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Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 41º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Joinville - SC – 2 a 8/09/2018
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NBB temporada 2016/2017 – rotina de produção da transmissão televisiva de
basquete a partir da perspectiva da TV Bandeirantes1
Tatiana Zuardi USHINOHAMA 2
Letícia Passos AFFINI3
Marco ROXO 4
Universidade de Federal Fluminense, Niterói - RJ
RESUMO
O objetivo deste artigo é identificar e comparar o processo de produção audiovisual da
cultural esportiva do basquete no Brasil, a fim de verificar as regularidades, o ciclo de
produção e os ritos de uma transmissão televisiva a partir da perspectiva da TV
Bandeirantes, emissora oficial da LNB. Trata-se de uma pesquisa de campo qualitativa
orientada pelos critérios da etnografia da comunicação, um método de análise que permite
observar como a comunicação ocorre e se desenvolve em uma atividade cultural, neste
caso o esporte. O método etnográfico possibilitou revelar questões ocultas, como a
infraestrutura do ambiente e a presença material do meio, na elaboração do discurso
televisivo, que são fundamentais na delineação das transmissões construídas
simultaneamente ao evento.
PALAVRAS-CHAVE: basquete; transmissão televisiva; esporte; televisão;
comunicação.
Atualmente, a disseminação do esporte passa por ações comunicacionais
assertivas, que envolvem a exibição dos jogos por meio de uma transmissão audiovisual
em tempo real, em meios de comunicação que permitem ao evento alcançar um grande
público. No Brasil, país do futebol, a Liga Nacional de Basquete (LNB) busca ampliar os
horizontes do basquete desde 2003, para “reconduzir o esporte ao posto de segundo mais
popular do Brasil, apenas atrás do futebol”5. Por isso, a entidade criou um campeonato
1 Trabalho apresentado no GP Comunicação e Esporte, XVIII Encontro dos Grupos de Pesquisas em Comunicação,
evento componente do 41º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação.
2 Doutoranda em Comunicação pelo Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal Fluminense (PPGCOM-
UFF), E-mail: tatianazuardi@globo.com
3 Docente do Programa de Pós-Graduação em Mídia e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista (PPGMIT-
UNESP), E-mail: affini@faac.unesp.br
4 Docente do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal Fluminense (PPGCOM-UFF), E-
mail: marcos-roxo@uol.com.br
5 Objetivo da LNB – Disponível em <http://lnb.com.br/institucional/sobre-lnb/>. Acesso em 14 jun 2018.
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nacional (Novo Basquete Brasil – NBB)6 em que se manteve como detentora dos direitos
de transmissão e reprodução de TV, com a pretensão de gerenciar a construção
audiovisual e a distribuição do evento por meio de múltiplos meios de transmissão (TV e
Internet), sinal (aberto e pago) e emissoras (Band e SporTV)7.
Nesse sentido, o objetivo do texto é identificar e comparar o processo de produção
audiovisual da cultural esportiva do basquete no Brasil por meio dos jogos ocorridos nas
fases decisivas, semifinal e final, do campeonato da NBB, temporada 2016/2017, a fim
de verificar as regularidades, o ciclo de produção e os ritos de uma transmissão televisiva
a partir da perspectiva da TV Bandeirantes, emissora oficial da LNB.
Para isso, utilizar-se-á, como fundamentação da pesquisa e método de
investigação da etnografia da comunicação, que segundo Mateus (2015) “centra-se, não
tanto no conteúdo, quanto no contexto, não tanto na informação quanto nos processos
de formação da significação”, durante o regime de observação do participante.
Esse método possibilita revelar as peculiaridades de um processo de produção na
criação de uma linguagem em função de um contexto específico, o jogo de basquete,
sendo “útil o suficiente para conscientizar as pessoas que os problemas de linguagem
existem e que eles são amplos e complexos8”, uma vez que a audiência tem como premissa
que as emissoras de televisão têm recursos ilimitados para construir um discurso
audiovisual esportivo.
Assim, na primeira parte, o artigo apresenta a etnografia da comunicação como a
fundamentação teórica norteadora da pesquisa; na segunda parte, definem-se o objeto de
pesquisa e o método de observação para, em seguida, na terceira parte, o artigo apresentar
o evento comunicativo e seus componentes em função do método proposto. O artigo
termina com uma análise sobre a configuração do estrutural da transmissão e o contexto
observado, no qual se questiona o pensamento da entidade organizadora em pensar apenas
a distribuição na transmissão esportiva e não ponderar sobre a importância de uma
infraestrutura adequada para uma produção audiovisual do seu evento, questão
fundamental na construção de um processo comunicacional.
6 Participam quinze equipes de oito diferentes estados do país. Disponível em <http://lnb.com.br/nbb/equipes>.
Acesso em 14 jun 2018. 7 Regulamento do campeonato da NBB determinando as atribuições da Entidade e das: Rádio, WEB e TV a partir do
artigo 279 a 315. Disponível em: < http://lnb.com.br/wp-content/uploads/2017/10/Regulamento-NBB-CAIXA-2017-
2018.pdf>. Acesso em 14 jun 2018. 8 Traduzido de: “It is useful enough to make people aware that these problems of language exist and that they are
widespread and complex.” (SALZMANN et. al, 2012, p. 2).
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ETNOGRAFIA DA COMUNICAÇÃO
A etnografia da comunicação trata de uma área de pesquisa que visa estudar o
contexto cultural a partir de um presente sistema linguístico na sociedade, de forma que
haja a “ênfase e a primazia do discurso sobre o código, função sobre a estrutura; e
contexto sobre a mensagem9”. Por isso, apesar de um estreito laço com a linguística
descritiva, a etnografia da comunicação é um campo que considera os padrões do
comportamento comunicativo como constituintes de um dos sistemas de cultura da
sociedade e que, por meio deles, podem se revelar pontos de vista da prática cotidiana.
Isso permite ao pesquisador identificar um evento comunicativo como fonte potencial de
conhecimento e discernimento da comunidade e não como objeto de persuasão.
Por isso, “a etnografia da comunicação tem se tornado uma emergente disciplina,
abordando uma perspectiva amplamente nova de informação na estrutura do
comportamento comunicativo e seu papel na condução da vida social10”.
No Brasil, segundo Travancas (2006), esse método tem fundamentado diversas
pesquisas na área da comunicação, com a proposta do pesquisador olhar para o processo
comunicacional de massa de forma multifatorial. Assim, a etnografia da comunicação
torna-se um método indicado “para se aprofundar nas raízes culturais da construção
simbólica dos megaeventos esportivos e algumas de suas variantes, como criação das
comunidades imaginárias das torcidas e o uso de textos culturais como forma de
comunicação” (PADOVEZ; MENEZES, 2018, p. 60).
Para orientar a prática do observador, o pai da etnografia da comunicação, Dell
Hymes (1964), propôs quatro aspectos sistemáticos em que se enfatizam o escopo e o
foco desta área de pesquisa: evento comunicativo e seus componentes, as relações entre
componentes, a capacidade e o estado dos componentes e a atividade do sistema assim
constituído. Este artigo concentrara-se em abordar apenas o primeiro aspecto proposto
por Hymes (1964), o evento comunicativo e seus componentes.
Nesta perspectiva, o ponto de partida da pesquisa é “o hábito comunicativo de
uma comunidade em sua totalidade, determinando o que conta para um evento
9 Traduzido de “emphasis and primacy of speech over code; function over structure; context over message”
(HYMES, 1964, p. 11).
10 Traduzido de “the ethnography of communication has become an emergent discipline, addressing a largely new order
of information in the structuring of communicative behavior and its role in the conduct of social life.” (SAVILLE-
TROIKE, 2003, p. 1).
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comunicativo e como seus componentes, não concebendo nenhum comportamento
comunicativo independente do conjunto enquadrado por algum cenário ou questão
implícita11”. Por isso, identificar e analisar o evento comunicativo e seus componentes é
fundamental para se compreender os significados atribuídos pelos próprios sujeitos ao
seu contexto, à sua cultura.
Identificação do evento comunicativo
Segundo Saville-Troike (2003), ao identificar um evento comunicativo, é
essencial definir a natureza dos marcadores de limite que sinalizam seu início e fim, assim
como as características que distinguem um tipo de evento de outro. Esses marcadores de
limites surgem quando ocorre uma mudança de evento ou uma mudança do uso
relativamente consistente de uma linguagem, de forma que as sinalizações possam ser
uma combinação de pistas verbais e visuais.
Os eventos comunicativos selecionados inicialmente para descrição e análise
por um aprendizado para usar essa abordagem devem ser breves sequências
independentes que tenham início e fim facilmente identificáveis. Além disso,
devem ser eventos que se repetem de forma semelhante e com alguma
frequência, de modo que padrões regulares sejam mais facilmente
discerníveis12 (SAVILLE-TROIKE, 2003, p. 110).
Em eventos rituais formais, os limites do discurso são mais claramente definidos
do que nos eventos informais, pois nestes há um alto grau de imprevisibilidade no
conteúdo e nas rotinas em cada ocasião. E, caso ocorra uma violação de limites, ela pode
se destacar como um comportamento inapropriado.
Componentes de comunicação
Segundo Hymes (1964), uma análise etnográfica começa com a descrição dos
componentes do evento comunicativo, fixados em oito critérios de observação, que são
os (1, 2) tipos participantes do evento comunicativo, (3) os canais disponíveis e seu uso,
(4) os códigos compartilhados com os participantes, (5) as configurações, (6) as formas
11 Traduzido de: “the communicative habits of a community in their totality, determining what count as communicative
events, and as their components, and conceiving no communicative behavior as independent of the set framed by some
setting or implicit question”. (HYMES, 1964, p. 13).
12 Traduzido de: “The communicative events selected initially for description and analysis by one learning to use this
approach should be brief self-contained sequences which have readily identifiable beginnings and endings. Further,
they should be events which recur in similar form and with some frequency, so that regular patterns will be more easily
discernible.” (SAVILLE-TROIKE, 2003, p. 110).
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de mensagens e seus gêneros, (7) os tópicos e comentários que a mensagem poderia
produzir, e o (8) evento em si.
Esses componentes em conjunto criam uma estrutura, ou seja, um cenário a
respeito de um aspecto cultural que é significativo e detectável pela sociedade. Por isso,
nem todas as combinações são possíveis entre os componentes na formação de uma
mensagem, de modo que, a partir das configurações desses componentes, torna-se
possível notar se há um padrão do comportamento comunicativo e, dessa forma, analisar
a construção televisiva do evento comunicativo.
Por isso, indaga-se: há um padrão do comportamento comunicativo estabelecido
pela emissora de televisão para transpor o evento esportivo, jogo de basquete, por meio
de um sistema de comunicação de “massa”, a transmissão televisiva ao vivo?
MÉTODO
Trata-se de uma pesquisa de campo qualitativa, orientada pelos critérios da
etnografia da comunicação proposta por Hymes (1964), um método de análise que
permite observar como a comunicação ocorre e se desenvolve em uma atividade cultural,
neste caso o esporte. Por isso, ao comparar o processo de produção audiovisual da cultural
esportiva do basquete no Brasil, foi possível identificar quais os limites do evento
comunicativo, seu grau de previsibilidade, estabilidade e regularidade, de modo que esse
comportamento comunicativo pudesse esclarecer as especificidades de um fenómeno
comunicacional a partir de uma observação minuciosa.
A amostra foi composta por dois jogos de basquete decisivos, envolvendo a equipe
do Bauru Basket em distintas fases do Campeonato Nacional de Basquete do Brasil, na
temporada da NBB 2016/2017. O primeiro jogo observado se trata da terceira partida da
semifinal, entre o Bauru Basket e o Pinheiros, realizada na cidade de Bauru, no ginásio
poliesportivo “Panela de Pressão”, com capacidade para duas mil pessoas, no dia 14 de
maio de 2017. O time do Bauru precisava ganhar para permanecer na disputa por uma
vaga na final, uma vez que o time do Pinheiros havia ganho os dois primeiros jogos. O
segundo jogo observado foi o terceiro jogo da final da NBB, temporada 2016/2017, entre
o Bauru Basket e o Paulistano, na cidade de Araraquara, no ginásio poliesportivo
Gigantão, com capacidade para quatro mil espectadores. O time de Bauru, novamente,
precisava ganhar o jogo para continuar na disputa pelo título na temporada, pois o
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Paulistano havia ganhado os dois primeiros jogos. Ambos os jogos tinham a TV
Bandeirantes (Band) como a principal emissora responsável pela transmissão, mas, em
um acordo entre a LNB e a SporTV, a emissora de canal por assinatura passou a construir
a narrativa principal do jogo.
Nos dois momentos observados, a coleta de dados foi sob a perspectiva da Band,
emissora que autorizou a presença da pesquisadora em todos os espaços por ela
gerenciados. O processo de observação minuciosa começou com a chegada das equipes
de transmissão, o planejamento da instalação dos equipamentos, a montagem dos
equipamentos e a construção da transmissão ao vivo. Os dados como fotos, filmagens,
entrevistas e anotações foram descritos e analisados para revelar as regularidades, o ciclo
de produção e os ritos de uma transmissão televisiva a partir da emissora oficial.
EVENTO COMUNICATIVO E SEUS COMPONENTES
Os limites do evento comunicativo variam de acordo com o foco estabelecido pela
pesquisa em função dos tipos de participantes. Ao considerar a emissora de TV como
foco principal da observação, o limite inicial do evento estabelece-se com a montagem
da infraestrutura para a transmissão do jogo de basquete “ao vivo” e se encerra com o
recolhimento dos equipamentos. Esses momentos são desconhecidos pela audiência.
Já ao considerar o ponto de vista da audiência, o marco inicial do evento
comunicativo muda e a base inaugural do evento desloca-se para a grade de programação,
com o término de um programa televisivo, a entrada no comercial, a vinheta de abertura
da transmissão “ao vivo”, seguida da entrada do narrador do jogo proferindo um: “Boa
Tarde! Hoje ,...”. E o marco final do evento surge com o encerramento do jogo, seguido
das entrevistas com dois jogadores, um de cada time, e a despedida do narrador.
Apesar de a audiência ser um tipo de participante do evento comunicativo, para
quem a transmissão está dirigida, este artigo focou-se no ponto de vista do emissor,
principalmente nos elementos que são invisíveis à audiência, mas significativo ao meio e
à construção da transmissão televisiva esportiva.
Assim, oito horas antes do início do jogo a emissora começa a preparar a
infraestrutura a partir da chegada de quatro caminhões destinados à transmissão: o
caminhão com o gerador de energia, o caminhão switcher, o caminhão de apoio da
produção e o caminhão com o uplink. A finalidade do caminhão gerador é manter o aporte
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de energia, sem oscilação na voltagem, de modo que os equipamentos funcionem sem
falhas e gerem as imagens e sons necessários. O caminhão switcher tem a função local de
elaborar a parte visual da narrativa. O caminhão uplink é responsável pelo envio do sinal
de áudio e vídeo via satélite para a “cabeça da rede”, neste caso o “sinal limpo”, ou seja,
o sinal puro, como foi captado, sem a finalização. Denomina-se “cabeça de rede” a central
da emissora, neste caso, em São Paulo, responsável pela finalização do produto, ou seja,
a inserção de narração, de comentários, de GCs, de vinhetas, etc. e, também, pela
distribuição do sinal “pronto” para todo o Brasil.
Imagem 01 – Caminhão de energia e do Switcher
na entrada do ginásio, em Bauru.
Imagem 02 – Caminhão de transmissão do sinal e
do Switcher na entrada do ginásio, em Araraquara.
O quarto caminhão, o de apoio da produção, transporta as câmeras, cabos,
microfones, etc., ou seja, os equipamentos necessários à construção da transmissão.
O caminhão de switcher, que constrói a transmissão em áudio e vídeo, interage
por meio de cabos com os outros caminhões, apresentados acima, e com os equipamentos
distribuídos na quadra, para captar o jogo. Por isso, há uma disputa entre as emissoras
para estacionar esses caminhões de produção o mais perto possível da entrada do ginásio,
para não ter que tensionar, expor ou danificar os cabos, que são desenrolados e esticados
pelo ginásio até o local de posicionamento das câmeras. Os cabos ficam expostos pelo
chão do ginásio e estendidos entre as cadeiras e as escadas da arquibancada, o que
aumenta os riscos desses serem danificados devido à circulação da torcida.
O diretor da transmissão elabora o mapa de posicionamento das câmeras no
ginásio em função da quantidade de equipamento disponível, da quantidade de
equipamento que a unidade móvel de transmissão suporta e, principalmente, da
compreensão da dinâmica do jogo que o diretor imagina para a modalidade.
Em ambos os jogos a Band posicionou 4 (quatro) câmeras pelo ginásio (figura
01), uma na posição central, no eixo principal de transmissão e acima do nível da quadra
(1), uma na posição central oposta ao eixo principal, elevada (2), uma na diagonal (3) e
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uma no nível da quadra móvel (4). Cada câmera é operacionalizada por um cinegrafista,
que está em contato direto com o diretor de imagem através do intercomunicador; a
câmera é posicionada sobre o tripé, que proporciona sua estabilização e conta também
com o cabo que transporta o AC, energia elétrica, e o sinal de vídeo e o áudio ambiente
para o caminhão switcher.
Imagem 03 – Cabos vindos do caminhão para
serem estendidos até as câmeras.
Imagem 04 – Equipamento (3) posicionado com
a interdição de cadeiras.
Por sua vez, a SporTV posicionou 9 (nove) câmeras, duas na posição central, no
eixo principal de transmissão e acima do nível da quadra (1 e 2), uma na posição central,
oposta ao eixo de principal na linha da quadra (3), uma embaixo de cada “garrafão” (4 e
5), uma em cada tabela – micro câmera (6 e 7), uma no nível da quadra móvel (8) e uma
enquadrando o placar, o tempo de posse de bola (9).
Figura 01 – Posicionamento de câmeras Band e SporTV.
5
2
9
3
4
C C
Band SporTV
1
4
Legenda:
1
3
2
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6
7
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Neste caso observado, como a detentora dos diretos de transmissão era a LNB, as
emissoras permutaram as imagens de algumas câmeras. Isso ampliou o número de
possibilidades de ambas as emissoras no momento da construção narrativa visual do jogo.
Esse acordo transferia para SporTV a construção narrativa imagética principal, de forma
que a Band poderia seguir a transmissão proposta pela SporTV ou recortar a narrativa
principal (câmeras 1 e 2), utilizando as suas câmeras ou as imagens das câmeras cedidas
pela SporTV (câmeras 6,7,9). Com isso, a Band ampliou as suas possibilidades de
replays, a partir das imagens dessas câmeras que são armazenadas no servidor do
caminhão de switcher e disponibilizadas para o editor de imagem. Este pode, portanto,
seguir a narrativa visual elaborada pela SporTV ou escolher o seu replay.
Imagem 05 – Monitor geral com todas as imagens, mesa de corte e sinal de retorno.
Ao discutir o posicionamento das câmeras, o diretor da transmissão pela Band fez
as seguintes considerações: o posicionamento da câmera 1 central e em plano aberto,
Plano Geral, capta a imagem com visão total da quadra, pois, se o sinal da SporTV falhar
ou “cair”, a Band consegue prosseguir a transmissão do jogo para a sua audiência sem
interrupção. A câmera 2 tem a orientação de capturar as imagens do banco de reserva e
dos treinadores da equipe, em Plano Conjunto. A câmera 3 tem a função de acompanhar
os jogadores na linha de três metros em ambos os lados da quadra, quando a bola está em
movimento. Quando a bola está parada, o plano deve ficar aberto em Grande Plane Geral,
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para ilustrar a dimensão do espaço para a audiência. A câmera 4, por ser móvel, no
primeiro jogo, ficou acompanhando os lances da linha da quadra do mesmo lado da
câmera 4, respeitando, assim, o eixo de ação, ou seja, uma linha imaginária traçada no
chão que acompanha, exatamente, os jogadores em movimento e estes devem mover-se
ao longo desse eixo. Durante a transmissão, o diretor da transmissão percebeu a ineficácia
das imagens captadas por essa câmera e a ausência de imagens aproximadas do garrafão,
do lado oposto. Dessa forma, ele deslocou a câmera e a manteve nessa posição no jogo
seguinte.
As imagens e os sons captados pelas câmeras são equalizados, no caminhão
switcher, de forma que a intensidade de cor e o contraste das imagens fiquem em um
mesmo padrão, independentemente do equipamento (tipo, modelo e qualidade) utilizado,
e o som fique no mesmo nível de decibéis (db). Essa uniformidade é importante, pois
permite que a utilização de imagens de diferentes câmeras ocorra sem que haja diferença
de cor e contraste, evitando, assim, ruídos na comunicação que disparariam a atenção da
audiência na narrativa do jogo.
Imagem 06 – Equipamento de ajuste da cor e
contraste. Imagem 07 – Informações das imagens.
As imagens captadas no ginásio são disponibilizadas para a mesa de corte, na área
central do caminhão de switcher, e estas são consideradas o material bruto, que o editor
de imagem deve cortar “ao vivo” para construir a narrativa. Em um aquário, atrás da mesa
de corte, fica o editor de áudio, que gerencia os sons vindos da quadra e faz a mixagem.
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Do outro lado da mesa de corte fica o editor de replays e melhores momentos, que tem
acesso a todas as imagens e seleciona, em tempo real, as imagens significativas para a
elaboração de replays; estes, na maioria das vezes, são editados com a utilização de Slow
Motion, ou seja, o efeito de câmera lenta, que reduz a velocidade de exibição para destacar
elementos importantes presentes no andamento da partida.
Evento em si
Para observar o “evento em si”, do ponto de vista do emissor, esta pesquisa
considerou como esse componente, a transmissão televisiva direta e “ao vivo”, definido
por Fechine (2008, p.136) como “um espaço que só possui existência no mesmo momento
em que se dá a transmissão e, através dela, ocorre à conexão que, ao colocar todos os
participantes em um mesmo agora, transforma todas as suas distintas posições espaciais
físicas em um mesmo aqui”. Assim, compreende-se que o jogo de basquete e o seu
ambiente são o núcleo dos acontecimentos que a televisão vai mediar para o telespectador,
de forma original, por meio de uma construção da narrativa e da transmissão simultânea
às ações do jogo. Por isso, ao estruturar os seus equipamentos para transmitir o evento, a
emissora precisa interpretar os acontecimentos que ocorrerão e antecipá-los, uma vez que
a natureza do evento é compreendida como um acontecimento cultural de conhecimento
público, no qual a audiência já possui uma prévia representação do acontecimento, muitas
vezes mais ampla do que o meio pode oferecer.
Segundo Debray (2000), esse ato de transmitir trata-se de uma ação de caráter
processual e mediatizada, que visa conjecturar toda a ilusão de imediaticidade. Nessa
dinâmica comunicacional, o elemento intermediário (técnico e orgânico) afeta
diretamente o processo de codificação dos estímulos naturais e sociais entre o fato e o
receptor por meio de uma tríade de dimensões interligadas: a política (regulação e
ordenação), a material (suporte físico e técnico) e a temporal (evolução do tempo). Este
artigo foca-se na base material desta tríade, o suporte físico e técnico do meio e do evento.
Por isso, faz-se necessário identificar e analisar o jogo de basquete no seu espaço
físico, na sua dinâmica e temporalidade, já que é a partir desse contexto que a transmissão
irá transpor o evento, em narrativa audiovisual.
Ao enfatizar o aspecto espacial, destaca-se que o jogo ocorre em um espaço,
ginásios, e estes, no Brasil, não possuem uma infraestrutura adequada para receber as
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emissoras de televisão, uma vez que não existem espaços reservados para acomodar os
equipamentos e, em decorrência disso, estes acabam invadindo as cadeiras na
arquibancada ou ficam exposto, na área de circulação do público. Isso cria situações de
risco de acidentes, tanto para a emissora como para o público. Outro fator é a
possibilidade de um torcedor entrar na frente da câmera, quando ficar em pé na
arquibancada, ou, ainda, esbarrar no equipamento. Enfim, são inúmeras as possibilidades
de acidentes que podem ocorrer pela falta de infraestrutura arquitetônica para a
transmissão.
Imagem 08 – Câmera dividindo espaço com o
público, em Araraquara.
Imagem 09 – Câmera dividindo espaço com o
público, em Bauru.
As quadras brasileiras possuem demarcações poliesportivas, ou seja, há linhas
limites de várias modalidades simultaneamente (futebol, handebol, vôlei e basquete), o
que visualmente pode dificultar a percepção de elementos próprios das regras do
basquete, como a linha de três pontos, em uma transmissão televisiva da modalidade. A
diferença fica inegável ao comparar os dois ginásios observados neste estudo. Em Bauru,
por ser a “casa” de um dos times, a quadra estava ajustada com marcações intensas para
o basquete, apesar de o ginásio ser poliesportivo. Em Araraquara, as linhas das outras
modalidades foram cobertas com fita adesiva amarela, mascarando-as visualmente na TV.
Outro fator determinante da estrutura dos ginásios para o meio televisivo é a
iluminação, pois há uma relação direta entre a iluminação e a construção visual por meio
de equipamento de captação. Sem luz não é possível transpor o espaço em imagem, pois
os contornos e as sombras dos jogadores se embaralham ou se multiplicam. Para
compensar a falta de iluminação é preciso aumentar o numero de refletores internos,
principalmente os que ficam abaixo da linha do solo.
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Imagem 10 – Ginásio em Bauru, construído
acima do solo e com demarcação específica para
o basquete.
Imagem 11 – Ginásio Araraquara, construído
abaixo da linha do solo e com demarcação
poliesportiva que foi apagada com fita.
A dinâmica do basquete é de um jogo intermitente, em que há um constante e ágil
embate entre o ataque e a defesa das equipes, com duração de 24 (vinte e quatro) segundos
de tempo de posse de bola. Por isso, para que não haja desajuste entre os tempos da quadra
e da transmissão, a emissora capta o tempo direto do placar. Assim, a equipe vencedora
é aquela que marcar o maior número de pontos, acertando a bola na cesta. E, conforme a
região da quadra em que acontecer o arremesso, a pontuação da cesta pode ser de 1 (um),
2 (dois) ou 3 (três) pontos. Isto posto, verifica-se a importância de se posicionar os
equipamentos que capturem a imagem de pontos chaves desse jogo, como a tabela e as
linhas de pontuação, principalmente as de três e o garrafão, devido às enterradas.
Em ambos os jogos observados, a Band administrou equipamentos que
elaboravam uma forma de linguagem universal à cobertura de todos os esportes, com
câmeras centralizadas e no alto e que, também, geravam imagens de pontos
caracterizadores da modalidade, como a micro câmera. No entanto, a emissora foi além e
criou uma interpretação específica, baseada nessa cultura do basquete, que a diferenciava
da outra emissora ao propôs cobrir as linhas de três em ambos os lados, com uma câmera
posicionada na diagonal e no alto do ginásio e do garrafão, com uma câmera móvel, na
linha da quadra e na lateral.
Imagem 12 – Micro câmera na tabela de
basquete.
Imagem 13 – Imagem da
microcâmera no videochecking,
disponível para a arbitragem.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Uma transmissão televisiva esportiva é um evento multifatorial e complexo, em
que o controle das variáveis envolvidas pode ser imprevisível; de forma precisa, esse
processo comunicacional é mais do as que imagens e a narração de um locutor e de um
comentarista, na tela da televisão, quando o espectador liga a sua TV. Essa visão simplista
precisa ser superada por administradores e pesquisadores do evento esportivo.
Por isso, com a proposta de elucidar os bastidores de uma produção televisiva
esportiva, esta pesquisa acompanhou o processo de produção televisiva do basquete em
dois momentos, com pesos comunicacionais diferentes, para relatar as inúmeras etapas
da rotina que os profissionais da televisão realizam antes desse programa ser elaborado.
E, com isso, mostrar as diversas decisões técnicas, tomadas em função do
ambiente físico, quantidade de equipamento, profissionais envolvidos e política da
emissora, que refletem diretamente na construção de uma linguagem visual do evento e,
consequentemente, no discurso produzido pela emissora.
Assim, quando uma instituição esportiva assume a responsabilidade de
administrar as transmissões e só se preocupa com a difusão de um discurso, adota um
papel de total desconhecimento das questões multifatoriais que englobam a transmissão
audiovisual e considera que apenas a divulgação do seu evento é fator necessário para
conquistar um grande público.
Especificamente neste caso, está-se expondo um evento nacional, em que o
esporte em evidência tenta progredir em âmbito nacional; porém, os espaços em que eles
acontecem não possuem infraestrutura adequada para uma transmissão televisiva segura.
Vários processos de produção precisaram ser adaptados para a transmissão do evento,
como a existência de um mastro fixo, na diagonal da quadra, que impeça o ângulo de
visão diagonal de uma câmera ou placar, no nível do público, que dificulte captar os
tempos do jogo. Além disso, cada emissora autorizada pela entidade esportiva para
transmitir o evento configurou o seu equipamento da sua forma, resultando na
possibilidade de se criar várias composições do jogo, que podem ser mais gerais ou
apropriadas à modalidade.
É, portanto, a questão material oculta de uma transmissão esportiva que organiza
e delimita as possibilidades de composição audiovisual, de modo a afetar diretamente o
Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação 41º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Joinville - SC – 2 a 8/09/2018
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processo de codificação dos estímulos naturais e sociais entre o jogo e o telespectador, e
que precisa começar a ser considerada nas análises comunicacionais esportivas, que são
construídas simultaneamente ao evento.
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