2015jan_carga tributaria

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A2 | Valor | Quinta-feira, 29 de janeiro de 2015 Brasil Aumento da carga tributária foi base para expansão social, aponta estudo Juliana Elias De São Paulo O Brasil teve aumento expressi- vo e contínuo da carga tributária nos últimos 20 anos. A arrecada- ção alta, no entanto, está na base do financiamento que permitiu ao país expandir políticas sociais e promover a inclusão no período, e é essa combinação que ajuda a ex- plicar um fenômeno intrigante pa- ra quem olha de fora: o fato de esse aumento ter passado razoavel- mente incólume à insatisfação da sociedade até pouco tempo atrás. Essa interrogação foi o ponto de partida para um estudo chefiado pela Universidade de Manchester sobre as relações entre o sistema tributário brasileiro e o modelo de crescimento econômico que o país desenvolveu. O estudo faz parte do projeto “Brazil For Africa”, um pro- grama financiado pelo governo britânico que visa estudar diferen- tes facetas da economia brasileira em busca de políticas a serem re- plicadas na África. “A democratização em 1989 vem com pressão crescente da so- ciedade por políticas sociais e de redistribuição”, explica Marcus André Melo, professor da Universi- dade Federal de Pernambuco e um dos responsáveis pela pesquisa. É o que o estudo chamou de “contrato social” brasileiro: a contrapartida em gastos sociais também crescen- tes abriu uma espécie de espaço ta- citamente aceito pela população a uma taxação maior. “A carga brasileira é claramen- te um ponto fora da curva dos países de renda similar, mas isso foi essencial para o modelo de desenvolvimento econômico do país que tentamos desvendar”, diz. “O Brasil taxa muito e gasta muito, com alta redistribuição. É um equilíbrio escandinavo.” Nos países escandinavos, onde a taxação chega a 55% do Produto Interno Bruto (PIB), os indicadores sociais e o retorno em bem-estar estão bem à frente dos brasileiros — uma das principais razões que colocaram os impostos na pauta de reclamações desde as manifes- tações de 2013. Mas o peso tributá- rio vem de muito antes. De 1995 a 2010, período co- berto pelo estudo, houve um sal- to de sete pontos, de 27% para 34% do PIB. Hoje, oscila em torno de 37%, enquanto a média latino- americana é de 20%. Segundo os pesquisadores, o avanço social foi igualmente enorme desde lá, e foi isso que fomentou esse “con- trato” por duas décadas. E não são apenas políticas de distribuição direta que entram na conta, como o Bolsa Família. Pesa, principalmente, todo o arcabouço de assistência do Estado brasileiro, chancelado em boa parte pela Constituição de 88, que inclui um sistema universal e gratuito de saúde, educação também gratuita e uma Previdência ampla. Só a Pre- vidência, que inclui os gastos com aposentadorias, licenças e seguro- desemprego, responde por cerca de dez pontos dos 37% que se paga hoje em impostos. “Outros países, como China e Chile, têm uma carga tributária menor que a do Brasil, mas lá não existe previdência pública”, diz o consultor Everardo Maciel, secre- tário da Receita durante o governo FHC. Para os chilenos, os impostos representam 20% do PIB e, para os chineses, 17%. “A carga tributária é do tamanho da despesa, e o tama- nho da despesa é fruto de uma op- ção feita pela sociedade. ” O economista Amir Khair, ex-se- cretário municipal das Finanças na gestão da prefeita Luiza Erundina em São Paulo, lembra também que boa parte do aumento na arreca- dação veio do crescimento vigoro- so da última década. “Os tributos têm relação direta com a atividade econômica. Quando o país cresce, diminui a inadimplência, as pes- soas têm folga na renda, as empre- sas têm mais lucros. ” Por outro lado, a desacelera- ção da economia é um dos fato- res identificados pelos especia- listas como responsável pelo es- gotamento do modelo. Sem cres- cimento, a arrecadação cai e, com ela, a folga para se continuar ar- cando com o sistema social. E por que a demanda pelo am- paro social apareceu tão mais forte no Brasil do que em outros países que também se democra- tizaram e refizeram suas consti- tuições na mesma época? Segundo Melo, coordenador do estudo, a resposta passa ne- cessariamente pelo grau de dis- tribuição de renda, tendo em vis- ta que o Brasil saiu do regime mi- litar como um dos países mais desiguais do mundo — “só perdia para Serra Leoa”, afirma. “Os militares trouxeram desen- volvimento, mas houve arrocho salarial e a desigualdade aumen- tou muito, então o processo de re- democratização no Brasil veio acompanhado por demandas for- tes nesse sentido”, diz o professor. Não só pela necessidade de se des- concentrar a renda ao nível dos ou- tros países, mas porque a desigual- dade cria distorções políticas. É o que a ciência política, explica Melo, que também é PhD na área pela Universidade de Sussex (Rei- no Unido), estuda por meio do “teorema do eleitor mediano”: mesmo com um nível de renda si- milar ao de seus pares, a desigual- dade fez o Brasil ter uma propor- ção de pobres muito maior, o que faz a população ser naturalmente mais dependente do Estado. Como a volta da democracia e das eleições trazia de volta tam- bém aos governantes a necessida- de de votos e de aprovação da maioria, a agenda social acabou ganhando um espaço enorme, pa- ra se alinhar a essa maioria. Hoje, por outro lado, numa sociedade com mais classe média e menos pobres, isso também explica o es- gotamento do modelo e as mu- danças no tom das demandas. O sistema, no entanto, tem im- perfeições. A principal delas é de não ter tudo o que as políticas pú- blicas têm em distribuição. Como a proporção de impostos indire- tos, cobrados sobre produtos fi- nais, é maior do que a de diretos, sobre a renda, o fardo acaba sendo proporcionalmente maior para os mais pobres, que têm pouca renda e a utilizam totalmente para o con- sumo. Enquanto os 10% mais po- bres entregavam, em 2008, 32% de sua renda em impostos, os 10% mais ricos pagavam apenas 21% — padrão chileno. “Há duas formas de fazer polí- tica redistributiva, pelo lado dos gastos e pelo lado dos tributos. Temos um sistema ruim, regressi- vo e ineficiente, mas estava geran- do receita e funcionando”, diz Melo. “Acabou se criando essa si- tuação esquizofrênica, em que, ao mesmo tempo que o governo faz um grande esforço em gasto social, não se promove a igualda- de pelo lado da tributação.” Affirm A11 Airbus B6 Alelo D3 Alibaba A11, B9 ALL B2 Amazon B9 American Airlines B6 Andrade Gutierrez A7 Anglo American B1, B9 Anima D2 Antero B4 Apple B7 Arezzo B2 ARX A4 Aurelius B3 Avianca B6 Azul B6 B2W B2, D2 Banco do Brasil C2, C12, D1, D2 Barcellos Tucunduva D1 BBS D3 BM&FBovespa B5 BNDES B5 BNP B3, C1 BofA C1 BP B9 Bradesco B2, C2, D1 BRF B2 BTG Pactual B2, C2, C12 Bunge A6 Calhoun B4 Canepa C1 Carrefour B2 CCR B2, B5 CCS B7 Cemig C2 Cemil B12 Cepeda, Greco & Bandeira de Mello D1 Chevron B9 Citi B2, B9, C1, D2 Coca-Cola B8 Copasa A3, B12 Copel B2 Corporación América B6 CPFL B2 Credit Suisse B3, B4, C1 CSN C2, D2 Davivienda B9 Deloitte B3 Deutsche Bank B2 E.On A12 EcoRodovias B2 Electrolux B6 Eletrobras B4 Embaré B12 Embraer B2, B6 Engevix B6 Estácio D2 Euromonitor B6 Exxon B9 Eztec C2 Faberg B6 Facebook B1 Fator A4, C2 Ferretti B8 Fiat B5 Fibria B2 Fitch B11, C1 Furnas A7 Gafisa C2 Gartner B7 General Motors B4 Gerdau D2 Gol B2, B6 Goldman Sachs D2 Google A11, A12, B7 GPI A7 Greylock C1, C3 Grupo Bolívar B9 guide i B2, C2, D2 Hering D2 HSBC B2 IDC B7 Ikea A12 Intermarine B8 INTL FCStone C12 Iochpe-Maxion B2 iPhones B7 Itambé B12 Itaú A4, B2, B4, C2 Jackdaw B7 Jato Dynamics B4 JBS B2 Kantar B7 Klabin B2 Kroton D2 LCA A4 Localiza B2 Locamerica B2 Lojas Americanas B2, D2 Love Mondays D3 Macallan D4 Magazine Luiza B2 Mapfre C12 Marcopolo B2 Marfrig B2 Microsoft B9 Mills B2 Minerva B2 Morgan Stanley B2 Morningstar D2 Multiplus B2 Natura D2 Nestlé A11 Nucor B4 OAS A5 Pão de Açúcar B2 PayPal A11 PDG B5, C2 PepsiCo B8 Petrobras A7, A10, B2, B3, B4, C1, C2, C12 Pfizer D3 Pimco C1, C3 Porto Alegre B12 Price Futures B10 PwC B3 Quantitas C2 Queiroz Galvão A5 Randon B2 Raymond James B4 Renner B2 Robert Half D3 S&P C1 Sabesp A3 Samsung B7 Saneago C1 Santander A4, B2, B9 Schaefer. B8 Ser Educacional D2 Shell B9 Sotheby’s D4 Square A11 Standard & Poor’s B9 SulAmérica C2 Suzano B2 SW B4 Taler D1 TAM B6 Target A11 Tegma B2 Totvs B1 Tupy B2 U.S. Steel B4 Uber A11 Usiminas C2, D2 Vale B2 Verde Campo B12 Vinci B5 WEG B2 Wells Fargo D2 Xiaomi B7 XP C1, C2, D1, D2 Zephirin B4 Índice de empresas citadas em textos nesta edição Falta transparência ao ajuste fiscal Ribamar Oliveira Q uando assumiu o comando da economia, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, encontrou as contas públicas desarrumadas, no vermelho, e com grandes passivos a serem equacionados. É provável que somente dentro de algum tempo ele e o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, consigam ter clareza sobre todos os problemas que encontraram e como vão enfrentá-los. Não há dúvidas no mercado sobre a disposição de Levy e de Barbosa de entregar a meta de superávit primário de 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB) para o setor público neste ano. Desde o início, no entanto, eles disseram que a transparência das ações do governo seria um elemento fundamental para ajudar a resgatar a credibilidade na área fiscal, vítima da famosa “contabilidade criativa” dos últimos anos. O Valor passou todo o dia de ontem tentando esclarecer se as novas regras para o abono salarial, instituídas pela Medida Provisória 665/2014, valeriam para os pagamentos a serem realizados em 2015. Essa questão foi levantada pelo jornal “O Estado de S. Paulo”, que publicou matéria informando que as modificações só seriam válidas a partir de 2016. Segundo a matéria, os pagamentos em 2015 serão feitos com base nas regras válidas até 2014. O jornal citou o presidente do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), Quintino Severo, segundo quem, em 2015, será pago o direito adquirido em 2014. O Valor solicitou esclarecimentos aos Ministérios do Planejamento, da Fazenda e, por fim, ao Ministério do Trabalho sobre essa questão e não obteve resposta. O jornal queria saber apenas qual é a regra válida para os pagamentos do abono salarial neste ano. Ou seja, se em 2015 só terão direito ao abono os trabalhadores que mantiveram vínculo formal por, no mínimo, 180 dias ininterruptos no ano anterior. Além disso, se o valor do benefício passará a ser proporcional aos meses trabalhados, variando de meio salário mínimo para aqueles que trabalharam no mínimo seis meses a um salário mínimo para aqueles que trabalharam 12 meses. Essas regras foram estabelecidas pela MP 665. Antes da MP, o benefício era pago aos trabalhadores que mantiveram vínculo formal por um mês no ano anterior ao do pagamento. O valor do benefício era de um salário mínimo, independentemente do número de meses trabalhados. Ter clareza sobre essa questão não interessa apenas aos milhões de trabalhadores que ganham até dois salários mínimos e têm o direito a receber o benefício. Ela é importante também para todos aqueles que acompanham a política fiscal do governo e querem saber como as contas da União serão fechadas neste ano e como o governo espera obter o superávit primário de 1,2% do PIB. Ao anunciar as mudanças no seguro-desemprego, no abono salarial, na pensão por morte e no auxílio-doença, a área econômica estimou que haveria uma economia, já em 2015, de R$ 18 bilhões. O ministro do Planejamento informou, em entrevista à ‘Folha de S. Paulo”, que do total, R$ 9 bilhões resultariam das mudanças nas regras do seguro-desemprego, R$ 7 bilhões nas normas do abono salarial e R$ 2 bilhões por conta das alterações no benefício da pensão por morte e do auxílio-acidente. Se as novas regras para o abono salarial não valerem para os pagamentos a serem feitos em 2015, o governo não poderá contar com a economia de R$ 7 bilhões neste ano e, assim, o ganho fiscal com as medidas cairia para R$ 11 bilhões. Com isso, outras medidas terão que ser tomadas para compensar a redução. Há falta de clareza também sobre a estimativa para o ganho com as mudanças do seguro-desemprego. Um estudo feito pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) estima que as alterações do seguro-desemprego resultem em uma economia para o governo de R$ 14,78 bilhões e não de R$ 9 bilhões como estimou a equipe econômica. Com as mudanças no abono, o Dieese projetou uma redução de R$ 8,45 bilhões na despesa. No total, apenas com o abono e o seguro-desemprego, a estimativa do Dieese é de que a economia será de R$ 23,2 bilhões. O Dieese fez a sua análise para subsidiar os dirigentes sindicais que vão negociar as MPs 665 e 664 com o governo e com o Congresso. Os técnicos da entidade informaram que não sabem onde encontrar o detalhamento do cálculo que resultou na estimativa de R$ 18 bilhões de economia com as duas MPs. Como a diferença entre o que a equipe econômica projetou de ganho fiscal e o cálculo do Dieese é muito grande, é provável que o governo tenha deixado margem para ceder em alguns pontos durante as negociações. O ntem, o governo divulgou que a arrecadação de tributos federais em 2014 apresentou uma queda real de 1,79% — a primeira desde 2009, quando a redução real foi de 2,96%. O péssimo desempenho da receita está diretamente relacionado com a estagnação da economia brasileira e com a elevada desoneração tributária executada no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff. No ano passado, a Receita Federal estima que as desonerações ficaram em R$ 104 bilhões, contra R$ 78,6 bilhões em 2013. O baixo crescimento reduziu a lucratividade das empresas. Com isso, a arrecadação do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) caiu 4,58% no ano passado, em comparação com 2013. A atividade em desaceleração reduziu, igualmente, a receita do PIS e da Cofins, que caiu 3,47% em termos reais. O resultado da arrecadação carrega duas más notícias para a nova equipe econômica. A primeira é que a receita do IRPJ e da CSLL tende a ser ruim também neste ano, pois ela irá refletir a baixa lucratividade e os prejuízos das empresas em 2014. A segunda é que o resultado do ano passado só não foi pior por causa de uma receita extraordinária de R$ 24,9 bilhões, proveniente, principalmente, de pagamentos de débitos tributários que foram parcelados em condições vantajosas, com redução de multas e juros. Isto significa que o governo terá que contar também com receitas extraordinárias neste ano para fechar suas contas e alcançar a meta fiscal. Ribamar Oliveira é repórter especial e escreve às quintas-feiras E-mail [email protected] Governo não explicou como chegou à economia de R$ 18 bi 25 27 29 31 33 35 Fonte: CIAT/BID, “Qual o impacto da tributação e dos gastos públicos sociais na distribução de rendado Brasil?” (Silveira,F.G.; J.Ferreira; J.Mostafa e J.A.Ribeiro) e Brazil4Africa. * Referente a 2008/09. Paradoxo tributário Retrato dos impostos no Brasil Carga tributária, em % do PIB Impostos pagos de acordo com a renda do contribuinte (em %)* 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 29,6 0 5 10 15 20 25 30 35 27,0 26,5 27,0 27,7 28,8 30,3 31,0 32,3 31,7 32,3 33,5 33,5 34,2 34,3 33,8 34,1 Diretos Indiretos 10% mais pobres 10% mais ricos 4 28 11 10 Total de impostos pagos diretos e indiretos (em %)* 10 16 22 28 34 40 10% mais pobres 10% mais ricos 32 21 Curtas Trabalho escravo O Ministério do Trabalho resga- tou 1,590 mil pessoas em situação análoga a escravidão em 2014. O número é menor do que os mais de 2 mil trabalhadores resgatados em 2013, apesar do número de ações ter crescido de 179 para 248 entre os dois últimos anos. Os da- dos foram divulgados pelo Minis- tério Trabalho. Para 2015, o plano é concentrar as operações de com- bate em regiões remotas do país. O principal setor fiscalizado em 2014 foi a pecuária, que foi alvo de 60 ações . Olimpíada do Rio A proporção de investimentos públicos na Olimpíada de 2016, no Rio, cresceu de 26% para 36% nos últimos 12 meses. A Autorida- de Pública Olímpica (APO) divul- gou a matriz de responsabilidades dos Jogos Olímpicos , documento que engloba os compromissos as- sumidos pelos entes governamen- tais associados à organização e realização do evento. A maior par- te dos recursos públicos virá do governo federal, que vai bancar to- da a construção do Complexo Es- portivo de Deodoro. GUSTAVO LOURENCÃO/VALOR Amir Khair:“ Os tributos têm relação direta com a atividade econômica”

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Jornal Valor --- Página 2 da edição "29/01/2015 2a CAD A" ---- Impressa por ivsilva às 28/01/2015@22:36:11

A2 | Valor | Quinta-feira, 29 de janeiro de 2015Enxerto

JornalValor Econômico -CADA-BRASIL - 29/1/2015 (22:36) - Página 2-Cor: BLACKCYANMAGENTAYELLOW

Brasil

Aumentodacargatributáriafoibaseparaexpansãosocial,apontaestudoJulianaEliasDeSãoPaulo

O Brasil teve aumento expressi-vo e contínuo da carga tributárianos últimos 20 anos. A arrecada-ção alta, no entanto, está na basedo financiamento que permitiu aopaís expandir políticas sociais epromover a inclusão no período, eé essa combinação que ajuda a ex-plicarumfenômenointrigantepa-raquemolhade fora:o fatodeesseaumento ter passado razoavel-mente incólume à insatisfação dasociedadeatépouco tempoatrás.

Essa interrogação foi o ponto departida para um estudo chefiadopela Universidade de Manchestersobre as relações entre o sistematributário brasileiro e o modelo decrescimento econômico que o paísdesenvolveu. O estudo faz parte doprojeto “Brazil For Africa”, um pro-grama financiado pelo governobritânico que visa estudar diferen-tes facetas da economia brasileiraem busca de políticas a serem re-plicadasnaÁfrica.

“A democratização em 1989vem com pressão crescente da so-ciedade por políticas sociais e deredistribuição”, explica MarcusAndréMelo,professordaUniversi-dade Federal de Pernambuco e umdosresponsáveispelapesquisa. Éoque o estudo chamou de “contratosocial” brasileiro: a contrapartidaemgastossociais tambémcrescen-tesabriuumaespéciedeespaçota-citamente aceito pela população aumataxaçãomaior.

“A carga brasileira é claramen-te um ponto fora da curva dospaíses de renda similar, mas issofoi essencial para o modelo dedesenvolvimento econômico dopaís que tentamos desvendar”,diz. “O Brasil taxa muito e gastamuito, com alta redistribuição. Éum equilíbrio escandinavo.”

Nos países escandinavos, onde ataxação chega a 55% do ProdutoInterno Bruto (PIB), os indicadoressociais e o retorno em bem-estarestão bem à frente dos brasileiros— uma das principais razões quecolocaram os impostos na pautade reclamações desde as manifes-taçõesde2013.Masopesotributá-riovemdemuitoantes.

De 1995 a 2010, período co-berto pelo estudo, houve um sal-to de sete pontos, de 27% para34% do PIB. Hoje, oscila em tornode37%, enquantoamédia latino-americana é de 20%. Segundo ospesquisadores, o avanço socialfoi igualmente enorme desde lá,e foi issoquefomentouesse “con-trato” por duas décadas.

E não são apenas políticas dedistribuição direta que entram naconta, como o Bolsa Família. Pesa,principalmente, todo o arcabouçode assistência do Estado brasileiro,chancelado em boa parte pela

Constituição de 88, que inclui umsistema universal e gratuito desaúde, educação também gratuitae uma Previdência ampla. Só a Pre-vidência, que inclui os gastos comaposentadorias, licenças e seguro-desemprego, responde por cercade dez pontos dos 37% que se pagahojeemimpostos.

“Outros países, como China eChile, têm uma carga tributáriamenor que a do Brasil, mas lá nãoexiste previdência pública”, diz oconsultor Everardo Maciel, secre-tário da Receita durante o governoFHC. Para os chilenos, os impostosrepresentam 20% do PIB e, para oschineses, 17%. “A carga tributária édo tamanho da despesa, e o tama-nho da despesa é fruto de uma op-ção feitapela sociedade. ”

OeconomistaAmirKhair, ex-se-cretáriomunicipaldasFinançasnagestão da prefeita Luiza ErundinaemSãoPaulo, lembra tambémqueboa parte do aumento na arreca-dação veio do crescimento vigoro-so da última década. “Os tributostêm relação direta com a atividadeeconômica. Quando o país cresce,diminui a inadimplência, as pes-soas têm folga na renda, as empre-sas têmmais lucros. ”

Por outro lado, a desacelera-ção da economia é um dos fato-res identificados pelos especia-listas como responsável pelo es-gotamento do modelo. Sem cres-cimento,aarrecadaçãocaie, comela, a folga para se continuar ar-cando com o sistema social.

E por que a demanda pelo am-paro social apareceu tão maisforte no Brasil do que em outrospaíses que também se democra-tizaram e refizeram suas consti-tuições na mesma época?

Segundo Melo, coordenadordo estudo, a resposta passa ne-cessariamente pelo grau de dis-tribuição de renda, tendo em vis-ta que o Brasil saiu do regime mi-litar como um dos países maisdesiguaisdomundo—“sóperdiapara Serra Leoa”, afirma.

“Os militares trouxeram desen-volvimento, mas houve arrochosalarial e a desigualdade aumen-tou muito, então o processo de re-democratização no Brasil veioacompanhado por demandas for-tes nesse sentido”, diz o professor.Não só pela necessidade de se des-concentrararendaaoníveldosou-trospaíses,masporqueadesigual-dadecriadistorçõespolíticas.

Éoqueaciênciapolítica,explicaMelo, que também é PhD na áreapela Universidade de Sussex (Rei-no Unido), estuda por meio do“teorema do eleitor mediano”:mesmo com um nível de renda si-milar ao de seus pares, a desigual-dade fez o Brasil ter uma propor-ção de pobres muito maior, o quefaz a população ser naturalmentemaisdependentedoEstado.

Como a volta da democracia edas eleições trazia de volta tam-bém aos governantes a necessida-de de votos e de aprovação damaioria, a agenda social acabouganhando um espaço enorme, pa-ra se alinhar a essa maioria. Hoje,por outro lado, numa sociedadecom mais classe média e menospobres, isso também explica o es-gotamento do modelo e as mu-dançasnotomdasdemandas.

O sistema, no entanto, tem im-perfeições. A principal delas é denão ter tudo o que as políticas pú-blicas têm em distribuição. Comoa proporção de impostos indire-tos, cobrados sobre produtos fi-nais, é maior do que a de diretos,sobre a renda, o fardo acaba sendoproporcionalmente maior para osmais pobres, que têm pouca rendaeautilizamtotalmenteparaocon-sumo. Enquanto os 10% mais po-bres entregavam, em 2008, 32% desua renda em impostos, os 10%mais ricos pagavam apenas 21% —padrãochileno.

“Há duas formas de fazer polí-tica redistributiva, pelo lado dosgastos e pelo lado dos tributos.Temos um sistema ruim, regressi-voe ineficiente,masestavageran-do receita e funcionando”, dizMelo. “Acabou se criando essa si-tuação esquizofrênica, em que,ao mesmo tempo que o governofaz um grande esforço em gastosocial, não se promove a igualda-de pelo lado da tributação.”

Affirm A11Airbus B6Alelo D3Alibaba A11, B9ALL B2Amazon B9American Airlines B6Andrade Gutierrez A7Anglo American B1, B9Anima D2Antero B4Apple B7Arezzo B2ARX A4Aurelius B3Avianca B6Azul B6B2W B2, D2Banco do Brasil C2, C12,D1, D2Barcellos Tucunduva D1BBS D3BM&FBovespa B5BNDES B5BNP B3, C1BofA C1BP B9Bradesco B2, C2, D1

BRF B2BTG Pactual B2, C2, C12Bunge A6Calhoun B4Canepa C1Carrefour B2CCR B2, B5CCS B7Cemig C2Cemil B12Cepeda, Greco & Bandeirade Mello D1Chevron B9Citi B2, B9, C1, D2Coca-Cola B8Copasa A3, B12Copel B2Corporación América B6CPFL B2Credit Suisse B3, B4, C1CSN C2, D2Davivienda B9Deloitte B3Deutsche Bank B2E.On A12EcoRodovias B2Electrolux B6Eletrobras B4

Embaré B12Embraer B2, B6Engevix B6Estácio D2Euromonitor B6Exxon B9Eztec C2Faberg B6Facebook B1Fator A4, C2Ferretti B8Fiat B5Fibria B2Fitch B11, C1Furnas A7Gafisa C2Gartner B7General Motors B4Gerdau D2Gol B2, B6Goldman Sachs D2Google A11, A12, B7GPI A7Greylock C1, C3Grupo Bolívar B9guide i B2, C2, D2Hering D2HSBC B2

IDC B7Ikea A12Intermarine B8INTL FCStone C12Iochpe-Maxion B2iPhones B7Itambé B12Itaú A4, B2, B4, C2Jackdaw B7Jato Dynamics B4JBS B2Kantar B7Klabin B2Kroton D2LCA A4Localiza B2Locamerica B2Lojas Americanas B2, D2Love Mondays D3Macallan D4Magazine Luiza B2Mapfre C12Marcopolo B2Marfrig B2Microsoft B9Mills B2Minerva B2Morgan Stanley B2

Morningstar D2Multiplus B2Natura D2Nestlé A11Nucor B4OAS A5Pão de Açúcar B2PayPal A11PDG B5, C2PepsiCo B8Petrobras A7, A10, B2,B3, B4, C1, C2, C12Pfizer D3Pimco C1, C3Porto Alegre B12Price Futures B10PwC B3Quantitas C2Queiroz Galvão A5Randon B2Raymond James B4Renner B2Robert Half D3S&P C1Sabesp A3Samsung B7Saneago C1Santander A4, B2, B9

Schaefer. B8Ser Educacional D2Shell B9Sotheby’s D4Square A11Standard & Poor’s B9SulAmérica C2Suzano B2SW B4Taler D1TAM B6Target A11Tegma B2Totvs B1Tupy B2U.S. Steel B4Uber A11Usiminas C2, D2Vale B2Verde Campo B12Vinci B5WEG B2Wells Fargo D2Xiaomi B7XP C1, C2, D1, D2Zephirin B4

Índice de empresas citadas em textos nesta edição

Falta transparênciaaoajuste fiscalRibamarOliveira

Quando assumiu ocomando daeconomia, oministro daFazenda, Joaquim

Levy, encontrou as contaspúblicas desarrumadas, novermelho, e com grandespassivos a serem equacionados.É provável que somente dentrode algum tempo ele e oministro do Planejamento,Nelson Barbosa, consigam terclareza sobre todos osproblemas que encontraram ecomo vão enfrentá-los. Não hádúvidas no mercado sobre adisposição de Levy e de Barbosade entregar a meta de superávitprimário de 1,2% do ProdutoInterno Bruto (PIB) para o setorpúblico neste ano. Desde oinício, no entanto, elesdisseram que a transparênciadas ações do governo seria umelemento fundamental paraajudar a resgatar acredibilidade na área fiscal,vítima da famosa“contabilidade criativa” dosúltimos anos.

OValorpassoutodoodiadeontemtentandoesclarecer seasnovas regrasparaoabonosalarial, instituídaspelaMedidaProvisória665/2014, valeriamparaospagamentosa seremrealizadosem2015.Essaquestãofoi levantadapelo jornal “OEstadodeS.Paulo”,quepublicoumatéria informandoqueasmodificações sóseriamválidasapartirde2016. Segundoamatéria,ospagamentosem2015serão feitos combasenas regrasválidasaté2014.O jornal citouopresidentedoConselhoDeliberativodoFundodeAmparoaoTrabalhador (FAT),QuintinoSevero, segundoquem,em2015, serápagoodireitoadquiridoem2014.

OValor solicitouesclarecimentosaosMinistériosdoPlanejamento,daFazendae,por fim,aoMinistériodoTrabalhosobreessaquestãoenãoobteve resposta.O jornalqueria saberapenasqual éaregraválidaparaospagamentosdoabonosalarialnesteano.Ouseja, seem2015só terãodireitoaoabonoos trabalhadoresquemantiveramvínculo formalpor,nomínimo,180diasininterruptosnoanoanterior.

Alémdisso, seovalordobenefíciopassaráa serproporcionalaosmesestrabalhados, variandodemeiosaláriomínimoparaaquelesquetrabalharamnomínimoseismesesaumsaláriomínimoparaaquelesque trabalharam12meses. Essas regras foramestabelecidaspelaMP665.AntesdaMP,obenefícioerapagoaostrabalhadoresquemantiveramvínculo formalporummêsnoanoanterioraodopagamento.Ovalordobenefícioeradeumsaláriomínimo,independentementedonúmerodemeses trabalhados.

Ter clareza sobreessaquestãonão interessaapenasaosmilhõesde trabalhadoresqueganhamatédois saláriosmínimose têmodireitoa receberobenefício. Elaéimportante tambémpara todosaquelesqueacompanhamapolítica fiscaldogovernoequeremsabercomoascontasdaUniãoserão fechadasnesteanoecomoogovernoesperaobterosuperávitprimáriode1,2%doPIB.

Aoanunciarasmudançasnoseguro-desemprego,noabono

salarial,napensãopormorteenoauxílio-doença, aáreaeconômicaestimouquehaveriaumaeconomia, jáem2015,deR$18bilhões.OministrodoPlanejamento informou,ementrevistaà ‘FolhadeS.Paulo”,quedototal,R$9bilhõesresultariamdasmudançasnasregrasdoseguro-desemprego,R$7bilhõesnasnormasdoabonosalarial eR$2bilhõesporcontadasalteraçõesnobenefíciodapensãopormorteedoauxílio-acidente. Seasnovasregrasparaoabonosalarialnãovaleremparaospagamentosaseremfeitosem2015,ogovernonãopoderácontar comaeconomiadeR$7bilhõesnesteanoe, assim,oganhofiscal comasmedidascairiaparaR$11bilhões.Comisso,outrasmedidas terãoqueser tomadasparacompensara redução.

Há faltadeclareza tambémsobreaestimativaparaoganhocomasmudançasdoseguro-desemprego.UmestudofeitopeloDepartamentoIntersindicaldeEstatísticaeEstudosSocioeconômicos(Dieese)estimaqueasalteraçõesdoseguro-desempregoresultememumaeconomiaparaogovernodeR$14,78bilhõesenãodeR$9bilhõescomoestimouaequipeeconômica.Comasmudançasnoabono,oDieeseprojetouumareduçãodeR$8,45bilhõesnadespesa.Nototal, apenascomoabonoeoseguro-desemprego, aestimativadoDieeseédequeaeconomiaserádeR$23,2bilhões.

ODieese feza suaanáliseparasubsidiarosdirigentes sindicaisquevãonegociarasMPs665e664comogovernoecomoCongresso.Os técnicosdaentidade informaramquenãosabemondeencontrarodetalhamentodocálculoqueresultounaestimativadeR$18bilhõesdeeconomiacomasduasMPs.Comoadiferençaentreoqueaequipeeconômicaprojetoudeganhofiscal eocálculodoDieeseémuitogrande, éprovávelqueogovernotenhadeixadomargemparacederemalgunspontosduranteasnegociações.

Ontem, o governodivulgou que aarrecadação detributos federaisem 2014

apresentou uma queda real de1,79% — a primeira desde 2009,quando a redução real foi de2,96%. O péssimo desempenhoda receita está diretamenterelacionado com a estagnaçãoda economia brasileira e com aelevada desoneração tributáriaexecutada no primeiromandato da presidente DilmaRousseff. No ano passado, aReceita Federal estima que asdesonerações ficaram em R$104 bilhões, contra R$ 78,6bilhões em 2013.

Obaixocrescimentoreduziualucratividadedasempresas.Comisso, aarrecadaçãodo ImpostodeRendadasPessoas Jurídicas (IRPJ)edaContribuiçãoSocial sobreoLucroLíquido(CSLL) caiu4,58%noanopassado, emcomparaçãocom2013.Aatividadeemdesaceleraçãoreduziu,igualmente, a receitadoPISedaCofins,quecaiu3,47%emtermosreais.

Oresultadodaarrecadaçãocarregaduasmásnotíciasparaanovaequipeeconômica.Aprimeiraéqueareceitado IRPJ edaCSLL tendeaser ruimtambémnesteano,pois ela irá refletir abaixa lucratividadeeosprejuízosdasempresasem2014.Asegundaéqueoresultadodoanopassadosónão foipiorporcausadeumareceitaextraordináriadeR$24,9bilhões,proveniente,principalmente,depagamentosdedébitos tributáriosque foramparceladosemcondiçõesvantajosas, comreduçãodemultase juros. Isto significaqueogoverno teráquecontar tambémcomreceitasextraordináriasnesteanopara fechar suascontasealcançarameta fiscal.

RibamarOliveira é repórter especial eescreve às quintas-feirasE-mail [email protected]

GovernonãoexplicoucomochegouàeconomiadeR$18bi

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Fonte: CIAT/BID, “Qual o impacto da tributação e dos gastos públicos sociais na distribução de renda do Brasil?” (Silveira,F.G.; J.Ferreira; J.Mostafa e J.A.Ribeiro) e Brazil4Africa. * Referente a 2008/09.

Paradoxo tributárioRetrato dos impostos no Brasil

Carga tributária, em % do PIB

Impostos pagos de acordo com a renda do contribuinte(em %)*

1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010

29,6

0

5

10

15

20

25

30

35

27,0 26,5 27,027,7

28,8

30,331,0

32,331,7

32,333,5 33,5

34,2 34,3 33,8 34,1

Diretos Indiretos

10% mais pobres 10% mais ricos

4

28

11 10

Total de impostos pagos diretos e indiretos(em %)*

10

16

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40

10% mais pobres 10% mais ricos

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Curtas

TrabalhoescravoOMinistériodoTrabalhoresga-

tou1,590milpessoasemsituaçãoanálogaaescravidãoem2014.Onúmeroémenordoqueosmaisde2mil trabalhadores resgatadosem2013, apesardonúmerodeações ter crescidode179para248

entreosdoisúltimosanos.Osda-dos foramdivulgadospeloMinis-térioTrabalho.Para2015,oplanoéconcentrarasoperaçõesdecom-bateemregiões remotasdopaís.Oprincipal setor fiscalizadoem2014 foiapecuária,que foi alvode60ações .

OlimpíadadoRioAproporçãode investimentos

públicosnaOlimpíadade2016,noRio, cresceude26%para36%nosúltimos12meses.AAutorida-dePúblicaOlímpica (APO)divul-gouamatrizde responsabilidadesdos JogosOlímpicos ,documento

queenglobaoscompromissosas-sumidospelosentesgovernamen-tais associadosàorganizaçãoerealizaçãodoevento.Amaiorpar-tedos recursospúblicosvirádogoverno federal, quevaibancar to-daaconstruçãodoComplexoEs-portivodeDeodoro.

GUSTAVOLOURENCÃO/VALOR

AmirKhair:“Os tributos têmrelaçãodireta comaatividade econômica”