11 - Design Contemporaneo Cultura Digital.pdf

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Design Contemporâneo = Cultura Digital + Linguagem + Hibridismo Contemporary Design = Digital Culture + Language + Hybrid MOURA, Mônica Profa. Doutora em Comunicação e Semiótica da Universidade Anhembi Morumbi - SP. Palavras-chave: Design, Hibridismo, Tecnologia. Resumo: O artigo trata das mudanças na criação e produção do design gráfico a partir da disseminação da tecnologia digital, analisa alguns projetos gráficos que exemplificam estas mudanças e aponta relações históricas entre design, cultura digital, hibridismo e contemporaneidade. Key-words: Design, Hybrid imagery, Technology. Abstract: The article treats of the changes in the creation and production of the graphic design starting from the diffusion of the digital technology, it analyzes some graphic projects that exemplify these changes and it points historical relationships among design, culture digital, hybrid and contemporary moment. Design e Cultura Digital A funcionalidade rígida e sem espaço ao lúdico, a limpeza da forma, a grade como uma estrutura de padrões determinados, os princípios 'a forma segue a função' e 'menos é mais', caíram por terra mediante as mudanças tecnológicas e de linguagem destes tempos pós-modernos. As possibilidades de desconstrução, apropriação, articulação, velocidade, relação e acesso a imagens de todos os tempos e épocas possibilitadas pelos processos digitais determinaram uma nova e outra linguagem. Se antes a ortogonalidade determinava o projeto, hoje é a sinuosidade e a circularidade que determinam o espaço, porém sem virar lei, ou seja, tudo é possível, inclusive pensar o espaço sinuoso relacionado ao ortogonal, pensar o espaço construindo-se, modificando-se e desconstruindo-se constantemente. Os princípios clássicos do design que foram pensados para o universo bidimensional do design gráfico ou para o universo tridimensional do design de produto não bastam para atender as características da mídia e do design digital e interativo. A própria história nos comprova que a cada mudança tecnológica e cultural, o design se modifica, pois são gerados novos padrões de criação, de produção e de percepção. Na atual realidade o design é revalorizado e se torna campo de essencial importância. Porém, diante destes novos paradigmas do ciberespaço os fundamentos tradicionais do design devem-se ampliar, adaptando-se à nova realidade. Para quem atua ou deseja atuar como um designer destas novas mídias é necessário conhecer as características desta linguagem e os seus elementos compositivos de modo a utilizar e a projetar para esta área envolvendo toda a sua complexidade e potencialidade. 21 anos de Experimentação e Linguagem Digital O início dos anos de 1980 i despontou na área de design com projetos e peças repletos de imagens fragmentadas, em fusão, híbridas que indicavam uma nova estética e uma diferente maneira de criar e projetar. Designers americanos como April Greiman, Rudy VanderLans, Katherine McCoy, entre outros, começaram a utilizar e experimentar as ferramentas e as possibilidades do sistema e programas dos computadores da marca Apple que acabavam de chegar ao mercado. Estes designers compreenderam rapidamente que o sistema informático e computacional trazia um novo paradigma e abria uma nova era de possibilidades para os design gráfico. Também perceberam que a

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  • Design Contemporneo = Cultura Digital + Linguagem + Hibridismo Contemporary Design = Digital Culture + Language + Hybrid

    MOURA, Mnica Profa. Doutora em Comunicao e Semitica da Universidade Anhembi Morumbi - SP.

    Palavras-chave: Design, Hibridismo, Tecnologia.

    Resumo: O artigo trata das mudanas na criao e produo do design grfico a partir da disseminao da tecnologia digital, analisa alguns projetos grficos que exemplificam estas mudanas e aponta relaes histricas entre design, cultura digital, hibridismo e contemporaneidade.

    Key-words: Design, Hybrid imagery, Technology.

    Abstract: The article treats of the changes in the creation and production of the graphic design starting from the diffusion of the digital technology, it analyzes some graphic projects that exemplify these changes and it points historical relationships among design, culture digital, hybrid and contemporary moment.

    Design e Cultura Digital

    A funcionalidade rgida e sem espao ao ldico, a limpeza da forma, a grade como uma estrutura de padres determinados, os princpios 'a forma segue a funo' e 'menos mais', caram por terra mediante as mudanas tecnolgicas e de linguagem destes tempos ps-modernos. As possibilidades de desconstruo, apropriao, articulao, velocidade, relao e acesso a imagens de todos os tempos e pocas possibilitadas pelos processos digitais determinaram uma nova e outra linguagem.

    Se antes a ortogonalidade determinava o projeto, hoje a sinuosidade e a circularidade que determinam o espao, porm sem virar lei, ou seja, tudo possvel, inclusive pensar o espao sinuoso relacionado ao ortogonal, pensar o espao construindo-se, modificando-se e desconstruindo-se constantemente.

    Os princpios clssicos do design que foram pensados para o universo bidimensional do design grfico ou para o universo tridimensional do design de produto no bastam para atender as caractersticas da mdia e do design digital e interativo.

    A prpria histria nos comprova que a cada mudana tecnolgica e cultural, o design se modifica, pois so gerados novos padres de criao, de produo e de percepo. Na atual realidade o design revalorizado e se torna campo de essencial importncia. Porm, diante destes novos paradigmas do ciberespao os fundamentos tradicionais do design devem-se ampliar, adaptando-se nova realidade.

    Para quem atua ou deseja atuar como um designer destas novas mdias necessrio conhecer as caractersticas desta linguagem e os seus elementos compositivos de modo a utilizar e a projetar para esta rea envolvendo toda a sua complexidade e potencialidade.

    21 anos de Experimentao e Linguagem Digital

    O incio dos anos de 1980i despontou na rea de design com projetos e peas repletos de imagens fragmentadas, em fuso, hbridas que indicavam uma nova esttica e uma diferente maneira de criar e projetar. Designers americanos como April Greiman, Rudy VanderLans, Katherine McCoy, entre outros, comearam a utilizar e experimentar as ferramentas e as possibilidades do sistema e programas dos computadores da marca Apple que acabavam de chegar ao mercado.

    Estes designers compreenderam rapidamente que o sistema informtico e computacional trazia um novo paradigma e abria uma nova era de possibilidades para os design grfico. Tambm perceberam que a

  • tecnologia digital alterava o processo de criar e fazer design de modo significativo. A rapidez associada facilidade de fazer e desfazer, a gerao de uma srie possibilidades grficas somadas a finalizao com qualidade profissional se mostravam de forma muito positiva.

    A designer April Greiman (1990) indicava que esta nova maneira de produzir levava a uma condio de incerteza e instabilidade que se estendia a todo o projeto. Nada era definitivo e fsico tudo podia ser eliminado e modificado a todo instante. Sabemos que no mundo digital nada est definitivamente acabado, qualquer arquivo de dados pode ser reconsiderado e reutilizado a qualquer momento e esta facilidade permite ter sempre em vista um grande nmero de opes e de variaes. At os acidentes, os rudos e erros podem se tornar elementos da linguagem projetual e as limitaes tcnicas podem ser tornar partido do projeto, desde que trabalhadas conceitualmente.

    Um dos exemplos destas transformaes e da nova esttica emergente foi o cartaz criado e desenvolvido por Greiman para a revista Design Quarterly, n. 133, no ano de 1986. Segundo Poynor (2003) tanto a concepo quanto a elaborao deste cartaz dependia das ferramentas eletrnicas e refletiu no resultado final uma sensibilidade digital exuberante e intransigente.

    Este cartaz uma declarao da associao da tcnica, da linguagem digital, do hibridismo presentes nos projetos a partir de ento. Fatos que ficam bem exemplificados na descrio do processo de criao e produo desta designer: "... seis meses compilando material; trs meses desenhando com MacPaint e digitalizando imagens com MacVision, e depois trs meses compondo, superpondo e ampliando a imagem com McDraw antes de imprimi-la com LaserWriter - uma tarefa que parecia desafiar a tecnologia " (Greiman in Poynor: 2003, 99).

    O cartaz de 0,60 X 1,80 apresenta um auto-retrato, uma imagem em tamanho natural de Greiman nua com todo o seu corpo revestido de textura obtida a partir de pontos e pequenas linhas que indicam a presena dos pixels como elemento mnimo da construo imagtica computacional. Abaixo e entre o espao de seus ps a imagem de seu rosto com os cabelos presos e um olhar frontal direto ao observador representa o seu duplo espiritual, conforme suas prprias palavras, e tambm pela presena do ttulo 'the spiritual dowble' na lateral desta imagem. Alm disto, h uma srie de imagens sobrepostas e justapostas ao seu corpo: figuras geomtricas, representaes do universo, planetas, dinossauro, crebro, astronauta, smbolos lunares, mticos e sexuais, mos em diversos gestos e representaes pr-histricas convivem com uma linha do tempo.

    I. April Greiman. Cartaz, Revista Design Quarterly, n. 133, EUA, 1986.

    Segundo Rick Poynor, este cartaz apresenta "distintas invenes e acontecimentos que se inserem em uma linha temporal (...) nos recorda uma imagem esquemtica da humanidade enviada atravs do espao para atender uma mo amiga de possveis extraterrestres que vai do nascimento desta designer at o surgimento do computador Mac" (Poynor: 2003, 99).

  • Na lateral da linha do tempo h uma seqncia de palavras que esto no limite do cartaz, como se estabelecessem uma margem, o limiar entre a representao e a realidade. As palavras so de diversas naturezas. Algumas se referem partculas fsicas elementares (prton, nutron, eltron) outras a unidades de pesos e medidas (mili, micro, nano, quilo, pipa, tera). Outras surgem como dicotomias (ordem, caos) e outras ainda parecem indicar a pluralidade do momento contemporneo e relaes possveis do universo computacional (jogo, sonho, faa sons). Na base da linha do tempo h algumas palavras que podem ser indicativas da busca para o equilbrio espiritual humano, como tambm parecem ser palavras de ordem (dance, sinta, no se preocupe, seja feliz).

    A linha do tempo se contrape aos outros elementos imagticos e contextuais. Podemos observar a dicotomia ordem e caos presente se relacionarmos a rea da linha do tempo organizada e linear reafirmada pelo paralelismo dos braos e da linha mediana estabelecida entre o corpo da designer e a cabea na base. Estas informaes contrastam com os outros elementos que parecem inseridos num caos proposital, como um jogo de imagens que aludem ora organizao, ora desorganizao e esto localizados em diversas reas do cartaz, sobrepostas ao corpo ou inseridas na parte superior da pea.

    O conjunto da composio proporciona a criao de narrativas diversas a partir de uma srie de acontecimentos reais e imaginrios, ilustrados por meio de palavras e de imagens. Tambm nos leva a pensar que a designer apresenta as caractersticas da contraposio entre o universo material e imaterial, as questes da linearidade e no-linearidade, da imagem sinttica e processada e da representao desenhada, do grafismo e da geometria, da forma orgnica e geomtrica.

    No artigo 'Miss April' publicado na Print, Chuck Byrne afirma que este cartaz foi muito importante para "determinar as caractersticas nicas do computador e o impacto destas caractersticas no 'aspecto' futuro da comunicao visual"(Byrne: 1987, 144).

    Podemos acrescentar que este cartaz foi determinante por marcar a mudana da tecnologia e a introduo dos procedimentos informticos no cotidiano do design grfico, demonstrando uma srie de novas possibilidades. O carter excessivo presente no tamanho, na presena de vrios detalhes grficos e a grande quantidade de informaes o tornaram complexo. Provavelmente esta pea instigou, atordoou o olhar e a visualidade das pessoas que tiveram contato direto com ela. uma tpica expresso da cultura digital contempornea que exigiu (e continua exigindo) uma maneira diferenciada de olhar, perceber e se relacionar com a produo cultural e com o design ps-moderno.

    Baudrillard observa que na cultura contempornea convivemos com um excesso de informaes que invadem nosso espao privado forando a extroverso de qualquer interioridade e fazendo-nos viver o xtase obsceno da comunicao, uma obscenidade do visvel mais que visvel, do completamente exposto (Baudrillard apud Poynor: 100 e 101, 2003).

    II. Katherine Mc Koy, III. Rudy Vanderlans, IV. Rudy Vanderlans, Ilustrao, Emigre n. 5, Cartaz Cranbrook, 1989. Capa, Emigre n. 11, 1989. 1986.

  • importante ressaltar que April Greiman no foi a nica a trabalhar questionando e explorando os recursos digitais. Outros designers como Katherine Mc Koy e Rudy Vanderlans, entre outros, tambm indicaram estas questes em seus trabalhos como podemos observar no cartaz para Cranbrook de 1989 da designer Mc Koy, na ilustrao realizada para a revista Emigre n. 5 de 1986 e na capa da Emigre n. 11 de 1989, ambas executadas por Vanderlans.

    Estes exemplos nos trazem as caractersticas da multiplicidade, da metamorfose, da colagem, do hibridismo, da associao de imagens de diversas pocas, de diferentes procedncias, do texto aplicado alm do seu sentido verbal que destaca a visualidade e a explorao tipogrfica. Ainda h indicao de movimento perceptivo, apesar de a imagem ser esttica e presente em um suporte bidimensional impresso. O jogo de contrastes de cores e luzes, de formas e espaos estabelece uma dinmica rica de informaes.

    Os trabalhos de design grfico dos anos 1990 demonstram a continuidade das experimentaes e da interferncia digital nos processos de criao e expresso iniciados na dcada anterior e indicam a sobrecarga de informaes, a diluio de fronteiras entre reas, o processamento de dados presente nas atividades mais comuns da vida cotidiana. Devemos lembrar que falamos da fase pr-internet, ou seja, as questes e caractersticas apontadas nos trabalhos grficos dos anos 80 e incio dos 90 do sculo XX abriram caminho e estabeleceram uma nova esttica que culminou aps o surgimento da Internet e da WWW.

    Quando nos remetemos a este resgate histrico nos conscientizamos sobre os 21 anos de presena das questes digitais no universo do design grfico. Apesar disto, ainda hoje temos que discutir e apresentar a importncia destas mudanas e lembrar que elas no ocorreram apenas na forma e sim na estrutura e na linguagem do design, determinando novos segmentos e novos paradigmas. Por outro lado, podemos dizer que 21 anos no representam quase nada em termos histricos e teremos de continuar o caminho de anlise e reflexo sobre estas mudanas, buscando a compreenso e uma abertura maior aos procedimentos adotados na ps-modernidade. Ou seja, apesar do design digital ter atingido sua maioridade ele tem ainda de pedir permisso para participar da festa do design consagrado e encarado como um pr-adolescente sem opinio prpria.

    Na dcada seguinte, anos de 1990, podemos ver a continuidade da experimentao e explorao do universo computacional e digital nos exemplos citados a seguir. O cartaz para a exposio Cranbrook Design: the new discourse em 1990 realizado por Scott Makela com imagens de origens fotogrficas e televisivas alteradas e distorcidas, contrastes cromticos e de sombras, luzes e brilhos, palavras que sugerem movimento. A capa de disco 3MB Featuring Magic Juan Atkins de 1993 desenvolvido pelo grupo ingls The Designers Republic que apresenta uma trama grfica de palavras, formas e pontos que geram texturas num jogo cintico de movimento, proximidade e distanciamento.

    IV. Scott Makela, Cartaz, 1990. V. The Designers Republic, Capa de Disco, 1993.

  • No final dos anos 90 (sculo XX) os designers do Me Company apresentam em seus trabalhos a miscigenao entre homem e mquina gerando organismos cibernticos, aplicando modelos virtuais construdos em 2D e 3D como podemos ver na srie de capas de CD desenvolvidos para a cantora Bjorg - Army of Me, Bachelorette e Alarm Call de 1995, 1997 e 1998, respectivamente. a presena da miscigenao de linguagens atravs dos recursos possibilitados e da influncia exercida pelas novas tecnologias e mdias.

    VI, VII e VIII. Me Company, Capas de CD Bjorg - Army of Me, 1995; Bachelorette, 1997 e Alarm Call, 1998.

    IX e X. Attik, Ilustrao de pgina dupla, Noise 3.5: Analytical Experiments in Graphic Science, 1998.

    J no final dos anos de 1990, os designers do estdio Attik desenvolveram imagens digitais (geradas no computador) extremamente trabalhadas que relacionam textos, diagramas, superposies, imagens com caractersticas sintticas, imagens de exames clnicos e de medicina nuclear. o mundo ciberntico que est retratado nestes trabalhos, a mistura do ser humano e do rob, como em um processo de simbiose, caracterstico com o que ocorre na criao computacional.

    Podemos encontrar exemplos semelhantes no Brasil a partir dos anos de 1990. Se tomarmos como referncia a 2. e 3. Bienal de Design Grfico da ADGii realizadas na capital de So Paulo, respectivamente, no ano de 1994 e 1996 e a 6. Bienal ocorrida anos depois, em 2002, podemos perceber a presena da computao grfica e a interferncia dos processos informticos na criao e execuo dos projetos e peas apresentadas que vo alm de um modismo passageiro. Quase uma dcada separa estas bienais e no s as caractersticas digitais contemporneas continuam a se fazer presentes, como h um aumento significativo no nmero de trabalhos selecionados e expostos que apresentam tais caractersticas e destacam um design hbrido.

    O cartaz do 9 Festival Videobrasil de Kiko Farkas (1994); o cartaz do documentrio Ulisses Cidado de Ana Luisa Escorel (1996); o logotipo da Casa das Rosas de Fernanda Sarmento e Noris Lima (1996) apresentam estas questes. Imagens que se fundem, grafismos das mais variadas espcies, recursos das ferramentas e dos sistemas computacionais, bem como a visualizao de pontos que remetem aos pixels.

  • O projeto editorial do livro Os Farrapos de Cl Barcellos; a capa da revista Tupigrafia de Claudio Rocha e Tony De Marco; o conjunto de matrias de temas diversos do jornal O Dia de Andr Hippert e Lusa Bousada; os cartazes do evento XXIV Gioconda Venuta realizados pela equipe do escritrio Nuts Design; o cartaz para o Cd AD de Alexandre Suannes apresentam as influncias dos processos da computao grfica e as caractersticas do meio digital.

    XI. Kiko Farkas, Cartaz, 1994. XII. Ana Luisa Escorel, Cartaz, 1996. XIII. Fernanda Sarmento e Noris Lima, Logotipo, 1996.

    XIV. Claudio Rocha e Tony De Marco, XV. Cl Barcellos, Livro Os Farrapos, 2001. Capa da revista Tupigrafia, 2000.

  • XVI. Andr Hippert e Lusa Bousada, XVII. Alexandre Suannes, cartaz para o Cd AD, Cadernos do Jornal O Dia, 2000. 2000.

    XVIII. Nuts Design, Cartazes do evento XXIV Gioconda Venuta, 2000.

    Em todos esses trabalhos h o predomnio da fuso de imagens; imagens impressas, mas que aludem a vrios outros tipos de imagem (pictricas, videogrficas, televisivas, desenhos, grafites, grafismos); experimentaes tipogrficas (caligrafias, diferentes tamanhos e diferentes letras e famlias tipogrficas contrastam e se integram). Vrios planos coexistem dentro de um mesmo plano, h inverses das formas e dos espaos, explorao de diferentes efeitos e tipos de resoluo (alta e baixa) em uma total fuso de linguagens que remetem ao hibridismo.

    O Design Hbrido

    Devemos lembrar que o jornal, o teatro, o cinema, a televiso e a produo videogrfica trouxeram o hibridismo em diferentes graus e quantidades de linguagens inter-relacionadas, mas o pice do hibridismo pode ser encontrado a partir da utilizao da computao grfica e dos sistemas informticos-digitais que geram uma constante re-significao de valores e possibilidades na produo contempornea.

    O hibridismo o encontro ou associao de duas ou mais mdias. Amplia as descobertas e possibilidades criativas e permite desenvolver novas formas de criao e expresso imagticas e projetuais. Sabemos que a utilizao do hibridismo no foi inaugurada a partir da cultura digital, mas nos parece que nunca tantos meios foram acionados ao mesmo tempo, nunca houve tanta miscigenao, tanto cruzamento, tanto inter-relacionamento entre elementos advindos de diferentes processos, linguagens e mdias.

    Imagens pictricas, fotogrficas, videogrficas, desenhos, ilustraes, grafismos, animaes em 2D e 3D, diversas tipografias e caligrafias, textos, poesias visuais, frases soltas, narrativas, jogos, telas sobrepostas, justapostas, concntricas propem uma nova e dinmica diagramao. Tambm so incorporados os rudos e interferncias dos prprios sistemas ou programas que constituem uma nova paisagem e convivem na mesma interface, associando-se e fundindo-se em uma nova esttica, em uma nova potica.

    O hibridismo vem no sentido contrrio da limpeza visual e da formalidade funcionalista e ulmiana. Rompe com este axioma, mas abre as possibilidades de criao e de explorao de uma nova linguagem e de uma nova mdia. McLuhan dizia que os meios so agentes produtores de conhecimentos e a hibridizao a combinao destes agentes. A hibridao se faz pela interpenetrao de um meio em outro ou mais meios, estabelecendo novos ndices relacionais e caracterizando um momento de libertao e de resgate dos nossos sentidos, fazendo-nos ampliar as nossas percepes, constituindo "um momento de verdade e revelao, do qual nasce a forma nova (Mcluhan: 1979, 75).

    Edmond Couchot (1993) indica a ampliao da ao hbrida a partir das tecnologias computacionais que ocorre em vrios nveis inter-relacionais entre as formas, as imagens, a imagem e o objeto, a imagem e o

  • sujeito, o universo simblico dos modelos e o universo instrumental dos utenslios e tcnicas, o pensamento tcnico-cientfico e o pensamento figurativo, as linguagens, os saberes instrumentais, os modos de pensamento e de percepo. Enquanto Janet Murray (2003), ao se referir esttica das novas mdias, diz que os ambientes digitais trazem em sua essncia o prazer da transformao, nos quais qualquer coisa que vemos em formato digital palavras, nmeros, imagens, quadros se torna mais plstica, convidando sempre mudana.

    O designer Marcelo Bicudo nos lembra que o hbrido uma "mistura que mantm as caractersticas de suas matrizes, no havendo uma sobreposio facilmente perceptvel" (Bicudo: 2003, 3) e que a integrao das tecnologias possibilita o intercmbio de linguagens, amplia os limites para a liberdade criativa e configura o design hbrido.

    O design hbrido alm de relacionar diversas linguagens, procedimentos e mdias caminha no sentido de atingir todos os sentidos humanos e integrar diferentes campos de saber, rompendo com a distncia e os muros existentes entre estas reas. Arquitetura, engenharia, moda, msica, urbanismo se integram e se somam, rompendo com valores e padres h muito estabelecidos e constituindo o design hbrido, prprio da contemporaneidade.

    i No ano de 1984 os computadores Apple Macintosh chegam ao mercado americano

    ii Associao dos Designers Grficos - ADG/Brasil

    Bibliografia

    Bicudo, M. O Design Hbrido na Escala de Comunicao Humana. (Dissertao de Mestrado. Comunicao e Semitica) PUC/SP, 2003, 128p. Byrne, C. Miss April. In: Print, XLI: V, set/out, 1987, EUA, p.144. Bonsiepe, G. Design do Material ao Digital. Florianpolis: FIESC/IEL, 1997, cap. 14, 192 p. Couchot, E. Da Representao Simulao. In: A. Parente (org). Imagem Mquina. Rio de Janeiro, 34, 1996, p. 37- 48, cap. 1, 300p. Greiman, A. Hybrid Imagery: the fusion of technology and graphic design. In: Architeture Design and Technology Press, 1990. Londres. Mcluhan, M. Os Meios de Comunicao como Extenses do Homem. 5 ed. So Paulo: Cultrix, 1979, cap. 5, 407 p. Moura, M. O Design de Hipermdia. (Tese de Doutorado. Comunicao e Semitica) PUC/SP, 2003, 355p. Murray, J. Hamlet no Holodeck. So Paulo: Ed. Unesp/ Ita Cultural, 2003, cap. 3, 282 p. Poynor, R. No Ms Normas Diseo Grfico Posmoderno. Barcelona: GG, 2003, cap. 4, 192 p.

    Catlogo da 2 Bienal de Design Grfico. So Paulo: ADG,1994. Catlogo da 3 Bienal de Design Grfico. So Paulo: ADG, SESC, 1996. Catlogo da 6 Bienal de Design Grfico. So Paulo: ADG, SESC, SENAC, 2002.

    Mnica Moura - [email protected]