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  • Deslocamento metonmico no alamento argumental no portugus brasileiro

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    DAS RELAES ENTRE FORMA E CONTEDO NAS ESTRUTURAS

    MORFOLGICAS DO PORTUGUS

    Carlos Alexandre Gonalves*Maria Lcia Leito de Almeida**

    IntroduoComo assinala Jensen (1991, p. 12), o morfema constitui a linha

    de frente da dupla articulao da linguagem, sendo caracterizado, por-tanto, como entidade-limtrofe entre a lingstica da forma (fonologia esintaxe) e a lingstica do contedo (semntica). Modelos de anlise lin-gstica se desenvolveram tentando explicitar o mapeamento entre ex-presso e contedo em morfologia. Com esse propsito, depararam-secom um problema de soluo quase impossvel: definir o que vm aser as unidades da anlise morfolgica (ANDERSON, 1985, p. 34).Neste texto, apresentamos e discutimos alguns desvios no mapeamento

    * Doutor em Lingstica pela UFRJ com ps-doutorado em fonologia e morfologia pela UNI-

    CAMP. Pesquisador-bolsista do CNPq e professor-adjunto IV do Departamento de LetrasVernculas (Setor de Lngua Portuguesa) da Universidade Federal do Rio de Janeiro.**

    Doutora em Lingstica pela UFRJ com ps-doutorado em semntica pela UNICAMP. Pro-fessor Associado I do Departamento de Letras Vernculas (Setor de Lngua Portuguesa) daUniversidade Federal do Rio de Janeiro.

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    expresso-contedo em morfologia, tentando responder as seguintes ques-tes: (a) em portugus, que situaes sabotam o ideal de univocidadeentre forma e contedo? (b) morfemas so, de fato, coisas ou podemser interpretados como regras (ou padres)? (c) expedientes usadospara dar conta dos casos mal-comportados se mostram apropriados? e(d) como abordar casos em que um mesmo formativo veicula mais de umsignificado? Ao apresentar uma reviso dos casos de no-simetria entreforma e significado em morfologia, procuramos fornecer ao leitor umaviso crtica e corrente sobre esse tipo de distrbio nas construes mor-folgicas do portugus.

    Morfema: definio e problemasEmbora o conceito de morfema possa sofrer pequenas variaes,

    em decorrncia do modelo de anlise adotado, h relativo consenso quanto idia de que formas mnimas dotadas de significao constituemmorfemas (MATTEWS, 1974, p. 119). A seguir, so apresentadas setedefinies para essa entidade:

    (a) Bloomfield (1933, p. 120): O morfema uma forma mnima re-corrente (dotada de significado) que no pode ser analisada emformas recorrentes menores, sem prejuzo da significao;

    (b) Nida (1949, p. 259): Formas que possuem distintividade semn-tica correspondem a morfemas;

    (c) Togeby (1965, p. 39): Morfema designa o elemento fundamentale mnimo da lingstica de contedo.

    (d) Langacker (1977, p. 71): Um morfema tem um significado claroe constante em todos os seus usos, embora seja relativamentefcil encontrar excees.

    (e) Hjelmslev (1963, p. 231): Apesar de o morfema corresponder aoplano do contedo, h casos em que elementos formais, apesarde vazios de significao, levam a morfemas por apresentaremuma clara funo morfolgica.

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    (f) Crystal (1985, p. 175): Como todas as noes -micas, morfemasso unidades abstratas, realizadas por unidades discretas, conhe-cidas como morfes (...). Providas de significado ou de funo,tais unidades (...).

    (g) Jensen (1991, p. 5): Morfemas contribuem com algum tipo designificado ou, pelo menos, funo nas palavras das quaisso constituintes.

    Como se v, h unanimidade na caracterizao do morfema comoentidade significativa, muito embora as definies apresentem divergnciaquanto (1) ao uso do termo significao e (2) incluso de outros aspec-tos que acompanham a natureza dessa unidade de anlise lingstica. Emlinhas gerais, tais definies se sustentam quando h estrita relao bidire-cional, de um-para-um, entre forma e significado. Muitas questes sur-gem em funo desse mapeamento, o que esvazia a noo de morfema etorna necessria uma discusso dos casos que sabotam esse ideal de cor-respondncia.

    Para dar conta da falta de simetria no mapeamento forma-significa-do, muitas solues foram propostas, como, por exemplo: (a) analisar oscasos menos sistemticos como tipos especiais de formativos; (b) pro-por operaes fonolgicas que expliquem diferentes realizaes superfi-ciais de elementos morfolgicos; (c) admitir a existncia de casos no-morfmicos; (d) prever morfemas que no se materializam fonologica-mente; e (e) postular que regras so tambm morfemas.

    Resumindo, assumir que palavras so segmentadas em partes mni-mas significativas pilar de sustentao dos estudos morfolgicos de baseestruturalista e gerativa leva a um nmero significativo de problemas,sabotando o ideal de univocidade entre unidades semnticas e expres-ses fonolgicas.

    Modelos baseados na noo de item (e no na de palavra) tendema conceber a morfologia como um mdulo linear, sintagmaticamente de-terminado pela adio de formas que portam significados (ou funes).Processos morfolgicos de natureza no-aglutinativa, como, por exem-

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    plo, a reduplicao (quebra-quebra; puxa-puxa), o truncamento (sa-lafrrio > salafra; delegado > delega) e o cruzamento vocabular(mautorista

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    dos de uma determinada categoria lingstica. Dessa maneira, o uso de cognitivamente motivado (BYBEE, 1985): tende a caracterizar elemen-tos bsicos ou conceptualmente mais simples.

    Se, por um lado, unidades de contedo podem no ser representa-das fonologicamente, por outro, seqncias fnicas segmentveis podemno ser associadas a unidades de contedo. Tem-se, nessa situao, oque se pode chamar de o caso dos formativos assemnticos, ouseja, dos elementos de expresso sem contedo. Possibilitados pela altatransparncia dos elementos a que se associam, formativos assemnticos tambm conhecidos como morfes vazios (HOCKETT, 1947) ou for-mas no-morfmicas (CABRAL, 1980) so unidades de vrios tiposem portugus:

    (1) ndices temticos (ou morfes classificatrios, na terminologia de Ho-ckett, 1947). Vistas como unidades da flexo, tais marcas no veicu-lam qualquer informao semntica, muito embora apresentem im-portante funo morfolgica: servem para agrupar formas da lnguaem classes flexionais, como fazem as vogais temticas verbais do por-tugus;

    (2) Vogais e consoantes de ligao (ou morfes relacionais, ainda na ter-minologia de Hockett, 1947). Essa classe vem representada por seg-mentos fnicos que entram em determinados contextos para possibi-litar junturas, de acordo com os padres fonotticos da lngua. Hanlises que no os levam em conta como elementos isolveis, mascomo partes do constituinte que os precede ou os segue. Por exem-plo, pode-se pensar na seqncia /-al/ como sufixo responsvel pelanoo de lugar em que se concentram plantaes de X, como ocorreem pessegal, laranjal e coqueiral. Em formas como cafezal ecajazal, pode-se admitir a existncia de um /-z-/ como morfe-ponte(uma espcie de cola morfolgica) entre as bases e o sufixo al. Apresena desse /-z-/ justificvel em termos fonotticos: aparece paraimpedir adjacncia voclica e, conseqentemente, inibir a existnciade slabas sem ataque. Como alternativa, poder-se-ia analisar /z/ como

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    membro do sufixo e, com isso, considerar a existncia de uma varia-o condicionada fonologicamente1. Essa anlise alternativa, no en-tanto, esbarra num outro distrbio de mapeamento, a alomorfia, comodescreveremos mais adiante;

    (3) Seqncias fnicas no-recorrentes. Tais unidades conferem ao itemmorfologicamente complexo sentido exclusivo, especfico e no-pre-visvel. Nesse grupo, incluem-se falsas bases e falsos afixos, chama-dos basides e afixides (ROCHA, 1998), que, por no serem re-correntes, contrariando a definio de Bloomfield (1933), apresenta-da na seo precedente, aparecem em construes isoladas. Exem-plos de basides so encontrados em (01): palavras em que a seg-mentao possvel graas alta transparncia semntica do afixo(primeira coluna)2 e existncia de padres derivacionais gerais (se-gunda coluna), como o que caracteriza as formaes X-aria e X-eiro.Exemplos de afixides so vistos em (02), em que a base, por seruma palavra da lngua, autoriza o fatiamento.

    (01) manada marcenaria / marceneirobursite serralheria / serralheiromercenrio padaria / padeiromoroso carpintaria / carpinteirorstico artilharia / artilheiro

    (02) casebre carnia corpanzil copzio marujo ferrolho

    (4) Fonestemas (fon (phono) = som + est (aesth) = perceber + ema unidade estrutural). Fonestemas so seqncias fnicas recorrentesque associam algumas poucas palavras com significado relacionado

    1 Os elementos relacionais efetivamente encontrados em novas formaes so /z/ e /d/, que

    podem ser consideradas consoantes epentticas por excelncia na lngua. O primeiro apareceem formaes denominais (cafezinho, cajazeiro) e o segundo, em formaes deverbais(arrumadeira, encanador). Os demais elementos relacionais constituem resduos histricose podem receber interpretaes variadas, incluindo a analogia (cafeteira).2 Nesses exemplos, o enquadramento das formas num paradigma semanticamente regular pos-

    sibilita a interpretao genrica do produto: grupo de X (manada), inflamao em X (bursi-te) e assim sucessivamente.

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    (JOSEPH, 1998). Muitos vocbulos negativos do portugus, comoos que aparecem na primeira coluna de (03), apresentam uma nasalrecorrente a que se pode atribuir uma identidade de significado: nega-o. No entanto, se tais formas so reconhecidas no interior de uni-dades maiores, destroem-se, para o restante do vocbulo, as rela-es de som e significado que fundamentam a segmentao em uni-dades mnimas. O mesmo acontece com os dados da segunda colunade (03), nos quais a isolabilidade de /k/ como suposto elemento ca-racterizador de pergunta levaria proposio de vrios elementosno-morfmicos3:

    (03) no quandonada quantoningum qualnenhum quemnecas que

    (5) Morfes suprfluos (ANDERSON, 1982). H determinadas formasque aparecem no interior do vocbulo sem qualquer tipo de motiva-o fonolgica. o caso da vogal -a em dados como lindamente egloriosamente. O que fazer com essa vogal, numa anlise compo-nencial do significado do produto? De acordo com Rosa (2000: 64),seria possvel classific-la como marca de feminino, mas, argumenta aautora, essa marca decididamente suprflua num vocbulo in-varivel e, pior ainda, incompatvel com o significado da pala-vra. Caso esse -a seja entendido como expresso de gnero femini-no, outro problema se coloca: marcar uma flexo (suprflua) an-tes da derivao (ROSA, 2000: 64). Podemos apelar para outrassolues, mas estaramos saindo de um problema para entrar em ou-tro. Nos dados a seguir, aparecem elementos suprfluos. Nessas pa-lavras, as bases as formas realmente recorrentes so grafadas em ne-grito:

    3 Cumpre enfatizar que no o fonestema o elemento no-morfmico. Na verdade, a seqncia

    fnica que sobraria aps a segmentao que seria interpretada como no-significativa.

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    (04) chiqu-et-simominim-al-idadesatisfeit-is-ssimo

    Em todas as situaes at aqui apresentadas, as informaes mor-folgicas apesar da falta de correspondncia forma-contedo podemser devidamente isoladas, j que se sucedem numa linha temporal. Hcasos, no entanto, em que simplesmente impossvel demarcar as infor-maes morfolgicas. Palavras podem apresentar claramente dois (oumais) significados, sendo difcil estabelecer a segmentao. Chamemosessa situao de o caso das fronteiras morfolgicas e vejamos aconcretizao desse tipo de fenmeno em dados da lngua portuguesa.

    Processos no-aglutinativos no se ajustam bem a caixotes mor-folgicos e, por isso mesmo, so de difcil segmentao. Formas replaci-tivas (ou alternativas) ilustram bem o problema das fronteiras em morfolo-gia. Atuando em conjunto com uma marca morfolgica aditiva ou (es-tas interpretadas como morfmicas), replacitivos (chamados por CmaraJr. (1970) de sub-morfmicos ou de reforo) caracterizam-se por umamudana na constituio fonolgica da base e, por isso, so vistos comocasos de flexo interna (manifestao no prprio radical). Essa mudanavem a ser o abaixamento voclico, no caso do gnero e do nmero (n[]vo,n[]va, n[]vos), ou diferenas na altura, em formas do paradigmaverbal (d[u]rmo, d[]rme, d[]rmimos), explicveis por umlaut (oumetafonia).

    Alternncias voclicas de reforo tambm so encontradas na deri-vao. Poucos so os sufixos tonos do portugus. Dentre eles, destaca-se ico, formador de adjetivos. Nas formas resultantes, a informao adi-tiva (acrscimo do afixo) acompanhada por uma mudana na qualidadevoclica chamada de abaixamento dactlico (WETZELS, 1992), comonos dados da primeira coluna de (05), a seguir, e de abaixamento espon-daico (segunda coluna) , o que evidencia no estar o replacitivo circuns-crito aos paradigmas flexionais, como atestam os dados abaixo, que su-gerem a existncia de neutralizao tambm na srie tnica (WETZELS,1992; BISOL, 2002).

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    (05) cal[]r cal[]rico d[]ce d[]cilesquel[]to esquel[]tico m[]lver m[]velmetf[]ra metaf[]rico pr[]jetar proj[]til

    Radicais tambm podem se modificar para expressar a categoriasinttica da palavra. o que acontece na sistemtica oposio de classesa seguir, em que o nome sempre caracterizado pela vogal mdia fecha-da, em oposio forma verbal, categoricamente representada pela m-dia aberta:

    (06) (o) esf[]ro (eu) esf[]ro (o) ap[]lo (eu) ap[]lo(o) tr[]co (eu) tr[]co (o) ap[]go (eu) ap[]go(o) ch[]ro (eu) ch[]ro (o) com[]o (eu) com[]o(o) ref[]ro (eu) ref[]ro (o) ap[]rto (eu) ap[]rto

    Outro caso de difcil manobra, por no envolver seqenciaolinear de formas, o minus morfema (morfe subtrativo). Na viso deNida (1949, p. 75), morfes subtrativos devem ser postulados para aco-lher casos em que a expresso de um trao gramatical se faz atravs dadiminuio do corpo fnico da palavra-base. Consistem, pois, na perdade um ou mais sons para marcar oposio entre membros de uma mesmacategoria. Pares como irmo/irm e rfo/rf, entre outros, evi-denciam que as formas de feminino so caracterizadas pela queda dasemivogal do masculino. Num modelo do tipo IP (Item-e-Processo)4,poder-se-ia pensar numa forma bsica marcada pela presena de um ar-quifonema nasal travador de slaba (/iRmaN/ e /RfaN/). O segmentofinal dessas formas abstratas se torna visvel nas operaes derivacionais,como em irmanar e orfanato, e suprimido, quando, em fronteiramorfolgica de flexo, precede o /-a/ de feminino, nasalizando-o e ocasi-onando a posterior degeminao das vogais finais, como se observa noesquema a seguir:

    4 Em linhas gerais, no modelo IA (Item-e-Arranjo), palavras so vistas como seqncias

    lineares (combinaes, arranjos) de morfes (itens). Adota-se, para tanto, a idia de que asinformaes morfolgicas podem ser devidamente dispostas num molde previamente estabele-cido. O modelo alternativo, Item-e-Processo, prev o uso de processos fonolgicos paradescrever as relaes formais entre palavras.

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    (07) /iRmaN/ (forma bsica)/iRmaN/ + /-a/ (regra morfolgica)/iRmaNa/ (concatenao)/iRma/ (queda de nasal e nasalizao de vogal precedente)/iRm/ (degeminao) sada

    A representao em (07), tpica de modelos que prevem deriva-o serial a partir de uma representao mais abstrata, como o gerativostandard (CHOMSKY & HALLE, 1968), leva a repensar o minus mor-fema como entidade relevante numa anlise morfolgica. Na propostaformalizada em (07), a aparente reduo de corpo fnico pode ser atri-buda atuao de processos fonolgicos em srie sobre o que se chamade forma bsica (ou representao subjacente). Nesse caso, o acrscimode -a forma do masculino desencadeia uma srie de regras segmentaisordenadas que fazem com que o produto no manifeste a presena domorfema. Tal soluo, apesar de mais abstrata, atribui fonologia a irre-gularidade encontrada na morfologia.

    Se, por um lado, relativamente natural a explicao para a falta de-a em dados como irm e rf, por outro, como descrever a atuaode regras fonolgicas ordenadas nos casos de truncamento (primeira co-luna de (08) a seguir) e hipocorizao (segunda coluna)? Que processossegmentais explicariam o encurtamento, extremamente necessrio parasinalizar a informao morfolgica?

    (08) delegado > delega Rafael > Rafasalafrrio > salafra Alexandre > XandeMaracan > Maraca Gertrudes > TudeSapato > sapata Mariana > Mari

    Tais processos, modernamente acolhidos sob a rubrica morfologiasubtrativa (PIEROS, 2000), vm recebendo tratamento adequado nummodelo chamado Morfologia Prosdica (McCARTHY & PRINCE,1998), que descreve fenmenos no-concatenativos luz de dispositivoscomo moldes e cirscunscries. Nas abordagens anteriores ao advento

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    da Morfologia Prosdica, no entanto, tais processos foram deliberada-mente relegados a segundo plano, sendo denominados de marginais eidiossincrticos5.

    Tambm h dificuldade de se demarcarem fronteiras nos casos emque um contedo morfolgico se manifesta prosodicamente. Determina-das informaes morfolgicas podem ser expressas atravs de alteraesna configurao prosdica da palavra-base, como variaes no tom, nadurao voclica e no acento lexical. Em portugus, os chamados morfessuprassegmentais (tambm conhecidos como suprafixos) servem paraexpressar diferenas de tempo e mudanas de classe. A oposio entre ofuturo do presente e o pretrito mais-que-perfeito, como em cantar vs.cantara, evidencia que a informao quanto ao acento deve estar conti-da no formativo -ra: se tono, caracteriza formas de mais-que-perfeito; setnico, formas de futuro.

    Todos os exemplos da primeira coluna de (09), a seguir, caracteri-zam formas verbais, em oposio aos exemplos da segunda coluna, cate-gorizados como nomes. O que acontece nesses pares que o acento,como determinados afixos derivacionais da lngua (-o, mento, -agem),sinaliza a categoria sinttica da palavra: o verbo paroxtono, em oposi-o ao nome, sempre proparoxtono6.

    (09) fabrica fbricarefugio refgiosecretaria secretriaauxilio auxlionegocio negcio

    Dados como esses corroboram a idia de que morfemas no sonecessariamente coisas, podendo ser vistos tambm como processos /operaes. Recorrendo a Anderson (1982, p. 153), podemos afirmar

    5 Para aprofundamento no tema, remeto o leitor ao artigo de Gonalves (2004), que apresenta

    os processos no-concatenativos do portugus e os descreve luz da Morfologia Prosdica.6 No por acaso que a nominalizao regressiva de rubricar seja freqentemente produzida

    rbrica, com acento proparoxtono, contrariando a norma estabelecida como padro ru-brica, forma anmala na lngua.

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    que replacitivos, subtrativos e suprassegmentais fazem parte do grupodos mal-comportados, ficando mal acomodados num modelo do tipoIA (Item-e-Arranjo), justamente porque difcil segmentar a forma desuperfcie que contm essas categorias, de modo que alguma subpar-te de sua estrutura constitua o morfe em questo.

    Tambm so mal-comportadas, por envolver questes de fronteirae, no raro, requerer acesso a informaes prosdicas, as chamadas for-mas descontnuas. Nessa situao, uma s unidade formal dividida emfraes e aparece em diferentes lugares da cadeia sintagmtica. No seuinterior, outra forma se inclui, tornando-a descontnua. Formativos des-contnuos podem ser de naturezas variadas: razes, afixos flexionais e afi-xos derivacionais.

    Infixos exemplificam casos mais tpicos de descontinuidade morfo-lgica: inserem-se por completo no interior da raiz, fracionando-a em partesno-discretas. Em rabe, por exemplo, uma seqncia triconsonantal sim-ples (padro CCC para razes) responsvel pela veiculao de inme-ros significados relacionados, como se observa nos dados abaixo.

    (10) *ktb escreverkatab ele escreveukatib escrevendokitab livro

    Em portugus, a descontinuidade morfolgica aparece em dois afi-xos: um flexional e outro derivacional. No primeiro caso, incluem-se asformas de futuro do presente e futuro do pretrito. No segundo, os casosde parassntese (ou circunfixao / simulfixao).

    A tcnica da comutao possibilita identificar -ra e ria como ele-mentos veiculadores das noes de futuro do presente e futuro do pre-trito, respectivamente. Essas unidades mnimas indivisveis podem serfracionadas para que, em seu interior, seja anexado um cltico de objeto:encontrar-se-, encontrar-me-ia. Seja qual for a interpretao dadaao cltico, fato que, em termos estruturais, ele responsvel pela ciso

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    do formativo modo-temporal nesses usos mais tpicos do portugus euro-peu.

    Nos casos de parassntese, um prefixo e um sufixo so adicionadossimultaneamente a uma base para efeitos de mudana de classe e expres-so de contedo aspectual. Como s h uma diferena de significadoentre derivado e derivante, uma possvel soluo seria considerar que umdos elementos (o prefixo ou o sufixo) desprovido de contedo, inter-pretando-o, pois, como assemntico. De qualquer modo, estaramos evi-tando uma situao (descontinuidade morfolgica) para criar outra (mor-fes no-morfmicos).

    Uma proposta alternativa que evitaria a proliferao indiscrimina-da de formas sem significado seria considerar a parassntese como umcaso de circunfixao (SPENCER, 1993), no qual h adio simultneade elementos nas posies inicial e final. Como o formativo literalmente sedivide em dois, no seu interior anexada a raiz, como se observa noesquema a seguir:

    (11) /-1 +1/en triste eceren velho ecerem pobre ecerem rico ecer/eN .... ecer/tornar-se X

    Talvez o caso de mais difcil sistematizao, em termos de combi-nao linear das informaes morfolgicas, seja a reduplicao outromal-comportado da morfologia (ANDERSON, 1982). Na literatura, areduplicao pode ser analisada como coisa ou como regra. No pri-meiro caso, bem ao estilo Item-e-Arranjo, a reduplicao envolve ele-mentos aditivos (prefixos e sufixos) ou descontnuos (infixos). Uma abor-dagem dessa natureza se depara com um questionamento imediato: queafixo esse que, para expressar a mesma noo, utiliza-se de formas tovariadas? Qual , de fato, o recheio, i. e., a massa fnica responsvelpela expresso do contedo? Gleason Jr. (1961, p. 143) define a redupli-cao como afixos com formas extremamente variveis. Conforme

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    aponta Rosa (2000), Gleason Jr. analisa a reduplicao apenas comouma lista morfemas aditivos, perdendo em generalidade.

    Uma segunda interpretao, mais condizente com a abordagem Item-e-Processo, considera a reduplicao um mecanismo de cpia: consistena repetio (total ou parcial) de uma base. Apesar de mais apropriadaem termos de generalizao, essa anlise tambm se depara com questi-onamentos inevitveis: (i) qual a natureza do elemento copiado? e (ii)como se d o processo de cpia?

    Os dados a seguir, extrados de Rosa (2000), evidenciam que oredobro leva expresso do nmero no verbo samoano. A reduplicaoconsiste na cpia da penltima slaba da base, tornando-a descontnua.

    (12) manao (quer) mananao (querem)matua ( velho) matutua (so velhos)malosi ( forte) malolosi (so fortes)punou (retesa) punonou (retesam)pese (canta) pepese (cantam)alofa (ama) alolofa (amam)

    Vista como processo, essa operao pode ser explicada nos se-guintes termos: a categoria nmero plural, nos verbos, manifesta-se pelarepetio da penltima slaba da forma singular. Essa anlise permite cap-tar a generalizao de que o elemento que veicula a informao de pluralno /na/, /tu/, /lo/ ou /pe/ que, na anlise de Gleason Jr., constituiriamuma lista de alomorfes que expressam o mesmo contedo , mas a repe-tio de um constituinte da base.

    Em portugus, a reduplicao um fenmeno responsvel pelanominalizao7: a repetio de uma forma verbal na 3 pessoa do singulardo presente do indicativo (a) leva criao de um nome, (b) manifesta o

    7 H casos de reduplicao mais marginais na lngua, como atestam Gonalves & Albuquerque

    (2004): (1) em incio de palavras, caracterizando relaes de parentesco (mame, papai,vov, titio); (2) em final de palavras, expressando intensidade (bolol, choror); (3)em situaes de baby-talk (dedera, cocoto, papato); e (4) na formao de hipocorsticos(Ded, Faf).

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    aspecto iterativo8 e (c) pode, inclusive, rotular novos referentes, apresen-tando, portanto, funo lexical:

    (12) esfrega-esfrega (ato de esfregar repetidas vezes)empurra-empurra (ato de empurrar repetidamente)corre-corre (confuso)puxa-puxa (tipo de doce)pega-pega (brincadeira infantil)come-come (jogo de vdeo-game)

    Elementos descontnuos e reduplicativos no so perfeitamenteadaptveis ao esquema de caixotes morfolgicos porque (a) nem sem-pre se sucedem numa linha temporal e, em funo disso, (b) difcil deter-minar onde comea e termina a informao morfolgica. De fato, a mor-fologia que se manifesta pela adio linear de formas se adapta bem aosideais de univocidade e isolabilidade e, por isso, recebeu tratamento rela-tivamente adequado. Ao contrrio, a morfologia que, de uma forma ou deoutra, no se manifesta por estrito encadeamento de peas morfolgicasdificilmente se acomoda a esse esquema e, em funo disso, foi relegadaa segundo plano.

    Outra situao que sabota o ideal de univocidade entre forma econtedo o caso da alomorfia, uma vez que as informaes morfo-lgicas nem sempre se realizam da mesma maneira nos diversos ambien-tes em que se manifestam. Dessa constatao, deriva a idia de que mor-femas so, na verdade, classes de morfes: elementos diferentes em forma,mas com distintividade semntica comum, so vistos como membros deuma mesma classe de morfemas. A alomorfia constitui fenmeno de sa-botagem no ideal de correspondncia unvoca porque, nesse caso, tem-se uma relao de um-para-muitos entre contedo e expresso (um signi-ficado relacionado a vrias formas).

    Num modelo do tipo IA, a alomorfia explicada em termos distri-bucionais: sries estruturais diferentes constituem a base para a com-

    8 O termo iterativo utilizado para indicar um evento que acontece repetidas vezes, opondo-

    se, portanto, a pontual.

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    binao de possveis alomorfes num morfema apenas (NIDA, 1949:princpio (c) de identificao de morfemas). Num modelo do tipo IP, ele-ge-se uma forma como bsica, sendo as demais explicadas em termos deoperaes fonolgicas. Analisemos a alternncia abaixo:

    (13) [i]legal [ m]possvel [i.n]apto[i]moral [ n]certo [i.n]experiente[i]rreal [ ]justo [i.n]til[i]negvel [ ]correto [i.n]igualvel

    Como se v, as diferenas fnicas observadas na forma do prefixode negao so previsveis e evidenciam um caso tpico de distribuiocomplementar: o segmento voclico oral ([i-]) ocorre antes de uma soan-te (nasal ou lquida); o segmento voclico nasal ([ -]), seguido de nasaltautossilbica, aparece sempre que a palavra-base se inicia por uma con-soante (oclusiva ou fricativa); por fim, a seqncia bifnica constituda devogal + consoante nasal alveolar heterossilbica ([i.n ]) caracteriza so-mente o ltimo bloco de formas as iniciadas por vogal.

    Por questes de simplicidade e economia, podemos pensar em /iN-/ como forma bsica do prefixo de negao em portugus. Todas asdiferentes realizaes podem ser descritas por processos fonolgicos re-gulares que modificam a configurao bsica desse elemento, inspecio-nando a classe maior do som que inicia a palavra-base. Assim, nos dadosda primeira coluna, a ausncia de consoante nasal explicada pela atua-o de um processo de dissimilao, regulado por um princpio conheci-do como OCP9: a consoante abstrata apagada quando em contato comoutra soante, seja ela nasal ou no. Na segunda, ao contrrio, a nasalabstrata assimila o ponto de articulao da consoante vizinha, tornado-selabial ([ m ]possvel), alveolar ([ n ]certo), palatal ([ ]justo) ou velar([ ]correto), em funo do local de articulao desse segmento. Por fim,nas palavras iniciadas por vogal essa consoante abstrata passa da posi-

    9 OCP a abreviao da expresso inglesa Obligatory Countor Principle (Princpio do Contor-

    no Obrigatrio). Nos atuais estudos de fonologia, esse princpio bloqueia a adjacncia deelementos idnticos numa mesma camada. Nos dados em anlise, OCP explica o apagamentoda nasal porque, na concatenao morfolgica, duas soantes ficam contguas.

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    o de coda para a de onset silbico, seguindo o princpio de silabifica-o que prev a ligao de consoantes primeiramente nessa margem daslaba (o chamado Princpio de Maximizao do Ataque). Com isso, ad-quire o ponto de articulao default, coronal, como acontece em outrosprocessos morfolgicos do portugus: r >> ranrio; fim >> final;um >> nico; gostoso > gostosona.

    Dados como os apresentados em (13) levaram o modelo gerativo-padro a negar a existncia de um mdulo morfolgico autnomo. Assim,questes morfolgicas que puderam ser resolvidas fonologicamente, comoa alomorfia aqui descrita, foram abordadas em termos de derivao seri-al, recorrendo-se, para tanto, aos chamados smbolos de fronteiras: [+]para fronteiras de morfemas e [#] para fronteiras de palavras. Com isso,parte da morfologia, incluindo-se, a, a realizao de suas unidades deanlise, foi incorporada ao componente fonolgico.

    Se, por um lado, relativamente natural que a forma de primitivosmorfolgicos se altere na concatenao, por outro, o que dizer a respeitodos dados a seguir, em que o radical se modifica sem nenhuma causafnica aparente? Sem dvida alguma, esses casos envolvem alomorfia, nosentido estrito do termo, mas informaes gramaticais, como tempo easpecto, aparecem fundidas com o contedo lexical da base. Na propos-ta cognitivista de Bybee (1985), dados desse tipo so explicveis pelaalta relevncia do tempo, do modo e do aspecto para o significado doverbo quanto maior a relevncia do contedo gramatical, maior a chan-ce de fuso na expresso morfolgica (GONALVES, 2005).

    (14) /poN/ ponho, pe, ponha, ponhamos/puN/ punha, pnhamos, punham/puS/ pusramos, pusemos, pusssemos, puser/poR/ porei, poramos, poremos, poria

    Como se v em (14), a forma /puN/, alm de veicular a informaode colocar, agrupar, botar, tambm expressa as noes de tempo emodo, haja vista ser usada somente no imperfeito do indicativo. A mesma

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    afirmao pode ser feita em relao variante /poN/, que sempre apare-ce associada ao presente, nos modos indicativo, subjuntivo e imperativo10O imperativo apresenta a mesma forma de raiz que o presente. Do ponto-de-vista do tempo, podemos dizer que o modo imperativo, por expressaruma ordem, veicula a noo de presente. Dito de outra maneira, formascom a slaba seguida de nasal palatal (ponho) ou de semivogalnasal (pe) mesclam o significado por com o de tempo presente, demodo que o contedo gramatical aparece fundido com o lexical. Uma vezque todas as formas verbais com /poN/ remetem ao presente, podemosafirmar que a noo de tempo figura no prprio radical do verbo.

    Formas com /poR/ sempre veiculam a noo de futuro (do presen-te ou do pretrito, nos modos indicativo e subjuntivo). Por fim, /puS/ seassocia ao pretrito perfeito e ao mais-que-perfeito. Como se v, as v-rias realizaes do radical servem para expressar tempo, aspecto e modo,significados diretamente relevantes para o contedo do verbo. So bemmais raras fuses com as categorias nmero e pessoa, dada sua baixarelevncia para o significado do verbo (GONALVES, 2005), j quefazem referncia ao sujeito (no ao evento verbal propriamente dito).Assim, alternncias no radical podem ser explicadas pelo fenmeno dafuso. No entanto, temos, ainda assim, um distrbio no mapeamento for-ma-significado, j que um item monomorfmico veicula mais de um con-tedo. H, nos dados de (14), o que se pode denominar de o caso dacumulao fenmeno de anlise morfolgica em que uma forma inde-componvel comporta mais de um significado.

    A cumulao constitui empecilho para o ideal de univocidade entreexpresso e contedo em morfologia, j que, no chamado portmanteau111,

    10 O imperativo apresenta a mesma forma de raiz que o presente. Do ponto-de-vista do tempo,

    podemos dizer que o modo imperativo, por expressar uma ordem, veicula a noo de presente.10

    Originalmente, o termo portmanteau (do francs cabide) foi introduzido por Hockett(1947) para denominar um morfe que corresponde a dois ou mais morfemas. Esses morfemasapresentam os mesmos traos gramaticais de outros que vem em seqncia em certos contex-tos. o caso da crase em portugus. Portmanteau tambm o termo utilizado por Pieros(2002) para batizar o processo de formao de novas palavras que no se identifica nem coma composio propriamente dita, nem tampouco com a derivao o cruzamento vocabular(sacol, chaf). Da esses autores chamarem de portmanteaux os vocbulos cruzados queapresentam segmentos ambimorfmicos (comuns s duas bases).

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    uma forma no-analisvel em unidades menores veicula, simultaneamen-te, dois (ou mais) contedos. Toda a flexo verbal portuguesa marcadapela presena de elementos cumulativos, uma vez que a informao tem-poral se superpe de modo e aspecto, da mesma forma que a de pes-soa aparece interseccionada com a de nmero. Alm da cumulao designificados, elementos morfolgicos tambm podem ser caracterizadospelo entranhamento de funes. Tal o caso dos sufixos nominalizadores,como mento e o, por exemplo, que, alm de veicular um significado epromover mudana categorial (de verbo para nome), so tambm res-ponsveis pela atribuio de gnero.

    Uma situao diametralmente oposta observada na alomorfia o caso da identidade formal. Nessa situao, no se tem distintivida-de fontica, mas distintividade semntica, isto , uma mesma seqnciafnica veicula mais de um significado. Surgem, de imediato, dois questio-namentos: (a) haver tantos formativos quantos forem os significados? e(b) o que, de fato, caracteriza as unidades da morfologia, a forma ou ocontedo?

    Do contedo para a forma: novas maneiras de sabotagem?A homonmia pode se constituir num problema para o ideal da uni-

    vocidade na relao forma / significado em morfologia. Isso porque a elase associam dois diferentes critrios: o sincrnico e o diacrnico. Sob ocritrio sincrnico, so homnimas as formas cujos significados no po-dem ser entendidos como relacionados pelo falante; sob o critrio diacr-nico, so homnimas as formas que, embora apresentem a mesma se-qncia fonolgica num determinado momento do tempo, tm timos di-ferentes. Em ambas as perspectivas, a homonmia no seria mais que umacidente histrico. Observemos o clssico exemplo de cabo, acidentegeogrfico, ou cabo, parte do utenslio de cozinha por onde ele podeser segurado. Sob o ponto de vista sincrnico, teremos formas homni-mas, j que aparentemente impossvel relacionar os dois significados;sob a perspectiva diacrnica, no teremos homonmia, mas polissemia,pois as palavras vm do mesmo timo: caput (cabea em latim).

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    Se a homonmia pensada diacronicamente, ela se constitui numfalso problema na relao de um-para-um entre significado e forma. Narealidade, estaramos diante de duas formas diferentes, com significadosigualmente diferentes, que se igualaram. o caso de so, em suas trsacepes (a) verbo ser, 3. pessoa do presente do indicativo; (b)sinnimo de sade; e (c) reduo de santo provenientes, respectiva-mente, de sunt, sanus e sancti.

    A homonmia, entretanto, sob o conceito sincrnico, pode realmen-te transtornar o ideal de equilbrio das estruturas lingsticas e, por isso, foibastante tratada nas diferentes escolas formalistas, de Saussure a Bloomfi-eld, e reconhecida como tal por Chomsky e discpulos. O que interes-sante notar que a homonmia prolifera a partir de escolhas tericas des-sas escolas por privilegiar a langue, o sistema, a independncia do co-nhecimento lingstico em si (dissociado do enciclopdico), o reconheci-mento de um significado bsico, primrio. Anlises que transformam fe-nmenos polissmicos em homonmias (como a de caput acima) sochamados por Silva (2006: 29) de estratgias homonimistas hbitoda anlise distribucional e gerativa de descrever e representar um itemlexical em termos de entradas independentes homnimas. A radicalizaofoi de tal monta que, lembra Silva (2006), a anlise de Geckeler (1976)do campo lexical dos adjetivos de idade aponta para duas entradas devieux: uma para idade prpria (homem velho) e outra para idade defuno (meu velho amigo).

    Adotando o critrio diacrnico para a homonmia, podemos afir-mar que esse fenmeno tambm se manifesta na morfologia. Em todos oscasos apresentados em (15) a seguir, possvel falar em homomorfia uma relao de homonmia encontrada em elementos morfolgicos:

    (15) -s (elemento que expressa plural, nos nomes) e -s (marca de 2. p. sing.)-a (marca de gnero feminino) e -a (vogal temtica de 1. conjugao)-o (vogal temtica nominal) e -o (desinncia de 1. p. do presente)

    Em todos os dados de (15), aparece uma outra caracterstica dahomonmia a diferena de classe. Observe-se que as formas idnticasesto relacionadas flexo e aprecem em palavras de classes diferentes nome, no primeiro caso, e verbo, no segundo. No raro, no entanto,

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    encontrar homomorfia entre afixos de mesmo tipo (derivacional) em for-mas de uma mesma classe. Tal fato pode ser observado nos dados abaixo:

    (16) departamental laranjalregional bananalconstrucional coqueiralmortal cafezalvital jaboticabal

    Observe-se que os dados em (16) tm em comum o formativo -al,que, no entanto, manifesta diferentes significados. No primeiro caso, -alforma adjetivos a partir de substantivos e provm do sufixo latino -alis; nosegundo, indica o local em que se encontram plantaes do que se espe-cifica na base e se relaciona aos timos latinos are e ar (CUNHA, 1982;p. 62). Na morfologia derivacional, uma atividade arqueolgica em rela-o s palavras pode revelar homonmias esclarecedoras envolvendo afi-xos do portugus.

    A polissemia e sua manifestao na morfologia do portugus comum que se ache em compndios que tratam da derivao a

    citao de determinado afixo associado a seus possveis valores, depre-endidos de anlises localizadas. Lembramos, a ttulo de exemplificao, osufixo -eiro, sobre o qual se fala que pode formar (a) agentes habituais ouprofissionais, (b) locais, (c) fenmenos da natureza e (d) objetos, acep-es ilustradas com palavras como jornaleiro, galinheiro, nevoeiro ecinzeiro. Fato similar se d com outros sufixos agentivos, como -nte edor.

    Se os sufixos so acrescidos a bases e se os diversos significadosque veiculam so independentes entre si, ento, seriam os sufixos deriva-cionais manifestaes de homonmia morfolgica (homomorfia)? Se sim,tal fato aumentaria o lxico e o custo da aquisio. Essa possibilidade,entretanto, contra-intuitiva, j que a observao da lngua em uso, comprodues no-dicionarizadas, evidencia novas criaes lexicais que lan-am mo do sufixo para veicular este ou aquele contedo. So criaes

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    relativamente recentes pagodeiro e funqueiro, que podem expressaragente profissional ou habitual, assim como brameiro, que s designa,pela prpria natureza da atividade (consumir uma determinada marca decerveja), agente habitual. Se h extenso regular dos significados dos su-fixos para determinadas acepes, lcito pensar, pois, que se trata depolissemia e no de homonmia. E mais, que tais extenses formam redesmotivadas por processos metafricos ou metonmicos (GONALVES& ALMEIDA, 2006).

    Caso interessante de sufixo que aparentemente tm vrios e dife-rentes significados o de -ura. Verificaes em trabalhos filolgicos indi-cam que o sufixo ura, no latim, era formador de adjetivos e, em portugu-s, tornou-se um sufixo formador de nomes a partir de adjetivos (largu-ra, alvura) e verbos (mordedura, armadura). Said Ali (1971) ensinaque muitos termos de origem verbal em -ura foram introduzidos no portu-gus por via erudita (formatura) ou foram recebidos diretamente do la-tim, desaparecendo os respectivos verbos, ou tomando estes formas di-ferentes (pintura

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    vez, assinala que o sufixo -ura formador de substantivos que indicamqualidade (grossura), estado (frescura), instrumento (atadura), obje-to (abotoadura), ao (mordedura) ou resultado (feitura). A par dasdiferentes constataes, v-se que essas anlises apontam para relaode homonmia, se considerado o seguinte critrio: formas homnimasso aquelas fonologicamente iguais, cujas significaes no se consegueassociar num mesmo campo semntico.

    Estamos, pois, diante de duas constataes parciais: a improdutivi-dade do sufixo ura e o fato de esse sufixo assumir diferentes valores, comdiferentes funes, nas bases a que se junta. Para verificar a primeira,fizemos uma busca com a ferramenta eletrnica Google em stios de rela-cionamento da internet. Tal atividade trouxe as seguintes palavras no-dicionarizadas:

    (17) magrura bonitura zonzurachatura pobrura preturadoidura limpura viadura

    Essas palavras, como j havia verificado Said Ali para a produtivi-dade do ura em portugus, formam nomes a partir de adjetivos e inte-gram o grupo mais produtivo, embora no o nico de formas novas haquelas cujas bases so substantivos (tamanhura, coisura, limpezu-ra) e aquelas com bases verbais (varredura, vendedura, abridura).

    Cotejamos o grupo mais produtivo das novas formas com o grupomais produtivo das formas encontradas no portugus arcaico, organiza-das por similaridade semntica, independentemente da classe da base.Nesse grupo, temos formas como quentura, corredura, queixadura,catadura e esfoladura, entre outras.

    A concluso aponta instigante fato: tanto as formas do portugusarcaico quanto as novas representam a propriedade de excesso em rela-o especificao da base. Estamos, sem dvida, diante de uma gene-ralizao e face a uma possibilidade de rever a homonmia atribuda a essesufixo. Mas como propor a unificao da anlise?

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    A importncia da motivao semntica para a formao de novaspalavras, assim como a dos processos figurativos como a metfora e ametonmia, vem permitindo novas perspectivas compreenso dos estu-dos morfolgicos. Como evidncia de motivao semntica para forma-o de palavras, temos o caso de paixonite, preguicite e frescurite,que podem ser analisadas levando-se em conta a conceptualizao desentimento (paixo) e de atitude (preguia e frescura) como doenasem grande gravidade, inflamao curvel, tal como apendicite, laringi-te e tendinite. H ainda a utilizao do sufixo ete para denominaraquela que faz parte de um grupo liderado por algum, como chacrete(bailarina que danava no programa comandado pelo apresentador Cha-crinha), xuxete (assistente de palco da apresentadora Xuxa) e martelle-te (aluna participante do grupo do professor Martellota). Tanto no casodas palavras derivadas por ite quanto por ete verifica-se a motivaosemasiolgica para a formao, como tambm a polissemia sufixal, por-que os sentidos so adaptados s bases.

    Caso interessante tambm de se observar o dos compostos, paraos quais a literatura especializada lana mo da idiossincrasia para expli-car as formaes. Vemos, entretanto, que compostos podem criar pa-dres com um determinado ncleo que vai sendo reutilizado sempre comnovos reenquadramentos. o caso atual de palavras formadas com bol-sa.

    A palavra bolsa (do grego byrse, do latim bursa), para designarobjeto que porta algo de valor, j surgiu por metonmia, pois sua primeiraacepo couro designava o material de que era feito o utenslio. Apalavra passa depois a designar ajuda de custos para determinado fim etemos, ento, bolsa-famlia, bolsa-escola. O valor de tal conceito abs-tratizado (bolsa como auxlio a fundo perdido com fins sociais), em de-terminado momento scio-histrico, permite a formao de novas pala-vras que se valem das extenses de sentido, mas que mantm o cunho deauxlio com fins sociais. , ento, que atualmente circula na grande im-prensa a palavra bolsa-ditadura, para designar indenizao governa-mental a vtimas da ditadura militar, e bolsa-derrota, ressarcimento acabos eleitorais de candidatos a cargos polticos que perderam as elei-es.

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    V-se, nos casos de bolsa-ditadura e bolsa-derrota, que o sen-tido bsico desbota, mas surge ainda para tentar caracterizar o aspectosocial. Vale notar, nessas formaes, a metonmia do segundo termo doscompostos. Interessante verificar, nesse conjunto promovido pela palavrabolsa, a formao bolsa-floresta, que expressa devastao mensal daAmaznia, que desfavorece interesses sociais, mas cuja utilizao remete continuidade de ocorrncia.

    No por acaso, em texto que fala de novas expresses (sinistro,bizarro), o escritor Joo Ubaldo Ribeiro publicou em setembro o artigoO Bolsa Blindagem, em vrios jornais do pas. Nele, o escritor chamaateno para a proliferao e a necessidade de popularizao da blinda-gem de carros, apartamentos e do mais que seja necessrio, sugerindoque o governo crie uma bolsa com tal fim.

    Em todos os casos expostos, h oscilao do conceito de bolsa,que ora aponta para contribuio necessria, obrigatria, regular, ora apon-ta apenas para subsdio governamental suprfluo, ora somente para o ca-rter de mensalidade, mesmo que sendo de instituies privadas. Almdisso, as relaes que bolsa mantm com o segundo elemento tantopodem ser de causa (como bolsa de estudo, bolsa-famlia, bolsa-ditadura, bolsa-blindagem), como de conseqncia (bolsa-floresta)da contribuio. As ocorrncias notadas nas formaes com bolsa sosimilares s com vale (vale-transporte, vale-leite, vale-tudo) e scom seguro (seguro-desemprego, seguro-sade).

    Palavras finaisNeste artigo, discutiu-se uma srie de fatos que conspiram contra o

    ideal de univocidade ente forma e significado em morfologia. Foram to-mados dois diferentes pontos de vista: em primeiro lugar, observaram-secasos de distrbio na forma, para, a seguir, refletir sobre as diferentesrelaes de significado envolvendo um elemento morfolgico. O artigo,no entanto, no teve por meta apresentar solues para os diferentes des-vios na relao forma-contedo, mas mapear as situaes de conflito en-tre essas duas instncias que caracterizam as unidades da morfologia.

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    vestigation of phonological process in morphologicallimits and the exam of the polissemy in morphologicalconstructions.

    Palavras-Chave: Morfema; Mapeamento forma-con-tedo; Processos fonolgicos de fronteira; Unidadesde anlise lingstica.

    Keywords: Morphology; Form and meaning relati-onship; Morpheme.

    Diadorim4.pmd 18/11/2008, 11:4255