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  • Cmara dos DeputadosPraa dos 3 PoderesConsultoria LegislativaAnexo III - TrreoBraslia - DF

    SELEO DOS MAGISTRADOS NODIREITO PTRIO E COMPARADO.

    VIABILIDADE LEGISLATIVA DE ELEIODIRETA DOS MEMBROS DO SUPREMO

    TRIBUNAL FEDERAL.Regina Maria Groba Bandeira

    Consultora Legislativa da rea IDireito Constitucional, Eleitoral, Municipal, Administrativo,

    Processo Legislativo e Poder Judicirio

    ESTUDOFEVEREIRO/2002

  • 2 2002 Cmara dos Deputados.

    Todos os direitos reservados. Este trabalho poder ser reproduzido ou transmitido na ntegra, desde que

    citados o(s) autor(es) e a Consultoria Legislativa da Cmara dos Deputados. So vedadas a venda, a reproduo

    parcial e a traduo, sem autorizao prvia por escrito da Cmara dos Deputados.

  • 3O s Estados adotam variados mtodos derecrutamento de seus rgos singulares(juzes) e membros de seus rgos colegiados(desembargadores e ministros de tribunais). Os mais conhecidosso a eleio popular, a livre nomeao do Executivo, a nomeaopelo Executivo condicionada proposta dos tribunais, anomeao pelo Executivo aps aprovao por corpos polticos eo concurso pblico.

    O jurista argentino EUGNIO ZAFFARONIprope interessante classificao das estruturas judicirias.Aquelas nas quais o ingresso e demisso dos juzes ocorre porjuzo poltico seguiriam o modelo emprico-primitivo. Nos casosem que h a exigncia de seleo tcnica, carreira estruturada econcentrao do poder interno na cpula, o modelo seguido otecnoburocrtico. J quando h um governo do Poder entregue aum rgo pluralstico, separado das ltimas instncias e formadomajoritariamente por juzes eleitos horizontalmente, por outrosmagistrados, a estrutura judiciria seria do tipo democrticocontemporneo. Segundo essa classificao, os pases latino-americanos adotam o modelo emprico-primitivo, com exceodo Brasil, cuja Justia segue o modelo tecnoburocrtico (PoderJudicirio. Crise, Acertos e Desacertos. So Paulo, Ed. Revista dosTribunais, 1995).

    O sistema de concurso pblico o critrio adotadoentre ns para escolha dos juzes de primeiro grau. consideradopelos doutrinadores e estudiosos do assunto meio democrticode recrutamento, com o nico inconveniente de no apurar aidoneidade moral dos candidatos. H, contudo, no ato deinscrio, a exigncia de indicao de nomes de autoridades ecidados idneos com capacidade para atestarem a probidadedaquele que pretende concorrer ao cargo de juiz.

    O Desembargador do Tribunal de Justia do Estadode Mato Grosso JOS VIDAL enaltece as qualidades dessesistema, citando o Senador NABUCO (O Poder Judicirio - AMagistratura e os Sistemas de Escolha dos Juzes in Anais Forenses doEstado de Mato Grosso, n 50, Milesi Ed., 1981):

    SELEO DOS MAGISTRADOS NO DIREITO PTRIOE COMPARADO. VIABILIDADE LEGISLATIVA DEELEIO DIRETA DOS MEMBROS DO SUPREMO

    TRIBUNAL FEDERAL.

    Regina Maria Groba Bandeira

  • 4O grande mrito do concurso afastar in limine os absolutamente incapazes. Em abstrato, ningumpoder seriamente negar que o concurso oferece trplice vantagem: d magistratura osmais amestrados na cincia do direito, eleva o juiz no conceito pblico e tornadifcil o ingresso aos incapazes. Soma total: mais um elemento de independnciado juiz. Na prtica, poder alguma vez no corresponder o concurso ao ideal doutrinado? Concedido - masse o concurso no serve para, em regra, dar a medida da aptido cientfica do candidato, servir o plenoarbtrio do governo? (destacamos)

    O emrito processualista CELSO AGRCOLA BARBI tambm no poupa elogios aosistema de recrutamento de juzes de primeiro grau adotado no Brasil (Formao, Seleo e Nomeao deJuzes no Brasil, sob o Ponto de Vista da Humanizao da Justia in Revista de Processo, ns 11 e 12, Julho-Dezembro, 1978):

    A exigncia de concurso pblico para ingresso na magistratura de primeiro grau teve a grande vantagemde fazer melhor seleo no plano intelectual.

    Outra vantagem desse sistema que permitiu o acesso de bacharis originados da classemdia e da classe pobre, mesmo quando desprovidos de proteo poltica.

    O resultado final foi verdadeira democratizao na escolha dos juzes, pelo predomnioapenas das qualidades intelectuais, independentemente da classe social de origem.(grifamos)

    H mesmo aqueles que advogam a extenso do sistema de concurso aos tribunais, onde,hoje, em nosso sistema, ocorre a mera indicao.

    Condenando o sistema de carreira da magistratura adotado hodiernamente no Pas, oJuiz federal JOS BAPTISTA DE ALMEIDA FILHO esclarece como se d o acesso do juiz doprimeiro ao segundo grau (O fim da carreira ou do falso mrito e o controle do incontrolvel in Revista doTribunal Regional Federal 1 Regio, v. 8, n 1, jan/mar, 1996):

    (...) mesmo os juzes chamados de carreira, s em tese, tm o direito de subirem do 1 ao 2 grau, issoporque a promoo por antigidade poder deixar de ser acatada pelo tribunal, se dois teros de seusmembros assim o entenderem, e na denominada promoo por merecimento, a bem da verdade, no existemrito e - o que pior - muitas vezes h demrito no promovido, que a logra custa de conchavos evassalagens, no condizentes com nenhum homem e, muito menos, quando exerce o ofcio judicante.

    Defende, ento, o mencionado articulista, o fim da carreira, propondo concurso pblicopara ingresso nos tribunais, idia tambm esposada por AGAPITO MACHADO, juiz federal, consoanterelata:

    O merecimento do juiz em um Estado Democrtico de Direito, como se auto-intitula a RepblicaFederativa do Brasil (art. 1 da Constituio Federal) no pode continuar a ser aferido pelo filhotismo,afilhadismo, nepotismo, sectarismo, ou qualquer outra forma de apaniguamento; tampouco, pela subservinciaservil e, nem mesmo, pelos ttulos e ilustraes com que se adorna o magistrado mais vaidoso, para sobre sichamar a ateno do tribunal, pois no so as qualidades de filho, afilhado, parente, pupilo, amigo, conivente,ou douto, que do eficincia ao ofcio de dar a cada um o que seu, sim, as qualidades apontadas peloMinistro Lindhdurst, da Corte Suprema dos Estados Unidos da Amrica: honestidade, habilidade ecoragem.

    Segue que, a no ser extinta a carreira, extinta deveria ser a promoo por merecimento, com o critrioou a falta de critrio, com que o mrito do magistrado atualmente aferido.

    O juiz federal cearense Dr. Agapito Machado, em interessante artigo publicado na edio de 09.06.95do Dirio do Nordeste, sob o ttulo Concurso para todos os Poderes preconizou a necessidade da realizaode concurso pblico, de provas apenas escritas, sem provas orais, para todos osmembros dos Tribunais, estando a a chave democrtica, penso eu, para o fim dacarreira na magistratura. (destacamos)

  • 5Quanto ao sistema de sufrgio popular para a escolha de juzes, verifica-se que h quaseque uma unanimidade entre os doutrinadores em reprovar esse meio de recrutamento de magistrados.

    certo que h as excees, como o Juiz ANTNIO LVARES DA SILVA, membro doTribunal Regional do Trabalho, que sugere a eleio direta para os membros do Supremo TribunalFederal e tribunais superiores, tomando como exemplo a ser seguido os trinta e nove Estados norte-americanos que adotam esse sistema (in Eleio direta para o STF. Folha de So Paulo. 11.1.01).

    Cabe esclarecer que adota esse sistema, alm dos citados trinta e nove Estados norte-americanos, v.g., a Sua .

    O mtodo suo de recrutamento de juzes por eleio dos poucos desta espcie quevem produzindo bons resultados, segundo CARLOS DAVID S. AARO REIS (A Escolha de Juzespelo voto popular in Revista de Processo, n 78, abril-junho, 1995).

    Na Sua, os juzes so eleitos para mandatos de quatro a seis anos. No nvel federal e emvrios Tribunais cantonais so eleitos pelo Parlamento. Os rgos de cpula so o Tribunal Federal eos Tribunais cantonais.

    O Tribunal Federal, com papel relevante na uniformidade do direito nacional, compostode trinta juzes e quinze suplentes, designados pela Assemblia Federal, com mandato de seis anos,permitida a reconduo e vedado o exerccio de outro cargo pblico ou profisso.

    Registra o citado doutrinador que a causa provvel do sucesso do mtodo eletivo naSua est no pequeno tamanho dos distritos eleitorais e no elevado nvel cultural e tradio dedemocracia direta. E aduz, ainda, lembrando MONTESQUIEU:

    somente por um grande acaso as leis de uma nao podem convir a outraQuanto magistratura estadunidense, os mtodos de seleo de juzes federais e estaduais

    so diferentes. Os juzes federais so indicados pelo Presidente da Repblica, inclusive os da SupremaCorte, condicionada a nomeao aprovao do Senado. Os Estados tm autonomia para legislarsobre recrutamento de magistrados e trinta e sete deles optaram pelo sistema de eleio popular. Nosdemais Estados, os juzes so nomeados pelo Executivo ou designados pelo Legislativo.

    CARLOS DAVID S. AARO REIS narra os percalos da implantao do sistema eletivoem nvel estadual nos Estados Unidos, reportando-se aos estudos de ANDR TUNC E SUZANNETUNC (Le Systme Constitutionnel des tats-Unis dAmrique. Paris, Domat Montchrestien, 1954) e deHAROLD LASKI (The Tecnique of Judicial Appointment in Studies in Law and Politics, New Haven,Yale University Press, 1932. / El Estado Moderno _ sus instituciones polticas y econmicas, Barcelona,Bosch, 1932):

    As conseqncias deste democratismo judicirio foram pssimas. No incio deste sculo, as descries deobservadores europeus mostravam o amesquinhamento da magistratura escolhida por eleio popular e oabalo na sua independncia.

    (...) os candidatos no eram procurados entre as pessoas de valor, mais aptas para as funes judicirias,mas que no obteriam a maioria dos sufrgios. Eram preferidos advogados ambiciosos, intrigantes e insinuantes,sabedores de como seduzir os eleitores. Deviam participar dos meetings e contribuir para a caixa do partido,mas, se eleitos, seus vencimentos seriam inferiores aos honorrios que auferiam como advogados. Por vezes, ocandidato a juiz chegava ao ponto de anunciar, nos comcios, como julgaria as questes.

    Era uma magistratura dbil, na qual a populao no tinha confiana nem gozava de respeito.(...) Porocasio de processos importantes, os jornais preparavam de tal maneira a opinio pblica, a favor desta oudaquela deciso, que o magistrado era constrangido a segui-la, se no quisesse ser obrigado a se demitir. EmDakota do Norte, houve juzes que buscavam o favor de seu eleitorado pela publicao de manifestossemanais acerca dos assuntos judicirios.

  • 6A experincia norte-americana, no entendimento de CARLOS DAVID S. AARO REIS,compartilhado pelo juiz DALMO SILVA (O Juiz de Fabreguettes ou a arte de julgar in Revista Forense, v.288, out/nov/dez, 1984), no tem logrado xito, tanto que a Associao dos Advogados Americanos,segundo informam, desaconselha o mtodo, que vem sofrendo corretivos que o desnaturam (naCalifrnia e no Missouri, os juzes passaram a ser indicados por Comisses integradas por membrosde tribunais superiores, advogados e cidados):

    J na segunda metade deste sculo, o sistema de eleio dos juzes era considerado mau, seno pssimo; seuprincipal vcio era a falta de independncia, sem mencionar a mediocridade da magistratura.

    Hoje, segundo VERA LCIA ROCHA SOUZA JUCOVSKY, juza federal da 19 VaraFederal da Seo Judiciria de So Paulo (Justia Federal nos Pases que a adotam in Srie Monografias doCentro de Estudos Judicirios, Conselho da Justia Federal, 1997, p. 23), alguns estados norte-americanos escolhem seus juzes por indicao, enquanto a maioria se vale de comisso para selecion-los ou de eleio.

    WILLIAM DO COUTO GONALVES abordando essa temtica, condena enfaticamenteo sistema de eletividade (O Juiz na Histria, critrios de sua escolha e a escola da magistratura in Revista deProcesso, outubro-dezembro, 1990, n 60):

    Em Roma, na Frana, na Sua, na Rssia, na Iugoslvia e nos EUA - em alguns de seus Estados-, e, inclusive no Brasil Colnia quanto aos juzes da vintena e os juzes ordinrios, e no Brasil imprio quantoaos juzes de paz, vigorou o sistema de seleo de juzes atravs da manifestao popular por meio de votos.(...)

    Hoje, tanto entre ns como em Roma, na Frana, e em Portugal, no subsiste mais o critrio daeletividade pela evidncia de sua impropriedade. A uma porque no hbil paraselecionar aquele que rene requisitos de personalidade e carter, cultura geral etambm jurdico-cientfica. A duas pelo indisfarvel comprometimento que passaa vincular o votado ao votante, retirando daquele toda condio de ser imparcialno pronunciamento de sua deciso.

    E escolhe, entre os vrios sistemas seletivos de juzes, o de concurso pblico:Por fim, o sistema de concurso pblico de provas para aferio do conhecimento cientfico do candidato,

    e de ttulos, que o predominante em nosso Pas e que tem dado mostras ao longo dos anos, comparado comos demais critrios e pases, o mais eficaz.

    O Desembargador JOS VIDAL tambm categrico ao reprovar a adoo da eleiopopular como sistema de recrutamento de juzes (Ob. cit. p. 32):

    Por eleio popular, em nosso Estado de Mato Grosso, eram escolhidos, at a dcada de 60, os juzesde paz.

    Esse sistema no se coaduna com as caractersticas imprescindveis ao magistrado: capacidade, idoneidademoral e independncia. Pelo menos, a ser submetido ao voto popular, o candidato perderia a sua independncia.No exerccio do cargo, ter que agir politicamente, se quiser concorrer a mais um perodo de mandato, o queviria em prejuzo da aplicao do Direito e da realizao da Justia.

    E, citando GARGIULO, conclui:O magistrado eleito voltar-se-ia para os eleitores amigos ou inimigos e dentre essa parte que no foi seu

    eleitor, no ter nele confiana alguma (Corso Elementare di Diritto Giudiziario Civile, n 29).Acompanhando esse entendimento, o Professor RICARDO MALHEIROS FIZA

    esclarece que o sistema de eleio caiu em desuso no mundo inteiro, fenmeno esse observvel nospases da antiga cortina de ferro, que o adotavam e vm buscando orientao, agora, de Estados daUnio Europia, tais como a Frana e Portugal (in Eleio direta para juiz de direito? Correio Braziliense.12.2.01).

  • 7Os magistrados portugueses so selecionados pelo Centro de Estudos Judicirios, porconcurso pblico, exigida a participao dos aprovados em curso de formao de vinte e trs mesesantes da assuno do cargo.

    Na Frana, a seleo de juzes se faz por concurso da cole Nationale de la MagistratureFranaise, com posterior curso de formao de dois anos e sete meses.

    O ingresso na magistratura italiana tambm por concurso, devendo os aprovadospassarem por curso de tirocnio de, mnimo seis meses.

    Na Espanha, os candidatos devem fazer exame oral, organizados pela Escuela Judicial,devendo participar de curso de formao de dois anos em Barcelona.

    Na Alemanha, os juzes so selecionados com base nos graus obtidos nos exames finaisdas faculdades de direito.

    Na Holanda, os candidatos magistratura so submetidos a concurso organizado porcomisso extrajudicial. No perodo de formao bsica, de seis anos, os magistrados so analisadospelo Instituto Nacional Holands para o Ensino Jurdico, sendo expulsos no caso de reincidncia decomportamento reprovvel.

    Resta clara, portanto, a opo europia pelo sistema que adota o concurso pblico. Forada Europa, podemos citar o exemplo do Japo e o novo sistema em implantao no Timor Leste, quetambm privilegiam os exames pblicos para acesso magistratura.

    Ao criticar o modelo norte-americano, cita o Professor DANIEL MEADOR, catedrticode Direito da Universidade da Virgnia, que, em sua obra American Courts, questiona a adequaoda funo jurisdicional ao sistema eleitoral, que demanda, entre outras providncias, filiao partidriae apresentao de plataforma pelos magistrados. O financiamento de campanha outro grave problema,com o crescente aumento de custo, principalmente da publicidade televisiva, essencial para o sucessoda disputa. Nesse passo, os candidatos tm que levantar fundos junto a advogados e empresas quepodem ser partes em processos no futuro. Conclu o Professor, ento, que o dano objetividadejudicial e aparncia dessa objetividade bvio.

    O sistema de livre nomeao pelo Executivo adotado em alguns Estados, mascondenado pela maior parte da doutrina. Tal critrio adotado na Frana, na Inglaterra e na ustria,por exemplo, para a seleo de magistrados em variados graus de jurisdio.

    Na tradio Inglesa, os membros da Court of Appeal e da, logo abaixo, High Court, sorecrutados entre profissionais bem sucedidos e nomeados pela Rainha, com recomendao do LordChancellor. Os demais juzes so leigos, nomeados pelo Lord Chancellor. J na experincia austraca, osjuzes so nomeados pelo Presidente por recomendao do Ministrio da Justia (Ministro Federal).

    O sistema de indicao dos Tribunais e nomeao pelo Executivo adotado por nspara a escolha dos magistrados dos rgos colegiados do Judicirio, com exceo do Supremo TribunalFederal, cujos membros so nomeados pelo Presidente da Repblica depois da aprovao pelo SenadoFederal.

    Tal sistema tem o srio inconveniente de atrelar os integrantes de um Poder aos outrosdois. H sempre o risco de escolha de funcionrios fidelssimos do Chefe do Executivo, eis que oscorpos legislativos, normalmente, apenas ratificam o nome indicado pelo Presidente da Repblica.

    Nesse passo, fcil entender porque, no Brasil, o sistema de recrutamento de juzes deprimeiro grau no alvo de crticas. O concurso pblico aqui entendido como meio democrtico deescolha de magistrados, que ao mesmo tempo privilegia o conhecimento tcnico e a concorrnciaisonmica. No se pode dizer o mesmo do mtodo de seleo de desembargadores e Ministros detribunais, tendo surgido algumas propostas alternativas ao longo das discusses acerca da reforma doPoder Judicirio na Constituio de 1988.

  • 8Impende registrar, ainda, que, durante as audincias pblicas realizadas durante alegislatura passada no mbito da Comisso Especial da Cmara dos Deputados destinada a dar parecer PEC n 96/92 (Reforma do Poder Judicirio) foram ouvidas vrias autoridades e especialistas notema, tendo a maioria dos palestrantes se posicionado contrariamente fixao de mandato para osmembros dos tribunais, no obstante a pretenso original da proposta.

    Naquela ocasio, argumentou-se que a composio dos tribunais j passa pelos rgoslegtimos de representao popular, Presidente da Repblica e Senado Federal, e que a submisso doJudicirio ao escrutnio popular peridico levaria politizao desse Poder do Estado, o que seriaprejudicial.

    Aduziu-se, na oportunidade em comento, que, ao contrrio do sistema da common law,adotado por Pases nos quais h eleio para cargos da magistratura, nosso Pas segue a civil law, detradio romanstica, que no se coadunaria com tal espcie de investidura. Assim, no obstantenossa Federao seguir o modelo da Federao norte-americana, nosso sistema judicirio aproxima-se do europeu em vrios aspectos, sendo de se notar que na Europa no se cogita de eleio popularpara a seleo de juzes.

    Ademais, proposio nesse sentido poderia ter sua constitucionalidade questionada, portendente a abolir o direito individual decorrente dos princpios relativos s prerrogativas da magistraturanacional adotados pelo legislador constituinte originrio, em afronta a clusulas ptreas explcitas(art. 95 c/c arts. 5, 2 e 60, 4, IV da C.F.).

    Os argumentos foram no sentido de que os juzes, assim como os parlamentares, porserem membros de Poder do Estado, gozam de certas prerrogativas, que os resguardam de ingernciasexternas para o fiel cumprimento de suas atribuies. Nesse passo, foram institudas a inviolabilidadee a imunidade parlamentares. J para os rgos do Poder Judicirio, a Carta Poltica consagrou ospredicamentos da vitaliciedade, da inamovibilidade e da irredutibilidade de vencimentos.

    Nessa linha, proposio que adotasse o voto popular como mtodo de recrutamento demagistrados viria a afetar a garantia da vitaliciedade do magistrado, adotada desde a primeiraConstituio republicana, que se traduz na vedao de sua destituio, salvo por sentena judicialtransitada em julgado. Ao lado da inamovibilidade e da irredutibilidade de vencimentos, a vitaliciedade entendida, no sistema constitucional, como garantia da prpria instituio, do Poder, e, antes demais nada, do cidado, que tem direito entrega da prestao jurisdicional por rgo estatal imparciale independente.

    No podemos deixar de notar, contudo, que vem ganhando fora a idia de dotar oSupremo Tribunal Federal de maior legitimidade democrtica com a alterao da forma derecrutamento de seus ministros, para que essa Corte possa se transformar definitivamente em TribunalConstitucional, semelhana dos Tribunais Constitucionais europeus, com participao poltica maisativa.

    No se tem cogitado do voto popular, todavia, nas discusses da reforma do PoderJudicirio, mas de indicao de seus membros pelos trs Poderes, passando a contar o Pretrio Excelsocom membros da carreira da magistratura. Com a fixao de mandato para os membros do STF seriaimprescindvel a previso da chamada quarentena, visando a impedir o nefasto trfico de influnciadaqueles que possuem informaes privilegiadas (art. 37, 7 da C.F.). Manifestaram-se nesse sentido,em audincia realizada em 27.04.99 na Comisso Especial de Reforma do Poder Judicirio, osrepresentantes da CONAMP e da Associao Juzes para a Democracia.

  • 9A respeito do tema, a sugesto do Professor LUIZ FLVIO GOMES h que serreproduzida, no s porque fulcrada em estudos percucientes do Poder Judicirio, mas tambm porqueprivilegia a pluralidade poltica, conforme podemos constatar (A dimenso da Magistratura no EstadoConstitucional e Democrtico de Direito .So Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 1997, p. 180):

    A forma mais democrtica de composio do Supremo deveria contar com a participao,paritria e seqencial, do prprio Supremo, da Cmara dos Deputados, da Ordem dos Advogados doBrasil e do Ministrio Pblico. O primeiro faria lista trplice, dentre Magistrados brasileiros; os demaisapresentariam listas sxtuplas, dentre juristas, que seriam transformadas em listas trplices pelo Supremo.Estas seriam encaminhadas ao Presidente da Repblica para a escolha final, depois de aprovado onome pelo Senado Federal. Seria uma forma de escolha bastante democrtica, mas no tudo: urgeimpor limitao ao tempo de permanncia do Ministro da Corte. O supremo deve ser renovado como passar do tempo, respeitando-se, no entanto, a vitaliciedade dos atuais ocupantes.

    Sugesto semelhante foi externada pelo Professor DALMO DE ABREU DALLARI, emsua obra O Poder dos Juzes, in verbis:

    Seria mais razovel, e mais condizente com a democracia, permitir que entidadesrepresentativas de advogados, juzes e do Ministrio Pblico, bem como os tribunais superiores federaise estaduais, apresentassem sugestes de nomes. Entre os trs que obtivessem maior nmero deindicaes, o Presidente da Repblica escolheria um nome para ser submetido aprovao do Senado.Esse procedimento daria publicidade ao processo de escolha, evitando a premiao de amigos dorei, assegurando a legitimidade do escolhido. (O Poder dos Juzes. So Paulo, Ed. Saraiva, 1996, p.115)

    Impende lembrar, contudo, que tal sistema de escolha vem sendo adotado quando setrata de Tribunais Constitucionais propriamente ditos, segundo o modelo existente na Europa. OSupremo Tribunal Federal no tem o mesmo perfil dos Tribunais Constitucionais europeus, uma vezque suas competncias constitucionais ultrapassam o controle de constitucionalidade abstrato. Defato, o Supremo Tribunal Federal tambm constitui a ltima instncia da jurisdio ordinria noBrasil.

    Em Portugal, o Tribunal Constitucional no integra o Poder Judicirio, sendo sua missoo controle de constitucionalidade, assim como os demais tribunais constitucionais europeus. Trata-se de um rgo de soberania, dotado de autonomia administrativa e financeira, cujos membros, trezeao todo, tm mandato de nove anos, no renovvel. Dez membros so eleitos pela Assemblia daRepblica, por maioria de 2/3; os outros trs integrantes so cooptados pelos dez primeiros, tambmpor maioria de 2/3.

    Esse mesmo modelo encontrado na Espanha, v.g., cujo Tribunal Constitucional composto de quatro integrantes designados pela Cmara, quatro pelo Senado, por maioria de 3/5;dois pelo Governo e dois pelo Consejo General del Poder Judicial.

    Nesse passo, merece especial destaque o importante estudo do Professor ALEXANDREDE MORAES sobre os Tribunais Constitucionais e o Supremo Tribunal Federal, que conclui pelanecessidade de transformao do Eg. STF em Corte de constitucionalidade, nos seguintes termos:

    O Supremo Tribunal Federal deve transformar-se exclusivamente em Corte de constitucionalidade,dirigindo seus trabalhos para a finalidade bsica de preservao da supremacia constitucional e defesaintransigente dos direitos fundamentais.

  • 10

    A transformao do STF em um exclusivo Tribunal Constitucional exige maioraperfeioamento das normas constitucionais destinadas a sua composio e forma de investidura deseus membros, devendo contemplar-se participao mais efetiva dos Poderes Executivo, Legislativoe Judicirio na escolha dos membros do Tribunal Constitucional, a fim de garantir-se maior legitimidadeda justia constitucional.

    A atual regra de vitaliciedade dos membros do STF deve ser substituda pela previso demandatos nos moldes do Conselho Constitucional francs e dos Tribunais Constitucionais alemo,portugus, italiano e espanhol, com a finalidade de adequao social da Corte e constante renovaode sua legitimidade.

    A reconduo ao cargo de ministro do STF deve ser vedada, para garantir-se totalindependncia da jurisdio constitucional.

    Os membros do STF devem ser escolhidos, de maneira proporcional, pelos representantesdos Poderes Executivo, Legislativo e Judicirio. Assim, quatro devem ser escolhidos, respeitados osrequisitos capacitrios e os impedimentos constitucionais, e mediante parecer opinativo do ConselhoFederal da Ordem dos Advogados do Brasil, livremente pelo Presidente da Repblica; quatro ministroseleitos pelo Congresso Nacional, sendo dois por maioria absoluta da Cmara e dois por maioriaabsoluta do Senado; e os trs restantes pelo prprio STF, entre membros de carreira da magistraturae do Ministrio Pblico. (Jurisdio constitucional e tribunais constitucionais; garantia suprema daconstituio. So Paulo, Atlas, 2000, p. 324)

    A Reforma do Judicirio em tramitao no Congresso, contudo, no trata da matria,deixando passar a oportunidade de aperfeioar o sistema de recrutamento dos membros do SupremoTribunal Federal, no obstante a apresentao de emendas a respeito do tema nas Comissescompetentes (PECs 96/92, na Cmara e 29/00, no Senado).

    Em verdade, a estrutura judiciria brasileira se aproximaria do modelo democrticocontemporneo a que se refere EUGNIO ZAFFARONI se os membros do rgo de cpula dosistema judicial, o STF, fossem escolhidos com a participao dos trs Poderes constitudos ou deentidades representativas das funes essenciais da Justia. Tal alterao constitucional poderia serproposta independentemente da tramitao da reforma do Poder Judicirio em curso. Contudo, aschances de sua apreciao antes do trmino da votao da reforma seriam pequenas. Ademais, aapresentao de proposta idntica a outra que j tenha sido aprovada ou rejeitada na mesma sessolegislativa, ou transformada em diploma legal poderia acarretam a prejudicialidade da matria, conformedeterminam os arts. 163 do Regimento Interno da Cmara dos Deputados e 334 do Regimento Internodo Senado Federal.

    Quanto aos demais tribunais, vrios estudos vm apontando a necessidade dedemocratizao da seleo de seus membros por meio de eleio pelos juzes togados vinculados respectiva Corte. Uma vez adotado o critrio eletivo, cada categoria representada nos tribunais poderiaescolher seus representantes por eleies diretas, pelos prprios integrantes das categoriasrepresentadas. Registre-se, nesse sentido, a tese aprovada no VII Encontro Regional dos Magistradosdo Trabalho da 4 Regio Porto Alegre 1991. Compartilha tambm dessa idia a AssociaoNacional dos Juzes Federais, cujo representante compareceu perante a Comisso Especial de Reformado Poder Judicirio (PEC 96/92), em audincia pblica de 27.04.99.

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