11_8_2011_17_40_45
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XXVIII CONGRESSO INTERNACIONAL DA ALAS 6 a 11 de setembro de 2011, UFPE, Recife-PE
Grupo de Trabalho: Reestruturao produtiva, trabalho e dominao social
A expanso da indstria de extrao mineral pelo meio rural e a problemtica do trabalho
Jos Aderivaldo S. da Nbrega. UFCG/PPGCS
Dra. Marilda Aparecida de Menezes. UFCG/PPGCS RESUMO: A atividade da minerao, no processo de formao econmica brasileiro, segundo algumas obras clssicas sobre o tema (Caio Prado Jr. e Celso Furtado), foi muito importante. No atual contexto, esta atividade tem recebido do Estado brasileiro grandes incentivos crescendo o seu reconhecimento como fonte de desenvolvimento local. Na regio Nordeste do pas, sobretudo, no Estado da Paraba, a atividade tem se expandido no meio rural, proporcionando mudanas significativas nas formas de trabalho nele existentes. Em decorrncia da expanso da minerao, os agricultores tem se dividido entre o trabalho agrcola e o trabalho no garimpo. Este artigo analisa as formas de trabalho empreendidas pela indstria mineradora no municpio de Junco do Serid. O artigo se fundamenta em 40 questionrios aplicados e observao direta nas minas de extrao do caulim, minrio explorado na regio estudada. Palavras chave: minerao, garimpo, trabalho ABSTRACT: The minening activity in the process of economic education in Brazil,
according to some classic works on the subject (Caio Prado Jr. and Celso Furtado),
was very important. In the present context, this activity has received from the Brazilian
government strong incentives to grow its recognition as a source of local development.
In the Northeast region of the country, especially in the state of Paraiba, the activity has
expanded in rural areas, providing significant changes in ways of working within it. Due
to the expansion of mining, farmers have been divided between farm work and work in
the mines. This article examines the types of work undertaken by the mining industry in
the municipality of Reed Serid. The article is based on 40 questionnaires and direct
observation in the extraction of kaolin mines, ore explored in the study area.
Key Words: Mining, Garimpo, Job
Introduo
A atividade da minerao foi considerada por alguns intelectuais, tais como
Caio Prado Jr. e Celso Furtado, como muito importante no processo de formao
econmica brasileiro. No atual contexto, a minerao desempenha tambm importante
papel na economia. Os dados do Ministrio de Minas e Energia (MME, 2010:27)
apontam para o fato de que, no PIB brasileiro, a minerao, de modo geral, contribui
com 4,2% dos quais 1,1% da minerao e 3,1 da transformao mineral. Segundo
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estatsticas do anurio mineral de 2008, a balana comercial da minerao teve
exportaes na ordem de US$ 20 bilhes e as importaes de US$ 11 bilhes, o que
representa um fluxo de comrcio de US$ 31 bilhes e um saldo comercial de US$ 9
bilhes. Nesta balana de nmeros positivos, em termos econmicos, o caulim um
bem mineral de grande importncia, ocupando a 5 posio na produo mineral
brasileira.
O caulim uma rocha argilosa, de cor branca, com baixo nvel de ferro. O fato
de ser um material inorgnico, incombustvel, insolvel em gua, imputrescvel, neutro,
imune ao ataque de microorganismos e mudanas bruscas de temperatura, entre
outras propriedades, o torna um importante material aplicvel na indstria. Entre as
possibilidades de utilizao deste material esto: a fabricao de pigmento, de carga e
cobertura na indstria de papel, aplicao como matria-prima para a indstria
cermica, a fabricao de porcelanas, azulejos, esmaltes, etc., aplicao como matriz
para catalisadores (craqueamento de petrleo e dispositivo para exausto de gases em
automveis), isolante eltrico, agente fortalecedor de borrachas e concretos, cobertura
digestiva de remdios na indstria de frmacos, componente na fabricao de vidros
etc.
Na minerao de caulim existem duas dinmicas que organizam a explorao
desta atividade: a primeira a extrao e beneficiamento mecanizada/industrializada
que se desenvolve, sobretudo, nos Estados da regio amaznica maior detentora de
reservas e tambm maior produtora. A segunda artesanal, o que significar neste
artigo, uma atividade que se desenvolve com baixo ou inexistente nvel de
mecanizao, que tem produtividade baixa, que se desenvolve a custa do trabalho nos
garimpos.
Este artigo analisa as relaes de trabalho configuradas em funo da
expanso das indstrias de beneficiamento de caulim do Junco do Serid, municpio do
Estado da Paraba no Nordeste Brasileiro. A problemtica investigada a formao de
relaes de trabalho precrias e informais decorrentes da estratgia das empresas de
estimularem a difuso de caulim pelo meio rural de Junco para comprarem dos
garimpeiros o minrio sem criar vnculo formal com os trabalhadores. Na primeira
seo deste artigo analisaremos a organizao produtiva do garimpo e as relaes de
produo e, na segunda, discutiremos as relaes de trabalho de decorrem da
expanso da cadeia produtiva do caulim.
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A organizao social do garimpo, da produo e as relaes de trabalho
A discusso sobre a organizao produtiva dos garimpos no algo novo o
que nos remete, em princpio, releitura de um autor que foi clssico nas cincias
sociais em relao abordagem do garimpo. Nos referimos ao antroplogo britnico
David Cleary que veio ao Brasil, inicialmente, interessado em estudar a migrao rural-
urbana no Estado do Maranho e Leste da Amaznia. Chega ao Maranho em plena
poca da corrida do ouro e encontra um fluxo muito grande de pessoas chegando
regio para garimpagem e, conseqentemente, um ambiente de disputas pela
ocupao das reas de garimpo. Em face disso, elegeu a garimpagem e os
garimpeiros como objeto de seu estudo. Ele Esteve em Marab (prximo Serra
Pelada), Belm e So Luis, realizando entrevistas com instituies ligadas ao garimpo
e pesquisas documentais e bibliogrficas sobre o assunto. A mudana de foco em seu
estudo decorre de trs motivos: o primeiro a suspeita de que, por trs de uma
imagem catica e de desorganizao exista uma organizao social; o segundo a
carncia de estudos sobre a questo e o terceiro a rotatividade e circulao de
garimpeiros.
O trabalho de Cleary oferece uma ampla descrio das condies sob as quais
os garimpos so formados e como as relaes sociais nele se desenvolvem. A tese
que sustenta, em primeiro lugar, a de que o garimpo um objeto de estudo relevante
para Antropologia e, em segundo lugar, no obstante as diferentes matrias primas
exploradas (ouro, diamante etc) e as diversas tcnicas de trabalho, possvel
identificar elementos comuns aos garimpos o que possibilita falar em organizao
social do garimpo. Seu trabalho nos ajuda a entender que em meio precariedade e
instabilidade do garimpo em Junco do Serid subjaz uma organizao que implica
disposio de funes no processo produtivo. Cleary analisa o garimpo como uma
atividade de carter eminentemente manual, que se desenvolve paralelamente
minerao industrial. Percebemos estas caractersticas quando consideramos a
relao dos garimpeiros com as empresas de beneficiamento em Junco do Serid. Elas
so apenas compradoras de caulim enquanto que eles fazem o contingente que se
afirma como garimpeiros que trabalham por conta prpria.
Barrozo (1997) dedicou sua tese de Doutorado em Sociologia a estudar a
formao social dos garimpos de diamante no Estado do Mato Grosso. A preocupao
do autor foi, inicialmente, estudar como a inovao das tcnicas e extrao de
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diamante repercutia na organizao do trabalho nos garimpos matogrosenses, no
entanto, a complexidade do garimpo o fez decidir fazer um amplo estudo exploratrio
destacando no s as relaes de trabalho no garimpo como tambm a questo do
gnero e a trajetria social dos garimpeiros.
Senilde Guanaes (2009) fez sua dissertao de mestrado dedicando-se aos
estudos do garimpo na Chapada Diamantina com o objetivo central de acompanhar a
sobrevivncia e estratgias de permanncia dos garimpeiros de serra na atividade. O
garimpo de Junco do Serid tem esta caracterstica analisada por Guanaes: a insero
na atividade para sobrevivncia. Enquanto que os garimpeiros estudados pela autora
afirmam subir serra para encher o saco com alimentos adquiridos com a renda da
extrao de diamante, no nosso contexto, eles dizem arrumar a feira com o dinheiro
da puxada do caulim. A autora destaca que, na chapada diamantina, alguns garimpos
desapareceram enquanto que outros, para manter-se tiveram que modificar o processo
produtivo e os garimpeiros tiveram que encontrar outras estratgias de sobrevivncia
que se combinavam com a garimpagem. A atividade encontrada seria o turismo. No
contexto paraibano, a alterao no processo de trabalho mais significativa, ao invs de
ser a substituio da peneira pela bateia, como destacam alguns autores (GUANAES,
2009; COSTA, 2002; CLEARY, 1990), foi a substituio do guincho manual de madeira
e corda pelo guincho mecnico movido a motor a diesel e cabos de ao. Trs
atividades so combinadas com o garimpo: agricultura, vendedor de castanha e moto
txi.
A dissertao de mestrado de Costa (2002) est centrada no estudo do
garimpo de ouro no distrito de Monsenhor Horta, municpio de Mariana, Minas Gerais e
se preocupa com as mudanas no processo de trabalho nos garimpos mineiros. O
autor aponta em, seu texto, para necessidade de se desconstruir determinados
esquemas idealizados do mundo social do garimpo no qual a figura do garimpeiro
aparece com o esteretipo romantizado do aventureiro em descries distorcidas e
muitas vezes preconceituosas. Esta sua abordagem nos ajuda a responder questo:
existem garimpeiros em Junco do Serid? A resposta positiva tendo em vista que
garimpeiro uma categoria definida pela legislao mineral, que reconhece como
reas de garimpo no s ouro e diamante, mas todos aquelas que contenham
minerais que o Departamento Nacional de Produo Mineral reconhea1 como
1 Os trabalhadores do caulim de Junco do Serid so reconhecidos oficialmente com garimpeiros pela
portaria N 1524 publicada no dirio oficial da unio em 03 de novembro de 1982.
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garimpveis, tais como o caulim. Alm disso, garimpeiro uma categoria pela qual os
prprios trabalhadores se identificam. Assim, corroboramos com Costa (2002) no que
se refere necessidade de desconstruir essa viso romntica estereotipada da figura
do garimpeiro.
No contexto paraibano, diversos trabalhos aparecem discutindo aspectos
tcnicos e geolgicos do garimpo. Do ponto de vista das cincias sociais verificamos
alguns trabalhos interessantes como o de Forte (1994), que uma dissertao de
mestrado que analisa a formao de cooperativas de garimpeiros em Junco do Serid.
O autor se dedica a analisar o sistema de cooperativas de garimpeiros em um contexto
no qual as polticas pblicas do setor mineral comeam a financiar pesquisa mineral e a
interveno nos garimpos atravs de suporte tcnico estas organizaes.
Outro trabalho voltado ao contexto do Serid Ocidental da Paraba, onde Junco
do Serid geograficamente est localizado, a tese de doutorado de Vasconcelos
(2006). Sua preocupao central a espacializao das atividades de minerao. O
que nos chama a ateno neste texto que o autor analisa a formao do espao
produtivo mineiro no Serid, mais especificamente no municpio de Pedra Lavrada-PB,
a partir da anlise das prticas de localizao das empresas. Estas empresas,
sobretudo em Junco do Serid, so habilitadas para extrair minrio,mas sua estratgia
foi instalar suas plantas prximas s reas de garimpo configurando o que, segundo a
abordagem de Vasconcelos seria o processo de territorializao das microempresas de
minerao com vista explorao do trabalho garimpeiro.
Estes textos foram o mais significativos, dentro dos objetivos do nosso projeto
de mestrado, mas no so os nicos que abordam o garimpo na literatura das cincias
sociais. O que importa notar que estes textos nos ofereceram uma leitura crtica da
organizao social dos garimpos, do processo de produo e da hierarquia de funes
que acabam definindo as relaes de trabalho no garimpo.
Em Junco do Serid, a forma preponderante de trabalho na extrao de caulim
o garimpo. Chama-se de garimpeiro os homens que extraem caulim porque trata-se,
em primeiro lugar, de um bem mineral no subsolo, em segundo lugar, as tcnicas de
trabalho so diferentes daquelas que ocorrem na minerao industrial,ou seja, utilizam
ferramentas e realizam operaes braais. Alm disso, os prprios trabalhadores de
caulim se definem como garimpeiros, fundaram uma associao e uma cooperativa de
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garimpeiros da qual participam, segundo informa o gerente da COOPERJUNCO, 140
cooperados.
O processo produtivo do caulim que desenvolvido em Junco do Serid possui
caractersticas comuns quelas tratadas pelos autores citados acima (CLEARY, 1989
GASPAR, 1990, BARROZO, 1997; COSTA 2002). Nos referimos, especificamente, a
caractersticas como trabalho em turma de trs a seis pessoas, desenvolvido com
tcnicas de trabalho semi-mecanizadas recorrendo picaretas, para escavar a terra,
ps para retirar o material e um guincho, este sendo mecnico, que transporta os
trabalhadores e o minrio do subsolo para superfcie. O guincho mecnico uma
novidade que h um ano vem se instalando nos garimpos da regio. Os
atravessadores compram este equipamento e formam as turmas para trabalhar e, com
isso, os atravessadores retiram o valor do alugel do equipamento (R$ 200,00 a
semana), paga a porcentagem do dono da terra que exploram (10%), paga o valor do
frete dos carros (varia entre R$ 60,00 e R$ 70,00) e o restante distribudo entre os
garimpeiros.
A produo de caulim comea com a descoberta e negociao da rea para
explorao. Esta operao no feita por gelogos e o contrato no nada
formalizado. Quem seleciona a rea para puxar o caulim como dizem na regio o
garimpeiro mais experiente da turma que tem a habilidade para reconhecer reas que
contenham os minrios e, esta habilidade, segundo nos conta Z de Parelhas um
garimpeiro antigo que se tornou atravessador, adquirida pela prtica cotidiana e pelos
conhecimentos repassados pelos pais ou pessoas mais prximas. O conhecimento
para o exerccio do ofcio de garimpeiro, no s na fase da escolha do terreno, mas em
todas as outras fases emprico, baseado no saber-fazer. Alm do garimpeiro antigo,
outra figura tambm habilitada para fazer o reconhecimento das reas explorveis e
fazer a negociao da terra: o atravessador. Este pode ter sido um dia garimpeiro, mas
pode estar apenas atuando como atravessador, ou seja, escolhendo terras, formando
turmas e vendendo o material. Com uma picareta o garimpeiro sai pelas serras fazendo
pequenas escavaes no terreno que, de acordo com as caractersticas da camada
superficial pode ou no conter caulim.
Este processo de seleo de terras semelhante ao descrito por David Cleary
(1989) nos garimpos da regio amaznica. A diferena est no ato de que as
expedies para encontrar jazidas de ouro demoram dias, semanas, so feitas em
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equipes de trs homens, enquanto que em Junco do Serid apenas o garimpeiro
experiente ou o atravessador com o dono da terra que saem.
No que tange questo da terra, a maneira mais comum de negociar a
explorao de determinada rea o sistema de porcentagem. Este sistema consiste no
pagamento de 1% de todo lucro lquido ao proprietrio que autoriza trabalharem em
suas terras. Ao proprietrio cabe todos os riscos de punies pela falta de
licenciamento ambiental, licenciamento de pesquisa e de lavra de minrio. Z de
Parelhas conta que, quando a negociao feita com o atravessador, a distribuio do
lucro da extrao de caulim fica do seguinte modo: de todo o apurado da venda do
minrio, quer dizer, quando voc paga carro, leo para os motores, explosivos, daquilo
que sobra voc deixa 1% para o dono da terra, 1% para mim e o restante dividido
entre a turma.
Note-se, do depoimento, que h especificao do rateio dos recursos pagos
pelas carradas de caulim, mas tudo isso feito verbalmente sem nenhuma
formalizao. Esta a primeira etapa do processo produtivo no garimpo de caulim.
Depois de acertada a terra, vem a mobilizao ou arregimentao dos trabalhadores
em turmas.
O atravessador quem se responsabiliza por selecionar os trabalhadores para
o garimpo. Trata-se de algum que, como j falamos anteriormente, adquire um
guincho e rene as turmas de trabalhadores ou de um garimpeiro mais experiente que
se responsabiliza por escolher o terreno, negociar com o proprietrio e intermediar a
venda para as empresas. As entrevistas realizadas durante nossa pesquisa apontam
alguns fatores que tm grande importncia na hora de escolher as turmas de
trabalhadores dos quais se destacam os laos de parentesco e os laos de afinidade.
No Morro do Choro, rea mais conhecida e explorada de Junco do Serid, tivemos
contato com vrias turmas de garimpeiros, entre as quais, a turma controlada pelo
atravessador Francisco de Assis.
Ele informa que, na turma de seis trabalhadores, dois eram irmos e moravam
na mesma casa e quatro eram pessoas com quem ele j convivia h muito tempo por
serem vizinhos e por ter relao de amizade com os pais desses garimpeiros.
Z de Parelhas, outro atravessador, explica que para formar turmas para
garimpar, primeiro, observa se maior de 18 anos:
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eu procuro pessoas de 18 anos pra cima, gente que eu conheo e que sei que trabalhadora. mais pai de famlia que precisa trabalhar pra botar o po de cada dia na mesa. Quem trabalha comigo assim. Esse povo eu luto com eles h muitos anos, ai uns vai saindo e outros entrando, mas tudo maior de idade.
As tarefas necessrias extrao de caulim so basicamente: limpeza do
terreno, escavaes, operao de guincho e conduo material at a superfcie para
carregamento dos carros. Todas as funes no processo de extrao so organizadas
tendo em vista estas tarefas. A limpeza do terreno consiste no desmatamento da
vegetao local para descobrir a rea a ser escavada e, deste modo, a camada mais
superficial da terra vai sendo removida. Esta tarefa feita por todos os trabalhadores
do garimpo com ajuda de foices e picaretas, raramente, se usa mquinas de
terraplanagem, tratores ou retroescavadeiras, como se faz no modelo industrial da
extrao de caulim.
O garimpo de caulim tanto feito a cu aberto, por meio de grandes crateras
escavadas, ou atravs de galerias subterrneas localmente denominadas de
banquetas. Na escavao, os trabalhadores se dividem entre os que cavam e os que
removem o material para fora do buraco. Ao passo em que a cratera vai se
aprofundando muito, e h escavaes de 50 metros de profundidade, ou vai se
tornando uma banqueta faz-se uso de guinchos. A operao desse motor envolve mais
uma pessoa que no participa das escavaes, mas fica exclusivamente descendo os
trabalhadores ao subsolo e iando o material at a superfcie em caixas de ferro presas
ao cabo de ao do guincho. Assim, dois trabalhadores escavando, dois com ps
enchendo as caixas de ferro e lanando o material superfcie e um operando o motor
do guincho somam cinco trabalhadores que , de modo geral, a configurao das
turmas no garimpo.
H, ainda a tarefa de carregar os carros que vm buscar o caulim bruto. Estes
carros, em geral, ou so alugados pelos garimpeiros ou atravessador para entregar o
material nas empresas espalhadas pela zona rural de Junco do Serid, ou so
enviados pelas prprias empresas para pegar o material. Este envio de carro pelas
empresas descontado no valor pago pela tonelada de caulim.
A tonelada de caulim bruto e com a conformao pedida pelas empresas, ou
seja, um caulim branco vendida R$ 18,00. Por cada caminho carregado, que
comporta 10 toneladas, os garimpeiros recebem R$ 180,00 e, e acordo com
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depoimento dos garimpeiros, semanalmente, em condies normais, ou seja, sem
chuva e sem paralisao por conta de fiscalizaes, acidentes etc. possvel carregar
entre trs e quatro caminhes. O atravessador quem controla todas essas operaes
de venda do material e conferncia do carregamento dos caminhes. Mesmo tendo
sido garimpeiro outrora, o atravessador no se envolve na extrao, a no ser como
uma espcie de supervisor da extrao e da montagem dos motores.
Pela descrio que fizemos at aqui, podemos concluir que o garimpo, como j
pensava David Cleary na dcada de 1980, no algo catico, sem ordem. Ao
contrrio, o processo produtivo nos garimpos de caulim em Junco do Serid tem uma
organizao produtiva especfica, marcada por uma diviso de tarefas bem articulada:
h os que tm responsabilidade de selecionar a terra e negociar sua explorao, bem
como de agenciar as turmas, que so os garimpeiros antigos e mais experientes e/ou
os atravessadores, h os que escavam, os que enchem os guinchos, h os operadores
do motor. Jos Roberto, garimpeiro de 21 anos, nos explica que existe uma espcie de
rodzio de funes durante o dia de trabalho:
assim: vamos supor. Se eu e um amigo estamos cavando,ai os outros dois vo enchendo a concha e o outro fica l em cima do guincho. Agente termina de encher uma carrada ai quando for na outra carrada ai quem tava cavando vai encher e quem tava enchendo vai cavar(Jos Roberto)
- E quem diz quem vai ficar com a p ou a picareta?
Ai tem um que mais velho da turma que vai e diz fulando agora voc que cava(Jos Roberto)
Embora exista uma diversidade de tarefas a desempenhar, no significa que os
garimpeiros tenham se hiper-especializado em uma delas no sabendo desenvolver as
demais. Em garimpagem, os trabalhadores sabem desenvolver todas as funes,
inclusive operao de motor. Costa (2002) estudando o garimpo de ouro afirma que
no propriamente o tipo de funo que uma pessoa desempenha que far dela um
lder, mas a sua trajetria e sua experincia.
No trabalho garimpeiro, a experincia, o conhecimento e o saber fazer so os principais fatores de distino hierrquica. Dentro da cava os mais experientes so os mais ouvidos. No entanto, a hierarquia no trabalho no influencia e nem influenciada pela diviso de tarefas dentro da lavra. (COSTA, 2002:96)
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Este reconhecimento do garimpeiro mais velho ou experiente como aquele que
precisa ser ouvido influencia a tomada de decises cotidianas como a definio do
lugar onde colocar o guincho, reas para escavar dentro das banquetas. O
atravessador na hora de definir estas questes tende a seguir a opinio dos mais
experientes e isso repercute no modo como os demais garimpeiros se relacionaro
com este colega.
As relaes sociais no garimpo, de modo geral, envolvem a interao cotidiana
de atores distintos: garimpeiros, atravessadores, proprietrios de terra, empresrios
que tm intencionalidades diversas, assim como diversas so suas participaes na
cadeia produtiva da minerao de caulim.
As relaes de trabalho do trabalho no garimpo
J tivemos a oportunidade de destacar, neste artigo, a importncia que a
minerao desempenha na economia brasileira. O caulim, pelas propriedades que tem,
acaba se tornando matria prima para muitos ramos da indstria que demandam num
ritmo crescente toneladas deste minrio. Existem no Brasil dois grandes modelos em
execuo da atividade de extrao e beneficiamento de caulim: o primeiro
desenvolvido por grandes empresas, que detm grande contingente de trabalhadores
de carteira assinada e que operam com tecnologias que controlam tanto a extrao
como o beneficiamento do material. Neste tipo de empresa os trabalhadores se
distribuem mais em tarefas com operao de mquinas, manuteno de equipamentos,
controle de qualidade etc. Trata-se do modelo de minerao de caulim desenvolvido,
sobretudo, na regio Norte do pas especificamente no Estado do Par onde se localiza
a maior empresa de beneficiamento de caulim do pas e do continente a Par
Pigmentos S/A (PPSA).
O segundo modelo, este foi objeto de nossa pesquisa de mestrado, o modelo
da extrao em pequena escala que envolve mo de obra braal, realizada em
garimpos por trabalhadores informais e clandestinos, no qual os trabalhadores se
distribuem entre operaes como escavao, desmatamento, carregamento de
caminhes, operao de guincho. Este material vendido para empresas que atuam
somente no processo de beneficiamento do material bruto deixando-o numa
consistncia prpria para ser consumido por grandes indstrias fabricantes de tintas,
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papel, isolantes eltricos, louas de banheiro e de mesa, indstrias de frmacos. Este
o modelo de minerao do Nordeste brasileiro, sobretudo, dos Estados da Paraba e do
Rio Grande do Norte.
Assim, por exemplo, do subsolo de Junco do Serid, no Estado da Paraba, at
chegar na folha de papel na qual este artigo foi impresso, uma complexa cadeia
produtiva foi estabelecida e, para entender qual a problemtica que ela contm, do
ponto de vista do trabalho, precisamos entender bem quais so os elos dessa cadeia.
Segundo dados da nossa pesquisa, Junco do Serid possui oito empresas das
quais cinco esto habilitadas tanto para extrair caulim como para benefici-lo. Destas,
visitamos trs: Caulin, Minerao Santo Onofre e Minerao Pacher a ltima de
propriedade de um empresrio do Rio Grande do Sul. Entrevistamos os empresrios e
perguntamos primeiro quantos funcionrios haviam de carteira assinada e obtivemos o
seguinte resultado:
Tabela 1 Nmero de Funcionrios de Carteira Assinada
Empresa Quantidade de funcionrios
Caulin Minerao Pacher Minerao Santo Onofre
15 11 14
Fonte: Dados da Pesquisa
Observamos o montante de matria-prima estocado no ptio da empresa e nos
questionamos sobre a capacidade de onze funcionrios, em mdia, extrarem tamanha
quantidade, ento perguntamos como o processo de extrao de caulim, a resposta
foi praticamente de mesmo contedo:
- aqui agente tem licena para lavra e beneficiamento de caulim, mas eu s trabalho com beneficiamento. O caulim bruto agente compra dos garimpeiros da regio mesmo. (Dono da Minerao Pacher);
- O caulim todo comprado. Vem daquelas serras ali que voc t vendo. Aqui agente s beneficia; (Dono da Caulin)
- Os garimpeiros tiram o caulim e agente compra. (dono da Minerao Santo Onofre)
Assim, a minerao de caulim est dividida entre a extrao do minrio e o seu
beneficiamento. Esta diviso incide, justamente, na diferenciao dos atores que
desempenharo as tarefas. O que est claramente colocado em junco do Serid que
a extrao do minrio uma tarefa feita pelos garimpeiros estimulados pelas prprias
empresas que assumem outro papel na cadeia produtiva que fazer o beneficiamento
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do caulim que chega aos seus ptios ainda bruto, ou seja, em formato de pedra e com
muitas impurezas.
Nesta fase de beneficiamento, as tarefas so de operao e manuteno de
mquinas, embalagem do material beneficiado. Os trabalhadores, em sua maioria de
carteira assinada, que levam o caulim para as mquinas que retiram suas impurezas,
que transformam a pasta umedecida de caulim em pastilhas em formato redondo, que
so secadas ao sol ou em fornos para serem posteriormente modos e ensacados,
todos os trabalhadores que realizam estas operaes no interior das empresas
beneficiadoras esto subordinados a um gerente que, por sua vez est subordinado ao
empresrio. Todo esse trabalho coordenado e supervisionado resultar em um produto
com a consistncia de pequenos gros como se fosse uma espcie de areia bem fina
ou mesmo de farinha que colocada em embalagens personalizadas com pesos
diversos, mas geralmente de 20kg. Da o material alimenta indstrias na capital da
Paraba, Joo Pessoa, alm dos Estados de Pernambuco, So Paulo, Paran e Rio
Grande do Sul principais consumidores do caulim de Junco do Serid. Este o ltimo
elo da cadeia produtiva deste minrio.
A expanso do garimpo pelo meio rural de Junco do Serid , portanto,
estimulada pela demanda crescente de matria prima para as grandes indstrias que
recorrem Paraba como fornecedora de caulim. As visitas de campo que fizemos
revelam que as reas de garimpo tem se ampliado: se, nas dcadas de 1980-1990 era
Morro do Choro e Carneira, agora tem Gatos, Malhada, Noruega, alm de diversas
propriedades de pequeno porte, mas que ficam prximas morros e serras, reas
propcias existncia de depsitos caulinferos.
Em Junco do Serid o nmero de trabalhadores de carteira assinada, com
direitos trabalhistas e previdencirios garantidos diminui enquanto que o nmero de
garimpeiros que atuam por conta prpria sem nenhuma seguridade social e nenhuma
formalizao se mantm crescente. Este um tipo de problema que os autores que se
dedicam a pesquisar o trabalho na indstria automobilstica e no setor de servios tm
enfatizado bastante como sendo resultados do processo de reestruturao produtiva.
ANTUNES (2007), por exemplo, afirma que o debate sobre a reestruturao produtiva
veio traduzido sob os termos: flexibilidade e flexibilizao, sendo o segundo o mais
recorrente. Para ele, a flexibilizao refere-se a um processo
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que tem condicionantes macroeconmicos e sociais derivados de uma nova fase de mundializao do sistema capitalista, hegemonizado pela esfera financeira, cuja fluidez e volatilidade tpicas dos mercados financeiros contaminam no s a economia, mas a sociedade em seu conjunto e, desta forma, generaliza a flexibilizao para todos os espaos, especialmente no campo do trabalho. [...] Esse processo mais geral determina e articula a flexibilizao dos processos de trabalho, do mercado de trabalho, das leis trabalhistas e dos sindicatos, definindo o carter da reestruturao produtiva mais recente, especificamente no que se refere a estratgia das empresas na adoo dos novos padres de gesto do trabalho toyotismo, produo enxuta etc (ANTUNES, 2007:29)
O debate sobre a precarizao das relaes de trabalho no Brasil se remete,
justamente, aos efeitos desse processo de flexibilizao. Para Vasapollo (2006) esta
flexibilizao responsvel pelo crescimento gigantesco de formas de trabalho no
regulamentadas e contradizem a idia de que esta seja uma alternativa para enfrentar
o nvel de desemprego:
a flexibilizao, definitivamente, no soluo para aumentar os ndices de ocupao. Ao contrrio, uma imposio fora de trabalho para que sejam aceitos salrios reais mais baixos e em piores condies. nesse contexto que esto sendo reforadas ofertas de trabalho por meio do denominado mercado ilegal, no qual est sendo difundido o trabalho irregular, precrio e sem garantias. (VASAPOLLO, 2006:47)
Diego Pieiro, analisando a precaridade do trabalho na agricultura uruguaia,
discute que as mudanas mais gerais no mundo do trabalho tm repercusses para o
mercado de trabalho, gerando a situao de dualidade: h um mercado de
trabalhadores estveis, qualificados, melhor pagos, mais protegidos e um mercado
secundrio de trabalhadores precrios menos qualificados, vulnerveis e submetidos
s condies de demanda (PIEIRO, 2007: 46).
Assim, confrontando esse debate acadmico com o contexto local de Junco do
Serid, consideramos que a problemtica do trabalho no garimpo reside no fato de que
esta uma forma de produo do minrio de caulim que estimulada pela demanda
das grandes indstrias dos mais diversos gerando uma situao em que o garimpo
est integrado s empresas de minerao numa relao de explorao do trabalho que
ocorre nos subterrneos da legislao trabalhista, tributria e ambiental. No entanto,
esta relao entre as indstrias e o garimpo favorece a difuso pelo meio rural de
Junco do Serid do trabalho informal e precrio. Isto, como j dissemos anteriormente,
entendido quando analisamos mais detalhadamente a cadeia produtiva do minrio de
caulim e vemos que as empresas localizadas no municpio produtor de caulim adotam
a estratgia de no extrarem esse minrio, mas apenas o beneficiarem. Com isso, os
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custos da produo so reduzidos porque estas empresas no tm que arcar com as
responsabilidades trabalhistas e ambiental que encareceria ainda mais o processo
produtivo. Estamos diante, portanto, da reproduo desta lgica a que Antunes (2007)
fala do estabelecimento de novas formas de organizao da produo que implicam
flexibilizao dos processos de trabalho, do mercado de trabalho, das leis trabalhistas e
dos sindicatos em todos os espaos, inclusive o rural.
Galvo (1999) diz que a emergncia de espaos industriais, ou clusters,
decorre, em grande parte da tendncia da desintegrao vertical dos processos
produtivos gerada pelas economias:
As caractersticas acima brevemente assinaladas a da flexibilizao dos novos processos tecnolgicos, a da progressiva desterritorializao das atividades econmicas e a emergncia de um novo trabalhador podero produzir efeitos espaciais em duas direes: concentrar indstrias e pases mais industrializados (as chamadas indstrias de alta tecnologia, como a de microeletrnica, a de biotecnologia, a de mecnica de preciso, a de novos materiais) e dispersar pelo mundo inclusive nos pases e regies menos desenvolvidos, as indstrias intensivas em recursos naturais e mo de obra menos qualificadas, e atm muitas intensivas em capital e utilizadoras de tecnologias avanadas, mas baseadas em operaes repetitivas e elementares, com exigncia de apenas um numero reduzido de trabalhadores muito qualificados. (GALVO, 1999:15)
As reas rurais, dados os recursos naturais existentes e o perfil de suas
populaes ocupantes, apresentariam os atrativos para o tipo de empresa a que
Galvo faz referncia, especificamente, o tipo de empresas que so intensivas em
recursos naturais e que demandam mo de obra menos qualificadas. No caso
particular de Junco do Serid, o efeito principal da instalao das empresas
beneficiadoras de caulim no especificamente abrir espao para contratao de mo
de obra barata, com baixo contingente de trabalhadores qualificados, isto tambm
ocorre, como j destacamos anteriormente, inclusive apresentamos nmeros da
contratao na tabela 1. O efeito principal da difuso de empresas pelo meio rural
daquele municpio a criao da demanda de caulim e, portanto, a mobilizao de
trabalhadores em turmas para suprir o mercado.
Os relatrios encomendados por agncias pblicas (FUNPEC, 2009;
COOPAGEL, 2006) apresentam a minerao como uma atividade de grande extenso,
permeada por tcnicas ainda rudimentares de extrao de minrio e que mobilizam um
grande contingente de trabalhadores sob condies de informalidade. Expresses
como informalidade, trabalho informal, rudimentar, trabalho precrio, nestes relatrios e
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em outros artigos (GOMES, et al, 2008 e ALMEIDA et all, 2010) so usadas de
maneira recorrente para caracterizar as condies de trabalho na atividade de
minerao.
Cardins (2010) enfatizava a manuteno de uma situao de precariedade nas
condies de trabalho nos garimpos de Junco do Serid mesmo com a mecanizao
dos de alguns equipamentos tais como o guincho. Gomes et al (2008) visitou os
garimpos de Junco com a finalidade de observar as condies de trabalho e, em sua
descrio, afirma que os trabalhadores no utilizam equipamentos de segurana e seu
regime de trabalho informal.
O trabalho no garimpo possui elevado ndice de acidentes e contaminaes
tendo em vista que a abertura das banquetas (uma espcie de trincheira cavada em
morros e serras) envolve explosivos, escavaes com picareta etc. de modo que a falta
de conhecimento geolgico dificulta a preveno de soterramentos etc. do ponto de
vista do beneficiamento so pequenas empresas que adquirem o minrio e aplicam
tcnicas sem grande sofisticao. Joo Mauro Arajo, em cobertura jornalstica de uma
srie de acidentes ocorrida em 2010, descreve os aspectos que fazem desta uma
atividade de risco:
Primeiro, pela exposio slica: a inalao da poeira desse mineral pode causar silicose, um processo de inflamao nos bronquolos e alvolos pulmonares. Trata-se de uma doena silenciosa, que evolui lentamente. No Serid, quase todos os mineradores conhecem algum que j morreu ou padece de silicose a principal causa de invalidez entre as doenas respiratrias ocupacionais. O segundo maior fator de risco so os acidentes de trabalho: quedas nas fendas de acesso s minas, traumas por objetos que caem e soterramentos.(ARAJO, 2010)
O jornalista completa sua reportagem: A lavra do caulim em Junco do Serid
marcada pela informalidade, o que intensifica a explorao da fora de trabalho e
prejudica a sade do garimpeiro. No s o jornalista, mas, como mostramos, toda uma
literatura (FUNPEC, 2009; COOPAGEL, 2006, GOMES, et al, 2008 e ALMEIDA et al,
2010, Carins et al, 2010) tem qualificado o trabalho nos garimpos de Junco do Serid
como informal. Concordamos que h um aspecto de informalidade, mas precisamos
entender bem que esta informalidade no se refere apenas ao aspecto do registro da
carteira.
O conceito de setor informal tratado por Cacciamali, por exemplo, est
associado a trabalhadores que ocupam espao econmico intersticial, integrado e
subordinado firmas capitalistas. Este setor, em funo do perfil do desenvolvimento
do capitalismo, encerrado numa dada realidade, representado por uma determinada
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composio de atividade cuja importncia pode variar em termos de espao
econmico, valor da produo, tamanho e composio do mercado. (CACCIAMALI,
1982: 28).
Para alm disso, a informalidade uma atividade na qual: 1. O produtor
direto possuidor dos instrumentos de trabalho; 2. Ele emprega a si mesmo e pode
lanar mo de trabalho familiar ou de ajudantes como extenso de seu prprio
trabalho; obrigatoriamente participa diretamente da produo e conjuga esta atividade
com aquela de gesto; 3. O produtor direto vende seus servios ou mercadorias e
recebe um montante de dinheiro que utilizado, principalmente, para o consumo
individual ou familiar e para manuteno da atividade econmica; e mesmo que o
indivduo aplique seu dinheiro com o sentido de acumular, a forma como se organiza a
produo, com apoio no seu prprio trabalho, em geral, no lhe permite a acumulao;
4. A atividade dirigida pelo fluxo de renda que a mesma fornece ao trabalhador e
no por uma taxa de retorno competitiva e desta renda que se retira o salrio dos
ajudantes ou empregados que possam existir; 5. Nesta forma de produzir no
existe vnculo impessoal e meramente de mercado entre os que trabalham entre
estes se encontra com freqncia mo de obra familiar; 6. O trabalho pode ser
fragmentado em tarefas, mas isso no impede ao trabalhador aprender todo o
processo que origina o produto ou servio final, processo este muitas vezes
descontnuo ou intermitente, seja pelas caractersticas da atividade, pelo mercado ou
em funo do prprio trabalhador.
As famlias rurais cedem suas terras para explorao mineral e, alm disso,
passam condio de trabalhadores da extrao de caulim (onze municpios do Serid
Ocidental da Paraba recorrem esta atividade como sustentao de suas economias
locais, a saber, Assuno, Areia de Baranas, Frei Martinho, Junco do Serid,
Passagem, Pedra Lavrada, Picu, Salgadinho, Santa Luzia, So Mamede e Tenrio
os maiores produtores, dentre outros no citados a exemplo de Juazeirinho e
Soledade), complementando as atividades a partir das quais garantem as condies de
sobrevivncia familiar.
A facilidade de entrada neste tipo de atividade grande e, a clandestinidade
dos trabalhadores, do licenciamento do uso da terra, do manejo de materiais explosivos
etc. so aspectos desta ocupao que no so suficientemente apresentados nos
dados oficiais. As indstrias tm funcionrios de carteira assinada, declaram a
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quantidade de matria que beneficiam, mas no apresentam o nmero real daqueles
que trabalham da extrao do produto o que envolve centenas de pessoas distribudas
entre esse onze municpios. H aqui uma inter relao entre o setor formal e informal
na qual os trabalhadores atravs de seus produtos alimentam a indstria paraibana,
especificamente, a indstria de tintas, sandlias, cermicas e rao para aves. Neste
caso reiteramos o argumento de Portes (2007, 13) segundo o qual el trabajo que
significa la supervivencia de un trabajador informal puede ser apropiado por la empresa
formal que lo contrata para lograr mayor flexibilidade. Isso tem ocorrido na prtica na
medida em que as indstrias tm se beneficiado de uma mo de obra que no
registrada nos seus quadros de funcionrios, mas que responsvel pela maior parte
da matria prima que ela beneficia. Matria esta, vale sempre registrar, que extrada
sob precrias condies de trabalho com todos os riscos que podem representar os
explosivos e o desmoronamento das valas ou banquetas nos termos locais. Alm dos
riscos de no ser beneficiados com os auxlios ou seguros desempregos em caso de
sada ou invalidez por acidente de trabalho.
Esta dinmica de trabalho, portanto, se aproxima de uma literatura das cincias
sociais que considera o setor informal como um setor desprotegido e gerador de
postos de trabalho de baixa qualidade (ULYSSEA, 2006), mas que promove renda
monetria para aqueles trabalhadores que no se inseriram na indstria. Considerando
o aspecto jurdico, observa-se que no obstante a legislao que regulamenta as
condies de desenvolvimento da atividade de extrao mineral e a legislao
trabalhista, as condies de trabalho no garimpo so absolutamente adversas em
relao ao marco legal que mencionamos. As empresas instaladas em Junco do Serid
tm seus mecanismos de extrao mineral de larga escala, contudo, a maior parte dos
envolvidos nessa atividade so os agricultores familiares, portanto, informais que
realizam seu trabalho utilizando tcnicas precrias, basicamente manuais, auxiliadas
por explosivos. A relao com o mercado mnima e basicamente se desenvolve com
a mediao do atravessador.
Consideraes finais
O garimpo, como abordam os diversos autores citados neste artigo, entre os
quais se destaca David Cleary, no uma forma catica de produo mineral, ao
contrrio, trata-se de uma estrutura organizacional fundamentada na cooperao, na
igualdade dos companheiros de trabalho que compartilham do mesmo desafio da
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sobrevivncia em um pequeno municpio no qual as opes de emprego so
limitadssimas.
O desempenho de atividades econmicas de carter extrativista em Junco do
Serid, como forma de garantir o sustento da famlia e a permanncia na regio,
demonstra que nessa parte do nordeste brasileiro o garimpo muito importante. E, por
essa razo, este universo particular da expanso da minerao pelo meio rural precisa
ser estudado tendo em vista que esta atividade implica mudana na forma de trabalho
de agricultores que passam a se dedicar cada vez mais a atividade de minerao,
algumas vezes, mesmo em tempo de inverno.
A difuso dos garimpos pelo meio rural precisa de interveno do Estado no
sentido de controlar essa situao de precariedade do trabalho. A pesquisa que
realizamos aponta para o fato de que a insero dos trabalhadores nesta atividade
condicionada pela crise do emprego no pequeno municpio e pela estratgia das
mineradoras que no contratam funcionrios, mas compram a produo daqueles se
propem a extrair caulim organizados em turmas de garimpeiros e sem nenhum vnculo
formal e nenhuma proteo social a no ser aquela oferecida pelo sindicato dos
trabalhadores rurais, para aqueles que so agricultores sindicalizados. A garimpagem
de caulim estimulada pela demanda das grandes indstrias dos mais diversos ramos,
mas no est integrada a elas a no ser pela relao de compra e venda deste minrio.
Isso configura uma atividade precria, do ponto de vista das condies de trabalho e
informal, do ponto de vista, das relaes de trabalho, da insero do trabalhador, do
espao intersticial que ocupa etc.
Os trabalhadores mobilizados para o garimpo assumem as responsabilidades e os
riscos, no s de soterramentos e contaminao com um minrio chamado Silica,
como tambm assumem o risco de priso por manuseio de explosivos, por explorarem
reas no regulamentadas, por no cumprirem as regras ambientais necessrias ao
desenvolvimento da atividade de minerao. Enfrentam, portanto, o dilema de se
submeter situao precria de ter dificuldades para sustentar a famlia, ou para se
sustentar, submeter-se a um trabalho que degrada no s o meio ambiente, mas o
prprio trabalhador.
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