A continuidade da nossa vida profissional

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A continuidade da nossa vida profissional Cada dia mais venho recebendo solicitações de recomendações das minhas conexões do Linkedin em busca de recolocação no mercado profissional. A crise está aí e com ela vem o desemprego, queda do poder aquisitivo, inflação e demais problemas que estamos vivenciando já há alguns meses. O mercado de Continuidade de Negócios no Brasil, depois do seu melhor período em 2008 – 2010, vem reduzindo gradativamente ano após ano. Minha leitura desta retração, confirmada em várias conversas com executivos das empresas onde transito, é que com os baixos crescimentos da economia brasileira nos últimos anos, os PIBinhos, e o aumento continuo nas despesas administrativas (OPEX), as empresas se veem forçadas a priorizar novos projetos (CAPEX) e/ou reduzir as despesas administrativas reduzindo, consequentemente, as suas equipes de Continuidade de Negócios. Infelizmente, este cenário não é diferente das demais áreas de negócios das empresas, onde a priorização de projetos e a redução de despesas administrativas, incluindo a redução do quadro de colaboradores, também vem ocorrendo e tem sido uma constante nos últimos tempos. A norma ISO 22301:2012 – Societal Security – Business continuity management systems – Requirements nos fornece os requisitos necessários para aumentar a resiliência da continuidade de negócios das organizações e, com alguma adaptação, pode nos ajudar a aumentar a resiliência da continuidade da nossa vida profissional, na minha visão o segundo maior patrimônio que temos, após a nossa saúde. Procurarei fazer uma referência aos pontos chave de cada capítulo da norma ISO 22301, a exceção dos capítulos 1, 2 e 3 que são meramente normativos. No escopo deste texto a nossa vida profissional é a nossa organização. Capitulo 4 – Contexto da organização Você tem claro as suas principais habilidades, valores, diferenciais, capacitações, qualificações e os impactos decorrentes de uma indisponibilidade em pelo menos um destes

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A continuidade da nossa vida profissional

Cada dia mais venho recebendo solicitações de recomendações das minhas conexões do Linkedin em busca de recolocação no mercado profissional. A crise está aí e com ela vem o desemprego, queda do poder aquisitivo, inflação e demais problemas que estamos vivenciando já há alguns meses.

O mercado de Continuidade de Negócios no Brasil, depois do seu melhor período em 2008 – 2010, vem reduzindo gradativamente ano após ano. Minha leitura desta retração, confirmada em várias conversas com executivos das empresas onde transito, é que com os baixos

crescimentos da economia brasileira nos últimos anos, os PIBinhos, e o aumento continuo nas despesas administrativas (OPEX), as empresas se veem forçadas a priorizar novos projetos (CAPEX) e/ou reduzir as despesas administrativas reduzindo, consequentemente, as suas equipes de Continuidade de Negócios.

Infelizmente, este cenário não é diferente das demais áreas de negócios das empresas, onde a priorização de projetos e a redução de despesas administrativas, incluindo a redução do quadro de colaboradores, também vem ocorrendo e tem sido uma constante nos últimos tempos.

A norma ISO 22301:2012 – Societal Security – Business continuity management systems – Requirements nos fornece os requisitos necessários para aumentar a resiliência da continuidade de negócios das organizações e, com alguma adaptação, pode nos ajudar a aumentar a resiliência da continuidade da nossa vida profissional, na minha visão o segundo maior patrimônio que temos, após a nossa saúde.

Procurarei fazer uma referência aos pontos chave de cada capítulo da norma ISO 22301, a exceção dos capítulos 1, 2 e 3 que são meramente normativos. No escopo deste texto a nossa vida profissional é a nossa organização.

Capitulo 4 – Contexto da organização

Você tem claro as suas principais habilidades, valores, diferenciais, capacitações, qualificações e os impactos decorrentes de uma indisponibilidade em pelo menos um destes valores? Qual é o seu apetite ou aversão, se preferir, ao risco?

Você, enquanto um profissional, tem um conjunto de habilidades, valores etc. que podem diferenciá-lo no mercado profissional, principalmente num momento quando há um excesso de candidatos para poucas oportunidades de recolocação. Quais são estes diferenciais? Quais são os investimentos que você tem feito ou planejado para reforçar estes diferenciais? Somente mais experiência não é o suficiente pois os seus concorrentes também estarão cada dia mais experientes. Existem excelentes cursos gratuitos online na VEDUCA (http://www.veduca.com.br/), COURSERA (https://www.coursera.org/) dentre outros.

E o seu apetite ou aversão ao risco qual é? É melhor pensar sobre ele enquanto você está empregado do que desempregado. Talvez você tenha que rever o seu apetite ao risco pois a medida que o tempo vai passando e ficamos cada vez mais experientes em

contrapartida a quantidade de oportunidades de recolocação no mercado também diminuem significativamente, o que pode nos obrigar a rever o nosso apetite ao risco, só que agora numa situação de pressão, o que normalmente não é uma boa forma de decidir.

Assumindo que tenhamos uma vida profissional de pelo menos 45 anos, dos 20 aos 65, e que um ciclo médio de trabalho numa empresa seja de 5 anos, então teremos, pelo menos, 9 transições na nossa vida profissional. Só esta quantidade já justifica o planejamento para enfrentarmos de forma estruturada as transições, inevitáveis, na nossa vida profissional, agravadas, como já mencionei antes, com o aumento da nossa idade.

Capítulo 5 – Liderança

Você é o CEO da sua organização, o presidente da sua vida profissional. As decisões que você tomar, ou deixar de tomar, afetarão o seu futuro profissional. Um item muito importante deste capítulo é o COMPROMETIMENTO. Quanto, de fato, você está comprometido com a sua vida profissional? Numa escala de 0 a 5, onde 0 é Nenhum e 5 é Extremo que nota, sincera, você daria ao seu COMPROMETIMENTO com a sua vida profissional?

Deixa a Vida me LevarZeca PagodinhoE deixa a vida me levar (vida leva eu!)Deixa a vida me levar (vida leva eu!)Deixa a vida me levar (vida leva eu!)Sou feliz e agradeçoPor tudo que Deus me deu.

Infelizmente nossa vida profissional não é a música do Zeca Pagodinho. Nossa vida profissional requer planejamento e para podermos realizar o nosso planejamento precisamos, antes de tudo, estarmos comprometidos.

Assim, como qualquer CEO, não somos senhores absolutos de nossas decisões. Deve existir uma diretoria executiva, quem sabe um conselho de administração, temos que prestar contas para as auditorias internas e externas etc. Qual será a nova avaliação do seu COMPROMETIMENTO com a sua vida profissional na sua estrutura familiar?

Entre um MBA e uma viagem à Disneylândia, com muitas mordomias, qual seria a sua decisão e a da sua família, enquanto CEO da sua vida profissional.

Capítulo 6 – Planejamento

Para não vivermos conforme a música do Zeca Pagodinho será necessário planejarmos a nossa vida profissional.

As organizações não fazem planejamento estratégico para vários anos? Nossa vida profissional não é nossa organização? Então porque não fazemos planejamento estratégico para ela? Quais são os seus planos para a sua vida profissional para daqui 5 anos? 10 anos? Para quando não conseguir recolocação e for obrigado a partir para um negócio próprio, sendo obrigado a aceitar riscos previsíveis não mapeados anteriormente? E para a sua aposentadoria?

Na década de 90, quando fazia os treinamentos gerenciais na Credicard/Citibank já nos era ensinado que deveríamos manter uma reserva financeira de pelo menos 1 ano, com alguma redução no padrão de vida, para enfrentarmos as inevitáveis transições na nossa vida profissional.

Não tenho parâmetros para afirmar, mas acredito que para uma gerência intermediária ou um cargo técnico especializado o prazo médio de recolocação é, hoje, de pelo menos 1 ano. Você tem esta reserva financeira? Se tem ótimo e se não tem, quais são os seus planos para obtê-la rapidamente?

Juntando comprometimento com planejamento, a sua família conhece e concorda com este plano? Concorda, por exemplo, em reduzir significativamente as despesas, os almoços de finais de semana, as baladas, as viagens, os hobbies etc. ou para juntar a reserva financeira ou para sobreviver durante o longo período de recolocação? São vários os casos de crises familiares decorrentes da redução no padrão de vida.

Capítulo 7 – Recursos

Já abordei recursos financeiros acima. Mas além dos recursos financeiros quais outros recursos você necessitaria para ou se preparar para enfrentar a recolocação ou para enfrentar a recolocação se e quando ela ocorrer? Ainda este capítulo da norma ISO 22301 aborda um item muito importante que é a comunicação.

Vamos primeiramente aos recursos. Seguramente você necessitará de muita tranquilidade para enfrentar a crise da recolocação. Me lembro quando, depois de quase 10 anos e uma carreira brilhante, fui demitido da Credicard/Citibank. Foi como se o chão tivesse desaparecido debaixo dos meus pés. Foram semanas até absorver e digerir o golpe, que felizmente não impactaram a minha carreira profissional. E naquela época eu também não tinha nenhum plano, tudo acabou sendo resolvido no melhor estilo Zeca Pagodinho, “deixando a vida me levar”.

Outro recurso estratégico importante inserido no contexto da comunicação é a sua rede profissional de contatos. O Linkedin pode te ajudar, mas não fará milagres se você diuturnamente não cuidar desta rede social. Quantas horas por semana você passa no Facebook ou outras mídias sociais e quantas horas você se dedica a cultivar a sua carreira profissional? Pois é, uma hora a conta aparece. O que vemos com frequência no Linkedin são candidatos em busca de recolocação disparando convites, quase que de forma desesperada, para aumentar a sua rede de contatos e esperando com isto a desejada recolocação.

Na minha visão, o Linkedin é um local para você construir e solidificar a sua carreira profissional, participando de grupos de discussão, elaborando artigos e trocando experiências com a sua comunidade. Linkedin, como vários postam quase que diariamente, não é o Facebook, para você ficar postando selfies ou outros fatos do seu dia a dia.

Ainda com relação à comunicação você tem um plano para comunicar a sua família que você foi desligado da empresa onde trabalhava? Sei de vários casos de profissionais que continuaram levantando pela manhã e saindo de casa, pretendendo que estavam indo ao trabalho, ou por medo ou vergonha de contarem em casa que

foram demitidos. Demissão não é vergonha alguma e faz parte da vida profissional de qualquer um.

Capítulo 8 – Operação

É neste capítulo que materializaremos o macroplanejamento da nossa vida profissional, conciliando as nossas competências, apetite ou aversão ao risco, aos recursos e planos de ação.

Nosso plano de ação inclui a avaliação dos riscos e dos impactos, o desenvolvimento das nossas estratégias e os planos de ação.

Para avaliação dos riscos, oportunidades e impactos recomendo a análise SWOT – Strengths (Forças), Weaknesses (Fraquezas), Opportunities (Oportunidades) e Threats (Ameaças). Um bom profissional de coaching pode te ajudar a realizar esta análise de maneira bastante imparcial e com isto te permitindo identificar as suas habilidades, limitações, oportunidades que eventualmente você não esteja enxergando e as ameaças que você está correndo, sem se perceber disto.

Parafraseando Delfos, a análise SWOT permitirá que você "Conhece-te a ti mesmo" trazendo informações relevantes para a elaboração dos planos de ação para a sua carreira profissional.

Alguns exemplos:

Forças: capacidade de planejamento, liderança, fluência em mais de um idioma, competência técnica etc.

Fraquezas: falta de planejamento, liderança difusa, sem segunda língua, desatualizado tecnicamente etc.

Oportunidades: uma recolocação em outra cidade/estado/país, uma recolocação interna em outra área de conhecimento, uma vaga numa start up promissora etc.

Ameaças: acomodado, inabilidade política, falta de capacidade de comunicação objetiva etc.

Voltando à minha demissão na Credicard/Citibank, no dia seguinte ao fato, uma terça-feira, pedi uma conversa rápida com o então vice-presidente de tecnologia para entender as razões da minha demissão. A resposta foi dura, embora no fundo eu já a soubesse: “você tinha um futuro brilhante nesta organização e até mesmo na holding, mas a sua falta de habilidade política, e não foram poucos os avisos que te demos, nos levaram a tomar esta decisão”, disse o vice-presidente. Falhei na avaliação dos meus riscos e consequentemente na minha postura estratégica.

No meu pacote de demissão estava incluído uma empresa de recolocação. Optei pela Lens & Minarelli (http://www.lensminarelli.com.br/) onde tive o prazer de conhecer o José Augusto Minarelli, que desenvolveu um conceito muito interessante sobre empregabilidade, que remete à capacidade do profissional de ter a sua carreira protegida dos riscos inerentes ao mercado de trabalho.

Na sua análise SWOT, qual seria o escore para a sua empregabilidade? Quanto menor for este escore, provavelmente maiores serão as suas dificuldades de recolocação. Projete o escore da sua empregabilidade ao longo do tempo, antecipando as possíveis

crises que poderão ocorrer nas suas transições de carreira à medida que você envelhece.

Como possíveis estratégias de recolocação profissional pode ser que surja o “negócio próprio”. Se me permite um conselho, não se lance a esta empreitada se você não tiver um bom plano de negócios, capital e demais recursos necessários, conhecimento no ramo de atuação e muita vontade de vencer, tendo que trabalhar muitas vezes 16, 18 horas por dia de segunda a segunda.

As estatísticas do SEBRAE estão aí, 90% das pequenas empresas não completam um ano de vida, muitas vezes deixando os seus empreendedores ainda mais quebrados, devendo na praça e/ou para as suas famílias.

Com todo este conjunto de informações em mãos é hora de desenvolver os planos de ação. Os planos de ação dependerão, fundamentalmente, do que você definiu como os seus objetivos profissionais de curto, médio e longo prazos.

O seu plano de ação é a recolocação? Com vínculo empregatício ou não? Então foco e mãos à obra. Estabeleça uma rotina de trabalho. Lá na Lens & Minarelli éramos obrigados a ir de terno e gravata realizar as nossas atividades de networking e prospecção de oportunidades. Isto para não perder o foco nem tratar a atividade como secundária.

Se o seu objetivo é a recolocação com vínculo empregatício e a oportunidade que surgiu é de terceirizado, avalie bem o seu plano de ação. Não assuma um compromisso que você não pretende honrar. O mercado é pequeno demais para comportamentos assim.

Da mesma forma, avalie muito aceitar um cargo de coordenação, por exemplo, quando você já tinha um cargo de gerência. A situação é muito parecida com a acima. Um bom headhunter perceberá facilmente as suas intenções.

Seu objetivo é o negócio próprio? SUCESSO! Faça o seu plano de negócios e demais orientações já citadas aqui.

Capítulos 9 e 10 – Avaliação de Performance e Melhoria

Planos desenvolvidos e indicadores estabelecidos é hora de avaliarmos se os planos estabelecidos estão se desenvolvendo como planejados ou não.

Caso os planos estejam ocorrendo como planejados o que podemos fazer para melhorá-los ainda mais? Em contrapartida, se estão ocorrendo desvios ou não estamos conseguindo cumprir o planejando, quais ações devem ser executadas de forma a fazer cumprir o planejado, eventualmente até mesmo mudando o planejamento todo, que pode estar baseado em premissas não confirmadas.

Capítulos 11 – Infelizmente aconteceu (este capítulo não está na norma)

Infelizmente o indesejado aconteceu, a demissão.

Vamos ao básico.

Você tinha um bom plano de ação para este momento? Então é hora de executá-lo, de forma organizada, sem atropelos ou decisões emocionais. Siga o plano, antecipe e monitore os desvios. Replaneje se for necessário.

Você não tinha um plano de ação? Não se culpe, administre a crise estabelecida. Decisões emocionais ou não planejadas agravarão a crise. Mantenha a calma. Faça uma rápida análise da situação.

o Qual a sua folga financeira, o que pode ser cortado para reduzir as despesas?o Por quanto tempo você conseguirá viver assim?o Estabeleça intervalos de tempo associados à sua reserva financeira, digamos

quando chegar a 75%, 50% e 25% das reservas;o Quais outras despesas podem ser cortadas? Lembre-se estamos operando

em modo sobrevivência, onde itens não essenciais são desnecessários;o Se as reservas financeiras permitirem ou dentro do novo planejamento

financeiro busque apoio profissional: coaching, plano de negócios etc.o Quais as alternativas para trazer alguma receita para casa?o Desenvolva um plano de ação. Assuma, por hipótese, que você levará, no

mínimo, 1 ano para se recolocar.o Estabeleça uma rotina de trabalho para conseguir a sua recolocação. Ficar

24 hs./dia somente fazendo isto pode te deixar muito angustiado e ansioso. Arrume alguma atividade onde você possa relaxar, desestressar, renovar as suas energias para perseverar na busca da sua recolocação;

o Cultive a sua rede de contatos, mas sem afobação;o Desenvolva um plano B caso o plano A não funcione satisfatoriamente.

Sidney R. Modenesi, MBCI