A Ascensão de um Modelo Híbrido na Comunicação

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Intercom Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XVII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Centro-Oeste Campo Grande - MS 4 a 6/6/2015 1 A Ascensão de um Modelo Híbrido na Comunicação: análise dos Informes Publicitários do site Campo Grande News 1 Bruno Navarros Fraga 2 Marcos Paulo da Silva 3 Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campo Grande, MS Resumo O artigo apresenta um breve histórico sobre a influência da publicidade no fazer jornalístico e aponta aspectos da hibridização contida nos Informes Publicitários, formato utilizado em publicações por diversos veículos de comunicação. O trabalho traz uma análise quantitativa do site Campo Grande News, sediado em Campo Grande-MS, apresentando como recorte temporal mais de quatro anos de publicação deste produto informativo, mas de cunho também comercial, cujo conteúdo é produzido com o objetivo de convencer o leitor a consumir um produto ou serviço específico. Palavras-chave: hibridização, Informes Publicitários, Jornalismo, Publicidade. Influência histórica Historiadores apontam a Acta Diurna, publicação oficial do Império Romano criada no ano de 59 A.C. durante o governo de César, como o primeiro jornal da História, com informações diárias sobre conquistas militares, ciência e política; na verdade, um meio de comunicação oficial para reforçar o poder do Imperador. Historicamente, a informação passou a se valer de códigos próprios, com o surgimento de novos meios de comunicação e de tecnologias que transformaram drasticamente a maneira de se fazer notícia. Ressalta-se a invenção de Gutenberg, com a prensa de papel, que fez surgir na Idade Média os primeiros impressos periódicos. A partir do século XVII, tem-se registro dos primeiros anúncios em jornais. Jornalismo e Publicidade começavam a dividir espaço. No século XIX, na esteira da Revolução Industrial, houve a massificação do consumo, quando essas duas formas de 1 Trabalho apresentado no DT 2 Publicidade e Propaganda do XVII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Centro-Oeste, realizado de 4 a 6 de junho de 2015. 2 Jornalista graduado e mestrando em Comunicação pela UFMS, email: [email protected] . 3 Orientador do trabalho. Doutor em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), com estágio de doutorado-sanduíche na Syracuse University (NY, Estados Unidos). Professor do curso de Jornalismo e do Mestrado em Comunicação da UFMS, email: [email protected] .

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O artigo apresenta um breve histórico sobre a influência da publicidade no fazer jornalístico e aponta aspectos da hibridização contida nos Informes Publicitários, formato utilizado em publicações por diversos veículos de comunicação.

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    A Ascenso de um Modelo Hbrido na Comunicao: anlise dos Informes

    Publicitrios do site Campo Grande News1

    Bruno Navarros Fraga2

    Marcos Paulo da Silva3

    Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campo Grande, MS

    Resumo

    O artigo apresenta um breve histrico sobre a influncia da publicidade no fazer

    jornalstico e aponta aspectos da hibridizao contida nos Informes Publicitrios,

    formato utilizado em publicaes por diversos veculos de comunicao. O trabalho traz

    uma anlise quantitativa do site Campo Grande News, sediado em Campo Grande-MS,

    apresentando como recorte temporal mais de quatro anos de publicao deste produto

    informativo, mas de cunho tambm comercial, cujo contedo produzido com o

    objetivo de convencer o leitor a consumir um produto ou servio especfico.

    Palavras-chave: hibridizao, Informes Publicitrios, Jornalismo, Publicidade.

    Influncia histrica

    Historiadores apontam a Acta Diurna, publicao oficial do Imprio Romano

    criada no ano de 59 A.C. durante o governo de Csar, como o primeiro jornal da

    Histria, com informaes dirias sobre conquistas militares, cincia e poltica; na

    verdade, um meio de comunicao oficial para reforar o poder do Imperador.

    Historicamente, a informao passou a se valer de cdigos prprios, com o surgimento

    de novos meios de comunicao e de tecnologias que transformaram drasticamente a

    maneira de se fazer notcia. Ressalta-se a inveno de Gutenberg, com a prensa de

    papel, que fez surgir na Idade Mdia os primeiros impressos peridicos.

    A partir do sculo XVII, tem-se registro dos primeiros anncios em jornais.

    Jornalismo e Publicidade comeavam a dividir espao. No sculo XIX, na esteira da

    Revoluo Industrial, houve a massificao do consumo, quando essas duas formas de

    1 Trabalho apresentado no DT 2 Publicidade e Propaganda do XVII Congresso de Cincias da Comunicao na Regio Centro-Oeste, realizado de 4 a 6 de junho de 2015.

    2 Jornalista graduado e mestrando em Comunicao pela UFMS, email: [email protected].

    3 Orientador do trabalho. Doutor em Comunicao Social pela Universidade Metodista de So Paulo

    (UMESP), com estgio de doutorado-sanduche na Syracuse University (NY, Estados Unidos). Professor

    do curso de Jornalismo e do Mestrado em Comunicao da UFMS, email: [email protected].

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    comunicao tambm passaram por mudanas consideradas revolucionrias. As

    tcnicas tipogrficas ganharam novos inventos, como as rotativas de Marinoni, em

    1871, que possibilitaram a produo de jornais em alta escala tornou-se possvel

    imprimir 95.000 pginas por hora (TRAQUINA, 2004, p.38).

    A Publicidade direcionava suas armas para o coletivo; compradores e

    vendedores desconhecidos, formados pela massa do proletariado. O Jornalismo passava

    a ser tratado como uma atividade que deveria gerar lucro, sendo a notcia de atualidade

    sua mercadoria. No ltimo quarto do sculo XIX, a Imprensa se estabeleceu como pleno

    negcio e a produo jornalstica, buscando uma forma de se sustentar, focou na

    associao de elementos da publicidade ao produto informativo, com a produo e a

    circulao de notcias financiadas em grande parte pelos anunciantes.

    Mas, foi a partir do final do sculo XX, quando o excesso de informao saturou

    o mercado e a concorrncia tornou-se intensa, que a informao ganhou um tratamento

    esttico cuidadoso, na inteno de reter a ateno do pblico por tempo suficiente para

    que a mensagem publicitria ou jornalstica fosse transmitida. O Brasil tambm seguiu

    essa tendncia j consolidada nos territrios norte-americano e europeu.

    A partir da ps-modernidade, a publicidade comea a transpor os limites do

    jornalismo: a ordem hibridizar a natureza persuasiva da publicidade,

    dissolvendo-a no espao jornalstico, como se fora parte da prpria natureza

    jornalstica. um exerccio que inocula o interesse privado no espao pblico

    da imprensa e investe de legitimidade o gene clandestino da lgica

    publicitria. (MARSHALL, 2003, p.119-120).

    Remete-se ao pensamento de Luiz Gonzaga Godoi Trigo (2003), que ao debater

    sobre entretenimento afirma que:

    Em uma sociedade cuja informao uma mercadoria valiosa e os fluxos de

    circulao da informao so controlados por instituies e empresas ligadas

    aos mais diversos setores produtivos, existe uma intricada rede que agrupa

    em um mesmo fenmeno atividades que, na origem, so diferentes (esportes,

    notcias, arte, educao, lazer, turismo, show-business), mas que se articulam enquanto mercadorias destinadas a um consumo especfico

    caracterizado pelo prazer. (TRIGO, 2003, p. 21-22).

    Segundo Patrick Charaudeau (2010, p.83) "a situao de comunicao miditica

    pode convocar uma finalidade dominante dupla: de informao, para responder

    exigncia democrtica que quer que a opinio pblica seja esclarecida sobre os

    acontecimentos que se produzem no espao pblico; e de incitao, para responder

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    exigncia de concorrncia comercial que quer que este discurso se enderece ao maior

    nmero e, desse modo, procure capt-lo".

    A informao como mercadoria

    A hibridizao entre Jornalismo e Publicidade torna-se atrativa em um mercado

    da Comunicao cada dia mais competitivo em termos comerciais. O pensamento de

    quase meio sculo de Marshall Mcluhan estimula a discusso, ao apontar que:

    "O homem ligado ao livro tem a iluso de que a imprensa seria melhor sem

    os anncios e sem a presso dos anunciantes. As pesquisas tm espantado at

    os diretores de jornais ao revelarem que os olhos errticos dos leitores de

    jornais se deliciam por igual com os anncios e os textos noticiosos (MCLUHAN, 1969, p.237). O autor pondera que o que h de pejorativo nos

    contedos publicitrios o fato de apresentarem sempre notcias positivas.

    Quando se trata sobre o impacto do contedo publicitrio disfarado de

    Jornalismo, depara-se constantemente com afirmaes crticas em artigos e obras

    acadmicas a respeito dos eventuais enganos a que os leitores so levados pelos

    modelos adotados para a transmisso de contedo.

    Segundo Ciro Marcondes Filho,

    Os publicitrios veem na apresentao jornalstica de seus anncios, isto ,

    no desfiguramento do carter de anncio de sua publicidade (por meio da

    mistura da parte publicitria com a redacional), um aumento da eficincia

    propagandstica desta. A qualidade da parte noticiosa que pode aumentar o

    poder do anncio apresenta-se para os editores como fonte especial de lucros.

    (MARCONDES FILHO, 1984, p. 72).

    Leandro Marshall chama de 'jornalismo cor-de-rosa' aquele influenciado pelo

    discurso publicitrio. De acordo com classificao do autor, o 'jornalismo cor-de-rosa'

    pode ser identificado em 25 variaes ou gneros; um deles o Desfiguramento:

    publicidade paga, disfarada de notcia, com identificao de Informe Publicitrio

    (MARSHALL, 2003, p.122).

    Observa-se com certa frequncia nos grandes meios de comunicao a presena

    de materiais publicitrios apresentados em linguagem e forma de notcia; identificados

    com os dizeres "Informe Publicitrio". Porm, encontra-se dificuldade em identificar

    trabalhos cientficos com pesquisas e dados coletados justamente junto ao pblico-alvo,

    o leitor; que pode de fato apontar para a forma como o contedo do Informe Publicitrio

    espcie de anncio camuflado percebido.

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    Uma pesquisa divulgada em 2014 pela empresa norte-americana de marketing e

    contedo Contently4, mostra que 54% dos consumidores dos Estados Unidos no

    confiam no contedo patrocinado. Uma parcela de 59% acredita que um veculo

    jornalstico perde a credibilidade quando publica um contedo patrocinado por uma

    marca. Dois teros dos entrevistados alegam que so menos propensos a clicar em uma

    matria patrocinada do que em um artigo editorial das publicaes.

    A Contently entrevistou 542 usurios de internet entre 18 e 65 anos e constatou

    ainda que 48% dos entrevistados acreditam que 'Contedo Patrocinado' significa que

    "um anunciante paga para o artigo ser criado e teve influncia sobre o contedo";

    porm, mais de metade (52%) considera que isso significava algo diferente. O estudo

    tambm revela que quanto maior o nvel educacional dos consumidores, mais eles

    declararam se sentir enganados quando se deparam com uma reportagem patrocinada.

    Esses nmeros revelam a ateno que se deve ter no s com a informao em

    si, mas tambm quanto s expectativas e reaes do pblico que consome o contedo;

    algo que muitas vezes negligenciado por responsveis em produzir a informao. Para

    explicar a relao entre enunciador e enunciatrio, o linguista francs Patrick

    Charaudeau se aprofunda no conceito de Contrato de Comunicao, conceito que leva

    em conta o texto e as condies em que produzido (fatores tcnicos, socioculturais e

    econmicos), descrevendo expectativas recprocas ao afirmar que:

    Toda troca linguageira se realiza num quadro de co-intencionalidade, cuja

    garantia so as restries da situao de comunicao. O necessrio

    reconhecimento recproco das restries da situao pelos parceiros da troca

    linguageira nos leva a dizer que esto ligados por uma espcie de acordo

    prvio sobre os dados desse quadro de referncia". (CHARAUDEAU, 2006,

    p. 68).

    Fato que, em uma sociedade de consumo, que por outro lado vive em um

    cenrio em que a publicidade tradicional j d indcios de ter saturado o pblico em

    geral, constantemente profissionais da rea de Comunicao buscam novas alternativas

    para levar a mensagem publicitria de forma mais informativa e provocar maior

    engajamento do pblico-alvo. A partir da, as fronteiras entre Jornalismo e Publicidade

    comeam a se dissolver, resultando em contedos hbridos que se apropriam de tcnicas

    de ambas as reas de conhecimento, as interligando para atrair a ateno do leitor.

    4LAZAUSKAS, Joe. Study: Sponsored Content Has a Trust Problem. Disponvel em

    .

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    Cabe aqui a meno de outro modelo que tem sido adotado por grandes veculos

    jornalsticos, como o The New York Times5, nos Estados Unidos, e recentemente pelo

    portal Terra, no Brasil: a "Publicidade Nativa"6, isto , modelo no qual uma equipe de

    jornalistas, via de regra no integrante da redao do veculo, produz materiais

    relacionados a temas de interesse das empresas patrocinadoras, mas que no

    necessariamente as citam no texto (diferenciando-se por este, dentre outros aspectos, do

    Informe Publicitrio). Em geral, o formato configura-se por apresentar na matria os

    dizeres "Patrocinado por" acompanhados da logomarca da empresa patrocinadora.

    Controversa troca de elementos

    Jos Antonio Martinuzzo define Informe Publicitrio como:

    Espao publicitrio, uma vez que comprado junto s mdias jornalsticas,

    mas com contedo informativo. Geralmente, dialoga com padres estticos e

    estilsticos do veculo jornalstico, o que explica a identificao como

    'informe publicitrio'. utilizado para garantir maior formalidade a

    publicaes e posicionamentos organizacionais acerca de temas complexos

    ou mais densos. (MARTINUZZO, 2013, p.77).

    Para Leandro Marshall, "embora obedea aos princpios do jornalismo, estando

    corretamente identificada, a publicidade acaba obtendo o bnus de uma notcia, j que

    os leitores, majoritariamente, no percebem o aviso de 'informe publicitrio' e do a

    credibilidade de notcia ao texto" (MARSHALL, 2003, p.123).

    O Cdigo Brasileiro de Autorregulamentao Publicitria7, elaborado pelo

    Conar (Conselho Nacional de Autorregulamentao Publicitria), traz no 'Artigo 28' a

    indicao de que "o anncio deve ser claramente distinguido como tal, seja qual for a

    sua forma ou meio de veiculao". No 'Artigo 30', o documento indica que "a pea

    jornalstica sob a forma de reportagem, artigo, nota, texto-legenda ou qualquer outra que

    5 O peridico norte-americano lanou em 2014 seus primeiros formatos de Publicidade Nativa. "Women

    Inmates: Why the Male Model Doesnt Work" um dos contedos que obtiveram xito com a audincia. O material traz

    uma reportagem sobre o sistema carcerrio feminino nos Estados Unidos e foi patrocinado pelo Netflix

    com o intuito de divulgar a nova temporada da srie "Orange & Black", que apresenta a histria de uma

    personagem envolvida neste cenrio.

    6 O conceito e um panorama geral sobre este formato, com vantagens e ameaas, podem ser encontrados

    na reportagem do Portal Imprensa , publicada em16 de maio de

    2014 e intitulada "Publicidade nativa opo para as marcas gerarem relevncia com credibilidade".

    7 Disponvel em , aba "Cdigo".

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    se veicule mediante pagamento, deve ser apropriadamente identificada para que se

    distinga das matrias editoriais e no confunda o Consumidor".

    Busca-se em Nilson Lage, ento, uma definio para a funo principal de um

    profissional do Jornalismo:

    Jornalistas devem transformar, processar, codificar informaes segundo

    padres tcnicos consensuais (sem o que as mensagens correriam o risco de

    no ser aceitas ou compreendidas) e obedecendo a valores ticos admitidos

    pela sociedade, embora no necessariamente por todos os grupos que a

    compem. So, nesse aspecto, como os professores: transmitem mensagens

    tidas por verdadeiras que s excepcionalmente eles mesmo descobriram ou

    inventaram. (LAGE, 1988, p.125-126).

    Logo na sequncia deste pensamento em sua obra, Lage (1988, p. 127)

    enftico ao afirmar que a uniteralidade da publicidade, representada pela apresentao

    de fatos da perspectiva que convm ao cliente, praticamente uma falsidade absoluta.

    Segundo o autor, o carter falso da mensagem agravado por tcnicas como "a

    dramatizao de testemunhos sobre algum produto ou servio" ou "a produo de

    bestialgicos em que se abusa da linguagem tcnica ou cientfica".

    Para Wilson Gomes (2009, p.61), verdadeiros "so os enunciados que descrevem

    coisas e fatos e, assim, mostram, revelam como eles so". O autor conclui

    posteriormente que "no h apenas fatos; no h to somente interpretaes. H verdade

    e h perspectiva. O importante no perder de vista a tenso de convivncia destes dois

    termos imprescindveis. Verdade na perspectiva, no verdade da perspectiva".

    (GOMES, 2009, p.66)

    Embora haja um nmero mnimo de trabalhos de pesquisa relacionados aos

    impactos do Informe Publicitrio no pblico leitor, quando pesquisa-se referncias

    sobre a utilizao de elementos do Jornalismo e Publicidade na produo de contedo as

    opes aumentam significativamente. O debate sobre as consequncias turvas desta

    relao estende-se h dcadas, perdura e ganha corpo com a transformao dos meios,

    indivduo e sociedade.

    De acordo com Nelly de Carvalho (2002), com o intuito de convencer, a

    linguagem publicitria utiliza recursos estilsticos e argumentativos da linguagem

    cotidiana.

    Falar argumentar, tentar impor. O mesmo se pode dizer da linguagem

    jornalstica, dos discursos polticos (sobretudo em poca eleitoral), da

    linguagem dos tribunais (com defesas e acusaes apaixonadas) e at do

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    discurso amoroso. Em todos esses casos, h uma base informativa que,

    manipulada, serve aos objetivos do emissor. A diferena est no grau da

    conscincia quanto aos recursos utilizados para o convencimento e, nesse

    sentido, a linguagem publicitria se caracteriza pela utilizao racional de tais

    instrumentos para mudar (ou conservar) a opinio do pblico-alvo.

    (CARVALHO, 2002, p.9).

    Ao analisar a linguagem atrelada ao contexto social, Charaudeau (2006) concebe

    as mdias num complexo cenrio de poder. Sua legitimao depende do campo

    econmico, que busca captar um grande pblico, e do campo da cidadania, no qual

    adquirem legitimidade atravs da construo de opinio pblica que lhes garanta

    credibilidade.

    Na tenso entre os polos de legitimidade e de captao, quanto mais as

    mdias tendem ao primeiro, cujas exigncias so as da austeridade

    racionalizante, menos tocam o grande pblico; quanto mais tendem para a

    captao, cujas exigncias so as da imaginao dramatizantes, menos

    credveis sero. As mdias no ignoram isso, e seu jogo consiste em navegar

    entre esses dois polos aos sabor de sua ideologia e da natureza dos

    acontecimentos. (CHARAUDEAU, 2006, p.93).

    O municpio, o Campo Grande News e os Informes Publicitrios

    Segundo dados do ltimo levantamento sobre a populao brasileira, publicado

    pelo IBGE8 no Dirio Oficial da Unio, a estimativa populacional para Campo Grande-

    MS em 2014 foi de 843.120 mil habitantes, crescimento de 7,15% em relao ao Censo

    2010. O IBGE Cidades9 aponta que a capital sul-mato-grossense tem o PIB baseado no

    setor de Servios e o valor do rendimento nominal mdio mensal per capita de R$

    1.246,75. De acordo com o Atlas do Desenvolvimento Humano 201310

    , o municpio

    possui IDH (ndice de Desenvolvimento Humano) de 0,784 e est na 100 posio das

    melhores cidades do pas.

    A cidade passou recentemente por um grande crescimento imobilirio e

    expanso comercial, em especial nos bairros. Dados da Junta Comercial do Estado de

    8 Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenao de Populao e Indicadores Sociais.

    9 Detalhamento sobre Campo Grande-MS disponvel em . Fonte da renda

    per capita: IBGE, Censo Demogrfico 2010. .

    10 Publicao desenvolvida pelo Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), Instituto

    de Pesquisa Econmica Aplicada (Ipea) e Fundao Joo Pinheiro (FJP). Disponvel em

    .

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    Mato Grosso do Sul (Jucems11

    ) apontam que o total de empresas em Campo Grande

    encerrou maro de 2015 com 74.580 negcios ativos, incluindo os 30.632

    microempreendedores individuais apontados pelas estatsticas da Receita Federal12

    . Este

    ltimo tipo de atividade empresarial est em constante crescimento na Capital, j que de

    maro de 2014 - quando havia 25.398 pessoas - para o mesmo perodo em 2015 houve

    crescimento de mais de 20% no nmero de microempreendedores individuais.

    O site Campo Grande News, um dos portais jornalsticos pioneiros em Mato

    Grosso do Sul, foi criado em maro de 199913

    . Em agosto de 2011, lanou o canal

    Lado B14, integrando editorias relacionadas ao consumo, lazer, comportamento,

    diverso, tendncias e arquitetura. Concomitantemente, na mesma poca, passou a

    produzir Informes Publicitrios como forma de vender espaos a maioria relacionados

    a editorias do "Lado B" a empresas interessadas na divulgao de produtos ou

    servios.

    Segundo dados do Alexa Analytics15

    , servio gerenciado pela Amazon, que

    analisa e elabora rankings dos sites mais acessados de todo o mundo baseado em dados

    gerados pela ferramenta, o Campo Grande News hoje o site mais acessado do estado,

    com mdia de 111.230 mil visitantes dirios nicos e 627.272 mil pginas visualizadas.

    Observa-se que os Informes Publicitrios so publicados atualmente com maior

    frequncia no site, com espao de destaque, principalmente no banner rotativo principal.

    Eles so inseridos em formato quase idntico s matrias jornalsticas, exceo da

    identificao no lugar do nome do reprter e atravs de tarja na imagem, conforme

    ilustrado abaixo.

    11 , aba Informaes-Estatsticas.

    12 ,

    Opo "Quantidade de optantes SIMEI".

    13 KEMPFER, ngela. Aos 15 anos, Campo Grande News a histria do jornalismo online em MS.

    .

    14 http://www.campograndenews.com.br/lado-b.

    15 http://www.alexa.com/siteinfo/campograndenews.com.br.

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    Figura 01 - Comparativo Notcia/Informe Publicitrio da editoria 'Consumo'

    (Fonte: www.campograndenews.com.br)

    Figura 02 - Comparativo Notcia/Informe Publicitrio da editoria 'Sabor'

    (Fonte: www.campograndenews.com.br)

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    Figura 03 - Comparativo Notcia/Informe Publicitrio da editoria 'Empregos'

    (Fonte: www.campograndenews.com.br)

    Atravs de uma pesquisa feita pela ferramenta de busca do prprio site Campo

    Grande News, foi constatado que, desde 2011, os Informes Publicitrios apresentaram

    aumento considervel nas inseres a cada ano (ver tabela a seguir).

    Tabela 01 - Informes Publicitrios do Campo Grande News, por ano e editoria.

    (Fonte: levantamento realizado para as finalidades deste artigo a partir da ferramenta de busca do site

    Campo Grande News)

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    Percebe-se que os Informes Publicitrios tiveram crescimento considervel a

    partir de 2013 e se consolidaram como produto comercial do site em 2014, quando

    foram produzidos 128 materiais; o que representa um aumento de 132% em inseres

    quando comparado ao ano anterior. At o ms de maro de 2015 j haviam sido

    publicados 60 Informes Publicitrios, ou seja, quase a metade do total realizado no ano

    de 2014; o que refora a percepo de que este tipo de contedo vem ganhando mais

    notoriedade como estratgia para captao de recursos financeiros por parte do veculo

    de comunicao.

    Fica evidenciado no levantamento quantitativo que as editorias com maior

    nmero de inseres de Informes Publicitrios foram 'Empregos', 'Consumo' e 'Sabor'

    (estas duas ltimas, integrantes do canal "Lado B"). Os grficos abaixo mostram,

    respectivamente, a evoluo da quantidade de Informes Publicitrios nestas editorias

    durante os ltimos anos e o total produzido at agora, com um comparativo entre a

    quantidade de notcias e de Informes Publicitrios publicados em 2015 no site Campo

    Grande News.

    Grfico 01 - Quantidade de Informes Publicitrios nas trs editorias com maior

    frequncia de publicao

    (Fonte: levantamento realizado para as finalidades deste artigo a partir da ferramenta de busca do site

    Campo Grande News)

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    Grfico 02 - Comparativo entre Notcias e Informes Publicitrios publicados de

    janeiro a maro de 2015 nas trs editorias com maior frequncia de publicao

    (Fonte: levantamento realizado para as finalidades deste artigo a partir da ferramenta de busca do site

    Campo Grande News)

    Na editoria 'Consumo', 21,3% do contedo em 2015, de janeiro a maro, foi

    formado por Informes Publicitrios. J na editoria 'Empregos', o percentual ficou em

    7,4%; enquanto na editoria 'Sabor', alcanou 15,3%. Conclui-se que, especialmente nas

    duas editorias ligadas ao canal "Lado B", os Informes Publicitrios representam um

    nmero expressivo no contedo do site, dividindo espao com as notcias.

    Consideraes finais

    Na pesquisa sobre os Informes Publicitrios do site Campo Grande News foi

    possvel identificar a ascenso das inseres deste tipo de contedo; crescimento

    acentuado em 2014 e nos primeiros meses de 2015. O formato hbrido de informao

    mescla recursos jornalsticos e publicitrios e se consolida como ferramenta comercial

    deste que o site com maior nmero de acessos do estado de Mato Grosso do Sul.

    Ao contrrio de revistas e jornais impressos, que na diagramao de pgina

    buscam diferenciar a propaganda da linha editorial do veculo, a coleta de Informes

    Publicitrios no site Campo Grande News e posterior comparao com notcias

    publicadas nas respectivas editorias revelou que esta distino neste veculo online est

    restrita identificao com as palavras "Informe Publicitrio" abaixo do ttulo da

  • Intercom Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicao XVII Congresso de Cincias da Comunicao na Regio Centro-Oeste Campo Grande - MS 4 a 6/6/2015

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    matria e tambm tarja com os mesmos dizeres em uma das fotos do material.

    necessrio para estudos futuros saber se uma diferenciao mais contundente no ocorre

    por complexidade em modificar o layout de pginas internas do site ou por

    convenincia, isto , com intencionalidade de gerar contedo semelhante ao jornalstico.

    Ainda uma tarefa desafiadora para os veculos de comunicao encontrar

    modelos comerciais que no conflitem com a tica jornalstica, principalmente quando

    se propem, atravs de formatos hbridos de comunicao, a vender um produto ou

    servio ao mesmo tempo em que levam informao ao pblico. E, como qualquer outra

    empresa, o veculo deve gerar lucro para se manter no mercado.

    Na realidade atual dos meios online, na qual est saturada a cada dia a

    disposio do pblico para clicar em banners de site, modelo de Publicidade que

    tradicionalmente era responsvel por grande parte das receitas, profissionais das reas

    ligadas ao marketing tm buscado e testado outras solues. Desponta-se como

    estratgia da vez associar marca do patrocinador contedo relevante, transmitido com

    narrativas, dados e contextualizao, promovendo a interao com o pblico e tentar ao

    mesmo tempo entender melhor suas necessidades.

    No caso do Campo Grande News, a constatao de que o Informe Publicitrio

    aparece como alternativa para gerao de receita, j que a incidncia crescente ao

    longo dos ltimos meses. Os materiais com maior nmero de insero encontram-se nas

    editorias de Consumo, Sabor e Empregos, com dicas de servios para usufruir na

    cidade, estabelecimentos para se conhecer; entre outros. Seja no layout semelhante,

    quase gmeo, ou nos ttulos e no corpo de texto, os informes e as notcias convivem de

    maneira harmoniosa, principalmente nestas trs editorias cuja finalidade aguar a

    vontade de consumir, seja um bem material (calados, alimentao, etc) ou

    conhecimento, no caso da oferta de cursos de aperfeioamento profissional.

    Este artigo marca o incio de uma pesquisa em nvel de ps-graduao sobre os

    Informes Publicitrios no site sul-mato-grossense; torna-se um ensaio que se prope a

    partir de ento a uma maior anlise e levantamento de questes sobre o uso de

    contedos hbridos no meio digital, do processo envolvido na elaborao deste produto

    que agrega elementos do Jornalismo e da Publicidade e, principalmente, dos Contratos

    que Comunicao que se estabelecem entre enunciador (quem escreve o texto; muitas

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    vezes, jornalistas do veculo que produzem notcias para as mesmas editorias) e

    enunciatrio (o pblico leitor).

    No contexto atual, no qual debatem-se temas como consumismo, gerao de

    conhecimento na internet, cultura participativa e tambm os modelos de negcio para a

    sobrevivncia dos veculos jornalsticos, analisar e problematizar a forma como a

    mensagem publicitria hibridizada produzida e chega ao pblico, alm da relao

    entre produtores de contedo e leitores, torna-se cada vez mais relevante; com presena

    necessria em futuros trabalhos cientficos.

    REFERNCIAS

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