A GOVERNANÇA AMBIENTAL INTERNACIONAL, DESASTRES AMBIENTAIS...

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A GOVERNANÇA AMBIENTAL INTERNACIONAL, DESASTRES AMBIENTAIS E ORGANIZAÇÕES-NÃO GOVERNAMENTAIS: EM ESPECIAL A CRUZ VERMELHA Fernanda Ribeiro de Azevedo RESUMO Este trabalho aborda o surgimento da governança ambiental internacional e de suas características principais, o desenrolar de suas atuações, do início da preocupação com as questões ambientais até os dias atuais. Através do desempenho das organizações não governamentais e de suas atividades no plano internacional, notadamente quanto à problemática dos desastres ambientais, proceder-se-á ao exame da matéria, limitando-se aos desastres de origem natural. Por fim, estudar-se-á o Comitê Internacional da Cruz Vermelha e suas características institucionais, jurídicas e assistencialistas. Será analisado seu mandato, suas atividades para o desenvolvimento do DIH, sendo apreciadas suas ações no plano internacional para uma efetiva e eficaz assistência nos casos de catástrofes. PALAVRAS- CHAVE: Governança Ambiental; desastres ambientais; organizações não governamentais; Cruz Vermelha; assistência. ABSTRACT This article outlines the emergence of international environmental governance and its main characteristics: outlining the course of their actions, tracing its origins from the early concern with environmental issues to today’s state of the practice. It will be analyzed the performance of non-governmental organizations and their activities at the international level, particularly regarding the issue of environmental natural disaster response. The article will also delve into the Red Cross International Committee and analyze its institutional characteristics, including legal aspects and aid policy. It will be Advogada, mestranda em Ciências Jurídico Internacionais na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.

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A GOVERNANÇA AMBIENTAL INTERNACIONAL, DESASTRES AMBIENTAIS E ORGANIZAÇÕES-NÃO GOVERNAMENTAIS:

EM ESPECIAL A CRUZ VERMELHA

Fernanda Ribeiro de Azevedo∗

RESUMO

Este trabalho aborda o surgimento da governança ambiental internacional e de suas

características principais, o desenrolar de suas atuações, do início da preocupação com

as questões ambientais até os dias atuais. Através do desempenho das organizações não

governamentais e de suas atividades no plano internacional, notadamente quanto à

problemática dos desastres ambientais, proceder-se-á ao exame da matéria, limitando-se

aos desastres de origem natural. Por fim, estudar-se-á o Comitê Internacional da Cruz

Vermelha e suas características institucionais, jurídicas e assistencialistas. Será

analisado seu mandato, suas atividades para o desenvolvimento do DIH, sendo

apreciadas suas ações no plano internacional para uma efetiva e eficaz assistência nos

casos de catástrofes.

PALAVRAS- CHAVE: Governança Ambiental; desastres ambientais; organizações

não governamentais; Cruz Vermelha; assistência.

ABSTRACT

This article outlines the emergence of international environmental governance and its

main characteristics: outlining the course of their actions, tracing its origins from the

early concern with environmental issues to today’s state of the practice. It will be

analyzed the performance of non-governmental organizations and their activities at the

international level, particularly regarding the issue of environmental natural disaster

response. The article will also delve into the Red Cross International Committee and

analyze its institutional characteristics, including legal aspects and aid policy. It will be

∗ Advogada, mestranda em Ciências Jurídico Internacionais na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.

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considered its mandate, its activities for the development of IHL, and analyzed their

actions at the international level for an effective and efficient assistance in cases of

disasters.

KEYWORDS: Environmental Governance; natural disasters; non-governmental

organizations; Red Cross; assistance.

INTRODUÇÃO

As últimas décadas presenciaram um inédito e irreversível processo de mudança

no cenário internacional. O surgimento de novos atores evidenciou uma necessidade de

transformação das velhas estruturas e uma adaptação à realidade que despontava. Dessa

forma, delinearam-se as bases de um processo no qual o Estado e os novos sujeitos

atuam em cooperação e administração de interesses comuns: a governança.

A governança significa a mudança do paradigma de relação entre o Estado e os

atores não estatais, notadamente a sociedade civil, os quais começam a participar dos

processos decisórios, em busca de interesses que atendam a toda a comunidade. O

Estado passa a exercer sua autoridade em cooperação com as entidades não estatais,

visando sempre atender ao benefício da coletividade em si.

Nesse panorama, a atuação das organizações não governamentais, como um dos

proeminentes sujeitos da governança, tem ganhado destaque tendo em vista o seu

crescente papel na persecução de interesses públicos e na expansão das suas atividades

para diversos setores da sociedade. Entre esses setores, vale ressaltar as importantes

conquistas que esses atores vêm obtendo no desenvolvimento do Direito Ambiental

Internacional e na defesa do coletivo. Assim, suas atividades se desdobram e abrangem

temas de relevância atual, como a pobreza, o desenvolvimento sustentável, o

aquecimento global, as mudanças climáticas e os desastres naturais.

A ocorrência de fenômenos naturais de grande magnitude sempre foi presente na

história do planeta, desde seus primórdios. Entrementes, desde a Revolução Industrial

houve um aumento exponencial na população humana e na exploração desmedida da

natureza. O resultado dessa combinação já se torna visível perante o meio ambiente e

os ecossistemas, com o aumento da incidência de extremos climáticos. Destarte, muitos

3

desses fenômenos provocam tragédias de grandes proporções, com alto número de

vítimas e enormes prejuízos para os países atingidos. Nas nações mais pobres, as

consequências de um desastre alcançam cifras alarmantes, ocasionando crises sem

precedentes paras as instituições locais e resultando em situações de total desamparo à

população vitimada.

É nessa esteira que o Comitê Internacional da Cruz Vermelha presta seus

serviços, através da proteção e da assistência dos que se encontram em posição de

penúria. Suas atividades buscam minorar o sofrimento dessas pessoas, com o

fornecimento dos bens necessários para uma vida condigna e com o auxilio para um

recomeçar.

Tendo em vista a importância desse tema e a sua relevância no cenário atual, que

o presente trabalho se desenvolverá.

1. GOVERNANÇA AMBIENTAL INTERNACIONAL

1.1 O que é Governança Ambiental Internacional?

A governança define-se, em um sentido amplo, como uma mudança no

paradigma do exercício do poder pelo Estado, de onde surgem novos sujeitos na

produção do Direito. Dessa forma, desponta um novo modo de organização, não só no

âmbito interno, mas também no internacional, com a inovação da participação da

sociedade civil.

No entendimento de Maria da Glória Garcia, a governança pode ser definida

como um poder que visa alcançar a otimização de resultados, agindo de maneira a

atingir a melhor decisão, atendendo a interesses públicos que em sua natureza acabam

por ser diferentes e conflitantes1.

É um processo amplo, dinâmico e complexo de cooperação2 entre vários atores

na tomada de decisão. Esse processo inclui instituições formais e informais, habilitadas

para fiscalizar o cumprimento de acordos e tratados, podendo agir por meio de novos

métodos de negociação. E é nesse novo modelo de articulação entre Estado-sociedade

1 GARCIA, Maria da Glória Dias. Governança Local, Política e Direito. Em Especial, a Ação sobre o Ambiente, Ordenamento do Território e do

Urbanismo. In: Revista do Ministério Público, nº. 112, 2007, p.11. 2 BIRNIE, Patricia W.; BOYLE, Alan, International Law and The Environment. Second Edition. Oxford University Press, 2002, p. 34.

4

que a governança se caracteriza, posto que, para se chegar a um resultado satisfatório, a

própria sociedade se mobiliza junto ao “órgão decisor” para a obtenção de determinado

interesse coletivo.

Essa participação de indivíduos, de organizações da sociedade civil e mesmo de

empresas com o Estado, no sentido caracterizador da governança, surge para preencher

lacunas na interferência do domínio político, em que se torna quase impossível a

convocação desse poder habitual, com a austeridade que o caracteriza3. Observa-se que

a dimensão estatal não é afastada, mas partilhada.

Milani e Solinís notam que a governança costuma ser definida como um sistema

de tomada de decisão que antecipa e ultrapassa o governo4 e descrevem as

características que, normalmente, são imputadas a ela, quais sejam: a divisão do poder

entre o administrador e os administrados; os processos de gestão e orientação entre os

múltiplos atores e a flexibilização da autoridade e dos encargos derivados da atividade

de governar.

Portanto, a governança é um conjunto de atividades entre atores públicos e não

públicos, sem a tradicional hierarquização entre essas relações, atuando em um sentido

mais horizontal, reciprocamente dependente, com intuito de regular possíveis conflitos

de interesses5 e alcançar o bem comum. A participação de novos atores é fundamental e

com eles nascem também novos mecanismos nesse controle social, inclusive

mecanismos informais, como uma abordagem menos de cima para baixo e mais

horizontal6.

Michael Heldeweg cita cinco importantes princípios da governança (que foram

estabelecidos no Livro Branco da governança europeia7). São eles: abertura,

participação, responsabilidade, eficácia e coerência8.

Abertura estabelece uma comunicação mais funcional e dinâmica por parte das

instituições, de maneira que as decisões governamentais sejam mais acessíveis e de um

entendimento mais fácil.

3 GARCIA, Maria da Glória Dias, Governança Local..., cit., p.12. 4 MILANI, Carlos; SOLINÍS, Germán. Pensar a Democracia na Governança Mundial: Algumas pistas para o futuro. In: Democracia e Governança Mundial:

Que regulações para o século XXI? Programa MOST, UNESCO, 2002. Disponível em: http://www.unesco.org/most/demgov_port.htm#conclusion

Acesso em 04 de Julho de 2010.

5 COVAS, António. A Governança Europeia: a política europeia no limiar de uma nova revisão dos tratados. Editora Colibri, Lisboa, 2007, p. 13.

6 HELDEWEG, Michael A. Towards Good Environmental Governance in Europe. European Law Review, 2005, p. 2.

7Mais informações sobre o Livro Branco da Governança Europeia disponível em: <http://eur-

lex.europa.eu/LexUriServ/site/en/com/2001/com2001_0428en01.pdf>. Acesso em 04 de Julho de 2010. 8 No texto de HELDEWEG os princípios são openness; participation; accountability; effectiveness e coherence. A tradução dos mesmos para o português foi a

encontrada no Relatório da Comissão sobre a Governança Europeia, disponível em < http://ec.europa.eu/governance/docs/comm_rapport_pt.pdf>. Acesso em 04

de julho de 2010.

5

Participação garante ampla participação em todos os níveis da estrutura política.

Responsabilidade determina que Estados-membros e as instituições esclareçam

seus atos e que também se responsabilizem por eles.

Eficácia estabelece que as políticas devam ser eficazes e adequadas, nas

avaliações de impacto passado e futuro, com objetivos determinados, de forma a serem

implementadas de maneira apropriada e proporcional.

Coerência demanda uma visão objetiva e coerente das políticas e ações a serem

tomadas, com uma perspectiva das estruturas como um todo9.

O surgimento da governança ambiental internacional desenrolou-se com a

consciência da escassez dos recursos naturais do planeta. Desde o advento da Revolução

Industrial, ocorrida no século XVIII, e as inovações tecnológicas que se seguiram, o

mundo se deparou com um desenvolvimento econômico ininterrupto, resultando em

uma exaustão dos recursos naturais.

A partir da década de 1970 e 1980, houve um aumento na preocupação com o

meio ambiente, um “despertar ecológico”, quando essas questões e as bases de Direito

Ambiental Internacional começaram a ser abordadas no âmbito internacional.

A Organização das Nações Unidas, 1968, através da resolução 2398(XXIII) da

Assembleia Geral, decidiu convocar uma conferência para debater problemas com a

proteção ambiental. Em 1972, foi realizada em Estocolmo, a Conferência sobre Meio

Ambiente Humano. Essa Conferência assinalou a necessidade de se instituírem

princípios comuns e critérios a serem observados para a salvaguarda do meio ambiente

humano, e teve como resultados a adoção da Declaração de Estocolmo sobre o Meio

Ambiente Humano e posteriormente, a criação do PNUMA.

O PNUMA - Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente surgiu com

objetivo de buscar a conservação do meio ambiente, estimular a utilização dos recursos

por meio do desenvolvimento sustentável, coordenar as atividades internacionais de

proteção ambiental, procurando alertar os Estados e a comunidade internacional para as

questões que surgem10.

Em 1983 a ONU estabeleceu uma comissão independente (Comissão Mundial

sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento) com objetivo de preparar um estudo sobre

o meio ambiente e o desenvolvimento. Três anos depois, em 1987, a Comissão

apresentou seu trabalho, intitulado “O Futuro de Todos Nós” comumente conhecido por

9 HELDEWEG, Michael A. Towards Good Environmental..., cit., p. 3. 10 Organization Profile- United Nations Environment Program: <http://www.unep.org/PDF/UNEPOrganizationProfile.pdf> P. 3

6

Relatório Brundtland. O relatório consagrou uma conexão entre a conservação

ambiental e o desenvolvimento, por meio do conceito de desenvolvimento sustentável,

salientando a necessidade de conservação e utilização consciente dos recursos naturais.

O documento definiu a sustentabilidade como um novo modelo de crescimento

econômico, com vistas a assegurar a preservação dos recursos para as gerações

futuras11. Esse relatório culminou na realização de uma nova conferência, que foi

realizada em 1992 no Rio de Janeiro.

A Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento,

ou Eco-92, como ficou conhecida, tinha as questões socioeconômicas como uma das

pautas principais do programa, e por isso, atentava para a redução da degradação

ambiental, para o desenvolvimento econômico-social visando a sustentabilidade, a

erradicação da pobreza, buscando promover atuações integradas com a sociedade, para

a proteção dos recursos naturais. Foi nessa Conferência que se oficializou a expressão

“desenvolvimento sustentável”. Desde então, houve uma sequência de conferências, que

se sucederam de 10 em 10 anos: em 1982 em Nairóbi; 1992 no Rio de Janeiro; 2002 em

Joanesburgo.

Foram estabelecidos alguns instrumentos importantes na Conferência do Rio

entre eles a Agenda 21 e a Declaração sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento.

Essa participação da sociedade se revela essencial, de modo que nasce a

chamada “cidadania ambiental internacional”, pois o meio ambiente é um bem coletivo

e não se limita a determinado Estado ou pessoa, de modo que não é de ninguém, mas,

sim, usufruto de todos.

Portanto, a governança, entendida como o processo que abrange regras,

estruturas e instituições12, estatais e não estatais que se relacionam de maneira a gerir as

dificuldades coletivas, caracteriza-se em uma perspectiva ambiental como a busca pela

colaboração entre esses diversos atores de modo a promover a questão ambiental, de

vital importância para a condução dos problemas e a tomada de decisão, como em

relação às mudanças climáticas, os desastres ambientais, a pobreza, a poluição e

outros13.

11 KISS, Alexander; SHELTON, Dinah. Guide to International Environmental Law. Netherlands: Martinus Nijhoff Publishers, 2007, p.38-39. 12 BARNETT, Michael; DUVALL, Raymond. Power in Global Governance. Cambridge University Press, Cambridge, 2005, p.2. 13 GIRÃO, Mardônio Da Silva. Uma Governança Global Funcional no Trato das Questões Ambientais: Limites e Possibilidades. In: Direito Ambiental,

Mudanças Climáticas e Desastres. Impacto nas Cidades e no Patrimônio Cultural. Antônio Herman Benjamim, Eladio Lecey, Sílvia Cappelli (orgs.), São Paulo:

Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2009, V. II, p. 428.

7

1.2 SUJEITOS DA GOVERNANÇA

As ONGs possuem um papel importante como sujeitos da governança ambiental

internacional haja vista a multiplicidade de funções e de papéis que desempenha.

A Conferência sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento no Rio consagrou a

participação da sociedade civil nos fóruns internacionais da ONU. Calcula-se que

tomaram parte nas atividades da Eco-92 um número de 2,400 ONGs14.

Como Peter Bombay nota, mais tarde a Comissão de Desenvolvimento

Sustentável-CDS (a Comissão é o fórum de alto nível para o desenvolvimento

sustentável dentro do sistema das Nações Unidas, e atua como uma comissão funcional

do Conselho Econômico e Social-ECOSOC15) desenvolveu o princípio 10 da

Declaração16, expressando seu desejo de estimular essa nova prática de incluir

representantes dos chamados grandes grupos17 nas delegações nacionais da Comissão,

como uma maneira efetiva de aumentar internacionalmente a participação deles18. Essa

prática do CDS foi estabelecida na Resolução 47/19119, de 1993, que fixou

recomendações para a participação das ONGs na Comissão e determinou que os

procedimentos do ECOSOC fossem considerados.

O princípio 10 da Declaração enunciou ainda que se incluiriam acesso à

informação, participação na tomada de decisão e acesso a procedimentos

administrativos e judiciais20.

As organizações não governamentais21 desempenham atualmente um papel

muito maior do que antes. A vantagem de sua participação é que suas decisões se

baseiam em dados científicos e não meramente políticos, como fazem os Estados, e

14 EBBESSON, Jonas. Public Participation. In: The Oxford Handbook of International Environmental Law. Daniel Bodansky; Jutta Brumee ; Ellen Hey (Eds.)

Oxford Press, 2007, p.683. 15 De agora em diante denominado ECOSOC. 16 O princípio 10 da Declaração afirma que “a melhor maneira de tratar questões ambientais é assegurar a participação, no nível apropriado, de todos os cidadãos

interessados. No nível nacional, cada indivíduo deve ter acesso adequado a informações relativas ao meio de que disponham as autoridades públicas, inclusive

informações sobre materiais e atividades perigosas em suas comunidades, bem como a oportunidade de participar do processo de tomada de decisões. Os Estados

devem facilitar e estimular a conscientização e a participação pública, colocando a informação à disposição de todos. Deve ser propiciado acesso efetivo a

mecanismos judiciais e administrativos, inclusive no que diz respeito à compensação e reparação de danos”. (Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente

de Desenvolvimento). Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente de Desenvolvimento. Disponível em

<http://www.cedin.com.br/site/pdf/legislacao/pdf_tratados11/Declara%E7%E3o%20do%20Rio%20de%20Janeiro%20sobre%20Meio%20Ambiente%20e%20Des

envolvimento.pdf>. Acesso em 11 de Fevereiro de 2010.

17 A denominação grandes grupos, ou partes interessadas veio substituir o termo “sociedade civil” para que pudesse abranger uma gama maior de grupos,

notadamente aqueles que não tivessem origens estatais. 18 BOMBAY, Peter. The Role of Environmental NGOs in International Environmental Conferences and Agreements: Some Important Features.

European Law Review, 2001/7, P. 230. 19 Resolução 47/191 disponível em <http://www.un.org/documents/ga/res/47/ares47-191.htm>. Acesso em 12 de janeiro de 2010. 20 EBBESSON, Jonas. Public Participation..., cit., p. 684. 21 Doravante denominada pela sigla ONG, no plural ONGs.

8

enquanto estes agem através de uma visão egoísta, as ONGs, em contraponto, possuem

uma visão altruísta.

Atuam também como grupos de pressão, por meio do monitoramento e na

implementação de convenções e acordos internacionais. Elas podem influenciar

decisões internacionais ao invocar determinados interesses públicos e alertam para

assuntos que poderiam passar despercebidos, agindo na disseminação da informação e

na dinamização da opinião pública. Mesmo quando sua atuação é restrita ao papel de

observador, as organizações não governamentais acabam por influenciar o

desenvolvimento e o cumprimento das leis e políticas ambientais, por meio do

fornecimento de conhecimentos técnicos, do lobbying e da fiscalização dos deveres

ambientais22.

Dessa forma, nesse processo de ascensão de organizações internacionais, a

importância crescente da atuação das ONGs, de empresas e de outros representantes do

setor privado vem limitando e, de certa forma, pressionando a soberania dos Estados23.

Apesar dessa multiplicidade de atores, o Estado continua sendo o principal

sujeito da governança. Não obstante essa influência que novos atores vêm adquirindo no

cenário internacional, isso não significa que os Estados tenham abdicado dos seus

poderes na tomada de decisão ou nos processos de produção normativa, mas demonstra

que eles não mais são os únicos a representar os interesses públicos ambientais na

tomada de decisão e nem no cumprimento dos acordos e convenções internacionais 24.

Assim, a governança ambiental internacional surge como elemento de

originalidade, com a atuação conjunta entre esses sujeitos. Reflete, não uma limitação

da soberania, mas uma expansão da democracia, para a qual todos contribuem, não

exclusivamente em busca de seus próprios interesses, mas na promoção de interesses

públicos ambientais.

2. ORGANIZAÇÕES NÃO GOVERNAMENTAIS

22 EBBESSON, Jonas. Public Participation..., cit., p.683. 23 Alcindo Gonçalves enfatiza que “A governança não é ação isolada da sociedade civil buscando maiores espaços de participação e influência. Ao contrário, o

conceito compreende a ação conjunta de Estado e Sociedade na busca de soluções e resultados para problemas comuns. Mas é inegável que o surgimento dos

atores não- estatais é central para o desenvolvimento da ideia e da prática da governança.” O Conceito da Governança, p. 14. Disponível em:

http://conpedi.org/manaus/arquivos/Anais/Alcindo%20Goncalves.pdf Acesso em 04 de Julho de 2010. 24 EBBESSON, Jonas. Public Participation..., cit., p. 684.

9

Pode-se afirmar, sem sombra de dúvida, que as organizações não

governamentais são uma particularidade da nova ordem internacional25. No entanto, a

existência de entidades não vinculadas a nenhum organismo estatal remonta ao século

XVIII, tendo sua atuação majoritariamente ligada a fins religiosos e de assistência. Mas

com o passar do tempo essas entidades foram se desenvolvendo e se diversificando,

passando a operar em diversas áreas. Entre algumas cabe ressaltar a criação do Comitê

Internacional da Cruz Vermelha, em 1863 e do Institut de Droit Internacional (IDI) e da

International Law Association em 187326.

Contudo, foi somente no período seguinte à Segunda Guerra Mundial que houve

um crescimento significativo dessas organizações, que surgiram com intuito de

prestação de serviços sociais, de ajuda mútua e de solidariedade. Foi um movimento

originário da Europa Ocidental e da América do Norte, entretanto, nas décadas de 60 e

70, tornou-se um fenômeno mundial.

Essa explosão não se deu exclusivamente no número dessas organizações, mas

na atuação em variados setores de interesse público, tais como no desenvolvimento dos

países do Terceiro Mundo, na proteção dos direitos humanos e do meio ambiente –

resultando, quanto a este último, o que Ana Luisa Riquito denominou “esverdejamento

da consciência coletiva27”.

A delimitação do conceito de organizações não governamentais se traduz numa

certa dificuldade, posto não existir uma concepção formal comumente aceita. Em uma

acepção mais abrangente, pode-se defini-las como associações ou instituições, criadas

por iniciativa privada ou mista, e com exclusão de qualquer acordo

intergovernamental28, sem fins lucrativos, com o objetivo de influenciar ou corrigir a

atuação dos sujeitos do Direito Internacional, notadamente dos Estados soberanos e das

Organizações Internacionais29.

Apesar da possibilidade de serem instituições mistas, é necessário ressaltar que a

participação de entidades governamentais é admitida, contanto que não haja nenhuma

interferência na viabilização dos objetivos organizacionais. Não possuem finalidade

25 SILVA , Roberto Luiz. Direito Internacional Público. 3ª Edição. Del Rey: Belo Horizonte, 2008, p.184. 26 HOBE, Stephan. Non Governmental Organizations. In R. Wolfrum (Ed.), The Max Planck Encyclopedia of Public International Law, Oxford University

Press, 2010, online edition. Disponível em: <http://www.mpepil.com.ezproxy.ub.unimaas.nl/subscriber_article?script=yes&id=/epil/entries/law-9780199231690-

e968&recno=1&searchType=Advanced&title=non+governmental+organizations>, acesso em: 13 de junho de 2010, pg. 9.

27 RIQUITO, Ana Luisa .Variações sobre a Nova Sociedade Civil Mundial. ONGs Internacionais: Um Sujeito Sem Personalidade? In: Nação e Defesa, nº.

97, 2001, p. 212. 28 DINH, Nguyen Quoc; DAILLER, Patrick ; PELLET, Allain. Direito Internacional Público. 2ª Edição. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2003, p.659. 29 PEREIRA, André Gonçalves; QUADROS, Fausto de. Manual de Direito Internacional Público. 3ª Edição. Lisboa: Almedina, 2009, p.402.

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lucrativa, de modo que as rendas da instituição não são divididas entre os integrantes e o

corpo dirigente. Toda a parcela de patrimônio deve ser aplicada na persecução dos

propósitos do objeto social.

No presente trabalho estudar-se-ão as ONGs internacionais, que além dos

requisitos supramencionados, para terem a qualificação de internacionais precisam

desenvolver suas atividades em mais de um Estado e possuir membros de

nacionalidades diferentes. Atualmente, essas organizações vêm ganhando destaque cada

vez maior através da produção de orientações de “políticas públicas internacionais” 30.

2.1 NATUREZA JURÍDICA

Sujeitos são, na esfera jurídica, todos aqueles que forem titulares de direitos e

deveres perante determinada ordem jurídica. Sujeitos de Direito Internacional,

consequentemente, são todos aqueles suscetíveis de possuírem direitos e obrigações no

plano internacional.

Entre os sujeitos de Direito Internacional temos os Estados, que são os sujeitos

primários por excelência, e que usufruem de uma capacidade jurídica internacional

absoluta. Em seguida, temos os sujeitos de capacidade limitada, e que de acordo com a

classificação de Pereira e Quadros, são sujeitos com base territorial, sujeitos sem base

territorial, exceções para a Santa Sé e a Ordem de Malta, os indivíduos e as

organizações internacionais31.

As organizações não governamentais, objeto do presente estudo, possuem

personalidade jurídica de direito interno do Estado que as sedia. Este, ao reconhecer-

lhes a personalidade, concede-lhes poderes para prosseguirem suas atividades. No

entanto, a doutrina majoritária entende que as ONGs não são sujeitos de Direito

Internacional e não possuem personalidade jurídica para tal32.

Em sentido contrário, Quoc Dinh, Daillier e Pellet entendem que essas

organizações possuem “personalidade derivada, funcional e relativa33” e para Pereira e

30 MACHADO, Jónatas E. M. Direito Internacional: Do Paradigma Clássico ao Pós- 11 de Setembro. 2ª Edição. Coimbra: Coimbra Editora, 2004, p. 240. 31 PEREIRA, André Gonçalves; QUADROS, Fausto de. Manual.., cit., p. 303. 32 Nesse sentido ver SILVA, Roberto Luiz .Direito Internacional Público. 3ª Edição. Belo Horizonte: Del Rey, 2008, p. 184-185; SOARES, Guido Fernando

Silva. Curso de Direito Internacional Público. 2ª Edição. São Paulo: Editora Atlas, 2004, p.154-155. 33 DINH, Nguyen Quoc et all. Direito Internacional..., cit., p 661.

11

Quadros34 elas possuem personalidade jurídica iniciante dentro do ordenamento jurídico

internacional, sendo sua capacidade jurídica limitada pelas atividades que

desempenham.

A posição das organizações não governamentais, no cenário internacional,

encontra-se incerta. Não obstante o papel por elas desenvolvido, não existe um

instrumento internacional que regulamente suas atividades, seu âmbito de atuação e nem

sua personalidade jurídica.

Em âmbito regional, o Conselho da Europa, em 24 de abril de 1986,

regulamentou a matéria com a Convenção Europeia sobre o Reconhecimento da

Personalidade Jurídica das Organizações Internacionais Não Governamentais. No seu

preâmbulo, a Convenção reconhece a utilidade da participação das ONGs na

comunidade internacional e a sua contribuição para a concretização dos princípios e

objetivos, não só do Estatuto do Conselho da Europa mas também nos da Carta da

ONU35, e define em seu artigo 1º que as organizações não governamentais reguladas

sejam ONGs sem finalidade lucrativa, mas que tenham relevância internacional; sejam

criadas por ato relevante de direito interno de um Estado- parte; exerçam uma atividade

em pelo menos dois Estados; tenham sede estatutária no território de uma parte e sua

sede real no território desta ou de outra parte.

O artigo 2º estabelece não uma nova personalidade jurídica internacional às

organizações não governamentais, mas se limita a conceder que a personalidade e a

capacidade jurídica delas, reconhecidas pelo Direito interno de um Estado-parte onde

tenham sede estatutária, sejam reconhecidas de pleno direito no território das outras

partes. Dessa forma, esse reconhecimento somente se dá quando os Estados-membros

do Conselho da Europa ratificarem a Convenção, depois de cumpridos os requisitos nela

fixados 36.

A Carta Social Europeia dispõe que informações fornecidas por ONGs sobre a

aplicação da Convenção no território dos Estados signatários sejam incluídas em seus

relatórios. Ana Luisa Riquito observa que o Protocolo Adicional de 1995 foi mais além

34 CYNTHIA SOARES CARNEIRO vai ainda mais longe e afirma que as ONGs, como associações que representam a sociedade civil, não são somente

destinatárias de direitos e obrigações no plano internacional, como também possuem personalidade internacional e capacidade de agir mais ampla que a do

individuo, que é claramente reconhecido pela doutrina, como sujeito de Direito Internacional com capacidade jurídica limitada. Artigo 71, Capítulo X- Conselho

Econômico Social. In: Comentário à Carta das Nações Unidas. Leonardo Nemer Caldeira Brant (Org.), Belo Horizonte: Cedin, 2008, p. 959. 35 Convenção Europeia sobre o Reconhecimento da Personalidade Jurídica das Organizações Internacionais Não Governamentais. Disponível em:

http://www.gddc.pt/cooperacao/materia-civil-comercial/ce/ce-124-rar.htm. Acesso em 31 de janeiro de 2010. 36 PEREIRA, André Gonçalves; QUADROS, Fausto de. Manual.., cit., p. 310.

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e garantiu locus standi às ONGs que possuem estatuto consultivo junto ao Conselho,

para apresentar uma queixa coletiva37.

No decorrer dos últimos anos, percebeu-se uma clara mudança quanto ao

envolvimento e à participação de novos atores no cenário internacional, notadamente

com as organizações não governamentais e outros atores não estatais, em uma

irreversível “senda de privatização das relações internacionais” 38.

 

2.2 ATUAÇÕES DAS ONGS NO PLANO INTERNACIONAL

 

As ONGs podem estar ligadas a organizações internacionais, como é o caso da

Organização das Nações Unidas39, da Organização Internacional do Trabalho- OIT-,

entre outras. Nesta última, excepcionalmente, sindicatos, empresários e entidades

governamentais se articulam em níveis de igualdade, mas essa não é a regra.

A ONU, no artigo 7140 da sua Carta apresentou a possibilidade de diálogo, até

então inédito, entre uma organização internacional e associações da sociedade civil,

garantindo-lhes o estatuto consultivo. Esse estatuto foi conferido na esfera do Conselho

Econômico e Social e prevê participação dessas associações como observadoras em

seus foros, podendo inclusive, submeter declarações escritas e orais ao Conselho, desde

que dentro dos parâmetros fixados pela própria organização.

Por motivo de artigo 71 não definir critérios para a participação das ONGs, foi

criado em 1946 o atualmente denominado Comitê Encarregado das Organizações Não

Governamentais, que, entre, as suas funções, já redigiu relatórios utilizados pelo

Conselho para embasar certas decisões referentes a normas gerais de procedimentos

com as instituições não estatais41. Dentre essas normas, foi editada, em 23 de maio de

1968, a Resolução 1296 (LXIV), uma substituição à Resolução 288 B(X) de 1950, que

regulamentava os critérios para a entrada e a participação das ONGs nas conferências

37 RIQUITO, Ana Luisa. Variações..., cit., p. 222. 38 GOUVEIA, Jorge Bacelar. Manual de Direito Internacional Público. 3ª Edição. Coimbra: Almedina, 2008, p.600. 39 Doravante denominada pela sigla ONU. 40 Artigo 71, Carta das Nações Unidas: “O Conselho Econômico e Social poderá entrar nos entendimentos convenientes para a consulta com organizações não

governamentais, encarregadas de questões que estiverem dentro da sua própria competência. Tais entendimentos poderão ser feitos com organizações

internacionais e, quando for o caso, com organizações nacionais, depois de efetuadas consultas com o Membro das Nações Unidas no caso”. Disponível em:

http://www.onu-brasil.org.br/doc5.php. Acesso em 30 de janeiro de 2010. 41 CARNEIRO, Cynthia Soares. Capítulo X..., cit., p.950.

13

internacionais convocadas pela ONU. Em 25 de julho de 1996, foi adotada a Resolução

1996/3142, que alterou e aperfeiçoou as resoluções anteriores.

Foram fixadas as regras para a análise dos requerimentos de admissão das

organizações não governamentais, os procedimentos em caso de aceitação ou de recusa,

os limites de suas participações e também os casos de suspensão e/ou retirada do

estatuto consultivo. Essa resolução estabeleceu também três categorias de status

consultivo: geral, especial e Roster.

A primeira categoria, denominada geral, são as organizações que compreendem

em suas finalidades vários temas abrangidos pelas atividades do Conselho e de seus

órgãos subsidiários e que denotem capacidade para cooperar para a consecução dos

objetivos das Nações Unidas.

O status consultivo especial é mais limitado e é conferido às ONGs dedicadas

apenas a algum campo específico, mais restrito entre aqueles desenvolvidos pelo

Conselho.

E, por fim, as organizações que não se encaixam em nenhuma das categorias

citadas, mas que podem fazer contribuições ocasionais e úteis para o Conselho e seus

órgãos subsidiários, inclusive a outros órgãos das Nações Unidas, dentro de suas

competências, são incluídas em uma lista, Roster, mas que não são qualificadas com o

status consultivo geral nem especial43.

A resolução supramencionada oficializou a participação das organizações não

governamentais nas sessões do Conselho, nas Conferências Internacionais da ONU e

também nos trabalhos preparatórios, na qualidade de observadores44. Para a participação

das ONGs no sistema da ONU, elas precisam ter garantia de representatividade, mais de

dois anos de existência e de atuação, podendo receber incentivos estaduais, mas que não

ultrapassem o montante de 30%, e suas decisões internas tem de ser tomadas, por vias

democráticas.

Com os avanços advindos dessa resolução, notam-se a importância e o

crescimento do papel das organizações não governamentais no cenário internacional

atual.

42 Resolução 1996/31, disponível em: http://esango.un.org/paperless/Web?page=static&content=resolution. Acesso em 30 de janeiro de 2010. 43 Resolução 1996/31, parágrafo 24. 44 Resolução 1996/31, parágrafo 42.

14

Jónatas Machado salienta que as organizações não governamentais são as

grandes impulsionadoras do nascimento da sociedade civil global45, haja vista a

importância que esses novos atores vêm obtendo nos últimos anos. Observando-se a

multiplicidade de campos de atuação dessas instituições, suas atividades de fiscalização

de cumprimento dos acordos internacionais, de busca e transmissão da informação, têm

lhes granjeado acesso aos principais fóruns internacionais e possibilitando um maior

acesso e participação na tomada de decisão.

3. DESASTRES AMBIENTAIS

Desastre46 é um acontecimento inesperado, podendo ser natural ou provocado

por ação humana, susceptível de provocar vítimas, prejuízos materiais e ambientais.

Assim, se um evento geofísico resulta em elevado número de vítimas e gera um grande

prejuízo econômico pode-se defini-lo como um desastre natural. Seguindo essa ideia, se

um fenômeno natural acontece em uma região desprovida de interesses humanos, não

constituiria uma calamidade.

Entretanto, com a atual interdependência do meio ambiente com o homem, as

devastações que afetam o meio ambiente puramente podem ser definidas como

catástrofes47. Reduzir o conceito de desastre a uma relação causa/efeito com a presença

humana não condiz com a real percepção do acontecimento natural como resultante de

forças inevitáveis da natureza48.

45 MACHADO, Jónatas E. M. Direito Internacional..., cit., p. 239. De acordo com ANA FLÁVIA BARROS- PLATIAU “a sociedade civil global, como

Wapner define, é tudo que se encontra entre as esferas pública e individual, ou seja, o que há abaixo do Estado e acima do indivíduo. A sua maior diferença com o

conceito de sociedade internacional é o fato de ressaltar o papel dos atores não- estatais, cada vez mais independentes dos Estados.” Novos Atores, Governança

Global e o Direito Internacional Ambiental. In: Meio Ambiente, Vol. I. Grandes Eventos. Brasília: Escola Superior do Ministério Público, 2004, p. 4. 46 De acordo com a Resolução nº. 2 da Política Nacional de Defesa Civil do Brasil, desastre natural é “o resultado de eventos adversos, naturais ou provocados

pelo homem, sobre um ecossistema vulnerável, causando danos humanos, materiais e ambientais e consequentes prejuízos econômicos e sociais. A intensidade de

um desastre depende da interação entre a magnitude do evento adverso e a vulnerabilidade do sistema, e é quantificada em função de danos e prejuízos”.

Disponível em: http://defesacivil.gov.br/politica/index.asp. Acesso em 10 de Julho de 2010. 47GARBACCIO, Grace Ladeira; PAGEAUX, Mathieu. Visão Europeia do Direito das Catástrofes. In: Direito Ambiental, Mudanças Climáticas e Desastres.

Impacto nas Cidades e no Patrimônio Cultural. Antônio Herman Benjamim, Eladio Lecey, Sílvia Cappelli (orgs.), São Paulo, Imprensa Oficial do Estado de São

Paulo, Vol. II, 2009, p.293. 48 Em sentido contrário, JEAN-PIERRE DUPUY aduz que “Um risco natural caracteriza-se pela combinação do acaso (ou seja, do fenômeno geológico gerador)

com a vulnerabilidade (o efeito sobre agrupamentos humanos). O que caracteriza hoje um risco, no plano de seu impacto, o que faz dele uma catástrofe, é a

exposição dos homens. Nesta medida, uma das conclusões do decênio internacional para a prevenção das catástrofes naturais (DIPCN), que terminou em 2000, foi

considerar que já não fazia sentido falar de <catástrofe natural>. Se o acaso natural existe, e não o podemos impedir, é a vulnerabilidade social que transforma o

fenômeno em catástrofe”. Ainda há catástrofes naturais? In: Análise Social. Revista do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, vol. XLI, nº.

181, 2006, p.1183.

15

Claro que não se pode negar e nem poderia deixar de ser discutido o impacto que

a atuação humana produziu e ainda produz sobre o planeta. O homem, agindo sob o

prisma de superioridade sobre a natureza, através da exploração desenfreada dos

recursos naturais, da explosão demográfica, da urbanização desordenada, da poluição,

do desmatamento entre outras coisas, afeta de forma profunda o meio ambiente e, com

isso, as mudanças nos ecossistemas e no planeta já são visíveis.

As mudanças climáticas, notadamente o aquecimento global, estão, sem sombra

de dúvida, intimamente ligadas ao aumento dos extremos climáticos49.

E o questionamento que surge é até que ponto essas calamidades são realmente

naturais? Peter Walker observa que, apesar de inundações na China e secas na África se

enquadrarem como desastres naturais, no que diz respeito às inundações, muitas vezes

elas têm a ver não só com a quantidade de chuva, mas também como o uso

indiscriminado da terra. Ele exemplifica com a ocorrência do tsunami que atingiu Papua

Nova Guiné, em 1998, e que teve consequências pioradas por causa do desmatamento

resultante da exploração madeireira na região e com as ocorrências de fome derivadas

da seca extrema no continente africano, que muitas vezes coincidiram com conflitos das

mais variadas intensidades50.

Dados da Cruz Vermelha revelam que, em comparação com 1989-1998, a

década passada teve um aumento de mortes por catástrofes em 62%, e o número de

pessoas afetadas por esses eventos aumentou em 26%51. Pode se concluir, então, que as

mudanças climáticas52 com as intervenções humanas na natureza são fatores que afetam

sim e de maneira substancial a incidência dos desastres naturais.

49 Apesar das alterações climáticas no planeta terem impulsionado um movimento crescente de preocupação quanto aos reais e potenciais efeitos de um desastre

natural e da assistência a ser prestada nesses casos, esse tema já se encontrava há algum tempo na agenda mundial. Prova disso foi a criação, em 1927, no âmbito

da Liga das Nações, da União Internacional do Socorro (International Relief Union), que tinha como objetivo “oferecer assistência em caso de catástrofes que

superassem os recursos das populações atingidas; coordenar as organizações de ajuda humanitária durante calamidades públicas; promover o estudo da prevenção

de desastres e influenciar a assistência mútua internacional”. Não obstante a inovação que a União representava em relação às preocupações dos Estados quanto à

assistência humanitária em casos de catástrofes naturais, essa nunca chegou a ter plena efetividade. As dificuldades enfrentadas por esse organismo, foram

oriundas em grande parte, do seu orçamento reduzido, que lhe possibilitou uma atuação meramente simbólica e por ter ser restringido aos meios administrativos e

burocráticos URIOSTE, Alejandra de. When Will Help Be on the Way? The Status of International Disasters Response Law. In: Tulane Journal of

International and Comparative Law, Vol. 15, issue 1, 2006, p. 181- 206, p. 183-184; COURSEN- NEFF, Zama. Preventive Measures Pertaining to

Unconventional Threats to Peace such as Natural and Humanitarian Disasters. In: New York University Journal of International Law and Politics, Vol. I,

issues 3/ 4, 1998, p. 645-708, p. 645-646. 50 WALKER, Peter. Victims of Natural Disaster and the Right to Humanitarian Assistance: a Practitioner´s View. In: International Review of the Red

Cross. Disponível em: <http://www.icrc.org/web/eng/siteeng0.nsf/htmlall/57jpje?opendocument> Acesso em 15 de Fevereiro de 2010. 51 World Disasters Reports, International Federation of Red Cross and Red Crescent Societies, 2009, p. 180. 52 Em 1988, as Nações Unidas juntamente com a Organização Meteorológica Mundial e o Programa das nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA)

estabeleceram o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas – IPCC (sigla em inglês para Intergovernmental Panel on Climate Change) com o

propósito de avaliar, analisar e fornecer dados e informações científicas, técnicas e sócio - econômicas sobre as alterações climáticas. É uma organização científica

e por sua natureza intergovernamental está aberta para a participação de todos os países da ONU e da Organização Meteorológica Mundial. Mais informações

disponíveis em: http://www.ipcc.ch/organization/organization_history.htm Acesso em 11 de Julho de 2010.

16

Ante essa percepção, as Nações Unidas declararam os anos 90 como a Década

Internacional para Redução dos Desastres Naturais. Posteriormente, em dezembro de

1999, a organização declarou por meio da Resolução 44/236 e depois confirmou com a

Resolução 56/195 que a segunda quarta-feira de outubro seria o Dia Internacional para

Redução de Desastres Naturais.

Ainda em 1999, também foi criada no âmbito das Nações Unidas, a Estratégia

Internacional para Redução de Desastres (International Strategy for Disasters

Reduction- ISDR), que surgiu com o objetivo de conscientizar, promover e desenvolver

um compromisso com autoridades públicas sobre risco, vulnerabilidade e redução dos

desastres, difusão da informação e de conhecimentos científicos, de modo a reduzir as

perdas humanas, sociais, econômicas e ambientais53.

A crescente preocupação mundial com as calamidades naturais é um fator que

pode ser mensurado. O número de mortos resultantes dessas tragédias e os prejuízos que

delas decorrem chamam a atenção dos governos e, com isso, atenta-se para uma maior

inclusão nas políticas públicas de questões relativas à prevenção e à redução dos riscos.

Nos países desenvolvidos, como Japão e Estados Unidos que costumam ser

afetados por fenômenos naturais, já se encontram bastante desenvolvidos

tecnologicamente e com infraestrutura para lidar com acontecimentos de tal magnitude.

Mas nem eles estão imunes às consequências que podem vir a ser devastadoras. Um

grande exemplo foi o furacão Katrina, que em 2005 devastou Nova Orleães, no sul dos

Estados Unidos, e que deixou um rastro de milhares de mortos e um prejuízo que

chegou a bilhões de dólares.

Quando os eventos de natureza catastrófica atingem países em desenvolvimento,

os resultados são ainda mais alarmantes. Em uma gama de fatores que vai desde a

inexistência de estruturas aptas para lidar com essas situações, aliada à concentração de

populações em áreas vulneráveis, a carência de recursos financeiros não só na

prevenção, mas principalmente na recuperação, acaba por resultar em tragédias de

grandes proporções. Um dos problemas resultantes dos desastres tem sido o aumento do

número de refugiados ambientais. As alterações climáticas no planeta têm ocasionado

secas prolongadas, aumento na incidência de chuvas e dos próprios fenômenos naturais,

obrigando, dessa forma, que milhares de pessoas abandonem suas casas e migrem em

busca de melhores condições. As correntes migratórias impulsionadas por problemas

53 Estratégia Internacional para Redução de Desastres- International Strategy for Disasters Reduction- ISDR. Mais informações disponíveis em:

http://www.unisdr.org/eng/about_isdr/isdr-mission-objectives-eng.htm Acesso em 10 de Julho de 2010.

17

ambientais e calamidades naturais tendem a sobrecarregar as estruturas dos locais onde

os refugiados procuram abrigo e com isso, inicia-se um ciclo inesgotável de problemas.

E é nesse cenário que surge a atuação de organismos da sociedade civil, como as

ONGs e, em especial, a Cruz Vermelha, com intuito de fornecer condições mínimas de

subsistência para aqueles vitimados por esses eventos catastróficos.

Contudo, os desastres naturais estudados neste trabalho serão limitados a

fenômenos naturais, tais como terremotos, inundações, furacões, tsunamis, erupções

vulcânicas, não englobando calamidades resultantes da ação humana, os chamados

desastres tecnológicos.

4. COMITÊ INTERNACIONAL DA CRUZ VERMELHA

 

Em 1859, o médico suíço Henry Dunant, ao presenciar o fim da Batalha de

Solferino, entre a França e a Áustria, ficou chocado diante do abandono dos feridos e

dos mortos em combate. Dessa forma, resolveu, juntamente com mais cinco pessoas

criar uma organização voluntária, neutra, que teria como objetivo a assistência aos

feridos e aos mortos em conflitos. Dunant também visualizou a necessidade de se criar

um acordo internacional para garantir a proteção dos feridos e dos que atuavam na

assistência em campos de batalha.

Em função dos seus esforços, foi criado, primeiramente, o Comitê Internacional

para Ajuda aos Militares Feridos, que mais tarde se transformou no Comitê

Internacional da Cruz Vermelha. E esse Comitê organizou, em 1864, uma conferência

em Genebra, em convênio com o governo suíço, que resultou na Convenção para

Melhoria das Condições dos Feridos nos Exércitos no Terreno, o embrião da I

Convenção de Genebra para proteção das vítimas de guerra. Posteriormente, foram

criadas as Sociedades Nacionais, e suas atividades se espalharam pela Europa e, em

seguida, por uma série de outros países.

Durante a Segunda Guerra Mundial, a Cruz Vermelha teve uma atuação intensa,

especialmente com os prisioneiros e com os seus repatriamentos54. Em 1949, foram

aprovadas as quatro Convenções de Genebra e, em 1977, os dois protocolos adicionais.

54 GASSER, Hans- Peter. International Committee of the Red Cross. In: R. Wolfrum (Ed.), The Max Planck Encyclopedia of Public International Law, Oxford

University Press, 2010, online edition. Disponível em: http://www.mpepil.com/subscriber_article?script=yes&id=/epil/entries/law-9780199231690-

e310&recno=1&author=Gasser . Acesso em 15 de Janeiro de 2010.

18

O Movimento Internacional da Cruz Vermelha é formado pelo Comitê

Internacional da Cruz Vermelha55, Sociedades Nacionais da Cruz Vermelha e do

Crescente Vermelho e Federação Internacional de Sociedades da Cruz Vermelha e do

Crescente Vermelho. O CICV, as Sociedades Nacionais e a Federação Internacional são

organizações independentes, mas possuem como mais alta autoridade a Conferência

Internacional, que se reúne, a princípio, em período de quatro em quatro anos ou quando

há, excepcionalmente, um caso de necessidade extraordinária, com os representantes

dos Estados-membros das Convenções de Genebra56.

Os Estatutos do Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente

Vermelho57 foram adotados primeiramente na Conferência Internacional de 1986, sendo

complementados em 1995 (pela Resolução VII) e por fim, em 2006, pela Resolução I da

29ª Conferência Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho. Os Estatutos

determinam a relação entre as duas instituições; e o Acordo de Sevilha, de 1997,

explicita a responsabilidade e os princípios que regem o Movimento.

O Comitê é o órgão fundador do movimento é ele que coordena as ações

internacionais da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho. É composto de 15 a 25

membros, de nacionalidade suíça, que tenham experiência e vasto conhecimento em

assuntos humanitários. O Comitê se reúne durante o ano em assembleia, que fixa os

objetivos, as políticas a serem tomadas, bem como aprova o orçamento e elege o

presidente do Comitê. O mandato do presidente é de um período de quatro anos

renovável por mais quatro.

As atividades do Movimento da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho são

embasadas pelos princípios da Humanidade, Imparcialidade, Neutralidade,

Independência, Voluntariado, Unidade e Universalidade. Esses princípios, que foram

estabelecidos na 20ª Conferência Internacional da Cruz Vermelha de 1965, seguem uma

hierarquia apoiados no princípio fundamental da Humanidade e têm como objetivo

colocar regras de conduta para a atuação humanitária58.

55 De agora em diante denominado pela sigla CICV. 56 Descubra o CICV, disponível em: http://www.icrc.org/Web/por/sitepor0.nsf/htmlall/p0790/$File/ICRC_007_0790.PDF. Acesso em 15 de fevereiro de 2010. 57 Mais informações sobre os Estatutos <http://www.ifrc.org/Docs/pubs/who/constitution/120500-statutory-texts-en.pdf> 58 Esses princípios são divididos em substanciais, derivados e orgânicos.

Os princípios substanciais são aqueles que se consubstanciam em um fim e não em meios, já os derivados são os que garantem a transposição dos substanciais para

a realidade dos fatos e, por fim, os princípios orgânicos versam sobre as regras de aplicação sobre a forma e o funcionamento da organização58.

Humanidade é o princípio basilar do Movimento, e afirma, em seu âmbito nacional e internacional, seu dever em prevenir e aliviar o sofrimento humano, bem

como empenhar-se no respeito à pessoa humana, na proteção da vida e da saúde. Estimula a compreensão mútua, a amizade, a cooperação e a paz entre os povos.

O princípio da Imparcialidade compromete-se ao socorro dos que dele necessitam, não havendo distinção entre raça, nacionalidade, religião, condição social ou

vinculação política, priorizando somente os casos de maior necessidade.

19

O financiamento da organização é feito por meio de contribuições voluntárias

dos Estados signatários das Convenções de Genebra, das Sociedades Nacionais da Cruz

Vermelha e do Crescente Vermelho, de organizações supraestatais e de fundos de

origem público e privado. As contribuições podem ser feitas de várias maneiras,

podendo ser por meio de alimentos, de dinheiro, de serviços. A maior parte do

financiamento provém de um grupo denominado Grupo de Doadores, formado por

doadores governamentais e internacionais, que doam por ano o mínimo de 10 milhões

de francos suíços. Ainda assim, a organização faz apelos para aumentar as contribuições

e, com isso, ter a capacidade financeira para atuar em todas as situações em que sua

presença se faz necessária59.

4.1 NATUREZA JURÍDICA

A natureza jurídica do Comitê Internacional da Cruz Vermelha se destaca dentro

do quadro legal em que outras organizações não governamentais se inserem.

A Cruz Vermelha é uma associação criada em consonância com o direito interno

suíço, regida pelos artigos 60 e seguintes do Código Civil desse país, mas que tem como

característica relevante sua atuação no campo do Direito Internacional, mais

especificamente no Direito Internacional Humanitário. Suas ações no domínio

humanitário, agindo sob o prisma de um serviço público internacional60, permitem-lhe

que intervenha no território de determinados Estados para que exerça sua missão de

assistência aos necessitados.

A base legal de sua atuação vem das quatro Convenções de Genebra de 1949. A

primeira Convenção diz respeito à proteção dos feridos e enfermos; a segunda é relativa

aos náufragos, feridos e enfermos no mar; a terceira refere-se aos prisioneiros de guerra

e a última à proteção dos civis em tempo de guerra61. Em 1977, foram adotados dois

Neutralidade tem como objetivo envolver-se nas situações de conflito, sem qualquer interferência nas questões de matéria política, racial, religiosa e ideológica, de

modo a conservar a confiança de todas as partes.

Independência- visa levar as Sociedades Nacionais a atuarem em apoio ao poder público, com suas atividades submetidas às normas dos seus respectivos países,

mas conservando sempre uma autonomia para agir dentro dos princípios que regem o movimento.

Voluntariado objetiva auxiliar desinteressadamente aqueles que necessitam de ajuda.

Unidade - em cada país só pode haver uma Sociedade da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho, acessível a todos de maneira a atuar dentro de todo o território.

Universalidade - sendo a Cruz Vermelha uma instituição universal, todas as sociedades têm direitos iguais e o dever de se ajudarem umas às outras. 59 Descubra o CICV, p. 51. 60 PEREIRA, André Gonçalves; QUADROS, Fausto de. Manual..., cit., p. 403. 61 BORGES, Leonardo Estrela. O Direito Internacional Humanitário. Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2006, p. 28.

20

protocolos, com o objetivo de complementar as lacunas existentes nas Convenções

citadas.

Desse modo, apesar da sua origem e ligação com o estado suíço, país da sede da

organização, o Comitê, pela importância das suas atividades internacionais, possui uma

natureza jurídica sui generis, que lhe é conferida diante dos inúmeros Acordos sede e

Convenções assinadas com diversos países.

Os acordos com os Estados lhe concedem uma serie de privilégios e imunidades,

em um status quase diplomático, em que não somente é garantida a independência e a

liberdade de ação, mas a inviolabilidade das suas instalações e também a imunidade de

jurisdição e execução da instituição e de seus funcionários62. Os privilégios e

imunidades de que ela goza lhe permitem atuar dentro da esfera da neutralidade e da

independência, possibilitando, assim, que ela cumpra sua missão e garanta a confiança

entre as partes em conflito.

Pode-se afirmar que o Comitê Internacional da Cruz Vermelha, não obstante a

sua característica não governamental e não lucrativa, é um sujeito internacional, mas

com personalidade jurídica limitada, posto que sua atuação é restrita aos objetivos

estabelecidos nas Convenções de Genebra. Wladimir Brito observa que, examinando a

prática internacional, percebe-se a atribuição de direitos e obrigações a essa organização

e ressalta inclusive, a sua contribuição na produção normativa do Direito das Gentes,

quando participa da celebração de tratados e acordos internacionais63.

A sua personalidade jurídica internacional foi reconhecida pela Organização das

Nações Unidas através da Resolução 45/664, de 16 de outubro de 1990, que lhe

concedeu o status de observador na Assembleia Geral e lhe garantiu uma gama de

direitos necessários ao exercício de sua missão.

O Comitê atua como observador, não somente na Assembleia Geral da ONU,

mas em várias agências dessa instituição como o “OCHA-UN Office for the

Coordination of Humanitarian Activities”, - o ACNUR - Alto Comissariado das Nações

Unidas para Refugiados – e também em inúmeras outras organizações

intergovernamentais, tais como a União Europeia e União Africana.

62 GASSER, Hans- Peter. International Committee of the Red Cross. In: R. Wolfrum (Ed.), The Max Planck Encyclopedia of Public International Law,

Oxford University Press, 2010, online edition. Disponível em: Disponível em: http://www.mpepil.com/subscriber_article?script=yes&id=/epil/entries/law-

9780199231690-e310&recno=1&author=GasserAcesso em 12 de Janeiro de 2010. 63 BRITO, Wladimir. Direito Internacional Público. Coimbra: Coimbra Editora, 2008, p. 449. 64 Resolução 45/6 disponível em: http://daccess-dds-ny.un.org/doc/RESOLUTION/GEN/NR0/563/95/IMG/NR056395.pdf?OpenElement. Acesso em 13 de

Fevereiro de 2010.

21

4.2 PAPEL DA CRUZ VERMELHA COMO APLICADORA DO DIREITO HUMANITÁRIO

Como Leonardo Estrela Borges observa o nascimento do Comitê Internacional

da Cruz Vermelha confunde-se com a origem do próprio direito internacional

humanitário65.

O Direito Humanitário66 é um ramo específico do Direito Internacional Público,

que tem como escopo regulamentar as normas em situações de conflitos armados. Essas

normas têm como finalidade limitar os métodos e meios de guerra e tentar minimizar os

sofrimentos dos que se encontram atingidos pelo conflito.

Esse direito se desenvolveu com base em três correntes, o Direito de Haia, o

Direito de Genebra e o Direito de Nova York. O Direito de Haia, também denominado

como Direito da Guerra, originou-se nas Conferências de Paz ocorridas em 1899 e 1907

e busca regular os meios de condução das hostilidades. O Direito de Genebra, que

engloba as Convenções de Genebra e os Protocolos Adicionais, visa à proteção das

vítimas em caso de conflitos armados.

E por fim, o Direito de Nova York, que se desenrolou com a atuação das Nações

Unidas na esfera do Direito Humanitário67. Com a adoção da Resolução 2444 pela

Assembleia Geral, que reconhecia a necessidade de se aplicarem os princípios

humanitários às situações de conflitos armados, as Nações Unidas adotaram também a

Resolução XXVIII da XX Conferência da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho,

realizada em 1965, e que continha os princípios norteadores em ocorrência de conflitos:

a) O direito das partes em conflito de escolherem os meios para

prejudicar o inimigo não é ilimitado

b) A proibição de direcionar ataques contra a população civil como tal;

c) A distinção, entre os que participam das hostilidades e a população

civil, que deve ser feita a todo tempo, de modo a poupar os últimos sempre que

possível68.

65 BORGES, Leonardo Estrela. O Direito Internacional..., cit., p .63. 66 Esse Direito pode ser entendido como: “As regras internacionais, de origem convencional ou costumeira, que são especificamente destinadas a regulamentar os

problemas humanitários decorrente diretamente dos conflitos armados, internacionais ou não internacionais, e que restringem, por razões humanitárias, o direito

das partes no conflito de empregar métodos e meios de guerra de sua escolha ou que protegem as pessoas e bens afetados ou que podem ser afetados pelo

conflito”. GASSER apud BORGES, Leonardo Estrela.. O Direito Internacional..., cit., p. 16. 67 Nessa atuação das Nações Unidas se destacam: a Resolução 2603 de 1969, relativa a condenação de uso de armas químicas e biológicas; Resolução 2936 que

condena o uso de armas e forças nucleares; a Declaração sobre a Proteção das Mulheres e Crianças em Período de Urgência e Conflitos Armados de 1974 e a

Convenção sobre a Proibição do Uso de Técnicas de Modificação Ambiental para Fins Militares ou Quaisquer outros Fins Hostis, de 1977. 68 Resolução 2444 da Assembleia Geral, disponível em: http://daccess-dds-ny.un.org/doc/RESOLUTION/GEN/NR0/244/04/IMG/NR024404.pdf?OpenElement.

Acesso em 09 de Julho de 2010.

22

O fortalecimento da relação entre as Nações Unidas e o CICV ocorreu em 1990,

após o Comitê receber o status de observador junto aos fóruns da organização69.

Na esteira do surgimento em julho de 1998, do Tribunal Penal Internacional,

instituído pelo Tratado de Roma, origina-se o Direito de Roma. A instauração desse

Tribunal vem a preencher uma das maiores lacunas existente no Direito Internacional

Penal, ou seja, a falta de um sistema jurisdicional internacional permanente apto para

punir indivíduos acusados de desrespeito aos Direitos Humanos e Direito Humanitário.

A Cruz Vermelha tem entre suas tarefas difundir o Direito Internacional

Humanitário, zelar para a aplicação dele e de suas eventuais violações. Através da

comunicação e na difusão de conhecimentos, o CICV atua em três níveis: na

conscientização; na promoção do DIH através do ensino e da formação e na articulação

entre o Direito Humanitário e os programas públicos de caráter educativo, jurídico e

operacional70.

O Comitê, por meio da Assessoria de Direito Humanitário, estimula os Estados-

membros das Convenções de Genebra a adotarem legislação no sentido de aplicar o

Direito Humanitário nacionalmente. Ele também procura maneiras de promover a

implementação das disposições pertinentes a esse direito, inclusive por meio do

desenvolvimento de novas normas71.

Embora sejam os Estados os principais aplicadores desse direito, seus preceitos

se materializam por meio da atuação da Cruz Vermelha.

4.2.1. Proteção e Assistência

A atuação do Comitê Internacional da Cruz Vermelha se realiza em duas frentes:

a da proteção e da assistência, e ambas são abordadas e regidas pelas Convenções de

Genebra de 1949.

69 O Direito Internacional Humanitária e Direitos Humanos. Ficha Informativa sobre Direitos Humanos nº. 13, Rev. I. Gabinete de Documentação e Direito

Comparado, Procuradoria Geral da República, Lisboa, 2001, p.13. 70 Descubra o CICV, p. 41. 71 Descubra o CICV, p. 16.

23

O sentido de assistência engloba dois conceitos, a assistência em si mesmo e o

instituto da proteção. A proteção se desenvolve antes da assistência, e esta só acontece

quando a primeira não funciona72.

Em situações de urgência ou de conflitos armados a organização busca garantir o

respeito pelas normas de Direito Humanitário, relembrando as partes dos seus deveres e

direitos assegurados pelas Convenções de Genebra.

O CICV busca, através do contato com as partes em combate, proteger a vida, a

saúde e a pessoa humana. Dessa forma, suas atividades procuram minimizar os perigos

e ameaças que afligem as pessoas, em meio ao conflito ou estados de urgência, e

prevenir ou pôr um fim às situações de violações dos direitos humanos.

A Cruz Vermelha tem como compromisso a proteção e a assistência dos que se

encontram em desamparo, e para isso, opera em diálogo com os atores estatais e os não

estatais, buscando a promoção, a difusão e a aplicabilidade das regras de Direito

Humanitário. Assim, a ação protética deve anteceder a assistencialista, com o objetivo

de sempre de evitar que se recorra a ultima. No entanto, caso isso seja possível, a

assistência deverá sempre ser acompanhada da proteção73.

O Instituto de Direito Internacional (IDI) adotou no Relatório Bruges74, de 2003,

a definição de Assistência Humanitária:

Todos os atos, atividades, recursos humanos e materiais para o fornecimento de bens e serviços de caráter exclusivamente humanitário, indispensável para a sobrevivência e para a satisfação das necessidades essenciais das vítimas de catástrofes 75.

O conceito de Assistência tem como ponto fundamental todas e quaisquer ações

com o intuito de minorar o sofrimento daqueles que, seja pela guerra, pelas catástrofes

naturais ou por qualquer outro evento, encontram-se em situação de penúria. Essa ajuda,

geralmente, é feita pelo envio de bens para a satisfação de necessidades básicas

urgentes, como alimentos, medicamentos, ou por envio de profissionais e até suporte

econômico.

72 RAIMUNDO, Isabel. Imperativo Humanitário e Não-Ingerência. Os Novos Desafios do Direito Internacional Contemporâneo. Lisboa: Edições Cosmos,

Instituto de Defesa Nacional, 1999, p. 49. 73 RAIMUNDO, Isabel. Imperativo Humanitário..., cit., p. 49. 74 Relatório Bruges. Disponível em: http://docs.google.com/viewer?a=v&q=cache:oIcTcWuUMuQJ:www.idi-

iil.org/idiE/resolutionsE/2003_bru_03_en.PDF+Bruges+Resolution&hl=pt-BR&pid=bl&srcid=ADGEESiMgmnq3_j4-kkiCnbrdPmv-

fTsJXIdFYSJ96gXrajNudNppygH_QW9u68tfy8g_Fl7FKKAEkVGa0pHI4X5MVmmB_FhU5jBoDYESsd7svf_fwJpJsXD6USyZaUrXTCn3dIERId&sig=AHIEt

bSfP8b6qjaBPq7ssfxHBzC97sTKqg Acesso em 15 de Fevereiro de 2010. 75 ‘Humanitarian assistance’ means all acts, activities and the human and material resources for the provision of goods and services of an exclusively

humanitarian character, indispensable for the survival and the fulfillment of the essential needs of the victims of disasters. (Artigo 1º.) Tradução nossa.

24

Diante do estudo desse instituto, faz-se necessária a distinção entre assistência

humanitária principal e assistência humanitária subsidiária ou internacional.

Assistência humanitária principal é a prestada pelos Estados onde ocorreu a

emergência humanitária. E ela é, acima de tudo, um dever do Estado atingido, uma vez

que decorre da sua própria soberania e também em função de ser ele o que mais tem

condições de atuar de maneira rápida e eficaz após uma análise das necessidades

exigidas pela ocorrência.

Nesse sentido, Budislav Vukas pondera que o Estado onde ocorreu a emergência

é o principal responsável pela organização, coordenação, disposição e distribuição de

assistência humanitária. No entanto, ele ressalta que nesse dever primário dos Estados

afetados, incluem-se também todos os seus órgãos centrais, autoridades locais e

inclusive os componentes da sociedade civil que são capazes de ajudar, em especial as

ONG nacionais, cuja finalidade é a assistência em tais situações76.

Apesar de ser o sujeito da assistência humanitária primária, o Estado atingido,

em caso de inaptidão de proporcionar o auxílio necessário, tem o dever de permitir a

assistência humanitária oferecida por outras instituições de vocação

protética/assistencialista e de outros organismos da comunidade internacional.

A assistência subsidiária ou internacional surge concomitante às ações

governamentais ou diante da inércia ou da inaptidão do Estado que as deveria

proporcionar. Essa assistência é prestada por organizações internacionais e organizações

não governamentais de atuação humanitária, tal como a Cruz Vermelha, objeto deste

trabalho.

J. A. Carrillo Salcedo entende que o direito de receber assistência implica o

direito a solicitá-la, ou seja, o direito à assistência humanitária engloba o direito de

solicitar/receber esse auxílio77. De acordo com os “Princípios que regem o Direito à

Assistência Humanitária”, enunciados pelo Instituto Internacional de Direito

Humanitário em 1992, o Estado tem o dever de prestar assistência às vítimas dentro de

seu território; e os outros Estados, as Organizações Internacionais e as ONGs têm o

direito de fornecer a assistência humanitária para as vítimas, mas com o prévio

76 VUKAS, Budislav. Humanitarian Assistance in Cases of Emergency. In: R. Wolfrum (Ed.), The Max Planck Encyclopedia of Public International Law,

Oxford University Press, 2007, online edition. Disponível em: http://www.mpepil.com.ezproxy.ub.unimaas.nl/subscriber_article?script=yes&id=/epil/entries/law-

9780199231690-e823&recno=1&searchType=Advanced&title=humanitarian+assistance+in+cases+of+emergency. Acesso em 18 de Fevereiro de 2010, parágrafo

20. 77 Carrillo Salcedo apud RUIZ, Rosario Ojinaga. Emergencias Humanitarias y Derecho Internacional: La asistencia a las víctimas. Cruz Roja Española.

Valencia: Tirant lo Blanch, 2005, p.198-199.

25

consentimento do país onde se desenrola a crise78. Em um cenário de multiplicidade de

novos atores, capazes de prestarem essa assistência subsidiária, o Estado, em situações

de emergências humanitárias, deve não só aceitar, mas também facilitar a entrada desses

organismos.

Desse modo, a assistência em um sentido amplo, engloba tanto as ações

destinadas a promover o envio de recursos materiais e econômicos, como as medidas de

proteção das vítimas dos desastres79.

Entretanto, o direito à assistência humanitária em situações de catástrofes

ambientais não possui um escopo legal definido. Apesar de já existirem instrumentos

jurídicos relativos à assistência humanitária, esses são voltados para as que ocorrem em

tempos de conflitos. Ainda assim, pode-se atribuir à assistência humanitária em

desastres naturais, princípios gerais de direito e princípios relacionados com os direitos

humanos.

Os princípios e regras que podem ser aplicados à assistência, tema deste

trabalho, são diversos e somente variam em razão da sua natureza jurídica, posto que

alguns são princípios gerais e normas do direito consuetudinário internacional, outros

são normas ius cogens80 de observância geral e imperativa81. O direito à vida, direito à

liberdade, à integridade física, à dignidade da pessoa humana são princípios mais do que

consolidados na esteira jurídica e embasam o direito à assistência humanitária também

em caso de catástrofes naturais.

O direito à assistência humanitária tem a sua origem no costume internacional.

Sob a ótica da doutrina do direito costumeiro, para que uma norma se cubra de um

caráter obrigatório e vinculativo perante um Estado, tem de existir uma ampla e

uniforme prática, como prova da aceitação dessa regra como direito.

Diante disso, alguns autores afirmam o surgimento de uma nova visão do direito

consuetudinário internacional e entendem como possível a criação de costume por

atores não governamentais, tais como organizações internacionais e algumas

78 FERNANDES, J. Alcaide; MÁRQUEZ CARRASCO, Mª. Del C.; CARRILLO SALCEDO, J. A. La Asistencia Humanitaria en Derecho Internacional

Contemporáneo. Universidad de Sevilha, 1997, p.128. 79 STOFFELS, Ruth Abril. La Asistencia Humanitaria en los Conflictos Armados. Cruz Roja Española, Centro de Estudios de Derecho Internacional

Humanitario. Valencia: Tirant Lo Blanch, 2001, p. 37. 80 As normas de ius cogen estão estabelecidas no artigo 53 da Convenção de Viena sobre o direito dos tratados: “Para os fins da presente Convenção, uma norma

imperativa de Direito Internacional geral é uma norma aceita e reconhecida pela comunidade internacional dos Estados como um todo, como norma da qual

nenhuma derrogação é permitida e que só pode ser modificada por norma ulterior de Direito Internacional geral da mesma natureza”. 81 VUKAS, Budislav. Humanitarian Assistance..., cit., parágrafo 8.

26

organizações não governamentais que tenham relevância no cenário internacional82. As

resoluções sobre esse tema, aprovadas pela Assembleia Geral da ONU também

contribuíram de forma relevante para a criação desse costume.

A Assembleia Geral adotou algumas resoluções nesse sentido, primeiramente

com a Resolução nº. 43/13183, de 8 de dezembro de 1988, que estabeleceu o dever de

prestar socorro aos afetados pela calamidade, com fulcro no princípio do livre acesso às

vítimas, e legitimou assim o direito de assistência subsidiária quando o Estado atingido

for incapaz de atender rápida e prontamente às necessidades que a situação demanda.

Em 14 de dezembro de1990, foi editada a Resolução nº. 45/100 e, em 19 de

dezembro de 1991, foi adotada a Resolução 46/182, denominada Fortalecimento da

Coordenação da Assistência Humanitária de Emergência. Ambas visavam estabelecer

os princípios norteadores da assistência diante de todas as fases existentes nesse

processo.

A Resolução 43/131, em seu parágrafo 8º, considerou também que “o abandono

das vítimas de desastres naturais e situações de emergência semelhantes, sem a ajuda

humanitária constitui uma ameaça à vida humana e ofensa à dignidade humana”.

O parágrafo 6º da Resolução 43/13184 e o parágrafo 7º da Resolução 45/100

incentivam os Estados que se localizam perto das zonas afetadas pelas situações de

emergência a facilitarem o trânsito da assistência e cooperarem com ele. Assim, a

doutrina entende não haver uma obrigação de um Estado terceiro prestar a assistência a

vítimas em território de outro país; contudo, eles têm o dever de facilitar a entrega desse

auxílio e cooperar com ela85.

82 Nesse sentido, GUNNING aduz que “While nations remain powerful entities on the international scene, they no longer have the autonomous authority that

traditional customary law presumed them to have. State actions that develop custom are themselves strongly influenced by a complex structure of international

organizations. Similarly, the traditional theoretical framework upon which customary international law has rested - certain selected assumptions about human

nature and interaction and by analogy states' actions and interaction - are now only a partial description of what nations do in fact. To reflect this shift in power in

international relations, customary international law as well should look to non-state actors as having the ability to create custom. The modification of the

development of customary international law could be achieved in two ways. One approach expands the role of international organizations when their acts are

determined to constitute collective acts of states, so that these acts, which are traditionally understood as only highly influential, would be recognized as part of the

process of custom creation in international law. The second approach recognizes that certain non-governmental organizations have a distinct, measurable impact

on international affairs. As these groups mobilize widespread support, they should be given a legal role in the custom creation process”. GUNNING, Isabelle R.

Modernizing Customary International Law: The Challenge of Human Rights. In: Virginia Journal of International Law, nº. 31, 1991, p. 221-222.

Corroborando esse entendimento ver: HARDCASTLE, Rohan J.; CHUA, Adrian T. L. Humanitarian Assistance: Towards a Right of Access to Victims of

Natural Disasters. Disponível em: http://www.icrc.org/web/eng/siteeng0.nsf/htmlall/57jpjd?opendocument. Acesso em: 23 fev. 2010. Essa produção do costume internacional por atores não estatais demonstra cada vez mais o papel que a governança tem exercido, não só no direito interno, mas

claramente no internacional.

83 Resolução 43/131. Disponível em: < http://www.un.org/documents/ga/res/43/a43r131.htm> Acesso em 14 de Fevereiro de 2010. 84 Resolução 43/131, parágrafo 6º: “Urges States in proximity to areas of natural disasters and similar emergency situations, particularly in the case of regions that

are difficult to reach, to participate closely with the affected countries in international efforts with a view to facilitating, to the extent possible, the transit of

humanitarian assistance”. 85 RUIZ, Rosario Ojinaga. Emergencias Humanitarias..., cit., p. 194.

27

A proteção da pessoa humana e de sua dignidade tem sido uma das maiores

preocupações do mundo jurídico, não só no âmbito interno, mas principalmente no

externo. A salvaguarda dos direitos fundamentais são temas cujos princípios competem

ao homem como seu patrimônio comum e devem ser amparados, não podendo mais se

invocar a soberania como impeditivo para o desenvolvimento desses direitos. Dessa

forma, diante da recusa injustificada de um Estado em aceitar a assistência humanitária,

os organismos e as instituições de vocação humanitária podem recorrer a órgãos da

ONU relacionados com a matéria, ou outros organismos regionais ou internacionais no

sentido de se tomarem medidas para induzir o Estado a permitir a assistência e a

impedir o abandono das vítimas86.

E isso ocorreu quando o Conselho de Segurança adotou a Resolução 688, em

abril de 1992, condenando a repressão que Iraque impingia aos curdos e aos xiitas, e

solicitando que esse país pusesse um fim a esses atos, insistindo para que conferisse

acesso imediato às organizações humanitárias, para que estas pudessem assistir a

população necessitada e que colocasse à disposição todos os meios necessários para

alcançar esse objetivo. Assim, foi-se reconhecido, implicitamente, o dever/obrigação do

Estado de aceitar a assistência humanitária subsidiária87.

4.3 ATUAÇÕES DA CRUZ VERMELHA EM DESASTRES AMBIENTAIS

Não obstante o enfoque da atuação da Cruz Vermelha ser diretamente ligado às

situações de conflitos armados, o princípio da humanidade lhe garante atuação perante

circunstâncias não previstas nas Convenções de Genebra, tais como em desastres

ambientais.

O Acordo sobre a Organização das Atividades Internacionais dos Componentes

do Movimento Internacional da Cruz Vermelha, comumente conhecido como Acordo

de Sevilha88, define em seu artigo 5º a atuação das instituições integrantes do

Movimento.

O Comitê Internacional atuará como agência central em situações de conflitos

armados internacionais e não internacionais, e que podem ser simultâneos com desastres

86 VUKAS, Budislav. Humanitarian Assistance..., cit., parágrafo 24. 87 SCHINDLER, Dietrich. Humanitarian Assistance, Humanitarian Interference and International Law. In: Essays in Honor of Wang Teya, Ronald St. J.

MacDonald (Ed.). Great Britain: Kluwer Academic Publishers,1993, p.696. 88 Acordo sobre a Organização das Atividades Internacionais dos Componentes do Movimento Internacional da Cruz Vermelha. Disponível em:

<http://www.icrc.org/web/eng/siteeng0.nsf/htmlall/57jp4y?opendocument>Acesso em: 12 de Fevereiro.

28

naturais ou tecnológicos. A Federação agirá como agência líder na administração e na

coordenação das atividades do Movimento em emergências naturais e tecnológicas que

ocorram em tempos de paz e que necessitem de recursos superiores aos das Sociedades

Nacionais. A assistência prestada pelas Sociedades Nacionais será coordenada pela

Federação ou pelo CICV.

Em 1993, o Conselho de Delegados adotou a Resolução sobre os Princípios da

Assistência Humanitária e o Código de Conduta no socorro em caso de desastre para o

Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho e Organizações

Não Governamentais89. Esse Código foi elaborado junto às organizações não

governamentais de relevância no cenário internacional e os outros componentes do

Movimento da Cruz Vermelha e teve, como finalidade, fixar as normas e os princípios

de conduta das organizações de vocação humanitária perante situações de emergências e

desastres naturais.

Para o Comitê as situações de desastres requerem medidas a serem tomadas sob

quatro premissas90. Primeiramente, os programas de atuação emergencial devem ser

vistos não como um fim em si mesmo, mas como início de uma série de medidas que

envolvem a assistência em situações de desastres.

As noções de risco e de gestão de desastres devem ser trabalhadas em regiões de

grande incidência desses acontecimentos. Os governos, as organizações não

governamentais e todas as outras estruturas locais devem implementar e aperfeiçoar

seus mecanismos de resposta, de assistência e de desenvolvimento.

Deve haver uma reformulação quanto às doações e aos sistemas de

financiamento, para que essas assegurem às organizações uma capacidade financeira

para atuar em todas as situações em que seja necessário, anulando dessa forma, o

elemento político das contribuições. Deve ser priorizado o desenvolvimento dos

sistemas de redução de riscos, sempre aliados ao desenvolvimento.

89 O artigo 1º do Código estabelece que “o direito de receber e fornecer assistência humanitária constitui um princípio humanitário fundamental que beneficia a

todo cidadão em todos os países. Como membros da comunidade internacional, reconhecemos nossa obrigação de prestar assistência humanitária onde quer que

haja necessidade. Por isso, a importância fundamental do livre acesso às populações afetadas para que seja possível o cumprimento desta responsabilidade. O

principal motivador de nossa intervenção em situações de catástrofe é aliviar o sofrimento humano entre os que estejam menos preparados para suportar as

consequências de uma catástrofe”. O Código de Conduta no socorro em caso de desastre para o Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do

Crescente Vermelho e Organizações Não Governamentais se encontra disponível em:

<http://www.icrc.org/web/por/sitepor0.nsf/htmlall/654h33?opendocument> Acesso em: 18 de Fevereiro de 2010. 90 As premissas abaixo descritas foram desenvolvidas no World Disaster Report, 2001- Focus on Recovery, chapter 01. International Federation of Red Cross

and Red Crescent Societies. Disponível em: http://www.cruzvermelha.pt/publicacoes/95/814-relatorio-mundial-sobre-desastres.html. Acesso em: 12 de Julho de

2010.

29

As organizações de vocação humanitária não têm capacidade para resolver os

problemas sociais existentes nos lugares afetados, nem os problemas resultantes dos

desastres. Os Estados também não devem ficar inertes diante dessas dificuldades.

Destarte, o advento de uma catástrofe deve impulsionar as organizações de ajuda

humanitária, junto aos governos e aos próprios doadores, a estabelecerem projetos

visando à mitigação dos riscos, ao planejamento de estruturas aptas para lidar com essas

situações e ao desenvolvimento de planos para a integração não só do auxílio, mas da

recuperação, da reabilitação e do desenvolvimento das comunidades afetadas. Todos os

elementos civis e políticos devem assumir suas responsabilidades e atuar em

colaboração umas com as outras.

Os desastres naturais geralmente acontecem inesperadamente, e assim para

evitar que a situação das vitimas se deteriore, é necessária uma resposta rápida e

eficiente por parte das autoridades locais. Quando um Estado não se encontra em

condições de fornecer os elementos indispensáveis para uma assistência rápida e efetiva,

deve permitir o auxilio oferecido pela sociedade internacional, assim, ante o

acontecimento de uma emergência natural, que resulte em tragédias de grandes

proporções com elevado número de vítimas e perdas materiais, o Comitê Internacional

se prepara para intervir.

A atuação da Cruz Vermelha se dá primeiramente com a avaliação das

necessidades mais urgentes, pois a assistência varia de acordo como local e com a

natureza da crise. Através da análise da dimensão da tragédia, faz-se mister a

coordenação entre as ações a serem tomadas e os meios e métodos disponíveis para se

alcançar esse objetivo. A capacidade de resposta deve ser feita de maneira rápida e

eficiente, com a utilização dos recursos humanos, materiais e econômicos adequados.

Não obstante a existência de necessidades básicas, tais como medicamentos,

alimentos, atendimento médico, o Comitê leva em consideração todas as necessidades

exigidas pela situação, sejam elas de vestuário, habitação, saneamento e outras

indispensáveis para garantir a dignidade dos que se encontram atingidos pela catástrofe.

A atuação primeira é tentar controlar e impedir a disseminação de doenças, pois

normalmente, após alguma emergência, com a falência das estruturas básicas, a falta de

um sistema de saneamento e água potável resultam em epidemias tais como tifo, cólera,

que aliadas ao caos já existente, aumentam ainda mais o número de vítimas.

A assistência prestada pelo CICV se estende além do auxílio imediato. Quando a

situação começa a se normalizar, a Cruz Vermelha atua auxiliando a população no

30

restabelecimento e na reabilitação das estruturas locais. Assim, a assistência tem seu

papel ampliado, criando-se uma conexão entre a assistência emergencial e na de

desenvolvimento91, pois o Comitê enxerga a necessidade de continuar a prestação da

ajuda após o período inicial da crise, auxiliando na retomada econômica.

Notadamente, um dos grandes objetivos, não só da Cruz Vermelha, mas de

outras organizações de cunho assistencialista, é de chamar a atenção dos doadores e da

mídia para a necessidade de recursos para na fase do pós-desastre. Normalmente, o

advento de um desastre ambiental atrai enorme atenção da sociedade internacional,

sendo amplamente divulgado pelos meios de comunicação e angariando fundos para

auxílio da comunidade atingida. Por isso, como citado anteriormente, uma das

premissas do CICV é realçar a necessidade de se continuar com a arrecadação de

fundos, para assegurar uma reconstrução das obras de infraestruturas, e possibilitar que

a população local possa voltar a produzir seus próprios meios de subsistência. Os

limites da assistência vão além de simplesmente proporcionar o envio de bens para a

satisfação das necessidades mínimas. Atualmente, eles se estendem para a fase de

reabilitação e posteriormente para o desenvolvimento.

O mundo assistiu no ano de 2010 um terremoto que atingiu o Haiti, provocando

uma devastação de enormes proporções. Entretanto, esse pequeno país já havia sido

alvo de outra catástrofe quando, em 2008, três furacões seguidos rasgaram a nação,

ocasionando um alto índice de mortandade e uma destruição quase total das estruturais

locais e do setor agrícola. Nesse período, a Cruz Vermelha operou fornecendo

alimentos, medicamentos e cuidados médicos. Sua atuação se ampliou na reconstrução

das redes de saneamento, de água potável, dos abrigos para os que perderam suas casas

e apoio à reabilitação de hospitais e escolas92.

O que se concluiu dessa tragédia e de tantas outras que se seguiram é que há a

necessidade de se implantarem medidas de prevenção de catástrofes e de redução dos

riscos e da vulnerabilidade. O Relatório Mundial sobre Desastres, anualmente publicado

pela Federação Internacional da Cruz Vermelha, na sua versão de 2009, analisou a

importância do alerta precoce e da ação antecipada. No relatório, a Federação explicitou

91 Descubra o CICV, p. 34. 92 Segundo a Cruz Vermelha, desde o fim do ano de 2008 “mais de 10.000 kits de casa foram doados, 400 pessoas receberam atendimento psicológico, 1.500

famílias foram beneficiadas com a prevenção da malária, as latrinas foram construídas para 300 famílias, mais de 15.000 famílias foram beneficiadas com o

abastecimento de água potável, casas de 4.000 famílias foram reabilitados e a assistência continuou”. Haiti- Between the Hurricanes, disponível em:

http://www.redcross.int/en/mag/magazine2009_1/12-13.html. Acesso em 15 de Julho de 2010.

31

a importância desse sistema na prevenção e na análise dos riscos e elaborou uma série

de diretrizes que devem ser tomadas93.

Entre as medidas, devem ser estabelecidos sistemas de alertas prévios ao

fenômeno natural, que devem contar com mecanismos de comunicação e disseminação

da informação. Como o relatório ressalta o sistema de alerta não será eficaz se não

houver a difusão dos alertas à população. As políticas públicas devem ser voltadas para

a conscientização e a educação das comunidades quanto aos riscos e às medidas a serem

tomadas ante a ocorrência dos desastres.

Em países menos desenvolvidos, sem recursos econômicos para o

desenvolvimento desses sistemas, a comunidade internacional por meio da Estratégia

Internacional para Redução de Desastres, vem agindo, buscando sempre a

implementação de medidas nacionais para a mitigação dos desastres. A 2ª Conferência

sobre Redução de Desastres Naturais, realizada em Kobe, no Japão, estabeleceu dentro

do “Quadro de Ação de Hyogo para 2005-2015: aumento da resistência das nações e

comunidades perante desastres”, iniciativas de prevenção, aplicadas pelas autoridades

locais, com vistas a se estabelecerem mecanismos que possam ser eficientes quanto à

preparação, à conscientização da população e às avaliações de projetos que levem em

conta os riscos naturais.

Em uma clara caracterização da governança ambiental internacional, o Relatório

salienta a cooperação entre os variados atores estatais, não estatais e as agências

internacionais, objetivando a tomada de medidas articuladas para que se possa reduzir o

número de vítimas e assegurar que não aconteça uma destruição total dos meios de

subsistência.

Após a devastação causada por um ciclone em Bangladesh, em meados da

década de 1970, que resultou em um grande número de mortos, a Sociedade Nacional

do Crescente Vermelho, com a Federação Internacional e com o governo de

Bangladesh, desenvolveram um programa de preparação para ocorrências de ciclone.

Por meio do sistema de alerta precoce, os integrantes do Movimento da Cruz Vermelha

puderam atuar de maneira antecipada e evitar que a chegada do ciclone Sidr em

novembro de 2007 atingisse maiores proporções.

Após os alertas da chegada do ciclone, os voluntários do Crescente Vermelho

começaram sua ajuda avisando a população e, logo após, iniciaram as medidas para uma

93 Os parágrafos subsequentes são baseados nas informações contidas no World Disaster Report, 2009. People- Centre Approach and the Last Mile,

International Federation of Red Cross and Red Crescent Societies. Disponível em: http://www.ifrc.org/Docs/pubs/disasters/wdr2009/WDR2009-English-2.pdf.

32

ação antecipada. Depois da evacuação, as pessoas foram conduzidas para abrigos e

outros lugares seguros. Apesar da estimativa de mais de 3.000 mortos e mais de 1.5

milhão de casas terem sido destruídas, os danos foram consideravelmente menores do

que poderia ter acontecido caso não existisse o sistema de alerta preventivo94.

A Federação Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente

Vermelho possui o Fundo de Emergência de Resposta a Desastres (DREF) 95, que é

utilizado para transferências de fundos, visando assegurar um apoio financeiro em

situações de emergência. Notavelmente, esse fundo pode ser disponibilizado ante a

iminência de uma catástrofe, e dessa forma, minimizar os potenciais danos resultantes

desse acontecimento. Por isso, salienta-se a necessidade de se desenvolverem os

mecanismos de alerta precoce, pois eles são indispensáveis para a mitigação das

consequências de um fenômeno natural de grande escala.

O terremoto, de magnitude 7.0 que atingiu o Haiti em janeiro de 2010, trouxe

com ele uma onda de tragédias e devastações. A capital do país, Porto Príncipe, ficou

inteiramente destruída, com o desabamento inclusive de parte do Palácio Nacional e a

sede da MINUSTAH, a Missão das Nações Unidas para o Haiti. Os resultados foram de

milhares de mortos e desabrigados. Em um dos países mais pobres da América, as

consequências de um tremor de tal magnitude ocasionaram um colapso total das já

precárias instituições locais.

Dessa forma, o Comitê, junto à Federação Internacional da Cruz Vermelha e à

Sociedade Nacional do Haiti96, iniciou suas atividades com a busca pelos sobreviventes

sob os escombros e com o estabelecimento de postos de primeiros socorros. Com a

falência dos sistemas de saúde e a destruição de vários hospitais, a missão primeira foi

tentar atender os feridos e assegurar aos doentes o mínimo de cuidados médicos. Assim,

primeiramente visava-se atender às necessidades hospitalares, através de

estabelecimentos dos postos e de auxílio para a recuperação de centros de saúde que

foram parcialmente destruídos, com fornecimento de medicamentos e kits de material

94 World Disaster Report, 2009. People- Centre Approach and the Last Mile, p. 39. International Federation of Red Cross and Red Crescent Societies.

Disponível em: http://www.ifrc.org/Docs/pubs/disasters/wdr2009/WDR2009-English-2.pdf. Acesso em: 21 de Julho de 2010. 95 Mais informações sobre o Fundo estão disponíveis em: http://www.ifrc.org/what/disasters/responding/drs/tools/dref.asp. Acesso em 30 de Julho de 2010. 96 As informações sobre as operações no Haiti foram retiradas dos seguintes sítios: http://www.icrc.org/WEB/POR/sitepor0.nsf/html/haiti!Open;

http://www.icrc.org/Web/por/sitepor0.nsf/html/haiti-update-010310; http://www.icrc.org/Web/por/sitepor0.nsf/html/haiti-earthquake-interview-120210;

http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:_ryDa5tjCJEJ:www.icrc.org/Web/por/sitepor0.nsf/html/haiti-earthquake-interview-

150110+haiti+terremoto&cd=53&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br;

33

médico. A OMS97, em coordenação com vários países, auxiliou com envio de equipes

de busca e salvamento, envio de profissionais e bens como medicamentos, alimentos e

outros necessários para a ajuda de emergência.

O esgotamento do sistema hospitalar refletiu ainda outra preocupação: a

disseminação de doenças. Como todas as outras estruturas, o sistema de água e

saneamento também sofreu enormes danos, e aliado aos agrupamentos irregulares dos

desabrigados, em locais desprovidos de condições para receber o elevado número de

pessoas, o risco de uma epidemia era enorme. Destarte, o CICV atuou, ao lado do

governo haitiano, na reconstrução das redes de distribuição de água e de saneamento e

contribuiu para a retomada da coleta de lixo, para a retirada dos entulhos e dos lixos

acumulados. Outro passo importante foi a campanha de vacinação para a imunização de

crianças e adultos contra doenças diversas como o sarampo, a difteria entre outras.

A Cruz Vermelha operou também no auxílio dos detidos, que também sofreram

com o caos que se instalou no país. As condições dos presídios já eram precárias antes

do terremoto, mas depois pioraram sensivelmente. O mandato do Comitê, atribuído

pelas Convenções de Genebra, já lhe garantia acesso aos detidos em situações de

conflitos armados e de violência interna e como já mencionado, seu princípio da

humanidade lhe assegura atuação perante circunstâncias não previstas nas referidas

Convenções, tais como em desastres ambientais. De tal modo, o CICV agiu fornecendo

os bens indispensáveis a uma condição digna, e também com o apoio médico e

emergencial. Agiu igualmente, com suporte econômico para a reforma das estruturas

danificadas.

Uma das graves consequências do terremoto foi a separação de famílias,

especialmente crianças e feridos que foram transferidos para hospitais fora da capital. O

Comitê, então, estabeleceu um programa de restabelecimento de laços familiares, com o

objetivo de buscar informações e encontrar o paradeiro dos familiares perdidos.

Como pode se perceber, a assistência prestada pela Cruz Vermelha, diante de

uma ocorrência de catástrofe, atinge uma variada gama de atividades. Dessa feita, após

o auxílio emergencial a organização amplia suas operações para a chamada assistência

de reabilitação e de desenvolvimento. No caso do Haiti, não foi diferente. Alguns meses

após o terremoto, a situação começa por normalizar, mas o Comitê continua na sua

tarefa de ajudar os sobreviventes.

97 A OMS disponibilizou uma tabela com as doações fornecidas por diversos países. Para uma análise dessa ver:

http://www.who.int/hac/crises/hti/appeal/haiti_bilateral_donations.pdf. Acesso em 22 de Julho de 2010.

34

A Cruz Vermelha, embasada no mandato que lhe é conferido pelas Convenções

de Genebra e pela própria sociedade internacional expande a suas atividades, buscando

sempre aprimorar a prestação da assistência humanitária e difundir o Direito

Internacional Humanitário. Dentre os exemplos estão as suas ações em busca do

desenvolvimento de normas para a regulação da assistência humanitária em casos de

desastres. Como já explicitado, a assistência humanitária em ocorrências de desastres

não possui um escopo normativo legal que a legitime e que determine um regime

jurídico para o seu desenrolar.

Deste modo, a problemática que envolve a prestação da assistência humanitária

em ocorrência de desastres advêm, em grande parte, da inexistência de um instrumento

jurídico que regule a matéria. Disso decorre que não existe um parâmetro legal que

defina o que seria um desastre natural e qual a magnitude do fenômeno para que seja

considerado como tal. Seria de acordo com os prejuízos materiais? Ou humanos? Outra

questão é a falta de articulação entre os diversos atores que prestam a assistência

subsidiária. A ausência de um corpo normativo integrado e coerente, que estabeleça e

coordene a atuação desses agentes, resulta em dispersão e atraso na hora da prestação do

auxílio.

Procurando solucionar esses obstáculos a Cruz Vermelha, em cooperação com

outras organizações não governamentais, nacionais e internacionais, agências da ONU,

desenvolveu o chamado Sphere Project - Humanitarian Charter and Minimum

Standards, que tem como escopo aprimorar a qualidade da assistência proporcionada às

vítimas de desastres e também de fornecer um conjunto coeso e completo de normas

para as instituições e organizações que atuam nessa área, buscando a transparência e a

efetividade.

Peter Walker ressalta que a Humanitarian Charter and Minimum Standards

inova ao estabelecer uma conexão entre os direitos fundamentais, os princípios

humanitários e as normas padrões que devem reger a prática da assistência humanitária.

O projeto visa instituir um escopo normativo sobre a prestação da assistência, definindo

previamente os procedimentos e as respectivas competências, com o objetivo de ser

referência para agências humanitárias no planejamento e na avaliação dos riscos98.

O Comitê, em seu trabalho pelo desenvolvimento do Direito Humanitário e da

própria assistência humanitária, esforça-se no desenvolvimento do Disaster Response

98 WALKER, Peter. Victims of Natural Disaster And the Right to Humanitarian Assistance: a practitioner’s view. In: International Review of the Red

Cross, nº. 325, 1998, p.

35

International Law, posto que, os instrumentos legais existentes tanto no âmbito da

prevenção de desastres, redução de riscos e assistência, encontram-se em documentos

esparsos na esfera de outros direitos. Consequentemente, um primeiro passo no

processo de reforço do quadro normativo para resposta a desastres seria combinar esses

segmentos em uma nova área jurídica intitulada "Disaster Response International Law"

(IDRL) 99.

Para o desenvolvimento desse novo campo jurídico faz-se necessária a atuação

em conjunto dos diversos atores, Estados, organizações não governamentais,

organizações internacionais e regionais. Cada qual agindo dentro de seu âmbito - os

Estados por meio de doações e suporte financeiro; as ONGs através da sua flexibilidade

de atuação e seu desempenho nos mais diversos setores; as organizações internacionais

como a ONU, e as regionais como a OTAN, por meio de acordos e tratados

bilaterais/multilaterais – todos contribuindo para o incremento e o aperfeiçoamento dos

mecanismos de assistência em situações de catástrofes naturais100.

Percebem-se nitidamente os contornos caracterizadores da governança, enquanto

faz-se necessária a atuação conjunta dos diversos atores do cenário internacional para

que se desenvolva um campo jurídico próprio para os desastres naturais.

5. CONCLUSÃO

O nascimento de uma nova forma de cooperação entre o poder estatal e

múltiplos atores foram resultados de inúmeras mudanças que se sucederam no

panorama internacional. A emergência da sociedade civil e a sua demanda para atuar

nos processos de tomada de decisão e na gestão de interesses coletivos teve como

resultado a ruptura e o nascimento de um novo paradigma. Ineditamente, iniciou-se uma

integração entre os mecanismos governamentais e atores como a sociedade civil e as

organizações não governamentais, na busca pela administração de interesses comuns e

na obtenção de resultados satisfatórios para todos os participantes. A governança, então,

reflete essa articulação entre diversos setores da sociedade e as instituições públicas, em

99 The Federation Promotes the Development of International Disaster Response Law. In: International Review of The Red Cross,Vol. 83, nº. 842, 2001, p. 546-

547. 100 URIOSTE, Alejandra de. When Will Help Be on the Way?..., cit., p. 187-188;

36

uma relação mais horizontal, atuando cooperativamente nos múltiplos níveis da

estrutura política.

Entre esses participantes não estatais se destacam as organizações não

governamentais. O crescente papel que essas organizações têm conquistado nos últimos

anos demonstra cada vez mais a importância das suas ações. No cenário ambiental, elas

tem atuado na fiscalização da implementação dos acordos internacionais, na difusão de

informação e, inclusive, como grupos de pressão na tomada de decisão.

A preocupação com o meio ambiente é mais do que oportuna na cena mundial,

com especial atenção ao aquecimento global, ao aumento dos extremos climáticos e dos

fenômenos naturais de grande magnitude que tem assolado diversos países. No

desenrolar do presente trabalho, percebeu-se que a incidência desses fenômenos resulta

por vezes em grandes desastres e enormes perdas materiais, humanas e inclusive

ambientais. A exploração desenfreada dos recursos naturais tem potencializado os

efeitos desses acontecimentos e, notadamente, suas consequências são cada vez mais

calamitosas. Apesar de países desenvolvidos sofrerem com a ocorrência desses

desastres, são os países em desenvolvimento e a sua população que mais padecem.

Diante da descrição dos desastres que atingiram o Haiti nos últimos anos

percebe-se quão nefastos esses acontecimentos podem ser em uma sociedade

economicamente mais pobre e dependente. Em locais onde as instituições públicas e

políticas já são frágeis, a ocorrência de eventos de natureza catastrófica não só debilitam

como ocasionam o colapso dessas estruturas. E quem sofre com isso é a população.

O Estado como guardião da ordem e do bem estar social tem o dever de ajudar a

sua população por meio da assistência humanitária. Conforme o examinado, ele tem a

obrigação primária de oferecer o auxilio necessário naturalmente por ser quem tem

melhores condições de atuar. Conquanto o Estado possua a responsabilidade principal

na prestação do socorro, quando não consegue realizar plenamente a assistência, ele tem

o dever de aceitar o auxílio oferecido pelas organizações humanitárias como a Cruz

Vermelha e organizações internacionais. Conforme apresentado no desenrolar do

trabalho, as inúmeras resoluções da Assembleia Geral e do Conselho de Segurança, e o

desenvolvimento por meio do direito costumeiro consolidaram o direito de assistência

humanitária em casos de desastres naturais.

A atuação das organizações não governamentais, com especial atenção á Cruz

Vermelha, tem ganhado destaque na prestação da ajuda humanitária. O Comitê

operando com base nos princípios da neutralidade e imparcialidade tem desenvolvido o

37

seu mandato e assegurando que milhares de pessoas tenham acesso às condições

mínimas de subsistência. O CICV incentiva por meio das Sociedades Nacionais que

organizações locais e as entidades governamentais operem de maneira mais rápida e

eficaz na prestação do socorro.

As atividades do Comitê diante de situações de desastres naturais vão além da

assistência humanitária de emergência. Ele atua não só no fornecimento do auxílio

básico à população, como também na reconstrução e na reabilitação das instituições

locais após o impacto inicial dos fenômenos, para que as vítimas possam recomeçar e

retomar a normalidade.

Constatou-se que em questões de desastres ambientais a atuação estatal tem que

ser ampliada, não se restringindo somente a prestação do socorro das vítimas, porque

isso é uma obrigação que decorre da sua própria característica de Estado soberano, mas

deve ocorrer também na prevenção e mitigação dos riscos. Os Estados, notadamente os

propensos a incidência de fenômenos naturais, devem desenvolver mecanismos de

prevenção, preparação e alertas precoce. A atuação estatal prévia tem como efeito a

diminuição no número de mortos e dos prejuízos causados. A educação é de

fundamental importância para que a população tenha conhecimento quanto aos riscos

envolvidos e como agir em tais situações. Nesse caso, deve-se ressaltar a relevância da

educação ambiental, para difusão de informações sobre o meio ambiente,

sustentabilidade e preservação.

No entanto, constatou-se que, a prestação da assistência humanitária esbarra na

inexistência de um corpo jurídico integrado e coeso que regule a matéria. Com isso,

dificulta-se uma coordenação e uma correta operacionalização do socorro, posto que

sem um instrumento jurídico que delimite parâmetros e estabeleça requisitos para a

prestação da ajuda, esta acaba se desenrolando desarticuladamente entre os diversos

atores. A criação de normas jurídicas vinculantes quanto à assistência em desastres faz-

se necessária para impedir que Estados obstaculizem a prestação da assistência dentro

do seu território, alegando uma violação da sua soberania, e também para que os vários

atores que operam na prestação possam desenvolver seus trabalhos por meio de regras

determinadas e que se possam coordenar todos os elementos que essas situações

demandam.

Atualmente, o conceito de soberania não permite mais que os Estados atuem

arbitrariamente dentro de suas fronteiras. Desta feita, os Estados tem o dever/obrigação

38

de prestar a assistência humanitária e, quando não tenham condições de fazê-lo, devem

aceitar o auxilio oferecido pela sociedade internacional.

A Cruz Vermelha, em uma ampliação do seu mandato, atua em cooperação com

outros atores do cenário mundial buscando solucionar e desenvolver novos mecanismos

para aprimorar a assistência humanitária, por meio de programas como Sphere Project e

o Disaster Response International Law.

Ante o exposto ao longo do trabalho, restou demonstrada a importância do papel

exercido pelo Comitê e os integrantes do Movimento da Cruz Vermelha. A sociedade

internacional reconheceu a proeminência de seu mandato lhe conferindo um destaque

dentre as organizações não governamentais, sendo certo afirmar que ela é um sujeito de

direito internacional, mas com personalidade jurídica limitada aos objetivos fixados nas

Convenções de Genebra.

Conclui-se que a Cruz Vermelha é um dos atores que contribui sensivelmente no

cenário da governança, pois apesar de ser uma organização não governamental ela atua

no desenvolvimento e na produção de normas de Direito Humanitário, e indiretamente,

em outros setores, como no ambiental. A produção normativa sempre foi uma das

prerrogativas estatais, mas o Comitê pela relevância de seus trabalhos e pelo impacto

que eles têm no cenário internacional tem contribuído para o incremento do direito

costumeiro. A governança, então, se materializa em sua característica mais essencial,

nessa conjugação entre os atores públicos e não públicos.

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