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  • Formao cultural de professores

    ISSN 1982 - 0283

    Ano XX boletim 07 - Junho 2010

    Ministrio daEducao

    Secretariade Educao a Distncia

  • SUMRIO

    Formao Cultural de ProFessores

    Apresentao da srie ........................................................................................................... 3

    Rosa Helena Mendona

    Proposta da srie

    Formao cultural de professores ......................................................................................... 4

    Monique Andries Nogueira

    Texto 1 Formao cultural: questes tericas.................................................................................. 8

    Monique Andries Nogueira

    Texto 2 Cultura e formao de professores

    A cultura na formao de professores ......................................................................................... 14

    Clia Maria de Castro Almeida

    Texto 3 Experincias estticas e linguagens artsticas

    Inquietudes e experincias estticas para a educao ....................................................................... 22

    Luciana Gruppelli Loponte

  • 3Formao Cultural de ProFessores APRESENTAO DA SRIE

    1 FORQUIN, Jean-Claude. Escola e cultura: as bases sociais e epistemolgicas do conhecimento escolar. Porto Alegre: Artes Mdicas, 1993.

    2 Supervisora Pedaggica do Programa Salto para o Futuro.

    A relao entre educao e cultura no pode

    ser pensada de forma dicotmica. Jean-Clau-

    de Forquin1 destaca que toda educao de

    tipo escolar supe sempre na verdade uma

    seleo no interior da cultura. Uma poss-

    vel definio de currculo deveria ento dar

    nfase, segundo o autor, a aspectos como

    seleo e transposio didtica, ou seja, o

    que levar para a escola das mltiplas experi-

    ncias culturais vividas no cotidiano e como

    torn-las acessveis s novas geraes.

    Nesse contexto, a escola assume um im-

    portante papel, no sentido de possibilitar o

    acesso a variadas formas de expresso cul-

    tural, em especial no campo da arte. E os

    professores so mediadores dessa relao.

    De que forma a leitura de um livro de litera-

    tura, a frequncia a salas de cinema e teatro,

    a ida a museus e a espetculos musicais e de

    dana constituem um repertrio capaz de

    enriquecer o currculo escolar?

    Com a srie Formao cultural de professo-

    res, a TV Escola, por meio do programa Salto

    para o Futuro, traz cena o debate em torno

    da importncia das experincias estticas e

    das linguagens artsticas, visando contribuir

    para prticas docentes mais ricas e estimu-

    lantes.

    A srie conta com a consultoria de Monique

    Andries Nogueira (UFRJ). A pesquisadora

    tem se dedicado investigao no campo

    da formao cultural de professores. Os tex-

    tos que compem esta publicao destacam

    a importncia de colocar esta prtica no

    mbito das polticas pblicas de formao

    de professores. Nos programas televisivos,

    buscamos entrevistar pesquisadores e pro-

    fessores e registramos diversos momentos

    em que arte e cultura possibilitaram a pro-

    fessores e alunos vivncias estticas enri-

    quecedoras.

    Rosa Helena Mendona2

  • 41 Professora da Faculdade de Educao da UFRJ. Consultora da srie.

    PROPOSTA DA SRIE

    Formao Cultural de ProFessores

    Monique Andries Nogueira1

    A proposta da srie Formao cultural de pro-

    fessores abrir espao para um tema que,

    pela sua importncia, j deveria estar in-

    corporado aos discursos e s prticas dos

    que almejam a melhoria da qualidade da

    educao brasileira. Em meio a um encon-

    tro nacional de pesquisadores e educadores

    brasileiros, Gimeno Sacristn afirmou, sem

    tergiversar, que se os professores no po-

    dem dar o que no tm, preciso, antes de

    mais nada, que sejam cultos para poderem

    dar cultura (1996, p. 3), referindo-se ne-

    cessidade de o professor ampliar seus refe-

    renciais estticos, frequentando diferentes

    espaos culturais, e no se limitando ao

    eterno caminho entre casa e trabalho.

    O termo cultura, assim como formao, apre-

    senta uma multiplicidade de sentidos. Sendo

    assim, achamos necessrio explicitar, j de

    incio, qual o recorte escolhido nesta srie.

    Ainda que entendamos que, por sua polisse-

    mia, o conceito de cultura possa sempre dar

    a impresso de que esteja restrito, em uma

    ou outra abordagem, assumimos o risco e

    apresentamos o vis escolhido: entendemos

    formao cultural como o processo em que

    o indivduo se conecta com o mundo da cul-

    tura, mundo esse entendido como um espa-

    o de diferentes leituras e interpretaes do

    real, concretizado nas artes (msica, teatro,

    dana, artes visuais, cinema, entre outros) e

    na literatura (NOGUEIRA, 2008). Por ser pro-

    cesso, trata-se de ao contnua e, alm dis-

    so, cumulativa.

    Nesta srie, procura-se abordar como po-

    dem ser significativas as experincias est-

    ticas para quem se dedica a formar outros

    seres humanos, objetivando um crescimen-

    to, tanto do ponto de vista pessoal, na me-

    dida em que a arte favorece um processo de

    construo de um saber sensvel, quanto

    de ponto de vista profissional, j que, am-

    pliando seus referenciais, o professor pode

    desenvolver uma prtica docente mais rica

    e estimulante.

    Ao longo de minha prtica docente, convivi

    com professores de perfis muito distintos:

  • 5com variadas formaes, em diferentes cida-

    des e estados, da rede pblica e privada, da

    Educao Infantil universidade. Em meio

    a tantas diferenas, uma ressaltava a meus

    olhos: a bagagem cultural, isto , o conjun-

    to de experincias e informaes extracur-

    riculares, do campo da arte e da cultura,

    que cada um apresentava e o modo como

    isso aparecia na sua prtica docente. Ha-

    via os que, embora dominassem seus con-

    tedos disciplinares, no pareciam capazes

    de alargar as experincias de seus alunos,

    exatamente porque tinham suas prprias

    experincias muito restritas: no liam obras

    literrias, no iam ao cinema, ao teatro, a

    concertos. Outros, no entanto, apesar de

    muitas vezes lutarem contra situaes bas-

    tante adversas, conversavam a respeito de

    assuntos variados: filmes a que haviam as-

    sistido, algum novo CD, o ltimo livro lido,

    uma visita ao museu.

    Nos professores do primeiro grupo, perce-

    bia-se uma limitao clara no sentido de es-

    tabelecer com os alunos uma ligao para

    alm do contedo da sala de aula: falhavam

    eles naquilo que me parece ser fundamen-

    tal no ofcio de professor, que a ampliao

    do universo cultural do aluno, o estmulo a

    estar aberto s diferentes leituras da realida-

    de, possibilitadas pela Arte e pela Literatura.

    Como suas prprias experincias estticas

    eram limitadas, seus recursos didtico-pe-

    daggicos tambm eram restritos, o que se

    refletia em sua prtica pedaggica.

    J nos professores do segundo grupo, nota-

    va-se um repertrio mais rico, sendo comuns

    as referncias a filmes, peas de teatro, m-

    sicas, livros, enfim, ao mundo da cultura,

    em suas aulas. Por conseguinte, seus alunos

    tambm eram motivados a frequentar esses

    espaos e a estabelecer relaes entre essas

    leituras e os contedos escolares. Nessas

    salas de aula, percebia-se um movimento

    instigador, estimulante, no qual o interesse

    pela herana cultural da humanidade ficava

    manifesto.

    Nesta srie, procuraremos abordar essas

    experincias estticas e revelar como se

    tornam fundantes de uma outra prtica

    docente, uma prtica que, por se perceber

    portadora e criadora de cultura, plural e

    transformadora. Concordamos com Adorno

    (1996), quando afirma que a formao cul-

    tural (Bildung) , ao mesmo tempo, ade-

    quao e autonomia, e preciso que assim

    seja. adequao, quando oferece aos indi-

    vduos formas de se reconhecerem perten-

    centes a um grupo, por meio da aquisio

    de seus valores, tradies e conhecimen-

    tos. Por outro lado, autonomia quando,

    de posse dessas mesmas ferramentas cul-

    turais, o indivduo pode alar voos e ir alm

    do que est posto. Para Adorno, portanto, o

    problema surge quando se perde esse tnue

    equilbrio e o polo da adaptao fica mais

    forte, impossibilitando a prtica emancipa-

    dora.

  • 6Pretendemos demonstrar, a partir das en-

    trevistas, debates e textos desta srie, que

    o incentivo formao cultural dos profes-

    sores, por meio da frequncia a eventos ar-

    tsticos e de experincias estticas, aponta

    para a possibilidade de uma prtica docente

    marcada pela autonomia e pela pluralidade.

    2 Estes textos so complementares srie Formao cultural de professores, com veiculao no programa Salto para o Futuro/TV Escola (MEC) de 21 a 25 de junho de 2010.

    TEXTOS DA SRIE FORMAO CULTURAL DE PROFESSORES2

    A srie pretende abordar uma questo que se apresenta quando so discutidos os saberes ne-

    cessrios docncia: alm dos contedos especficos de sua disciplina, fundamental que o

    professor tenha parmetros estticos mais amplos e, para isto, importante que ele tenha uma

    slida formao cultural, que lhe d os subsdios necessrios para atender s novas e velhas

    demandas que so colocadas no seu cotidiano. Esta srie tem como objetivos discutir o concei-

    to de indstria cultural, a formao cultural dos professores e, ainda, visa mostrar diferentes

    iniciativas neste mbito.

    TEXTO 1 - FORMAO CULTURAL: QUESTES TERICAS

    Nesse texto, sero abordados os fundamentos que balizam nossa compreenso do conceito de

    formao cultural, assim como o alcance desse tema no campo da educao e, particularmente,

    na formao de professores.

    TEXTO 2 - CULTURA E FORMAO DE PROFESSORES

    Clia Maria de Castro Almeida dirige seu foco questo especfica do lugar da cultura na for-

    mao de professores. Mapeia como nossa legislao educacional trata da questo, alm de

    apresentar dados de pesquisas que comprovam a pouca frequncia dos professores brasileiros

    a espaos de arte e cultura.

    TEXTO 3 - EXPERINCIAS ESTTICAS E LINGUAGENS ARTSTICAS

    Luciana Grupelli Loponte traz necessrias reflexes a respeito do papel da arte na educao,

    particularmente no que se refere s possibilidades que a arte contempornea oferece forma-

  • 7o docente. O potencial de inquietude e transformao presente na arte contempornea passa

    a ser visto como porta de entrada para experincias estticas significativas e relevantes para o

    professorado.

    Os textos 1, 2 e 3 tambm so referenciais para o quarto programa, com entrevistas que refletem

    sobre esta temtica (Outros olhares sobre formao cultural de professores) e para as discusses do

    quinto programa (Formao cultural de professores em debate).

    BIBLIOGRAFIA

    ADORNO, T. Teoria da semicultura. Educao e Sociedade. Revista Quadrimestral de Cincia da

    Educao, Ano XVII, n. 56. Campinas: Papirus/Cedes, 1996.

    NOGUEIRA, M. A. Formao cultural de professores ou a arte da fuga. Goinia: UFG, 2008.

    SACRISTN, G. Tendncias investigativas na formao de professores. Trad. e transcrio de Jos

    Carlos Libneo. Mimeo, 1996.

  • 8TEXTO 1

    Formao Cultural: questes teriCas

    Monique Andries Nogueira 1

    1 Professora da Faculdade de Educao da UFRJ. Consultora da srie.

    A expresso formao cultural vem sendo

    cada vez mais utilizada, para os mais diver-

    sos propsitos. Pretendemos, neste texto,

    desenvolver esse conceito, a partir de sua

    gnese, para depois relacion-lo com o cam-

    po da Educao.

    O termo cultura deriva-se do latim cultur e

    era originalmente relacionado aos cuidados

    dispensados ao campo, isto , seu cultivo

    com plantas e animais. A partir do sculo XVI,

    seu sentido inicial sofre transformaes e

    com o Movimento Iluminista, em meados do

    sculo XVIII, que a utilizao do sentido figu-

    rado do termo ganha fora. A metfora de se

    cultivar o esprito, assim como se cultiva a

    terra, recebe reconhecimento e o termo cul-

    tura passa a ser entendido como o estado do

    esprito cultivado, quase sempre associado

    ideia de civilizao (CUCHE, 1999).

    Mais tarde, intelectuais nacionalistas ale-

    mes criticaram a influncia da corte fran-

    cesa e passaram a utilizar o termo cultura

    para o que autntico, profundo, e civi-

    lizao para o que seria suprfluo, mero

    refinamento estrangeiro. Essa polarizao

    permanece por boa parte do sculo XIX: para

    os alemes, a noo de cultura abarca o

    conjunto de tradies artsticas e intelectu-

    ais que marcam determinado povo; para os

    franceses, a noo de cultura se funda de

    civilizao, denotando todo um patrimnio

    de arte e conhecimento que se compreende

    como universal. Essa polarizao marca o

    debate sobre cultura presente no sculo XX,

    oscilando entre dois polos, um universalista

    (de herana francesa) e outro particularista

    (de origem germnica).

    Atualmente, percebe-se uma tendncia, na

    qual nos inclumos, de se aproximar esses

    dois polos, isto , entender a cultura tanto

    do ponto de vista local quanto do ponto de

    vista universal. No caso da Educao, esse

    debate ganha contornos peculiares.

  • 9Em geral, a Educao, ao longo dos tempos,

    vinha adotando a concepo francesa, isto

    , universalista. Os currculos e contedos

    considerados educacionais giravam em

    torno de saberes consagrados. Os crticos,

    muitos provenientes de outras reas das ci-

    ncias humanas, notadamente da sociolo-

    gia, apontavam equvocos e afirmavam que

    muito do que era considerado universal

    era apenas europeu, branco e masculino.

    Defendiam, tal como os intelectuais ger-

    mnicos do sculo XIX, a necessidade de se

    abarcar as manifestaes culturais locais,

    distintivas de determinados grupos sociais,

    ainda que minoritrios do ponto de vista da

    hegemonia poltica e econmica. Essa pos-

    tura pode ser reconhecida principalmente

    no campo das discusses sobre currculo,

    em particular nas questes relativas mul-

    ticulturalidade e, certamente, tem validade.

    Contudo, importante ressaltar o perigo

    de se cair em um processo igualmente no-

    civo que o da recusa a qualquer contedo

    que represente o pensamento consagrado.

    Conforme nos lembra Rouanet, h o perigo

    de se adotar uma postura anticolonialista,

    que termina por se constituir em xenofobia:

    cultura autnoma aquela que pode ser

    posta a servio de um projeto de autonomia,

    e no vejo porque s a cultura gerada den-

    tro das fronteiras nacionais possa contribuir

    para esse objetivo (1999, p. 127).

    Exemplifiquemos: estudar Cervantes, conhe-

    cer sua obra-prima, viajar junto com Dom

    Quixote combatendo os moinhos de vento,

    tudo isto absolutamente necessrio e rico,

    do ponto de vista da prpria constituio de

    humanidade. No porque um aluno more

    na periferia do Rio de Janeiro que seus limi-

    tes tenham que ficar restritos ao jornal do

    bairro. Mais uma vez recorremos a Rouanet:

    O ideal democrtico a universalidade,

    o que significa criar condies para que

    todos tenham acesso lngua culta, e

    no a segregao, que excluiu grandes

    parcelas da populao do direito de usar

    um cdigo mais rico, que lhes permiti-

    ria estruturar cognitivamente sua pr-

    pria prtica, com vistas a transform-la

    (1999, p. 137).

    Da mesma forma, ainda que sejam valoriza-

    das, em sala de aula, as produes musicais

    que o aluno vivencia cotidianamente, como

    o samba ou outros ritmos mais populares,

    no razovel que no se possa apresentar

    a ele obras-primas consagradas, como afir-

    ma Snyders, respondendo s crticas perti-

    nentes de Bourdieu a respeito do elitismo da

    msica erudita:

    A msica de Mozart msica de clas-

    se: ouvimos nela a vida das cortes se-

    nhoriais, respiramos nela a atmosfera

    arcaizante de galanteria e de lacaios

    empoados; o acesso a Mozart hoje, as

    condies que fazem com que ele seja

    ou no ouvido, so fenmenos de classe.

  • 10

    Entretanto, as obras primas de Mozart

    possuem em si mesmas elementos para

    ultrapassar as barreiras de classe, tanto

    as de seu autor como as de seu pblico;

    um ensino elaborado necessrio, sem

    dvida, para que os alunos tomem cons-

    cincia desses elementos e isto consti-

    tui tambm uma das justificativas desse

    ensino (1992, p. 43).

    importante afirmar que

    o potencial de transfor-

    mao da arte intrnse-

    co sua prpria nature-

    za, no estando restrito a

    um discurso que se quer

    engajado. A arte no re-

    volucionria apenas por

    ser escrita por ou para

    trabalhadores. Quanto a

    isso, adverte-nos Marcuse

    (1977, p. 14):

    Quanto mais imediatamente poltica for

    a obra de arte, mais ela reduz o poder

    de afastamento e os objetivos radicais e

    transcendentes de mudana. Neste sen-

    tido, pode haver mais potencial subver-

    sivo na poesia de Baudelaire e de Rim-

    baud que nas peas didticas de Brecht.

    fundamental, portanto, ter em mente o

    potencial transformador da Arte e, por con-

    seguinte, sua centralidade em um projeto

    de formao de professores para uma so-

    ciedade que se quer transformada. Esse po-

    tencial pode estar igualmente localizado em

    obras de arte de origem popular ou erudita.

    Tambm importante distinguir as produ-

    es artsticas verdadeiramente populares

    daquelas produzidas pela indstria cultural,

    tendo em vista, prioritariamente, o lucro

    comercial, acima de qualquer preocupao

    com qualidade est-

    tica.

    Poder-se-ia afirmar

    que o professor est

    imerso na cultura:

    os apelos visuais,

    sonoros, corporais

    esto por toda par-

    te, especialmente

    veiculados pelos

    grandes meios de

    comunicao de

    massa. Por que, ento, insistir na ideia de

    que a formao cultural dos professores ain-

    da incipiente e precisa ser incrementada?

    Porque preciso estarmos alertas quanto ao

    processo de coisificao da arte, isto , sua

    incorporao pela indstria cultural. nes-

    se processo de mercantilizao que se retira

    o potencial transformador da arte. Segundo

    Pucci (1995, p. 26), a arte introduz a dimen-

    so do novo, do subjetivo, do arriscado, do

    ambguo, qualidades no to bem vistas pe-

    los planejadores da Razo Instrumental. J

    a indstria cultural, transformada em sens-

    vel instrumento de controle social, confere

    importante afirmar

    que o potencial de

    transformao da arte

    intrnseco sua prpria

    natureza, no estando

    restrito a um discurso

    que se quer engajado.

  • 11

    aos produtos culturais um ar de semelhan-

    a, de homogenizao, de coisificao.

    Essa falsa variedade est ancorada em uma

    suposta liberdade de escolher o que sem-

    pre a mesma coisa (ADORNO E HORKHEI-

    MER, 1985, p. 156). Nesse processo, deno-

    minado semicultura (ADORNO, 1996), o

    indivduo no vivencia uma experincia es-

    ttica profunda: apenas uma fruio epi-

    drmica, pouco vigorosa e, principalmente,

    passageira, uma vez que preciso estar sem-

    pre disposto a consumir o novo produto a

    ser lanado. As ondas de que o meio fono-

    grfico brasileiro lana so um triste exem-

    plo dessa pasteurizao: a cada vero, novos

    modismos/artistas so lanados no merca-

    do. H toda uma veiculao de produtos

    correlatos (DVDs, roupas, calados, shows),

    exaustivamente divulgados, que atingem

    nmeros realmente impressionantes de

    vendagem, frequentemente batendo os re-

    cordes dos anos anteriores. No entanto, da

    mesma forma que se apresentam de forma

    avassaladora, no resistem a mais de uma

    estao, curiosamente o perodo em que o

    mundo da moda lana seus novos produ-

    tos. Nesse sentido, a expresso modismo,

    quando aplicada aos produtos da indstria

    cultural, no fortuita.

    Diferentemente, as obras de arte, sejam de

    origem popular ou erudita, promovem no

    apreciador, seja ele ouvinte ou espectador,

    um crescimento na direo de sua prpria

    humanizao. A relevncia da experincia

    esttica est justamente nesse processo,

    pois no contato com a Arte, seja assistindo

    a um filme e sentindo empatia pelos perso-

    nagens, seja participando de um concerto e

    se transportando para outro perodo hist-

    rico, seja apreciando uma pintura e viven-

    ciando o ideal de beleza e humanidade nela

    expresso, o homem anseia por absorver o

    mundo e, ao mesmo tempo, integr-lo a si

    mesmo. Para Fischer, isto claro na medida

    em que faz parte da natureza humana essa

    transcendncia:

    O desejo do homem de se desenvolver e

    completar indica que ele mais que um

    indivduo. Sente que s pode atingir a

    plenitude se se apoderar das experin-

    cias alheias que potencialmente lhe con-

    cernem, que poderiam ser dele. E o que

    um homem sente como potencialmente

    seu inclui tudo aquilo de que a huma-

    nidade, como um todo, capaz. A arte

    o meio indispensvel para essa unio

    do indivduo com o todo; reflete a infini-

    ta capacidade humana para a associa-

    o, para a circulao de experincias e

    ideias (2002, p. 13).

    a partir de afirmaes como essa que rei-

    teramos nossa convico de que a formao

    cultural dos professores fundamental e ur-

    gente. Como formador de futuros cidados,

    o professor, antes de tudo, precisa estar co-

    nectado com o mundo da cultura, cultura

  • 12

    essa entendida como patrimnio de todos.

    inerente ao seu ofcio fazer as mediaes

    necessrias para que seu aluno possa tomar

    posse de todo esse patrimnio. Contudo,

    se ele mesmo no possui os instrumentos

    de anlise necessrios para esse fruir mais

    aprofundado, como estimular esse processo

    em seus alunos? Da a necessidade de inves-

    timentos vigorosos nessa direo.

    Uma conjugao de

    es -foros se faz neces-

    sria: mudanas curri-

    culares nos cursos de

    formao de profes-

    sores, estmulo fre-

    quncia de espaos cul-

    turais, descontos para

    professores nos ingres-

    sos, enfim, uma efetiva

    poltica de incentivo

    formao cultural dos

    professores. Efetivamente, uma conjugao

    de esforos e medidas que se constituam em

    um projeto poltico e no apenas iniciativas

    isoladas, quase sempre marcadas por inte-

    resses localizados ou sem continuidade.

    preciso ultrapassar a lgica de uma poltica

    de eventos para se viabilizar uma poltica de

    Estado, na direo de um conjunto de medi-

    das, a curto, mdio e longo prazos, que ga-

    rantam a formao cultural dos professores

    em um nvel aprofundado.

    no reconhecimento do potencial da Arte

    e da cultura em geral na transformao das

    pessoas que defendemos sua apropriao por

    todos os indivduos, sem distino de classe,

    gnero ou etnia. E no reconhecimento da

    Educao como uma das alavancas primor-

    diais para a transformao social (FREIRE,

    1993), que defendemos a formao cultural

    dos professores como elemento central no

    processo de emancipao da sociedade.

    BIBLIOGRAFIA

    ADORNO, T. Teoria da

    semicultura. Educao

    e Sociedade. Revista

    Quadrimestral de Cin-

    cia da Educao, ano

    XVII, n. 56. Campinas:

    Papirus/Cedes, 1996.

    ADORNO, T. e

    HORKHEIMER, M.

    Dialtica de esclarecimento. Rio de Janeiro:

    Zahar, 1985.

    CUCHE, D. A noo de cultura nas cincias hu-

    manas. Bauru: Edusp, 1999.

    FISCHER, E. A necessidade da arte. 9. ed. Rio

    de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002.

    FREIRE, P. Professora sim, tia no cartas a

    quem ousa ensinar. So Paulo: Olho Dgua,

    1993.

    Como formador de

    futuros cidados, o

    professor, antes de tudo,

    precisa estar conectado

    com o mundo da

    cultura, cultura essa

    entendida como

    patrimnio de todos.

  • 13

    MARCUSE, H. A dimenso esttica. So Paulo:

    Martins Fontes, 1977.

    PUCCI, B. Teoria crtica e Educao. In: PUC-

    CI, B. (org.) Teoria crtica e educao: a ques-

    to da formao cultural na Escola de Frank-

    furt. 2. ed. Petrpolis/So Carlos: Vozes/

    Ufscar, 1995.

    ROUANET, S. P. As razes do iluminismo. 6.

    ed. So Paulo: Cia. das Letras, 1999.

    SNYDERS, G. A escola pode ensinar as alegrias

    da msica? So Paulo: Cortez, 1992.

  • 14

    1 Professora no Mestrado em Educao da Universidade de Uberaba.

    2 Por coerncia terica, grafo alguns termos no masculino e no feminino.

    3 O sensvel e o artstico no podem ser desprezados quando se busca compreender a constituio do ser humano (Vygotsky, 2003).

    TEXTO 2

    Cultura e Formao de ProFessoresa Cultura na Formao de ProFessores

    Clia Maria de Castro Almeida 1

    Em educao, uma ideia questionvel, mas

    amplamente generalizada, a de que o su-

    cesso do processo de ensino e aprendizagem

    se vincula diretamente ao domnio de con-

    tedos escolares pelo pro-

    fessor ou pela professora2

    e capacidade de transmi-

    ti-los. A fim de contribuir

    para esse debate, defendo

    aqui a necessidade de a

    formao docente incluir

    experincias estticas que

    permitam a professores e

    professoras mediarem a

    aprendizagem de conte-

    dos curriculares e amplia-

    rem o repertrio cultural

    de alunos e alunas com

    mais facilidade e segu-

    rana. Tambm discuto a

    contribuio de experin-

    cias estticas para proces-

    sos de subjetivao constitutivos da profis-

    sionalidade docente. Para tanto, parto dos

    pressupostos de que fatores sociais e cultu-

    rais so decisivos constituio de saberes

    docentes e sua mediao na aprendizagem

    discente e, ainda,

    de que estudos so-

    bre a relao entre

    docentes e cultura

    podem ampliar a

    compreenso das

    prticas educativas

    referentes no s

    mediao do co-

    nhecimento esco-

    lar, mas tambm

    formao humana

    em sentido lato,

    que supe forma-

    o cultural e est-

    tica3.

    Toda prtica social

    tem dimenso cultural, ou seja, a cultura

    Toda prtica social tem

    dimenso cultural,

    ou seja, a cultura

    aprendida e apreendida

    referncia para

    diversos procedimentos

    ou normas de pensar,

    agir e relacionar-se

    compartilhados e

    reconhecidos pelos

    sujeitos na vida pessoal

    e na vida profissional.

  • 15

    aprendida e apreendida referncia para di-

    versos procedimentos ou normas de pensar,

    agir e relacionar-se compartilhados e reco-

    nhecidos pelos sujeitos na vida pessoal e na

    vida profissional. Cultura e educao no

    se dissociam, pois os processos educativos,

    sejam institucionais ou no, inserem-se em

    uma cultura4.

    luz de Bourdieu e Jean Claude Passeron

    (1975) quando asseveram que as relaes

    entre competncias culturais e lingusticas

    prprias de certa classe social determinam

    o desempenho na escola , tambm se pode

    supor que, quanto maior e mais variado for

    o repertrio cultural do professorado, mais

    numerosas e apropriadas sero as escolhas

    possveis para que este medeie a construo

    de conhecimentos escolares.

    Ora, se a educao tem vnculos fortes com

    a cultura, ento pertinente discutir a con-

    tribuio das experincias culturais da vida

    cotidiana para a formao de docentes e sua

    prtica educativa.

    Para Maurice Tardif, o saber docente5 plural

    e construdo em diferentes tempos e espa-

    os da vida em sociedade; um saber resul-

    tante de um amlgama de vrios saberes: os

    saberes da formao profissional, os saberes

    disciplinares, os saberes curriculares e os sa-

    beres experienciais. Aqui nos interessa dis-

    cutir os saberes experienciais, ou seja, aque-

    les saberes que mobilizam conhecimentos

    adquiridos atravs da histria de vida, da

    experincia de trabalho e da socializao

    (TARDIF, 2002).

    Se, como afirma Tardif, os saberes experien-

    ciais colaboram para a constituio do saber

    docente e se resultam, em grande parte,

    das experincias da vida em sociedade ,

    ento cabe perguntar: que experincias so

    essas? Incluem experincias culturais e es-

    tticas como prticas de leitura e hbito de

    frequentar museus, salas de concerto, tea-

    tro, cinema, exposies de artes visuais, es-

    petculos de dana etc.? E quais so as con-

    tribuies que essas experincias trazem

    prtica pedaggica?

    Ainda so escassos os estudos que desta-

    cam os vnculos entre cultura e educao

    e defendem a escola como centro de for-

    mao cultural onde as disciplinas das hu-

    manidades voltadas ao sentir e ao pensar

    (msica, literatura, teatro, cinema, artes

    visuais e outras) so vistas como parte im-

    portante da educao escolar; tambm so

    4 A cultura no somente um conjunto de imperativos no qual se inscreve necessariamente todo projeto pedaggico e que o professor deve bem conhecer se quer poder domin-lo [...]; tambm, mais fundamentalmente, o que constitui o objeto mesmo do ensino, seu contedo substancial e sua justificao ltima [...]. (Forquin, 1993, p. 1678).

    5 Tardif (2000) emprega o termo saber para designar um conjunto de conhecimentos, competncias, habilidades e atitudes.

  • 16

    escassos estudos que apontem a relevncia

    das experincias estticas para processos de

    subjetivao e para a constituio da profis-

    sionalidade docente. Mas tal escassez no

    se justifica por falta de reconhecimento da

    importncia desses vnculos, apontados por

    vrios autores que defendem uma poltica

    de formao (inicial e continuada) que asse-

    gure ao professor e professora o acesso a

    formas variadas de expresso artstica.

    No Brasil, a posio oficial quanto a uma

    formao cultural para docentes incipien-

    te e difusa. Com efeito, o Plano Nacional de

    Educao apenas sugere que os currculos

    dos cursos de formao para o magistrio

    assegurem uma ampla formao cultural,

    e recomenda uma parceria entre as institui-

    es formadoras e os equipamentos cultu-

    rais pblicos e privados com o objetivo de

    [...] criar oportunidades de convivncia com

    um ambiente cultural enriquecedor [...]

    (BRASIL, 2001, p. 74).

    Tambm as Diretrizes Curriculares Nacio-

    nais para formao de professores/as da

    educao bsica abordam vagamente o pro-

    blema da formao cultural. Tal documen-

    to diz que [...] a organizao curricular de

    cada instituio observar [...] outras formas

    de orientao inerentes formao para a

    atividade docente, entre as quais o preparo

    para [...] o exerccio de atividades de enrique-

    cimento cultural [...]; e tambm recomenda

    [...] iniciativas que garantam parcerias para

    a promoo de atividades culturais destina-

    das aos formadores e futuros professores

    (BRASIL, 2002).

    A ambiguidade e a superficialidade desses

    documentos no tocante problemtica

    da formao cultural do professorado so

    reiteradas pelos dados de uma pesquisa

    recente (GATTI; BARRETO, 2009) sobre as

    licenciaturas. A pesquisa indica a presena

    de disciplinas optativas nos currculos das

    licenciaturas que, pela sua denominao,

    podem ser relacionadas educao es-

    ttica; mas isso no significa que visem

    formao cultural de professores e profes-

    soras dito de outro modo, podem ser dis-

    ciplinas instrumentais, voltadas ao ensino

    de tcnicas artsticas.

    A mesma pesquisa indica que muitas licen-

    ciaturas incluem no currculo atividades

    culturais, atividades cientfico-culturais

    ou seminrio cultural. Mas, no dizer das

    pesquisadoras, [...] pelo material examina-

    do [...] fica muito pouco claro do que cons-

    tam e qual o tratamento que lhes ofereci-

    do [...] (GATTI; BARRETO, 2009, p. 124). O que

    nos leva suposio de que foram inseridas

    no currculo para atender no papel s re-

    comendaes dos documentos oficiais.

    Outra pesquisa (UNESCO, 2004), de mbito

    nacional, evidencia a necessidade de os r-

    gos governamentais se preocuparem mais

    com a formao cultural de docentes. Feita

  • 17

    em 2002, ela enfocou o perfil de professores

    e professoras da educao bsica no Brasil

    e, dentre outros quesitos, levantou informa-

    es sobre o consumo cultural e as prefern-

    cias e atividades culturais. Os dados foram

    obtidos mediante questionrio, respondido

    por uma amostra representativa cinco mil

    pessoas do universo constitudo por do-

    centes de escolas pblicas e privadas das 27

    unidades federativas. Sobre a participao

    docente em eventos e atividades culturais

    (visitas a museus e exposies de artes visu-

    ais, frequncia a teatro, concertos, cinema

    etc.), os dados so alarmantes: 62,1% nun-

    ca foram a um concerto de msica erudita,

    17,4% nunca foram ao teatro, 14,8% nunca

    foram a um museu, 8,6% nunca visitaram

    uma exposio em centros culturais e 8,6%

    nunca foram ao cinema.

    Os baixos ndices de consumo de bens cul-

    turais obtidos nessa pesquisa podem indicar

    que, em muitos municpios brasileiros,

    pequena ou nula a oferta de equipamentos,

    aes e eventos culturais. No Brasil, a maio-

    ria das aes culturais no abrange muitos

    segmentos do mercado consumidor, pois

    esto nos grandes centros urbanos e so

    destinadas a um pblico mais exigente e di-

    ferenciado que vive nas capitais de mais pro-

    jeo (CAIADO, 2001). Ou seja, o investimen-

    to pblico em cultura subsidia o consumo

    das camadas de mdia e alta renda (SANTOS,

    2009). Ao no contemplar pequenos munic-

    pios e a periferia das grandes cidades, tais

    aes no atingem as camadas de mais bai-

    xa renda, nas quais a maior parte do profes-

    sorado se inclui.

    Mas outros fatores contribuem para o baixo

    ndice de consumo cultural entre professo-

    res e professoras. Em pesquisa mais recente

    (ALMEIDA; CAMARGO; SILVA, 2007), que cor-

    robora os ndices acerca do consumo cultu-

    ral obtidos na pesquisa UNESCO, as profes-

    soras entrevistadas afirmam que jornadas

    de trabalho intensas e salrios baixos, bem

    como a falta de familiaridade com certos

    tipos de produo artstica suas histrias

    de vida familiar e escolar no registram tais

    experincias limitam ou impedem certas

    prticas culturais. Essas justificativas con-

    firmam que a dificuldade de acesso a certas

    expresses da cultura se vincula ao nvel de

    educao, profisso, localizao domici-

    liar e, sobretudo, s transmisses familiares

    como assinala Bourdieu (1998).

    Os resultados das pesquisas aqui citadas

    permitem supor que as experincias cultu-

    rais da maior parte do professorado brasi-

    leiro no se distinguem das experincias

    do alunado, pois compartilham a mesma

    cultura amorfa disseminada pela indstria

    cultural via meios de comunicao massi-

    va. Assim, cabe indagar: como professores e

    professoras podem ampliar a bagagem cul-

    tural de alunos e alunas se os repertrios de

    experincias estticas de ambos se asseme-

    lham?

  • 18

    O baixo ndice de frequncia a eventos cul-

    turais entre professores e professoras se tor-

    na ainda mais srio porque fatores sociais

    e culturais so centrais na constituio de

    saberes docentes e na mediao de conheci-

    mentos escolares. Ora, na prtica educativa,

    no s se busca cumprir as prescries da

    cultura escolar6, mas

    tambm se expressa

    uma subjetividade pro-

    duzida pela cultura vi-

    vida em sociedade.

    Se escola cabe a

    responsabilidade de

    ampliar a dimenso

    expressiva e criativa

    de alunos e alunas,

    familiarizando-os com

    um mundo cultural

    alheio ao cotidiano de

    suas vidas, premen-

    te a necessidade de

    se implementar uma

    poltica de formao

    profissional que preve-

    ja o desenvolvimento cultural e esttico do

    professorado da educao bsica.

    Defender uma formao cultural que ultra-

    passe os limites do que a cultura massiva

    pode oferecer, de modo algum, supe op-

    la chamada cultura erudita. No se trata

    de preferir uma a outra, pois os universos

    distintos de significados culturais que tran-

    sitam na sociedade contempornea no po-

    dem ser hierarquizados; antes, tm de ser

    previstos no processo criativo dos sujeitos

    e nas mediaes possveis entre o vivido, o

    aprendido e o imagi-

    nado. Nesse caminho,

    cabe ao professorado

    reconhecer as cultu-

    ras locais de que o

    alunado participa s

    vezes de forma dspar

    e levar sala de aula

    outros universos de

    significados para que

    possam ser confronta-

    dos, apropriados e re-

    construdos.

    O consumo de bens

    culturais direito de

    todos, por isso tarefa

    do Estado implemen-

    tar aes coordenadas

    e contnuas para ampliar as condies de

    acesso cultura mediante servios cultu-

    rais que garantam formas de incluso e

    participao de todos; ou seja, uma polti-

    ca cultural que amplie as dimenses exis-

    tenciais para alm do trabalho e da sub-

    O baixo ndice

    de frequncia a

    eventos culturais

    entre professores e

    professoras se torna

    ainda mais srio

    porque fatores sociais e

    culturais so centrais na

    constituio de saberes

    docentes e na mediao

    de conhecimentos

    escolares.

    6 Cultura escolar o [...] conjunto dos contedos cognitivos e simblicos que, selecionados, organizados, normalizados, rotinizados, sob o efeito dos imperativos de didatizao, constituem habitualmente o objeto de transmisso deliberada no contexto das escolas [...] (Forquin, 1993, p. 167).

  • 19

    sistncia. Equivocadamente, as polticas

    pblicas para se democratizar a cultura se

    fundamentam na ideia de que os entraves

    ao consumo de tais bens so materiais: m

    distribuio ou ausncia de espaos cultu-

    rais, ingressos com preo muito alto etc.

    No entanto, na contramo do que revelam

    as pesquisas, as barreiras simblicas pre-

    ponderam como forma de impedir alguns

    segmentos da populao de consumirem

    certos bens culturais.

    A sensibilidade, sobretudo em relao a ex-

    perincias de apreciao artstica da msi-

    ca, da dana, do teatro, das artes visuais e

    do cinema, tambm constitui os saberes do-

    centes. Se tais experincias so reiterativas

    da cultura amorfa disseminada pela mdia

    massiva, elas expressam uma formao ini-

    cial e continuada ineficiente, agravada pela

    insero precria ou pela falta de insero

    na vida cultural. Superar esse problema de-

    pende do Estado (definio de prioridades,

    controle e acompanhamento de aes pro-

    gramadas ou fomentadas pelo governo) e da

    sociedade civil (que tem papel decisivo na

    construo dos sistemas culturais). Ao pro-

    fessorado cabe se mobilizar no s em prol

    do controle de gastos pblicos com cultu-

    ra, mas tambm de sua participao direta

    na definio de polticas culturais em geral

    e polticas para a formao de profissionais

    da educao em particular.

    Ora, se as barreiras simblicas preponderam

    como empecilhos para que certos segmen-

    tos da populao nesse caso, professores

    e professoras, alunos e alunas consumam

    certos bens culturais, ento necessrio que

    os currculos de formao docente deem

    mais ateno a prticas estticas, culturais

    e de criao. Enfim, se a escola instrumen-

    to poderoso para formar o gosto e estimular

    a apreciao e o uso de bens simblicos de

    forma duradoura e estvel, ento, urgen-

    te uma reviso curricular da formao ma-

    gisterial e polticas pblicas para formao

    cultural e esttica de docentes atuantes na

    educao bsica do Brasil. No uma polti-

    ca de eventos 7, mas uma poltica que crie

    um programa educativo a ser desenvolvido

    em longo prazo e abarque educao escolar,

    estudos superiores e formao continuada;

    um programa em que as instituies forma-

    doras sejam espaos no s de produo e

    difuso cultural, como tambm e sobretu-

    do de mediao cultural; um programa em

    que dadas as condies atuais de trabalho

    e salrio de professores e professoras haja

    uma democracia cultural que lhes possibili-

    te consumir outros bens culturais alm dos

    que so oferecidos pela indstria cultural.

    7 [...] conjunto de programas isolados que no configuram um sistema, no se ligam necessariamente a programas anteriores nem lanam pontes necessrias para programas futuros. (Teixeira Coelho, 1999, p. 300).

  • 20

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

    ALMEIDA, Clia M. C.; CAMARGO, Ana Maria

    F.; SILVA, Silvia M. C. Repertrio cultural de

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    In: Nogueira, Maria Alice; CATANI, Afrnio

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    n. 1, de 18 de fevereiro de 2002. Institui Di-

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    GATTI, Bernadete A.; BARRETTO, Elba Siquei-

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    Acesso em 10 de fev. de 2009.

    TARDIF, Maurice. Saberes docentes e forma-

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    2002.

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    e conhecimentos universitrios. Elementos

    para uma epistemologia da prtica profis-

    sional dos professores e suas consequncias

    em relao formao para o magistrio.

    Revista Brasileira de Educao, n. 13, p. 524,

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  • 21

    TEIXEIRA COELHO NETO, Jos. Dicionrio cr-

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    CO. O perfil dos professores brasileiros: o que

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    VYGOTSKY, Lev S. A educao esttica. In:

    ______. Psicologia pedaggica. Porto Alegre:

    Artmed, 2003. p. 225-48.

  • 22

    TEXTO 3

    exPerinCias esttiCas e linguagens artstiCas

    inquietudes e exPerinCias esttiCas Para a eduCaoLuciana Gruppelli Loponte

    1

    Uma sala escura, um vdeo. Na tela nos-

    sa frente, uma mulher equilibra-se sobre

    a linha do horizonte sobre o mar, em uma

    praia qualquer, num vai-

    e-vem contnuo e lento,

    enquanto a mudana das

    nuvens atrs dela revela

    a passagem do tempo.

    Se a frase acima apa-

    rentemente demonstra

    uma situao nonsen-

    se, pode adquirir outro

    significado se devida-

    mente contextualizada.

    Trata-se de uma descrio sucinta de Touch,

    um vdeo/instalao da artista Janine Antoni,

    apresentado na 7 Bienal do Mercosul, reali-

    zada em Porto Alegre, de 16 de outubro a 29

    de novembro de 2009, na mostra Fices do

    Invisvel2.

    A arte contempornea traa novos mapas es-

    tticos e desconcerta as nossas provisrias

    certezas sobre o que ou pode ser conside-

    rado arte. Mas o que produes como essas

    podem dizer ao campo da educao? Muito.

    As exposies das quais

    participaram essa e ou-

    tros artistas demons-

    traram uma intensa

    preocupao pedaggi-

    ca com aes educati-

    vas que extrapolam os

    conceitos mais comuns

    do pedaggico, sem

    tentar didatizar obras

    to complexas, mas

    tornando mais acess-

    veis as discusses levantadas pelos artistas.

    Por exemplo, vale destacar o projeto pedag-

    gico da 7 Bienal do Mercosul que contem-

    plou atividades prvias com vrios artistas,

    colocados em disponibilidade ao pblico

    em seminrios e residncias pedaggicas em

    escolas da capital do Rio Grande do Sul e em

    cidades do interior do estado.

    1 Doutora em Educao, professora Adjunta da Faculdade de Educao da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, coordenadora do GT Educao e Arte da Associao Nacional de Ps-Graduao e Pesquisa em Educao (ANPEd)

    2 Para mais detalhes ver http://www.fundacaobienal.art.br/ e http://www.youtube.com/watch?v=r_n2kfqNmpY

    A arte contempornea

    traa novos mapas

    estticos e desconcerta

    as nossas provisrias

    certezas sobre o que

    ou pode ser considerado

    arte.

  • 23

    Neste texto, no entanto, no trato sobre a

    importncia das aes educativas e a me-

    diao entre obra e pblico, mas sim das

    possibilidades e potencialidades que a arte

    e, em especial, a arte contempornea, ofe-

    recem para a formao esttica docente. As

    questes que trago para discusso aqui j fa-

    zem parte de minhas inquietaes h algum

    tempo (Loponte, 2005, 2006, 2007): h espa-

    o para criao e inveno na docncia? A

    docncia pode ser uma obra de arte? O que a

    docncia pode aprender com os/as artistas?

    Que tica/esttica possvel para a docn-

    cia na educao bsica? Estas questes so

    alimentadas pelo trabalho especfico com

    formao docente em arte (e outras reas) e

    pelas provocaes tericas dos filsofos Mi-

    chel Foucault e Friederich Nietzsche.

    A arte no campo da educao (aqui pensan-

    do em artes visuais, teatro, dana e msica),

    uma rea de saber que ainda de certa for-

    ma marginalizada na hierarquia curricular

    escolar ou considerada como uma atividade

    extracurricular, acessria ou alentadora da

    seriedade das disciplinas mais importan-

    tes. Muitas vezes a arte que entra na es-

    cola uma arte consoladora, confortvel,

    presente em decoraes de datas comemo-

    rativas, recurso para outras disciplinas, re-

    presentaes apenas para mostrar aos pais e

    mes... Apesar desse cenrio to conhecido

    e persistente, os avanos tericos do campo

    da arte e educao so muitos, no pode-

    mos ignorar. Basta considerar o incremento

    de publicaes e eventos na rea nos lti-

    mos anos, alm de experincias inovadoras

    em algumas escolas. Mas no disso que se

    trata este texto. Alm dessas questes, pre-

    ocupa-me em pensar: quais as sonoridades

    ouvidas pela escola quando se fala de arte? A

    arte apenas conforta ou tambm pode per-

    turbar, provocar, deslocar formas de pensar?

    E o que dizer da relao entre arte e forma-

    o docente?

    Ao nos ajudar a pensar nessas questes,

    Foucault e Nietzsche alimentam um pensa-

    mento sobre arte que vai alm do campo de

    um saber especfico, dominado apenas por

    alguns. Perguntar se, afinal, a vida no po-

    deria ser uma obra de arte, se no teramos

    muito a aprender com os artistas ou se

    podemos pensar que no h separao en-

    tre arte e vida, se quisermos ser os poetas-

    autores de nossas vidas (Foucault, 1995;

    Nietzsche, 2001) so algumas indagaes

    instigantes que podem impulsionar ques-

    tes importantes para a formao docente.

    A partir da amplitude dessas indagaes ini-

    ciais, tenho me preocupado em investigar

    temas mais especficos3: de que modo a arte

    e a experincia esttica podem alimentar a

    constituio da docncia na educao bsi-

    ca? O que professores e professoras da edu-

    3 Essas questes fazem parte do projeto de pesquisa Arte e esttica da docncia em fase de concluso em 2010, com financiamento do CNPq.

  • 24

    cao bsica, que atuam em nveis de ensi-

    no diversos (da Educao Infantil ao Ensino

    Mdio) e em campos disciplinares diversos

    e no necessariamente com arte, podem

    aprender com a arte e a experincia esttica

    para a sua prpria formao continuada do-

    cente? possvel encontrar espaos de cria-

    o na docncia da Educa-

    o Bsica?

    As interrogaes ticas

    que Foucault faz em seus

    ltimos escritos (Fou-

    cault, 1998, 2004), a partir

    do profundo estudo sobre

    os processos de subjetivi-

    dade na Antiguidade, tm

    me ajudado a entender

    do que pode ser feita uma

    possvel esttica de si do-

    cente: um diferir-se per-

    manentemente do que se

    , um modo artista de

    constituir-se, fugindo de

    modelos identitrios para

    a docncia, feitos de com-

    petncias e habilidades

    predeterminadas. Pensar

    em uma docncia artis-

    ta no , no entanto, pensar em um ponto

    de chegada e a tico-esttica que a constitui

    pouco tem a ver com a arte das obras-pri-

    mas e sua insuspeitada originalidade cris-

    talina. Assemelha-se mais quela arte que

    se assume como esboo, como rascunho

    contnuo, como busca de estilo, como expe-

    rimentao, como resultado rduo e quase

    infinito de trabalho do artista sobre si mes-

    mo. Uma arte que se aproxima mais do que

    chamamos hoje de arte contempornea,

    avessa a rotulaes, legendas definidoras,

    sentidos fechados, rompendo com frontei-

    ras de materiais, tc-

    nicas e temticas.

    Para Bauman (2009,

    p. 99), fazer da exis-

    tncia uma obra de

    arte nesse mundo

    lquido-moderno

    viver num estado

    de transformao

    permanente, auto-

    redefinir-se perpe-

    tuamente tornando-

    se (ou pelo menos

    tentando se tornar)

    uma pessoa diferen-

    te daquela que tem

    sido at ento. Bus-

    camos uma identi-

    dade, para logo des-

    cart-la. Praticamos

    a destruio criativa

    diariamente, con-

    tinua provocando Bauman. Isso pode dizer

    algo docncia?

    Parafraseando Nietzsche, acredito que a do-

    cncia pode aprender muito com a arte e

    artistas, e em especial com artistas contem-

    O que professores e

    professoras da educao

    bsica, que atuam

    em nveis de ensino

    diversos (da Educao

    Infantil ao Ensino

    Mdio) e em campos

    disciplinares diversos

    e no necessariamente

    com arte, podem

    aprender com a arte e a

    experincia esttica para

    a sua prpria formao

    continuada docente?

  • 25

    porneos. Com Michel Foucault, podemos

    pensar em certa inquietude consigo mes-

    mo, uma inquietude esttica que nos desa-

    comoda. Bem antes de Foucault, Nietzsche

    j vinha bradando pela arte e sua relao

    mais prxima com a vida, nos convocando

    a pensar nossa prpria existncia estetica-

    mente. A arte no um mero tintinar de

    guizos que se pode muito bem dispensar

    ante a seriedade da existncia, j advertia

    Nietzsche (2003) em seu primeiro livro aos

    homens srios, principalmente aqueles

    que encarnavam a racionalidade moderna

    e que desacreditavam no potencial da arte

    para a existncia. Seguindo as flechas lana-

    das por estes dois autores, podemos olhar

    para a docncia esteticamente, como uma

    forma de arte? Acredito que sim, e esta tem

    sido a aposta das minhas ltimas pesquisas.

    Arte e esttica na escola so percebidas com

    certo estranhamento por aqueles que no

    so os chamados especialistas em arte.

    Olha-se com desconfiana para um conhe-

    cimento que parece pertencer somente a

    alguns e que no to importante quanto

    reas disciplinares mais nobres do curr-

    culo escolar, ou consideradas mais srias.

    Mas por que no unir estas possibilidades

    em uma experincia de formao docente?

    Uma das temticas que tenho perseguido

    a arte contempornea e sua potencial rela-

    o com a formao esttica docente. Vale

    lembrar o quanto a discusso em torno da

    arte contempornea polmica, se conside-

    rarmos o quanto ainda prevalecem noes

    de senso comum em torno destas produ-

    es, tais como se isso arte, tambm sou

    artista, qualquer coisa pode ser arte?,

    mas isso arte?, no entendi nada, no

    gostei, sou burro diante dessas obras. As

    impresses mais comuns em torno da arte

    contempornea so, em certa medida, deri-

    vadas do apego s noes clssicas e romn-

    ticas em torno da arte aprendidas (formal

    ou informalmente) no percurso da nossa

    formao, e extrapolam o mbito dessa dis-

    cusso sobre formao docente. O que im-

    portante deixar registrado aqui neste texto

    so os movimentos que podemos fazer na

    relao desestabilizadora que as produes

    artsticas contemporneas (pensadas como

    metforas para a criao e para a vida como

    obra de arte) provocam aos modos mais co-

    muns com os quais estamos acostumados a

    problematizar a docncia.

    Embora a arte tematizada por Nietzsche te-

    nha sido sobremaneira a msica (Dias, 2005),

    podemos estabelecer relaes importantes

    do seu pensamento sobre arte e esttica e

    com as provocaes estticas contempor-

    neas para a formao. Rosa Dias (2006) nos

    lembra o quanto a arte para Nietzsche no

    pretende acalmar, nem suspender o desejo,

    o instinto, a vontade. A arte antes de mais

    nada o que intensifica a vida, enquanto

    fora contrria a toda forma de negar a vida,

    a arte a base de novos valores (Dias, 2006,

  • 26

    p. 197). Instigados pelo filsofo, e pela de-

    sestabilizao esttica da arte contempor-

    nea, podemos pensar em sermos artistas da

    nossa prpria existncia, nossa vida como

    obra de arte, e nossos modos de ser docen-

    te contaminados por uma perspectiva est-

    tica. preciso, no entanto, ao pensar e ler

    essas questes, no cair em armadilhas f-

    ceis como interpretar tais afirmaes como

    sinnimos de tudo que fazemos arte,

    qualquer um pode ser docente e artista,

    s a arte pode salvar a escola e seus pro-

    fessores. Nada disso. E nem h aqui uma

    apologia pela formao de docentes de qual-

    quer rea para trabalhar com arte na escola.

    Se ainda uma determinada arte escolar,

    sensvel, bonitinha e consoladora que

    permeia muitas das experincias estticas

    docentes (sejam de arte ou no) e conse-

    quentemente de seus alunos, podemos ir

    alm, pensando arte e experincia esttica

    na formao docente como uma forma de

    sacudir nossas ideias mais comuns a respei-

    to, ambicionando uma formao arejada e

    provocada por inquietaes estticas, inde-

    pendentemente da rea de conhecimento.

    H espaos para inveno e criao na do-

    cncia? Com Nietzsche, penso em experin-

    cias estticas que podem suscitar o estado

    de embriaguez da criao, pensando na arte

    bem alm de uma finalidade moral. Que po-

    tncia a arte e a experincia esttica tm

    para desacomodar, desalojar certezas de

    docentes de Arte, Matemtica, Portugus,

    Pedagogia, Histria ou qualquer outra rea?

    Obras e experincias desestabilizadoras,

    como as produes da arte contempornea,

    podem nos tirar do lugar estvel onde nos

    posicionamos cotidianamente como docen-

    tes? Que espectadores-criadores podemos

    ser? Reviver a experincia do criar na forma-

    o docente, invenes de si mesmo (a) na

    docncia, criar obras de arte em prticas

    pedaggicas, embriagar nossos modos de

    nos constituirmos como docentes: ambio

    demais? Por que no?

    Antes de qualquer mal-entendido, aviso que

    no h aqui a busca por um educador mais

    sensvel e adocicado pelas vias da arte.

    preciso cuidado ao ler as palavras e pensar

    no que j aprendemos e pensamos sobre

    elas. da arte provocadora, zombeteira, em-

    briagadora de que falamos aqui: uma arte

    sem moral. No poderia ser diferente se

    escolhemos nos acompanhar pelo filsofo-

    danarino de fartos bigodes. Com ele, luta-

    mos contra a finalidade moralizante da arte,

    que ocupa largo espao nas interpretaes

    estticas escolares. de uma outra arte que

    precisamos se queremos abrir espaos de

    criao na docncia. Sejamos menos ino-

    centes e puros quando pensamos em arte e

    docncia: ao Diabo com a moral (Nietzs-

    che, 2006, p.77).

    A imagem da artista Janine Antoni equili-

    brando-se sobre a linha de horizonte em

    dias sucessivos, aprendendo a equilibrar-se

    no desequilbrio, pode ser uma boa metfo-

  • 27

    ra para pensar a relao entre arte, experi-

    ncia esttica e docncia. Seremos capazes,

    afinal, de transformar nossas experincias

    docentes em arte?

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

    BAUMAN, Zygmunt. A arte da vida. Rio de Ja-

    neiro: Zahar, 2009.

    DIAS, Rosa. Nietzsche e a fisiologia da arte.

    In. Nietzsche e os gregos: arte, memria e edu-

    cao: assim falou Nietzsche V. Rio de Janeiro:

    DP&A, 2006. p. 195-204.

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    curso Editorial; Iju, RS: Uniju, 2005.

    FOUCAULT, Michel. A hermenutica do sujei-

    to. So Paulo: Martins Fontes, 2004.

    ______. Histria da sexualidade v. 2: O uso dos

    prazeres. 8. ed. Rio de Janeiro: Graal, 1998.

    ______. Sobre a genealogia da tica: uma

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    RABINOW, Paul. Michel Foucault, uma tra-

    jetria filosfica. Para alm do estruturalismo

    e da hermenutica. Rio de Janeiro: Forense

    Universitria, 1995. p. 253-278.

    LOPONTE, Luciana Gruppelli. Arte da docn-

    cia em arte: desafios contemporneos. In:

    OLIVEIRA, Marilda Oliveira de. (org.). Arte,

    educao e cultura. Santa Maria, RS: UFSM,

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    _______. Escritas de si (e para os outros) na

    docncia em arte. Revista do Centro de Educa-

    o da UFSM, v. 31, n.2, p. 295-304, 2006.

    _______. Docncia Artista: arte, esttica de si e

    subjetividades femininas. Tese de Doutorado

    em Educao, UFRGS, 2005.

    NIETZSCHE, Friederich. Crepsculo dos do-

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    ______. O nascimento da tragdia ou helenis-

    mo e pessimismo. So Paulo: Companhia das

    Letras, 2003.

    _______. A gaia cincia. So Paulo: Compa-

    nhia das Letras, 2001.

  • 28

    Presidncia da Repblica

    Ministrio da Educao

    Secretaria de Educao a Distncia

    Direo de Produo de Contedos e Formao em Educao a Distncia

    TV ESCOLA/ SALTO PARA O FUTURO

    Coordenao-geral da TV Escola

    rico da Silveira

    Coordenao Pedaggica

    Maria Carolina Machado Mello de Sousa

    Superviso Pedaggica

    Rosa Helena Mendona

    Acompanhamento Pedaggico

    Grazielle Avellar Bragana

    Coordenao de Utilizao e Avaliao

    Mnica MufarrejFernanda Braga

    Copidesque e Reviso

    Magda Frediani Martins

    Diagramao e Editorao

    Equipe do Ncleo de Produo Grfica de Mdia Impressa TV BrasilGerncia de Criao e Produo de Arte

    Consultora especialmente convidada

    Monique Andries Nogueira

    E-mail: [email protected]

    Home page: www.tvbrasil.org.br/salto

    Rua da Relao, 18, 4o andar Centro.

    CEP: 20231-110 Rio de Janeiro (RJ)

    Junho 2010