A Descoberta do Insólito

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    Erik Borba:Tendo em vista o tema do Dossi Dispora Descentramentos e Relaes Raciaisno Brasil Contemporneo uma das coisas que me chamou a ateno, e por onde podemoscomear essa entrevista, que voc toca no seu livro na presena de brasileiros no congressode escritores negros que aconteceu em Roma, no segundo congresso, no qual estava, porexemplo Franz Fanon, por mais que no seu trabalho no ficou o indicativo do que eles trouxeramde fato, voc aponta para uma relao que a intelectualidade negra brasileira tinha em algumamedida com esse cenrio mais global de autores negros e africanos que esto nesse perodo.Com relao a isso, acho que a primeira pergunta : em que medida essa trocas globais entrea intelectualidade negra influenciaram esses escritores e ativistas negros do Brasil? E em quemedida a anlise desse processo traz desafios para a sociologia que no Brasil? Sendo queaparentemente essa seguiu uma tendncia de ver o negro dentro do contexto nacional e queremete a problemas a do contexto nacional.

    Mario Augusto Medeiros da Silva:A pergunta vai dar uma resposta longa, uma perguntaboa, o desafio principal conseguir concretizar essa conexo de sentido, quanto ao caso

    especificamente ao caso do congresso dos pesquisadores negros que voc mencionou, de1959 o primeiro foi 1956 o segundo em 1959. Como que eu cheguei nessa aproximao, notudo comea com entrevista com Osvaldo de Camargo escritor e com as fontes que eu fuilevantando com a Associao Cultural do Negro. De repente se depara ali com a figura doGeraldo Campos de Oliveira que num depoimento que o Jos Correia Leite d para o Cuti queele diz que o Geraldo Campos de Oliveira teria ido para o congresso de pesquisadores negrosna Frana. Isso tem uma passagem literal que eu cito no trabalho que o Geraldo Campos deOliveira participou desse congresso e trouxe uma poro de documentos, o Jos Correia Leiteno diz muito bem que tipo seria esses documentos, se seriam as atas do congresso ou umatese que ele tenha contribudo ou recebido, e ai eu fui a naquela ocasio, embora o perodo

    que eu lido de 1960 a 2000, rigorosamente na tese eu retorno at a dcada de 1950, por causada associao cultura do negro, entrevistando o Osvaldo eu disse vem c, me fala sobre essafigura Geraldo Campos de Oliveira porque as informaes que a gente tem sobre ele so

    pouqussimas, e de repente a gente tem esse homem, que um professor, como professorda dcada de 1950, pelas fotos que se tem da poca, j est em meia idade, que nasce nocomeo do sculo XX, contemporneo do Correia Leite, que nasceu em 1900, que se formouprofessor, que voc consegue descobrir que foi diretor do Teatro Experimental do Negroem SoPaulo, conexo direta com o Abdias, e tambm pouco se sabe sobre a experincia do TEN2emSo Paulo, e que militou na legio negra, foi chefe comandante militar civil da legio negra nadcada de 1930 e sempre referenciado como professor, como homem que tem essa bagagemcultural, e que h uma esforo coletivo para o congresso de escritores. O prprio Osvaldotambm me falou muito pouco da figura do Geraldo e dessa ida do Geraldo para o congressode pesquisadores negros. Agora o Problema, que torna mais interessante, qual congressoele vai e as circunstncias, ele consegue fazer uma vaquinha, nos documentos da ACN3, lem So Carlos, d para perceber que ele vai pedindo apoio para viajar, no fica claro se so dinheiro dos associados permitiram isso ou se houve de fato a concesso de passagens eele vai para o congresso que tem justamente Fanon fazendo a conferencia sobre Racismo eCultura. Primeiro que em um congresso que vai acontecer em outro pas, a primeira coisa queme vem cabea que: esse cara tem que saber falar francs. Ou se, depois eu fui procurar

    as informaes sobre o congresso, eu menciono a pesquisa foi feita pelo pessoal do museu ...que d as notas do congresso, no d para saber se houve traduo simultnea, ai depois,

    2 Teatro Experimental do Negro3 Associao Cultural do Negro.

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    acho que voc ou outra pessoa de So Carlos recentemente, acho que foi o Deivison, que mealertou, que havia uma outra possibilidade porque no congresso havia j um outro brasileiroque era o pintor Tibrio que est l radicado em Paris a muito tempo ento conhece a lnguafrancesa. Que pode ter sido tradutor, pode ter sido mediador do Geraldo, mas o que importadisso tudo que tem uma associao de negros de So Paulo, que so homens e mulherestrabalhadores funcionrios pblicos professores, vrias empregadas domsticas, um ncleoduro que de funcionrios pblicos mdio, professores, trabalhando na prefeitura de So Paulo,no estado ou coisa do tipo, e tem a viso a demandar um cara para um congresso, que sevoc for ver, em termos de intelectuais brasileiros s esses dois, e em termos de escritores oupesquisadores da questo negra nenhum brasileiro foi, nem no primeiro nem no segundo, entoisso assombroso. Por outro lado, tambm no to assombroso, ai entro na segunda parte dasua pergunta, haja vista que abre um campo de pesquisa para pesquisadores da Dispora, daquesto racial acho que tem muita coisa para nadar, que so as conexes que se estabeleceno mundo negro, no Brasil com o Caribe, com os Estados Unidos, com a Francofonia, para mim um encontro de tirar o sono em termos de pesquisa. De novo fazendo referncia ao Correia

    Leite, dizendo o seguinte a gente tinha no Clarim da Alvorada uma seo chamada o mundonegro, e eu era um grande leitor um grande admirador das ideias do Marcus Garvey, e a genteest falando de 1920. 1920! O Correia Leite d aquilo de barato dizendo que recebia traduesdo jornal do Garvey do [...] que vinha da Bahia que vinha para So Paulo e a gente publicavano Clarim (Correia Leite) na sesso dedicada ao mundo negro, isso em 1920. Dispora umtermo muito contemporneo mas se a gente for ver para valer ela j vem rolando na dcadade 1920. Para se restringir ao sculo XX na dcada de 1920 em So Paulo, na capital Paulista,articulando Brasil, com os Estados Unidos, com a Jamaica, j que Garvey, e com uma

    conexo interna de intelectuais negros, voc tem gente na Bahia que capaz de traduzir doingls para o portugus e mandar isso para So Paulo e isso ser veiculado, esse tipo de coisa

    j est acontecendo, digamos que j h uma experincia ou tentativas de uma experinciainternacional, dilogo em So Paulo, que antecede o congresso dos pesquisadores negros em36 anos mais ou menos, isso, no sei o que vocs pensam disso, mas de uma riqueza e deum problema de pesquisa concreto terico muito interessante para a gente pensar. O problemaso as fontes para dar concretude a essas fontes, tanto no caso de 1920 quanto no caso de1956. Pergunta: quem , quem so as pessoas que o Correia Leite diz que traduzem, ele dizum nome Mrio diz outro nome que no lembro, no me lembro o nome agora, uma dupla deintelectuais negros que traduzem isso e mandam para So Paulo, como que a gente acessaisso? Porque os dados que ele fornece so muito poucos, at cheguei a entrar em contato como Cuti, que fez a entrevista, e o Cuti em uma conversa, em uma artigo que estava escrevendo

    com Correia Leite, que era para o livro, disse que tinha algo em torno de mais de 900 laudasescritas dessa entrevista transcrita, no sei se tudo entrou no livro quando foi passado para aedio, at entrei em contato com o Cuti mas a conversa no prosperou para ver mais detalhesdisso, mas talvez possa ter informao l. Acho que o Cuti no ia omitir isso no livro, mascomo que a gente acessa esses caras? Como que d concretude acessa a essa Disporaque j est acontecendo ou se vocs no quiserem chamar de Dispora, dessa solidariedadeinternacional, dessa percepo do Negro em So Paulo.

    Dener Santos Silveira:Ou a ideia da circulao de ideias que j acontecia nesse momento

    Mario Augusto Medeiros da Silva Exato, exato. Perfeito. Dessa circulao de ideias ede perceber uma solidariedade internacional, So Paulo, Estados Unidos, Caribe, movimentoVolta para a frica basicamente disso que o Garvey est falando, ou uma solidariedade deempoderamento, de associaes negras, que o que est no horizonte do Garvey, com a Bahia

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    com So Paulo e publicar isso, h uma precariedade das fontes. Para rastrear quem so ossujeitos o que eles esto lendo, como que eles tm acesso a isso...talvez tentar fazer algo...

    Dener Santos Silveira: De todo modo j abre uma possibilidade para a pesquisa.

    Mario Augusto Medeiros da Silva: Enorme, enorme, abre uma possibilidade de pesquisa

    Dener Santos Silveira: A talvez o que voc est mostrando um problema das fontes,conseguir dar concretude, porque a circulao, a hiptese essa, est dada que ela existe,a circulao de ideias que est acontecendo nesse momento, mesmo antes de se trabalharcom o esse conceito de Dispora de forma bem concreta e acho que abre um rol de pesquisanesse sentido

    Mario Augusto Medeiros da Silva: Sim, sim, sim. Mas isso sempre me preocupa, principalmenteporque a gente est falando de circulao de ideias, acho que no basta enunciar, a pista est

    l, a pista est no depoimento do Correia Leite, outros pesquisadores antes de mim j viramisso, alguns deram maior nfase a isso outros no, eu achei essa pista interessantssima.E que d uma margem para pensar, que se ento um conjunto de intelectuais negros que

    j de alguma forma nutre ou tem um conhecimento, ou tem um interesse em articular umdilogo internacional, e no se trata de um, se for para ser rigoroso com o momento em queos conceitos so enunciados, no se trata de dispora, ningum est falando em disporaenquanto termo conceitual, mas dispora que est acontecendo, e de novo como a AssociaoCultural do Negro se tornou uma grande questo para mim, e isso me permite pensar que no estranho ver o Geraldo Campos ento, ou os membros do ncleo duro da associao, queso essas pessoas que tiveram experincias j nas dcadas de 1920 e 1930 com a impresso

    negra, com diferentes forma de associativismo, com uma literatura internacional no caso domundo negro, ou com, de novo, negros caribenhos, negros estrangeiros, melhor dizendo, emSo Paulo, que tambm mencionado no depoimento do Correia Leite, tinha o tal do misterGeertz, que um cara de Trinidad Tobago, Joe Geertz, ou Gittens, o Flvio, me fugiu o nomedo pesquisador, j vai voltar, teve um pesquisador que conseguiu rastrear essa figura que mencionada no depoimento do Correia Leite e um cara que tem a intenso de criar umabiblioteca em So Paulo voltada exclusivamente para o negro e o cara tambm do Caribe.Ento j tem uma ligao, j na dcada de 1920, que no est no estranho, muito inslito, ofato de na dcada de 1950, se ter um professor, precisa ver professor do que, qual a trajetriado Geraldo Campos, onde ele se forma, se ele algum semelhante, de repente ao Arlindo

    Veiga. Enfim, que tem o domnio de outras lnguas, que tem uma formao intelectual maisslida, indo para um congresso internacional de escritores e artistas negros. E isso tambmtorna menos inslito tambm o fato de voc ter o secretrio da revista Presena Africana,quatro anos depois, mandando uma carta para a associao cultural do negro dizendo quequeria criar uma aliana com a associao aqui em So Paulo. Uma sociedade de amigos daPresena Africana. Voc tem l o Diop, de novo no arquivo de So Carlos no arquivo da UEIMmandando uma carta dizendo: Olha, voc sabe quem nossos somos, ns somos da PresenaAfricana... A gente est querendo criar uma articulao de solidariedade internacional, achoque at transcrevi essa carta no livro, e a agente acha que a Associao Cultural do Negro um parceiro um bom interlocutor. P! 1960, mas o cara foi em 1959 ser que o cara fezcontatos? Ai um exerccio de imaginao sociolgica. Eu estou apontando coisas, se issovai dar em algo ou vai dar em gua eu no sei, mas no estranho, assim como tambm nofica estranho, de novo com a entrevista com o Osvaldo, isso a gente est falando ento 1920conexo com Estados Unidos e com Caribe, em 1959 conexo com a francofonia, e com ideia

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    difusa de negritude, uma ideia mais concreta de negritude, mas frica, tambm est contadoem funo do arquivo da ACN, na entrevista do arquivo de vocs da UFSCar, uma circulao demilitantes africanos de Angola ou Moambique que uma coisa conhecida, uma coisa melhorconhecida essa articulao internacional depois do trabalho do Jerry Dvila Hotel Trpico,mas de algo que ficou mais claro para mim algo quando o Osvaldo de Camargo dizia para mim:Eu no conhecia a frica antes de tomar contato com um cara chamava Paulo Matoso. Quem Paulo Matoso? Paulo Matoso est fazendo o que aqui em So Paulo? ah, Esse cara trouxe livrosda Nomia Souza Abranches. Que uma poetiza da libertao moambicana, ah e trouxeuma bibliografia sobre o que estava acontecendo em termos de lutas de libertao. Ele, a vocpega o livro do Eduardo de Oliveira, no o Eduardo de Oliveira e Oliveira, mas o poeta EduardoFerreira de Oliveira, O banzo, o livro O banzo, quem faz a reviso do livro? Paulo dos SantosMatoso, a voc vai procurar quem Paulo do Santos Matoso s um representante do MPLAno Brasil. s.Um dos caras que citado como sendo dos um dos angolanos que vai aparecernos inquritos policial militar e desaparece depois de 1964. Esse cara est circulando no SoPaulo e Rio e tem ligao com gente da Associao Cultural do Negro, est apresentando fricaou algumas ideias sobre frica, literatura africana contempornea para intelectuais brasileirosnegros e agora eu estou trabalhando, vou ver se termino, me organizo num artigo sobre o PauloMatoso, porque est sendo possvel mapear atravs da impressa, no da imprensa negra masda imprensa mais ampla, esse cara est fazendo propaganda sobre a doutrina de libertao deangola em 1960 aqui, alis 1962-1963 ele um dos caras que vem no acordo que o Jnio fazem 1962. O trabalhodo Jerry Dvila d concretude a isso em 1962 criado o centro de estudosafro-asiticos, depois vai ser mais tarde o Centro de Estudos Afro-Asiticos do Candido Mendes.Mas o Jnio Quadros faz uma poltica de aproximao com o continente Africano, parte dessapoltica concesso de bolsa para estudantes africanos virem para Bahia, So Paulo e Riode Janeiro, s que nessa brincadeira vem militantes polticos, como Paulo Matoso, para SoPaulo ou gente que vai ter contato, com o Cndido Mendes, e aquele intelectual que acaboude falecer Jos Nunes Pereira no Rio, que tambm gente que tinha contato com africanos, oJos Nunes Pereira e o Fernando Mouro da USP, na casa de estudantes do imprio, nada dissodeveria ser muito estranho para a gente, porque ningum est falando de dispora porque no um termo do tempo, mas existe uma solidariedade internacional entre intelectuais negrosno negros e africanos e no-negros e negros brasileiros, enfim, que se a gente ficar aqui entre1920 e 1960 so quarenta anos de dilogo. Digamos que as coisas no aconteceram somentea partir de 1978, com a criao do Movimento Negro Unificado, tem muita coisa que aconteceantes. O que eu penso, a ideia, eu no uso nenhum momento a palavra de dispora, no livrouou na tese, se eu uso no com o devido rigor mas existe uma circulao de ideias, existe umasolidariedade internacional, uma aproximao de temas que eu posso no conseguir evidenciarde maneira mais concreta, mas eu no posso ignorar que ela exista. Uma penas muitas vezesque o arquivo no permita algo mais, ou de repente permite e a gente no descobriu, o arquivoda ACN riqussimo, talvez o arquivo da Presena frica em Paris, eu no fui para l, pode tercoisas mais interessantes, o arquivo do Garvey ou a documentao referente ao movimentovolta para a frica ou ao mundo negro do Garvey pode ter correspondncias, eu no sei, euno visitei isso, isso abre uma agenda de pesquisa muito interessante. Para outras pessoasque possam vir a trabalhar com isso.

    Dener Santos Silveira: Voc falou sobre Paulo Matoso, me veio a ideia sobre a pesquisade um de nossos amigos, sobre a formao do Estado Nacional,. Ps processo de libertao,ps processo de descolonizao e essas lutas, pensar nesse caso, seria muito interessante,se tem essa influncia, essa circulao de ideias na dcada de 1960 e 1970, como que erafeito isso, qual a relao desse estado nacional, Moambique e o Paulo Matoso e realidadeBrasileira, mas a outra questo.

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    Mario Augusto Medeiros da Silva: Mas a gente tem uma agenda de pesquisa muito

    grande para quem se interessa sobre isso, porque, de certa maneira, eu estou sugerindo que seconsiga mapear aspectos concretos de uma dispora intelectual, uma solidariedade intelectual,entre negros, Africanos, entre esse mundo negro se se quiser chamar assim, antes da ideiade dispora ser propriamente enunciada dessa forma, mas a gente acho que j falei demais.

    Dener Santos Silveira: No imagina, fica com a vontade de fazer perguntas demais e agente vem com um roteiro para seguir.

    Jos Ricardo Marques dos Santos: Outra coisa que temos discutido em So Carlos o livroA integrao do Negro na Sociedades de Classes do Florestan Fernandes ter feito 50 anos, um marco na sociologia, mas tambm na histria da sociologia das relaes raciais, em funodo impacto, na forma como foi publicado. E ao mesmo tempo ele contemporneo disso quea gente est discutindo agora, ele apresenta uma viso sobre esse momento, particular naforma como Florestan pensou, mesmo passando esse tempo a gente tem a impresso que

    ele deixa algumas possibilidades abertas, em funo dessa nova discusso que existe sobreDispora, em funo das fontes que o Florestan apresentou, ele apresenta uma coleo dedados durante o livro inteiro, algumas coisas ele coloca de acordo com o interesse dele naquelemomento, nesse sentido voc acha que esse livro pode ter uma releitura nesse sentido? abrirportas para pensar outras conexes, pensando a forma como ele pensou a militncia, militanainterna ao Brasil a circulao....

    Dener Santos Silveira: H uma atualidade ainda?

    Mario Augusto Medeiros da Silva: No tenho a menor dvida, eu espero que isso no soecomo algo pretensioso, depois vou ter que ler essa transcrio para ver se no soou, (risos), ocaptulo 3 A descoberta do Inslito uma espcie de releitura do A Integrao do Negro naSociedade de Classes o captulo 3 e 4. O que estou propondo ali , bom a gente sabe que, pelomenos a gente pensa que sabe, nos pesquisadores do pensamento social da sociologia dasrelaes raciais, quais eram os interesses dos socilogos em fazer pesquisa sobre o negro emSo Paulo, na pesquisa UNESCO, naquela histria que j bastante conhecida, a gente sabe,mas qual os interesses dos negros em participar dessa pesquisa? Assim que eu abro o captulo,assim comea uma outra discusso. Me Parece quer dizer, ou pelo menos, basicamente, eu noquero fazer mais do mesmo falando sobre a pesquisa UNESCO, j tem O trabalho do Marco

    Chor Maio que bem feita, tem as pesquisas sobre o Florestan, N pesquisas sobre o Florestanque tratam muito bem desse assunto, enfim, eu acho que tem duas coisas me chamavam aateno, e mostra o vigor da pesquisa, mostra o vigor do livro, e quanto possvel no arquivodo Florestan ir atrs de algo novo, que eu achava que no estava devidamente respondidas,a primeira essa pensar se era possvel, pensando a contrapelo, pensar do outro lado, qualos interesses que os intelectuais negros tinham em colaborar com a pesquisa UNESCO, poiseles poderiam ter se recusado, qual os interesse de eles de colaborar com a pesquisa UNESCO

    de So Paulo? Segunda coisa haveria especialmente o volume dois de A Integrao do Negrona Sociedade de Classes, acho que o livro todo, mas especialmente o livro dois, que tradadas lutas sociais no meio negro, existira a integrao do negro sem a colaborao ativa dosintelectuais negros? No. Florestan escreve sobre as lutas sociais no meio negro calcado

    nas entrevistas, nas rodas de discusso que ele promove Biblioteca Mrio de Andrade e dafaculdade de filosofia, ento al que surge a discusso sobre o mito da democracia racial,uma polmica uma coisa que...preciso dar o crdito preciso, porque uma coisa que minha

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    orientadora Elide4sempre apontava, que todo mundo fala que era o Florestan que denunciao mito da democracia racial, mas o Florestan faz isso conversando com os militantes negros,ento no um Fla X Flu Florestan X Gilberto Freyre.

    Dener Santos Silveira: Florestan j estava ali com a descoberta do inslito ....Risos....

    Mario Augusto Medeiros da Silva: P! Florestan, O Bastide, j na dcada de 1950, anos1940 conversando com os militantes negros, tem coisas que parecem ser coisas bobas que nodeveriam estar no livro (A descoberta do Inslito), porque que eu fico falando que trs intelectuaisnegros que vo participar dos Necrolgicos do Bastide em 1974, o que o Correia Leite, JaimeAguiar e o Raul Joviano do Amaral esto fazendo uma homenagem na USP, quando o Bastidefalece, tem uma mesa especifica, que o Joo Batista Borges que organiza, de militantes negrospara o Bastide. E o que os caras esto falando? O cara era nosso amigo, o cara ia nas nossascasas, tomava nosso caf, professor Roger Bastide ia nas nossas associaes. Ou seja: desdea dcada de 1940, anos 1930-1940, tem uma ligao do Bastide com esses caras, ai voc vai

    ver o que o Bastide esta produzindo: O ensaio sobre a Imprensa negra no estado de So Paulo ensaio sobre poesia afro-brasileira, a discusso sobre os estudos sobre macumba em SoPaulo etc etc etc. Ponto nmero um. Ponto dois, o Bastide que leva o Florestan para a pesquisada UNESCO, diz a histria que sim, ok. Ai a pergunta : Florestan entra em contato com essescaras e comea a ouvir o que? Pergunta: ele comea a ouvir o que? Racismo, a gente no podeentrar em qualquer salo de barbearia, a gente no pode entrar em um hotel, rua direita anoite no pode ser porque rua de negro, tem um secretrio de polcia que manda bater - Mitoda democracia racial. J em Brancos e Negros em So Paulo, aparece como a luta contra opreconceito de cor, ai voc vai ver que as bases so basicamente transcrio de entrevista e

    jornais da imprensa negra, que ele e Bastide j haviam tido acesso, e a Integrao Do Negro

    na Sociedade de Classes calcado especialmente no segundo volume nas discusses como movimento negro, associativismo negro, do seu tempo. Perguntar sobre o que esses carasesto querendo uma forma de reler o livro e que eu acho, pelo menos isso que eu tinhaem mente, que era um caminho que no havia sido muito trilhado, muito afundo por outrospesquisadores antes de mim, mencionado, no indito a coisa de mencionar a ligao.Fica, a frase geralmente termina por a: eles tinham ligao com; Mas no ligao comqualquer um ligao com qualquer sujeito, qualquer associao, o tamanho dessa ligao daem uma ou duas obras clssicas da sociologia. D em pelo em pelo menos um artigo clssicodo Roger Bastide sobre Imprensa negra, inaugura toda uma discusso sobre imprensa negrano Estado de So Paulo que depois vo ter outras pessoas, necessrio perguntar o ngulo dooutro, o ngulo do associativismo, do intelectual, necessrio qualificar essas pessoas comointelectuais negros, porque isso tambm uma dificuldade da bibliografia, que esses sujeitossejam chamados de intelectuais negros. Ou seja: que estejam do mesmo nvel de interlocuocom os intelectuais das cincias sociais brancos. Acho que foi algo que tentei, procurei fazer.A outra coisa que 50 anos depois ainda informa a gente, e ai acompanhado uma discussoque do pensamento social que est no Gabriel Cohn, a prpria Hlide menciona, algo que euaponto no livro com menor intensidade, que essa primeira coisa, a historia que o Integrao DoNegro na Sociedade de Classes tudo menos um livro sobre o negro. Seria um ttulo assertivo,est l no trabalho do Gabriel Cohn, um artigo que ele escreve para Banquete nos trpicos, que

    o Florestan dava ttulos assertivos para dizer justamente o que no estava acontecendo, no um livro propriamente sobre a ideia de integrao mas como ela no acontece na perspectivado sculo vinte, do ngulo dos seus interlocutores negros, e anteriormente na perspectiva

    4 Elide Rugai Bastos, Professora do departamento de Sociologia da UNICAMP.

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    de uma sociologia mais histrica. Agora se ele no livro sobre o negro ele um livro sobreo que? Se ele no um livro sobre a integrao do negro propriamente dito, se ele no umlivro exclusivamente sobre a questo racial, ele um livro sobre o que tambm? O final meioque enigmtico do Integrao Do Negro na Sociedade de Classes, [...] O negro se converteuna pedra de toque da nossa forja da civilizao moderna[...] um livro sobre democracia, umlivro sobre os limites da democracia., da no realizao da democracia brasileira. Se a gentefaz isso com esses caras que so os elos mais fracos da corrente, uma sociedade que estavaalicerada nos princpios republicanos de liberdade, igualdade e fraternidade... mas que noaconteceu nada disso na virada para o sculo XIX para o XX, esses caras esto passandometade do sculo XX no sendo iguais, no tendo todos os seus direitos plenamente realizados,denunciam a discriminao, preconceito, cotidianamente, fraternidade zero, ou perto de zero,logo, ns no nos realizamos como uma sociedade republicana, cidad e democrtica, a zica que Florestan defende isso em maro de 1964, dez dias antes do ato institucional nmeroum, nada mais atual no momento que ele defende essa tese, que ele defenda dez dias antesdo ato institucional nmero um, e 50 anos depois quando estamos fazendo o balano sobre o

    golpe de Estado Civil-Militar, o Golpe de 1964, cabe a pergunta: se voc angular a discussopelo grupo social negro, a gente se realizou para valer com uma sociedade democrtica? Ou,como um problema contemporneo, se abrir para os grupos subalternos ou subalternizados,indgenas, negros, gays, enfim, as questes quentes do nosso cotidiano, pegando a hiptesedo autor, se esse grupo que o mais fragilizado da corrente, teve esse ponto de partida e essedesenvolvimento e isso coloca um impedimento na realizao democrtica, se a gente fizer umexerccio de reflexo, com o procedimento metodolgico, a gente se realizou como plenamentedemocraticamente? Eu creio que no. Ento a gente continua tendo 50 anos depois com umproblema de cidadania, de realizao republicana, de democracia pra valer, que era meramenteum enunciado formal e no uma realizao concreta ento o livro extremamente atual por

    esses dois ngulos fornece respostas ou abre para mais perguntas intensas.

    Dener Santos Silveira: Vou tentar dar uma juntada nas questes. Vamos falar mais daobra agora, descreva, classifique o que voc chamou de inslitoe dupla negao, que voctrabalha. A ideia de negra aquilo que foi negado.

    Mario Augusto Medeiros da Silva:A negao da negao.

    Mario Augusto Medeiros da Silva:Comeando pelo ttulo, o ttulo do livro ele meio queuma cpia do A descoberta do Frio do Osvaldo de Camargo. Que a novela, do Osvaldo de

    Camargo sobre preconceito, uma alegoria sobre o preconceito racial em So Paulo. Nunca faleiisso, estou falando pela primeira vez na entrevista. Risos.... E nem escrevi sobre isso! Mas decerta maneira, quando estava pensando em ttulo eu havia lido A descoberta do Frio que umlivro de 1979, do Osvaldo, e... p! interessante... e copiei, que fique gravado....copiei....risos.

    Dener Santos Silveira, Erick Borba: Risos.....

    Jos Ricardo Marques dos Santos: Homenageou. Risos...

    Mario Augusto Medeiros da Silva:A segunda coisa, Risos... a ideia de inslito, o estranho,o inesperado o esquisito...tal... a pesquisa, falei isso vrias vezes, falei em So Carlos, mencionoisso no livro, ela nasce do contemporneo e vai cada vez mais para o passado, ento quandoeu pensei no projeto, a minha preocupao no era especificamente com a dcada de 1940do movimento negro, estava preocupado em entender porque Carolina de Jesus e Paulo

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    Lins eram tratados da mesma forma em um espao de 40 anos, dois negros, dois favelados,pobres, que escreveram obras de grande impacto em seu momento, e eram vistos como seresestranhos no sistema literrio brasileiro, pode o favelado escrever Quarto de Despejo? Podeum favelado escrever uma obra como Cidade de Deus? A mesma coisa acontece com o Ferrezcom o Capo Pecado, ento essa pergunta sobre o pode, o estranho, puta mas o lugar deonde esse cara veio...tal ento a ideia de inslito vem da, o estranho o esquisito...se quiser...atambm demais... o Osvaldo tem um livro chamado de O Estranho, Risos... a sacanagem....Risos... fica com a A Descoberta do Frio, est bom demais! Mas outros nomes para inslito,so...o esquisito, o fora do comum.

    Dener Santos Silveira:. A princpio quando voc pega o livro A descoberta do Inslito elegera uma ambiguidade, como estivesse surgindo algo que inslito, mas no necessariamenteaquilo que nasce se fosse o novo? Aquilo que nasce dessa dupla negao?

    Mario Augusto Medeiros da Silva: ....

    Dener Santos Silveira: Novo em um contexto, uma segunda questo, h circunstanciashistrias para haja essa emancipao? A gente est falando de Paulo Lins, de um espao detempo relativamente grande, mas que tratado da mesma maneira, h momentos substanciaisna histria em que voc pode dizer que h esse momento desse surgimento do inslito?

    H momentos em que ele pode acontecer ou ele .... como funciona essa questo?

    Mario Augusto Medeiros da Silva:Olha, vamos por partes. A ideia de Negao da Negao uma tentativa de demostrar o seguinte, esses sujeitos, esses intelectuais, com coletivos asvezes com experincias individuais, eles negam o negativo para propor algo positivo no final,

    nega tudo aquilo que negativo para voc, voc ser negro, pobre, favelado, discriminado ... eapesar de tudo isso, num esforo coletivo, cultural, poltico, individual voc nega tudo aquiloque estigma e afirma a passagem do escravo ao cidado, afirma a passagem do personagemestereotipado para autor, afirma a organizao poltica, afirma uma serie de ideias sobre omundo, do ngulo da literatura, do ngulo da organizao poltica, enfim, tudo aquilo que tudoque era negado como uma possibilidade vira, algo como projeto poltico, projeto cultural, algoabsolutamente positivado, no sentido de afirmado, no sentido de realizado, ou pelo menostentado, nesse sentido que eu penso a ideia de negao da negao, seja enquanto projetocoletivo, ai histria do associativismo, a histria do associativismo poltico e cultural negro muito interessante. Estou sempre me restringindo a essa dimenso de poltica de organizao

    poltica, em relao a dimenso da cultura em relao a samba, cordes carnavalescos melhordizendo, cordes carnavalescos imprensa negra, literatura negra, teatro negro, no estou

    falando do associativismo religioso como das irmandades, ou associativismo religioso comodo candombl, que tambm acho que pode ir por ai mas eu no trato disso, ... ento comoprojeto coletivo voc nega a experincia de no poder se organizar coletivamente, voc seafirma coletivamente. Voc faz algo. Voc cria um querer coletivo, voc faz algo coletivamentecom isso, cria um projeto, um projeto da projeto da imprensa negra, da literatura negra, teatronegro, dos cordes carnavalescos negros, clubes sociais negros, enfim, tudo que a ordemsocial competitiva ...Risos... Para entrar no Florestan, est dizendo para voc ...no d, atomizado, famlia desestruturada, voc bbado, voc no estudou, toda negao voc vail e...vou fazer algo com isso. Individualmente ai o bicho pega, especialmente em literatura,dos autores que eu estudei tem dois deles so pontos fora da curva e problemas tericosconcretos muito srio para o livro, e para a pesquisa sobre literatura negra. Carolina e PauloLins. Carolina primeiro porque ela nunca negou que ela fosse negra, digamos que a conscincia

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    de ser negro, estar negro no mundo, conscincia sobre aquilo que negativo em ser negro,preconceito discriminao, ela denuncia rasga o verbo, tudo aquilo que uma experincianegativa contra o pobre, contra o negro, mulher, ela afirma rasga o verbo, mas Carolina nuncadiz que ela fazia literatura negra.

    Dener Santos Silveira: Embora ela tivesse essa compreenso.

    Mario Augusto Medeiros da Silva:Ela no participava de um projeto coletivo de literaturanegra. Ela no participava ativamente, ela no estava na ACN, inclusive o pessoal da

    associao tentou se aproximar da Carolina e deu gua, deu zica. E o Paulo Lins nunca negouque fosse negro, fosse pobre, tivesse uma origem favelada, a experincia da discriminaoetc. a participao em grupos de solidariedade negra, escolas de samba... mas esse cara teveuma embate srio com o Cuti, no museu Afro-Brasil, com Marcio Barbosa, No quero saberdos cadernos negros, no quero saber da ideia de literatura, eu sou um escritor negro, que no

    faz literatura negra, eu fao literatura meu dialogo com Nietsche, Dostoievski e tal. Est l no

    livro, bom ao mesmo tempo isso precisa ser matizado, est l a Carolina na capa do Nger,dialogando com o Jos Correia Leite, est l nas memrias, tem uma aproximao e tal, eest dizendo coisas at coisas mais radicais que o associativismo negro de sua poca diriasobre o negro, rasgando verbo, no est falando de democracia racial, sou pobre, sou preta,sou discriminada por tudo isso, meu corpo, a fome sou objeto do lixo de So Paulo , enquantoprograma o estatuto da associao diz lutar por todos os negros, marginalizados, uma coisamuito genrica, eu sou a negra marginalizada ferrada que vocs querem, eu estou dizendo na carado governador que vocs querem chamar para conversar que eu fao parte do quarto de despejo

    da cidade, do lixo da cidade. O Paulo Lins, tem uma negao do projeto de literatura negra,que ele no se v, embora ele dialogue, ele foi convidado para um debate no museu Afro-Brasil,

    estava cheio de militante negro l, africanista, blblbl e ele veio. Ele conversou com a RuthGuimares, conversou com o Osvaldo, com o pessoal dos cadernos, e tambm Paulo Lins noentra em grupo nenhum, tambm no est no pessoal da literatura marginal perifrica, emboraparticipe do primeiro ato da literatura marginal, do Ferrez coisa e tal. Ento acho que tem umdilogo tenso com esses sujeitos isolados, com esses indivduos que no pode ser negadoque tem uma interlocuo e torna a discusso sobre projetos coletivos mais complexas, masso problemas de pesquisa, possvel ter escritor negro, que se afirme como negro, e nofaa literatura negra? , Paulo Lins. Ou Carolina. Ele s no participa do projeto esttico etico da literatura negra. Agora tem um esforo individual, que no s individual, do cara aoescrever estar negando tudo aquilo que lhe foi negado, ele est negando tudo aquilo que me

    foi negado, que , estou afirmando minha capacidade como criador, meu eu como potncia,s que eu venho de um grupo social que antigamente era dito que eu no tinha alma, n?Que tem uma sria de ausncias, de faltas de formao, e eu vou escrever um romance, que algo que exige uma complexidade formativa, que exige tempo, que exige fabulao, e estoufalando na literatura, no estou falando no samba, no candombl, falando isso nos espaos,para usara a expresso da Llia Gonzales, no estou falando nos lugares naturalizados parao negro, estou falando em um terreno em que o negro no mximo personagem, personagemmal descrito, estereotipado, mal visto e tudo mais. Estou falando como autor. Ento tem umaafirmao do eu, da potncia do criador, da potncia do escritor, de negar tudo aquilo, paraele como individuo, que negado para ele sua famlia, seu coletivo, negado j de partida.Ento se afirma algo positivo. nesse sentido que eu penso.

    Dener Santos Silveira: Queria fazer uma pergunta sobre o tema a partir de uma fala sua:Pode o favelado falar? Essa uma questo, porque aqui agora e em alguns momentos a expor

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    essa questo, que me parece ser uma questo de fundo do inslito. Ai no teria como no fazeruma relao, trazendo para algumas perspectivas e debates tericos que a gente utiliza emSo Carlos, Pode o subalterno Falar? da Spivak. Outro autor partindo da noo de excntrico,como classificao do uso da msica negra no mundo, qual a relao que podemos fazer?Pois o Gilroy usa a ideia de excntrico para falar sobre a msica, voc trabalha com a ideiado inslito para a literatura, e a Spivak com o Pode o Subalterno Falar?qual a relao comessas abordagens? esse mesmo processo que voc utiliza?, vai na mesma linha, possvelfazer essa relao?

    Mario Augusto Medeiros da Silva:Nossa senhora, risos.....quero deixar bem claro queno paguei jab para os caras de So Carlos risos....vocs querem me sacanear risos....p!ms passado o Deivison defende uma tese uma tese sobre Fanon e entre os interpretes doFanon no Brasil est o Antonio Srgio, eu! Agora vem o outro e diz Paul Gilroy, Spivak, MrioMedeiros, Risos...Vocs esto loucos? Que que isso? Risos.... registra a que eu no estoupagando jab para a equipe do Valter Silvrio. Agora falando srio, cara, eu s fui ler a Spivak

    depois que terminei o doutorado, no brincadeira, o Gilroy eu havia lido, O Atlntico Negro,agora as minhas referncias, uma coisa precisa ficar clara, as referncias que eu tenho parafazer o doutorado, so referncias bastante clssicas, assim, eu trabalhei com a Hlide, quetem uma perspectiva mais clssica sobre o pensamento social brasileiro, eu fui ler coisas

    sobre poscolonialismo, mais clssicas com ela ou por fora, ento minhas referncias de

    poscolonialismo, so Fanon, Csaire, albert Memmi, so coisas que eu vou ler aqui no IFCHou vou ler na literatura, no IEL com o Marcio Seligman Silva, enfim, no tinha chegado paramim ainda a Spivak, mesmo que fosse um texto da dcada de 1980, no tinha lido, agorao Gilroy eu li, tinha lido Gilroy e mais ainda, tinha me impactado mais ainda a Bell Hooks,especialmente o debate sobre os intelectuais negros, especialmente o debate que ela trava

    e depois vai produzir com...O Dilema do intelectual negro.... Cornell West, o debate CornellWest-Bell Hooks as proposies dos dois, isso tinha me impactado mais, no momento que euestou escrevendo a tese, assim tambm com o Du Bois, que algum que me impacta muito,que onde tambm o Gilroy vai beber, a dupla conscincia e tal...o dilema, a ciso do intelectualnegro a dupla conscincia, uma fonte para o Gilroy, putz.... Risos... uma fonte para o Gilroye uma fonte para mim, risos....risos o cara me pegou, sacanagem...risos...se for para falarem termos de influncia ps-coloniais, influencias leituras ps-coloniais, tem uma coisa maisdos primrdios, muito mais clssica, no o Fanon do Peles Negras, mas do Os Condenadosda Terra, esse, eu brinco com o Josu Pereira, eu e o Josu que o meu Fanon o do PelesNegras como voc um Negro mais acirrado o seu do Os Condenados da Terra, risos...

    isso mesmo... eu adoro...risos...

    Jos Ricardo Marques dos Santos, Dener Silveira, Erik Borba: Risos...

    Dener Santos Silveira: Cada um com seus fanonismos...Risos...

    Mario Augusto Medeiros da Silva:Risos... o Meu Fanon o do Os condenados da terraou o Em defesa da Revoluo Africana, mas enfim, ento mais os Condenados da Terra.Ento: Fanon, Cesaire, Memmi, sim. Do ngulo do poscolonialismo, Desses trs mais Fanon,que mergulhei mais, at mesmo porque, em funo dos Cadernos Negros, em funo da ACN,dessa aproximao da dcada de 1950 e 1960, e dos Cadernos Negros que tem l o MrcioBarbosa, que leitor de fanon, e que vai fazer uma discusso em certo momento sobre literaturanegra, sobre e a partir de Fanon, ele tem l o texto aspectos da literatura negra, ou influxosfanonianos, alguma coisa assim, que me levou a ler Fanon, acho que fui ler Fanon em funo

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    do Marcio, ou j tinha lido com o Marcio Seligman Silva e voltei a ler e fiquei mais impactadoa partir do Marcio Barbosa o Os Condenados da Terra e o Em defesa da Revoluo Africana.

    Dener Santos Silveira: mais ps-colonial do que parece...risos...

    Mario Augusto Medeiros da Silva:agora a Spivak, eu fui ler depois...

    Erik Borba: O debate ps-colonial mais anglfono...

    Mario Augusto Medeiros da Silva:... eu confesso que no gostei, ai, essa coisa, a Spivak,eu gostos do indianos, eu gosto do Gurrar, gosto do Chakrabarti, as vezes me da impresso,gosto do Said, que tambm algum que eu li mas no incorporo, tinha lido via literatura.

    Dener Santos Silveira: Essa coisa do Pode o subalterno falar, em muitas vezes que lhe vifalar voc comenta sobre, diz pode o favelado falar? por isso me vem essa questo.

    Mario Augusto Medeiros da Silva:Mas isso em funo de uma empiria.

    Dener Santos Silveira: Eu havia pensado no Du Bois, mas pensei, muito semelhante aoGilroy Risos....

    Mario Augusto Medeiros da Silva:Naao... mais em funo de uma empiria do queum fluxo terico, eu estou falando de pode o favelado falar?, porque voc pega as matriasdos jornais contemporneos, quando sai Capo Pecado, Quarto de despejo, Cidade de Deuse a pergunta do jornalista : Ela mora no Canind, pobre preta favelada, trs filhos de paisdiferentes, fala sobre tudo da vida menos sobre a literatura e termina ser que foi ela mesmaque escreveu?, Ser que algum escreveu por ela? Ai, 37 anos depois: o cara vem l deCidade de Deus, flagelado preto bl, no importa se ele fez letras na UFRJ, no importa se eleera apadrinhado pelo Roberto Schwarz, no importa. O cara preto, favelado.... e Como que ele escreve Cidade de Deus? . Ento pensei pera ai: esses caras esto perguntando se opreto, pobre, favelado, ferrado, condenado da terra, risos...pode falar, se ele pode escrever seele pode ser um romancista. A mesma coisa com Ferrez com Capo Pecado. Basicamenteuma empiria, eu no tinha lido, de verdade, juro, no tinha lido Pode o Subalterno Falar, odebate inclusive ps-coloniais indianos, ou os ps-coloniais indianos que depois vo circular

    pela Europa, Estados unidos, Gurrar, Chakrabarti, ou Spivak, eu vou ler depois que eu terminoo doutoramento. Quem eu tinha lido mesmo com interesse a trade clssica, Cesire, Fanon,Memmi, Said O Orientalismo, mas que eu no incorporo. Basicamente isso, e o Gilroy eutinha comprado o Atlntico Negro, em certo momento da tese, que me chamou a ateno,p, o Altantico Negro, alis eu tinha duas amigas que haviam participado daquele curso deformao na Bahia, a Janaina Damasceno que minha contempornea aqui, minha colegade graduao, e a Daniela Rosa, que era orientanda da Hlide, que fez a tese/dissertao demestrado sobre o teatro experimental do Negro, as duas foram para o curso de formao, asduas foram no curso l, e as duas foram quando o Gilroy estava aqui no Brasil. Eu no lembromais que isso. Ele veio para o curso do Livio Sansone. Vocs tm como recuperar isso.

    Dener Santos Silveira: Foi em 1998

    Mario Augusto Medeiros da Silva:no, dois mil e pouco.

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    Dener Santos Silveira: Foi 2001 que saiu o livro? ele at comenta de quando ele estavaaqui. No prefacio a edio brasileira.

    Erik Borba: Vem o Valter Minholo.

    Mario Augusto Medeiros da Silva:Nooo, no, no, ele j havia vindo ao Brasil e ele vemespecificamente para o curso do Livio Sansone. Enfim, como chama o tal do curso? As duasparticiparam disso, eu me lembro que a gente tinha que ler o livro alucinadamente para poderfazer pergunta. P, que histria essa de Atlntico Negro? .... O livro do cara foda!...Porque? porque est falando sobre Du Bois, est falando de dupla conscincia, Richard Wright,eu tinha lido Richard Writht, eu tinha lido O Filho Nativo. P, tem um cara que fala do Filhonativo. Foi um romance que me impactou.

    Dener Santos Silveira:O cara l o que os caras leram...risos....

    Mario Augusto Medeiros da Silva:Nooo, foi um romance que me impactou, foi umromance que eu fiquei muito muito muito.... cara a voc vai comeando a viajar...por que eufui ler o Richard Wright? Eu tive aqui um grande amigo, que era funcionrio da UNICAMP, quea gente falava muito de Literatura Mrio Martins Machado de lima ele era o porteiro ... eugosto muito de ler um escritor negro estadunidense de romance policial contemporneo doRichard Wright chamado Chester Himes, no sei se vocs j ouviram falar, Chester Himes,conheci por conta do meu irmo, um dia me d um livro chamado Um Homem em Fuga, ahistria de um homem em fuga que est sofrendo opresso policial, bom, na dcada de 1950,um romance policial de um romancista negro, ai fui procurar, Chester Himes a muito traduzidona dcada de 1980 pela editora brasiliense, vai aparecer A Travessura de Casper Holmes vai

    aparecer o Harlem escuro, so todos romances policiais mas traduzido desde a dcadade 1960. Ai um belo de um dia, eu estou conversando com o Mario, acabei de ler um livro quevai ser interessante para voc, voc gosta de escritor negro, gosta de jazz literatura negra... eleme deu um trabalho chamado A margem Esquerda, empresta o livro, deixa ver se eu consigoachar o autor, que basicamente sobre os prias do mundo que vo se encontrar em Paris,no ps-guerra, prias do mundo ...italiano escocs, polons, um bando de intelectual que vaiver Paris como um lugar que possvel ser gente, grande parte desses prias, grande parte dolivro sobre intelectuais negros estadunidenses que se auto exilam no ps-guerra, para ficarem Paris para ficar com o grupo existencialista do Jean-Paul Sartre da Simone de Beauvoire Boris Vian, no gratuito que aqui no livro5, de um historiador, quem so esses negros?Bom, passado a guerra, ex-combatentes, guerrearam na Europa voltaram para os EstadosUnidos e continuaram a sobre discriminao da pesada, e alguns intelectuais negros se exilam,quem se exila? Ou quem tem uma passagem por Paris? Miles Daves, Chester Himes, RichardWright, James Baldwin, enfim, uma intelectualidade negra de primeira linha. E o Mrio disseVoc no gosta de existencialismo? No gosta do Sartre?,, p, adoro Sartre Sartre leitorde Fanon ah, voc no gosta de jazz? esse cara aqui est chamado Boris Vian, que adoravajazz, que adorava literatura negra estadunidense, que vai copiar o romance policial negro violento

    da sua poca vai copiar o Chester Himes e Richard Wright, eu tinha acabado de ler o RichardWright, eu havia comentado com o Mrio, Filho Nativo um romance do caralho.. que no sei

    o que...blblble ele me passa. Bom, foi por isso que eu li o Wright, fiquei impactado tal....ai quando as meninas foram para o curso de formao na Bahia elas voltam e dizem: temuma cara, Gilroy, britnico que est falando sobre Dispora, articulao internacional, dupla

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    conscincia, o intelectual negro, est falando de Richard Wright, putz o cara est falando sobretudo isso e ainda est falando de Richard Wright? Ok. Vou ler. Adorei, a discusso do AtlnticoNegro e especialmente o debate sobre a dupla conscincia, ai falei, mas a dupla conscinciaeu j tinha lido sobre isso no Du Bois As Almas da Gente Negra taltaltal, o primeiro capitulo sobre o Douglas n? O segundo captulo...enfim um especificamente sobre o Du Bois, e oterceiro ou quarto captulo especifico sobre o Richard Wright, tinha lido o Gilroy e a discussosobre o que o intelectuais negro uma a discusso que estava pegando na poca porque erauma conversa que eu tinha com a Hlide, dizia Hlide...eu preciso de um especialista sobreintelectuais.....

    Erik Borba: James Campbell

    Mario Augusto Medeiros da Silva:James Campbell, esse livro belssimo. Belssimo mesmo,basicamente sobre o exilio dos intelectuais negros no ps-guerra em Paris em contato com osexistencialistas do grupo sartriano, eles encaram a possibilidade de ser gente, falado isso.

    E especialmente os embates que vo ter, o debate entre Richard Wright e James Baldwin que basicamente sobre o que ser um intelectual negro, Wright estava ainda muito prximo dopartido comunista estava se desligando como acontece no Filho Nativo, as crticas ao partidocomunista americano, que no encara a questo racial para valer. Mas ele diz , escritor,intelectual negro tem que ter um projeto uma postura, etc.. ele tem que falar sobre coisasespecificas do mundo negro, o James Baldwin um negro intelectual que est fazendo umaliteratura negra defensor dos direitos civil com temtica homoafetiva, homoertica, homossexualem seus trabalhos e cria uma ciso ai, um debate muito interessante. Mas voltando, o que meinteressava para valer no Gilroy, o que me interessava para valer no Du bois e que me interessavatentar apreender o debate, depois vai me aparecer de maneira mais clara na conversa West e

    Bell Hooks, o que intelectual negro? O que que isso? Porque a Hlide me respondia o que o intelectual com a perspectiva clssica o debate clssico, Mannheim, Gramsci, Sartre, que importante, que onde alguns desses autores vo beber da fonte inclusive. Gramsci vai darpara os subalternos, Sartre vai dar para Fanon, etc. Mannheim vai organizar o debate sobreintelligentsia. Mas falei, bom mas tem uma especificidade no intelectual negro? Quem falasobre isso? Isso est no Du Bois, dupla conscincia, a ciso, isso est no Gilroy, as experinciasde ser um intelectual negro, isso est na Bell Hooks e Cornell West isso est na experinciaconcreta de debate de intelectuais negros Wright/Baldwin, isso est no Fanon, Racismo eCultura, as tarefas do intelectual no contexto ps-colonial.

    Erik Borba: Sobre a Questo Nacional

    Mario Augusto Medeiros da Silva:Esse texto do Fanon... uma coisa brilhante, brilhanteque eu tambm acho subaproveitado, sobre a questo nacional e ali tem um de bate sobrequal a tarefa do intelectual colonizado ps-colonial, qual a tarefa do homem de cultura,como que voc inventa de fato o homem novo, essas so minhas leituras de uma discussops-colonial mais clssica, o que me incomodava na Spivak e eu achava uma coisa muito alDerrida .... que foi o orientador dela... coisa chata! Risos...

    Jos Ricardo Marques dos Santos/Dener Silveira/Erik Borba: Risos...

    Mario Augusto Medeiros da Silva: Coisa chata de desconstrucionismo, que eu no

    entendia muito bem, em termos de projeto poltico que isso d exatamente? Por que essescaras aqui esto brigando para se afirmar como humanos, ento voc esta me dizendo que

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    tem desconstruir tudo isso? de repente, isso no me dizia nada, posteriormente no me dizernada tambm, at hoje no me diz muita coisa, dos Subalternos, do grupo dos Subalternos,que eu li depois de fechada a tese, o Chakrabarti me diz muito mais, o Gurrar me diz muitomais, um projeto enquanto intelectual, tal... os subalternos latino americanos eu fui ler depoisainda, Minholo, Kirrano, ento no uma leitura contempornea da tese, vai ser uma leituracontempornea do momento ps tese e como professor da UNICAMP como projeto de pesquisade leitura tal..... Minhas referncias so outras.

    Erik Borba: Durante o Curso da entrevista uma coisa que saltou, para poder caminhar parao fim da entrevista, sobre o que voc chama no livro de sociologia das lacunas, me parece quedurante a entrevista voc dava sinais dessa sociologia da lacuna, queria que voc falasse maissobre isso, sobre o que voc entende por isso. Ao mesmo tempo, so duas perguntas em uma,a segunda mais complicada, se voc v a possibilidade de ver essa sociologia das lacunas comos ingressos dos estudantes negros nas universidades brasileiras e se existe sinais de mudanada sociologia, mudana na agenda da sociologia brasileira para a sociologia das lacunas, ao

    olhar esses processos tericos, intelectuais e sociais a partir das margens.

    Mario Augusto Medeiros da Silva:Olha a ideia de lacuna, ela j deu muito pano paramanga e muita briga, no exatamente na poca do doutorado mas depois que o livro saiu, euparticipei de um debate, quem uma cara disse eu odeio essa ideia de ausncia de lacuna, quesempre falta alguma coisa, e no tem nada demais nisso. Bom, no bem assim n, a histriaaqui outra. A lacuna uma produo social, isso eu no tenho a menor dvida, quandoa gente est dizendo, perguntando por que pouco se fez a pergunta a contrapelo: Qual o

    interesse dos intelectuais negros em participar na pesquisa UNESCO? Durante muito tempoesses caras estiveram vivos bastava ir l e perguntar, a gente tem uma problema muito srio de

    fontes, para pesquisa sobre o negro curiosamente no sculo XX, XIX e XX cada vez mais estouconvencido que a histria, a histria social vem fazendo um trabalho fantstico, de, emborano apresente recorrncias mas especificidades mas que coisas existem, que no estranhoencontrar grupos de solidariedade negra, no Rio de Janeiro, de homens livres, libertos, como que Paula Brito possvel? Como que o Machado de Assis possvel? Como possveluma imprensa negra ainda no sculo XIX? o que vem disso, o que sobre disso?um exemplarde jornal, uma folha, um nome perdido, porque a gente perde tanta informao quando setrata do grupo negro? essa a parte da questo da lacuna, porque tem tanta falta? Por que to difcil fazer pesquisa? Por que falta tanta entrevista? Salvo a entrevista do Jos CorreiaLeite quantas outras mais quantas entrevistas mais, quantas entrevistas de folego, de longa

    durao com intelectual negro, no sculo XX, publicada tem em livro? e teve um monte, o Abdiasganha duma ou duas biografias s depois de morto, ou muito perto do fim da vida, CorreiaLeite ganha a sua biografia entre aspas perto do fim da vida, ele no viu o livro publicado, salvoengano, morreu em 1989 e o livro de 1992, a imprensa negra voc tem fragmentos aqui acol,blblbl, tem uma construo social da lacuna, para colocar o dedo na ferida mesmo, umaconstruo social que feita por pesquisador, que some com material de pesquisa, que nofaz entrevista quando possvel, ah mas tem uma dificuldade no meio tcnico. Ok, respeito,tem uma dificuldade, no tem gravador digital, no tem gravador de fita k-7, mas voc podetranscrever, da um trampo estenografa, a prpria pesquisa do Florestan ele fala, no prefcio,pedi para fazer taquigrafia das sees e se perderam no sei quantas, se perderam mais dametade da conversa taquigrafada, estenografada, como assim!? No possvel que o pretode tanto azar nesse mundo! Risos...

    Jos Ricardo Marques dos Santos/Dener Silveira/Erik Borba: Risos...

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    Mario Augusto Medeiros da Silva:Srio mesmo!!?? Risos...Ai o que me levou a pensarnessa ideia de lacuna, alm dessas dificuldades, de efetivamente dar conta de trajetria deexistncia, blblbl... Eu estou estudando literatura negra, no de hoje que o negro aparecena literatura como personagem. Mas tambm no de hoje que o negro aparece na literaturabrasileira como autor. Ento vamos fazer um exerccio, est cheio de dicionrio sobre histriada literatura brasileira, existem alguns dicionrios da literatura brasileira, vamos ver comoo negro aparece, se tem um verbete sobre QuilomboHoje, Marcio Barbosa, Cuti, Paulo Lins,os caras que eu estudo. Fui at o IEL, at a biblioteca Mrio de Andrade, pego dicionrio deliteratura brasileira, procuro o verbete literatura negra, no tem. No tem!

    Erik Borba:Ai comea a procurar os autores.

    Mario Augusto Medeiros da Silva:T bom, no consensual a ideia de literatura negra,dos dicionrios mais recentes de 2001, vamos pegar os autores, eu comecei com um dicionriode 1954, o que que j existia em 1954? eu tinha feito uma tabela com desde 1900, de autores

    auto referenciados negros que tinham publicado obras no Brasil, desde 1900, com base nolevantamento do Bastide, do levantamento de Zil Bern, uma galera que j havia trabalhadocom a ideia de literatura negra ou negros na literatura brasileira, eu havia feito uma tabela detrs quatro pginas desde 1900, peguei um dicionrio de 1954, quem j tinha publicado? LinoGuedes, um exemplo raro de escritor negro, auto referenciado negro, que fala como autor negro,que diz que est fazendo uma poesia negra, que escreve um livro em 1927 chamado O cantodo Cisne Preto, que era amigo do Mrio de Andrade. Enfim, O canto do Cisne Preto, o outrolivro se chama Black, mais preto que isso no sei, Risos... O canto do Cisne Preto 1927, estoupegando um dicionrio de 1954, aparece pontualmente uma ou duas linhas no dicionrio. RuthGuimares, havia publicado o romance gua Funda Romance de 1946, no dicionrio de 1954

    ela aparece? Pontualmente, muito pontualmente. Bom, t, vai caminhando... dicionrio de1968 ou 1969, coisa assim. Quem que havia publicado no dicionrio de 1968/69? Osvaldode Camargo, Carlos Assuno j havia publicado, Carolina Maria de Jesus j tinha publicado.Bom, ento t, Carlos Assumpo tinha feito O Protesto....tudo bem... menos conhecido novou dar tanta importncia assim, no estava publicado, mas o Osvaldo j tinha feito 15 poemasnegros, ah mas foi uma publicao da Associao Cultural do Negro, uma coisa endgena tal...a Carolina Maria de Jesus tinha lanando 1960 Quarto de despejo, trs idiomas, best seller,bombou, encheram a burra de dinheiro com o trabalho dela, todo mundo comentou. Ento temque estar no dicionrio de 1968 e 1969. Em um est, mas como que ela est? Mulher, preta,favelada, me solteira de trs filhos, andou flertando com um chileno...Fala sobre tudo menos

    sobre literatura velho! Est l! No outro aparece uma linha.

    Erik Borba:Para no falar dos erros biogrficos.

    Mario Augusto Medeiros da Silva:Para no chegar nisso, mas vou chegar...vamos l!Dicionrio anos 1980, 1990, 2000. Quem que j publicou em 2001 no ultimo dicionrio?

    Nos anos 1980 j tinha os Cadernos Negros, ano 2000 j tinha Paulo Lins em 1997, e umconjunto de escritores e autores ta...as informaes quando aparecem so telegrficas, nofazem meno a projetos coletivos, que supostamente esses autores teriam participado,

    projetos de literatura negra, quer dizer que no existe literatura negra no Brasil, Lino Guedesest tranquilo, masnehuma meno, Osvaldo Camargo que diz que faz literatura negra quepertence a Associao Cultural do Negro, quando aparece informao nada disso afirmadosobre ele, as informaes so ruins, as informaes sobre as histrias de vida desses carasso pssimas! O que que me importa saber se ela estava pegando um cara no Chile ou no?

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    Se ela a autora de Quarto de Despejo, no me diz nada! Alis nem sei se d para comprovarse ela estava pegando um chileno, no me interessa nada saber se ela esta pegando o chilenoou no, me interessa saber de Quarto de Despejo, Casa de Alvenaria, que que isso! umdicionrio de literatura no Contigo Tititi, as informaes so desencontradas. Quandoencontra o nome do cara voc encontra com erro de data, erro de local de nascimento, erro depublicao, ento no d para dizer que no existe uma produo social da lacuna, quandoaparece se produz socialmente o erro! ah mas muita gente para ser preciso, mas voc

    preciso com o outro!

    Mario Augusto Medeiros da Silva:Basicamente o negcio o seguinte aqui. Memria poder. Se eu estou falando que existe uma produo da lacuna, significa existe a produo eausncia de memoria, logo existe uma retirada de poder do grupo social negro. Memria poder,e os grupos sociais dominantes sempre tiveram muito claro, a memria da classe dominante poder, as ideias da classe dominante, as ideias dominantes da sociedade so as ideias da classedominante na sociedade. Isso no sou quem diz mas o velho barbudo na Ideologia Alem, os

    dois barbudos na Ideologia Alem, as ideias dominantes de uma determinada poca so asideias dominantes da classe classe dominante de sua poca. Memria poder, poder, no tema menor dvida, isso est na leitura do Gramsci, na histria social dos grupos subalternos, setem uma coisa que os grupos subalternos tem que fazer... isso uma coisa que a Elide6sempreme alertava vai ler Gramsci, Risos...eu falava: mas no d tempo!, Vai ler Gramsci Risos...coisa de orientadora e orientando n...Risos... Vai ler Gramsci, eu tenho os cadernos do Crcereem italiano, o Carlos Nelson Coutinho fez uma publicao, j perdi em qual caderno que est, se

    vira. Est l caderno 25, da nova edio, O Risorgimento, A margem da histria: histria socialdos grupos subalternos, Gramsci est falando claramente: por que os subalternos so sempreperdedores? Porque eles no tem memria, porque eles so privados da memria, e por que

    o subalterno precisa o tempo todo ritualizar sua memria? Para construir um projeto polticocom isso. Logo a ideia de lacuna tambm uma discusso sobre a ritualizao da memria, senomes de referncia, dicionrio voc no tem a presena do negro ou tem ela precarizada outem ela toda mutilada, a memria desse grupo inexistente, e vai sempre soar como estranhoquando surge um preto na cena pblica, na cena poltica, na cena literria, Oh raio em cuazul, no tem raio em cu azul, tem uma histria de longa durao em que esses caras vemaparecendo, e de repente voc tem um cara que se projeta mais que o outro, mas para chegarem Paulo Lins, uma Carolina de Jesus em termos de presena negra na literatura, voc tem quevoltar para o sculo XVIII e XIX, que j tem l um Domingos Calda Barbosa, sculo XVIII paraisso que serve as antologias de literatura negra, para mostrar uma ritualizao do processo dememria sobre a presena do negro como autor na literatura brasileira, e de uma histria deuma literatura negra, para isso que o Osvaldo de Camargovai fazer a antologia da literaturanegra brasileira, para isso que Paulo Colinavai fazer o Ax, enfim os intelectuais negrose no negros vo fazer um repertorio de existncia da sua presena na histria da literaturabrasileira, porque memria poder, e chega dessa histria de raio em cu azul, de inslito!Antes do Paulo Lins tem uma cadeia longa durao de autores podem no ter tido a mesmaprojeo que o Paulo Lins, que podem ser inferiores a ele enquanto realizao esttica, masest cheio de autor branco ruim, e por que eles esto presentes no dicionrio? Est cheio deautor no negro, branco, menor, e tem mas tem seu nome l bonitinho, o que escreveu, data de

    nascimento etc... est l! Dicionarista no tem que ficar fazendo opo esttica, se melhorou pior, bom ou ruim.

    Jos Ricardo Marques dos Santos: Ou fazer s de um lado.

    6 Elide Rugai Bastos, Professora do departamento de Sociologia da UNICAMP.

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    Mario Augusto Medeiros da Silva:E fazer s de um lado, e para sacanear peguei umaintroduo que o Antonio Candido faz para um desses dicionrios em que ele diz que aqueleestudante de literatura brasileira que for fazer estudo sobre histria literatura e precisar de umdicionrio e est ferrado, eu concordo com o Candido. O cara que for fazer histria da literaturanegra brasileira est mais ferrado ainda! Est mais lascado ainda. Porque ruim, pssimo otrabalho. Ento na poca o que voc tinha de dicionrio bacana, voc tinha do Ney Lopes, que um esforo interessantssimo, as antologias que haviam sido feitas por gente como a Zilh Berndque pesquisadora de literatura brasileira, negra brasileira, Osvaldo de Camargo com Negroescrito, Osvaldo de Camargo com a Razo da Chama: antologia, o Paulo Colina com Ax,o Quilomboje que faz uma ritualizao dessa memria, e estava ali o projeto, estava na bocado leo, o projeto do Eduardo Assis Duarte, que o Gran projeto, o grande projeto pra valer deuma antologia crtica da literatura negra brasileira, que o cara pega do comeo do sculo XVIII,Caldas Barbosa, Maria Firmina dos Reis no sculo XIX e vem chegar nos escritores marginaisdos anos dois mil do sculo XXI, ento, em termos de dicionrio, repertoriar essa memria,de ritualizar, de no produzir a lacuna, so esses caras que fizeram um trabalho decente, os

    antologistas, negros e no negros, Ney Lopes e o Eduardo de Assis Duarte, ponto. Agora alacuna, ela tambm um problema do ngulo das fontes, a gente comeou a entrevista falandosobre a ideia de concretude, ah porque o cara foi para o congresso dos escritores negros, quem esse cara? Foi como? Dialogou com quem? Trouxe o que? Eu no sei nada disso. muitodifcil auferir, isso lacuna, e a lacuna produzida pelos prprios grupos negros, isso precisaser dito, que tambm no produzem a sua memria, tem dificuldade de produzir a sua memria.Em agosto eu estava em um seminrio da USP, com... que eu conheci finalmente a MirianFerrara, Miriam Nicolau Ferrara, sobre imprensa negra no estado de So Paulo. P! E a mulherfaz o trabalho entre 1915 e 1963, ela conta como ela conseguiu os jornais da imprensa negra eque depois ela e o Clvis Moura vo doar para microfilmar na biblioteca Mrio de Andrade e vai

    virar esse trabalho aqui, tem o livrinho da Mirian Ferrara sobre a imprensa negra no estado deSo Paulo, que ela faz com a dissertao de mestrado, com o Joo Batista Pereira, n, que sainum livro pequeno na USP, eu achei que a mulher tinha morrido, mas no, est a, viva e firme eforte, e branca, e na dcada de 1980, final da dcada de 1970 e comeo de 1980 ela vai fazeruma dissertao de mestrado continuando o trabalho do Bastide, que para, comea, em 1915e vai at 1940, ela faz at 1963. Ela conta nesse evento, que a Flavia Rios, Ana Barone, estavaorganizando, Territrios Negros nas cidades Paulistas, em um momento foi a exposio sobre aimprensa negra, que virou uma exposio permanente on-line. Como que ela chegou na casado cara? Em gente como o Jaime de Aguiar, o Jos Correia Leite, Raul Joviano do Amaral, echegou nas casas dos caras e eles tinham os jornais da imprensa negra mofando, se perdendo,

    porque ningum se interessava, vendendo esses jornais a peso para ferro velho, a famlia noestava nem ai, a famlia dos caras no estava nem ai... Ou seja, onde est o arquivo da FrenteNegra Brasileira? A gente est falando do primeiro projeto poltico, de partido poltico do negrono Brasil sculo XX, entre 1931 e 1937, cad o arquivo da Frente Negra Brasileira? Ficou coma famlia de algum? Talvez, com a famlia do Lucrcio, dos Veiga dos Santos? Mas o arquivoinstitucional, hum... cad? J cansei de perguntar para o Valter como que o arquivo da ACNchegou na UFSCar? Ningum me responde isso direito, ele me diz que talvez tenha sido peloEduardo de Oliveira e Oliveira, santo Eduardo de Oliveira e Oliveira! Porque seno seria maisuma associao negra que teria seu arquivo indo para o buraco, pense na srie de coletivosnegros, experincias intelectuais negros no sculo XX, estou falando de sculo XX! Cujos osarquivos a gente no sabe, tem uma responsabilidade do grupo social negros, dos intelectuaisnegros da famlia do intelectual negro, dos continuadores dessas experincias coletivas negrasde no ritualizar sua memria, porque que o Cuti vai fazer o livro sobre o Jos Correia Leite?Porque um dos poucos caras interessados em memria no grupo negro. Da gerao ps 1978.

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    O que o Cuti faz? Ele pega um gravador, uma mquina de escrever, bate na casa do seu JosCorreia Leite, que estava louco para falar, velhinho, posso gravar?, Pode. 900 laudas, dtrabalho? Trabalho do co, mas graas a esse trabalho temos a histria do associativismonegro de 1920 a 1964 riqussimo, h uma irresponsabilidade dos intelectuais negros para coma sua ritualizao da memria, ento eles produzem socialmente lacuna, coisa que o Abdiasdo Nascimento tinha sacado muito bem quando ele tinha publicado Drama para Negros

    Prlogos para Brancos ou quando ele publica Teatro experimental do Negro: Testemunhos.Em Drama para Negros Prlogos para Brancos ele diz eu criei o teatro experimental do negro1944 peas para negros, ou com atores negros, ou com autores brancos aliados como Nelson

    Rodrigues, Boal, com atores negros, diretores negros, com companhia... se eu no documentar

    essas peas, se eu no documentar que isso existiu, se eu no tirar fotos, quem que vai saber

    do Teatro Experimental do Negro?E ele publica pela editora do TEN. A, o negcio existiu e tevecrtica, vou pegar todas essas crticas e reunir em um livro, Teatro experimental do Negro,dois pontos, Testemunhos, sem isso a gente no teria, a gente saberia como ler as peas queforam feitas para o Teatro Experimental do Negro primeira experincia no sculo XX de um

    tetro de negros para negros no palco municipal do Tetro Municipal do Rio de Janeiro, o caratem a saca de produzir memria, porque memria poder. Mesmo que os livros se espalhem,que fiquem raros, e hoje rarssimo encontrar Drama para Negros Prlogos para Brancos,mas est em biblioteca, fomenta a produo do teatro do Olodum, fomenta Os Crespos emSo Paulo. Os Crespos dizem: ns nos baseamos na experincia do TEN, mas como eles sebaseiam na experincia do TEN se eles no viram uma pea do TEN ser encenadas? Eles vol e leem o livro, leem a pea. P! Anjo Negro, a pea revolucionria da histria do teatrobrasileiro, est l, foi feita para o TEN. Cacilda Becker, Abdias do Nascimento, contracenandoem cena, tem uma foto dos dois ali, dando uma bicotinha, pois , memria poder... existeuma produo social da lacuna? Sim! Do grupo negro, ah mas como que vai guardar isso em

    casa, a familia enche... voc s .... s perdeu tempo com isso, no estava aqui comigo, com seusfilhos, vai ficar esse lixo ai?.. verdade, mas as geraes mais novas, mas tambm se vocno faz isso, no ritualizar a memria parece que voc est inventando a roda o tempo todo.Essa frase eu acho o mximo, ela mgica, porque perde o processo social, perde a histria,ai como sempre me disse a Hlide: as ideias parecem que surgem como cogumelos, porqueento houve um ressurgimento do movimento negro em 1978, surgiu da onde? brotou do chocomo cogumelo? Ento fez-se Hamilton Cardoso? Fez-se Llia Gonzales, Fez-se Abdias doNascimento no municipal! Fez-se Milton Barbosa, assim? magico? Fizeram-se os cadernosnegros? E tudo que veio antes, no serviu para nada? to novo assim? Memria poder.Lacuna disputa de poder Vocs me perguntam se Lacuna uma agenda de pesquisa? Acho

    que uma tremenda agenda de pesquisa para se enfrentar.

    Erik Borba: E voc acha que isso tem sido aos poucos, se direcionado?

    Mario Augusto Medeiros da Silva:Acho que no s eu, para mim isso um projeto

    intelectual, agora estuo estudando a Associao Cultural do Negro de maneira mais aprofundada,mas eu tenho visto outros pesquisadores que tem feito trabalhos que no esto dialogandocom a ideia de lacuna mas que partem do mesmo principio que eu, a Ana Flavia MagalhaesPinto com trabalho sobre a imprensa negra no sculo XIX demostrando que a gente a seguiua marcao clssica do Bastide, de que a imprensa negra comea em 1915, a Ana Flvia vemmostrando com um jornal que j em 1889 j havia um jornal negro na cidade de So Paulo,que a imprensa negra nasce ali em 1880 antes da abolio. Ou a tese de Doutorado dela agorasobre redes de solidariedade de negros no Rio de Janeiro no sculo XIX, o trabalho da JanainaDamasceno sobre a Virginia Bicudo. Eu me lembro, claramente, a Janaina era chata, lembro

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    claramente um dia que a gente estava na USP, j contei essa histria em pblico, ela tambm,uma roda de estudantes negros, no saguo da faculdade de filosofia, da histria, todo mundoali fazendo suas teses, estou estudando isso, aquilo, e a Janaina ali s ouvindo... Hum, querdizer que todo mundo aqui pesquisador da questo racial, voc j leu Virginia Bicudo?, quem?,Virginia Bicudo, voc j ouviu falar dela?... No... de Comer?... s a primeira mulhere a primeira pesquisa sobre relaes raciais no Brasil, ou seja, de onde voc est partindo,1945... Por que voc no leu?... ah, porque meu orientador no passou... ah, que bonito,quer dizer que se seu orientar no passar, que beleza de pesquisador voc , no ? Todo

    mundo, ficou uma coisa constrangedora, e tal, mas acho que um trabalho a tese dela sobrea Virginia, um trabalho que luta contra a lacuna o tempo todo, sobre a produo da lacuna otempo todo. Os trabalhos sobre o ps-abolio, do Petrnio, Flvio Gomes, acho que vai nessadireo tambm. A moada aqui do CECULT, Sidney Challub, Robert Slins, uma galera queluta contra a lacuna, sem usar essa histria ideia de lacuna, vamos ler as coisas a contrapelo,vamos ver essas experincias, vamos, mesmo que seja um fragmento, vamos cair matandono fragmento para ver o que ele pode formar vamos repensar a histria do pensamento social

    a partir do ngulo do negro? Vamos repensar a histria da sociologia, da sociedade brasileiraa partir desse ngulo do negro? Mesmo que seja um fragmento.