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Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa Universidade Federal da Paraíba 15 a 18 de agosto de 2017 ISSN 2236-1855 5129 A DOCÊNCIA E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO MUNICÍPIO DE GARÇA SP (1940-1996): MEMÓRIAS DA ESCOLA NORMAL AO MAGISTÉRIO Vania Regina Pieretti Julião 1 Mirtes Rose de Andrade Moura Mariani 2 Introdução Esta comunicação apresenta uma síntese e alguns resultados de pesquisa na linha da História da Educação, centrada na História da Formação Docente. O objeto de estudo é a história da docência e da formação de professores para atuar na escola primária, no município de Garça SP, localizada no interior do estado de São Paulo, Brasil. Nesta comunicação apresentamos resultados preliminares e uma síntese do processo de criação e a institucionalização da formação de professores. A coleta de dados e a análise se referem ao início da docência e formação de professores no município de Garça SP. O recorte temporal de 1940 a 1996 se justifica visto a formação de professores no município estudado ter se institucionalizado no final da década de 1940 e, o ano de 1996 pode ser considerado como um marco, pois a partir deste período há uma extinção gradual do curso do Magistério. Para esta comunicação, selecionamos para a apresentação uma das escolas de formação de professores, por ser a primeira a se institucionalizar como tal no município, a atual Escola Estadual Hilmar Machado de Oliveira. As memórias da escola Normal ao Magistério foram coletadas nos Atos Normativos Legais que regulamentaram a formação de professores; documentos internos da Escola Estadual Hilmar Machado de Oliveira como Regimentos, álbum de fotografias, Pasta do Histórico da Escola, Registros de Docentes e Matriz Curricular; Livro de Garça; Jornais e entrevistas com alunos e docentes . 1 Doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação em Educação - História da Educação Faculdade de Filosofia e Ciências FFC Unesp/Marília. E-Mail: <[email protected]>. 2 Mestra em História da Educação Faculdade de Filosofia e Ciências FFC Unesp/Marília. E-Mail: <[email protected]>.

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Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa – Universidade Federal da Paraíba – 15 a 18 de agosto de 2017

ISSN 2236-1855 5129

A DOCÊNCIA E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO MUNICÍPIO DE GARÇA SP (1940-1996): MEMÓRIAS DA ESCOLA NORMAL AO

MAGISTÉRIO

Vania Regina Pieretti Julião1

Mirtes Rose de Andrade Moura Mariani2

Introdução

Esta comunicação apresenta uma síntese e alguns resultados de pesquisa na linha da

História da Educação, centrada na História da Formação Docente.

O objeto de estudo é a história da docência e da formação de professores para atuar na

escola primária, no município de Garça SP, localizada no interior do estado de São Paulo,

Brasil.

Nesta comunicação apresentamos resultados preliminares e uma síntese do processo

de criação e a institucionalização da formação de professores.

A coleta de dados e a análise se referem ao início da docência e formação de professores

no município de Garça SP. O recorte temporal de 1940 a 1996 se justifica visto a formação de

professores no município estudado ter se institucionalizado no final da década de 1940 e, o

ano de 1996 pode ser considerado como um marco, pois a partir deste período há uma

extinção gradual do curso do Magistério.

Para esta comunicação, selecionamos para a apresentação uma das escolas de formação

de professores, por ser a primeira a se institucionalizar como tal no município, a atual Escola

Estadual Hilmar Machado de Oliveira.

As memórias da escola Normal ao Magistério foram coletadas nos Atos Normativos

Legais que regulamentaram a formação de professores; documentos internos da Escola

Estadual Hilmar Machado de Oliveira como Regimentos, álbum de fotografias, Pasta do

Histórico da Escola, Registros de Docentes e Matriz Curricular; Livro de Garça; Jornais e

entrevistas com alunos e docentes .

1 Doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação em Educação - História da Educação – Faculdade de Filosofia e Ciências FFC – Unesp/Marília. E-Mail: <[email protected]>.

2 Mestra em História da Educação – Faculdade de Filosofia e Ciências FFC – Unesp/Marília. E-Mail: <[email protected]>.

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Para tanto, nos pautamos nos conceitos de Documento e Monumento e da História

Oral.

A história oral centra-se nos sujeitos, em suas narrativas das situações vividas, nas

experiências, na história. É uma abordagem metodológica que se alicerça no sujeito, em suas

narrativas sobre situações vividas, em suas experiências e histórias. Nesse sentido, o passado

tem continuidade na atualidade e ainda garante sentido social à vida dos sujeitos depoentes e

leitores que poderão entender a sequência histórica bem como se sentirem parte do contexto

em que vivem (MEIHY, 1996, p.10). Essa abordagem está centrada na memória humana e na

sua capacidade de reviver o passado como testemunho do presenciado e vivido. No entanto,

além da lembrança de uma pessoa, se considera também a sua inserção em um contexto

social ou familiar, o que se leva a uma memória coletiva.

Vale ressaltar que a memória registra e atua no que tem importância, no que é

significativo.

Para Thompson (1992, p.22), a história oral é uma prática social capaz de gerar

mudanças que transformam o conteúdo e a finalidade da história, pois a história oral

modifica o enfoque da própria história e demonstra novos campos de investigação.

Nesse sentido, a história oral como procedimento metodológico, registra e assim dá

continuidade às lembranças e vivências dos sujeitos que compartilham a suas memórias.

As narrativas orais e a escrita são fontes que se completam e, consequentemente os

dados podem ser obtidos por meio de fontes vivas de informações tais como: depoimentos,

biografias, depoimentos pessoais, histórias de vida e entrevistas.

Sobre entrevistas Thompson (1992, p.25) aponta que:

Os historiadores podem escolher exatamente a quem entrevistar e a respeito do que perguntar. A entrevista propiciará, também, um meio de descobrir documentos escritos e fotografias que, de outro modo, não teriam sido localizados.

Assim, na intenção de se conseguir as informações desejadas, se faz necessário ativar a

memória do entrevistado, pois para que fatos adormecidos possam ser revividos, a memória

depende de elementos significativos como um rosto, um nome ou outros ( THOMPSON,

1992, p.152).

Nesta perspectiva, a história oral pode ser utilizada em trabalhos que focam as

trajetórias dos indivíduos, dos grupos, da sociedade e instituições. Portanto, é adequada a

esta pesquisa.

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Para esta comunicação, entrevistamos uma aluna que fez parte da primeira turma de

alunos do município de Garça, A Sra. Madalena Chaves, de 94 anos, um aluno que estudou na

primeira escola oficial o Sr. João Chaves, 95 anos, a filha de um dos alunos da primeira

turma, a Sra, Estela Marina Aparecida Mancini e dois alunos do curso Normal do Colégio

Estadual e Escola Normal Hilmar Machado de Oliveira, professores aposentados da rede

pública estadual, Senhores Mario Baraldi, 85 anos e Sérgio De Stefani, 86 anos.

Para Le Goff (2004) documentos e monumentos fazem parte da memória coletiva e da

sua forma científica que é a história. Os monumentos considerados como herança do passado

e os documentos como escolha do historiador se fundem, e cabe ao historiador a crítica do

documento enquanto monumento:

O documento não é qualquer coisa que fica por conta do passado, é um produto da sociedade que o fabricou segundo as relações de forças que aí detinham o poder. Só a análise do documento enquanto monumento permite à memória coletiva recuperá-lo e ao historiador usá-lo cientificamente, isto é, com pleno conhecimento de Causa. (LE GOF, 2004,p.545)

Mediante o quadro teórico apresentado pautado em Le Gof (2004) escolhemos e

analisamos os documentos citados. Ainda para um melhor entendimento contextualizamos a

história da formação docente nos períodos que antecedem o recorte temporal ora

apresentado para além da história da formação docente no município de Garça SP.

A docência e a formação de professores

A história da formação de professores e a docência se relacionam com a história do

processo educativo bem como com o histórico das instituições. Para Magalhães (2004, p.58):

Conhecer o processo histórico de uma instituição educativa é analisar a genealogia da sua materialidade, organização, funcionamento, quadros imagético e projetivo, representações, tradição, memórias, práticas, envolvimento, apropriação. [...] Trata-se, portanto, de uma construção subjetiva que depende das circunstâncias históricas, das imagens e representações dos sujeitos, e que é afetada por dados de natureza biográfica e grupal. As memórias, como repertório cognitivo dos sujeitos, função e papel na dinâmica grupal, afetam a relação pedagógica. A participação e o envolvimento integram o momento instituinte, o momento em que a ação se faz norma.

Na história da formação dos professores os docentes que assumiram esta formação e,

os professores formados foram sujeitos que atuaram de acordo ou não com os contextos

políticos, econômicos e sociais de cada período.

Nóvoa (1991), mediante uma abordagem histórica, esclarece que durante a Idade Média

houve um esquecimento da educação da Antiguidade, bem como a inexistência de

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preocupações com a educação da criança que era educada distante do convívio familiar, em

círculo comunitário onde ocorria a aprendizagem na coexistência cotidiana com o mundo

adulto.

Foi a partir do século XV que reapareceu a preocupação educativa devido às

transformações que ocorreram no mundo ocidental entre os séculos X e XV. Essas

transformações são referentes ao renascimento do comércio, à emergência do mercado

enquanto centro da vida econômica, a criação de cidades e o surgimento da classe burguesa.

Esta classe trouxe um novo conceito, o de que o homem é transformável e capaz de fazer uma

sociedade diferente. Portanto, se teve a necessidade da escrita e, consequentemente, da

escola como reprodutora das normas e da transmissão cultural.

Nesse contexto, Nóvoa (1991, p.26) destaca:

A escola moderna nasceu no seio do movimento social e de suas interações culturais, com o objetivo de tomar a cargo a educação das crianças, da qual a escola, que existia já na Idade Média, não se preocupava especialmente. Não é senão a partir do século XV que ela vai pouco a pouco se transformar e ser utilizada para a educação das crianças, no sentido em que entendemos hoje.

O mesmo autor observa duas fases na história da escola a partir do século XV: a fase da

dominação da igreja na escola que vai até a segunda metade do século XVIII e a fase na qual a

escola está a cargo do estado que predomina até hoje. Também destaca que não se trata de

duas histórias, mas de dois momentos do processo de escolarização das crianças e esclarece:

[...] a gênese da profissão docente é anterior a estatização da escola pois, desde o século XVI, vários grupos sociais, leigos e religiosos, consagram cada vez mais tempo e energia à atividade docente. É uma ação de longa duração, realizada sobretudo no seio de algumas congregações religiosas, ao longo da qual os docentes tendem a abandonar suas múltiplas atividades para se concentrar sobre o ensino, diferenciando assim a função docente de toda uma série de outras funções e erigindo o campo educativo em domínio de investimento de um grupo social específico e autônomo.( NÓVOA, 1991, p.118)

É nesse processo de escolarização que está a figura do professor e com ela a

necessidade da formação docente.

É em meados do século XIX que no Brasil surgem as instituições escolares para a

formação docente. Anterior a este período, não houve uma formação específica para

professores, estes eram avaliados por concurso de nomeação mediante atestado de

moralidade e conhecimento sobre o que se deveriam ensinar. Outra maneira de atuação dos

professores era por meio da prática do ofício, na qual os futuros professores aprendiam a

lecionar no acompanhamento da atuação de outro profissional durante a aula.

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Saviani (2009, p.142-143), com fundamento nas questões pedagógicas em articulação

com as transformações que ocorrem na sociedade brasileira, distingue seis períodos na

formação de professores no Brasil conforme segue:

1-Ensaios intermitentes de formação de professores ( 1827-1890). Esse período se inicia com o dispositivo da Lei das Escolas de Primeiras Letras, que obrigava os professores a se instruir no método do ensino mútuo, às próprias expensas: estende-se até 1890, quando prevalece o modelo das Escolas Normais. 2-Estabelecimento e expansão do padrão das Escolas Normais(1890-1932), cujo o marco inicial é a reforma paulista da escola Normal tendo como anexo a escola modelo. 3-Organização dos Institutos de Educação (1932-1939), cujo os marcos são as reformas de Anísio Teixeira no Distrito Federal, em 1932 e de Fernando de Azevedo em São Paulo, em 1933. 4-Organização e implantação dos cursos de Pedagogia e de Licenciatura e consolidação do modelo das Escolas Normais (1939-1971). 5-Substituição da Escola Normal pela Habilitação Específica de Magistério (1971-1996). 6-Advento dos Institutos Superiores de Educação, Escolas Normais Superiores e o novo perfil do Curso de Pedagogia (1996-2006).

Do primeiro período ao sexto há uma longa trajetória na formação dos professores

passando pela concepção da preparação específica conforme segue: domínio apenas dos

conteúdos a serem ensinados; ênfase nos exercícios práticos de ensino; pedagogia como

conhecimento de caráter científico; formação no aspecto profissional; habilitação tecnicista e

competências específicas, sendo todos relacionados ao contexto histórico e político de cada

época.

No entanto, esses períodos podem ser considerados como marcos, pois não se encerra

um e se inicia o outro.

Logo no início da República, em 12/03/1890, ocorreu no estado de São Paulo a reforma

paulista sob a direção de Caetano de Campos, que ficou conhecida como Reforma Caetano de

Campos. Assim, a Escola Normal paulista foi reaberta com professores especialistas trazidos

do exterior para concretizar um modelo de formação, baseado nos modelos de escolas

americanas com o método intuitivo, que consistia em priorizar a educação dos sentidos. Esta

reforma foi estendida a todo o ensino público com destaque para as ações a seguir: 1- criação

de um ensino primário com duração de 8 anos, dividido em dois cursos, um elementar( 4

primeiros anos primário) e outro complementar( primário complementar); 2- criação dos

grupos escolares; a criação de um curso superior anexo à Escola Normal, destinados a formar

professores para a Escola Normal e os ginásios; 3- Escolas Normais com um currículo

ampliado com ênfase nas matérias científicas, com duração de quatro anos e exames para

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ingresso na instituição de ensino no curso Normal, com a exigência de uma cultura

enciclopédica. (TANURI, 2000, p.69 ).

Ressalta-se que em São Paulo, em 1885, se instalou a primeira Escola Complementar

anexa à Escola Normal.

A formação de professores para o ensino primário se deparou novamente com um

modelo dual. Visto as Escolas Normais não atenderem a demanda, muitos estados

transformaram o Curso Primário Complementar em curso de formação de professores, sem

alterações curriculares apenas acrescentando mais um ano de prática de ensino realizada em

escola modelo anexa à Escola Normal. Após esta formação, o aluno, para ser professor,

poderia realizar concurso para a sua nomeação. Para cursar o Ensino complementar, não era

necessário prestar exame, como para ingressar na Escola Normal, apenas concluir o primário

elementar. Também, ressalta-se que no curso Normal as disciplinas eram ministradas por

professores especialistas enquanto que no Curso Primário Complementar um único professor

ministrava todas as disciplinas .

Essa dualidade também ocorreu no estado de São Paulo, mas se dissolveu a partir de

1911 com a transformação das escolas complementares em escolas normais primárias, estas

passaram a compor professores diferentes para cada disciplina e incluir no currículo a

disciplina de Pedagogia como uma disciplina teórica de educação. Já em 1920, as Escolas

Normais Públicas do estado de São Paulo foram unificadas às instituições secundárias.

Concomitante com a formação de professores no âmbito público também ocorreu a

introdução das escolas normais de iniciativas privada e municipal, estas eram consideradas

como livres ou equiparadas e cresceram gradativamente ao longo dos anos 1920- 1930

O município de Garça SP e a formação de professores

O Município de Garça é localizado na região centro-oeste do estado de São Paulo, se

constituiu como município no ano de 1928. A história de sua formação se estende ao longo da

década de 1920 e é marcada pela disputa entre dois fundadores, o Sr. Labieno da Costa

Machado e o Sr. Carlos Ferrari. O Sr. Labieno pertencia a uma família abastada de

tradicionais cafeicultores do interior de São Paulo, e chegou no futuro município de Garça

com uma comitiva para desbravar na intencionalidade de colonizar e promover a

cafeicultura, formou o patrimônio Labienópolis. O Sr. Carlos Ferrari, imigrante italiano,

trabalhou como colono em uma fazenda próximo de onde seria a cidade de Garça e, após

economizar dinheiro conseguiu adquirir terras que foram vendidas, formando assim um

outro Patrimônio denominado Ferrarópolis. Além dos dois fundadores, outros fazendeiros

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podem ser considerados como fundadores, pois adquiriam grandes glebas de terras

formando fazendas ou pequenas colônias que originaram vilas. Dentre eles se destaca o Cel.

Antônio Carvalho de Barros, imigrante português que em disputa política com o Sr. Labieno

da Costa Machado, proporcionou a construção do primeiro prédio escolar no ano de 1929.

No entanto, a história oral nos mostrou que o processo de escolarização se iniciou antes

mesmo de Garça ser elevada a município. Em entrevista com a Sra. Madalena, nos foi

relatado que quando tinha por volta de dois anos já pertencia à um grupo de crianças com

idades variadas entre 2 a 12 anos que se reuniam em uma garagem e sob a orientação de sua

tia Luiza tinham aulas. Mesmo tão pequena, brincando, já rabiscava alguns papéis. As

lembranças da Sra. Madalena foi avivada por meio de uma fotografia na qual estão algumas

crianças e a Profa. Luiza.

O Sr. João Chaves nos contou que a Profa. Sra. Luiza Anceloni Bertolucci não tinha

formação docente, portanto, era chamada de rábula a pessoa que exercia a docência, mas não

tinha a formação. A Sra. Luiza veio morar com o Sr. Mathias Manchini, pai da Sra. Madalena,

pois ficou órfã e era irmão de sua esposa, a Sra. Ida Ansanello. O Sr. Mathias era morador do

Patrimônio Labienópolis e veio com os filhos e a esposa para a promissora Vila trabalhar

como carroceiro e logo montou uma Casa de Comércio próximo de sua residência. A escola

improvisada funcionou na garagem de sua casa.

Figura 1- Professora Luiza e a primeira turma de alunos. Acervo pessoal da Sra. Estela Marina Aparecida Mancini

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A Sra. Estela Mancini, neta do Sr. Mathias, relatou as memórias narradas pelo seu pai

Sr. Mario Manchini, em relação a fotografia exposta:

A primeira escola funcionava em uma garagem. Não havia ninguém para dar aulas, se juntavam nesta garagem para estudar sob a regência da tia Luiza. Essa garagem se localizava na casa do pai dele o Sr Mathias Manchini, onde ele mantinha uma Casa de Comércio ( mercadinho ) que, na época, ficava na saída da fazenda do Alto Cafezal, em direção à Marília. Também era perto da casa do velho Montovanelli e da fazenda dos Fabretti ( onde é hoje a esquina da Rua do Sul com a Av. Faustina). Ele reconhece alguns de seus irmãos na foto suas primas e os filhos do Popofe, Nicolau e Natália, grandes amigos. Estes últimos pertenciam a uma família originária da Rússia, fugindo do comunismo. Moravam numa chácara, ali próximo. Tinham ainda vários descendentes de japoneses também de famílias tradicionais da cidade. Ele aparece com 08 anos aproximadamente, em pé, ao centro da foto, com paletozinho escuro e camisa branca por baixo com colarinho. Ao fundo da foto, pode se notar uma casinha de madeira. Era o banheiro que eles usavam e que fazia fundo com a casa do Dr. Labieno, hoje Clube da Terceira Idade. Ele relatou ainda que sua família morava numa casa do pai do Dr. Labieno. (ENTREVISTA, 05/04/2016)

Mediante os relatos orais se entende que a escola na garagem foi uma maneira de

atender a demanda de uma pequena sociedade que se iniciava na então Vila. Garça, foi

elevada à categoria de Vila em 29 de dezembro de 1925, à município em 27 de dezembro de

1928 e, recebeu a sua emancipação política em 5 de maio de 1929.

Nesse período, imigrantes italianos e japoneses e até russo, se instalaram na Vila, tanto

no Patrimônio Labienópolis, como no Ferrarópolis e nas terras do Cel. Antônio Carvalho de

Barros, chamada de Barrarópolis.

Visto a necessidade de uma escola formal, a família do Cel. Antônio Carvalho de Barros

doou uma parte de suas terras para se construir uma escola, o primeiro Grupo Escolar

denominado “Grupo Escolar das Escolas Reunidas de Garça-Julio Prestes”. Este Grupo

funcionou neste local até o ano de 1945 quando se transferiu para um prédio maior numa

área próxima em terreno também doado pela família Barros. Este primeiro Grupo Escolar

recebeu o nome de Julio Prestes, indicado pelo doador do terreno como uma forma de

homenagear o candidato paulista Julio Prestes de Albuquerque3 às eleições presidenciais de

1930.

Sobre o período do funcionamento desse Grupo Escolar, o Sr. João Chaves nos contou

que os alunos não moravam somente na cidade, mas vinham muitos das fazendas. Os alunos

que vinham da Fazenda, como foi o caso dele, eram transportados por jardineiras e os custos

bancados pelos seus pais que tinham cinquenta por cento de desconto nos bilhetes. Os que

3Ultimo presidente do Brasil eleito durante período conhecido como República Velha, mas não assumiu o cargo impedido pela Revolução de 1930.

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não podiam ficavam nas escolas das Fazendas. Algumas fazendas tinham uma sala

multisseriada com uma professora. A construção da sala e o pagamento da professora era

responsabilidade do fazendeiro. Não havia merenda cedida pela escola, cada aluno deveria

levar a sua marmita. Sobre a docência o Sr. Chaves lembrou:

Terminei em 1933. Lembro-me da D. Didi, essa me marcou. Era muito brava, tinha palmatória, mas ensinava muito bem. Quando começava a explicar conseguíamos entender tudo. Passava o ponto, fazia ler, perguntava... Ai de quem não soubesse. Ficava brava, mas ao mesmo tempo acolhia. Ela se formou professora em outro município.( ENTREVISTA, 05/04/2016).

Esta lembrança nos mostra a valorização da conduta e do saber da professora que ficou

na memória do Sr. João Chaves, enérgica, mas tinha conhecimento do conteúdo que

explicava de maneira que o aluno entrevistado entendia.

Figura 2- Primeira Escola do município de Garça SP- Grupo Escolar. Acervo: Museu Histórico Pedagógico de Garça.

Outra doação de terreno para construção de instituição escolar também foi cedida pela

família do Cel. Antônio Carvalho de Barros, construído e instalado em 28 e fevereiro de 1937,

a Instituição recebeu a denominação de Ginásio Municipal e oferecia os cursos: primário,

admissão, contabilidade. Foi fechada em 1942 por deficiências de suas instalações. De 1943 a

1948, o então prefeito Hilmar Machado de Oliveira, concedeu a autorização de arrendamento

do prédio aos Padres Antônio Magliano e João Aquino que deram continuidade aos cursos e a

primeira turma foi formada em 1946. Após verificações dos Inspetores de Ensino Estadual, a

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escola passou sob a responsabilidade do Estado em 15 de maio de 1949 com a denominação

de Ginásio Estadual e Escola Normal de Garça.

No Jornal “O Progressista”, de 22 de abril de 1948, se tem como manchete a seguinte

chamada: “As primeiras nomeações para o Ginásio Estadual e Escola Normal de Garça”. No

corpo do texto da notícia se explica que o Governador do estado de São Paulo, Sr. Adhemar

de Barros havia realizado o decreto de nomeações do corpo docente e administrativo que

atuariam no Ginásio Estadual e Escola Normal de Garça. As disciplinas estão divulgadas

conforme segue: Português; Francês; Inglês; Geografia Geral e Geografia do Brasil; História

Geral e História do Brasil; Trabalhos Manuais; Doméstica; Educação Física; Desenho;

Matemática; Canto orfeônico; Ciências Naturais.

O que se entende é que oficialmente há a nomeação para os docentes do curso Ginasial,

pois não há as disciplinas específicas do curso Normal.

Em 1950, mediante a Lei n. 671, de 23 de março de 1950, a instituição passou a

denominar-se Colégio e Escola Normal Dr. Hilmar Machado de Oliveira, em homenagem

póstumas ao prefeito, Hilmar Machado de Oliveira. Assim, é a partir desse ano que o curso

Normal passou a ser oferecido no nível secundário, pois já era oferecido no nível ginasial

conforme apontam os registros nos Livros dos Cursos da Instituição.

Figura 3- Prédio do Ginásio Municipal e Colégio Estadual e Escola Normal Hilmar Machado de Oliveira. Acervo da Escola Estadual Hilmar Machado de Oliveira

A necessidade do oferecimento de um curso Normal se deu pela crescente demanda da

formação de professores para atender ao crescimento de crianças que chegavam à escola

primária.

O Padre Antônio Magliano foi o articulador dessa necessidade. Enquanto esteve com a

escola arrendada, articulava junto a Prefeitura a doação de um terreno para a construção de

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uma Escola Normal particular com a intenção de atender a formação docente das filhas dos

fazendeiros do município e região. Inicialmente conseguiu, junto com as irmãs franciscanas

da cidade de Agudos SP, instalar o atendimento do Jardim da Infância e primário no prédio

doado pela família do Cel. Antônio Carvalho de Barros. Após conseguir um terreno próximo

da cidade, mediante doações e sob a coordenação da Associação Brasileira das Franciscanas

de Agudos, foi construído um prédio e a Escola Normal passou a funcionar, no ano de 1957,

particular, exclusivamente para moças e como internato. Era uma escola também de

formação religiosa. O prédio suntuoso também servia de moradia para as freiras franciscanas

que exerciam a docência na formação das professoras. Posteriormente, como parte do prédio

foi construída uma capela. Denominado como Colégio Santo Antônio, ficou conhecido na

sociedade como “Coléginho”.

O curso Normal do Colégio Santo Antônio, denominado Normal Livre, foi oferecido até

o ano de 1972. Quando a Lei 5.692/71, institui a formação de professores para atuar no

primário e Pré-Escola no curso técnico denominado Magistério, as freiras franciscanas,

mantenedoras, optaram por oferecer Jardim da Infância, Pré- Primário, 1º e 2º Graus.

Em relação ao Colégio Estadual e Escola Normal Hilmar Machado de Oliveira,

mediante a Lei 7148 de outubro de 1962, foi instituído o Instituto de Educação Hilmar

Machado de Oliveira.

Assim, no município de Garça SP, o início da formação de professores se fez em duas

instituições, uma pública, com classes mistas e outra particular, exclusiva para moças.

A implantação das duas instituições de formação docente tem a contextualização de um

cenário nacional na educação.

A década de 1930 foi marcada como consequências das ideias ecolanovistas que

perpetuaram ao longo da década anterior. Dentre estas ideias se destacava programas mais

flexíveis adaptados ao desenvolvimento do aluno.

A partir dessas ideias, se teve o Decreto 3.810 de 19/03/1932 com destaque para a

remodelação na escola Normal do Distrito Federal mediante a reforma preconizada por

Anísio Teixeira e, na capital pela reforma realizada por Fernando de Azevedo pelo Decreto

5.884 de 21/04/1933. Esta remodelação foi a transformação da Escola Normal em Instituto

de Educação.

Nesse modelo de formação, o currículo para a formação do professor primário

centrava-se nas disciplinas pedagógicas distribuídas em três seções conforme segue: 1-

psicologia, pedagogia, prática de ensino, história da educação; 2- fisiologia e higiene da

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criança, estudo do crescimento da criança e higiene da escola; 3- sociologia, fundamentos da

sociologia, investigações sociais em nosso meio.

Este modelo de formação influenciou o curso Normal que seria implantado no

município de Garça SP.

A década de 1930 também foi marcada pela necessidade, apontada pelos educadores,

de se ter no Brasil um sistema nacional de ensino no lugar dos muitos sistemas estaduais

existentes. Esses apontamentos se concretizaram a partir da Constituição de 1937, no

governo Vargas mediante a proposição de que a União deveria organizar o ensino em todos

os níveis no país. Assim, se teve em 1946, a Lei Orgânica do Ensino Normal – Decreto Lei n.

8.530, de 02/01/1946.

Sobre a estrutura geral da formação de professores, a Lei referida estabeleceu que o

curso seria dividido em dois ciclos: o primeiro com duração de 4 anos- formação de regentes

para o ensino primário em instituições denominadas Escolas Normais Regionais e o segundo

com duração de 3 anos- formação de professor primário nas Escolas Normais e nos Institutos

de Educação . Este segundo ciclo apresentava um caráter mais técnico, mais profissional à

formação dos normalistas. Ainda um terceiro nível de formação também foi estabelecido na

referida Lei: para a formação de diretores de grupos escolares, inspetores de ensino e

orientadores escolares, cursos de especialização nos Institutos de Educação (VICENTINI e

LUGLI, 2009, p.43-45)

Houve um crescimento do curso Normal no país, inclusive na iniciativa particular. Sob

a égide da legislação citada as duas Escolas de formação de professores primários,

mantinham escolas primárias e Jardim da Infância/Pré-escola anexas.

Sobre esse início da formação docente no município o Sr. Sérgio de Stefani nos

informou que se formou professor no Colégio Estadual e Escola Normal Hilmar Machado de

Oliveira no ano de 1952 e a sua esposa no ano de 1950. Durante a entrevista buscou o seu

acervo de fotos do período que foi aluno e, a sua memória em relação ao período de estudante

veio na sua fala:

No curso Normal aprendíamos a ser professor, mas também tínhamos incentivo no esporte. Eu sempre joguei basquete e estávamos sempre participando de campeonatos. A nossa turma era muito unida. Tanto que em 2003 consegui reunir a nossa turma, que se formou em 1952! Vieram vários!!! Até a Profa. Terezinha Circe, a que mais nós gostávamos! Tinham outras também, elas se formaram em outras cidades e vinham morar em Garça para dar aulas no curso Normal. Moravam em repúblicas. Teve até uma vez que juntou um grupo de alunos e fomos fazer serenata para elas! Existia respeito e amizade entre nós! Não dá para esquecer as aulas de música da Dona Celeste. Ela gostava de mim! Sempre me chamava para

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cantar, por isso apareço nas fotos de outras formaturas. (ENTREVISTA, 06/04/2016)

O Sr. Sergio nos mostrou e nos emprestou suas fotos e convites de formatura. Também

reconheceu cada aluno, inclusive os da turma da sua esposa. Ao ver as fotos me chamou a

atenção o grupo de normalistas em um local fora da escola e outra foto na qual uma moça

parecia discursar. Sobre este momento registrado na imagem, o Sr. Mario contou:

Não era um curso que ficamos somente na sala de aula. Os professores programavam excursões que era passeio mas também para aprender. A foto que tem as alunas é na Fazenda dos Ingleses, lá aprendia-se de tudo, sobre plantio, sobre arte e ainda tinha a igreja! Essa professora que aparece discursando é a Professora Terezinha Circe, ela dava aula de Práticas de Ensino. Na foto foi uma excursão à Fazenda Santa Cecília. Tinha sempre um ponto de como deveríamos dar aulas, depois preparávamos as aulas e tínhamos que ir no Grupo Escolar aplicar. Ela ia verificar. Mas foi uma professora que muito marcou, era alegre, gostava de recitar poemas e nos incentivava a ensinar. Quando comecei como professor no inicio da década de cinquenta, me lembrava do jeito dela ensinar. Outra Professora que ficou marcada na minha lembrança e que se foi a pouco tempo, foi a D. Celeste, com as suas aulas de músicas... Ela era muito engraçada, brava, nos fazia cantar do jeito dela! (ENTREVISTA, 06/04/2016)

Figura 4- Professora Terezinha, de Práticas de Ensino, discursando aos alunos em aula na Fazenda Santa Cecília.

Acervo pessoal do Sr. Sérgio De Stéfani.

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Figura 5- Alunas normalistas do Colégio Estadual e Escola Normal em estudos na Fazenda dos Ingleses Gália SP. Acervo pessoal do Sr. Sérgio De Stefani.

As fotografias nos mostram alunas normalistas descontraídas, professora discursando,

mas como afirmou o entrevistado Prof. Sr. Mario, as aulas, em sua maioria, eram nas salas e

com pontos para aprender e aplicar. Também lembrou muito do Prof. Porfírio, que apesar de

não ser professor do curso Normal, enquanto eles foram alunos, marcou muito a vida dos

alunos, pois se fazia entender, explicava muito bem e quando começava a falar todos

prestavam atenção. Ele dava aulas no ginásio, mas quando chegava a formatura do curso

Normal os alunos o escolhiam para homenagear. Ele foi o autor do Hino à Garça. Por isso ele

está na foto da formatura da Dona Lúcia, esposa do Prof. Sr. Sérgio de Stefani, em 1950.

Outra lembrança que os entrevistados destacaram foi a exigência do uso do uniforme.

Todos os dias as alunas deveriam comparecer à escola com o traje determinado: saia

plissada, camisa branca, meias brancas curtas e sapatos pretos. A saia sempre abaixo do

joelho. Os moços deveriam trajar camisa branca e calça escura. Nas festividades os alunos

sempre estavam de terno.

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Figura 6- Alunas e alunos normalistas no final do terceiro ano do curso Normal no Colégio Estadual e Escola Normal Hilmar Machado de Oliveira, ao centro de terno cinza, o prof. Porfírio. Acervo da Escola Hilmar Machado

de Oliveira.

De acordo com a Matriz Curricular do curso Normal do Colégio Estadual e Escola

Normal Hilmar Machado de Oliveira as disciplinas eram compostas conforme segue:

Psicologia; Prática de Ensino; História da Educação; Higiene da criança e da escola.

Os alunos entrevistados, normalistas da década de 1950, salientaram que a disciplina

de Prática de Ensino abrangia todas, pois aprendiam os conteúdos que ensinariam e como

ensinariam.

No ano de 1962, mediante a Lei n. 7148 de outubro de 1962, o Colégio Estadual e

Escola Normal passou a ser Instituto de Educação Hilmar Machado de Oliveira.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 4.024 de 20/12/1961, trouxe como

novidade apenas a equivalência legal de todas as modalidades de ensino médio, a

descentralização administrativa e a flexibilidade curricular. Assim, a maioria dos estados,

realizou alterações curriculares, mas conservou o sistema dual, com escolas normais de nível

ginasial, com quatro séries no mínimo, e as de nível colegial, com três séries, no mínimo.

Destaca-se que alguns estados como foi o caso de São Paulo, se utilizaram de escolas de

segundo ciclo do grau médio para a formação dos professores primários.

No município de Garça SP, as duas escolas formadoras de professores, mantiveram o

sistema de formação no nível colegial com três séries.

A Lei Complementar n. 5.692/71 estabeleceu as diretrizes e bases para o ensino de 1º

e 2º graus e alterou as nomenclaturas de primário e ginásio para Ensino de 1º Grau com

seriação de oito anos e o 2º grau como o colegial, transformando esse nível em habilitações

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profissionais. Dentre essas habilitações se incluiu a formação de professor para atuar no 1º

grau de 1ª a 4ª série e Pré-Escola e Educação Infantil denominada Habilitação Específica

para o Magistério. Vale ressaltar que o primeiro ano do 2º Grau era comum, o aluno

começava a habilitação profissionalizante a partir do segundo ano. Novamente se tem um

sistema dual na formação de professores para o ensino primário.

Dessa maneira, cada estado poderia se organizar oferecendo dentro da Habilitação

citada um aprofundamento de estudo priorizando 1ª a 4ª série ou Pré Escola, na qual cada

aprofundamento apresentava um currículo. No entanto, independente da escolha, os

formados poderiam atuar da Pré-Escola à 1ª a 4ª série.

No município de Garça SP, a formação de professores para atuar nesse segmento

também foi alterada. As religiosas mantenedoras do Colégio Santo Antônio optaram pela não

continuidade dessa formação, visto entenderem como um curso técnico e, o Instituto de

Educação Hilmar Machado de Oliveira foi extinto mediante o Decreto n. 7.510 de

29/01/1976. A Habilitação Magistério passou a ser oferecida na Escola Estadual Técnica

Monsenhor Antônio Magliano e, a partir do ano de 1992, se transferiu para a Escola Estadual

de 1º e 2º Grau Profa. Lydia Yvone Gomes Marques.

Este modelo trouxe consequências na atuação, pois o aluno que optasse para o

aprofundamento em Pré-Escola não teria a formação para a alfabetização, mas poderia atuar

na 1ª série.

É no cenário de críticas a esse modelo que vários órgãos do sistema de educação

promoveram discussões de projetos de estudo, pesquisas e propostas de ação para revitalizar

o ensino normal, ou seja, redefinir a Habilitação Específica para o Magistério. Assim,

resultante das discussões, o Ministério da Educação- MEC apresentou a proposta do CEFAM-

Centro de Formação e Aperfeiçoamento do Magistério.

O CEFAM teve uma implantação gradativa com início em 1983, em apenas cinco

estados, expandiu-se e, em 1996 todos os estados já haviam implantado-o em escolas

estaduais ou municipais onde já funcionavam os cursos de magistério.

Vale ressaltar que apesar da expansão não eram todas as escolas com cursos de

magistério que se transformaram em CEFAMS. O projeto foi implantado de forma

representativo, ou seja, implantado em algumas escolas. Também, os alunos desse projeto

eram contemplados com a Bolsa de Trabalho para o Magistério que consistia numa

remuneração para garantir o tempo integral dos alunos e o seu trabalho de mo a monitoria

nas séries iniciais- 1ª a 4ª série.

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No município de Garça SP não houve o projeto CEFAM, permanecendo o curso

habilitação para o Magistério como formação de professores até a promulgação da Lei de

Diretrizes e Bases 9.394/96 que alterou e modificou integralmente a formação de professores

dos anos iniciais e pré-escola ao indicar e exigir tal formação no nível superior.

Considerações

Na síntese apresentada referente a formação de professores, se faz necessário

considerar a figura do docente, tanto como professor formador de professores, como o

professor formado que exerceu a docência. A docência se constituiu a partir de uma formação

institucional, mas também a partir dos agrupamentos por afinidades e ainda, por opções e

decisões de fazer uma educação no município onde ocorreu a formação.

Em relação à docência e a instituição escolar Nóvoa (1991,125), destaca:

No momento em que a escola se impõe como instrumento privilegiado de estratificação social os docentes são investidos de um imenso poder: eles detêm as chaves da ascensão (ou estagnação) social. Isso os coloca no cruzamento de interesses e aspirações sócio-econômicas frequentemente contraditórias: funcionários do Estado e agentes de reprodução da ordem social dominante, eles personificam também as esperanças de mobildade social de diferentes camadas da população. Aqui reside toda a ambiguidade e toda a importância da profissão docente: agentes culturais, eles são também inevitavelmente agentes políticos.

Os professores, no município de Garça SP, formados nos modelos apresentados na

síntese, de acordo com cada período, faziam parte de grupos que ora entendiam a profissão

docente como uma ascensão social, ora como uma necessidade de profissionalização,

principalmente em relação ao gênero feminino, para atuação no mercado de trabalho, mas

também poderiam entender a educação como um campo para modificação social.

Na comunicação apresentada, priorizamos uma Escola de formação no início da

Década de 1950, e entrevista com dois alunos deste período. Portanto, podemos considerar

alguns resultados, pois se faz necessário outras entrevistas com alunos e professores.

Assim, como principais conclusões prévias de investigação, se tem que as instituições

de formação docente foram instituídas e se constituíram de acordo com as determinações

legais, mas o ser e os saberes professorais marcaram a formação e a atuação docente no

município de Garça SP, pois as lembranças evocadas se fixaram na figura da professora

alegre e dinâmica que proporcionava aulas fora do espaço escolar, na figura do professor

amigo com uma oratória que se fazia entender, na professora com as suas aulas enérgicas de

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música, mas querida pelos alunos e ainda na figura da primeira professora que sem formação

para tal ensinava os seus saberes adquiridos no grupo escolar e Ginásio de outro município.

Na contínua busca de pesquisa, poderemos encontrar outros saberes e desvendar

outras histórias.

Referências

BRASIL. Lei Complementar n. 5.692/71 de 11 de agosto de 1971. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Disponível em http://www.planalto. Gov.br/ccvil_03/Leis/L5692htm. Acesso em 10/10/2013. ________. Lei n.9.394/96 de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 de dezembro de 1996, ano CXXXXIV, nº248, p.27.833-27.841. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_3/ LEIS/L9394.htm. Acesso em 10/10/2013. LE GOFF, J. História e Memória. 5. Ed. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2004. MAGALHÃES, J. P. Tecendo Nexos: História das Instituições Educativas. Bragança Paulista SP: Editora Universitária São Francisco, 2004. MEIHY, J.C.S.B. Manual de história oral. São Paulo: Edições Loyola, 1996. NÓVOA, A. Para o estudo sócio-histórico da gênese e desenvolvimento da profissão docente. Teoria e Educação. Porto Alegre: Pannonica, n.4, 1991. SAVIANI, Demerval. Formação de Professores: aspectos históricos e teóricos do problema no contexto brasileiro. Revista Brasileira da Educação. v. 14, n. 40 jan./abr.2009. TANURI, L. M. História da formação de professores. Revista Brasileira de Educação, n.14, p.61-88, maio/ago.2000. THOMPASON, P. A voz do passado – História Oral. São Paulo: Paz e Terra, 1992. VICENTINE, P.; LUGLI, R. G. História da profissão docente no Brasil: representações em disputa. São Paulo: Cortez, 2009.

Jornal

O Progressista, 22 de abril de 1948, nº36.

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Instituição e Acervo Consultado

Escola Estadual Hilmar Machado de Oliveira Museu Histórico Pedagógico de Garça