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    EDUCAO AMBIENTAL,

    CIDADANIA E SUSTENTABILIDADE

    PEDRO JACOBI

    Professor Associado da Faculdade de Educao e do Programa de Ps-Graduao

    em Cincia Ambiental da USP

    [email protected]

    RESUMO

    A reflexo sobre as prticas sociais, em um contexto marcado pela degradao

    permanente do

    meio ambiente e do seu ecossistema, cria uma necessria articulao com a produo de

    sentidos

    sobre a educao ambiental. A dimenso ambiental configura-se crescentemente como

    uma questo que diz respeito a um conjunto de atores do universo educativo,

    potencializando o

    envolvimento dos diversos sistemas de conhecimento, a capacitao de profissionais e a

    comunidade

    universitria numa perspectiva interdisciplinar. O desafio que se coloca de formular

    uma

    educao ambiental que seja crtica e inovadora em dois nveis: formal e no formal.

    Assim, ela

    deve ser acima de tudo um ato poltico voltado para a transformao social. O seu

    enfoque deve

    buscar uma perspectiva de ao holstica que relaciona o homem, a natureza e o

    universo, tendo

    como referncia que os recursos naturais se esgotam e que o principal responsvel pela

    suadegradao o ser humano.

    CIDADANIA ECOLOGIA EDUCAO AMBIENTAL

    ABSTRACT

    ENVIRONMENTAL EDUCATION, CITIZENSHIP AND SUSTAINABILITY. To

    reflect upon social

    practices, in a context marked by a permanent degradation of the environment and its

    ecosystem,

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    involves a necessary articulation with the production of meanings on environmental

    education.

    The environmental dimension is now increasingly configured as an issue that comprises

    a team of

    players from the educational universe, strengthening the involvement of different

    knowledge systems,

    professional capacity building and the university community in an interdisciplinary

    perspective.

    The challenge posed is to formulate environmental education that is both critical and

    innovative

    on both the formal and informal levels. Thus, it must be primarily a political act

    concerned with

    social transformation. Its focus should be on searching for a holistic action perspective

    that correlates

    mankind, nature and the universe, having as a reference point the fact that natural

    resources run

    out and that mankind bears the main responsibility for its degradation.

    CITIZENSHIP ECOLOGY ENVIRONMENTAL EDUCATION

    190 Cadernos de Pesquisa, n. 118, maro/ 2003

    DESENVOLVIMENTO, MEIO AMBIENTE E PRTICAS EDUCATIVAS

    A reflexo sobre as prticas sociais, em um contexto marcado pela degradao

    permanente do meio ambiente e do seu ecossistema, envolve uma necessria

    articulao com a produo de sentidos sobre a educao ambiental. A dimenso

    ambiental configura-se crescentemente como uma questo que envolve

    um conjunto de atores do universo educativo, potencializando o engajamento

    dos diversos sistemas de conhecimento, a capacitao de profissionais e a comunidadeuniversitria numa perspectiva interdisciplinar. Nesse sentido, a produo

    de conhecimento deve necessariamente contemplar as inter-relaes do meio

    natural com o social, incluindo a anlise dos determinantes do processo, o papel

    dos diversos atores envolvidos e as formas de organizao social que aumentam o

    poder das aes alternativas de um novo desenvolvimento, numa perspectiva

    que priorize novo perfil de desenvolvimento, com nfase na sustentabilidade

    socioambiental.Tomando-se como referncia o fato de a maior parte da populao brasileira

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    viver em cidades, observa-se uma crescente degradao das condies de vida,

    refletindo uma crise ambiental. Isto nos remete a uma necessria reflexo sobre os

    desafios para mudar as formas de pensar e agir em torno da questo ambiental

    numa perspectiva contempornea. Leff (2001) fala sobre a impossibilidade de resolver

    os crescentes e complexos problemas ambientais e reverter suas causas sem

    que ocorra uma mudana radical nos sistemas de conhecimento, dos valores e dos

    comportamentos gerados pela dinmica de racionalidade existente, fundada no aspecto

    econmico do desenvolvimento.

    A partir da Conferncia Intergovernamental sobre Educao Ambiental realizada

    em Tsibilisi (EUA), em 1977, inicia-se um amplo processo em nvel global

    orientado para criar as condies que formem uma nova conscincia sobre o valor

    da natureza e para reorientar a produo de conhecimento baseada nos mtodos

    da interdisciplinaridade e nos princpios da complexidade. Esse campo educativo

    tem sido fertilizado transversalmente, e isso tem possibilitado a realizao de

    experincias

    concretas de educao ambiental de forma criativa e inovadora por diversos

    segmentos da populao e em diversos nveis de formao. O documento da

    Conferncia Internacional sobre Meio Ambiente e Sociedade, Educao e Conscincia

    Pblica para a Sustentabilidade, realizada em Tessalnica (Grcia), chama a

    ateno para a necessidade de se articularem aes de educao ambiental baseadas

    nos conceitos de tica e sustentabilidade, identidade cultural e diversidade,

    mobilizao e participao e prticas interdisciplinares (Sorrentino, 1998).

    Cadernos de Pesquisa, n. 118, maro/ 2003 191

    A necessidade de abordar o tema da complexidade ambiental decorre da

    percepo sobre o incipiente processo de reflexo acerca das prticas existentes e

    das mltiplas possibilidades de, ao pensar a realidade de modo complexo, defini-lacomo uma nova racionalidade e um espao onde se articulam natureza, tcnica e

    cultura. Refletir sobre a complexidade ambiental abre uma estimulante oportunidade

    para compreender a gestao de novos atores sociais que se mobilizam para a

    apropriao da natureza, para um processo educativo articulado e compromissado

    com a sustentabilidade e a participao, apoiado numa lgica que privilegia o dilogo

    e a interdependncia de diferentes reas de saber. Mas tambm questiona valores

    e premissas que norteiam as prticas sociais prevalecentes, implicando mudanana forma de pensar e transformao no conhecimento e nas prticas educativas.

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    A realidade atual exige uma reflexo cada vez menos linear, e isto se produz

    na inter-relao dos saberes e das prticas coletivas que criam identidades e valores

    comuns e aes solidrias diante da reapropriao da natureza, numa perspectiva

    que privilegia o dilogo entre saberes.

    A preocupao com o desenvolvimento sustentvel representa a possibilidade

    de garantir mudanas sociopolticas que no comprometam os sistemas ecolgicos

    e sociais que sustentam as comunidades.

    A complexidade desse processo de transformao de um planeta, no apenas

    crescentemente ameaado, mas tambm diretamente afetado pelos riscos

    socioambientais e seus danos, cada vez mais notria. A concepo sociedade de

    risco, de Beck (1992), amplia a compreenso de um cenrio marcado por nova

    lgica de distribuio dos riscos.

    Os grandes acidentes envolvendo usinas nucleares e contaminaes txicas

    de grandes propores, como os casos de Three-Mile Island, nos EUA, em 1979,

    Love Canal no Alasca, Bhopal, na ndia, em 1984 e Chernobyl, na poca, Unio

    Sovitica, em 1986, estimularam o debate pblico e cientfico sobre a questo dos

    riscos nas sociedades contemporneas. Inicia-se uma mudana de escala na anlise

    dos problemas ambientais, tornados mais freqentes, os quais pela sua prpria

    natureza tornam-se mais difceis de serem previstos e assimilados como parte da

    realidade global.

    Ulrich Beck identifica a sociedade de risco com uma segunda modernidade

    ou modernidade reflexiva, que emerge com a globalizao, a individualizao, a

    revoluo de gnero, o subemprego e a difuso dos riscos globais. Os riscos atuais

    caracterizam-se por ter conseqncias, em geral de alta gravidade, desconhecidas a

    longo prazo e que no podem ser avaliadas com preciso, como o caso dos riscos

    ecolgicos, qumicos, nucleares e genticos.192 Cadernos de Pesquisa, n. 118, maro/ 2003

    O tema da sustentabilidade confronta-se com o paradigma da sociedade de

    risco. Isso implica a necessidade de se multiplicarem as prticas sociais baseadas no

    fortalecimento do direito ao acesso informao e educao ambiental em uma

    perspectiva integradora. E tambm demanda aumentar o poder das iniciativas baseadas

    na premissa de que um maior acesso informao e transparncia na

    administrao dos problemas ambientais urbanos pode implicar a reorganizao dopoder e da autoridade.

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    Existe, portanto, a necessidade de incrementar os meios de informao e o

    acesso a eles, bem como o papel indutivo do poder pblico nos contedos educacionais,

    como caminhos possveis para alterar o quadro atual de degradao

    socioambiental. Trata-se de promover o crescimento da conscincia ambiental,

    expandindo a possibilidade de a populao participar em um nvel mais alto no

    processo decisrio, como uma forma de fortalecer sua co-responsabilidade na

    fiscalizao

    e no controle dos agentes de degradao ambiental.

    H uma demanda atual para que a sociedade esteja mais motivada e mobilizada

    para assumir um papel mais propositivo, bem como seja capaz de questionar,

    de forma concreta, a falta de iniciativa do governo na implementao de polticas

    ditadas pelo binmio da sustentabilidade e do desenvolvimento num contexto de

    crescente dificuldade na promoo da incluso social.

    Nessa direo, a problemtica ambiental constitui um tema muito propcio

    para aprofundar a reflexo e a prtica em torno do restrito impacto das prticas de

    resistncia e de expresso das demandas da populao das reas mais afetadas

    pelos constantes e crescentes agravos ambientais. Mas representa tambm a

    possibilidade

    de abertura de estimulantes espaos para implementar alternativas

    diversificadas de democracia participativa, notadamente a garantia do acesso

    informao

    e a consolidao de canais abertos para uma participao plural.

    A postura de dependncia e de desresponsabilizao da populao decorre

    principalmente da desinformao, da falta de conscincia ambiental e de um dficit

    de prticas comunitrias baseadas na participao e no envolvimento dos cidados,

    que proponham uma nova cultura de direitos baseada na motivao e na co-participaoda gesto ambiental.

    EDUCAO AMBIENTAL: ATORES, PRTICAS E ALTERNATIVAS

    Nestes tempos em que a informao assume um papel cada vez mais relevante,

    ciberespao, multimdia, internet, a educao para a cidadania representam a

    possibilidade de motivar e sensibilizar as pessoas para transformar as diversas

    forCadernos

    de Pesquisa, n. 118, maro/ 2003 193mas de participao na defesa da qualidade de vida. Nesse sentido cabe destacar

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    que a educao ambiental assume cada vez mais uma funo transformadora, na

    qual a co-responsabilizao dos indivduos torna-se um objetivo essencial para

    promover

    um novo tipo de desenvolvimento o desenvolvimento sustentvel. Entende-

    se, portanto, que a educao ambiental condio necessria para modificar

    um quadro de crescente degradao socioambiental, mas ela ainda no suficiente,

    o que, no dizer de Tamaio (2000), se converte em mais uma ferramenta de

    mediao necessria entre culturas, comportamentos diferenciados e interesses de

    grupos sociais para a construo das transformaes desejadas. O educador tem a

    funo de mediador na construo de referenciais ambientais e deve saber us-los

    como instrumentos para o desenvolvimento de uma prtica social centrada no conceito

    da natureza.

    A problemtica da sustentabilidade assume neste novo sculo um papel central

    na reflexo sobre as dimenses do desenvolvimento e das alternativas que se

    configuram. O quadro socioambiental que caracteriza as sociedades contemporneas

    revela que o impacto dos humanos sobre o meio ambiente tem tido conseqncias

    cada vez mais complexas, tanto em termos quantitativos quanto qualitativos.

    O conceito de desenvolvimento sustentvel surge para enfrentar a crise ecolgica,

    sendo que pelo menos duas correntes alimentaram o processo. Uma primeira,

    centrada no trabalho do Clube de Roma, rene suas idias, publicadas sob o

    ttulo de Limites do crescimento em 1972, segundo as quais, para alcanar a

    estabilidade

    econmica e ecolgica prope-se o congelamento do crescimento da populao

    global e do capital industrial, mostrando a realidade dos recursos limitados e

    indicando um forte vis para o controle demogrfico (ver Meadows et al., 1972).

    Uma segunda, est relacionada com a crtica ambientalista ao modo de vidacontemporneo,

    e se difundiu a partir da Conferncia de Estocolmo em 1972. Tem

    como pressuposto a existncia de sustentabilidade social, econmica e ecolgica.

    Estas dimenses explicitam a necessidade de tornar compatvel a melhoria nos nveis

    e qualidade de vida com a preservao ambiental. Surge para dar uma resposta

    necessidade de harmonizar os processos ambientais com os socioeconmicos,

    maximizando a produo dos ecossistemas para favorecer as necessidades humanaspresentes e futuras. A maior virtude dessa abordagem que, alm da incorporao

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    definitiva dos aspectos ecolgicos no plano terico, ela enfatiza a necessidade

    de inverter a tendncia auto destrutiva dos processos de desenvolvimento no seu

    abuso contra a natureza ( Jacobi, 1997).

    Dentre as transformaes mundiais das duas ltimas dcadas, aquelas vinculadas

    degradao ambiental e crescente desigualdade entre regies assumem

    194 Cadernos de Pesquisa, n. 118, maro/ 2003

    um lugar de destaque no reforo adoo de esquemas integradores. Articulamse,

    portanto, de um lado, os impactos da crise econmica dos anos 80 e a necessidade

    de repensar os paradigmas existentes; e de outro, o alarme dado pelos fenmenos

    de aquecimento global e a destruio da camada de oznio, dentre outros

    problemas.

    A partir de 1987, a divulgao do Relatrio Brundtlandt, tambm conhecido

    como Nosso futuro comum 1, defende a idia do desenvolvimento sustentvel

    indicando um ponto de inflexo no debate sobre os impactos do desenvolvimento.

    No s refora as necessrias relaes entre economia, tecnologia, sociedade e

    poltica, como chama a ateno para a necessidade do reforo de uma nova postura

    tica em relao preservao do meio ambiente, caracterizada pelo desafio de

    uma responsabilidade tanto entre as geraes quanto entre os integrantes da sociedade

    dos nossos tempos. Na Rio 92, o Tratado de Educao Ambiental para Sociedades

    Sustentveis e Responsabilidade Global coloca princpios e um plano de ao

    para educadores ambientais, estabelecendo uma relao entre as polticas pblicas

    de educao ambiental e a sustentabilidade. Enfatizam-se os processos participativos

    na promoo do meio ambiente, voltados para a sua recuperao, conservao e

    melhoria, bem como para a melhoria da qualidade de vida.

    importante ressaltar que, apesar das crticas a que tem sido sujeito, o conceito

    de desenvolvimento sustentvel representa um importante avano, na medidaem que a Agenda 21 global, como plano abrangente de ao para o desenvolvimento

    sustentvel no sculo XXI, considera a complexa relao entre o desenvolvimento

    e o meio ambiente numa variedade de reas, destacando a sua pluralidade,

    diversidade, multiplicidade e heterogeneidade.

    As dimenses apontadas pelo conceito de desenvolvimento sustentvel contemplam

    clculo econmico, aspecto biofsico e componente sociopoltico, como

    referenciais para a interpretao do mundo e para possibilitar interferncias na lgicapredatria prevalecente. O desenvolvimento sustentvel no se refere especificamente

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    a um problema limitado de adequaes ecolgicas de um processo social,

    mas a uma estratgia ou um modelo mltiplo para a sociedade, que deve levar em

    conta tanto a viabilidade econmica como a ecolgica. Num sentido abrangente, a

    noo de desenvolvimento sustentvel reporta-se necessria redefinio das rela-

    1 Este relatrio o resultado do trabalho da comisso da ONU World Comission on

    Environment

    and Development, presidida por Gro Harlem Brundtlandt e Mansour Khalid, da o seu

    nome.

    O documento parte de uma abordagem da complexidade das causas que originam os

    problemas

    socioeconmicos e ecolgicos da sociedade global.

    Cadernos de Pesquisa, n. 118, maro/ 2003 195

    es entre sociedade humana e natureza, e, portanto, a uma mudana substancial

    do prprio processo civilizatrio, introduzindo o desafio de pensar a passagem do

    conceito para a ao. Pode-se afirmar que ainda prevalece a transcendncia do

    enfoque sobre o desenvolvimento sustentvel radical mais na sua capacidade de

    idia fora, nas suas repercusses intelectuais e no seu papel articulador de discursos

    e de prticas atomizadas que, apesar desse carter, tem matriz nica, originada

    na existncia de uma crise ambiental, econmica e tambm social (Jacobi, 1997).

    O desenvolvimento sustentvel somente pode ser entendido como um processo

    no qual, de um lado, as restries mais relevantes esto relacionadas com a

    explorao dos recursos, a orientao do desenvolvimento tecnolgico e o marco

    institucional. De outro, o crescimento deve enfatizar os aspectos qualitativos,

    notadamente os relacionados com a eqidade, o uso de recursos em particular

    da energia e a gerao de resduos e contaminantes. Alm disso, a nfase no

    desenvolvimento deve fixar-se na superao dos dficits sociais, nas necessidadesbsicas e na alterao de padres de consumo, principalmente nos pases desenvolvidos,

    para poder manter e aumentar os recursos-base, sobretudo os agrcolas,

    energticos, biticos, minerais, ar e gua.

    Assim, a idia de sustentabilidade implica a prevalncia da premissa de que

    preciso definir limites s possibilidades de crescimento e delinear um conjunto de

    iniciativas que levem em conta a existncia de interlocutores e participantes sociais

    relevantes e ativos por meio de prticas educativas e de um processo de dilogoinformado, o que refora um sentimento de co-responsabilidade e de constituio

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    de valores ticos. Isto tambm implica que uma poltica de desenvolvimento para

    uma sociedade sustentvel no pode ignorar nem as dimenses culturais, nem as

    relaes de poder existentes e muito menos o reconhecimento das limitaes ecolgicas,

    sob pena de apenas manter um padro predatrio de desenvolvimento.

    Atualmente, o avano para uma sociedade sustentvel permeado de obstculos,

    na medida em que existe uma restrita conscincia na sociedade a respeito

    das implicaes do modelo de desenvolvimento em curso. Pode-se afirmar que as

    causas bsicas que provocam atividades ecologicamente predatrias so atribudas

    s instituies sociais, aos sistemas de informao e comunicao e aos valores

    adotados pela sociedade. Isso implica principalmente a necessidade de estimular

    uma participao mais ativa da sociedade no debate dos seus destinos, como uma

    forma de estabelecer um conjunto socialmente identificado de problemas, objetivos

    e solues. O caminho a ser desenhado passa necessariamente por uma mudana

    no acesso informao e por transformaes institucionais que garantam

    acessibilidade e transparncia na gesto. Existe um desafio essencial a ser enfrenta196

    Cadernos de Pesquisa, n. 118, maro/ 2003

    do, e este est centrado na possibilidade de que os sistemas de informaes e as

    instituies sociais se tornem facilitadores de um processo que reforce os argumentos

    para a construo de uma sociedade sustentvel. Para tanto preciso que se

    criem todas as condies para facilitar o processo, suprindo dados, desenvolvendo

    e disseminando indicadores e tornando transparentes os procedimentos por meio

    de prticas centradas na educao ambiental que garantam os meios de criar novos

    estilos de vida e promovam uma conscincia tica que questione o atual modelo de

    desenvolvimento, marcado pelo carter predatrio e pelo reforo das desigualdades

    socioambientais.

    A sustentabilidade como novo critrio bsico e integrador precisa estimularpermanentemente as responsabilidades ticas, na medida em que a nfase nos

    aspectos extra-econmicos serve para reconsiderar os aspectos relacionados com

    a eqidade, a justia social e a prpria tica dos seres vivos.

    A noo de sustentabilidade implica, portanto, uma inter-relao necessria

    de justia social, qualidade de vida, equilbrio ambiental e a ruptura com o atual

    padro de desenvolvimento (Jacobi, 1997).

    Nesse contexto, segundo Reigota (1998), a educao ambiental aponta parapropostas pedaggicas centradas na conscientizao, mudana de comportamento,

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    desenvolvimento de competncias, capacidade de avaliao e participao dos

    educandos. Para Pdua e Tabanez (1998), a educao ambiental propicia o aumento

    de conhecimentos, mudana de valores e aperfeioamento de habilidades, condies

    bsicas para estimular maior integrao e harmonia dos indivduos com o

    meio ambiente.

    A relao entre meio ambiente e educao para a cidadania assume um

    papel cada vez mais desafiador, demandando a emergncia de novos saberes para

    apreender processos sociais que se complexificam e riscos ambientais que se

    intensificam.

    As polticas ambientais e os programas educativos relacionados conscientizao

    da crise ambiental demandam cada vez mais novos enfoques integradores

    de uma realidade contraditria e geradora de desigualdades, que transcendem a

    mera aplicao dos conhecimentos cientficos e tecnolgicos disponveis.

    O desafio , pois, o de formular uma educao ambiental que seja crtica e

    inovadora, em dois nveis: formal e no formal. Assim a educao ambiental deve

    ser acima de tudo um ato poltico voltado para a transformao social. O seu enfoque

    deve buscar uma perspectiva holstica de ao, que relaciona o homem, a natureza

    e o universo, tendo em conta que os recursos naturais se esgotam e que o principal

    responsvel pela sua degradaco o homem. Para Sorrentino (1998), os grandes

    Cadernos de Pesquisa, n. 118, maro/ 2003 197

    desafios para os educadores ambientais so, de um lado, o resgate e o desenvolvimento

    de valores e comportamentos (confiana, respeito mtuo, responsabilidade,

    compromisso, solidariedade e iniciativa) e de outro, o estmulo a uma viso

    global e crtica das questes ambientais e a promoo de um enfoque interdisciplinar

    que resgate e construa saberes.

    Quando nos referimos educao ambiental, situamo-na em contexto maisamplo, o da educao para a cidadania, configurando-a como elemento determinante

    para a consolidao de sujeitos cidados. O desafio do fortalecimento da cidadania

    para a populao como um todo, e no para um grupo restrito, concretiza-se pela

    possibilidade de cada pessoa ser portadora de direitos e deveres, e de se converter,

    portanto, em ator co-responsvel na defesa da qualidade de vida.

    O principal eixo de atuao da educao ambiental deve buscar, acima de

    tudo, a solidariedade, a igualdade e o respeito diferena atravs de formasdemocrticas

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    de atuao baseadas em prticas interativas e dialgicas. Isto se consubstancia

    no objetivo de criar novas atitudes e comportamentos diante do consumo na nossa

    sociedade e de estimular a mudana de valores individuais e coletivos (Jacobi, 1997).

    A educao ambiental atravessada por vrios campos de conhecimento, o que a

    situa como uma abordagem multirreferencial, e a complexidade ambiental (Leff,

    2001) reflete um tecido conceitual heterogneo, onde os campos de conhecimento,

    as noes e os conceitos podem ser originrios de vrias reas do saber

    (Tristo, 2002).

    Portanto, utilizando como referencial do rizoma, a dimenso ambiental representa

    a possibilidade de lidar com conexes entre diferentes dimenses humanas,

    propiciando, entrelaamentos e mltiplos trnsitos entre mltiplos saberes. A escola

    participa ento dessa rede como uma instituio dinmica com capacidade de

    compreender e articular os processos cognitivos com os contextos da vida (Tristo,

    2002). A educao insere-se na prpria teia da aprendizagem e assume um papel

    estratgico nesse processo, e, parafraseando Reigota, podemos dizer que

    ...a educao ambiental na escola ou fora dela continuar a ser uma concepo

    radical de educao, no porque prefere ser a tendncia rebelde do pensamento

    educacional contemporneo, mas sim porque nossa poca e nossa herana histrica

    e ecolgica exigem alternativas radicais, justas e pacficas. (1998, p.43 )

    E o que dizer do meio ambiente na escola? Tomando-se como referncia

    Vigotsky (apud Tamaio, 2000) pode-se dizer que um processo de reconstruo interna

    (dos indivduos) ocorre a partir da interao com uma ao externa (natureza,

    reciclagem, efeito estufa, ecossistema, recursos hdricos, desmatamento), na qual os

    198 Cadernos de Pesquisa, n. 118, maro/ 2003

    indivduos se constituem como sujeitos pela internalizao de significaes que so

    construdas e reelaboradas no desenvolvimento de suas relaes sociais. A educaoambiental, como tantas outras reas de conhecimento, pode assumir, assim, uma

    parte ativa de um processo intelectual, constantemente a servio da comunicao,

    do entendimento e da soluo dos problemas (Vigotsky, 1991). Trata-se de um

    aprendizado social, baseado no dilogo e na interao em constante processo de

    recriao e reinterpretao de informaes, conceitos e significados, que podem se

    originar do aprendizado em sala de aula ou da experincia pessoal do aluno. Assim,

    a escola pode transformar-se no espao em que o aluno ter condies de analisara natureza em um contexto entrelaado de prticas sociais, parte componente de

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    uma realidade mais complexa e multifacetada. O mais desafiador evitar cair na

    simplificao

    de que a educao ambiental poder superar uma relao pouco harmoniosa

    entre os indivduos e o meio ambiente mediante prticas localizadas e pontuais,

    muitas vezes distantes da realidade social de cada aluno. Cabe sempre enfatizar a

    historicidade da concepo de natureza (Carvalho, 2001), o que possibilita a construo

    de uma viso mais abrangente (geralmente complexa, como o caso das

    questes ambientais) e que abra possibilidades para uma ao em busca de alternativas

    e solues.

    E como se relaciona educao ambiental com a cidadania? Cidadania tem a

    ver com a identidade e o pertencimento a uma coletividade. A educao ambiental

    como formao e exerccio de cidadania refere-se a uma nova forma de encarar a

    relao do homem com a natureza, baseada numa nova tica, que pressupe outros

    valores morais e uma forma diferente de ver o mundo e os homens.

    A educao ambiental deve ser vista como um processo de permanente

    aprendizagem que valoriza as diversas formas de conhecimento e forma cidados

    com conscincia local e planetria.

    E o que tem sido feito em termos de educao ambiental? A grande maioria

    das atividades so feitas dentro de uma modalidade formal. Os temas predominantes

    so lixo, proteo do verde, uso e degradao dos mananciais, aes para

    conscientizar a populao em relao poluio do ar. A educao ambiental que tem

    sido desenvolvida no pas muito diversa, e a presena dos rgos governamentais

    como articuladores, coordenadores e promotores de aes ainda muito restrita.

    No caso das grandes metrpoles existe a necessidade de enfrentar os problemas

    da poluio do ar, e o poder pblico deve assumir um papel indutor do

    processo. A reduo do uso do automvel estimula a co-responsabilidade social napreservao do meio ambiente, chama a ateno das pessoas e as informa sobre os

    perigos gerados pela poluio do ar. Mas isso implica a necessidade de romper com

    Cadernos de Pesquisa, n. 118, maro/ 2003 199

    o esteretipo de que as responsabilidades urbanas dependem em tudo da ao

    governamental, e os habitantes mantm-se passivos e aceitam a tutela.

    O grande salto de qualidade tem sido feito pelas ONGs e organizaes comunitrias,

    que tem desenvolvido aes no formais centradas principalmente napopulao infantil e juvenil. A lista de aes interminvel e essas referncias so

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    indicativas de prticas inovadoras preocupadas em incrementar a co-responsabilidade

    das pessoas em todas as faixas etrias e grupos sociais quanto importncia de

    formar cidados cada vez mais comprometidos com a defesa da vida.

    A educao para a cidadania representa a possibilidade de motivar e sensibilizar

    as pessoas para transformar as diversas formas de participao em potenciais

    caminhos de dinamizao da sociedade e de concretizao de uma proposta de

    sociabilidade baseada na educao para a participao.

    O complexo processo de construo da cidadania no Brasil, num contexto

    de agudizao das desigualdades, perpassado por um conjunto de questes que

    necessariamente implica a superao das bases constitutivas das formas de dominao

    e de uma cultura poltica calcada na tutela. O desafio da construo de uma

    cidadania ativa configura-se como elemento determinante para constituio e

    fortalecimento

    de sujeitos cidados que, portadores de direitos e deveres, assumam a

    importncia da abertura de novos espaos de participao.

    Atualmente o desafio de fortalecer uma educao ambiental convergente e

    multirreferencial prioritrio para viabilizar uma prtica educativa que articule de

    forma incisiva a necessidade de se enfrentar concomitantemente a degradao

    ambiental e os problemas sociais. Assim, o entendimento sobre os problemas

    ambientais

    se d por uma viso do meio ambiente como um campo de conhecimento

    e significados socialmente construdo, que perpassado pela diversidade cultural e

    ideolgica e pelos conflitos de interesse. Nesse universo de complexidades precisa

    ser situado o aluno, cujos repertrios pedaggicos devem ser amplos e

    interdependentes, visto que a questo ambiental um problema hbrido, associado

    a diversas dimenses humanas. Os professores(as) devem estar cada vez maispreparados para reelaborar as informaes que recebem, e dentre elas, as

    ambientais, a fim de poderem transmitir e decodificar para os alunos a expresso

    dos significados sobre o meio ambiente e a ecologia nas suas mltiplas determinaes

    e interseces. A nfase deve ser a capacitao para perceber as relaes

    entre as reas e como um todo, enfatizando uma formao local/global, buscando

    marcar a necessidade de enfrentar a lgica da excluso e das desigualdades. Nesse

    contexto, a administrao dos riscos socioambientais coloca cada vez mais anecessidade

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    de ampliar o envolvimento pblico por meio de iniciativas que possibilitem

    200 Cadernos de Pesquisa, n. 118, maro/ 2003

    um aumento do nvel de conscincia ambiental dos moradores, garantindo a informao

    e a consolidao institucional de canais abertos para a participao numa

    perspectiva pluralista. A educao ambiental deve destacar os problemas ambientais

    que decorrem da desordem e degradao da qualidade de vida nas cidades

    e regies.

    medida que se observa cada vez mais dificuldade de manter-se a qualidade

    de vida nas cidades e regies, preciso fortalecer a importncia de garantir padres

    ambientais adequados e estimular uma crescente conscincia ambiental, centrada

    no exerccio da cidadania e na reformulao de valores ticos e morais, individuais

    e coletivos, numa perspectiva orientada para o desenvolvimento sustentvel.

    A educao ambiental, como componente de uma cidadania abrangente, est

    ligada a uma nova forma de relao ser humano/natureza, e a sua dimenso cotidiana

    leva a pens-la como somatrio de prticas e, conseqentemente, entend-la na

    dimenso de sua potencialidade de generalizao para o conjunto da sociedade.

    Entende-se que essa generalizao de prticas ambientais s ser possvel se

    estiver inserida no contexto de valores sociais, mesmo que se refira a mudanas de

    hbitos cotidianos.

    A problemtica socioambiental, ao questionar ideologias tericas e prticas,

    prope a participao democrtica da sociedade na gesto dos seus recursos atuais

    e potenciais, assim como no processo de tomada de decises para a escolha de

    novos estilos de vida e a construo de futuros possveis, sob a tica da sustentabilidade

    ecolgica e a eqidade social.

    Torna-se cada vez mais necessrio consolidar novos paradigmas educativos,

    centrados na preocupao de iluminar a realidade desde outros ngulos, e isto supea formulao de novos objetos de referncia conceituais e, principalmente, a

    transformao

    de atitudes.

    SUSTENTABILIDADE, MOVIMENTOS SOCIAIS E A EDUCAO

    AMBIENTAL

    Talvez uma das caractersticas mais importantes do movimento ambientalista

    seja a sua diversidade. Esse amplo espectro de prticas e atores confere-lhe umcarter multissetorial que congrega inmeras tendncias e propostas orientadoras

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    de suas aes, considerando valores como eqidade, justia, cidadania, democracia

    e conservao ambiental. Nesse amplo universo de ONGs, algumas fazem trabalho

    de base, outras so mais voltadas para a militncia, outras tm um carter mais

    poltico e outras implementam projetos demonstrativos. Embora ocorra uma certa

    Cadernos de Pesquisa, n. 118, maro/ 2003 201

    queda na capacidade mobilizatria dos movimentos ambientalistas, observa-se tambm

    um grau de amadurecimento das prticas e a consolidao de um perfil de

    atuao de instituies numa perspectiva proativa e propositiva, dentro de moldes

    de sustentabilidade. O que representa a marca da atuao das ONGs? Seus pontos

    fortes esto na sua credibilidade e capital tico; na sua eficincia quanto interveno

    na microrrealidade social (grupos e comunidades), o que lhes permite formular

    aspiraes e propor estratgias para atend-las; na maior eficincia quanto aplicao

    de recursos e agilidade na implementao de projetos que tm a marca da

    inovao e da articulao da sustentabilidade com a eqidade social.

    O ambientalismo ingressa nos anos 90 constituindo-se como um ator relevante

    que, embora carregue consigo as marcas do seu processo de afirmao, assume

    um carter ampliado, baseado num esforo cada vez mais claramente planejado

    de dilogo com outros atores sociais.

    As questes que o ambientalismo suscita esto hoje muito associadas s necessidades

    de constituio de uma cidadania para os desiguais, nfase dos direitos

    sociais, ao impacto da degradao das condies de vida decorrentes da degradao

    socioambiental, notadamente nos grandes centros urbanos, e necessidade de

    ampliar a assimilao, pela sociedade, do reforo a prticas centradas na

    sustentabilidade

    por meio da educao ambiental.

    O salto de qualidade do ambientalismo ocorre na medida em que se criauma identidade crescente entre o significado e dimenses das prticas, com forte

    nfase na relao entre degradao ambiental e desigualdade social, reforando a

    necessidade de alianas e interlocues coletivas.

    Apesar de a maior parte das entidades ser baseada na militncia voluntria

    no remunerada, observa-se, nos ltimos anos, um crescente esforo de

    profissionalizao,

    ainda que isso ocorra em um nmero muito restrito de entidades. Um aspectobastante polmico est relacionado com a representatividade de entidades

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    nos diversos tipos de conselhos e comisses. O que se nota a existncia de

    organizaes

    que praticamente concentram suas atividades associadas participao em

    espaos de representao. Trata-se de uma lgica bastante perversa, gerada pela

    dinmica de institucionalizao de entidades centradas em poucas pessoas, que tm

    muita capacidade de ocupar espaos e que, mesmo sem trabalho de base e inclusive

    pouca legitimidade no prprio movimento ambiental, articulam a manuteno

    de sua presena.

    As coalizes na sociedade civil vm-se fortalecendo, explicitando escolha de

    temas e questes a serem enfrentadas em nome da busca de objetivos comuns, de

    modo a configurar a inflexo de uma dinmica reativa para uma dinmica propositiva,

    202 Cadernos de Pesquisa, n. 118, maro/ 2003

    que aproxima as ONGs e movimentos da mdia e que centra a atuao na coleta,

    sistematizao e disseminao de informaes.

    Nessa direo, as articulaes tm possibilitado o crescente fortalecimento

    de um plo poltico interno que integra as ONGs no centro do processo de presso

    e gesto, representando, portanto, uma inflexo importante numa agenda at

    recentemente trazida de fora para dentro.

    Apesar do pequeno reconhecimento do papel das ONGs, do que decorre

    reduzido interesse da sociedade brasileira em financiar de forma voluntria suas

    organizaes da sociedade civil, observa-se um aumento da sua legitimidade e da

    sua institucionalidade.

    O ambientalismo do sculo XXI tem uma complexa agenda pela frente. De

    um lado, o desafio de uma participao cada vez mais ativa na governabilidade dos

    problemas socioambientais e na busca de respostas articuladas e sustentadas em

    arranjos institucionais inovadores, que possibilitem uma ambientalizao dosprocessos

    sociais, dando sentido formulao e implementao de uma Agenda 21

    no nvel nacional e subnacional. De outro, a necessidade de ampliar o escopo de

    sua atuao, mediante redes, consrcios institucionais, parcerias estratgicas e outras

    engenharias institucionais que ampliem seu reconhecimento na sociedade e

    estimulem o envolvimento de novos atores.

    Se o contexto no qual se configuram as questes ambientais marcado peloconflito de interesses e uma polarizao entre vises de mundo, as respostas precisam

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    conter cada vez mais um componente de cooperao e de definio de uma

    agenda que acelere prioridades para a sustentabilidade como um novo paradigma

    de desenvolvimento. No se devem esquecer, no caso, das determinaes estruturais

    decorrentes de um sistema globalizado, de um padro de consumo que promove

    o desperdcio naquelas sociedades e segmentos que dele fazem parte, bem como

    a dualidade entre os que tm e os que no tm.

    O desafio que est colocado o de no s reconhecer, mas estimular prticas

    que reforcem a autonomia e a legitimidade de atores sociais que atuam articuladamente

    numa perspectiva de cooperao, como o caso de comunidades locais

    e ONGs. Isto representa a possibilidade de mudar as prticas prevalecentes, rompendo

    com as lgicas da tutela e da regulao, definindo novas relaes baseadas

    na negociao, na contratualidade e na gesto conjunta de programas e atividades,

    o que introduz um novo significado nos processos de formulao e implementao

    de polticas ambientais.

    Trata-se, portanto, de repensar o pblico por meio da sociedade e de verificar

    as dimenses da oferta institucional e a criao de canais institucionais para

    Cadernos de Pesquisa, n. 118, maro/ 2003 203

    viabilizar novas formas de cooperao social. Os desafios para ampliar a participao

    esto intrinsecamente vinculados predisposio dos governos locais de criar

    espaos pblicos e plurais de articulao e participao, nos quais os conflitos se

    tornam visveis e as diferenas se confrontam como base constitutiva da legitimidade

    dos diversos interesses em jogo, ampliando as possibilidades de a populao

    participar mais intensamente dos processos decisrios como um meio de fortalecer

    a sua co-responsabilidade na fiscalizao e controle dos agentes responsveis

    pela degradao socioambiental.

    O momento atual exige que a sociedade esteja mais motivada e mobilizadapara assumir um carter mais propositivo, assim como para poder questionar de

    forma concreta a falta de iniciativa dos governos para implementar polticas pautadas

    pelo binmio sustentabilidade e desenvolvimento num contexto de crescentes

    dificuldades para promover a incluso social. Para tanto importante o fortalecimento

    das organizaes sociais e comunitrias, a redistribuio de recursos mediante

    parcerias, de informao e capacitao para participar crescentemente dos

    espaos pblicos de deciso e para a construo de instituies pautadas por umalgica de sustentabilidade.

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    Diversas experincias, principalmente das administraes municipais, mostram

    que, havendo vontade poltica, possvel viabilizar aes governamentais pautadas

    pela adoo dos princpios de sustentabilidade ambiental conjugada a resultados

    na esfera do desenvolvimento econmico e social.

    Nessa direo, a educao para a cidadania representa a possibilidade de

    motivar e sensibilizar as pessoas para transformar as diversas formas de participao

    em potenciais fatores de dinamizao da sociedade e de ampliao do controle

    social da coisa pblica, inclusive pelos setores menos mobilizados. Trata-se de criar

    as condies para a ruptura com a cultura poltica dominante e para uma nova

    proposta de sociabilidade baseada na educao para a participao. Esta se concretizar

    principalmente pela presena crescente de uma pluralidade de atores que,

    pela ativao do seu potencial de participao, tero cada vez mais condies de

    intervir consistentemente e sem tutela nos processos decisrios de interesse pblico,

    legitimando e consolidando propostas de gesto baseadas na garantia do acesso

    informao e na consolidao de canais abertos para a participao, que, por sua

    vez, so precondies bsicas para a institucionalizao do controle social.

    Conclumos, afirmando que o desafio poltico da sustentabilidade, apoiado

    no potencial transformador das relaes sociais que representam o processo da

    Agenda 21, encontra-se estreitamente vinculado ao processo de fortalecimento da

    democracia e da construo da cidadania. A sustentabilidade traz uma viso de

    204 Cadernos de Pesquisa, n. 118, maro/ 2003

    desenvolvimento que busca superar o reducionismo e estimula um pensar e fazer

    sobre o meio ambiente diretamente vinculado ao dilogo entre saberes, participao,

    aos valores ticos como valores fundamentais para fortalecer a complexa

    interao entre sociedade e natureza. Nesse sentido, o papel dos professores(as)

    essencial para impulsionar as transformaes de uma educao que assume umcompromisso com a formao de valores de sustentabilidade, como parte de um

    processo coletivo.

    A necessidade de uma crescente internalizao da problemtica ambiental, um

    saber ainda em construo, demanda empenho para fortalecer vises integradoras

    que, centradas no desenvolvimento, estimulem uma reflexo sobre a diversidade e

    a construo de sentidos em torno das relaes indivduos-natureza, dos riscos

    ambientais globais e locais e das relaes ambiente-desenvolvimento. A educaoambiental, nas suas diversas possibilidades, abre um estimulante espao para repensar

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    prticas sociais e o papel dos professores como mediadores e transmissores de

    um conhecimento necessrio para que os alunos adquiram uma base adequada de

    compreenso essencial do meio ambiente global e local, da interdependncia dos

    problemas e solues e da importncia da responsabilidade de cada um para construir

    uma sociedade planetria mais eqitativa e ambientalmente sustentvel.

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    Cadernos de Pesquisa, n. 118, maro/ 2003 205