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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO CUIDADOS CLÍNICOS EM ENFERMAGEM
E SAÚDE
DOUTORADO EM CUIDADOS CLÍNICOS EM ENFERMAGEM E SAÚDE
ROBERTA MENESES OLIVEIRA
COMPORTAMENTO DESTRUTIVO NO TRABALHO EM SAÚDE:
ANÁLISE DE CONCEITO
FORTALEZA – CEARÁ
2015
1
ROBERTA MENESES OLIVEIRA
COMPORTAMENTO DESTRUTIVO NO TRABALHO EM SAÚDE:
ANÁLISE DE CONCEITO
Tese apresentada ao Curso de Doutorado do
Programa de Pós-Graduação Cuidados
Clínicos em Enfermagem e Saúde da
Universidade Estadual do Ceará, como
requisito parcial à obtenção do título de
Doutor em Cuidados Clínicos em Enfermagem
e Saúde. Área de Concentração: Cuidados
Clínicos em Enfermagem e Saúde.
Orientadora: Prof.ª Ph. D. Lucilane Maria
Sales da Silva.
FORTALEZA – CEARÁ
2015
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação
Universidade Estadual do Ceará
Sistema de Bibliotecas
Oliveira, Roberta Meneses.
Comportamento destrutivo no trabalho em saúde:
análise de conceito [recurso eletrônico] / Roberta
Meneses Oliveira. – 2015.
1 CD-ROM: il. ; 4 ¾ pol.
CD-ROM contendo o arquivo no formato PDF do
trabalho acadêmico com 221 folhas, acondicionado em
caixa de DVD Slim (19 x 14 cm x 7 mm).
Tese (doutorado) – Universidade Estadual do Ceará,
Programa de Pós-Graduação Cuidados Clínicos em
Enfermagem e Saúde, Doutorado em Cuidados Clínicos em
Enfermagem e Saúde, Fortaleza, 2015.
Área de Concentração: Cuidados Clínicos em
Enfermagem e Saúde.
Orientação: Prof.ª Ph.D. Lucilane Maria Sales da
Silva.
1. Comportamento destrutivo. 2. Enfermagem. 3.
Trabalho. 4. Atitude do pessoal de saúde. 5. Relações
interpessoais. I. Título.
3
ROBERTA MENESES OLIVEIRA
COMPORTAMENTO DESTRUTIVO NO TRABALHO EM SAÚDE:
ANÁLISE DE CONCEITO
Tese apresentada ao Curso de Doutorado em
Cuidados Clínicos em Enfermagem e Saúde do
Programa de Pós-Graduação Cuidados
Clínicos em Enfermagem e Saúde da
Universidade Estadual do Ceará, como
requisito parcial à obtenção do título de
Doutora em Cuidados Clínicos em
Enfermagem e Saúde. Área de Concentração:
Cuidados Clínicos em Enfermagem e Saúde.
Aprovada em: 30 de março de 2015.
BANCA EXAMINADORA
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Dedico esta tese ao meu inesquecível Tio
Carlinhos (in memorian) e à minha amada
vovó Zilma (in memorian), por terem sido os
maiores incentivadores dessa pesquisa, e por
me fazerem acreditar nas relações
profissionais humanizadas e na segurança do
paciente.
5
AGRADECIMENTOS
A Deus, pelo dom da vida, equilíbrio, paciência e saúde para superar os obstáculos que
apareceram nesta caminhada.
Aos meus pais, Carla e Mundinho, pela força e ajuda em todos os momentos da minha vida,
sobretudo naqueles mais difíceis. Por acreditarem em todos os meus projetos, principalmente
me dando o maior incentivo para meu crescimento pessoal e profissional.
Aos meus irmãos Germano e Samuel, e cunhadas Adriana e Michelli, pelos momentos
compartilhados nesta caminhada.
A Walter, meu namorado, pelo companheirismo, paciência e compreensão, e por cada palavra
de amor e incentivo.
Ao meu avô Chico Luiz, fonte de sabedoria e inspiração.
À Profª. Dra. Lucilane Maria Sales da Silva, pela sua orientação e por toda a contribuição
dada a este trabalho, e pelos momentos compartilhados durante a pós-graduação.
Aos Membros da Banca Examinadora, por terem aceitado o convite e disponibilizado o seu
tempo para contribuir com o aperfeiçoamento deste trabalho.
À professora Adriana Catarina, minha gratidão pela cuidadosa acolhida em Murcia, Espanha,
e pela amizade, trocas de experiências e de saberes e importantes sugestões para este trabalho.
À professora Rosario Gómez Sanchéz, por todo o ensinamento, o apoio e as valiosas
orientações na UCAM, as quais contribuíram para superar os obstáculos da língua e criar um
profundo respeito e admiração pelo campo teórico da Inteligência Emocional.
À professora Vilani Guedes, pelos momentos compartilhados desde a Graduação, e pelas
orientações fundamentais quanto à metodologia da pesquisa, pelo carinho e disponibilidade
com que aceitou fazer parte da banca examinadora desta tese, meus sinceros agradecimentos.
À Dra. Miriam Nóbrega, pelos ensinamentos sobre análise conceitual e pela disponibilidade
em fazer parte da banca examinadora.
Ao professor José Luiz Dias, pelos ensinamentos transmitidos sobre a Simulação Realística e
a Segurança do Paciente, e pela disponibilidade em gravar um vídeo para o caso modelo.
Aos professores da Simulação Realística da UCAM, por aceitarem participar na gravação do
caso modelo e pelos maravilhosos momentos compartilhados, meus sinceros agradecimentos.
Ao professores e funcionários da Pós-Graduação em Ciências Sócio-Sanitárias da UCAM,
pela generosa acolhida, pelos ensinamentos repassados e troca de experiências.
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Aos meus tios e tias, em especial a Tia Penha, Tio Sérgio, Tia Vaninha, Tio Roberto, Tia
Valquíria, Tia Josélia e Tio Bira por sempre acreditarem em meu potencial e me incentivarem
da melhor forma.
Aos docentes, funcionários e colaboradores do Programa de Pós-Graduação Cuidados
Clínicos em Enfermagem e Saúde da Universidade Estadual do Ceará, por todo o suporte
dado durante esses três anos de Doutorado.
Aos meus queridos colegas da 1ª turma do Doutorado Acadêmico Cuidados Clínicos em
Enfermagem e Saúde, pela amizade construída, palavras de otimismo, pelos momentos felizes
e momentos difíceis que conseguimos superar juntos.
À minha amiga Renata Sampaio, por todo o suporte nos últimos três anos, pela amizade
traduzida em carinho e atenção constantes, principalmente nos momentos mais difíceis dessa
trajetória.
Às minhas amigas, em especial a Ilse, Aurora e Wladia, que sempre me incentivaram e
acompanharam nesta caminhada.
Aos membros do Laboratório de Pesquisas e Práticas Coletivas em Saúde – LAPPRACS, e do
Grupo de Pesquisa Políticas, Saberes e Práticas em Saúde Coletiva e Enfermagem, pelos
momentos e discussões compartilhadas ao longo dos últimos anos.
Aos acadêmicos de enfermagem Idalina, Luana, Yane, Mayula, Suzana, Perla, Bruno e
Hudson, e demais integrantes do Grupo de Estudos sobre Segurança do Paciente, pelo
envolvimento e incentivo nas pesquisas realizadas.
Aos médicos, enfermeiros e técnicos de Enfermagem do HGF, que colaboraram como sujeitos
desta pesquisa, através de seus depoimentos, suas experiências, me recebendo de forma
atenciosa, minha eterna gratidão.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, pelo apoio e
financiamento à pesquisa.
Àqueles que, porventura, eu tenha esquecido de citar o nome, minhas desculpas e meus
sinceros agradecimentos.
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A tarefa não é tanto ver aquilo que ninguém
viu, mas pensar o que ninguém ainda pensou
sobre aquilo que todo mundo vê.
Arthur Shopenhauer
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RESUMO
O processo de trabalho em saúde tem sido analisado sob diferentes perspectivas, e nesta
pesquisa foi abordado a partir da dimensão relacionada ao comportamento humano. Dentre os
vários comportamentos apresentados pelo trabalhador da saúde no ambiente de trabalho,
destaca-se o comportamento destrutivo, um conceito recentemente introduzido na literatura da
saúde. No Brasil, são escassos os estudos que se reportam a este assunto, apesar de ser um
fenômeno recorrente na prática diária dos trabalhadores de saúde. Em pesquisas
internacionais, este conceito tem sido utilizado como sinônimo de bullying, assédio moral,
violência lateral, comportamento abusivo, dentre outros. O objetivo deste estudo foi analisar o
conceito comportamento destrutivo no trabalho em saúde de acordo com a literatura e a
percepção de trabalhadores, com base no Modelo Híbrido de Desenvolvimento de Conceitos.
Para tanto, realizou-se pesquisa qualitativa fundamentada pelo referencial teórico-
metodológico do modelo híbrido em suas três fases: teórica, de campo e analítica final. A fase
teórica foi realizada mediante revisão integrativa da literatura nas bases de dados CINAHL,
LILACS, PsycINFO, PubMed e SciVerse Scopus, possibilitando identificar 70 artigos
científicos que responderam à questão norteadora e que favoreceram a identificação dos
atributos, antecedentes e consequentes do conceito. Em seguida, deu-se início à fase de
campo, que ocorreu no período de março a julho de 2014, no maior hospital da rede pública
de saúde do Ceará, com aplicação de entrevistas em profundidade e observação sistemática.
Foram entrevistados 29 trabalhadores de saúde de diferentes unidades assistenciais, incluindo
médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem. Os textos produzidos a partir da transcrição
das entrevistas e dos diários de campo foram submetidos à Técnica da Análise de Conteúdo
Temática, possibilitando as discussões dos resultados em duas categorias. Com base nas
convergências e divergências encontradas nos relatos dos entrevistados, nas observações e nos
achados da literatura, foram descritos um caso modelo e um caso contrário de comportamento
destrutivo no trabalho em saúde, e proposta uma definição para o conceito na fase analítica
final. A análise deste conceito permitiu evidenciar, na literatura e na prática, os pressupostos
da pesquisa, de que se trata de um problema real vivenciado pelos trabalhadores de saúde no
contexto hospitalar, com repercussões negativas e significativas sobre o desempenho e a
saúde da equipe, bem como sobre a segurança do paciente, ao deixá-lo mais susceptível a
riscos, erros e eventos adversos. Foi possível identificar seus principais atributos: incivilidade,
violência psicológica e violência física/sexual; com base na análise de condutas características
deste comportamento na prática. A falta de colaboração entre os colegas de trabalho; o não
9
cumprimento de normas, rotinas e protocolos organizacionais; a grosseria cotidiana; o
desrespeito sistêmico; as humilhações e as intimidações frequentes configuraram as condutas
características que representam o espectro de comportamentos destrutivos no trabalho em
saúde. Como antecedentes, destacaram-se as características de personalidade, o estresse e a
sobrecarga de trabalho. Como consequentes, sobressaíram-se o sofrimento moral e psíquico
dos trabalhadores, o comprometimento significativo da segurança do paciente, os prejuízos
laborais e o rompimento da comunicação, da colaboração e do trabalho em equipe.
Palavras-chave: Comportamento destrutivo. Enfermagem. Trabalho. Atitude do pessoal de
saúde. Relações interpessoais. Segurança do paciente.
10
ABSTRACT
The work process in healthcare has been analyzed from different perspectives, and this
research was approached from the dimension related to human behavior. Among the various
behaviors presented by the health workers in the workplace, it is evident the disruptive
behavior, a concept recently introduced in the literature of healthcare. In Brazil, there are few
studies related to this subject, although it is a recurring phenomenon in the daily practice of
health workers. In international research, this concept has been used as a synonym for
bullying, moral harassment, lateral violence, abusive behavior, among others. The objective
of this study was to analyze the concept of disruptive behavior in healthcare work according
to the literature and the perception of workers, based on the Hybrid Model of Concept
Development. Therefore, a qualitative study was developed based on the theoretical and
methodological framework of the hybrid model in its three phases: theoretical, fieldwork and
final analytic. The theoretical phase was carried out through integrative literature review in
CINAHL, LILACS, PsycINFO, PubMed and SciVerse Scopus databases, allowing identify 70
scientific articles that answered the guiding question and favored the identification of
attributes, antecedents and consequences. Then was started the field phase, which took place
from March to July 2014 in the largest public hospital of Ceará, with application of in-depth
interviews and systematic observation. Were interviewed 29 health workers of different health
care units, including doctors, nurses and nursing technicians. The texts produced from the
interview transcript and fieldwork diaries were submitted to the Thematic Content Analysis
Technic, enabling discussions of the results into two categories. Based on the similarities and
differences found in the reports of respondents in the observations and findings in the
literature, have been described a model case and an contrary case of disruptive behavior in
healthcare work, and proposed a definition for the concept in the final analytic phase. The
analysis of this concept has highlighted in the literature and in practice, the assumptions of the
research, that this is a real problem experienced by health workers in the hospital context,
with negative and significant effect on the performance and health of staff and on patient
safety, to make patients more susceptible to risks, errors and adverse events. It was possible to
identify the most important attributes: incivility, psychological violence and physical / sexual
violence; based on the analysis of the characteristics conducts of the disruptive behavior in
practice. The lack of collaboration between co-workers; non-compliance with norms, routines
and organizational protocols; everyday rudeness; systemic disrespect; humiliation and
intimidation frequently shaped the behavior characteristics that represent the broad spectrum
11
of disruptive behaviors in healthcare work. As background, stood out the personality traits,
stress and overwork. As consequential, highlights were the moral and psychological suffering
of workers, significant impairment of patient safety, labor losses and disruption of
communication, collaboration and teamwork.
Keywords: Disruptive behavior. Nursing. Work. Attitude of health personnel. Interpersonal
relationships. Patient safety.
12
RESUMEN
El proceso de trabajo de la salud ha sido analizado desde distintas perspectivas, y esta
investigación se aborda desde la dimensión relacionada con el comportamiento humano. Entre
los diversos comportamientos presentados por el trabajador de la salud en el trabajo, se
destaca el comportamiento destructivo, un concepto introducido recientemente en la literatura
de salud. En Brasil, hay pocos estudios que se refieren a este tema, a pesar de que es un
fenómeno que se repite en la práctica diaria de los trabajadores de salud. En la investigación
internacional, este concepto se ha utilizado como sinónimo de acoso moral, intimidación,
violencia lateral, comportamiento abusivo, entre otros. El objetivo de este estudio fue analizar
el concepto comportamiento destructivo en el trabajo sanitario de acuerdo con la literatura y
la percepción de los trabajadores, basado en el Modelo Híbrido de Desarrollo de Concepto.
Por lo tanto, se realizó estudio cualitativo con el marco teórico y metodológico del modelo
híbrido en sus tres fases: teórica, campo y análisis final. La fase teórica se llevó a cabo
mediante la revisión integradora de la literatura en las bases de datos CINAHL, LILACS,
PsycINFO, PubMed y SciVerse Scopus, lo que permitió identificar 70 artículos científicos
que respondieron a la pregunta guía y favorecieron la identificación de atributos, antecedentes
y consecuentes. Entonces se inició la fase de campo, que se llevó a cabo entre marzo y julio
de 2014 en el mayor hospital público de salud de Ceará, con aplicación de entrevistas en
profundidad y observación sistemática. Entrevistamos a 29 trabajadores de la salud de las
diferentes unidades de salud, incluyendo médicos, enfermeras y técnicos de enfermería. Los
textos producidos a partir de la transcripción de las entrevistas y de los diarios de campo
fueron sometidos a la técnica de análisis de contenido temática, lo que permitió la discusión
de los resultados en dos categorías. Con base en las similitudes y diferencias encontradas en
los informes de los encuestados en las observaciones y en la literatura, se han descrito un caso
modelo y un caso contrario del comportamiento destructivo en el trabajo de salud, y propuso
una definición para el concepto en la fase de análisis final. El análisis de este concepto
permitió evidenciar, en la literatura y en la práctica, las hipótesis de la investigación, que se
trata de un verdadero problema experimentado por los trabajadores de salud en el contexto del
hospital, con un efecto negativo y significativo sobre el rendimiento y la salud del personal y
la seguridad del paciente, por hacerlo más susceptible a los riesgos, errores y eventos
adversos. Fue posible identificar los atributos más importantes: incivilidad, violencia
psicológica y violencia física/sexual; basado en el análisis de las conductas características de
comportamiento destructivo en la práctica. La falta de colaboración entre los compañeros de
13
trabajo; el incumplimiento de las normas, rutinas y protocolos de la organización; rudeza
cotidiana; falta de respeto sistémica; la humillación y la intimidación frecuente representaran
el amplio espectro de comportamientos destructivos en el trabajo de salud. Como
antecedentes, se destacaron los rasgos de personalidad, el estrés y el exceso de trabajo. Como
consecuencias, se destacaron el sufrimiento moral y psicológico de los trabajadores, el
deterioro significativo de la seguridad del paciente, las pérdidas laborales y la interrupción de
la comunicación, de la colaboración y del trabajo en equipo.
Palabras clave: Comportamiento destructivo. Enfermería. Trabajo. Actitud del personal de
salud. Relaciones interpersonales. Seguridad del paciente.
14
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Principais referenciais teórico-metodológicos das pesquisas de
análise de conceito na Enfermagem....................................................... 33
Figura 2 – Principais componentes do modelo híbrido de análise
conceitual............................................................................................... 36
Figura 3 – Sumário do processo de levantamento nas bases de dados.................... 46
Figura 4 – Distribuição do total de artigos encontrados nas bases de dados
conforme o entrecruzamento dos descritores......................................... 48
Figura 5 – Problemas sistêmicos não resolvidos segundo os artigos
analisados............................................................................................... 66
Figura 6 – Principais prejuízos laborais gerados pelo comportamento destrutivo
no trabalho em saúde.............................................................................. 72
Figura 7 – Consequências do comportamento destrutivo para a segurança do
paciente segundo os artigos analisados.................................................. 74
Figura 8 – Estrutura conceitual do comportamento destrutivo no trabalho em
saúde: fase teórica.................................................................................. 76
Figura 9 – Sistemas de código gerados pela análise de conteúdo realizada no
software MAXQDA® e sua representatividade.................................... 96
Figura 10 – Estrutura conceitual do comportamento destrutivo no trabalho em
saúde: fase de campo.............................................................................. 160
Figura 11 – Estrutura conceitual do comportamento destrutivo no trabalho em
saúde: fase analítica final....................................................................... 169
15
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – Atributos e condutas características do comportamento destrutivo no
trabalho em saúde segundo número de referências e artigos
analisados............................................................................................... 54
Quadro 2 – Características ou adjetivos atribuídos ao comportamento destrutivo
segundo número de referências e artigos analisados............................. 61
Quadro 3 – Antecedentes do comportamento destrutivo no trabalho em saúde
segundo número de referências e artigos analisados............................. 63
Quadro 4 – Consequentes do comportamento destrutivo no trabalho em saúde
segundo número de referências e artigos analisados............................. 70
Quadro 5 – Definições de comportamento destrutivo encontradas nos artigos
analisados, segundo autores, ano e variáveis enfatizadas...................... 78
Quadro 6 – Distribuição dos entrevistados segundo dados sóciodemográficos e
ocupacionais. Fortaleza, CE, mar-jul. 2014........................................... 90
16
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Distribuição das variáveis do estudo e sua frequência segundo
evidenciadas nos artigos analisados. n=70...................................
49
Tabela 2 – Distribuição dos temas centrais dos artigos analisados e sua
frequência.....................................................................................
51
Tabela 3 – Distribuição dos conceitos relacionados ao comportamento
destrutivo no trabalho em saúde e sua frequência de ocorrência
nos artigos analisados. n=70........................................................
52
Tabela 4 – Atributos e condutas características de comportamento
destrutivo relatadas pelos entrevistados. Fortaleza, CE, mar-jul
2014. n=29...................................................................................
114
Tabela 5 – Antecedentes do comportamento destrutivo no trabalho em
saúde segundo os entrevistados. Fortaleza, CE, mar-jul 2014.
n=29.............................................................................................
134
Tabela 6 – Consequentes do comportamento destrutivo no trabalho em
saúde segundo os entrevistados. Fortaleza, CE, mar-jul 2014.
n=29.............................................................................................
147
Tabela 7 – Distribuição dos atributos e condutas características de
comportamento destrutivo no trabalho em saúde segundo os 70
artigos científicos e as 29 entrevistas. Fortaleza, CE, 2013-
2014..............................................................................................
163
Tabela 8 – Distribuição dos antecedentes do comportamento destrutivo no
trabalho em saúde segundo os 70 artigos científicos e as 29
entrevistas. Fortaleza, CE, 2013-2014.........................................
164
Tabela 9 – Distribuição dos principais adjetivos atribuídos ao trabalhador
que adota comportamento destrutivo, segundo os 70 artigos
científicos e as 29 entrevistas. Fortaleza, CE, 2013-2014............
165
Tabela 10 – Distribuição dos consequentes do comportamento destrutivo no
trabalho em saúde segundo os 70 artigos científicos e as 29
entrevistas. Fortaleza, CE, 2013-2014.........................................
166
17
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AHRQ Agência de Pesquisa e Qualidade dos Cuidados em Saúde
AMA Associação Médica Americana
CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CEP Comitê de Ética em Pesquisa
CINAHL Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature
EUA Estados Unidos da América
LILACS Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde
MESH Medical Subject Headings
OMS Organização Mundial de Saúde
SESA Secretaria de Saúde
SUS Sistema Único de Saúde
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
UC Unidade de Contexto
UR Unidade de Registro
UTI Unidade de Terapia Intensiva
18
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO............................................................................................. 21
2 OBJETIVOS.................................................................................................. 31
2.1 OBJETIVO GERAL........................................................................................ 31
2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS.......................................................................... 31
3 REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO.................................... 32
3.1 PRESSUPOSTOS DA ANÁLISE DE CONCEITO....................................... 32
3.2 MODELO HÍBRIDO DE ANÁLISE DE CONCEITO.................................. 35
3.2.1 Fase teórica..................................................................................................... 36
3.2.1.1 Seleção do conceito......................................................................................... 36
3.2.1.2 Revisão de literatura........................................................................................ 37
3.2.1.3 Aproximação do significado............................................................................ 38
3.2.1.4 Escolha de uma definição do conceito a ser trabalhada.................................. 38
3.2.2 Fase do trabalho de campo........................................................................... 38
3.2.2.1 Escolha do cenário........................................................................................... 38
3.2.2.2 Negociação da entrada..................................................................................... 39
3.2.2.3 Seleção dos casos............................................................................................ 39
3.2.2.4 Coleta e Análise dos Dados............................................................................. 40
3.2.3 Fase analítica final......................................................................................... 40
4 ANÁLISE DE CONCEITO: FASE TEÓRICA.......................................... 43
4.1 SELEÇÃO DO CONCEITO.......................................................................... 43
4.2 REVISÃO DE LITERATURA....................................................................... 43
4.2.1 Atributos do Comportamento Destrutivo no Trabalho em Saúde........... 53
4.2.2 Antecedentes do Comportamento Destrutivo no Trabalho em Saúde.... 62
4.2.3 Consequentes do Comportamento Destrutivo no Trabalho em Saúde.... 68
4.3 APROXIMAÇÃO DO SIGNIFICADO.......................................................... 77
4.4 ESCOLHA DE UMA DEFINIÇÃO DO CONCEITO A SER
TRABALHADA..............................................................................................
80
5 ANÁLISE DE CONCEITO: FASE DO TRABALHO DE CAMPO........ 82
19
5.1 ESCOLHA DO CENÁRIO............................................................................. 83
5.2 NEGOCIAÇÃO DA ENTRADA.................................................................... 83
5.3 SELEÇÃO DOS CASOS................................................................................ 84
5.4 COLETA E ANÁLISE DOS DADOS............................................................ 85
5.4.1 Resultados...................................................................................................... 89
5.4.1.1 Perfil dos participantes.................................................................................... 89
5.4.1.2 Análise de conteúdo das entrevistas e das observações realizadas no
campo.............................................................................................................. 95
5.4.1.2.1 Categoria 1. Considerações sobre o trabalho em saúde: o dia a dia, os
dilemas éticos e os conflitos interpessoais....................................................... 96
5.4.1.2.2 Categoria 2. Comportamento destrutivo do trabalhador de saúde: condutas
características (casos), atributos, antecedentes e consequentes..................... 113
5.4.1.2.2.1 Condutas características e atributos do comportamento destrutivo no
trabalho em saúde........................................................................................... 113
5.4.1.2.2.2 Características ou adjetivos atribuídos ao comportamento destrutivo do
trabalhador de saúde....................................................................................... 132
5.4.1.2.2.3 Antecedentes do Comportamento Destrutivo.................................................. 133
5.4.1.2.2.4 Consequentes do comportamento destrutivo no trabalho em saúde............... 146
6 ANÁLISE DE CONCEITO: FASE ANALÍTICA FINAL........................ 162
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................ 174
REFERÊNCIAS............................................................................................ 178
APÊNDICES.................................................................................................. 190
APÊNDICE A – INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS: FASE
TEÓRICA........................................................................................................ 191
APÊNDICE B – QUADRO DE DISTRIBUIÇÃO DOS ARTIGOS
ANALISADOS SEGUNDO TÍTULO, AUTOR, ANO DE PUBLICAÇÃO,
TIPO DE ESTUDO, ENFOQUE E VARIÁVEIS CONTEMPLADAS........ 192
APÊNDICE C – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E
ESCLARECIDO (TCLE)............................................................................. 203
APÊNDICE D – ROTEIRO DE OBSERVAÇÃO SISTEMÁTICA.............. 204
APÊNDICE E – ROTEIRO DE ENTREVISTA............................................ 205
APÊNDICE F – SÍNTESE DOS CASOS RELATADOS DE
COMPORTAMENO DESTRUTIVO NO TRABALHO EM SÁUDE
SEGUNDO EXEMPLOS, ANTECEDENTES, CONSEQUENTES E
20
TERMOS DEFINIDORES............................................................................ 206
ANEXO........................................................................................................... 217
ANEXO A – PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA............ 218
21
1 INTRODUÇÃO
O interesse em pesquisar o comportamento destrutivo no trabalho em saúde surgiu
em 2010, ao iniciar os estudos sobre a segurança do paciente nas organizações de saúde, mas
também foi instigado ao longo da nossa trajetória acadêmica e profissional na Enfermagem.
A introdução nos campos de prática e a experiência do estágio supervisionado, no
último ano do curso de Graduação em Enfermagem, permitiram uma aproximação às questões
gerenciais e aos conflitos éticos envolvidos no processo de trabalho, em que determinadas
posturas de médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem causavam constragimento.
Tais posturas e relações interpessoais negativas foram também evidenciadas na
atividade profissional como enfermeira assistencial e na experiência como docente do Curso
de Graduação em Enfermagem de uma universidade pública, ao lançar um olhar crítico sobre
o processo de trabalho em saúde e, particularmente, na Enfermagem.
Esta avaliação crítica do processo de trabalho foi aprimorada ao longo da
realização do Curso de Mestrado em Cuidados Clínicos em Enfermagem e Saúde, e pela
inserção no Laboratório de Práticas Coletivas em Saúde (LAPRACS) e no Grupo de Pesquisa
Políticas, Saberes e Práticas em Saúde Coletiva, vinculados ao Curso de Graduação em
Enfermagem da Universidade Estadual do Ceará (UECE). Esta atuação culminou com a
dissertação de Mestrado com enfoque no Gerenciamento do Cuidado, além de algumas
publicações nesta área e na área de Segurança do Paciente (BARROS et al., 2015;
OLIVEIRA et al., 2015; OLIVEIRA et al., 2014; OLIVEIRA et al., 2013).
Em 2009, durante a coleta de dados da dissertação, foram realizadas entrevistas
com médicos e enfermeiros cujos depoimentos sobre as dificuldades vivenciadas no
cotidiano da prática quanto às inter-relações e ao trabalho em equipe marcaram o interesse
em iniciar os estudos sobre o trabalho em saúde, o comportamento humano e suas
implicações para a segurança do paciente.
Paralelamente, ao desenvolver atividades profissionais como enfermeira
assistencial em hospital privado, eram observadas, diariamente, a negligência de alguns
profissionais, a intimidação frequente, o abuso verbal perante colegas de trabalho e pacientes,
bem como a subestimação de diagnósticos e cuidados necessários, o que parecia repercutir na
qualidade do atendimento.
Assim, determinados comportamentos claramente mostravam-se associados à
ocorrência de eventos adversos. Profissionais que se dedicavam aos seus pacientes, que
22
realizavam suas anamneses e destinavam um tempo ao contato com eles, eram mais
reconhecidos pelas suas habilidades técnicas e humanas, tanto pelo paciente, quanto pela
equipe de saúde. Por outro lado, havia profissionais que geravam desconforto na equipe, que
somente pelo fato de adentrar à unidade já causavam mal-estar, instabilidade psíquica e
insatisfação em muitos trabalhadores e pacientes. Esses profissionais assumiam uma postura
autoritária diante de todos à sua volta, falavam em tom agudo, arremessavam prontuários,
gritavam com os profissionais que ocupavam cargos inferiores aos deles, bem como
hostilizavam e ignoravam quaisquer oportunidades de comunicação efetiva.
A realidade mencionada gerou inúmeras inquietações. No trabalho e na pesquisa
era notável a necessidade de estudar as relações interprofissionais e a segurança do paciente
no serviço de saúde. Associava os discursos dos profissionais à prática diária e, finalmente,
às queixas dos pacientes e de colegas de trabalho sobre a negligência diante de aspectos
inerentes ao nosso exercício profissional.
A inquietação em investigar os comportamentos destrutivos no trabalho em saúde
surgiu, também, da experiência como enfermeira docente na área do gerenciamento. Nos
campos de prática, é comum os alunos questionarem as atitudes inapropriadas de médicos,
enfermeiros e trabalhadores de nível médio entre si e perante os pacientes nas ações de
cuidado.
Nesse contexto, foi possível iniciar os estudos sobre o processo de trabalho em
saúde, a qualidade da assistência e a segurança do paciente. Durante três anos (2010 a 2012),
a participação em simpósios internacionais fez crescer o interesse pela temática, e, em um
destes simpósios, chamou a atenção uma palestra intitulada: ―O fator humano e a segurança
em saúde‖. E foi a partir das reflexões geradas nesta palestra, aliadas à prática profissional e
acadêmica supracitada, que emergiu o interesse em analisar o conceito comportamento
destrutivo no trabalho em saúde.
Na busca de estudos sobre o tema, inicialmente, evidenciou-se uma problemática:
a grande maioria das pesquisas era internacional, desenvolvida por médicos norte-
americanos, havendo poucas referências nacionais que se aproximavam do objeto de estudo,
mas não abordavam o conceito de comportamento destrutivo propriamente dito.
Além disso, constatamos que havia inúmeras referências na literatura que
utilizam conceitos cujas características assemelhavam-se àquelas do comportamento
destrutivo no trabalho em saúde, tais como violência institucional, bullying e assédio moral.
Assim, consideramos uma dificuldade inicial: esclarecer e refinar o conceito. Surgiu,
23
portanto, a necessidade de analisá-lo de forma aprofundada, pela sua natureza
multidimensional e complexa.
A primeira e importante característica deste conceito, e que o distingue dos
demais, é a sua relação intrínseca com a grande área de estudos hoje reconhecida como
Segurança do Paciente. Até então, os estudos na área de violência no trabalho ou de assédio
moral no trabalho, além de serem escassos nas pesquisas sobre o processo de trabalho em
saúde, não faziam alusão à repercussão para o paciente, quando da ocorrência de violência
manifestada por trabalhadores de saúde.
Ademais, os estudos sobre violência institucional envolvem a violência perpetrada
pelo trabalhador contra o usuário dos serviços de saúde ou vice-versa. Diferentemente, o
comportamento destrutivo abrange as condutas adotadas pelo trabalhador e manifestadas
contra colegas de trabalho ou contra a organização de saúde em que atua.
A análise deste conceito possibilita, portanto, reconhecer causas, características e
consequências do fenômeno em estudo. Desse modo, é possível elucidar como o
comportamento destrutivo se manifesta; e suas repercussões para todos os envolvidos:
trabalhadores, pacientes e organizações.
Nesse contexto, o processo de trabalho em saúde configura-se como o cenário
propício para o estudo do conceito comportamento destrutivo, por envolver interações
multiprofissionais complexas. Trabalhadores que atuam em situações extremas de
morbimortalidade, de carência de estrutura adequada para funcionamento e resolução dos
casos, em um espaço de multipoderes estabelecidos.
Necessitou-se, portanto, aprofundar o estudo do comportamento humano no
trabalho, o que foi possível mediante a aproximação a alguns referenciais teóricos, como o da
Psicodinâmica do Trabalho. Esta disciplina se propõe a estudar o espaço que separa um
comportamento livre de um estereotipado, atentanto para o campo do sofrimento e do
conteúdo, da significação e das formas desse sofrimento no contexto do trabalho (DEJOURS,
1993).
O autor traz à tona a reflexão sobre as transformações ocorridas na relação homem
e trabalho, as quais, nos últimos anos, favoreceram e impulsionaram a compreensão das
diferentes formas de organização e de produção dos processos de trabalho em todos os
segmentos.
Na área da saúde, garantir um ambiente mais seguro e favorável ao trabalho e à
assistência, tanto para pacientes quanto para profissionais; melhorar o uso de recursos e
24
investir no desenvolvimento de uma gestão compartilhada são os maiores desafios das
políticas públicas.
O trabalho, como ação transformadora, tem sido analisado de diferentes modos,
considerando que se modificou, ao longo dos tempos, quanto às formas de trabalhar, à sua
conceituação, às formas de remuneração e aos sentidos que assume. Tomamos o trabalho
como um vetor complexo que exige analisá-lo de acordo com o que em nosso tempo o
presentifica, um misto que assume diferentes intensidades, nuances, formas, lógicas, a partir
das transformações sociais que o interpelam (MORSHEL; BARROS, 2014).
Conforme ensinou Marx, o trabalho se efetiva na condição do homem de
transformar sua natureza para atender a suas necessidades por meio de uma organização social
deste trabalho, a qual é historicamente determinada. Para o autor, o processo de trabalho:
é atividade orientada a um fim para produzir valores de uso, apropriação do natural
para satisfazer as necessidades humanas, condição universal do metabolismo entre o
homem e a natureza, condição eterna da vida humana e, portanto, independente de
qualquer forma dessa vida, sendo antes igualmente comum a todas as suas formas
sociais (MARX, 1985, Tomo I, p.153).
Por sua vez, autores afirmam que a reflexão crítica e contínua sobre o processo de
trabalho e sua transformação é característica marcante da humanidade e constitui parte central
do processo de desenvolvimento humano. O grau de dificuldade dessa reflexão aumenta com
a complexidade e com a indeterminação dos processos de trabalho: quanto mais complexo o
processo de trabalho e quanto menos sistematizado ele for, mais difícil será refletir sobre ele
(FARIA et al., 2009).
Na saúde, o processo de trabalho difere da prestação de serviços em geral, pois o
usuário não se porta como um consumidor comum diante da mercadoria. Desse modo, muitas
vezes é desprovido de conhecimentos técnicos e não detém informações necessárias para a
tomada de decisão sobre o que irá consumir: o cuidado (FRANCO; MERHY, 2012).
Pela sua natureza relacional, os produtos da saúde se realizam em ato, na relação
entre produtor e consumidor, caracterizando a centralidade do trabalho vivo. Mesmo que o
trabalhador desenvolva seu trabalho com altos graus de liberdade, exercendo efetivamente um
autogoverno do seu processo de trabalho, há também a adoção de práticas com base em
modelos de assistência que se constituíram como dispositivos de realização do mercado, e,
por este motivo, centrado no ato prescritivo, alto consumo de insumos e procedimentos
(FRANCO; MERHY, 2012).
Paralelamente, o processo de trabalho em saúde compartilha características
comuns com outros setores da economia, por estar marcado por uma direcionalidade técnica e
25
envolver o uso de instrumentos, tecnologias e força de trabalho. Em relação à incorporação
tecnológica, tem ocorrido outro diferencial no setor saúde, ou seja, a inclusão de tecnologia
avançada sem a redução dos postos de trabalho, diferentemente dos demais setores da
economia (MALTA; MERHY, 2003).
A rigor, afirma-se que, quanto mais tecnologia se incorpora às intervenções em
saúde, lançando mão de equipamentos sofisticados que atendam à lógica da maximização da
lucratividade, mais desvalorizado fica o trabalho humano, da escuta, do atendimento
personalizado, da interação entre quem adoece e quem cuida. Ademais, sabe-se que a atenção
à saúde é uma atividade complexa que exige a atuação de diversos agentes que agregam
diferentes formas de organização do processo de trabalho, de uso de tecnologias, de espaços e
ambientes de trabalho e de formas de interação com os usuários (SOUZA, 2010).
Nessa perspectiva, o agir em saúde depende do trabalho coletivo, e garantir a
articulação dos diversos profissionais na prestação da assistência é um grande desafio ao se
repensar o processo de trabalho em saúde a partir das competências exigidas e, dentre elas, as
relacionais.
As diretrizes curriculares nacionais dos cursos da área da saúde reiteram a
importância da formação superior propiciar competências e habilidades relacionais para o
trabalho em equipe multiprofissional e para garantir a integralidade da assistência. O trabalho
em equipe, necessidade colocada tão em evidência nas diretrizes curriculares dos cursos da
área da saúde, é um nó crítico encontrado nos serviços, pois os estudantes em formação
aprendem, com ênfase, uma prática predominantemente individualizada (ROSSONI;
LAMPERT, 2004).
Por outro lado, o processo de trabalho em saúde e na Enfermagem tem sido
avaliado e criticado em aspectos relativos a: gerenciamento do cuidado (CHRISTOVAM;
PORTO; OLIVEIRA, 2012); competências gerenciais (CUNHA; XIMENES NETO, 2006;
PERES; LOURENÇÃO; BENITO, 2010); qualidade da assistência e segurança do paciente
(OLIVEIRA et al., 2014; BELELA; PETERLINI; PEDREIRA, 2010; CLARO et al., 2011;
GOLVEIA; TRAVASSOS, 2010; QUES; MONTORO; GONZÁLEZ, 2010; RADUENZ et
al., 2010; YURI; TRONCHIN, 2010).
Existe, ainda, uma preocupação crescente em desmistificar a dicotomia entre o
gerenciar e o cuidar, devendo os profissionais de saúde, e, em específico, os enfermeiros,
serem formados e capacitados para a gerência do cuidado em sua prática clínica, o qual
envolve uma concepção teórica e dialética entre o saber-fazer gerenciar e o saber-fazer cuidar.
As ações de gerência do cuidado caracterizam-se por ações expressivas e instrumentais de
26
cuidado direto e indireto, pela articulação e interface dos aspectos técnicos, políticos e da
politicidade social; comunicativos; de desenvolvimento da cidadania e organizacionais
(CHRISTOVAM; PORTO; OLIVEIRA, 2012).
Em consonância a estas ações, acredita-se que a gerência do cuidado pode ser
utilizada como uma ferramenta de gestão para a garantia da segurança do paciente, definida
como a redução do risco de danos desnecessários associados aos cuidados de saúde a um
mínimo aceitável (RUNCIMAN et al., 2009).
Os estudos sobre segurança do paciente surgiram nos Estados Unidos da América
(EUA) a partir da publicação do relatório denominado ―To Err is Human: Building a Safer
Health System”, em 1999, que estimava 44 a 98 mil mortes de americanos em decorrência de
erros associados aos cuidados em saúde. A partir de então, a segurança do paciente tornou-se
o foco de uma política a ser implementada nos serviços de saúde, em todo o mundo, e um
aspecto primordial inserido nas discussões sobre a temática tratou-se do fator humano, bem
como do processo de comunicação e relacionamento interpessoal (WACHTER, 2013).
No Brasil, apesar da divulgação de que a prestação do cuidado em saúde é
insegura, os estudos sobre o tema somente surgiram nas duas últimas décadas. Divulga-se que
os principais motivos dessa insegurança diz respeito à falta de investimento na formação e no
preparo dos trabalhadores quanto a aspectos relativos a: gerência do cuidado, trabalho em
equipe, liderança, comunicação, pensamento crítico, práticas diárias de solução de problemas,
falta de valorização dos aspectos interacionais entre a equipe de saúde e desta com o usuário,
e prestação de cuidados sem embasamento teórico e/ou científico apropriado (HADDAD;
ÉVORA, 2008; RADUENZ et al., 2010).
Além disso, na prática, a abordagem tradicional dos erros associados aos cuidados
em saúde tem sido a de culpar o profissional que oferece atendimento direto ao paciente,
atuando no que, às vezes, é chamado de ―ponta‖ do cuidado. Durante a última década, tem
sido reconhecido que essa abordagem ignora o fato de que a maioria dos erros é cometida por
seres humanos, e que tais erros provavelmente não são prevenidos, advertindo as pessoas a ter
mais cuidado, envergonhando-as, demitindo-as, ou processando-as (WACHTER, 2013).
Estes aspectos também estão intimamente relacionados à satisfação do
profissional no trabalho, considerada, hoje, um indicador de qualidade na gestão de pessoas
(SIQUEIRA; KURCGANT, 2012).
Ao analisar criticamente a disposição dos trabalhadores de saúde para a realização
do trabalho e os aspectos que geravam satisfação e insatisfação no seu desempenho, autoras
encontraram que a insatisfação estava ligada às condições estruturais do serviço, aos
27
privilégios e à supervalorização do modelo biomédico da saúde. Concluíram que existem
fatores que estimulam o trabalho e outros que geram conflitos, tornando mais difícil a atenção
integral à saúde e comprometendo a autonomia e a satisfação dos trabalhadores (SILVA;
FRAGA, 2003).
Neste sentido, vê-se que o trabalho em saúde ocorre a partir de uma intensa
interação social que incorpora uma complexa gama de necessidades que envolvem o
trabalhador de saúde, os gestores e os usuários do serviço. Certamente, essa interação é
determinada pelas condições objetivas e subjetivas de trabalho que podem facilitar ou
dificultar os resultados da prestação dos serviços (SOUZA, 2010).
A força de trabalho em saúde tem a evidência da sua desvalorização traduzida
pelo processo de desregulamentação do trabalho que se expressa em problemas como: a
precarização, a desestruturação no planejamento dos serviços, a descontinuidade dos
programas assistenciais, a intensificação da jornada de trabalho pela adoção dos múltiplos
vínculos, as baixas remunerações, a alta rotatividade, a inadequação de pessoal e as precárias
condições de trabalho que comprometem uma intervenção qualificada e põem em risco a vida
dos usuários (SOUZA, 2010).
Ao analisar o trabalho de médicos e enfermeiros, pesquisadores constataram
relação significativa entre comportamentos inapropriados e traços comportamentais e
psicológicos preocupantes. Estas condutas levaram ao prejuízo nas relações de trabalho
evidenciado por intimidação, hostilidade, estresse, frustração, perda de foco, pobreza na
comunicação e redução de transferência de informação. Identificaram, ainda, que estes
atributos afetaram diretamente os resultados da assistência prestada ao paciente
(ROSENSTEIN; O‘DANIEL, 2005; ROSENSTEIN; O‘DANIEL, 2006).
Devido ao modelo biomédico hegemônico, tanto nas escolas de formação
profissional, quanto nas instituições hospitalares, os enfermeiros tendem a valorizar o
tecnicismo durante a assistência, desconsiderando, na maioria das vezes, os aspectos
individuais e emocionais do usuário (ANDRADE; VIEIRA, 2005), bem como de sua equipe.
Nos currículos médicos, por sua vez, a formação profissional humanista e
generalista não tem sido eficazmente estimulada, tampouco formando sujeitos crítico-
reflexivos. Necessita-se, então, além das mudanças pedagógicas e metodológicas na formação
do profissional em saúde, diversificar os cenários de ensino-aprendizagem na construção de
novos currículos e sujeitos (FERREIRA; SILVA; AGUER, 2007).
Portanto, percebe-se que há muito a ser feito para que haja uma formação que
permita maior aproximação e comunicação entre a equipe de saúde e o usuário. Sendo assim,
28
um dos desafios para os profissionais, no processo de trabalho em saúde, é aprender a escutar
o diferente, o singular, o dissenso e, também, a possibilidade de exercer um protagonismo.
Mas, ao mesmo tempo, reconhecer a sua relação com uma complexa rede de instituídos que
teima em reproduzir modos de construir relações que julgamos tão necessário e urgente mudar
(BERNARDES et al., 2007).
Diante destas considerações e no cerne das situações supracitadas, encontra-se o
comportamento destrutivo no trabalho em saúde. Rosenstein (2002, p.27) define
comportamento destrutivo como ―qualquer comportamento inapropriado, confronto ou
conflito, que vai desde o abuso verbal (gritos, intimidação, repreensão, desrespeito,
comportamento abusivo) ao assédio físico ou sexual, que pode impactar negativamente nas
relações de trabalho, na eficácia da comunicação, na transferência de informações e no
processo e resultados do atendimento‖.
Por sua vez, a Associação Médica Americana (AMA) define comportamento
médico destrutivo como "conduta, seja verbal ou física, que afeta ou que, potencialmente,
pode afetar negativamente o atendimento ao paciente‖. Explosões de raiva, comentários ou
opiniões por outros membros de uma equipe de saúde que são suprimidos pelo
comportamento intimidador, retaliação contra um membro da equipe de saúde que informou
uma violação de um código de conduta, e os comentários que enfraquecem a auto-confiança
de um profissional de saúde na assistência ao paciente são outros exemplos de
comportamentos destrutivos (JERICHO; MAYER; MCDONALD, 2011).
Rosenstein (2011), médico pioneiro no estudo da temática, identificou inúmeros
fatores relacionados a esse comportamento: fatores arraigados, como idade/geração, sexo,
cultura, etnia, experiências de vida, personalidade; fatores situacionais, experiências recentes
de vida, pressões ambientais, estresse/frustração, fadiga/burnout, depressão, abuso de
substâncias, distúrbios psiquiátricos; e respostas provocadas por discussões conflituosas.
Como consequências, comportamentos destrutivos podem gerar falta de
comunicação e causar eventos adversos. Estes são definidos como complicações indesejadas
decorrentes do cuidado prestado aos pacientes, não atribuídas à evolução natural da doença de
base, afetando em média 10% das admissões hospitalares e constituindo um dos maiores
desafios para o aprimoramento da qualidade na área da saúde atualmente (GALLOT, 2004).
Além disso, pesquisa do Instituto de Práticas Seguras em Medicação revelou que
7% dos mais de 2.000 profissionais de saúde foram envolvidos em um erro de medicação em
que a intimidação desempenhou um papel crucial (ISMP, 2004). Além disso, Rosenstein e
O'Daniel mostraram, em 2006, que a ocorrência de eventos adversos, erros médicos,
29
comprometimento da segurança do paciente e da qualidade, e mortalidade do paciente estão
ligados ao comportamento destrutivo.
Os resultados adversos do comportamento destrutivo também estão associados a
menor satisfação do paciente, falta de trabalho em equipe, aumento da rotatividade de pessoal
e redução da eficácia dos registros de saúde. Os gestores dos sistemas de saúde, por sua vez,
conhecem esta problemática, mas o comportamento destrutivo ainda é predominante nos
serviços (PASCAL, 2011).
Em se tratando de comportamento destrutivo na equipe de saúde, existem
publicações referentes ao bullying, à violência lateral (lateral violence), ao assédio moral e à
violência institucional, as quais, embora se aproximem do objeto de estudo, não retratam o
conceito de comportamento destrutivo a ser analisado nesta tese (FELBLINGER; 2008;
JOHNSTON; PHANHTHARATH; JACKSON, 2009; RCN, 2005; WALRATH; DANG;
NYBERG, 2010).
Diante das considerações apresentadas, delimitaram-se as seguintes questões
norteadoras do estudo:
a) Quais são os atributos do conceito comportamento destrutivo no trabalho em
saúde?
b) Que eventos contribuem para a ocorrência do comportamento destrutivo no
processo de trabalho em saúde no contexto hospitalar?
c) Existem implicações geradas diante da ocorrência do comportamento
destrutivo para o trabalhador de saúde, sua equipe e para a segurança do
paciente?
Percebe-se que o comportamento destrutivo é um conceito que articula o
comportamento humano, o processo de trabalho em saúde e a segurança do paciente. No
entanto, a existência de outros conceitos que são tratados como sinônimos de comportamento
destrutivo leva a dificuldades de abordagem e compreensão do fenômeno na prática.
Acrescentando-se às referidas questões, justifica-se a realização desta pesquisa
com a constatação de que a maioria dos estudos encontrados é proveniente de pesquisas norte-
americanas e de que inexistem publicações brasileiras abordando a análise do conceito
comportamento destrutivo no trabalho em saúde, principalmente devido à inconsistência ou
ao desconhecimento dos atributos relacionados a este conceito e, também, à dificuldade de
abordar o tema entre os envolvidos na prática.
30
Trata-se de um fenômeno multidimensional visto como temática proeminente do
ponto de vista do processo de trabalho em saúde, do gerenciamento do cuidado e da segurança
do paciente. Desse modo, a análise desse conceito, com elucidação de seus antecedentes e
consequentes, pode permitir a gestores e trabalhadores adotar estratégias que viabilizem o
progresso do cuidado em saúde, instituir critérios de avaliação de desempenho das equipes,
elaborar ferramentas para melhoria da comunicação e do trabalho em equipe, tendo como
foco o ideal ético no ambiente de trabalho.
A análise do conceito comportamento destrutivo no trabalho em saúde favorece,
ainda, uma ampla compreensão das características essenciais desse comportamento no
contexto da equipe de saúde, principalmente em nossa cultura e País, podendo viabilizar
novas formas de refletir e solucionar o problema na prática. Nesse contexto, conformaram-se
os seguintes pressupostos para esta pesquisa:
a) A adoção de comportamento destrutivo por profissionais de saúde, no
cotidiano do trabalho, põe em risco o cuidado prestado, pode provocar erros na
assistência ao paciente e comprometer o reconhecimento dos profissionais
diante deste e da equipe de saúde;
b) No ambiente de trabalho, o comportamento destrutivo ocasiona estresse,
frustração dos membros da equipe e, principalmente, prejuízo na qualidade da
assistência prestada;
c) São inúmeros os fatores associados (antecedentes) à adoção desse
comportamento por parte do profissional, dos quais muitos são visualizados no
cenário da prática, mas que merecem ser confrontados e elucidados;
d) Diante do estudo dos fatores associados ao comportamento destrutivo e de suas
implicações para o trabalho em saúde, concretizado ainda pela análise e
validação do conceito, é possível compreender o fenômeno na atual conjuntura
da saúde no Brasil, aprimorar o processo de trabalho, pensar propostas para
solucionar conflitos, considerar medidas para promover segurança no
atendimento, prover ações para aumentar a satisfação dos profissionais de
saúde e, consequentemente, melhorar a qualidade do atendimento.
e) Ao elucidar este conceito no contexto hospitalar os profissionais de saúde e
gestores poderão utilizá-lo para gerar reflexões, no processo de tomada de
decisão e na proposição de ações que possam promover diálogos e a boa
convivência dos profissionais no trabalho em saúde.
31
2 OBJETIVOS
2.1 OBJETIVO GERAL
Analisar o conceito comportamento destrutivo no trabalho em saúde de acordo
com a literatura e a percepção de trabalhadores, com base no Modelo Híbrido de
Desenvolvimento de Conceitos.
2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
a) Identificar, na literatura, os atributos essenciais, os antecedentes e os
consequentes do conceito comportamento destrutivo no trabalho em saúde;
b) Verificar, em pesquisa de campo, se os elementos essenciais deste conceito
representam o fenômeno em análise, conforme vivenciado por trabalhadores de
saúde;
c) Comparar os resultados das etapas teórica e de campo, buscando convergências
e divergências no modo de se reproduzir o comportamento destrutivo no
processo de trabalho em saúde;
d) Conhecer as implicações do comportamento destrutivo no trabalho em saúde
para a segurança do paciente;
e) Propor uma definição para o conceito comportamento destrutivo no trabalho
em saúde;
f) Descrever um caso-modelo e um caso-contrário com o conceito de
comportamento destrutivo.
32
3 REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO
3.1 PRESSUPOSTOS DA ANÁLISE DE CONCEITO
Os conceitos são a base da ciência, considerados os menores elementos com os
quais se constroem as teorias científicas. Desse modo, definem os fenômenos a serem
estudados, bem como diferem uma ciência de outra; por isso, cada ciência tem seu próprio
conjunto de conceitos, que determina os campos de ação, os métodos, os temas, os objetivos e
os objetos de pesquisa (DAU, 2006).
É através do conhecimento dos conceitos fundamentais de uma ciência que se
pode compreendê-la, ou seja, sem conhecê-los é impossível entender com o que se está
trabalhando. Assim, a definição dos conceitos é fundamental na discussão científica, visto que
aquele que afirma e aquele que pergunta devem ter bem claro qual o significado do conceito
empregado (DAU, 2006).
Um conceito é uma palavra, porém não é como as utilizadas no cotidiano, cujo
significado é passageiro, móvel. No âmbito da Ciência, caracteriza-se por ter um único
significado claro, preciso e abstrato, que não resulta de preferências, de gostos e de anseios
individuais. O conceito pode ser compreendido a partir do próprio contexto em que se
encontra, não necessitando que o leitor invoque o auxílio de qualquer elemento extrínseco ao
texto (DAU, 2006).
A característica principal do conceito é a identificação dos elementos centrais do
que é estudado. Além disso, é preciso dizer que um conceito se refere não a um indivíduo, a
um caso único, a um fenômeno, mas a classes, a grupos, a relações. Pode-se afirmar que é
uma palavra que tem como características: universalidade (seu significado é válido, de igual
maneira, para todos os componentes da comunidade científica); necessidade (sua definição
não pode mudar de significado de acordo com os interesses dos cientistas); e objetividade (seu
sentido não depende das preferências individuais de quem fala) (DAU, 2006).
Por sua vez, autoras afirmam que ―a análise, o desenvolvimento, a síntese de
conceito e outros termos referem-se ao processo rigoroso de trazer clareza à definição dos
conceitos usados na ciência. A análise de conceito e o desenvolvimento de conceito são os
termos usados mais comumente na Enfermagem e são, em geral, aplicados ao processo de
pesquisa que examina os conceitos quanto ao seu nível de desenvolvimento revelado por
estrutura interna, uso, representatividade e relacionamento com outros conceitos‖ (WILLS;
MCEWEN, 2009, p.79).
33
Para Wilson (2005), a análise conceitual é, de pleno direito, um saber
especializado, com técnicas próprias, sem as quais não se podem abordar questões gerais – e,
de fato, nenhuma das perguntas que envolvam conceitos abstratos -, senão de modo confuso e
ineficaz; e que as técnicas podem ser ensinadas e facilmente aprendidas.
Certas disciplinas desenvolveram ou formularam seus métodos de análise de
conceito. Estes métodos são destinados ao esclarecimento e desenvolvimento dos próprios
conceitos, pois compartilham uma visão acadêmica de problemas conceituais e metodologia,
mas uma vez que são disciplina específica, eles também podem precisar de modificação antes
de se tornar aplicáveis a outros campos. Além disso, estes métodos não parecem ter
desenvolvido um aparato conceitual tão detalhado e uma abordagem sistemática para a
resolução de problemas conceituais como o trabalho de terminologia e a ciência tem fornecido
(NUOPPONEN, 2010).
A seguir, a Figura 1 reúne os principais referenciais teórico-metodológicos das
pesquisas de análise de conceito na área da Enfermagem.
Figura 1 – Principais referenciais teórico-metodológicos das pesquisas de análise de
conceito na Enfermagem
Fonte: Elaborada pela autora.
PRINCIPAIS REFERENCIAIS DE
ANÁLISE DE CONCEITO
Análise de Conceito
(Walker & Avant)
Modelo Híbrido de Desenvolvimento
de Conceito (Schwartz-Barcott
& Kim)
Desenvolvimento de Conceito
(Meleis)
Análise Evolutiva de
Conceitos (Rodgers)
Comparação de conceito
(Morse)
34
O Método de Análise Conceitual de Walker e Avant é o mais usado na
Enfermagem. Para as autoras, a análise de conceito é definida como um exame cauteloso e a
descrição de uma palavra ou termo, e seus usos, associada a uma explicação de outra palavra ou
termos relacionados. Inclui oito passos que servem para esclarecer o significado dos termos,
identificar os referentes empíricos e os atributos definidores, delinear os antecedentes e as
consequências. São casos construídos: modelo, limítrofe, relacionado e contrário (WALKER;
AVANT, 2005).
O Modelo da Análise Evolutiva de Conceito de Rodgers tem a finalidade de
refinar e esclarecer conceitos para uso na pesquisa e na prática. Para a autora, três distintos
aspectos de desenvolvimento de conceito são aparentes, e incluem a significância, o uso e a
aplicação do conceito. O método envolve cinco passos e a construção de um caso modelo,
apenas. Identifica-se um domínio apropriado (cenário e amostra), analisam-se os dados sobre as
características, são conduzidas comparações interdisciplinares ou temporais e identificam-se
hipóteses e implicações para estudo posterior (RODGERS, 1989).
Afaf Ibrahin Meleis (1997), uma enfermeira e socióloga proeminente, é uma
reconhecida teórica, pesquisadora e palestrante sobre os temas da saúde da mulher e
desenvolvimento, saúde imigrante, cuidados de saúde internacional e conhecimento e
desenvolvimento teórico. Descreveu três estratégias para desenvolver o significado conceitual
para uso na teoria, pesquisa e prática de enfermagem: a exploração, o esclarecimento e a
análise de conceito.
Seu modelo é intitulado Desenvolvimento de Conceito e tem por finalidades:
definição de conceitos teórica e operacionalmente, esclarecimento das ambiguidades e
relacionamento dos conceitos com os referentes empíricos. Realiza-se em sete etapas, com a
construção de casos modelos iguais ou semelhantes e modelos contrários (MELEIS, 1997).
Por sua vez, Janice Morse estabeleceu o Método de Utilidade Pragmática, com o
qual o pesquisador utiliza questões analíticas decorrentes da compreensão em profundidade da
literatura para sintetizar dados, para ir além dos limites de achados isolados e disciplinas
individuais, para identificar o conhecimento compartilhado, e para obter novos insights, linhas
de questionamento, e direção (MORSE, 2000).
Finalmente, descreve-se o Modelo Híbrido de Desenvolvimento de Conceito,
cujas finalidades e etapas configuram-se como as mais apropriadas à consecução dos objetivos
desta tese. A seguir, apresenta-se, com detalhes, o referencial adotado.
35
3.2 MODELO HÍBRIDO DE ANÁLISE CONCEITUAL
O Modelo Híbrido de Análise Conceitual, ou de Desenvolvimento de Conceitos,
foi apresentado por Swartz-Barcott e Kim (2000) e interliga análise teórica e observação
empírica, sendo composto de três fases que podem ser operacionalizadas de forma
progressiva, fase a fase, ou de forma simultânea:
a) Fase teórica (seleção do conceito, busca e revisão da literatura, definição
conceitual e operacional do conceito - instrumento de medida);
b) Fase de campo (integração da análise teórica às observações empíricas
referentes ao fenômeno no contexto em que se manifesta), que envolve o
estabelecimento do cenário do estudo, a seleção de casos, a coleta e a análise de
dados;
c) Fase analítica final, que compreende o cotejamento entre os dados resultantes
da fase teórica inicial e as observações empíricas, sendo o produto final a
apresentação da definição do conceito, bem como a identificação de lacunas
conceituais que direcionam o desenvolvimento de outras pesquisas.
Considerando, de modo particular, esse cotejamento entre os dados teóricos e
empíricos, Swartz-Barcott e Kim ressaltam que o seguinte questionamento pode orientar o
pesquisador: em que extensão a análise teórica e os achados empíricos apoiam a presença e a
frequência do conceito na população investigada?
Vários resultados podem ser obtidos a partir dessa análise: o significado atual do
conceito pode ser apoiado ou melhorado; uma definição diferente daquela previamente usada
pode emergir; o conceito pode ser completamente definido, incluindo seu modo de
mensuração.
O Modelo Híbrido surgiu em resposta às exigências, excitações e complexidades
por trás do desenvolvimento de cursos específicos para teoria e sua aplicabilidade prática na
Enfermagem (SWARTZ-BARCOTT; KIM, 2000).
A abordagem foi criada para garantir que:
a) Os conceitos selecionados para análise fossem integrais para a prática de
enfermagem;
b) A literatura revisada fosse ampla o suficiente para captar as semelhanças e
diferenças na conceitualização e uso do conceito entre as disciplinas;
36
c) O foco de análise seria os aspectos essenciais de definição e mensuração;
d) A análise de revisão de literatura seria fortemente integrada com a coleta de
dados empíricos da pesquisa na prática clínica.
Desse modo, o modelo desenvolvido faz uma interface entre a análise teórica e a
observação empírica, com enfoque nos aspectos essenciais de definição e mensuração.
O modelo híbrido envolve passos para identificar, analisar e refinar conceitos na
fase inicial do desenvolvimento de teorias e é mais aplicável às ciências aplicadas em geral e,
especificamente, à Enfermagem.
A Figura 2 apresenta os principais componentes do modelo híbrido.
Figura 2 – Principais componentes do modelo híbrido de análise conceitual
Fonte: Schwartz-Barcott; Kim (2000).
3.2.1 Fase teórica
Nesta fase, o principal foco é desenvolver uma base ou fundamento para as fases
subsequentes de análise em profundidade e refinamento do conceito. Desse modo, inclui as
seguintes etapas: a. seleção do conceito; b. revisão de literatura; c. aproximação do
significado; e d. escolha de uma definição do conceito a ser trabalhada.
Esta fase termina quando identifica uma definição de trabalho para a fase de
campo.
3.2.1.1 Seleção do conceito
O uso mais produtivo do modelo Híbrido tem sido aquele que inicia pelo uso de
um conflito procedente diretamente da prática clínica. Este conflito é usado, então, como uma
base para selecionar um conceito, o qual é fortemente associado à realidade empírica.
II
FASE
DE CAMPO
1. Escolha do cenário.
2. Negociação da entrada.
3. Seleção dos casos.
4. Coleta e análise dos
dados.
III
FASE
ANALÍTICA FINAL
Escrita dos resultados.
I
FASE TEÓRICA
1. Seleção do conceito.
2. Procura na literatura.
3. Aproximação do significado.
4. Escolha de uma definição do
conceito a ser trabalhada.
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Os autores acrescentam que alguns dos melhores conflitos são aqueles
inesperados e que deixam a enfermeira sentindo-se frustrada, horrorizada, com raiva,
envergonhada ou aturdida.
Desse modo, considera-se o método aplicável ao desenvolvimento deste estudo,
por envolver o conceito de comportamento destrutivo no trabalho em saúde, o qual envolve
um fenômeno que emergiu da nossa prática clínica profissional e docente, configurando o que
as autoras determinam como conflito que advém da prática e da realidade empírica.
3.2.1.2 Revisão de literatura
Esta etapa inicia na fase teórica e continua na fase do trabalho de campo, quando é
expandida. Seu objetivo é obter um domínio e um conhecimento completo da literatura sobre
o conceito, adquirir uma compreensão profunda e entendimento de como tem sido usado em
torno das disciplinas e ao longo do tempo (SWARTZ-BARCOTT; KIM, 2000).
Tal entendimento exige ampla pesquisa sistemática, interdisciplinar, dirigida
inicialmente para compreender o significado do conceito e, em segundo lugar, para as várias
maneiras já medidas ou que possam vir a serem medidas.
Os autores sugerem algumas perguntas que promovem um direcionamento inicial
na busca:
1. Qual é a natureza essencial de um conceito?
2. Como pode a sua essência ser claramente definida?
3. Como o conceito pode ser desenvolvido de forma a melhorar a sua
mensurabilidade?
Como essas questões sugerem, a revisão inicial da literatura precisa ser focada em
questões centrais de definição e mensuração. O importante é captar os extremos de
conceitualização e o uso do conceito selecionado em torno das disciplinas. Em seguida,
depois que o pesquisador está na fase do trabalho de campo, o foco se desloca para os
elementos mais sutis de definição e mensuração.
Para identificar os diversos usos do conceito de comportamento destrutivo na
literatura científica, foi realizada uma revisão integrativa, descrita de forma detalhada, em
todos os seus passos, no capítulo referente à Fase Teórica.
38
3.2.1.3 Aproximação do significado
Uma vez que algumas definições são dadas, é preciso que o pesquisador volte o
olhar para os principais pontos de contraste e semelhança entre elas, em busca de uma
definição operacional do conceito, que deve ser trabalhada na fase de campo.
3.2.1.4 Escolha de uma definição do conceito a ser trabalhada
Uma vez que os principais pontos de acordo e desacordo entre as definições
existentes e entre estas e sua definição inicial tornam-se aparentes, uma definição é
selecionada ou gerada para posterior exame detalhado.
A seleção de uma definição que parece congruente com pensamentos iniciais
ajudará a manter uma perspectiva de Enfermagem. No entanto, a manutenção de uma postura
hesitante em relação a uma definição selecionada é necessária se o pesquisador permanecer de
mente aberta no processo de refinamento.
Para Wilson (2005), uma definição correta requer critérios rigorosos. Portanto,
deve ser mais clara que o que é definido, ser positiva e breve. Além disso, é preciso que a
definição se refira, se possível, à essência e não a propriedades ou características mais
superficiais; não retome o termo a definir (exemplo: um sistema linear é um sistema...); E não
seja negativa, ou seja, a definição deve, tanto quanto possível, delimitar afirmativamente a
realidade a definir.
3.2.2 Fase do trabalho de campo
Esta fase visa corroborar e refinar um conceito, estendendo e interagindo a análise
iniciada na primeira fase com observações empíricas.
No modelo híbrido, o foco está em um único conceito, identificado antes do início
do trabalho de campo e em uma definição e mensuração, ao invés da explicação. O prazo
mínimo para coleta de dados é de dois a três meses.
3.2.2.1 Escolha do cenário
O foco desta etapa é a seleção do local do trabalho de campo e a identificação das
questões principais para guiar essa fase de coleta de dados.
A seleção de um local é algo crítico para garantir uma perspectiva de
Enfermagem. Ao listar o espectro potencial da população ou situações de atendimento ao
paciente em que o conceito é esperado que ocorra, o pesquisador pode esclarecer elementos
39
centrais do estudo, bem como aumentar a generalização provável do conceito dentro da
Enfermagem.
Existem três critérios essenciais que devem guiar a seleção de uma população e
um cenário:
1. A probabilidade de observações frequentes do fenômeno em estudo;
2. A adequação da observação como método de coleta de dados empíricos;
3. A probabilidade de que o pesquisador será capaz de criar e manter um papel
de observador no cenário.
Em contraste com as fases anteriores e subsequentes deste modelo, uma
familiaridade extensa com um local específico pode atuar como um forte impedimento para
sustentar o papel de observador.
São aspectos a serem observados na fase de trabalho de campo: 1. Os elementos
definidores essenciais do conceito; 2. Os elementos diferenciadores que separam o conceito
central de conceitos semelhantes; 3. Os critérios de mensuração que podem ser desenvolvidos
para o conceito.
3.2.2.2 Negociação da entrada
Swartz-Barcott e Kim (2000) ressaltam a necessidade dos pesquisadores
considerarem a complexidade desse tipo de negociação, especialmente com organizações
altamente formais e complexas, como um hospital.
Os procedimentos metodológicos e resultados desta etapa encontram-se descritos
no capítulo referente à Fase do Trabalho de Campo.
3.2.2.3 Seleção dos casos
As decisões relativas a quem o pesquisador deve abordar e como concentrar
observações no campo dependem da unidade de análise em estudo e do grau de clareza e da
intersubjetividade encontrada na revisão inicial de literatura.
Um grande número de casos é desnecessário e indesejável com este modelo de
desenvolvimento de conceito. Cabe ressaltar que encontros únicos não permitem tempo
suficiente para reflexão e sondagem. A seleção de cada indivíduo, grupo ou unidade vai
depender do grau de clareza das definições adquiridas na fase teórica. Se os aspectos do
conceito estão relativamente claros, um ou dois indicadores podem servir como a base para a
seleção.
40
A partir daí, devem-se selecionar um caso modelo e um caso contrário referente
ao conceito analisado.
Segundo Wilson (2005), um caso modelo é ―...uma ocorrência que nos pareça,
sem dúvida alguma, exemplar; um caso daqueles em que se pensa ―Bem, se isso não é bom
exemplo de x...nada mais será‖ (WILSON, 2005, p.27). Já o caso contrário se pode definir
utilizando-se o método oposto, ou seja, considerando os casos e, que se possa dizer: ―bem,
seja lá o que for tal conceito, isto eu sei que não é.‖ (WILSON, 2005, p.29).
3.2.2.4 Coleta e Análise dos Dados
É indicado seguir um sistema de coleta, transcrição e análise dos dados para essa
etapa, com a combinação de observação e entrevista em profundidade. Isto facilita múltiplas
observações e reflexões aprofundadas, assim como proporciona um diálogo com os
participantes ao longo do tempo (SWARTZ-BARCOTT; KIM, 2000).
A coleta de dados inclui notas observacionais, notas teóricas e notas
metodológicas que guiam o pesquisador entre distintas possibilidades analíticas no momento
da transcrição (SWARTZ-BARCOTT; KIM, 2000).
As notas observacionais são frases sobre eventos experienciados principalmente
por meio de visão e escuta. Elas contém a menor e a mais confiável interpretação possível por
parte do observador. É o quem, o quê, quando, como e onde se deu o fenômeno e
identificação de quem disse ou fez o que sobre determinadas circunstâncias. Tais notas foram
descritas em um diário de campo.
As notas teóricas são usadas para ir além dos fatos. O pesquisador pode
interpretar, conscientemente, inferir ou especular sobre o possível significado da observação.
No modelo Híbrido, pode-se usar uma nota teórica para trazer definições e mensurações da
literatura para comparar e contrastar com os dados descritos nas notas observacionais. Já as
notas metodológicas incluem instruções ao pesquisador durante o processo de coleta dos
dados.
3.2.3 Fase analítica final
Nesta fase, as questões a seguir devem ser respondidas: Quão aplicável e
importante é o conceito para a Enfermagem?; A seleção inicial do conceito parece
justificada?; Em que extensão a revisão de literatura, a análise teórica e os achados
empíricos apoiam a presença e a frequência deste conceito na população selecionada para o
estudo empírico?
41
Relatar os resultados de uma análise segundo o modelo híbrido requer a
integração de duas tradições distintas de escrita: análise de conceito e trabalho de campo. A
melhor e única abordagem para a integração destas tradições tem sido a de enquadrar a
introdução e revisão inicial da literatura de acordo com o formato clássico de análise de
conceito e, em seguida, desenhar sobre estilos de escrita usados no trabalho de campo para
apresentar e integrar as observações empíricas com a revisão da literatura (SWARTZ-
BARCOTT; KIM, 2000).
42
―Há uns que nos falam e não ouvimos; há uns
que nos tocam e não sentimos; há aqueles que
nos ferem e nem cicatrizes deixam, mas há
aqueles que simplesmente vivem e nos
marcam por toda a vida.‖
(Hannah Arendt)
43
4 ANÁLISE DE CONCEITO: FASE TEÓRICA
Esta fase objetiva obter um domínio compreensivo da literatura ao lidar com o
conceito e adquirir um profundo alcance e entendimento deste, sobre como tem sido utilizado
em torno das disciplinas e ao longo do tempo. Tal compreensão requer uma busca sistemática
e interdisciplinar dirigida inicialmente ao entendimento do significado do conceito e,
secundariamente, às várias formas de ter sido ou poder ser medido (SCHWARTZ-
BARCOTT; KIM, 2000).
A seguir, apresenta-se os resultados desta fase inicial da análise de conceito
segundo o modelo híbrido, em suas respectivas etapas: seleção do conceito; revisão de
literatura; aproximação do significado; e escolha de uma definição do conceito a ser
trabalhada.
4.1 SELEÇÃO DO CONCEITO
Comportamento destrutivo é um constructo complexo, considerado um termo
abrangente aplicado a uma ampla gama de "maus comportamentos" que são relatados na
literatura de saúde.
Autores afirmam que a literatura recente reflete numerosos comportamentos
destrutivos, a maioria dos quais tem definições inconsistentes ou imprecisas. Assim, relataram
esta dificuldade conceitual, afirmando que não encontrararam nenhuma estrutura conceitual
na literatura de saúde que englobasse estes conceitos inter-relacionados de forma significativa
(WALRATH; DANG; NYBERG, 2010).
Portanto, selecionou-se este conceito para compor o objeto de estudo dessa tese,
diante de sua relevância para a compreensão do comportamento destrutivo de trabalhadores
de saúde e suas implicações para equipe, paciente e organização.
A análise deste conceito foi iniciada com uma ampla revisão de literatura, descrita
a seguir.
4.2 REVISÃO DE LITERATURA
A revisão inicial da literatura precisa ser focada em questões centrais de definição
e medição, com o objetivo de capturar os extremos na conceituação e o uso do conceito
selecionado em todas as disciplinas. Mais tarde, após o investigador ir para a fase de trabalho
44
de campo, o foco se desloca para elementos mais sutis de definição e medição (SCHWARTZ-
BARCOTT; KIM, 2000).
A referência de Ganong (1987) é sugerida pelas autoras do método para proceder
à revisão integrativa nesta etapa do estudo. Segundo este autor, revisões integrativas de
pesquisa são uma parte importante do processo de criação e organização de um corpo de
literatura, devendo ser realizadas com os mesmos padrões de clareza, rigor e replicação de
uma pesquisa primária. Para tanto, definiram-se alguns métodos para a realização de uma
revisão integrativa.
Embora estes métodos variem tanto quanto os métodos de uma pesquisa primária,
é possível intensificar etapas-padrão no processo de revisão. Estes passos são:
a) Formular o propósito da revisão e desenvolver questões relacionadas a serem
respondidas pela revisão ou hipóteses a serem testadas;
b) Estabelecer critérios preliminares para inclusão de estudos na revisão de tal
forma que, conforme os dados são recolhidos, critérios podem ser alterados
por razões de mérito ou metodológicas;
c) Realizar pesquisa bibliográfica tomando decisões de amostragem, se o número
de estudos localizados for grande;
d) Desenvolver um questionário com o qual se recolha dados a partir dos
estudos;
e) Identificar regras de interferência para serem usadas em análises de dados e
interpretação;
f) Revisar critérios para inclusão no questionário, conforme necessário;
g) Ler os estudos utilizando o questionário para coleta de dados;
h) Analisar dados de forma sistemática;
i) Discutir e interpretar dados;
j) Preparar um relatório da revisão da forma mais clara e completa possível.
A seguir, descreve-se a revisão integrativa realizada em seus passos.
Inicialmente, elaborou-se a seguinte questão norteadora para a busca dos
documentos nas bases de dados: Quais são os atributos, antecedentes e consequentes do
conceito de comportamento destrutivo no trabalho em saúde?
Para esta etapa de revisão, foram considerados na busca textos provenientes de
artigos de pesquisa original, revisão, reflexão teórica, teses e dissertações.
45
As palavras-chave para o levantamento dos artigos foram devidamente
identificadas no Portal Brasileiro de Informação Científica CAPES, por meio de acesso ao site
<http://periodicos.capes.gov.br>, nas bases da dados das terminologias em saúde: Descritores
em Ciências da Saúde (DeCS), através da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS-BIREME),
disponível em <http://decs.bvs.br>, e Medical Subject Heading (MeSH), através da
MEDLINE/PUBMED (via National Library of Medicine), disponível em:
<http://ncbi.nlm.nih.gov/mesh>.
No período de agosto a dezembro de 2013, a busca dos artigos foi realizada nas
seguintes bases de dados eletrônicas:
a) LILACS (Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde): o
mais importante e abrangente índice da literatura científica e técnica da
América Latina e Caribe. Há 27 anos contribuindo para o aumento da
visibilidade, acesso e qualidade da informação em saúde na Região;
b) PubMed (serviço da U.S National Library of Medicine do National Institute of
Health): composta por mais de 23 milhões de citações para a literatura
biomédica do MEDLINE, revistas de ciências da vida, e livros on-line;
c) PsycINFO: base de dados extensa que reúne mais de três milhões de registros
de literatura revisada por pares em ciências do comportamento e saúde mental,
tornando-se uma descoberta ideal e ligando ferramenta para a pesquisa
acadêmica em uma série de disciplinas;
d) SciVerse Scopus: maior banco de dados de citações de literatura revisada por
parte do mundo, incluindo resumos e citações de artigos para jornais/revistas
acadêmicos. Abrange cerca de 18 mil títulos de mais de 5.000 editoras
internacionais, incluindo a cobertura de 16.500 revistas revisadas por pares nos
campos científico, técnico e de ciências médicas e sociais;
e) CINAHL (Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature): fornece
indexação de 2.928 periódicos científicos nos campos da enfermagem e
relacionados à saúde. Oferece cobertura completa de periódicos de
enfermagem em inglês e publicações da National League for Nursing e da
American Nurses‘ Association, abrangendo enfermagem, biomedicina,
biblioteconomia de ciências da saúde, medicina alternativa/complementar,
saúde do consumidor e 17 disciplinas ligadas à saúde;
46
Considerando o conceito em estudo, foram selecionadas as seguintes palavras
chave: Disruptive Behavior; Nursing (Enfermagem); Social Behavior (Comportamento
Social); Delivery of Health Care (Assistência à Saúde); Attitude of Health Personnel (Atitude
do Pessoal de Saúde); Interpersonal Relations (Relações Interpessoais); Interdisciplinary
Communication (Comunicação Interdisciplinar); Organizational Culture (Cultura
organizacional); Burnout, Professional (Burnout); Bullying; Workload (Carga de Trabalho); e
Patient Safety (Segurança do Paciente).
Tais palavras foram combinadas em suas diversas possibilidades de
entrecruzamento nos campos título, resumo e assunto, sempre considerando disruptive
behavior como o descritor-chave.
Como critérios de inclusão, definiram-se: (1) manuscritos publicados em língua
inglesa, portuguesa ou espanhola; (2) artigos que abordassem o conceito de comportamento
destrutivo no contexto do trabalho em saúde, sem delimitação de período de publicação ou do
tipo de estudo, e que respondessem à questão norteadora.
O fato de não delimitar o tipo de estudo justifica-se pela necessidade de
compreensão do fenômeno de forma abrangente, havendo interesse da pesquisadora em ter
acesso ao máximo de estudos que abordassem o conceito, seja do ponto de vista teórico-
conceitual, ou reflexivo, seja do ponto de vista empírico.
Os resultados desta busca encontram-se ilustrados na figura a seguir:
Figura 3 – Sumário do processo de levantamento nas bases de dados
Fonte: Elaborada pela autora.
Artigos identificados por meio de
triagem nas bases de dados
(n = 1730)
Excluídos da revisão após leitura dos resumos (n=1660)
Não examinava ou abordava especificamente o comportamento
destrutivo no trabalho em saúde = 1573
Duplicidade de artigo = 59
Resumo ou texto completo indisponíveis ou com resultados não
inclusos no artigo = 28
Artigos incluídos na revisão (n=70)
47
Dos 1730 artigos identificados, apenas 70 foram incluídos na amostra. Os artigos
que não respondiam à questão norteadora abordavam o conceito de comportamento destrutivo
em outras áreas, tais como gerontologia, saúde do adolescente e pediatria. Trata-se de outro
conceito utilizado nessas áreas para abordar comportamentos inapropriados de idosos com
demência em instituições de longa permanência, bem como as condutas destrutivas de
crianças e adolescentes no ambiente familiar ou escolar. Assim, esses artigos foram excluídos
da amostra no momento em que eram lidos seus resumos e identificadas suas áreas temáticas.
A Figura 4 apresenta os resultados do quantitativo de artigos localizados em cada
base de dados, conforme o intercruzamento dos descritores selecionados.
48
Figura 4 – Distribuição do total de artigos encontrados nas bases de dados conforme o
entrecruzamento dos descritores
Fonte: Elaborada pela autora.
Após selecionados, os estudos foram submetidos a uma leitura exaustiva e
compreensiva. Em seguida, informações relevantes foram extraídas para formar o corpus de
análise do conceito.
Elaborou-se, para tanto, um instrumento de coleta de dados (APÊNDICE A) com
o intuito de reunir as seguintes informações a serem extraídas dos artigos: Título, Objetivo (s),
Disruptive behavior
Burnout
1 PubMed
1 Scopus
0 PsycINFO
0 Lilacs
0 Cinahl
Disruptive behavior
Interpersonal Relations
11 PubMed
1 Scopus
0 PsycINFO
0 Lilacs
0 Cinahl
Disruptive behavior
Nursing
14 PubMed
6 Scopus
0 PsycINFO
0 Lilacs
0 Cinahl
Disruptive behavior
Organizational Culture
3 PubMed
3 Scopus
0 PsycINFO
0 Lilacs
0 Cinahl
Disruptive behavior
Social behavior
21 PubMed
2 Scopus
0 PsycINFO
0 Lilacs
0 Cinahl
Disruptive behavior
Bullying
0 PubMed
8 Scopus
0 PsycINFO
0 Lilacs
0 Cinahl
12 artigos
20 artigos
6 artigos
23 artigos
8 artigos
2 artigos
49
Autor (es), Tipo de publicação e método, Referência, Palavras-chave ou descritores (MESH) e
Área de concentração. Além disso, o instrumento continha um quadro em que as variáveis de
análise de conceito eram apreendidas dos artigos e reunidas de forma detalhada.
Em seguida, um quadro ilustrativo foi construído para distribuição e organização
dos 70 artigos segundo código (A1, A2, A3, ...), título, autor/ano de publicação, tema central
da pesquisa e variável de análise de conceito contemplada (APÊNDICE B).
Constatou-se que os artigos inseridos nesta revisão foram publicados no período
de 1999 a 2013, com um quantitativo expressivo de manuscritos sobre o tema no período de
2009 a 2013 (46 artigos). Este resultado demonstra que os estudos sobre comportamento
destrutivo cresceram de forma considerável a partir do ano 2000, o que coincide com o
mesmo período em que se iniciaram as pesquisas sobre segurança do paciente.
Em recente estudo que analisou pesquisas sobre assédio moral na Enfermagem, os
autores também identificaram um salto quantitativo em relação às publicações sobre o tema,
pois se observou que nos primeiros oito anos (2003 a 2010), foram encontradas apenas seis
publicações, contra doze nos últimos três anos (2008 a 2010). Estes dados evidenciaram o
aumento do interesse dos pesquisadores acerca do tema (FONTES; PELLOSO;
CARVALHO, 2011).
No que diz respeito às variáveis em estudo, a Tabela 1 representa o quantitativo
de artigos que abordaram definição, antecedentes, atributos e consequentes do conceito de
comportamento destrutivo no trabalho em saúde.
Tabela 1 – Distribuição das variáveis do estudo e sua frequência segundo evidenciadas
nos artigos analisados. n=70
Fonte: Elaborada pela autora.
Além das variáveis de análise de conceito segundo o modelo híbrido, foi possível
identificar exemplos de condutas destrutivas, categorias (padrões de comportamento
destrutivo) e estratégias para lidar com estes comportamentos por parte de gestores, líderes,
Variáveis f (%)
1. Estratégias para lidar com o comportamento destrutivo 63 (90,0)
2. Consequentes 59 (84,3)
3. Exemplos (casos e condutas características) de comportamento destrutivo 50 (71,4)
4. Atributos 49 (70,0)
5. Antecedentes 41 (58,6)
6. Definição 31 (44,3)
50
trabalhadores e organização. Tais variáveis estão analisadas ao longo das fases teórica e de
campo.
Percebe-se que a ênfase dos estudos esteve dirigida, em sua maioria, às estratégias
para lidar com o comportamento destrutivo (90%), seguida das consequências desse
comportamento para trabalhadores, pacientes e organizações (84,3%).
Um dado que chamou a atenção diz respeito ao fato de apenas 44,3% dos estudos
apresentarem alguma definição do conceito de comportamento destrutivo, o que justifica a
necessidade de sua análise.
Desse modo, verifica-se que muitos artigos abordaram o tema ao apresentar
causas, consequências e exemplos de comportamento destrutivo no trabalho em saúde, porém
não definindo este conceito.
No que se refere ao tipo de estudo, houve predominância de artigos de reflexão
teórica (24) e de atualização (21), seguidos dos estudos analíticos e transversais (14), estudos
qualitativos (4), relatos de experiência (3), pesquisa de intervenção/avaliação (2), revisão
sistemática (1) e estudo de caso (1).
Este é mais um dado que demonstra a necessidade de refinamento do conceito.
Evidencia-se como importante os estudos de revisão e atualização sobre o tema, pois chamam
a atenção para um conceito ainda pouco discutido na prática, mas de prevalência significativa
e de relevância no que diz respeito à cultura de segurança e à qualidade nas organizações de
saúde.
Quanto à categoria profissional dos autores dos artigos, predominaram estudos
desenvolvidos por médicos e enfermeiros publicados em periódicos médicos (38), seguidos de
Enfermagem (23) e outros (9) (Gestão em Saúde, Qualidade da assistência à Saúde, Tópicos
hospitalares, Segurança do Paciente).
Os periódicos médicos, por sua vez, eram das áreas de Obstetrícia e Ginecologia,
Medicina acadêmica, Medicina executiva, Gestão, Radiologia e Neurologia.
No que diz respeito aos enfoques temáticos, a Tabela 2 representa os resultados:
51
Tabela 2 – Distribuição dos temas centrais dos artigos analisados e sua frequência.
Tema central f (%)
1. Comportamento destrutivo e seu impacto na segurança do paciente e na qualidade
da assistência.
19 (27,1)
2. Comportamento médico destrutivo. 18 (25,7)
3. Gestão de comportamentos destrutivos. 11 (15,7)
4. Comportamento destrutivo na Enfermagem. 9 (12,9)
5. Comportamento destrutivo e relacionamento médico-enfermeiro no hospital. 8 (11,5)
6. Comportamento destrutivo no centro cirúrgico. 5 (7,1)
Total 70 (100,0)
Fonte: Elaborada pela autora.
Constata-se que os temas centrais permearam o impacto do comportamento
destrutivo na segurança do paciente, bem como a problemática em torno desse
comportamento entre médicos, trabalhadores de enfermagem e o relacionamento estabelecido
entre estas categorias profissionais. Ressaltam-se os estudos sobre a gestão desse
comportamento na prática, em que foram abordadas as estratégias adotadas por lideranças
para lidar com trabalhadores destrutivos.
Para análise do conceito, também foi imprescindível identificar os conceitos
utilizados, na literatura, como sinônimos de comportamento destrutivo. Tais conceitos
caracterizam-se como elementos diferenciadores, termo utilizado pelo modelo híbrido, que
significa aqueles conceitos que são utilizados como sinônimos ou confundidores do conceito
em análise.
A Tabela 3 apresenta estes conceitos relacionados segundo frequência de
ocorrência nos estudos incluídos na revisão.
52
Tabela 3 – Distribuição dos conceitos relacionados ao comportamento destrutivo no
trabalho em saúde e sua frequência de ocorrência nos artigos analisados. n=70
Fonte: Elaborada pela autora.
Verifica-se que diferentes terminologias e conceitos tem sido utilizados como
sinônimo de comportamento destrutivo, não havendo uma definição única que reúna um
conjunto de atributos específicos que a distingua dos demais conceitos. Foram frequentes os
estudos que utilizaram os conceitos de Bullying, Intimidação, Violência Horizontal/Lateral e
Comportamento Abusivo como sinônimos de Comportamento Destrutivo, o que justifica,
mais uma vez, a necessidade de análise deste conceito.
A seguir, apresentam-se os resultados da fase teórica que dizem respeito às
variáveis de análise de conceito estudadas: antecedentes, consequentes, atributos, definições;
além da variável que emergiu da revisão e que foi considerada de relevância para a análise
Conceito f (%)
1. Bullying 19 (27,1)
2. Intimidação 17 (24,3)
3. Violência Lateral/Horizontal 15 (21,4)
4. Comportamento Abusivo 14 (20,0)
5. Incivilidade 12 (17,1)
6. Comportamento Inapropriado 12 (17,1)
7. Comportamento Não-profissional 10 (14,3)
8. Mau comportamento 7 (10,0)
9. Assédio moral 6 (8,6)
10. Comportamento Hostil 6 (8,6)
11. Comportamento Negativo 5 (7,1)
12. Comportamento Desrespeitoso 3 (4,3)
13. Comportamento Grosseiro 3 (4,3)
14. Violência no ambiente de trabalho 3 (4,3)
15. Comportamento inaceitável 3 (4,3)
16. Comportamento agressivo 3 (4,3)
17. Comportamento passivo-agressivo 3 (4,3)
18. Destruição no ambiente de trabalho 3 (4,3)
19. Comportamento ameaçador 2 (2,8)
20. Comportamento problemático 2 (2,8)
21. Comportamento prejudicial 1 (1,4)
22. Comportamento revoltante/escandaloso 1 (1,4)
23. Reputação destrutiva 1 (1,4)
24. Sofrimento moral 1 (1,4)
25. Comportamento maladaptativo 1 (1,4)
26. Comportamento não emocionalmente inteligente 1 (1,4)
27. Comportamento passivo 1 (1,4)
28. Conduta destrutiva 1 (1,4)
29. Drama no ambiente de trabalho 1 (1,4)
30. Comportamento descortês 1 (1,4)
31. Comportamento divisível 1 (1,4)
32. Comportamento depreciativo 1 (1,4)
33. Comportamento disfuncional 1 (1,4)
34. Impairment 1 (1,4)
35. Comportamento anormal 1 (1,4)
53
final do conceito: categorias e condutas características de comportamento destrutivo no
trabalho em saúde.
4.2.1 Atributos do Comportamento Destrutivo no Trabalho em Saúde
Os atributos são palavras ou expressões utilizadas com frequência pelos autores
para descrever as características do conceito (RODGERS, 1989).
Esta revisão integrativa possibilitou realizar um estudo aprofundado sobre as
características e os elementos essenciais do conceito de comportamento destrutivo, na medida
em que eram apresentados em cada artigo analisado. Para este estudo, as condutas destrutivas
relatadas na literatura foram submetidas à categorização e análise minuciosa, que
possibilitaram a classificação dos atributos do comportamento destrutivo em três padrões:
Violência Psicológica, Incivilidade e Violência Física/Sexual.
Com esta categorização, é possível afirmar que o conceito Comportamento
Destrutivo no Trabalho em Saúde representa um constructo teórico, ou seja, uma construção
mental ou síntese feita a partir da combinação de vários atributos, que representam um
espectro de comportamentos que vão desde o menos grave (incivilidade) ao mais grave
(violência física e sexual).
O Quadro 1 apresenta as condutas características do comportamento destrutivo
adotado por trabalhadores de saúde, segundo sua classificação e ocorrência nos artigos
analisados. Ao todo, foram encontradas 321 referências destas condutas nos 70 artigos
analisados, sendo 198 de Violência Psicológica, 94 de Incivilidade e 29 de Violência
Física/Sexual.
54
Quadro 1 – Atributos e condutas características do comportamento destrutivo no
trabalho em saúde segundo número de referências e artigos analisados
Fonte: Elaborado pela autora.
ATRIBUTOS/
Condutas características de
comportamento destrutivo
NÚMERO DE
REFERÊNCIAS
ARTIGOS
VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA
Humilhar o colega de trabalho
publicamente. 47
A4, A11, A15, A18, A23, A32, A36,
A39, A40, A42, A43, A47, A48, A51,
A53, A56, A60, A61, A62, A64, A69
Agir ou falar com grosseria/Gritar. 31
A2, A3, A4, A5, A7, A10, A11, A13,
A15, A18, A23, A32, A36, A42, A47,
A49, A53, A64, A65, A69
Intimidar. 26
A3, A7, A11, A15, A21, A22, A23,
A35, A40, A42, A43, A52, A53, A56,
A57, A61, A65
Usar linguagem abusiva. 22
A15, A22, A23, A25, A32, A35, A39,
A40, A42, A49, A50, A52, A54, A58,
A60, A61, A65, A69
Arremessar objetos, instrumentais
ou prontuários. 17
A1, A7, A13, A18, A30, A32,
A40, A43, A48, A50, A52, A53,
A65, A69
Gerar fofocas, brigas, sabotagem,
traição. 16
A6, A15, A18, A2 A31, A32, A45,
A60, A61
Fazer observações e exibir atitudes
discriminatórias. 13
A13, A14, A23, A25, A31, A32,
A35, A40, A48, A52, A69
Reter informações para prejudicar o
colega. 6
A15, A18, A51, A52, A61, A69
Ameaçar. 6 A18, A23, A61, A69
Outras. 14 A13, A15, A18, A31, A32, A40,
A45, A64, A69
INCIVILIDADE
Manifestar explosões de raiva. 16 A1, A10, A14, A15, A18, A30, A32,
A40, A42, A49, A52, A69, A70
Desrespeitar o colega de trabalho. 14 A3, A4, A7, A15, A18, A24, A40,
A51, A52, A56, A69
Fazer comentários hipercríticos ou
depreciativos acerca da
organização.
13
A6, A7, A8, A13, A15, A23, A30,
A35, A40, A48, A52, A56
Relutar ou recusar-se a responder a
perguntas e/ou retornar ligações. 12
A7, A10, A13, A15, A18, A23, A30,
A35, A40, A48
Descumprir normas, rotinas e
protocolos organizacionais. 12
A13, A15, A18, A36, A40, A48, A56,
A63
Recusar-se a executar tarefas
atribuídas ou exibir atitudes que
não cooperam durante as atividades
de rotina.
10
A10, A18, A30, A40, A47, A51, A52,
A69
Agir indelicadamente, não ouvir,
ignorar o colega de trabalho. 5
A14, A18, A23, A56, A69
Outras. 12 A18, A40, A52, A61, A64, A69
VIOLÊNCIA FÍSICA OU SEXUAL
Assédio Sexual. 15 A13, A15, A23, A25, A30, A32, A35,
A40, A48, A52, A64, A65, A69
Violência física. 14 A13, A15, A21, A23, A25, A30, A32,
A35, A47, A48, A51
55
Verifica-se que a maior parte das condutas características de comportamento
destrutivo, segundo os artigos analisados, esteve concentrada nos atributos Violência
Psicológica e Incivilidade, o que também foi encontrado em outras pesquisas sobre o tema
(KAPLAN; MESTEL; FELDMAN, 2010; WALRATH; DANG; NYBERG, 2010).
Analisando as experiências de enfermeiras assistenciais com comportamento
destrutivo nos EUA, pesquisadores encontraram a ocorrência deste comportamento em todos
os contextos de prática e entre uma grande variedade de profissionais de saúde. Um total de
168 comportamentos destrutivos diferentes foram identificados e, em seguida, sintetizado em
21 categorias. Dentro destas categorias, três temas ou padrões de comportamento destrutivo
surgiram: incivilidade, agressão psicológica e violência (WALRATH; DANG; NYBERG,
2010). Tais padrões são os mesmos trabalhados nesta tese.
Dentro desses três temas, a maioria dos comportamentos destrutivos descritos
pelos participantes dos grupos focais, no estudo dos referidos autores, foi categorizada como
agressão psicológica; e menos comportamentos foram categorizados como incivilidade ou
violência.
Para os autores (WALRATH; DANG; NYBERG, 2010), estes conceitos estão
assim descritos:
a) Incivilidade no ambiente de trabalho: comportamento desviante de baixa
intensidade, que viola normas do ambiente de trabalho para o respeito mútuo,
podendo ou não ter a intenção de prejudicar o alvo, não ameaça fisicamente o
alvo, e pode transcender a hierarquia organizacional.
b) Agressão psicológica: comportamentos ativos ou passivos que
intencionalmente infligem danos psicológicos ao alvo. Três categorias de
comportamentos destrutivos, neste tema, foram: fofocas, intimidação e
comportamento passivo-agressivo. Um participante informou que "a
bisbilhotice é enorme. . . [Ele] pode ser bastante maligno e muito vingativo. As
pessoas querem sair e correr para longe por causa da intensidade. Você não
pode desfazer o impacto da fofoca na unidade.‖
c) Violência: formas físicas, ativas e diretas de comportamento agressivo. Uma
enfermeira descreveu um incidente "em rondas em uma manhã, quando o
[médico assistente] ficou tão excitado e jogou uma caneta que saltou fora do
prontuáro e por pouco não atingiu o rosto de outro médico. [Desde então] tem
uma história tão longa deste [tipo de comportamento] que as rondas
continuaram. Foi como se nada tivesse acontecido. Outro exemplo de violência
56
física incluía uma situação em que dois membros da equipe começaram uma
briga na unidade, sobre quais eram suas responsabilidades de trabalho,
resultando em empurrões a tal ponto que foi preciso chamar a segurança.
Em outra pesquisa, Kaplan, Mestel e Feldman (2010) categorizaram o
comportamento destrutivo em três tipos:
a) Comportamento desrespeitoso: incivilidade, adotando a mesma definição do
estudo anterior (comportamento desviante de baixa intensidade que viola normas
do ambiente de trabalho para o respeito mútuo), caracterizada por grosseria,
constrangimento público, sarcasmo, impaciência com perguntas, comentários
inapropriados sobre a atuação na frente dos outros, demorar ou recusar a atender
ligações ou responder a mensagens baseadas em questões de relacionamento
interpessoal, e insinuar acusações ao invés de ser direto;
b) Comportamento desrespeitoso (intimidação ou bullying): bullying definido
como forma persistente de hostilidade. Caracterizado por linguagem abusiva,
ameaças de retribuição ou litígio, insultos persistentes sobre a atuação do colega,
repreensão dos colegas, humilhar subordinados, ameaçar arruinar a carreira se o
comportamento for relatado, e atacar os outros aleatoriamente;
c) Mau comportamento: comportamento inaceitável que requer políticas e
procedimentos formais. Demonstrado por meio de ameaças de violência ou
violência atual, abuso físico, assédio sexual incluindo comentários vulgares ou
sexuais sugestivos ou explícitos, observações discriminatórias incluindo insultos
raciais, étnicos ou religiosos, risco imediato à segurança, saúde ou bem-estar dos
pacientes e atividade criminal.
O Bullying, conceito tão comumente empregado para designar os comportamentos
destrutivos no trabalho, foi definido por estudo como comportamento repetitivo, que ocorre a
um mínimo de duas vezes por semana; comportamento a longo prazo, que continua para uma
mínimo de seis meses; e que ocorre em situações onde a pessoa(s)-alvo(s) acha difícil de se
defender e parar o abuso (GROGAN; KNECHTGES, 2013).
Para os autores, o bullying é manifestado por aqueles profissionais que batem de
frente com os colegas, rompendo com a harmonia dos membros da equipe, menosprezando os
pacientes nas suas caras, berrando alto, ameaçando a todos, espalhando sarcasmo e
insinuações sarcásticas, chegando atrasado dia após dia, furiosos, mau humorados,
arremessando instrumentos cirúrgicos, sabotando compromissos, reuniões, zombando dos
57
administradores, insultando seus colegas, recusando-se a responder chamadas, estragando-se
com bebida ou drogas, violando limites sexuais (GROGAN; KNECHTGES, 2013).
Observa-se que esta definição abrange uma ampla gama de condutas
características de violência psicológica, pondendo, portanto, ser inserida neste padrão de
comportamento destrutivo.
Outro estudo abordou o comportamento destrutivo como uma modalidade de
desrespeito no ambiente de trabalho (LEAPE et al., 2012). A pesquisa classificou o
comportamento desrespeitoso nos seguintes padrões:
a) Comportamento destrutivo;
b) Tratamento humilhante de enfermeiros, residentes e estudantes;
c) Comportamento passivo-agressivo;
d) Desrespeito passivo;
e) Tratamento desdenhoso de pacientes; e
f) Desrespeito sistêmico.
Para os autores, ações características de comportamento destrutivo incluem
ataques de raiva, ameaças verbais, gritar, berrar, e a ameaça ou imposição de força física
injustificada. Ter um acesso de raiva, jogar objetos e quebrar coisas, assim como qualquer
contato físico indesejado de natureza sexual. Pode ser dirigido a qualquer um - enfermerias,
colegas médicos, residentes, estudantes de medicina, técnicos de enfermagem,
administradores hospitalares e membros de sua família.
Comportamento destrutivo inclui, ainda: linguagem profana, desrespeitosa,
ofensiva ou abusiva; argumentos altos ou inapropriados; comentários depreciativos ou
intimidaçao; expor/envergonhar os outros por resultados negativos, e grosseria simples
(LEAPE et al., 2012).
As violações dos limites físicos e assédio sexual estão nesta categoria, assim
como os comentários negativos gratuitos sobre os cuidados de outros médicos e julgamentos
graves ou censura dos colegas ou pessoal da equipe na frente dos pacientes, visitantes, ou
outros funcionários. Também estão incluídos o bullying; comentários insensíveis sobre a
condição médica, aparência ou situação de um paciente; e piadas ou comentários sobre raça,
etnia, religião, orientação sexual, idade, aparência física, ou status socioeconômico ou
educacional (LEAPE et al., 2012).
Quanto ao tratamento humilhante de enfermeiros, residentes e estudantes,
discutiu-se que muito mais comum do que as formas brutais de comportamento destrutivo são
58
estes padrões de tratamento degradante ou humilhante dos subordinados, em particular dos
enfermeiros, residentes e estudantes de medicina (LEAPE et al., 2012).
Os estudantes de medicina, na parte inferior da hierarquia de equipe de
atendimento ao paciente, são muito vulneráveis ao desrespeito do corpo docente, funcionários
do serviço, enfermeiros e outros, por meio de agressões verbais ou físicas, rebaixamento,
humilhação, assédio, intimidação e exploração, ou simplesmente por serem ignorados
(LEAPE et al., 2012).
Desrespeito também pode ocorrer na sala de aula pré-clínica ou laboratório, mas é
mais comum na prática clínica, como serviços hospitalares ou clínicas. Estudantes mulheres
são mais vulneráveis do que os homens (LEAPE et al., 2012).
O Comportamento passivo-agressivo inclui recusar a cumprir tarefas ou fazê-las
numa intenção de incomodar os outros. Indivíduos passivo-agressivos saem de seu caminho
para fazer os outros parecerem mal, fingindo inocência, não obedecem/seguem acordos, e
deliberadamente atrasam em responder a chamadas, cobrindo os atrasos com desculpas. Eles
costumam fazer comentários negativos sobre sua instituição, hospital, grupo ou colegas. As
características definidoras de agressão passiva são raiva oculta, negativismo, e intenção de
causar dano psicológico (LEAPE et al., 2012).
Já o Desrespeito Passivo é mais comum. Consiste em uma série de
comportamentos não cooperativos que não são malévolos ou enraizados em raiva reprimida.
Seja por causa da apatia, esgotamento, frustração situacional, ou por outros motivos,
indivíduos passivamente desrespeitosos estão cronicamente atrasados nas reuniões,
respondem lentamente às chamadas, não conseguem prescrever ou fazer notas operacionais
em tempo hábil, e não trabalham colaborativamente ou cooperativamente com os outros. Eles
resistem a seguir práticas de segurança, tais como a desinfecção das mãos, listas de
verificação, e "time-outs", mesmo quando a lógica tem sido suficientemente descrita. Eles
podem recusar-se a participar nos esforços de melhoria da qualidade, ou, se o fizerem, eles
são jogadores da equipe indiferentes ou fracos. Todos estes comportamentos são
manifestações de desrespeito para os outros, para a instituição, e para pareceres de
especialistas.
No que diz respeito ao Tratamento desdenhoso de pacientes, os dados de
incidência são escassos, mas as evidências crescem na forma de histórias de pacientes em
relação ao tratamento degradante e desrespeitoso pelos médicos. Os pacientes podem
descrever esse tratamento em diversas maneiras: "Ele me trata como um idiota", "Ele me faz
sentir como se eu estivesse tomando o tempo dele", "Ela não retorna minhas ligações", "Eles
59
me ignoram nas visitas. ―Eles falam sobre mim, mas não para mim ", ou," Era claro que ele
não gosta de pessoas que fazem perguntas‖. Não só tal comportamento viola a obrigação
fundamental do médico para dar apoio e cura, como também pode ser devastador para o
paciente já apreensivo (LEAPE et al., 2012).
Tratamento de desprezo e humilhações não se limitam aos pacientes. Alguns
médicos tratam os enfermeiros, estudantes, residentes e até mesmo colegas com desdém,
tornando a comunicação e a colaboração impossível. No entanto, devido os pacientes serem
tão dependentes do médico para o seu bem-estar, eles são especialmente vulneráveis ao
tratamento desdenhoso (LEAPE et al., 2012).
Finalmente, o desrespeito sistêmico manifesta-se por meio da aceitação do
desrespeito como algo estabelecido e inerente às características do sistema de saúde. Os
hospitais demonstram falta de respeito com os enfermeiros e outros trabalhadores quando eles
não conseguem garantir a sua segurança física, tomando as medidas adequadas para evitar
ferimentos, como acidentes com agulha e tensão nas costas. O fato de que estas são muitas
vezes aceitas como riscos do trabalho ilustra até que ponto a falta de respeito é
institucionalizada em hospitais (LEAPE et al., 2012).
Não se conhecem estudos realizados para quantificar esses tipos de
comportamentos, mas foi encontrado na pesquisa um amplo acordo entre os médicos de que
tais comportamentos não são raros (LEAPE et al., 2012).
Em outro estudo (MARTIN, 2008), o comportamento destrutivo foi dividido em
três tipos:
a) Comportamento destrutivo;
b) Comportamento comprometido/arruinado;
c) Comportamento incompetente.
O autor afirma que a habilidade de distinguir os três tipos é crítica porque as
estratégias usadas para prevenir e resolver essas questões são específicas para cada tipo. Tal
distinção entre comportamento destrutivo, comprometido e incompetente não é puramente
acadêmica. E é crítica por duas razões. Primeiro, para atender aos padrões de liderança,
administradores hospitalares devem formular definições. Segundo, um plano de tratamento é
limitado pela acurácia do diagnóstico, e a intervenção gerencial e organizacional é limitada
pela acurácia da avaliação e da causa raiz do problema (MARTIN, 2008).
O comportamento destrutivo é muitas vezes chamado de disfuncional, mas
considerado um termo vago e emocionalmente carregado. Quanto ao comportamento
60
comprometido/arruinado, este também abrange aspectos pessoais, sendo visto como uma falta
de habilidade resultante de desordens psiquiátricas, alcoolismo ou dependência de drogas. Já a
definição de comportamento incompetente dá ênfase ao comportamento profissional
relacionado a padrões, guidelines e normas profissionais. Competência pode ser definida
como possuir as habilidades requisitadas e qualidades para desempenhar funções
profissionais, efetivamente, de acordo com padrões éticos e profissionais específicos
(MARTIN, 2008).
Foi possível pereceber que o comportamento destrutivo, comprometido e
incompetente não são mutuamente exclusivos. Qualquer profissional pode apresentar todos os
três comportamentos concomitantemente.
Diante das considerações apresentadas sobre os atributos do comportamento
destrutivo, esta análise inicial possibilitou reconhecer como este comportamento se apresenta
no ambiente de trabalho em saúde, e incluir as condutas mais características dentro de cada
atributo evidenciado: incivilidade, violência psicológica e violência física/sexual.
Optou-se por esta categorização por considerar os elementos diferenciais nas
definições destes padrões e, ainda, por reconhecer que o comportamento destrutivo pode
surgir diante de uma incivilidade subjacente, quando o trabalhador adota condutas não-
profissionais, mas que podem não ter a intenção de gerar consequências negativas à
organização ou ao colega de trabalho. Havendo esta incivilidade subjacente, o trabalhador
pode acostumar-se ao desrespeito institucional, ao não cumprimento de normas, e chegar a
adotar condutas mais desrespeitosas, hostis ou agressivas, como aquelas características de
violência psicológica, física ou sexual.
Portanto, é imprescindível enfatizar que os padrões de comportamento
destrutivos, nesta análise de conceito, podem permitir melhor compreensão de suas
manifestações nos três tipos, os quais deverão ser abordados de forma distinta por parte das
lideranças dos serviços, e associados a uma série de elementos essenciais e fatores
relacionados, ou seja, de seus antecedentes.
Além dos atributos e condutas características de comportamento destrutivo,
identificaram-se todos os adjetivos/características definidoras citadas pelos autores dos
estudos para caracterizar os indivíduos destrutivos, conforme evidenciados no Quadro 2.
61
Quadro 2 – Características ou adjetivos atribuídos ao comportamento destrutivo
segundo número de referências e artigos analisados
Fonte: Elaborado pela autora.
Constata-se a existência de um grande número de diferentes adjetivos utilizados
pelos autores para caracterizar o comportamento destrutivo no trabalho em saúde. Tais
características/adjetivos tem relação com falta de cortesia, grosseria e intimidação, além de
muitos serem sinônimos uns dos outros.
CARACTERÍSTICAS/ADJETIVOS NÚMERO DE
REFERÊNCIAS ARTIGOS
1. Intimidante 19 A6, A8, A10, A15, A18, A21, A23, A28, A30, A37,
A38, A40, A43, A48, A49, A56, A66, A69, A71
2. Hostil 18 A4, A8, A14, A15, A17, A19, A20, A21, A25, A32,
A39, A42, A43, A49, A50, A51, A57, A70
3. Grosseiro/Rude 15 A4, A15, A17, A18, A23, A25, A26, A30, A41, A49,
A50, A51, A52, A56, A57
4. Abusivo 13 A4, A6, A14, A17, A19, A23, A25, A41, A49, A52,
A54, A57, A58
5. Inadequado/inapropriado 9 A6, A28, A36, A37, A41, A49, A66, A69, A70
6. Não-profissional 8 A8, A10, A31, A33, A36, A49, A49, A55
7. Ameaçador 7 A8, A15, A23, A37, A41, A43, A49
8. Incivil 7 A6, A17, A51, A52, A57, A58, A60
9. Bullying 7 A17, A51, A52, A55, A57, A58, A63
10. Desrespeitoso 5 A23, A4, A18, A32, A58
11. Ofensivo 4 A14, A43, A49, A57
12. Arrogante 3 A26, A28, A57
13. Intolerável 3 A10, A40, A53
14. Negativo 3 A23, A52, A56,
15. Persistente 3 A37, A56, A68
16. Condescendente 2 A8, A41
17. Estressante 2 A8, 22
18. Degradante 2 A32, A58
19. Disfuncional 2 A43, A65
20. Explosivo 2 A34, A41
21. Humilhante 2 A32, A58
22. Irritante 2 A21, A49
23. Violento 2 A25, A52
24. Vergonhoso 2 A32, A52
25. Anormal 1 A65
26. Baixo 1 A64
27. Brusco/seco 1 A4
28. Controlador 1 A37
29. Controverso 1 A49
30. Crítico 1 A49
31. Depreciativo 1 A60
32. Desagradável 1 A7
33. Descortês 1 A52
34. Desmoralizante 1 A25
35. Duradouro 1 A4
62
No entanto, verifica-se preponderância dos adjetivos intimidante, hostil,
grosseiro/rude e abusivo. Assim, buscaram-se seus sinônimos em dicionário para melhor
interpretá-los e inseri-los nesta análise conceitual.
Segundo o dicionário Aurélio (FERREIRA, 2010), rude é sinônimo de
grosseiro/descortês; intimidante é aquele que inspira receio, medo ou temor; hostil é aquele
que hostiliza, sinônimo de agressivo, provocador; e abusivo é aquele que faz por abuso;
inconveniente; qualificativo dos atos que a moral condena mas que o uso tolera.
Compreendendo estas definições, considera-se que o profissional destrutivo pode,
inicialmente, ser rude ou abusivo, quando adota condutas características de incivilidade; mas
pode ser, também, intimidante, hostil e abusivo, quando adota condutas mais violentas, seja
de violência psicológica, seja de violência física ou sexual.
Mais adiante, são apresentados antecedentes e consequentes deste conceito,
possibilitando a escolha de uma definição operacional do conceito para a etapa seguinte, do
trabalho de campo.
4.2.2 Antecedentes do Comportamento Destrutivo no Trabalho em Saúde
Os antecedentes do conceito são situações, eventos ou fenômenos que precedem o
conceito de interesse, auxiliando na compreensão do contexto social no qual o conceito é
geralmente utilizado, bem como favorecendo o seu refinamento (RODGERS, 1989).
Recentes estudos utilizaram o termo gatilho para designar tais antecedentes. Para
os autores, o gatilho é um traço, evento anterior ou condição que contribui para a ocorrência
de um evento de comportamento destrutivo. Ocorrem em três níveis: intrapessoal
(características ou condições que ocorrem dentro do indivíduo, tais como características
pessoais, falta de competência, ou fadiga); interpessoal (relação entre as pessoas); e
organizacional (sistemas, processos, ou culturas que inibem a interação ou o trabalho)
(WALRATH; DANG; NYBERG, 2010; WALRATH; DANG; NYBERG, 2013).
Esta categorização foi utilizada, também, no presente estudo, pois garante uma
abordagem multidimensional dos inúmeros fatores envolvidos nos casos de comportamento
destrutivo no trabalho em saúde.
A seguir, o Quadro 3 apresenta os antecedentes do comportamento destrutivo no
trabalho em saúde, os quais foram referidos em 191 citações nos 70 artigos analisados.
63
Quadro 3 – Antecedentes do comportamento destrutivo no trabalho em saúde segundo
número de referências e artigos analisados
Fonte: Elaborado pela autora.
Observa-se uma predominância de antecedentes intrapessoais na origem de
comportamentos destrutivos, os quais foram referidos em 90 citações dos 70 artigos
analisados.
Os antecedentes intrapessoais são considerados traços ou condições que envolvem
o indivíduo, tais como características pessoais, falta de competência, ou fadiga. Envolvem
ANTECEDENTES NÚMERO DE
REFERÊNCIAS ARTIGOS
INTRAPESSOAIS
Estresse/situações críticas, ansiedade, fadiga e
depressão. 28
A14, A24, A25, A26, A27, A31,
A32, A35, A42, A53, A56, A67,
A68
Características/traços de personalidade. 20
A1, A5, A7, A11, A24, A25,
A27, A31, A32, A35, A36, A40,
A49, A67, A69
Falta de competência, de autonomia e de
inteligência emocional no trabalho. 14
A1, A11, A14, A17, A25, A31,
A67
Crenças e valores pessoais arraigados. 10 A20, A24, A24, A27, A30, A42,
A68
Abuso de substâncias. 4 A1, A27, A31, A63
Conflitos/problemas pessoais ou familiares. 4 A27, A31, A36, A49
Desordens psiquiátricas. 4 A1, A14, A49, A65
Formação acadêmica. 3 A24, A42, A54
Experiências prévias com comportamento
destrutivo. 3
A32, A34, A35
ORGANIZACIONAIS
Problemas sistêmicos não resolvidos. 16 A5, A7, A32, A40, A42, A49,
A61, A68
Sobrecarga de trabalho. 13 A3, A11, A17, A18, A21, A23,
A27, A32, A42, A68, A69, A70
Cultura organizacional disfuncional. 9 A18, A31, A32, A56, A59, A61,
A68
Áreas/especialidades de alta tensão. 9 A1, A13, A23, A24, A27, A32,
A49, A54, A61
Dimensionamento de pessoal inadequado. 6 A5, A21, A42, A54, A61
Falta de suporte organizacional. 5 A11, A42, A59, A61
Demandas de atendimento dos usuários. 4 A1, A13, A42
Conflitos de papel e de poder. 3 A14, A15 A17, A31, A61
Outros. 3 A21, A25, A32, A54
INTERPESSOAIS
Comunicação ineficaz. 9 A17, A21, A25, A31, A42, A49,
A64, A68
Divergência de opiniões/pensamentos. 8 A5, A7, A11, A15, A17, A20,
A42, A59
Ausência de trabalho em equipe/colaboração. 6 A3, A5, A59, A68
Autoritarismo. 5 A18, A32, A33, A49
Questionamento de ordens médicas. 5 A22, A68
64
personalidades controladoras e agressivas, que inibem a comunicação efetiva (WALRATH;
DANG; NYBERG, 2010).
Em seguida, foram destaque os antecedentes organizacionais, os quais foram
encontrados em 68 citações dos 70 artigos analisados. Estes referem-se a sistemas, processos,
cultura ou clima que inibem as interações ou o trabalho. A ameaça organizacional mais
frequentemente identificada tem sido a elevada pressão da carga de trabalho, volume e
demanda de pacientes (WALRATH; DANG; NYBERG, 2010; WALRATH; DANG;
NYBERG, 2013).
Por último, tem-se os antecedentes interpessoais, que envolvem relações entre
duas pessoas. O uso do status para controlar outros é um exemplo (WALRATH; DANG;
NYBERG, 2010). Observou-se que apenas 33 citações abordaram tais antecedentes,
considerando os 70 artigos analisados.
Estudo afirma que médicos e enfermeiros não iniciam o dia planejando serem
destrutivos, referindo a existência de uma série de eventos profundamente arraigados, sub-
agudos e agudos que podem desencadear uma resposta destrutiva (ROSENSTEIN, 2008).
Desse modo, acredita-se que as causas de comportamento destrutivo não são
idiossincráticas e não surgem durante a noite. Em vez disso, elas tem um desenvolvimento
gradual. Porém, considera-se que as causas mais comuns de comportamento destrutivo são
intrapessoais, incluindo problemas médicos, privação do sono/ fadiga, transtorno de
ajustamento e, por último, traços/desordens de personalidade que são caracteristicamente
duradouras (SAMENOW et al., 2007).
No que diz respeito aos antecedentes intrapessoais, nesta revisão, houve
predominância de referências que abordaram o crescente estresse, as situações críticas
vivenciadas no ambiente de cuidados de saúde, a ansiedade, a fadiga e a depressão como
as principais causas relacionadas ao indivíduo que adota um comportamento destrutivo no
trabalho.
Em seguida, preponderaram as características ou desordens de personalidade
dos indivíduos destrutivos, que podem incluir desde posturas defensivas, como incapacidade
de enfrentar os outros ou assumir intenções negativas (LUX; HUTCHENSON; PEDEN,
2013); a desordens de personalidade, problemas psicológicos e narcisismo.
No que diz respeito aos antecedentes organizacionais, houve destaque para os
problemas sistêmicos não resolvidos e sobrecarga de trabalho. Em um estudo, enfermeiros e
médicos identificaram a elevada pressão da demanda, volume e fluxo de paciente; a
65
sobrecarga ambiental; e os problemas sistêmicos não resolvidos como os gatilhos
organizacionais que ocorrem mais frequentemente (WALRATH; DANG; NYBERG, 2013).
A presença de "pressão de produção", como a exigência de ver um grande volume
de pacientes, é considerado o maior contribuinte para o estresse no ambiente de trabalho
(LEAPE et al., 2012).
Desse modo, a elevada demanda de pacientes a serem atendidos em um curto
espaço de tempo e a consequente sobrecarga de trabalho, principalmente para médicos e
enfermeiros, tem configurado os maiores problemas enfrentados pelas organizações de saúde,
os quais ameaçam a segurança do paciente e favorecem a ocorrência de comportamentos
destrutivos.
O problema é ainda maior nas áreas ou especialidades de alta tensão, consideradas
antecedentes organizacionais de comportamento destrutivo. Estudioso do assunto afirma que
os eventos destrutivos são mais fáceis de ocorrer em áreas ou especialidades de elevada
intensidade, considerados ambientes de cuidado estressantes, tais como centro cirúrgico e
emergência (LEAPE et al., 2012; ROSENSTEIN, 2008); unidades de terapia intensiva; e
especialidades como cirurgia geral, cardiologia, neurocirurgia e ortopedia (BREWER et al.,
2013).
O ambiente cirúrgico, devido ao estresse inerente à cirurgia (BIGONY et al.,
2009; ROSENSTEIN; O‘DANIEL, 2008a); o ambiente hospitalar, comparado com unidades
não hospitalares (GROGAN; KNECHTGES, 2013); e os ambientes de trabalho com
interrupções frequentes (BROWN; GOSKE; JOHNSON, 2009), ou ambientes de trabalho
disfuncionais (GROGAN; KNECHTGES, 2013).
A Figura 5 apresenta uma dos problemas sistêmicos não resolvidos, conforme
discutidos pelos artigos analisados.
66
Figura 5 – Problemas sistêmicos não resolvidos segundo os artigos analisados
Fonte: Elaborada pela autora.
Dentre os problemas sistêmicos não resolvidos, estudiosos do assunto
identificaram a falta de equipamentos, de suprimentos, de itens de dieta, de horários para
procedimentos; bem como expectativas irrealísticas, medicações não entregues, falta de
confiança nos sistemas de suporte, condições de trabalho hostis ou precárias, suporte
inadequado da equipe, escalas ineficientes, dentre outros (LEAPE et al., 2012;
ROSENSTEIN, 2008; ROSENSTEIN; NAYLOR, 2012; WALRATH; DANG; NYBERG,
2010).
Quanto à contribuição de fatores conjunturais que podem contribuir para a
comunicação ineficaz e, consequentemente, resultar em comportamentos destrutivos,
ressaltam-se: pessoal inadequado (40,0%), pobres habilidades de comunicação (40,2%),
ferramentas ou equipamentos inadequados (31,4%), funções e responsabilidades pouco claras
(29,1%), atrasos de rendimento (24,0%) e problemas de escala (15,5%) (ROSENSTEIN;
NAYLOR, 2012).
Quanto aos antecedentes interpessoais, destacaram-se a comunicação ineficaz e
as divergências de opiniões e pensamentos, que geram conflitos entre os colegas de trabalho.
A questão das falhas de comunicação bem como falhas de trabalho em equipe
advindos de intimidação e hierarquia foi recentemente enfatizado pela Joint Comission,
organização acreditadora internacional. Comportamentos destrutivos ou intimidantes podem
Problemas sistêmicos
não resolvidos
Atrasos no rendimento Condições de
trabalho hostis ou precárias
Desvalorização do trabalho da Enfermagem
Problemas de escalas
Métodos tradicionais de resolução de
conflitos Pressão
para controlar
custos
Hierarquias
variáveis
Falta de cumprimento das políticas hospitalares
Pressão pela elevada demanda
de pacientes
Barreiras técnicas e operacionais
67
contribuir para erros e resultados adversos diretamente por meio da inibição de comunicação
entre os membros da equipe de saúde, diminuindo a vontade de questionar e discutir ordens e
planos de tratamento, ou dando voltas nos corredores para evitar o contato e discussões com
profissionais que adotam esses comportamentos (VELTMAN, 2007).
Lux, Hutcheson e Peden (2013) afirmam, ainda, que a má comunicação pode levar
a conflitos de personalidade, os quais resultam em comportamento destrutivo. Ou seja, a falta
geral de habilidades de comunicação efetiva pode influenciar nos demais antecedentes do
comportamento destrutivo, sendo, portanto, considerada um dos mais importantes fatores
associados.
Outros antedecentes interpessoais incluíram as críticas constantes entre
profissionais de saúde, o que torna o ambiente da prática improdutivo (HICKSON et al.,
2007), além de valores sociais e culturais conflitantes (WLODY, 2007) e da diversidade da
equipe (ROSENSTEIN, 2012). Cabe destacar que a ansiedade intrapessoal aumenta a tensão
interpessoal e leva a um comportamento destrutivo dentro das organizações (THOMAS;
HYNES, 2007).
Acrescenta-se a questão de gênero envolvida nos conflitos interpessoais,
principalmente quando se trata de trabalhadores de enfermagem.
A ocorrência de comportamento destrutivo entre os enfermeiros é frequentemente
explicada como o resultado de mulheres que trabalham juntas, tendo certos traços de
personalidade, ciúmes entre colegas, ou uma falta de respeito umas pelas outras. Autores
afirmam que tal comportamento ocorre porque enfermeiras são um grupo oprimido e
participam de comportamentos opressores. Justificam afirmando que a posição subordinada
da Enfermagem no sistema de saúde pode resultar em sentimentos de impotência que levam
enfermeiras a agirem contra outras (LUX; HUTCHESON; PEDEN, 2012).
Desde os tempos de Florence Nightingale, a Enfermagem tem sido e continua
sendo uma profissão predominantemente feminina. Felizmente, algumas das primeiras
pesquisas sobre inteligência emocional demonstra que isto atravessa a questão de gênero. Em
testes de diferentes componentes, homens ou mulheres podem marcar maior escore, que
depende do componente ou constructo que está sendo medido (LITTLEJOHN, 2012).
Alunos de enfermagem já relataram que farpas relacionados a gênero, raça ou
orientação sexual são ouvidas mais comumente em áreas de alta tensão, como a sala de
cirurgia e o departamento de emergência. Muitas vezes, estes alunos afirmaram que, quando
tal comportamento desrespeitoso era relatado, as medidas corretivas não eram aparentes,
68
enviando a mensagem de que o comportamento desrespeitoso era tolerado, se não
comemorado (LEAPE et al., 2012).
As pesquisas reafirmam que as questões de gênero influenciam nos
comportamentos inapropriados, por gerar conflitos interpessoais. Homens são
tradicionalmente orientados para a tarefa, prosperam em ter poder e controle, e quando estão
estressados, preferem trabalhar de forma independente. As mulheres são geralmente um grupo
mais orientado, são melhores em escuta e partilha, e quando estão estressadas, tendem a
procurar o consenso do grupo para apoiar o seu ponto de vista. Cultura e diversidade étnica
também desempenham um papel importante nesses comportamentos (ROSENSTEIN;
NAYLOR, 2012).
Dos 1.503 entrevistados em estudo transversal, 47% (702) disseram que o gênero
influenciou a tendência a apresentar um comportamento destrutivo. Dos 950 entrevistados que
responderam à pergunta sobre se os médicos homens ou mulheres tiveram maior tendência a
apresentar um comportamento destrutivo, 57% (543) relataram uma maior tendência em
médicos, e 2% (17) relataram uma maior tendência em médicas, e 41% (390) disseram que
sexo não faz diferença. Feita a mesma pergunta em relação aos enfermeiros, 40% (372) dos
935 entrevistados relataram uma maior tendência em enfermeiras, 7% (63) uma maior
tendência em enfermeiros, e 53% (500) disseram sexo não faz diferença (ROSENSTEIN;
O‘DANIEL, 2005).
Residentes mulheres podem ser mais prováveis de encontrar preconceito de
pacientes, membros da equipe médica e enfermeiros (BROWN; GOSKE; JOHNSON, 2009).
Reconhecer os antecedentes de comportamento destrutivo são importantes para
compreender os motivos que levam aos trabalhadores adotar condutas destrutivas, e, ainda,
para analisar o contexto de trabalho. No entanto, para a análise de conceito se faz necessário
conhecer seus consequentes.
A seguir, apresentam-se os consequentes do comportamento destrutivo segundo a
análise dos artigos inseridos na revisão.
4.2.3 Consequentes do Comportamento Destrutivo no Trabalho em Saúde
Os consequentes são eventos ou situações resultados da utilização do conceito
(RODGERS, 1989).
Embora a incidência de comportamento destrutivo no local de trabalho pode ser
baixa, tal comportamento é considerado uma força extremamente destrutiva que enfraquece a
69
moral dos funcionários, aumenta o estresse e a frustração, estimula a rotatividade de pessoal e
leva a resultados adversos para os pacientes (ROSENSTEIN; O‘DANIEL, 2005).
Nesta análise, foi possível identificar consequências de três ordens: para o
trabalhador de saúde, para o paciente e para a organização de saúde. O Quadro 4 reúne as
principais consequências do comportamento destrutivo, conforme identificado em 344
citações dos 70 artigos analisados.
70
Quadro 4 – Consequentes do comportamento destrutivo no trabalho em saúde segundo
número de referências e artigos analisados
a. Poderia haver mais de uma citação em um mesmo artigo sobre as consequências do comportamento
destrutivo para a segurança do paciente, como erros de medicação, infecção, procedimento em local errado,
morte, dentre outros.
Fonte: Elaborado pela autora.
Destacaram-se as consequências para o trabalhador e a equipe de saúde,
preponderantes nesta revisão integrativa, e encontradas em 207 citações.
No que diz respeito ao sofrimento moral e psíquico, estudo com 1500
trabalhadores de saúde e administradores de 50 hospitais, nos EUA, encontrou o
comportamento destrutivo como fator contribuinte para o aumento do estresse no trabalho e
CONSEQUENTES NÚMERO DE
REFERÊNCIAS ARTIGOS
Para o trabalhador/equipe de saúde
Sofrimento moral e psíquico: da
ansiedade ao Burnout. 48
A1, A5, A8, A11, A13, A15, A16, A20,
A21, A22, A24, A25, A32, A40, A42, A43,
A49, A52, A57, A61, A62, A67, A70
Rompimento da comunicação, da
colaboração e do trabalho em
equipe.
41
A3, A4, A5, A6, A7, A8, A9, A10, A11,
A14, A15, A18, A21, A22, A25, A30, A32,
A35, A41, A43, A48, A49, A57, A61, A64,
A67, A68, A69, A70
Prejuízos laborais: demissão,
rotatividade/mudança de unidade e
intenção de deixar o emprego.
40
A1, A5, A11, A15, A20, A28, A30, A32,
A33, A38, A42, A49, A55, A61, A64, A65,
A66, A67, A70
Hostilidade no ambiente de
trabalho. 23
A8, A14, A15, A18, A19, A21, A30,
A32, A33, A35, A41, A49, A53, A54,
A60, A64, A65, A70
Insatisfação, diminuição da moral e
do engajamento no trabalho 22
A3, A4, A5, A9, A25, A28, A30, A32,
A34, A35, A48, A49, A52, A54, A56,
A67, A69, A70
Medo, tensão, perda de foco. 18 A8, A9, A11, A13, A14, A21, A24,
A26, A32, A36, A61, A67
Afastamento/Isolamento. 15 A6, A8, A15, A21, A23, A26, A32,
A33, A52, A64, A65, A70
Para o paciente
Comprometimento da segurança do
paciente e da qualidade dos
cuidados. 73
a
A1, A3, A4, A5, A6, A7, A9, A10, A11,
A14, A15, A18, A21, A22, A25, A30, A32,
A35, A41, A43, A48, A49, A57, A61, A64,
A67, A68, A69, A70
Insatisfação. 15
A1, A3, A6, A7, A10, A20, A23, A28, A41,
A42, A43, A48, A66, A67, A68
Para a organização de saúde
Custos com processos legais,
recrutamento de novos
profissionais e tratamento de
eventos adversos.
25
A6, A8, A9, A10, A14, A21, A22, A28,
A30, A34, A41, A45, A49, A64, A66, A68,
A69, A70
Impacto na dinâmica e na cultura
organizacional. 14
A9, A17, A31, A32, A33, A43, A54, A70
Ameaça à imagem da
instituição/equipe. 10
A7, A30, A34, A52, A65, A66, A67
71
Burnout, além de influenciar fortemente a satisfação no trabalho das enfermeiras e as decisões
de deixar a profissão (ROSENSTEIN; O‘DANIEL, 2005).
Um ambiente de trabalho hostil reduz a moral, cria insegurança, e é uma das
causas de Burnout. Além disso, gera ansiedade e depressão e leva os indivíduos a se
concentrarem internamente, acentuando a auto-absorção e diminuindo a empatia e a
disposição para cooperar. Além da raiva, humilhação, vergonha e frustração que qualquer um
sente como resultado de um tratamento humilhante, os que ainda estão em processo de
formação podem experimentar sentimentos de insegurança e perda de auto-estima
(FELBLINGER, 2008; LEAPE et al., 2012).
Ressalta-se que qualquer desafio emocional durante a vida de trabalho tem um
impacto potencialmente negativo sobre o desempenho, as ações, a saúde do trabalhador e,
consequentemente, sobre a segurança do paciente (LITTLEJOHN, 2012).
Desse modo, este consequente pode ser considerado o mais relevante na análise
das repercussões do comportamento destrutivo no trabalho em saúde. Considera-se que o
sofrimento moral e psíquico tem forte impacto nos demais consequentes, formando o círculo
vicioso dos fatores envolvidos no surgimento e nas repercussões dos comportamentos
destrutivos na vida e no trabalho dos profissionais de saúde.
Pode-se afirmar que o impacto gerado sobre a moral e o estado emocional dos
trabalhadores é fator determinante para o esgotamento profissional e para a grande maioria
dos resultados adversos nos serviços de saúde, para as manifestações de insatisfação e de
hostilidade, para a busca por novos empregos e até para o abandono da profissão.
No entanto, em muitos casos os enfermeiros permanecem na categoria,
vivenciando esses problemas com frequência, mas pouco denunciando ou comentando a
respeito com seus pares ou gerentes. Casos de abandono da profissão são mais comuns entre
enfermeiros norteamericanos, conforme relatados pelos estudos dessa fase teórica.
A Figura 6 apresenta os principais prejuízos gerados pelo comportamento
destrutivo do trabalhador para a saúde organizacional, bem como para a estabilidade e o
engajamento no emprego. Estes prejuízos foram encontrados em 40 citações nos artigos
analisados.
72
Figura 6 – Principais prejuízos laborais gerados pelo comportamento destrutivo no
trabalho em saúde
Fonte: Elaborada pela autora.
O comportamento destrutivo cultiva um ambiente de trabalho hostil, aumenta o
risco de litígio e de responsabilidade compartilhada, danifica o local de trabalho ou os
colegas, e desvia recursos humanos e financeiros para longe do serviço de qualidade ao
paciente (PFIFFERLING, 2008).
Nesse contexto, o comportamento desrespeitoso tem sido abordado como a
principal causa de desejo das pessoas de deixarem seus trabalhos (GRENNY, 2009). Autora
afirma que, quando este comportamento existe no cuidado à saúde, a satisfação do paciente
cai, a rotatividade de profissionais aumenta e a prosperidade da prática ou do hospital é
ameaçada (CHISM, 2012b).
Apesar da proporção de profissionais que adotam comportamento destrutivo ser
desconhecida, independentemente do seu quantitativo, eles representam uma ameaça para a
qualidade e para a segurança do paciente (HICKSON et al., 2007). As consequências do
comportamento destrutivo para o paciente foram relatadas pela grande maioria dos estudos
analisados e encontradas em 88 citações.
O comprometimento da segurança do paciente mais relatado tem sido o aumento
da ocorrência de erros médicos, que contribuem para a menor satisfação do paciente e outros
resultados adversos evitáveis (BROWN; GOSKE; JOHNSON, 2009).
Pedido de demissão/
intenção de deixar o emprego
A4, A5, A6, A9, A10, A14, A18, A22, A25, A41, A43, A65, A67
Abandono da profissão
A6, A14, A21, A25, A43, A61, A57
Rotatividade aumentada
A3, A7, A11, A18, A21, A30, A32, A41, A48, A49, A68, A69, A70
73
Mais de 20% dos profissionais de saúde tem observado dano real a pacientes
como resultado de um comportamento desrespeitoso e abusivo entre médicos e funcionários.
Estatisticamente, a cada ano, 1 em cada 20 pacientes internados em hospitais receberá uma
medicação errada, 3,5 milhões terão uma infecção de alguém que não lavou as mãos ou não
tomou outras precauções apropriadas, e milhares morrerão por causa de erros cometidos
enquanto estiverem no hospital (GRENNY, 2009).
Destes trabalhadores negligentes, imprudentes ou que não cumprem as políticas e
protocolos organizacionais, destacam-se os médicos, enfermeiros e demais membros da
equipe de saúde que adotam comportamentos destrutivos.
Pfifferling (2008) aponta os motivos pelos quais o comportamento destrutivo
aumenta o risco de cuidados ineficazes ou abaixo do padrão:
a) O trabalho colaborativo necessário é diminuído, o que prejudica os pacientes,
especialmente ao lidar com casos complexos que exigem comunicação respeitosa;
b) Erros aumentam por causa da ansiedade em torno de comentários hipercríticos
(por exemplo, os instrumentos não estão disponíveis ou "desaparecem" para que o
médico destrutivo fique em problemas);
c) Outros profissionais de saúde se recusam a trabalhar com os pacientes do médico
destrutivo: sua contribuição é perdida;
d) Desaparecimento cognitivo (funcionários estão fisicamente lá, mas não estão
presentes) aumenta devido ao médico destrutivo.
A Figura 7 resume as consequências do comportamento destrutivo para a
segurança do paciente.
74
Figura 7 – Consequências do comportamento destrutivo para a segurança do paciente
segundo os artigos analisados
Fonte: Elaborada pela autora.
O comportamento destrutivo é uma ameaça à segurança do paciente, pois pode ter
ambos os efeitos negativos imediatos e de longo prazo sobre a vítima. Esta experimenta uma
mistura de sentimentos intensos: medo, raiva, vergonha, confusão, incerteza, isolamento,
insegurança, frustração e depressão. Estes sentimentos afetam significativamente a capacidade
da pessoa de pensar claramente, cometer um erro na tomada de decisões ou desempenho mais
provável. Além disso, a intimidação pode estimular uma pessoa a cometer um ato inseguro
(LEAPE et al., 2012).
As consequências tem efeito rebote. Erros médicos podem resultar de
comportamento destrutivo, o que leva a falhas de comunicação na equipe de cuidados ao
paciente e novas ocorrências de erros (GRAY, 2009a).
A frequência e sutileza dos comportamentos insidiosos resultam em destruição
contínua do cuidado ao paciente e das interações da equipe em todos os níveis do sistema
(ZIMMERMAN; AMORI, 2011).
Tal comportamento constitui uma violação da cultura de segurança do paciente,
pois interfere com a comunicaçao efetiva entre profissionais de saúde, e, consequentemente,
destrói pouco a pouco a prestação segura do cuidado ao paciente (BIGONY et al., 2009).
75
Nesta revisão, houve destaque, também, para as consequências para a
organização de saúde, com impacto sobre as despesas financeiras e sociais decorrentes do
comportamento destrutivo (PFIFFERLING, 2008).
Como uma das principais consequências para a organização de saúde, destacam-
se: aumento dos custos do cuidado ao paciente, custos com advogados, despesas financeiras e
sociais, risco de litígio empregado, risco financeiro e de processo (CHISM, 2012a;
FELBLINGER, 2009; GALLUP, 2006; GLUCK, 2010; GROGAN; KNECHTGES, 2013;
GUGLIELMI, 2010; HOFMANN, 2010; JACOBS; WILLE, 2012; LEIKER, 2009;
PFIFFERLING, 2008; PFIFFERLING, 1999; PIPER, 2003; ROSENSTEIN, 2002;
ROSENSTEIN, 2011a; ROSENSTEIN, 2012; SAMENOW; SWIGGART; SPICKARD,
2008; WLODY, 2007). Tais processos podem ser de ordem clínica, financeira e de reputação
pública (FELBLINGER, 2009).
Lidar com o comportamento destrutivo dos médicos é esgotador. Funcionários,
colegas, gerentes e administradores médicos e não médicos estão envolvidos em tentativas
para corrigir o comportamento. As despesas financeiras e sociais decorrem conforme o
comportamento destrutivo continua, incluindo o tempo e os custos com advogados, membros
de comitês médicos, treinadores externos, conselheiros, programas de saúde médica, e
conselhos de licenciamento. Uma enorme quantidade de esforço e despesa é frequentemente
associada a parar, neutralizar, ou corrigir o comportamento destrutivo (PFIFFERLING, 2008).
De um lado, trabalhadores eficientes em silêncio, se comunicando somente
quando estritamente necessário, com medo de retaliações ou ansiosos por mudanças, porém
com pouca força ou poder para iniciá-las; por outro lado, subculturas, grupos que favorecem a
disseminação de condutas inapropriadas e desrespeitosas, ao aceitar o comportamento
destrutivo como regra, e construindo um ambiente de trabalho hostil e inseguro.
Percebe-se, portanto, que o comportamento destrutivo tem um efeito cascata, pois
suas consequências negativas afetam tanto o indivíduo como a organização (MARTIN, 2008).
Tal conduta inibe o cumprimento e a implementação de novas práticas, e ameaça a cultura
organizacional de diferentes formas (LEAPE et al., 2012).
A seguir, apresenta-se um mapa conceitual elaborado pela pesquisadora no
programa examtime®, o qual representa os resultados da fase teórica.
76
Figura 8 - Estrutura conceitual do comportamento destrutivo no trabalho em saúde: fase teórica
Fonte: Elaborada pela autora.
RUDE/GROSSEIRO Intimidante
Hostil Abusivo
ATRIBUTOS/CONDUTAS CARACTERÍSTICAS
DO COMPORTAMENTO DESTRUTIVO NO
TRABALHO EM SAÚDE
CONSEQUÊNCIAS DO
COMPORTAMENTO DESTRUTIVO ANTECEDENTES DO COMPORTAMENTO
DESTRUTIVO
Características
77
4.3 APROXIMAÇÃO DO SIGNIFICADO
Embora não exista nenhuma definição universal de comportamento destrutivo
entre os prestadores de cuidados de saúde, várias definições comparáveis foram publicadas.
Estas geralmente incluíram abuso verbal, assédio sexual, insultos raciais, ameaças físicas e
blasfêmia (SAXTON, 2012).
Estudiosos afirmam que definições vagas de comportamento destrutivo podem ser
sujeitas a mau uso por hospitais. Apesar da Joint Comission ter descrito comportamento
destrutivo e inapropriado, a organização acreditora não estabeleceu uma definição obrigatória
de tais comportamentos. Como resultado, hospitais e equipes são capazes de construir
definições que atendam às suas necessidades (LEIKER, 2009).
A lógica do padrão de comportamento destrutivo se refere ao uso de "linguagem
grosseira" e "condutas ameaçadoras". No entanto, ambos os termos gerais podem ser
interpretados de várias maneiras diferentes (HPR, 2007).
O Quadro 5 apresenta as definições encontradas nos artigos analisados, sua
autoria e variáveis enfatizadas.
78
Quadro 5 – Definições de comportamento destrutivo encontradas nos artigos analisados,
segundo autores, ano e variáveis enfatizadas
(continua)
ARTIGO (S) DEFINIÇÃO DO CONCEITO AUTORIA VARIÁVEIS
ENFATIZADAS
A10, A12, A13,
A18, A33, A35,
A36, A37, A40,
A49, A50, A65,
A66
Qualquer conduta abusiva, incluindo o assédio
sexual e/ou outras formas de assédio, ou outras
formas de conduta verbal ou não verbal, que
prejudicam ou intimidam outros, na medida em
que a qualidade dos cuidados ou a segurança do
paciente pode ser comprometida.
American
Medical
Association
(AMA) (2002,
2009, 2012)
Manifestação do
comportamento
(exemplos)
Consequências para
a qualidade dos
cuidados e
segurança do
paciente
A11, A17, A20,
A22, A42, A43,
A48, A52, A66,
A67
Qualquer comportamento inapropriado, confronto
ou conflito – variando desde o abuso verbal
(comportamentos abusivos, intimidantes,
desrespeitosos, ameaçadores), ao assédio físico ou
sexual – que pode impactar negativamente nas
relações de trabalho, na eficácia da comunicação,
na transferência de informações, e no processo e
resultados do cuidado.
Rosenstein
(2002; 2011)
Rosenstein;
O‘Daniel
(2002, 2008)
Rosenstein;
Naylor (2011)
Rosenstein;
Russel; Lave
(2002)
Manifestação do
comportamento
(exemplos)
Consequências para
pacientes, equipe e
organização
A1
Comportamento destrutivo no ambiente médico é
definido como aquele que interfere com o cuidado
ao paciente ou que pode razoavelmente ser
esperado para interferir com o processo de
prestação de cuidados de qualidade.
Leape; Fromson
(2006)
Consequências para
os pacientes
A8
Um médico destrutivo é alguém que mina a
prática da moral, aumenta a rotatividade na prática
ou organização, tira o foco de atividades
produtivas, aumenta o risco de prática inefetiva ou
pobre, intimida ou ameaça causar dano aos outros,
e desproporcionalmente causa estresse para os
outros no ambiente de trabalho.
Pfifferling
(1997)
Consequências para
a organização
A15
Comportamento destrutivo foi definido por incluir
explosões de raiva, grosseria ou ataques verbais;
ameaças físicas; intimidação; não cumprimento
das políticas existentes; assédio sexual; ordens
idiossincráticas, inconsistentes ou passivo-
agressivas; comentários humilhantes sobre a
organização; e destruição da função regular da
equipe de saúde.
Veltman (2007)
Manifestação do
comportamento
(exemplos)
A19
Qualquer comportamento que cria um ambiente
de trabalho hostil.
OR Manager
(2005)
Consequências para
a organização
A30
Forma de prejuízo médico que tem se tornado um
foco de atenção na saúde pública devido ao seu
impacto destrutivo na equipe hospitalar, nas
instituições e no cuidado ao paciente.
Samenow;
Swiggart;
Spickard (2008)
Consequências para
pacientes, equipe e
organização
A32 É a causa raiz da cultura disfuncional que permeia
o cuidado à saúde, que dificulta o progresso em
segurança e que também é produto daquela
cultura.
College of
Physicians and
Surgeons of
Ontario;
Hickson; Pickert
(2010)
Consequências para
a organização
79
ARTIGO (S) DEFINIÇÃO DO CONCEITO AUTORIA VARIÁVEIS
ENFATIZADAS
A34
Qualquer tipo de interação interpessoal que pode
levar a um cuidado inadequado ao paciente e
impacta negativamente na habilidade da
organização de operar de uma forma ordenada
para cumprir sua missão.
Piper (2003) Consequências para
pacientes e
organização
A48
Pode ser definido de diversas formas. São
tradicionalmente vistos como comportamento
destrutivo: blasfêmia; jogar objetos; atraso crônico
ou recusa em seguir políticas; comportamento
passivo-agressivo como cair no sono em reuniões
ou não participar na discussão.
Rawson et al.
(2013)
Manifestação do
comportamento
(exemplos)
A64
É uma forma de prejuízo médico que pode
aumentar o risco de erros médicos, prejudicar
programas de retenção de enfermeiros, e às vezes
destruir a operação do hospital.
Gallup (2006)
Consequências para
pacientes, equipe e
organização
A67
É um problema impregnado e intratável que mina
a cultura de segurança para pacientes e médicos.
Esses comportamentos reduzem o trabalho em
equipe e comunicação, prejudicam pacientes,
equipe e a organização pela destruição da
confiança, do respeito mútuo, e coleguismo.
Walrath; Dang;
Nyberg (2013)
Consequências para
pacientes e
organização
A69
Bullying, incivilidade e seus comportamentos
destrutivos associados são forças destrutivas e
insidiosas com consequências negativas que
requerem identificação e intervenção ao nível
individual e organizacional.
Felblinger (2009) Exemplos e
Consequências
Fonte: Elaborado pela autora.
(conclusão)
80
Dentre as definições do conceito identificadas, foi observada uma ênfase às
consequências do comportamento destrutivo para pacientes, equipe e organização. No
entanto, os atributos, que configuram características essenciais do comportamento, não foram
abordados de forma consistente.
Assim, selecionou-se, inicialmente, uma definição mais ampla e, ao mesmo
tempo, característica do comportamento destrutivo no trabalho em saúde, para que, ao longo
da fase empírica, fosse possível abordar o problema com os trabalhadores e tentar renuir
informações relevantes favoráveis ao refinamento deste conceito na etapa final.
4.4 ESCOLHA DE UMA DEFINIÇÃO DO CONCEITO A SER TRABALHADA
Considerando as definições citadas, observou-se uma predominância de estudos
que utilizaram as referências da AMA (13) e de Rosenstein (10). Esta última foi considerada
mais clara e abrangente, por abordar não somente a manifestação do comportamento
destrutivo e seus exemplos, mas também as consequências para pacientes, equipe e
organização.
Desse modo, optou-se por trabalhar com a seguinte definição na fase de de
campo:
“Qualquer comportamento inapropriado, confronto ou conflito – variando
desde o abuso verbal (comportamentos abusivos, intimidantes, desrespeitosos,
ameaçadores), ao assédio físico ou sexual – que pode impactar negativamente nas relações
de trabalho, na eficácia da comunicação, na transferência de informações, e no processo e
resultados do atendimento”.
Esta definição foi abordada durante as entrevistas com enfermeiros, médicos e
técnicos de enfermagem, com o intuito de levantar esta problemática no contexto de trabalho
desses profissionais e selecionar um caso modelo.
A partir de então, procedeu-se à revisão dos casos relatados, bem como dos
atributos, antecedentes e consequentes do conceito, possibilitando a análise final do conceito
de comportamento destrutivo no trabalho em saúde.
82
5 ANÁLISE DE CONCEITO: FASE DO TRABALHO DE CAMPO
Esta fase visa corroborar e refinar o conceito, estendendo e interagindo a análise
iniciada na primeira fase com observações empíricas. Inclui os passos básicos encontrados em
qualquer pesquisa qualitativa que se baseia fortemente na observação, localização do cenário,
negociação da entrada, seleção de casos, coleta e análise dos dados (SCHWARTZ-
BARCOTT; KIM, 2000).
Para a escolha da abordagem e do método de investigação, considerou-se a
natureza do problema, os objetivos traçados e a questão de pesquisa. São características do
objeto de estudo: (1) uma realidade humana complexa que engloba um sistema de relações,
(2) uma estrutura dinâmica, e (3) um fenômeno de natureza comportamental e processual.
Desse modo, considerou-se que a natureza do fenômeno em estudo enquadrava-se
no método qualitativo, reconhecido por ser centrado no processo e dirigido à descoberta de
estruturas psicológicas ou sociais, de sistemas dinâmicos ou rede de relações (FLICK, 2009).
Em geral, a pesquisa qualitativa é frequentemente descrita como uma abordagem
naturalista, interpretativa, preocupada em explorar fenômenos do interior e tendo as
perspectivas e as histórias dos participantes da pesquisa como um ponto de partida (RITCHIE
et al., 2013).
São características comuns deste tipo de pesquisa: objetivos direcionados a uma
compreensão profunda e interpretada do mundo social dos participantes, aprendendo sobre o
sentido que eles fazem de suas condições sociais e materiais, experiências, perspectivas e
histórias; uso de métodos não-padronizados e adaptáveis de produção de dados, sensíveis ao
contexto social do estudo e adaptados para cada participante ou caso que permita a exploração
de questões emergentes; dados detalhados, ricos e complexos; análise que retém
complexidade e nuance e respeita a singularidade de cada participante ou caso; abertura para
categorias emergentes e teorias na etapa de análise e interpretação; produção que inclui
descrições detalhadas do fenômeno pesquisado, fundamentado nas perspectivas e nas histórias
dos participantes; e abordagem reflexiva, em que o papel e perspectiva do pesquisador no
processo de pesquisa é reconhecido (RITCHIE et al., 2013).
Além disso, na pesquisa qualitativa, os conceitos que se estudam são
desenvolvidos e refinados no processo de pesquisa. Desse modo, leva-se a sério o contexto e
os casos para entender uma questão em estudo (FLICK, 2009).
83
A seguir, estão descritas as etapas da fase de trabalho de campo e seus resultados,
segundo o Modelo Híbrido de Análise de Conceito.
5.1 ESCOLHA DO CENÁRIO
Considerando as determinações de Schwartz-Barcott e Kim (2000) quanto à
escolha do cenário, conforme exposto no referencial teórico-metodológico, decidiu-se realizar
a pesquisa em uma instituição de referência, considerada o maior hospital da rede pública
estadual de saúde do Ceará, que atende à população do Estado e, também, aos estados
vizinhos, em diferentes áreas de saúde.
Além do atendimento de emergência, nas áreas de cirurgia geral e vascular;
clínica médica, obstetrícia e neurologia; o hospital conta com 525 leitos de internação e possui
63 especialidades e sub-especialidades médicas e outros serviços de saúde – Enfermagem,
Fisioterapia, Fonoaudiologia, Terapia Ocupacional, Nutrição, Farmácia, Bioquímica,
Psicologia e Serviço Social.
É também um dos maiores centros de treinamento do país, certificado por portaria
interministerial como hospital de ensino, atuando na formação de profissionais de saúde,
incluindo 24 especialidades médicas.
Trata-se, portanto, de um hospital que possibilitou a observação do fenômeno em
análise, além da obtenção de uma perspectiva de enfermagem, conforme é requerida pelo
método.
5.2 NEGOCIAÇÃO DA ENTRADA
O projeto de tese foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do
referido hospital, sob número de protocolo: 479.384/2013 (ANEXO A).
Antes de ser encaminhado ao CEP, durante três meses (setembro a novembro de
2013), o projeto esteve sob avaliação da Gerência de Enfermagem e da Direção Geral do
serviço para emitirem um termo de anuência para a realização da pesquisa nas unidades
assistenciais. Junto ao projeto na íntegra, foi encaminhado documento solicitando a
permissão para a execução do projeto, especificando os objetivos do estudo e os riscos
envolvidos, destacando-se que os possíveis benefícios da pesquisa seriam mais amplos, como
a reflexão por parte da equipe de saúde frente às situações de seu cotidiano, possibilitando
ganho de qualidade na equipe, na instituição e no atendimento ao paciente.
84
Após autorizada a entrada no campo por parte do CEP, solicitamos nossa inserção
nas unidades assistenciais, para início das entrevistas e observações. Para cada gerente de
unidade, foi entregue uma cópia do projeto e esclarecida a intenção de não expor a instituição
e seus trabalhadores, mediante a garantia do caráter confidencial das informações, do
anonimato dos participantes envolvidos na coleta de dados, e de que tanto a instituição como
os profissionais poderiam retirar seu consentimento a qualquer momento, sem prejuízos ou
danos.
A inclusão dos participantes na pesquisa somente foi iniciada mediante a
assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) (APÊNDICE C),
elaborado em duas vias, assinado pelo trabalhador entrevistado, assim como pela
pesquisadora. Em ambas as vias, constavam o contato telefônico da pesquisadora e do CEP
local.
Também foi assegurado que as informações coletadas somente seriam utilizadas
para os fins dessa pesquisa. Respeitamos a condição humana e cumprimos todos os requisitos
de autonomia, não-maleficência, justiça e equidade, dentre as outras exigências explícitas na
Resolução 466/2012 do Ministério da Saúde (BRASIL, 2012). Segundo a referida resolução:
A eticidade da pesquisa implica em: a) respeito ao participante da pesquisa em sua
dignidade e autonomia, reconhecendo sua vulnerabilidade, assegurando sua vontade
de contribuir e permanecer, ou não, na pesquisa, por intermédio de manifestação
expressa, livre e esclarecida; b) ponderação entre riscos e benefícios, tanto
conhecidos como potenciais, individuais ou coletivos, comprometendo-se com o
máximo de benefícios e o mínimo de danos e riscos; c) garantia de que danos
previsíveis serão evitados; e d) relevância social da pesquisa, o que garante a igual
consideração dos interesses envolvidos, não perdendo o sentido de sua destinação
sócio-humanitária (BRASIL, 2012, p.3).
Convém ressaltar que os resultados aqui apresentados serão devolvidos aos
entrevistados por meio de relatórios enviados ao hospital envolvido, deixando uma cópia dos
artigos científicos resultantes da pesquisa junto à Gerência de Enfermagem. As entrevistas
gravadas e demais materiais utilizados serão guardados em arquivos específicos para esse
fim, por um período de cinco anos após a publicação desta tese.
5.3 SELEÇÃO DOS CASOS
Considerando os dados da revisão integrativa, em que se constatou uma maior
prevalência de comportamentos destrutivos nas unidades críticas (unidade de terapia
intensiva, emergência, unidades de internação obstétrica e neurológica, sala de parto, centro
85
cirúrgico, centro obstétrico, dentre outras), optamos por incluir o pessoal de saúde dessas
diferentes unidades.
Uma ênfase foi dada aos trabalhadores das unidades de terapia intensiva, devido
sua característica de ambiente crítico associado à presença de elevada tensão. Estas unidades
foram consideradas favoráveis às observações e análise do conceito de comportamento
destrutivo, pois permitem interação de diferentes atores em trabalho multiprofissional diário e
contínuo. Além disso, pelas observações, seria possível encontrar os indícios dos
comportamentos destrutivos e as suas repercussões para a segurança do paciente.
Portanto, os profissionais foram convidados a relatar experiências com
comportamento destrutivo, no intuito de levantar fatos/eventos e, após análise, selecionar um
caso modelo e um caso contrário de comportamento destrutivo no trabalho em saúde.
5.4 COLETA E ANÁLISE DOS DADOS
Conforme descrito no referencial teórico-metodológico, nesta etapa, é indicada a
combinação de observação e entrevista em profundidade (SWARTZ-BARCOTT; KIM,
2000).
Desse modo, considerou-se que, para o objeto deste estudo, a melhor abordagem
de observação seria a não-participante, tendo em vista que possibilitava uma melhor
apreensão do fenômeno comportamental, e, ao mesmo tempo, não envolveria a intervenção da
pesquisadora.
Um roteiro de observação sistemática foi elaborado (APÊNDICE D), contendo
condutas a serem observadas que correspondiam a comportamentos destrutivos, incluindo
intimidação, desrespeito, incivilidade e outras atitudes relacionadas. O roteiro abrangia, ainda,
os trabalhadores envolvidos (agentes e receptores); as consequências geradas para os
trabalhadores e os pacientes; além do período da observação, que constou dos turnos da
manhã, da tarde e da noite, em dias alternados. Os resultados do roteiro foram transcritos em
um diário de campo, o qual era preenchido a cada turno em que eram realizadas as
observações.
Antes do início das observações, era explicado aos trabalhadores (membros da
equipe médica e de enfermagem) que a pesquisadora iria passar um período na unidade
fazendo observações sobre seu processo de trabalho, a comunicação e o cuidado em saúde.
Por sua vez, para levantar os casos de comportamento destrutivo vivenciados
pelos profissionais, na prática, foi utilizado um roteiro de questões para entrevista em
profundidade (APÊNDICE E). Esta entrevista abordou o trabalho dos profissionais na
86
unidade; conflitos e dilemas do dia a dia; e a definição do conceito de comportamento
destrutivo no trabalho em saúde, em que cada participante foi solicitado a relatar sua
percepção e experiência com as características do comportamento abordado.
A entrada dos participantes no estudo foi estabelecida por conveniência. Para
responder às entrevistas, foram convidados a participar trabalhadores de saúde, incluindo
médicos, enfermeiros assistenciais e técnicos/auxiliares de enfermagem. Estes foram eleitos
pelo fato de manterem contato mais próximo com o paciente: os médicos responsabilizando-
se pela terapêutica prescrita e evolução diária; e os trabalhadores de enfermagem por
promoverem o cuidado direto e indireto nas 24 horas, intervindo e gerenciando em suas
dimensões clínicas, administrativas, sociais, ambientais, educativas ou de outras ordens.
Como critério de inclusão, participaram trabalhadores em cargo assistencial,
atuantes na instituição há, pelo menos, um ano. Este tempo foi definido por proporcionar à
pesquisadora abordar trabalhadores mais integrados ao cotidiano do serviço e, assim, em
condições de discutir e criticar o seu processo de trabalho e as relações instituídas nesse
ambiente.
Como critérios de exclusão, aqueles que estavam afastados no período da coleta
dos dados por quaisquer motivos, seja férias, atestado médico ou licenças de quaisquer
naturezas.
A coleta de dados foi realizada no período de março a julho de 2014. Ao todo,
foram entrevistados vinte e nove (29) trabalhadores de saúde, sendo onze técnicos de
enfermagem, dez enfermeiros, dois auxiliares de enfermagem e seis médicos.
Como critério para o número de entrevistas, foi utilizada a ferramenta de
saturação do tema. O roteiro investigou as experiências profissionais sobre o objeto do estudo,
bem como concepções e valores morais acerca do mesmo. As entrevistas foram gravadas e
transcritas, permitindo a leitura criteriosa do material produzido, o que possibilitou o
aprofundamento de temas que surgiam do material empírico e que se destacavam como
categorias para uma análise temática.
Assim, os textos produzidos a partir da transcrição das gravações ou dos diários de
campo foram analisados a partir da Técnica da Análise de Conteúdo Temática proposta por
Bardin (2010), definida como um conjunto de técnicas de análise das comunicações que
utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens em
três fases: Pré-análise; Exploração do material; Tratamento dos resultados, inferência e
interpretação.
87
A fase de pré-análise consiste na organização propriamente dita, momento em que
se organiza o material, escolhem-se os documentos a serem analisados, formulam-se hipóteses
ou questões norteadoras. No caso das entrevistas, estas foram devidamente transcritas e sua
reunião constituiu o corpus da pesquisa (BARDIN, 2010).
Procedeu-se, então, à preparação do material, a qual se fez pela "edição" das
entrevistas transcritas. O material foi organizado em colunas, para anotar e marcar
semelhanças e contrastes, fazendo uso da ferramenta ―cor de realce do texto‖, em arquivo do
Microsoft Word®, para sublinhar as semelhanças com a mesma cor (BARDIN, 2010).
A fase de exploração do material foi a etapa seguinte, considerada a mais longa e
cansativa. Trata-se do momento da codificação, em que os dados brutos foram transformados
de forma organizada e agregados em unidades, as quais permitiram uma descrição das
características pertinentes do conteúdo (BARDIN, 2010). A codificação compreendeu a
escolha de unidades de registro e de contexto, a seleção de regras de contagem e a escolha de
categorias. Unidade de registro (UR) é a unidade de significação a codificar, a qual pode ser o
tema, a palavra ou a frase. A frequência com que aparece uma UR denota-lhe importância.
Neste estudo, foi definida como unidade de registro a frase e, como unidade de
contexto (UC), o parágrafo. Esta, por sua vez, serve de unidade de compreensão para
codificar a unidade de registro e corresponde ao segmento da mensagem cujas dimensões
(superiores às da unidade de registro) são ótimas para que se possa compreender a
significação exata da unidade de registro.
Na transcrição das unidades de registro e de contexto apresentados ao longo dos
resultados, foram utilizados colchetes [ ] para indicação de acréscimos ou comentários que
favoreceriam a compreensão do contexto relatado (UNIVERSIDADE ESTADUAL DO
CEARÁ, 2014).
Para garantir o anonimato dos entrevistados, médicos foram codificados com a
letra ‗M‘, enfermeiros com a letra ‗E‘, técnicos de enfermagem com ‗TE‘, e auxiliares de
enfermagem com ‗AE‘, seguida de numeral arábico conforme a ordem em que foram
entrevistados.
Ressaltamos que, para a construção do caso modelo, foram atribuídos nomes
fictícios aos profissionais envolvidos no caso, garantindo a confidencialidade das
informações. Além disso, nos registros do diário de campo realizados durante a observação,
apenas foram apontadas as condutas observadas e a categoria do profissional, preservando seu
anonimato.
88
A etapa seguinte consistiu na categorização. Categorias são rubricas ou classes que
reúnem um grupo de elementos (unidades de registro) em razão de características comuns. Na
atividade de agrupar elementos comuns, estabelecendo categorias, seguem-se duas etapas:
inventário (isolam-se os elementos comuns) e classificação (repartem-se os elementos e
impõem-se certa organização à mensagem).
Por último, foi realizado o tratamento dos resultados obtidos e interpretação. Nesse
momento, ao se descobrir um tema nos dados, é preciso comparar enunciados e ações entre si,
para ver se existe um conceito que os unifique; quando se encontram temas diferentes, é
necessário achar semelhanças que possa haver entre eles. Durante a interpretação dos dados, é
preciso voltar atentamente aos marcos teóricos, pertinentes à investigação, pois eles dão o
embasamento e as perspectivas significativas para o estudo. A relação entre os dados obtidos
e a fundamentação teórica é que dará sentido à interpretação.
O Apêndice F apresenta um quadro que reúne unidades de registro/contexto
extraídas das entrevistas, apresentando uma síntese dos casos relatados pelos entrevistados,
bem como antecedentes, consequentes e características do comportamento destrutivo no
trabalho em saúde.
Para efetivação da análise de conteúdo, os dados obtidos com as entrevistas foram
processados em um software para análise de texto profissional denominado MAXQDA®.
Trata-se de um software de análise qualitativa de dados que permite avaliar sistematicamente
dados qualitativos e interpretar dados textuais por meio da análise de conteúdos. É
considerada uma importante ferramenta para a gestão do conhecimento, desenvolvimento de
teorias e para testar as conclusões teóricas de uma análise. Esta ferramenta tem sido utilizada
em diferentes disciplinas e áreas de conhecimento, nomeadamente na sociologia, psicologia,
antropologia, educação, marketing, economia, entre outras.
O software possui funções amplas e diferenciadas, combinadas com uma
visualização única e avançada disponível para os processos de codificação, memo-escrita e
navegação, contando ainda com integração com MS Office e Internet Explorer.
No que concerne à análise de texto, este software permite a transcrição direta das
entrevistas realizadas pelos investigadores que desejam associar ao seu trabalho os registros
em áudio e/ou vídeo das suas entrevistas, permitindo sincronizar o texto com o registro áudio
e/ou vídeo, facilitando o processo de análise dos dados.
A análise de dados produzida pelo programa gera diversas visualizações que
facilitam a interpretação e a formulação de conclusões, e favorece a descrição dos resultados.
89
5.4.1 Resultados
5.4.1.1 Perfil dos participantes
O Quadro 6 apresenta os dados de identificação e as características laborais dos 29
entrevistados. Estes apresentaram médias de 33,8 anos de idade; 9,8 anos de formados; 5,3
anos de tempo médio de atuação no serviço; e 44,4 horas de trabalho semanal.
90
a. SESA: Secretaria de Saúde.
Fonte: Elaborado pela autora.
ENTREVISTA CÓDIGO IDADE
(ANOS) SEXO
CATEGORIA
PROFISSIONAL
ESPECIALIDADE
TEMPO DE FORMAÇÃO
(ANOS)
TEMPO DE
ATUAÇÃO NO
SERVIÇO (ANOS)
CARGA HORÁRIA DE
TRABALHO SEMANAL UNIDADE EM QUE ATUA
1 TE1 25 Fem Téc. Enf. - 3 2 48 Terapia Intensiva
2 E1 26 Fem Enfermeira - 3 3 42 Terapia Intensiva
3 TE2 43 Masc Téc. Enf. - 20 5 48 Terapia Intensiva
4 TE3 19 Fem. Tec. Enf. - 2 1 48 Terapia Intensiva
5 E2 26 Fem. Enfermeira Saúde Pública 4 1,5 42 Terapia Intensiva
6 E3 42 Fem. Enfermeira Emergência 11 1 42 Terapia Intensiva e Emergência
7 TE4 30 Fem. Téc. Enf. - 3 3 60 Terapia Intensiva
8 TE5 28 Fem. Téc. Enf. - 8 7 30 Terapia Intensiva
9 TE6 44 Fem. Téc. Enf. - 14 6 40 Terapia Intensiva
10 AE1 46 Masc. Aux. Enf. - 22 12 60 Terapia Intensiva
11 TE7 35 Fem. Téc. Enf. - 9 4 60 Terapia Intensiva
12 E4 27 Fem. Enfermeira Obstetrícia 3 3 45 Internação obstétrica
13 TE8 41 Fem. Téc. Enf. - 18 5 36 Internação obstétrica
14 E5 24 Fem. Enfermeira Enfermagem do Trabalho 2 1 48 Emergência Obstétrica
15 TE9 36 Fem. Téc. Enf. - 8 8 48 Emergência Obstétrica
16 E6 30 Fem. Enfermeira Saúde Pública
Gestão em Saúde
5 5 54 Emergência e Internação Obstétrica
17 E7 50 Fem. Enfermeira Terapia Intensiva 30 22 20 (SESAa) Internação Clínica: Neurocirurgia e
Endocrinologia
18 AE2 44 Fem. Aux. Enf. - 16 6 30 (SESA) Internação Clínica: Neurocirurgia e
Endocrinologia/ Emergência
19 E8 32 Fem. Enfermeira Obstetrícia 5 5 45 Sala de parto
20 TE10 32 Fem. Téc. Enf. - 8 8 60 Sala de parto
21 E9 36 Fem. Enfermeira Terapia Intensiva 14 3,5 20 (SESA) Terapia Intensiva
22 M1 29 Masc. Médico residente em
Terapia Intensiva
Clínica Geral 4 3 80 Terapia Intensiva
23 M2 30 Fem. Médica residente em Clínica
Médica
- 5 1 40 Terapia Intensiva e Emergência
24 M3 52 Fem. Médica plantonista: UTI Terapia Intensiva/
Envelhecimento saudável
26 13 60 (SESA + Serviço
prestado)
Terapia Intensiva
25 M4 27 Fem. Médica plantonista: clínica
médica
Clínica Médica 5 4 72 Internação Clínica Médica e Time
de Resposta Rápida/Emergência
26 TE11 29 Masc. Téc. Enf. - 10 6 30 (SESA) Terapia Intensiva
27
E10
41
Fem.
Enfermeira
Gestão do Sistema Local de
Saúde/ Educação em Saúde
Pública/ Saúde do Trabalhador
17
10
20 (SESA)
Internação clínica:
Nefrologia/Urologia/Ortopedia
28 M5 30 Fem. Médica plantonista: clínica
médica
Clínica Médica 6 2 20 Internação Clínica Médica e Time
de Resposta Rápida/Emergência
29 M6 28 Fem. Médica Plantonista: clínica
médica
Clínica Médica 3 3 40 Internação Clínica Médica e Time
de Resposta Rápida/Emergência
Quadro 6 – Distribuição dos entrevistados segundo dados sóciodemográficos e ocupacionais. Fortaleza, CE, mar/jul 2014
91
Analisando o perfil dos estrevistados, destaca-se o predomínio de mulheres, o que
se justifica pela maioria fazer parte da categoria de enfermagem, cuja característica histórica
marcante é a de ser predominantemente feminina. Chamam a atenção, também, o vínculo
empregatício e a carga horária de trabalho semanal, em que a maioria dos trabalhadores era
cooperada e exercia suas atividades em jornadas superiores a 40 horas por semana, chegando
alguns a assumirem mais de 60 horas de trabalho.
Este é um dos aspectos a serem considerados no estudo do comportamento
destrutivo em saúde: a precarização do trabalho no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).
Esta difere sobremaneira do modelo de contratação e vínculo empregatício adotado em países
desenvolvidos, como os EUA.
Abordar esta diferença é fundamental, pois o estado da arte desta pesquisa, na fase
teórica, foi alcançado mediante a análise de estudos realizados, em sua maioria, nos EUA.
Apesar de aproximarem-se da problemática estudada sob o ponto de vista social, relacional e
organizacional, estas pesquisas não adentraram na essência das questões trabalhistas
implicadas no processo de trabalho em saúde, particularmente o brasileiro.
Quando os estudos internacionais abordavam aspectos objetivos e subjetivos do
processo de trabalho, havia um enfoque às hierarquias variáveis e ao modelo de gestão
punitiva, não considerando as variáveis como o vínculo empregatício, as condições e o
contexto de trabalho, com suas peculiaridades.
É notória a diferença da carga horária de trabalho semanal entre cooperados e
trabalhadores estáveis. Esta característica já chamou a atenção em outro estudo, em que, na
variável jornada de trabalho, foi possível identificar que 100% dos trabalhadores precarizados
assumiam carga horária semanal maior que daqueles estáveis ou efetivos. Além disso, foram
identificados trabalhadores ocupantes do mesmo cargo e atuantes num mesmo setor, porém
praticando jornadas de trabalho diferenciadas, a depender da natureza do vínculo (RIBEIRO;
SOUZA; SILVA, 2014).
A disponibilidade de oferta de mão-de-obra, associada a não ampliação dos postos
de trabalho, tem facilitado a ampliação do trabalho precário, visto que o trabalhador acaba se
submetendo às piores condições laborais como forma de garantir sua permanência no
emprego e renda (RIBEIRO; SOUZA; SILVA, 2014).
Os trabalhadores da enfermagem são submetidos a estes subcontratos, recebendo
salários bem abaixo do mercado, trabalhando em condições desfavoráveis, e sendo cobrados
sempre por mais produção. ―Como mecanismo de defesa diante das precárias condições em
que desenvolve o seu trabalho, o profissional pode passar a sentir-se orgulhoso de seu
92
trabalho, ao dar conta de suas tarefas, uma vez que o sistema reforça e reprisa a ideia de que o
trabalhador é o controlador de seu próprio processo de trabalho. Esse fato é providencial para
os gestores do sistema, pois, assim, não se discutem as próprias condições de trabalho a que
esse profissional está submetido‖ (SOUZA et al., 2014, p.249).
A acumulação flexível do capital e o neoliberalismo trouxeram estas mudanças
para o trabalho em saúde, acirrando, principalmente, a competitividade entre os trabalhadores
e aumentando a desumanização entre os pares. Os trabalhadores de enfermagem devem,
portanto, ter conhecimento acerca dos atuais cenários e relações de trabalho, para
compreender suas condições de trabalho, tentar alavancar mudanças em busca da preservação
de sua saúde e bem estar, além da constante procura da humanização de suas relações com
aqueles que recebem os seus cuidados (SOUZA et al., 2014).
Estudioso explica que a alteração dos princípios produtivos baseados no modelo
industrial possibilitou o surgimento de uma grande variedade de formas de trabalhos
assalariados, tal como se observa na área da saúde. Sendo assim, essa heterogeneidade
demarcada pela flexibilização – descentralização das unidades de produção, substituição da
força de trabalho pela utilização de novas tecnologias, subcontratação de obras e serviços,
novas formas de organização do trabalho - é responsável pela criação de novas formas de
exploração laboral (AQUINO, 2008).
Em recente estudo, as formas adotadas pelas secretarias de saúde para seleção,
contratação e remuneração dos profissionais de saúde foram associadas a um alto índice de
precarização dos serviços, perda de direitos trabalhistas e alta rotatividade. Os autores
afirmaram que a precarização pode levar ao descompromisso com a instituição e com a
qualidade da assistência prestada, com efeitos extremamente deletérios sobre os usuários. As
relações de trabalho também são precarizadas, porque os profissionais permanecem à mercê
da instabilidade político-partidária e das diferenças entre governos que se sucedem no poder,
desestabilizando, dessa forma, a natureza inovadora da reforma sanitária brasileira
(JUNQUEIRA et al., 2010).
Do ponto de vista legal, vale a pena destacar que a multiplicidade de vínculos
utilizados no interior do SUS nem sempre cumpre o que a legislação brasileira
estabelece como padrão de proteção ao trabalhador, mobilizando ações judiciais para
cumprimento desses dispositivos. O Ministério Público brasileiro tem sido vigilante
em relação a essa questão, buscando apropriar-se da dinâmica de funcionamento do
SUS por seus procuradores, para atuarem na mediação dessas e de outras questões
que integram a gestão do trabalho no SUS, na sua missão de preservação da saúde
da população brasileira, mas zelando pelo que preceituam as leis do país (BRASIL,
2007, p.25).
93
Além do vínculo, é preciso considerar que as cargas de trabalho são responsáveis
pelo desgaste emocional dos profissionais de saúde e enfermagem, e como consequência da
sobrecarga/excesso de cargas de trabalho, tem-se a ocorrência de acidentes e problemas de
saúde. Com isso, sugere-se que a prática gerencial do(a) enfermeiro(a) seja sustentada em
bases científicas para melhor fundamentar a defesa de quantitativo adequado de pessoal,
educação permanente, formulação de estratégias de promoção de melhores condições de
trabalho e de prevenção do adoecimento profissional (SCHMOELLER et al., 2011).
Este entendimento prévio do perfil laboral é imprescindível para compreender as
questões subjacentes ao comportamento destrutivo analisadas adiante, que serão discutidas
com base nos depoimentos dos entrevistados sobre o processo de trabalho, conflitos e dilemas
éticos existentes no cotidiano.
No entanto, além do perfil profissional propriamente dito, foi preciso aprofundar
as questões relacionadas ao processo de trabalho em saúde, buscando uma compreensão das
suas nuances, da estrutura hierárquica e organizacional, das culturas e subculturas existentes
no serviço, dos modos de se relacionar e de se produzir o cuidado, e, principalmente, das
condições de trabalho impostas aos profissionais.
As condições de trabalho da equipe de enfermagem, principalmente nos hospitais,
tem sido consideradas impróprias no que concerne às especificidades do ambiente gerador de
riscos à saúde. A remuneração inadequada, a acumulação de escalas de serviço, o aumento da
jornada de trabalho, as características tensiógenas dos serviços de saúde (tanto pela natureza
do cuidado prestado às pessoas em situações de risco quanto pela divisão social do trabalho),
a hierarquia presente na equipe de saúde e o desprestígio social, entre outros fatores,
associam-se às condições de trabalho da equipe de enfermagem e refletem-se na qualidade da
assistência prestada ao usuário e no sofrimento psíquico dos profissionais. Esse conjunto de
problemas tem levado diversos profissionais ao abandono da profissão, tendo como
consequência a diminuição do quantitativo de profissionais no mercado de trabalho
(MEDEIROS et al., 2006).
Posteriormente, serão abordados casos de comportamento destrutivo no hospital
analisado. Suas condutas características tem estreita relação e podem ser pensadas sob as
bases conceituais da Psicodinâmica do Trabalho. O principal mérito deste campo teórico é ter
exposto as possibilidades de agressão mental originadas na organização do trabalho e
identificáveis ainda em uma etapa pré-patológica, o que permite progredir-se na identificação
das consequências da organização taylorista do trabalho sobre o aparelho psíquico dos
indivíduos (MERLO, 2002).
94
A organização do trabalho em enfermagem ainda acompanha um modelo centrado
na tarefa, em que os profissionais dividem suas atividades com foco na produção. Desse
modo, ao receber o plantão, o enfermeiro divide a equipe de técnicos entre os que farão os
banhos e as higienes, os que ficarão com a administração de medicamentos, os outros com o
controle de materiais, dentre outras funções. Este modelo fragmenta o processo de cuidar,
despersonaliza o atendimento e enfraquece o trabalhador no desenvolvimento de suas
competências. Este se acostuma com o desempenho de tarefas extremamente técnicas e
específicas, e o fato de não realizarem cotidianamente outras atividades é utilizado, por eles,
como ―desculpa‖ para a não execução de determinadas atribuições a eles delegadas. Isto
resulta em conflitos com as enfermeiras, e pode gerar comportamentos de incivilidade e
violência psicológica, tais como encontrados na literatura.
Os enfermeiros vivenciam esse impasse diariamente. No entanto, é preciso
afirmar que muitos serviços evoluíram em seus modelos de gestão e assistência, ao longo dos
anos, adotando novas formas de produzir o cuidado, como o modelo de cuidado integral ou do
cuidado centrado no paciente. Estes modelos permitem que o trabalhador volte a sua atenção
para as necessidades do paciente, intervindo em suas peculiaridades, responsabilizando-se por
um grupo de pacientes em seu turno de trabalho, de forma integral.
Além do modelo assistencial e de gestão, inúmeros outros aspectos do ambiente
de trabalho podem implicar em favorecimento da ocorrência de comportamentos destrutivos,
os quais serão discutidos mais adiante. Portanto, precisamos nos debruçar sobre os aspectos
intrínsecos da categoria trabalho e sua psicodinâmica, para a compreensão desse fenômeno
em nossa prática.
Importa, para Dejours, conseguir compreender como os trabalhadores conseguem
manter um certo equilíbrio psíquico, mesmo estando submetidos a condições de trabalho
desestruturantes. Para o autor, o sofrimento é um espaço clínico intermediário que marca a
evolução de uma luta entre funcionamento psíquico e mecanismo de defesa por um lado, e
pressões organizacionais desestabilizantes por outro lado, com o objetivo de conjurar a
descompensação e conservar, apesar de tudo, um equilíbrio possível, mesmo se ele ocorre ao
preço de um sofrimento, com a condição que ele preserve o conformismo e satisfaça aos
critérios sociais de normalidade (DEJOURS, 1993).
A coletividade do trabalho também é característica marcante da Psicodinâmica do
Trabalho, e a reflexão sobre o processo de trabalho em saúde exige compreender que o
trabalho e o cuidado são produzidos por meio da interação frequente estre sujeitos, os quais
95
mantém e adotam diferentes formas de organização do trabalho, de assumir responsabilidades
e de estabelecer relações.
O sofrimento psíquico e moral dos trabalhadores de saúde é real, tendo sido
relatado por pesquisadores enfermeiros nos últimos anos (BARLEM et al., 2013; BARLEM
et al., 2012; DALMOLIN; LUNARDI; LUNARDI FILHO, 2009), e tem estreita relação com
o perfil histórico, social e político da categoria. Porém, sabemos que o tempo de formação, o
modelo de formação acadêmica, o tempo de serviço, a cultura, a educação prévia e outras
variáveis são fatores associados ao modo de desenvolver e de ser influenciado pelo trabalho.
Tal como evidenciado na fase teórica, este sofrimento pode ser uma consequência
de um comportamento destrutivo, mas, se não abordado dentro de um contexto, pode se tornar
um antecedente desse mesmo comportamento, que poderá ser adotado por outros
trabalhadores, de forma distinta, no mesmo ambiente laboral. A subjetividade e as
características de personalidade do trabalhador são importantes, mas as condições de trabalho
e a sua organização podem moldar, modificar e determinar o modo de agir e reagir do
trabalhador frente ao estresse, à sobrecarga de trabalho e às adversidades enfrentadas no dia a
dia.
5.4.1.2 Análise de conteúdo das entrevistas e das observações realizadas no campo
No que diz respeito ao tratamento analítico das 29 entrevistas, realizado com
auxílio do programa MAXQDA®, chegou-se a 355 unidades de registro/contexto distribuídas
nas seguintes categorias temáticas:
a) Categoria 1. Considerações sobre o trabalho em saúde: o dia a dia, os dilemas
éticos e os conflitos interpessoais (70);
b) Categoria 2. Comportamento destrutivo do trabalhador de saúde: condutas
características (casos), atributos, antecedentes e consequentes (285).
A Figura 9 representa graficamente um sistema de códigos, imagem gerada pelo
programa MAXQDA®, que permite identificar o grau de importância de cada código após
finalizado o tratamento dos dados A interpretação se dá ao identificar que, quanto maior o
quadrado, maior o grau de relevância da categoria ou subcategoria no escopo da análise.
96
Figura 9 – Sistemas de código gerados pela análise de conteúdo realizada no software
MAXQDA® e sua representatividade
Fonte: dados primários do estudo no programa estatístico MAXQDA®.
Verifica-se que houve maior distribuição de unidades de registro/contexto nos
subtópicos referente ao código Caso Modelo, que foi posteriormente categorizado com o
título de Comportamento destrutivo do trabalhador de saúde: condutas características
(casos), atributos, antecedentes e consequentes (Categoria 2).
Constatou-se, ainda, uma predominância de depoimentos a respeito dos exemplos
de comportamento destrutivo, ou seja, das suas condutas características; seguidos dos
consequentes e antecedentes. Portanto, são estes os que estão discutidos em maior
profundidade mais adiante.
A seguir, são apresentados os resultados desta fase de campo, nas duas grandes
categorias, com discussão e análise dos principais achados.
5.4.1.2.1 Categoria 1. Considerações sobre o trabalho em saúde: o dia a dia, os dilemas
éticos e os conflitos interpessoais
A propriedade simbólica do produto dos serviços está diretamente vinculada aos
significados de cada ato do processo de trabalho. Dessa forma, a compreensão que cada
trabalhador constrói, a partir da experiência vivida nele, se constitui como bem simbólico
daquele serviço. São as ―leituras‖ feitas dos processos vividos que podem ser diferentes ou
semelhantes para as pessoas participantes que as elaboram mentalmente. A propriedade
simbólica diz respeito à interpretação do trabalho no seu todo, portanto, à interpretação do
valor agregado ao serviço realizado e que, por isso, o diferencia de outro (KIRCHHOF,
2003).
Apreendeu-se, inicialmente, a percepção dos entrevistados sobre o seu processo
97
de trabalho e suas características. Desse modo, foi possível desvendar aspectos positivos e
negativos em 70 unidades de registro/contexto extraídas dos depoimentos dos participantes,
com destaque às dificuldades estruturais e organizacionais enfrentadas no dia a dia, como a
falta de recursos e a sobrecarga de trabalho, considerados antecedentes de comportamento
destrutivo, conforme evidenciado na fase teórica.
Meu trabalho é um pouco cansativo, exige muitos cuidados com os
pacientes, e é corrido, a gente trabalha direto! Não [conseguimos fazer tudo
que seria necessário], por conta de muitos procedimentos que são feitos, tipo
assim, tomografia, exames que tem no dia a dia, e a gente acaba deixando
algumas coisas de lado... [por exemplo] as mudanças de decúbito mesmo,
que a gente é para fazer de 3 em 3 horas e não dá tempo, por conta da carga
de trabalho! (TE2)
Aqui [na UTI] a gente pode realmente cuidar do paciente. A gente não é uma
enfermesa, que chamam..., a gente tem contato mesmo com o paciente, de
fazer tudo pelo paciente, assistencial mesmo! É puxado, porque, por ser um
hospital escola, são muitos procedimentos, mesmo sendo só 4 pacientes [por
enfermeiro]. Mas eu gosto, eu acho bem completo e interessante. É
gratificante para a gente, porque apesar de ser um trabalho árduo, você vê
resultados. (E1)
Eu vejo meu trabalho como uma ajuda... [mas] eu acho que, quando o
plantão está muito corrido, fica a desejar! Porque, às vezes, tem pacientes
que eles [os médicos] pedem: ah, molha a boca e tudo, e às vezes é tão
corrido que acontece de ter três traqueostomias ao mesmo tempo, passa para
um, vai para o outro, e a gente tem que auxiliar, e tem que evoluir os quatro
pacientes, tem que preparar droga vasoativa antes dela terminar. Não tem
como você parar e realmente ter aquela interação...Só na hora dos sinais
vitais, que você conversa, eu tento também toda vez que vou ao leito, tentar
fazer aquela comunicação... (E2)
Eu trabalho aqui no time de resposta rápida, prestando assistência aos
pacientes que apresentam alguma intercorrência...e também eu trabalho na
UTI daqui, então, assim, é um trabalho estressante alguns dias...a gente se
depara com muita burocracia, às vezes são coisas que vão além da nossa
capacidade de resolução, o que acaba frustrando um pouco. Mais por conta
da forma como a saúde está organizada atualmente, então são coisas que não
adianta a gente bater de frente. Tipo, se você quer internar um paciente que
você sabe que tem indicação e muitas vezes você não consegue porque a
emergência está lotada, então, assim, são coisas que [estão] além do nosso
poder administrativo e de médico e de tudo, até da parte administrativa do
hospital mesmo por conta da demanda. Então isso muitas vezes acontece
com uma certa frequência, às vezes o paciente vai a óbito, tem algum
desfecho desfavorável, que a gente sabe que não era para ter acontecido
assim, porque a demanda é muito grande, porque não se consegue assistência
a tempo para uma coisa besta, uma infecção, uma coisa do tipo, precisar de
uma abordagem cirúrgica e não é feita a tempo e o paciente vai a óbito.
Então você fica realmente com raiva do sistema, de como as coisas são!
(M6)
98
Os depoimentos apresentados retratam a complexidade do processo de trabalho no
atual contexto do SUS, agravada por uma série de questões estruturais, políticas, econômicas
e culturais que devem ser superadas para melhorar os ambientes de cuidado à saúde.
Os profissionais de Enfermagem, que representam a maior força de trabalho nas
organizações hospitalares, estão presentes em todas as fases do processo assistencial, de
forma direta ou indiretamente intervindo nos cuidados prestados ao paciente, mantendo
contato mais próximo deste durante sua permanência em uma unidade de saúde. Nesse
contexto, as nuances do processo de trabalho em Enfermagem refletem, consideravelmente,
na segurança do paciente no contexto hospitalar.
As queixas relacionadas à sobrecarga por parte dos profissionais foi constatada,
em seus discursos, ao afirmarem que o trabalho é: cansativo (TE1, TE2, M1, M4); tão corrido,
que não tem como parar! (E2); com muitos procedimentos, puxado! (E1); estressante e
frustrante (M6).
Além das evidências da prática, os meios de comunicação tem relatado as más
condições de trabalho enfrentadas pelos profissionais de saúde, além dos recursos limitados,
da superlotação e das longas esperas nos hospitais públicos, expondo o paciente a falhas na
assistência, que tem se tornado cada vez mais frequentes. Tais relatos podem alimentar a
percepção entre a população leiga a respeito dos profissionais da saúde como ineficientes
(MAGALHÃES; DALL‘AGNOL; MARCK, 2013).
A carga de trabalho enquanto ―sobrecarga de trabalho‖ interfere diretamente no
processo de desgaste laboral, tendo relação com as condições de trabalho. Ressalta-se o
crescente risco de sofrimento psíquico, devido à alta pressão social e psicológica a que estão
submetidos os profissionais tanto na esfera do trabalho quanto fora dela. As difíceis condições
de trabalho e de vida podem estar relacionadas a ocorrências de transtornos mentais, como
ansiedade e depressão (SCHMOELLER et al., 2011).
Conforme evidenciado na fase teórica desta pesquisa, a sobrecarga de trabalho foi
considerada o antecedente organizacional mais implicado na ocorrência de comportamentos
destrutivos no trabalho em saúde. Trata-se de um gatilho para inúmeros outros processos
disfuncionais e barreiras encontradas no cotidiano hospitalar, pois os profissionais, além de
trabalharem com equipes reduzidas em número de pessoal, acumulam funções e papeis muitas
vezes inconsistentes ou incoerentes com sua competência técnica.
Além disso, os enfermeiros precisam treinar, educar e supervisionar os técnicos de
enfermagem em suas atividades, além de cumprir tarefas que poderiam ser designadas a um
outro profissional que exercesse a função de secretário nas unidades assistenciais. Desse
99
modo, acumulam-se funções burocráticas, ao mesmo tempo em que os pacientes ficam sob a
―vigilância‖ e o ―cuidado integral‖ por parte de técnicos e auxiliares de enfermagem que,
muitas vezes, não detém a competência e as habilidades exigidas para um cuidado crítico,
reflexivo e cientificamente respaldado na cultura de segurança.
O tema é particularmente importante nas UTIs, devido ao impacto das novas
tecnologias no cuidado, às mudanças no perfil dos pacientes graves e às necessidades de
trabalhadores especializados, com aumento dos custos nesse setor (SCHMOELLER et al.,
2011).
Sabe-se que a sobrecarga de trabalho e o dimensionamento de pessoal inadequado
são fatores que tem estreita associação com a segurança do paciente e do profissional,
considerados temas amplamente discutidos na área da saúde, mobilizando recursos pela
Organização Mundial de Saúde (OMS) (MAGALHÃES, DALL‘AGNOL, MARCK, 2013).
Segundo alguns autores, a falta de profissionais de enfermagem no mercado, em alguns
países; a falta de qualificação e a carga de trabalho excessiva são problemas que
comprometem diretamente a segurança do paciente (O‘BRIEN-PALLAS et al., 2010;
HARLESS; MARK, 2010; NEEDLEMAN et al., 2011; INOUE, MATSUDA, 2010).
Quando a técnica de enfermagem (TE2) afirma que não há tempo suficiente para a
mudança de decúbito dos pacientes ser realizada de três em três horas, conforme preconiza os
protocolos de prevenção de lesões de pele e de úlceras por pressão, isso significa que a
sobrecarga de trabalho da enfermagem gera um risco significativo para os pacientes, os quais
podem ter seu tempo de internação prolongado, desenvolver lesões que requeiram tratamentos
de elevado custo, e até chegar a um desfecho mais negativo, como adquirir uma infecção ou
morrer.
Esta associação entre a carga de trabalho da equipe de Enfermagem e a ocorrência
de eventos adversos já foi comprovada, como quedas do leito e infecções relacionadas ao
cateter venoso central. Isto demonstra que o aumento do número de pacientes designados para
cada enfermeiro ou auxiliar/técnico de enfermagem pode aumentar a incidência desses
eventos, pois a elevada jornada de trabalho facilita a ocorrência de eventos adversos e erros
humanos ocasionados pela pressa (HARLESS, MARK, 2010; NEEDLEMAN et al., 2011).
Conforme a fala das enfermeiras, outras pesquisas também convergem com esta
questão da sobrecarga de trabalho, considerado um fator que merece ser discutido e ressaltado
no ambiente hospitalar, pois, frente às inúmeras demandas assistenciais, eleva-se a
possibilidade de ocorrência dos eventos adversos e de redução da qualidade do cuidado.
Estudo retrospectivo e observacional financiado pela Agência de Pesquisa e Qualidade dos
100
Cuidados em Saúde (AHRQ) mostrou que baixos níveis de pessoal de enfermagem foram
associados ao aumento do índice de mortalidade, o que reforça a necessidade de corresponder
o quantitativo de pessoal de enfermagem às necessidades de cuidados dos pacientes
(NEEDLEMAN et al., 2011).
Os enfermeiros, como gerentes do cuidado, precisam adotar posturas mais
protetoras de sua equipe no cenário de tomada de decisões em defesa de sua autonomia e
responsabilidade diante do paciente, assumindo uma posição política nas deliberações junto à
alta direção dos hospitais. Esta é representada por gestores da categoria médica, em sua
maioria, autoritários, ocupando o cargo por indicação política, muitas vezes sem a formação
ou o interesse na gestão pública e nos princípios do SUS.
Desse modo, nos espaços de discussão, os enfermeiros deveriam se utilizar desta
relação comprovada, na prática e nas evidências científicas, de que equipes reduzidas podem
sobrecarregar o serviço, os trabalhadores e gerar danos muitas vezes irreversíveis para os
pacientes, aumentando os custos e refletindo na imagem do serviço. Além disso, se o
ambiente de cuidados de saúde encontra-se sob a constante e elevada tensão de seus membros,
há uma probabilidade desses trabalhadores manifestarem condutas inapropriadas, que vão de
encontro às suas crenças, aos seus valores e aos preceitos éticos de sua categoria profissional.
Muitas vezes, as condutas adotadas são de incivilidade, como a recusa em ajudar
o colega de trabalho ou não cooperar com as atividades de rotina. Tais condutas podem não
ter intenção de prejudicar o colega ou o serviço, mas podem ser assumidas diante do cansaço,
do estresse físico e mental e da baixa motivação do profissional em contribuir para que as
coisas dêem certo.
Autores ressaltam que o número adequado de profissionais é indispensável para o
cuidado seguro, mas as instituições devem prover condições favoráveis de trabalhadores nas
unidades e a adequação quanti-qualitativa destes a fim de possibilitar não só menor risco para
a ocorrência de eventos adversos, como também menor incidência de agravos à sua saúde
(INOUE, MATSUDA, 2010).
A falta de profissionais nos hospitais públicos brasileiros tem gerado grandes
problemas e dificuldades para a assistência de Enfermagem, pois a elevada demanda de
pacientes só aumenta e a contratação de mais enfermeiros e técnicos de enfermagem não
acompanha essa crescente realidade, havendo sobrecarga de trabalho, prejudicando a
realização de um cuidado efetivo.
A superlotação em hospitais públicos se dá pela crescente demanda dos hospitais
de referência, como o hospital do presente estudo. A baixa resolutividade da atenção primária
101
e secundária de saúde também contribuem para esta elevada demanda. Desse modo, boa parte
dos hospitais públicos brasileiros sofrem com a falta de recursos e sentem-se obrigados a
realizar adaptações e improvisações, o que resulta em desgaste físico e psíquico para os
trabalhadores (GARLET et al., 2009).
O desgaste evidenciado nos depoimentos dos entrevistados também pode implicar
em outros antecedentes de comportamento destrutivo, assim como fora evidencido na fase
teórica: conflitos interpessoais; comunicação ineficaz; ausência de trabalho em
equipe/colaboração; autoritarismo; falta de suporte gerencial e conflitos de papel e de poder.
Trabalhadores sobrecarregados, cansados física e mentalmente, estressados e
fatigados, não se comunicando adequadamente, são mais propensos a desenvolver
comportamentos hostis no ambiente de trabalho, dos quais muitos se enquadram nos tipos de
comportamento destrutivo evidenciados na prática.
Trata-se de um círculo vicioso em que a falta de investimento na saúde e no
processo de trabalho dos profissionais implica em maior sobrecarga, estresse, erros e eventos
adversos. Estes, por sua vez, aumentam o tempo de internação dos pacientes e repercutem em
inúmeros outros indicadores estruturais e assistenciais da qualidade do serviço, exigindo
esforços contínuos de uma equipe com participação restrita no planejamento de mudanças
organizacionais.
Um outro aspecto relacionado à sobrecarga de trabalho, especialmente relatado
pelos enfermeiros, trata-se da burocracia, conforme designado como uma barreira enfrentada
diariamente na organização do processo de trabalho.
...no meu trabalho, a gente tem dificuldade como enfermeiros pela falta de
material, pela falta de pessoas...a gente não consegue fazer o que realmente é
para estar fazendo, o povo reclama: ah, você fica muito em balcão! ... mas
você tem que protocolar tudo, tem que dar conta de tudo, tem que atender
aos pacientes, tem que atender às outras categorias, tem que atender ao
telefone, tem que atender a tudo, tudo é a Enfermagem, até a parte da
limpeza é a Enfermagem que tem que resolver, tudo! Uma medicação é a
enfermeira, parte de farmácia, tudo, tudo, tudo é a Enfermagem tem que
resolver. Então assim, fica muito a desejar, porque o que era para a gente
realmente estar se dedicando, estar vendo o paciente, às vezes você deixa de
fazer, porque realmente o tempo não dá. Se tivesse uma secretária para estar
protocolando um exame, para estar encaminhando um exame, recebendo...
por exemplo, um paciente vai para a cirurgia hoje, está com um exame
pendente e, para ele não perder a cirurgia, você vai, corre atrás, telefona...já
hoje mesmo eu liguei para clínicas fora do hospital atrás de exame do
paciente que vai para cirurgia hoje, porque se não ele perderia, não iria fazer,
então assim, não deixa de ser uma ajuda ao paciente, mas não aquela ajuda
de você estar lá, né? cuidando, vendo, acompanhando o paciente em si, a
pessoa. (E7)
102
Na UTI, é um trabalho que você não pára um minuto, são muitas atividades
para os enfermeiros aqui nesse serviço. Eu acho que é até, assim, uma
dificuldade de ter qualidade da assistência por conta da quantidade de
serviço. Você não dá a assistência que é para dar, devido à burocracia que é
importante, mas ainda você tem que dar assistência porque você fica no
preparo das medicações, dos antibióticos, das drogas, é sedação, analgesia e
sai prescrição, é todos os impressos, os curativos e você tem que estar na
supervisão e ainda tem que acompanhar aluno, você tem que treinar os
técnicos porque a quantidade, a rotatividade do serviço é enorme! Então,
você não tem pessoas que já vem para o serviço com experiência, são
pessoas verdes, imaturas que vem para aprender... não vem para aprender, já
vem para trabalhar, e para trabalhar e aprender na mesma hora... e você tem
que estar em cima, porque se não os erros acontecem e a prejudicada vai ser
você, e daqui a pouco quando você treina já vão procurar outro serviço, que
tenha maior estabilidade porque aqui o serviço é cooperado, então a
sobrecarga é muito grande para o enfermeiro aqui na UTI. (E9)
É exigido muito das enfermeiras, principalmente da parte burocrática!
Assim, eu estou há uma hora e meia mais ou menos que começou o plantão e
uma hora e meia eu estava na burocracia, tentando organizar a burocracia e a
questão dos jejuns, dos exames, do senso, da ocorrência, a gente se perde
muito na burocracia e aí a assistência vai ficando um pouco de lado...mas
mesmo com essa dificuldade a gente consegue ver as prioridades dos
pacientes que estão mais graves, a gente consegue... Antes da burocracia,
visualizar o que é prioridade, chama o time, já avalia, mas eu sinto assim que
a gente poderia desburocratizar mais a Enfermagem, se a gente pudesse ter
uma secretária, uma pessoa para ficar atendendo o telefone... Porque a gente
fica como telefonista, para chamar maqueiro, chamar mensageiro, para
resolver as coisas da farmácia, a gente perde um tempo grandioso, que a
secretária poderia resolver isso, essa parte burocrática... A parte de
informação, de senso, também poderia ficar na parte de uma secretária, então
a gente poderia estar mais disponível para dar assistência ao paciente, então
na maioria dos plantões a gente não consegue fazer as evoluções de todos os
pacientes. São trinta e oito pacientes, é impossível fazer a evolução de 38
pacientes no plantão noturno, até porque é um plantão mais curto, às 22
horas eles estão dormindo, então fica a desejar a gente. Só evolui pacientes
mais crítico, com mais intercorrências... Então a gente poderia
desburocratizar mais e assistir melhor o paciente. (E10)
Os depoimentos retratam, mais uma vez, a avaliação crítica das enfermeiras
quanto ao processo de burocratização da assistência, o que gera frustração principalmente
nessas profissionais e na equipe de enfermagem. Dar conta ―de tudo‖ é uma queixa reiterada
entre as enfermeiras, pois elas acreditam que muitas tarefas poderiam ser designadas para
algum funcionário administrativo.
O papel do enfermeiro é oferecer um cuidado clínico ao paciente, ou seja, um
cuidado integral, baseado em evidências e atento à preservação da vida por meio da garantia
de segurança, bem estar e humanização para o sujeito em situação de adoecimento. Mas esse
profissional necessita de tempo, recursos materiais e condições de trabalho para conseguir
cuidar do paciente com qualidade e segurança. Estando responsável por questões que não
103
dizem respeito apenas à Enfermagem, os enfermeiros não conseguem atender às necessidades
dos pacientes, nem tampouco identificar os riscos e as intercorrências aos quais eles possam
estar submetidos, o que compromete a segurança do paciente.
Em resumo, há um paradoxo na assistência de enfermagem, pois existe, por um
lado, uma elevada demanda de pessoas a atender, em sua maioria graves e necessitando de
uma atenção mais individualizada, e, por outro lado, enfermeiros pouco disponíveis para este
cuidado por absorverem questões técnicas e operacionais.
É preciso considerar, nesse contexto, que a organização dos serviços de saúde
depende, em maior grau, do ambiente sociopolítico. Seu quadro de funcionamento é regulado
externamente à organização e está exposto à contaminação burocrática, fator importante no
estabelecimento de limites, por exemplo, ao desempenho gerencial, quando a norma a que
ficam submetidos os trabalhadores é emanada do poder público para o poder público em geral
(BRASIL, 2007).
Se, por um lado, o conhecimento informal da burocracia é importante, é desejável
também a aquisição de conhecimentos específicos para a superação dos entraves burocráticos
da administração pública e para o desenvolvimento e a adoção de processos de trabalho mais
ágeis, eficazes e eficientes (BRASIL, 2007).
A realidade declarada pela enfermeira E7 é a mesma encontrada na grande
maioria dos hospitais brasileiros. Enfermeiros correndo contra o tempo para localizar exames,
solicitar medicamentos atrasados à farmácia, contactar o serviço de limpeza para a higiene de
um leito, chamar a manutenção para trocar uma lâmpada quebrada, ou um equipamento com
defeito, dentre outras inúmeras tarefas que poderiam ser desempenhadas por um funcionário
da instituição designado, especificamente, para estas funções.
Durante as observações, esta problemática foi claramente observada. Enfermeiras
mal entravam nas enfermarias para ver seus pacientes, pois a intensificação do trabalho era
real, e isto implicava na adoção de comportamentos destrutivos, conforme constatado durante
a observaçãos em uma unidade de internação da clínica médica:
Enfermeira fala em voz alta: ―Não sei para quê tanto exame se não tem onde
colocar na folha [de solicitação]!‖. Em seguida, a funcionária do laboratório responde em
voz alta, do corredor: - ―Ei, a culpa não é minha não, não reclame!‖. A enfermeira responde
que sabe e que vai reclamar no laboratório.
Quando a enfermeira se queixa sobre a folha de solicitação de exames,
percebemos a impaciência desta profissional com o trabalho realizado. Ela queixava-se, de
forma estressada, sobre o quantitativo de exames a serem solicitados, mas que não daria para
104
transcrevê-los em uma folha apenas. Na verdade, ela estava se queixando do trabalho que
teria ao precisar de mais de uma folha de solicitação para registrar todo o pedido de exames
deixado pelo médico.
Percebe-se o estresse envolvido na origem desse comportamento, o que leva à
reflexão sobre a existência de um possível desinteresse dessa profissional pelo objetivo final
de seu trabalho: o cuidado ao paciente. Pois, se o paciente necessitava dos exames, esperava-
se que médico e enfermeira reunissem esforços para garantir que eles fossem realizados,
independentemente de haver espaço ou não na folha de requisição. Compreendemos que a
intensificação do trabalho pode gerar esta conduta manifestada pela enfermeira, mas é preciso
repensar atitudes e práticas em torno de um cuidado mais humano e comprometido.
É necessário refletir, portanto, sobre as questões envolvidas na intensificação do
trabalho na saúde, que corresponde ao aumento da intensidade da atividade em um mesmo
período de tempo.
Trata-se de um conceito que vem ganhando relevo no contexto do trabalho
precarizado e relaciona-se ao sujeito que trabalha e não aos meios e instrumentos laborais. O
desempenho avaliado não incide sobre o maquinário, mas sobre o trabalhador, em seus
aspectos físicos, intelectuais e psíquicos. Essa noção é essencial à categoria intensidade, pois
se refere à maneira como o sujeito realiza seu trabalho, e ao dispêndio de energia envolvido
na atividade (LIMA; BARROS; AQUINO, 2012).
É no âmbito da atividade que o processo de intensificação se expressa, pois cabe
ao trabalhador, ou aos seus superiores, regular os efeitos da ampliação da complexidade ou do
aumento do número de tarefas a serem realizadas na mesma unidade temporal por uma
mesma pessoa ou equipe (LIMA; BARROS; AQUINO, 2012).
Ou seja, neste atual contexto de intensificação do trabalho, uma estratégia que
poderia ser adotada pela enfermeira seria tentar desenvolver seus próprios métodos para lidar
com as atividades atribuídas, organizar o seu processo de trabalho, apesar da mesma
reconhecer que muitas atividades não são prioritárias. Para isto, são necessários autonomia e
tomada de decisão.
Por um lado, temos um trabalhador desgastado, que, diante da sobrecarga física e
mental, não utiliza sua criatividade e capacidade de resolução de problemas para lidar com o
enfrentamento de entraves simples, como a solicitação de um exame. Por outro lado, temos
líderes pouco implicados na mudança desse contexto de trabalho disfuncional, com pouca
compreensão dos efeitos negativos da organização e do ambiente de trabalho para a saúde e
satisfação do profissional e, consequentemente, do paciente.
105
A relação entre a intensificação e a estipulação de metas nas organizações é direta
e penosa ao trabalhador. Isso porque, em muitos casos, são estabelecidas metas praticamente
inatingíveis, fazendo com que o trabalhador utilize toda a sua capacidade física, intelectual,
emocional para alcançar o objetivo proposto. Ressalta-se que o estabelecimento de metas é
apresentado ao sujeito como um desafio a ser cumprido, e o fracasso desta meta resulta na
culpabilização do indivíduo (LIMA; BARROS; AQUINO, 2012).
Observou-se, ainda, que mesmo tentando resolver alguns problemas nas
prescrições, as enfermeiras se deparavam com a pouca colaboração dos médicos, em
realmente assumir suas responsabilidades nesse aspecto. O registro do diário de campo
representa esta afirmação:
Em certa ocasião, uma enfermeira chamou um médico (residente) para falar sobre
alguns erros na prescrição dele. Ele se aproximou, ela começou a falar que estava faltando a
folha de controle de medicamentos de alto custo, e, enquanto ela falava, ele respondia e pedia
que ela falasse rápido pois ele estava em visita. E, ao mesmo tempo que a enfermeira falava,
ele ia andando para trás e evitando a conversa. A enfermeira continuava a falar e o médico
andando... Ela disse que estava tudo errado, que tinha outras coisas para ajeitar, ele disse que
ia ajeitar tudo, entrou na sala de prescrições e fechou a porta. Alguns minutos depois, o
médico saiu com uma folha na mão e entregou à enfermeira, que disse que ainda estava
faltando a folha que ela havia dito e ele saiu andando enquanto ela falava e do corredor disse:
ah, então peça a outra pessoa! E foi embora...
Percebemos que a burocracia deixa as enfermeiras frustradas e pode impedir que
suas habilidades de criatividade, tomada de decisão, comunicação e liderança sejam
praticadas. Cobrar do médico as funções que cabem somente a eles, como prescrição e
solicitação de medicamentos, é mais uma atividade absorvida pelas enfermeiras, o que se
manifesta como um conflito de papeis e pode ser outro fator motivador de comportamentos
destrutivos.
A partir daí, as enfermeiras ficam insatisfeitas, desmotivadas, podendo,
consequentemente, desenvolver um comportamento destrutivo e favorecer a consolidação de
um ambiente de trabalho hostil, conforme evidenciado nos seguintes registros do diário de
campo:
Enfermeira olha as solicitações de exames e vê que tem solicitação de cultura de
ponta de cateter para um paciente. Ela pergunta à técnica se está prescrita a retirada do cateter
no prontuário do paciente, e a técnica responde que não tem na prescrição. Então a enfermeira
106
conclui: ―Se não está prescrito, então não vou fazer esse exame, não vou tirar esse cateter
sem prescrição!‖. E joga a folha do exame de lado...
Em outro momento, uma enfermeira recebe uma bolsa de plaquetas para
administrar em um paciente, aproximadamente às 10 horas e 40 minutos. Quase uma hora
depois, ela ainda não havia ido até o paciente administrar a bolsa de plaquetas, que ficou em
cima do balcão do posto de enfermagem, em temperatura ambiente. A médica que solicitou a
transfusão, apareceu, em seguida, e avisou que tinha pedido duas bolsas, 1 para ―agora‖ e
outra para o momento do procedimento. A enfermeira disse que ia instalar ―agora‖, mas não
foi. Ficou escrevendo a evolução de alguns pacientes...
Observa-se o desrespeito dessas enfermeiras com o paciente e com a organização.
A primeira decide por não realizar o procedimento no paciente simplesmente por não constar
na prescrição, apesar de estar com a solitação em mãos. Questionamos se ela não poderia
entrar em contato com o médico responsável para saber o motivo de não haver deixado
prescrito no prontuário. Portanto, a decisão tomada por esta enfermeira, que agiu de forma
incivil, repercutiu no paciente, que não teve seu procedimento realizado, além do que
favoreceu a ocorrência de novas condutas inapropriadas, tendo em vista que a enfermeira é
exemplo para sua equipe e, diante de comportamentos assim, as técnicas podem considerar
tais atitudes normais e manifestarem comportamentos semelhantes, favorecendo o desrespeito
às rotinas e ao bem estar organizacional.
Por sua vez, a segunda enfermeira ignora a necessidade de instalar a bolsa de
sangue em tempo hábil, para que não fosse perdida a estabilidade do hemocomponente, bem
como para que o paciente fosse hemotransfundido de forma segura. Percebemos uma atitude
desrespeitosa e não profissional, ainda, quando esta mesma enfermeira prefere manter-se
sentada escrevendo as evoluções dos pacientes, ao invés de assumir a responsabilidade da
administração do hemocomponente que somente cabe ao enfermeiro, na referida instituição.
Esta crítica ao processo de trabalho do enfermeiro nos leva a refletir sobre a
mudança nos modelos assistencial e gerencial. Urge a necessidade de um trabalho mais
centrado no paciente, integral, com profissionais treinados e formados adequadamente para
trabalhar em equipe, comunicando-se e compartilhando tarefas em consonância com objetivos
comuns, estabelecidos também em equipe. Esta colaboração só é permitida mediante a
reformulação dos processos de trabalho e com base em um modelo de gestão mais flexível,
em que haja maior garantia de autonomia do enfermeiro na efetiva execução dos seus
específicos papeis e maior responsabilização da equipe médica diante de suas reais
atribuições.
107
Quando uma inovação gerencial é implementada em determinada organização,
seu sucesso depende não só de seu desenho técnico, das normas instituídas ou da vontade dos
dirigentes, mas das condições que estes adquirem para conduzir processos produzidos pelas
interações entre pessoas concretas, os membros das organizações. Entender os caminhos — e
descaminhos — desses processos implica, ao mesmo tempo, entender como essas pessoas
concretas pensam e agem, seus valores, representações e práticas. Neste sentido, a abordagem
dessa dimensão simbólica, cultural, permite a identificação de parte dos fundamentos
subjetivos que orientam comportamentos no cotidiano organizacional, vinculam-se a
problemas concretos relativos aos processos de gestão e condicionam a produção dos
indicadores de eficiência, eficácia e qualidade (VAITSMAN, 2001).
A intenção de um melhor atendimento aos pacientes foi, portanto, percebida em
grande parte dos discursos dos entrevistados, mas, na prática, enfrentam-se sérios entraves
estruturais, organizacionais e comportamentais. As relações precisam ser mais horizontais,
trabalhadores necessitam se articular melhor em um trabalho interdisciplinar que favoreça um
cuidado mais seguro e satisfatório para ambos: paciente e profissional.
Autores afirmam que o investimento da qualificação do pessoal de saúde está
relacionado à oferta do melhor atendimento para os pacientes, devido à relação entre a
percepção dos trabalhadores de saúde e seus comportamentos no trabalho (YEPES-BALDÓ;
ROMEO; BERGER, 2012). Tal relação é considerada, hoje, aspecto fundamental para a
efetivação da segurança nas organizações de saúde (RONDEAU; WILLIAMS; WAGAR,
2009).
Nessa perspectiva, alguns entrevistados abordaram o ―lado positivo‖ do processo
de trabalho, considerando aspectos como responsabilidade e gratificação pelo trabalho
desempenhado. Por sua vez, estes aspectos podem favorecer a prevenção de que
comportamentos inapropriados e não profissionais surjam no dia a dia de trabalho.
Podemos constatar a relevância e a satisfação atribuídas ao trabalho nos
depoimentos a seguir:
Eu costumo avaliar que o meu trabalho é muito importante! Ele é de suma
importância para a continuidade da assistência, porque eu planejo, eu
executo, eu oriento. Então assim, nada entra, nada sai, sem que passe pelas
mãos do enfermeiro, desde um exame a uma alta, uma admissão, então tudo
tem que passar por nós. Nada acontece aqui que o enfermeiro não esteja
ciente. É como se eu fosse porta de entrada e porta de saída para finalizar
todo e qualquer procedimento realizado aqui na unidade. Eu acho que,
apesar das dificuldades que todos temos nos hospitais, não só aqui, mas
assim, no geral, eu acho que dá para realizar sim. Aqui nós temos bastantes
materiais para estar trabalhando, uma vez ou outra que falta alguma coisa,
mas é esporadicamente, então eu acredito que sim. (E3)
108
Eu acho que é um trabalho de complementariedade, sabe, é muita
responsabilidade, mas é como se fosse a maior articulação, o eixo central, se
não tiver o enfermeiro não tem articulação, auxiliar com o médico, não tem
tanta ação como também com o paciente, é como se fosse o centro.... (E5)
No hospital, a gente trabalha aqui já há algum tempo como cooperada e
como concursada. Por ter uma maior estabilidade, a gente acaba tendo uma
maior segurança e isso reflete no trabalho, né? Então a gente se tornou mais
segura ao longo do trabalho... Com relação ao ambiente de trabalho, a gente
tem um bom relacionamento entre a equipe, eu não tenho nenhum problema
com os profissionais, às vezes a gente encontra um mau relacionamento com
alguns profissionais da área médica, isso é uma coisa que já é crônica, a
gente não tem um bom relacionamento com a maioria, com alguns deles, e o
que tem de avanço na unidade melhorou bastante o trabalho da gente... E
com relação à equipe de enfermagem, eu já trabalho aqui há mais tempo,
antes como cooperada, eu já estou aqui há mais de dez anos no hospital, a
gente tem um bom relacionamento no hospital com a equipe como um todo,
com a chefia também e é muito prazeroso, é muito gratificante trabalhar
aqui, eu gosto muito! Quero passar o resto da minha vida aqui, quero me
aposentar, realmente não penso em sair, mesmo no concurso, quando a gente
foi chamada eu tive oportunidade de escolher outro hospital e não quis,
geralmente por ser um hospital escola, ter essa oportunidade de estar
aprendendo também, a gente sempre tem cursos, tem congressos, tem
jornadas, tem oportunidades, sempre assim... (E10)
Verificamos, nos depoimentos das enfermeiras E3 e E5, o quanto ambas
valorizam o principal aspecto da assistência de enfermagem hospitalar: a continuidade do
cuidado e a presença constante na assistência ao paciente. Diferentemente das queixas
anteriores, estas enfermeiras já veem o aspecto positivo de que nada sai nem entra sem o
conhecimento e a articulação do enfermeiro.
No discurso da enfermeira E10 identificamos o grau de satisfação com o trabalho,
apesar do relacionamento com a equipe médica não ser o mais satisfatório. A enfermeira
deixa clara a sua motivação para permanecer trabalhando na instituição, o que tem relação
com a satisfação com o trabalho desempenhado, com a chefia e com o aprendizado contínuo
que recebe da organização.
Diversos fatores contribuem para melhorar o nível de satisfação dos
trabalhadores, tais como a estabilidade no emprego; as condições de infraestrutura; a relação
chefia-funcionário; a capacitação técnica; a relação interpessoal entre os colegas de trabalho;
e a oportunidade de crescimento e segurança na organização. Dessa maneira, a questão da
satisfação do trabalhador é fundamental para o desempenho das atividades realizadas na
organização.
A partir daí, pode-se refletir sobre a relação entre profissionais satisfeitos e a
preservação de um ambiente de trabalho mais saudável e seguro. Acredita-se que esses
109
trabalhadores podem atuar como barreiras à hostilidade e à intimidação, pois controem um
empoderamento e uma autonomia profissional que servem como auto-proteção para colegas
que venham a demonstrar comportamentos destrutivos ou atitudes intimidantes, incivis e
violentas.
É preciso, portanto, investir na satisfação dos trabalhadores de saúde. Sabe-se que
as organizações que investem no desenvolvimento de seus trabalhadores podem ser capazes
de reduzir a rotatividade de profissionais e demais problemas relacionados à gestão de pessoas
por meio da criação de condições que, de forma mais eficaz, desenvolvem e utilizam seus
recursos humanos (RONDEAU; WILLIAMS; WAGAR, 2009).
É imprescindível, portanto, valorizar a abertura para o encontro entre o
profissional de saúde, o usuário e sua rede social, como liga fundamental no processo de
produção de saúde; reorganizar o serviço a partir da problematização dos processos de
trabalho, de modo a possibilitar a intervenção de toda a equipe multiprofissional encarregada
da escuta e da resolução do problema do usuário; elaborar projetos terapêuticos individuais e
coletivos com equipes de referência em atenção diária que sejam responsáveis e gestoras
desses projetos (horizontalização por linhas de cuidado); e promover mudanças estruturais na
forma de gestão do serviço, ampliando os espaços democráticos de discussão e decisão, de
escuta, trocas e decisões coletivas (BRASIL, 2009).
No que diz respeito aos dilemas éticos e conflitos interpessoais vivenciados no
ambiente de trabalho, os trabalhadores revelaram os conflitos de papeis, a falta de colaboração
entre os colegas de trabalho, a falta de reconhecimento e as condutas inapropriadas no
trabalho:
O meu maior dilema, o meu maior conflito é exatamente esse: de querer
mudar algumas atividades aqui que são exercidas pelo enfermeiro que eu
acho que deveriam ser realizadas pelo auxiliar; e a chefia imediata não achar
que deve ser assim. (E9)
Você tem um paciente ali, como foi o caso da emergência, deu o maior
conflito! Paciente tava passando mal e eu chamei o médico por duas vezes,
mas ele tinha que atender outro paciente que também estava complicando.
Para ele era difícil né? E o chefe de equipe não foi muito atencioso, porque
ele como chefe poderia sair lá da cadeirinha dele e vir prestar assistência
àquele paciente ou então chamar um outro médico né?! (AE2)
Já vi discussões, uma [auxiliar] pede para [a outra] fazer uma coisa, [e a
outra diz:] você não manda em mim, então ... aí vira aquela briga, aquele
conflito. (E6)
110
Enfermagem é completar o serviço do outro. Quando é plantão, você
encontra muitos casos de problemas na prescrição, alguma coisa do tipo, que
vem do plantão passado, então fica aquele clima chato entendeu? É a questão
mesmo de complementar, de continuidade, o diálogo...acaba que você vai
falar e o profissional não entende, você tá falando ali não como uma
reclamação, mas seria uma crítica que no final acaba sendo construtiva. Hoje
cheguei no plantão e tinha uma paciente para fazer um procedimento
cirúrgico desde o dia [da admissão], e não tinha o material na hora da
cirurgia, aí isso gera um conflito, você tenta explicar, por exemplo eu
procuro não colocar nada no livro, eu procuro falar com o colega justamente
para não passar para a chefia, mas mesmo assim ainda tem algumas que não
tem problema se desculpam, mas outras não, o principal problema é o colega
que não consegue aceitar uma crítica. (E5)
Eu acho que seria mais assim em relação à mudança constante da rotina.
Tipo, um dia o serviço está funcionando de um jeito, com uma rotina. No
outro dia que você chega, é a mudança constante de rotina. Como eu sou
cooperada, a gente fica até um pouco sem voz. Não adianta a gente colocar
nossas ideias, ou então opinião, porque normas são normas! (E4)
Questão de conduta mesmo, com o paciente. Há muitas vezes entre
enfermeiros e técnicos, que a gente sabe que tem que fazer uma coisa e eles
[os técnicos] continuam dizendo que não vão fazer. Então muitas vezes a
gente tem que tomar a frente e fazer. E também questão que a gente discute
de uma forma profissional com os médicos, algumas condutas que eles vão
fazer, que a gente acha que não vai ser benefício para o paciente, a gente
chega para eles e comenta, discute, e eles dão o ponto de vista deles e a
gente dá o nosso. E isso algumas vezes gera conflitos. (E1)
Verifica-se que os conflitos tem origens e características diferentes, abrangendo
desde condutas desrespeitosas, como não realizar as tarefas atribuídas ou aceitar a crítica
construtiva de um colega; a comportamentos mais preocupantes, como discutir com o colega
na frente dos pacientes, o médico que não reuniu esforços para atender ao paciente da
emergência, dentre outros.
Esta queixa de quebra na continuidade da assistência é maior entre os membros da
equipe de enfermagem. No entanto, sabemos que a coletividade é a essência do cuidado de
enfermagem, e sem esta compreensão as pessoas replicam práticas individualistas,
fragmentadas e alienantes. Nesse contexto, cabe ao enfermeiro evitar a reprodução destas
condutas negativas, já que é de sua competência legal coordenar as atividades realizadas pela
equipe de enfermagem. Além disso, estes problemas repercutem em posturas inadequadas e,
até no negligenciamento do cuidado aos pacientes (AMESTOY et al., 2014).
A dificuldade do trabalhador em dar continuidade às ações da equipe que o
precedeu também emergiu, em outro estudo, como problema no ambiente hospitalar. Deixar
alguma atividade para outro horário, tornando-se frequente, é visto como falta de
111
comprometimento e responsabilidade, negligenciando o bom andamento das atividades de
enfermagem, e por consequência, o cuidado prestado (AMESTOY et al., 2014).
Em outra pesquisa, que abordou a psicodinâmica do reconhecimento no contexto
dos trabalhadores de enfermagem, constatou-se que estes tem um nível de responsabilidade
que transcende as horas normais de trabalho, assumindo também as responsabilidades de
outros e levando preocupações para casa, para além dos muros do hospital. Assim, os
pesquisadores inferiram que a questão afetiva que atravessa o trabalho na enfermagem é
repleta de contradições, pois a doação ilimitada para o outro pode trazer efeitos nocivos para
sua própria saúde (TRAESEL; MERLO, 2009).
Os problemas relatados e evidenciados, na prática, além de trazerem efeitos
negativos à saúde do trabalhador, tem interferência direta na satisfação com o trabalho e, por
consequência, gera conflitos, dificultando o exercício da liderança e interferindo na qualidade
do cuidado. Destaca-se, ainda, que a sobrecarga de trabalho costuma gerar cansaço e exaustão
no profissional e pode levar a situações extremas como o descuidado ao paciente,
problemática importante no gerenciamento do cuidado.
Pensar os dilemas éticos do trabalho significa, outrossim, enfrentar situações
embaraçosas, qualquer que seja o campo de atuação profissional. A verdade é que o dilema
nos coloca diante da dificuldade de escolher a solução ideal, diante de um raciocínio que parte
de premissas contraditórias e mutuamente excludentes, em relação a uma determinada
situação, ambas ingratas ou mesmo contárias ao nosso sentir. Daí a importância de
construirmos uma cultura ética no cotidiano do exercício profissional para não nos perdermos
pelo viés do utilitarismo. Neste, decidem aqueles que tem o poder de decisão, tem autonomia
sobre outros que vivem à margem, terminando por ser penalizados. Na sociedade em que
vivemos, com profunda desigualdade social, cresce e se fortalece um cenário desumano, do
descuido e do abandono (GERMANO, 2013).
―O conflito existe. Ele é inerente às relações sociais e está presente o tempo todo
nos diversos aspectos da vida (familiares, sociais e organizacionais)‖ (SPAGNOL;
L‘ABBATE, 2010, p.822).
Analisar conflitos de forma coletiva não é tarefa fácil, visto que se trata de
questões que dependem da situação em foco, das pessoas envolvidas e do contexto em que
essa situação ocorreu. Assim, são vários os fatores que interferem nesse processo complexo e
dinâmico das relações interpessoais, sendo necessário investir na formação dos futuros
enfermeiros e demais profissionais de saúde de forma a capacitá-los a lidar com essas
situações (SPAGNOL; L‘ABBATE, 2010, p.822).
112
Os conflitos e dilemas éticos emergem das ações humanas que vão de encontro
aos princípios, normas ou regras de comportamento de uma determinada comunidade. No
momento da decisão, os indivíduos se vêem defronte a opções desejáveis ou não, e esta
situação pode causar dúvida e desconforto, especialmente, quando a decisão é tomada. Vale
ressaltar que a solução encontrada pode levar a novas situações conflituosas (OLIVEIRA,
2011).
Em busca de compreender os significados de conflitos e dilemas éticos
vivenciados pela enfermeira, em sua prática profissional, pesquisadora encontrou o dilema do
argumento de sentimento moral como o mais expressivo, seguido de conflito de esforço,
conflito de interesse e conflito de consciência. Compreendeu-se, portanto, que elas
expressaram ambiguidade, quanto aos significados do fenômeno; os conflitos são intrínsecos
à prática profissional e gerados devido a dificuldades no relacionamento interpessoal; o
ambiente de trabalho é estressante; há desgaste da equipe; há deficiência de recursos e leitos
de unidade de terapia intensiva, além do desrespeito à autonomia da enfermeira (OLIVEIRA,
2011).
O dilema ético ocorreu diante de escassez de recursos; demanda de paciente;
atitudes não-éticas de profissionais na assistência. Concluiu-se que, embora com dificuldade
para reconhecer os conflitos e dilemas éticos, as enfermeiras tomam decisões, e essas são
fundamentadas na moral e na bioética. Ao fazê-lo, procuram manter o equilíbrio emocional da
equipe e a harmonia no ambiente de trabalho (OLIVEIRA, 2011).
É preciso considerar esta conjuntura do processo de trabalho revelada pelos
trabalhadores entrevistados, pois favorecem a compreensão dos fenômenos, das situações e
dos casos de comportamento destrutivo no trabalho em saúde.
Pode-se apreender, previamente, que o contexto estudado revela trabalhadores
capazes de criticar e refletir sobre o seu processo de trabalho, comunicando a respeito de seus
dilemas e conflitos e vislumbrando mudanças estruturais e relacionais no seu ambiente
laboral. Para tanto, ainda se fez necessário conhecer como o comportamento destrutivo se
manifestava nesse cenário, a fim de que o constructo pudesse ser melhor analisado e
compreendido.
113
5.4.1.2.2 Categoria 2. Comportamento destrutivo do trabalhador de saúde: condutas
características (casos), atributos, antecedentes e consequentes
Dos 29 entrevistados, a maioria (22) descreveu alguma situação vivenciada ou que
já havia ouvido falar a respeito do comportamento destrutivo no trabalho.
Após relatarem os casos (exemplos de condutas destrutivas) que permitiam
identificar os atributos do comportamento destrutivo, os entrevistados eram indagados sobre
suas causas (antecedentes) e consequências (consequentes). Estes resultados encontram-se
sintetizados no Apêndice F, que permite um melhor entendimento da situação relatada.
A seguir, apresentam-se os resultados relacionados às variáveis de análise de
conceito estudadas, todas apreendidas das entrevistas, em que os participantes realataram
casos de comportamento destrutivo vivenciados na prática.
5.4.1.2.2.1 Condutas características e atributos do comportamento destrutivo no trabalho em
saúde
A Tabela 4 reúne os exemplos de condutas destrutivas relatadas pelos
entrevistados, os quais foram encontradas em 89 unidades de contexto (UC) e distribuídas
dentro dos padrões dos três atributos que emergiram na fase teórica: Incivilidade, Violência
Psicológica e Violência Física/Sexual. Cabe destacar que os entrevistados relataram várias
histórias e diferentes condutas de comportamento destrutivo adotadas por colegas de trabalho.
Em muitas vezes, os casos relatados apresentaram tanto condutas características de
incivilidade quanto de violência psicológica.
114
Tabela 4 – Atributos e condutas características de comportamento destrutivo relatados
pelos entrevistados. Fortaleza, CE, mar-jul 2014. n=29
a. poderia haver referência de mais de uma conduta em cada entrevista.
Fonte: Elaborada pela autora.
Enquanto que, na fase teórica, as condutas mais características de comportamento
destrutivo foram de violência psicológica, na fase de campo os entrevistados descreveram
casos reais vivenciados no trabalho, em que a maioria das condutas destrutivas foi
característica de incivilidade, identificadas em 59 unidades de contexto.
Dentre estas condutas, aquela mais característica do comportamento destrutivo,
segundo os participantes, principalmente os membros da equipe de Enfermagem, trata-se da
recusa em executar tarefas atribuídas ou exibir atitudes que não cooperam durante as
atividades de rotina, conforme evidenciado nos depoimentos: ―Tem gente individualista, que
não ajuda o outro, principalmente na equipe de enfermagem.‖ (TE4)
Assim, todos os meses a gente pega um par diferente, uma parceira diferente,
aí geralmente, a gente gosta de todo mundo, mas tem umas pessoas que a
gente fica por ficar, aí às vezes a gente tem alguns [conflitos]. Gente que
gosta de trabalhar só, individual, sozinha. (TE7)
Assim, comigo foi mais a história de [colegas] não ajudarem. Porque você
entra, você precisa de ajuda, e aí eu fui falar para ela [a chefe] que eu não
tava aguentando... (E2)
Alguém quer mostrar que não precisa do outro, que quer trabalhar só...tem
algumas técnicas, auxiliares que parecem não querer aceitar, não ajudar na
hora que o outro precisa. Eu acho o pessoal um pouco desunido! (TE8)
ATRIBUTOS/CONDUTAS CARACTERÍSTICAS f (%)
Incivilidade
Recusar-se a executar tarefas atribuídas ou exibir atitudes que não cooperam durante as
atividades de rotina.
Manifestar comportamento antiético.
Desrespeitar o colega de trabalho.
Praticar uma gestão punitiva, autoritária.
15 (51,7)
10 (34,5)
9 (31,0)
7 (24,1)
Descumprir normas, rotinas e protocolos organizacionais. 6 (20,7)
Gerar discussões conflituosas. 6 (20,7)
Agir com negligência. 3 (10,3)
Totala 59
Violência Psicológica
Intimidar. 14 (48,3)
Agir ou falar com grosseria/gritar. 13 (44,8)
Humilhar o colega de trabalho publicamente. 1 (3,4)
Arremessar objetos, instrumentais ou prontuários. 1 (3,4)
Totala 29
Violência Física ou Sexual
Abusar fisicamente. 1 (3,4)
Total 1
115
O conflito mais frequente é quando um dos membros da equipe não
compreende qual é o seu papel no cuidado do paciente. A gente precisa de
um exame, o técnico do laboratório foi jantar e o outro, que não está no
horário, acha que, como não está no horário dele, ele não tem que vir! (M4)
É o desrespeito com o trabalho do próprio colega! Muitas vezes o colega não
respeita o trabalho do outro, quer encostar, quer assim, por acaso você
trabalha de uma forma e a pessoa quer que seja dessa forma, dela, da pessoa,
não respeitando o colega... (TE6)
Não tem acolhimento à noite, então elas [as técnicas de enfermagem da
noite] não fazem parte das oficinas, não acompanham, então é um
crescimento que para quem tá no dia e ver a paciente dizer que é um
atendimento bom, que as pessoas são atenciosas, é bom para quem está no
dia, mas para quem está a noite é indiferente, ajudar então, desconstruir o
que foi feito, para ela [técnica da noite], é indiferente. (E5)
As falas apontam para uma problemática real visualizada no ambiente de trabalho
em saúde e, particularmente, no contexto hospitalar: a falta de colaboração com o colega de
trabalho. No dia a dia hospitalar, a indisponibilidade de um trabalhador para ajudar ou
colaborar com as atividades de rotina se manifesta como um desrespeito e implica na
fragmentação do trabalho em equipe, gerando um desconforto para todos os envolvidos no
processo de cuidar.
Cabe ressaltar que esse tipo de conduta pode ser identificado como
comportamento destrutivo do tipo incivilidade, mas é preciso ressaltar que pode ter ou não a
intenção de prejudicar o colega de trabalho ou a organização. Às vezes, o fato de um
trabalhador não ajudar o colega pode ser justificado pela sobrecarga ou pelas inúmeras
atividades que precisam dar conta em um curto espaço de tempo. Mas os relatos mostram a
insatisfação dos trabalhadores, principalmente da equipe de enfermagem, quando não obtém a
ajuda dos colegas em situações realmente necessárias, como os banhos, as higienes, as
mudanças de decúbito dos pacientes, dentre outras, que somente podem ser realizadas por, no
mínimo, duas pessoas.
Auxiliares e técnicos de enfermagem precisam desenvolver a habilidade de
trabalhar em equipe, e esta pode ser influenciada pelos enfermeiros, que são os líderes dessa
equipe e os responsáveis pela organização da unidade, distribuição das tarefas e elaboração da
escala diária de atividades.
Quando não há condições de trabalho favoráveis, nem um modelo de gestão
flexível, enfermeiros não conseguem administrar o tempo e as funções básicas que o
competem, o que implica em dificuldades de supervisionar e contribuir com o melhor
desempenho dos técnicos de enfermagem.
116
O não seguimento de rotinas ou protocolos também é uma característica de
incivilidade, conforme evidenciado na literatura, e também constatado na observação. O
registro do diário de campo revela a atitude incivil adotada por uma enfermeira ao saber que
participaria de um treinamento em serviço:
Chega à unidade uma comissão de médicos para fazer uma simulação do
Protocolo de Sepse. Eles iriam testar o tempo de resposta da farmácia e do laboratório a uma
chamada da unidade. O médico explica para a enfermeira que é uma simulação e o que ela
deve fazer. A enfermeira pergunta em quanto tempo ele quer que tudo termine. O médico
responde que em, no máximo, 1 hora. A enfermeira ri e pergunta onde está a varinha mágica
dele para fazer essa mágica acontecer...
A atitude da enfermeira pode ser pensada sob diferentes pontos de vista.
Dependendo do relacionamento dela com o colega médico, esse tipo de comentário poderia
não ser interpretado de forma negativa e não ter influenciado no desenvolvimento do trabalho,
pois poderia ser visto como uma ―brincadeira‖. No entanto, acreditamos que atitudes como
esta vão de encontro à ética profissional, podendo dificultar a adesão da equipe ao protocolo e
repercutir, negativamente, nos pacientes. Esse comentário pode demonstrar, ainda, a má
vontade da enfermeira em contribuir para que novos protocolos fossem implementados,
característica comum da incivilidade no trabalho, e citado em vários estudos da fase teórica.
Portanto, é preciso estabelecer as bases para o trabalho em equipe, para a ajuda
mútua e para um ambiente de trabalho interdisciplinar, em que os diferentes trabalhadores,
independentemente da formação, consigam se articular em torno de um trabalho profissional,
que atenda aos objetivos da organização, mas que sejam realizados sob condições favoráveis,
o que inclui um quantitativo suficiente de trabalhadores, escalas mais flexíveis, estrutura
física e material suficiente para atender à demanda em qualidade e quantidade.
O reconhecimento da necessidade de formação direcionada ao trabalho em equipe
não ocorre de forma linear com todas as profissões. Pesquisa revelou a existência de alguns
profissionais, especificamente da categoria médica, que apesar de buscarem sua capacitação
contínua, não se mostram sensíveis ao exercício do trabalho em equipe. Os discursos
sinalizaram que o trabalho em equipe ainda não ocorre como desejado, mas tem no processo
de formação uma possibilidade de avanço em sua prática e na proposta de novas formas de
fazer (DUARTE et al., 2012)
Autores justificam afirmando, ainda, que as universidades formam,
separadamente, profissionais que necessitam trabalhar juntos. Nessa perspectiva, há
necessidade de se redirecionar a formação inicial, colocando em questão os modelos e valores
117
a serem construídos. Para atender a esta reorganização, pautando-se pela ética nos processos
de intervenção, é necessário construir e re-construir os processos de trabalho e competências
profissionais, integrando a formação à realidade dos serviços da comunidade com a presença
de todos os profissionais necessários na equipe (AGUILAR-DA-SILVA; SCAPIN;
BATISTA, 2011).
O principal aspecto positivo da atuação em equipe é a possibilidade de
colaboração de várias especialidades que denotam conhecimentos e qualificações distintas.
Esse mesmo aspecto, entretanto, pode dificultar a compreensão mútua e a possibilidade de
uma tarefa uniforme, pelas diferenças próprias de cada área, tanto em nível do conhecimento
em si, como da própria tarefa (AGUILAR-DA-SILVA; SCAPIN; BATISTA, 2011).
Estudando o comportamento desrespeitoso de médicos, pesquisadores
evidenciaram o comportamento passivo-agressivo como uma modalidade de desrespeito
profissional, que inclui recusar a cumprir tarefas ou fazê-las numa intenção de incomodar os
outros. Indivíduos passivo-agressivos saem de seu caminho para fazer os outros parecerem
mal, fingindo inocência, não obedecem/seguem acordos, e deliberadamente atrasam em
responder a chamadas, cobrindo os atrasos com desculpas. Eles costumam fazer comentários
negativos sobre sua instituição, hospital, grupo ou colegas. As características definidoras de
agressão passiva são raiva oculta, negativismo, e intenção de causar dano psicológico
(LEAPE et al., 2012).
Outra conduta característica do comportamento destrutivo, citada pelos
entrevistados, diz respeito ao comportamento antiético, conforme se verifica a seguir:
[Auxiliares de enfermagem] ficam conversando sobre a vida pessoal, e aos
poucos, ficam passando uns para os outros, e isso acaba atingindo a equipe
todinha. (TE1)
Tem determinados auxiliares de enfermagem que às vezes ficam falando
alto, e falam coisas que não devem, até nós médicos mesmo às vezes em
visita médica fica comentando caso do paciente na frente dele, ele fica
escutando, às vezes a gente não se dá conta que isso não deveria acontecer...
(M3)
Tem profissionais e profissionais, os com muito compromisso e outros sem
compromisso. Então assim, indigna a gente chegar em um plantão e saber
que o paciente teve uma falha na assistência por uma simples
irresponsabilidade do profissional, que o plantão estava calmo, mas
simplesmente ela estava no whatsapp conversando... (E10)
A postura não profissional pode ser evidenciada em diferentes contextos de
trabalho, pois tem relação com crenças, cultura, educação, formação acadêmica e valores
118
construídos ao longo da vida. Em oposição à postura desrespeitosa e não-profissional, no
ambiente de trabalho em saúde, as dimensões intrínsecas incluem a atenção, a empatia e a
disponibilidade para o atendimento aos usuários dos serviços. Mas, nos serviços hospitalares,
o que se tem percebido é uma despersonalização do trabalho humano, desempenhado por
indivíduos cujo ideal ético encontra-se perdido ou esquecido.
Tais posturas também foram evidenciadas durante as observações, conforme
registros do diário de campo: técnica de enfermagem lendo revista no horário do trabalho;
técnica de enfermagem falando sobre assuntos pessoais no telefone da unidade; técnicas de
enfermagem reunidas em torno do celular de uma delas, olhando fotos e fazendo comentários
sobre a foto [―muito bonito!‖]...
Ainda foi observado, em um plantão diurno na UTI, durante a passagem de
plantão, uma médica plantonista utilizando o celular de modo a interferir o trabalho. À beira
do leito, a médica participava da passagem de plantão, mas se afastava do grupo e não
prestava atenção na passagem, enviando e respondendo mensagens no celular, sorrindo e
interagindo com o aparelho telefônico. Como consequências, pode-se pensar que esta
profissional perdeu informações relevantes sobre o paciente, e os demais colegas perceberam
sua falta de interação, o que pode repercutir no desenvolvimento do trabalho da equipe como
um todo.
A falta de ética no ambiente de trabalho pode não ser reconhecida como um
comportamento inapropriado ou não receber a atenção merecida, caso a organização favoreça
a adoção de comportamentos indesejáveis, não abordando os profissionais com a seriedade
necessária.
A perda da ética conduz ao fracasso técnico e prático, podendo engendrar a
violência (transformando sujeito em objeto), em função da dependência e legitimidade do
saber e prática envolvidos (AGUIAR; D‘OLIVEIRA; SCHRAIBER, 2013).
O comportamento ético se origina das estruturas psicológicas profundas, que são,
em parte, uma predisposição e, em parte, resultado de um cultivo. Quando nos comportamos
eticamente como cuidadores, não estamos obedecendo a princípios morais – embora,
certamente, eles possam guiar nosso pensamento -, mas estamos nos reunindo ao outro em
encontros em que há compromisso e há escolha (NODDINGS, 2003).
Nesse sentido, a falta de ética favorece os casos de desrespeito, conforme se pode
ver a seguir:
119
O comportamento assim que eu mais abomino aqui são dos cirurgiões,
porque eles não respeitam a Enfermagem. Não adianta nenhuma informação
que a gente passe para eles, que parece que não tem importância nenhuma!
Eles se sentem acima de tudo e de qualquer coisa, não sei porque eles tem
essa postura. Desprezam o trabalho da gente da Enfermagem. (E3)
Estudo sobre sofrimento moral na enfermagem encontrou resultado semelhante.
Este sofrimento estava mais associado ao enfrentamento de situações diretamente
relacionadas ao modo de agir de alguns médicos, o que pode estar ligado à percepção de um
aparente descaso e indiferença frente às queixas e manifestações referidas pelos pacientes, à
demora nos atendimentos às solicitações das enfermeiras, a ausências e falta de
comprometimento com a integralidade da atenção, prescrições médicas incompletas, com
erros e/ou atrasadas (BARLEM et al., 2012).
Outros depoimentos representaram o desrespeito entre os membros da equipe de
enfermagem:
Eu tive um problema com uma [auxiliar da noite]. Fui fazer uma transfusão,
aí calculei o gotejamento em horas [e disse:] olha daqui a tantas horas você
pode pedir a segunda bolsa [de sangue]. [E ela respondeu]: olha, eu vou
trazer e vou instalar, e eu: você não vai instalar, quem instala bolsa de
sangue é o enfermeiro; e a técnica: eu instalo até no plantão da chefe, porque
que eu não instalo no seu? eu disse: instale no dela, mas no meu você não
vai instalar, entendeu? Tem essa questão, aí ela diz: eu tenho mais tempo do
que você aqui, e se acha! As meninas da noite são assim, se eu digo: eu não
quero Antibiótico em vinte [ml] de soro, mas elas fazem... (E5)
[As auxiliares da noite dizem assim:] eu não vou receber o plantão, eu vou
trocar de roupa, vou comer... e a auxiliar do dia esperando [para passar o
plantão e ir embora], entendeu? (E5)
Assim, [exemplo de comportamento destrutivo envolve] a questão de
receber o paciente ou não. A enfermeira lá embaixo [na emergência] decidia
quando ela ia receber o paciente, ela queria decidir que paciente vinha, o
médico falava uma coisa e ela decidia por outra, entendeu? Por algum
motivo assim que ela acha que é a chefe do serviço. (M2)
[Comportamento destrutivo] tem relação com a chefia impor, dizer: olha é
assim, pronto acabou, trabalhe com o que tem, dessa forma e fique calada! É
a falta de respeito com o colega que exerce a mesma função que a sua só que
ele tem um cargo de chefia que eu acho que são coisas que tem que ser
explicadas de uma forma mais tranquila e não com agressão, com falta de
respeito... com autoridade a pessoa se sente mais... (E9)
O desrespeito sistêmico também foi abordado pelos estudos analisados na fase
teórica. Acredita-se que existe uma tolerância aos comportamentos inapropriados e ao
desrespeito na sociedade contemporânea, como se o ser humano estivesse se acostumando a
viver em um ambiente hostil, dentro e fora do trabalho. Essa tolerância manifesta-se no fato
120
de considerar que tais atitudes são normais, inerentes à pessoa desrespeitosa, acreditando que
não há o que fazer.
Este desrespeito foi observado no comportamento adotado por um maqueiro na
unidade de internação da clínica médica, quando uma enfermeira solicitou que levasse um
paciente urgente para um exame. A médica do paciente reforçou que era urgente e que ela
mesma iria acompanhando o paciente. O maqueiro respondeu que não tinha cadeira de rodas
disponível e a enfermeira perguntou se poderia, então, levá-lo em uma maca. Ele respondeu
que não tinha nem maca nem cadeira. A médica perguntou, então, se não poderia levar o
paciente na sua própria cama, pois o exame era realmente urgente, e o maqueiro perguntou:
por que é tão urgente? e disse que não ia levar na cama, ia procurar por uma cadeira... [Recusa
pedido da médica e da enfermeira].
Vê-se que a postura do maqueiro é desrespeitosa mas, ao mesmo tempo,
imprevista, pois, na prática, é incomum ver esses trabalhadores questionarem as atividades a
eles delegadas. Em geral, respeitam as normas do serviço e atuam como colaboradores no
processo de trabalho em saúde, apesar de não serem profissionais desta categoria.
No entanto, essa atitude desrespeitosa pode revelar um comportamento de
retaliação por parte do maqueiro, ao enfrentar em seu cotidiano as dificuldades de falta de
instrumentos básicos de trabalho, como a cadeira de rodas ou a maca para o transporte de
pacientes, sua única atribuição. Ou seja, remete-se à problemática da organização e das
condições de trabalho e de suas repercussões para o comportamento dos trabalhadores.
Em outra perspectiva, pode-se pensar que o maqueiro agiu dessa forma porque
estava sobrecarregado e sob pressão das inúmeras chamadas das unidades assistenciais, o que
não justifica, mas pode ter relação com a adoção de comportamento destrutivos.
Acrescenta-se, ainda, à reflexão exposta, a banalização da injustiça, quando o
sistema organizacional produz e agrava as desigualdades, fazendo com que as injustiças
pareçam boas e justas (DEJOURS, 2001). Segundo o autor, há uma tolerância social cada vez
maior com as injustiças sociais, os sofrimentos infligidos a outrem em nossas sociedades. Esta
tolerância não resultaria somente da resignação dos indivíduos ou de um sentimento de
impotência diante de processos que julgam inevitáveis, mas funcionaria também como defesa
contra a consciência dolorosa da própria cumplicidade e responsabilidade no agravamento da
adversidade social.
Além disso, as estratégias de defesa contra o próprio sofrimento psíquico também
podem tornar tolerável o que o autor denomina ―sofrimento ético‖ – entendido como o que o
121
sujeito pode experimentar ao cometer, por causa de seu trabalho, atos que condena
moralmente (DEJOURS, 1999).
O desrespeito sistêmico manifesta-se por meio desta aceitação do desrespeito
como algo estabelecido e inerente às características do sistema de saúde. Os hospitais
demonstram falta de respeito com os enfermeiros e outros trabalhadores quando eles não
conseguem garantir a sua segurança física, tomando as medidas adequadas para evitar
ferimentos, como acidentes com agulha e tensão nas costas. O fato de que estas são muitas
vezes aceitas como riscos do trabalho ilustra até que ponto a falta de respeito é
institucionalizada em hospitais (LEAPE et al., 2012).
Paralelamente ao desrespeito sistêmico, alguns entrevistados citaram profissionais
cujas condutas eram manifestadas pelo abuso de poder, ao praticarem uma gestão autoritária e
punitiva:
Agora recentemente umas colegas foram advertidas, de assinar advertência,
porque elas estavam fora da unidade e o chefe não queria saber porque elas
estavam lá. Elas estavam lá porque o rapaz do raio X disse ―tá na hora do
raio X‖, e elas saíram da unidade pra não receber uma radiação. E, por conta
disso, o chefe deu uma advertência assinada, que eu acho errado. (AE2)
Teve uma vez que estava faltando um manguito para um doente. Todo
paciente em terapia intensiva cada um tem seu manguito, o seu monitor, tudo
separado. Aí quando eu cheguei no plantão, estava um manguito sendo
usado para dois pacientes, tirava de um e daqui a pouco puxava no outro...Aí
eu fui direto na pessoa responsável, minha superior, falar que não tinha
condições daquele jeito, tinha que ser providenciado um manguito da forma
correta. Aí ela disse: não, mantém desse jeito mesmo! Não tem, pronto e
acabou! Aí a gente tem que aceitar aquilo ali e trabalhar daquela forma, sem
ser da forma certa, a pessoa chega e impõe a autoridade dela. (E10)
Tem uma enfermeira que eu acho que ela é assim agressiva, fica prestando
conta de tudo, querendo mostrar serviço, assim, geral... (M2)
Estava faltando médico na UTI e o chefe, o coordenador atual da UTI, se
posicionou de uma maneira que eu não concordei. O médico plantonista já
estava há mais de 36 horas de plantão, chegou a hora de ele sair, mas tinha
um colega que tinha saído de férias, todo mundo sabia e o coordenador não
providenciou ninguém para ficar no lugar dele. Aí quando o colega
plantonista disse que ia embora e ia deixar o plantão com o residente que é
capaz, que também é plantonista, é intensivista, o chefe não concordou e
disse que o médico seria obrigado a ficar no plantão. Isso é uma coisa
incoerente! Ninguém em sã consciência obriga ninguém a dar mais de 36
horas de plantão, nem 24 horas a gente poderia!... Também vejo muita
pressão da chefia da enfermagem com os auxiliares. 99% dos que são
subordinados a ela [chefe] reclamam. (M3)
122
Essas manifestações de gestão autoritária e punitiva também foram visualizadas
durante o período de observação, principalmente entre a chefia e os ―subordinados‖ em uma
unidade de internação, como se lê nos registros do diário de campo:
Chefe de enfermagem veio ao posto e perguntou para duas técnicas sobre uma
troca de plantão, chamando a atenção das duas na frente de todos no posto de enfermagem, e
usando um tom de voz elevado.
Chefe de enfermagem, ao mexer no computador do posto de enfermagem, disse
em voz alta: - Isso aqui tá errado!! [instrumento de passagem de plantão]. Em seguida,
reclamou com um funcionário [secretário] e disse que ele tinha que dar um jeito naquele
instrumento, pois a palavra ―mobilidade‖ não deveria estar numa linha sozinha. O secretário
respondeu que já havia tentado mas não conseguia. E a chefe respondeu em tom de voz
elevado na frente de todos: - Tem que dar um jeito. Vamos gastar papel até sair do jeito que
eu quero! [E bateu a mão com força na bancada].
Enfermeira chefe falava alto com todos, inclusive com os membros da equipe
médica. Queixava-se de todos e da unidade como um todo [desorganização]. Abria portas e
gavetas em busca de identificar falhar/erros. Se reportava a todos com arrogância. Aparentava
gerar intrigas na equipe, sempre chamando os trabalhadores para responder pelos ―erros‖
identificados. A maioria relacionada à guarda de material e à organização da unidade.
Vê-se que a maior parte das atitudes desrespeitosas era adotada pela chefe do
serviço, uma enfermeira rude, que adotava inúmeras condutas características de
comportamento destrutivo no trabalho, tais como: usar poder para gerenciar; intimidar a
equipe médica e de enfermagem; criar um ambiente de medo; dominar ou controlar os outros
por posição; fazer ataques verbais altos; gritar; promover blasfêmia e romper com a harmonia
da equipe.
Esta vigilância hierárquica se constitui num jogo de olhares que se efetua na rede
de relações múltiplas e entrecruzadas, mesmo quando a organização possui uma forma
piramidal, como num hospital de ensino, de forma que se instituem “fiscais perpetuamente
fiscalizados”. Os efeitos de poder desta vigilância hierarquizada se realizam de forma
integrada, ou seja, ela se insere na essência da prática seja no ensino ou na produção, como
um mecanismo que, tornando-se inerente a essa prática, multiplica sua eficiência (SOUZA,
1998).
Particularmente na Enfermagem, o processo gerencial, como meio para a
efetivação da assistência, é realizado privativamente por enfermeiros, que participam nos
órgãos decisórios institucionais, reproduzindo a política institucional de produtividade,
123
utilizando como instrumento a hierarquia e o autoritarismo. Esses processos expõem os
trabalhadores de enfermagem a cargas de trabalho, que são obstáculos para a saúde (ROCHA;
FELLI, 2004).
Autores acrescentam que a ação de controlar exerce um caráter punitivo, atribui
autoridade e poder, pois os enfermeiros possuem a necessidade profissional de controlar como
parte de exercício de suas ações, em seu processo de trabalho (VAGHETTI et al., 2004).
Nesse sentido, em estudo de etnoenfermagem, foi possível identificar situações de
autoritarismo, de humilhações e ofensas a que esses trabalhadores ainda são submetidos pelas
chefias, optando por se calar, por não dialogar ou tentar o consenso, por medo de serem
penalizados (DALMOLIN; LUNARDI; LUNARDI FILHO, 2009).
É preciso ressaltar que o poder pode ser utilizado de forma positiva quando
beneficia a todos, mas seu abuso, no caso da Enfermagem, pode oprimir os trabalhadores a
ponto de prejudicar o cuidado aos pacientes. Os profissionais de enfermagem devem
compartilhar esse poder no processo de empoderamento das pessoas, não para dominá-las,
coagi-las ou controlá-las (RIBEIRO et al., 2011).
As possibilidades de transformação estão postas em novas formas de organizar o
trabalho, privilegiando o desenvolvimento das quatro dimensões da gerência, no
exercício gerencial. Para tal, torna-se imprescindível a adoção de processos mais
participativos de gestão e o investimento em educação continuada centrada na
emancipação dos sujeitos. A gerência, pela forma como se insere no processo de
trabalho de enfermagem, incorpora tanto obstáculos para a melhoria da saúde dos
trabalhadores como detém possibilidade de transferência dessa realidade (ROCHA;
FELLI, 2004, p.458).
Enquanto as mudanças não ocorrem, o cenário de punição, desrespeito e
hostilidade é perpetuado, podendo surgir os casos de violência, a qual vem sendo manifestada
no contexto laboral de diferentes formas: física, sexual ou psicológica.
A violência é favorecida pelo ambiente no qual não existem regras internas, nem
para os comportamentos nem para os métodos; tudo parece permitido. O poder dos chefes não
tem limites, assim como o que pedem aos subordinados. Quanto mais uma organização é
hierarquizada, mais forte é a dependência e mais aumenta o risco de assédio moral. Em
consequência, o que aparece claramente é que, se um dirigente ou alguém da direção tem
atitudes perversas, isto provocará comportamentos perversos ao longo de toda a escala
hierárquica. Os relacionamentos perdem as regras, e todas as atitudes passam a ser permitidas.
O sistema torna-se então perverso por ele mesmo, uma vez que não existe um padrão ético de
conduta (CLDF, 2008).
124
Na categoria violência psicológica, houve destaque para as condutas
características de intimidação e assédio moral:
Tem um caso aqui de uma auxiliar de enfermagem pegar o prontuário
daquela paciente, que [outra auxiliar de enfermagem, novata] estava
responsável, olhar, bater foto para ver o erro e mostrar para a chefia. Fotos
de trabalho, de procedimentos que ela fez errado. Então ela espalha para
todo mundo. Então o que que acontece... É uma falta de postura enorme! E o
pior: a colega que errou tinha mais de anos de experiência e, a outra, cinco
meses de enfermagem na vida! E influenciar toda a equipe da noite... A
pessoa trabalhar sob pressão, sair de casa e saber que vai ser vigiada 24
horas... As meninas [mais antigas] cismaram com ela. (TE10)
Antes tinha muito conflito, principalmente na emergência... Era assim, muito
estresse, muito estresse mesmo, de colegas... Agredir, assim... Até mesmo o
modo de falar, quando por exemplo, se tivesse um colega que estava
chegando, não tivesse segurança para fazer [o procedimento], uma
experiência maior...Aí chegava e falava assim: você não sabe fazer isso?!...É
muito tempo te agredindo! (TE6)
Tinha a lei do silêncio. Toda semana ela [a chefe] determinava uma pessoa
para fazer a lei do silêncio: não pode conversar! Aí, assim, ela colocava a
gente uma contra as outras! Ela [a chefe] trabalhava em forma de ditadura!
(E4)
Gritos, intimidação, repreensão tem quase todo dia, né? E ser repreendido
pelos próprios colegas da enfermagem mesmo, da sua própria categoria né?
De uma coisa que não foi dado continuidade, de um erro e um senso, de
alguma coisa desse tipo... (E7)
Tem caso aqui de três funcionários que iriam sair do hospital porque, por
ocasião da avaliação que é feita [de desempenho], a chefia julgou muito
abaixo do [padrão]... por motivos pessoais, deu uma nota inferior e isso
gerou problema para eles. Os problemas daqui geralmente são [entre]
auxiliares de enfermagem e a chefia deles. E a chefia direta. Seriam
devolvidos para a secretaria de saúde porque não atingiram o perfil, mas não
foi... Foi assim, injustamente, porque na verdade eles eram capazes e foi
mais uma questão pessoal. (M3)
A intimidação envolve comportamentos ativos ou passivos que intencionalmente
infligem danos psicológicos ao alvo. Desse modo, os depoimentos supracitados são retratos
da intimidação no hospital em estudo, sendo necessário lembrar que os trabalhadores
entrevistados não exerciam suas atividades na mesma unidade.
A intimidação no trabalho em saúde também foi abordada por diversos estudos na
fase teórica, destacando-se condutas características desse tipo de agressão psicológica:
a) Usar força ou poder para gerenciar (CHISM, 2012b);
b) Dar muita responsabilidade sem supervisionar adequadamente (LUX;
HUTCHESON; PEDEN, 2012);
125
c) Intimidar a equipe de enfermagem, sempre que ela questiona ou pede
esclarecimentos sobre a condição do paciente, ou quando documentação
necessária está faltando no prontuário do paciente antes da cirurgia de rotina
(VELTMAN, 2007);
d) Um médico intimidante no posto de enfermagem ou nas salas cirúrgicas,
repreendendo o pessoal verbalmente, jogando instrumentos cirúrgicos,
humilhando o pessoal de anestesiologia (WLODY, 2007);
e) Insinuar acusações ao invés de ser direto; ameaçar arruinar a carreira se o
comportamento for relatado (KAPLAN; MESTEL; FELDMAN, 2010);
f) Repreender os colegas de trabalho (KAPLAN; MESTEL; FELDMAN, 2010;
ROSENSTEIN; NAYLOR, 2012);
g) Suprimir a entrada de outros membros da equipe de saúde no cuidado ao
paciente (SPRINGER, 2008);
h) Ameaçar a segurança psicológica dos membros da equipe (WINLAW et al.,
2011);
i) Agir com sarcasmo, gestos não-verbais ou comportamento passivo-agressivo
(ROSENSTEIN, 2011b);
j) Fazer fofocas; olhar fixamente, suspirar, gritar, fazer gestos, caretas, e
posicionar o corpo para excluir outros de uma conversa (ZIMMERMAN;
AMORI, 2011);
k) Fazer fofocas negativas, comentários intimidantes, e exclusão de atividades
sociais na unidade (CLARCK; AHTENS; MACY, 2013);
l) Enfermeiras repreendendo colegas menos experientes (MARTIN, 2008);
m) Ameaçar membros da equipe com retribuição, processos, violência ou perda de
emprego (FELBLINGER, 2008);
n) Adotar comportamento que pode ignorar ou minimizar outra enfermeira, tais
como rolamento de olho ou levantar a sobrancelha (BIGONY et al., 2009);
Em estudo norte-americano sobre as experiências de enfermeiras assistenciais
com comportamento destrutivo, os relatos das participantes evidenciaram comportamentos
destrutivos incluindo comportamento rude e desrespeitoso, desrespeito profissional quando na
defesa de um paciente, engajar-se em fofocas, microgerenciamento excessivo de seu trabalho,
intimidação e agressão verbal (WALRATH; DANG; NYBERG, 2010).
126
Qualquer comportamento que influencia o desejo do pessoal de saúde de reduzir,
limitar ou eliminar qualquer interação com um determinado indivíduo porque ele ou ela
espera que o encontro seja desagradável se encaixa na definição de intimidação insidiosa, a
qual se manifesta em três categorias principais de comportamento: passivo-agressivo, verbal
e não-verbal. A agressão passiva é um comportamento em que um indivíduo faz comentários
que parecem cooperativa e complacente mas eles se comportam de maneira que minam essas
declarações (ZIMMERMAN; AMORI, 2011).
Pessoas passivo-agressivas podem, tranquilamente, sabotar indivíduos no
processo por não concluírem o seu trabalho ao nível exigido para uma passagem de plantão
segura (eu não tenho tempo para completar esse formulário. Deixe-os descobrir.). O seu
cumprimento pode atender à letra da lei, mas outros podem vê-lo como resistentes ou talvez
até rancorosos. Se a pessoa é um supervisor, ela pode delegar regularmente tarefas
indesejáveis aos indivíduos que ele não gosta (ZIMMERMAN; AMORI, 2011).
Como formas de intimidação não-verbal, destacam-se: olhar fixamente, suspirar,
gritar, gesticular, fazer caretas, e posicionar o corpo de modo a excluir outros de uma
conversa (ZIMMERMAN; AMORI, 2011).
Já a intimidação verbal pode caminhar lado a lado com os outros dois tipos. Pelo
menos direta, volitiva, e, mais importante, potencialmente ouvida pelos outros e, portanto,
pode mais facilmente ser documentada como prova. O praticante de intimidação verbal
insidiosa frequentemente fofoca, comunica-se com sarcasmo, e em alguns casos até mesmo
reconhece o efeito deletério do seu comportamento. Alguns podem exercê-lo como uma arma
para garantir sua posição de autoridade ou posição desejada de autoridade. Alguns podem ser
experientes e sobreviver a anos de mudanças. Estas pessoas podem criticar abertamente os
colegas, políticas, mudanças, ou a administração, enquanto reclamam que as outras partes
estão desrespeitando os seus próprios sentimentos ou pensamentos. Eles podem queixar-se
aos pacientes, bem como a outros funcionários sobre recursos humanos, administração ou
políticas. Eles podem insultar colegas mais jovens ou fazer comentários maldosos sobre eles.
Podem acusar as pessoas de ser responsável por erros que ocorrem. Eles podem se gabar de
suas realizações ou esforços para instituir a mudança, comentando que o processo "nunca
funciona" ou "já foi tentado antes e não funcionou, então, por que trabalhar agora?" O mais
importante, gerentes e supervisores precisam perceber que a experiência desses indivíduos
particulares dá peso a suas palavras e que os profissionais mais jovens e menos experientes
podem aprovar seus pontos de vista e ações (ZIMMERMAN; AMORI, 2011).
127
Esta intimidação também foi evidenciada nas observações, conforme os registros
do diário de campo:
Chefe de enfermagem abre armário, retira dali uma conexão para oxigênio e diz
que ali não é lugar para guardar aquilo. E coloca o objeto em cima da bancada do posto de
enfermagem. Em seguida, a enfermeira assistencial chega, pega a conexão, levanta e mostra
para a chefe, como se questionasse o que aquilo estava fazendo em cima das coisas dela. A
chefe responde: ―Você sabe que o lugar disso não é ali‖. Enfermeira responde: - ―e é aqui?‖.
Chefe responde de novo: ―Você sabe onde é o lugar!‖.
Técnica de enfermagem pede para a enfermeira solicitar máscara de oxigênio para
aerossol. Ela liga para o setor responsável, mas ninguém atende. Depois de um tempo a chefe
fica sabendo que está faltando máscara e diz em voz alta: ―Eu vou deixar é faltar máscara,
para ver se as pessoas aprendem a ser mais responsáveis, tem um monte de kit aí
incompleto!‖.
As condutas observadas são consideradas manifestações de mobbing,
caracterizado por situações de assédio moral, coação psicológica e violência emocional, ou
seja, uma severa forma de stress psicológico resultante de comunicações hostis ou atos
dirigidos de forma sistemática a um indivíduo, com dificuldades em defender-se (SARAIVA;
PINTO, 2011).
O tema assédio moral ainda é considerado novo. As pesquisas voltadas para essa
área temática encontram-se, em sua maioria, no campo do Direito, deixando um vasto campo
social e emocional a ser pesquisado. Assim, tem despertado interesse dos estudiosos de outras
áreas, porém, no Brasil, discussões e pesquisas sobre ele ainda precisam de maior visibilidade
(SOUSA, 2012).
Uma recente análise do conceito de assédio moral foi realizada por pesquisadoras
brasileiras, que o definiram como ―violência psicológica, sutil, dissimulada, intencional, de
caráter repetitivo e prolongado, com a intenção de humilhar e excluir socialmente uma pessoa
no contexto da atividade laboral, provocando-lhe estresse psicossocial e prejuízos à sociedade
e à organização” (CAHÚ et al., 2012, p.559).
Em nossa pesquisa, um caso de assédio moral foi relatado por uma enfermeira:
128
A gente não podia conversar umas com as outras, não podíamos almoçar
juntas...eu era obrigada a fazer pesquisas para colocar o nome da pessoa. Ela
[a chefe] usa os fracos, que não verdade não são fracos intelectualmente, não
são fracos de desenvolver atividades, são fracos apenas de poder, no sentido
de hierarquia, aí ela mostra os serviços deles como se fosse serviço dela..ela
trabalhava em forma de ditadura!e vivia dizendo também: - uma vez
trabalhando comigo, se você sair, você não pode mais voltar! Porque eu
tenho pleno apoio da direção. Entrevistada: - que eu não sei se tem mesmo
esse apoio, mas ela vivia dizendo: a direção já disse: se eu quiser demitir
todo mundo eu posso demitir! Então vocês tomem cuidado! Uma vez
trabalhando comigo, não trabalha mais em outro setor! (E4)
Trata-se de uma situação cuja prevalência é muito mais frequente do que se
imagina, e com tendência a aumentar progressivamente, acarretando efeitos devastadores na
vida dos indivíduos, mas também nas organizações e na sociedade (SARAIVA; PINTO,
2011).
Estudo revisou pesquisas sobre assédio moral na Enfermagem, em todo mundo, e
identificou que são comuns os comportamentos manifestados por meio de relações
hierárquicas e abusivas, e também sob a forma de discriminação racial. Os autores
evidenciaram que existem evidências de que enfermeiros, além de alvos, também tem sido
autores de violência no ambiente de trabalho (FONTES; PELLOSO; CARVALHO, 2011).
―O trabalho tem um papel central na estruturação da identidade, e ser apreciado,
estimado ou amado ajuda a garantir uma boa imagem de si mesmo. Inversamente, ser
rejeitado, criticado ou humilhado desperta um sentimento de insegurança‖ (CLDF, 2008, p.9).
Além da intimidação, houve relatos de grosseria e abuso verbal por parte de
médicos, segundo os relatos dos entrevistados: ―O anestesista começou a gritar comigo,
dizendo que a enfermeira era incompetente, que não tinha ligado para avisar.‖ (E1)
O médico começou a gritar! Ele tava nervosinho com alguma outra coisa e
se estressou. Eu presenciei o nervosismo dele depois em exigir minha
presença lá e que eu não saísse de lá enquanto ele não terminasse o
procedimento. (E3)
Médico estrela gritando com a enfermeira, porque queria descer o paciente
para uma tomografia. O médico queria descer o paciente para fazer uma
tomografia, aí aqui tá reduzido [o pessoal de enfermagem] ... e aí ele disse
que não queria saber se tava reduzido, queria saber se descia o paciente.
(TE4)
Tem muitas histórias assim de cirurgião, de ser grosseiro com residente, com
a técnica, de jogar material... aqui na chefia da enfermagem tem algumas
histórias também. (M5)
129
Em relação a assédio físico, sexual, nunca sofri, nunca ouvi falar; em relação
a gritos, intimidação, isso aí eu já ouvi, já ouvi nos corredores, a pessoa que
fala mais alto, às vezes, médico com enfermeiro, médico com
fisioterapeuta... Reclamando, aí fala mais alto. Tem internos, residentes que
às vezes chegam com uns gritos... tem pessoas que gritam e saem correndo,
não escutam, não querem lhe escutar também, não esperam nem para escutar
sua resposta... (E7)
Os depoimentos evidenciam o abuso verbal dos médicos e sofrido,
principalmente, pelas enfermeiras e técnicas de enfermagem do serviço. Cabe ressaltar que
nenhum dos médicos entrevistados relatou sofrer abuso verbal de um colega da mesma
categoria ou da categoria de enfermagem, apenas M5 comentou que sabia de histórias
envolvendo cirurgiões.
Segundo os artigos analisados na fase teórica, a grosseria pode envolver
comentários grosseiros (HPR, 2007; PFIFFERLING, 1999; GRENNY, 2009); linguagem
condescendente ou entonação de voz (LEIKER, 2009); linguagem profana, ofensiva,
depreciativa (SAXTON, 2012, JACOBS; WILLE, 2012; linguagem corporal ameaçadora
(SAXTON, 2012); condescendência (152 citaram, 52,6%) (ROSENSTEIN; NAYLOR, 2012);
e uso de linguagem alta, chula e com raiva (GALLUP, 2006).
A lógica do padrão de comportamento destrutivo se refere ao uso de "linguagem
grosseira" e "condutas ameaçadoras" - ambos os termos gerais podem ser interpretados de
várias maneiras diferentes. O que uma pessoa considera rude ou ameaçador, outro pode não
considerar. Então, uma das coisas que as organizações precisam fazer é levar isso para fora do
subjetivo, e torná-lo muito específico. Pode ficar fora de controle, a menos que este esteja
claramente definido (HPR, 2007).
Em qualquer ambiente de cuidados em saúde, mas principalmente em hospitais,
não é difícil encontrar esse padrão de comportamento em profissionais médicos. Segundo
Gallup (2006), médicos acreditam que estão acima das regras, dos padrões de comportamento
e de etiqueta social aos quais os demais profissionais são submetidos.
Tem sido relatado, também, que os médicos abusivos que geram muito dinheiro
para os hospitais são relativamente imunes à punição e, em grandes cidades, com vários
hospitais, esses profissionais são ''permitidos'' a serem destrutivos. Autor explica que este tipo
de situação é cada vez mais comum na ―Geração X‖ (de indivíduos em seus primeiros 20 a 40
anos), pois ela pode ser menos disposta a aceitar a autoridade e hierarquia em comparação
com gerações anteriores (pessoas com mais de 40 anos) (GALLUP, 2006).
130
Trata-se de um sistema de privilégios instituído e imbricado na estrutura
hierárquica de muitos hospitais e instituições de saúde cuja organização sofreu influência do
militarismo (BITTAR, 2004), o que nos remete à necessidade de aproximação ao estudo de
sua natureza histórica.
Na idade contemporância (de 1789 em diante), a medicina convergiu para o
hospital e experimentou reformulações na orientação pragmática, o que fez com que ela se
convertesse em atividades eminentemente hospitalares. Assim, o saber médico proclamou a
necessidade de estabelecer um rígido controle sobre tudo o que envolvesse o doente internado
e, para que isso se tornasse viável, foram necessários que todos os recursos hospitalares se
destinassem expressamente às finalidades terapêuticas, ficando então submetidos ao comando
funcional e administrativo da classe médica (MOREIRA, 2007).
Desse modo, o papel que o hospital e as demais instituições de saúde
desempenham tem como palco o poder médico, sobretudo depois de 1920, e a generalização
dos sistemas públicos e privados de seguro-saúde e seguro-doença. Hoje, o hospital é um
sistema de poder e de autoridade diferente de outras organizações, assim como apresenta uma
estrutura técnica e organizacional de trabalho e uma cultura muito próprias (MOREIRA,
2007).
Segundo Pedrosa e Couto (2007), para o cumprimento de suas funções e para o
atendimento da alta regulamentação desse setor, as instituições hospitalares modernas se
organizam internamente em estruturas hierárquicas e de poder, compostas de diversas áreas e
subáreas, em que um grande número de profissionais técnicos e não-técnicos executa
atividades extremamente diversificadas.
Por suas características complexas, os autores afirmam que o hospital é uma
organização cada vez mais regida por leis, normas, regulamentações e portarias, onde existe
uma diversudade de anseios e objetivos específicos de cada categoria profissional atuante na
organização que é campo de conflito e disputas (PEDROSA; COUTO, 2007).
Assim, médicos alcançam um sistema de privilégios de diversas espécies, e um
destes tem sido a ―aceitação‖ de suas condutas inapropriadas e hostis, principalmente por
parte de cirurgiões, staffs (chefes de equipe), dentre outros que ocupam o topo da hierarquia.
Assim, seus maus comportamentos não são abordados pelos pares ou pelos gestores,
perpetuando o que se pode chamar de hostilidade institucionalizada.
A problemática do abuso verbal e dos maus comportamentos não é exclusiva da
categoria médica. Budin et al. (2013) estudaram o abuso verbal sofrido por enfermeiras em
início de carreira pelos colegas da mesma categoria, concluindo que este continua a ser um
131
grande problema, apesar da atenção dada a ele ao longo dos últimos cinco anos. Os dados do
estudo apoiam a noção de que enfermeiras assistenciais, em início de carreira, são
potencialmente vulneráveis aos efeitos do abuso verbal dos colegas de enfermagem. Como
esses dados são provenientes de uma grande amostra representativa (1.544 enfermeiras), os
autores tem mais confiança na generalização dos resultados em comparação com estudos
anteriores.
No mesmo estudo, as enfermeiras que trabalhavam em ambientes hospitalares, em
comparação com outros ambientes de trabalho, foram as mais propensas a relatar níveis
moderados ou elevados níveis de abuso verbal dos colegas enfermeiros, enquanto enfermeiros
que trabalham em UTI‘s foram os menos propensos a relatar altos níveis de verbal abuso de
colegas de enfermagem (BUDIN et al., 2013).
Enfermeiras que trabalhavam pela manhã também experimentaram uma maior
proporção de abuso verbal do que as que trabalhavam à tarde ou à noite. As que trabalhavam
em turnos de 8 horas eram menos propensas a experimentar o abuso verbal, e aquelas que
trabalham em turnos de 12 horas sofreram abuso mais moderado do que aquelas que
trabalharam em outros turnos. Enfermeiras que relataram menor número de profissionais na
equipe do que o previsto em sua unidade, na maioria ou a cada um dos seus turnos, eram mais
propensas a experimentar níveis moderados a elevados de abuso verbal, em comparação com
aquelas que não experimentaram carências de pessoal. E aquelas que relataram nenhum
abuso verbal por parte dos colegas de enfermagem eram menos propensas a deixar a sua
posição nos próximos 3 anos, e aquelas que sofreram abuso verbal moderado a alto foram
mais propensas a deixar a profissão nos próximos 12 meses (BUDIN et al., 2013).
Em outra pesquisa, os participantes foram solicitados a descrever o impacto do
comportamento destrutivo em si mesmos e nos outros. Foram sintetizados 90 descrições em
três temas: impacto no enfermeiro assistencial, no paciente e no ambiente da prática do
enfermeiro. Uma enfermeira descreveu os efeitos significativos de incivilidade
experimentados com "grosseria cotidiana... o impacto disso é grande! afeta a sua moral, o seu
investimento, o tempo que você está disposto a trabalhar, e a sua vontade de vir trabalhar.‖
(WALRATH; DANG; NYBERG, 2010).
Quanto à violência física, apenas um caso foi relatado, em nosso estudo, por uma
técnica de enfermagem da sala de parto, que envolvia dois profissionais de categorias
distintas. Apesar de ser importante a violência física para aquele contexto, esta não foi uma
prática frequente evidenciada no cotidiano do serviço.
132
5.4.1.2.2.2 Características ou adjetivos atribuídos ao comportamento destrutivo do
trabalhador de saúde
As características do comportamento destrutivo são aquelas evidências ou
adjetivos específicos que permitem identificar o profissional destrutivo no âmbito da prática
clínica e da pesquisa. Estas foram identificadas em 27 unidades de registro, nas quais os
entrevistados desceveram os profissionais que adotavam comportamento destrutivo como:
grosseiro/ignorante (13), desrespeitoso (3), desagradável (2), constrangedor, inapropriado,
chato, desumano, explosivo, confuseiro, pedante, arrogante e agressivo.
Nos depoimentos identificam-se tais adjetivos: ―[Os indivíduos destrutivos] ficam
vistos como o estúpido, o ignorante, e que desprezam o trabalho da gente, em si, da
enfermagem no geral.‖ (E3); ―[O indivíduo destrutivo é uma] pessoa grosseira mesmo,
ignorante...‖ (TE4); ―Ela [a médica destrutiva] é tão grossa! Porque ela é uma médica tão
profissional, tão boa, e assim tão ignorante!‖ (TE7); ―Ele [o cirurgião destrutivo] é uma
pessoa arrogante!‖ (E1); ―[O comportamento destrutivo é] inapropriado e desrespeitoso com o
paciente, e também com o profissional...‖ (M2); ―[As técnicas de enfermagem da noite] são
conhecidas como explosivas, confuseiras, desde a portaria, brigam até com o porteiro...‖ (E5);
Tem uma colega que o jeito dela ser grosseirona, ela era grosseira com os pacientes... então
isso me agredia também, só que eu não podia interferir, senão ia gerar conflito. (TE6)
Percebe-se que os trabalhadores trouxeram em suas definições termos
culturalmente arraigados, que caracterizam os sujeitos que adotam comportamento destrutivo,
em sua maioria, como grosseiros ou ignorantes. No domínio local da língua, a palavra
ignorante tem, além do significado de pessoa sem instrução e educação formal, um sentido de
pessoa grosseira, rude, que age de forma desrespeitosa.
Analisando as narrativas da experiência de 13 pacientes durante a internação em
um hospital geral público de Fortaleza-Ceará, pesquisadoras constataram que o paciente
avalia os gestos e expressões dos cuidadores durante todo o percurso. No contexto
pesquisado, foi criticada a atitude distante, fria e bruta dos profissionais de saúde,
metaforicamente comparada a um cavalo batizado por parte dos pacientes (NATIONS;
GOMES, 2007).
As autoras afirmaram, ainda, que há uma assimetria na relação, parte de uma
complexa rede de representações conflituosas com disparidades de classe, status,
escolaridade, condições de vida etc. Quando o profissional, o cavalo batizado, maltrata –
soltando grosserias, falando brutalmente ou tratando de modo ignorante –, o paciente é
impotente para denunciá-lo abertamente.
133
Ademais, vê-se que não só o paciente reconhece estes atributos e sofre nessas
circunstâncias. Os trabalhadores que adotam uma conduta respeitosa, fundamentada em uma
atitude de generosidade, estabelecendo uma relação de trabalho justa e equilibrada, também
criticam seus colegas de trabalho, vivenciando um sofrimento moral nessa atmosfera de
hostilidade e desrespeito.
Assim, os adjetivos enunciados pelos entrevistados demonstram essa percepção
crítica sobre o profissional destrutivo, considerando-o grosseiro e incapaz de tratar os outros
de forma ética e profissional.
5.4.1.2.2.3 Antecedentes do Comportamento Destrutivo no Trabalho em Saúde
Após relatarem os casos vivenciados ou presenciados de comportamento
destrutivo no trabalho, os entrevistados foram interrogados sobre o que consideravam fatores
relacionados ou causas desses comportamentos.
Os antecedentes do comportamento destrutivo foram encontrados, portanto, em 84
unidades de contexto extraídas dos depoimentos analisados, tendo sido categorizados
conforme o padrão estabelecido na fase teórica: antecedentes intrapessoais, interpessoais e
organizacionais. Ressaltamos que o entrevistado poderia citar mais de um antecedente em seu
depoimento.
A Tabela 5 representa os resultados, com a frequência de ocorrência das unidades
de registro/contexto sobre cada antecedente.
134
Tabela 5 – Antedecentes do comportamento destrutivo no trabalho em saúde segundo os
entrevistados. Fortaleza, CE, mar-jul 2014. n=29
a. poderia haver citação de mais de um antecedente em cada entrevista.
Fonte: Elaborada pela autora.
Assim como evidenciado na fase teórica, os antecedentes intrapessoais foram
citados como mais prevalentes na origem dos comportamentos destrutivos evidenciados no
cotidiano dos trabalhadores entrevistados.
Destes, as características de personalidade foram referidas por quase todos os
entrevistados que relataram ter vivenciado comportamentos destrutivos, havendo alguns que
referiram este antecedente mais de uma vez ao longo da entrevista. Os depoimentos
representam tal achado: ―A personalidade mesmo [é o que influencia]. Pessoa mais arredia,
né? Aquela história do pavio mais curto, mais irritada.‖ (E6); ―[Comportamento destrutivo
tem relação com] prepotência, falta de amor e falta de preocupação com o paciente também.‖
(M5).
Eu acho que [comportamento destrutivo] é da característica da pessoa,
personalidade muito forte, pessoa grosseira mesmo, ignorante. Mais
[comum] em médico, mas também tem enfermeiros da personalidade muito
forte! (TE4)
[Comportamento destrutivo é] da própria característica da pessoa mesmo...
que ela parece ser um pouco mais desequilibrada, não sei, ou
emocionalmente desequilibrada, eu não sei se pode dizer isso... ou que está
sendo levado ao estresse do trabalho dele mesmo. (TE10)
Os entrevistados avaliaram seus colegas de trabalho, criticaram e apontaram as
possíveis causas, segundo suas percepções, sobre o que antecede a adoção de comportamentos
ANTECEDENTES f (%)
Intrapessoais
Características/traços de personalidade. 30a
Estresse. 12 (41,4)
Falta de competência e de compromisso. 7 (24,1)
Má educação. 6 (20,7)
Maior idade e tempo de serviço. 4 (13,8)
Falta de humanização/ética profissional. 3 (10,3)
Total 62a
Organizacionais
Sobrecarga de trabalho. 13 (44,8)
Conflitos de papel e de poder. 3 (10,3)
Problemas sistêmicos não resolvidos. 2 (6,9)
Total 18 (62,0)
Interpessoais
Divergência de opiniões/pensamentos. 2 (6,9)
Falta de respeito entre colegas. 2 (6,9)
Total 4 (13,8)
135
destrutivos. Destacaram, dentre outros, os traços característicos de personalidades mais
agressivas, emocionalmente desequilibradas, como apontam TE4 e TE10.
Autoras afirmam que os traços de personalidade podem ser usados para resumir,
prever e explicar a conduta de um indivíduo, de forma a indicar que a explicação para o
comportamento da pessoa será encontrada nela, e não na situação, sugerindo, assim, algum
tipo de processo ou mecanismo interno que produza o comportamento (SILVA; NAKANO,
2011).
Em estudo sobre violência institucional, autoridade médica e poder nas
maternidades sob a ótica dos profissionais de saúde, a maioria dos entrevistados também
associou a violência institucional ao caráter pessoal de quem a pratica. Ser violento seria uma
questão de ―natureza rude‖, de índole, de ―falha de caráter‖ ou uma questão de formação
pessoal, falta de ―berço‖, ou seja, em função do grupo social em que está inserido. Esse tipo
de justificativa naturaliza a violência, limita as possibilidades de questionamento crítico,
contribuindo para a banalização da violência institucional e sua maior invisibilização. E, não
por acaso, alguns profissionais entrevistados tenderam a ser mais compassivos com a
grosseria de seus colegas do que das pacientes, o que expressa a hierarquia de valores que
regula as relações interpessoais entre profissionais, e destes com as pacientes (AGUIAR;
D‘OLIVEIRA; SCHRAIBER, 2013).
Uma pesquisa atribuiu o comportamento destrutivo àquele manifestado por
personalidades controladoras e agressivas, que inibem a comunicação efetiva geralmente
afirmando e exigindo que ―é desta forma!‖, ―eu estou certo!‖, ―você faz o que eu digo!‖
(LITTLEJOHN, 2012).
Do mesmo modo, uma entrevistada ressaltou este traço de personalidade
controladora:
[Comportamento destrutivo tem relação com] o caráter da pessoa, que se
julga um ser superior e não sabe chegar e tentar resolver as coisas como
pessoas humanamente civilizadas. (AE2)
Estudo bibliográfico sobre a síndrome de Burnout, um dos consequentes de
comportamento destrutivo segundo os artigos analisados, identificou fatores individuais
(características de personalidade) associados a índices superiores desta síndrome em
trabalhadores, tais como: padrão de personalidade (indivíduos competitivos, esforçados,
impacientes, com excessiva necessidade de controle das situações, dificuldade em tolerar
frustração); lócus de controle externo (consideram que suas possibilidades e acontecimentos
de vida são consequentes à capacidade de outros, à sorte ou ao destino); superenvolvimento
136
(sujeitos empáticos, sensíveis, humanos, com dedicação profissional, altruístas, obsessivos,
entusiastas, suscetíveis a se identificarem com os demais); indivíduos pessimistas (costumam
destacar os aspectos negativos, prevêem insucesso, sofrendo por antecipação); indivíduos
perfeccionistas (são bastante exigentes consigo mesmos e com os outros, não tolerando erros
e dificilmente se satisfazendo com os resultados das tarefas realizadas); indivíduos com
grande expectativa e idealismo em relação à profissão (podem deixar de ser realistas, tendo
grandes chances de se decepcionarem. se associado ao otimismo, pode levar a baixos índices
de burnout); indivíduos controladores (são inseguros, preocupam-se excessivamente, têm
dificuldade em delegar tarefas e em trabalhar em grupo); indivíduos passivos (mantêm-se na
defensiva e tendem à evitação diante das dificuldades); gênero (as mulheres apresentam maior
pontuação em exaustão emocional; e os homens, em despersonalização); nível educacional
(indivíduos com nível mais elevado); estado civil (maior risco em solteiros, viúvos ou
divorciados) ou o oposto (TRIGO; TENG; HALLAK, 2007).
A adoção de comportamentos destrutivos também tem sido relacionada a
características de personalidade como o narcisismo, o perfeccionismo (manejo inadequado de
seus sentimentos de culpa ou vergonha quando as coisas não vão perfeitamente), ou o
egoísmo (HICKSON et al., 2007).
A personalidade narcisística inclui um sentimento exagerado de auto-importância,
exigências descabidas de tratamento especial ou conformidade automática, uma falta de
consideração dos sentimentos dos outros e conduta arrogante e altiva (WINLAW et al., 2011).
Na microfísica de uma instituição médica de ensino, os futuros médicos
encontram apoio no narcisismo dos professores médicos expresso coletivamente no seu desejo
de certeza e de onipotência, levando à prática a ser o que é, normalizada apesar do discurso
parecer sempre ambivalente em relação à tensão doente/doença. E a solução de compromisso
ou o "sintoma" está nos próprios médicos, quando apreendem, em seu discurso, um ideal
romântico, apesar da desvalorização do ato na clínica como um ato simbólico e, em sua
prática, o exercício de uma prática normalizada sem romantismo (SOUZA, 1998).
Além disso, médicos que mostram comportamento destrutivo muitas vezes se
vêem como clinicamente superiores (LITTLEJOHN, 2012; SAMENOW et al., 2007). Assim,
podem considerar outros membros da equipe de saúde como menos competentes, ou talvez
até mesmo incompetentes, fracos e vulneráveis, vendo-se como campeões para seus pacientes,
apenas porque eles foram para a faculdade de medicina (LITTLEJOHN, 2012).
Algumas entrevistadas referiram-se a esta personalidade de alguns médicos: ―Tem
médicos que, [para eles], Enfermagem e nada é a mesma coisa né? É só eles e pronto!‖ (E1);
137
―Acha que porque é médico, pode gritar, abusar assim, tanto pelo status como pela
educação...‖ (TE7)
O investimento de tempo e energia necessários para ter sucesso profissionalmente
na Medicina requer um alto grau de auto-envolvimento, que em alguns indivíduos podem
acentuar os traços de caráter narcisista. Indivíduos altamente narcisistas acreditam que eles e
suas ideias são especiais; tem dificuldade em tolerar pessoas que vêem como comuns,
ordinárias; tem um senso de direito a um tratamento favorável por outros, e são insensíveis
aos sentimentos e necessidades de outras pessoas. Para alguns, essas características podem ser
essenciais para dominar as demandas de alta complexidade de prática e alcançar a auto-
preservação em um ambiente estressante (LEAPE et al., 2012).
No trabalho em saúde, essa sensação de privilégio e de status pode levar médicos
a tratarem os enfermeiros com desrespeito, criando uma barreira para a comunicação aberta e
o feedback que são essenciais para o atendimento seguro. A sensação de autonomia pode estar
subjacente à resistência em seguir práticas de segurança, resultando em danos ao paciente. A
ausência de respeito mina o trabalho em equipe necessário para melhorar a prática (LEAPE et
al., 2012).
Esta postura, por parte de um cirurgião, foi constatada em um dia de observação
no Centro Cirúrgico, em que o neurocirurgião chegou à sala de cirurgia, o paciente já estava
na mesa cirúrgica, ainda acordado, sendo preparado pela equipe de anestesia. Em voz alta e
tom rude, o cirurgião perguntou à enfermeira onde estava o fio cirúrgico. E a enfermeira
respondeu, educadamente, que estava faltando aquele tipo de fio, mas que se ele quisesse
tinha outro de uma outra marca. Antes dela terminar, ele interrompeu com grosseria e afirmou
em tom elevado: ―Eu quero saber se tem o fio que eu uso! Basta dizer que não tem, não
precisa ficar enrolando não! Agora você me diz como eu vou operar sem esse fio?‖
A grosseria, a falta de educação e de ética deste profissional deixou a sala de
operações tensa. Havia em torno de sete profissionais na sala, entre membros da equipe
cirúrgica, de anestesia e de enfermagem. A enfermeira saiu cabisbaixa, em silêncio, enquanto
os outros continuaram realizando suas atividades, sem nenhuma abertura para a comunicação.
O paciente, que ainda estava acordado, presenciou a cena de desrespeito e isto pode ter
aumentado a tensão inerente a um procedimento cirúrgico de grande porte, como a
neurocirurgia.
Certas características de personalidade estão associadas, ainda, com ameaças à
autoestima, a qual é especialmente importante para os médicos, pois está intimamente ligada à
percepção de sua própria competência e reputação. Por investir uma quantidade substancial de
138
tempo e energia para alcançar competência e sucesso profissional, médicos podem ser
sensíveis a quaisquer ameaças à autoestima. Quando sua autoestima está ameaçada, podem
reagir com comportamento interpessoal destrutivo como uma forma de restabelecer o domínio
profissional (LEAPE et al., 2012).
Outras características de personalidades destrutivas incluem uma tendência, em
algumas circunstâncias, a exteriorizar as razões do fracasso quando existem, em vez de tomar
uma quota de responsabilidade ou reconhecer a dificuldade associada como resultado de
fatores relacionados ao paciente (WINLAW et al., 2011).
Autores reiteram que o comportamento desrespeitoso está enraizado, em parte,
nas características do indivíduo, como a insegurança ou a agressividade, mas também é
aprendida, tolerada, e reforçada na cultura hierárquica da organização (LEAPE et al., 2012).
Sabe-se que pessoas altamente agressivas desfrutam de combate e de confronto,
tem temperamentos-gatilho, e encontram segurança em serem capazes de intimidar os outros
como uma defesa contra o desamparo. Contratempos profissionais podem ser experimentados
como desamparo, desencadeando uma resposta agressiva (LEAPE et al., 2012).
Outro registro do diário de campo retrata a personalidade autoritária e agressiva
da chefe de enfermagem na unidade de internação: enfermeira chefe aproximou-se da
enfermeira assistencial com um tom de voz alto e entregou uma papelada dizendo que a
enfermeira levasse para casa para estudar e que depois assinasse o documento. Tratava-se de
um material da internet sobre uma doença rara que acometia um paciente internado na
unidade. A chefe falava alto e mandava a enfermeira ler, afirmando que iria controlar todos os
que trabalham na unidade para ler o documento. A enfermeira assistencial olhou para mim, eu
me encontrava na situação de pesquisadora, e em tom baixo disse: ―Valente nossa chefe! Ela é
terrível! Já inventou até história a meu respeito aqui dentro!‖
Percebeu-se que o comportamento agressivo dessa chefe de enfermagem parece
estar associado a traços de personalidade, quando demonstra uma necessidade de controlar
tudo e todos na unidade, adotando posturas com base em um modelo de gestão impregnado
por punição e autoritarismo.
Há, ainda, casos de comportamento destrutivo associados à vitimização prévia.
Nestes, médicos que sofreram experiências ruins, como a intimidação durante seus anos de
formação, podem ser tão traumatizados que o comportamento imitativo fica enraizado em seu
inconsciente. Sua reação ao estresse é intimidar, refletindo suas experiências anteriores
(LEAPE et al., 2012).
139
Não obstante, algumas pessoas podem se referir a um indivíduo com
personalidade forte e assertiva como "intimidante", mas o seu comportamento pode ser
apropriado para uma dada situação e destina-se a ser cooperativo. Esses indivíduos podem
estar em posições de liderança reais ou virtuais por causa de seu conhecimento, perícia e
experiência. Eles podem ser opressores para determinados tipos de personalidade ou para
aqueles com menos experiência. Por outro lado, alguns indivíduos tem sensibilidade refinada
a um comportamento que eles percebem como julgador, opressivo ou agressivo. Sua
calibração excessiva pode levá-los a concluir que os indivíduos com personalidades fortes são
intimidantes (ZIMMERMAN; AMORI, 2011).
Pode-se afirmar, desse modo, que os traços de personalidade moldam o
comportamento, inicialmente, mas existem condições internas e externas que irão influenciar
ou potencializar o desenvolvimento de uma personalidade destrutiva, como o estresse.
O crescente estresse também foi relatado como antecedente de comportamento
destrutivo segundo os entrevistados, conforme as unidades de contexto identificadas:
Ele [o médico plantonista] estava só, ligando não sei para quem tentando
conseguir uma ajuda. Ele viu que a paciente estava afundando [piorando], eu
acho que também o desespero dele foi em perder a paciente...Devido ao
nervosismo, devido ter que ser rápido [ele agiu de forma destrutiva]...,
porque era uma hora de sufoco! (E8)
Às vezes, acontece com a gente também, enquanto profissional ele não está
isento disso, assim o dia a dia, o estresse, o cansaço, acontece [esses
comportamentos] quando tem um plantão muito estressante, com muitas
intercorrências, com muita parada [cardiorrespiratória]; já teve duas paradas
num plantão, a gente está cansada, esgotada, chega assim uma hora da
manhã e você ainda não foi para o repouso e aí acaba passando, querendo
exigir mais de você... (E10)
Estresse, problemas particulares que [as pessoas] não sabem direito separar...
Estresse acho que é um dos principais [aspecto envolvidos no
comportamento destrutivo] (TE5)
O grau de estresse é crescente entre trabalhadores de saúde, o que pode estar
associado às condições e características do ambiente de trabalho, mas também às
características pessoais e aos traços de personalidade. Quanto maior o nível de estresse, maior
a probabilidade de desenvolver comportamentos inapropriados e desrespeitosos no trabalho.
Ao abordar as naturezas e as causas de comportamento desrespeitoso por parte de
médicos, estudo destacou que um dos principais contribuintes é o ambiente de cuidados de
saúde estressante, especialmente a presença de "pressão de produção‖ (LEAPE et al., 2012).
Essa pressão para manter os pacientes que se deslocam através do sistema de cuidados
140
contribui para o estresse tanto do profissional quanto do sistema (WALRATH; DANG;
NYBERG, 2013).
Com relação aos médicos, estes são particularmente propensos a insegurança e
ansiedade decorrentes da preocupação sobre se estão à altura dos desafios de praticar a
medicina. Especialmente quando estão sobrecarregados ou estressados, aqueles que não estão
confiantes sobre suas habilidades podem reagir ao estresse culpando os outros quando as
coisas dão errado ou fazendo comentários humilhantes e hipócritas (LEAPE et al., 2012).
Essas pessoas ficam deprimidas por ameaças à sua competência profissional,
culpando-se por insuficiência real ou imaginária. Além de serem excessivamente críticos
consigo mesmos, os indivíduos deprimidos podem lidar com a situação sendo
demasiadamente críticos com os outros (LEAPE et al., 2012).
Na Enfermagem, sabemos que muitos enfermeiros não tem controle suficiente
sobre seu ambiente de trabalho. Estes profissionais tem um elevado grau de prestação de
contas e um local de trabalho tecnológico altamente complicado, que estão acoplados a um
baixo grau de autonomia.
Embora sejam cuidadores compassivos, enfermeiros também lidam com uma
variedade de estressores no local de trabalho, muitos dos quais podem levá-los a demonstrar
menos respostas emocionais eficazes em um determinado momento. Eles estão, muitas vezes,
cansados e irritados devido a longos turnos e horas extras, estando sempre de plantão e com
demandas elevadas de pacientes cada vez mais doentes (LITTLEJOHN, 2012).
Como enfermeiros, é comum lidar diariamente com a realidade de que a saúde é
uma atividade inerentemente estressante; vive-se em um ambiente mutável rapidamente e
complexo, onde existem muitos possíveis gatilhos e causas desse estresse (LITTLEJOHN,
2012).
Também houve depoimentos sobre a falta de competência e de compromisso de
alguns trabalhadores, que também contribui para comportamentos destrutivos: ―Muitas
meninas jovens tem esse tipo de atitude sem compromisso...falta de maturidade de uma ou
outra pessoa...‖ (E3).
[Comportamento destrutivo tem relação com] inexperiência, as recém-
formadas, o pouco compromisso, baixo compromisso com a profissão, com a
unidade. Pouco compromisso! (E10)
Alguns entrevistados ressaltaram a falta de competência e de compromisso dos
trabalhadores mais jovens, que chegam ao mercado de trabalho muitas vezes inexperientes e
com baixa percepção sobre o desempenho de suas funções. Já na fase teórica, houve destaque
141
para a falta de competência do ponto de vista da ausência de formação apropriada, de
treinamentos e de habilidades para o trabalho, atrelada à baixa autonomia e inteligência
emocional (BROWN; GOSKE; HICKSON et al., 2007; JACOBS; WILLE, 2012; JOHNSON,
2009; LITTLEJOHN, 2012; LUX; HUTCHESON; PEDEN, 2012; LUX; HUTCHENSON;
PEDEN, 2013; WALRATH; DANG; NYBERG, 2013).
Um estudo demonstrou que as enfermeiras apresentavam maior percepção de
intensidade de vivência de sofrimento moral associada à falta de competência na equipe de
trabalho, seguida da negação do papel da enfermeira como advogada do paciente, enquanto
que a maior frequência de vivência de sofrimento moral relacionava-se também à falta de
competência na equipe de trabalho, seguida da obstinação terapêutica (BARLEM et al.,
2012).
Particularmente na Enfermagem, os enfermeiros estão presos em uma dicotomia -
pouca autonomia, porém grande responsabilidade (LITTLEJOHN, 2012). Desse modo,
autores justificam que a posição subordinada da Enfermagem no sistema de saúde pode
resultar em sentimentos de impotência que levam enfermeiros a atuarem uns contra os outros
(LUX; HUTCHESON; PEDEN, 2012).
Como prática social, a Enfermagem transita no campo da saúde em meio a
contingência de conflitos, disputas, interesses e coerções que constituem o cotidiano, este
profundamente enraizado nos contextos sociais, culturais, históricos e políticos, onde os seres
humanos vivem e se relacionam (WALDOW; MEYER; LOPES, 1998).
Devido às suas pobres respostas e interações relacionadas à inteligência
emocional, muitos enfermeiros se tornaram marcados emocionalmente de fofocas, traições,
rumores e outros atos hostis, abusivos e desmoralizantes que enfermeiros provocaram uns
contra os outros. Existe, ainda, uma relação significativa entre competência emocional e
insegurança pessoal em enfermeiros (LITTLEJOHN, 2012).
Por sua vez, esta falta de competência emocional e de autonomia no trabalho
revertem-se em ambientes mais estressantes e propensos a erros e a comportamentos
destrutivos.
Nestes ambientes, os trabalhadores tem baixa autonomia pessoal ou falta de
participação na tomada de decisão, percebem pouco controle sobre o fluxo de trabalho,
possuem habilidades que são incongruentes com as tarefas esperadas, vivenciam conflito de
papel e ambiguidade, tem sentimentos de serem mal gerenciados/administrados ou
recompensados, ou experimentam interrupções frequentes (BROWN; GOSKE; JOHNSON,
2009).
142
Na Enfermagem, os trabalhadores que manifestam comportamento destrutivo são,
ainda, reconhecidos como improdutivos, segundo a opinião dos colegas de trabalho. Recente
estudo encontrou descrições desses profissionais, que utilizaram os termos "enfermeira sem
força" ou "preguiçosa" para descrever as colegas destrutivas, afirmando que elas tinham
problemas pessoais que afetaram sua vida profissional. Uma agressora foi descrita como
"vivendo em um ambiente negativo" e outro como sendo uma enfermeira ineficaz (LUX;
HUTCHESON; PEDEN, 2012).
No contexto do centro cirúrgico, uma pesquisa afirmou que o comportamento
destrutivo também é resultado, dentre outros fatores, de mau planejamento para a cirurgia,
bem como de pobres habilidades sociais individuais - um problema relacionado com a má
seleção de pessoas para se tornarem médicas (JACOBS; WILLE, 2012).
Assim, percebe-se que autonomia, empoderamento e inteligência emocional são
essenciais para o desenvolvimento de habilidades e competências para lidar com
comportamentos destrutivos e, ao mesmo tempo, evitar a adoção desta conduta no ambiente
de trabalho. Para tanto, faz-se necessário reconhecer estes fatores nos processos de admissão,
treinamento e avaliação de desempenho do pessoal de saúde, com foco no empoderamento do
trabalhador, assim como na segurança e na qualidade dos cuidados.
Quanto aos antecedentes organizacionais, a sobrecarga de trabalho também foi
lembrada pelos entrevistados, assim como na fase teórica.
Eu atribuo [o comportamento destrutivo] à sobrecarga de trabalho. Eu acho
que, na saúde, as pessoas acabam trabalhando mais do que o que seria
aceitável. Aí, com esse cansaço, a relação interpessoal fica complicada. Eu
atribuo a isso. (M4)
Você já vem de outro emprego, já vem cansado, às vezes não vem com a
mesma disposição que outro, às vezes não estava num dia bom, às vezes
você vem trabalhar doente! (E7)
Eu tenho colegas que trabalham durante um mês 20, 25 plantões, então
assim, chega num ponto que a gente chega esgotado, não consegue render o
que deveria, então pela baixa remuneração salarial você tem que procurar
outras formas de trabalho, outras fontes de renda, aí em virtude disso você
chega muito cansada e não rende no plantão, a sobrecarga atrapalha também
na assistência. (E10)
Conforme já abordado, o trabalho em saúde tem sido marcado pelo fenômeno da
precarização, e os trabalhadores são cobrados pelo atendimento de uma elevada demanda de
pacientes, associada ao dimensionamento de pessoal inadequado e ao baixo investimento no
pessoal de saúde. Assim, trabalhadores de saúde, principalmente os de enfermagem, estão
143
cada vez mais cansados, pouco produtivos e estressados, o que pode levá-los a adotar
condutas inapropriadas e atitudes retaliatórias no ambiente organizacional.
Autores afirmam que a organização e a divisão do trabalho no hospital estão
subordinadas ao processo de trabalho médico, e este processo tem definido o ritmo, o volume
e o tipo de trabalho a ser executado no hospital. Assim, o modelo gerencial adotado para a
produção em saúde determina sobrecarga para os trabalhadores (ROCHA; FELLI, 2004)
Estudo sobre comportamento destrutivo e relacionamento médico-enfermeiro no
contexto hospitalar evidenciou que os principais fatores associados diziam respeito à
indisponibilidade de pessoal, ao dimensionamento inadequado de enfermagem, ao excesso de
trabalho e à fadiga (ROSENSTEIN; O‘DANIEL, 2005). A fadiga por excesso de trabalho
entre médicos e enfermeiros foram consideradas as maiores ameaças à segurança do paciente,
por favorecerem a adoção de comportamentos destrutivos e a ocorrência de erros (CHISM,
2012b).
Analisando os tênues limites entre autoridade e violência em maternidades
brasileiras, pesquisadores encontraram que a sobrecarga de demandas, as condições
estruturais e a precariedade de recursos materiais e humanos foram apontadas pelos
entrevistados como dificuldades enfrentadas cotidianamente. As consequências dessas
dificuldades vão desde a falta de anestesistas de plantão para realização de analgesias de parto
até a proibição de acompanhantes homens na sala de pré-parto, sob a alegação de falta de
espaço físico que garanta a privacidade para as demais pacientes (AGUIAR; D‘OLIVEIRA;
SCHRAIBER, 2013).
Comportamento destrutivo é uma das influências mais importantes sobre a
qualidade das relações em equipe. Ter o número certo de funcionários, a combinação de
pessoal ideal, e forte comunicação e colaboração podem ter enormes efeitos sobre a prestação
de cuidados de saúde e os seus resultados (ROSENSTEIN; O‘DANIEL, 2005).
Outra estudiosa reflete sobre a sobrecarga de trabalho dos enfermeiros, afirmando
que jornadas de trabalho superiores a 12,5 horas aumenta em três vezes a chance de cometer
erros (CHISM, 2012b).
Sabe-se que os indivíduos são responsáveis por seu próprio comportamento; no
entanto, é raro aquele que irá reverter o ambiente em que atua e dizer: "Eu não posso trabalhar
16 horas. Eu tenho que dormir!" Se a cultura organizacional não garante um suporte para o
indivíduo manter-se em pé para suas necessidades físicas, é improvável que algo vai mudar.
Enquanto a cultura tiver uma lacuna na integridade de dizer que está comprometida com a
segurança do paciente, apesar de não olhar para a raiz mais simples das questões energéticas
144
dentro da organização, nada vai mudar. Enquanto for encorajado que estagiários sejam
privados de sono, como parte de seu treinamento; assim como que os enfermeiros trabalhem
em turnos de 16 horas ou mais; e que a privação do sono fique em segundo plano, haverá mais
comportamento destrutivo do que paz (CHISM, 2012b).
A elevada demanda de pacientes a serem atendidos em um curto espaço de tempo
e a consequente sobrecarga de trabalho, principalmente para médicos e enfermeiros, tem
configurado os maiores problemas enfrentados pelas organizações de saúde, os quais
ameaçam a segurança do paciente e favorecem a ocorrência de comportamentos destrutivos.
Espaço restrito, superlotado, com profissionais de saúde diferentes, além do ritmo
acelerado que exige uma forte confiança interdisciplinar e colaboração eficaz, também foram
citados como fatores predisponentes da violência lateral no ambiente perioperatório
(BIGONY et al., 2009).
As horas extras e as inúmeras demandas do plantão também são fatores
contribuintes para a sobrecarga de trabalho. No ambiente cirúrgico, por exemplo, o estresse
inerente de realizar a cirurgia, a elevada gravidade do paciente, a escassez de profissionais
experientes, as horas extras e demandas de plantão, e o isolamento desta unidade do restante
da organização, são fatores que permitem que comportamentos negativos sejam omitidos mais
facilmente (BIGONY et al., 2009).
Quando ocultadas, tais condutas facilitam a ocorrência de outros comportamentos
inapropriados e negativos, sendo os perpetradores muitas vezes recompensados por suas
atitudes.
Os conflitos de papel e de poder e o desrespeito com o colega de trabalho também
foram lembrados por alguns entrevistados: ―Com os médicos ela [a médica] se relaciona
muito bem. O problema é com os subordinados! (M3)‖
...usar do seu poder, da sua autoridade e impor à pessoa. A pressão do chefe,
porque eles querem mostrar uma coisa que não é real dentro do hospital.
Você quer mostrar um serviço que, na real, ele é mentiroso! (TE10)
É a falta de respeito com o colega que exerce a mesma função que a sua, só
que ele tem um cargo, uma chefia, que eu acho que são coisas que tem que
ser explicadas de uma forma mais tranquila e não com agressão, com falta de
respeito. Assim, com autoridade a pessoa se sente mais... (E9)
A equipe de enfermagem necessita manter boas relações no trabalho, uma vez que
lida com diferentes profissionais, o que pode deixá-la susceptível a conflitos e choque de
ideias, pelas diferenças de pensamentos e interesses, principalmente com as chefias, com a
145
administração e com aqueles que representam o poder na instituição. Segundo os participantes
em um estudo de etnoenfermagem em dois hospitais, estas situações implicam sofrimento,
pela percepção da impossibilidade de expressar ideias e dificuldades vividas, sugerir
mudanças na organização do trabalho, enfim, expressar-se como um trabalhador com direito e
condições de participar e exercer sua cidadania (DALMOLIN; LUNARDI; LUNARDI
FILHO, 2009).
O abuso de poder, a pressão da chefia e a ambiguidade de papeis são temas
relevantes no estudo do comportamento organizacional. É preciso considerar que estruturas
hierárquicas rígidas e tradicionais, associadas à indeterminação dos processos de trabalho,
vem favorecendo a ascensão de ―líderes‖ cada vez mais autoritários e com pouco ou nenhum
reconhecimento por parte dos trabalhadores.
Saxton (2012) afirma que os conflitos de poder, papel e personalidade podem
levar a falhas de comunicação. No estudo de Rosenstein e Naylor (2011), papeis e
responsabilidades não-claras foram citadas por 29,1% dos 370 trabalhadores entrevistados
como fatores situacionais contribuintes para a comunicação inefetiva e, consequentemente,
para a ocorrência de comportamentos destrutivos.
Atrelado aos conflitos de papel, tem-se o desrespeito com o colega de trabalho. A
ascensão da mídia social tem expandido o alcance do discurso insultuoso e depreciativo que,
em épocas anteriores, teria sido melhor controlado e abordado. Não inesperadamente, um
pouco dessa tolerância de toda a sociedade para o desrespeito transborda para os cuidados de
saúde (LEAPE et al., 2012).
No cotidiano da prática dos profissionais de saúde, há amplo reconhecimento de
maus-tratos e desrespeitos, que em alguns momentos são percebidos e nomeados como
violência e, em outros, como condutas necessárias ao trabalho; como parte do exercício da
autoridade profissional (AGUIAR; D‘OLIVEIRA; SCHRAIBER, 2013).
Além dessa aceitação social de desrespeito, a cultura de saúde contemporânea é
caracterizada por recursos que estimulam o comportamento desrespeitoso. Uma dessas
características é a sua natureza hierárquica. Desrespeito, que está intimamente ligada ao
status, geralmente flui para baixo, não para cima. Os estudantes raramente são exteriormente
desrespeitosos para com os seus professores, ou enfermeiras com seus supervisores, por causa
da probabilidade de repercussões. Por outro lado, alunos e residentes muitas vezes fazem
comentários desrespeitosos e depreciativos sobre seus superiores quando estão fora do alcance
da voz (LEAPE et al., 2012).
146
Organizações cuja cultura há muitos anos desencoraja comunicações
interpessoais, culturas organizacionais não-produtivas, aceitação do mau comportamento e
inércia clínica e administrativa são alguns termos utilizados nos estudos para abordar o
envolvimento da cultura organizacional disfuncional na ocorrência de comportamento
destrutivo no trabalho em saúde. (HARTUNG; MILLER, 2013; HICKSON et al., 2007;
ZIMMERMAN; AMORI, 2011).
Como ninguém relata o comportamento não-profissional, isto leva os outros a se
comportarem de maneira similar. Assim, o comportamento torna-se normal e aceito pelos
indivíduos (HICKSON et al., 2007).
Os especialistas concordam que o ambiente perioperatório é uma área em que as
enfermeiras geralmente são vítimas de bullying e violência lateral. Quer perpetrado por
médicos, administradores ou colegas, comportamentos de bullying foram identificados como
parte da rotina da cultura da sala de operações (BIGONY et al., 2009).
Este comportamento desrespeitoso pode realmente afirmar status, ao premiar a
pessoa quando se comporta de maneira desrespeitosa, que normalmente é altamente sensível à
hierarquia e tem plena consciência das consequências do desrespeito dirigido ao gradiente de
status. Em um ambiente hierárquico, a capacidade de desrespeitar os outros com a impunidade
é uma medida de status. O cirurgião cardíaco chefe de departamento pode, muitas vezes, sair
ileso de uma conduta que não é tolerada para os que estão mais abaixo da hierarquia (LEAPE
et al., 2012).
Embora as características de personalidade predispõem algumas pessoas a um
comportamento desrespeitoso, em sua maior parte, o desrespeito é um comportamento
aprendido, apoiado e reforçado pela cultura, baseada no estado autoritário encontrado na
maioria dos hospitais (LEAPE et al., 2012).
A seguir, apresentam-se as consequências do comportamento destrutivo relatadas
pelos entrevistados, categorizadas conforme a fase teórica.
5.4.1.2.2.4 Consequentes do comportamento destrutivo no trabalho em saúde
Semelhante aos resultados da fase teórica, as maiores consequências do
comportamento destrutivo relatadas nas entrevistas incidiram sobre o trabalhador, sua equipe
e a segurança do paciente, conforme se pode ver na Tabela 6.
147
Tabela 6 – Consequentes do comportamento destrutivo no trabalho em saúde segundo
os entrevistados. Fortaleza, CE, mar-jul 2014. n=29
a. poderia haver citação de mais de um consequente em cada entrevista. Fonte: Elaborada pela autora.
Quanto às consequências para o trabalhador, o sofrimento moral e psíquico foi
referido pela maioria dos entrevistados:
...na época que teve uma greve, que ia entrar uma nova cooperativa, alguns
profissionais batiam no peito mesmo dizendo: - ah, as pessoas que vão entrar
agora, a gente não vai treinar!...aí teve gente que chorou..., e teve momento
assim que eu pensei até em desistir por causa disso. Você percebia no olhar,
não falava com você...Eu cheguei a chorar. Sofri viu? (E2)
... [o médico] disse que não queria saber se [o pessoal] estava reduzido,
queria saber se descia o paciente! Isso [repercute para a] própria equipe
mesmo, trabalhar, vamos dizer assim, desgostosa, não vai trabalhar
motivada... (TE4)
...aquilo ali ia mexer comigo como até hoje mexe. Eu fico até chateada
[choro] pela situação, eu não gosto nem de falar disso... super chateada. Ela
me deixa traumatizada! Foi um conflito que eu acabei levando para dentro
de casa. E repercute até hoje. Que só em falar, eu me desestruturo! (E4)
A médica agrediu a enfermeira...Empurrou. A enfermeira também, não
pensou duas vezes, no que foi a mão, foi nas costas da médica. ... [Como
consequência...] a enfermeira perdeu a estrutura! Ela, literalmente, não
conseguiu voltar para o setor. Ela passou o resto do plantão todinho no
repouso. (TE10)
Isso [comportamento destrutivo] acontece muito e, assim, é motivo de muito
descontentamento, de muita insatisfação do ponto de vista deles, dos
auxiliares. (M3)
Dependendo da conduta adotada pelo indivíduo destrutivo, a consequência para os
colegas de trabalho pode variar desde impedimentos à colaboração em equipe e à
CONSEQUENTES f (%)
Para o trabalhador/equipe de saúde
Sofrimento moral e psíquico.
Prejuízos laborais: demissão, rotatividade/mudança de unidade e intenção de
deixar o emprego.
Rompimento da comunicação, da colaboração e do trabalho em equipe.
Afastamento e isolamento.
25 (86,2)
10 (34,5)
8 (27,6)
8 (27,6)
Totala 51
Para o paciente
Comprometimento da segurança e da qualidade dos cuidados.
Insatisfação.
25 (86,2)
5 (17,2)
Totala 30
Para a organização de saúde
Ameaça à imagem da instituição/equipe. 4 (13,8)
Total 4 (13,8)
148
comunicação ineficaz, ao isolamento e às manifestações de sofrimento moral e psíquico, com
sérias repercussões na vida individual, social e familiar.
O sofrimento moral é definido como uma resposta enfrentada quando, após uma
decisão de um conflito ético, reconhecem uma ação pessoal dificultada por barreiras
individual, institucional ou social (KOPALA; BURKHART, 2005). Compreendê-lo permite ir
além do enfrentamento dos problemas morais dos próprios trabalhadores, chegando a
configurar, de maneira mais ampla e reflexiva, a situação da própria instituição e do sistema
de saúde. Esses podem estar imperceptivelmente dificultando os cuidados e a atenção integral
na saúde, provocando, consequentemente, a necessidade da elaboração de uma ética de
sujeitos ativos e de amplas possibilidades, definidas principalmente pelas relações consigo
mesmos (BARLEM et al., 2013).
A submissão dos trabalhadores a situações constrangedoras e geradoras de
sofrimento moral, como as relatadas, associada às condições de trabalho como um todo, são
responsáveis pela emergência dos sintomas do burnout, mais do que as características isoladas
dos trabalhadores ou do ambiente de trabalho (MOREIRA et al., 2009).
O termo burnout foi primeiramente descrito por Freudenberger (1974), o qual o
definiu como um ―incêndio interno" resultante da tensão produzida pela vida moderna,
afetando negativamente a relação subjetiva com o trabalho. A síndrome de burnout, por sua
vez, caracteriza-se por uma tríade de dimensões (exaustão emocional, despersonalização e
redução da realização pessoal) e é uma condição relacionada à organização do trabalho
(VIEIRA et al., 2006).
Os efeitos do burnout podem prejudicar o profissional em três níveis: individual
(físico, mental, profissional e social), profissional (atendimento negligente e lento ao cliente,
contato impessoal com colegas de trabalho e/ou pacientes/clientes) e organizacional (conflito
com os membros da equipe, rotatividade, absenteísmo, diminuição da qualidade dos serviços)
(TRIGO; TENG; HALLAK, 2007).
Os efeitos são semelhantes aos discutidos nesta análise de conceito, considerando
que o burnout, além de ser consequente de comportamento destrutivo, atua como potencial
antecedente, na medida em que o profissional que sofre desta síndrome pode adotar conduta
negligente e entrar em conflito com os colegas de trabalho, renovando o círculo vicioso do
comportamento destrutivo no trabalho.
É preciso pensar, portanto, que os efeitos gerados por comportamentos destrutivos
podem, consequentemente, fazer emergir os antecedentes, numa retroalimentação do
fenômeno no contexto laboral.
149
A percepção da vivência de sofrimento moral pelas enfermeiras reforça a
necessidade de constantes indagações, reflexões e discussões nas equipes de trabalho,
enfocando os problemas morais e o sofrimento moral enfrentados pelos diferentes
trabalhadores, considerando-se, especialmente, sua possível relação com o cuidado dos
pacientes e o respeito aos seus direitos (BARLEM et al., 2012).
Além do sofrimento moral e psíquico, os entrevistados referiram que, após um
comportamento destrutivo, ocorre o rompimento da comunicação, da colaboração e do
trabalho em equipe, evidenciado nos seguintes depoimentos: ―A ajuda mútua e a interação
entre a equipe é completamente ameaçada!‖ (E1).
Acaba que afeta um pouco o relacionamento da equipe. Tem colega que
chega e sabe que é aquele médico, e já diz ―Ah! Droga! É o médico tal que
está de plantão?‖ Aí já fica meio receoso, fica mais na dele. Já trata tudo
profissionalmente, não conversa abertamente. (TE11)
O outro resultado potencial da opressão e do comportamento desrutivo é o
silêncio. Neste caso, os oprimidos não exercem sua voz ao falar, compartilhando seus
pensamentos, percepções e experiências, defendendo os seus pacientes, ou defendendo-se.
Este silêncio leva à submissão e à falta de autonomia percebida, resultando em perda de
criatividade e de iniciativa (LONGO; SMITH, 2011).
Os usuários dos serviços de saúde reconhecem que o atendimento seguro ao
paciente e de alta qualidade exige trabalho em equipe eficaz, comunicação aberta e um
ambiente de trabalho colaborativo (PATEL et al., 2011). No entanto, uma outra consequência
do comportamento destrutivo é a decomposição do trabalho em equipe (ROSENSTEIN,
2011b). Tal resultado tem relação com o comprometimento na comunicação entre os
membros da equipe, e é geralmente aceito que a falha na comunicação é uma das mais
proeminentes causas de erro médico (GUGLIELMI, 2010).
Além do prejuízo na comunicação e na eficácia individual e da equipe, ocorre
aumento do custo do cuidado, o que leva médicos, administradores e gestores a buscarem
novas posições em ambientes mais profissionais (BROWN; GOSKE; JOHNSON, 2009).
Estudos já confirmaram o impacto do comportamento destrutivo no aumento do
estresse e da frustração, na perda de concentração, na diminuição de coordenação de equipe,
na falta de compartilhamento de informação; na comunicação ineficaz, no aumento de erros
médicos; na diminuição da qualidade da assistência ao paciente, e até mesmo no aumento da
mortalidade do paciente (LUX; HUTCHESON; PATEL et al., 2011; PEDEN, 2012;
ROSENSTEIN, 2011b; ROSENSTEIN; O‘DANIEL, 2008b; VELTMAN, 2007).
150
No ambiente cirúrgico, embora a prevalência de transtornos de comportamento
tem diminuído, os episódios de comportamento destrutivo de cirurgiões persistem e afetam
negativamente a dinâmica da equipe e os resultados dos pacientes, porque eles diminuem a
comunicação, a colaboração e a troca de informações com o paciente e a equipe (PATEL et
al., 2011).
O fato do comportamento destrutivo ou intimidante contribuir para quase-erros e
resultados adversos nos serviços tem relação direta com a comunicação entre os membros da
equipe de saúde, que se encontra inibida. Esta ineficácia na comunicação diminui a vontade
de questionar e discutir planos de tratamento, ou faz com que os profissionais os contornem
para evitar contato e discussões com os colegas destrutivos (VELTMAN, 2007).
Em pesquisa sobre comportamento médico destrutivo e relacionamento da equipe
de saúde, embora tenha havido muitos comentários sobre as relações de trabalho positivas
entre enfermeiros e médicos, a maioria dos comentários incidiram sobre as consequências
negativas de intimidação e da má comunicação (ROSENSTEIN; O‘DANIEL, 2008b).
Para estes trabalhadores, o comportamento destrutivo provoca estresse, ansiedade,
frustração e raiva, o que pode dificultar a comunicação e a colaboração, e resultar em erros
médicos evitáveis, eventos adversos e outros comprometimentos em cuidados de qualidade
(ROSENSTEIN; O‘DANIEL, 2008b).
No que diz respeito ao trabalho em equipe, sabe-se que este é consideravelmente
afetado pela falha na comunicação. Nos estudos analisados, autores referiram que o
comportamento destrutivo gera redução da eficácia da equipe (GLUCK, 2010), por inibir o
coleguismo e a cooperação essencial para o trabalho em equipe (LEAPE et al., 2012).
Falta de respeito envenena o bem do coleguismo e da cooperação, prejudica a
moral, e inibe a transparência e o feedback. É uma grande barreira para as organizações de
saúde se tornarem centros de colaboração, integrados, suportes de cuidado centrado no
paciente (LEAPE et al., 2012).
Além de seu impacto tóxico sobre a segurança do paciente, o comportamento
desrespeitoso afeta muitos outros aspectos de cuidados de saúde. A qualidade sofre quando os
profissionais não trabalham em equipe (LEAPE et al., 2012).
Em pesquisa sobre comportamento destrutivo no serviço de emergência, o
comportamento destrutivo causou impacto negativo significativo sobre a colaboração em
equipe, considerando que 43,8% dos profissionais relataram prejuízo na colaboração entre
enfermeiros e médicos, 42% relataram fluxo de informações prejudicado, 55,6% menor
151
comunicação, e 46,7% prejuízo das relações enfermeiro-médico (ROSENSTEIN; NAYLOR,
2012).
Outro estudo aponta que o médico destrutivo pode ter um aumento da carga de
trabalho porque colegas nao irão assisti-lo (DISRUPTIVE, 2011).
Desse modo, as consequências para a comunicação e o trabalho em equipe afetam
não somente as vítimas de comportamento destrutivo, mas também o próprio indivíduo
destrutivo. Este, ao retornar ao ambiente de trabalho, vivencia o impacto da falta de
colaboração por parte dos colegas e este clima favorece novas ocorrências de condutas
desrespeitosas e inapropriadas no serviço, o que se transforma em hostilidade no ambiente de
trabalho.
Houve também relatos de afastamento e isolamento, os quais ocorrem devido ao
rompimento da ajuda mútua e da comunicação.
Eu tento fazer o percurso que ela [a chefe] não faz. Eu tento chegar na hora
que ela não chega. Ela trabalha em outra unidade. Eu tento não passar em
frente à sala dela, não andar no mesmo andar que é o setor dela. Eu evito.
Porque não dá para eu bater de frente, aqui no hospital, com ela. (E4)
Aí o profissional faz a coisa com mau gosto, aí o profissional se cansa, aí o
profissional não gosta daquela pessoa quando vem dar o plantão com ela
entendeu? Se afasta, se isola... (AE2)
Existem certas pessoas que se acham que por ser concursado, por trabalhar
aqui por mais tempo e por eventualmente você, embora capacitado, seja uma
pessoa nova no serviço, elas se sentem aptas a se sentir dono do lugar e fazer
confusão mesmo com uma coisa que ela julga ser errado sem apurar ou saber
a verdade. Mas isso foi uma coisa pontual de uma pessoa. É uma enfermeira
[destrutiva]. É a única pessoa que eu não gosto, que eu evito até conversar!
(M1)
Você tem medo de perguntar alguma coisa à pessoa [destrutiva]... (TE7)
Os depoimentos demonstram o quanto o comportamento destrutivo implica na
deteoriração da harmonia da equipe, favorecendo o aumento da hostilidade, da frustração e da
insatisfação com o trabalho.
Autores afirmam que a intimidação da equipe de enfermagem pode impedi-la de
questionar o médico sobre os aspectos do atendimento ao paciente ou esclarecer um
tratamento ou ordem de medicação (WLODY, 2007).
Além de diminuir a vontade de questionar e discutir ordens e planos de
tratamento, este ambiente de tensão e de pouca colaboração pode fazer com que o enfermeiro
modifique ou contorne as orientações mal esclarecidas, para evitar o contato e discussões com
colegas destrutivos (VELTMAN, 2007).
152
Individualmente, essas questões não costumam levar as pessoas a revidar, mas o
efeito cumulativo pode resultar na percepção de que certos comentários são ataques pessoais,
causando uma reação de luta ou de fuga (KAPLAN; MESTEL; FELDMAN, 2010).
Além disso, pode ocorrer uso indiscriminado de atestado médico e isolamento do
paciente e dos profissionais, no intuito de evitar o médico destrutivo (MCLEMORE, 2006;
MCLEMORE, 2006), além da busca por tratamentos com psicólogos ou psiquiatras.
Evitar a pessoa impõe o comportamento danoso. Para um enfermeiro ou residente,
este pode ser expresso por relutância em chamar um médico assistente desrespeitoso com
perguntas para esclarecimento de uma ordem, ou por preocupações clínicas que não estão
claras. Nesses casos, os profissionais podem desviar a atenção do paciente para auto-proteção.
Quando a comunicação na equipe de cuidados de saúde é limitada ao que é absolutamente
necessário, o perdedor é o paciente, que pode sofrer de diagnósticos ou tratamentos tardios ou
errados (LEAPE et al., 2012).
As vítimas dos comportamentos destrutivos não são reconhecidas como tal; não
há reconhecimento ou apoio para as ações contra elas, e estas podem se tornar complacentes
ou sofrerem em silêncio. Este silêncio põe em perigo a saúde e a segurança do paciente e do
trabalhador (LONGO; SMITH, 2011).
Comportamento intimidante no local de trabalho pode incluir ameaças à situação
pessoal, isolamento, excesso de trabalho e desestabilização (FELBLINGER, 2008).
Ultimamente, o tem sido relacionado a um efeito negativo na segurança do paciente e na
qualidade da assistência por levar os outros a evitarem o médico destrutivo. Os profissionais
podem evitar de questioná-lo para pedir ajuda ou esclarecimento e hesitar de fazer sugestões
relacionadas ao cuidado do paciente (ROSENSTEIN, 2011b).
Alguns médicos podem ser isolados dos colegas, da equipe e administração do
hospital (DISRUPTIVE, 2011). Vítimas tendem a reter informações por medo de serem
criticadas ou menosprezadas; encobrem os erros médicos para não ter que pedir ajuda ou
servirem de bode expiatório; e a equipe torna-se mais isolada, defensiva ou disfuncional
(PFIFFERLING, 1999).
A partir daí, o ambiente de trabalho torna-se hostil, e surgem os prejuízos laborais,
também lembrados por alguns entrevistados: ―Ela [a auxiliar que sofreu intimidação] perdeu a
escala, simplesmente perdeu a escala! Ela saiu daqui por causa de conflito de
relacionamento.‖ (TE10); ―O que eles [os técnicos de enfermagem] fazem é, às vezes, não vir
pro plantão, ou sair daqui e procurar outro hospital...‖ (M3); ―...demissão não, mas [já soube
de casos em que houve] transferência sim, de setor...‖ (TE1)
153
Muitas pessoas já perderam o emprego, foram intimidadas, principalmente
os meninos da cooperativa. Por chefia, por diretores, por médicos, e eu acho
isso errado, muito errado! (AE2)
Estudo afirma que, quando este comportamento existe no cuidado à saúde, a
satisfação do paciente cai, a rotatividade de profissionais aumenta e a prosperidade da prática
ou do hospital é ameaçada (CHISM, 2012b). Assim, há aumento da carga de trabalho e da
despesa, e impedimento da retenção de profissionais na organização, pois a equipe sai
prematuramente ou abusa de dias doentes para se distanciar do profissional destrutivo. O
recrutamento também sofre consequências, devido às histórias em torno do médico destrutivo.
Existe, ainda, apoio limitado por parte das lideranças, então mais erros são cometidos por
aqueles que permanecem na instituição (PFIFFERLING, 2008).
Tempo extra e esforço são gastos em defesa dos fatos hostis no ambiente de
trabalho. Os custos sobem enquanto médicos intimidam colegas que se defendem por,
obrigatoriamente ou compulsivamente, documentarem ou detalharem episódios destrutivos.
Nos EUA, estes custos médicos defensivos são conservadoramente estimados em bilhões de
dólares (PFIFFERLING, 2008).
Colegas de trabalho chegam mais tarde, saem mais cedo, e não contribuem para
reuniões clínicas da equipe, de modo a evitar a interação com o colega destrutivo. A
capacidade de criatividade e de inovação declina por causa do ambiente "tóxico". Médicos de
consultório fogem de participarem na assistência ao paciente hospitalizado por causa do
estresse associado à interação com o médico destrutivo (PFIFFERLING, 2008).
No contexto acadêmico, quando comportamentos destrutivos surgem, há também
um desconforto gerado no ambiente de trabalho. Este se manifesta por meio de dores de
cabeça administrativas e necessidade de acalmar os membros do corpo docente e funcionários
que foram submetidos aos comportamentos destrutivos (FRANKEN, 2011).
Eventualmente, há baixa moral, principalmente entre os residentes, técnicos,
funcionários e membros da equipe de apoio; surgem problemas sutis, mas definidos em
recrutar e manter professores e funcionários (FRANKEN, 2011). Além disso, administradores
e gestores tendem a buscar novas posições em ambientes mais profissionais (LEIKER, 2009).
O comportamento destrutivo também leva a uma maior rotatividade de
funcionários dentro e fora das organizações. Os trabalhadores individuais que são afetados por
este comportamento relatam aumento do sofrimento psicológico e maior insatisfação com sua
154
vida pessoal e trabalho, e são, portanto, mais propensos a abandonar o emprego (PATEL et
al., 2011).
Um dos principais objetivos de uma pesquisa foi identificar o impacto do
comportamento destrutivo sobre a retenção de enfermeiros. Os participantes foram solicitados
a descrever o impacto do comportamento destrutivo em si mesmos e nos outros. Descrições
de 90 trabalhadores foram sintetizadas em três temas: impacto no enfermeiro assistencial, no
paciente e no ambiente da prática. Uma enfermeira descreveu os efeitos significativos da
incivilidade experimentada como "grosseria cotidiana‖, com grande impacto na moral, no
investimento, no tempo que estava disposto a trabalhar e na vontade de ir trabalhar
(WALRATH; DANG; NYBERG, 2010).
No mesmo estudo, cada grupo de participantes foi perguntado se sabia de algum
caso em que um enfermeiro tinha sido transferido para outra unidade ou departamento devido
ao comportamento destrutivo. Quarenta e seis enfermeiros (48%) responderam que sim. Além
disso, 33 (34%) afirmaram que sabiam que os enfermeiros deixaram a organização por causa
do comportamento destrutivo.
Esta descoberta tem implicações significativas para o recrutamento, a retenção e o
treinamento de enfermeiros, para a prestação do cuidado ao paciente, e para os custos
associados (WALRATH; DANG; NYBERG, 2010).
No contexto cirúrgico, os trabalhadores temem que os cirurgiões sejam poderosos
e, se eles relatá-los, podem ser demitidos (OR MANAGER, 2005). Em outra pesquisa,
verificou-se uma média de 2,4 enfermeiros que deixaram a instituição a cada ano devido a
esses comportamentos. Enfermeiros que deixaram o hospital devido sofrerem
comportamentos destrutivos fizeram outras alterações – como rever horários, alternar turnos,
ou mudança de unidades, a fim de evitar o contato com certos médicos (ROSENSTEIN,
2002).
Mais importante ainda, o fato de perder apenas um empregado, particularmente
um enfermeiro, pode afetar profundamente a capacidade do hospital de operar e pode
adicionar os custos já elevados de recrutamento e substituição (ROSENSTEIN, 2002).
Quanto às consequências para o paciente, os entrevistados referiram o
comprometimento da segurança e da qualidade dos cuidados, assim como na fase teórica:
[Após um episódio de comportamento destrutivo], o paciente, em vez de ter
um dia de plantão com o funcionário descansado, ele estaria com um
funcionário que estava com a escala bem sobrecarregada! E isso pode
ocasionar vários erros na assistência, que a gente vê por aí. Por sobrecarga
de trabalho... erros de medicações. (E4)
155
[Comportamento destrutivo] traz o prejuízo porque você tem que parar, o
serviço já não flui, você tem que parar, voltar para ajeitar aquilo ali, para dar
continuidade... (E6)
[Após um episódio de comportamento destrutivo], todo mundo vai ficar
chateado, então ele [o trabalhador] não vai dar uma qualidade [no
atendimento]. Porque é uma pessoa que está estressada, ela está cobrada, ela
pode fazer uma medicação errada, ela pode deixar de fazer [a medicação]...
(AE2)
No meio do plantão tinha uma paciente grave, que tinha que ser sondada, e a
enfermeira não foi. A sonda... a assistência total ao paciente deixou de ser
feita pela enfermeira. A enfermeira, eu acredito, que não teve foi estrutura,
depois da confusão, para dar assistência, sendo que ela tinha que dar
assistência, era paciente, entendeu? Talvez por não conseguir enxergar a
equipe, pelo que a médica falou em relação à vida pessoal dela... Então
assim... ela não deu assistência!‖ (TE10)
[Devido ao comportamento destrutivo do profissional de saúde], o paciente
se enquadra no lugar errado, num lugar pouco apropriado, com pouca
assistência, ele vai piorar e até voltar pra UTI. Pode ter uma recaída! (M2)
[Um episódio destrutivo] tira a concentração ali, do paciente, tira o foco do
paciente e coloca em outra coisa e acaba que, imagino que prejudique o
resultado final. (M5)
Além dos entrevistados relatarem, por meio de sua experiência, que o
comportamento destrutivo traz prejuízos à segurança do paciente, também foi possível
evidenciar esta consequência na prática.
Quando a equipe estava sobrecarregada, conforme relato de algumas técnicas, os
pacientes que não tiveram sua mudança de decúbito realizada podem ter desenvolvido uma
úlcera por pressão. O paciente que ia para exame e o maqueiro relutou em levá-lo também
pode ter sofrido uma consequência negativa em seu tratamento, pois sua condição clínica
estava realmente agravada e o exame seria extremamente necessário para confirmar a
gravidade do caso e para a tomada de decisão da médica assistente. A paciente que não foi
sondada, porque a enfermeira não teve condições psicológicas para continuar trabalhando
após discussão com uma médica no centro cirúrgico, pode ter sofrido danos também. No
entanto, seria preciso informações mais acuradas e maior tempo de observação e
acompanhamento de cada caso para comprovar sua relação com o comportamento destrutivo.
No entanto, foi possível perceber, em muitos momentos, que quando a chefe de
enfermagem adotava um comportamento destrutivo, toda a equipe manifestava insatisfação e
tensão, e isso poderia implicar em erros e eventos adversos.
Assim, identificar as repercussões de condutas destrutivas para a qualidade da
assistência pode ser uma das ações a serem desenvolvidas com maior propriedade por parte de
156
gestores, gerentes e lideranças dos serviços de saúde. Tratar o comportamento destrutivo
como indicador de qualidade no ambiente hospitalar seria uma estratégia para abordar como e
quando os fatores humanos estão envolvidos na ocorrência de erros, falhas de comunicação e
resultados negativos para o paciente, como os eventos adversos.
Estudo afirma que o comportamento destrutivo ou intimidante demonstrado pelos
profissionais no ambiente de saúde é uma das maiores ameaças à segurança do paciente
(VELTMAN, 2007), pois leva à distração e coloca em risco a qualidade e a segurança do
paciente. Isto porque este comportamento tem um efeito cascata nos pacientes: "os pacientes
são destinatários de comportamento destrutivo também!‖. Alguém que é destrutivo no
ambiente de trabalho não vai ser desligado quando entrar no quarto do paciente."
(WALRATH; DANG; NYBERG, 2010).
Na mesma pesquisa, enfermeiros expressaram preocupações de que o
comportamento destrutivo pode diminuir a qualidade do atendimento, criar riscos para a
segurança do paciente, retardar a prestação de cuidados, e perturbar as relações de trabalho
entre os membros da equipe.
Estudo reitera que a consequência mais importante do comportamento destrutivo
de médicos é o risco aumentado de erros médicos e a segurança do paciente comprometida
(BROWN; GOSKE; JOHNSON, 2009). Este aspecto foi ressaltado pela maioria dos artigos
inseridos na fase teórica.
Em recente pesquisa com 1500 profissionais de diversas categorias, entre 53% e
75% dos entrevistados disseram que viram uma forte ligação entre comportamento destrutivo
e resultados clínicos negativos (com exceção de mortalidade dos pacientes, apenas um quarto
dos entrevistados viu tal associação) (ROSENSTEIN; O‘DANIEL, 2005).
Os resultados também mostraram uma forte percepção de associação entre
comportamento destrutivo e a ocorrência de eventos adversos e erros, bem como os efeitos
negativos deste comportamento sobre a segurança do paciente, a qualidade dos cuidados, a
mortalidade e a satisfação do paciente (ROSENSTEIN; O‘DANIEL, 2005).
A questão mais crítica de uma pesquisa foi a percepção do entrevistado sobre a
relação entre interações destrutivas e eventos adversos na assistência ao paciente. Usando a
estrutura de questão nunca, ocasionalmente, às vezes, frequente e constante, os entrevistados
foram convidados a avaliar a relação entre comportamentos destrutivos e eventos adversos,
erros médicos, segurança do paciente, qualidade do cuidado, mortalidade do paciente e
satisfação. Se combinarmos as respostas às vezes, freqüentes e constantes como motivo de
preocupação, 66% dos participantes consideraram que havia uma ligação entre
157
comportamentos destrutivos e eventos adversos, 71% com erros médicos, 53% com o
comprometimento da segurança do paciente, 72% com efeitos prejudiciais sobre a qualidade
do atendimento, 25% com a mortalidade dos pacientes, e 75% com a piora da satisfação
pessoal. Acrescenta-se que 14% dos entrevistados relataram estar ciente de um evento
adverso específico que ocorreu por causa de um episódio de comportamento destrutivo
(ROSENSTEIN; O‘DANIEL, 2008b).
No ambiente cirúrgico, estudo multicêntrico registrou que a pobre comunicação
pós-operatória por causa de uma reputação destrutiva resultou em atraso no tratamento,
broncoaspiração, e a eventual morte do paciente (ROSENSTEIN; O‘DANIEL, 2008a).
A grande preocupação é o impacto no atendimento ao paciente. Os resultados de
estudo com 4530 participantes de 2004 a 2007 nos EUA, entre enfermeiros, médicos,
administradores e outros, indicam que mais de 70% dos inquiridos consideraram que havia
uma ligação entre comportamentos destrutivos, erros médicos e atendimento de má qualidade.
Mais do que dois terços sentiu que comportamentos destrutivos estavam ligados a eventos
adversos, mais de 50% sentia que havia uma ligação com, e mais de um quarto dos
entrevistados sentia que havia uma ligação com a mortalidade dos pacientes (ROSENSTEIN;
O‘DANIEL, 2008a).
Os resultados da pesquisa mostraram que o comportamento destrutivo ocasiona
erros (71%), eventos adversos potencialmente evitáveis (67%), comprometimento em matéria
de segurança do paciente (51%) e qualidade do cuidado (71%), e mortalidade dos pacientes
(27%) (ROSENSTEIN; O‘DANIEL, 2008a).
Em outro estudo, dos 1131 entrevistados, 10,1% (n=114) responderam que um
dano ocorreu e 19,6% (n=222) relataram que não tinham certeza se o evento destrutivo havia
resultado em dano. Para aqueles que referiram dano aos pacientes, foram relatados 189
incidentes de danos como resultado de comportamento destrutivo: 77,2% (n=146)
temporários, 10% (n=19) permanentes, e 12,7% (n=24) requeriram intervenções para garantir
a vida (ROSENSTEIN, 2012).
A insatisfação do paciente também foi considerada uma consequência do
comportamento destrutivo do trabalhador: ―[As pessoas destrutivas] são vistas com maus
olhos... gera um transtorno!‖ (E6).
De paciente, a gente tem problemas demais de reclamação, e eles não sabem
diferenciar o que é enfermeiro e o que é auxiliar, acontece muito de o
paciente chegar da noite pra vim falar com a ouvidoria durante o dia e fala
que foi a enfermeira [que agiu de forma destrutiva]... (E5)
158
Já ouvi relato de paciente [após presenciar um comportamento destrutivo]...,
de subir pressão de paciente, de ficar tenso...Eu acho que o paciente fica
tenso! (E7)
É possível perceber, na prática, que os pacientes percebem, sentem e criticam as
atitudes manifestadas por profissionais de saúde, principalmente quando eles presenciam
situações constrangedoras e inapropriadas. Muitos deles apenas observam, comentam a
respeito com o acompanhante ou com os outros pacientes, manifestando indignação ou
insatisfação. No entanto, está cada vez mais comum aqueles pacientes que buscam denunciar
os profissionais, talvez por reunirem mais informações e terem maior conhecimento de seus
direitos e dos deveres dos trabalhadores de saúde. Desse modo, seguem adiante e fazem
queixas à ouvidoria do serviço ou aos órgãos de classe.
Autoras afirmam que o paciente é capaz de visualizar e criticar a falta de um
cuidado ético que honre sua dignidade humana, tratando-o como se fosse gente. Deseja, em
contrapartida, uma conduta profissional que integre a alteridade e o respeito. O paciente-
cidadão é observador, reflexivo e crítico, capaz de avaliar minuciosamente o menor gesto e
interpretar a expressão mais sutil do profissional, seja do cavalo batizado, seja do coração
bondoso. É essa a voz legítima, comprometida com a defesa da vida, que poderá revolucionar
a conduta profissional, remoralizar o paciente e humanizar o cuidado (NATIONS; GOMES,
2007).
Outro estudo apontou a insatisfação e o descontentamento dos pacientes quanto às
ações e atitudes da equipe de enfermagem, compreendidas como ―não cuidado‖, tais como
não informação, atenção e assistência devida; transferência de responsabilidade entre os
profissionais; demasiado tempo para o atendimento de suas necessidades; não valorização dos
sinais e comunicação não verbal como cuidado, como pouco contato, mais mecânico que
humano; não prioridade de atendimento aos idosos; calma e respeito esgotados e, por vezes,
tratamento grosseiro, frio e insensível (BAGGIO; CALLEGARO; ERDMANN, 2011).
Finalmente, foram relatadas as consequências quanto à ameaça à imagem da
equipe e da organização: ―Aquilo ali [a intimidação] fica uma visão péssima para toda a
equipe da UTI!‖ (E1); ―[As pessoas destrutivas] ficam mal vistas...[pelo] mal estar que gera, a
pessoa já fica trabalhando com má vontade, tenso e se sentindo mal mesmo.‖ (E7); ―[as
pessoas destrutivas ficam] muito mal vistas!‖ (AE2)
159
A satisfação do paciente é influenciada por experiências com profissionais da
equipe e médicos e relatos de insatisfaçaão podem negativamente afetar a reputação do
hospital (WALRATH; DANG; NYBERG, 2013).
Pacientes que presenciam o comportamento destrutivo podem perder a confiança
no médico assim como na instituição (ROSENSTEIN, 2011a). Quando testemunham eventos
destrutivos ou encontram comportamentos não-profissionais desagradáveis, pacientes são
mais predispostos a expressar respostas negativas nos questionários de satisfação, a contar às
suas famílias ou escrever a respeito em um número de diferenctes redes sociais, todos os quais
podem afetar a impressão pública e a imagem da instituição (WALRATH; DANG; NYBERG,
2013).
Desse modo, há ameaça à imagem do hospital (CHISM, 2012b; PIPER, 2003);
redução da imagem pública do hospital (GROGAN; KNECHTGES, 2013; SAMENOW;
SWIGGART; SPICKARD, 2008); e influência negativa na imagem, confiança e moral da
equipe (PIPER, 2003).
O comportamento médico destrutivo pode resultar em consequências médicas,
econômicas e emocionais significativas (GROGAN; KNECHTGES, 2013); em ameaça ao
status profissional (FELBLINGER, 2008); e em perda de confiança do paciente na equipe de
cuidados (ROSENSTEIN, 2012).
Nota-se, portanto, que o comportamento destrutivo gera uma ―destruição‖ no
ambiente de trabalho, o que podemos atribuir ao desrespeito organizacional instituído e
enraizado nas condutas de muitos trabalhadores. Uma sucessão de condutas hostis,
intimidantes, abusivas e grosseiras podem favorecer a aceitação do desrespeito como algo
normal, seguido do estabelecimento de um ambiente de trabalho hostil, em que as pessoas se
encontram doentes e cansadas, os pacientes pioram seus quadros clínicos e correm mais riscos
de desenvolver danos e outras doenças, e estes resultados implicam na imagem da
organização perante a sociedade, que não acredita na garantia de qualidade dos trabalhadores
que ali labutam. Além disso, comportamento destrutivo implica em maior sobrecarga de
trabalho e outros problemas de comunicação, colaboração e trabalho em equipe, renovando o
círculo vicioso do comportamento destrutivo no trabalho em saúde.
A seguir, apresenta-se a Figura 10, que representa um mapa conceitual elaborado
pela pesquisadora no programa examtime®, sintetizando os achados da fase de campo, inter-
relacionando antecedentes, atributos e consequentes do comportamento destrutivo.
160
Figura 10 – Estrutura conceitual do comportamento destrutivo no trabalho em saúde: fase do trabalho de campo
Fonte: Elaborada pela autora.
Características GROSSEIRO/IGNORANTE DESRESPEITOSO
Desagradável
Abusivo
Constrangedor
Desumano Confuseiro
Pedante
Arrogante Agressivo
Inapropriado
Explosivo
ATRIBUTOS/CONDUTAS CARACTERÍSTICAS
DO COMPORTAMENTO DESTRUTIVO NO
TRABALHO EM SAÚDE
CONSEQUÊNCIAS DO COMPORTAMENTO
DESTRUTIVO ANTECEDENTES DO COMPORTAMENTO
DESTRUTIVO
161
―A lei de ouro do comportamento é a
tolerância mútua, já que nunca pensaremos
todos da mesma maneira, já que nunca
veremos senão uma parte da verdade e sob
ângulos diversos.‖
(Mahatma Gandhi)
162
6 ANÁLISE DE CONCEITO: FASE ANALÍTICA FINAL
Esta fase compreende a comparação entre os dados resultantes da fase teórica e as
observações empíricas, sendo o produto final a apresentação da definição do conceito, bem
como a identificação de lacunas conceituais que direcionam o desenvolvimento de outras
pesquisas.
Respondendo aos questionamentos iniciais propostos pelo modelo híbrido,
compreendemos que o conceito é igualmente aplicável e importante não só para a
Enfermagem, mas para a área da saúde como um todo. Assim, a seleção do conceito se
justifica, pois possibilitou conhecer o fenômeno em toda a sua complexidade, considerando
aspectos envolvidos, manifestações e consequências. A revisão de literatura, por sua vez,
permitiu o aprofundamento teórico, e os achados empíricos possibilitaram apoiar a sua
presença no grupo e no contexto social dos trabalhadores selecionados, com divergências e
convergências abordadas em todo o processo de análise dos dados na fase de campo.
Constatou-se que o comportamento destrutivo no trabalho em saúde se manifesta
por meio de condutas características de violência psicológica, incivilidade ou violência
física/sexual, estas últimas consideradas os três principais atributos do comportamento
estudado. Na Fase teórica, as evidências científicas levantadas identificaram, como principais
condutas destrutivas: humilhar o colega de trabalho publicamente, agir ou falar com
grosseria, intimidar e usar linguagem abusiva, todas características de Violência
Psicológica. Já na Fase do trabalho de campo, predominaram, nas entrevistas e nas
observações, condutas características de Incivilidade, como recusar-se a executar as tarefas
atribuídas ou exibir atitudes que não cooperam durante as atividades de rotina; seguidas
de condutas de violência psicológica, como intimidar e agir ou falar com grosseria.
Este resultado pode ser visualizado, com clareza, na Tabela 7, onde estão reunidos
e confrontados os resultados das fases téorica e de campo quanto às categorias e condutas
características de comportamento destrutivo, com suas frequências em relação ao número
total de artigos analisados (70) e de entrevistas (29).
163
Tabela 7 – Distribuição dos atributos e condutas características de comportamento
destrutivo no trabalho em saúde segundo os 70 artigos científicos e as 29 entrevistas.
Fortaleza, CE, 2013-2014
a. poderia haver citação de mais de um atributo/conduta característica em cada artigo/entrevista.
Fonte: Elaborada pela autora.
No que diz respeito aos antecedentes do comportamento destrutivo, em ambas as
fases predominaram os intrapessoais. Na Fase Teórica, destacaram-se o estresse/situações
críticas, ansiedade, fadiga e depressão; e as características ou traços de personalidade.
Na Fase do trabalho de campo, estes dois antecedentes também foram preponderantes, e
ATRIBUTOS/CONDUTAS CARACTERÍSTICAS Teóricos
f (%)
Empíricos
f (%)
Total
f (%)
Violência Psicológica
Humilhar o colega de trabalho publicamente. 47 (67,1) 1 (3,4) 48 (48,5)
Agir ou falar com grosseria/ gritar.
Intimidar.
31 (44,3)
26 (37,1)
13 (44,8)
14 (48,3)
44 (44,4)
40 (40,4)
Usar linguagem abusiva. 22 (31,4) - 22 (22,2)
Arremessar objetos, instrumentais ou prontuários. 17 (24,3) 1 (3,4) 18 (18,2)
Gerar fofocas, brigas, sabotagem, traição. 16 (22,9) - 16 (16,2)
Fazer observações e exibir atitudes discriminatórias. 13 (18,6) - 13 (13,1)
Reter informações para prejudicar o colega. 6 (8,6) - 6 (6,1)
Ameaçar. 6 (8,6) - 6 (6,1)
Outras. 14 (20,0) - 14 (14,1)
Totala 198 29 227
Incivilidade
Recusar-se a executar tarefas atribuídas ou exibir
atitudes que não cooperam durante as atividades de
rotina.
Desrespeitar o colega de trabalho.
Descumprir normas, rotinas e protocolos
organizacionais.
Manifestar explosões de raiva.
10 (14,3)
14 (20,0)
12 (17,1)
16 (22,9)
15 (51,7)
9 (31,0)
6 (20,7)
-
25 (25,3)
23 (23,2)
18 (18,2)
16 (16,2)
Fazer comentários hipercríticos ou depreciativos acerca
da organização.
13 (18,6) - 13 (13,1)
Relutar ou recusar-se a responder a perguntas e/ou
retornar ligações.
12 (17,1) - 12 (12,1)
Manifestar comportamento antiético.
Praticar uma gestão punitiva, autoritária
Gerar discussões conflituosas
-
-
-
10 (34,5)
7 (24,1)
6 (20,7)
10 (10,1)
7 (7,1)
6 (6,1)
Agir indelicadamente, não ouvir, ignorar o colega de
trabalho.
Fazer cobranças.
5 (7,1)
-
-
3 (10,3)
5 (5,1)
3 (3,0)
Agir com negligência. - 3 (10,3) 3 (3,0)
Outras. 12 (17,1) - 12 (12,1)
Totala 94 59 153
Violência Física ou Sexual
Abusar Fisicamente 14 (20,0) 1 (3,4) 15 (15,2)
Assediar Sexualmente 15 (21,4) - 15 (15,2)
Totala 29 1 30
164
evidenciados em boa parte das entrevistas, mas a sobrecarga de trabalho, antecedente
organizacional, também mereceu destaque, conforme se pode constatar na Tabela 8.
Tabela 8 – Distribuição dos antecedentes do comportamento destrutivo no trabalho em
saúde segundo os 70 artigos científicos e as 29 entrevistas. Fortaleza, CE, 2013-2014
a. poderia haver citação de mais de um antecedente em cada artigo/entrevista.
Fonte: Elaborada pela autora.
As principais características/adjetivos atribuídos ao trabalhador que adota o
comportamento destrutivo, na Fase teórica, foram intimidante, hostil, rude/grosseiro e
abusivo. Já na Fase de campo, os termos utilizados pelos trabalhadores para definir colega
destrutivo convergiram para determinar o adjetivo rude/grosseiro, sinônimo de ignorante, na
ANTECEDENTES Teóricos
f (%)
Empíricos
f (%)
Total
f (%)
Intrapessoais
Características/traços de personalidade. 20 (28,5) 30a 50 (50,5)
Estresse/situações críticas, ansiedade, fadiga e
depressão.
28 (40,0) 12 (41,4) 40 (40,4)
Falta de competência, autonomia, inteligência
emocional no trabalho.
14 (20,0) 7 (24,1) 21 (21,2)
Crenças e valores pessoais arraigados. 10 (14,3) - 10 (10,1)
Má educação. - 6 (20,7) 6 (6,1)
Abuso de substâncias. 4 (5,7) - 4 (4,1)
Maior idade e tempo de serviço. - 4 (13,8) 4 (4,1)
Conflitos/problemas pessoais ou familiares 4 (5,7) - 4 (4,1)
Desordens psiquiátricas. 4 (5,7) - 4 (4,1)
Formação acadêmica. 3 (4,3) - 3 (3,0)
Experiências prévias com comportamento destrutivo. 3 (4,3) - 3 (3,0)
Falta de humanização/ética profissional. - 3 (10,3) 3 (3,0)
Totala 89 62 151
Organizacionais
Sobrecarga de trabalho. 13 (18,6) 13 (44,8) 26 (26,3)
Problemas sistêmicos não resolvidos. 16 (22,8) 2 (6,9) 18 (18,2)
Cultura organizacional disfuncional. 9 (12,8) - 9 (9,1)
Áreas/especialidades de alta tensão. 9 (12,8) - 9 (9,1)
Dimensionamento de pessoal inadequado. 6 (8,6) - 6 (6,1)
Conflitos de papel e de poder. 3 (4,3) 3 (10,3) 6 (6,1)
Falta de suporte organizacional. 5 (7,1) - 5 (5,1)
Demandas de atendimento dos usuários. 4 (5,7) - 4 (4,1)
Outros. 3 (4,3) - 3 (3,0)
Totala 68 18 86
Interpessoais
Divergência de opiniões/pensamentos. 8 (11,4) 2 (6,9) 10 (10,1)
Comunicação ineficaz. 9 (12,8) - 8 (8,1)
Ausência de trabalho em equipe/colaboração. 6 (8,6) - 6 (6,1)
Autoritarismo. 5 (7,1) - 5 (5,1)
Questionamento de ordens médicas. 5 (7,1) - 5 (5,1)
Falta de respeito entre os colegas. - 2 (6,9) 2 (2,0)
Totala 33 4 37
165
linguagem cearense, termo mais referido pelos entrevistados. Este resultado é constatado na
Tabela 9.
Tabela 9 – Distribuição dos principais adjetivos atribuídos ao trabalhador que adota
comportamento destrutivo, segundo os 70 artigos científicos e as 29 entrevistas.
Fortaleza, CE, 2013-2014
a. poderia haver citação de mais de um adjetivo em cada artigo/ entrevista.
Fonte: Elaborada pela autora.
Na avaliação dos consequentes do comportamento destrutivo, verificou-se que
esta variável foi a mais convergente ao se compararem os dados teóricos e os dados do
trabalho de campo. Ou seja, em ambas as etapas, predominaram os seguintes consequentes:
comprometimento da segurança do paciente e da qualidade dos cuidados e sofrimento
moral e psíquico dos trabalhadores, seguidos do rompimento da comunicação, da
colaboração e do trabalho em equipe e dos prejuízos laborais. Isto pode ser confirmado na
Tabela 10.
ADJETIVOS Teóricos
f (%)
Empíricos
f (%)
Total
f (%)
Rude/grosseiro 15 (21,4) 13 (44,8) 28 (28,3)
Intimidante 19 (27,1) - 19 (19,2)
Hostil 18 (25,7) - 18 (18,2)
Abusivo 13 (18,6) - 13 (13,1)
Totala 65 13 78
166
Tabela 10 – Distribuição dos consequentes do comportamento destrutivo no trabalho em
saúde segundo os 70 artigos científicos e as 29 entrevistas. Fortaleza, CE, 2013-2014
a. poderia haver citação de mais de um consequente em cada artigo.
Fonte: Elaborada pela autora.
Analisando as tabelas, e observando as frequências das variáveis analisadas,
conseguimos identificar os elementos definidores essenciais do conceito Comportamento
Destrutivo no Trabalho em Saúde, seus principais antecedentes, condutas
características/atributos e consequentes.
A pessoa que adota este comportamento, dependendo da conduta, é, geralmente,
rude, intimidante, hostil ou abusiva, o que tem relação com características/traços de
personalidade como narcisismo, perfeccionismo, intolerância, mas também com o estresse e
a sobrecarga de trabalho enfrentadas no cotidiano da prática. Em consequência, a segurança
do paciente é comprometida de forma considerável, pois o paciente sofre as repercussões do
sofrimento moral e psíquico dos trabalhadores, que tendem a se afastar do colega destrutivo,
se isolar e não questionar dúvidas sobre o cuidado, ocasionando erros e posteriores eventos
adversos.
Além desses consequentes, ocorrem sérios prejuízos laborais e rompimento da
comunicação, da colaboração e do trabalho em equipe, gerando uma ―destruição‖ da
CONSEQUENTES Teóricos
f (%)
Empíricos
f (%)
Total
f (%)
Para o trabalhador/equipe de saúde
Sofrimento moral e psíquico: da ansiedade ao Burnout.
Prejuízos laborais: demissão, rotatividade/mudança de
unidade e intenção de deixar o emprego.
Rompimento da comunicação, da colaboração e do
trabalho em equipe.
Afastamento/Isolamento.
Hostilidade no ambiente de trabalho.
Insatisfação, diminuição da moral e do engajamento no
trabalho.
Medo, tensão, perda de foco.
48 (68,6)
40 (57,1)
41 (58,6)
15 (21,4)
23 (32,8)
22 (31,4)
18 (25,7)
25 (86,2)
10 (34,5)
8 (27,6)
8 (27,6)
-
-
-
73 (73,7)
50 (50,5)
49 (47,5)
23 (23,2)
23 (23,2)
22 (22,2)
18 (18,2)
Totala 207 51 258
Para o paciente
Comprometimento da segurança do paciente e da
qualidade dos cuidados.
Insatisfação.
73d
15 (21,4)
25 (86,2)
5 (17,2)
98 (98,9)
20 (20,2)
Totala 88 30 118
Para a organização de saúde
Custos com processos legais, recrutamento de novos
profissionais e tratamento de eventos adversos.
Impacto na dinâmica e na cultura organizacional.
Ameaça à imagem da instituição/equipe.
25 (35,7)
14 (20,0)
10 (14,3)
-
-
4 (13,8)
25 (25,2)
14 (14,1)
14 (14,1)
Totala 49 4 53
167
harmonia entre os membros da equipe e da saúde organizacional, com todos os trabalhadores
podendo sofrer repercussões a curto, médio ou longo prazo. A organização também é
prejudicada, tendo sua imagem comprometida e aumentando os custos com processos,
recrutamento de novos profissionais, pagamento de indenizações, dentre outros.
Diante desta análise conceitual, podemos considerar que, em nítido contraste ao
trabalho honesto e respeitoso centrado no paciente, está o trabalhador destrutivo, preocupado
principalmente em afirmar a sua própria vontade. Estes indivíduos buscam levar a melhor não
pela lógica de seus argumentos, mas por seu comportamento arrogante (GLUCK, 2010).
Infelizmente, os vários estudos analisados e as evidências da prática mostraram que o
comportamento destrutivo é comum no contexto hospitalar.
A análise do conceito, ao final deste estudo, permitiu esclarecer suas causas,
consequências e manifestações. Desse modo, possibilitou uma maior clareza e especificidade
em sua definição, descrita a seguir:
Comportamento destrutivo no trabalho em saúde é um espectro de condutas
desrespeitosas adotadas por trabalhadores de saúde no ambiente de sua prática, podendo se
manifestar por meio de incivilidade, violência psicológica ou violência física/sexual, e
repercutindo em comprometimento da segurança do paciente, sofrimento moral e psíquico,
prejuízos laborais para os trabalhadores, rompimento da comunicação, da colaboração e
do trabalho em equipe.
O termo espectro foi escolhido por envolver situações e apresentações muito
diferentes umas das outras, numa gradação que vai da mais leve à mais grave. Ou seja, o
trabalhador pode ser destrutivo adotando condutas incivis, que podem não ter intenção de
prejudicar os colegas ou a organização, mas que não correspondem às expectativas das
organizações e à ética profissional. Por outro lado, pode ser intimidante, abusivo, hostil e
agressivo, características daquele comportamento destrutivo manifestado como violência
psicológica, física ou sexual.
Diante desta definição, pode-se avaliar criticamente a atual problemática do
comportamento destrutivo no trabalho em saúde e constatar a instrumentalização do ato
médico que, associado à ilusão, muito presente em certos meios pragmatistas e positivistas, de
que os fatos falam por si sós, vem levando a uma desvalorização mais intensa da atividade de
interpretação dos sujeitos implicados na prática clínica. A oposição subjetivo/objetivo é
tomada como uma oposição exclusiva e o campo da prática é reduzido a um conjunto de
relações necessárias, de tal forma que o singular, o contingente, o histórico, apesar de estarem
sempre a instigar, não encontram facilmente um espaço de reflexão (SOUZA, 1998)
168
Esta análise final encontra-se apoiada, portanto, na reflexão de outras autoras, que
afirmam ser necessário refletir sobre a possibilidade de mudar as condutas profissionais
inseridas em estruturas de iniquidade. Há, ainda, a necessidade de incorporar, na formação,
além dos conhecimentos técnico-instrumentais, outras formas de saber: significados e sentidos
da realidade dos cidadãos, sua cultura, emoções e condições de vida. Edificar uma nova
relação terapêutica, não de dominação, mas de respeito, afeto e vínculo, é um grande desafio,
entre muitos, para uma conduta profissional solidária e uma gestão ética a fim de construir o
hospital humano (NATIONS; GOMES, 2007).
Em suma, a Figura 11 foi elaborada pela pesquisadora no programa examtime® e
apresenta os resultados desta análise conceitual na etapa final.
169
Figura 11 – Estrutura conceitual do comportamento destrutivo no trabalho em saúde:
fase analítica final
Fonte: Elaborada pela autora.
170
Com a definição de comportamento destrutivo no trabalho em saúde, tornou-se
mais fácil selecionar o caso modelo, dentre os inúmeros casos relatados pelos trabalhadores
entrevistados. Este caso, relatado pela enfermeira E3, na UTI, apresenta os elementos
essenciais do conceito, tais como o antecedente relacionado ao estresse do profissional, a
conduta rude, intimidante, hostil e grosseira de um cirurgião, bem como as repercussões
para o paciente, os trabalhadores envolvidos e a equipe de saúde.
Lê-se, a seguir, o Caso Modelo de comportamento destrutivo no trabalho em
saúde:
Em um plantão diurno na Unidade de Terapia Intensiva de um Hospital
Universitário, o cirurgião Dr. Dias era esperado para iniciar um procedimento invasivo
(punção de acesso para uma P.A.I – pressão arterial invasiva) em um paciente em estado
vigil, sob ventilação mecânica. A enfermeira Angélica havia separado todo o material e
deixado sob a responsabilidade da técnica de enfermagem Maria auxiliá-lo. Esta, apesar de
jovem e recém-admitida no serviço, tinha habilidades e conhecimento para acompanhar o
procedimento. No geral, naquela UTI, os cirurgiões não solicitam a presença da enfermeira à
beira do leito para fazer este procedimento, o máximo que ela providencia é a sedação e
deixa todo o material preparado para o procedimento acontecer. Os cirurgiões, como sempre
aparecem à unidade acompanhados de vários estudantes e residentes, na maioria das vezes
dispensam a ajuda da Enfermagem.
Naquele dia, o cirurgião chegou sozinho à unidade e não conseguiu puncionar o
acesso. Estava nervoso, gritava e exigia a presença da enfermeira ao lado dele, para auxiliá-
lo. A enfermeira Angélica, que no momento estava ocupada atendendo a outro paciente, foi
ao encontro do médico e indagou: o que o Senhor quer doutor? Dr. Dias respondeu: olha,
você tem que ficar aqui do meu lado! E ela responde: mas eu já deixei uma técnica e todo o
material aí, de que o senhor precisa mais? E ele responde: „Esse é o único procedimento em
que eu exijo a presença da enfermeira do meu lado!‟ Nesse momento, a técnica de
enfermagem saiu constrangida, porque o Dr. Dias disse que ela não sabia fazer o
procedimento, que consiste em abrir o material e zerar o monitor no momento em que ele
conseguisse conectar o cateter. Então, a enfermeira Angélica tranquilizou a técnica, que
estava demasiadamente constrangida, e permaneceu ao lado do cirurgião até o final do
procedimento.
O cirurgião demorou várias horas, e a todo momento deixava claro que queria a
enfermeira ao seu lado, exigindo que ela não saísse dali! E a enfermeira falava: Dr., eu estou
171
atendendo outra intercorrência... E o cirurgião: „Fala que você não pode ir, você tem que
ficar aqui comigo!‟ O cirurgião parecia inseguro, ou com pressa para terminar o
procedimento, e precisava ir embora. A enfermeira permaneceu de pé ao lado dele, não fez
mais nenhum atendimento, e o cirurgião continuava nervoso e estressado.
O cirurgião, estressado durante o procedimento, demorou muito mais do que o
habitual para fazê-lo. É um profissional extremamente hábil, no entanto, naquele dia, ele
demorou, e em uma das múltiplas tentativas de punção, chegou a “respingar” sangue no
rosto do cirurgião. A enfermeira Angélica indagou: „o senhor sabe o diagnóstico daqui?‟ (o
paciente era portador do vírus HIV), e o cirurgião respondeu: „Sei, claro que sei, pegou no
meu olho?‟ E a enfermeira respondeu: não pegou no seu olho porque estava de óculos! E
continuou: o senhor quer que eu limpe? Dr. Dias. responde: Não, não precisa não, não
precisa! Apenas quando terminou o procedimento ele foi lavar o rosto, tamanho o estresse
em que se encontrava. Se ele não estivesse com os óculos, teria penetrado sangue em seu
olho. E o paciente ficou exposto ao procedimento durante um tempo consideravelmente
maior, por diversas vezes sendo puncionado, sofrendo múltiplos procedimentos e até
ocasionando uma perda de sangue importante no local da punção, o que se associa a um
maior risco de infecção. Por fim, após um longo período de tensão e tentativas de punção
sem êxito, o cirurgião desistiu da punção e resolveu fazer a dissecção venosa. E a enfermeira
separou novamente todo o material para ele realizar o novo procedimento.
Depois deste acontecimento, quando o Dr. Dias adentra à unidade, ninguém mais
quer auxiliá-lo, os técnicos evitam, tem medo, a imagem dele ficou péssima, visto como o
estúpido, o ignorante, e que despreza o trabalho da Enfermagem, no geral. A equipe ficou
restrita, ninguém agiliza mais nada, ninguém quer auxiliar, fica todo mundo fugindo, já que
não quer passar por uma situação constrangedora.
Em seguida, desenhamos um Caso Contrário, fictício, relacionado ao caso
modelo apresentado, com condutas que seriam favoráveis à construção de uma relação
interprofissional saudável, pautada na ética e no respeito mútuo, no incentivo à comunicação e
na garantia de segurança para o paciente. Ou seja, o comportamento respeitoso e ético,
contrário ao comportamento destrutivo no trabalho em saúde:
Na unidade de terapia intensiva, em um plantão diurno, o médico cirurgião Dr.
Alfredo chega à unidade e dirige-se ao posto de Enfermagem. Cumprimenta a todos com um
bom dia, senta-se e busca o prontuário do paciente que aguarda se submeter a um
procedimento invasivo. Tira suas dúvidas no prontuário, interage com os profissionais da
172
equipe e se coloca à disposição para que, no momento mais apropriado, inicie o
procedimento com o auxílio de um membro da equipe de enfermagem. Enquanto isso, vai em
direção ao paciente, o examina e explica sobre o procedimento ao qual será submetido.
Quando a enfermeira Ana termina um procedimento em outro paciente, vai em
direção ao leito em que se encontrava o Dr. Alfredo e este a cumprimenta: - Bom dia
enfermeira Ana, como está o plantão? E a enfermeira gentilmente responde: - Bom dia Dr.,
está um pouco atribulado, mas tudo conforme o esperado. Bem, como de rotina, preciso
passar-lhe o caso do paciente e separar o material necessário. Alguém de sua equipe virá
auxiliá-lo? E o médico responde: Não, hoje não. A enfermeira então questiona: o senhor
conhece a técnica de Enfermagem Francisca? Ela poderá auxiliá-lo. O médico responde: que
bom Ana, já dei uma olhada no prontuário, chequei exames e vejo que o paciente está em
condições de realizar o procedimento. Quanto à Francisca, não a conheço, mas certamente
irá me auxiliar com presteza. E se dirige à técnica dizendo: Muito prazer Francisca! Vamos
iniciar nosso procedimento? A técnica responde: Prazer Dr., quando quiser iniciar, estou à
disposição. E a enfermeira deixa o leito, fecha as cortinas e comunica ao cirurgião: Doutor,
para o que precisar ou caso surja alguma dúvida, é só me chamar!
O cirurgião inicia, então, o procedimento. Tem uma certa dificuldade
inicialmente, tenta realizar a punção por três vezes, sem êxito. Ao concluir que não
conseguiria puncionar o acesso venoso profundo, decidiu-se por fazer uma dissecção venosa.
Solicitou, então, à técnica de Enfermagem que separasse o material para o novo
procedimento. Enquanto isso, explicava ao paciente a mudança de conduta, administrava
algum analgésico e se paramentava novamente para iniciar o segundo procedimento.
Após alguns minutos, o cirurgião realizou a dissecção da veia, com êxito. Em
seguida, medicamentos de rotina foram administrados. Ele lavou as mãos, foi ao prontuário
do paciente, deixou tudo registrado, cumprimentou a enfermeira e os demais membros da
equipe e se colocou à disposição para quaisquer procedimentos futuros. Além disso,
agradeceu e cumprimentou a técnica de Enfermagem pelo suporte durante todo o
procedimento. Este cirurgião, quando retorna à unidade, é sempre recebido com atenção e
respeito por parte da equipe, pois promove boa colaboração e comunicação efetiva,
garantindo segurança para o paciente e para a equipe de plantão.
173
Reconhecer os modos de se apresentar o comportamento destrutivo, seus
atributos, antecedentes e consequentes, proporciona gerar discussões sobre este fenômeno,
favorecendo às organizações de saúde uma maior apropriação do conceito para, a partir daí,
implementar estratégias e desenvolver políticas voltadas para a abordagem desse
comportamento e tratamento de suas consequências.
Quanto às lacunas encontradas nesse processo de análise, destaca-se o fato de não
ter sido possível comprovar como o comportamento destrutivo realmente impacta nos custos
hospitalares e nos eventos adversos graves, como a morte de pacientes. Portanto, um dos
desafios para as posteriores pesquisas em torno da temática será a realização de estudos de
avaliação econômica que possibilitem conhecer o impacto desses comportamentos nos custos
e na reputação organizacional, além de avaliar os reais danos gerados para os pacientes.
Também se fazem necessárias pesquisas com enfoque em intervenções para os
hospitais lidarem com esse fenômeno recorrente na prática, ensinando sobre gestão de
conflitos e inteligência emocional no trabalho, envolvendo todos os profissionais em um
planejamento voltado para prevenir e abordar casos de comportamento destrutivo, dando o
encaminhando necessário.
Finalmente, é preciso fortalecer a pesquisa, principalmente no contexto brasileiro,
quanto a três importantes fatores descobertos nesse estudo, e que são relacionados à
manutenção do comportamento destrutivo no trabalho em saúde: o desrespeito sistêmico, a
cultura punitiva e a banalização da injustiça.
Estas pesquisas podem ajudar a compreender e combater o desrespeito sistêmico
institucionalizado, fazendo com que os trabalhadores sejam reconhecidos como seres
humanos com necessidades e modos de trabalhar distintos, mas capazes de promover
melhorias naquelas características do processo de trabalho evidenciadas como prejuízos à sua
moral e ao seu desempenho, como a precarização e a sobrecarga de trabalho.
174
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente pesquisa analisou o conceito comportamento destrutivo no trabalho
em saúde, com integração de revisão integrativa da literatura e pesquisa de campo,
possibilitada por meio de entrevistas e observações do comportamento de médicos,
enfermeiros e técnicos de enfermagem no trabalho em hospital público de grande porte da
cidade de Fortaleza, Ceará.
Trata-se de hospital de ensino, frequentemente superlotado, que atende a centenas
de pacientes tanto da capital quanto do interior do Estado, os quais necessitam de
procedimentos, tratamentos e cuidados especializados, num ambiente dotado de tecnologias.
Este hospital, assim como em muitas instituições públicas de saúde, apresenta deficiências de
estrutura para a elevada demanda, escassez de recursos e trabalhadores com diversos vínculos
empragatícios (terceirizados, cooperados, estatutários) submetidos a diferentes modelos de
gestão.
A análise do comportamento destrutivo permitiu evidenciá-lo como um problema
real vivenciado pelos trabalhadores de saúde desta instituição, com repercussões negativas e
significativas sobre o desempenho e a saúde da equipe, bem como sobre a segurança do
paciente, ao deixá-lo mais susceptível a riscos, erros e eventos adversos, incluindo a morte.
Trata-se de um constructo teórico, analisado e produzido mediante a interlocução
de referenciais teóricos e empíricos, que possibilitaram estudar este comportamento no que
diz respeito aos seus antecedentes, atributos e consequentes. Além disso, foi possível
identificar os atributos a partir das condutas características deste comportamento na prática:
incivilidade, violência psicológica e violência física/sexual.
A grosseria cotidiana, o desrespeito interpessoal e organizacional, a falta de
colaboração entre os colegas de trabalho, as humilhações e as intimidações frequentes
configuraram as condutas que representam o espectro de comportamentos destrutivos no
trabalho em saúde. Os perpretadores geralmente são aqueles que ocupam o topo da hierarquia:
médicos, enfermeiros, gerentes de unidades, bem como aqueles profissionais que estão há
mais tempo no serviço, com estabilidade no emprego e experiência clínica reconhecida.
Estes, por sua vez, carregam consigo traços de personalidades característicos,
como o narcisismo, além de sofrerem influência de fatores pessoais arraigados, como cultura,
crenças, educação, gênero e idade.
Os primeiros a serem atingidos são, na maioria das vezes, os trabalhadores que se
encontram na base da pirâmide organizacional, aqueles inseridos na assistência ao paciente,
175
no cumprimento de suas funções, os quais, segundo seus depoimentos, encontram-se
sobrecarregados, cansados, pouco valorizados pelas lideranças, atuando como fáceis
receptores das grosserias e dos ataques verbais de ―chefes‖ autoritários e punitivos
favorecidos pela hierarquia e pelos privilégios institucionais.
O ambiente de trabalho torna-se, a partir daí, hostil, perigoso e penoso.
Consequentemente, os trabalhadores fogem do encontro com o colega destrutivo, se isolam,
não participam da tomada de decisões, não questionam dúvidas, sofrem danos físicos, morais
e psíquicos, gastando com tratamentos medicamentosos e psicoterapia; faltando ao trabalho;
podendo chegar a mudar de unidade oum, em último caso, pedir demissão.
Isto repercute em maior insegurança para a organização e para o paciente. Este
sofre danos reais, com profissionais sobrecarregados, distraídos, desatentos, ansiosos,
propensos a erros e à oferta de um cuidado inseguro, que não atende aos protocolos e às
evidências de uma prática de qualidade. Tais danos envolvem os riscos clínicos, profissionais,
assistenciais, institucionais, além dos erros médicos e procedimentos em local ou paciente
errado, infecção e até a morte.
Assim, urge a necessidade de uma chamada para a ação por parte de líderes,
trabalhadores e usuários dos serviços de saúde, cuja atenção seja direcionada, inicialmente, a
aumentar a consciência dos profissionais sobre o comportamento destrutivo; garantir uma
comunicação interprofissional aberta e efetiva; e estabelecer as bases para o trabalho em
equipe, a colaboração e a corresponsabilização pela assistência segura.
Uma outra estratégia seria proporcionar educação e treinamento para os
profissionais, administradores e estudantes da área da saúde quanto às questões supracitadas e
à inteligência emocional; favorecer uma mudança cultural, cuja cultura punitiva seja
substituída, com a participação de todos, por uma cultura de segurança alicerçada na justiça,
no respeito mútuo, na paz e no conforto organizacional para trabalhadores e pacientes.
Faz-se necessário, ainda, que os hospitais elaborem políticas de conduta ética, as
quais estabeleçam a diferença entre comportamentos desejáveis e indesejáveis, e que todos os
trabalhadores consigam falar sobre o assunto sem medo de retaliação ou punição. Pois a
cultura de respeito mútuo favorece as comunicações horizontais, o estabelecimento de vínculo
e a valorização do ambiente de trabalho saudável.
Implementar procedimentos e ferramentas para identificação e abordagem ao
profissional destrutivo também se faz necessário, pois estes precisam reconhecer o problema,
suas repercussões e refletir sobre suas condutas. Nesse momento, profissionais devidamente
treinados podem atuar como mediadores de conflitos e restauradores do respeito e da
176
colaboração no ambiente de trabalho. Estes precisam conhecer a realidade do processo de
trabalho em suas particularidades, identificar fatores que intervenham de forma negativa no
trabalho em equipe e nas relações interpessoais, para propor as mudanças necessárias.
Outra ação importante seria realizar avaliações individuais e organizacionais
permanentes, para que os profissionais se autoavaliassem constantemente, favorecendo
reconhecer o clima, a satisfação e o comprometimento de todos com o trabalho e sua
segurança. Instituir estratégias de intervenção e encaminhamento; alcançar o
comprometimento da liderança; e conseguir gerenciar os conflitos são fundamentais nesse
processo.
Cabe ressaltar que todas estas estratégias somente obterão êxito se o processo de
trabalho em saúde sofrer as mudanças necessárias para a garantia de um trabalho mais
humano, de respeito mútuo e capaz de garantir segurança para os envolvidos. As condições de
trabalho insalubres, a precarização e a sobrecarga de trabalho, os múltiplos vínculos, a má
remuneração e os demais problemas estruturais e relacionais precisam ser repensados e
sanados, na medida do possível, com envolvimento de todos aqueles responáveis pela
construção e operacionalização do nosso sistema de saúde.
Assim, percebe-se como o tema é instigante e, nesta produção, muitas questões
discutidas mereceriam maior aprofundamento, tais como o levantamento sobre os custos
provenientes das consequências desse tipo de conduta, no próprio hospital e em outros
ambientes que sofram influência do comportamento destrutivo.
Além disso, os vários poderes e os sistemas de privilégios visualizados, no cenário
estudado, precisam ser melhor elucidados no sentido da influência que exercem sobre o
trabalhador que apresenta comportamento destrutivo.
Sugerem-se, ainda, estudos que esclareçam a relação entre as histórias de vida, os
processos de formação, as crenças e os aspectos culturais imbricados na origem de
comportamentos destrutivos no processo de trabalho em saúde, pois seriam grandes
contribuições para se pensar em ações direcionadas ao contexto em que tais comportamentos
se manifestam.
Dada a importância deste tema, é necessário discutir, junto ao hospital em que se
desenvolveu a pesquisa e à comunidade científica, de que forma este conceito pode ser
abordado junto aos trabalhadores e aos gestores como indicador relacionado à segurança do
paciente e à satisfação do trabalhador no ambiente laboral, podendo se configurar como um
indicador de qualidade da área de gestão de pessoas na saúde.
177
Somado a isto, é importante levar este conceito como pauta para os eventos da
área da saúde e, em especial, da Enfermagem, favorecendo aos profissionais e aos estudantes
da área discutirem este tema que está diretamente implicado no seu processo de trabalho.
178
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APÊNDICE A - Instrumento de coleta de dados: fase teórica
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ARTIGO: ______
Título: __________________________________________________________________________________________
Objetivo: ________________________________________________________________________________________
Autores: ________________________________________________________________________________________
Tipo de publicação e método: _______________________________________________________________________
Referência: ______________________________________________________________________________________
Palavras-chave/descritores: ________________________________________________________________________
Área de concentração: _____________________________________________________________________________
ANTECEDENTES DEFINIÇÃO ATRIBUTOS CONSEQUENTES CONCEITOS
RELACIONADOS EXEMPLOS ESTRATÉGIAS
FICHAMENTO:
Citação/Página:
192
APÊNDICE B – Distribuição dos artigos analisados segundo título, autor, ano de publicação, tipo de estudo, enfoque e variáveis contempladas
(continua)
203
APÊNDICE C – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)
Caro (a) Trabalhador (a) de Saúde,
O (a) Sr. (a) está sendo convidado (a) a participar da pesquisa de tese de Doutorado intitulada
“Comportamento destrutivo no trabalho em saúde: análise de conceito”, que tem como objetivo analisar o
conceito de comportamento destrutivo no trabalho em saúde. Pedimos a sua colaboração nesta pesquisa,
respondendo a uma entrevista sobre seu cotidiano de trabalho, que poderá ser gravada se o (a) Sr. (a) concordar.
Garantimos que este estudo possui riscos mínimos, já que não envolve a realização de
procedimentos invasivos; mas poderá ocorrer insatisfação do entrevistado em decorrência de possíveis
lembranças de experiências anteriores com comportamentos destrutivos. Nesse caso, a pesquisadora estará
preparada para intervir sugerindo a suspensão da entrevista, deixando você à vontade para decidir sobre sua
participação no estudo posteriormente.
Por outro lado, benefícios potenciais decorrerão diante de sua participação: reflexão contínua sobre
o comportamento do profissional de saúde no ambiente de trabalho e suas repercussões para a comunicação e a
segurança do paciente; fortalecimento da pesquisa no campo da segurança em saúde e do gerenciamento do
cuidado; ampliação dos conhecimentos sobre o comportamento humano nas organizações de saúde; apresentação
das diversas propostas e sugestões a serem inseridas na realidade investigada.
Ressaltamos que todas as informações obtidas nesse estudo serão mantidas em sigilo e sua
identidade não será revelada. Vale lembrar que sua participação é voluntária e o (a) Sr. (a) poderá a qualquer
momento deixar de participar deste, sem qualquer prejuízo ou dano. Comprometemo-nos a utilizar os dados
coletados apenas para pesquisa e os resultados poderão ser veiculados em artigos científicos e congressos,
sempre resguardando sua identificação.
Todos os participantes poderão receber quaisquer esclarecimentos acerca da pesquisa. Em caso de
dúvidas relativas à pesquisa, pode entrar em contato com os pesquisadores responsáveis através dos seus
telefones: Doutoranda Roberta Meneses Oliveira: (85) 9936 6765; e Orientadora da pesquisa Profª. Dra.
Lucilane Maria Sales da Silva: (85) 9927 7421.
O Comitê de Ética do Hospital Geral de Fortaleza encontra-se disponível para esclarecimento pelo
telefone: (085) 3101.3344 – Endereço Rua. Ávila Goulart, 900 - Papicu, CEP: 60.175-295 – Fortaleza – Ceará.
Esse termo está elaborado em duas vias sendo uma para o sujeito participante da pesquisa e outro para o arquivo
do pesquisador.
Eu, _______________________________________________, tendo sido esclarecido (a) a
respeito da pesquisa, aceito participar da mesma.
Fortaleza, ____ de __________________ de ________.
______________________________ _______________________________
Assinatura do (a) participante Assinatura do (a) pesquisador (a)
204
APÊNDICE D – Roteiro de Observação Sistemática
Aspectos a serem observados:
Condutas Profissionais envolvidos:
agente (s) e receptor (es) Consequências
Período da
Observação
Número de vezes
observado
Recusa a executar as
tarefas atribuídas, não
colabora ou exibe atitudes
que não cooperam com as
atividades de rotina.
Manifesta comportamento
anti-ético. Ex. usa celular
de modo a interferir o
trabalho.
Pratica uma gestão
punitiva, autoritária.
Humilha o colega de
trabalho publicamente.
Intimida, exclui
intencionalmente outros do
grupo, usa força ou poder
para gerenciar.
Usa linguagem
grosseira/rude
Fala das pessoas pelas
costas.
Trata novatos
severamente.
Afirma que os outros são
incapazes.
Grita com outras pessoas.
Vira as costas antes de
uma conversa terminar.
Descumpre normas e
rotinas institucionais.
Retém informações para
prejudicar os colegas.
Falha ao responder
ligações telefônicas e/ou
solicitações.
Toca pessoas em formas
abertamente sexuais.
Faz comentários com
caráter de crítica quanto a
sexo, raça, religião e etnia.
Mostra agressão física
(agarrar, jogar, bater,
empurrar).
Outra:
205
APÊNDICE E – Roteiro de Entrevista
DADOS DE IDENTIFICAÇÃO/OCUPACIONAIS:
1. Idade: __________
2. Sexo: __________
3. Categoria profissional:
a. Enfermeiro ( ) b. Técnico/auxiliar de enfermagem ( ) c. Médico ( )
4. Pós-graduação (médicos e enfermeiros): ___________________________________
5. Tempo de formação: __________
6. Tempo de atuação no serviço: __________
QUESTÕES NORTEADORAS
1. Como você vê o trabalho no seu dia a dia?
a. Consegue desenvolver aquilo que acredita que deve ser feito? Comente.
2. Existem conflitos e dilemas no cotidiano de trabalho? Se sim, exemplifique.
3. A respeito da seguinte definição:
“qualquer comportamento inapropriado, confronto ou conflito, que vai desde o abuso
verbal (gritos, intimidação, repreensão, desrespeito, comportamento abusivo) ao
assédio físico ou sexual, que pode impactar negativamente nas relações de trabalho,
na eficácia da comunicação, na transferência de informações e no processo e
resultados do atendimento‖.
a) Você considera já ter vivenciado esse tipo de comportamento em sua prática?
a. Se sim, teria algum caso a relatar? (exemplos/caso modelo)
b) Quais as características desta pessoa ou deste comportamento? (atributos)
c) O que você acha que tem relação com esse tipo de comportamento? O que leva uma
pessoa a agir dessa forma? (antecedentes)
d) Você acredita que há repercussões desse comportamento para o paciente ou para o
serviço? (consequentes)
a. Se sim, quais?
206
APÊNDICE F – Síntese dos casos relatados de comportameno destrutivo no trabalho em sáude segundo exemplos, antecedentes, consequentes e
termos definidores
(continua)
Entrevistado
Após a leitura da definição do conceito de comportamento
destrutivo, você teria algum caso a relatar da sua experiência?
(EXEMPLOS)
O que você acha que leva
uma pessoa a agir dessa
forma?
(ANTECEDENTES)
Você acredita que há
repercussões para o paciente
ou para o serviço? Se sim,
quais? (CONSEQUENTES)
Quais as
características desta
pessoa ou deste
comportamento?
(TERMOS
DEFINIDORES)
1. TE1
Já vivenciei colegas tratando uns aos outros com desrespeito...assim, eles
ficam conversando sobre a vida pessoal, e aos poucos, uns ficam
passando uns pros outros, e isso acaba atingindo a equipe todinha, e se
você expõe sua vida pessoal bastante, isso acaba, às vezes, até dando caso
de demissão. Vida pessoal, eu acho que viria ao caso, eles não relatarem
a vida pessoal aqui, acho que no caso, problema familiar, financeiro,
amoroso.
A relação que vem a ter é que
nós viemos trabalhar aqui, e
temos que saber diferenciar
uma coisa da outra, e a
maioria dos profissionais não
consegue diferenciar. Eu acho
que tudo parte de um
comportamento, de uma ética.
Implica sim, no tratamento do
paciente, eu acredito que sim.
Alguns [pacientes] referem que
quando saem da sedoanalgesia,
referem reconhecer algumas
vozes, não conhecem as faces,
mas reconhecem as vozes.
Sempre fica o formato
das panelinhas, uma
fala da outra...
2. E1
Aconteceu comigo em relação a outro profissional. Mas colocava em risco
a vida do paciente também. Quando a gente vai admitir um paciente, a
gente liga quando o leito tá completamente pronto ou o pessoal da outra
unidade liga e a gente diz se tá pronto ou não. Ligaram do Centro
Cirúrgico e vinha um paciente entubado, mas o ventilador mecânico ainda
não estava no leito. Eu disse que não poderia subir, porque o ventilador
não estava no leito. Com 5 minutos, o paciente estava aqui na porta.
[Sendo] ambuzado. Por quê? porque o anestesista queria sair mais cedo.
Aí começou a confusão! Ele começou a gritar comigo, o anestesista,
dizendo que a enfermeira era incompetente, que não tinha ligado para
avisar. Só que graças a Deus o meu plantonista estava ao meu lado
quando eu liguei! Então eu ia começar a falar e ele me defendeu: ele disse
que não precisava o anestesista falar comigo [daquela forma] e ele que
estava errado, por isso ele ficasse ambuzando o paciente até conseguir o
ventilador e assim foi feito. Ele ficou com o paciente aqui uns 15 minutos
ambuzando. Foi o tempo que chegou o ventilador. Porque não é a gente
que monta aqui, então a gente depende da central de material. E o
paciente correu risco. Vai que a bala de oxigênio acabava. E aí? Como é
que ele ia ambuzar? E1
Eu acho assim, que a falta de
humanização, principalmente
com o paciente... E também a
questão de desobediência...
Péssima. Porque corta a
comunicação entre a equipe e
isso vai gerar procedimentos
errados, coisas que eu vou fazer
sem chegar no médico, aí vai dar
errado pro paciente. Se o
paciente estiver sentido alguma
coisa, um médico desse eu não
posso chegar pra discutir uma
conduta pro paciente, ele tem que
ver. Então, assim, a ajuda mútua
e a interação entre a equipe é
completamente ameaçada!
Ele é uma pessoa
arrogante!
207
3. E2
Tem assim, na época que teve uma greve, que ia entrar uma nova
cooperativa, aí alguns profissionais batiam no peito mesmo dizendo: - ah,
as pessoas que vão entrar agora, a gente não vai treinar..., esquecendo
que eles também chegaram para serem treinados né? Ninguém chega aqui
[pronto]...aí aconteceu sim. Teve gente que chorou, da cooperativa. Eu
entrei um pouquinho antes, então eu ainda peguei um pouco da transição.
Eu vim da outra cooperativa e então, como eu entrei logo, alguns diziam:
- ah, é da outra cooperativa...era horrível assim...você tá entrando,
iniciando um trabalho super intensivo, que você precisa de ajuda, e teve
momento assim que eu pensei até em desistir por causa disso. Não chegou
a ser desrespeito e tal, comigo era mais assim, você percebia no olhar,
não falava com você...hoje eu falo com todo mundo, eu vejo a diferença
assim, pessoas que no começo nem olhavam nem na nossa cara, ou seja,
querendo dizer que não iam ajudar, não iam treinar... A gente foi coagido,
a gente usa esse termo mesmo, o pessoal da cooperativa que entrou foi
coagido pelo pessoal que já estava...
Eu acho que é pessoal! Não
sei nem explicar. Elas se
juntam, criam força...era
homem e mulher, era o
pessoal antigo mesmo.
Acho que o dilema maior é
esse: a sobrecarga na
enfermagem. É muita coisa
em cima da gente! Muita,
muita coisa! Até, assim, pra
ligar, agendar exames, que é
do interesse de todos, a equipe
meio que se acostumou a ser a
enfermeira que vai ligar...
A repercussão é direta! Quem
não entrou na rotina não
conseguiu desenvolver o
trabalho, porque não tinha como!
Porque aqui não funciona se não
tiver equipe...
[Para o paciente] eu acho que é
perigoso, porque vai que a pessoa
não ajuda, não liga, eu acho
perigoso.
...teve gente que chorou..., e teve
momento assim que eu pensei até
em desistir por causa disso. Você
percebia no olhar, não falava
com você...Eu cheguei a chorar.
Sofri viu?
Acho que é uma pessoa
cega, que ela não viu
que também cresceu, se
desenvolveu na
enfermagem, e nesse
momento esqueceu.
4. E3
Olha, o comportamento assim que eu mais abomino aqui são dos
cirurgiões, por que eles não respeitam a Enfermagem...parece que eles
são estéreis e não adianta nenhuma informação que a gente passe pra
eles, que pra eles parece que não têm importância nenhuma, só por parte
dos cirurgiões...
Uma vez o cirurgião X estava num procedimento invasivo, passando uma
P.A.I, e eu separei todo material, deixei tudo lá e deixei uma técnica
jovem, porém tinha conhecimento do que estava fazendo e assim, no geral
eles nunca pedem pra gente ficar lá do lado, o máximo que a gente faz é a
sedação deixa tudo pronto, dá certo, que ele sempre vem em bando né... E
dispensa totalmente a ajuda da enfermagem e a técnica ficou lá
auxiliando e ele não conseguiu puncionar, tava meio nervoso, começou a
gritar lá, que queria porque queria a enfermeira, sendo que eu estava
atendendo outro paciente, aí eu voltei e falei: o quê que o Senhor quer
doutor? „Ah você tem que ficar aqui do meu lado.‟ Ai eu falei assim: mas
eu te deixei todo o material ai o quê que você quer mais? „Esse é o único
procedimento que eu exijo a presença da enfermeira do meu lado!‟ E a
técnica saiu constrangida por causa que ela relatou que ele disse que ela
não sabia fazer o procedimento, isso não é verdade, lá todos eles sabem.
Tá? Que é abrir o material e zerar no monitor na hora que ele
conseguisse conectar. Então, tudo bem, depois eu conversei com ela, ela
se sentiu constrangida mas... E eu fiquei lá até o final, assim ele demorou
um século, como se eu não tivesse mais nada pra fazer e como se eu não
tivesse deixado uma pessoa lá pra auxiliá-lo, mas ele bateu o pé que
queria que eu ficasse ali. Eu falei: eu to atendendo outra intercorrência.
[E ele:] „Fala que você não pode ir, você tem que ficar aqui comigo!‟
Eu acho que foi, ele devia tá,
sei lá... inseguro, ou com
pressa pra terminar o
procedimento e precisava ir
embora, não que a minha
presença lá fosse modificar
alguma coisa, em relação ao
procedimento dele, porque eu
simplesmente fiquei de pé do
lado dele, eu não fiz mais
nada, a não ser ficar olhando
pra cara dele, eu... ah não sei,
o quê que ele, se ele errou e
quis jogar a culpa na
ausência da enfermeira, não
sei... Por que não estava
desassistido, o material estava
todo lá, tinha um técnico lá
habilitado auxiliando ele,
então não sei, eu acredito que
ele tava nervosinho com
alguma outra coisa e se
estressou.
Quando chega ninguém quer
auxiliar, fica péssimo a imagem
deles... A gente fica meio restrita,
assim „a vai vir o cirurgião
fulano de tal, fazem: iiii...‟ Então,
nossa, ninguém vai agilizar nada,
ninguém quer auxiliar, fica todo
mundo meio que fugindo...
O paciente fica exposto a ficar
muito mais tempo, e por diversas
vezes sendo puncionado,
puncionado, múltiplos
procedimentos...
Por conta do estresse dele, todo
nós acabamos passando muito
mais tempo em determinado
procedimento que ele já está
cansado de fazer em minutos e
expondo o paciente e a um risco
maior, inclusive a ele próprio,
que acabou se contaminando com
o sangue do paciente que era HIV
até então.
...ficam vistos como o
estúpido, ignorante, e
que desprezam o
trabalho da gente, em
si, da enfermagem no
geral...
208
5. TE4
Médico estrela gritando com a enfermeira, porque queria descer o
paciente para uma tomografia. O médico queria descer o paciente pra
fazer uma tomografia, aí aqui tá reduzido [o pessoal de enfermagem], (...)
e ele disse que não queria saber se estava reduzido, queria saber se descia
o paciente.
Eu acho que é da
característica da pessoa,
personalidade muito forte.
Mais em médico, mas também
tem enfermeiros da
personalidade muito forte.
Na frente de todo mundo, todo
mundo ficou com medo...
A própria equipe mesmo, vai
trabalhar, vamos dizer assim,
desgostosa, não vai trabalhar
motivada.
[Implica também] em geral em
uma assistência sem qualidade.
Pessoa grosseira
mesmo, ignorante, me
desrespeitou.
6. TE5
Bom já faz tempo, já faz tempo, eu não vejo mais tanto assim...Tipo
enfermeiro ficar gritando com o auxiliar, por um motivo x, motivos
corriqueiros, tipo uma bomba de infusão com antibiótico, às vezes
simplesmente tiram a hidratação que é o soro que coloca contínuo no
paciente pra colocar o antibiótico por que a enfermeira não quer ir
buscar e quer que você vá buscar, aí às vezes a pessoa diz assim: não, não
vou buscar e aí começa, tem que ir buscar e começa a... Agora grito, grito
assim não, mas esses conflitos perto, que não geram tanta zuada, pra
também não ficar correndo risco de chegar ao ouvido da chefia, coisa que
ninguém quer... E já ouvi comentários de briga entre enfermeiro do setor,
mas eu nunca vi.
Estresse, problemas
particulares que não sabem
direito separar... Estresse
acho que é um dos
principais...
Eu, particularmente, quando os
vejo, já crio uma resistência, eu
não vou dizer pra você que eu vou
tratar a pessoa com má
educação, por que eu não vou,
mas eu vou ficar na minha, eu
não vou querer conversa, não vou
falar... É estritamente
profissional, mais nada e querer
distância...
Chatas
7. TE6
...de começo eu fiquei horrorizada... tem uma colega que, talvez até
mesmo o jeito dela ser grosseirona, ela era grosseira com os pacientes,
entendeu? Grosseira, então isso me agredia também, só que não podia
interferir pra que... isso, se não ia gerar conflito, Mas...Ah... Antes, antes
tinha muito, principalmente na emergência, na emergência era mais... Era
assim, muito estresse, muito estresse mesmo, de colegas agredirem,
assim... Até mesmo o modo de falar, quando pro exemplo, se tivesse um
colega que estava chegando, num tivesse segurança pra fazer uma
experiência maior né? Aí chegava e falava assim: você não sabe fazer
isso? Ta entendendo? É muito tempo te agredindo...
Em vez de chegar e conversar: ó fulano, é não assim, assim, assim
assado... Ela, a pessoa, infringe a ética e fala na frente de todo mundo, aí
intimidava mais a pessoa né... isso acontecia muito, então via muito na
emergência, mas graças a Deus, aqui [na UTI] eu ainda não cheguei a
ver...
Eu acho que vem de dentro de
casa, é da educação da
própria pessoa... Acho que o
estresse que ela traz de fora
que gera... quer ser um ar de
superioridade... porque a
pessoa quando agride outra,
na minha concepção, é uma
pessoa que tem complexo de
inferioridade, acho que ela,
talvez pisando nos outros,
elacom isso se sente um pouco
mais lá em cima... Maior...
Melhor...
Estresse... Muito estresse! Tanto
que quando uma pessoa é
agredida nesse ponto... faz com
que ela piore, por que ela se sente
mais diminuída... Aí isso é, quando alguém me
agride, eu me desequilibro
todinha, até eu voltar o normal,
ta entendendo? Gera tempo, que
eu fico assim... Eu fico num
estresse, comigo mesma, num
estresse...
Grosseirona
8. TE7
Era uma médica, ela não sabia pedir sabe, era muito grossa tanto com a
gente como com os pacientes, então às vezes ela falava, e machucava as
pessoas, nem todo mundo né, o tom assim, dela falar.
Na minha opinião, eu acho
que a educação já vem do
berço, ou às vezes a pessoa
acha que porque é médico,
pode gritar, abusar assim,
tanto pelo status como pela
educação.
Com certeza, fica um clima meio
pesado, você tem medo assim de
perguntar alguma coisa à pessoa.
Ela é tão grossa,
porque ela é uma
medica tão
profissional, tão boa, e
assim tão ignorante.
209
9. E4
Assim, a gente trabalhava em um local que o serviço era super agradável,
e fácil, não exigia muito da gente, era um serviço tranquilo. Mas a gente
não podia conversar umas com as outras, não podíamos almoçar
juntas...eu era obrigada a fazer pesquisas pra colocar o nome da
pessoa...e como eu sempre fui de pesquisa, então isso aí eu não admitia!
Mas como eu precisava trabalhar, precisava daquele emprego, então ou
era aquilo ali ou não. Então, assim, eu tentava fazer o meu serviço, o que
era de obrigação do serviço. Mas o que era tarefa ditada por ela [a
chefe], que não era em uso do serviço, eu tentava não realizar... enquanto
a gente não fizesse o que ela queria, a gente era chamado em sala,
fechadinha, e ela sempre colocava nosso emprego em risco, sempre dizia
que – ah, eu tenho dois tetos, eu que mando aqui, a qualquer momento eu
posso demitir todos...e a gente ficava na mão dela! Consegui sair, mas em
compensação eu tenho uma denúncia no conselho.
Tinha a lei do silêncio....a gente tinha que trabalhar caladinha, caladinha
tinha que ficar. Toda semana ela determinava uma pessoa pra fazer a lei
do silêncio: não pode conversar! Aí, assim, ela colocava a gente uma
contra as outras!
Eu acho que é inveja...ela não
gostar de si própria, falta um
amor próprio. Ela não confia
nela mesma, não tem
autoconfiança...tem a ver com
a criação dela, só pode ser
uma criação com muitos
traumas!
Aquilo ali ia mexer comigo como
até hoje mexe. Eu coloquei ela na
justiça...eu fico até chateada
[choro] pela situação, eu não
gosto nem de falar disso, porque
você fica totalmente sem ajuda de
ninguém, sem ajuda de ninguém!
E isso me faz ficar super
chateada! E essa pessoa, até hoje,
eu fico assim só em falar dela, ela
me deixa traumatizada! Eu tento
fazer o percurso que ela não faz,
tento chegar na hora que ela não
chega, tento não andar no andar
que é o mesmo setor dela. Eu
evito!
Sobrecarregava outras pessoas,
outros profissionais. Acho que o
serviço perde com isso! Porque o
funcionário, o profissional não
vai trabalhar motivado, não vai
fazer aquilo ali 100%.
[O paciente] perde. Paciente
perde...como eu fazia fichas de
notificações, em vez de eu
notificar o paciente naquele dia,
eu ia notificar outro dia...ele não
pode perder agora, mas a
unidade que trabalhava, como
gera plano de ações, ele [o
paciente] poderia perder um
plano de ação.
O paciente, em vez de ter um dia
de plantão com o funcionário
descansado, ele estaria com um
funcionário que estava com a
escala bem sobrecarregada! E
isso pode ocasionar vários erros
na assistência, que a gente vê por
aí. Por sobrecarga de trabalho...
Erros de medicações...
Psicopata
210
10. E5
...é assim um problema muito sério com as meninas da noite, um sumário
de urina, exames coletados, a gente protocola tudo pra não perder, aí a
noite não protocola nada, os exames da paciente somem e são obrigados
passar 24 hs esperando o resultado, pra começar uma medicação... tive
um problema com uma [técnica de enfermagem da noite]: fui fazer uma
transfusão, aí eu calculei o gotejamento em horas [e disse] olha daqui a
tantas horas você pode pedir a segunda bolsa. [e a técnica]: olha eu vou
trazer e vou instalar, e eu, você não vai instalar, quem instala bolsa é o
enfermeiro; e a técnica: eu instalo até no plantão da chefe, porque que eu
não instalo no seu?, instale no dela, mas no meu você não vai instalar,
entendeu?, tem essa questão ai se ela diz, eu tenho mais tempo do que
você aqui, e se acha.
Se uma auxiliar no dia chega 7:15 ela é punida, eu anoto no livro e ela vai
ser chamada entendeu?, se ela chegar 7:15 ela vai ser a última a entregar
o plantão, entendeu? , ela vai ser a última a se ausentar do plantão, aqui
as meninas ficam até 7:15 da noite esperando, ela [técnica da noite]
chega, [e diz]: eu não vou receber o plantão, eu vou trocar de roupa, vou
comer... e a auxiliar do dia esperando.
Questão da segurança do
emprego, o tempo, porque são
funcionárias muito antigas, a
questão da idade... Acho que é uma pessoa que
precisa reconhecer o que tem
essa forma, esse gênio forte...
...acaba prejudicando o paciente,
os sinais vitais que é pra ser feito
às vinte e duas horas, e eu só vou
quando termina a novela,
entendeu?,
Os pacientes reclamam demais,
principalmente da forma como
falam com o paciente.
Explosivas,
confuseiras.
11. E6
Já ouvi auxiliar dizer: vamo logo, termina esse banho, por que num tomou
banho agora? Com os profissionais... é tipo quando acha que tá fazendo
mais a sua parte... Já vi discussões, uma pede para fazer uma coisa, você
não manda em mim, então ... aí vira aquela briga, aquele conflito.
É desinformação, até a
própria educação mesmo da
pessoa, o caráter, que ela
pode até não ter
conhecimento, mas ela não
vai querer tratar daquele
jeito, às vezes é da própria
pessoa mesmo! A
personalidade mesmo. Pessoa
mais arredia, aquela história
do pavio mais curto, mais
irritada.
Gera um transtorno né? No
momento que é um mal estar
tanto para o paciente como pro
serviço que tá acontecendo e se
tiver outro paciente do lado, já
acarreta pro lado.. Traz o
prejuízo porque você tem que
parar, o serviço já não flui, você
tem que parar, voltar pra quando
ajeitar aquilo ali, pra dar
continuidade.
Pessoa arredia, pavio
curto
211
12. E7
Gritos, intimidação, repreensão tem quase todo dia, né? E ser
repreendidos pelos próprios colegas da enfermagem mesmo, da sua
própria categoria. De uma coisa que não foi dado continuidade, de um
erro e um senso, de alguma coisa desse tipo. Em relação a assedio físico,
sexual, nunca sofri, nunca ouvi falar; em relação a gritos, intimidação,
isso aí eu já ouvi, já ouvi nos corredores, a pessoa que fala mais alto, às
vezes médico com enfermeiro, médico com fisioterapeuta... Reclamando,
aí fala mais alto, tem internos, residentes que às vezes chegam, acho que,
tem muita gente novinho que tá chegando, tá se achando né? e já chega
com uns grito às vezes, gritando...
Eu acho que é educação que
já não vem de casa. Por que
assim, principalmente, essas
pessoas mais novas, é o que a
gente percebe hoje, na
sociedade como um todo, é
que elas são muito mal
educadas, são muito cheias de
direito, muito respondona,
ninguém sabe mais o que é
uma hierarquia, ninguém
respeita mais as pessoas mais
velhas, então a pessoa já
chega do jeito que vem, do
jeito que vem da faculdade, já
vem trazendo aquela bagagem
e acha que está chegando e é
assim....
Com certeza! Eu acho que sim,
tanto o mal estar que gera, a
pessoa já fica trabalhando com
má vontade, tenso e se sentindo
mal mesmo. Como, quando é
apurado e chamado atenção, você
já fica sentindo...
Eu acho que de qualquer forma
influencia em relação ao paciente
sim, porque às vezes isso
acontece até dentro da
enfermaria, né? e o paciente está
ouvindo, ele está vendo. Se a
pessoa grita no corredor, o
paciente dentro da enfermaria
está ouvindo! Eu não gostaria de
estar internado num local e ter
uma pessoa no corredor gritando,
falando alto, brigando, tendo
discussão. Por que a pessoa pode
sair de uma confusão, sai tensa, a
pessoa sai, né? a pessoa não sai
normal, né? e ai você vai depois
atender o paciente, conversar
com o paciente, lógico que você
não vai misturar as coisas e não
vai levar, mais não deixa de você
estar com aquela tensão, né?
Então, eu acho que prejudica sim.
Eu acho que o paciente fica tenso.
Inclusive eu já ouvi relato de
paciente dizer, olhe, de subir
pressão de paciente, de ficar
tenso.
Os neurocirurgiões são
muito grosseiros, os
neurocirurgiões são
uns deuses.
212
13. AE2
Muitas pessoas foram intimidadas, principalmente os meninos da
cooperativa. Por chefia, por diretores, por médicos, e eu acho isso errado,
muito errado. Você não pode usar do seu poder, da sua autoridade e
impor a pessoa... Agora recentemente umas colegas foram advertidas, de assinar
advertência, porque elas estavam fora da unidade e o chefe não queria
saber porque, porque elas estavam lá. Elas estavam lá porque o rapaz do
raio X disse “ta na hora do raio X”, elas saíram da unidade pra não
receber uma radiação. E por conta disso o chefe deu uma advertência
assinada, que eu acho errado.
A pressão do chefe dele.
Porque eles querem mostrar
uma coisa que não é real
dentro do hospital, entendeu?
Não existe. Você quer mostrar
um serviço que na real ele é
mentiroso.
O caráter da pessoa diz, que
jugar um ser superior. E não
sabe chegar e tentar resolver
as coisas como pessoas
humanamente civilizadas. E
tentar compreender os lados
opostos, só sempre querer que
o seu lada seja compreendido
e jamais o lado do outro.
Ficam muito mal vistas. Aí o
profissional faz a coisa com mau
gosto, aí o profissional se cansa,
aí o profissional não gosta
daquela pessoa quando vem dar o
plantão com ela, se afasta, se isola...
Uma repercussão muito ruim.
Porque todo mundo vai ficar
desgastado! Todo mundo vai ficar
chateado, então ele não vai dar
uma qualidade [no atendimento].
Ele já vem, ele já vem com aquela
coisa, ”vixe hoje é dia de
fulana”, “vixe hoje eu não vou
produzir”. Muitas pessoas já perderam o
emprego!
Grosseiro, atrevido.
14. E8
Foi assim: a paciente começou com uma insuficiência respiratória,
colocamos oxímetro na paciente, a paciente estava dessaturando, tava
chegando a 84, 83, foi chamado a obstetrícia...[o médico chegou e disse:]
vamos gente, vamos ser mais rápido, estamos perdendo o paciente!!!E a
gente sendo rápido, mais sente que teve uma pressão, que não foi boa pra
equipe né? ...
Ele tava só, ele tava ligando
num sei pra quem tentando
conseguir uma ajuda, ele viu
que a paciente tava
afundando, eu acho também o
desespero dele em perder a
paciente. Um plantão noturno
dia 25/12, eu acho que tinha
poucos médicos no hospital.
Devido ao nervosismo, devido
ter que ser rápido... porque
era uma hora de sufoco.
Ficamos nervosos, mas graças a
Deus, o paciente foi pra UTI,
ficou tudo bem, o paciente foi pra
casa e ficou tudo bem.
Assim, depois que tudo
aconteceu, as meninas até
disseram..., teve muitos
comentários, as auxiliares
comentando que ele foi meio
grosseiro, ..., mas que as meninas
comentaram, comentaram dele,
achou ele muito bruto, né?
aquelas coisas, aí ele foi muito
bruto com a paciente, com a
gente, esses comentários
existiram, mais, depois.
No outro dia, era só o que se
comentavam, até no face
comentava (risos).
Ele foi muito bruto!
213
15. TE10
Uma enfermeira e uma obstetra quase iam no braço. A obstetra invadiu a
conduta da enfermeira. Faltou um pessoal. A enfermeira foi fazer um
sorteio da equipe para quem ia para outro setor. Ela sugeriu uma
auxiliar, mas a médica disse “ela não vai”, ela (enfermeira) disse “como
é que é, ela vai sim, a chefe dos técnicos de Enfermagem sou eu e ela vai”.
Para ela não afrontar a médica, ela fez um sorteio, e, coincidentemente, a
colega caiu também no sorteio. A briga foi grande, o paciente viu. Até
então a gente achou que naquela discussão ali, acabou ali. Mas não
acabou. Quando foi meia noite, no meio de um procedimento, de uma
cirurgia... a médica estava se escovando para entrar em outra cirurgia. A
outra sala estava arrumada com outra equipe. Quando a gente viu, os
gritos. O que foi? A médica agrediu a enfermeira...Empurrou. A
enfermeira também, não pensou duas vezes, no que foi a mão, foi nas
costas da médica. E a enfermeira... ninguém sabe... só há rumores de que
é homossexual. E o que aconteceu? A médica no meio da confusão falou
para ela assim “eu não tenho medo de homem, quiçá de gente metida a
homem”. Aquilo dali, assim, a vida pessoal dela foi exposta, foi uma falta
de postura fora do comum!
Essa enfermeira tem uma
fama de ser muito chata,
enfermeira desagradável...
...o problema entre o pessoal,
o caráter também. É uma
questão de caráter, porque teu
pai te ensinou como você deve
fazer, como você deve agir
quando se sentir ameaçada...
A sonda... a assistência total ao
paciente deixou de ser feita pela
enfermeira. A enfermeira, eu
acredito, que não teve foi
estrutura, depois da confusão,
para dar assistência, sendo que
ela tinha que dar assistência, era
paciente, entendeu? Talvez por
não conseguir enxergar a equipe,
pelo que a médica falou em
relação à vida pessoal dela...
Então assim... ela não deu
assistência.
Só sei de um termo:
falta de ética e postura!
16. M1
Com certeza! Sexual não, mas verbal, intimidação, repreensão
desrespeito, tem demais! Vou dar o exemplo aqui da UTI. Existem certas
pessoas que se acham que por ser concursado, por trabalhar aqui por
mais tempo e por eventualmente você, embora capacitado, seja uma
pessoa nova no serviço, elas se sentem aptas a se sentir dono do lugar e
fazer confusão mesmo com uma coisa que ela julga ser errado sem apurar
ou saber a verdade. Mas isso foi uma coisa pontual de uma pessoa.
Acho que são motivos
individuais de cada pessoa.
Acho que cada pessoa que age
dessa forma deve ter um
motivo, algumas devem agir
sem motivo porque é da índole
mesmo... [ou] problema em
casa, trazendo pro trabalho.
Eu evito até conversar [com a
pessoa].
-
17. M2
Assim, a questão de receber o paciente ou não. A enfermeira lá embaixo
decidia quando ela ia receber o paciente, ela queria decidir que paciente
vinha, o médico falava uma coisa e ela decidia por outra, entendeu? Por
algum motivo assim que ela acha que ela é a chefe do serviço né. E ai esse
problema viu. Eu já vi relatos de pessoas falando dessa barreira com a
entrada de paciente na emergência. O paciente dentro da observação.
Paciente vai ser admitido lá, aí determinados pacientes a pessoa não
recebe. Não quer receber ou fica botando muita banca para receber. É já
vi. Essas coisas. Tem muito disso aqui!
Falta de interesse!
O paciente se enquadra no lugar
errado, num lugar pouco
apropriado, com pouca
assistência ,ele vai piorar e até
voltar pra UTI. Pode ter uma
reca
É algo inapropriado e
desrespeitoso com o
paciente, e também com
o profissional.
214
18. M3
Tem determinados auxiliares de enfermagem que às vezes ficam falando
alto, e falam coisas que não devem, até nós médicos mesmo às vezes em
visita médica fica comentando caso do paciente na frente dele, ele fica
escutando, às vezes a gente não se dá conta que isso não deveria
acontecer. Termina falando e quando vê já falou na frente dele, e ele ta ali
escutando tudo, as vezes repercute. E outra coisa: como aqui é hospital
escola, tem muito estudante, muito residente, às vezes eles esquecem que
tão lidando com gente e acha que tá só estudando e termina... sei lá as
vezes eles esquecem, literalmente, esquecem que quem tá do outro lado é
um paciente, uma pessoa. Com relação a assédio nunca vi, com relação a
repreensão e pressões também não. Eu vejo muita pressão da chefia da
enfermagem com os auxiliares!
Tem caso aqui de três funcionários que iriam sair do hospital porque por
ocasião da avaliação que é feita [de desempenho], o pessoal julgou muito
abaixo do [padrão]... A chefia, por motivos pessoais, deu uma nota
inferior e isso gerou problema pra eles!
...acho que é mais uma
questão pessoal da chefe.
Talvez ela tenha problema
com ela mesma, consigo
mesma, que não consiga
resolver e ai termina
repercutindo das outras
pessoas. Acho que é mais uma
questão talvez de
personalidade ou talvez
alguma situação emocional
mal resolvida que ela tenha e
que não consiga resolver.
Isso acontece muito e assim é
motivo de muito
descontentamento, de muita
insatisfação do ponto de vista
deles, dos auxiliares. O que eles
fazem é as vezes não vir pro
plantão, ou sair daqui e procurar
outro hospital.
Eu acho isso
desumanidade,
desrespeito, má
vontade.
19. M4
Essa questão de gritos eu já vivenciei, mas, sinceramente, não aqui [na
unidade de internação]. Já vivenciei em ambientes mais estressantes
como, por exemplo, na emergência. Isso já aconteceu, por parte da equipe
de enfermagem e de alguns médicos também.
Eu atribuo à sobrecarga de
trabalho. Eu acho que na
saúde as pessoas acabam
trabalhando mais do que o
que seria aceitável. Aí, com
esse cansaço, a relação
interpessoal fica complicada.
Com certeza. Porque eu acho que
se não tiver harmonia entre os
membros da equipe, o
entrosamento é menor e o
resultado é menos eficaz, tem
menos eficiência para o
atendimento.
-
20. TE11
Comigo não, mas eu já vi com colegas. De um profissional, tipo assim, se
for um profissional técnico de Enfermagem, ou um enfermeiro, ou um
médico, que tem um tom de voz um pouco mais alto, por conta de algum
tipo de erro que foi cometido, certo, ou então uma opinião dele sobre o
tipo de assistência que está sendo dada. Basicamente isso, uma cobrança
em si do profissional, do técnico de Enfermagem. Ele é muito cobrado
para fazer o serviço certo. E a gente tem aquele impasse, a gente é
cobrado, mas também ele tem que fazer a parte dele, mas a gente não sabe
como cobrar da parte dele. Então a gente meio que... harmoniosa nesse
sentido, tipo, do técnico para o enfermeiro. A gente chega para conversar,
faz um tipo de indireta “olha, paciente tá sentindo tal coisa e está sendo
feito isso, ou não está sendo feito isso”, certo. Mas quando é ao contrário,
geralmente, é um pouquinho mais agressivo. Tem um médico da unidade
que quando ele se dirige ao profissional e que houve algum certo tipo de
falha, ele fala alto mesmo com o profissional. Chama atenção “ê, fulano,
o que isso que está acontecendo, que não era para acontecer isso”.
Da própria característica da
pessoa mesmo, que ele parece
ser um pouco mais
desequilibrado, não sei, ou
emocionalmente
desequilibrado... ou que está
sendo levado ao estresse do
trabalho dele mesmo.
Acaba que afeta um pouco o
relacionamento da equipe. Tem
colega que chega e sabe que é
aquele médico já diz “Ah! Droga!
É o médico tal que está de
plantão?” Aí já fica meio
receoso, fica mais na dele. Já
trata tudo profissionalmente, não
conversa abertamente. Como a
gente trabalha bastante, tem
muito tempo de serviço aqui no
hospital, a gente acaba ficando
com amizade entre os
profissionais, que tem bastante
tempo com a gente, que tem
afinidade com a equipe, então a
gente acaba levando na amizade.
E tem pessoas desse tipo de
comportamento mais estressante,
a gente leva no profissionalismo.
-
215
21. E11
Indigna a gente ter que chegar em um plantão e ter uma colega de
trabalho que o paciente teve uma falha da assistência por uma simples
irresponsabilidade do profissional, que o plantão estava calmo, porque
simplesmente ela estava no whatsapp, porque estava conversando, porque
teve que sair, então assim, acontece às vezes de chegar no plantão e ter
algo pendente, alguma coisa que interferiu na assistência do paciente por
irresponsabilidade do profissional, isso às vezes gera conflitos. A gente
discute, leva pra chefia,, gera conflitos...
A inexperiência, as recém-
formadas, o pouco
compromisso, que alguns tem
baixo compromisso mesmo
com a profissão, com unidade,
então aqui: muitas vezes „eu
to pelo dinheiro‟, „ah eu vou
trabalhar por que eu preciso
desse plantões‟, mas não vê
que pra trabalhar você
precisa ter responsabilidade
profissional, às vezes tem
alguns profissionais que se
posicionam dessa forma, aí
isso causa alguns conflitos em
reunião, que a gente repassa
pra equipe. É o pouco
compromisso, e também a
sobrecarga, porque assim, o
salário do enfermeiro ainda
não é suficiente pra
sobrevivência, então tem
colega da gente que trabalha
em três empregos né? eu já
me sinto muito cansada, eu
dou sete plantões aqui e eu
tenho outro emprego, já me
sinto muito cansada. Eu tenho
colegas que trabalham
durante um mês 20, 25
plantões, então assim, chega
num ponto que a gente chega
esgotado, não consegue
render o que deveria, então
pela baixa remuneração
salarial você tem que
procurar outras formas de
trabalho, outras fontes de
renda, aí em virtude disso
você chega muito cansada e
não rende no plantão, a
sobrecarga atrapalha também
na assistência.
Se eu tenho conflitos, se a equipe
não me orienta, se eu não tenho
segurança, se eu não confio, eu
não vou conseguir estar bem na
unidade, então a gente tem que
star realmente disponível, mais
relaxada, mais tranquila e mais
disponível pra ele [o paciente]...
[Para o paciente] com certeza!
100% tá relacionado. Se eu estou
cansada, esgotada, eu não
consigo oferecer a assistência ao
paciente.
-
216
22. M5
Olha, comigo eu não estou lembrando, mas tem muitas histórias assim de
cirurgião, de ser grosseiro com residente, com a técnica, de jogar
material... aqui na chefia da enfermagem tem algumas histórias também.
Eu acho que um pouco de
prepotência, um pouco de
falta de amor. Acho que um
pouco de falta de
preocupação com o paciente
também.
Numa cirurgia isso desestrutura
tudo,, acaba que tira a
concentração ali do paciente, tira
o foco do paciente e coloca em
outra coisa e acaba que, imagino
que prejudique o resultado final..
Grosseiro