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15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental 1 15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental RECUPERAÇÃO DO TALUDE DA CAVA - MINA DE ÁGUAS CLARAS Felipe Gobbi 1 ; Daniel Tobler 2 ; Anderson Fonini 3 ; Gilvan Sá 4 ; Maria Teresa Soares 5 Resumo Em 1992 uma ruptura de talude de grandes proporções ocorreu na Mina de Águas Claras - MAC, na época explorada pela Mineração Brasileiras Reunidas MBR. Após esta ruptura foram realizados estudos para a verificação da estabilidade global do talude remanescente, os quais indicaram nível de segurança adequado para o mesmo. Entretanto eventos erosivos acabaram por promover instabilidades superficiais, colocando em risco a crista do talude, que compõe a paisagem da Serra do Curral, patrimônio histórico. Devido a este fato um projeto de recuperação do talude do Talude da Cava foi desenvolvido em 2008 que contemplava a utilização de solo/rocha grampeada com faceamento de malha metálica de alta resistência além de um sistema de drenagem. No ano de 2013 foi contratada a obra de recuperação, atualmente a obra encontra-se em andamento sendo que cerca de quarenta por centro da obra já está concluída, a revisão do projeto executivo é realizada simultaneamente ao avanço da obra. Nesta parte inicial foi identificada forte condicionante estrutural do Itabirito presente na encosta no mecanismo de ruptura identificado. Os grampos foram dimensionados com base nestas condições estruturais e nos parâmetros de junta obtidos através de ensaios de campo e laboratório. Até o momento o sistema empregado tem se mostrado eficiente para a recuperação do talude no que tange a deslizamentos superficiais. Abstract In 1992 a massive landslide had occurred at Águas Claras Mine, at that time it was operated by Mineração Brasileiras Reunidas, MBR. After this event slope stability studies were carried out in order to evaluate the remaining slope, which were considered acceptable. However erosion process leaded to shallow landslides -hence the crest of the mountain become a risk area, which is part of the national heritage Serra do Curral landscape. As consequence, in 2008 a recuperation solution consisting in a soil/rock nailing faced with high strength steel wire mesh and a drainage system, were designed. In 2013 the slope recuperation work was initiated. Nowadays the work is ongoing, with forty percent of the stabilization area concluded. A review of the executive design has been carried out simultaneously with the field work. In the first stage of the design, structural geologic aspects of the remaining rock mass were identified as constraint aspects on the failure mechanism. The nails were designed based on the structural conditions and joint shear stress parameters, defined by in situ and laboratory tests. So far the designed solution is performing accordingly, in order to avoid superficial slope instabilities. Palavras-Chave Recuperação de encosta; obras de contenção; taludes de mineração. 1 Eng., D.Sc., Geobrugg AG/FGS Geotecnia, (51) 9238-8894, [email protected] 2 Geól., M.Sc., Daniel Tobler, Geotest, Suiça, +41 (0)31 910 01 34, [email protected] 3 Eng. D.SC. Anderson Fonini, FGS Geotecnia, Porto Alegre, (51) 3508-5493, [email protected] 4 Geól., M.Sc. Gilvan Sá, VALE, Belo Horizonte, MG, (31) 9529-0278, [email protected] 5 Maria Teresa Soares, Geobrugg AG, (21) 3624-1449, [email protected]

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15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental

RECUPERAÇÃO DO TALUDE DA CAVA - MINA DE ÁGUAS CLARAS

Felipe Gobbi 1; Daniel Tobler 2; Anderson Fonini 3; Gilvan Sá 4; Maria Teresa Soares 5

Resumo – Em 1992 uma ruptura de talude de grandes proporções ocorreu na Mina de Águas Claras - MAC, na época explorada pela Mineração Brasileiras Reunidas – MBR. Após esta ruptura foram realizados estudos para a verificação da estabilidade global do talude remanescente, os quais indicaram nível de segurança adequado para o mesmo. Entretanto eventos erosivos acabaram por promover instabilidades superficiais, colocando em risco a crista do talude, que compõe a paisagem da Serra do Curral, patrimônio histórico. Devido a este fato um projeto de recuperação do talude do Talude da Cava foi desenvolvido em 2008 que contemplava a utilização de solo/rocha grampeada com faceamento de malha metálica de alta resistência além de um sistema de drenagem. No ano de 2013 foi contratada a obra de recuperação, atualmente a obra encontra-se em andamento sendo que cerca de quarenta por centro da obra já está concluída, a revisão do projeto executivo é realizada simultaneamente ao avanço da obra. Nesta parte inicial foi identificada forte condicionante estrutural do Itabirito presente na encosta no mecanismo de ruptura identificado. Os grampos foram dimensionados com base nestas condições estruturais e nos parâmetros de junta obtidos através de ensaios de campo e laboratório. Até o momento o sistema empregado tem se mostrado eficiente para a recuperação do talude no que tange a deslizamentos superficiais.

Abstract – In 1992 a massive landslide had occurred at Águas Claras Mine, at that time it was operated by Mineração Brasileiras Reunidas, MBR. After this event slope stability studies were carried out in order to evaluate the remaining slope, which were considered acceptable. However erosion process leaded to shallow landslides -hence the crest of the mountain become a risk area, which is part of the national heritage Serra do Curral landscape. As consequence, in 2008 a recuperation solution consisting in a soil/rock nailing faced with high strength steel wire mesh and a drainage system, were designed. In 2013 the slope recuperation work was initiated. Nowadays the work is ongoing, with forty percent of the stabilization area concluded. A review of the executive design has been carried out simultaneously with the field work. In the first stage of the design, structural geologic aspects of the remaining rock mass were identified as constraint aspects on the failure mechanism. The nails were designed based on the structural conditions and joint shear stress parameters, defined by in situ and laboratory tests. So far the designed solution is performing accordingly, in order to avoid superficial slope instabilities.

Palavras-Chave – Recuperação de encosta; obras de contenção; taludes de mineração.

1 Eng., D.Sc., Geobrugg AG/FGS Geotecnia, (51) 9238-8894, [email protected] 2 Geól., M.Sc., Daniel Tobler, Geotest, Suiça, +41 (0)31 910 01 34, [email protected]

3 Eng. D.SC. Anderson Fonini, FGS Geotecnia, Porto Alegre, (51) 3508-5493, [email protected]

4 Geól., M.Sc. Gilvan Sá, VALE, Belo Horizonte, MG, (31) 9529-0278, [email protected]

5 Maria Teresa Soares, Geobrugg AG, (21) 3624-1449, [email protected]

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1. INTRODUÇÃO

A mina de Águas Claras teve sua exploração de minério de ferro iniciada em 1973, sendo que no ano de 1992 uma ruptura de talude de grandes proporções ocorreu próximo ao Morro do Patrimônio. Estimativas da época indicaram que a ruptura movimentou, aproximadamente, 500.000 m³, de minério de ferro. Felizmente devido ao horário de ocorrência da ruptura nenhuma vítima foi atingida pela mesma, sendo apenas registrados danos a equipamentos, além da interferência no funcionamento da mina.

Estudos realizados à época indicaram que a condição de estabilidade do talude após a ruptura não era crítica, em termos globais (Figueiredo Ferraz, 1992 Franca P., 1997 Costa T., 2008 entretanto processos erosivos e instabilidades superficiais (i.e. aprox.. 2m) ocasionaram a evolução dos processos de instabilidade e começaram a comprometer a geometria do pico da Serra do Curral, que é tombado como patrimônio histórico e cultural.

Em função disto, em 2003 a VALE iniciou a concepção de soluções para estabilização do talude, através do desenvolvimento de estudos de concepção de solução que possibilitassem galgar todos os desafios da encosta, do ponto de vista de desempenho, viabilidade executiva, restrições ambientais, entre outros. Estes estudos se alongaram até 2008 quando a primeira versão do projeto executivo de estabilização do talude foi finalizada. Em 2013 foi realizada a contratação da obra, que iniciou em 2014 e encontra-se em fase de execução. Este artigo apresenta o histórico desta ruptura, o diagnóstico atual das condições de estabilidade do talude, o conceito parcial da solução de estabilização empregada além da situação atual do projeto.

2. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA ESTUDADA

2.1. Localização

O talude do patrimônio encontra-se dentro dos limites da antiga Mina de Águas Claras, cujas operações cessaram em 2002. Atualmente é ocupada por diversos prédios que abrigam parte da equipe técnica e administrativa da VALE. A área situa-se na cidade de Nova Lima, MG, e está inserida em uma região de pujante expansão imobiliária.

Figura 1. Localização da área de estudo.

2.2. Caracterização geológica

A última atualização geológica da superfície da cava foi realizada em 2014. De acordo com esse mapeamento, o talude da cava é composto unicamente por itabirito friável e médio. Entretanto,

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cabe ressaltar que para esse mapeamento não foram permitidos acessos ao talude, visto as suas condições de segurança. Após inúmeras inspeções na área, é possível afirmar que além do material descrito há itabirito compacto, lentes de hematita compacta e canga. A Figura 3 apresenta um mapa geológico e estrutural com analises cinemáticas por setor da mina (BVP, 2014).

Figura 3. Mapa geológico da Mina de Águas Claras – MAC (BVP, 2014)

2.3. Caracterização geotécnica

Como resultado da geologia local, dos processos de exploração empregados na área, e do evento de ruptura de 1992 o talude da cava pode ser separado em três fases distintas:

Fase 1: consiste na região de crista do talude, estende-se aproximadamente da cota 1340 até a cota 1240 e é caracterizada pela exposição de material laterizado no topo (canga) e itabirito sotoposto a esta camada. O itabirito intercala camadas de rocha friável a dura, seguindo a foliação dominante do maciço.

Fase 2: é a região logo abaixo da área 1 onde predomina a deposição de material proveniente da ruptura. Nesta área ocorrem blocos de dimensões métricas ora imersos em material friável ora totalmente expostos devido à ação de processos erosivos progressivos

Fase 3: é composta basicamente por material friável, entretanto consiste em sua maioria material

in situ, em porções isoladas ocorre fina deposição de material, como na área 2.

A Figura 4 apresenta uma planta baixa com uma seção onde estão separadas as fases descritas anteriormente.

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Figura 4. Seção transversal típica e Planta baixa do talude do pico do patrimônio.

3. HISTÓRICO DA RUPTURA

A operação da mina de Águas Claras teve início em 1973, sendo a Mineração Reunidas do Brasil detentora dos direitos minerários, onde as formações ferríferas ocorriam em elevados teores nas Hematitas e nos Itabiritos.

No amanhecer de 29 de Abril 1992 ocorreu um movimento de massa no talude localizado na porção Oeste da cava. Este movimento de massa foi caracterizado como uma ruptura de grandes proporções envolvendo aproximadamente dois milhões de toneladas de material que se deslocaram a uma distância de até 500m da face do talude. A ruptura ocorreu no contato entre os materiais geológicos presentes no talude, especificamente entre as camadas de itabirito silicoso e o itabirito médio, conforme pode ser verificado na Figura 5.

Figura 5. Planta baixa e seção pré-ruptura do talude do morro do Patrimônio (fonte: MBR, 1992)

Embora a ruptura ocorrida fosse considerada de grandes dimensões, estudos posteriores concluíram que a porção remanescente da encosta encontrava-se estável, pelo menos no que tange a estabilidade global.

Entretanto, com o passar dos anos, erosões progressivas ocorreram ao longo a área afetada pela ruptura de 1992 e provocam ravinas e voçorocas, as quais atingem parcialmente a cumeeira da Serra, protegida na atualidade pelo patrimônio cultural do estado de Minas Gerais.

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4. DIAGNÓSTICO DO PROCESSO ATUAL DE RECUPERAÇÃO

Em 2008, pela primeira vez desde a ruptura de 1992, foi realizada a inspeção detalhada do talude, onde foram mapeados os diferentes tipos de problemas de estabilidade e definiu-se o conceito da solução. O conceito pode ser descrito sucintamente como a aplicação do sistema de telas de aço de alta resistência através da aplicação de chumbadores/grampos e de um sistema de drenagem. A Figura 6 apresenta a planta baixa do projeto de recuperação do talude da cava

Figura 6. Planta baixa do projeto de de recuperação do talude da cava de 2008 (Geobrugg/Geotest 2008).

Este conceito busca doutrinar o principal agente erosivo (drenagem superficial) e conter o material potencialmente suscetível a erosão e quedas de blocos. Em virtude das difíceis condições de acesso, que impõe severas restrições tanto operacionais quanto de segurança, durante a fase do projeto não foi possível à realização de investigações geotécnicas na face do talude. A estimativa dos parâmetros de adesão da calda de cimento com o substrato (Qs) foi realizada com base em ensaios de arrancamento realizados no entorno da encosta, em locais indicados pela equipe de geologia da VALE onde os materiais se assemelham aos materiais do talude.

Em 2014 quando a obra foi iniciada houve a necessidade de revisão do projeto de 2008, pois o talude já havia sofrido vários processos de erosão no período 2008 a 2014. Após as primeiras inspeções foi verificado que o ingresso a toda a altura do talude era inviável devido às precárias condições de segurança, visto que o trabalho é realizado com técnicas de acesso por corda, e o talude é muito alto (~240m) ao se inspecionar as porções mais baixas a equipe ficaria exposta a queda de blocos oriundos da porção superior. Então a maneira viável de proceder a revisão de projeto foi a de alinhar a revisão de projeto ao andamento da obra. Desta forma o projeto foi revisado em pequenas áreas a medida que a obra avança. Por estas razões, neste trabalho, será apresentado o diagnóstico e projeto da Fase 1, a qual encontra-se em finalização.

4.1. Fase 1

A Fase 1 é caracterizada como a crista da ruptura, onde o talude apresenta-se mais íngreme e a quantidade de material depositado das rupturas anteriores é mínima. Nessa região prevalece a característica do terreno exposto pós-ruptura. Na área da Fase 1 é observado a intercalação de itabirito friável com itabiritos médios a compactos formando camadas de materiais com diferentes graus de resistência, em alguns locais sobreposta a estes, e em porções da crista ocorre uma camada oxidada que foi genericamente denominada de canga, embora também possa possuir

porções de Itabirito compacto de acordo com a textura apresentada por Zaparolli 2007 apud Costa, 2009.

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Figura 7. Escala de compacidade do Itabirito, conforme Zaparolli, 2007 apud Costa, 2009.

Do ponto de vista geotécnico para análise deste projeto foram realizadas três distinções de materiais na Fase 1: Canga, Itabirito duro a médio e Itabirito friável, que visam distinguir o comportamento dos materiais encontrados na encosta.

A porção superior, composta pelo material denominado canga/itabirito (zona de contato), é a que possui as maiores inclinações, conforme pode ser verificado na Figura 9, mapa de declividades. As feições verificadas neste material em campo apontam para uma grande heterogeneidade, entretanto sem anisotropia clara, ora surgem foliações com direções erráticas ora verifica-se presença de blocos imersos em uma matriz extremamente friável ora verificam-se orifícios dentro deste material. Desta forma, do ponto de vista de dimensionamento pode-se afirmar este material possui um comportamento mais coesivo do que friccional devido a grande oxidação entre as partículas, o que justifica a manutenção de elevados ângulos de inclinação nos taludes remanescentes, até 52º em geral, mas chegando a alguns trechos negativos em posições isoladas na crista. A figura 8 apresenta uma imagem onde é possível verificar um exemplo de inclinações negativas, enquanto a Figura 10 apresenta um mapa de declividade de toda a área de projeto.

Figura 8. Talude negativo no topo da encosta.

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Figura 9. Mapa de declividades da encosta.

Onde ocorre esta porção do talude verifica-se uma melhor proteção contra os processos de desplacamentos dada a maior dificuldade de degradação do material pela ação intempérica. Ressalta-se que os mecanismos de ruptura verificados neste material normalmente estão associados ao desplacamento de blocos de itabiritos com maior grau de resistência que serão explicados a seguir.

Na porção logo abaixo da crista, o Itabirito aflora até o final da Fase 1. Camadas com diferentes graus de resistência são verificadas com espessuras variando de centimétricas a métricas. O processo de ruptura consiste em ruptura planar, fortemente condicionadas pela condição estrutural do maciço. Estas rupturas tendem a ser superficiais, e não consistem em condicionante para estabilidade global do maciço. Desta forma, apesar da grande espessura destes desplacamentos superficiais (2m, em alguns casos até 4m), dada a escala do problema pode-se considerar que frente à estabilidade global do maciço, estes eventos podem ser considerados processos erosivos retrogressivos que acabam culminando no evento descrito. A Figura 10 apresenta diferentes camadas de material friável e compacto, identificadas em campo.

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Figura 10. Identificação de alternância de camadas de Itabirito duro e friável em campo.

Referente ao condicionamento estrutural do maciço, basicamente podemos destacar três feições principais: duas famílias de fraturas subverticais e a foliação do Itabirito.

Família 1: A primeira família subvertical, que pode ser caracterizada pela direção e mergulho 229/88 (plano 1 do estereograma) é a família que condiciona em parte a direção dos deslizamentos, a persistência da mesma direciona os deslizamentos para a direção 138º, que

consiste no strike desde mesmo plano. Este direcionamento possui importante participação na estabilidade do talude atual, conforme será verificado adiante.

Família 2: A segunda família subvertical é aproximadamente perpendicular a direção do deslizamento, possui direção mais errática que a primeira, mas em vários pontos condiciona a segmentação dos blocos, pois cria trincas de tração e favorecem a ocorrência dos desplacamentos.

Família 3: Finalmente a foliação consiste no plano de deslizamento em si, planos 3 e 6 (verdes) do estereograma. As famílias de fraturas estão apresentadas da Figura 11.

Figura 11. Análise estereográfica da Fase 1.

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O aspecto importante do mecanismo de desplacamento verificado consiste no fato de que a direção do deslizamento é esconsa à foliação devido ao condicionante imposto pela família subvertical supracitada, este fato faz com que o ângulo do deslizamento seja ligeiramente inferior ao ângulo da foliação, cerca de 3º a 5º. Além disso, este desalinhamento gera uma rugosidade no plano de deslizamento, que acreditamos não houvesse caso existisse liberdade para o deslizamento ocorrer na direção da foliação. Estes dois fatores combinados geram um importante incremento de atrito nesta superfície de deslizamento dado basicamente à dilatância e tem papel fundamental na compreensão do mecanismo de falha, além de evidenciar a condição limite dos desplacamentos destes escorregamentos superficiais neste talude.

O valor encontrado em ensaios em campo tipo tilt test é na ordem de grandeza de 34 graus e o mergulho médio da foliação encontrado para esta área é de 35 graus o que indica indicaria condição acima da resistência por atrito da descontinuidade.

Entretanto, para esta área especificamente analisado, devido à diferença nas direções da foliação e do deslizamento, o ângulo resultante da instabilidade é de 33º, o que por si só justificaria a condição de equilíbrio encontrada. Embora em equilíbrio, este fato denota grande atenção, pois indicaria um FS~1,05 para esta porção do talude.

O mecanismo mencionado consiste no mecanismo de quase a totalidade da Fase 1, exceto em alguns pontos de crista, onde a presença marcante do material denominado Canga, gera a ocorrência de deslizamentos mais abrangentes, entretanto estes são deflagrados pela alteração de geometria do pé em virtude dos deslizamentos planares mencionados anteriormente.

Nos pontos de crista, onde esta situação foi verificada, os mecanismos de ruptura circular também foram verificados.

5. CONCEPÇÃO DA SOLUÇÃO DE ESTABILIZAÇÃO DA FASE 1

Conforme mencionado anteriormente o conceito da solução do talude da cava consiste em uma solução de solo/rocha grampeada com faceamento em malha metálica de alta resistência.

Foi dimensionado e executado o grampeamento destas camadas de Itabirito e executado um revestimento em malha metálica de alta resistência. Os grampos adotados foram grampos de aço de 32mm de diâmetro e duas malhas foram empregadas (nunca sobrepostas), ambas com aço de 1770MPa de tensão de escoamento, uma com resistência de 150kN/m e outra com resistência de 220kN/m.

Como o desplacamento se dá em planos, os parâmetros geotécnicos fundamentais consistem

nos parâmetros das descontinuidades, por isto foram realizados ensaios tilt test para determinação do atrito entre os planos e também ensaios de cisalhamento direto em laboratório para determinação da resistência ao cisalhamento do Itabirito friável em diferentes compacidades relativas, cujos resultados estão apresentados na Tabela 1.

Tabela 1: ângulos de atrito obtidos.

Ensaio Ângulo de atrito - φ (º)

Tilt test 34

Cisalhamento direto – itabirito friável - emax 39

Cisalhamento direto – itabirito friável - emed 38

Cisalhamento direto – itabirito friável - emin 37

De posse destes parâmetros, foram realizados dimensionamentos distintos para áreas semelhantes, sendo que este processo resultou na divisão da Fase 1 em 32 áreas, para as quais foram determinados os espaçamentos e comprimentos de grampos.

Extensivas investigações da adesão grampo x maciço foram realizadas, sendo que para a Fase 1 realizou-se 80 ensaios de arrancamento, o que possibilitou a análise dos valores de Qs

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com particular precisão e consequente redução do fator de segurança considerado no comprimento ancorado dos grampos. O resultado deste procedimento é estimado em uma economia de cerca de 30% em perfuração e injeção, ao longo desta fase, em relação as premissas iniciais - fator de segurança de 1,75 e valores mais baixos de Qs obtidos nas fases preliminares da obra.

Figura 12. Resumo dos tratamentos adotados na adaptação de projeto, polígonos amarelos indicam áreas

de tratamento com a malha TECCO (150kN/m) e os polígonos laranja indicam o uso da malha SPIDER (220kN/m). A figura da esquerda traz o comprimento dos grampos e a figura da direita o espaçamento

adotado entre eles.

6. COMENTÁRIOS FINAIS

Em 1992 uma significativa ruptura ocorreu no talude norte da cava, o qual estava em plena operação. Estudos aprofundados foram realizados naquela época e identificaram que o talude não representava riscos de instabilidade, dando continuidade as operações. A recuperação do talude da cava é parte das obras que estão contempladas no plano de uso futuro da MAC.

Processos de deslocamento contínuos e erosões em materiais friáveis durante os anos requerem uma difícil e desafiadora solução. A VALE investiu inúmeros recursos humanos e financeiros a fim de determinar uma solução segura e duradoura para o talude em questão, e vem empregando o mesmo esforço para os demais taludes da área da MAC, a fim de promover o uso futuro desta antiga área de mineração.

A solução concebida alia as viabilidades: técnica/operacional, de segurança, de desempenho e de custos para o talude em questão. As dificuldades de acesso, e as precárias condições geológica/geotécnicas do talude fazem deste projeto um projeto peculiar, onde a revisão e adequação dos dimensionamentos devem andar juntos com o avanço da obra, garantindo a melhor relação entre segurança e recursos investidos a todo o processo.

A Fase 1 consiste em um mecanismo bastante condicionado pela estrutura do maciço, entretanto em alguns pontos, dada a ocorrência de camadas contínuas de Itabirito friável, os parâmetros de resistência adotados não são do maciço rochoso e sim da rocha friável entre as camadas de Itabirito compacto.

O número de ensaios de arrancamento realizados permitiu uma otimização bastante precisa dos comprimentos de ancoragens dos grampos de projeto.

Até o momento o sistema tem apresentado desempenho de acordo com o projetado, e a obra avança com velocidade ao longo da Fase 2.

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Figura 13. Imagens da aplicação do sistema de telas de aço de alta resistência.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem a VALE pela colaboração técnica e permissão de publicação dos dados de sua propriedade. A Geobrugg, Geotest e FGS Geotecnia, empresas consorciadas e responsáveis pelo projeto executivo, pela publicação de seus pareceres e dimensionamentos.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BVP, 2014. Readequação da região sul da cava – MAC. Mapa Geológico, Projeto Básico

FGS Engenharia Geotécnica e Ambiental (2014) Projeto executivo de estabilização do morro do patrimônio. Relatório técnico não publicado preparado para VALE.

Figueiredo Ferraz Consultoria e Engenharia de Projeto Ltda (1992) The Patrimônio Rockslide: A Geotechnical Analysis – Unpublished Report Prepared to MBR;

FRANCA P. R. B. (1997) Analysis of Slope Stability Using Limit Equilibrium and Numerical Methods With Case Examples From The Águas Claras Mines, Brazil. Queen’s University, Kingston, Ontário - Canadá. 204p.

GEOBRUGG/GEOTEST (2008) Projeto executivo MAC. Relatório técnico não publicado preparado para VALE.

VIEIRA DA COSTA, T.A. (2008). Resistência e Deformabilidade do Minério Hematítico Friável nas

Minas da VALE/DIFL. Borda oeste do Quadrilátero Ferrífero - MG. Dissertação de Mestrado. UFOP. Ouro Preto – MG. 120p;