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http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6
A INDÚSTRIA CULTURAL NO CIRCUITOTURÍSTICO GUIMARÃES ROSA1
Gabriel Pironcelli Kazukas
Universidade de São Paulo
INTRODUÇÃO
“É, e não é. O senhor ache e não ache. Tudo é e não é...” João Guimarães Rosa
O Trabalho de Campo da disciplina Migrações e Trabalho, lecionada pelo
Professor Doutor Heinz Dieter Heidemann, no primeiro semestre de dois mil e treze, foi o
grande impulsionador dessa pesquisa. Em Viagem de Campo para o município de Morro da
Garça, entre primeiro e cinco de maio, percebemos uma cidade pequena, no interior de
Minas Gerais, mas que apresentava uma cultura rica e resistente.
Durante o Trabalho de Campo, entre outras atividades, separados em pequenos
grupos por eixo temático, percorremos a cidade conversando com as pessoas. Pudemos
viver a cidade, e essa vivência deixou saudades e uma questão: Até onde a cultura de Morre
da Garça, até onde a Indústria Cultural Morrense, (re)produz-se no território e na sociedade
local? A tentativa de resposta para essa questão gerou essa pesquisa e, consequentemente,
milhares de outras perguntas, indagações, contradições e descobertas que descrevemos
nesse trabalho.
O município inicialmente investigado faz parte de um Circuito Turístico, que
consiste em uma associação de municípios geograficamente próximos e ecológica, cultural,
social e economicamente afins para o desenvolvimento sustentável local a partir da
atividade do turismo.
1 Artigo apresentado ao VI. Congreso Iberoamericano de Estudios Territoriales y Ambientales (CIETA), em São Paulo,Brasil, em setembro de 2014. Refere-se à parte de pesquisa de graduação em andamento desde 2013 noDepartamento de Geografia da USP (São Paulo, Brasil), sob orientação do Profº. Drº. Rodrigo Ramos HospodarFelippe Valverde.
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O Circuito Turístico Guimarães Rosa, que, quando criado em cinco de dezembro
de dois mil e três e certificado pela Secretaria de Estado de Turismo de Minas Gerais em
cinco de fevereiro de dois mil e cinco, foi batizado, apenas, de Circuito Guimarães Rosa.
Este tinha um cunho literário, nos quais os leitores e admiradores da obra de
João Guimarães Rosa podiam viver um pouco da cultura e sentir a paisagem sertaneja
descrita na obra desse grande autor brasileiro.
Figura 1: Mapa do circuito turístico Guimarães Rosa
http://www.circuitoguimaraesrosa.com.br/novo/?page_id=260. Acessado em 30/07/2014.
Os municípios que fazem parte do Circuito são: Araçaí, Buritizeiro, Corinto,
Curvelo, Inimutaba, Morro da Garça, Pirapora, Presidente Juscelino, Santo Hipólito e a
Basílica de São Geraldo em Curvelo. A cidade de Cordisburgo, onde o escritor nasceu e viveu
até os oito anos, e o município de Três Marias, na qual inclui o distrito de Andréquice, onde
nasceu Manuelzão, o grande personagem do livro “Grande Sertão: Veredas”, são convidados
de honra do Circuito Turístico Guimarães Rosa porque pertencem a outros Circuitos
(Circuito das Grutas e Circuito Lago Três Marias) e não podem, legalmente, pertencer a dois
Circuitos.
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A metodologia deste trabalho está pautada na “Nova Geografia Cultural”, em que
a Escola de Berkeley foi renovada após um período de críticas, portanto as ideias de Scott e
Power, são fundamentais para a realização desse trabalho.
Esse trabalho visou à análise qualitativa ao valorizar os aspectos descritivos e as
percepções pessoais, além de procurar compreender os sujeitos envolvidos, para isso
utilizei os recursos da etnografia e da observação participante para elaborar descrições
minuciosas a respeito da Indústria Cultural, do modo como o turismo é realizado e de como
a sociedade local se relaciona com o Circuito. Para isto precisou ser realizado, no início de
dois mil e catorze um novo Trabalho de Campo com duração de trinta dias, no qual
percorremos alguns dos municípios do Circuito Turístico afim de compreender melhor a
realidade da região estudada.
Os estudos em arquivos históricos, a busca dos dados públicos atualizados e os
trabalhos de campo foram fundamentais para a formação das fontes primárias no intuito de
compreender a cultura local e como está se manifesta no Circuito. A leitura de textos de
João Guimarães Rosa foi um componente a mais para se entender a cultura sertaneja
descrita pelo autor e vivenciada em campo.
“A Geografia e a Literatura cruzam-se, então, na dimensão de um enfoque
cultural sobre o espaço e o ser social, independente de tê-lo como objeto,
sujeito, manifestação ou como uma abordagem” (OLANDA e ALMEIDA, 2008, p.
17).
Os principais resultados foram os levantamentos sobre como se configura a
Indústria Cultural no Circuito Turístico Guimarães Rosa, bem como a descoberta de uma
disparidade de como se deve prosseguir a gestão no Circuito. De um lado possui municípios
que priorizam o desenvolvimento da cultura e de outro o do turismo, tal divisão é intrínseca
ao processo de desenvolvimento regional. Tal divisão é totalmente responsável sobre como
se dá a (re)produção do espaço nessas áreas e de uma possível descaracterização do
circuito. O modelo de sociedade a qual iremos discutir adiante está totalmente marcado
dentro do processo de turismo que está se desenvolvendo nessa região
“No turismo, como em outras faixas da cultura, o que está em pauta, em última
análise, não são bens, sentidos e valores. São relações entre os homens. O tipo
de turismo que propusermos e praticarmos dependerá do tipo de relações que
julgarmos aceitáveis e desejáveis entre os homens, isto é, do modelo de
sociedade pelo qual optarmos” (MENEZES, 1996)
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INDÚSTRIA CULTURAL
Cultura é uma prática regida pela relação entre sociedade e natureza, portanto,
cada sociedade obtém um entendimento diferenciado da atividade cultural. Para os
romanos, por exemplo, a palavra cultura, segundo Sodré, 1983, origina-se da palavra colere
que significa cultivar, ou seja, a cultura implicava numa autoeducação do indivíduo.
Naturalmente, a partir das Revoluções Burguesas do século XVII, com o advento
do capitalismo, parte dos estudiosos começou a ver na cultura uma conotação capitalista, e
os primeiros indícios do termo “indústria cultural” possuiu uma significação muito forte,
sobretudo depois dos períodos de Ditaduras que assombraram o Mundo Ocidental no
século passado.
Controle e alienação das mídias e das atividades de lazer são muito presentes
para caracterizar indústria cultural nos dias de hoje. Adorno (2002) afirma que
“A indústria cultural pode se vangloriar de haver atuado com energia e de ter
erigido em princípio a transposição — tantas vezes grosseira — da arte para a
esfera do consumo, de haver liberado a diversão da sua ingenuidade mais
desagradável e de haver melhorado a confecção das mercadorias”.
É claro que as ideias de Adorno e da Escola de Frankfurt devem ser pensadas e
questionadas ainda hoje. O que seria errôneo, por parte do pensamento científico, é aceitar
essas premissas como um dogma e perder uma Geografia Cultural que está exprimida nas
lacunas deixadas por essas ideias. Dado que
“a forma como a economia capitalista se desenvolve espacialmente foi reduzida
e simplificada por um discurso que, em sua origem, descarta as especificidades
das suas formas de ação por um discurso que, em sua origem, descarta as
especificidades das suas formas de ação devido a uma crítica moral que ecoava
os termos gerais do modelo da Escola de Frankfurt descrito anteriormente”
(VALVERDE)2.
Atualmente não é só o setor da economia obtêm vantagens com a promoção da
cultura em seu sistema, sistemas políticos já pensam em incentivar a cultura como via
importante para o desenvolvimento regional.
“Nesse contexto, (re)produzir cultura, significa promover intervenções no mundo
que são significativas, uma vez que ultrapassam simplesmente a questão da
identidade e do consumo. Pensar, agir e produzir sob a justificativa cultural
2 Texto não publicado.
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significaria então realizar a escolha de uma estratégia que pode aproximar
agentes, mobilizar recursos e ganhar nova força no mundo globalizado”
(VALVERDE)3.
Portanto, indústria cultural é um reflexo da crescente convergência que está
ocorrendo na sociedade moderna entre a ordem econômica, de um lado e os sistemas de
expressão cultural, por outro (SCOTT E POWER, 2004).
“Tal convergência citada por Power e Scott é viabilizada por um avanço das
tecnologias de transporte, de comunicação e dos mercados em escala
planetária, o que contempla, inclusive, países periféricos (...). É nesse sentido que
os autores sugerem que as indústrias culturais podem ser exemplos
importantes de estudos geográficos que se desenvolvem no contexto da Nova
Economia e que qualificam de forma original as relações entre cultura e
economia. Entendemos aqui a indústria cultural como um fenômeno
relacionado a economia criativa, que tem como pressupostos o conhecimento, a
flexibilidade do trabalho, a valorização da subjetividade e a rapidez e amplitude
dos fluxos” (VALVERDE, 2013).
O turismo pode ser considerado como uma das maiores indústrias culturais
contemporâneas, devido à quantidade de atividades correlacionadas que a atividade do
turismo movimenta em toda a sua cadeia. Redes hoteleiras, restaurantes, parques de
exposições, infraestrutura básica, aeroportos etc. Enfim uma série de encadeamentos
públicos, privados, públicos-privados, de esfera local, regional, estadual, federal,
internacional... O turismo movimenta parcerias e investimentos no âmbito político,
econômico, social, cultural e ecológico. Desenvolver o turismo, em muitos casos, significa
desenvolver a região com a patrimonialização do patrimônio cultural e natural.
TURISMO
“O que se quer dizer é que sem fronteiras não há turismo. É a afirmação da
diferença que move a indústria. E tal caminhada é física. Extenuante. Inebriante.
Portanto, há que pensar o turismo também como fenômeno geográfico. Uma
geografia do espetáculo talvez, ou ainda do virtual. Mas geografia sempre”.
Wainberg
Primeiramente é importante ressaltar que turismo não pode ser considerado
como ciência pois, segundo Yázigi, 2012, não logra se quer categoria de análise, porém,
3 Texto não publicado.
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ainda segundo o autor, as abordagens sobre o turismo não podem abrir mão da
necessidade de rigor científico, caso isso não for comprido, teremos produzidos visões
deformadas que não nos aproximam do entendimento global. Portanto é um conjunto de
enfoques científicos que explicam o turismo.
O enfoque geográfico é importante, pois o turismo é uma prática social na
medida em que viajar tornou-se uma atividade de lazer na sociedade moderna, além disso,
uma atividade econômica que envolve diversos atores e setores da sociedade. O turismo
como atividade econômica envolve o consumo do espaço à vista de diferentes formas e
aspectos, mas, ainda assim, é uma das únicas atividades econômicas contemporâneas em
que o consumo do espaço é a relação intrínseca do processo econômico.
Por isso, o turismo, pode ser tanto uma fator de desenvolvimento territorial
local, quando feito de maneira propícia, como também pode ser um fator de alienação do
território a cultura globalizada, fazendo com que perca-se a verdadeira essência cultural
local. Neste segundo caso o território pode até se desenvolver, entretanto será mais um
território, como inúmeros outros no mundo, para fazer concorrência no turismo de massa.
Teoricamente, não há território que seja adjetivamente turístico. O que existe, de
fato, são ‘usos turísticos do território’ ou seja, porções de espaço apropriadas por diferentes
fins, incluindo-se e destacando-se a atividade do turismo, ou seja, porções do espaço
geográfico em que a participação do turismo na produção do espaço foi e ainda é
determinante. (CRUZ, 2007).
“A valorização da atividade turística no Brasil, a partir da década de 1990, resulta
de diversos fatores conjugados, como o crescente significado econômico do
setor de serviços no mundo e, inserido neste, o turismo; a chamada
potencialidade turística do país; a disponibilização de capitais estrangeiros para
financiamento de projetos e os posicionamentos público e privado favoráveis ao
desenvolvimento da atividade. Um marco dessa mudança é a Política Nacional
de Turismo, instituída durante o primeiro mandato do governo Fernando
Henrique Cardoso (1995–98)” (CRUZ, 2002, p.10)
A FORMAÇÃO DOS CIRCUITOS TURÍSTICOS
A PNT, Política Nacional de Turismo, criada em 1996, foi orientado pela lógica
neoliberal de atração de investimentos, lógica que foi regida pelo governo FHC quase que
em todos os setores durante o seu governo. A intenção também foi criar um plano com
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ampla participação da sociedade, ou seja, diversos atores sociais envolvidos sejam eles
governos (em todas suas dimensões: federal, estadual e municipal), a iniciativa privada e a
sociedade como um todo.
Com esse cenário se desenhando para o turismo no Brasil, o Estado de Minas
Gerais, em 1999, cria a SETUR, Secretaria de Turismo de Minas Gerais, com o objetivo de
propor a política estadual de turismo; propor o calendário oficial de eventos turísticos do
Estado; implementar e coordenar a execução da política estadual de turismo; planejar,
promover e avaliar o desenvolvimento do turismo; promover e divulgar os produtos
turístico; celebrar contratos, convênios, acordos, ajustes e outros instrumentos com
entidades de direito público e privado, nacionais e estrangeiras; propor normas
relacionadas ao estímulo e ao desenvolvimento do turismo; exercer a supervisão das
atividades dos órgãos e das entidades da sua área (MINAS GERAIS, 1999)
A criação da SETUR, portanto, foi o início de uma política pública visando o
desenvolvimento do turismo no Estado de Minas Gerais baseada na descentralização e
regionalização, com participação ativa dos diversos atores da sociedade. Regionalizar e
descentralizar foram medidas abrangentes da diversidade mineira, tomadas decorrentes da
ampla extensão do território estadual de Minas Gerais e, também, em decorrência do
grande número de municípios que o estado possui.
Segundo Corrêa, 2007, “o conceito de região está ligado à noção fundamental de
diferenciação de área, quer dizer, à aceitação da ideia de que a superfície da Terra é
constituída por áreas diferentes entre si”, ou seja,
“A região é, portanto, concreta, observável e delimitável. Como qualquer
segmento do espaço, a região é dinâmica, historicamente construída e interage
com o todo social e territorial (...). Em outras palavras, a região é o espaço vivido,
ou seja, o espaço das relações sociais mais imediatas e da identidade cultural”
(CASTRO, 1992)
A prática de regionalização e a descentralização do turismo no estado de Minas
Gerais culminaram não só com a criação da SETUR, mas com a política de formação dos
Circuitos Turísticos. Nesta política está implícito a ideia de Becker, 2004, que perpetua a
ideia de que o Estado precisa dialogar com as suas regiões, com os interesses políticos
específicos especializados e regionalizados, que são ele mesmo, em última análise, e
negociar formas diferenciadas para poder agir. Com isso, além de promover um
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desenvolvimento regionalizado, o Estado de Minas Gerais conseguia promover um aumento
do número em relação a quantidade e maior tempo de permanência dos turistas.
O Decreto 43.321 de 2003 define Circuito Turístico como
“o conjunto de municípios de uma mesma região, com afinidades culturais,
sociais e econômicas que se unem para organizar e desenvolver a atividade
turística regional de forma sustentável, através da integração contínua dos
municípios, consolidando uma atividade regional”.
Este mesmo decreto profissionaliza esses conjuntos de municípios na medida
em que sinaliza algumas diretrizes básicas para o funcionamento, são elas: possuir sede
definida com endereço fixo, telefone/fax e email, devidamente atualizados para efeito de
correspondência junto a SETUR; apresentar uma logomarca que corresponda à Identidade
do Circuito Turístico; viabilizar e apresentar o levantamento da oferta turística dos
municípios do Circuito Turístico; comprovar, através do balanço patrimonial, a captação de
associados relacionados à cadeia produtiva do turismo do Circuito Turístico; manter no
Circuito Turístico pelo menos um Bacharel em Turismo como responsável técnico pelos
projetos desenvolvidos; ter promovido ou participado de no mínimo três eventos turísticos
que lhe proporcionem divulgação e visibilidade; instalar e manter pelo menos um posto
oficial de informações turísticas em local estratégico do Circuito Turístico.
Para a implantação dos Circuitos Turísticos estabeleceu-se, em 2001, uma
metodologia de integração para que as comunidades próximas, localizadas em um mesmo
espaço geográfico pudessem se envolvessem de modo ativo e se configurar um circuito
turístico. Silva, Lima e Teixeira, 2012, afirmam que a metodologia participativa envolveu a
realização de oficinas e reuniões com representantes do Poder Público, da inciativa privada
e da sociedade civil, para a integração dos municípios, no intuito de criar uma identidade
regional.
Além dessas oficinas de participação, a SETUR exigiu que houvesse um gestor
capaz de organizar e administrar o Circuito de forma plena. Como não existiu nenhum
método pré-estabelecido, o método dos Circuitos Turísticos implantado pela SETUR foi
inovador e postulado em tentativas e erros. O modo mais assertivo para os Circuitos foi o de
associativismo. Nessa forma os municípios formariam uma associação e os respectivos
atrativos, equipamentos e serviços turísticos se complementariam e enriqueceriam,
sobremaneira, a oferta turística regional, com expressivos ganhos para os turistas e para as
comunidades envolvidas (EMMENDOERFER, 2008)
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Dessa forma podemos considerar que a implementação dos Circuitos Turísticos
foi um planejamento forçado pelo Estado afim de se criar padrões espaciais para o
desenvolvimento local. Dessa forma os Circuitos representam novos espaços públicos para
a operacionalização das políticas públicas de maneira participativa, integrando-se à
discussão do desenvolvimento local. Ainda, segundo Oliveira, 2010, os Circuitos Turísticos de
Minas Gerais podem ser vistos como espaços públicos de diálogo, no sentido de que há um
novo sujeito social que irá participar das reuniões dos Circuitos para buscar reforçar a
conquistas de seus direitos e deveres, a partir de uma posição cidadã, imbuída da essência
do conceito de cidadania.
O CIRCUITO TURÍSTICO GUIMARÃES ROSA
Os municípios que fazem parte do Circuito são: Araçaí, Buritizeiro, Corinto,
Curvelo, Inimutaba, Morro da Garça, Pirapora, Presidente Juscelino, Santo Hipólito e a
Basílica de São Geraldo em Curvelo. A cidade de Cordisburgo, onde o escritor nasceu e viveu
até os oito anos, e o município de Três Marias, na qual inclui o distrito de Andréquice, onde
nasceu Manuelzão, o grande personagem do livro “Grande Sertão: Veredas”, são convidados
de honra do Circuito Turístico Guimarães Rosa porque pertencem a outros Circuitos
(Circuito das Grutas e Circuito Lago Três Marias) e não podem, legalmente, pertencer a dois
Circuitos.
O Circuito Turístico Guimarães Rosa é um circuito de cunho literário que nasceu
de experiências realizadas por amantes da literatura, que percorrem o sertão de
Minas pelo prazer “de tocar com a mão e ver com os próprios olhos” as
paisagens e os lugares onde se passam as estórias de Guimarães Rosa. Neste
circuito, inspirado na vida e na obra do escritor, são realizados expedições,
caminhadas eco-literárias, momentos de contação de estórias e encontros
culturais, no território iluminado pelas estórias de amor, de humor e de pura
poesia.
O fragmento acima foi retirado do site oficial do Circuito Turístico Guimarães
Rosa (www.circuitoguimaraesrosa.com.br). Nele, podemos perceber o quão de mágico que
há nessa região. Percorrer as paisagens inspiradoras do escritor Guimarães Rosa, poder
vivenciar a cultura sertaneja, o sertão, a vereda.
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UM OLHAR SOBRE A PAISAGEM
A paisagem no Circuito Turístico Guimarães Rosa é muito importante, pois não
se trata só de um plano de fundo, ou o cenário de um espetáculo. A paisagem aqui não faz
parte apenas do Patrimônio Natural, sobretudo o sertão e as veredas fazem parte do
Patrimônio Cultural do Circuito.
Cientificamente,
“as Veredas presentes na região do Cerrado são subsistemas jovens -
Holocênicas, ainda em processo de evolução, portanto, qualquer tipo de
intervenção é altamente prejudicial a esse processo evolutivo,
consequentemente novos conceito se estruturarão. O Buriti (Mauritia vinifera),
espécie de palmácea presente nas Veredas, deve ser considerado como seu
símbolo maior, pela sua pujança e aspecto estético-paisagístico, é extremamente
sensível, não suporta as transformações inseridas no ambiente decorrentes das
práticas antrópicas, devendo ser entendido enquanto componente
ecossistêmica em equilíbrio. Nesse contexto perceptivo, Vereda, então, são áreas
brejosas que ocorrem na região do Cerrado em sintonia com o caminho das
águas, em cuja composição fitopaisagística esteja, sempre, a presença do buriti”
(FERREIRA, 2008).
Figura 2: Vereda
Arquivo Pessoal. Tirada em fevereiro de 2014 no distrito de Lança em Buritizeiro, Minas Gerais.
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Para o sertanejo a vereda adquire papel de sobrevivência, pois além de indicar a
presença de água, no meio do sertão, ela também contém a palmeira Buriti, que além de
seu fruto, que alimenta e proporciona o tradicional doce de Buriti, sua palha é utilizada para
fazer inúmeros objetos para a sobrevivência, como telhados de pequenas casas e moveis.
O sertão não é um lugar, mas uma condição atribuída a variados e diferenciados
lugares. Trata-se de um símbolo imposto – em certos contextos históricos – a determinadas
condições locacionais, que acaba por atuar como um qualificativo local básico no processo
de sua valorização. Enfim, o sertão não é uma materialidade da superfície terrestre, mas
uma realidade simbólica: uma ideologia geográfica (MORAES, 2003)
Guimarães Rosa, definido como viajante por ele mesmo andou muito pelo sertão
mineiro, o qual serviu como inspirações para obras literárias muito lidas até hoje. O escritor
vê o sertão mineiro, ser-Tão, de três formas: A primeira geografia, como campo de
pastagens, um sertão mais ameno; a segunda como mítico, em que mostra as conflagrações
locais entre bandos de jagunços a serviço de coronéis, tratadas como novelas de cavalaria; e
a terceira transfigura esse sertão, geográfico e mítico, em uma arena abstrata, onde Deus e
o Diabo travam uma batalha cósmica que tem por trunfo a salvação ou a danação da alma
dos seres humanos.
Com isso, o público do Circuito Turístico Guimarães Rosa, assim como o escritor
que foi grande inspiração para a criação do Circuito, não são apenas turistas, são viajantes.
TURISTAS E VIAJANTES
Neste momento é importante deixar clara a diferença existente entre dois atores
diferentes na sociedade: o turista e o viajante. O turista é associado ao ator que pratica o
turismo de massa, este ator não interage com a sociedade a sua volta, não sente os cheiros
das comidas, das pessoas e dos ares, pois está alienado a tirar fotos e coloca-las nas mídias
digitais, para mostrar que visitou o lugar; comprar todo o tipo de bugigangas que lhe é
oferecido e escutar dos guias turísticos tantas informações em curtos momentos de
visitação que nem as lembra quando retorna. O turista é um estranho no espaço, as roupas,
o jeito de se comunicar e se impor nos lugares, podem até serem educados, mas são vistos
como um extraterrestre para a população local, pois não compartilham o cotidiano da vida
local, e no momento em que estão livres, sentem-se perdidos. Os sentidos (o tato, o fato, o
paladar...) dos turistas é totalmente alienado ao pacote e a representação dos lugares,
mesmo estando consumindo esses lugares. Wainberg, 2003, define essas viagens como
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“montanhas russas”, pois, “na montanha russa parte-se ao alto cheio de expectativas e
medos. Desce-se aos gritos. E rapidamente. E comemora-se a chegada ao ponto de partida.
Na memória resta o frio na barriga, verdadeira atração da empreitada”.
Ao contrário do revelado anteriormente, têm-se os viajantes. Esses atores sociais
escolhem o lugar para viajar não pelo que está na mídia, mas pelo que eles querem
vivenciar. Os viajantes chegam ao local de destino e se envolvem com a população local.
Não se importam com o tipo de acomodação a qual estão sujeitos, nem o tipo de
alimentação que vão encontrar pela frente. É claro que não precisa ser tudo da pior
qualidade, mas o fato é que vivem o que o local proporciona. Estão dispostos a ouvir e sentir
o que e como a população local vive, os sentidos são todos aguçados. É como se
alimentassem a alma. Na hora de ir embora, não tem apenas fotografias e artesanatos
locais, possuem também uma recordação, uma saudade das relações que tiveram com o
lugar e com a população local.
O TRABALHO DE CAMPO E SUAS DESCOBERTAS
Vivendo, se aprende; mas o que se aprende mais, é só fazer outras maiores perguntas”.
João Guimarães Rosa
Entre os dias quinze de janeiro e treze de fevereiro de dois mil e catorze
viajamos pelo Circuito Turístico Guimarães Rosa. O critério destinos foi estabelecido por um
planejamento pré-campo muito bem estruturado. Antes da viagem elaboramos uma
pesquisa documental sobre os principais atrativos turísticos, tanto do Patrimônio Natural,
mas, sobretudo, do Patrimônio Cultural da região. Essa pesquisa também estabeleceu a
quantidade de dias que ficaríamos em cada destino. Os dados obtidos no campo foram, e
ainda estão sendo cruzados com a pesquisa bibliográfica para que possamos realizar a
discussão com mais recursos.
Nosso roteiro então foi: Cordisburgo, Araçai, Sete Lagoas, Morro da Garça,
Corinto, Curvelo, Andréquice, Três Marias, Pirapora, Buritizeiro e Belo Horizionte.
Em Cordisburgo conversamos com a Ana, da secretaria do turismo, e ela nos
contou que a principal medida do município em relação ao turismo é agregar valores a
cidade para que os turistas possam ficar um final de semana completo, pois a maioria só
passa um dia, o tempo de visitar a Gruta do Maquiné. Outra medida do governo municipal é
fazer a revitalização das Praças com o programa municipal “Adote o Verde” em que a
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população cuide da praça, ou de uma área verde próxima a sua casa. Essa medida garante a
beleza da cidade sem comprometer o pequeno orçamento público.
Conversamos também com Ronaldo, que é Coordenados do Museu Casa
Guimarães Rosa e Presidente do Conselho Municipal do Patrimônio Cultural de Cordisburgo.
Ronaldo nos falou que o principal problema que há sobre os bens tombados, que são o
Prédio da Prefeitura e Câmara Municipal, o Conjunto Ferroviário Urbano e o Arquivo
Documental Guimarães Rosa, é a manutenção das fachadas já que toda propriedade
tombada é de responsabilidade do proprietário, embora receba o investimento do ICMS
Cultural. O patrimônio imaterial tombado de Cordisburgo é: o Grupo Miguilim de
Contadores de Estórias, a Festa do Rosário tanto de Cordisburgo como do distrito de Lagoa
Bonita e a Folia de Reis do Periquito.
Percebemos nessa conversa com o Ronaldo que o Trabalho Educacional
Patrimonial nas escolas é feito de maneira errônea, pois tem duração de três meses e
apenas os quartos e quintos anos que são submetidos a esse projeto. Para que o projeto
tivesse grandes frutos o ideal seria um projeto continuado desde o começo até o último ano
que as crianças ficam na escola.
Conversamos, alias, tivemos um dedo de prosa com uma das maiores figuras do
sertão: Brasinha. Leitor e amante de Guimarães Rosa, esse sertanejo começou a ir atrás das
pessoas que inspiraram os personagens do escritor, além dos lugares que também
refletem-se em sua obra. É o grande responsável pelas caminhas eco-literárias e atualmente
está com um projeto cultural de objetos na história, todo objeto possui a sua história (ou
estória) e essas histórias é o que nos fazem vivo.
A Gruta do Maquiné, como já antecedera Peter Lund e Guimarães Rosa é um
local de rara beleza natural, porém o moderno museu que fora criado recentemente para
compor o complexo turístico, pareceu-nos trabalho com um pouco de descaso pelos
próprios turistas e mesmo por funcionário. Não conseguimos ver as gigantescas telas de led,
pois estavam desligadas. Já o Zoológico de Pedras Peter W. Lund fica em uma praça em
Cordisburgo com imensas esculturas de pedras dos animais pré-históricos achados pelo
pesquisador Lund.
Fomos também até a zona rural de Cordisburgo visitar o pacato distrito de Lagoa
Bonita, mas não conseguimos entrar na Igreja do século XVIII pois estava em reforma.
Porém durante o caminho de volta acabamos conhecendo o Empreendimento Turístico de
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Arraial do Conto. Um gigantesco hotel de luxo com representações de uma vila mineira
antiga. Possui uma capela, uma fábrica, o galpão do tropeiro, mas tudo isso
descaracterizado de suas funções, exceto pela capela. Podemos considerar esse
empreendimento um não lugar, pois diferencia-se do lugar pelo seu processo de
constituição, uma reprodução de um simulacro de lugar (CARLOS, 1996). Esse simulacro fica
bem localizado, visto que está à 115km de Belo Horizonte, próximo a Sete Lagoas (polo
local), e na cidade de uma das grutas mais famosas do Brasil.
Figura 3 – Empreendimento Turístico Arraial do Conto – exemplo de simulacro
Arquivo Pessoal. Tiradas em janeiro de 2014 no empreendimento turístico Arraial do Conto em Cordisburgo, MinasGerais.
Tentamos visitar a Cachoeira do Fio, ainda em Cordisburgo, e não tivéssemos
excito devido a falta de qualidade da estrada de terra, além de possuir sinalizações bem
precárias. Fomos então para Araçai tentar conhecer a Fazenda São Francisco, local de
destino da “Boiada”, viagem feita pelo Guimarães Rosa e cinco vaqueiros que deu origem ao
livro “Grande Sertão: Veredas”, mas não conseguimos chegar, porque a falta de sinalização
impediu-nos, e nenhum morador local soube nos explicar como chegar, muitos ainda nem
sabiam do que se tratava. Visitamos então Sete Lagoas para ter uma visão de como um polo
regional se portava perto do sertão, além de também fazer parte do Circuito Turístico das
Grutas.
Depois dessa longa estada em Cordisburgo visitamos Morro da Garça, na qual
participamos do XVIII Encontro de Arte e Cultura ao Pé da “Pirâmide do Sertão”. O prefeito
Zé Maria e a primeira dama de Morro da Garça Fátima, grande realizadora do Circuito
Turístico Guimarães Rosa, fazem um trabalho belíssimo. É um dos poucos lugares do Brasil
onde a cultura está na dimensão de desenvolvimento.
Diversas oficinas embalaram a semana com destaque para o Bordado Memórias
de Beth Ziani, que começou a configurar um livro de bordado sobre a história de Morro da
Garça. A oficina do Brasinha, sobre “Objetos e suas Histórias”, projeto que foi citado
anteriormente. Oficina de Teatro com Andrah Dorim e de Percussão com Rafa Nunes.
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Oficinas com o grupo paulista Bloco do Beco sobre Maracatu, RAPoesia e Grafite. Além é
claro de mesas de prosa sobre agricultura familiar, cinema e medicina alternativa. As
contações de estórias com os Grupos de Morro da Garça, Grupo Miguilim e uma contação
de estória especial com Dôra Guimarães e Thiago Goulart não poderiam ficar de fora além
dos shows com Jean e Joana Garfunkel e Pratinha Saraiva. O encerramento aconteceu com a
caminhada literária “O Recado do Morro”.
Os maiores patrimônios culturais materiais de Morro da Garça, além do
“Morrão”, são a Casa de Cultura, que é uma casa antiga que obteve uma reforma que a
modernizou, mas a deixou ainda mais com aspecto sertanejo. A Casa de Cultura é o local
onde acontecem oficinas, encontros, exposições, rodas de conversas, enfim, é o coração
cultural do sertão, além da Casinha da Criança do sertão que funciona como um museu dos
antigos brinquedos e brincadeiras sertanejos.
Em Corinto nos encontramos com Paulo, grande cultivador da cultura sertaneja
da idade, ele nos levou até os principais pontos turísticos corintianos, como a Maria Fumaça,
e as bonitas igrejas que Corinto possui. Nosso último destino foi o Espaço Cultural, um
prédio enorme, moderno que funciona a Casa da Cultura de Corinto, porém estava fechado,
e Paulo nos conta que sobre espaço e falta organização de oficinas e eventos. Em frente ao
prédio há uma escultura representando o escritor e seus personagens, Manuelzão e
Miguilim, percebemos ainda que Miguilim está com os olhos pichados de vermelho.
Posterior ao “city tour” improvisado, Paulo nos deixou na casa de Jorge Patrício, ex
presidente do Circuito Turístico Guimarães Rosa. Jorge nos contou das dificuldades que
obteve por Corinto não apresentar uma exposição e organização de sua rica cultura, que
aos poucos está se perdendo, mas que o professor e ex presidente do Circuito guarda ainda
alguns objetos importantes no fundo de sua casa. No final fomos, acompanhado de Jorge,
para a casa da Dona Pérola, integrante da Academia Corintiana de Letras, em que
cerimonias com todas as tradições são compridas.
No dia seguinte fomos para Curvelo, atual sede do Circuito Turístico Guimarães
Rosa, que ganhou o posto de sede por uma jogada política do atual presidente e do atual
gestor. Conseguimos assistir a reunião do Circuito que aconteceria naquele dia, cujos
principais temas foram a análise da variação do fluxo de caixa de 2013 e uma explicação
sobre o Salão Mineiro. Posterior a reunião fomos conhecer a cidade, que se configura como
polo regional, e com seus atrativos turísticos como a Praça Central do Brasil, o Projeto Dedo
de Gente, a Basílica de São Geraldo e a Igreja de Santo Antônio. Subsequente ao nosso “city
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tour” voltamos a sede do Circuito, um prédio todo espelhado, com arquitetura moderna, e
realizamos uma entrevista com o atual gestor. Muito carismático e organizado em suas
contas e pensamentos, nos explicou que a importância de mudança da sede era porque
Curvelo tinha banco, por isso ficava mais fácil de fazer pagamentos e também por ser uma
cidade maior passava um fluxo maior de pessoas para dar acessória... Nosso espanto surgiu
quando o gestor disse que Guimarães Rosa era pano de fundo para se fazer turismo.
Deixamos o local chocado com tal declaração depois de todas as experiências vividas e
seguimos nossa viagem.
Logo na chegada à cidade de Três Marias avistamos de um mirante, a represa do
rio São Francisco sob nós, era uma paisagem linda. Fomos para a Secretaria de Cultura e
Turismo e a secretária, a senhora Maria Amélia Barbosa Martins nos atendeu muito bem,
disponibilizando muito material, uma entrevista muito legal e nos deixou conversando com
as agentes culturais Barbara Melgaço e Noeli de Oliveira. Descobrimos o quão rico é a
cultura e os projetos culturais de Três Marias. No município não há contadores de estórias,
mas há o Grupo Semeando Rosa, que é a Literatura Roseana apresentada de forma lúdica e
sensível. Há também os grupos culturais da Pastorinhas e da Folia de Reis. Os Projetos Guia
Opará Pintando o Velho Chico, Cirimim e Sufi. Além da Festa da Consciencia Negra e das
Nações, que já está na sua 11ª edição e a Virada Cultural. No distrito de Andréquice, há
também Bordadeiras, Contadores de Estórias e a Festa de Manuelzão.
O Município de Três Marias conta também com uma série de cachoeiras, a praia
de minas, a ponte do Rio São Francisco, Igrejas, um centro de artesanato, passeios de barcos
e pesca e uma estrutura muito boa em termos de restaurantes e hotéis.
Pirapora e Buritizeiro são cidades vizinhas. A primeira possui uma infraestrutura
maior e melhor além de ser a sede do atual presidente do Circuito Turístico Guimarães
Rosa, já a segunda possui inúmeras atrações turísticas e uma figura importante na área do
turismo local, o turismólogo e aventureiro Rômulo Melo.
O Rômulo é uma figura importante pois esse mineiro conhece todos os
principais lugares turísticos da região, que são locais muito belos, porém o acesso é
péssimo, pois as vias de acesso são totalmente ruins (muita areia, buracos etc), e não possui
sinalização, além de serem locais distantes dos centros das cidades, ou seja, não é possível
parar para perguntar a localização de tal atrativo na região.
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Visitamos o distrito Barra do Guaicuí, há vinte e dois quilômetros de Pirapora, e
pertencente ao município de Várzea da Palma. A Barra do Guaicuí possui a ruína de uma
igreja que foi tomada por uma árvore na beira do Rio das Velhas, além é claro da barra do
Rio das Velhas que deságua no Rio São Francisco.
Os maiores legados culturais de Pirapora são: A ponte Marechal Hermes, ponte
de ferro que cruza o Rio São Francisco e liga Pirapora a Buritizeiro; o Vapor Benjamin
Guimarães, um dos únicos barcos centenários a vapores navegáveis do mundo; o Mercado
Municipal; a Antiga Estação Ferroviária, que hoje é repartição de cultura de Pirapora e
Biblioteca Municipal; a Associação de Artesãos, conhecida como Associação dos
Carranqueiros, pelas famosas carrancas do Rio São Francisco; A Sinfonia do Velho Chico,
uma orquestra formada por crianças que tocam no Vapor em algumas apresentações
durante o ano, o Centro de Convenções e Receptivo Turístico que é um prédio super
moderno, e a feirinha de sexta-feira a noite, onde a cidade se encontra ao som de música ao
vivo e barracas com comidas típicas.
Já em Buritizeiro, podemos destacar o povoado de Paredão de Minas, a beira do
Rio do Sono, onde foi o local inspirado para a batalha final do livro de Guimarães Rosa
“Grande Sertão: Veredas”, além de ser o local da filmagem da série Grande Sertão da Rede
Globo na década de 1985, nesse local conversamos com Sidraque, grande figura local que
nos deu um apanhando de como foram as gravações na época, além da carência e da falta
de visibilidade que o governo municipal encara o povoado.
Também em Buritizeiro há uma Ponte Natural de Pedra no meio do cerrado, das
veredas e do sertão. Além do Pico do Itacolomi, uma estrutura rochosa elevada esculpida
pelo vendo sobre uma colina. O povoado da Lança é importante pois foi uma tentativa de
reforma agrária no meio das veredas, nesse lugar há uma escola primaria em que as
crianças estudam e uma cozinha comunitária em que as mulheres produzem os doces de
buriti e de pequi (fruta local). Na volta para São Paulo, ainda paramos dois dias em Belo
Horizonte para poder vivenciar a capital mineira, com seus ritmos, seus valores e seus ricos
patrimônios arquitetônicos.
O que pudemos perceber nessa viagem foram dois fatores muito importantes:
Há uma ruptura de pensamento e de ações no Circuito. De um lado as maiores e mais
estruturadas cidades pertencentes ao Circuito Turístico Guimarães Rosa: Curvelo e Piropora,
que valorizam um desenvolvimento do turismo, de outro, sobretudo as cidade de
Cordisburgo, Morro da Garça e Três Marias, desenvolvem um lado cultural muito forte
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dentro do Circuito, porém esse lado cultural muitas vezes vem se artificializando dentro do
processo de globalização da cultura.
A contradição existente no que tange os municípios que priorizam a cultura é
que nesses lugares a cultura local resistente está sendo artificializada perante a
homogeneização da cultura causada pela globalização, ou seja, a homogeneização cultural
causada pela globalização está se tornando a cultura local moderna, e os pontos de
resistência da cultura local tradicionais estão se tornando artificiais no novo quadro cultural
mundial. Portanto nas cidades que valorizam o turismo, a tendência é a cultura local se
perder totalmente e os municípios virarem mais um território de turismo artificializado, com
algum diferencial, dentro do catálogo de territórios turísticos mundiais.
O próprio fluxo de pessoas que frequenta esses lugares tende a ser diferentes,
nos lugares da cultura tendem a ir viajantes, em busca da típica cultura sertaneja descrita
nos livros de Rosa, já nos lugares de valorização turística, há de haver um fluxo de turistas
que consomem pura e simplesmente o espaço e suas atrações. A produção do espaço
nesses dois eixos do Circuito tende a ser cada vez mais diferente nos próximos anos, com a
configuração da mentalidade de cada governante. Nessas disparidades se tem o município
de Buritizeiro, que possui um alto potencial cultural e turístico, mas que devido a falta de
iniciativa dos seus governantes está estagnado.
CONCLUSÃO
A indústria cultural se caracteriza como investimentos públicos e privados para o
desenvolvimento da cultura, bem como o favorecimento do desenvolvimento local por
intermédio da cultura. Portanto o turismo é uma das mais importantes indústrias culturais
no mundo atual. O turismo envolve uma série de atores e setores sociais por se tratar de
uma prática social e de uma atividade econômica que consume, invariavelmente, o espaço.
Os circuitos turísticos de Minas Gerais foram criados e desenvolvidos numa
época em que a valorização do turismo estava em alta no Brasil e no mundo, sobretudo com
os princípios de descentralização e regionalização das regiões.
O trabalho de campo foi muito importante, primeiro pela descoberta do local, e
segundo para o desenvolvimento de um olhar crítico sobre o território e a (re)produção do
espaço no local estudado.
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Os principais resultados obtidos foram: A percepção da existência de uma
ruptura no que tange o delineamento ideológico no Circuito Turístico Guimarães Rosa, em
que alguns municípios estão optando por uma postura de (re)produção do espaço voltado
para o turismo e outros para a cultura. Tais caminhos levam a consequências totalmente
diferentes tanto para a população local, como para o desenvolvimento do território e da
cultura. Sendo o primeiro caso leva uma homogeneização da cultura local gerada pela
globalização e a criação de espaços artificiais. Já o caminho da cultura leva há uma
resistência cultural local, e a (re)produção do território por intermédio da cultura.
Outra descoberta importante foi a contradição existente no que tange os
municípios que priorizam a cultura. Nesse lugares a cultura local resistente está sendo
artificializada perante a homogeneização da cultura causada pela globalização, ou seja, a
homogeneização cultural causada pela globalização está se tornando a cultura local
moderna, e os pontos de resistência da cultura local tradicionais estão se tornando artificiais
no novo quadro cultural mundial.
Portanto a crescente atuação das indústrias culturais pode ou não causar um
impacto positivo nas sociedades, sobretudo com a valorização do turismo na esfera local
regionalizada e decentralizada. Basta, realmente, escolhermos o tipo de viagem para o tipo
de sociedade que quisermos ter no futuro.
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A INDÚSTRIA CULTURAL NO CIRCUITO TURÍSTICO GUIMARÃES ROSA
EIXO 3 – Desigualdades urbano-regionais: agentes, políticas e perspectivas.
RESUMO
Este discute a Indústria Cultural concebida no Circuito Turístico Guimarães Rosa, localizado ao
norte de Minas Gerais. Além de realizar uma abordagem crítica sobre como o turismo é
desenvolvido nessa região, é feito também um estudo de como essa indústria cultural afeta direta
e indiretamente a população local. Utilizando do artificio da pesquisa qualitativa, os recursos da
etnografia e da observação participante, foram importantes para elaborar descrições minuciosas a
respeito do modo como o turismo é realizado e de como a sociedade local se relaciona com o
Circuito. O principal resultado foi a descoberta de uma disparidade da priorização do
desenvolvimento do Circuito. De um lado procura-se o desenvolvimento e proliferação da cultura
e de outro o do turismo com todas as consequências que esses processos implicam na região,
sobretudo na produção do espaço.
Palavras-chave: Indústria cultural; preservação cultural; desenvolvimento regional.
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