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DIREITO DA ECONOMIA 1 Ano lectivo 2014/2015 A CONSTITUIÇÃO ECONÓMICA EUROPEIA: CONTEÚDO E SIGNIFICADO Professor Lúcio Feteira Francisca Bastos, nº 3083

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DIREITO DA ECONOMIA

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Ano lectivo 2014/2015

A CONSTITUIÇÃO ECONÓMICA

EUROPEIA:

CONTEÚDO E SIGNIFICADO

Professor Lúcio Feteira

Francisca Bastos, nº 3083

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Introdução

O presente trabalho surgiu por proposta do Professor de Economia, subordinado ao

tema “A Constituição Económica Europeia”.

O objetivo deste trabalho é, primeiramente, explicitar o conceito de Constituição

Económica Europeia, a sua origem, conteúdo, significado e a sua evolução, distinguindo os

vários tipos de Constituição Económica e focando-nos na Constituição Económica Europeia em si

mesma considerada. Pretende-se, de igual modo, enquadrar juridicamente a Constituição

Económica Europeia, identificando os seus principais objectivos, instrumentos e princípios.

Referiremos as liberdades económicas fundamentais, nomeadamente, a liberdade de

circulação de mercadorias, de trabalhadores, de estabelecimento, de prestação de serviços, a

liberdade de circulação de capitais e a liberdade de concorrência/regras de concorrência.

Por último iremos falar, ainda que de forma sucinta, dos desafios que a União Europeia

enfrenta nos dias de hoje, nomeadamente dos resultantes de novos alargamentos, do

aprofundamento e da necessidade de afirmação externa da U.E, bem como a necessidade de

reformular as políticas comunitárias.

A metodologia utilizada baseou-se na pesquisa de informação e respetiva organização,

utilizando alguns sites da Internet e livros de apoio de Direito da Economia, tal como indicamos

na bibliografia.

Pretendemos concretizar os objetivos referidos e transmitir as informações de um modo

simples e motivador.

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1. Origem do conceito de Constituição Económica

A origem e formação do conceito de Constituição Económica têm a sua mais direta raiz e o seu

desenvolvimento na Doutrina Germânica. De facto, após a Iª Guerra Mundial, a Constituição de

Weimar de 1919, a Constituição Mexicana e a Lei Fundamental Russa de 1918, inauguram no

seio literal-formal a consagração de normas e princípios sobre matérias económicas e sociais,

rompendo com a tradição das Constituições estritamente Politicas e espelhando o declínio ou

abandono da Ideia de Estado Liberal puro, abstencionista quanto à «coisa económica». Na

verdade, antes da 1ª Guerra deparávamo-nos com um Estado abstencionista do ponto de vista

económico, pois à luz da filosofia liberal, a intervenção económica ficava melhor entregue aos

privados, para salvaguarda do princípio da liberdade do comércio e da indústria. A constituição

de Weimar foi a primeira a introduzir uma seção especialmente dedicada ao enquadramento da

vida económica, inspirando constituições posteriores, inclusive a Constituição Portuguesa de

1933. Os princípios desta Constituição não são, porém, extremamente rígidos, admitindo

restrições, exceções concretizados pelos limites dos princípios da justiça e de uma existência de

uma vida humana digna, que se sobrepõem à liberdade económica particular.

A origem e desenvolvimento da formação do conceito da Constituição Económica surge assim,

no prolongamento da evolução do Constitucionalismo, ou melhor da Constituição Política, seio

consolidado das ideias da categoria jurídica dos Direitos, Liberdade e Garantias Fundamentais,

ou seja, nos valores supremos da comunidade. Este conceito de constituição económica não é

acidental, contou antes com colaboração de conjunto de autores alemães, que agregou juristas

e economistas, de entre os quais se destacam o nome de Franz Bohm (jurista) e Walter Eueken

(economista), que pertenciam à Escola de Freiburgo ou à corrente do Ordoliberalismo.

Esta corrente era baseada no conceito da existência de dois sistemas económicos: um sistema

de economia de mercado e um sistema de direção central de economia planificada.

O suporte para que estes dois sistemas económicos funcionassem, é precisamente a

Constituição Económica. Note-se, Constituição Económica em sentido material, isto é, que no

seu todo assegura o funcionamento do sistema económico que preconiza.

A tendência histórica dos textos constitucionais consagrou progressivamente, em grau variável

de extensão, normas e princípios quanto à organização e direção das atividades económicas,

tendo ganho um novo impulso e intensidade com a crise económica de 29/30 e após a I e II

Guerras Mundiais, até à atualidade, em dois extremos modelares:

De um lado as Constituições dos Estados do mundo da liberdade do comércio e da

indústria - quer por pressão dos desequilíbrios com impacto social provocados pela Guerra,

quer pela constatação fáctica e de Ciência de que a auto-regulação do mercado não é tão

segura como a pureza embrionária do princípio - foram sucumbindo aos apelos e

necessidades de intervenção em múltiplas formas indiretas e diretas.

Do outro lado, as Constituições dos Estados do mundo do socialismo-comunismo (sob o

primado da coletivização dos meios de produção e da planificação central da economia),

em que as normas e os princípios políticos se confundem, sob base económica, com

aqueles primados jus-económicos: O ESTADO POLÍTICO, O ESTADO ECONÓMICO E

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SOCIAL. Assim, o espaço deixado à iniciativa pessoal, privada e cooperativa consagra-se

como residual. As Constituições são aqui necessariamente Económicas em intensidade e

extensão estruturante, legitimadora e programático-diretiva.

Do percurso histórico das experiências modelares, ficaram os valores fundamentais que se

reconduzem aos princípios da justiça, da igualdade, da dignidade e progresso da pessoa

humana. É assim que no âmbito extensivo do conceito de CE se entroncam tipos e conceitos,

quer da Ciência do Direito quer da Ciência Económica: por um lado o conceito de Constituição e

por outro lado, o conceito de Sistema Económico.

Na verdade, as normas e princípios jurídicos da Constituição Económica aderem a um tipo de

Sistema Económico que lhes subjaz, ou seja, a Constituição Económica corresponderá, assim, a

uma decisão por parte da comunidade relativamente a um determinado sistema económico.

2. A constituição Económica;

2.1 Conteúdo e significado:

Os sistemas jurídicos/políticos não podem ficar indiferentes ao poder do sistema económico, de

onde resultam questões de subordinação do poder económico ao poder político e vice-versa, de

controlo ou de estabelecimento de uma democracia económica. Assim, tendo em conta os

aspetos já anteriormente enunciados, podemos definir Constituição Económica como sendo o

conjunto de normas, instituições jurídicas fundamentais e princípios constitucionais relativos à

economia que definem o regime jurídico do sistema económico vigente e permitem a integração

de um conjunto de leis que são fundamentais na definição da ordem jus-económica.

Trata-se de normas que conferem o direito ao exercício da atividade económica e anunciam

restrições gerais a esse mesmo direito, colocando à disposição do Estado um conjunto de

instrumentos que lhe permitem regular o processo económico e definir os objetivos que essa

regulação deve obedecer. De referir que a Constituição Económica é menos ampla do que a

ordem jurídica da economia porque não inclui todas as normas e princípios, mas apenas os

princípios básicos, isto deve-se ao facto da Constituição deixar margem ao legislador ordinário

para variar ou evoluir a ordem jurídica de cada economia.

3. Tipos de Constituíção Económica

3.1. Quanto à estrutura- sentido formal e material

3.1.1 Sentido formal

Constituição Económica em sentido formal é o conjunto de normas e princípios jurídicos sobre

o essencial da atividade económica desenvolvida pelos indivíduos, pelas pessoas coletiva ou

pelo Estado, plasmados no texto da Constituíção do Estado.

3.1.2 .Sentido material

Constituição Económica em sentido material é o núcleo essencial de normas jurídicas que

regem o sistema e os princípios básicos das instituíções económicas, quer constem ou não do

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texto constitucional. A Constituíção económica material integra, portanto, os aspectos

relacionados com a aplicação e interpretação das próprias normas pela Administração Pública,

pelos Tribunais e pela sociedade no seu conjunto.

4. Quanto à forma jurídica:

4.1 Explícitas

As constituíções económicas que se traduzem na formalização de um conjunto de princípios e

normas que tendem a caracterizar o sistema económico na sua globalidade, com objetivos de

orientação dos seus agentes, de enquadramento das instituíções da economia e definição dos

fins e programas de evolução do sistema económico.

4.2 Implícitas

Uma ordem jurídica da economia, incorpora sempre uma "constituíção económica", de cujos

princípios essenciais decorre, ou com os quais deverá ser mínimamente coerente.

5.- Quanto ao conteúdo Económico: Capitalistas – liberais e intervencionistas; Socialistas –

Centralizadas

6. Quanto ao Enquadramento Politico: de regimes democráticos; de regimes autocráticos

7. Quanto ao modo de regulação do sistema : Estatutárias - Garantir a ordem económica existente; Programáticas - Programa político-económico visando reformar a ordem económica existente; Diretivas - Não se limitam a reformar a ordem económica existente, mas dirigem o legislador num certo sentido;

8. Funções da constituição económica

As funções da Constituição Económica decorrem do seu objeto e natureza ou dimensão das

respetivas normas e princípios jurídicos. Assim:

a) Função sistemática central ou unitária, que se exprime quer no primado da Constituição quer

no princípio da unidade da Constituição, quer no da conformidade com a Constituição e que têm

como destinatários tanto o legislador, como o intérprete-aplicador.

b) Função estruturante e legitimadora da delimitação dos poderes do Estado e demais agentes

que realizam ou participam na organização e direção da economia (relevam aqui aspetos do

Sistema económico).

c) Função de garantia (intrinsecamente ligada ao anterior) dos direitos liberdades e garantias

económicos fundamentais, (outra trave mestra derivada de elementos do sistema económico).

Esta função, tal como a anterior, realiza-se, essencialmente, numa dimensão precetiva

contraposta ao Estado.

d) Função diretiva: aquela em que se realiza e manifesta toda à dimensão prospectiva ou

programática da CE, nas suas diretrizes ou objetivos económicos e nas incumbências cometidas

ao Estado ou a outros agentes, segundo as mais diversas formas de intervenção ou de

concertação para a sua concretização. É uma função que não deixa de refletir certas dimensões

preceptivas dirigidas aos destinatários das respetivas normas, ao legislador e à Administração

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Pública, quer em termos da eficácia vinculante, quer em termos dos limites da sua acção,

segundo princípios da proporcionalidade, do meio menos lesivo e demais princípios

fundamentais da Constituição

Ou seja, à Constituição Económica cabe a:

- Garantia dos direitos, liberdades e garantias no domínio económico;

- Delimitação dos poderes do Estado, das entidades menores e dos grupos sociais no domínio

económico;

- Delimitação de objetivos sócio económicos a prosseguir pelo Estado ou por outras entidades;

- Definição dos elementos jurídicos do sistema económico e do regime económico, bem como

dos princípios gerais da ordem jurídica económica;

- Formulação de tarefas económicas gerais do Estado e de critérios jurídicos para selecção dos

objectivos da política económica;

- Definição de modelos de reformas estruturais (reforma fiscal descentralização, etc.)

- Formulação de um processo de evolução histórica que visa a construção de novos sistemas

económicos;

9. A Constituição Económica da União Europeia

Sendo a Economia da União Europeia baseada essencialmente num modelo económico

capitalista liberal, tendo como principal objetivo económico, promover uma economia livre,

concorrencial e sem barreiras comerciais tanto ao nível das mercadorias, dos capitais, como

dos seus cidadãos e dos seus trabalhadores, a Constituição Económica Europeia tem de refletir,

naturalmente esse modelo económico.

Na verdade, a falarmos de uma Constituição em Económica Europeia temos em vista as normas

estruturantes do sistema económico que se encontram consagradas nos seus diversos tratados:

Tratado de Roma, 1957- integração pelos mercados (produtos, capitais, trabalho; liberdade de

estabelecimento das empresas); Ato Único Europeu, 1986 – criação do mercado único; política

de coesão social; política de I&D; política de ambiente; Tratado da União Europeia, Maastricht,

1992 – União Económica e Monetária (UEM); Tratado de Amesterdão, 1996 – BCE; PESC;

Tratado de Nice, 2001 e Tratado de Lisboa (TUE, TFUE), 2010.

Apesar de ter havido sempre a preocupação de não se inscrever nos diversos tratados uma

opção por um determinado sistema económico, de maneira a que não se excluíssem outras

oportunidades, o certo é que há claramente uma opção pelo sistema capitalista, de economia

de mercado. Contudo, esta opção é temperada com preocupações sociais próprias das

economias sociais de mercado, embora existam algumas áreas dentro da Constituição

Económica Europeia que têm um grande pendor de planeamento (contrário ao da economia de

mercado), nomeadamente na área da política industrial e, especialmente, na política agrícola

comum (PAC).

Da leitura conjugada das disposições do TUE (artigo 3.º n.º 3, artigo 119º TFUE e protocolo nº 27

TFUE – relativo ao mercado interno e à concorrência), podemos extrair como elementos

essenciais da Constituição Económica Europeia os seguintes:

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a) Economia social de mercado: economia que assenta no funcionamento do mercado, mas

temperada por algumas preocupações sociais (artigo 3.º do TUE) tendo em vista um

crescimento económico equilibrado; pleno emprego; progresso social e não apenas

preocupações no modo como o mercado funciona.

b) Mercado Interno – corresponde à evolução do projeto de integração económica europeia.

Integra necessariamente a liberdade de circulação de mercadorias, pessoas, e capitais

(Protocolo n.º 27 TFUE).

c) Tutela da concorrência (livre e não falseada) – papel absolutamente decisivo na estruturação

do sistema económico europeu - Art. 119.º TFUE – que vem fazer a ligação com o art.º3, n.º3

TFUE , baseado na ideia da concorrência e mercado interno.

Ou seja, o mercado europeu sendo um mercado liberal, é um mercado regulado e caracterizado

mais por um “laisser-passer” do que por um “laissez-faire”, pois existe regulação da

concorrência, do ambiente e do consumo. Por outro lado, as políticas económicas/financeiras e

sociais da União Económica e Monetária, nomeadamente no que se refere aos fundos de coesão

económica e social (fundos estruturais) implicam uma governação económica de pendor por

vezes dirigista e protecionista, pelo que o modelo da Constituição Económica Europeia acaba

por não ser um modelo liberal puro.

A União Europeia encontra-se estruturada em torno da ideia já preconizada pelo pensamento

ordoliberal de que a Constituição Económica retrata uma determinada opção por um sistema

económico, que assenta na interação entre a procura e a oferta, sinalizada por um sistema de

preços que condiciona o comportamento dos agentes económicos e, por conseguinte, do

mercado em si.

Nesta ótica, são seis os princípios constitutivos em torno dos quais se encontra erigida a

Constituição Económica Europeia:

1) Estabilidade cambial;

2) Abertura dos mercados – os agentes económicos são livres de entrar e sair dos mercados;

3) Propriedade privada - seja na vertente de direito subjetivo, seja na vertente de instituição;

4) Liberdade de mercado – traduz-se na liberdade contratual, isto é, na liberdade dos agentes

económicos contratarem livremente entre si;

5) Mecanismos de responsabilização jurídica – a economia de mercado, para funcionar, tem de

ter como base o princípio de que todos os agentes económicos são responsáveis pelas suas

ações/decisões/investimentos, etc. A responsabilização não é, assim, uma responsabilização em

sentido exclusivamente jurídico, mas sim em sentido lato;

6) Estabilidade da política económica.

Tais princípios são implementados através de uma dinâmica regulamentadora própria da UE –

cuja consequência é uma perda de autonomia dos Estados-membros (embora esta perda não

seja total) em matéria de política económica e de direito económico. De referir que, estes

princípios, tal como foram constituídos, formam um todo. No entanto, é também importante

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referir que esta economia de mercado, fundada nestes princípios orientadores, sofre um

conjunto de exceções no TFUE:

Por exemplo, assistimos a uma neutralidade a respeito do regime da propriedade (Artigo 295.º

TCE, hoje 345.º TFUE): “Os Tratados em nada prejudicam o regime da propriedade nos Estados-

Membros.”

Ou seja, a União Europeia não interfere na esfera da repartição dos setores de atividade nos

Estados Membros. Porém, na prática, não é bem assim, pois existem regras de concorrência

próprias que obrigam a que o setor público e privado estejam sujeitos a determinado tipo de

constrangimentos.

De facto, para além dos constrangimentos referidos, deparamo-nos ainda com restrições de

ordem geral, quer no que respeita à política agrícola, quer no que respeita à política industrial.

Na política industrial, através do art. 173.º TFUE, por exemplo, é-nos permitido concluir que o

mercado não funciona plenamente, pois os incentivos destinam-se, em primeiro lugar, a

incentivar/apoiar as pequenas e médias empresas (restrição introduzida à economia de

mercado);

Na política Agrícola – art. 38.º a 44º do TFUE. Veja-se o art. 39.º/1 TFUE – onde se pretende

estabilizar mercados [alínea c)] e assegurar preços razoáveis [alínea e)] - negação da economia

de mercado – pois, supostamente, os preços na economia de mercado funcionam livremente e

por si);

Deparamo-nos, ainda, com algumas restrições setoriais, por exemplo em matéria de auxílios

estatais. Na verdade, os auxílios estatais são proibidos pelo Tratado sobre o Funcionamento da

União Europeia. No entanto, algumas exceções autorizam os auxílios justificados por objetivos

de interesse comum, por exemplo, para os serviços de interesse económico geral, desde que

estes não falseiem a concorrência num sentido contrário ao interesse comum. O controlo dos

auxílios estatais exercido pela Comissão Europeia consiste assim em avaliar o equilíbrio entre os

efeitos positivos e negativos dos auxílios – 107º a 109º TFUE.

10. Objetivos, instrumentos e princípios da Constituição Económica

A UE assenta hoje, sobretudo em dois tratados:

Tratado da União Europeia (TUE)

Tratado do Funcionamento da União Europeia (TFUE)

10.1. Objetivos Gerais (3.º TUE)

Os objetivos gerais da UE estão fixados no art.º 3.º do TUE e no respetivo preâmbulo, devendo

ser concretizados através das competências e meios que lhe são atribuídos pelo TFUE.

Ao lado de objetivos ou fins económicos, como:

Desenvolvimento harmonioso, equilibrado e sustentável das atividades económicas;

Crescimento sustentável e não inflacionista;

Alto grau de competitividade e de convergência de comportamentos das economias.

Surgem outros com conteúdo aberto às dimensões social e política: pleno emprego e um

elevado nível de proteção social, a igualdade entre os homens e mulheres, um elevado nível de

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proteção e de melhoria de qualidade do ambiente, o aumento do nível de vida, a coesão

económica e social e a solidariedade entre os Estados-Membros;

10.2. Princípios fundamentais:

A ordem europeia da economia baseia-se em certos princípios, uns de índole jurídico-política

(princípio das competências de atribuição, solidariedade, não discriminação, proporcionalidade,

equilíbrio institucional) outros de índole predominantemente jurídico-económica:

Princípio da economia de mercado aberta e da liberdade de concorrência (119º a 127º

TFUE)

Supressão dos obstáculos às trocas (União Aduaneira) e à circulação dos factores de produção

(trabalho, capitais e iniciativas empresariais traduzidas no exercício das liberdades de

estabelecimento e de prestação de serviços), de forma a favorecer uma repartição eficaz dos

recursos (120.ºTFUE). Esta liberdade de concorrência é disciplinada por normas tendentes a

garantir que a concorrência não seja falseada no mercado interno (3.º/b) TFUE), de forma a

assegurar o progresso da União no seu todo e, simultaneamente, os interesses dos operadores

económicos em geral – produtores comerciantes e consumidores.

Princípios Orientadores (119.º/3 TFUE):

Estabilidade dos preços

A estabilidade dos preços é essencial, na medida em que as tensões inflacionistas são causa de

descontrolo de outros indicadores económicos cuja estabilidade a nível conveniente é condição

básica de praticabilidade de uma moeda única. (140.º/1; 127.º TFUE)

Solidez das Finanças Públicas e das condições monetárias

Os défices orçamentais, impondo a obtenção de empréstimos destinados a cobri-los, vão pesar

na dívida pública e esta, por sua vez, através de encargos (juros e amortizações) que gera, acaba

por se reflectir no défice de ulteriores exercícios orçamentais.

Assim, o critério da sustentabilidade das Finanças Públicas exige, por um lado, a contenção do

défice orçamental e, por outro, a redução da dívida pública para um valor que não implique uma

pressão excessiva sobre as finanças do Estado. (140.º/1 TFUE)

11. Sustentabilidade da balança de pagamentos – tem 3 decorrências:

Princípio da Subsidiariedade (5.º, n.º3 TUE)

Segundo o qual a UE intervém na medida em que os objectivos da acção encarada não possam

ser suficientemente realizados pelos Estados Membros, e possam, pois, devido à dimensão ou

aos efeitos da acção prevista, ser melhor alcançados ao nível da União.

Princípio da Não Discriminação

Este princípio consagrado no art.º 18.º TFUE, encontra a sua expressão concreta noutras

disposições, como sejam, os art.ºs 34.º, 35.º, 37.º/1 e 2, 45.º/2 e 3, 49.º, 54.º, 57.º, 92.º TFUE

etc. O princípio proíbe todas as formas de discriminação em razão da nacionalidade, opondo

assim um limite intransponível ao exercício, pelos Estados-Membros, de qualquer competência

que tenha por efeito estabelecer não só discriminações ostensivas e evidentes com base na

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nacionalidade como, igualmente, formas dissimuladas de discriminação que por aplicação de

outros critérios possam conduzir ao mesmo resultado.

Princípio da Liberdade Económica

O princípio da liberdade económica reflecte-se, precisamente, a realidade de que o mercado

interno é expressão de uma economia de mercado, de inspiração neoliberal – o que explica a

importância que os tratados atribuem ao princípio da livre concorrência.

Tal principio comporta, por isso mesmo, a propriedade privada dos meios de produção

(constitucionalmente garantida quer na ordem jurídica interna dos EM quer no quadro da

União); comporta, igualmente, a liberdade de empreender e de agir no domínio económico

(livre iniciativa).

A liberdade económica implica, ainda, mais concretamente, o direito reconhecido aos

operadores ou agente económicos do mercado interno de circular livremente no espaço da

União para aí se dedicarem a um trabalho assalariado ou independente (actividade artesanal ou

profissão liberal), para se estabelecerem como comerciante ou produtores em qualquer

domínio da vida económica e para prestarem livremente os serviços correspondentes ao seu

ramo de actividade.

Tudo isto no quadro de um estado de direito democrático que salvaguarda os direitos que dão

conteúdo real ao princípio da liberdade económica.

Note-se, porém, que a liberdade económica não é absoluta, já que os Estados se reservam no

direito de restringir o acesso dos operadores do mercado interno à propriedade e ao uso de

certos meios de produção e a determinadas actividades profissionais.

O art.º 345.º TFUE, diz-nos, como já anteriormente referimos, que “Os Tratados em nada

prejudica o regime de propriedade nos Estados Membros”.

Cada Estado é, portanto, livre não somente de manter, mas igualmente de alargar, em

detrimento da propriedade privada, o sector público da economia – e isto quer através da

criação de novas empresas, quer mediante a socialização (por nacionalização, expropriação,

tomada de posição accionista, etc.) de empresas preexistentes.

No entanto, o facto de o Tratado não interferir com o regime de propriedade dos meios de

produção, tem muito a ver com o uso que deles é feito: as empresas do setor público estão, com

efeito, no exercício da respectiva atividade, sujeitas às regras comuns de concorrência e os

Estados obrigados a respeitar o princípio da não discriminação. (101.º e 106.º TFUE).

12. Áreas e Instrumentos de Ação

Áreas

Na prossecução dos seus objetivos, a UE recorre quer a métodos de integração (em áreas de

competência das instituições da UE), quer a métodos de cooperação (em áreas de competência

dos Estados Membros). As medidas de integração podem ser negativas (eliminação de

discriminações, de restrições e de obstáculos) ou positivas (criação de instrumentos e

instituições, para assegurar funcionamento eficaz do mercado):

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Medidas de integração:

Criação de um Mercado Interno

O Mercado Interno é uma medida de integração negativa, que implica um espaço sem fronteiras

internas no qual é juridicamente assegurada a livre circulação das mercadorias, pessoas, dos

serviços e dos capitais (26.º/2 TFUE)

Construção de União Económica Monetária – UEM

A Construção da UEM é uma expressão típica de um método de integração económica positiva.

Sendo que:

a) A política económica é conduzida pelo Conselho/Comissão/Parlamento Europeu;

b) A política monetária é levada a cabo pelo BCE (instituição autónoma)

Instrumentos de Integração:

- Regulamentos (art.º 288.º TFUE) : “O regulamento tem caráter geral. É obrigatório em todos os

seus elementos e directamente aplicável em todos os EM”

- Diretivas (art.º 288.º TFUE): “A diretiva vincula o EM destinatário quanto ao resultado a

alcançar, deixando, no entanto, às instâncias nacionais a competência quanto à forma e aos

meios”

Métodos de cooperação interestadual:

Ao lado dos métodos de integração, a UE recorre frequentemente a métodos de cooperação

interestadual, cuja prossecução implica a anuência de todos os EM.

Em regra estamos perante domínios de competência exclusiva dos EM (como a fiscalidade, livre

circulação de pessoas, direitos e interesses dos trabalhadores assalariados – 114.º/2 TFUE), que

é feita através de vários instrumentos de cooperação, nomeadamente Recomendações (art.º

288.º TFUE), acordos políticos e “Soft Law”

Delimitação de Competências:

A UE não dispõe de atribuições genéricas ou de competências tendencialmente ilimitadas. A

delimitação da esfera de intervenção da UE perante os EM é, de acordo com o art.º 5.º/1 TUE,

regida pelo princípio das competências de atribuição.

O TFUE no seu art.º 3.º e ss., distingue três tipos de competências da União:

Competências Exclusivas

União Aduaneira; Regras de Concorrência; Política Monetária para os EM da área do

Euro; Conservação dos Recurso Biológicos do Mar; Política Comercial Comum;

Competências Complementares (a UE pode desenvolver acções destinadas a apoiar, coordenar

ou completar as ações do EM, no que toca à sua finalidade europeia):

Protecção da Melhoria da Saúde Humana; Indústria; Cultura; Turismo; Educação e

Formação Profissional; Juventude; Desporto; Protecção Civil; Cooperação Administrativa;

Competências Partilhadas (aquelas que são partilhadas com os Estados Membros em todos os

outros domínios):

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Políticas Relativas ao Mercado Interno; Políticas Sociais; Política de Coesão; Agricultura;

Pescas; Ambiente; Defesa dos Consumidores; Transportes; Etc…

Esta forma de delimitação de competências é no entanto atenuada pelo princípio das

“competências Implícitas”, segundo o qual, se alguma ação da UE for considerada necessária

para atingir, no quadro das políticas definidas nos tratados, um dos seus objetivos, sem que

aqueles tenham previsto os poderes de ação necessários para o efeito, o Conselho, deliberando

por unanimidade, sob proposta da Comissão, e após aprovação do Parlamento Europeu,

adoptará as disposições adequadas – 352.º TFUE.

13. As Liberdades Económicas Fundamentais

13.1. Liberdade de Circulação de Mercadorias (União Aduaneira)

O mercado interno pressupõe como primeiro fundamento a construção de uma União

Aduaneira (fusão dos diversos territórios aduaneiros num só, com a correspondente abolição

dos direitos aduaneiros e de encargos de efeito equivalente e proibição de restrições

quantitativas – quotas impostas à importação/exportação – e medidas de efeito equivalente).

Daqui resulta a Liberdade de Circulação de Mercadorias no território da União, aplicável tanto a

produtos originários do EM, como a produtos provenientes de países terceiros que, por terem

cumprido as formalidades aduaneiras e pago os direitos exigíveis, se encontrem em livre prática

(28.º a 32.º TFUE).

Nos anos 90, três passos foram tomados no sentido de facilitar a livre circulação:

Aprovação de um Código Aduaneiro;

Estabelecimento de um regime transitório de IVA (tendo em vista a abolição dos

controlos aduaneiros por razões fiscais, enquanto não se verificasse a passagem da

tributação do país de destino para o país de origem);

Redução das barreiras ou entraves de natureza técnica ao comércio intracomunitário;

13.2. Liberdade de Circulação de Trabalhadores Assalariados

A liberdade de circulação de trabalhadores assalariados dos EM visa a constituição de um

mercado unificado do trabalho assalariado e funda-se na abolição de quaisquer discriminações

em razão da nacionalidade (e de sexo) entre os trabalhadores dos EM no que respeita a

emprego, à remuneração e demais condições de trabalho (45.º a 48.º TFUE)

“Trabalhador Assalariado”: abrange todo aquele que, mediante um contrato de trabalho ou um

contrato de qualquer outro tipo, se encontra na dependência de um empregador (que não seja

a administração pública), exercendo uma actividade remunerada por conta alheia, sendo

indiferente que a exerça a tempo parcial ou que aufira eventualmente outros rendimentos de

trabalho. A livre circulação de trabalhadores não se limita ao direito de responder a ofertas de

emprego ou ao direito de livre deslocação, inclui também o direito à residência no Estado de

acolhimento, mesmo depois de ter cessado o exercício da actividade laboral, sendo que os

membros da sua família são igualmente beneficiários desse direito. (45.º/3/c) e d) e 4; 48.º

TFUE).

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Hoje em dia a liberdade de circulação ultrapassa a esfera económica. O conceito de cidadania da

União (20.º a 25.º TFUE), reforçou a protecção jurídica da liberdade das pessoas, estendendo-a a

pessoas fora do sector produtivo (estudantes, reformados, turistas).

13.3. Liberdade de Estabelecimento

A liberdade de estabelecimento de cidadãos e empresas de um EM noutro EM diz respeito quer

ao acesso às atividades não assalariadas e seu exercício (trabalhadores independentes,

profissões liberais, comerciantes e artesãos, etc.), quer à constituição e gestão de empresas e

sociedades (liberdade de empresa) (54.º TFUE). nas condições definidas pela legislação do país

de estabelecimento para os seus próprios nacionais (49.º a 55.º TFUE)

Este direito não se circunscreve ao direito de abrir um estabelecimento principal, mas abrange

igualmente os estabelecimentos secundários (filiais, agências, sucursais), desde que estes

possuam um vínculo (sede social, administração central ou estabelecimento principal) com a

economia de um dos EM (49.º e 54.º TFUE)

Na base desta liberdade está ainda uma exigência de igualdade de tratamento (18.º e 49.º

TFUE). Assim, qualquer EM pode estabelecer limitações à liberdade de estabelecimento

(incluindo monopólios profissionais), desde que esse regime não discrimine entre nacionais e

membros de outros países de União.

13.4. Liberdade de Prestação de Serviços

O TFUE proíbe igualmente as restrições à livre prestação de serviços na UE a efetuar por

nacionais de um EM estabelecidos noutro EM (56.º e ss).

“Prestação de Serviços”: abrange as prestações normalmente realizadas mediante

remuneração, desde que não sejam reguladas pelas disposições relativas à livre circulação de

mercadorias, de capitais ou de pessoas.

A liberdade de prestação de serviços, permite às pessoas físicas e às sociedade nacionais dum

EM, estabelecidas sobre o seu território, oferecer, sem se instalar, a título ocasional, serviços a

clientes situados num outro EM.

13.5. Liberdade de Circulação de Capitais

A liberdade de circulação de pagamentos, consiste na supressão das restrições impeditivas de

um operador de um EM poder efectuar a contrapartida de uma prestação fornecida por um

operador de outro EM. (63.º/2 TFUE).

Na verdade, o exportador de mercadorias quer receber, sem entraves de qualquer ordem, o

valor dos bens que vendeu para outros EM, tal como o importador de tais bens precisa de obter

livremente no seu país e remeter para o do seu fornecedor a moeda correspondente ao preço

dos bens adquiridos.

Teria, por isso, de ser prevista a liberdade da conversão e transferência de moeda para a

efectivação dos pagamentos exigidos pelo normal funcionamento do mercado interno.

Além disso, e por que a economia da União não está isolada do mundo, teriam de ser eliminadas

quaisquer restrições aos pagamentos internacionais, assim o art.º 63 foi mais longe e proibiu

também as restrições aos pagamentos entre EM e países terceiros.

Já em matéria de liberdade de movimento de capitais, e por força do art.º 63.º/1, os operadores

do mercado interno da UE podem movimentar livremente capitais de que disponham ou

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obtenham no mercado financeiro, transferindo-os de EM para EM ou para países terceiros para

fim de investimento directo ou meras aplicações financeiras.

13.6. Liberdade de Concorrência

A concorrência é considerada o motor dos sistema de economia de mercado, mas que

dificilmente subsistiria se deixado entregue a si próprio. Assim houve necessidade de garantir

que esta não fosse falseada, através da atribuição de competência exclusiva à UE de estabelecer

“as regras de concorrência necessárias ao funcionamento do mercado interno” – (3.º/1/b)

TFUE).

Sem a efetivação deste princípio poder-se-ia verificar a permanência ou criação de mercados

restritos, fechados, e de barreiras artificiais ao comércio no mercado interno (intracomunitário)

através de acordos entre empresas, a exploração abusiva de posições dominantes no mercado,

com efeitos restritivos sobre a competição empresarial, bem como a realização de operações de

concentração danosa da concorrência. Do mesmo modo, também certos auxílios concedidos

pelos Estados a empresas ou sectores de produção mostram-se incompatíveis com o mercado

interno porque deformadores da concorrência e do comércio no interior da União.

Como é que as regras de concorrência se efectivam no seio da União Europeia?

Na verdade, a concorrência não se traduz literalmente numa liberdade fundamental. Falamos,

antes, de uma complementaridade necessária e funcional entre as liberdades fundamentais e as

regras de concorrência. Ambas convergem na função que desempenham: a de assegurar o

funcionamento do mercado interno.

E como? Ora, as liberdades fundamentais, as regras sobre circulação de pessoas bens e capitais

têm como principais destinatários os EM, e isto faz com que se assegure o funcionamento do

mercado interno, verificando se os EM não criam barreiras ao seu correcto funcionamento.

No entanto, esta fiscalização não é suficiente. Uma vez que também os próprios indivíduos e

empresas podem criar barreiras, através de comportamentos anti concorrenciais.

É esta a razão pela qual as liberdades fundamentais e as regras da concorrência têm de

funcionar de forma articulada, para que se consiga atender a tipos de destinatários diferentes

Contudo, esta situação ocorre no âmbito da pureza dos princípios, pois também é possível

encontrar comportamentos anti concorrenciais por parte dos próprios Estados Membros, que

muitas vezes adoptam e apoiam restrições quantitativas e medidas de efeito equivalente.

Tornou-se, deste modo, necessário alterar esta lógica.

Na verdade, nos últimos tempos, o direito da concorrência europeu tem sido alvo de críticas por

parte dos EUA, pois é aí que este tem a sua origem, sendo que estas críticas surgem

precisamente porque o direito da concorrência nunca foi aplicado de igual modo a nível da

União Europeia. O direito da concorrência europeu preocupa-se, para além da liberdade da

concorrência, com fins de eficácia e bem-estar dos consumidores, e isto pode ser comprovado

através dos artigos 101º a 108º do TFUE, onde se encontram reguladas as regras comuns

relativas à concorrência, à fiscalidade e à aproximação das legislações.

A intervenção ao nível das regras de concorrência efectiva-se de duas formas:

A – Intervenção EX ANTE - que se preocupa com as estruturas em si mesmas consideradas:

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Nesta matéria é relevante olhar para o Regulamento 139/2004, que trata das concentrações

entre empresas.

Nesta primeira intervenção, ocorre a verificação das estruturas em si mesmas, ou seja, averigua-

se se determinada estrutura vai ser perigosa para o mercado. É uma espécie de prevenção –

olha-se para a operação de concentração e fiscaliza-se, se de acordo com determinados

indicadores, é previsível que dali resulte uma estrutura de mercado dê problemas futuros.

B – Intervenção EX POST – preocupa-se com comportamentos das empresas:

- Art. 101.º TFUE - Visa fiscalizar comportamentos colectivos de várias empresas que restringem

a concorrência.

- Art. 102.º TFUE - Proibição da posição dominante - Ao contrário do 101.º, visa fiscalizar

comportamentos individuais, que consistem numa determinada empresa, devido à forte posição

no mercado, adoptar comportamentos restritivos da concorrência. Ex. Coca-Cola pode

aumentar os preços sem ter grandes repercussões no mercado, pois tem uma grande influência

no mesmo.

- Art. 106.º TFUE - Estende a aplicação do 101.º e 102.º a uma realidade determinada: às

empresas públicas e às empresas que gozem de direitos especiais ou exclusivos (por exemplo

uma empresa a quem é atribuído o monopólio de um determinado bem ou da produção de um

serviço). Este artigo, apesar de já se encontrar fora do Título da concorrência, também é

abrangido por ela, até porque descortinamos aqui uma ligação com o princípio da neutralidade.

- Art. 107.º TFUE - Proibição dos auxílios de Estado.

14. DESAFIOS QUE SE COLOCAM À U.E - alargamento e aprofundamento.

O alargamento da União Europeia, constituiu e constitui um desafio à sua capacidade de

organização, funcionamento e adaptação, constituindo sobretudo um desafio político quanto ao

futuro da União Europeia devendo:

Ter um funcionamento mais democrático e mais próximo do cidadão;

Ter um maior comprometimento pela partilha do risco, pois com a crise das dívidas

soberanas a UE viu-se assolada por novos desafios complexos que até à data não eram

muito significativos, tais como, choques assimétricos de desenvolvimento, ataques

especulativos;

Reforçar a autoridade do Banco Central Europeu a fim de poder garantir uma integração

mais sólida e reforçar a própria governação entre os seus estados-membros da zona

euro, salvaguardando, no entanto, o equilíbrio que terá de existir entre políticas de

austeridade e as de crescimento económico;

Proceder ao reajustamento das políticas da União e dos fundos estruturais, bem como

proceder a uma reforma das instituições da União, criando mecanismos operacionais de

funcionamento com base na democracia;

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Bibliografia:

Web:

http://eeas.europa.eu/global_challenges/index_pt.htm

http://eur-lex.europa.eu/homepage.html?locale=pt

Obras:

HENRIQUES, Manuel Gorjão, Tratado de Lisboa – 5ª edição, Lisboa, Almedina, 2014

MORAIS, Luís Silva/Cunha Rodrigues, Nuno/Pardal, Paulo Alves, Direito da Economia,

volume I, Lisboa, AAFDL, 2014

MADURO, Miguel Poiares – Constituição Plural: Constitucionalismo e União Europeia,

Principia, 2006 BAST, Jurgen/BOGDANDY, Armin von – Principles of European Constitucional Law, Hart

Publishing, 2010

Legislação: Constituição da República Portuguesa.

Tratado da União Europeia e Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.