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GOVERNO DO PARANÁ
SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ - UEM
PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL – PDE
PROFESSORES DO ENSINO DE CIÊNCIAS DIANTE DAS IMPLIC AÇÕES DA TEORIA DA ARGUMENTAÇÃO EM SUA AÇÃO PEDAGÓGICA.
FOTOSSÍNTESE: O QUE FALAR QUER DIZER ...
ANA LÍDIA OSSAK
MARINGÁ/ PARANÁ 2009
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PROFESSORES DO ENSINO DE CIÊNCIAS DIANTE DAS IMPLIC AÇÕES DA TEORIA DA ARGUMENTAÇÃO EM SUA AÇÃO PEDAGÓGICA.
FOTOSSÍNTESE: O QUE FALAR QUER DIZER ...1
OSSAK2, Ana Lídia. RESUMO Este trabalho é resultado das reflexões sobre as contribuições da Teoria da Argumentação (Breton; Reboul; Perelman e Olbrecht-Tyteca) em um curso de Extensão Universitária com professores de Educação Básica de Escolas Estaduais de municípios da região noroeste do Paraná que pertencem ao Núcleo Regional de Educação de Maringá. Os objetivos foram trabalhar a argumentação como recurso didático em sala de aula, demonstrar o papel da Retórica na constituição e negociação dos sentidos com ênfase no ensino de ciências. Dezenove professores participaram de oito reuniões de quatro horas cada encontro. Discutiu-se a respeito da importância do aprimoramento da argumentação para o trabalho docente dos diferentes níveis e áreas de ensino. Como resultado verificou-se que os professores perceberam a necessidade de aperfeiçoarem-se em relação ao referencial teórico-metodológico e à necessidade de novos encontros de formação quanto à retórica. O grupo, apesar de concordar que foram poucos encontros, demonstrou que já começaram melhorar sua prática argumentativa na busca de alternativas para aperfeiçoar seu trabalho efetivo em sala de aula. Palavras-chave: Argumentação. Ensino de Ciências. Figuras de retórica. Fotossíntese.
SCIENCE’S TEACHERS GIVEN THE IMPLICATIONS OF ARGUME NT THEORY in THEIR CLASSROOM. PHOTOSYNTHESIS: WHAT SPEAKING WANTS TO SAY ABSTRACT This paper is a result of reflections on the contributions of the Argumentation Theory (Breton, Reboul, Perelman and Olbrecht-Tyteca) made on a course of continuing education at University, with teachers of Basic Education in State Schools localized in the cities in the northwest of Paraná State, which belong to the Regional Education Institute in Maringá. The objectives were: recognizing the argument study method in the classroom, demonstrating the role of rhetoric in the constitution and negotiation of meanings with emphasis on science education. Then, nineteen teachers took part in this study, which includes eight meetings of four hours each. It was discussed about the importance the approach of argument for the teaching methods, in different levels and Education areas. As a result of this, it was noticed that teachers became aware of the importance of improving their knowledge about these theoretical methods and aspects, and the necessity of participating in other study meetings about rhetoric. The group agreed that there were few meetings, but they showed that they were a beginning to improve their practice of argumentation in the search for alternatives to getting better its effective work in the classroom. Keywords : Argumentation. Science teaching. Figures of speech Rhetoric. Photosynthesis.
1 Artigo orientado pela Profª. Drª. Luzia Marta Bellini, do Departamento de Pós-Graduação em Educação para a Ciência e o Ensino de Matemática da Universidade Estadual de Maringá. <martabellini@uol.com.br> 2 Professora de Ciências da Rede Pública Estadual de Educação do Paraná, Colégio Estadual Rui Barbosa – EFM, Maringá-PR. Professora PDE, Turma 2008. <al.ossak@uol.com.br>
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1. INTRODUÇÃO O presente trabalho é resultado do processo de formação continuada da
Secretaria de Estado da Educação do Paraná (SEED), especificamente do
Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE), desenvolvido ao longo dos
anos de 2008 e 2009 em parceria com as IES e NREs, decorrente da intervenção
pedagógica em escola pública paranaense como meio de melhoria do processo
ensino-aprendizagem.
Para tanto, se fez necessário a elaboração e aplicação de um material didático
pedagógico como parte do processo de formação continuada de professores e
pedagogos em encontros - multidisciplinares - que visavam introduzir o professor a
algumas características básicas do pensamento a respeito da argumentação e da
retórica, além de refletir a respeito da melhoria da ação argumentativa do
professor no âmbito de suas aulas. Essa proposta foi vinculada às Diretrizes
Curriculares da Rede Pública de Educação Básica do Estado do Paraná
(PARANÁ, 2008).
A proposta de intervenção, com abordagem qualitativa, foi desenvolvida no
ambiente escolar por meio de um curso de Extensão Universitária para
desenvolver diferentes aspectos da Teoria da Argumentação e da Retórica. Para
esta tarefa foi imprescindível o referencial teórico dos estudos de Breton (2003),
Reboul (2004) e de Perelman-Tyteca (2004; 2005).
Conversar e convencer são atividades essenciais na vida humana. Sabe-se que o
mundo está estruturado na linguagem que expressa um sentido comum aos que a
utilizam. O ente da linguagem apresenta um sentido a quem fala e a quem a ouve
e a interpreta, especialmente na atividade de docência. O professor ensina o aluno
a falar, não apenas como um meio de comunicação; ele também conduzirá o
pensamento a uma determinada direção, por um caminho seguro.
Todo professor é um professor de linguagem – da Química, da Física, da Biologia
– e essa reflete os conhecimentos comuns da comunidade nas quais
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determinados sujeitos estão inseridos. A ele compete a tarefa de apresentar o
nível culto da linguagem falada ou escrita e aproximá-la à linguagem própria do
conhecimento escolar.
Muitos profissionais da educação procuram diferentes procedimentos que os
conduzam a uma maior eficácia em suas aulas. Procuram, ainda, um maior
comprometimento/atenção dos alunos ao que lhes ensinam.
Dessa maneira, consideramos relevante a importância de o professor buscar
auxílio na teoria Retórica para aprender a dialogar – ouvir e falar – com seus
alunos, avaliar, reconstituir sua fala e negociar os sentidos semânticos com o seu
auditório. Este é o exercício principal na vida docente, saber argumentar e dialogar
com seus alunos. Neste trabalho com professores direcionou-se a argumentação
do professor – relacionado, em princípio, ao conteúdo estruturante da DCE de
Ciências, a energia biológica; o qual enfoca a nutrição das plantas e a
fotossíntese.
Assim, o principal objetivo de implementação foi o de discutir com os professores
os diferentes aspectos a respeito da importância do estudo da Retórica para o
aprimoramento da argumentação do professor; bem como a proposição de
sugestões e encaminhamentos de recursos retóricos para as aulas.
2. A TEORIA DA ARGUMENTAÇÃO Argumentar é uma das ações mais importantes da humanidade. Comunicar é uma
situação que implica em parceiros e mensagens. A linguagem não se processa
desvinculada do pensamento, em outras palavras, a fala e a escrita são recursos
diretamente ligados à nossa percepção, pensamento e ação no mundo permitindo
construir realidades.
Na opinião de Breton, saber argumentar não é um luxo, mas uma necessidade. De
acordo com o autor “argumentar é racionar, propor uma opinião aos outros dando-
lhes boas razões para aderir a ela”. Tal situação na realidade é menos simples do
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que parece, além de complexa sempre mobiliza “toda a riqueza e possibilidades”
(BRETON, 2003, p. 11, 26).
A maneira ou a arte de se organizar um discurso para que fosse eficaz e
persuasivo foi fundamentada por Aristóteles, historicamente é conhecida como
Retórica clássica. Segundo Perelman (2004, p.177), tal retórica propunha “estudar
os meios discursivos de ação sobre um auditório, com o intuito de conquistar ou
aumentar sua adesão às teses que se apresentavam ao seu assentimento”, ou
seja, a adesão que o orador obtém por meio da argumentação.
Uma das funções pedagógica da Retórica é a de “ensinar a compor um segundo
plano, a encadear os argumentos de modo coerente e eficaz, a cuidar do estilo, a
encontrar as construções apropriadas, a falar distintamente [...]” (REBOUL, 2004,
p. XXII).
Perelman (2004) lista quatro condições prévias da argumentação no estudo do
discurso: a existência de uma linguagem comum; o desejo do orador de se
comunicar; o fato de o orador valorizar a opinião do auditório e a disposição do
auditório de ouvir o orador.
Como ressalta Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005, p. 19) “não basta falar ou
escrever, é preciso ser ouvido, ser lido”. Isso quer dizer que o auditório, no caso
os alunos, não são passivos receptores de comunicações, pois eles as julgam e
as pesam, refazendo o que foi comunicado. É necessário compreender que
ensinar Ciências é uma tarefa de comunicação diferente da comunicação entre os
cientistas; mesmo que no ensino utilizemos métodos de experimentação e/ou
observação, a comunicação se diferencia.
Cada pessoa confere sentido àquilo que ouve. De acordo com o pensamento
perelmaniano “o sentido é uma obra humana (...) um texto que parece
perfeitamente claro pode deixar de sê-lo quando é preciso aplicá-lo a situações
imprevistas”. Assim, não compete ao orador se responsabilizar pelos sentidos
produzidos pela totalidade de sua platéia (PERELMAN, 2004, p. 26). Para Reboul
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(2004) o sentido está ligado à função heurística da retórica, às descobertas que o
indivíduo confere ao enunciado. Para Breton (2003, p.56-85),
Argumentar é convencer com razão, é: [...] dar ao auditório boas razões para acreditar no que lhe dizemos [...]. [...] A opinião ‘comumente aceita’ é geralmente um ponto de vista atenuado que se tornou um lugar comum com uma pequena eficiência argumentativa. Aceita-se esta opinião, mas sem entusiasmo pelo fato de ser muito comum. [...] apesar de desgastada pode provocar uma certa adesão.
Para facilitar o trabalho de argumentação retórica, torna-se necessário que o
orador saiba de antemão qual é o “tipo de auditório” com o qual passará a
interagir, isso simplificará sua tarefa (PERELMAN, 2004, p. 182).
Cada auditório é único e apresenta características distintas em seu contexto. O
“contexto da recepção” para Breton (2003, p. 29) é o conjunto de valores e
opiniões que são partilhados por um auditório, previamente as apresentações do
discurso. Essas opiniões, certamente, influenciarão na aceitação ou na recusa do
argumento proferido pelo orador. Por outro lado, se o orador não tiver domínio a
respeito de seu enfoque da argumentação ou apresentá-la de modo desastrado
acabará prejudicando sua elocução. No entanto, o encanto e a emoção são
essenciais à persuasão, diz Reboul (2004, p.89). A persuasão é elemento
essencial no discurso.
A argumentação é um ato comunicativo que implica necessariamente: a
mensagem/logos, o emissor/ethos (em grego) e o receptor/pathos, componentes
essenciais, sem os quais não haveria a argumentação ou a retórica (REBOUL,
2004, p.47-49). Na situação de ensino a mensagem ou o logos deve ser
privilegiado. No entanto, ensinar é uma situação complexa que requer vários
conhecimentos e habilidades.
Um orador/professor, proficiente, antecipa a reconstituição do discurso, facilitando
a tarefa dos ouvintes, sempre tendo em mente que precisa persuadi-los de alguma
coisa. Para isso, utiliza-se das mais variadas técnicas para prender a atenção e
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facilitar a comunicação. De fato, se o enfoque for o pedagógico, o orador precisa
realmente da adesão da platéia. Para Reboul (2004, p.XVII-62), o orador eficaz
adota o estilo que convém a seu assunto.
Quanto às características do bom orador, verifica-se em Reboul (2004, p. XIX),
que não basta saber falar, é imprescindível saber a quem se destina o discurso,
“compreender o discurso do outro”. Ou seja, captar o não-dito do discurso e da
influência que o discurso acaba gerando no orador e na platéia. Por outro lado, se
o orador não tiver domínio a respeito de seu enfoque da argumentação ou
apresentá-la de modo desastrado acabará prejudicando sua elocução. O orador é
aquele que se coloca na postura de transportar a “opinião até o auditório e
submetê-la a esse auditório, para que ele partilhe dela” (BRETON, 2003, p. 29).
O uso da palavra em sala de aula é um dos recursos para o professor apresentar
os argumentos das Ciências e ainda, suscitar a participação dos alunos. O
professor usa a linguagem na intervenção com os alunos para promover a
mediação do conhecimento. A retórica do gênero epidíctico contempla alguns
recursos necessários para a melhor apresentação de um discurso e provocar a
mediação. Um desses recursos são as figuras de retórica; aquelas que auxiliam
na imaginação dos encadeamentos do argumento apresentado.
Reboul (2004) afirma que os argumentos pedagógicos referem-se às
características do discurso epidíctico, apresentadas por Aristóteles. Este gênero
caracteriza-se por ser persuasivo, em longo prazo, não exigindo decisões
imediatas. Os argumentos do tipo entimema, as figuras de estilo fazem parte das
dimensões dos argumentos próprios do raciocínio silogístico (docere) para instruir
ou ensinar o auditório. As metáforas contribuem para agradar e comover um
auditório, mas também são figuras argumentativas, pois auxiliam na expressão
dos argumentos (REBOUL, 2004, p. XVIII).
O uso de figuras na eficácia literária nunca foi ignorado. Perelman e Olbrechts-
Tyteca (2005, p. 189), afirmam que, desde a antiguidade, reconheceu-se que
alguns modos de expressão se apresentavam de maneira figurada (PERELMAN,
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2004, p.83). As figuras retóricas ajudam a compor os argumentos com a finalidade
de engajar os ouvintes devido às maneiras como são interpretadas; auxiliam na
organização e na expressão do pensamento, pois podem ser percebidas como
esquemas mentais. Ou seja, são argumentos que fundamentam a estrutura do
real.
A figura é “um recurso de estilo” ou um meio retórico funcional para o autor de um
discurso fazer uso, a fim de que a platéia aceite o argumento enquanto “exprimir-
se de um modo marcante, com encanto e emoção” (REBOUL, 2004, p. 113). As
figuras retóricas cumprem o papel de auxiliar no processo de mediação didática.
Auxiliam os alunos a conciliar o que é desconhecido e abstrato com sua realidade,
as quais provocam associações, representações e imaginações que contribuem
com a aprendizagem.
A analogia e a metáfora, grupo de argumentos de presença são procedimentos
destinados, sobretudo, a aumentar a intensidade da adesão do ouvinte. A
metáfora, por exemplo, é um recurso argumentativo que faz o ouvinte desenvolver
uma imagem a respeito do que está sendo proferido. Essa imaginação auxiliará na
adesão dos argumentos apresentados e na aprendizagem.
Para explicar a finalidade de se estudar as figuras de retórica, como recurso
argumentativo, Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005, p. 190), com a Nova Retórica,
apresentam duas características indispensáveis: a que diz respeito à estrutura e a
forma semântica do enunciado; e ao modo diferenciado de se expressar com o
intuito de chamar a atenção do ouvinte. Tal aspecto também é enfocado por
Breton que afirma a necessidade de se “apresentar as coisas de diferentes
maneiras porque tratamos com públicos diferentes”; além disso, é necessário
“levar em conta o fato de que se fala a um determinado auditório” (BRETON,
2003, p. 31).
No livro Introdução à retórica Reboul (2004) descreve algumas figuras retórica
como: Analogia: É a relação de semelhança entre dois objetos ou entes. Para
Reboul, “raciocinar por analogia é construir uma estrutura do real que permita
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encontrar e provar uma verdade graças a uma semelhança de relações” (2004,
p.185). Metáfora: figura em que consiste em designar uma coisa pelo nome da
outra que se lhe assemelha. A leitura imediata apresenta uma impertinência: “O
Eterno é meu rochedo”, para meu “apoio seguro”. Segundo Lakoff &Jhonson
(2002), a metáfora é um modo de conceber uma coisa em termos de outra, e sua
função primordial é a compreensão. Por outro lado, a metonímia tem
principalmente uma função de referência permitindo usar uma entidade para
representar outra; a relação existente é de contiguidade, enquanto que na
sinédoque é de inclusão. É o emprego do todo pela parte ou vice-versa havendo
ampliação ou redução do sentido usual da palavra. Sinédoque: figura que consiste
em designar uma coisa por outra que tenha com ela uma relação de necessidade;
devido a relação de inclusão existente entre os termos. Vários autores consideram
a sinédoque como um tipo de metonímia. Entretanto, as relações que se
estabelecem entre as palavras na produção dessas figuras são de natureza
distinta.
A mediação do professor nesse percurso é adequar o conhecimento produzido
pela ciência para a escola, com o objetivo de promover o processo
ensino/aprendizagem. A interação entre o professor e os alunos é uma relação de
diálogo. Nas aulas de ciências, o discurso verbal com questionamentos permite
uma vasta elaboração mental para troca e ampliação de compreensões, aceitando
reflexões, associações simples, além de sínteses.
Ensinar requer a "transposição didática", de que fala Reboul (2004), ou a
“mediação didática pelo professor” da Ciência para o Ensino. Tal tarefa constitui-
se em procedimento retórico, o qual pode ser analisado e conhecido; quando o
professor, em sala de aula, comunica-se com seus alunos. Adequar o
conhecimento a esses é agir como um retorista, ainda que, a qualidade desta
comunicação mude de docente para docente. A mediação didática do professor
com os recursos retóricos permite auxiliar o aluno a conciliar o desconhecido com
o que lhe é familiar. O uso dos diferentes recursos retóricos ou de determinadas
figuras representam o estilo do orador, sua intuição criadora e sua capacidade
expressional.
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Por outro lado, Nubiola (2000) aponta que uma explicação que faça uso de
metáfora, é vitalmente mais persuasiva; permite produzir uma estrutura coerente
para criar novas realidades e conceitos mediante a forma com que recebemos e
atuamos no mundo, o que, para os alunos da educação básica, é de fundamental
importância.
Para evitar incorrer em erros o orador poderá seguir um modelo. O modelo
retórico é um apoio analítico para se ter acesso às concepções da mente na
realidade dos participantes. “O modelo é mais que um exemplo; é um exemplo
dado como algo digno de imitação” (REBOUL, 2004, p.182). Em uma situação
específica do ato argumentativo, Breton afirma ser “preciso refletir sobre o
esquema de comunicação ad hoc [para o momento] (2003, p. 28). No caso de o
professor, sua condição de retorista poderá apoiar-se, ainda, nas descrições e
justificativas, nas explicações alternativas dos alunos a respeito da tese que está
sendo apresentada; as quais auxiliarão a platéia a ter acesso às suas próprias
concepções como também a respeito do que o orador/professor expõe.
3. ENCAMINHAMENTOS Para a implementação da proposta pedagógica do PDE/2008 propusemos um
curso de formação continuada aos professores do Colégio Estadual Rui Barbosa –
Ensino Fundamental e Médio. O procedimento metodológico adotado para esta
proposta fundamentou-se em uma abordagem qualitativa, tendo como referencial
teórico a Retórica e a Argumentação visando sua adequação ao espaço
pedagógico. Como os docentes necessitam de constante capacitação, tanto para
a ascensão profissional quanto para a busca de conhecimentos, verificamos um
considerável interesse dos professores.
A implementação ocorreu no primeiro semestre de 2009. Os sujeitos da pesquisa
foram os professores da Educação Básica de Ensino Fundamental e Médio.
Desse modo, o público alvo constituiu-se por professores do Colégio Estadual Rui
Barbosa – Ensino Fundamental e Médio, Iguatemi - Maringá; além de alguns
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interessados na proposta dos municípios de Mandaguaçu, Atalaia, São Jorge do
Ivaí e Maringá; das seguintes disciplinas: Ciências; Geografia; Inglês; Língua
Portuguesa; Matemática; História; Educação Física; Pedagogia; Educação
Especial (sala de recurso).
Após a constituição do grupo, ocorreu o curso de Extensão Universitária de trinta e
duas horas com oito encontros presenciais (aos sábados pela manhã) e
semipresenciais (durante a hora atividade do professor). Os instrumentos de
coleta de dados foram: a) as entrevistas descritivas a respeito do referencial
teórico e prática pedagógica; b) as reflexões em torno do referencial teórico
estudado e sua relação com a prática pedagógica do docente; c) a relação com a
produção do material didático produzido; d) a observação direta da ação
argumentativa de alguns professores; e) a análise do modelo argumentativo de um
tema de Ensino da Educação Básica organizado pelos professores.
Durante o curso houve: a) sessões de leitura dos estudos sobre retórica; b) debate
sobre os conceitos básicos da Teoria da Argumentação; c) filme a respeito da
evolução e a necessidade da linguagem humana; d) apresentação de slides que
consideraram a conjuntura argumentativa no contexto escolar; e) discussões a
respeito da argumentação empírica do professor – especialmente em aulas de
ciências; f) debate com sistematização das discussões a respeito das leituras e a
respeito da argumentação na situação de ensino; g) a proposição de um modelo
argumentativo de um tema de Ensino da Educação Básica organizado pelos
professores; h) proposição de sugestões de encaminhamentos e uso de diferentes
recursos retóricos que auxiliem o professor em sua atividade diária de
argumentação.
Nessas sessões exploramos as possibilidades do uso da palavra durante a
elocução pedagógica sob o enfoque retórico do gênero epidíctico. Assim, fez-se
necessário aos professores compreender seu papel na mediação entre o
conhecimento escolarizado e o conhecimento de senso comum. Além disso, o
curso conduziu o professor a pensar sobre suas aulas e sobre como poderia
melhorar sua prática argumentativa.
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O enfoque principal, neste contexto argumentativo, foi apresentar as figuras
retóricas, ou figuras de linguagem como chamam os linguistas, na negociação de
sentido do conhecimento escolarizado com os alunos, visto que, são recursos – ou
palavras organizadas de modo diferenciado – que auxiliam a linguagem humana e
especialmente a situação de ensino e de aprendizagem.
Desse modo, decidimos obter informações sobre como o professor toma a palavra
frente a seus alunos. No primeiro momento coletamos as concepções dos
professores a respeito da argumentação na situação de ensino com o uso de um
questionário. Na segunda etapa, após o estudo do referencial teórico, verificamos
o modo pelo qual o professor organiza e aplica o discurso numa situação de
ensino. O objetivo foi verificar a presença de alguns recursos retóricos na
apresentação dos argumentos escolarizados.
Nas transcrições dos comentários dos professores apresentamos a indicação C1
para um dos professores de ciências; do mesmo modo, LP2 significa um dos
professores de língua portuguesa. Lembramos que apenas no pré-teste houve a
indicação da disciplina do professor; nas demais atividades os cursistas não se
identificavam, já que essa pesquisa não apresenta preocupação estatística com
necessidade de identificação do professor por disciplina. Portanto, a partir do
segundo encontro as transcrições de suas contribuições foram indicadas apenas
com P (de professor).
3.1. REFLETINDO COM OS PROFESSORES A TEORIA DA ARGUMENTAÇÃO NO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM
A argumentação do professor orienta seu trabalho pedagógico. No momento em
que antecedeu o início do curso foi aplicado um questionário aos professores com
o intuito de conhecer suas opiniões a respeito do entendimento prévio a respeito
do que pensam sobre a argumentação na situação de ensino. O questionário
apresentou enfoques quanto à habilidade comunicativa para sustentar a atenção
dos alunos nas aulas: a maioria dos professores acredita ter habilidade
comunicativa para prender a atenção dos alunos. Um dos professores de ciências
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C1 afirmou que “poderia ser melhor”. Essa idéia sugere a necessidade de
aperfeiçoamento teórico e prático a respeito do ato de tomar a palavra; oferece
entendimentos a respeito de uma auto-reflexão a respeito de prováveis falhas
durante o ato argumentativo. Por outro lado, o professor C3 afirma que sua
habilidade comunicativa esta relacionada ao aspecto de seu enfoque
metodológico: “Procuro estar relacionando o conteúdo a fatos que eles assistem
em programas de TV, veem na internet, jornais”. Estas idéias são indícios da
reflexão docente a respeito da sua fala.
Quanto às características do professor na exposição dos argumentos destacamos
a opinião de C5: “ Para expor é necessário ter clareza, domínio de conteúdo... não
ser repetitivo, sempre que tiver que ‘repetir’ [sic] a explicação, usar um modo
diferente para expor o conteúdo”; o professor EF1 afirma que o professor deve
apresentar bem suas idéias e “apresentá-las de forma organizada. Ao contrário, o
professor enfrenta dificuldades se o tom de voz demonstra insegurança, fala baixo
demais, lento ou rápido demais, não articula bem as palavras ou concordância”.
Nesses comentários, implicitamente, os professores destacam a importância da
organização do discurso e da boa argumentação.
Quando enfocado o aspecto a respeito de saber argumentar ser uma necessidade
foi ressaltado que a argumentação escolar visa apresentar a verdade acerca dos
conhecimentos acumulados historicamente. Essa verdade precisa ser oferecida
aos alunos como o uso de recursos metodológicos e da apresentação de palavras
apropriadas que ampliem a compreensão dos alunos.
A linguagem, ou o argumento do professor, é um esforço realizado para construir
explicações sobre o mundo, além de oferecer interpretações a respeito de um
tema. Nesse caminho, o professor P9 afirma que:
“a frase ‘saber argumentar não é um luxo, mas uma necessidade’ consiste no contexto escolar da necessidade do professor ter que mostrar ao aluno uma verdade científica, o qual é necessário explicar com clareza, com segurança no diálogo, pois a linguagem é um objeto do processo de aprendizagem dos conteúdos científicos, sendo um instrumento de mediação no processo de ensino”.
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O professor/locutor organiza as idéias durante a conversa da aula
(argumentação); estabelece relações e possibilidades de entendimento. Desse
modo, P13 considera que a “língua é parte social da linguagem, para se
argumentar é necessário que se defenda o ponto de vista sobre determinado
assunto, que tem que ser fundamentada, introduzir a idéia principal, desenvolver
os argumentos e firmar a idéia principal, ou seja, concluir.” Além desse aspecto, o
mesmo professor enfoca questões a respeito da oratória, ou seja, “com os
encadeamentos seja dos conteúdos de sala ou exposições das idéias, se consiga
chegar ao objetivo que é como o professor passa o conhecimento de forma clara e
consistente para o educando”. Portanto, ao professor compete o entendimento a
respeito do que o aluno fala; ao mesmo tempo em o aluno precisa compreender o
que o professor expõe em suas aulas. Saber conversar e convencer é, portanto,
com diz Breton (2003), necessidade do professor.
Quanto ao contexto de recepção dos argumentos na prática pedagógica
verificamos que as várias interações que acontecem entre professores e alunos
auxiliam a ambos no desenvolvimento da aula. No entanto, o professor vive a
angústia de tomar a palavra em ambiente, muitas vezes, conturbado – reflexos de
diferentes aspectos sócio-político-econômicos. Esta condição ratificada pelo
professor P16 quando diz que “Na prática do dia-a-dia quando eu assumo o papel
de orador enfrento muitas dificuldades em argumentar, nem sempre o auditório
está em sintonia, impossibilitando a recepção. Desse modo devo ser não apenas
um orador e sim um artista”. O professor P3 expõe suas angústias quando afirma
ser “difícil este processo, visto ter muitos fatores que interferem no processo.
Acredito que eu preciso melhorar nos argumentos, pois muitas vezes acho difícil
prender a atenção dos alunos, incitarem a curiosidade e fazê-los aprender”.
Outro aspecto destacado foi quanto à escuta dos alunos, aspecto fundamental no
processo. De acordo com o contexto de recepção enunciado por Breton (20030, o
P5 afirma que “depende da turma, todos os componentes têm que estar em
sintonia: professor-assunto-aluno. Mas, como emissor, o professor tem que
prender a atenção; e até trocar o emissor; e até levar ao debate”. Como afirma
Perelman (2004), a disposição do auditório é uma condição essencial para a
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argumentação. Durante as aulas é importante que o professor permita a inversão
de papéis; que se torne ouvinte e que promova o papel de locutor aos alunos.
Desse modo, passará a valorizar suas opiniões, seus sentidos, além de facilitar a
contextualização do tema abordado. A argumentação em sala de aula é epidíctica
e não judiciária.
O modo de exposição dos argumentos pelo professor implicará, ou não, o
aluno/auditório em seus argumentos. O professor precisa organizar estratégias
que atraiam o aluno/ouvinte para a verdade do conhecimento escolarizado que
comunica para que seu raciocínio e sentido ocorram de maneira correta. Se o
assunto interessa ao professor e ele deixa transparecer seu interesse,
imediatamente os alunos passarão a se envolver com o que o professor fala. De
acordo com P11 “Valorizo o conhecimento do aluno conversando sobre aquilo que
ele já sabe sobre o tema estudado/proposto. Quando possível realizamos
experimentos e as metáforas (auxiliam no processo de mediação didática) para
que o aluno faça uma imagem daquilo que está sendo estudado. Através do
diálogo ocorrem reflexões, as associações e os esclarecimentos do senso comum
para o científico”. Assim o aluno cria expectativas positivas sobre o tema e sobre a
elaboração dos argumentos do professor. Como diz Polya: “Faça-os aprender a
dar palpites”.
Quanto à avaliação a respeito da persuasão gerada pelos argumentos utilizados
em sala de aula verificou-se que a linguagem permite descrever e construir
realidades. Quando se fala é preciso organizar as idéias para apresentar a
realidade (verdade) que se expressa a fim de que o ouvinte/auditório possa
compreender e reconstruir em seu imaginário o que foi dito. Nesse sentido, o
professor LP1 considera bons seus argumentos quando “prende ou não a atenção
do aluno. Ou se o educando argumenta, questiona sobre esse assunto”. O
professor H1 aponta os mesmos indícios de persuasão verificados quando ocorre
“o envolvimento do aluno com o tema. Se ele questiona, faz comparação,
percebem mudanças, semelhanças (ou) diferenças, concorda ou discorda e
argumenta”. Em face dessa verdade apresentada em sala de aula o professor C3
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diz que é frente à “avaliação que é onde percebemos o quanto nossa fala foi
significativa ou não”.
Um papel fundamental na atuação docente é o aspecto de refletir sobre sua
prática e aperfeiçoar-se continuamente para a ação de argumentação no ambiente
pedagógico.
3.2. OS PROFESSORES FRENTE ÀS IMPLICAÇÕES DA TEORIA EM SEU FAZER PEDAGÓGICO
O exemplo da Unidade Didática Pedagógica - Fotossín tese: o que falar quer dizer
Os saberes a respeito dos recursos argumentativos necessários à prática
pedagógica são indispensáveis à vida do professor, para que ele possa
desempenhar bem sua função educativa. É importante pensar a própria ação
docente e aos poucos alterar algumas situações com a finalidade de aprimorar as
aulas e a exposição dos argumentos aos alunos.
Neste processo foi utilizado, como roteiro para reflexão, a Unidade Didática
produzida no 2º semestre de 2008 a respeito da fotossíntese. Este momento da
implementação consistiu na reflexão sobre como o professor percebeu a
exposição de argumentos baseando-se no exemplo da Produção Didático-
Pedagógica: Fotossíntese: o que falar quer dizer3. Este tema foi elaborado com
objetivo de exemplificar, gerar opiniões e sugestões para o avanço qualitativo na
ação argumentativa do professor.
Após a apresentação em slides houve comentários e discussões a respeito da
pertinência da produção didática pedagógica para o trabalho argumentativo e
didático do professor.
3 Vide produção pedagógica do Material Didático (MD) PDE2008 no endereço eletrônico: dia a dia educação.
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Observemos as considerações de P3 a esse respeito: “O trabalho fotossíntese
apresentado possui as características de uma argumentação que leva a uma
mudança de opinião. As ilustrações e os questionamentos induzem a uma
sustentação de argumentação por comprovação sugerindo experiências práticas a
partir das informações”.
De acordo com o professor P4 existe a necessidade da organização de um
esquema simplificado que direcione o trabalho do professor “Na prática diária,
ainda há certa dificuldade em sistematizar esse método, creio que seja necessário
um roteiro de implementação, onde estejam descritos os passos a serem seguidos
para que a argumentação e a retórica sejam realmente implementadas”.
Quanto ao exemplo discutido P1 aponta que o exemplo apresentado na Unidade
Didática utilizado em sua aula auxiliou o aluno no raciocínio e na compreensão da
aula: “ Usei o recurso da exposição argumentativa procedendo à exposição dos
textos utilizados em sala de aula e foi aceito; em seguida foi aplicado atividade
prática com base no modelo apresentado no item 4 (quatro) do trabalho
fotossíntese da página 21 (vinte e um). O aluno conseguiu fazer uma relação entre
os intemperismo, decomposição e solo. Foram apresentados os fatos específicos
de cada estágio para que o aluno compreendesse cada relação”.
Por outro lado, P9 diz acreditar ser “viável, mesmo porque já realizei algumas
adaptações. Quando estivemos em curso, colegas apresentaram alguns planos de
ação, então aproveitei determinadas situações, mesmo sendo de diferentes
áreas e adaptei nas minhas aulas”. Por outro lado, o mesmo professor prossegue
afirmando que “se tivéssemos recursos de pesquisas que nos ajudem e ofereçam
aporte (modelos, esquemas) para nossa atuação em sala, nosso trabalho seria
muito mais produtivo e convincente, pois nos falta conhecer técnicas discursivas
para o aprimoramento da argumentação. Portanto seria viável que fosse ofertado
aos professores da rede pública, uma proposta de estudo a cerca da
argumentação e da retórica que permeie o processo de ensino aprendizagem”.
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3.2.1. PROFESSORES EM CONFLITO: COMO ORGANIZAR O DISCURSO ARGUMENTATIVO?
A escolha de argumentos e da estratégia argumentati va:
Tomando como ponto de partida a Unidade Didática citada anteriormente
procurou-se organizar estratégias e possibilidades de aplicação metodológica em
relação ao referencial teórico estudado. Longe da pretensão de elaborar um
modelo inflexível, pronto e acabado a intenção foi de apresentar um exemplo com
algumas perspectivas de argumentação docente vinculado a um determinado
tema. A partir dessa discussão foi pedido aos professores que pensassem a
respeito da possibilidade de usar alguns recursos estudados durante o curso. Bem
como, na elaboração um modelo organizado de apresentação dos argumentos de
um assunto de sua área de atuação. Nosso objetivo principal com essa atividade
foi a de perceber algum padrão na atividade docente (metodologia) de sua arte de
ensinar aliado aos recursos argumentativos e retóricos.
Nesse tópico apontamos algumas práticas discursivas e o uso de recursos
argumentativos das aulas (especialmente de ciências). As figuras de linguagem
surgiram durante o processo como possibilidade de articulação entre o raciocínio
formalizado e o contexto do aluno. Ou seja, ajudaram na apresentação dos
argumentos criando efeitos para atrair a atenção dos alunos.
Observemos alguns dos modos de disposição dos argumentos empregados pelos
professores em suas aulas e apresentados durante o curso:
Situação I: P1- Aula de Ciências
Tema: O ciclo da água na natureza Narração: Desenho do ciclo da água. - Uso de modelo; metonímia. - para onde vai a água da chuva? E a água dos rios, mares e oceanos? - Choveu! As poças de água que estavam no quintal secou. Para onde foi? Como ela fez o trajeto?
A mediação didática é verificada com argumentos de exemplos do senso comum.
Na busca de uma situação ideal de argumentação o professor apresenta
argumentos que estejam associados ao contexto do aluno; ele cria associações
entre os conceitos e fenômenos para superar as dificuldades do processo de
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abstrações e compreensão dos novos vocábulos específicos da educação formal.
O orador é aquele que se coloca na postura de transportar a “opinião até o
auditório e submetê-la a esse auditório, para que ele partilhe dela” (BRETON,
2003, p. 29). Nesse momento, surgem as figuras retóricas (ou linguagem) auxiliam
na forma (metodologia) adotada pelo professor/orador que visa uma situação ideal
de argumentação, além de auxiliar na expressão dos argumentos (REBOUL,
2004, p.XVIII).
A maneira como o professor inicia ou termina uma explicação, como repete,
interrompe e questiona, reforça as repetições, etc., apresenta certos padrões que
revelam um modo retórico em ambiente interativo. Desse modo, seleciona
determinados aspectos para contextualizar a situação que pretende apresentar.
Ou seja, negocia múltiplos pontos de vista (fatos, idéias, opiniões, discussões). É
imprescindível saber a quem se destina o discurso, “compreender o discurso do
outro” (REBOUL, 2004).
Desse modo, distingui-se o que é mais e o que é menos importante na
argumentação apresentada. Quando um professor contextualizou suas aulas
(apresentou suas idéias a respeito de determinado conceito científico) destacou
situações do cotidiano dos alunos manifestando o uso de linguagem figurada; a
metafórica, por exemplo. Desse modo, ajuda a compor os argumentos com a
finalidade de engajar os ouvintes devido às maneiras como são interpretadas;
auxilia na organização e na expressão do pensamento. Tal aspecto viabiliza a
mediação do conhecimento cotidiano com o escolarizado democratizando o
conhecimento.
Um dos recursos figurados utilizados foi a metonímia; a entidade chuva representa
o todo que é a água. O professor empregou várias partes (chuva, poça, rio) para
designar o todo (água).
Os argumentos marcam o estilo de encadeamento de idéias do professor; os
recursos retóricos são usados para expressar a realidade do modo como deseja
que ela seja vista, percebida ou entendida pelo aluno.
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Os questionamentos verificados no exemplo são um modo (recurso/forma)
utilizado pelo professor para conseguir a implicação do aluno àquilo que ele fala e
apresenta. Uma das condições prévias da argumentação é o desejo “do se
comunicar” (PERELMAN, 2004). Durante a apresentação do conhecimento
escolarizado o professor procura falar de um modo eficaz para que sua
transmissão seja eficiente para o sentido do aluno/ouvinte. De acordo com
Perelman (2005, p.1), “o campo da argumentação é o do verossímil, do provável”.
Para o autor, uma argumentação é eficaz quando aumenta a intensidade da
adesão, de modo a desencadear no ouvinte uma ação pretendida, ou que se crie
uma disposição para tal ação.
Valorizar as idéias dos ouvintes consiste em atrair sua atenção para as palavras-
chave. Nesse sentido o pesquisador do ensino matemático, Polya, afirma que
ensinar é uma arte e aprender acontece a partir das observações, das situações
parecidas.
No entanto, a dinâmica discursiva do professor pode ser persuasiva, ou não, de
acordo com o sentido que o recurso retórico adotado produza em seus ouvintes.
De acordo com Aristóteles, só se deve persuadir para aquilo que é verdadeiro ou
verossímil.
Situação II: P2- Aula de Ciências
Tema: Biosfera - Compreender as características básicas dos seres vivos; Narração: Biosfera = bio: significa vida; esfera: sinônimo de redondo. -Uso de Prefixo/sufixo. Provas: Montagem do aquário (no laboratório). -Uso de Modelo; comparação; sinédoque.
Na situação de ensino a mensagem ou o logos deve ser privilegiado. Portanto,
ensinar é uma situação complexa que requer vários conhecimentos e habilidades.
O discurso escolarizado proveniente dos conceitos científicos apresenta
expressões apropriadas, muitas vezes desconhecidas pelos alunos. Neste caso, a
narração do professor inicia-se com um argumento quase lógico, constituído na
definição promovida pelo prefixo e sufixo que compõe a palavra biosfera.
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Como prova de seus argumentos o professor faz apelo a pressupostos comuns.
Com a ajuda do aquário modifica o contexto de recepção dos argumentos e
convence os alunos com o enquadramento do real (BRETON, 2003). O aquário
cumpre a função de prender a atenção do ouvinte (adesão) e facilitar a
comunicação (REBOUL, 2004). O professor, em sua prática, redimensiona-a (de
um domínio cultural para outro) explica e dá funcionalidade a esses termos
permitindo que o aluno produza os significados e sentidos apropriados aos
conceitos, aos fatos e aos fenômenos estudados. Desse modo, o professor
consegue compartilhar a argumentação e a observação com seu auditório
(BRETON, 2003).
A semelhança entre o aquário e uma variedade de outras situações do
ecossistema permite ao aluno perceber relações e, a partir da amostra,
compreender os fenômenos submetidos à generalização simbólica do aquário. De
acordo com Reboul (2004) “o modelo é mais que um exemplo; é um exemplo dado
como algo digno de imitação”. O aquário é um modo metodológico para efetuar a
persuasão do auditório.
Nesse caso, os argumentos se apóiam na estrutura do real; faz nexos e
comparações entre as coisas. Ou seja, o professor usa o recurso da sinédoque;
procura ir de um contexto particular para um contexto geral. Ou seja, seu
significado foi transferido a todos os ecossistemas com a elaboração de
generalizações – vai do fato à regra. O modelo estrutura o discurso escolarizado
apresentado.
O professor percorreu o caminho argumentativo do particular para o geral; das
metonímias à sinédoque - figura que explicita a generalização. O aluno precisa
compreender o percurso realizado a fim de promover uma significação coerente e
sólida a respeito da comparação com o modelo por ela adotado para expor seus
argumentos.
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Dessa maneira, o aluno constrói uma imagem de um todo unitário a partir da
lógica da representação do aquário. Cabe ao aluno fazer o caminho inverso:
utilizando a idéia de representação promover a generalização. Ou seja,
compreender a idéia da representação buscando entender o processo numa
construção geral. Ambos são processos inversos que não se excluem, porém se
complementam sendo essenciais na construção do conhecimento.
Situação III: P4 - Aula de Ciências
Tema: Célula Narração: Questionamentos aos alunos a respeito de como é a constituição dos seres vivos. De que são feitos? Como é essa estrutura? Como são constituídos? As partes são iguais? São do mesmo tamanho? -Uso de Repetição
Comparação com a sala de aula: De que a sala é feita? “Parede, Porta, janela, carteiras, cimento, ferro, tinta, tijolos”.
- Parede como se fosse a membrana; A parede tem porta e janelas que permitem a passagem de materiais. A membrana permite a passagem de substâncias intra e extracelulares. Comparação com os tijolos da parede. Esquema de célula no quadro comparando com a célula macroscópica conhecida pelos alunos: o ovo. -Uso da Metáfora do transporte; Analogia; sinédoque. Provas: Visualização de célula ao microscópio. -Uso da Demonstração.
Nesse exemplo, as metáforas que o professor utiliza, de maneira consciente ou
inconsciente, visam relacionar os conceitos estudados sobre a célula com
situações experimentadas pelo cotidiano do aluno (a própria sala de aula) com o
objetivo de facilitar a compreensão de algo microscópico. Ou seja, verificamos a
Metáfora de interface: a elaboração de um modelo mental que representa a
estrutura e a posição relativa de um conjunto de objetos do mundo real. Ou, de
acordo com Lakoff e Jonhson (2002), é uma metáfora orientacional, pois oferece
uma orientação espacial; organiza o sistema de conceitos a respeito dos
componentes celulares em relação aos objetos da sala de aula - orienta
espacialmente os alunos. A parte mais externa da célula é relacionada com a
parede da sala (o mais externo) e o que está dentro da sala (o mais interno) como
se fosse o citoplasma, organelas e núcleo. Essa elaboração metafórica é quase
sempre de modo inconsciente.
No caso do uso da analogia o professor recorreu a uma noção de proximidade
com o assunto; com semelhança de relações entre os termos (“como se”) para
facilitar a compreensão do raciocínio. Esta figura cumpre o papel de adaptar a
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opinião. São dois argumentos, cada qual com sua dimensão própria (a membrana
celular é representada pela parede da sala de aula; os objetos da sala como as
organelas citoplasmáticas). Desse modo, o professor considera que o contexto de
recepção dos alunos foi modificado - e os ouvintes começam a aderir aos
argumentos. Muitas vezes, a apresentação de argumentos pelo exemplo implica
em uma comparação.
As metáforas, os modelos e analogias formam uma ponte para aquisição de
conhecimentos e conceitos novos. O exemplo funciona como um modelo mais
geral de metáfora, sobre o qual o aluno poderá refletir e buscar conexões e
sentidos para a aprendizagem.
Quanto às provas, o retor apresenta vários elementos da sala de aula com o
objetivo de provocar a adesão dos alunos além de encaminhá-los aos novos
conceitos sobre a estrutura da célula.
Além disso, a gesticulação do professor ajuda a expressar e representar uma
analogia. Esta, por sua vez, não será uma expressão inconsciente. Existe o desejo
do orador em contextualizar os fenômenos e suas representações. Segundo
Reboul (2004, p. 185) “raciocinar por analogia é construir uma estrutura do real
que permita encontrar uma verdade graças à semelhança de relações (...) na
argumentação, as relações são simplesmente semelhantes”. Para Perelman
(2005), a analogia pode ser trocada por um raciocínio pelo exemplo ou pela
ilustração. Para contextualizar o professor usa a linguagem figurada; faz relações
entre os diferentes campos do conhecimento – são artifícios para inserir o
conteúdo científico e problematizar a situação nova que está sendo trabalhada.
A respeito dos exemplos de argumentação expostos nas três situações
verificamos a presença de diferentes recursos retóricos que representam o estilo
do orador, sua intuição criadora e sua capacidade de expressão. De acordo com
Breton consideramos e verificamos a necessidade de se “apresentar as coisas de
diferentes maneiras porque tratamos com públicos diferentes”; além disso, é
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necessário “levar em conta o fato de que se fala a um determinado auditório”
(BRETON, 2003, p. 31).
Além da constituição e apresentação dos modelos de aula apresentados
anteriormente numa nova etapa da implementação pedagógica propomos aos
docentes cursistas que refletissem e comparassem o seu modo de organização
discursivo com as demais propostas apresentadas refletindo a respeito de sua
aplicabilidade (ou readaptação) a seu modo de tomar a palavra frente aos alunos.
Pois, de acordo com Polya, “Quem ensina não pode esquecer que também é um
aprendiz”.
Portanto, com relação à proposta de elaboração de um modelo de discurso
escolar, verificamos que a maioria dos professores considerou que houve pouco
tempo disponível de curso e pouco tempo profissional para elaborá-la. Outro
aspecto que devemos considerar foi quanto à dificuldade em descrever a
apresentação das idéias do discurso escolar. Nesse sentido destacamos que o
professor P2 não conseguiu concluir a atividade e afirmou que “O fator tempo foi o
motivo primordial... Achei complicado relacionar a teoria com a parte prática em
sala de aula. Nós professores necessitamos de tempo para aprimorar nossas
aulas”. Já o professor P8 afirma que “Quanto à parte que se destina a figura de
linguagem no plano de aula, nós não fazemos com freqüência em nossa prática
de sala de aula”; ou, os professores ainda não se atentaram ao fato de que
inconscientemente usamos diversos recursos figurados em nossa fala diária.
Porém, a maior dificuldade para P10 foi transcrever “aquilo que eu pretendia
apresentar, identificando claramente os aspectos específicos da argumentação na
aula”.
Para o professor é importante saber usar os recursos retóricos, da melhor forma
possível, com o intuito de facilitar seu trabalho e conseguir maximizar a
aprendizagem dos alunos. Contudo, sabe-se da dificuldade em modificar hábitos
próprios e hábitos dos alunos. Entretanto, alguns cursistas consideraram a
viabilidade de alguns aspectos do curso em sua prática pedagógica como afirmou
P17: “a troca de experiências, pois o tema de um professor dá idéias de aula para
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outro professor; e sempre ter claro que o ‘desenvolver’ da aula depende muito do
interesse do auditório (alunos): uma turma nunca é igual à outra”. Já o professor
P16 afirmou que achou “significativos os exemplos trazidos pelos demais
professores, já pensando em usar determinado modelo em minhas aulas.
Também destaco a importância da valorização da contribuição do aluno e como
utilizar-me disso para melhorar a aula”. Nesse caso, verificou-se que o curso
desenvolvido de modo interdisciplinar trouxe benefícios aos participantes.
Conforme depoimentos durante os encontros, a maioria dos professores iniciam
sua atividade profissional sem saber como organizar o que e como “falar” sua
aula, ou seja, tomar a palavra durante os minutos de uma hora-aula. Nesse
sentido, ensinar exige segurança do que pensa e fala; competência no ato de
tomar a palavra e de organizar a sequência lógica desse ato; exige ainda
determinados recursos metodológicos ou lingüísticos que auxiliem essa prática.
Por outro lado, no que se refere à receptividade do aluno frente ao uso dos
recursos retóricos os professores afirmaram que verificaram diferentes aspectos
positivos quanto à apresentação de um discurso mais organizado e ao uso de
alguns recursos implicando na facilidade de apresentação dos temas aos alunos;
na concentração da fala do professor; na maior participação dos alunos durante as
aulas. Nesse sentido P1 afirmou que “passei a ter mais cuidado, percebi que muita
coisa fazia de modo superficial e incorreto, quando passei a aplicar a
argumentação vista no curso, melhorou a participação dos alunos nas aulas e
troca de experiência passou a ser mais freqüente”. P2 considerou que teve
condições de “observar melhor minhas atitudes e falas diante de cada conteúdo
trabalhado e isso facilitou até mesmo a preparação de atividades mais atrativas e
de mais fácil compreensão para os alunos”. A estrutura organizada controla o fluxo
de informações além de contribuir para a compreensão do ouvinte
A mudança gradual na atitude docente pode ser verificada no depoimento de P8:
“comecei a falar mais pausadamente, e a utilização de recursos como analogias,
comparações demonstrações, com mais frequência, estão possibilitando aos
alunos uma compreensão mais sólida do conteúdo, tenho percebido isso nas
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avaliações”. Quanto às implicações da atitude do professor frente a aprendizagem
do aluno P2 aponta que “nós professores nos colocamos como oradores, ao
mesmo tempo que somos ouvintes das necessidades e dificuldades dos alunos,
quando nos utilizamos de comparações, quando articulamos o raciocínio com o
tema, tudo isto com o intuito de ajudar o aluno a concretizar o conhecimento,
inserindo-o no processo ensino-aprendizagem”.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Consideramos que o trabalho de intervenção desenvolvido na escola não foi uma
tarefa simples, mas foi uma experiência muito significativa. Com esta pode-se
verificar como a teoria e a prática se aproximam numa proporcionalidade clara de
idéias entre o referencial teórico e a participação do grupo de professores. A
principal meta do curso realizado foi fomentar a discussão e a manifestação de
opiniões a respeito da argumentação e da retórica na situação de ensino foi
alcançado. O uso da linguagem verbal é essencial, não está restrita ao ensino e,
portanto, precisa ser constantemente aprimorada. O professor é um comunicador
e precisa estudar a argumentação. Cabe a este orientar o discurso na direção do
conhecimento escolar.
A Retórica como arte e técnica do discurso pode ser um aporte aos estudos do
Ensino de Ciências para que o docente possa explorar e compreender as formas
de recepção da linguagem ou do conhecimento científico escolarizado pelos
alunos. O (des) conhecimento a respeito da teoria e da sua relevância para o
ensino influencia diretamente a atuação do professor em sala de aula e na adesão
dos alunos. Cremos que a arte Retórica poderá preencher a lacuna que temos na
didática; dará suporte ao professor a fim de organizar seu discurso, ajudará na
seleção dos melhores recursos e sua adequação à finalidade pedagógica e
didática ao mesmo tempo em que se torne um meio de aperfeiçoamento da
argumentação docente.
O professor precisa ser instruído quanto à escolha dos melhores modos de tomar
a palavra para apresentar o currículo escolarizado aos alunos, independente do
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fundo – das interferências e variações que acontecem nas diferentes turmas de
alunos.
Há muito que se explorar na prática discursiva do professor como a organização
do esquema (mental ou não) ou organização geral que dá sequência, coerência e
hierarquia nas proposições do discurso, como os enunciados se combinam aos
recursos retóricos que visam promover a adequação do discurso à vivência do
ouvinte.
5. REFERÊNCIAS ARISTÓTELES, Tópicos; Dos Argumentos sofísticos / Aristóteles; seleção de textos de José Américo Motta Pessanha; tradução: Leonel Vallandro e Gerd Bornheim da versão inglesa de W. A. Pickard. São Paulo: Abril cultural, 1978. BRETON, Philippe. A argumentação na comunicação. Tradução de Viviane Ribeiro. 2ª ed. Bauru, São Paulo: EDUSC, 2003. DCE: Diretrizes Curriculares de Ciências para o Ensino Fundamental. Secretaria de Estado da educação do Paraná Superintendência da Educação. Departamento de Educação Básica, 2008. LAKOFF, George & JONHSON, Mark. Metáforas do cotidiano. São Paulo: Mercado de Letras, 2002. NUBIOLA, Jaime. El valor cognitivo de las metáforas. Cuadernos de Anuario Filosófico nº 103, Pamplona, 2000. pp. 73-84. Disponível em: <http://www.unav. es/users/valorcognitivometaforas.html>. Acesso em: 23 set. 2005. OSSAK, A.L. Professor, aluno e livro didático em aulas de ciências, análise retórica dos argumentos didáticos. Dissertação (Mestrado em Educação Para a Ciência e o Ensino de Matemática) - Universidade Estadual de Maringá. 2006. PERELMAN, Chaïn. Retóricas. Tradução de Maria Hermanita de Almeida Prado Galvão. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2004. PERELMAN, Chaïn e OLBRECHTS-TYTECA, Lucie. Tratado da argumentação: A nova retórica. Tradução Maria Hermanita de Almeida Prado Galvão. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2005. POLYA, George. Aprender, ensinar e aprender a ensinar. Disponível em <http://www.educ.fc.ul.pt/docentes/opombo/seminario/polya/traducao.htm> Acesso em 15 out.2008. REBOUL, Olivier. Introdução à Retórica. Tradução Ivone Castilho Benedetti. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2004. 241 p.