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 IGUALDADE, DISCRIMINAÇÃO E DIREITO DO TRABALHO Estêvão Mallet * “Dans l’état de nature les homes naissent bien dans l’égalité, mais ils n’y sauroient re ster . La société la leur fait perdre, et ils ne redeviennet égaux que  par les lois.” (Monte squieu, De l’esprit des lois, Livro VIII, Capítulo III) 1 – INTRODUÇÃO É  certo que há vários conceitos de igualdade. Pode-se pensar em igual dade formal ou em igualdade material, bem como em igualdade abso luta ou igualdade relativa. Um dado, porém, é seguro: se não há uma certa iguadade, algum tipo de igualdade pelo menos, não há como falar em justiça. Existe, pois, profunda relação entre a ideia de justiça e a ideia de igualdade. Como anota Friedman, “equality is a postulate of justice” 1 . Tanto a ideia de justiça está associada à de igualdade que Aristóteles assinalou: “O injusto é desigual, o justo é igual” 2 , o que levou Alf Ross a escrever, de modo um tanto excessivo: “Ajustiça é igualdade” 3 . Não por acaso, no dístico inscrito no frontão da Suprema Corte dos Estados Unidos da América lê-se: equal justice under law . Daí a importâ ncia do princípio da igualdade e, ao mesmo tempo, a repulsa  pro vocada pel a discrimin açã o. Afi nal, o q ue é a discri min açã o senã o a desigualdade arbitrária, inaceitável e injustificáv el? Nada mais do que isso. Discriminação supõe desigualdade. Não qualquer desigualdade, como será visto mais ad iante, mas a desigualdade ilegítima, intolerável diante das circunstâncias *  Doutor e livr e-docente em Dir eito; professor de Dir eito do T rabalho da Faculdade de Dir eito da Universidade de São Paulo; conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil, Secção de São Paulo; advogado. 1  Legal theory. London: Stevens & Sons Limited, 1960. p. 385. 2  Ética a Nicômaco, V, 6, 1131a. 3  Direito e Justiça. São Paulo: Edipro, 2000. p. 313, par. 62. Cf., ainda, CURCIO, Carlo. Eguaglianza (dottrine generali). In:  Enciclopedia del Diritto. Varese: Giuffrè, 1965. p. 513, XIV.

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    IGUALDADE, DISCRIMINAO E DIREITODO TRABALHO

    Estvo Mallet*

    Dans ltat de nature les homes naissent bien dans lgalit, mais ils nysauroient rester. La socit la leur fait perdre, et ils ne redeviennet gaux quepar les lois. (Montesquieu, De lesprit des lois, Livro VIII, Captulo III)

    1 INTRODUO

    certo que h vrios conceitos de igualdade. Pode-se pensar em igualdade formal ou em igualdade material, bem como em igualdade absoluta ou igualdade relativa. Um dado, porm, seguro: se no h uma certaiguadade, algum tipo de igualdade pelo menos, no h como falar em justia.Existe, pois, profunda relao entre a ideia de justia e a ideia de igualdade. Comoanota Friedman, equality is a postulate of justice 1. Tanto a ideia de justia estassociada de igualdade que Aristteles assinalou: O injusto desigual, o justo igual2, o que levou Alf Ross a escrever, de modo um tanto excessivo: A justia igualdade3. No por acaso, no dstico inscrito no fronto da Suprema Corte dosEstados Unidos da Amrica l-se: equal justice under law.

    Da a importncia do princpio da igualdade e, ao mesmo tempo, a repulsaprovocada pela discriminao. Afinal, o que a discriminao seno adesigualdade arbitrria, inaceitvel e injustificvel? Nada mais do que isso.Discriminao supe desigualdade. No qualquer desigualdade, como ser vistomais adiante, mas a desigualdade ilegtima, intolervel diante das circunstncias

    * Doutor e livre-docente em Direito; professor de Direito do Trabalho da Faculdade de Dir eito daUniversidade de So Paulo; conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil, Seco de So Paulo;advogado.

    1 Legal theory. London: Stevens & Sons Limited, 1960. p. 385.

    2 tica a Nicmaco, V, 6, 1131a.

    3 Direito e Justia. So Paulo: Edipro, 2000. p. 313, par . 62. Cf., ainda, CURCIO, Carlo. Eguaglianza(dottrine generali). In: Enciclopedia del Diritto. Varese: Giuffr, 1965. p. 513, XIV.

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    e dos padres ento vigentes. Por isso que, se a justia se relaciona com aigualdade e a igualdade repele a discriminao, a discriminao tambm anegao da justia.

    2 A IGUALDADE ENTRE AS PESSOAS AO LONGO DO TEMPO

    A evoluo da humanidade se processa no sentido de reduo dasdesigualdades entre as pessoas. D-se tal evoluo, portanto, com a gradativaeliminao das discriminaes. evidente que isso ocorre com algunssobressaltos, com marchas e contramarchas, como to frequente se v ao longoda histria. Mas o sentido ntido.

    Primeiramente h a diviso entre senhores e escravos; entre os que sopessoas e os que nem pessoas so, recebendo o tratamento de objeto de direi-to4. O passar do tempo faz com que o elemento humano, comum a todos,prepondere e sejam as pessoas reconhecidas, indistintamente, como sujeitosde direito. Permanecem, todavia, outras distines, como, em particular, a es-tabelecida entre nobres e servos, aqueles com mais direitos, os ltimos commenos direitos5. As Ordenaes Filipinas, por exemplo, diferenciavam, no to-cante ao procedimento para a realizao da penhora, as pessoas comuns dosescudeiros, cavaleiros, fidalgos ou dahi para cima6.

    Com as revolues liberais do sculo XVIII e do sculo XIX, o elementohumano, o trao comum j mencionado, ocupa o espao e as distinesdesaparecem. a consagrao da igualdade formal; a abolio de qualquerdiscriminao em face da lei. Expressiva, a propsito, a referncia contida noart. 1 da Declarao dos Direitos do Homem e do Cidado: Les hommesnaissent et demeurent libres et gaux en droits.

    No Brasil, o princpio da igualdade manifesta-se, de incio, no art. 179, 13, da Constituio de 1824: A Lei ser igual para todos, quer proteja, quercastigue.... Adquire maior amplitude com a Constituio de 1891, conformeart. 72, 2: Todos so iguais perante a lei. A Repblica no admite privilgiosde nascimento, desconhece foros de nobreza e extingue as ordens honorficasexistentes e todas as suas prerrogativas e regalias, bem como os ttulosnobilirquicos e de conselho. Manteve-se o princpio em todas as Constituies

    4 Por todos, JHERING. Lesprit du droit romain. Paris: Marescq, 1886. tome deuxime. p. 101 e segs.

    5 A propsito, FOIGNET, Ren. Manuel lmentaire dhistoire du droit franais. Paris: Rousseau, 1932.p. 158 e segs.

    6 Ordenaes Filipinas, Livro III, Ttulo LXXXVI, 12.

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    subsequentes, com modificaes de redao apenas. Na Constituio de 1988encontra-se logo no caput do art. 5: T odos so iguais perante a lei, semdistino de qualquer natureza....

    Para o legislador constituinte, como todas as pessoas naturais so sereshumanos, no h mais distines aceitveis em face da lei, embora algumaspoucas, resqucios de tempos pretritos, tenham permanecido mais do quedeveriam, chegando at a Constituio de 1988. Somente foram em definitivorevogadas com a edio de outra regra especfica, ao lado do princpio geralenunciado pelo caput do art. 5. o caso da distino entre filhos, que remon-tava s Ordenaes Filipinas 7, abolida com o art. 227, 6, da vigenteConstituio: Os filhos, havidos ou no da relao do casamento, ou por ado-o, tero os mesmos direitos e qualificaes, proibidas quaisquer designaesdiscriminatrias relativas filiao.

    Aqui no cabe tratar exaustivamente dessa caminhada no sentido damaior igualdade. um universo muito vasto, quase inesgotvel. O que cabe considerar como ela se processou no campo do Direito do Trabalho e quais asdificuldades que surgiram e surgem no seu curso.

    3 A ORGANIZAO INTERNACIONAL DO TRABALHO E A LUTACONTRA A DISCRIMINAO NO CAMPO TRABALHISTA

    A luta contra a discriminao figura como um dos objetivos fundamentaisda Organizao Internacional do Trabalho. Entre os princpios que norteiam suaatuao, inscreve-se, conforme enunciado na Declarao de Filadlfia, a assertivade que all human beings, irrespective of race, creed or sex, have the right topursue both their material well-being and their spiritual development in conditionsof freedom and dignity, of economic security and equal opportunity8.

    A primeira Conveno a tratar da discriminao a de n 100, editadaem 1951, relativa igualdade de remunerao. Ratificada pelo Brasil desde1957, a Conveno, a que corresponde a Recomendao n 90, do mesmo ano,funda-se no princpio da equal remuneration for men and women workers forwork of equal value9. Segue-se a Conveno n 111, de 1958 ratificada peloBrasil em 1965 mais abrangente, que trata da discriminao em geral epreconiza a adoo de poltica nacional voltada a promover , by methods

    7 Livro IV, Ttulo 93.

    8 Declarao de Filadlfia, II, a.

    9 Art. 2.

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    appropriate to national conditions and practice, equality of opportunity andtreatment in respect of employment and occupation, with a view to eliminatingany discrimination in respect thereof10.

    Outras Convenes referem-se incidentalmente promoo da igualdadeentre homens e mulheres, como as de ns. 117, sobre poltica social, que deveter por objetivo to abolish all discrimination among workers on grounds ofrace, colour, sex, belief, tribal association or trade union affiliation11, e a de n122, sobre poltica de emprego, que deve propiciar, a cada trabalhador, freedomof choice of employment and the fullest possible opportunity for each workerto qualify for, and to use his skills and endowments in, a job for which he iswell suited, irrespective of race, colour, sex, religion, political opinion, nationalextraction or social origin12.

    digna de nota, ainda, a Declarao sobre igualdade de oportunidadese de tratamento para as trabalhadoras, aprovada em 1975, pela 60 ConfernciaInternacional do Trabalho. A Declarao sublinha que toutes formes dediscrimination fondes sur le sexe qui dnient ou limitent (lgalit de chanceset de traitement) son inacceptables et doivent tre abolies13.

    4 A ORGANIZAO DAS NAES UNIDAS E A DISCRIMINAOPOR MOTIVO DE SEXO

    Em 1979, a Organizao das Naes Unidas aprovou a Conveno sobrea eliminao de todas as formas de discriminao contra a mulher . O textoentrou em vigor, no plano internacional, aps a sua vigsima ratificao, em 3de setembro de 1981. No Brasil, a Conveno foi promulgada inicialmentepelo Decreto Legislativo n 93, de 1983, e, posteriormente, pelo Decreto n4.377, de 2002.

    A Conveno, resultado de mais de trinta anos de trabalho da UnitedNations Commission on the Status of Women, enfrenta a discriminao contraa mulher nos mais variados planos, entre os quais vida poltica e pblica (art. 7),representao poltica (art. 8), nacionalidade (art. 9), educao (art. 10), sade(art. 12), legislao (art. 15), vida familiar e casamento (art. 16). Da discrimina-o contra a mulher no trabalho ocupa-se o art. 11. Nele se determina a adoo,

    10 Art. 2.

    11 Art. 14, caput.

    12 Art. 2, c.

    13 Apud Les normes internationales du travail, BIT, Genve, 2001, p. 82, nota 4.

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    pelos Estados-Partes, de todas as medidas apropriadas para eliminar a discrimi-nao contra a mulher na esfera do emprego, a fim de assegurar , em condiesde igualdade entre homens e mulheres, os mesmos direitos, em particular: a) odireito ao trabalho como direito inalienvel de todo ser humano; b) o direito smesmas oportunidades de emprego, inclusive a aplicao dos mesmos critriosde seleo em questes de emprego; c) o direito de escolher livremente profis-so e emprego, o direito promoo e estabilidade no emprego e a todos osbenefcios e outras condies de servio, e o direito ao acesso formao e atualizao profissionais, incluindo aprendizagem, formao profissional supe-rior e treinamento peridico; d) o direito a igual remunerao, inclusive benefcios,e igualdade de tratamento relativa a um trabalho de igual valor , assim comoigualdade de tratamento com respeito avaliao da qualidade do trabalho; e) odireito seguridade social, em particular em casos de aposentadoria, desempre-go, doena, invalidez, velhice ou outra incapacidade para trabalhar, bem como odireito de frias pagas; f) o direito proteo da sade e segurana nas condi-es de trabalho, inclusive a salvaguarda da funo de reproduo.

    5 DIREITO DO TRABALHO E DISCRIMINAO POR MOTIVO DE SEXO

    No plano do direito interno, o preceito que em primeiro lugar chama aateno, em matria de igualdade, no campo trabalhista, e do qual se podemextrair algumas consideraes ricas e interessantes, o art. 5 da CLT, introdu-zido na parte geral, com o claro objetivo de ressaltar a importncia da regraposta. Estatui o dispositivo: Para trabalho de igual valor corresponder igualsalrio, sem distino de sexo. Ao lado das diferentes implicaes da regra,h nela pelo menos dois pontos dignos de nota.

    De uma parte, significativa a referncia do legislador igualdade ape-nas no plano remuneratrio. Importante parece ser to s a igualdade deremunerao. Os outros aspectos do contrato de trabalho, inclusive o trata-mento dispensado a cada empregado, so deixados de lado, em clara mostra daconcepo patrimonialista que inspirou a CLT e que ainda impregna o Direitodo Trabalho brasileiro. Leva-se quase sempre em conta apenas o aspecto pecu-nirio da relao de trabalho, como se fosse o nico decisivo. Vrios exemploshaveria para mencionar, mas basta a aluso monetarizao do risco sadedo trabalhador, com pagamento de adicionais pelo trabalho realizado em con-dies insalubres ou perigosas, j sublinhada pela doutrina14.

    14 Cf., mais extensamente, OLIVEIRA, Sebastio Geraldo de. Proteo jurdica sade do trabalhador.So Paulo: LTr, 2002. p. 138 e segs.

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    De outra parte eis o segundo ponto a notar no art. 5 da CL T significativa a referncia apenas discriminao fundada em motivo de sexo,como se a estivesse a nica hiptese de discriminao. A explicao para areferncia restrita do legislador quando muito mais acertada seria previsoampla, excludente de qualquer forma de discriminao resulta do pesohistrico da discriminao por motivo de sexo, mesmo em pases com maiortendncia igualdade. , alis, o que tambm justifica e explica a regra expressado inciso I, art. 5, da vigente Constituio, que se poderia ter por desnecessria,ante os termos gerais do caput, do mesmo dispositivo 15. H passagens, emmatria de discriminao por motivo de sexo, muito expressivas, a demonstrarclaramente como esteve ela entranhada na cultura ocidental, mesmo recente.Vale a pena dedicar algumas linhas ao problema.

    Eloquente, em primeiro lugar, trecho do voto apresentado na SupremaCorte norte-americana, pelo juiz Bradley, que, ao julgar caso envolvendo leido Estado de Illinois, proibitiva do exerccio da advocacia por mulheres, afirmoutextualmente, em 1873: The civil law , as well as nature herself, has alwaysrecognized a wide dif ference in the respective spheres and destinies of manand woman. Man is, or should be, womans protector and defender. The naturaland proper timidity and delicacy which belongs to the female sex evidentlyunfits it for many of the occupations of civil life. The constitution of the familyorganization, which is founded in the divine ordinance, as well as in the natureof things, indicates the domestic sphere as that which properly belongs to thedomain and functions of womanhood. The harmony, not to say identity , ofinterest and views which belong, or should belong, to the family institution isrepugnant to the idea of a woman adopting a distinct and independent careerfrom that of her husband... The paramount destiny and mission of woman areto fulfill the noble and benign offices of wife and mother. This is the law of theCreator. And the rules of civil society must be adapted to the general constitutionof things, and cannot be based upon exceptional cases16. Com tais fundamentos,a Suprema Corte considerou constitucional e no ofensiva s garantiasconferidas aos cidados americanos a proibio estabelecida pelo legisladorestadual, com apenas um voto contrrio e embora j estivesse em pleno vigora XIV Emenda Constituio, com a garantia de equal protection17.

    15 A propsito, cf. MIRANDA, Pontes de. Comentrios Constituio de 1967 . t. IV. Rio de Janeiro:Forense, 1987. p. 708.

    16 Bradwell v. State of Illinois, 83 US 130. As passagens transcritas encontram-se nas pp. 141 e 142. Adeciso, hoje considerada aberrante, contou apenas com o voto vencido do Chief Justice Samuel Chase.

    17 Consta da seco 1 da referida emenda, cuja vigncia foi certificada em 1868: All persons born ornaturalized in the United States and subject to the jurisdiction thereof, are citizens of the United States

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    Passadas sete dcadas, em 1948, o assunto voltou Suprema Corte.Discutiu-se a validade de lei que vedava o trabalho de mulheres em bares.Questionou-se a constitucionalidade dessa proibio. Agora com margem maisestreita, por 6 votos contra 3, conclui o tribunal que a lei era constitucional,porque bar no era lugar para uma mulher exercer sua atividade18.

    J em 1961 as datas so muito expressivas para que se perceba como adiscriminao por motivo de sexo esteve mesmo muito entranhada na culturaocidental outra vez se reconheceu a legitimidade do tratamento discriminatrioem face da mulher . Tratava-se de lei do Estado da Flrida que exclua aparticipao das mulheres da composio dos jris, instituio que, como todossabem, tem papel importantssimo no processo penal e tambm no processocivil norte-americano. Pois bem, a Corte Suprema concluiu que o tratamentodiferenciado entre homens e mulheres, no que toca ao servio no jri, no erainconstitucional. Como assinalou a Corte, em deciso redigida pelo Juiz Harlan:Woman is still regarded as the center of home and family life, o que permitirialegitimamente dispensa legal de servir em tribunal do jri, unless she herselfdetermines that such service is consistent with her own special responsabilities19.

    Oito anos antes do julgamento envolvendo a lei do Estado da Flrida,ou seja, em 1953, a mesma Suprema Corte dos Estados Unidos havia destrudo,ao menos em termos formais, os pilares jurdicos da discriminao racial, como famoso julgamento proferido no caso Brown v . Board of Education, queeliminou a segregao racial nos colgios20. Permaneceriam, contudo, por quaseuma dcada, os pilares jurdicos da discriminao contra a mulher.

    Em outros pases, talvez mais prximos da cultura e realidade brasileiras,o quadro no se desenhou de forma diversa. Tenha-se em mente o que se deuna Itlia, aps a Constituio democrtica e social de 1947, que categrica aoproibir discriminao entre homem e mulher , ao dispor, no art. 3: T utti i

    and of the State wherein they reside. No State shall make or enforce any law which shall abridge theprivileges or immunities of citizens of the United States; nor shall any State deprive any person of life,liberty, or property, without due process of law; nor deny to any person within its jurisdiction the equalprotection of the laws.

    18 Goesaert v. Cleary, 335 U.S. 464. Ficaram vencidos os juzes Rutledge, Douglas e Murphy. Coube aojuiz Frankfurter redigir a deciso tomada pela maioria, na qual registrou: Michigan could, beyondquestion, forbid all women from working behind a bar. This is so despite the vast changes in the socialand legal position of women. The fact that women may now have achieved the virtues that men havelong claimed as their prerogatives and now indulge in vices that men have long practiced, does notpreclude the States from drawing a sharp line between the sexes, certainly , in such matters as theregulation of the liquor traffic (p. 465-466).

    19 Hoyt v. Florida (368 U.S. 57).

    20 347 U.S. 483.

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    cittadini hanno pari dignit sociale e sono eguali davanti alla legge, senzadistinzione di sesso, di razza, di lingua, di religione, di opinioni politiche, dicondizioni personali e sociali. Em 1961, a Corte Constitucional italiana tevede se defrontar com um caso muito marcante. O art. 559 do Cdigo Penalitaliano pune o adultrio. Mas o faz to somente a propsito do adultriocometido pela mulher. O texto dizia o seguinte: La moglie adultera punitacon la reclusione fino a un anno . No h dvida quanto ao significado danorma. A punio dirigida, no tocante aos cnjuges, apenas mulher, no aohomem. Discutiu-se, em consequncia, a constitucionalidade da puniounicamente do adultrio feminino. Em 1961, a Corte Constitucional, naSentena n 64, chegou concluso de que a diferena de tratamento refletirialegtima valorao estabelecida pelo legislador , insuscetvel de controle pelajurisdio constitucional. So surpreendentes os termos da deciso: Il principiodi eguaglianza di cui allart. 3 della Costituzione, diretto ad impedire che adanno dei cittadini siano dalle leggi disposte discriminazioni arbitrarie, nonpu significare che il legislatore sia obbligato a disporre per tutti una identicadisciplina, mentre, al contrario, deve essergli consentito di adeguare le normegiuridiche ai vari aspetti della vita sociale, dettando norme diverse per situazionidiverse. Pertanto con lart. 559 c.p. che punisce soltanto ladulterio della mogliee non pone condizioni alla punibilit della relazione adulterina della moglie,non stata creata a carico di questa una posizione di inferiorit, ma soltanto stata diversamente disciplinata una situazione che il legislatore ha ritenutadiversa. Spetta al legislatore, non alla Corte Costituzionale, lo stabilire se lanorma in questione risponda alla attuale valutazione sociale dei rapporti fra iconiugi e se i meriti oppure no di essere modificata. Rejeitou-se, assim, aalegao de inconstitucionalidade e manteve-se o tratamento discriminatrio.

    Felizmente, porm, no existe, no sistema italiano, a descabida eindesejvel regra incorporada ao ordenamento jurdico brasileiro, segundo aqual a deciso que afirma a constitucionalidade da lei imutvel21. Por isso, a

    21 Nos termos do art. 26, da Lei n 9.868, a deciso que declara a constitucionalidade ou ainconstitucionalidade da lei ou do ato normativo em ao direta ou em ao declaratria irrecorrvel,ressalvada a interposio de embar gos declaratrios, no podendo, igualmente, ser objeto de aorescisria. Para exame do problema, no sistema italiano, com expressa afirmao do carter nodefinitivo da deciso que afirma a constitucionalidade de certa lei, cf. CRISAFULLI, Vezio. Lezioni didiritto constituzioanale. Padova: CEDAM, 1974. p. 151, II, 2.. A mesma soluo prevalece no direitoportugus, como mostra MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. t. 2. Coimbra: CoimbraEditora, 1996. p. 483. A razo para a revisibilidade da deciso declaratria de constitucionalidade simples. A interpretao constitucional necessariamente evolutiva. A Constituio no um textoapenas jurdico, mas tambm um texto poltico. O significado dado norma em certa altura poder noser o mesmo depois de passado algum tempo. Nas palavras de Girgio Berti: Linterpretazione si denotaper la continuit e ladattabilit allevoluzione della vita sociale e dei rapporti giuridici e non c mai

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    afirmao da constitucionalidade do art. 559, do Cdigo Penal italiano, pdeser novamente reexaminada sete anos depois, em 1968. Em ambiente distinto,sob a presidncia de um dos maiores administrativistas italianos, Aldo Sandulli,afirmou a Corte, com sua Sentena n 126, a inconstitucionalidade da normapenal questionada, porque discriminatria a distino estabelecida. A sentenatem a seguinte ementa: Per lunit familiare costituisce indubbiamente unpericolo sia ladulterio del marito sia quello della moglie; ma quando la leggefaccia un differente trattamento, questo pericolo assume proporzioni pi gravi,sia per i riflessi sul comportamento di entrambi i coniugi, sia per le conseguenzepsicologiche sui soggetti. Pertanto, i commi primo e secondo dellart. 559 delcodice penale sono viziati di illegittimit costituzionale in riferimento agli artt.3 e 29 della Costituzione, in quanto sanciscono una deroga al principio dieguaglianza dei coniugi non essenziale per la garanzia dellunita familiare,ma risolventesi, piuttosto, per il marito, in un privilegio; e questo, come tutti iprivilegi, viola il principio di parit. O art. 559, do Cdigo Penal italiano,deixou, em consequncia, de viger.

    No Brasil, aps a Constituio de 1988, ainda prevalece em jurispru-dncia a afirmao da necessidade de tratamento diferenciado da mulher ,com proibio de elastecimento, por meio de negociao coletiva, de inter -valo intrajornada, prevista no art. 383, da CL T, diversamente do quantoestabelecido para o homem22, concluso que oferece alguma dificuldade para

    una definivit assoluta, una forza di giudicato dellatto interpretativo che non consenta di rivederne ipressupposti, quando questi mutino(Interpretazione costituzionale. Padova: CEDAM, 1990. p. 619).

    22 A questo veio a ser resolvida pela seguinte deciso do Tribunal Superior do Trabalho: ... A igualdadejurdica e intelectual entre homens e mulheres no afasta a natural diferenciao fisiolgica e psicolgicados sexos, no escapando ao senso comum a patente diferena de compleio fsica entre homens emulheres. Analisando o art. 384 da CLT em seu contexto, verifica-se que se trata de norma legal inseridano captulo que cuida da proteo do trabalho da mulher e que, versando sobre intervalo intrajornada,possui natureza de norma afeta medicina e segurana do trabalho, infensa negociao coletiva, dadaa sua indisponibilidade (cfr. Orientao Jurisprudencial 342 da SBDI-1 do TST). 3. O maior desgastenatural da mulher trabalhadora no foi desconsiderado pelo Constituinte de 1988, que garantiu diferentescondies para a obteno da aposentadoria, com menos idade e tempo de contribuio previdenciriapara as mulheres (CF, art. 201, 7, I e II) . A prpria diferenciao temporal da licena-maternidadee paternidade (CF, art. 7, XVIII e XIX; ADCT, art. 10, 1) deixa claro que o desgaste fsico efetivo da maternidade. A praxe generalizada, ademais, a de se poster gar o gozo da licena-maternidadepara depois do parto, o que leva a mulher, nos meses finais da gestao, a um desgaste fsico cada vezmaior, o que justifica o tratamento diferenciado em termos de jornada de trabalho e perodo de descanso.4. No demais lembrar que as mulheres que trabalham fora do lar esto sujeitas a dupla jornada detrabalho, pois ainda realizam as atividades domsticas quando retornam casa. Por mais que se dividamas tarefas domsticas entre o casal, o peso maior da administrao da casa e da educao dos filhosacaba recaindo sobre a mulher . 5. Nesse diapaso, levando-se em considerao a mxima alber gadapelo princpio da isonomia, de tratar desigualmente os desiguais na medida das suas desigualdades, aonus da dupla misso, familiar e profissional, que desempenha a mulher trabalhadora corresponde obnus da jubilao antecipada e da concesso de vantagens especficas, em funo de suas circunstncias

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    harmonizar-se com a ideia mais ampla de igualdade entre homens e mulhe-res23.

    Em sntese, a persistncia, ao longo do tempo, da discriminao pormotivo de sexo, discriminao por vezes referendada pelo prprio legislador,como no caso do art. 383 da CL T, que explica a regra do art. 5 da CL T. tambm o que explica o fato de a norma geral contra a discriminao, inseridano texto da CLT em data recente, figurar exatamente no Captulo que cuida dotrabalho da mulher. Trata-se do art. 373-A, introduzido pela Lei n 9.799, que,embora integrado a seguimento especfico do diploma legal, enuncia regrageral contrria discriminao, abrangendo no apenas a discriminao pormotivo de sexo como, igualmente, por outros motivos24.

    6 DISCRIMINAO POR MOTIVO DE RAA

    Meno particularizada deve ser feita discriminao racial.

    H uma ideia generalizada de que no Brasil a discriminao racial muito menos intensa e muito menos acentuada do que a encontrada em outrospases. Isso se deveria, segundo a conhecida concepo de Gilberto Freyre, colonizao portuguesa, tida como menos segregacionista no tratamentodispensado aos escravos, permitindo mais facilmente a miscigenao. Afirmouele que a escravido portuguesa no seria a escravido violenta que existiu,por exemplo, nos Estados Unidos, mas uma escravido adaptada aos trpicos,fazendo com que a discriminao racial fosse muito menos intensa 25, a gerar,inclusive, o mito da assim chamada democracia racial. Esse julgamento noretrata bem a realidade.

    prprias, como o caso do intervalo de 15 minutos antes de iniciar uma jornada extraordinria, sendode se rejeitar a pretensa inconstitucionalidade do art. 384 da CL T (TST, Pleno, IIN-RR-1540/2005-046-12-00.5, Rel. Min. Ives Gandra Martins Filho, j. 17.11.08, DJe 12.02.09).

    23 Por isso afirma a doutrina a incompatibilidade do art. 384, da CLT que exige intervalo de 15 minutosantes da prestao de horas extras por mulheres, previso sem correspondente para os homens com aigualdade constitucional entre homens e mulheres. Cf., entre outros autores, BARROS, Alice Monteirode. Curso de Direito do Trabalho. So Paulo: L Tr, 2005. p. 1.029; SAAD, Eduardo Gabriel. CLTcomentada. So Paulo: LTr, 2001. p. 241; OLIVEIRA, Francisco Antonio de. CLT comentada. SoPaulo: RT, 2000. p. 257; e ROBOR TELLA, Luiz Carlos Amorim. O trabalho feminino no Direitobrasileiro. In: Trabalho & Doutrina, So Paulo, Saraiva, jun. 1996, n. 9, p. 63).

    24 Sobre o tema da discriminao por motivo de sexo, com o seu exame por diferentes autores, tendo emconta vrios sistemas jurdicos, cf. A igualdade dos gneros nas relaes de trabalho, obra coletiva(coord. Las de Oliveira Penido), Braslia, Escola Superior do Ministrio Pblico da Unio, 2006,passim.

    25 Casa-Grande & Senzala. Braslia: Universidade de Braslia, 1963. Passim.

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    No se deve perder de vista, em primeiro lugar , que o Brasil foi um dosltimos pases do mundo em que eliminada a escravido, aps quase 400 anosda prtica. E os efeitos de to largo perodo de tempo no se apagam, de nenhu-ma forma, do dia para noite ou em curto espao de tempo. Em segundo lugar, ossinais de discriminao contra negros na sociedade so inegveis. Dispensamat mesmo exemplificao detalhada26. No existe aqui, com certeza, a discrimi-nao explcita e violenta, encontrada nos Estados Unidos da Amrica, pas emque, at 1953, com a deciso tomada no caso Brown v . Board of Education, jmencionada, ainda prevalecia a tese da legitimidade do tratamento diferenciadoentre brancos e negros, firmada no final do sculo XIX, quando do julgamentoPlessy v. Ferguson27, seguramente um dos mais infelizes pronunciamentos daSuprema Corte norte-americana28, a partir do qual se formou a doutrina do equalbut separete. No Brasil, porm, a discriminao, se no ostensiva, costumaapresentar-se de forma mais dissimulada, oculta, disfarada. Com isso o proble-ma no desaparece. Pelo contrrio. Torna-se ainda mais grave, dado mais difcilde identificar e de combater . Da a reao firme do legislador , no s com orepdio formal ao racismo29, como, igualmente, com a tipificao de sua prticacomo crime inafianvel e imprescritvel, punvel com pena de recluso 30, e,mais recentemente, com a aprovao do Estatuto da Igualdade Racial31.

    7 OUTRAS FORMAS DE DISCRIMINAO

    Alm da discriminao por motivo de sexo ou de raa, mencionadasnos itens anteriores, existem muitas outras formas de discriminao, vriasdelas previstas em diferentes dispositivos da Constituio, da CL T, de leisesparsas ou de normas existentes em outros sistemas jurdicos.

    26 Cf., mais amplamente sobre o tema, TELLES, Edward. Racismo brasileira: uma nova perspectivasociolgica. Rio de Janeiro: Relume, 2003. Passim; bem como ROLAND, Edna Maria Santos. Theeconomics of racism: people of african descent in Brazil. Seminar on the economics of racism, TheInternational Council on Human Rights Policy, Geneva, 2001, passim.

    27 163 U.S. 537. Na deciso, que soa hoje como brbara e inacreditvel, afirma-se: A statute whichimplies merely a legal distinction between the white and colored races a distinction which is foundedin the color of the two races, and which must always exist so long as white men are distinguished fromthe other race by color has no tendency to destroy the legal equality of the two races, or re-establisha state of involuntary servitude (p. 543).

    28 Jeffrey Rosen diz tratar-se de deciso to criticada como a tomada no caso Dred Scott, que declarou aobrigao do Congresso norte-americano de proteger os direitos dos senhores de escravo (cf. The SupremeCourt: the personalities and rivalries that defined America. New York: Times Books, 2006. p. 100).

    29 Constituio, art. 4, inciso VIII.

    30 Constituio, art. 5, XLII.

    31 Lei n 12.288, de 20 de julho de 2010.

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    No art. 7, inciso XXX, da Constituio, encontra-se, por exemplo, areferncia discriminao por motivo de idade e por motivo de estado civil,no tocante ao salrio, exerccio de funo e critrio de admisso.

    A discriminao por motivo de idade j estava proibida pelo menos desdea Lei n 5.473, de 1968, cujo art. 1 estatui: So nulas as disposies eprovidncias que, direta ou indiretamente, criem discriminaes entre brasileirosde ambos os sexos, para o provimento de cargos sujeitos a seleo, assim nasempresas privadas, como nos quadros do funcionalismo pblico federal,estadual ou municipal, do servio autrquico, de sociedades de economia mistae de empresas concessionrias de servio pblico. Adquiriu mais evidncia adiscriminao por idade a partir de julgamento do Tribunal Superior doTrabalho, proferido no mbito da 5 Turma, de que foi relator o Juiz ConvocadoAndr Luis Moraes de Oliveira. O caso envolvia empresa que dispensavasistematicamente trabalhadores com mais de 60 anos. O Tribunal Superior doTrabalho, antes mesmo de que estivesse em vigor a Lei n 10.741, queexpressamente proibiu a fixao de limite mximo de idade para o exercciode trabalho, ressalvados os casos em que a natureza da atividade justifique aexigncia32, reconheceu que o caso era de discriminao e acolheu o pedido dereintegrao do trabalhador no emprego33.

    32 Trata-se da regra editada pelo art. 27, do Estatuto do Idoso, de seguinte teor: Na admisso do idoso emqualquer trabalho ou emprego, vedada a discriminao e a fixao de limite mximo de idade, inclusivepara concursos, ressalvados os casos em que a natureza do cargo o exigir.

    33 O acrdo tem a seguinte ementa: RECURSO DE REVIST A. DISPENSA DISCRIMINATRIAPOR IDADE. NULIDADE. ABUSO DE DIREITO. REINTEGRAO. Se das premissas fticasemergiu que a empresa se utiliza da prtica de dispensar seus funcionrios quando estes completam 60anos, imperioso se impe ao julgador coibir tais procedimentos irregulares, efetivados sob o manto dopoder potestativo, para que as dispensas no se efetivem sob a pecha discriminatria da maior idade.Embora o caso vertente no tivesse, poca de sua ocorrncia, previso legal especial (a Lei n 9.029que trata da proibio de prticas discriminatrias foi editada em 13.04.95 e a dispensa do reclamanteocorreu anteriormente), cabe ao prolator da deciso o dever de valer-se dos princpios gerais do direito,da analogia e dos costumes, para solucionar os conflitos a ele impostos, sendo esse, alis, o entendimentoconsagrado pelo art. 8 da CLT, que admite que a aplicao da norma jurdica em cada caso concretono desenvolve apenas o dispositivo imediatamente especfico para o caso ou o vazio de que se ressente,mas, sim, todo o universo de normas vigentes, os precedentes, a evoluo da sociedade, os princpios,ainda que no haja omisso na norma. Se a realidade do ordenamento jurdico trabalhista contempla odireito potestativo da resilio unilateral do contrato de trabalho, verdade que o exerccio deste direitoguarda parmetros ticos e sociais como forma de preservar a dignidade do cidado trabalhador . Adespedida levada a efeito pela reclamada, embora cunhada no seu direito potestativo de resiliocontratual, estava prenhe de mcula pelo seu contedo discriminatrio, sendo nula de pleno direito, emface da expressa disposio do art. 9 da CLT, no gerando qualquer efeito, tendo como consequnciajurdica a continuidade da relao de emprego, que se efetiva atravs da reintegrao. Efetivamente, a aplicao da regra do 1 do art. 5 da Constituio Federal que impe a aplicao imediata dasnormas definidoras dos direitos e garantias fundamentais, pois, como apontando pelo v . acrdo, aprtica da dispensa discriminatria por idade confrontou o princpio da igualdade contemplado no

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    Sem embargo das hipteses mencionadas, o certo que esse art. 7,inciso XXX, da Constituio, traa apenas parmetros exemplificativos. AConstituio pode-se claramente inferir isso do seu sistema e, especialmente,da parte final do seu art. 3, inciso IV probe genericamente qualquer formade discriminao. Alis, outras formas de discriminao acham-se mencionadasem dispositivos diversos, mas que tm toda a pertinncia no campo do Direitodo Trabalho. O art. 7, inciso XXX, no se refere discriminao por motivode crena religiosa. Mas o art. 5, inciso VIII, da mesma Constituio, alude proibio de discriminao por esse motivo, soluo que se estende, sem dvidanenhuma, ao campo do Direito do Trabalho.

    O mesmo se pode dizer propsito da situao familiar , que mencionada no art. 373, da CLT, e na Lei n 9.029. A filiao, como causa dediscriminao, completamente repudiada. No se pode, por conta da filiaodo trabalhador, negar-lhe certo direito. A Cour de Cassation francesaacertadamente considerou nula a dispensa do empregado decorrente do lelien de filiation lunissant un autre salari de lentreprise 34. A recproca igualmente verdadeira. Tampouco se pode favorecer algum em virtude de suafiliao. A concluso a que chegou a Suprema Corte norte-americana em Kotchv. Board of River Port Pilot Comrs for Port of New Orleans, ao validar aseleo de novos pilotos de navio feita de modo a favorecer sempre relativesand friends35, no correta. Tinha toda razo o juiz Rutledge ao anotar, na suadissenting opinion: the result of the decision therefore is to approve asconstitutional state regulation which makes admission to the ranks of pilotsturn finally on consanguinity. Blood is, in effect, made the crux of selection.That, in my opinion, is forbidden by the fourteenth amendment s guarantyagainst denial of the equal protection of the laws 36. muito pouco provvelque hoje prevalecesse, na Suprema Corte, a deciso da maioria.

    Tampouco a discriminao por convico filosfica ou poltica aceitvel. Como notou a United States Court of Appeals for the First Circuit,em proposio passvel de generalizao, ... as a general rule, a government

    caput do art. 5 da Constituio Federal. Inocorrncia de vulnerao ao princpio da legalidade e noconfigurada divergncia jurisprudencial. Recurso de revista no conhecido relativamente ao tema.(TST, 5 T., RR n 462.888, Rel. Juiz Convocado Andr Lus Moraes de Oliveira, j. 10.09.03, DJU26.09.03). Sobre o tema, amplamente, cf. FURTADO, Emmanuel Tefilo. Preconceito no trabalho e adiscriminao por idade. So Paulo: LTr, 2004. Passim.

    34 Cour de Cassation, Chambre Sociale, Processo n 96-43617, julgamento de 01.06.99, publicado noBulletin 1999, V, n. 249, p. 180.

    35 330 U.S. 552.

    36 330 U.S. 552, 565.

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    employer cannot discharge public employees merely because they are notsponsored by or af filiated with a particular political party ...37. ACHISTERAdmitir a resciso de contrato de trabalho, por o empregado, condutor de trensde metr ou professor em escola pblica, recusar -se a responder se ou nofiliado a determinado partido poltico, como fez a Suprema Corte dos EstadosUnidos em Lerner v. Casey38 e, de novo, em Beilan v. Board of Education39,no de nenhuma forma aceitvel. A pergunta nem pode ter lugar 40. Comorealado no Cdigo do Trabalho de Portugal, o direito reserva sobre aintimidade no mbito da relao de emprego compreende a preservao deinformaes relacionadas com a vida familiar, afectiva e sexual, com o estadode sade e com as convices polticas e religiosas41.

    igualmente proscrita a discriminao decorrente da procedncia dapessoa, como referido, a propsito da procedncia nacional, pelo art. 20, daLei n 7.71642. Impor tratamento diferenciado a trabalhadores, por conta desua origem geogrfica, ilcito, conquanto se cuide de prtica no de todo rarano pas.

    H ainda mais formas de discriminao a referir, como, entre outras, asindicadas pela Lei belga de 10 de maio de 2007, a saber , fortuna, lngua eorigem social43. A Carta dos direitos fundamentais da Unio Europeia tambmmenciona a discriminao por motivo de riqueza 44. O Cdigo do Trabalhofrancs alude discriminao fundada em hbitos ou costumes 45. Tambm aopo sexual da pessoa no pode ser causa de discriminao, como deixaexpresso, alis, a Lei belga h pouco referida. A Lei n 9.029 no abrange ahiptese, pois trata de discriminao por motivo de sexo, o que diverso. Noimporta. Nenhuma dessas formas de discriminao se admite, ainda que noexista previso expressa no Direito brasileiro. De se mencionar a deciso daCour de Cassation francesa, que considerou nula a dispensa de sacristo, por

    37 Benito Galloza et al., v. Norman E. Foy et al., n 03-2658.

    38 357 U.S. 468.

    39 357 U.S. 399.

    40 LPEZ, Manuel Carlos Palomeque; ROSA, Manuel Alvarez de la. Derecho del Trabajo. Madrid:Editorial Centro de Estdios, 2001. p. 707.

    41 Art. 16, n 2.

    42 O dispositivo tipifica como crime o seguinte: Praticar, induzir ou incitar a discriminao ou preconceitode raa, cor, etnia, religio ou procedncia nacional.

    43 Art. 4, n 4.

    44 Art. 21, n 1.

    45 Art. L1132-1.

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    motivo de homossexualidade46. Importa, no fundo, o princpio geral de proibiode discriminao, enunciado em julgado do Tribunal Superior do Trabalho,em caso em que se examinou prtica discriminatria contra empregado infectadopelo vrus HIV. EMPREGADA PORTADORA DO VRUS HIV. DISPENSADISCRIMINATRIA. A SDI-I do TST firmou posicionamento no sentido deque, ainda que no exista, no mbito infraconstitucional, lei especficaasseguradora da permanncia no emprego do empregado portador do vrusHIV, a dispensa de forma arbitrria e discriminatria afronta o caput do art. 5da CF/88. Precedentes: ERR 439.041/1998, ERR 217.791/1995, ERR 205.359/1995. Recurso de revista conhecido e parcialmente provido47.

    8 NOVAS FORMAS DE DISCRIMINAO

    Novas formas de discriminao tm surgido em decorrncia de avanoscientficos e de transformaes dos costumes ou dos hbitos. particularmen-te expressiva, no particular, a discriminao gentica, propiciada pelo progressoda biotecnologia, a permitir, a partir de exame do DNA, antecipar a tendnciade certas pessoas para o desenvolvimento de algumas doenas, o que possibi-litaria como j se noticia 48 preteri-las no somente no campo do trabalhocomo, outrossim, em outros setores, inclusive em matria de acesso a serviosde sade, especialmente aqueles propiciados por planos de assistncia mdi-ca49. O risco de discriminao, no caso, levou a Declarao Internacional sobreos Dados Genticos Humanos, aprovada em Paris, no ano de 2004, a dispor ,no art. 14, sob a rubrica Vida privada e confidencialidade: (a) Os Estadosdevero desenvolver esforos no sentido de proteger, nas condies previstaspelo direito interno em conformidade com o direito internacional relativo aosdireitos humanos, a vida privada dos indivduos e a confidencialidade dosdados genticos humanos associados a uma pessoa, uma famlia ou, se forcaso disso, um grupo identificvel. (b) Os dados genticos humanos, os dadosprotemicos humanos e as amostras biolgicas associados a uma pessoa iden-tificvel no devero ser comunicados nem tornados acessveis a terceiros, em

    46 Cour de Cassation, Chambre Sociale, Processo n 90-42636, deciso de 17.04.91, publicada no Bulletin1991, V, n. 201, p. 122.

    47 TST, 5 T., RR n 726.101/2001, Rel. Min. Rider Nogueira de Brito, j. 26.11.03, DJU 06.02.04.

    48 Cf. O artigo Clandestinidade gentica, Folha de So Paulo, mar., Mais!, p. 9, 2008. Na Frana, desde2004 a doutrina considera o problema. Cf. o artigo de MA THIEU, Bertrand. Le recours aux testesgntiques en matire demploi: un droit en construction. In: Droit Social, mars, n. 3, p. 257 e segs.,2004.

    49 Cf. DIAS, Rodrigo Bernardes. Privacidade gentica. So Paulo: SRS, 2008. p. 204 e segs.

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    particular empregadores, companhias de seguros, estabelecimentos de ensinoou famlia, se no for por um motivo de interesse pblico importante nos casosrestritivamente previstos pelo direito interno em conformidade com o direitointernacional relativo aos direitos humanos, ou ainda sob reserva de consenti-mento prvio, livre, informado e expresso da pessoa em causa, na condio detal consentimento estar em conformidade com o direito interno e com o direitointernacional relativo aos direitos humanos. A vida privada de um indivduoque participa num estudo em que so utilizados dados genticos humanos,dados protemicos humanos ou amostras biolgicas dever ser protegida e osdados tratados como confidenciais. Da a importncia da regra do art. 22, n2, do Cdigo do Trabalho de Portugal, que oportunamente se ocupou do proble-ma e disps, entre outras coisas: Nenhum trabalhador ou candidato a empregopode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ouisento de qualquer dever , em razo, nomeadamente, de ... patrimnio genti-co.... Igual referncia merece o Genetic Information Nondiscrimination Act de2008, que estabelece ser ilegal um empregador (1) to fail or refuse to hire, or todischarge, any employee, or otherwise to discriminate against any employeewith respect to the compensation, terms, conditions, or privileges of employ-ment of the employee, because of genetic information with respect to theemployee; or (2) to limit, segregate, or classify the employees of the employer inany way that would deprive or tend to deprive any employee of employmentopportunities or otherwise adversely affect the status of the employee as an em-ployee, because of genetic information with respect to the employee50.

    H tambm a discriminao relacionada com submisso de trabalhadoraa tratamento para superar a infertilidade. O assunto veio tona no julgamentodo caso Hall v. Nalco Company, decidido, em 2008, pela United States Courtof Appeals for the Seventh Circuit. Ao reformar a deciso proferida em primeirograu, que havia acolhido pedido de extino liminar do processo, a Corte deApelao considerou haver, no caso, indevida discriminao por motivo desexo, proibida pelo Ttulo VII, do Civil Rights Act, de 1964, diante da polticaadotada pela empresa, de dispensar as trabalhadoras que se afastam da atividadepara realizar tratamento voltado a superar infertilidade. Registra a deciso:Employees terminated for taking time of f to undergo IVF just like thoseterminated for taking time off to give birth or receive other pregnancy-relatedcare will always be women. This is necessarily so; IVF is one of severalassisted reproductive technologies that involves a sur gical impregnationprocedure... Thus, contrary to the district courts conclusion, Hall was terminated

    50 Title II, Sec. 202, (a), sob a rubrica Discrimination Based on Genetic Information.

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    not for the gender -neutral condition of infertility , but rather for the gender -specific quality of childbearing capacity. Because adverse employment actionbased on childbearing capacity will always result in treatment of a person ina manner which but for that person s sex would be dif ferent, Manhart, 435U.S. at 711, Halls allegations present a cognizable claim of sex discriminationunder Title VII51.

    Fala-se hoje tambm, cada vez com mais frequncia, em discriminaopor excesso de peso ou obesidade. Segundo a impressa norte-americana pasem que notoriamente mais intenso o problema de excesso de peso 52 talforma de discriminao pode ser as common as racial bias53. Deixar de admitirempregado por conta de seu peso excessivo, se o fato irrelevante para aatividade a ser exercida, certamente no se amolda regra geral de proibiode prticas discriminatrias, ainda que no haja, no sistema jurdico brasileiro,nenhuma proibio expressa da prtica. Os tribunais norte-americanos jconsideraram discriminatria, por exemplo, a prtica, adotada por companhiaarea, de estabelecer limites de peso proporcionalmente mais estritos paramulheres do que para homens54.

    No passado, no era incomum exigir -se, para o exerccio de certasatividades ou profisses, atestado de bons antecedentes ou at mesmo certidonegativa do distribuidor criminal. A Lei n 6.242, de 1975, por exemplo,condiciona o exerccio da profisso de guardador ou lavador autnomo deveculos apresentao da mencionada certido 55. A Lei n 5.859, de 1972,impe ao domstico, para sua admisso, a apresentao de atestado de boaconduta56. Exigncias do gnero criam dificuldades para a admisso oucontratao de trabalhadores com antecedentes criminais. Em alguns sistemasjurdicos, probe-se discriminao fundada em antecedentes criminais, tal comose v na Provncia canadense de Ontario, onde o Human Rights Code estatui:

    51 534 F.3d 644 (7th Cir. 2008).

    52 Disponvel em: .Acesso em: 25 jul. 2010. Conforme texto de 9 de junho de 2008, l-se que americans are gettingheavier and heavier. Statistics from the Centers for Disease Control show that, in 1996, no state had aprevalence of obesity equal to or great than 20%. Just 10 years later, only four states had a prevalenceof obesity under 20%, while two states had a prevalence equal to or greater than 30%. Today, 34% ofadults in the U.S. are considered obese, defined as having a body mass index (BMI) of 30 or higher.

    53 Veja-se a notcia divulgada em: . Acesso em: 25 jul. 2010. Indica-se na matria que reported discriminationbased on weight has increased 66% in the past decade, up from about 7% to 12% of U.S. adults.

    54 Frank v. United Airlines, Inc., 9th Cir., n. 98-15638.

    55 Art. 3, III.

    56 Art. 2, II. Cf., ainda, art. 4, II, do Decreto n 71.885.

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    Every person has a right to equal treatment with respect to employment withoutdiscrimination because... Record of offences...57. Como regra geral, a proibiopode ser transposta para o direito brasileiro. Com ela se busca assegurar, o quese convencionou chamar, no direito portugus, de direito ao esquecimento,necessrio para evitar estigmatizao ou discriminao de certas pessoas 58.Afinal, fosse sempre possvel a investigao, sem nenhum limite temporal esem que esteja presente uma particular e relevante justificao, o risco demarginalizao de certas pessoas seria muito grande, o que no desejvel.Assim, somente diante de ponderosas circunstncias, em casos bastantelimitados, que se deve admitir investigao de antecedentes criminais oumesmo creditcios do prprio empregado59.

    Por fim, sem a pretenso de oferecer rol exaustivo, vale citar adiscriminao provocada pelo exerccio de direitos, hiptese que no nova,mas torna-se mais ntida nos dias de hoje. Caso tpico, em matria trabalhista, a discriminao pelo exerccio do direito de ao. Deixar de admitir otrabalhador, em virtude de ter ele ajuizado reclamao em face de seu antigoempregador, prtica ilcita, j sancionada pelos tribunais brasileiros, comdeferimento de indenizao, como mostra deciso assim ementada: ... O direitode ao constitucionalmente assegurado (art. 5, XXXV) e as chamadas listasnegras so de h muito repudiadas pelo ordenamento jurdico, por impedir ,injustamente, a admisso de trabalhadores que exerceram direito legitimamenteassegurado. Assim, demonstrado que a atitude da reclamada foi lesiva honrae intimidade do reclamante, causando-lhe frustrao pela oportunidade perdidainjustamente, indubitvel o dano moral ocasionado e a relao de causalidadeentre o ato e o efeito, pelo que deve ser deferida a indenizao especfica,ressaltando ainda o carter pedaggico da pena, que visa a coibir a prticadiscriminatria, pela reclamada60. Tambm discriminatria a dispensa deempregados pelo exerccio de direito de greve ou por participao emassociao, sindical, mutualista ou cooperativa. A previso do Cdigo doTrabalho da Frana significativa ao proibir discriminao de empregado porsua participao em atividade syndicales ou mutualistes 61. A Cour deCassation j decidiu, com razo, que le licenciement dun salari en raison de

    57 Art. 5, (1).

    58 GUERRA, Amadeu. A privacidade no local de trabalho. Coimbra: Almedina, 2004. p. 70.

    59 Em termos conformes, cf. GUERRA, Amadeu. A privacidade no local de trabalho, cit., p. 87.

    60 TRT, 3 Reg., RO n 00951-2005-015-03-00-4, Rel. Juiz Fernando Luiz Gonalves Rios Neto, j. 05.07.06,DJMG 15.07.06, p. 13.

    61 Art. L. 1.132-1.

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    ses activits syndicales tant nul de plein droit, le juge doit ordonner , silintress le demande, la poursuite de lexcution du contrat de travail qui napas t valablement rompu62. A concluso vale no somente para dispensa oupunio do empregado como, igualmente, para sua admisso. Haver participadode greve em emprego anterior no constitui motivo para recusar admisso dotrabalhador em nova empresa.

    9 DISCRIMINAO E DIFERENA DE TRATAMENTO

    Na presente altura, depois do que j se disse sobre as diferentes formasde discriminao, h uma observao a fazer. A proibio de discriminao que, como se procurou mostrar , muito ampla, a compreender , inclusive,situaes no previstas expressamente pelo legislador, como nas hipteses dediscriminao por excesso de peso ou obesidade no significa imposio deigualdade absoluta entre as pessoas.

    Seria, no fundo, erro evidente compreender o princpio da igualdade oua proibio de discriminao como imposio de igualdade absoluta, linear ecompleta entre todos. Como notou Duguit, querer tirar da garantia de isonomiaexigncia de identidade matemtica seria o paradoxo da igualdade, que levariamuito mais desigualdade63. E decidiu bem o Tribunal Superior do Trabalhoao admitir a diferenciao de empregados que exerciam atividades diversas,com concesso a uns de vantagens no estendidas a outros64.

    O que se probe, o que todos os dispositivos legais antes citados vedam,o que a evoluo da sociedade proscreve, a discriminao desarrazoada oudescabida. Em outros termos, o que o princpio da igualdade tolhe sodifferenziazioni arbitrarie65. No impede que se estabeleam distines, atporque o papel da lei , em grande medida, fazer distines. Probe-se, com aregra da igualdade, como assentou o Tribunal Constitucional de Portugal, apenas

    62 Chambre Sociale, Processo n 97-45555, deciso de 17.03.99, publicado no Bulletin 1999, V, n. 126, p. 92.

    63 Trait de droit constitutionnel. Tome troisime. Paris, Ancienne Librairie Fontemoing & Cie., 1923. p. 585.

    64 Cuida-se de julgado assim ementado: ADICIONAL DE NVEL UNIVERSITRIO. Se institudo oadicional de nvel universitrio apenas para os advogados, no h amparo legal para a extenso davantagem aos economistas, sob o fundamento de que deve ser aplicado o princpio isonmico, mesmoporque este no pode se sobrepor ao poder diretivo e de administrao do empregador, respeitados osprincpios bsicos de proteo ao trabalho. Revista parcialmente conhecida e provida. (TST, 1 T., RRn 298.012, Rel. Juiz Convocado Domingos Spina, j. 17.11.99, DJU 11.02.00, p. 50)

    65 PALLIERI, Balladore. Diritto costituzionale. Milano: Giuffr, 1963. n. 122, p. 366. Na mesma linha,com indicao de precedente da Corte Constitucional alem, cf. CURRIE, David P. The Constitution ofthe Federal Republic of Germany. Chicago: The University of Chicago Press, 1994. p. 322.

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    que se estabeleam distines arbitrrias ou irrazoveis, porque carecidas defundamento material bastante. Dizer igualdade prossegue a deciso afirmar a proibio do arbtrio, do irrazovel, do injustificado66. Para repetir aobservao de Guilherme Machado Dray, sendo admissveis as diferenciaes,o que se pede e exige que estas sejam materialmente fundadas e se baseiemnuma distino objectiva de situaes67. Em resumo, diante da conotao quea palavra j adquiriu, pode-se afirmar que proibida , to somente, adiscriminao e no a mera diferenciao, que algo diverso e que se podeadmitir.

    interessante, no particular, voltar a ateno para o Cdigo do Trabalhode Portugal, j antes mencionado. O legislador portugus tratou com bastanteacerto do assunto, porque foi muito mais abrangente do que a limitada regrado art. 373-A, da CLT. Preceitua o art. 23, n; 1, do Cdigo do Trabalho dePortugal, que trata da proibio da discriminao: O empregador no podepraticar qualquer discriminao, direta ou indireta, baseada nomeadamente naascendncia, idade, sexo, orientao sexual, estado civil, situao familiar ,patrimnio gentico, capacidade de trabalho reduzida, deficincia ou doenacrnica, nacionalidade, origem tnica, religio, convices polticas ouideolgicas e filiao sindical. Embora o rol seja bastante amplo, no perde oseu carter exemplificativo, realado pela doutrina 68. O legislador apenasprocurou, com a meno a grande nmero de situaes, dar mxima abrangnciaao enunciado, tudo para mostrar que qualquer forma de diferenciaodesarrazoada ou discriminao est afastada do ponto de vista legal.

    Mas da a importncia da referncia ao dispositivo do Cdigo doTrabalho de Portugal proibio de discriminao no sinnimo de proibiode diferenciao. Certas diferenas precisam ser estabelecidas. E o legisladorportugus tinha isso em mente quando, logo na alnea n 2, do mesmo art. 23,disps: No constitui discriminao o comportamento baseado num dos fatoresindicados no nmero anterior, sempre que, em virtude da natureza das atividadesprofissionais em causa ou do contexto de sua execuo, esse fator constituaum requisito justificvel e determinante para o exerccio da atividadeprofissional, devendo o objetivo ser legtimo e o requisito proporcional.Retoma-se a ideia que havia sido esboada acima. O que se proscreve

    66 Processo n 249/91, Rel. Messias Bento, Acrdo n 226/92, deciso de 17.06.92. A passagem transcritaacha-se no n 7 da deciso.

    67 O princpio da igualdade no Direito do Trabalho. Coimbra: Almedina, 1999. n. 125. p. 109.

    68 GOMES, Jlio Manuel Vieira. Direito do Trabalho. v. 1. Coimbra: Coimbra, 2007. p. 423 e QUINTAS,Paula; QUINTAS, Helder. Cdigo do Trabalho: anotado e comentado. Coimbra: Almedina, 2004. p. 136.

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    simplesmente a discriminao, ou seja, a diferenciao abusiva, que no temcausa justa69. No toda e qualquer diferenciao.

    claro que o problema, assim colocado, no se resolve por inteiro. Adificuldade que remanesce est exatamente em determinar aquilo que justificvel ou no no campo da diferenciao. Para a Suprema Corte norte-americana o sexo era, no exerccio da advocacia, em 1873, um elemento dediferenciao justificvel, como se infere do exemplo j dado no presente texto.O passar do tempo deixou patente o erro da concluso, que ningum mais hojesubscreveria.

    No direito, porm, as linhas nem sempre so ntidas, nem sempre cortamcom preciso. O que atualmente se v, com toda clareza e transparncia, comoum erro grave, inaceitvel mesmo, ontem parecia normal e inevitvel 70. E oque hoje se admite talvez amanh venha a revelar -se intolervel. H zonascinzentas, em que as solues se mostram mais difceis 71. Basta pensar nocaso, que no hipottico, da discriminao, no trabalho, por motivo de crenareligiosa. Se levantada a dvida sobre a legitimidade de se condicionar o acessoao emprego ou a permanncia nele ao fato de o trabalhador professardeterminada religio, o impulso inicial claramente no sentido de repelir-se ocritrio, por inaceitvel. Mas, caminhando na direo da zona cinzenta lembrada,a assertiva torna-se mais complexa. Caso o empregador seja, por exemplo,uma escola confessional, com todo o seu ensino a determinada religio, mantm-se o carter inaceitvel do critrio? Continuar a ser arbitrria a no admissode todos aqueles trabalhadores que no professam essa mesma religio? Ajurisprudncia italiana deu questo resposta negativa. Concluiu que o critrio legtimo. Considerou a religio, em escola confessional, aspecto validamentedeterminante para a admisso do trabalhador , conforme Sentena n 195,proferida em 1972, na qual se afirma: La libert della scuola intesa comeattuazione del principio del pluralismo scolastico ai sensi dellart. 33 Cost., siestende indubbiamente alle universit, per cui ammissibile la creazione di

    69 A propsito, RAPOSO, Vera Lcia. Os limites da igualdade: um enigma por desvendar. In: A igualdadedos gneros nas relaes de trabalho. Las de Oliveira Penido (coord.). Braslia: Escola Superior doMinistrio Pblico da Unio, 2006. p. 169-171.

    70 O defloramento da mulher, ignorado pelo marido, como erro suficiente anulao de casamento, nostermos do art. 219, inciso IV, do Cdigo Civil de 1916, exemplo bastante expressivo de algo consideradonormal no passado e hoje visto como clara aberrao. Torna-se ainda mais eloquente o exemplo quandoconsiderada a assertiva de Joo Luiz Alves, para quem a regra do inciso IV seria, em rigor, desnecessria,pois o defloramento estaria compreendido implicitamente na previso do inciso III, ante a referncia,neste ltimo, a defeito fsico irremedivel! (Cdigo Civil. v. 1. So Paulo: Saraiva, 1935. p. 249).

    71 Em termos semelhantes, cf. MELLO, Celso Antnio Bandeira de. Contedo jurdico do princpio daigualdade. So Paulo: Malheiros, 2006. n. 34. p. 39.

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    universit libere, che possono essere confessionali o comunque ideologicamentecaratterizzate, e ne deriva necessariamente che la libert di insegnamento daparte di singoli docenti che sono liberi di aderire allindirizzo della scuolacome di recedere dal relativo rapporto, incontra nel particolare ordinamento disiffatte universit i limiti necessari a realizzarne le finalit. Ci vale in particolareper lUniversit cattolica la cui pretesa natura di persona giuridica pubblicanon ne attenuerebbe comunque loriginaria destinazione finalistica e lacaratterizzazione confessionale. Negando ad una libera universitideologicamente qualificata il potere di scegliere i suoi docenti in base ad unavalutazione della loro personalit e negandosi alla stessa il potere di recederedal rapporto ove gli indirizzi religiosi o ideologici del docente siano divenuticontrastanti con quelli che caratterizzano la scuola, si mortificherebbe erinnegherebbe la libert di questa, inconcepibile senza la titolarit di quei poteri,e pertanto lart. 38 del Concordato non contrasta con lart. 33 Cost., chesubordina al nulla osta della S. Sede la nomina dei professori dellUniversitcattolica del Sacro Cuore. La legittima esistenza di libere universitcaratterizzate dalla finalit di diffondere un credo religioso uno strumento dilibert, e la libert religiosa dei cattolici sarebbe gravemente compromessaove lUniversit cattolica non potesse recedere dal rapporto con un docenteche pi non ne condivida le fondamentali e caratterizzanti finalit. pertantoinfondata la questione di legittimit costituzionale dellart. 38 del Concordatoche subordina la nomina e la permanenza dei professori dellUniversit cattolicaal nulla osta della S. Sede, sollevata in relazione allart. 19 Cost..

    Em outros pases, a diferena de tratamento, na situao mencionada,conta com a expressa permisso legislativa. o que se d, por exemplo, naAlemanha, em que a Lei geral sobre igualdade de tratamento ( AllgemeinesGleichbehandlungsgesetz AGG) admite distino fundada em crena religiosaou secularismo, no caso de emprego oferecido por comunidades religiosas,instituies associadas a elas ou, ainda, associaes que tenham por finalidadecultivar determinada crena religiosa ou o secularismo72. Tambm nos EstadosUnidos da Amrica o famoso Civil Rigths Act de 1964 contm previsosemelhante e no considera ilegal a employment practice for a school, college,university, or other educational institution or institution of learning to hire andemploy employees of a particular religion if such school, college, university ,or other educational institution or institution of learning is, in whole or insubstantial part, owned, supported, controlled, or managed by a particular

    72 Cf. 9, (1), do Allgemeines Gleichbehandlungsgesetz, na traduo para o ingls encontrada emEmployment & Labor Law in Germany, C. H. Beck e Ant. N. Sakkoulas: Mnchen, 2008. p. 128.

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    religion or by a particular religious corporation, association, or society , or ifthe curriculum of such school, college, university , or other educationalinstitution or institution of learning is directed toward the propagation of aparticular religion73.

    Nem mesmo na situao extrema figurada e tida em conta pelaslegislaes alem e norte-americana, contudo, a distino fundada em motivoreligioso pode ser aceita. O decisivo o conhecimento que se tem para oexerccio do trabalho, no importando necessariamente a adeso a uma ou aoutra religio ou a rejeio de todas elas. A deciso da Corte Constitucionalitaliana, antes referida e transcrita em parte, no levou em conta que a liberdadeindividual do empregador no se pode sobrepor ao interesse pblico de queno haja discriminao por motivo religioso74.

    Outro exemplo das tantas dificuldades colocadas pelo exame darazoabilidade da distino posta manifesta-se no plano poltico. certo comoj exposto, alis no se admitir diferenciao de tratamento por motivo deconvico poltica. Mas considere-se agora o problema como julgar a escolhafeita para ocupar car go de confiana na administrao pblica, a partir decritrios polticos, com excluso de pessoas vinculadas a outros partidos?Haveria, no caso, discriminao, ou, ao contrrio, simples diferenciao,aceitvel ante o contexto em que realizada? A Suprema Corte americana, emBranti v. Finkel, disse que no havia discriminao, diante do cartereminentemente poltico do cargo, que, na hiptese examinada, era de assessorde defensor pblico. Assinalou: Party affiliation is an appropriate requirementfor the effective performance of the public office involved75. Teve de admitir,porm: It is not always easy to determine whether a position is one in whichpolitical affiliation is a legitimate factor to be considered 76. De modosemelhante, o Supremo Tribunal Federal do Brasil excluiu, do mbito deincidncia da vedao decorrente da Smula Vinculante n 13, proibitiva de

    73 Sec. 703, (e), 2.

    74 Sobre o tema, com concluso divergente, porm, cf. MOREIRA, Teresa Alexandra Coelho. Da esferaprivada do trabalho e o controlo do empregador. Coimbra: Coimbra, 2004. p. 507 e segs. Note-se que,a despeito da data de publicao, o texto anterior ao Cdigo do Trabalho de Portugal.

    75 445 U.S. 507. Do mesmo modo, em John A. Uphoff Figueroa v. Hector Alejandro and Nitza VazquezRodriguez a United States Court of Appeals for the First Circuit decidiu: The First Amendment doesnot bar public employers from considering political affiliation for positions for which political affiliationis an appropriate requirement for ... effective performance... Trust employees participate inpolicymaking and can be hired and fired on political grounds... Career employees must be selectedand terminated based on merit, not politics (processo n 08-1921).

    76 Idem, 445 U.S. 507.

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    nepotismo, os ocupantes de cargo de secretrio de estado, exatamente por setratar de cargo de natureza poltica77.

    Pode-se referir, por fim, a diferena de tratamento decorrente da idade.Embora no se trate, em regra e normalmente, de critrio legtimo para oestabelecimento de distines ou para restringir o exerccio de direitos conforme j exposto acima em certos casos no h como deix-lo de lado.Sempre que o vigor fsico ou a acuidade dos sentidos seja importante para oexerccio do emprego ou da funo, legtimo diferenciar-se a partir da idade.Nada tem de ilegal, por exemplo, o estabelecimento de limite de idade para oexerccio do emprego de piloto de avio. So evidentes a relevncia e o interessepblico, relacionado com a segurana de passageiros e de terceiros, de quetenha o piloto adequada acuidade visual. Da a previso da Smula n 683 doSupremo Tribunal Federal: O limite de idade para a inscrio em concursopblico s se legitima em face do art. 7, XXX, da Constituio, quando possaser justificado pela natureza das atribuies do cargo a ser preenchido.

    10 IGUALDADE E AES AFIRMATIVAS

    A discriminao, como visto at aqui, est claramente proibida e no tolerada pelo ordenamento jurdico brasileiro. A realidade, no entanto, nemsempre condiz com tal ideia. A distncia entre o dever ser a norma legal eo ser aquilo que se passa no mundo dos fatos enorme. Por isso mesmo que fica evidente como no basta proscrever, por meio da lei, a discriminao. preciso elimin-la da realidade. Eis o grande problema dos dias de hoje. Ailegalidade da discriminao j no est mais em causa. No aceita peloordenamento jurdico. No tolerada. O problema que ela continua a ocorrerna prtica. Como elimin-la? Como fazer com que a igualdade de tratamento,enunciada pela lei, transforme-se cada vez mais em realidade? Eis a questohoje mais importante. Nesse campo h pelo menos dois aspectos fundamentais.

    O primeiro envolve as chamadas aes afirmativas, caracterizadas, emlinhas muito gerais, pelo tratamento desigual imposto pela lei, para compensar

    77 "STF, Pleno, AgReg MC Rcl n 6.650-PR, Rel. Min. Ellen Gracie, j. 16.10.08, DJe 21.11.08, com a seguinteementa: AGRAVO REGIMENTAL EM MEDIDA CAUTELAR EM RECLAMAO. NOMEAODE IRMO DE GOVERNADOR DE EST ADO. CARGO DE SECRETRIO DE EST ADO.NEPOTISMO. SMULA VINCULANTE N 13. INAPLICABILIDADE AO CASO. CARGO DE NA-TUREZA POLTICA. AGENTE POLTICO. ENTENDIMENTO FIRMADO NO JULGAMENTO DORECURSO EXTRAORDINRIO 579.951/RN. OCORRNCIA DA FUMAA DO BOM DIREITO. 1.Impossibilidade de submisso do reclamante, Secretrio Estadual de Transporte, agente poltico, s hipte-ses expressamente elencadas na Smula Vinculante n 13, por se tratar de cargo de natureza poltica.

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    a desigualdade existente na realidade. O tema da ao afirmativa est atualmenteem bastante evidncia por conta de alterao legislativa ocorrida em algunsEstados da Federao, consistente na criao de cotas para ingresso, emuniversidades pblicas, de estudantes vinculados a grupos minoritrios oudesfavorecidos. Houve enorme polmica sobre a legitimidade da previso, comdiscusso em torno da prpria constitucionalidade dessa reserva de cotas.

    O que se alega, em oposio ao afirmativa, que a poltica no fundoviola a regra de tratamento igual de todos perante a lei. Afinal, se no pode haverdiscriminao, como privilegiar certa minoria ou certo grupo nem sempreminoritrio com cotas reservadas, fazendo, por exemplo, com que aqueles queobtenham uma nota inferior possam ser admitidos na universidade em detrimentode outros, que no pertencem ao grupo e obtiveram notas superiores?

    Ao enfrentar a questo lanada, prontamente vem tona o julgamentoda Suprema Corte americana que envolveu, mais uma vez, o problema dadiscriminao racial. A Universidade da Califrnia estabeleceu cotas reservadaspara negros, hispnicos e outros grupos desfavorecidos na sociedade norte-americana. Questionou-se a legitimidade da providncia e a Suprema Corte,em 1978, afirmou que as cotas eram inconstitucionais 78. Invoca-se esseprecedente para justificar a mesma soluo no direito brasileiro. A forma comose conduz o debate , todavia, incorreta, at porque a mesma Suprema Corte,em junho de 2003, reviu, em parte, sua posio 79. Afirmou, agora em relaoao sistema de cotas institudo pela Universidade de Michigan, que ele eralegtimo, desde que o critrio racial no fosse o nico e convivesse com outroscritrios. O resultado, de todo modo, que, com o critrio adotado, ingressarona universidade integrantes de grupos desfavorecidos, mesmo que tenhamobtido nota inferior exigida de outros alunos. Como se v, a Suprema Cortevalidou, em grande medida, a ao afirmativa. E mesmo antes, em 1970, nojulgamento do caso Steelworkers v. Weber, reformou deciso da United StatesCourt of Appeals for the Fifth Cir cuit, ao reconhecer a validade de normacoletiva celebrada com sindicato, em que prevista a promoo preferencial detrabalhadores negros, anteriormente preteridos no setor80.

    Alis, o resultado a que se chegou no direito norte-americano est emlinha com um dos dispositivos mais elegantes da Constituio italiana de 1947.

    78 Regents of Univ. of Cal. v. Bakke (438 U. S. 265).

    79 Grutter v. Bollinger (000 U.S. 02-241).

    80 443 U.S. 193. Igualmente admitindo aes afirmativas, agora no campo da contratao de prestadoresde servios, veja-se a deciso tomada em Adarand Constructors, Inc. v. Pena, Certiorari to the UnitedStates Court of Appeals for the Tenth Circuit n. 93-1841, de 1995.

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    O art. 3, que estabelece a regra geral de igualdade, dispe, como j visto:Tutti i cittadini hanno pari dignit sociale e sono eguali davanti alla legge,senza distinzione di sesso, di razza, di lingua, di religione, di opinioni politi-che, di condizioni personali e sociali. Esse o enunciado geral que, tal comona Constituio italiana, aparece em muitas outras constituies. Mas o pre-ceito verdadeiramente importante o pargrafo nico, que estabelece: compito della Repubblica rimuovere gli ostacoli di ordine economico e soci-ale, che, limitando di fatto la libert e leguaglianza dei cittadini, impedisconoil pieno sviluppo della persona umana e lef fettiva partecipazione di tutti ilavoratori allorganizzazione politica, economica e sociale del Paese. Poste-riormente, a Unio Europeia, no mbito do combate discriminao por motivoracial ou tnico, ressalvou, na Diretiva 2000/43/CE do Conselho, de 29 deJunho de 2000, que a proibio de discriminao no obsta a que os Estados-Membros mantenham ou aprovem medidas especficas destinadas a prevenirou compensar desvantagens relacionadas com a origem racial ou tnica81. Emtermos semelhantes, a Constituio da ndia, estatui, no art. 15, sob a rubricaprohibition of discrimination on grounds of religion, race, caste, sex or placeof birth: (1) The State shall not discriminate against any citizen on groundsonly of religion, race, caste, sex, place of birth or any of them. (2) No citizenshall, on grounds only of religion, race, caste, sex, place of birth or any ofthem, be subject to any disability, liability, restriction or condition with regardto (a) access to shops, public restaurants, hotels and places of public entertain-ment; or (b) the use of wells, tanks, bathing ghats, roads and places of publicresort maintained wholly or partly out of State funds or dedicated to the use ofthe general public. Sem embargo, logo no n 3, do mesmo artigo, preceitua-se: Nothing in this article or in clause (2) of art. 29 shall prevent the S tatefrom making any special provision for the advancement of any socially andeducationally backward classes of citizens or for the Scheduled Castes and theScheduled Tribes.

    A vigente Constituio brasileira, a despeito da consagrao da igualda-de formal, como se v do caput do art. 5, segue a linha da Constituio italianae da Constituio da ndia, ainda que no de maneira to clara ou em termosto expressos. Em seu art. 3, inciso III, porm, inclui, entre os objetivos fun-damentais da Repblica, erradicar a pobreza e a marginalizao e reduzir asdesigualdades sociais e regionais. Compreende-se, em tal contexto, faa a

    81 Art. 5, sob a rubrica de ao positiva. Na Carta dos direitos fundamentais da Unio Europeia, encontra-se, no art. 23, disposio semelhante, relativamente discriminao por motivo de sexo: O princpioda igualdade no obsta a que se mantenham ou adoptem medidas que prevejam regalias especficas afavor do sexo sub-representado.

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    Constituio referncia proteo do mercado de trabalho da mulher , consi-derando no apenas a proibio passiva de discriminaes (art. 7, inciso XXX),como, ainda, a adoo de incentivos especficos (art. 7, inciso XX) 82. Noh, por conseguinte, contraste entre o princpio constitucional da igualdade eas aes afirmativas, como reconheceu, inclusive, o Tribunal Federal da 4Regio, ao enunciar a validade do sistema de cotas, na Universidade Federaldo Paran83.

    Na verdade, as aes afirmativas esto plenamente amparadas pela ideiade igualdade substancial, at porque s se remove a desigualdade com umadesigualdade compensatria, com o tratamento favorecido, por meio do qualse possa reequilibrar a desigualdade de fato. No h, na adoo de medidaspromocionais ou de favorecimento de grupos ou pessoas desfavorecidas, ofensaao princpio da igualdade. Como explicitou o Tribunal Constitucional espanhol,no puedan considerarse lesivas del principio de igualdad, aun cuandoestablezcan un trato ms favorable, las medidas que tengan por objetocompensar la situacin de desventaja de determinados grupos sociales y , enconcreto, remediar la tradicional situacin de inferioridad de la mujer en elmbito social y en el mercado de trabajo, matizacin que, por otra parte, vienesiendo habitual en las normas internacionales ms recientes sobre igualdad yno discriminacin84.

    Aqui bem se pode invocar, outra vez, a jurisprudncia norte-americana.Teve a Suprema Corte de defrontar -se, certa feita, com o problema daaposentadoria com prazos diferenciados para homens e mulheres, cujalegitimidade se questionou, em face do princpio constitucional da igualdade.Por que o tratamento discriminatrio? A Suprema Corte, em julgamento queno teve tanta repercusso como outros, assentou: The challenged statute

    82 Analogamente, a Constituio portuguesa de 1976 estabelece, no art. 81: Incumbe prioritariamente aoEstado no mbito econmico e social: a) Promover o aumento do bem-estar social e econmico e daqualidade de vida das pessoas, em especial das mais desfavorecidas, no quadro de uma estratgia dedesenvolvimento sustentvel; b) Promover a justia social, assegurar a igualdade de oportunidades eoperar as necessrias correces das desigualdades na distribuio da riqueza e do rendimento,nomeadamente atravs da poltica fiscal.... A Constituio da Venezuela, por sua vez, dispe, no art.21: Todas las personas son iguales ante la ley; en consecuencia:... 2. La ley garantizar las condicionesjurdicas y administrativas para que la igualdad ante la ley sea real y efectiva; adoptar medidas positivasa favor de personas o grupos que puedan ser discriminados, mar ginados o vulnerables; protegerespecialmente a aquellas personas que por alguna de las condiciones antes especificadas, se encuentrenen circunstancia de debilidad manifiesta y sancionar los abusos o maltratos que contra ellas se cometan.

    83 TRF, 4 Reg., 3 T., Ap. MS n 2005.70.00.008336-7, Rel Juza Maria Lcia Luz Leiria, j. 25.03.08.

    84 Sentena n 19/89, julgamento em 31.01.89, publicada em 28.02.89. Para outros pronunciamentos, detribunais de diferentes pases europeus, cf. FAVOREU, Louis et elli. Droit des liberts fondamentales.Paris: Dalloz, 2000.p. 343 e segs, par. 436 e segs.

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    85 Califano v. Webster (430 U.S. 313). De idntico modo, na dissenting opinion apresentada no j citadocaso Regents of Univ. of Cal. v. Bakke (438 U.S. 265), o juiz Harry Blackmun assentou: ... in order totreat some people equally we must first treat them differently.

    86 TJ-MG, 5 Cm. Crim., Ap. Crim. n 1.0672.07.245992-4/001(1), Rel. Des. Alexandre Victor de Carvalho,j. 06.11.07, DJMG de 01.12.07. Em sentido oposto, todavia, decidiu o Tribunal de Justia do Rio deJaneiro: MANDADO DE SEGURANA. UERJ. SISTEMA DE COTAS PARA NEGROS, PARDOSE EGRESSOS DE ESCOLAS PBLICAS. LEIS ESTADUAIS ns. 3708/01 e 3524/2000. Consta queo Apelante obteve o 14 lugar no vestibular para o Curso de Engenharia e Produo de Petrleo do anode 2004, sendo 20 (vinte) as vagas ento disponveis. Em razo da aplicao do sistema de reserva devagas para negros e pardos e para alunos egressos de escolas pblicas, previstos nas Leis ns. 3.708/01e 3.524/2000, acabou ficando fora do limite. O presente mandamus foi impetrado quando ainda vigiamas mencionadas Leis. Acontece que a Lei n 3.708/01 foi declarada inconstitucional pelo Egrgio rgoEspecial, na Arguio de Inconstitucionalidade n 15/05 e, quanto a Lei n 3.524/00, no mereceuapreciao pelo rgo Especial. Sua revogao posterior no retira do Judicirio o controle difuso ouincidental acerca dos seus efeitos concretos enquanto vigia. As chamadas aes afirmativas visam darefetividade ao princpio constitucional da igualdade no plano material. Sem dvida que essas aes so

    operated directly to compensate women for past economic discrimination.Retirement benefits under the act are based on past earnings. But as we haverecognized: Whether from overt discrimination or from the socializationprocess of a male-dominated culture, the job market is inhospitable to the womanseeking any but the lowest paid jobs. Kahn v . Shevin, 416 U.S., at 353...Thus, allowing women, who as such have been unfairly hindered from earningas much as men, to eliminate additional low-earning years from the calculationof their retirement benefits works directly to remedy some part of the effect ofpast discrimination85. E a jurisprudncia nacional usou ar gumento muitosemelhante para rejeitar a tese da inconstitucionalidade da Lei n 1 1.340,conforme julgado com a seguinte ementa: APELAO. LEI MARIA DAPENHA. INCONSTITUCIONALIDADE. INOCORRNCIA. BUSCA DAIGUALDADE SUBSTANTIVA. COERNCIA COM O PRINCPIO DAISONOMIA. A ao afirmativa do Estado que busque a igualdade substantiva,aps a identificao dos desnveis socioculturais que gere a distino entreiguais/desiguais, no se pode tomar como inconstitucional, j que no lesa oprincpio da isonomia, pelo contrrio: busca torn-lo concreto, efetivo. As aespolticas destinadas ao enfrentamento da violncia de gnero desguem ouno em Leis buscam a efetivao da igualdade substantiva entre homem emulher enquanto sujeitos passivos da violncia domstica. O tratamentodiferenciado que existe e isto fato na Lei n 1 1.340/06 entre homens emulheres no revelador de uma faceta discriminatria de determinada polticapblica, pelo contrrio: revela conhecimento de que a violncia tem diversidadede manifestaes e, em algumas de suas formas, subproduto de uma concepocultural em que a submisso da mulher ao homem um valor histrico, moral oureligioso a origem mltipla. Arguio de inconstitucionalidade rejeitada86.

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    A afirmao adquire especial significado no campo das cotas nasuniversidades. preciso ter em conta que a discriminao existente para oingresso nas universidades decorre j da deficincia no ensino para certaspessoas. Os grupos desfavorecidos tm, em regra, um ensino de menorqualidade. Com isso, no ingressam em universidades de melhor qualidade.Em consequncia, exercero atividades ou funes com menor remunerao,fazendo com que a desigualdade se multiplique e, na verdade, se perpetue.

    Portanto, as aes afirmativas so mesmo indispensveis quando sepretende eliminar de fato e no apenas de direito a discriminao. Comoassinalou em famoso voto vencido o juiz Tanaka, da Corte Internacional deJustia: To treat unequal matters dif ferently according to their inequality isnot only permitted but required 87. Em 1984, o Conselho das ComunidadesEuropeias assinalava, ao tratar da discriminao contra a mulher comenunciado passvel, de todo modo, de generalizao que as normas jurdicasexistentes sobre a igualdade de tratamento, que tm por objectivo concederdireitos aos indivduos, so insuficientes para eliminar qualquer forma dedesigualdade de facto se, simultaneamente, no forem empreendidas, por partedos governos, dos parceiros sociais e de outros organismos competentes, acescom vista a compensar os efeitos prejudiciais que, para as mulheres na vidaactiva, resultam de atitudes, de comportamentos e de estruturas da sociedade88.Da ter razo E. W. Vierdag ao concluir: It is only after compensatory unequaltreatment has been accorded in compliance with the non-discrimination rulethat legal equality, i.e. formal equal treatment, will also constitute materialequal treatment, will produce genuine equality 89. No por outra razo aCanadian Charter of Rights and Freedoms, depois de estabelecer, na subseco

    louvveis na medida em que se almeja um Estado mais equnime, em que as oportunidades surjamigualitariamente para todos. Acontece que discriminar no privilegiar, e o que se v pela conjugaodas leis acima apontadas nada menos do que 70% das vagas destinadas a uma minoria. Sim, porqueconsiderado o universo de estudantes no Estado, aqueles que estudam em escolas pblicas acabam seconstituindo uma minoria. E mais ainda, pois verifico que a tal lei veio atender aqueles alunos deescolas pblicas tendo por pressuposto que a qualidade do ensino fornecido no estava no mesmopatamar das escolas particulares. Pois muito bem, no fundo o Estado criou um paliativo para compensara sua ausncia, a sua falha, seu desleixo na rea de ensino. No razovel privilegiar um grupo deestudantes porque o ensino que o Estado ministra no de boa qualidade. A no estaremos privilegiando,mas, qui, criando uma discriminao ao inverso. Ao agir assim, o Estado afrontou princpios daproporcionalidade, da razoabilidade, da igualdade, pois afrontou tanto a Constituio Federal, como aLei Federal n 9.394/96 (TJRJ, 7 Cm. Cv, Ap. Cv. n 2004.001.04268, Rel. Des. Ricardo RodriguesCardozo, j. 21.11.07).

    87 South-West Africa-Case, Reports 1966, p. 248.

    88 Recomendao do Conselho 84/635/CEE, de 13 de dezembro de 1984.

    89 The concept of discrimination in international law.The Hague: Martinus Nijhoff, 1973. p. 165.

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    1, de seu art. 15, a regra geral da igualdade 90, na subseco seguinte estatui:(2) Subsection (1) does not preclude any law, program or activity that has asits object the amelioration of conditions of disadvantaged individuals or groupsincluding those that are disadvantaged because of race, national or ethnic origin,colour, religion, sex, age or mental or physical disability91. Disse muito bem,alis, o Ministro Carlos Ayres de Britto ao assinalar: No h outro modo deconcretizar o valor constitucional da igualdade seno pelo decidido combateaos fatores reais de desigualdade. O desvalor da desigualdade a proceder ejustificar a imposio do valor da igualdade92.

    exatamente o que faz, embora de modo imperfeito, o art. 93, da Lei n8.213/91, ao impor aos empregadores a obrigao de contratao de certo nmerode trabalhadores deficientes 93. A disciplina legal, em tal hiptese como emoutras em que se criam medidas promocionais em favor de pessoas desfavorecidas apenas procura riammettere al lavoro a condizione normali coloro che, per leminorazioni subite, dif ficilmente potrebbero affrontare la concorrenza con ilavoratori sani, como evidenciado por Valente Simi94. No outro o fundamento

    90 O texto est assim redigido: (1) Every individual is equal before and under the law and has the right to theequal protection and equal benefit of the law without discrimination and, in particular, without discriminationbased on race, national or ethnic origin, colour , religion, sex, age or mental or physical disability.

    91 Para indicao da admissibilidade de medidas de ao afirmativa na legislao britnica ( positivediscrimination), em matria trabalhista, em favor de idosos, cf. UPEX, Robert; BENNY , Richard;HARDY, Stephen. Labor Law. Oxford: Oxford University Press, 2006. n. 4.140. p. 188.

    92 Item 30, do voto proferido na ADIn n 3.330-1 DF.

    93 Imperfeio evidente da norma indicada resulta de nela no se levarem em conta dificuldades decorrentesde impossibilidades tcnicas ou de situaes em que a liberdade de escolha do empregador no pode sesujeitar a parmetros mais rigorosos, como no caso dos cargos de confiana (art. 62, inciso II, da CLT).O direito italiano, com a experincia acumulada ao longo de mais tempo de aplicao de medidaspromocionais, considerou as hipteses, ainda que em termos, tambm algo imperfeitos e suscetveis deaprimoramento. Dispensou, de todo modo, certas empresas do cumprimento, em relao a determinadasfunes, da obrigao de admisso de deficientes, por conta de obstculos tcnicos. Trata-se do art. 13,da Lei n 482, de 1968, em que se estatui: Le imprese di navigazione marittima ed aerea, le ferroviedello Stato e le imprese esercenti pubblici servizi di trasporto in concessione non sono tenute, perquanto concerne il solo personale navigante e viaggiante, allosservanza dellobbligo di cui al precedentearticolo. Admitiu, em relao a outras empresas, a substituio, em situaes excepcionais e medianteprvia autorizao administrativa, da contratao de deficientes por outras medidas promocionais. Apossibilidade est no art. 13, n 5, da mesma Lei n 482, nos seguintes termos: Con decreto del Ministroper il lavoro e la previdenza sociale, sentita la commissione provinciale di cui allart. 16, le aziendeprivate che, per le speciali condizioni della loro attivit non possono occupare lintera percentuale d