1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME...

76
Bibliografia b´ asica do curso: [3, 2, 1, 4] Autor: Leandro Fiorini Aurichi - [email protected] Vers˜ ao: 2008 1 Espa¸ cos vetoriais Comecemos com a defini¸ ao de espa¸ co vetorial. Defini¸ ao 1.1. (V, , e dito um espa¸ co vetorial 1 se V ´ e um conjunto que cont´ em um elemento que denotaremos por 0 e se : V × V -→ V e : R × V -→ V ao fun¸ oes que satisfazem as seguintes propriedades: (A1) u, v, w V (u v) w = u (v w) (A2) u, v Vu v = v u (A3) u Vu 0= u (A4) v V u Vv u =0 (M1) α R u, v (u v)=(α u) (α v) (M2) α, β R v V (αβ ) v = α (β v) (M3) α, β R v V (α + β ) v =(α v) (β v) (M4) v V 1 v = v Cada elemento de V ´ e chamado de vetor. ´ e chamada de soma e ´ e chamada de multi- plica¸ ao por escalar. Vamos ver alguns exemplos de espa¸ cos vetoriais. Note que, para isso, precisamos exibir um conjunto, determinar duas opera¸ oes e mais um elemento que far´ a o papel do elemento 0 destacado acima. Tudo isso de forma que sejam satisfeitas as propriedades da defini¸ ao. No que se segue, quando aparecer = quer dizer que a igualdade vale pela defini¸ ao de que for dada no exemplo. Analogamente, quando aparecer = a justificativa ´ e a defini¸ ao de . Quando aparecer R =, a igualdade se d´ a por propriedades dos n´ umeros reais. Quando aparecer A1 = a justificativa ´ e a propriedade (A1) da defini¸ ao de espa¸ co vetorial. Analogamente para as propriedades (A2), ..., (A4) e (M1), ..., (M4). 1 na verdade a defini¸ ao apresentada aqui ´ e a de um espa¸ co vetorial sobre R, mas, como s´ o trabalharemos com espa¸ cos desta forma, omitiremos o “sobre R1

Transcript of 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME...

Page 1: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Bibliografia basica do curso: [3, 2, 1, 4]

Autor: Leandro Fiorini Aurichi - [email protected]: 2008

1 Espacos vetoriais

Comecemos com a definicao de espaco vetorial.

Definicao 1.1. (V,⊕,�) e dito um espaco vetorial1 se V e um conjunto que contem umelemento que denotaremos por 0 e se ⊕ : V × V −→ V e � : R × V −→ V sao funcoes quesatisfazem as seguintes propriedades:

(A1) ∀u, v, w ∈ V (u⊕ v)⊕ w = u⊕ (v ⊕ w)

(A2) ∀u, v ∈ V u⊕ v = v ⊕ u

(A3) ∀u ∈ V u⊕ 0 = u

(A4) ∀v ∈ V ∃u ∈ V v ⊕ u = 0

(M1) ∀α ∈ R ∀u, v ∈ V α� (u⊕ v) = (α� u)⊕ (α� v)

(M2) ∀α, β ∈ R ∀v ∈ V (αβ)� v = α� (β � v)

(M3) ∀α, β ∈ R ∀v ∈ V (α + β)� v = (α� v)⊕ (β � v)

(M4) ∀v ∈ V 1� v = v

Cada elemento de V e chamado de vetor. ⊕ e chamada de soma e � e chamada de multi-plicacao por escalar.

Vamos ver alguns exemplos de espacos vetoriais. Note que, para isso, precisamos exibir umconjunto, determinar duas operacoes e mais um elemento que fara o papel do elemento 0 destacadoacima. Tudo isso de forma que sejam satisfeitas as propriedades da definicao.

No que se segue, quando aparecer ⊕= quer dizer que a igualdade vale pela definicao de ⊕que for dada no exemplo. Analogamente, quando aparecer �= a justificativa e a definicao de �.Quando aparecer R=, a igualdade se da por propriedades dos numeros reais. Quando aparecerA1= a justificativa e a propriedade (A1) da definicao de espaco vetorial. Analogamente para aspropriedades (A2), ..., (A4) e (M1), ..., (M4).

1na verdade a definicao apresentada aqui e a de um espaco vetorial sobre R, mas, como so trabalharemos comespacos desta forma, omitiremos o “sobre R”

1

Page 2: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Exemplo 1.2. Considere (R2,⊕,�) onde R2 := {(a, b) : a, b ∈ R} e, dados (a, b), (c, d) ∈ R2 eα ∈ R, definimos (a, b) ⊕ (c, d) := (a + c, b + d) e α � (a, b) := (αa, αb). Considere como 0 oelemento (0, 0). E possıvel mostrar que (R2,⊕,�) satisfaz todas as propriedades de um espacovetorial. Como exemplo, vamos mostrar que satisfaz as propriedades (A3) e (A4), deixando asoutras como exercıcio:

(A3) Note que, dado (a, b) ∈ R2 temos (a, b)⊕ (0, 0) ⊕= (a + 0, b + 0) R= (a, b) e, portanto, temos(A3).

(A4) Seja (a, b) ∈ R2. Considere (−a,−b) que, de fato, pertence a R2. Note que (a, b) ⊕(−a,−b) ⊕= (a− a, b− b) R= (0, 0) = 0 e, portanto, temos (A4).

Apesar do nome vetor ter um certo apelo geometrico, os elementos de um espaco vetorial naoprecisam estar num plano, nem mesmo em qualquer outra figura geometrica. O proximo exemplomostra exatamente isso.

Exemplo 1.3. Considere (F ,⊕,�) onde F := {f : f e funcao de R em R} e ⊕ : F ×F −→ F e� : R×F −→ F sao funcoes dadas por (f⊕g)(x) = f(x)+g(x) e (α�f)(x) = αf(x). Para quemnao esta acostumado, esta notacao pode parecer confusa. Uma maneira de se ler a definicao de ⊕e a seguinte: dadas f, g ∈ F queremos que f ⊕ g seja uma funcao de R em R de forma que, paracada x ∈ R, seu valor neste ponto seja o mesmo que f(x) + g(x). Como o elemento 0, considerea funcao z : R −→ R dada por z(x) := 0 para qualquer x ∈ R. Novamente, pode-se mostrar que(F ,⊕,�) satisfaz a definicao de espaco vetorial. Como exemplo, verifiquemos as propriedades(M3) e (M4) deixando as outras como exercıcio.

(M3) Sejam α, β, x ∈ R e f ∈ F . Temos

((α + β)� f)(x) �= (α + β)f(x)R= αf(x) + βf(x)�= (α� f)(x)⊕ (β � f)(x)

(M4) Sejam f ∈ F e x ∈ R. Temos (1� f)(x) �= 1f(x) R= f(x).

As operacoes assim definidas sao as usuais de F .

Note que, no exemplo 1.2, poderıamos ter considerado, em vez do R2, Rn := {(x1, ..., xn) :x1, ..., xn ∈ R} com ⊕ e � analogos, isto e, (x1, ..., xn) ⊕ (y1, ..., yn) := (x1 + y1, ..., xn + yn) eα� (x1, ..., xn) := (αx1, ..., αxn) para (x1, ..., xn), (y1, ..., yn) ∈ Rn e α ∈ R. Essas operacoes assimdefinidas sao as usuais no Rn. Desta maneira, em particular, temos que (R,⊕,�) e um espacovetorial onde ⊕ e � sao a soma e o produto usuais respectivamente.

O que nos impede de tentar fazer o mesmo e obter que (Z,⊕,�), onde Z e o conjunto dosnumeros inteiros e ⊕ e � sao, respectivamente, a soma e o produto usuais, e um espaco vetorial?Pode-se verificar que as propriedades (A1), ..., (A4) e (M1), ..., (M4) sao satisfeitas. O problemaaqui e que, dados z ∈ Z e α ∈ R, α � z = αz nao necessariamente pertence a Z (tome, por

2

Page 3: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

exemplo z := 1 e α := 12). Assim, nao temos que ⊕ assim definida e uma funcao de R× Z −→ Z

e, portanto, (Z,⊕,�) nao e um espaco vetorial.

Vamos ver outro exemplo que nao e um espaco vetorial.

Exemplo 1.4. Considere (R2,⊕,�) onde ⊕ e o mesmo de 1.2 e � e dada por α�(a, b) := (αa, b),onde α ∈ R e (a, b) ∈ R2. Note que, pela definicao de �, temos que 2�(1, 2) = (2, 2). Suponha porabsurdo que (R2,⊕,�) e um espaco vetorial. Ou seja, temos que valem todas as propriedades dadefinicao de espaco vetorial. Entao, temos 2�(1, 2) R= (1+1)�(1, 2) M3= (1�(1, 2))⊕(1�(1, 2)) �=(1, 2) ⊕ (1, 2) ⊕= (1 + 1, 2 + 2) R= (2, 4). Como (2, 2) 6= (2, 4) temos uma contradicao e, portanto,(R2,⊕,�) nao e um espaco vetorial.

Por comodidade, dado (V,⊕,�) um espaco vetorial, denotaremos o sımbolo ⊕ por + (assim,v ⊕ u = v + u) e � por · (assim, α � v = α · v). Na verdade, o mais usual (e que tambemadotaremos aqui) e simplesmente omitir o sımbolo �. Por exemplo, α � v fica αv. Quando ⊕ e� estiverem claros no contexto, chamaremos de V o espaco vetorial (V,⊕,�).

Ja vimos alguns exemplos de espacos vetoriais e alguns exemplos de coisas que nao sao espacosvetoriais. Vamos agora comecar a ver o que pode ser deduzido a partir da definicao de umespaco vetorial. Ou seja, vamos ver algumas propriedades que todos os espacos vetoriais tem,independente de sua definicao particular.

Definicao 1.5. Seja V um espaco vetorial. Dizemos que v ∈ V e um elemento neutro se, paraqualquer u ∈ V , temos u + v = u.

Note que o elemento 0 que aparece em (A3) da definicao de espaco vetorial e um elementoneutro. Sera que podem haver outros? O proximo resultado diz que nao.

Proposicao 1.6. Seja V um espaco vetorial e seja v elemento neutro de V . Entao v = 0.

Dem.: Como v e elemento neutro de V , temos que 0 + v = 0. Por outro lado, temos 0 + vA2=

v + 0 A3= v. Logo, 0 = v como querıamos.

Ja que num espaco vetorial temos que existe um unico elemento neutro, e frequente, ao sedefinir um espaco vetorial, se omitir quem e o elemento 0. Mas o leitor pode facilmente determinarquem e tal elemento. Uma maneira simples e dada pelo proximo resultado:

Proposicao 1.7. Seja V um espaco vetorial e seja v ∈ V . Temos que 0v = 0 (Atencao: o 0 queaparece a esquerda da igualdade e o numero real zero. Ja o 0 que aparece a direita, e o elementoneutro de V ).

3

Page 4: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Dem.: Seja u ∈ V tal que 0v+u = 0. Tal u existe por (A4). Temos que 0vR= (0+0)v M3= 0v+0v.

Assim, temos que 0 = 0v + u = (0v + 0v) + uA1= 0v + (0v + u) = 0v + 0 A3= 0v.

Definicao 1.8. Sejam V um espaco vetorial e v ∈ V . Dizemos que u ∈ V e um elementooposto a v se v + u = 0.

Pela propriedade (A4) da definicao de espaco vetorial, temos que todo elemento v tem umoposto. O proximo resultado diz que existe apenas um unico oposto para cada elemento.

Proposicao 1.9. Sejam V um espaco vetorial e v ∈ V . Suponha que u,w ∈ V sao elementosopostos a v. Entao u = w.

Dem.: Temosu

A3= u + 0= u + (v + w)A1= (u + v) + wA2= (v + u) + w= 0 + wA2= w + 0A3= w

Vamos agora ver que, dado um elemento v, para encontrarmos seu oposto, basta multiplica-lopelo escalar −1.

Proposicao 1.10. Sejam V um espaco vetorial e seja v ∈ V um elemento qualquer. Entao −1ve oposto a v (e, por 1.9, e o unico elemento oposto a v).

Dem.: Temos v + (−1v) M4= 1v + (−1v) M3= (1− 1)v R= 0v1.7= 0. Logo, −1v e o oposto de v.

Por comodidade, quando tivermos v, u ∈ V e α ∈ V , denotaremos v + (−αu) simplesmentepor v − αu. Analogamente, o oposto de v sera denotado simplesmente por −v.

Vamos agora a algumas propriedades elementares:

Proposicao 1.11. Sejam V um espaco vetorial, v ∈ V e α ∈ R. Temos:

(i) α(−v) = −αv;

(ii) α0 = 0.

4

Page 5: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

(iii) Se αv = 0 entao α = 0 ou v = 0;

Dem.: (i) α(−v) = α(−1v) M2= (α · (−1))v R= −αv.

(ii) α0 A3= α(0 + 0) M1= α0 + α0. Somando-se −α0 em ambos os lados da igualdade, temos, pelaparte (i), 0 = α0.

(iii) Suponha α 6= 0. Vamos entao mostrar que v = 0. Considere α−1 ∈ R tal que α−1α = 1.De α0 = 0 temos α−1(αv) = α−10. Aplicando (ii) ao lado direito da igualdade, temos queα−1(αv) = 0. Assim, temos que 0 = α−1(αv) M2= (α−1α)v = 1v

M4= v.

1.1 Exercıcios

Exercıcio 1.1. Considere M2:={(

a bc d

): a, b, c, d ∈ R

}, ⊕ : M2 ×M2 −→ M2 dada por

(a1 b1

c1 d1

)⊕

(a2 b2

c2 d2

):=

(a1 + a2 b1 + b2

c1 + c2 d1 + d2

)e � : R×M2 −→ M2 dada por

α�(

a bc d

):=

(αa αbαc αd

)Mostre que (M2,⊕,�) e um espaco vetorial. As operacoes assim definidas sao as usuais para

M2.

Exercıcio 1.2. Considere Q o conjunto dos numeros racionais, ⊕ e � a soma e o produto usuaisde numeros reais. (Q,⊕,�) e um espaco vetorial? Justifique.

Exercıcio 1.3. Exiba os elementos neutros dos seguintes espacos vetoriais: R3 e M2 (cada umcom a soma e a multiplicacao por escalar usuais).

Exercıcio 1.4. Seja f ∈ F . Determine qual e a funcao representada por −f .

Exercıcio 1.5. Seja V := {r ∈ R : r > 0}. Considere sobre V as seguintes operacoes ⊕ :V × V −→ V e � : R × V −→ V dadas por r ⊕ s := rs e α � r := rα onde r, s ∈ V e α ∈ R.Mostre que (V,⊕,�) e um espaco vetorial e exiba o elemento neutro de V .

5

Page 6: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Exercıcio 1.6. Considere C = {a + bi : a, b ∈ R} o conjunto dos numeros complexos. Mostreque C com as operacoes usuais e um espaco vetorial.

Exercıcio 1.7. Seja P := {a + bx + cx2 : a, b, c ∈ R} o conjunto dos polinomios de grau menorou igual a 2. Mostre que P e um espaco vetorial e exiba seu elemento neutro.

Exercıcio 1.8. Seja A,B, C ∈ M2, onde A :=(

1 22 1

), B :=

(0 31 0

)e C :=

(7 −41 0

).

Calcule, com as operacoes usuais de M2, os seguintes elementos:

(a) A + B

(b) B + 12C

(c) A−B + 4C

Exercıcio 1.9. Sejam V um espaco vetorial e v, u, w ∈ V . Mostre as seguintes afirmacoes:

(a) −(−v) = v;

(b) Se u + v = w + v entao u = w.

(c) Se u + u = 0 entao u = 0.

Exercıcio 1.10. Sejam V um espaco vetorial e u, v ∈ V . Mostre que existe um unico vetorw ∈ V tal que u + w = v.

Exercıcio 1.11. Considere (R,⊕,�) onde, dados a, b ∈ R e α ∈ R, definimos a ⊕ b = a − b eα� a = αa. (R,⊕,�) e um espaco vetorial?

Exercıcio 1.12. Sejam (U,⊕U ,�U ) e (V,⊕V ,�V ) espacos vetoriais. Considere U×V := {(u, v) :u ∈ U, v ∈ V } com as seguintes operacoes:

(u1, v1) + (u2, v2) := (u1 ⊕U u2, v1 ⊕V v2)

α · (u, v) := (α�U u, α�V v)

onde u, u1, u2 ∈ U , v, v1, v2 ∈ V e α ∈ R. Mostre que (U × V,+, ·) e um espaco vetorial.

6

Page 7: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

2 Subespacos vetoriais

Vejamos agora um modo de obter espacos vetoriais “novos” a partir de “velhos”. Dado (V,+, ·)um espaco vetorial, podemos tentar criar um novo espaco (S,⊕,�) simplesmente tomando S ⊂ Ve fazendo com que ⊕ e � sejam as restricoes de + e · respectivamente. E, e claro, queremos que(S,⊕,�) satisfaca as propriedades da definicao de espaco vetorial. Ou seja, temos a seguintedefinicao:

Definicao 2.1. Seja (V,+, ·) um espaco vetorial. Dizemos que (S,⊕,�) e um subespaco ve-torial de V se (S,⊕,�) e um espaco vetorial, S ⊂ V e, dados u, v ∈ S e α ∈ R temos queu ⊕ v = u + v e α � v = α · v. Dizemos que ⊕ e � sao as operacoes induzidas por + e ·respectivamente.

Por comodidade, normalmente usaremos os mesmos sımbolos para as operacoes no espaco ori-ginal e no subespaco. E, quando as operacoes estiverem claras no contexto, diremos simplesmenteque S e subespaco de V .

O proximo resultado e simples, mas e importante te-lo em mente.

Proposicao 2.2. Se (S,⊕,�) e subsespaco vetorial de (V,+, ·), entao, dados u, v ∈ S e α ∈ R,temos que u + v ∈ S e αv ∈ S.

Dem.: Como S e espaco vetorial, temos que ⊕ : S × S −→ S. Logo, dados u, v ∈ S, temos queu ⊕ v ∈ S. Como u + v = u ⊕ v, temos que u + v ∈ S. Analogamente, temos o resultado paraαv.

Vamos agora a um exemplo de subespaco.

Exemplo 2.3. Seja (D,+, ·) onde D :={(

a 00 b

): a, b ∈ R

}e + e · sao as restricoes das

operacoes em M2. Vamos ver que D e subespaco de M2. Para isso, precisamos ver, primeiramente,que as operacoes + e ·, que sao as restricoes da operacoes de M2, de fato sao funcoes de D ×Dem D e R×D em D respectivamente. Ou seja, precisamos mostrar que, dados A,B ∈ D e α ∈ R,

temos que A + B ∈ D e αA ∈ D. Sejam A :=(

a1 00 a2

), B :=

(b1 00 b2

)∈ D. Temos que(

a1 00 a2

)+

(b1 00 b2

)+=

(a1 + b1 0

0 a2 + b2

)∈ D. Para mostrar que αA ∈ D e analogo

(exercıcio). Observe tambem que o elemento(

0 00 0

)∈ D faz o papel de elemento neutro em

D. Assim, para concluirmos que D e de fato um espaco vetorial, so resta mostrar que valemas propriedades (A1), ..., (A4), (M1), ..., (M4) da definicao de espaco vetorial. Como exemplo,

7

Page 8: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

vamos mostrar a propriedade (A2) deixando as outras como exercıcio: Sejam A :=(

a1 00 a2

),

B :=(

b1 00 b2

)∈ D. Temos

A + B =(

a1 00 a2

)+

(b1 00 b2

)=

(a1 + b1 0

0 a2 + b2

)=

(b1 00 b2

)+

(a1 00 a2

)= B + A

O proximo exemplo mostra que podemos ter (V,+, ·), (S,⊕,�) ambos espacos vetoriais e comS ⊂ V mas sem que S seja subespaco de V .

Exemplo 2.4. Considere (R,+, ·), onde + e · sao as operacoes usuais. Considere (P,⊕,�), ondeP := {r ∈ R : r > 0} e ⊕ e � sao as operacoes definidas no exercıcio 1.5, isto e, dados r, s ∈ P eα ∈ R, temos que r ⊕ s = rs e α � r = rα. Pelo exercıcio 1.5, temos que (P,⊕,�) e um espacovetorial. Mas, apesar de P ⊂ R, nao e verdade que (P,⊕,�) e subespaco vetorial de (R,+, ·).Isso se da porque as operacoes em P nao sao as operacoes induzidas por R. De fato, considere1, 2 ∈ P . Por um lado, tomando as operacoes em P , temos que 1⊕ 2 = 1 · 2 = 2. Por outro lado,tomando as operacoes em R, temos que 1 + 2 = 3.

O proximo exemplo mostra que podemos ter (S, +, ·), com S ⊂ V , “definir”as operacoes emS como as de V e, ainda assim, S nao ser subespaco de V .

Exemplo 2.5. Considere [0, 1] ⊂ R. Temos que ([0, 1],+, ·), onde + e · sao as restricoes dasoperacoes usuais de R, nao e um subespaco vetorial de R. Para ver isso, suponha que seja. Entao,dados a, b ∈ [0, 1] temos, por 2.2, que a + b ∈ [0, 1]. Como 1 ∈ [0, 1], temos que 1 + 1 = 2 ∈ [0, 1],contradicao. Logo, [0, 1] nao e subespaco vetorial de R.

Vimos que, dado um subconjunto S de um espaco vetorial V e necessario fazer muitas veri-ficacoes para decidir se ele e um subespaco vetorial ou nao. Temos que verificar as oito propri-edades de espaco vetorial, a existencia de um elemento neutro e ainda verificar se as restricoesdas duas operacoes tem contra domınio S. O proximo resultado mostra uma maneira mais facilde fazer tal decisao.

Proposicao 2.6. Seja (V,⊕,�) um espaco vetorial. Seja S ⊂ V . Entao (S, +, ·), onde + e ·sao as restricoes das operacoes de V , e um subespaco vetorial se, e somente se, sao satisfeitas asseguintes condicoes:

(a) 0 ∈ S;

8

Page 9: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

(b) Dados u, v ∈ S temos que u⊕ v ∈ S;

(c) Dados v ∈ S e α ∈ R temos que α� v ∈ S.

Dem.:

⇒): Suponha que S e um subespaco vetorial. Entao, por 2.2, temos (b) e (c). Em particular,temos que S e um espaco vetorial e, portanto, S 6= ∅. Seja v ∈ S. Temos 0 = 0� v = 0 · v ∈ S e,portanto, temos (a).

⇐): Suponha que S satisfaca (a), (b) e (c). Por (a) temos que S e nao vazio. Por (b) temos que +e uma funcao de S × S em S e, por (c), temos que · e uma funcao de R× S em S. Assim, restaverificarmos as propriedades (A1), ..., (A4), (B1), ..., (B4). Vamos verificar as propriedades (A2)e (M1) deixando as outras como exercıcio.

(A2) Sejam u, v ∈ S. Temos que u + v = u ⊕ v∗= v ⊕ u = v + u, onde ∗ vale por que vale a

propriedade (A2) em V .

(M1) Sejam u, v ∈ S e α ∈ R. Temos α(u + v) = α � (u ⊕ v) ∗∗= (α � u) ⊕ (α � v) = αu + αv,onde ∗∗ vale pois (M1) vale em V .

Vamos aproveitar o resultado anterior e dar mais alguns exemplos de subespacos vetoriais,agora fazendo as verificacoes de maneira bem mais simples.

Exemplo 2.7. Considere C := {f : f e funcao contınua de R em R}. Temos que C, com asoperacoes usuais de funcoes, e um espaco vetorial. De fato, podemos mostrar que C e subespacovetorial de F (ver exemplo 1.3). Para isso, vamos aplicar 2.6. Note que o elemento neutro deF e a funcao identicamente nula que e uma funcao contınua. Logo, 0 ∈ C. Se f e g sao funcoescontınuas, temos que f + g tambem e uma funcao contınua. Finalmente, se f e um funcaocontınua e α ∈ R, temos que αf e uma funcao contınua.

Exemplo 2.8. Considere R2 com as operacoes usuais. Considere S := {(a,−a) ∈ R2 : a ∈ R}.Vamos mostrar que S e um subespaco vetorial de R2 com as operacoes induzidas. Pela definicaode S, temos que 0 = (0, 0) ∈ S (basta tomarmos a = 0). Agora sejam (a,−a), (b,−b) ∈ R2.Temos (a,−a) + (b,−b) = (a + b,−a − b) = (a + b,−(a + b)) ∈ S. Agora sejam (a,−a) ∈ S eα ∈ R. Temos α(a,−a) = (αa,−αa) ∈ S.

9

Page 10: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

2.1 Exercıcios

Exercıcio 2.1. Sejam V um espaco vetorial e S ⊂ V . Suponha que, dados u, v ∈ S e α ∈ Rtemos que u + v ∈ S e αv ∈ S. Mostre que 0 ∈ S se, e somente se, S e nao vazio.

Exercıcio 2.2. Seja V espaco vetorial e S ⊂ V . Mostre que S com as operacoes restritas de Ve um subespaco vetorial de V se, e somente se, S e nao vazio e, dados α ∈ R e u, v ∈ S temosαu + v ∈ S.

Exercıcio 2.3. Seja V um espaco vetorial. Considere S := {0} ⊂ V . S com as operacoesinduzidas por V e um subespaco vetorial?

Exercıcio 2.4. Decida se os conjuntos abaixo sao subespacos vetoriais de R3 com as operacoesinduzidas pelas operacoes usuais de R3. Justifique suas afirmacoes.

(a) A := {(x, y, z) ∈ R3 : z = 0}

(b) B := {(x, y, z) ∈ R3 : x + y = z}

(c) C := {(x, y, z) ∈ R3 : xy = 0}

(d) D := {(x, y, z) ∈ R3 : x + z = 0}

(e) E := {(x, y, z) ∈ R3 : x2 + z2 = 1})

Exercıcio 2.5. Sejam V um espaco vetorial e A,B ⊂ V subespacos vetoriais de V . As seguintesafirmacoes sao verdadeiras? Justifique suas respostas.

(a) A ∩B e um subespaco vetorial de V .

(b) A ∪B e um subespaco vetorial de V .

(c) {a + b : a ∈ A e b ∈ B} e um subespaco vetorial de V .

(d) Se A ⊂ B entao A e subespaco vetorial de B.

Exercıcio 2.6. Seja S subespaco vetorial de V . Seja 0V o elemento neutro de V e 0S o elementoneutro de S. Mostre que 0V = 0S .

Exercıcio 2.7. Considere S := {A ∈ M2 : detA 6= 0} ∪{(

0 00 0

)}. S com as operacoes

induzidas por M2 e subespaco vetorial de M2?

10

Page 11: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

3 Combinacoes lineares e subespacos gerados

Segue imediatamente das propriedades de espacos vetoriais que podemos sempre somar doiselementos e que podemos multiplicarmos qualquer elemento por um numero real sempre tendocomo resultado outro elemento do espaco. O proximo resultado simplesmente diz que podemos,na verdade, somar qualquer quantidade (finita) de elementos do espaco e sempre obteremosoutro elemento do espaco. Alem disso, cada elemento desta soma pode ser multiplicado por umescalar sem prejuızo algum. Antes de mostrar tal resultado, vamos demonstrar uma importanteferramenta matematica que nos sera util:

Teorema 3.1 (Princıpio da inducao). Seja P uma propriedade. Suponha que sabemos que talpropriedade vale para o numero 0 e que, sempre que ela vale para um numero n ∈ N ela tambemvale para o numero n + 1. Entao a propriedade P vale para todos os numeros1 m ∈ N.

Dem.: Suponha que existe um numero para o qual a propriedade P nao vale. Seja n o menornumero para o qual nao vale P . Por hipotese, temos que n 6= 0. Assim, temos que n − 1 ∈ Ne, como n − 1 < n, temos que a propriedade P vale para n − 1. Por hipotese, temos que apropriedade P vale para (n− 1) + 1 = n, contradicao.

Corolario 3.2. Seja P uma propriedade que vale para um numero m ∈ N e que se ela vale paraum numero n ∈ N ela tambem vale para n + 1. Entao a propriedade P vale para todo numerok ∈ N com k ≥ m.

Dem.: Considere a propriedade P ′ tal que P ′ vale para um numero n se, e somente se, P valepara n + m. Aplicamos o teorema para P ′ e obtemos o resultado.

Proposicao 3.3. Seja V um espaco vetorial. Sejam α1, ..., αn ∈ R e v1, ..., vn ∈ V . Entao

n∑i=1

αivi ∈ V

Dem.: Por inducao2 sobre n. Caso n = 1, temos que α1v1 ∈ V pela definicao de espaco vetorial.Agora suponha que vale o resultado para n e vamos mostrar para n+1. Por hipotese, temos que∑n

i=1 αivi ∈ V . Assimn+1∑i=1

αivi = (n∑

i=1

αivi)︸ ︷︷ ︸∈V

+αn+1vn+1︸ ︷︷ ︸∈V

∈ V

1Uma versao “informal”deste resultado que talvez ajude a entende-lo melhor: se ha uma fila infinita de bolase sabemos que a primeira esta pintada e que, se alguma esta pintada, entao a proxima tambem esta pintada,podemos concluir que toda a fila esta pintada.

2ou seja, a propriedade aqui considerada e que dados α1, ..., αn ∈ R e v1, ..., vn temos quePn

i=1 αivi ∈ V .

11

Page 12: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Este tipo de operacao vai ser importante para o restante do texto.

Definicao 3.4. Seja V espaco vetorial. Sejam u, v1, ..., vn ∈ V . Dizemos que u e uma com-binacao linear de v1, ..., vn se existem α1, ..., αn ∈ R tais que u =

∑ni=1 αivi.

Exemplo 3.5. Considere R3 com a soma e multiplicacao usuais. Temos que (1, 1, 1) e combinacaolinear de (1, 0, 0), (0, 1

2 , 1) e (0, 0, 1) pois

1(1, 0, 0) + 2(0,12, 1)− 1(0, 0, 1) = (1, 1, 1)

Por outro lado, temos que (1, 1, 1) nao e combinacao linear de (1, 0, 0) e (0, 1, 0). Pois, suponhaque seja. Entao existem α, β ∈ R tais que α(1, 0, 0) + β(0, 1, 0) = (1, 1, 1). Com isso, olhando asequacoes dadas pelas terceiras coordenadas, temos que 1 = α · 0 + β · 0 = 0, contradicao.

Exemplo 3.6. Seja V espaco vetorial. Sejam u, v ∈ V . Temos que u + v e combinacao linear deu− v e v. De fato, temos que 1(u− v) + 2v = u + v.

Suponha que temos um espaco vetorial V e A ⊂ V um conjunto qualquer nao vazio. Peloresultado 3.3 temos que se A e um subespaco vetorial de V , entao qualquer combinacao linear deelementos de A tambem e um elemento de A1. E se A nao for um subespaco? Sera que e suficienteacrescentarmos as combinacoes lineares de A para obtermos um subespaco? O resultado seguinteafirma que sim.

Proposicao 3.7. Seja V um espaco vetorial. Seja A ⊂ V um conjunto nao vazio. EntaoS := {v ∈ V : ∃n ≥ 1, v1, ..., vn ∈ A e α1, ..., αn ∈ R

∑ni=1 α1vi = v} e um subespaco vetorial de

V . Alem disso, A ⊂ S.

Dem.: Vamos usar 2.6 para mostrar que A e subespaco. Como A e nao vazio, podemos to-mar v ∈ A. Entao 0v = 0 ∈ S. Sejam u, v ∈ S. Entao existem u1, ..., un, v1, ...., vm ∈ A eα1, ..., αn, β1, ..., βm ∈ R tais que u =

∑ni=1 αiui e v =

∑mi=1 βivi. Note que

u + v =n∑

i=1

αiui +m∑

i=1

βivi

Logo, u + v ∈ S. Seja α ∈ R. Temos que

αv = α

m∑i=1

βivi =m∑

i=1

αβivi

Logo, αv ∈ S e, portanto, S e subespaco vetorial de V .Para mostrar que A ⊂ S, basta notar que para cada a ∈ A, temos que a = 1a ∈ S.1se nao “enxergou” isso, tente fazer como exercıcio

12

Page 13: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Com esse resultado, fazemos a seguinte definicao:

Definicao 3.8. Sejam V um espaco vetorial e A ⊂ V um subconjunto nao vazio. Denotamospor [A] := {v ∈ V : ∃n ≥ 1, v1, ..., vn ∈ A e α1, ..., αn ∈ R

∑ni=1 α1vi = v} o subespaco vetorial

gerado por A. E, neste caso, dizemos que A e um conjunto gerador para [A]. Por convencao,dizemos que [∅] = 0.

Por comodidade, quando exibirmos os elementos de um conjunto A, omitiremos as chaves.Por exemplo, em vez de denotar por [{u, v, w}], usaremos [u, v, w].

Exemplo 3.9. Considere o espaco vetorial R3 com as operacoes usuais. Temos que [(0, 1, 2), (1, 0, 0)] ={(a, b, 2b) : a, b ∈ R}. De fato, considere (a, b, 2b) e vamos mostrar que (a, b, 2b) ∈ [(0, 1, 2), (1, 0, 0)].Para isso, basta notar que (a, b, 2b) = b(0, 1, 2) + a(1, 0, 0). Assim, temos que {(a, b, 2b) : a, b ∈R} ⊂ [(0, 1, 2), (1, 0, 0)]. Para o outro lado, considere α(0, 1, 2)+β(1, 0, 0) = (β, α, 2α). Tomando-se a = β e b = α, temos que α(0, 1, 2)+β(1, 0, 0) ∈ {(a, b, 2b) : a, b ∈ R}. Logo, temos a igualdade.

Ja o subespaco S := {(x, y, z) : z = 0} e gerado por {(1, 0, 0), (0, 1, 0)}. De fato, seja(x, y, 0) ∈ S. Entao (x, y, 0) = x(1, 0, 0) + y(0, 1, 0). E, dados α, β ∈ R, temos que α(1, 0, 0) +β(0, 1, 0) = (α, β, 0) tem a terceira coordenada 0 e, portanto, pertence a S.

Exemplo 3.10. Considere S ⊂ M2 dado por{(

a 00 b

): a, b ∈ R

}. Temos que S e gerado por

{(1 00 0

),

(1 00 2

)}

De fato, seja(

a 00 b

)∈ S. Temos que

(a 00 b

)= (a− b

2)(

1 00 0

)+

b

2

(1 00 2

)

Por outro lado, e facil ver que qualquer combinacao linear de(

1 00 0

)e

(1 00 2

)e da forma(

a 00 b

).

13

Page 14: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

3.1 Exercıcios

Exercıcio 3.1. Considere R2 com as operacoes usuais. Escreva (1, 2) como combinacao linearde {(1, 1), (0, 4)}.

Exercıcio 3.2. Considere R3 com as operacoes usuais. Considere S := [(1, 0, 0), (1, 1, 0)]. Deuma interpretacao geometrica para S.

Exercıcio 3.3. Seja V um espaco vetorial. Mostre as seguintes afirmacoes:

(a) Seja S ⊂ V . Entao S ⊂ [S];

(b) Sejam S1 ⊂ S2 ⊂ V . Entao [S1] ⊂ [S2];

(c) Seja S ⊂ V . Entao [S] = [[S]].

Exercıcio 3.4. Considere R3 com as operacoes usuais. Considere S := {(a, b, a + 2b) : a, b ∈ R}.(a) Mostre que S e subespaco de R3 com as operacoes usuais.

(b) Encontre um conjunto com exatamente 2 elementos que seja um gerador para S.

(c) Encontre um conjunto com exatamente 3 elementos que seja um gerador para S.

(d) Encontre A,B ⊂ R3 tais que A ∩B = ∅ e [A] = [B] = S.

Exercıcio 3.5. Sejam V um espaco vetorial e v ∈ V . Mostre que [V r {v}] = V .

Exercıcio 3.6. Seja V um espaco vetorial e seja S ⊂ V um subconjunto qualquer. Mostre queS = [S] se, e somente se, S e um subespaco vetorial de V .

Exercıcio 3.7. Considere M2 com as operacoes usuais. Considere

S :={(

a bc d

)∈ M2 : a = c

}A :=

{(0 10 0

),

(0 00 1

),

(1 01 0

)}(a) S e um subespaco vetorial de M2? Justifique.

(b) Relacione S com [A], justificando suas afirmacoes.

Exercıcio 3.8. Sejam V um espaco vetorial e A ⊂ V um conjunto nao vazio. Suponha que Sseja um subespaco de V tal que A ⊂ S. Mostre que [A] ⊂ S.

Exercıcio 3.9. Sejam V um espaco vetorial e A ⊂ V um conjunto nao vazio. Mostre que[A] =

⋂{S ⊂ V : S ⊃ A e S e subespaco de V }.

14

Page 15: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

4 Dependencia linear

Vimos na secao anterior que um subespaco pode ter varios conjuntos geradores. Inclusive, pode-mos ter A ⊂ B distintos que gerem o mesmo subespaco. Os conceitos que aprentamos a seguirservem para podermos tomar conjuntos geradores que sejam, de alguma forma, minimais.

Definicao 4.1. Sejam V um espaco vetorial e v1, ..., vn ∈ V distintos. Dizemos que v1, ..., vn

sao linearmente dependentes se existem α1, ..., αn ∈ R, com pelo menos um αi 6= 0, tais que∑ni=1 αivi = 0. Dizemos que v1, ..., vn sao linearmente independentes caso contrario, isto e,

se dados α1, ..., αn ∈ R temos∑n

i=1 αivi = 0, entao α1 = · · · = αn = 0. Dizemos que A ⊂ V elinearmente dependente se existem v1, ..., vn ∈ A distintos linearmente dependentes. Dizemos queA e linearmente independente caso contrario, isto e, se dados quaisquer v1, ..., vn ∈ A distintostemos que v1, ..., vn sao linearmente independentes. Por convencao, dizemos que o conjunto ∅ elinearmente independente.

Este primeiro exemplo, ilustra uma relacao entre dependencia linear e combinacao linear.

Exemplo 4.2. Sejam V um espaco vetorial e u, v, w ∈ V . Suponha que w e combinacao linearde u, v. Entao u, v, w sao linearmente dependentes. De fato, como w e combinacao linear de u, v,existem α, β ∈ R tais que αu + βv = w. Assim, αu + βv − 1w = 0.

Mais adiante, veremos que vale uma especie de recıproca para este exemplo. Mas antes,vejamos mais alguns exemplos simples.

Exemplo 4.3. Considere R4 com as operacoes usuais. Temos que (0, 1, 0, 1), (4, 6, 2, 6) e (2, 0, 1, 0)sao linearmente dependendentes. De fato, temos que

3(0, 1, 0, 1)− 12(4, 6, 2, 6) + 1(2, 0, 1, 0) = 0

Exemplo 4.4. Considere M2 com as operacoes usuais. Entao A :=(

1 10 1

), B :=

(1 10 0

),

C :=(

0 02 2

)sao linearmente independentes. De fato, sejam α, β, γ ∈ R tais que αA + βB +

γC = 0. Entao, temos o seguinte sistema de equacoes:α + β = 0α + β = 02γ = 0α + 2γ = 0

De onde obtemos que α = β = γ = 0

15

Page 16: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Exemplo 4.5. Considere F com as operacoes usuais. Temos que que as funcoes sen(x) e cos(x)sao linearmente independentes. De fato, sejam α, β ∈ R tais que, para todo x ∈ R, temosque αsen(x) + βcos(x) = 0. Fazendo x = 0, temos que 0 = αcos0 + βsen0 = α. E, fazendox = π

2 , temos que 0 = βsenπ2 = β. Logo, α = β = 0. Por outro lado, temos que as funcoes

f(x) := 2sen(x), g(x) := sen(x)−cos(x) e h(x) := sen(x)+2cos(x) sao linearmente dependentes.De fato, temos que

−32f(x) + 2g(x) + h(x) = 0

para qualquer x ∈ R.

Agora vamos ao resultado da “recıproca” do primeiro exemplo desta secao. Sua afirmacao ea de que se n vetores sao linearmente dependentes, e porque um deles e combinacao linear dosoutros.

Proposicao 4.6. Sejam V um espaco vetorial e v1, ..., vn ∈ V . Suponha que v1, ..., vn sao li-nearmente dependentes. Entao existe k tal que 1 ≤ k ≤ n tal que vk e combinacao linear de{vi : 1 ≤ i ≤ n e i 6= k}, isto e, existem αi ∈ R tais que

vk =n∑

i = 1i 6= k

αivi

Dem.: Como v1, ..., vn sao linearmente dependentes, existem α1, ..., αn ∈ R, com pelo menos umβi 6= 0, tais que

∑ni=1 βivi = 0. Seja k tal que βk 6= 0. Temos

vk =n∑

i = 1i 6= k

− βi

βkvi

O proximo resultado sera util para quando formos cuidar da minimalidade de conjuntosgeradores. Ele simplesmente diz que, se um conjunto gerador finito e linearmente dependente,entao existe um elemento dele que podemos “descartar”.

Corolario 4.7. Seja V um espaco vetorial. Seja A ⊂ V finito1 e linearmente dependente. Entaoexiste v ∈ A tal que [A] = [A r {v}].

Dem.: Escreva A = {v1, ..., vn}. Pelo resultado anterior, existem k e αi ∈ R tais que

vk =∑i = 1i 6= k

αivi

1Veja o exercicio 4.9

16

Page 17: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Vamos mostrar que [A] = [A r {vk}]. E claro que [A r {vk}] ⊂ [A] (ver exercicio 3.3). Assim,resta mostrar que [A] ⊂ [A r {vk}]. Seja u ∈ [A]. Sejam β1, ..., βn ∈ R tais que v =

∑ni=1 βivi.

Temosv =

∑ni=i βivi

= βkvk +∑n

i = 1i 6= k

βivi

= βk∑n

i = 1i 6= k

αivi +∑n

i = 1i 6= k

βivi

Logo, v ∈ [A r {vk}].

O proximo resultado diz que podemos aumentar um conjunto linearmente independente comelementos que nao sejam combinacao linear dele.

Proposicao 4.8. Sejam V um espaco vetorial e A ⊂ V um subconjunto linearmente indepen-dente. Seja v ∈ V tal que v /∈ [A]. Entao A ∪ {v} e linearmente independente.

Dem.: Suponha que nao. Entao existem v1, ..., vn ∈ A e α, α1, ..., αn ∈ R nao todos nulos taisque αv +

∑ni=1 αivi = 0. Note que α 6= 0 pois, caso contrario, terıamos

∑ni=1 αivi = 0 com algum

αi 6= 0 o que contraria o fato de A ser linearmente independente.Assim, temos que v = −

∑ni=1

αiα vi o que contraria o fato de v /∈ [A].

4.1 Exercıcios

Exercıcio 4.1. Sejam V um espaco vetorial e A ⊂ V . Mostre que, se 0 ∈ A, entao A elinearmente dependente.

Exercıcio 4.2. Considere R4 com as operacoes usuais. Decida se cada conjunto de vetores elinearmente dependente ou nao. Justifique suas respostas:

(a) {(1, 0, 0, 0), (0, 1, 0, 0), (0, 0, 1, 0), (0, 0, 0, 1)}

(b) {(1, 1, 0, 0), (2, 2, 4, 4), (0, 0, 1, 1)}

(c) {(x, y, z, w) : x + y + z + w = 0}

(d) {(0, 0, 0, 2), (0, 0,−1, 3), (0, 4, 2, 1), (1, 2, 3, 4)}

(e) {(0, 2, 2, 4), (1, 0, 2, 2), (1, 2, 2, 0)}

Exercıcio 4.3. Seja V um espaco vetorial. Sejam A,B ⊂ V . Decida se as seguintes afirmacoessao verdadeiras ou falsas e justifique suas respostas:

17

Page 18: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

(a) Se A e linearmente independente e B ⊂ A, entao B e linearmente independente.

(b) Se A e linearmente dependente e B ⊃ A, entao B e linearmente dependente.

(c) Se A e linearmente independente e B ⊃ A, entao B e linearmente independente.

(d) Se A e linearmente dependente e B ⊂ A, entao B e linearmente dependente.

Exercıcio 4.4. Seja V um espaco vetorial tal que V 6= {0}. Mostre que V r {0} e linearmentedependente.

Exercıcio 4.5. Sejam V um espaco vetorial e u, v, w ∈ V . Suponha que v ∈ [w] e u ∈ [w].Mostre que {u, v} e linearmente dependente.

Exercıcio 4.6. Sejam V um espaco vetorial e u, v, w ∈ V . Suponha que {u, v, w} e linearmenteindependente. Mostre que {u + v, u + w, v + w} e linearmente independente.

Exercıcio 4.7. Sejam V um espaco vetorial e u1, ..., un, v1, ..., vm ∈ V . Suponha que {u1, ..., un, v1, ..., vm}seja linearmente independente. Mostre que [u1, ..., un] ∩ [v1, ..., vm] = {0}.

Exercıcio 4.8. Considere P2 := {a + bx + cx2 : a, b, c ∈ R} o conjuntos dos polinomios de graumenor ou igual a 2 com as operacoes usuais. Verifique se os seguintes elementos sao linearmenteindependentes ou nao, justificando suas respostas.

(a) f(x) := 1 + x + x2, g(x) := 2 + 2x + 2x2.

(b) f(x) := x + x2, g(x) := 2, h(x) := 1 + 2x2.

(c) f(x) := 1 + x, g(x) := 2 + x, h(x) := x2.

Exercıcio 4.9. Mostre que podemos retirar a hipotese de A ser finito em 4.7. Dica: Como A elinearmente dependente, temos que existem v1, ..., vn ∈ A linearmente dependentes. Comece comisso e procure fazer algo parecido com a demonstracao de 4.7.

18

Page 19: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

5 Bases

Agora temos material suficiente para tomarmos conjuntos geradores minimais.

Definicao 5.1. Sejam V um espaco vetorial e B ⊂ V . Dizemos que B e uma base para V se Be linearmente independente e [B] = V .

Vejamos alguns exemplos.

Exemplo 5.2. Considere R4 com as operacoes usuais. Temos que B := {(1, 0, 1, 0), (0, 1, 0, 1),(1, 0, 0, 1), (0, 0, 1, 1)} e uma base para R4. De fato, seja (a, b, c, d) ∈ R4. Considere α, β, γ, δ ∈ Rtais que α(1, 0, 1, 0) + β(0, 1, 0, 1) + γ(1, 0, 0, 1) + δ(0, 0, 1, 1) = (a, b, c, d). Temos

α + γ = aβ = bα + δ = cβ + γ + δ = d

De onde, temos α = a− d + b + c−a+d−b2 , β = b, γ = d− b− c−a+d−b

2 , δ = c−a+d−b2 . Assim, temos

que [B] = R4. Vamos agora mostrar que B e linearmente independente. Sejam α, β, γ, δ ∈ R taisque α(1, 0, 1, 0) + β(0, 1, 0, 1) + γ(1, 0, 0, 1) + δ(0, 0, 1, 1) = (0, 0, 0, 0). Temos

α + γ = 0β = 0α + δ = 0β + γ + δ = 0

De onde temos que α = β = γ = δ = 0.

Exemplo 5.3. Para cada k ∈ N, considere pk : R −→ R dada por pk(x) = xk. Seja n ∈ N.Chamamos de polinomios de grau menor ou igual a n o subespaco vetorial de F geradopor p0, ..., pn. Denotamos tal espaco por Pn. Temos que B := {p0, ..., pn} e uma base para Pn.De fato, pela propria definicao, ja temos que [B] = Pn. Resta mostrar que B e linearmenteindependente. Sejam α0, ..., αn ∈ R tais que

∑ni=0 αipi = 0. Isto e, dado qualquer y ∈ R, temos

que(α0p0 + · · ·αnpn)(y) = α0y

0 + · · ·+ αnyn = 0 (1)

Mas temos que um polinomio identicamente nulo tem todos os seus coeficientes nulos. Logo,α0 = · · ·αn = 0.

Nao apresentaremos aqui a demonstracao do proximo resultado pois ela precisa de um poucode material que foge do nosso escopo. Alem disso, para os principais exemplos tratados aqui,apresentaremos uma versao mais fraca (mas suficiente) deste resultado na proxima secao.

Teorema 5.4. Seja V um espaco vetorial. Entao existe B ⊂ V base para V .

Dem.: Ver [3], p. 76.

19

Page 20: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

5.1 Exercıcios

Exercıcio 5.1. Exiba uma base para cada espaco vetorial e demonstre que a mesma de fato euma base. Considere para cada conjunto as operacoes usuais.

(a) M2

(b) R3

(c) R

Exercıcio 5.2. Sejam V um espaco vetorial e B uma base para V . Considere C,D ⊂ V tais queC ( B e D ) B. Mostre que C e D nao sao bases de V .

Exercıcio 5.3. Sejam V um espaco vetorial e B uma base para V . Seja α ∈ R com α 6= 0.Mostre que C := {αv : v ∈ B} e uma base para V .

Exercıcio 5.4. Sejam V um espaco vetorial e S ⊂ V um subespaco tal que S 6= {0}. ConsidereB base para V . E verdade que, necessariamente, B ∩ S 6= ∅?

Exercıcio 5.5. Sejam U, V espacos vetoriais. Sejam A base para U e B base para V . ConsidereU × V (veja o exercicio 1.12). O conjunto C := {(a, b) : a ∈ A, b ∈ B} e uma base para U × V ?

6 Sistemas lineares

Antes de prosseguirmos com os espacos vetoriais, vamos ver uma aplicacao no estudo de sistemaslineares homogeneos. Vamos fazer essa aplicacao agora pois um dos resultados sera utilizado nasequencia de nosso trabalho.

Definicao 6.1. Dizemos que um sistema com n equacoes nas incognitas x1, ..., xk e um sistemalinear homogeneo se cada uma das suas equacoes e da forma α1x1 + α2x2 + · · · + αkxk = 0com α1, ..., αk ∈ R. Dizemos que v = (v1, ..., vk) ∈ Rk e uma solucao para o sistema se, paracada equacao α1x1 + · · ·αkxk = 0 temos que α1v1 + · · · + αkvk = 0. Dado um sistema linearhomogeneo E com k incognitas, denotamos por Sol(E) o conjunto {v ∈ Rk : v e solucao de E}.Chamamos Sol(E) de espaco solucao de E.

20

Page 21: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Exemplo 6.2. {x1 + 2x2 = 0x2 − x3 = 0

e um sistema linear homogeneo1. Uma solucao para tal sistema e (−2, 1,−1) ∈ R3.

Nosso primeiro resultado ja mostra uma ligacao entre os sistemas lineares e algebra linear: oconjunto solucao e um espaco vetorial.

Proposicao 6.3. Seja E um sistema linear homogeneo com k incognitas. Entao Sol(E) e umsubespaco vetorial de Rk.

Dem.: Comecemos mostrando que 0 ∈ Sol(E). Dada∑k

i=1 αixi = 0 equacao de E, temos que∑ki=1 αi0 = 0, logo, 0 e solucao.Agora sejam (v1, ..., vk), (u1, ..., uk) solucoes de E. Vamos mostrar que (v1, ..., vk)+(u1, ..., uk) =

(v1 + u1, ..., v1 + uk) e solucao de E. Seja∑k

i=1 αixi = 0 uma equacao de E. Temos:∑ki=1 αi(vi + ui) =

∑ki=1 αivi +

∑ki=1 αiui

= 0 + 0= 0

Agora sejam (v1, ..., vk) ∈ Sol(E) e γ ∈ R. Vamos mostrar que γ(v1, ..., vk) = (γv1, ..., γvk) ∈Sol(E). Seja

∑ki=1 αixi = 0 uma equacao de E. Temos:∑k

i=1 αi(γvi) = γ∑k

i=1 αivi

= γ0= 0

O que vamos fazer agora e determinar uma condicao para que um sistema linear homogeneotenha solucoes nao triviais:

Lema 6.4. Considere E uma equacao da forma∑k

i=1 αixi = 0. Sejam u, v ∈ Rk onde v nao esolucao para E. Entao existe γ ∈ R tal que u− γv e solucao para E.

Dem.: Escrevemos u = (u1, ..., uk) e v = (v1, ..., vk). Sejam a :=∑k

i=1 αui e b :=∑k

i=1 αvi.Como v nao e solucao para E, temos que b 6= 0. Assim, podemos tomar γ := a

b . Vejamos que talγ satisfaz o enunciado. Temos que u− γv = (u1 − γv1, ..., uk − γvk). Assim∑k

i=1 αi(ui − γvi) =∑k

i=1 αiui − γ∑k

i=1 vi

= a− ab b

= 0

1repare que ha incognitas que nao aparecem em todas as equacoes, o que seria exigido pela nossa definicao.Mas isso pode ser facilmente contornado, notando-se, por exemplo, que a primeira equacao e equivalente a x1 +2x2 + 0x3 = 0.

21

Page 22: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Proposicao 6.5. Seja E um sistema linear homogeneo com n equacoes e k incognitas com k ≥ n.Entao existe um conjunto linearmente independente em Sol(E) com pelo menos k−n elementos.

Dem.: Vamos fazer por inducao sobre n. Caso n = 0 temos que Sol(E) = Rk e temos o resultado.Vamos fazer o caso n + 1, supondo que o caso n vale. Ou seja, temos que mostrar que se E temn + 1 equacoes, Sol(E) tem um subconjuto linearmente independente com k − n− 1 elementos.Se n+1 = k, terminamos porque {0} ⊂ Sol(E). Entao podemos supor n+1 < k, logo, k−n > 0.Considere E0 ⊂ E onde E0 tem n equacoes. Seja F a equacao restante. Por hipotese de inducao,temos que Sol(E0) tem um subconjunto A linearmente independente com k − n elementos. Setodos os elemetos de A forem solucao para F , temos que todos os elementos de A sao solucaopara E e temos o resultado. Se nao, entao existe v ∈ A tal que v nao e solucao de F . EscrevaA r {v} = {a1, ..., ak−n−1}. Para cada i = 1, ..., k − n − 1, seja γi ∈ R tal que ai − γiv sejasolucao para F (existe pelo lema). Como a1, ..., ak−n−1 e v sao solucoes para E0, temos quecada ai − γiv e solucao para E0. Logo, {a1 − γ1v, ..., ak−n−1 − γk−n−1v} ⊂ Sol(E). Logo, paraconcluirmos o resultado, basta mostrarmos que tal conjunto e linearmente independente. Sejamα1, ..., αk−n−1 ∈ R tais que

∑k−n−1i=1 αi(ai − γiv) = 0. Temos:

0 =∑k−n−1

i=1 αi(ai − γiv)=

∑k−n−1i=1 αiai −

∑k−n−1i=1 γiv

=∑k−n−1

i=1 αiai − (∑k−n−1

i=1 γi)v

Como {a1, ..., ak−n−1, v} = A e um conjunto linearmente independente, temos que que α1 = ... =αk−n−1 = 0 como querıamos.

Corolario 6.6. Seja E um sistema linear homogeneo com mais incognitas do que equacoes.Entao E tem uma solucao nao trivial, isto e, existe v ∈ Sol(E) com v 6= 0.

6.1 Exercıcios

Exercıcio 6.1. Determine o espaco solucao de cada um dos sistemas a seguir, determinandotambem uma base para cada um deles.

(a){

x1 + x2 = 0x2 − x3 = 0

(b)

x1 + x2 + 3x3 − x4 = 0x1 + x5 = 0x5 + x2 − x3 = 0

22

Page 23: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

7 Espacos finitamente gerados e dimensao

Vamos definir agora o tipo de espaco com o qual mais trabalharemos.

Definicao 7.1. Seja V um espaco vetorial. Dizemos que V e finitamente gerado se existeA ⊂ V finito tal que [A] = V .

Uma propriedade de espacos finitamente gerados e que existe um limitante para o tamanhodos conjuntos linearmente independentes.

Proposicao 7.2. Sejam V um espaco vetorial finitamente gerado e suponha que {v1, ..., vn} ⊂ Vseja um gerador de V . Entao todo subconjunto de V com mais de n elementos e linearmentedependente.

Dem.: Seja A := {u1, ..., um} com m > n. Vamos mostrar que A e linearmente dependente(note que isso implica o resultado). Como {v1, ..., vn} e gerador de V , para cada uk existemβk,1, ..., βk,n ∈ R tais que

n∑i=1

βk,ivi = uk

Considere o seguinte sistema linear, nas incognitas a1, ..., am:β1,1a1 + · · ·+ βm,1am = 0...β1,na1 + · · ·+ βm,nam = 0

Como esse sistema e homogeneo, tem m incognitas, n equacoes e n < m, temos que existeα1, ..., αm, com algum αi 6= 0, que e solucao. Isto e, para cada i = 1, ..., n, temos que β1,iα1 +· · ·+ βm,iαm = 0. Temos:

0 =∑n

i=1

∑mk=1 βk,iαkvi

=∑m

k=1

∑ni=1 αkβk,ivi

=∑m

k=1 αkuk

Logo, u1, ..., um sao linearmente dependentes.

Corolario 7.3. Seja V um espaco vetorial finitamente gerado. Dadas B,B′ ⊂ V bases de V ,temos que B e B′ tem a mesma quantidade de elementos.

Dem.: Como B gera V e B′ e linearmente independente, temos que |B′| ≤ |B|. Por outro lado,como B′ gera V e B e linearmente independente, temos que |B| ≤ |B′|.

Dada a unicidade garantida pelo ultimo resultado, podemos fazer a seguinte definicao:

23

Page 24: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Definicao 7.4. Seja V um espaco vetorial. Se V e finitamente gerado e B e uma base para V ,dizemos que V tem dimensao |B| e denotamos por dim V := |B|. Se V nao e finitamente gerado,simplesmente dizemos que V tem dimensao infinita. Neste caso, denotamos dim V = ∞.

Exemplo 7.5. Considere C = {a + bi : a, b ∈ R} o conjunto do numeros complexos com asoperacoes usuais. Note que (C,+, ·) e um espaco vetorial (exercıcio). Temos que B := {1, i} euma base para C. De fato, dado a+ bi ∈ C, temos que a+ bi = (a · 1)+ (b · i) e, portanto, B geraC. Resta mostrar que B e linearmente independente. Sejam α, β ∈ R tais que α · 1 + β · i = 0.Entao α = β = 0 e, portanto, B e base. Assim, temos que dim C = 2. Esta e chamada a basecanonica de C.

Vejamos um exemplo de um espaco que nao tem dimensao finita.

Exemplo 7.6. Considere P := {a0 + a1x1 + · · ·+ anxn : ai ∈ R, n ∈ N} o espaco dos polinomios

com as operacoes usuais. Suponha que a dimensao de P seja finita. Entao existe B ⊂ P finitotal que [B] = P . Seja p ∈ B o polinomio com o maior grau em B. Seja k o grau de p. Noteque q(x) := xk+1 e tal que q ∈ P mas q nao e combinacao linear dos elementos de B (exercıcio).Logo, B nao gera P .

A ideia do proximo resultado e que, num espaco finitamente gerado, podemos ir “aumentando”um conjunto linearmente independente ate obtermos uma base.

Teorema 7.7 (do completamento de base). Sejam V um espaco vetorial finitamente gerado eA ⊂ V um conjunto linearmente independente. Entao existe B base de V tal que B ⊃ A.

Dem.: Se [A] = V , nao ha nada a mostrar. Caso contrario, existe v1 ∈ V r [A]. Por 4.8,temos que B1 := A ∪ {v1} e linearmente independente. Se [B1] = V , acabamos. Se nao, existev2 ∈ V r [B1]. Novamente por 4.8, temos que B2 := B1 ∪ {v2} e linearmente independente.Continuamos tal processo ate que [Bn] = V . Observe que, de fato, isso ocorre, pois, casocontrario, terıamos conjuntos linearmente independentes arbitrariamente grandes o que nao podeocorrer ja que V e finitamente gerado e por 7.2

Corolario 7.8. Seja V um espaco vetorial de dimensao n. Seja B ⊂ V um conjunto linearmenteindependente tal que |B| = n. Entao B e base para V .

Dem.: Seja C ⊃ B base para V . Pela definicao de dimensao, temos que existe D base para Vtal que |D| = n. Pelo resultado 7.3, temos que |C| = n. Logo, como |B| = n, temos que C = Be, portanto, B e base de V .

Ja o proximo resultado diz que, em espacos finitamente gerados, podemos “diminuir” conjun-tos geradores linearmente dependentes ate obtermos uma base.

24

Page 25: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Proposicao 7.9. Seja V um espaco vetorial. Seja A ⊂ V finito tal que [A] = V . Entao existeB ⊂ A base para V .

Dem.: Se A e linearmente independente, acabamos. Se nao, pelo resultado 4.7, existe v1 ∈ Atal que A1 := A r {v1} e tal que [A1] = [A] = V . Se A1 e linearmente independente, acabamos.Se nao, novamente por 4.7, existe v2 ∈ A1 tal que A2 := A1 r {v2} = A r {v1, v2} e tal que[A2] = [A1] = [A] = V . E podemos repetir tal processo ate que se encontre An ⊂ A linearmenteindependente tal que [An] = V (note que tal processo de fato termina ja que A tem finitoselementos).

Corolario 7.10. Seja V um espaco vetorial de dimensao n. Seja B ⊂ V tal que |B| = n e[B] = V . Entao B e base para V .

Dem.: Pelo resultado anterior, existe C ⊂ B tal que C e base para V . Pela definicao de dimensao,existe D base para V tal que |D| = n. Por 7.3, temos que |C| = |D| = n. Assim, C = B e,portanto, B e base para V .

Observe que pelos resultados 7.8 e 7.10 temos que, num espaco vetorial de dimensao n, setemos um conjunto com n elementos, para decidirmos se ele e uma base, basta uma so verificacao:se ele e linearmente independente ou se ele e gerador.

7.1 Exercıcios

Exercıcio 7.1. Considerando as operacoes usuais de cada espaco, exiba uma base e calcule adimensao de cada um dos espacos abaixo:

(a) R2

(b) M2

(c) Pn

(d) R

Exercıcio 7.2. Considerando as operacoes usuais de P3, mostre que o conjunto {q1, q2, q3, q4, q5}e linearmente dependente, onde q1(x) := x+1, q2(x) := x2− 2x, q3(x) := x3 +5x, q4(x) = x2 +9e q5 := x3 + x2 − x + 1.

Dica: Use o exercıcio 7.1

Exercıcio 7.3. Considere R4 com as operacoes usuais. Defina bases para R4 que contenham osseguintes vetores

25

Page 26: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

(a) (1, 1, 0, 0) e (1, 1, 1, 1).

(b) (0, 0, 0, 1)

(c) (2, 0, 0, 2), (2, 0, 0, 1), (1, 1, 2, 1).

Exercıcio 7.4. Sejam V um espaco vetorial e S um subespaco seu. Mostre que dim S ≤ dim V .

Exercıcio 7.5. Seja V espaco vetorial de dimensao n. Seja S ⊂ V subespaco. Suponha quedim S = n. Mostre que S = V .

Exercıcio 7.6. Sejam U e V espacos vetoriais de dimensao m e n respectivamente. Qual adimensao de U × V ?

Exercıcio 7.7. Seja V um espaco vetorial. Considere A,B ⊂ V conjuntos nao vazios tais que adimensao de [A] e m, de [B] e n e a de [A ∪B] = k.

(a) De um exemplo onde m < n < k.

(b) De um exemplo onde m = n < k.

(c) De um exemplo onde m = n = k.

(d) E possıvel acontecer k < max{m,n}?

(e) O que podemos afirmar sobre [A], [B] e [A ∪B] se m = n = k?

(f) Suponha [A] ⊂ [B]. Calcule k em funcao de m e n.

(g) Suponha [A] ∩ [B] = {0}. Calcule k em funcao de m e n.

Exercıcio 7.8. Seja V um espaco vetorial. Considere A,B ⊂ V conjuntos nao vazios tais que[A] e [B] tem dimensao finita. Mostre que

dim[A ∪B] = dim[A] + dim[B]− dim([A] ∩ [B])

Dica: Use o exercıcio anterior.

26

Page 27: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

8 Sistemas de coordenadas

O que vamos fazer nesta secao e construir um jeito de se descrever os elementos de um espacovetorial.

Definicao 8.1. Seja V um espaco vetorial finitamente gerado. Um sistema de coordenadas,ou base ordenada, em V e uma base B := {v1, ..., vn} ⊂ V em que a ordem dos elementos estafixada1.

O proximo resultado nos da uma grande utilidade para os sistemas de coordenadas:

Proposicao 8.2. Sejam V um espaco vetorial finitamente gerado e B := {v1, ..., vn} uma baseordenada para V . Entao, para cada elemento v ∈ V , existem a1, ..., an ∈ Rn tais que v =∑n

i=1 aivi. Alem disso, tais ai’s sao unicos com tal propriedade.

Dem.: A existencia de a1, ..., an se da simplesmente pelo fato de B ser base. Vamos mostrarentao a unicidade. Sejam b1, ..., bn ∈ R tais que v =

∑ni=1 bivi. Temos

0 = v − v=

∑ni=1 aivi −

∑ni=1 bivi

=∑n

i=1(ai − bi)vi

Logo, como v1, ..., vn sao linearmente independentes, (ai − bi) = 0 para todo i = 1, ..., n.

O resultado anterior nos permite fazer a seguinte definicao:

Definicao 8.3. Sejam V um espaco vetorial finitamente gerado e B := {v1, ..., vn} uma baseordenada para V . Dado v ∈ V , denotamos por [v]B := (a1, ..., an)B a unica n-upla tal que∑n

i=1 aivi = v.

Exemplo 8.4. Considere R3 com as seguintes bases ordenadas: B1 := {(1, 0, 0), (0, 1, 0), (0, 0, 1)},B2 := {(1, 1, 0), (0, 1, 1), (0, 2, 0)} e B3 := {(0, 1, 0), (1, 0, 0), (0, 0, 1)}. Seja v := (1, 2, 3) ∈ R3.Temos

• [v]B1 = (1, 2, 3)B1

• [v]B2 = (1, 3,−1)B2

• [v]B3 = (2, 1, 3)B3

Note que o processo de se mudar as coordenadas de um vetor de uma base para outra muitasvezes e trabalhoso. Mais adiante, veremos uma maneira bem mais simples de se fazer isso. Mas,para isso, precisamos do conceito de transformacoes lineares e de alguma teoria sobre elas. Comoas transformacoes lineares sao uteis em diversos outros problemas, faremos um apanhado geralde sua teoria antes de voltarmos a aplicacao de mudanca de bases.

1ou seja, um sistema de coordenadas e uma n-upla (v1, ..., vn) cujas coordenadas formam uma base de V . Mas,por comodidade, utilizaremos o mesmo sımbolo de conjunto.

27

Page 28: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

8.1 Exercıcios

Exercıcio 8.1. Considere B :={(

1 01 0

),

(0 10 1

),

(0 10 0

),

(0 01 1

)}base ordenada

de M2. Calcule [v]B em cada um dos seguintes casos:

(a) v =(

2 10 0

)

(b) v =(

1 11 1

)

Exercıcio 8.2. Considere B := {q1, q2, q3} base de P2, onde q1(x) := 2 + x2, q2(x) := 1 + x + x2

e q3(x) := 4. Calcule p(1) onde [p]B = (1, 2, 3)B

Exercıcio 8.3. Seja V espaco vetorial finitamente gerado. Sejam B1 e B2 bases ordenadas paraV . Mostre que B1 e B2 sao iguais se, e somente se, dado qualquer v ∈ V , [v]B1 = [v]B2 .

Exercıcio 8.4. Seja V 6= 0 um espaco finitamente gerado e seja A := {a1, ..., an} ⊂ V ordenadotal que [A] = V , mas A nao e base de V . Mostre que existem v ∈ V e α1, ..., αn, β1, ..., βn ∈ Rtais que

∑ni=1 αiai =

∑ni=1 βiai = v, mas αi 6= βi para algum i = 1, ..., n.

Exercıcio 8.5. Sejam U espaco vetorial finitamente gerado, α ∈ R e u, v ∈ U . Seja B baseordenada para U .

(a) Mostre que [u]B + [v]B = [u + v]B.

(b) Mostre que α[u]B = [αu]B.

9 Transformacoes lineares

Vamos agora considerar funcoes entre espacos vetoriais. Para nos vao interessar as funcoes quepreservam a estrutura de espaco vetorial. Tais funcoes sao as descritas na proxima definicao.

Definicao 9.1. Sejam U e V espacos vetoriais. Uma funcao T : U −→ V e dita uma trans-formacao linear se, dados u1, u2 ∈ U e α ∈ R temos:

(i) T (u1 + u2) = T (u1) + T (u2);

(ii) T (αu1) = αT (u1)

28

Page 29: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Muitas vezes iremos denotar Tu em vez de T (u).

Vejamos alguns exemplos.

Exemplo 9.2. Sejam U e V espacos vetoriais. Considere T : U −→ V dada por T (u) := 0 paraqualquer u ∈ U . Temos que T e linear. De fato, dados u1, u2 ∈ U , temos T (u1 + u2) = 0 =0 + 0 = T (u1) + T (u2) e, dado α ∈ R, temos que T (αu1) = 0 = α0 = αT (u1).

Exemplo 9.3. Seja V um espaco vetorial. Considere T : V −→ V dada por T (v) := v paraqualquer v ∈ V . Temos que T e linear. De fato, dados v1, v2 ∈ V , temos que T (v1 + v2) =v1 + v2 = T (v1) + T (v2) e, dado α ∈ R, temos que T (αv1) = αv1 = αT (v1).

Exemplo 9.4. Considere R3 e R2 com as operacoes usuais. Seja T : R3 −→ R2 dada porT (a, b, c) := (a, b + c) para qualquer (a, b, c) ∈ R3. Temos que T e linear. De fato, sejam(a1, b1, c1), (a2, b2, c2) ∈ R3, temos

T ((a1, b1, c1) + (a2, b2, c2)) = T (a1 + a2, b1 + b2, c1 + c2)= (a1 + a2, b1 + b2 + c1 + c2)= (a1, b1 + c1) + (a2, b2 + c2)= T (a1, b1, c1) + T (a2, b2, c2)

Dados α ∈ R e (a, b, c) ∈ R3, temos

T (α(a, b, c)) = T (αa, αb, αc)= (αa, αb + αc)= α(a, b + c)= αT (a, b, c)

Exemplo 9.5. Considere Pn+1 e Pn com as operacoes usuais. Temos que D : Pn+1 −→ Pn

dada por D(p) := p′ (isto e, a derivada1 de p) e uma transformacao linear. De fato, sejaman+1x

n+1 + anxn + · · ·+ a0, bn+1xn+1 + bnxn + · · ·+ b0 ∈ Pn+1. Temos

D((an+1xn+1 + · · · a0) + (bn+1x

n+1 + · · ·+ b0)) = (n + 1)an+1xn + · · ·+ a1 + (n + 1)bn+1x

n + · · · b1

= D(an+1xn+1 · · · a0) + D(bn+1x

n+1 + · · ·+ b0)

Sejam α ∈ R e an+1xn+1 + · · · a0 ∈ Pn. Temos

D(α(an+1xn+1 + · · · a0)) = D(αan+1x

n+1 + · · ·αa0)= α(n + 1)an+1x

n + · · ·αa1

= α((n + 1)an+1xn + · · · a1)

= αD(an+1xn+1 + · · ·+ a0)

1dado p(x) := a0 + a1x + · · · anxn, denotamos por p′(x) o polinomio a1 + 2a2x + · · ·nanxn−1

29

Page 30: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

O proximo resultado diz que a imagem de uma transformacao linear e um espaco vetorial.

Proposicao 9.6. Sejam U e V espacos vetoriais e T : U −→ V uma transformacao linear.Temos que ImT := {v ∈ V : ∃u ∈ U T (u) = v} e um subespaco vetorial de V .

Dem.: Temos que T (0) = T (0 · 0) = 0T (0) = 0. Logo, 0 ∈ ImT . Sejam v1, v2 ∈ ImT . Entaoexistem u1, u2 ∈ U tais que T (u1) = v1 e T (u2) = v2. Temos que v1 + v2 = T (u1) + T (u2) =T (u1 + u2) e, como u1 + u2 ∈ U , temos que v1 + v2 ∈ ImT . Sejam v ∈ ImT e α ∈ R. Seja u ∈ Utal que T (u) = v. Temos que αv = αT (u) = T (αu) e, como αu ∈ U , temos que αv ∈ ImT .

Temos que composta de transformacoes lineares e uma transformacao linear, como mostra oresultado a seguir.

Proposicao 9.7. Sejam U , V e W espacos vetoriais. Sejam T : U −→ V e F : V −→ Wtransformacoes lineares. Entao F ◦ T : U −→ W , dada por (F ◦ T )(u) := F (T (u)) para u ∈ U euma transformacao linear.

Dem.: Primeiramente, note que, como T (u) ∈ V , podemos tomar F (T (u)) e, portanto, F ◦ Testa bem definida. Sejam u1, u2 ∈ U . Temos:

(F ◦ T )(u1 + u2) = F (T (u1 + u2))= F (T (u1) + T (u2))= F (T (u1)) + F (T (u2))= (F ◦ T )(u1) + (F ◦ T )(u2)

A verificacao da multiplicacao por escalar fica como exercıcio.

9.1 Exercıcios

Exercıcio 9.1. Sejam U e V espacos vetoriais e T : U −→ V uma transformacao linear. SejaS ⊂ U subespaco vetorial de U . Mostre que T [S] := {v ∈ V : ∃s ∈ S T (s) = v} e um subespacovetorial de V .

Exercıcio 9.2. Sejam U e V espacos vetoriais. Seja T : U −→ V uma transformacao linear.Considere 0U e 0V os elementos neutros de U e V respectivamente. Mostre que T (0U ) = 0V .

Exercıcio 9.3. Sejam U1, U2, V1, V2 espacos vetoriais. Sejam T : U1 −→ U2 e F : V1 −→ V2

transformacoes lineares. Considere G : U1 × V1 −→ U2 × V2 dada por G(u, v) := (T (u), F (v)).Considerando em U1 × V1 e U2 × V2 as operacoes induzidas, mostre que G e uma transformacaolinear.

30

Page 31: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Exercıcio 9.4. Sejam V um espaco vetorial e B := {v1, ..., vn} uma base ordenada de V . SejaT : V −→ R dada por T (v) :=

∑ni=1 αi onde

∑ni=1 αivi = v. Considerando R como espaco

vetorial com as operacoes usuais, mostre:

(a) T esta bem definida, isto e, se∑n

i=1 αivi =∑n

i=1 βivi entao T (∑n

i=1 αivi) = T (∑n

i=1 βivi).

(b) T e uma transformacao linear.

Exercıcio 9.5. Seja V um espaco vetorial finitamente gerado. Seja B := {v1, ..., vn} uma basepara V . Para cada i = 1, ..., n considere Πi : V −→ V dada por Πi(v) = αivi onde v =

∑nj=1 αjvj .

Mostre, para cada i = 1, ..., n:

(a) Πi esta bem definida, isto e, se∑n

j=1 αjvj =∑n

j=1 βjvj entao Πi(∑n

j=1 αjvj) = Πi(∑n

j=1 βjvj).

(b) Πi e uma transformacao linear.

Exercıcio 9.6. Sejam U e V espacos vetoriais. Seja B := {u1, ..., un} base para U . Mostre que[T (u1), ..., T (un)] = ImT .

10 Inversa e nucleo de uma transformacao

Dada uma transformacao linear T : U −→ V podemos nos perguntar se conseguimos uma outratransformacao linear que faca o “caminho inverso”, isto e, uma transformacao F : V −→ U talque F (T (u)) = u para qualquer u ∈ U . Nesta secao vamos ver quando isso e possıvel e algumasgeneralizacoes.

Definicao 10.1. Sejam A e B conjuntos nao vazios. Seja f : A −→ B uma funcao. Dizemos quef e uma funcao injetora quando, dados a1, a2 ∈ A, se f(a1) = f(a2) entao a1 = a2. Dizemosque f e uma funcao sobrejetora se, para qualquer b ∈ B, temos que existe a ∈ A tal quef(a) = b. Isto e, quando temos que Imf = B. Dizemos que f e uma funcao bijetora se ela einjetora e sobrejetora simultaneamente.

Proposicao 10.2. Sejam A e B conjuntos. Seja f : A −→ B uma funcao bijetora. Entao existeuma unica funcao g : B −→ A tal que, para todo a ∈ A, a = g(f(a)).

Dem.: Para cada b ∈ B existe ab ∈ A tal que f(ab) = b (pois f e sobrejetora). Defina g : B −→ Adada por g(b) := ab. Seja a ∈ A. Seja b ∈ B tal que f(a) = b. Note que ab = a, pois f e injetora(isto e, so existe um a′ ∈ A tal que f(a′) = b). Assim, g(f(a)) = g(b) = ab = a.

31

Page 32: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Vamos agora mostrar que g e unica com tal propriedade. Seja h : B −→ A tal que h(f(a)) = apara todo a ∈ A. Seja b ∈ B e seja a ∈ A tal que f(a) = b. Temos

h(b) = h(f(a))= a= g(f(a))= g(b)

Definicao 10.3. Sejam A e B conjuntos. Seja f : A −→ B funcao bijetora. Chamamos de f−1

a funcao g dada pelo ultimo resultado. Tal f−1 e dita a funcao inversa de f .

Vimos que se uma funcao qualquer e bijetora, podemos construir uma inversa. Agora, vol-tando ao nosso problema original, veremos que se T e uma transformacao linear bijetora, entaosua inversa tambem e uma transformacao linear.

Proposicao 10.4. Sejam U e V espacos vetoriais. Seja T : U −→ V transformacao linear.Suponha que T seja bijetora. Entao T−1 : V −→ U e uma transformacao linear.

Dem.: Sejam v1, v2 ∈ V . Sejam u1, u2 tais que T (u1) = v1 e T (u2) = v2 (podemos fazer issopois T e sobrejetora). Temos

T−1(v1 + v2) = T−1(T (u1) + T (u2))= T−1(T (u1 + u2))= u1 + u2

= T−1(v1) + T−1(v2)

Fica como exercıcio a verificacao para a multiplicacao por escalar.

Associado a uma transformacao linear qualquer, temos dois subespacos naturalmente associ-ados: o nucleo e a imagem da transformacao. A imagem nos ja vimos que e um subespaco de V .Vejamos agora o nucleo:

Definicao 10.5. Sejam U e V espacos vetoriais. Seja T : U −→ V uma transformacao linear.Chamamos de nucleo de T o seguinte conjunto:

NucT := {u ∈ U : T (u) = 0}

Proposicao 10.6. Sejam U e V espacos vetoriais. Seja T : U −→ V uma transformacao linear.Entao NucT e um subespaco vetorial de U .

32

Page 33: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Dem.: Pelo exercıcio 9.2, temos que 0 ∈ NucU . Sejam a, b ∈ NucT . Temos T (a + b) =T (a) + T (b) = 0, logo, a + b ∈ NucT . Seja α ∈ R. Temos T (αa) = αT (a) = α0 = 0, logo,αa ∈ NucT . Assim, NucT e um subespaco vetorial de U .

O nucleo da transformacao nos fornece informacao sobre se a transformacao e injetora ou nao.

Proposicao 10.7. Sejam U e V espacos vetoriais. Seja T : U −→ V uma transformacao linear.Temos que T e injetora se, e somente se, NucT = {0}.

Dem.: Suponha que T e injetora. Temos que mostrar que NucT = {0}. Como T (0) = 0, temosque {0} ⊂ NucT . Suponha que nao e verdade que NucT ⊂ {0}. Entao existe u ∈ U com u 6= 0tal que T (u) = 0 = T (0), contrariando que T e injetora.

Suponha que NucT = {0}. Sejam u, w ∈ U tais que T (u) = T (w) temos que mostrar queu = w. De T (u) = T (w), temos que 0 = T (u) − T (w) = T (u − w). Logo, u − w ∈ NucT = {0}e, portanto, u− w = 0. Ou seja, u = w.

Exemplo 10.8. Considere U e V espacos vetoriais. Seja T : U −→ V dada por T (u) := 0 paratodo u ∈ U . Temos que NucT = U . Assim T e injetora se, e somente se, U = {0}. Observetambem que T e sobrejetora se, e somente se, V = {0}.

Exemplo 10.9. Considere U um espaco vetorial. Seja T : U −→ U dada por T (u) := u paratodo u ∈ U . Note que T e bijetora. Observe tambem que T−1 = T .

Exemplo 10.10. Considere R3 e R2 com as operacoes usuais. Seja T : R3 −→ R2 dada porT (a, b, c) = (a, b + c) para todo (a, b, c) ∈ R3. Observe que

NucT = {(a, b, c) : T (a, b, c) = (a, b + c) = (0, 0)}= {(0, b, c) : b = −c}= {(0, b,−b) : b ∈ R}= [(0, 1,−1)]

Note que T e sobrejetora. De fato, dado (x, y) ∈ R2, temos que T (x, y, 0) = (x, y).

33

Page 34: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

10.1 Exercıcios

Exercıcio 10.1. Exiba quatro transformacoes lineares de R3 em R3 cujos nucleos tenham di-mensao 0, 1, 2 e 3 respectivamente.

Exercıcio 10.2. Calcule o nucleo e a imagem de cada transformacao (em cada espaco, considereas operacoes usuais).

(a) T (a, b, c, d) := (a + b, c)

(b) T (a, b) := a− b

(c) T (a, b) := (a, 2b, a + b, a− b)

Exercıcio 10.3. Seja U e V espacos vetorias. Considere T : U −→ R, (R com as operacoesusuais) e F : V −→ NucT transformacoes lineares. Descreva T ◦ F .

Exercıcio 10.4. Sejam U e V espacos vetoriais. Considere T : U −→ V uma transformacaolinear. Mostre as seguintes afirmacoes:

(a) T e injetora se, e somente se, para qualquer A ⊂ U linearmente independente, temos queT [A] e linearmente independente.

(b) Sejam u1, ..., un ∈ U . Se T (u1), ..., T (un) sao linearmente independentes, entao u1, ..., un saolinearmente independentes.

Exercıcio 10.5. Considere a transformacao linear G obtida no exercıcio 9.3. Descreva NucGem termos de NucF e NucT .

11 Transformacoes lineares e espacos de dimensao finita

O proximo resultado nos da uma maneira simples de definir uma transformacao linear:

Proposicao 11.1. Sejam U um espaco vetorial finitamente gerado e V um espaco vetorial qual-quer. Seja B := {b1, ..., bn} ⊂ U uma base para U . Para cada bi ∈ B, seja vi ∈ V . Entao existeuma unica transformacao linear T : U −→ V tal que T (bi) = vi para todo bi ∈ B.

34

Page 35: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Dem.: Dado v ∈ U , existem α1, ...αn ∈ R tais que v =∑n

i=1 αibi (lembre que tais αi’s saounicos). Defina

T (v) :=n∑

i=1

αiT (bi)

Vamos mostrar que T assim definida e linear. Sejam u, v ∈ U . Sejam α1, ..., αn, β1, ..., βn ∈ Rtais que u =

∑ni=1 αibi e v =

∑ni=1 βibi. Temos

T (u + v) =∑n

i=1(αi + βi)T (bi)=

∑ni=1 αiT (bi) +

∑ni=1 βiT (bi)

= T (u) + T (v)

Seja α ∈ R. Temos que T (αu) =∑n

i=1(ααi)bi = α∑n

i=1 αibi = αT (u).Vamos agora mostrar que T e a unica transformacao linear que satisfaz o enunciado. Seja

F : U −→ V satisfazendo o enunciado. Sejam u ∈ U e α1, ...αn ∈ R tais que u =∑n

i=1 αibi.Temos

F (u) = F (∑n

i=1 αibi)∗=

∑ni=1 αiF (bi)

∗∗=∑n

i=1 αiT (bi)= T (u)

onde (∗) vale pois F e linear e (∗∗) vale por hipotese.

O proximo resultado mostra que a dimensao da imagem, do nucleo e do domınio de umatransformacao estao relacionados entre si.

Teorema 11.2. Sejam U e V espacos vetoriais finitamente gerados. Seja T : U −→ V umatransformacao linear. Entao temos

dim U = dim ImT + dim NucT

Dem.: Seja n := dim U . Como NucT ⊂ U , temos que NucT e finitamente gerado. Sejak := dim NucT . Note que k ≤ n. Note que, se k = n, o resultado vale ja que T e a funcaoconstantemente nula. Suponha k = 0. Temos que T e injetora (por 10.7). Seja {a1, ..., an}base para U . Pelo exercıcio 9.6, temos que ImT = [T (a1), ..., T (an)]. Pelo exercıcio 10.4,como T e injetora, temos que T (a1), ..., T (an) sao linearmente independentes. Assim, temos quedim ImT = n e, portanto, temos o resultado.

Agora suponha que k > 0. Seja {b1, ..., bk} base para NucT . Como {b1, ..., bk} e base,temos que {b1, ..., bk} e linearmente independente. Assim, por 7.7, existem u1, ..., up ∈ U taisque {b1, ..., bk, u1, ..., up} e uma base para U . Note que, assim, p = n − k. Vamos mostrar que{T (u1), ..., T (up)} e base de ImT . Note que, com isso, teremos o resultado.

Pelo exercıcio 9.6, temos que [T (b1), ..., T (bk), T (u1), ..., T (up)] = ImT . Mas temos tambemque [T (b1), ..., T (bk), T (u1), ..., T (up)] = [T (u1), ..., T (up)] ja que T (bi) = 0 para todo i = 1, ..., k(mostre que de fato vale a igualdade). Assim, temos que [T (u1), ..., T (up)] = ImT . Resta,portanto, mostrar que T (u1), ..., T (up) sao linearmente independentes. Sejam α1, ..., αp ∈ R

35

Page 36: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

tais que α1T (u1) + · · · + αpT (up) = 0. Com isso, temos que 0 = T (α1u1) + · · · + T (αpup) =T (α1u1 + · · ·αpup). Logo, α1u1 + · · ·αpup ∈ NucT = [b1, ..., bk]. Assim, temos que α1u1 + · · ·+αpup ∈ [u1, ..., up] ∩ [b1, ..., bk]. Como {b1, ..., bk, u1, ..., up} e linearmente independente, temos,pelo exercıcio 4.7, α1u1 + · · ·αpup = 0. Como u1, ..., up e linearmente independente, temos queα1 = · · · = αp = 0 e, portanto {T (u1), ..., T (up)} e linearmente independente.

Exemplo 11.3. Considere M2 e R3 com as operacoes usuais. Vamos construir uma aplicacaolinear T : M2 −→ R3 tal que

NucT = A :={(

a 00 b

): a, b ∈ R

}ImT = B := {(a, 2a, b) : a, b ∈ R}

Primeiramente, note que (exercıcio)

A =[(

1 00 0

),

(0 00 1

)]B = [(1, 2, 0), (0, 0, 1)]

Por 11.1, podemos determinar T apenas exibindo seus valores calculados na base canonica deM2. Assim, considere T tal que

T

(1 00 0

):= (0, 0, 0) T

(0 10 0

):= (1, 2, 0)

T

(0 01 0

):= (0, 0, 1) T

(0 00 1

):= (0, 0, 0)

Pelo exercıcio 9.6, temos que ImT = B. Resta mostrar que NucT = A. Observe que A ⊂ NucT(exercıcio) e que dim A = 2. Note que, por 11.2, que dim Nuc = 4 − 2 = 2. Logo, temos queNucT = A.

Definicao 11.4. Sejam U e V espacos vetoriais. Seja T : U −→ V . Dizemos que T e umisomorfismo se T e uma transformacao linear bijetora. Dizemos que U e V sao isomorfos seexiste um isomorfismo entre eles.

Proposicao 11.5. Sejam U e V espacos finitamente gerados tais que dim U = dim V . SejaT : U −→ V uma transformacao linear. As seguintes afirmacoes sao equivalentes:

(i) T e um isomorfismo.

(ii) T e injetora.

(iii) T e sobrejetora.

36

Page 37: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Dem.: E imediato pelas definicoes que (i) ⇒ (ii) e (i) ⇒ (iii). Resta mostrar que (ii) ⇒ (i) e(iii) ⇒ (i). Seja n := dim U = dim V .

(ii) ⇒ (i) Suponha que T e injetora. Entao, por 10.7, temos que dim NucT = 0. Por 11.2,temos que n = dim Im + 0. Logo, ImT = V e, portanto, T e sobrejetora.

(iii) ⇒ (i) Suponha que T e sobrejetora. Entao dim T = dim V = n. Assim, por 11.2, temosque n = n + dim NucT . Logo, dim NucT = 0 e, por 10.7, temos que T e injetora.

Os proximos resultados dizem que, do ponto de vista da estrutura de espaco vetorial, doisespacos com a mesma dimensao finita sao iguais.

Teorema 11.6. Sejam U e V espacos vetoriais finitamente gerados de mesma dimensao. EntaoU e V sao isomorfos.

Dem.: Seja n := dim U = dim V . Sejam {u1, ..., un} e {v1, ..., vn} bases para U e V respecti-vamente. Considere T : U −→ V tal que T (ui) = vi para todo i = 1, ..., n. Por 11.5, bastamostrarmos que T e injetora. Para isso, basta mostrarmos que, se u ∈ NucT , entao u = 0. Sejau ∈ NucT . Entao T (u) = 0. Sejam α1, ..., αn ∈ R tais que u =

∑ni=1 αiui. Temos

0 = T (u)=

∑ni=1 T (αiui)

=∑n

i=1 αiT (ui)=

∑mi=1 αivi

Como v1, ..., vn sao linearmente independentes, tesmo que α1 = · · ·αn = 0. Logo, u = 0.

Corolario 11.7. Todo espaco vetorial de dimensao n ≥ 1 e isomorfo a Rn.

11.1 Exercıcios

Exercıcio 11.1. Sejam U e V espacos vetoriais. Seja B := {u1, ..., un} base para U . Seja T :U −→ V uma transformacao linear. E verdade que NucT = [C], onde C := {bi ∈ B : T (bi) = 0}?Vale que [C] ⊂ NucT? Justifique.

Exercıcio 11.2. Considere R3 e R2 com as operacoes usuais. Sejam T : R3 −→ R2 e F : R2 −→R3 transformacoes lineares. T pode ser injetora? F pode ser sobrejetora? Justifique.

37

Page 38: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Exercıcio 11.3. Considere R4 com as operacoes usuais. Sejam U := {(a, a2 , a+ b,−b) : a, b ∈ R}

e V := {(x, y, z, w) ∈ R4 : x − y = 0 e z + w = 0} subespacos vetoriais de R4. Defina umatransformacao linear T : R4 −→ R4 tal que NucT = U e ImT = V .

Exercıcio 11.4. Considere M2 com as operacoes usuais. Defina T : M2 −→ M2 uma trans-

formacao linear tal que NucT =[(

1 10 0

),

(0 01 1

),

(0 10 0

)]e ImT =

[(1 00 0

)].

Exercıcio 11.5. Sejam U e V espacos vetoriais finitamente gerados. Seja T : U −→ V umatransformacao linear.

(a) Mostre que, se T e injetora, entao dim V ≥ dim U .

(b) Mostre que, se T e sobrejetora, entao dim U ≥ dim V .

Exercıcio 11.6. Seja U espaco vetorial finitamente gerado. Seja T : U −→ U . Suponha queNucT = ImT .

(a) De um exemplo de um espaco e de uma transformacao que satisfacam o enunciado.

(b) Mostre que dim U e par.

Exercıcio 11.7. Sejam U e V espacos vetoriais. Seja T : U −→ V um isomorfismo. Mostre queT−1 : V −→ U e um isomorfismo.

Exercıcio 11.8. Sejam U e V espacos vetoriais finitamente gerados. Suponha que dim U 6=dim V . Mostre que U e V nao sao isomorfos.

Exercıcio 11.9. Considere T : R4 −→ R4 dada por T (1, 0, 0, 0) := (0, 1, 0, 0), T (0, 1, 0, 0) :=(0, 0, 1, 0), T (0, 0, 1, 0) := (0, 0, 0, 1), T (0, 0, 0, 1) := (0, 0, 0, 0). Mostre que T 4(v) := T (T (T (T (v)))) =0 para qualquer v ∈ R4.

38

Page 39: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

12 Matrizes de transformacoes lineares

Nesta secao veremos como podemos representar transformacoes lineares entre espacos de di-mensao finita usando matrizes reais.

Definicao 12.1. Sejam U e V espacos vetoriais. Sejam B := {b1, ..., bn} e C := {c1, ..., cm} basesordenadas para U e V respectivamente. Seja T : U −→ V uma transformacao linear. Para cadai = 1, ..., n, sejam α1i, ..., αmi ∈ R tais que T (bi) = α1ic1 + · · ·+ αmicm. Considere

M :=

α11 α12 · · · α1n

α21 α22 · · · α2n...

αm1 αm2 · · · αmn

∈ Mm×n

Tal matriz e chamada de matriz da transformacao T nas bases B e C e e denotada por [T ]BC .

O proximo resultado mostra uma utilidade de tal representacao: aplicar uma transformacaoa um vetor passa a ser mero calculo matricial.

Proposicao 12.2. Sejam U e V espacos vetoriais. Sejam B := {b1, ..., bn} e C := {c1, ..., cm}bases ordenadas para U e V respectivamente. Seja T : U −→ V uma transformacao linear. Entaovale a seguinte equacao, dado u ∈ U :

[T ]BC [u]B = [T (u)]C

Isto e, a matriz de T nas bases B e C multiplicada pelo vetor formado pelas coordenadas de u nabase B e igual ao vetor das coordenadas de T (u) na base C.

Dem.: Para cada i = 1, ..., n, sejam α1i, ..., αmi ∈ R tais que T (bi) = α1ic1 + · · · + αmicm. Sejau ∈ U . Sejam β1, ..., βn ∈ R tais que u = β1b1 + · · ·βnbn. Temos

α11 α12 · · · α1n

α21 α22 · · · α2n...

αm1 αm2 · · · αmn

β1

β2...

βn

=

∑n

i=1 α1iβi∑ni=1 α2iβi

...∑ni=1 αmiβi

Verifiquemos agora que, de fato, o vetor obtido e o desejado.∑n

i=1 α1iβic1 + · · ·+∑n

i=1 αmiβicm =∑m

j=1

∑ni=1 αjiβicj

=∑n

i=1

∑mj=1 αjiβicj

=∑n

i=1 βi∑m

j=1 αjicj

=∑n

i=1 βiT (bi)= T (

∑ni=1 βibi)

= T (u)

39

Page 40: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Exemplo 12.3. Seja T : M2 −→ R3 dada por

T

(a bc d

):= (a + b, c, d− c)

Considere B a base canonica de M2 e C := {(1, 1, 0), (0, 1, 0), (0, 1, 1)} base do R3. Temos

T

(1 00 0

)= (1, 0, 0) = 1(1, 1, 0)− 1(0, 1, 0) + 0(0, 1, 1) = (1,−1, 0)C

T

(0 10 0

)= (1, 0, 0) = 1(1, 1, 0)− 1(0, 1, 0) + 0(0, 1, 1) = (1,−1, 0)C

T

(0 01 0

)= (0, 1,−1) = 0(1, 1, 0) + 2(0, 1, 0)− 1(0, 1, 1) = (0, 2,−1)C

T

(0 00 1

)= (0, 0, 1) = 0(1, 1, 0)− 1(0, 1, 0) + 1(0, 1, 1) = (0,−1, 1)C

Assim, temos que

[T ]BC =

1 1 0 0−1 −1 2 −10 0 −1 1

Seja u :=

(1 23 4

)∈ M2. Vamos calcular T (u) de duas maneiras. Comecemos com a propria

definicao de T . Desta forma, temos

T

(1 23 4

)= (1 + 2, 3, 4− 3) = (3, 3, 1)

Agora, usemos a matriz [T ]BC . Antes, observe que [u]B = (1, 2, 3, 4)B. Assim, temos

1 1 0 0−1 −1 2 −10 0 −1 1

1234

=

1 + 2−1− 2 + 2 · 3− 4

−3 + 4

=

3−11

Com isso, temos que [T (u)]C = (3, 1, 1)C . Voltando para as coordenadas usuais, temos:

T (u) = 3(1, 1, 0)− 1(0, 1, 0) + 1(0, 1, 1) = (3, 3, 1)

Vejamos que a propriedade da matriz associada a T na verdade caracteriza a matriz.

Lema 12.4. Sejam A,B ∈ Mm×n. Se para todo u ∈ Rn temos que Au = Bu (multiplicacaomatricial), entao A = B.

40

Page 41: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Dem.: Considere ei ∈ Rn tal que ei = (0, ..., 1, ..., 0) onde o “1” aparece na i-esima coordenada.Note que dada uma matriz M ∈ Mm×n, temos que Mei e igual a i-esima coluna da matriz M .Assim, como Au = Bu para qualquer u ∈ Rn, em particular temos que Aei = Bei. Assim, ai-esima coluna de A e B sao iguais. Como i e qualquer, temos que A = B.

Corolario 12.5. Seja U, V espacos vetoriais finitamente gerados. Sejam B,C bases para U e Vrespectivamente. Seja T : U −→ V uma transformacao linear. Seja M ∈ MdimV×dimU tal que,para qualquer u ∈ U , M [u]B = [T (u)]C . Entao M = [T ]BC .

Dem.: Basta notar que Ma = [T ]BCa para qualquer a ∈ RdimU .

Agora vejamos que a representacao matricial e coerente com a composicao de transformacoes.Em resumo, a representacao matricial de uma composta e o produto matricial das matrizes decada transformacao.

Proposicao 12.6. Sejam U, V e W espacos vetoriais finitamente gerados. Sejam T : U −→ Ve F : V −→ W transformacoes lineares. Sejam A,B e C bases ordenadas para U , V e Wrespectivamente. Entao temos que [F ◦ T ]AC = [F ]BC [T ]AB.

Dem.: Seja u ∈ U . Note que [F ◦ T ]AC [u]A = [F (T (u))]C . Por outro lado, temos que

([F ]BC [T ]AB)[u]A = [F ]BC([T ]AB[u]A)= [F ]BC [T (u)]B= [F (T (u))]C

Assim, por 12.5, temos o resultado.

Finalmente, vamos mostrar que o caminho inverso tambem e verdadeiro, isto e, dada umamatriz, existe uma transformacao associada.

Proposicao 12.7. Sejam U e V espacos vetoriais. Sejam B := {b1, ..., bn} e C := {c1, ..., cm}bases para U e V respectivamente. Entao, dada uma matriz A ∈ Mm×n existe uma unica trans-formacao linear T : U −→ V tal que [T ]BC = A.

Dem.: Sejam αij com i = 1, ...,m e j = 1, ..., n tais que

A =

α11 α12 · · · α1n

α21 α22 · · · α2n...

αm1 αm2 · · · αmn

Por 11.1, existe uma unica transformacao linear T : U −→ V tal que, para cada j = 1, ..., n,T (uj) =

∑mi=1 αijci. Observe que [T ]BC = A.

41

Page 42: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

12.1 Exercıcios

Exercıcio 12.1. Considere T : R3 −→ R4 dada por T (a, b, c) = (a + b, 0, 2c,−b). SejamB := {(1, 0, 0), (0, 0, 1), (0, 2, 0)} e C := {(1, 0, 0, 0), (0, 2, 2, 0), (0, 0, 4, 0), (0, 0,−2,−2)} basesordenadas de R3 e R4 respectivamente. Calcule

(a) [T ]BC

(b) (T (1, 2, 4))C

(c) T (u), onde [u]B = (1, 2, 4)B

(d) T (u)C onde [u]B = (1, 2, 4)B

Exercıcio 12.2. Considere T : M2 −→ R2 dada por T

(a bc d

):= (a + b, 2(c− d)). Encontre

uma base C para R2 tal que [T ]BC =(

4 4 0 00 0 6 −6

), onde B e a base canonica de M2.

Exercıcio 12.3. Sejam U e V espacos vetoriais finitamente gerados. Sejam B = {b1, ..., bn}e C := {c1, ..., cm} bases para U e V respectivamente. Sejam T : U −→ V e F : U −→ Vtransformacoes lineares. Considere G : U −→ V dada por G(u) = T (u) + F (u) para todo u ∈ U .Escreva [G]BC em termos de [T ]BC e [F ]BC .

Exercıcio 12.4. Considere R4 e R3 com as operacoes usuais. Sejam B e C as bases canonicasde R4 e R3 respectivamente. Calcule [T ]BC nos seguintes casos:

(a) T (a, b, c, d) := (0, 0, a)

(b) T (a, b, c, d) := (a + b + c + d, a2 , c− d)

(c) T (a, b, c, d) := (a, b, c)

Exercıcio 12.5. Considere P3 com as operacoes usuais e B := {1, x, x2, x3} a base canonica deB. Considere T : P3 −→ P3 tal que

[T ]BB :=

1 2 0 00 3 0 4−1 2 0 10 0 2 1

Calcule:

(a) T (x2 + 3x + 7).

(b) T ((x + 1)3).

(c) p(4) onde p = T (x3 + x2 + x− 7).

42

Page 43: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

13 Matriz de mudanca de base

Nesta secao vamos nos aprofundar um pouco no caso particular de quando queremos usar arepresentacao matricial apenas para obter uma mudanca na base em que os vetores serao escritos.

Definicao 13.1. Sejam U um espaco vetorial e B := {b1, ..., bn} e C := {c1, ..., cn} bases ordena-das para U . Chamamos de matriz de mudanca de base de C para B a matriz [Id]BC , ondeId : U −→ U e tal que Id(u) := u para todo u ∈ U .

Segue imediatamente da definicao que, dado u ∈ U temo que, se A e a matriz de mudanca debase de C para B, A[u]B = [u]C .

Proposicao 13.2. Sejam U um espaco vetorial e B := {b1, ..., bn} e C := {c1, ..., cn} basesordenadas para U . Se A e a matriz de mudanca de base de C para B, entao A−1 (a matrizinversa de A) existe e e a matriz de mudanca de base de B para C.

Dem.: Lembre-se que X e a inversa de A se, e somente se, AX = I onde I e a matriz formadapor aij com i = 1, ..., n e j = 1, ..., n tal que

aij ={

1 se i = j0 se i 6= j

Lembre-se tambem que Y = I se, e somente se, para todo r ∈ Rn temos que Y r = r. Assim, paramostrarmos o resultado, basta mostrarmos que AXr = r para todo r ∈ Rn onde X e a matriz demudanca de base de C para B. Seja r ∈ Rn. Seja u ∈ U tal que [u]C = r. Temos:

AXr = AX[u]C= A(X[u]C)= A([u]B)= [u]C= r

Assim, temos o resultado.

Corolario 13.3. Sejam U um espaco vetorial e B := {b1, ..., bn} e C := {c1, ..., cn} bases orde-nadas para U . Seja T : U −→ U uma transformacao linear. Seja P a matriz de mudanca debase de C para B. Entao [T ]BB = P−1[T ]CCP .

Dem.: Basta mostrarmos que, dado u ∈ U , P−1[T ]CCP [u]B = [T (u)]B. De fato, temos

P−1[T ]CCP [u]B = P−1[T ]CC [u]C= P−1[T (u)]C= [T (u)]B

43

Page 44: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

13.1 Exercıcios

Exercıcio 13.1. Considere R3 com as operacoes usuais. Seja B := {(1, 1, 1), (0, 1, 1), (1, 1, 0)}base do R3. Calcule:

(a) A matriz de mudanca de base de B para a canonica.

(b) A matriz de mudanca de base da canonica para B.

(c) [u]B onde u := (6, 1, 2)

(d) (1, 4, 10)B expresso da maneira usual.

Exercıcio 13.2. Considere R4 com as operacoes usuais. Sejam B := {(1, 0, 1, 0), (0, 1, 0, 1),(1,−1, 0, 0), (0, 0, 1, 1)} e C := {(2, 1, 0, 0), (1, 0, 2, 0), (0, 4, 6, 0), (0, 0, 2, 8)} bases para R4. Cal-cule:

(a) A matriz de mudanca de base de B para a canonica.

(b) A matriz de mudanca de base de C para a canonica.

(c) A matriz de mudanca de base da canonica para B.

(d) A matriz de mudanca de base da canonica para C.

(e) A matriz de mudanca de base de B para C.

(f) A matriz de mudanca de base de C para B.

(g) [u]B onde u := (1, 0, 0, 0).

(h) [u]B onde u := (1, 0, 0, 0)C .

(i) [u]C onde u := (1, 0, 0, 0).

(j) [u]C onde u := (1, 0, 0, 0)B.

Exercıcio 13.3. Considere R3 com as operacoes usuais. Considere A :=

2 1 00 1 11 0 0

e C :=

{(1, 0, 0), (0, 1, 1), (1, 0, 1)}. Sabendo que A e a matriz de mudanca de base de B para C, calculeB.

44

Page 45: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

14 O espaco L(U, V )

Nesta secao veremos um importante exemplo de espaco vetorial, o espaco das transformacoeslineares entre dois espacos.

Proposicao 14.1. Sejam U e V espacos vetoriais. Seja F(U, V ) o conjunto de todas as funcoesf : U −→ V . Considere em A as seguintes operacoes, dadas f, g ∈ F(U, V ), u ∈ U e α ∈ R:

(f + g)(u) := f(u) + g(u)

(αf)(u) := αf(u)

Entao (F(U, V ),+, ·) e um espaco vetorial.

Dem.: Esta demonstracao fica como exercıcio. Repare que nao e muito diferente do caso em queU = V = R que nos ja fizemos.

Definicao 14.2. Sejam U e V espacos vetoriais. Denotamos por L(U, V ) o conjunto de todas astransformacoes lineares T : U −→ V .

Proposicao 14.3. Sejam U e V espacos vetoriais. Entao L(U, V ) e um subespaco de F(U, V ).

Dem.: Note que a funcao identicamente nula e o elemento neutro de F(U, V ). Como tal funcaoe linear, temos que ela pertence a L(U, V ). Sejam T, F ∈ L(U, V ). Vamos mostrar que (T +F ) ∈L(U, V ), isto e, vamos mostrar que (T + F ) e linear. Sejam a, b ∈ U . Temos

(T + F )(a + b) = T (a + b) + F (a + b)= T (a) + T (b) + F (a) + F (b)= (T + F )(a) + (T + F )(b)

Sejam α ∈ R. Temos

(T + F )(αa) = T (αa) + F (αa)= αT (a) + αF (a)= (α(T + F ))(a)

Seja λ ∈ R. Vamos mostrar que (λT ) ∈ L(U, V ). Sejam a, b ∈ U . Temos

(λT )(a + b) = λT (a + b)= λT (a) + λT (b)= (λT )(a) + (λT )(b)

45

Page 46: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Seja α ∈ R. Temos

(λT )(αa) = λT (αa)= λαT (a)= α(λT )(a)

Apesar de ter uma construcao mais complicada, o espaco L(U, V ), do ponto de vista deespacos vetoriais, e bem simples1:

Proposicao 14.4. Sejam U e V espacos vetoriais finitamente gerados. Sejam n := dim U em := dim V . Temos que L(U, V ) e isomorfo a Mm×n.

Dem.: Sejam B e C bases para U e V respectivamente. Vamos definir ϕ : L(U, V ) −→ Mm×n.Seja T ∈ L(U, V ) definimos ϕ(T ) := [T ]BC . Vamos ver que ϕ assim definida e um isomorfismo.Comecemos mostrando que ϕ e linear. Sejam T, F ∈ L(U, V ). Temos que mostrar que [T ]BC +[F ]BC = [T + F ]BC . Para isso, e suficiente mostrar que, dado u ∈ U temos que ([T ]BC +[F ]BC)[u]B = [T + F ]BC [u]B (por 12.5). Seja u ∈ U . Temos:

([T ]BC + [F ]BC)[u]B = [T ]BC [u]B + [F ]BC [u]B= [T (u)]C + [F (u)]C∗= [T (u) + F (u)]C= [T + F ]BC [u]B

A demonstracao de ∗ segue do exercıcio 8.5. Vamos deixar a demonstracao de que, dado α ∈ Rtemos que αϕ(T ) = ϕ(αT ) como exercıcio.

Para mostrar que ϕ e injetora, basta notar que a unica trasformacao T ∈ L(U, V ) tal queϕ(T ) = [0]BC e a transformacao nula. Para mostrar que ϕ e sobrejetora, basta aplicar 12.7.

14.1 Exercıcios

Exercıcio 14.1. Sejam m,n ∈ N. Para cada i, j com 1 ≤ i ≤ m e 1 ≤ j ≤ n, considereEij ∈ Mm×n tal que, se apq e a entrada da p-esima linha e q-esima coluna de Eij , entao

apq ={

1 se p = i e q = j0 caso contrario

Mostre que {Eij ∈ Mm×n : 1 ≤ i ≤ m e 1 ≤ j ≤ n} e uma base para Mm×n. Conclua quedim Mm×n = mn.

1Veja os exercıcios desta secao para uma demonstracao alternativa a este fato.

46

Page 47: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Exercıcio 14.2. Sejam U e V espacos vetoriais finitamente gerados. Sejam m := dim V en := dim U . Sejam B := {u1, ..., un} e C := {v1, ..., vm} bases para U e V respectivamente. Paracada i, j ∈ N tais que 1 ≤ i ≤ m e 1 ≤ j ≤ n, seja Tij : U −→ V tal que

Tij(uk) ={

vi se j = k0 caso contrario

Mostre que {Tij ∈ L(U, V ) : 1 ≤ i ≤ m e 1 ≤ j ≤ n} e uma base para L(U, V ).

Exercıcio 14.3. Sejam U e V espacos vetoriais finitamente gerados. Sejam m := dim V en := dim U . Mostre que L(U, V ) e isomorfo a Mm×n a partir dos dois exercıcios anteriores.

Exercıcio 14.4. Seja U um espaco vetorial e seja S ⊂ U um subespaco vetorial. ConsidereA := {T ∈ L(U,U) : T (s) ∈ S para todo s ∈ S}.

(a) Se S 6= {0}, mostre que existe T 6= 0 tal que T ∈ S.

(b) Mostre que S e subespaco vetorial de L(U,U).

15 Diagonalizacao

Nesta secao vamos desenvolver um metodo em que, quando possıvel, mudamos a base do espacopara uma em que a matriz associada a uma transformacao dada fique mais facil de se fazer contas.

Definicao 15.1. Sejam U um espaco vetorial e seja T : U −→ U uma transformacao linear.Dizemos que λ ∈ R e um auto valor de T se existe u ∈ U , u 6= 0 tal que T (u) = λu. Neste caso,dizemos que u e um auto vetor de T associado a λ.

Exemplo 15.2. Considere R2 com as operacoes usuais. Seja T : R2 −→ R2 dada por T (a, b) :=(4b, 4a). Observe que 4 e um auto valor de T e (1, 1) e um auto vetor associado a 4 ja queT (1, 1) = 4(1, 1).

Proposicao 15.3. Sejam U um espaco vetorial, T : U −→ U uma transformacao linear. Sejaλ um auto valor de T . Dado u ∈ U , u 6= 0, temos que u e um auto vetor associado a λ se, esomente se, u ∈ Nuc(λId− T ).

47

Page 48: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Dem.: Seja u ∈ U , u 6= 0 tal que T (u) = λu. Temos

(λId− T )(u) = λId(u)− T (u)= λu− λu

= 0

Logo, u ∈ Nuc(λId− T ).Agora suponha que exista u 6= 0 tal que u ∈ Nuc(λId − T ). Entao 0 = (λId − T )(u) =

λu− T (u). Portanto, T (u) = λu.

Corolario 15.4. Sejam U um espaco vetorial e T : U −→ U uma transformacao linear. Entaoλ ∈ R e um auto valor de T se, e somente se, Nuc(λId− T ) 6= {0}.

Corolario 15.5. Sejam U um espaco vetorial e T : U −→ U uma transformacao linear. Sejaλ ∈ R um auto valor de T . Entao {0} ∪ {u ∈ U : u e auto valor associado a λ} e um subespacovetorial de U .

Notacao: Dados U um espaco vetorial finitamente gerado, B uma base para U e T : U −→ Uuma transformacao linear, denotamos por [T ]B a matriz [T ]BB.

Proposicao 15.6. Sejam U um espaco vetorial finitamente gerado e T : U −→ U uma trans-formacao linear. Seja B uma base para U . Seja λ ∈ R. Temos que λ e auto valor de T se, esomente se, λ e raiz de det[xId− T ]B.

Dem.: Ver [3] p. 135.

O proximo resultado mostra que a escolha da base B no resultado anterior nao influencia opolinomio.

Proposicao 15.7. Sejam U um espaco vetorial finitamente gerado e T : U −→ U uma trans-formacao linear. Sejam B e C bases para U . Entao det[xId− T ]B = det[xId− T ]C .

Dem.: Seja M := [Id]BC . Note que M−1 = [Id]CB. Observe que detMdetM−1 = 1 e que[T ]B = M−1[T ]CM . Seja I a matriz identidade dim U × dim U . Temos

det[xId− T ]B = det(xI − [T ]B)= det(xM−1IM −M−1[T ]CM)= det(M−1(xI − [T ]C)M)= det(M−1)det(xI − [T ]C)detM

= det(xI − [T ]C)= det[xId− T ]C

48

Page 49: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Definicao 15.8. Seja U um espaco vetorial finitamente gerado, T : U −→ U uma transformacaolinear e B uma base para U . Entao p(x) := det[xId − T ]B e dito o polinomio caracterısticode T .

Lema 15.9. Sejam V um espaco vetorial e T : V −→ V uma transformacao linear. Sejamλ1, ..., λn ∈ R auto valores de T distintos. Sejam v1, ..., vn auto vetores de associados a λ1, ..., λn

respectivamente. Entao {v1, ..., vn} e linearmente independente.

Dem.: Vamos mostrar o resultado por inducao sobre n. Caso n = 1, temos o resultado ja quetodo auto vetor e nao nulo. Suponha que temos o resultado para n e vamos mostrar para n + 1.Suponha que v1, ..., vn, vn+1 sejam linearmente dependentes. Entao existem i tal que 1 ≤ i ≤ n+1e α1, ..., αn+1 tais que

vi =n+1∑j = 1j 6= i

αjvj . (2)

Aplicando T dos dois lados da equacao e usando o fato que cada vj e auto vetor, obtemos:

λivi =n+1∑j = 1j 6= i

αjλjvj .

Temos dois casos. Primeiro, suponha que λi = 0. Entao, como {vj : j 6= i} e linearmenteindependente (pela hipotese de inducao), temos que cada αj = 0 para j 6= i (pois todo λj 6= 0para j 6= i, ja que todos os auto valores sao distintos). Substituindo tais valores em (2) temosque vi = 0, contradicao.

Agora vamos fazer o caso λi 6= 0. Temos que

vi =n+1∑j = 1j 6= i

αjλj

λivj .

Subtraindo esta equacao de (2) e novamente usando o fato de {vj : j 6= i} ser linearmenteindependente, obtemos que, para cada j 6= i, temos que αj = αj

λj

λi. Assim, cada λj = λi,

contradicao com o fato deles serem todos distintos.

Teorema 15.10. Sejam U um espaco vetorial finitamente gerado e T : U −→ U uma trans-formacao linear. Sejam λ1, ..., λn ∈ R auto valores distintos de T . Para cada i = 1, ..., n, seja Bi

conjunto linearmente independente formado por auto vetores associados a λi. Entao B1∪· · ·∪Bn

e linearmente independente.

49

Page 50: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Dem.: Para cada i = 1, .., n, sejam {b1i, ..., bmii} = Bi. Sejam α11, ..., αm11, ..., α1n, ..., αmnn ∈ Rtais que

m1∑i=1

αi1bi1 + · · ·+mn∑i=1

αinbin = 0.

Para cada i = 1, ..., n, seja vi :=∑mj

j=1 αjibji. Observe que vj e auto vetor associado a λi ouvi = 0 (por 15.5). Se vi = 0, temos que α1i = · · · = αmii = 0, ja que {b1i, ..., bmii} e linearmenteindependente. Assim, so precisamos cuidar do caso em que algum vi 6= 0. Seja u a soma de todosos vi tais que vi 6= 0. Observe que u = 0 (pois os que foram ignorados na conta ja eram 0). Comocada vi e auto vetor associado a um auto valor diferente, temos uma contradicao com o lema.

Definicao 15.11. Seja U um espaco vetorial finitamente gerado e T : U −→ U uma trans-formacao linear. Dizemos que T e diagonalizavel se existem λ1, ..., λn ∈ R auto valores distintosde T e B1, ..., Bn ⊂ U tais que cada Bi e um conjunto linearmente independente de auto vetoresassociados a λi e B1 ∪ · · · ∪Bn e uma base para U .

Exemplo 15.12. Seja T : R3 −→ R3 uma transformacao linear tal que

[T ]B :=

1 2 00 1 03 −4 2

onde B e uma base para R3. Vamos calcular o polinomio caracterıstico de T :

det[xId− T ]B = det

x− 1 −2 00 x− 1 0−3 4 x− 2

= (x− 1)2(x− 2)

Assim, os auto valores de T sao 1 e 2. Vamos procurar agora os auto vetores associados. Dadefinicao de auto vetor, temos que, se (a, b, c) e um auto vetor associado a 1, entao T (a, b, c) =1(a, b, c). Observe que o mesmo vale na base B (veja o exercıcio 15.1), assim, se (a, b, c) sao ascoordenadas de um auto vetor na base B, temos: 1 2 0

0 1 03 −4 2

abc

=

abc

De onde obtemos o seguinte sistema:

a + 2b = ab = b3a− 4b + 2c = c

50

Page 51: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

De onde obtemos que b = 0 e c = −3a. Assim, temos que os auto vetores associados a 1 saoda forma (a, 0,−3a). Note que (1, 0,−3) e um auto vetor associado a 1 e que nao e possıvelencontrar um segundo auto vetor associado a 1 e que seja linearmente independente com esse.

Agora procuremos os auto vetores associados a 2. Temos 1 2 00 1 03 −4 2

abc

=

2a2b2c

De onde obtemos o seguinte sistema:

a + 2b = 2ab = 2b3a− 4b + 2c = 2c

Assim, temos que os auto vetores associados a 2 sao da forma (0, 0, c). Assim, o vetor (0, 0, 1)e um auto vetor associado a 2. Observe que C = {(1, 0,−3), (0, 0, 1)} nao e uma base para R3

e nao e possıvel encontrar uma base para R3 formada apenas por auto vetores. Logo, T nao ediagonalizavel.

Exemplo 15.13. Considere T : R3 −→ R3 dada por T (a, b, c) := (a+ b− c, 2b, b− a+ c). Vamosverificar se T tem auto valores. Primeiramente, calculamos [T ]B onde B e a base canonica doR3. Temos

[T ]B =

1 1 −10 2 0−1 1 1

Agora calculamos o polinomio caracterıstico:

det[xId− T ]B = det

x− 1 −1 10 x− 2 01 −1 x− 1

= (x− 1)(x− 1)(x− 2)− (x− 2)= (x2 − 2x + 1)(x− 2)− (x− 2)= x3 − 2x2 − 2x2 + 4x + x− 2− x + 2= x3 − 4x2 + 4x

= (x2 − 4x + 4)x

Assim, as raizes do polinomio sao 0 e 2. Vamos calcular os auto vetores associado a 0: 1 1 −10 2 0−1 1 1

abc

=

000

51

Page 52: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Assim, obtemos o sistema: a + b− c = 02b = 0−a + b + c = 0

De onde concluimos que b = 0 e a = c. Logo, os auto vetores associados a 0 sao da forma (a, 0, a).Logo, {(1, 0, 1)} e um conjunto linearmente independente maximal de auto vetores associados a0.

Agora vamos calcular os auto vetores associados a 2. Temos 1 1 −10 2 0−1 1 1

abc

=

2a2b2c

Assim, obtemos o sistema:

a + b +−c = 2a2b = 2b−a + b + c = 2c

De onde obtemos que c = b − a. Logo, os auto vetores associados a 2 sao da forma (a, b, b − a).Assim, {(1, 0,−1), (0, 1, 1)} e um conjunto linearmente independente maximal de auto vetoresassociados a 2.

Com isso, temos que o conjunto C := {(1, 0, 1), (1, 0,−1), (0, 1, 1)} e uma base para R3 formadapor auto vetores de T . Logo, T e diagonalizavel. Temos tambem que

[T ]C =

0 0 00 2 00 0 2

Definicao 15.14. Sejam U um espaco vetorial finitamente gerado e T : U −→ U uma trans-formacao linear diagonalizavel. Chamamos de forma diagonal de T a matriz [T ]B onde B ={b1, ..., bn} e uma base para U formada por auto vetores de T . Observe que [T ]B e uma matrizdiagonal, isto e, se aij e uma entrada de [T ]B, onde i representa a linha e j a coluna, temos que

aij ={

0 se i 6= 0λi se i = j e λi e o auto valor associado a bi

15.1 Exercıcios

Exercıcio 15.1. Seja U um espaco vetorial finitamente gerado. Sejam B base para U e n :=dim U . Sejam u, v ∈ U e λ ∈ R. Sejam α1, ..., αn, β1, ..., βn ∈ R tais que [u]B = (α1, ..., αn)B e[v]B = (β1, ..., βn)B. Mostre que u = λv se, e somente se, αi = λvi para todo i = 1, ..., n.

52

Page 53: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Exercıcio 15.2. Sejam U um espaco vetorial e T : U −→ U uma transformacao linear. Suponhaque T nao e injetora. Mostre que T admite um auto valor.

Exercıcio 15.3. Seja T : R3 −→ R3 uma transformacao linear. Suponha que 1, 2 e 3 sejam autovalores para T . Suponha tambem que (1, 1, 0) e um auto vetor associado a 1, (0, 1, 1) e um autovetor associado a 2 e que (0, 0, 1) e um auto vetor associado a 3. Seja (a, b, c) ∈ R3. CalculeT (a, b, c).

Exercıcio 15.4. Seja B a base canonica de R2. Seja T : R2 −→ R2 uma transformacao linear.Seja M = [T ]B. Verifique, em cada caso, se T e diagonalizavel:

(a) M =(

1 22 1

)

(b) M =(

0 12 3

)

(c) M =(

0 00 0

)

Exercıcio 15.5. Seja U um espaco de dimensao n ∈ N. Seja T : U −→ U tal que o polinomiocaracterıstico tenha n raızes reais distintas. Mostre que U e diagonalizavel.

Exercıcio 15.6. Seja T : U −→ U um operador linear tal que [T ]B e sempre uma matriz diagonalpara toda base B. Mostre que existe λ ∈ R tal que T = λId.

Exercıcio 15.7. Sejam U um espaco vetorial de dimensao 2 e T : U −→ U um operador linearnao diagonalizavel que tem um unico autovalor λ ∈ R.

(a) Mostre que existe base B tal que

[T ]B =(

λ 0c λ

),

onde c 6= 0.

(b) Mostre que existe base C tal que

[T ]C =(

λ 01 λ

).

(Dica: Suponha a base do item anterior B = {u, v} e troque u por w = u−vc .)

53

Page 54: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

16 Funcionais lineares

Nesta secao vamos estudar um caso particular de transformacoes lineares, a saber, o caso em queo contra domınio e o conjuntos dos numeros reais.

Definicao 16.1. Seja V um espaco vetorial. Considere R com as operacoes usuais. Dizemos quef : V −→ R e um funcional linear se f e uma transformacao linear.

Definicao 16.2. Seja V um espaco vetorial. Chamamos de espaco dual de V o conjunto detodos os funcionais lineares de V . Denotamos tal espaco por V ∗.

Note que V ∗ = L(V, R) e, portanto, e um espaco vetorial com as operacoes usuais de funcoes.

Proposicao 16.3. Seja V um espaco vetorial finitamente gerado. Seja B := {b1, ..., bn} umabase para V . Sejam e1, ..., en ∈ V ∗ tais que

ei(bj) ={

1 se i = j0 se i 6= j

Entao B∗ := {e1, ..., en} e uma base para V ∗. B∗ e dita a base dual de B.

Dem.: Poderıamos aqui usar o que ja temos por 14.4, mas optamos por uma demonstracaodireta. Comecemos por mostrar que B∗ e linearmente independente. Sejam α1, ..., αn ∈ R taisque α1e1 + · · · + αnen = 0. Ou seja, para todo v ∈ V , temos que α1e1(v) + · · · + αnen(v) = 0.Substituindo v por bj com j = 1, ..., n, temos que αj = 0. Logo, α1 = · · · = αn = 0 e, portanto,temos que B∗ e linearmente independente.

Vamos agora mostrar que [B∗] = V ∗. Sejam f ∈ V ∗. Para cada i = 1, ..., n, seja αi ∈ R talque αi := f(bi). Vamos mostrar que f =

∑ni=1 αiei. Seja v ∈ V . Sejam β1, ..., βn ∈ R tais que

v = β1b1 + · · ·+ βnbn. Note que, assim, temos que ei(v) = ei(∑n

j=1 βjbj) =∑n

j=1 βjej(bj) = βi.Assim, temos:

f(v) = f(n∑

i=1

βibi)

= β1f(b1) + · · ·+ βnf(bn)= β1α1 + · · ·+ βnαn

= α1e1(v) + · · ·+ αnen(v)

Corolario 16.4. Seja V um espaco vetorial finitamente gerado. Entao V e isomorfo a V ∗.

54

Page 55: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Proposicao 16.5. Sejam V um espaco vetorial finitamente gerado e B uma base ordenadapara V . Considere B∗ = {e1, ..., en} a base dual de B. Dado v ∈ V temos que [v]B =(e1(v), ..., en(v))B.

Dem.: Seja {v1, ..., vn} = B. Sejam α1, ..., αn ∈ R tais que v =∑n

i=1 αivi. Temos que mostrarque, para cada i = 1, ..., n, vale αi = ei(v). Seja i tal que 1 ≤ i ≤ n. Temos

ei(v) = ei(n∑

j=1

αjvj)

=n∑

j=1

αjej(vj)

= αi

Proposicao 16.6. Sejam V um espaco vetorial finitamente gerado e B = {b1, ..., bn} base paraV . Seja B∗ = {e1, ..., en} a base dual de B. Seja f ∈ V ∗. Entao [f ]B∗ = (f(b1), ..., f(bn))B∗.

Dem.: Seja f ∈ V ∗. Sejam α1, ..., αn ∈ R tais que, para qualquer v ∈ V , temos que f(v) =α1e1(v) + · · ·αnen(v). Temos que mostrar que, para cada i = 1, ..., n, αi = f(bi). Seja i = 1.Temos

f(bi) = α1e1(bi) + · · ·αnen(bi)= αiei(bi)= αi

Proposicao 16.7. Sejam U e V espacos vetoriais. Seja B := {b1, ..., bn} uma base para Ve B∗ := {e1, ..., en} base dual para B. Seja T : U −→ V uma funcao. Temos que T e umatransformacao linear, se, e somente se, para cada i = 1, ..., n temos que ei ◦ T : U −→ R e umelemento de U∗.

Dem.: ⇒) Como cada ei e uma transformacao linear, temos que ei ◦ T e uma transformacaolinear e, portanto, elemento de U∗.

⇐) Vamos mostrar que T e uma transformacao linear. Observe que, dado u ∈ U temos queT (u) = e1(T (u))b1 + · · ·+ en(T (u))bn. Assim, sejam u, v ∈ U . Temos

T (u + v) = e1(T (u + v))b1 + · · · en(T (u + v))bn

= e1(T (u))b1 + · · · en(T (u))bn + e1(T (v))b1 + · · · en(T (v))bn

= T (u) + T (v)

55

Page 56: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Agora sejam u ∈ U e α ∈ R. Temos

T (αu) = e1(αu)b1 + · · ·+ en(αu)bn

= αe1(u)b1 + · · ·+ αen(u)bn

= α(e1(u)b1 + · · ·+ en(u)bn)= αT (u)

Definicao 16.8. Seja V um espaco vetorial. Seja H ⊂ V um subespaco vetorial tal que existev /∈ H tal que [H ∪ v] = V . Neste caso, dizemos que H e um hiperplano de V .

Exemplo 16.9. No R3, qualquer subespaco de dimensao 2 (ou seja, um plano) e um hiperplano.

Proposicao 16.10. Seja V um espaco de dimensao finita. Seja S ⊂ V um subespaco vetorial deV . Temos que S e um hiperplano de V se, e somente se, existe f ∈ V ∗ r {0} tal que S = Nucf .

Dem.: ⇒) Como S e hiperplano, existe v /∈ S tal que V = [{v} ∪ S]. Seja {b1, ..., bn} base paraS. Note v /∈ [b1, ..., bn] e, portanto, {v, b1, ..., bn} e linearmente independente. Note tambemque V = [{v} ∪ S] = [v, b1, ..., bn]. Assim, {v, b1, ..., bn} e base para V . Defina f : V −→ Rtal que, f(v) = 1 e f(bi) = 0 para todo i = 1, ..., n. Vamos verificar que Nucf = S. Sejau ∈ Nucf . Sejam α0, ..., αn ∈ R tais que u = α0v + α1b1 + · · · + αnbn. Aplicando T emambos os lados, temos que 0 = α0. Logo, u ∈ [b1, ..., bn] = S. Assim, temos que Nucf ⊂ S.

Por outro lado, temos que, dado u ∈ S, existem α1, ..., αn ∈ R tais que u = α1b1+· · ·+αnbn.Aplicando f em ambos os lados, obtemos que f(u) = α1f(b1) + · · · + αnf(bn) = 0. Logo,S ⊂ Nucf .

⇐) Seja f ∈ V ∗ r {0}. Precisamos mostrar que Nucf e um hiperplano. Como f 6= 0, temosque dim Imf = 1 e, portanto, dim Nucf = dim V − 1. Seja v ∈ V r Nucf . Assim,dim[Nucf ∪ {v}] = dim V e, portanto, [Nucf ∪ {v}] = V .

Ja vimos que, em espacos de dimensao finita, dada uma base, podemos encontrar uma basepara o espaco dual. Vamos terminar esta secao mostrando que o caminho inverso tambem podeser feito. Mais que isso, vamos mostrar que ao se tomar a base dual para a base encontrada,recuperamos a base original.

Proposicao 16.11. Seja V espaco vetorial. Seja v ∈ V . Temos que gv : V ∗ −→ R dada porgv(f) = f(v) e um elemento de (V ∗)∗.

56

Page 57: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Dem.: Observe que, de fato, gv tem domınio V ∗ e contra domınio R. Resta verificarmos se gv elinear. Sejam f, h ∈ V ∗. Temos que mostrar que gv(f + h) = gv(f) + gv(h).

gv(f + h) = (f + h)(v)= f(v) + h(v)= gv(f) + gv(h)

A demonstracao de que, dado α ∈ R temos que αgv(f) = gv(αf) para qualquer f ∈ V ∗ fica comoexercıcio.

Proposicao 16.12. Seja V espaco vetorial de dimensao finita. Seja B = {f1, ..., fn} base paraV ∗. Entao existe A ⊂ V base para V tal que A∗ = B.

Dem.: Defina T : V −→ (V ∗)∗ tal que, dado v ∈ V temos que T (v) = gv (onde gv e a funcaodefinida no resultado anterior). Observe que, de fato, T e uma funcao com domınio V e contradomınio (V ∗)∗. Vamos mostrar que T e um isomorfismo. Comecamos mostrando que ela e linear.Sejam α ∈ R, f ∈ V ∗ e u, w ∈ V . Temos

(T (u + w))(f) = gu+w(f)= f(u + w)= f(u) + f(w)= gu(f) + gw(f)= (T (u))(f) + (T (w))(f)

(T (αu))(f) = gαu(f)= f(αu)= αf(u)= (αT (u))(f)

Vamos agora mostrar que ela e bijetora. Como temos que dim V = dim V ∗ = dim(V ∗)∗, bastamostrar que T e injetora. Para isso, basta notar que gv(f) = 0 para toda f ∈ V ∗ implica quev = 0 (exercıcio).

Vamos agora mostrar o resultado. Seja B∗ = {w1, ..., wn} base dual de B (ou seja, e umabase para (V ∗)∗. Seja A = {b1, ..., bn} onde, para cada i = 1, ..., n temos que bi = T−1(wi).Podemos fazer isso ja que T e um isomorfismo. Como T−1 e injetora, temos que A e linearmenteindependente e, portanto, base para V . Vamos mostrar que A∗ = B. Sejam i, j = 1, ..., n. Temos:

fi(aj) = gaj (fi)= (T (aj))(fi)= wj(fi)

Assim, temos que

fi(aj) ={

1 se i = j0 caso contrario

57

Page 58: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

16.1 Exercıcios

Exercıcio 16.1. Mostre que todo funcional linear nao nulo e sobrejetor (mesmo para espacos dedimensao infinita).

Exercıcio 16.2. Seja V um espaco vetorial finitamente gerado. Seja v ∈ V tal que f(v) = 0para todo f ∈ V ∗. Mostre que v = 0.

Exercıcio 16.3. Seja B = {b1, b2, b3} onde b1 := (2, 2, 0), b2 := (0, 3, 3) e b3 := (0,−1, 0) basepara R3. Seja B∗ = {e1, e2, e3} base dual de B. Seja (a, b, c) ∈ R3. Calcule e1(a, b, c), e2(a, b, c)e e3(a, b, c).

Exercıcio 16.4. Considere R com as operacoes usuais. Mostre que toda transformacao linearT : R −→ R e da forma T (x) = rx onde r ∈ R.

Exercıcio 16.5. Considere A := {e1, e2} ⊂ (R2)∗ onde e1(a, b) := 2a + b e e2(a, b) := a− 3b.

(a) Mostre que A e base para (R2)∗.

(b) Determine B base para R2 tal que B∗ = A.

17 Produto interno e norma

Comecamos definindo uma nova operacao no espaco vetorial.

Definicao 17.1. Seja V um espaco vetorial. Um produto interno sobre V e uma funcao〈·, ·〉 : V × V −→ R que satisfaz as seguintes condicoes, dados u, v, w ∈ V e λ ∈ R:

(a) 〈u + v, w〉 = 〈u, w〉+ 〈v, w〉

(b) 〈λu, v〉 = λ〈u, v〉

(c) 〈u, v〉 = 〈v, u〉

(d) 〈u, u〉 > 0 se u 6= 0

Proposicao 17.2. Sejam V um espaco vetorial e 〈·, ·〉 : V × V −→ R um produto interno sobreV . Temos que valem as seguinte propriedades, dados u, v, w ∈ V e λ ∈ R:

58

Page 59: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

(i) 〈0, v〉 = 0

(ii) 〈v, v〉 = 0 se, e somente se, v = 0

(iii) 〈u, λv〉 = λ〈u, v〉

(iv) 〈u, v + w〉 = 〈u, v〉+ 〈u, w〉

Dem.: (i) 〈0, v〉 = 〈0v, v〉 = 0〈v, v〉 = 0.

(ii) Suponha que 〈v, v〉 = 0. Pela propriedade (d) da definicao de produto interno, temos quev = 0. Por outro lado, temos que, se v = 0, entao 〈v, v〉 = 〈0, 0〉 = 0.

(iii) 〈u, λv〉 = 〈λv, u〉 = λ〈v, u〉 = λ〈u, v〉.

(iv) 〈u, v + w〉 = 〈v + w, u〉 = 〈v, u〉+ 〈w, u〉 = 〈u, v〉+ 〈u, w〉.

Exemplo 17.3. Considere Rn com as operacoes usuais. Sejam a := (a1, ..., an), b := (b1, ..., bn) ∈Rn. Definimos

〈a, b〉 :=n∑

i=1

aibi

Vamos mostrar que 〈·, ·〉 assim definido e de fato um produto interno. Sejam a := (a1, ..., an), b :=(b1, ..., bn), c := (c1, ..., cn) ∈ Rn e λ ∈ R. Temos

(a) 〈a + b, c〉 =∑n

i=1(ai + bi)ci =∑n

i=1 aici +∑n

i=1 bici = 〈a, c〉+ 〈b, c〉.

(b) 〈λa, b〉 =∑n

i=1(λai)bi = λ∑n

i=1 aibi = λ〈a, b〉.

(c) 〈a, b〉 =∑n

i=1 aibi =∑n

i=1 biai = 〈b, a〉.

(d) Suponha a 6= 0. Entao, existe j tal que aj 6= 0. Temos

〈a, a〉 =n∑

i=1

a2i

≥ a2j

> 0

Este e o produto interno usual sobre Rn.

Proposicao 17.4. Sejam U e V espacos vetoriais. Sejam 〈·, ·〉 um produto interno sobre V eT : U −→ V uma transformacao linear injetora. Entao 〈·, ·〉T : U × U −→ R dada por

〈a, b〉T := 〈T (a), T (b)〉

para a, b ∈ U e um produto interno sobre U .

Dem.: Sejam a, b, c ∈ U e λ ∈ R. Temos

59

Page 60: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

(a) 〈a + b, c〉T = 〈T (a + b), T (c)〉 = 〈T (a) + T (b), T (c)〉 = 〈T (a), T (c)〉+ 〈T (b), T (c)〉 = 〈a, c〉T +〈b, c〉T .

(b) 〈λa, b〉T = 〈T (λa), T (b)〉 = 〈λT (a), T (b)〉 = λ〈T (a), T (b)〉 = λ〈a, b〉T .

(c) 〈a, b〉T = 〈T (a), T (b)〉 = 〈T (b), T (a)〉 = 〈b, a〉T .

(d) Suponha a 6= 0. Temos que T (a) 6= 0, pois T e injetora. Logo, 〈T (a), T (a)〉 > 0. Assim〈a, a〉T = 〈T (a), T (a)〉 > 0.

Proposicao 17.5. Sejam V um espaco vetorial e 〈·, ·〉 um produto interno sobre V . Dadosu, v ∈ V , temos que vale a seguinte desigualdade:

〈u, v〉2 ≤ 〈u, u〉〈v, v〉

Dem.: Sejam u, v ∈ V . Sejam α, β ∈ R. Se v = 0, temos o resultado. Agora suponha que v 6= 0.Temos:

〈αu− βv, αu− βv〉 = 〈αu, αu− βv〉 − 〈βv, αu− βv〉= 〈αu, αu〉 − 〈αu, βv〉 − 〈βv, αu〉+ 〈βv, βv〉= α2〈u, u〉 − 2αβ〈u, v〉+ β2〈v, v〉

Fazendo α := 〈v, v〉 e β := 〈u, v〉 temos:

0 ≤ 〈αu− βv, αu− βv〉= 〈v, v〉2〈u, u〉 − 2〈v, v〉〈u, v〉〈u, v〉+ 〈u, v〉2〈v, v〉= 〈v, v〉2〈u, u〉 − 〈v, v〉〈u, v〉2

= 〈v, v〉(〈v, v〉〈u, u〉 − 〈u, v〉2)

Como 〈v, v〉 > 0, temos que 〈v, v〉〈u, u〉 − 〈u, v〉2 ≥ 0. Isto e, temos 〈u, v〉2 ≤ 〈v, v〉〈u, u〉.

Definicao 17.6. Seja V um espaco vetorial. Dizemos que ||·|| : V −→ R e uma norma sobre Vse, dados u, v ∈ V e α ∈ R sao satisfeitas as seguintes condicoes:

(a) ||v|| ≥ 0.

(b) Se ||v|| = 0, entao v = 0.

(c) ||αv|| = |α|||v||.

(d) ||u + v|| ≤ ||u||+ ||v||.

60

Page 61: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Exemplo 17.7. Considere em R2 a seguinte norma:

||(a, b)|| := |a|+ |b|

Vejamos que ela, de fato, e uma norma. Sejam (a, b), (c, d) ∈ R2 e λ ∈ R.

(a) ||(a, b)|| = |a|+ |b| ≥ 0.

(b) Suponha ||(a, b)|| = 0. Entao |a|+ |b| = 0 e, portanto, a = b = 0.

(c) ||λ(a, b)|| = ||(λa, λb)|| = |λa|+ |λb| = |λ||a|+ |λ||b| = |λ|(|a|+ |b|) = |λ|||(a, b)||.

(d) ||(a, b) + (c, d)|| = ||(a + c, b + d)|| = |a + c|+ |b + d| ≤ |a|+ |b|+ |c|+ |d| = ||(a, b)||+ ||(c, d)||.

Teorema 17.8. Sejam V um espaco vetorial e 〈·, ·〉 um produto interno sobre V . Entao ||·|| :V −→ R dado por

||v|| :=√〈v, v〉

para v ∈ V e uma norma sobre V . Chamamos ||·|| de norma induzida por 〈·, ·〉.

Dem.: Sejam u, v ∈ V e λ ∈ R. Temos

(a) ||v|| =√〈v, v〉 ≥ 0.

(b) Suponha que ||v|| = 0. Entao 〈v, v〉 = 0. Logo, v = 0.

(c) ||λv|| =√〈λv, λv〉 =

√λ2〈v, v〉 = |λ|

√〈v, v〉 = |λ|||v||.

(d) ||u + v||2 = 〈u + v, u + v〉 = 〈u, u〉 + 2〈u, v〉 + 〈v, v〉17.5≤ 〈u, u〉 + 2

√〈u, u〉〈v, v〉 + 〈v, v〉 =

||u||2 + 2||u||||v||+ ||v||2 = (||u||+ ||v||)2.

Exemplo 17.9. Considere 〈(a, b), (c, d)〉 := ac + bd o produto interno usual em R2. Temos quea norma induzida por tal produto interno e

||(a, b)|| :=√〈(a, b), (a, b)〉 =

√a2 + b2

61

Page 62: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

17.1 Exercıcios

Exercıcio 17.1. Considere R3 com as operacoes usuais. Verifique se 〈·, ·〉 e um produto interno,justificando suas respostas, onde, dados (a, b, c), (d, e, f) ∈ R3:

(a) 〈(a, b, c), (d, e, f)〉 := |a|+ 2|b|+ 10|c|

(b) 〈(a, b, c), (d, e, f)〉 := a + b + c

(c) 〈(a, b, c), (d, e, f)〉 := |a|

(d) 〈(a, b, c), (d, e, f)〉 := |a| − |b|+ |c|

Exercıcio 17.2. Seja V um espaco vetorial com um produto interno 〈·, ·〉.

(a) Mostre que 〈0, v〉 = 0 para qualquer v ∈ V .

(b) Mostre que se u ∈ V e tal que 〈u, v〉 = 0 para qualquer v ∈ V , entao u = 0.

Exercıcio 17.3. Seja V um espaco vetorial com produto interno 〈·, ·〉 e com ||·|| a norma induzida.Mostre que, dados u, v ∈ V , temos

〈u, v〉 =14||u + v||2 − 1

4||u− v||2

Exercıcio 17.4. Seja V um espaco vetorial de dimensao finita. Mostre que V admite uma normainduzida por um produto interno.

18 Ortogonalizacao e funcionais lineares versus produto interno

Definicao 18.1. Sejam V um espaco vetorial e 〈·, ·〉 um produto interno sobre V . Dizemos queu, v ∈ V sao ortogonais se 〈u, v〉 = 0. Notacao u⊥v.

Proposicao 18.2. Sejam V um espaco vetorial e seja 〈·, ·〉 um produto interno sobre V . SejaA ⊂ V tal que 0 /∈ A e, dados u, v ∈ A distintos, temos que u e v sao ortogonais. Entao A elinearmente independente.

62

Page 63: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Dem.: Suponha que nao vale o resultado. Entao existem v, v1, ..., vn ∈ A e α1, ..., αn ∈ R taisque v =

∑ni=1 αivi = 0 e v 6= vi para i = 1, ..., n. Considere ||·|| a norma induzida pelo produto

interno. Temos

||v||2 = 〈v, v〉

= 〈v,n∑

i=1

αivi〉

=n∑

i=1

〈v, αivi〉

=n∑

i=1

αi〈v, vi〉

= 0

Mas, como v 6= 0, temos que ||v|| 6= 0, contradicao.

Proposicao 18.3 (Processo de ortogonalizacao de Gram-Schimdt). Seja V um espacovetorial com um produto interno 〈·, ·〉 e seja A := {a1, ..., an} um conjunto linearmente indepen-dente. Entao B := {b1, ..., bn} onde

b1 := a1

bk+1 := ak+1 −〈ak+1, b1〉||b1||2

b1 − · · · − 〈ak+1, bk〉||bk||2

bk

para k = 1, ..., n−1, e tal que bk e bj sao ortogonais se i 6= j, bk 6= 0 para k = 1, ..., n e [B] = [A].

Dem.: Vamos mostrar o resultado por inducao sobre n. Caso n = 1, nada ha para mostrar.Agora suponha que ja temos os resultado para n e vamos mostrar para n+1. Como [b1, ..., bn] =[a1, ..., an] e {a1, ..., an+1} e linearmente independente, temos que an+1 /∈ [b1, ..., bn]. Assim,bn+1 = an+1 −

∑ni=1

〈an+1,bi〉||bi||2

bi e diferente de 0. Vamos agora mostrar que bn+1 e ortogonal a bi

para todo i = 1, ..., n.

〈bn+1, bi〉 = 〈an+1 −n∑

j=1

〈an+1, bj〉||bj ||2

bj , bi〉

= 〈an+1, bi〉 −n∑

j=1

〈an+1, bj〉||bj ||2

〈bj , bi〉

= 〈an+1, bi〉 −〈an+1, bi〉||bi||2

〈bi, bi〉

= 0

Assim, pela hipotese de inducao, temos que bi e bj sao ortogonais para todo i, j = 1, ..., n+1 comi 6= j. E, como cada bi 6= 0, temos que {b1, ..., bn+1} e linearmente independente. Observe que[B] ⊂ [A]. Como dim B = dim A, temos que [A] = [B].

63

Page 64: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Definicao 18.4. Seja V um espaco vetorial de dimensao finita n ≥ 1. Dizemos que B :={b1, ..., bn} e uma base ortonormal se seus elementos sao ortogonais entre si e, dado bi ∈ Btemos ||b|| = 1.

Corolario 18.5. Seja V um espaco vetorial de dimensao finita n ≥ 1 com um produto interno〈·, ·〉. Entao V tem uma base ortonormal.

Dem.: Seja B = {b1, ..., bb} uma base para V . Por 18.3, existe C = {c1, ..., cn} tal que [C] = [B]e os elementos de C sao ortogonais entre si. Considere D := {d1, ..., dn} onde, dado i = 1, ..., ntemos:

di :=1||ci||

ci

Sejam i e j distintos. Temos que 〈di, dj〉 = 〈 1||ci||ci,

1||cj ||cj〉 = 1

||ci||||cj ||〈ci, cj〉 = 0. Seja i = 1, ..., n.

Temos ||di|| =√〈ci, ci〉 =

√〈 1||ci||ci,

1||ci||ci〉 = 1

||ci|| ||ci|| = 1. Assim, temos que C e um conjunto for-mado por n elementos ortogonais entre si e todos nao nulos. Assim, C e linearmente independentee, portanto, e base para V .

Proposicao 18.6. Seja V um espaco vetorial de dimensao finita n ≥ 1 com um produto interno〈·, ·〉. Seja B : {b1, ..., bn} uma base ortonormal para V . Sejam u, v ∈ V . Entao 〈u, v〉 =∑n

i=1 αiβi, onde [u]B = (α1, ..., αn)B e [v]B = (β1, ..., βn)B.

Dem.: Sejam u, v ∈ V . Sejam α1, ..., αn, β1, ..., βn ∈ R tais que [u]B = (α1, ..., αn)B e [v]B =(β1, ..., βn)B. Temos

〈u, v〉 = 〈n∑

i=1

αibi,n∑

i=1

βibi〉

=n∑

i=1

αi〈bi,n∑

j=1

βjbj〉

=n∑

i=1

αiβi

Proposicao 18.7. Seja V um espaco vetorial com um produto interno 〈·, ·〉. Seja v ∈ V . Entaof : V −→ R dada por

f(u) := 〈u, v〉

para u ∈ V e um funcional linear.

64

Page 65: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Dem.: Seja a, b ∈ V e λ ∈ R. Temos

f(a + b) = 〈a + b, v〉= 〈a, v〉+ 〈b, v〉= f(a) + f(b)

f(λa) = 〈λa, v〉= λ〈a, v〉= λf(a)

Teorema 18.8. Seja V um espaco vetorial de dimensao finita n ≥ 1. Seja f ∈ V ∗. Entao existev ∈ V tal que, para todo u ∈ V , f(u) = 〈u, v〉.

Dem.: Seja B = {b1, ..., bn} uma base ortonormal para V . Seja v :=∑n

i=1 f(bi)bi. Vamosmostrar que v satisfaz o enunciado. Para isso, vamos mostrar que g(bi) = f(bi) para todoi = 1, ..., n onde g(u) := 〈u, v〉 para u ∈ V . Note que isso e suficiente pois B e base. Seja bi ∈ B.

g(bi) = 〈bi, v〉

= 〈bi,

n∑j=1

f(bj)bj〉

= f(bi)

18.1 Exercıcios

Exercıcio 18.1. Seja V um espaco vetorial. Seja v ∈ V . Mostre que S := {u ∈ V : u e ortogonala v} e um subespaco de V .

Exercıcio 18.2. Mostre que a base canonica do R3, com relacao ao produto interno usual, euma base ortonormal.

Exercıcio 18.3. Seja V um espaco vetorial e A = {a1, ..., an} um conjunto cujos elementos saoortogonais entre si. Seja λ ∈ R, com λ 6= 0. Mostre que B := {λa1, ..., λan} tambem e umconjunto cujos elementos sao ortogonais entre si.

65

Page 66: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Exercıcio 18.4. Considere R3 com as operacoes usuais. Seja f : R3 −→ R um funcional lineartal que f(a, b, c) := a + 2b− 3c para a, b, c ∈ R. Encontre v ∈ R3 tal que f(u) = 〈u, v〉 onde 〈·, ·〉e o produto interno usual de R3.

19 Somas diretas e espacos ortogonais

Comecamos esta secao definindo uma forma de se obter um subespaco vetorial a partir de outrosdados.

Definicao 19.1. Sejam V um espaco vetorial e S, W ⊂ V subespacos vetoriais. Definimos S + W:= {v ∈ V : ∃s ∈ S e w ∈ W v = s + w} a soma de S e W .

Vejamos que, de fato, S + W define um subespaco vetorial.

Proposicao 19.2. Sejam V um espaco vetorial e S, W ⊂ V subespacos vetoriais. Entao S + We um subespaco de V .

Dem.: Primeiramente, observe que 0 ∈ S + W ja que 0 = 0 + 0 e 0 ∈ S, W . Agora sejama, b ∈ S + W e vamos mostrar que a + b ∈ S + W . Sejam s1, s2 ∈ S e w1, w2 ∈ W tais quea = s1 + w1 e b = s2 + w2. Temos

a + b = (s1 + w1) + (s2 + w2)= (s1 + s2) + (w1 + w2)

Como s1 + s2 ∈ S e w1 + w2 ∈ W , temos o que desejamos. A demonstracao de que αa ∈ S + Wpara qualquer α ∈ R fica como exercıcio.

Vejamos agora um caso especıfico de soma de subespacos vetoriais.

Definicao 19.3. Sejam V espaco vetorial e S, W ⊂ V subespacos vetoriais. Se S ∩ W = {0}denotamos o espaco S + W por S ⊕W . Este espaco e chamado de soma direta de S e W .

Uma vantagem da soma direta e o seguinte resultado:

Proposicao 19.4. Sejam V espaco vetorial e S, W ⊂ V subespacos vetoriais tais que S ∩W ={0}. Sejam v ∈ S ⊕W , s1, s2 ∈ S e w1, w2 ∈ W tais que v = s1 + w1 = s2 + w2. Entao s1 = s2

e w1 = w2 (ou seja, a escrita e unica).

66

Page 67: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Dem.: Sejam v ∈ S ⊕W , s1, s2 ∈ S e w1, w2 ∈ W tais que v = s1 + w1 = s2 + w2. Temos

s1 − s2 = s1 − s2 + v − v= s1 − s2 + s2 + w2 − s1 − w1

= w2 − w1

Observe que temos que s1 − s2 ∈ S. E, como s1 − s2 = w2 − w1 ∈ W , temos que s1 − s2 ∈S ∩W = {0}. Assim, s1 = s2. Para provar que w1 = w2 e analogo (exercıcio).

Proposicao 19.5. Seja V espaco vetorial de dimensao finita. Suponha que V = S ⊕W . Entaodim V = dim S + dim W .

Dem.: Sejam {s1, ..., sn} base para S e {w1, ..., wm} base para W . Vamos provar que {s1, ..., sn,w1, ..., wm} e base para S ⊕W = V . Note que isso mostra o resultado.

Seja v ∈ V . Temos que existem s ∈ S e w ∈ W tais que v = s + w. Assim, existemα1, ..., αn, β1, ..., βm ∈ R tais que s =

∑ni=1 αisi e w =

∑mi=1 βiw1. Assim, temos que v =∑n

i=1 αi +∑m

i=1 βiw1 e, portanto, {s1, ..., sn, w1, ..., wm} gera V . Resta mostrar que e linearmenteindependente. Suponha que nao, entao existe algum elemento em {s1, ..., sn, w1, ..., wm} que podeser escrito como combinacao linear dos outros. Vamos supor que seja um dos si’s (o outro casoe analogo). Assim, temos que si = s + w, onde s ∈ [{s1, ..., sn} r {si}] e w ∈ [w1, ..., wm]. Poroutro lado, sabemos que si = si + 0, onde si ∈ S e 0 ∈ W . Assim, pelo resultado anterior, s = si

e w = 0. Ou seja, temos que si ∈ [{s1, ..., sn} r {si}], contradicao com o fato de {s1, ..., sn} serbase.

Vamos agora a definicao do espaco ortogonal.

Definicao 19.6. Seja V um espaco vetorial com um produto interno. Seja S subespaco de V .Denotamos por S⊥ o espaco ortogonal a S, isto e, o conjunto {v ∈ V : ∀s ∈ S v⊥s}.

Vejamos que, de fato, o espaco ortogonal e um espaco vetorial:

Proposicao 19.7. Seja V um espaco vetorial com um produto interno. Seja S subespaco de V .Entao S⊥ e um subespaco de V .

Dem.: Note que 0 ∈ S⊥. Sejam a, b ∈ S⊥. Vamos mostrar que a+ b ∈ S⊥. Para isso, seja s ∈ S.Precisamos mostrar que (a + b)⊥s. De fato, temos 〈a + b, s〉 = 〈a, s〉 + 〈b, s〉 = 0 + 0 = 0. Sejaa ∈ S⊥ e α ∈ R. Temos que αa ∈ S⊥ pois, dado s ∈ S temos 〈αa, s〉 = α〈a, s〉 = α0 = 0.

Proposicao 19.8. Seja V espaco vetorial com produto interno. Seja S subespaco de V . Entaovalem as seguintes propriedades:

(i) S ⊂ (S⊥)⊥;

67

Page 68: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

(ii) S ∩ S⊥ = {0}.

Dem.: (i) Seja s ∈ S. Temos que, dado a ∈ S⊥, a⊥s. Assim, s ∈ (S⊥)⊥.

(ii) Seja v ∈ S ∩ S⊥. Como v ∈ S⊥, temos que 〈v, s〉 = 0 para todo s ∈ S. Em particular,〈v, v〉 = 0 e, portanto, v = 0.

Proposicao 19.9. Seja V espaco vetorial de dimensao finita com produto interno. Seja Ssubespaco de V . Temos que V = S ⊕ S⊥.

Dem.: Temos que S ∩S⊥ = {0} pelo resultado anterior. Resta mostrar que, dado v ∈ V exitems ∈ S e t ∈ S⊥ tais que v = s + t. Seja B1 base para S e B2 conjunto linearmente independentetal que B1 ∪ B2 seja uma base para V . Por 18.3, existe C = C1 ∪ C2 base ortogonal para Vtal que C1 e base para S. Assim, temos que, dado v ∈ V , existem s ∈ [C1] e t ∈ [C2] tais quev = s + t. Note que s ∈ S, ja que C1 e base para S. Resta mostrar que t ∈ S⊥. O exercıcio 19.4diz que t e ortogonal a qualquer elemento de [C1] = S, logo t ∈ S⊥.

Corolario 19.10. Seja V espaco vetorial de dimensao finita e com produto interno. Seja S ⊂ V .Entao temos que (S⊥)⊥ = S.

Dem.: Ja temos que S ⊂ (S⊥)⊥. Resta mostrar a outra inclusao. Seja v ∈ (S⊥)⊥. Pelo resultadoanterior, temos que existem s ∈ S e t ∈ S⊥ tais que v = s + t. Se mostrarmos que t = 0, teremoso resultado. Para isso, vamos mostrar que 〈t, t〉 = 0. Como s ∈ S e t ∈ S⊥, temos que 〈t, s〉 = 0.E, como t ∈ St e v ∈ (S⊥)t, temos que 〈t, v〉 = 0. Assim

〈t, t〉 = 〈t, v − s〉= 〈t, v〉 − 〈t, s〉= 0 + 0= 0

19.1 Exercıcios

Exercıcio 19.1. Mostre que a condicao de que S∩W = {0} em 19.4 e necessaria. Isto e, de umexemplo de um espaco V , S, W ⊂ V subespacos e v ∈ V que possa ser escrito de duas maneirasdistintas na forma v = s + w com s ∈ S e w ∈ W .

Exercıcio 19.2. Sejam V um espaco vetorial e S, W ⊂ V subespacos vetoriais. Mostre queS + W = [S ∪W ].

68

Page 69: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Exercıcio 19.3. Use o exercıcio anterior e o exercıcio 7.8 para mostra que, dados V espacovetorial de dimensao finita e S, W ⊂ V temos que dim(S + W ) = dim S + dim W − dim(S ∩W ).Use este resultado para dar outra demonstracao do caso particular de 19.5.

Exercıcio 19.4. Seja V espaco vetorial com produto interno. Sejam A,B ⊂ V tais que, paraquaisquer a ∈ A e b ∈ B temos que a⊥b. Entao, dado v ∈ [B] temos que v⊥w para qualquerw ∈ [A].

Exercıcio 19.5. Seja V um espaco vetorial de dimensao finita e com produto interno. SejaS ⊂ V subespaco vetorial. Considere T : V −→ S e F : V −→ S⊥ dadas por T (v) = s e F (v) = tpara v = s + t onde s ∈ S e t ∈ S⊥.

(a) Mostre que T e F sao transformacoes lineares.

(b) Calcule NucT e NucF .

(c) Calcule ImT e ImF .

69

Page 70: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

20 Grafos

Nesta secao vamos fazer uma aplicacao de algebra linear a teoria dos grafos. Um grafo, informal-mente falando, e uma colecao de pontos que podem, ou nao, ser ligados por arestas. E comumtais arestas terem uma direcao, isto e, a aresta que sai de um ponto A e chega num ponto B ediferente da aresta que sai do ponto B e chega no ponto A. Vejamos uma maneira mais formalde se definir um grafo.

Definicao 20.1. Dizemos que G e um grafo se G = (P,A) onde P e um conjunto de pontos e Ae um conjunto de funcoes que chamaremos de arestas. As arestas sao da forma a : {i, f} −→ Gonde a(i) e o ponto de inıcio da aresta e a(f) e o ponto final da aresta.

Definicao 20.2. Seja G = (P,A) um grafo. Dizemos que C = {a1, ..., an} ⊂ A e um caminho deg1 para g2 em G se a1(i) = g1, an(f) = g2 e, para todo j = 1, ..., n−1 temos que aj(f) = aj+1(i).Neste caso, dizemos que {a1, ..., an} e um caminho de tamanho n. Dizemos que G e conexose, para dados g, h ∈ G, existe um caminho de g para h.

Definicao 20.3. Seja G = (P,A) um grafo finito (isto e, tanto P como A sao finitos). Fixamos{p1, ..., pn} uma ordem para P . Chamamos de matriz de conectividade de G a matriz M ∈Mn×n onde cada elemento mjk da matriz e dado por

mjk = |{a ∈ A : a(i) = pj e a(f) = pk}|

Ou seja, na linha j pela coluna k fica o numero de arestas que saem de pj e chegam em pk.

Proposicao 20.4. A quantidade de caminhos de tamanho r entre os elemento pj e pk num grafoG({p1, ..., pn}, A) e o elemento da linha j na coluna k da matriz M r onde M e a matriz deconectividade de G.

Dem.: Por inducao sobre r. Caso r = 1, segue diretamente da definicao de matriz de conectivi-dade. Agora suponha que ja temos o caso r e vamos provar o caso r + 1. Sejam (ust)s,t=1,...,n e(vst)s,t=1,...,n as matrizes M r e M respectivamente. Observe que o elemento na linha j da colunada k de M r+1 e dado por

n∑s=1

ujsvsk

Pela hipotese se inducao, ujs representa quantos caminhos de tamanho r existem ligando pj eps. E note que vsk representa quantas arestas existem ligando ps e pk. Temos que vsk = 0 se,e somente se nao existe uma aresta ligando ps e pk. Assim, ujsvsk representa quantos caminhosexistem de tamanho r saindo de pj e chegando em ps e que podem ser extendidos (com maisuma aresta so) para pk. Como somamos o resultado para todos os ps possıveis, temos o quedesejamos.

70

Page 71: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Corolario 20.5. Seja G um grafo com n pontos. Entao G e conexo se, e somente se, M +M2 +· · ·+ Mn−1, onde M e a matriz de incidencia de G, tem todos os seus elementos nao nulos.

Dem.: Se todos os elementos de tal matriz sao nao nulos, e claro que o grafo e conexo. Por outrolado, se G e conexo, dados dois pontos seus, existe um caminho que os une com no maximo n− 1pontos (pois, se o caminho tiver mais pontos que isso, ele passa duas vezes por um mesmo ponto,podendo assim ser encurtado). Assim, o elemento da matriz correspondente a esse caminho enao nulo.

21 Continuidade

Definicao 21.1. Sejam U e V espacos vetoriais normados. Sejam f : U −→ V uma funcao eu ∈ U . Dizemos que f e contınua no ponto u se dado ε > 0 existe δ > 0 tal que para qualquera ∈ U tal que ||u−a|| < δ temos que ||f(u)−f(a)|| < ε. Dizemos simplesmente que f e contınuase f e contınua em todo ponto u ∈ U .

Note que essa definicao coincide com a usual para funcoes de R em R (quando tomamos emR a norma usual).

Proposicao 21.2. Sejam U e V espacos vetoriais normados. Seja T : U −→ V uma trans-formacao linear. As seguintes afirmacoes sao equivalentes:

(i) T e contınua no 0.

(ii) Existe M > 0 tal que, para qualquer u ∈ U , ||T (u)|| ≤ M ||u||.

(iii) T e contınua.

Dem.: (i) ⇒ (ii): Seja ε > 0. Seja δ > 0 tal que, se ||0− v|| = ||v|| < δ, entao ||T (0)− T (v)|| =||T (v)|| < ε. Seja M := 2ε

δ . Seja u ∈ U . Se u = 0, temos o resultado. Assim, suponhau 6= 0. Observe que || δ

2||u||u|| < δ. Assim, temos

||T (u)|| = ||T (2||u||δ

δ2||u||u)||

= 2||u||δ ||T ( δ

2||u||u)||< 2||u||

δ ε= M ||u||

(ii) ⇒ (iii): Seja u ∈ U . Vamos mostrar que T e contınua em u. Seja ε > 0. Seja M como noitem anterior. Considere δ = ε

M . Seja a ∈ U tal que ||u− a|| < δ. Note que podemos supora 6= u. Temos:

||T (u)− T (a)|| = ||T (u− a)||≤ M ||u− a||< Mδ= M ε

M= ε

71

Page 72: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

(iii) ⇒ (i): Imediato.

Proposicao 21.3. Seja V um espaco vetorial de dimensao finita. Sejam || · ||1 e || · ||2 duasnormas sobre V . Entao existem α, β > 0 tais que, para qualquer v ∈ V , temos:

||v||1 < α||v||2 e ||v||2 < β||v||1

Proposicao 21.4. Sejam U e V espacos vetoriais normados. Suponha dim U = n. Seja T :U −→ V uma transformacao linear. Entao T e contınua.

Dem.: Seja B := {b1, ..., bn} uma base para U . Considere || · ||′ : U −→ R dada por

||u||′ :=n∑

i=1

|αi|

onde [u]B = (α1, ..., αn)B. Note que || · ||′ definida assim e uma norma sobre U . Seja α talque para qualquer u ∈ U temos que ||u||′ < α||u||. Seja A := max{||T (b1)||, ..., ||T (bn)||} + 1.Considere M := Aα. Seja u ∈ U . Vamos mostrar que ||T (u)|| < M ||u||. Temos

||T (u)|| = ||T (α1b1 + · · ·αnbn)||≤ ||T (α1b1)||+ · · ·+ ||T (αnbn)||= |α1|||T (b1)||+ · · ·+ |αn|||T (bn)||< |α1|A + · · · |αn|A= A||u||′< Aα||u||= M ||u||

Referencias

[1] M. Barone. Algebra Linear. IME-USP, 1998.

[2] C. A. Callioli, H. H. Domingues, and R. C. F. Costa. Algebra linear e aplicacoes. EditoraAtual, 1987.

[3] F. U. Coelho and M. L. Lourenco. Um curso de Algebra Linear. Edusp, Sao Paulo, 2005.

[4] T. Lawson. Algebra Linear. Editora Edgard Blucher, Sao Paulo, 1997.

72

Page 73: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Notacao

(a1, ..., an)B, 27L(U, V ), 45M2, 5NucT , 32S + W , 66S ⊕W , 66S⊥, 67Sol(E), 20[A], 13[v]B, 27dim V , 24u⊥v, 62

73

Page 74: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

Indice Remissivo

arestas, 70auto

valor, 47vetor, 47

base, 19base

dual, 54ordenada, 27ortonormal, 64

bijetora, 32bijetora

funcao, 31

caminho, 70caminho

tamanho, de, 70caracterıstico

polinomio, 49combinacao

linear, 12completamento de base

teorema do, 24conectividade

matriz de, 70conjunto

gerador, 13contınua, 71contınua

ponto, no, 71coordenadas

sistema de, 27

de grau menor ou igual a npolinomios, 19

dependenteslinearmente, 15

diagonalforma, 52

diagonalizavel, 50dimensao, 24dimensao

infinita, 24

diretasoma, 66

dualbase, 54espaco, 54

elementoneutro, 3oposto, 4

escalarmultiplicacao por, 1

espacodual, 54ortogonal, 67solucao, 20vetorial, 1

finitamentegerado, 23

formadiagonal, 52

funcaobijetora, 31injetora, 31inversa, 32sobrejetora, 31

funcionallinear, 54

geradofinitamente, 23

geradorconjunto, 13

grafo, 70Gram-Schimdt

Processo de ortogonalizacao de, 63

hiperplano, 56homogeneo

sistema linear, 20

independenteslinearmente, 15

74

Page 75: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

induzidanorma, 61

induzidasoperacoes, 7

infinitadimensao, 24

injetorafuncao, 31

internoproduto, 58

inversafuncao, 32

isomorfismo, 36isomorfos, 36

linearcombinacao, 12funcional, 54transformacao, 28

linearmentedependentes, 15independentes, 15

matrizconectividade, de, 70mudanca de base, de, 43transformacao, da, 39

mudanca de basematriz de, 43

multiplicacaoescalar, por, 1

nucleo, 32neutro

elemento, 3norma, 60norma

induzida, 61

operacoesinduzidas, 7

opostoelemento, 4

ordenadabase, 27

ortogonais, 62

ortogonalespaco, 67

ortonormalbase, 64

polinomiocaracterıstico, 49

polinomiosde grau menor ou igual a n, 19

pontocontınua no, 71

Processo de ortogonalizacaoGram-Schimdt, de, 63

produtointerno, 58

sistemacoordenadas, de, 27

sistema linearhomogeneo, 20

sobrejetorafuncao, 31

solucao, 20solucao

espaco, 20soma, 1, 66soma

direta, 66subespaco

vetorial, 7vetorial gerado, 13

tamanhocaminho de, 70

teoremacompletamento de base, do, 24

transformacaolinear, 28matriz da, 39

valorauto, 47

vetor, 1vetor

auto, 47vetorial

75

Page 76: 1 Espa¸cos vetoriais - Instituto de Matemática e Estatística | IME …laurichi/verao/aulas.pdf · 2008-02-18 · J´a vimos alguns exemplos de espa¸cos vetoriais e alguns exemplos

espaco, 1subespaco, 7

vetorial geradosubespaco, 13

76