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15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental 1 15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental SIG EM LAUDOS GEOLÓGICO-GEOTÉCNICOS DE LOTEAMENTOS Oswaldo Augusto Filho 1 Resumo A inclusão de laudos geológico-geotécnicos entre as exigências técnicas no processo de obtenção da licença para implantação de loteamentos é usual no estado de São Paulo. De maneira genérica, estes laudos investigam e analisam as características do meio físico (solos, rochas, relevo, águas superficiais e subterrâneas, etc.), a dinâmica dos processos erosivos, a estabilidade dos taludes de corte e de aterro e outras restrições geológico-geotécnicas das áreas a serem loteadas. Também é comum que elas demandem uma análise e eventual revisão dos projetos urbanístico, de terraplenagem e de drenagem apresentados para o loteamento. Este trabalho apresenta um método para a elaboração destes laudos geológico-geotécnicos com apoio de Sistema de Informação Geográfica SIG. O método está estruturado em três etapas principais: análise dos aspectos geológico-geotécnicos regionais; análise dos aspectos topográficos e geotécnicos da área do loteamento e análise dos projetos urbanístico, de terraplenagem e de drenagem do loteamento frente aos condicionantes geotécnicos identificados. A aplicação do método proposto é analisada com estudo de casos. Abstract The inclusion of geological and geotechnical reports between the technical requirements in the process of obtaining the license for the implementation of urban allotments is usual in the state of São Paulo. Generically, these reports investigate and analyze the characteristics of the physical environment (soil, rocks, relief, surface and ground water, etc.), the dynamics of erosion, the stability of cut slopes and landfill and other geological geotechnical constraints of the areas to be allotted. It is also common for them demanding a review and possible revision of urban, earthworks and drainage projects presented to the allotment. This paper presents a method for the preparation of these geological and geotechnical reports with support by Geographic Information System - GIS. The method is divided into three main stages: analysis of geological and geotechnical regional aspects; analysis of topographic and geotechnical aspects of allotment area and analysis of urban, earthworks and drainage projects of allotment front to the identified geotechnical conditions. The application of the proposed method is analyzed with case studies. Palavras-Chave Laudos geológico-geotécnicos, loteamentos, Sistema de Informação Geográfica - SIG. Keywords Geological and geotechnical reports, urban allotments, Geographic Information System - GIS. 1 Geólogo, Professor Associado, Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, (16) 3373-9488, [email protected]

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15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental 1

15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental

SIG EM LAUDOS GEOLÓGICO-GEOTÉCNICOS DE LOTEAMENTOS

Oswaldo Augusto Filho 1

Resumo – A inclusão de laudos geológico-geotécnicos entre as exigências técnicas no processo de obtenção da licença para implantação de loteamentos é usual no estado de São Paulo. De maneira genérica, estes laudos investigam e analisam as características do meio físico (solos, rochas, relevo, águas superficiais e subterrâneas, etc.), a dinâmica dos processos erosivos, a estabilidade dos taludes de corte e de aterro e outras restrições geológico-geotécnicas das áreas a serem loteadas. Também é comum que elas demandem uma análise e eventual revisão dos projetos urbanístico, de terraplenagem e de drenagem apresentados para o loteamento. Este trabalho apresenta um método para a elaboração destes laudos geológico-geotécnicos com apoio de Sistema de Informação Geográfica – SIG. O método está estruturado em três etapas principais: análise dos aspectos geológico-geotécnicos regionais; análise dos aspectos topográficos e geotécnicos da área do loteamento e análise dos projetos urbanístico, de terraplenagem e de drenagem do loteamento frente aos condicionantes geotécnicos identificados. A aplicação do método proposto é analisada com estudo de casos.

Abstract – The inclusion of geological and geotechnical reports between the technical requirements in the process of obtaining the license for the implementation of urban allotments is usual in the state of São Paulo. Generically, these reports investigate and analyze the characteristics of the physical environment (soil, rocks, relief, surface and ground water, etc.), the dynamics of erosion, the stability of cut slopes and landfill and other geological geotechnical constraints of the areas to be allotted. It is also common for them demanding a review and possible revision of urban, earthworks and drainage projects presented to the allotment. This paper presents a method for the preparation of these geological and geotechnical reports with support by Geographic Information System - GIS. The method is divided into three main stages: analysis of geological and geotechnical regional aspects; analysis of topographic and geotechnical aspects of allotment area and analysis of urban, earthworks and drainage projects of allotment front to the identified geotechnical conditions. The application of the proposed method is analyzed with case studies.

Palavras-Chave – Laudos geológico-geotécnicos, loteamentos, Sistema de Informação Geográfica - SIG.

Keywords – Geological and geotechnical reports, urban allotments, Geographic Information System - GIS.

1Geólogo, Professor Associado, Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, (16) 3373-9488, [email protected]

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1. INTRODUÇÃO

A inclusão de laudos geológico-geotécnicos entre as exigências técnicas no processo de obtenção da licença para implantação de loteamentos urbanos é usual no estado de São Paulo. As especificações solicitadas nestes laudos podem ser genéricas, como a exemplificada a seguir: “Caberá à prefeitura, antes da aprovação plena dos projetos de Terraplenagem, Drenagem e Urbanístico, exigir do interessado laudo geotécnico, acompanhado da respectiva ART, contendo parecer favorável em relação aos projetos apresentados, bem como, as recomendações técnicas que deverão ser observadas quando da implantação do loteamento” (GRAPROHAB, 2012).

Em outras situações, são feitas exigências técnicas específicas, tais como: "Face à grande movimentação de terraplenagem para implantação do loteamento, com extensões significativas de aterro, adoção de muros de arrimo elevados, etc., sugere-se que quando da reabertura do presente processo se apresente um estudo geológico-geotécnico da gleba, acompanhado das recomendações para implantação física do empreendimento” (GRAPROHAB, 2015).

Outra condição contorno comum neste tipo de estudo técnico, refere-se à utilização principalmente de dados secundários já constantes nos levantamentos e nas investigações dos projetos Urbanístico, de Terraplenagem e de Drenagem dos loteamentos.

Os dados de interesse (tipos de rochas e solos, perfil de alteração típico, condições do nível d’água, presença de feições erosivas e de movimentação do terreno, etc.) também são obtidos a partir de vistorias na área a ser loteada e por consultas a publicações técnicas de referência sobre a área onde será implantado o loteamento.

No presente trabalho, é proposto um roteiro geral para a elaboração destes laudos geotécnicos com apoio de Sistema de Informação Geográfica – SIG e considerando as condições de contorno descritas acima, a elaboração de mais de uma dezena destes laudos em diferentes cidades do interior do estado de São Paulo e as pesquisas acadêmicas correlatas desenvolvidas no âmbito da universidade.

2. FUNDAMENTOS TÉORICOS

Como qualquer estudo geológico-geotécnico, os laudos voltados à implantação de loteamentos demandam levantamentos e análises regionais e locais conjugadas. Desta forma, procedimentos envolvendo a localização da área do empreendimento em bases cartográficas (folhas topográficas na escala 1:10.000 ou 1:50.000), em mapas temáticos de interesse em escala mais regional (geológico, pedológico, geomorfológico, geotécnico) são necessários nas etapas iniciais destes estudos.

A localização da área do loteamento em imagens aéreas disponíveis, inclusive na internet (Google Earth), também fazem parte das etapas iniciais destes estudos e requerem conhecimentos básicos de georreferenciamento e de sistemas de projeção cartográfica (AUGUSTO FILHO, 2012).

Na análise de detalhe, a topografia constitui-se em um dos parâmetros básicos no projeto de um loteamento. O levantamento planialtimétrico de detalhe utilizados nos projetos Urbanístico, de Terraplenagem e de Drenagem deve apresentar boa adequabilidade tanto aos levantamentos topográficos regionais existentes (menor escala), bem como, às principais feições topográficas identificadas na vistoria de campo, tais como, depressões no terreno, vales e divisores, linhas de drenagem perenes e intermitentes, etc. (IPT, 1987).

A elaboração do mapa de declividades em cinco intervalos de percentagens (0 a 6%, 6 a 15%, 15 a 30%, 30 a 50% e > 50%), definidos com base na suscetibilidade dos terrenos à erosão pluvial (DAEE, 1990) e nas restrições potenciais para implantação de loteamentos (IPT, 1987) constitui-se em outra etapa fundamental da caracterização geotécnica dos loteamentos (Tabelas 1 e 2).

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Tabela 1. Declividades (%) e suscetibilidade aos processos erosivos pluviais (Fonte: DAEE, 1990).

Declividades (%) Suscetibilidade à Erosão Pluvial

0 - 3 Muito baixa

3 – 6 Baixa

6 - 12 Média

12 - 20 Alta

>20 Muito Alta

Tabela 2. Declividades (%) e restrições potenciais para loteamentos (Fonte: IPT, 1987).

Declividades (%) Restrição potencial para implantação de loteamento

0 - 15 Baixa: distribuição dos lotes, implantação do sistema viário e serviços de terraplenagem facilitados. Terrenos com declividades inferiores a 6% tendem apresentar baixa suscetibilidade a processos erosivos pluviais.

15 -30 Média: ocorrência localizada de trechos mais complicados para implantação do sistema viário e execução dos serviços de terraplenagem.

30 - 50 Alta: projetos especiais para o sistema viário e serviços de terraplenagem. Restrições legais (Lei Lehmann – 6766, 1979).

> 50 Muito Alta: áreas com alta suscetibilidade a deslizamentos e processos de instabilização de encostas. Restrições legais (Lei Lehmann e Código Florestal para declividades acima de 100%).

Os aspectos do projeto urbanístico de maior interesse para a avaliação geológico-geotécnica dizem respeito à disposição dos lotes e do sistema viário em relação às curvas de nível (topografia). Os aspectos geotécnicos mais importantes do Projeto de Terraplenagem referem-se às amplitudes e às dimensões dos cortes e dos aterros a serem implantados na área, profundidades do topo rochoso e do nível d’água (escavabilidade e estabilidade das escavações e aterros) e as características de resistência e de erodibilidade dos solos. No projeto de drenagem, o principal aspecto geotécnico a ser destacado refere-se à implantação de estruturas de dissipação de energia nos pontos de lançamento do sistema de galerias pluviais no terreno natural, com o intuito de se evitar a indução de processos erosivos remontantes e até mesmo, movimentações no terreno. As vazões de projeto em geral são calculadas considerando um tempo de retorno de 10 anos, que é usual em projetos de drenagem urbana (SEHAB, 2011).

Todas estas atividades técnicas demandam a espacialização dos condicionantes geotécnicos envolvidos, bem como, a utilização de modelos da variabilidade espacial destes condicionantes, analisados individualmente e combinados em diferentes processos geológico-geotécnicos (movimentos de encosta, erosão, recalques, etc.). Neste contexto, o SIG torna-se fundamental, pois agrega ferramentas de um banco de dados relacional e orientado ao objeto, desenho digital, sensoriamento remoto, métodos de interpolação determinísticos e geoestatísticos e várias outras ferramentas de análise e modelagem espacial.

Um dos principais planos de informação produzidos pelas funções de interpolação disponíveis nos programas de SIG em termos de utilização em projetos de Geotecnia é o Modelo Digital do Terreno (MDT), também conhecido como Modelo Numérico do Terreno (MNT) ou Modelo Digital de Elevação (MDE). O MDT é uma superfície topográfica contínua interpolada segundo modelos matemáticos determinísticos ou geoestatísticos a partir de valores de cota altimétricas com coordenadas em um determinado sistema de projeção cartográfica. As funções de interpolação de MDT também podem ser utilizadas para obtenção de outras superfícies baseadas em cotas altimétricas que não representem o relevo, como por exemplo, uma superfície do lençol freático (AUGUSTO FILHO, 2012).

O MDT também permite obter perfis topográficos em diferentes direções, cálculos planimétricos (distâncias, áreas e volumes), visualização 3D e sobrevôos virtuais sobre a área estudada. Entre os métodos de interpolação determinísticos, existem duas formas usuais de representação digital básica dos MDT, o formato vetorial Triangular Irregular Network – TIN (rede triangular irregular) e o formato raster, através de uma matriz retangular de m linhas por n colunas (ESRI, 2007).

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3. MÉTODO

O método proposto está fundamentado no embasamento técnico e científico da Geologia de Engenharia e da Geotecnia, ramos de pesquisa tecnológica adequados para análise das características dos terrenos, dos processos geodinâmicos atuantes e potenciais, subsidiando projetos de obras de engenharia e de áreas urbanas. Ele também se insere na linha de pesquisa voltada ao aprimoramento dos instrumentos de gestão ambiental para a prevenção e a mitigação dos impactos ambientais negativos e riscos, decorrentes da ocupação urbana, da implantação e da operação de obras civis, ramos importantes de aplicação da Geologia de Engenharia e da Geotecnia.

O método está estruturado segundo três grandes etapas: Análise dos aspectos geológico-geotécnicos regionais; Análise dos aspectos topográficos e geotécnicos da área do loteamento e Análise dos projetos urbanístico, de terraplenagem e de drenagem do loteamento frente aos condicionantes geotécnicos identificados. Em todas estas etapas, o SIG é utilizado como ferramenta básica para espacialização, armazenamento e análise dos dados geológico-geotécnicos de interesse.

3.1. Análise dos aspectos geológico-geotécnicos regionais

Esta etapa envolve os procedimentos de localização da área do loteamento em mapas topográficos, temáticos ou analíticos de menor escala e em imagens aéreas disponíveis. As ferramentas mais utilizadas do SIG são os módulos de georreferenciamento e ortorretificação, este último, principalmente, no caso de áreas de declividade mais acentuada. Também é importante o módulo de mudança de sistema de projeção, uma vez que é comum que os mapas de interesse estejam projetados em diferentes sistemas.

Os principais mapas utilizados são: Folhas topográficas do Instituto Geográfico e Cartográfico do estado de São Paulo – IGC, na escala 1:10.000 e com curvas de nível em intervalos de 5 m; Mapas geológico, geomorfológico, pedológico e geotécnico, disponíveis em escalas, em geral, menores que 1:50.000.

A primeira atividade desta etapa refere-se ao georreferenciamento do levantamento topográfico de detalhe na folha topográfica na escala 1:10.000 do IGC. Os levantamentos topográficos de detalhe da área do loteamento são fornecidos, em geral, em arquivos de desenho digital do tipo CAD (Computer Aided Design) e em coordenadas planas e valores de cota arbitrários. Segue-se o georreferenciamento dos demais mapas de interesse no mesmo sistema de projeção adotado no processo descrito anteriormente.

As imagens aéreas da área de interesse com grande potencial de serem utilizadas são as obtidas pela internet com o programa Google Earth Pro. Este programa permite acessar um modelo tridimensional do globo terrestre, construído a partir de mosaico de imagens de satélite obtidas de fontes diversas, imagens aéreas e SIG 3D. É possível obter imagens com boas resoluções espaciais e relativamente atualizadas para grande parte do território paulista. Recomenda-se gerar imagens em duas escalas distintas, sendo uma delas compatível com a da folha topográfica 1:10.000 e outra em maior escala, cobrindo mais diretamente a área a ser loteada.

Esta etapa, apesar de envolver procedimentos de geoprocessamento relativamente simples, é bastante importante, principalmente o georreferenciamento do levantamento topográfico de detalhe em CAD na folha topográfica 1:10.000 do IGC. Após este procedimento, será possível avaliar a qualidade do levantamento topográfico de detalhe, quesito que influenciará diretamente todas as demais etapas da elaboração do laudo geológico-geotécnico.

O georreferencimento nos demais mapas temáticos e analíticos fornecem informações geológico-geotécnicas fundamentais para o desenvolvimento das análises mais detalhadas subsequentes, incluindo a vistoria de campo.

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3.2. Análise dos aspectos topográficos e geotécnicos da área do loteamento

Nesta etapa, o levantamento topográfico de detalhe da área do loteamento, georreferenciado e confrontado na etapa anterior com a base cartográfica na escala 1:10.000, é utilizado para interpolar o Modelo Digital de Terreno – MDT do local.

O MDT interpolado no formato raster, principalmente nas rotinas que incorporam a dinâmica de fluxo superficial nas superfícies geradas (modelos hidrologicamente corretos), tende a produzir melhores resultados em áreas com relevo natural. O tamanho da malha de interpolação deve ser compatível com as escalas de trabalho destes levantamentos topográficos de detalhe (curvas de nível de 1 m e escalas variando de 1:100 a 1:500). Recomenda-se a adoção do erro cartográfico admissível como critério básico para definição do tamanho desta malha de interpolação e a realização dos testes de validação do MDT, pois este servirá de base para elaboração de novos mapas e análises nas etapas subsequentes do estudo (AUGUSTO FILHO, 2011).

Os principais planos de informação (mapas digitais) produzidos a partir do MDT são os mapas hipsométrico, de declividades e de sombreamento. O mapa hipsométrico resulta do fatiamento (classificação) do MDT em intervalos regulares de cotas altimétricas. Ele permite analisar os desníveis topográficos existentes na área a ser loteada.

O mapa de declividades (clinométrico) é produzido em cinco intervalos de percentagens (0 a 6%, 6 a 15%, 15 a 30%, 30 a 50% e > 50%), definidos com base na suscetibilidade dos terrenos à erosão pluvial e nas restrições potenciais para implantação de loteamentos (Tabelas 1 e 2).

O mapa de sombreamento permite a produção do efeito tridimensional na visualização dos mapas gerados e da imagem georreferenciada na área do loteamento. Este efeito tridimensional pode ser útil na identificação e na visualização de feições morfométricas de interesse. Recomenda-se gerar o sombreamento sem exagero vertical e utilizando o azimute de 315º e altitude de 45º.

As ferramentas de cálculo de área disponíveis no SIG permitem a quantificação da distribuição das cotas altimétricas e valores de declividade na área de intervenção direta dos loteamentos, considerando suas quadras e sistemas viários.

Nesta etapa, a vistoria de campo é outra atividade fundamental. Estes levantamentos de campo devem ser direcionados para checagem do levantamento topográfico de detalhe (depressões no terreno, vales e divisores, linhas de drenagem, etc.) e para o detalhamento dos dados geológico-geotécnicos de interesse (tipos de rochas e solos, perfil de alteração típico, condições do nível d’água, presença de feições erosivas e de movimentação do terreno, etc.).

Os pontos de controle de campo também devem ser georreferenciados com auxílio de GPS (Global Positioning Satellite) portátil para possibilitar sua localização nos mapas hipsométrico e de declividade e na imagem aérea da área do loteamento. O armazenamento em planilhas eletrônicas das informações coletadas no campo, com as coordenadas correspondentes, possibilita sua fácil integração à base de dados em SIG.

3.3. Análise dos projetos urbanístico, de terraplenagem e de drenagem do loteamento

Nesta etapa, os projetos urbanístico, de terraplenagem e de drenagem do loteamento são analisados com relação aos condicionantes geológico-geotécnicos coletados nas etapas anteriores (disposição dos lotes e do sistema viário, amplitudes e dimensões dos cortes e dos aterros, profundidades do topo rochoso e do nível d’água, escavabilidade, estabilidade das escavações e aterros, características de resistência e de erodibilidade dos solos, implantação de estruturas de dissipação de energia nos pontos de lançamento do sistema de galerias pluviais, etc.).

Também são selecionadas seções de corte e aterro mais críticas para análise de estabilidade do projeto de terraplenagem, com cálculo de Fatores de Segurança (FS) para diferentes condições de contorno. A análise de estabilidade é feita utilizando programas computacionais específicos que trabalham com diferentes métodos de análise de estabilidade do tipo equilíbrio-limite.

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A elaboração do mapa de aterros e cortes é uma das principais ferramentas do SIG para apoiar a análise do projeto de terraplenagem. Este mapa é obtido pela diferença entre os MDT com as situações topográficas atual e com a terraplenagem proposta para o loteamento. Os valores negativos e positivos indicam, respectivamente, alturas dos aterros e dos cortes (terrenos com cotas mais e menos elevadas na topografia com terraplenagem).

Ainda para apoiar a análise dos projetos do loteamento, recomenda-se elaborar um novo mapa de declividades considerando o MDT com a situação topográfica após a terraplenagem. A elaboração automática de perfis topográficos e de declividade na área das quadras e ao longo dos eixos das vias projetadas para o loteamento é outra ferramenta de análise espacial do SIG muito utilizada nesta etapa.

O produto a ser obtido nesta etapa é o objetivo principal do laudo geológico-geotécnico e envolve a proposição de recomendações gerais e específicas, incluindo eventuais revisões dos projetos urbanístico, de terraplenagem e de drenagem do loteamento.

4. ANÁLISE DE RESULTADOS

A seguir são apresentados alguns resultados obtidos em laudos geológico-geotécnicos de projetos de loteamentos em dois municípios paulistas que foram elaborados segundo as etapas principais do método apresentado no item anterior.

A Figura 1 ilustra o georreferenciamento do levantamento topográfico de detalhe de loteamento no município de Alumínio nas folhas topográficas na escala 1:10.000 e na imagem Google Earth regional (etapa de análise dos aspectos geológico-geotécnicos regionais). Com estes procedimentos, informações regionais importantes, como adequabilidade do levantamento topográfico de detalhe, localização do loteamento em bacias hidrográficas e características de uso e cobertura do entorno puderam ser coletadas (AUGUSTO FILHO, 2014).

Figura 1. Loteamento nas folhas topográficas 1:10.000 e na imagem Google Earth (AUGUSTO FILHO, 2014).

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As Tabelas 3 e 4 apresentam a distribuição em área das cotas altimétricas e dos valores de declividade nas quadras e no sistema viário deste loteamento. Estes quantitativos foram fundamentais para análise das eventuais restrições geotécnicas deste empreendimento (etapa de análise dos aspectos topográficos e geotécnicos da área do loteamento). Os mapas hipsométrico, de declividade e de sombreamento (Figura 2) foram obtidos do MDT no formato matricial (raster). Este MDT foi interpolado a partir do levantamento topográfico de detalhe (curvas de nível de 1 m em arquivo CAD) com uma malha com células de 0,5 m de lado e utilizando o comando topo to raster do programa de SIG Arcgis versão 10.2.

A área de intervenção do futuro loteamento (sistema viário e das quadras) ocupa cotas entre 739 a 841 m, porém com maior percentagem de área entre as cotas 775 a 825 m (acima de 70% da área total, Tabela 3). As análises com SIG também mostraram que no loteamento em questão predominam terrenos com declividades entre 15 e 30% (59,7% e 70,4% da área total das quadras e vias, respectivamente), além de setores significativos acima de 30% (38,3% e 26,8% da área total das quadras e vias, respectivamente. Ver Tabela 4 e Figura 2).

Na vistoria de campo foram cadastrados 14 pontos de controle. O armazenamento das informações em planilha eletrônica, com as coordenadas coletadas em campo com GPS manual, permitiu sua incorporação à base de dados digital em SIG. Este procedimento aperfeiçoou a utilização dos dados coletados na vistoria de campo que foram utilizados para a checagem do levantamento topográfico de detalhe, a caracterização dos aspectos geológico-geotécnicos de interesse para o projeto e para a implantação do loteamento (Figura 3).

Os cortes observados na vistoria de campo indicaram que as obras de terraplenagem e de implantação da infraestrutura (sistema de drenagem pluvial, adução, esgoto, etc.) deverão escavar até profundidades de 3 a 4 m, principalmente materiais brandos, relativamente coesivos e facilmente escaváveis por meios mecânicos (1ª categoria). Escavações mais profundas já deverão atravessar predominantemente de materiais de 2

a e até de 3

a categoria (rocha pouco

alterada). Com exceção das porções mais baixas da rua 4 e da quadra E, as obras de terraplenagem também deverão ocorrer em condições não saturadas (acima do lençol freático).

Na etapa de análise dos projetos urbanístico, de terraplenagem e de drenagem do loteamento as ferramentas de elaboração automática de perfis topográficos e de declividade no terreno ou ao longo dos eixos das vias facilitaram a avaliação da disposição dos lotes e do sistema viário em relação às curvas de nível (Figura 4).

O predomínio de terrenos com declividades entre 15 e 30% maximiza a influência os fatores

topográficos nos projetos urbanístico, de terraplenagem e de drenagem do loteamento estudado, demandando cuidados especiais na elaboração e implantação dos mesmos.

Tabela 3 – Distribuição das cotas altimétricas no loteamento (Fonte: AUGUSTO FILHO, 2014).

Cotas (m) Áreas (% do Total)

Quadras Sistema Viário

739 a 750 0,3 0,9 750 a 775 8,4 12,9 775 a 800 41,9 47,5 800 a 825 34,5 28,1 825 a 841 14,8 10,7

Tabela 4 – Distribuição das declividades (%) no loteamento (FONTE: AUGUSTO FILHO, 2014).

Declividade (%) Áreas (% do Total)

Quadras Sistema Viário

0 - 6 2,0 3,2 6 - 15 10,2 14,3 15 -30 49,5 56,1 30 - 50 35,5 25,6

> 50 2,8 0,8

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Figura 2. Mapas hipsométrico e de declividades (%) do loteamento. (AUGUSTO FILHO, 2014).

Foto do ponto 8. Afloramento de núcleo de rocha alterada. Veio quarto-feldspático (granitização) no solo residual jovem do filito. Plataforma de acesso de terra na área do loteamento. Cota 805 m e declividade 30 a 50%.

Figura 3. Imagem Google Earth de detalhe do loteamento e pontos de campo (AUGUSTO FILHO, 2014).

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O mapa de aterro e de corte é muito útil para avaliação do projeto de terraplenagem, identificando as áreas mais críticas quanto às geometrias dos cortes e aterros. A Figura 5 ilustra o resultado obtido para um loteamento localizado em Brigadeiro Tobias, Sorocaba (SP). Os valores negativos (tons de azul) e positivos (amarelo a vermelho) indicam, respectivamente, alturas dos aterros e dos cortes.

No caso estudado, a concepção geral do projeto de terraplenagem prevê uma suavização geral da topografia da área das quadras e do sistema viário do loteamento, com a implantação de um corte de grande extensão, altura e inclinação acentuadas nos limites sudoeste e sudeste do loteamento, formando um patamar suavizado e com caimento médio para norte. Os serviços de terraplenagem envolverão movimentações significativas de terra, com aterros e cortes com alturas de até 5 m e 17,5 m, respectivamente e em grandes extensões (Figura 5).

A análise de estabilidade utilizando o programa Geostudio 2004 foi realizada em uma seção topográfica do talude de corte mais acentuado proposto no projeto de terraplenagem. Este talude apresenta amplitude total em torno de 20 m e inclinação média de 38

o ou 78%. Foram

consideradas duas condições de perfil de alteração e de nível d'água (N.A.): solos de alteração do granito relativamente espessos (mais de 5 m) e rasos (menos de 5m até topo rochoso irregular); níveis d'água posicionados abaixo e acima da base do talude. Após as análises de estabilidade foram sugeridas adequações geométricas para este talude (Figura 6).

Figura 4. Perfil topográfico do eixo da Rua 10 do loteamento (AUGUSTO FILHO, 2014).

Figura 5. Mapa de aterro e corte do loteamento (AUGUSTO FILHO, 2015).

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Figura 6. Análise de estabilidade do talude de corte crítico do loteamento. (AUGUSTO FILHO, 2015).

5. CONCLUSÕES O método proposto tem se mostrado eficiente para apoiar a elaboração de laudos geológico-geotécnicos de projetos de loteamentos em todas as etapas envolvidas neste tipo de estudo e atendendo suas diferentes demandas técnicas e escopos. O SIG é uma ferramenta computacional muito útil para realização destes estudos técnicos e com grande potencial para novas aplicações, além das apresentadas neste artigo.

REFERÊNCIAS

AUGUSTO FILHO, O. (2011) Análise de métodos de interpolação de modelo digital de terreno e aplicação em SIG de gestão de riscos geotécnicos e ambientais em oleodutos In: CONGRESSO BRASILEIRO DE GEOLOGIA DE ENGENHARIA E AMBIENTAL, 13, São Paulo. Anais. São Paulo: ABGE, 2011. v.1. p.1 - 9.

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AUGUSTO FILHO, O. (2014) Laudo geológico-geotécnico do loteamento Jardim Residencial Trianon (Alumínio, SP). 40p.

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