a imprensa e a alfabetização na escola – a perspectiva de freinet

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES CURSO DE PEDAGOGIA TALITA KELLY LUZ ROCHA DE ASSIZ A IMPRENSA E A ALFABETIZAÇÃO NA ESCOLA A PERSPECTIVA DE FREINET MARINGÁ 2012

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

CURSO DE PEDAGOGIA

TALITA KELLY LUZ ROCHA DE ASSIZ

A IMPRENSA E A ALFABETIZAÇÃO NA ESCOLA –

A PERSPECTIVA DE FREINET

MARINGÁ

2012

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TALITA KELLY LUZ ROCHA DE ASSIZ

A IMPRENSA E A ALFABETIZAÇÃO NA ESCOLA – A PERSPECTIVA

DE FREINET

MARINGÁ

2012

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial para a obtenção do título de Licenciada em Pedagogia pela Universidade Estadual de Maringá. Orientadora: Profa. Dra. Maria Cristina Gomes

Machado

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TALITA KELLY LUZ ROCHA DE ASSIZ

A IMPRENSA E A ALFABETIZAÇÃO NA ESCOLA –

A PERSPECTIVA DE FREINET

BANCA EXAMINADORA

________________________________________

Profa. Dra. Maria Cristina Gomes Machado Universidade Estadual de Maringá

________________________________________

Profa. Dra. Maria Angélica Olivo Francisco Lucas Universidade Estadual de Maringá

________________________________________

Profa. Dra. Tânia dos Santos Alvarez da Silva Universidade Estadual de Maringá

Maringá, __ de_________ 2012.

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial para a obtenção do título de Licenciada em Pedagogia pela Universidade Estadual de Maringá. Orientadora: Prof

a. Dr

a. Maria Cristina Gomes

Machado

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AGRADECIMENTOS

A Deus, por ele ser o motivo pelo qual estou conseguindo encerrar esta caminhada,

porque me deu vida e forças para continuar, mesmo quando as coisas pareciam tão

difíceis.

À orientadora Profa. Dra. Maria Cristina Gomes Machado, por todas as orientações e

conhecimentos transmitidos, por ser companheira e entender o momento difícil que

passei na finalização deste trabalho.

À Profa. Dra. Maria Angélica Olivo Francisco Lucas, que me disponibilizou os livros

para o desenvolvimento do meu trabalho.

À minha filha Isabelle, que, mesmo tão pequena, foi o incentivo e ânimo para

continuar.

Ao meu esposo Evandro, pela sua dedicação, sendo um grande companheiro e que

me deu força e incentivo.

Aos meus pais Derli e Jucimar e à minha sogra Elizabeth, que ficaram tantas vezes

com a minha filha para que eu pudesse estudar.

Às minhas irmãs Meire e Helen, pelo afeto e pelo companheirismo.

À Universidade Estadual de Maringá, aos professores e ao Curso de Pedagogia, que

me oportunizaram o acesso ao conhecimento.

Enfim, obrigada a todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para que eu

conseguisse finalizar este percurso.

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A IMPRENSA E A ALFABETIZAÇÃO NA ESCOLA –

A PERSPECTIVA DE FREINET

Talita Kelly Luz Rocha de Assiz Maria Cristina Gomes Machado – orientadora

RESUMO

Este trabalho de pesquisa tem por objetivo investigar a importância do uso da

imprensa no processo de alfabetização para Celestin Freinet (1896-1966), dando

ênfase à utilização desta técnica de leitura e escrita e relatando como ela foi

utilizada em escolas. Neste estudo, são abordados quem foi Freinet, quais os

princípios de sua pedagogia e como contribuiu para o desenvolvimento da

educação. Em relação à utilização da imprensa na escola, pela análise do livro de

Freinet A leitura pela imprensa na escola, e pelo estudo de autores que abordam

esta temática, é possível concluir que a utilização de sua técnica contribuiu de

forma positiva com a alfabetização. E se destacou por formar leitores que

compreendem o que leem, pelo fato de se estabelecer relações com o que está

inserido no cotidiano infantil, diferente da escola tradicional que trazia textos já

prontos e que não permitia a ela ser criativa e expressar-se.

Palavras-chave: Educação. História da Educação. Freinet.

Abstract

The research work aims to investigate the importance of the press in the press in

the process of literacy for Celestin Freinet (1896–1966), emphasizing the use of

reading and writing technique and reporting how it was used at the schools. This

study approaches who was Freinet, what principles of his pedagogy contributed to

the development of education. Regarding the use of press at schools, by analysing

Freinet´s book titled The Literacy by Press at School, and by using authors that

approaches this theme it´s possible to concluded that the use of his tecnique

contributes positively with the process literacy and stood out by forming reader

that understand what they read, by the fact of stablishing relation with is inserted

in the childish quotidian, diferently of the traditional schools that did not allon

children to express themselves nor being creative.

Keywords: Education. History of Education. Freinet.

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho objetiva investigar o uso da imprensa e sua

importância no processo de alfabetização na perspectiva de Celéstin Freinet

(1896-1966), com ênfase na utilização desta técnica e seus resultados. Para

alcançar tal objetivo, consideramos fundamental entender quem foi Freinet, como

era a sua pedagogia e quais ideias contribuíram para o desenvolvimento de suas

técnicas, dentre elas o uso da imprensa (copiadora rudimentar) como recurso

pedagógico.

Ao ler sobre esse pedagogo, percebemos que a maioria dos autores o

destaca como um dos teóricos que trouxe importantes contribuições para

modificações na educação. Conforme exposto por Paiva (1996), ele foi um dos

mais importantes educadores da atualidade ao abrir caminho para a

modernização da escola. Foi criador do movimento da Escola Moderna, “[...]

buscou técnicas pedagógicas que pudessem envolver todas as crianças no

processo de aprendizagem” (ELIAS 1997 p. 13) e propôs uma pedagogia que

tinha como centro a atividade e o ato criativo da criança. Segundo Nascimento

(1995), o trajeto intelectual e político de Freinet manifesta as mudanças e os

dilemas vivenciados entre setores militantes da transformação da educação e da

sociedade, em particular após a I Guerra Mundial (1914-1918).

A pedagogia de Freinet, como afirma Bello (1999), é centralizada na

criança e baseada em alguns princípios como: senso de responsabilidade e

cooperação, sociabilidade, julgamento pessoal, autonomia, expressão,

criatividade, comunicação, reflexão individual e coletiva, afetividade. Sob esta

perspectiva pedagógica, ele propõe novas metodologias, dentre elas se encontra

a utilização da imprensa para auxiliar na alfabetização, questão tomada como

foco de estudo neste trabalho. Pretendemos, por meio dele, enfatizar a

importância da imprensa para a alfabetização na escola, focando a visão de

Freinet e a importância da utilização da imprensa como material didático.

A presente pesquisa justifica-se visto ser Freinet um pedagogo que

contribuiu com a educação de forma expressiva e por acreditarmos que os livros

de Freinet “[...] permanecem muito atuais e constituem uma fonte de pesquisa

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para o professor que deseja alfabetizar a partir dos textos” (CARVALHO, 2004 p.

53). Por essa razão, acreditamos que esta pesquisa é importante, já que

possibilita-nos compreender a pedagogia freinetiana, suas bases e métodos

utilizados, destacando-se, sobretudo, as contribuições do uso da imprensa em

sala de aula para a educação.

Para a realização desta pesquisa, escolhemos como fonte documental o

livro de Freinet A Leitura pela imprensa na escola (FREINET; BALESSE, 1977),

escrito na França, em 1927, com a colaboração de seu amigo Lucienne Balesse

na última parte do livro, traduzido para o português e publicado pela editora

Dinalivros em 1977. Compartilhamos a posição de Elias (1997) quando afirma que

este livro traz considerações sobre o método global e propõe a substituição dos

textos descontextualizados dos manuais pela leitura do texto livre, escrito e

impresso pela criança.

Ao escrever este livro, Freinet tinha como intenção apresentar a sua

técnica, bem como os resultados e contribuições para o ensino da leitura.

Sampaio (1994) destaca que, de fato, isso ocorreu, porque, após a sua

publicação, ele recebeu pedidos de informações de muitos professores de toda

França, o que resultou na impressão de boletins para esses professores, sendo

um importante passo para a divulgação da técnica.

Inserido entre os educadores considerados escolanovistas, Cambi (1999)

destaca que Freinet elaborou não somente métodos didáticos, mas uma nova

reflexão sobre os fundamentos teóricos e as implicações políticas que

caracterizam a Escola Nova, e que as várias obras dele reúnem interesses

didáticos educativos e um forte engajamento político socialista, sendo essas

características uma ampla difusão do método Freinet na Europa, em específico na

Itália, com o Movimento de Cooperação Educativa.

Tanto o texto e a obra de Freinet, bem como suas técnicas tiveram ampla

repercussão e “[...] milhares de educadores, na França e em mais de 43 países

do mundo, experimentam hoje seus trabalhos, prosseguindo a obra por ele

começada e que tem inspirado numerosas reformas na esfera da educação”

(PAIVA, 1996, p. 9).

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Para a realização deste trabalho, a metodologia adotada foi a pesquisa

bibliográfica. A análise será baseada no livro supracitado de Freinet e em outros

textos escritos por ele, bem como utilizaremos autores que experimentaram a

pedagogia freinetiana.

No desenvolvimento deste estudo, na primeira seção, faremos a

contextualização de quem foi Freinet, qual a sua contribuição e como ele

desenvolveu as suas metodologias frente ao contexto social, político, cultural e

educacional da época. Em seguida, na seção dois, faremos uma análise da

importância da imprensa na escola para Freinet por meio de seus escritos, em

especial do seu livro já citado.

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1. FREINET E SUA PEDAGOGIA

Freinet pode ser situado, com base no estudo de Elias (1997), em um

período histórico que estava politicamente abalado por acontecimentos que

provocaram mudanças tanto na sociedade como na economia francesa. Ele foi

insuflado por um espírito libertador que se instaurou após o final da I Guerra

Mundial. Sentia que era necessário “[...] uma verdadeira correção pedagógica

racional, eficiente e humana que deve permitir à criança enfrentar, com o máximo

de realização, o seu destino de homem” (FREINET, 1973 apud FLEURI, 1996, p.

196). Para chegar a esse objetivo, ele teorizou e divulgou uma pedagogia

inovadora, que se colocava contra a pedagogia tradicional, utilizada na época.

Considerava que esse formato de ensino limitava as ações do professor e o

desenvolvimento crítico do aluno.

Para Freinet, o entusiasmo por essa nova educação apareceu “[...] no

decorrer do período que precedeu a guerra de 1939 e que viu a eclosão de

associação de ideias e de fórmulas que se colocaram todos sob o signo da

Educação Nova Libertadora” (FREINET; BALESSE, 1977, p. 12). Esta forma de

educação respeitava a criança como um ser individual, e não a submetia a

modelos pré-estabelecidos. Por meio dessa pedagogia, Freinet procurava

oferecer aos seus alunos uma educação condizente com as suas necessidades e

práticas cotidianas.

A pedagogia freinetiana “[...] revolucionou a dinâmica da sala de aula que

trouxe grandes mudanças no relacionamento entre professor e aluno” (PAIVA,

1996, p. 10). Mas, de fato, quem foi Freinet e no que se baseava a sua

pedagogia?

Nascido em 15 de outubro no ano de 1896 em um vilarejo em Gars no

sudoeste da França, Elias (1997) destaca que Celéstin Baptistin Freinet era filho

de Joseph Delphin Freinet e de Marie Victorie Torcat, era o último de uma família

de quatro filhos e, pelo fato de seus pais serem agricultores, passou a sua

infância no campo.

Seu contato com a educação, como afirma Elias (1997), teve início em

1912 quando ingressou na Escola de Formação de Professores. Porém seus

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estudos foram interrompidos em 1914 em virtude do início da I Guerra Mundial.

Ele foi convocado para servir, mas teve baixa por ter sofrido ação de gases

tóxicos que lhe prejudicaram os pulmões. Em 1920, iniciou suas atividades como

professor adjunto, mesmo sem ter finalizado o Curso Normal, em uma aldeia em

Bar-sur-Loup, que se localiza nos Alpes Marítimos, e foi nela que ele concebeu a

ideia de um novo método de educação, contribuindo com o movimento da Escola

Moderna.

Sampaio (1994) destaca que essa escola estava instalada em uma casa

antiga, pobre e escura, e que Freinet,

Diariamente, anotava aquilo que ouvia de seus alunos e registrava as observações que considerava originais [...]. Com isso, foi descobrindo os interesses, os problemas e a personalidade de cada criança [...] Essas descobertas, [...] avivaram a sua curiosidade e o seu desejo de saber mais sobre a educação. Passou, então, a se interessar por Rousseau, Rabelais, Montaigne e, sobretudo, por Pestalozzi [...]. Assim pode prestar o exame que o habilitou a exercer a função de professor. (SAMPAIO, 1994, p. 14).

Porém a leitura das obras desses autores causou nele certa inquietação,

visto que “[...] provoca-lhe indagações sobre o fosso existente entre a sua prática

de professor de uma escola coerente e o idealismo das teorias daqueles autores”

(NASCIMENTO, 1995, p. 15).

Sampaio (1994) afirma que, com base em suas observações, o educador

começou a se questionar se o formato da educação tradicional era eficiente com

suas regras e métodos, bem como se oferecia algum interesse aos alunos. Pelas

observações que fizera,

Para ele ficou claro que o interesse das crianças estava lá fora, nos bichos que subiam pelo muro, nas pedrinhas redondas do rio, pois percebia que, nos momentos de leitura dos livros de classe, o desinteresse era total. [...] Dentro da classe não havia nada que realmente motivasse as crianças, [...] Freinet sabia que alguma coisa teria de ser feita. Era preciso mudar. (SAMPAIO, 1994, p. 15).

Com a intenção de formar um cidadão expressivo, e por considerar que a

educação poderia ter um objetivo diferente do que a escola tradicional

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apresentava até aquele momento, ele defendia que a educação poderia ser vista

sobre outro olhar, para além do “[...] processo de desenvolvimento da capacidade

moral e física do ser humano” (DICIONÁRIO LAUROSSE, 2004, p. 311). A

educação passava a se apresentada como, segundo Luzuriaga (1980), uma

forma intencional de se influenciar o indivíduo, tendo como intenção a formação e

o desenvolvimento do mesmo com a função de orientar e transmitir valores e

conhecimentos. Sob tal perspectiva, seria essencial na vida do homem e da

sociedade, por ser uma manifestação cultural que fazia com que os

conhecimentos adquiridos fossem transmitidos e levados adiante, sem que a

cultura se perdesse com o passar do tempo.

Para que essa educação não fosse somente a transmissora de instrução,

seria, então, necessário que o ensino não se restringisse ao assunto ou conteúdo,

e houvesse mudança no modo como se levava esse conhecimento adiante, e é

isso que se destaca na pedagogia de Freinet. A maneira como o professor

trabalharia esse conhecimento seria importante, porque, pela forma que a escola

tradicional tentava produzir o conhecimento, não dava ao aluno o acesso à

cultura, à criatividade, que era resultado do texto livre, a sua metodologia de

ensino produzia “[...] uma instrução passiva e frontal” (FREINET, 1973, apud

FLEURI, 1996, p. 195).

Para Freinet, esse formato de ensino era insuficiente, uma vez que tornava

o aluno passivo, “[...] sendo ele incapaz de desenvolver suas habilidades de

análise crítica, de julgamento pessoal, de expressão livre de seus próprios

pensamentos e opiniões [...]” (PAIVA, 1996, p. 10). Algo deveria ser feito para

combater essa pedagogia que, na sua perspectiva, era livresca. Para alcançar

este objetivo, Freinet fazia um apelo aos educadores com a seguinte fala: “[...]

ponhamos de lado, então, o manual e deixemos que vivam os nossos alunos”

(FREINET, apud MAURY, 1993, p. 5). Explica Nascimento (1995) que ele

intencionava, por meio do ensino, formar o cidadão de amanhã.

Com o objetivo de trazer motivação para seus alunos vida às suas aulas,

Freinet passou a realizar as chamadas aulas passeios, que, depois, ficaram

conhecidas como aulas das descobertas. Por meio delas, Sampaio (1994)

esclarece que o educador e seus alunos passaram a ter um relacionamento bem

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diferente do que a escola tradicional propunha, visto que, durante os passeios,

eles interagiam entre si. Esse novo relacionamento deixava de lado aquela

distância existente entre professor e alunos, dando lugar a um relacionamento

mais afetivo e participativo, e espaço para o aluno expressar-se. “A relação

tradicional entre professores e aluno se modificava, e Freinet, num gesto que se

tornou simbólico, retirou o estrado de sua cadeira de professor e passou a sentar-

se junto de seus alunos” (SAMPAIO, 1993, p. 17).

Ao abordar sobre a aula passeio, Sampaio (1994) destaca que, em seus

relatos, Freinet aponta que, quando seus alunos retornavam dos passeios, a

atmosfera na sala de aula era outra, eles ficavam entusiasmados, querendo cada

um contar o que havia presenciado. Esse comportamento evidenciado pelos

alunos era uma demonstração de que ele estava certo. As crianças que

encontrara nas obras dos grandes pedagogos, como afirma Nascimento (1995),

em nada tinham a ver com os alunos cheios de vida que estavam diante de si,

porém o entusiasmo que tomava conta deles cessava quando chegava a hora da

leitura obrigatória.

Nesse momento o encanto se quebrava e, para Freinet, mandar abrir a página de um livro, onde as frases feitas nada tinham a ver com a vida da criança, era cortar pela raiz o entusiasmo que as crianças tinham trazido lá de fora. Elas liam os manuais sem respeitar a pontuação, sem prestar atenção ao significado das frases. Havia uma total dissociação entre a escola e a vida. (SAMPAIO, 1994, p. 17).

Esse fato trouxe para Freinet um novo desafio: Como fazer com que o

entusiasmo da aula passeio não fosse perdido em meio àquele ensino

tradicional? O que fazer para que aquele entusiasmo fosse permanente dentro da

sala de aula?

Diante dessa realidade e na tentativa de resolver tal problema, pôs em

prática a ideia de fazer relatórios desses passeios. Sampaio (1994) destaca que,

para a construção desses relatórios, ele escrevia junto com as crianças um

resumo, contando sobre o que eles presenciaram e, em seguida, as crianças liam

comentavam e, depois, copiavam o texto em seus cadernos, ilustrando da

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maneira que quisessem. Este foi o início ante a necessidade de criar uma nova

forma de ensino.

Sampaio (1994) comenta que Freinet foi influenciado por Adolpho Ferrière1

(1879- 1960), por meio do livro L’école active, no qual ele encontrou uma linha a

ser seguida, que dava embasamento às inovações que estava utilizando no

ensino. Baseando-se em Ferrière, afirmava que, para a criança ser espontânea,

era essencial rever o ensino que estava sendo oferecido a ela, e foi isso que, na

perspectiva de Sampaio (1994), induziu Freinet a desenvolver a pedagogia do

trabalho. Nela,

[...] propõe a educação pelo trabalho, que não significa educação pelo trabalho manual e sim a união entre intelectualidade e manipulação pensamento e ação, [...] E para chegar ao valor educativo do trabalho propõe inicialmente a observação, em seguida a expressão, depois a experimentação; o valor educativo destas operações está no resultado da união das três (SCHEFFER, 1996, p. 83).

Entretanto Nascimento (1995) alerta que, aos poucos, ele percebeu que a

pedagogia defendida por Ferrière era limitada, intelectualizada isolando-se do

social.

Com a ideia de que havia a necessidade de uma nova forma de ensino da

leitura e escrita e criando técnicas inovadoras, Freinet começou a desenvolver

uma nova pedagogia, que respeitava a criança como um ser individual. Valendo-

se da denúncia e da negação que fazia a respeito da escola como instituição, por

oprimir a classe menor, ele propôs, como destaca Nascimento (1995), uma nova

forma e estrutura do que viria a ser a educação, idealizando uma prática que tinha

_________________________

1 “Pedagogo suíço (1879-1960), nascido em Genebra, onde seguiu estudos universitários. O

trabalho pedagógico de Ferrière está estreitamente ligado ao movimento da Escola Nova, na medida em que é difícil separar as ideias de cada um dos seus idealizadores. A sua ação é caracterizada pela transformação e renovação, por oposição à velha escola e métodos tradicionais. Ferrière propõe o conceito da nova escola cujo funcionamento é baseado no respeito aos interesses e necessidades da criança, a utilização de métodos ativos, do desenvolvimento de autonomia, espírito crítico e da cooperação. A finalidade da educação é contribuir para o desenvolvimento infantil e ao desenvolvimento das suas potencialidades, numa educação para a liberdade.” Disponível em: http://www.educacaomoral.org.br/reconstruir/os_educadores_edicao_72_adolphe_ferriere.htm. Acesso em: 20 set. 2012.

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como fundamento os modos da vida e trabalho. Elias (1997) afirma que, quando

Freinet sugere a sua metodologia ele propõe algo inovador para época, a

Pedagogia do Bom Senso, que trazia uma metodologia de cooperação e

atividade, deixando de lado os manuais escolares e trazendo novas técnicas, que

“[...] possibilitariam ao professor rever a própria postura em relação ao ensino e à

educação, abrindo todos os caminhos possíveis para que os alunos e professores

pudessem refletir sobre realidade e sobre ela expressarem-se livremente” (ELIAS,

1997, p. 15).

A pedagogia freinetiana, na perspectiva de Paiva (1996), estava alicerçada

em vários fundamentos, como confiança e respeito ao ser humano, abertura da

escola para a vida e para o futuro, a organização cooperativa da classe, a

educação pelo trabalho, a utilização do tateamento experimental2, mas o centro

de sua pedagogia era a livre expressão, visto que, “[...] por meio do texto livre, do

desenho livre, da palavra do canto, da dança, do teatro..., a criança se revela,

cria, inventa, exprime, enfim suas vivências” (ELIAS, 1996, p. 15).

Ao tomar como ponto de partida que a criança era um ser original, Freinet,

afirma Nascimento (1995), buscava na sua livre expressão a maneira pela qual

ela poderia ter um desenvolvimento harmônico, que a retirasse de uma liberdade

individual e desse oportunidade para alcançar uma liberdade que fosse construída

de forma coletiva. E utilizando a expressão livre, o centro da escola passou a ser

mudado, uma vez que “[...] não é mais o professor, mas a criança, a vida da

criança; suas necessidades, suas possibilidades [...]” (FREINET, 1979, apud

PAIVA, 1996, p. 14), que se tornavam o novo foco da escola.

Santos (1996) enfatiza que o texto livre é o que dá vida à classe, e utilizar

essa técnica isoladamente é banalizá-la, transformando-a em um simples

exercício de redação, já que a prática do texto livre necessita de um ambiente que

proporcione condições para que a criança se expresse.

Entende-se que a pedagogia de Freinet é composta por várias técnicas

como a aula passeio, o texto livre, a imprensa escolar, a correção, o livro da vida,

o fichário de consulta, a correspondência interescolar e a autoavaliação. A utiliza-

_____________________ 2 “Era o direito que a criança tinha de chegar sozinha a suas descobertas e se alegrar com elas”.

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ção delas sempre foi feita de forma conjunta, visto a utilização de uma levar à

outra. Podemos confirmar isto quando lemos sobre a sua pedagogia que se

iniciou com a proposta de se fazerem aulas passeios, que resultaram na

construção dos textos livres, que possibilitaram a utilização da imprensa para que

não se perdessem textos tão vivos, escritos pelas próprias crianças. Havia a

necessidade de serem efetuadas as correções tanto individual quanto de forma

coletiva para que o texto pudesse ser impresso, o livro da vida, que funcionava

como um diário para escrever os textos livres.

Enfim, entende-se que na pedagogia freinetiana existia uma dinâmica que

movimentava as suas técnicas, é isso que dava vida às aulas de Freinet, era a

sala cooperativa que fazia a sua proposta se movimentar. Essa dinâmica

É a essência da proposta pedagógica de Freinet. Todas as atividades, as conferências, os textos livres, as correspondências interescolares, o jornal escolar, os planos de trabalho... são desenvolvidos dentro de uma linha de cooperação, adquirindo, assim, um sentido novo e profundo. A criança não é vista como um indivíduo isolado, mas como parte de uma comunidade a que serve e que a serve, assume a organização da vida. Pouco a pouco vai, então, aprendendo a assumir responsabilidades, a cumprir seus compromissos, a tornar-se livre e autônoma. (ELIAS, 1996, p. 15).

Contudo, indagamos: O que dava embasamento à pedagogia de Freinet?

Em que ele se apoiava quando propôs essa reestruturação na educação que teve

como resultado o movimento da Escola Moderna?

Freinet está inserido entre os educadores considerados escolanovistas.

Este movimento chamado de Escola Nova surgiu no século XX, período que

Cambi (1999) destaca como dramático e conflituoso, porém inovador nos

aspectos da vida social. Este, como ele afirma, foi o século do “homem novo”, no

qual os comportamentos e as mentalidades transformaram-se de forma radical,

tendo, como reflexo dessas mudanças que ocorreram na política, na economia e

na cultura, grandes transformações na educação e na pedagogia, que levaram a

muitos caminhos, como o movimento já mencionado, que predominou na Europa

Ocidental e nos Estados Unidos.

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Lourenço Filho (1978) destaca que, em todas as épocas, a forma de se

pensar a educação e suas maneiras de ensino vão apresentando modificações.

Estas são ocasionadas por fatos que ocorrem na sociedade que mudam a forma

de pensar da mesma a respeito de determinados aspectos sociais no âmbito da

economia, da política, dos valores, dentre outros. No caso da Escola Nova, teve

razões políticas que pregavam a expansão das ideias democráticas ante a

transformação da vida econômica, devido ao processo industrial, modificando

muitas regiões. Diante dessas afirmativas, podemos compreender que

Na origem e evolução do movimento da escola nova há, sem dúvida, alguma coisa correspondente a esse sentimento, determinado pela complexidade social decorrente da industrialização, e pelas formas de opressão resultantes dos dois grandes conflitos armados deste século, [...]. (LOURENÇO FILHO, 1978, p. 23).

Foi nesse contexto que cresceu o descontentamento com a Escola

Tradicional, as suas metodologias e seus esquemas “[...] de imposição de cima

para baixo e de fora para dentro” (DEWEY, 1971, p. 5). Pode-se afirmar, tomando

por base Lourenço Filho (1978), que a Escola Nova trouxe como sugestão um

espírito crítico e uma atitude criadora, que deu origem a uma nova concepção.

Para Saviani (1983), o movimento desencadeou uma maneira diferente de

interpretar a educação que exigia uma reestruturação da organização escolar e

uma nova postura do professor. A escola “[...] deverá deixar de ser um aparelho

formal, desligado do meio social, e transforma-se num organismo vivo,

constituindo-se miniatura, de modo que coloque as crianças em contato direto

com o ambiente que os rodeia [...]” (SAVIANI, 1998, p. 247).

A educação nova aparece como uma renovação da escola e não somente

“[...] um tipo de escola, ou sistema didático determinado, mas [...] um conjunto de

princípios tendentes a rever as formas de ensino tradicional” (LOURENÇO FILHO

1978, p. 17), que, na perspectiva de Lourenço Filho, deriva de uma nova

compreensão das necessidades da infância e que, mais futuramente, essa ideia

de uma nova educação passou a se basear nas novas funções atribuídas à

escola devido a mudanças na vida da sociedade.

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De acordo com Cambi (1999), a Escola Nova fundamentou-se em uma

prática educativa centralizada na criança, em suas necessidades e capacidades.

A infância passou a ser entendida por seus idealizadores como “[...] idade pré-

intelectual, na qual os processos cognitivos se entrelaçam estreitamente à ação e

ao dinamismo, não só motor, como psíquico da criança [...]” (CAMBI, 1999, p.

514). Nesta direção, Manacorda (1989) destaca que o conhecimento psicológico

infantil e da psicologia da idade evolutiva tornaram-se temas essenciais para o

desenvolvimento da pedagogia escolanovista.

Para Cambi (1999), a escola nessa nova perspectiva deveria ser o lugar

em que as crianças possam ser criativas e tenham a oportunidade de viver em

sociedade, tendo acesso a atividades criativas, como musicais, atividades

artísticas, jogos, laboratórios e a imprensa. Essas atividades, como o autor afirma,

capacitam a criança a desenvolver-se e a descobrir suas vocações, tendo em

vista que os idealizadores da educação nova entendem que “[...] a criança é

espontaneamente ativa e necessita, portanto, ser liberta dos vínculos da

educação familiar e escolar, permitindo-lhe uma livre manifestação de suas

inclinações primárias” (CAMBI, 1999, p. 514).

É nessa perspectiva que Freinet defende “[...] que uma criança que a cada

instante dá provas de suas aptidões criadoras, que, incessantemente, imagina,

inventa e cria, só pode ser compreendida e orientada através de uma pedagogia e

psicologia da construção e do movimento” (ELIAS, 1997, p. 14).

No Brasil, somente após a década de 1920, haveria uma influência

escolanovista na reforma educacional, sendo seu principal divulgador, como

afirma Saviani (1998), Fernando de Azevedo (1894-1974). Este foi um dos

idealizadores da Manifesto dos Pioneiros de 1932, documento que tinha a missão

de compor novas diretrizes para a educação, um novo plano de reconstrução da

educação, uma proposta para uma reforma educacional. Este documento foi

elaborado por Fernando de Azevedo em cinco dias e com o intuito de ser aplicado

em dois meses, tendo o cuidado de escolher cada um dos nomes dos convidados

para subscrever o texto, levando em consideração a posição de liderança e ou

estarem ligados ao exercício profissional em órgãos da imprensa.

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17

Nesse documento, Saviani (1998) aponta que a educação era vista sob o

olhar da Escola Nova. Por meio desse novo ideal, o educador seria de larga visão

e utilizaria de todas as técnicas disponíveis desenvolvidas cientificamente para

impulsionar a administração dos serviços escolares. Esse manifesto era “[...] uma

reação categórica, intencional e sistemática contra a velha estrutura do serviço

educacional, artificial e verbalista, montado para uma nova concepção vencida”

(MANIFESTO..., 2010, p. 40).

O autor compartilha que a família deixava de ser o centro de produção para

se tornar um simples centro de consumo, o que levou a transformar a educação

em uma responsabilidade estatal. Dentre todos os deveres do Estado, o mais

importante era se comprometer com as novas gerações e o futuro do país, e nem

mesmo os problemas econômicos eram mais importantes, porque

Nem mesmo os de caráter econômico lhe podem disputar a primazia nos planos de reconstrução nacional. Pois, se a evolução orgânica do sistema cultural de um país depende de suas condições econômicas, é impossível desenvolver as forças econômicas ou de produção, sem o preparo intensivo das forças culturais e o desenvolvimento das aptidões à invenção e à iniciativa que são os fatores fundamentais do acréscimo de riqueza de uma sociedade. (MANIFESTO..., 2010, p. 33)

No referido documento, o objetivo da função educativa era organizar e

desenvolver a educação a fim de que o desenvolvimento do indivíduo fosse

natural e integral em cada uma das etapas de seu crescimento, utilizando-se da

concepção de mundo em que este indivíduo estava inserido. Explica Saviani

(1998) que a escola não iria mais modelar o educando no modelo exterior como

fazia a escola tradicional, visto que a educação passava a ser algo que ocorria de

dentro para fora.

Por fim, fica evidente que esse documento é um marco para a educação

brasileira por trazer grandes contribuições para a reforma educacional. A respeito

deste Manifesto, dois aspectos foram apontados por Saviani (1998): por um lado,

é um documento doutrinário em que declara estar filiado à Educação Nova e, por

outro lado, por ser visto como um documento de política educacional que

expressa a defesa da escola pública e não somente da Escola Nova. Nessa

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18

perspectiva, o autor destaca que o texto abrange a reforma educacional desde a

escola infantil até as universidades, sendo algo ímpar no Movimento da Escola

Nova, tendo em vista que, na Europa e em alguns locais dos Estados Unidos, as

mudanças sempre ocorreram no âmbito das escolas privadas, e mesmo Freinet,

que tentou atuar no campo público, acabou por sair do poder público e, para dar

continuidade a seu trabalho, fundou a sua própria escola.

Apesar de tais constatações, vale ressaltar que tanto a contribuição do

Movimento da Escola Nova quanto a de Freinet é de grande importância para a

educação, por inaugurar uma formato de educação que trouxe liberdade de

expressão para os seus alunos, tendo como resultado um cidadão mais crítico e

participativo.

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2. A UTILIZAÇÃO DA IMPRENSA NA ESCOLA

Como já mencionamos anteriormente, Freinet desenvolveu a sua

pedagogia sob o olhar escolanovista, uma Pedagogia do Bom Senso, que “[...]

defendia a espontaneidade das crianças e, por isso, difundiu várias técnicas de

ensino que valorizassem a expressão livre de cada aluno o que significava uma

recusa ao intelectualismo, ao academicismo e ao excesso de racionalismo,

existentes na escola tradicional” (LUSTOSA, 2010, p. 2).

Dentre as técnicas de Freinet, a utilização da imprensa na escola foi

considerada uma das mais importantes desenvolvidas em sua pedagogia.

Sampaio (1994) afirma que a utilização da imprensa foi sugerida por ele pelo fato

de não se conformar com o destino dado aos textos que seus alunos produziam

após as aulas passeios, já que ficavam parados nos cadernos, e o educador os

considerava muito vivos para que fossem lidos somente durante a aula. Por isso

Freinet

Começou a utilizar a imprensa para registrar e divulgar essa forma de expressão dos alunos em que o texto devia surgir naturalmente a partir das impressões de cada um, seja após um passeio pelo campo, uma visita a uma praça ou por meio da observação da natureza. (LUSTOSA 2010, p. 2).

Freinet não foi o primeiro a usar a imprensa na escola, Rousseau (1712-

1778) já a havia mencionado muito antes e Decroly (1871- 1932), como comenta

Elias (2000), propunha a utilização de materiais de leitura significativos com

assuntos de suas vidas, do dia a dia, imprimindo-os em um duplicador para o

aprendizado da leitura. Tais informações nos leva a querer entender o que fez

Freinet para ser diferente das ideias anteriores, “[...] será que a imprensa é uma

invenção original ou seria a utilização que dela faz Freinet que é original”

(MAURY, 1993, p. 12).

Elias (2000) destaca que o pedagogo não negou que as suas técnicas

tinham predecessores. Entretanto a sua originalidade estava na forma como ele

utilizava e assimilava os seus ensinamentos, dando origem a novos princípios,

sendo ela uma técnica e não um método, visto que não era algo estático.

Page 21: a imprensa e a alfabetização na escola – a perspectiva de freinet

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Contudo, permitia transformar a escola em suas bases, por oportunizar ao aluno a

possibilidade de expressar-se livremente, permitindo-lhe ser criativo,

diferentemente dos métodos tradicionais que tinham suas possibilidades e formas

presas ao que já estava pré-estabelecido em seus manuais. Neles, as crianças

aprendiam, primeiramente, as letras; em seguida, as vogais e, depois,

combinavam-nas para formar as sílabas, dando origem às palavras, muitas vezes

sem saber o real significado das mesmas. Nesta perspectiva,

Enquanto a alfabetização escolar ficou presa à autoridade de mestres, métodos e livros, que tinham todo processo preparado de antemão, constatou-se que muitos alunos que não trabalhavam segundo as expectativas dos mestres, métodos e livros eram considerados incapazes e acabavam de fato não conseguindo se alfabetizar. (CAGLIARI, 2009 p. 34).

Sendo assim, como ressalta Elias (2000), a leitura e a escrita, assim como

a compreensão das mesmas são dois momentos distintos de uma mesma

operação, por meio das quais a criança pode chegar a decifrar sem saber, no

entanto, traduzir as palavras em pensamento. Ante esta constatação, é

necessário deixar a criança falar e escrever livremente, à sua maneira, com as

palavras do seu próprio vocabulário, sem que o professor esqueça-se de motiva-

lá a buscar o próprio aperfeiçoamento.

Por entender a necessidade de uma nova forma de proporcionar ao aluno a

aprendizagem da leitura e da escrita de forma que ele viesse a se tornar um

indivíduo crítico e não um reprodutor do que a escolástica já previa, Freinet

procurou pôr a sua ideia de utilização da imprensa na escola em prática. Para

isso, como relata Sampaio (1994), ele procurou os tipógrafos da cidade de

Grasse, situado nos Alpes Marítimos da França, porém sentiu que sua ideia não

tinha sido aprovada pelos mesmos, isso não o desanimou e, no ano de 1924, ele

começou a utilizar essa técnica na escola de Bar-sur-loup. Sendo assim,

Estava criada uma nova técnica de divulgação da leitura e da escrita escolar que envolvia o método global e natural. Nesse método, primeiro a criança produz um texto com sentido, proveniente de uma descrição ou de uma narrativa com significado social, depois o texto é lido aos outros em sala. Da

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leitura coletiva surgia o aperfeiçoamento do texto com o auxílio do professor e dos colegas e, em seguida, o texto manuscrito passa a texto impresso. (LUSTOSA, 2010, p. 3).

A chegada da imprensa no cotidiano escolar, como afirma Sampaio

(1994), trouxe entusiasmo, por desafiar as crianças, que logo conseguiam superar

as dificuldades que apareciam, tendo como resultado “[...] uma mudança de

comportamento de professores e alunos [...]” (ELIAS 1997 p. 26), trazendo vida

para a sala de aula e um sentimento de cooperação entre todos.

Para que os objetivos fossem alcançados, conforme destaca Maury (1993),

era necessária uma nova postura do professor, que deveria passar a se dedicar

inteiramente a seu aluno. Era fundamental haver um relacionamento de

cooperação entre o professor e seus alunos, porque, segundo Cagliari (2009),

uma proposta de alfabetização que valorizasse a criança e seu trabalho criava um

clima sem pressão dentro da sala de aula, tendo como resultado uma melhor

interação entre professor e aluno, oportunizando ao aluno condições mais

saudáveis para a realização do processo de alfabetização.

Sampaio (1994) aponta que, ao trabalhar com a imprensa na escola,

Freinet não intencionava transformar a criança em um tipógrafo, mas acreditava

que, por meio dessa técnica, era valorizado, sobretudo o registro do pensamento

da criança, desenvolvendo-lhe um espírito crítico.

Todo esse processo de utilização da imprensa era feito de forma coletiva,

algo que era essencial para os pressupostos da pedagogia freinetiana. Esta

técnica era aplicada da seguinte maneira: tudo se iniciava com as aulas passeio;

nelas, os alunos faziam entrevista, colhiam informações e, em seguida, produziam

textos sobre o que presenciaram; posteriormente, eram feitas, como esclarece

Maury (1993), as correções do texto escolhido para ser impresso. Este, para ser

impresso, precisava ser perfeito em acentos e pontuações, sendo este o

momento em que Freinet trabalhava com as crianças a escrita correta das

palavras. Em seguida,

Discutiam a diagramação e também o tipo de ilustração que acompanharia o texto depois de impresso. Quando chegavam a um acordo, com tudo decidido, dividiam-se em grupos que assumiam diferentes tarefas: preparação do papel e contagem

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das folhas a serem impressas e arrumação da mesa de trabalho. Cada grupo sabia de sua responsabilidade e assim um texto individual se transformava num produto de toda a classe. A cada dia preparavam um texto, as páginas iam sendo impressas e penduradas para secar e, no final do mês, “o jornal de textos livres” estava pronto para ser distribuído. [...]. (SAMPAIO, 1994, p. 25).

Na perspectiva de Freinet, a utilização de sua técnica era essencial por

trazer vida para a sala de aula e outras grandes vantagens, como atenção ao

texto, um trabalho perfeitamente acabado, que auxiliava na aprendizagem da

ortografia e da leitura. Esses resultados foram evidenciados por Freinet, como

destaca Maury (1993), ao afirmar que, durante os meses em que utilizou essa

técnica na escola já mencionada, o interesse de seus alunos não enfraqueceu e

foram grandes os progressos na leitura e na ortografia.

Em seu texto, Sampaio (1994) cita um comentário de Piaget (1896-1980)

em que aponta que, ao utilizar a imprensa escolar, Freinet alcança o objetivo de

uma educação da inteligência e de uma aquisição dos conhecimentos gerais pela

ação, atingindo o objetivo da escola ativa que era alcançar o desenvolvimento dos

interesses na formação social da criança. Ele destaca que Freinet conseguiu

juntar as duas vertentes da psicologia das funções cognitivas, na qual o

desenvolvimento das operações intelectuais provém da ação do sentido mais

completo e a coordenação geral das ações implica em uma dimensão social.

Para abordar sobre a imprensa na escola, Freinet escreveu o livro A Leitura

pela Imprensa na Escola, com a colaboração de seu amigo Lucienne Balesse e

publicado pela Dinalivros em 1927, objetivando, segundo Elias (1997), fazer

considerações sobre o que vem a ser o método global e propor a substituição dos

manuais pela leitura do texto livre e impresso pela criança. Segundo Sampaio

(1994), essa foi sua primeira obra escrita.

Freinet – só será mencionado Freinet, apesar de a autoria do livro ser dos

dois, porque Balesse só participou na parte final – inicia seu livro destacando o

momento apocalíptico que a sociedade em que estava inserido passava, havia

um espírito de liberdade que surgira após a I Guerra Mundial, que se refletia em

vários âmbitos, inclusive no educacional. Isso se percebe porque “[...] a massa

docente, habituada à servidão e à obediência, deixou-se entrever um grande ideal

Page 24: a imprensa e a alfabetização na escola – a perspectiva de freinet

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de liberdade com o nascimento e a evolução da educação nova” (FREINET;

BALESSE, 1977, p. 11). Em suas afirmações, destacava que esse entusiasmo

eclodiu e se associou à ideia de uma educação nova e libertadora.

Nessa primeira parte do livro, ele trata do método global e faz críticas à

forma de ensino da pedagogia tradicional, deixando claro que talvez tivessem

razão, já que, por meio desse formato de ensino, chegava-se a algum resultado,

porém isso limitava os alunos e, ao utilizar o tradicionalismo, dever-se- ia deixar

de lado a personalidade, a cultura e esquecer a liberdade.

Além de criticar os métodos de ensino tradicionais, Freinet se coloca contra

o formato dos prédios escolares, a superlotação das classes, os salários

insuficientes dos professores. Ele também atribuía a essa pedagogia a culpa pelo

aparecimento da dislexia em muitos alunos, uma vez que, como a criança “[...]

não compreende o que escreve e como [...] isso não tem importância, escreverá

indiferentemente CRATA por CARTA”. (FREINET; BALESSE 1977 p. 36),

dificilmente no momento da fala ela faria esta troca, mas, ao escrever, por não

compreender o que escrevia, poderia facilmente cometer esses erros.

Ao abordar o método global, Freinet destacava que a sua utilização pelos

pedagogos tradicionais estava longe daquilo que fora proposto por Decroly,

idealizador do método. Para ele, os pedagogos da época não conheciam o

método, visto que o utilizavam de forma errada. Diferente do método tradicional

que primeiro ensinava a letra, a sílaba, a palavra e, por fim, a frase, o método

global se construía de forma diferente; primeiro ele ia do todo para, depois,

decompor-se nas partes.

Esta era uma questão problemática para Freinet, porque ele compreendia

que a aprendizagem da escrita ocorre de uma forma diferente do que os métodos

utilizados propunham. É orientado por este princípio que ele desenvolveu um

método natural, porque, para ele, a ideia de aprendizagem se dá

[...] como resultado das tentativas experimentais empreendidas pelas crianças. Partindo daí, expõe concepções pedagógicas e preconiza o método natural. Elimina o manual de leitura e qualquer ideia de progressão programática (CORDEIRO; VALE, 1996, p. 48).

Page 25: a imprensa e a alfabetização na escola – a perspectiva de freinet

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Ao falar da aprendizagem da escrita, afirma Elias (1996), Freinet definiu

cinco fases de desenvolvimento, sendo a primeira o grafismo, constituída quase

que exclusivamente pela tentativa de exercitar a mão, sendo esta fase um

processo de criação constituída de grafias curvas, quebradas irregulares.

A evolução para a segunda fase ocorreria de forma natural à medida que a

criança evoluía dos rabiscos ao desenho, seguida da imitação dos sinais gráficos,

tornando-se capaz de diferenciá-los. Nesta fase, a criança seria capaz de ler as

palavras que escreve, uma vez que só escreve aquilo que compreende. Defende

Freinet que este é um momento crucial em que se destaca “[...] a importância dos

estímulos, do acompanhamento do processo, das formas técnicas de auxílio e

paciência da espera para que a criança caminhe sozinha no seu próprio ritmo [...]”

(ELIAS, 1996, p. 58).

Na terceira fase, a criança procura dar um valor sonoro a cada uma das

grafias que compõe a figura, ela já não mistura o desenho e a escrita. Para

Freinet, esta fase seria o alvorecer da verdadeira escrita, a fase em que as

crianças percebem a existência de regras e formas e tenta imitá-las. Somente na

quarta fase a criança se interessaria pelos textos produzidos em sala de aula e os

tenta reproduzir.

Sendo assim, ao chegar à quinta fase, ele propõe que fosse explorada

totalmente a expressão livre e desenvolvido o trabalho ortográfico, atividades que

aperfeiçoariam cada vez mais a escrita, fazendo com que a criança seja capaz de

se expressar de forma satisfatória a sua idade.

Por essa razão, como aponta Elias (2000), a ideia de Decroly de delegar ao

mestre a tarefa de recriar e refletir sobre os métodos, em busca de técnicas e

recursos novos para concretizar a tarefa educativa, levou Freinet a propor o

método natural para o ensino da leitura e da escrita, tendo como proposta a

associação de conteúdos. Entendia, porém, que a sua aplicação dependeria da

mentalidade do professor, que deveria levar a criança a criar, agir e construir um

verdadeiro conhecimento.

Na segunda parte de seu livro, Freinet aborda a leitura global pela via da

imprensa na escola, alertando que a utilização desta técnica deveria ocorrer já na

Escola Maternal. Nesse momento, deveria ser procurado o verdadeiro sentido e

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alcance de sua técnica, visto que, por meio de um pensamento novo, seria

revelada à criança e ao educador uma nova ideia de criança. A partir deste ponto,

ele destaca a importância do uso da imprensa como meio auxiliar no ensino da

leitura e da escrita. Afirma que, “[...] através da imprensa na escola, as crianças

começaram a falar na aula, a exprimir-se, pela palavra, pela caneta, pelo lápis,

pela mímica” (FREINET; BALESSE 1977, p. 44)

Para Freinet, nas palavras de Elias (2000), a aprendizagem se desenvolve

em três estágios: a experimentação, a criação e a documentação. Enquanto a

experimentação e a criação são atividades mais comuns, a documentação só

poderá ser obtida por meio de registros, como o livro da vida, a ficha, o jornal, a

correspondência, os intercâmbios interescolares, as fotografias e outros meios e

materiais, sendo esta etapa a representação da tomada de consciência de

alguma experiência.

Por esta descrição, é possível afirmar que ele teoriza a respeito de uma

forma de ensino natural, da mesma maneira que a família fazia quando, a

princípio, não corrigia a forma errada da fala, mas deixava que a criança

descobrisse aos poucos, porque o importante, nesse momento, era deixar que a

criança se expressasse de forma livre. Neste sentido, afirmam que “[...] a natureza

preparou o milagre: todas as crianças normalmente constituídas e colocadas num

meio onde se fala correctamente, aprende com segurança a sua língua materna.

E, isto, sem exceção alguma!” (FREINET; BALESSE 1977, p. 46).

Postulava que, dessa forma, a criança sente-se estimulada a ler

globalmente, sem métodos pré-estabelecidos, sendo essa leitura a ideal, já que

nela o leitor, “[...] lerá e compreenderá frases inteiras até o dia em que [...]

palavras e sílabas descobrirá” (FREINET; BALESSE, 1977, p. 49).

Freinet destacava que não se deve ter pressa de ensinar a criança a

aprender a ler. Alguns pedagogos, com seus métodos artificiais, até conseguiam

antecipar essa aprendizagem, mas a leitura se tornava o cumprimento de lições e

não uma expressão.

Em relação à sua técnica de utilização da imprensa na escola, Freinet

afirmava que, graças a ela,

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Todas as crianças lêem com entusiasmo os seus próprios textos; tentam ler globalmente alguns textos dos seus correspondentes. Distinguem apenas algumas palavras, e nem sempre de uma forma perfeita. Mas elas têm si, intimamente ligada a toda a sua vida psíquica e social, a imagem de uma multidão de palavras que, bruscamente, surgirão, no seu sentido verdadeiro e total [...] (FREINET; BALESSE, 1977, p. 52).

Na última parte de seu livro, ele deu a palavra para o seu amigo Lucienne

Balesse, que utilizou, em Genebra, as suas técnicas, para que ele falasse sobre

essa experiência da utilização da técnica da leitura pela imprensa na escola.

Balesse, no decorrer de seus relatos, assevera que ninguém desenvolveu

instrumentos que aliviassem o trabalho para os professores, mas, quando Freinet

apresentou a sua técnica de utilização de imprensa na escola, a leitura global

tornou-se facilitada para o professor, trazendo resultados positivos, por permitir o

crescimento da personalidade dessas crianças que tanto foi feito para impedir a

sua eclosão. “A imprensa restitui a palavra à criança.” (FREINET; BALESSE 1977

p. 65).

Ele destaca que somente a imprensa era capaz de alcançar uma das

preocupações que ele considerava prioridade, “[...] a formação do pensamento e

da sua expressão através da linguagem [...]” (FREINET; BALESSE, 1977, p. 66),

porque ela oferecia a possibilidade de fixação e tomada de consciência da

realidade.

O autor faz um reforço à crítica de Freinet sobre a maneira de utilização do

método global pelas escolas naquela época, que, na intenção de fazer com que

as crianças aprendessem rapidamente a ler, tendiam a não utilizar “[...] o método

global puro, aquele que segue verdadeiramente o desenvolvimento da criança,

que contribui para o seu desabrochar, para sua verdadeira cultura” (FREINET;

BALESSE 1977 p. 69).

Ao utilizar o método global, ele intencionava que a criança não apenas

decorasse letras, palavras e sílabas, porém que fosse capaz de fazer uma leitura

em que compreendesse o sentido do texto que estava lendo. Balesse elucida que

a utilização da leitura global não é “[...] como um processo que obrigue à

aquisição rápida do mecanismo, mas queremos, graças a ela, permitir que cada

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criança faça sua experiência tacteada e ponha em prática uma técnica que nunca

venha a trair o seu pensamento” (FREINET; BALESSE, 1977 p. 72).

Ele acrescenta que todo esse processo é feito integrado à vida de seus

alunos, sem a utilização de textos e manuais pré-estabelecidos. No momento em

que o texto utilizado pela criança fizer parte do domínio da mesma, ou seja, aquilo

que está mais próximo dela, ela terá melhor compreensão e, como resultado,

conseguirá aprender a ler até com mais facilidade.

Em outro momento de seu relato de experiências, ele descreve a maneira

como era utilizada a técnica, como os alunos se dividiam para chegarem ao final

de um texto impresso, mas sempre deixando bem claro que não se utilizava de

sistematização. Informa que tudo se iniciava com a produção dos textos pelas

crianças. Após a escolha de qual texto seria impresso e efetuadas as correções

ortográficas, ele era dividido em linhas que eram enumeradas e distribuídas em

etiquetas para que elas as montassem no componedor3. Todos participavam

desse processo, até os menores, que, posteriormente, tinham seus erros

ortográficos corrigidos pelo próprio professor.

Fonte: Carvalho (2010).

Alunos montando o texto para impressão

Ao finalizar as composições e correções, o responsável pelo trabalho

__________________________ 3”

Instrumento tipográfico em que o compositor vai alinhando caracteres para formar palavras”.

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(geralmente o autor do texto), chamava cada criança com seu componedor para a

reconstituição do texto sobre a mesa e, em seguida, a sua organização na

impressora.

Fonte: Sete educadores (2006)

Alunos organizando texto

Com as etiquetas já dispostas na prensa, o responsável distribuía as

tarefas, “[...] tu prensas; tu pões as tintas; tu tiras as folhas, etc. [...]” (FREINET;

BALESSE, 1977 p. 81) e imprimia as folhas sob o olhar iluminado e espantado

das crianças por verem a primeira folha imprensa, transformando o texto

individual em um produto de toda a classe.

Fonte: Sampaio (1994, p. 22)

Alunos trabalhando com a impressora

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29

Esse processo de impressão, continua Balesse, posteriormente, continuava

automaticamente sem a sua intervenção, dando aos seus alunos autonomia e

confiança para realizar o trabalho proposto.

Essa liberdade proporcionada à criança dentro da sala de aula era algo que

enriquecia o aprendizado, visto que, “[...] para desabrochar, a criança exige um

clima de liberdade e confiança, no qual a simpatia e a disponibilidade venham ao

encontro das suas iniciativas mais secretas” (ELIAS, 2000, p. 119).

Em relação à escrita e à ortografia, Balesse que era utilizada a mesma

técnica da leitura, não se usavam de técnicas metódicas, não se forçava para que

a criança tivesse uma letra perfeita, mas dava-se a oportunidade para que ela se

aprimorasse aos poucos. Ele afirma que não se cobrava da criança uma escrita

com o traçado, apenas era exigida uma escrita limpa e legível.

Ao finalizar a sua contribuição para o livro, Balesse destaca a sua forma de

trabalhar a técnica freinetiana, como ela trouxe uma nova perspectiva para o

ensino da leitura e da escrita e como mudou a relação entre professores e alunos,

suprimindo de suas aulas “[...] a ideia de professor e de aluno, de dominador e de

dominado, de comando e de obediência [...]” (FREINET; BALESSE, 1977, p. 107).

Por fim, ao terminarmos a leitura desse livro, percebemos que a intenção

de Freinet não era ensinar a forma de utilização, mas apresentar a sua técnica,

resultados e contribuições para o ensino da leitura, porque, segundo seu

entendimento, “[...] a nova técnica não cairá do céu já pronta; o novo espírito não

atingirá a massa dos interessados como por encanto” (FREINET; BALESSE 1977,

p. 55). Ao finalizar o seu livro, oportunizou que um professor relatasse os

alcances obtidos ao aplicar sua técnica, permitindo aos seus leitores antever que,

de fato, é possível utilizá-la, porém desde que os professores envolvidos, assim

como Balesse, estivessem dispostos a mudar a sua postura dentro da sala de

aula, permitindo total interação com os seus alunos.

Entendia que essa nova postura do professor faria com que essa técnica,

assim como toda a pedagogia freinetiana alcançassem os seus objetivos, porque

esse novo relacionamento entre professor e aluno trazia um novo sentimento na

sala de aula, um espírito de cooperação, algo que, como já destacamos, seria

essencial na pedagogia proposta por Freinet.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante de tudo o que foi apresentado, é possível afirmar que a pedagogia

freinetiana trouxe importantes contribuições para a educação, que resultou em um

grande movimento, a Escola Moderna, e que, em toda a sua caminhada, Freinet

sempre lutou para um ensino que desse valor à criança e que permitisse que ela

não fosse somente a reprodutora de conceitos e falas sem entender do que se

tratava. Pretendia que, ao se utilizar de suas técnicas, seus alunos pudessem ser

estimulados a serem criativos e expressivos, transformando-os, assim, em

cidadãos críticos.

Não se pode negar que toda essa nova forma de pensar a educação foi

influenciada pelo momento histórico que vivia Freinet, resultado de uma nova

postura da sociedade, que se refletiu na educação. Naquele momento, defendia-

se a formação de um cidadão crítico, e acreditava-se isso só seria possível com a

reestruturação da sociedade e, em consequência, da educação. Esse novo

formato de educação foi encontrado por Freinet dentro da Escola Nova. Ele se

orientou por princípios estabelecidos por ela e formou os seus, e teve como

resultado um movimento chamado Escola Moderna.

Em relação à utilização da imprensa na alfabetização, analisado por meio

de textos lidos e do livro escrito por Freinet e Balesse, é preciso reconhecer que

ele a considerava muito importante dentro do conjunto de técnicas criadas. Ele

acreditava que esse movimento de utilização de textos livres, que dava permissão

para que a criança utilizasse suas próprias ideias, era o diferencial de sua técnica,

por permitir que a criança construísse o seu texto livre e o utilizasse,

oportunizando ao aluno ser um leitor que, de fato, estava entendendo o que lia, e

não somente um reprodutor do que estava já pré-estabelecido nos manuais. Além

disso, o fato de imprimir os textos para que outras pessoas pudessem ler fazia

com que cada vez mais os alunos se motivassem e se dedicassem ao trabalho

proposto.

Freinet considerava a utilização dessa técnica importante, porque ela

motivava o aluno. Todo o processo de escrita dos textos, correção, preparação de

material para impressão causava em seus alunos a expectativa de presenciar o

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32

trabalho acabado. Este processo de trabalho pedagógico centrado na leitura e na

escrita, como estava baseado na cooperação, trazia vida para a sala de aula.

Enfim, o que Freinet considerava como importante na utilização de sua

técnica como contribuição para alfabetização era a formação de leitores e

escritores que compreendiam o que estavam lendo ou escrevendo, pelo fato de

se relacionar com o que estava inserido no seu cotidiano, diferente da escola

tradicional que trazia textos já formados e que não permitia à criança ser criativa e

expressiva.

Mas é imprescindível lembrar que tal técnica não funcionava de forma

isolada. Usar a imprensa não era somente imprimir os textos, mas usar texto livre,

aplicar os princípios da sala cooperativa, e ter um professor com uma nova

postura de trabalho junto ao aluno, considerando que o centro é a criança e seus

interesses e não o professor e seu conhecimento. Em síntese, o importante, para

que essa técnica trouxesse resultados positivos, era utilizar a filosofia da

pedagogia do trabalho, na qual se aprendia por meio da ação e do trabalho, ou

seja, por meio do movimento.

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33

REFERÊNCIAS

BELLO, José Luiz de Paiva. A pedagogia de Célestin Freinet. Rio de Janeiro: 1999. Disponível em:

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