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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
SUCESSÃO LEGÍTIMA DOS CÔNJUGES NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
TATIANE ROSEMAR MEISTER
Itajaí, 06 de junho de 2006.
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
SUCESSÃO LEGÍTIMA DOS CÔNJUGES NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
TATIANE ROSEMAR MEISTER
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Professora MSc Denise Schmitt Siqueira Garcia
Itajaí, 06 de junho de 2006.
AGRADECIMENTOS
Meus sinceros agradecimentos aos meus pais, por serem a razão da minha vida, e pelo apoio tanto nos momentos de alegrias como nos momentos mais difíceis. Por estarem torcendo por mim sempre. Como também pelo amor e carinho que a mim dedicam.
A minha vó Dirléia, pelo incentivo em todos os momentos que precisei, deixo aqui minha eterna gratidão.
Meu sincero agradecimento as minhas amigas Marina e Helen por estarem sempre presentes e dispostas a ajudar, tanto na pesquisa bibliográfica, como também pela amizade e confiança a mim dedicados.
A professora Denise pela excelente orientação, apoio e sugestões que foram sempre muito valiosas para a conclusão do presente trabalho.
Enfim, meu profundo agradecimento a todos aqueles que, aqui e ali, tornaram possível a conclusão desta monografia.
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho aos meus pais, Eduílio Edson Meister e Marta Schreiner Meister por acreditarem na minha capacidade, e cujo amor a mim dedicado é meu alimento e amparo, sendo
sempre meu porto seguro. .
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí, 06 de junho de 2006.
Tatiane Rosemar Meister Graduanda
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Tatiane Rosemar Meister, sob o
título Sucessão Legítima dos Cônjuges no Ordenamento Jurídico Brasileiro, foi
submetida em 06 de junho de 2006 à banca examinadora composta pelos
seguintes professores: Professora MSc. Denise Schimitt Siqueira Garcia,
Professora MSc Ana Lúcia Pedroni e Professora MSc. Andrietta Kretz, e aprovada
com a nota 10 (dez).
Itajaí , 06/06/2006
Denise Schmitt Siqueira Garcia Orientador e Presidente da Banca
[Professor Título Nome] Coordenação da Monografia
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.
Ascendentes 1
Aqueles de quem se descende, antepassados.
Causa Mortis 2
A causa determinante da morte. Diz-se do imposto pago sobre a importância
liquida da herança ou legado
Cônjuge 3
Cada uma das pessoas ligadas pelo casamento em relação à outra.
Cônjuge sobrevivente ou cônjuge supérstite 4
Aquele que era casado com o falecido e sobrevive a este.
Descendentes 5
Aqueles que descendem do de cujus
De cujus6
A pessoa que faleceu e que por esta ocasião deixa o seu patrimônio aos seus
sucessores.
Direito das Sucessões 7
1 GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri Dicionário Jurídico / organizador Deocleciano Torrieri Guimarães; coordenadora Dulce Eugênia de Oliveira. São Paulo: Rideel, 1997. 2 GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri Dicionário Jurídico / organizador Deocleciano Torrieri Guimarães; coordenadora Dulce Eugênia de Oliveira. São Paulo: Rideel, 1997. 3 GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri Dicionário Jurídico / organizador Deocleciano Torrieri Guimarães; coordenadora Dulce Eugênia de Oliveira. São Paulo: Rideel, 1997. 4 GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri Dicionário Jurídico / organizador Deocleciano Torrieri Guimarães; coordenadora Dulce Eugênia de Oliveira. São Paulo: Rideel, 1997. 5 GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri Dicionário Jurídico / organizador Deocleciano Torrieri Guimarães; coordenadora Dulce Eugênia de Oliveira. São Paulo: Rideel, 1997. 6 GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri Dicionário Jurídico / organizador Deocleciano Torrieri Guimarães; coordenadora Dulce Eugênia de Oliveira. São Paulo: Rideel, 1997.
Conjunto de regras jurídicas que regulamentam a transferência do patrimônio do
de cujus, tanto no que tange ao ativo como o passivo do falecido a seus
sucessores.
Direito Real de Habitação 8
É o direito do cônjuge sobrevivente continuar residindo no imóvel que servia de
residência do casal, desde que seja o único da natureza de residência a
inventariar.
Filiação Hibrida 9
Filiação híbrida é quando tem-se filhos do autor do herança e do cônjuge
sobrevivente e filhos só do autor da herança.
Herança 10
A herança é um conjunto de bens, direitos e obrigações patrimoniais, na qual o
falecido era sujeito ativo e passivo.
Herdeiro 11
Herdeiro ou sucessor é aquele que recebe os bens deixados pelo falecido.
Regime Matrimonial de Bens 12
É o regramento das relações econômicas entre homem e mulher casados entre
si.
Sucessão Legítima 13
7 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões . v. 6. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 03 8 GARCIA, Denise Schimitt Siqueira. Direito sucessório do cônjuge na sucessão legítima no ordenamento jurídico brasileiro. II semana de divulgação cientifica do CERJURPS. 9 GARCIA, Denise Schimitt Siqueira. Direito sucessório do cônjuge na sucessão legítima no ordenamento jurídico brasileiro. II semana de divulgação cientifica do CERJURPS. 10 GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri Dicionário Jurídico / organizador Deocleciano Torrieri Guimarães; coordenadora Dulce Eugênia de Oliveira. São Paulo: Rideel, 1997. 11 GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri Dicionário Jurídico / organizador Deocleciano Torrieri Guimarães; coordenadora Dulce Eugênia de Oliveira. São Paulo: Rideel, 1997. 12 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: lei n.º 10.406, de 10.01.2002. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 617. 13 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões . v. 7. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 2002.
É aquela decorrente de lei e outorgada às pessoas nela definidas que, por serem
ligadas ao falecido por laços de parentesco, ou casamento, presumivelmente
seriam por ele beneficiadas, se houvesse manifestado sua última vontade.
SUMÁRIO
RESUMO ............................................................................................................... X
INTRODUÇÃO......................................................................................................11
CAPÍTULO 1......................................... ................................................................14
CONSIDERAÇÃO GERAL SOBRE O DIREITO SUCESSÓRIO ...... ...................14 1.1 BREVES CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS................ ..................................14 1.2 CONCEITUAÇÃO DO DIREITO DAS SUCESSÕES .......... ...........................17 1.3 CONTEÚDO E FUNDAMENTO DO DIREITO SUCESSÓRIO .......................20 1.4 SUCESSÃO LEGÍTIMA E SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA..... .....................23 1.5 SUCESSÃO A TÍTULO SINGULAR E SUCESSÃO A TÍTULO UNIVERSAL28 1.6 CLASSIFICAÇÃO DAS HERANÇAS..................... ........................................31 1.7 CLASSIFICAÇÃO DOS SUCESSORES ................... .....................................33
CAPITULO 2......................................... ................................................................38
DOS REGIMES MATRIMONIAIS DE BENS ................... .....................................38 2.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS ACERCA DOS REGIMES MATRINO MIAIS DE BENS. ...................................................................................................................38 2.2 DO REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS.............. ........................43 2.2.1 BENS EXCLUÍDOS DA COMUNHÃO PARCIAL ........................................................45 2.2.2 BENS QUE INGRESSAM NA COMUNHÃO PARCIAL . ...............................................47 2.2.3 ADMINISTRAÇÃO DOS BENS NA COMUNHÃO PARCIAL . ........................................48 2.3 REGIME DE COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS. .......... ............................51 2. 3.1 BENS EXCLUÍDOS DA COMUNHÃO UNIVERSAL. .................................................52 2.4 REGIME DE PARTICIPAÇÃO FINAL NOS AQÜESTOS...... .........................58 2.5 REGIME DE SEPARAÇÃO DE BENS .................... .......................................61
CAPITULO 3......................................... ................................................................63
DIREITO SUCESSÓRIO DO CÔNJUGE..............................................................63 3.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS:.......................... ...............................................63 3.2 DIREITO REAL DE HABITAÇÃO ...................... ............................................67 3.3 CÔNJUGE CONCORRENDO COM OS DESCENDENTES...........................69 3.4 CÔNJUGE CONCORRENDO COM ASCENDENTES. ........... .......................77 3.5 HERDANDO A TOTALIDADE DA HERANÇA............... ................................79
CONSIDERAÇÕES FINAIS............................... ...................................................81
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS...................... ........................................84
RESUMO
O presente trabalho de monografia, intitulado Sucessão
Legítima dos Cônjuges no Ordenamento Jurídico Brasileiro tem por intuito a
análise dos institutos da vocação hereditária e da concorrência do cônjuge
sobrevivente com os descendentes ou os ascendentes do falecido, instituída no
Código Civil de 2002. Tratando-se a concorrência de um instituto recente, muitos
questionamentos surgem na esfera jurídica, assim, de forma simplificada, partir-
se-á de diversos conceitos para a interpretação do artigo 1829 do Código Civil de
2002, principalmente no que tange seus incisos I, II e III. O objetivo deste
trabalho de conclusão de curso é procurar a interpretação que se entender ser a
mais acertada para este tema tão divergente; principalmente no que diz respeito à
concorrência do cônjuge com os descendentes.
INTRODUÇÃO
O Código Civil de 2002 inovou no que tange à matéria
sucessória, dispondo acerca da nova ordem de vocação hereditária no artigo
1829. Ocorre que o artigo mencionado é alvo de diversas interpretações, o qual,
de acordo com cada entendimento, faz com que o artigo tenha um ou outro
significado.
No presente trabalho, objetiva-se aprofundar os
conhecimentos sobre a Sucessão Legítima do Cônjuge no Ordenamento Jurídico
Brasileiro realizando uma monografia para a obtenção do título de bacharel em
direito - Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.
Visa-se também realizar a pesquisa que atenda aos rigores
científicos, sobre a Sucessão Legítima do Cônjuge no Ordenamento Jurídico
Brasileiro, com a finalidade de analisar as diferentes possibilidades de
interpretação do artigo 1.829 do Código Civil vigente, tendo em vista que este, na
prática, é alvo de diversas interpretações quanto a sua aplicação ao caso
concreto por ainda não haver sido firmado um entendimento uniforme no que
tange o direito sucessório do cônjuge.
Para tanto, iniciará, no Capítulo 1, tratando do Direito
Sucessório de uma forma geral, estabelecendo o seu histórico, conteúdo,
fundamento e conceitos basilares acerca deste direito. Disporá ainda sobre as
espécies de sucessão, que podem ser legítima, testamentária, a título singular e a
título universal; bem como a classificação das espécies de heranças existentes no
ordenamento jurídico brasileiro. Por fim, discorrerá acerca da classificação dos
herdeiros do falecido.
O Capítulo 2 trará uma breve abordagem acerca do Regime
Matrimonial de Bens que podem ser o Regime de Comunhão Parcial, o Regime
de Comunhão Universal, o Regime de Participação Final nos aqüestos e por fim o
Regime de Separação de bens. Cabe ressaltar, que este tema é de extrema
importância para a compreensão do 3º Capítulo deste trabalho de conclusão de
12
curso, pois para discorrer sobre a concorrência do cônjuge, que é a real intenção
desta monografia, se faz mister, o entendimento acerca do regime Matrimonial de
Bens.
O 3º Capítulo tratará exclusivamente sobre o Direito
Sucessório do Cônjuge, real intenção deste trabalho de monografia, fazendo
primeiramente uma comparação sobre a vocação hereditária do Cônjuge
sobrevivente no Código Civil de 1916 com o Código Civil de 2002. Em seguida
disporá sobre o direito do cônjuge ao Direito real de Habitação sobre o único
imóvel da família, que vem estabelecido no artigo 1830 do atual Código Civil, o
qual também sofreu algumas alterações no que diz respeito a manutenção da
viuvez. Dar-se-á seguimento ao trabalho discorrendo sobre a concorrência do
cônjuge com os descendentes, matéria de muita divergência no campo do
ordenamento jurídico. Passará então à concorrência do cônjuge com os
ascendentes, e por fim com o cônjuge sobrevivente herdando a totalidade da
herança.
O presente Relatório de Pesquisa se encerrará com as
Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos
destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões
sobre a Legítima Sucessão do Cônjuge no Ordenamento Jurídico Brasileiro.
Para a presente monografia serão levantados os seguintes
problemas:
� É lógico este sistema criado pelo Legislador em que a concorrência do cônjuge dependerá do Regime de Bens adotado durante a vigência do casamento?
� Sobre qual parcela deverá incidir a herança do cônjuge sobrevivente em concorrência com os descendentes quando casado como o falecido pelo regime de Comunhão Parcial de Bens e o falecido tiver deixado bens particulares?
� Havendo descendentes comuns e descendentes só do falecido, terá o cônjuge sobrevivente o direito da reversa da quarta parte?
13
Como solução para o primeiro problema, verificar-se-á que
este sistema, criado pelo legislador brasileiro não tem lógica, porque faz depender
do regime de bens escolhido para reger a vida patrimonial dos consortes o direito
de ser ou não herdeiro.
No tocante ao segundo problema, verificar-se-á muita
divergência na doutrina, pois há doutrinadores que entendem que o cônjuge
deverá concorrer somente sobre os bens particulares deixados pelo falecido, e,
há doutrinadores que entendem que o cônjuge deverá concorrer sobre a
totalidade do acervo.
Quanto ao terceiro problema, verificar-se-á que não há na
doutrina um entendimento pacífico. Há doutrinadores que entendem que todos os
descendentes deveriam ser tratados como comuns, respeitando-se a reserva da
quarta parte do cônjuge. Outros doutrinadores têm entendido que o cônjuge não
terá direito ao benefício da reserva da quarta parte se existir, simultaneamente,
filhos comuns e unilaterais.
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase
de Investigação será utilizado o Método Indutivo14, com as Técnicas do
Referente15, da Categoria16, do Conceito Operacional17 e da Pesquisa
Bibliográfica18.
14 “Método é a forma lógico-comportamental na qual se baseia o Pesquisador para investigar, tratar os dados colhidos e relatar os resultados”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica- idéias e ferramentas úteis para o pesquis ador do Direito . 7 ed. rev.atual.amp.Florianópolis: OAB/SC Editora, 2002, p.104 . 15 "explicitação prévia do motivo, objetivo e produto desejado, delimitado o alcance temático e de abordagem para uma atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa". PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica, 2002 p. 241. 16 “palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma idéia". PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica, 2002 p. 229. 17 “definição estabelecida ou proposta para uma palavra ou expressão, com o propósito de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias expostas”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica, 2002 p. 229. 18 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais”.PASOLD,Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica, 2002 p. 240.
14
CAPÍTULO 1
CONSIDERAÇÃO GERAL SOBRE O DIREITO SUCESSÓRIO
1.1 BREVES CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS
No presente trabalho, verifica-se que para uma melhor
compreensão sobre o direito sucessório se faz necessário um breve relato sobre
a sua evolução histórica. As considerações aqui apresentadas tiveram como base
a obra Cidade Antiga de Fustel de Coulanges.
Até onde se pode remontar a história da raça indo-européia,
de onde se originaram as populações gregas e italianas, observou-se que essa
raça jamais acreditou que, depois desta curta existência, tudo terminasse com a
morte do homem. As gerações mais antigas já acreditavam em uma segunda
existência para além desta vida terrena. Encarava-se a morte não como uma
desmaterialização do homem, mas como uma singela mudança de vida. 19
Desta crença primitiva surgiu para o homem a necessidade de uma sepultura. Para a alma se fixar na morada subterrânea destinada a esta segunda vida, impõe-se, igualmente, que o corpo, ao qual a alma está ligada, seja coberto de terra. A alma que não tivesse o seu túmulo não terá morada, seria errante. 20
Além do sepultamento, eram necessários os ritos e as
fórmulas das cerimônias fúnebres. Temia-se menos a morte do que a privação da
sepultura. Essas crenças deram lugar a normas de conduta. 21
(...) Como, entre os antigos, o morto necessitasse de alimento e de bebida, concebeu-se, como dever dos vivos, satisfazer-lhe esta sua necessidade. O cuidado de levar aos mortos os alimentos não esteve a cargo do capricho ou dos sentimentos variáveis dos
19 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga. Trad. Fernando de Aguiar. 4 ed. São Paulo: Martins Fonte, 1998. p. 08 20 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga . 1998 p. 10 21 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga . 1998 p.10
15
homens; foi obrigatório. Assim se estabeleceu toda esta religião da morte, (...) Os mortos eram tidos como entes sagrados. Os antigos davam-lhes os epítetos mais respeitosos que podiam encontrar no seu vocabulário; chamavam-lhes bons, santos, bem-aventurados. Tinham por eles tanta veneração quanto o homem pode ter pela divindade que ama ou teme. Para o seu pensamento cada morto era um Deus. 22
A religião dos tempos primitivos não rendia adoração a um
só Deus, e estes não aceitavam a adoração de qualquer homem. Cada Deus não
podia ser adorado por mais de uma família. A religião era puramente doméstica. 23
O culto aos mortos só pode ser prestado aos mortos de cada
família pelo sangue lhes pertencia, era verdadeiramente o culto dos
antepassados. 24
Cada família tinha as suas cerimônias, que lhe eram próprias, e do mesmo modo as suas festas particulares, as suas fórmulas de oração e os seus hinos. Só o pai, único intérprete e único pontífice da sua religião, é que tinha o poder de ensiná-la, e somente a seu filho, e ninguém mais podia ser instruído nas regras de sua religião caseira. Mas é preciso atentar, como particularidade, ao fato de esta religião doméstica só se transmitir da linha masculina em linha masculina. 25
Deste antigo conceito, nasce a regra de que o culto
doméstico só se transmite de varão para varão, a mulher somente participava
nesse culto por intermédio de seu pai ou de seu marido. Depois da morte a
mulher não recebia a mesma parte dos ritos e cerimônias fúnebres que eram
destinadas ao homem. 26
Deste princípio derivaram todas as regras do direito de sucessão entre os antigos. A primeira está em que, sendo, como já vimos, a religião doméstica hereditária, de varão em varão, a propriedade
22 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga . 1998. p. 14 23 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga. 1998. p. 28 24 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga. 1998. p. 29 25 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga. 1998. p. 32 26 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga. 1998. p. 33
16
igualmente o era. Assim como o filho é o natural e necessário continuador do culto, por esse motivo herda também os bens.27
“Deste modo se encontrou o princípio da hereditariedade;
esta não é o resultado de simples convenção celebrada só entre homens; deriva
das suas crenças e religião, do que há de mais poderoso sobre as almas.” 28
O filho não tem de aceitar nem de recusar a herança. A continuação da propriedade como a do culto, é para o filho uma obrigação tanto como um direito. Queira, ou não queira, incumbe-lhe a sucessão, qualquer que esta possa ser, e mesmo com encargos e dívidas. O benefício de inventário e o benefício de desistência não se admitem para os filhos no direito grego, e também só muito tarde se introduziram no direito romano. 29
O pai de filha única podia adotar um filho e dar-lhe a filha em
casamento. Podia também instituir por testamento um herdeiro que casasse com
sua filha. Caso o pai de filha única morria sem ter adotado ou testado, o antigo
direito exigia que fosse o seu mais próximo parente a herdar, mas esse tinha
obrigação de casar com a filha. Se esta já fosse casada, deveria desquitar-se do
marido para casar com o herdeiro de seu pai. A filha não era considerada capaz
de herdar por atenuação muito natural ao rigor deste princípio a filha única
considerava-se como intermediária pela qual a família podia continuar. 30
Estes princípios regulavam a ordem de sucessão. Se determinado homem, tendo perdido o filho e a filha, apenas deixasse netos, quem herdava era o filho de seu filho, e não o filho de sua filha. À falta de descendente, o herdeiro era o irmão e não a irmã; o filho do irmão, nunca o filho da irmã. À falta de irmãos e sobrinhos, tornava-se preciso remontar na série dos ascendentes do defunto, subindo sempre na linha masculina até se encontrar um ramo que se tivesse destacado da família por varão; depois baixava-se de novo este ramo de varão em varão, até se ir encontrar ali um homem ainda vivo; era o herdeiro.31
27 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga. 1998. p. 70 28 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga. 1998. p. 70 29 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga. 1998. p. 70 30 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga. 1998. p. 75 31 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga. 1998. p. 76
17
“A emancipação e a adoção produziam no homem mudança
de culto. A primeira desligava-o do culto paterno, a segunda o iniciava na religião
de outra família.” 32
O pensamento do antigo legislador ao determinar direito com
regras tão minuciosas era que, não se podia aceitar a possibilidade de união na
mesma pessoa de duas heranças, isto, porque dois cultos domésticos nunca
podiam ser servidos pela mesma mão.33
O direito de testar, isto é, o de transmitir a herança a quem
não era herdeiro natural, também se achava conflitos com as crenças religiosas,
base do direito de propriedade e do direito sucessório, pois a propriedade não
pertencia ao individuo, mas a família; o homem a adquiria pelo culto doméstico e
não pelo trabalho. Sendo ligado à família, a transmissão dos bens era do de
cujus para o filho, não segundo a vontade e escolha do falecido, mas por virtude
de regras superiores preestabelecidas na religião.34
1.2 CONCEITUAÇÃO DO DIREITO DAS SUCESSÕES
Este subtítulo tem por objetivo traçar os conceitos basilares
no que diz respeito ao direito das sucessões.
Suceder, no sentido amplo da palavra, é substituir, é a
transferência de um direito de uma pessoa para outra. Significa o ato pelo qual
uma pessoa toma o lugar de outra, inserindo-se, a qualquer título, em todo ou em
parte, nos direitos que lhe pertenciam. 35
No direito, quando se refere ao direito das sucessões, está
se tratando de uma parte específica do direito civil, a transmissão de bens,
direitos e obrigações em razão do falecimento do titular destes. É o direito
32 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga. 1998 p. 78 33 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga. 1998 p. 79 34 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga. 1998 p. 79 35 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito das sucessões. v. 6. 35 ed. ver. e atual, por Ana Cristina de Barros Monteiro França Pinto. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 01
18
hereditário que se diferencia do sentido amplo da palavra sucessão, que se aplica
também à sucessão entre vivos (contratos de compra e venda). 36
Nesse sentido, expressivas são as colocações de Wald:
O conceito de sucessões, todavia, abrange não só os casos de transferência de direito subjetivo ou de dever jurídico mortis causa, como também os atos inter vivos. O direito sucessório ou
hereditário, pois, tem restrito o seu campo de ação à transmissão de direitos e deveres - oriundos do falecimento do seu titular - que se transfere a terceiros, em virtude da declaração de vontade do de cujus ou de disposição legal. 37
No entender de Gomes: “Direito das Sucessões é a parte
especial do direito civil que regula a destinação do patrimônio de uma pessoa
depois da sua morte”. 38
De modo similar, Rodrigues salienta que:
A idéia de sucessão sugere, genericamente, a de transmissão de bens, pois implica a existência de um adquirente de valores, que substitui o antigo titular. Assim, em tese, a sucessão pode operar-se a título gratuito e oneroso, inter vivos ou causa mortis. Todavia,
quando se fala em direito das sucessões entende-se apenas a transmissão em decorrência de morte, excluído, portanto, do alcance da expressão, a transmissão de bens por ato entre vivos.39
Neste sentido, o direito das sucessões se apresenta como o conjunto de princípios jurídicos que regulam a transferência do patrimônio do falecido a seus sucessores. Usa-se a palavra patrimônio, em vez de referir-se à
36 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito das sucessões. 4 ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 15 37 WALD, Arnoldo. Direito das sucessões . 12 ed. ver. ampl. e atual de acordo dom a legislação vigente, jurisprudência dos tribunais e o código civil. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 03 38 GOMES, Orlando. Sucessões. 12 ed. re. atual e aumentada de acordo com o Código Civil de 2002/ por Mario Roberto Carvalho de Faria – Rio de Janeiro: forense, 2004 p. 01 39 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões . v. 6. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 03
19
transmissão de bens ou valores, porque a sucessão hereditária envolve a transmissão tanto do ativo como do passivo do defunto. 40
Nesta mesma linha de pensamento, Diniz dispõe:
O direito das sucessões vem a ser o conjunto de normas que disciplinam a transferência do patrimônio de alguém, depois da sua morte, ao herdeiro, em virtude de lei ou testamento (CC/200241, art. 1.786). Consiste, portanto no complexo de disposições jurídicas que regem a transmissão de bens ou valores e dívidas do falecido, ou seja, a transmissão do ativo e do passivo do de cujus ao herdeiro. 42
De modo similar, apregoa Rodrigues:
Realmente, declarando que o direito das sucessões disciplina a transmissão do patrimônio do falecido, a definição abrange os valores por ele deixados, assim, como as dívidas pelas quais era responsável. 43
Gomes nos ensina que direito das sucessões refere-se tão
somente as pessoas físicas ou naturais. Sendo a sucessão um dos modos de
aquisição de propriedade, divide-se em quatro partes fundamentais constituídas
de princípios, conceitos e regras no que tange a sucessão legítima, a sucessão
testamentária, o inventário e a partilha. 44
Como aponta Wald:
O direito das sucessões, que estabelece as normas referentes à transmissão dos bens pertencentes às pessoas falecidas encontra-se regulado no último livro do Código Civil em vigor. Além dessa regulamentação, a matéria encontra, atualmente, amparo constitucional, porquanto o art. 5º, que disciplina acerca
40 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. Direito das sucessões , 2002 p. 03 41 Código Civil Brasileiro de 2002 42 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro – Direito das Sucessões , v. 6, 17 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 03 43 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. Direito das sucessões , 2002, p. 04 44 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004, p. 02
20
dos direitos e garantias individuais, introduziu, no inciso XXX da Carta Magna de 5 de outubro de 1988, o direito de herança. 45
Portanto, com base nos conceitos acima apresentados
verifica-se que o direito das sucessões se apresenta como o conjunto de regras
jurídicas que regulamentam a transferência do patrimônio do de cujus, tanto no
que tange ao ativo como o passivo do falecido a seus sucessores.
1.3 CONTEÚDO E FUNDAMENTO DO DIREITO SUCESSÓRIO
O presente item refere-se ao conteúdo do direito das
sucessões, como também ao seu fundamento. Sendo este último objeto de
muitas divergências doutrinárias, este subtítulo dispõe sobre alguns
posicionamentos a respeito do tema.
Em tempos remotos, no início da socialização dos
indivíduos, não existindo a propriedade individual, e sim a coletiva, os grupos
sociais eram os titulares dos bens. Com a individualização da propriedade,
tornando o sujeito seu titular, ampliou o instituto da sucessão hereditária, trazendo
à tona a discussão filosófica e jurídica acerca do fundamento do direito
sucessório. 46
Alguns doutrinadores procuram legitimar o fundamento do
direito sucessório nas teses da biologia e antropologia, assemelhando no direito
hereditário uma seqüência da hereditariedade biopscicológica entres ascendentes
e descendentes. 47
Sobre tal posicionamento, faz crítica, Monteiro, dispondo que:
Tais concepções pecam pela sua manifesta fragilidade. A seqüência da vida humana não depende da sucessão, ela subsiste esse instituto, porque se subordina precipuamente ao
45 WALD, Arnoldo. Direito das sucessões , 2002. p. 02 46 CAHALI, Francisco José. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avançado de direito civil: direito das sucessões , v. 6. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. p. 25 47 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito das sucessões , 2003. p. 07
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instinto sexual. Aliás, tal doutrina explicaria apenas a transmissão da herança entre ascendentes e descendentes, jamais a sucessão entre cônjuges, entre colaterais e entre o de cujus e o Estado. 48
Em suas colocações Rodrigues também faz referência ao
fundamento do direito sucessório, ao assim lecionar:
Nota-se que antigas regras sobre a Sucessão, quer inspiradas em motivos religiosos, quer fundadas no anseio de fortalecer a família, não levam em consideração o sentimento de eqüidade, ou seja, o intuito de aquinhoar igualmente os descendentes, ou os parentes em igualdade de grau. Entretanto, foi nesse sentido que o direito hereditário evoluiu, visto que hoje, na quase totalidade dos países, a sucessão legítima se processa entre os herdeiros que se encontram no mesmo grau e que, por conseguinte, recebem partes iguais. 49
Apesar da sua reconhecida antigüidade, o direito hereditário
em seu fundamento, seja de ordem religiosa ou biológica encontra opositores que
negam não só a sua legalidade, como também o seu interesse. Dentre esses
destacam-se os escritores socialistas, contrários a propriedade privada, que vêem
nela um incentivo à desigualdades entre os homens, concentrando riquezas nas
mãos de poucos, além de alimentar a ociosidade, prejudicial ao desenvolvimento
produtivo e econômico da sociedade.50
Dentre várias outras objeções à posição destes escritores
socialistas, expressivas são as afirmações de Rodrigues:
Não admitida a transmissão hereditária, falta ao indivíduo incentivo para amealhar e conservar a riqueza, sendo provável que consagre os últimos anos de sua vida a esbanjar um patrimônio que não pode deixar aos seus entes querido. Tal comportamento representa um prejuízo a sociedade. Ademais, raramente a lei deixaria de ser burlada, pois, mediante doações,
48 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito das sucessões , 2003. p. 07 49 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. Direito das sucessões , 2002 p. 04 50 CAHALI, Francisco José. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avançado de direito civil: direito das sucessões , 2003. p. 26
22
ou liberalidades simuladas em negócios onerosos, o titular do direito tentaria transmitir seu patrimônio a seus herdeiros. 51
Significativas são as colocações de Wald sobre o
fundamento do direito sucessório, ao assim dispor:
Na realidade, o problema desse fundamento lógico ou filosófico do direito de suceder, pouca importância tem quando se é obrigado a reconhecer que a sucessão hereditária corresponde a um imperativo de caráter social. A segurança e a continuidade do direito, num determinado meio, não permitem que as relações jurídicas, com a repercussão que tem na vida econômica do país, dependam de um elemento tão aleatório quanto a vida humana. (...) É, pois, atendendo ao interesse social, à necessidade de continuidade na vida civil e comercial, que se impõe a sucessão, ou seja, a continuação, na pessoa do sucessor, das obrigações e dos direitos do sucedido.52
No que diz respeito ao conteúdo do direito de sucessão
nota-se que este é limitado. Assumindo o herdeiro a posição jurídico-econômica
do falecido, não são todos os direitos deste que se transmitirão ao sucessor. 53
No que se refere ao conteúdo do direito sucessório Gomes
dispõe:
Transmissíveis são, de regra, ativa e passivamente, as relações jurídicas patrimoniais. Excetuando-se o usufruto, o uso, a habitação, a renda vitalícia, o mandato, a empreitada de lavor, a relação de emprego e a obrigação de prestar alimentos. (...) também não entram os direitos personalíssimos e os direitos de família sem cunho patrimonial, o pátrio poder, o direito de reconhecer o filho, o de contestar a paternidade, o de propor ação de separação ou de divórcio, e outros. 54
O Código Civil de 2002, em seus artigos 1.784 à 2.027,
incluídos no Livro V, divide o direito das Sucessões em quatro partes: “Sucessão
51 RODRIGUES, Silvio. Direito civil . Direito das sucessões , 2002. p. 06 52 WALD, Arnoldo. Direito das sucessões , 2002. p. 14 53 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004, p. 10 54 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004, p. 11
23
em geral”, “Sucessão Legitima”, “Sucessão Testamentária” e “Inventário e
partilha”.55
O Título I dispõe tanto da sucessão legítima, como da
testamentária, e as normas que regulam a administração da herança. O Titulo II,
talvez o de maior importância, refere-se à sucessão legítima, ou seja, a que se
opera por força da lei, pois é esta a que mais ocorre no Brasil. O Titulo III, que
regula a sucessão testamentária, é o mais extenso, o que mostra que o legislador
atribuiu grande importância à transmissão de bens por ato de última vontade. O
Titulo IV, determina as regras do inventário e da partilha dos bens, como também
dispõe sobre colações e sonegados. 56
Em análise ao disposto acerca do fundamento e do
conteúdo do direito sucessório, entende-se que o fundamento do direito
sucessório deve atender ao interesse social na continuação na pessoa do
sucessor, das obrigações e dos direitos do falecido. No que diz respeito ao
conteúdo do direito de sucessão verifica-se que este é limitado, pois não são
todos os direitos do falecido que se transmitirão ao sucessor.
1.4 SUCESSÃO LEGÍTIMA E SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA
O nosso ordenamento jurídico compreende dois tipos de
sucessão, a sucessão que ocorre de acordo com manifestação de vontade do de
cujus (sucessão testamentária) ou a decorrente de lei (sucessão legítima). Este
subtítulo tem o objeto de distinguir as espécies de sucessão para uma melhor
compreensão do tema.
Como assevera Gonçalves: “A Sucessão, considerando-se
sua fonte, pode ser legítima (ab intestato) ou testamentária. No primeiro caso,
55 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das sucessões , 1997. p 01 56 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. Direito das sucessões , 2002. p. 07
24
decorre da lei; no segundo, disposição da última vontade, ou seja, de testamento
ou codicilo.”57
Retrata ainda Gonçalves, que:
Dá-se a sucessão legítima ou ab intestato em caso de
inexistência, ineficácia ou caducidade de testamento e, também em relação aos bens nele não compreendidos. Nestes casos a lei defere a herança a pessoas da família do de cujus e na falta
destas, ao Poder Público. 58
O artigo 1786 do Código Civil vigente preceitua que “a
sucessão dá-se por lei ou por disposição de última vontade do falecido”
Subentende-se neste dispositivo legal, as duas formas de sucessão aceitas no
ordenamento jurídico pátrio, a legítima (decorrente da lei) e a testamentária
(decorrente de manifestação de última vontade do de cujus). 59
Neste diapasão, comenta Diniz que:
Há sucessão legítima ou ab intestato, resultante de lei nos casos
de ausência, nulidade, anulabilidade ou caducidade de testamento (CC/2002, arts. 1786 e 1788). Deverás, se o de cujus não fizer
testamento, a sucessão será legítima, passando o patrimônio do falecido às pessoas indicadas pela lei, obedecendo-se à ordem de vocação hereditária (CC/2002, art. 1829). 60
A título de curiosidade, merece ser transcrito o artigo 1.788
do Código Civil de 2002, subordinado à epígrafe sucessão legítima.
Art. 1788: Morrendo a pessoa sem testamento, transmite a
herança aos herdeiros legítimos; o mesmo ocorrerá quanto aos bens que não forem compreendidos no testamento; e subsiste a sucessão legítima se o testamento caducar, ou for julgado nulo.
No tocante a sucessão legítima, entende-se que esta se dá
quando a herança é destinada as pessoas da família do falecido, por este não ter
57 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das Sucessões , 1997. p. 17 58 RODRIGUES, Silvio. Direito civil . Direito das sucessões , 2002 p. 17 59 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito das sucessões , 2003. p. 09 60 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro – Direito das Sucessões , 2002.p. 18
25
deixado testamento ou quando ineficaz ou caduco o seu ato de última vontade.
Como o falecido pode dispor de seus bens mudando a ordem de vocação
hereditária legal - desde que respeitados os herdeiros necessários - se este não
deixar testamento, subentende-se que sua vontade está de acordo com esta
ordem. Por este motivo é que alguns autores dizem que a sucessão legítima
representa a última vontade presumida do de cujus. 61
Acerca desta espécie de sucessão, comenta Rodrigues, em
sua obra:
(...) legítima é a sucessão procedida de acordo com a lei e deferida às pessoas nela definidas que, por serem ligadas ao de cujus por laços de parentesco, ou matrimônio, presumivelmente
seriam por ele beneficiadas, se houvesse manifestado sua última vontade. 62
Portanto a sucessão legítima ocorrerá quando a pessoa
falece sem deixar testamento, ou quando este caducar, ou não abranger todo o
patrimônio, e é a lei que determina a ordem pela qual serão convocados os
herdeiros. A ordem de vocação hereditária está prevista no artigo 1829 no nosso
Código Civil, que dispõe:
Art. 1829 – A sucessão defere-se na seguinte ordem:
I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares.
II – aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III – ao cônjuge sobrevivente;
IV – aos colaterais.
61 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das Sucessões, 1997. p. 30 62 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. Direito das sucessões , 2002 p. 17
26
Atenta-se, que a referência feita no inciso I do artigo 1829 ao
artigo 1640, parágrafo único, está incorreta. O dispositivo correto é o artigo 1641,
que dispõem sobre as hipóteses de casamento sob o regime de separação
obrigatória. O projeto nº. 6.960, corrige este equívoco. 63
A primeira classe é dos descendentes. Havendo alguém que
a ela pertença, afastados ficam todos os herdeiros pertencentes às subseqüentes.
A regra geral estabelecida no ordenamento, é que a convocação é feita por
classes, a mais próxima exclui a mais remota. Por isso diz-se que tal ordem é
preferencial. 64
No que diz respeito a sucessão testamentária, verifica-se
que o testamento serve justamente para o testador modificar a vontade do
legislador. 65
Será sucessão testamentária se o de cujus deixou
testamento válido, atribuindo assim, os seus bens as pessoas indicadas por ele
no seu último ato de vontade. 66
Descreve sobre a sucessão testamentária Gonçalves:
A sucessão testamentária decorre de expressa manifestação da última vontade, em testamento ou codicilo. A vontade do falecido, a quem a lei assegura a liberdade de testar, limita apenas pelos direitos dos herdeiros necessários, constitui, neste caso, a causa necessária e suficiente da sucessão. Tal espécie permite a instituição de herdeiros e legatários, que são, respectivamente, sucessores a título universal e particular. Embora não se admitem os pactos sucessórios, que têm por objeto herança de pessoa viva, considera-se válida a partilha em vida, sob a forma de doação do ascendente aos descendentes. 67
A sucessão testamentária é proveniente de testamento válido ou de declaração de última vontade. No entanto, perante a limitação da
63 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito das sucessões , 2004. p. 90 64 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das Sucessões , 1997. p. 30 65 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito das sucessões , 2004. p. 90 66 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito das sucessões , 2003. p. 10 67 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das Sucessões , 1997. p. 30
27
liberdade de legar, adotado pelo ordenamento jurídico vigente, se o testador tiver herdeiros necessários, (CC/2002, art. 1845 e 1846), só poderá conceber metade de seus bens (CC/2002, art. 1789), pois a outra metade constituí a legítima daqueles herdeiros. No ordenamento jurídico brasileiro, só haverá total liberdade para dispor de todo o patrimônio em testamento para depois da sua morte, se o autor da herança não possuir herdeiros necessários, podendo neste caso afastar da sucessão os colaterais. 68
Desta maneira, é o que determina o artigo 1.850 do Código
Civil vigente:
Art. 1850- Para excluir da sucessão os herdeiros colaterais, basta
que o testador, disponha de seu patrimônio sem os contemplar.
Há casos em que a sucessão testamentária pode conviver
com a legítima. Ocorre a sucessão testamentária concomitantemente com a
sucessão legítima quando havendo herdeiro necessário, o testador dispor
somente de parte que lhe é disponível, não interferindo na parte do patrimônio
que a lei assegura a este herdeiro.”69
De modo similar, postula Rodrigues:
A sucessão é simultaneamente legítima e testamentária quando o testamento do defunto não abrange todos os seus bens. (...) Em ocorrendo o caso, os bens referidos no testamento se transmitem aos herdeiros testamentários e aos legatários. Os bens restantes são deferidos aos herdeiros legítimos, na ordem de vocação hereditária. 70
Reforçando este entendimento, Diniz, nos ensina:
(...) Pelo Código Civil, art. 1788, 2ª parte, se o testamento não abranger a totalidade dos bens do falecido, a parte de seu patrimônio não mencionada no ato de última vontade é deferida aos herdeiros legítimos, na ordem da vocação hereditária. Os bens mencionados são transmitidos aos herdeiros testamentários e aos legatários. Igualmente prescreve o Código Civil, no art.
68 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro – Direito das Suc essões, 2002. p. 17 69 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das Sucessões , 1997. p. 18 70 RODRIGUES , Silvio. Direito civil. direito das sucessões, p. 17
28
1966, que quando o testador só dispõe de parte de sua metade disponível, entende-se que se instituem os herdeiros no remanescente. 71
Diante do todo exposto a cima, verifica-se que no atual
ordenamento jurídico a sucessão só pode resultar de lei ou de testamento, não
admitindo a sucessão contratual, conforme o disposto no artigo 426 do Código
Civil Brasileiro, que proíbe os pactos sucessórios ao assim declarar: ”não pode
ser objeto de contrato, herança de pessoa viva”. A principal razão desta proibição
está no interesse de evitar que a pessoa seja impedida de regular livremente sua
própria sucessão. 72
1.5 SUCESSÃO A TÍTULO SINGULAR E SUCESSÃO A TÍTULO UNIVERSAL
O presente subtítulo tem o intuito de definir os efeitos da
sucessão causa mortis, que são a sucessão a título singular e a sucessão a título
universal.
A sucessão a título universal se realiza quando se transfere
ao sucessor a totalidade dos bens do falecido, ou a quota-parte deste,
abrangendo tanto o seu ativo, como o seu passivo. O seu beneficiário denomina-
se herdeiro. Já a sucessão a título singular se caracteriza quando o sucessor
recebe não o patrimônio inteiro, mas apenas bens determinados, singulares, sem
responder pelo passivo da herança. 73
Nesse mesmo sentido, apregoa Wald:
A sucessão no direito pátrio pode dar-se a título universal ou a título singular. É a título universal quando se transfere ao sucessor a totalidade do patrimônio do de cujus ou uma fração determinada
dele, abrangendo tanto o seu ativo como o seu passivo. Neste caso o sucessor é determinado herdeiro. Essa sucessão só é concebível nos casos de morte, pois a ninguém é lícito transferir
71 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro – Direito das Suc essões , 2002. p. 19 72 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004, p. 84 73 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004. p. 06
29
todos os bens em vida. Cada um tem seu patrimônio maior ou menor, que pode reduzir à sua mínima expressão, mas do qual não se pode despojar inteiramente. 74
O ordenamento jurídico pátrio somente admite a sucessão a
título universal causa mortis. As relações jurídicas constituídas no patrimônio do
falecido, na sucessão a título universal, transferem-se no todo ao sucessor, isto é,
direitos, obrigações, créditos e débitos.75
Neste sentido, Diniz, também dispõe sobre a sucessão a
título universal, ensinando que:
Há título universal, quando houver transferência da totalidade ou de parte indeterminada da herança, tanto no seu ativo como no seu passivo, para o herdeiro do de cujus. (...) O herdeiro é,
portanto, chamado a suceder no todo ou numa quota-parte do patrimônio do de cujus, sub-rogando-se, abstratamente, na
posição do falecido, como titular da totalidade ou de parte ideal daquele patrimônio no que concerne ao ativo, e assumindo a responsabilidade relativamente ao passivo. 76
Na sucessão a título universal o herdeiro continua a pessoa
do falecido ou a representa, ou seja, este a substitui completamente, nos seus
direitos e deveres, sem que a morte cause qualquer modificação nas relações
jurídicas. O devedor do de cujus fará o pagamento do seu débito ao sucessor e o
credor do falecido passa a ser credor do herdeiro.
Em relação à sucessão a título singular, esta ocorre quando
o herdeiro recebe não o patrimônio inteiro, mas apenas um bem determinado e
singular. Esta difere da sucessão a título universal, pois pode sobrevir de atos
inter vivos ou de falecimento. Seu beneficiário, neste caso, é chamado de
legatário. 77
Diniz também faz referência à sucessão a título singular, ao
assim lecionar: 74 WALD, Arnoldo. Direito das sucessões , 2002. p 03 75 GOMES, Orlando. Sucessões, 2004. p 06 76 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro – Direito das Su cessões , 2002. p 20 77 WALD, Arnoldo. Direito das sucessões , 2002. p. 04
30
Há título singular, quando o testador transfere ao beneficiário apenas objetos certos e determinados. Nessa espécie de sucessão é o legatário que sucede ao de cujus em bens ou
direitos determinados ou individuados, ou fração do patrimônio devidamente individuada, sub-rogando-se de modo concreto, na titularidade jurídica de determinada relação de direito, sem representar o falecido, pois não responde pelas dívidas e encargos da herança. Portanto se o testador contemplar alguém com coisa concreta, definida, singularizada, ter-se-á a nomeação de legatário. 78
A sucessão a título singular, origina-se unicamente de
testamento, determinando objeto específico que pode ser um conjunto de bens,
desde que não constituam unidade na qual percam sua individualidade. 79
Na mesma diretriz, significativas são as colocações de
Rodrigues, ao assim lecionar:
A sucessão se processa a título singular quando o testador se dispõe a transferir ao beneficiário um bem determinado, como, por exemplo, na cláusula testamentária que deixa a alguém um automóvel, determinado prédio, certas ações de companhia, etc.80
A distinção feita acima é de extrema importância, pois
conforme se trate de sucessão a título singular ou a título universal, umas ou
outras serão as conseqüências de ordem prática. 81
Cumpre ainda salientar, que a sucessão legítima sempre
será a título universal, ao passo que a sucessão testamentária poderá ser
universal, se o testador estabelecer sucessor que lhe substitua no todo ou na
quota parte de seus bens, ou singular, se o testador dispuser a um beneficiário
uma coisa específica, caso em que se transfere aquele bem determinado ao
legatário. 82
78 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro – Direito das Suc essões , 2002. p. 20 79 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004. p. 07 80 RODRIGUES , Silvio. Direito civil. direito das sucessões , 2002. p. 17 81 RODRIGUES , Silvio. Direito civil. direito das sucessões, 2002. p. 17 82 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro – Direito das Suc essões , 2002. p. 20
31
1.6 CLASSIFICAÇÃO DAS HERANÇAS
A herança é um conjunto de bens, direitos e deveres
patrimoniais, na qual o de cujus era sujeito ativo e passivo.
Frequentemente aplica-se o termo sucessão como sinônimo
de herança, porém, se faz necessário a distinção destes. Sucessão diz respeito
ao ato de suceder, é o modo de transmissão dos bens, que pode acontecer por
ato ou fato inter vivos ou causa mortis, já herança é a universalidade de bens que
se transfere, em razão da morte, a uma pessoa ou um conjunto de pessoas, que
sobrevivem ao de cujus. 83
No entender de Diniz:
O objetivo da sucessão causa mortis é a herança. (...) A herança
é, portanto, o patrimônio do falecido, ou seja, o conjunto de bens materiais, direitos e obrigações (CC/2002, arts. 91 e 943) que se transmitem aos herdeiros legítimos ou testamentários. 84
Os princípios básicos que predominam no ordenamento
jurídico, em relação a herança são os da liberdade de testar, respeitar a legítima,
e ter simples caráter de suprir a ordem de vocação hereditária estabelecida pela
lei, que se aplica somente quando não houver testamento. Tem-se então, três
espécies de herança: a herança testamentária, a herança legítima e a herança
necessária. 85
A Herança Testamentária é aquela baseada na vontade do
testador, pois vai decorrer de um testamento, respeitando a legítima dos herdeiros
necessários se houver, ou dispondo sobre a totalidade de bens na ausência
destes. 86
A Herança Legítima é aquela baseada nas disposições
legais com o intuito de suprir a falta de declaração de última vontade do testador
83 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito das sucessões , 2004. p. 20 84 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro – Direito das Su cessões , 2002. p. 37 85 WALD, Arnoldo. Direito das sucessões , 2002. p. 16 86 WALD, Arnoldo. Direito das sucessões, 2002. p. 16
32
ou no caso de nulidade, anulação ou caducidade do testamento, devendo ser
obedecida a ordem de vocação hereditária. 87
E por fim a Herança Necessária que é aquela destinada aos
herdeiros necessários (descendentes, ascendentes e o cônjuge), obedecendo a
um princípio de ordem pública, que se impõe mesmo quando oposta as
declarações testamentárias. Se aparecer somente a nomenclatura legítima, esta
se referindo a herança necessária.
A expressão herança necessária tem sido objeto de algumas
críticas, pois no direito romano esta nomenclatura era usada para se referir ao
herdeiro que não podia rejeitar a herança, tendo que aceitá-la mesmo contra sua
vontade. Esta não é a concepção moderna de herdeiro necessário, pois esta
imposição só se refere ao testador, e não ao herdeiro, ou seja, proíbe-se que em
testamento se conceda mais da metade do patrimônio do falecido a quem não for
herdeiro necessário quando houver estes. 88
No entender de Wald:
“Pode-se então, dizer que a herança necessária é um
compromisso ou uma solução conciliatória entre a plena liberdade de testar e a
proteção dos direitos dos parentes mais próximos.” 89
Portanto, a herança é o conjunto de bens do falecido,
abrangendo tanto seu passivo quanto seu ativo. Diferencia-se de sucessão que é
o ato de suceder, de receber a herança. A herança poderá ser legítima (quando
obedecer as disposições legais), testamentária (quando decorrer de ato de última
vontade do falecido) ou ainda necessária (quando for destinada aos herdeiros
necessários).
87 WALD, Arnoldo. Direito das sucessões , 2002. p. 16 88 WALD, Arnoldo. Direito das sucessões, 2002. p. 162 89 WALD, Arnoldo. Direito das sucessões, 2002. p. 162
33
1.7 CLASSIFICAÇÃO DOS SUCESSORES
Herdeiro ou sucessor é aquele que recebe os bens deixados
pelo de cujus. Este subtítulo tem o intuito de classificar e conceituar cada um
deles.
Com relação aos sucessores, reconhece-se a seguinte
classificação: herdeiro legítimo, herdeiro necessário, herdeiro testamentário e
legatário.
Herdeiro legítimo é aquele designado em lei como herdeiro
nos casos de sucessão legítima, a quem se transfere a totalidade da herança ou
quota-parte desta. 90
De modo similar, para Cahali, herdeiro legítimo é:
Herdeiros legítimos são aqueles sucessores eleitos pela legislação, através da ordem de vocação hereditária (CC/2002, art. 1.829), ou por regra especial, como ocorre na sucessão entre companheiros decorrente da união estável (CC/2002, art. 1790). 91
O herdeiro legítimo possui prerrogativas e obrigações
decorrentes da sua posição pessoal em que se insere quando convocado a
suceder. Entre essas prerrogativas, ressaltam as que se referem à destinação do
cadáver e aos funerais. Entre as obrigações, sobressaem o de arcar com as
despesas do sepultamento. 92
A classificação do herdeiro legítimo tem origem na
organização da família. 93
Sobre tal coisa, leciona Gomes:
Reside seu chamamento em três ordens de direito: 1 – jus familiae, 2 – jus sanguinis, 3- jus conjugii. Por direito de família
90 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004. p. 40 91 CAHALI, Francisco José. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avançado de direito civil: direito das sucessões, 2003. p. 56 92 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004. p. 41 93 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004. p. 41
34
stricto sensu, em favor dos parentes legítimos. Por direito de
sangue, dos filhos e pais. Por direito matrimonial, do cônjuge. 94
A sucessão necessária, imposta pela lei, estabelece uma
proteção especial para uma determinada classe de herdeiros ligados por laços de
parentesco mais íntimo com o de cujus. 95
Herdeiro necessário é o parente que tem direito a metade da
herança, da qual não pode ser excluído por declaração de última vontade do
testador, significando a sua existência uma delimitação à liberdade de testar. 96
Como aponta Gomes:
Herdeiro necessário é o parente e o cônjuge com direito a uma quota parte da herança, da qual não pode ser privado. A parte reservada aos herdeiros legitimados chama-se legítima. Constitui-se, entre nós, da metade dos bens do falecido. 97
Esta categoria é formada pelo cônjuge, descendente e
ascendente, estes dois últimos, sem limitação de grau. São os herdeiros que não
podem ser privados da herança por faculdade do testador, salvo em caso de
deserdação, prenunciado em lei. Se não for este o caso, os sucessores
necessários terão salvaguardada a sua quota-parte, caso o autor da herança
resolva fazer testamento, delimitando, desta maneira, o alcance da parte
disponível para transferência de somente metade dos bens do falecido. 98
A parte dos bens do falecido que é resguardada
exclusivamente aos herdeiros necessários – parte indisponível – é equivalente à
metade da herança, subtraídas as dívidas e os gastos do funeral; esta parte
indisponível designa-se legítima ou reserva. 99
94 GOMES, Orlando. Sucessões, 2004. p. 41 95 WALD, Arnoldo. Direito das sucessões, 2002. p. 161 96 CAHALI, Francisco José. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avançado de direito civil: direito das sucessões , 2003. p. 57 97 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004. p. 40 98 CAHALI, Francisco José. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avançado de direito civil: direito das sucessões , 2003. p. 57 99 CAHALI, Francisco José. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avançado de direito civil: direito das sucessões, 2003. p. 57
35
É exatamente este direito, que diferencia o herdeiro
necessário do herdeiro facultativo, também legítimo como ele. A existência dos
herdeiros facultativos, não impossibilita a disposição, em testamento, de toda a
herança, mas, se o autor da herança, faleceu intestado, esses herdeiros são
convocados a suceder. Para afastá-los da sucessão, basta, portanto, que o
testador disponha do seu patrimônio, sem os outorgar. 100
Como demonstra Gomes:
(...) havendo herdeiros necessários, a liberdade de testar é restrita à metade disponível; havendo somente herdeiros facultativos, é plena. Todo herdeiro necessário é legítimo, mas nem todo herdeiro legítimo é necessário. 101
Ante o direito brasileiro, herdeiro não é só aquele, chamado
conforme a ordem de vocação hereditária, mais também aquele que é designado
ou declarado herdeiro por testamento. 102
Pela sucessão testamentária recebem os bens deixados
tanto os herdeiros nomeados, como os legatários instituídos, mas a possibilidade
de nomeá-los ou instituí-los, só existe se o interessado fizer uso do meio
adequado que a lei oferece. 103
Herdeiros testamentários são aqueles nomeados pelo
testador, no seu ato de última vontade, para receber a totalidade ou quota-parte
do seu patrimônio, ou seja, aqueles instituídos como favorecidos da herança por
testamento, podendo, inclusive, ser também herdeiros legítimos, quando o
testador quiser beneficiá-los mais do que outros da mesma categoria de
preferência, com quem eventualmente estejam concorrendo.104
Para melhor entendimento, é de suma importância
transcrever o exemplo dado por Cahali: 100 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004. p. 41 101 GOMES, Orlando. Sucessões, 2004. p. 41 102 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito das sucessões , 2003.p 188 103 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004. p. 86 104 CAHALI, Francisco José. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avançado de direito civil: direito das sucessões , 2003. p. 57
36
Dentre os parentes colaterais do mesmo grau, o testador estabelece que um deles receberá, por herança, 30% do patrimônio, sem prejuízo do quinhão a que tem direito na concorrência com os demais herdeiros da mesma classe. Nestas condições sucede o instituído como herdeiro testamentário (30%) e como herdeiro legítimo na proporção do seu quinhão.105
No entanto, herdeiro designado ou instituído não se
confunde com legatário, merecendo este último tratamento jurídico próprio. Os
legatários são aqueles instituídos no testamento para receber bem determinado e
específico. 106
Nesta mesma linha de pensamento, descreve Monteiro:
Na sucessão legítima, em que não há testamento, existem apenas herdeiros legítimos; na sucessão testamentária, quanto à porção disponível, podem concorrer herdeiros instituídos e legatários. Recebem estes, coisa determinada, precisa, certa; recolhem aqueles, indeterminadamente, parte ideal na universalidade, embora posteriormente, com a partilha, se restrinjam seus direitos aos bens que lhes forem adjudicados ou atribuídos. 107
Legatário é o beneficiário a quem o testador deixa coisa
específica, determinada. O legatário sucede apenas num determinado bem
descrito no testamento, a título singular. 108
Como o legatário recebe a título singular, pode este
igualmente coincidir, com a pessoa do herdeiro legítimo ou testamentário, mas,
pelo testamento, no que se refere ao legado, em relação a sucessão, terá
também qualidade própria e específica. 109
Como registra Cahali:
105 CAHALI, Francisco José. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avançado de direito civil: direito das sucessões, 2003. p. 57 106 CAHALI, Francisco José. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avançado de direito civil: direito das sucessões , 2003. p. 57 107 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito das sucessões , 2003.p 189 108 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito das sucessões , 2003.p 188 109 CAHALI, Francisco José. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avançado de direito civil: direito das sucessões , 2003. p. 57
37
(...) A instituição de filho como legatário de um determinado imóvel, de valor pequeno em relação ao patrimônio, sem prejuízo da parte que lhe caída na herança, para qual, como herdeiro legítimo, concorrerá com seus irmãos e/ ou cônjuge/ companheiro sobrevivente. 110
A sucessão do legatário dá-se a título singular. O herdeiro,
como demonstrado, é sempre a título universal, pois este recebe uma
universalidade de bens. Esta universalidade do herdeiro é um patrimônio,
consequentemente uma universalidade de direito. O legatário pode acolher uma
universalidade de fato, por exemplo, uma livraria, um rebanho, sem que isso o
torno um sucessor universal. Pode o legatário também, receber um determinado
bem, que em si mesmo, resume-se em uma universalidade de direito, como é o
caso da sucessão em um estabelecimento comercial. Contudo, para fins
sucessórios, o estabelecimento é um bem determinado, especifico, ainda que
peculiarmente contenha uma universalidade de direito.
No capítulo subseqüente faz-se uma análise a respeito dos
regimes matrimoniais de bens. Esta análise se faz necessária para um melhor
entendimento sobre a concorrência do cônjuge com os descendentes, assunto
que será discorrido no terceiro capítulo do presente trabalho.
110 CAHALI, Francisco José. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avançado de direito civil: direito das sucessões , 2003. p. 57
38
CAPITULO 2
DOS REGIMES MATRIMONIAIS DE BENS
2.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS ACERCA DOS REGIMES MATRINO MIAIS DE
BENS.
No que diz respeito ao Regime Matrimonial de Bens,
verifica-se que este é o regramento das relações econômicas entre homem e
mulher casados entre si. Seu objetivo é disciplinar o patrimônio dos cônjuges
antes e na vigência do casamento, de acordo com a vontade de ambos, mas
dentro dos limites da lei. Este tema é de extrema importância para o presente
trabalho, pois para discorrer sobre a concorrência do cônjuge com os
descendentes, o que será feito no próximo capítulo, se faz mister, o entendimento
deste tema.
O regime de bens significa a disposição das relações
econômicas entre marido e mulher, abrangendo adequadamente os efeitos dele
em relação aos bens do casal, ou seja, com o intuito de regulamentar as relações
patrimoniais resultantes do casamento, vem instituídas algumas regras jurídicas
que tratam dos bens existentes antes do casamento, e daqueles que surgirem
durante a vigência da relação conjugal.111
Para Gomes, o regime matrimonial “é o conjunto de regras
aplicáveis à sociedade conjugal considerada sob o aspecto dos seus interesses
patrimoniais. Em síntese, o estatuto patrimonial dos cônjuges”.112
O regime matrimonial de bens, no seu âmbito, regulariza a
propriedade, a administração, o gozo e a disponibilidade dos bens do casal, assim 111 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: lei n.º 10.406, de 10.01.2002. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 617. 112 GOMES, Orlando. Direito de Família . Rio de Janeiro: forense, 2002. p. 173
39
como a responsabilidade dos cônjuges por suas dívidas e o modo de partilha
destes bens numa eventual dissolução matrimonial.113
No entender de Caio Mario “quanto ao seu objeto, o regime
de bens pode resultar a comunicação, total ou parcial dos haveres dos cônjuges,
ou a sua separação”114
A existência das relações patrimoniais entre os cônjuges,
reside nos regimes de bens, sobre os quais, se estende, tanto a doutrina nacional,
como a estrangeira, deles cogitando igualmente as legislações. É defeso, na
verdade, conceder um casamento sem regime de bens, mesmo nos países de
economia socialista, e ainda que os cônjuges salvaguardassem seus bens
totalmente reservados e sem despesas matrimoniais, pois a legislação que o
determinasse estaria desta maneira, criando um regime de bens.115
O regime matrimonial de bens, como acima já foi dito, é o
estatuto que normatiza os interesses patrimoniais dos cônjuges durante o
casamento. O código civil de 2002 propõe quatro regimes de bens do casamento,
a saber:
� O Regime de Comunhão Parcial � O Regime de Comunhão Universal � O Regime de Participação Final nos Aqüestos � O Regime de Separação de Bens
O Código Civil de 2002, em seu artigo 1639, faculta aos
nubentes convencionar o que lhes for de interesse no que se refere aos seus
bens. De maneira que podem optar por um dos regimes listados no Código ou
ainda, combinar regras de um, com regras de outro, com também estipular um
regime peculiar. 116
Seguindo esta mesma linha de pensamento, Rizzardo
esclarece:
113 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família : 2005. p. 618. 114 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . Rio de Janeiro: Forense: 2004. p. 187 115 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 187 116 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. direito de Família , 2002. p. 174
40
(...) a lei não impede um determinado regime matrimonial. Deixa ampla liberdade para a opção, bastando que se faça a menção, ou a referência aos dispositivos que regulam cada espécie. Procura-se, com isso, atender aos interesses particulares das pessoas que se matrimoniam, o que é uma tradição em nosso direito.117
O artigo 1640 do Código Civil atual, em seu parágrafo único,
primeira parte, reafirma a liberdade de escolha quando dispõe que: ”Poderão os
nubentes, no processo de habilitação, optar por qualquer dos regimes que este
Código regula.”118
A escolha do regime de bens deve realizar-se por meio de
pacto antenupcial, a não ser que seja o da comunhão parcial, que predomina na
falta de escolha de outro regime. O pacto antenupcial deve ser feito através de
escritura pública, como exigência do artigo 1653 do Código Civil. 119
Contudo a liberdade de convencionar dos nubentes não é
ilimitada, pois o artigo 1655 do Código Civil vigente reza que:
Art. 1655 - É nula a convenção ou cláusula dela que contravenha
disposição absoluta em lei.
Assim, não são válidas as cláusulas contrárias a lei do
contrato ou pacto antenupcial. O pacto antenupcial ao conter claúsula, por
exemplo, que o cônjuge varão, no regime de comunhão universal, poderá vender
bens imóveis sem a intervenção de sua esposa, será nula ou ineficaz. E a
conseqüência da nulidade deste pacto será a aplicação do regime legal de bens,
artigo 1.640 do Código Civil, denominado regime de bens supletivo. 120
117 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: 2005. p. 618 118 CAHALI, Yuseef Said. Constituição Federal - Código Civil – Código de Pro cesso Civil , 2004. p. 500 119 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família : 2005. p. 618 120 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. direito de Família , 2002. p. 175
41
Será ineficaz também a convenção antenupcial que ajusta a
comunhão de bens, quando o casamento só podia efetuar-se pelo regime de
separação (casos do artigo 1641 do Código Civil). 121
Várias foram as modificações introduzidas na atual
legislação civil brasileira, como a possibilidade de mudar o regime de bens na
vigência do casamento, e a introdução de direitos e obrigações referentes aos
bens e interesses patrimoniais que vinham no Título relativo no Código anterior.122
Entre os dispositivos mais polêmicos do Código Civil atual,
está o artigo 1.639 e seus parágrafos 1º e 2º, inseridos no capítulo das
disposições gerais. Principalmente no que se refere ao seu parágrafo 2º, que
regulariza a possibilidade de alteração do regime de bens no decorrer do
casamento.123
Estabelece o artigo 1.639 do Código Civil vigente:
Art. 1.639 - É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular quanto aos seus bens, o que lhes aprouver.
§ 1º O regime de bens entre os cônjuges começa a vigorar desde a data do casamento.
§ 2º É admissível alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros.
O parágrafo 1º do artigo 1.639, que estabelece o termo
inicial do regime de bens, reproduz, parcialmente o texto do artigo 230 do Código
Civil de 1.916. Diz-se parcialmente, porque o regime de bens sempre foi
irrevogável depois de promovidas as núpcias e isso vem indiscutivelmente
121 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. direito de Família , 2002. p. 176 122 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: 2005. p. 618. 123 DIAS, Maria Berenice. Direito de família e o novo Código Civil . 3 ed. 2.tir., ver. atual. e ampl., Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 196
42
disposto no artigo 230 do Código Civil de 1.916, em sua parte final, o que não foi
reproduzido no artigo 1.639 do atual do Código Civil.124
No que se refere ao § 2º do artigo 1.639, inovou o Código
Civil de 2002, ao admitir a modificação do regime matrimonial, por intermédio de
autorização judicial, se motivado por ambos os cônjuges, ressalvados os direitos
de terceiros. O legislador não estabeleceu prazo mínimo de vigência do
casamento como requisito para a alteração do regime, apenas que este deve ser
feito em documento fundamentado, e requerido por ambos os cônjuges. 125
A concessão da modificação do regime adotado cabe
somente a autoridade judicial - Juiz de Família – que levará em consideração os
argumentos alegados pelas partes. Não se trata de simples decisão
homologatória, mais requer que esta seja fundamentada. O Código de 2.002, não
admite o pedido unilateral de modificação. 126
Como aponta Rizzardo:
(...) Denota-se a viabilidade da alteração, se fortes motivos impuserem o pedido, que será dirigido ao juiz, na forma de procedimento de jurisdição voluntária, disciplinado nos arts. 1.103 e seguintes do Código de Processo Civil. Aos cônjuges faculta-se mudar não apenas o regime, como também modificar algumas regras, estabelecendo inovações sobre a comunhão em determinados bens.127
Levando em conta a igualdade dos cônjuges e dos sexos
que estipula a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, seria
irônico que em plena era de globalização, um dos consortes, apenas por seu
gênero sexual ser considerado mais frágil que seu parceiro. Sob este ponto de
vista, a doutrina moderna não acolhe a severa defesa da imutabilidade do regime
dos bens, pois ambos os cônjuges devem gozar de independência de vontade
para decidirem sobre uma eventual modificação do regime dos bens durante o
124 DIAS, Maria Berenice. Direito de família e o novo Código Civil . 2003. p. 196 125 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 191 126 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 192 127 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família : 2005. p. 619
43
casamento, sem que o legislador possa presumir que um deles possa abusar da
fraqueza de outro.128
Passa-se agora a discorrer especificadamente sobre cada
um dos regimes matrimoniais de bens
2.2 DO REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS
O regime de comunhão parcial de bens, que doutrinadores
mais antigos nomeavam como “regime de separação parcial”, e no Código de
1.916 era denominado de “regime de comunhão limitada”, é o que observa os
princípios da justiça, por garantir a liberdade dos nubentes, salvaguardando cada
um deles, a propriedade, a administração e o gozo excluídos dos respectivos
bens.129
Na vigência do Código de 1.916 o regime de comunhão
parcial de bens, podia ser escolhido pelos cônjuges através de pacto antenupcial.
Com a Lei do Divórcio (Lei n.º 6.515/77) este regime passou a ser o regime legal
e assim foi mantido no Código Civil atual. Portanto, na falta de declaração
expressa dos cônjuges, a comunhão parcial predominará no casamento. 130
No entender de Venosa:
A idéia central do regime da comunhão parcial, ou comunhão de adquiridos, como é conhecido no direito português, é a de que os bens adquiridos após o casamento, os aqüestos, formam a comunhão de bens do casal. Cada esposo guarda para si, em seu próprio patrimônio, os bens trazidos antes do casamento.131
Nesse regime formam-se três massas de bens: os bens do
marido, os bens da mulher e os bens comuns. Portanto, o regime de comunhão
128 DIAS, Maria Berenice. Direito de família e o novo Código Civil . 2003. p. 199 129 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família : 2005. p. 632 130 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 213 131 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família . v 6 3 ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 180
44
parcial é aquele que, se afasta da comunhão os bens que marido e mulher
possuíam antes do casamento ou que venham a adquirir por causa anterior ou
alheia ao casamento, por exemplo: doação ou herança. Comunicando-se apenas
os bens que forem adquiridos na constância da relação matrimonial. 132
Pode-se considerar o regime de comunhão parcial como um
regime de separação quanto aos bens do passado e de comunhão quanto aos
bens adquiridos no futuro. Aliás, o artigo 1.661 do Código Civil, torna visível essa
característica do regime:
Art. 1.661 - São incomunicáveis os bens cuja aquisição tiver por
título uma causa anterior ao casamento.
A escolha deste regime leva-se a termo no processo de
preparação do casamento. Os nubentes ao seguir os trâmites legais, já elegem o
regime na própria petição de casamento, sendo necessário somente o seu
apontamento no processo de habilitação. Já se optarem por outro regime, se faz
necessário o pacto antenupcial, por escritura pública, lavrada em cartório. 133
Tornou-se o regime da maioria absoluta dos casamentos
realizados após 1977, pois é celebrado sem o pacto ou convenção antenupcial
que necessitam os outros regimes. 134
O regime de comunhão parcial se extingue por morte,
separação, divórcio ou anulação do casamento. Extinta a comunhão cada um dos
consortes retirará o que trouxe de bens antes do casamento (bens particulares) e
serão divididos os bens que adquiridos durante a vigência deste, salvo aqueles
cuja aquisição tiver causa anterior ao casamento. Desta maneira se um dos
cônjuges tiver firmado compromisso de compra e venda de imóvel antes da
relação matrimonial, este bem não irá se comunicar, ainda que a escritura
132 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. direito de Família , 2002. p. 206 133 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: 2005. p. 633 134 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família . 2003. p. 180
45
definitiva seja firmada após, salvo se houver prova de que o outro consorte
contribuiu financeiramente para a aquisição deste imóvel. 135
2.2.1 Bens excluídos da comunhão parcial.
O Código Civil de 2002 modificou a sistemática apresentada
quanto aos regimes da comunhão parcial e universal. No Código de 1.916 os
bens e dívidas excluídos da comunhão universal (CC/1.916136, art. 263), eram os
mesmos que viram a ser excluídos da comunhão parcial (CC/1.916, art.269). 137
No Código Civil de 2002 os bens comuns e as causas de
exclusão inseridas no regime de comunhão parcial são estabelecidos de forma
independente, e quando trata dos bens excluídos do regime de comunhão
universal, refere-se a complementação, a algumas exclusões do regime parcial.
Por este motivo, a apresentação dos dispositivos legais referentes à comunhão
parcial vem antes dos que se referem as regras da comunhão universal,
exatamente no sentido contrário ao Código de 1.916.138
Para Venosa:
É natural que o âmbito dos bens que não se comunicam na comunhão parcial seja de maior espectro do que na comunhão universal. Podemos dizer que há uma comunhão mais intensa na comunhão universal e menos intensa na comunhão de aqüestos.139
Assim, o artigo 1.659 do Código Civil vigente, estabelece os
bens que se excluem da comunhão:
Art. 1.659 - Excluem-se da comunhão:
I – os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por adoção ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar;
135 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família. 2003. p. 181 136 Código Civil Brasileiro de 1916 137 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de Família , 2002. p. 210 138 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. direito de Família , 2002. p. 210 139 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família. 2003. p. 181
46
II – os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares;
III – as obrigações anteriores ao casamento
IV – as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal;
V – os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão
VI – os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;
VII – as pensões, meio-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.
Em análise ao artigo citado acima, verifica-se que o
legislador não considerou a exclusão dos rendimentos proveniente do usufruto
sobre os bens de filhos anteriores ao casamento recebidos no exercício do poder
familiar. No entanto, entende-se, que a lacuna legal não permite, por si só, a
inclusão desses rendimentos, ao que o usufruto, por sua natureza, é um direito
personalíssimo e intransferível, podendo somente o titular receber os
benefícios.140
Quanto às dívidas, entende-se que na comunhão universal
de bens não se comunicam aquelas provenientes de obrigações anteriores ao
casamento (art. 1.668, III CC/2002) incluem-se, porém, aquelas decorrentes dos
aprestos (dívidas decorrentes dos preparativos do casamento) ou ainda que
tivessem destinadas ao proveito do casal. Já na comunhão parcial, não entram na
comunhão as dívidas, mesmo que provenientes dos aprestos do casamento. 141
Este é o ponto de maior destaque na doutrina, como um dos
mais favoráveis ao outro consorte, já que resguarda os seus bens da ação dos
140 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de Família , 2002. p. 211 141 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família . 2003. p. 182
47
credores do outro. Entende-se, porém, que ocorrerá comunicação das dívidas
provenientes de aquisição de bens em proveito de ambos.142
Os bens sub-rogados, também se excluem da comunhão.
Para isso é necessário que o consorte resguarde essa sub-rogação no título de
aquisição e comprove que um bem particular substituiu outro. Isso é relevante ao
que se refere a imóveis, pois quanto aos bens móveis, estes se presumem
adquiridos na vigência do casamento (art. 1.662 do CC/2002) 143
É importante também, salientar, que fiel ao princípio
unuscuique sua culpa nocet (cada um responde por sua culpa), cada um dos
consortes responderá pelas obrigações provenientes de ilícito por ele cometido,
salvo se dele ambos tiveram vantagem.144
2.2.2 Bens que ingressam na comunhão parcial.
No regime de comunhão parcial de bens, comunicam-se
todos os bens adquiridos durante a vigência do casamento, sem que a causa da
aquisição seja fato anterior a relação matrimonial.145
Os Bens que se comunicam no regime de comunhão parcial
são aqueles elencados no artigo 1.660 do Código Civil vigente:
Art. 1.660 - Entram na comunhão:
I – os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges;
II – os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior;
III – os bens adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges;
IV – as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge;
142 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 214 143 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família . 2003. p. 182 144 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 214 145 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de Família , 2002. p. 212
48
V – os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge, percebidos na constância do casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão.
Nota-se que os incisos do citado artigo não apresentam
maior dificuldade de compreensão. Será fato eventual, por exemplo, o prêmio de
loteria. Por outro lado, os bens móveis, presumem-se adquiridos na vigência do
casamento, há não ser por prova em contrário. 146
O inciso IV do artigo 1.660, refere-se às benfeitorias feitas
nos bens particulares, presumindo-se estas, decorrentes do esforço de ambos os
consortes, sendo justo que seu valor acrescente o patrimônio comum. No que se
refere ao inciso V, só os bens é que formam o patrimônio que não se
comunicam.147
Sobre o inciso V do artigo 1.660, Rodrigues leciona:
Em relação ao inciso V, só os bens, ou seja, o capital, é que constituem o patrimônio incomunicável do cônjuge. A escolha do regime da comunhão parcial visa, justamente, impedir a confusão do patrimônio atual e obter a confusão dos ganhos futuros. De modo que é absolutamente lógico e conseqüente o princípio segundo o qual os frutos produzidos pelos bens da cada qual dos cônjuges se comunicam. 148
Mostra-se então, que os frutos e rendimentos adquiridos
pelos bens próprios, entram na comunhão dos cônjuges. Desta maneira, os
alugueis de um imóvel particular, pertence ao casal, deles podendo gozar
igualmente. 149
2.2.3 Administração dos bens na comunhão parcial.
Segundo o disposto no artigo 1.663 do Código Civil de 2002
a administração dos bens comuns no regime de comunhão parcial confere a
qualquer dos cônjuges. O Código Civil anterior rezava que a administração do
146 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família. 2003. p. 184 147 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. direito de Família, 2002. p. 213 148 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. direito de Família, 2002. p. 213 149 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família : 2005. p. 640
49
patrimônio deveria ficar a cargo do cônjuge varão, o que não podia mais ter valor
após a Constituição de 1988. 150
Tratando a matéria nos termos da igualdade constitucional
adotada pela legislação civil pátria, cabe a administração dos bens particulares ao
cônjuge proprietário dos mesmos, e no que se refere aos bens comuns, compete
a ambos a administração. Não se justifica nos dias atuais, atribuir a administração
do patrimônio comum a só um dos consortes. 151
No entender de Pereira:
O artigo 1.663 (caput) determina que “a administração do patrimônio comum compete a qualquer dos cônjuges”. Confere a administração a ambos, o que, na prática, pode embaraçar a gerência. Melhor será que cada um administre os bens com o qual contribuiu para o acervo comum. Caracterizada a parceria na aquisição, que vigore o bom senso e uma efetiva relação de conjugalidade. 152
Durante a administração as dívidas que forem contraídas
serão de encargo do consorte administrador e obrigam seus bens comuns e
particulares e os do outro em razão da vantagem obtida (art. 1.663, § 1º
CC/2002). 153
Vale a pena ressaltar, que o patrimônio comum responde
pelas obrigações assumidas. Se este for insuficiente, arcam os bens particulares
de cada cônjuge, na extensão adequada para saldar em partes iguais a dívida.
Inclusive se o cônjuge contraiu obrigações sem informar do outro, deste que
tenha sido em proveito de ambos.154
O inciso 2º do referido artigo, estabelece que é necessário a
autorização de ambos os consortes para atos a título gratuito, que demandem
150 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família. 2003. p. 184 151 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família : 2005. p. 642 152 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 219 153 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família . 2003. p. 185 154 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: 2005. p. 642
50
sobre cessão do uso ou gozo dos bens comuns. Portanto, o negócio realizado
sem a anuência de um dos cônjuges será anulável.155
Há de se ressaltar que os negócios de cessão onerosa de
uso, consideram-se incluídos na administração normal, sendo necessário a
outorga de ambos os consortes para os atos a título gratuito sob pena de se
tornar anulável. 156
Acrescenta ainda o § 3º do artigo 1.663, que “em caso de
malversação dos bens o juiz poderá atribuir a administração a apenas um dos
cônjuges”. Se o cônjuge administrador, colocar em risco os bens comuns, pode
este ser afastado da sua administração. Para o afastamento há necessidade de
autorização judicial, e o cônjuge que causou prejuízo ao outro enquanto estava na
administração do patrimônio, ficará obrigado a reparar o dano, nos termos do
artigo 186 CC/2002. 157
Ainda sobre as dívidas adquiridas na administração do
patrimônio, o artigo 1.664 do Código Civil vigente dispõe:
Art. 1.664 - Os bens da comunhão respondem pelas obrigações
contraídas pelo marido ou pela mulher para atender aos encargos da família, às despesas de administração e às decorrentes de imposição legal.
As obrigações adquiridas pelo marido ou pela mulher,
durante a administração dos bens comuns, comprometem os bens do casal se
estas forem destinadas para atender as despesas familiares, bem como os
encargos da administração. Havendo dúvida, a cônjuge que as contrair deverá
provar sua respectiva causa, sob pena de responder com seus bens
particulares.158
No que tange aos bens particulares, a administração destes,
fica a cargo de seu proprietário, salvo estipulação em contrário no pacto
155 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família . 2003. p. 185 156 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 219 157 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família . 2003. p. 185 158 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 219
51
antenupcial. Assim como, as dívidas relativas aos bens particulares de cada
cônjuge, em benefício destes, não compromete o patrimônio comum.159
Se faz mister, distinguir entre as dívidas contraídas em
benefício do casal e as do interesse do acervo particular do consorte que a
contraiu. As primeiras obrigam os bens comuns, as outras somente o particular do
cônjuge que a contraiu.160
2.3 REGIME DE COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS.
Até a chegada da Lei do Divórcio, em 1977, o regime legal
na ausência de pacto antenupcial era o da Comunhão Universal. O regime vem
regulamentado nos pelo Código Civil vigente nos artigos 1.667 ao 1.671. 161
Através do regime de comunhão universal, em princípio,
todos os bens dos consortes se comunicam, com poucas exceções. Não
importando a sua natureza, seja móveis ou imóveis, direitos ou ações, passam a
formar um único patrimônio até a dissolução da relação conjugal. Os bens
trazidos pelo consorte ao matrimônio se confundem com os do outro cônjuge,
formando um único patrimônio. 162
Como regra, no Regime de Comunhão Universal, tudo o que
cada consorte adquire passa a ser comum, tendo cada cônjuge direito a metade
de todo o patrimônio, ainda que um deles não tivesse bens particulares ou
adquirido bens na vigência do casamento. Contudo, há exceções, admitindo a lei
bens incomunicáveis, que ficarão sendo apenas de um dos cônjuges.163
Nesta mesma linha de pensamento, dispõe Pereira:
O que caracteriza o regime da comunhão universal é comunicação de todos os valores, móveis ou imóveis, de que
159 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 220 160 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 220. 161 DIAS, Maria Berenice. Direito de família e o novo Código Civil. 2003. p. 213 162 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família : 2005. p. 643 163 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família . 2003. p. 186
52
cada um dos cônjuges é titular ao tempo das núpcias, e bem assim os que forem adquiridos na constância do matrimônio, posto que adquiridos por um deles apenas. Comunicam-se igualmente as dívidas, anteriores e posteriores. Além de outras exceções, legais e convencionais, eventualmente estabelecidas o artigo seguinte exclui de comunicação os bens e dívidas que menciona.164
É defeso, a qualquer dos cônjuges, se apropriar de qualquer
dos bens, privando o outro de sua utilização. A ambos, no entanto, cabe defender
os bens contra as vias de fato ou de terceiros. Somente com o final da relação
conjugal e a extinção da comunhão, é que cabe a cada cônjuge os que a que tem
direito na meação.165
2. 3.1 Bens excluídos da Comunhão Universal.
Pelo pacto antenupcial os nubentes podem optar que o
regime de bens seja o da comunhão universal de bens, através do qual, todos os
bens adquiridos antes ou depois do casamento, como também as dívidas
passivas se comunicam, constituindo um só patrimônio. Através desde inicia-se o
estado de indivisão, no qual cada consorte tem direito a metade do patrimônio
comum.166
Os bens excluídos da comunhão vêm elencados no artigo
1.668 do Código Civil de 2002, de modo que aqueles não incomunicáveis ou não
excluídos consideram-se comum.
Art. 1.668 - São excluídos da comunhão:
I - os bens doados, ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar;
II – os bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva;
164 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 224 165 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 224 166 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro . v. 5, 19 ed. São Paulo: Saraiva. 2004. p. 161
53
III – as dívidas anteriores ao casamento, salvo se provieram de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum;
IV – as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com a cláusula de incomunicabilidade;
V – os bens referidos nos incisos V a VII do artigo 1659.
No inciso I do artigo 1.668, destaca-se que não entram no
patrimônio comum dos consortes, os bens considerados incomunicáveis, por
testamento ou doação. A incomunicabilidade deve ser declarada
expressamente.167
Sobre a claúsula de incomunicabilidade Venosa relata:
A claúsula de incomunicabilidade pode ser imposta por terceiros em doação ou testamento. Geralmente, vem acompanhada das claúsulas de inalienabilidade e impenhorabilidade. Discutia-se se a claúsula de inalienabilidade, por ser mais ampla, implicava nas outras duas. A conclusão majoritária foi estampada na Súmula 49 do STF. (...) Comunicação implica em síntese, alienação. O novo Código assumiu expressamente essa posição ao estatuir que:” a claúsula de inalienabilidade, imposta aos bens por atos de liberalidade, implica impenhorabilidade e incomunicabilidade”.168
Ressalta-se que embora a lei silencie a esse respeito, os
bens doados com a claúsula de reversão, também são incomunicáveis. Por força
do artigo 547 do Código Civil vigente, o doador pode estabelecer que o patrimônio
doado, volte para si, se este sobreviver ao donatário. É necessário, no entanto,
para convalidar a reversão dos bens, que estes permaneçam no domínio do
beneficiado.169
Os bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro
fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva (inciso II, art. 1668,
CC/2002) também são excluídos da comunhão dos bens.
167 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 2004. p. 224 168 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família: 2003. p. 188 169 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família : 2005. p. 645
54
Explica-se fideicomisso como a disposição testamentária,
pela qual, o testador (fideicomitente) estipula que o legado ou herança, inserida
certa condição, se transmita a outra pessoa chamada a suceder.170
Sobre este assunto, explica Venosa:
A propriedade de fiduciário no fideicomisso é restrita e resolúvel (art. 1.951, CC/2002). Sob certo tempo, condição ou com sua morte o bem fideicomitido será transferido ao fideicomissário. O fiduciário recebe o bem com o encargo de transferi-lo. Por essa razão, não poderá comunicar-se, para não inviabilizar a transferência. (...) Da mesma forma, não haverá comunicação do direito do herdeiro fideicomissário, enquanto não se realizar a condição ou decurso de prazo, pois sem isso o agente não terá ainda a propriedade do bem, mas mero direito eventual. 171
O fiduciário é o titular da posse, mas sua posse é resolúvel,
ao passo que o fideicomissário é apenas titular de um direito eventual, pois este
só adquirirá a posse do bem se sobrevier a condição suspensiva.172
Por ser o direito do fiduciário resolúvel e o direito do
fideicomissário eventual, estes não se comunicam, No entanto, se a propriedade
se consolida na posse do fiduciário, por causa de pré-morte do fideicomissário, ou
se, com o começo da condição, os bens transferirem-se ao patrimônio do
fideicomissário, dá-se a comunicação. 173
Neste sentido, esclarece Rizzardo:
O direito do fideicomissário, que é resolúvel, não se comunica ao outro cônjuge, pois se o mesmo falecer antes do fiduciário, caduca o fideicomisso, consolidando-se a propriedade na posse deste último, na ordem do art. 1.958 (art. 1.738 do diploma civil de 1.916). Se o fiduciário, no entanto, falecer antes, passam os bens
170 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família : 2005. p. 645 171 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família: 2003. p. 188 172 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. direito de Família, 2002. p. 200 173 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. direito de Família, 2002. p. 200
55
automaticamente ao fideicomissário, e se comunicam ao cônjuges.174
Portanto, se a propriedade consolidar-se em mãos do
fiduciário, em decorrência da pré-morte do fideicomissário, a propriedade do
primeiro passa a ser plena, desse modo comunicando-se com seu consorte.175
Na forma do inciso III do artigo 1.668 do Código Civil
vigente, não entram no patrimônio comum as dívidas adquiridas antes do
matrimônio, salvo se estas advierem de despesas para os seus aprestos ou
reverterem em proveito de ambos.176
Pelas dívidas adquiridas antes do casamento, que não
advierem de despesas com seus aprestos ou não reverterem em proveito dos
consortes, responde unicamente, o devedor com os seus bens particulares ou
como os bens que este trouxe para o matrimônio. Só com o fim do casamento, os
bens do devedor respondem por suas dívidas contraídas antes do casamento. 177
No entanto, se o credor comprovar que os débitos são
provenientes de despesas com os aprestos do casamento, como aquisição de
móveis ou festa, ou que estas se reverteram em proveito comum, como
empréstimo para comprar a casa destinada a residência do casal, ter-se-á a
comunicabilidade.178
No que refere-se as doações antenupciais feitas por um dos
consortes ao outro, não se comunicaram aqueles bens que tiveram a claúsula de
incomunicabilidade (inciso IV do artigo 1.668, CC/2002). 179
No entanto, se a doação constituir forma de fraude à
execução, ou fraude contra credores, tornando-se insolvente o doador, poderá
174 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família : 2005. p. 646 175 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família: 2003. p. 188 176 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 224 177 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: 2004. p. 163 178 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: 2004. p. 163 179 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 224
56
esta ser desconstituída ou tornar-se ineficaz se pendia de processo objetivando o
reconhecimento da vítima. 180
No que tange ao inciso V do artigo 1.668 Código Civil de
2002, também são excluídos do acervo comum os bens referidos nos incisos V a
VII do artigo 1.659 do Código Civil atual. São eles: V - os bens de uso pessoal, os
livros e instrumentos de profissão, VI - os proventos do trabalho pessoal de cada
cônjuge, VII - as pensões, meio-soldos, montepios e outras rendas
semelhantes.181
No Código Civil de 1.916, havia outras classes de bens que
também se excluíam. Entre elas, o artigo 263, VI, relatava às obrigações advindas
de atos ilícitos. A principal idéia neste caso, era de que as sanções e suas
conseqüências não ultrapassassem a pessoa do cônjuge que causou o dano. As
indenizações advindas destes atos ilícitos comprometiam somente os bens da
pessoa que causou o dano. Na prática, a situação era de difícil apuração. O
problema era saber como atribuir a responsabilidade na meação do cônjuge
obrigado. Claro que terceiros, não podiam ficar impedidos de acionar o cônjuge
obrigado, nem de penhorar os bens do casamento. Em princípio, enquanto
persistisse o casamento, não havia como se separar o valor dessa
responsabilidade. O Código de 2002, contudo, manteve a exclusão da comunhão
das obrigações provenientes de atos ilícitos no regime de comunhão parcial, salvo
reversão em proveito do casal (art. 1.659, IV). 182
Outras exceções de bens que se não se comunicavam no
antigo Código se tornaram inócuo, pois se referiam à questões superadas no
novo ordenamento.183
Pelo artigo 1.669 do Código Civil de 2002, a
incomunicabilidade dos bens elencados no artigo 1.668 não se estende aos
frutos, quando se recebe ou vencem durante a relação conjugal. 184
180 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família : 2005. p. 646 181 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 224 182 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família: 2003. p. 188 183 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família: 2003. p. 190
57
A título de curiosidade merece ser transcrito o exemplo dado
por Diniz:
Se um dos nubentes, antes de se casar, tinha direito a uma pensão, esse direito não se comunica pelo casamento. Porém, o dinheiro que receber, após as núpcias, se comunica, a partir do vencimento da prestação, isto é, recebida a pensão, o valor assim obtido entra no patrimônio do casal, bem como os bens adquiridos com ela. Faltando estipulação em contrario, comunicam-se esses frutos auferidos na constância do matrimônio. 185
Durante a vigência da relação matrimonial, a propriedade e
posse patrimônio é comum, mas, como a direção da relação conjugal é dos dois
cônjuges, compete e ambos a administração desse patrimônio. 186
A comunhão de bens termina a com o fim da sociedade
conjugal, quando se fará a meação do acervo.187
As causas de extinção da sociedade conjugal são:
� Pela morte de um dos consortes; � Pela anulação do casamento, quando a sentença o considerar
putativo; � Pela separação judicial; � Pelo divórcio.
Terminada a comunhão por qualquer dessas causas, e feita
a meação dos bens e dívidas, ou homologada a partilha, cada um dos consortes
ficará responsável pelas próprias dívidas, não podendo ser responsabilizado
pelas que forem contraídas pelo outro consorte. 188
Tema de muita divergência, é a regra de transmissão da
obrigação alimentar, prevista no artigo 1.700 do Código Civil atual, que remete ao
artigo 1.694, dando a entender que esta regra envolve também a obrigação
184 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: 2004. p. 165 185 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: 2004. p. 165 186 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: 2004. p. 165 187 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 224 188 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 228
58
alimentícia originada do vínculo de parentesco, além das decorrentes do
casamento e união estável; e que os herdeiros do alimentante estariam obrigados
a prestar alimentos ao credor-alimentado de acordo com as suas possibilidades, e
não nas forças da herança. Na verdade o Código Civil atual, não soluciona de
uma forma clara as discussões atuais sobre o tema, mas apenas gera uma nova
fase de conflitos e incertezas a serem solucionadas pela doutrina e jurisprudência.
2.4 REGIME DE PARTICIPAÇÃO FINAL NOS AQÜESTOS
O Código Civil atual inseriu o Regime de Participação final
nos aqüestos, como uma opção dos nubentes, o qual deverá ser realizado
através de pacto antenupcial.
Sobre o Regime de participação final nos aqüestos, Caio
Mário dispõe:
Pretendeu o Código de 2002 ser inovador ao instituí-lo, sobre cuja penetração em nosso sistema jurídico manifestamos nossas restrições, sob fundamento de não encontrar amparo em nossas tradições, e não oferecer aos cônjuges maiores vantagens do que já oferecem os clássicos regimes de comunhão parcial e de separação de bens, como as contribuições que ao longo do tempo lhes trouxe a jurisprudência. 189
Neste regime de bens existe a formação de duas massas de
bens particulares e incomunicáveis na vigência do casamento, mas que se tornam
comuns no momento da dissolução. Na vigência do casamento os consortes tem
a expectativa da meação, uma vez que cada um dos consortes terá direito a
metade do que o outro adquiriu a título oneroso durante o matrimônio (art. 1.672,
CC/2002) se houver extinção da sociedade conjugal.190
Os consortes orientando-se durante o casamento como se
tivesse sob o regime de separação de bens, porém, mantém a expectativa da
divisão dos bens ao final do casamento. Portanto, preserva a necessidade da
189 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 228 190 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: 2004. p. 167
59
outorga conjugal para a prática de determinados atos, (art. 1647, CC/2002), como
por exemplo: alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis.191
Quanto à administração do patrimônio, o artigo 1.673
determina que “a administração destes bens é exclusiva de cada consorte, que os
poderá livremente alienar se forem móveis”. Cada um dos consortes possui a
administração de seu acervo particular, como também, a disponibilidade sobre os
bens móveis.192
No tocante as dívidas adquiridas depois do casamento por
um dos consortes, apenas este responderá por elas, salvo comprovação de que
estas se reverteram em proveito comum (art. 1677, CC/2002), que neste caso,
terá responsabilidade na extensão da vantagem obtida. 193
O cônjuge que tiver pago dívida do outro, pela qual não era
responsável, com os bens do seu patrimônio, o valor deste pagamento deverá ser
atualizado e impugnado, na data da dissolução, à meação do outro consorte,
reduzindo a participação deste nos aqüestos.194
Na dissolução da sociedade conjugal, o montante dos
aqüestos a ser dividido é o da data em que se decretou a separação judicial ou o
divórcio. A determinação do final da relação conjugal é questão de fato, devendo
ser considerada no caso concreto. Esta determinação pode advir, por exemplo, da
separação de corpos. É importante estabelecer o final da relação sem que tenha
havido separação ou divórcio, pois pode ocorrer mudança no patrimônio do
cônjuge, a qual não deve ser considerada para a averiguação da meação. 195
O artigo 1.684, traça as regras para a divisão dos bens e
apuração dos valores:
Art. 1.684 - Se não for possível nem conveniente a divisão de
todos os bens em natureza, calcular-se-á o valor de alguns ou de todos para a reposição em dinheiro ao cônjuge não-proprietário.
191 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família: 2003. p. 192 192 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 224 193 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: 2004. p. 168 194 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 232 195 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família: 2003. p. 195
60
Parágrafo único: Não se podendo realizar a reposição em dinheiro, serão avaliados e, mediante autorização judicial, alienados tantos bens quantos bastarem.
Sobre o artigo acima citado, Diniz, esclarece:
Realmente, de boa política legislativa é esse artigo, porque, às vezes, a partilha in natura poderá acarretar a destruição de
valores unitários, pois determinados bens têm maior valor quando não divididos, como por ex. o conjunto de ações que conferem ao seu titular a maioria numa empresa. E se a partilha prejudicar patrimonialmente os ex-consortes, ambos poderão pleitear avaliação para fins de reposição pecuniária no valor da meação que lhes é cabível. 196
A divisão do patrimônio na extinção do casamento por morte
levará em conta a meação do consorte sobrevivente em concordância com as
disposições anteriores. Os herdeiros do cônjuge herdam em de acordo com as
regras comuns da sucessão.197
O artigo 1.686 do Código Civil de 2002 estabelece que as
dívidas de um dos cônjuges, quando superiores a sua meação, não obrigam ao
outro, ou a seus herdeiros. O referido artigo trata da situação após a dissolução
do casamento. Incumbe ao devedor ou ao cônjuge, comprovar que há dívida que
ultrapasse o valor da meação. 198
Analisando o que se refere ao regime de participação final
nos aqüestos, os nubentes, a princípio, se desencorajarão com este regime, pois
nota-se que o regime de comunhão parcial o supera com inúmeras vantagens
para os cônjuges, bem como o que se refere ao relacionamento com terceiros.199
196 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: 2004. p. 171 197 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família : 2005. p. 646 198 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família: 2003. p. 196 199 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família: 2003. p. 198
61
2.5 REGIME DE SEPARAÇÃO DE BENS
A principal característica deste regime é que há completa
distinção do patrimônio dos dois consortes, não se comunicando os frutos e
aquisições, conservando cada qual a propriedade, posse e administração do seu
patrimônio.200
Para optar pelo regime de separação de bens, se faz mister,
a estipulação em pacto antenupcial. Salvo, quando este regime for imposto aos
consortes nos casos previstos no artigo 1641 do Código Civil Brasileiro.201
Sobre o regime de separação de bens, Rizzardo, relata:
Este regime não ingressa no âmbito pecuniário dos patrimônios, inclusive no que diz respeito à alienação de imóveis, que não dependerá do assentimento recíproco, eis que a liberdade para tanto não mais se restringe aos móveis, o que era preservado no sistema do Código de 1.916. Todavia, cumpre observar a liberdade de livremente alienar ou onerar restringe-se quando consensual a adoção do regime de separação absoluta.202
Como os bens, as dívidas do casal também não se
comunicam, respondendo cada um pelos próprios débitos. Somente aquelas
dívidas adquiridas sem a outorga conjugal, se estas se efetuaram para a
aquisição de coisas necessárias a economia doméstica, pois ambos os consortes
devem contribuir para as despesas do casal.203
O regime de separação de bens como já foi dito, poderá
advir da lei ou convenção.
Destarte, em certas situações a lei no artigo 1.641 do Código
Civil vigente, impõe este regime por razões de ordem pública, visando proteger os
nubentes ou terceiro ou por ser exigido como sanção.
200 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família: 2003. p. 198 201 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . 2004. p. 237 202 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família : 2005. p. 657 203 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: 2004. p. 177
62
No regime de separação de bens convencional, poderão os
nubentes estipular que alguns bens, eventualmente, se comunicam, estabelecer
normas referente a administração, à quota de contribuição de cada qual, para as
despesas domésticas ou ainda as despesas relativas a educação dos filhos. 204
Verifica-se, analisando o disposto acima que a separação de
bens pode ser pura ou limitada. A primeira estabelece a incomunicabilidade de
todo o patrimônio, inclusive dos frutos e rendimentos futuros. A segunda abrange
os bens presentes, comunicando-se os frutos e rendimentos futuros. 205
Em razão da igualdade constitucional do homem e da
mulher, o regime de separação de bens molda o regime das futuras relações
matrimoniais, na medida que cada consorte irá concorrer com seus bens
particulares para atender as cargas especificas do casamento, mantendo
intocáveis os seus bens no caso da dissolução do casamento. Principalmente
quando se habilitam para uma nova relação conjugal, existe o medo de arcar com
mais prejuízos quando anterior separação já lhes tomou significativa parte do
patrimônio.
Depois da análise feita no que tange ao regime matrimonial
dos cônjuges, passa-se agora a discorrer sobre o direito sucessório do cônjuge.
204 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: 2004. p. 175 205 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família : 2005. p. 661
63
CAPITULO 3
DIREITO SUCESSÓRIO DO CÔNJUGE
3.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS:
O presente capítulo tem por intuito o estudo da concorrência
do cônjuge com os descendentes, com os ascendentes do falecido ou ainda
herdando a totalidade da herança. Tratando-se a concorrência de um instituto
recente, muitos questionamentos surgem na comunidade jurídica, assim, de
forma simplificada, parte-se de vários conceitos para uma melhor compreensão
do tema apresentado.
Em nosso direito, anterior ao Código Civil de 1916, o
cônjuge supérstite era colocado em quarto lugar na ordem de vocação hereditária,
isto é, depois dos colaterais, estes, chamados a suceder até o décimo grau. Esta
situação durou até o advento da Lei n.º 1.839, de 31 de dezembro de 1907,
chamada “Lei Feliciano Pena”. Tal lei chamou o cônjuge para o terceiro lugar na
ordem de suceder.206
Durante a vigência do Código Civil de 1916, o cônjuge era
herdeiro meramente facultativo, o que possibilitava ao falecido, na falta de
descendentes ou ascendentes, dispor da totalidade de seu patrimônio a qualquer
pessoa.207
O Código Civil de 1916 atribuiu a herança ao cônjuge
supérstite, sob duas condições: ausência de descendentes e ascendentes e não
estarem aos cônjuges legalmente separados. Os descendentes e ascendentes,
206 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Rio de Janeiro, Editora Forense, 2005. p. 131 207 DELGADO, Mário Luiz. ALVES, Jones Figueiredo.Questões controvertidas no direito de família e das sucessões. São Paulo: Editora Método. 2005. p 418
64
no sistema deste Código, excluíam o cônjuge. E a separação judicial e a anulação
do casamento contestavam o seu direito sucessório.208
Cabe esclarecer, que tanto no sistema do Código Civil de
1916, como no atual, não há de se confundir o direito a herança, reconhecido ao
cônjuge sobrevivente, com a sua meação. Com o falecimento de um dos
cônjuges, desfaz-se a sociedade conjugal. Como em qualquer outra sociedade,
os bens comuns, devem ser divididos. A meação é avaliada de acordo com o
regime de bens que vigorava na constância do casamento. Como visto no
capítulo anterior, na comunhão universal os bens são divididos ao meio, na
comunhão de aqüestos, se dividirá pela metade os bens adquiridos na vigência
do matrimônio. Se existir pacto antenupcial, a meação será feita de acordo com o
estipulado no acordo. Conseqüentemente, ao se examinar uma herança no
falecimento de uma pessoa casada, há de se separar dos bens comuns o que
pertence ao cônjuge supérstite, não porque o sua esposa (o) morreu, mais porque
aquela porção ideal do patrimônio já lhe pertencia. Excluída a meação, o que não
for patrimônio do cônjuge sobrevivente compõe a herança, para ser dividida entre
os descendentes, ascendentes ou cônjuge, conforme o caso.209
Neste sentido, esclarecedoras são as colocações de Cahali:
Assim, paralelamente, se o regime de bens e situação patrimonial do falecido permitir, o consorte sobrevivente comparece no processo também na qualidade de cônjuge viúvo, para preservar a sua meação pela parte ideal de 50% da universalidade de bens comuns.210
Não se confunde a meação com herança. A meação decorre da comunhão total dos bens ou da comunhão parcial em relação aos aqüestos (adquiridos na constância do casamento). A herança representa exclusivamente o patrimônio particular do de cujus, e a
parte dele na comunhão conjugal. A meação não é objeto da sucessão, pois pertence ao consorte por direito próprio, em razão do casamento. A herança, objeto do inventário, será destinada
208 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil, 2005. p. 131 209 VENOSA, Sílvio de Saulo. Direito das sucessões . 2004. p. 108 210CAHALI, Francisco José. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avançado de direito civil : direito das sucessões. 2003. p 210
65
aos sucessores (legais ou instituídos), sempre preservada a eventual meação, dela não integrante. Mesmo que o viúvo não tenha direito a meação, poderá ser convocado para receber a herança do cônjuge falecido. 211
O Código Civil de 2002, em seu artigo 1830, determina que
o cônjuge sobrevivente não herda se estiver separado judicialmente ou
divorciado; ou ainda se o casamento tiver sido anulado ou declarado nulo antes
da morte do autor da herança, de modo que, para ter direito à herdar, o cônjuge
sobrevivente precisa, a princípio, estar convivendo com o falecido no momento de
sua morte.212
Dispõe o artigo 1830 do Código Civil de 2002:
Art. 1830 - Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente.
O artigo citado acima, inova em relação ao Código Civil de
1916, ao estabelecer que o cônjuge separado de fato de seu consorte, há mais de
dois anos, não herdará caso esse faleça, determinando uma forma de cessação
do direito sucessório do cônjuge independentemente do término da sociedade
conjugal.213
Esse dispositivo legal tem seu ponto forte ao estabelecer
que a separação de fato faz cessar o direito de herdar do cônjuge sobrevivente,
pois no sistema anterior, apenas se houvesse a dissolução da sociedade conjugal
antes da morte do autor da herança é que se extinguiria o direito de sucessório do
cônjuge supérstite. Havia, portanto, situações injustas em que os cônjuges
estavam separados de fato há tempos e, como a sociedade conjugal não havia
sido dissolvida judicialmente, o cônjuge supérstite continuava sendo considerado 211 CAHALI, Francisco José. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avançado de direito civil : direito das sucessões. 2003. p. 211 212 ORSELLI, Helena de Azeredo. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil . v 7, n.39, Porto Alegre: Síntese, 2006 p. 113 213 ORSELLI, Helena de Azeredo. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil . 2006 p. 113
66
herdeiro, contrariando um dos fundamentos do direito sucessório que é a
afetividade entre o falecido e seus herdeiros. 214
No entanto o referido artigo do Código Civil estabelece uma
questão extremamente delicada, pois permite que o cônjuge separado de fato do
falecido há mais de dois anos seja sucessor de comprovar que o fim da
convivência se deu sem culpa sua.215
Neste sentido, Orselli:
Essa previsão legal trará inconvenientes ao processo de inventário do patrimônio do de cujus, pois o direito sucessório do
cônjuge separado de fato do falecido dependerá da prova de que a convivência se tornou impossível sem sua culpa. Certamente, o juiz do inventário remeterá a discussão relativa à culpa às vias ordinárias posto que dependerá de provas mais complexas.216
O Código Civil de 2002 trouxe também inovações ao direito
sucessório, principalmente no que tange a modificação da situação do cônjuge
sobrevivente, que assumiu lugar de destaque, ganhando inclusive a qualidade de
herdeiro necessário. 217
O Código Civil de 2002 representa o ponto de chegada de
uma lenta evolução. Além de afirmar textualmente a qualidade de herdeiro
necessário ao cônjuge, assegurando-lhe com isso a legítima, pôs o cônjuge
sobrevivente em situação de destacada, no que diz respeito à ordem de
sucessão, permitindo-lhe ser chamado para receber a propriedade, em
concorrência com descendentes e ascendentes.218
Diferentemente ao Código Civil anterior, o Código Civil de
2002 possibilita a vocação de herdeiros simultânea, com quem o de cujus
214 ORSELLI, Helena de Azeredo. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil . 2006 p. 113 215 ORSELLI, Helena de Azeredo. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil . 2006 p. 114 216 ORSELLI, Helena de Azeredo. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil . 2006 p. 114 217 DELGADO, Mário Luiz. ALVES, Jones Figueiredo.Questões controvertidas no direito de família e das sucessões, 2005. p. 418 218 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil, 2005. p. 143
67
mantinha relações de diferentes naturezas. Assim, a primeira classe de
sucessores legítimos passa a ser dos descendentes em concorrência com o
cônjuge, a segunda, dos ascendentes em concorrência com o cônjuge. Pode
ocorrer ainda, como no Código revogado, o cônjuge supérstite receber
integralmente a herança, não havendo descendente ou ascendente sucessível
com o qual deva concorrer. 219
Cabe ressaltar que o atual Código Civil em seu artigo 1831
mantém o direito real de habitação. Assunto este que será tratado com mais
atenção no próximo subtítulo.
Com base no exposto acima, há de se perceber que no atual
ordenamento jurídico brasileiro o cônjuge sobrevivente foi beneficiado no que diz
respeito ao direito sucessório devido a sua equiparação a herdeiro necessário.
3.2 DIREITO REAL DE HABITAÇÃO
O Código Civil de 2002, em seu artigo 1831 mantém o direito
real de habitação, mas em melhores condições, pois o amplia para qualquer tipo
de regime de bens, e silenciou quanto a sua extinção. Desta forma, entende-se
que há o direito real de habitação sobre o único imóvel da família, independente
do regime de bens e da manutenção do estado de viuvez.220
Dispõe o artigo 1831:
Art. 1831: Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime
de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação, relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar.
Diferentemente do Código Civil de 1916, o atual não
manteve a cláusula restritiva “enquanto viver ou permanecer viúvo”, daí 219 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil, 2005. pg. 143 220 CAHALI, Francisco José. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avançado de direito civil : direito das sucessões. 2003. p. 217
68
subentende-se que a cessação do estado de viuvez não mais priva o cônjuge
sobrevivente do direito real de habitação.221
Neste sentido, expressivas são as colocações de Leite,
acerca do direito real de habitação:
Sensível melhoria ocorreu, se considerarmos a ausência da limitação (presente no Código anterior) relativamente ao regime de bens (não mais necessária à caracterização desse direito), bem como o igual silêncio quanto à permanência na viuvez. É que a intenção manifesta do legislador – via direito real de habitação- não é punir, ou suprimir direitos do cônjuge sobrevivente (como ocorria anteriormente, fazendo depender o benefício da manutenção da viuvez), mas sim, proteger membros da família, assegurando-lhes o direito real de habitação, quando ele é o único imóvel daquela natureza a inventariar. 222
O direito real de habitação deferido em favor do cônjuge
sobrevivente é um direito personalíssimo e resolúvel, cessando com a morte do
titular. O direito real de habitação, compreende apenas o direito de continuar
utilizando diretamente a residência, sem qualquer ônus perante os titulares do
domínio, impossibilitando a fruição ilimitada, assim entendida a possibilidade de
alugar, ceder em comodato, etc.223
Na amplitude da ocupação contida no direito real de
habitação, pode o cônjuge sobrevivente, inclusive, ali constituir nova família, seja
através de um novo casamento ou ainda de união estável, pois a restrição contida
na legislação anterior sobre a manutenção do estado de viuvez não foi renovada,
subentendendo-se que um novo casamento ou convívio não irá cessar o benefício
do direito real de habitação.224
221 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil, 2005. pg. 150 222 LEITE, Eduardo de Oliveira. Comentários ao Novo Código Civil, Volume XXI: direi to das sucessões : 2004. p. 232 223 CAHALI, Francisco José. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avançado de direito civil : direito das sucessões. 2003. p. 218 224 CAHALI, Francisco José. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avançado de direito civil : direito das sucessões. 2003. p. 218
69
Os titulares da herança serão condôminos viúvo, no entanto,
não podem reclamar a posse direita do imóvel, nem cobrar aluguel, referente ao
direito real de habitação, enquanto este persistir.225
Portanto, terá o cônjuge sobrevivente direito real de
habitação sobre o único imóvel da família, independente do regime de bens e da
manutenção do estado de viuvez.
3.3 CÔNJUGE CONCORRENDO COM OS DESCENDENTES.
Depois de tratar das normas gerais referentes à sucessão,
no sentido de serem regras que se aplicam tanto à sucessão testamentária,
quanto àquela que se processa tendo autor da herança falecido sem deixar
expressa a sua vontade, passa o legislador a formular regras para aquelas
situações em que a morte se dá com a falta de testamento ou de testamento
válido, com testamento incompleto, enquanto um testamento que não abrange a
totalidade do acervo hereditário disponível, ou mesmo com um testamento que,
ainda que completo, encontra limitação na existência de herdeiros necessários,
que são aqueles que necessariamente devem ser chamados a herdar. 226
Esta convocação se organiza, em níveis de preferência por
certas classes de pessoas conforme a regra do artigo 1829 do atual Código Civil:
Art. 1829 - A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:
I – Aos descendentes em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime de comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1640 parágrafo único); ou se, no regime de comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;
225 LEITE, Eduardo de Oliveira. Comentários ao Novo Código Civil, Volume XXI: direi to das sucessões : 2004. p. 232 226 HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Concorrência do companheiro e do cônjuge na sucessão dos descendentes. Disponível em: http://www.direitodafamilia.net/ . Acesso em 19 de março de 2006
70
II – aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III – ao cônjuge sobrevivente;
IV – aos colaterais.
A concorrência, no que tange ao direito sucessório, é um
instituto recente, introduzido em nosso sistema legal com a vigência do Código
Civil de 2002.
Como já salientado, foi atribuída posição mais favorável ao
cônjuge, pois este foi colocado em terceiro lugar na ordem de vocação
hereditária, podendo recolher a herança integralmente a falta de descendentes ou
ascendentes, ou ainda, poderá ser ele herdeiro concorrente com descendentes
dependendo do regime de bens dotado no casamento, ou com ascendentes, em
não havendo descendentes.
O subtítulo em questão irá tratar unicamente da
concorrência do cônjuge com os descendentes
Importante ressaltar, antes de examinar o artigo transcrito
acima, que o direito de herdar do cônjuge sobrevivente dependerá do regime de
bens que vigorava na constância do casamento, mas com ele não se confunde.
Regime de Bens, que é um instituto de direito de família, trata sobre o patrimônio
dos cônjuges, ou seja, consiste nas normas jurídicas que regem a vida patrimonial
dos cônjuges enquanto casados, cessando com o fim da sociedade conjugal.
Assim, enquanto o regime de bens cessa com a morte de um dos cônjuges, neste
mesmo momento é que nasce o direito sucessório das pessoas que herdarão do
falecido.227
Na primeira classe de preferência, isto é, na concorrência
com descendentes, o cônjuge supérstite será chamado de acordo com o regime
227 ORSELLI, Helena de Azeredo. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil . 2006 p. 115
71
de bens que vigorava na constância do matrimônio, aliado a existência de
patrimônio particular se as núpcias forem pelo regime de comunhão parcial.228
Na opinião de Venosa, a intenção da lei foi, sem dúvida,
proteger o cônjuge sobrevivente, quando este nada receberia a título de meação.
Assim, quando casados no regime de comunhão universal de bens, o cônjuge
não será herdeiro em concorrência com os descendentes, porque o patrimônio é
dividido. No regime de separação obrigatória, o cônjuge sobrevivente não herda,
porque em tese haveria fraude a este regime imposto pela lei. 229
Orselli, por outro lado, entende que não se encontra razão
para a concorrência do cônjuge sobrevivente depender do regime de bens
adotado. Sendo este sistema, criado pelo legislador brasileiro ilógico e injusto. É
ilógico porque faz depender do regime de bens escolhido para reger a vida
patrimonial dos consortes o direito de ser ou não herdeiro, principalmente quando
se verifica que as pessoas que escolhem o regime de comunhão universal
querem a comunicação total do patrimônio e subentende-se que desejam
beneficiar seu cônjuge após sua morte, mas nesse caso, não haverá direito a
sucessão. Enquanto as pessoas que elegem o regime de separação convencional
de bens querem manter patrimônios independentes, ficando cada qual com a sua
parte, porém, conforme prescreve o artigo 1829, I do Código Civil Brasileiro de
2002, o cônjuge supérstite será herdeiro.230
Tema ainda mais complexo é a condição de herdeiro do
cônjuge, quando for casado pelo regime de comunhão parcial de bens.
Sobre este tema, aduz Leite:
Na comunhão parcial de bens, o legislador cria duas hipóteses de incidência da regra de concorrência. Primeiro (regra geral), o cônjuge sobrevivente não concorre com os demais descendentes, porque já meeiro, quando o autor da herança não houver deixado bens particulares. Segunda hipótese, se o autor da herança
228 CAHALI, Francisco José. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avançado de direito civil : direito das sucessões. 2003. p. 213 229 VENOSA, Sílvio de Saulo. Direito das sucessões . 2004. p. 113 230 ORSELLI, Helena de Azeredo. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil . 2006 p. 117
72
houver deixado bens particulares, a contrariu sensu, da regra
geral, conclui-se que o cônjuge sobrevivente concorre com os descendentes.231
Verifica-se que nesta última hipótese, o cônjuge
sobrevivente será herdeiro, ainda que exista a meação. Neste sentido, conclui
Leite:
Na realidade, ao excetuar os três regimes de bens (comunhão universal de bens, comunhão parcial de bens e separação obrigatória de bens) o legislador só abriu a possibilidade, efetivamente, do cônjuge sobrevivente concorrer como herdeiro necessário, com os descendentes, quando o autor da herança houver deixado bens particulares, no regime da comunhão parcial de bens, pois, nos demais casos, o cônjuge será meeiro ou simplesmente tomará sua massa de bens particulares.232
Aspecto que vem gerando grande polêmica na doutrina é
sobre que parcela da herança há na concorrência do cônjuge supérstite com os
descendentes quando o viúvo era casado com o de cujus pelo regime de
comunhão parcial de bens e o falecido deixar bens particulares, de acordo com o
artigo 1829, I do Código Civil vigente.233
Para alguns doutrinadores, havendo bens particulares o
cônjuge somente será sucessor sobre estes. A meação do falecido não fará parte
do montante hereditário do cônjuge sobrevivente, somente do montante destinado
aos descendentes.234
Por exemplo, o falecido ao se casar já possuía uma fazenda.
Casou-se pelo regime da comunhão parcial e durante a vigência deste casamento
adquire um apartamento. Deixa dois filhos e o cônjuge virago. Os bens serão
divididos da seguinte maneira. O cônjuge virago tem meação sobre o
231 LEITE, Eduardo de Oliveira. Comentários ao Novo Código Civil, Volume XXI: direi to das sucessões : 2004. p. 222 232 LEITE, Eduardo de Oliveira. Comentários ao Novo Código Civil, Volume XXI: direi to das sucessões : 2004. p. 224 233 ORSELLI, Helena de Azeredo. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil . 2006 p. 117 234 DELGADO, Mário Luiz. ALVES, Jones Figueiredo.Questões controvertidas no direito de família e das sucessões, 2005 p. 434
73
apartamento, sendo que além da meação herdará 1/3 da fazenda (bem particular
do falecido). Aos filhos será destinado ½ do apartamento e 2/3 da fazenda, o que
será divido igualmente entre os mesmos.235
Seguindo esta esteira doutrinária, Venosa salienta que o
viúvo deve concorrer com os descendentes apenas no diz respeito aos bens
particulares, no entanto, essa limitação da quota hereditária não está expressa
em lei. A lei não estabelece que o cônjuge, casado com o falecido pelo regime de
comunhão parcial, herdará em relação aos bens particulares desse, mas que
herdará se houver bens particulares.236
Tal posicionamento, entretanto, não é pacífico. Outros
autores declaram que a participação do cônjuge será sobre todo o acervo. Que
havendo bens particulares o cônjuge herdará sobre estes e também sobre os
quais já era meeiro. O principal argumento desta última corrente é o princípio da
indivisibilidade da herança.237
Nesse viés, salienta Diniz:
Pelo novo Código Civil, convém repetir, haverá concorrência do cônjuge supérstite com descendentes do autor da herança, desde que, pelo regime matrimonial de bens, o falecido possuía patrimônio particular. Para tanto, o consorte sobrevivo, por força do art. 1829, I, só poderá ser casado sob o regime de separação convencional de bens, de participação final dos aqüestos ou de comunhão parcial, embora sua participação incida sobre todo o acervo hereditário e não somente nos bens particulares do de cujus.238
Portanto, existindo bens particulares o cônjuge é chamado à
sucessão pela nova lei. O legislador silenciou no que diz respeito à legítima recair
apenas sobre os bens particulares, apenas propõe que o cônjuge casado pelo
235 CARO, Lara Marina Zanella Martinez. A sucessão do cônjuge no novo Código Civil. Disponível em: http://www.ufsm.br/direito/artigos/cicl/sucessão-conjuge.htm. Acesso em 15 de março de 2006. 236 VENOSA, Sílvio de Saulo. Direito das sucessões . 2004. p. 113. 237 DELGADO, Mário Luiz. ALVES, Jones Figueiredo.Questões controvertidas no direito de família e das sucessões, 2005 p. 434 238 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro - direito das su cessões. 2002. p. 112
74
regime de comunhão parcial de bens não concorre com os descendentes se não
houver patrimônio particular do falecido, de modo que, neste regime de bens, se o
de cujus houver deixado bens particulares, o viúvo concorrerá com os
descendentes sobre toda a herança.239
Essa tese se solidifica pelo exposto no artigo 1832 do
Código Civil de 2002, que dispõe que o cônjuge supérstite terá direito a uma
quota parte igual a que couber aos descendentes que sucederam por cabeça, não
podendo esta ser inferior à quarta parte da herança se for ascendente dos
herdeiros com quem concorrer.
Dispõe o artigo 1.832 do Código Civil de 2002:
Art. 1832 - Em concorrência com os descendentes (art. 1829,
inciso I) caberá ao cônjuge quinhão igual aos dos que sucedem por cabeça, não podendo a sua quota ser inferior à quarta parte da herança, se for ascendente dos herdeiros com que concorrer.
Conforme expresso no artigo acima, se o cônjuge concorrer
com descendentes que herdam por direito próprio, ou seja, os que são de grau
mais próximo na ordem de sucessão, tem direito a uma quota igual a estes.
Portanto, se houver dois filhos do de cujus, e o cônjuge era casado com esse por
um dos regimes de bens que permite a concorrência, dividir-se-á a herança por
igual entre eles. O mesmo ocorreria se o falecido não tivesse filhos vivos, apenas
dois netos.240
Assim como se houver descendentes que herdam por direito
próprio e descendentes que herdam por direito de representação, a sucessão se
dará por estirpe, ou seja, a herança será dividida pelo número de descendentes
de grau mais próximo do falecido. Nesta situação o cônjuge supérstite terá direito
a quota igual dos que herdarem por cabeça. 241
239 ORSELLI, Helena de Azeredo. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil . 2006 p. 118 240 ORSELLI, Helena de Azeredo. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil . 2006 p. 118 241 ORSELLI, Helena de Azeredo. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil . 2006 p. 118
75
A lei faz distinção se essa concorrência é com filhos comuns
ou com filhos somente do cônjuge falecido. Se os descendentes forem comuns,
ou seja, filhos do de cujus e do supérstite, a quota do cônjuge sobrevivente não
poderá ser menor à quarta parte da herança.242
Reforça-se o entendimento com o exemplo de Venosa:
(...) se concorre com um filho, a herança será dividida ao meio; se concorre com dois filhos comuns, o cônjuge receberá 1/3 da herança. Se concorrer com três ou mais filhos comuns, ser-lhe-á assegurada sempre a quarta parte da herança, sendo o restante dividido pelos demais. 243
Cabe salientar, que essa reversa da quarta parte da
herança, refere-se à possível herança do cônjuge e não à totalidade da herança.
Sendo assim, a reversa deve ser feita apenas sobre os bens particulares, e não
sobre a meação. Não há reserva da quarta parte no que tange ao patrimônio
comum.244
Se, porém, o cônjuge sobrevivente concorrer com os
descendentes somente do de cujus, não há reserva da quarta parte, portanto
receberá parcela idêntica à dos que sucederem por direito próprio. Assim, sendo
4 filhos cada qual receberá 1/5 da herança. 245
O problema da questão é quando há descendentes comuns
e descendentes apenas do autor da herança.
Há uma corrente doutrinária que tem entendido que nessas
hipóteses, todos os descendentes deveriam ser tratados como comuns, visto que
se deve respeitar a reserva da quarta parte do cônjuge. 246
242 DELGADO, Mário Luiz. ALVES, Jones Figueiredo. Questões controvertidas no direito de família e das sucessões, 2005 p. 436 243 VENOSA, Sílvio de Saulo. Direito das sucessões . 2004. p. 114 244 DELGADO, Mário Luiz. ALVES, Jones Figueiredo. Questões controvertidas no direito de família e das sucessões, 2005 p. 437 245 CAHALI, Francisco José. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avançado de direito civil : direito das sucessões. 2003. p. 215 246 DELGADO, Mário Luiz. ALVES, Jones Figueiredo. Questões controvertidas no direito de família e das sucessões, 2005 p. 437
76
Neste sentido, é o entendimento de Venosa:
Se, porém, concorrer com os descendentes comuns e descendentes apenas do de cujus, há que se entender que se
aplica a garantia mínima da quarta parte em favor do cônjuge. O legislador não foi expresso, mas parece ser esse o espírito da lei. Qualquer outra forma de divisão, existindo dois grupos de descendentes, seria ilógica e, em princípio, impossível de ser feita. Não tendo a lei feito distinção, não cabe ao intérprete distinguir.247
No entanto, uma outra esteira doutrinaria têm entendido que
o cônjuge não terá direito ao benefício da reserva da quarta parte se existir,
simultaneamente, filhos comuns e unilaterais. Sustentam que o Código só
assegura ao cônjuge sobrevivente o direito à reserva da quarta parte quando este
for ascendente de todos os herdeiros descendentes do de cujus.248
Filiada a esta corrente, a Diniz, questiona:
E se houverem filhos comuns e filhos só do falecido? O cônjuge sobrevivente teria ainda direito à quota de ¼? Diante da omissão legal, parece-nos, que deveria receber quinhão igual ao dos filhos, que herdam por cabeça, não se aplicando a quota hereditária mínima de ¼.249
Existe ainda, um terceiro entendimento, que acredita que a
questão se resolveria por intermédio de uma proporção matemática. 250
Nesta linha de pensamento está Leite:
(...) a solução seria plenamente sustentável se, à data da morte de um dos cônjuges, o outro tivesse apenas direito à sua cota hereditária. Entretanto, se considerarmos que, além dessa cota ele tem o direito de levantar a sua meação nos bens do casal, esta posição de supremacia do cônjuge sobre os próprios filhos não pode deixar de considerar-se injusta, sobretudo, atenta a
247 VENOSA, Sílvio de Saulo. Direito das sucessões . 2004. p. 114 248 DELGADO, Mário Luiz. ALVES, Jones Figueiredo. Questões controvertidas no direito de família e das sucessões, 2005 p. 437 249 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro - direito das su cessões. 2002. p. 113 250 DELGADO, Mário Luiz. ALVES, Jones Figueiredo. Questões controvertidas no direito de família e das sucessões, 2005 p. 437
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facilidade com que hoje em dia o cônjuge sobrevivo parte para a realização de novas núpcias. 251
Analisando a parte final do artigo em questão, que determina
que ao cônjuge sobrevivente cabe um quarto da herança se for ascendente dos
descendentes com que concorrerá, nota-se que, para que o cônjuge tenha direito
a no mínimo um quarto da herança deve ser ascendente de todos os
descendentes com que concorre. Se a intenção fosse que o viúvo teria direito a
reserva mínima se fosse ascendente de, pelo menos, um descendente com que
concorre, isso teria de estar expresso na regra, o que não ocorre.252
A respeito da concorrência do cônjuge nas hipóteses de
filhos comuns e filhos só do falecido, ainda não se alcançou um posicionamento
consensual.
3.4 CÔNJUGE CONCORRENDO COM ASCENDENTES.
Na falta de descendentes do falecido, de conformidade com
os artigos 1829, II e 1836 do Código Civil de 2002, são chamados a receber a
herança, os ascendentes em concorrência com o cônjuge.
Estabelece o artigo 1836 do Código Civil vigente:
Art. 1836 - Na falta de descendentes, são chamados à sucessão
os ascendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente.
§ 1º Na classe dos ascendentes, o grau mais próximo exclui o mais remoto, sem distinção de linhas.
§ 2º Havendo igualdade em grau e diversidade em linha, os ascendentes da linha paterna herdam a metade, cabendo a outra aos da linha materna.
251 LEITE, Eduardo de Oliveira. Comentários ao Novo Código Civil, Volume XXI: direi to das sucessões : 2004. p. 240 252 ORSELLI, Helena de Azeredo. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil . 2006 p. 120
78
Ao determinar a concorrência do cônjuge sobrevivente com
os ascendentes, O Código Civil não submeteu este direito ao regime de bens, de
maneira que qualquer que seja o regime de bens pelo qual o viúvo era casado
com o de cujus ele será considerado herdeiro legitimo deste, salvo se estava
separado judicialmente ou separado de fato por mais de dois anos.253
Para que haja a concorrência do cônjuge com os
ascendentes do falecido, basta, estar casado e convivendo com o falecido no
momento de sua morte.254
Na concorrência do cônjuge com os ascendentes aplica-se o
artigo 1837 do Código Civil de 2002:
Art. 1837 - Concorrendo com ascendente em primeiro grau, ao
cônjuge tocará um terço da herança; caber-lhe-á a metade desta se houver um só ascendente, ou se maior for aquele grau.
Com o falecimento de um dos cônjuges, o outro não casado
pelo regime de comunhão universal poderia sofrer alteração na sua situação
econômica se seus sogros estiverem vivos, ou houver avós do de cujus, por isso
a lei veio a garantir sua participação na sucessão do falecido.255
Assim, concorrendo o cônjuge com sogro e sogra do de
cujus (ascendentes em primeiro grau), receberá o cônjuge sobrevivente um terço
da herança, que será dividida em quinhões iguais. Se concorrer apenas com
sogro ou sogra, o cônjuge supérstite terá direito a metade da herança, restando a
outra metade ao ascendente vivo. Falecido pai e mãe do de cujus é chamado a
sucessão os ascendentes de grau mais remotos (avós, bisavós), neste caso, ao
cônjuge sobrevivente será reservada a metade da herança. A metade restante
será dividida entre os ascendentes convocados. 256
253 ORSELLI, Helena de Azeredo. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil . 2006 p. 121 254 ORSELLI, Helena de Azeredo. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil . 2006 p. 121 255 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro - direito das su cessões. 2002. p. 113 256 CAHALI, Francisco José. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avançado de direito civil 6: direito das sucessões. 2003. p. 217
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Por exemplo, se o falecido deixa dois avós paternos, um
avô materno e o cônjuge, este ficará com 50% da herança, cada avô paterno
ficará com 12,5% e ao avô materno 25% da herança, pois havendo igualdade
em graus e diversidade em linhas a herança partir-se-á entre as duas linhas pelo
meio. 257
Se o falecido não tiver deixado nem descendentes, nem
ascendentes vivos, nem tiver disposto de seu patrimônio de maneira diferente em
testamento, caberá a totalidade da herança ao cônjuge sobrevivente.
3.5 HERDANDO A TOTALIDADE DA HERANÇA
Inexistindo parentes vivos, e em condições de herdar, nestas
duas primeiras classes de preferência, a herança na sua integralidade, será
destinada ao cônjuge supérstite, independentemente do regime de bens no
casamento.
O artigo 1838 do Código Civil de 2002 prevê:
Art. 1838 - Em falta de descendentes e ascendentes, será
deferida a sucessão por inteiro ao cônjuge sobrevivente.
Cabe ressaltar que, como o cônjuge supérstite, no Código
Civil de 2002, foi classificado como herdeiro necessário, não pode ser afastado da
toda herança por testamento, salvo em caso de deserdação ou de exclusão por
indignidade, pois os herdeiros necessários tem direito à legítima, que representa a
metade do patrimônio do falecido.258
Somente na ausência de descendentes, ascendentes e
cônjuge do de cujus serão chamados a sua sucessão, seus parentes em linha
colateral até o quarto grau, em ordem de preferência. E, só neste caso, a pessoa
257 CARO, Lara Marina Zanella Martinez. A sucessão do cônjuge no novo Código Civil. Disponível em: http://www.ufsm.br/direito/artigos/cicl/sucessão-conjuge.htm. Acesso em 15 de março de 2006 258 ORSELLI, Helena de Azeredo. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil . 2006 p. 122
80
tem ampla liberdade de testar, ou seja, de dispor de todo o seu patrimônio em
testamento da maneira como bem entender, inclusive afastando do recebimento
da herança os herdeiros legítimos facultativos, os colaterais, de acordo com o
artigo 1850 do Código Civil de 2002.
Portanto, se não existirem descendentes ou ascendentes no
momento da abertura da sucessão, herda o cônjuge sobrevivente, independente
do regime de bens, excluindo a todos os parentes colaterais.
81
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No decorrer deste trabalho de monografia verificou-se que o
silêncio do legislador em algumas ocasiões, possibilitou uma dupla interpretação
quanto à aplicação da norma ao caso concreto.
Quanto às hipóteses que foram levantadas na introdução do
presente trabalho de monografia, verificou-se que estas não puderam ser
confirmadas devido a grande discussão doutrinária existente sobre o tema
estudado.
No que se referiu a 1ª hipótese, há doutrinadores que
entenderam que a intenção do legislador ao determinar que a concorrência do
cônjuge dependerá do regime de bens adotado na vigência do casamento, foi,
sem dúvida, de proteger o cônjuge sobrevivente, quando este nada receberia a
título de meação. Assim, quando casados no regime de comunhão universal de
bens, o cônjuge não será herdeiro em concorrência com os descendentes, porque
o patrimônio é dividido. Por outro lado, há doutrinadores que entenderam que não
se encontra razão para a concorrência do cônjuge sobrevivente depender do
regime de bens adotado, porque faz depender do regime de bens escolhido para
reger a vida patrimonial dos consortes o direito de ser ou não herdeiro,
principalmente quando se verificou que as pessoas que escolhem o regime de
comunhão universal querem a comunicação total do patrimônio e subentende-se
que desejam beneficiar seu cônjuge após sua morte, mas neste caso, não haverá
direito a sucessão. Enquanto as pessoas que elegeram o regime de separação
convencional de bens querem manter patrimônios independentes, ficando cada
qual com a sua parte, porém, conforme prescreve o artigo 1829, I do Código Civil
Brasileiro de 2002, o cônjuge sobrevivente será herdeiro.
No que disse respeito, a parcela deverá incidir a herança do
cônjuge sobrevivente em concorrência com os descendentes quando casado
como o falecido pelo regime de Comunhão Parcial de Bens e o falecido tiver
deixado bens particulares. Sobre este tema ainda não há um consenso no campo
82
jurídico brasileiro. Há doutrinadores que entenderam que o viúvo deve concorrer
com os descendentes apenas no diz respeito aos bens particulares, no entanto,
essa limitação da quota hereditária não está expressa em lei. A lei não estabelece
que o cônjuge, casado com o falecido pelo regime de comunhão parcial, herdará
em relação aos bens particulares desse, mas que herdará se houver bens
particulares. Seguindo uma esteira contrária, outros doutrinadores entenderam
que a participação do cônjuge será sobre todo o acervo. Que havendo bens
particulares o cônjuge herdará sobre estes e também sobre os quais já era
meeiro.
Grande discussão também girou em torno do direito da
reversa da quarta parte do cônjuge em concorrência com filhos comuns e filhos só
do falecido. Uma corrente doutrinária entendeu que existindo filhos comuns e
filhos só do falecido, todos os descendentes deveriam ser tratados como comuns,
visto que se deve respeitar a reserva da quarta parte do cônjuge. No entanto, tal
posicionamento não é pacífico, pois outros doutrinadores entenderam que o
cônjuge não terá direito ao benefício da reserva da quarta parte se existir,
simultaneamente, filhos comuns e só do de cujus. Sustentam que o Código só
assegura ao cônjuge sobrevivente o direito à reserva da quarta parte quando este
for ascendente de todos os herdeiros descendentes do falecido. Existe ainda, um
terceiro entendimento, que acredita que a questão se resolveria por intermédio de
uma proporção matemática. A solução seria plenamente sustentável se, à data da
morte de um dos cônjuges, o outro tivesse apenas direito à sua quota hereditária.
No entanto, considerando que além dessa quota o cônjuge tem o direito de
levantar a sua meação nos bens do casal, esta posição de supremacia do
cônjuge sobre os filhos é injusta.
Em relação à concorrência com os ascendentes o Código
Civil de 2002 não submeteu este direito ao regime de bens, de maneira que
qualquer que seja o regime de bens pelo qual o viúvo era casado com o de cujus
ele será considerado herdeiro legítimo deste, salvo se estiver separado
judicialmente ou de fato por mais de dois anos. Portanto para o cônjuge concorrer
com os ascendentes, basta estar casado e convivendo com o falecido no
momento de sua morte.
83
Por fim, conclui-se que o Código Civil, no que diz respeito na
parte que foi objeto este trabalho, necessita de uma reforma, com o propósito de
esclarecer as dúvidas existentes quanto à concorrência do cônjuge quando
casado pelo Regime de Comunhão Parcial de Bens e o falecido tiver deixado
bens particulares, como também no caso de filiação híbrida e a reversa da quarta
parte.
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