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no internamento até ao médico defamília. Saber diagnosticar e carac-terizar o defeito afásico, para poderdirigir o doente para os locais certosde avaliação e tratamento, pode serfundamental para a recuperaçãodestes doentes.

No Laboratório de Estudos de Lin-guagem usamos uma bateria detestes padronizada (Bateria de Ava-liação da Afasia de Lisboa) para ava-liação dos defeitos de linguagem, sen-do a maior parte dos doentes envia-dos pelos serviços de internamentodo Hospital de Santa Maria, por ou-tros hospitais e centros de saúde e pe-los médicos assistentes dos doentes.A avaliação é feita pelos terapeutas dafala, à semelhança do que aconteceem quase todo o mundo.

São diversos os tipos de afasia,dependendo da localização da lesão.O diagnóstico do tipo de afasia é feitoessencialmente por quatro provas:

análise do discurso, nomeação deobjectos por confrontação visual,repetição de palavras e compreensãode ordens simples.

Para além das afasias existemoutras alterações de linguagem pro-vocadas por lesões cerebrais (Qua-dro I).

Alterações de linguagem em síndromas confusionaisEstes doentes apresentam uma alte-ração no reconhecimento e na com-preensão do ambiente, defeito deatenção e de memória, pensamentoconfuso e desorientação no tempo eno espaço. A sintaxe, a evocação depalavras, a compreensão auditiva ea capacidade de repetição estão nor-mais. Contudo, as respostas a per-guntas abertas são confabulatóriase irrelevantes. Este tipo de alteraçãoencontra-se em doentes com lesõescerebrais bilaterais (frequentemente

Avaliação da afasia peloMédico de FamíliaGABRIELA LEAL*, ISABEL PAVÃO MARTINS**

*Terapeuta da Fala**Professora de Neurologia da Faculdade

de Medicina de Lisboa.Laboratório de Estudos de Linguagem

Centro de Estudos Egas Moniz,Faculdade de Medicina de Lisboa

AAfasia pode ser definidacomo a perda ou reduçãoda capacidade de proces-sar linguagem como re-

sultado de uma lesão cerebral. Podemanifestar-se como dificuldade em:1) perceber mensagens faladas ouescritas; 2) identificar imagens e ob-jectos e/ou 3) comunicar através dafala, escrita e/ou do gesto.

A avaliação sumária do defeitoafásico pode e deve ser do domíniode todos os médicos, desde os queatendem os doentes no Serviço deUrgência, os que os acompanham

RESUMOA linguagem é um processo complexo que envolve múltiplas estruturas do hemisfério cerebral esquerdo, hemisfério dominante para alinguagem nos indivíduos dextros e, mesmo na maioria dos indivíduos canhotos.Designa-se por Afasia a perturbação de linguagem resultante de uma lesão cerebral que compromete vários aspectos da comunicação,nomeadamente a expressão oral, a compreensão de linguagem, a leitura e a escrita. São diversos os tipos de afasia, dependendo da localiza-ção da lesão cerebral.A Afasia é uma sequela frequente de Acidente Vascular Cerebral, de traumatismos crânio-encefálicos e, embora mais rara, de tumorescerebrais ou de doenças infecciosas.Pretende-se, neste artigo, descrever uma avaliação de linguagem passível de ser feita à cabeceira do doente ou numa consulta pelo médi-co de família. A avaliação consiste em quatro provas cardinais que permitem diagnosticar o tipo de afasia: fluência, nomeação de objec-tos, repetição de palavras e compreensão de ordens simples. Além destes, outros testes de leitura e de escrita permitem caracterizar me-lhor o defeito.

Palavras-Chave: Afasia; Avaliação; Linguagem.

EDITORIAISINTRODUÇÃO

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traumáticas e é, em geral, transitó-rio) ou em disfunções metabólicas(etilismo; abstinência alcoólica; in-suficiência hepática, etc.).

Alterações de linguagem nademênciaAs alterações de linguagem na de-mência são acompanhadas de dete-rioração de outras capacidadescognitivas, sobretudo os defeitos dememória. Os defeitos notam-se,principalmente, nas tarefas deretenção, atenção, abstracção e ge-neralização. Os defeitos de lingua-gem são semelhantes em gravidadeaos encontrados noutras tarefas in-telectuais1.

À medida que a demência avança,aumentam os defeitos na fluênciaverbal, na evocação de palavras, nafonologia, na sintaxe e na semânti-ca, na estrutura e no conteúdo dodiscurso.

Defeitos de comunicação subsequentes a lesões do hemisfério direitoAs alterações de linguagem mais co-muns nas lesões do hemisfério direi-

to são: alterações da prosódia e difi-culdades na compreensão de metá-foras e do sentido de humor. Apesardestes doentes não manifestaremgrandes defeitos na produção do dis-curso, são comunicadores pobres2.

Alterações de linguagem na esquizofreniaSegundo Benson3, a esquizofrenia écaracterizada por um defeito no pen-samento e não na linguagem. Nosdoentes esquizofrénicos observa-se,sobretudo, perseveração nas ideias,ideias delirantes e confabulação queobviamente se manifestam atravésda linguagem, mas sem que haja al-teração na selecção das palavras ecom um desempenho gramatical in-tacto.

Apraxia do discursoÉ uma alteração que geralmente co-existe com a afasia. Segundo Kent eRosenbek4, a apraxia é uma pertur-bação sensoriomotora da fala que setraduz por um defeito na articulaçãoe na prosódia e, resulta da incapa-cidade do Sistema Nervoso Centralprogramar a sequência de movimen-tos orais necessários à fala, naausência de defeito motor.

DisartriaA disartria é um defeito de articula-

ção. Darley5 descreveu a disartriacomo um grupo de perturbações dafala que resulta da falha no contro-lo motor – fraqueza, lentidão ou in-coordenação – do mecanismo dafala, devido a lesão central e/ou peri-férica do sistema nervoso.

As características mais salientesda disartria incluem má inteligibili-dade da fala, má qualidade da voz ehipernasalidade dependendo da lo-calização da lesão. Todas diferemmarcadamente da perturbação geralda linguagem que caracteriza a afa-sia.

Os doentes disártricos escolhemcorrectamente as palavras que que-rem dizer, as frases são correcta-mente construídas, não têm defeitosde compreensão de leitura e es-crevem sem erros.

Existem vários tipos de afasia, de-pendendo do defeito de linguagemencontrado (Quadro II). A classifica-ção depende do desempenho dodoente em quatro parâmetros fun-damentais (fluência do discurso,nomeação de objectos, repetição depalavras e compreensão de ordenssimples) que devem sempre ser tes-tados.

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QUADRO I

OUTRAS CAUSAS DE ALTERAÇÕES DE LINGUAGEM

Síndromas confusionais – discurso incoerentede conteúdo confabulatório, sem defeitos denomeação, repetição ou de compreensão.Demência – defeitos de evocação de palavras e do conteúdo e estrutura do discurso.Lesões do Hemisfério Direito – defeitos deprosódia, dificuldades na compreensão de metáforas e do sentido figurativo da linguagem.Esquizofrenia – conteúdo confabulatório e delirante; linguagem hermética com significadopróprio.Apraxia do discurso – defeito na programaçãomotora do discurso.Disartria – defeito de articulação.

QUADRO II

CLASSIFICAÇÃO DAS AFASIAS

TIPO DE AFASIA FLUÊNCIA COMPREENSÃO NOMEAÇÃO REPETIÇÃOGlobal Não fluente Perturbada Perturbada PerturbadaBroca Não fluente Normal Perturbada PerturbadaTranscortical mista Não fluente Perturbada Perturbada NormalTranscortical motora Não fluente Normal Perturbada NormalWernicke Fluente Perturbada Perturbada PerturbadaCondução Fluente Normal Perturbada PerturbadaTranscortical sensorial Fluente Perturbada Perturbada NormalAnómica Fluente Normal Perturbada Normal

CLASSIFICAÇÃO DAS AFASIAS

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As afasias classificam-se em não--fluentes e fluentes de acordo comas características do discurso6. Emgeral, as afasias não fluentes corres-pondem a lesões cerebrais anterio-res (frontais ou pré-rolândicas) e asafasias fluentes a lesões posteriores(temporo-parietais ou pós-rolândi-cas).

Passamos a descrever os quatroparâmetros que permitem classificaras afasias.

Análise do DiscursoA análise do discurso faz-se a partirda produção espontânea do doente(aquela que resulta de uma conver-sa entre duas pessoas). Para desen-cadear a produção de discurso per-gunta-se ao doente dados da suahistória clínica ou da sua biografia(por ex. porque é que veio à consul-ta? / como é que chegou até aqui?/ em que é que trabalha?).

A forma mais fácil de distinguir-mos os dois tipos de discurso é pen-sarmos que, se aquele doente fosseestrangeiro, por exemplo grego outurco, se seria considerado um fa-lante normal (discurso fluente) ouse, pelo contrário, o achávamos dife-rente, na forma de se exprimir, deoutros seus conterrâneos (discursonão fluente).

O discurso diz-se «não fluente» se

o doente não consegue ou tem difi-culdade em falar, o discurso é pro-duzido com esforço, muito lenta-mente, e é constituído sobretudo porpalavras (substantivos) isoladas oufrases curtas e com erros de gra-mática.

Dentro destes discursos podemosencontrar vários graus de defeito:

a) Mutismo – o doente não produzqualquer som, mas nota-se que quercomunicar (pelo olhar, pelos gestos,pela escrita).

b) Emissão de um estereotipo –sempre que tenta comunicar o doen-te produz a mesma palavra/som oufrase (ex. «amen», «tai-tai», «dente--doente-dentista», «começa é hojemãe ali», «ó mai ti ó mai levu»...).

c) Produção de palavras ocasio-nalmente correctas – o doente con-segue produzir algumas palavrascorrectas, sobretudo formas do dis-curso automático (ex. «ai Jesus»,«vai-te embora»), palavras de con-teúdo emocional e por vezes algunsnomes (substantivos).

d) Frases telegráficas – o discur-so é reduzido aos seus elementosessenciais, constituído por palavrassem elementos de ligação ou par-tículas gramaticais (preposições,pronomes, conjunções) e erros sin-tácticos, sobretudo incorrecta con-jugação dos verbos (ex. «amanhã ir

cinema tarde amigos»).e) Erros de articulação – este é o

grau mais ligeiro do defeito e traduz--se pela substituição, omissão ouadição de alguns sons.

Por outro lado, o discurso classi-fica-se como «fluente» quando é pro-duzido sem esforço, as frases são decomprimento normal e o débito (nú-mero de palavras por unidade detempo), a melodia e o ritmo são nor-mais, ou seja, se nos abstrairmosdaquilo que o doente está a tentardizer e atendermos apenas à formado discurso, ele parece-nos normal.

Este tipo de discurso tem frequen-temente pouco conteúdo informati-vo devido à falta de nomes (substan-tivos), ao uso de palavras incorrec-tas (parafasias) e aos circunlóquios.

Dentro dos discursos fluentes po-demos encontrar vários tipos:

a) Discurso jargonafásico ou jar-gão – caracteriza-se pela emissão deneologismos (palavras que não fa-zem parte da língua portuguesa nemde qualquer outra língua, ex.: gasti-neiro, chominó ...) ou de parafasiassemânticas (troca de palavras poroutras que também existem, ex.:vidro por frasco ou mão por pé), eapesar de manter todas as carac-terísticas físicas da língua (prosódia,entoação, melodia, articulação) é in-compreensível.

Alguns doentes com este tipo dediscurso são muitas vezes confundi-dos com doentes confusos ou psi-quiátricos (daí a importância desaber avaliar sumariamente umaafasia).

b) Discurso com predomínio deparafasias – o doente usa com mui-ta frequência parafasias, embora umouvinte atento consiga perceber al-guma coisa do que ele quer dizer. Asparafasias podem ser verbais ousemânticas, quando se troca um no-me por outro (ex. anel por relógio oufaca por camisa); literais ou fonológi-

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QUADRO III

CARACTERÍSTICAS DO DISCURSO ESPONTÂNEO NA AFASIA

Características do Discurso Afasia não fluente Afasia fluenteDébito baixo (- de 50 ppm*) normalEsforço aumentado normalArticulação perturbada normalProsódia alterada normalConteúdo excesso de nomes falta de nomesOcorrência de parafasias** rara frequente

* palavras por minuto** palavras incorrectas

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cas, quando há transposição, omis-são ou adição de sons (ex. xeipe porpeixe ou muler por mulher ou bata-nata por batata) e ainda neologísti-cas quando não há qualquer seme-lhança com a palavra alvo (ex. gas-tineiro em vez de pescador).

1. Circunlóquio – para suprir afalta dos nomes o doente vai substi-tuindo-os por outras palavras erodeando o assunto utilizando paraisso um número exagerado depalavras que, na maioria das vezes,o torna muito difícil de compreender.

2. Predomínio de pausas anómi-cas – o doente recorre frequente-mente a palavras como «coisa» ou«aquilo», ou descreve a função doobjecto (ex.: aquela coisa, aquela quese usa para cortar). Faz pausas fre-quentes, à procura da palavra, e aexpressão é entrecortada tornando--se quase não fluente. Quando o de-feito é muito marcado é difícil com-preender estes doentes.

3. Ocorrência de parafasias ou depausas anómicas – o doente faz al-guns erros, mas é possível com-preendê-lo.

Nomeação (de objectos por confrontação visual)Todos os doentes com afasia fazemerros de nomeação – ou porque nãoevocam o nome ou porque fazemuma parafasia ou ainda, por haverum tempo de latência, até surgir onome, muito superior ao normal.Este fenómeno (a anomia) pode ocor-rer quer durante o discurso espon-tâneo quer quando pedimos especi-ficamente ao doente para nos dizero nome de objectos que lhe vamosmostrando.

Para testar a capacidade denomeação podemos fazer uma pro-va muito simples que consiste empedir ao doente que diga os nomesde alguns objectos, de uso comum,que habitualmente trazemos con-

nosco e que lhe mostramos, comouma caneta, uma moeda, óculos,chaves, um relógio...

Se o doente não conseguir no-mear podemos dar-lhe uma peque-na ajuda iniciando a palavra (ex./ch/ quando lhe mostramos achave) ou dizendo-lhe uma frase in-completa cujo final seja o nome pre-tendido (ex. fechei a porta à ...).

Devemos usar objectos suficien-temente simples e conhecidos paraque não haja qualquer dúvida em in-terpretar a dificuldade da nomeação.A anomia não tem que ser comple-ta (100% errada ou 100% correcta),pode ser apenas parcial e pode serexpressa por uma fracção (ex.: no-meia correctamente 2 dos 5 objec-tos apresentados).

RepetiçãoA capacidade de repetição verbal érelativamente fácil de testar. Come-ça-se por pedir ao doente que repi-ta palavras curtas e frequentes(casa, rato, bola, pêra, ponte), núme-ros (dois, quatro, cinquenta, sete-centos, mil e dezanove), depoispalavras mais compridas (futebol,autocarro, frigorífico, presidente, ele-vador) e por fim frases (hoje está sol/ não deixes a chave na porta / ovento era muito forte e derrubou aárvore do jardim).

Alguns doentes tendem a repetircompulsivamente tudo o que o exa-minador diz; por exemplo, quandose lhe pergunta «Como é que se cha-ma?», o doente responde repetindoa frase ou o seu final («se chama») -a este fenónemo chama-se ecoláliae é frequente verificar-se nas AfasiasTranscorticais.

Compreensão Auditiva VerbalO método mais tradicional de testara compreensão consiste em dar or-dens ao doente para ele executar (ex.feche os olhos, aperte a minha mão)

ou fazer perguntas de respostasim/não (ex. está a chover?/ a por-ta está fechada?). Deve ter-se umcuidado particular para não darachegas ao doente; por exemplo, sepedimos para nos apertar a mão nãodevemos estender a mão ao doenteou se perguntamos se está a chovernão devemos olhar para a janela.

Muitas vezes a resposta incorrec-ta a ordens verbais pode ser influen-ciada pela apraxia (incapacidade derealizar movimentos, por comandoverbal, na ausência de defeito motorque a justifique), por isso, devemosestar atentos ao comportamento dodoente. Por exemplo, se lhe pedir-mos que abra a boca ele pode esbo-çar um movimento desajustado,uma careta ou um sopro, devido àapraxia buco-facial, ou pode sim-plesmente não fazer nada ou fazerqualquer coisa que não tenha nadaa ver com o que se lhe pediu.

É também frequente os doentesterem uma melhor compreensão dodiscurso coloquial do que de ordens.Muitas vezes quando se começa afalar com o doente ele parece perce-ber tudo o que estamos a dizer e dárespostas adequadas, mas depoisquando lhe pedimos para executaruma ordem simples como «agarre aminha mão», ele não compreende.Por esta razão, alguns fisioterapeu-tas queixam-se de má colaboraçãodos doentes, quando afinal o defeitoé de compreensão da linguagem.Dentro dum contexto, por exemplose lhe estivermos a falar dos motivosque o trouxeram à consulta, há in-formação não verbal (a mímica, aentoação...) que o doente apreendee lhe facilita a compreensão, mas se,de repente, lhe pedimos que ponhaa mão na orelha, o doente não com-preende a ordem porque está fora docontexto «motivo que o trouxe aocentro de saúde».

Com a aplicação destas quatro

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provas já é possível fazer o diagnós-tico do tipo de afasia. Poder-se-á ain-da, para complementar, fazer umaavaliação breve das capacidades deleitura e escrita, o que permitirácaracterizar melhor os defeitos.

LeituraÉ fácil avaliar a capacidade de leitu-ra. Numa folha de papel escrevem-se algumas palavras (por ex.: chave,moeda, caneta, relógio). Devemosutilizar letra maiúscula e bem legí-vel. Devemos assegurar-nos que odoente não precisa de óculos para lere depois pedimos que diga onde estácada uma das palavras escritas (porex.: diga-me onde está escrito apalavra «caneta») ou mostramos-lheo objecto correspondente à palavraescrita e pedimos para o doente di-zer qual é palavra (ex.: diga-me qualdestas palavras é o nome do objec-to que eu tenho na mão). Se o doenteconsegue fazer isso pode-se dificul-tar a tarefa escrevendo perguntassim/não («hoje é dia de Natal?», «osmédicos usam bata?») ou aindapedir que leia um cabeçalho de jor-nal.

A capacidade de ler alto e a capa-cidade de compreender o que estáescrito deve ser testada separada-mente. Muitos afásicos não-fluentesnão conseguem ler alto, mas algunscompreendem o que está escrito; ooposto também pode acontecer,havendo afásicos fluentes que lêembem alto e não compreendem nadaou muito pouco do que leram. De-vemos, por isso, fazer sempre algu-mas perguntas em relação ao que odoente leu para sabermos se elecompreendeu (ex.: se o doente leu afrase «O primeiro ministro anunciouque os combustíveis vão aumentarno próximo mês de Janeiro» pode-mos perguntar-lhe: o que é que vaiaumentar / quando é que vão au-mentar ou quem disse que os com-

bustíveis iam aumentar.)Só a incapacidade para com-

preender o que está escrito é alexia.

EscritaPara avaliar esta capacidade pede-se ao doente que escreva o nome, oque muitos afásicos conseguem fa-zer pois é quase uma actividade au-tomática. Depois pede-se que escre-va algumas palavras por ditado (ex.:carro, frasco, garrafa, bombeiro). Seo doente tiver sucesso nessa tarefapede-se que escreva uma frase porditado (ex.: comi peixe com batatasao almoço) e, por fim, que escrevaespontaneamente uma frase.

Há doentes que conseguem escre-ver bem palavras por ditado, masque evidenciam dificuldades na es-crita de frases (por ditado) e sobretu-do na escrita espontânea.

Além das quatro provas mencio-nadas fazem também parte da ba-teria de testes do Laboratório de Es-tudos de Linguagem: a escala degravidade da bateria WAB7; acaracterização do discurso coloquial;a avaliação do discurso automáticoe linguagem serial; identificação deobjectos; nomeação de categoriassemânticas; emparceiramento pa-lavra-objecto; Token Test; repetiçãode palavras, de pseudopalavras, defrases e séries de dígitos; leitura altoe identificação de letras e de pala-vras; compreensão de leitura de tex-to; escrita por cópia, por ditado eespontânea; testes de praxias buco-facial, dos membros, para gestossimbólicos e para uso de objectos;estudo das praxias construtivas bi-e tridimensional e um teste de re-conhecimento de gestos.

Para um profissional com experiên-cia não é difícil nem demorado fazer

esta avaliação; contudo, mesmo pes-soas pouco treinadas, embora pos-sam demorar mais algum tempo,também a conseguem fazer. Suge-rimos, no entanto, que após umteste breve seja dada indicação deque o doente deve fazer uma avalia-ção mais formal.

Numa avaliação tão sumária,como aqui sugerimos, é muito difí-cil classificar correctamente o tipo deafasia, mas isso não é o mais im-portante. O fundamental é que, numcurto espaço de tempo, o médico queavaliou o doente saiba distinguir seo doente tem um defeito de lingua-gem (afasia), ou um defeito de articu-lação (disartria), se tem apenas umdiscurso confabulatório (síndromaconfusional), ou alteração do pensa-mento (esquizofrenia) para que pos-sa dar a indicação correcta ao doenteou à família onde fazer uma avalia-ção mais completa.

Quanto mais cedo for feita a ava-liação e a orientação terapêutica dosdoentes afásicos maiores hipóteseseles terão de recuperar.

Todos os afásicos, qualquer queseja o tipo de afasia que apresentem,podem ser submetidos a um progra-ma de terapia da fala.

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CONCLUSÃO

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Agradecimentos:Agradece-se aos Dra. Marta Gonçalves,Dra. Susana Silva, Dr. José Pedro Boléo--Tomé e Dr. Miguel Coelho pelas suges-tões na redacção deste manuscrito.

Endereço para correspondênciaTerapeuta Gabriela LealLaboratório de Estudos de Linguagem, Centro de Estudos Egas Moniz, Faculdade de Medicina de Lisboa, Hospital de Santa Maria 1600 Lisboa, PortugalTelef/Fax: 217 934 480E-mail: [email protected]

Recebido para publicação em: 18/02/05Aceite para publicação em: 03/08/05

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ABSTRACTLanguage is a complex process, which depends on multiple structures of brain’s left hemisphere, the domi-nant one for language in the right-handed and in the majority of the left-handed individuals. Aphasia is a disturbance of language resulting from a brain injury that compromise several aspects of com-munication, including oral expression, understanding of language, reading and writing. The type of aphasiadepends on the location of the injury in the brain. Aphasia is a frequent sequel from stroke, head trauma and, in less common cases, brain tumours and infec-tions. The authors describe a standard method for the evaluation of language that can be used at the bedsideor in the family doctor’s consultation. This evaluation consists of four cardinal tests that allow diagnosingthe type of aphasia: fluency, nomination, repetition and understanding of simple orders. Beyond these, otherreading and writing tests allow a better characterization of the found disturbances.