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MINISTROTHOMPSON FLORESDISCURSOS PROFERIDOS NO STF,
NA SESSÃO DE 11 DE MARÇO DE 1981
POR MOTIVO DE SUA APOSENTADORIA
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
BRASÍLIA – 1981
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
CARLOS THOMPSON FLORES
Discursos proferidos no STF,
a / / de março de /98/,
por motivo de sua aposentadoria
BRASÍLIA
1981
A primeira parte desta sessão é dedicada à homenagem que o Supremo Tribunal Federal presta, hoje, obediente à tradição e submisso ao sentimento unânime de seus juízes, ao eminente Ministro Carlos Thompson Flores, por motivo de sua recente aposentadoria.
Desculpou-se Sua Excelência de não poder, por motivos emocionais compreensíveis, estar presente à solenidade, e credenciou, para nela representá-lo, seus ilustres primos Ministro Francisco Thompson Flores, cujo comparecimento anuncio e agradeço, e Coronel Armando de Paiva Chaves, que não pôde comparecer por estar ausente de Brasília, integrando a comitiva que acompanha o Presidente da República em sua viagem à Colômbia.
A carta de despedida que o ilustre homenageado dirigiu ao Presidente da Corte quando dela se afastou para não mais retornar, já foi lida na sessão de 2 de fevereiro passado e incorporada à respectiva ata.
Para falar em nome do Tribunal, dou a palavra ao eminente Ministro Soares Mufioz.
«Brasília, 20 de dezembro de 1980.
Eminente Presidente Antonio Neder,
Com a sessão plenária de ontem, deu o Supremo Tribunal Federal por findas suas atividades do corrente ano.
Ao reencetá-las, em fevereiro próximo, já não integrarei sua composição, por força da idade e de imperativo constitucional.
Impedido, assim, de apresentar as minhas despedidas, faço-o por este meio, rogando a Vossa Excelência que aceite e transmita a seus dignos pares, com as expressões, as mais sinceras, o meu sentido pesar com que me retiro de seu precioso e agradável convívio, do qual me lembrarei sempre com muita saudadty.
Encerro minha vida de juiz, após quase meio século de constante e ininterrupta atividade, durante o qual, com o mesmo devotamento de hoje, servi minha Pátria.
Galguei, degrau a degrau, todos os postos da Magistratura de meu Estado. E, da Presidência de seu Tribunal de Justiça, ascendi a esta Suprema Corte, em março de 1968, distinguido pelo eminente e
saudoso Presidente Costa e Silva.
Aqui, ocupei todas as suas cátedras, inclusive a de Presidente da Casa e das Turmas.
É, pois, com profunda emoção que, como juiz, pela vez derradeira, me dirijo a Vossa Excelência e aos meus eminentes colegas, com alguns dos quais convivi por quase treze anos.
Penso, agora, em todos aqueles com quem me iniciei. Muitos pertencem hoje à eternidade. A eles a minha reverência e perene saudade. Recordo-lhes os nomes: Luiz Gallotti, o Presidente afetuoso e amigo que me recebeu com seu habitual carinho, o mais lúcido dos juízes com quem convivi; Barros Monteiro e Rodrigues Alckmin, com os quais tão fraternalmente me vincul�i, tombados em plena atividade; Themístocles Cavalcanti, Adaucto Cardoso, Aliomar Baleeiro, Hermes Lima e Lafayette de Andrada.
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Com os que desfrutam da aposentadoria e com os que aqui ficam formei minha segunda família. Contei com a sua constante amizade, inspirei-me no seu exemplo, orientando-me pelo conselho dos mais experientes e nas lições dos mais sábios.
A todos minha gratidão.
Retorno às minhas origens, à capital do meu Rio Grande, de onde parti no ardor de meus vinte e dois anos, quando, pela primeira vez, vesti a toga de juiz.
Dispo-a, hoje, usada pelo tempo, mas tão pura como antes, repetindo Costa Manso.
Faço-o com a consciência do dever cumprido, feliz por haver exercido a mais nobre das funções atribuídas ao homem e da qual sempre me orgulharei.
E, reconhecido ao Senhor meu Deus, que me proporcionou tantas vitórias e a insigne glória, a mais honrosa a que possa aspirar um brasileiro, de concluir minha carreira de magistrado como juiz da Suprema Corte do Brasil.
Não sei de Tribunal que disponha de tão ampla cOIUpetência como a que lhe atribui a Constituição.
Nem a Corte Suprema dos Estados Unidos, na qual se inspirou, nem as Cortes Constitucionais do Ocidente Europeu dispõem de tão largos poderes, como acentuou Prado Kelly perante esta Casa.
Orgulhar-me-ei, sempre, de ter sido um dos seus; contribuído, com os demais, para manter indelével a austeridade, o prestígio e a autoridade os quais, em verdade, residem, essencialmente, na independência e serena imparcialidade dos seus juízes.
Manifesto, por fim, minha gratidão ao Ministério Público Federal, na pessoa do ilustre Procurador-Geral da República, Df. Firmino Ferreira Paz; aos nobres advogados do País, tão bem representados pelos causídicos desta Capital, cuja colaboração muito contribuiu para o bom exercício desta excelsa judicatura, e aos dignos Servidores da Secretaria do Supremo Tribunal Federal, desde os mais graduados aos mais modestos, com os quais convivi, na labuta diária, especialmente no biênio de minha Presidência, e de cuja amizade semp're me envaidecerei.
A Vossa Excelência, Senhor Presidente Antonio Neder, cujo convívio relembro, desde a Segunda Turma, onde se iniciou, e no Tribunal Superior Eleitoral, e aos estimados Ministros, renovo os sentimentos de minha profunda gratidão. Deus guarde, e para sempre, o Supremo Tribunal Federal!
a) Carlos Thompson Flores.»
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Faz muitos anos. Um jovem Promotor Público VIajava de Bagé para Porto Alegre. Na estação férrea de Cacequi, encontrou-se com o Juiz Municipal de Rosário do Sul. Amigos desde a infância e colegas no curso secundário, no pré-jurídico e na Faculdade de Direito, era natural que tivessem muitas impressões a compartilhar sobre as experiências que haviam adquirido no exercícioqe seus cargos. E o Juiz Municipal de Rosário do Sul, relembrando casos e episódios que mais o impressionaram, salientava, com ênfase e sincera admiração, o quanto aproveitara com a convivência do Juiz de Direito da comarca, em exemplos, em conselhos discretos e em incentivos, magistrado de inexcedível capacidade de trabalho, reto e exato nas suas decisões, hábil e firme na direção do foro, atualizado com a doutrina e a jurisprudência, sobrando-lhe tempo, ainda, para ler as grandes obras da literatura universal e para manter-se em dia com os autores nacionais.
Foi essa a primeira vez que ouvi falar no Juiz Carlos Thompson Flores.
De imediato, relacionei-o com o seu venerando avô, Desembargador Carlos Thompson Flores, Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito de São Paulo, Promotor Público, Juiz de Direito, Desembargador do Tribunal da Relação de Porto Alegre, Procurador-Geral do Estado, Deputado Provincial, Vice-Presidente da Província, exercendo a Presidência durante cerca de um ano; fundador da Faculdade de Direito de Porto Alegre e seu primeiro Diretor (I ).
A família Thompson Flores, das mais ilustres do Rio Grande do Sul, originou-se do casamento do Dr. Luiz da Silva Flores com Dona Maria da Glória Thompson. Ele, de ascendência açoriana, e ela, bisneta do capitão britânico Thompson. A memória do Dr. Luiz da Silva Flores, médico humanitário e prestigioso político, é lembrada em Porto Alegre com o seu nome, Dr. Flores, dado à rua em que residiu, situada no perímetro central da capital gaúcha. Vários de seus descendentes mereceram distinção semelhante, e ainda hoje é inegável o real-
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ce da família Thompson Flores na diplomacia, no magistério superior, na política, na carreira militar, na engenharia e na alta administração do País.
Nasceu o nosso homenageado na então cidade de São João do Montenegro, no Rio Grande do Sul, por ele descrita no discurso que proferiu neste Plenário na sessão comemorativa do centenário de Plínio Casado:
«Tranqüila localidade, entre a elevação que lhe deu o nome e as águas do Caí, que levam sua riqueza para a capital» (2).
Seu pai, advogado, era filho do Desembargador Carlos Thompson Flores, e sua mãe descendia das tradicionais famílias riograndenses Borges Fortes e Abott.
Antes de diplomar-se bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais, foi nomeado juiz distrital do município de Herval, cargo que assumiu a 30 de outubro de 1933. Quatro décadas depois, ao empossar-se na Presidência do Supremo Tribunal Federal, o Ministro Thompson Flores relembrou aquela fase de sua vida:
« . .. meu pensamento se volta a um passado distante, qua
tro décadas atrás.
O tempo não apagou de minha memória aquela tarde
ensolarada de outubro de 1933, quando me aprestava a as
sumir, na zona pastoril do Sul do Rio Grande, meu primei
ro posto no Judiciário.
Na inexperiência de um bacharelando de vinte e dois
anos, não escondia da face o tumulto de preocupações que
me iam na mente; e, traduzindo a angústia do desconheci
do, acelerava o bater do coração.
Trazia, porém, na alma o ideal da mocidade, a fé no
Direito e na Justiça; e a esperança de vencer. Fora ensinado
que o bom Juiz se faria por si, no quotidiano aprender.
Era um desafio a mim mesmo» (3).
No foro de Herval há uma cadeira em lugar preeminente. Os filhos daquele município, ao ensejo da renovação do mobiliário do Tribunal de Justiça, reivindicaram do Presidente, Desembargador Thompson Flores, o direito de homenagear, dessa maneira, o jovem juiz distrital. E a tradição oral, de juiz para juiz, de promotor de justiça para promotor, de advogado para advogado, de escrivão para escrivão, a todos faz ciente de que aquela comarca reverencia, orgulhosamente, o privilégio de ter sido o marco inicial da brilhante carreira do Ministro Carlos Thompson Flores.
De Herval transferiu-se para Bom Jesus do Triunfo. Ali naquela pequena cidade, de gente pacata e ordeira, que ostenta a glória de ser a terra natal de Bento Gonçalves e manancial da História dos Farra-
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pos, o Juiz Municipal preparou-se, com dedicação e paclencia, «ao som da palinódia das águas do Taquari-Jacuí» (4), para concorrer ao concurso de ingresso na magistratura vitalícia. Aprovado, percorreu o Rio Grande do Sul nas mais variadas direções. Em Santa Vitória do Palmar, conviveu com o gaúcho do pampa, dos campos de perder de vista, donde outrora despontou a célebre coluna revolucionária do intrépido caudilho Gomercindo Saraiva, para percorrer, a cavalo, cerca de 2.500 quilômetros do território brasileiro. Em Rosário do Sul, comarca que instalou, conheceu-lhe os campos de pastagens cortados por três grandes rios e interceptados pela coxilha de Santana, mais conhecida pelo nome de Serra do Caverá, que evoca Honório Lemes, o mais popular caudilho riograndense. Era outra nuance de gaúcho que lhe competia jurisdicionar. Retornou a Montenegro, e no foro leu os provimentos baixados pelo seu avô, que foi o primeiro Juiz de Direito da comarca; encontrou a cidade e o município transfigurados pelo progresso e observou, de perto, as chamadas colônias alemãs e italianas, erigidas em importantes comunas. Foi, porém, na prestigiosa comarca de Livramento, cidade dividida por uma linha imaginária de Rivera, na República Oriental do Uruguai, que deparou com o mais sugestivo cenário da formação econômica do Rio Grande, que evoluíra das estâncias sem divisas e da gadaria alçada e sem costeio, para a indústria, a agricultura e o comércio.
Haviam dito ao jovem Carlos Thompson Flores, quando de sua posse no juizado distrital de Herval, que o bom juiz se faz por si. E ele realmente se fizera, por si, um bom juiz, inteiriço e culto. Convivera e passara a compreender o povo a quem lhe competia jurisdicionar, assimilando-lhe, inclusive, a história, e estudara, com afinco, aprimorando seus dotes culturais. As comarcas, em que exerceu a judicatura, sentiram e identificaram o juiz inteligente e culto, sereno e educado, reto, organizador e exato. Sua promoção a Juiz dos Feitos da Fazenda Pública, proclamou o brilhante e severo Desembargador Solon Macedonia Soares, «honrou e dignificou, sobretudo, a toga nacional, eis que proporcionou aos egrégios Supremo Tribunal Federal e Tribunal Federal de Recursos a oportunidade de medir o quilate de ouro puro da cultura do ilustre magistrado» (5).
Em 1953, incluído, pela quarta vez, em lista tríplice de merecimento, foi o nosso homenageado promovido ao cargo de Desembargador. Recebendo-o no Tribunal de Justiça do Estado, o saudoso Presidente Homero Martins Batista proferiu estas significativas palavras:
«É-me sumamente grato, deferindo-lhe neste momento
o legal compromisso de desembargador, dá-lo como empos
sado neste Tribunal de Justiça.
Máximo anelo dos que se devotam à honrosa carreira
da magistratura - a desembargadoria, conquistou-a o no-
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bre Colega não de assalto ou por efeito de fato acidental, e
menos ainda pela simples fluência do tempo, mas dia por
dia, no constante labutar de juiz de instância inferior, ao
revelar em sua atuação, persistentemente, nos trabalhos de
sua judicatura e na correção de sua vida pública e privada,
as aprimoradas qualidades de caráter, cultura, inteligência e
alto espírito público, de que é dotado.
Conheci-o entre 1931 e 1933, quando de minha judica
tura em Montenegro, sua terra natal. Então, mero acadêmi
co de direito, sem responsabilidade outra, e inobstante sua
natural modéstia e retraimento, já se fazia notar pelo apego
aos estudos e, em especial, pela correção de sua conduta
moral. É possível que datem dessa época seus naturais pen
dores pela carreira da magistratura, em que iniciou sua vida
pública; .como provável é que o seu ânimo juvenil experi
mentasse o benéfico influxo da tradição de um antepassado
ilustre, o seu avô Carlos Thompson Flores que, como de
sembargador, dignificou este mesmo Tribunal de Justiça ao
tempo sob a denominação de Tribunal de Relação.
Suas promoções na carreira da magistratura obedece
ram sempre ao critério do merecimento. E é sob este digni
ficante critério que ora vê coroado de êxito o seu constante
labutar pela rápida, segura e exata 'distribuição de justiça,
conquistando o lugar que lhe compete neste Tribunal.
Autêntico magistrado, devotado como poucos ao de
sempenho de sua apostolar missão, Carlos Thompson Flo
res concorrerá poderosamente para manter e sublimar o
prestígio moral deste Tribunal de Justiça. DecIarando-o ne
le integrado, eu saúdo o nobre Colega, certo do êxito de
sua judicatura nesta superior instância, ao mesmo tempo
que me congratulo, por tão auspicioso acontecimento, com os nossos dignos Colegas desta honrada Corte de Justiça»
(6).
Elogio maior e mais expressivo, penso que ninguém o teve do austero e justo Desembargador Homero Martins Batista. Embora «já prateadas as têmporas» Carlos Thompson Flores atingiu o cargo de Desembargador apenas com 42 anos de idade. Ignoro que, antes ou depois dele, outro magistrado, com essa idade, tenha sido promovido a Desembargador no Rio Grande do Sul. Sua carreira, embora rápida e brilhante, jamais suscitou ressentimentos nos juízes mais antigos, tão notório lhe era o merecimento. Comprova essa assertiva a circunstância de, no ano seguinte, ter sido eleito Presidente da AJURIS, por unanimidade. Com aludida eleição, iniciou-se uma nova fase para a entidade dos magistrados gaúchos. Permaneceu, porém, pouco tempo
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no cargo. É que, eleito pelo Tribunal de Justiça Corregedor-Geral, o Desembargador Thompson Flores passou a presidência daquela entidade ao Vice-Presidente.
Corregedor-Geral da Justiça do Rio Grande do Sul, voltou aos cartórios da capital e às comarcas do interior, procedendo, pessoalmente, a inspeções e correições. A seu convite, tive ocasião de auxiliálo na inspeção de dois tabelionatos de Porto Alegre. Nesse mister, impressionava-me a consideração e brandura com que tratava os servidores, aos quais ensinava e instruía e, quando era constrangido a puni-los, não lhes negava uma palavra de estímulo. E, dessa forma, o surto de uma nova ordem judicial se institui no Estado, pondo fim à frouxidão, às praxes viciosas e indefensáveis, à improbidade funcional, ao descaso, à descrença na lei e na justiça. Nos arquivos das serventias e da Corregedoria-Geral ainda permanecem os provimentos baixados pelo Corregedor Carlos Flores; assim era comumente chamado no Rio Grande do Sul, escorrei tos na técnica forense, exatos e justos (7).
Após dois biênios de intenso labor na Corregedoria-Geral, voltou às funções judicantes com a mesma disposição e capacidade de trabalho de antes, passando a integrar a 4� Câmara Cível, recentemente criada, bem assim o Conselho Superior da Magistratura e o Tribunal Regional Eleitoral, que presidiu. Seus méritos fizeram que o Plenário, quebrando o critério da antiguidade, o elegesse Presidente do Tribunal de Justiça, antes de chegar a sua vez pelo rodízio tradicional. Na chefia do. Poder Judiciário Estadual, empenhou-se, extremadamente, na solução dos problemas e lacunas que embaraçavam o regular funcionamento da Justiça do Estado. Promoveu a elaboração de um projeto de novo Código de Organização Judiciária e do Regulamento da Secretaria; conseguiu dinamizar as obras do Palácio da Justiça; garántiu a ampliação dos quadros do pessoal da Secretaria, através de proposta que se transformou na Lei 5.668/67; criou a Revista de Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, organizada e editada sob a responsabilidade do próprio Poder Judiciário. Compreendendo que o maior problema da magistratura riograndense era (e ainda é) a falta de juízes, resultante do desinteresse dos novos bacharéis pela carreira, resolveu dialogar com os estudantes de direito de Porto Alegre, Pelotas, Santa Maria, Passo Fundo e Caxias do Sul, visitando-lhes as respectivas Escolas numa campanha de esclarecimentos aos que seriam os naturais candidatos à magistratura (8).
Cumprido esse último mandato, o mais alto e o mais nobre a que pode aspirar um magistrado de carreira, preparava-se o Desembargador Carlos Thompson Flores para retornar à sua saudosa 4� Câmara Cível, H:liz por haver servido à Justiça e ao Estado em todos, absolutamente em todos os seus postos. Trazia no peito o mesmo entusiasmo
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de seus vinte e dois anos e contava em servir ainda à Justiça estadual, ensejando-lhe a experiência para a instalação de cursos destinados à formação de magistrados e seu aproveitamento, quando se viu distinguido com o convite do Presidente da República para ocupar a excelsa cátedra de Ministro do Supremo Tribunal Federal (9).
No Pretório Excelso, o insigne juiz ratificou o alto conceito que desfrutava na Província. Permaneceu nesta Corte cerca de treze anos. Ninguém o excedeu no amor à Justiça e no devotamento ao serviço. Sem contar os dois anos nos quais presidiu o Tribunal, julgou, como relator, 9.391 processos, alcançando a média anual de 853 feitos. Essa imensa produção revela a excepcional capacidade de trabalho do eminente Ministro Thompson Flores e demonstra, ademais, que S. Exa. tinha razão ao registrar, no discurso que proferiu na sessão solene comemorativa do sesquicentenário do Supremo Tribunal Federal:
«O peso das atividades continua preocupando os julgadores, que, para vencê-lo, estão a exigir penosos sacrifícios até de sua própria saúde, e para os quais, de há muito, não há fins de semana livres, nem o total descanso das noites. Só assim conseguem manter em dia seus encargos funcionais» (lO).
Dizia Soler que «o trabalho que se faz sem amor tem todos os ca
racteres de uma vil escravidão». Somente o· grande amor à Justiça explica a quantidade e qualidade da respeitável coletânea de decisões proferidas, com saber e pontualidade, pelo eminente Ministro Thompson Flores. Bem o assinalou o nobre Ministro Moreira Alves ao saudá-lo na sessão de sua posse na Presidência da Corte:
«Tenho-o, Sr. Ministro Thompson Flores, por modelo de Juiz.
Vossa Excelência, no exercício da judicatura, revela não limitar-se a possuir aquelas qualidades que Muratori, apoiado nas santas escrituras e veemente na crítica aos juristas exigia dos juízes: o saber, para bem aplicar as leis; o amor à verdade, para poder distingui-la do erro; o temer a Deus, para não deixar-se levar pelo ódio, medo, cupidez ou qualquer outra inclinação; o desprezar disposições e regalias, para ser imparcial. A esses atributos, acrescenta-se, em Vossa Excelência, um outro: o exercer a magistratura como sacerdócio, com amor de quem nela, e só por ela, realiza o ideal de suas aspirações» (11).
Longo seria arrolar os votos e inter"venções mais importantes, proferidos pelo Ministro Thompson Flores, todos revelando a vivência, a prudência e o descortino do notável juiz. Fácil será registrar, no entanto, que muitos deles se acham compendiados na Súmula e passaram a constituir a jurisprudência predominante do Supremo Tribunal
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Federal. Os verbetes 498, 527, 536, 552, 570, 573, 582, 590 e 591 (12), entre outros, tiveram por precedentes básicos os votos de S. Exa. Ademais, sempre atento ao aprimoramento da jurisprudência e à atualização dela, por diversas vezes, propôs ao Plenário a alteração ou o cancelamento de verbetes da Súmula. Assim aconteceu com as Súmulas 14 e 388, que foram canceladas por sua iniciativa (13); sendo que a de número 211 foi esclarecida pela exegese por ele feita (14).
Além desses pronunciamentos, tenho presentes na memória alguns julgados em que, pedindo vista dos autos, o Ministro Thompson Flores passou a liderar o Plenário, divergindo do relator e dos que com este haviam concordado. Foi o que ocorreu, por exemplo, na apreciação do Habeas Corpus n? 45.067. Discutia-se a expulsão de estrangeiro que estava sendo processado no Brasil. O relator votara pela concessão da ordem e fora acompanhado por cinco Ministros (ao tempo o Tribunal era constituído de 16 membros). Pediu vista o Ministro Thompson Flores e, reiniciado o julgamento dias depois, sustentou a tese de que a expulsão de estrangeiro é ato discricionário do Presidente da República, que o pratica como emanação da soberania nacional, de sorte que, não tendo sido proferida sentença condenatória pela Justiça Brasileira no processo a que responde o estrangeiro, pode ele ser expulso do território nacional. Essa tese obteve a· adesão da maioria, sendo indeferido o habeas corpus (15).
De outra feita, discutia-se o RE 55.378. O relator conhecia da irresignação pela letra «b», mas lhe negava provimento. O vogal que se lhe seguira divergiu, provendo o extraordinário e cassando a segurança, por não ter encontrado eiva de inconstitucionalidade no Decreto Federal em discussão. Solicitou vista o Ministro Thompson Flores e, dissentindo dos dois pronunciamentos anteriores, conheceu do recurso e lhe deu provimento, em parte, não para cassar a segurança, mas para anulpr o acórdão do Tribunal local, visto que proferido por Câmara isolada, deslembrada da exigência a que se referia a Constituição, então vigente, consoante a qual, nos órgãos colegiados do Poder Judiciário, é privativa de seu Plenário a declaração de inconstitucionalidade. Seu voto prevaleceu e foi designado relator para o acórdão (16). Não se trata, e não se cuidava na época (1970), de tese nova. Menciono o precedente para acentuar a vigilância e a acuidade com que o Ministro Thompson Flores acompanhava a discussão das causas, não distinguindo se grandes ou pequenas, nem se nelas funcionava como relator ou vogal; a todas abrangia a sua admirável vocação de Juiz.
Finalmente, ocorre-me mencionar a Ação Rescisória n? 732, versando sobre venda em hasta pública que teria sido realizada em fraude à execução. No recurso extraordinário n? 47.725 fora anulada a arrematação com arrimo no art. 895, I, do Código de Processo Civil de 1939. Daí o pedido rescisório. O relator, o revisor e um vogal, que se
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pronunciara antecipadamente, haviam votado julgando improcedente a ação rescisória. Solicitou vista o Ministro Thompson Flores e, dissentindo dos pré-opinantes, julgou procedente a ação para convalidar a hasta pública. Interpostos embargos de divergência, foram eles rejeitados por unanimidade, ficando assentado que a orientação dominante, na doutrina e na jurisprudência, é a de que a venda de bens sujeitos, eventualmente, aos efeitos da sentença a ser proferida em ação real ou reipersecutória só é presumida, em caráter absoluto, como feita em fraude à execução, quando a citação para a demanda tiver sido inscrita no Registro de Imóveis» (17).
Ademais, constantemente preocupado com o peso das atividades impostas aos Ministros e com o contínuo crescimento delas, o Ministro Thompson Flores elaborou várias proposições no sentido de evitar que o serviço atribuído à Corte se tornasse invencível. De sua iniciativa partiu a proposta que deu origem ao atual parágrafo I? do art. 119 da Constituição Federal, dando ao Supremo Tribunal Federal competência para indicar, no regimento interno, as causas a que se refere o item 111, alíneas «a» e «d», do mesmo artigo. A seção concernente ao recurso extraordinário do Código de Processo Civil resultou, também, de proposta por ele elaborada. Os notórios e excelentes efeitos dessas duas proposições dispensam que, a respeito delas e de seu ilustre autor, sejam tecidas as considerações elogiosas a que fazem jus.
O Ministro Thompson Flores exerceu todos os cargos administrativos que a alta magistratura do País pode proporcionar. Integrou as três comissões regimentais, foi Vice-Presidente e Presidente do Tribunal Superior Eleitoral e, por igual, Vice-Presidente e Presidente do Supremo Tribunal Federal. No desempenho dessas funções, que impõem deveres complexos e difíceis e as responsabilidades mais sérias e excelsas, sempre se houve com invulgar êxito. Recebeu todas as dignidades a que um magistrado pode aspirar e soube realçá-las, inclusIve, com a sua dignidade pessoal e funcional. Tudo fez em prol do Poder Judiciário, para que fosse distribuída a melhor justiça, aquela que ele idealizava:
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«Justiça que brote de Juízes independentes, sem falsos
ou mal compreendidos exageros. Justiça austera, impoluta,
incorruptível, como se faz mister o seja, e para cujos impe
rativos prosseguiremos indormidos e intransigentes. Justiça
humana, como merece distribuída às criaturas, feitas à ima
gem de Deus. Justiça que jamais se aparte dos fins sociais e
das exigências do bem comum, sem cujo conteúdo não teria
nenhum sentido. Justiça que se aproxime, sem excessos ou
enganosas formas, do próprio Povo, para o qual é ditada e
do qual deve estar sempre ao alcance: simples, real, despida
de tudo que a possa tornar dificultosa, a fim de que a com-
preenda melhor, sinta-a com mais fervor, e possa, assim,
nela crer, para amá-Ia, prestigiá-Ia e defendê-Ia, se preciso
for, convencido que ela é o seu baluarte democrático e a
sua mais sólida garantia. E, sobretudo, Justiça pontual, como a queria Rui, porque tarda não mereceria o nobre título.
E como dizia, reclamando, «Para que paire mais alto que a
coroa dos reis e seja tão pura como a coroa dos santos».
Só assim nos tornaremos dignos do respeito e da con
fiança da Nação, ao lado dos demais Poderes da
República» ( 18).
Mas o alto conceito do Ministro Thompson Flores não deflui, unicamente, de sua capacidade de trabalho e do seu amor à justiça, dos seus dotes de inteligência e cultura, da seriedade, isenção e pontualidade com que exerceu a magistratura; outras virtudes e qualidades ornam-lhe também a personalidade, singularizando-o como ser humano admirável. Suas intervenções, no Plenário, na Turma ou em sessões de conselho, sempre se fizeram no momento adequado, com a elegância de saber discutir, sem contundência, policiando-se para falar apenas o necessário. O cavalheirismo, a cortesia, a suavidade de maneiras, a modéstia cativante, a tolerância, a afabilidade tornaram-no alvo da amizade dos colegas, da estima dos advogados e do afeto filial dos funcionários da Casa.
Em pleno vigor físico e intelectual, com o serviço que lhe fora distribuído rigorosamente em dia, foi surpreendido pela idade-limite e em conseqüência aposentado compulsoriamente. Cumpriu-se, inexoravelmente, o preceito constitucional. O Supremo Tribunal Federal perdeu um grande Juiz. O Ministro Thompson Flores, no entanto, continuará presente nos fastos da Justiça Brasileira, não só como um grande Juiz, mas como um Juiz exemplar.
NOTAS
I) A Família do Fundador, por Paulo Xavier, in Correio do Povo. caderno de Sábado, 19-4-1980, pá�. 13; 2) Discurso do Ministro Thompson Flores, in sessão come
morativa do centenário do nascimento do Ministro Plínio Casado; 3) Discurso do Minis
tro Thompson Flores, in Relatório do Presidente do S.T.F. correspondente ao ano de
1977, pág. 79/80; 4) Discurso do Desembargador Solon Macedonia Soares na posse do
Desembargador Carlos Thompson Flores, Revista Juridica, vol. 3, pág. 338; 5) Discurso
do Desembargador Solon Macedonia Soares, cit. na nota 4; 6) Palavras do Desembargador Homero Martins Batista, Presidente do Tribunal de Justiça, na posse do Desembar
gador Carlos Thompson Flores, Revista Jurídica, vol. 3, pág. 337; 7) Discurso do Desembargador Solon Macedonia Soares, .;it. na nota 4; 8) Discurso do Desembargador
Sisínio Bastos Figueiredo na sessão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul ao ensejo da despedida do Desembargador Thompson Flores, nomeado Ministro,
Revista de Jurisprudência, vol. 9, pág. 408; 9) Discurso do Desembargador Carlos
Thompson Flores na sessão de despedida do Tribunal de Justiça do Estado do Rio
Grande do Sul, Revista de Jurisprudência, vol. 9, pág. 4\3; 10) Discurso do Presidente
Thompson Flores na sessão solene comemorativa do sesquicentenário do S.T.F., in Re
latório da Presidência correspondente ao ano de \978, pág. 9\; 11) Discurso do Ministro
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Moreira Alves na posse do Mmistro Thompson Flores na Presidência do Supremo Tri
bunal Federal, Relatório de 1977, pág. 64; 12) Súmulas do Supremo Tribunal Federal,
por Hugo Mosca; 13) RE 74.355, RTJ 70/147 e HC 53.777, RTJ 83/735; 14) RE
65.291, RTJ 51, pág. 767; 15) HC 45.067, RTJ 49/829; 16) RE 55.378, Ementário 830
do S.T.F.; 17) AR 732, Ement. 787, vaI. I, RTJ 51/790 e EAR 732, Ement. 1.170, vaI.
I, S.T.F.; 18) Discurso do Min. Thompson Flores pronunciado na sessão de sua posse
na Presidência do S.T.F., Relatório de 1977, págs. 82/83.
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Exmo. Sr. Ministro Presidente do Colendo Supremo Tribunal Federal, Exmos. Srs. Ministros da Corte Suprema, Exmo. Sr. Ministro Francisco Thompson Flores, Exmos. Srs. Ministros Presidentes dos Tribunais Superiores.
Esta homenagem, que o Supremo Tribunal Federal ora presta a Vossa Excelência, Senhor Ministro Carlos Thompson Flores, e a que se associa, por meu intermédio, cordialmente, o Ministério Público Federal, é o testemunho eloqüente do grande apreço, da profunda admiração e do puro respeito, que todos votamos à notável personalidade de Vossa Excelência, ao juiz exemplar, ao jurista de escol, ao amigo afetuoso, ao patriota sem jaça, e ao brasileiro perante o qual, neste momento, se curva, reverencialmente agradecida, a mais alta expressão da Justiça brasileira, que é o Supremo Tribunal Federal.
Esta homenagem é, a todas as luzes, julgamento público e supremo daquele que, por quase meio século, dedicou todos os momentos de sua vida honrada à distribuição de justiça a quantos lha pediam. Julgou. Agora, está sendo julgado e proclamado um dos mais eminentes, honrados e cultos juízes do Brasil.
Para que alguém, por tantos e tantos anos, sem o mínimo desvio de propósitos, ponha, a serviço de uma causa, força e dedicação constantes, é preciso ideal e viver dele. E o mais nobre, mais sublime, o mais excelso, o mais divino, não há que o de ser justo. Desse ideal, senhores, viveu e vive o eminente Ministro Thompson Flores.
Julgar, servindo ao Poder Judiciário, é forma de realizar o Direito, prevenindo ou extinguindo conflitos sociais objeto de demandas forenses. É forma de promover a adaptação dos homens entre si, em convivência social.
Não fossem, entre os homens individualmente considerados, ou entre grupos sociais, os conflitos que a vida, em sociedade, provoca, e, mais do que isso, a prevenção ou a extinção desses conflitos, não havia, dentre os processos sociais de adaptação, o Direito.
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Os conflitos humanos, sejam quais lhes forem os motivos determinantes, são factos. Uns são preveníveis; outros, extintíveis. A prevenção e a extinção, de sua vez, realizam-se em factos. Dessa sorte, facto previne ou extingue facto, é dizer, previne ou extingue conflito social. Opera-se, outrossim, em conseqüência, a adaptação social, fim último do Direito.
O que se sabe e aprende, todos os dias, nos Juízos ou Tribunais, é que a função judicial visa a realizar a prevenção ou a extinção dos conflitos entre os homens, para alcançar a adaptação social.
Assim, pois, em última análise, o acto judicial de julgar é, também, conceptualmente, Direito.
Dessas razões, suscintamente expostas, podemos dizer que o eminente Ministro Thompson Flores, por quase meio século, julgando, e o fazendo com sabedoria e prudência, fora, neste País, por todos os caminhos da judicatura, ascencionalmente, admirável e brilhante realizador do Direito no Brasil. Ninguém, nesse mister, o terá superado em dedicação, em amor às letras jurídicas, em senso de responsabilidade, em coragem e em grandeza de atitudes.
Neste Colendo Supremo Tribunal Federal, último estágio da judicatura exercida pelo nosso homenageado, figuram-lhe, nos anais, os votos brilhantes proferidos pelo eminente Ministro Carlos Thompson Flores, a quem, incontestavelmente, devem as letras jurídicas nacionais grande e brilhante contribuição.
Receba, Excelentíssimo Senhor Ministro Thompson Flores, por último, do Ministério Público Federal e de mim próprio, nossas homenagens, em sinal de respeito profundo, sincera amizade e admiração incondicional. a par de nossos votos de muitas e muitas felicidades.
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Senhor Ministro Thompson Flores,
Por honrosa delegação de seu Presidente, represento o Egrégio Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil nesta Magna Sessão de homenagem, que presta a Corte Suprema, a V. Exa., um de seus eminentes Ministros, que por força do atingimento de idade limite, dela se afastou em merecida e digna jubilação. Tenho, porém, a convicção plena de que esse afastamento jamais representará ausência no mundo jurídico nacional do Juiz reto, que por vocação e merecimento galgou todos os postos da Magistratura em sua terra natal havendo exercido a curul máxima do T.S.E. e deste S.T. F.
Sobre sua personalidade e carreira, os doutos oradores que me antecederam incumbiram-se de gizá-Ias, ressaltando todas as nuances que o fizeram merecedor do respeito e acatamento de seus pares e jurisdicionados. De sua cultura jurídica e humanística, dizem os arestos proferidos em toda sua vida dedicada à judicatura.
Acentuo, entretanto, que V. Exa., antes e acima de tudo, sempre soube sei JUIZ. Afirmação que aqui reitero e testemunho, em nome dos advogados brasileiros, eis que, para meu privilégio já a formulara no ano de 1974, quando, então, em nome dos advogados fluminenses, por sua Seccional do extinto Estado do Rio de Janeiro, da qual me honrava presidir, em saudação prestada a Vossa Excelência, à época Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, e aos demais Presidentes dos Tribunais Estaduais daquela justiça especializada, em seu primeiro encontro Nacional, que se realizava na cidade serrana de Friburgo. E, quando realço, dentre outras, esta qualidade, que orna a personalidade de Vossa Excelência, faço-o com vista a seu chamamento para integrar esta Corte Excelsa, em vaga decorrente da aposentadoria do eminente e douto Ministro Prado Kelly (em março de 1968) meses antes de se instalar no País o sistema de Governo que concentrando no Executivo poder de arbítrio, constrangeu os demais, suprimindo do Judiciário as necessárias garantias para o exercício constitucional de suas elevadas atribuições. É verdade que a história deste Supremo Tribunal,
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registra antecendentes de tal natureza. Têm os historiadores estabelecido elo de continuidade na vida desta Casa, fincando seus primitivos alicerces na Casa de Suplicação do Rio de Janeiro, embrião do que se viria constituir o Supremo Tribunal de Justiça. E já naquela época, no Poder Judiciário do Império, marcou-se o episódio da ingerência, anotado por Geminiano da Fonseca, dentre outros, quando por seu Ministro da Justiça tentava o executivo influir nos trabalhos do Tribunal. Depois, na República, acentuando-se, ficaram notórios os constrangimentos praticados nos Governos de Floriano Peixoto, Prudente de Moraes e Hermes da Fonseca, que chegaram a paralização do Tribunal, por ausência de quorum às sessões, eis que nas vacâncias ocorridas não se lhe nomeavam novos Ministros. Fatos chegados até o período ditatorial do Estado Novo.
E ao destacar, Senhor Ministro Thompson Flores, Senhores Ministros, estes fatos, gravados na memória jurídica nacional, tristes episódios os quais, todavia, não tiveram o condão de eliminar a vocação democrática de nosso povo ou minimizar-lhe os anseios de sedimentação do sistema federativo estruturada num Estado Pleno de Direito, onde o respeito à liberdade e aos direitos civis se constituam realidade alcançável ao mais comum dos cidadãos, os quais devem ter no Poder Judiciário, Órgão Moderador por excelência, os freios e contrapesos aos excessos e pressões dos demais poderes com os quais compartilha na formação dum País socialmente organizado, faço-o porque inobstante todos esses percalços, os juízes desta Corte Máxima sempre se colocaram indenes ao entrechoque das paixões partidárias que lhes deram causa.
Como Juízes, cônscios de sua missão político institucional, na interpretação e aplicação das leis, sempre buscaram atender aos pedidos ode prestação Jurisdicional, obedientes ao princípio do controle de sua constitucionalidade, fato que no meu modesto entender levou o eminente Ministro Djaci Falcão, quando de sua Presidência, em 1975, a
«ressaltar que o Supremo Tribunal Federal, mesmo nas fases excepcionais da vida política brasileira, vem mantendo seu empenho de resguardar, com naturalidade, independên· cia e firmeza de convicção, o superior papel que lhe é reservado pela Constituição Federal.»
Por isso que os advogados brasileiros, por sua Corporação, através seu Conselho Federal e suas Seccionais, como estamento social, em legítima representação daqueles anseios da Nação Brasileira, com vigor e serenidade se opôs, como voz primeira e isolada, ao ato violador das garantias constitucionais do poder judiciário, imposto pelo Ato Institucional n? 5, lutando por seu pleno restabelecimento.
Não o fez, entretanto, Senhores Ministros, por entender necessário a Vossas Excelências, ou aos demais Juízes brasileiros, como
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Juizes, aqueles predicamentos ao exercI CIO de suas elevadas funções. Julgadores isentos e independentes, para tanto bastou-lhes a força morai e a honradez da toga que ostentam.
Fê-lo por saber fórmula indispensável a restauração do Estado de Direito Democrático, que quer, na letra do pacto social, a existência dos poderes que o constituem, independentes e harmônicos entre si. Fê-lo por compreender, como na voz do Ministro Oswaldo Trigueiro «que só através da aprendizagem da democracia, num sistema presidencialista, poderíamos alcançar a estabilidade político-institucional, por serem essas as tendências e a vocação do povo brasileiro e assim deixando, com essa aprendizagem democrática, de viver afogados em leis e constituições fictícias, desprezando o formalismo e fazendo conviver, então, o país legal com o país real.»
Senhor Ministro Thompson Flores. Viveu Vossa Excelência todos os momentos daquela excepcionalidade como Juiz desta Corte, do Tribunal Superior Eleitoral, como seu Presidente e como Chefe do Poder Judiciário Nacional.
Quer judicando, quer exercendo as atribuições administrativas da Presidência do Supremo Tribunal Federal, Vossa Excelência sempre demonstrou elevado saber Jurídico, sólida formação humanística e acurado senso administrativo. Sua isenção e competência estão proclamadas em todos os brilhantes votos aqui proferidos. Sua altivez e independência deram continuidade às sólidas tradições desta Corte, que do Império à data presente sobrepairou acima de todas as formas e tentativas de minimização de suas elevadas atribuições constitucionais. Disso trazem seu testemunho e saudação, por minha voz, os advogados brasileiros ao afirmar que, ao jubilar-se, pode guardar Vossa Excelência, a certeza do dever cumprido, o crédito de nosso respeito e admiração e o pleno acatamento de seus jurisdicionados.
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As orações hoje produzidas passarão a integrar os anais desta Casa e com eles se perpetuarão.
Agradeço, novamente, a presença do ilustre Ministro Francisco Thompson Flores, que aqui representa nosso querido homenageado. Agradeço, igualmente, e registro a presença do eminente Ministro José Néri da Silveira, Presidente do egrégio Tribunal Federal de Recursos; do ilustre Ministro Luíz Octávio Gallotti, membro e representante do Presidente do Tribunal de Contas da União; do ilustre Ministro José Fernandes Dantas, do Tribunal Federal de Recursos; do advogado Dr. Antônio Carlos Elizalde Osório, que representa a Ordem dos Advogados do Brasil, seção do Rio Grande do Sul; dos Srs. advogados aqui presentes; dos funcionários do Tribunal, que vieram prestigiar a homenagem devida ao notável ex-Presidente; e de todos quantos trouxeram o endosso de seu prestígio a esta solenidade.
Para que os eminentes Senhores Ministros tenham oportunidade de cumprimentar o representante do homenageado e as autoridades presentes, suspendo a sessão por cinco minutos.