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V FOTOS: DIVULGAÇÃO Você liga a TV e durante aquele comercial bacana iden- tifica no canto da tela uma logomarca que te faz lem- brar uma música. Provavelmente, você cantou em al- guma festa, lá pelas tantas na pista: Alô, alô, W Brasil... Alô, alô, W Brasil. Você para e por alguns momentos se recorda do nome por trás da marca: Washington Olivetto, um dos publicitários mais conhecidos do País. Ganhador de títulos e vários prêmios nacionais e internacionais, ele confessa que a profissão entrou em sua vida por acaso. “No caminho para a faculda- de, meu pneu furou na frente de uma agência na Rua Itambé, em São Paulo, e enquanto eu pensava em como trocá-lo vi o dono chegando. Pedi para falar com ele e disse: ‘Meu pneu furou aqui na porta e você deveria me dar uma oportunidade, afinal, meu pneu não vai furar no mesmo lugar mais de uma vez!’ Ganhei o emprego”, recorda Olivetto, que hoje se define em uma frase tão interessante quanto sua trajetória: “Sou o melhor Wa- shington Olivetto que consigo ser”. Há quanto anos existe a W/Brasil? Desde que foi fundada como WGGK, em 8 de julho de 1986. Antes disso, trabalhei na HGP, Lince Propagan- da, Casablanca, DPZ, e saí para abrir a W. Como foi o início da carreira? Incrível. Comecei como estagiário e logo cresci na pro- fissão. Era uma agência muito pequena e tinha muito trabalho, isso acabou me ensinando muito. O primeiro comercial que escrevi, por exemplo, me levou a ganhar o Leão de Ouro no festival de Cannes. Achei que os ju- rados estavam loucos. Mas acabei trazendo o Leão para casa pela campanha que criei para as torneiras Deca. Você é formado em Publicidade? Acabei não me formando. Quando comecei a trabalhar, aos 19 anos, estava matriculado em duas faculdades, Psi- cologia e Comunicação, e não tive mais tempo para ir às aulas. Consegui o estágio e me encantei com a profissão, trabalhava das 8 às 22 horas. Não acho mérito nenhum não ter terminado a faculdade, mas fui atropelado pela vida profissional. Recentemente, ganhei o título de Dou- tor Honoris Causa em Comunicações e fiz uma piada em relação a isso. Já que não conseguiram erradicar o analfabetismo no Brasil, estão erradicando os analfabe- tos. Porque é surrealista um sujeito ganhar diploma de doutor sem ter terminado o curso universitário. Defina sua profissão, o que faz? Basicamente, sou um adequador de linguagem. Ora estou vendendo algo para o caminhoneiro, ora para a dona de casa. O que facilita minha profissão é o meu interesse por toda e qualquer forma de linguagem. E isso é uma característica da minha personalidade. É curioso! Eu não sou assim porque trabalho nisso, mas trabalho nisso porque sou assim... Qual é a diferença da publicidade da década de 80 e a de hoje? A década de 80 foi a de maior brilho criativo. No Brasil foi curioso. As condições de produção eram muito capengas, mas as ideias eram melhores, simples e brilhantes. Hoje, as condições são muito boas, mas correspondem apenas à falta de conteúdo. Sou eternamente grato aos meus antecessores que profissionalizaram a publicidade no Brasil na década de 70 e deram a oportunidade para que eu entrasse na área. Quais eram as ferramentas que utilizavam na época? Os filmes eram feitos em 35 milímetros, reduzidos para 16 milímetros e projetados nas emissoras e agências em proje- tores. E imaginem: montados em um instrumento mágico do cinema da época, a moviola. Hoje, a tecnologia ajuda muito. E até as ideias ruins se tornam grandes. As possibi- lidades de acabamento, edição, digitalização e uma série de coisas facilitam o trabalho. Na mídia impressa realizamos a edição de palavra por palavra com tesoura e lâmina. Os processos tecnológicos atuais são fascinantes. Você tem alguma máquina que utilizava naquela época? Todas. Tenho verdadeiro fascínio pelas máquinas de escre- ver. O barulho das teclas ditava o ritmo dos meus textos. Se um dia pudesse criar uma escultura com algum objeto que remetesse ao passado faria com uma máquina de escrever. Meu início com o computador foi difícil. Você é de família rica? Não, minha família era média, bem média. Meu pai era vendedor. Mas eu tinha uma tia que não tinha filhos e me co-patrocinava. Meu pai trabalhou muito para me dar um Fusca e minha tia o trocou por um Karmanguia. Quando percebeu que já era um case de sucesso? É muito ruim descobrir isso em qualquer momento da vida. Nós, publicitários, treinamos o tempo todo para não viver de passado. Hoje criamos um filme bom, fazemos sucesso. Amanhã temos que pensar em algo novo, nos reinventar. Existe um momento na tua vida profissional que as pessoas começam a te achar bom e você começa a ficar preocupado. Todos passam por isso. A partir do segundo ano, tinha a per- cepção de que tinha descoberto para quê eu servia na vida. E só no quarto, quinto ano me tornei um publicitário mais seguro. Se é que algum publicitário é seguro. Quais suas principais características, defeitos ou qualidades? Se eu tiver algumas qualidades, tenho três: ótima capa- cidade de rir de mim mesmo (o que é muito bom), exijo que me levem a sério, mas eu não me levo nada a sério, e, por último, tenho um lado intuitivo muito forte. Cos- tumo dizer que sou uma comitiva de mulheres! CF20_washington olivetto - V3.in41 41 CF20_washington olivetto - V3.in41 41 27/8/2009 00:17:14 27/8/2009 00:17:14

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Você tem alguma máquina que utilizava naquela época? Todas. Tenho verdadeiro fascínio pelas máquinas de escre- ver. O barulho das teclas ditava o ritmo dos meus textos. Se um dia pudesse criar uma escultura com algum objeto que remetesse ao passado faria com uma máquina de escrever. Meu início com o computador foi difícil. CF20_washington olivetto - V3.in41 41 CF20_washington olivetto - V3.in41 41 27/8/2009 00:17:14 27/8/2009 00:17:14 41 41 41 C H I Q U E S & F A M O S O S

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Você liga a TV e durante aquele comercial bacana iden-tifi ca no canto da tela uma logomarca que te faz lem-brar uma música. Provavelmente, você cantou em al-guma festa, lá pelas tantas na pista: Alô, alô, W Brasil... Alô, alô, W Brasil. Você para e por alguns momentos se recorda do nome por trás da marca: Washington Olivetto, um dos publicitários mais conhecidos do País. Ganhador de títulos e vários prêmios nacionais e internacionais, ele confessa que a profi ssão entrou em sua vida por acaso. “No caminho para a faculda-de, meu pneu furou na frente de uma agência na Rua Itambé, em São Paulo, e enquanto eu pensava em como trocá-lo vi o dono chegando. Pedi para falar com ele e disse: ‘Meu pneu furou aqui na porta e você deveria me dar uma oportunidade, afi nal, meu pneu não vai furar no mesmo lugar mais de uma vez!’ Ganhei o emprego”, recorda Olivetto, que hoje se defi ne em uma frase tão interessante quanto sua trajetória: “Sou o melhor Wa-shington Olivetto que consigo ser”.

Há quanto anos existe a W/Brasil?Desde que foi fundada como WGGK, em 8 de julho de 1986. Antes disso, trabalhei na HGP, Lince Propagan-da, Casablanca, DPZ, e saí para abrir a W.

Como foi o início da carreira?Incrível. Comecei como estagiário e logo cresci na pro-fi ssão. Era uma agência muito pequena e tinha muito trabalho, isso acabou me ensinando muito. O primeiro comercial que escrevi, por exemplo, me levou a ganhar o Leão de Ouro no festival de Cannes. Achei que os ju-rados estavam loucos. Mas acabei trazendo o Leão para casa pela campanha que criei para as torneiras Deca.

Você é formado em Publicidade?Acabei não me formando. Quando comecei a trabalhar, aos 19 anos, estava matriculado em duas faculdades, Psi-cologia e Comunicação, e não tive mais tempo para ir às aulas. Consegui o estágio e me encantei com a profi ssão, trabalhava das 8 às 22 horas. Não acho mérito nenhum não ter terminado a faculdade, mas fui atropelado pela vida profi ssional. Recentemente, ganhei o título de Dou-tor Honoris Causa em Comunicações e fi z uma piada em relação a isso. Já que não conseguiram erradicar o analfabetismo no Brasil, estão erradicando os analfabe-tos. Porque é surrealista um sujeito ganhar diploma de doutor sem ter terminado o curso universitário.

Defi na sua profi ssão, o que faz?Basicamente, sou um adequador de linguagem. Ora estou vendendo algo para o caminhoneiro, ora para a dona de casa. O que facilita minha profi ssão é o meu interesse por toda e qualquer forma de linguagem. E isso é uma característica da minha personalidade. É curioso! Eu não sou assim porque trabalho nisso, mas trabalho nisso porque sou assim...

Qual é a diferença da publicidade da década de 80 e a de hoje?

A década de 80 foi a de maior brilho criativo. No Brasil foi curioso. As condições de produção eram muito capengas, mas as ideias eram melhores, simples e brilhantes. Hoje, as condições são muito boas, mas correspondem apenas à falta de conteúdo. Sou eternamente grato aos meus antecessores que profi ssionalizaram a publicidade no Brasil na década de 70 e deram a oportunidade para que eu entrasse na área.

Quais eram as ferramentas que utilizavam na época?Os fi lmes eram feitos em 35 milímetros, reduzidos para 16 milímetros e projetados nas emissoras e agências em proje-tores. E imaginem: montados em um instrumento mágico do cinema da época, a moviola. Hoje, a tecnologia ajuda muito. E até as ideias ruins se tornam grandes. As possibi-lidades de acabamento, edição, digitalização e uma série de coisas facilitam o trabalho. Na mídia impressa realizamos a edição de palavra por palavra com tesoura e lâmina. Os processos tecnológicos atuais são fascinantes.

Você tem alguma máquina que utilizava naquela época?Todas. Tenho verdadeiro fascínio pelas máquinas de escre-ver. O barulho das teclas ditava o ritmo dos meus textos. Se um dia pudesse criar uma escultura com algum objeto que remetesse ao passado faria com uma máquina de escrever. Meu início com o computador foi difícil.

Você é de família rica?Não, minha família era média, bem média. Meu pai era vendedor. Mas eu tinha uma tia que não tinha fi lhos e me co-patrocinava. Meu pai trabalhou muito para me dar um Fusca e minha tia o trocou por um Karmanguia.

Quando percebeu que já era um case de sucesso?É muito ruim descobrir isso em qualquer momento da vida. Nós, publicitários, treinamos o tempo todo para não viver de passado. Hoje criamos um fi lme bom, fazemos sucesso. Amanhã temos que pensar em algo novo, nos reinventar. Existe um momento na tua vida profi ssional que as pessoas começam a te achar bom e você começa a fi car preocupado. Todos passam por isso. A partir do segundo ano, tinha a per-cepção de que tinha descoberto para quê eu servia na vida. E só no quarto, quinto ano me tornei um publicitário mais seguro. Se é que algum publicitário é seguro.

Quais suas principais características, defeitos ou qualidades?

Se eu tiver algumas qualidades, tenho três: ótima capa-cidade de rir de mim mesmo (o que é muito bom), exijo que me levem a sério, mas eu não me levo nada a sério, e, por último, tenho um lado intuitivo muito forte. Cos-tumo dizer que sou uma comitiva de mulheres!

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