levantar
hipóteses sobre o desafio dessa realidade e procurar soluções (Freire, 1979:30).
Decorrente da pergunta inicialmente identificada como questão de partida, definimos o objetivo
geral já inicialmente identificado: Sistematizar informação sobre a prática educativa na inclusão de
alunos com Necessidades Educativas Especiais - especificamente quando portadores de deficiência
mental - em contexto de 1.ºCEB.
Como objetivos específicos definimos:
Refletir sobre as orientações educativas a considerar aquando da inclusão de alunos com
Necessidades Educativas Especiais integrados na Educação Pré-Escolar e no 1.º Ciclo do
Ensino Básico;
Identificar um conjunto de pressupostos fundamentais à implementação de uma escola
inclusiva;
Reconhecer a importância da educação inclusiva face a crianças com deficiência mental;
Auscultar o modo como duas técnicas especializadas percecionam as respostas educativas
existentes ao nível do caso específico de uma aluna com deficiência mental, integrada
numa escola de ensino regular do 1.º CEB e identificar elementos facilitadores e/ou
descobrir eventuais falhas ou entraves no processo de inclusão;
Refletir sobre a eficácia das respostas educativas canalizadas para uma criança com
deficiência mental.
Decorrente disto, assumimo-nos como agentes de mudança e propusemo-nos contribuir para
melhorar a inclusão de crianças com NEE, especificamente crianças com deficiência mental, e
ajudar os professores - naquilo que estiver ao nosso alcance - a tornarem-se agentes capazes de
enfrentar a diversidade de alunos nas escolas regulares.
Através da nossa reflexão e da auscultação dos profissionais atrás referenciados, queremos dar
conta dos problemas e das questões que se colocam aos sistemas de ensino quando procuram dar
resposta a todas as crianças nas suas comunidades; e que se alarguem os limites do conhecimento
existentes sobre esta matéria.
Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental
© Fernanda Cardoso (2015) 117
Após a clarificação dos objetivos definimos as questões a investigar no decurso do presente estudo,
que também já foram identificadas na Introdução do nosso trabalho. As mesmas encontram a sua
fundamentação na análise e conhecimentos fornecidos pela literatura especializada.
6.4 Opções metodológicas
Esclarecendo o significado de método, invocamos Desahaies (1992), quando se refere a método
como: Actividade do espírito que se apoia tanto na capacidade de raciocínio, de julgar e de
avaliar como nos procedimentos e práticas reconhecidas da investigação (Desahaies, 1992:112).
No ponto de partida da utilização de um método, colocam-se certos problemas fundamentais de
epistemologia que não podem se ignorados. Por isso, é importante tomarmos consciência de certas
condições prévias epistemológicas dos problemas de método e recordarmo-nos delas.
Uma das constatações é que, relativamente à essência do método, este proporciona uma direcção
do pensamento. Serve de guia, mas não substitui a intervenção do sujeito (Ibidem:126).
Provavelmente qualquer que seja a abordagem metodológica, deverá procurar-se uma explicação
em que se vai das partes para o todo e do todo para as partes, para tentar compreender o fenómeno
na sua globalidade.
Consoante os critérios epistemológicos específicos, os estudos de metodologia poderão seguir duas
formas: a indução ou a dedução (Carvalho, 2002:87) à qual corresponde respetivamente o método
indutivo ou dedutivo. Pela nossa parte não esquecemos o que a bibliografia especializada nos diz:
O dualismo dedutivo-indutivo, pode ser apenas teórico porque a ciência e o método científico
verdadeiro, reúnem intimamente os dois momentos num movimento recursivo em que o indutivo se
junta ao dedutivo e vice-versa (Desahaies, 1992:126).
No caso do nosso estudo, as opções metodológicas recaíram sobre o método qualitativo que se
baseia na descrição, numa teoria fundamentada, na indução e no estudo das perceções pessoais. É,
normalmente, o mais utilizado em questões de Educação, dado que O foco da investigação
qualitativa é (…) a compreensão mais profunda dos problemas: entender o que certos
comportamentos, atitudes ou convicções escondem (…) sendo portanto menos o rigor posto na
selecção da amostra e o maior cuidado colocado na generalização dos resultados (Sêco,
1997:112).
Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental
© Fernanda Cardoso (2015) 118
6.5 Técnicas de recolha de dados
Entendendo técnicas como procedimentos operacionais que servem de mediação prática para a
realização das pesquisas (Severino,2007:124); precisam sempre de ser compatíveis com os
métodos e paradigmas epistemológicos adotados. Parafraseando Fortin (1996) Como a
investigação pode incidir sobre uma variedade de fenómenos, requer o acesso a diversos métodos
de colheita de dados. A natureza do problema de investigação determina o tipo de método de
colheita de dados a utilizar (Fortin,1996:240).
Antes de empreender uma colheita de dados, o investigador deve perguntar-se se a informação que
quer colher com a ajuda de um instrumento de medida em particular é exatamente a que tem
necessidade para responder aos objetivos da sua investigação. Os dados podem ser colhidos de
diferentes formas junto dos sujeitos. Cabe ao investigador determinar o tipo de instrumento de
medida que melhor convém ao objecto de estudo (Ibidem:240). Uma vez determinadas as
informações que se pretendem recolher, é necessário elaborar uma estratégia de recolha de
informações. Estratégia que por sua vez, exige o recurso a métodos de recolha de informações,
considerando-se como métodos principais (Fortin,1996:240; Ketelle, s/d:18).
- A prática de entrevistas;
- A observação;
- O recurso a questionários;
- O estudo de documentos.
Ao lado destes quatro métodos, existe um certo número de outras técnicas, utilizadas para obter
informação. No entanto, pensamos ser conveniente – antes de avançarmos – esclarecer que a
diferente bibliografia consultada, refere que para obter informação é preciso observar. Nesta
sequência, note-se á partida que na observação, é possível distinguir duas formas: a observação
direta ou indireta (Deshaies, 1992:296). Na estratégia metodológica tivemos presente que Qualquer
metodologia deve ser escolhida em função dos objectivos da investigação, em função do tipo de
resultados esperados, do tipo de análises que desejamos efectuar (Albarello et. al.; 1995:50).
No nosso caso, considerando que pretendíamos obter informação de forma relativamente acessível
e rápida que nos permitisse ser analisada (para recolher dados descritivos na linguagem do próprio
sujeito), a opção recaiu na entrevista. Nesta decisão, teve também relevante peso o nosso passado
académico em que (para lá de outros estudos), aquando da especialização em educação especial e
mais tarde realização de mestrado, recorremos – em ambos os cursos - à aplicação do questionário
Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental
© Fernanda Cardoso (2015) 119
como instrumento para a recolha de dados. Por esse motivo, no início deste trabalho, aquando da
tomada de decisão sobre o estudo empírico - em que refletimos sobre as técnicas a utilizar -
sentimo-nos impulsionados pela curiosidade na utilização de uma nova técnica e pelos desafios daí
decorrentes. Apoiámo-nos na convicção forte de que seria uma experiência enriquecedora.
Na elaboração da entrevista, tivemos alguns cuidados prévios, nomeadamente: teve-se em conta a
motivação sobre as finalidades da investigação, os entrevistados foram oportunamente informados
do enquadramento e pertinência do estudo, ou seja, sobre a sua utilidade científica e social e
sensibilizados para isso; respeitando no entanto que, as pessoas não são obrigadas a responder e
encarando sempre a sua colaboração como uma atitude de cortesia. Foi construído um primeiro
documento que, após conhecimento aos entrevistados sofreu ligeiras adaptações; o vocabulário
empregue foi claro, adaptado ao público visado e com fórmulas muito simples de questões. O guião
de perguntas foi organizado tendo-se o cuidado de que não fosse constituído por um “corpo” de
perguntas demasiado longo e colocando questões abertas que davam a possibilidade de os
entrevistados darem sugestões, consideradas úteis para o tema em estudo. Depois de elaborado o
guião da entrevista, procedemos à sua validação, de forma a garantir a boa compreensão das
questões e que as respostas não se afastassem significativamente dos objetivos deste trabalho.
No complemento da informação recolhida para lá da entrevista, foi ainda realizada análise
documental (materiais escritos que podiam ser utilizados como fonte de informação); observação
participante; conversas informais e diário de campo (com registo das observações diretas e
participantes efetuadas e reservadas a uso exclusivamente pessoal). Reportando-nos à entrevista
enquanto método de técnica de recolha de dados, Bell (1997), acrescentou ainda que, mediante o
recurso à entrevista, o investigador pode aprofundar motivos e sentimentos, mas, não nos
poderemos no entanto esquecer dos inconvenientes que a aplicação da entrevista pressupõe. O
mesmo autor inventariou os seguintes inconvenientes:
- O consumo significativo de tempo;
- Elevada carga de subjetividade;
- Dificuldade de interpretação de algumas respostas;
- Possibilidade de as perguntas induzirem e influenciarem as respostas.
Situando-nos no nosso estudo, o tipo de entrevista utilizada foi semidiretiva, no sentido que foi
definida por Ghiglione & Matalon (1997), uma vez que permite, partindo dum quadro de referência
já existente, alargar o conhecimento prévio de que se dispõe. Tratou-se duma entrevista orientada
por objetivos, funcionando as perguntas como tópicos para o entrevistado desenvolver, onde o
entrevistador não assume um papel diretivo, mas apenas motivador das respostas. Este tipo de
Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental
© Fernanda Cardoso (2015) 120
entrevista é geralmente utilizado em estudos que procuram conhecer as perceções, atitudes e
motivações dos sujeitos relativamente a determinados assuntos, contribuindo para que se revelem
os aspetos mais valorizados e de maior significação para os entrevistados.
Relativamente a outros procedimentos adotados, importa referir que as entrevistas decorreram no
final do ano letivo em que decorreu o estágio (período em que o ritmo de trabalho dos diferentes
intervenientes já havia diminuído um pouco). As entrevistas ficaram registadas em suporte escrito,
dando assim, aos entrevistados a possibilidade de clarificar, explicitar, ou desenvolver alguns
assuntos ou ideias se assim o entendessem.
6.6 Apresentação e análise de conteúdo
Tendo recorrido à entrevista para recolha de informações, pareceu-nos coerente utilizar a análise de
conteúdo como técnica de análise de dados. A análise de dados é um processo de busca e de
organização sistemático de transcrições de entrevistas (…) com o objetivo de aumentar a sua
própria compreensão desses mesmos materiais e de lhe permitir apresentar aos outros aquilo que
encontrou (Bogdan & Biklen, 1994:205).
Vala (1986), afirmou que uma das vantagens da análise de conteúdo consiste em poder incidir
sobre material não estruturado como, por exemplo, as entrevistas abertas ou semiabertas.
Recolhida a informação através das entrevistas, fizemos a exploração dos discursos de cada uma.
Hesitámos em integrar as respostas das entrevistas no corpo do trabalho (pois sabemos que existe
alguma falta de consenso relativamente a este procedimento). No entanto, entendemos que, dadas
as caraterísticas da investigação, esta poderia ser a melhor forma para explicitar o seu conteúdo. O
mesmo é apresentado no quadro que se segue:
Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental
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Quadro 6: Registo das respostas às entrevistas
Questões 1.O que sabe sobre a gravidez e o historial da D. ?
Res
post
as Psicóloga Não tenho informação precisa.
Terapeuta da
Fala
Sei apenas que a D. e a irmã gémea C. nasceram da 3ª gravidez da mãe e que atualmente os pais estão separados. Desconheço qualquer
outro tipo de informação relevante.
Questões 2.Em que momento foi diagnosticada a deficiência mental? É conhecida a causa da deficiência?
Res
post
as Psicóloga
A deficiência foi diagnosticada em julho de 2012, após a realização de avaliação psicológica à aluna, no seguimento da sinalização
efetuada pela professora titular da turma. A deficiência mental é resultado de baixo desenvolvimento das estruturas ou funções mentais da
aluna, podendo haver várias causas para tal, nomeadamente a componente hereditária, a fraca estimulação ambiental.
Terapeuta da
Fala
Penso que em julho de 2012. A causa estará relacionada com questões hereditárias e ambientais (falta de estimulação).
Questões 3. Resumidamente, pode dizer quais são as principais caraterísticas evolutivas da deficiência mental?
Res
post
as Psicóloga
As crianças que apresentem deficiência cognitiva têm, comparativamente com outras crianças da mesma faixa etária, baixa maturação
intelectual. Isto pressupõe que, apesar das eventuais evoluções que apresentem, podendo fazer grandes progressos, não alcançarão o nível
de desenvolvimento considerado normativo. Não esquecer que estamos perante deficiências de carácter permanente. Ainda assim, e
dependendo do grau de deficiência, podem fazer aquisições académicas, podendo, em alguns casos, ser semelhantes ao seu grupo de pares,
tendo para tal de apresentar mais e melhor trabalho e estudo.
Terapeuta da
Fala
A deficiência mental é um problema de caráter permanente. Mesmo fazendo evoluções significativas, a nível académico, linguístico, etc, a
criança terá sempre um desenvolvimento aquém do esperado para a idade.
Questões 4.Em sua opinião, quais são as principais implicações educativas destes alunos
(neste caso específico da D.) na escola dita regular?
Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental
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Res
post
as Psicóloga
No momento de planificar a intervenção educativa, pensarmos na dificuldade na linguagem, nas relações, sociais, autonomia conhecer o
estado de desenvolvimento para melhor adequar a planificação….
Terapeuta da
Fala
Uma criança com NEE na Escola Regular implica a necessidade avaliar primeiro as suas competências para depois planificar a
intervenção educativa mais adequada.
Questões 5.Considera que estão a ser utilizadas estratégias de inclusão?
Res
post
as Psicóloga
A integração destas crianças, em turmas ditas regulares, pressupõe a ideia de inclusão. Todavia, elas são em muitos aspetos diferenciadas
dos restantes colegas (ex: medidas educativas diferentes, avaliação diferente, tpc diferentes). Ao fazê-lo estamos a transmitir a ideia de que,
de alguma forma, se trata de uma criança diferente. Esta ideia facilmente é apropriada pela própria criança e pelos restantes colegas.
Assistimos assim recorrentemente, nos intervalos das nossas escolas e até dentro da sala de aula, à diferenciação e distinção destas
crianças, que muitas vezes são apenas aceites e vistas como iguais, por outros que se encontram na mesma situação. Desta forma, que tipo
de inclusão estamos nós a praticar? Serão estas crianças felizes nas escolas ditas regulares? Ou estão apenas a serem obrigadas a
conviver com tantos que consideram diferentes? Tenho muitas dúvidas em relação a este tipo de inclusão...
Terapeuta da
Fala
Penso que sim. Estar integrada numa turma regular já é uma estratégia de inclusão. No entanto tenho algumas dúvidas acerca da eficácia
desta e de outras estratégias de inclusão.
Questões 6. Pode indicar reações da criança ao ambiente na sala de aulas?
Res
post
as Psicóloga
O que muitas vezes acontece com esta criança, e outras na situação dela, é que, como não conseguem de maneira nenhuma perceber e
acompanhar a matéria lecionada, incorrem numa crescente desmotivação e desinvestimento escolar. Como são obrigadas a estar sentadas
nos seus lugares, acabam por perturbar o normal funcionamento da aula. Ou então são muitas vezes ocupadas com tarefas e exercícios
imaturos e facilitistas, que não contribuem para o seu progresso.
Terapeuta da
Fala
A desmotivação e a falta de atenção/concentração parecem ser as principais reações que a D. manifesta em contexto de sala de aula. Este
tipo de reações poderá estar relacionado com o facto de a aluna não conseguir acompanhar o grupo ao nível dos conteúdos académicos.
Questões 7.Em sua opinião, esta criança é aceite pelo grupo? Como reagem as crianças à sua presença?
Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental
© Fernanda Cardoso (2015) 123
Res
post
as Psicóloga
De momento, a criança ainda vai conseguindo integrar-se nos intervalos e brincadeiras (com a ajuda da sua irmã que frequenta o mesmo
ano). Todavia, já ouve os comentários depreciativos dos colegas. Com o avançar da idade, e particularmente na mudança para o 2º ciclo,
esta discrepância vai sendo cada vez mais evidente.
Terapeuta da
Fala
Penso que sim. A maioria das crianças da turma e mesmo da Escola conhece a D. desde o 1º ano, o que faz com que atualmente esteja
integrada e seja aceite pelos colegas. Todavia, a partir do 2º ciclo as dificuldades de integração das crianças com NEE aumentam.
Questões 8.O que pensa sobre os recursos humanos e materiais que são atualmente disponibilizados para os alunos com deficiência mental no
ensino regular?
Res
post
as Psicóloga
Naturalmente são insuficientes! Particularmente os disponibilizados pelo Ministério da Educação (quer o número de profissionais, quer a
carga horária que lhes disponibiliza). Felizmente, a aluna, consegue beneficiar de recursos da Seg. Social que comportam as terapias que
tem tido nestes dois últimos anos.
Terapeuta da
Fala
Penso que os recursos humanos, disponibilizados pelo Ministério da Educação, são escassos. Considero que número de alunos atribuído
por Professor é excessivo, o que faz com que o tempo semanal dedicado a cada um seja insuficiente.
Questões 9.Sabe se a resposta educativa por parte da educação especial está a ser eficaz? Se pretender, refira dificuldades e evoluções.
Res
post
as Psicóloga
Neste tipo de deficiências, é sempre muito importante o apoio individualizado, quer pelas aprendizagens promovidas, quer pelo apoio e
conforto que transmite à criança. Ainda assim, e indo ao encontro da pergunta anterior, considero insuficiente o número de horas semanais
dispensadas a cada aluno.
Terapeuta da
Fala
Acredito no bom trabalho da Educação Especial, mas como referi na questão anterior, o tempo semanal dispensado pelo Professor parece-
me insuficiente.
Questões 10.Em termos de perspetivas para o futuro, até onde pensa que poderá evoluir esta criança?
Res
post
as
Psicóloga
Como já referi, a aluna vai fazendo as suas aquisições, sempre distantes das consideradas normativas para a sua faixa etária. Neste caso
concreto, penso ser possível que domine a capacidade de escrita e leitura, mais fluentemente. Mais importante que os conteúdos
curriculares, neste caso em concreto, penso que a escola assume o importante papel de a preparar para o mercado de trabalho e para as
Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental
© Fernanda Cardoso (2015) 124
exigências do seu dia a dia, sendo este o trabalho a realizar futuramente.
Terapeuta da
Fala
A D. ainda pode fazer aquisições académicas que lhe permitam futuramente alguma autonomia nas atividades de vida diária. Todavia será
incapaz de desempenhar funções, no mercado de trabalho, mais exigentes a nível mental.
Questões 11.Quais as dificuldades que vislumbra no percurso escolar e de vida desta aluna?
Res
post
as Psicóloga
A discriminação do seu grupo de pares (levando a um conjunto de consequências sociais e emocionais) e a crescente desmotivação e
desinvestimento escolar por parte da aluna.
Terapeuta da
Fala
As suas competências académicas, linguísticas, sociais, entre outras, estarão sempre aquém do esperado para idade, o que pode gerar
situações de desmotivação por parte da aluna e discriminação por parte do grupo de pares e futuramente da sociedade em geral
Questões 12.Quer anotar estratégias que possam contribuir para a inclusão dos alunos com deficiência mental no sistema educativo dito
regular?
Res
post
as Psicóloga
O apoio individualizado deve ser prestado exclusivamente na sala, juntamente com a sua turma, não havendo horários diferentes para
estes alunos (exceto no caso de alunos com cei). as notas e resultados escolares devem ser transmitidos de igual forma (mesmo que realize
testes diferentes), efetuando a correção e dando nota como aos colegas de turma.
Terapeuta da
Fala
Não…
Fonte: Elaboração própria
Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental
© Fernanda Cardoso (2015) 125
A análise documental, para além de ter como objetivo analisar a perceção das técnicas
especializadas face á deficiência mental em particular, teve como objetivo principal analisar a sua
perceção perante a inclusão em geral. Fizemo-lo com a consciência de que, nós próprios –
enquanto docentes de educação especial – éramos colocados à prova, como se pode depreender das
questões colocadas e das falas registadas. Vemos nisso não um entrave, mas sim um fator de
enriquecimento pessoal e profissional.
6.7 Principais ilações
Como principais ilações, relativas aos dados apresentados, poderemos apontar as seguintes:
Nesta situação específica, o diagnóstico da deficiência mental foi realizado numa fase
bastante adiantada da vida da aluna, aos 9 anos.
Esta constatação foi antecipada na revisão bibliográfica: frequentemente a DM, tem um diagnóstico
tardio, o que adia a intervenção de medidas necessárias e adequadas.
Diz-nos a literatura especializada que as caraterísticas evolutivas da deficiência mental
conduzem a que, à medida que a vida da criança se desenvolve, a discrepância do comportamento
adaptativo entre ela e os seus pares se acentue. Essa é também a visão das técnicas especializadas.
A integração e inclusão de um aluno com NEE na escola regular traz implicações
educativas que obrigam a planificações individualizadas. Num primeiro momento, a criança será
avaliada, são as suas competências e limitações que determinarão o tipo de planificação. Esta
planificação individualizada conduz-nos para a diferenciação curricular, mais acentuada, sobretudo
se se tratar de uma criança com um Currículo Específico Individual (CEI). Este ponto de vista foi,
também, enfatizado na revisão bibliográfica, como tivemos oportunidade de ver.
As estratégias de inclusão não são consideradas por todos os intervenientes de igual modo.
Inclusive são questionadas as “vantagens” de determinados alunos com NEE estarem integradas em
turmas de ensino regular. Esta diferença de pontos de vista enriquece o debate e solidifica algumas
questões que viemos colocando ao longo do presente relatório e se prendem com a problemática
que subjaz ao ideal de escola inclusiva.
No que respeita à reação da aluna em sala de aula a visão das técnicas especializadas
encaminha-se no sentido de que as dificuldades em acompanhar os conteúdos curriculares poderão
conduzi-la (à D. ou a outras crianças em situação idêntica) a alguma falta de atenção e
desmotivação. Na verdade, este é um dos problemas que a inclusão coloca: atender a todos, sem
descurar nenhum. Para que nenhum se sinta esquecido. Mas este ponto de vista poderá ser um
ideal. Ideal que norteará a realidade. Contudo, na prática, é também um dos maiores problemas que
Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental
© Fernanda Cardoso (2015) 126
a inclusão coloca. É um dos grandes desafios com que o professor se debate. Foi também abordado
este ponto de vista durante o nosso trabalho.
No que respeita à recetividade da turma face à D., as técnicas especializadas são de opinião
que de momento, ainda é aceite pelo grupo. Salientam como importante suporte a sua irmã. No
entanto, anteveem que com a passagem para o 2.ºCiclo esta situação se altere. Por também nós
valorizarmos, sobremaneira, a aceitação destas crianças pelos seus pares, lembramos que, tal como
foi oportunamente referido, o seu PEI previa a sua participação em todas as atividades da
turma/escola.
Quando questionadas sobre os recursos técnicos e humanos disponibilizados para esta
população escolar, as entrevistadas apontam, claramente, a sua insuficiência ao nível da educação
especial quer no número (esclarecendo que há muitos alunos na proporção professor/aluno), quer
nas horas disponibilizadas (que são poucas). Uma das entrevistadas enfatiza pela positiva o papel
da Segurança Social, que complementa a escassez de recursos. Estes aspetos vêm de encontro a
alguns dos pontos de vista que temos vindo a debater: a falta de recursos adequados pode ser um
entrave à escola inclusiva e o facto de trabalharem com os alunos equipas multidisciplinares,
especialistas de várias áreas do saber, deve ser objeto de reflexão da parte da educação; razão pela
qual nos propusemos auscultar técnicos especializados em vez de docentes.
No que respeita ao papel desenvolvido por parte da educação especial, as técnicas
especializadas relevam a importância do apoio individualizado quer pelas aprendizagens
desenvolvidas quer pelo conforto que é proporcionado à criança. Ainda assim, voltam a acentuar a
insuficiência do número de horas disponibilizadas para cada aluno.
Relativamente às expetativas para o futuro da D., as entrevistadas acreditam na aquisição
de competências académicas, mas salientam a importância de a aluna ser preparada para integrar o
mercado de trabalho desempenhando funções menos exigentes ao nível mental. A preocupação
com o futuro da população escolar portadora de NEE, tem vindo a merecer atenção crescente. Isso
é visível tanto a nível de debates televisivos como da promulgação de diferentes normativos legais
(lembramos que o Art.º14.º do dec.-Lei n.º3/2008 prevê um Plano Individual de Transição, iniciado
três anos antes da idade limite da escolaridade obrigatória que promova a adequada transição para a
vida pós-escolar dos alunos que apresentem dificuldades em seguir o currículo). No entanto, é
igualmente verdade que - apropriando-nos aqui de um sentimento muito pessoal – não poderemos
deixar de refletir sobre esta questão: Se até para os jovens ditos “normais”, o mercado de trabalho
se apresenta tão exigente e pouco generoso, que possibilidades dará aos jovens portadores de
NEE?
Por fim, a entrevistada que apontou possíveis estratégias para melhorar a inclusão dos alunos com
Deficiência Mental no ensino dito regular, referiu um conjunto de estratégias que pretendem
Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental
© Fernanda Cardoso (2015) 127
aproximar/normalizar o máximo possível aqueles alunos, dos seus pares dando como exemplo:
ensino proporcionado em ambiente de sala de aula e procedimentos iguais aos dos seus pares no
registo das avaliações.
6.8 Limitações do estudo
Esta investigação focaliza-se num caso específico incluído no grupo de crianças que integraram o
nosso estágio. Temos consciência da particularidade e das restrições várias que envolveram este
estudo e, como tal, a análise das respostas bem como as conclusões não podem ser generalizadas,
apenas poderão servir como suporte de reflexão e, eventualmente, conduzir a melhorias nas
práticas pedagógicas. Devem entender-se, tendo em conta condicionantes de diversa natureza.
As limitações do estudo são evidentes, mas, com humildade, consideramos que não diminuem a
solidez das informações apresentadas. O primeiro grande obstáculo terá sido o fator tempo cuja
escassez hoje perturba as mais diversas classes profissionais, e os professores não escapam a esta
situação. Esta condicionante conjugada com contextos profissionais exigentes e ambientes
familiares frágeis impedem à partida que se invista num Projeto mais ambicioso.
Uma outra condicionante, decorrente da primeira, terá sido o facto de, como já foi referido, o
estudo empírico ter poucas unidades de análise. Contudo, com modéstia, teremos presente o ponto
de vista de Ghiglione e Matalon (1997), quando nos referem que não existe qualquer método que
nos assegure, em todos os casos, uma amostra absolutamente representativa. Finalmente
reconhecemos que um tratamento estatístico mais elaborado das respostas, poderia enriquecer os
resultados apurados. Ainda assim, sem dúvida, conseguimos recolher os dados que
verdadeiramente nos interessavam para o nosso estudo.
6.9 Apresentação do estudo de caso
Embora tivéssemos, ao longo do trabalho realizado, refletido globalmente sobre todos os alunos
que integravam o nosso grupo de estágio, e apesar de, como já referimos, termos integrados na sala
de aula três alunos com NEE, a nossa proposta no âmbito das entrevistas realizadas, recaiu, apenas,
num dos casos que foi escolhido aleatoriamente. Após reflexão e auscultação das técnicas
especializadas, entendemos que, em boa verdade, poderia não ser muito produtivo para a
Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental
© Fernanda Cardoso (2015) 128
investigação a realização de três entrevistas, às mesmas pessoas, sobre uma mesma realidade
educativa já que o contexto institucional era rigorosamente o mesmo (a mesma escola e a mesma
turma).
Por outro lado, não entrevistámos a professora titular de turma porque a classe docente não estava
diretamente prevista no contexto deste estudo de campo, pois como foi oportunamente referido, já
em trabalhos anteriores havíamos realizado investigações abrangendo a inquisição a um grande
nível de população docente (professores do ensino regular e professores da educação especial). Do
mesmo modo, aceitamos que o leitor possa questionar se não seria interessante ouvir, também,
diretamente a opinião da encarregada de educação da aluna; contudo, igualmente, este aspeto fugia,
aqui, à especificidade dos dados que pretendíamos apurar. Acresce, o facto de considerarmos como
tema para um novo estudo, a possibilidade de auscultar os encarregados de educação do nosso
Agrupamento face à inclusão dos seus educandos com NEE.
Posto isto, passamos a apresentar a D., aluna na qual se centraram as entrevistas realizadas à
psicóloga e à terapeuta da fala. Os dados constantes no Roteiro de Avaliação com referência à CIF,
o seu PEI e outros documentos anexos ao processo individual permitiram-nos realizar a sua
caraterização sob o ponto de vista da história pessoal e escolar, e do trabalho com ela realizado em
contexto académico. Proporcionamos, ainda, informações relativas à sua situação atual.22
Deste modo, cumpre-nos informar que: aquando do momento da referenciação, ocorrido em 20 de
julho de 2012, para efeitos de elegibilidade no âmbito do Dec.-Lei n.º3/2008 de 7 de janeiro, foi
realizado em conformidade com a lei, a Planificação do Roteiro de Avaliação. Mais tarde, no início
do ano letivo 2012/2013 foi elaborado para a aluna o Programa Educativo Individual. No mesmo
processo (referenciação) constavam todos os diferentes passos nele previstos: Roteiro de
Avaliação; Descrição da Situação Educativa da Aluna; O que avaliar; Como avaliar; Checklist –
Funções do Corpo; Checklist – Atividade e Participação; Checklist – Fatores Ambientais e
Relatório Técnico Pedagógico. Anexo estava, também, o relatório psicológico que serviu de
importante pedra basilar ao desenrolar do processo.
Apresentam-se de seguida uma réplica do documento Descrição da Situação da Aluna, por, neste
contexto, ter sido o primeiro a ser organizado e reunir a informação relevante para ponto de partida,
e do Relatório Técnico Pedagógico, a parte que respeita ao Perfil de funcionalidade, por sintetizar
22 Acompanhámos o percurso da aluna até ao momento atual e podemos pronunciar-nos com total conhecimento de causa.
Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental
© Fernanda Cardoso (2015) 129
toda a informação recolhida durante o procedimento, registar a tomada de decisão e apontar as
medidas educativas.
Quadro 7: Descrição da situação da aluna
ROTEIRO DE AVALIAÇÃO
Nome: D. Idade: 9 anos
Data de Nascimento:
Ano de Escolaridade: 3º Escola: Póvoa do Mileu
DESCRIÇÃO DA SITUAÇÃO DA ALUNA
A D. está matriculada no 3.º ano, mas acompanha e desenvolve conteúdos ao nível do 1.º e do 2.º
ano a Língua Portuguesa. Só agora começa a ler textos muito simples, tendo dificuldade na
identificação e aplicação de casos de leitura e escrita de palavras e frases. Estas dificuldades
refletem-se em todas as suas aprendizagens precisando de ajuda para a realização de todas as
suas tarefas.
Em Estudo do Meio acompanhou os seus pares apenas no domínio oral, mas revelou muitas
dificuldades quer na aquisição quer na aplicação de conhecimentos.
Em Matemática trabalhou alguns conteúdos do 3.ºano e outros do 2.ºano mas, revela igualmente,
muitas dificuldades, principalmente no cálculo mental, resolução de situações problemáticas e
escrita e identificação de números. Também não conseguiu memorizar as tabuadas dadas.
Apresenta ainda falta de atenção/concentração e pouco interesse pela atividades escolares.
A nível comportamental tem dificuldade no cumprimento de regras, distrai-se e distrai os colegas
causando perturbação.
Apesar de todas as suas fichas de avaliação terem sido adaptadas ao seu nível de aprendizagem,
nem sempre foi autónoma na realização das mesmas necessitando de ajuda.
Foi-lhe elaborado um Plano de Recuperação, no entanto não foi suficiente para que a D.
desenvolvesse as competências necessárias à transição de ano, tendo ficado retida no 3.ºano de
escolaridade.
Na sequência das dificuldades diagnosticadas, foi proposto no ano letivo anterior
acompanhamento pelo Perito de Orientação Escolar do Agrupamento e neste ano letivo,
Avaliação Psicológica, cujo relatório foi colocado em anexo.
Fonte: Elaboração própria
Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental
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Quadro 8: Relatório Técnico Pedagógico
RELATÓRIO TÉCNICO-PEDAGÓGICO
(Por referência à CIF)
Perfil de Funcionalidade
1.Funções do corpo
Os testes psicológicos confirmam que se encontram comprometidas as seguintes funções:
Funções da orientação no espaço e no tempo; Funções intelectuais; Funções do temperamento e
da personalidade; Funções da atenção; Funções da memória; Funções emocionais; Funções da
perceção; Funções do pensamento; Funções cognitivas de nível superior; Funções mentais da
linguagem; Funções do cálculo; Funções da articulação.
Como tal, a sua problemática enquadra-se no Domínio Cognitivo.
2.Atividade e participação
Encontram-se comprometidos os seguintes qualificadores: Adquirir informação; Adquirir
conceitos; Aprender a ler; Aprender a escrever; Aprender a calcular; Concentrar a atenção;
Direcionar a atenção; Pensar; Resolver problemas; Levar a cabo uma tarefa única; Controlar o
seu próprio comportamento; Comunicar e receber mensagens escritas; Escrever mensagens;
Interações interpessoais básicas; Interações interpessoais complexas; Relacionamento formal;
Educação escolar; Vida escolar e atividades relacionadas.
3. Fatores ambientais
Os produtos e tecnologias para a educação surgem como facilitadoras, no seu
ensino/aprendizagem. Ao nível de apoio e relacionamentos, os conhecidos, professores e
membros da comunidade surgem como facilitadores. As professoras têm mantido uma atenção
especial às necessidades da aluna, colaborando e incentivando-a. O Perito de Orientação
Escolar e a Psicóloga foram um facilitador ao colaborarem no processo da aluna.
Fonte: Elaboração própria
Este Relatório Técnico Pedagógico veio confirmar a necessidade de a D. necessitar de intervenção
especializada em Educação Especial, referindo que A aluna apresenta um quadro
Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental
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cognitivo/emocional complexo que se traduz em fracos desempenhos escolares. Apresenta
limitações significativas na atividade e participação principalmente ao nível da leitura, da escrita
e também do cálculo (julho/2012).
Como já foi enunciado, o Relatório apontou, ainda, as adequações a realizar no processo de ensino
e de aprendizagem, com as respetivas medidas educativas. Estas, foram :
Artigo 17º - Apoio pedagógico personalizado;
Artigo 18º -Adequações curriculares individuais (em todas as áreas);
Artigo 20º Adequações no processo de avaliação (a todas as disciplinas);
- Tipo de prova;
- Instrumentos de avaliação e certificação;
- Formas e meios de comunicação;
- Periodicidade;
- Local.
Artigo 22 º Tecnologias de apoio.
Propunha, também, que a aluna beneficiasse de turma reduzida de acordo com o disposto no ponto
2 do art.12º do Dec.Lei 3/2008, conjugado com o ponto 5.4 do Desp. nº 14026/2007 e de
acompanhamento a nível de estimulação psicológica. Estas importantes orientações foram
consideradas quando o PEI foi elaborado e implementado, no início do ano letivo seguinte, como já
foi mencionado. De igual modo, nele, foram definidos (e clarificados) os seguintes conteúdos a
desenvolver: Emocional/Comportamental; Autonomia Pessoal e Social; Leitura; Escrita e Cálculo.
O mesmo documento previa ainda que a D. participaria em todas as actividades escolares,
respeitando as suas limitações e valorizando as suas competências. Participará em todas as visitas
de estudo e passeios da sua turma, desde que mostre interesse e a Encarregada de Educação
autorize (PEI 2012/2013).
Mais tarde viria, ainda, a solicitar-se e conceder-se intervenção ao nível da terapia da fala. Por
outro lado, cumpre esclarecer que o Perito de Orientação Escolar terminou a sua intervenção a
partir do momento em que a aluna foi integrada na educação especial, sendo, assim, acompanhada
pela psicóloga. Este procedimento é habitual nos normativos da escola.
Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental
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6.10 Situação educativa atual23
Como a aluna conseguiu - com as medidas educativas propostas - atingir os objetivos definidos,
não se verificou necessidade de recorrer a outras mais restritivas e no ano letivo em curso à data da
PES, a sua escolarização foi feita como já referimos, no âmbito da educação especial, nas
condições atrás previstas.
A D. revelou estar bem integrada na sala de aula e acompanhou os pares em todas as atividades
propostas para a turma. O desenvolvimento do seu plano de estudos impôs muita flexibilização e
estratégias diversificadas, bem como adequada articulação tanto da parte das discentes que a
acompanharam, como da parte da psicóloga e da terapeuta da fala. Assim, o ano letivo foi
concluído com êxito24.
Naturalmente que não foi alheio a este sucesso a postura da aluna (que tem desenvolvido atitudes
cada vez mais positivas, e tem manifestando empenho e vontade crescente em participar nas tarefas
propostas), a recetividade dos pares, o esforço e envolvimento dos diferentes agentes educativos
que ultrapassaram barreiras e acreditaram nas suas competências. Também a Encarregada de
Educação, colaborou com a escola, dentro das suas limitadas possibilidades, no desenvolvimento
do processo escolar.
Assim, relativamente à eficácia da resposta educativa encontrada, os dados demonstram que a
evolução da criança foi muito significativa, constatação esta que acompanhámos muito de perto25,
durante um longo período de tempo, e com a qual nos congratulamos profundamente. No entanto,
em nome da verdade, cumpre dizer que a implementação da diferenciação curricular, que se
manifesta imprescindível para alunos com patologias específicas e a adequada gestão pedagógica
em sala de aula, não são caminhos fáceis de percorrer.
23 A informação reporta-se a ao momento do final da PES. 24 Lembramos que podemos dar-nos a possibilidade de fazer uma avaliação de final de ano letivo porque a
conclusão da nossa PES coincidiu com o final do mesmo. 25Apesar de sabermos que esta informação ultrapassa o âmbito deste trabalho (embora acreditemos que o
leitor ficará agradado em a saber), não podemos deixar de referir que acompanhámos a aluna durante um
longo período de tempo subsequente à nossa PES e tivemos a possibilidade de acolher o feed back do seu
desenvolvimento pessoal e académico que foi muito satisfatório.
Conclusões
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Conclusões
Como escreveu Shakespeare,
há quem diga que todas as noites são de sonhos. Mas há também quem garanta que nem todas, só
as de verão. Mas no fundo isso não tem muita importância. O que interessa mesmo não são as
noites em si, são os sonhos. Sonhos que o homem sonha sempre.
William Shakespeare
Chegados ao terminus desta caminhada, urge agora reunir as principais ideias-base que as leituras
efetuadas e o estudo empírico nos ajudaram a construir ao longo deste trabalho. No quadro das
informações recolhidas a primeira grande ilação a retirar é que a realização deste Curso de
Mestrado foi profundamente enriquecedora. Temos consciência de ter encontrado aqui uma
oportunidade singular na reflexão e aprofundamento de diferentes saberes relativamente à
Educação Pré-Escolar e ao 1.º Ciclo do Ensino Básico, dos quais, em termos de formação contínua,
temos andado bastante alheados, há que dizê-lo.
Por um lado, o Curso de Mestrado conduziu-nos para uma perspetiva crítica e reflexiva, permitiu-
nos compreender melhor o papel do professor do ensino regular e aperfeiçoar a nossa atuação
pedagógica, tendo sempre presente a realidade educativa, mormente quando na sala de aula
coexistem mais do que um ano de escolaridade e alunos com Necessidades Educativas Especiais.
Deu-nos, assim, a possibilidade de refletir “na ação” e “sobre a ação” que converge na partilha e
troca de experiencias pedagógicas entre os docentes, aproveitando e valorizando as boas práticas e
a experiência com carater prospetivo e de futuro. Neste contexto, pretende-se caminhar,
essencialmente, para uma melhoria da qualidade das Práticas Pedagógicas, na reflexão para a
“ação”, que queremos cada vez mais eficaz, através de Práticas mais profícuas, promotoras,
rentáveis e de sucesso (não só escolar, mas também de vida).
Pelo outro, ajudou-nos a firmar a ideia de que a educação inclusiva, não é um evento, mas sim um
processo; processo este que assentou as suas bases em valores de democracia, da justiça social e da
solidariedade, que desde a segunda metade do século XX impuseram, progressivamente, o
reconhecimento da educabilidade de todas as pessoas e o direito de todos à educação.
O problema consiste agora, em se encontrarem meios de organizar as escolas, e as salas de aula, de
modo a que todos os alunos – mesmo os que têm problemáticas mais complexas, como é o caso da
deficiência mental – tenham sucesso nas aprendizagens e evoluam rumo a uma plena inclusão na
Conclusões
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escola, na sociedade e na vida. Tendo como referência este tipo de conceptualização, quisemos
também nós dar o nosso humilde contributo, fornecendo pistas sobre a forma como as condições
necessárias a uma mais adequada gestão das respostas educativas especializadas aos alunos com
NEE, podem ser criadas e/ou melhoradas. Tenhamos presente que O paradigma emergente da
inclusão assenta em ideais de Humanismo, mas também em estudos realizados por pessoas e
grupos legitimados por um conhecimento patenteado (Carvalho, 2000:16).
Neste contexto – e sem termos qualquer tipo de pretensão – é importante que também este nosso
estudo seja visto numa perspetiva em que o papel das diferentes respostas educativas seja encarado
como parte do processo de melhoramento da inclusão das crianças com NEE, e que se alarguem os
limites do conhecimento existente; especificamente no que respeita à problemática da deficiência
mental. Acreditamos que as possibilidades de concretização da escola inclusiva poderão ser
possíveis; mas reafirmamos que são problemáticas. Se não fosse assim, provavelmente não se
falaria tanto dela. Exigem mudanças e ainda há um longo caminho para percorrer, mas como nos
diz Ladeira (1999), depende de nós iniciar o processo dessa mudança que se impõe.
Situando o contributo deste nosso estudo, na moldura das informações recolhidas, e a partir dele, o
reconhecimento das dificuldades experimentadas na implementação da escola inclusiva, diremos
que, o mesmo, pode fornecer uma humilde colaboração no plano de ação para a mudança e, de fato,
conduzir à perceção do modo como a implementação das políticas inclusivas podem ser levadas a
cabo. Esta abordagem pode funcionar como indicador de necessidades, com vista à melhoria da
escola no seu todo. Como já admitimos, não se podem generalizar os dados por serem insuficientes,
contudo espera-se que (mesmo não se resolvendo o problema) se possa conduzir à discussão
esclarecida desta questão: Quais os principais obstáculos que se colocam à escola, quando procura
dar resposta a todas as crianças – especificamente à criança portadora de deficiência mental – e
como poderemos dar o nosso contributo para minimizar esta problemática?
O CNE (1999) enuncia como “um vasto conjunto de condições indispensáveis”: mudanças
jurídico-legislativas; mudanças organizativas e de gestão ao nível das escolas; mudanças ao nível
do professor e de outros intervenientes; apoio aos alunos numa perspetiva de escolarização para
todos; mudanças ao nível da natureza e da estrutura do currículo, mudanças no modelo de apoio
individual aos alunos.
Ainda na prossecução desse ideal apontamos outros caminhos que poderão constituir-se como
novos focos de estudo e surgem fruto do contributo desta investigação, mas não tiveram nela o
destaque merecido. Nomeadamente: tendo em conta a relevância que o envolvimento familiar
Conclusões
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assume na construção da verdadeira escola inclusiva, seria interessante questionar as famílias das
crianças com NEE sobre o que pensam ser necessário para que a inclusão dos seus filhos se
processe da melhor forma possível.
Para já, concluímos este nosso trabalho acreditando que, em síntese, apontámos ideias
fundamentais a reter como moldura necessária para o desenvolvimento de uma verdadeira escola
inclusiva. Por essa via, modestamente, acreditamos que conseguimos com o nosso estudo atingir os
objetivos propostos, quer através da nossa fundamentação teórica (que deu praticamente todas as
respostas para a problemática abordada), quer com a parte prática que constituiu o estudo de
campo.
Encerramos com uma abrangente reflexão: Felizmente sob o ponto de vista teórico, existe consenso
quanto à necessidade de criar condições favoráveis à educação para todos. Na prática de entre os
muitos obstáculos que se levantam, o maior será a atual crise económica mundial (Baptista:2011).
Pela nossa parte, faremos tudo o que está ao nosso alcance para eliminar ou minimizar os
obstáculos que daí decorrerem.
E porque …
A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios.
Por isso, cante, chore, ria e viva intensamente, antes que a cortina se feche e a peça termine sem
aplausos.
Charlie Chaplin
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Decreto-Lei n.º319/91 de 23 de agosto.
Decreto-Lei n.º20/2006 de 31 de janeiro.
Decreto-Lei n.3/2008 de 7 de janeiro.
Decreto-Lei n.º147/97 de 11 de junho.
Decreto-Lei n.º241/2001 de 30 de agosto.
Decreto-Lei n.º75/2008 de 22 de abril.
Decreto-Lei n.º6/2011 de 18 de janeiro.
Despacho normativo n.º50/2005 de 9 de novembro.
Despacho conjunto n.º105/97 de 1 de julho.
Despacho N.º9590/99 de 14 de maio.
Despacho n.º11120 – A/2010 de 6 de julho.
Lei n.º 46/86 de 14 de Outubro (LSBE).
Referências Bibliográficas
© Fernanda Cardoso (2015) 145
Lei n.º5/97 de 10 de fevereiro.
Lei n.º 11-A/2013 de 28 de janeiro.
Lei n.º 49/2005 de 30 de agosto.
Portaria n.º611/93 de 29 de junho.
Portaria n.º293/2013 de 26 de setembro.
Relatórios
Report of the Warnock Commitee of Enquiry into the Education of Handicapped Chilren Young
People (1978).
Declaração Salamanca: http://unesdoc.unesco.org/images/0009/000984/098427Eo.pdf
Relatório Integral – Janeiro 2011. Pobreza e Exclusão Social. Eurobarometro.
CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO (1999). Crianças e alunos com Necessidades
Educativas Especiais – Parecer nº3/99. Diário da República II.ª Série, nº40.
Entrevista Psicóloga
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ENTREVISTA - GUIÃO
1- O QUE SABE SOBRE A GRAVIDEZ E O HISTORIAL DA D.?
2- EM QUE MOMENTO FOI DIAGNOSTICADA A DEFICIÊNCIA MENTAL? É CONHECIDA A CAUSA DA DEFICIENCIA?
3- RESUMIDAMENTE, PODE DIZER QUAIS SÃO AS PRINCIPAIS CARATERÍSTICAS EVOLUTIVAS DA DEFICIÊNCIA MENTAL?
4- EM SUA OPINIÃO, QUAIS SÃO AS PRINCIPAIS IMPLICAÇÕES EDUCATIVAS DESTES ALUNOS NA ESCOLA DITA REGULAR?
5- CONSIDERA QUE ESTÃO A SER UTILIZADAS ESTRATÉGIAS DE INCLUSÃO?
6- PODE INDICAR REAÇÕES DA CRIANÇA AO AMBIENTE NA SALA DE AULAS?
A P R E S E NT E E NT R E VIS TA INS E R E - S E NO ÂM BIT O DE UM
E S T UDO, C UJ A T E M ÁT IC A VE R S A A I NC L US ÃO D E AL UN OS C O M
DE F IC IÊ NC I A M E NTAL ( DM ) NO 1 . º C E B E M E S C OL AS DE E NS IN O
R E G UL AR . T E M C OM O P R INC IPAL OBJ E T I VO C ON HE C E R AS
P E R C E Ç ÕE S DOS P R OF IS S IONAIS QUE INT E RVÊ M J UNT O D E
AL UN OS C OM E S TA P R O B L E M ÁT IC A.
Entrevista Psicóloga
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7- EM SUA OPINIÃO, ESTA CRIANÇA É ACEITE PELO GRUPO? COMO REAGEM AS CRIANÇAS À SUA PRESENÇA?
8- O QUE PENSA SOBRE OS RECURSOS HUMANOS E MATERIAIS QUE SÃO
ATUALMENTE DISPONIBILIZADOS PARA OS ALUNOS COM DEFICIÊNCIA MENTAL NO ENSINO REGULAR?
9- SABE SE A RESPOSTA EDUCATIVA POR PARTE DA EDUCAÇÃO ESPECIAL ESTÁ A SER EFICAZ? SE PRETENDER, REFIRA DIFICULDADES E EVOLUÇÕES.
10- EM TERMOS DE PERSPETIVAS PARA O FUTURO, ATÉ ONDE PENSA QUE PODERÁ EVOLUIR ESTA CRIANÇA?
11- QUAIS AS DIFICULDADES QUE VISLUMBRA NO PERCURSO ESCOLAR E DE VIDA DESTA ALUNA?
12- QUER ANOTAR ESTRATÉGIAS QUE POSSAM CONTRIBUIR PARA A INCLUSÃO DOS ALUNOS COM DEFICIÊNCIA MENTAL NO SISTEMA EDUCATIVO DITO REGULAR?
MUITO OBRIGADA PELO SEU CONTRIBUTO.
Autorização
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AUTORIZAÇÃO
Autorizo a realização das entrevistas programadas.
As entrevistas têm como objetivo a recolha de dados para a
realização de um Estudo de Caso sob o tema “Inclusão de alunos com
deficiência mental no 1.º CEB – Um estudo de caso”, no âmbito de um
Mestrado em Educação Pré-Escolar /1º Ciclo do Ensino Básico.
Em:
___/____/____
Entrevista Psicóloga
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ENTREVISTA - PSICÓLOGA
1- O QUE SABE SOBRE A GRAVIDEZ E O HISTORIAL DA D.?
Não tenho informação precisa.
2- EM QUE MOMENTO FOI DIAGNOSTICADA A DEFICIÊNCIA MENTAL? É CONHECIDA A CAUSA DA DEFICIENCIA?
A deficiência foi diagnosticada em julho de 2012, após a realização de
avaliação psicológica à aluna, no seguimento da sinalização efetuada pela
professora titular da turma. A deficiência mental é resultado de baixo
desenvolvimento das estruturas ou funções mentais da aluna, podendo haver várias
causas para tal, nomeadamente a componente hereditária, a fraca estimulação
ambiental.
3- RESUMIDAMENTE, PODE DIZER QUAIS SÃO AS PRINCIPAIS
CARATERÍSTICAS EVOLUTIVAS DA DEFICIÊNCIA MENTAL?
As crianças que apresentem deficiência cognitiva têm, comparativamente com
outras crianças da mesma faixa etária, baixa maturação intelectual. Isto pressupõe
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E S T UDO, C UJ A T E M ÁT IC A VE R S A A I NC L US ÃO DE AL UN OS C OM
DE F IC IÊ NC I A M E NTAL N O 1 . º C E B E M E S C OL AS DE E NS IN O
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Entrevista Psicóloga
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que, apesar das eventuais evoluções que apresentem, podendo fazer grandes
progressos, não alcançarão o nível de desenvolvimento considerado normativo.
Não esquecer que estamos perante deficiências de carácter permanente. Ainda
assim, e dependendo do grau de deficiência, podem fazer aquisições académicas,
podendo, em alguns casos, ser semelhantes ao seu grupo de pares, tendo para tal
de apresentar mais e melhor trabalho e estudo.
4- EM SUA OPINIÃO, QUAIS SÃO AS PRINCIPAIS IMPLICAÇÕES
EDUCATIVAS DESTES ALUNOS (NESTE CASO ESPECÍFICO DA D.) NA ESCOLA DITA REGULAR?
No momento de planificar a intervenção educativa, pensarmos na dificuldade
na linguagem, nas relações, sociais, autonomia, linguagem…conhecer o estado de
desenvolvimento para melhor adequar a planificação….
5- CONSIDERA QUE ESTÃO A SER UTILIZADAS ESTRATÉGIAS DE INCLUSÃO?
A integração destas crianças, em turmas ditas regulares, pressupõe a ideia de
inclusão. Todavia, elas são em muitos aspetos diferenciadas dos restantes colegas
(ex: medidas educativas diferentes, avaliação diferente, TPC diferentes). Ao fazê-lo
estamos a transmitir a ideia de que, de alguma forma, se trata de uma criança
diferente. Esta ideia facilmente é apropriada pela própria criança e pelos restantes
colegas. Assistimos assim recorrentemente, nos intervalos das nossas escolas e até
dentro da sala de aula, à diferenciação e distinção destas crianças, que muitas
vezes são apenas aceites e vistas como iguais, por outros que se encontram na
mesma situação. Desta forma, que tipo de inclusão estamos nós a praticar? Serão
estas crianças felizes nas escolas ditas regulares? Ou estão apenas a serem
obrigadas a conviver com tantos que consideram diferentes? Tenho muitas dúvidas
em relação a este tipo de inclusão...
6- PODE INDICAR REAÇÕES DA CRIANÇA AO AMBIENTE NA SALA DE AULAS?
Entrevista Psicóloga
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O que muitas vezes acontece com esta criança, e outras na situação dela, é que,
como não conseguem de maneira nenhuma perceber e acompanhar a matéria
lecionada, incorrem numa crescente desmotivação e desinvestimento escolar.
Como são obrigadas a estar sentadas nos seus lugares, acabam por perturbar o
normal funcionamento da aula. Ou então são muitas vezes ocupadas com tarefas e
exercícios imaturos e facilitistas, que não contribuem para o seu progresso.
7- EM SUA OPINIÃO, ESTA CRIANÇA É ACEITE PELO GRUPO? COMO REAGEM AS CRIANÇAS À SUA PRESENÇA?
De momento, a criança ainda vai conseguindo integrar-se nos intervalos e
brincadeiras (com a ajuda da sua irmã que frequenta o mesmo ano). Todavia, já
ouve os comentários depreciativos dos colegas. Com o avançar da idade, e
particularmente na mudança para o 2º ciclo, esta discrepância vai sendo cada vez
mais evidente.
8- O QUE PENSA SOBRE OS RECURSOS HUMANOS E MATERIAIS QUE SÃO ATUALMENTE DISPONIBILIZADOS PARA OS ALUNOS COM DEFICIÊNCIA MENTAL NO ENSINO REGULAR?
Naturalmente são insuficientes! Particularmente os disponibilizados pelo
Ministério da Educação (quer o número de profissionais, quer a carga horária que
lhes disponibiliza). Felizmente, a aluna, consegue beneficiar de recursos da Seg.
Social que comportam as terapias que tem tido nestes dois últimos anos.
9- SABE SE A RESPOSTA EDUCATIVA POR PARTE DA EDUCAÇÃO ESPECIAL ESTÁ A SER EFICAZ? SE PRETENDER, REFIRA DIFICULDADES E EVOLUÇÕES.
Neste tipo de deficiências, é sempre muito importante o apoio individualizado,
quer pelas aprendizagens promovidas, quer pelo apoio e conforto que transmite à
criança. Ainda assim, e indo ao encontro da perg. anterior, considero insuficiente
o número de horas semanais dispensadas a cada aluno.
Entrevista Psicóloga
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10- EM TERMOS DE PERSPETIVAS PARA O FUTURO, ATÉ ONDE PENSA QUE PODERÁ EVOLUIR ESTA CRIANÇA?
Como já referi, a aluna vai fazendo as suas aquisições, sempre distantes das
consideradas normativas para a sua faixa etária. Neste caso concreto, penso ser
possível que domine a capacidade de escrita e leitura, mais fluentemente. Mias
importante que os conteúdos curriculares, neste caso em concreto, penso que a
escola assume o importante papel de a preparar para o mercado de trabalho e
para as exigências do seu dia a dia, sendo este o trabalho a realizar futuramente.
11- QUAIS AS DIFICULDADES QUE VISLUMBRA NO PERCURSO ESCOLAR E DE VIDA DESTA ALUNA?
A discriminação do seu grupo de pares (levando a um conjunto de
consequências sociais e emocionais) e a crescente desmotivação e desinvestimento
escolar por parte da aluna.
12- QUER ANOTAR ESTRATÉGIAS QUE POSSAM CONTRIBUIR PARA A INCLUSÃO DOS ALUNOS COM DEFICIÊNCIA MENTAL NO SISTEMA EDUCATIVO DITO REGULAR?
O apoio individualizado deve ser prestado exclusivamente na sala, juntamente
com a sua turma, não havendo horários diferentes para estes alunos (exceto no
caso de alunos com CEI). As notas e resultados escolares devem ser transmitidos
de igual forma (mesmo que realize testes diferentes), efetuando a correção e dando
nota como aos colegas de turma.
MUITO OBRIGADA PELO SEU CONTRIBUTO.
Entrevista Terapeuta da Fala
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ENTREVISTA - TERAPEUTA DA FALA
1- O QUE SABE SOBRE A GRAVIDEZ E O HISTORIAL DA D. ?
Sei apenas que a D. e a irmã gémea C. nasceram da 3ª gravidez da mãe e que
atualmente os pais estão separados. Desconheço qualquer outro tipo de
informação relevante.
2- EM QUE MOMENTO FOI DIAGNOSTICADA A DEFICIÊNCIA MENTAL? É CONHECIDA A CAUSA DA DEFICIENCIA?
Penso que em julho de 2012. A causa estará relacionada com questões
hereditárias e ambientais (falta de estimulação).
3- RESUMIDAMENTE, PODE DIZER QUAIS SÃO AS PRINCIPAIS CARATERÍSTICAS EVOLUTIVAS DA DEFICIÊNCIA MENTAL?
A deficiência mental é um problema de caráter permanente. Mesmo fazendo
evoluções significativas, a nível académico, linguístico, etc, a criança terá sempre
um desenvolvimento aquém do esperado para a idade.
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Entrevista Terapeuta da Fala
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4- EM SUA OPINIÃO, QUAIS SÃO AS PRINCIPAIS IMPLICAÇÕES EDUCATIVAS DESTES ALUNOS (NESTE CASO ESPECÍFICO DA D.) NA ESCOLA DITA REGULAR?
Uma criança com NEE na Escola Regular implica a necessidade avaliar
primeiro as suas competências para depois planificar a intervenção educativa mais
adequada.
5- CONSIDERA QUE ESTÃO A SER UTILIZADAS ESTRATÉGIAS DE INCLUSÃO?
Penso que sim. Estar integrada numa turma regular já é uma estratégia de
inclusão. No entanto tenho algumas dúvidas acerca da eficácia desta e de outras
estratégias de inclusão.
6- PODE INDICAR REAÇÕES DA CRIANÇA AO AMBIENTE NA SALA DE AULAS?
A desmotivação e a falta de atenção/concentração parecem ser as principais
reações que a D. manifesta em contexto de sala de aula. Este tipo de reações
poderá estar relacionado com o facto de a aluna não conseguir acompanhar o
grupo ao nível dos conteúdos académicos.
7- EM SUA OPINIÃO, ESTA CRIANÇA É ACEITE PELO GRUPO? COMO REAGEM AS CRIANÇAS À SUA PRESENÇA?
Penso que sim. A maioria das crianças da turma e mesmo da Escola conhece a D. desde o 1º ano, o que faz com que atualmente esteja integrada e seja aceite pelos colegas. Todavia, a partir do 2º ciclo as dificuldades de integração das crianças com NEE aumentam.
8- O QUE PENSA SOBRE OS RECURSOS HUMANOS E MATERIAIS QUE SÃO ATUALMENTE DISPONIBILIZADOS PARA OS ALUNOS COM DEFICIÊNCIA MENTAL NO ENSINO REGULAR?
Penso que os recursos humanos, disponibilizados pelo Ministério da Educação, são escassos. Considero que número de alunos atribuído por Professor é excessivo, o que faz com que o tempo semanal dedicado a cada um seja insuficiente.
Entrevista Terapeuta da Fala
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9- SABE SE A RESPOSTA EDUCATIVA POR PARTE DA EDUCAÇÃO ESPECIAL ESTÁ A SER EFICAZ? SE PRETENDER, REFIRA DIFICULDADES E EVOLUÇÕES.
Acredito no bom trabalho da Educação Especial, mas como referi na questão
anterior, o tempo semanal dispensado pelo Professor parece-me insuficiente.
10- EM TERMOS DE PERSPETIVAS PARA O FUTURO, ATÉ ONDE PENSA QUE PODERÁ EVOLUIR ESTA CRIANÇA?
A D. ainda pode fazer aquisições académicas que lhe permitam futuramente
alguma autonomia nas atividades de vida diária. Todavia será incapaz de
desempenhar funções, no mercado de trabalho, mais exigentes a nível mental.
11- QUAIS AS DIFICULDADES QUE VISLUMBRA NO PERCURSO ESCOLAR E DE VIDA DESTA ALUNA?
As suas competências académicas, linguísticas, sociais, entre outras, estarão
sempre aquém do esperado para idade, o que pode gerar situações de
desmotivação por parte da aluna e discriminação por parte do grupo de pares e
futuramente da sociedade em geral.
12- QUER ANOTAR ESTRATÉGIAS QUE POSSAM CONTRIBUIR PARA A INCLUSÃO DOS ALUNOS COM DEFICIÊNCIA MENTAL NO SISTEMA EDUCATIVO DITO REGULAR?
Não…
MUITO OBRIGADA PELO SEU CONTRIBUTO.