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Poder Judiciário da União Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios 1ª Vara da Infância e da Juventude do Distrito Federal – 1ªVIJ/DF Seção de Medidas Socioeducativas – SEMSE

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Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios A violência policial na voz dos adolescentes em conflito com a lei

Redação

Bárbara do Socorro Moraes Macedo Analista Judiciário

Paula Frassinetti Costa da Silva Analista Judiciário

Regina Marinho de Loiola Analista Judiciário

Pesquisadores

Bárbara do Socorro Moraes Macedo Analista Judiciário

Paula Frassinetti Costa da Silva Analista Judiciário

Regina Marinho de Loiola Analista Judiciário

Elisa Matos Menezes Estagiária

Luana Alves de Souza Estagiária

Colaboradores

Denise Nascimento Silva Analista Judiciário

Professora Dra. Maria Aparecida Penso

Elen Alves dos Santos Estagiária

Professor Dr. Arthur Trindade

Gisele Carneiro Campos Técnico Judiciário

Roberta Freitas Lemos Psicóloga do CEDECA – Interlagos /São Paulo

Leila da Silva Segurado Pimentel Lotti Assessora Jurídica

Sarah da Silva Araujo Estagiária

Revisor

Pedro Ernesto Bastos Salles Técnico Judiciário

Projeto gráfico e impressão

SUGRA Subsecretaria de Serviços Gráficos

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Composição Administrativa do TJDFTDesembargador Otávio Augusto Barbosa PresidenteDesembargador Dácio Vieira Vice-PresidenteDesembargador Sérgio Bittencourt CorregedorGuilherme de Sousa Juliano Secretário-Geral

1ª Vara da Infância e da Juventude do Distrito FederalDr. Renato Rodovalho Scussel Juiz de Direito TitularSimone Costa Resende da Silva Diretora-Geral AdministrativaCristina Ferreira Vitalino Diretora de SecretariaEustáquio Ferreira Coutinho Assessor TécnicoElda do Carmo Araújo Pereira Supervisora da Seção de Medidas Socioeducativas

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Violentar é sempre fazer calar, e privar o homem de sua palavra é já privá-lo da sua vida.

Jean-Marie Muller

A abordagem tem que ser a abordagem legal, não tem que ter exagero. É aquela que não tem tapa, não tem tor-tura, o uso da força estritamente necessária. Boa parte dos policiais trabalha bem. A questão é complexa, não é simples não. Eles lidam com a criminalidade, por que eles lidam com um adolescente que acabou de apontar uma arma pra uma senhora de 60 anos, não é fácil. Aqui eu só lido com a lei. Às vezes o policial chega aqui e diz que está combatendo a criminalidade e ainda está res-pondendo processo.

Dermeval Farias Gomes Filho

Se cuidamos dos meios, o fim cuidará de si mesmo. Sem-pre temos controle sobre os meios, nunca sobre os fins.

Mahatma Gandhi

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Agradecimentos

Nossos sinceros agradecimentos aos adolescentes em conflito com a lei que par-ticiparam da pesquisa, especialmente aqueles que, corajosamente, se manifes-taram durante os grupos focais.

Agradecemos ao juiz da 1ª Vara da Infância e da Juventude do Distrito Federal, Dr. Renato Rodovalho Scussel, que autorizou a realização da pesquisa e também a ex-supervisora da Seção de Medidas Socioeducativas, Deiza Carla Medeiros Leite, pela paciência e por acreditar na relevância deste trabalho.

A todos os representantes das instituições do Sistema de Garantia de Direitos entrevistados nossa gratidão: Secretaria Judicial e Assessoria Jurídica da 1ª VIJ/ DF, Promotoria de Defesa de Justiça da Infância e da Juventude do Distrito Fede-ral, Núcleo de Controle da Atividade Policial, Promotoria de Justiça Militar, Centro de Assistência Judiciária do Distrito Federal, Instituto Médico Legal, 1ª e 2ª Dele-gacias da Criança e do Adolescente do DF, Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente do DF, Academia de Polícia Militar, Academia de Polícia Civil, Corre-gedoria da Polícia Civil e Corregedoria da Polícia Militar.

Essa pesquisa também contou com o apoio da Assessoria da Secretaria Nacional de Direitos Humanos e dos técnicos do Núcleo de Execução de Liberdade Assis-tida de Taguatinga do DF.

Aos colegas da SEMSE (“meninas e menino”) obrigada pelos insights e mo-mentos de descontração e ao Promotor de Justiça, Dr. Anderson Pereira, pelo grande incentivo.

Dedicamos este trabalho a todos aqueles que, pela sua condição de exclusão, seja qual for, carecem de espaço público para se expressarem e serem ouvidos.

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Apresentação“Eles seguraram aqui ó (aponta pra garganta), apertando, e perguntando coisa pra mim, aí segurando aqui que não tinha nem como falar... fiquei com falta de ar, chega fiquei mole e caí no chão lá... E eu ‘oxe’ como é que eu vou falar? Sendo que não tem nem como. Nós ainda fo-mos tudo pro IML eu tava com umas marcas aqui assim, até na boca, que também tava machucada, só que não aconteceu nada, fizeram perícia e tudo, mas...”

Relato de um adolescente vítima de violência policial

Desde 1997, a Seção de Medidas Socioeducativas – SEMSE – da 1ª Vara da Infância e da Juventude do Distrito Federal tem ouvido diariamente relatos como o mencionado acima sobre diversos tipos de agressões desferidas por policiais civis e militares contra adolescentes em conflito com a lei.

Em 2002 foi apresentado um relatório sintético para o Juiz Titular da 1ª VIJ/DF contendo os primeiros dados pesquisados pela Seção sobre a temática. Em 2005, a SEMSE optou por realizar uma pesquisa aprofundada a partir de dados quantita-tivos por meio da aplicação de questionário. No entanto, a pesquisa foi retomada apenas no segundo semestre de 2007, quando então dados qualitativos foram adicionados por meio da metodologia de grupos focais.

Ouvir os adolescentes foi fundamental para compreender a percepção desses jo-vens quanto à violência policial vivenciada e sobre o acolhimento nas instituições do Sistema de Garantia de Direitos, por onde transitaram.

Os adolescentes pesquisados eram em sua grande maioria do sexo masculino, com faixa etária de 15 a 17 anos, residentes na periferia do Distrito Federal e cujas famílias recebiam renda mensal inferior a dois salários mínimos. Esses jovens fo-ram vítimas de um ou mais ato(s) violento(s), sendo o tapa, o soco, e o chute os de maior incidência. Registrou-se também a ocorrência de atos brutais, tais como unha arrancada, choque e sufocamento. Chamou a atenção, ainda, o fato de que, apesar de terem sido vítimas da violência policial, 79% não a denunciaram.

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Ao realizar esta pesquisa, a SEMSE pretende contribuir para que o tema sobre a vio-lência policial no segmento juvenil ocupe espaço de discussão crítica e constante entre agentes do Sistema de Garantia de Direitos e a sociedade do Distrito Federal.

Não se pretende negar que os adolescentes em conflito com a lei possuam obri-gações a cumprir, mas a sua voz e os seus relatos precisam de maior credibilidade. Esse é um dos fatores fundamentais para que sejam considerados e possam se sentir verdadeiros sujeitos de direitos, não carregando, apenas, o estigma de autores de atos infracionais. O sentimento da equipe ao realizar este trabalho é o de estar em consonância com a Doutrina de Proteção Integral prevista pelo ECA, especialmente em seu art. 18: “É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor”.

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Sumário

Introdução 13

1 Aspectos da violência policial 132 Adolescentes em conflito com a Lei 23

Metodologia 31

Análise e discussão: o que dizem os dados 37

1 A vulnerabilidade social dos adolescentes pesquisados 372 A abordagem policial 38

2.1 O desrespeito à dignidade humana na abordagem policial 392.2 Conseqüências dos atos violentos 442.3 Motivos da abordagem policial violenta 452.4 A autoridade policial na visão dos adolescentes 482.5 A reação dos adolescentes à abordagem policial 502.6 Sentimentos, imagens e lembranças da abordagem policial violenta 502.7 Agressões policiais e mudança de comportamento dos adolescentes 522.8 Reflexões sobre o papel social da polícia e de sua abordagem 53

3 Regiões Administrativas e locais de ocorrência da violência policial 544 Sobre policiais agressores 57

4.1 Categorias policiais 574.2 Identificação nominal dos policiais 574.3 Lotação 594.4 Categorias policiais e locais de violência 604.5 Categorias policiais e Regiões Administrativas 61

5 A denúncia da violência policial 625.1 Os motivos da não realização da denúncia 635.2 Orientação sobre o direito de denúncia 665.3 Sobre as denúncias realizadas 675.4 Sobre o retorno dos relatos das denúncias 685.5 Um exemplo de percurso da denúncia sobre a violência policial 715.6 O Laudo de Lesão Corporal 76

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5.6.1 A análise dos Laudos de Lesão Corporal 77

Considerações Finais 79

Referências 89

Glossário 97

Apêndices 99

A Questionário sobre violência policial 99B Cadastro dos adolescentes em conflito com a lei 100C Roteiro do grupo focal I 103D Roteiro do grupo focal II 104

Lista de abreviaturas e siglas 105

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Introdução“Ação policial sem vaselina, sem creme. Só de ver de longe a farda de um PM a criança de colo se treme. Dia a dia na periferia...”

Rapper da Ceilândia

1. Aspectos da violência policial

A relação entre adolescentes em conflito com a lei1 e policiais agressores é bas-tante complexa e marcada pela violência. De um lado encontram-se jovens que infringem a lei ao cometerem delitos e, do outro, agentes de segurança pública que usam a força autorizada pelo Estado de forma abusiva.

Estudos sobre o tema da violência partem do pressuposto de que não existe um saber único sobre a temática, pois ela depende de condições histórico-culturais e cada sociedade utiliza-se de critérios para administrá-la.

Para Michoud a violência surge:

quando, em uma situação de interação, um ou vários atores agem de maneira direta ou indireta, maciça ou esparsa, causando danos a uma ou mais pessoas em graus variáveis, seja em sua integridade física, seja em sua integridade moral, em suas posses, ou em suas participações simbólicas e culturais. (1989, p.10 apud STEINBERG e CARDOSO, 2005, p. 92).

A violência se insere no espaço existente entre os desenvolvimentos potencial e real, estando “presente quando os seres humanos se vêem influenciados de tal forma que as suas realizações efetivas, somáticas e mentais encontram-se aquém de suas realizações potenciais”(GALTUNG, 1986, p.30 apud MILANI, 2003, p.33). Ela pode ser compreendida como estrutural e direta. A primeira decorre de estru-turas econômicas, sociais ou políticas que oprimem, exploram ou alienam (MUL-LER,1995). Enquanto a segunda refere-se a ferimentos, incapacitações, banimen-tos e mortes de atores sociais (SILVA, P. 2005).

1 No presente estudo, considera-se adolescente em conflito com a lei aquele que se envolveu na prática de ato infracional, independentemente de ter sido responsabilizado ou não. O item 1.2 deste capítulo versará sobre essa temática.

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Estudiosos da não-violência e cultura de paz defendem a idéia de que existe uma cultura de violência que permeia todas as sociedades. Para Milani (2003, p.33) tal cultura “influencia os indivíduos a privilegiarem o comportamento violento como meio natural de defender seus interesses”. Ela se justifica por meio da ideologia da violência, cuja função é:

construir uma representação da violência que evite ver aquilo que ela é efectivamente – desumana e escanda-losa. Ela visa ocultar aquilo que a violência tem de ir-racional e de inaceitável e fazer prevalecer uma repre-sentação racional aceitável (...) O objetivo pretendido – e muitas vezes alcançado – é a banalização da violência. Em vez de ser banida – declarada fora da lei –, a violên-cia é banalizada – declarada em conformidade com a lei. (MULLER,1995, p. 11).

Além da banalização, essa ideologia veicula incorretamente a idéia da violência como sendo uma entidade única, onipotente e invencível (COSTA, 1993 apud MI-LANI, 2003). A partir de tal perspectiva cria-se um ambiente social de medo e insegurança, no qual o Estado passa a fazer uso da força como ação imperiosa.

O termo polícia é derivado da palavra politéia2. A instituição polícia consolidou-se historicamente como o principal agente público autorizado para utilizar a força quando necessário. Manter a ordem pública e reprimir o crime constituíram as principais funções da polícia, incluindo ainda, sob a ótica humanista, a proteção das pessoas e a garantia de exercício dos direitos “à vida, à integridade física, à liberdade de opinião e à propriedade”(ROLIM, 2006, p.28).

A natureza da atividade policial é bastante diversificada, situando-se desde a emissão de autorizações, localização de objetos perdidos, socorro a feridos, controle de multidões em jogos populares, apoio a drogaditos e alcoolistas, até a investigação para solução de crimes e a contenção de criminosos. Para bem desempenhar suas funções, os policiais são investidos de grande autonomia decisória (COSTA, A., 2005). E sua atividade pode ser considerada, “entre as demais profissões perigosas, (como) aquela em que mais claramente o risco é oferecido pelo contato com o outro”(ROLIM, p. 34).

2 Palavra grega que “designava a arte de governar a cidade, ou a arte de tratar da ‘coisa pública’.”(ROLIM, 2006, p.24)

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Segundo a Constituição Federal do Brasil de 1988, são órgãos responsáveis pela Segurança Pública, entre outros, as polícias civil e militar. “Às polícias civis, diri-gidas por delegados de polícia, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares”3. Entende-se por polícia judiciária aquela responsável pela “apuração das infrações penais, as investigações criminais e o auxílio à justiça, no campo da aplicação da lei penal e processual, além dos registros e fiscalizações de na-tureza regulamentar”4.

Às polícias militares cabe o policiamento ostensivo e a manutenção da ordem pública. Manoel (2004) compreende por ostensivo, aquele policiamento no qual o agente “é facilmente identificado pela farda que ostenta, como principal as-pecto e de equipamentos, aprestos, armamento e meio de locomoção.”O autor acrescenta que esse policiamento focaliza suas intervenções na “prevenção dos crimes, contravenções penais e de violações de normas administrativas em áreas específicas, como o trânsito, meio ambiente, poluição sonora entre outras”5.

Reza o art. 144 da Carta Magna de 1988 que a Segurança Pública é “dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, (sendo) exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio”. Como um direito fundamental da pessoa humana, seus agentes devem estar totalmente comprometidos com o exercício pleno da cidadania, com a convivência pacífi-ca em sociedade e com a consolidação do sentimento coletivo de segurança. Contudo, quando segmentos de policiais extrapolam o uso autorizado da força, utilizando-a de forma desnecessária, inadequada e abusiva (COSTA, A.; BANDEI-RA, 2007), mesmo diante de situações sob controle, cria-se a violência policial e, conseqüentemente, rompe-se o compromisso com os preceitos da Segurança Pública e dos Direitos Humanos.

Considerada como tipo especial de violência institucional, porque infringida pelo Estado contra cidadãos, nem sempre é fácil definir o que seja a violência poli-cial, levando em conta que “uma prática policial vista como legítima, legal e até normal pode ser interpretada como violenta, ilegítima e ilegal em outra época ou sociedade”(COSTA, A., 2004, p. 12).

3 Constituição da República Federativa do Brasil, 1988, art. 144, § 4º p.100. 4 Lei Nº 5406, de 16 de dezembro de 1969, Capítulo I, art. 38.5 Ibidem.

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Segundo consta no endereço eletrônico Direitos Humanos na Internet, existem quatro concepções com relação à violência policial:

O uso da força física contra outra pessoa de forma ilegal, não relacionada ao cumprimento do dever legal ou de forma proibida por lei; o uso desnecessário ou excessivo da força para resolver pequenos conflitos ou para pren-der um criminoso de forma ilegítima; os usos irregulares, anormais, escandalosos ou chocantes da força física contra outras pessoas; o uso de mais força física do que um policial altamente competente consideraria necessá-rio em uma determinada situação.

Costa6 assinala sete práticas policiais reconhecidamente violentas: detenções violentas, mortes sob custódia, abuso da força letal, controle violento das mani-festações públicas, operações policiais, intimidação / vingança e tortura.

As detenções violentas ocorrem quando suspeitos são apreendidos com o uso da força, sem haver justificativa para tanto. Quanto à morte sob custódia, é comum o trucidamento dos detidos, ou porque guardam informações importantes (queima de arquivo), ou como maneira de punição. A permissão para matar, denominada força letal, se não usada nas situações em que policiais e/ou cidadãos correm perigo de vida, pode ser considerada abusiva e, portanto, um ato violento.

O uso excessivo da força também costuma aparecer no controle de manifesta-ções públicas ou nas operações policiais. Segundo Costa7, as ações de intimida-ção e vingança funcionam, para alguns policiais, como “fazer justiça com as pró-prias mãos, em vez de esperar pela decisão dos tribunais.”Grupos paramilitares, de justiceiros ou esquadrões da morte utilizam constantemente esses meios para submeter dissidentes políticos e comunidades.

De acordo com a Resolução 39/46 da Assembléia Geral das Nações Unidas, de 10 de dezembro de 1984, considera-se tortura:

qualquer ato pelo qual dores ou sofrimentos agudos, fí-sicos ou mentais, são infligidos intencionalmente a uma pessoa a fim de obter, dela ou de terceira pessoa, infor-mações ou confissões; de castigá-la por ato que ela ou

6 Ibidem.7 Ibidem, p.17.

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terceira pessoa tenha cometido ou seja suspeita de ter cometido; de intimidar ou coagir esta pessoa ou outras pessoas; ou por qualquer motivo baseado em discrimina-ção de qualquer natureza; quando tais dores ou sofrimen-tos são infligidos por um funcionário público ou outra pes-soa no exercício de funções públicas, ou por instigação, ou com seu consentimento ou aquiescência.

Ao lado de tais violências, é importante salientar que, quando policiais (ou qual-quer outro agente público) excedem a autoridade8 delegada pelo Estado no uso de suas atribuições, praticam crime descrito na Lei 4.898, de 09 de dezembro de 1965. Essa define ser crime de abuso de autoridade, entre outros, qualquer tentativa contrária:

à liberdade de locomoção; à inviolabilidade do domicílio; (...)ao direito de reunião; à incolumidade física do indiví-duo;(...) ordenar ou executar medida privativa da liberda-de individual, sem as formalidades legais ou com abuso de poder; submeter pessoa sob sua guarda ou custódia a vexame ou a constrangimento não autorizado em lei.

Vários autores assinalam que a truculência da polícia apresenta raízes históricas. Para Stenberger e Cardoso (2005, p.107), as práticas violentas são provenien-tes “do ideário de ‘combate ao inimigo’, usado desde os anos 1920 em larga escala nas organizações policiais”, posteriormente reforçado durante a ditadura militar (1964-1985) com a doutrina da segurança nacional. Com a desculpa de combater o Comunismo, as Forças Armadas passaram a exercer o controle do monopólio de repressão político e ideológico no país, reordenando as polícias, especialmente a militar, para conter e perseguir internamente os adeptos da nova ordem. De volta ao Estado Democrático, tal doutrina foi “transposta para a luta contra a criminalidade, em que o criminoso é um inimigo que precisa (para ser melhor combatido) ser tratado sem a proteção dos direitos civis e, se possível, ser abatido”(PINHEIRO; SADER, 1986, p. 87 apud SALLAS, 1999, p. 294).

Outro fator histórico que contribuiu para o recrudescimento da violência policial refere-se ao modelo de policiamento. Antes da segunda metade do século XX, o policiamento moderno adotava o modelo proativo, caracterizado por estreitos

8 A autoridade é a capacidade nata ou adquirida manifestada por um indivíduo ou grupo, que exerce ascendência sobre outros indivíduos ou grupos que a aceitam voluntariamente. Também é conhecida como poder legítimo (Miranda Netto et al, 1987).

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vínculos entre policiais e comunidade (ROLIM, 2006). Distribuídos pelos postos de policiamento e realizando rondas a pé, os policiais responsáveis pela segu-rança de determinada área residencial direcionavam suas ações, muitas vezes preventivas, para a manutenção da ordem, independentemente da solicitação dos cidadãos. Posteriormente o referido modelo foi substituído pelo policiamento reativo, cujas ações policiais passaram a ser impetradas a partir da demanda dos cidadãos. Com o uso de novos recursos tecnológicos (o telefone, o carro de pa-trulha e o rádio de intercomunicação), a polícia passou a patrulhar áreas maiores de acordo com as determinações centralizadas nos departamentos policiais e as demandas da comunidade deixaram de ser realizadas presencialmente.

As dificuldades apontadas pelos críticos a este modelo seguem no sentido de que a reatividade fez romper os laços comunitários entre a polícia e a comunidade, produzindo uma situação de estranhamento entre esses atores (ROLIM, 2006). Soares avalia que:

o modelo é reativo porque estimula ações apenas depois dos fatos consumados e de acordo com pressões exter-nas e demanda, muitas vezes politicamente orientadas e filtradas pela mídia ( que privilegia as elites e as ca-madas médias) (...) é inercial porque tende a reproduzir padrões tradicionais, sem que haja qualquer avaliação a respeito de sua eficiência (...) é fragmentário porque são fragmentárias as demandas às quais se submetem as iniciativas institucionais (2004, p. 1-2 apud STEINBER-GUER; CARDOSO, p. 110).

As raízes de militarização da instituição e o distanciamento da comunidade con-tribuíram para que policiais começassem a identificar algo de suspeito em cada pessoa observada, abrindo espaço fecundo para a prática do preconceito e dis-criminação contra minorias9, entre elas jovens negros. Suas vítimas também são pertencentes majoritariamente às camadas pobres da sociedade; aquelas que, paradoxalmente, mais solicitam os diversos serviços da polícia diante da condi-ção de exclusão em que se encontram (ROLIM, 2006).

O preconceito e a discriminação não ocorrem apenas em nível social, mas tam-bém territorial. No caso de Brasília, por exemplo, estudos demonstraram que o

9 Para L. Wirth (apud Moonen, s.d ), minoria é “um grupo de pessoas que, por causa de suascaracterís-ticas físicas ou culturais, são isoladas das outras na sociedade em que vivem, por um tratamento diferencial e desigual, e que por isso se consideram objetos de discriminação coletiva.”

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banimento de suas favelas para a periferia, pelos governos distritais, gerou no-vos assentamentos marcados pela ausência do Estado nesses espaços. Consti-tuiu-se assim um espaço social com apenas uma função urbana, a de moradia, olvidando outras funções não menos importantes como infra-estrutura e gera-ção de emprego (FERREIRA; PENNA, 2005).

Na visão de Skolnick (1966, apud COSTA, N., 2004), a adesão do policial às nor-mas legais variaria de acordo com o perigo a que é exposto. Assim, o policial pode empregar o uso da força de acordo com a ameaça a que se sente submetido, ou quando a sua autoridade é questionada ou desrespeitada. Ainda para o autor, nas camadas populares, o policial acaba agindo com mais rigor ou com excesso de poder e arbitrariedade, porque as julga a partir de critérios subjetivos e da con-dição de classe ou de cor, considerando-as criminosas em potencial que coloca-riam em risco não só a ordem social, como a sua (policial) própria vida. Para com as elites, ele tende a ser mais civilizado, porque teoricamente essas pessoas não oferecem nenhum risco à sua segurança. Porém, quando o policial não percebe o prestígio e o poder pertencentes a classes sociais privilegiadas, tende a manter a atitude de truculência.

Nesse contexto, as conseqüências mais perceptíveis da violência policial são, sem dúvida, a falta de confiança da população na instituição Polícia, o medo perante seus agentes e, de forma mais ampla, o descrédito da atuação do Es-tado na segurança de seus cidadãos. Segundo Rolim10, as poucas pesquisas de vitimização11 realizadas no mundo inteiro apontam para o fato de que o número de crimes não informados à polícia é extremamente alto. Os motivos destacados para tanto são:

Em primeiro lugar, muitas vítimas têm medo de sofrer represálias. Em segundo, muitas imaginam que a polí-cia não irá produzir qualquer resultado; por alguma ra-zão elas não confiam na instituição e imaginam que irão apenas perder seu tempo. Em terceiro, muitas vítimas não desejam o envolvimento da polícia em determina-dos casos. Elas podem se sentir mais seguras em tratar pessoalmente do problema, podem manter vínculos com

10 Ibidem, p.40-41.11 Para a Vitimologia, vitimização relaciona-se à pessoa (vítima) que sofre “danos de ordem física, mental e

econômica, bem como a que perde direitos fundamentais, seja em razão de violações de direitos huma-nos (...), bem como por atos criminosos comuns.”(OLIVEIRA, 1993).

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os infratores ou ainda sentir vergonha de expor a situa-ção que as vitimou. Por fim, o que ocorre é que muitas pessoas não sabem como proceder para registrar uma ocorrência, não têm recursos para se deslocar até uma delegacia ou, mesmo, não têm noção de que foram lesa-das em algum direito.

Pesquisa sobre vitimização realizada pelo Instituto Latino Americano das Nações Unidas para Prevenção do Delito e Tratamento do Delinqüente – ILANUD – (2002) nas capitais do Rio de Janeiro, Recife, Vitória e São Paulo, com 2.800 entrevis-tados, maiores de 16 anos, constatou que a polícia só é notificada por um terço das vítimas, sendo que cerca de dois terços dos casos não são notificados. Outra pesquisa realizada no Distrito Federal (WAISELFISZ, 2002, p. 19) confirma o baixo registro de queixas à polícia pela população jovem. Em se tratando de “violência física, só 6,4% realizaram denúncia; nos casos de assalto/furto, só 4%; nos casos de violência no trânsito, só 15%.”.

A condição de exclusão da maioria da população e a desconfiança no trabalho dos policiais contribuem para que eles sejam identificados como agentes de re-pressão e não de proteção. Esse caráter repressivo foi expresso por adolescentes autores de ato infracional, usuários de drogas, em artigo sobre o lugar do pai nas relações familiares. Para Penso; Ramos; Gusmão (2005, p.1), esses jovens percebem a polícia como o “pai de botas”, porque, ao invés de proteger, têm a “função de bater, espancar e maltratar.”Para Rolim12, essas condições favorecem a não realização de protestos contra a violência policial. E, em havendo denúncia, salienta que policiais agressores desqualificam-na como uma fala de “um de-linqüente comum, um traficante, um ‘bandido’. Logicamente pessoas com esse perfil ‘não têm do que se queixar’; devem é ‘pagar pelos seus crimes’.”.

Outro aspecto importante sobre a temática diz respeito à vitimização da juven-tude, compreendida entre a faixa etária de 15 a 24 anos, segundo o Mapa da Violência IV (WAISELFISZ, 2004). Conforme dados desse Mapa, em 2002, no Brasil, 39,9% das mortes de jovens ocorreram em função de homicídio. Ainda se-gundo o mesmo documento13, a vítima principal do homicídio é “a população de sexo masculino (em torno de 93% das vítimas são homens) e de raça negra: que tem uma vitimização 65% superior na população total e 74% superior entre os

12 Ibidem, p. 40.13 Ibidem, p. 162.

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jovens.”Atualmente, a Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República – SEDH/PR –, com base no Índice de Homicídios na Adolescência – IHA –, estima que os homicídios na faixa etária entre 12 e 18 anos representem 46% das causas de morte, cuja maioria das vítimas é assassinada por arma de fogo.

Pesquisa do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo – NEV/USP – (2006), referente ao período de 1980 a 2003, constatou que 5.718 crian-ças e adolescentes brasileiros foram vítimas de graves violações de direitos humanos. Grande parte desse universo (53%) sofreu execução sumária14, 43% foram submetidos à violência policial e 4% foram vítimas de linchamento15. Há indícios de que houve envolvimento policial em mais da metade dessas graves violações. Segundo a pesquisa16, “Oitenta e cinco por cento das vítimas de execu-ção sumária (n. = 2.569), 94,5% das vítimas de linchamento (n. = 205) e 82% das vítimas de violência policial (n. = 2.028) eram da faixa etária de 15 a 19 anos.”.

Sallas et al (1999), em pesquisa sobre a juventude curitibana na faixa etária de 14 a 20 anos, assinala aspectos importantes da visão juvenil com relação à vio-lência policial. Na escala de 1 a 10, a instituição Polícia recebeu nota mediana de satisfação (4,99), estando acima do Congresso, Governo e Partidos Políticos, porém abaixo da Família, Escola e Igreja. A maioria dos entrevistados considerou a ação policial como negativa, pois muitas vezes ocorre sem motivo justo, mes-clada com atos de violência física (pancadarias, cenas de tortura, entre outros.) e psicológica (xingamentos, humilhações.).

Para os curitibanos pesquisados, o jovem trabalhador foi o principal alvo da polícia. Consideraram a abordagem discriminadora do ponto de vista racial e social, pois os maiores suspeitos de crimes são populações pobres e negras. Além do mais, nos momentos em que a aproximação policial deveria respeitar a diferença sexual, ela se tornou abusiva, haja vista a queixa de uma adolescente que informou ter sido revistada indevidamente por policial do sexo masculino e não feminino.

A abordagem policial também pode ocorrer entremeada pela corrupção, uma vez que “Sob qualquer pretexto, alguns policiais se aproveitariam para pegar objetos 14 Execuções sumárias são homicídios motivados por vingança, dívida, acerto de contas, entre outros.15 Considera-se linchamento a tentativa de assassinato de pessoa ou consumação do ato, realizado em

geral por uma multidão, sem qualquer espécie de julgamento legal e com prejuízo de seus direitos fundamentais.

16 Ibidem, p. 176.

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pessoais dos jovens reproduzindo assim um comportamento que pouco diferen-cia o policial do marginal”17. Quando os policiais são usuários de drogas ilícitas costumam negociar a liberdade de jovens, também consumidores, em troca de tais substâncias psicoativas.

Na avaliação da maioria dos jovens curitibanos, tal comportamento corrupto decorre dos baixos salários e da própria corrupção inerente ao sistema policial. Com relação à eficiência do trabalho policial, os jovens pertencentes às classes de maior poder aquisitivo consideraram-na negativa, pois os policiais chegam sempre atrasados aos locais de brigas juvenis ou de roubos. Essa ineficiência, entretanto, não está somente relacionada à baixa remuneração, mas também ao despreparo profissional.

Os autores da pesquisa demonstraram, com base em entrevistas com policiais, que esses vêem as classes populares moradoras de favelas e de bairros pobres como bem mais perigosas que as outras classes, suscitando-lhes uma aborda-gem mais enérgica. Sallas et al (1999) avaliam que esse discurso discriminador decorre de três motivos. O primeiro surgiu da herança histórica da ditadura mili-tar, conforme anteriormente explicitado. O segundo advém do nível intelectual e educacional do jovem e/ou cidadão abordado. Vale ressaltar que foi nos setores sociais com maior acesso à educação onde houve a maior aprovação da Polícia. E o terceiro refere-se à abordagem ser direcionada especificamente para jovens.

Este último motivo requer maiores explicações. Fernandes (1988, apud SALLAS et al, 1999) afirma existir o ‘discurso da suspeita’, “no qual o cidadão pobre pas-sa a ser vigiado e percorrido por um olhar persecutório seletivo e adestrado”18. Seus componentes são: “1) a mobilidade do olhar: a identificação do suspeito e a ação que supõe ir atrás do suspeito; 2) o adestramento do olhar: o feeling para perceber a culpa do suspeito; 3) o atuar: trata-se da forma e da técnica utilizada para a abordagem”19. Em outras palavras, para a autora, tal discurso põe tanta ênfase no instinto, na intuição dos policiais, que eles seriam capazes, por meio de um único olhar, de distinguir, por exemplo, se o jovem está sob efeito de dro-gas ou se vai adquiri-la. Concorre para tamanha constatação o ato de observar a aparência do jovem: seu caminhar, as roupas diferenciadas, o corte de cabelo, a linguagem, o jeito, entre outros.

17 Ibidem, p.290.18 Ibidem, p. 294.19 Ibidem, p. 294.

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Além da discriminação social admitida na abordagem, a referida pesquisa apon-tou para policiais que justificaram seus atos violentos como respostas às atitu-des de desacato dos jovens perante sua autoridade e a ordem pública. E, ainda, muitos agentes avaliaram que “o Estado e a sociedade, através do Estatuto da Criança e do Adolescente, teriam dado um cheque em branco ao jovem para este cometer impunemente atos de transgressão”20.

Chevigny (1995, apud MACHADO; NORONHA, 2002) assevera que, quando a vio-lência é praticada contra pessoas que se colocam como trabalhadores, pais e mães de família honestos, cumpridores de seus deveres, tal violência é tida como inaceitável, ilegítima. No entanto, quando atos violentos são praticados contra os ditos infratores, “foras-da-lei”, a violência passa a ser aceitável e legítima. A percepção de perda de controle sobre a criminalidade faz com que setores da sociedade desenvolvam comportamentos autoritários, apoiando excessos da po-lícia contra responsáveis por delitos grandes ou pequenos.

Vale ainda destacar que os jovens curitibanos pesquisados admitiram a impor-tância da Polícia para a segurança da comunidade, bem como a utilização de procedimentos (geral, batidas) que ocorrem na abordagem. Contudo, a maioria se posicionou contrariamente aos abusos de autoridade e à prática violenta de manutenção da ordem.

2. Adolescentes em conflito com a Lei

O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA –, Lei 8.069, de 13 de julho de 1990, art. 2º, considera adolescente toda pessoa que se encontra entre a faixa etária de doze anos completos a dezoito anos incompletos. Em consonância com a Doutrina de Proteção Integral, inserida no ordenamento jurídico brasileiro por meio do artigo 227 da Constituição Federal de 1988, o ECA defende em seu art. 3º serem o adolescente e a criança pessoas em condições peculiares de desen-volvimento, sujeitos de direitos e que gozam de prioridade absoluta na proteção do Estado para se desenvolverem do ponto de vista “físico, mental, moral, es-piritual e social”(2004, p. 9). Prevê ainda, no art. 5º, que “Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, explo-

20 Ibidem, p. 301.

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ração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais”21.

Segundo o diploma legal, denomina-se adolescente autor de ato infracional todo aquele que pratica uma conduta descrita como crime ou contravenção penal. Também conhecido pela nomenclatura “adolescente em conflito com a lei”, esse jovem, quando da apreensão por flagrante de ato infracional, é encaminhado ao Sistema de Justiça do Distrito Federal, composto pela Delegacia da Criança e do Adolescente – DCA –, Ministério Público – MP –, Centro de Assistência Judiciária – CEAJUR – e 1ª e 2ª Varas da Infância e da Juventude – VIJs –, onde poderá ser processado, sentenciado e receber medida socioeducativa.

Inimputável para o Código Penal, mas sujeito à responsabilização pelo ECA, a medida socioeducativa sanciona o adolescente pelo ato ilegal ocorrido e busca atingir, para além da sanção, os aspectos socioeducativo e reparador. Dessa ma-neira, visa a propiciar ao autor condições que favoreçam a mudança do compor-tamento delituoso com vistas a priorizar “o exercício da cidadania e da resiliên-cia, mediante a participação em atividades pedagógicas, a inserção temporária em ocupações laborais e o fortalecimento dos laços familiares e da participação social”(SALLES et al, 2007, p. 5). Procura ainda promover a reparação: “movimen-to de introspecção no qual o jovem, a partir da reflexão sobre o ato infracional, reconcilia-se consigo e com a sociedade”(CAMPINA et al, 2004, p.5).

O adolescente em conflito com a lei pode receber as seguintes medidas socioe-ducativas, conforme o art. 112 do ECA22:

advertência. Trata-se de uma admoestação verbal realizada em audiência pelo juiz ao adolescente;

obrigação de reparar o dano. Constitui-se de restituição, ressarcimento ou compensação, por parte do jovem, de prejuízo experimentado pela vítima;

prestação de serviços à comunidade. Segundo o art. 117 do ECA esta medida “consiste na realização de tarefas gratuitas de interesse geral, por período não excedente a seis meses, junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimentos congêneres, bem como em programas comunitários ou governamentais.”;

21 Ibidem, p. 10.22 Ibidem, p.32-33.

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liberdade assistida. É aquela destinada ao acompanhamento, auxílio e orien-tação do jovem pelo período mínimo de 6 meses. Nos termos do art. 118, incisos I e II, respectivamente, o orientador responsável deve procurar, entre outras atribuições, “promover socialmente o adolescente e sua família” e “su-pervisionar a freqüência e o aproveitamento escolar do adolescente”;

inserção em regime de semiliberdade. Esse regime pode ser imposto desde o início, ou como transição do adolescente inserido no regime fechado23 para o aberto, viabilizando a escolarização e a profissionalização do jovem;

internação em estabelecimento educacional. É uma medida que priva a liber-dade do adolescente, sendo “permitida a realização de atividades externas, a critério da equipe técnica da entidade, salvo expressa determinação judicial em contrário.”;

qualquer uma das medidas protetivas24 previstas no art. 101, I a VI do ECA.

Os fatores de risco que podem levar adolescentes a envolver-se em atos infracio-nais são inúmeros. Segundo experiências vivenciadas pela SEMSE, podem ser destacados os seguintes fatores: ter sido vítima de violência na infância, ausên-cia de monitoramento dos pais, impulsividade, uso abusivo de drogas, problemas de concentração e/ou transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), falta de limites, ausência de projeto de vida25, dentre outros. Pesquisa de vitimi-zação do Ilanud (2002) apontou como causas sociais da criminalidade o ócio entre os jovens, a falta de emprego e renda, a carência de escolas e creches, as condições de vida nas favelas, entre outras. Como causas não sociais, foram ressaltadas a desconfiança na Justiça e na Polícia e a carência de policiamento.

Ao lado de todas as possíveis situações que podem levar um adolescente a entrar em conflito com a lei, há que se ressaltar o contexto de vulnerabilidade social da grande maioria, cujo conceito pode ser compreendido como:

o resultado negativo da relação entre a disponibilidade dos recursos materiais ou simbólicos dos atores( capi-tal financeiro (renda mensal e bens do indivíduo), capital

23 Fazem parte do regime fechado as medidas de semiliberdade e de internação, nas quais os direitos são restringidos ou privados de liberdade. O regime aberto contempla as outras medidas socioeducativas.

24 As medidas protetivas (arts. 100 e 101 do ECA) visam a fortalecer os vínculos familiares e comunitários. As mais aplicadas no D.F. são: matrícula em escola de ensino fundamental, tratamento psicológico, psiquiátrico ou médico e, ainda, tratamento para dependência química.

25 Para Nascimento (2006, p. 5), projeto de vida “tem o sentido de aspirações, desejos de realizações que se projetam para o futuro como uma visão antecipatória de acontecimentos, cuja base reside em uma realidade construída na interseção das relações que o sujeito estabelece com o mundo.”

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humano (educação formal e capacidades intelectuais), experiência de trabalho,(...), recursos familiares), sejam eles indivíduos ou grupos, e o acesso à estrutura de oportunidades sociais, econômicas, culturais que provê-em do Estado, do mercado e da sociedade. (ABRAMO-VAY, 2002, p. 13)

Segundo pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA – (apud SILVA, E.; GUERESI, 2003) referente aos meses de setembro e outubro de 2002, encontravam-se privados de liberdade 9.555 adolescentes de ambos os gêneros. A maioria, 76% desses jovens, possuía entre 16 e 18 anos e cerca de 94% do total de internos eram do sexo masculino. Mais da metade, 61%, eram afrodescendentes (pretos e pardos). A maioria provinha de famílias pobres, das quais 66% sobreviviam com rendimento mensal que variava “de menos de um até dois salários mínimos vigentes”26 no período pesquisado. A renda per capita de uma família composta por quatro pessoas não excedia a cem reais mensais. O levantamento detectou também que 51% não frequentavam a escola à época do delito e 49% não trabalhavam, “sendo que, entre os que trabalhavam, cerca de 40% atuavam no mercado informal”27. Entre os principais delitos praticados, 43% foram crimes contra o patrimônio (roubo e furto), seguidos do homicídio (18,6%) e do tráfico de drogas (8,7%).

Além da situação de vulnerabilidade exemplificada pelo estudo sobre adoles-centes sob medida socioeducativa de internação, vale salientar a existência no imaginário social de alguns mitos que favorecem uma visão distorcida sobre a condição dos jovens autores de ato infracional.

Volpi (2000) apresenta três mitos: o hiperdimensionamento do problema, a peri-culosidade e a impunidade. O primeiro mito busca demonstrar a ascensão vertigi-nosa do número de adolescentes em conflito com a lei. Contudo, Alves (2007), em estudo, informou que os adolescentes eram responsáveis por menos de 4% do total de crimes no estado de São Paulo com referência ao ano de 2003. O mesmo autor informou que “apenas cerca de 10% dos crimes brasileiros são cometidos por quem tem menos de 18 anos”(2008, p. 2). Segundo Ilha (2006), do total de adolescentes no país entre 2005 e 2006, apenas 0,14% são adolescentes em conflito com a lei.

26 Ibidem, p. 24.27 Ibidem, p. 23.

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Essa última informação remete ao segundo mito: o da periculosidade. Para os de-fensores desse mito, a maioria dos adolescentes praticaria crimes hediondos28. Tal acepção cai por terra, tendo em vista as informações apresentadas pelo Ilanud (2007), cujo mapeamento realizado constatou que os delitos de tráfico de drogas, homicídio e tentativa de homicídio perfaziam cerca de 12% do total apurado. Os atos infracionais de estupro e latrocínio não entraram no rol dos 15 delitos mais citados, constando provavelmente no item “outros crimes”cujo total foi de 7,1%.

O terceiro mito refere-se à impunidade ou irresponsabilidade dos adolescentes que cometem atos infracionais. Eles estariam mais suscetíveis à pratica de deli-tos porque a punição prevista em lei é leve. Contudo,

Nesse caso ocorre confusão entre inimputabilidade pe-nal e impunidade. O fato de um adolescente ser inimpu-tável penalmente não o exime de ser responsabilizado com medidas socioeducativas, inclusive, com a privação de liberdade por até três anos (VOLPI, 2000, p. 4).

A SEMSE ao realizar a presente pesquisa defrontou-se com a carência de estudos que abordassem a visão de adolescentes em conflito com a lei sobre a violência policial da qual foram vítimas. Contudo, vale mencionar a pesquisa realizada pelo Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Interlagos – CEDE-CA Interlagos/SP – (2006) com 116 adolescentes autores de ato infracional, na faixa etária de 12 a 20 anos, todos sob cumprimento de medida socioeducativa em meio aberto.

Nesse estudo, chama a atenção que 86% dos pesquisados chegaram a ser abor-dados entre três e quatro vezes, fato considerado exagero. Esse CEDECA apontou que as duas primeiras abordagens poderiam estar relacionadas à prática do de-lito que encaminhou os jovens ao Sistema de Justiça. Aqueles que foram aborda-dos quatro vezes ou mais (47% do universo) sofreram o dobro das agressões com relação aos que foram agredidos apenas uma vez (20%). O perfil dos suspeitos está em consonância com a literatura especializada. A maioria é composta por negros e pardos, trajando vestes características (bonés, roupas folgadas), pobres e moradores da periferia (da cidade de São Paulo).

28 Consideram-se crimes hediondos: o homicídio qualificado, o latrocínio, o estupro, o genocídio (Lei N. 8072/90). Assemelham-se a esses o crime de tráfico ilícito de entorpecentes e o de prática de tortura. Todos são inafiançáveis e insuscetíveis de graça, anistia ou indulto (BRASIL, 2009).

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A abordagem policial se caracterizou pela grande ausência na identificação for-mal dos policiais (86%). Contudo, os adolescentes relataram que 70% dos agen-tes eram policiais militares, 27%, policiais civis e o restante pertencente à Guarda Civil Metropolitanta – GCM. Para 95% dos entrevistados houve violência durante a abordagem: 51% de ordem física, 43% psicológica e 1% sexual. Os locais de maior incidência dos atos violentos foram: rua (71%), outros (15%) – os quais não foram identificados pela pesquisa – e casa (9%).

Embora o levantamento não tenha especificado grande parte dos tipos de violên-cia física, foram citados: o uso de algemas (72%), casos de tortura e a danificação de documentos ou materiais pessoais dos jovens (aproximadamente 30%). Neste último caso, estavam incluídos documentos comprobatórios do cumprimento das medidas em meio aberto sob supervisão do próprio CEDECA Interlagos. O abuso de autoridade também apareceu por meio da invasão de domicílio sem mandado de busca29 ( 42%), ferindo, não somente lei específica ( Lei 4898, de 9 de de-zembro de 1965), como o art. 5º, inciso LXI da Constituição Federal (1988), que permite apenas a prisão em situações de flagrante delito ou sob ordem judiciária, com exceção dos casos que configuram crime militar.

O referido estudo demonstrou que cerca de 80% dos entrevistados consideraram a recepção na delegacia como incorreta. Um dos parâmetros na avaliação dessa recepção refere-se à não comunicação aos pais ou responsáveis sobre a apreen-são em 17% dos casos, desrespeitando o art. 107 do ECA (2004), que determina comunicação imediata do fato aos familiares ou a pessoa indicada pelo apreen-dido. Quase 44% dos pesquisados dividiram o mesmo espaço físico com adultos; fato em desacordo com o art. 175, § 2º, do mesmo diploma legal, que autoriza a permanência do jovem em repartição policial, mas por breve espaço de tempo e em dependência separada daquela reservada aos maiores.

Os dados coletados revelaram que 48% dos jovens sofreram violência física dentro das delegacias. Cinqüenta e um por cento foram vítimas de violência psicológica tais como: “advertência abusiva, ameaças, ameaças aos familiares, humilhações”(CEDECA Interlagos, 2006, p. 44), entre outras.

29 O mandado de busca e apreensão é ordenado pelo juiz e deve preceder a busca de pessoas ou coisas em domicílio, quando esta não for realizada pessoalmente pelas autoridades judiciária ou policial (Decreto-lei 3689, de 03 de outubro de 1941, Código Processual Penal, art. 241).

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Diante de tal quadro, a avaliação dos adolescentes sobre o tratamento recebido nas delegacias foi pouco satisfatória. Quase a metade dos pesquisados (49%) avaliaram o atendimento como péssimo, seguido de regular (33%) e bom (15%). Apenas 3% dos entrevistados consideraram o acolhimento muito bom.

A presente pesquisa procurou conhecer a visão de adolescentes atendidos pela Semse, sobre a violência policial eventualmente sofrida em decorrência de ato infracional cometido.

Para tanto, foram elencados os seguintes objetivos específicos:

1. Elaborar o perfil psicossocial dos adolescentes que sofreram violência policial;

2. Verificar os tipos de atos violentos praticados por policiais, as partes do corpo mais atingidas e prováveis conseqüências para os adolescentes;

3. Mapear as Regiões Administrativas e os locais de ocorrência dos atos violentos, as corporações policiais envolvidas e, se possível, os responsáveis por tais atos e suas respectivas lotações;

4. Investigar a ocorrência de denúncia por parte dos adolescentes sobre os atos violentos sofridos em decorrência da força policial, o trâmite institucional res-pectivo e a orientação por parte do Sistema de Garantia de Direitos do Distrito Federal quanto ao direito de denunciar;

5. Compreender como os adolescentes perceberam e vivenciaram a violência policial.

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Metodologia

A presente pesquisa contemplou três etapas. A primeira ocorreu no período de agosto a outubro de 2005, na qual questionários foram respondidos por ado-lescentes que receberam medidas socioeducativas em meio aberto: Liberdade Assistida (LA) e Prestação de Serviços à Comunidade (PSC) ou ambas cumula-das entre si, ou ainda cumuladas com medidas protetivas. Esses adolescentes afirmaram ter sido vítimas de violência policial durante a abordagem, no trajeto às delegacias e/ou no interior delas em decorrência de suposto cometimento de ato infracional.

Na etapa subseqüente, entre o segundo semestre de 2007 e o primeiro de 2008, foi utilizada a técnica de grupo focal, na qual parte dos adolescentes pesquisados (5,83%) expôs opiniões, vivências, crenças e percepções sobre a temática. Optou-se por essa técnica com vistas a estabelecer um espaço de discussão que promo-vesse o aprofundamento qualitativo das questões levantadas pelos questionários aplicados (IERVOLINO; PELICIONI, 2001).

Ainda nessa etapa, o atraso de uma adolescente e seu interesse em contribuir para o estudo motivou a equipe de pesquisa a efetuar com ela uma entrevista semi-estruturada. Turato (2003) afirma que essa técnica permite a interação en-tre pesquisadores e pesquisados, a partir de questões introduzidas pelos entre-vistadores, tal como nos grupos focais.

Na terceira etapa (novembro e dezembro de 2007), construiu-se um perfil social dos jovens sentenciados na medida socioeducativa de Liberdade Assistida, cumu-lada ou não com outras medidas (PSC e protetivas) que haviam sido orientados pela SEMSE no período de agosto a outubro de 2005. A opção pelos jovens sob LA se deu em função da grande disponibilidade, à época, de dados sobre essa medida na Seção. Ainda nessa fase foi quantificado o percentual de passagem infracional30 dos 120 adolescentes que afirmaram ter sofrido violência policial, contemplando os delitos anteriores à passagem pesquisada.

30 A passagem infracional refere-se a todo envolvimento do adolescente em ato infracional que chegou ao conhecimento da autoridade judiciária.(LOTTI, 2009)

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No decorrer da pesquisa, surgiu a necessidade de efetuar visitas às seguintes instituições do Sistema de Garantia de Direitos – SGD31– do Distrito Federal: Ins-tituto Médico Legal – IML –, Delegacias da Criança e do Adolescente I e II – DCAs I e II –, Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente – DPCA –, Corregedoria da Polícia Militar, Corregedoria da Polícia Civil, Academia de Polícia Civil, Acade-mia de Polícia Militar, Centro de Assistência Judiciária – CEAJUR –, Promotoria de Justiça de Defesa da Infância e da Juventude – PDIJ –, Núcleo de Controle da Atividade Policial – NCAP – e Promotoria de Justiça Militar – PJM32. Buscou-se, nessas visitas, esclarecer o percurso institucional desses jovens no Sistema, bem como a divulgação de dados parciais da pesquisa que pudessem contribuir para futuras discussões sobre o tema. Entretanto, a maioria das informações coleta-das não constituiu foco desse estudo, embora algumas tenham sido analisadas nesse estudo.

Paralelamente, foram realizadas duas entrevistas, uma com o professor doutor de Sociologia da Universidade de Brasília – UnB –, Arthur Costa Trindade, para melhor compreensão do tema, e outra com a professora doutora de Psicologia da Universidade Católica de Brasília – UCB –, Maria Aparecida Penso, com o intuito de aprofundar questões metodológicas.

1ª Etapa –Questionário

Participantes

No período de agosto a outubro de 2005, a SEMSE orientou 513 adolescentes sobre o cumprimento das medidas socioeducativas em meio aberto: Liberda-de Assistida e Prestação de Serviços à Comunidade. Desse total, 120 jovens (aproximadamente 23,4%), com idade entre 12 e 20 anos, afirmaram ter sofri-do violência policial em decorrência da prática de atos infracionais, sendo eles os sujeitos da presente pesquisa.

31 O Sistema de Garantia de Direitos articula e integra as instâncias públicas governamentais e a socie-dade civil na defesa e na promoção dos direitos da criança e do adolescente (SEDH/PR, 2009).

32 Apenas a Subsecretaria de Direitos Humanos, ligada à Secretaria de Estado de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania do Governo do Distrito Federal –SEJUS, no ano de 2008, não permitiu ser entre-vistada pelos pesquisadores da 1ª VIJ/DF. Atualmente, essa Subsecretaria não mais existe.

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Local

Os questionários foram aplicados nas salas de atendimento psicossocial da Seção de Medidas Socioeducativas – SEMSE – da 1ª Vara da Infância e da Juventude do Distrito Federal.

Material

Foi utilizado um questionário (apêndice A), contendo 13 perguntas.

Procedimentos

A partir da resposta afirmativa à questão “Sofreu violência policial em fun-ção do ato infracional?”, (pergunta 3 do item IV do Cadastro dos Adolescentes em Conflito com a Lei, apêndice B), os técnicos da SEMSE informavam sobre a realização da pesquisa, solicitando autorização para o preenchimento de questionário específico sobre a violência policial. Respondido esse instrumen-to, procedia-se aos agradecimentos e firmavam-se os compromissos de sigilo e retorno dos resultados pesquisados.

2ª Etapa –Grupo Focal I

Participantes

Integraram o primeiro grupo focal quatro adolescentes do sexo masculino, com faixa etária de 16 a 20 anos, sendo um preto, dois brancos e um pardo33, todos moradores da cidade de Taguatinga. Desses, dois jovens estavam, tão somente, trabalhando, e os outros apenas estudando. Quanto à situação so-cioeducativa, dois pesquisados haviam sido liberados da medida de Liberdade Assistida, um aguardava o respectivo desligamento oficial pela 1ª VIJ/DF e o outro continuava sob cumprimento.

Data e local

O encontro ocorreu no Centro de Referência Especializada de Assistência So-cial – CREAS – de Taguatinga –no dia 25 de setembro de 2007, no período de 14h30 a 16h30.

33 O indicador de cor ou raça foi definido pela equipe de pesquisa, de acordo com os parâmetros do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.

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Material/recursos

Foram utilizados dois gravadores, quatro fitas cassetes de 90 minutos de dura-ção cada, papéis para fins de registro, canetas esferográficas e vales-transporte.

Procedimentos

Coordenaram o grupo focal I duas técnicas da área psicossocial e uma esta-giária da SEMSE. Os técnicos do CREAS contataram 20 adolescentes para o encontro, todos selecionados pela Seção a partir dos questionários aplicados na primeira etapa da pesquisa. Esses contatos foram reforçados pela Seção na véspera do evento.

O encontro iniciou com o acolhimento dos adolescentes, momento em que fo-ram explicitados os objetivos do grupo focal, feito o pedido de autorização para a gravação do evento e firmado o compromisso de sigilo dos relatos.

Em seguida, com base no roteiro (apêndice C) proposto pelos pesquisadores, os adolescentes discutiram as questões sugeridas. Terminada a discussão, os jovens expressaram interesse em ter acesso ao resultado final da pesqui-sa; compromisso ratificado pela equipe de pesquisa. Finalizado o encontro, procedeu-se aos agradecimentos pela participação dos jovens e foram dispo-nibilizados vales-transporte.

Grupo Focal II

Participantes

Compuseram o segundo grupo focal três jovens: dois do sexo masculino e um do feminino. Os adolescentes possuíam, à época do grupo, as idades de 18 e 19 anos, sendo um preto e outro pardo, ambos moradores da cidade do Para-noá. A jovem contava com 20 anos, de cor parda e moradora da cidade do Re-canto das Emas. Apenas um jovem encontrava-se trabalhando e nenhum dos pesquisados estava estudando. Quanto à situação socioeducativa, um jovem ainda estava sob cumprimento da Liberdade Assistida e o restante já havia sido desligado oficialmente dessa medida pela 1ª VIJ/DF.

Data e local

O grupo focal II ocorreu no auditório da 1ª Vara da Infância e da Juventude do Distrito Federal, dia 07 de maio de 2008, de 14h30 a 16h30.

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A Violência policial na voz dos adolescentes em conflito com a lei | 35

Material/recursos

Foi utilizado um gravador digital, papéis para fins de registro, canetas esfero-gráficas e vales-transporte.

Procedimentos

De acordo com o grupo focal anterior, duas técnicas da SEMSE coordenaram o encontro apoiadas por uma estagiária. Foram contatados 37 adolescentes por telefone e telegrama, porém apenas três compareceram no horário marcado.

O acolhimento dos adolescentes pela equipe da Seção contou com o esclare-cimento dos objetivos do encontro, o pedido de autorização para a gravação dos relatos e o compromisso com o sigilo das informações. A partir da análise dos relatos do primeiro grupo focal, elaborou-se um novo roteiro de questões (apêndice D), sobre o qual os adolescentes discutiram. Finda a discussão, as pesquisadoras se comprometeram a divulgar os resultados do estudo e agradeceram a participação dos jovens no evento. Estes avaliaram o encontro como um espaço para “desabafar”e, ao final, receberam o montante referente às passagens de ônibus.

Entrevista Semi-estruturada

Participou desta entrevista apenas uma adolescente, que já havia sido libera-da da medida de Liberdade Assistida, 19 anos, branca, estudante da 6ª série do Ensino Fundamental e moradora da cidade do Riacho Fundo.

Munidas de um gravador digital, papel e caneta esferográfica, as pesquisado-ras realizaram a entrevista com base no roteiro de discussão e nos procedi-mentos do grupo focal II.

3ª Etapa –Perfil Social

Amostragem

Conforme mencionado anteriormente, no período de agosto a outubro de 2005, a SEMSE orientou 513 adolescentes que foram sentenciados a cumprir Liberdade Assistida e Prestação de Serviços à Comunidade. Desse total, 225 jovens receberam a medida de Liberdade Assistida, cumulada ou não com outras medidas (PSC e Medidas Protetivas).

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O perfil aqui apresentado refere-se a 32,4% (n.=73) do total de 225 jovens, aci-ma mencionado, que responderam afirmativamente à questão “Sofreu violên-cia policial em função do ato infracional?”(pergunta 3 do item IV, do Cadastro dos Adolescentes em Conflito com a Lei – SEMSE.).

Data e local

A análise dos dados ocorreu nos meses de novembro e dezembro de 2007, nas dependências da Seção de Medidas Socioeducativas da 1ª VIJ/DF.

Material

Os dados para a formação do perfil social foram coletados a partir do Cadastro dos Adolescentes em Conflito com a Lei, o qual contemplava, à época da pes-quisa, 55 itens, tais como: identificação completa do adolescente, informações familiares, motivos para a prática do ato infracional, uso de drogas, a ocorrên-cia ou não de violência policial, entre outros.

Procedimento

Inicialmente, os dados foram sistematizados em planilha e posteriormente as informações foram sintetizadas em forma de tabela.

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37

Análise e discussão: o que dizem os dados(...) onde não houver respeito pela vida e pela integri-dade física do ser humano, onde as condições mínimas para uma existência digna não forem asseguradas, onde a intimidade e identidade do indivíduo forem objeto de ingerências indevidas, onde sua igualdade relativamente aos demais não for garantida, bem como onde não hou-ver limitação do poder, não haverá espaço para a digni-dade da pessoa humana, e esta não passará de mero objeto de arbítrio e injustiças.

Ingo Sarlet

Com base nos dados obtidos por meio da aplicação de questionário, das falas apresentadas nos grupos focais e das entrevistas com representantes do Siste-ma de Garantia de Direitos do Distrito Federal, procurou-se responder aos obje-tivos anteriormente descritos. As informações obtidas foram sistematizadas por meio de categorias.

1. A vulnerabilidade social dos adolescentes pesquisados

O perfil mapeado na terceira etapa da pesquisa tomou como base os jovens sen-tenciados na medida de Liberdade Assistida – LA –, cumulada ou não com outras medidas, apresentando aspectos de vulnerabilidade social.

O sexo masculino é marcante neste perfil (95,9%), bem como a faixa etária de 15 a 17 anos (57,5%). Grande parte desses jovens (60,3%) cursava o ensino funda-mental, sendo que 21,9% sequer alcançaram a 5ª série. Aproximadamente 36% não estudavam nem trabalhavam à época do atendimento na SEMSE.

O local de moradia mais citado foi o Recanto das Emas (16,4%) seguido de Ta-guatinga (12,3%) e Ceilândia (11%). O maior número de ocorrência de atos infra-cionais foi registrado na região administrativa de Taguatinga (21,9%), seguida de Samambaia (9,6%) e Recanto das Emas (9,6%).

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Os atos infracionais de maior incidência foram: roubo (52,1%), porte de arma (15,1%) e furto (9,6%). Cerca de 65,8% dos pesquisados não possuíam registro de passagens infracionais anteriores àquela foco da pesquisa na 1ª Vara da In-fância e da Juventude do DF.

A grande maioria das famílias dos jovens era monoparental, sendo visível a pre-ponderância da mãe como a única responsável (54,8%). Apenas 16,4 % dos ado-lescentes tinham como responsáveis o pai e a mãe.

A situação de trabalho mais comum entre as genitoras foi a de estar empregada (17,8%), seguida da condição de autônoma (15,1%).

A renda familiar mais apontada foi a de até dois salários mínimos (60,2%), sendo que 4,1% não possuíam nenhuma renda.

O motivo mais indicado, pelos jovens, para o cometimento de ato infracional re-feriu-se ao suprimento de gastos pessoais (27,4%) com vestuário, diversão, entre outros. Já para os responsáveis, a motivação predominante foi a influência de terceiros (35,6%), popularmente denominados de más companhias.

Quanto ao uso de drogas lícitas e ilícitas, 68,5% indicou ser usuário. A droga de uso lícito mais freqüente foi o cigarro (46,6%) e entre as ilícitas, a maconha, com 8,2%.

2. A abordagem policial

Considera-se abordagem policial:

um encontro entre a polícia e o público, cujos procedi-mentos adotados variam de acordo com as circunstân-cias e com a avaliação feita pelo policial sobre a pessoa com que interage, podendo estar relacionada ao crime ou não.(PINC, 2006).

Utilizando-se de técnicas e meios apropriados, os policiais devem abordar em casos de flagrante delito, mandado judicial e fundada suspeita. Segundo infor-mações de funcionário da Academia de Polícia Militar do Distrito Federal (2008), a abordagem policial deve ser direcionada a uma atitude suspeita e não a um elemento (pessoa) suspeito. O cidadão muitas vezes não se dá conta de que o gesto que está fazendo, como por exemplo, colocar a mão no bolso da calça, pode

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representar para a polícia a retirada de uma arma; daí a necessidade da aborda-gem para verificação (entrevista)34.

Um dos exemplos mais simples de abordagem citado por funcionários da Acade-mia de Polícia Civil (2008) envolve os seguintes passos35: em havendo a suspei-ção, os policiais se apresentam para o cidadão e dão a voz de comando “parado, polícia”; em seguida ordenam que o suspeito fique de costas, coloque as mãos na cabeça e abra as pernas. Estando parcialmente imobilizado, o policial se aproxi-ma e só então procede à revista; encontrando arma, retira-a, avisa aos colegas e a seguir algema o revistado. É solicitado silêncio durante toda a abordagem e, ao final, são explicados os motivos da verificação. Essa é uma técnica que se baseia no uso progressivo da força e no respeito à dignidade humana (entrevista)36.

Considera-se dignidade humana:

um atributo inerente ao ser humano, como um ‘ valor de todo o ser racional ‘ e em virtude disso é que uma pes-soa não pode ser privada de seu direito fundamental – a vida – mesmo tendo violado os direitos dos outros. (SIL-VA, J., s.d. apud JACOB E BIACHI, s.d.).

Em nenhum momento, a regra permite atos como: chutes, socos, tapas ou xinga-mentos. Havendo resistência por parte do suspeito, a contenção será realizada por meio de técnicas que não machuquem e que não são letais. Entretanto, os representantes citados admitiram que em uma abordagem podem ocorrer exces-sos que redundem em lesões.

2.1 O desrespeito à dignidade humana na abordagem policial

A presente pesquisa revelou que, no universo de 513 adolescentes atendidos, 23,4% (n.= 120) admitiram ter sofrido excessos durante a abordagem policial. Os excessos ou atos violentos mais praticados pelos policiais, na fala dos jovens, foram: tapas (17,9%), socos (14,6%), chutes (14,1%) e xingamentos (12,3%), con-forme Gráfico 1. Foi verificado ainda um número considerável de ameaças (9,6%),

34 Entrevista concedida por Deloci Barbosa Chimendez Júnior na Academia de Polícia Militar do Distrito Federal, em Brasília, em agosto de 2008.

35 Não foi possível acessar os manuais utilizados para o manejo da abordagem. Na Academia de Polícia Militar, o documento estava sob revisão. A Academia de Polícia Civil informou não possuir manual, utilizando-se do power point para ministrar as aulas sobre o tema.

36 Entrevista concedida por Maria Aparecida Fontenelli e Paulo César Santana Rodrigues na Academia de Polícia Civil do Distrito Federal, em Taguatinga, em julho de 2008.

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de arma do policial apontada para os jovens (8,3%) e de pisões (6,3%). Ressalte-se que outros atos praticados contra os adolescentes, embora com menor in-cidência, foram bastante graves, tais como: sufocamento (3,7%), tiros contra o jovem (1%) e pauladas (0,8%).

Gráfico 1: Atos violentos praticados por policiais, segundo adolescentes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

algumas apertadas

pauladas

tiros

coronhadas

golpes de cacetete

sufocamento

pisões

arma apontada

ameaça

xingamento

chutes

socos

tapas

outros

0,76

%

0,76

1,01

1,26

2,77

3,70

6,30

8,31

9,57

12,34

14,11

14,61

17,88

6,55

Fonte: SEMSE, 2005.

Com base na figura anterior e na Tabela abaixo, constatou-se grande diversidade de práticas violentas, totalizando 35 tipos de atos.

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Tabela 1: Outros atos violentos praticados por policiais, segundo adolescentes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

Outros atos violentos %

Choques 7,68Cotoveladas 7,68Empurrão 7,68Jogar no camburão de qualquer jeito 7,68Cortes 3,84Ducha fria enquanto dormia 3,84Quebra da ignição do carro do jovem 3,84Puxões 3,84Furos 3,84Proibição de olhar para o policial 3,84Batida de membro no capô do carro 3,84Agressões com o telefone e lista telefônica 3,84Uso de gás lacrimogêneo 3,84Agressão com um rolo de papelão 3,84Enforcamento 3,84Roubo de dinheiro 3,84Cascudo 3,84Arrancamento da unha do adolescente 3,84Abuso sexual 3,84

Cusparadas 3,84Pontapés 3,84Fratura de Osso 3,84Total 100,00

Fonte: SEMSE, 2005.

Apurou-se que, de 116 jovens37, 78,44% (n.=91) afirmaram ter sofrido de dois a doze atos violentos. A fala de um jovem revelou a heterogeneidade das agressões:

“Foi um civil num fiat aí ele me pegou, me jogou no carro dele, me bateu lá dentro e depois me deitou no chão, botou a arma nas costas e começou a me dar chute e

37 A pesquisa foi realizada com 120 jovens, havendo perda de dados sobre os atos violentos em 4 formu-lários.

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mandava eu olhar pra ele, me dava tapa na cara e tudo. Aí chegou um camburão, aí quando o camburão chegou um me pegou pela orelha, outro me deu um tapa nas costas e me jogou dentro do carro e algemaram. Aí quando saía das ruas assim, pas-sava nos quebra-mola no pulo aí me batia assim, tacava a cabeça no carro.”

Segundo alguns jovens, o grau de violência durante a abordagem foi exacerbado, conforme relato abaixo:

“Ah, exagerado, né!. A gente tá rendido, não tem mais o que fazer, não tem prá onde correr, e os caras querem bater na gente.”

“Manda encostar na parede, eles apertam a mão, assim, da pessoa, assim. Dá murro, manda a pessoa abrir a perna, chuta a perna, assim, da pessoa. Dá murro, assim.”

Outro jovem descreveu a criação de instrumentos e o uso do camburão por parte de alguns policiais, com vistas ao cometimento do ato violento:

“Têm uns que andam com uns pneusão, assim, de caminhão, um borrachão só pra bater. É, a borracha assim, um pedaço de pau no cabo, só pra dar umas porradas. Chega estrala.”

“Entra todo mundo no camburão! Aí algemaram com as mãos pra trás, coloco nós 3 no camburão. Aí cheio de quebra-mola e eles foram ‘vvvvvrrrrrummmmm papapapa-pa’, e nós se batendo tudinho lá atrás, não tinha como segurar. Chegou e soltou nós lá bem longe de casa.”

A pesquisa demonstrou que na abordagem policial sofrida pelos adolescentes preponderou a violência física, em torno de 70%, seguida da violência psicoló-gica (xingamento, ameaça, arma apontada), aproximadamente 30% (figura 1). Foi verificado um caso de violência sexual, no qual a jovem informou ter sofrido abuso mediante revista indevida (com toques de sedução) por policiais do sexo masculino:

“Eu sei que ele é PM, autoridade, mas eles num tava no direito de ficar tocando no meu corpo daquele jeito. Podia pegar em qualquer lugar, no meu braço, na minha perna, mas, uai, vai pegar lá! Eu não aceitei.”

Tal situação remete, pelo menos, à contravenção de importunação ofensiva ao pudor, constante na Lei das Contravenções Penais (Decreto Lei 3.688 de 03 de

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outubro de 1941), art. 61, além de ferir a Lei 4898, de 09 de dezembro de 1965, referente ao crime de abuso de autoridade.

Foram constatados, ainda, atos brutais como choques, puxão de unha, fratura de ossos (costelas), enforcamento e sufocamento, os quais sugerem a prática de tortura. Algumas falas retrataram essa realidade:

“Eles seguraram aqui ó (aponta pra garganta), apertando, e perguntando coisa pra mim, aí segurando aqui que não tinha nem como falar... fiquei com falta de ar, chega fiquei mole e caí no chão lá.. E eu oxe como é que eu vou falar? Sendo que não tem nem como.”

“Eles me botaram dentro do camburão, botaram lá o capuz em mim, para mim ca-guetar os outros bichos, né. Foi por isso que eu apanhei, porque eu não falei nada.”

Outro adolescente descreveu o que considera tortura:

“Tortura assim quando tem o outro lá e tá faltando pessoa que tá na rua, e eles sa-bem que tá faltando aí, os que tá preso lá paga. Eles vão lá, tortura até pegar o que tá na rua.(..) Agora quando pega todos juntos lá, eles faz nada não.”

Em todos os casos, os pesquisados se referiram a um tipo de tortura denominada tortura-prova, a qual acontece com vistas à obtenção de informação ou confissão do torturado (Comissão de Direitos Humanos – MPDFT, 2005). Foucault (2007, p.37) avalia a prática da tortura como a ligação entre “sofrimento, confronto e verdade” no corpo de quem a sofre.

Vale lembrar que tais ações são contrárias ao art. 5º, inciso III da Constituição Fe-deral (1988, p. 5) que reza: “ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante”.

O Gráfico 2 demonstra que 42,5% (n.=51) de jovens do total pesquisado (n.=120) informaram as regiões do corpo mais atingidas pelos policiais. A cabeça/rosto foi o alvo mais citado, com 38%, seguido de rins e costelas (16%, respectivamente). Sobressai o fato de que 30% dos adolescentes foram agredidos em várias partes do corpo: pulso, pernas, abdômen, pé, costas, unhas, entre outras.

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Gráfico 2: Regiões do corpo mais atingidas pelos policiais, segundo adolescentes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

16%

16%

30%

38% costelas

rins

várias partes do corpo

cabeça/rosto

Fonte: SEMSE, 2005.

2.2 Conseqüências dos atos violentos

Para 116 adolescentes pesquisados, 39,63% (n.=46) relataram ter sofrido con-seqüências da violência policial. Conforme o Gráfico 3, as mais citadas foram: he-matomas (31%), dores (26%) e inchaço (17%). Com menor expressão apareceram marcas (15%) e cortes/arranhões (11%).

Gráfico 3: Conseqüências da violência policial, segundo adolescentes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

dores

hematomas

cortes e arranhões

inchaço

marcas

26%

31%11%

17%

15%

Fonte: SEMSE, 2005. Nota: Foram consideradas apenas as conseqüências de maior incidência.

A Tabela 2 evidencia o número de atos violentos que tiveram ou não conseqüências para os adolescentes. Em 60,31% (n.=70) dos jovens pesquisados, não houve rela-tos de conseqüências da violência policial, embora tenham sofrido de uma a doze agressões. Entretanto, para cerca de 40% dos adolescentes, que admitiram efeitos danosos na abordagem policial, a prática de dois atos violentos por policiais contra adolescente apresentou-se como a de maior incidência, com 23,28%.

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Tabela 2: A relação entre atos violentos e suas conseqüências, segundo adolescentes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

Atos violentos

Adolescentes pesquisados

Relatos sem conseqüência da violência

Relatos com conseqüência da violência

N N (%) N % N %

1 25 21,55 22 (18,96) 3 (2,58)2 27 23,28 16 (13,79) 11 (9,48)3 18 15,52 13 (11,2) 5 (4,31)4 13 11,21 7 (6,03) 6 (5,17)5 13 11,21 6 (5,17) 7 (6,03)6 8 6,90 2 (1,72) 6 (5,17)7 8 6,90 3 (2,58) 5 (4,31)

8 a 12 4 3,45 1 (0,86) 3 (2,58)Total 116 100,00 70 60,31 46 39,63

Fonte: SEMSE, 2005. Nota: Houve perda de dados em 4 formulários.

As conseqüências de caráter psicológico foram pouco citadas pelos adolescen-tes, apenas 4% dos casos. Um jovem relatou que após a violência sofrida entrou em depressão. Desmotivado, passou a conversar pouco com os familiares, parou de freqüentar a escola, o que lhe valeu a reprovação do 1º ano do Ensino Médio. Superou essa situação com o apoio da família.

Um adolescente chamou a atenção para o fato de que nem sempre os policiais ao agredirem deixam vestígios:

“Mas eles tem um lugar certo de bater que não deixa não. Só fica na hora assim. (...) Nas costelas, assim. Perde a força na hora assim que cai. Gosta também de bater na cara, assim, uns tapas.”

2.3 Motivos da abordagem policial violenta

O principal motivo apontado pela maioria dos participantes nos grupos focais, que leva a polícia a agir com uso excessivo da força durante a abordagem, foi a pobreza aliada à territorialidade, conforme literatura especializada. Para os pes-quisados, as agressões policiais são constantes nas regiões administrativas –

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RAs38 –onde moram adolescentes sob vulnerabilidade econômica. O contrário ocorre quando a abordagem é dirigida para jovens provenientes de classe com melhor condição socioeconômica. Neste caso, os adolescentes afirmaram que os policiais são menos repressivos, como se vê a seguir:

“...aqui no Plano (nome popular da área central de Brasília), eles pegam esses play-boy aí com droga e não bate. Só dá um tapinha na orelha e manda embora pra casa. Por que é filhinho de papai. Agora pega um da favela pra ver, toma um cacete mesmo.”

“Pobre, periferia e mendigo. Os que têm informação, os que têm dinheiro, aí eles num fazem essas coisas não...”

“...eles aliviam os filhos... filho da burguesia. Eles tem medo do pai de um cara desse ser advogado, ser alguma coisa lá e tacar um processo neles. Agora já chega na periferia ‘ah não, nem trabalha’.”

O segundo motivo apontado pelos pesquisados refere-se à abordagem policial com base na aparência física – essa intimamente relacionada ao contexto socio-econômico – e os trejeitos juvenis (falar, andar, entre outros):

“Assim pelo rosto, eles vê, assim, a cara, assim, e pensa que é cara de marginal.”

“O jeito de falar. As gírias.”

“(...) Ele pode ser o malandro que for, um traficantão, mas se ele tá bem arrumado tá todo vestido bem eles não abordam.”

“A roupa. Pra mim é a roupa.“

Outro motivo está relacionado ao abuso de autoridade, o qual sempre vem acom-panhado de violência física:

“Eles se acham muito autoridade e como eles se acham autoridade se vêem no direi-to de fazer qualquer coisa com qualquer um. Então pra eles tudo não presta, estão abaixo deles né.”

“...qualquer coisinha eles têm motivo pra te bater.”

“Ah, muitas das vezes eles aproveitam do uniforme deles que eles usam para agredir (...).”

Ao se sentirem marginalizados pela aparência e por suas expressões juvenis, esses adolescentes se sentem discriminados, sob suspeita o tempo todo, con-tinuamente sob o olhar persecutório de agentes responsáveis pela segurança pública e submetidos a constante vitimização (FERNANDES, 1988 apud SALLAS

38 No Distrito Federal, as cidades são designadas oficialmente pelo termo Regiões Administrativas.

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et al, 1999). Dessa maneira, a abordagem policial correta, que deveria privilegiar as atitudes suspeitas, se constrói sobre a pessoa ou o elemento suspeito.

Além dessas motivações sociais, os adolescentes indicaram outras de âmbito psicológico. Inferiram que os policiais violentos teriam sido vítimas de violência em sua história de vida, reproduzindo as agressões na atuação profissional. As reações violentas poderiam advir também de tensões ocasionadas por proble-mas familiares ou, ainda, quando os agentes se encontram em estado alterado de consciência decorrente do uso de bebida alcoólica:

“Acho que eles apanharam é muito. Pra tratar os outros desse jeito...”

“Problema de casa, leva um bacu lá e vem dá uns bacu na gente bem dado mesmo.”

“E tem uns que bebe ainda também, uns policiais que bebem. Anda meio bêbado e aí gosta de pegar neguinho na rua pra bater.”

Assinalaram ainda que um policial pode se tornar violento mediante influência de outros policiais já acostumados à prática de desvios de conduta, conforme trecho abaixo:

“...E tem policiais que ficam agressivos desse jeito por causa de influência dos pró-prios colegas falam ‘não uai, e porque você não bate também? A gente bate e por-que que você não bate?’ Aí ele ‘ah, então eu vou bater.’ Né? Eu mesmo.. ixi, eu já escutei...”

A abordagem policial violenta também pode se dar para efeitos de correição dos adolescentes, funcionando também como ação preventiva. Essas atitudes, para alguns entrevistados, se justificariam, tendo em vista estarem errados, por des-respeitarem normas sociais:

“Uai, eu acho que eles batem para ‘ah,esse aí apanhou, num vai mais andar com isso’.”

“O policial já pegou com duas armas, mas não me levou para delegacia da civil. Ele pegou, me bateu e mandou embora depois.”

“Mas eu não tava fazendo a coisa certa, tava fazendo a coisa errada, aí depois disso eu parei e pensei, porque é isso que acontece se você tiver fazendo a coisa errada: eles vão te bater. Se você tiver fazendo uma coisa boa eles não vão te bater, se você tiver fazendo uma coisa boa para a sociedade, eles não vão te agredir, pois não há motivo.”

Essas falas exemplificam a banalização da violência embutida em uma aborda-gem policial indevida. Não somente os policiais violentos abraçam a ideologia da violência (MULLER,1995), reforçando a idéia de que os conflitos só podem ser

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resolvidos via agressão física, abuso de autoridade, preconceito e discriminação, como também os próprios adolescentes em conflito com a lei, vítimas da violên-cia institucional, assim entendem.

Os adolescentes pesquisados não mencionaram que a abordagem policial tenha sido violenta em função da questão étnico-racial39. É provável que o mito da de-mocracia racial, no qual se defende a convivência harmoniosa entre as raças no Brasil, possa ainda persistir na visão desses adolescentes, contribuindo para na-turalizar a discriminação racial, ainda que pesquisas comprovem essa realidade, no tocante à violência policial (CANO, 1997).

2.4 A autoridade policial na visão dos adolescentes

Alguns jovens relataram que, para a abordagem ocorrer, o policial precisa estar resguardado pelo seu grupo. O policial, então, afirma sua autoridade quando está com seus pares.

“Eles conseguem poder quando tá lá com o grupinho deles, agora quando pega sozi-nho só fica na manha. Eles podem estar armados e tudo, mas não faz nada. Agora quando tá 2, 3 lá que um já pode chamar o patrulhamento e tudo não acontece nada, eles que é autoridade. Quando tá um só, assim, de folga, num show, alguma coisa assim aí eles não é autoridade não. É isso que acontece mesmo.”

O discurso dos entrevistados foi corroborado nas entrevistas realizadas com re-presentantes das Academias de Polícia do DF, haja vista a abordagem policial correta contemplar dois ou mais policiais, com o intuito de resguardá-los de qual-quer ameaça.

Os adolescentes pesquisados se sentem subjugados diante de um policial que comete abuso de autoridade, ao se intitular detentor de poder:

“Eu tenho poder. Eu posso te bater e você não pode me bater”.

O referido relato expressa um dos conceitos de poder que “é a coação física ou psíquica exercida sobre grupos ou indivíduos que a ela são forçados a se submeterem.”(MIRANDA NETTO et al, 1987).

Quando dividem o mesmo espaço com os policiais durante uma audiência, por exemplo, os entrevistados sentem que ficam em situação de desvantagem, pois o policial “tem moral”, conforme trechos abaixo:

39 Atualmente, prefere-se adotar o termo étnico-racial quando se refere ao segmento negro (Gomes, 2005).

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“No caso também quando dá certo né e chama pra audiência, a voz da polícia é mais alta do que a da gente. O que a gente falou pra eles não é nada.”

“Autoridade tem moral. A gente falou lá e eles falam outra coisa.”

No entanto, durante audiência, quando o jovem consegue se manifestar verbal-mente, usufruindo um espaço de fala que lhe é de direito, expressa possuir certa autoridade frente aos policiais, pois se sente protegido e com credibilidade.

“Porque você vai e fala na frente da polícia aí eles não tão nem aí. Lá dentro, lá mes-mo do julgamento lá, aí eles não podem fazer nada. Aí a gente já tem um pouco de autoridade.”

É importante salientar alguns aspectos sobre a credibilidade dos adolescentes em conflito com a lei no âmbito do SGD/DF. Durante as entrevistas realizadas com operadores do Direito, a equipe de pesquisa foi surpreendida com o discur-so de dois entrevistados que afirmaram que as denúncias realizadas por esses adolescentes não teriam credibilidade, tendo em vista serem autores de atos infracionais.

Talvez a perspectiva de falta de credibilidade (qualidade de ser crível, acreditável) dos adolescentes em conflito com a lei permeie a relação entre estes e a auto-ridade policial. Huggins; Haritos-Fatouros e Zimbardo (2006) comentam sobre a hierarquia de credibilidade, socialmente constituída, a qual pressupõe que os membros mais elevados de uma ordem sejam considerados mais dignos de cré-dito. Ou seja, sua versão da realidade é mais legítima e objetiva, em detrimento da versão daqueles que estão situados em posição hierárquica inferior.

Ainda que, no caso ora estudado, os atores não participem da mesma instituição, o conceito de hierarquia de credibilidade pode ser estendido. Na lógica dessa hierarquia, os policiais, representantes do poder público e responsáveis pela se-gurança, teriam sempre maior credibilidade que os adolescentes em conflito com a lei. Essa é uma lógica que pode estar permeando as ações abusivas, sobretudo quando a versão do jovem sobre a violação de direitos que sofreu é confrontada com a do policial.

A ausência de credibilidade ainda pode estar relacionada não apenas à prática de um ato infracional, mas também a sua reiteração. Contudo, levantamento rea-lizado pela SEMSE, em 2008, sobre as passagens infracionais dos adolescentes pesquisados (n.=120), identificou que 37,5% (n.=45) possuíam apenas a passa-

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gem infracional que foi foco da aplicação do questionário (2005) e 40% (n.=48) não possuíam passagens anteriores a esta40.

2.5 A reação dos adolescentes à abordagem policial

Durante as entrevistas realizadas com instituições do Sistema de Garantia de Direitos, alguns operadores do Direito relataram que adolescentes reagem mais violentamente à abordagem policial que adultos. Porém, as instituições policiais entrevistadas, também partícipes do Sistema, não concordaram com essa asser-tiva. Houve tentativas por parte da SEMSE de pesquisar o assunto, todavia não foram encontrados estudos que comprovem e/ou discutam essa questão.

Para os adolescentes entrevistados, poucos são aqueles que reagem a uma abor-dagem policial, haja vista a polícia estar bem aparelhada para se defender, por meio de armas, cacetetes e algemas:

“Apanha né, porque não tem nada prá defender. Não tem cassetete, não tem revól-ver, não tem nada. A polícia que tem, a polícia tem cassetete, a polícia tem algema pra segurar. Algemou aqui, como é que você vai bater na polícia?”

“Se reagir eles matam, mano.”

“Ué, a única reação que tem é levantar a mão e esperar dar a revista.”

Aqueles que na abordagem retrucam são punidos e os que permanecem calados também, segundo depoimentos:

“Tem uns amigos meus que quando levam um bacu eles ficam respondendo.”

“E os que não respondem também pagam do mesmo jeito. Um respondeu, todos vão apanhar.”

2.6 Sentimentos, imagens e lembranças da abordagem policial violenta

Como vítimas da violência policial, os jovens expressaram os seguintes sentimen-tos, quando são agredidos:

“Ah, vai criando vergonha.”

“Todo mundo olhando né, na rua.”

“Vai criando revolta.”

“Raiva.”

40 O referido levantamento teve apenas um dado perdido.

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Diante de uma provável abordagem, os adolescentes destacaram o medo como prin-cipal reação:

“Toda hora que a gente vê polícia, é o medo de apanhar.”

“Não, eu passo normal, sei que não devo pra ele, passo normal. Só que o coração acelera um pouco, né, quando vejo aqueles farda...”

Todos esses sentimentos levam à seguinte valoração por parte dos jovens:

“Eu não gosto da polícia.”

“Prá mim, que já apanhei muitas vezes, eu não gosto de polícia.”

“Pra mim, a pior coisa é a polícia.”

Para a maioria dos adolescentes dos grupos focais, a imagem do policial violento é aquela que se mescla com a do bandido. Em vez de proteger a população, esse policial inverte o seu papel social, tornando-se referência para a reprodução da violência:

“Pra mim é proteger. (...) Uai, dos bandidos! Ou deles mesmo próprio, né, que a maio-ria dos bandidos agora são eles mesmo.”

“...corrupção, tráfico, por dinheiro, tem cara que faz mesmo.”

“Porque incentiva os outros a fazer besteira, matar, roubar, porque eles batem nos outros, agride. Os outros não gosta aí faz besteira.”

Observou-se, por meio dos discursos, que o sentimento de rejeição à polícia é majoritário e que a imagem dos policiais agressores está vinculada a dos infrato-res. Porém, chamou a atenção que parte dos jovens pesquisados não se vê como transgressores da lei. O tráfico de drogas e o roubo são considerados trabalhos e não violações da lei, tendo em vista a escassez da oferta de empregos para o segmento jovem:

“Por exemplo, eu quero trabalhar sério. Aí onde eu vou todo mundo ‘não,não tem jeito não’. Então você faz é fazer o quê? Tem que roubar e traficar, é o jeito. Tem dinheiro, ganha dinheiro.”

Questionados sobre como ficaram as lembranças dessas abordagens, alguns relataram:

“Pra mim virou foi piada agora, né, pro povo aí. Engraçado e triste ao mesmo tempo.”

“Ah! A dor já passou, né, é passado.”

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2.7 Agressões policiais e mudança de comportamento dos adolescentes

Diante da pergunta se as agressões policiais provocaram mudanças em suas vidas, a maioria dos entrevistados afirmou que não. Nesse sentido, há que se destacar a resposta de três adolescentes, maiores de idade à época da pesqui-sa. Esses jovens ficaram internados provisoriamente41 no Centro de Atendimento Juvenil Especializado – CAJE –, antes de receberem medida socioeducativa. Eis os relatos:

“Não foi nem essa violência não. O que interferiu foi eu ter ficado preso lá. (...) e ver também que aquela vida lá de ficar nas esquinas apanhando da polícia não é boa pra gente não.”

“É o que os vizinhos acham também. Os vizinhos sabem, né, descobrem.”

“Acho que a cadeia é uma lição também. Se não fosse ela talvez nós taria aí até hoje, talvez... aí é arriscado pegar de maior aí e ficar é anos e anos lá.”

Percebe-se que a perda transitória da liberdade para esses adolescentes refletiu muito mais na reparação de seus comportamentos delitivos que as agressões policiais. Em outras palavras, ao fazerem justiça com as próprias mãos, esses agentes públicos contribuem mais para a perpetuação de uma cultura de violên-cia, do que para inibir a prática de novos atos infracionais. De acordo com o ECA, a responsabilização pela transgressão deve ocorrer pela via legal: o cumprimento de medida socioeducativa.

Outro aspecto que merece destaque refere-se à desconstrução do mito da impu-nidade (VOLPI, 2000). Nos grupos focais, os adolescentes relataram que, quando do cometimento do ato infracional, acreditavam que, por estarem na condição de menor de idade, seriam isentos de responsabilização judicial. A frase-clichê “não dá em nada”, presente não somente no discurso dos adolescentes como também no discurso social, sintetiza o mito. Contudo, a resposta da Justiça demonstrou para os pesquisados que sanções judiciais diante do cometimento de atos infra-cionais podem ocorrer, conforme trechos abaixo:

“Eles falam ‘não dá nada’, que a polícia pega, bate ali, leva para DCA e de lá eles soltam, que é de menor, né e pá. Só que tem uma hora que eles vê lá a situação do menor e se agrava o delito ele fica detido.”

“Já tinha duas vezes anterior que me pegaram e só levava lá para delegacia e me soltava. Aí cê fica ‘ah, eles me soltam então ta bom’. Aí na terceira foi batata.”

41 A internação, antes da sentença, é uma medida de cautela por até 45 dias (ECA, 2004, art. 108). É aplicável havendo indícios suficientes de autoria e materialidade e quando a gravidade e a repercussão do ato ensejar a segurança do adolescente, da sociedade e a conclusão do PIA.

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2.8 Reflexões sobre o papel social da polícia e de sua abordagem

Embora o sentimento primordial seja o de não gostar da polícia, a maioria dos jovens entrevistados admitiu a importância do papel da polícia em promover a proteção da sociedade. Alguns ressaltaram que, na falta dos policiais, outra força não legal poderia ocupar-lhes o espaço:

“De proteger, né, a população. Pra mim é proteger, né, é pago pra proteger.”

“Dar segurança para a comunidade, poder andar na rua tranqüilo qualquer hora...”

“Ah, sem a polícia quem vai mandar é os traficantes né.”

Os jovens sugeriram que a atuação policial deveria ocorrer por meio de atitudes educadas e respeitosas durante as abordagens e não por intermédio da prática de atos abusivos:

“...A única necessidade que eles têm é de chegar, fazer a abordagem, revistar, se tiver, sei lá, com revólver, droga, alguma coisa, apreender e levar pra delegacia..”

“Eles tinham que conversar com a pessoa primeiro. Conversar, se a pessoa não ir, eles não partir pra bater, pra violência, mas simplesmente pegar e levar. Pronto e acabou.”

“Pegar, né, levar pra uma delegacia, fazer algum encaminhamento. Incentivar parar, chamar o pai dele pra comparecer.”

“Uai, de todos que, sei lá, chegassem, abordassem, fizessem o papel deles mesmo né... na educação, não chegasse xingando mãe de ninguém, pai de ninguém; che-gasse xingando ninguém.”

Verifica-se que os adolescentes entendem que, quando do ato infracional, devem ser encaminhados à delegacia, com vistas às providências cabíveis. Além disso, a queixa nesses discursos é sempre a mesma: a de que são punidos e, portanto, julgados antes dos procedimentos previstos em lei.

Contudo, a visão de que todos os policiais são violentos durante a abordagem não foi um consenso nos grupos focais. Dois adolescentes avaliaram que nem todos agem com violência:

“(...) porque tem uns que age pelo lado certo, né? E outros não.”

“Nem todos os policiais batem.”

Essas afirmativas poderiam explicar, em parte, a estatística na qual, do total pes-quisado (n.= 513), 23,4 % (n.=120) alegaram ter sofrido violência policial.

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A maioria dos jovens teceu críticas aos procedimentos da polícia, porque, no exercício de suas funções, alguns agentes adotaram procedimentos que feriram direitos humanos, preceitos constitucionais e do ECA. Porém, dois adolescentes admitiram ter interesse em serem policiais, por motivos diversos:

“Eu tenho vontade de virar polícia, mas não é pra querer bater nos outros não, é para só receber o que eles recebem por mês.”

“Já pensei em ser (policial) sim, mas só pra mostrar pra eles como é que é que se trabalha.(...). Se eu conseguir terminar meus estudos, menino, mas eu vou mesmo!”

3. Regiões Administrativas e locais de ocorrência da violência policial

Entre as 29 RAs que formavam o Distrito Federal à época, Taguatinga (14,53%) e Ceilândia (11,97%) despontaram como as cidades de maior incidência da vio-lência policial, conforme Gráfico 4. As regiões de Samambaia, Gama e Brasília apareceram em seguida (9,4% cada uma).

Gráfico 4: Regiões administrativas onde ocorreu a violência policial, segundo adoles-centes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

Riacho Fundo

Recanto das Emas

Paranoá

Sobradinho

Planaltina

Santa Maria

Brasília

Gama

Samambaia

Ceilândia

Taguatinga

outros

4,27

%

5,13

5,13

5,98

6,84

8,55

9,40

9,40

9,40

11,97

14,53

9,40

Nota: As Regiões Administrativas no item Outros são: Brazlândia, Núcleo Bandeiran-te, Cruzeiro, Guará, São Sebastião, Candangolândia e Padre Bernardo –(GO).

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Aproximadamente 81,5% (n.=98) dos adolescentes pesquisados informaram que o ato violento aconteceu em apenas um lugar (Gráfico 5) e 18,5% (n.=22) em mais de um local (Tabela 3), denominado de locais consecutivos.

O Gráfico 5 demonstra que a via pública foi o lugar de maior incidência, com 38% (n.=53) dos casos, seguido de delegacia comum, 26% (n.=35), e viatura, com 16% (n.=22), tanto para apenas um local de ocorrência, como em locais conse-cutivos.

Gráfico 5: Locais de ocorrência da violência policial, segundo adolescentes em confli-to com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

via pública

delegacia não especializada

residência

viatura

DCA

outros

39%

26%

8%

16%

6% 6%

Fonte:SEMSE, 2005. Nota: A categoria “outros” corresponde à escola, terreno baldio, hospital, festas e bar.

É marcante o fato de que a via pública tenha sido o principal espaço da violência, pois, mesmo com a possibilidade de testemunho por parte de cidadãos, imagina-se que os policiais não se sentiram intimidados em agredirem os adolescentes. Outra hipótese, partindo de Chevigny, 1985 (apud MACHADO; NORONHA, 2002), refere-se ao fato de que, para alguns segmentos da sociedade, a violência po-licial, ao ser praticada em desfavor daqueles que infrigem a lei, é considerada aceitável e legítima. Assim, tais segmentos sociais entendem que a soberania da lei aplicada para os jovens infratores não deve ser empregada, o que faz com que a legalidade dê lugar à arbitrariedade. Provavelmente, a prática freqüente de atos violentos em via pública seja apoiada por essa perspectiva.

Chama a atenção que atos violentos tenham ocorrido no âmbito da Delegacia da Criança e do Adolescente – DCA –, mesmo que com menor incidência. Por se tratar de delegacia especializada em registrar atos infracionais cometidos por adolescentes, espera-se, a priori, que não ocorra em seu espaço algum tipo de abuso policial. É importante salientar que, no ano de 2005, havia apenas uma

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delegacia especializada sediada em Brasília, o que determinava a condução dos adolescentes em conflito com a lei de todas as regiões administrativas do DF para essa cidade.

A Tabela 3 ilustra os locais consecutivos nos quais os adolescentes relataram ter sido agredidos. Os mais citados foram viatura e via pública com 22,7% (n.=5), seguida de delegacia e terreno baldio, e delegacia e viatura, com 13,6% (n.=3), respectivamente.

Tabela 3: Ocorrência da violência policial em locais consecutivos, segundo adoles-centes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

Locais consecutivos %

Viatura e via pública 22,7Delegacia e terreno baldio 13,6Delegacia e viatura 13,6Delegacia, viatura e via pública 9,1Delegacia e residência 4,5Delegacia e via pública 4,5Delegacia e hospital 4,5DCA, via pública e viatura 4,5DCA e bar 4,5Viatura e posto militar 4,5Viatura e padaria 4,5DCA e via pública 4,5Via pública e residência 4,5

Fonte: SEMSE, 2005.

Mais uma vez, vale ressaltar que as delegacias, inclusive a DCA, foram palcos de violência policial. Fato incoerente, uma vez que é comum o adolescente, suposto autor de ato infracional, comparecer à instituição policial contido por meio de algemas ou escolta. Diante dessa condição, entende-se que seria desnecessário o uso da força ilegítima (abusiva).

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4. Sobre policiais agressores

4.1 Categorias policiais

Dos 120 adolescentes entrevistados, 66,6% (n.=80) apontaram a categoria po-licial, como autora da violência42. Cinqüenta e oito por cento dos adolescentes, 58%, (n.=47) declararam que a violência sofrida foi perpetrada por policiais mili-tares e 38% (n.=30) por policiais civis. Apenas 4% (n.=3) dos jovens apontaram ambas as polícias como protagonistas do ato violento, sucessivamente, conforme Gráfico 6.

Gráfico 6: Porcentagem de adolescentes em conflito com a lei que identificaram a categoria policial autora da violência, de forma sucessiva ou não, segundo pesquisa da 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

identificaram PM

identificaram PC

identificaram PM e PC58%

38%

4%

Fonte:SEMSE, 2005.

4.2 Identificação nominal dos policiais

Dos oitenta adolescentes que identificaram as categorias policiais, 22,5% (18) conseguiram indicar nominalmente 19 policiais, sendo 11 militares e 8 civis, con-forme Gráfico 7.

42 Houve perda de dados em 33,4% (n.= 40) com relação à identificação dos jovens sobre as categorias policiais. Por outro lado, o questionário aplicado não contemplou a quantificação dos policiais que cometeram atos violentos por adolescentes.

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Gráfico 7: Porcentagem de adolescentes em conflito com a lei que identificaram no-minalmente os policiais militares e civis, segundo pesquisa da 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

não identificaram

identificaram PMs por nome

identificaram PCs por nome

77,5%

13%

9,5%

Fonte: SEMSE, 2005.

A dificuldade de identificação do policial militar soa estranha, uma vez que o uni-forme dessa corporação contém no lado direito do peito tarjeta, velcro ou bor-dado, onde consta a identificação do posto/graduação e o nome de guerra do policial (sobrenome ou primeiro nome). Imagina-se que a reduzida identificação desses policiais, pelos adolescentes, ocorra em função da falta de atenção ou do medo. Ou ainda pela ausência da tarjeta ou velcro no uniforme, fáceis de retirar. Esta hipótese também foi contemplada na pesquisa do Centro de Defesa dos Direitos da Criança e Adolescente – CEDECA – de Interlagos/SP (2006), na qual 86% dos policiais não se encontravam identificados no momento da abordagem.

Pela especificidade do cargo, os policiais civis costumam ser de mais difícil iden-tificação, tendo em vista trabalharem à paisana ou com camisetas, distintivos e coletes da corporação, os quais não trazem a identificação nominal.

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4.3 Lotação

Dos oitenta adolescentes que identificaram a categoria policial, 48,75% (n.=39) informaram a lotação dos policiais autores de atos violentos, somando 15 milita-res e 24 civis.

Segundo o Gráfico 8, as lotações dos policiais militares mais citadas foram o 11º Batalhão de Polícia Militar – BPM/DF – situado na RA de Samambaia (26,67%); o 9º BPM/DF, localizado na RA do Gama (20%) e o 13º BPM/DF situado na RA de Sobradinho (20%); dados esses aferidos nos boletins de ocorrência presentes nos Processos de Infração de Adolescente – PIAs43.

Gráfico 8: Lotação dos policiais militares, segundo adolescentes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

Riacho Fundo | 19º Cpmind1

Taguatinga | 2º BPM

Santa Maria | 14º Cpmind

Planaltina | 14º BPM

Itinerante | Batalhão Escolar2

Sobradinho | 13º BPM

Gama | 9º BPM

Samambaia | 11º BPM

6,67

%

6,67

6,67

6,67

6,67

20

20

26,67

Fonte: SEMSE, 2005. Notas: ¹Trata-se da Companhia de Polícia Militar Independente.² Refere-se ao 6º Batalhão de Polícia Militar do Distrito Federal.

43 O PIA é o processo que visa apurar o ato infracional e aplicar medida socioeducativa. Formalizado pelo Poder Judiciário, contém a apuração desse ato pela DCA, o pronunciamento do MP, a defesa do adoles-cente e a sentença judicial.

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O Gráfico 9 demonstra que as lotações dos policiais civis mais indicadas foram a DCA (20,83%), situada na RA de Brasília, seguida da 21ª Delegacia de Polícia, em Taguatinga com 16,67%, e da 20ª DP no Gama, com 12,5 %.

Gráfico 9: Lotação dos policiais civis por regiões administrativas mais citadas pelos adolescentes, conforme pesquisa realizada pela 1ª VIJ/DF em 2005.

Planaltina | 31ª DP

Gama | 20ª DP

Samambaia | 26ª DP

Ceilândia | 24ª DP

Ceilândia | 23ª DP

Ceilândia | 19ª DP

Ceilândia | 15ª DP

Taguatinga | 21ª DP

Taguatinga | 17ª DP

Taguatinga | 12ª DP

Paranoá | 6ª DP

Brasília | DCA

4,17

%

12,50

4,17

4,17

8,33

4,17

4,17

16,67

4,17

4,17

4,17

20,83

Fonte: SEMSE, 2005.

4.4 Categorias policiais e locais de violência

Observou-se, no cruzamento das categorias policiais com os locais de ocorrência da violência, que, em 28,75% dos casos, a agressão ocorreu em via pública. Nes-se local, a maioria dos adolescentes (27,5%) afirmou que os atos violentos foram protagonizados por policiais militares (Tabela 4); estatística esperada, haja vista essa categoria trabalhar majoritariamente nas ruas.

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Quando a violência muda para o cenário das delegacias comuns e da DCA, são os policiais civis os atores de maior destaque, segundo 23,75% dos jovens. Esse dado é marcante, uma vez que compete às delegacias, especialmente à DCA, registrar o fato ocorrido e garantir a integridade física e moral dos jovens.

Tabela 4: Porcentagem dos adolescentes em conflito com a lei que identificaram as categorias policiais por locais da violência, segundo pesquisa da 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

Locais da violência policial Porcentagem de adolescentes

que identificaram as categorias policiais (%)

(%) Policia Militar Polícia Civil PM e PC

Via pública 28,75 27,5 1,25 0,0Delegacia comum 22,5 5,0 17,5 0,0Locais consecutivos¹ 21,25 8,75 10,0 0,0DCA 7,5 1,25 6,25 2,5Residência 7,5 7,5 0,0 0,0Viatura 6,25 6,25 0,0 0,0Outros2 6,25 2,5 2,5 1,25Total 100,00 58,75 37,5 3,75

Fonte: SEMSE, 2005. Notas: ¹ Refere-se a mais de um local em que o adolescente sofreu violência policial. ² Relaciona-se a locais como: bar, festa, escola, hospital e terreno baldio.

4.5 Categorias policiais e Regiões Administrativas

A Tabela 5 permite observar a relação entre as regiões administrativas em que ocorreu a violência e a porcentagem de adolescentes que apontaram as catego-rias dos policiais agressores. As RAs nas quais a polícia civil aparece com maior freqüência são: Taguatinga (8,75%), Brasília (7,5%), Gama e Ceilândia (5%, res-pectivamente). Já a polícia militar, responsável pelo policiamento ostensivo, apa-rece no relato dos adolescentes com maior ênfase no Gama, Santa Maria e Sa-mambaia, todas com 7,5% cada.

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Tabela 5: Porcentagem de adolescentes em conflito com a lei que identificaram as categorias policiais por RAs de ocorrência da violência, segundo pesquisa da 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

Regiões Administrativas da violência policial

Porcentagem de adolescentes que identificaram as categorias policiais (%)

(%) Policia Militar Polícia Civil PM e PC

Taguatinga 15,0 6,25 8,75 0,0Gama 12,5 7,5 5,0 0,0Brasília 11,25 3,75 7,5 0,0Santa Maria 10,0 7,5 1,25 1,25Ceilândia 8,75 3,75 5,0 0,0Samambaia 8,75 7,5 1,25 0,0Recanto das Emas 7,5 6,25 1,25 0,0Sobradinho 5,0 5,0 0,0 0,0Planaltina 5,0 2,5 1,25 1,25Riacho Fundo 3,75 2,5 0,0 1,25Outras 12,5 6,25 6,25 0,00

Fonte: SEMSE, 2005. Nota: As outras regiões administrativas são: Paranoá, Brazlândia, Núcleo Bandei-rante, São Sebastião, Cruzeiro e Guará. Em um caso não foi coletada a informação sobre a RA.

5. A denúncia da violência policial“Ué, no momento que você chega na delegacia e conta a sua história e eles relatam e fazem alguma coisa. Agora se vai lá, denuncia, e eles relatam e não acontece nada, então isso não é denúncia não, você só chegou lá e contou a sua história. Entrou aqui e saiu ali.”

A fala acima, registrada no grupo focal, descreve como um adolescente compre-endia ser a denúncia. Há uma expectativa, quando de seu depoimento à autorida-de policial, para que esta faça alguma coisa, que dê um retorno, de forma a evitar que suas palavras sejam colhidas em vão.

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Esse entendimento vai, em parte, ao encontro do que Houaiss define ser a de-núncia44:

imputação de crime ou de ação demeritória revelada à autoridade competente; ato verbal ou escrito pelo qual alguém leva ao conhecimento da autoridade competente um fato contrário à lei, à ordem pública ou a algum regu-lamento e suscetível de punição (2009, p.615).

Embora o discurso do jovem esteja conforme com o que se espera de uma de-núncia, os resultados apontados no estudo vão na contramão dessa prática. Con-forme o Gráfico 10, dos 120 adolescentes pesquisados, apenas 20,83% (n.=25) relataram ter denunciado a violência policial em instituições pertencentes ao Sis-tema de Garantia de Direitos. Todavia, nenhum desses relatos tornou-se efetiva-mente uma denúncia formalizada, como se verá a seguir.

Gráfico 10: Adolescentes em conflito com a lei e a denúncia da violência policial, se-gundo pesquisa da 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

não denunciaram

denunciaram

denúcias formalizadas

79,17

%

20,83

0

Fonte: SEMSE, 2005.

5.1 Os motivos da não realização da denúncia

Cerca de 79% (n.=95) não realizaram a denúncia dos atos violentos. Os motivos mais relatados, conforme Tabela 6 foram: não adianta (36,6%), medo de retalia-ção (36,6%) e não sabia que tinha direito à denúncia (20,0%).

44 Neste trabalho, utilizou-se a definição de denúncia apresentada por Houaiss e não o conceito jurídico do termo.

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Tabela 6: Motivos alegados para a não denúncia da violência policial, segundo adoles-centes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

Motivos da não denúncia Frequência %

Não adianta 33 36,66Medo de retaliação 33 36,66Não sabia que tinha direito 18 20,00Não tinha provas 4 4,44Não passou pela cabeça 3 3,33Ninguém perguntou 2 2,22Não considerou violência 2 2,22Porque estava errado 2 2,22Não sabia onde denunciar 2 2,22Outros 4 4,44Não informado 2 2,22

Fonte: SEMSE, 2005. Nota: Em 6,3% dos casos não foi possível coletar os dados.

Em conformidade com os estudos apresentados por Rolim (2004), as respos-tas de maior incidência para a não denúncia encontradas na pesquisa foram “porque não adianta” e “medo de retaliação” com o mesmo percentual: 36,66%. Entende-se que a primeira resposta refletiu a falta de credibilidade desses jovens nas instituições do SGD, principalmente naquelas em que parte dos adolescen-tes relataram ter denunciado e não obtiveram resposta. A fala de um policial, na voz de uma adolescente, demonstrou a consciência da ineficácia do relato das denúncias, seja porque ele, na condição de agente de segurança, tem mais credibilidade e poder legítimo que ela, autora de ato infracional, seja porque a denúncia exige provas:

“Não adianta, vocês quererem denunciar a gente, porque não vai adiantar, a gente é autoridade! E outra, pra denunciar a gente tem que dar muitas provas.”

A outra resposta, medo de retaliação, revelou que o medo, além de ser uma re-ação possível à violência, é também uma de suas conseqüências, sendo ainda um de seus prováveis geradores (CHESNAIS,1999 apud MILANI, 2003). Isso fi-cou explícito no grupo focal quando um adolescente relatou que não se sentia

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seguro para denunciar, porque acreditava que sua denúncia poderia chegar ao conhecimento do policial agressor, ficando então marcado, sob possível revanche a qualquer momento. Assim, o silêncio se apresentou como a melhor forma de autoproteção, expresso na seguinte fala:

“pra mim (...) ir pro IML pra fazer denúncia. Aí eu pensei ‘não, eu vou, faço denúncia, aí vou conversar e eles já me marcou me pega de novo e faz pior. Aí eu...’ deixa quieto.”

“(...) perguntou pra mim ‘você quer fazer denúncia?’(...) eu conheço (...) a gente fica com medo né, a gente sai pra rua e não sabe o que eles vão fazer, né. (...) com os bens materiais, eu tava com uma bicicleta lá e ele disse que era roubada, não tinha documento (...) aí depois eles voltaram pra pegar a bicicleta e não tava lá mais. Aí o advogado ainda falou ‘ué se vocês quiserem a bicicleta, o PM paga ela em 3 vezes’ só que aí minha mãe ficou com medo e falou ‘não, deixa quieto’.”

A terceira resposta mais apontada, “não sabia que tinha direito”, e outras como, “por que estava errado”, “não passou pela cabeça” sugerem que, pelo fato de te-rem cometido atos infracionais, e, portanto, transgredido normas sociais, os jovens abnegaram seu direito de denunciar o abuso policial. Há que se pensar ainda que, frente à repressão, ao “pai de botas”, não há muito o que fazer, apenas se subme-ter à abordagem violenta, já que houve inicialmente uma transgressão da ordem pelos próprios jovens. Em outras palavras, os adolescentes corroboram o discurso social e culturalmente construído pela ideologia da violência: resolução de conflitos apenas por meio da violência e passividade diante dos abusos sofridos.

A resposta “não sabia onde denunciar” vai além da percepção anterior, pois não há a negação do direito de denúncia, mas expressa a falta de orientação sobre esse direito; uma ação que seria também de competência do SGD informar. Nes-se sentido, pode ser que, não somente os jovens pesquisados desconheçam os locais adequados para denunciar, mas toda a população jovem.

Ao serem informados sobre os procedimentos e locais de realização da denún-cia, os adolescentes relataram desconhecimento, conforme a seguinte fala:

“Se no dia lá que eles me pegaram eu soubesse disso, disso aqui, eu tinha denuncia-do pro Disque Denúncia.”

E sugeriram que:

“Devia ter cartaz lá no mural (da escola)... Colocam cartaz lá só de festa. Aí a galera só gosta de festa mesmo.”

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O fato de não denunciar um ato policial violento, porque não considerou violência, pode ser explicado pela banalização da violência, o que traz como conseqüência a visão de que um tapa ou um chute desferido pela autoridade policial não possui o significado de ato abusivo.

5.2 Orientação sobre o direito de denúncia

Quando perguntados se receberam orientação quanto ao direito de denúncia da violência policial, apenas 26% (n.=31) dos 119 adolescentes pesquisados45 re-lataram ter sido orientados. Questionados sobre quem os orientou, o item “ter-ceiros” despontou como principal, com 22,6%. Em seguida, foram considerados como orientadores o IML com 12,9% e a DCA com 9,7%, conforme Tabela 7.

Tabela 7: Orientadores da denúncia, segundo adolescentes em conflito com a lei pes-quisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

Orientador da Denúncia %

Terceiros¹ 22,6IML 12,9DCA 9,7CEAJUR 6,5Delegacia 6,5Família 3,2MPDFT 3,2Policial 3,2Advogado 3,2Escola 3,2Quartel da PMDF 3,2Não informado 22,6Total 100,0

Fonte: SEMSE, 2005. Nota: Foram considerados terceiros: amigos e conhecidos.

Do total de jovens que admitiram ter recebido orientação (n.=31), apenas 25,8% (n.=8) realizaram a denúncia. Embora a pesquisa não tenha questionado o teor

45 Houve perda de um dado do total de 120 jovens.

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da orientação oferecida, é provável que essa orientação não tenha colaborado para a efetivação da denúncia.

5.3 Sobre as denúncias realizadas

Do total de jovens pesquisados, 21%(n=25) relataram ter denunciado as agres-sões policiais e indicaram os seguintes locais de denúncia:

Tabela 8: Instituições onde ocorreu o relato da denúncia, segundo adolescentes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

Instituições onde ocorreram as denúncias %

IML 32,0DCA 24,0DCA e IML 8,0MPDFT 8,0Fórum do Gama 8,0VIJ/DF 4,0CEAJUR 4,0Delegacia 4,0Juizado Especial Criminal 4,0Não informado 4,0Total 100,0

Fonte: SEMSE, 2005.

O Instituto de Medicina Legal – IML – e a Delegacia da Criança e do Adolescente – DCA – apareceram como os principais locais de denúncia pelos entrevistados, com 32% e 24% respectivamente, sendo que apenas 8% realizaram a denúncia em ambos os locais. Imagina-se que o IML despontou como o maior lugar de denúncia, tendo em vista realizar o Laudo de Lesão Corporal (LLC). Segundo in-formações do referido Instituto, o laudo é composto pelo relato da vítima e pelo exame físico dessa efetivado pelo perito. O relato do adolescente deve incluir to-dos os fatos que contribuíram para contusões e marcas em seu corpo.

Quanto à DCA, trata-se da primeira instituição especializada com a qual o jovem se defronta após ter sido apreendido por policiais. Segundo delegados entrevistados,

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ela é um espaço onde o apreendido pode comunicar espontaneamente as agres-sões sofridas ou, quando questionado. Contudo, será mesmo que foi permitida a realização de denúncia nessa delegacia, tendo em vista a ocorrência de violência em suas dependências, conforme 6% dos relatos obtidos na pesquisa (Gráfico 5)?

Chama a atenção que, segundo a Tabela 8, apenas 8% dos jovens admitiram ter denunciado no Ministério Público, órgão responsável pelo controle externo da atividade policial nos termos da Constituição Federal de 1988, art. 129, inciso VII.

5.4 Sobre o retorno dos relatos das denúncias

Cerca de 60% (n.=15) dos jovens denunciantes (n.=25) avaliaram que o relato de suas denúncias foi desconsiderado, conforme ilustra o Gráfico 11.

Gráfico 11: Avaliação quanto ao retorno dos relatos da denúncia, segundo adoles-centes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

4%

60%

8%

28%

desconsiderada

aguardando

não tem conhecimento

não informado

Fonte: SEMSE, 2005.

A desconsideração sentida pela maior parte dos denunciantes não é fantasiosa. A maioria das informações, prestadas pelos jovens que afirmaram ter denunciado a violência no IML e DCA, não foi registrada nos Processos de Infração de Ado-lescente – PIAs – da 1ª VIJ/DF. A fala abaixo exemplifica essa desconsideração:

“...Nós ainda fomos tudo pro IML, eu tava com umas marcas aqui assim, até na boca que também tava machucada, só que não aconteceu nada, fizeram perícia e tudo, mas...”

A partir desse resultado, procurou-se compreender se as denúncias realizadas pelos adolescentes tiveram expressão no âmbito das instituições partícipes do Sistema de Garantia de Direitos, nas quais eles transitaram.

A equipe de pesquisa teve acesso, na 1ª VIJ/DF, a 88% dos PIAs (n.=22) referente aos 25 jovens que relataram ter denunciado a violência policial. Foram encontrados

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apenas dois Procedimentos de Apuração de Ato Infracional – PAAIs46 –, oriundos da DCA, com registro da violência. A Promotoria de Justiça de Defesa da Infância e da Juventude – PDIJ – somente registrou informações sobre as agressões em dois autos. Quanto à Defensoria, houve manifestação em apenas um processo. Consta-tou-se ainda que somente em um PIA houve o registro da denúncia no momento da audiência com despacho do juiz da 1ª VIJ/DF, conforme Tabela 9.

Tabela 9: Registros nos PIAs sobre os relatos de denúncia de violência policial, confor-me pesquisa realizada na 1ª VIJ/DF em 2008.

Registros no PIA N (%)

PAAI –DCA 2 (9%)Parecer –PDIJ 2 (9%)Pronunciamento –CEAJUR 1 (4,5%)Despacho – Juiz da 1ª VIJ 1 (4,5%)

Fonte: SEMSE, 2008.

A pesquisa também selecionou seis PIAs relacionados aos relatos de denúncia de atos brutais (indícios de tortura) para verificação das informações prestadas pelos jovens à SEMSE, conforme demonstra a Tabela 10.

Tabela 10: Registro de atos brutais praticados por policiais contra adolescentes em conflito com a lei nos Processos de Infração de Adolescente – PIAs –, conforme pes-quisa realizada na 1ª VIJ/DF em 2008.

Registros nos PIAs

Atos Brutais por PIA

Informação no PAAI pela DCA

Pedido do LLC pela DCA

Parecer da PDIJ

Pronunciamento da CEAJUR

Despacho do Juiz–1ª VIJ

Sufocamento _ consta _ _ _

Deslocamen-to de ombro _ consta _ _ _

Extração de unha, sufocamento e paulada

_

consta

_ _ _

46 O PAAI integra o PIA e é elaborado pela DCA. Compõe-se dos seguintes documentos: Comunicação de Ocorrência Policial, que registra as circunstâncias do ato infracional; Termo de Declarações do suposto autor do fato e solicitação do Laudo de Lesão Corporal, entre outros.

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Registros nos PIAs

Atos Brutais por PIA

Informação no PAAI pela DCA

Pedido do LLC pela DCA

Parecer da PDIJ

Pronunciamento da CEAJUR

Despacho do Juiz–1ª VIJ

Lesão no ouvido consta _ _ _ _

Fratura de costelas _ _ _ _ _

Choques _ consta _ _ _

Fonte: SEMSE, 2005.

É interessante observar que nos seis PAAIs, cuja autoria é da DCA, só houve regis-tro de violência policial em um procedimento. Constatou-se ainda que nesses PA-AIs, em 9,0 % (n.=2), não houve solicitação, por parte dessa delegacia, do LLC ao IML; justamente naqueles procedimentos onde dois adolescentes sofreram atos brutais, tais como: lesão no ouvido e fratura de costelas. Em ambos os casos, houve ainda a ocorrência de outros atos violentos: tapas, xingamentos, choques, ameaça com arma, chutes, pisões e socos.

Com relação aos PIAs referentes a atos brutais, verificou-se que apenas um pro-cesso continha o resultado do laudo de lesão corporal. Segundo informação da PDIJ, não há previsão legal de que o laudo do IML figure nos autos antes da sen-tença judicial. Também não foi verificada nenhuma manifestação das instituições não policiais do SGD (CEAJUR, PDIJ e 1ª VIJ) sobre tais atos nesses PIAs.

Acredita-se que os jovens denunciantes não tenham tido, por parte das institui-ções do SGD (DCA, CEAJUR, PDIJ e 1ª VIJ), o retorno que esperavam porque o sim-ples relato da violência não significa a institucionalização da denúncia. Essas ins-tâncias podem registrar o relato das agressões, porém devem encaminhá-los ao Núcleo de Controle Externo da Atividade Policial – NCAP – do Ministério Público.

Supõe-se que, com base nas informações obtidas na pesquisa, que DCA, PDIJ, CEAJUR e 1ª VIJ, à época, provavelmente não esclareceram suficientemente aos adolescentes e seus familiares sobre o trâmite da denúncia. A hipótese de que a desinformação possa ter sido um dos fatores que levaram à não denúncia das agressões policiais, há que se tecer um profundo questionamento. Onde se en-contra o espaço de fala desses adolescentes no Sistema de Garantia de Direitos?

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Quais as garantias que esse Sistema tem viabilizado para que adolescentes em conflito com a lei denunciem os abusos de agentes públicos?

O fiel cumprimento, pelo Sistema de Garantia de Direitos, do papel de proteção aos jovens autores de ato infracional, passa pela credibilidade que as instituições desse sistema devem conceder a esses jovens, sob risco de serem alvos cons-tantes de agressões por parte de agentes públicos não compromissados com os direitos humanos e os preceitos constitucionais de direito à vida, a integridade física, a dignidade, entre outros.

Vale ainda salientar que a ausência de uma resposta institucional frente aos re-latos de denúncia das agressões policiais sofridas pelos adolescentes corrobora um dos principais motivos alegados pelos adolescentes para a opção de não se fazer a denúncia, ou seja, “não adianta”. Se o que é dito é desconsiderado, logo não adianta denunciar.

5.5 Um exemplo de percurso da denúncia sobre a violência policial

Os resultados apresentados nesta pesquisa motivaram as pesquisadoras a envi-darem esforços no sentido de procurar compreender o trâmite de uma denúncia sobre violência policial.

A denúncia pode ser informada a várias instâncias do Poder Público, tais como: Disque Denúncia (181 e 33238855) da Secretaria de Segurança Pública do Dis-trito Federal, Polícias Civil e Militar do DF (por meio de suas Corregedorias, Ou-vidorias e Delegacias), Ministério Público do DF e Territórios – MPDFT –, Centro de Assistência Judiciária – CEAJUR – (Defensoria Pública), Câmara Legislativa do DF – CLDF –, Auditoria Militar do Distrito Federal – AMDF –, e Varas da Infância e da Juventude do DF. Também pode ser comunicada à Ordem dos Advogados do Brasil do DF – OAB/DF.

Considerando que, na pesquisa, 36% dos jovens denunciantes informaram ter re-alizado a denúncia em delegacias, optou-se por traçar um percurso, entre vários possíveis, a partir da Delegacia da Criança e do Adolescente – DCA. Tal percurso, ora apresentado de forma bastante sucinta, não visa esgotar o tema, mas indicar alguns passos que possibilitem que a denúncia de violência policial, realizada

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pelo adolescente em conflito com a lei, se transforme em um procedimento de investigação criminal47 passível de encetar uma ação penal pública48.

Após ter sido apreendido em flagrante de ato infracional, o jovem em questão deve ser encaminhado à autoridade policial competente da Delegacia da Criança e do Adolescente, unidade policial responsável pelo registro de delitos praticados por adolescentes. Durante o interrogatório realizado nessa instituição, o jovem pode admitir que sofreu alguma agressão policial e/ou o delegado pode identifi-car indícios de tal violência.

Segundo informações colhidas nessa Delegacia, mesmo quando o adolescente se encontra lesionado, mas nega a autoria do agressor, é de praxe, conforme mencionado anteriormente, ser ele encaminhado ao Instituto Médico Legal com vistas a realizar Laudo de Lesão Corporal. Tal procedimento também ocorre nos casos de apreensão em flagrante por meio da solicitação do LLC Ad Cautelam, (por precaução), com vistas a resguardar a instituição solicitante com relação à existência de algum dano ao jovem frente aos outros órgãos do Sistema de Ga-rantia de Direitos e, ainda, para proteger garantias processuais e constitucionais do próprio adolescente.

Após a realização do exame, o adolescente ficará aguardando intimação da Pro-motoria de Justiça de Defesa da Infância e da Juventude – PDIJ – para compare-cer à oitiva informal49.

Nesse ínterim, o Procedimento de Apuração de Ato Infracional – PAAI –, realizado pela delegacia especializada, é encaminhado para a 1ª VIJ/DF, momento em que será autuado, tornando-se um procedimento judicial denominado Processo Infra-cional de Adolescente – PIA. O PIA segue para a PDIJ, onde receberá o registro da oitiva.

O promotor da PDIJ procede à oitiva informal, entrevistando o adolescente, su-posto autor do ato infracional, “e, em sendo possível, seus pais ou responsável,

47 De competência do Ministério Público, o procedimento de investigação criminal visa apurar a ocorrên-cia de infrações penais de natureza pública. Para maiores explicações, vide glossário.

48 A Ação Penal Pública é o direito ou o poder-dever do Ministério Público de provocar o Poder Judiciário para que decida sobre a prática de um crime.

49 A oitiva informal consiste em entrevista realizada pelo promotor de justiça para diagnosticar os motivos da conduta infracional e as necessidades pedagógicas do adolescente com vistas a oferecer ou não representação para instauração da ação socioeducativa ao juiz.

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vítimas e testemunhas.” (ECA, 2004, art.179, p.46). Segundo informações de um membro da PDIJ (2008), a ocorrência ou não de violência policial é verificada durante o procedimento, seja pela denúncia do adolescente infrator e/ou do res-ponsável, seja por indícios de agressões observados pelo promotor, mesmo que não alegados pelos entrevistados. Nesse sentido, busca-se verificar: a natureza da lesão relatada pelo jovem, sua extensão, se houve prejuízo nas questões mo-toras ou se o jovem encontra-se ainda sob efeito de agressão recente. As provas buscadas fundamentam-se preferencialmente sobre os indícios físicos, os quais, inexistindo, podem ser substituídos por fortes dados testemunhais (entrevista)50. O nome do agressor é uma informação muito importante e, caso seja mencio-nado, constará da peça do Parquet51. Vale ressaltar que, nesse momento, nem sempre é possível contar com o resultado do LLC, haja vista o prazo mínimo para esse resultado ser de 15 dias.

Uma vez registrado o relato da violência na oitiva, a PDIJ envia memorando com cópia de peças extraídas dos autos ao Núcleo de Controle da Atividade Policial – NCAP –, solicitando investigação. Dessa maneira, a PDIJ procura resguardar provas por meio do registro e, assim, evitar que sejam perdidas. Ainda segundo o entrevistado da respectiva Promotoria, o encaminhamento ao NCAP já existia antes do segundo semestre de 2008, porém, a partir desse período, tornou-se uma rotina entre todos os promotores da área infracional.

O NCAP é um órgão adicional do Ministério Público. Foi criado no Distrito Federal pela Portaria nº 799/96 do MPDFT e encontra-se subordinado diretamente ao Gabinete do Procurador-Geral de Justiça. Possui, entre outras atribuições:

exercer o controle externo da atividade policial, na forma da Lei Complementar n.º 75/93, (implementando e ga-rantindo) a preservação da ordem pública, a incolumida-de das pessoas e a integridade do patrimônio público, a prevenção e a correção de ilegalidade e abuso de poder, a indisponibilidade da persecução penal na ação penal pública e a competência dos órgãos incumbidos da se-gurança pública (Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios, 2009).

50 Entrevista concedida por Nino Franco na Promotoria de Justiça de Defesa da Infância e da Juventude, em Brasília, em outubro de 2008.

51 Parquet refere-se ao Ministério Público.

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Compete a esse Núcleo investigar crimes praticados por policial civil, inclusive aqueles referentes à improbidade administrativa e, ainda, crimes de tortura pra-ticados por policiais civis, militares e por bombeiros; desde que, em todas essas situações, o ato tenha ocorrido durante o exercício da função pública.

Outro órgão do MPDFT também responsável pelo controle externo da atividade policial é a Promotoria de Justiça Militar – PJM. É de sua competência investigar crimes militares e de improbidade administrativa cometidos por bombeiros e po-liciais militares em serviço, exceto os casos de tortura.

Tanto o NCAP como a PJM recebem denúncias de abuso policial não apenas da PDIJ e das VIJs, mas do público em geral. Em ambas as instâncias é realizada a triagem para verificar se as solicitações encaminhadas ou diretamente apresen-tadas referem-se às suas esferas de atuação.

Nas situações de envio de memorando pela PDIJ, todos os documentos são ana-lisados nessas instâncias. Não constando na documentação o Laudo de Lesão Corporal, o NCAP e a PJM podem requisitá-lo ao IML. Em seguida, solicitam o comparecimento do denunciante para oitiva, na qual será lavrado o termo de declaração do fato-crime.

Se consideradas consistentes as provas físicas (laudo do IML positivo) e testemu-nhais, o procedimento de investigação criminal instaurado servirá de base para a propositura de denúncia, que será levada às Varas Criminais ou ao Tribunal do Júri52, onde, sendo recebida pelo juiz, tornar-se-á ação penal pública. A denúncia também poderá ser encaminhada à Auditoria Militar, quando o crime for cometi-do por policiais militares contra civis, desde que não doloso contra a vida (como, por exemplo, lesão corporal). Em todas essas situações, o adolescente em confli-to com a lei passa a ocupar a posição de vítima e o agente policial agressor como réu de um processo penal.

Entretanto, se as provas forem avaliadas como insuficientes, o NCAP ou a PJM indicarão o arquivamento do procedimento investigatório, o qual deverá ser ho-mologado por três procuradores de Justiça do MPDFT.

52 O Tribunal do Júri é responsável pelo julgamento de crimes dolosos contra a vida, incluindo aqueles cometidos por militares contra civis. São considerados crimes dolosos “quando o agente quis o re-sultado ou assumiu o risco de produzi-lo.” (CP, art. 18, 1998).

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Com base na análise de um PIA e levantamento feito no NCAP e PJM, foi possível traçar o seguinte percurso da denúncia de violência policial, conforme Gráfico 12:

Gráfico 12: Um exemplo de percurso da denúncia de violência policial, segundo levan-tamento realizado na 1ª VIJ/DF e no SGD/DF em 2008.

Apreensão do adolescente em sua residência

Memorando da denúnciaNCAP ou PJM

(procedimento investigatório criminal)

DCA

VIJ

PDIJ

provas insuficientesINDICAÇÂO DE ARQUIVAMENTO

ProcuradoriaARQUIVAMENTO

provas suficientesDENÚNCIA

Varas Criminais, Tribunal do Júri ou Auditoria Militar

AÇÃO PENAL PÚBLICA

PAAIRequisição doLLC ao IML

Oitivainformal

PIA

Vale salientar que o trâmite da denúncia de violência policial corre à parte do de-senrolar do PIA. Neste, o adolescente é o autor da infração e não, vítima. Por isso, a sentença judicial constante no PIA nunca contempla informações sobre a denúncia.

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5.6 O Laudo de Lesão Corporal

No decorrer da pesquisa, observou-se que o Laudo de Lesão Corporal – LLC – é considerado crucial para a comprovação dos atos violentos e para que a denún-cia realizada pelo adolescente em conflito com a lei se torne um procedimento investigatório criminal.

O referido exame é realizado por peritos legistas mediante solicitação dos se-guintes órgãos: Delegacia da Criança e do Adolescente, Promotoria de Justiça de Defesa da Infância e da Juventude, Centro de Assistência Judiciária, Varas da Infância e da Juventude, Núcleo de Controle Externo da Atividade Policial e Pro-motoria de Justiça Militar.

O LLC é composto de duas partes: o registro do histórico do periciando e o exame físico. Este último é o mais importante, uma vez que o compromisso do profissional se dá com a constatação física de marcas e lesões no jovem. Contudo, conforme mencionado anteriormente, alguns jovens relataram que policiais batem de forma que os vestígios perdurem por pouco tempo ou não apareçam. Tal fato compromete o registro da violência durante o exame físico, pois, embora tenha ocorrido agres-sões, o resultado do laudo pode ser negativo. Além do que, a narrativa do adoles-cente só será considerada para efeito de instauração de procedimento de investi-gação criminal, quando for corroborada pelo resultado positivo do referido laudo.

Esse importante documento apresenta quesitos que procuram avaliar se houve agressão à integridade corporal ou da saúde do periciando por meio do estudo das causas das lesões, dos instrumentos e meios utilizados e da existência ou não de perigo de vida. Também busca verificar se as conseqüências resultaram para o indivíduo alguma incapacidade para ocupações, debilidade, inutilização de membro ou enfermidade incurável. As lesões constatadas podem apresentar graus diferenciados, de leve a gravíssima, sendo possível verificar inclusive casos de tortura, desde que haja vestígios corporais.

A partir do ano de 2005, o IML do DF foi informatizado e os resultados dos laudos puderam ser acessados na internet por todos os delegados, no prazo de 24 h. En-tretanto, conforme já mencionado, o laudo será encaminhado para a autoridade requisitante após 15 dias de sua conclusão.

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Vale ressaltar que o Instituto não avalia a dimensão psicológica da violência, em-bora os dados tenham revelado que aproximadamente 30% dos adolescentes pesquisados sofreram esse tipo de violência.

5.6.1 A análise dos Laudos de Lesão Corporal

Foram analisados 22 PIAs referentes a adolescentes que admitiram ter denuncia-do a violência policial. Desses, seis não continham o pedido de requisição do lau-do do IML. Verificou-se a requisição do referido laudo pela DCA53 em 73% (n.=16) dos autos. Dessas requisições, constatou-se a juntada de 5 laudos, sendo que 4 apresentavam resultado favorável à ofensa da integridade corporal e saúde do adolescente e um resultado negativo à referida ofensa. Nos 11 restantes não constavam os laudos requisitados pela Delegacia.

Diante desse resultado, a equipe de pesquisa requisitou no ano de 2008 à DCA, e esta, por sua vez, ao IML, cópias dos laudos não juntados (n.=11) aos PIAs. Dessas cópias, 5 confirmaram ofensa da integridade corporal e saúde do adoles-cente, 5 foram negativas e em uma não foi possível identificar a resposta. Consta-tou-se então que, dos 16 laudos solicitados pela DCA, 56% (n.= 9) apresentaram resultados favoráveis à ofensa, conforme o Gráfico 13.

Gráfico 13: Resultado dos Laudos de Lesão Corporal solicitados pela DCA ao IML, conforme levantamento realizado pela 1ª VIJ/DF em 2008.

positivo à ofensa

negativo à ofensa

não identificado56%

38%

6%

Fonte: SEMSE, 2005.

Verificou-se que nenhum dos adolescentes, cujos LLCs solicitados pela DCA fo-ram positivos (n.=9), logrou êxito em ver suas denúncias no NCAP e PJM54, órgãos

53 A Delegacia da Criança e do Adolescente pode solicitar o laudo de lesão corporal para a melhor preservação de provas. Os pedidos de LLC pelo MPDFT e VIJ/DF ocorreram em PIAs, cuja solicitação já havia sido realizada pela DCA.

54 A equipe de pesquisa, em 2009, verificou no NCAP e na PJM se havia registro de denúncia relacionada a algum dos 25 jovens que admitiram ter denunciado agressões policiais. Desse total, apenas um inquérito foi aberto na PJM e, posteriormente, arquivado.

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do MP responsáveis pelo controle externo da polícia. Segundo um dos represen-tantes da PDIJ, a rotina de encaminhamento de ofícios, com as queixas dos ado-lescentes sobre as agressões policiais para o NCAP e PJM, se modificou a partir de 2008, tornando-se mais ágil e efetiva. É possível que a irregularidade dessa rotina, em 2005, possa ter prejudicado o encaminhamento da documentação aos órgãos competentes e, portanto, a formalização das denúncias.

Cabem questionamentos quanto aos laudos não juntados: por que esses laudos (n.=11) não foram encaminhados para a DCA, órgão solicitante? Se o foram, por que essa Delegacia não os encaminhou à PDIJ ou a 1ª VIJ para as providências cabíveis, inclusive com vistas à realização de juntada nos PIAs?

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Considerações Finais

A pesquisa buscou dar voz aos adolescentes em conflito com a lei frente aos ca-sos de violência policial sofrida. O tema é relevante, pois é grande a carência de estudos institucionais que enfoquem a relação adolescente em conflito com a lei/ policiais agressores. Outro fator que o torna importante refere-se à necessidade de registrar o índice de violência contra os jovens pesquisados, 23,4%. Embora não tenha sido possível avaliar se tal porcentagem é expressiva, diante do desco-nhecimento dos pesquisadores sobre outras taxas da mesma natureza.

Dar visibilidade à fala desses adolescentes significou incluí-los no paradigma da proteção integral que, segundo o art. 4º do ECA (2004, p.9), é dever do poder público dentre outros, assegurar para crianças e adolescentes a efetivação dos direitos “à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à pro-fissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar comunitária.”

Talvez seja natural, pensarão alguns, que os adolescentes envolvidos na prática de ato infracional não possuam bons sentimentos com relação aos policiais, visto que a polícia é um dos entes que estabelece o limite legal e a contenção desses jovens. Todavia, percebe-se, a partir do relato dos adolescentes, que o sentimen-to de rejeição não diz respeito à instituição Polícia (porta de entrada para o SGD), que é compreendida como necessária para a manutenção da segurança pública. A indignação dos jovens está relacionada à atuação de parte desses agentes pú-blicos, que ao realizar a justiça por seus próprios meios, desconsideram o trâmite legal, fazendo uso de abordagem ilegítima, ilegal, de exclusão e reprodutora da cultura de violência.

Imagina-se que essa forma de abordagem foi um dos fatores que contribuiu para a inviabilização da denúncia por parte dos adolescentes, haja vista os principais motivos por eles alegados: medo de retaliação e não adianta. Além disso, a pes-quisa apontou para o fato de que a não formalização da denúncia ocorreu por desconhecimento dos jovens quanto às instâncias adequadas para esse fim, gerando expectativas ilusórias. Ressalte-se que a desinformação provavelmente

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adveio da precariedade ou falta da orientação fornecida pelas instituições do Sistema de Garantia de Direitos.

Dentro da perspectiva de Cultura de Paz, há que se chamar a atenção para a conduta passiva dos adolescentes pesquisados perante a violência policial. Tal passividade é fruto da impunidade dos policiais agressores, do medo de que suas ameaças se concretizem e da auto-imagem dos jovens, que não se vêem como sujeitos de direitos pelo fato de terem cometido atos delitivos. Por isso, não de-nunciam a violência e, quando o fazem, não cobram do Sistema respostas para suas denúncias.

Concorrentemente, essa passividade ou omissão também se encontra presente no Sistema de Garantia de Direitos, quando se verificam: o não acolhimento das denúncias dos jovens, a ausência dos respectivos registros, bem como a interrup-ção de seu trâmite, conforme demonstrado na análise dos autos selecionados. Trata-se, portanto, de uma segunda violência institucional – a primeira ocorre durante a abordagem policial – que gera, por parte dos usuários, descrédito e desconfiança nas instituições do Sistema.

Nesse sentido, é importante questionar de que forma o SGD tem atuado para mu-dar essa realidade e conquistar a confiança dos seus usuários. De qual Sistema estamos falando senão daquele cujo objetivo principal é de “articulação e inte-gração das instâncias públicas governamentais e da sociedade civil, na aplicação de instrumentos normativos e no funcionamento dos mecanismos de promoção, defesa e controle para a efetivação dos direitos da criança e do adolescente, nos níveis Federal, Estadual, Distrital e Municipal”(Secretaria Especial de Direitos Hu-manos, 2009). Entende-se que o papel dos integrantes desse sistema é proteger sujeitos em desenvolvimento por meio da escuta, da informação, do encaminha-mento e do acompanhamento responsável de suas demandas. Dar voz a esses jovens significa acreditar que a condição de adolescente em conflito com a lei não exclui a importância do seu relato.

O discurso presente na sociedade de que a luta pelos Direitos Humanos é voltada para a proteção de bandidos e não das vítimas é equivocado. Coibir as práticas violentas e a violação dos direitos dos cidadãos, independentemente da condição de agressor ou vítima, além de ser um dos objetivos da defesa desses direitos, é

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também um caminho para a construção de uma segurança pública efetiva e de uma sociedade pacífica.

Para tanto, tornam-se necessários mecanismos de controle para os executores da Segurança Pública, bem como a inserção dos cidadãos nas políticas de proa-tividade do setor, como, por exemplo, o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania – PRONASCI55– desenvolvido pelo Ministério da Justiça.

Ainda sobre as polícias, Soares apresenta discernimento ao dizer que:

As polícias, elas não existem, na democracia, para ser algozes de negros e pobres, ou para servir às elites e proteger as camadas médias, erigindo cercos sanitários em torno das “classes perigosas”. Elas podem livrar-se do fardo que as têm condenado ao destino infausto que tem sido o seu, a despeito da paradoxal coincidência de cor e classe, que promovem, entre os algozes e suas ví-timas. As polícias podem ser instituições democráticas, que defendem direitos e liberdades, reparando e preve-nindo injustiças e violações, em benefício da cidadania e da disseminação dos princípios de eqüidade que a re-gem. Se podem sê-lo, é nosso dever, enquanto nação, fazê-las assim (prefácio apud Ramos, 2005, p. 12).

A partir dos resultados demonstrados nesta pesquisa, é evidente a necessidade de melhoria das ações do SGD frente à violência policial. Para tanto, acredita-se que seja urgente a realização de um seminário sobre a temática no Distrito Fe-deral com vistas a discutir e implementar medidas que a coíbam, em favor dos adolescentes em conflito com a lei e outros segmentos sociais, e que melhorem o fluxo da denúncia de tal violência. A presente pesquisa – a ser publicada pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios – poderá ser apresentada e discutida nesse evento.

Uma das propostas a ser levada ao seminário, ou ser implementada o mais breve possível, baseia-se na formação de uma comissão interinstitucional do SGD/DF para aprimorar o trâmite da denúncia de violência policial e a divulgação do re-sultado dessa denúncia para os seus propositores. Assim, deve-se chamar a aten-

55 O PRONASCI “articula políticas de segurança com ações sociais; prioriza a prevenção e busca atingir as causas que levam à violência, sem abrir mão das estratégias de ordenamento social e segurança pública.”(PRONASCI, 2007).

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ção para a necessidade de que os operadores do Direito registrem nos Processos Infracionais de Adolescente os relatos dessas denúncias, por eles observados e/ou manifestados pelos próprios adolescentes e seus responsáveis, bem como os respectivos encaminhamentos para os órgãos competentes de apuração.

Outro fator premente está ligado à criação de bancos de dados no Núcleo de Con-trole da Atividade Policial e na Promotoria de Justiça Militar que permitam identi-ficar as denúncias realizadas pelos adolescentes e os procedimentos efetuados, inclusive, se for o caso, com os resultados das ações penais encaminhadas.

Além da violência física cometida contra adolescentes, há que se pensar sobre a importância de averiguar a violência psicológica sofrida durante a abordagem policial e quais os meios de aferi-la, uma vez que essa é real, constante e gera conseqüências.

Sobre as instituições policiais, os autores da pesquisa entendem que é funda-mental a elaboração de normas, regulamentos e políticas claras de atuação, den-tro de marcos de referências legais e institucionais. Faz-se imprescindível ainda a seleção e capacitação continuadas dos policiais em observância à política de direitos humanos, conforme já vêm sendo realizadas pela Secretaria Nacional de Segurança Pública, com foco especial sobre o Estatuto da Criança e do Adoles-cente. Ressalte-se também a importância da divulgação de dados sobre a letali-dade e outros referentes à violência policial.

Não se pode ausentar as comunidades do DF desse processo e, portanto, imagi-na-se que a discussão sobre o tema apresentado pela pesquisa possa alcançar as escolas de ensino fundamental e médio por meio de seus Conselhos de Segu-rança Escolar ou outras entidades afins. Pode-se pensar também na elaboração e distribuição de cartilhas educativas como já o fizeram o CEDECA Interlagos/ SP e a Promotoria de Justiça de Ceilândia-DF. E, ainda, fortalecer a criação de novos territórios de paz, propostos pelo PRONASCI.

A participação de diversos segmentos sociais para elaboração de uma política de segurança pública deve ser privilegiada, a exemplo das Conferências Estaduais de Segurança Pública ocorridas em diversos estados brasileiros, incluindo o Dis-trito Federal, em 2009. Nessas, o tema “A violência policial contra adolescentes em conflito com a lei” poderia ser debatido.

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A discussão sobre o tema com a intelligentsia deve ser incentivada, abarcando participantes do SGD, organizações não governamentais envolvidas, comunida-des e instituições de pesquisa. Nesse sentido, sugere-se, para futuros estudos, o aprofundamento de algumas questões, tais como: a percepção dos operadores do direito pertencentes ao SGD a respeito dos adolescentes em conflito com a lei, vítimas de violência policial, e o estudo sobre o trâmite da denúncia e seus mecanismos de acesso pelo usuário. Essas questões se fazem necessárias com vistas a aprimorar a relação entre adolescentes em conflito com a lei e operado-res do direito, e ainda sobre o reconhecimento e conseqüente exercício do direito de denúncia por esses jovens.

Por fim, há que se destacar o objetivo estratégico V da Diretriz 13 do Plano Na-cional de Direitos Humanos 3 (2009, p. 116), que busca “garantir aos grupos em situação de vulnerabilidade o conhecimento sobre serviços de atendimento, ati-vidades desenvolvidas pelos órgãos de segurança e mecanismos de denúncias, bem como a forma de acioná-los.”

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Lista de gráficos

Gráfico 1: Atos violentos praticados por policiais, segundo adolescentes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005. 40

Gráfico 2: Regiões do corpo mais atingidas pelos policiais, segundo adoles-centes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

44

Gráfico 3: Conseqüências da violência policial, segundo adolescentes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005. 44

Gráfico 4: Regiões administrativas onde ocorreu a violência policial, segun-do adolescentes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

54

Gráfico 5: Locais de ocorrência da violência policial, segundo adolescentes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

55

Gráfico 6: Porcentagem de adolescentes em conflito com a lei que identifi-caram a categoria policial autora da violência, de forma sucessiva ou não, segundo pesquisa da 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

57

Gráfico 7: Porcentagem de adolescentes em conflito com a lei que identifica-ram nominalmente os policiais militares e civis, segundo pesquisa da 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

58

Gráfico 8: Lotação dos policiais militares, segundo adolescentes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005. 59

Gráfico 9: Lotação dos policiais civis por regiões administrativas mais ci-tadas pelos adolescentes, conforme pesquisa realizada pela 1ª VIJ/DF em 2005.

60

Gráfico 10: Adolescentes em conflito com a lei e a denúncia da violência policial, segundo pesquisa da 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005. 63

Gráfico 11: Avaliação quanto ao retorno dos relatos da denúncia, segundo adolescentes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

68

Gráfico 12: Um exemplo de percurso da denúncia de violência policial, se-gundo levantamento realizado na 1ª VIJ/DF e no SGD/DF em 2008. 75

Gráfico 13: Resultado dos Laudos de Lesão Corporal solicitados pela DCA ao IML, conforme levantamento realizado pela 1ª VIJ/DF em 2008. 77

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Lista de tabelas

Tabela 1: Outros atos violentos praticados por policiais, segundo adolescen-tes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

41

Tabela 2: A relação entre atos violentos e suas conseqüências, segundo ado-lescentes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

45

Tabela 3: Ocorrência da violência policial em locais consecutivos, segundo adolescentes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

56

Tabela 4: Porcentagem dos adolescentes em conflito com a lei que identifica-ram as categorias policiais por locais da violência, segundo pesquisa da 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

61

Tabela 5: Porcentagem de adolescentes em conflito com a lei que identifi-caram as categorias policiais por RAs de ocorrência da violência, segundo pesquisa da 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

62

Tabela 6: Motivos alegados para a não denúncia da violência policial, segun-do adolescentes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

64

Tabela 7: Orientadores da denúncia, segundo adolescentes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005. 66

Tabela 8: Instituições onde ocorreu o relato da denúncia, segundo adoles-centes em conflito com a lei pesquisados na 1ª VIJ/DF, de agosto a outubro de 2005.

67

Tabela 9: Registros nos PIAs sobre os relatos de denúncia de violência poli-cial, conforme pesquisa realizada na 1ª VIJ/DF em 2008. 69

Tabela 10: Registro de atos brutais praticados por policiais contra adolescen-tes em conflito com a lei nos Processos de Infração de Adolescente – PIAs –, conforme pesquisa realizada na 1ª VIJ/DF em 2008.

69

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Glossário

Audiência: é uma sessão em que o Juiz ouve as partes, determinando medidas ou proferindo decisões sobre questões trazidas a seu conhecimento. Participam dela também o Promotor de Justiça e o defensor do jovem.

Cultura de Paz: Constitui-se de “valores, atitudes e comportamentos que refletem o respeito à vida, à pessoa humana e à sua dignidade, aos direitos humanos, entendidos em seu conjunto, interdependentes e indissociáveis. Viver em uma Cultura de Paz sig-nifica repudiar todas as formas de violência, especialmente a cotidiana, e promover os princípios da liberdade, justiça, solidariedade e tolerância, bem como estimular a com-preensão entre os povos e as pessoas.”( UNESCO, 2003, apud MILANI, 2003, p. 36).

Discriminação racial: O Decreto 65.810, de 08 de dezembro de 1969, que promulga a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, ado-tada pela Assembléia Geral das Nações Unidas, compreende na parte I, art. I, ser a discriminação racial “qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha por objeto ou resultado anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício em mesmo plano de liberda-des fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer campo de sua vida pública.”(Brasil, 1969).

Não-violência: Também conhecida como ahimsa, palavra de origem sânscrita, utiliza-da por Mohandâs Karamchand Gandhi enquanto prática de luta pela independência da Índia, pelo fim do sistema de castas indiano, em favor da liberação das mulheres e contra o enfrentamento entre hindus e mulçumanos. Ahimsa significa a desistência de causar algum tipo de dor ou dano a qualquer ser humano ou a outra criatura, nos âmbitos da ação, da fala e do pensamento tanto no nível individual como coletivo. A Não-violência parte do pressuposto de que o conflito é inevitável e deve ser resolvido de forma pacífica, com a cooperação entre as partes. Não ausência dessa coopera-ção, usa-se estratégias sociais para pressionar o adversário: manifestações, greves, boicote econômico, jejum, desobediência civil, entre outros. O adversário é visto como um ator social, que desempenha papéis sociais e por isso, sua pessoa deve ser pre-servada para além de seu posicionamento numa dada estrutura social.

Preconceito: Refere-se a toda “atitude, fenômeno intergrupal dirigido às pessoas ou grupos de pessoas; é predisposição negativa contra alguém; algo sempre ruim:

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predisposição negativa, hostil, frente a outro ser humano; desvalorização do outro como pessoa, considerando indigno de convivência no mesmo espaço, excluído moralmente.”(LOPES, 2005, p. 188, apud LUZ, (200-?), p.5).

Procedimento Investigatório Criminal: A Resolução nº 13, de 02 de outubro de 2006, do Conselho Nacional do Ministério Público, determina em seu art. 1º que o procedi-mento investigatório criminal é o “instrumento de natureza administrativa e inquisito-rial, instaurado e presidido pelo membro do Ministério Público com atribuição criminal, e terá como finalidade apurar a ocorrência de infrações penais de natureza pública, servindo como preparação e embasamento para o juízo de propositura, ou não, da respectiva ação penal.” (BRASIL, 2006). Essa infrações penais, como por exemplo, os crimes contra a vida (homicídio, lesão corporal grave, entre outros), não dependem da iniciativa do particular para que seja iniciada a ação penal pelo Ministério Público.

Remissão Ministerial: “A remissão consiste no perdão e é uma forma de excluir, extin-guir ou suspender o processo de apuração do ato infracional. (...) A remissão ministe-rial é aquela de competência do Ministério Público e gera a exclusão do processo de apuração do ato infracional.” (BARRETO, 2008) Ela “não implica necessariamente o reconhecimento ou comprovação da responsabilidade (do adolescente suposto auto de ato infracional), nem prevalece para efeito de antecedentes, podendo incluir even-tualmente a aplicação de qualquer das medidas previstas em lei, exceto, a colocação em regime de semiliberdade e a internação.”(ECA, 2004, art. 127, p.35).

Resiliência: É a propriedade de retornar à forma original após ter sido submetido a uma deformação. Do ponto de vista psicossocial, a resiliência é entendida como a retomada do curso favorável do desenvolvimento, mesmo com a vivência de situa-ções adversas, desenvolvendo-se uma capacidade de adaptação contextual coerente e saudável.

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Apêndices

A – Questionário sobre violência policial

Autos Nº: Iniciais do adolescente:

Data da entrevista:

a) Tipos de atos violentos praticados por policiais:

( ) Ameaça ( ) Arma apontada para o jovem ( ) Choques

( ) Chutes ( ) Cortes ( ) Golpes de cacetete

( ) Pauladas ( ) Pisões ( ) Socos

( ) Sufocamento ( ) Tapas ( ) Xingamento

( ) Outros:

b) Circunstâncias da violência:

1. Região Administrativa:

2. Onde ocorreu a violência?

( ) Delegacias: ( ) Via pública

( ) Escolas ( ) Viatura policial

( ) Outros:

3. Identificação dos policias:

Nome/ Alcunha:

Lotação dos Policiais:

c) Sobre a denúncia:

1. Denunciou contra a violência?

( ) Sim Local da denúncia:

Conseqüências:

( ) Não Por que não denunciou?

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( ) Medo de retaliação ( ) Intimidação

( ) Não adianta ( ) Porque estava errado

( ) Não sabia que tinha direito à denúncia ( ) Outros:

2. Recebeu orientação/informação sobre o direito de denúncia?

( ) Sim Onde?

( ) Não

d) Houve seqüelas da violência?

( ) Sim Quais?

( ) Não

B – Cadastro dos adolescentes em conflito com a lei

CADASTRO DOS ADOLESCENTES EM CONFLITO COM A LEI

I. DADOS GERAIS:

Autos Nº: Ato infracional:

Local da infração: Data da infração:

Internação provisória: (horas / dias) Data da sentença:

MSE: Período:

Medida Protetiva: inciso(s):

Infrações anteriores: MSE e MP anteriores:

Entrevistador: Data da entrevista:

II. DADOS DO ADOLESCENTE:

1. Identificação:

Adolescente:

Sexo: ( ) Masculino ( ) Feminino Data de nascimento:

Filiação:

Endereço:

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Fones:

Estado Civil: ( ) solteiro ( ) casado ( ) união estável ( ) separado

Grau de instrução:

Ensino Fundamental: _______ série ( ) Alfabetizado

Ensino Médio: ________série ( ) Superior

Supletivo: _______ série ( ) Não alfabetizado

2. Atividades realizadas:

Estuda? ( ) Sim ( ) Não

Escola:

Turno de estudo: ( ) Matutino ( ) Vespertino ( ) Noturno

Em caso de não estudar, por que parou?

( ) desmotivação ( ) falta de vaga na escola ( ) violência

( ) dificuldade de aprendizagem ( ) trabalho ( ) outros:

Trabalha?( ) Sim ( ) Não Ocupação atual:

III. DADOS FAMILIARES

1. Convívio familiar:

O jovem reside com quem?

( ) mãe ( ) pai( ) madrasta ( ) padastro ( ) sozinho

( ) parentes. Quantos? Quais?

( ) outros. Quantos?Quais?

2. Dados sobre os responsáveis (pais ou outros):

Responsável 1:

Vínculo com o jovem: * Ocupação: ( )Endereço/Fone:

Responsável 2:

Vínculo com o jovem: * Ocupação: ( ) Endereço/Fone:

* Use os seguintes códigos: 1–empregado 2–do lar 3–desempregado 4–aposenta-do5–autônomo 6–empregador 7–pensionista 8–outras

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3. Renda familiar:

Renda líquida total da família (exceto benefícios):

Benefícios:

Valor: Discriminação:

IV. DADOS SOBRE OS ATOS INFRACIONAIS:

1.Motivo do ato infracional:

Jovem:

( ) para suprir gastos pessoais ( ) para proteger-se e/ou a terceiros

( ) influência de terceiros ( ) para aquisição de drogas

( ) nega a autoria da infração ( ) estava sob o efeito de drogas

( ) outros:

Responsável:

( ) Influência de terceiros ( ) O (A) jovem não cometeu a infração

( ) Não havia motivo para tal conduta ( ) Não acata orientações

( ) O (A) jovem estava sob o efeito de drogas ( ) Outros:

2.Uso de drogas (substâncias psicoativas – SPA)

Faz uso de drogas? ( ) Sim ( ) Não

Quais? ( ) cigarro ( ) álcool ( ) maconha ( ) merla

( ) cocaína ( ) inalantes ( ) injetáveis ( ) medicamentos

( ) crack ( ) ignorada ( ) outras:

Droga mais utilizada: Freqüência do uso:

3. Violência policial:

Sofreu violência policial em função do ato infracional? ( ) sim ( ) não

(Em caso positivo, registrar maiores informações no dossiê).

4. Síntese do ato infracional (incluir período de internação provisória):

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103 A Violência policial na voz dos adolescentes em conflito com a lei | 103

5. Encaminhamentos da SEMSE ( Registrar na fl. de evolução da SEMSE as informa-ções de caráter reservado:)

C – Roteiro do grupo focal I

Seção de Medidas Socioeducativas – SEMSE

Pesquisa “A Violência Policial na Voz dos Adolescentes em Conflito com a Lei”

Grupo Focal I

Roteiro do Grupo Focal

I – Objetivo do encontro

Tema: pesquisa sobre a violência policial

Observações: sigilo dos depoimentos, autorização para a gravação, seminário com as autoridades para discutir o tema.

II – Apresentação dos participantes

Em dupla, caso compareçam mais de 4 jovens.

III –Roteiro de perguntas

1) O que vocês acham sobre a abordagem policial?

2) Como foi a abordagem dos policiais no momento do ato infracional cometido por vocês?

3) Qual foi a reação de vocês nessa abordagem?

4)Há diferenças entre a abordagem da polícia civil e da polícia militar?

5) O que vocês acham sobre a abordagem policial no seu local de moradia? É diferen-te de outros lugares?

6) Qual deveria ser o papel da polícia?

7) Qual é a imagem/sentimento/palavra que vem a cabeça de vocês sobre a polícia?

8) O que vocês pensam sobre a denúncia de violência policial?

IV) Lanche de confraternização e distribuição das passagens.

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D – Roteiro do grupo focal II

Seção de Medidas Socioeducativas – SEMSE

Pesquisa “A Violência Policial na Voz dos Adolescentes em Conflito com a Lei”

Grupo Focal II

Roteiro do grupo focal

I – Objetivo do encontro

Tema: pesquisa sobre a violência policial

Observações: sigilo dos depoimentos, autorização para a gravação, seminário com as autoridades para discutir o tema.

II – Apresentação dos participantes

Em dupla, caso compareçam mais de 4 jovens.

III –Roteiro de perguntas

1) O que vocês acham sobre a abordagem policial?

2) Como foi a abordagem dos policiais no momento do ato infracional cometido por vocês?

3) Qual foi a reação de vocês nessa abordagem?

4) Há diferenças entre a abordagem da polícia civil e da polícia militar?

5) O que vocês acham sobre a abordagem policial no seu local de moradia? É diferen-te de outros lugares?

6) Como vocês foram recebidos nas Delegacias, na DCA e no IML quando cometeram esse ato infracional?

7) Qual deveria ser o papel da polícia?

8) Alguém aqui já pensou em ser policial?

9) Qual é a imagem/palavra que vêm a cabeça de vocês sobre a polícia?

IV) Avaliação do encontro

1) Que acharam desse encontro?

2) Alguém gostaria de participar do seminário de apresentação da pesquisa?

V) Lanche de confraternização e distribuição das passagens.

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105 A Violência policial na voz dos adolescentes em conflito com a lei | 105

Lista de abreviaturas e siglas

AMDF – Auditoria Militar do Distrito Federal

BPM/DF – Batalhão de Polícia Militar do Distrito Federal

CAJE – Centro de Atendimento Juvenil Especializado

CEAJUR – Centro de Assistência Judiciária

CEDECA Interlagos/SP – Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Interlagos /São Paulo

CLDF – Câmara Legislativa do Distrito Federal

CPMInd – Companhia de Polícia Militar Independente

CREAS – Centro de Referência Especializada de Assistência Social

DCA – Delegacia da Criança e do Adolescente

DF – Distrito Federal

DP – Delegacia de Polícia

DPCA – Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente

ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente

GCM – Guarda Civil Metropolitana

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IHA – Índice de Homicídios na Adolescência

ILANUD – Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para Prevenção do Delito e Tratamento do Delinqüente

IML – Instituto Médico Legal

IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

LA – Liberdade Assistida

LLC – Laudo de Lesão Corporal

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MPDFT – Ministério Público do Distrito Federal e Territórios

NCAP – Núcleo de Controle da Atividade Policial

NEV/USP – Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo

OAB – Ordem dos Advogados do Brasil

PAAI – Procedimento de Apuração de Ato Infracional

PCDF – Polícia Civil do Distrito Federal

PDIJ – Promotoria de Justiça de Defesa da Infância e da Juventude

PIA – Processo de Infração de Adolescente

PJM – Promotoria de Justiça Militar

PMDF – Polícia Militar do Distrito Federal

PRONASCI – Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania

PSC – Prestação de Serviços à Comunidade

RA – Região Administrativa

SEDH/PR – Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República

SEJUS – Secretaria de Estado de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania

SEMSE – Seção de Medidas Socioeducativas

SENASP – Secretaria Nacional de Segurança Pública

SGD – Sistema de Garantia de Direitos

SGD/DF – Sistema de Garantia de Direitos do Distrito Federal

TJDFT – Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios

UCB – Universidade Católica de Brasília

UnB – Universidade de Brasília

VIJ/DF – Vara da Infância e da Juventude do Distrito Federal

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1ª Vara da Infância e da Juventude do Distrito Federal

SGAN 909, Módulos C/D Brasília –DF

Cep: 70790-090

Seção de Medidas Socioeducativas –SEMSE

Fones: 33486655/33486677/33486642

Contatos:

[email protected]

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