ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE ARTES Mestrado em Multimeios ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA<;AO DA REVOLU<;AO INDUSTRIAL A REVOLU<;AO DIGITAL FABIO DUARTE DE ARAUJO SILVA Disserta'(ao apresentada ao Curso de Mestrado em Multimeios do lnstituto de Aries da UNICAMP c,omo requisito parcial para a obtenyiio do grau de Mestre em Multimeios, sob a orien!ayiio do Prof. Dr. Gilberte dos Santos Prado, do DMM- lA CAMPINAS, 1997

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ARTES

Mestrado em Multimeios

ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA<;AO

DA REVOLU<;AO INDUSTRIAL A REVOLU<;AO DIGITAL

FABIO DUARTE DE ARAUJO SILVA

Disserta'(ao apresentada ao Curso de Mestrado

em Multimeios do lnstituto de Aries da UNICAMP

c,omo requisito parcial para a obtenyiio do grau de

Mestre em Multimeios, sob a orien!ayiio do

Prof. Dr. Gilberte dos Santos Prado, do DMM- lA

CAMPINAS, 1997

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L~Jc!::' .. l2.J Q t ,=t FICHA CATALOGRAFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL DA UN I CAMP

Silva, Fabio Duarte de Araujo Si38a Arquitetura e as tecnologias de informat;:ao : da

Revolut;:ao Industrial a Revolut;:ao Digital I Fabio Duarte de Araujo Silva. -- Campinas, SP : [s.n.], 1996

Orientador: Gilberta dos Santos Prado. Dissertat;:ao (mestrado)- Universidade Estadual de

Campinas. lnstituto de Aries.

1. Arquitetura. 2. Tecnologia da informat;:ao. I. Prado, Gilberta dos Santos. II. Universidade Estadual

de Campinas. lnstituto de Aries. Ill. Titulo.

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Bam:a Examinadora

Prof. Dr. Gilberto dos Santos Prado, orientador

Prof. Dr. Julio Plaza Gonzalez

Prof. Dr. Martin Grossmann

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Agradecimentos

a Maria Silvia Lordello e Paulo Silveira, meus pais; Valeria e Fernando Duarte,

meus irmaos; e Dafne Campos, pela companhia e incentive constantes

ao Prof. Dr. Gilberta dos Santos Prado, pela orientac;:ao livre e segura,

estimulando-me a trilhar meus pr6prios caminhos

a Prof" Roti Nielba Turin, fundac;:8o de meu desenvolvimento intelectual

a FAPESP- Fundac;:ao de Amparo a Pesquisa do Estado de Sao Paulo-, pela

concessao da bolsa, que possibilitou a realizac;:ao deste trabalho

a Coordenac;:ao de P6s-Graduac;:ao do Institute de Artes, pelos auxilios para

que apresentasse partes desta dissertac;:ao em congresses cientificos

aos colegas da Secretaria da p6s-graduac;:ao e da Biblioteca do IA-Unicamp,

pelos prestimos em todos os mementos

as bibliotecas da Escola de Engenharia de Sao Carlos- USP; da Faculdade de

Arquitetura e Urbanismo - USP; da Universidad de Madrid, Espanha; do

Institute Goethe, Sao Paulo; e do Bauhaus-Archiv, Berlim, Alemanha; e a Prof".

Dr". Diana Domingues

a Emanuel Pimenta, Unitram, Lisboa, Portugal; Alex Adriaansens e Andreas

Broeckman, V2_0rganisatie, Rotterdam, Holanda; Mr. Peter Hahn, Bauhaus­

Archiv, Berlim, Alemanha; Christian Moller, Frankfurt, Alemanha; e Prof Fred

Forest, Sophia-Antipolis, Nice, Franc;:a; que me receberam para breves

temporadas de estudo e pesquisa, que enriqueceram minha dissertac;:ao

aos meus amigos Gustavo S. Lanfranchi, Paulo S. Teixeira,

Javier A. Robles, e Roberto R. Gambarato,

pelo compartilhamento das inquietac;:6es arquitetonicas que nos movem

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I RESUMO

Com este trabalho pretendo discutir as interat;:6es entre os avant;:os tecnol6gicos e a concept;:iio de objetos arquitet6nicos, desde a Revoluc;ao Industrial ate a Revoluc;ao Digital.

Tccnologias lndustriais

A revolu<;:iio meci'mica industrial foi fort;:a motriz para transformat;:6es sociais e espaciais das cidades, desde o desenvolvimento de novos materiais, ate a incorpora<;:ao de novos veiculos na concep<;:ao e apreensao do espat;:o.

Tclc-Tccnologias

Os meios de comunicat;:iio de massa ampliaram nossas concept;:6es espaciais e temporais. Viveriamos numa "Aideia Global", onde alguns arquitetos imaginavam os objetos arquitet6nicos formando um sistema global, funcionando atraves da troca de informat;:oes com outros elementos simi lares.

Tecnologias Digitais

A Arquitetura Virtual se faz como interface entre usuarios e ambientes mediada por maquinas inteligentes. Analiso projetos de arquitetura nesse universo, discutindo:

A tradut;:iio da imaterialidade das imagens videograficas na materialidade arquitet6nica de espat;:os publicos.

A incorporat;:iio das tecnologias eletr6nicas transformando arquitetura num meio de comunicat;:iio interativo com seu ambiente circundante, recriando-o constante e imprevisivelmente, tendo o usuario como vetor.

E finalmente, discutindo como a arquitetura poderia ter como locus os universes virtuais. Como ambientes digitais podem trazer a possibilidade de novas sensat;:oes, 16gicas, composit;:oes e liberdades que estao alem da antiga materialidade da arquitetura: liberdade exponenciada.

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I ABSTRACT

In this work I intend to discuss the interactions between technological advances and the conception of architectural objects from Industrial to Digital Revolution.

Industrial Technologies

Mechanic industrial revolution was the motricity force to the social and spatial trlilnsformations of the cities, since the use and development Gf new materials, till the consideration of new vehicules, like cars and airplanes, to the space aprehension.

Tele-Technologies

Mass media amplified our temporal and spatial conception of the world. We would live in a Global Village, where some architects thought architectural objects as components of a global system, working by changing informations with other ones.

Digital Technologies

Virtual Architecture is the architecture that become an interface mediated by intelligent machines between user and environments. I propose a discussion of contemporary projects in this new world, based on these three aspects:

Translation of video images immateriality to the architectural materiality.

Incorporation of electronic technologi.es thinking architecture as an interactive medium, always bringing the user as a vector to its realization, recreating constantly our environment.

And how virtual and digital environments could bring us the possibility to explorate sensations, logics, compositions and freedoms that are beyond the ancient architecture materiality: exponenciated freedom.

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iN DICE

INTRODU~AO

PARTE A

TECNOLOGIAS INDUSTRIAS E ARQUITETURA

Capitulo 1: BAUHAUS

1 . 1 A Republica de Weimar

1.2 Weimar - Dessau - Berlim

1.3 Arte & Industria: XIX I XX

Capitulo 2:

MARCEL BREUER

2.1 Leitura da Cadeira Wassily

Capitulo 3:

WALTER GROPIUS

3.1 Bauhaus-Dessau

3.2 Leitura da Bauhaus-Dessau

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PARTE B

TELE-TECNOLOGIAS E ARQUITETURA

Capitulo 4:

0 CONTEXTO MUNDIAL POS-GUERRA 59

Capitulo 5:

MARSHALL MCLUHAN

5.1 Contra e a Favor de Marshall Mcluhan 62

5.2 Do Universo Linear ao Global 64

5.3 0 Meio e a Mensagem 70

5.4 Aldeia Global 72

5.5 Comando na Tribo Televisiva 73

5.6 0 Habitat Global e a Arquitetura Metabolista 74

Capitulo 6:

BUCKMINSTER FULLER

6.1 Marshall Mcluhan e Buckminster Fuller via John Cage 79

6.2 0 Universo de Buckminster Fuller 81

6.3 A Regencia Sinergetica 83

6.4 40 : Veiculo Aerodinamico 85

6.5 Dymaxion e suas Extensoes 87

6.6 Domo Geodesico Transformando a Geologia Terrestre 89

Capitulo 7:

ARQUITETURA INSTANTANEA DO GRUPO ARCHIGRAM

7.1 A Arquitetura das HQs

7.2 A Revista Archigram 1: ldeias

7.3 Living City, o Cotidiano Recortado

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7.4 Plug-in-City, Capsulas de Metropolis

7.5 Living 1990, a Habitat;ao nos Anos 90

7.6 Mordomos Eletronicos

7.7 Quarto de Oncinhas

7.8 Arquitetura e Interface

7.9 Instant City, a Metropolis Visil<Jnle

7.10 0 Universe das MetaMetr6polis

PARTE C

TECNOLOGIAS ELETRONICAS E ARQUITETURA

Capitulo 8:

TRADUl;AO, INCORPORAl;AO E INSER<;:AO

Capitulo 9:

TRADUl;AO -

IMAGENS DIGITAIS E ARQUITETURA

9.1 0 Video e as Folies de Groningen

9.2 Arquitetura de Movimento e de lmagens

9.3 Encruzilhadas de lmagens: Paul Virilio

9.4 P61os lnertes: Encruzilhadas

9.5 Superficies Limite: lmagens

9.6 lmagens Numericas

9.7 Muralhas Digitais e Portais: Interfaces

9.8 Bernard Tschumi, Video Folie

9.8.1 Parque de La Villette, Paris

9.8.2 Video Folie, Groningen

9.9 Peter Eisenman, Video Folie

9.9.1 Eisenman e Derrida: Khbra

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9.9.2 Eisenman e Deleuze: Dobras

9.9.3 Video Folie, Groningen

Capitulo 10:

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INCORPORACAO - TECNOLOGIAS ELETRONICA E ARQUITETURA

10.1 Ambientes Virtuais: Peter Weibel

10.2 Oscila<;5es e Interfaces

10.3 Arquitetura como Caixa Preta

10.4 Knowbotic: Ambiente lnterativo

10.5 Jean Nouvel: lnstituto do Mundo Arabe

1 0.5.1 Paris de Mitterand

10.5.2 Jean Nouvel na Paris de Mitterand

10.5.3 lnstituto do Mundo Arabe

10.6 A Casa Numerica

10.6.1 A Casa Numerica e a L6gica Fuzzy

10.6.2 lnforma<;5es Digitais Domiciliares

10.6.3 Do Carro a Geladeira

10.7 Christian Moiler: Space Balance e ZeiiGalerie

10.7.1 Space Balance, a Gangorra do Virtual

10.7.2 ZeiiGalerie e os Ruidos Urbanos

10.8 Perry Hoberman: Bar Code Hotel

1 0.8.1 Arquitetura em C6digo de Barras

Capitulo 11:

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IMERSAO - SIMULACOES DIGITAIS DE ARQUITETURA

11.1 Modelos e Simula<;5es

11.2 A lnfografia Aeroespacial de Frank Gehry

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11.3 Abismo Numerico 163

11.4 Philippe Queau: Virtudes e Vertigens 164

11.5 lmersao em Ambientes Virtuais 168

11.6 Simula9oes: o Resgate do Tempo 169

11.7 As Luzes do Museu do Louvre 169

11.8 Projetos ltalianos de Frank Lloyd Wright 171 . 11.9 Barcelona Digital de ldelfonso Cerda 172

11.10 0 Bale Triadico Danga na Bauhaus Virtual 174

11.11 Netr6polis: Arquitetura nas Redes Digitais 177

11.12 Arquitetura a Distancia: o lmagina 97 179

11.13 Woiksed, o Planeta Virtual de Emanuel Pimenta 180

11.13.1 lmpermanemcia das Coisas e das ldeias

11.13.2 A Maquina dos Sentidos

11.13.3 Woiksed

PARTE D

CONSIDERAyOES FINAlS

Capitulo 12:

DESMATERIALIZAyAO DA ARQUITETURA

12.1 A Desmaterializagao

12.2 Khbra, o Receptacula dos Possfveis

12.3 Encontro de Jacques Derrida e Charles S. Peirce

12.4 Dobras na Arquitetura

12.5 Dobras no Tempo

12.6 Prosseguimento: Netas para Trabalhos Futures

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PARTE E

REFERENCIAS

llustra~oes 200

Videos e Filmes 203 . URI, (World Wide Web) 204

Revistas 204

Artigos e Textos Avulsos 205

Liv.-os 210

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INTRODUCAO

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As Cidades e a Medida Humana

A cidade em que vivemos e a sobreposiyao de hist6rias, culturas, formas

urbanas e arquitetonicas que tramam e organizam nossa frui<;:ao no cotidiano

urbano. A arquitetura, mais que · servir para proteger os homens das

intemperies, e uma forma de organizayao de suas referencias culturais e seu

posicionamento crftico junto ao ambiente natural. Para Vitruvio, seria um

instrumento de medida e ordenar:;ao da cultura humana frente ao universo.

A arquitetura e um meio de transmissao de informao;:6es com a qual o homem

vem dando a sua medida aos territ6rios que ocupa.

Mas para se realizar como a concretiza<;:ao de um extrato cultural; mas para

isso, sempre houve o intermedio de tecnicas de constru<;:ao, seja no corte das

pedras no antigo Egito, o uso do barro nas cidades maias ou os grandes

paineis de a<;:o e vidro de Frankfurt contemporanea. Porem, quando estudamos

a hist6ria da arquitetura, vemos que a tecnica foi considerada apenas como

intermediaria entre as inteno;:6es e o objeto construldo, sem ser vista com

autonomia. lsso foi claro ate meados do seculo XIX, quando encontramos em

todas as artes um vinculo direto, ffsico, entre os artistas e a obra. Havia, clara,

ferramentas, mas essas eram extensoes imediatas do homem em relac;:ao a

suas obras.

Com a primeira revolu<;:ao industrial, a tecnica assumiria sua autonomia. Ja nas

maquinas a vapor vemos uma transforma<;:ao teleol6gica no papel da tecnica,

que passava a ser intermediador ativo entre as intenc;:oes do homem e a

concretiza<;:ao de suas obras; e se colocava como o terceiro elemento no

processo Homem - Tecnica - Obra. Vejamos, por exemplo, a industria textil.

Com o uso da gera<;:ao de energia a vapor, foi passive! a construc;:ao de

grandes maquinas que interpretavam OS movimentos das maos dos tecel6es

atraves de alavancas e barras de ferro. Produzindo cada vez em maior

quantidade e mais rapidamente, os operadores dessas maquinas podiam nao

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ter conhecimento algum da antiga arte da tecelagem. Essas maquinas traziam

em si conhecimento dos padroes de conduta da arte que dispensava que seus

operadores o tivessem.

Da Tecnica a Tecnologia

E na transformagao de uma extensao imediata do homem em escala individual

para seus desdobramentos distantes e em escala coletiva que se da o primeiro

passo da evolugao da tecnica a tecnologia. A tecnica e um modo de fazer, uma

opera9ao mental que posslblllta a lnterayi!lo entre o homem e sua obra, que se

da atraves de intrumentos que estendem e adaptam as habilidades manuais a materia com que se vai trabalhar.

Com a maquina a vapor, que gerava, acumulava e distribula energia em larga

escala, foi posslvel a potencializagao da tecnica, com a criayao de

instrumentos mecanicos que operavam analogicamente ao trabalho dos

bragos, maos e pernas de inumeros artesaos. Alem disso, podiam ser

comandados por outras pessoas que nao tinham necessariamente

conhecimento sobre as atividades artesanais.

Ha, na mudanga da tecnica a tecnologia, dois pontos que serao chaves ao

desenvolvimento de todas as outras obras e cultura humana a partir de entao.

Em primeiro Iugar houve a criagao da profissao do projetista, aquela pessoa

com conhecimento dos processo artesanais e da mecanica maqulnica, que

transferia os movimentos antes feitos pelos artesaos as bielas, cabos e

alavancas das maquinas.

Em segundo Iugar, a autonomia da tecnologia em relagao ao artesao e ao

produto. Um alicate, por exemplo, nao significa nada isoladamente, e pode ser

usado para criar qualquer coisa. Depende do artesao que loma-lo e qual sua

intengao, para produzir um objeto singular, pois s6 este determinado artesao

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domina sua tecnica especifica. Ja os instrumentos tecnol6gicos trazem em si,

mesmo inativos, suas potencialidades.

Uma maquina de corte de pedras serve para cortar pedras, sempre. E nao

importa quem a opere. Assim, a tecnologia se instaura e se identifica como a

transferencia de um determinado conhecimento e sua instrumentalizayao num

aparelho que opera sempre com essas especificidades.

As Cidades Tecnol6gicas

0 historiador e crftico de arquitetura Leonardo Benevolo 1 nota que entre os

seculos XVIII e XIX o tempo m9dio de vida subira de 35 para 50 anos,

rompedo com um equilibria secular entre as gera96es. Em 1760 havia 7

milh6es de habitantes na lnglaterra, subindo para 14 milh6es em.

Com o aumento demografico e transformay6es produtivas, o territ6rio dos

pafses que se industrializavam foi redesenhado, principlamente em virtude do

movimento populacional do campo para as cidades. Manchester, que em 1760

tinha 12.000 habitantes, contava 400.000 em 1850; e Londres, em 1851 era a

maior cidade do mundo, com 2,5 milh6es de habitantes. Esse redesenho se

amplia com o desenvolvimento de meios de comunicayao necessaries para

facilitar o fluxo de produtos e da pr6pia popula((ao, como foram as pistas, os

canais navegaveis (na lnglaterra a partir de 1760), barcos e trens a vapor (em

1825).

Com a transforma((ao da tecnica em tecnologia, houve a construyao de

grandes galp6es para abrigar as industrias que atrafam mao-de-obra do

campo para as cidades. A industria e o comercio foram consequencias

fundamentais do progresso tecnol6gico e desenvolvimento economico; e com

o aumento da popula9ao nas cidades, houve um crescimento na oferta de

bens e servi((OS, que criavam um novo aspecto nas grandes cidades.

1 BENEVOLO, Leonardo; Diseflo de Ia Ciudad; Ed Gustavo Gili, Mexico, DF

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Alem das mudanc;:as territoriais, houve uma mudanc;:a temporal nas cidades.

Fases de equilibria seculares jamais existiriam novamente. Com as

transformac;:oes tecnol6gicas, inserindo a rapidez de produc;:ao e distribuic;:ao

de produtos e informac;:oes nas cidades, nao mais se poderia prever urn

equ'ilibrio estavel, mas ao contrario, que o ritmo de novas transformac;:oes seria

cada vez mais rapido e profunda.

Os Arquitetos nas Cidades Tecnol6gicas

Na metade do seculo XIX ja eram claras todas as mudanc;:as no ambiente

urbana oriundas da Revoluc;:ao Industrial. Os arquitetos absorviam essas

mudanc;:as tecnol6gicas cada vez mais em suas obras, ao mesmo tempo que

demonstravam inquietac;:ao quanta ao futuro das cidades fabris. lniciam-se

nesse perfodo discussoes e se formulam diversas propostas para

reconfigurac;:Oes urbanas, abrangendo novas aspectos, como as questoes

sociais e higienistas, alem de ser possivel notar claramente como isso

interferia nas concepc;:oes esteticas.

Giulio Carlo Argan identifica que foi com essa explosao das cidades ligada ao

avanc;:os tecnol6gicos que se originou urn campo especifico na arquitetura, que

englobava nao s6 questoes formais e tecnicas, mas a complexidade de

relac;:oes entre os homens e a sociedade que ocorria nas cidades, que agora

apresentavam a necessidade de serem planejadas. Esse campo e o

urbanismo, que serviu ao mesmo tempo como sintese de inquietac;:oes e

propulsor de propostas da arquitetura moderna.

Sao desse periodo projetos urbanos em importantes cidades sufocadas pela

industrializac;:ao, como e o caso do plano do barao Haussmann para Paris,

centrado na abertura de boulevards e vias de circulac;:ao que incrementassem

o fluxo urbane; e o Eixample de ldelfonso Cerda para Barcelona, que ampliou

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a cidade com blocos ordenados em largas vias de circulayao com linhas de

bonde, e introdugao de tecnicas higienistas no planejamento urbano.

Podiamos continuar a enumerar essas cidades com Londres, Roma ou

Chicago. E alem das reformas urbanas, diverso arquitetos-urbanistas langaram

projetos de cidades industriais ideais, como e o Projeto de uma Cidade

Industrial, de Tony Garnier, em 1901/1904.

Os Monumentos da lndustrializagao

As tecnologias tem 16gicas pr6prias que condicionam os seus produtos e, com

isso, o meio onde se inserem. Os arquitetos estiveram atentos a isso, tanto

quando propuseram reformas urbanas, como ao incorporarem essas

transformagoes em seus projetos de obras menores.

Os avangos tecnol6gicos possibilitaram novas maneiras de fundir o ferro e

modela-lo, assim como novas tecnicas de laminagao a vapor da madeira, e a

fabricagao de placas de vidro maiores. Todos esses avangos no feitio dos

materiais esliveram logo ligados a ediffcios com novas fungoes que

configuravam as cidades.

0 comercio em larga escala, nacional e internacional, !eve um incremento

atraves das vias ferreas, por onde os produtos eram transportados. E dessa

epoca o crescimento das bolsas de comercio e dos servi<;;os dos correios. As

pr6prias ferrovias tinham necessidade de estagoes de parada e depositos; e

os trens metropolitanos subterraneos, tambem criavam novas tipos de

edificagoes nas cidades.

Joseph Paxton construiu, em 1851, o Palacio de Crista!, para a primeira das

grandes feiras industrias que foi a Exposir:;ao Universal de londres, onde

utilizou segmentos metalicos e placas de vidro como elementos pre-fabricados,

criando, com essas novas possibilidades tecnol6gicas, novas petencialidades

esteticas - que safram das exposic;:oes e foram inseridas em espagos do

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cotidiano urbano. Em 1865, Giuseppe Mengoni projetou a Galeria Vittorio

Emanue/le II, cobrindo com estrutura metalica e placas de vidro quatro ruas em

um cruzamento viario pr6ximo ao Domo de Milao. Essas galerias/rua, com

tecnologia e desenho semelhantes, alastraram-se por Paris, Napoles,

Bruxelas.

A tecnologia de estruturas metalicas e placas de vidro cobrindo grandes vaos

foi utilizada em 1904 por Otto Wagner na Caixa Econ6mica de Viena. Essa

mesma tecnologia ja fora empregada pelo arquiteto dez anos antes, na

esta'!(l!lo Karlplatz de metrO, tambem em Vlena. Desse mesmo perfodo sao

algumas esta'!(oes de metro construidas em Paris por Hector Guimard, estas

com linhas claramente art nouveau, sendo que Otto Wagner ja prenunciava em

seus projetos uma racionalizac;:8o formal que seria vigente na arquitetura

modern a.

Com todas as possibilidades plasticas dos novas materias e a inser9ao na

cultura moderna dos meios tecnol6gicos, houve uma crescents

monumentalizavao da tecnologia: obras arquitetonicas que tiravam sua

criatividade plastica dos novos meios e, muitas vezes, esgotavam-se nisso.

Um clare exemplo e a Torre construida em Paris para a Feira lntemacional que

comemorou os 100 anos da Revoluvao Francesa, projetada por Gustave Eiffel.

A intenvao inicial era que, depois da feira, ela fosse desmontada. Simbolo de

um periodo, mantiveram-na construida e se tornou simbolo do pais.

As Cidades Modernas

Foi no inicio desse seculo que a urgencia da reconcep9ao da cidade frente as

novas tecnologias deu origem a um movimento internacional de arquitetura. Os

arquitetos do movimento Moderno integravam a tecnologia em suas propostas

nao apenas como um tecnica superlativa, mas como um saber autonomo, com

caracteristicas pr6prias e com uma dinamica organizacional que, interagindo

com as cidades, transformavam seus aspectos sociais, ideol6gicos, estruturais

Page 21: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

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e esteticos. Era precise projetar para as maquinas, com as maquinas e,

sobretudo, projetar as interac;:oes maquina/cidade.

Oesse periodo e possivel destacar projetos de Mies van der Rohe, Walter

Gropius e Le Corbusier - que sao paradigmaticos do movimento Moderno.

Porem, seria possfvel tambem apontar os trabalhos de George Howe e

William Lescale nos EUA, Jacobus Oud na Holanda ou Erik Asplund na

Suecia. Houve, em linhas gerais, um movimento de vanguarda que propunha

modificar e/ou construir globalmente as cidades.

E desse periodo que parto para minhas discussoes desta disserta<;ao sobre as

teorias e projetos que tern como centro de suas preocupac;:oes as intera<;:oes

entre a Arquitetura e as Tecnologias de lnformar;ao.

Tecnologias Industrials, Tele-Tecnologias e Tecnologias Eletronicas

Com a intenc;:ao de acompanhar os trabalhos de arquitetos frente as

transforma<;:oes das tecnologias de informac;:ao e sua interac;:ao com a

arquitetura no seculo XX, divide este trabalho em tres partes, coerentes com

as mudanc;:as tecnol6gicas chaves que vern redefinindo nossa interac;:ao com

as cidades.

Num primeiro memento, deter-me-ei nas Tecnologias Industries mecanicas,

que criou territories especificos ligados a diferentes func;:oes, introduzindo

novos materials industrializados e veiculos de fruic;:ao dos espac;:os

arquitetonicos. lsso se reforc;:ou ap6s a Primeira Guerra Mundial, e a escola

alema Bauhaus foi por mim escolhida como sintetizadora das discussoes e

propostas pois, em seu programa, apresentava os problemas da arquitetura

estendendo-se do desenho da cidade ao desenho da colher. Seus trabalhos

eram elaborados coletivamente e com uma preocupac;:ao pedag6gica para com

os jovens arquitetos.

Page 22: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

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Nos anos 60, os meios de comunica<;:ao de massa, como radio e TV - com

transmissoes intercontinentais ao vivo, via satelite -, cobriam o mundo todo e

assim ampliavam nossas concepr;oes temporais e espaciais. Marshall

Mcluhan foi o te6rico chave desses meios de massa, e tornou-se uma

importante referemcia, prognosticando urn mundo retribalizado pelos meios

eletronicos.

Arquitetos estiveram atentos a esses novos meios Tete-Tecno/6gicos e

propuseram questoes e solur;oes arquitetonicas no universe costurado pelas

transmiss6es de informar;ao. Buckminster Fuller propunha geodesicas que

poderiam envolver todo o globe, e assim transformer as caracterfsticas de

relacionamentos entre os homens e seu ambiente; e o grupo Archigram, que

porjetavam as cidades instantaneas, que aportariam e desapareceriam ser

deixar rastros ffsicos, apenas conex6es informacionais.

Hoje, a internet parece ser a realizar;ao da aldeia de Mcluhan; as TVs, antes

na sala-de-estar, formam a paisagem urbana nas avenidas e cruzamentos;

Paul Virilio escreve que a ultima insti.'mcia da alta velocidade e a inercia, onde

o diferencial espar;o/tempo inexiste; Peter Weibel nomeia a arquitetura que se

constr6i na interface espar;o/tecnologias digitais de Arquitetura Virtual; a

cidade de Groningen espalha cabines de video deconstrutivistas em suas

prayas;Perry Hoberman produz ambientes via c6digo de barras; Emanuel

Pimenta prop6e a criar;ao de urn Planeta Virtual. 0 universo das Tecnologias

Eletr6nicas e Digitais torna o novo territ6rio de projetar;ao e cosntrur;ao de

propostas arquitetonicas.

Nesse final dos anos 90, as camadas das cidades nao se assentam antes que

outras as transforme, absorva e construa novas lerril6rios. Sao algumas

dessas camadas da arquitetura contemporanea que intenciono apresentar e

discutir atraves das Tecnologias de lnformat;ao.

Page 23: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

Fritz Lana Metropolis, 19:27

Erik Asplund Pavilhao de Exposic;:6es, Estocolmo, 1930

Joseph Paxton Palacio de Cristal. Londres. 1851

Oas Tccnicas as TccnolO'.J,ias Industriais

Seculos XIX-XX

Com a primeira revolu<;ao industrial a tecnica assumiria sua autonomia. lnstrumentos mecanicos potencializaram as extens6es ffsicas dos homens em largo escala. Do tecnica a tecnologia, houve tambem uma potencializa<;ao do conhecimento maqufnico que logo se estendeu a transforma<;ao das cidades e a cria<;ao de objetos arquitet6nicos. A arquitetura do seculo XX e pautada nessa transforma<;ao tecnol6gica dos meios de produ<;ao e informa<;ao.

Gustave Eiffel Torre Eiffei.Paris,l88 7/9

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PARTE A

TECNOLOGIAS INDUSTRIAlS E ARQUITETURA: BAUHAUS

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24

I CAPiTULO 1:

Bauhaus

A Bauhaus, criada palo arquiteto Walter Gropius em 1919, em Weimar -

Alemanha, que dirigiu a integragao da Escola de Balas Artes e a Escola de

Artes Aplicadas - que estivera sob o comando de Henri Van de Velda -, e o

primeiro p61o que escolho para trabalhar as relagoes entre a Arquitetura e os

processes tecnol6gicos industrias do infcio deste seculo. Como escreveu

Reyner Banhan, a Bauhaus foi " ... uma escola dedicada a arquitetura da !dade

da Maquina e ao projeto de produtos da maquina, utilizando uma estetica da

ldlilde da Maquina ... "2

Contudo, antes de iniciar as discussoes que reflitam as interagoes das

tecnologias emergentes e os processes intelectivos de criagao atraves de

obras da escola, ater-me-ei a . uma breve abordagem das premissas

ideol6gicas e artisticas que impulsionaram sua criagao, a insergao em seu

universe artistico e politico, a formagao de seu corpo de mestres, e seu

desenvolvimento na sociedade industrial contemporanea. Os exatos quatorze

anos de sua existencia, de 1919 a 1933, sao coincidentes com a epoca em

que a Alemanha, derrotada na Primeira Guerra Mundial, esteve imersa na

busca de sua reconstruc;:ao social, economica e politica - interna e

externamente. Este periodo e caracterizado na hist6ria alema como a

Republica de Weimar. Rainer Wick nota que" ... a hist6ria da Bauhaus comega

e termina com a hist6ria da Republica de Weima('3 .

2 BANHAM, Reyner; Teoria e Projeto na Primeira Era da Maquina; Ed. erspecliva; SP, 1979 (2a ed); p.16

3 WICK, Rainer; Pedagogia da Bauhaus; Ed. Martins Fontes; SP, 1989; p.13

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25

1.1 A Republica de Weimar

No ano de 1917 a Alemanha safa derrotada da Primeira Guerra Mundial. 0

pars estava destrufdo econOmics, social e politicamente, asslm como suas

importantes cidades estavam arrasadas. Era urgente a sua reconstruc;ao ffsica

e politica, refazer-se sob a destruic;:ao da guerra e se enquadrar na nova

ordem mundial ditada pelo Tratado de Versalhes.

Ao final da Guerra, ja premente a derrota alema, frente aos sacrificios a que

estava exposta, a populac;ao rompia aos poucos com a aprovac;ao a politica

Imperial e a guerra. 0 estado de calamidade estendia-se a queda constante do

poder de compra dos salaries dos trabalhadores - reduzidos a um terc;:o -, a falta de transporte, ao racionamento de energia eletrica e agua encanada, e a falta de alimentos basicos, como carne, batatas, avos e farinha de trigo, sendo

que 200.000 pessoas na capital, Berlim, subsistiam apenas com as sopas

populares. Ao mesmo tempo, as revoltas dos operarios nas fabricas se

alastravam, estimulados pela revoluc;ao vitoriosa na Russia, "que alimentava a

esperanc;:a de alcanc;ar rapidamente a paz e liquidar, ao mesmo tempo, o

regime imperia1".4

A Alemanha, dividida em 22 duas monarquias e 3 republicas, era governada

porum imperador com poderes executives absolutes e poder para dissolver a

qualquer momenta e pressuposto o Conselho Federal, composto por

deputados nomeados de todos os seus 25 Estados. Em 26 de outubro de 1918

a Constituic;:ao sofreu uma serie de mudanc;as, transformando o pais numa

monarquia parlamentar; contudo os disturbios entre os trabalhadores e classes

politicas se alastravam por todos os Estados.

"Em todas as cidades do antigo Imperio alemiio, os dias de novembro de 1918 se assemelham

aos da capital. Greves, manifesta<;:oes, assembleias gerais, discursos, vota<;:iies de resolu<;:6es,

ocupa<;:iies de predios publicos, cortejos fiinebres se repetem sensivelmente da mesma

maneira, em datas por vezes diferentes, nos centros urbanos de todos os Estados federados

4 RICHARD, Lionel; A Republica de Weimar (1919 - 1933); Cia das Letras + Circulo do Livro; SP, 1988 (3a reimpressao) , p. 25

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26

que formavam o Imperio, do Hesse ao Wurtemberg, de Bremen e Lubeck a Sax6nia e a Renanla.'5

Os social-democratas, reformadores da Constitui<;:ao em 1918, apoiados pelo

exercito, marcam elei<;:6es para janeiro de 1919: 87% do alemaes

credenciados votaram, dando vit6ria-ao parlamentarismo.

A capital, Berlim, atingida duramente pela destrui<;:ao fisica e moral, nao

apresentava condio;:oes para ser o centro de redefinio;:oes polfticas. A cldade

escolhida foi Weimar, na Turfngia, com 6.000 habitantes, bern mais calma e

polo de emergencia cultural do pais em varios mementos da hist6ria. Nesta

cidade seria reconstrufda a estrutura politica da Alemanha e discutido o

Tratado de Versalhes, pelo qual, entre diversos pontos, a Alemanha deve

ceder um oitavo de sua superficie a paises vizinhos, como Polonia, Belgica e

Tchecoslovaquia. Tambem e em Weimar que o paise definido como territ6rio

unico, nao mais dividido em Estados autonomos. Ap6s a resolw;ao de seu

problema mais turbulento, o Tratado de Versalhes, a sede da Republica

regressa a Berlim no outono de 1919. Weimar passou a significar ao povo

alemao nao mais sua heran<;:a classica, mas local de derrota pela aprova<;:ao

do Tratado.

Contudo, a crise economica nao cessa. Alain Brossat escreveu que:

"De julho a dezembro de 1919, em seis meses apenas, o pre9o dos produtos de primeira

necessidade dobrara. ( ... ) Em certas empresas, por falta de carviio e oleo, as maquinas

estavam avariadas e retornava-se ao trabalho manual."6; e junto ha desconfian<;:as

gerais sabre os resultados da Republica:" ... sea Republica se imp6s em 1918 como

etapa institucional diante do deslocamento ignominioso do Imperio, ela niio consegue, durante

os reduzidos quinze anos que lhe cabem, impor sua legitimidade e seus valores consensuais.

( ... ) Para muitos alemiies, a Republica continua inexoravelmente associada a lembranya da

derrota de 1918, a Versalhes ... "?

5 Ibidem.; p.40 6 Ibidem. p.87 7 BROSSAT, Alain in RICHARD, Lionel (org); BERLIM, 1919-1933- A Encamaqilo Extrema

da Modemidade; Jorge Zahar Ed., RJ, 1993, p. 184

Page 28: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

27

Peter Gay considera que, politicamente, "A Republica nasceu derrotada, viveu

em tumulto e morreu em desastre, e desde o infcio havia muitos que viam sua

labuta com suprema indiferenc;:a .. .''8 e "Ninguem deixou de perceber que a

Republica veio ao mundo quase que por acidente e coberta de descuipas"9.

No correr dos anos o pais apresenla periodos de progresso e crise. A

industrializac;:ao foi incentivada ap6s a derrota na Primeira Guerra com o intuito

de produzir oferta de empregos e ajudar na reconstruc;:ao do pals, incentivando

tambem a urbanizac;:ao das cidades: em 1931, 58% da populac;:ao a lema ativa

trabalha nos setores de industria, comerclo e transportes. A industria e al<;;ada

para colaborar na fabricac;:ao de pec;:as que serviriam de elementos

construtivos para a construc;:ao de milhares de moradias necessarias e

asseguradas pelo artigo 155 da Constituiyao, contando com uma equipe de

arquitetos que controlava todos os nfveis desta operac;:ao, entre eles Erich

Mendelsohn, Bruno Taut, Mies van der Rohe e Waiter Gropius.

"Onde quer que o problema de moradias ja se encontrava presente antes da guerra, este se

lorna agudo no p6s-guerra, e sobretudo depois de alguns anos, grayas a retomada do

crescimento demogrlifico. A vastidiio de tarefas e tao grande que somente o Estado esta

capacitado a desempenM-Ia, raziio pela qual se intensificam as iniciativas de construyao

subvencionada e se aperfeic;:oam as leis correspondentes"10

A Alemanha conhece uma febre da construc;:ao civil de 1925 a 1928,

interrompida pela crise economica.

Os disturbios sociais e politicos continuavam, acentuados pelas consequentes

crises economicas, por uma tentativa da Republica de unificar um pais

historicamente dividido em Estados autonomos, e pelo ressentimento aos

paises vizinhos, em especial a Franc;:a, pelas perdas e humilhal(6es oriundas

do Tratado de Versalhes. Nas eleic;:oes legislativas de 1932 os nazis!as

passam de 18,3% para 37,3% de representatividade, tornando-se o partido

mais forte no Parlamento. "Nas ruas de todas as cidades, e mesmo das

8 GAY, Peter; A Cultura de Weimar. Paz e Terra; RJ, 1978; p.16 9/bidem. p.24 10 BENEVOLO, Leonardo; Hist6ria da Arquitetura Moderna; Perpectiva; SP, 1976; p.390

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-28

aldeias, os homens de suas se96es de assalto exibiam a sua forya. Serviam-se

dela contra os piquetes sindicais, contra os comunistas, os judeus, ( ... ) Crimes

horriveis alimentavam o fascinio e o medo. Ambos eram fomentados pelos

nazistas, ... "11

Os nazistas recusavam o Tratado de Versalhes, mantinham o sonho da

dominayao alema em toda a Europa, e cada vez mais adquiriam simpatizantes

entre os alemaes vinculados as tradi96es imperiais. Neste mesmo ano de

1932, Hindenburg e reeleito presidente da Republica e Adolf Hitler e nomeado

conselheiro, pleiteando o cargo de chanceler. Nas ruas h8 batalhas entre os

nazistas e os anti-fascistas. Em 1933 Hindenburg chama Hitler para compor o

governo e lhe cede plenos poderes. A Constituic;:ao nada mais vale. lnstala-se

o Terceiro Reich.

Hitler tern consciencia da necessidade de comoc;:ao da populac;:ao para ganhar

forc;:a politica para levar a frente seus projetos. A seu lado estao Rudolph

Joseph Goebels e Albert Speer. Goebels, no cargo de Ministro da

Propaganda desde que Hitler se tornara chanceler, e responsavel pela

propaganda nazista, criando filrnes de entretenimento e com cunho

publicitario12. Speer e o arquiteto oficial do Reich, e cria monumentos

arquitetonicos inspirados na tradic;:ao romantica do pais 1a A arquitetura deixa

de ser instrumento de reconstruc;:ao social, investimento na industrializac;:ao

para atingir a meta de dar moradia a toda populac;:8o - que linha como simbolo

a Escola de arquitetura Bauhaus - para ser, cada vez mais, palco das

encenac;:oes politicas do Nazismo14.

Desde sua instaurac;:ao em 1919 ao seu exterminio em 1932, a Republica de

Weimar comportou incentives e insatisfac;:oes, e a Escola de Arquitetura

Bauhaus esteve envolvida indiretamente em seus problemas politicos.

11 RICHARD, Lionel; Op. Cit., p.116 12 REES. Laurence; 0 Poder na Mfdia; BBC; London, 1992 (Documentario para Televisao) 13 CANETTI, Elias; A Consciencia das Patavras: Ensaiosl; Cia das Letras; SP. 1990; 14 COHEN, Peter; Arquitetura da Destrui!flio; Suecia,1989 (The Architecture of Doom -Filme) •.

Page 30: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

29

1.2 Weimar- Dessau - Berlim

Walter Gropius esteve desde o infcio ligado a criagao da Bauhaus; e as

intengoes que o levaram a propor a unificagao da Escola de Belas Artes e a

Escola de Artes Aplicadas estao presentes desde sua formagao.

Nascido em 18 de maio de 1883 numa familia de arquitetos, estudou em

Munique e Berlim - sua cidade natal - e logo iniciou-se profissionalmente como

assistente de Peter Behrens, ate que em 1910 montou seu proprio gabinete.

Nesse mesmo ano escreveu urn memorando que o tornaria conhecido, onde

propos a prefabricagao industrial de pegas standards para construgao de

casas.

Em 1911 projeta urn dos ediffcios mais importantes de sua carreira, apontado

por muitos historiadores da Arquitetura no tocante a arquitetura e

industrializa"ao no inicio do Modernismo: a fabrica de sapatos Fagus, em

colabora"ao com Adolf Meyer. Leonardo Benevolo considera que "na produ"ao

de Gropius, as obras que mais se assemelham com esta nao sao ediffcios,

mas produtos industriais, como a automotriz de 1913 e o autom6vel Adler de

1930"15, afirmando que esta obra pode ser analisada exclusivamente por seu

carater tecnol6gico; e Giulio Carlo Argan aponta esta obra como responsavel

por uma ruptura na concepgao de arquitetura industrial, resolvendo a

funcionalidade e condi"oes psicol6gicas de trabalho com urn ediffcio que "ja

nao e uma massa plastica, e sim uma constru"ao geometrica de pianos

transparentes no espa"o". 16

A partir do ano seguinte Gropius participa da Werkbund Alema, movimento

artistico que, com o Arts and Crafts, ingles, buscou a integra9ao da arte e

artesanato, aproximando-se da industrializa9ao emergente. Esse sera o

direcionamento dos interesses de Gropius. Em 1915 ele inicia negocia9oes

com Fritz Mackensen, diretor da Escola Superior de Belas Artes de Weimar

(Sanchsische Hochschule fUr Bildende Kunst) com o intuito de criar urn

15 BENEVOLO, Leonardo; Op. Cit. 16 ARGAN, Giulio Carlo; Arte Modema; Cia das Letras,SP. 1992

Page 31: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

30

"Departamento de Arquitetura e Artes Aplicadas", substituindo a Escola de

Artes Aplicadas (Sanchsische Kunstgewerbeschule) de Van de Velde, fechada

ha pouco. As negociaQOes se desenvolveram com o minlstro de Estado do

Grao-Ducado da Saxonia. No memorandum datado de 25 de janeiro de 1916

Gropius propoe a criaQaO de "um institute de ensino, como local de consulta

artistica para a industria, o artesanato e o trabalho manual"17, que esta muito

proximo as ideias da Werkbund e as de Henri Van de Velde. A proposta foi

muito mal acolhida na epoca, principalmente na camara dos mestres da

Turingia, por considerarem que nao se daria atenc;:ao devida ao artesanato.

Ap6s o fim da Primeira Guerra Mundial, com a derrota alema e a abdicac;:ao de

Guilherme II em novembro de 1918, as classes trabalhadoras, intelectuais,

politicas e artfsticas iniciaram diversos manifestos de reconstruc;:ao do pais,

incluindo as reformas no ensino. Neste bojo, Gropius recoloca suas ideias ao

governo de Weimar, recem instaurado, sugerindo novamente a integrac;:ao da

Escola de Belas Artes e a Escola de Artes Aplicadas. Apoiado pela esquerda

assim como pela administrac;:ao ducal, e sob influencia do diretor geral dos

museus de Berlim, Wilhelm von Bode, que via nisso a oportunidade de

melhorar os produtos da industria e ligar os interesses da arte aos do Estado,

cria a Bauhaus Estatal em 1919, na cidade de Weimar.

Assim, apesar de Gropius nunca envolver diretamente a Escola na politica

alema, ela esteve sob seus efeitos desde sua criac;:ao, influenciando tanto nas

mudanc;:as de sua direc;:ao- Gropius (1919-1928), Hannes Meyer (1928-1930) e

Mies van der Rohe (1930-1933) -, quanta nas transferencias de sua sede -

Weimar (1919 -1925), Dessau (1925-1932) e Berlim (1932-1933).

Em 1919 a ideia da criac;:ao da Bauhaus em Weimar respondia aos anseios da

reconstruc;:ao do novo Estado Alemao, mas cabe lembrar que pouco antes,

1916, esta proposta foi rechac;:ada pelos mesmos trabalhadores e artesaos

que ora a apoiavam, no afa politico do surgimento de uma nova sociedade

democratica e socialista.

17 VITALE, Elodie; Le Bau/Jaus de Weimar: 1919- 1925; Pierre Mardaga, Belgica

Page 32: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

31

Em 1923, por pressao do Estado, que a subvencionava e queria resultados,

houve uma grande exposi~ao da produ~ao da Bauhaus. Apesar do bom reflexo

internacional e apoio artistico interno, como da propria Werkbund - que

realizava na mesma epoca.um simp6sio em Weimar-, os partidos de direita a

criticaram ferozmente, e o apoio financeiro aos poucos escasseava, ja que o

Ministro das FinanC(8s, o social-democrata Hartmann, considerava-a

"superflua". A situa~ao chegou ao limite em marc;;o de 1925, quando os

pr6prios mestres decretaram a dissoluc;;ao da Escola.

A convite de Fritz Hesse, prefeito de Dessau, toda a Bauhaus, mestres e

alunos, transfere-se para essa cidade, escolhendo entre outros convites,

vindos de Frankfurt-Meno, Mannheim, Munique, Darmstadt, Krefeld,

Hamburgo, etc. Dessau, com cerca de 50.000 habitantes em 1925, era

radicalmente diferente de Weimar: sediava um quarto da industria quimica da

Alemanha e entre suas maiores empresas estava a fabrica de avioes, Junkers.

Para sediar a Escola foi necessaria a construc;;ao de um ediffcio, que ficou sob

a responsabilidade de Gropius. Foi tambem encomendado a ele a construc;;ao

das casas dos docentes; tres ediffcios duplos para os mestres Kandinsky,

Klee, Moholy-Nagy, Schlemmer, Scheper e Muche; a sede do 6rgao municipal

do Trabalho; e um bairro operario no suburbia de Torten, que em sua primeira

fase consistiu na construc;;ao de 60 casas terreas independentes.

"No decurso total de Ires rases de constru<;:ao do Bairro Torten, Gropius p6de, pela primeira

vez, testar um conceito central para a solu<;:iio da critica falta de alojamentos. Desde ha alguns

anos que Gropius estudava meios para dirninuir os custos de construgiio atraves da

racionaliza<;:ao do trabalho no local de constru.;:ilo, da utiliza<;:iio de materiais pre-fabricados e

da estandardiza<;:ao"18

A construc;;ao da nova sede, iniciada em abril de 1925, e a concretizac;;ao das

ideias da Bauhaus no campo da arquiletura, constantes desde seu primeiro

programa e que agora tem chance unica de se firmar. Gropius envolve os

18 DROSTE, Magdalena; BAUHAUS, 1919-1933; Benedikt Taschen, Berlim, 1992 -·

Page 33: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

32

mestres de todas as oficinas e todos os alunos nos trabalhos de projeta.;:ao e

construc;t:lo, tanto do ediffcio quanto do mobiliario, iluminagao, tapegaria,

utensflios, etc. Leonardo Benevolo escreve que a inten.;:ao de um trabalho

coletivo esta expresso nos pr6prios materials empregados na sede: "Gropius

evita ressaltar sua individualidade com um tratamento que marque a

consistEmcia ffsica que tem esses elementos, e em substfmcia recorre a

apenas dois materials: o vidro para os espa.;:os vazios, envolvido em metal, e o

reboco branco para os espa.;:os cheios." 19 E notavel por fotos da sede de

Dessau a existencia de diversos elementos constituintes dos trabalhos das

Oflcinas da Escola formando os amblentes e ldentificando o trabalho da

Bauhaus.

Ale o crash de Wall Street, EUA, em 1929, a Alemanha viveu um periodo de

estabilidade econOmica, o que se refletiu na verba destinada pela Prefeitura de

Dessau a Escola, e nas encomendas crescentes das empresas privadas por

projetos de produtos desenvolvidos nas oficinas da Bauhaus. Porem, ja em

1928, desgastado com anos de responsabilidades administrativas, alem da

pressao polilica dos conservadores de Dessau, que cortaram em mais de 60%

as verbas para a Bauhaus, Gropius desliga-se da Escola e estabelece-se

como arquiteto autonomo em Berlim. Com ele saem Herbert Bayer, Marcel

Breuer e Lazl6 Moholy Nagy.

Assume a dire.;:ao Hannes Meyer, que estava a apenas nove meses como

Mestre, com indica9ao do proprio Gropius. A Escola desprende-se cada vez

mais de seu cunho artfstico para se voltar a projetagao de produtos ligados as

necessidades da vida cotidiana.

"Sob tais condiyoes eram absolutamente inevitaveis os acontecimentos que preconizavam

uma desint&gra<;:iio: Schlemmer desligou-se da Bauhaus em 1929, Klee em 1931, e em

Kandinsky cresceu uma forte hostilidade com rela91io a Hannes Meyer. Apesar de o sentido da

ideia b<isica da Bauhaus ter sido cerceado pela ac;:iio de Meyer, niio h1i que se negar que nos

anos 1928 a 1930 a Bauhaus trabalhou com insupenivel eficiencia do ponto de vista da

produyiio e da economia"20

19 BENEVOLO, Leonardo; Hist6ria da Arquitetura Modema; p. 416 20 WICK, Rainer; Pedagogia da Bauhaus; Ed. Martins Fontes; SP, 1989; p. 57

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33

Todavia, esse distanciamento e responsavel pela diluiyao do projeto inicial da

Escola de ligar o pensamento artfstico a industria, que era sua fon;a motriz. Se

em cada produto da Bauhaus ate entao havia uma id€Ha articuladora dos

processes intelectivos das Novas Tecnologias e da Arquitetura, o

distanciamento da produ9ao do pensamento artfstico dos objetos faz com se

per'ca a no9ao de design, por se valora apenas a parcela quantitativa que e possfvel pela industrializayao, sem considerar sua influi'mcia qualitative na

reordena9ao conceitual dos novas produtos.

Em 1930 Meyer e demitido pelo Prefeito de Dessau, Fritz Hesse, acusado de

incentivar celula comunista na Escola e apoiar a mineiros em greve. Nesse

periodo, mesmo Gropius, que o havia indicado, esteve por tras de sua

demissao, temendo que suas posic;:oes polfticas afetassem o prestigio da

Bauhaus.

Mies van der Rohe, arquiteto ja internacionalmente conhecido pelo projelo do

pavilhao alemao na Exposi9ao lnternacional de Barcelona em 1929, assume a

dire9ao, nao se preocupando tanto com a produ9ao em massa dos objetos da

Bauhaus, mas sim com o carater pedag6gico da Escola", priorizando sempre a

arquitetura. "A Bauhaus foi transformada numa escola de arquitetura ao qual

um pequeno numero de atelies se encontrava associado."21

Em 1932 os social-democratas safram derrotados das elei96es municipals em

Dessau, e a Bauhaus foi obrigada a abandonar a cidade. Num ultimo suspiro,

buscou se estabelecer como instituic;:ao privada em Berlim-Steglitz, ocupando o

ediffcio de uma antiga fabrica. Com o aumento do poder dos nacional­

socialistas, a Escola era alvo de constantes acusac;:oes de ser um reduto

bolchevista e comunista, e sofria com repressoes da polfcia, SS e Gestapo.

Com a retomada da estetica romantica como revalorizac;:ao polftica da

Alemanha, os nazistas, quando tomaram o predio da Bauhaus em Dessau,

21 DROSTE, Magdalena; Op Cit, p. 206

Page 35: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

34

sobrepoem "urn telhado inclinado, segundo a 'tradiyao nacional germanica', as

coberturas planas do ediffcio de Gropius; desejava-se fazer desaparecer ate

os vestfgios do abominavel 'internacionalismo' da Bauhaus" 22.

Durante a ocupayao do ediffcio da escola em Dessau pelo Ill Reich, ele serviu

de fabrica para os avioes Junkers e alojamento para o staff de Speer, alem de

escola regional para os Jfderes nazistas. Em 20 de julho de 1933, num

ambiente crftico financeira e politicamente, os mestres da Escola, liderados

por Mies, aprovaram a auto-dissoluyao da Bauhaus, representando "urn

exerdcio final da liberdade intelectual de escolha"23

Em 1945, o ediffcio de Dessau pegou fogo e a conservac;:ao da memoria da

Bauhaus foi deixada de !ado pela Alemanha, ate que foi considerado

monumento hist6rico em 1974.

1.3 Arte & Industria: XIX I XX

A industrializayao que ocorria em diversos pafses europeus desde o seculo

XIX foi motive de preocupac;:ao dos movimentos artfsticos que ocorreram na

Jnglaterra, ltalia, Russia, Alemanha, etc, tomando a 16gica fabril em graus

diferentes, tanto pelo seu aspecto formal quanto pelas mudanc;:as que

proporcionavam a sociedade.

Alem dos processes industriais que transformavam as rela9oes de produyao e

trabalho, havia tambem a crescenta cria9ao de materiais produzidos

industrialmente, e cada vez em maior escala. Os avan9os da siderurgia

propiciavam a substituic;:ao do ferro-gusa pelo a9o, a invenyao do dfnamo em

1869 deu maior aproveitamento a energia eletrica, em 1876 e criado o

telefone, em 1879 a lampada eletrica, e em 1885 o motor a explosao, utilizado

em navios, autom6veis e, a partir de 1903, em avioes.

22 ARGAN,Giulio Carlo ; Walter Gropius e a Bauhaus; Ed Presen<;;a, Lisboa, 1984; p. 31 23 DROSTE, Magdalena; Op. Cit., p. 236

Page 36: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

35

Os novos materiais e/ou a produ9ao maci9a deles, como o ago, o vidro e o

concreto armado, redirecionam as discussoes arquitetonicas, com a criayao de

novos elementos, que se tornaram paradigmas da arquitetura Moderna:

coberturas transparentes, grandes estruturas, vaos livres maiores e balanyos.

Tambem sao novos os temas dessa sociedade industrial e urbana emergente:

pontes, ferrovias, metro, galpoes industriais, estayoes e rodovias redefinem o

can:\ter dos grandes projetos, antes restritos aos monumentos publicos.

Deslocados de simbologias mfticas ou hist6ricas que, no mais das vezes,

distinguiam o poder dos soberanos, os novos grandes projetos simbolizam a

nova vida moderna, locada nas grandes cidades, cada vez mais industriais.

Em rela9ao as mudangas sociais, as formas de produ9ao mec€mica

instauraram novas concepyoes de trabalho e, consequentemente, de moradia,

lazer, cultura, etc. Giulio Carlo Argan pontua esse perfodo como sendo o

nascimento de urn novo campo no estudo das cidades: o urbanismo.

Oriundo da convergencia de disciplinas como sociologia, economia e

arquitetura, "nasceu da necessidade de enfrentar metodicamente os graves

problemas determinados pela modificagao do fenomeno urbano, devido a

'Revolu9ao Industrial', e pela consequente transformagao da estrutura social,

da economia e do modo de vida"24. E preciso lembrar que, com a

industrializagao, as cidades aumentam, alem de surgirem novas, devido a urn

crescenta exodo rural que ocorreu em varios paises. Tambem ha novas

necessidades sociais e profissionais, vinculadas a novos espagos, como

escrit6rios, estagoes ferroviarias, edificios industria is, etc. Ha tambem carencia

no setor habitacional, com a formayao de uma nova classe social, o

proletariado.

Urn contingente populacional crescenta invadia as cidades, e nao havia como

se adaptar as estruturas das antigas cidades burguesas: inicia-se, no campo

24 ARGAN, Giulio Carlo;Op. Cit.

Page 37: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

36

da arquitetura, pesquisas te6ricas e praticas para o equacionamento desses

problemas tfpicos da sociedade industrial moderna.

A preocupac;:ao com os espayos das novas cidades estende-se a varias

manifesta~toes artfsticas, como o cinema. Em 1927, Fritz Lang, que havia

estudado arquitetura, fez o filme "Metropolis"25, onde trac;:a um possfvel perfil

da ·megal6pole industrial e totalitaria, com a maquina tomando o Iugar dos

homens e propiciando uma nova forma de tirania, onde os poderosos vivem

nas alturas e os outros seres humanos, como escravos, habitam os

subterraneos, recebendo ordens atraves de maquinas.

Contudo, trabalhos no campo da arquitetura e do urbanismo veem a

problematica por outro aspecto. As novas Tecnologias !razem informa~toes

inovadoras ao contexte urbana: rompem-se velhas estruturas sociais e formais

das cidades, transformam-se habitos e criam-se outros; e todas essas

oscilac;:oes refletem-se e sao questionadas em todos os campos culturais. Se

ha novas problemas a serem resolvidos, ha tambem novas elementos a serem

absorvidos e trabalhados em todas suas potencialidades. Pontua-se em toda a

Europa grupos e movimentos que, de diferentes maneiras, questionam e

propoem dialogos entre as Tecnologias lndustriais e a Arquitetura.

A Bauhaus representa o apice desses processes de traduc;:ao entre processes

tecnol6gicos e a arquitetura do infcio deste seculo. Contudo, houveram

movimentos precedentes que foram importantes para a consolidac;:ao dos

trabalhos da Escola e de Gropius, seu fundador. Ele mesmo enumera algumas

de suas influencias26, como a Uga de Oficios Alemti (Deutscher Werkbund),

com o apoio de Peter Behrens, com quem Gropius trabalhara; Otto Wagner,

com a construc;:ao da Caixa Econ6mica Postal em Viena, Austria; Sant'Elia e o

futurismo italiano iniciado em 1913; e mesmo o arranha-ceu de tijolos

construfdo par Root em Chicago, EUA, em 1883.

25 LANG, Fritz; Metropolis; Alemanha, 1927 (Filme) 26 GROPJUS, Walter; Bau/Jaus: Novarquitetura; Ed Perspectiva; SP, 1977 (33 Ed)

Page 38: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

37

Houve tambem o movimento ingles Arts and Crafts, na lnglaterra, notado pelos

crfticos como ponte importante para a compreensao das relagoes entre arte e

industria. Para isso basta atentar a evolugao industrial na Europa: a lnglaterra

foi o bergo e incentivadora de mudangas industriais profundas e contfnuas,

enquanto a Alemanha, com forte cultura artesanal, tardou seu avango

tecnol6gico.

0 historiador da arquitetura G. C. Argan 27, por exemplo, coloca a Werkbund e

o Arts and Crafts como os dois fundamentos iniciais da Bauhaus, como

exemplos de artes "menores" ou "aplicadas" posicionadas contra a arte "pura",

exclusivamente formal, de idealismo estetico. Elodie Vitale, reportando as

influencias de Gropius nos trabalhos desenvolvidos na lnglaterra coloca, alem

do Arts and Crafts mais dois nomes: John Ruskin e William Morris. De Ruskin,

observa similaridades na tentativa de "sfntese das artes sob a egide da

arquitetura e da unificagao entre as artes e o artesanato"28; e de Morris ha a

apropriagao das "artes menores" e a pesquisa com processes fabris e

diferentes materiais, com relevo do artesanato. Exatamente essa importi'!mcia

do artesanato como aproximagao aos metodos industriais na lnglaterra que faz

surgir diversas sociedades que trabalham com vies artfstico, entre elas o Arts

and Crafts, criado em 1888 pelo proprio Morris.

Esse movimento foi importante em ambientes culturais de toda a Europa,

inclusive na Alemanha, onde influenciou a criagao, par Hermann Muthesius,

em 1907, do Deutscher Werkbund, "organizagao que !eve por fim munir

artistas, artesaos, industriais e comerciantes a fim de melhorar a qualidade do

produto manufaturado"2"- Nesse mesmo ana, Peter Behrens liga-se a industria

eletrica AEG (Allgemeine Electricitatsgesellschaft) como consultor de design

para "tudo que a AEG construfsse, fabricasse ou imprimisse. E a AEG nao era

a unica a fazer isso ... "30

27 ARGAN, Giulio Carlo; Op. Cit. 28 VITALE, Elodie; Op. Cit., p. 13 29 Ibidem., p.14 30 BANHAM, Rayner; Teoria e Projeto na Primeira Era da Maquina; Ed. Perspectiva; SP, 1979

Page 39: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

38

Na Werkbund iniciaram-se pesquisas que levavam em conta a padronizar;:ao

dos produtos, buscando distanciar-se dos objetos artesanais personalizados: a

arte como produto de uma colaborar;:ao de ideias e esforr;:os. isso ja prenuncia

a tentativa de lndependt!lncia entre a ldeia do objeto e sua produr;:8o direta,

ligada a industria, onde a intervenr;:ao do artifice seria extinta, onde os

problemas, tanto de utilidade como do material, tecnica ou economia

pretisavam ser resolvidos a priori: "A maquina nao faz mais do que receber e

multiplicar a marca da idear;:ao ... 31 Porem, como se ve pelas propostas da

Wekbund, tal idear;:ao levava a maquina em conta apenas em seu carater

quantitativa, pois a "ideac;:ao" esta ainda preocupada com o artesanato, que

seria a matriz intelectual e artfstica dos produtos.

Arquitetos como Walter Gropius e Mies van der Rohe, que seriam per;:as-chave

da Bauhaus e de toda a Arquitetura Moderna, formaram-se na Werkbund.

Mesmo estando em um outro contexto, e preciso lembrar que enquanto esses

movimentos ocorriam na europa, nos Estados Unidos, o americana Frederick

W. Taylor propunha metodos revolucionaios para o trabalho industrial de

linhas de montagem e que, mesmo antes de 1914, algumas companhias

alemas ja utilizavam processos semelhantes.

Ap6s a Primeira Guerra Mundial, quando o ritmo das construr;:oes decrescera,

havia uma situac;:ao economica, social e tecnol6gica profundamente alterada.

Com a retomada dos trabalhos na industria, a classe operaria cresceu

violentamente nos centros urbanos, cada vez mais politizadas e conscientes

de seus direitos. Os problemas urbanos pensados antes da Guerra como

projer;:oes para o futuro tornaram-se integralmente presen!es e de extrema

gravidade, com preocupar;:ao pelos aspectos higii'micos, politicos, psicol6gicos,

sociais e funcionais: a cidade era um organismo produ!ivo que precisava

liberar-se de qualquer impecilho; e sua classe hegem6nica eram os operarios,

muitos dos quais oriundos do carnpo, com necessidade de moradia, mas

31 ARGAN, Giulio Carlo; Op. Cit., p.26 -·

Page 40: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

39

conscientes da opressao das defici€mcias da cidade-fabrica do final do seculo

XIX.

"A sociedade dernocratica nao tern classes, tern apenas func;;oes; todas as func;;oes sao

igualmente neoessarias; ala a lnll\llramenta oon$tllufda de comunioac;:oes, mas as

cornunicayoes niio descem do alto, e sim circularn"32•

E esse o contexto social, marcadamente industrializado, com reflexos no modo

de vida de todos os citadinos, que Gropius se forma arquiteto e langa suas

propostas arquitetonicas, preconizando o uso de elementos pre-fabricados

industrialmente nos objetos arquitetonicos e que, expandindo-se tal 16gica,

aplicar-se-ia a construyao das cidades provenientes da civilizagao industrial.

A situagao das cidades, reconstruidas em seus aspectos sociais e formais,

aliada a fabricagao de novos materiais, como o concreto armado, Iigas

metalicas e paineis de vidro, foram responsaveis pela redefinigao conceitual

da Arquitetura: a funcionafidade tornou-se explicita, e mais, tornou-se o mole

do pensamento arquitetonico. Vitorio Gregotti observa que a carga estetica dos

objetos passa de simbolismos para as fungoes: "A mac;:aneta nao pode mais ter

a forma de uma cabega de leao ou de uma flor-de-lis porque sua carga

estetica e precisamente a expressao de sua maqanetafidade"33

Na Bauhaus a funcionalidade nao apenas se reflete em seus objetos, mas

passa pela sua estrutura didatica, direcionando as oficinas a aproximag6es de

industrias, que vieram a produzir e comercializar seus produtos.

Aos poucos, essas inteng6es se ampliam ao domfnio dos equipamentos

domesticos a propria arquitetura, passando pelos veiculos, roupas, produtos

de uso diario, embalagens, espetaculos, ate envolver toda a Cidade. 0

urbanismo se instaura nessa era de circulac;:ao de informac;:6es diversas, e o

meio de circulagao e a cidade, e tais informag6es sao elementos de dialogo

32 ARGAN, Giulio Carlo; Arte Modema; Cia das Letras,SP.1993, p.270 33 GREGOTIJ, Vittorio, Territ6rio da Arquitetura; Perpectiva, SP,1975;

Page 41: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

40

entre fungoes: os veiculos dialogam com a ruas; estas com os novos edificios,

etc.

Sendo que todas essas informag6es sao mediadas pela industria, isso se

refletira na concepgao dos centros urbanos: "o plano urbanistico de uma

grande cidade e o desenho industrial, da mesma forma que o projeto de uma

colher."34 Se o urbanismo, disciplina que estuda toda a cidade, contem a

essencia do desenho industrial, ha igual preocupagao com utensilios diarios

minimos, do mobiliario as embalagens; e a Bauhaus tratou-os como pegas

constituintes da sociedade industrial emergente: dialogos retroalimentadores

entre o microcosmo e o macrocosmo.

Na essencia desse dialogo das novas formas industrials de produgao em

massa para a constituigao do universo moderno, esta a ideia de

estandartizar;ao.

A nogao de standard, tipo reproduzivel em serie, instaura-se com as

tecnologias industriais do inicio deste seculo, colocando a possibilidade de

reprodugao infinita a partir de um tipo inicial que transfere todas suas

caracteristicas formals e conceituais para cada uma das reprodug6es. Argan

aborda essa questao como um paradoxa, pois, apesar da nogao de standard

sugerir uma repetigao mon6tona, o objeto, sem passar pelas mao do artesao,

mas partindo diretamente do projeto a produgao industrial, levaria o publico a

urn contato direto com o "valor ou qualidade da forma". 35 Assim, ha a

necessidade da resolugao total do objeto ja em seu projeto, que sera

reproduzido infinitamente. Penso que, a principia, essa proposta respeita ao

maximo o processo intelectivo de ideagao, transferindo suas qualidades

diretamente a cada uma das reprodugoes, guardando nao apenas

similaridades formais mas, em ultima insli'mcia, as qualidades intelectuais de

sua concepgao.

34 ARGAN, Giulio Carlo, Op. Cit., p.220 35 Ibidem, p. 38

Page 42: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

41

Em 1935, Walter Benjamin escreveu sabre a destituiyao da aura que envolvia

as obras de arte unicas na medida em que fossem reproduzidas infinitamente,

substituindo "a existencia unica da obra por uma exislencia serial" 36,

resultando "violento abalo da tradiy.!!o"37• Seu texto detem-se na folografia, mas

se tornou paradigmatico em quase todos os ambitos da produgao artistica que

se utilizam dos meios de produgao em serie. Se por um lado e valida essa

ideia se pensarmos nas reprodugoes de uma tela, onde existira sempre a tela

original e outras incontaveis reprodugoes - principalmente que se utilizem da

base de reprodugao industrial -, isso nao e aplicavel as artes que tecem seus

processes intelectivos de criagao em similaridade com essas mesmas

tecnologias industriais.

Pelo contrario, como escreve Benjamin,

"com a reprodutibilidade tecnica, a obra de arte se emancipa, pela primeira vez na hist6ria, de

sua exisU!ncia parasitaria, destacando-se do ritual. A obra de arte reproduzida e cada vez mais

a reproduyiio de uma obra de arte criada para ser reproduzida. ( ... ) Mas, no momenta em que

o criterio da autenticidade deixa de aplicar-se a produyiio artistica, toda a fungilo social da arte

se transforma. "38

Tal e o caso dos objetos da Bauhaus, como a cadeira Wassily, de Marcel

Breuer, e o edificio da Bauhaus-Dessau, de Walter Gropius, objetos de

diferentes escalas compostos de elementos produzidos industrialmente.

Gropius sempre buscou pesquisar os tipos reproduziveis industrialmente como

mote das oficinas da Bauhaus. Para ele,

"A existilncia de produtos padroes sempre caracteriza o apogeu de uma civilizagao, uma

selegao de qualidade e uma separa((ao entre o pessoal e o ocasional e o essencial e o

suprapessoal. ( ... ) e preciso opor-se a propaganda superficial e arrasadora, que

indiscriminadamente eleva todo produto industrial em serie a categoria de produto standard. "39

36 BENJAMIN, Walter; "A Obra de Arte na Era de sua Reprodutibilidade Tecnica" in Obras Escolhidas I; Ed Brasiliense, SP, 1987

37 Ibidem 38 Ibidem

39 GROPIUS, Walter, Bauhaus: Novarquitetura; Ed Perspectiva; SP, 1977; p.41 -·

Page 43: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

42

0 design industrial e a atividade que respondera questoes pertinentes a esses

novos objetos, frutos do utilitarismo, produyao medmica em serie. Todos

esses pontos sao notaveis ao se refletir sobre esses produtos: a migrat;:ao da

fruit;:ao dos objetos para um vies utilitario e sua forma de produt;:ao industrial

reestruturam a mensagem desses novos signos modernos. Gropius tinha

con'sciencia dessas transformar;oes e expunha-se abertamente, buscando a

radicalidade da problematica: "0 problema nao foi atacado pela raiz. A nova

meta seria a produr;So Industrial de casas de moradia, que seriam fabricadas,

nao mais no canteiro de obra, mas dentro de fabricas especiais em partes

iso/adas passfveis de montagem"40• Com partes isoladas sendo produzidas

industrialmente, e nao todo o edificio, pretendia abrir a possibilidade de se

"montar diferentes tipos de casas, assim como na construr;ao de maquinas

certas partes encontram aplicar;ao internacional em diferentes maquinas ... "41

Contudo, apesar do discurso contemporaneo de Gropius, alguns criticos, como

Winfried Nerdinger42, notam que OS metodos propostos pela Bauhaus ja

estavam em uso em alguns lugares dos EUA e que, quando Gropius foi dar

palestras em NY foi duramente criticado pelo que consideraram anos de atraso

em suas ideias. E em 1938, o arquiteto americana Frank Lloyd Wright, em

palestras em Londres, disse considerar a arquitetura de Gropius e de Le

Corbusier "uma escravidao do homem a maquina, que ele confrontava com

sua arquitetura Americana organica e democratica."43

Da obra da Bauhaus, destacarei dois objetos por considera-los sintese do

pensamento artistico embuido de questoes esteticas e 16gicas industriais,

desde o projeto a fabricar;ao: a cadeira Wassily, de Marcel Breuer, e o edificio

da Bauhaus em Dessau, de Walter. Gropius. Tomando objetos pensados e

produzidos em escalas aparentemente dispares, proporei analisa-los quan!o a

suas importancias como elementos sinteticos da produt;:ao arquitetonica frente

40 Ibidem 41 Ibidem., p.193 42 NERDINGER, Winfried; Walter Gropius; Bauhaus-Archiv + Busch-Reisinger Museum; Berlin

e Cambridge (EUA), 1985 43 Ibidem, p. 23

Page 44: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

43

aos meios Modernos de Jnformac;;ao, marcados pela preem€mcia da Revoluc;;ao

Industrial.

Page 45: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

44

I CAPiTULO 2

Marcel Breuer

Em sua formayao, o aluno da Bauhaus estudava com dais mestres: o Mestre

da Forma eo Mestre artesao, para que, de acordo como programa da Escola,

soubesse integrar o saber artfstico com o fazer artesanal para melhor projetar

objetos de acordo com os processes Industrials. Gropius, em texto escrito

entre 1935 e 1952, coloca essa necessidade por entender que nao havia

"artesaos que possufssem suficientemente fantasia para dominar problemas

artfsticos, nem artistas que possufssem suficientes conhecimentos tecnicos

para dirigirem uma sec;;ao de oficinas" 44. Era preciso formar uma gerac;;ao na

pr6pria Escola que rompesse essa dicotomia. Esses profissionais seriam os " ...

designer, que por seu conhecimento exato do material e dos processos de

trabalho estivessem em condic;:oes de influir na produc;:ao industrial de nosso

tempo".45

Marcel Breuer (1902-1981) parlicipa dessa gerac;;ao. Entra na Bauhaus em

1920, e em 1925 assume a nova oficina, que substitui a oficina de carpintaria:

a Oficina de M6veis. Breuer, como aluno, havia se dedicado aos m6veis de

assento, e dentro da oficina de carpintaria inicia um trabalho tecnico e

conceitual que se estendera por toda sua prodUI;;ao na Escola. Ainda em

Weimar, suas cadeiras guardam fortes influEmcias do grupo holandes De Stijl,

em especial as cadeiras de Rietveld, com seus jogos de linhas e pianos, e

autonomia dos m6veis como pec;:as artfsticas aut6nomas.

Pode-se destacar a pr6pria mudanc;:a de nome da Oficina de Carpintaria para

Oficina de M6veis como amadurecimento dos processo tecnol6gicos no ensino

da Bauhaus: se a primeira se dedicava a tecnicas com madeira, a segunda

abre possibilidade de experimentos com novas materials, alargando os

campos tecnicos e conceituais.

44 GROPIUS, Walter; Op. Cit; p. 40 45 Ibidem

Page 46: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

45

Essas transformay6es entre os domfnios tecnicos e conceituais tiveram inicio

com a entrada de Moholy-Nagy na Escola em 1923, dedicando-se

especialmente a cria9ao de luminarias para espa9os publicos e privados. Com

uso de metais, como cromo e aluminio, e vidro leitoso, Nagy produzia objetos

que prescindissem da marca do artifice, incorporando totalmente a 16gica de

produyao industrial. lsso representou uma "quebra fundamental com o

passado"46 que se alastrou por outras areas da Bauhaus. Outro fator essencial

na ruptura com o modo de constru9ao artesanal do objeto iniciado por Nagy foi

o trabalho conjunto que desenvolveu com industrias de luminarias com a

Kandem e a Osram, que propiciou a divulga9ao em massa de objetos

concebidos nas oficinas da Escola: em 1931 foram vendidas 50.000 luminarias

produzidas pela Kandem com design Bauhaus, o que representou inclusive a

sua independ€mcia finance ira.

Outro destaque da Escola e exatamente a Oficina de M6veis, dirigida par

Marcel Breuer. Envolvido com as transformayoes no pensamento arquitet6nico

propiciadas pelos novas materiais e processo tecnol6gicos, e ligado a Gropius

e Nagy, Breuer inicia uma serie de projetos de cadeiras utilizando elementos

construtivos modernos, notadamente tubas de a!(o, mais adequados as

possibilidades de produ!(ao industrial.

Assim a Bauhaus se aproxima de seu objetivo: ligar os trabalhos

desenvolvidos em suas oficinas ao universo industrial e comercial. Com a

constru!(ao do proprio ediffcio da Bauhaus em Dessau e a produ!(ao das

oficinas ligadas produtivamente a industria, OS proceSSOS de fabricayaO, a

16gica da maquina industrial assumia primeiro plano no trabalho de criayao de

objetos arquitet6nicos; e e esse limiar que distingue o trabalho da Escola das

produ!(6es contemporaneas que estiveram muito pr6ximas - como o

Neoplasticismo -, e a singularize dos movimentos precedentes - como a

Werkbund. E seu periodo mais produtivo e intelectualmente maduro, quando a

func;ao do objeto assume o primeiro plano e o modo de sua construc;:ao

explicita-se.

46 EHRLICH, Doreen; Tile Baullaus; Mallard Press; USA, 1991

Page 47: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

46

2.1 leitura da Cadeira Wassily

A cadeira Wassily, projetada em 1925 por Marcel Breuer e ate hoje produzida,

e o primeiro objeto desta reflexao sobre a intera~ao entre as Tecnologias de

lnforma~ao e Arquitetura. Os 70 anos da cria~ao de seu design, e a

continuidade de sua produc;:ao, atestam seu valor como tradu~ao da ideia de

stan'dard. Pode-se dizer que exista uma numero um, uma numero 104 ou uma

numero 1.073 da serie, mas nao se pode identificar a cadeira a partir da qual

todas e quaisquer sao reprodu~oes - com a carga pejorativa que pode-se

atribuir a esta palavra. Houve o projeto de Breuer que tratou a funr;ao da

cadeira e seu modo de produr;ao como elementos chave de seu processo

criativo, e por esses exatos motivos escolheu o material com sua forma minima

padrao: tubos metalicos, e desenhou (to design) o tipo da cadeira Wassily.

Esse tipo guarda todas as caracteristicas conceituais do processo intelectivo

de Breuer, mas nao serve de assento. logo, se detenho-me numa cadeira, que

tem como fun~ao primaz ser propicia ao ato de sentar, nunca houve a cadeira

Wassily. 0 primeiro objeto de reprodu9ao do design Wassily no qual se pode

sentar e igualmente valoroso quanta o que esta sendo produzido agora - e

ambos sao igualmente validos quanta a sua originalidade por remeterem a problematica artfstica que envolveu. sua concep~ao, que buscava ligar o

processo intelectivo criativo de um objeto ao seu processo de produyao

industrial.

Detendo-se na analise material da cadeira Wassily, pode-se destacar algumas

pe~as que sao capazes de nos remeter a sua ideia total. Atendo-se a seus

parafusos, responsaveis pelo encaixe de pe~as de tubas metalicos, que

moldados industrial mente formam a estrutura da cadeira: esses parafusos - um

dos possiveis fragmentos - indiciam um modo de encaixe, um modo de

constru~ao; tem-se esse elemento metonimico como um indice do processo

tecnol6gico que envolve a concep~ao do objeto. 0 parafuso e constituinte, do

mesmo modo que os tubos metalicos, da 16gica da tecnologia influente na

concep~ao da cadeira Wassily, que traz embutido em seu design todo o

Page 48: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

47

processo criativo de Marcel Breuer, que tem em considerac;ao uma proposta

de cunho estetico marcadamente industrial.

Por ser uma imagem de uma constru<;:ao mental, cada cadeira - da serie de

cadeiras possfveis de serem fabricadas - e uma sfntese da ideia Wassily. E

sendo que fundamentalmente seu processo de produyao parte de um tipo que

pode ser reproduzido infinitamente, o autor trabalha toda sua concepc;ao do

projeto neste tipo, distanciando-se da produc;ao material de cada exemplar.

Dessa maneira, esse tipo, em seu estrito senso ffsico, e molde do quai partin3

cada cadeira, constituindo num simbo/o do design Wassily, pois transmitira

suas caracterfsticas por contiguidade, sem passar, levando em conta o

processo de reprodutibilidade tecnica, pelo campo da ideia original.

Mas o que significa uma cadeira ? Ha comumente ligada a palavra e a ideia

que se tem de uma cadeira uma forma geral em sensa comum, que

retrabalhada diferenciaria um objeto cadeira de outro. No infcio deste sEkulo,

particularmente proximo a estetica romi!mtica, havia variac;oes de estilos na

produc;ao artesanal dos objetos, sem um questionamento de seus significados.

No trabalho de design de m6veis de Marcel Breuer, desde o infcio e colocado

em jogo o significado intrfnseco de cada determinado objeto. Partindo desse

questionamento, a cadeira tem como significado primeiro a ac;ao humana de

sentar. isso resgata a ideia motriz de sua exist€mcia material.

0 sentar e a funr;ao da cadeira, e esta funr;ao, encoberta por variac;oes

estilisticas ate entao, passa a primeiro plano. Retomando as oscilar;oes e

rupturas dos signos quando se opera metassignagens, o carater

imediatamente pragmatico da cadeira, o ato humano de sentar, assume seu

valor de significado, evidencia-se sua carga semantica. Ha a ruptura dos

c6digos do desenho da cadeira: seus signos nao sao primordialmente

estilfsticos, mas seus signos funcionais: ocorre migraqoes de seu eixo

pragmatico para seu eixo semantico.

Page 49: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

48

Esse deslocamento aponta para outra questao: se o sentar e a

mensagem/func;:ao da cadeira, rompendo com a hegemonia da mensagem

marcadamente estilfstica daquela epoca, , qual e a forma desse sentar, qual

seu desenho? Envolvido com os novos processes tecnicos, novos materials e

movimentos artisticos contemporaneos, Marcel Breuer tern os principios

tecnol6gicos como indicadores dos novos padroes esteticos: a articulac;:ao dos

melos e materials industrializados e matriz a ordenac;:ao sintatica do sentar.

Assim, a sintaxe da cadeira e essencial para explicitar seu significado.

Tubos metalicos, parafusos, tecidos sinteticos sao novos elementos que,

ordenados sintaticamente constituem a ideia do design Wassily. Contudo,

quando o usuario toma contato com uma Wassily sua propria elaborac;:ao

formal e elemento questionador do significado que se atribufa ate entao as

cadeiras, e sua fruic;:ao com essa nova forma de cadeira desperta

reconfigurac;:oes de seu uso, ora incorporando o pensado pelo designer, ora

requestionando-o, num processo de retroalimenlac;:ao que gera outras

oscilac;:oes e migrac;:oes de seus signos nos nfveis sintatico, semantico e

pragmatico.

Page 50: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

' • • • • • • • • • • P. Cooper, 1860

• • • • • • Coluna de Ar • Sintese do Sentar

A. Aalto, 1935 M.Thonet 1860

Cadeira Wassily/ 1 925

Arquilctura c TccnoloJias Industriais

Marcel Breuer

lncorporando as novas tecnologias ao projeto do mobili6rio, Marcel Breuer buscou no Bauhaus dar-lhe autonomia artfstica no sociedade industrial. A noc;ao de standard leva a todos os elementos produzidos as caracterfsticas intrfnsecas ao projeto, nao havendo interferencia do artesao. Placas de tecido sintetico e tubos met61icos: no caderia se materializa a coordenadac;ao entre os questionamentos esteticos e as tecnologias contemporaneas, reformulando sua produc;ao, func;ao e desenho.

Page 51: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

I CAPITULO 3

Walter Gropius

3.1 Bauhaus I Dessau

0 ediffcio da Bauhaus em Dessau e, sem duvida, o vertice das pesquisas

desenvolvidas na Escola, envolvendo desde a Oficina de Pintura Mural a de

Tecelagem. A ideia de integra<;:ao das artes e tecnicas buscada por Gropius e

todo o corpo da Bauhaus esta representado em cada detalhe do ediffcio. 0

projeto arquitet6nico e constituido da interdepend~ncia da estrutura regular

que sustenta as veda<;:oes, opacas ou transparentes; assim como a pintura

dessas veda<;:oes, que resignificam os ambientes; os m6veis, as Juminarias, e

utensilios de uso diario, como capos e talheres. A Bauhaus-Dessau funciona

como a sfntese das pesquisas arquitet6nicas da era maqufnica, pautada pela

produ<;:ao industrial e integra<;:ao, da idea<;:ao a execuc;:ao dos objetos, de

diferentes areas do conhecimento tecnico e artistico.

Neste trabalho, distancio-me um pouco das analises formais e hist6ricas de

autores como Giulio Carlo Argan, Leonardo Benevolo ou Rayner Banham,

entres outros, que sao referencias basicas a aproximac;:ao critica do projeto do

Ediffcio da Bauhaus-Dessau, para tamar outros pontos que considero

pertinentes nesta discussao sabre o dialogo entre as Tecnologias de

lnformac;:ao e a Arquitetura.

De um lado, pretendo buscar nos novas materiais empregados, ou os

diferentes usos de outros, a evidencia dos valores arquitetonicos do projeto,

funcionando tanto como signos auto-referentes, nao mais se escondendo sob

formas simb61icas, e, concomitantemen!e, como signos da Novarquitetura da

Bauhaus. E num outro momenta, o emprego da estandardizaqao dos

elementos arquitetonicos, desde o design dos caixilhos dos paineis de vidro a estrutura do edificio, em malhas ortogonais de pilares, como o resultado da

busca de Gropius pela radicalidade das potencialidades dos tipos-standard

Page 52: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

51

produzidos em serie pela industria; e neste projeto, ao utiliza-los em todos os

ambientes, em todas as escalas, Gropius potencializa suas possibilidades

esteticas, premissa das artes da Era da Maquina.

A consolida9ao das ideias ligando o design a industrializayao, possibilitando a

construyao da sede em Dessau, tem um reves apontado por Rayner Banham,

para quem "os produtos e edificios projetados na Bauhaus tambem come9am a

exibir um Estilo Bauhaus reconhecivel e isso deve ser dito, mesmo que

Gropius e outros tenham negado a exist€mcia de semelhante coisa. ( ... )grades

de espa90, ... "47 Contudo, o proprio Banham nota que esses trabalhos sao

"contrlbulyOes genulnamente originals" a arquitetura lnternaclonal. Mesmo

tendo razao ao constatar a emersao de um "Estilo Bauhaus" , considero que tal

crftica e pautada por um anacronismo (texto de 1960), sem um

aprofundamento crftico hist6rico. Diversamente de uma nova moda, um novo

inv61ucro, muitas vezes preconizado nas decadas de 60/70, como nota Gillo

Dorfles, para o que chama styling48, penso ser mais pertinente colocar a obra

da Bauhaus desse periodo como a consuma9ao de ideias que amadureceram

dentro da Escola desde seu infcio; e mais, como sfntese das possibilidades

que um dialogo processual entre a cria9ao arquitetonica e as tecnologias

industrials, muito discutido e buscado desde a segunda metade do seculo XIX,

podem propiciar. A produ9ao da Bauhaus-Dessau chegou ao limite

contemporaneo de como as novas tecnologias poderiam estar presentes

intrinsecamente na produgao arquitetonica, datando a Hist6ria da Arquitetura

Moderna, e apontando os novos rumos que seriam trilhados.

Num mundo em crescente industrializagao, a Bauhaus foi o bastiao das

discussoes da arquitetura no mundo moderno, e, mais que uma finalizagao,

escorando num estilo, com a carga negativa atribufda por Banham, , considero

sua produgao como a sfntese das inquietagoes arquitetonicas no universo

maqufnico: " ... era um rigoroso exercicio no metoda industrializado. Nao era

apenas aparencia. Era o sistema em processo"49

47 BANHAM. Rayner: Teoria e Projeto na Primeira Era da Maquina; Ed. Perspectiva; SP, 1979 (2a ed .) : p. 463

48 DORFLES,Gillo; 0 Desenho Industrial e a sua Estetica; Ed. Presen<;:a; Lisboa, 1984 49 FRY, Maxwell; A Arte na Era da Maquina·, Ed. Perspectlva; SP, 1976

Page 53: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

52

Os blocos da nova sede da Bauhaus compreendem basicamente a Escola

Tecnica de Dessau e laborat6rios, ligados por uma galeria ao edificio

administrative; em outro bloco estao o refeit6rio, sala de reuni6es, atelies e

laborat6rios, os estudios e alojamentos dos alunos.

3.2 Leitura Do Edificio Da Bauhaus - Dessau

0 ediffcio da Bauhaus-Dessau exclui os pianos obliques ou curves, e suprime

toda a forma de ornamentac;:ao simb61ica. Basicamente composto por jogos de

Ls, eles sao simples ou compostos, de dimens6es diversas e posicionados

tanto na horizontal quanta na vertical. Giulio Carlo Argan50 faz analogia desses

elementos da mecanica da alavanca e da biela, o que, metaforicamente,

aproximaria as preocupac;:6es de Gropius com a industrializac;:ao. Mas M

pontos a serem resgatado no projeto que traduzem tal ligac;:ao passando ao

largo das metaforas e detendo-se em cortes metonimicos do projeto.

A ideac;:ao no plano da prancheta perde Iugar para a concepc;:ao espacial, que

deixa de envolver o pensamento em planta a qual correspondem como um

desenvolvimento imediato de sua projec;:ao vertical. 0 trabalho de Gropius

abandona as regras de proporc;:oes classicas entao muito empregadas na

arquitetura para trabalhar com linhas, pianos e volumes, sempre com angulos

retos que, reordenados, transformam os espac;:os.

Ha um jogo de remetencias de um bloco para outro, com o emprego diferentes

alturas e com volumes opacos e pianos de vidro, estando diante de um bloco

vislumbra-se outro, atraves de transparencies e partes de outros blocos que

cruzam a vista. Aliado a isso h8 o jogo de blocos em L na horizontal e vertical,

enfatizando a necessidade de se apreender a obra percorrendo por diversas

direc;:6es e velocidades. Um ediffcio de uso escolar, mas cruzado por uma via

50 ARGAN, Giulio Carlo; Walter Gropius e a Bauhaus; Ed Presenc;a, Lisboa, 1984

Page 54: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

53

expressa, potencializa essa possibilidade de deferentes formas de apreensao,

tanto a pe como de carro. E, talvez mais sintomatico no que se refere aos

novos meios de transporte interferindo na apreensao e concepc;:ao do projeto

arquitetonico sao os desenhos e fotos da Bauhaus que enfatizam as vistas

superiores do edificio. Gropius, assim como Le Corbusier, afirmara que a partir

de entao os predios deviam considerar que as cidades seriam vistas do alto,

dos 'avi6es, e que isso seria determinante na concepc;:ao dos projetos.

No trabalho com os volumes e pianos, Gropius procurou resgatar dos pr6prios

materials empregados suas possibilidades esteticas, nao mais como materia

pronta a ser forjada na construc;:ao de formas simb61icas, mas dizendo-se a si

mesmos e assegurando clareza ao jogo de formas puras: pontos, linhas,

pianos e volumes.

Ao ver as imagens do ediffcio, o que mais se nota sao os paineis de vidro e as

superficies e volumes brancos. Leonardo Benevolo51 observou a importancia

da utilizac;:ao do reboco branco para dar destaque aos valores geometricos das

formas do predio. E M outros aspectos a serem observados: durante o dia,

com a luz solar, a luminosidade refletida pelas parades brancas possibilita um

jogo de luzes e sombras sobre o jogo dos volumes. Todos os elementos que

se destacam do edificio, como platibandas, sacadas, escadas e marquises,

projetam-se fisicamente para fora do corpo do edificio, ao mesmo tempo que

se fixam com pianos de sombra em suas parades claras. E as diferentes series

de vidrac;:as ou os grandes paineis de vidro parecem mais escuros a luz do sol

que incide no branco, o que faz que se destaquem com o negativo,

destacanco pianos, faixas lineares e pontuac;:oes rftmicas.

Dentro do predio os valores se transformam: as parades impedem a entrada da

luz, enquanto as aberturas possibilitam que a riqueza do jogo de claridades e

sombras dos volumes externos invada o ediffcio. E a noite, no lado externo,

novamente o jogo se inverte: as parades se apagam, enquanto, pelos espac;:os

51 BENEVOLO, Leonardo; Hist6ria da Arquitetura Moderna; Perpectiva; SP, 1976

Page 55: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

54

internos que estao sendo utilizados, ora o refeitorio, ora os estudios, ora os

alojamentos, vaza luminosidade.

Ainda em relayao as parades opacas e transparentes, as quest6es

tecnologicas sao fundamentals. Gropius liberta as parades de seu car<~ter

estrutural: uma malha regular de pilares feitos em concreto armada, produto

que' comec;:a a ser usado em escala industrial, sustenta toda a estrutura do

edlficio; e utllil!!ando-se dessa matriz Gropius distrlbul os pianos opacos ou

transparentes., que da maior liberdade ao projeto, evidenciando a ligac;:ao com

a moderna industria da construc;:ao civil. Por esse mesmo motivo pode-se

observar a riqueza da distribuic;:ao das placas de vidro: ora locadas em

diferentes seqOencias, ora com longas faixas, ora constituindo toda uma

parede, com aproximadamente nove metros de altura, sao possibilidades

oriundas das tecnologias empregadas no fabrico do vidro e no de perfis

metalicos, desenhados na propria escola, que possibilitam essas varia96es.

Nas sacadas, corrimaos e, principalmente, na constituiyao dos ambientes

internes, urn dos mais importantes indices do dialogo entre as novas

Tecnologias e a Arquitetura se manifeste, nas luminarias, cadeiras,

mal(anetas, etc. No ediffcio da Bauhaus h8 urn emprego macic;:o de elementos

construidos com tubos metalicos. A mesma tecnologia empregada no

mobiliario de Marcel Breuer da Iugar aos elementos mais simples do edificio,

como os corrimaos, guarda-corpos, trilhos para luminarias, e quase todo o

mobiliario, com tratamento que explicita sua materialidade: o tubo metalico diz­

me como tubo metalico, e de acordo com o projeto industrial de Gropius, ele

assumiu diferentes fun96es no ediffcio da Bauhaus-Dessau.

Outro ponto que considero importante para demonstrar o dialogo

Tecnologia/Arquitetura por Gropius na sede da Bauhaus e seu trabalho com

elementos standard. A propria malha de pilares, que me referi para ressaltar a

distribuil(ao livre dos pianos opacos e transparentes, tern a potencialidade de

remeter a outro ponto das novas tecnologias pesquisadas por Gropius. Usando

de urn unico elemento, o pilar, que assume, com as vigas, toda a carga

Page 56: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

55

estrutural da arquitetura, Gropius comp6e com ele malhas com diferentes

espac;:amentos que se ligam numa matriz estrutural, onde serao anexadas os

pianos e volumes. Assim , a propria composic;:ao serial dessa matriz que

guards espac;:amentos comuns, pode ser um fndice formal da origem de sua

produc;:ao: a produc;:ao industrial mecanica de produtos em serie - tecnologia

essa que realmente foi utilizada na construc;:ao dos pi lares.

Pensando que Gropius partiu com a intenc;:ao de trabalhar as novas Tenologias

lndustriais na Arquitetura, a estrutura mesma do predio da Bauhaus-Dessau e

um icone dessa intenc;:ao, por trazer consigo a possibilidade de se identificar

um diagrams formal das ideias de Gropius em relac;:ao a Arquitetura e

Industria.

Do mesmo modo pode-se analisar os pianos transparentes. Tanto os conjuntos

seriais de pequenos paineis, como as longas faixas ou a grande parede

envidrac;:ada estao primeiramente apoiadas em outro elemento: o caixilho

metalico. Observando todas essas variac;:oes de transparencias do ediffcio

percebe-se que eles partem de uma mesma estrutura minima, que e entao

ordenada das mais diversas maneiras, compondo matrizes estruturais que

possibilitam atingir resultados formais significativos. Esse elemento mfnimo e o

caixilho metalico desenvolvido para esse projeto e produzido industrialmente.

lsso, mais uma vez, resgata a ideia da 16gica da produc;;ao industrial em

objetos em series ser fonte alimentadora de composic;;Oes esteticas de objetos

arquitetonicos. Com isso, tomando-se cada caixilho tem-se a remetencia a toda essa nova concepc;;ao da arquitetura, fundada sobre as possibilidades de

diillogo entre as Novas tecnologias de lnformac;;ao - a industrializac;;ao Moderna

- e a Arquitetura.

Page 57: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

Planta Superior

Arquilclura c TccnolO'.,;ias lndu slriais

Walter Gropius

Um jogo de Ls duplos, verticais e horizontais, comp6ema arquitetura do predio do Bauhaus em Dessau. Walter Gropius concebia a escola Bauhaus como multipacetada em

Planta Terrea tecnologias, mobili6rios, tape<;::arias, utensflios e demais

BAUHAUS - Dessau, Alemanha, l 926 elementos desenvolvidos pelos seus atelies. Esse ediffcio possibilitou que se colocasse em pr6tica, num grande projeto, o ideal do escola de, coletivamente, explorar as novas possibilidades que as tecnologias contemporaneas trariam a cria<;::ao

Ediffcio no Contexto Atual - 1996

Page 58: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

Arquil.clura c Tccnolozias lndllslriais

Walter Gropius

BAUHAUS - Dessau, Alemanha, 1926

Page 59: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

PARTE B

TELE-TECNOLOGIAS E ARQUITETURA

Page 60: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

59

I CAPiTULO 4

0 Contexto Mundial P6s-Guerra

A Segunda Guerra Mundial envolveu avan9os tecnol6gicos que foram

desenvolvidos durante o combate, e tecnologias anteriores que ganharam

for9a e autonomia durante o conflito. Um grande numero de imagens que nos

lembramos desse periodo sao tomadas aereas feitas de avioes; estes, por sua

vez, transformaram-se enormemente com o incremento da engenharia

aeronautica. Transmissoes radiofonicas foram utilizadas como meio de trocas

de informa96es estrategicas pelas partes envolvidas,; e diversos materials

sinteticos foram desenvolvidos para armamentos. Todos isso foi diretamente

vinculado a batalha, mas em seguida os substrates desses avan9os

tecnol6gicos foram penetrando e transformando o cotidiano da sociedade pes­

Guerra.

Mas e claro que a maior transforma9ao oriunda da II Guerra Mundial foi a

reordena9ao politica e economica internacional. Os EUA entraram na guerra

junto aos paises aliados e, com ajuda essencial dos sovieticos, derrotaram a

Alemanha - onde os nazistas comandavam o Eixo com a ltalia e Japao - e

finalizaram a batalha com as explosoes das bombas atomicas em Nagazaki e

Hiroshima.

Os paises europeus sairam da batalha destruidos, sobretudo Alemanha,

Fran9a e lnglaterra, e a vit6ria estava nas maos dos americanos - que nao

tiveram seu territ6rio bombardeado. Contudo, o aliado sovietico fora crucial

para a vit6ria, mas representava,_ ao mesmo tempo, o pais economica e

ideologicamente mais diferenciado possivel. Era preciso reconstruir a ordem

politica e economica na Europa, e uma das medidas mais marcantes no p6s­

Guerra para a hist6ria da segunda metade do seculo XX foi a dissolu9ao da

Liga das Na96es e a cria9ao da Organiza9ao das Na96es Unidas (ONU). Uma

das medidas tomadas foi a divisao politico/economica da Europa, onde o

Page 61: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

60

comunismo (sovietico) seria dominante em alguns paises (na Europa oriental),

e o capitalismo nos outros (Europa ocidental). De fato, isso significava a

soberania aberta do poder sovieticci sobre os pafses do leste europeu, e a

soberania calada dos EUA sabre os demais.

Em 1946 a ONU foi criada. Nesse mesmo ano os testes nucleares do atol de

Bikihi foram transmitidos ao vivo via radio para os lares americanos.

A reordenac;:ao politica mundial p6s-Guerra sera fator crucial no

desenvolvimento nas cidades e meios de informac;:ao na segunda metade do

seculo XX. Nao s6 os paises que se posicionaram logo em 1946 nos lados

sovietico ou americana por questoes diretamente vinculadas a guerra o

fizeram, mas em poucos anos quase todos os paises do mundo haveriam de

tomar uma posic;:ao bipolar entre as duas forc;:as emergentes. 0 mundo dividiu­

se em dois: capitalistas e comunistas, americanos e russos; e isso estruturou a

politica nos trinta anos seguintes. Os americanos haviam utilizado as primeiras

bombas atomicas no Japao, e sabia-se que a URSS (Uniao das Republicas

Socialistas Sovieticas) tinha a mesma tecnologia; e a utilizac;:ao dessas armas

significaria o aniquilamento mutuo das duas nac;:oes e, em poucos anos, a

possibilidade da destruic;:ao de todo o mundo diversas vezes.

Essa potencialidade armamentista e sintomatica para a reordenac;:ao do

mundo. A possibilidade da destruiqao de todo o mundo diversas vezes e o

ponto maximo que chegamos com o avanc;:o de uma tecnologia. Significa, em

certo sentido, que atingimos o absurdo, o inutil, talvez o ridicule. E impossivel

destruir qualquer coisa mais de uma vez, alem de nao servir para nada e, pior,

a palavra nao seria destruic;:ao, mas auto-destruic;:ao, o que lorna mais absurda

a possibilidade que o poderio tecnol6gico armamentista nos levou. Com isso,

essa extrema capacitac;:ao tecnol6gica para a guerra, fez com que termos

contradit6rios se igualassem: a vit6ria seria, ao mesmo tempo, a derrota. 0

medo profunda na quase proeminencia de uma outra guerra mostrou

exatamente seu contrario - era improvavel e inutil que uma nova batalha

Page 62: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

61

surgisse. 0 campo de batalha deixava de fazer parte de qualquer possibilidade

de conflito entre os dois adversario mundiais; contudo, a guerra nao acabara.

Ainda era necessaria - pensavam as duas partes envolvidas - aniquilar o

adversario, tirar-lhes o poder e tornar-se hegemonico. lniciou-se a Guerra Fria.

Foi uma epoca que nao se podia conhecer o adversario e muito menos

anaiisar suas estrategias no campo de batalha, simplesmente porque nao

havia um. As armas tecnol6gicas da Guerra Frla comeyaram a se distanciar da

p61vora ou da fissao atomica; e adquiriram caracterfsticas, campos de atua!(ao

e grandezas completamente distintas. Era ao mesmo tempo a criayiio de

microcircuitos que transformavam canetas em cameras e gravadores, e

projetos de conquista espacial.

Os anos que se seguiram foram a epoca da espionagem, dos agentes

secretes, da contra-informayao, do desenvolvimento e lan<;:amento de satelites

que fotografavam e enviavam informay6es a Terra, do projeto para a conquista

da Lua, dos circuitos fechados de video, das transmissoes intercontinentais de

televisao. Em 1961, enquanto a cidade de Berlim era dividida em uma parte

comunista (oriental) e capitalista (ocidental), determinando simbolicamente a

divisao bipolar global, as duas pot€mcias estavam lan<;ando satelites para

vasculharem e trazerem informa<;6es no espa<;:o sideral.

Tomando a ideia basica que ordena esta disserta<;ao, que e como as

transforma<;6es tecnol6gicas se relacionam com as !ransforma<;6es na

arquitetura, os anos de Guerra Fria foram responsaveis por transforma<;6es

radicais que reconfiguraram ou se entremearam as mudan<;as modernistas da

revolu<;ao industrial e que sao presentes no nosso cotidiano.

Para pensar quais foram e como essas mudan<;as constitufram o contexte

intelectual, urbano e artistico desse periodo, considero fundamental tomar em

discussoes algumas ideias de Marshall Mcluhan que, debru<;ando-se sobre os

meios de comunica~tao, procurou construir um panorama de como vem sendo

construida nossa percep!(ao, intera~tao e transforma~tao do mundo.

Page 63: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

62

I CAPiTULO 5

MARSHALL MCLUHAN

5.1 Contra e a Favor de Marshall McLuhan

Diretamente vinculado ao universo da literatura, sendo por muitos anos

professor em Cambridge, EUA, e um estudioso de James Joyce, McLuhan tem

seus primeiros trabalhos ligados ao poder da palavra escrita na forma.,:ao do

universo como o entendemos hoje.

Se num primeiro momenta o homem era plurisensorial, o desenvolvimento da

escrita e sua prevalescencia como a tecnologia de aproxima9ao e analise de

fatos, privilegiou nossa visao. McLuhan aponta que o desenvolvimento da

tipografia foi a grande transformadora da 16gica ocidental. Os tipos m6veis

compondo palavras, a estrutura linear da nossa linguagem escrita levada ao

extrema com essa nova tecnologia fez com que o homem mudasse sua forma

de relacionamento com o mundo, lendo-o e estruturando-o apenas desse

modo linear, proprio da forma utilizada nos livros impressos.

Contudo, antes de colocar as mudanyas que seriam consequencias da

tipografia sabre o homem, levantadas por McLuhan, e necessaria fazer

algumas ressalvas quanta ao te6rico dos meios de comunica<;ao. Houve,

quando seus escritos foram lan<;:ados, uma grande divisao entre os intelectuais

pr6 ou contra McLuhan; entretanto, e pouco provavel que haja qualquer

possibilidade de se pensar os meios de comunica9ao sem se passar pela

leitura de suas ideias, de forma que vejamos as transforma96es de meios

"antigos" com outra concep9ao e leiamos autores novos sabre meios

contemporaneos, como Pierre Levy, Nicholas Negroponte e Paul Virilio, como

uma sensa<;ao deja ter vista suas ideias em algum Iugar.

Page 64: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

63

Nao tenho intenc;:ao, neste trabalho, de fazer um estudo critico de todas as

ideias de McLuhan, nem de colocar e discutir os autores que foram contraries

as suas posic;:oes. Gostaria apenas de dizer que Mcluhan servira de estimulo

as discussoes que levantarei sobre a arquitetura na era da globalizac;:ao

televisiva, e s6 destacarei algumas ideias fundamentais que penso se

relacionarem a construc;:ao das cidades.

Apenas para apontar Ires casas de discordancias com ideias basicas de

Mcluhan, o numero de janeiro de 1996 da revista americana Wired', dedicada

ao universe digital e claramente filha de um universe mcluhiano, foi dedicado a

este te6rico. A revista levantou todos os livros por ele assinados, e com esse

material editou uma entrevista post mortem com perguntas que ele

"respondia" com ideias contradit6rias.

A denominac;:ao dos meios Quentes e Frios foi definida por Mcluhan em

diversos livros e artigos e continuou incompreendida, ou, na verdade,

reconhecida como inutil por varios autores, ja que, de acordo com o proprio

autor, povos com culturas distintas interagiam com os mesmos meios de modo

diverse. E Jonathan Miller' escreve que mesmo a ideia de que a linguagem

escrita seria linear e que sua hegemonia na cultura ocidental condicionaria

nossa forma linear de pensamento e errada, ja que experiencias psicol6gicas e

medicas provam que o olho, ao ler uma pagina, nao se detem no caminho

linear da ordenac;:ao das letras em sequencia, mas sim faz constantemente o

movimento dessa sequencia para o todo da pagina, sempre mantendo uma

noc;:ao visual do antes e do depois. Propoe tambem que e mais absurda ainda

a distinc;:iio que Mcluhan faz com a linguagem oral, que seria globalizadora,

expondo exatamente o contrario: utilizando de um equipamento tecnol6gico

entao recente, o gravador em fila magnetica, dizia que era possivel gravarmos

varias pessoas falando ao mesmo tempo e que todos os sons seriam

registrados na fila, de modo linear, e que mesmo para ouvi-Ja seria possivel

apenas com a leitura linear na fila, diferentemente do livro, que possibilita

pular linhas, paginas, e a volta de modo interativo.

1 Wired- Channeling McLuhan; 4.01, jan.1996; USA 2 MILLER, Jonathan; As ldtlias de McLu!Jan; Ed. Cultrix, Sao Paulo, 1982

Page 65: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

64

5.2 Da Universe linear ao Global

A concep9ao do mundo que temos, de acordo com Mcluhan, e ligada

diretamente ao uso e aprimoramento da tecnologia do tipo m6vel sobre nossas

formas de conhecimento, que transformaram nossa percepc;;ao do mundo tendo

a predisposi9ao da sequencia 16gica linear, da ordena9ao de fatos e eventos

atrelados a essa ordenac;;ao, e que com isso terfamos perdido a capacidade de

criarmos conexoes criativas e polivalentes de modo a abrangermos diversos

outros aspectos que fugiam a predominancia do nosso campo visual.

Viverfamos um perfodo em que a compreensao do mundo se da pelo

parcelamento, divisao e compartimentalizac;;ao de eventos e percep96es, sem

ligarmo-nos a ideia que, em verdade, cada evento poderia despertar-nos

diversamente de acordo com os estimulos que dao a nossos diferentes 6rgaos

sensoriais.

Antes do telegrafo, Mcluhan coloca que havia um la9o estreito entre a palavra

escrita e o deslocamento de informac;;oes via estradas. Escreve que o imperio

romano, entre outras coisas, devia-se a estrutura viaria uniforme construida

entre suas regioes importantes, e que nelas circulavam as mercadorias e as

leis escritas, que eram a ordem do imperador. Aponta que a crise no papiro foi

uma das causas da queda do imperio - pela impossibilidade de se veicular

informa96es escritas -, o que inviabilizou a rota segura pelas estradas, a

organiza9ao de exercitos e deu margem que o mundo medieval emergisse,

sem burocracias uniformes, exercitos imperiais ou estradas.

Ja com a palavra impressa, propoe que foi responsavel pela individualizayao

na culture moderna, fazendo com que as transmissoes de informac;;ao fossem

feitas em larga escala, mas que seu usufruto fosse feito individualmente pela

leitura - o que, ainda, teria feito prevalecer a visao sobre nossos outros

sentido. Seria a mesma 16gica da prensa tipografica, que haveria possibilitado

o surgimento e amadurecimento de na96es, quando ideias fundamentais

Page 66: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

66

Orson Welles sobre a invasao marciana a Terra, dizendo que surtiu efeito pelo

grau elevado de envolvimento proporcionado pelo radio, diversamente do

jornal; e tambem credita ao excelente uso da tecnologia radiofonica para a

ascens~o e poder de Hitler sobre os alem~es. Todavia, lembra tambem das

possibilidades de usos e reat;:oes contrarias que surgiram com a utilizat;:ao do

radio.

Sendo tecnologicamente (principalmente se pensarmos a relagao

investimento/numero de pessoas atingidas) mais barato e mais facil de ser

usado que a imprensa escrita, o radio foi brevemente disseminado por

inumeras pequenas comunidades. Se a escala do imprensa escrita era

nacional, o radio era local; e isso nao em termos de potencia de abrangencia -

pois senao, como o telegrafo, o radio iniciava o processo de envolver

diferentes continentes numa mesma informagao -, mas pelo fato de que

pequenos grupos religiosos, etnicos, politicos ou linguisticos, adquiriram a

possibilidade de terem equipamento de transmissao de informag6es e

livremente colocariam no ar suas mensagens para um grupo de pessoas que

estivessem interessadas em ouvi-las. Na India, como exemplificado por

McLuhan, ha doze linguas oficiais, e cada uma delas possui diferentes

emissoras de radio; e os israelenses fazem suas transmiss6es em lingua que

estivera morta por seculos.

Com isso, se a imprensa escrita possibilitara o surgimento da ideia de

nacionalismo, o radio reacendia a diferenciat;:ao local de pequenos grupos:

nao era necessaria filtrar dialetos e coloquialismos para chegar a linguagem

jornalistica, mas ao contrario, levar as diferentes linguagens, posig6es

ideol6gicas e politicas ao ar, mesmo que para pequenos grupos etnicos. E

pelo grau de abrangencia universal que algumas frequencias de radio tinham,

os aparelhos radiofonicos receptores tornaram-se tao perigosos quanto os

transmissores - pois que as vezes fora do alcance diplomatico de agao de

governos nacionais.

Page 67: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

67

Urn breve exemplo encontramos aqui no Brasil onde, com muita dificuldade

(economica e polftica) Roquete Pinto instalou a primeira emissora de radio do

pais, utilizando-se de loca9ao e equipamentos do exercito - resquicios da II

Guerra Mundial. Se ja fora dificil a instala9ao da transmissora, que era

unicamente educacional, estava Ionge o dia que as pessoas poderiam comprar

seus aparelhos receptores sem que fossem sondados, registrados e

fisi:::alizados pelas forl(as polfticas brasileiras. E isso acon!eceu justamente

quando a pequena diversidade de emissoras deixavam de !ado o cunho

educacional e jovens ligavam-se, em determinados horarios da semana,

apontando a antena para determinadas posi96es para ouvirem programas

europeus sabre o comunismo, criticas ao "imperialismo ianque", ou a famosa

Radio Albania.

As cidades, ao mesmo tempo em que ganhavam a possibilidade de

reflorescerem suas caracteristicas fmpares via radio, ao inves do pensamento

nacionalizante do jornal, ganhavam dimensoes intercontinentais e delas

recebiam influencias. Com o radio as informai(Cies de diversas partes do

mundo chegavam ao vivo e influenciavam as comunidades locais - urn exemplo

tipico era o movimento das balsas de valores. 0 radio inaugurava a dimensao

eletrica das cidades, proporcionando uma multiplicidade informacional e

reavivando a percep9ao auditiva que fora abandonada pelo jornal.

Alguns anos depois urn outro meio de informa9ao realmente revolucionario

transformaria definitivamente concep96es espaciais, polf!icas e temporais no

mundo. A primeira transmissao televisiva foi feita nos EUA, e urn ano depois

em Ires outros paises: Fran9a, Alemanha e Brasil - o que, clara, nao

pressupoe poderio e influencia informacional.

A televisao, envolvendo a palavra falada, outros sons quaisquer e a visao -

nao mais decodificada como a palavra escrita, mas aberta a uma diversidade

de estimulos - era urn meio envolvente, muito mais que o radio,

proporcionando participa\(ao ativa dos usuaries. Sem duvida, esta e uma das

posi96es mais controvertidas de Marshall Mcluhan; ao mesmo tempo, todos

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68

creditam a ele a grande teorizac;;ao do meio televisivo que ainda hoje paula

discussoes sobre o tema.

Para McLuhan, mesmo que a uniao· imagens em movimento e som fosse a

caracterizac;;ao do cinema, a TV trazia inovac;;oes contundentes. Entre as que

sao aceitas claramente e a possibilidade de transmissao ao vivo e

intercontinental - via satelites - das informac;;oes televisivas; e que inseridas no

cotidiano das pessoas, transforma-lo-ia diretamente, fazendo com que

informac;:oes de diferentes especies e oriundas de diferenles lugares fizessem

parte tanto da vida de um argentino quanta de um palestino.

Entre as ideias discutidas ferreamente esta a fatfdica divisao dos rneios frios e

quentes, onde a TV seria exemplo de meio frio por necessitar a participac;:ao do

usuario para formar as imagens, que seriam compostas de rnilhoes de pontos

luminosos e o usuario (seu aparelho 6ptico) selecionaria apenas algumas

duzias para forma-las. McLuhan diz que isso e perceptive! quando vemos que

a TV, diversamente do Radio, nao serve como pano de fundo, sendo

necessaria a interac;:8o com o usuario para construir sua mensagem

audiovisual, exemplificando com cenas de toda a familia em frente a TV,

olhando-a atentamente. Alguns criticos3 apontam que isso se dava nao por

uma caracterfstica intrinseca ao meio, mas pelo fato que as lransmissoes nos

anos 50 eram tao ruins que toda essa atenc;:ao era para tentarem distinguir os

fantasmas que apareciam na tela, e que, assim que isso melhorasse, ela seria

incorporada mais facilmente.

Discussoes a parte, McLuhan merece todos os creditos por diagnosticar a

envolvencia global que viria com a televisao, e como ela influenciaria na

construc;:ao do panorama politico e cotidiano no mundo. No universo da Guerra

Fria, a guerra sem campo de batalhas, as informac;:oes tornaram-se preciosas,

e sobretudo os americanos dedicaram-se bravamente ao desenvolvimento de

novos meios de comunicac;:ao; eles mesmos sofreram as influemcias que,

sabiam, as informac;:oes teriam. lsso lornou-se claro durante a Guerra do

3 STEARN, G. E. (org.); Pour ou Contre McLuhan; Ed du Seuil, Paris, 1969

Page 69: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

69

Vietna - urn dos poucos conflitos de campo que envolveram indiretamente o

Grande Conflito URSSxEUA .

Noam Chomsky4, ao analisar a era Kennedy e as consequencias da Guerra do

Vietnfi, lembra que em 1968, como pais ja desgastado externa e internamente

pela batalha, houve diversos protestos internes para a sua finalizac;;ao, o que

incluia desde de senhoras da alta sociedade ate os jovens de Woodstock.

Quando a TV americana iniciou a exibic;;ao de seus jovens soldados sendo

mortos e chafurdando no mar de lama que, de fato, os pr6prios americanos

criaram no Vietna. A panaceia que se seguiu reivindicando o fim da guerra e a

volta dos her6is amerlcanos para casa mostrou a influE!Jncia das imagens da

TV sobre a populac;:ao; e ao mesmo tempo reiterou e retirou razoes de

Mcluhan.

De urn lado, provava-se que o poder informacional da TV seria, como nenhum

outro, capaz de mover quest6es polfticas globais; de outro lado, a interac;;ao

entre os povos numa aldeia de interesses comuns, era falsa. Todos os

movimentos politicos, economicos e ideol6gicos em prol do fim da Guerra do

Vietna nao se preocupavam sequer urn instante com os vietnamitas, vitimas de

invasao atroz dos EUA, mas com o simples fato de quererem ver seus filhos

Ionge da guerra, de estancarem os gastos financeiros e politicos num conflito

distante e perdido.

Assim que os americanos sairam do Vietna, pouquissimo se fez para se

reconstruir aquele pais, destruido pelos americanos, e mesmo as

manifesta<;:Oes de paz global - tipica dos anos 60 - foram aos poucos se

emudecendo. 0 carater nacional era muito mais forte que qualquer

possibilidade de uma noc;;ao de urn mundo globalizado.

0 que poderia parecer uma concrelizac;;ao da Aldeia Global, com problemas de

povos distintos cultural, polflica e economicamente se interpenetrando,

escondia o seu avesso. Felizes que os seus voltavam a casa, o povo global

4 CHOMSKY, Noam; Camelot. Os Anos Kenneay; Ed Scritta; Silo Paulo, 1993 ~·

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70

americano nao voltaria as ruas com a mesma forc;a para exigir que seu

governo desse agora todo apoio para a reconstruc;ao da parte da aldeia global

que havia destruido. A televisao mostrava mas nao atuava retroalimentarmente

(feedback) nos eventos que transmitia.

Nessa evoluc;ao dos meios de comunicac;ao e as caracteristicas lineares e . globais que eles deram a configurac;ao no mundo, Mcluhan detem-se em

alguns outros meios, como telefone, carros, rel6gio. Mas para essa

dissertac;ao, vinculada as transformac;oes da Arquitetura atreladas as

Tecnologias de lnformac;ao, a discussao de duas ideias chaves de Mcluhan

que serao agora expostas e discutidas: o meio e a mensagem e a aldeia

global.

5.3 0 Meio e a Mensagem

A maxima 0 Meio e a Mensagem e talvez a mais conhecida e sintetizadora do

pensamento de Mcluhan. Para ele, "o meio e um conjunto complexo de

eventos que influencia populac;oes inteiras e age sobre elas. lsso muda suas

atitudes e suas aparencias."5 Mais importante que a mensagem veiculada, a

natureza tecnol6gica do meio e responsavel por essas transformac;oes. Para

desenvolver sua ideia no livro Understanding Media6, que foi balisador de suas

ideias, ele se utiliza sabiamenle da energia eletrica como esse meio sem

mensagem reestruturador de todo o mundo contemporaneo.

A luz eletrica, a nao ser quando ilumina um anuncio, e informac;ao pura, nao

trazendo um significado em si, e que sua mensagem e, na verdade, como

qualquer meio, as mudanc;:as de escala, ordenac;ao e padroes que introduzem

no universe. E no seculo XX, a eletricidade e o exemplo mais contundente que

era possivel levantar. Ao liquidar a sequencialidade intrfnseca as tecnologias

anteriores e tornar todas as coisas simultaneas, foi responsavel pela maior

5 MCLUHAN, Marshall; Mutations 1990, Maison Marne, Paris, 1969 6 MCLUHAN, Marshall; Os Meios de Comunicac;ao como Extensoes do Homem; Ed. Cultrix,

Sao Paulo, 1969

Page 71: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

71

revoluc;;ao deste seculo. Ela amplificou diversos de nossos sentidos, da fala a visao, e inserida em nosso cotidiano tanto para iluminar um ambiente -

rompendo a sequencia inexoravel de dia e noite - quanta para transmitir

informac;;oes televisivas, e a metafora tecnol6gica da amplificac;;ao de nossa

consciencia sabre o mundo.

Se as tecnologias anteriores estendiam nossos sentidos fragmentariamente, o

uso da energia eletrica vem potenciallzando meios tecnol6gicos inclusivos,

com o que podemos ter consciencia das causas e consequencias de ac;;oes

distantes espacial e temporalmente, que hoje se unem instantaneamente. A

tecnologia eletrica, ao inves de fragmentar, departamentalizar as percepc;;oes,

lorna-as concomitantes ou, como disse Mcluhan, retribaliza-as. Cria diversos

centres em localidades distintas, nao necessitando de um unico e grande

centro gerador de informac;:oes. Tudo chega em todos os lugares ao mesmo

tempo.

As transformac;:oes tecnol6gicas recriam nossas noc;:oes de lerril6rio e habitat,

que sao a base da arquitetura; e Mcluhan, vivendo num universe

polissensorial do circuitos eletricos, propunha que viviamos num mundo onde

as mudanc;:as territoriais seriam cruciais, a ponte de todas as lransformac;:6es

recentes - como a consolidac;:ao dos nacionalismos no seculo XIX - serem

implodidas. Acreditava que se a palavra impressa possibilitou a explosao de

nossa consciencia, exemplificando com a consolidac;:ao do Estados nacionais,

a era eletrica, notadamente da televisao, implodiria a nossa civilizac;:ao,

transformando-a numa Aldeia Global, onde todas as ac;:oes seriam

interdependentes e, com isso, viveriamos todos num territ6rio informacional

unico.

Page 72: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

5.4 Aldeia Global

72

Na era da e/etricidade, a pr6pria roda e obsoleta.7

Marshall Mcluhan

Hoje talvez seja esta a ideia de Mcluhan mais difundida nos meios de

comunleac;:ao de massa. A globallzac;:ao e palavra de ordem, ao mesmo tempo

que e um grande equivoeo eonceitual com as propostas de Mcluhan.

Ele propunha que a Aldeia Global seria constitufda pelos meios ultra-rapidos

de informayao a distancia - o que chamei de TeleTecnologias -, como radio,

telefone, televisao, que poderiam ligar povos do mundo inteiro em redes de

circuitos eletricos. Cada evento seria pertinente a todos, ja que a humanidade

estaria novamente organizada como uma tribo, uma tribo eletrica. lsso fez com

que, inseridos na rede de causas e efeitos, fatos e agoes, cada um de n6s nos

tornassemos responsaveis (ao menos conscientes) de todos os outros

problemas do mundo, misturando culturas de povos que conservavam

aspectos pre-hist6ricos com o universe mercadol6gico, povos iletrados com

centres de pesquisas espaciais.

Uma das caracteristicas propostas por Mcluhan era exatamenle a mudan<;:a do

mundo fragmentado por um universe organico onde todos os eventos se

relacionariam tecnologicamente. Nessa mesma epoca, Mcluhan convivia com

biologistas de Cambridge, EUA, que, desde os anos 30, estudavam a

estrutura do nosso sistema nervoso atraves de tecnicas de eletrofisiologia, que

deu impulse as ciemcias cognitivas; e e tambem desse perfodo OS livros de

Norbert Wiener" sabre a cibernetica, que estudava justamente a construgao e

analise de fenomenos como sistemas de partes interligadas que agiam

interativamente, e, aos poucos, foi aplicada tanto em matematica ou

7 Ibidem 8 WIENER, Isaac; Cibemetica e Sociedade - o Usa Humano de Seres Humanos; Ed Cultrix,

Sao Paulo, 1984

Page 73: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

73

instrumentos eletronicos, quanto em analises de jogos, poesia ou criticas

sociais.

Mcluhan achava que, nesse universo interligado eletricamente, haveria uma

mudan9a de adapta9ao do ser humano com seu meio ambiente, ja que todo o

unlverso serla agora para ele como sua "pequena aldeia", a Vila Planetaria. 0

ponto de vista individual cederia Iugar a consciencia do papel global de cada

um num universo sistemico e conectado eletricamente.

Essas transformayoes seriam tambem fundamentais no plano espacial da

cidades: para os meios eletricos de comunicayao, a configurayao do espayo

urbano seria irrelevante, ja que nossas extensoes eletricas contornam as

referencias de espayo e tempo, configurando novas possibilidades de

organiza9ao e movimento para a humanidade. Alem disso, o universo

informacional, descolado do universo territorial, interferia diretamente nas

cidades, sendo que referencias de culturas completamente distintas come9ava

a fazer parte do cotidiano urbano de outros povos, reformando e, em ceria

medida, homogeneizando estruturas urbanas aptas as novas lransmissoes de

informa9ao que ordenam o mundo.

5.5 Comando na Tribo Televisiva

lngressavamos na era da Globalizac;ao, na qual Mcluhan achava que as

diferen9as potenciais entre os povos poderiam ser vistas e se alimentariam

reciprocamente. Interessante mas falso.

Alem da chuva milionaria de pontos de luz que o telespectador deve organizar

em poucas duzias, Mcluhan se esqueceu de que e igualmente proprio a TV

que haja uma pessoa com uma camera na mao que capte as imagens de

determinado modo, que sua distribui9ao interplanetaria dependa de satelites

pagos - e portanto controlados - per alguem que fara que prevale9a seus

Page 74: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

74

interesses, e que haja publico com dinheiro para comprar um aparelho

receptor.

Esses pontos basicos na "natureza" da tecnologia televisiva estavam nas maos

da industria americana, portanto, nada mais "natural" e compreensfvel que eles

determinassem o que filmariam, o que distribuiriam, e o que assistiriam. E M

tambem um sedimento cultural que pesa no olhar e na mao do camera. Mesmo

Mcluhan tendo levantado pontos essenciais para a discussao do poder dos

meios de comunicavao no nosso universo, nao podemos esquecer que todo

aborigene africano que viamos (ou vemos) na televisao passou, antes de

chegar a nossos aparelhos, pelos olhos do Tarzan - atraves dos filtros

culturais previos.

5.6 0 Habitat Global e a Arquitetura Metabolista

Vitruvio, o primeiro tratadista da arquitetura no Ocidente, trabalha a novao da

casa primordial como a intenvao de pro!eger o homem tanto das intemperies

climaticas quanta divinas, alem de ser a sua medida fisica e cultural frente ao

mundo. Essa ideia esta no amago da arquitetura ate hoje; mas o contexte se

transforma e assim sera com a arquite!ura, como e o caso da base teto e

quatro parades num universe teleconectado. Vilem Flusser9 escreveu que

dessa estrutura restariam ruinas no mundo interpenetrado de cabos materials

e imateriais - antenas, televisao, radio, telefone -, nao sendo possivel aos

homens se adaptar as ruinas, mas sim repensar a arquitelura para os

"sobreviventes" da revoluvao comunicacional.

0 lransito informacional ja estava permeando o cotidiano das casas desde os

anos 60; e e intensa, nessa epoca, nos EUA e paises como o Japao, a

locomovao de pessoas nos territ6rios nacionais e pelas fronleiras geopoliticas,

por recreavao ou trabalho. No universe interligado por cabos e satelites, a

propria casa torna-se um module intercambiavel e viajante, compondo

9 FLUSSER, Vilem; "Environment. Vilem Flusser on Future Architecture" in Art Forum 08, april 1989, USA, pp.13/14

Page 75: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

75

estruturas urbanas e globais de acordo com sua posi~;ao e uso em

determinado tempo. A dinamica 16gica dos Novos Meios de Comunicac;:ao

redireciona as propostas arquitetonicas. Urn exemplo e a Arquitetura

Metabolista, desenvolvida no Japao.

No inicio dos anos 60 urn grupo de arquitetos japoneses formulou propostas

teo'ricas e arquitetonicas para as cidades contemporaneas levando em

considerac;:ao os problemas de crescimento estrondoso que se deu ap6s a

Revoluc;:ao Industrial, alem da crescenta movimenta~;ao populacional. Em

1851, T6quio tinha 570.000 habitantes, e em pouco mais de urn seculo, passou

a 10 milhOes. A soluc;:ao para tais crescimento sempre fora a expansao das

cidades para as areas perifericas; em decadas, notou-se que a popula<(ao nos

centros se reduzia e eram cada vez maiores as distancias de "viagem" da

periferia (para onde as pessoas foram deslocadas) para o centro ( onde

trabalhavam).

Alem desse deslocamento diario - ou talvez por conta dele -, uma pesquisa

realizada pela rede de televisao japonesa NHK mostrou que os japoneses

gastavam ano a ano mais tempo fora de casa, em compras, visitas e atividades

de lazer. Aumentavam tanto o numero de atividades quanta o tempo de

deslocamento entre elas, rompendo, nas grandes cidades, os limites politico­

administrativos, que deixavam de ser importantes como barreiras fisicas aos

interesses extra-locais das pessoas. 0 que vinha a tona no cotidiano urbana

era que as maquinas - das TVs aos carros - interagiam com os homens

promovendo urn reordenal(ao das cidades, sendo que entre as micro e macro

esferas havia uma retroalimentac;:ao informacional que as estruturava, e

criavam-se alguns mecanismos de controle dessas relac;:oes que serviam para

organizar o corpo informacional entre as pessoas, as maquinas e o ambiente

construido.

Atento a essas mudanl(aS, o arquiteto Kisho Kurokawa'0 escreveu o livro chave

do movimento Metabolista, onde propoe o planejamento das cidades baseado

10 KUROKAWA, Kisho; Metabolism in Arc/Jitecture; Studio Vista; London, 1977

Page 76: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

76

em crescimentos organicos espac1a1s e temporais. De acordo com as

atividades e expansoes das estruturas urbanas, elas adquiririam outro papel

numa superestrutura urbana, que seria a metafora arquitetonica para a

interliga98o global dos melos de comunicac;:ao. Nesse entrelac;:amento de

sistemas informacionais que configurava o universe onde a arquitetura se

inscrevia, Kurokawa propc5e m6dulos espaciais e temporals que, trocando

infoimac;:oes, comporiam as novas paisagens das cidades.

Os modules temporais eram regidos pela durac;:ao em anos de hierarquias

sociais e de servic;:os que determinavam ciclos do metabolismo urbane. Sao 07

ciclos:

a- Servic;:os infra-estrutura urbana basica, como o abaslecimento de agua,

eletricidade e gas; de 5° (um ano) a 52 (25 anos), com modulo de 51 anos;

b- Bens de consume duraveis, como mudanc;:as automotivas e outras

vinculadas ao progresso tecnologico; de 01 a 25 anos, com modulo de 51 anos;

c- Espac;:os de servic;:os, como shoppings, espac;:os para negocios,

entretenimento, lazer e cultura; de 5 a 50 anos, com modulo de 10 anos;

d- Espac;:o de moradia, sendo o espac;:o fundamental da vida urbana; com

mudanc;:as de 10 a 125 anos, com modulo de 52 anos;

e- Espac;:os Sociais, como prac;:as, estacionamentos, parques, calc;:adas; de 25

a 625 anos, com modulo de 125 anos;

f- Espac;:os Culturais, como monumentos publicos; de 125 a 3.125 anos, como

modulo de 625 anos;

g- Espac;:os Naturais, como florestas, bacias hidrograficas, etc; de 3.125 a

400.000 anos, que marca o intervale entre os periodos glaciais; com modulo

de 15.000 anos.

Page 77: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

77

Em relac;:ao ao desenvolvimento espacial, Kurokawa os ordenou em sete

niveis:

a- Casa, espac;:o destinado as necessidades imediatas do homem, com area de

10' a 102 m•, reglda pelas medldas do homem ou pelos lnstrumentos que

representam sua extensao imediata;

b- Metapolis (espac;:o urbana); o desenho entre a arquitetura e vias de

circulac;:ao pr6ximas, equivalents a distancia do caminhar humano; de 103m a

104m· '

c- Metropolis; desenho das vias automotivas, com distancias baseadas na

locomoc;:ao feita com carros; de 104m a 105 m (1 OOkm);

d- Megalopolis; determinada pelas estruturas de redes de transports rapidos,

como metros e trens; de 105m a 106m (1 .OOOkm);

e- Ecumenopolis; determinada pelas rotas aereas, levanto em considerac;:ao a

velocidade dos avioes; de 106m a 107m (10.000km);

f- Cosmopolis; estruturada nas comunicac;:oes via satelite; de 107m a 108m

(100.000km).

Kurokawa considerava que cada um desses ciclos, tanto lemporais quanta

espaciais, deveriam ser etapas de evoluc;:ao urbana global, nao como o

crescimento de uma area continua. Ele tinha consciE'mcia da interpenetrac;:ao

informacional que estrutura o universo, que tornava cada vez mais dificil definir

em areas metricas o espac;:o de uma casa, sendo que, interconectada via

meios globais de informac;:ao, como satelites, ela era um n6 na trama da

Cosmopolis, sendo os m6dulos espaciais ligados e por vezes definidos pelos

m6dulos temporais.

Assim, para propostas Metabolistas, escapou de Kurokawa que a varia<;;ao

exponencial que propoe para seus m6dulos sofreria, com os avan<;;os

tecnol6gicos, uma compressao tambem exponencial. Por exemplo, quando

consideramos hoje as influencias diretas das redes internacionais de

computadores, que sao instantaneas (ou seja, aquem do modulo minima de 1

ano, para habitac;:ao) e interferem nos espac;:os sociais, entao estipulados entre

Page 78: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

78

25 a 625 anos; e que ocorrem e se transformam instantaneamente, sem

considera<;ao alguma a espa<;os geograficos ou metricos, mas que, se

pensarmos nos m6dulos metabolista, corresponderiam a diversas Cosmopolis.

Mesmo preso a definiyao desses m6dulos espa<;o-temporais de evolu<;ao

urbana global, ou meta-urbana, Kurokawa tinha consciencia arquitetonica

dessas interpenetra<;oes. Vemos isso quando analisamos que o projeto final a

que se dedicou foram as capsulas de habita<;ao, que considerava a moradia do

Homo Mavens. Com essas capsulas, as pessoas podiam se locomover

llvremente para satlsfazer seus interesses de trabalho, culture ou lazer, sem

delxar suas capsulae. Todas as cidades terlam grandee estruturas em tornes

onde as capsulas poderiam se encaixar por perfodos indeterminados e depois,

com guindastes, trens e caminhoes, serem transportadas para outros centros.

Kurokawa considerava as capsulas como a revolta individual contra a

massificayao urbana, sendo que com elas as pessoas poderiam ter livre

movimento e possibilidade de a<;ao e reconfigurarem os espa9os urbanos de

acordo com seus interesses imediatos. As capsulas como unidades

arquitetonicas-informacionais minimas que transitariam entre as diversas

esferas temporals e espaciais da urbanidade global.

lmagino que essa ideia e uma das chaves arquitetonicas do anos regidos

pelas tele-tecnologias, apontando a consci€mcia que fatos locais se infiltram e

reconfiguram aspectos globais. Esse sera o caso dos dois pensamentos

arquitetonicos que serao discutidos a seguir: o arquiteto americana Richard

Buckminster Fuller, que e o arquiteto vetor do periodo das Tecnologias

Industries as Te/e-tecnologias, tendo iniciado suas propostas arquitetonicas no

entre Guerras - mesmo perfodo da escola Bauhaus, analisada no capitulo

anterior -, e se firmado com suas ideias arquitetonicas sinergeticas globais nos

anos 60; e o grupo ingles Archigram, expoente direto da cultura de massa do

terceiro quarto deste seculo, que refletiu suas preocupagoes em propostas

arquitetonicas.

Page 79: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

79

I CAPiTULO 6

BUCKMINSTER FULLER

6.1 Marshall McLuhan e Buckminster Fuller via John Cage

• Quando iniciei minhas leituras dedicadas as relar;;oes entre a Arquitetura e as

Tecnologias de lnformaqao, busquei apresentar minhas primeiras inquietar;;oes

a alguns professores arquitetos e ·outros profissionais que estivessem de

algum modo ligados a uma dessas duas areas do conhecimento. Uma das

primeiras conversas definidoras de fechamento de periodos da produ<;:ao

arquitetonica a serem estudados foi com a music61oga americana Laura Kuhn,

que havia trabalhado com John Cage e acabara de publicar sua lese de

doutorado sobre a opera Europera 1 & 2, deste compositor americano.

Na leitura dos textos de Cage encontramos diversas referencias as ideias de

Marshall McLuhan e principalmente de Buckminster Fuller e os aspectos

organizacionais sinergeticos dos elementos ffsicos e energeticos no universo.

Em sua lese, Laura Kuhn" dedica um capitulo especialmente a essas

correspondencias intelectuais entre as propostas de Cage e Fuller, e outro a

Cage e McLuhan que, alem do interesse direto no tema por ela estudado, sao

para mim importantes para que pudesse considerar as possfveis relar;;oes

entre as concepr;oes globais de McLuhan e Fuller.

0 primeiro ponto de mudanr;a em relar;ao a produr;Bo artfstica que vinha sendo

desenvolvida, que Laura Kuhn aponta nesses tres autores, e o deslocamento

da atenr;ao do Objeto para o Processo, discutido de modos distintos, mas que

entendem o universe como elementos em operar;ao, considerando a aceitar;ao

ao inves da rejeir;ao, a inclusao ao inves da exclusao.

11 KUHN, Laura; John Cage's "Europeras 1 & 2": the Musical Means of Revolution; University Microfilms International (UMI), Michigan, US, 1993

Page 80: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

80

Mcluhan imaginava que no mundo conectado com meios plurissensoriais

fosse possivel transformar nossa educa9ao ortodoxa no desenvolvimento de

urn pensamento de recomposi96es constantes, de acordo com os novos dados

que fossem surgindo. Para ele, o metoda de nosso tempo seria o de

utilizarmos modelos multiples de explora9ao e a9ao no universe. E possivel

vermos/escutarmos essas caracteristicas nas composi96es de Cage dos anos

50!60, quando despertou para o interesse na descontinuidade da pontua9ao

de seus longos textos, que usava em discursos onde, abruptamente, os temas

mudavam, respondendo ou nao a variac;:ao ritmica da frase, alem do principia

das operac;:oes com o acaso, acreditando e creditando a configurac;:ao dos

ambientes musicais a uma ausencia de intenc;:oes pre-conhecidas, mas com as

quais deveria lidar no momenta em que surgissem.

Fuller desenvolve ideias com a crenc;:a de que o desenvolvimento das

sociedades globais esta na intera9ao entre o homem e as tecnologias

emergentes, que possibilitaria uma redistribuic;:ao racional de energia de fontes

naturais. Ele nao estava interessado diretamente na reforma do homem, mas

na de seu ambiente, de modo que tomasse o homem como urn ser em

movimento que fosse capaz de escolher suas dire96es numa gama de

possibilidades, oriundas de cruzamentos entre fatores de disciplinas diferentes

do saber.

Seus temas principais eram mobilidade, polui9ao, industrializa98o, reciclagem,

fontes de energia finitas, e a unidade global, colocando suas alenc;:oes na

solu9ao de novas tecnologias que fizessem mais com menos recursos. Para

isso, era preciso criar mecanismos de conscientiza9ao, selec;:ao e eliminac;:ao

dos ruidos do universo global - polui9ao, perdas de energia, alenc;:ao a reciclagem de materiais e fontes -, entendendo o universo como urn sistema de

equilibria energetico. Nao intencionava organizar totalmente a Aldeia Global ,

mas dar liberdade aos homens, individualmente, para que travassem relac;:6es

produtivas nos mais diferentes meandros do universo.

Page 81: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

81

Dessa maneira, Laura Kuhn coloca a preocupa~rao de Cage, similar a de

Mcluhan e Fuller, de organizar suas composi~roes onde isso se fazia

necessaria (ambiente), deixando seu conteudo (os elementos individuals) livre

para surgirem e atuarem independentemente de uma ordem geral estatica.

6.2 0 Universo de Buckminster Fuller

Buckminster Fuller abandonou seus estudos em Cambridge para lutar na 1

Guerra Mundial, de 1917 a 1919, onde desenvolveu sua visao interativa do

mundo e parte de suas ideias basicas de arquitetura. Percebeu que os

progresses tecnol6gicos - sempre os mais avan<;:ado presentes nas guerras -

passavam da telegrafia a radiofonia, a ausencia de trilhos nos caminhos, do

tubulado ao nao-tubulado, e da "arma<;:ao estrutural visfvel para a resistencia

invisfvel dos elementos qufmicos das Iigas metalicas e do elelromagnetismo"'2•

E exatamente atraves de estudos das liga<;:6es de elementos qufmicos que

desenvolveria mais tarde a teoria da Sinergia.

E nesse perfodo que estuda a forma<;:ao geometrica dos elementos da

natureza, concluindo que sua formac;:ao se baseia em sistemas coordenados

de vetores, tendo como eslrutura basica o triangulo. Esta forma como um

conjunto de Ires evenlos energelicos, Ires Iadas baseados em tres angulos

tensos, onde cada uma, com um minima esfor<;:o, estabiliza o outro. Atraves de

experimenlac;:oes com esse elementos, Buckminster Fuller explorou o

tetraedro, onde Ires triangulos criavam um quarto e, em seu ponto de vista, "o

menor denominador comum do Universo"13• A partir desse elemento, o mais

simples dos cinco s61idos regulares", que considerou basico e altamente

modelavel, Fuller desenvolveria sua futura arquitetura.

12 FULLER, Richard Buckminster; Manual de Operar;i'lo para a Espar;;onave Terra; Ed. Universidade de Brasilia; Brasilia, 1985

13 FULLER, Richard Buckminster; Synergetics: Explorations in the Geometry of Thinking; MacMillan Publishing Co.; London and New York, 1975; p. 63

14 Os outros sao Octaedro (8 triiingulos), Cubo (6 quadrados), Dodecaedro (12 pentagonos), e o lcosaedro (20 triangulos)

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82

Porem , antes de analisarmos alguns de seus importantes projetos

arquitetonicos, considerarei algumas de suas visoes de mundo, onde embasa

conceitualmente sua arquitetura.

0 homem, enquanto se imaginou apenas um ser terrestre e pedestre, sem

considerar sua capacidade de imergir nos oceanos ou explorar o espac;:o

inte'rgalfltico, era limitado pelo fato de que menos de 25% da parte seca da

Terra era favoravel ao sustento humano, e o homem, ao Iongo de sua hist6ria,

ocupou apenas 10% da superffcie terrestre. Apenas os grandes aventureiros

do mar, ou os Grandes Piratas 15, como os chamou Fuller, tinham uma

consciencia abrangente do mundo, e que cerca de 99,9% da humanidade,

antes da invenc;:ao do telegrafo e radio - ha pouco mais de um seculo apenas -,

tinham consciencia apenas de problemas locais, e que cada um de n6s

conhecia somente um milionesimo da superficie do globo terrestre.

Essa visao regional favoreceu um pensamenlo especializado e

compartimentalizado, propiciando as ideias de nac;:ao e soberania. lembrando­

nos das ideias de Mcluhan, segundo as quais o universo literario incentivara o

criac;:ao das nac;:oes, vemos que a visao de Fuller e ainda mais contundente ao

diagnosticar tais problemas devido a uma deficiencia na concepc;:ao espacial

de universo da humanidade. E essas noc;:oes de nac;:ao e soberania territorial

fizeram com que perguntas como Onde voce mora? ou De onde voce e?, que

sao profundamente i16gicas se levarmos em conta o universo como um

equilibria dinamico de forc;:as naturais, tornassem-se triviais.

lsso lorna claro a que ponto de especializagao a que fomos conduzidos pela

ignon3ncia do regimento energetico dinamico do universo, e que Fuller coloca

como uma forma de confinamento que deteriora nossa adaptabilidade ao

mundo. Era preciso darmo-nos conta das mudanc;:as tecnol6gicas e ffsicas do

mundo contemporaneo para que entendessemos a dinamica que regia nossas

15 FULLER, Richard Buckminster; Manual de Operal(i!IO para a Espa9onave Terra; Ed. Universidade de Brasilia; Brasilia, 1985, p.12

Page 83: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

83

movimentagoes e nos adaptassemos a elas ou as controlassemos para o

interesse de toda a humanidade.

6.3 A Reg6ncia Sinergetica

E nesse sentido que se baseia a ideia chave de Fuller, a Sinergia. Em Iugar da

compartimentaliza98o por ele den\-lnciada, deveriamos estar atentos as

passagens do sistema global do universo, que seriam circularmente

interligadas e ordenadas topologicamente numa estrutura geodesica -

referente a forma da Terra, mas estrutura no elemento minima da ordenagao

da natureza, o tetraedro. A topologia como a definigao de padroes de

"interligagao estrutural das constelagoes de eventos"16.

Para compreendermos esse universo, era preciso identificar as interligagoes

mais estreitas e economicas entre os eventos, partindo para urn trabalho de

eliminagao de irrelevancies. Na polifonia do mundo, aceitar e identificar os

sons e ruidos e eliminar os que nao se encaixam na reordenagao 16gica

proposta. Fuller inaugura o que considero a eco/ogia informacional, propondo

que nao pensassemos apenas em poluigao do ar ou agua, mas tambem em

poluigao informacional, armazenada em nossos cerebros ou incorporada pelo

ambiente, a qual deviamos atentar e lentar minimiza-la para entao maximizar

as potencialidades dos meios, territ6rios e pensamentos.

Fuller considera que a palavra Sinergia e a unica que da o sentido do

"comportamento dos sistemas totais nao previstos pelos comportamentos

separadamente observados de quaisquer das partes isoladas do sistema ou

de quaisquer subconjuntos das partes do sistema"17. Como exemplo, usa a liga

de ago cromo-niquel, que tern resistencia de aproximadamente 350.00 Iibras

por polegada quadrada, ou 100.00 a mais que a soma das resistencias de

cada urn de seus componentes. E via no arquiteto e designer a obrigagao de

pensarem seus produtos com a visao dessa interagao de fon;:as estruturais,

16 Ibidem, p. 38 17 Ibidem, p. 37

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84

combinando o conhecimento de diversas artes e ci€mcias em seus projetos

para atingirem uma unidade sinergetica.

Einstein percebeu que os corpos afetam constantemente uns aos outros, e

que seu estado natural nao e a inercia, mas os movimentos e mudangas

contfnuas, e desde que o homem adquiriu essa consciencia, teria a habilidade

de desenvolver urn papel ativo em sua pr6pria evolugao e na sua relagao com

o ambiente circundante, criando urn movimento de trocas informacionais que o

beneficiassem. Pensando nisso, Fuller escreveu que o nosso conhecimento

("constituinte metafisico") s6 pode crescer, e que a energia ("constituinte

fisico") nao pode decrescer, assim, cada vez que os utilizamos, contrariamos a

lei da entropia, que e a crescente desordem oriunda da dispersao de energia,

para incrementarmos a concenlragao ordenada na nossa exploragao e

compreensao do universo.

De forma similar as ideias de Mcluhan, Fuller diz que as ferramentas

produzidas pelo homem sao exteriorizagoes de nossas fungoes que sao, a

principia, integrais, e que, mesmo tendo desenvolvido ferramentas

especializadas, com a consciencia sinergetica de suas atividades poderiamos

adquirir uma capacidade global e interativa de relagao com o mundo.

E com essa concepyao de exploragao, entendimento e a<;:ao no mundo que

Buckminster Fuller trabalha seus projetos arquitetonicos, desde o fim da I

Guerra Mundial ate o final anos 70. Com uma produgao extensa, onde urn

mesmo projeto se desdobrava em diferentes versoes. Para esta dissertagao

apresentarei Ires de seus trabalhos - por vezes estendidos em outros

adjacentes: Vefculo 40, Dymaxion e Domo Geodesico, sua mais importante e

conhecida proposta arquitetonica.

Page 85: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

85

6.4 40 Veiculo Aerodinamico

A posicao moderna de Buckminster. Fuller frente a arquitetura nao estava

preocupada com a exclusao de ornamentos, com a "verdade" dos materiais, e

muito menos desenvolvia-se com prismas geometricos puros de angulos retos.

A tonica de sua arquitetura, desde o infcio, era trazer a materia e a energia

em equilibria dinamico, e dessa relacao sinergetica resultaria seus projetos.

Essas ideias foram apresentadas em projetos na serie Dymaxion, que teve

como um dos primeiros resultados - e o primeiro com sucesso no meio

arquitetOnico e industrial - os Carros 40 (como era conhecido tambem os

projetos Dymaxion), que tiveram cinco·versoes, a ultima de 1934.

Os primeiros esbot;:os para o Carro 40 ja trazem o elemento geometrico basico

da arquitetura de Fuller, o trifmgulo, que estudara como elemento minima de

format;:ao geometrica da natureza, e sua extensao tridimensional, o tetraedro.

Porem, esse projeto foi iniciado com as formas de um aviao, ou melhor, de um

vefculo que pudesse levantar voo quando necessaria. Com duas rodas

dianteiras e uma traseira - respondendo a forma triangular -, o veiculo possuia

duas asas que poderiam ser infladas rapidamente com ar ou gas, e

impulsionado por turbinas de ar lfquido, permitindo uma mobilidade imediata e

sem necessidade de responde as rotas pre-trat;:adas para os veiculos

convencionais.

Todavia, quando iniciou as fases de projetat;:ao e construt;:ao dos prot6tipos,

Fuller deixou de lado as asas mas manteve-se atenlo aos princfpios

aerodinamicos que poderiam ser aplicados a qualquer corpo em movimento na

Terra. Considero que ai esteja uma demonstrat;:ao da visao global das

interat;:oes entre materia e energia que nortearam a arquite!ura de Fuller. Os

desenhos dos carros ate entao respondiam a fatores - mesmo que nao

explicitos em seus relat6rios ou descrit;:oes comuns que deles encontramos -

de tecnologias de movimento anteriores aos veiculos automotores. Pensemos

num carro comum na epoca, como o Ford 29 (mesmo que, infelizmente,

Page 86: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

86

possamos imaginar diversos outros carros produzidos e projetados ainda hoje),

e veremos !res caracterfsticas ultrapassadas como:

1. 0 desenho de sua carroceria e muito semelhante ao das carruagens que se

locomoviam poucas decadas antes;

2. Seu desenho, sinteticamente um paralelepipedo com quatro rodas, duas a

duas alinhadas e paralelas, eram multo menos uma necessldade de

equilibria que um resquicio dos vagoes de trem, que rodavam sabre trilhos

paralelos; e

3. Sua locomo«;:ao respondia apenas ao desenho imediato das vias de

circulagao, no plano, nao pensando nos outros fatores tridimensionais;

Nos primeiros desenhos do carro 40, Buckminster Fuller faz comparag6es

aerodinamicas, tanto no plano horizontal, quanto vertical, entre um carro

tradicional e seu projeto, que com esses testes adquire a forma de uma gota -

a forma similar ao carro-aviao, triangular -, com duas rodas dianteiras e uma

traseira. Tambem simula um serie de situag6es entre um carro comum e o

Oymaxion, ao fazerem uma conversao numa esquina de 90°, sendo que o 40,

com a roda traseira pivotante, faz a curva em menor area; numa baliza, onde o

40 estaciona de frente, em menor espago e tempo; ou ainda testes de

visibilidade traseira e dianteira, com o 40 tendo um raio de visao

sensivelmente maior.

Com este projeto, Fuller pode colocar em pratica diversas de suas ideias de

interagoes entre elementos para compor um projeto que utilize minimos

esforgos para o aproveitamento maximo, tendo a sua disposigao uma pequena

industria automobilistica com tecnicos e engenheiros que o auxiliaram durante

todo o processo.

Page 87: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

87

6.5 Dymaxion e suas Extensoes

As principais preocupa<;Oes de Buckminster Fuller quando iniciou os projetos

para a unidade de habita<;ao Dymaxion eram com a redu<;ao do espa<;o do

design das casas, estruturas portaveis que pudessem ser instaladas em

regioes in6spitas, e criac;:ao de projetos estruturais que nao dependessem do

terreno onde fossem instaladas.

Cabe lembrar que os projetos para as unidades Dymaxion foram desenvolvidas

no perfodo da II Guerra Mundial, e como notou James Ward18, e nela que

Fuller encontrou o incentive e a derrota desse projeto. Com extrema facilidade

de transports e um custo muito baixo, U$1 ,250.00 par unidade, centenas del as

foram enviadas para o Golfo Persa para servirem de abrigo as tropas; mas a

escassez crescente de metal fez com que o projeto fosse abandonado. Em

contrapartida, a Beech Aircraft Company, baseada em Wichita, EUA, vendo a

reduyao da produyao de avioes com o fim da guerra, preocupada com a

inatividade de seus empregados e com seu mercado, e conhecendo os

projetos de Fuller - que, como vimos, mostravam um profunda conhecimento

na fisica e tecnologia aerodinamica -, convidou-o para projetar unidades de

habitac;:ao com essa tecnologia que pudessem ser construidas facilmente.

A casa Wichita e uma extensao da unidade Dymaxion, que tinha a forma

basica de urn cilindro, com urn domo suspenso a partir de urn mastro central de

onde partiam cabos metalicos que sustentavam toda a estrutura, e era

revestido com placas de aluminio. Das diversas variac;:oes desse projeto,

vemos em todos a divisao interna dos ambientes ser tripardides, com os

vertices no centro, mesmo que com angulos variaveis. Todas as aberturas

para iluminac;:ao e ventilac;:ao eram propiciadas nao s6 pelas janelas locadas

junto as paredes do cilindro, mas sobretudo pelas placas m6veis que

constituiam a cobertura.

18 WARD, James (ed.) ; The Artifacts of R. Buckminster Fuller -4 volumes; Garland Publishing, Inc.; London and New York, 1985; vol. 2, p. 55

Page 88: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

88

Com urn custo final menor do que de urn Cadilac, e pesando menos de tres

toneladas, a unidade Wichita podia ser erguida em apenas urn dia por urn

grupo de trabalhadores. Haviam ainda centenas de partes metalicas que

compunham as unidades, mas nenhuma delas pesava mais que 5 kg, o que

propiciava que uma unica pessoa pudesse lidar com ela; e apesar da

quantidade aparentemente grande de pe9as, todas elas podiam ser

enipacotadas e transportadas em urn pequeno container cilfndrico.

Buckminster Fuller , nos catalogos das unidades Dymaxion, enumerava assim

suas principais caracteristicas: produ9ao em massa; distribui9ao da unidade

em pacotes; constru9ao rapida; baixo custo; orienta9ao flexfvel; resistencia a

fogo; resistencia a abalos; e desmonlabilidade.

Essas caracterfsticas afirmam as inten96es te6ricas de Fuller, em dois pontos

basi cos:

1. Quando notamos que o projeto intenciona integrar for9as dinamicas dos

diversos lugares onde pode ser construfdo, como a orienta9ao solar

flexivel, aberturas adaptaveis aos ventos, ou grande resistencia a aba/os de

terra. Percebemos que isso e resultado de uma a9ao consciente frente a

diversos fatores que interagem simultaneamente e que produzem

fen6menos territoriais, com os quais Fuller trabalha com conhecimento de

ordens ffsicas e de tecnologias contemporaneas para compor urn projeto

integrative.

2. 0 baixo custo e a extrema facilidade de montagem e desmontagem

propiciam que os moradores dessas unidades tenham grande flexibilidade

de locomo9ao para as areas onde estejam seus interesses em determinadas

epocas. lsso proporciona uma visao dinamica a arquite!ura frente aos

territories informacionais contemporaneos, que nao estariam mais presos a

urn Iugar geografico perene.

Page 89: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

89

Essas questoes ficam ilustradas quando vemos que ao mesmo tempo em que

desenvolvla os projetos arquitetOnicos, Fuller planejava e compunha o Mapa

de Estrategia Industrial para a distribuic;:ao e implantac;:ao das unidades Wichita

nos EUA e toda America do Norte, em estrutura radial partindo da cidade de

Wichita.

6.6 Domo Geodesico Transformando

a Geologia Terrestre

Os estudos de Fuller para a construc;:ao da Geodesica partiram de seus

trabalhos com as formas triangulares e tetraedricas, que combinadas

formavam circulos e esferas. Ele desenvolveu um minucioso estudo sobre as

relac;:oes matematicas entre o tetraedro e as esferas e quaisquer sistemas

poliedricos em seu livro Sinergetics19, propondo que a relac;:ao entre o numero

de vertices e de triangulos que formam qualquer esfera poliedrica sempre !era

como base o tetraedro. Tomando apenas dois exemplos vemos que:

Numa geodesica com 42 vertices e com 80 triangulos, temos:

42 X 360°= 15.120°

e 80 x 180° = 14.400°

a diferenc;:a entre 15.120° e 14.400° e 720°, que equivale a soma dos angulos

de um tetraedro.

E numa geodesica com 812 vertices e com 1620 triangulos, temos:

812 X 360°= 292.320°

e 1620 x 180° =291.600°

a diferenc;:a entre 292.320° e 291.600° e 720°, que equivale a soma dos

angulos de um tetraedro.

19 FULLER, Richard Buckminster; Synergetics: Explorations in the Geometry of Thinking; MacMillan Publishing Co.; London and New York, 1975; pp. 56-59

Page 90: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

90

Lembrando que Fuller havia estudado o trii:mgulo - onde esta baseado o

tetraedro - como a forma geometrica que com urn minimo de troca de energia

entre seus elementos mantem urn sistema em equilfbrio, seu prolongamento

para as esferas poliedricas propiciou que projetasse e construisse estrutura

com escalas imensas com massa correspondendo a uma fragao minima que

requereria uma construgao feita com os metodos tradicionais, ja que todos os

elementos da geodesica trabalham ao mesmo tempo e complementarmente

para equilibrarem uns aos outros. Fuller havia atingindo com esses projetos

geodesicos a forma arquitetonica sintetica de suas concepgoes sinergeticas de

compreensao e agao no mundo.

0 Domo Geodesico era construido de cima para baixo, sendo que cada nova

secgao era colocada em movimento circular baseado em urn mastro central. A

integridade de forgas em equilibrio desse projeto permitiu que Fuller

experimentasse materiais baratos em suas construg6es, como bambu, sarrafos

de madeira, madeira dobrada, papel, plastico e fibras de poliester.

Fuller desenvolveu quase todos os projetos das Geodesicas com Shoji Sadao.

0 primeiro deles foi para o Brookhaven National Laboratory, em 1964, que

compreendia dois Oomos, onde seriam instalados urn acelerador de particulas,

urn reator atomico e outros instrumentos cientificos medicos e bio16gicos.

Seguiram-se a este os projetos para a Galeria de Artes da Universidade de

Colorado (1965); a estrutura Monohex (1965), com aberturas circulares nas

faces dos triangulos estruturais; e mesmo urn antigo projeto de Fuller ja era

baseado na estrutura geodesica, como sua casa em Carbandale (1960).

Contudo, o grande projeto geodesico da equipe de Fuller e Sadao foi o

Pavilhao Americana para a Expo '67 em Montreal, no Canada. Assim que foi

inaugurada a feira, a Geodesica assumiu destaque absolute, e se caracterizou

como a grande transformagao arquitetonica contemporanea.

Todos os cabos que formavam a estrutura triangular da Geodesica eram

visfveis interna e externamente, sendo revestida com placas de acrflico

Page 91: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

91

transparente, serviu para ilustrar as potencialidades tecnol6gicas da

arquitetura sinergetica. Contudo, mesmo com o sucesso de publico e a

revoiU!;:ao no pensamento arquitetonico trazidos por esse projeto, James

Ward'0 lembra que um dos aspectos mais impressionantes do projeto nao fora

realizado. Atraves de computadores, as placas triangulares seriam abertas ou

fechadas de acordo como movimento da Terra em relagao ao Sol, produzindo

placas de luminosidade na esfera, alem de manter um equiHbrio luminotecnico

e termico entre o interior e exterior da Geodesica.

Fuller continuou a desenvolver os projetos geodesicos intensificando a

possibilidade de facil transporte e constru;;:ao em diferentes regioes do mundo,

nao importando as condi96es especificas do terreno, Geodesicas foram

construidas tanto em regioes deserticas como no Polo Sui, onde abrigou uma

esta9ao cientifica que, construida inteiramente com aluminio, resistiu por mais

de 10 anos, dando condi;;:oes de habitabilidade ao homem em condi;;:oes

climaticas que impossibilitavam sua perman€mcia com formas e tecnol6gica de

constru;;:oes tradicionais.

Por fim, Fuller volta a alguns projetos te6ricos que considero chaves para

fechar o circulo de seu pensamento sinergetico, onde a totalidade s6 e

compreendida se levarmos em consideragao a rela9ao entre os elementos, e

como esse conjunto pode transformar a intera;;:ao com o ambiente. Num

desses projetos, Fuller propoe a construgao de um grande Domo sobre a ilha

de Manhathan, em Nova York, reconfigurando todo o seu territ6rio. E numa

forma final, defendendo e provando matematicamente que a Geodesica nao

tinha limites para suas dimensoes," dependendo apenas de investimen!o e

descoberta - ou criagao sintetica - de novos materiais, levantou a possibilidade

de que todo o Globo terrestre fosse envolvido numa Geodesica. Com o tempo,

poderiamos controlar todo nosso ambiente, transformando suas condi¢es

climaticas e, ap6s seculos ou milenios, ate mesmo sua composi;;:ao geologica.

Com isso, seria possivel atingir um dos primeiros aspectos do pensamento de

Fuller, que nao pretendia mudar diretamenle a humanidade, mas sim

20 WARD, James; Op. Cit., p.xii

Page 92: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

92

transformer o seu ambiente, o que entao, possibilitaria o surgimento de um

novo Homem, integrado com seu ambiente, agora Global.

Os avanyos das Tecnologias de lnforma9ao, que deram aos arquitetos uma

visao Global de seu territ6rio de ayao, tiveram tambem um lado menos

tecno/6gico ou matematico, como foi a arquitetura de Buckminster Fuller. Os

meibs de comunicayao como o radio, os jornais, as revistas, as hist6rias em

quadrinhos e a televisao, que transformavam a abrangencia na compreensao

do mundo, traziam consigo uma estetica pr6pria que foi apreendida e

trabalhada por arquitetos em dlferentes partes do mundo. Considero que um

dos expoentes mais atentos a essas questoes foi o Grupe Ingles Archigam,

que discutirei a seguir.

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• • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • ~

• • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • ' • • • • •

4D - Dymaxion House, 1932

Dymaxion House para 4 pessoas, 1941

Dymaxion Car, 1934

Arquitctura c Tclc-Tccnolo•~ias

Buclaninster Fuller

A organizac;;ao do natureza em forma minima: triangulo ~ o equilfbrio de tens6es, ac;;6es e reac;;6es: coda elemento estabilizando seu contr6rio. A arquitetura como espac;;o de de sfntese de fluxos informacionais. Na sociedade industrial de consumo, Buckminter FUller imaginava as casas como elementos simples, integrantes de um sistema global. Os meios tecnol6gicos e sua incorporac;;ao a construc;;ao de ambientes destinados ao homem e as comunidades como possibilidade de remodelar as relac;;oes humanas .

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Domo Geodesico, 1967 Pavllhao EUA- Expo'67, Montreal, Canada

EVO"liOP0.11ill0 + Evon!O Negollm

TETRAEDRO

Domo Geodesico, sfntese de sua ideia de Sinergia, onde formas eram construfdas como sistemas de forgas entre seus elementos. Dentrode um inv6cucro de formas tetraedricas, podia-se criar um ambiente artificial que transformasse nossa existencia biol6gica, geologica e cultural

Domo Mannathan Domo envolvendo o centro de Nova York. EUA

Page 95: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

95

I CAPiTULO 7

ARCHIGRAM

" ... 'architecture-as-ideas' ... We are in the ideas business.

Hopefully too, we can be in the 'doing things' business"

Peter Cook, 1989

7.1 A Arquitetura das HQs

A inten9ao inicial era criar uma "modesta molestia" que irritasse os colegas

"ordenados", "enfastiados" e "superiores" das oficinas de arquitetura de

Londres. A principia, estes nao se importaram, mas logo as ideias do grupo

Archigram despertaram interesse em arquitetos de varias partes do mundo.

Recem formados, com interesses diversos, foram se aproximando via Peter

Cook para discutirem arquitetura contemporanea. Como descreveu o proprio

Peter Cook, era um grupo bem diversificado e separado: "Talvez seja essa sua

for9a. ( ... ) essa habilidade de Mike Webb de aprender a tocar a Brahms ou

assoviar longas frases de Wagner tinha pouco a ver com a compreensao de

Dennis Crompton de motores ou o interesse de Warren Chalk na pintura

americana"21•

Resolveram criar uma revista, nos anos 60. 0 nome veio da ideia de urgencia

das informa96es: mais simples e rapido que um jornal, como um 'aerograma'

ou 'telegrama': ARCHI(tecture)GRAM.

A linguagem da revista, desde o primeiro numero, traz ecos da linguagem da

TV, radio e sobretudo HQs. Sua composi9ao era uma bricolagem de fotos e

fontes diversas, as ideias de pessoas com interesses dfspares eram expostas

igualmente sem que buscassem regras ou novos 'mandamentos' para a

arquitetura. Paginas de diversos numeros das revistas sao colagens de

21 COOK, Peter; in A+U Extra Edition- Peter Cook, 1961 -1989; dez 89; Tokyo

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96

quadrinhos de ficc;:ao cientifica com baloes reescritos, onde discutiam

arquitetura. Graficamente, as HQs eram o meio que mais se assemelhava a multiplicidade de ac;:oes em lugares diferentes e ao mesmo tempo - o que na

vida "real" era vivenciado atraves do radio e TV.

Fo~uetes eram lanyados pelas duas potencias mundiais, satelites nos olhavam

e transmitiam-nos nossas imagens, o homem logo chegaria a Lua. As hist6rias

de ficyao cientffica tinham nisso seu territ6rio de ac;:ao.

Cidades do futuro intergalacticas, com robos e foguetes eram a paisagem dos

quadrinhos, e prenunciavam que logo seria das cidades. 0 grupo Archigram

utilizou-se de todos as meios graficos disponiveis e iniciou uma discussao

constante sabre esses temas atraves da revista. Em pouco tempo come<;:aram

tambem a publicar seus projetos que refletiam as mesmas questoes.

Mas, antes de analisar alguns desses projetos, gostaria de salientar que o

grupo soube - como poucas vezes na hist6ria da apresentac;:ao de projetos

arquitetonicos - traduzir suas ideias e projetos em linguagem grafica

contemporanea, o que proporcionou uma retroalimentac;:ao entre o meio, a

linguagem utilizada e a mensagem que discutiriam.

7.2 A Revista Archigram 1: ldeias

0 arquiteto Hans Hollein, em texto sabre o impacto do Archigram para a

arquitetura na epoca, escreve que o Estilo lnternacional moldado pelos

modernistas estava estagnado, que seus "dogmas" tinham sido formulados ha

muito tempo e nao se adequavam a multiplicidade e variabilidade das

transformac;:oes que ocorriam no mundo - e, clara, nas cidades. Era hora de

discutir ideias ao inves de objetos, "Konzeptie ao inves de Rezeptie. Alguns

tambem queriam discutir 'cidade' e 'vida' no seu mais amplo sentido". 22 Desse

modo, coloca que as imagens e projetos do Archigram tiveram impacto

22 HOLLEIN, Hans "Prefacio" in A+U Extra Edition Peter Cook 1961-1989; Tokyo, dec 1989

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97

imediato e iniciaram discussoes entre estudantes e arquitetos que se

desenvolvem ate hoje.

0 numero 1 da revista Archigram foi publicada em maio de 1961, por Peter

Cook e David Greene. A capa era urn mosaico de fotos, projetos e frases com

carater de manifesto. A principal frase era: "Uma nova gera9ao de arquitetura . deve surgir - com formas e espal(os que parecem rejeitar os preceitos do

Moderno".

lmersos no universe das revistas, anuncios e televisao, onde o consume girava

o cotldlano das cldades, tlnham como ponto chave de suas propostas e

discussoes a Casa como um produlo de consumo. E os acontecimentos

fugidios que movimentavam as cidades, como o transito das pessoas, a

presenl(a/ausemcia quase instantanea dos carros eram "possivelmente mais

importantes que os ambientes construfdos, que a demarcayao construfda do

espal(om. A concepl(aO da cidade devia-se dar rompendo as barreiras de

pensamento arquitetonico construfdo rfgido e im6vel. E um instrumento para

esse reaprendizado de como olhar, entender e discutir o meio urbano seriam

as HQs de ficl(ao cientffica, que apresentavam o mundo como uma rede

geodesica de informal(6es estruturadas em tubos pneumaticos, bolhas e

domos de plastico.

0 Homem estava em movimento. Se retomarmos a problematica para o inicio

do seculo, tambem encontramos que uma das questoes que redirecionavam a

arquitetura e as cidades era o macil(o movimento populacional do campo para

a cidade. Contudo, no infcio do seculo XX, uma multidao se deslocava para

determinada area - proxima as industrias -, tinham um passado agrario comum,

e tambem um futuro multo similar como operarios nas atividades industrials. 0

cotidiano das pessoas se assemelhariam e, pensava-se, suas necessidades e

objetivos, enfim, suas ideias de vida seriam iguais. Para isso as solul(oes

arquitetonicas propunham cidades planejadas com grandes conjuntos

23 CHALK, Warren; "Housing as a Consumer Product" in Archigram 3, reproduzido em COOK, Peter (ed); Archigram; Studio Vista, Londres, 1972

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98

habitacionais, moradias padrao e ate mesmo o desenvolvimento de um

homem-tipo.

Agora, nos anos 60, na mesma lnglaterra que fora ben;:o da industrializac;:ao no

seculo XVIII, via-se que ao mesmo tempo que a TV era a costura universal de

que falava Mcluhan, a sociedade de consume apontava para diferenc;:as nas . necessidades e objetivos que deveriam ser vistas globalmente de maneira

quase individuais. Apesar do aparente contrasenso, tinha-se consciencia que

no mundo todo (ou no mundo televisivo, conhecido vias meios de comunicac;:ao

de massa), os homens que moviam as cidades o fariam por ideais pr6prios aos

seu microcosmo, e nao porum ideal universal de sociedade igualitaria.

Um exemplo disso, captado e desenvolvido pelo grupo Archigram, foi a

emergencia de produtos fat;;a voce mesmo, que logo chegou a propor

transformac;:oes nas pr6prias habitac;:oes da pessoas, quando se podia em

supermercados kits com os quais propunham a ampliar a sala-de-estar ou

construir garagens instantaneas. Com isso, conforme as mudanc;:as de

necessidades ou gosto, as pessoas, individualmente, seriam partes ativas na

determinac;:ao espacial de seus ambientes.

lsso provocou uma ruptura num dos paradigmas chave do Modernismo em

arquitetura: a estandardizac;:ao. A ideia de standard desenvolveu-se baseada

na produc;:ao em massa, propiciada pelas transformac;:oes tecnol6gicas do

infcio deste seculo. Essa forma de produyao e inconteste na formac;:ao do

mundo "urbane" como o conhecemos ainda hoje. Contudo, a ideia das formas

estandard sofreram uma mudanc;:a drastica: ao inves de produzirem um mesmo

objeto sempre com um mesmo fim, o design nas sociedades nas sociedades

telematicas de consume, atento as possibilidades de mudanc;:as individuais e

locais, direcionou-se a projetar pec;:as estandard que fossem intercambiaveis

entre si, dependendo das necessidades e preferencias dos consumidores.

Essa concomitante sequencia e ruptura na ideia do standard na sociedade de

produc;:ao em massa foi constante nos projetos e publicac;:oes do Archigram,

Page 99: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

99

que identificavam-se com as discussoes e propostas tanto de Le Corbusier e

Jean Preuve, como com Buckminster Fuller e os Metabolistas japoneses.

Com isso, propunham que na concep9ao e desenho global dos ambientes o

designer seria um profissional mais e mais dispensavel, pois cada qual poderia

propor e reconfigurar seu proprio espa9o. "0 edificio e reduzido ao papel de

carca9a - ou menos"24• 0 designer estaria vinculado ao projeto do maior

numero de pe9as intercambiaveis, mas as solu96es seriam tomadas

indivldualmente por cada usuario.

Em 1963 iniciou-se com maior assiduidade a publica9ao e discussao em larga

escala dos projetos do grupo Archigram. Entre esses projetos, vao de

propostas graficas para a arquitetura contemporanea a experimentos com

video, de cidades instantaneas a veiculos que transformavam os homens em

auto-suficientes nos ambientes urbanos, gostaria de destacar e analisar

quatro: Living City, Living 1990, Plug-in-City e Instant City.

7.3 living City, o Cotidiano Recortado

Living City, realizado em junho de 1963 com o apoio do Institute de Arte

Contemporanea de Londres, foi o primeiro projeto que reuniu todo o grupo

Archigram. Foi um projeto grafico, publicado em forma de revista e uma

exibiyao/instala9ao montada com estruturas construidas com plastico. "Seu

objetivo era expressar a vitalidade da vida da cidade, mais que sugerir um

plano para uma nova cidade". 25

Archigram procurou refletir sobre a cidade atraves de seus minimos detalhes

do cotidiano, que iam do ato de acender um cigarro, ao maci90 movimento de

milh5es de pessoas nos metros e outros transportes publicos de Londres.

Compuseram com isso uma estrutura que exibia aos visitantes seu proprio

24 COOK, Peter; Archigram; Studio Vista, Londres, 1972 25 Ibidem.; p.20 •

Page 100: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

100

cotidiano recortado. e com esses recortes, isolados do dia-a-dia automatico,

construfram urn organismo de reflexao sobre a cidade. Esse trabalho era

dividido em sete compartimentos com caracterfsticas especiais, os quais

nomearam Gloops.

Os sete G/oops eram:

1. Sobrevivencia: cada indivfduo estaria relacionado com seu kit individual de

sobrevivencia, compostos por diferentes elementos, como comidas, bebidas,

drogas, sexo, roupas, carro, dinheiro.

2. Massa: urn caleidosc6pio de todos os tipos de indivfduos e suas maneiras

vistas isoladamente, alem de suas intera~oes: como indivlduos, como grupos e

como massa anonima.

3. Movimento: Fluxos; alta, media e baixa velocidades; os movimentos

contfnuos de parar e andar dos trafegos como urn dos aspectos mais

excitantes da vida urbana.

4. Homem: a cidade como urn organismo que e o habitat do homem. Assim, e

necessaria projetar o futuro das cidades (ou as cidades do futuro) ainda e

sempre tendo o homem como seu(s) centro(s).

5. Comunicat;;Oes: as redes de comunica~ao como a principal estrutura urbana.

As mudan~as rapidas nos meios de transporte nao se adequam aos projetos

de urn homem e uma sociedade em modelos rigidos. Os satelites circundam a

Terra e em permanente contato com centres comuns de distribui~ao

instanUmea de informa~oes pedem urn reavalia~ao do formate das cidades

que contam com um centro ffsico rfgido.

6. Lugar: apenas a arquitetura nao e suficiente para dar identidade a urn Iugar.

A inteligibilidade dos ambientes construfdos nao dependem de uma forma

Page 101: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

101

arquitetonica mas de seus conteudos, usos e arranjos dos espac;:os nas

cidades.

7. Situar;;oes: todos essas mudanc;:as ambientais sao responsaveis para que se

recaracterize espac;:os estabelecidos. Os happenings, as situac;:oes mutaveis

constantemente nas cidades sao propulsores da vida urbana. Essas situac;:oes . podem ser desde o trafego de pessoas e vefculos, com suas diferentes

velocidades e dlrec;:Oes, asslm como mudanc;:as do clima e durac;:ao dos dias ou

das noites.

Com a exibic;:ao montado sobre essas sete estruturas, o grupo Archigram

tridimensionalizou pela primeira vez suas ideias arquitetonicas. Ainda nao em

forma de propostas e projetos edificaveis, mas sim - e muito mais importante -

como uma reflexao imagetica e espacial sobre a multiplicidade, maleabilidade

e efemeridade dos ambientes urbanos. Assim como discutiam e propunham, e

coerente que desde seu primeiro projeto, ap6s sua realizayao e disseminac;:ao

de ideias, ele se desintegrasse numa corrente de informac;:oes que

contagiavam diversos outros arquitetos e principalmente os pr6ximos trabalhos

do grupo.

No compute geral, a triade tempo/movimento/situac;:ao foi determinante nos

projetos do grupo, e ja na exposic;:ao Living City colocavam que "A pulsac;:ao da

vida da cidade e rapida, entao porque nao de seu ambiente? ( ... ) Por que nao

construir para isso?"26• Assim, identificaram que a maior fraqueza da

arquitetura urbana era sua inabilidade para center esses movimentos rapidos

da vida das cidades como parte de suas propostas esteticas. Era precise estar

atento aos foguetes, HQs, satelites e incorpora-les aos projetos das cidades.

Para isso trabalharam.

26 Ibidem.; p. 23

Page 102: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

102

7.4 Plug-in-City, Capsulas de Metropolis

Este trabalho, de Peter Cook, e a combinac;:ao e desenvolvimento de uma serie

de projetos desenvolvidos entre 1962-1964. Estava ligado com o Plug-in­

Capsule (1964) de W. Chalk, tambem do grupo, e com a ideia dos ediffcios

expandiveis, que foram tema das revistas Archigram 2 e 3. Com o

desenvolvimento dessa ideia, tornou-se inevitavel a investigac;:ao de o que e

como aconteceria se todo o ambiente urbane pudesse ser programado e

estruturado para que estivesse em constantes mutac;:oes arquitetonicas.

0 Plug-in-City nao foi uma soluc;:ao para as ideias que se desenvolveram entre

62/64, mas sim uma colagem das diferentes propostas. Como deveria ser,

pelas discuss6es arquitetonicas do grupo, nao se constituia em uma soluc;:ao

global e final, mas sim conjunto de diversas ideias.

Plug-in-Capsule tinha como base capsulas habitaveis. 0 proprio nome remete

as capsulas que vinham sendo utilizadas e desenvolvidas para as explorac;:oes

espaciais atraves dos astronautas. E o projeto de W. Chalk consistia em

capsulas que seriam pre-fabricadas com requinte ergonomico e organizacional

de urn espac;:o mfnimo habitavel, e seriam acopladas e removiveis em

estruturas de grandes torres. As diversas partes das capsulas, e elas em

relac;:ao as torres, seriam feitas para serem aptas as transformac;:oes

tecnol6gicas e as necessidades dos usuarios, que transformariam seu uso e

estetica.

Os projetos foram desenvolvidos separadamente ate que a ligayao entre eles

se tornou 6bvia, e foi a primeira proposta do grupo que abrangia desde

detalhes ergonomicos de uma habitac;:ao a reconcepyao das transformac;:6es

de escala urbana. Com o desenvolvimento do projeto Plug-in-City tambem fica

claro ao grupo que as grandes estruturas em torres fixas que sustentariam as

capsula eram por demais rigidas para as ideias globais de cidades mutaveis

que eram propostas pelo Archigram. Foram entao descartadas.

Page 103: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

103

As similaridades do projeto com as tecnologias presentes e transformadoras

das cidades eram tanto as capsulas dos astronautas como - e mais pr6ximo a realidade cotidiana - os carros que, alt§m de serem fator decisivo no

redimensionamento e redesenho urbano, incorporavam a ideia de trocas

sucessivas dos objetos nas sociedades de consumo. Assim, o Plug-in-City

tinha como mote a necessidade das cidades de se formarem como um

consumo incessante de elementos capazes de intercambio total entre si, de

modo que, ano a ano, de acordo com as necessidades e vontades dos

usuarios, ou de acordo com a moda, a cidade e as casas tornassem-se um

continuo intercambio de elementos a reconfigurarem a paisagem urbana.

Com essa ideia e o uso cada vez maior de metais e plasticos, punha o grupo

na vanguarda dos experimentos com o design contemporaneo.

7.5 Living 1990, a Habita~ao nos Anos 90

Em 1967 a Weekend Telegraph Magazine encomendou ao Archigram um

projeto de como seria habitar em 1990. Como resultado foi criado o Living

1990.

As ideias de que os ediffcios seriam cada vez mais carcat;:as, onde o usuario

comporia seu ambiente em mutat;:ao, de acordo com suas necessidades e

gostos, nao pressupunham como arquitetura uma caixa vazia, mas pelo

contrario, um requinte de desenho industrial que incorporasse todos os

avant;:os tecnol6gicos eletronicos e novos materiais desenvolvidos e utilizados

nas industrias que permitissem a maior mobilidade possfvel as habitat;:6es -

externa e internamente.

Co similaridades ja apontadas com os vefculos automotores, a ideia basica do

Archigram para esses novos espat;:os habitaveis era o auto environment, que

sugeria de uma s6 vez a conjungao de elementos m6veis (carros) e locacionais

(pad), elementares (feitos de componentes identicos e aptos a construfrem

Page 104: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

104

espa9os idEmticos) e e/i3sticos (componentes que poderiam ser trocados e

removiveis, redefinindo os espa9os).

Apoiado nessas ideias o Archigram exibiu uma habita9ao em escala 1:1 da

proposta Living 1990. Neste prot6tipo, as paredes, o teto e o piso se ajustavam

de acordo com as necessidades do morador. 0 espa9o das areas internas nao . eram mais rfgidos, mas ajustaveis horizontal e verticalmente, do mesmo modo

que todo o piso, sendo que este seria em determinados pontos "rfgido

suficiente para se dan9ar ou macio suficiente para se sentar'm.

7.6 Mordomos Eletronicos

Os equipamentos eletro-eletronicos de controle dos ambientes se estendia aos

grupos de elementos para se sentar ou dormir, que eram inflaveis, a detalhes

como o peso das cobertas que podia ser controlado pelos usuarios. Robos

eram programados para executar diversas fun96es, como inflar e desinflar a

mobilia, ou fazer a limpeza da unidade de habita9ao. Outros robos eram

incrementados com radio e TV, e inclufam c6pias de filmes favoritos do

morador e programas educativos.

Um dos elementos arquitetonicos da casa era uma parede de servi9os

conectada com uma rede metropolitana de servi9os telematicos que poderiam

ser acessados pelos moradores quando necessitassem.

0 projeto Living 1990 e a concretiza9ao da preocupa9ao do grupo Archigram

com a autonomia do indivfduo na cidade. Oposto as ideias totalizadoras

urbanas do movimento moderno, o indivfduo teria a oportunidade de, apoiado

em unidades desenvolvidas para serem mutaveis e com elementos

intercambiaveis, reconfigurarem constantemente seu ambiente e, em

consequemcia, o ambiente urbano. Cada unidade familiar teria autonomia de

mutabilidade organizacional e estetica sobre sua habita9ao, ligada as

27 Ibidem

Page 105: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

105

megaestruturas urbanas - que, descartada a ideia das torres ainda presentes

nos projetos anteriores -, seriam megaestruturas de servic;;os e comunicac;;oes.

Na exibic;;ao foram expostos diversos desenhos das reconfigurac;;oes espaciais

possiveis do projeto, de acordo com as horas do dia e das diferentes

atividades dos moradores.

Este trabalho no desenho da habitac;;ao reconfiguravel levou o grupo, anos

depols, ao estaglo final das preocupac;;Oes das transformac;;Oes e autonomla

espacial decididas e comandadas pelos individuos, que foi o projeto Cushicle -

a casa-nas-costas -, composto de dois elementos, a espinha dorsal (estrutura

com equipamentos eletronicos) e o inv61ucro inflavel que envolvia o indivfduo.

Com esse equipamento o usuario poderia dormir, caminhar e se conectar com

a mega-estrutura informacional das cidades. Chegou-se assim a maxima

desintegrac;;ao da casa e sua inevitavel localizayao fixa no espac;;o.

7.7 Quarto de Oncinhas

Durante o XIX Congresso da Uniao lnternacional de Arquitetos, UIA 96,

realizado em julho de 1996 em Barcelona, Espanha, foi montada uma

exposic;;ao chamada Liar Dok;a Liar, que exibiu uma serie de propostas

realizadas desde os anos 60 sobre novos modos de morar para os anos 90,

entre eles o Living 1990, do Archigram. A exposic;;ao foi montada em alguns

containers cor-de-laranja na prac;;a da catedral de Barcelona, que levavam no

exterior a frase "Jar doce lar" em diversos idiomas, e as palavras: o arquiteto, o

designer, o habitante. Dentro dos containers, fotos dos projetos futuristas

(muitos dos quais presentes hoje em nosso cotidiano) e, em contrapartida,

fotos de ambientes que foram recaracterizados pelos seus moradores. Via-se

quartos com temas de tigres e onc;;as, banheiros florais, salas-de-jantar

cinematograficas, etc.

A exposic;;ao nao apresentou grande quantidade de material que motivasse

uma visao crftica do conjunto das propostas, mas era possivel notar uma

Page 106: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

106

"falha" nesses projetos "futuristas", entre os quais o Living 1990: a

impossibilidade projetual de controlar, via robos e toda a parafernalia proposta

pelo Archigram, procedimentos fantasiosos - como os quartos com oncinhas -

de identidade espacial das pessoas.

7.8 Arquitetura e Interface

Em contrapartida, a conjun9ao dos projetos Living 1990 e Cushicle aponta para

urn aperfeiyoamento dos trabalhos do grupo: de urn lado a utilizayao do design

ligado as multiplas possibilidades de reconfigurayao especial - que, com o

Cushicle chegaram a urn nivel estruturas minimo -, e a proposta de as

unidades habitaveis (Living 1990) estivessem ligadas nao mais a uma mega­

estrutura fisica urbana, mas a uma mega-estrutura informacional que

alimentaria e possibilitaria a maleabilidade da organizayi'io do cotidiano

urbane. Era assim colocado em objetos arquitetonicos que a interface

informacional Homem/maquina poderia resultar em grandes transforma96es

espaciais.

7.9 Instant City, a Metr6polis Visitante

Com apoio financeiro do Graham Foundation for Advanced Studies in Art, de

Chigago, foi possfvel ao Archigram desenvolver em abril de 1969 o projeto

Instant City, que culminou ideias desenvolvidas em diversos antigos projetos e

foi referencia do grupo.

Ja tendo claras suas preocupa96es e propostas no mundo conectado pelos

meios de informayao, em Instant City, o grupo trabalhou com a escala urbana,

tendo como pesquisa preparat6ria os la9os culturais entre diferentes culturas

atraves das redes televisivas. Apesar da apontada proximidade entre as

culturas diversas em igualdade que propunha Mcluhan, o grupo ingles sabia

que isso eram ideias distantes da realidade imediata das cidades - no caso, a

..

Page 107: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

107

principio, da lnglaterra, mas que logo se estenderia a outras em diferentes

paises. Sabiam que, apesar da globalizac;:ao informacional, as pessoas,

principalmente nas pequenas cidades, sentiam-se mais e mais frustradas,

notadamente os jovens que gostariam nao apenas de receberem informac;:oes

dos grandes centros, mas de estarem envolvidos em todos os aspectos da vida

contemporanea onde suas pr6prias experiencias fossem vistas e integradas . como parte do estava ocorrendo. Havia ao mesmo tempo um incremento das

metr6poles, onde "tudo" acontecia, e reac;:ao contraria de quem estava a margem, que nao participava.

Para isso a Instant City reagia com a ideia de uma "metr6polis visitante", uma

metr6polis dinamica conectada e criando uma rede de informac;:oes que

cobririam uma malha de cidades que se conectariam no memento em que o

evento arquitetonico, que era a Instant City, ocorresse.

E interessante colocar que, mais uma vez, o grupo Archigram nao apresentava

um projeto total e unissono, mas polifonico e atonal, digamos assim.

Sintetizando experiencias e propostas anteriores ja apresentadas ou que

vinham sendo pesquisadas, a Instant City nao e um conjunto homogeneo de

componentes. 0 projeto foi exibido atraves de desenhos que foram feitos nos

ultimos dois anos e continham elementos graficos de diversos projetos

anteriores e, com o tempo, incorporava fragmentos de novos projetos do

grupo.

Mais uma vez a figura do robo - que nao tinha aspectos antropom6rficos nem

antropometricos, como normalmente representado no cinema, na televisao e

nas HQs de ficc;:ao cientifica - aparecia como chave no projeto, dessa vez

como simbolo da possibilidade das maquinas eletroeletronicas de coletarem e

organizarem diversos servic;:os operando uma infinidade de variaveis com as

quais o usuario poderia reconfigurar seu ambiente.

E importante notar que essa propriedade das maquinas eletricas (no caso, os

robes) vinha sendo notada por Mcluhan desde seu livro Understanding Media,

Page 108: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

108

onde propunha que, ao contrario da maquinas mecanicas que possibilitavam

expansOes do homem e consequentemente de seu ambiente, a energia

eletrica propiciaria a implosao do homem e suas faculdades, aglutinando em

aparelhos simples diversas funr;:oes e estimulando, com isso, seus diferentes

sentidos ao mesmo tempo .

. Archigram propunha que a Instant City funcionasse como a TV, que seria

possfvel crlar malhas lnformaclonais que conectassem as pequenas cidades

do interior as metropolis. Os componentes eram sistemas audiovisuais, TVs,

unidades m6veis (carros e caminhoes, a principia). jogos de iluminar;:§o,

estruturas pneumaticas, maquinas de entretenimento e guindastes leves.

0 projeto tinha uma linha te6rica que era sintomatica do envolvimento do

grupo com as novas tecnologias: o "hardware", onde estariam o design de

edificar;:oes e espar;:os; e o "software", onde seriam trabalhados os efeitos da

informar;:ao e programar;:ao dos ambientes criados. Teoricamente tambem se

baseava na ideia de dispersao do ambiente urbana, e da arquitetura entre o

entretenimento e aprendizado.

7.10 0 Universo das MetaMetr6polis

Mesmo com propostas inovadoras no design dos eventos urbanos, havia uma

preocupar;:ao do grupo de utilizarem os conhecimentos tecnol6gicos existentes

e aplica-los as situar;:oes reais. 0 programa envolvia reunir informar;:oes e

trar;:ar o itinerario entre as comunidades que participariam do evento, assim

como mapear as atividades e utilidades urbanas ja existentes nesses lugares

(como clubes, radios locais, universidades. etc) que pudessem ser integradas

ao sistema informacional urbana a ser criado. Com isso, a "cidade pacote" que

era o programa da Instant City nao seria uma alien, mas urn sistema

complementar, articulador e dinamizador de urn processo urbano.

Page 109: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

109

Nesse sentido, considero que . seja possivel aponta-lo como uma

MetaMetr6polis: a metalinguagem da metropolis contemporanea. Num universo

interligado televisamente, e sobretudo eletricamente - que, energia movel, e

portadora de infindaveis futuras aplica¢es -, a Instant City, apropriando-se de

pequenos elementos existentes em quaisquer cidades ou vilarejos, e

propiciando (ou ativando) sua interconectividade, refletia sobre o universo

como uma grande metropolis ao mesmo tempo que concretizava essa ideia.

No primeiro estagio das operagoes da Instant City, que foram simuladas na

lnglaterra e posteriormente em Los Angeles, EUA, o projeto se iniciava com

cerca de 20 velculos (entre caminhoes e trailers) que carregavam todos os

equipamentos necessaries ao evento. Sua realizagao estruturava-se em onze

passos, que iam do carregamento do material nos veiculos, o

descarregamento os locais escolhidos, a montagem das estruturas-suporte, as

conexoes telefonicas e televisivas, a ligagao com as atividades existentes na

cidade, o intercambio informacional com outras cidades, a desmontagem do

evento e a partida dos veiculos - deixando as conexoes ativas.

A imagem dessa atividade para o Archigram era de uma serie de caminhoes

operando como formigas, o que proporcionava mesmo um trabalho pratico e

imediato, mas confrontava com a ideia da cidade instantanea, que apareceria

do nada e, apos o evento, esvaneceria. Os baloes e zepelins tornaram-se o

instrumento adequado para as futuras atividades da Instant City.

Em simulagoes da Instant City em outras cidades, como o projeto para Monte

Carlo, o grupo desenvolveu o evento ja propondo a utilizagao dos bal6es e

coberturas de lona, leves e de facil montagem e desmontagem. Na sequenica

de imagens da Instant City, ve-se uma cidade pacata onde nada acontece e ha

interrogagoes sobre a entao em voga Aldeia Global. Chegam os baloes da

Instant City, baixam e montam suas estruturas de cabos e coberturas de lona,

conectam as poucas atividades locais com as atividades que trouxeram,

interligam o evento aos radios e telcvisoes, e assim constroem uma malha de

informagoes. Depois desmontam as estruturas fisicas, recolhem os cabos e

Page 110: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

110

Ionas e desaparecem no ar. Deixam as conexoes e o que criaram: a

metametr6polis informacional.

Do design de elementos intercambiaveis, que por si ja sao uma redefinigao da

proposta "moderna", onde a nogao de standard era ideia mestre e objetivo, ao

design efemero dos eventos construtores de metr6plois informacionais,

Archigram levou a cabo a ideia de Peter Cook, para quem eles estavam no

"neg6cio" de ideias. No inicio de suas atividades discutiam e propunham que

a cidade era uma teia de troca de informagoes mediada pelos novos meios, e

que seriam transformadores do design de elementos arquitetonicos industrias;

e no final, seus projetos, como a Instant City, chegaram quase que a imaterialidade: transformavam-se no design de suas ideias, no design de

estruturas de informagao.

Page 111: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

Plug-in-City

Arquil.ctura c Tclc-Tccnologias

Archigram

Meios como radio e televisao conectavam diversas partes do mundo, reconfigurando sociedades; os elementos de pl6stico e kits montaveis de qualquer coisa recompunham a paisagem cotidiana; e os foguetes levavam os homens e nossa imagina<;:ao ao espa<;:o sideral - o que foi vivido nos dinamicas HQs. As cidades, para o grupo Archigram, seriam compostas de eventos-arquitet6nicos que estimulariam as conex6es entre as pessoas e informa<;:6es, mas que se diluiriam na trama informacional que despertavam.

Page 112: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

Arquitclura c Tclc-Tccno!CJ<_l;ias

Archigran-..

Instant City

C6psulas

.............. :..-.. ••• -....................... ··-··· .......... do""' -- .... ~." ....... , ., .. ,,..., ........ ---. ,_....., .... ~-~ ............... -• ~~. ~ •.. , ................ -~d

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Page 113: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

113

PARTE C

TECNOLOGIAS ELETRONICAS E ARQUITETURA

Page 114: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

114

Ao propor a discussao entre as Tecnologias Eletr6nicas e a Arquitetura,

busquei resgatar e analisar projetos contemporaneos que trabalham nesses

sentido. Assim, diferente dos t6picos anteriores, das Tecnologias lndustriais -

onde trabalho a Bauhaus - e das Tete-Tecnologias - onde os objetos foram as

obras de Marshall McLuhan, Archigram e Buckminster Fuller -, agora abro a

questao para diversos autores e arquitetos. As discussoes, teorias, encontros

e ooras estao ocorrendo hoje. 0 termo Arquitetura Virtual foi cunhado ha

menos de uma decada por Peter Weibel e e pouco assimilado pelos

arquitetos.

E entao quase ao mesmo tempo - e as vezes realmente em concomitancia -

que textos, artigos, videos e projetos foram lidos e vivenciados. Nao M urn

te6rico-chave que abranja a totalidade das quest6es, nao ha um arquiteto­

chave que sintetize as propostas. Tipicamente vinculado ao universe

contemporaneo, esse segmento da disserta9ao e feito ao mesmo tempo em

que as coisas acontecem. No universe digital, a modeliza9ao, a simula9ao, a

apreensao, a analise e a critica sao partes de um mesmo processo que por

vezes dura horas, minutes, segundos.

Contudo, pela diversidade de obras e pontos de discussao apresentados

quando trabalhamos a interface meios eletronicos/arquitetura, articulei os

projetos e corpos te6ricos em tres eixos. Esses eixos nao existiam a priori e

muito menos sao segmentarios ou excludentes; servem como estrutura dos

capitulos desta Disserta9ao, guardando alguns pontos de semelhan9a entre si,

que identifiquei como Tradur;ao, lncorporar;ao e lmersao.

Esses termos sao abrangentes, suscetfveis a diferentes defini96es, e por

muitas vezes sera possivel, na leitura das discuss6es dos projetos por mim

propostas, considerar que poderiam ser incluidos em outro eixo. Fa9a-o.

Havera realmente caracteristicas desses Ires eixos em quase todos os

projetos. De minha parte, gostaria de destacar pontos que considerei como

argumenta9ao para defini9ao de cada eixo.

Page 115: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

115

I CAPiTULO 8

TRADU<;:AO, INCORPORA<;:AO E INSER<;:AO

Tradu~rao

Os meios tecnol6gicos como a TV, video, computadores, grandes telas de alta

resoluc;;ao esUlo cada vez mals presentes nas nossas cldades. E lmpossfvef

aos arquitetos, os construtores das cidades, deixarem de lado asses meios e

as mudanc;;as que vem trazendo ao modo de vida das pessoas e, em

consequencia, ao modo como elas se relacionam com o ambiente urbano.

Assim, como a dramatizac;;ao criou seu espac;;o na cidade (teatros), ou os filmes

(cinemas), esses novos meios apontam novas possibilidades. Neste eixo

pretendo colocar em relevo como arquitetos vem trabalhando na Tradur;ao das

mudanc;;as oriundas desses novos meios tecnol6gicos em edificios concretes,

entendendo a traduc;;ao como uma forma de leitura critica, a traduc;;ao

intersemi6tica sofrendo a "influencia nao somente dos procedimentos de

linguagem mas tambem dos suportes e meios empregados, tais que neles

estao embutidos tanto a hist6ria quanto seus procedimentos" 1.

Os projetos escolhidos para discussao nesse capitulo sao caracterizados por

esta reflexao sobre o impacto das novas midias na sociedade, tendo

arquitetura como objeto desta reflexao. Quase sempre a proposic;;ao de discutir

e criar um objeto critico a partir de um primeiro corre riscos de se trabalhar no

nivel dos significados, sem se apropriar da 16gica intrinseca da estruturac;;ao,

da sintaxe do objeto.

A Tradur;ao lntersemi6tica, como escreveu Julio Plaza, tende a ser (ou busca

ser) iconica, no sentido de criar outro objeto captando as qualidades inerentes

1 PLAZA, Julio; Tradul}tio lntersemi6tica; Ed. Perspecliva; Sao Paulo, 1987

Page 116: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

116

ao objeto primeiro. 0 pensador americana Charles Sanders Peirce2 escreveu

que urn signo pede ser iconico ao representar seu objeto atraves da

similaridade. 0 icone peirceano se da no campo das ideias, mas h8 a

possibilidade de signos externos despertarem essa relac;:ao genuina e primeira

com o objeto: sao os hipoicones que, como chama Peirce, sao

"substantives", ou seja, existem em si mesmos autonomamente. E nesse

campo que se opera as Tradur;oes lntersemi6ticas.

Existem tres categorias de hipoicones: lmagens, que se identificam com o

objeto lnstantaneamente, em "Primelra primeiridade"; Diagramas, que atraves

das relac;:oes entre sues pr6prias partes, e se organizando de acordo com leis

que lhes sao pr6prias, buscam a ideia do objeto (urn exemplo dessa categoria

sao as equagoes matematicas); e as Metaforas, que busca a identificagao da

ideia do objeto atraves de paralelismos com outros objetos (por exemplo, o

nome dado "asa" da xicara).

Assim, o capitulo Tradur;ao e fundado sobretudo nas caracteristicas

metaf6ricas dos projetos das Video Folies a serem analisados, na medida em

que os arquitetos, com a proposta de refletirem sobre os vidoclips no ambiente

urbana, propoem que a identificagao com caracteristicas com o meio, a ideia

intrinseca ao meio (video), seja dada atraves do paralelismo com as formas e

intengoes projetuais desses objetos arquitetonicos.

0 projeto das Video Folies, realizado em Groningen, Holanda, constitui na

construr;ao de pavilh6es para que cerca de 40 pessoas possam juntas usufruir

da exibir;ao de videos musicais, e que esses edificios sejam objetos de

reflexoes sobre a 16gica propria das imagens do video. Trabalho aqui mais

detidamente sobre as ideias de Paul Virilio e Arlindo Machado, e os projetos

de Bernard Tschumi e Peter Eisenman.

2 PEIRCE, c. S.; Semi6tica; Ed. Perspectiva; Sao Paulo, 1977

-

Page 117: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

117

lncorpora~rao

Peter Weibel cunhou a expressao Arquitetura Virtual para os edificios que se

constr6em na interface Homem, maquina, ambiente. A utilizac;ao de

instrumentos tecnol6gicos contemporaneos em edificios propiciam urn controle

do projeto fazendo com que os ambientes propostos ganhem novas dimensoes

e possibilidades formais, visuais, enfim, de apreensao ambiental que estao

alem da concretude dos predios.

Com a lncorporaqao de meios eletronicos, arquitetos vern trabalhando novos

conceitos espaciais e composic;oes formais ancestrais de modo

contemporaneo, passando de elementos digitais diretamente inseridos nos

edificios, que possibilitam suas reconfigurac;oes, ao uso interativo de imagens

sinteticas que ampliam e criam espac;os alem dos corpos concretes dos

edificios.

Para este eixo escolhi o projeto de Jean Nouvel para o lnstituto do Mundo

Arabe, que tern instrumentos eletronicos incorporados na concretude do

predio; os trabalhos de Christian Moiler, Space Balance e Zei!Galerie, nos

quais utiliza recursos digitais e imagens sinteticas para potencializar novas

apreensoes ambientais; e o Bar Code Hotel, de Perry Hoberman, cujos

ambientes tern como base espac;os pre-existentes mas que se formam e/ou se

reconfiguram, estreitamente vinculados a transformayao dos dados contidos

nos c6digos de barras, em ambientes virtuais.

Entendo que, mesmo em diferentes instancias, todos os projetos que serao

discutidos incorporam meios eletronicos e/ou digitais. Todavia, o diferenciador

das obras que serao apresentadas nesse capitulo e que tal incorporac;ao da-se

inclusive no universo concreto. Os edificios existem concretamente e estao

inseridos em contextos urbanos que lhes impoem e/ou sugerem caracterfsticas

projetuais. Ha nesses projetos a necessidade da lncorporaqao ffsica de

instrumentos eletronicos e digitais, que servern de potencializador das

Page 118: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

118

propostas dos arquitetos preocupados com essas novas tecnologias no projeto

de arquitetura. Os ediffcios so sao capazes de transmitir as suas mensagens,

as ideias dos arquitetos, mediados por asses instrumentos eletronicos.

lmersao

"Cada fragmento de saber e de existencia pode se decompor em um mosaico infinito de

lml'lgens. Este mosaioo de elementos que, tornados isoladamente, siio insignificantes, torna-se

o mundo dado a nos atraves das midias"3.

Proponho aqui a discussao de experiencias arquitetonicas que vem sendo

construidas integralmente em ambientes virtuais, no universo digital.

Um dessas experiemcias e a simulayao digital que trabalha com obras

existentes ou que nao foram construfdas concretamente, principalmente com

fins de pesquisa e didaticos, como sao os casas desenvolvidos por M. Koob,

que criou a Bauhaus-Virtual; a equipe da Universidade de Nancy, com o

projeto de iluminayao do Museu do Louvre; M. A. Crippa, com a obra de Frank

Lloyd Wright; e Txatxo Sabater, com os projetos urbanos de Cerda para

Barcelona.

Nesse aspecto, a ideia de Traduqao emerge novamente, afinal ha os projetos

arquitetonicos - muitas vezes o proprio ediffcio construfdo - e trabalho se da

em suas construqoes no ambiente virtual, o que compreende uma elaborayao

de similaridades entre linguagens. E necessaria a tradw;ao da arquitetura

apresentada em desenhos tecnicos, croquis e fotos para a linguagem digital da

informatica.

Como resultado e signa mediador entre o universo digital e concreto, Iemos

imagens sinteticas. Todavia, o universo digital tem sua linguagem propria, uma

linguagem matricial numerica binaria. Dessa maneira, a traduqao nao se da via

imagens ou metaforas, mas com a construyao de diagramas. Partindo disso,

3 DURAND, Regis; "Usage de !'Image, Usage du Monde" in Art Press 180, p. 43

Page 119: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

119

os projetos que serao discutidos nesse capitulo portam a ideia de traduc;ao.

Porem, as diferenc;:as principal entre eles e as Video Folies (discutidas no

capitulo Tradur;ao) sao extremas; para isso o termo lnserr;ao e usado para

caracterlza-las.

Tais projetos apenas existem no ambiente virtual. Nao tem nenhuma metafora

coni os meios eletronicos ou digitais, e tambem nao os incorpora - mesmo

porque nao possuem concretude. Tem como base o universe virtual, sao

"construfdos" com elementos virtuais e sua fruic;:ao se da "apenas"

virtual mente.

Em outra vertente, projetos contemporaneos que levam em considerac;:ao as

redes digitais de informac;:ao, a Internet, e que nela tem seu campo de

realizac;:ao. Sao exclusivamente frutos desses novas universes. Nao estao

apoiados em antigos projetos e sim· apontam experimentac;:oes arquitetonicas

que apenas sao possfveis porque imersas no ambiente virtual.

A preocupac;:ao dos arquitetos foi refletir com projetos a Arquitetura frente as

Tecnologias Digitais, e tem como instrumental as potencialidades do meio

numerico digital, como a transmigrac;:ao de informac;:oes, independencia de

bases ontol6gicas da arquitetura ate entao (como a gravidade), e a

mutabilidade informacional/imagetica.

Discutirei o projeto para o Imagine 97 que vem sendo realizado entre Monaco

e Los Angeles tendo como ambiente de trabalho computadores ligados a Web,

com tecnologia de video-conferencia; e a construc;:ao de Woiksed, o "planeta

virtual" de Emanuel Pimenta, que e todo construido no espac;:o virtual das

redes digitais.

Indica mais uma vez que a leitura dos projetos a serem discutidos nao seja

categorizada rigidamente segundo Tradur;ao, lncorporar;ao e lmersao, mas

que as projetos sejam vistas como objetos de experimentac;:ao de arquitetos

frente aos novas meios de comunicac;:ao

Page 120: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

120

I CAPiTULO 9

TRADUc;AO: lmagens Digitais e Arquitetura

9.1 Video e as Folies de Groningen

A ci~ade Groningen, ao norte da Holanda, com pouco mais de 950 anos, vem

sendo h8 algum tempo sftio de projetos urbanos e arquitetOnicos

contemporaneos de carater experimental. Tanto o Museu da Cidade, projetado

por varies arquitetos e artistas, entre eles Philippe Starck; quanto os Portais de

Groningen, projeto coordenado pelo arquiteto Daniel Libeskind, que tambem

reuniu profissionais de varias areas que trabalharam as ideias de acessos e

limites nas cidades contemporaneas (entre eles Paul Virilio); e o projeto das

Video Folies, que reuniu cinco equipes de arquitetos.

Este projeto, realizado em 1990, tinha como proposta basica a discussao da

imaterialidade das imagens eletronicas concretizando-se na materialidade

arquitetonica. Para isso foram convidados cinco profissionais da area de

arquitetura que participaram da exposic;;ao Deconstrutivista realizada por

Philhip Johnson no MoMA, Nova York, em 1988: Peter Eisenman, Rem

Koolhaas, Zaha Hadid, Coop Himmelblau e Bernard Tschumi.

Tendo em vista as novas concepc;;6es esteticas das imagens que estavam

sendo experimentadas com os video de musica (video clips), onde se

trabalhavam certas ideias e emoc;;oes aliadas a maneiras de corte e edic;;ao de

imagens para condensa-las em aproximadamente 5 minutes de video,

incorporando cada vez mais recursos digitais de produc;;ao, aquisic;;ao e p6s­

produc;;ao das imagens, os organizadores queriam discutir o contexte dessa

arte em lugares publicos.

Na apresentac;;ao dos projetos, Frans Haks, entao diretor do Groninger

Museum, coloca que assim como no inicio desse seculo os filmes inspiraram

um novo tipo de arquitetura, os cinemas, e ainda ha muito tempo certo tipo de

Page 121: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

121

encenayiio dramaturgica fora responsavel pelo cria9iio dos teatros e se

pergunta se os videos trarao uma reconcep9ao do espa9o arquitetonico_4

Houve uma seleyao de cerca de 200 videos, organizados em 13 categorias,

que foram exibidos em cinco cabines com capacidade para 40 pessoas,

localizadas na area periferica no centro da cidade, junto ao rio onde estava em

processo de construyiio o Museu de Arte Contemporanea de Groningen -

Groninger Museum.

9.2 Arquitetura de Movimento e de lmagens

Os novas meios tecnol6gicos eletronicos ligados a informatica estao

reconfigurando os espayos urbanos e as formas arquitetonicas. As imagens

eletronicas e imagens de sintese (video, TV alta definiyiio em espa9os

publicos, realidade virtual), especialmente, estao cada vez mais presentes nos

questionamentos e projetos de arquitetos e urbanistas que, conscientes ou

nao, nao tem mais como se distanciar das influencias desses novas meios no

cotidiano das metr6poles.

A ordem classica da arquitetura, recuperada dos gregos, era hierarquizada

esteticamente, baseada na "geometria da natureza", nas rela96es numericas

perfeitas, expressas nas plantas e fachadas dos edificios, em especial na

fachada principal: plano: quadro.

Na passagem do seculo XIX para o XX, os meios de produyiio e representayiio

tiveram papel transformador na arquitetura. Os carros, avioes e sobretudo os

trens trouxeram aos projetos arquitetonicos nao s6 a ideia de movimento

atraves de jogos geometricos, mas a intenyiio real de que a obra fosse

apreendida pelo deslocamento dos usuaries. Assim, para que a ideia do

arquiteto se realizasse, era precise a determinayiio de percursos:roteiros:

imagens em movimento.

4 MEIJER, Jola e TEE, Ernie (org); What a Wonderful World; Groninger Museum; Groningen, 1990

Page 122: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

122

A ideia do movimento "real" representado pelos meios de transportes foi

crucial a arquitetura desde entao. Do trem passou-se rapidamente ao carro.

Brasilia, projeto de Lucio Costa e Oscar Nyemeier, e a cidade simbolo da

presenc;:a dos carros como mote da formulac;:ao das metr6poles baseadas em

eixos de grande fluxo viario. E nas "strips" de Las Vegas, Robert Venturi

nom~ia a arquitetura "pato" e a arquitetura "abrigo decorado", formas mais

marcantes de apreensao arquitetonica para carros em alta velocidade.

Com seus questionamentos e propostas, Venturi coloca que o espac;:o fruivel

da arquitetura nao mais interessa, pais nao ha tempo ou disposic;:ao para

percorre-la. No predio funciona uma cafeteria? Nao importa seu ambiente;

para transmilir sua mensagem instantaneamente, tern a forma de uma xicara.

Ou os cassinos de Las Vegas, caixas desinteressantes distantes centenas de

metros da auto-pista, onde mantem urn enorme luminoso chamando a atenc;:ao

para seus simbolos: sucesso, dinheiro, diversao. Arquitetura para as vias

expressas: outdoor.

Retomando a imagem das camadas sobrepostas de cidades formando nosso

cotidiano urbana contempon3neo, Iemos, em certa medida, consciencia de

seus indices desde as cidades gregas as cidades automotivas. Os meios

tecnol6gicos eletronicos trazem novas questionamentos e paradigmas que

vern sendo discutidos por artistas, fil6sofos e arquitetos. Ora se trabalha em

projetos arquitetonicos realizados em ambientes sinteticos (Realidade Virtual),

onde a obra e apresentada em imagens acessadas por computador,

construidas em base numerica digital; ora se constr6em projetos concretes que

questionam a interac;:ao desses novos meios eletronicos, principalmente

ligados a imagem, em ambientes "reais".

Essas duas questoes sao de extrema importancia para a arquitetura

contemporanea. Contudo, neste capitulo tera destaque o segundo ponto: como

pode ser uma obra projetada e construida para abrigar, criticamente,

dispositivos eletronicos que, por sua vez, trazem consigo novas

Page 123: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

123

experimentayoes as artes baseadas· em imagens? Como objeto de analise

tomarei as VideoFolies de Bernard Tschumi e Peter Eisenman, construidas em

Groningen, Holanda, que sao cabines de video instaladas em lugares publicos

abertos na cidade.

9.3 · Encruzilhadas de lmagens: Paul Virilio

Paul Virilio, urbanista e fil6sofo frances dedicado a analises das

transformayOes na artes, cl&nclas e sociadada provocadas palos novos meios

tecnol6gicos, e uma referencia marcante a todos que trabalham com questoes

correlates. Principalmente ap6s o livro L'Espace Critique, de 1993, ele vern

sendo balisador de questionamentos e experimentayoes nas areas de

urbanismo, arquitetura e outras manifestayoes artisticas que operam na/com/a

Cidade atraves dos meios digitais de informayao.

Detendo-me em alguns pontos de seus textos que considero pr6ximos as

rela96es das imagens digitais e arquitetura, tomarei as questoes : P61os

lnertes: Encruzilhadas; e Superficies Limite: lmagens.

9.4 P61os lnertes: Encruzilhadas

Em seu livro "A lnercia Polar"5, Paul Virilio nomina um dos pontos que

considero fundamentals a discussao dos novos meios tecnol6gicos na

configura9ao das cidades.

A velocidade foi um dos temas mais trabalhados por Virilio: da constata9ao de

que desde a arquitetura moderna as cidades tornaram-se subordinadas as

rotas dos carros, ate o deslocamento supersonico dos avioes a jato que, alem

de romper barreiras fisicas, rompia a no9ao de tempo linear: partindo de um

ponto e viajando supersonicamente a oeste, seria possivel viver a mesma hora

5 VIRILIO, Paul; L'lnercie Polaire; Christian Bourgois; Paris, 1990

..

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124

diversas vezes em lugares distintos. Virilio detem-se em alguns textos nos

b61idos de corrida, os dragsters. Nessa corrida nao ha referencia alguma ao

espa<;:o; nao importa o tempo para se percorrer determinado espar,;o: o que

vale e em quanta tempo atinge-se a maxima velocidade. Para onde? Nao

importa. Assim, mais que a rela<;:ao ve/ocidadeltempo transformar-se em

acelerar;tJo (m/s2) - o que nao deixa de ser considerado -, ha a autonomia da

ve/ocidade enquanto valor absolute.

Contudo, quando se debru<;:a inteiramente sabre os novas meios tecnol6gicos,

em especial o computador, considero que seus pontes atingem o limite

transformador nas rela<;:oes deslocamentolespar,;olvelocidade. Se com o

supersonico Virilio atribui independemcia a velocidade, fazendo com que essa

no<;:ao suplante as rela<;:6es tradicionais e lineares espa<;:o/tempo, quando se

detem no computador, que e "im6vel" e apresenta um universe

instantaneamente, em constante muta<;:ao, ha uma ruptura: a velocidade atinge

seu grau absolute: a Luz. Nao obstante, considero que ao mesmo tempo traz

consigo seu complementar contrario: o Abismo.

9.5 Superficies Limite: lmagens

" ... o momenta da inercia sucede ao des/ocamento continuo. '8

Paul Virilio

0 momenta da inercia chega como "veiculo estatico", o "veiculo audiovisual",

que suplanta o deslocamento fisico fazendo com que o meio nao mais seja um

vetor em busca de informa<;:6es, mas um p61o atrator e gerador de informa<;:6es

que estao permanentemente a sua volta.

Ja em L'Horizon Negatif(1984), Virilio coloca a ideia dos p61os atentando para

que, com os meios de comunica<;:ao permeados pela informatica, as

informa<;:6es possuem determinado Iugar no espa<;:o, mas se encontram em

movimento constantes. E as informa<;:6es nao seriam presas a um meio, mas

6 Ibidem, p.40 ..

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125

permutaveis e intercambiaveis. Como escreveu Nicholas Negroponte, o "meio

nao e mais a mensagem". 7; ou seja, nao ha informac;;oes produzidas

exclusivamente para televisao e outras para radio ou video, com linguagens

pr6prias e restritas aos meios. Nao mais o meio como balisador de

determinada linguagem.

A linguagem da informatica e baseada em relac;:oes numericas que, em ultima

instancia, sao estruturadas binariamente em Os e 1 s. Assim, se trabalhados

com meios digitais, obras concebidas em qualquer linguagem sao, por fim,

traduzidas em c6digo binario. E todo meio e capaz de reprocessar tais signos

para suas combinac;;Oes signicas pr6prias. Desse modo, as informac;;oes, re­

apresentadas na superficie da tela como imagens (por exemplo) nao sao mais

presas ou nao trazem necessariamente indices de seus meios originais ou de

um objeto referente. Nao dependem de uma posic;;ao no espac;;o, mas estao em

permanente mutac;:ao e intercambio "grac;:as a superexposic;:ao da acelerac;:ao"8

E, tratando dos meios audiovisuais em L'lnertie Polaire, creio que a extensao

dessa afirmac;:ao seja que as informac;;oes, mutaveis e intercambiaveis, apenas

se realizam atraves da velocidade maxima, a velocidade da luz: lmagens.

Todas as informac;:oes/imagens que Iemos numa tela sao presentificadas a velocidade da luz e estao em relac;;ao direta com uma base de dados

numericos. Se a superficie as pr6prias imagens digitais transformam as

relac;:oes plasticas entre as artes correlatas - foto, pintura, cinema, video - M

tambem seu sentido 16gico absolutamente diferenciado. De um modo ou outro

essas linguagens, principalmente foto e cinema, trazem um carater indicia!

inevitavel; ou seja, nao existem sem a presenc;;a de um objeto referente -

mesmo nas fotos-luz de Moholy-Nagy ou nos filmes de animac;;ao de Norman

Mclaren, que indiciavam a presenc;;a dos objetos que incidiram diretamente

sobre a pelicula. Tambem ha outra considerac;;ao fisica: por mais que se

utilizem metaforas ou alegorias poeticas contrarias, um filme e um filme e um

filme (vale para foto). Mesmo sem ser revelado, sabe-se que determinada

7 NEGROPONTE, Nicholas; A Vida Digital ; Cia das Letras, SP, 1995

8 VIRILIO, Paul; L'Horizon Negatif; Ed. Galilee; Paris, 1984, p.169

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126

pelicula vela tal e unica determinada imagem. 0 video, "gravado" em sistema

eletromagnetico, mesmo guardando ordenagao linear, quase estruturado

literariamente, como colocou Arlindo Machado • , tem sua base regravavel,

permutavel, mas ainda restrito a propriedades intrinsecas a seu meio.

As imagens digitais rompem as suas qualidades 16gicas com as do meio. Som,

imag'em em movimento, imagem estatica, com alta ou baixa resolugao, toda

informagao depende de um meio para se apresentar, mas guarda, contudo,

uma 16gica ordenativa propria: ordenada em base numerica, uma paisagem,

um concerto, um timbre sao sempre construgoes numericas, ordenadas em

base numerica.

9.6 lmagens Numericas

Porem, nao devemos ligar a estrutura binaria a 16gica dicot6mica, onde cada

estimulo gera uma resposta inalienavel. Nao, a 16gica numerica binaria e

potencial e potencializadora.

Qualquer imagem e um modelo numerico computacional, e como tal ha, sem

me estender muito, duas caracterfsticas que devem ser consideradas:

1. Os modelos numericos computacionais sao constitufdos por numeros

inteiros. A qualquer aproximagao matematica para se "reconstruir" o mundo

concreto em imagens, logo as relagoes numericas aproximam-se de numeros

reais, onde as mfnimas diferengas estao nos pontos flutuantes: 32,767 = 0,32767x102

, onde o 2 representa a quantidade de casas decimais dos

numeros inteiros nesta relagao matematica, e que, ordenada em agrupamentos

binaries de numeros inteiros e:

12 132767

9 MACHADO, Arlindo; "0 Video e sua Linguagem", in Revista USP no16, dez.92/jan/fev. 93; Universidade de Sao Paulo, Sao Paulo

Page 127: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

127

Mas essas nuances sao "perdidas" quando ordenadas no c6digo binario de Os

e 1 s. Porem, se pensarmos num imagem estruturada em 32 bits, sua

representac;:ao matematica significa uma gama de possibilidades exponenciais,

que vao de 0 a 232-1

• Em c6digo binario, sua estrutura e assim representada:

I····· 1231 1232-1

Onde 21 significa a possibilidade das combinac;:oes: 0,0;0, 1; 1 ,0; e 1, 1. Assim, a

gama de combinac;:oes possfveis e finita mas imensa, podendo, desse modo,

guardar nuances quase infinitesimais.

2. Os modelos numericos trabalham em combinac;:6es binarias que vao, por

exemplo, de 0 a 232-1 possibilidades; contudo, em nenhum instante qualquer

dessas combinac;:6es trouxe consigo informac;:6es qualitativas, nenhuma

referencia indicia! com o meio e/ou objeto referente. Assim, os modelos

numericos sao a possibilidade de imagens, sons, desenhos, calculos, etc.

As imagens digitais, apresentadas de acordo com a velocidade da emissao

luminosa dos tubos cat6dicos na superffcie das telas, estao, em estado bruto,

apoiadas numa base numerica puramente 16gica: as imagens apresentam-se,

sao manipuladas, transmigram entre os meios, mas distanciadas de suas

apresentac;:6es "perdem-se" num abismo numerico.

0 universe superficial das telas e imagens ocupam cada vez mais espac;:os nas

cidades e transformam a vida urbana. Dos computadores pessoais que

trazem/levam informac;:6es e reorganizam o cotidiano privado, aos

computadores portateis que conectam seus usuaries a redes sem referencia

posicional; os terminais de bancos, supermercados, festivais, que trazem

informac;:6es e permitem intercambio em escala global que traduzem valores

ate pouco tempo materiais (dinheiro, por exemplo) para valores informacionais;

ate as grandes telas de alta definic;:ao (jumbo-Iron, por exemplo) espalhadas

nas grandes cidades, que transformam a paisagem urbana nao com

Page 128: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

128

intervenyoes espaciais em Ires dimensoes, mas superficiais e temporais - ou

atemporais.

9. 7 Muralhas Digitais e Porta is: Interfaces

Os eixos e limites das cidades, das muralhas, ruas, edificios, monumentos, sao

agora apresentadas como superficies, que ora existem quando

superficiea/imagem -, ora ee apagam. E, como al@m de apreeentarem imagene

possibilitam muitas vezes sua manipulayao (terminais publicos de Internet,

bancarios), representam um deslocamento total dos limites urbanos: se numa

escala significa que os limites dissolvem-se nos intercambios globais de

informa9ao, por outre lade s6 resta o limite tempo/imagem: a tela como porta,

como acesso direto e barreira ao universe informacional, nao importando se a

milhares de quilometros de distancia ou se com o seu vizinho do apartamento

ao lade.

Virilio se pergunta em "Espa90 Critico" se as aglomera96es urbanas possuem

fachadas, sendo que os limites das cidades sao superficies de interface,

"desprovido de dimens6es espaciais, mas inscrito na temporalidade unica de

uma difusao instantanea" 10. As rela96es arquitetonicas e urbanas diluidas em

migra9ao constante em um "eter eletronico".

Questionando a dissolu9ao do urbanismo no seio das metr6poles, Virilio

coloca que, em Iugar da agora da p6/is grega, nada mais resta que um "tela

cat6dica onde se agitam as sombras, os espectros de uma comunidade em

vias de desaparecimento" 11.

Contudo, se o proprio autor assume que o papel da arquitetura nao se

restringe a proteger o homem das intemperies, mas sim e um instrumento de

medida a organizar o espa9o e o tempo das sociedades, e precise lembrar que

10 VIRILJO, Paul; Espa<;o Crltico; Ed. 34; RJ, 1993, p. 09 11 lbiidem; , p.14 •.

Page 129: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

129

Vitruvio, ha seculos, ja atentava a essa questao no Uvro I do De Architectura' 2,

principalmente quando trabalha a ideia de Metron, que e a busca, em

arquitetura, da ordem correta e harmonica (em sentido etico e estetico), onde

os numeros tinham uma dimensao qualltativa e nao meramente quantitativa, e

havia uma aproxima<;:ao do concreto com o mitico, vinculada a mitologia e aos

fil6sofos gregos.

Assim, permito-me estender essas observa<;:6es a sociedade e arquitetura

contemporaneas permeadas pelos meios eletronicos, notadamente as imagens

digitais, lembrando que a arquitetura tambem e a constru<;:ao da

problematiza<;:ao das 16gicas operacionais intrinsecas aos meios.

Ha entao duas caracteristicas: como se porta(m) a(s) arquitetura(s) no(s)

universo(s) das imagens digitais; e como a(s) arquitetura(s) pode(m) ser

portadora(s) do(s) universo(s) das imagens digitais. Em rela<;:ao ao segundo

questionamento, e para isso tomarei como objeto de analise as VideoFolies de

Bernard Tschumi e Peter Eisenman, duas das cinco cabines de video e

construidas na cidade holandesa de Groningen, que tinham como proposta

geral exatamente a discussao de como a arquitetura pensa-se/constr6i-se

como tradu<;:ao das imagens de video e imagens digitais.

9.8 Bernard Tschumi, Video Folie

9.8.1 Parque de La Villette, Paris

Entre 1982 e 1983 a Uniao lnternacional de Arquitetos (UIA) e a Federa<;:ao

lnternacional de Arquitetos Paisagistas (IFLA) organizaram concurso publico

internacional de projetos para o Parque Urbano La Villette, em Paris, em area

de 33 hectares, inserida em conjunto de 55 hectares contando com a Cidade

da Ci€mcia e Tecnologia e a Cidade da Musica. Entre 472 candidates de 37

paises, o juri presidido pelo paisagista brasileiro Roberto Burle Marx decidiu

pelo projeto do arquiteto franco-sui<;:o Bernard Tschumi.

12 VITRUVE; Les Dix Livres d'Arcl1itecture; Les Libraires Associes; Paris, 1965

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130

Tschumi, que antes de se dedicar totalmente a arquitetura desenvolveu

trabalho te6rico, trouxe o questionamento da no9ao de unidade ao projeto: a

ruptura com inicios e finais; a disjun9ao com denominador comum, alcan9ada

com repeti96es, distor96es e superposi96es. Contudo, colocou que a

dissocia9ao da ideia de sintese nao e a negayao da autonomia ou estrutura do

proje'to arquitetonico, mas que implica constantes e sistematicas opera96es de

dissocia96es no espa9o e no tempo. ·

Seu projeto para o Parque La Villette e baseado em tres sistemas: atividades

pontuais, atividades lineares e atividades p/anares.

• Pontos: cubos vermelhos de 1Om de lado, cada um transformado com

cortes, rota96es, etc, dispostos em uma malha regular ortogonal com 120m

de intervalo, servindo r:omo referencias comuns a todos os eventos;

• Linhas: dois eixos ortogonais cruzam o Parque, um no sentido esla9ao

Pantin - La Villette, outro margeando o rio Ourcq. Ha tambem os "Passeios

de Jardins Tematicos", circuito sinuoso que liga diferentes eventos do

Parque, passando por jardins boti'micos, educacionais, esportivos,

contemplativos, etc.

• Pianos: grandes areas destinadas as atividades constantes no programa

inicial do concurso do Parque, sabre as quais estao inscritos os Pontos e

atravessam as Linhas.

Na interrela9ao desses tres sistemas configura(m)-se o(s) Parque(s). E

Tschumi mostra-se atento a essa possibilidade de composi9ao fragmentaria no

parque atraves dos Passeios Lineares, que metaforicamente nomeia de

"Promenade Cinematique". Nos longos passeios tortuosos que se estendem

em toda a area do projeto, cruzando os eixos ortogonais e costurando os

Pontos (denominados Folies), sao dispostos equipamentos com

funyoes/formas distintas e jardins os mais variados, sendo que a paisagem

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131

forma-se de acordo com o caminhar, de acordo com a sequencia feita pelo

fruidor: cada "jardim ou quadro (cadrage) corresponde aos quadros de um

filme, enquanto o movimento dos visitantes representa a banda sonora. Os

jardins sao organizados de acordo com os princfpios de edic;;ao de um filme,

alternando sincronizac;;ao perfeita com deliberados mismatches" 13

Assim, o universo das imagens esta de algum modo presentes no

desenvolvlmento da arquitetura de Tschumi. Todavia, isso ainda esta

demasiadamente a nfvel metaf6rico. Entretanto, quando e convidado, entre

outros, para projetar uma da cinco VideoFolies em Groningen, as imagens

tecnol6gicas passam ao primeiro plano: como se comporta um edificio em

espac;;o publico que traduza a paisagem urbana seu conteudo, que e a 16gica

das imagens tecnicas: cabines de video e terminais multimfdia ?

9.8.2 Video Folie, Groningen

Uma caixa de vidro no meio de uma prac;;a publica. Paralelepipedo com dupla

inclinac;;ao. Todas as faces, estruturas e divisoes de vidro; piso de grade

metalica, sobre o qual estao torres negras com monitores de video e terminais

multimidia.

Como colocou Arlindo Machado14, os habitos do fruidor do video nao sao os

mesmos daquele do cinema, que sai de casa com o objetivo de entrar em uma

sala escura e olhar atentamente a uma tela onde sera projetado o filme que

veio para assistir. 0 video admite a passagem, tanto ffsica quanto eletronica -

ou as duas. lsto e clare no controle remoto, que traz a TV a estetica do

zapping, a estetica fragmentaria de saltar de canal para canal, assistindo

pedac;;os de programas de canais diferentes, construindo uma ordenac;;ao

imagetica fragmentada para o zappeur : retalhos de imagens. E o video, que

13 TSCHUMI, Bernard; "Pare La Villette" in BARZILA Y, Marianne; HAYWARD, Catherine; e LOMBARD-VALENTINO, Lucette (org.); L'lnvenlion du Pare- Pare La Villette. Paris­Coneours International - 1982 -1983; Graphite Editions; Paris, 1984; p. 22

14 MACHADO, Arlindo; Maquina e lmaginario- 0 Desafio das Poeticas Tecnol6gicas; Edusp; Sao Paulo, 1993

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132

dispensa a sala de projec;;ao, e muito usado para se assistir a uma c6pia do

filme cinematogn3fico; s6 que em casa, com o aparelho do video, ganha os

comandos do controle remote: v~-se o final antes, para saber se vale a pena

assisti-lo; pulam-se trechos; repete-se varias vezes a mesma sequencia; enfim,

a estrutura narrative do video comporta manipulac;;oes do fruidor: a obra em

video esta sempre em fase de p6s-produc;;ao.

A passagem fisica e, de certo modo, a traduc;;ao espacial da passagem

eletr6nica: as telas pequenas dos monitores dispersam a visao, chamando a

atenc;;ao para objetos pr6ximos; a possibilidade de poder ser visto em

amblentes elaros feelllta esse dispers!o; e o canflter da composit;:ao de imagem

em linhas de varredura faz que seja necessaria a recomposic;;ao da imagem

pelo aparelho 6ptico do usw1rio. 0 video esta em corredores de museus,

shoppings centers, ruas e galerias, permitindo que se passe pela obra sem

que precise se deter, parar.

Outra caracteristica do video esta em suas imagens, que sao granuloses, sem

a definic;;ao da imagem cinematogn3fica; emitem luz ao inves de serem

resultados de projec;;ao; e, em ambientes claros, a tela freqOentemente reflete

objetos circundantes. Assim, alem da composic;;ao eletronica fragmentaria, a

imagem do video apresenta-se atraves de transparencies, luminosidades,

opacidades, espelhamentos e sombras.

Considero que a Video Folie de Tschumi traduz metaforicamente diversos

desses aspectos: Arquitetura, Passagens e Sombras: Luz. Alem de aberto ao

publico, mais importante que adentrar seu espac;;o quando quiser obter alguma

informac;;ao ou ver alguma obra em especial, a cabine de Tschumi e

atravessada pelos olhares em transito da cidade, que nao se detem em nada,

mas varrem a paisagem; e o olhar do fruidor, mesmo "dentro", atravessa a

cabine. 0 olhar atraw~s dos pianos de vidro sempre traz ao campo visual do

fruidor imagens do "exterior'' a obra.

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133

E mais que isso, a cabine de vidro e poucas vezes transparente. Duplamente

inclinada, reflete imagens circundantes da cidade, em alguns horarios espelha

o brilho da luz do sol, a noite espelha o brilho da luz dos monitores: sombras,

espelhamentos, opacidades, luminosidades e transparencias: a arquitetura de

Tschumi como traduc;:ao da 16gica do meio que a habita.

9.9 Peter Eisenman, Video Folie

9.9.1 Eisenman e Derrida: Khora

The Pattern of Electron Beam e o nome da VideoFolie projetada por Peter

Eisenman15 para Groningen. Diretor do lnstituto de Arquitetura e Estudos

Urbanos de Nova York, Eisenman, antes da Exposic;:ao Deconstrutivista de

1988 no MaMA, organizada por Philiph Jonhson, ja tinha fortes cantatas com a

filosofia de Jacques Derrida, e sua relac;:ao com as discuss6es entre

arquitetura e as tecnologias contemporaneas da imagem foram motivo de uma

grande exposic;:ao em 1985.

Organizada por J.F. Lyotard no Centre Georges Pompidou - Beaubourg16, em

Paris, centro cultural que foi considerado uma apologia ao High-Tech, a

exposic;:ao de Eisenman se intitulava Les lmmateriaux, anunciada como uma

"dramaturgia p6s-moderna". Entre os desenhos e maquetes, duas propostas

chamam a atenc;:ao se Iemos em mente as VideoFolies: "Visitas Simuladas",

maquete de um 6nibus onde as janelas eram monitores de video, e

"Profundidade Simulada", conjunto de tres hologramas; ambas demonstram um

questionamento do arquiteto frente as imagens contemporaneas de

representac;:ao.

A ligac;:ao com Derrida se deu mesmo diretamente no campo arquitetonico. A

partir de um croqui enviado pelo fil6sofo em uma carta a Eisenman que

lembrava uma lira ou uma harpa, eles desenvolveram um projeto para o

15 P. Eisenman, G. Kewin, J. Gueiter, A. Stipa, A. Vidilz-Ward e R. Freeman 16 Autores do Projeto: Renzo Piano e Richard Rogers

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134

Parque La Villette17 em Paris denominado Choral, assumidamente ligado as

propostas teoricas desenvolvidas por Derrida em seu livro Khora18, onde

discute as nocoes do Timeu de Platao sobre o "receptaculo" de qualidades

cambiantes, que recebe ricas e inesgotaveis interpretacoes, toma-lhes a forma

esquematica mas as esvanece sem conter vestigios.

Entendo que alguns pontos levantados por Derrida nesse livro sao balizadoras

da arquitetura de Eisenman, pois o Khora e "apenas" o anuncio: "Eie nao

promete nem ameaca ninguem. Permanece estrangeiro a pessoa, nomeando

somente a iminencia, e ainda uma iminencia estrangeira ao milo, ao tempo e a

historia de toda promessa e de todas as ameacas possiveis"19• Khora nao e

isso nem aquilo e e ao mesmo tempo isso e aquilo.

Discuto nocoes do Khora como pertinentes a propria logica das Tecnologias

do(s) Virtua(l(is)) por considerar o grau maximo de possfveis porque propicia

de oposi96es, mesmo nao se submetendo a inversoes, pois nao e nada alem

de sua propria apresenta9ao, "nada alem de seu nome", estando aquem e

alem de polaridades com sentidos proprios. Tais ideias sao fortes nas

propostas de Eisenman, que busca romper (e ao mesmo tempo reinstaurar) a

fic9ao da representa9ao. Em entrevista a Nicolau Sevcenko20 coloca que para

Vitruvio alem da arquitetura "manter-sa em pe" ela precisava "simbolizar a

possibilidade de manter-sa erguida frente a natureza", e considera que tal

simbolismo acabou, revertendo a problematica aos novos paradigmas

eletronicos, que seriam a "antitese da estabilidade, do fechamento, da

constru9iio da habita9ao".

Em uma entrevista a Charles Jenks, Eisenman trava um dialogo que mais de

uma vez mostra suas inten96es de ataque a pre-conceitos funcionais, culturais

e simbolicos na arquitetura. Vale a pena transcreve-lo:

17 Autor do Projeto: Bernard Tschurni, 18 Derrida, Jacques; Kh6ra, Ed. Papirus, 1995, trad Nicia A. Bonatti; Ed Galilee,93 19 Ibidem., p 09 2° Catalogo da Exposi<;iio Ma//Jas, Escalas, Rastros e Dobras na Obra de Peter Eisenman no

MASP, Sao Paulo, 18/rnaio- 18/junho, 1993

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"Charles Jenks: Niio, nao, vamos ... Sua Casa VI, voce sabe, as escadas e a famosa mesa da

cozinha sao polemicamente anti-funcionais e ...

Peter Eisenman: Nao, eles sao contra o simbolismo da funyiio

C.J.: Niio, nilo, elas nlio funcionam ...

P.E.: Pessoas moram la."21

9.9.2 Eisenman e Deleuze: Dobras

Mais recentemente o interesse filos6fico de Peter Eisenman voltou-se para

Gilles Deleuze e suas Dobras. Com esses conceitos Eisenman construiu novas

rela~t6es entre opostos classicos como horizontal/vertical, fundo/figura,

interior/exterior atraves de constru96es de desvios e nega96es de determinada

realidade.

Para Deleuze, as dobras sao construv6es labirfnticas multiplas. Uma esponja

cavernosa composta de cavernas feitas de cavernas, numa textura de infinitas

reparti~t6es. Nao mais composiyoes de pianos e volumes tendo como

paradigmas basicos os eixos x, y e z. Podem mesmo existir pontos x, y, z mas

disperses num corpo elastico dividido em fragmentos menores por sua vez

redivididos, que comporiam urn espayo topol6gico, sem referencias

ontol6gicas a eixos geometricos.

Claire Robinson discute que a descontinuidade espacial possibilitada pela

geometria topol6gica traz a reconcilia~tao formal entre o ediffcio e o terreno, a

ideia e os rufdos circundantes. Entre esses elementos h8 dobras que nao

formam uma "geometria estatica mas urn fluxo espacial, temporal e material"22.

Deleuze propoe que o desenvolvimento de urn ser, urn objeto e/ou uma ideia

nao faz o percurso do menor ao maior, mas das diferenciav6es entre o geral e

os especiais, atraves de a~toes do ambiente exterior e sob influencia de for~tas

internas que dao formas nao constituindo os objetos, mas resultantes

direcionais singulares dessas interayees.

21 Architeture and Design, vol 58, 1988 22 ROBINSON, Claire; "The Material Folding" in AD - Folding in Architecture, n. 1 02;

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136

Tal abordagem e clara no projeto de Einsenman para o Centro de Artes da

Emory University, em Atlanta, Georgia, EUA, projetado em 1991. Dedicado ao

teatro, cinema e musica, o edificio e originalmente um unico bloco. Para

reinterpreta-lo foram aplicados princfpios harmonicas da musica para

redesenhar condi<;:oes hist6ricas e topograficas, atraves de uma onda basica

do seno que, aplicada numa malha regular e na topografia acidentada da area,

criou as deforma<;:oes/transforma<;:oes do ediffcio.

9.9.3 Video Folie, Groningen

A Video Folie de Eisenman em Groningen foi construida na Ubbo

Emmiussingel, estando claramente inserida nos trabalhos do arquiteto com as

"dobras".

A rela<;:ao espa<;:o arquitetonico e video partiu da analise de como as imagens

videograficas se apresentam na tela: eletrons varrem a tela da esquerda para

a direita compondo cada imagem ponto a ponto. Come<;:ando de cima, os

eletrons vao substituindo os pontos da imagem precedents, sempre da

esquerda para a direita, em cada nova linha. Para se produzir um imagem e

precise que a onda de eletrons passe duas vezes - ainda que nao haja jamais

uma imagem completa, pois as linhas que foram desenhadas primeiro

desaparecem assim que a ultima foi completada.

0 projeto e baseado no zig-zag entre os movimentos horizontals e verticals, e

o visitants do pavilhao segue esses percursos como que assumindo o papel

dos eletrons, nunca com um ponto estatico de orienta<;:ao, mas aludindo aos

movimentos da eletricidade para formar imagens de video.

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Bernard Tschumi, 1992

Jeter Eisenman, l 992

Arquitclura c Tccnolozias Dic>;ilais

Video Folies Gronin$Cl1, Holanda

A imagem de vfdeo e granulosa, indefinida, de baixo definic;ao . Seus pontos eletr6nicos de luz sao projetados nos vfdeo-espectadores. Sua edic;aoe fragment6ria, r6pida, e, podendo ser usufrufdo em ambientes claros, propicia a dispersao do olhar, que varre objetos alheios pr6ximos. Assim como a dramaturgic e o cinema criaram seus espac;os nos cidades, como seria o espac;o publico das imagens videogr6ficas? Como materializar a imaterialiada das imagens eletr6nicas? Essa foi a proposta das VideoFolies desenvolvida em Groningen, Holanda, por cinco arquitetos.

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138

I CAPiTULO 10

INCORPORA<;AO:Tecnologias Eletronicas e Arquitetura

10.1 Ambientes Virtuais: Peter Weibel

Peter Weibel, artista e cientista, por diversos anos foi coordenador do Festival

ARS Electronica realizado em Linz, na Austria, onde se encontram

profissionais de diversas areas para discutir as influencias das mfdias

contemporfmeas no conhecimento humane. Em 1989 nomeou Arquitetura

Virtual a arquitetura que se constr6i como uma interface mediada por maquinas

inteligentes entre os usuaries e o ambiente, numa relac;:ao comunicacional de

entrada ("input") e safda ("output"), onde cada ac;:ao do usuario reflete no

conjunto ambiental ou as pr6prias modificac;:oes do ambiente refletem no

apreensao espacial do usuario - essas relac;:oes traduzidas de um para outro

par computadores e dispositivos eletronicos. Assim, os meios eletronicos

poderiam construir uma arquitetura multifuncional, multidimensional,

multisensorial e multinterpretativa.

Desse modo, a noc;:ao de Arquitetura Virtual nao se restringe a imagens 30

geradas em computador de um projeto arquitetonico estatico e com

concepc;:oes cartesianas do espac;:o, mas na interac;:ao proporcionada pelas

tecnologias eletronicas e digitais amplificando as possibilidades de apreensao

dos ambientes.

Peter Weibel propoe que isso e uma possibilidade de se desvencilhar o pensar

arquitetura como jogos de pec;:as e materiais, e sim que potencializa a

dissoluc;:ao "da materialidade do ediffcio".

Na era do universe mediado por dispositivos eletronicos, que estao vinculados

as tele-tecnologias, como o telefone, televisao, telegrafo, avanc;:ando as redes

digitais de informac;:ao, e possfvel notar separac;:oes entre o mensageiro e

mensagem, el ou materia e mensagem. lsso e fisicamente clara quando

estudamos que no final do seculo XIX, Joseph J Thomson, examinando a

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139

natureza dos raios cat6dicos, descobriu o eletron, "particula basica de

qualquer atomo de qualquer elemento, desenvolvendo assim as fundagoes

para a era eletronica"23•

10.2 Osci I ayoes e Interfaces

As partfculas eletricas (eletrons) que transmigram e estimulam impulses nos

meios eletronicos fazem com o que o transporte das informagoes nao se ligue

diretamente a um corpo ou a uma imagem, mas sim que todas as informagoes

sejam transformadas em dados numericos digitais e eletricos, reconfigurando-a

em outre meio com um intercambio e tradugao de dados.

Ainda ligado a questoes ffsicas para tecer suas opinioes sobre as imagens

sinteticas nos ambientes contemporaneos, Peter Weibel coloca que, alem da

entropia, ja estudada com a cibernetica no meio do seculo, viverfamos agora o

"trauma do demonic de Maxwell", como se os seres artificiais inteligentes

interviessem autonomamente num sistema dinamico entre os universes

"concreto" e "eletronico". E com isso Weibel aponta a questao que considero

chave para a discussao de projetos arquitetonicos que incorporam meios

eletronicos:

"0 que aconteceria se, ao inves do desenvolvimento da inteligencia e adaptabilidade dos seres

artificiais, a propria inteligencia dos ambientes artificiais crescesse. Em outras palavras, o que

acontece se os ambientes naturais sao incrementados pela inteligencia artificial?"24

Entre os ambientes naturais e concretes (criados pelo homem) e instrumentos

inteligentes (artificiais) ha uma constante troca de informag6es que

possibilitam a reconfiguragao e mesmo reconcepgao dos espagos fisicos,

abrindo novas possibilidades de criagao e apreensao.

23 WEIBEL, Peter; "The World of Virtual Images" in Camera Austrian. 16; Forum Stadtpark; Graz, Austria, 1994

24 WEIBEL, Peter; "Intelligent Beings in an Intelligent Universe" in ARS Electronica 94-lntelligente Ambiente; Linz, Austria, 1994

-

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140

Salim Koder nota que a arquitetura tradicional e modelada em sistemas

fechados, como sistemas cartesianos e com propon;:oes harmonicas. Com a

abertura de possibilidades com os meios eletrOnicos, a arquitetura poderia se

tornar um sistema dinamico, nao-linear, emergente. Esses sistemas nao­

lineares sao base da ideia de Arquitetura Virtual de Weibel.

"Pulsos de energia movendo-se atraves de s61idos, Hquidos e gases, formando intera9oes niio

lineares ( ... ) Essas intera9oes nao-lineares em momentos criticos nao levam ao caos, mas ao

contnirio produzem auto-organiza9oes espontaneas ou sistemas emergentes"2s

Para Weibel a Arquitetura Virtual baseia-se em dois pontos, a interface

Homem/maquina/ambiente, e a teoria dos sistemas complexes, ou sistemas

nao-lineares. Estes, ao contrario dos lineares, onde o todo e a soma das

partes, estao alem de somas ou totalidades encerradoras, nao sendo sequer

possivel analisar isoladamente as partes, posto que "a vida nao e algo

inerente a materia, mas sobretudo ·O resultado da organizayao e forma da

materia"26.

Assim, as caracterfsticas dos sistemas nao-lineares se constr6em nas relayoes

entre suas partes a tal ponto que elas desaparecem completamente se

tomarmos os elementos constituintes isoladamente. Por isso, Peter Weibel

nomina esses elementos de "partes virtuais". Nesses sistemas a arquitetura, o

Homem e as maquinas sao partes integrantes que se completam e sao

elementos de significa9ao em relayoes com as partes virtuais das informa96es

eletronicas e digitais.

Nesse universo complexo e interdisciplinar nao ha um controls central, mas os

sistemas e significam atraves de necessidades, movimentos e regras locais. 0

acaso e as decisoes pontuais dos usuarios da Arquitetura Virtual tornam-se

elementos de sistemas recombinantes. As configurayoes espaciais entao sao

vinculadas as posiyoes tomadas no tempo: o espa9o medido como parti96es

25 KODER, Selim; "The Trnasformation of Drawing" in ARS Electronica 94- lntelligente Ambiente; Linz, Austria, 1994, p. 53

26 WEIBEL, Peter; Op. Cit., p.09

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141

do tempo: "perspectiva, propon;:ao e escala tornam-se valores livres

flutuantes'm.

10.3 Arquitetura como urn a Caixa Preta

A principia, Weibel coloca que a arquitetura viavel seria a Caixa Preta onde as

condicionantes entre usuario e espagos pn3-concebidos nao existem, podendo

ser inseridos os estimulos eletronicos formando um sistema de informagoes

entre maquina/Homem/espago.

Para a cibernetica, "caixa preta" e um sistema onde podemos introduzir

estimulos e observar os resultados, sem saber como esses dados articulam-se

internamente. E ainda impossivel, por exemplo, analisar todas as relagoes

entre os mais de 10 bilhOes de neuronios do cerebra humano em atividade.

Para a analise de sistemas como esse, constr6em-se outros com algumas

entradas e saidas de dados conhecidas e, por homomorfismo, busca-se

compreender os processos relacionais.

Em instrumentos mecanicos ou eletronicos basicos e possivel, com analise

das caixas pretas, prever saidas atraves de dados inseridos. Porem, nos

instrumentos digitais, busca-se dar ceria autonomia de ordenagao entre seus

dados, o que faz com seja possivel nao mais prever respostas, pois a propria

maquina pode criar seus modelos, aleatoriamente ou tomando decisoes

distintas de acordo com os dados inseridos.

Como escreveu Ezio Manzini28, dos instrumentos tradicionais nada mais se

esperava que fizessem o que deviam fazer; dos instrumentos digitais

interativos, esperamos que far;;am .alguma coisa, que pensem e decidam

quando surgir algum problema. Sua performance depende tanto do usuario

quanta das reconfiguragoes 16gicas da maquina; e esse entrecruzamento de

27 Ibidem., p.13 28 MANZINI, Ezio; "Entre Reel et Virtue!: !'Objet lnteractiF in WEISSBERG, Jean-Louis;

Cal1iers de Ia CCI- Les C/Jemins du Virtueli; Centre Georges Pompidou, Paris, 1989, pp.85-95.

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142

estimulos e dados pode se estender ao ambiente circundante, que fornece

estimulos e os recebe das maquinas eletronicas.

0 arquiteto Peter Eisenman29 nota que no universe mecanico a arquitetura

trabalhou na supera9ao das for9as naturais, como gravidade e temperatura, e

aos poucos nao s6 se bastou na supera9ao fisica mas tornou-se urn

monumento dessa supera9ao, onde constr6i-se metaforas de ideias pre­

concebidas de arquitetura, como far, alicerce, abrigo que vao alem de suas

fun96es fisicas para se tornarem ideol6gicas. Assim, nao se constr6em

janelas, vigas, portas, colunas tanto por suas func;:oes estruturais na

arquitetura, mas porque precisamos metaforicamente de suas presenc;:as para

aceitarmos tais constru96es como arquitetura.

10.4 KnowBotic: Ambiente lnterativo

Com a interac;:ao Homem/maquina/arquitetura em sistemas complexes, nao­

lineares, as construr:;oes dos ambientes virtuais se realizam atraves de

calculos locais de acordo com a9oes e posi96es tomadas em determinado

tempo. Possibilitam-se varias e mutaveis sintaxes espaciais e, finalmente, hit a

ruptura de antigos paradigmas arquitetonicos para que a arquitetura baseie-se

na flutua9ao e oscila9ao das interfaces.

Em instala9ao do grupo Knowbotic durante o festival Next Five Minutes -

Tactical Media, realizado em Roterda/Amsterda e, em tempo real, na internet,

essas oscila96es e reconfiguray6es eram claras. No galpao da

V2_0rganisatie, em Roterda, uma grande tela; na escada de acesso, placas

de luz branca e tubula96es de ar. Para quem passasse pelo galpao, veria

apenas pontos brancos na tela, como uma paisagem galaxial, veria as fuzes

com luminancia oscilante, e sopros de ar frio e quente. Contudo, qualquer

pesso9 pqdia ir a frente da tela e, com urn 6culos 3D, interagir com as

imagens. Atraves dessa interface digital, na imagem desse operador

29 EISENMAN, Peter; "Visoes que se Desdobram -A Arquitetura na Epoca da Midia Eletr6nica" in 6cu/um 3; PUC; Campinas, man;:o 1993

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143

apareciam mensagens como velocidade, mudanc;;as de direc;;ao e, como num

jogo, atingiam-se alvos. De acordo com as atitudes tomadas pelo operador, as

condic;;oes ambientais da sala, como iluminac;;ao e temperatura mudavam,

fazendo com que todos que estivessem no galpao (ambiente real) fossem

participantes sensoriais das interac;;oes Homem/maquina que se realizavam

nas imagens geradas por computador (ambiente virtual).

10.5 lnstituto do Mundo Arabe: Jean Nouvel

10.5.1 Paris de Mitterand

Desde sua eleic;;ao em maio de 1981 para a presidi'mcia da Franc;;a, Franc;;ois

Mitterand anunciava, em meio a surpresa geral, seu projeto para o Grande

Louvre e suas intenc;;oes de comemorar em grande estilo - e com grandes

obras - o bicentenario da Revoluc;;ao Francesa. Sob criticas ferozes ou

entusiastas, Mitterand seguiu seu projeto desde o inicio, quando deslocou

parte do Ministerio das Finanqas de uma das alas do Louvre e levou-o para urn

edificio projetado junto ao Sena, e construiu uma pin3mide de cristal, do

arquiteto I. M. Pei, na prac;;a do museu. Jornais circularam com sua caricature

como o fara6 Franc;;ois I ou como a esfinge.

Como urn grande imperador, Mitterand propos o parque para o seculo XXI, o

La Villette (Bernard Tschumi); a construc;;ao da enorme 6pera da Bastilha

(Carlos Ott); a Cidade da Musica (Christian de Portzamparc). Entretanto

haviam projetos ainda mais simb61icos de suas intenc;;oes majestosas: avanc;;ou

sabre as margens do Sena e fincou no rio as "pernas" do novo Ministerio das

Finanqas (Paul Chemetov e Borja Huidobro); a Area da Defesa (Johan Otto von

Spreckelsen), urn imenso arco alinhado com o Arco do Triunfo; a Piramide (I.

M. Pei) em frente ao Louvre; o lnstituto do Mundo Arabe (Jean Nouvel),

concentrando as riquezas desses povos tomadas pela Franc;;a; a Biblioteca

(Dominique Perrault), quatro quinas/livro de vidro formando urn paralelepipedo

dear- a nova biblioteca de Alexandria; e a Torre sem Fim (Jean Nouvel).

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144

0 presidente era chamado, ironicamente, de "monarca republicano"30; e

quando de sua morte, alem da banalizayao "noticiosa" que correu mundo e foi

abusiva na Fran9a, houve satiras ainda a seu espirito arquitetonico

imperialista. Como notou Paulo Francis, "Coce um socialista e emerge um

fara6" 31; ou artigos na Time, que notam que realmente os unicos desses

projetos que funcionam com o publico - como utilitarios, e nao espectadores de

um espetaculo politico -sao o La Villette eo lnstituto do Mundo Arabe.

1 0.5.2 Jean Nouvel na Paris de Mitterand

De todos esses grandes projetos o arquiteto Jean Nouvel e responsavel por

dois: o lnstituto do Mundo Arabe (IMA) e a Torre sem Fim (TSF). A Torre,

mesmo nao construida, e conhecida do publico alem do meio arquitetonico e

frances pelo filme Ate o Fim do Mundo, do cineasta Wim Wenders32 Esse

filme trata basicamente de um homem que se lan9a a captura de imagens em

todo o mundo e busca, atraves de equipamentos de alta tecnologia, fazer com

que sua mae, cega, consiga enxergar atraves de seu olhar.

Nessa constru9ao metaf6rica e tecnol6gica do olhar, ha uma cena no filme

onde Wim Wanders faz o mesmo experimento de seu personagem colocando­

nos, espectadores, no Iugar da mae: atraves de modeliza9ao digital foi

construida a TSF e inserida digitalmente na pelicula do filme. Com isso, num

memento em que o ator faz um telefonema de uma cabine sob a Area da

Defesa em Paris, vemos ao seu lado a fantastica coluna de vidro, a Torre, que

ainda nao existe concretamente.

Apesar do fator surpreendente da realidade da inser9ao de um edificio criado

sinteticamente numa imagem cinematografica captada analogicamente, Jean

30 CHASLIN, Fran<;:ois; "Paris, Capital de Ia Republica de los Faraones" in Arqitectura y Vivienda n. 17- Monografias; Ed. A viSa, Madrid, 1989

31 FRANCIS, Paulo; "Diario da Corte" in 0 Estado de Silo Paulo- Caderno 2; Sao Paulo,

21/01/1996 32 WENDERS, Wim; Ate o Fim do Mundo; Alemanha + EUA, 1991 (Filme)

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Nouvel, em entrevista exibida no lmagina 9633, considera que ap6s o

deslumbramento com as novas tecnologias digitais, os arquitetos voltam ao

papel, aos croquis, de onde surgem suas ideias, e que entao para exibigao e

potencializagao, constr6em e simulam nos computadores seus projetos.

Se e amplamente discutido que o tempo do universe digital e urn presente

constante, sobretudo para Paul Virilio, e agradavel aos criadores/arquitetos

lembrarmo-nos de Jorge Luis Borges: "Que extraordinario pensar que dos Ires

tempos em que Iemos dividido o Tempo - passado, presente e futuro - o mais

dificil, o mais inacessivel seja o presente! 0 presente e tao inacessivel como o

ponto" .34 Assim, no projeto para o Institute do Mundo Arabe em Paris, Jean

Nouvel, antes da fase de deslumbramento com o universe sintetico, trabalhou

a poetica do(s) tempo(s) e da(s) hist6ria(s) mediado por instrumentos

eletronicos.

10.5.3 Institute do Mundo Arabe

Localizado a margem esquerda do rio Sena, o IMA35 foi construfdo para

abrigar o acervo de arte arabe existente na Franga e divulgar a produgao

artfstica hist6rica e contemporanea desses povos - de onde vern a maior

partes dos imigrantes com destine ao pais.

Em cruzamento viario importante no centro de Paris, a poucos metros do

Jardim Botanico, o seu posicionamento, altura e inclinagao das paredes

respondem a referencias urbanas hist6ricas e religiosas, como o Pantheon, a

Praga da Bastilha, e as igrejas de Saint Gervais e Saint Louis e a catedral de

Notre Dame 36. Alem das referencias locais, foram trabalhados dados formais

hist6ricos da arquitetura arabe, como os patios internes aos blocos; o grande

patio entre os edificios; a trama de cabos de a9o das escadas; a rampa

33 Encontro de profissionais que trabalham com imagens tecnol6gicas que ocorre anualmente em Monaco, Monte Carlo.

34 BORGES, J. L.; Cinco VisOes Pessoais; Ed. UnB; Brasilia, DF, 1985, p. 48 35 Jean Nouvel + Pierre Soria + Gilbert Lezenes + Architecture Studio 36 Exposi9iio dos estudos para o IMA, no Netherlands Architecture tnstitut, Roterdii,

janeiro/1996

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146

helicoidal resgatando, de acordo com o proprio arquiteto, as torres babelicas; e

sobretudo a grande fachada quadriculada e cristalina com desenhos

geometricos que resgatam temas de pinturas, tapec;:arias e os mushrabiyyas,

usado nas aberturas externas dos edificios muc;:ulmanos.

As janelas sao compostas com diafragmas metalicos fotossensiveis

controlados por computadores. As salas, de acordo com os trabalhos

expostos, tem niveis adequados de iluminac;:ao. As celulas fotossensiveis das

fachadas captam a lumlnancia externa e, atraves de sistemas eletrOnicos,

traduzem essas informac;:6es aos diafragmas que abrem ou fecham recriando

constantemente figuras que recuperam o imaginario formal arabe.

Com a incorporac;:ao de processes tecnol6gicos eletronicos, Jean Nouvel

trabalha a func;:ao do edificio com os dados relatives a sua inserc;:ao em

determinado local {Paris), com fatores melaf6ricos mutantes e formas artisticas

inerentes ao conteudo do projeto: o Mundo Arabe. E tambem, com os meios

eletronicos, elabora e da vida a esse imaginario com o resgate temporal de

ancestrais mosaicos, cujas origens vao Ionge no tempo, mas que sao

reformulados constantemente no presente continuo das condic;:6es de

iluminac;:ao do ambiente. Passado e Futuro: Presente{s) dos dialogos

eletronicos.

10.6 A Cas a Numerica

Min/Ja casa e onde esta meu cora9i!io ou meu computador?

Florian Brody37

1 0.6.1 A Cas a Numerica e a L6gica Fuzzy

No nosso dia-a-dia hci ja essa inserc;:ao de elementos eletronicos

reconfigurando nossos ambientes; como os carros, avi6es e mesmo maquinas

domesticas, como forno micro-ondas, maquina de lavar, video-cassete, que

37 BRODY, Florian; "My Home is my Memory is my Home" in Mediatic 8; Amsterdam, 2/3, 95

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147

estao redesenhando a Casa como uma interface e nao um espayo com

funy6es fixas e constantes.

Lembrando que toda informayao digital e baseada numa matriz numerica,

poderfamos pensar que nossas casas, quando totalmente conectadas com o

universe virtual, transformar-nos-iam -em "habitantes matriciais". E quanto as

decls6es precisas das tecnologias digitais entrassem em contato com o

cotidiano humano imprecise, haveria, digamos, um choque de interesses, ou

uma incompatibilidade de genios.

Antes de colocar previs6es, discuss6es e comentar projetos que transformam

as casa em interfaces, e importante redimensionar OS calcUIOS que farao essas

operay6es. Cientes que as decis6es das maquinas eletronicas digitais eram

exatas demais para conviver com os humanos, os americanos e, sobretudo, os

japoneses, incorporaram nos seus aparelhos tecnol6gicos procedimentos da

16gica Fuzzy, criada pelo professor iraniano de computayao Lotfi Zadeh, da

Universidade de Berkeley, nos anos 60.

Ela foi incorporada desde aspiradores de p6 a tostadeiras, cameras de video e

freios de metro. Criada para simular o pensamento humano, ela e usado em

trabalhos com processes que envolvem constantes mudanyas de suas

variaveis, nao se detendo em todos os dados a cada calculo, mas apenas nos

que sofreram alteray6es. E o caso de uma camera da Panasonic que

armazena 120 pontos de refer€mcia e, quando o operador balanya, por

exemplo, ala detecta todos os pontos que se moveram numa mesma direyao e

e capaz de entender que quem mexeu foi a camera, e nao o objeto, e com

base nos primeiros pontos armazenados, corrige a imagem globalmente para

compensar a tremulayao.

Mesmo no caso do recalculo de mudanyas das variaveis, a 16gica Fuzzy nao

atualiza os dados com precisao, mas trabalha com faixas de respostas. Ao

inves de classificar os dados em numeros, distribui-los em categorias, como

quente, frio, muito Ionge, muito perto, etc. Se nao e a adequada para maquinas

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de precisao, o e para estacionar um carro - que nao importa fique 5mm ou 4

em da guia - ou cozinhar um ovo.

1 0.6.2 lnformagoes Digitais Domiciliares

Traqalhamos, divertimo-nos e criamos diversos lagos sociais atraves das e nas

redes digitais de informat;:ao, que costuram quase o mundo todo; e acessamos

esse universo por nossos computadores pessoais.

A casa sempre foi um abrigo e uma marcagao territorial dos homens, e podia

ser geograficamente localizada e definida. Nos territ6rios digitais nossa

localizagao da-se por onde acessamos a rede, atraves das interfaces. Porem,

observando a navegabilidade informatica da internet, se nos desprendemos de

uma localizagao geografica, nao o fazemos do simbolismo de seguranga que o

termo far exerce sobre n6s. Perdidos no universo digital, o clique no icone

Home e a certeza de atingirmos um "Iugar" seguro. E todas as informag6es

que nos interessam na trama digital podem ser guardadas e recuperadas com

seguranga na memoria do nosso computador.

A relagao casa/computador lraz entao duas possibilidades de discussao: a

ideia de tar como interface ao universo digital e a interagao com esse universo

digital reconfigurando as casas.

Bill Gates, presidente da Microsoft, admitiu que cometeu um erro crasso ao

afirmar que o futuro da informatica estava no CO-Rom. Quando o computador

"uniu-se" a telefonia e costurou o universo numa trama informacional, onde os

n6s de recepgao e distribuigao serao 2 bilh6es no ano 2.000, percebemos que

a "polifonia" informacional interativa seria o novo territ6rio onde habitariamos.

A arquitetura estaria em xeque, nao s6 espacialmente, como nao poderia

conviver com o tempo instantaneo que se instaurava. Essa preocupat;:ao,

espantosamente foi levantada por Lebbeus Woods38, que sempre esteve a

38 WOODS, Lebbeus; The New City, Byron Preiss Book+ Touchstone Book; Nova York, 1992

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149

frente das proposi<;:6es de uma arquitetura para o futuro das cidades. Para ele,

tudo ocorrendo a velocidade da luz, cruzando espa.;:os infinitos e infinitesimais,

estariamos vivendo "hist6ria do agora".

0 computador poder ser o elo entre o universo digital e o ambiente da casa.

Nicholas Negroponte, em seu livro Vida Digital, aponta diversas possibilidades

de incremento dos computadores para serem uma interface completa e ativa

com o mundo exterior, conectado com jornais personalizados, TVs via satelite

programaveis, etc. A Sony, junto com a empresa californiana Web TV

Networks, pretende ser a pioneira na conversao da TV como uma interface no

universo das redes digitais, ao lan.;:ar ja em 1996 urn aparelho que e acoplado

ao televisor convencional e ligado a uma linha telefOnica, custando 5 vezes

menos que a conexao via computador. Se o "casamento" computador -

telefonia transformou o universo da informatica nos ultimos dez anos, essa

"menage a trois", computador - telefonia - televisao, promete ser uma

reconfigura<;:ao total na infoesfera - a rede informacional digital que permeia

grande parte do mundo.

Negroponte escreve ainda que havera a necessidade de uma mudan<;:a futura

do design domestico, que deixara de se preocupar exclusivamente com os

aspectos fisicos dos objetos e seu carater ergonomico para transformar-se no

design inteligente das interfaces entre a maquina e seus usuarios,

determinando quando e como serao os "pontos especificos no espa<;:o e no

tempo nos quais os bits serao convertidos em atomos e vice-versa"39.

1 0.6.3 Do Carro a Geladeira

Se a casa sera, possivelmente, onde a reconfigura<;:ao ambiental pelos meios

digitais mais afetara - ao menos emocionalmente - os homens, hoje essa

rela<;:ao de interface entre usuarios e ambiente circundante e possivel ser

39 NEGROPONTE, Nicholas; A Vida Digital; Cia das Letras, SP, 1995

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150

vivenciada em quase todos os lugares publicos e pequenos acess6rios que

comp6em nosso dia-a-dia.

Equipados com a 16gica Fuzzy, os freios do metro de Tokyo respondem as

variag6es que ocorram no cotidiano de suas operag6es. essa mesma

tecnologia usada pela Hitachi vem sendo empregada nas caixas de cambia

dos carros da Nissau para tornar mais suaves as trocas de marcha, de acordo

com a velocldade do carro, relevo, mudanc;:as anterlores. sao alnda nos carros

que vemos outros usos dos computadores em nosso dia-a-dia, que em alguns

cases regulam todo o sistema hidro-pneumatico que, dependendo do relevo da

pista, ou da vontade do motorista, controla o modo de diregao agressiva ou

moderada.

Negroponte cementa o projeto da AMP Corporation, que desenvolve edificios

que serviriam como placas-mae de computadores, onde haveriam cabos e

conectores em diversos pontes, podendo-se compartilhar sinais entre todos os

eletrodomesticos: da TV ao aspirador de p6. lsso possibilitaria a

reconfiguragao constante dos ambientes, como a transformagao acustica e

visual de sua sala-de-estar em sala de cinema quando acessar, via satelite e

atraves de seu computador, o filme que quiser assistir. Ou se estiver faltando

Ieite em sua geladeira, seu carro o lembraria de trazer para casa ou se

conectaria via computadores com seu distribuidor de alimentos.

Um projeto de casa digital semelhante aos recursos propostos por Negroponte

foi desenvolvido e construido em T6quio em 1988, por um grupo comandado

por Ken Sakamura. A casa, chamada de TRON project, tinha 200m2, e havia

1. 000 computadores conectados, tornando a casa inteligente, respondendo as

necessidades dos seus habitantes mesmo sem a necessidade de se dar um

comando a cada ato que se realize.

0 nome TRON vem de The Real-time Operating System Nucleus, e

prognostica a era dos "computadores persuasivos" que, inseridos e

conectados em todos os elementos do espac;:o - casa, escrit6rio, hospital -

Page 151: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

151

torna-o apto a interayao constante e imediata com os usuarios. No projeto

apresentado em T6quio, a temperatura da casa era controlada por

computadores que, antes de ligar o ar-condicionado, abriam ou fechavam as

janelas e portas; ou as luzes dos amblentes que as pessoas haviam deixado

se apagavam.

A intenyao era que toda a cidade fosse conectada, a ponto de o banheiro de

uma casa ser capaz de colher a urina de um morador, analisa-la e, se for de

sua vontade, enviar os resultados para sua clinica medica, que marcara uma

proxima consulta, se necessaria. Ou tambem duas casa vizinhas trazem

vantagens nessas conexoes, quando, por exemplo, alguem comet;:a a tocar

piano, os sensores das casa vizinhas identificam se o nfvel de ruido incomoda

seus habitantes, ou se ha um bebe dormindo, essas informac;:oes voltam a primeira casa que automaticamente fecha as janelas e Jiga o ar-condicionado.

Esses elementos minimos de interface domestica sao expandidos nas cidades.

Cidades e casas sao pontos numa comunicac;:ao orbital, tecida por meios

eletronicos como os satelites; e a arquitetura na era da midia digital baseia-se

nas interfaces, onde os espac;:os virtuais (produzidos digitalmente em

computadores, que vao desde funcionamento remoto de maquinas domesticas

a imagens espaciais sinteticas) penetram e reconfiguram os espat;:os reais.

10.7 Christian Moller: Space Balance e ZeiiGalerie

0 trabalho de Christian Moiler, arquiteto baseado em Frankfurt, e uma

constante busca de autonomia para os ambientes, sempre fazendo do usuario

um vetor de interat;:ao e construt;:ao dos espac;:os por ele apreendidos. A

arquitetura como uma interac;:ao viva entre as tecnologias eletronicas, os

usuarios e os ambientes.

Trabalhando com instalat;:oes ambientais, como Space Balance, ou intervindo

diretamente em edificios ja construidos, como a ZeiiGalerie, Meller transforma

o suporte da arquitetura. Para Paul Virilio, a arquitetura teve sempre como

Page 152: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

152

base duas forc;;as principais, a gravidade e a linha do horizonte, que

subordinavam inclusive a apreensao visual dos projetos. 0 suporte da

concepc;;ao e construc;;ao da arquitetura de Moiler e o entre : entre

sensibilidade especial e ilusao visual, entre os movimentos dos usuaries e os

ambientes visuais construfdos em tempo-real, entre a temperatura e as cores

das fachadas: entre usuarios entre tecnologias entre ambientes entre ilus6es

entre arquitetura.

10.7.1 Space Balance, a Gangorra do Virtual

Space Balance e uma instalac;;ao que foi apresentada como parte do festival

ARS Electronica de 1992, em Linz, Austria. E uma caixa de 16x2 metros onde

o usuario/vetor entra por uma pequena escada no meio do ediffcio. Dois

computadores Silicon Graphis conectados calculam e projetam continuamente

imagens em movimento em superficies na parede frontal e de tras de onde se

posiciona o usuario. 0 piso e estruturado como uma gangorra, e muda de

inclinac;:ao de acordo com a movimentac;:ao do usuario - e em coordenac;;ao com

esses movimentos as imagens sao animadas. Essas inclinac;:oes mudam

diretamente as noc;:6es de horizonte e gravidade. Nas lelas, imagens de

objetos estericos rolam respondendo as inclinac;:6es no piso/gangorra, rolando

de encontro ao usuario - dependendo da inclinac;:ao -, e se ele muda de

posic;:ao, o movimento das esferas tambem.

Uma simulac;:ao acustica das colis6es das esferas com a sala virtual da

imagem ou entre elas mesmas e calculada e executada pelos computadores e

ouvida atraves de auto-falantes posicionados junto as telas. Esse conjunto cria

a sensac;:ao de uma imersao num ambiente virtual.

Page 153: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

153

10.7.2 ZeiiGalerie e os Ruidos Urbanos

Na arborizada rua de pedestres e comercio Zeil, no centro de Frankfurt,

Alemanha, h8 a ZeiiGalerie, um shopping construfdo sobre uma estrutura de

rampas, onde todas as passagens e lojas estao dispostas em pianos

inclinados. Para este ediffcio Moiler criou Knetic Light Sculpture , baseada na

ideia dos artistas Kram e Srigl. Conclufda em setembro de 1992, ela tem como

suporte uma superffcie de metal perfurado que e a fachada do ediffcio. Cinza

durante odie, a noite traz consigo a possibilidede de cores a ZeiiGelerie.

Um total de 120 spots HQI projetam pianos de luz na placa de metal de acordo

com os calculos e "decisoes" tomadas por um Silicon Graphis conectado a

uma estac;:ao meteorol6gica localizada no topo do edificio. As variac;:oes de

temperatura, entre 0°C e 30°C determinam a intensidade de luz azul (0°C) e de

luz amarela (30°C) a ser projetada na fachada. A direc;:ao e velocidade dos

ventos controlam os movimentos da esquerda para a direita (ou vice-versa) de

linhas de luz amarela; e quando chove, elas se movem verticalmente. Na parte

superior da fachada um grafico transmite as noticias e informac;:oes locais

durante o dia, e a noite desenhos graficos sao calculados e visualizados

grac;:as aos computadores que neles transformam o nivel de ruido na rua.

Ruidos, chuva, oscilac;:oes de temperatura, luzes, noticias: elementos

interconectados criando constante e imprevisivelmente nossos ambientes

urbanos. Arquitetura transformada como um meio de comunicayao, como um

elo de informac;:ao para as interrelac;:oes entre o meio ffsico (e suas

intemperies), os usuaries e os meios tecnol6gicos. E assim, a arquitetura se

potencializa enquanto mediadora e medida do universe contemporaneo

tecnol6gico. A arquitetura de Chirstian Moiler esta a um passe da

desmaterializac;:ao, apoiada sobretudo em acasos, tanto dos usuaries, quanto

do ambiente onde e inserida ou das maquinas. Mas ao mesmo tempo em que

esta prestes a se dissolver junto ao conjunto de efemeros com que opera, ela

depende vitalmente dos elementos concretes onde se apoia. Assim, os

Page 154: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

154

projetos de Moiler trabalham com a reconstruc;:iio infinita e mutavel dos

espac;:os "concretes" interagindo com tecnologias que traduzem a eles o acaso.

Urn tanto similar as questoes do Khora, trabalhado por Jacques Derrida que e

o receptacula que niio existe a priori, mas se forma constantemente e da

sentido ao que contem, Moiler impregna bases concretas de acasos e as

(traris )forma.

Page 155: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

' Space Balance, Linz,Austria, l 992

Controle do Ambiente pelo Usuario

:eil Galerie, Frankfurt Alemanha, 1992

A interface entre o usu6rio, o ambiente e as mfdias eletronicas e o fundamento do Arquitetura Virtual, criando espa<;:os multidimensionais, multisensoriais e posslbllltando uma fruic;:ao multintelectiva, ao romper paradigmas cl6ssicos como horizontalidade e gravidade. Christian Mol/er busca uma constante autonomia no cria<;:ao de seus ambientes, dissolvendo a materialidade dos ediffcios num amplo espectro de experiencia<;:6es ambientais potencializados pela intera<;:ao a arquitetura com os novos meios.

Page 156: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

156

10.8 Bar Code Hotel 40: Perry Hoberman

A interrelac;:ao entre as tecnologias eletronicas e digitais, incorporada as

propostas de arquitetos e realizadas materialmente nos projetos faz com que

estes se realizem em suas plenas possibilidades quando mediados por essas

tecnologias. lsso se da nos projetos do IMA (Jean Nouvel) e Space Balance e

ZeiiGalerie (Christian Moiler), que transcendem a materialidade dos edificios

ao inseri-los no meio urbana com mediac;:ao das midias, mas tem como ponto

de contato espac;os especializados e singulares - o IMA tem seu projeto

extremamente vinculado a cidade de Paris e a sua localizac;:ao junto ao Sena,

assim como a Knetic Light impregnou-se numa especifica galeria no corac;:ao

de Frankfurt, a ZeiiGalerie.

Contudo, alguns outros artistas aos poucos ultrapassam o limite do espa<;:o

concreto a priori, partindo da rela<;:ao direta entre o usuario e os meios

tecnol6gicos e, atraves desse dialogo, abrem a possibilidade da criat;:ao de

sensac;oes ambientais, ou Ambientes Virtuais, ainda na concept;:ao de Peter

Weibel, que os entende como mantendo elos sensoriais e intelectivos com o

espac;:o concreto. Um desses artistas e Perry Hoberman.

A primeira grande instalat;:ao do artista Perry Hoberman, que vinha

desvendando como se faziam as composit;:6es informacionais atraves do

c6digo de barras e propondo intervenc;:oes artisticas que se produzissem a

partir da estruturat;:ao e leitura por canetas 6pticas das barras, foi produzida

pela Art and Environments Projects para a Quarta Conferencia lnternacional

em Ciberespa<;:o, no Banff Centre for the Arts, em Alber, no Canada em maio

de 1994.

1 0.8.1 Arquitetura em C6digo de Barras

0 c6digo de barras surgiu no inicio dos anos 70 como uma tentativa de ponte

entre o universe das informat;:6es fisicas e o computador, permitindo a

40 http://www.portola.com/PEOPLE/PERRY/BarCodeHotel/index.html

Page 157: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

157

maquina compreender o mundo onde ela esta inserida, assim como introduzir

informac;:oes digitais no universe material que ficassem desapercebidas:

informac;:oes digitais ampliando "silenciosamente" o mundo material.

As pessoas que chegavam ao Banff recebiam um cartao com codigo de barras,

um par de oculos 3D e uma caneta optica que lhes permitiam escanear (ler)

outr6s codigos e transmitir informac;:oes em barras instantaneamente para o

sistema de computadores, onde cada visitante possuia uma identificac;:ao.

Todo o ambiente da sala era interface: das paredes aos cartoes e canetas do

outros participantes. 0 Bar Code propiciava series ilimitadas de troca de

informac;:oes, que estavam contidas digitalmente nos elementos fisicos do

espac;:o, ao se fazer o mapeamento, centimetre a centimetre - ou aonde

houvessem as barras - e processar os dados pelos computadores.

0 suporte se completava com imagens estereoscopicas produzidas por um par

de videos (e os oculos 3D) e um sistema de som quadrifonico.

Um conjunto de cubos brancos se encontravam disperses pela sala, onde

estavam impresses codigos de barras, e propiciavam aos usuaries a criac;:ao

de um ambiente virtual. Esses objetos eram semi-autonomos, pois cada codigo

ja determinava a principia um imagem propria, mas os usuaries, tendo tambem

suas proprias identidades, aos lerem as barras dos cubes com suas canetas,

produziam as imagens com diferenciagoes. Assim, cada objeto criado pelo

computador corresponde a interrelac;:ao entre a identidade e a "historia" de

cada cuba e de cada usuario. Se o objet a A foi lido pelos usuaries 1 ,2 e 5, sua

imagem e produzida mas ele guarda em sua memoria caracteristicas desses

usuaries; e par seu lado, se o usuario 1 passa pelo cuba A, D e F, quando

chegar ao B tal ordem de escolhas tambem estara armazenado na sua

memoria digital e modificara a produgao imagetica de suas leituras.

Mas os objetos, como semi-autonomos, respondem nao so a Jeitura dos

usuaries como aos outros objetos (lembre-se que todos tern uma memoria

Page 158: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

158

digital) e ao ambiente circundante (tambem impregnado com c6digo de

barras), emitindo varia96es sonoras ao Iongo de suas a96es e rea96es, alem

de mudarem os pontes de vista das proje<;:oes de video. Como escreveu Perry

Hoberman, "Eies tern suas pr6prias necessidades e personalidades; eles tern

seus pr6prios tempos de vida (na ordem de alguns minutes); eles envelhecem

e (eventualmente) morrem". Assim, respeitando sua hist6ria e suas idades, os

mais'jovens respondem rapidamente, os mais velhos demoram e falham, ate

que morrem e diio origem a urn novo.

Essa mesma instala<(iio foi montada na V2_0rganisatie em 1995, contudo foi

completamente dlferente, pols o ambiente era outro, os usuaries outros e os

pr6prios objetos ja tinham uma historia digital que proporcionava outras

variac;:oes. Com urn 16gica narrativa e constitutiva variavel ao absolute, pais

depende de quando e que visitante lera o c6digo de barras nesse momenta,

abre-se a possibilidade da cria<;:ao de inesperados e dinamicos ambientes.

A interac;:ao do universe das informac;:oes digitais e sues usuaries possibilitam a

experienciac;:ao de espac;:os e ambientes que niio se prendem a determinado

espac;:o concreto, tornando absolutamente livres - contudo, ainda assim

guardam na sua variabilidade urn dialogo com o ambiente que lhes serve como

base naquele determinado momenta.

Perry Hoberman agora trabalha com Scott Fisher na construc;:iio de urn

ambiente virtual 3D que podera ser navegado pela Internet chamado

Chimerium41•

41 http://www.cosntruct.neUprojects/chimerium/world.cgi

Page 159: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

Bar Code Hotel, 1 99 4

m 1111 F L E E COLLIDE

m PEt~ETRATE

Arquitctura c TccnolO',l;ias Dizitais

Perry Hobern1an

0 c6digo de barras insere informac;6es digitais no ambiente concreto. Interface entre dois universos que se constr6em reciprocamente, atraves do interac;ao com os usu6rios. Perry Hoberman utiliza essa tecnologia, aliada a video, equipamentos e imersao em ambientes virtuais e canetas 6pticas para codificar distintos espac;os. Coda usu6rio portando suas pr6rias informac;6es digitais, em leituras das borras locadas em diversos elementos, reconfiguram os ambientes, explorando possibilidades esteticas e sensoriais

Page 160: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

161

I CAPiTULO 11

IMERSAO: Simula~;oes Digitais de Arquitetura

11.1 Modelos e Simula~oes

E hoje um tanto comum, mesmo em bancas de revistas, encontrar publicac;:6es

a respeito de "Arquitetura Virtual". Normal mente sao produtos realizados em

softwares de auxilio ao desenho, como o AutoCad, e posteriormente

texturizados e animados em outros softwares, como o 30 Studio, entre outros.

Esse instrumental tem grande valia nos escrit6rios de arquitetura por varios

motivos, entre eles a otimizac;:ao dos servic;:os: a partir de um unico desenho

completo e simulado no computador e possivel se reproduzir quantas plantas,

cortes e fachadas necessarias em quaisquer escalas desejadas; e ha tambem

o valor comercial da simulac;:ao, possibilitando, por exemplo, a experimentac;:ao

das cores e materiais a serem utilizados no ediffcio. Contudo, uma ferramenta

que agora vem sendo mais explorada pelos profissionais da area e a propria

simulac;:ao: construindo um edificio simulado no computador, e possivel

sintetizar uma serie de imagens e mesmo fazer animac;:6es por percursos que

serao importantes na apreensao do objeto arquitetonico quando da sua

realizac;:ao.

Philippe Queau, responsavel pela organizac;:ao do lmagina, festival de

realizadores em imagens eletronica que tem encontros anuais em Monaco,

coloca que as imagens virtuais sao, alem de apenas imagens, possibilidades

de explorac;:6es, pois sao apenas representac;:6es de modelos que possuem

infinitas dimens6es, podendo trazer a tona as ideias que engendram.

Dessa maneira, e importante considerar os trabalhos de simulac;:ao de

arquitetura como fundamentais as experienciac;:6es previas de projetos;

contudo, e talvez mais importante estar atento a que a maioria dos trabalhos

que vem sendo feitos trazem, a meu ver, alguns inconvenientes. Por que?

Page 161: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

162

Esses trabalhos mostram vistas e perspectivas dos edificios exatamente do

mesmos pontos que ate a alguns anos - ou mesmo hoje - eram feitos pelos

desenhistas, diferenciando-se apenas pelo suporte ser outro, mais veloz, com

mais cores, etc. lsso pode ser util no dia-a-dia de urn escrit6rio pequeno, mas

e hora de se discutir mais profundamente entre os arquitetos as possibilidades

diferenciadoras que essa tecnologia traz. 0 computador abole todas as

referlllnclas reals e, sobretudo, can6nlcas da arqultetura ate entao: no universe

digital nao ha horizonte ou gravidade, nao ha materialidade concreta, nao h8

elementos s61idos intransponiveis, nao ha tempo cronol6gico, e nao ha no9ao

aprioristica de escalas, determinando pontos de vista.

11.2 A lnfografia Aeroespacial de Frank Gehry

No escrit6rio de Frank Gehry trabalha uma equipe de infografistas e arquitetos

que faz o dialogo computador/arquitetura ultrapassar o carater

representacional. Em verdade, Gehry mostrou-se desde o infcio urn tanto

repulsive as imagens de sintese, continuando seu metodo de projeta9ao e

apresenta9ao dos trabalhos em maquetes concretas. 0 trabalho da equipe de

infografistas e posterior ao desenvolvimento do projetos e serve para

potencializar a intera9ao entre o escrit6rio, os fabricantes e os construtores no

canteiro.

0 software utilizado e o Katia, desenvolvido para a industria aeroespacial

francesa, que ao mesmo tempo em que simula forma tridimensionais, cria suas

constru96es geometricas e determina especifica96es construtivas. Alem disso,

utilizam escaners com guia laser para capturar as imagens de objetos em tres

dimensoes - os mesmos usados em cirurgias medicas e em alguns filmes de

anima9ao, como o Capitao Nemo.

No projeto do Disney Concert Hall, os computadores do escrit6rio estavam

conectados com a industria de corte de pedras na Jtalia. Assim, diretamente

dos modelos digitais 30 desenvolvidos no escrit6rio de Gehry, as informay6es

Page 162: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

163

migravam a ltalia, sem necessitar sua transposil;:ao para pranchas de duas

dimensoes, onde os computadores "decidiam" o melhor modo de cortar as

pedras, economizando material.

11.3 Abismo Numerico

"Onde esta a obra virtual? Ela esta Ia onde e inteligivel. Ela esta na ideia" .42

Philippe Queau

Se a arquitetura ate entao tinha como referencia de base o plano horizontal e a

gravldade - o chao como base aprlorfstica -, no universe digital devemos nos

lembrar que tudo se baseia em numeros, num abismo numerico. Havia uma

instancia primeira que era o chao - um edificio em fase de projeto tinha como

primeiro ponte de contato com a realidade a no~o embutida que haveria um

plano referencia perpendicular a gravidade, e se ele desmoronasse o faria

paralelo as linhas de fon;:a gravitacional e atingiria a inercia distribuido nesse

plano perpendicular a ela. No universe digital, essas referencias nao existem.

A bases unica e que todas as informa~oes estao finalmente baseadas nas

oscila~oes binarias entre Os e 1 s: osci/aqoes.

Assim, e precise explorar arquitetonicamente as possibilidades exponenciais

que essa nova dimensao tecnol6gica traz a arquitetura. Philippe Queau lembra

que os modelos e a imagens digitais sao representa~oes intermediarias "de

uma mesma natureza: a representa~ao numerica. lsto implica a possibilidade

concreta de passar, atraves de numeros, de modelos a imagens, e vice­

versa"43. A arquitetura na era digital pode se colocar entre esses universes,

explorar intersticios.

:~ QUtAU, Philippe; Le Virtue/- Vertus et Vertiges; Ed. Champ Vallon + INA; Seyssel, 1993 Ibidem., p. 208

Page 163: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

164

11.4 Philippe Queau: Virtudes e Vertigens

A cidade do futuro, que rapidamente se aproxima, e uma cidade simulada

Mark Taylor

No livro Eloge de Ia Simulation, Queau escreve que a simula<;ao nao e apenas

mais uma ferramenta de representa<;ao de arquitetura, mas sim uma maneira

de recria-la - trata-se de uma experiencia "demiurgica". Mais que trazer as

formas existentes traduzidas para a linguagem digital, o universo numerico da

informatica possibilita concentrarmos experiencias visuais, formais, fisicas,

medicas, no menor espa<;o possfvel em signos minimos mas oscilat6rios.

Como passo inicial M a modeliza<;ao, que e a atividade criativa e ludica,

vinculada a forma<;ao, a formula<;ao dos objetos. Varreduras 30 a laser,

marca<;6es pontuais em objetos e sua transmissao com canetas 6pticas aos

computadores, calculos e equa<;6es numericas, desenhos auxiliados por

softwares, enfim, uma serie de procedimentos sao utilizados para a capta<;ao e

constru<;ao de objetos no universe virtual, como no filme 20.000 Lieues au de/a

du Soleif'l, de Jacques Bigot onde uma serie de pontes sensfveis a um tipo de

luz foram marcados na cabe<;a do ator Richard Bonringer, e uma "camera"

infravermelho contorna-a e a escaneriza, passando essas marca<;6es para o

computador. Com o fechamento dos pontes criam-se milhares de pollgonos

que configuram as fei<;6es do personagem do filme, o Capitao Nemo.

A simula<;ao e o passo seguinte, consistindo em aplicar varia<;6es ao modelos,

em coloca-los sob diferentes pontes de vista, diferentes condi<;6es "fisicas",

criando modifica<;6es possfveis, anamorfoses, distor<;6es, replica<;6es. E o

processo de dar origem ao maior numero de possibilidades e varia<;6es,

potencializando os objetos virtuais alem dos modelos digitais. A simula<;ao

como uma energia modelada: fragmentos de oscila<;oes energeticas,

44 BIGOT, Jacques; 20.000 Lieues au de/a du Solei/; Le Film du Soleil; Frans;a, 1993 (Video)

Page 164: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

165

matematicas, formais que tem, em grande parte dos casos - neste trabalho ha

nisso maior interesse -, a interface de intelecc;:ao humana as imagens de

sfntese.

"A imagem traz possibilidades imensas de correlac;:6es, de extrapola<;:6es, de reagrupamentos

sin6pticos que capitalizam o saber e totalizam o real, sistematizando-o, depurando-o para

red~i-lo ao essencial"4s

Com isso, entendemos que as imagens sinteticas nao sao apenas imagens

finais, mas representac;:Oes de um modelo e simulac;:ao, trazendo consigo uma

das possibilidades, tanto as que no momento sao visualizadas, quanto todas

as outras que foram ou poderiam ser experimentadas e nao estao presentes

visualmente - mas ainda logicamente, nos modelos numericos que sao sua

base.

0 universo virtual, sintetico, nao esta alem ou aquem do "real", concreto, mas

e um universo intermediario. Baseado nos modelos 16gico-matematicos, pode

ser transformado signicamente construindo possibilidades do "real" alem das

restric;:oes do mundo concreto, mas. que podem ser vivenciadas sensorial e

intelectivamente pelos usuarios - construtores ou "visitadores". Afinal, como

escreveu Queau, diferente das imagens de captura anal6gica como a

fotografia, o cinema ou mesmo o video, que tem uma ligac;:ao direta com o que

e "retratado", as imagens numericas sao totalmente construidas pelo Homem.

0 Homem constr6i seu real em analogia a seus processes mentais e aos

processos 16gico-computacionais.

"Os modelos e as imagens sao constituidos um pelo outro. Ha um ir e vir

permanente entre a inteligibilidade formal do modelo e a percepc;:ao sensivel

da imagem"46. Quando imersos em ambientes virtuais, nao deixamos o

universe "real", mas cada ponto !amado e sentido no mundo virtual significa

uma operac;:ao matematica. Se sentimos e vemo-nos pegando um objeto ou

45 QUEAU, Philippe; Eloge de Ia Simulation- de Ia Vie des Langages a Ia Synthese des Images; Ed. Champ Vallon + INA; Seyssel, 1986, p. 197

46 QUEAU, Philippe; Le Virtue/- Vertus et Vertiges; Ed. Champ Vallon +INA; Seyssel, 1993

Page 165: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

166

simplesmente conduzindo uma nave num espac;:o virtual, devemos ter

consci€mcia de que apesar de sentirmos tais movimentos, nao ha referencias

espaciais fixas nesse mundo, e cada mudanc;:a e, na verdade, uma

transformac;:ao 16gica, um novo calculo matematico. As mudan9as no universe

virtual se dao pelas oscila96es provocadas por atratores nas equac;:oes que

formam esses espac;:os.

A imersao em ambientes virtuais traz a mente a imagem de imensidao de

Gaston Bachelard, que escreveu que para a fenomenologia, ao analisar as

impressoes da imensidao, nao precisamos esperar que os fenomenos da

imaginac;:ao se finalizem em imagens completas, mas que a sensac;:ao de

imensidade (sic) apresenta-se quando por vivenciarmos o 'fluxo de produc;:ao

de imagens ( ... ) Nesse caminho do devaneio de imensidao, o verdadeiro

produto e a consciencia dessa ampliac;:ao"47. Mais que a experienciac;:ao de

um objeto, o que importa e a consciencia do processo imaginante, da

construc;:ao da imaginac;:ao.

Queau coloca que talvez o que nos fascine quando imersos no universe virtual

e a sensac;:ao de abismo - a vertigem. E lembra que, em alemao, abismo em e Abgrund, contrario de Grund, que e Base ou, como escreveu Heidegger,

Razao. Um universe matematico nao apoiado na razao? Nao, mas apenas nao

restrito as razoes, aos paradigmas fixos do espac;:o que conhecemos, como

horizonte e gravidade, horizontal e vertical.

Devemos tambem ter consciencia da ruptura do fator posicional dos objetos,

que nao mais sao localizaveis e sequer pode ser dito que estao acima, abaixo

ou atras. Os objetos virtuais sao situacionais: e a visao do usuario que, atraves

das operac;:oes menlais que ela implica, situa esses objetos espacialmente

naquele momenta singular. E a propria visao que da presenc;:a e posic;:ao aos

objetos/signos virtuais. lnexiste uma clara distinc;:ao entre sujeito,

representac;:ao e suporte. Gada relac;:ao entre esses tres elementos e uma nova

47 BACHELARD, Gaston; A Poetica do Espayo; Martins Fontes, Sao Paulo, 1989

Page 166: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

167

composi9ao mental e sensorial, que Jean-Louis Weissberg48 diz serem

"cenas". onde nao e possivel fixar atores, publico ou cenario, pois todos se

constituem de um mesmo imaginario numerico.

Como pensarmos em bases espaciais rfgidas se atingindo e ultrapassando a

velocidade da luz - fonte, afinal, das imagens virtuais atraves de tubos

cat6aicos - dissolvemos mesmo a no9ao de tempo, deixando de nos

prendermos ao tempo linear, cronol6gico? E mais, sendo que a velocidade da

luz transformou-se em medida espacial quando o Homem, atraves de suas

pr6prias maquinas, rompeu galaxias que estao a anos-luz da Terra (sera que

nem o geocentrismo a arquitetura abandonou ainda?), em medidas espaciais

metricas inimaginaveis pelo Homem, onde nao M nenhuma base horizontal

ou vertical/gravitacional. E, por fim, o Homem vern buscando captar as

imagens de explos6es estelares que ocorreram a bilh6es de anos-luz da nossa

era para com isso tentar entender o surgimento da Terra, sem se lemprar que

a materia formadora da nossa galaxia estava condensada com uma densidade

que sequer a luz conseguiria atravessa-la, impossibilitando assim que

captemos alguma imagem intergalactica do memento do Big Bang.

Talvez jamais venhamos a saber a origem da Terra- espa9o e tempo -atraves

da luz (suas imagens e velocidade): abismo. Talvez seja atraves dos universes

virtuais e suas estruturas de linguagem numerica que possamos continuar a

explorar possibilidades espaciais - sensoriais e intelectivas - alem da base,

Grund: Vertigem.

48 WEISSBERG, Jean-Louis; "Telepnlsence, Naissance d'un Nouveau Milieu d'Experience" in Art Press HS 12- Nouvelles Teclmo/ogies, Paris, 1991

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168

11.5 lmersao em Ambientes Virtuais

Voce pode me ver, mas eu nijo existo. Eu sou urn clone.

Richard Boringer

As tecnologias digitais possibilitam a constru9ao, divulga9ao e experienciac;ao

de ambientes em redes de informa9oes. Como notaram H. Ronzenbacher e G.

Stocker49, o computador potencializou e foi potencializado pelas linhas

telefonicas, e essa mobilidade incessante e multidirecional de informa9oes

sera a fonte e for9a motriz das (so)ci(e)dades contemporaneas. Ligado e

construfdo em redes digitais, os universos virtuais potencializam uma vivencia

social e interativa de ambientes alem das restric;oes espaciais newtonianas.

Essa experiencia9ao coletiva e intercambiavel de ambientes virtuais foi

apresentada no lmagina 93. Houve a modelizac;ao da abadia de Cluny em

ambientes digitais e entao, para a exibi9ao publica, propuseram um encontro

televirtual entre operadores situados um em Paris e outro em Monaco.

Encontraram-se e passearam pela abadia com luvas e 6culos de imersao

virtual, quando um dos participantes levou o outro a passear pela cupula do

abadia, como se desprendidos da forc;a gravitacional. Houve uma primeira

repulsa, certa apreensao, pois o "corpo" do operador estava condicionado as

leis da gravidade terrestre; porem, no universo virtual nao h8 gravidade, o que

amplia as possibilidades de explorac;ao espacial. Nichos, ambientes, percursos

jamais visitados na Abadia de Cluny agora sao explorados, vivenciados:

Virtualidade.

Com essa discussao abro a apresentac;ao de algumas experiencias, com

destaques as modelizac;oes de espac;os arquitetonicos importantes na hist6ria

da arquitetura e simulados principalmente com fins didaticos e pesquisa; e as

experiencias dos universos virtuais nas redes digitais de informac;oes, como e

o caso de Woiksed, o "planeta virtual" de Emanuel Pimenta.

49 RONZENBACHER, H. e STOCKER, G.; "Nodes" in ADRIAN X, Robert e STOCKER, Gerfrie.d (Projektleitung), Zero - The Art of Being Everywhere; Stirisch Kulturinitiative; Graz, Austria, 1993

Page 168: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

169

11.6 Simula~oes: o Resgate do Tempo

Uma das possibilidades que vern sendo exploradas com as tecnologias de

simula<;:ao digital e 0 levantamento hist6rico e analise de edificios importantes

na hist6ria que nao mais existem M decadas, M seculos. Principalmente

desenvolvidos em escolas de arquitetura em diversos lugares do mundo, a

reconstru<;:ao de importantes exemplos arquitetonicos entre os modelos e as

imagens digitais. e ferramenta de estudo aprofundado dessas predios,

possibilitando sua visita<;:ao atraves. de seculos, buscando dimensoes nao

constante no material iconografico tradicional ainda existente e assim, por

essas novas possibilidades de experiencia<;:6es, redescobri-los e rediscuti-los.

11.7 As Luzes do Museu do louvre

Edificio importante e ainda existente, o Museu do Louvre, Paris, e urn born

exemplo das possibilidades previas que as novas tecnologias trazem quando

se e precise intervir nesses predios hist6ricos prevendo seus efeitos. Foi o que

ocorreu com a equipe da Universidade e Escola de Arquitetura da

Universidade de Nancy"0, Franc;;a, no projeto de iluminac;;ao das fachadas do

Museu.

A simula<;:ao da iluminac;;ao requer acuidade desde a precisa reconstruc;;ao

geometrica do edificio em ambientes digitais, onde suas superficies devem

conter os dados de abson;:ao e reflectancia da luz, e o proprio software estar

munido matematicamente das leis de propaga<;:ao dos raios luminosos e

caracteristicas ffsicas da luz natural e luzes artificiais a serem usadas.

0 Museu do Louvre possui !res grandes pra<;:as, a Place du Carrousel, em

frente ao Jardin de Tuleries, o Cour Napoleon, onde esta a piramide de vidro

50 Projeto de FASSE, I. e PAUL, J. C. da Universidade de Nancy - CRIN/INRIA + PERRIN, J. P. e PAOLO, S. S. da Escola de Arquitetura de Nancy- CRAI

Page 169: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

170

do arquiteto I. M. Pei, e o Cour Carre, desenhado por Pierre Lescot, que e o

simbolo do Renascimento Frances. Foi esta praga a escolhida para as

simulagoes luminotecnicas digitais.

A equipe tinha os seguintes objetivos ao iniciarem o trabalho:

1. destacar as singularidades de cada andar, em particular os detalhes

italiahos e do classicismo;

2. respeitar o ritmo vertical das duplas colunas Corintias;

3. destacar balxos relevos e frisos, assim como os ornamentos da Attica, uma

das fachadas do Cour Carre.

Nao era possivel fazer a iluminagao a partir das fachadas opostas, iniciando­

se os trabalhos com a prerrogativa de que os spots estariam nas pr6prias

fachadas, com iluminagao vertical, de cima para baixo e vice-versa. A

simulagao do edificio e do sistema de iluminagao auxiliaram na definigao do

localizayao dos spots, das intensidades, distribuigao espacial e espectral de

cada fonte de luz e entao auxiliar os efeitos das decisoes de cada escolha.

Com uma complexidade de detalhes, a modelizagao e simulagao de cada

fragmento do edificio foi realizado pela sintetizac;;ao dos elementos essenciais

que respondiam a 16gica geometrica da propagac;;ao da luz. E de outro lado,

simuladas caracteristicas plasticas e tecnicas, como os materiais de

construc;;ao do Museu, zinco, pedra, madeira e vidro, e como interferem na

distribuic;;i:lo da luz. Para simula-los, fcram medidos em laborat6rio os numeros

luminotecnicos e convertidos em informagoes digitais que foram incorporados

a modelizagao do edificio, as texturas geradas em computador dos materiais

para que as imagens respondessem visualmente as simulagoes de

propagagao, reflexao e absorgao da luz.

Baseadas na 16gica numerica matricial dos computadores, tanto as cores

quanta texturas e dados fisicos (nao concretos) do edificio do Museu do

Louvre foram gerados em ambientes digitais aproximando, atraves de imagens

sinteticas, as condigoes de possiveis "rea is".

Page 170: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

171

11.8 Projetos ltalianos de Frank Lloyd Wright

A modelizayao de objetos arquitetonicos em ambientes digitais vem sendo

instrumento de estudo de obras e projetos de grandes arquitetos com fins

didaticos, em evidencia nos cursos de Hist6ria da Arquitetura. Na Faculdade

de Engenharia da Escola Politecnica de Milao, ltalia, os professores M. A.

Crippa, S. Cinti Luciani e G. Magrassi sao exemplos da utilizayao da utiliza9ao

das simulayOes eletrOnlcas transformando a interayao e crltica dos projetos.

No Imagine 96 o grupo de Milao apresentou, atraves da professora Maria

Antonieta Crippa, a utiliza9ao de imagens de sinteses como ferramenta de

conhecimento da arquitetura e sua hist6ria, tomando como exemplo os estudos

que vem sendo desenvolvidos na Faculdade sobre a obra de Frank Lloyd

Wright, arquiteto americana com destaque no inicio deste seculo. Em especial

foi apresentado o projeto do "Templo Unitarien", para o qual Wright

desenvolveu 34 estudos para chegar ao projeto que imaginava ser coerente a imagem que buscava para o templo, de uma "simplicidade exata"; mas como

coloca M. A. Crippa, "Uma vez que a via definitiva e descoberta, os estudos

infelizmente se dispersam"51.

Atraves do produto final, dificilmente se pode tecer o processo de criayao do

autor e, se nos interessamos exatamente pela discussao do processo criativo,

o conhecimento dos croquis, que representam fragmentos do ato projetual, e

fundamental. Com a reconstru9ao dos projetos de Wright busca-se a revelayao

de indices desse processo que possibilitem a modelizayao da 16gica projetual

que esta alem das imagens do projeto.

Com a reconstru9ao digital de objetos arquitetonicos e possivel se valer das

possibilidades interativas e nao-lineares para se percorrer as fases criativas

51 GRIPP A, Maria Antonietta; "Les Images de Synthese, Outil de Connaissance de I'Archileclure et de son Histoire" in /mara 96- Actes du Col/oque; Ecole d'Archilecture de Paris-Val de Marne+ INA (lnstitul National de I'Audiovisuel; Monaco, 1996

Page 171: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

172

que geraram os projetos. 0 pesquisador/usuario e assim o recriador dos

caminhos 16gicos do arquiteto que estuda, potencializando seu percurso critico

atraves das composi96es e recomposi96es do modelo digital, levando sua

pesquisa a inumeros cortes, detalhes, incursoes a espa9os jamais visualizados

nas sempre mesmas imagens divulgadas dos projetos. Antes, a crftica de

arquitetura, principalmente de projetos nao construidos ou ja nao mais

existentes, valia-se de olhares pre-definidos de outrens; com os modelos de

sintese o crrtlco resgata as lmagens que deseja, orla oamlnhos alem da

gravidade e mesmo alem dos percursos concretamente possiveis, aumentando

com isso as possibilidades de analise.

Expandindo as pesquisas, a princtpto com Frank Lloyd Wright, a Escola

Politecnica de Milao reuniu trabalhos de alunos de 91 a 95, e os esta

colocando na Web52, com intenyao de ampliar a divulga9ao dos trabalhos e

estimular praticas e pesquisas hipermidia, com imagens, modelos 30 e textos.

11.9 Barcelona Digital de ldelfonso Cerda

ldelfonso Cerda criou os pianos de reconcep<;:ao urbana de Barcelona,

Espanha, em 1859, e ampliou seus estudos na Teoria Gera/ da Urbanizar;ao

em 1867. Seus pianos, realmente aplicados na capital catala e paradigmas da

urbaniza<;:ao , vern sendo h8 muito lema de analises, teses, congresses.

Ainda no lmagina 96, o professor Txatxo Sabater53, da Universidade

Politecnica da Catalunha, apresentou o trabalho do grupo do Departamento de

Composiqao Arquitetonica sabre a obra de Cerda, baseado na cria<;:ao e

conexao de ilustra<;:oes e textos do urbanista de 1859, alem da modelizac;:ao

virtual de partes de seus pianos. Com as simula<;:oes dinamicas buscou-se

52 http://www.cdc.polimi.it!IT/OD/SdA/sdahome.html 53

TXA TXO, Sabater e GASSULL, Albert; "Interactive Visit and Virtual Walk- Through in the Barcelona of ldelfonso Cerda" in /mara 96- Actes du Colloque; Ecole d'Architecture de Paris-Val de Marne + INA (lnstilut National de I'Audiovisuel; Monaco, 1996

Page 172: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

173

levar o usuario a entrar em contato interativo com um projeto marco das

ciencias urbanas.

Nao se restringindo a criac;:ao de imagens de maquetes eletronicas, o trabalho

reconstr6i e possibilita a analise dos aspectos de estudos de transportes,

higiene, privacidade, moralidade urbc:'na, canais de esgoto e atmosferologia -

elementos constituintes do projeto de Barcelona, que e balizador do urbanismo

moderno emergente.

Em exposicao sobre a obra de Cerda em Barcelona, em julho de 1996, durante

o XIX Congresso da Uniao lnternacional de Arquitetos (UIA 96), houve a

apresentac;:ao dos projetos do arquiteto, fotos das transformac;:oes urbanas por

ele empreendidas nas cidade, maquetes e desenhos. Para completar a

exibic;;ao o CD sobre Cerda estava a disposic;;ao em alguns computadores, o

que possibilitou o cruzamento de diferentes informac;;oes que estavam

expostas "concretamente"no pavilhao.

Na apresentac;;ao do trabalho em CD-ROM, e possivel trafegar pelos

dados/imagens com organizac;;oes interativas e nao-lineares que permitem

comparac;;oes por parametres distintos.

No CD estao basicamente dois eixos-mestre de pesquisa: M documentos em

2D com vista axonometrica, e a partir dai o acesso a organizac;;oes internas

dos apartamentos, estruturas de diferentes blocos, circulac;;oes verticais e

horizontais, explorando a diversidade das propostas urbanas de Cerda. Dentro

da mesma 16gica interativa, atraves de animac;;oes, e possivel acompanhar o

funcionamento dos sistemas de drenagem, renovac;;ao de ar nos apartamentos

e blocos, iluminac;;ao das unidades, blocos e ruas.

Com carater didatico, o projeto do grupo do prof. Txatxo permite comparac;;oes

entre os projetos de 1855, 1859 e 1863 em seus diversos niveis- da cidade as

unidades habitacionais, incluindo pianos topograficos, redes viarias, sistemas

hidricos, circulac;;ao de ar - em diversas escalas. Baseado em informac;;oes

•..

Page 173: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

174

digitais, asses dados sao passiveis de novas simula96es e vem sendo uteis ao

estudo de antigos projetos servindo de base interativa na projeta9ao de

solu96es contemporaneas.

11.10 0 Bale Triadico Dan~ta na Bauhaus Virtual

Um exemplo de uma arquitetura mais recente e curiosamente pertinente a esta

disserta9ao e o caso do trabalho desenvolvido pela equipe do professor

Manfred Koob54, a reconstruyao virtual da Bauhaus. No livro de Koob ha a

construyao em ambientes digitais de diversos projetos canonicos da

arquitetura moderna, e um fato importante e que muitos desses projetos nao

foram construldos concretamente mas sao balizadores das ideias

arquitetonicas do seculo XX. Assim, com esses estudos, e possivel visitar tais

obras multidimensionalmente e tambem reconstruir completamente a visao

critica desses edificios. Entre eles estao Mies van der Rohe, Le Corbusier, ou

a torre de Wladimir Tatlin, o Monumento a Terceira Revo/ucionaria paradigma

da arquitetura construtivista russa.

Tendo a escola de arquitetura alema Bauhaus como o primeiro polo desta

disserta9ao sabre as rela96es entre as Tecnologias de lnformar;ao Arquitetura,

desse trabalho organizado por Manfrede Koob gostaria de destacar alguns

projetos e apontar possibilidades de experimenta96es espaciais e temporais.

Margarita Perez recriou em simula9ao digital todas as pe9as, figurinos e

personagens do Ballet Triadico, de Oskar Schlemmer, que foi a grande

surpresa na exposi9ao da Bauhaus em 1923 sendo transgressor e

fundamental na concep9ao teatral cenografica para o seculo XX,

geometrizando a96es, formas, coreografias. Assim, atraves dessas simula96es

e possivel recriar coreografias que foram encenadas pelo Ballet Triadico, e

pelos olhos da dan9a contemporanea, criar novas possibilidades para o

trabalho de Schlemmer.

54 KOOB, Manfred; Bauhaus- Architektur als Vision; Edition Braus; Heidelberg; 1994

Page 174: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

175

Em rela9ao a possibilidades de criar virtualmente as coreografias e

personagens do Ballet Triadico, e interessante vermos a simula9ao criada por

Jose Torres para o Tota/Theatre, um dos projetos mais polemicos e

revoluciomkios de Walter Gropius, arquiteto idealizador da Bauhaus. lmaginar

as possibilidades de se encenar pe9as e coreografias do Ballet Triadico no

Tota7 Theatre era algo sonhado por estudiosos de Schlemmer e/ou Gropius

que pode ser realizado entre os modelos e as imagens, entre o abismo

numerico e o imaginario.

Urn ultimo exemplo colhido e sobre o conhecimento de projetos jamais

realizados que nem por isso deixaram de ser fundamentals a arquitetura

mode rna. T res arquitetos foram convidados a apresentarem projetos para a

constru9ao do Palacio dos Soviets, em Moscou; entre os concorrentes estavam

dois dos maiores arquitetos europeus, balizadores da arquitetura moderna:

Walter Gropius e Le Corbusier.

Os Ires projetos tinham caracteristicas distintas, mas com explora96es

maximas do funcionalismo, apontavam, atraves de suas formas, inten96es

progressistas para a sociedade sovietica. Contudo, nenhum dos projetos foi

construido, pois a burocracia politica e cultural preferia a representar;ao da

autoridade do Estado a expressao do dinamismo da revolu9ao socialista.

0 Palacio projetado por Gropius foi simulado Lars Urspruch e Thorstev Butz, e

projeto de Le Corbusier por Boris Schlarb e Christian Volkman. Ambos

trabalhos, constantes nas discuss6es sobre o legado moderno, mas que jamais

passaram da concep9ao e desenhos ganharam quatro dimens6es imateriais no

universo digital. Agora e possivel passear, observar detalhes e sobretudo tecer

compara96es entre os projetos. Se o concurso nao possibilitou a concretiza9ao

de dois projetos marco da arquitetura europeia no inicio do seculo, hoje e

possivel descortinar seus misterios e avalia-los criticamente com pan3metros

espaciais.

Page 175: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

Arquitclura c Tccnologias Di:z,iiiJis

I. Cerda e F.L. Wright

Plano Cerda; Barcelona, Espanha CD-ROM reallzdo pela Escola Politecnica do Catalunha. 1995

)ossibilidades de composi<;6es de quadras e blocos do Elxample

)bras de F. Lloyd Wright 'eb site do Politecnico de Milao, 1993/94

Edificio Johnson Wax

As simuia96es digitais suspendem e recriam projetos arquitet6nicas esquecidos, imaginados ou nunca realizados. Reconstruindo-lhes, pode-se buscar tra<;:ar o percurso criativo de seus autores e instrumentalizar uma nova vis6o crftica do arquitetura. Espa<;:os descolados de um territ6rio e de um tempo concretos ou cornol6gicos: espa<;:os de experimenta<;:6es intelectivas que poderao transformer os percursosinvestigativos do hist6ria do arquitetura.

Taliesin West

Page 176: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

177

11.11 Netr6polis: Arquitetura Nas Redes Digitais

How can you lock your doors wflen you live in cyberspace?55

Mark Taylor+ Esa Saarinen

Ha (:;ontudo outro ponto completamente diferente das possibilidades de

simulac;:ao em ambientes virtuais que considero de sumo valor. Sao questoes

conceituais e 16gicas das tecnologias digitais que penso nao serem tratadas

nesses projetos, entre elas as possibilidades de novas rumos de desenho - a

suspensao absoluta da arquitetura dos paradigmas classicos do horizonte e

gravidade, explorando-a a revelia dessas constric;:oes, usando como base

16gica projetual o Abismo Numerico Digital; ou as Redes Digitais de lnformaqao

(internet), que distributibilidade do pensar e projetar arquitetura.

Mark Taylor e Esa Saarinen publicaram /magologies como resultado de anos

de tele-trabalho conjunto, entre os EUA e a Finlandia, via internet, que se

realizou em sua plenitude num ciclo de debates entre fil6sofos, cientistas e

artistas, via tele-conferencia, que discutiram a inserc;:ao das midias digitais na

sociedade contemporanea.

Um dos pontos chaves desse livro que considero propicio ao pensarmos as

cidades, e o fim da hegemonia dos conceitos de centro e hierarquia no

universo mediatizado, cedendo Iugar as noc;:oes de periferia e horizontalidade -

que nao esta ligada a ideia de horizonte, mas possibilidade de expansoes por

igual em infinitas direc;:oes. E sao os meios tecnol6gicos eletr6nicos e digitais

que promovem e mantem essa cultura da heterogeneidade, onde questoes

locais tornam-se globais.

Mas considero que, mais que pensarmos a nova ideia de periferia em relac;:ao

ao centro, e possiver_considel'armos, como escr~veu Paul Virilio, que ha

infinitos p61os de recepc;:ao e produc;:ao de informac;:oes. A unica ideia espacial

que resta nao e mais a centralidade, e cada posic;:ao s6 se da em relac;:ao a

55 TAYLOR, Mark+ SAARINEN, Esa; lmagologies- Media Pflilosopfly; Routledge; NY, 1994

Page 177: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

178

outras posi<;6es, que sao interdependentes e umas significam as outras. A

configura<;ao do espa<;o mediatizado e topol6gica.

Nessa trama de conexoes entre p61os informacionais e que se originam as

novas possibilidades da arquitetura. Na Netr6polis, como denominaram esse

territ6rio de conexoes digitais Esa Saarinen e Mark Taylor, a arquitetura torna­

se Eletroctura (arquitecture becomes electroture). E no design das interfaces

digitais que reside um dos novas sftios da arquitetura.

Alguns reflexes dessas interfaces entre o mundo digital e concreto sao ja

claras, como o dinheiro, que se desvincula de seu Iastra material para tornar­

se intercambios informacionais; ou as relagoes sexuais que se originam e

muitas vezes chegam ao cabo nos espagos virtuais das redes de

computadores; ou, como nota Katherine Hayles56, o direito de acesso as redes

informacionais mais que a posse ffsica de informa<;oes determina a mudan<;a

de legisla<;oes nos anos 90.

Katherine Hayles aponta para um espago excessivamente heterogeneo e

fissurado, baseado em "modelos" e "colisoes rand6micas", que substituem as

formagoes ate entao baseadas na dicotomia "ausencia" e "presen<;a".

Os projetos realizados em redes digitais ganham novas possibilidades de

projeta<;ao, prescindindo de um posicionamento no espa<;o concreto, e mesmo,

no perfodo de criagao, da pre-configuragao do Espago euclidiano que ate

entao precedia o projeto de arquitetura. Cabe agora aos arquitetos explorar

essas possibilidades dos novas territories digitais de informagao, conceberem

seus projetos em espa<;os criados em conexoes das redes digitais e

descolarem-se da pre-existencia euclidiana, construindo objetos arquitetonicos

no campo das novas possibilidades ffsicas e matematicas pr6prias ao universe

digital: objetos eletroct6nicos.

56 HAYLES, N. Katherine; "Virtual Bodies and Flickering Signifiers" in October 66, Fall 1993, MIT, Boston, pp. 69-91

Page 178: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

179

11.12 Arquitetura a Distancia - lmagina 97

Uma das experi~ncias mais interessantes e completas que conheo;:o em

relao;:ao a Arquitetura a disttlncia, onde as redes digitais sao o campo de

interface e trabalho entre equipes distantes geograficamente envolvidas na

elaborao;:ao de um mesmo projeto, esta sendo desenvolvida entre Monaco e

Los Angeles, EUA. Para o festival Imagine 97, foi proposto ao Conselho da

Ordem dos Arquitetos do Principado· de Monaco (COAPM) a realizao;:ao do

saguao de abertura, tendo como ponto de discussao a arquitetura frente as

novas tecnologias.

Para isso o COAPM convidou o arquiteto americana Eric Owen Moss. Com

equipes de arquitetos e infografistas nos dois continentes, houve apenas um

encontro "concreto" para fechar o contrato - realizado em Los Angeles e nao

na cidade da obra. Eric Moss jamais foi a Monaco e a primeira fungao da

equipe de Monte Carlo foi transmitir-lhe, via rede, fotos, mapas, plantas e

videos da area do projeto, junto ao mar Mediterraneo.

A partir dai se iniciou um habito projetual diario entre as duas equipes, das

18:30 as 20:30 (horario da Europa continental) atraves de sistema de

videoconferencia - onde partilhavam os campos de trabalho com programas de

modelizagao, simulagao, edigao de video, alem de, com pequenas janelas nas

telas, verem-se e discutirem o trabalho em tempo real. Os desenhos

apresentados pela equipe de Eric Moss podiam ser transformados diretamente

atraves da tela pela equipe de Monaco.

Ja no lmagina 96 o publico pode partilhar uma sessao de trabalho entre as

duas equipes, com a apresentagao de desenhos e simulagoes baseadas em

fotos e videos sabre o projeto em desenvolvimento, com as explanagoes das

equipes.

Milhares de quilometros e alguns fusos horarios de diferenga, a arquitetura

encontra um campo de trabalho no universe virtual que, desmaterializado no

Page 179: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

180

universe digital, e potencializado por esses novos instrumentos de cria<;ao

libertos do tempo e espa<;o terrenos. Virtualidade.

11.13 Woiksed, o Planeta Virtual de Emanuel Pimenta

" ... eu venho do espar;o cibernetico( .. ) voci>s nilo ti>m a independi>ncia que nos une. "57

John P. Barlow

11.13.1 lmpermanencia das Coisas e das ldeias

Arquiteto e musico contemporaneo, Emanuel Pimenta teve sua formayao

profissional na Brasil com mestres como o maestro Hans J. Koellreuter e o

poeta e semioticista Decio Pignatari, tendo trabalho posteriormente com John

Cage e Merce Cunningham. Em seu primeiro livro, Tapas - a lmpermanencia

das Coisas e da ldelias58 , essas irifluemcias sao marcantes tanto no texto

quanto na composi<;ao das imagens.

Em verdade, esse trabalho ja aponta todos os outros textos e trabalhos a

serem publicados pelo arquiteto. Colagens, eis a estrutura basica do volume.

Tipos de letra diferentes numa mesma frase, criando destaques e volumes -

como nos textos/partituras de Cage -; e os textos em zoom in e zoom out, como

no famoso poema de Pignatari, Organismo - reproduzido no livro-; e ainda

cortes de quadrinhos, onomatopeias, imagens de partituras musicais e plantas

de edificios servindo como signos graficos. E, no mais, toda a estrutura

resgata o livro 0 Meio e a Mass-Agem, de Mcluhan, que foi o grande

pensador da midia no meio deste seculo e que influenciou Buckminster Fuller,

John Cage, Decio Pignatari, enfim, todos os pensadores das dinamicas

poeticas dessa segunda metade do seculo.

57 BARLOW, John P. in Caderno 2 -Internet: Estrada Virtual mostra seu Lado Humano; 0 Estado de Sao Paulo, Sao Paulo, 31/03/1996

50 PI MENTA, Emanuel Dimas de Mello; Tapas- a lmpermani>ncia das Coisas e das /deias; Projeto Ed. ; Sao Paulo, 1985

Page 180: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

181

"0 homem eletronico retira o ser humano da vivencia hist6rica linear.

conscientizando-a nele, assim como fazendo surgir um "tempo vertical",

criando novas relac;:oes que o remetem a um universo vivencial sintatico e

sinergetico, em func;:ao de um gestalt que e outra ilusao.''59

Em 1991, em seu outro livro, Virtual Architecture, Pimenta mostra os trabalhos

que' expos em diversos festivals, realizados em computador. Diversos desses

trabalhos sao projetos de Estruturas Ativas ou Estruturas Sinergeticas,

lembrando os estudos de Buckminster Fuller para o Domo Geodesico. Com

seus sistemas de estruturas ativas Emanuel cria projetos onde apresenta um

concelto chave na sua obra: a desprogramsr;l'lo, eomo no Pro}eto de Sistema

Oesprogramacional, de 1989, exibido em T6quio, que abrigaria 300.000

pessoas em fabricas, escolas, shopping centers e clubes locados em espac;:os

"construidos" com sistemas estruturais sinergeticos reprogramaveis e

desprogramaveis.

Um de seus projetos construidos que considero mais interessante e a

reprograma<;:ao arquitetonica do escrit6rio e oficina da Renault em Lisboa,

Portugal, vencedor de um concurso europeu. Realizado com paineis metalicos

em 1990, baseado em figuras geometricas encontradas na Peninsula Iberica,

Pimenta retrabalhou-as e espacializou-as em ambientes digitais munido de

calculos e 16gicas matematicas nao convencionais, como a geometria fractal.

Com isso ganhou 180m2 de areas mortas no espac;:o ja existente como

economia de U$400.000.

11.13.2 A Maquina dos Sentidos

Atualmente, com a baronesa Durini, de Milao, que foi mecenas de Mario Mezz

e Joseph Beuys, Pimenta desenvolve a Maquina dos Sentidos, que foi

apresentada sumariamente no encontro Arte e Tecnologia, em Sao Paulo em

novembro de 1995, com arduas discuss6es que englobaram de um lado

59 Ibidem, p. 107

Page 181: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

182

artistas como Stelarc, entusiasmados com o projeto, e de outre te6ricos como

a professora Lucia Santaella. E por que as discussoes?

A intenc;:ao do projeto e recuperar a apreensao global dos espagos

arquitetonicos de maneira critica por todos nossos sentidos. Ap6s seculos

imersos na 16gica escrita, linear e visual, que nos levou a estruturar nosso

sal:ier unidirecionalmente - pela visao e verbo -, com os meios digitais

interativos de comunicagao planetaria, englobando satelltes, computadores

pessoais e perifericos tateis de interface, Pimenta pensa "acordar'' nossos

sentidos adormecidos pelo 16gica escrita e retomar um sentido holistico

sagrado do Homem.

Espagos codificados nos cinco sentidos basicos - visao, tato, olfato, audigao e

paladar -, alem do senlido globalizador da sinestesia, essencial para a

arquitetura, vem sendo pensados e projetados em redes digitais de

informac;;6es por fi16sofos, artistas, cientislas e empresarios.

A semioticisla Lucia Sanlaella levantou a impossibilidade do projeto, visto que

ela propoe que s6 a comunicagao visual e auditiva podem ser codificadas -

interessantemente nas quais se baseiam as linguas escritas ocidentais, que

estao na base dos estudos dos semiologistas, desde Saussure, e

semioticistas, com Peirce. Essa proposta ja fora colocada por Santaella no

ForumBHZ Video, em Belo Horizonte em 1992: " ... proponho que a variedade e

multiplicidade crescente de todas as formas de linguagem estao alicergadas

em Ires e nao mais que Ires matrizes da linguagem-pensamento: a matriz

verbal, a matriz visual e a matriz virtual (que encontra sua forma exemplar de

expressao na musica). Todas as linguagens, nao obstante a variedade dos

canals e as diferengas especificas que elas adquirem nesses canals, tem suas

bases nessas matrizes."60

Ap6s seculos de apoio de toda nossa filosofia ocidental nesses sistemas

comunicacionais, opiniao mais que embasada. Mas disso sabemos nos e sabe

60 SANTAELLA, Lucia; "Tres Metrizes.da Linguagem-Pensamento" in Form BHZVfdeo; Belo Horizonte, 1992, p: 28 ·

Page 182: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

183

Pimenta: "L6gica Ocidental, assim como a metodologia cientffica comum, tem

sido caracterizada por uma estrutura hipotatica e teleol6gica.''61

A questao e que a constru<;:ao desses ambientes nao responde as 16gicas dos

pintores, fot6grafos ou escritores que se detinham as aparemcias perceptiveis

dos fenomenos. 0 programador, o modelizador de ambientes virtuais busca

entender o mecanisme de funcionamento dos fenomenos - construgao das

imagens e ambientes da-se pela inscriqao e organizagao matematica dos

elementos ffsicos, qufmicos e apreensfveis dos fenomenos. 0 conhecimento e

cria<;:ao de espagos globais regrades por algoritmos numericos na 16gica digital

binaria.

Resgatando Arlindo Machado, "... se trata menos de avaliar estrategias

semi6ticas do que determinar o nascimento (o renascimento, seria melhor

dizer) de uma arte, ou pelo menos de um sistema expressive, em que a

dimensao heurfstica passa a ser o dado fundamental."62

0 que importa aqui e 0 tratamento de profissionais de diversas areas para,

atraves da arquitetura, pensarmos nas possibilidades de apreensao espacial

globalizador, hipersinestesico, no universe das tecnologias eletronicas e

digitais.

11.13.3 Woiksed

Como a arquitetura poderia, alem de incorporar elementos eletronicos e

traduzir sua 16gica em edificios, desprender-se da nogao de sitio e ter como

locus os universes virtuais?

As cidades sao resultado de cruzamentos de caminhos, de rotas de comercio,

troca de produtos e informag6es. Para os fenfcios o simbolo de Cidade era um

Y, que representava esses cruzamentos. Casas, blocos, quadras amarradas

---~~----~

61 PIMENTA, Emanuel D. M.; Rome (paper); ASA- Art and Technology; London, 1992 62 MACHADO, Arlindo; "0 lmaginario Numerico" in F6rum BHZVideo; Belo Horizonte, 92, p.54

Page 183: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

184

por vias de circula9ao. Como a arquitetura e as cidades se comportarao nos

ambientes virtuais que sao total circulac;ao? 0 "urbanismo" das ou nas malhas

digitais da internet e possivel ?

Sendo que todas as informac;6es. digitais estao baseadas num abismo

numerico, como conceber arquitetura atraves de oscila96es numericas

binckias? Nao ha horizonte, nao h8 gravidade, nao M toque, nao M

visualidade: sao apenas numeros, apenas imaginac;ao. 0 sonho de Hans

Hollein, arquiteto que propunha que a arquitetura deveria se desprender da

concepyao inicial da materialidade chega agora a sua possibilidade de

realizac;ao. A materia-prima da arquitetura deixa de ser "materia", deixa de ter

esse vinculo material. A arquitetura na era digital tern como elemento basico

nao mais a fixibilidade do espa9o ou da materia, mas e construida atraves das

oscila96es numericas binarias, compondo imagens, compondo o imaginario

entre numeros.

Ambientes digitais e virtuais trazem-nos a possibilidade de experimentarmos

sensa96es, 16gicas, composi96es e liberdades que estao alem da antiga

materialidade da arquitetura: liberdade exponenciada. lsso e virtualidade:

possibilidade de ser imaginario alem da realidade newtoniana.

Woiksed, o planeta virtual de Emanuel Pimenta e um projeto de arquitetura

digital. Existira na World Wide Web (www). Arquitetura de sintese onde

podemos navegar baseados em nossos computadores pessoais e, com

equipamentos de imersao, experienciar ambientes virtuais nao mais

confinados as regras do mundo "concreto". Ambiente numerico, ambiente

imaginario.

Quando dizemos que a 16gica digital e baseada em Os e 1s, a verdade e que e

baseada nas suas varia96es exponenciais. Uma imagem de 32 bytes, por

exemplo, tern a possibilidade de 232 recombina96es de Os e 1 s. A 16gica digital

e baseada nas oscila96es do c6digo binario.

Page 184: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

185

Em Woiksed, mais que navegar, imersos num ambiente virtual, podemos trocar

informac;;oes, construir objetos. Com este projeto Pimenta constr6i

possibilidades arquitetonicas. Experiencias virtuais ganham liberdade

experimental: Virtualidade.

Page 185: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

Sistema Desprogram6vel

lucleo de Ciencia e Tecnologia -lisboa

loil<sed, o Planeta Virtual

Arquilctura c TccnolO<.,sias Di$ilais

Emanuel Pimenta

0 abismo numerico digital como o territ6rio da arquitetura. N6o h6 horizonte, nao h6 gravidade, nao ha concretude ffsica: constru<;6o de numeros e imagina<;ao. Os ambientes criados nos oscila<;6es bin6rias digitais trazem a possibilidade de experienciarmos outras snsa<;6es, 16gicas e liberdades arquitetonicas alem da materialidade. Emanuel Pimento cria a arquitetura exponenciada. Virtualidade: o ser imagin6rio alem da realidade newtoniana.

Page 186: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

187

PARTE D

CONSIDERAt;(OES FINAlS

Page 187: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

188

I CAPiTULO 12

DESMATERIALIZA9AO DA ARQUITETURA

"Em cada cidade existe uma cidade virtual, uma sombre digital urbana. E precisamente esses

espaqos virtuais e/etr6nicos des c/dades onde v/agens imaginaries sso poss/ve/s, qua tem

tornado real o espar;o urbano".

Peter Weibel, Op. Cit., p.23

12.1 A Desmaterializa~ao

Acompanhando o percurso das obras analisadas sera possivel perceber que a

ordem dos eixos por mim propostos - Traduc;ao, lncorporac;ao e Jmersao - traz

dois conceitos ordenadores: a Desmaterializac;ao e a Amplificac;ao dos

territ6rios da arquitetura.

De um lado vemos que das Folies aos projetos de Christian e desses a

Woiksed a cria9ao dos ambientes arquitetonicos dependem cada vez menos

dos suportes ffsicos, do terreno ao ediffcio.

lmaginemos as rela96es maquina/ ediffcio. Nas Folies, o ediffcio e a traduc;ao

metaf6rica da linguagem dessa maquina, mas se a maquina for desligada o

edificio continuara, mesmo que abrigue outra funvao, outro sentido. Nos

projetos de Moiler e Hoberman o entendimento dos ediffcios e intrinsecamente

vinculado a maquinas - se forem desligadas, OS edificios perdem

completamente o sentido e perdem, inclusive, suas dimensoes espaciais

apreendidas pelos usuaries - mas continuam existindo no universe concreto. E

no caso de Woiksed a arquitetura e construida baseada na 16gica dos

computadores, e assim a arquitetura s6 existe no periodo que as maquinas

estiverem ligadas: desliga-se a maquina, esvanece a arquitetura - mesmo que

isso nao exclua a continuidade de sua fruiyao em outro Iugar do mundo

mediada por outra maquina.

Page 188: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

189

Mas ha um processo inverse em rela<;:ao as dimensoes do territ6rio da

arquitetura: as Folies, mesmo tratando uma dimensao tecnol6gica presente no

dia-a-dia de pessoas de todo o mundo, tem um Iugar geografico fixo; e no

outro extreme, Woiksed nao tem dimensoes geometricas ou geograficas, mas

topol6gicas, nas rela<;:oes entre os seus elementos e entre os n6s e links das

redes digitais de lnforma<;:oes (internet), que englobam o mundo todo e nao

esta em Iugar nenhum.

Considero, porem, que e possivel tecer alguns paralelos entre essa

"desmaterializa<;:ao" da arquitetura e alguns trabalhos filos6ficos que vem

sendo trazidos para discussao por alguns arquitetos e te6ricos quando se !rata

de pontes crfticos sobre as midias digitais.

Pense que esse movimento simultaneo de esvanescimento do suporte fisico e

exponencia<;:ao de significados possibilitados pelos meios eletronicos e digitais

traz correspondencias as questoes de Kh6ra, de Jacques Derrida e das

Dobras, de Gilles Deleuze.

12.2 Khora, o Receptaculo dos Possiveis

A arquitetura ligada aos meios eletronicos, e sobretudo aos meios digitais, esta

baseada em calculos matematicos. Operando com e atraves de computadores,

que tem por natureza de seus raciocinios maquinicos as matrizes numericas, a

arquitetura passa a ter como interface de realiza<;:ao e mesmo ambiente de

constru<;:ao esse suporte numerico, matematico.

A 16gica numerica dos meios controlados por computador, contudo, nao

respondem a uma equa<;:ao fechada e/ou continua. A grande diferen<;:a entre a

16gica da maquina do inicio do seculo XX e a atual, e que na primeira buscava­

se programar as maquinas para servi<;:os continuos e identicos - dai a cria<;:ao

do tipo nas artes e arquitetura -, e atualmente as maquinas trabalham com

varia<;:oes constanles. Como escreveu lvo A. lbri, "A rnatematica e uma ciencia

que constr6i seus objetos na forma de hip6teses, e delas extrai conseqOencias

Page 189: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

190

necessarias, sem lidar, contudo, com questoes de fato"63. Podemos dizer assim

que a arquitetura na era digital, que tern por base as matrizes numericas das

maquinas informaticas, e a extrat;:ao de possiveis formas apresentadas pelas

hip6teses criadas nas interfaces Homem/maquina/espat;:o.

Mas como a arquitetura, arte/cii'mcia que e prioritariamente uma inscrit;:ao no

espat;:o, ficaria apta a efemeridade e oscilat;:oes oriundas das reordenat;:oes

eletronicas e digitais? Talvez seja possivel reconsiderarmos algumas not;:6es

de Espat;:o.

"Khora nos chega, e como o nome. E quando um nome vern, rapidamente diz

mais que o nome, o outro nome e o outro, simplesmente, do qual anuncia

justamente a irrupt;:ao"64. Kh6ra nao e isso ou aquilo mas pode anunciar ou

apresentar isso e aquilo.

Oerrida trabalha Kh6ra a partir do Timeu de Platao, e prop6e a impossibilidade

de uma tradut;:ao do termo que seria ao mesmo tempo "Iugar", "localizat;:ao",

"territorio" e/ou expressoes metaforicas como "mae", "receptaculo", "molde". 0

proprio sentido de Kh6ra nao propoe um fechamento de significados, e sim

suas variabilidades. "Ricas, numerosas, inesgotaveis, as interpretat;:6es vern,

em suma, informar a significat;:ao ou o valor de Kh6ra"6s

lsso me interessa neste trabalho pois creio que nao e necessario haver uma

definit;:ao formal e significativa restrita aos paradigmas tradicionais da

arquitetura quando trabalhamos com os meios eletronicos, mas sim que a

propria arquitetura, quanto mais se "desmaterializa" no universo digital, mais

se forma a cada instante absorvendo e interpretando os resultados dos

dialogos Homem/maquina/espat;:o.

Como ainda coloca Derrida sobre Kh6ra, as sucessivas interpretat;:6es dariam

sua forma e ai deixariam sedimentos de suas contribuit;:6es, nem por isso

63 IBRI, lvo Assad; K6smos Noet6s: A Arquitetura Metafisica de Charles Sanders Peirce; Ed. Perpectiva +Ed. H61on; Sao Paulo, 1990, p. 03

64 DERRIDA, Jacques; Kh6ra; Ed.Papirus, Campinas, p. 05 65/bidem, p. 18

Page 190: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

191

inFormando Kh6ra, que possuiria uma "virgindade" radical, apta a todas

possibilidades sem se tornar nenhuma delas, sendo o receptaculo "a todas as

hist6rias, ontol6gicas ou miticas, que se pode contar a respeito daquilo que ela

recebe e mesmo daquilo a que ela se assemelha, mas que de fato toma Iugar

nela, a propria Kh6ra, se assim podemos dizer, nao se lorna o objeto de

nenhuma narrative, quer esta se passe por verdadeira ou fabulosa"66.

Seguindo alguns pontos anteriores de livros de Derrida, se pensarmos a

arquitetura como urn processo signico - e que agora, trabalhando com as

interfaces digitais, podemos ver claro essas interrela96es entre signos de

diferentes c6digos, linguagens -, vemos que Kh6ra resgata importantes

questoes levantadas pelo fil6sofo sobre a necessidade de se romper com

significados a priori dos signos, deixando livre outras constantes constru96es

significadoras.

12.3 Encontro de Jacques Derrida e Charles S. Peirce

Tal trabalho de romper com significay6es aprioristicas de objetos (ou palavras)

e crucial na obra de Derrida e, pensando na transformayao do "signo-simbolo",

reflexo de referemcias simb61icas fechadas, para o "signo-possibilidades", que

se constr6i intrinsecamente mesmo sendo amalgamado e servindo de

recipiente para manifesta96es alheias, lembro-me tambem na obra do fil6sofo

Charles Sanders Peirce, no inicio do seculo XX.

A colocayao em paralelo desses autores nao intenciona a aproxima9ao

absoluta de suas obras, mas sim ampliar o leque de possibilidades para a

analise dos projetos propostos nesta disserta9ao.

Derrida escreve sobre a transforma9ao do "signo" em "linguagem" em A

Escritura e a Diferenr:;a, quando urn signo/sinal esta "defunto", e preciso que

nao seja mais "utilizado como informayao natural, biol6gica ou tecnica, como

66 Ibidem, p. 55

Page 191: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

192

passagem de um sendo a outro ou de um significante a um significado"67 para

que entao se vincule apenas a si-pr6prio. Assim, o signo se descola do eixo

perene significante/significado que o aprisiona e se abre como elemento de um

jogo sem significa9oes previas.

Ainda debatendo o aprisionamento do poder criativo das linguagens quando

paitimos de um eixo constante entre signo e significado, Derrida coloca a

existencia de uma superestrutura intelectiva que, mesmo em "estado de agao,

sempre se viu neutralizada, reduzida: por um gesto que consistia em dar-lhe

um centro"68, para apontar a necessidade de uma explosao desse centro fixo

em estilhagos de estrmulos, onde cada elemento ni!lo possui urn significado

intrfnseco, primeiro, mas possibilita a gera9ao de outros significantes e

signlficados com aproximac;blo e/ou atrito entre eles.

Peirce, rompe na Semi6tica com a liga9ao dicotomica signo/objeto, e propoe

que tal rela9ao se de por um processo interpretante, que urn operante

intelectivo de substitui9ao de um objeto por um signo - que pode ocorrer

diversas e diferenciadas vezes - dinamize esta relac;blo, e assim capturemos as

varias facetas de um mesmo objeto e de seus signos, observando suas

potencialidades de diversidade de estfmulos. Nesse trabalho caleidosc6pico

com os objetos e/ou signos - retomando a cadeia sfgnica, vemos que um signo

esta ora substituindo um objeto, ora sendo ele proprio objeto de substitui9ao

de um outro signo - Peirce coloca-nos a possibilidade de conexoes abdutivas

que "advem-nos como urn lampejo. E urn ato de introvisao (insight), embora de

uma introvisao extremamente falfvel ( ... ) e a ideia de reunir aquilo que nunca

!inhamos sonhado reunir que lampeja a nova sugestao diante de nossa

contemplac;ao"69.

Tendo em mente os projetos discutido no capitulo Tecnologias Eletr6nicas e a

Arquitetura, devemos lembrar que nem Derrida nem Peirce trazem a ideia de

exclusao. Derrida abandona a no9ao de um centro fixo, quase metaffsico, mas

67DERRIDA, Jacques; A Escritura e a Diferem;a; Ed. Perspectiva; Sao Paulo 68/bidem, p. 230 68 PEIRCE, Charles Sanders; Semi6tica; Ed. Perspectiva; Sao Paulo, p.226

Page 192: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

193

tern claro que "nao podemos enunciar nenhuma proposic;:ao destruidora que

nao se tenha ja vista obrigada a escorregar para a forma, para a 16gica e para

as postulac;:6es implfcitas daquilo mesmo que gostaria de contestar"70 , sendo

sem sentido tentar abalar uma ideia abandonando seus conceitos, mas sim os

fragmentando e vendo as outras possibilidades que despertam e que, presos a

urn centro, ficaram velados.

Em Peirce, o signa e uma construc;:ao mental entre significantes e suas

significac;:6es, de modo que todo significante, para se valer de uma intelecc;:ao

signica, passa por operac;:Oes de significayao. 0 que Peirce rompe e com uma

ligac;:ao inequivoca e univoca de urn objeto ou significante com urn significado.

Essa visao dinamica do objeto e significantes nos remete a forc;:a da atividade

interpretante na 16gica peirceana, que nao busca a exclusao de significados,

mas sim exponencia-los, gerando novas e infinitas cadeias signicas: "Se a

serie de interpretantes sucessivos vern a ter fim, em virtude desse fato o signa

torna-se, pelo menos imperfeito"71 ; nao h8 sentido buscar urn "grau puro de

excelencia estetica"72.

Assim, essas exponenciac;:6es de formas e significados dos signos - no nosso

caso, da arquitetura - sao possibilitadas por deslocamentos, permutas,

substituic;:6es, oscilac;:6es, desdobramentos de discursos e procedimentos

formais e significadores, de desdobramentos entre as naturezas das

linguagens espaciais e digitais que constr6em a arquitetura nos ambientes

virtuais.

12.4 Dobras na Arquitetura

Uma serie de novas experimentac;:6es formais e resignificac;:6es arquitetonicas

estiveram sempre ligadas as revoluc;:6es tecnol6gicas, como procure mostrar

neste trabalho, a partir das Tecnologias lndustriais no inicio do seculo, as Tete-

70/bidem, p. 233 71 Ibidem, p.74 72

Ibidem, p.203

Page 193: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

194

Tecnologias no p6s Segunda Guerra Mundial e as Tecno/ogias E/etr6nicas,

contemporaneamente. Contudo, nos dois primeiros p6/os as transformac;;oes

estiveram sempre ligadas as dimensoes e bases espaciais como horizonte,

gravidade, altura, disUmcia, com parametres geometricos e geograficos.

Com as interac;;oes da arquitetura com as Tecnologias Eletr6nicas e Digitais,

foram esses mesmos paradigmas basicos que iniciaram um processo de

ruptura. Paul Virilio, sempre atento a essas transformac;;oes nos ambientes

urbanos escreve que "As nor;:oes ehaves de entrada e safda de slnals (radio,

video, digitais) suplantam aqueles habitualmente ligados aos movimentos de

deslocamento de pessoas ou objetos tradicionalmente distribufdos na extensao

do espac;;o"73• Ha como que in-transformac;;oes: a arquitetura mudou

completamente em contato com os meios mas nao se transforma em outra

coisa, nem continua sendo o que era, pois nada era aquem da relac;;ao com os

meios: interdependencia.

De uma maneira, busco colocar que o Iugar da arquitetura na interface com os

meios eletronicos e digitais se transforma num receptaculo potencializador de

formas e significac;:oes. Proponho ainda que cada vez mais abolidas as noc;:oes

a priori ligadas as extensoes e medidas espaciais, os multiples espac;:os

originados dessas interfaces se deem de maneiras diferenciadas.

0 arquiteto Peter Eisenman , dos mais preocupados e integrados nas

discussoes dos meios eletronicos e ligados a fil6sofos contemporaneos, vern

trabalhando as ideias de Dobras de Gilles Deleuze e a Arquitetura.

Deleuze explica, escrevendo sobre o Barroco em Leibniz, as dobras: "um

corpo flexivel ou elastica ainda tern partes coerentes que formam uma dobra,

tal que elas nao sao separadas em partes de partes mas sao sobretudo

divididas ao infinito em dobras menores e menores que sempre conservam

certa coesao"74• Para essas dobras de dobras sao influentes calculos locais,

73 VIRILIO, Paul; La Vitesse de Liberation; Ed. Galilee; Paris, 1995 74 DELEUZE, Gilles; "The Fold: Leibniz and the Baroque" in AD- Folding in Architecture,

vol.63, 03/04-1993; London; p. 18 •.

Page 194: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

195

oscilac;:oes que apontem para singularidades que emergem de um mesmo. A

dobra e um momento especifico no espac;:o e no tempo, mementos que sao

pontes de um mapeamento de relac;:oes diferenciais nomades, sem definic;:oes

de distancias geometricas. Como escreveu Peter Eisenman, "Esses pontos

nao sao mais fixados pelas coordenadas X, Y e Z; eles podem ser chamados

de X, Y e Z mas nao tem mais um Iugar espacial, fixo"75.

E exatamente essa deslocalizac;:ao dos espaqos das Dobras que aponta ao

receptacula (Kh6ra) potencializador que constr6i inumeras possibilidades

formais e significadoras dos ambientes criados nas interfaces da Arquitetura

com os meios eletronicos e digitais. lnumeras possibilidades como um labirinto

de dobras sob(re)/ent(re) dobras: um mundo de infinitas cavernas que apontam

ao "espirito da materia" que, como escreve Deleuze, "A materia-Dobra e a

materia-Tempo".

12.5 Dobras no Tempo

No universe virtual dos meios digitais o tempo instantaneo e, como discutiu

Paul Virilio, o tempo das mfdias que esta alem ou aquem do deslocamento no

espac;:o e no tempo: o tempo desvinculado do tempo cronol6gico - do video,

fragmentario (FastFoward, Rewind, Play); da TV, 'ao vivo', instanti!meo

suplantando distancias espaciais; do tempo-real, em ac;:oes simultaneas

intercontinentais; do tempo-simulado, das modelizac;:oes digitais.

Talvez para apreendermos o tempo instantaneo dos meios digitais possamos

nos deslocar do tempo de Cronos, circular, mesmo que sujeito a acidentes, e

resgatarmos o tempo da Teogonia, da Origem dos Deuses, onde "Nao M um

tempo unico e uniforme, durac;:ao homog€mea e infinita, comum a todos os

75 EISENMAN, Peter;"Folding in Time- The Singularity of Rebstock" in Folding in Architecture, vol.63, 03/04-1993; London

Page 195: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

\

196

Deuses e pre-existente a eles;. ha tempos multiples e qualificados

diversamente segundo o nascimento-natureza que o instaura"76•

Para fecharmos o circulo entre as infinitas Dobras no espa<;o propiciadas por

essas pontua<;6es do tempo, nao devemos esquecer que Deleuze escreve

sobre um quase-cfrculo, o Anel de Moebius, no qual "sua superffcie exterior

esia em continuidade com sua superffcie interna: ela envolve o mundo inteiro e

faz com que o que esta dentro esteja fora eo que esta fora fique dentro"77.

Entao, o que imagino ser interessante e podermos atentar as novas

arquiteturas, ao receptaculo de (ln)forma<;Oes espaciais que se orlglnam nas

interfaces da arquitetura como os meios eletronicos e digitais que trazem

consigo diferentes dinamicas temporais, a materia que "oferece uma textura

infinitamente porosa, esponjosa e cavernosa infinitamente contida em outras

cavernas"78, desdobrando ambiencias.

12.6 Prosseguimento: Notas para Trabalhos Futuros

Partindo da analise das teorias e projetos de Ires periodos marcantes nesse

seculo que discutem as conexoes entre as Tecnologias de lnforma<;ao e a

Arquitetura, separadas por mim como Tecnologias Industries, para discutir a

industrializa<;ao no inicio do seculo, Tele-Tecnologias, onde analiso as

mudanyas ocorridas no universe abrangido pelo radio e televisao, e as

Tecnologias Eletronicas, que apontam experiencias contemporaneas no

debate da arquitetura frente ao universe digital que se inaugura, considero que

e possivel tecer paralelos entre as tecnologias e as constru<;oes das cidades.

0 terceiro p61o, das Tecnologias Eletronicas, propicia que seja estudado ao

mesmo tempo em que acontece: analisamos os acontecimentos em tempo-

76 TORRANO, Jaar; Estudo de HESIODO; Teogonia; Ed. Massao Ohno- Roswitha Kempf: Sao Paulo, 1981

77 DELEUZE, Gilles; A L6gica do Sentido; Ed. Perspectiva; Sao Paulo, p. 12 78

; "The Fold: Leibniz and the Baroque" in AD- Folding in Architecture, vol.63, 03/04-1993; London

Page 196: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

197

real, acessamos informa<;:ao a qualquer instante e Iemos a possibilidade de no

mesmo momento coloca-la em discussao, sem tira-la do sistema, construirmos

contra-informa<;:oes.

lsso, como procurei demonstrar pelos exemplos colhidos, esta cada vez mais

emaranhado no dia-a-dia urbano. Contudo, buscando fazer essa disserta<;:ao

ao mesmo tempo em que as coisas acontecem, uma nova serie de questoes

foram se abrindo - e que pretendo conserve-las para urn trabalho futuro:

1. Cada vez mais inseridos em ambientes virtuais - de Homebanks com

moedas digitais a Woiksed, qual o significado dos territ6rios no universo

contemporaneo digital? Haverao no<;:oes de territ6rio onde se basearao as

cidades globais digitais?

2. Junto a globaliza<;:ao digital vimos acontecer uma dissolu<;:ao de fronteiras de

paises tanto na Africa quanta na Europa ou Asia. Quais sao as barreiras e

fronteiras que delimitam os espa<;:os digitais? Ou, em contrapartida, como se

sustentarao fronteiras terrestres - baseadas nao apenas em marcos fisicos,

mas em linguas, moeda, costumes - imersas operacionalmente no universe

virtual?

3. Se Mcluhan achava que com a globaliza<;:ao haveria uma homogeneiza<;:ao

cultural, vemos pela internet que ha a possibilidade, ao contrario, convivermos

com diferen<;:as, vivermos num universo de contradi<;:oes nao excludentes, mas

amplificadoras. Quais as propostas de nichos culturalmente distintos ocuparem

e migrarem pelas teias de informa<;:oes digitais?

4. Virilio aponta para que com a inser<;:ao no universe digital que podo ser feito

sentado em sua casa em frente a urn computador, os deslocamentos atingiriam

sua velocidade maxima: a lnercia. Contudo, nunca antes na hist6ria houve urn

seculo quanta tanta movimenta<;:ao populacional interterritorial - e isso

agravou-se no final do seculo e tende a crescer ate o infcio do proximo milenio.

lmigrantes, refugiados, nomades globais sao responsaveis pela derrocada de

Page 197: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

198

inumeras barreiras territoriais. Serao as cadeias de informa"oes digitais seu

ambiente? Como se inserem povos. diferentes em movimento constante num

universe virtual?

Essas sao algumas das questoes que considero concernentes a arquitetura e

ao urbanismo no inicio do proximo seculo que comeyam a despontar e devem

ser 'analisadas, discutidas e projetas. Os arquitetos serao cada vez mais

projetistas de Jigay6es, de mapeamentos de cruzamentos, de possibilidades de

trafego informacional.

Page 198: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

199

PARTE E

REFERENCIAS

Page 199: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

I iNDICE DAS ILUSTRAI;:OES

p.22

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Erik Asplund; Ibid.

Gustave Eiffel; Ibid.

Joseph Paxton; Ibid.

p.49

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200

- Cadeira Wassily; Bauhaus-Archiv; 83 Serie Marcel Breuer; G. LEPKOWSKI

- Cadeira 1922; DROSTE, Magdalena; Bauhaus, 1919-1933; Benedikt

Taschen, Berlim, 1992

- Co/una deAr, Ibid.

Peter Cooper; ARGAN, G. C.; Op. Cit.

Gerrit Rietveld; Ibid.

Alvar Aalto; Ibid.

Michel Thonet; Ibid.

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- BITTENBERG, Kari-Georg (org); Catalogo da Exposic;:ao 50 Jahre Bauhaus;

lnstitut fOr Auslandsbeziehungen; Sttutgart, 197 4

- DROSTE, Magdalena; Op. Cit.

-Fabio Duarte de ARAUJO

Page 200: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

p.57

Walter Gropius;

- BITTENBERG, Kari-Georg (org); Op. Cit.

- Bauhaus-Archiv; Serie Fotografie Karle 1; Lucia MOHOL Y

-Fabio Duarte de ARAUJO

. p.93

Buckminster FUller

-WARD, James (ed.) ; The Artifacts of R. Buckminster FO/Ier-4 volumes;

Garland Publishing, Inc.; London and New York, 1985.

p.94

Buckminster Fuller

- ARGAN, G. C.; Op. Cit.

-WARD, James (ed.); The Artifacts of R. Buckminster Faller -4 volumes;

Garland Publishing, Inc.; London and New York, 1985.

201

- FULLER, Richard Buckminster; Synergetics: Explorations in the Geometry of

Thinking; MacMillan Publishing Co.; London and New York, 1975

p. 111

Archigram;

- COOK, Peter; Archigram; Studio Vista, Londres, 1972

- A+U extre edition- Peter Cook: 1961-1989, dec 1989; Tokyo

p. 112

Archigram;

- COOK, Peter; Archigram; Studio Vista, Londres, 1972

- A+U extre edition- Peter Cook: 1961-1989, dec 1989; Tokyo

Page 201: ARQUITETURA E AS TECNOLOGIAS DE INFORMA

p. 137

Bernard Tschumi

-MEIJER, Jola e TEE, Ernie (org); What a Wonderful World; Groninger

Museum; Groningen, Holanda, 1990

- Fabio Duarte de ARAUJO

Peter Eisenman

- ME'IJER, Jola e TEE, Ernie (org); Op. Cit.

p. 155

Christian Moller

202

- MOLLER, Christian; lnteraktive Architecktur, Aedes + Galerie fOr Architektur

und Raum; Berlim, 1994

p.159

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