Post on 24-Nov-2015
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARAN
SETOR DE CINCIAS DA TERRA
DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA
PROGRAMA DE PS GRADUAO EM GEOGRAFIA
CELIA REGINA GAPSKI YAMAMOTO
WETLANDS NA REGIO METROPOLITANA DE CURITIBA PR: DIAGNSTICO,
CONFLITOS SOCIOECONMICOS E DESAFIOS DE GESTO
Tese de doutorado
CURITIBA
2011
CELIA REGINA GAPSKI YAMAMOTO
WETLANDS NA REGIO METROPOLITANA DE CURITIBA PR:
DIAGNSTICO, CONFLITOS SOCIOECONOMICOS E DESAFIOS DE GESTO
Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Geografia Doutorado, rea de Concentrao Espao, Sociedade e Ambiente, Linha de Pesquisa Paisagem e Anlise Ambiental, Setor de Cincias da Terra da Universidade Federal do Paran
Orientador: Prof. Dr. Naldy Emerson Canali
CURITIBA
2011
iv
DEDICATRIA
Aos tomadores de deciso, que possam reconhecer os valores das wetlands
e aportar esforos para uma gesto mais sustentvel das wetlands para o benefcio
da sociedade.
v
We cannot solve the problem with the same approach which cause the
problem. Albert Einstein
vi
SUMRIO
LISTA DE FIGURAS .............................................................................................................................. ix
LISTA DE TABELAS ........................................................................................................................... xiii
LISTA DE QUADROS .......................................................................................................................... xiv
LISTA DE SIGLAS ................................................................................................................................ xv
RESUMO .............................................................................................................................................. xvi
1 INTRODUO ...................................................................................................................................1
1.1 JUSTIFICATIVA ..............................................................................................2
1.2 OBJETIVOS ....................................................................................................4
1.3 HIPTESES ...................................................................................................5
1.4 ORGANIZAO DO TRABALHO ...................................................................6
2 CARACTERIZAO GERAL DA REA DE ESTUDO ....................................................................7
3 REVISO BIBLIOGRFICA .......................................................................................................... 15
3.1 BACIAS HIDROGRFICAS .......................................................................... 15
3.2 WETLANDS .................................................................................................. 19
3.2.1 Importncia das Wetlands ....................................................................... 20
3.2.2 Impactos e Medidas Recomendadas ....................................................... 23
3.2.3 Classificao das Wetlands ..................................................................... 25
3.2.4 Vrzeas.................................................................................................... 27
3.2.5 Vrzeas Urbanas ..................................................................................... 33
3.2.6 Wetlands Urbanas ................................................................................... 34
3.2.7 Wetlands Construdas ............................................................................. 37
3.3 INDICADORES DE ESTADO ....................................................................... 44
3.4 CONSERVAO E RECUPERAO .......................................................... 46
3.5 CONECTIVIDADE ........................................................................................ 48
3.6 PULSOS HIDROLGICOS ........................................................................... 52
3.6.1 Efeitos da Alterao dos Pulsos em Rios e Wetlands ............................. 53
vii
3.6.2 Hidrologia e Hidrodinmica de Wetlands ................................................. 54
3.7 MACRFITAS AQUTICAS ......................................................................... 56
3.8 MERCADOS DE SERVIOS AMBIENTAIS ................................................. 61
4 METODOLOGIA ............................................................................................................................. 66
4.1 RECORTE DA REA DE ESTUDO .............................................................. 66
4.2 PROCEDIMENTOS METODOLGICOS ..................................................... 68
4.2.1 Geossistema ............................................................................................ 69
4.2.2 Territrio .................................................................................................. 78
4.2.3 Paisagem ................................................................................................. 78
5 RESULTADOS E DISCUSSES ................................................................................................... 80
5.1 GEOSSISTEMA ............................................................................................ 80
5.1.1 Conectividade pelas guas ..................................................................... 80
5.1.2 Conectividades Antrpicas ...................................................................... 92
5.1.3 Caracterizao da Vegetao .................................................................. 93
5.1.4 Qualidade da gua ................................................................................ 102
5.2 TERRITRIO .............................................................................................. 114
5.2.1 Histrico da Ocupao Alteraes Antrpicas .................................... 114
5.2.2 Fragmentao e Delimitao do Geossistema pela Rede Viria ........... 123
5.2.3 Ocupaes e Usos das reas ............................................................... 125
5.2.4 Projetos e Agentes Atuais de Apropriao do Espao .......................... 128
5.2.5 Percepo dos Atores ........................................................................... 131
5.2.6 Contornos Normativos ........................................................................... 134
5.2.7 Servio Ambiental .................................................................................. 144
5.3 PAISAGEM ................................................................................................. 146
5.3.1 Funes ................................................................................................. 147
5.3.2 Problemas Ambientais Observados na Regio ..................................... 153
5.3.3 Destaques na Paisagem ........................................................................ 160
6 CONCLUSO E RECOMENDAES......................................................................................... 171
7 REFERNCIAS ............................................................................................................................ 179
8 LEGISLAO CONSULTADA .................................................................................................... 193
viii
9 SITES VISITADOS ....................................................................................................................... 195
10 ANEXOS ....................................................................................................................................... 197
ix
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Wetlands do rio Iguau ............................................................................... 7
Figura 2 - Localizao das wetlands do Alto Iguau ................................................... 8
Figura 3 - Perfil esquemtico dos tipos de vegetao ............................................... 11
Figura 4 - Mapa geolgico da regio do Alto Iguau ................................................. 12
Figura 5 - Perfil Marechal Floriano e Avenida das Torres ......................................... 14
Figura 6 - Corte esquemtico do valley-flat ............................................................... 28
Figura 7 - Paisagem onde predomina rea com turfa ............................................... 30
Figura 8 - Sistemas Nogawa, Hirasegawa e Yajigawa .............................................. 38
Figura 9 - Restauradores Living machines, canal de Baima, China .......................... 39
Figura 10 - Sistema Krefeld ....................................................................................... 40
Figura 11 - Wetland construida de Koh Phi Phi Don ................................................. 42
Figura 12 - Hong Kong wetland park ......................................................................... 43
Figura 13 - Zona de domnio de atrao ................................................................... 44
Figura 14 - Larguras ideais para as funes da zona ripria. ................................... 51
Figura 15 - rea varivel de fonte ............................................................................. 56
Figura 16 - Variedades de heliconia, cana e iris possveis de utilizao no sistema
wetland ............................................................................................................... 60
Figura 17 - Patrimnio mundial da Unesco em Ifugao, nas Filipinas. ........................ 62
Figura 18 - reas de aluvio na bacia do Alto Iguau ............................................... 66
Figura 19 - Aluvies em reas urbanizadas da bacia do Alto Iguau ........................ 67
Figura 20 - Sees dos niveis de cheias considerados para espacializao ............ 70
Figura 21 - Localizao dos pontos e ambientes de amostragem ............................ 73
Figura 22 - Localizao e visualizao dos pontos de amostragem ......................... 74
Figura 23 - Cota do nvel de eventos de cheias do rio Iguau. Estaes: Olaria do
Estado (0,36 km); Pinhais (7,63km); Ponte BR 277 (11,62 km); ETE Sanepar
(16,07 km); Ponte Umbarazinho (31,04 km); ETA Araucria (52,83 km) e Balsa
Nova (96,05 km). ................................................................................................ 81
Figura 24 - Plancie inundvel para diferentes TRs ................................................... 82
Figura 25 - Conectividade pelo meandro abandonado .............................................. 86
Figura 26 - Conectividade entre cavas e cava e rio .................................................. 90
x
Figura 27 - Lagoas reservatrios da ilha a montante da BR-277 ........................... 92
Figura 28 - Conectividades antrpicas ...................................................................... 92
Figura 29 - Macrfitas emergentes observadas na paisagem do Altssimo Iguau ... 94
Figura 30 - Ambientes a montante da lagoa do Itaqui ............................................... 96
Figura 31 - Vrzea do rio Itaqui ................................................................................. 96
Figura 32 - Borda de cavas e vrzea do rio Pequeno ............................................... 97
Figura 33 - Macrfitas flutuantes observadas na paisagem do Altssimo Iguau ...... 98
Figura 34 - Retirada de Pistia stratiotes na lagoa e vrzea do Itaqui ........................ 99
Figura 35 - Macrfitas submersas observadas em ambientes do Altssimo Iguau 100
Figura 36 - Exemplos de macrfitas marcantes na paisagem ................................. 100
Figura 37 - Erythrina crista-galli L. ........................................................................... 101
Figura 38 - Precipitao acumulada ........................................................................ 103
Figura 39 - Domnio de macrfitas e valores de E. coli encontrados no sistema de
conteno de cheias no So Judas Tadeu ...................................................... 105
Figura 40 - Lixo e quantidade de plantas aquticas existentes no sistema de
conteno de cheias na Vila Zumbi dos Palmares ........................................... 107
Figura 41 - Ambientes da lagoa da Cidade Jardim em 2010 .................................. 107
Figura 42 - Cavas originadas aps extrao da areia entre a BR-277 e Avenida Ira
......................................................................................................................... 108
Figura 43 - Localizao dos pontos de coleta na regio das cavas. P1 no rio Ira; P2
no canal extravasor; P3, P4 e P5 nas cavas .................................................... 108
Figura 44 - Variao da concentrao de P-total e de N-amoniacal nos pontos
amostrados nas cavas, rio Ira e canal extravasor ........................................... 109
Figura 45 - Variao da concentrao de oxignio dissolvido (mg L-1) nos pontos
amostrados nas cavas ..................................................................................... 110
Figura 46 - Variao da quantidade de E. coli (NMP/100 mL) e da concentrao de
demanda bioqumica de oxignio, N-amoniacal, fsforo total, ortofosfato e
oxignio dissolvido nos pontos amostrados no rio Palmital ............................. 113
Figura 47 - Variao da concentrao de cafena no rio Palmital ........................... 114
Figura 48 - Ocupao continuada nas vrzeas do Parque Metropolitano do Iguau
......................................................................................................................... 115
Figura 49 - Aterro sanitrio de Curitiba ................................................................... 117
Figura 50 - Banhado margem direita do Iguau, municpio de Curitiba ................ 118
xi
Figura 51 - Macrfitas identificadas no banhado ..................................................... 119
Figura 52 - Enchentes de 1995 trecho Av. das Torres Av. Marechal Floriano,
Curitiba ............................................................................................................. 120
Figura 53 - Retificao do rio Iguau e alterao das vrzeas ................................ 120
Figura 54 - Canal extravasor, retificao e alargamento do rio iguau ................... 122
Figura 55 - Guarituba, Piraquara ............................................................................. 124
Figura 56 - Ocupao irregular nas vrzeas do rio Barigui ..................................... 127
Figura 57 - Areal em operao e abandonado ........................................................ 127
Figura 58 - Aluvies e reas prioritrias de conservao de biomas ...................... 129
Figura 59 - rea de interesse especial regional do Iguau ..................................... 130
Figura 60 - Areal em operao nas vrzeas do Altssimo Iguau ........................... 132
Figura 61 - Lagoa da Corina.................................................................................... 148
Figura 62 - Canal extravasor ................................................................................... 148
Figura 63 - Lagoa do So Judas Tadeu .................................................................. 149
Figura 64 - Localizao e entorno da lagoa da Cidade Jardim ............................... 150
Figura 65 - Lagoa da Cidade Jardim ....................................................................... 150
Figura 66 - Tratamento paisagstico das lagoas de reteno .................................. 151
Figura 67 - Ambientes de jusante e montante da lagoa do Itaqui ........................... 152
Figura 68 - Lagoa do Itaqui ..................................................................................... 152
Figura 69 - Lanamentos com problemas de qualidade .......................................... 153
Figura 70 - Ocupao irregular ................................................................................ 155
Figura 71 - Descarte de resduo .............................................................................. 155
Figura 72 - Estaes de tratamento de esgoto construdas nas vrzeas ................ 156
Figura 73 - Desassoreamento de rios e canais ....................................................... 157
Figura 74 - Areais em operao .............................................................................. 158
Figura 75 - Vista de lavadores de areais fora de operao ..................................... 158
Figura 76 - Vrzeas vistas de pontos elevados da paisagem ................................. 159
Figura 77 - Cavas a montante da BR-277 ............................................................... 161
Figura 78 - Vrzeas e cavas potenciais para implantao de sistemas wetlands ... 161
Figura 79 - Vrzea do rio Iguau a jusante do canal extravasor ............................. 164
Figura 80 - Floresta de influncia fluvial a jusante da estrada da Cachoeira .......... 165
Figura 81 - Montante e jusante da estrada do Ganchinho em 07/05/2008 .............. 165
xii
Figura 82 - Ponte Nicola Pelanda sobre o leito antigo do Iguau, leito atual do rio
Despique/Cotia ................................................................................................. 166
Figura 83 - Vrzeas urbanas a jusante da foz do rio Miringuava ............................ 166
Figura 84 - Mata ribeirinha ...................................................................................... 168
Figura 85 - Leito abandonado ao lado de dique marginal ao leito atual .................. 168
Figura 86 - Vrzea e cavas em Balsa Nova ............................................................ 169
Figura 87 - ltima vista da vrzea do Iguau .......................................................... 169
Figura 88 - Testemunhos da histria econmica..................................................... 169
Figura 89 - General Lcio ........................................................................................ 170
Figura 90 - Usos de lazer ........................................................................................ 170
xiii
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Valores econmicos mdios por funo de wetland ................................ 23
Tabela 2 - Eficincia dos sistemas com vegetao flutuante transversal ao rio ....... 39
Tabela 3 - Eficincia do sistema zona de razes wetland de fluxo subsuperficial
horizontal - Escola Municipal Padre Luigi Salvucci, Foz do Iguau/PR .............. 43
Tabela 4 - Pontos de amostragem ............................................................................ 72
Tabela 5 - Porcentagem de dados vlidos dos nveis do rio Iguau por estao por
ano ..................................................................................................................... 80
Tabela 6 - Valores mdios dos parmetros oxignio dissolvido (OD, mg L-1),
demanda bioqumica de oxignio (DBO, mg L-1), carbono orgnico dissolvido
(COD, mg L-1), N-nitrato (N-NO3, mg L-1), nitrognio amoniacal (N-NH3, mg L
-1),
fsforo total (P-total, mg L-1) e E. coli (NMP/100 mL). Resultado das quatro
coletas realizadas em 2010 .............................................................................. 110
Tabela 7 - Valores do ndice de Qualidade da gua (IQA) para os ambientes
avaliados .......................................................................................................... 111
Tabela 8 - Variao de alguns parmetros na entrada e sada da lagoa do Itaqui. 112
xiv
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Impactos que ocorrem em conseqncia das vrias atividades humanas
........................................................................................................................... 25
Quadro 2 - Diagrama das relaes geomtricas ....................................................... 49
Quadro 3 - Espcies de macrfitas aquticas por zona/profundidade ...................... 60
Quadro 4 - Grupos e gneros dos estandes das lagoas ........................................... 61
Quadro 5 - Relao de campanhas nas vrzeas ...................................................... 79
Quadro 6 - Espcies de macrfitas aquticas identificadas no ambiente 3 .............. 91
Quadro 7 - Uso do solo e parcelamento na zona de restrio a ocupao das UTPs
......................................................................................................................... 143
xv
LISTA DE SIGLAS
AIERI rea de Interesse Especial Regional do Iguau
APA rea de Proteo Ambiental
APPs reas de Preservao Ambiental
COD Concentrao de Oxignio Dissolvido
DBO Demanda Bioqumica de Oxignio
GTP Geossistema, Territrio e Paisagem
IDS ndice de Desenvolvimento Sustentvel
MNT Modelo Numrico do Terreno
RCC Resduo da Construo Civil
RMC Regio Metropolitana de Curitiba
SANEPAR Companhia de Saneamento do Paran
SIG Sistema de Informao Geogrfica
SNUC Sistema Nacional de Unidades de Conservao
UC Unidade de Conservao
UTPs Unidades Territoriais de Planejamento
xvi
RESUMO
Diversas polticas pblicas aplicadas ao solo urbano atual visam a promoo
sustentvel do uso dos espaos. Muitas vezes, porm, determinados instrumentos
no so suficientes ou no so eficientes para o alcance dos resultados esperados,
promovendo desvios nos objetivos projetados, cuja reconduo depende de um
eficiente sistema de gesto. Saliente-se as gravssimas conseqncias da poluio
das guas bem como a importncia da gesto das wetlands para as guas e a
gesto das guas para as wetlands. A pesquisa considera que os desvios entre os
modelos aplicados e projetados em reas urbanas e os ganhos em recursos hdricos
podem ser detectados, permitindo o equilbrio entre a utilizao dos recursos
disponveis e o desenvolvimento sustentvel das cidades. Assim, o objetivo geral
desta tese foi proporcionar e contribuir com a avaliao e gesto das wetlands que
se mostram potencial para a melhoria da qualidade das guas dos rios em geral.
Aplica, de modo indito, um ensaio metodolgico baseado na metodologia GTP -
Geossistema, Territrio e Paisagem - para uma avaliao qualitativa e quantitativa
de wetlands urbanas e de utilizao potencial destas para a melhoria da
disponibilidade de recursos hdricos. Adotando-se, como estudo de caso, parte da
bacia do Alto Iguau na Regio Metropolitana de Curitiba, Paran, foram realizadas
as anlises qualitativa e quantitativa das variveis envolvidas, obtendo-se a sntese
necessria a priorizao de ambientes potenciais para os recursos hdricos e dessa
forma, contribuir com diretrizes para a requalificao do espao (recomposio
ambiental das reas), visando a melhoria das guas urbanas e a conservao das
wetlands do Alto Iguau e, tambm, a aplicao em outras bacias.
PALAVRAS-CHAVE: gesto urbana; gesto de recursos hdricos; wetlands; desenvolvimento sustentvel.
1
1 INTRODUO
As reas midas, internacionalmente conhecidas por wetlands so
paisagens com presena permanente ou peridica de gua e compreendem
diferentes ecossistemas que cobrem uma considervel parte da superfcie terrestre.
A definio mais amplamente difundida para reas midas ou wetlands a adotada
pela Conveno de Ramsar, sobre - Zonas midas de Importncia Internacional -
que as definem como reas de pntano, charco, turfa ou gua, natural ou artificial,
permanente ou temporria, com gua estagnada ou corrente, doce, salobra ou
salgada, incluindo reas de gua martima com menos de seis metros de
profundidade na mar baixa. Essa definio abrangente na qual se pode incluir as
vrzeas, como wetlands naturais.
Para Tockner e Stanford (2002), atualmente, as wetlands so pontos focais
para o desenvolvimento urbano e a explorao exaustiva de seus recursos, estando
entre os ambientes mais ameaados pelas atividades humanas, principalmente pela
regulao da gua, infra-estrutura e disposio de resduos. As wetlands so
afetadas pela construo de barragens, suprimento de gua para abastecimento,
retificaes e diques marginais que com isto modificam o regime de suas guas e,
conseqentemente, o fluxo e o rompimento das ligaes ao longo dos rios, ou entre
os rios e suas plancies de inundao. Os estressores das wetlands afetam vrios e
importantes servios ecossistmicos, como armazenamento e purificao da gua,
recarga de aqferos subterrneos, amortecimento de vazo, manuteno da
heterogeneidade da paisagem e da biodiversidade, sumidouro de carbono, produo
de recursos naturais renovveis e outros.
Quanto aos benefcios econmicos de prticas alternativas de gesto, se
comparados com os de sistemas submetidos a prticas insustentveis, percebe-se
que os benefcios dos sistemas que tem uma gesto sustentvel so maiores que
aqueles dos ecossistemas convertidos (ALMEIDA, 2007).
No Estado do Paran, as wetlands regionais e locais apresentam um valor
ecossistmico importante para estocagem e purificao da gua e recreao, mas
esto tambm sob ameaa crescente, decorrente de aterros e poluio, associados
a uma populao crescente concentrada nas reas urbanas.
2
O rio Iguau e alguns de seus afluentes apresentam em suas margens
inmeras e extensas wetlands naturais, configurando plancies de inundao bem
definidas. Portanto deve-se ter um especial interesse na preservao destas
wetlands, visto que representam importante papel na gesto do meio ambiente e dos
recursos hdricos para o desenvolvimento territorial.
Assim, na Regio Metropolitana de Curitiba RMC - um dos maiores
desafios regionais o gerenciamento e a gesto de suas wetlands, altamente
urbanizadas e povoadas, com evidentes interferncias na qualidade das guas,
degradadas pelas atividades antrpicas, gerando situaes potenciais de escassez
de gua para o consumo humano em condies adequadas de qualidade.
Este crescimento da demanda por gua para os mais variados usos faz
crescer e tomar corpo o princpio dos usos mltiplos, gerando uma srie de conflitos
de interesses (MMA, 2006b).
As wetlands do Alto Iguau, durante o ltimo sculo, no foram levadas em
considerao nas operaes de urbanizao, implantaes industriais e de infra-
estrutura viria. A recente considerao do meio ambiente, polarizada na urgncia
dos problemas de despoluio e de controle de cheias preocupou-se pouco com as
wetlands e o que elas podem representar para a sociedade. Alm da extensiva
explorao da minerao, obras foram freqentemente realizadas sobre elas, ou
ento foram abandonadas, tornando-se alvos de assentamentos irregulares.
1.1 JUSTIFICATIVA
Segundo Almeida (2007) o valor dos ecossistemas deve ser melhor
apropriado, tanto no que se refere incluso das externalidades quanto no que se
refere a servios ambientais j internalizados, como o solo. Embora a comunidade
acadmica e outros especialistas venham trabalhando sobre o assunto, a
apropriao dos servios ambientais e formas de quantificao de seus valores so
temas ainda em discusso.
Em relao aos servios ambientais, as wetlands so, em sua aparente
banalidade, uma verdadeira riqueza regional, necessitando serem administradas,
valorizadas e apreciadas, pois em certas periferias urbanas so transformadas e
3
ameaadas ao desaparecimento devido a ocupaes, trazendo um custo a esta
explorao ou uso.
O rio Iguau e suas wetlands tiveram seu regime modificado pelas
retificaes, barragens, poluio, usos e atividades nas margens e retiradas de
gua, areia e argila. Trata-se de um recurso que foi diferentemente valorizado e
artificializado pelos sistemas econmicos que se sucederam. A destruio continua
em larga escala como conseqncia de polticas de desenvolvimento inadequadas,
a falta de efetividade das leis existentes, bem como de planejamento do uso do solo
de longo prazo, afetando negativamente o rio e as wetlands em propriedades
pblicas e privadas.
Decises nas polticas pblicas de carter social exigem anlises custo-
benefcio que incorporem parmetros sociais e ambientais de modo a adaptar os
projetos a padres econmica, ecolgica e socialmente aceitveis, uma vez que a
mitigao de muitos de seus efeitos negativos nem sempre so possveis.
Uma poltica moderna para as wetlands baseada em conhecimento cientfico
e capaz de conciliar desenvolvimento econmico com a proteo ambiental e bem-
estar social se faz necessria. Esta poltica deveria considerar o valor das wetlands
e seus servios ambientais, alm de sua importncia para a biodiversidade. A
Conveno de Ramsar, da qual o Brasil um dos 158 pases signatrios, requer o
estabelecimento e implementao de uma poltica especfica para a gesto e
proteo das wetlands, comeando com um inventrio das wetlands nacionais e a
manuteno do seu carter ecolgico mediante um manejo racional. A Declarao
de Cuiab (INTECOL, 2008) chama a ateno para a necessidade de estudos,
gesto e proteo das wetlands com prioridade para a manuteno dos servios
ambientais para o benefcio da espcie humana.
Uma das maiores ameaas o crescimento populacional que impem
crescentes presses sobre os recursos das mesmas. Visto que a urbanizao
continuar crescendo, estas presses certamente tambm aumentaro. Assim, a
proteo das wetlands torna-se uma questo central em relao ao meio ambiente,
as transformaes do territrio, a identidade cultural e a qualidade da vida. Um
conhecimento melhor das questes relativas a origem, funes, funcionamento,
4
utilizao e representao das vrzeas por parte da comunidade s poder melhorar
a pertinncia de futuras intervenes.
1.2 OBJETIVOS
Partindo-se da premissa de que a sustentabilidade econmica, social e
ambiental da Regio Metropolitana de Curitiba - RMC - passa pela considerao da
urgncia em atenuar os impactos negativos das relaes entre desenvolvimento
urbano e disponibilidade dos recursos hdricos, o objetivo geral desta tese foi
proporcionar e contribuir com a avaliao e gesto das vrzeas wetlands - que se
mostram potencial para a melhoria da qualidade das guas dos rios.
So objetivos especficos:
Determinar a extenso e variabilidade das vrzeas
inventariando tipos de wetlands ocorrentes na bacia do Alto
Iguau;
Identificar um banco de wetlands atuais na bacia do Alto
Iguau na R M C;
Analisar os aspectos relevantes, disponveis no conjunto de
normas de gesto territorial, ambiental e de recursos hdricos,
aplicveis s wetlands urbanas da bacia do Alto Iguau;
Identificar os principais causadores da degradao das
wetlands metropolitanas da Bacia do Alto Iguau;
Avaliar a qualidade da gua em determinadas wetlands;
Identificar alternativas de integrao entre as polticas visando
incorporar as wetlands e seus valores ambientais ao mosaico
de reas protegidas;
Propor ferramentas de proteo/manuteno e restaurao das
funes de wetlands.
Identificar e valorizar a paisagem das wetlands.
5
1.3 HIPTESES
So hipteses consideradas nesta tese:
Embora importantes para o equilbrio e o suprimento de vida do
ambiente urbano, as wetlands so contrariamente e
freqentemente objeto de degradao;
O processo acelerado de degradao das funes das
wetlands do Alto Iguau pode estar sendo causado:
o pela baixa valorizao decorrente do desconhecimento
das funes como ecossistema complexo;
o pela falta de estudo do regime hidrolgico como um
parmetro a ser considerado na recuperao.
A incluso da gesto das wetlands nos planos diretores pode
trazer melhora na qualidade das guas dos rios;
A reestruturao das paisagens atravs de eco-tecnologias
(wetlands construdas) pode ser de grande utilidade para a
manuteno ou restaurao da qualidade dos corpos hdricos;
Os geofcies de vertente se apresentam como potenciais
paisagsticos e filtradores de guas da drenagem carregadas
da poluio difusa das reas urbanas;
Wetlands no tem preo de mercado determinado pelos
servios ambientais prestados e como tal no so
reconhecidas como tendo um valor econmico;
A sociedade percebe ou atribui um valor as wetlands
(econmico, cultural, ecolgico) que depende em grande
medida dos objetivos da sociedade e tambm do grau de
conhecimento que a mesma tem a respeito das funes
essenciais das wetlands. Este conhecimento cresce a partir da
pesquisa, mas chega lenta e deficientemente sociedade;
O valor operacional deste sistema vrzeas-wetlands ainda
precisa ser demonstrado, de modo a evidenciar outras
alternativas que no seja o de apenas ocupar e degradar todo
do territrio.
6
1.4 ORGANIZAO DO TRABALHO
Aps a Introduo o Captulo 2 apresenta a caracterizao geral da rea de
estudo, as wetlands do rio rio Iguau, na RMC.
O Captulo 3 apresenta a reviso bibliogrfica sobre aspectos gerais dos
ecossistemas de wetlands, onde so descritos: formas de classificao; estruturas,
funes e valores de uma wetland; uso e conservao; indicadores de estado;
hidrologia e hidrodinmica; e a relao entre hidroperodo e as comunidades
biolgicas. Apresenta, por um lado, o resultado da busca por conceitos e diversas
tcnicas, privilegiando claramente as medidas tendentes recuperao ambiental
de wetlands, como modo de fomentar a melhoria da qualidade dos rios urbanos.
O Captulo 4 apresenta a metodologia do Sistema GTP, adotada nesta
pesquisa e d incio a apresentao das wetlands do Iguau, na bacia do Alto
Iguau na Regio Metropolitana de Curitiba, local selecionado para o estudo de
caso.
No Captulo 5 so apresentados e discutidos os resultados relacionados com
os ambientes, os servios e os instrumentos a serem considerados para a gesto,
conservao ou restaurao das wetlands do Alto Iguau na RMC. Neste captulo
so apresentados suas funes e valores, alm dos conflitos existentes pelo uso.
Ainda neste Captulo, e atendendo necessidade da metodologia, o local do estudo
de caso caracterizado em termos hidrolgicos e biolgicos. Tambm identifica e
analisa aspectos relevantes, disponveis no conjunto de normas de gesto territorial,
ambiental e de recursos hdricos, que potencializem a apropriao destas com usos
adequados, alternativas de integrao entre as polticas para a incorporao das
wetlands e seus valores ambientais ao mosaico de reas protegidas.
Finalmente, no Captulo 6 encontram-se concluso e recomendaes do
trabalho.
7
2 CARACTERIZAO GERAL DA REA DE ESTUDO
A Regio Metropolitana de Curitiba (RMC) est localizada na parte leste do
Estado do Paran, concentrando cerca de 25% da populao total e 30% da
populao urbana do estado. Apresenta populao de 2.532.929 habitantes em uma
rea de 366.180 ha (3.661,80 km2), resultando numa densidade mdia de 6,92
hab/ha, distribuda em 18 municpios (SUDERHSA, 2007) e devendo ultrapassar 4
milhes de habitantes no ano 2020 (SUDERHSA, 2008) afetando, assim, a rea de
mananciais das nascentes do rio Iguau e necessitando da preservao das reas
de wetlands, principalmente pelo fato de apresentarem importante papel na
disponibilidade dos recursos hdricos para o desenvolvimento territorial.
O rio Iguau possui uma extenso de cerca de 910 km, drenando com seus
afluentes uma bacia de 70.800 km2. Ao longo do rio Iguau e de seus afluentes
existem extensas wetlands naturais, configurando sua plancie de inundao (Figura
1 e Figura 2), as quais vem sofrendo presses ambientais, principalmente, pela
expanso da ocupao urbana.
FIGURA 1 - WETLANDS DO RIO IGUAU
Fonte: COHAPAR, 2007
8
FIGURA 2 - LOCALIZAO DAS WETLANDS DO ALTO IGUAU
A qualidade das guas do rio Iguau, aps passar pela RMC, alterada por
diferentes processos antropognicos, classificando este rio como segundo mais
poludo do Brasil, apenas atrs do Tiet, em So Paulo, conforme o ndice de
Desenvolvimento Sustentvel (IDS), divulgado pelo Instituto de Geografia e
Estatstica (IBGE) em 2008. Dos 1,3 mil quilmetros do rio Iguau, apenas 70 km
9
apresentam em suas guas sinais de poluio, justamente no trecho das nascentes
do Iguau. As informaes reunidas nos 68 pontos de monitoramento da Bacia do
Alto Iguau tambm demonstram que a carga domstica corresponde a cerca de
90% da poluio, enquanto o restante provocado por indstrias e carga difusa
(resduos direcionados pelas galerias de guas pluviais) (SEMA, 2008). O rio Belm,
um dos seus afluentes, o mais comprometido e a sua foz no Iguau apresenta mau
cheiro e um cenrio desolador, com urubus explorando o lixo acumulado nas
margens. Segundo SANEPAR, o esgoto no a nica fonte de poluio do rio,
existindo outras, como drenagem, poltica inadequada de coleta de lixo, manejo da
gua da chuva, e ligaes irregulares de esgotos. E, atravs do Programa Viva a
natureza! Se ligue na rede tem como meta 80% das ligaes regularizadas
(GAZETA DO POVO, 2008a).
Diferentes estudos comprovaram a contaminao do rio Iguau, como o de
Lange (2006) e Grando (GAZETA DO POVO, 2008a) que consideram o rio Iguau
com caractersticas de rio natimorto na RMC, embora nas suas margens existam
garas e outros que se adaptam s condies insalubres do rio. Ainda, segundo
Furlan (2007), entre as espcies presentes na mata ciliar, apesar do nmero de
indivduos ter reduzido, possvel encontrar veados, capivaras, pacas, cutias, soc-
boi, bigus e, entre as espcies da flora, a espinheira-santa, o cambu, a guajuvira e,
em especial, os branquilhos. Carrano (2006), pesquisando as aves, relata a
presena de quero-quero nas vrzeas, de algumas espcies relacionadas com os
ambientes formados pelas cavas, indicando a boa qualidade das suas guas e de
maaricos no rio Iguau, com destino ao hemisfrio norte. Em termos de ictiofauna,
Duboc (2006) identificou estoques naturais disponveis nas cavas, que cedem
exemplares para recomposio do meio. Joilson Tadeu Scepanski, morador h 16
anos margem da corredeira Caiacanga, um dos trechos mais bonitos do rio Iguau,
em Porto Amazonas, coloca ainda d lambari e bagre por aqui, mas do jeito que
est eu no sei at quando. Vai diminuindo a cada ano. Ele ainda comenta que o rio
mudou muito em alguns anos (GAZETA DO POVO, 2008b). A contaminao da
biota no rio Iguau tambm foi verificada por Lange e Assis (2006) que, trabalhando
com biomarcadores, encontraram concentraes elevadas dos ons cdmio,
10
arsnico, mercrio, cobre e chumbo em plasma e msculo de cgados-pescoo-de-
cobra (Hydomedusa tectifera) na bacia do Alto Iguau.
O compartimento Planalto de Curitiba, segundo o Plano Diretor de Manejo
Florestal (PARAN, 1989) est dividido em trs sub-zonas sendo uma delas as
Plancies Aluvionares: superfcies de agradao horizontalizadas, que se estendem
ao longo dos rios, incluindo as reas de vrzeas propriamente ditas, com ocorrncia
de solos hidromrficos gleyzados e solos orgnicos. Trata-se de reas aplainadas
formadas pela deposio de material carreado principalmente durante as grandes
inundaes. As plancies aluviais apresentam geralmente grande fertilidade,
encontrando-se peridica ou permanentemente encharcadas. As formaes vegetais
podem apresentar-se sob duas fisionomias distintas: herbceo-arbustiva (vrzeas e
taboais, entre outras) e arbrea (caxetais e maricazais), desenvolvendo-se sobre as
plancies aluviais dos rios.
Em vrzeas de florstica mais heterognea, restringidas necessariamente s
condies de alagamento do solo, predominam espcies das famlias Cyperaceae e
Poaceae, cujas touceiras formam extenso tapete ao longo da plancie. De maneira
mais esparsa tambm ocorrem representantes das famlias Polygonaceae,
Apiaceae, Xyridaceae, Lentibulariaceae e Alismataceae, entre outras. Dentre as
formaes pioneiras com influncia fluvial arbreas, a Erythrina crista-galli
(corticeira-do-banhado) ocorre em meio vegetao herbcea das vrzeas e taboais
(SEMA, 2005; CURSIO et al., 2007).
Esta regio tambm pode apresentar floresta ombrfila mista aluvial (Figura
3), constituindo as florestas riprias que ocupam sempre terrenos aluviais situados
junto aos cursos dgua e estando sujeitas a inundaes peridicas. Caracteriza-se
estruturalmente por uma elevada densidade de indivduos de mdio e pequeno
porte, podendo apresentar comunidades em diferentes graus de desenvolvimento
(SEMA, 2005).
No Primeiro Planalto, das nascentes at Balsa Nova/Engenheiro Bley, o solo
argiloso contaminado pelo esgoto e pelo lixo. Segundo Cursio, o lixo responsvel
por danificar a vegetao das margens e o esgoto interfere na fertilidade do solo em
torno do rio. Na regio de Curitiba, o nmero de espcies que compem a mata ciliar
bem reduzido, 11 a 15 espcies, enquanto no Segundo Planalto, a partir de
11
Engenheiro Bley e suas corredeiras ao longo de 15 km, o nmero aumenta, 25 a 30
espcies. possvel recuperar a mata ciliar no Primeiro Planalto, mas seria preciso
limpar o rio. Eu apostaria no branquilho, que atrai fauna e segura o solo, e o resto
viria na sombra, diz Cursio (GAZETA DO POVO, 2008c).
FIGURA 3 - PERFIL ESQUEMTICO DOS TIPOS DE VEGETAO
Fonte: SEMA, 2005 adaptado
Em termos de macrfitas, pode-se citar a vrzea do rio Barigi, prximo
foz no rio Iguau, em rea anteriormente utilizada para extrao de areia onde a
Superintendncia de Recursos Hdricos e Saneamento Ambiental, SUDERHSA,
prev o uso de fitorremediao. A vrzea apresenta grande diversidade de
macrfitas aquticas, o que pode ser evidenciado pelo grande nmero de txons (72
distribudos em 27 famlias). A extrao de areia ocasionou a formao de 14 cavas,
de tamanhos que variam de cinco at quinze metros de dimetro, onde o
desenvolvimento de macrfitas aquticas se deu naturalmente e de forma bastante
intensa. As macrfitas foram classificadas como anfbias, emergentes, flutuantes
fixas, submersas livres e flutuantes livres (PEGORINI et al., 2007). O gnero que
apresentou maior nmero de espcies foi Ludwigia, com sete espcies, seguido por
Cyperus (seis) e Baccharis (quatro). As espcies Eichhornia crassipes (Mart.) Solms
12
e Heteranthera reniformis Ruiz & Pav., tidas como aquticas, foram encontradas
somente em solo mido, prximo s margens das cavas.
Na rea afloram trs unidades litolgicas: Complexo Gnissico-Migmattico,
Formao Guabirotuba e Sedimentos Aluvionares. Em toda a rea ocorre o
Complexo Gnissico-Migmattico e em alguns pontos est aflorante, representado
por solos residuais, argilosos, de colorao avermelhada, no restante da rea est
sotoposto aos sedimentos da Formao Guabirotuba ou aos Sedimentos
Aluvionares (Figura 4).
FIGURA 4 - MAPA GEOLGICO DA REGIO DO ALTO IGUAU
Legenda
ALUVIO Sedimentos quaternrios inconsolidados depositados ao longo das principais drenagens
Perfis Geolgicos Traados
FORMAO GUABIROTUBA Rochas sedimentares pleistocnicas, que preenchem a Bacia Sedimentar de Curitiba
Ferrovia
EMBASAMENTO CRISTALINO Rochas gnissicas-mimatiticas
Rodovias
Lineamento Estrutural
Curso dgua
Fonte: COMEC, 1996
13
Os sedimentos da Formao Guabirotuba, que preenchem a Bacia
Sedimentar de Curitiba, apresentam predominncia de argilas, siltitos argilosos e
lentes de arcsios. Os depsitos de sedimentos Aluvionares apresentam camadas
siltica-argilosas, entremeadas por lentes de areias mdias a grosseiras, quartzosas,
esbranquiadas, com espessuras variando entre 4,00 a 7,00 m. Os lineamentos
estruturais traados referem-se ao canal do rio Iguau, o qual se desenvolveu, muito
provavelmente, sobre expressiva falha geolgica, e aos canais dos rios Pequeno,
Atuba, Palmital e Barigui (COMEC, 1996).
As perfuraes realizadas ressaltaram um perfil tpico e constante ao longo
de todo o aluvio do rio Iguau at Balsa Nova. A cobertura do terreno
representada por um solo negro, argiloso, rico em matria orgnica, muito plstico,
caracterizado como solo hidromrfico (Figura 5) (COMEC, 1996).
Imediatamente abaixo, tem-se camada de argila esbranquiada com pores
slticas, pouco consistente. Lateralmente, esta camada de argila interdigita-se com
pores mais arenosas. Em meio ao horizonte sltico-argiloso surgem lentes e
mesmo bolses de areias grosseiras de espessuras mtricas que apresentam
mineralogia quartzo-feldsptica, colorao cinza-esbranquiada e baixa
compactao. Entremeando as camadas de argila-siltosa e silte-argiloso, ocorrem
lentes mtricas de areais mdias a grosseiras, mal selecionadas, formadas
predominantemente por gros de quartzo esbranquiado (COMEC, 1996).
Estas lentes possuem distribuio e espessura errtica e so o alvo
preferencial dos mineradores (COMEC, 1996), os quais, aps a extrao da areia,
deram origem s cavas do Rio Iguau com a abandono da rea, sem sua devida
recuperao. De uma forma geral e independente da sazonalidade, o lenol fretico
em toda a plancie aluvionar do rio Iguau encontra-se, quase sempre, aflorante, de
tal forma que nas cavas de areia o nvel de gua encontra-se sempre muito prximo
superfcie.
Observa-se nas cavas, que as guas nelas contidas costumam ser limpas e
despoludas, propiciando a existncia de vida aqutica, ao contrrio dos cursos
dgua vizinhos (afluentes), totalmente comprometidos. Isto propiciado pela
passagem das guas por entre os interstcios das camadas de areia, que funcionam
como filtros naturais (COMEC, 1996; FURLAN, 2007).
14
FIGURA 5 - PERFIL MARECHAL FLORIANO E AVENIDA DAS TORRES
Legenda
Solo hidromrfico Argila cinza-escura, com matria orgnica, muito plstica
Alterao de rocha cristalina Silte argiloso com areia fina, esverdeado, rgido
Depsito aluvionar Argila siltosa com areia fina, de cor marrom escura a vermelha, consistncia mdia
Alterao de rocha cristalina Areia fina, siltosa e argilosa, com colorao castanha clara, compacta
Depsito aluvionar Areia grosseira, mal selecionada, de cor castanha, pouco compacta
Posio do lenol fretico
Depsito aluvionar Argila arenosa, cinza escura, rica em matria orgnica, muito plstica
SP ST
Ensaio de penetrao dinmica Perfurao a trado manual
Fonte: COMEC, 1996.
15
3 REVISO BIBLIOGRFICA
Aspectos de relevncia para a gesto de recursos hdricos e uso do solo,
so abordados a seguir, tendo como ponto focal o potencial das Wetlands na Regio
Metropolitana de Curitiba para a manuteno do equilbrio das regies em que se
desenvolvem.
Lima (2006) adverte:
Pensamos deixa o rio, ele um artista, o maior artista porque consegue atravessar
quilmetros de rea degradada, mas est morrendo porque as micro bacias que so as
alimentadoras dos grandes sistemas pluviais no passam por polticas ambientais. Precisaria dar uma
guinada...
O progresso tcnico oferece ao homem a capacidade de modificar
profundamente a paisagem e alterar o curso dos acontecimentos naturais. Nos
ltimos anos, os problemas ambientais criados por uma desenfreada interferncia
com os diferentes elementos da paisagem para satisfazer as necessidades
socioeconmicas tm-se convertido em matria de preocupao.
A extenso e acelerao da interveno antrpica na paisagem ocasiona
uma exploso de diversas crises: ecolgica, de energia e hidrolgica, entre outras
(VILAS, 1992). Um dos exemplos a citar a explorao da areia, alterando as
vrzeas do Rio Iguau na Regio Metropolitana de Curitiba (RMC). Atualmente so
observados resultados de um padro de desenvolvimento anacronicamente
predador, em termos sociais e ambientais, e da ao de lideranas mal informadas
no geral e mal-intencionadas no particular (ALMEIDA, 2007).
3.1 BACIAS HIDROGRFICAS
Os ambientes que compem uma bacia dependem de diferentes fatores
para seu funcionamento e estabilidade relativa, como pelas taxas de afluxo e efluxo
de gua, materiais e organismos de outras reas da bacia. Assim, a bacia
hidrogrfica, entendida como um sistema aberto, influenciada e/ou influencia
outros sistemas, portanto, qualquer deciso tomada por uma comunidade em uma
determinada bacia influencia outras bacias ou sub-bacias (SOUZA, et al, 2008).
Como exemplo pode-se citar a entrada de esgotos sanitrios ou efluentes industriais
16
nos ambientes aquticos de uma bacia. Se o material orgnico de esgotos ou de
efluentes industriais no puder ser assimilado, o rpido acmulo de tais materiais
poder destruir o sistema. Por outro lado, a eroso do solo e a perda de nutrientes
de uma floresta perturbada ou de um campo cultivado inadequadamente no apenas
empobrecem estes ecossistemas, como tambm tais efluxos apresentam,
provavelmente, impactos eutrficos. A expresso "eutrofizao cultural" vem sendo
utilizada largamente para denotar a poluio orgnica que resulta de atividades
humanas. Por isso, a bacia hidrogrfica inteira e no somente a massa de gua ou
trecho de vegetao, deve ser considerada a unidade mnima de ecossistema,
quando se trata de interesses humanos. Assim, os campos, as florestas, as massas
de gua e as cidades, interligadas por um sistema de riachos ou rios (ou canais ou
por urna rede de drenagem subterrnea), interagem como uma unidade prtica tanto
para o planejamento como para o gerenciamento. O conceito de bacia hidrogrfica
ajuda a colocar em perspectiva muitos dos problemas e conflitos, podendo ser citado
que as causas e as solues da poluio da gua no sero encontradas olhando-
se apenas para o canal fluvial, sendo necessrio considerar a bacia de drenagem
inteira como unidade de gerenciamento (ODUM, 1988).
A rpida urbanizao e crescimento das cidades durante o ltimo meio-
sculo mudou as bacias hidrogrficas mais do que, provavelmente, qualquer outro
resultado da atividade humana em toda a histria. A cidade, como sistema, um
campo de interaes de todo tipo entre os diferentes elementos que compe o
espao urbano, resultando em significativas mudanas na paisagem, em curto
espao de tempo e na necessidade de planejamento e gesto (PIA, 1992), com a
finalidade de minimizar os impactos negativos. Uma cidade que considere em seu
desenho os recursos dos elementos antrpicos, biticos e abiticos e que
configuram a paisagem como relevo e gua apresentar caractersticas prprias que
lhe propiciar personalidade urbanstica. Em termos de recursos, as cidades ou a
reas metropolitanas so ecossistemas incompletos ou heterotrficos que
dependem de grandes reas externas a elas, uma vez que apresentam: (1) uma
grande necessidade de entrada de energia ou recursos, como gua; e (2) sua sada
mais degradada, com gerao de resduos (ODUM, 1988). O uso da gua
principalmente como um meio de transporte e como um recipiente de substncias
17
indesejveis inibe o mltiplo uso do recurso e no representa uma estratgia de
gesto sustentvel (ARHEIMER, B.; TORSTENSSON, G.; WITTGREN, H. B, 2004).
A disponibilidade de gua, tanto em quantidade como em qualidade, um
dos principais fatores limitantes ao desenvolvimento das cidades (CURITIBA, 2008).
O crescimento da demanda por gua, o elemento mais dinmico da paisagem
(SANTOS, 2001), para os mais variados usos faz crescer e tomar corpo o princpio
dos usos mltiplos, gerando uma srie de conflitos de interesses (MMA, 2006a). As
regies metropolitanas impem um dos maiores desafios regionais, que o
gerenciamento e a gesto de reas altamente urbanizadas e povoadas, com
evidentes interferncias na qualidade das guas, degradadas pelas atividades
antrpicas, bem como situaes potenciais de escassez (grandes demandas em
relao s disponibilidades de gua existentes (MMA, 2006b).
Com o crescente processo de urbanizao, diversas alteraes no meio
ambiente podem ser percebidas relacionadas, ao aumento das reas impermeveis,
que reduz a infiltrao, resultando no aumento do volume de escoamento superficial
(CHOW, V. T.; MAIDMENT, D. R.; MAYS, L. W., 1988), e das redes de condutos e
canais de escoamento. Este fato implica em aumento das vazes mdias de cheias;
aumento da produo de sedimentos; reduo da alimentao dos aqferos, com
rebaixamento do nvel do lenol fretico e, ainda, deteriorao da qualidade da gua
superficial e subterrnea, devido lavagem das ruas, ao transporte de material
slido, s ligaes clandestinas de esgotos, e contaminao direta dos aqferos
(SUDERHSA, 2007). A concepo clssica dos sistemas de drenagem urbana
recomenda evacuar rapidamente as guas pluviais do meio urbano, atravs de
condutos subterrneos artificiais, levando ao aumento da velocidade de escoamento
e, como conseqncia, da magnitude dos picos de cheia (SUDERHSA, 2002). A
combinao destes efeitos da urbanizao aumento dos volumes escoados e
acelerao do escoamento tem levado os sistemas clssicos de drenagem urbana
a operarem impactos sociais, econmicos e ambientais. Se a fonte de
abastecimento do fluxo dos rios depender principalmente do escoamento superficial,
o rio apresentar fluxo muito varivel, com grandes cheias ou pequenos volumes
mnimos (SUGUIO; BIGARELLA, 1979).
18
Quando chove, a gua carreia poluentes atmosfricos, escorre por telhados,
ruas e caladas limpando a cidade, originando o que Kobiyama, Mota, e Corseuil
(2008) chamam de esgoto pluvial, que possui alta carga poluente, sendo que muitas
vezes, impossvel conter seu fluxo para trat-lo. Conseqentemente, esse fluxo
acaba poluindo os corpos dgua.
Na medida em que a adoo do modelo clssico de drenagem no
apresenta caractersticas de sustentabilidade, uma vez que tambm so limitados os
usos presentes e futuros da gua em meio urbano de forma quase sempre
irreversvel, Baptista e Nascimento, (1996), Kobiyama, Mota e Corseuil, (2008)
sugerem uma inverso desta lgica, cunhando o termo armazenamento urbano. A
nova filosofia baseia-se no controle na fonte do escoamento pluvial atravs do uso
de dispositivos que amorteam o escoamento das reas impermeabilizadas e/ou
recuperem a capacidade de infiltrao: a) acumular, o mximo possvel, os
excedentes hdricos a montante, possibilitando assim a retardamento do pico de
enchentes para as chuvas de curta durao e maior intensidade; b) recuperar,
gradativamente a situao existente anterior a urbanizao, ou seja, o coeficiente de
escoamento superficial (runoff) natural (SUDERHSA, 2002).
Segundo Baptista e Nascimento (1996), as novas tecnologias buscam
neutralizar os efeitos da urbanizao sobre os processos hidrolgicos, permitem a
reduo dos impactos da poluio de origem pluvial e a continuidade do
desenvolvimento urbano, sem gerar custos excessivos, e propor o tratamento
conjunto das questes de drenagem pluvial em meio urbano com outras questes
urbansticas, permitindo usos diversos pela populao, como reas de
estacionamento, reas para a prtica de esportes, reas de parques ou de lazer
inundveis. Entretanto, mesmo parecendo indispensveis ou ricas em
potencialidades, estas solues so freqentemente pouco ou mal utilizadas
(BARRAUD; LE GAUFFRE; MIRAMOND, 2000 ).
A fragmentao de reas naturais e destruio das conexes hidrolgicas
tem resultado em bacias degradadas funcionalmente, nas quais os problemas de
qualidade das guas ocorrem regularmente (VERHOEVEN et al., 2008).
Uma vez que muito difcil e muito cara a recuperao ambiental de um rio
poludo, a estratgia de manejo da zona ripria , sem dvida, a mais racional para
19
manter os recursos hdricos e a qualidade ambiental dos rios (NAIMAN; DCAMPS,
1997). Por outro lado, como colocado por Gunderson (2000) e Lima (2003), a
gradativa perda de resilincia dos ecossistemas riprios, tornando-os, assim, mais
vulnerveis a perturbaes que de outro modo seriam normalmente absorvidos (e
toda a degradao hidrolgica decorrente dela) , sem dvida, um dos impactos
ambientais mais evidentes. No precisa ir longe, no precisa nem sair da cidade,
s passar por qualquer riacho para ver, pois toda atividade humana produz algum
grau de alterao no ambiente. O problema por resolver , se as paisagens
influenciadas pelas obras de engenharia produziram ou produziro mudanas que
comprometam a rea ocupada pelas mesmas, sua complexidade estrutural e os
principais processos que condicionam a estabilidade dos mesmos (NEIFF,1999).
3.2 WETLANDS
A palavra inglesa wetland, termo de uso internacional, pode ser traduzida
como rea mida ou zona mida que abrange o conjunto de diversos tipos de
ecossistemas midos existentes que ocupam cerca de 6% da superfcie terrestre.
So ecossistemas valiosos e compreendem tanto ecossistemas terrestres,
fortemente influenciados pela gua, quanto sistemas aquticos com caractersticas
especiais decorrentes de sua pouca profundidade e proximidade ao solo (SCHUYT ;
BRANDER, 2004).
As wetlands, de maneira geral so formadas por reas planas, cuja
localizao ou condies de precipitao e drenagem fazem delas zonas alagadias,
sujeitas a variaes sazonais de reas inundadas, com pequenas profundidades.
Esta caracterizao bastante abrangente, e incluem-se dentro dela reas como
plancies de inundao de rios, reas inundadas prximas s lagoas, manguezais e
reas submetidas a inundaes devido s mars, pntanos e banhados, tanto
aquelas reas que recebem o aporte de cursos dgua como aquelas que tm como
nica entrada do sistema a precipitao (TASSI, 2007).
IBAMA, SEMA e IAP (2007) definem wetland como o segmento de paisagem
constitudo por solo hidromrfico, que em condies naturais encontra-se saturado
de gua, permanentemente ou em determinado perodo do ano, independente de
20
sua drenagem atual. Em virtude do processo de sua formao, apresenta
comumente, dentro de 50 (cinqenta) centmetros, a partir da superfcie, cores
acinzentadas, azuladas ou esverdeadas e/ou cores pretas resultantes do acmulo
de matria orgnica.
Com fins operativos, neste trabalho adotou-se a definio de wetland
proposta por Neiff (1999, p.102) como sendo:
Sistema de cobertura onde a presena temporal de uma lmina de gua varivel (espacial e temporal) condiciona fluxos biogeoqumicos prprios, solos com acentuado hidromorfismo e uma biota peculiar por processos de seleo, que tem padres prprios em sua estrutura e dinmica. Podem ser considerados como macrossistemas cuja complexidade cresce com a variabilidade hidrosedimentolgica e a extenso geogrfica ocupada.
Assim as vrzeas do rio Iguau enquadram-se na definio de wetland -
reas midas - acima mencionada.
3.2.1 Importncia das Wetlands
Quando gestores ou tomadores de deciso no entendem as funes e
valores do ecossistema, podem ser tomadas escolhas errneas durante prticas de
gerenciamento, impossibilitando assim seu pleno funcionamento, podendo trazer
mudanas irreversveis ao ecossistema. O conhecimento das funes e valores de
um ecossistema de wetland pode melhorar as decises que so tomadas hoje, e
assim proteger estes ecossistemas para geraes futuras (USEPA, 1994),
principalmente pelo fato destas reas, alm de uma grande diversidade biolgica,
exercerem funes ecolgicas essenciais (ADAMUS, 1983). Adamus (1983)
identificou diferentes funes para as wetlands, sendo as principais, relacionadas
capacidade de armazenar e descarregar gua, como no controle de inundaes,
reduzindo a velocidade das enchentes e as catstrofes geradas com a subida das
guas, como tambm desempenham importante papel na manuteno das
condies climticas globais. Outra funo importante das wetlands o ciclo
biogeoqumico de nutrientes, sua interao com os ambientes aquticos lticos
(fluxo horizontal) e lnticos (fluxo vertical) que pode ser influenciada por fatores
fsicos, como solar, ventos, mares (ODUM, 1988; NEIFF, 1999), tendo assim
21
possveis variaes temporais e espaciais, influenciando a cobertura do solo e a
biota do meio (como tipo de vegetao) (USEPA, 2008).
Schuyt e Brander (2004) resgatam uma lista das funes de wetlands:
funes de regulao (nutrientes, reciclagem, recarga de gua, controle de
inundao, controle de eroso, manuteno da estabilidade da biodiversidade e do
ecossistema); funes de suporte (irrigao, pecuria, transporte, energia, turismo);
funes de produo (gua, alimento, madeira, recursos medicinais) e funes de
informao (pesquisa e educao).
Wetlands, sob condies favorveis, tem-se mostrado eficiente em
remover/degradar/reter nutrientes, compostos orgnicos e inorgnicos naturais ou
sintticos, materiais txicos que fluem por estes ambientes aquticos (MITSCH;
GOSSELINK, 2000). As wetlands tambm podem atuar como local para
sedimentao de material particulado, atividade aerbica ou anaerbica, reteno de
substncias pelas plantas (manejo) e em maiores reas midas ocorre tambm
maiores trocas entre a interfase gua/sedimento.
As wetlands podem ser fatores importantes nos ciclos globais de nitrognio,
enxofre, metano e dixido de carbono (SAHAGIAN; MELACK, 1998; MITSCH;
GOSSELINK, 2000; MMA, 2006a).
Outro valor da wetland relacionado hidrologia a recarga de aqferos.
Esta funo tem recebido muito pouca ateno, e a magnitude do fenmeno no
tem sido bem documentada. Alguns hidrologistas acreditam que, apesar de algumas
wetlands recarregarem os sistemas subterrneos, outras no o fazem (CARTER et
al., 1979; NOVITZKI, 1979; CARTER, 1986; CARTER; NOVITZKI, 1988 apud
MITSCH; GOSSELINK, 2000).
O IBAMA (2010), usando o termo banhado, foca numa srie de razes para
conservar as wetlands: esto entre os ecossistemas mais produtivos do planeta em
termos de produo primria (de espcies vegetais) e secundria (de animais); a
fauna abundante e diversificada, incluindo espcies ameaadas de extino;
representam abrigos e reas de alimentao, reproduo e crescimento de muitas
espcies de ambientes vizinhos (rios, lagoas, matas...) e de outras regies do
planeta, como no caso das aves migratrias; filtram as impurezas carregadas pela
22
gua dos rios; regulam o volume de gua dos ambientes aquticos na ocasio de
grandes chuvas e so grandes reservatrios de carbono.
A preservao das wetlands condio indispensvel para a concretizao
do desenvolvimento sustentvel, sendo o reconhecimento de sua importncia, por
parte de rgos governamentais e instituies privadas, bem como da sociedade em
geral, o primeiro passo para a sua conservao (IBAMA, 2010).
Mesmo considerando sua importncia, existem grandes dificuldades na
determinao do valor de uma wetland. Sua estimativa, em geral, tem uma avaliao
muito subjetiva, particularmente a estimativa de uso indireto, uso futuro, ou valores
de existncia. Hruby (1999), por exemplo, cita a grande dificuldade de valorar uma
funo (uso indireto), porque os processos em wetlands so dinmicos e requerem
intensos trabalhos de amostragem temporal e espacial. A dificuldade est em
conciliar a qualidade da informao, que leva tempo a ser obtida com certo grau de
confiana, e a necessidade urgente que os tomadores de deciso tm em obter
estes valores.
Economistas e ecologistas, de modo geral concordam que a teoria
econmica, ligada a teoria energtica, corretamente compreendida, fornece o
potencial para se incluir a obra da natureza como um valor econmico (ODUM,
1988). A estimativa do valor econmico da rea total de wetlands, de 12,8 milhes
de km2, da ordem de $70 bilhes por ano (SCHUYT; BRANDER, 2004). Ainda que
muitas funes das wetlands no fossem avaliadas e que somente 63 milhes de
hectares integrassem a avaliao, uma amostra de 89 estudos de caso, mostra o
valor econmico mdio anual da funo da wetland por hectare de rea, conforme
Tabela 1.
Os valores ilustram quanto as wetlands so valiosas economicamente e
representam estimativas iniciais dos custos para a sociedade caso estas wetlands
sejam perdidas. Por ltimo, deve ser considerado que o valor econmico somente
um componente do seu valor total, que inclui biodiversidade e valores scio-culturais
e cientficos, funes que no podem ser expressas em valores monetrios
(SCHUYT; BRANDER, 2004).
23
TABELA 1 - VALORES ECONMICOS MDIOS POR FUNO DE WETLAND
Funes de wetlands Valor econmico mdio (US$/ha ano, ano referncia: 2000)
Controle de cheias 464 Pesca amadora 374 Recreao 492 Filtragem de gua 288 Biodiversidade 214 Berrio 201 Caa amadora 123
Fonte: SCHUYT; BRANDER, 2004
Apesar do crescente reconhecimento do seu valor e importncia, as
wetlands, so continuamente modificadas com grandes custos, as quais esto
desaparecendo, em nvel mundial, enquanto outras esto sendo restauradas
tambm com grandes custos.
3.2.2 Impactos e Medidas Recomendadas
Sarakinos et al. (2001) mostram que o atual sistema de gerenciamento das
wetlands no Quebec/Canad, no consegue proteger as espcies deste
ecossistema, sendo necessrio a adio de novas reas de proteo no entorno. No
entanto, esse processo no economicamente nem socialmente vivel, visto que a
maioria das wetlands est localizada em reas de grande concentrao urbana. J
Long e Nestler (1996) fizeram uma anlise do histrico hidrolgico no rio Cach
(Patterson, Arkansas/EUA) e perceberam que mudanas de longo prazo no
hidroperodo indicaram um permanente declnio na magnitude dos nveis de gua
durante perodos de seca, que estavam associadas com o aumento de
bombeamento de gua e com mudanas do uso do solo nesta bacia. Assim, deve-se
ressaltar que o fato de uma wetland possuir um sistema hidrolgico contnuo, usos
que modifiquem esse componente impactaro as partes contguas.
Alm disso, modificaes do sistema hidrolgico podem ser pensadas como
uma autoperpetuao do processo, porque a soluo para um problema geralmente
cria outro problema para reas adjacentes. Winter (1988) cita, por exemplo, que uma
modificao na paisagem geralmente tem efeitos locais, mas mltiplas modificaes
podem ter impactos extensivos. Portanto, a adoo de prticas conservacionistas
24
para uma wetland deve contemplar a bacia hidrogrfica como um todo, buscando
avaliar os impactos em diferentes escalas.
No Brasil no diferente a mentalidade sobre as wetlands. Existe uma
variao geogrfica das principais causas desse desaparecimento, sendo que as
principais atividades impactantes variam bastante de acordo com a regio em que
ocorrem. Na regio Norte, o maior problema provocado pela falta de manejo
adequado da pecuria bubalina, que degrada as reas, formando canais nas reas
alagadas e mudando a hidrologia do sistema. Na regio Sul e Sudeste a expanso
agrcola o principal problema desses ambientes, que so drenados para cultivo de
arroz irrigado (IBAMA, 2010).
Resumidamente podem ser citados alguns principais problemas observados
nas diferentes regies brasileiras.
a) A retirada de gua altera o padro natural de vazo, afetando o aporte de
nutrientes, alterando a composio da flora e da fauna existente no ambiente. J a
reteno exagerada de gua pode contribuir para a alterao da qualidade do solo e
a sua drenagem pode promover a acidificao do solo local. Estas alteraes podem
ser provocadas pela degradao dos cursos de gua que abastecem as wetlands;
retirada de gua para uso agrcola, domstico e industrial; construo de diques,
barragens e represas; e drenagem para implantao de atividades agrcolas.
b) A atividade agrcola tambm afeta as wetlands. Alm da alterao do
solo, o uso de grandes quantidades de herbicidas e fertilizantes contribui para
distrbios na cadeia alimentar e para o desequilbrio dos ecossistemas. A criao de
gado, atravs do pisoteio do solo, provoca sua compactao, alterando as condies
abiticas e biticas do meio e, tambm, sua permeabilidade.
c) A ocupao urbana em reas de wetlands realizada por meio de
loteamentos, construo de moradias e implantao de indstrias, cujo processo se
d com remoo da vegetao nativa, aterramento das reas, disposio
inadequada de resduos slidos (lixo), lanamento de efluentes (esgotos) domsticos
e industriais. A alterao das wetlands pela urbanizao agrava as enchentes nas
cidades.
d) A pavimentao de ruas ou outras construes reduzem a infiltrao das
chuvas no solo, afetando o abastecimento do lenol fretico e aumentando o
25
escoamento da gua pela superfcie. Isto ocasiona enchentes, aumento da eroso
do solo e arrastamento de poluentes urbanos para o interior dos corpos hdricos.
e) A alterao da biota atravs da caa, da pesca, do desmatamento e a
introduo de espcies exticas so outros problemas de degradao das wetlands.
Nas ltimas dcadas, os seres humanos causaram alteraes sem
precedentes nos sistemas para atender a crescentes demandas de alimentos, gua,
fibras e energia, ajudando a melhorar a vida de bilhes de pessoas, mas, ao mesmo
tempo, enfraquecendo a capacidade da natureza de prover outros servios
fundamentais, como a purificao da gua e a proteo contra catstrofes naturais,
uma vez que, por exemplo, rios e wetlands, sofreram alto impacto por mudanas no
habitat e poluio por nitrognio e fsforo (ALMEIDA, 2007) conforme Quadro 1.
QUADRO 1 - IMPACTOS QUE OCORREM EM CONSEQNCIA DAS VRIAS ATIVIDADES HUMANAS
Atividade humana Impacto nos sistemas Valores/Servios em risco
Construo de represas Altera o fluxo dos rios e o transporte de nutrientes e sedimentos
Altera habitats
Construo de diques e canais Destri a conexo do rio com as reas inundveis
Afeta a fertilidade natural das wetlands e os controles das enchentes
Alterao do canal natural dos rios
Modifica os fluxos dos rios Afeta os habitats
Drenagem de reas alagadas Elimina um componente-chave Perda de funes naturais de filtragem e de reciclagem de nutrientes e de habitats
Desmatamento/uso do solo Altera os padres de drenagem Altera quantidade e qualidade das guas e o controle de enchentes
Poluio no controlada Diminui a qualidade da gua Altera a disponibilidade hdrica
Fonte: Modificado de TUNDISI; TUNDISI, 2008
3.2.3 Classificao das Wetlands
O primeiro passo para estudar uma wetland definir a que nvel hierrquico
ela pertence. A Conveno de Ramsar divide as wetlands em trs categorias
principais de ambientes: costeiras, interiores e construdas. As costeiras
compreendem ambientes de esturios, lagoas, recifes de corais e manguezais. As
interiores se referem a reas de lagoas, rios, cachoeiras, pntanos, turfeiras e
campos de inundao. Por ltimo, as construdas incluem canais, tanques de
26
piscicultura, reas de armazenamento de gua e mesmo reas de estao de
tratamento (SCHUYT; BRANDER, 2004).
Na literatura so encontradas diversas formas de classificar as wetlands em
nveis (COWARDIN et al., 1979; Environmental Laboratory, 1987; GIOVANNINI,
2003; TASSI, 2007). Cowardin et al. (1979) classificam em nveis marinho, estuarino,
fluvial, lacustre e palustre e sub-nveis que consideram o fluxo de gua, tipos de
substrato, vegetao e espcies dominantes, regimes de inundao e nveis de
salinidade para cada sistema. Outra forma de classificar hidrogeomrfica de
Brinson (1993) que considera trs componentes: a geomorfologia que incluem as
wetlands de depresso, fluviais, de orlas e turfeiras extensivas; a origem da gua
que pode ser atravs da precipitao, escoamento superficial e recarga subterrnea;
hidrodinmica que est relacionado com o movimento da gua.
Neiff (1999) prope uma classificao de natureza fisiogrfica e dinmica,
que contempla como parmetros principais o marco geomorfolgico e a relao de
alagamento com os sistemas vinculados wetland. As principais wetlands so:
aluvial, marginal, fluvial e lacustre. No sul do Brasil, outro termo bastante usado o
banhado, empregado para caracterizar extenses de terras baixas inundadas pelos
rios (GUERRA, 1997). Os banhados e as plancies de inundao so reconhecidos
como mosaicos de ecossistemas altamente dinmicos, de bordas lbeis, onde a
estabilidade e a diversidade esto condicionadas primeiramente pela hidrologia e
pelos fluxos de matrias (NEIFF, 1999).
A palavra banhado provm do termo espanhol bafado, sendo utilizada
principalmente no Rio Grande do Sul. Na maior parte do pas, esses ambientes so
conhecidos como "brejos", embora sejam chamados tambm de "pntanos",
"pantanal", "charcos", "varjes" e "alagados", entre outros. Na classificao de
vegetao do projeto RADAMBRASIL (IBGE, 1996) os banhados aparecem como
reas Pioneiras de Influncia Fluvial.
As plancies de inundao se constituem em superfcies de agradao
horizontalizadas, que se estendem ao longo dos rios, incluindo as reas de wetlands
propriamente ditas, com ocorrncia de solos hidromrficos gleyzados e solos
orgnicos. As suas restries ao uso do solo dizem respeito a inundabilidade dos
terrenos e estabilidade dos cursos dgua que as controlam (PARAN, 1989;
27
YAMAMOTO, 2005). As plancies constituem sistemas complexos que contm vrios
subsistemas, e por este motivo, so considerados macrossistemas que
compreendem sistemas aquticos permanentes, temporrios e setores de terra
firme, dominando areal e funcionalmente os ambientes aquticos temporrios. Estes
macrossistemas constituem uma unidade ecolgica de funcionamento, em razo dos
fluxos de matria e energia, suas transformaes internas que surgem ao comparar
entradas e sadas de elementos inorgnicos e orgnicos que normalmente esto
relacionados com os pulsos (NEIFF, 1999).
Essa classificao enfatiza a imensa diversidade das wetlands, no entanto
percebe-se que, de forma geral, as wetlands tm ligaes estruturais e funcionais
com sistemas terrestres e aquticos. Por outro lado, a estrutura, processos internos
e funes das wetlands so suficientemente diferentes dos sistemas terrestres ou
aquticos, portanto requerem uma base de conhecimento especfico para as
mesmas (LEMLY, 1999 ).
Assim as vrzeas do rio Iguau enquadram-se na classificao de wetland,
acima mencionada, como interior, fluvial e aluvial.
3.2.4 Vrzeas
Convm, tambm, que se caracterize o processo sedimentar fluvial original
atuante nas plancies quaternrias anteriormente urbanizao, entendendo
conforme Jean Dresch (apud PELOGGIA, 1998) que o estudo da transformao das
paisagens pelo homem s autorizado pelo estudo da paisagem natural, e somente
a partir da se pode passar ao exame de uma explicao total.
Entre os processos responsveis pela formao das vrzeas, Suguio e
Bigarella (1979) citam: a) deposio lateral no canal nas partes convexas (barras de
meandro); b) deposio nas enchentes sobre os diques naturais; c) coluviao. A
proporo entre eles depende das caractersticas das enchentes, alm da
disponibilidade e do dimetro dos detritos. Leopold, Wolman e Miller (1964 apud
SUGUIO; BIGARELLA, 1979) assinalam que parte das vrzeas est sujeita
deposio de colvio procedente das vertentes do vale, resultante do escoamento
superficial e movimentos de massa locais.
28
Os valley flats, conforme Figura 6, representam o ltimo preenchimento dos
vales com sedimentos. Neles, vrios nveis de terraos formados nas inundaes
(overbank flow), documentam flutuaes climticas, traduzidas por mudanas das
condies hidrolgicas e no regime do curso dgua (BIGARELLA; MOUSINHO,
1965).
FIGURA 6 - CORTE ESQUEMTICO DO VALLEY-FLAT
NOTA: 1 Substrato rochoso; 2 depsitos de cascalho do assoalho da vrzea; 3 depsitos dos canais anastomosados, do canal meandrante e dos diques marginais; 4 colvio; 5 depsitos arenosos dos diques marginais; 6 depsitos de plancie de inundao; 7 depsitos de rompimentos dos diques marginais. Fonte: BIGARELLA; MOUSINHO, 1965
Apesar da antiga vrzea representar em toda a sua extenso uma unidade
estrutural definida, ela pode em parte ser recoberta por uma outra unidade, o manto
coluvial. As vrzeas de inundao atuais dos rios tambm podem apresentar uma
rampa de colvio, cuja continuidade em relao ao fundo horizontal resultante do
preenchimento aluvial de tal forma marcante, que muitas vezes se torna difcil
fazer a sua separao no campo, sem que seja em sub-superfcie. Trata-se,
portanto, de formas de separao pouco ntidas e tende-se a considerar ambas as
feies como um nico conjunto, ou seja, a vrzea dentro de um sentido mais amplo.
Para Thornbury (1958 apud BIGARELLA; MOUSINHO, 1965), os depsitos
da vrzea so geralmente mais grosseiros na base e os mais finos depositados
durante as enchentes no leito maior do rio. Bigarella e Mousinho (1965) verificam
uma espessura aprecivel dos depsitos de vrzea. Em Curitiba, atingem de 8,00 a
29
15,00 m, desconhecendo-se ainda a sua maior espessura. Os depsitos so
caracterizados por duas seqncias sedimentares distintas: A mais antiga,
constituda por depsitos de cascalho de natureza varivel (quartzo, gnaisses e
outras metamrficas), ou de areia grosseira; A mais recente assenta sobre a
anterior, sendo constituda por sedimento formado de rochas pr-existentes
(clsticos) mais finos (sltico-argilosos). O resultado da ao meandrante dos rios no
preenchimento das vrzeas origina camadas de areia dispostas irregularmente no
espao. A seqncia mais recente assenta inconformemente sobre a anterior, sendo
o conjunto recoberto por um manto coluvial.
Para Leopold, Wolman e Miller (1964 apud SUGUIO; BIGARELLA, 1979) a
vrzea constitui um espao deposicional do vale dos rios. Os sedimentos
deslocando-se ao longo do vale so temporariamente retidos na vrzea. Em
condies de equilbrio, a entrada e sada de sedimentos so equivalentes. Um
rompimento das condies de equilbrio por mudanas no regime hidrolgico
(incluindo mudanas no suprimento de gua e sedimentos) resulta na alterao da
vrzea.
O transbordamento dos rios constitui um importante processo sedimentar,
especialmente importante em sistemas fluviais, onde as guas tm sua velocidade
bruscamente diminuda, provocando a deposio da frao mais grosseira de sua
carga suspensa imediatamente s margens do canal constituindo os depsitos de
diques naturais. A frao mais fina da carga em suspenso espalhada pela
plancie de inundao, originando os depsitos de plancie de inundao ou de
vrzea (SUGUIO; BIGARELLA, 1979).
A presena de solos hdricos ou hidromrficos fator de identificao das
wetlands e pode ser definido como Giovannini (2003): solos formados sob condies
de saturao, alagamento ou inundao por tempo suficientemente longo durante a
estao de crescimento, para gerar condies de anaerobiose em sua parte
superficial.
Segundo Tassi (2007), o conhecimento do tipo de substrato da wetland
permite construir um retrato de como a mesma pode ser gerenciada. E cita que, se o
solo arenoso, durante o perodo seco haver pouca reteno de gua e, assim,
poucas condies de desenvolvimento de vegetao. E, tambm, quando h uma
30
maior concentrao de argila, o substrato ser mais consolidado durante uma seca
e, conseqentemente, no haver re-suspenso do solo quando perturbado por uma
inundao.
Os solos aluviais de textura fina ou de nvel hidrosttico muito raso possuem
baixa permeabilidade vertical, apresentando camadas superficiais sempre midas,
ricas em matria orgnica e subsolos pouco desenvolvidos. As reas onde
naturalmente se encontra a turfa (solo que contm uma proporo elevada de
matria orgnica, principalmente plantas na superfcie) podem ser definidas como
peatlands ou turfeiras, wetlands importantes, para a manuteno de suprimento
seguro de gua limpa para os rios e como reservatrio de carbono (IPCC, 2010). A
Figura 7 ilustra uma rea com turfa que recebe gua e nutrientes do solo, subsolo e
precipitao.
FIGURA 7 - PAISAGEM ONDE PREDOMINA REA COM TURFA
Fonte: Atkins Brook, Kejimkujik National Park, Nova Scotia, Environment Canada 1999. http://www.ipcc.ie/wpcanada.html
Unidades Fisiogrficas das Vrzeas
A paisagem de plancie aluvial apresenta-se complexa e com grande
desenvolvimento de linhas de escoamento, bem como, numerosos canais
abandonados, lagunas, banhados ou bacias de inundao, pntanos, diques
marginais, barras de meandro, muitas ladeadas por um ou mais terraos fluviais.
31
Diques marginais
Como elementos morfolgicos so notrios os diques marginais, que
aparecem como elevaes paralelas aos cursos dgua (atuais ou abandonados)
(SUGUIO; BIGARELLA 1979). Os diques marginais encontram-se prximos ao leito
dos rios e apresentam-se topograficamente mais elevados que as demais unidades
fisiogrficas da paisagem aluvial. Os solos ocorrentes sobre os diques apresentam
uma maior contribuio da frao areia grossa comparados com os materiais
constituintes dos solos ocorrentes na bacia de inundao (SOUZA, 1990). Por
estarem localizados em posio topogrfica mais elevada, apresentam menor
influncia do lenol fretico e, portanto, melhor condio de drenagem favorecendo
o estabelecimento de vegetao arbrea (SUGUIO; BIGARELLA, 1979; SOUZA,
1990).
Bacias de inundao
As bacias de inundao so alongadas e apresentam comprimento duas a
oito vezes a largura (BIGARELLA; SUGUIO, 1979). Geralmente, dispem-se
paralelamente aos cursos dgua, e tendem a aumentar para jusante. Constituem
depresses na plancie de inundao e, freqentemente, possuem um conjunto de
pequenos canais, em parte herana de sistemas mais velhos. Estes canais facilitam
a entrada da gua nas bacias durante as enchentes, bem como auxiliam a
drenagem das mesmas durante as vazantes.
A bacia de inundao apresenta-se subdividida em dois compartimentos:
bacia de inundao alta e bacia de inundao baixa. A bacia de inundao baixa,
normalmente, encontra-se prximo ao centro da plancie de inundao, fato este
observado por Souza (1990). O material sedimentado na bacia de inundao fino,
normalmente argiloso e que se deposita lentamente por ocasio dos
transbordamentos. Por estarem localizadas em posies mais baixas da paisagem,
apresentam lenol fretico superficial ou at mesmo acima da superfcie do solo.
Como a condio de drenagem deficiente, ocorre o favorecimento do
desenvolvimento de uma vegetao adaptada ao excesso de gua: como exemplo,
o campo subtropical hidrfilo de vrzea (SOUZA, 1990; CURSIO, 2006). A bacia de
32
inundao alta encontra-se cerca de 1,0 a 1,50 m elevada, em relao a de
inundao baixa. Apresenta sedimentos argilosos e uma vegetao caracterstica de
campo subtropical higrfilo de vrzea, podendo ocorrer espcies arbustivas
(SOUZA, 1990; CURSIO, 2006).
Canais abandonados
Os canais abandonados ocorrem associados a rios meandrantes, pela
tendncia que tm para cortar atalhos. Um lago formado por atalho em colo
rapidamente bloqueado pela corrente devido a grande mudana de ngulo na
direo do fluxo. O canal principal do lago preenchido pelos materiais finos
decantados das fases de enchentes. Muitos dos canais abandonados tornam-se
verdadeiros lagos com flora e fauna abundante, com baixa taxa de sedimentao.
Inicialmente, a sedimentao nos canais abandonados rpida junto s reas dos
atalhos, diminuindo, posteriormente, com o bloqueio progressivo do canal isolado
(SUGUIO; BIGARELLA, 1979).
Barra de meandro
Enquanto o transbordamento acarreta uma acumulao por acreo vertical,
a migrao lateral dos canais e o desenvolvimento de meandros so processos de
sedimentao por acreo lateral. Os meandros e as barras de meandros
constituem os aspectos mais notveis da paisagem aluvial. As barras ocorrem
principalmente prximas margem convexa do canal fluvial sendo formadas por
cordes de barras. Entre os cordes de barra encontram-se reas mais baixas com
banhados, poas ou braos rasos da corrente (THORNBURY, 1966; SUGUIO;
BIGARELLA, 1979; CHRISTOFOLLETTI, 1981; SOUZA, 1990). Por estarem
localizadas prximas ao canal fluvial, normalmente, apresentam-se constitudos de
sedimentos grosseiros, conferindo unidade, boas condies de drenagem
(LEOPOLD; WOLMAN; MILLER., 1964; SOUZA, 1990; CURSIO et al, 2007), com a
parte mais alta apresentando vegetao arbrea e a parte mais baixa uma
vegetao de campo (SOUZA, 1990; CURSIO et al, 2007).
33
Terrao fluvial
Os terraos, de uma maneira geral, so superfcies planas ou quase planas
que se destacam na paisagem fluvial em posies mais elevadas que os demais
compartimentos da vrzea (CHRITOFOLLETTI, 1981