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    Msica que matiza, pintura que encena:

    a expresso mimtica em Caravaggio e Monteverdi

    Heloisa Muller11. Caravaggio

    Em 1993, a Galeria Nacional da Irlanda anuncia ao mundo que havia encontradoa tela A Priso de Cristodo pintor italiano Michelangelo da Merisi, dito Caravaggio,desaparecida por mais de 200 anos. A tela foi pintada em 1602, quando o artista tinha31 anos e, j famoso e popular, trabalhava para a famlia Mattei, residindo em seu

    palcio - uma construo que ocupava uma quadra inteira no centro de Roma. Alitambm vivia seu principal patrocinador, Ciriaco Mattei, famoso mecenas ecolecionador de arte. O artista que fosse por ele indicado seria visto por gente muitoimportante do mercado das artes. A Roma de ento era uma cidade cosmopolita,sofisticada e rica, muito marcada pelo clima de competio entre os artistas que aliacorriam em busca de trabalho.

    A priso de Cristo recria o momento bblico em que Judas, guiando umamultido armada com espadas e paus, agarra-se a Cristo para beij-lo. uma cenaescura, de perseguio, traio e medo, representada num beco qualquer da cidade.Focos de luz incidem sobre os personagens e iluminam apenas parte das figuras,emprestando-lhes um aspecto monumental e evidenciando suas expresses faciais. Aluz se concentra nos detalhes, isolando as figuras de primeiro plano daquelas deimportncia secundria, aumentando a tenso emocional de forma exponencial. comose estivessem se movendo na escurido e um sbito facho de luz os revelasse nomomento mais intenso de seu drama. Estes contrastes vigorosos de luz e sombraimprimem uma sensao muito grande de veracidade e realismo aos fatos que aliacontecem e se tornaro caractersticos do estilo desenvolvido por Caravaggio. Esta suatcnica de iluminao dramtica, o tenebrismo, passou a ser reconhecida como umacaracterstica da pintura deste perodo, um artifcio bastante efetivo para converter a telaem movimento, em cena. Caravaggio visto hoje como um dos maiores representantesda pintura barroca, o gnio pictrico que conseguiu assegurar que a mensagem religiosada contrarreforma chegasse aos fiis atravs de uma arte inovadora e de grande impactoemotivo.

    De fato, uma das ambies do Barroco nos impressionar com suasenormidades, sua magnificncia, seu dramatismo e grandiosidade, diz Waldemar

    Januszczak .E quando o Barroco esteve em mos de grandes gnios, tornou-se escuro earriscado e, alm de tudo, psicolgico, turvando a linha divisria entre arte erealidade.2Caravaggio aproximou as pessoas comuns da arte religiosa, fazendo quetodos pudessem compreende-la, senti-la melhor. Comovia sua forma de expressorealista, onde as figuras parecem estar em movimento, ali frente, quase saltando datela, impactando e transformando o expectador.

    1Doutora em Musicologia pela USP. Mestre em Cincias Sociais pela UFPB. Bacharel em Msica pela

    UFG. Professora do departamento de Msica da UFPB. E-mail: [email protected], 2010, 03:37

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    Tambm mudou o elenco de protagonistas. Gente de verdade reunida emtabernas e mercados eleita pela expressividade de seus rostos, ao invs dosdeuses impossveis de outrora. Vemos [em suas telas] o homem do mercado, aatraente taberneira, gente como a que se poderia ver nas ruas, possvel de sereconhecer e com as quais se podia identificar. como se Caravaggio houvessese proposto a reinventar totalmente a arte religiosa e aproveitasse todos ostruques existentes no Barroco para captar nossa ateno. Tudo isto resulta muitoreal, sensvel, credvel.3

    ltima obra que Caravaggio produziu para a famlia Mattei, A priso de Cristopermaneceu por 200 anos no mesmo palcio, como herana das geraes que ali sesucederam. No incio muito apreciado, o quadro se tornou objeto de desejo dos amigos edemais pessoas que visitavam o palcio, fato que motivou a reproduo de centenas decpias, sabe-se que pelo menos uma para a prpria famlia Mattei. Caravaggio ficaramuito famoso e estava na moda. E ainda que alguns do clero e da crtica sehorrorizassem com sua falta de decoro, seus modelos de ps sujos e seu excesso denaturalismo, o pblico o compreendia e respondia. Sua tcnica expressiva e seudramatismo romperam as barreiras de Roma e se infiltraram na arte Barroca de toda aEuropa. Ali aonde chegasse, Espanha, Flandres, Holanda, transformava a arte local.4

    Porm, as modas artsticas tambm sofrem transformaes e antes do final dosculo sua arte havia perdido a popularidade de um modo indito. A Era das Luzesqueria ideias clssicas, no realismo sujo. A arte deveria ser edificante e no obscura,terrena ou natural demais. Cristo era um paradigma de virtude e portanto deveria estaridealmente bem, pois isto refletiria o estado de sua alma. Obviamente, Caravaggio nose encaixava neste modo de pensar e o que tinha sido o mais celebrado e mais caroquadro foi aos poucos sendo esquecido.5Em 1793, foi feito um inventario da famlia

    Mattei e aPriso de Cristofoi listada como sendo de Gerard Van Honthorst, um artistaholands, cuja fama estava em ascenso poca. O motivo dessa nova paternidade podeter sido a vontade de aumentar o preo na hora de vender; no se sabe, mas o queinteressa que o quadro foi perdido.

    O reconhecimento de Caravaggio vai ressurgir to somente no sculo XX, naprpria Itlia do ps-guerra, quando os tempos difceis da reconstruo desenvolveramum novo gosto pelo cinema e literatura realistas. Foi ento que o grande realista dacontrarreforma, o artista que tentara superar a arte maneirista de seu tempo modelandofiguras sagradas a partir da expresso de pessoas comuns, teve seus trabalhos mais umavez considerados. Em 1951, suas telas so reunidas para uma exposio em Milo, mas

    A Priso de Cristoexposta foi escolhida entre as primeiras cpias feitas ainda no sculo

    XVII, pois o original ainda estava perdido. Sua representao da inocncia perseguidapela corrupo agora falava diretamente ao nosso tempo. As pessoas vem muitascoisas dilacerantes do nosso prprio presente e Cristo personifica um homem sobre oqual se expressa toda a vulnerabilidade dos injustamente atacados, daqueles que so

    presos pelas foras do poder do imprio das sombras.6Na verdade, estudos recentes mostram traos de uma rejeio esttica obra de

    Caravaggio ainda no sculo em que o pintor viveu, e embora seu tambm famoso ealarmante comportamento antissocial tenha sido enfatizado exausto pela crtica, no

    3Idem, 14:034Idem, 17:305

    BUGLER, 2009, 27:176Idem,47:43

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    este o fator determinante para a perda de sua popularidade. Tem peso infinitamentemaior, sem dvida, sua opo estilstica e a recusa em seguir os preceitos da concepoartstica vigente entre os finais dos anos Quinhentos e o incio dos Seiscentos, achamada maniera. Trata-se de um estilo que, de forma processual, foi deixando para

    trs a expresso revolucionria e apaixonada de artistas como Pontormo e Rosso, emfavor de um retorno a ideais clssicos de equilbrio, proporo e harmonia, que o gostopalaciano ento elegera. Vasari a figura terica mais proeminente desta tendncia.

    Mas ao lado deste gosto palaciano ancorado em ideais clssicos que rejeitavamos princpios artsticos de Caravaggio, existia outra intelligentsiaque valorizava a artecomo expresso, como contato direto com o indivduo atravs da experincia imediata,carnal e sensorial, prpria da natureza do homem. Uma tendncia que vive uma fase de

    particular fortuna no contexto cultural romano dos primeiros decnios do sculo XVII.Um exemplo evidente desta disposio o testemunho de Vincenzo Giustiniani, ricocolecionador e grande conhecedor da arte de seus contemporneos. No negando asqualidades do pintar maniera, que subtendia em sentido geral, a preocupao formal

    com aBeleza, com o rigor de determinados padres pictricos tidos como de bom gosto,Giustiniani aponta que a verdadeira pintura deve tender ao justo meio termo entre amaniera e a natureza do homem. Em seu Discorso sulla Pittura, escrito em 1620,afirma que os maiores artistas contemporneos eram aqueles capazes de sintetizar asvantagens da pintura manieracom a imitao direta da natureza, pois isto o maisdifcil e excelente modo de pintar.So eles Caravaggio, Annibale Carracci e GuidoReni, entre os quais alguns do maior nfase natureza que maniera, e algum mais maniera que natureza, mas sem desviar-se de um nem do outro modo de pintar. Todos

    pressurosos para alcanar o bom desenho, o verdadeiro colorido e a iluminao prpriae verdadeira.7Embora de forma diversa, tambm o terico bolonhs Giovan BattistaAgucchi, reconhece e valoriza a arte imitativa de Caravaggio, colocando-o no rol dosmelhores de seu tempo. Em seu Trattato della Pittura,provavelmente escrito em 1615,

    individua trs gneros de retrato: aquele idealizante que representa as pessoasmelhores do que a realidade, aquele naturalstico que as representa tal e qual, eaquele caricatural que as faz pior. Esta tipologia podemos encontrar naAntiguidade e tambm nos tempos modernos: Rafael e a escola Romanaseguindo a maneira das estatuas antigas tem sobre os outros imitadores, osmelhores: e o Bassano foi um Pierico [de Piria regio da Grecia] ao assemelharos piores. E uma grande parte dos modernos figurou os iguais e entre estes esto Caravaggio, excelentssimo no colorir, o qual se deve comparar a Demetrio,por que deixou para trs a ideia da beleza, disposto a seguir em tudo a

    imitao8

    Porm com o passar dos anos, acirram-se os nimos da crtica que v naimitao naturalista de Caravaggio uma forma vulgar de arte e passa a denegrir suaobra. Figura neste grupo o famoso terico da arte e um de seus primeiros bigrafos,Giovanni Bellori, que o considerou um pintor privado de talento, decoro econhecimento sobre pintura. Para Elizabetta Di Stefano, saliente-se, Bellori est entre osmais insgnes arautosdas tendncias classicistas que se consolidaram no curso dosSeiscentos italianos. Em seu texto Le vite depittori, scultori et architetti moderni,Bellori ratifica, graas sua autoridade de ilustre antiqurio e cultor de arte, a

    7

    GIUSTINIANI , Trattato della Pittura.In: FECI, BORTOLOTTI, BRUNI, 2002.8STEFANO, 2007, p.30

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    superioridade da beleza ideal, seja em relao mecnica imitao do real, seja emrelao desenfreada liberdade fantstica. O ensaio de Bellori justamente famoso esua centralidade na esttica classicista do Seiscentos amplamente reconhecido pelacrtica.9 Na prtica, Bellori condena os pintores realistas por ver em sua arte uma

    imitao mecnica da natureza, ou seja, sem mediao entre o real e o ideal. Para ele ofoco da arte deve estar na imitao das ideias, do modelo ideal da beleza e da virtude,nico caminho para alcanar a verdadeira essncia espiritual.

    necessrio referir ainda que o estilo palaciano que florescera durante oquinhentismo italiano chega ao final do sculo marcado pela supremacia de uma arteculta, artificiosamente expressiva e algo decorativa, que se voltava em demasia para

    padres esquemticos e pr-estabelecidos a um ideal abstrato de beleza. Um exemplointeressante desta elitizao da arte pode ser visto no texto Il lamento della pittura(1605), do conceituado terico maneirista Federeco Zuccari, o qual critica os pintoresque buscavam apenas satisfazer o olho do ignorante vulgar. Para ele, o trabalho doartista deveria se harmonizar com os anseios e concepes estticas da aristocracia

    local, mesmo que para isto tivesse que submeter seu talento a cnones artsticos emodelos pr-estabelecidos. As vantagens no eram pequenas, pois, no horizonte sevislumbrava a possibilidade de trabalhar muito para uma corte muito rica. No de seestranhar, assim, que em tal ambiente artstico e entre este pblico de educado gosto,tenha se difundido a figura do connaisseur pessoa culta que passa a estabelecer um

    juzo sobre arte fundado em modelos ideais. Distinguindo-se do apreciador comum,pouco a pouco este conhecedorou especialistavai assumindo prerrogativas de alcanara essncia da beleza que a obra contm. O j citado tratado de Agucchi tambmtematiza sobre esta questo. Diz ele: as coisas pintadas e imitadas do natural agradamao povo porque de costume se ver no que feito, e a imitao daquilo que ele conhecelhe agrada. Mas ao homem conhecedor dada a condio de elevar o pensamento ideia do belo extrado da natureza. Este belo o deixa extasiado por que o aproxima daobra divina.10Em seu ensaio sobre a esttica do Seiscentos, Di Stefano mostra que anovidade apresentada por Agucchi haver transferido a conscincia que o artista tem desua obra de arte para o observador que a julga. Assim, a tradio filosfico-literria deconferir prestgio ao ato criativo, vigente durante sculos, sofre uma inflexo e passa aatribuir ao fruidor culto, ao conhecedor, a competncia esttica e o refinamento de

    juzo, que o colocam, no fundo, sobre o mesmo plano do artista.11 Ou seja, os papisdo artista e do conhecedor passam a se confundir, uma vez que ambos so capazes dealcanar os aspectos metafsicos da obra, ou seja a Idea. A clivagem entre prazer dossentidos, prpria do povo inculto e prazer intelectual, prpria de entendidos est em

    processo: aos poucos ser consignada ao fruidor culto a mesma importncia do artista.Por outro lado, existe uma percepo de que a intelectualizao da arte foitambm promovida pelo estreitamento de suas relaes com as letras e a filosofia, oextrato social mais privilegiado dos sales cortesos. desta ligao que nasce atratadstica sobre arte do perodo, em sua grande parte voltada para a produo decarter literrio destinada a alcanar os amplos sales de uma fatia mais culta dasociedade a aristocracia italiana emergente. De fato, estes textos refletiram todos ostemas que a cultura humanista de raiz platnica havia proposto. Motivos que tomavam oamor como princpio gerador de todas as aes humanas, como fora universal capaz de

    9Idem.10

    Ibid., p.3111Idem.

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    trazer bondade, gentileza e beleza aos aspectos da natureza e do mundo sensvel.Tambm a insistncia sobre a beleza, vista como supremo elemento de harmonizao dosensvel com a essncia, no menos iluminadora dos caminhos estticos desenvolvidosdurante este ltimo sopro de classicismo humanista em terras italianas. Esttica que,

    embora passvel de um rebuscamento que avana para um processo de exausto, viradquirindo um valor que excede a perfeita forma literria e artstica para adentrar oslimites da educao humana. Este movimento , por sua vez, fruto da maior adeso edependncia da classe artstica e intelectual ao modo de vida da corte no segundohumanismo. Apesar de ter se degenerado em modismo, sua vastssima coleo detratados teve o mrito de discutir e sistematizar alguns aspectos estticos do platonismoe transform-los em elementos formadores do gosto literrio do perodo.

    Neste sentido, embora se possa perceber, na prtica, certa prevalncia de umaexpresso revolucionria que tentava refigurar os conflitos e a insegurana da condiohumana, permanece esta constante oscilao entre os princpios da tradio clssica emsua pregao pelo equilbrio e sobriedade e a inveno expressiva dramtica das

    primeiras dcadas dos anos Seiscentos. Oscilao que estar fortemente presentetambm no desenvolvimento da msica neste perodo, como se ver em seguida.

    2. Monteverdi

    A priso de Cristo tinha apena 5 anos de existncia quando, na cidade deMntua, d-se a estreia da pera LOrfeo do compositor Claudio Monteverdi, quecontava ento 40 anos e trabalhava para a corte ducal de Vincenzo Gonzaga, umimportante mecenas das artes e das cincias. Mntua estava longe de oferecer aMonteverdi as oportunidades de trabalho que Roma oferecera a Caravaggio, que ganhoufama e dinheiro. O compositor no teve vida fcil do ponto de vista econmico,trabalhando sob as ordens de um patro mesquinho e controlador, mas soube se

    beneficiar dos inmeros contatos que travou com artistas e poetas durante suapermanncia na corte ducal e das conexes com compositores das cortes de Ferrara eFlorena, centros de influencia no desenvolvimento musical da poca. Alm disso,acompanhou o duque em suas viagens a Flandres e Hungria onde pde travarconhecimento com outros compositores e novas sonoridades. neste contexto artsticode talhe corteso que nasce LOrfeo, como a primeira tentativa bem sucedida de unirmsica, teatro e dana numa s obra. Encenada pela primeira vez no palcio ducal em1607, a obra um marco inovador na histria da msica, pois representa o primeiroexemplo do que viria a se tornar uma nova forma de arte, a pera. Monteverdi toma o

    mito grego como tema e, ao lado do libretista Alessandro Striggio, monta um espetculoteatral que canta o drama deste heri cantor.Na corte dos Gonzaga, h 16 anos, trabalhando como intrprete e arranjador,

    Monteverdi j tinha uma base slida para a msica teatral, ento em moda nas cortesitalianas, e havia composto outras obras para cena, a exemplo do bailado Os amores de

    Diane e Endimone de 1604, do qual aproveitou alguns elementos musicais em suaprimeira peraLOrfeo, querene gneros de diferentes pocas. Para Harnoncourt,

    esta pera, que to brilhantemente inaugurou o Barroco, ao mesmo tempo altima obra em que se explora a riqueza formal e a suntuosa paletamulticolorida de sonoridades da msica renascentista. [..] LOrfeo a primeiraobra planejada para preencher o programa de todo um sero, o que causouverdadeira sensao. At aquele momento, somente a poesia lrica fora

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    musicada. Os madrigais assim criados duravam no mximo de dois a quatrominutos. Eis que Monteverdi compe um poema pastoral uma fabula que eleprprio batiza de fbula em msicaum drama com durao de uma hora emeia quando cantado. Com isto ele impe a si mesmo e tem que enfrentar uma tarefa indita: descobrir como dar coerncia a uma pea com elementos todiversos, por meio de uma nova forma. Os ingredientes bsicos eram omadrigal, o novo canto falado e uma imaginao altamente criativa e original.Apesar disto, era necessrio um arcabouo que fornecesse a indispensvelunidade estrutural, fundindo as diferentes partes isoladas num conjunto conexo,para dar ao ouvinte a impresso de uma obra completamente orgnica12.

    A msica monteverdiana alterna climas de suprema alegria e festa, pois se trata de umcasamento, e louvores so cantados beleza da natureza, ao sol e felicidade. E,naturalmente, a partir do anncio da morte de Eurdice pela infeliz mensageira, o climaemocional muda bruscamente, se tornando escurecido e angustiado, dramtico. Ocarter da pea da para frente se mantm taciturno e trgico. Monteverdi cria ambientes

    mimticos para cada uma das situaes e, mesmo que esteja ambientada num espaomitolgico longnquo, a obra se reveste de verossimilhana. Ao ouvir o canto lamentosode Orfeu, dele se pode compadecer como se estivssemos em sua pele, ou se ele fossealgum muito prximo. Sua dor, sua alegria ou sua angstia passam a se refletir emnosso animo de forma catrtica.

    Muito mais do que a palavra, a msica que faz sentir. E este sentir a suapaleta de tintas, a matria de seu trabalho. Em carta de 22 de outubro de 1636,Monteverdi declara o compromisso de sua arte com a imitao dos afetos:

    Creio que [meu tratado] no ser desvalente ao mundo. Provei na prtica,quando escrevia o lamento de Arianna, o grande esforo que necessriofazer para realizar o pouco que consegui no campo da imitao. Noencontrei nenhum livro que me abrisse a via natural para a imitao, nemque me iluminasse sobre o que deveria ser um imitador, a no ser Plato.Mas ele espargia uma luz longnqua, e ento s tenuemente minha vistaflbil discernia o pouco que mostrava.13

    E mais adiante, fala sobre a natureza dos sentimentos humanos como matria de suamsica:

    encaminhei meus estudos por outra via, apoiando-os sobre o fundamento dosmelhores filsofos escrutadores da natureza. E porque vejo pelas minhas

    leituras e na medida em que escrevo msica, a partir de tais observaes, que osafetos concordam com as referidas reflexes destes filsofos e com asnecessidades da natureza, e ento comprovo que as regras musicais (docontraponto dominante) no podem de fato satisfazer as necessidades danatureza, denominei meu livro de segunda prtica.14

    Quando escreve contraponto dominante, est se referindo pratica compositivaquinhentista anterior a ele, a prima pratica,ao passo que quando se refere segunda

    12HARNONCOURT, 1993, p.147.13

    MONTEVERDI, Prefcio do Livro VIII. In: CHASIN, 2009, p.129.14Ibid, p.131

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    pratica est afirmando a pratica contrapontstica moderna por ele instaurada de escreverpolifonia, batizada de Seconda Pratica.

    Para Stravinsky, Monteverdi o msico mais antigo com quem os modernospodem se identificar, tanto por sua concepo emocional como pelo poder e amplitude

    de sua arquitetura, diante das quais os experimentos de seus predecessores imediatos sereduzem a miniaturas.15Ao se referir a seus predecessores, Stravinsky est evocando adinmica expressiva que inspirou e impulsionou a msica dos finais do sculo XVIflorentinos, uma nova sonoridade que a nascida, espraia-se por toda a Itlia musical dosanos seqentes. Trata-se da busca de um canto que se aproxima das formas sonoras dodizer, ou seja, da aproximao entre canto e fala que passa a ser a perspectiva esttico-musical do perodo. E os nomes de Giulio Caccini e Jacopo Peri esto inscritos nesteiderio como personagens centrais na concepo ideal e na realizao do chamado estilorecitativo,uma nova arte de cantar que estar irremediavelmente ligada ao nascimentoda prtica operstica que movimentou a vida artstica e cultural dos sculos seguintes.

    De fato, tambm na esfera da msica os anos quinhentos testemunharam

    mudanas radicais. Embora com um pouco de atraso em relao s outras artes, nesteperodo que a msica realiza a sua guinada fundamental em direo arte humanista. Eem tal movimento comparecem de forma consistente artistas e intelectuais que, ao ladode Caccini e Peri, participaram da Camerata Florentina, uma espcie de salo literriocapitaneado por seu mentor, Giovanni Bardi. Inspirados e fundados nos estudoshumanistas das artes gregas e de suas formas sociais, os freqentadores da Camerata, do

    ponto de vista musical, estavam empenhados na criao de uma msica que repusesse ocanto em sua funo primria: para eles, mover os afetos. No se pode perder de vistaque nesta poca as pesquisas filosficas e filolgicas, particularmente no campo dasartes, direcionavam-se para tudo o que tangia a arte e literatura greco-romanas, pois sealmejava encontrar os vestgios de uma civilizao tida como referencial, a qual ento

    poderia, de algum modo, nortear caminhos mais humanos ao homem que, ento,descobria-se como seu prprio centro. Apesar de saber que no seria possvel umcontato direto com a msica da Antiguidade, o contrrio do que aconteceu com aarquitetura, a poesia e a escultura, os msicos florentinos no fugiram desta perspectiva:

    buscavam, na msica grega, subsdios para empreender um novo caminho artstico,caminho este que aproximava o canto da cena, do teatro, das personagens dramticas;em suma, um caminho que colou de forma visceral a msica poesia. Para Caccini, o

    passo em direo ao teatro cantado deveria favorecer a monodia, que, ao contrrio dapolifonia, muito em moda naquele tempo, tinha uma vinculao orgnica com aexpresso dos sentimentos. Em seu tratado sobre a nova musica ele chama ateno para

    o estilo mondico e representativo:Naquela poca, comecei compondo alguns cantos para uma s voz, parecendo-me que tinham mais fora para agradar e mover que o canto para muitas vozes.Compus, naquela ocasio, os madrigais Perfidissimo volto, Vedr l mio Sol ,Dovr dunque morire [...] neste estilo adequado, do qual me servi em seguidapara as fbulas, que em Florena so representadas cantando.

    Aqueles madrigais e rias foram ouvidos nesta camerata com to afetuososaplausos, e exortaes a que continuasse a perseguir meu objetivo por talcaminho, que moveram-me a me transferir para Roma, a fim de ali mostr-los

    15RINGER, 2006.pp.x-xi.

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    tambm. L, foram ouvidos por muitos cavalheiros que se reuniam naresidncia do senhor Nero Neri, e particularmente na do senhor Lione Strozzi.Todos deram bom testemunho e me exortaram a continuar o projeto iniciado,dizendo-me que at aqueles tempos nunca haviam escutado um canto para umas voz acompanhado por um simples instrumento de cordas que tivesse tantafora para mover o afeto da alma quanto aqueles madrigais.16

    elucidativo observar como j em terras gregas a monodia tambm estiveracentralmente associada expresso afetiva: para os gregos, monodia ( = uno + = cantar) significava o canto de uma nica voz, em contraste ao canto de um grupo

    coral. Mas, desde o incio, a este significado mais tcnico se somou a conscincia de umcarter expressivo diferente, uma vez que no teatro grego o termo monodia se referia aomonlogo da tragdia e consistia numa recitao dramtica feita por um s ator. Ouseja, e desdobrando a questo, os gregos acreditavam que quando a msica executadaapenas por um cantor, tornava mais intensa a expresso de sentimentos e estados de

    alma. Vale dispor a palavra histrica: Aristfanes j criticava o tom lgubre elamentoso trabalhado pela monodia e deplorava seu abuso nas tragdias de Eurpides.Com o tempo, a palavra monodia adquiriu significado de lamento, de canto triste,saudoso ou fnebre. Com tal significado e aplicado desde ento a trabalhos literrios,em verso ou em prosa, foi transmitido nos anos quatrocentos pelos bizantinos aoshumanistas italianos.17 De sorte que no pode parecer estranho que o movimentoesttico-humanista, em busca de uma sonoridade fundada na perspectiva da estticagrega, encontrasse no potencial expressivo da monodia terreno frtil construo deuma relao efetiva e estreita entre msica e poesia, entre msica e expressividade.

    Tomemos agora Monteverdi como a face musical de Caravaggio, com o queconcretamos os objetivos deste artigo. Isto , quero indicar como no sculo XVI suas

    artes, musical e pictrica, respectivamente, enlaam-se por sua orgnica expressiva,afetiva. Monteverdi, figura que, tal como o pintor, foi visto ao final (1643) da vidacomo anacrnico, ultrapassado, excessivo.

    No Prefcio da coletnea Madrigais Guerreiros e Amorosos (Oitavo livro),publicado j na faixa dos setenta anos, Monteverdi sintetiza os fundamentos estticosque sustentaram sua msica, assim:

    Trs so as principais paixes ou afeies da alma. Assim considerei, bem comoos melhores filsofos. So elas a ira, a temperana e a humildade ou splica,como mostra, alis, a prpria natureza da nossa voz, que se faz alta, baixa emediana; na msica, claramente referidas por concitado, mole e temperado. No

    pude, porm, encontrar nas composies do passado exemplos do gneroconcitado, apenas do mole e temperado, mesmo que o gnero concitado tivessesido mencionado por Plato no terceiro livro da Retrica[...]; e sabendo aindaque o que move efetivamente nossa alma so os contrrios, e que a finalidade daboa msica mover (como afirma Bocio, ao dizer: A musica composta nosserve para enaltecer ou destruir os costumes), me dispus, com no poucoesforo e estudo a realiz-lo.18

    Refere Chasin, emMsica Serva dAlma:

    16CACCINI,Le Nuove Musiche. In: MULLER, pp. 215-216.17

    PIRROTTA,Monodia. In:Dizionario Enciclopedico, 1989, pp.175-176.18MONTEVERDI,Idem, p.21-22

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    A partir das palavras monteverdianas se vislumbra e atina que a substancianutriz de sua partitura a vida humano-afetiva, os sentimentos que se descolamda cotidianidade e se exteriorizam esteticamente pela mediao dos sons da voz,transubstanciados em arte, em msica, em canto. Canto, pois, que seconsubstancia enquanto mimeses dos afetos.19

    Trata-se de uma modulao musical que encontra nas formas da fala, do dizer, suamatria-prima; da voz, seu ponto de partida. Inequivocamente, um canto com taiscaractersticas tende a fazer-se apto para o teatro, para aes dramticas, de sorte queno se incorre em qualquer equvoco terico ao se afirmar que esta msica proto-cnica. Igualmente, no pode causar surpresa que tenha sido exatamente Monteverdi umdos primeiros compositores a escrever msica no novo gnero que ento dava seus

    passos primordiais - a pera. Paolo Fabbri aponta para esta dimenso cnica daexpressiva monodia quinhentista-seiscentista:

    Exatamente a multplice funcionalidade do canto solo o tornou um gnero devirtudes hbridas, dotado de potencialidades teatrais mesmo quando privado dadimenso cnica. Entre a cmara e o teatro esto os Dialoghi rappresentativi deFrancesco Rasi (Veneza, Alessandro Vincenti 1620), e no fundo o mesmoacontece com as duas lettere monteverdianas, alguns anos depois reeditadasconjuntamente com uma pea de explcita e celebradssima derivao teatralcomo o Lamento dArianna. Sem esquecer ainda que este estilo de cantoexpressivo era acompanhado e sublinhado por gestos, de acordo inclusive com oque j havia sido iniciado pelos cantores dos madrigais patticos do ltimoquinhentismo.20

    A obra cnica, citada por Fabbri, foi considerada por seus contemporneos,

    talvez a mais bela composio neste gnero que tenha sido feita nos nossos tempos. 21Um depoimento de poca, que vale citar, explicita a experincia da plateia ante estecanto expressivo. O testemunho do msico Marco da Gagliano, tambm envolvido nosfestejos para os quais a obra de Monteverdi havia sido encomendada e presenciara inloco a reao dos convivas. Diz ele:

    entre as muito e admirveis comemoraes que pela S. Alteza foram ordenadaspara as soberbas npcias do serenssimo prncipe, seu filho [FrancescoGonzaga], com a serenssima infanta [Margherita] de Savoia, quis que serepresentasse uma fbula em msica, e esta foi LArianna, composta para talocasio pelo senhor Ottavio Rinuccini, feito vir a Mntua especialmente para

    este fim pelo senhor duque; o senhor Claudio Monteverdi, msico celebrssimo,chefe da msica de S.A., comps as rias de modo esquisito, com o que se podeverdadeiramente afirmar que se renovasse o prestgio da antiga msica, poisvisivelmente moveu todos do teatro s lgrimas.22

    Este apenas um dos muitos depoimentos sobre a excelncia de sua msica emostra a atitude positiva ante sua nova forma de expresso, que na verdade, sintetizavaos antigos valores da msica em nome de uma imitao nascida da prpria natureza da

    19CHASIN,Idem, p.2820FABBRI,Monteverdi. In: MULLER,Idem,p.75.21

    DONI, Trattato della musica scenica. In: CHASIN,Idem, p. 192.22GAGLIANO,Prefcio de Dafne. In: Chasin, idem, p. 193.

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    voz. Giustiniani, o mesmo crtico de arte que considerou Caravaggio um dos maioresartistas de sua poca por sua habilidade em sintetizar as vantagens da pintura manieracom a imitao direta da natureza, tambm apreciar a arte musical de vis dramtico.Em seuDiscorso sopra la musica de suoi tempi, de 1628, fala sobre a interpretao das

    damas de Ferrara e de Mantua, chancelando a opo interpretativa intensamente voltada expresso dos afetos. Diz ele:

    era grande a capacidade entre as damas de Mntua e Ferrara, que entre siemulavam no apenas quanto ao timbre e disposio da voz, mas com relaoaos ornamentos de belas passagens dispostas em conjuntura oportuna, e noexageradas/.../; emulavam-se ainda no abaixar e crescer a voz forte e piano,diminuindo-a ou aumentando-a de no momento justo; ora a prolongavam, ora aretraam, com o acompanhamento de um suspiro entrecortado e suave; oratiravam passagens longas, bem executadas, claras, ora grupos; ora caminhavampor saltos, ora dispunham trilos longos, ora breves; ora [realizavam] passagenssuaves e cantadas piano, as quais, algumas vezes eram subitamente respondidaspor ecos; e tudo isso era feito principalmente com a ao do rosto, dos olhos egestos que acompanhavam apropriadamente a msica e os conceitos, esobretudo sem movimentos da pessoa, da boca e das mos que fossemimprprios, ou no orientados finalidade pela qual se cantava.23

    De forma bastante afirmativa, Giustiniani se mostra favorvel aos efeitos queaquela msica expressiva e altamente teatral operava, buscando mover, comover com ocanto, com o gestual, com a interpretao corporal. No entanto, apesar desta e outrastantas linhas descritivas sobre as emoes que este canto podia exercer, agindo nontimo das pessoas, a seconda pratica, ou seja, a msica moderna de Monteverdi,tambm sofreu severas crticas. verdade que, ao contrrio do que aconteceu com

    Caravaggio, foram poucas as vozes que se levantaram contra a nova expresso imitativado compositor cremonense, mas, na voz do terico e musicista Giovanni Maria Artusi,transformaram-se em uma polemica que durou aproximadamente dez anos. SegundoEnrico Fubini, Artusi ficou mais famoso por essa polmica do que por suas criaesmusicais e, ao se voltar contra Monteverdi, se contraps tambm a todos que optaram

    pela nova tendncia da msica tornada expresso dos afetos, ou seja, por assumirvalores subjetivos e confiar na sensibilidade do indivduo.24

    Artusi foi um racionalista que via a arte como cincia, no como expresso desentimentos e achava que a msica de excelncia somente se daria atravs da habilidadeintelectual concebida pelas antigas regras tericas preconizadas por Zarlino, terico ecompositor italiano de grande renome. Em seu tratado Imperfezioni della modernamusica, publicado em 1600, e que acrescido de uma segunda parte em 1603, Artusicondena as praticas compositivas modernas, tais como a monodia acompanhada e asinovaes tcnicas da nova harmonia, as quais acusava de deformar o contrapontoviolando leis por ele consideradas prprias da natureza da msica. Em suas palavras:

    Tem talvez esta espcie de msica [moderna] - pergunta-se Artusi - operadoqualquer milagre, como se l que faziam aqueles msicos antigos [gregos]excelentes? No o tem; ento no pode gerar novos afetos, como V. Senhoriame diz; como eu bem disse, ela solicita o ouvido, e o percutir dura e

    23

    GIUSTINIANI,Discorso sopra la musica.In: Chasin, pp.121-12224FUBINI,1976, p.135.

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    asperamente. E embora parea que estes senhores cantores, por t-la em grandeprtica, a pronunciem com algumas passagens, e com estas cubram a aspereza,de modo que fazem parecer que no haja ofensa, isto acontece acidentalmente, eno por natureza daquelas dissonncias, que so realizadas a bel prazer, e queso e sempre sero speras, cruas, duras e insuportveis aos ouvidos. Ento,quando estas cantilenas esto fora das mos daqueles cantores, as dissonnciasaparecem como tal, porque, em suma, so isso.25

    Em observao irnica e desaprovadora, Artusi censura a prtica compositiva coeva:

    Todo o pensamento dos musicistas modernos est a satisfazer um nico sentido;pouco cuidando que a razo entre ali para designar seus cnticos.[...]A elesbasta saber jogar [sobre os textos] aquelas solfas a seu modo, e ensinar a cantarcom muitos movimentos de corpo, acompanhando a voz com estes movimentose no fim se deixando andar como se estivessem morrendo, e esta a perfeiode sua msica.26

    Para ele a msicaModernase confunde e erra ao tentar imputar sentimentos atravs dasdissonncias e do gestual dos cantores. Refere:

    Estes movem a cabea lentamente, ressaltam as sobrancelhas, reviram os olhos,torcem os ombros, andam de modo que denotam um querer morrer, e fazemmuitas outras transformaes, as quais Ovdio no imaginou jamais. Ejustamente fazem estes trejeitos quando cantam aquelas durezas [dissonncias]que ofendem o sentido, e isto para demonstrar que aquilo que fazem deveriamos outros igualmente sentir. Mas ao invs [das pessoas] se comoverem,confundem-se pela aspereza e insatisfao que sentem, e, dando-lhes as costas,

    partem insatisfeitas.

    27

    Enfim, ao reprovar a inovao musical acontecida na aurora do sculo XVII, Artusi estreprovando a msica que canta o pulso afetivo de um tempo, uma sonoridade que querse fazer mimtica.

    E Monteverdi frente a Artusi? Em sua defesa, escreve no frontispcio de seuQuinto Livrode madrigais (1606):

    No vos admireis por eu dar estampa estes madrigais sem antes responder soposies que fez Artusi contra algumas de suas passagens, porque estando euao servio de Sua Serenssima Alteza de Mntua, no sou patro daquele tempoque necessitaria. No obstante, escrevi a resposta, para dar a conhecer que euno fao minhas coisas ao acaso, e, logo que estiver escrita, [a rplica] vir alume portando no frontispcio o ttulo Seconda Pratica overo Perfettione DellaMusica Moderna, da qual, talvez alguns se admirem, no acreditando existiroutra prtica se no a ensinada por Zarlino; mas estejam seguros que no tocantes consonncias e dissonncias, existe uma outra considerao diferente daquelapreviamente determinada, a qual defende o moderno compor com oconsentimento da razo e do sensvel. E isto eu quis dizer para que estaexpresso Seconda Pratica no fosse, em qualquer tempo, usada por outros epara que tambm os engenhosos pudessem considerar, entre tantas, outras

    25ARTUSI, 1600. In: CHASIN,Idem, p.119.26

    Ibid, p.120.27Idem.

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    coisas em torno da harmonia, e acreditai que o moderno compositor opera sobreos fundamentos de verdade. Vivei felizes! 28

    Este depoimento, lato sensu, esclarece a todos a direo esttica de Monteverdi e

    sua opo pela expresso de talhe mimtico, expressivo. De fato, sua msica sejacontrapontstica ou mondica primou pela conduo do ouvinte ao mundo sensvel. Nose trata de buscar ou edificar a Beleza. Mas a verdade do sentir. O musicista modernoantepe de fato a expresso belezadiz Fubinie em nome da expresso no hesitaem ofender o ouvido e caminhar contra as regras e a razo. Monteverdi, que personalizaa nova msica, escolheu a expresso sacrificando aquilo que para Artusi so osverdadeiros valores da arte, a beleza e a razo ou a tradio.29 E as novidades tcnicastais como as dissonncias, tornam-se o instrumento principal para realizar o objetivo

    principal do musicista: a expresso.

    Assim, pontue-se ao final deste argumento, a polmica entre Artusi e Monteverdi

    apenas uma das vrias que se seguiro ao longo dos sculos XVII e XVIII, em cujocentro se contrapem a concepo racionalista da msica e a concepo mimtico-afetiva da msica. Neste cenrio, debateu-se incansavelmente sobre msica e poesia,sobre as diferenas entre a msica italiana e a francesa, sobre a msica em sua relaocom a poesia, e ocorreram as famosas querellesmusicais setecentistas.

    3. Monteverdi e Caravaggio

    Posto todo este quadro, hora de chegar ao final. Isto , o que de fato une, naarte e no destino, Caravaggio e Monteverdi? Da argumentao estabelecida se podeentrever uma resposta genrica, mas insuficiente.Tornemos, na medida do possvel, esta

    resposta mais efetiva, objetivo especfico de minhas reflexes.

    O que une Caravaggio a Monteverdi que ambos tomaram a verdade como tlosde sua arte. para ela que se movem as foras de seu fazer artstico. A verdade real,refigurada na singeleza ou exuberncia da alegria, ou no paradoxo da dor moral, daangstia ou da morte. Isto o mesmo que dizer: a matria prima de ambos a vidaautntica, bonita ou feia, boa ou m de todos os homens, plasmada na multiplicidade desentimentos de uma individuao possvel. O pintor transita entre as pessoas pobres deRoma e os transforma em mrtires, o flagelo daqueles no corpo destes. Suas cenasreligiosas transformam o sagrado em humano, entidades celestiais em homens de carne,osso e sangue. Monteverdi engendra sua arte a partir da voz cotidiana e sua condionatural de refletir as paixes da alma.Seu canto a mimeses da alma que seindividua30, diz Chasin. Sua melodia nasce do falar, e tem nos registros vocais osdiferentes afetos que a faz dramtica, triste, ou mediana. Este canto que parte danatureza do prprio homem busca a verossimilhana, Monteverdi nos diz com suas

    prprias palavras: Arianna nos moveu por ser mulher e Orfeo tambm nos moveu por

    ser homem, no vento31 Caravaggio e Monteverdi querem com sua arte atingir oespectador e o ouvinte na sua mais plena sensibilidade, mas em meados do sculo sua

    28MONTEVERDI,Il quinto Libro de Madrigali. Traduo da autora.29Idem.30

    CHASIN, 2004, 12831MONTEVERDI,Idem.

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    forma intensa de exprimir comea a incomodar e cair em desuso. A arte de ambos considerada exagerada, excessiva, sensual e desregrada. Falta-lhe a mediao com oideal esttico que passa a predominar no cenrio artstico. Falta-lhe o ponto deequilbrio entre imitao e prazer, em que a primeira no deve se contrapor ao segundo.

    De fato, ao final das primeiras dcadas do XVII, esta arte mimtica, nascida danatureza expressiva do homem comea a perder fora e deixa de agradar. E o estilomaneirista volta a se estabelecer, dominando a cultura italiana at o final do sculo.Para Hauser, ao longo de seu processo, a tendncia ao realismo que marcou esta

    primeira quadra histrica sofreu uma derrota. Diz ele:

    No decorrer do sculo XVII, o Barroco, sobretudo na Frana, desenvolveu-senuma arte aristocrtica, palaciana, elaborando seus elementos emocionais numapostura impressiva e desenvolvendo seus pontos de contato com a Renascenanum novo classicismo severo e sbrio, em que toda a nfase recaa no princpio

    da autoridade. [...]E mesmo que em sua forma corts, o Barroco tenhaconservado sua tendncia espontaneidade e ao sentimento voltado para onatural, o estilo cortspar excellence,no sentido do exclusivismo e fastio, foi omaneirismo.32

    Todo o entourageintelectual, literrio e artstico da vida cortes, nesta quadra histrica,prendeu-se a pressupostos estticos tendentes ao excessivo virtuosismo e o escassonaturalismo. A arte que pinta e canta a vida real, sensvel e verdadeira do homem,aquela que toma a natureza humana como matria fundamental, pouco a pouco sersubstituda pela expresso artificial e afetada que permear a produo de msicos,

    poetas e pintores por mais de cem anos. Em tal ambiente espiritual, a arte dramtica de

    Caravaggio e Monteverdi, artistas incomparveis em sua obstinao pela expressomimtica, no tem mais espao por que no tem mais sentido.Tomemos Alberti33 como ponto de partida de uma breve argumentao, para

    trazer tona a clivagem que se deu nas perspectivas humanas no curso de finais dosculo XV, as quais, necessariamente influenciaram os procedimentos e horizontesartsticos.

    Oitenta e sete anos antes de Castiglione34 publicar Il Cortegiano, Albertitambm se dedicara a escrever um tratado sobre educao, hoje reconhecido como suaobra-prima terica. I libri della famiglia so concebidos em quatro volumes, emmeados do sculo XV, nos termos de uma educao que visa a totalidade daformao humana, e no apenas, como se ver em tempos futuros, voltado a um modus

    faciendi de corte. Alberti escreve ainda no momento heroico da cultura renascentista:o homem deve se formar na sua integridade, e isto no s para ser idneo a tudo, mas

    32HAUSER, 1993, p.119

    33Leon Battista Alberti nasce em Genova em 1404. Arquiteto famoso,foi autor do projeto do TemploMalatestiano em Rimini, do palcio Rucellai em Florena, onde tambm se responsabilizou pela execu-o de S. Maria Novella. Terico das artes figurativas, matemtico, cientista, musicista. Em resumo, elerene em si os dotes do novo homem do Renascimento, homem universal, cujo engenho e versatilidadelhe consentiam sobressair-se nos ambientes culturais mais variados. A partir de 1433 se dedicou aescrever na lngua vulgar os quatro livros que compem I Libri della Famiglia, talvez sua obra-prima,terminada em 1441. CF BARBIERI, Laura, in: http://www.liberliber.it/biblioteca/a/alberti/index.htm34

    Baldassare Castiglione (Mntua 1478Toledo 1529)diplomata italiano que escreveuIl Cortegianoem 1529.

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    para ser, tanto quanto possvel, tudo; para no renunciar a nenhuma das possibilidades;cidado, mas tambm cientista, artista, tcnico, homem do mundo. A educaohumanista deve orientar-se no sentido desta totalidade.35 A orientao de cunhohumanista tinha no conhecimento e ao universais a perspectiva de formao

    (integral) do homem. Formao que perseguia, pois, o autntico desdobramento daspotencialidades humanas atravs da conexo mais efetiva entre a sociedade e oindivduo especfico, conexo indispensvel para tal crescimento e expanso da alma.De fato, esta busca humana integral do primeiro Renascimento, e que lhe caracterizahumana e culturalmente, nasce como um dever ser, mas que se realiza naimpossibilidade de uma efetivao mais ampla.

    importante frisar que existe tambm em Alberti o esforo em esboar eapontar direes para a vida, para os indivduos, pois a conscincia da existnciadramtica sugere alternativas e procedimentos prticos. Neste sentido, refletir sobre anecessidade da formao do homem, a necessidade da universalizao dos indivduos

    sua realizao atravs das prprias foras e de suas mltiplas potencialidades,testemunha fortemente sua ao na trilha de constituir sadas individuais perante umasociedade que, progressivamente, restringe estes espaos. Por outro lado, a desiluso

    perante um tempo em que a sociabilidade nega ao individuo a condio de se fazerintegral no se esconde, e deve ser sabida, assim como encarada, pois, sem estaconscincia, no h racionalidade possvel. Para Garin, aquele que l as pginas deAlberti v sempre, alm das pginas construdas com tanto estudo, o desconforto e a

    misria dos exlios, a runa das fortunas, a morte das cidades e das famlias36e podecompreender melhor os conflitos que interditavam os ideais humanos que Alberti viveue encarnou. Ou seja, o homem de seu tempo um homem que se aparta de sua prpriacondio humana e, por esta razo, necessrio frisar, a arte o deve tomar como serdramtico, pois ele vive dramaticamente.

    Ao alvorecer do sculo XVI, a contradio humana est tragicamente posta eexposta no confronto entre as exigncias da vida social e as necessidades e expectativasdo indivduo. No possvel ao homem se perspectivar na integralidade pretendida; seumovimento de individuao, de realizao de horizontes mais especficos e autnticosde um ponto de vista individual, est cerceado por uma sociabilidade que lhecontrapem suas predominantes necessidades e caminhos.

    Castiglione, distintamente, escreve Il Cortigiano num perodo cujodesenraizamento social das perspectivas traadas no Renascimento fato concreto. Seutexto desenha um ideal humano bastante diverso das aspiraes e reflexes que outrora

    deram vida s pginas de Alberti, pois outros so os horizontes da vida humana e suasfinalidades. Embora ambos tenham se preocupado com a educao, ntido que ohorizonte de Castiglione muito diverso daquele que pulsara no perodo anterior,mesmo porque a sociabilidade do Cinquecento tambm o . As foras internasuniversais que, de algum modo, outrora moveram Alberti e o homem, no mais ocupam

    posto central no sculo XVI. Em outros termos, enquantoI libri della famigliapassamquase despercebidos aos leitores quinhentistas, mesmo queles que propugnavam umaeducao voltada para os ideais clssicos, constata-se a enorme repercusso do livro deCastiglione, que, rapidamente, foi editado em vrias lnguas e tornou-se um dos textosmais lidos do perodo.

    35

    GARIN, 1990, pp. 80-81.36Ibid, pp.11-12

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    E qual a perspectiva baldassariana? Uma forma de educao que, centrada emnormas de comportamento para a boa e ordenada convivncia cortes, se afasta dasquestes e problemas que tangem a busca de uma universalidade humana, de um realmovimento de individuao. A diferena que marcou as duas publicaes assim aparece

    em Garin:

    No por acaso o livro de Alberti, mesmo rico em mritos literrios e emintuies pedaggico-morais, permanece indito e mais ou menos desconhecidopor sculos, enquanto a obra de Castiglione, traduzida para o espanhol, francse ingls, teve singular difuso e fortuna no sculo XVI, conjuntamente a tantasoutras produes menores do gnero, italianas e no italianas. Porm,transformada a arte do soberano numa cincia e numa tcnica em si, a culturado corteso como cultura humanista no podia no se reduzir formao debelas maneiras, de costumes honestos, de belo estilo, de polidas capacidades desecretrio, de chanceler, de escritor de cartas de ofcio ou de amor. A elegncia,a medida, o requinte do gentil-homem tomam o lugar da virtude do homem:virtude que era moralidade, fora, inteligncia, capacidade real. Le courtisan,le parfait courtisan, the courtier, representam o homem ideal do mundo, notanto cidado da repblica livre quanto homem de corte a servio de umprncipe e seu colaborador, capaz de conversar e se portar bem, de agir e seimpor em sociedade.37

    Em tal ambiente espiritual, em que a arte mais uma sada da vida do que suaconfigurao, o pulso dramtico de Caravaggio e Monteverdi, obstinados pelaexpresso mimtica, se perde no tempo. A msica expressiva de Monteverdi serconsiderada excessiva e ultrapassada ao final da vida ficando esquecida por mais detrezentos anos. E a pintura realista de Caravaggio progressivamente rejeitada por sua

    falta de decoro, por suas figuras rotas demasiado sofridas, demasiado brutalizadas,demasiado dramticas. Tanto para o msico quanto ao pintor, no se trata de negar arazo, muito ao contrrio, trata-se de atingir a razo atravs do caminho mais eficaz,que o da sensibilidade do homem. Por que sensibilidade no a inexistncia da razo,mas a razo sentida, portanto, a razo cotidiana da vida. Mas aqui tudo hiperblico,tanto a arte em sua imitao realista, quanto a reao em seu preconceito sistemticocontra o sensvel, a favor da norma, da tradio, da aparncia.

    Por fim, uma ltima e breve reflexo sobre esta arte que, reposta no sculo XX,pretende emocionar o espectador e o ouvinte na sua mais plena sensibilidade, mesmoestando esta adstringida por tempo espiritual to diverso. Assim como Caravaggio,Monteverdi quer arrebatar e comover, no com a msica dos anjos, mas com o canto

    mimtico, o canto dos afetos dos homens. Ele escreveu isto. Mas, por causa da prprianatureza temporal da msica arte que s existe quando recriada , criou-se o hbitode recorrer tratadstica coetnea para melhor compreender seu estilo e sentidoesttico. Ora, estes tratados sobre msica que, desde o quinhentismo, ocuparam-se emversar sobre os mais variados motivos estticos almejavam, acima de tudo, alcanar o

    prestgio de obras que se dedicaram a outras reas do conhecimento. Foram, portanto,escritos e configurados ao sabor de um esprito de corte que, sobrevivendo at os finaisdo sculo XVIII, ditou regras e controlou o gosto do pblico. Sero estes, as nicas emelhores fontes para nos mostrar o batimento espiritual da sonoridade monteverdiana ede seu matiz dramtico? Mesmo sabendo que a educao do homem democrtico nasce

    37Ibid, pp.81-82

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    desta lgica cortes? Ou poderemos buscar na arte de Caravaggio a refigurao de umtempo real e concreto para compreender melhor as nuances expressivas das linhascanoras que Monteverdi nos legou? A questo fica como um desafio para ns,musicistas e professores de msica.

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