10 Saúde Bucal do Diabético
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C A D E R N O D E A T E N Ç Ã O B Á S I C A N ˚ 1 7S A Ú D E B U C A L - A T U A L I Z A D O E I L U S T R A D O - F O U S P , 2 0 1 2
Caderno de Atenção Básica no 17 - Saúde Bucal - Ministério da Saúde 1
Saúde Bucal no Paciente Diabético
1. Introdução! O termo diabetes vem do grego e quer dizer “sifão” ou “manter as pernas afastadas”. O termo faz alusão à presença da poliúria, ou seja, ao fato de que o líquido produzido pelo metabolismo corpóreo é em grande quantidade e passa rapidamente pelo rins, originando a urina, a qual no passado era eliminada com o indivíduo em pé e de pernas afastadas (Rezende, 2007).
! O diabetes pode ser do tipo insipidus e mellitus. O diabetes insipidus é originário da deficiência de ADH (hormônio antidiurético) ou pela insensibilidade dos rins a esse hormônio, o qual é produzido pela adeno-hipófise. Caracteriza-se por poliúria, sede excessiva e polidipsia. Os líquidos corpóreos passam pelos rins e são eliminados rapidamente sob a forma de urina bem líquida,
uma vez que não há controle da filtragem glomerular feita pelo ADH.
! O diabetes mellitus (DM) é forma epidêmica de diabetes, caracterizada principalmente por poliúria e hiperglicemia. Estima-se que no Brasil existam 8 milhões de indivíduos com DM, e que esta provoque impacto considerável na taxa de mortalidade brasileira, bem como custo oneroso ao serviço público de saúde devido à sua cronicidade e aos seus meios de controle (SBD, 2006). O DM compreende uma gama de distúrbios metabólicos cuja característica em comum é a hiperglicemia. Em geral, ocorre deficiência de insulina, o que gera aumento das taxas de glicose no sangue.
! A classificação aceita pela OMS e pela Associação Americana de Diabetes considera a etiologia do
processo, incluindo 4 classes clínicas: DM tipo 1, DM tipo 2, outros tipos específicos de DM e DM gestacional. Existem ainda outras categorias referidas como pré-diabetes, as quais não são entidades clínicas, mas fatores de risco para o desenvolvimento de DM e de doenças cardiovasculares.
! O DM tipo I é o resultado de uma destruição das células beta pancreáticas com conseqüente deficiência de insulina. Na maioria dos casos essa destruição é de natureza auto-imune, mas existem situações em que essa auto-imunidade não é evidente, sendo então de natureza idiopática. O tipo I corresponde a 5-10% dos casos de DM.
! O DM tipo II caracteriza-se por defeitos na ação e na secreção da insulina. O indíviduo pode apresentar taxa de insulina insuficiente em relação à carga da
O paciente diabético apresenta quadro que exige cuidados e inclusive pode vir a ser diagnosticado no consultório odontológico.
1. Introdução
Página 1
2. Complicações do Diabetes mellitus
Página 2
3. Abordagem Coletiva
Página 2
4. Abordagem Individual
Página 3
5. Por que substituir as próteses?
Página 3
6. Referências e Créditos
Página 4
Capítulos Atualizado e Ilustrado
Caderno de Atenção Básica no 17 - Saúde Bucal - Ministério da Saúde 2
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glicose ou incapacidade dos tecidos periféricos em
responder à insulina, tornando-se resistentes à ela. Na maioria das situações, são observados os dois fenômenos no indivíduo.
! Outros tipos específicos de DM incluem indivíduos que apresentam defeitos genéticos nas células beta pancreáticas e alterações pancreát icas (pancreat i tes , neoplasias, acromegalia), bem como pode ser secundária a administração de medicamentos ou agentes químicos (gl icocort icóides, interferon alfa, hormônio tireoidiano etc.) ou a infecções (rubéola congênita, citomegalovírus etc.).
! O DM gestacional é a forma semelhante ao DM tipo 2, contudo é diagnosticado durante a gestação. Não exclui a possibilidade de a paciente já ser portadora previamente à gravidez. Em geral, após o parto a paciente torna-se normoglicêmica, porém relatos têm demonstrado um risco de desenvolvimento de DM tipo 2 no prazo de 5 a 16 anos após o parto (SBD, 2006).
2. Complicações do Diabetes mellitus
As complicações do diabetes mellitus (DM) podem ser agudas ou crônicas. As agudas incluem o coma por cetoacidose ou o coma por hipoglicemia. As crônicas são caracterizadas por micro e macroangiopatias, retinopatia diabética, nefropatias diabética e
hipertensão arterial sistêmica. As doenças vasculares, como a ateroesclerose, são a principal causa de morte dos pacientes diabéticos do tipo 2, principalmente devido às nefropatias, à hipertensão arterial sistêmica e às dislipidemias (Gross, Nehme, 1999). A retinopatia diabética acomete cerca de 40% dos pacientes diabéticos e é a principal causa de cegueira em pacientes com 24 a 72 anos de idade portadores DM tipo 2.
O pé diabético constitui também um evento de grande incidência nos pacientes com diabetes tipo 2, provocando hospitalizações freqüentes e amputações. A grande maioria (85%) dos casos graves que levam à hospitalização é originária de úlceras superficiais associadas à diminuição de sensibilidade por neuropatia diabética e a pequenos traumas (Gross, Nehme, 1999).
De interesse odontológico, em termos locais, deve-se atentar especificamente às alterações no processo reparativo do portador de DM, bem como ao risco de bacteremia e septicemia derivados de focos infecciosos na cavidade oral.
Quanto ao processo reparativo prejudicado (Brem, Tomic-Canic, 2007), observa-se:
intensa liberação de fatores pró-inflamatórios, derivados de estresse oxidativo intenso; isso leva a aumento da intensidade inflamatória, o que desrregula o binômio inflamação-reparação;
diminuição da angiogênese; o paciente com DM exibe menor migração de células endoteliais no local lesionado, o que leva à menor n e o v a s c u l a r i z a ç ã o e , conseqüentemente, a atraso no processo reparativo;
presença de microangiopatias, caracterizadas por lesão endotelial freqüente provocada por proteínas glicadas, bem como por depósito protéico na parede vascular (arterioloesclerose);
diminuição da diferenciação e migração de fibroblastos, endotel iócitos e células o s t e o p r o g e n i t o r a s e , conseqüentemente, menor produção de colágeno, de vasos sanguíneos e de tecido ósseo (Graves et al., 2006).
Quanto a maior possibilidade de bacteremia e septicemia, tem sido observado que focos infecciosos na cavidade oral, principalmente periodontopatias, provocam alterações sistêmicas importantes, com aumento de citocinas e fatores de crescimento, indicativos de resposta inflamatória geral, os quais contribuem para o desenvolvimento de doenças vasculares (Graves et al., 2006). A bacteremia derivada do patógenos do periodonto contribuem para a resistência à insulina e à destruição das células beta pancreáticas. Assim, focos inflamatórios na cavidade oral constituem fator de risco para o desenvolvimento de respostas inflamatórias que podem contribuir para complicações crônicas em nível sistêmico.
C L U B E D A S E Q U Ó I A
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Como manifestações orais do DM destaca-se, além da periodontite severa, acúmulo de
placa bacteriana, gengivite, sensação de boca seca com xerostomia (devido a comprometimento das glândulas salivares, bem como a desidratação decorrente da hiperglicemia) e infecções recorrentes por Candida.
3. Glicemia e pressão arterial no diabetes mellitus! Segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes, são três os critérios para o diagnóstico de DM:
• sintomas de poliúria, polidipsia e perda ponderal, com glicemia casual acima de 200 mg/dl;
• glicemia de jejum ≥ 126mg/dl (7 milimois);
• glicemia de 2 horas pós-sobrecarga de 75g de glicose acima de 200mg/dl.
! A Tabela abaixo resume os valores de glicemia aceitos como identificadores de DM.
Categoria Jejum* 2 horas após 75 g
de glicose
Casual**
Glicemia normal < 100 < 140
Tolerância à glicose
diminuída
> 100 e < 126 ≥ 140 a < 200
Diabetes mellitus ≥ 126 ≥ 200 ≥ 200 (sintomas
clássicos)***
*O jejum é definido como a falta de ingestão calórica por no mínimo 8 horas; **glicemia plasmática casual é aquela
realizada a qualquer hora do dia, sem se observar o intervalo desde a última refeição; ***os sintomas clássicos de DM incluem poliúria, polidipsia e perda não-explicada de peso.
Nota: O diagnóstico de DM deve sempre ser confirmado pela repetição do teste em outro dia, a menos que haja hiperglicemia inequívoca com descompensação metabólica aguda ou sintomas óbvios de DM.
Adaptado de SBD, 2006.
! É recomendado também o teste para detecção dos níveis de hemoglobina glicada (HG). Esse teste evidencia os níveis médios de glicemia que o paciente tinha 2 ou 3 meses da data de realização do teste de HG, tendo grande utilidade no controle glicêmico e na
eficácia do tratamento. A tabela abaixo relaciona os valores de HG com o de glicemia; valores acima de 7% indicam a necessidade de uma revisão do esquema terapêutico em vigor, uma vez que o paciente passa a ficar exposto a complicações, tais como cardiopatias, nefropatias e retinopatias.
Nível de HG
(%)
Glicemia média (mg/
dl)
Nível de HG
(%)
Glicemia média (mg/
dl)5 100 9 240
6 135 10 275
7 170 11 310
8 205 12 345
Adaptado de SBD, 2006.
! A hipertensão arterial freqüentemente está associada ao DM. No DM tipo 1 a pressão começa a se elevar 3 anos após o início da microalbuminúria, a qual é derivada da nefropatia em estágios iniciais; já no DM tipo 2 40% dos pacientes já estão hipertensos por ocasião do diagnóstico de diabetes (SBD, 2006). A hipertensão pode predispor à nefropatia diabética, bem como a doenças cardiovasculares importantes. Para prevenir essas complicações, é necessário manter a pressão do paciente em níveis mais baixos que os usuais. Assim, níveis de pressão arterial inferiores a 130/80 mmHg devem mantidos; havendo proteinúria e insuficiência renal, a pressão deve se aproximar de 120/75 mmHg. (Veja mais informações sobre hipertensão arterial).e desenvolvimento de DM tipo 2 no prazo de 5 a 16 anos após o parto (SBD, 2006).
4. Tratamento odontológico do paciente diabético! O tratamento odontológico do paciente com diabetes mellitus (DM) deve prever, em primeira instância, a pesquisa quanto a glicemia do paciente e ao regime terapêutico instituído, principalmente quanto aos hábitos nutricionais recomendados e às medicações. O objetivo maior é não provocar episódios de
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hipoglicemia decorrentes da ausência de ingestão de alimentos devido a dificuldades
de alimentação pós-procedimentos odontológicos (McKenna, 2006).
! Como plano de tratamento, é recomendável a remoção de focos infecciosos o mais rapidamente possível. Tem sido evidenciado que bactérias da cavidade oral, particularmente da doença periodontal, provocam aumento de fator de necrose tumoral α no plasma sanguíneo, o qual parece contribuir para a resistência à insulina (Engebretson et al., 2007). Assim, um paciente com DM e infecções crônicas bucais possivelmente apresenta resistência à insulina e, uma vez tratado, deve ser submetido novamente a avaliação médica, para adequação da terapêutica hipoglicemiante.
! É recomendável instituir medida terapêutica preventiva contra doenças periodontais, já que a severidade das infecções de bactérias periodontopatogênicas e a perda óssea alveolar são mais acentuados no DM (Graves et al., 2006).
! Quanto aos atos cirúrgicos, se o paciente está com a glicemia controlada e não será submetido a anestesia geral, estes devem ser realizados no período da manhã, após a ingestão dos medicamentos hipoglicemiantes orais. A conduta pós-operatória deve ser a de rotina, sem a necessidade de antibioticoterapia profilática. Já para os pacientes com DM tipo 1 e que serão submetidos a cirurgia oral menor sem anestesia geral, é necessária a pesquisa quanto ao regime de hipoglicemiantes do paciente (Bergman, 2007); o contato com o médico é fundamental, uma vez que é recomendável a administração de metade da dose diária de insulina no período da manhã previamente à cirurgia. Se o paciente está com a glicemia entre 100 e 200 mg/dl, o ato cirúrgico pode ser realizado; para valores acima de 200 mg/dl, a administração de insulina é necessária previamente à cirurgia, reduzindo os valores para 150 mg/dl (Bergman, 2007). No pós-operatório, o controle da glicemia em intervalo de até 4 horas é importante (Bergman, 2007). Em pacientes com controle desfavorável da glicemia, antibioticoterapia profilática deve ser realizada (McKenna, 2006). Deve ser
lembrado, além disso, que procedimentos cirúrgicos e anesthesia provocam alterações hormonais que estimulam a gluconeogênese e a glicogenólise, acarretando aumento dos níveis de glicose no sangue (Bergman, 2007).
! A prescrição de anti-inflamatórios não-esteroidais (AINEs) deve ser compartilhada com o médico, uma vez que é sabida a interferência dessas drogas sobre as de controle da glicemia. Algumas drogas que potencializam a ação hipoglicemiante são AINEs, beta-bloqueadores, antifúngicos e antidepressivos cíclicos. Algumas drogas que diminuem a ação hipoglicemiante são corticóides, estrógenos, bloqueadores de cálcio e rifampicina.
5. Referências e CréditosBergman SA. Perioperative management of the diabetic patient. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod. 2007 Jun;103(6):731-7.
Brem H, Tomic-Canic M. Cellular and molecular basis of wound healing in diabetes.J Clin Invest. 2007 May;117(5):1219-22.
Engebretson S, Chertog R, Nichols A, Hey-Hadavi J, Celenti R, Grbic J. Plasma levels of tumour necrosis factor-alpha in patients with chronic periodontitis and type 2 diabetes. J Clin Periodontol. 2007 Jan;34(1):18-24.
Graves DT, Liu R, Alikhani M, Al-Mashat H, Trackman PC. Diabetes-enhanced inflammation and apoptosis--impact on periodontal pathology. J Dent Res. 2006 Jan;85(1):15-21.
Gross JL, Nehme M. Detecção e tratamento das complicações crônicas do diabetes melito: Consenso da Sociedade Brasileira de Diabetes e Conselho Brasileiro de Oftalmologia. Rev Ass Med Brasil 1999; 45(3): 279-84.
Rezende. Diabetes. http://usuarios.cultura.com.br/jmrezende/diabetes.htm
SBD. Sociedade Brasileira de Diabetes. Tratamento e acompanhamento do diabetes mellitus. Diretrizes da
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Caderno de Atenção Básica no 17 - Saúde Bucal - Ministério da Saúde 5
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Sociedade Brasileira de Diabetes, 2006.
Atualização do Caderno de Atenção Básica em Saúde Bucal (link do original) – 2012:
Profa. Luciana Corrêa – FOUSP
Profa. Marina Helena C. Gallotini de Magalhães - FOUSP