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CENTRO UNIVERSITÁRIO SÃO CAMILO
POSICIONAMENTOS E IMPLICAÇÕES ÉTICASRELATIVAS AO INÍCIO DA
VIDA HUMANA
ROGÉRIO JOLINS MARTINS
SÃO PAULO2003
SUMÁRIO
I - INTRODUÇÃO........................................................................................................9
II - OBJETIVOS.........................................................................................................10
III – QUANDO COMEÇA A VIDA HUMANA?...........................................................11
3. 1 – Pareceres de comissões.................................................................................................13
3. 2 – Pareceres de pensadores...............................................................................................14
IV - O EMBRIÃO HUMANO NA ABORDAGEM CIENTÍFICA..................................17
4. 1 – Aspectos biológicos do embrião...................................................................................19
4. 2 – Aspectos antropológicos do embrião...........................................................................25
4. 3 – Aspectos psicológicos do embrião................................................................................27
4. 4 – Aspectos sociológicos do embrião................................................................................29
4. 5 – Reflexão filosófica acerca do embrião.........................................................................31
4. 6 - O direito do embrião à vida está impresso na consciência moral.............................32
4. 7 – Uma abordagem da Teologia Moral...........................................................................34
4.7.1 - O embrião humano na Sagrada Escritura...................................................................34a) Alguns versículos bíblicos relacionados ao embrião humano:...........................................................34
b) A dignidade do homem como filho de Deus.......................................................................................36
4.7.2 - Reflexão do Magistério sobre o embrião humano.....................................................37
V - REFLEXÃO NA BIOÉTICA ATUAL....................................................................39
5.1 - O uso do embrião na biotecnologia...............................................................................40
5.1.1 - Projeto Genoma Humano...........................................................................................41
5.1.2 - Clonagem humana......................................................................................................43
1
5.2 - Contexto da vida embrionária na América Latina......................................................45
VI - CONCLUSÃO.....................................................................................................48
VII - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................49
1. Fontes:..................................................................................................................................49
2. Documentos:........................................................................................................................49
3. Livros:..................................................................................................................................49
4. Dicionários:..........................................................................................................................51
5. Revistas e Jornais:...............................................................................................................51
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RESUMO
MARTINS, R. J. Posicionamentos e implicações éticas relativas ao início da vida humana. São Paulo, 2003, 48 p., Monografia (Curso de Especialização em Bioética) – Centro Universitário São Camilo.
O presente trabalho evidencia o valor e a dignidade do embrião humano, desde a
concepção. O título do primeiro capítulo, “Quando começa a vida humana?” serve de fio
condutor na elaboração da monografia. Existem algumas reflexões acerca da discordância,
sobre a data precisa do primeiro momento da vida humana, com pareceres de especialistas do
assunto. Com a abordagem de algumas ciências: Biologia, Antropologia, Psicologia,
Sociologia, Filosofia, Direito, Teologia e Bioética foram apresentados argumentos para
responder ao tema discutido. Situando a temática do embrião humano no contexto atual,
ficaram evidentes duas realidades contrapostas e alarmantes que devem nos chamar a atenção:
a primeira é o uso do embrião na engenharia genética e clonagem. A segunda, é uma visão
crítica aos desafios básicos de sobrevivência da vida embrionária, enfrentados pelos países
pobres, entre os quais, os da América Latina. Por fim, todo o conteúdo dessa pesquisa nos
leva a perceber que qualquer dano ao embrião constitui-se, por si mesmo, numa violação aos
seus direitos.
PALAVRAS CHAVES: Bioética; Dignidade Humana; Embrião; Biotecnologia; Pobreza.
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RESUMÉ
Martins, R. J. Positions et implications ethiques relatives au début de la vie humaine. São Paulo, 2003, 48 p., Monographie (Curso de Especialização em Bioética) – Centro Universitário São Camilo.
Ce travail rend évident la valeur et dignité de l’embryon humain, depuis la concptien.
Le titre du premier chapitre, “Quand commence la vie humaine?” sert de fil conducteur à
l’élaboration de la monographie. Il existe certaines réflexions sur le désacord au sujet de la
date précise du premier moment de la vie humaine, selon spécialistes de la question. Avec
l’abordage de quelques sciences: Biologie, Anthropologie, Psycologie, Sociologie,
Philosophie, Droit, Théologie et Bioéthique, ont été présentés des arguments pour répondre au
sujet discuté. Situant la thématique de l’embryon dans le contexte actuel, deux réalités
deviennent évidentes et alarmantes, réclamant attention: la première est l’emploi de
l’embryon en ingénierie génétique et clonage. La seconde est une vision critique des défits
fondamentaux de la vie embryonnaire en contexte des pays pauvres, entre lesquels ceux
d’Amérique Latine. Enfin, tout le contenu de cette recherche nous presse à percevoir que tout
dommage fait à l’embryon constitue par lui-même une violation de ses droits.
MOTS CLÉS: Bioéthique, Dignité humaine, Embryon, Biotechnologie, Pauvreté.
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I - INTRODUÇÃO
A vida humana, na fase da sua concepção, tem ocupado uma vasta bibliografia com
reflexões debatidas em congressos e escritos, além das dúvidas que aparecem no campo
prático dos laboratórios, hospitais e no cotidiano das pessoas.
A fecundação, até pouco tempo, era pensada como um desencadeamento do processo
natural. Depois começamos a experimentar esse processo com ajuda de algumas técnicas.
Hoje estamos passando, aos temores, do paradigma da tecnocultura, para viver sob os
esquemas da genocultura.
O nosso trabalho tende refletir sobre a realidade do embrião, tentando deixar clara
uma postura ética e as suas implicações com a manipulação deste.
No primeiro capítulo procurei abordar a temática do início da vida elencando
propostas de pesquisadores, participantes de Congressos, que muitas vezes decidem uma
reflexão da ciência mundial.
No segundo capítulo, com a ajuda de algumas ciências, tentei abordar o início da vida,
com o conteúdo que essas ciências podem oferecer. Fiz um estudo do embrião a partir de uma
reflexão biológica, antropológica, psicológica, sociológica, filosófica, jurídica e teológica,
cada uma dando a contribuição que lhe é própria.
Por último, no terceiro capítulo, a partir da dúvida registrada no primeiro capítulo e de
uma resposta dada no segundo, foi possível levantar uma série de indagações éticas.
Algumas indagações não foram respondidas, mas a questão ética, proposta pelo nosso
trabalho, sobre “O quando inicia a vida humana?”, ficou bem em evidência. Essa questão é o
fio condutor do nosso estudo. Resta, agora, uma leitura que não tem por finalidade persuadir o
leitor, mas apenas mostrar uma postura ética de uma visão não utilitarista.
5
II - OBJETIVOS
1. Refletir sobre a realidade do embrião, em contexto de relativização e manipulação.
2. Analisar as teorias científicas sobre o início da vida como fonte de soluções nos casos de conflito de consciência e de deveres.
3. Criticar e chamar atenção para a contraposição de valores: o uso do embrião na biotecnologia e o seu desafio básico de sobrevivência nos países pobres.
4. Identificar a posição doutrinal da Igreja Católica sobre o início da vida.
5. Verificar se o problema demográfico nos países pobres pode ser invocado para justificar o aborto como meio moralmente aceito de controle de natalidade.
6. Informar a opinião pública a respeito dos danos morais provocados pela interrupção da vida.
6
III - QUANDO COMEÇA A VIDA HUMANA?
“Na realidade, agir na dúvida a respeito do fato de haver ou não uma pessoa humana no fruto da concepção significa expor-se ao
risco de suprimir um ser humano, o que se configura em si mesmo
como desordem moral”. (Centro de Bioética,
Universidade Católica do Sagrado Coração - RS)
7
No presente estudo pretendemos expor algumas reflexões sobre os problemas da
desvalorização da vida humana, nos centrando mais especificamente na fase da concepção, ou
seja, no início da vida.
Diante da ameaça pela qual passa o homem, não há dúvida, que os mais indefesos1 são
exatamente os primeiros a sofrerem com as conseqüências. Aqui diríamos do embrião
humano, que por estar “encoberto”, nós nos achamos no direito de decidir por ele. Este
trabalho caracteriza-se por ser um grito em favor do homem que quer e deseja vida, ainda no
seu início. A chamada de responsabilidade para o risco que o ser humano corre pela falta de
prudência e respeito consigo mesmo, principalmente nesta etapa significativa de sua vida,
merece toda a nossa atenção.
Ninguém nega que o embrião constitui uma realidade com vida, desde a concepção. O
problema surge quando se pergunta, em que momento a pessoa humana passa a existir? Em
outras palavras podemo-nos perguntar: existe uma diferença essencial entre a vida humana já
nascida e a que todavia espera nascer? Esta questão é que irá ser o fio condutor do nosso
trabalho.
Em tempos passados, o início da vida humana constituía um enigma para o homem, que
apenas por observação, intuía essa realidade. O que não acontece mais hoje, quando se sabe,
através de estudos científicos, o desenrolar de todo o processo da gênese.
Agora o que o homem busca saber, é de onde veio o primeiro elemento que fez
germinar a vida. Alguns atribuem isso a um ato criador de Deus; outros, a algo que ainda não
foi descoberto, mas que virá a ser.
Seja um ato criador de Deus ou não, algo mudou na perspectiva de compreensão e
indagação feita pelo homem: se antes ele perguntava a Deus de onde veio, hoje sua pergunta
assume, a cada dia, mais horizontalidade no modo de compreendê-la, pois o homem está
cônscio de que sua vida não é um mistério o quanto parecia.
Com a secularização do mundo moderno, a vida embrionária passou a ser um simples
processo da natureza2 na produção da vida. Essa temática, que era debatida mais no plano 1 Madre Teresa de Calcutá definia o homem já concebido comparando-o ao homem moribundo: defendia a sua dignidade e estava disposta a ajudá-la. Cf. Conselho Episcopal Latino-Americano, Biogenética: Aspectos científicos, culturales y éticos, Bogotá-Colombia: Ed. Centro de publicações do CELAM, 1992, p. 194.2 Com a secularização do homem moderno há uma forte tendência em querer reduzir o homem a seus aspectos puramente biológicos ou animais. Encontramos essa tendência em Engelhardt e P. Singer, que são os principais expoentes dessa corrente. Assim considerado, cada homem seria meramente um animal que comporia a cadeia de sua espécie, tal como o rato, o cachorro, a minhoca, etc. O embrião humano, neste caso, teria o mesmo valor que o embrião. Sobre isso, cf. F. BELLINO, Fundamentos da Bioética: aspectos antropológicos, ontológicos e
8
teórico, hoje pode ser debatida em nível teórico e prático, a partir da contribuição que as
ciências nos oferecem.
Com o advento desses conhecimentos científicos e com os recursos que temos
atualmente, torna-se possível falar, com argumentos, sobre o processo de desenvolvimento da
vida do embrião para perguntas que surgem: Quando começa a vida humana? Ou
simplesmente: A partir de que momento o ser humano passa a existir? Ou ainda: Quando o
feto começa a sentir dor? Ou: Quando iniciam os movimentos fetais?
Vários estudiosos já dedicaram e dedicam suas vidas em contínuos esforços na tentativa
de obter uma resposta que aproxime da realidade. No entanto, dentre as várias discussões, e
com interesses diversos, as respostas acabam gerando várias discordâncias:
3. 1 – Pareceres de comissõesO Comitê Warnock3 , reunido na Inglaterra, em 1979, apresentou um relatório, dizendo
que, poder-se-ia dispor do embrião humano para fins experimentais até o 14º dia depois da
concepção. Isso dá a entender que até essa data não se reconheceria o caráter humano do
embrião ou que, de qualquer modo, ele estaria subordinado à vida do adulto. Essa tese está
embasada no fato de o 14º dia corresponder ao final da implantação, ou seja, a fase de
consolidação da formação embrionária.
A posição do Comitê Warnock encontrou apoio, na Comissão de Waller4, em 1984, na
Austrália. A Comissão Waller afirmou: “não mais de 14 dias”, porque depois desse tempo
forma-se a linha primitiva e a diferenciação do embrião são evidentes. McLaren, que é
membro do Comitê Warnock e que estava presente na Comissão Waller, disse que “o
desenvolvimento embrional até o 14º dia seria, portanto, um período de preparação, durante o
qual foram elaborados todos os sistemas protetores e nutritivos necessários para a sustentação
do futuro embrião; e “somente quando os sistemas de suporte tiverem sido estabelecidos é que
pode-se considerar o embrião como entidade individual” (Apud SGRECCIA, p. 348).
Essas duas comissões foram apenas para citar que existem vários grupos de estudos,
chamados também de comitês, organizados sobre esse assunto e que gozam de grande
morais, Tradução de Nelson Souza Canabarro, Bauru-SP: Ed. da Universidade do Sagrado Coração, 1997.3 Primeiro Comitê de Bioética reunido, em Warnock, na Inglaterra, para debater o estatuto do embrião. Com o nascimento de Louise Brown, primeiro bebê nascido com ajuda de técnicas de procriação in vitro, em 1978, a comunidade científica mundial se apressou para definir até que momento o embrião humano poderia estar disponível à experimentação. Cf. E. SGRECCIA, Manual de Bioética, São Paulo: Loyola, 1996, p. 348. 4 A realização da Comissão, em Waller, na Austrália, em 1984 já havia sido marcada em Warnock, devido à rapidez das descobertas científicas. (Ibidem).
9
prestígio e respeitabilidade. Além dessas comissões, existem também congressistas, escritores
e profissionais com as mesmas opiniões ou com opiniões divergentes.
3. 2 – Pareceres de pensadoresGrobstein, em sua obra “Biological Characteristics the Preembryo”, vai reafirmar o que
é sustentado por McLaren: “O pré-embrião humano tem um conjunto especial de
características que o distinguem biologicamente do óvulo que o precede e do embrião que o
segue. É um indivíduo geneticamente, mas não morfologicamente” (Apud SGRECCIA, p.
350).
Do mesmo modo N. Ford vai afirmar que “o aparecimento da linha primitiva é o sinal de
que se formou e começou a existir um só embrião propriamente dito e indivíduo humano.
Antes desse estádio não teria sentido falar de presença de um verdadeiro ser humano em
sentido ontológico” (Apud VIDAL, p. 448).
Vale estar atento aqui para o fato de que o Relatório de Warnock, a Comissão Waller,
McLaren, Grobstein e N. Ford estarem de comum acordo, ao falar do pré-embrião como o
período entre o momento de fecundação e o aparecimento da linha primitiva, o que
corresponderia aos 14 primeiros dias de vida do embrião. Para eles, somente a partir da linha
primitiva é que se pode evidenciar uma entidade especialmente definida que pode se
desenvolver diretamente em um feto e, depois, em um recém-nascido.
Encontramos em M. Zatti e W. Ruff posições que discordam daquelas defendidas pelos
cientistas anteriores. Para eles a vida humana inicia-se no 6º dia após a concepção, o que
coincide com a fase de início da implantação, ou seja, quando o zigoto atinge 100 células.
Para o inglês J. Goldening é fundamental, no desenvolvimento embrional, a formação do
sistema nervoso e o início da vida cerebral. Assim, segundo esse autor, a vida humana deve
ser definida a partir da oitava semana de gestação, quando, por ele, inicia-se a vida cerebral no
útero. Não basta estar presente os tecidos e sistemas de órgãos. Sem a presença de um cérebro
humano funcional eles não podem constituir um ser humano, ao menos em sentido médico.
Na mesma linha de Goldening, J. Donceel vai afirmar:
“Eu não sei quando a alma humana é infundida no corpo, mas estou certo de que não há alma humana e, por isso, não há pessoa humana nas primeiras semanas de gravidez... O mínimo que se pode exigir antes de admitir a presença da alma humana é a disponibilidade desses órgãos: os sentidos, o sistema nervoso, o cérebro e especialmente o córtex cerebral. Uma vez que esses órgãos não estão prontos durante os primeiros dias da gravidez, estou seguro de que não há pessoa humana senão depois de várias semanas” (SINGER, p. 102).
10
Proposta diferente e com posição mais ponderada que os anteriores encontramos em A.
Serra5. Este tenta re-significar a terminologia pré-embrião, proposta por McLaren, dizendo
que é, sem dúvida alguma, lícito, e por vezes conveniente e útil, do ponto de vista
terminológico, introduzir novos símbolos para ressaltar aspectos novos. Para Serra, o termo
pré-embrião poderia ser utilizado para indicar a fase precoce do embrião, ou seja, o período
que vai desde a constituição do zigoto até o momento em que aparece a linha embrional
primitiva. Mas seria errôneo querer significar com essa distinção que os dois processos, do
zigoto à linha primitiva e desta em diante, sejam dois processos descontínuos que não têm
nenhuma correlação entre si e que as duas estruturas, a que vem antes da linha primitiva e a
que vem depois, sejam de dois sujeitos diferentes.
Já H. T. Engelhardt não vendo com clareza no embrião e no feto aquelas características,
segundo ele, próprias da pessoa, ou seja, a autoconsciência, a racionalidade e o senso moral,
sustenta que “nem todos os seres humanos são pessoas. Os fetos, os recém-nascidos, os
retardados mentais graves e os que estão em coma sem esperança constituem exemplos de
não-pessoas humanas. “Essas entidades são membros da espécie humana. Não têm ‘status’,
em si e por si, na comunidade moral. Mas não são participantes primários do
empreendimento moral. Somente as pessoas humanas têm esse ‘status’” ( Apud SGRECCIA,
p. 351).
Para refutar essa idéia de Engelhardt, P. Singer sustenta que é pessoa quem possui
autoconsciência, autocontrole, sentido do passado, sentido do futuro, capacidade de se pôr em
relação com os outros, respeito pelos outros, comunicação e curiosidade; por isso, se o valor
da vida depende do fato de ser pessoa, é necessário:
“rejeitar a teoria segundo a qual a vida dos membros de nossa espécie tem mais valor do que a dos membros de outras espécies. Alguns seres pertencentes a espécies diferentes da nossa são pessoas; alguns seres humanos não o são. E, assim, parece-nos ser mais grave matar, por exemplo, um chipamzé do que um ser humano gravemente deficiente, que não é uma pessoa” (Apud SGRECCIA, p. 370).
A tendência de diminuir o estatuto biológico do embriãoa ponto de não considerá-lo
indivíduo humano senão a partir de alguns momentos arbitrariamente fixados está associada à
tentativa de não considerá-lo pessoa humana. A vida humana é, de fato, caracterizada por
etapas vividas de maneiras diferentes e até mais bem vividas, mas uma não é mais importante
5 A. SERRA adota uma postura mais ponderada entre os geneticistas. Em seu estudo sobre o embrião, pode ser considerado como uma ponte entre os extremos. (Ibidem).
11
que a outra. Entre essas etapas há continuidade de uma com outra. As etapas na vida não são
desconexas.
Aliás, você há de convir comigo que, perguntar “em que momento começa a vida
humana?”; ou “a partir de que momento o ser humano passa a existir?”, etc. são questões
preconceituosas, pressupondo uma flexibilidade, em não admitir a fecundação como o
primeiro momento da vida humana.
Vistas sob essa ótica, estas questões estarão sempre não-resolvidas na consciência do
homem. São questões não tranqüilizadoras para a consciência quando não se admite o que é
verdadeiro, e ainda mais, o que é óbvio.
12
O EMBRIÃO HUMANO NA ABORDAGEM CIENTÍFICA
“A vida não pode ser reduzida à pura realidade biológica que a ciência domina porque tem também um significado simbólicopara o relacionamento do ser humano com a natureza (...).
Essa consciência leva a afirmar que a existência da vida é um milagre da natureza,
suscitando respeito e admiração”. (Volnei Garrafa, 2002)
13
Com o advento dos estudos científicos e com os recursos que temos atualmente, torna-se
possível falar, através de argumentos, sobre o “como” perceber a vida do embrião 6. Se antes
não era possível saber sobre a vida embrionária do ser humano, hoje conseguimos detectar
nele, a partir das primeiras divisões celulares do seu embrião, as características que irá
assumir em sua vida adulta, por exemplo, a cor dos olhos, pele, cabelo, sexo, etc.
Mesmo as correntes científicas positivistas não negam que na concepção há uma vida
nascente. A grande divergência de idéias acontece, ao considerar a concepção como o
“primeiro momento” de uma vida humana. Que é o “primeiro momento” de uma vida,
ninguém nega; porém, dizer que é “vida humana” é o que de fato gera polêmica.
Para responder as essas indagações, tentaremos expor a partir de agora, já com a
possibilidade de uma reflexão científica7, ou seja, falaremos dessa realidade a partir de uma
abordagem biológica, antropológica, psicológica, sociológica, filosófica, do direito, da
Teologia Moral e assim podermos chegar a uma conclusão ética sobre o valor do embrião.
6 Embrião: O ser humano nas primeiras fases de desenvolvimento, desde as primeiras divisões do zigoto até o nascimento. A. B. H. FERREIRA, Dicionário Aurélio, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999.7 As abordagens científicas apresentadas são de pesquisadores e pensadores que têm uma mesma postura: defesa da vida. A defesa da vida será o fio condutor desse segundo capítulo, tendo como paradigma o modelo personalista de compreensão do homem.
14
4. 1 – Aspectos biológicos do embrião
É importante destacar, primeiro, a distinção que alguns pesquisadores biólogos e médicos
fazem entre as fases do desenvolvimento embrionário e fetal. Para esses, o desenvolvimento
embrionário ocorre no período de oito a dez semanas a partir da fertilização, quando os
membros estão tomando forma. Não há um tempo exato para a formação básica desses
membros.
O desenvolvimento fetal, por sua parte, corresponde ao período pós-fase embrionária até
o nascimento, quando a vida estará passando por estágio de crescimento, mas já com as partes
do corpo definidas.
Contudo, existem também pesquisadores que designam de embrião humano todos os
nove meses de desenvolvimento da vida, durante a gravidez, querendo mostrar assim, a
continuidade que existe entre uma etapa e outra.
Feto e embrião quer apenas caracterizar etapas da vida nascente. Como iremos detalhar a
formação da vida embrionária, tomá-lo-emos como processo de desenvolvimento e mudança
contínuos.
a) Como se forma o embrião humano?
O corpo humano tem na sua concepção genética seu primeiro momento de vida. Segundo
Jean Bernard8, já neste momento, a pessoa é uma individualidade biológica, um ser de
relações psicossociais, um caso para os juristas. Mas, essa pessoa em gestação, transcende
essas definições analíticas.
A concepção ou fecundação implica no encontro de duas células9 especializadas
chamadas gametas, uma de origem materna (óvulo) e outra de origem paterna
(espermatozóide), contendo cada uma 23 cromossomos10. A fecundação se dá, primeiro ao
afetar o citoplasma11 das células gaméticas e depois os seus núcleos. Obtido esse contato,
efetua-se a união da membrana celular do espermatozóide com a do óvulo, estabelecendo-se
pela primeira vez a continuidade citoplasmática entre as duas células sexuais. A seguir, o
8 Jean Bernard é presidente da Academia Francesa de Ciências. Em seu livro, Da biologia à ética, descreve com precisão e respeito o que acumulou de experiência em anos como médico comprometido com a vida. J. BERNARD, Da biologia à ética, Campinas-São Paulo, Ed. Psy, 1990.9 Os seres vivos são constituídos por células. O corpo humano adulto possui cerca de 100 trilhões de células que diferem na forma, no tamanho e na função. É a menor porção de um ser vivo. Cf. E. SGRECCIA, Manual de Bioética, São Paulo, Loyola, 1996.10 Cromossomo – É constituído por genes, que são as unidades hereditárias do organismo. Cada espécie animal ou vegetal possui um número constante de cromossomos, que transmitem os caracteres hereditários de cada ser e constituem a formação do novo ser. R. BASILE, L. E. MAGALHÃES, Citologia e genética, São Paulo: E. Cultrix, 1975.11 Citoplasma - Membrana externa ao núcleo das células germinativas.
15
núcleo do espermatozóide adquire um aspecto laxo e granular. A este estágio, José A.
Abrisqueta vai denominar “pronúcleo12 masculino”. O “pronúcleo feminino” aparece depois
da segunda divisão reducional, que se realiza uma vez que o espermatozóide penetrou no
interior do óvulo e se manifesta mediante a formação do segundo corpo polar que anuncia,
por sua vez, que o óvulo está fecundado. Temos já o zigoto13 com 46 cromossomos.
b) Os primeiros dias
Depois do zigoto formado acontece a clivagem14, que são repetidas divisões mitóticas do
zigoto e resultam no rápido aumento do número de células. Estas células ou blastômeros,
tornam-se menores a cada divisão de clivagem. Primeiro, o zigoto divide-se em dois
blastômeros que, por sua vez, dividem-se em quatro blastômeros, oito blastômeros e assim
por diante. Durante a clivagem, o zigoto fica dentro de uma zona pelúcida, espessa,
gelatinosa, que apresenta translúcida ao microscópio. Para muitos pesquisadores a divisão do
zigoto em blastômeros começa com cerca de 24 horas, enquanto para outros, essa divisão
ocorre a partir de 30 horas. As divisões seguem-se umas às outras, formando blastômeros
progressivamente menores.
Depois do estágio de nove células, os blastômeros mudam-se de forma e aderem
firmemente uns aos outros, formando uma bola compacta de células. A compactação
possibilita uma maior interação célula a célula e constitui um pré-requisito para a segregação
das células internas, que formam a massa celular interna do blastocisto. Ao atingir de 12 a 16
blastômeros, o ser humano em desenvolvimento é denominado de mórula15. A mórula, com
forma esférica, forma-se cerca de 3 dias após a fertilização e penetra no útero.
Por volta do 6º dia, o blastocisto16 está implantado superficialmente na camada compacta
do endométrio17 e nutre-se dos tecidos maternos.
c) Segunda semana
12 Pronúcleo – Expressão de José A. Abrisqueta para denominar o citoplasma. Cf. in M.VIDAL, Ética Teológica, Petrópolis: Vozes, 1999, p.402.13 Zigoto é um embrião unicelular. É geneticamente único, porque metade de seus cromossomas vem da mãe e metade do pai. O zigoto contém uma nova combinação de cromossomas que é diferente das células de ambos os progenitores. K. L. MOORE et alii. Embriologia Clínica. Tradução de I. VUGMAN; M. C. ENGELHARDT. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2000, p. 34.14 Clivagem – Série de divisões celulares que ocorrem no zigoto.15 Mórula – Agregado de células provenientes do óvulo fecundado.16 Blastocisto – Do gr. Blasto/Cisti = parte do embrião que se desenvolve por efeito da germinação. Esta parte refere-se à região da bexiga.17 Membrana mucosa que reveste o útero internamente e que, de acordo com a fase do ciclo menstrual, sofre modificações em sua espessura e sua estrutura.
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A implantação do blastocisto começa no fim da primeira semana e termina no fim da
segunda. O embrião dá origem às camadas germinativas que formam todos os tecidos e
órgãos do embrião. As estruturas que se formam durante a segunda semana, são a cavidade
amniótica18, saco vitelino19 e saco cariônico20.
Células do endoderma do saco vitelino dão origem a uma camada de tecido conjuntivo
frouxo, o mesoderma. O saco vitelino e as cavidades amnióticas tornam possiveis
movimentos morfogenéticos das células do disco embrionário. Durante a formação do âmnio,
do disco embrionário e do saco vitelino primitivo, aparecem algumas cavidades isoladas.
Logo essas lacunas se enchem com uma mistura de sangue materno, proveniente de capilares
endometriais rompidos, e de secreções de glândulas uterinas.
As células e glândulas do estroma21 endometrial degeneradas, juntamente com o sangue
materno, constituem uma rica fonte de material para a nutrição do embrião.
O usando técnicas de micromanipulação e de DNA atualmente disponíveis, é possível
diagnosticar, na fase da implantação e até mesmo antes, se um zigoto em divisão corre risco
de ter um distúrbio genético ou possibilidade de um abortamento espontâneo.
d) Terceira semana
O fim da segunda semana e início da terceira caracteriza-se pelo aparecimento de
vilosidades22 cariônicas primárias que é o primeiro estágio de desenvolvimento na placenta; o
mesoderma somático constitui o córion. O córion forma a parede do saco coriônico (saco da
gestação), dentro do qual o embrião com os sacos amniótico e vitelino estão suspensos pelo
películo. O saco amniótico e o saco vitelino são análogos a duas bexigas pressionadas uma
contra a outra e suspensos por um cordão dentro de uma bexiga maior.
A gastrulação é o início da morfogênese e é o evento significativo da terceira semana. A
gastrulação se inicia com a formação da linha primitiva, onde cada uma das três camadas
germinativas: ectoderma, mesoderma e endoderma vai dar origem a tecidos específicos e
órgãos:
18 Do gr. Amníon = âmnio, membrana que se desenvolve em torno do embrião.19 Do lat. Vitellum – protoplasma de reserva do óvulo.20 Do gr. Káryon = Cario, núcleo celular.21 Do gr. Strôma = “O que cobre”, tecido conjuntivo que constitui o arcabouço de um órgão.22 Pequena saliência vascular, especialmente em superfície livre de membrana.
17
O ectoderma23 dá origem ao sistema nervoso central, ao sistema nervoso periférico, aos
epitélios sensoriais do olho, aparelho auditivo e nariz, à epiderme24, e anexos (que são os
pelos e unhas), às glândulas mamárias, hipófise e ao esmalte dos dentes;
O mesoderma25 dá origem a tecido conjuntivo, cartilagem, osso, músculos estriados e
lisos, coração, vasos sanguíneos e linfáticos, rins, ovários e testículos, ductos26 genitais,
membranas serosas que revestem as cavidades do corpo, baço e córtex da adrenal;
O endoderma27 dá origem ao revestimento epitelial28 dos tratos gastrintestinal e
respiratório, tireóide e paratireóides, timo, fígado e pâncreas, revestimento epitelial da bexiga
e maior parte da uretra e revestimento da cavidade timpânica e antro do tímpano ou auditiva.
e) Da quarta à oitava semana
Da quarta à oitava semana acontece a organogênese, período que constitui a maior parte
do desenvolvimento embrionário; entretanto, é durante as três primeiras semanas, que
ocorrem eventos críticos do desenvolvimento, tais como clivagem do zigoto, blastogênese e o
desenvolvimento inicial dos sistemas nervoso e cardiovascular.
No final do período da organogênese, todos os principais sistemas de órgãos já
começaram a formar-se; entretanto, o funcionamento da maioria deles é mínimo, com exceção
do sistema cardiovascular. Com a formação dos tecidos e órgãos, a forma do embrião muda,
de modo que no final da oitava semana, ele tem um aspecto nitidamente humano.
Na quarta semana, com o crescimento do embrião, a região caudal se projeta sobre a
membrana cloacal (futuro local do ânus). Durante o dobramento, parte da camada germinativa
endodérmica é incorporada pelo embrião, formando o intestino posterior, que é o primórdio
do cólon29 descendente. A porção do intestino posterior logo se dilata um pouco e forma a
cloaca, que é primórdio da bexiga e do reto. Com a formação das paredes abdominais, parte
da camada germinativa endodérmica é incorporada pelo embrião, formando o intestino médio,
que é o primórdio do intestino delgado.
23 Do gr. Ecto + derma = Folheto superior do disco embrionário, que se origina nas células do epiblasto, relacionada com a cavidade amniótica.24 Do gr. Epidermis = porção superficial da pele.25 Do gr. Mésos + derma = a camada média, das três camadas germinativas primárias do embrião, da qual derivam os tecidos conjuntivos, etc.26 Ductos = Canal que dá passagem a secreções ou excreções.27 Do gr. Éndon + derma = folheto inferior do disco embrionário, e do qual se originam o epitélio dos tratos gastrintestinal, etc.28 Tecido constituído por células justapostas e com pouca substância intercelular, e que reveste as superfícies externa e interna do corpo e toma parte nos processos de absorção, de secreção e sensoriais.29 Do gr. Ko’lon = porção do intestino grosso.
18
f) Quinta semana
Durante a quinta semana, são pequenas as mudanças na forma do corpo, em comparação
com as que ocorrem durante a quarta semana, mas o crescimento da cabeça é maior do que o
das outras regiões. O aumento da cabeça é causado principalmente pelo rápido
desenvolvimento do encéfalo e das saliências faciais. A face logo entra em contato com a
saliência cardíaca. O arco faríngeo cresce formando o seio cervical.
g) Sexta semana
Os membros superiores começam a apresentar uma diferenciação regional com o
desenvolvimento dos cotovelos e das grandes placas das mãos. Os primórdios dos dedos,
denominados raios digitais, começam a desenvolver-se nas placas das mãos, indicando a
formação dos dedos. Embriões, na sexta semana, mostram movimentos espontâneos, como
contrações musculares do tronco e membros.
Nesta etapa, o olho é bem evidente, em grande parte por causa da formação do pigmento
da retina. A cabeça é muito maior em relação ao tronco e está encurvada sobre a grande
saliência cardíaca.
h) Sétima semana
Durante a sétima semana, os membros sofrem transformações consideráveis. Aparecem
recortes entre os raios digitais das placas das mãos, indicando claramente os futuros dedos. O
intestino penetra no celoma30 extra-embrionário na parte próxima ao cordão umbilical. A
hérnia umbilical, nesta data, é um evento normal do embrião. No fim da sétima semana,
começa a ossificação dos ossos dos membros superiores.
i) Oitava semana
No início desta semana os dedos das mãos já se separaram, mas ainda estão claramente
unidos por uma membrana. Os pés, de forma de leque, apresentam nítidas chanfraturas entre
os raios digitais. A cauda curta ainda está presente. O plexo vascular do couro cabeludo
aparece e forma uma faixa que envolve a cabeça. No fim da oitava semana, todas as regiões
dos membros são reconhecíveis. Durante esta semana ocorrem os primeiros movimentos
volutários dos membros. O embrião apresenta características nitidamente humanas, entretanto
a cabeça ainda é desproporcionalmente grande e constitui quase metade do embrião. O
30 Cavidade que se forma no mesoderma durante a vida embrionária, situada entre a parede do corpo e os órgãos internos.
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intestino está próximo ao cordão umbilical. As aurículas das orelhas externas começam a
tomar sua forma final, mas ainda têm uma localização baixa na cabeça.
j) O embrião a partir da nona semana até o nascimento:
Idade (semanas) Comprimento (mm) Peso (g) Principais características externas9 50 8 Olhos fechados, cabeça grande ou
arredondada. Genitália externa ainda não identificável como masculina ou feminina. Intestino na parte próxima do cordão umbilical. Orelhas em posição baixa.
10 61 14 Intestino no abdome. Desenvolvimento inicial das unhas das mãos.
12 87 45 Sexo distinguível externamente. Pescoço bem definido.
14 120 110 Cabeça ereta. Olhos colocados na frente. Orelhas na posição definida. Membros inferiores bem desenvolvidos. Início do desenvolvimento das unhas dos pés.
16 140 200 Orelhas externas destacam-se da cabeça.18 160 320 Vernix caseosa cobre a pele. Movimento
sentidos pela mãe.20 190 460 Cabelos e pêlos do corpo visíveis.22 210 630 Pele enrugada, translúcida e de rosada a
vermelha.24 230 820 Unhas das mãos presentes. Corpo magro.26 250 1.000 Olhos parcialmente abertos. Cílios
presentes.28 270 1.300 Olhos bem abertos. Com freqüência, boa
quantidade de cabelos presente. Pele levemente enrugada.
30 280 1.700 Unhas dos pés presentes. Corpo ficando roliço. Testículos descendo.
32 300 2.100 Unhas das mãos chegam até as pontas dos dedos. Pele rosada e lisa.
36 340 2.900 Corpo geralmente gorducho. Pêlos do lanugo quase ausentes. Unhas dos pés chegam à ponta dos dedos. Membros flexionados; mãos fechadas firmemente.
38 360 3.400 Tórax saliente; mamas fazem protrusão. Testículos no escroto, ou palpáveis no canal inguinal. Unhas das mãos ultrapassam as pontas dos dedos.
Cf. quadro de K. L. MOORE; T. V. N. PERSAUD. Embriologia clínica, 6ª ed. Tradução de I. VUGMAN; M. C. ENGELHARDT. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2000, p. 104.
20
Conclui-se que, do ponto de vista biológico, não há diferença substancial entre o primeiro
momento da concepção e o momento do nascimento.
4.2 – Aspectos antropológicos do embrião
É preciso considerar também no embrião humano o seu aspecto antropológico. A
realidade humana não se reduz ao aspecto biológico. Para Aristóteles, a realidade humana se
define pelo ponto de vista intelectivo, seu valor objetivo de dignidade de pessoa e à sua
estrutura ontológica. Analogamente afirma I. Kant: “O fato de que o homem possa
representar-se o próprio eu eleva-o infinitamente acima de todos os seres vivos sobre a
terra”31(KANT, p. 31). È considerando-o de tal modo que podemos evidenciar em sua
estrutura o caráter biológico, mas também os caracteres intelectual, social, espiritual e moral.
Isto eleva o homem à condição de Pessoa.
O conceito de pessoa tem origem nas palavras greco-latinas “prósopon/persona”, que
quer significar máscara – que se coloca no rosto para ocultar a face. Assim este termo nos
orienta para a dignidade da pessoa que está “por detrás” da realidade visível-biológica. Por
detrás da realidade concreta e aparente, há uma outra realidade que não se apresenta. A
máscara não serve somente para ocultar a face banal e quotidiana, mas usa-se sobretudo para
representar “outrem” mais digno. A pessoa é mais aquilo que ontologicamente a constitui, do
que por aquilo que fenomenologicamente se manifesta sem, no entanto, haver divisão entre as
duas instâncias. São realidades intrinsecamente unidas numa mesma substância. Esta unidade
concretíssima, na qual está a natureza comum da espécie humana, com todas as suas
características, é possuída pelo sujeito individual de modo absolutamente singular. A
totalidade concretamente existente da pessoa transcende pelo seu valor a natureza comum e a
soma de suas partes. A pessoa embora possuindo uma natureza, não se reduz a ela. Na pessoa
manifesta-se a insubstituibilidade de seu ser.
Dizer pessoa é indicar uma peculiar dignidade de existência, que tem valor de fim que se
afirma por si mesmo e nunca como meio usado por outro. A razão própria e específica da sua
dignidade de pessoa é que difere da natureza comum dos outros bilhões de seres vivos de
espécies diferentes. É deste modo que o personalismo contemporâneo, na tentativa de
combater o empirismo de J. Lock e D. Hume32, que considera o embrião humano como o de 31 I. Kant, em sua Crítica da Razão Pura, diz que os juízos de experiência como tais são todos sintéticos. I. KANT, Os Pensadores, Tradução de Valério Rohlen e Udo Baldur Moosburger, São Paulo: Abril Cultural, 1980, p. 33.32 O empirismo, sistematizado por John Lock e David Hume, no século XVII, afirma que nenhum conhecimento em nós precede a experiência, e todo conhecimento começa com ela. (Ibidem, p. 31)
21
um animal qualquer, assinala que a pessoa não pode ser considerada como objeto, mas como
sujeito. Sua subjetividade é sinônima de tudo aquilo que não é redutível no ser humano. O
objeto pode ser manipulado e usado como meio, mas o sujeito deve ser reconhecido como o
outro que tem a mesma subjetividade que o seu interlocutor. Seja ele estando na maior
deformação física possível. Por exemplo, o que levaria uma pessoa ter um filho deficiente, e
dizer que seu filho lhe dá muito trabalho, porém é ele que deu mais significado à sua vida,
humanizando-a?
Para o esboço do pensamento moderno, não se pode conceber que alguém com
deformação mental, ou o embrião humano e até uma criança, seja uma pessoa. Descartes já
dizia que a pessoa é o ser da consciência: “Cogito, ergo sum”33. O homem é uma substância
pensante, e apenas substância pensante. Esta teoria não se justifica hoje, pois ela causa uma
dicotomia, “res-extensa” e “res-cogitans”34, inconcebível no homem, provocando uma fratura
na sua unidade intrínseca.
Já Santo Tomás de Aquino, no século XIII, dizia que somente a pessoa como “suposto
racional” é capaz de ser senhora dos seus atos e autora de sua ação. Uma ação que começa a
se desdobrar na pessoa, ainda no seu embrião, com a tarefa de ter de se constituir.
Para o personalismo fenomenológico o caráter de ser pessoa confere ao indivíduo a
individualidade e singularidade de existência humana, como ser “único” e “irrepetível”.
Embora existindo e tendo existido no curso da história, a pessoa adulta é a mesma realidade
embrionária, modificada pelo tempo apenas.
O personalismo ontológico tomista de J. Maritain afirma que a pessoa não pode estar
reduzida simplesmente a um aspecto do seu ser: corpo biológico, alma, razão, vontade,
liberdade, espírito, que se faz presente já no seu início. Na verdade a pessoa é o conjunto
desses aspectos e muito mais. Vai dizer Pascal35 que o homem excede infinitamente o homem.
4.3 – Aspectos psicológicos do embrião
A complexa realidade de identidade da pessoa humana, já está presente em menor grau
também no seu embrião. Os psicanalistas são unânimes em afirmar que o estado de
“consciência madura” da pessoa é formada no decorrer da sua história de vida. 33 Esta frase indica o resultado da dúvida metódica de Descartes. Após ter duvidado de tudo, se admitiu com um “eu pensante”. R. DESCARTES, Os Pensadores, Tradução de J. Guinsburg e B. P. Júnior, São Paulo: 1973, 2ª Meditação, p. 91.34 Para Descartes todas as coisas se dividiam em res-cogitans (coisas do espírito) e res-extensa (coisas concretas), inclusive o próprio homem. (Ibidem).35 Pascal, filósofo personalista. A corrente personalista se opõe ao empirismo que reduz o homem ao seu puro aspecto biológico-experimental.
22
Muitos deles, influenciados pelo pragmatismo, dizem que a personalidade da pessoa se
forma de acordo com o meio que se vive. Seria como se a pessoa nascesse desprovida de
qualquer influência genética. É o que a base da teoria empírica chama de “tabula rasa”. A
pessoa nasce com a mente vazia e vai se preenchendo ou apreendendo a realidade no decorrer
de sua história.
Alguns outros autores, como é o caso de Carmichael36, afirmam que a base psicológica do
indivíduo está no momento em que tem início a atividade neuralmente induzida, em que os
nervos sensoriais provocam a atividade nervosa central, a ativação dos neurônios motores e
por fim a resposta dos músculos ou glândulas. Isso corresponde mais ou menos ao fim do 3º e
início do 4º mês da gravidez, que na linguagem desenvolvimentista chamaria de feto.
Para esses autores, a formação cerebral da pessoa no período fetal é de extrema
importância, mas torna-se irrelevante por não saberem nada sobre ele. Não negam existir a
sua importância. Porém, ainda não é possível saber como se dá o comportamento de uma vida
fetal, bem como não se consegue com segurança, já na fase adulta, saber algo sobre o período
de formação da massa encefálica. Essa ignorância se estende até o nascimento da vida.
Aqui entramos num confronto no modo de como se pode adquirir o conhecimento. O
primeiro, como já vimos, é o conhecimento “a posteriori”. Comprovar o comportamento do
feto pode ser algo possível um dia, considerando o grande avanço dos conhecimentos e
esforços dos cientistas. Mas é algo ainda em estudo, que nem mesmo no adulto se conseguiu
tal proeza.
A outra forma de conhecer, trata-se do conhecimento “a priori”, ou seja, que reconhece o
conhecimento empírico e reconhece também o conhecimento adquirido por indução de uma
determinada realidade. Para este, a razão é inata ao homem. Afirmar que a razão é inata ao
homem é dizer também de um comportamento inato, ou seja, que a constituição do
comportamento humano começa a partir de sua concepção, com os dados da hereditariedade.
É aqui que começa a história da vida de uma pessoa. Senão, como explicar o comportamento
de uma jovem, que desde o seu nascimento cresceu longe do pai, e sem dizer nada para ela
sobre seu pai, percebe-se nela um comportamento que é próprio dele?
Nesta abordagem de herança do comportamento genético, em sentido mais profundo, diz
a “psicologia clínica” que, “toda vida provém de uma vida anterior”. Aliás, é muito comum,
em nossos dias, as pessoas recorrerem aos médicos para saberem o seu tipo de patrimônio
genético, para a partir disso, saber o tipo de hereditariedade que irão transmitir. Também é 36 Carmichael possui três volumes sobre o desenvolvimento da personalidade humana. Em seu 1º volume trata diretamente do desenvolvimento da massa encefálica do embrião humano, comparando-o, inclusive, com o de outros animais.
23
sabido que a influência genética acontece até a 4ª geração passada, e caso queira fazer tal
exame com maior porcentagem de segurança, ele deve chegar a esse patamar.
Mesmo considerando todos esses aspectos, é na concepção que o indivíduo começa a
adquirir sua personalidade própria, constituindo a base do seu comportamento adulto. É na
concepção que se encontra o “primeiro sinal de personalidade” de uma vida autônoma. Do
material biológico de duas personalidades diferentes, ou seja, do pai e da mãe, estão contidos
aspectos psicológicos que, na sua fusão, forma alguém com personalidade também diferente.
Assim, a origem de cada novo indivíduo deve ser considerada como tendo início com o
processo de fertilização, mas, também, como uma continuação dos processos vitais presentes
nas células germinativas masculinas e femininas, antes da fertilização.
Já em 1928, Gesell37, afirmou com muita segurança e propriedade o início desse
comportamento, chamando-o de “zero ontogenético”38. Tudo que parte desse zero
ontogenético são processos dinâmicos do organismo em desenvolvimento estrutural. O fato de
mexer na sua estrutura física, não afetaria também a sua estrutura psicológica? Entramos no
aspecto da integralidade.
Com o processo dinâmico da divisão, diferenciação, migração celular e a formação dos
órgãos, entre outros está também a formação do que será o comportamento desse indivíduo. É
o que diz I. Kant: “Nele já estão as alterações que irão permear a sua vida” (Apud
SGRECCIA, p. 460).
Em cada estágio desses, o organismo é considerado como “alguém” que se mantém
através de uma relação com suas energias e gêneros alimentícios de seu ambiente. Isto não
quer dizer que o organismo esteja dependendo totalmente do ambiente (útero) materno para
ser formado.
É neste contexto de formação intra-uterina, desde o início, que faz o indivíduo estabelecer
uma relação de interdependência com a mãe. São duas pessoas que estabelecem relações
profundas entre si, num estreito laço dialogal e de respeito. São duas pessoas em fases de
idade e formação de comportamentos bem distintos.
4.4 – Aspectos sociológicos do embrião
37 Citado por Leonard CARMICHAEL, in Manual de Psicologia da Criança, Vol.III, São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo, 1979, p. 15.
38 Expressão de Leonard CARMICHAEL, Manual de Psicologia da Criança, Vol. III, São Paulo: Ed. Da Universidade de Sâo Paulo, 1979, p. 06.
24
Alguns autores, como os da corrente filosófica behaviorista, ou até mesmo alguns setores
da sociologia, como a sociologia de cunho pragmática, afirmam a irrelevância da metafísica
como critério de reconhecimento da individualidade do embrião.
Outros autores sustentam a categoria de relação mediante a qual não é possível o embrião
estabelecer diálogo do eu-tu. Para outros, embrião não pode ser considerado um ser de
relações porque não possui um senso social: indivíduo-sociedade – é a relação social que
habita o ser pessoa.
Afirmar que o embrião humano não é pessoa porque não tem capacidade de relação,
significa afirmar que é a relação que constitui o ser. A relação não constitui originariamente e
estruturalmente o sujeito, mas vice-versa. É a realidade do sujeito que possibilita, e que
também dá condição para a relação. Não há uma relação fisiológica ou social, se não existe
um ser que se relaciona39.
Grisez, criticando40 a posição do antropólogo M. Montagu, um dos sustentadores que o
ser pessoa do embrião humano deriva do reconhecimento social de outro, faz observar que
sendo corpo e mente dois aspectos da individualidade, a socialização resulta de um processo
psicossomático, que inicia biologicamente com a concepção do produto materno.
É de se reconhecer que a vida humana é de fato um processo, mas não um produto. A
imprescindibilidade do embrião humano, desde o zigoto, tem força de dirigir e guiar
autonomamente sua vida numa certa direção: o zigoto depende fisiologicamente da mãe, mas
ele é dotado de autonomia, de capacidade de ação, de autoconstrução41. A relação que se
estabelece com a mãe é para garantir a sua condição de desenvolvimento. Até mesmo uma
criança, com certa idade, depende do cuidado dos pais para sua sobrevivência. Caso não seja
cuidado, ela morre.
Ainda, não podemos dizer que a relação do embrião com a mãe é passiva. Hoje a
embriologia42 tem demonstrado que o embrião, a seu modo, mantém uma relação ativa, ainda
nos primeiros momentos da fecundação, com a mãe. Ainda nos primeiros dias o embrião entra
em diálogo com o organismo materno.
39Estudos recentes da Biologia, Antropologia e Psicologia caracterizam o homem como “ser biorrelacional”. Mais ainda, estes mesmos estudos parecem mostrar que, desde o útero materno, existem trocas relacionais entre o feto e a mãe. Alguns estudos psicanalíticos nos lembram que a criança bem cuidada e nutrida torna-se problemática se esses cuidados carecem de amor e de palavras.Cf. L. PESSINI, C. P. BARCHIFONTAINE, Problemas atuais de Bioética, São Paulo: Loyola, 2000.40 Crítica contida no Manual de Psicologia da Criança, de Leonard CARMICHAEL, Vol. III, p.149.41 A auto-construção do embrião é categoricamente descrito por J. BERNARD, Da biologia à ética, Campinas-SP: Ed. Psy, 1990, Cap. I.42 Embriologia – Estudo do embrião
25
Mesmo a psicanálise reconhece que o feto estabelece uma correlação social com a mãe,
fazendo uma profunda experiência de diálogo entre ambos. É, portanto, na reciprocidade
dialogal e no reconhecimento que se percebe o outro enquanto outro, e a partir disso é que a
pessoa se revela exatamente como pessoa, na sua característica individual e no seu
crescimento contínuo. A identidade imprescindível do homem está nesta sua capacidade de
perceber o outro como outro, com suas características particulares, até parecidas com as
minhas, mas que são diferentes, e ao mesmo tempo estabelecer relação com ele, com o que
temos de semelhante (que não é a mesma coisa de igual), e o que temos de diferente. A
alteridade constrói a identidade. Dizia É. Mounier que “A pessoa é para os outros e também
nos outros, para o mundo e no mundo” (BELLINO, p.118), relação que o existencialista
cristão Gabriel Marcel chamou de “comunhão”.
4.5 – Reflexão filosófica acerca do embrião
Do ponto de vista filosófico ou dos valores, não podemos separar o momento da
concepção da realidade que o faz ser único. Não há dúvida que desde o momento da
concepção está presente, ontologicamente, todo o valor da pessoa humana individual, por
duas razões:
a) O vínculo entre o corpo e a alma é um vínculo substancial e não acidental: o corpo é
transcrição, epifania, instrumento da pessoa e não simples vestido ou acessório. A pessoa é
pessoa corpórea, eu encarnado e não apenas entidade que tem um corpo.
b) A outra razão é que a personalidade no homem coincide com o ato existencial que
realiza a natureza humana composta de alma e de corpo, de psique e de físico; o ato
existencial age no momento mesmo em que está em ato o novo ser. O fato de a manifestação
da realidade ontológica e existencial acontecer gradualmente e continuar por toda a vida não
autoriza pensar que o “depois” não esteja enraizado e tenha sua causa no “já”: entre o “já”
realizado e o “ainda não” desenvolvido está o arco da gestação e da vida, mas não há um salto
qualitativo, ou melhor, ontológico; é o mesmo ato existencial que alimenta o
desenvolvimento, é o “Eu” que está realmente presente e operante, mesmo que não haja ainda
a autoconsciência e o reconhecimento social. A unidade de desenvolvimento e a unidade
ontológica do ser humano em formação levam à mesma conclusão: estamos diante de uma
vida humana individual em estado de desenvolvimento (SGRECCIA, p. 364-365).
O embrião humano não deve ser considerado como um ser em potencial, mesmo que se
encontre numa fase particular de sua existência na qual a forma humana não é ainda expressa
do mesmo modo como habitualmente somos levados a pensá-la. Ele deve ser visto como uma 26
substância viva e individualizada. De fato, o embrião humano é um ser que em princípio do
desenvolvimento e da mudança está, como em todas as substâncias vivas, no interior da
própria substância. É, portanto, equívoca e pervertida a expressão segundo a qual o embrião é
um homem em potência; “o embrião é em potência uma criança, ou um adulto, ou um velho,
mas não é em potência um indivíduo humano: isso ele já o é em ato” (VIDAL, p. 402).
A realidade substancial presente no óvulo fecundado revela em seu desenvolvimento,
uma continuidade substancial, justamente porque o princípio do desenvolvimento e da
mudança é interno à própria substância. É por isso que dizemos que a pessoa, ao se
desenvolver, mantém em cada uma de suas sucessivas fases a unidade ontológica com a fase
precedente, sem solução de continuidade.
Podemos dizer que desde o embrião, usando uma terminologia dos filósofos
existencialistas, a pessoa já se constitui num ser para a morte, pois ali está o seu primeiro
momento de vida. Já na sua concepção, ainda antes de nascer, ela vive a experiência da sua
própria ação como pessoa. Este é um processo de vida que, o ser em gestação, tem direito
sobre ele. Impedir uma pessoa de sobreviver é um assassinato, pior ainda quando esta pessoa
é alguém indefesa.
Consideração como essa, para Elio Sgreccia, é o mesmo que afirmar, sob o perfil lógico e
racional, que, ontologicamente, há identidade em todo o percurso do desenvolvimento
daquela única individualidade, a qual, ao nascer, é reconhecida por todos como detentora da
qualidade e da dignidade de pessoa humana. E, mesmo que, do ponto de vista psicológico e
social, a pessoa se realize como personalidade num longo caminho de intercâmbios
relacionais e culturais com o ambiente, a sua existência deve ser considerada desde o
momento em que a sua individualidade biológica é posta no ser (SGRECCIA, p. 355).
De fato, o dado experimental, por si só, não serve para reconhecer uma alma espiritual,
mas a própria ciência, através de seu discernimento racional, pode fornecer uma indagação
que confirma esta realidade. Esta indagação nós a encontramos na Instrução Donum Vitae, I:
“Como poderia um indivíduo humano não ser pessoa humana?”.
Apesar dessas considerações, se não reconhecemos no embrião todas aquelas
características que consideramos próprias de uma pessoa, é preciso ter presente, porém, que o
embrião é, em si, determinado a se tornar aquela pessoa.
Do ponto de vista ético, pode-se prescindir, até certo ponto, das discussões filosóficas
precedentes: basta que se confirme que o óvulo fecundado tem uma ligação intrínseca com o
ser pessoal em formação e a ele se destine intrinsecamente para se dever excluir qualquer ato
de eliminação e de danificação.27
4.6 - O direito do embrião à vida está impresso na consciência moral
Evocar o direito do embrião à vida é reconhecer a sua condição de sujeito, ainda indefeso
e que precisa da proteção de outrem para sua sobrevivência. De modo semelhante, é como se
um adulto estivesse indefeso e precisasse de proteção médica ou judicial. A vida humana tem
necessidade de alguém que a proteja.
No caso da decisão sobre o embrião, evoca-se a consciência moral de cada um, que é o
conhecimento do valor moral de uma ação. Esse juízo moral que se aplica é duplo:
compreende uma avaliação anterior à ação e uma avaliação posterior ao fato acabado. Os dois
momentos coincidem quando o juízo anterior é assumido como norma e seguido. Se a
liberdade não segue os ditames da consciência43, então surge um contraste entre aquilo que
deseja e faz.
Mas por que se deve “seguir a consciência” e não agir “jamais contra a consciência?”. A
consciência é o juízo racional, mais ou menos sistemático ou até intuitivo, sobre o valor de
uma determinada ação. Esse valor moral se fundamenta sobre a verdade ontológica. Em
outras palavras, a verdade objetiva vincula a razão, a razão vincula a consciência. Em nosso
caso, no juízo sobre a licitude de um aborto, a verdade objetiva é representada pelo valor do
homem, que é o máximo em termos de valores temporais.
O juízo da razão se é reto e sincero, e se, além disso, é certo (ou seja, sem elementos de
dubiedade ou escolha) cria a exigência ética do “não-matar” uma vida inocente.
Essa adesão da razão à verdade, imposta pela consciência, a conseqüente adesão da
vontade à razão, parece que induz a alguma forma de coerção: na realidade, essa adesão é
libertadora, porque faz a liberdade humana depender apenas da própria consciência e a liberta
de todo risco de manipulação externa ou de conformismos sociais e ideológicos.
Na definição do bem comum, necessário para a sobrevivência, a lei deverá muitas vezes
até pedir sacrifícios, mesmo no exercício da liberdade de cada um, dentro de certos limites, e
deverá também permitir algumas coisas que poderiam ser consideradas por alguns como não
boas, para evitar males piores. Isso para dizer que nem sempre a lei coincide com a ética, nem
sempre pode impedir todo mal e todo abuso no exercício da liberdade pessoal. No entanto,
entre as condições essenciais e objetivas que a lei deve garantir para o bem das pessoas e para
o bem comum é sem dúvida:
43 A Constituição Gaudium et Spes refere-se à consciência como “luminoso olhar da alma”, Compêndio Vaticano II, Petrópolis: Vozes, 1998, nº 248.
28
a) A lei deve defender a vida de todos, especialmente dos mais indefesos e dos inocentes.
Se não cria essa condição, a de viver, não é mais lei e se torna iníqua: deve ser combatida com
todos os meios legítimos por parte de todos e em nome de quem não pode se defender;
b) A lei não pode obrigar a ninguém tirar a vida de outras pessoas, exceto por legítima
defesa;
c) Um médico, por profissão, não é chamado a matar (Donum Vitae, p. 53-54).
4.7 – Uma abordagem da Teologia Moral
A reflexão da teologia moral, também apela para a consciência do homem, tentando
mostrar o valor que a vida humana possui desde a concepção.
A teologia parte dos ensinamentos contidos na Sagrada Escritura, para dar sua resposta
sobre este assunto. Por isso, veremos primeiro e brevemente, a concepção numa perspectiva
bíblica e, depois, a posição do Magistério da Igreja.
4.7.1 - O embrião humano na Sagrada Escritura
Para a Sagrada Escritura a vida é dom de Deus. A vida humana e de todos os seres é graça
de Deus. O homem foi criado à Sua imagem e semelhança (Gn 1,26; 2,7) por Ele mesmo.
Descrever o momento em que a vida passou a existir não foi de interesse do autor
sagrado, mas tão somente dizer que o homem passou a existir a partir do mandato do Senhor:
“Sede fecundos, multiplicai-vos...” (Gn 1,28). Ser fecundo é ser fértil, é reproduzir. É
reproduzir para garantir a descendência ou a perpetuação da espécie. É a multiplicação. Para a
multiplicação supõe a semente44 que faz gerar novos frutos. A semente provém do óvulo
fecundado e está inserida no fruto. Neste início a criança é uma “semente” provida do contato
do esperma com o óvulo. O óvulo fecundado é como o alicerce de uma nova vida.
É aí que brota uma nova vida, uma outra pessoa, que posteriormente, em sua maturidade
fará também o processo de fecundar e fazer gerar novas vidas. Esta é a ordem criada e querida
por Deus. É o processo natural do homem. Aqui está a base de onde a humanidade se forma.
A partir dessa compreensão é que se pode falar da gratuidade de Deus que se manifesta
ao oferecer a vida e pede para que o homem faça o mesmo: “multiplique”. O fazer o mesmo
consiste em continuar oferecendo a vida de maneira gratuita, tal como lhe foi oferecida, pois a
44 Semente (Do Latim sêmen) = germe donde alguma coisa deve nascer. F. TORRINHA, Dicionário latino-português, Porto_Portugal: Ed. Domingos Barreira, 1939.
29
vida é um Dom. Podemos dizer que está no gesto de oferecer a vida ao homem, a primeira
aliança de amor que Deus faz com este.
a) Alguns versículos bíblicos relacionados ao embrião humano:
Há uma série de textos bíblicos que falam dessa temática numa relação com a vocação
dos profetas. Podemos até comparar esta vocação com o esquema de Gn 1 e 2: uma palavra
criadora chama à existência antes de tudo, ela nomeia, assinala funções, consagra um tempo.
Um dos relatos proféticos mais citado é, sem dúvida, o texto autobiográfico de Jr 1,5 que
diz: “Antes mesmo de te formar no ventre materno, eu ti conheci; antes que saísses do seio, eu
ti consagrei. Eu te constituí profeta para as nações”. Alguns exegetas afirmam que a intenção
de Jeremias era expressar o caráter de vida longa concedida a ele por Javé. Daí a idéia de
Deus conhecê-lo ainda antes de formar no ventre de sua mãe, e ele ter projetado sua
experiência como também sua consciência amadurecida em direção do começo absoluto.
Sabemos, no entanto, que a idéia da eleição de Deus com seu povo precede totalmente à
existência, ou seja, Deus chama à existência o que ainda não existe. Se Jeremias será
concebido e nascerá, o texto nos chama a atenção para a radicalidade da terminologia usada:
“antes” mesmo de formar no ventre. Nesse diálogo Deus fala primeiro, para afirmar que
conhece Jeremias há muito tempo, “antes” mesmo que fosse concebido no seio materno. Esse
“antes” expressa que Deus já sabe o que fazer, ao passo que o homem ainda não é capaz de
entender o chamado.
O fato de Deus conhecer Jeremias ainda antes de formar no ventre materno quer
significar que já ali, Jeremias era escolhido por Deus. Neste momento o ser de Jeremias já era
sondado por Deus: “Quando eu era feito, em segredo, tecido na terra mais profunda, Teus
olhos viam o meu embrião” (Sl 138,13-16). Vejamos que, hoje, a nossa própria consciência se
dá conta de que somos formados, ainda estando nessa profundidade do nosso ser.
O termo hebraico Bahar quer expressar a ação divina de escolher (Is 44,1), de conhecer
(Jr 1,5; Am 3,2). O “Chamar pelo nome” (Is 49,1) implica escolher para uma função
determinada (Ex 31,2; Is 43,1; 45,3), convite divino para participar dos bens da salvação (Pr
1,24). O chamado divino é sinônimo de eleição e de vocação e também de predestinação, no
sentido de ser escolhido antes de existir. Na escolha divina entra todo um projeto de Deus
para o escolhido (Sb 9,1-11). O fato de criar o homem, Deus concretiza o seu projeto,
indicando o que o homem deve fazer (Gn 1,28-30).
Assim, Deus dá a vida ao homem e à mulher (Gn 1,26) e convida-os a participar do seu
ser, do seu agir. O ser de Deus é fazer gerar a vida porque Ele é vida. É assim que o salmista, 30
no salmo 70, 6, louva a Deus dizendo que a sua vida desde o seio materno é parte da vida de
Deus, ou seja, naquele momento a pessoa já é a “imagem e semelhança” de Deus.
Deus dá a vida para que o homem na sua ação contribua na geração da vida tanto
fecundativa quanto no projeto de fazer gerar vida, no sentido de fazer justiça entre os povos.
Esta foi a incumbência de Deus dada aos profetas. É já no início, no ventre materno (Gn 1,26;
Is 44,1-5; 49,1-3; Jr 1,5-7; Am 3,2; Jn 10,8-12; Sl 22,10; Sl 70,5-6; Sl 138,13-16) que as
pessoas têm a missão de colaborar com o plano divino.
Se ainda tentarmos resgatar no Livro do Levítico 1,18 e 20, não as formulações de
penalidades, mas o código de santidade, irá perceber o importante exercício de reconhecer no
sangue e no sêmen, bem como o valor do tempo fecundo da mulher, como expressões do
sagrado na vida.
b) A dignidade do homem como filho de Deus
A imagem de Deus, presente no homem, desde o seu embrião assumiu um novo vigor
com o evento da encarnação de Jesus. A verdade sobre a criação do homem e da mulher à
imagem e semelhança de Deus constitui um mistério que só se torna claro no Verbo
encarnado.
Está no fato do homem e a mulher serem imagem e semelhança de Deus a base de toda a
antropologia cristã. É na passagem do livro do Gênesis (Gn 1,26) que já encontramos esta
verdade fundamental: o homem é o ápice de toda a ordem criada no mundo visível.
É nesta base antropológica que o Novo Testamento introduz a revelação mais nítida e
sublime da “vida” íntima de Deus. Por meio de Cristo, Deus lança uma nova luz sobre a
imagem e semelhança dele no homem. Através da encarnação, Deus deu à vida humana
aquela dimensão que tencionava dar ao homem já desde o seu primeiro início.
Em Cristo, Deus revelou plenamente à humanidade e aproximou-se definitivamente dela,
como encontramos em Fl 2,6-11, que “mesmo estando na forma de Deus não usou de seu
direito de ser tratado como um deus, mas despojou-se, assumindo a condição de servo,
tornando-se semelhante aos homens... 45”. É em Cristo que o homem adquiriu essa consciência plena da sua dignidade, da sua
elevação e do valor transcendente da própria humanidade que lhe constitui a existência. Jesus
tornou-se o protótipo para cada homem.
45 Bíblia de Jerusalém, Paulus 2002.31
A missão de Jesus teve por finalidade, resgatar a vida no mundo em todos os seus
aspectos. Esforçou-se para mostrar a face sublime de Deus existente em cada pessoa, para que
a vida se tornasse cada vez mais humana, atingindo a sua vocação última que é tornar-se
divina.
Por meio dessa graça transbordante e indizível, que é a união de Cristo com o homem,
que nasce a nova humanidade, chamada a participar na vida de Deus (2 Pd 1,4). Nos diz o
Evangelho de João que o “o Verbo nos deu o poder de nos tornarmos filhos de Deus (Jo 1,12).
Agora não somos apenas imagem e semelhança de Deus, mas em Cristo somos também seus
filhos (Rm 14,7-8). Esta é agora a tamanha dignidade que pertence o ser do homem, desde a
sua concepção.
4.7.2 - Reflexão do Magistério sobre o embrião humano
Mas, o que orienta o Magistério a esse respeito?
O Magistério eclesiástico, em conformidade com as normas da lei natural, e aqui convém
estar atento, que qualquer agressão à lei da Igreja, neste sentido, é agressão em primeiro lugar
à própria natureza. O argumento da Igreja é antes um argumento da natureza. Portanto, é a
natureza que em primeiro lugar faz sua cobrança. E é próprio da natureza o aspecto unitivo e
procriativo. Quando o homem violenta essa realidade ele está contra a sua própria natureza.
A Igreja presente no mundo é chamada a dar uma resposta de conduta ética ao seu povo e
a todos os povos de “boa-vontade”, conduta que ela inspira nos ensinamentos da revelação. É
função do colégio episcopal, do Magistério, em razão do múnus que lhe foi confiado pelo
próprio Autor da Revelação, Jesus Cristo, e pela ajuda prometida do Espírito Santo,
apresentar à realidade atual orientações que servem para iluminar o percurso de
desenvolvimento no mundo.
Quando a doutrina moral da Igreja ensina, ela ensina para o bem estar humano e para
cumprir o seu mandato missional, isto é, que os homens se constituem em matrimônio,
correspondendo à sacralidade que eles representam. Assim, a doutrina da Igreja ensina que
“qualquer ato matrimonial deve permanecer aberto à transmissão da vida” (Pio XI, p. 39).
E “quando da união conjugal dos dois nasce um novo ser humano, este traz consigo ao
mundo uma semelhança especial com o próprio Deus: na biologia da geração está inscrita a
genealogia da pessoa” (João Paulo II, 1995, p. 43).
O critério ético valorativo é aqui marcado pela originalidade do ser humano, que “deriva
da própria originalidade da pessoa humana” (Donum Vitae, p. 19). “A transmissão da vida
32
humana é confiada pela natureza a um ato pessoal e consciente e, como tal, sujeito às
santíssimas leis de Deus: leis imutáveis e invioláveis que devem ser reconhecidas e
observadas” (João XXIII, p. 38). “Tal ato pessoal é a íntima união de amor dos esposos, os
quais, doando-se totalmente um ao outro, dão a vida” (Audiência geral de João Paulo II, 16-
01-1980). Da unidade desse ato, em que a união dos esposos torna-se “uma só carne”, forma-
se outro ato que é a vida nascente, com sua centralidade.
Assim:
“A partir do momento em que o óvulo é fecundado inaugura-se uma nova vida que não é aquela do pai ou da mãe, mas de um novo ser humano que se desenvolve por conta própria. Nunca se tornará humano se já não o é desde então... Desde a fecundação tem-se início a aventura de uma vida humana com capacidade para organizar-se e tornar-se pronta para agir” (Declaração sobre o aborto provocado, p. 12-13; 18-06-1974).
“A dignidade dessa pessoa exige que ela venha à existência como dom de Deus e fruto do
ato unitivo e procriativo entre os esposos, ato este que pela própria natureza torna-se
insubstituível” (Carta aos profissionais da Saúde, p. 40). A vida humana é sagrada, e “desde o
seu alvorecer compromete diretamente a ação criadora de Deus” (João XXIII, p. 53).
As recentes aquisições da biologia humana vêm confirmar que “no ovo que deriva da
fecundação já se encontra constituída a identidade biológica de um novo indivíduo
humano”(João Paulo II, 1987, p. 35). Trata-se da individualidade própria de um ser
autônomo. A individualidade biológica e, por isso, a natureza pessoal do ovo é tal desde a
concepção. Quando o Pontifício Conselho da Pastoral para os profissionais da saúde, diz que
“é errado falar de pré-embrião, se por isso se entende um estágio ou uma condição de vida
pré-humana do ser humano concebido”, deseja responder à teoria que reconhece como
humano somente o embrião quando atinge determinada idade, ou seja, o 6º, 14º, dia, etc.
Diante da dúvida, em reconhecer a vida nesta primeira idade, a Igreja46 aconselha que não
se cometam atrocidades, porque antes de infeccionar a criança nascente estará desonrando a si
mesmo que padecerá com as injúrias, isto é, com o peso de consciência.
Nisto o Vaticano II é categórico e claro em propor as diretrizes que devem orientar a
consciência do homem: “Tudo o que atenta contra a vida, como qualquer espécie de
homicídio, genocídio, aborto, eutanásia... são efetivamente dignas de censura”, pois “tanto o
aborto como o infanticídio são crimes nefandos” (Gaudium et Spes, Nº 284, 362).
Além de ser crime é também infidelidade com o Senhor Deus que confiou ao homem o
nobre encargo de preservar a vida, dando a vida, a condignidade própria de sua natureza.
46 Compêndio Vaticano II, Constituição Gaudium et Spes, Petrópolis: Vozes, 1998, nº 284.33
34
V - REFLEXÃO NA BIOÉTICA ATUAL
“Pierre Simon de Laplace tinha elaborado uma hipótese cosmogônica sobre a origem do universo,
segundo a qual o sistema solar proviriade uma nebulosa primitiva.
Um dia mostrou essa teoria a Napoleão, pedindo-lhe sua opinião.
Este respondeu: ‘Interessante, mas onde você coloca Deus em tudo isso?’.
‘Majestade’, retrucou Laplace, ‘essa é uma hipótese inútil’”.
(Revista Perspectiva Teológica, 2001)
5.1 - O uso do embrião na biotecnologia47
47 Biotecnologia – expressão para designar a técnica a serviço da vida.35
Inserir esta temática do embrião humano no contexto em que vivemos é pensar na
possibilidade de tirá-lo da ordem natural (graça) e passar a vê-lo na ordem da manipulação e
do interesse humano. O que era dado ao homem gratuitamente passará a ser algo que deverá
conquistar: a vida.
O problema vai mais além. Trata-se da relativização do homem de modo geral. Querem,
no fundo, fazer da espécie humana um objeto, como já está sendo. O homem está sendo
manipulado como matéria prima. E onde está a sua dignidade?
A partir do que vimos nos capítulos anteriores, podemo-nos perguntar acerca da
Bioética48: é lícito manipular o embrião humano, se desde a sua concepção ele deve ser
considerado uma pessoa humana?
As investidas sobre ele são tais que tendem a uma mudança radical da identidade
humana. Quanto a isso não queremos entrar no mérito se a pretensão da biotecnologia é a
modificação do homem ou não. Mas, sabe-se, no entanto, que o homem que estamos
procriando, quase artificialmente, amanhã irá diferir de nós mais profundamente de quanto
nós diferimos de nossos ancestrais. Esse tipo de ser humano que somos está em risco de se
tornar extinto por sua própria maquinação. Ele corre o risco de morrer porque quem nos
sobreviverá será culturalmente incomparável. Monsenhor Javier Lozano Barragan fala de um
“Homo Bioeconomicus”49. Para o filósofo agnóstico Taguief50, esta realidade seria na verdade
o surgimento de uma nova sociedade, de um mundo pós-humano. Como querermos construir
um mundo pós-humano se não humanizarmos primeiro o que nós vivemos? Segundo
Monsenhor Javier “O ‘Homo Sapiens’ deve guiar o ‘Homo Technicus’, respeitando esta
substancialidade da história e a sua responsabilidade não deve suscitar respostas que
supostamente modifiquem o embrião humano” (Conselho Episcopal Latino-Americano, p.
182).
Foi a partir da segunda metade do século XX, e, sobretudo após o início da década de 90
que a humanidade passou a conviver com os alarmes de uma “revolução silenciosa confinada
nos laboratórios de bioengenharia” (SOUZA, p. 78).
Pretende-se, com isso, “aperfeiçoar” a espécie humana, com a modificação ou
transformação dos genes de seu embrião. É o que disse Pe. Valdomiro, em seu livro, que
48 Bioética – “é um neologismo derivado das palavras gregas bios (vida) e ethike (ética). Pode-se defini-la como o estudo sistemático das dimensões morais – incluindo visão, decisão, conduta e normas morais -das ciências da vida e da saúde, utilizando uma variedade de metodologias éticas num contexto interdisciplinar”(L. PESSINI, C. P. BARCHIFONTAINE, in Problemas atuais de Bioética, São Paulo: Loyola, 2000.49 Conselho Episcopal Latino-Americano, Biogenética: Aspectos científicos, culturales y éticos, Bogotá-Colombia: Ed. Centro de Publicações do CELAM, 1992, p. 182.50 V. J. de SOUZA, in Projeto Genoma Humano, Franca-SP: Ed. Ribeirão Gráfica, 2001.
36
“Hitler está sobrevivendo nas ciências genéticas com o ideal de construir o homem perfeito”
(SOUZA, p. 80).Os dois grandes projetos neste campo são, sem dúvida, a engenharia genética
e a clonagem humana. Não é nossa intenção problematizar todo o assunto, mesmo porque
mudanças neste campo são mais profundas que o quanto aparentam, mas levantar a
problemática ética em torno do assunto, uma vez que essas técnicas trazem, simultaneamente
consigo, o paradoxo do avanço juntamente ao retrocesso prejudicial ao homem no campo da
embriologia. Nisto diria que parece ser “duas faces de uma mesma moeda”, cabendo ao
homem tomar uma decisão.
5.1.1 - Projeto Genoma Humano
Depois de tantas descobertas feitas nos animais e vegetais, o homem descobriu o seu
próprio código genético, e suas moléculas de DNA e RNA. Vive-se, agora, sobretudo nos
países desenvolvidos, uma corrida aos testes genéticos. A proposta do Projeto Genoma é fazer
com que ter uma criança do sexo feminino ou masculino não dependa mais somente da
natureza, mas da opção dos pais. “Por meio de uma técnica chamada FISH, é possível colorir
os espermatozóides e diferenciar os que vão gerar menino ou menina. Esta fecundação
artificial foi realizada em 14 casais com quase 100% de eficiência” (SOUZA, p. 50).
Como pensar, neste contexto, o ser humano tendo seu corpo negado e vilipendiado?
A Organização Mundial dos Direitos Humanos expressa que “Cada indivíduo tem direito à
sua identidade genética própria” (Artigo 2,10)51.
Os cientistas que fazem tais atrocidades dizem que os discursos que se opõem a esse
tipo de manipulação da vida são tabus ou preconceitos. Mas como aceitar a modificação de
uma pessoa a partir daquilo que nos recorda a Instrução Donum Vitae de que “quando se faz
uma intervenção no corpo humano não atinge apenas tecidos, órgãos e suas funções, mas
envolve também a própria pessoa52?”.
Como pensar esse paradoxo do mundo moderno, com suas escolas moderníssimas,
mas que não vêem o ser humano para além do seu aspecto biológico.
Aliás, não é de se estranhar! Diz-se com freqüência que tudo é hoje suscetível de ser
tratado: da inteligência à liberdade, das potencialidades alcoólicas às criminais e uma série
de doenças mais. Com uma simples amostra de sangue ou tecido, os médicos podem
detectar nos genes alterações capazes de causar doenças. Essa pesquisa em andamento
mostra um grande avanço da medicina que poderá prestar muita ajuda ao homem. Têm-se 51 L. PESSINI, C. P. BARCHIFONTAINE, Problemas atuais de Bioética, São Paulo: Loyola, 2000, p. 521, 523.52 J. PAULO II, Instrução Donum Vitae, São Paulo: Paulinas, 1987.
37
descoberto centenas de genes associados a doenças específicas, como alguns distúrbios
mentais, a doença de alzheimer, alguns tipos de câncer, etc.
Hoje, dispomos de testes genéticos que conseguem detectar, com graus variados, se
uma pessoa já tem a doença ou predisposição para adquiri-la. Em alguns casos isso permite
atrasar o seu aparecimento ou limitar seus efeitos. Isso é chamado de medicina preventiva.
Prever anomalias, ainda no embrião humano, para que possam ser corrigidas,
constitui, sem dúvida, um grande avanço para a vida do homem. A deformação física no
corpo humano, afirmam alguns médicos, é mais fácil ser curada quanto mais cedo for
tratada. Não há problema moral em cuidar do ser humano ao descobrir o seu problema.
Muito pelo contrário, todo ser humano tem o direito de ser tratado. O embrião é um ser
humano. Os avanços adquiridos pela ciência devem estar em função do homem. Por isso,
uma vez percebida no embrião alguma malformação, “ele deverá ser tratado como pessoa e
defendido na sua integralidade, tratado e curado, na medida do possível, como qualquer ser
humano, no âmbito da assistência médica” (João Paulo II, 1987, p. 25).
A Igreja mesma considera como moralmente lícita a intervenção estritamente
terapêutica, médica ou cirúrgica, no embrião. Isto porque se trata apenas de uma fase
específica na vida do indivíduo.
No entanto, torna-se um problema sério não somente para a moral cristã como
também para a ética quando essas descobertas são feitas através de uma variedade de
tentativas nas células vivas do embrião, ora dando certo e ora dando errado.
Outro problema é, quando ao constatar que na criança há determinada anomalia e,
que é de difícil diagnóstico, ou quando, ao se comprovar que não há recurso para ela, os
pais pedirem para os médicos abortá-la.
O que se quer hoje em dia, é livrar-se de uma vez por todas da linhagem de genes
defeituosos, pois a correção das células germinativas de uma pessoa garantirá que sua futura
descendência tenha o fenótipo perfeito.
Este ponto gera mais dúvida ainda, porque uma alteração genética mal sucedida
poderá ser passada também à descendência e isso, atualmente, é bem provável, dadas as
limitações técnicas. Assim surgem questões como as seguintes: a quem pertence o
patrimônio genético? O direito de uma pessoa interferir no seu genoma confere-lhe também
o direito de interferir no de seus descendentes? Numa perspectiva de direitos humanos,
podemos falar que existe algum direito de alguém sobre o filho?
Não existe um direito próprio ao filho. Já vimos no capítulo anterior o porque,
mesmo sendo filho, o indivíduo constitui-se num novo ser.38
5.1.2 - Clonagem humana
No mesmo nível da problemática engenharia genética, está também a chamada
clonagem humana.
Através da manipulação do embrião humano é possível se tornar realidade a
fecundação por outros meios que não a fecundação embrionária. Trata-se da fecundação
clonal.
Com esta experiência de clonagem de seres humanos temos uma nova proposta no
modo de conceber a vida. Assim ela deixa de ser concebida pelo processo natural, até então
tido como a única forma de reprodução, e assume um caráter de reprodução através da
intervenção humana. Falar dessa temática, nem que seja superficialmente, neste momento é
interessante porque ela tende a mudar o modo como percebíamos a concepção do embrião
humano até o momento.
A fecundação clonal acontece com a união de células somáticas adultas, em contato
com o óvulo feminino desnucleizado. Essa técnica extra-ordinária foi descoberta no processo
de fecundação da ovelha Dolly, pela equipe de Ian Wilmut, em 1997, e não há como negar,
que em nossos dias já constitui uma possibilidade de acontecer nos seres humanos. Estamos
assistindo atualmente os noticiários da imprensa, mesmo sem comprovar, o suposto
nascimento da menina “Eva”53, nos EUA, no dia 26 de dezembro de 2002, mencionado por
Darlene Menconi, como a “chegada ao mundo da nova encarnação da raça humana” (Isto É,
p. 76), referindo-se à mesma época que se comemora o nascimento de Cristo e a prepotência
do homem em competir com Deus e estabelecer uma nova era.
A clonagem de seres humanos tem, entre tantos, dois grandes problemas morais: o
primeiro é o problema do uso das técnicas no processo de fecundação e a quem essas técnicas
beneficiam. Se as técnicas fossem utilizadas apenas para ajudar no processo de fecundação,
não haveria maiores problemas. Pelo contrário, seria até aconselhado. Mas, o que não se
aceita é a substituição, até mesmo desnecessária, do processo de fecundação para a
reprodução.
O segundo problema está no fato de substituir as células germinativas, para aplicação
de células somáticas que são células encontradas em qualquer parte do nosso corpo, menos
nas células embrionárias.
53 Clone fabricado pela empresa Clonaid, de propriedade da seita Raeliana. Noticiário publicado pelo Jornal Folha de São Paulo, “Seita dos EUA diz que fez o 1º clone humano” em 28-12-2002, p. 11-12.
39
De qualquer forma temos de considerar, apesar de não ser aceito, que caso a
clonagem de humanos se comprovar, o início do seu processo de vida encontra-se no
momento da união da célula somática com o óvulo desnucleizado. Depois que acontecer a
fecundação, a vida humana tem os mesmos direitos que qualquer ser humano, pois ela é
humana e deve ser respeitada como tal.
Contudo, como a Igreja irá trabalhar pastoralmente54 com essas pessoas modificadas
geneticamente e fazê-las entender que a sua proveniência não foi querida somente pelos
homens, mas que tiveram suas origens em Deus? A Igreja pode ajudar nas reflexões éticas
agora, orientando para não acontecer. Mas depois que acontecer e, neste caso será um
caminho sem volta como dizem alguns cientistas, qual o procedimento que a Igreja e mesmo a
ética irá adotar: “é filha de Deus ou do homem? Há, na verdade um grito que ressoa em
nossas consciências colocando em cheque toda essa realidade da modificação humana.
Como fazer o clonado entender a gratuidade da vida, se ele sabe que a sua vida não
dependeu da gratuidade, mas do interesse manipulado por outros, e portanto, sem liberdade?
Mesmo sendo humano, como servir do preceito bíblico de serem imagem e semelhança de seu
“deus”, seu criador, se a sua existência não dependeu de Deus? Por outro lado, como impedir
o desenvolvimento do homem se ele é tido como co-partícipe de Deus e que deve cooperar55
com a obra da criação, buscando a sua perfeição? Como impedir, se a sua inteligência é um
dos aspectos que lhe dá a dignidade de ser semelhante a Deus, e que os talentos devem ser
multiplicados56? Neste caso parece ser justo e até abençoado o homem desenvolver as
faculdades que lhe são próprias e também queridas por Deus. A problemática aqui não é tanto
duvidar da graça de Deus na vida dessas novas pessoas, mas fazê-las entender que antes de
tudo existia somente a graça de Deus.
5.2 - Contexto da vida embrionária na América Latina
Além dos questionamentos éticos que se colocam nesta situação de uso ou não da
biotecnologia no ser humano, coloca-se também a problemática da contradição que existe, ao
investir bilhões e bilhões para solucionar problemas existenciais do homem, quando os
problemas básicos e concretos de muitas pessoas, e relativamente fáceis de serem 54 Monsenhor Javier acredita que o Personalismo é uma ponte magnífica para um trabalho pastoral entre as ciências da Genocultura e a fé. Cf. Conselho Episcopal Latino-Americano, Biogenética: Aspectos científicos, culturales y éticos, Bogotá-Colombia, Ed. Centro de publicações do CELAM, 1992, p. 192.55 (Ibidem, p. 180).56 Para o teólogo Levi Corrêa de Araújo, não há porque assustar com a clonagem. O desenvolvimento da ciência é algo absolutamente oriundo da capacidade que Deus deu ao ser humano. “Quem dá o sopro da vida não é o cientista, e sim Deus. O clone é outro ser” (Jornal Folha De São Paulo, “Dia sombrio para a história da ciência”, 28-12-02, p. A 12).
40
solucionados se quiserem, não são olhados. Enquanto querem usar técnicas caras, muitas
pessoas passam fome e morrem a todo minuto por falta de condições mínimas de
sobrevivência.
Uma grande contradição que acontece é aplicar as últimas descobertas da medicina
riquíssima para salvar a vida de um embrião (que deve ser salvo), sendo que a outros aplicam
a seringa para matá-lo ou abortá-lo, por falta de condições mínimas de vida. Enquanto nos
países “ricos” aperfeiçoam técnicas para a manipulação, nos países pobres a maioria das
pessoas está procurando apenas meios para sobreviver.
Sabe-se que esses recursos adquiridos pela elite dos países tanto do Primeiro quanto
do Terceiro Mundo são às custas da sangria dos pobres. São os pobres que vivem na miséria e
morrem, para ostentar a luxúria, o esbanjamento e a manipulação em si mesmos. Isso porque
até os experimentos são feitos nas pessoas pobres, usando seus corpos para exames
laboratoriais, como é o caso do uso de material genético de povos primitivos do Brasil usado
em laboratórios do USA (Mundo e Missão, p. 57).
Um outro dado curioso é que o “povo” dos países ricos se preocupa com a alta taxa
de natalidade dos países pobres, como se o fator que gera a pobreza fosse o número de filhos.
É nitidamente sabido que está na má distribuição dos bens. Globaliza-se tudo, menos os bens
para a sobrevivência básica dos povos famintos do Terceiro Mundo.
O interesse de controlar a natalidade é um fato. Mas, como entender o limite da
natalidade, por vias naturais, se querem gerar vida por vias de intervenção humana? Não é um
paradoxo?
Os problemas que se colocam de ordem moral nesta questão parecem ser mais uma
afronta do desperdício de um pequeno grupo de pessoas ricas, em detrimento da morte
miserável de uma grande multidão, que trabalham para sustentar a pujança desses poucos.
Um fator crescente nos países de Primeiro Mundo é a pobreza. Não sei se isto é bom
ou ruim, mas algo parece ser necessário para despertar nos detentores dos bens, a consciência
de uma melhor distribuição, da partilha. Não é que seja desejada, pelo menos tal coisa pode
sensibilizá-los e os incomodar, porque é fácil só ouvir falar e ficar de longe, sem presenciar e
nem sentir a realidade.
Aqui as nossas crianças já nascem desnutridas, deformadas e doentes (quando
nascem!), exatamente por falta de uma alimentação adequada para as mães alimentarem seus
filhos, ainda em formação, nos seus seios. A placenta da mãe é que nutre a criança. A falta de
alimento para a mãe e, consequentemente, para a placenta é um fator que faz com que muitas
crianças sejam abortadas. E muitas, quando não são abortadas antes, no seio da mãe, são 41
abortadas tardiamente, depois que deixam o útero, por falta de condições mínimas de
sobrevivência. Tomando a vida como um bem em si mesmo, que é uma realidade que existe
desde a concepção, como vimos no segundo capítulo, e que, existem muitas vidas humanas
indefesas em condição de desumanidade, inclusive neste estágio da vida, pergunta-se: é justo
querer ostentar técnicas caras de manipulação? Pode até ser, mas primeiro deveríamos
solucionar os problemas básicos que nos afligem. Este é um dos pilares da bioética: o
princípio da igualdade.
Como pensar em crianças sendo beneficiadas por tecnologias no momento de nascer,
se nós não nos preparamos para acolher os nossos filhos neste mundo? Quem está sendo
beneficiado com esta biotecnologia? Percebe-se que somente quando a técnica fica obsoleta é
que esta se torna acessível aos pobres. Enquanto isso os ricos já ficam usufruindo outras bem
mais avançadas.
Na América Latina, nascer dentro de famílias pobres, que são a grande maioria do
continente, antes de ser motivo de felicidade é motivo de choro, preocupação, tristeza e
angústia, porque os pais não sabem o que fazer quando estes nascem.
O filho que deveria ser causa de bênção para os pais, torna-se causa de maldição.
Como ver a imagem e semelhança de Deus nessas crianças, rejeitadas antes de vir ao mundo?
O fator econômico não é tudo, e disso sabemos. Mas é um fator muito influente na
vida de uma família, que até se desestrutura por causa de problemas financeiros. São filhos
que crescem sem pai ou sem mãe. São mães sendo obrigadas a trabalhar até no último
momento da gravidez por terem de se sustentar. São mães grávidas sendo espancadas por
maridos pela gravidez indesejada.
Uma coisa é certa. A nova vida que está por vir, no mínimo, vivendo num contexto
deste, nascerá e crescerá com fortes problemas psíquicos e emocionais que irão durar por toda
vida. São os problemas que deixam marca para o resto da vida.
De antemão, a impressão que tudo dá é de que não tem mais jeito. Diante dessa
situação de desordem moral parece não haver solução. Vivemos hoje um momento êxtase do
relativismo da vida humana, do desencantamento do homem frente ao que ele mesmo
construiu, um momento em que “ninguém sabe o que quer”. Se se pergunta pelo sentido da
vida, não se sabe falar momentaneamente. Vivemos a angústia indesejada do próprio homem.
Diante dessa situação, o cristão de hoje, por meio da presença salvífica de Deus,
seguindo o exemplo e o procedimento de Jesus no Novo Testamento, conhecendo a leitura da
Igreja nascente e a Tradição dessa mesma Igreja, é chamado a penetrar na realidade atual, 42
ajudando a propor regras e princípios éticos, para orientar a sociedade e ser capaz de
transformar o comportamento humano, e fazer transparente o Reino definitivo de Deus.
É neste sentido que dizia João Paulo II, no 35º Congresso Universitário
Internacional: “Resisti à tentação da mediocridade e do conformismo e deixai que a Lei de
Deus vos oriente”(“L’Osservatore Romano”, Nº 14, 2002).
43
VI - CONCLUSÃO
Em nossas reflexões chamamos a atenção para o valor que as ciências possuem, mas,
sobretudo, para o valor e a dignidade que tem a vida humana.
O tema é muito amplo, e mereceu uma abordagem de várias áreas do saber: Biologia,
Antropologia, Psicologia, Sociologia, Filosofia, Direito, Teologia e Bioética, sem contudo
esgotar este assunto.
Dentro do contexto em que vivemos é preciso estarmos abertos para o que dizia o
Apóstolo Paulo: “Dentre todas as coisas, examinai tudo e ficai com o que é bom”. Podemos
dizer com o Concílio Vaticano II que, reconhecendo a autonomia das realidades terrenas, “a
Criação não é uma realidade acabada” (Apud Perspectiva Teológica, p. 09). A Providência
Divina não existe apenas para conservar o já criado, mas principalmente para levar à
realização as potencialidades inscritas na natureza. Estas podem se frustrar ou chegar a bom
êxito. Não se pode ter bom êxito numa inversão de valores, ou seja, colocando a vida à mercê
de cálculos econômicos.
O valor e a dignidade humanas, face às manipulações, levou a UNESCO, em 1997, a
declarar que o genoma é um patrimônio da humanidade que não pode ser comercializado. Não
se pode patentear processos vitais e auferir lucros de algo que não foi produzido, apenas
transformado.
Cabe ao homem tomar consciência da fragilidade da vida. À lei, à ordem jurídica
compete defender e equalizar o peso do forte e do fraco e defender o direito do indefeso,
como é o caso do embrião.
Precisamos apontar as decisões destituídas de valores humanos, que poderão ser
frustrantes para o homem. Uma ética genuína é aquela que ajuda o homem a construir um
mundo novo. Fica, pois, nesse desejo de construir um mundo novo, o caminho aberto para
novos estudos que contribuam para diminuir as contradições do que deve permanecer e do
que deve ser mudado.
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VII - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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