90036500
-
Upload
stephanie-morganti -
Category
Documents
-
view
37 -
download
0
Transcript of 90036500
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 1/43
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO - SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO2 9a Câmara
No.ordem: 10 AGRAVO DE INSTRUMENTOProcesso: 900365- 0/6 SÃO PAULO
ATUAÇÃO AGVTE JESCONSULTORIA IMOBILIÁRIA LTDA ADVOGADO MARCIALHERCULINO DE HOLLANDA FILHO
AGVDO LOPES CONSULTORIA DE IMÓVEIS LTDAADVOGADO PAULO GUILHERME DE MENDONÇA LOPES
PARTE(S) SENNA PEREIRA ASSESSORIA E SERVIÇOS S/C LTDA
PARTE(S) MARCELO SILVA PEREIRA
COMPOSIÇÃO DA TURMA JULGADORA
RELATOR :DES. FERRAZ FELISARDO voto: 4874
2° JUIZ:DES. SILVIA ROCHA GOUVEA voto: 0
3o JUIZ:DES. LUÍS DE CARVALHO voto: 8744
SÚMULA :negaram provimento ao recurso, vencido o Juiz Relatorque dava provimento ao recurso, com declarações de voto.
Publicado em 03/08/05 Julgado em 08/08/05Presidência do Exmo. DES. S. OSCAR FELTRINJurisprudência { ) Acórdão ( ) Sentença ( )
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 2/43
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SAO PAULO - SEÇAO DE DIREITO PRIVADO
29a Câmara
AGRAVO DE INSTRUMENTO No. 900365- 0/6
Comarca de SÃO PAULO Processo 43159/0524.V.CÍVEL
AGVTE JES CONSULTORIA IMOBILIÁRIA LTDA AGVDO
LOPES CONSULTORIA DE IMÓVEIS LTDA PARTE(S) SENNA
PEREIRA ASSESSORIA E SERVIÇOS S/C LTDA MARCELO SILVA
PEREIRA
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos, osdesembargadores desta turma julgadora da Seção de DireitoPrivado do Tribunal de Justiça, de conformidade com o
relatório e o voto do relator, que ficam fazendo parteintegrante deste julgado, nesta data, negaram provimentoao recurso, vencido o Juiz Relator que dava provimento aorecurso, com declarações de voto.
Turma Julgadora da 29a CâmaraRelator DesignadoRelator Sorteado3o JUIZJuiz Presidente
Data do julgamento: 08/08/05
DES. SILVIA JíOCHA GOUVEARelator Designado
DES. SILVIA ROCHA GOUVEADES. FERRAZ FELISARDODES. LUÍS DE CARVALHODES. S. OSCAR FELTRIN
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 3/43
PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇASÃO PAULO
29a Câmara de Direito PrivadoAgravo de Instrumento n° 900.365-0/6
24a
Vara Cível Central da Capital (proc. n° 43.159/05)Agravante: JES Consultoria Imobiliária LtdaAgravada: Lopes Consultoria de Imóveis LtdaVoto divergente n° 813
- A cláusula de não concorrência é possível, não contraria alei, nem a Constituição e só deve ser afastada quando for
ilimitada, sem prazo ou não contiver previsão decompensação financeira ao profissional.
- A obrigação de não concorrer é pessoal, mas se oobrigado ingressar em sociedade e, através dela, praticar atos que infrinjam aquela obrigação de não fazer, ela ficatambém impedida de praticá-los, em obediência ao princípioda boa-fé objetiva, que instrui os negócios jurídicos e oscontratos.
Insurge-se a agravante contra r. decisão que
concedeu tutela antecipada na ação de obrigação de não fazer proposta
pela agravada contra a agravante, Senna Pereira Assessoria e Serviços S.
C. Ltda e Marcelo Silva Pereira.
Alega a agravante a inexistência de pressupostos
para a concessão de antecipação de tutela, porque não há risco de dano.Diz que nenhuma das intermediações de empreendimentos mencionadas na
inicial se deve à interferência de seu sócio que, antes, assumira com a
agravada compromisso de não concorrência, bem como que a cláusula de
não fazer é de duvidosa validade. Além disso, há impossibilidade de se
estender seus efeitos a terceiros, no caso a agravante, bem como de se
impedir o acesso de novas empresas no mercado, configurando a decisão
Agravo de Instrumento n° 900.365-0/6 - Voto 813 - 29a Câmara24a Vara Civel da Capital (proc. n° 43.159/05)JES Consultoria Imobiliária Ltda x Lopes Consultoria de Imóveis Ltda 1
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 4/43
PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇASÃO PAULO
infração à ordem económica. Por último, afirma que o contrato de trabalho,
no qual foi imposta a cláusula de não-concorrência, não previu sua execução
específica, limitando-se a estabelecer grave cláusula penal.
Recurso tempestivo e preparado.
A agravada ofereceu resposta e agravo
regimental contra r. decisão que concedeu efeito suspensivo ao agravo de
instrumento. O agravo regimental foi provido por maioria.
Foram prestadas informações.
É o relatório.
A ação de obrigação de não fazer proposta pela
agravada formulou pedido liminar para que a agravante e demais réus
deixem de proceder a atos que descreve e entende determinar concorrência
desleal, especialmente em relação a três empreendimentos que nomeia (fls.
73/74 do agravo de instrumento). Em que pese ter aquele pedido sido
nomeado de liminar, parece consistir, na verdade, em pedido de antecipação
de tutela, tendo em vista o principal de confirmação daqueles liminarmente
requeridos.
Foi concedida a antecipação de tutela e contra tal
decisão se volta este agravo.
Como se trata de decisão, cujo conteúdo
determina a apreciação da tutela jurisdicional pretendida na ação, ou ao
menos de parte dela, a reapreciação da questão em sede de agravo
demanda considerações mais largas sobre o conteúdo do próprio processo,
Agravo de Instrumento n° 900.365-0/6 - Voto 813 - 29a Câmara24a Vara Cível da Capital (proc. n° 43.159/05)JES Consultoria Imobiliária Ltda x Lopes Consultoria de Imóveis Ltda 2
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 5/43
PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇASÃO PAULO
sem que, por isso, se extrapole o âmbito do recurso ou se antecipe decisão
sobre o mérito. Tanto assim que o próprio agravo traz alegações que não
podem deixar de ser apreciadas e se referem ao direito discutido na ação.
A concessão de tutela antecipada pressupõe
prova que confira verossimilhança à alegação, ou seja, prova segura que
revele probabilidade do direito invocado, já que verossimilhança é a
atribuição do que parece ser verdadeiro, do que é provável. Por outro lado, a
antecipação de tutela não pode ser concedida se houver perigo de
irreversibilidade do provimento.
A agravada alegou e provou que existe contrato
formulado com um dos sócios da agravante e também um dos réus, que lhe
prestara serviços de corretagem, no qual se previu a impossibilidade de
concorrência desleal, por doze meses, prevendo compensação.
Na verdade, o contrato foi firmado entre a
agravada e Senna Pereira Assessoria e Serviços S/C Ltda, representada por Marcelo Silva Pereira, sócio da agravante, mas não pode deixar de ser
observado que a empresa Senna se confunde com Marcelo, porque ele tinha
99% da cotas de tal sociedade e ela foi constituída com a finalidade dele,
através da sociedade, prestar serviços de corretagem para a agravada.
Assim, quando a sociedade Senna aceitou e contratou a cláusula de não
concorrência com a agravada, quem o fez foi o próprio Marcelo que a
representava e era praticamente seu único sócio.
Sabe-se que a concorrência desleal pode ser
prevenida contratualmente e, uma vez provada, é fato penalmente típico (1).
Sabe-se, também, que é vedado ao corretor de imóveis praticar atos de
1 "CONCORRÊNCIA DESLEAL - Empregado categorizado da vítima que instala outra firmacom a mesma finalidade - Desvio de clientela - Condenação - Pena pecuniária reduzida-Inteligência dos arts. 196, § 1o, III, do CP e 178 do Dec. 7.903/45" (TACrimSP - Ement. )RT 566/337.
Agravo de Instrumento n° 900.365-0/6 • Voto 813 - 29a Câmara24a Vara Cível da Capital (proa n° 43.159/05)JES Consultoria Imobiliária Ltda x Lopes Consultoria de Imóveis Ltd 3
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 6/43
PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇASÃO PAULO
concorrência desleal, sob pena de cometer grave transgressão ética
(Resolução - COFECI n° 326/92). Assim sendo, a concorrência desleal é fato
grave, que deve ser prevenido.
A cláusula de não-concorrência, segundo Carlos
Henrique Bezerra Leite, citando Ari Passidonio Beltran, "implica a obrigação
pela qual uma das partes contratantes se compromete a não praticar ação
que induza desvio de clientela da outra (...). Quando a origem da cláusula
remonta ao contrato de trabalho, entende-se como de não concorrência a
obrigação em virtude da qual o empregado se compromete a não praticar ação que acarrete desvio de clientela do empregador." (2)
Nossa legislação trabalhista é silente a respeito
do tema, pelo que, no mesmo trabalho, é ressaltado que: "Ante a omissão do
legislador, a consideração é oportuna, face ao que dispõe o art. 8 o, da CLT,
que remete o intérprete, em caso de lacuna, ao direito comparado. Na
França as cláusulas de não concorrência são inseridas, frequentemente, no
contrato de trabalho (principalmente dos executivos), e são, habitualmente,
previstas e regulamentadas pelas convenções coletivas. Em contrapartida,
de uma indenização paga pelo empregador, ocorre a limitação da liberdade
de trabalho do assalariado a partir da ruptura do contrato: proibição de se
estabelecer por conta própria e/ou de trabalhar por conta de uma outra
empresa. A jurisprudência admite a validade de tais cláusulas, mas com
certas limitações, no tempo, no espaço e com relação à natureza da
atividade do interessado." (grifei)
Carlos Henrique Bezerra Leite ainda afirma:
"Importa ressaltar que a cláusula de não-concorrência não viola o princípio
que assegura a liberdade do exercício de qualquer trabalho, oficio ou
profissão (CF, art. 5o, XIII), na medida em que o próprio dispositivo, em sua
lAgravo de Instrumento n° 900.365-0/6 - Voto 813 - 29' Câmara24a Vara Cível da Capital (proc. n° 43.159/05)JES Consultoria Imobiliária Ltda x Lopes Consultoria de Imóveis Ltda 4
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 7/43
PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇASÃO PAULO
parte final, fixa limitações ao princípio, ao mencionar "atendidas as
qualificações profissionais que a lei estabelecer"".
Por força do contrato de trabalho ou do de
prestação de serviços, determinados profissionais, especialmente quanto
aos mais qualificados ou especializados, como no caso em tela, passam a
ter acesso a informações restritas, tais como lista de clientes, relação de
custos para formação de preços, novas técnicas, mercado, dentre outras,
que são consideradas essenciais para a sobrevivência do negócio e,
portanto, merecem proteção, principalmente em relação à concorrência.
Sendo assim, a cláusula de não concorrência é
possível, não contraria a lei, nem a Constituição e só deve ser afastada
quando for ilimitada, sem prazo ou não contiver previsão de compensação
financeira ao profissional.
No caso em tela, a cláusula de não competição foi
fixada por prazo certo, doze meses, bem menor do que a de dois anos tidacomo razoável na maioria das legislações (3) e o de cinco anos citado, às
vezes, analogicamente, tendo em vista o previsto no art. 1147, do C. Civil;
limitou a não concorrência aos clientes da agravada, não impedindo
Marcelo ou a empresa Senna de exercerem suas funções, atividades, nem
seu trabalho, não se podendo dizer que apenas a agravada tenha clientes
no enorme mercado imobiliário e, por fim, previu, expressamente,
remuneração e compensação pelas obrigações assumidas de não
competição e confidencialidade, não podendo ser desconsiderado que o
valor pago a Marcelo, quando ainda prestava serviços à agravada
ultrapassava os
2A cláusula de não-concorrência no direito do trabalho, in Revista do Advogado, São Paulo,1999, p.63/68, apud Carlos Henrique Bezerra Leite, in Contrato de Trabalho e Cláusula deNão-Concorrencia, site: http//www.prt17.mpt.gov.br .3No direito alemão, por exemplo, "a Konkurrenzklausel, tem limitações, principalmente, paraempregados no comércio, em cujos contratos de trabalho o período máximo para efeito da
cláusula de não concorrência é de dois anos." (apud Carlos Henrique Bezerra Leite, citandoCesarino Júnior, op. cit.)
Agravo de Instrumento n° 900.365-0/6 - Voto 813 - 29a Câmara24" Vara Civel da Capital (proc. n° 43.159/05)JES Consultoria Imobiliária Ltda x Lopes Consultoria de Imóveis Ltd 5
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 8/43
PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇASÃO PAULO
R$40.000,00, por mês. Bastante razoável a cláusula, portanto, e nada
abusiva, não havendo motivo para considerá-la inválida, nem para concluir
que fere a liberdade de iniciativa, a ordem económica ou que dê guarida a
monopólio.
Além disso, a cláusula que previne a concorrência
desleal pode ser contratada tanto com prestadores de serviços, como com
empregados, de modo que é, aqui, irrelevante a discussão sobre ter sido
Marcelo prestador de serviços, através da empresa Senna, à agravada ou
seu empregado, relevando apenas a afirmação da agravante de que Marceloera empregado da agravada, para emprestar maior segurança à conclusão
de ter sido ele próprio quem se submeteu à cláusula de não concorrência.
A agravada cita três empreendimentos, cujas
vendas realizava e que passaram a ser efetivadas pela agravante, depois
de Marcelo ter integrado tal sociedade. A agravante admite que passou a
comercializar as três incorporações, de modo que tal fato, mais do que
verossimilhante, é verdadeiro.
Os três empreendimentos só foram entregues à
comercialização pela agravante após o rompimento de seu sócio, Marcelo,
com a agravada. Aliás, logo em seguida a tal rompimento.
De fato, Marcelo desligou-se da agravada em
outubro de 2004. Um mês depois, os demais sócios da agravante e donos
do empreendimento chamado Isabella, também romperam com a agravada,
a quem até então cabia a venda daquele empreendimento. Uma semana
depois, tais sócios constituíram a agravante (JES), para comercializar seu
imóveis, inclusive o Isabella e, dois meses depois, Marcelo ingressou
formalmente na JES.
Não há dúvida que Marcelo é profissional
altamente qualificado como corretor, o que lhe garantira vultuoso
rendimento
Agravo de Instrumento n° 900.365-0/6 - Voto 813 - 29a Câmara24a Vara Cível da Capital (proc. n° 43.159/05)JES Consultoria Imobiliária Ltda x Lopes Consultoria de Imóveis Ltda 6
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 9/43
PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇASÃO PAULO
na agravada e determinara que se obrigasse a com ela não concorrer. Por
tal qualificação, ele ingressou na JES, já que os demais sócios eram apenas
incorporadores e dele necessitavam para o novo objetivo de comercializar os
seus e outros empreendimentos. Por outro lado, também não pode haver
dúvida que Marcelo sabia que os seus sócios, na agravante, haviam sido
clientes da agravada, no empreendimento Isabella e que, por isso, ele não
podia comercializá-lo.
Do mesmo modo, o empreendimento Matiz
também é de propriedade de sócio da JES e fora comercializado pelaagravada, motivo pelo qual Marcelo não podia comercializá-lo. Assim
também o último empreendimento citado no processo, de nome Grands
Jardins de France, porque a proprietária do empreendimento, Inpar, foi
cliente da agravada e o fato de ter vendido parte dele à empresa Cargill não
desnatura a cláusula de não concorrência, levando em conta o que nela foi
expresso e o fato óbvio de que o conhecimento prévio de Marcelo quanto a
tal empreendimento, por ter trabalhado como corretor para a agravada, levou
a agravante a conseguir ser contratada para comercializá-lo em seu lugar.
A agravante afirma não ter sido ela quem
acordou a cláusula de não concorrência ou não competição com a
agravada, de modo que por ela não pode ser atingida, bem como que tal
cláusula não pode impedir os donos de dois dos empreendimentos
mencionados e sócios da agravante de comercializá-los.
É evidente que os proprietários não podem ser
impedidos de comercializar seus bens e eles não estão sendo impedidos de
fazê-lo pela decisão atacada. Os que estão sendo impedidos de
comercializar os mesmos bens e outros, de clientes da agravada, são a
agravante, que não é proprietária daqueles empreendimentos, e seu sócio
Marcelo. Isto porque a venda feita peladade agravante beneficiará
Agravo de Instrumento n° 900.365-0/6 - Voto 813 - 29a Câmara24a Vara Cfvel da Capital (proc. n° 43.159/05)JES Consultoria Imobiliária Ltda x Lopes Consultoria de Imóveis Ltd
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 10/43
PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇASÃO PAULO
também Marcelo, já que ele é seu sócio, mas está impedido de fazê-lo pela
cláusula de não concorrência. Tal, todavia, não é o único motivo.
Não se desconhece que a obrigação de não fazer
é pessoal, nem que foi o sócio da agravante quem a firmou e não ela.
Contudo, não se desconhece, também, que os negócios jurídicos em geral
e os contratos em particular estão adstritos ao princípio da boa-fé objetiva,
hoje expressamente previsto no art. 113, do Código Civil, que a elencou
como norma interpretativa.
A boa-fé afirmada pela legislação é a objetiva,
que pode ser definida, grosso modo, como sendo regra de conduta que
implica no dever das partes de agir conforme certos parâmetros de
honestidade e lealdade, com a séria intenção de cumprir o pactuado, a fim
de se estabelecer o equilíbrio nas relações contratuais. "A boa-fé objetiva é
uma espécie de pré-condição abstrata de uma relação ideal. Toda vez que
no caso concreto, por exemplo, o Magistrado tiver de avaliar o caso para
identificar algum tipo de abuso, deve levar em consideração essa condição
ideal a priori, na qual as partes respeitam-se mutuamente, de forma
adequada e justa." (4)
Ora, quando pessoa, impedida de comercializar
por anterior pacto de não concorrência, integra sociedade e tanto ele, quanto
os demais sócios sabem do impedimento, é evidente que tal se estende à
sociedade, não só porque os negócios por ela feitos beneficiarão o sócio
impedido diretamente, como porque entendimento diverso dá guarida à
atuação contrária à boa-fé, já que a sociedade está sendo usada em clara
tentativa de burlar o que foi contratado pelo sócio, infringindo diretamente o
princípio da boa-fé.
A propósito, as seguintes decisões:
Agravo de Instrumento n° 900.365-0/6 - Voto 813 - 29a Câmara24a Vara Cível da Capital (proc. n° 43.159/05)JES Consultoria Imobiliária Ltda x Lopes Consultoria de Imóveis Ltda 8
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 11/43
PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇASÃO PAULO
"DANOS MATERIAIS - INDENIZAÇÃO
-INEXISTÊNCIA. Não afronta o art. 5 o, inciso XIII, da Constituição Federal de
1988, cláusula contratual firmada por empregado, após ruptura do contrato
de trabalho, comprometendo-se a não prestar serviços à empresa
concorrente, quer como empregado, quer como autónomo. Inexistência de
erro ou coação a anular o pactuado. Não há ilegalidade a macular o
pactuado e nem danos materiais decorrentes da limitação expressamente
aceita. Impede aqui invocar-se tambémo princípio da boa-fé, presente em
todos os atos da vida civil e pressupostos deles, mormente quando em
ajuste, estão pessoas capazes, de mediano entendimento jurídico e alto
nível profissional, como é o caso das partes envolvidas no Termo de
Confidencialidade e Compromissos Recíprocos." (TRT 2a Região, Ac n°
20020534536, Proc. n° 20898200290202008. 5a T., Rei. Rita Maria Silvestre)
"CONTRATO - Cláusula de proibição negocial de
concorrência - Descumprimento - Ocorrência - Constituição de nova
empresa com o mesmo objeto social e com membros do órgão diretivo dasociedade anterior - Prova segura da violação contratual - Obrigação de não
fazer cuja constituição em mora se confunde com o próprio inadimplemento
- Desnecessidade de interpelação - Inteligência do artigo 961 do Código
Civil - Sentença confirmada - Recurso não provido. Nas obrigações ad non
faciendum confunde-se a mora com o próprio inadimplemento. O devedor
constitui-se em mora desde o momento em que pratica o ato de que devia
se abster. A mora opera imediatamente, ex re em virtude da própria força
das coisas, sem necessidade de qualquer interpelação." (Apelação Cível n.
255.439-2 - Santos - Relator: Hermes Pinotti - CCIV 17 - V.U. - 28.03.95)
"INDENIZAÇÃO - Responsabilidade civil - Ato
ilícito - Concorrência desleal - Prática por ex-sócio ao consolidar nova
4 Rizzato Nunes, in Curso de Direito do Consumidor, Ed. Saraiva, São Paulo, 2004,
Agravo de Instrumento n° 900.365-0/6 - Voto 813 - 29a Câmara24a Vara Cível da Capital (proc. n° 43.159/05)JES Consultoria Imobiliária Ltda x Lopes Consultoria de Imóveis Ltd 9
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 12/43
PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇASÃO PAULO
empresa concorrente -
Fatos considerados
atípicos no Juízo
Criminal -Circunstância
que não afasta a
responsabilidade civil. -
Ação procedente
-Recurso provido." (JTJ
135/216)
H
á verossimilhança nas
alegações iniciais e, por
outro lado, a
antecipação de tutela
não implica em perigo
de irreversibilidade doprovimento judicial,
porque a obrigação de
não fazer está provada
e, ainda que houvesse
danos eventuais, eles
poderiam ser discutidos
e pleiteados.
P
or fim, o pedido de
cumprimento da
obrigação de não fazer,
na forma especificada
pela inicial, dado o que
contém o contratohavido entre a agravada
e o réu Marcelo, era
adequado e necessário,
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 13/43
tendo em vista o
expressamente previsto
no art 461 e 642, do
CPC, assim como nos
artigos 251 e 411, do C.
Civil, havendo, portanto,
interesse de agir.
D
e fato, o
descumprimento da
obrigação de não fazer
dá ensejo apenas à
perdas e danos quando
impossível a execução
específica, como no
exemplo de obrigação
negativa de alienar
imóvel, para não
prejudicar o adquirente
de boa-fé, não se
aplicando às obrigações
negativas em geral, em
que seja possível a
execução.
P
resentes os requisitoslegais para a concessão
da antecipação de
tutela, nego provimento
ao agravo.
SILVIA
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 14/43
ROCh^G
OUVÊA Relat
or a
p.127/128.
Agravo de Instrumento n° 900.365-0/6 - Voto 813 - 29a Câmara24a Vara Cível da Capital (proc. n°43.159/05)JES Consultoria Imobiliária Ltda xLopes Consultoria de Imóveis Ltda
10
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 15/43
PODER JUDICIÁRIO SÃO
PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
VOTO N.° 4874AGRAVO DE INSTRUMENTO N.° 900.365.00/6 - SÃO PAULOAGRAVANTE: JES - CONSULTORIA IMOBILIÁRIA LTDA.AGRAVADA: LOPES - CONSULTORIA DE IMÓVEIS LTDA.PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS - OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER
DECLARAÇÃO DE VOTO VENCIDO
1. Trata-se de agravo de instrumento
interposto contra a r. decisão interlocutória de fls. 174/175, nos
autos da ação de obrigação de não fazer, promovida por Lopes
Consultoria de Imóveis Ltda. em face de Senna Pereira
Assessoria e Serviços S.C. Ltda., Marcelo Silva Pereira e JES
Consultoria Imobiliária Ltda.
A agravante destaca a inexistência de
pressupostos para a concessão da antecipação da tutela, porque não
se evidencia a existência de risco de dano. Nenhuma das
intermediações de empreendimentos mencionadas na inicial se
deve à interferência do sócio "contaminado" pela cláusula de não
competição. As alegações da agravada são inverossímeis, porque a
cláusula de não fazer é de duvidosa validade em face do
ordenamento jurídico. Se a entender válida - o que se admite para
argumentar - há impossibilidade de se estender seus efeitos em
relação a terceiro, no caso a agravante, pois re& inter alios acta,
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 16/43
nec prodest, nec nocet (A coisa feita entre terceiros,
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 17/43
2
PODER JUDICIÁRIOSÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
nem aproveita, nem prejudica). Acrescenta a impossibilidade de se
impedir o acesso de novas empresas no mercado, configurando infração
à ordem económica, nos termos do artigo 21, IV, da Lei n.° 8.884/94.
Por último, nem mesmo o contrato de trabalho em que foi imposta essa
cláusula previu a possibilidade de sua execução específica, limitando-se
por estabelecer uma cláusula penal (meramente económica) de intensa
gravidade (um ano da remuneração paga).
A agravada ofereceu resposta e agravo regimental
contra a decisão que concedeu efeito suspensivo ao presente agravo de
instrumento, sob o fundamento de sua nulidade, por falta de
motivação. O agravo regimental foi provido, contra o voto deste
Relator, restabelecendo-se a decisão agravada.
Na resposta, a agravada sustenta que a cláusula de
não concorrência subjudice possui limitação temporal - apenas 12 meses
- e limitação quanto à clientela atingida (somente os clientes e
empreendimentos da agravada). Assim, pode a agravante manter relações
comerciais com todos os outros empreendedores económicos do mercado
que não sejam clientes da agravada. A existência de cláusula penal, para a
hipótese de descumprimento da cláusula de não concorrência e de
confidencialidade, não impede a execução da obrigação garantida por
como disposto no artigo 411, do Código Civil.
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 900.365.00/6 -SAO PAULO - VOTO N° 4874
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 18/43
3
PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
2. A doutrina majoritária tem concluído que a
natureza da tutela antecipada nada tem de cautelar, posto que se trata
de adiantamento do provimento que se busca no mérito da causa, isto
é, de antecipação provisória da prestação jurisdicional pretendida.
A discussão quanto a sua natureza (cautelar ou
satisfativa) decorre do inciso I, do artigo 273, do Código de Processo
Civil, que autoriza a antecipação quando houver fundado receio de
dano irreparável ou de difícil reparação, porém o fato de se referir a
um pressuposto característico das medidas jurisdicionais
acautelatórias, isto é, o periculum in mora, não justifica por si só a
afirmativa de natureza cautelar ao instituto, pois não tem como
objetivo assegurar a possibilidade de futuro exercício do direito
afirmado pelo autor, e sim o de antecipar os efeitos inerentes ao
provimento jurisdicional de fundo (efeitos declaratório, constitutivo,
condenatório, mandamental).
Segundo Sérgio Bermudes, "não se trata de
medida cautelar concedida diante de regras e princípios que
disciplinam essa espécie do processo civil contencioso. Cuida-se de
prestação jurisdicional cognitiva, consistente na outorga adiantada da
proteção que busca no processo de conhecimento, a qual, verificados
os pressupostos da lei, é anteposta ao momento procedimental
próprio." (in "A Reforma do Código de Processo Civil", Janeiro:
Freitas Bastos, 1995, p.35).
AGRAVO DE INSTRUMENTO N°900.365.00/6 -SÃOPAULO - VOTO N° 4874
> a
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 19/43
4
PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Cândido Rangel Dinamarco no mesmo sentido
sustenta que, "por meio da antecipação da tutela, não se procura obter
medida que impeça o perecimento do direito, ou que assegure ao
titular a possibilidade de exercê-lo no futuro. A medida antecipatória
conceder-lhe-á o exercício do próprio direito afirmado peio autor. Na prática, a decisão com que o juiz concede a tutela antecipatória terá,
no máximo, o mesmo conteúdo do dispositivo da sentença que
concede a definitiva e sua concessão equivale, mutatis mutandis, à
procedência da demanda inicial, com a diferença fundamental
representada pela provisoriedade." (in "Novidades sobre a Tutela
Antecipatória, Revista de Processo, vol. 69, p. 106).
Os pressupostos para a antecipação da tutela
dividem-se em genéricos e alternativos.
Os genéricos, formados pela prova inequívoca e
pela verossimilhança das alegações, estão fundados na preocupação do
legislador frente à restrição de direitos fundamentais das partes litigantes
e, por isso, são indispensáveis à concessão da tutela antecipada.
O fumus boni iuris deverá estar, assim,
especialmente qualificado, pois se exige que os fatos examinados com
base na prova já instaurada, possam ser tidos como certos e ainda que
tenha verossimilhança quando ao fundamento do direito que decorre^
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 900.365.00/6 - SÃO PAULO - VOTO N° 4874
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 20/43
5
PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Além dos pressupostos genéricos, deverão, ainda,
constar os pressupostos alternativos, quais sejam: fundado receio de
dano irreparável ou de difícil reparação e abuso de direito de defesa ou
manifesto caráter protelatório do réu, como bem determinam os
incisos do artigo 273, do Código de Processo Civil.
Pode-se dizer então, que uma vez requerida a
antecipação da tutela, poderá ser concedida pelo juiz desde que este
se convença da verossimilhança da alegação, mediante a existência de
prova inequívoca, devendo haver ainda a existência de um dos incisos
do artigo supra mencionado.
Literalmente, inequívoco significa algo claro,
evidente, certo, seguro que não enseja erro ou engano. Entretanto,
nenhuma prova é inequívoca, porque simplesmente não há prova que
transmita certeza absoluta de um fato ou de um acontecimento,
podendo-se dizer que, qualquer juízo sobre fatos no processo é juízo
de verossimilhança e não de certeza.
A prova testemunhal, por exemplo, apresenta uma
grande incerteza, pois poderá ser facilmente maculada, com o
depoimento falso ou, no caso de várias testemunhas, podem, estas
estarem enganadas quanto ao que esclarecem ou não terem
compreendido corretamente o acontecimento sobre o qual
testemunham, gerando, também nesse caso, equívoco quanto aos fatos^
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 900365.00/6 - SÃO PAULO - VOTO N° 4874 /
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 21/43
6
PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Até mesmo um sentença não é prova inequívoca,
pois se assim fosse, não caberiam recursos ou mesmo a propositura de
ação rescisória fundada em prova falsa, situação prevista no artigo
485, inciso VI, do Código de Processo Civil.
Como já julgou o Superior Tribunal de Justiça, a
prova, enquanto escrita, pode ser falsa, mesmo em se tratando de
escritura pública. (REsp. 36.174-SP, Rei. Min. Ari Pargendler - DJU
de 21.10.96, p. 40.227).
Assim, se interpretadas de forma restritiva a
expressão "prova inequívoca", ou seja, entendendo esta como prova
revestida de certeza em sua totalidade, estaria impedida a antecipação
da tutela.
O que na verdade pretendeu o legislador, foi
considerar como prova inequívoca aquela que, ante aos fatos expostos,
fosse suficiente para a formação de juízo de probabilidade, capaz de
antecipar a medida buscada.
A prova inequívoca a que alude o legislador, não é
aquele suficiente para a prolação da sentença, pois se assim fosse, não
estaria se concedendo a tutela pretendida, e sim, julgando
antecipadamente o mérito da causa, conforme previsão do artigo 330,
inciso I, do Código de Processo Civil, entendimento esse defendido
por Luiz Guilherme Marinoni1 e por Estavão Mallet2, que vão além/
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 900.365.00/6 -SÃO PAULO - VOTO N° 4874
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 22/43
7
PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
afirmando que "se a sentença pode fundar-se, até mesmo, em ausência
completa de prova, decidindo o juiz apenas com apoio nas regras
sobre ónus da prova, dizer que prova inequívoca é a prova suficiente à
prolação da sentença equivale a incluir, no conceito de prova
inequívoca, a hipótese de ausência de prova, o que soa exorbitante."(in "A antecipação da tutela na reforma do código de processo civil",
2a ed., São Paulo: Malheiros, 1996, p. 67/68! e "Tutela antecipada no
direito do Trabalho". São Paulo: LTr, 1998, p. 542).
Entretanto, sempre prevalecerá o princípio
insculpido no artigo 131, do Código de Processo Civil, onde se atribui
plena liberdade ao magistrado para a apreciação da prova.
Paralelamente, a verossimilhança da alegação não
pode apenas estar fundada no alinhamento de opiniões acerca da
questão tratada nem, tampouco, a busca de se encontrar solução para o
caso pode tornar incerto o direito. "Em consequência, ainda que
controvertida a interpretação propugnada pelo requerente da tutela
antecipada, se o juiz a tiver por acertada deverá deferir o pedido, não
cabendo, em virtude da assinalada controvérsia, acoimar-se de
inverossímil a alegação." (Estevão Mallet, ibid, p. 56).
Logo, o juízo de verossimilhança nada mais é do
que um juízo de probabilidade, isto é, pouco mais do que o óbvio.
O fato de ter a lei vinculado o convencimento da verossimilhança
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 900.365.00/6 -SÀOPAULO -VOTON°4874
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 23/43
8
PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
alegação à prova inequívoca, é sinal de que a probabilidade
identificada na verossimilhança não significa, de forma alguma, um
grau mínimo da provável realidade da alegação. Ao contrário, tem-se
que na tutela antecipada, o grau de probalidade que decorre da prova
inequívoca se não é, está muito próximo do máximo.
O entendimento preponderante é, então, o de que
a antecipação dos efeitos da tutela exige probabilidade e esta há de ser
intensa, capaz de induzir a identificação plena entre probabilidade e
verossimilhança.
Uma das causas que proporcionam ao juiz a
faculdade de antecipar os efeitos da tutela consiste no fundado receio
do requerente quanto à ocorrência de dano irreparável ou de difícil
reparação. O que faz a parte solicitar essa medida é, portanto, o perigo
da demora da prolação da sentença, ou seja, o periculim in mora.
Observa, no entanto, Ernane Fidélis dos Santos, que o "prejuízo
referido na lei não se confunde com o incómodo e a inconveniência
decorrentes da marcha normal do processo, mas de situação anómala,
particularíssima, relacionada com a parte especificamente1', (in
"Novos perfis do processo civil brasileiro", Belo Horizonte: Del Dey,
1997, p. 25). Assim o risco de dano irreparável ou de difícil reparação
que enseja a antecipação assecuratória é o risco concreto, o que se
apresente iminente no curso do processo, ou seja, atual, e ainda grave,
sendo que tem que ser potencialmente apto a fazer perecer ou a
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 900.365.00/6 -SÃO PAULO - VOTO N° 4874
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 24/43
9
PODER JUDICIÁRIOSÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
prejudicar o direito afirmado pela parte. Portanto, o risco deve ser
objetivo e real fundado em fatos, circunstâncias ou indícios que
legitimem a parte a invocar sua concessão, sob pena de ser infundado.
Para António Cláudio da Costa Machado, "sob o
ponto de vista objetivo, irreparável é a lesão ao direito deduzido pelo
autor que não pode ser plenamente restaurado pela via indenizatória, ou
seja, que não admite completa reparação por intermédio de compensação
pecuniária. Nesta mesma perspectiva, a ideia de irreparabilidade se
encontra inexoravelmente ligada à de impotência do dinheiro para
substituir ou repor o dano experimentado pelo titular do direito, como
acontece quando se cogita de compensar economicamente a perda da
vida, da integridade física, da saúde e de outros bens jurídicos imateriais.
Já sob o ângulo subjetivo, irreparável é a lesão a direito que, embora
perfeitamente restaurável pela via pecuniária, não se restaura pela
incapacidade económica, momentânea ou definitiva do titular da
obrigação de fazer frente à exigência ou pedido de caráter indenizatório.
Com base nessas duas dimensões que deve-se pensar no elementoirreparabilidade que integra a noção depericulum in mora.'" (in "Tutela
Antecipada", São Paulo: Juarez de Oliveira, 3aedição, 1999, p. 470).
O "Instrumento Particular de Prestação de
Serviços" celebrado entre a empresa Senna Pereira Assessoria e
Serviços S.C. Ltda. e Lopes Consultoria de Imóveis Ltda., em Io. de
janeiro de 2003, vigorando até 31 de dezembro de 2004, previa-
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 900.365.00/6 -SÃO PAULO - VOTO N° 4874 V-X]
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 25/43
10
PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
cláusula de confidencialidade e não competição, impondo multa
compensatória no montante equivalente a remuneração anual recebida
da LCI (Lopes Consultoria de Imóveis Ltda.).
Marcelo Silva Pereira era sócio majoritário da
empresa Senna Pereira Assessoria e Serviços S.C. Ltda.
O referido contrato foi rescindido, de forma
imotivada, aos 21 de outubro de 2004, tendo início o período de
restrição, nos termos de cláusula contratual.
O Ilustre Professor Miguel Maria de Serpa Lopes
ensina que: "As obrigações negativas, como já deixamos dito, sedefinem por um nomfare, uma abstenção (pati). Impõe-se ao devedor
a abstenção de um ato que lhe era lícito praticar, se não se houvesse
obrigado a uma abstenção. No domínio jurídico, é uma prestação não
muito frequente, destacando-se porém, dentre as mais usuais, as de
não fazer concorrência a um comerciante, ou de outra espécie, na
locação de serviço, etc. Todas essas obrigações negativas, embora
coarctem a liberdade de movimentos do obrigado, contudo são uma
proibição relativa, pois atinge apenas o domínio da licitude e não o
das possibilidades físicas. Está, em tais casos, a obrigação de não
alienar. Se, a despeito de assumida, o devedor alienar o imóvel a
terceiro, o ato não fica atingido de nulidade. Tão-somente o devedor
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 900.365.00/6 - SÃO PAULO - VOTO N° 4874
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 26/43
PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
inadimplente incorre na obrigação de perdas e danos".Curso de
Direito Civil; vol. II: Obrigações em geral - 6a. edição, p. 56
A agravada fundamenta seu pedido de
antecipação da tutela no parágrafo terceiro do artigo 461, do Código
de Processo Civil, argumentando "fundamento da demanda e o justificado receio de ineficácia do provimento final".
O pedido inicial, além de pedir a conversão da
obrigação em perdas e danos, se impossível o cumprimento da tutela
específica ou a obtenção de resultado prático correspondente, enumera
atos que os requeridos - Senna Pereira Assessoria e Serviços S.C.
Ltda., Marcelo Silva Pereira e JES Consultoria Imobiliária Ltda. -nãodevem fazer.
Sempre no plural, incluindo a agravante:
"(i) desfaçam e deixem de operar todo e qualquer
estande de venda, ou a comercializar unidades imobiliárias, em
qualquer empreendimento que implique na inobservância da cláusula de
não competição do contrato de prestações de serviços firmado com a
autora, mormente nos empreendimentos "Edifício Isabella" e "Grand
Jardins de France", e se abstenham de instalar estande de vendas, e a
comercializar unidades imobiliárias, no empreedimento "Matiz", em
qualquer caso, até que se esgote o período de restrição previs
cláusula 6.2. do contrato, ou seja, até o dia 21 de outubro de 2005;
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 900.365.00/6 - SÃO PAULO - VOTO ND 4874
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 27/43
12
PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
(ii) se abstenham de contratar, empregar, tentar
contratar ou empregar qualquer funcionário da autora ou corretor
autónomo que lá tenha prestado serviços nos últimos 12 meses
(cláusula 6.2., ii), até que se esgote o período de restrição previsto
na cláusula 6.2. do contrato, ou seja, até o dia 21 de outubro de
2005;
(iii) se abstenham de solicitar, persuadir ou
contratar com qualquer cliente incorporador enquadrável na
Cláusula 6.3., "b", do contrato, seja na tentativa de obter tal cliente
para si ou para terceiros (cláusula 6.2,i), extinguindo os vínculos
contratuais hoje existentes, e que se enquadram nesta hipótese, até
que se esgote o período de restrição previsto na cláusula 6.2. do
contrato, ou seja, até o dia 21 de outubro de 2005, e
(iv) se abstenham de se valer das informações
protegidas pela cláusula de confidencialidade. " (fls. 73)
O festejado Professor Serpa Lopes, já citado,
acrescenta que:
"O referido Código Civil também atribui à
prestação negativa um outro caráter: o de ser limitada a um
determinado tempo. Assim é que, nas cláusulas de concorrência, o pacto
limitativo deve ser circunscrito a uma determinada zona e determina
atividade, não podendo exceder ao tempo de cinco anos (artigo 2.596)/
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 900.365.00/6 -SÀO PAULO - VOTO N° 4874
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 28/43
13
PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Outro aspecto especial dessa prestação éo de ser pessoal e só pode ser
cumprida pelo próprio obrigado". Op. cit. pág. 57. (grifo)
Outro não é o ensinamento de Washington de
Barros Monteiro: "Na obrigação negativa ao revés, o devedor é quem
se acha pessoalmente adstrito à abstenção. A limitação não vai além
de sua pessoa." - grifo (in Curso de Direito Civil, Direito das
Obrigações, primeira parte, 32a. edição, Ed. Saraiva, pág. 104).
Todavia, o Digno Magistrado, ao deferir a tutela
antecipada, parte do pressuposto de que: "Constituída a terceira ré,
integrando o segundo réu seu quadro societário, tais obrigações foram
a ela estendidas, considerando a identidade do ramo comercial e sua
realização por seu sócio, privilegiado pelo conhecimento dos dados
confidenciais da autora".
A agravante, pessoa jurídica distinta da pessoa de
seus sócios, não pode sofrer os efeitos de tal limitação, porque não
está vinculada ao contrato firmado pela empresa Senna Pereira
Assessoria e Serviços S.C. Ltda.
Nos termos propostos pela agravante, res inter
alios acta, nec prodest, nec nocet (A coisa feita entre terceiros, nem
aproveita, nem prejudica).
O fato de Marcelo Silva Pereira, sócio da empresa
Senna, ter ingressado na agravante, aos 17 de fevereiro cte-
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 900.365.00/6 -SÃO PAULO - VOTO N° 4874
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 29/43
14
PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
2005, não "contamina" a pessoa jurídica, porque, segundo a lição dos
Mestres, a restrição é pessoal, intuitu personae.
A obrigação de não fazer é de Marcelo, não se
estendendo à pessoa jurídica, que não assumiu tal encargo.
Tanto que, a agravada, no pedido inicial, requer
que a obrigação em questão seja convertida em perdas e danos se
impossível o cumprimento da tutela específica ou a obtenção do
resultado prático correspondente.
Incumbe, neste caso, à agravada demonstrar nos
autos, caso a caso a intervenção pessoal de Marcelo. Tanto que, na
inicial, a agravante delimita o campo de atuação da cláusula restritiva,
"somente aos clientes e empreendimentos da agravada". Acrescenta
que, "pode a agravante manter relações comerciais com todos os
outros empreendedores económicos do mercado que não sejam
clientes da agravada".
Sendo assim, imprescindível a prova do
descumprimento do preceito para exigir-se a multa convencional.
Não demonstrada a mora do devedor,
inquestionável e provada nos autos, não se há de falar em antecipação
da tutela, que, antecipa os efeitos do julgamento final sem
demonstração inequívoca da culpa da empresa agravante. E, ainda
mais grava, impõe multa diária de valor elevado, não levando
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 900.365.00/6 - SÃO PAULO - VOTO N° 4874
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 30/43
15
PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
consideração a previsão de cláusula penal livremente acordada pelas
partes no contrato, sem a participação da agravante.
Sendo matéria de mérito e sujeita à prova, a tutela
antecipada não subsiste aos mais elementares princípios de Direito.
No âmbito do agravo de instrumento, não pode
encontrar solução a equação fáctico-jurídica constitutiva do mérito da
ação, que somente a sentença definitiva há de resolver (CPC, arts.
162, parágrafo 1.°, 269 e 458, III).
Para que ultrapassadas não sejam as fronteiras
deste recurso, transformando-se o seu julgamento em prematura
análise da questão de fundo, tenha-se sempre presente no espírito que
o exame da decisão agravada apenas tangencialmente se ocupará da
substância do pedido e da essência da resposta.
O julgamento do agravo de instrumento deve
circunscrever-se à aferição da prudência e da consistência (técnica e
factual) da decisão interlocutória atacada, evitando-se, tanto quanto
possível, incursões de mérito.
Versando a decisão agravada sobre antecipação da
tutela pretendida no pedido inicial - hipótese dos autos principais - o
julgamento do agravo de instrumento deve limitar-se a verificar, de
um lado, a presença dos respectivos pressupostos e, de outro, a
ausência do perigo de irreversibilidade do provimento antecipado./ /
r AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 900.365.00/6 - SÀO PAULO - VOTO N° 4874 /
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 31/43
ló
PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
O prejuízo da empresa agravante é inconteste.
No pedido, a agravada menciona que a obrigação
de não fazer diz respeito, especialmente aos edifícios "Isabella, Grand
Jardins de France e Matiz".
O Edifício Izabella foi construído pelas
construtoras Conceito Construtora e Participações Ltda. e Afinco
Construtora e Participações Ltda., que são de propriedade de Jorge
Afíf Cury Filho e Eduardo Elias Sauma Resk Filho, ambos também
sócios da empresa agravante.
Com a atencipação da tutela, os construtores doempreendimento imobiliário estão proibidos de comercializar seu
próprio imóvel.
A intermediação e promoção de venda do Edifício
"Gran Jardins de France" foi transferida com exclusividade à empresa
Cargill Agrícola S.A.
Por último, cumpre consignar que a agravadatambém menciona na ação proposta a desconsideração da pessoa
jurídica, com fundamento no artigo 50, do Código Civil,
Não é a hipótese dos autos, porque não de trata de
abuso da personalidade jurídica caracterizado pelo desvio de_
finalidade e pela confusão patrimonial. / rf-
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 900.365.00/6 -SAO PAULO - VOTO N° 4874
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 32/43
17
PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
3. Por tais motivos, pelo meu voto, dava
provimento ao recurso para afastar a antecipação da tutela.
FERRÂZTFEIJSARDORelator
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 900.365.00/6 - SÃO PAULO - VOTO N° 4874
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 33/43
PODER JUDICIÁRIOSÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA VIGÉSIMA
NONA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 900.365-00/6
COMARCA DA CAPITAL
VOTO N°8744
DECLARAÇÃO DE VOTO VENCEDOR
Em 1o de janeiro de 2003, a empresa Senna Pereira
Assessoria e Serviços S/C Ltda, da qual o seu sócio-gerente, Sr.
Marcelo Silva Pereira, conhecido por "Senna", no mercado imobiliá-
rio, detém 99,99% do capital social, ajustou contrato de prestação de
serviços com a Lopes Imóveis S/A., mediante a remuneração mensal
fixa de R$ 41.488,08 (quarenta e um mil, quatrocentos e oitenta e
oito reais e oito centavos), mais parte variável.
Nesse contrato, ficou pactuada a obrigação negativa de
natureza não concorrencial, pela qual a prestadora de serviço se o-
brigava por si, seus sócios, diretores, representantes, empregados,
prepostos e outros agentes a (i) não solicitar ou persuadir qualquer
cliente incorporador a diminuir ou encerrar sua relação com a Lopes,seja na tentativa de obter tal cliente para si ou para terceiros; (ii) a-
inda, para si ou terceiros, empregar, contratar, tentar empregar ou
contratar empregados, corretores autónomos ou prestadores de ser-
viços da Lopes Imóveis, bem como qualquer pessoa que seja ou te-
nha sido empregado desta nos últimos 12 meses.
Também, ficou constando nesse contrato cláusula deconfidencialidade, pela qual a prestadora, seus sócios, diretores, re-
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 34/43
PODER JUDICIÁRIOSÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA VIGÉSIMA
NONA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO
presentantes, empregados, contratados, prepostos e outros agentes
a ela relacionados obrigavam-se a não revelar a terceiros, ou utilizar
para fins alheios àqueles previstos no contrato quaisquer informa-
ções confidenciais relativas aos clientes da Lopes Imóveis, envol-
vendo segredos de mercado, programas de treinamento, informa-
ções técnicas, procedimentos etc etc.
Como contraprestação dos serviços e em remuneração
dessas obrigações de confidencialidade e de não-concorrência foi
pactuada a elevadíssima remuneração, acima mencionada, de R$
41.488,08, fora verba variável.
Esse contrato, previsto para vigorar de 1o de janeiro de
2003 a 31 de dezembro de 2004, foi resilido em 21 de outubro de
2004, imotivadamente por iniciativa da prestadora de serviços.
Em novembro de 2004, os incorporadores dos imóveis
Isabella, Le Grand Jardin e Matiz (Living Club) (Conceito Construtora
e Participações Ltda. e Afinco Construtora e Participações Ltda.),
cuja comercialização era de exclusividade da Lopes Imóveis, como
se vê dos "folders" de propaganda, romperam o contrato com esta,
sob alegação de que passariam a comercializá-los eles próprios.
Estes incorporadores - Srs. Eduardo Elias Sauma Resk
Filho e Jorge Afif Cury, que são os sócios das mencionadas constru-
toras - Conceito Construtora e Participações Ltda. e Afinco Constru-
tora e Participações Ltda. -, constituíram a empresa agravante,
J.E.S. Consultoria Imobiliária Ltda., em 2 de dezembro de 2004.
2
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 35/43
PODER JUDICIÁRIOSÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA VIGÉSIMA
NONA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO
Em 17 de fevereiro de 2005, o Sr. Marcelo Silva Pereira
que, como dito, era o titular de 99,99% da empresa Senna Pereira
Assessoria e Serviços S/C Ltda., e se desligara da agravada,
passou a integrar o quadro social da J.E.S. Consultoria Imobiliária
Ltda.
Assim, a J.E.S., com a presença do Sr. Marcelo Silva
Pereira, passou a comercializar os mesmos imóveis cuja comerciali-
zação era da exclusividade da agravada.
Acrescente-se que, como esta nos dá conta, o Sr. Mar-
celo "teria levado" diversos corretores, antes vinculados a ela, para
trabalharem com ele na J.E.S.
Esta a síntese dos fatos.
Desde logo, chama a atenção a proximidade das datas
em que os fatos narrados aconteceram, senão a evidenciar, ao me-
nos a insinuar que tudo foi montado para que o Sr. Marcelo Silva Pe-
reira fosse trabalhar na comercialização dos imóveis de seus sócios,
que anteriormente cabiam à Lopes Imóveis a comercialização, com
exclusividade.
Cumpre ainda registrar que, embora o ordenamento
pátrio não admita a constituição da chamada "sociedade unipessoal",
não apenas pela contradição dos termos, já que sociedade pressu-
põe ao menos duas pessoas, reconhece em situações especialíssi-
mas e durante breve espaço de tempo a sua existência, como no
í J <r-
3
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 36/43
PODER JUDICIÁRIOSÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA VIGÉSIMA
NONA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO
caso de falecimento ou exclusão de um dos sócios da sociedade
com apenas dois, por exemplo.
No entanto, situações há que, não obstante albergadas
pela lei, permite-se existir de fato sociedades unipessoais entre nós,
como no caso da Senna Pereira Assessoria e Serviços S/C Ltda., em
que o sócio majoritário, Sr. Marcelo Silva Pereira, detém 99,99% do
capital social da sociedade.
Na verdade, em hipóteses como esta, o sócio e a soci-
edade são uma única pessoa e assim têm de ser tratados no presen-
te caso. Inaplicável aqui a regra contratual contida no Código Bevilá-
qua, não repetida no atual, segundo a qual "As pessoas jurídicas têmexistência distinta da dos seus membros" (art. 20).
Vejamos os aspectos jurídicos da questão, tal como
posta pelos agravantes.
De indiscutível validade as cláusulas de não-
concorrência e de confidencialidade ajustada no contrato de presta-ção de serviços firmado entre a Lopes Imóveis e a Senna Pereira As-
sessoria e Serviços S/C Ltda.
Uma cláusula contratual somente pode ser acoimada
de ilegal quando contrariar norma cogente ou de ordem pública ou
atentar contra os bons costumes, como é pacífico na doutrina e na
jurisprudência (por todos, ORLANDO GOMES, Contratos, 17a
ed., atua-lizada por HUMBERTO THEODORO JR., Forense, p. 24).
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 37/43
PODER JUDICIÁRIOSÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA VIGÉSIMA
NONA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO
No caso, nenhuma das hipóteses ocorre.
A cláusula de não-concorrência foi limitada no tempo e
no espaço - 1 (um) ano, a partir da rescisão - e, se é que assim po-
demos chamar de espacial as atívidades vedadas, apenas os em-preendimentos que estavam ou estiveram sob comercialização da
Lopes Imóveis a ela estavam vinculados.
Portanto, ao Sr. Marcelo Silva Pereira e à sua empresa
Senna Pereira Assessoria e Serviços S/C Ltda. sempre estiveram
abertas as portas do mercado imobiliário em relação a todos os de-
mais imóveis, pois, de palmar evidência, que a Lopes detém apenasuma parcelas deles, ainda que seja a maior do mercado.
Ademais, como constou do contrato, justo que essas
cláusulas tivessem sido pactuadas, haja vista a elevadíssima remu-
neração percebida pelo Sr. Marcelo ou pela sua empresa, já que a
nosso ver confundem-se.
Portanto, não há se falar de cláusula leonina a impedir
o direito do Sr. Marcelo e de sua empresa de continuarem trabalhan-
do no ramo imobiliário.
Argumento que a agravante explora, e não deixa de
chamar a atenção, é o fato de os imóveis Isabela, Le Grand Jardin e
Matiz terem sido construídos pelos Srs. Eduardo Elias Sauma Resk
Filho e Jorge Afif Cury ou pelas empresas de que são titulares, que,
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 38/43
PODER JUDICIÁRIOSÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
VIGÉSIMA NONA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO
assim, foram os incorporadores e são os seus donos. Como impedi-
los de os comercializar?
É claro que se o fizessem por eles próprios, diretamen-
te ou com a colaboração de qualquer outra pessoa, poderiam fazê-lo.
Não, entretanto, em sociedade com o Sr. Marcelo Silva
Pereira e/ou sua empresa, em virtude da obrigação negativa que as-
sumiram com a Lopes Imóveis.
Então, indagar-se-á: poderia essa obrigação de não
fazer assumida com a Lopes "contaminar" a sociedade da qual o Sr.
Marcelo passou a fazer parte? A resposta é indiscutivelmente afirma-tiva.
E mais.
Tudo leva a crer que a retirada das mãos da Lopes da
comercialização desses imóveis, o desligamento do Sr. Marcelo da
Lopes e o seu ingresso no quadro social da agravante - J.E.S. - ,fatos ocorridos em datas bastante próximas, como dito, tenham sido
urdidos com o deliberado objetivo de descumprimento das cláusulas
de não competição e de confidencialidade ajustada com a Lopes
Imóveis.
Portanto, afasto inteiramente as alegações da agra-
vante relativas à validade das cláusulas e o alcance delas em rela-
ção a ela própria, na medida em que o Sr. Marcelo Silva Pereira
pas-
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 39/43
PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA VIGÉSIMA
NONA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO
sou a fazer parte do seu quadro societário e passou a comercializar
os imóveis que anteriormente eram da comercialização exclusiva da
Lopes Imóveis.
O brocardo jurídico invocado pela agravante, possivel-
mente decalcado da afirmação de ULPIANO, contida no Digesto, 48, 2,7, 2, relativo à coisa julgada (res inter alios judicatae aiii non prae-
judicant), não tem aplicação ao caso. Ou os sócios da J.E.S. sabiam
das cláusulas de obrigações negativas assumidas por Marcelo com a
Lopes, o que é provável em face da urdidura perpetrada, como antes
exposto, ou não sabiam e Marcelo deverá responsabilizar-se perante
eles. A Lopes é que não pode ser prejudicada diante do que ajustou
no contrato com Marcelo.
Outra questão suscitada é saber-se, já que o contrato
previa multa, se podia a credora da obrigação negativa exigir a exe-
cução específica.
Regra elementar e fundamental das obrigações em ge-
ral é que devem ser cumpridas no tempo, modo e lugar ajustados.
O recurso alternativo à eventual multa (cláusula penal)
pactuada somente deve se dar quando impossível a execução espe-
cífica, independentemente de poder ser cobrada juntamente com a
prestação específica.
Leciona a respeito o pranteado WASHINGTON DE BARROS
MONTEIRO, ao tratar das obrigações de não-fazer: "A questionadaexecução específica só será excluída se exigir violência física contra
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 40/43
PODER JUDICIÁRIOSÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
VIGÉSIMA NONA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO
o devedor" (Curso, Obrigações, 1a parte, 32a ed., atualizada por
CARLOS ALBERTO D. MALUF, Saraiva, p. 107).
Não discrepa CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, ao registrar
que, "Em simetria com o disposto no art. 249 do Código Civil de 2002
quanto à obrigação de fazer, o Código, no art. 251, assegura ao cre-
dor da obrigação negativa a via judiciária, para obter sentença que
imponha ao devedor o desfazimento daquilo cuja abstenção se obri-gara (...)" (Instituições, Teoria Geral das Obrigações, v. II, 20a ed.,
atualizada por Luiz ROLDÃO DE FREITAS GOMES, Forense, p. 65).
A invocação do saudoso SERPA LOPES, para afirmar que o
descumprimento da obrigação de não-fazer dá ensejo apenas às
perdas e danos, data vénia, amesquinha o extraordinário saber jurí-
dico desse mestre, porquanto no excerto citado, ele faz referência àsperdas e danos no exemplo específico de obrigação negativa de ali-
enar imóvel, em que se supõe que a venda já se tenha consumado.
Assim, impossível a execução específica, pois prejudicaria o adqui-
rente que desconhecia a obrigação assumida, restando ao credor
apenas as perdas e danos. Não se aplica a lição às obrigações ne-
gativas em geral, em que seja possível a execução específica.
Aliás, no que concerne à multa, é de meridiana clareza
o disposto no art. 411 do Código Civil: "Quando se estipular a cláu-
sula penal para o caso de mora, ou em segurança especial de outra
cláusula determinada, terá o credor o arbítrio de exigir a satisfação
da pena cominada, juntamente com o desempenho da obrigação
principal".
8
^6L:SfP*
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 41/43
PODER JUDICIÁRIOSÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA VIGÉSIMA
NONA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO
Assim, não estava a Lopes Imóveis obrigada a satisfa-
zer-se com a cobrança da multa. Esta pode ser cobrada indepen-
dentemente de exigir o desempenho da obrigação pactuada.
A questão da pessoalidade no cumprimento da obriga-ção negativa, no caso, não oferece a menor dificuldade. Como já se
registrou, a pessoa física do Sr. Marcelo Silva Pereira e a sua em-
presa Senna Pereira Assessoria e Serviços S/C Ltda. não podem
deixar de serem vistas como uma única pessoa, não apenas porque
o Sr. Marcelo detém 99,99% do capital social desta, mas também
porque as cláusulas de não-concorrência e de confidencialidade
ajustadas alcançavam a pessoa do sócio, o mesmo que as ajustou
ao subscrever o contrato.
Acrescente-se que sem nenhum sentido a afirmativa de
que a impossibilidade de a agravante comercializar imóveis, anteri-
ormente de comercialização da Lopes imóveis, implicaria infração à
ordem económica.
A alegação de que as mencionadas cláusulas não po-
deriam alcançar o empreendimento Grano Jardins de France tam-
bém não colhe, já que, antes de a J.E.S. aliená-los à Cargil Agrícola
S/A., era da comercialização da Lopes Imóveis. Portanto, na verda-
de, embora esta empresa o tenha entregue à J.E.S. por ser de sua
propriedade, agiu como interposta pessoa para colaborar na violação
das cláusulas de não-concorrência e confidencialidade.
.:SÍP,
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 42/43
PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
VIGÉSIMA NONA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO
Sob qualquer ângulo em que se examine os fatos, eles
subsumem-se a essas cláusulas ajustadas por Marcelo Silva Pereira,
no contrato que, em nome da sua empresa, firmou com a Lopes
Imóveis.
A nossa nova ordem jurídico-civil, na lição do PROF.MIGUEL REALE, está vinculada "aos princípios de equidade, de boa-fé, de
equilíbrio contratual, de correção (correttezzaa), de lealdade, de
respeito aos usos e costumes do lugar das convenções, de interpre-
tação da vontade tal como é consubstanciada, etc. etc, sempre le-
vando em conta a ética da situação, sob cuja luz a igualdade deixa
de ser vista in abstraio, para se concretizar em uma relação de pro-
porcionalidade. Essa tomada de posição perante a solução normati-va tem duas consequências fundamentais: a primeira é a preferên-
cia, sempre que possível, por cláusulas abertas que favoreçam a
adequação à justiça do caso concreto, em vez de opção sistemática
por um rigorismo formal que bloqueia a força expansiva dos valores
jurídicos; a segunda é a obediência aos mesmos princípios éticos
que presidiram a formulação da disposição normativa ao longo de
toda a sua execução" ("in" prefácio à obra Diretrizes Teóricas do
Novo Código Civil Brasileiro, de JUDITH MARTINS-COSTA e GERSON LUIZ
CARLOS BRANCO, Saraiva, 2002, p. X).
Por isso e por tudo que foi relatado, inaceitável a tese
sustentada, com brilhantismo, diga-se, pela agravante.
O caso indiscutivelmente comportava de maneira clara
a tutela antecipada concedida.
5/10/2018 90036500 - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/90036500 43/43
PODER JUDICIÁRIOSÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA VIGÉSIMA
NONA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO
Em face do exposto, nego provimento
ao agravo, ficando mantida a tutela antecipada
deferida pelo magistrado, acompanhando o voto da
ilustre 2a Juíza, DES. SYLVIA ROCHA GOUVÊA, e pedindo
vénia ao eminente DES. OTACÍLIO FERRAZ FELISARDO, por
dele divergir.
li
IIS CAMARGO PINTO DE CARVALHO
JUIZ