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A Jurisdição pode ser caracterizada como o Poder de dizer o Direito. Em verdade, em nível dou-trinário, várias teorias buscam conceituar a jurisdição, apresentando teses divergentes acerca do tema. Ocorre que, além de estar caracterizada como um poder, a jurisdição poderá ser entendida como uma função, uma atividade derivada diretamente da soberania estatal.

Uma primeira teoria classifica a Jurisdição como atuação da vontade da Lei. É a chamada Teoria

Objetiva. Para parte da doutrina, a jurisdição seria a função do Estado de fazer atuar a vontade da lei. A função de fazer atuar a vontade concreta do direito objetivo. Seria a aplicação do direito objetivo no caso concreto. Chiovenda afirma que a atuação da vontade da lei, no caso de jurisdição, se dará pela partici-pação do juiz, típica jurisdição, atividade substitutiva.

Muito bem conceituam esta tese os doutrinadores Antonio Carlos de Araujo Cintra, Ada Pele-grini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco, a saber:

“E assim, através do exercício da função jurisdicional, o que busca o Estado é fazer com que se atinjam, em cada caso concreto, os objetivos das normas de direito substancial. Em outras palavras, o escopo jurídico da jurisdição é a atuação (cum-primento, realização) das normas de direito substancial (direito objetivo)” (Teoria Geral do Processo, 24ª edição, pg. 149)

De outra banda, alguns doutrinadores sustentam a teoria de que a Jurisdição é a fonte produ-tora de Coisa Julgada. Adeptos a esta visão, Allorio, Liebman e Calamandrei. A crítica a esta teoria reside no fato de que não seria todo ato jurisdicional capaz de gerar coisa julgada, como a tutelar cautelar, os procedimentos de jurisdição voluntária, entre outros.

Para uma terceira corrente, a Jurisdição é a função do Estado de justa composição da lide, vi-são sustentada por Carnelutti. Nesta linha, a jurisdição pressupõe um embate, a pretensão resistida, a lide propriamente dita. Na clássica lição de Carnelutti – para a existência de lide ou litígio é necessário que ocorra “um conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida”.

“A função jurisdicional só atua diante de casos concretos de conflitos de interes-ses (lide ou litígio) e sempre na dependência da invocação dos interessados, por que são devedores primários destes à ordem jurídica e a aplicação voluntária de suas normas nos negócios jurídicos praticados.” (Citação de Humberto Theodor Ju-nior, Curso de Direito Processual Civil, Volume I, Editora Forense, p. 39)

Importa colacionar a visão de Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery que afirmam em sua obra Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante, 11ª edição, pg. 176, que “Em-bora seja atividade típica do Poder Judiciário, a jurisdição pode, excepcionalmente, ser exercida pelo Poder Legislativo”, nos termos do art. 52, I e II da CF, quando da competência do Senado Federal para o julgamento do Presidente e do Vice-Presidente nos crimes de responsabilidade. Seria uma excepcional função jurisdicional afeta ao Poder Legislativo.

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Nos primórdios do desenvolvimento social, a justiça de mão própria, a vingança privada, a deno-minada ‘autotutela’, caracterizava-se como o meio de solução de conflitos de interesse. Com o desenvol-vimento do conceito de Estado e a atração de diversos monopólios para este, a soberania estatal atraiu para si o monopólio da criação, aplicação e interpretação do direito. Desta feita, com a vedação da auto-tutela, surge o conceito da tutela jurisdicional, ‘o poder de dizer o direito com definitividade em substi-tuição à vontade das partes’, própria da soberania estatal.

Cumpre salientar que com a atração deste monopólio da tutela jurisdicional, o Estado nem sem-pre foi eficiente na solução dos conflitos, em razão de sua morosidade. Nesta linha, começou, nos últi-mos anos, um incentivo muito grande aos chamados mecanismos de autocomposição, com a aproxima-ção das partes, objetivando a solução dos conflitos de uma maneira célere e efetiva, inserindo-se a me-diação como uma de suas principais técnicas.

Neste diapasão, de igual forma, surge a arbitragem, apresentando na doutrina grande divergên-cia acerca de sua natureza jurisdicional. A arbitragem é regulamentada pela Lei Federal 9.307/96. O principal questionamento reside no ponto de ter a arbitragem natureza jurisdicional ou contratual – cláusula compromissória e compromisso arbitral. Para uma teoria, a arbitragem é jurisdição, exercida por particulares com a autorização do Estado. Para outra tese, a arbitragem não é jurisdição, uma vez que pode ocorrer controle por parte do Poder Judiciário, por exemplo, na hipótese de nulidade da sen-tença arbitral, bem como a execução forçada, de igual forma, necessitaria da participação do Poder Judiciário. A jurisdição somente poderia ser exercida por pessoa investida na autoridade de juiz – juiz natural –, sendo a jurisdição indelegável. Predomina em nosso sistema jurídico a natureza contratual da arbitragem, seria, portanto, um equivalente jurisdicional.

1.1. CARACTERÍSTICAS

Podem ser citadas como características da jurisdição, além da chamada unidade ou unicidade do poder jurisdicional, outras virtudes que acabam por delinear o caminho da jurisdição, senão vejamos:

1.1.1. Inércia: A jurisdição é inerte e necessita ser provocada. A prestação jurisdicional é efetiva somente quando solicitada. Nesta linha, a jurisdição necessita ser ‘provocada’, sendo do cidadão, e não do juiz, a iniciativa de movimentar ou não movimentar o Poder Judiciário, conforme preceitua o Códi-go de Processo Civil/73 em seus diversos artigos:

CPC/73:

Art. 262. O processo civil começa por iniciativa da parte, mas se desenvolve por im-pulso oficial.

Art. 2º Nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o inte-ressado a requerer, nos casos e forma legais.

Art. 128. O juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da par-te.

Art. 460. É defeso ao juiz proferir sentença, a favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que Ihe foi demandado.

Exceção a ser considerada, resta positivada nos arts. abaixo indicados do CPC/73:

Art. 989. O juiz determinará, de ofício, que se inicie o inventário, se nenhuma das pessoas mencionadas nos artigos antecedentes o requerer no prazo legal.

Art. 1.129 (exibição de testamento), art. 1.142 (herança jacente) e art. 1.160 (arre-cadação de bens de ausentes) todos do CPC/73.

Novo Código de Processo Civil: art.738 (herança jacente – o juiz procederá; art. 744 (arrecadação de bens do ausente - o juiz mandará)

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Esta inércia derivando no princípio da congruência restou solidificada no Novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015) que assim preceitua:

CPC/2015:

Art. 2º O processo começa por iniciativa da parte e se desenvolve por impulso ofici-al, salvo as exceções previstas em lei.

Art. 141. O juiz decidirá o mérito nos limites propostos pelas partes, sendo-lhe ve-dado conhecer de questões não suscitadas a cujo respeito a lei exige iniciativa da parte.

Art. 492. É vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem co-mo condenar a parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.

Desta feita, a atuação do juiz fica limitada pela iniciativa da parte – aos pedidos formulados pela parte. Importante ressaltar que a composição entre as partes poderá ocorrer sem a provocação do Poder Judiciário, fato próprio das relações contratuais e negócios jurídicos. Igualmente, provocado o Poder Judiciário, estabelecida a demanda, poderá ocorrer a chamada “transação” no curso do processo, sendo causa de sentença com resolução do mérito nos termos do art. 269, III do CPC.

Art. 269. Haverá resolução de mérito:

(...) III - quando as partes transigirem;

O Novo Código de Processo Civil insere no sistema uma “política pública de solução de confli-tos”, ao fomentar a conciliação, a mediação e a autocomoposição, vejamos:

Art. 3º (...)

§ 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos. Política Pública de Solução de Conflitos

§ 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.

Art. 487. Haverá resolução de mérito quando o juiz:

(...)

III - homologar:

a) o reconhecimento da procedência do pedido formulado na ação ou na reconven-ção;

b) a transação;

c) a renúncia à pretensão formulada na ação ou na reconvenção.

Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, em sua obra “Novo Código de Processo Civil Comentado”, Revista dos Tribunais, p. 96-97, assim referem:

“O novo Código tem como compromisso promover a solução consensual do litígio, sendo uma

das suas marcas a viabilização de significativa abertura para a autonomia privada das partes – o que se manifesta não só no estímulo a que o resultado do processo seja fruto de um consenso das partes (art. 3º, §§ 2º e 3º, CPC), mas também na possibilidade de estruturação contratual de determinados aspectos do processo (negócios processuais, art. 190, CPC, e calendário processual, art. 191, CPC)”.

Tipificação do que já restava estabelecido na Resolução n. 125 do CNJ. Estruturação do CPC ten-

dente à conciliação, estímulo à autocomposição.

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1.1.2. Secundária e Substitutiva: A jurisdição não é originária, não é original, mas secundária. A-tua em um segundo momento, diante de casos concretos de conflitos de interesses. Nesta linha, impõe ao autor o dever de provar o seu interesse de agir, a necessidade e utilidade de recorrer ao Poder Judici-ário.

Neste mesmo sentido, diz-se a jurisdição como substitutiva, pois estaria substituindo a vontade das partes e aplicando no caso concreto a vontade da lei. O artigo 466-A do Código de Processo Civil de 1973 revela de plano esta característica, que resta reproduzida na Lei de 2015:

CPC/73: Art. 466-A. Condenado o devedor a emitir declaração de vontade, a sentença, uma vez transitada em julgado, produzirá todos os efeitos da declaração não emitida.

CPC/2015:

Art. 501. Na ação que tenha por objeto a emissão de declaração de vontade, a sen-tença que julgar procedente o pedido, uma vez transitada em julgado, produzirá to-dos os efeitos da declaração não emitida.

Por fim, algumas outras características seriam agregadas à jurisdição, tais como indivisibilidade, indelegabilidade, declaratória de direitos, imparcialidade, entre outras, que fundamentam o conceito doutrinário de jurisdição. Ressalte-se que, pela letra da lei, não há conceituação e sequer elenco de características postos no Código de Processo Civil.

1.2. MODALIDADES DE JURISDIÇÃO

Acerca das modalidades da jurisdição, assim dispõe o artigo 1º do Código de Processo Civil de 1973: Art. 1º A jurisdição civil, contenciosa e voluntária, é exercida pelos juízes, em todo o território nacional, conforme as disposições que este Código estabelece.

A Jurisdição Voluntária está prevista do art. 1.103 ao 1.210 do Código de Processo Civil de 1973 e do art. 719 ao art. 770 do Código de Processo Civil de 2015. Pela teoria clássica (dominante), na jurisdição voluntária, o juiz realiza a gestão pública de interesses privados. Não há lide, mas negócio jurídico processual que necessita a chancela do Estado por meio de sua jurisdição. Torna eficaz o negócio desejado pelos interessados, sendo correta a denominação de ‘procedimento de jurisdição voluntária’. Ex.: nomeação de tutores, nas alienações de bens de incapazes, entres outros. (cfe. Humberto Theodoro Junior, Curso de Direito Processual Civil, Volume I, Editora Forense)

Ainda, Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery afirmam em sua obra Código de Pro-cesso Civil Comentado e Legislação Extravagante, 11ª edição, pg. 176:

“Também denominada pela doutrina majoritária de jurisdição graciosa ou, ainda, de ‘administração pública de interesses privados’, a jurisdição voluntária vem regulada no CPC, arts. 1103 a 1210. É jurisdição somente na forma. Não é jurisdição pu-ra porque o juiz não diz o direito substituindo a vontade das partes, mas prati-ca atividade integrativa do negócio jurídico privado administrado pelo Poder Judiciário. Esse negócio jurídico, contudo, não tem validade se não integrado pelo juiz, donde é lícito concluir não ser voluntária esta jurisdição, mas sim forçada. Nela não há processo, mas procedimento; não há lide, mas contro-vérsia; não há partes, mas interessados; não incide o princípio dispositivo, mas sim o inquisitório; não há legalidade estrita, pois pode o juiz decidir por eqüidade (CPC, art. 1.109)”.

Na Jurisdição Contenciosa a atividade é jurisdicional, há a presença de lide (controvertido), chama-se de processo, há a presença de partes, produz coisa julgada e tem como critério de julgamento a legalidade.

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2.1 HABEAS CORPUS NO PROCESSO CIVIL

Esta ação constitucional tem aplicabilidade prática no processo civil, nos dois casos de ataque à liberdade da pessoa do executado, permitidos por lei civil, quais sejam execução de alimentos e deposi-tário infiel. Quanto ao depositário infiel, aplica-se, atualmente, a Súmula Vinculante nº 25 do STF que assim preceitua:

SÚMULA VINCULANTE 25 DO STF: É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito.

2.2 MANDADO DE SEGURANÇA INDIVIDUAL E COLETIVO

Conforme preceitua a ordem constitucional dada pelo art. 5°, LXIX:

“Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por Habeas Corpus ou Habeas Data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autorida-de pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.”

Remédio Constitucional em desfavor de autoridade pública ou agente de pessoa jurídica que e-xerça atribuições do Poder Público. Aplica-se ao Mandado de Segurança o disposto no art. 5°, inciso LXIX, da Constituição Federal, bem como as disposições constantes na Lei n° 12.016/2009. É ação civil de rito sumário especial – sumariedade do procedimento – prova pré-constituída. Também chamado de ação mandamental, expede ordem para cumprimento imediato.

Acerca da legitimidade ativa, afirma-se que qualquer pessoa que tenha sido lesada ou tenha so-frido ameaça de lesão ao seu direito líquido e certo a possui. Pode ser pessoa física ou jurídica. Impetran-te: qualquer pessoa que tiver seu direito “líquido e certo” violado ou houver justo receio de sofrer tal violação, mediante ilegalidade ou abuso de poder de autoridade, desde que este direito não seja ampa-rado por habeas corpus ou habeas data, pode impetrar mandado de segurança. Pode ser pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado. A jurisprudência reconhece que até mesmo organismos sem personalidade jurídica, na defesa de suas prerrogativas institucionais. Por exemplo, Prefeito, Câmara de Vereadores, Câmara dos Deputados, Presidente da República, Governador, entre outros.

No pólo passivo, estará a autoridade que praticou a ilegalidade ou abuso de poder, violando di-reito líquido e certo. Pessoa física investida de poder de decisão. Não deverá ser prioritariamente o mero executor, mas o prolator da decisão. A autoridade aqui, será autoridade pública, representantes, órgãos de partidos políticos, administradores de entidades autárquicas, dirigentes de pessoas jurídicas ou as pessoas naturais no exercício de atribuições do poder público.

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É a chamada Autoridade Coatora, conforme dispõe o artigo 6°, §3º da Lei n° 12.016/09: “conside-ra-se autoridade coatora aquela que tenha praticado o ato impugnado ou da qual emane a ordem para a sua prática”.

Art. 1º. §1º Equiparam-se às autoridades, para os efeitos desta Lei, os representan-tes ou órgãos de partidos políticos e os administradores de entidades autárquicas, bem como os dirigentes de pessoas jurídicas ou as pessoas naturais no exercício de atribuições do poder público, somente no que disser respeito a essas atribui-ções.

§ 2º Não cabe mandado de segurança contra os atos de gestão comercial pratica-dos pelos administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público.

Ressalte-se que a autoridade coatora não será a pessoa jurídica ou o órgão a que pertence e ao

qual seu ato é impugnado em razão do ofício. A pessoa jurídica deverá ingressar dentro do prazo para as informações, como litisconsorte do impetrado.

“Art. 7

o Ao despachar a inicial, o juiz ordenará:

I - que se notifique o coator do conteúdo da petição inicial, enviando-lhe a segunda via apresentada com as cópias dos documentos, a fim de que, no prazo de 10 (dez) dias, preste as informações;

II - que se dê ciência do feito ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada, enviando-lhe cópia da inicial sem documentos, para que, querendo, in-gresse no feito;”

A respeito do assunto, mencionamos a Teoria da Encampação. Essa teoria se aplica nos casos em

que a autoridade superior hierarquicamente não se limita a informar sua ilegitimidade passiva, mas adentra no mérito da ação, tornando-se legítima para figurar no pólo passivo da demanda. Neste senti-do, trazemos a jurisprudência do STJ (ARE 696434 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julga-do em 30/10/2012): “A primeira preliminar merece ser rejeitada porque, conforme entendimento recen-te do STJ, na espécie aplica-se a teoria da encampação, uma vez que a autoridade apontada como coato-ra, ao prestar suas informações (fls. 177/180), não se limitou a negar sua ilegitimidade e defendeu o mérito do ato impugnado, requerendo a denegação da segurança, assumindo, com isso, a legitimatio ad causam passiva (neste sentido RMS 21508/MG, rel. Min. Luiz Fux – 1ª Turma – DJ 12.05.2008 p.1)”.

Litisconsórcio Passivo Necessário - Na visão da obra de Hely Lopes Meirelles, Arnold Wald e Gil-mar Ferreira Mendes, “Mandado de Segurança e Ações Constitucionais”, há formação de litisconsórcio passivo necessário entre a autoridade coatora e a pessoa jurídica a que está vinculada, a saber: “É litis-consórcio necessário, não se identificando com o impetrado, mas sofrendo os efeitos da sentença que vier a ser proferida”.

Art. 14. Da sentença, denegando ou concedendo o mandado, cabe apelação.

§ 1o Concedida a segurança, a sentença estará sujeita obrigatoriamente ao

duplo grau de jurisdição.

§ 2o Estende-se à autoridade coatora o direito de recorrer.

§ 3o A sentença que conceder o mandado de segurança pode ser executada provi-

soriamente, salvo nos casos em que for vedada a concessão da medida liminar.

Conforme previsão do art. 5º da Lei 12.016/09, importa colacionar as hipóteses de não cabimen-to do Mandado de Segurança, a saber:

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1) de ato do qual caiba recurso administrativo com efeito suspensivo, independentemente de caução: Não há obrigatoriedade de postular na esfera administrativa. Utilizando o recurso com efeito suspensivo, ter-se-á que aguardar seu julgamento. Inadmissível a concomitância de recurso administrati-vo e mandado de segurança. “Carência do direito de ação” – STF, MS n. 24.511-DF.

2) de decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo: Inadmissível Mandado de Se-gurança como substitutivo recursal, sendo hipótese de aplicação da Súmula 267 do Supremo Tribunal Federal. Admite-se a possibilidade do Mandado de Segurança para conferir efeito suspensivo ao recurso que não o tenha, desde que interposto o recurso cabível – STF, RTJ 81/879. Requerimento de concessão de liminar dando efeito suspensivo ao recurso até o julgamento. É de se observar que, no que tange aos efeitos do recebimento da apelação, cabe agravo de instrumento dirigido diretamente ao tribunal, forte no art. 523, §4º do CPC. O Superior Tribunal de Justiça vem admitindo a impetração de Mandado de Segurança contra atos irrecorríveis do relator do Agravo de Instrumento, quando este converte em Agra-vo Retido – STJ, RMS n. 22.847 – MT.

3) de decisão judicial transitada em julgado: A coisa julgada é atacável por Ação Rescisória, sendo aplicável no presente caso a Súmula 268 do Supremo Tribunal Federal.

Por derradeiro, importa referir que não é vedada a utilização de Mandado de Segurança contra ato disciplinar e ato de dirigente de estabelecimento particular sempre que realizem atividades delega-das do Poder Público. Atos de gestão comercial, realizados no interesse interno e particular da empresa ou instituição, não cabem Mandado de Segurança.

Conforme afirma a obra “Mandado de Segurança e Ações Constitucionais” de Hely Lopes Meirel-les e outros, pág. 49:

“Assim, quando o diretor de uma escola particular nega ilegalmente uma matrícula, ou a empresa pública ou mista comete uma ilegalidade no desempenho da atribui-ção delegada, cabe segurança. Mas, quando tais entidades, por seus dirigentes, re-alizam atividade civil ou comercial, estranha à delegação, respondem perante a Jus-tiça como particulares desvestidos de autoridade pública, e por isso só se sujeitam às ações comuns, excluído o mandamus”.

No que tange à arbitragem, o terceiro que anuiu à arbitragem e dela não participou poderá impe-trar Mandado de Segurança.

Procedimento: É ação documental destinada a proteger direito líquido e certo de pessoa física ou jurídica. É uma garantia do mais alto grau, pois trata-se de remédio constitucional.

a) Não há fase destinada à instrução probatória.

b) Necessária a existência de prova pré-constituída.

c) Direito Líquido e Certo: “está se exigindo que esse direito se apresente com to-

dos os requisitos para seu reconhecimento e exercício no momento da impetração. Em últi-

ma análise, direito líquido e certo é direito comprovado de plano”.1

Art. 4

o Em caso de urgência, é permitido, observados os requisitos legais, impetrar

mandado de segurança por telegrama, radiograma, fax ou outro meio eletrônico de autenticidade comprovada.

1 Hely Lopes Meirelles

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§ 2o O texto original da petição deverá ser apresentado nos 5 (cinco) dias úteis se-

guintes.

§ 3o Para os fins deste artigo, em se tratando de documento eletrônico, serão ob-

servadas as regras da Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP-Brasil.

Petição inicial: A petição inicial que deverá preencher os requisitos da lei processual, será apre-sentada em 2 vias e os documentos, que instruírem a primeira, deverão ser reproduzidos, por cópia, na segunda.

Art. 6o A petição inicial, que deverá preencher os requisitos estabelecidos pela lei

processual, será apresentada em 2 (duas) vias com os documentos que instruírem a primeira reproduzidos na segunda e indicará, além da autoridade coatora, a pessoa jurídica que esta integra, à qual se acha vinculada ou da qual exerce atribuições.

Art. 7o Ao despachar a inicial, o juiz ordenará:

I - que se notifique o coator do conteúdo da petição inicial, enviando-lhe a se-gunda via apresentada com as cópias dos documentos, a fim de que, no prazo de 10 (dez) dias, preste as informações;

II - que se dê ciência do feito ao órgão de representação judicial da pessoa ju-rídica interessada, enviando-lhe cópia da inicial sem documentos, para que, que-rendo, ingresse no feito;

III - que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja fi-nalmente deferida, sendo facultado exigir do impetrante caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica.

Liminar – art. 7o, II da Lei do MS:

Relevância da Fundamentação;

Risco de ineficácia da medida, caso deferida.

Da decisão que denega liminar, cabe agravo de instrumento.

Art. 7º. § 1

o Da decisão do juiz de primeiro grau que conceder ou denegar a liminar

caberá agravo de instrumento

Art. 7º. § 2o Não será concedida medida liminar que tenha por objeto a com-

pensação de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens provenien-tes do exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qual-quer natureza.

Art. 8o Será decretada a perempção ou caducidade da medida liminar ex officio ou

a requerimento do Ministério Público quando, concedida a medida, o impetrante cri-ar obstáculo ao normal andamento do processo ou deixar de promover, por mais de 3 (três) dias úteis, os atos e as diligências que lhe cumprirem.

A inicial será desde logo indeferida quando não for caso de mandado de segurança, lhe faltar algum dos requisitos ou quando decorrido o prazo decadencial, forte no art. 10 da Lei 12.016/09.

Art. 10. § 1o Do indeferimento da inicial pelo juiz de primeiro grau caberá apelação

e, quando a competência para o julgamento do mandado de segurança couber ori-ginariamente a um dos tribunais, do ato do relator caberá agravo para o órgão com-petente do tribunal que integre.

§ 2o O ingresso de litisconsorte ativo não será admitido após o despacho da petição

inicial.

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Do despacho de indeferimento caberá recurso de apelação. Findo o prazo de 10 dias para a prestação de informações e ouvido o representante do Ministério Público dentro de 10 dias, os autos serão conclusos ao juiz, independente de solicitação da parte, para a decisão, a qual deverá ser necessa-riamente proferida em 30 dias, consoante art. 12, parágrafo único.

- PECULIARIDADES:

SUSPENSÃO DA SEGURANÇA

Art. 15. Quando, a requerimento de pessoa jurídica de direito público interessada ou do Ministério Público e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, o presidente do tribunal ao qual couber o conhecimento do res-pectivo recurso suspender, em decisão fundamentada, a execução da liminar e da sentença, dessa decisão caberá agravo, sem efeito suspensivo, no prazo de 5 (cinco) dias, que será levado a julgamento na sessão seguinte à sua interposição.

§ 1º Indeferido o pedido de suspensão ou provido o agravo a que se refere o caput deste artigo, caberá novo pedido de suspensão ao presidente do tribunal competente para conhecer de eventual recurso especial ou extraordinário.

§ 2º É cabível também o pedido de suspensão a que se refere o § 1º deste artigo, quando negado provimento a agravo de instrumento interposto contra a liminar a que se refere este artigo.

§ 3º A interposição de agravo de instrumento contra liminar concedida nas ações movidas contra o poder público e seus agentes não prejudica nem condiciona o jul-gamento do pedido de suspensão a que se refere este artigo.

§ 4º O presidente do tribunal poderá conferir ao pedido efeito suspensivo liminar se constatar, em juízo prévio, a plausibilidade do direito invocado e a urgência na con-cessão da medida.

§ 5º As liminares cujo objeto seja idêntico poderão ser suspensas em uma única de-cisão, podendo o presidente do tribunal estender os efeitos da suspensão a liminares supervenientes, mediante simples aditamento do pedido original.

RECURSO – COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DOS TRIBUNAIS Art. 16. Nos casos de competência originária dos tribunais, caberá ao relator a ins-trução do processo, sendo assegurada a defesa oral na sessão do julgamento. Parágrafo único. Da decisão do relator que conceder ou denegar a medida liminar caberá agravo ao órgão competente do tribunal que integre.

Art. 18. Das decisões em mandado de segurança proferidas em única instância pe-los tribunais cabe recurso especial e extraordinário, nos casos legalmente previstos, e recurso ordinário, quando a ordem for denegada.

LIMITAÇÃO DA COISA JULGADA FORMAL Art. 19. A sentença ou o acórdão que denegar mandado de segurança, sem decidir o mérito, não impedirá que o requerente, por ação própria, pleiteie os seus direitos e os respectivos efeitos patrimoniais.

INEXISTÊNCIA DE CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Art. 25. Não cabem, no processo de mandado de segurança, a interposição de em-bargos infringentes e a condenação ao pagamento dos honorários advocatícios, sem prejuízo da aplicação de sanções no caso de litigância de má-fé.

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TRAMITAÇÃO PREFERENCIAL

Art. 20. Os processos de mandado de segurança e os respectivos recursos terão prioridade sobre todos os atos judiciais, salvo habeas corpus.

§ 1º Na instância superior, deverão ser levados a julgamento na primeira sessão que se seguir à data em que forem conclusos ao relator.

§ 2º O prazo para a conclusão dos autos não poderá exceder de 5 (cinco) dias.

DO PRAZO DECADENCIAL

Prazo decadencial de 120 dias contados da ciência, pelo interessado, do ato impugnado.

Art. 23. O direito de requerer mandado de segurança extinguir-se-á decorridos 120 (cento e vinte) dias, contados da ciência, pelo interessado, do ato impugnado.

O Mandado de Segurança Coletivo, por sua vez, resta estabelecido no art. 5º, LXX da Constituição Fede-ral, assim preceituando:

LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por:

a) partido político com representação no Congresso Nacional;

b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcio-namento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados;

De regra, possui o mesmo rito e disciplina legal do Mandado de Segurança Individual, sendo pon-to diferencial relevante apenas a legitimidade para a sua impetração.

Art. 21. O mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por partido político com representação no Congresso Nacional, na defesa de seus interesses legítimos relativos a seus integrantes ou à finalidade partidária, ou por organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há, pelo menos, 1 (um) ano, em defesa de direitos líquidos e certos da totalidade, ou de parte, dos seus membros ou associados, na forma dos seus estatutos e desde que pertinentes às suas finalidades, dispensada, para tanto, autoriza-ção especial.

Art. 22. No mandado de segurança coletivo, a sentença fará coisa julgada limita-damente aos membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante.

Neste tópico, cumpre ressaltar que o art. 22 trata da chamada coisa julgada ‘ultra partes’, benefi-ciando ou não, os membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante.

§ 1

o O mandado de segurança coletivo não induz litispendência para as ações indi-

viduais, mas os efeitos da coisa julgada não beneficiarão o impetrante a título indivi-dual se não requerer a desistência de seu mandado de segurança no prazo de 30 (trinta) dias a contar da ciência comprovada da impetração da segurança coletiva.

Importa referir a visão da obra de Hely Lopes Meirelles, acerca do tema da competência de jul-

gamento do Mandado de Segurança, a saber:

“A competência para julgar mandado de segurança define-se pela categoria da au-toridade coatora e pela sua sede funcional [...]. Para a fixação do juízo competente em mandado de segurança não interessa a natureza do ato impugnado; o que im-porta é a sede da autoridade coatora e sua categoria funcional, reconhecida nas normas de organização judiciária pertinentes. (in Mandado de Segurança, 31ª edi-ção, Malheiros Editores, págs. 75 e 77)”.

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O STJ já decidiu que “A competência para conhecer do mandado de segurança é fixada em razão da sede funcional da autoridade coatora”. (CC 60.560/DF, Rel. Min. Eliana Calmon, Primeira Seção, DJ 12/2/2007). Também a respeito do assunto, já se manifestou o STJ no seguinte sentido: “1. Na linha de orientação desta Corte Superior, em se tratando de mandado de segurança, a competência para proces-samento e julgamento da demanda é estabelecida de acordo com a sede funcional da autoridade apon-tada como coatora e a sua categoria profissional, o que evidencia a natureza absoluta e a improrrogabili-dade da competência, bem como a possibilidade de seu conhecimento ex officio. (...) 3. Considerando que o mandamus deve ser processado e julgado pelo juízo competente em relação ao local correto da sede funcional da autoridade apontada como coatora, evidencia-se a competência do Juízo Suscitante para apreciar a ação mandamental em questão”. (CC 41.579/RJ, Rel. Min. Denise Arruda, Primeira Seção, DJ 24/10/2005, p. 156).

DECISÕES RELEVANTES SOBRE MANDADO DE SEGURANÇA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. IMPOSSIBILIDADE DE EXECUÇÃO INDIVIDU-AL DE SENTENÇA COLETIVA POR PESSOA NÃO FILIADA À ASSOCIAÇÃO AUTORA DA AÇÃO COLETIVA. O servidor não filiado não detém legitimi-dade para executar individualmente a sentença de procedência oriunda de ação coletiva - diversa de mandado de segurança coletivo - proposta por associação de servidores. De fato, não se desconhece que prevalece na jurisprudência do STJ o entendimento de que, indistintamente, os sin-dicatos e associações, na qualidade de substitutos processuais, detêm le-gitimidade para atuar judicialmente na defesa dos interesses coletivos de toda a categoria que representam; por isso, caso a sentença coletiva não tenha uma delimitação expressa dos seus limites subjetivos, a coisa julga-da advinda da ação coletiva deve alcançar todas as pessoas da categoria, legitimando-as para a propositura individual da execução de sentença. Contudo, não pode ser ignorado que, por ocasião do julgamento do RE 573.232-SC, sob o regime do artigo 543-B do CPC, o STF proferiu decisão, com repercussão geral, vinculando horizontalmente seus magistrados e verticalmente todos os demais, reiterando sua jurisprudência, firmada no sentido de que "as balizas subjetivas do título judicial, formalizado em a-ção proposta por associação, é definida pela representação no processo de conhecimento, presente a autorização expressa dos associados e a lista destes juntada à inicial". À luz da interpretação do art. 5º, XXI, da CF, con-ferida por seu intérprete maior, não caracterizando a atuação de associa-ção como substituição processual - à exceção do mandado de segurança coletivo -, mas como representação, em que é defendido o direito de ou-trem (dos associados), não em nome próprio da entidade, não há como reconhecer a possibilidade de execução da sentença coletiva por membro da coletividade que nem sequer foi filiado à associação autora da ação co-letiva. Assim, na linha do decidido pelo STF, à exceção do mandado de se-gurança coletivo, em se tratando de sentença de ação coletiva ajuizada por associação em defesa de direitos individuais homogêneos, para se beneficiar do título, ou o interessado integra essa coletividade de filiados (e nesse caso, na condição de juridicamente interessado, é-lhe facultado tanto dar curso à eventual demanda individual, para ao final ganhá-la ou perdê-la, ou então sobrestá-la, e, depois, beneficiar-se da eventual coisa julgada coletiva); ou, não sendo associado, pode, oportunamente, litis-consorciar-se ao pleito coletivo, caso em que será recepcionado como parte superveniente (arts. 103 e 104 do CDC). É oportuno frisar que, em-bora o mencionado leading case do STF não tenha deixado claro se a sen-tença coletiva pode vir a beneficiar aqueles que se filiam à associação posteriormente - tema de repercussão geral número 499, que será dirimi-do por ocasião do julgamento do RE 612.043-PR -, não há dúvidas de que a sentença coletiva, prolatada em ação de rito ordinário, só pode benefi-

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ciar os associados. Por último, a título de oportuno registro, cabe ressaltar que a legitimação concorrente, prevista no art. 82, IV, do CDC para defesa coletiva de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos de con-sumidores e das vítimas, é manifestamente impertinente ao caso em e-xame, pois o dispositivo restringe essa hipótese de atuação às associações legalmente constituídas há pelo menos um ano e "que incluam entre seus fins institucionais a defesa dos direitos protegidos pelo Código consume-rista". REsp 1.374.678-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 23/6/2015, DJe 4/8/2015. DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. TERMO INICIAL DO PRAZO DECADENCIAL PARA IMPETRAR MS CONTRA ATO ADMINISTRA-TIVO QUE EXCLUI CANDIDATO DE CONCURSO PÚBLICO. O termo inicial do prazo decadencial para a impetração de mandado de segurança no qual se discuta regra editalícia que tenha fundamentado eliminação em concurso público é a data em que o candidato toma ciência do ato ad-ministrativo que determina sua exclusão do certame, e não a da publi-cação do edital. Precedente citado: EREsp 1.266.278-MS, Corte Especial, DJe 10/5/2013. REsp 1.124.254-PI, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 1º/7/2014. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DESISTÊNCIA DE MANDADO DE SEGURAN-ÇA. O impetrante pode desistir de mandado de segurança sem a anuên-cia do impetrado mesmo após a prolação da sentença de mérito. Esse entendimento foi definido como plenamente admissível pelo STF. De fato, por ser o mandado de segurança uma garantia conferida pela CF ao parti-cular, indeferir o pedido de desistência para supostamente preservar inte-resses do Estado contra o próprio destinatário da garantia constitucional configuraria patente desvirtuamento do instituto. Essa é a razão por que não se aplica, ao processo de mandado de segurança, o que dispõe o art. 267, § 4º, do CPC ("Depois de decorrido o prazo para a resposta, o autor não poderá, sem o consentimento do réu, desistir da ação."). Precedentes citados do STF: RE 669.367-RJ, Pleno, DJe 9/8/2012; e RE-AgR 550.258-PR, Primeira Turma, DJe 26/8/2013. REsp 1.405.532-SP, Rel. Min. Eliana Cal-mon, julgado em 10/12/2013. EMENTA RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL ADMITIDA. PROCESSO CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. PEDIDO DE DESISTÊNCIA DEDUZIDO APÓS A PROLAÇÃO DE SENTENÇA. ADMISSIBILIDADE. “É líci-to ao impetrante desistir da ação de mandado de segurança, indepen-dentemente de aquiescência da autoridade apontada como coatora ou da entidade estatal interessada ou, ainda, quando for o caso, dos litis-consortes passivos necessários” (MS 26.890-AgR/DF, Pleno, Ministro Celso de Mello, DJe de 23.10.2009), “a qualquer momento antes do tér-mino do julgamento” (MS 24.584-AgR/DF, Pleno, Ministro Ricardo Le-wandowski, DJe de 20.6.2008), “mesmo após eventual sentença concessi-va do ‘writ’ constitucional, (…) não se aplicando, em tal hipótese, a norma inscrita no art. 267, § 4º, do CPC” (RE 255.837-AgR/PR, 2ª Turma, Ministro Celso de Mello, DJe de 27.11.2009). Jurisprudência desta Suprema Corte reiterada em repercussão geral (Tema 530 - Desistência em mandado de segurança, sem aquiescência da parte contrária, após prolação de senten-ça de mérito, ainda que favorável ao impetrante). Recurso extraordinário provido. (RE 669367, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ROSA WEBER, Tribunal Pleno, julgado em 02/05/2013, ACÓRDÃO E-LETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-213 DIVULG 29-10-2014 PUBLIC 30-10-2014)

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2.3 HABEAS DATA

Conforme determina a Constituição Federal em seu artigo 5º, LXXII, conceder-se-á "habeas-data": para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público; para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo.

A matéria encontra-se regulamentada na Lei 9.507/97, que dispõe que o requerimento será a-presentado ao órgão ou entidade depositária do registro ou banco de dados e será deferido ou indeferi-do no prazo de quarenta e oito horas, sendo que a decisão será comunicada ao requerente em vinte e quatro horas.

Conforme estabelece a Lei 9.507/97, é hipótese de concessão do habeas data:

A) para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registro ou banco de dados de entidades governamentais ou de cará-ter público;

B) para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo;

C) para a anotação nos assentamentos do interessado, de contestação ou explicação sobre dado verdadeiro mas justificável e que esteja sob pendência judicial ou amigável.

No que se refere à petição inicial, esta deverá preencher os requisitos dos arts. 282 a 285 do Có-digo de Processo Civil de 1973 (art. 319 do Código de Processo Civil de 2015), sendo apresentada em duas vias, e os documentos que instruírem a primeira serão reproduzidos por cópia na segunda. A peti-ção inicial deverá ser instruída, ainda, com prova: da recusa ao acesso às informações ou do decurso de mais de dez dias sem decisão; da recusa em fazer-se a retificação ou do decurso de mais de quinze dias, sem decisão; ou da recusa em fazer-se a anotação a que se refere o § 2° do art. 4° da lei 9.507/97 ou do decurso de mais de quinze dias sem decisão.

Art. 9° Ao despachar a inicial, o juiz ordenará que se notifique o coator do conteúdo da petição, entregando-lhe a segunda via apresentada pelo impetrante, com as có-pias dos documentos, a fim de que, no prazo de dez dias, preste as informações que julgar necessárias.

Art. 10. A inicial será desde logo indeferida, quando não for o caso de habeas data, ou se lhe faltar algum dos requisitos previstos nesta Lei.

Parágrafo único. Do despacho de indeferimento caberá recurso previsto no art. 15.

Art. 11. Feita a notificação, o serventuário em cujo cartório corra o feito, juntará aos autos cópia autêntica do ofício endereçado ao coator, bem como a prova da sua en-trega a este ou da recusa, seja de recebê-lo, seja de dar recibo.

Art. 12. Findo o prazo a que se refere o art. 9°, e ouvido o representante do Ministé-rio Público dentro de cinco dias, os autos serão conclusos ao juiz para decisão a ser proferida em cinco dias.

Art. 13. Na decisão, se julgar procedente o pedido, o juiz marcará data e horário pa-ra que o coator:

I - apresente ao impetrante as informações a seu respeito, constantes de registros ou bancos de dados; ou

II - apresente em juízo a prova da retificação ou da anotação feita nos assentamen-tos do impetrante.

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Art. 14. A decisão será comunicada ao coator, por correio, com aviso de recebimen-to, ou por telegrama, radiograma ou telefonema, conforme o requerer o impetrante.

Parágrafo único. Os originais, no caso de transmissão telegráfica, radiofônica ou te-lefônica deverão ser apresentados à agência expedidora, com a firma do juiz devi-damente reconhecida.

Art. 15. Da sentença que conceder ou negar o habeas data cabe apelação.

Parágrafo único. Quando a sentença conceder o habeas data, o recurso terá efeito meramente devolutivo.

Art. 16. Quando o habeas data for concedido e o Presidente do Tribunal ao qual competir o conhecimento do recurso ordenar ao juiz a suspensão da execução da sentença, desse seu ato caberá agravo para o Tribunal a que presida.

Art. 17. Nos casos de competência do Supremo Tribunal Federal e dos demais Tri-bunais, caberá ao relator a instrução do processo.

Art. 18. O pedido de habeas data poderá ser renovado se a decisão denegatória não lhe houver apreciado o mérito.

Art. 19. Os processos de habeas data terão prioridade sobre todos os atos judiciais, exceto habeas-corpus e mandado de segurança. Na instância superior, deverão ser levados a julgamento na primeira sessão que se seguir à data em que, feita a distri-buição, forem conclusos ao relator.

Parágrafo único. O prazo para a conclusão não poderá exceder de vinte e quatro horas, a contar da distribuição.

Art. 20. O julgamento do habeas data compete:

I - originariamente:

a) ao Supremo Tribunal Federal, contra atos do Presidente da República, das Me-sas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, do Tribunal de Contas da Uni-ão, do Procurador-Geral da República e do próprio Supremo Tribunal Federal;

b) ao Superior Tribunal de Justiça, contra atos de Ministro de Estado ou do próprio Tribunal;

c) aos Tribunais Regionais Federais contra atos do próprio Tribunal ou de juiz fede-ral;

d) a juiz federal, contra ato de autoridade federal, excetuados os casos de compe-tência dos tribunais federais;

e) a tribunais estaduais, segundo o disposto na Constituição do Estado;

f) a juiz estadual, nos demais casos;

II - em grau de recurso:

a) ao Supremo Tribunal Federal, quando a decisão denegatória for proferida em ú-nica instância pelos Tribunais Superiores;

b) ao Superior Tribunal de Justiça, quando a decisão for proferida em única instân-cia pelos Tribunais Regionais Federais;

c) aos Tribunais Regionais Federais, quando a decisão for proferida por juiz federal;

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d) aos Tribunais Estaduais e ao do Distrito Federal e Territórios, conforme dispuse-rem a respectiva Constituição e a lei que organizar a Justiça do Distrito Federal;

III - mediante recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal, nos casos previs-tos na Constituição.

Art. 21. São gratuitos o procedimento administrativo para acesso a informações e retificação de dados e para anotação de justificação, bem como a ação de habeas data.

DECISÃO RELEVANTE SOBRE O ‘HABEAS DATA’ NO STF: “Habeas data” e informações fazendárias - 1 O “habeas data” é a garan-tia constitucional adequada para a obtenção, pelo próprio contribuinte, dos dados concernentes ao pagamento de tributos constantes de siste-mas informatizados de apoio à arrecadação dos órgãos da administração fazendária dos entes estatais. (...) O Colegiado afirmou que o “habeas data” seria ação constitucional voltada a garantir o acesso de uma pes-soa a informações sobre ela, constantes de arquivos ou bancos de dados de entidades governamentais ou públicas (CF, art. 5º, LXXII, a). Estaria à disposição dos cidadãos para que pudessem implementar direitos subje-tivos obstaculizados, alcançáveis por meio do acesso à informação e à transmissão de dados. A sua regulamentação legal (Lei 9.507/1997) de-monstraria ser de caráter público todo registro ou banco de dados con-tendo informações que fossem ou que pudessem ser transmitidas a ter-ceiros, ou que não fossem de uso privativo do órgão ou entidade produ-tora ou depositária dessas informações. A lei não teria por objetivo ne-gar a seu próprio titular o conhecimento das informações que a seu res-peito estivessem cadastradas junto às entidades depositárias. Pretende-ria, na verdade, restringir a divulgação a outros órgãos ou a terceiros. No caso, o Sincor registraria os dados de apoio à arrecadação federal ao ar-mazenar os débitos e créditos existentes acerca dos contribuintes. En-quadrar-se-ia, assim, no conceito mais amplo de arquivos, bancos ou re-gistros de dados, entendidos em sentido “lato”, para abranger tudo que dissesse respeito ao interessado, direta ou indiretamente. Os legitimados ativos para a propositura da ação seriam pessoas físicas e jurídicas, nacio-nais e estrangeiras. Em relação aos contribuintes, seria assegurado o di-reito de conhecer as informações que lhes dissessem respeito em bancos de dados públicos ou de caráter público, em razão da necessidade de pre-servar seu nome, planejamento empresarial, estratégia de investimento e, em especial, a recuperação de tributos pagos indevidamente, entre ou-tras. Assim, essas informações não seriam de uso privativo do órgão ou entidade produtora ou depositária, mas diriam respeito ao próprio con-tribuinte. Seria diferente se fossem requeridas pelos contribuintes infor-mações sobre o planejamento estratégico do órgão fazendário, a ensejar o desprovimento do recurso. Entretanto, os extratos atinentes às anota-ções constantes do Sincor e outros sistemas informatizados de apoio à ar-recadação federal, quanto ao pagamento de tributos federais, não envol-veriam a hipótese de sigilo legal ou constitucional, uma vez requeridos pe-lo próprio contribuinte, sobre dados próprios. Nesse sentido, dever-se-ia entender como possível a impetração do “habeas data” de forma a es-clarecer à pessoa física ou jurídica os valores por ela pagos a título de tributos ou qualquer outro tipo de pagamento constante dos registros da Receita Federal ou qualquer outro órgão fazendário das entidades es-

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tatais (...) c) as informações seriam inúteis como prova de eventual pa-gamento indevido, a ser utilizada no âmbito de ação de repetição de in-débito, em face de seu caráter provisório; d) o “habeas data” seria des-necessário para a obtenção das informações acerca dos seus débitos tri-butários e pagamentos realizados, posto que o contribuinte deveria tê-los em sua contabilidade; e e) o risco para a ordem administrativa de-corrente do efeito multiplicador de eventual precedente no sentido do cabimento do “habeas data” na hipótese.. (RE 673707/MG, rel. Min. Luiz Fux, 17.6.2015, grifo nosso)

2.4 AÇÃO POPULAR

Encontra previsão na Constituição Federal, no art. 5º, inciso LXXIII, bem como regulamentação pela Lei 4.717/65.

A Ação Popular visa a defesa dos interesses da coletividade, perante os gestores do patrimônio público. Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios, de entidades au-tárquicas, de sociedades de economia mista, de sociedades mútuas de seguro nas quais a União repre-sente os segurados ausentes, de empresas públicas, de serviços sociais autônomos, de instituições ou fundações para cuja criação ou custeio o tesouro público haja concorrido ou concorra com mais de cin-qüenta por cento do patrimônio ou da receita ânua, de empresas incorporadas ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados e dos Municípios, e de quaisquer pessoas jurídicas ou entidades subven-cionadas pelos cofres públicos. Pela ação popular são tutelados interesses difusos ou coletivos pertinen-tes aos cidadãos brasileiros, à coletividade.

Três requisitos constitucionais devem ser observados para intentar a Ação Popular:

a. a condição de cidadão brasileiro; (pessoa física, pessoa jurídica não está legitimada)

b. a ilegalidade do ato a invalidar;

c. a lesividade do ato para o patrimônio público.

Consideram-se patrimônio público para os fins referidos na ação popular, os bens e direitos de valor econômico, artístico, estético, histórico ou turístico.

Legitimidade Ativa: qualquer cidadão poderá figurar no pólo ativo da ação popular. Pessoa jurídi-ca, portanto, não poderá ser legitimada ativa. A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. É facultado a qualquer cidadão habili-tar-se como litisconsorte ou assistente do autor da ação popular.

Legitimidade Passiva: contra as autoridades, funcionários ou administradores que houverem au-torizado, aprovado, ratificado ou praticado o ato impugnado, ou que, por omissas, tiverem dado oportu-nidade à lesão, e contra os beneficiários diretos do mesmo. Qualquer pessoa, beneficiada ou responsável pelo ato impugnado, cuja existência ou identidade se torne conhecida no curso do processo e antes de proferida a sentença final de primeira instância, deverá ser citada para a integração do contraditório, sendo-lhe restituído o prazo para contestação e produção de provas.

Súmula 101 STF “O mandado de segurança não substitui a ação popular”

Súmula 365 STF “Pessoa jurídica não tem legitimidade para propor ação popular”

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A pessoa jurídica de direito público ou de direito privado, cujo ato seja objeto de impugnação, poderá abster-se de contestar o pedido, ou poderá atuar ao lado do autor, desde que isso se afigure útil ao interesse público, a juízo do respectivo representante legal ou dirigente. O Ministério Público funciona com custos legais ou prossegue com a ação se o Autor desistir.

O prazo de contestação é de 20 (vinte) dias, prorrogáveis por mais 20 (vinte), a requerimento do interessado, se particularmente difícil a produção de prova documental, e será comum a todos os inte-ressados, correndo da entrega em cartório do mandado cumprido, ou, quando for o caso, do decurso do prazo assinado em edital.

A sentença tem força constitutiva e condenatória, uma vez que, sendo procedente a ação popu-lar, a sentença decretará a invalidade do ato impugnado, condenará ao pagamento de perdas e danos os responsáveis pela sua prática e os beneficiários dele, ressalvada a ação regressiva contra os funcionários causadores de dano, quando incorrerem em culpa.

A sentença incluirá sempre, na condenação dos réus, o pagamento, ao autor, das custas e demais despesas, judiciais e extrajudiciais, diretamente relacionadas com a ação e comprovadas, bem como o dos honorários de advogado.

Sendo o valor da lesão provado no curso da causa, será indicado na sentença. Dependendo de avaliação ou perícia, será apurado na execução.

Quando a lesão resultar da falta ou isenção de qualquer pagamento, a condenação imporá o pa-gamento devido, com acréscimo de juros de mora e multa legal ou contratual, se houver. Quando a lesão resultar da execução fraudulenta, simulada ou irreal de contratos, a condenação versará sobre a reposi-ção do débito, com juros de mora.

A parte condenada a restituir bens ou valores ficará sujeita a sequestro e penhora, desde a prola-ção da sentença condenatória. A sentença terá eficácia de coisa julgada oponível "erga omnes", exceto no caso de haver sido a ação julgada improcedente por deficiência de prova; neste caso, qualquer cida-dão poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova.

A sentença que concluir pela carência ou pela improcedência da ação está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal. Da sentença que julgar a ação procedente caberá apelação, com efeito suspensivo. Das decisões interlocutórias cabe agravo de instrumento. Das sentenças e decisões proferidas contra o autor da ação e suscetíveis de recurso, poderá recorrer qualquer cidadão e também o Ministério Público.

Quando o réu condenado perceber dos cofres públicos, a execução far-se-á por desconto em fo-lha até o integral ressarcimento do dano causado, se assim mais convier ao interesse público. A ação popular prescreve em 5 (cinco) anos, contando-se da data de publicação do ato.

DECISÕES RELEVANTES SOBRE A ‘AÇÃO POPULAR’ NO STF:

Direito Constitucional e Processual Civil. Ação popular. Condições da a-ção. Ajuizamento para combater ato lesivo à moralidade administrativa. Possibilidade. Acórdão que manteve sentença que julgou extinto o pro-cesso, sem resolução do mérito, por entender que é condição da ação popular a demonstração de concomitante lesão ao patrimônio público material. Desnecessidade. Conteúdo do art. 5º, inciso LXXIII, da Consti-tuição Federal. Reafirmação de jurisprudência. Repercussão geral reco-nhecida. (...). (ARE 824781 RG, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, julgado em 27/08/2015, grifo nosso ).

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AÇÃO POPULAR – AJUIZAMENTO CONTRA A PRESIDENTE DA REPÚBLICA – FALTA DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – REGIME DE DIREITO ESTRITO A QUE SE SUBMETE A DEFINIÇÃO CONSTI-TUCIONAL DA COMPETÊNCIA DA CORTE SUPREMA – DOUTRINA – PRECE-DENTES – AÇÃO POPULAR NÃO CONHECIDA – RECURSO DE AGRAVO IM-PROVIDO. – Não compete ao Supremo Tribunal Federal processar e jul-gar, originariamente, ação popular ajuizada contra a Presidente da Re-pública. Precedentes. – A ação popular não se qualifica como sucedâneo dos instrumentos de controle concentrado de constitucionalidade nem viabiliza o exame “in abstracto” de situações jurídicas formadas sob a égide da legislação em vigor. (Pet 5859 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 25/11/2015, grifo nosso).

2.5 AÇÃO CIVIL PÚBLICA

Conforme estabelecido pelo artigo 1º da Lei 7.347/1985: Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popu-lar, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causa-dos: l - ao meio-ambiente; ll - ao consumidor; III – a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisa-gístico; IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo. V - por infração da ordem econômica; VI - à ordem urbanística; VII – à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos; VIII – ao patrimônio público e social; Parágrafo único. Não será cabível ação civil pública para veicular preten-sões que envolvam tributos, contribuições previdenciárias, o Fundo de Ga-rantia do Tempo de Serviço – FGTS ou outros fundos de natureza institu-cional cujos beneficiários podem ser individualmente determinados.

No que se refere aos direitos difusos, temos como os transindividuais de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato (art. 81, parágrafo único, I, CDC) – dispersos pela sociedade civil como um todo (meio ambiente, consumidor, ordem eco-nômica).

Já os Interesses Coletivos são os transindividuais de natureza indivisível, de que seja titular gru-po, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base (art. 81, parágrafo único, II, CDC).

Os Interesses Individuais Homogêneos situam-se dentro da órbita de cada indivíduo – decorren-tes de origem comum. São divisíveis e seus titulares são determinados. Também podem ser defendidos na Ação Civil Pública, embora a lei não refira expressamente. Isto porque o próprio art. 91 do CDC autori-za a proteção.

Importante referir que o ajuizamento de Ação Civil Pública não impede a propositura de ações individuais sobre a mesma causa de pedir e pedido, nem induz litispendência, conforme entendimento jurisprudencial, a saber:

“1. A existência de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público não impede o ajuizamento da ação individual com idêntico objeto. Desta for-ma, no caso não há ocorrência do fenômeno processual da litispendência,

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visto que a referida ação coletiva não induz litispendência quanto às a-ções individuais”. (AgRg no Ag 1400928/RS, Rel. Ministro BENEDITO GON-ÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 06/12/2011, DJe 13/12/2011). “1. Ajuizada ação coletiva atinente a macro-lide geradora de processos multi-tudinários, suspendem-se as ações individuais, no aguardo do julgamento da ação coletiva.” (REsp 1110549/RS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, SE-GUNDA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 14/12/2009).

Súmula 329 STJ: “O Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil públi-ca em defesa do patrimônio público”.

“O Ministério Público não tem legitimidade para promover ação civil pública com o objetivo de impedir a cobrança de tributos na defesa de contribuintes, pois seus in-teresses são divisíveis, disponíveis e individualizáveis, oriundos de relações jurídi-cas assemelhadas, mas distintas entre si. Contribuintes não são consumidores, não havendo como se vislumbrar sua equiparação aos portadores de direitos difusos ou coletivos”. (STJ, REsp 82.461).

Questão interessante retratada em concurso de ponta refere-se à possibilidade de ocorrer Ação Civil Pública em face de majoração supostamente abusiva de tarifas, como no caso de transporte coleti-vo. A resposta é afirmativa, isto porque não há que se confundir o conceito de tarifa com o de taxa, tendo esta eminentemente carga tributária. Como tarifa não é tributo, poderá ser ajuizada Ação Civil Pública para aumento abusivo de tarifa de transporte.

A tutela a ser buscada na Ação Civil Pública poderá tanto ser repressiva, como preventiva ou ini-bitória, conforme autorizado pelo art. 3ºda Lei 7.347/85. Na hipótese de condenação, não se tratando de dano indenizatório ao autor, mas sim à coletividade, a indenização pelo dano causado é revertida a fundo especial, com destinação para a reconstituição dos bens lesados, havendo previsão específica na hipótese do art. 13 da Lei 7.347/85, a saber:

Art. 13. Havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano causado rever-terá a um fundo gerido por um Conselho Federal ou por Conselhos Estaduais de que participarão necessariamente o Ministério Público e representantes da comuni-dade, sendo seus recursos destinados à reconstituição dos bens lesados.

§ 1º Enquanto o fundo não for regulamentado, o dinheiro ficará depositado em esta-belecimento oficial de crédito, em conta com correção monetária. (Renumerado do parágrafo único pela Lei nº 12.288, de 2010)

§ 2º Havendo acordo ou condenação com fundamento em dano causado por ato de discriminação étnica nos termos do disposto no art. 1º desta Lei, a prestação em di-nheiro reverterá diretamente ao fundo de que trata o caput e será utilizada para a-ções de promoção da igualdade étnica, conforme definição do Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial, na hipótese de extensão nacional, ou dos Con-selhos de Promoção de Igualdade Racial estaduais ou locais, nas hipóteses de da-nos com extensão regional ou local, respectivamente. (Incluído pela Lei nº 12.288, de 2010)

A presença de medidas indutivas ao cumprimento, igualmente é visualizada na Ação Civil Pública, a saber:

Art. 11. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz determinará o cumprimento da prestação da atividade devida ou a ces-sação da atividade nociva, sob pena de execução específica, ou de cominação de multa diária, se esta for suficiente ou compatível, independentemente de requeri-mento do autor.

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Acerca da competência, assim refere o art. 2º da Lei da Ação Civil Pública:

Art. 2º As ações previstas nesta Lei serão propostas no foro do local onde ocor-rer o dano, cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa.

Parágrafo único. A propositura da ação prevenirá a jurisdição do juízo para todas as ações posteriormente intentadas que possuam a mesma causa de pedir ou o mesmo objeto.

Pela ordem legal, a competência será do foro do local onde ocorrer o dano. Ocorrendo em mais de uma comarca é competente qualquer uma delas, resolvendo-se a questão pela prevenção. Sobre o tema e a extensão dos efeitos há grande debate jurisprudencial.

Na hipótese de Ação Civil Pública que envolva direito do consumidor, aplica-se o art. 93 do CDC que assim dispõe:

Art. 93. Ressalvada a competência da Justiça Federal, é competente para a causa a justiça local:

I - no foro do lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano, quando de âmbito local;

II - no foro da Capital do Estado ou no do Distrito Federal, para os danos de âmbito nacional ou regional, aplicando-se as regras do Código de Processo Civil aos casos de competência concorrente.

A respeito do assunto, importa colacionar:

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SERVIÇO POSTAL. ECT. LITISCONSÓRCIO. UNIÃO. NÃO OCORRÊNCIA. ENTREGAS INDIVIDUALIZADAS DE OBJETOS DE COR-RESPONDÊNCIAS EM CONDOMÍNIOS HORIZONTAIS E VERTICAIS, RESI-DENCIAIS OU COMERCIAIS. ABRANGÊNCIA DA DECISÃO. ALÍNEA "C". DI-VERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADA. 1. No que se prende à abrangência da sentença prolatada em ação civil pública relativa a di-reitos individuais homogêneos, a Corte Especial decidiu, em sede de re-curso repetitivo, que "os efeitos e a eficácia da sentença não estão cir-cunscritos a lindes geográficos, mas aos limites objetivos e subjetivos do que foi decidido, levando-se em conta, para tanto, sempre a extensão do dano e a qualidade dos interesses metaindividuais postos em juízo (arts. 468, 472 e 474, CPC e 93 e 103, CDC)". (REsp 1243887/PR, Rel. Mi-nistro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado sob a sistemática pre-vista no art. 543-C do CPC, DJ 12/12/2011). 2. Desse modo, os efeitos do acórdão em discussão nos presentes autos são erga omnes, abrangendo a todas as pessoas enquadráveis na situação fático-jurídica descrita no julgado, independentemente da competência do órgão prolator. Não fosse assim, haveria graves limitações à extensão e às potencialidades da ação civil pública, o que não se pode admitir. 3. Com relação à alínea "c" do permissivo constitucional, observa- se que o recurso especial não logrou demonstrar o dissídio jurisprudencial porquanto coligiu preceden-tes superados pelo aludido recurso representativo da controvérsia. 4. A-gravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp 601.989/SC, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/03/2015, DJe 18/03/2015).

SÚMULA 489 STJ: Reconhecida a continência, devem ser reunidas na Justiça Federal as a-ções civis públicas propostas nesta e na Justiça Estadual.

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Jurisprudência: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. COMPETÊNCIA PARA PRO-CESSAR E JULGAR AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. Compete à Justiça Estadual – e não à Justiça Federal – processar e julgar ação civil pública de improbidade administrativa na qual se apure irregularidades na prestação de contas, por ex-prefeito, relacionadas a verbas federais transferidas mediante convênio e incorporadas ao patrimônio munici-pal, a não ser que exista manifestação de interesse na causa por parte da União, de autarquia ou empresa pública federal. Nessa situação, po-de-se, em tese, visualizar conflito entre as Súmulas 208 e 209 do STJ, que determinam, respectivamente, hipóteses de competência da Justiça Fede-ral e da Justiça Estadual. Isso porque, embora a ação tenha por objeto "verba sujeita a prestação de contas perante órgão federal" (Súmula 208), trata-se de "verba transferida e incorporada ao patrimônio municipal" (Súmula 209). Ocorre que esses enunciados provêm da Terceira Seção do STJ e, por isso, versam sobre hipóteses de fixação da competência em ma-téria penal, em que basta o interesse da União, de suas autarquias ou empresas públicas para deslocar a competência para a Justiça Federal, nos termos do inciso IV do art. 109 da CF. No âmbito cível, entretanto, de-ve-se observar uma distinção na aplicação desses enunciados, visto que o art. 109 da CF elenca a competência da Justiça Federal em um rol taxativo em que, em seu inciso I, menciona as causas a serem julgadas por juízo federal em razão da pessoa, competindo a este último "decidir sobre a e-xistência [ou não] de interesse jurídico que justifique a presença, no pro-cesso, da União, suas autarquias ou empresas públicas" (Súmula 150 do STJ). Assim, a despeito de a Súmula 208 do STJ afirmar que "Compete à Justiça Federal processar e julgar prefeito municipal por desvio de verba sujeita a prestação de contas perante órgão federal", a competência abso-luta enunciada no art. 109, I, da CF faz alusão, de forma clara e objetiva, às partes envolvidas no processo, tornando despicienda, dessa maneira, a análise da matéria discutida em juízo. Nesse contexto, a Segunda Turma do STJ já decidiu que "A competência da Justiça Federal, em matéria cível, é aquela prevista no art. 109, I, da Constituição Federal, que tem por base critério objetivo, sendo fixada tão só em razão dos figurantes da relação processual, prescindindo da análise da matéria discutida na lide". (REsp 1.325.491-BA, DJe 25/6/2014). CC 131.323-TO, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 25/3/2015, DJe 6/4/2015.

Como ficaria o caso da União Federal e a competência delegada da justiça estadual posta no art. 109, §3º da CF?

SÚMULA 183 DO STJ – CANCELADA - «Compete ao Juiz Estadual, nas Comarcas que não se-jam sede de vara da Justiça Federal, processar e julgar ação civil pública, ainda que a União figure no processo.»

Jurisprudência: “O dispositivo contido na parte final do § 3º do art. 109 da Constituição é dirigido ao legislador ordinário, autorizando-o a atribuir competência (rectius jurisdição) ao Juízo Estadual do foro do domicílio da outra parte ou do lugar do ato ou fato que deu origem à demanda, desde que não seja sede de Varas da Justiça Federal, para causas específicas dentre as previstas no inciso I do referido artigo 109. No caso em tela, a permissão não foi utilizada pelo legislador que, ao revés, se limitou, no

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art. 2º da Lei nº 7.347/85, a estabelecer que as ações nele previstas "se-rão propostas no foro do local onde ocorrer o dano, cujo juízo terá com-petência funcional para processar e julgar a causa". Considerando que o Juiz Federal também tem competência territorial e funcional sobre o local de qualquer dano, impõe-se a conclusão de que o afastamento da jurisdi-ção federal, no caso, somente poderia dar-se por meio de referência ex-pressa à Justiça Estadual, como a que fez o constituinte na primeira parte do mencionado § 3º em relação às causas de natureza previdenciária, o que no caso não ocorreu. Recurso conhecido e provido”. (RE 228955, Re-lator(a): Min. ILMAR GALVÃO, Tribunal Pleno, julgado em 10/02/2000, DJ 24-03-2001 PP-00070 EMENT VOL-01984-04 PP-00842 REPUBLICAÇÃO: DJ 14-04-2000 PP-00056 RTJ VOL-00172-03 PP-00992). “1. A competência da Justiça Federal, prevista no art. 109, I, da Constituição, tem por base um critério subjetivo, levando em conta, não a natureza da relação jurídica li-tigiosa, e sim a identidade dos figurantes da relação processual. Presente, no processo, um dos entes ali relacionados, a competência será da Justiça Federal. 2. É da natureza do federalismo a supremacia da União sobre Es-tados-membros, supremacia que se manifesta inclusive pela obrigatorie-dade de respeito às competências da União sobre a dos Estados. Decorre do princípio federativo que a União não está sujeita à jurisdição de um Es-tado-membro, podendo o inverso ocorrer, se for o caso. Precedente: CC 90.106-ES, 1ª S., Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 10.03.2008. 3. Estabe-lecendo-se relação de continência entre ação cautelar e ação civil pública de competência da Justiça Federal, com demanda declaratória, em curso na Justiça do Estado, a reunião das ações deve ocorrer, por força do prin-cípio federativo, perante o Juízo Federal. Precedente: CC 56.460-RS, 1ª S., Min. José Delgado, DJ de 19.03.07 4. Ademais, (a) não se aplica a orienta-ção contida na Súmula 183/STJ em razão do seu cancelamento (EDcl no CC 27676/BA, 1ª Seção, Min. José Delgado, DJ de 05.03.2001); (b) o Juízo Federal suscitado também tem competência territorial e funcional (Reso-lução n. 600-17, do TRF da 1ª Região de 28.06.2005) sobre o local onde ocorreu o dano (art. 2º da Lei n. 7.347/85). 5. Conflito conhecido para de-clarar a competência do Juízo Federal para as ações aqui discutidas, diver-gindo do relator”. (CC 90.722/BA, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, Rel. p/ Acórdão Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/06/2008, DJe 12/08/2008).

No que se refere à legitimidade, assim estabelece o art. 5º da Lei 7.347/85:

Art. 5º. Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar:

I - o Ministério Público;

II - a Defensoria Pública;

III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;

IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista;

V - a associação que, concomitantemente:

– esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil;

– inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao con-sumidor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estéti-co, histórico, turístico e paisagístico.

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(...)

§ 4º. O requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz, quando haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido.

“34. Dispensa da pré-constituição. Ao juiz cabe dispensar o prazo de um ano de pré-constituição da associação, avaliando no caso concreto se ocorrem os pressu-postos da lei, isto é, o manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou ca-racterística do dano ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido. Nesse caso, a legitimidade ativa da associação constituída há pelo menos de um ano fica subor-dinada à avaliação do juiz (...)” – Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery – Código de Processo Civil Comentado, 11ª ed., p. 1446.

Jurisprudência: DIREITO CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. LEGITI-MIDADE DA DEFENSORIA PÚBLICA PARA PROPOR AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM DEFESA DE JURIDICAMENTE NECESSITADOS. A Defensoria Pública tem le-gitimidade para propor ação civil pública em defesa de interesses indivi-duais homogêneos de consumidores idosos que tiveram plano de saúde reajustado em razão da mudança de faixa etária, ainda que os titulares não sejam carentes de recursos econômicos. ( EREsp 1.192.577-RS, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 21/10/2015, DJe 13/11/2015, grifo nosso) DIREITO PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE DO MP PARA PROPOR ACP OBJETIVANDO A LIBERAÇÃO DE SALDO DE CONTAS PIS/PASEP DE PESSO-AS COM INVALIDEZ. O Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública objetivando a liberação do saldo de contas PIS/PASEP, na hipótese em que o titular da conta – independentemente da obten-ção de aposentadoria por invalidez ou de benefício assistencial – seja in-capaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, bem como na hipótese em que o próprio titu-lar da conta ou quaisquer de seus dependentes for acometido das doen-ças ou afecções listadas na Portaria Interministerial MPAS/MS 2.998/2001 (...).( REsp 1.480.250-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 18/8/2015, DJe 8/9/2015. Grifo nosso)

ATENÇÃO: Súmula 470 (CANCELADA) – O Ministério Público não tem legitimidade para pleitear, em ação civil públi-ca, a indenização decorrente do DPVAT em benefício do segurado. Segunda Seção, cancelada em 27/5/2015, DJe 15/6/2015.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE DO MP PARA AJUIZAR AÇÃO COLETIVA EM DEFESA DE DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS DOS BE-NEFICIÁRIOS DO SEGURO DPVAT. O Ministério Público tem legitimidade para ajuizar ação civil pública em defesa dos direitos individuais homo-gêneos dos beneficiários do seguro DPVAT. Isso porque o STF, ao julgar o RE 631.111-GO (Tribunal Pleno, DJe 30/10/2014), submetido ao rito do art. 543-B do CPC, firmou o entendimento de que Órgão Ministerial tem

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legitimidade para ajuizar ação civil pública em defesa dos direitos indivi-duais homogêneos dos beneficiários do seguro DPVAT, dado o interesse social qualificado presente na tutela jurisdicional das vítimas de aciden-te de trânsito beneficiárias pelo DPVAT, bem como as relevantes fun-ções institucionais do MP. Consequentemente, é imperioso o cancela-mento da súmula 470 do STJ, a qual veicula entendimento superado por orientação jurisprudencial do STF firmada em recurso extraordinário submetido ao rito do art. 543-B do CPC. REsp 858.056-GO, Rel. Min. Mar-co Buzzi, julgado em 27/5/2015, DJe 5/6/2015.

Nos termos do parágrafo primeiro do art. 5º, o MP, se não for parte, atuará como fiscal da lei.

Súmula 643 STF – “O Ministério Público tem legitimidade para promover ação civil pública cujo fundamento seja a ilegalidade de reajuste de mensalidades escolares”.

O Conselho Federal da OAB pode propor ACP (art. 54, inc. XIV da lei 8.906/94 – EOAB).

Art. 6º. Qualquer pessoa poderá e o servidor público deverá provocar a iniciativa do Ministério Público, ministrando-lhe informações sobre fatos que constituam objeto da ação civil e indicando-lhe os elementos de convicção.

Art. 7º. Se, no exercício de suas funções, os juízes e tribunais tiverem conhecimento de fatos que possam ensejar a propositura da ação civil, remeterão peças ao Minis-tério Público para as providências cabíveis.

No polo passivo, poderão estar todos os responsáveis pelas situações ou fatos ensejadores da a-ção, sejam pessoas físicas ou jurídicas, sendo possível ao Poder Público, habilitar-se como litisconsorte de qualquer das partes, vejamos:

Art. 5º (...)

§ 2º. Fica facultado ao Poder Público e a outras associações legitimadas nos termos deste artigo habilitar-se como litisconsortes de qualquer das partes.

§ 5º. Admitir-se-á o litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da União, do Distrito Federal e dos Estados na defesa dos interesses e direitos de que cuida esta lei.

Ainda, cumpre ressaltar que na hipótese de desistência infundada ou abandono da ação por as-sociação legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado assumirá a titularidade ativa, conforme art. 5º, §3º da Lei 7.347/85.

É hipótese de substituição processual superveniente exigindo o abandono da causa ou desistên-cia infundada pela associação, não sendo, entretanto, obrigatória, conforme entendimento jurispru-dencial:

“(...) 3. Nos termos dos arts. 5.º, §3.º, e 15, da Lei n.º 7.347/85, nos casos de desis-tência infundada ou de abandono da causa por parte de outro ente legitimado, deve-rá o Ministério Público integrar o polo ativo da demanda. Em outras palavras, home-nageando-se os princípios da indisponibilidade e obrigatoriedade das demandas co-letivas, deve-se dar continuidade à ação civil pública, a não ser que o Parquet de-monstre fundamentalmente a manifesta improcedência da ação ou que a lide reve-le-se temerária. (...)” (REsp 200.289/SP, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS), TERCEIRA TURMA, julgado em 02/09/2010, DJe 15/09/2010).

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Jurisprudência: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ALTERAÇÃO DE POLO ATIVO DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA PROMOVIDA POR ASSOCIAÇÃO. Caso ocorra dis-solução da associação que ajuizou ação civil pública, não é possível sua substituição no polo ativo por outra associação, ainda que os interesses discutidos na ação coletiva sejam comuns a ambas. Em princípio, nos termos art. 5º, § 3º, da Lei 7.347/85, afigura-se possível que o Ministério Público ou outro legitimado, que necessariamente guarde uma represen-tatividade adequada com os interesses discutidos na ação, assuma, no curso do processo coletivo (inclusive com a demanda já estabilizada), a ti-tularidade do polo ativo da lide, possibilidade, é certo, que não se restrin-ge às hipóteses de desistência infundada ou de abandono da causa, men-cionadas a título exemplificativo pelo legislador (numerus apertus). Essa conclusão decorre da própria indisponibilidade dos interesses tutelados no bojo de uma ação coletiva, que transcendem a esfera jurídica do indi-víduo, e cuja defesa ostenta relevância pública e inequívoca repercussão social. Ante a natureza e a relevância pública dos interesses tutelados no bojo de uma ação coletiva, de inequívoca repercussão social, ressai evi-denciado que os legitimados para promover a ação coletiva – os quais ne-cessariamente devem guardar com tais interesses uma representativida-de adequada – não podem proceder a atos de disposição material e/ou formal dos direitos ali discutidos, inclusive porque deles não são titulares. No âmbito da tutela coletiva, vigora o princípio da indisponibilidade (tem-perada) da demanda coletiva, seja no tocante ao ajuizamento ou à conti-nuidade do feito, com reflexo direto em relação ao Ministério Público – que, institucionalmente, tem o dever de agir sempre que presente o inte-resse social (naturalmente, sem prejuízo de uma ponderada avaliação so-bre a conveniência e, mesmo, sobre possível temeridade em que posta i-nicialmente a ação) – e, indiretamente, aos demais colegitimados. Desse modo, a exegese das normas regentes do processo coletivo deve, mais acentuadamente, direcionar-se à plena consecução do direito material subjacente, de manifesta relevância pública e repercussão social. Assim, a superveniente ausência da capacidade de ser parte, não conduz, necessa-riamente, à extinção do feito sem julgamento de mérito, especialmente nos casos em que o Ministério Público ou outro colegitimado – que guar-de, de igual modo, representatividade adequada com os interesses ali dis-cutidos – manifeste interesse em assumir a titularidade da demanda. To-davia, esta compreensão quanto à possibilidade de assunção do polo ati-vo por outro legitimado não se aplica às associações, porque de todo in-compatível. No específico caso das associações, de suma relevância consi-derar a novel orientação exarada pelo STF, que, por ocasião do julgamen-to do RE 573.232-SC (Tribunal Pleno, DJe 19/9/2014), sob o regime do art. 543-B do CPC, decidiu que a atuação da associação, como parte legitima-da para promover ação coletiva, se dá na qualidade de representante de seus associados (defesa de direito alheio em nome alheio), e não na qua-lidade de substituto processual (defesa de direito alheio em nome pró-prio), a demandar, por conseguinte, expressa autorização de seus associ-ados, seja individualmente, seja por deliberação assemblear, não bastan-do, para tanto, a previsão genérica no respectivo estatuto. Não se descu-rando da compreensão de que a Lei, ao estabelecer os legitimados para promover a ação coletiva, presumivelmente reconheceu a correlação des-tes com os interesses coletivos a serem tutelados, certo é que o controle judicial da adequada representatividade, especialmente em relação às as-

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sociações, consubstancia importante elemento de convicção do magistra-do para mensurar a abrangência e, mesmo, relevância dos interesses dis-cutidos na ação, permitindo-lhe, inclusive, na ausência daquela, obstar o prosseguimento do feito, em observância ao princípio do devido processo legal à tutela jurisdicional coletiva. Reconhece-se, pois, a absoluta impos-sibilidade, e mesmo incompatibilidade, de outra associação assumir o po-lo ativo de ação civil pública promovida por ente associativo que, no curso da ação, veio a se dissolver. Sob o aspecto da representação, afigura-se, pois, inconciliável a situação jurídica dos então representados pela associ-ação dissolvida com a dos associados do novo ente associativo, ainda que, em tese, os interesses discutidos na ação coletiva sejam comuns aos dois grupos de pessoas. REsp 1.405.697-MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 17/9/2015, DJe 8/10/2015.

No que se refere ao Termo de Ajustamento de Conduta, a lei refere que os órgãos públicos legi-timados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial.

Conforme refere José dos Santos Carvalho Filho, em sua obra Ação Civil Pública – Comentários por artigo, “O STJ já decidiu, corretamente ao nosso ver, que a assinatura de compromisso de ajustamen-to na via administrativa, tomado por determinado órgão público, como o autoriza a lei, não constitui fato impeditivo para retirar do Ministério Público a legitimidade e o interesse de agir para a propositura de ação civil pública, na busca da indicação exata do dano ambiental causado e da indenização a cargo do violador do interesse transindividual difuso objeto da proteção jurídica”.

Cumpre salientar, ainda, outros tópicos pertinentes da Ação Civil Pública, com seu exato funda-mento legal:

- possibilidade do deferimento de medida liminar – art. 11 e 12;

- Suspensão da Liminar – Suspensão da Segurança – art. 12, § 1º e § 2º;

- Inquérito Civil:

Art. 8º. Para instruir a inicial, o interessado poderá requerer às autoridades compe-tentes as certidões e informações que julgar necessárias, a serem fornecidas no prazo de 15 (quinze) dias.

§ 1º O Ministério Público poderá instaurar, sob sua presidência, inquérito civil, ou requisitar, de qualquer organismo público ou particular, certidões, informações, e-xames ou perícias, no prazo que assinalar, o qual não poderá ser inferior a 10 (dez) dias úteis.

§ 2º Somente nos casos em que a lei impuser sigilo, poderá ser negada certidão ou informação, hipótese em que a ação poderá ser proposta desacompanhada daque-les documentos, cabendo ao juiz requisitá-los.

Art. 9º. Se o órgão do Ministério Público, esgotadas todas as diligências, se conven-cer da inexistência de fundamento para a propositura da ação civil, promoverá o ar-quivamento dos autos do inquérito civil ou das peças informativas, fazendo-o fun-damentadamente.

§ 1º Os autos do inquérito civil ou das peças de informação arquivadas serão reme-tidos, sob pena de se incorrer em falta grave, no prazo de 3 (três) dias, ao Conselho Superior do Ministério Público.

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§ 2º Até que, em sessão do Conselho Superior do Ministério Público, seja homolo-gada ou rejeitada a promoção de arquivamento, poderão as associações legitima-das apresentar razões escritas ou documentos, que serão juntados aos autos do in-quérito ou anexados às peças de informação.

§ 3º A promoção de arquivamento será submetida a exame e deliberação do Conse-lho Superior do Ministério Público, conforme dispuser o seu Regimento.

§ 4º Deixando o Conselho Superior de homologar a promoção de arquivamento, de-signará, desde logo, outro órgão do Ministério Público para o ajuizamento da ação.

Art. 10. Constitui crime, punido com pena de reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos, mais multa de 10 (dez) a 1.000 (mil) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional – ORTN, a recusa, o retardamento ou a omissão de dados técnicos indispensáveis à propositura da ação civil, quando requisitados pelo Ministério Público.

A respeito do assunto, colacionamos a jurisprudência dominante:

“(...) 2. Embora o inquérito civil público tenha por objetivo apurar fatos que poderão ensejar a propositura de ações de natureza civil, v.g., ação civil pública e ação de improbidade administrativa, não há empeço a que, caso posteriormente se entenda haver indícios da prática de infração penal, seja ele utilizado como suporte probató-rio de eventual ação penal. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça e do Su-premo Tribunal Federal. (...)”. (HC 123.855/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚ-NIOR, SEXTA TURMA, julgado em 22/05/2012, DJe 04/06/2012).

“(…) o inquérito civil, como peça informativa, tem por fim embasar a propositura da ação, que independe da prévia instauração do procedimento administrativo. Even-tual irregularidade praticada na fase pré-processual não é capaz de inquinar de nu-lidade a ação civil pública, assim como ocorre na esfera penal, se observadas as garantias do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório (...)”. (REsp 1.119.568/PR, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 23/09/2010).

Na visão de Nelson Nery Junior, na obra anteriormente citada “4. Inquérito Civil. Trata-se de pro-cedimento administrativo destinado à colheita de elementos para eventual e futura propositura respon-sável da ACO, evitando-se o ajuizamento de ação temerária (...) Como não é processo administrativo, não há contraditório no IC.”

- Efeito Suspensivo:

Art. 14. O juiz poderá conferir efeito suspensivo aos recursos, para evitar dano irre-parável à parte.

- Execução pelo Ministério Público:

Art. 15. Decorridos sessenta dias do trânsito em julgado da sentença condenatória, sem que a associação autora lhe promova a execução, deverá fazê-lo o Ministério Público, facultada igual iniciativa aos demais legitimados.

Na hipótese de direitos difusos e coletivos, a execução poderá ser proposta por qualquer legiti-mado para a defesa de interesses difusos e coletivos, não estando restrita ao autor.

Na hipótese de direitos individuais homogêneos, são legitimados:

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individual, qualquer prejudicado e beneficiado;

coletiva, os legitimados para a Ação Civil Pública e previstos no CDC como substitutos

processuais.

- Efeitos da Sentença:

Art. 16. A sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites da competên-

cia territorial do órgão prolator, exceto se o pedido for julgado improcedente

por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar

outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova.

Jurisprudência: “AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SERVIÇO POSTAL. ECT. LITISCON-

SÓRCIO. UNIÃO. NÃO OCORRÊNCIA. ENTREGAS INDIVIDUALIZADAS DE

OBJETOS DE CORRESPONDÊNCIAS EM CONDOMÍNIOS HORIZONTAIS E

VERTICAIS, RESIDENCIAIS OU COMERCIAIS. ABRANGÊNCIA DA DECISÃO.

ALÍNEA "C". DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADA. 1. No

que se prende à abrangência da sentença prolatada em ação civil pública

relativa a direitos individuais homogêneos, a Corte Especial decidiu, em

sede de recurso repetitivo, que "os efeitos e a eficácia da sentença não

estão circunscritos a lindes geográficos, mas aos limites objetivos e sub-

jetivos do que foi decidido, levando-se em conta, para tanto, sempre a

extensão do dano e a qualidade dos interesses metaindividuais postos

em juízo (arts. 468, 472 e 474, CPC e 93 e 103, CDC)". (REsp 1243887/PR,

Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado sob a sistemá-

tica prevista no art. 543-C do CPC, DJ 12/12/2011). 2. Desse modo, os e-

feitos do acórdão em discussão nos presentes autos são erga omnes, a-

brangendo a todas as pessoas enquadráveis na situação fático-jurídica

descrita no julgado, independentemente da competência do órgão pro-

lator. Não fosse assim, haveria graves limitações à extensão e às poten-

cialidades da ação civil pública, o que não se pode admitir. 3. Com rela-

ção à alínea "c" do permissivo constitucional, observa- se que o recurso

especial não logrou demonstrar o dissídio jurisprudencial porquanto coli-

giu precedentes superados pelo aludido recurso representativo da con-

trovérsia. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp

601.989/SC, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em

10/03/2015, DJe 18/03/2015).

- Litigância de Má-Fé:

Art. 17. Em caso de litigância de má-fé, a associação autora e os diretores respon-

sáveis pela propositura da ação serão solidariamente condenados em honorários

advocatícios e ao décuplo das custas, sem prejuízo da responsabilidade por perdas

e danos.

- Despesas Processuais:

Art. 18. Nas ações de que trata esta lei, não haverá adiantamento de custas, emo-

lumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da

associação autora, salvo comprovada má-fé, em honorários de advogado, cus-

tas e despesas processuais.

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3.1 CONCEITO

O conceito de competência está diretamente relacionado com o conceito de jurisdição. Ovídio Baptista e Fábio Luiz Gomes assinalam que “Costuma-se dizer, para definir a competência, que a jurisdição é o poder de julgar, conferido aos juízes e Tribunais, e que a competência é a medida da jurisdição, vale dizer, a porção dela atribuída pela lei a cada magistrado, ou aos Tribunais colegiadas, ou a porções fracionárias destes, para apreciar e julgar determinada causa.”

A competência é a divisão do poder jurisdicional. As regras de competência visam distribuir esse poder entre os órgãos jurisdicionais.

3.2 FIXAÇÃO DA COMPETÊNCIA

Segundo o art. 43 do Novo Código de Processo Civil, a competência é fixada na data da propositura da ação (distribuição da petição inicial):

Art. 43. Determina-se a competência no momento do registro ou da distribuição da petição inicial, sendo irrelevantes as modificações do estado de fato ou de direito ocorridas posteriormente, salvo quando suprimirem órgão judiciário ou alterarem a competência absoluta.

Portanto, é observado o domicílio do réu no dia da distribuição para fins de competência territorial.

3.3 CLASSIFICAÇÃO DAS REGRAS DE COMPETÊNCIA

Conforme o novo Código de Processo Civil a regra geral da competência segue sendo o domicílio do réu:

Art. 46. A ação fundada em direito pessoal ou em direito real sobre bens móveis será proposta, em regra, no foro de domicílio do réu. (...) § 5º A execução fiscal será proposta no foro de domicílio do réu, no de sua residência ou no do lugar onde for encontrado

3.3.1 COMPETÊNCIA INTERNA/COMPETÊNCIA INTERNACIONAL

Trata-se na verdade de conflitos de jurisdição, pois define se a causa deve ser julgada por um juiz brasileiro ou por um juiz estrangeiro.

3.3.2 COMPETÊNCIA CONCORRENTE DA JUSTIÇA BRASILEIRA

Nestes casos, o juiz brasileiro é competente, porém não há a exclusão da possibilidade de demanda idêntica tramitar em outro país.

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As hipóteses de competência brasileira concorrente estão previstas no art. 21 e 22 do NCPC. São as seguintes:

Art. 21. Compete à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações em que: I - o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil; II - no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação; III - o fundamento seja fato ocorrido ou ato praticado no Brasil. Parágrafo único. Para o fim do disposto no inciso I, considera-se domiciliada no Brasil a pessoa jurídica estrangeira que nele tiver agência, filial ou sucursal. Art. 22. Compete, ainda, à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações: I - de alimentos, quando: a) o credor tiver domicílio ou residência no Brasil; b) o réu mantiver vínculos no Brasil, tais como posse ou propriedade de bens, recebimento de renda ou obtenção de benefícios econômicos; II - decorrentes de relações de consumo, quando o consumidor tiver domicílio ou residência no Brasil; III - em que as partes, expressa ou tacitamente, se submeterem à jurisdição nacional

No âmbito da competência comum ou concorrente, para que tenha eficácia na ordem jurídica in-terna, a sentença deverá ser homologada pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme art. 105, I, i da Constituição Federal. Os critérios para a homologação estão previstos no art. 963 do CPC e na Resolução 09/2005 do STJ, conforme:

Art. 963. Constituem requisitos indispensáveis à homologação da decisão: I - ser proferida por autoridade competente; II - ser precedida de citação regular, ainda que verificada a revelia; III - ser eficaz no país em que foi proferida; IV - não ofender a coisa julgada brasileira; V - estar acompanhada de tradução oficial, salvo disposição que a dispense prevista em tratado; VI - não conter manifesta ofensa à ordem pública. Resolução 09/2005 – STJ: Art. 5º Constituem requisitos indispensáveis à homologação de sentença estrangeira: I - haver sido proferida por autoridade competente; II - terem sido as partes citadas ou haver-se legalmente verificado a revelia; III - ter transitado em julgado; e IV - estar autenticada pelo cônsul brasileiro e acompanhada de tradução por tradutor oficial ou juramentado no Brasil.

3.3.3 COMPETÊNCIA EXCLUSIVA DA JUSTIÇA BRASILEIRA E COOPERAÇÃO INTERNACIONAL

Nestes casos, apenas o juiz brasileiro é competente e nas hipóteses de competência exclusiva, não será possível a homologação de sentença estrangeira perante o Superior Tribunal de Justiça.

Os casos de competência brasileira exclusiva estão elencados no art. 23 do NCPC e são os seguintes:

Art. 23. Compete à autoridade judiciária brasileira, com exclusão de qualquer outra: I - conhecer de ações relativas a imóveis situados no Brasil; II - em matéria de sucessão hereditária, proceder à confirmação de testamento particular e ao inventário e à partilha de bens situados no Brasil, ainda que o autor da herança seja de nacionalidade estrangeira ou tenha domicílio fora do território nacional; III - em divórcio, separação judicial ou dissolução de união estável, proceder à partilha de bens situados no Brasil, ainda que o titular seja de nacionalidade estrangeira ou tenha domicílio fora do território nacional.

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Importante ressaltar a ausência de eficácia da litispendência nestes casos, conforme preceitua o art. 24 do Novo Código de Processo Civil

2

Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero3, assim referem:

“1. Ineficácia da Coisa Julgada Estrangeira. Ainda que já tenha transitado em julgado a decisão estrangeira, não tem o juiz brasileiro de extinguir o processo em que tem curso a causa lá decidida, porque a coisa julgada estrangeira só é eficaz no Brasil depois de homologada pelo Superior Tribunal de Justiça (art. 105, I, i, CF c/c arts. 961, CPC e 4º, Resolução 09, de 2005, STJ). Se, enquanto pendente o pedido de homologação, transita em julgado a decisão brasileira, o processo de homologação tem de ser extinto sem resolução do mérito, haja vista a existência de coisa julgada (art. 963, IV, CPC). Ao contrário, homologada a decisão estrangeira pelo Superior Tribunal de Justiça e pendente processo no Brasil sobre a mesma causa, tem o juiz brasileiro de extingui-lo sem resolução de mérito em face da existência de coisa julgada (art. 485, V, CPC)”

Ainda, é preciso referir, conforme indicado no art. 254 do NCPC, que a cláusula de eleição de foro

internacional:

“É admissível, desde que não se trate de ‘competência internacional exclusiva’. Para que surta efeito no Brasil, afastando a jurisdição brasileira, nas hipóteses em que cabível, além de sua regularidade formal (observadas as prescrições da legislação aplicável), é preciso que o interessado manifeste, na contestação (sob pena de preclusão) o interesse em excluir a jurisdição brasileira, invocando o pacto celebrado. Do contrário, torna-se ineficaz a cláusula de eleição de foro e a jurisdição nacional passa a ser competente para a controvérsia.”

5

3.3.4 COMPETÊNCIA INTERNA

Podemos referir a competência interna a partir dos seguintes critérios: competência material (ou em razão da matéria); competência em razão do valor; c competência funcional; e competência territo-rial.

3.3.4.1 COMPETÊNCIA MATERIAL

Neste caso, o critério de definição de competência é tido com base na temática jurídica que envolve a ação. Pode-se citar como exemplo as demandas que versam sobre direito indígena, que devem ser processadas perante a Justiça Federal.

2 Art. 24. A ação proposta perante tribunal estrangeiro não induz litispendência e não obsta a que a autoridade judiciária brasileira conheça da mesma causa e das que lhe são conexas, ressalvadas as disposições em contrário de tratados interna-cionais e acordos bilaterais em vigor no Brasil. Parágrafo único. A pendência de causa perante a jurisdição brasileira não impede a homologação de sentença judicial estrangeira quando exigida para produzir efeitos no Brasil. 3 IN “Novo Código de Processo Civil Comentado”, Revista dos Tribunais, p. 125 4 Art. 25. Não compete à autoridade judiciária brasileira o processamento e o julgamento da ação quando houver cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro em contrato internacional, arguida pelo réu na contestação. § 1o Não se aplica o dispos-to no caput às hipóteses de competência internacional exclusiva previstas neste Capítulo. § 2o Aplica-se à hipótese do caput o art. 63, §§ 1º a 4º. 5 Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, “Novo Código de Processo Civil Comentado”, Revista dos Tribunais, p. 125.

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3.3.4.2 COMPETÊNCIA EM RAZÃO DO VALOR

Os juizados especiais estaduais têm competência para julgar as causas de valor inferior ou igual a 40 salário mínimos, tendo essa regra caráter relativo, ficando a critério do autor se prefere que a ação tramite no juizado especial ou em uma vara comum. Entretanto, nos juizados especiais federais e nos juizados especiais da fazenda pública estadual e municipal, a competência é absoluta para as causas com valor inferior ou igual 60 salários mínimos, exceto as ações que discutem a respeito de bens imóveis da União (Lei 10.259/01).

3.3.4.3 COMPETÊNCIA FUNCIONAL

A competência funcional caracteriza-se pela competência que juízes e tribunais possuem dentro do mesmo processo. Por exemplo, a competência recursal, via de regra, pertence aos tribunais.

3.3.4.4 COMPETÊNCIA TERRITORIAL

O critério de competência territorial indica que, via de regra, as ações devem ser propostas no foro do domicílio do réu. Essa regra tem caráter relativo, podendo ser alterada pelas partes.

Nas ações contra a União, por exemplo o foro pode ser do autor, do Distrito Federal, local do ato ou fato, ou situação do bem imóvel, a critério do autor. Quando se tratar de ações reais imobiliárias, o foro competente é o da situação do bem imóvel, sendo essa regra de caráter absoluto

3.4 PERPETUATIO JURISDICIONIS

Importante ressaltar que no novo Código perpetua o princípio da perpetuatio jurisdictionis, já que a redação do art. 43 do Código de Processo Civil mantém a determinação de que após a fixação da competência são irrelevantes as alterações de fato e de direito.

Conforme Nelson Nery Junior “A norma institui a regra da perpetuação da competência (perpetuatio iurisdictionis), com a finalidade de proteger a parte (autor ou réu), no sentido de evitar a mudança do lugar do processo toda vez que houver modificações supervenientes, de fato ou de direito, que pudessem, em tese, alterar a competência. Estas modificações são irrelevantes para a determinação da competência, que é fixada quando da propositura da ação. Só incide a regra se o juízo for competente, pois não há estabilização da competência em juízo incompetente.”

3.5 COMPETÊNCIA ABSOLUTA E RELATIVA

3.5.1 NOÇÕES GERAIS

A competência absoluta diz respeito às regras de ordem pública e não pode ser alterada por vontade das partes, já a competência relativa diz respeito às regras particulares, podendo, portanto, ser alterada pelas partes.

Conforme preceituam os artigos 62 e 63 do Novo Código de Processo Civil, a competência em razão da matéria será sempre absoluta. Já a competência em razão do valor e do território é relativa:

Art. 62. A competência determinada em razão da matéria, da pessoa ou da função é inderrogável por convenção das partes. Art. 63. As partes podem modificar a competência em razão do valor e do território, elegendo foro onde será proposta ação oriunda de direitos e obri-gações § 1

o A eleição de foro só produz efeito quando constar de instrumento

escrito e aludir expressamente a determinado negócio jurídico. § 2

o O foro contratual obriga os herdeiros e sucessores das partes.

§ 3o Antes da citação, a cláusula de eleição de foro, se abusiva, pode ser

reputada ineficaz de ofício pelo juiz, que determinará a remessa dos autos ao juízo do foro de domicílio do réu. § 4

o Citado, incumbe ao réu alegar a abusividade da cláusula de eleição de

foro na contestação, sob pena de preclusão.

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3.5.2 CARACTERÍSTICAS E EFEITOS DA INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA E RELATIVA

3.5.2.1 INCOMPETÊNCIA RELATIVA

Se no antigo CPC, o instrumento processual para alegar a incompetência relativa era a exceção de incompetência, no novo Código de Processo Civil tanto esta quanto a incompetência absoluta deverão ser alegadas como questão preliminar de contestação

Importante ressaltar que prorrogar-se-á a competência relativa se o réu não alegar a incompetên-cia em preliminar de contestação. Ainda, poderá o Ministério Público nas causas em que atuar alegar incompetência relativa.

3.5.2.2 INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA

A incompetência absoluta será alegada em preliminar de contestação (art. 64 do CPC), podendo ser trazida a qualquer tempo ou grau de jurisdição e deve ser conhecida de ofício pelo juiz (art. 64, §1º) .

A competência absoluta não pode ser alterada por cláusula de eleição de foro (art. 111 do CPC).

Reconhecida a incompetência absoluta, os autos serão remetidos ao juízo competente e salvo de-cisão judicial em sentido contrário, os efeitos de decisão proferida pelo juízo incompetente serão conser-vados, até que outra decisão seja proferida, se for o caso, pelo juízo competente.

3.7 MODIFICAÇÃO DE COMPETÊNCIA

3.7.1 NOÇÕES GERAIS

Ocorre a modificação de competência quando um Juízo incompetente, a princípio, passa a ser competente para processar e julgar a demanda.

3.7.2 CONEXÃO

Duas ou mais ações são consideradas conexas quando o pedido ou a causa de pedir, elementos individualizadores da demanda (ao lado do elemento partes), forem idênticos.

Nesse sentido: “assim sendo, exceto nos casos em que já houver sido prolatado sentença, os feitos serão reunidos para prolação de decisão conjunta. Visa-se, dentre outros, obter-se unidade de convicção acerca das ações conexas, valor destacado pelo NCPC que, inclusive, a despeito da inexistência de conexão em sentido estrito entre certas demandas (“que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente”) para julgamento conjunto.

6”

Importante ressaltar, conforme sumulado pelo STJ, que a conexão não determina a reunião dos processos, se um deles já foi julgado (S. 235).

Ainda, convém referir que Fredie Didier Jr, assim comenta? “O §3º do art. 55 do CPC traz outra hipótese de conexão, mais aberta e, por isso, mais flexível. A abertura do enunciado normativo parece atender a antiga e generalizada reclamação doutrinária, que apontava a insuficiência, no particular, do CPC-1973, que possuía apenas enunciado semelhante ao atual art. 55. Problema resolvido.

7”

6 Novo código de processo civil anotado / OAB. – Porto Alegre : OAB RS, 2015, p. 87 7 Curso de Direito Processual Civil, Fredie Didier Jr., 17ª edição, página 232:

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3.7.3 CONTINÊNCIA

Há continência entre duas ou mais ações quando, face à identidade de partes e causa de pedir, mostra-se o pedido formulado numa delas sobreposto (“mais amplo”) ao formulado em outra.

Ressalte-se que no novo Código de Processo Civil, quando houver continência e a ação continente tiver sido proposta anteriormente, no processo relativo à ação contida será proferida sentença sem resolução de mérito, caso contrário, as ações serão necessariamente reunidas.

Neste sentido, Marinoni, Arenhardt e Mitidiero8:

“Reunião das Causas. Na continência, o código optou por dar tratamento intermediário, situado entre a conexão e a litispendência. Assim, se a ação continente (mais ampla) tiver sido deduzida anteriormente, a ação seguinte (contida), porque discute as mesmas questões já apresentadas na outra causa, deve ser extinta sem resolução do mérito. Se a primeira demanda proposta é a contida (menos ampla), então aplica-se o regime da conexão, devendo as causas ser reunidas perante o juiz prevento (art. 58, CPC)” “Obrigatoriedade. Na continência, a reunião de causas, quando cabível, é obrigatória. Excetua-se, porém, a hipótese em que uma das causas já foi julgada”

Designa-se continente a demanda que possui o pedido mais amplo, ensejador da sobreposição que justifica o reconhecimento da continência. Denomina-se ação contida, por sua vez, aquela que, a despeito da identidade de partes e causa de pedir, possui pedido apenas parcial se comparado ao formulado em sede de ação continente. 2. Quando a ação continente (pedido mais largo) houver sido proposta primeiro, a ação contida será, necessariamente, extinta sem resolução de mérito. Caso contrário, tendo a ação contida se iniciado anteriormente, impõe-se a reunião dos feitos. Trata-se, pois, de norma cogente, escapando ao juízo de conveniência dos julgadores envolvidos

3.7.4 FORO DE ELEIÇÃO

As partes podem, de comum acordo, modificar a competência em razão do valor e do território, escolhendo o foro onde será proposta ação oriunda de direitos e obrigações. Neste sentido, a eleição de foro só produzirá efeito quando constar de instrumento escrito e este aludir expressamente a determi-nado negócio jurídico. O Novo Código de Processo Civil pactua que o foro contratual eleito obriga os herdeiros e sucessores das partes.

Importa ressaltar, ainda, que antes da citação, a cláusula de eleição de foro, se abusiva, pode ser reputada ineficaz de ofício pelo juiz, que determinará a remessa dos autos ao juízo do foro de domicílio do réu.

3.7.5 PRORROGAÇÃO DA COMPETÊNCIA

A prorrogação de competência acontecerá quando o réu não alegar a incompetência relativa em preliminar de contestação

8 Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, em sua obra “Novo Código de Processo Civil Comentado”, Revista dos Tribunais, p. 143

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Frise-se que, no caso de incompetência relativa, o Ministério Público poderá alegá-la nas causas em que estiver atuante.

3.8 ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA

O Novo CPC traz em seu artigo 947 e parágrafos o Incidente de Assunção de Competência.O caput do artigo 947 do Novo CPC faz a previsão das hipóteses em que se admitirá a propositura do inciden-te.Depreende-se do leitura do caput que o incidente só ocorrerá em casos de relevante questão de direi-to, que sejam de grande repercussão social e onde ainda não existam múltiplos processos sobre a maté-ria. Em razão de interesse que ultrapasse o das partes. Uma vez ocorrendo as hipóteses de cabimento do incidente, o relator deverá propor, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, do Ministério Público ou Defensoria Pública, que o recurso, a remessa necessária ou o processo de competência origi-nária seja julgado pelo órgão colegiado que o regimento indicar, como pode-se verificar no §1º do art. 947 do Novo CPC.

O §2º do art. 947 do Novo CPC dispõe que quando for proposto o Incidente de Assunção de Com-petência, o órgão colegiado ao qual foi remetido o recurso, a remessa necessária ou o processo originá-rio, decidirá sobre a existência ou não de interesse público ali discutido. Uma vez reconhecido o interes-se, proferirá acórdão sobre a questão.

O Novo CPC trouxe previsão inovadora no §3º, o qual dispõe ser vinculante o acordão proferido no Incidente de Assunção de Competência, devendo ser observado por todos os juízes e órgão fracioná-rios. Contudo, este efeito vinculante não se verifica quando ocorrer revisão de tese.Já o §4º reflete o caráter preventivo do Novo CPC, o qual determina que o Incidente de Assunção de Competência também deverá ser proposto quando for conveniente a prevenção ou a composição de divergência entre câmaras e turmas do mesmo tribunal.

A ação provoca a prestação jurisdicional e atividade do órgão judicial. O exercício da ação não fica vinculado ao resultado do processo. O direito de ação é autônomo porque consiste em ser ele outro direito, distinto do direito material disputado entre os litigantes.

Do monopólio da justiça decorrem:

a) obrigação de prestar a tutela jurídica aos cidadãos;

b) um verdadeiro e distinto direito subjetivo – o direito de ação – oponível ao Estado-juiz – direito à jurisdição.

Direito de Ação natureza pública refere-se à atividade oficial do Estado.

Conforme ensina Liebman: “A ação é, portanto, o direito subjetivo que consiste no poder de produzir o evento a que está condicionado o efetivo exercício da função jurisdicional. (...) A ação é um direito abstrato (direito à composição do litígio), que atua independentemente da existência ou inexistência do direito substancial que se pretende fazer reconhecido e executado”.

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4.1 TEORIAS DA AÇÃO

Teorias distintas tentaram explicar o significado de ação e, cada uma a sua maneira, contribuiu para o desenvolvimento do instituto. Analisa-se, abaixo, as principais:

a) Teoria Civilista (ou Teoria Imanentista): Defendida por Savigny, a meados do século XIX. Para ele, a ação é o próprio direito material. Há aqui uma similitude entre o direito de ação e o direito material.

b) Teoria Concreta da Ação: ter direito de ação, é ter direito a uma sentença favorável. É o direito concreto à tutela jurídica. Na ação improcedente não haveria direito de ação, pois o direito de ação só existiria pela sentença favorável. É direito autônomo e concreto.

Ainda na teoria concreta filia-se a doutrina de Giuseppe Chiovenda, que tem a ação como direito potestativo. Para esta teoria, a ação é ter direito a uma sentença favorável dirigida em face do adversário fazendo atuar a vontade da lei. “Segundo Chiovenda, somente é investido da ação aquele cuja demanda é acolhida. Portanto, a ação é um poder em face do adversário que depende de uma sentença favorável, isto é, que necessita de uma sentença que declare a vontade da lei, uma vez que é dela que serão projetados efeitos jurídicos.

9”

c) Teoria Abstrata da Ação: : autonomia do direito de ação em relação ao direito material. O direito de agir é autônomo e abstrato, pois independe do reconhecimento do direito materia . Exercer ação é ter direito ao processo, a uma sentença. Ter direito a uma sentença de qualquer conteúdo. “O que obriga o réu a participar do processo é o direito de agir, que nada tem a ver com o direito material.” Portanto, a Teoria Eclética, adotada pelo CPC, parte desta concepção, sendo a ação o direito ao processo e ao julgamento de mérito, sendo favorável ou desfavorável.

d) Teoria Eclética: mescla duas idéias, a teoria da ação como direito abstrato e a ação como direito abstrato. Ausente as condições da ação (possibilidade jurídica do pedido, interesse de agir e legitimidade ad causam), o processo é extinto sem julgamento do mérito, assim não haverá atividade jurisdicional, não haverá exercício do direito de ação, não haveria ‘ação’. Na ação julgada improcedente (mérito) há exercício do direito de ação, conforme Liebman

10:

“Ausente uma destas condições, verifica-se o que, na exata expressão tradicional, se qualifica de carência de ação e o juiz deve negar-se a prover sobre o mérito da demanda. Neste caso não haverá verdadeiro exercício da jurisdição”

O direito de ação é, portanto, autônomo porque consiste em ser ele outro direito, distinto do

direito material disputado entre os litigantes.

4.2 CONDIÇÕES DA AÇÃO

Pode-se definir três condições genéricas da ação, na teoria majoritariamente defendida ao longo dos anos de vigência do antigo CPC. São elas:

d. Legitimidade;

e. Possibilidade jurídica do pedido;

f. Interesse de agir.

9 Marinoni, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. RT, 3ª ed., p. 168. 10 Enrico Tullio Liebman, “L’azione nella teoria del processo civile”, Problemi del processo civile, Morano, s.d., p. 46-47

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4.2.1 LEGITIMIDADE AD CAUSAN

Legitimidade é a aptidão para a condução de um processo em que se discute determinada situação jurídica. Para saber se tem ou não legitimidade, é preciso averiguar a situação jurídica discutida em juízo. Não há como saber se o sujeito é legítimo ou não sem examinar a relação discutida. O sujeito pode ser legítimo para um assunto e ilegítimo para outro assunto, em face da situação discutida.

4.2.1.1 CLASSIFICAÇÕES DA LEGITIMIDADE:

Primeira:

a) Legitimidade Exclusiva: a legitimação é atribuída a somente um sujeito.

b) Legitimidade Concorrente: a legitimação é atribuída a mais de um sujeito, sendo que mais de uma pessoa é legítima para discutir determinada relação em juízo. É também chamada de co-legitimação. Exemplo: credores solidários; condôminos; sujeitos do Art. 103/CF para propor ADI.

Segunda:

a) Legitimidade Ordinária: sempre que alguém vai a juízo defendendo em nome próprio direito próprio. Há uma coincidência entre o legitimado e o sujeito da relação jurídica discutida. É a regra.

b) Legitimidade Extraordinária: quando a lei atribui a alguém o direito de discutir o direito de outra pessoa em juízo, defendendo em nome próprio direito alheio. É o que acontece nas ações coletivas, onde o legitimado está em juízo defendendo interesses da coletividade.

b.1. Considerações sobre a legitimação extraordinária.

a) há casos em que o sujeito está em juízo discutindo interesse próprio e alheio. É uma situação ambivalente. É o que acontece com o credor solidário e o condômino, que defendem um direito que é deles, junto com outras pessoas.

b) a doutrina costuma referir a outra expressão quando cuida de legitimação extraordinária – “Substituição Processual” – esta e legitimação extraordinária costumam ser utilizadas como sinônimos. Alguns doutrinadores porém, preferem distinguir essas expressões, colocando a substituição processual como espécie de legitimação extraordinária. Seria uma legitimação extraordinária que ocorre quando o legitimado extraordinário estiver sozinho em juízo, defendendo o interesse de outra pessoa, sendo ele um substituto processual. Se estiver em juízo em litisconsórcio com o titular do direito, não haveria substituição processual. Exemplo: alimentos para o menino. Se o Ministério Público vai sozinho pleitear alimentos para o menino, será substituto processual. Mas se for junto com o menino, será um legitimado extraordinário, sendo litisconsorte do menino.

c) aprenderemos a distinguir substituição processual de sucessão processual. Na sucessão processual, ocorre uma mudança de sujeitos no processo, saindo um sujeito, entrando o outro. Por exemplo: o réu morreu, entra o espólio.

d) aprenderemos a distinguir substituição processual de representação processual. Na representação processual, alguém está em juízo discutindo interesse de outra pessoa só que não em nome próprio, mas sim em nome alheio. Age em nome alheio defendendo direito alheio. Exemplo: menininho vai a juízo representado pela mãe. A parte é o menininho, e a mãe é a representante.

b.2. Características da Legitimação Extraordinária:

a) tanto a substituição processual quanto a legitimação extraordinária, têm que derivar da Lei. Consequentemente, não pode haver legitimação extraordinária por força de contrato. Art. 6/CPC 73 e art. 18, caput, do NCPC.

b) o substituto processual é parte. Consequentemente paga as custas, pode ser multado por litigância de má-fé, é em relação a ele que se vai examinar a competência em razão da pessoa.

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c) a falta de legitimação extraordinária implica decisão que não examina o mérito da causa. O juiz apenas diz que o sujeito não pode discutir tal direito. Tanto é assim que há uma tendência legislativa e doutrinária de fazer com que a falta de legitimação extraordinária não gere a extinção do processo. Ao invés de extinguir, o juiz promova uma sucessão processual, trazendo quem possa para prosseguir no processo. Isso acontece na Ação Coletiva. Intimam-se outros legitimados para aproveitar a causa.

d) tradicionalmente, se diz que a coisa julgada proveniente de um processo conduzido por um substituto processual atinge o substituído, sendo uma exceção a regra de que a coisa julgada somente atinge as partes do processo. Pode ser que o legislador excepcione isso. A exceção é não atingir. Mas para isso é preciso autorização expressa da Lei, como o fez nas causas coletivas. Ação coletiva não prejudica a coletividade, só beneficia.

4.2.2. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO

O pedido deverá ser juridicamente possível, devendo este ser previsto em lei ou não ser vedado por ela. Neste sentido, possibilidade jurídica do pedido significa que haverá ação se o pedido formulado puder ser, em tese, acolhido.

4.2.3. INTERESSE DE AGIR

O interesse processual tem três requisitos, conforme preceitua a doutrina majoritária, quais sejam: a necessidade, a adequação e a utilidade. Sendo assim, há interesse de agir quando o processo for útil e necessário. É preciso que o processo possa propiciar algum proveito para a parte, para o demandante. Se o pedido, mesmo acolhido, não puder propiciar qualquer proveito ao sujeito, será inútil o processo. É preciso também a demonstração de que a utilidade almejada só pode ser alcançada pelo processo. Tem que demonstrar que o processo é necessário para alcançar aquilo que se deseja. Tem que demonstrar a necessidade de se ir a juízo.

Há um fenômeno chamado de “Ações Necessárias”, sendo aquelas ações que veiculam direitos que só podem ser exercidos em juízo. Nessas ações, nem se discute a necessidade da ação. Exemplos: Anulação de contrato; Interdição; Falência; Rescisória de Sentença; Exclusão de Herdeiro.

Dica: toda ação necessária é constitutiva.

4.3 CONSEQUÊNCIAS DA AUSÊNCIA DE UMA DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO

No CPC/73, caso alguma das condições supracitadas ficasse ausente, estaríamos diante da carência de ação, perpetuada pelo art. 267, VI. A consequência da carência de ação, portanto, seria a extinção do processo sem resolução do mérito.

Semelhante dispositivo é encontrado na forma do art. 485, inc. VI, do Novo Código de Processo Civil. Entretanto, é importante pontuar que no Novo CPC não há mais menção “à possibilidade jurídica do pedido” como hipótese que leva a uma decisão de inadmissibilidade do processo.

Conforme Fredie Didier JR:

Consagra-se o entendimento, praticamente unânime até então, de que a impossibilidade jurídica do pedido é causa de decisão de mérito e não de inadmissibilidade. Não há mais menção a ela, também, no rol de hipóteses de indeferimento da petição inicial (art. 305, NCPC). Trata-se de proposta que foi muito bem aceita na doutrina brasileira. Extingue-se essa categoria jurídica, e já não era sem tempo. A segunda alteração silenciosa é mais importante.e que, por isso, justificava a permanência de estudos doutrinários ao seu respeito. O texto proposto não se vale da expressão “condição da ação”. Apenas se prescreve que, reconhecida a ilegitimidade ou a falta de interesse, o órgão jurisdicional deve proferir decisão de

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inadmissibilidade. Retira-se a menção expressa à categoria “condição da ação” do único texto normativo do CPC que a previa esse aspecto do projeto ainda não foi percebido: nem a Comissão que elaborou a proposta o apresenta como uma das inovações sugeridas, muito menos a doutrina que vem comentando o projeto o tem examinado. A prevalecer a proposta, não haverá mais razão para o uso, pela ciência do processo brasileira, do conceito “condição da ação”. A legitimidade ad causam e o interesse de agir passarão a ser explicados com suporte no repertório teórico dos pressupostos processuais.

Neste diapasão, o Novo Código de Processo Civil inclina-se à Teoria da Apresentação, capitaneada por Cândido Rangel Dinamarco, o qual afirma

11:

Não basta que o demandante descreva formalmente uma situação em que estejam presentes as condições da ação. É preciso que elas existam realmente. Uma condição da ação é sempre uma condição da ação e por falta dela o processo deve ser extinto sem julgamento de mérito, quer o autor já descreva uma situação em que ela falte, quer dissimule a situação e só mais tarde os fatos revelem ao juiz a realidade. Seja ao despachar a petição inicial, ou no julgamento conforme o estado do processo (arts. 329-331) ou em qualquer outro momento intermediário do procedimento – ou mesmo afinal, no momento de proferir sentença – o juiz é proibido de julgar o mérito quando se convence de que a condição falta

Cabe referir, por fim, que se não reconhecida a legitimidade ad causam ou o interesse de agir, o juiz conhecerá a matéria de ofício, em qualquer tempo e grau de jurisdição, enquanto não ocorrer o trânsito em julgado.

5.1PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS

Como leciona Humberto Theodoro Jr., não se confundem os pressupostos processuais com as con-dições da ação. Os pressupostos são aquelas exigências legais sem cujo atendimento o processo, como relação jurídica, não se estabelece ou não se desenvolve validamente. E, em consequência, não atinge a sentença que deveria apreciar o mérito da causa.

São, em suma, requisitos jurídicos para a validade da relação processual. Já as condições da ação são requisitos a observar, depois de estabelecida regularmente a relação processual, para que o juiz possa solucionar a lide (mérito). São, pois, requisitos de sua eficácia.

Os pressupostos, portanto, são dados reclamados para análise de viabilidade do exercício do direi-to de ação sob o ponto de vista estritamente processual. Já as condições da ação importam o cotejo do direito de ação concretamente exercido com a viabilidade abstrata da pretensão de direito material.

Os pressupostos, em suma, põem a ação em contato com o direito processual, e as condições de procedibilidade põem-na em relação com as regras do direito material.

Inobservados, porém, os pressupostos processuais, ou as condições da ação, a missão da atividade jurisdicional estará frustrada, pois ocorrerá a extinção prematura do processo, sem resolução de mérito ou composição do litígio.

11 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. 5ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 316

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Todo juízo, independentemente do seu grau de jurisdição, é composto pelo juiz e pelos órgãos

auxiliares, que são formados pelos serventuários (escrivães, oficiais de justiça, escreventes, técnicos e

etc).

5.1 O JUIZ: PODERES, DEVERES E RESPONSABILIDADES

Ao juiz cabe o importante papel de dirigir o processo; o juiz como diretor do processo. A direção deve ser exercida com segurança, firmeza, imparcialidade, urbanidade, prudência e humildade. O papel do diretor do processo não confere ao juiz poder hierárquico sobre o advogado e o membro do Ministério Público. Juiz, advogado e Ministério Público têm, no processo, independência entre si e devem tratar-se reciprocamente com urbanidade.

O magistrado não pode ter nem participação interessada, nem alheamento, nem hipertrofia, nem ausência, devendo, pois, estar em posição equidistante das partes, garantindo-lhes igualdade de trata-mento. O ato do juiz que causar gravame à parte, Ministério Público ou interessado é passível de reexame por meio de recurso.

O juiz possui o dever de buscar a rápida e justa solução da lide, se possível com a conciliação, bem como de coibir qualquer ato contrário à dignidade da justiça.

Importante lembrar que, por força do princípio da inafastabilidade da apreciação dos órgãos juris-dicionais, o juiz não se exime de sentenciar ou decidir em virtude de eventual obscuridade ou lacuna na lei, podendo, nestes casos, recorrer à analogia, aos costumes, aos princípios gerais de direito e, nos casos previstos em lei, à equidade. Trata-se de ônus do monopólio do poder-dever de jurisdição, ou seja, uma vez que o Estado toma para si a função de solucionar os conflitos, coibindo o exercício da autotutela por parte do particular, passa a ter o dever de fazê-lo, não podendo eximir-se.

Outro importante princípio norteador da atuação do juiz é o da inércia do poder judiciário, assim sendo, salvo situações excepcionais, o juiz deverá decidir a lide nos limites em que foi proposta, não sendo possível conhecer de questões que à parte incumbia suscitar e não o fez.

Ressalta-se que a função do juiz é a de buscar a verdade real dos fatos, visando à justa aplicação do Direito. Para tal, pode determinar, de ofício ou a requerimento da parte, a produção de quaisquer provas que julgar necessárias à instrução do processo, bem como indeferir a produção daquelas que julgar inúteis ou meramente protelatórias.

O magistrado poderá apreciar as provas produzidas livremente, devendo, entretanto, fundamen-tar suas decisões indicando os motivos que lhe formaram o convencimento. Tal obrigatoriedade de fun-damentação tem por objetivo um melhor controle do exercício da função jurisdicional, devendo o juiz responder por perdas e danos nos casos em que proceder com dolo ou fraude, ou quando, sem justo motivo, retardar o processo.

5.2 IMPEDIMENTO E SUSPEIÇÃO

Impedimento e suspeição representam situações distintas, geradoras de consequências igualmente distintas.

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De acordo com Hélio Tornaghi, o impedimento “é a circunstância que priva o juiz do exercício de suas funções em determinado caso, dada a sua relação com o objeto da causa”, enquanto a suspeição, por sua vez, “é a desconfiança, a dúvida, o receio de que o juiz, ainda quando honesto e probo, não terá condi-ções psicológicas de julgar com isenção dada a sua relação com qualquer das partes”12.

O impedimento se apresenta como verdadeira proibição, imposta ao juiz, de oficiar no processo em que se encontre presente qualquer das circunstâncias apontadas no artigo 134 do CPC/1973. Já no NCPC, tal dispositivo encontra-se no artigo 144, in verbis:

Há impedimento do juiz, sendo-lhe vedado exercer suas funções no pro-cesso: I - em que interveio como mandatário da parte, oficiou como perito, funcio-nou como membro do Ministério Público ou prestou depoimento como tes-temunha; II - de que conheceu em outro grau de jurisdição, tendo proferido decisão; III - quando nele estiver postulando, como defensor público, advogado ou membro do Ministério Público, seu cônjuge ou companheiro, ou qualquer parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive; IV - quando for parte no processo ele próprio, seu cônjuge ou companheiro, ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive; V - quando for sócio ou membro de direção ou de administração de pessoa jurídica parte no processo; VI - quando for herdeiro presuntivo, donatário ou empregador de qualquer das partes; VII - em que figure como parte instituição de ensino com a qual tenha rela-ção de emprego ou decorrente de contrato de prestação de serviços; VIII - em que figure como parte cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge, companheiro ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, mesmo que patrocinado por advoga-do de outro escritório; IX - quando promover ação contra a parte ou seu advogado. § 1

o Na hipótese do inciso III, o impedimento só se verifica quando o defen-

sor público, o advogado ou o membro do Ministério Público já integrava o processo antes do início da atividade judicante do juiz. § 2

o É vedada a criação de fato superveniente a fim de caracterizar impedi-

mento do juiz. § 3

o O impedimento previsto no inciso III também se verifica no caso de

mandato conferido a membro de escritório de advocacia que tenha em seus quadros advogado que individualmente ostente a condição nele prevista, mesmo que não intervenha diretamente no processo.

Vale dizer, deve ele abster-se de participar da relação processual.

O impedimento tem natureza de objeção processual, na medida em que pode ser alegado a qualquer tempo pela parte e deve, mesmo, ser reconhecido de ofício pelo juiz. Representa, portanto, obstáculo absoluto, intransponível ao exercício da função jurisdicional pelo juiz assim incompatibilizado, invalidando a sentença por ele proferida, conforme art. 966, II do NCPC.

A suspeição, por sua vez, recomenda ao juiz o afastamento da presidência do processo sempre que se verificarem quaisquer dos motivos arrolados pelo artigo 145, in verbis:

Há suspeição do juiz: I - amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes ou de seus advogados; II - que receber presentes de pessoas que tiverem interesse na causa antes ou depois de iniciado o processo, que aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa ou que subministrar meios para atender às despesas do litígio;

12 TORNAGHI, Hélio. Comentários ao Código de Processo Civil, vol. I. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1974. p. 416-417.

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III - quando qualquer das partes for sua credora ou devedora, de seu cônju-ge ou companheiro ou de parentes destes, em linha reta até o terceiro grau, inclusive; IV - interessado no julgamento do processo em favor de qualquer das par-tes. § 1

o Poderá o juiz declarar-se suspeito por motivo de foro íntimo, sem ne-

cessidade de declarar suas razões. § 2

o Será ilegítima a alegação de suspeição quando:

I - houver sido provocada por quem a alega; II - a parte que a alega houver praticado ato que signifique manifesta aceita-ção do arguido.

Por fim, é imprescindível lembrar que os casos de impedimento e de suspeição não se aplicam tão-somente ao juiz, uma vez que o art. 138 determina que também promotores de justiça, serventuários, peritos e intérpretes podem ser considerados suspeitos ou impedidos.

As partes e o juiz são os sujeitos do processo. Segundo Humberto Theodoro Júnior, “pode-se de-finir a parte para o direito processual como a pessoa que pede ou perante a qual se pede, em nome pró-prio, a tutela jurisdicional.” Nesse contexto, o autor ou demandante é aquele que invoca a tutela jurisdi-cional, tomando a posição ativa de instaurar a relação processual. E o réu ou demandado é aquele que fica na posição passiva, sujeito à relação processual instaurada pelo autor.

São capazes para estar em juízo aqueles que têm personalidade jurídica, tanto pessoas físicas (cuja personalidade jurídica começa com o nascimento com vida, nos termos do art. 2º do CC) como pessoas jurídicas (cuja personalidade jurídica inicia com o registro de seus atos constitutivos na repartição competente e na forma da lei, consoante caput do art. 45 do CC).

6.1 PARTES

6.1.1 REPRESENTAÇÃO E ASSISTÊNCIA

Conforme preceitua o art. 70 do NCPC, toda pessoa que se encontre no exercício de seus direitos tem capacidade para estar em juízo. Caso a parte não tenha capacidade para estar em juízo, necessita ser representada ou assistida.

No caso de menor impúbere (art. 3º, I, CC) ser parte no processo, deverá ser representado por um de seus pais.

Se for menor púbere (art. 4, I, CC), será assistido por um de seus pais.

Caso se trate de menor, púbere ou impúbere, que não tiver pais (art. 1728, CC), será representado ou assistido por tutor.

No caso de absoluta ou relativamente incapaz, por outras causas que não a menoridade (art. 1767, CC), haverá representação ou assistência por curador. A fim de que possa ser nomeado curador para representar o incapaz em todos os atos da vida civil, é imprescindível um processo de interdição, no qual será constatada a sua incapacidade civil.

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No entanto, caso o incapaz (por outra causa que não a menoridade) seja parte em determinado processo e ainda não tenha curador, o juiz poderá lhe nomear um curador especial, que desempenhará a função de representante do incapaz somente para o processo em que foi nomeado.

6.1.2 CURADOR ESPECIAL

O curador especial é um representante legal nomeado ao incapaz somente para determinado processo. Ou seja, não se deve confundir curador especial com curador (nomeado para representar o incapaz num processo de interdição). O curador especial, diferentemente do curador, não se torna representante legal para todo e qualquer ato da vida civil, tampouco para outros processos para os quais não foi nomeado. Trata-se de um curador “ad hoc” somente para o processo específico em que foi nomeado.

Será nomeado curador especial nas seguintes hipóteses:

a) ao incapaz, se não tiver representante legal ou se os interesses deste colidirem com os daque-le, enquanto durar a incapacidade;

b) ao réu preso revel, bem como ao réu revel citado por edital ou com hora certa, enquanto não for constituído advogado.

A curadoria especial é uma das funções institucionais da Defensoria Pública (art. 4º, inc. XVI, da Lei Complementar 80/94).

13

Se o executado for citado por edital ou por hora certa, e permanecer revel, o curador especial nomeado terá legitimidade para apresentação de embargos, conforme súmula 196 do STJ, que assim prevê: “Ao executado que, citado por edital ou por hora certa, permanecer revel, será nomeado cura-dor especial, com legitimidade para apresentação de embargos”.

6.1.3 SUCESSÃO PROCESSUAL

A sucessão processual ocorre quando, voluntariamente e nos casos permitidos em lei, há a entrada de uma parte no processo no lugar de outra, a qual é excluída do processo.

O art. 109, caput, do NCPC prevê que a alienação do direito ou coisa litigiosa, no curso do proces-so, não altera a legitimidade das partes. Isso quer dizer que o alienante (que é parte no processo) passa a atuar no processo como substituto processual do adquirente, pois passa a defender em nome próprio o direito material alheio (do adquirente).

O § 1º do art. 109 do NCPC prevê que o adquirente ou o cessionário do direito ou coisa litigiosa somente poderá ingressar no lugar da parte se houver o consentimento da parte contrária e do alienante ou cedente. Nesse tocante, é importante ressaltar que, consoante entendimento pacífico da doutrina, quando o adquirente entra no lugar do alienante, ocorre a sucessão processual (ingresso de alguém no lugar da parte do processo, excluindo-se esta). De outro lado, se a parte contrária não consentir, o ad-quirente ou o cessionário poderá intervir no processo como assistente do alienante ou do cedente (§ 2º). Neste caso em que o alienante ou o cedente continuam no processo, passam a atuar em nome próprio defendendo direito alheio (do adquirente ou cessionário), razão pela qual passam a ser substitutos pro-cessuais.

Outro típico exemplo de sucessão processual é aquele que ocorre quando uma das partes do processo vem a falecer. Neste caso, haverá o ingresso do espólio ou dos herdeiros do falecido no seu lugar. Assim, ocorre a sucessão processual, conforme o art. 110 do NCPC.

13 “Art. 4º São funções institucionais da Defensoria Pública, dentre outras: (...) XVI – exercer a curadoria especial nos casos previstos em lei;”

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6.1.4 AUTORIZAÇÃO OU CONSENTIMENTO

Trata-se da forma prevista em lei para que um cônjuge manifeste o seu consentimento a fim de que o outro proponha ação real imobiliária, ou ação possessória, quando exigido legalmente, conforme preceitua o art. 73, in verbis:

Art. 73. O cônjuge necessitará do consentimento do outro para propor ação que verse sobre direito real imobiliário, salvo quando casados sob o regime de separação absoluta de bens. § 1

o Ambos os cônjuges serão necessariamente citados para a ação:

I - que verse sobre direito real imobiliário, salvo quando casados sob o re-gime de separação absoluta de bens; II - resultante de fato que diga respeito a ambos os cônjuges ou de ato pra-ticado por eles; III - fundada em dívida contraída por um dos cônjuges a bem da família; IV - que tenha por objeto o reconhecimento, a constituição ou a extinção de ônus sobre imóvel de um ou de ambos os cônjuges. § 2

o Nas ações possessórias, a participação do cônjuge do autor ou do réu

somente é indispensável nas hipóteses de composse ou de ato por ambos praticado. § 3

o Aplica-se o disposto neste artigo à união estável comprovada nos autos.

A consequência legal para a ausência de autorização é a invalidade do processo. No entanto, se a petição inicial não vier acompanhada da autorização do cônjuge para propor a ação, o juiz não deverá de plano extinguir o processo sem resolução de mérito (indeferir a petição inicial), senão intimar a parte para juntá-la aos autos.

14

6.2 LITISCONSÓRCIO

Quando se tem dois ou mais autores e/ou dois ou mais réus, está-se diante de uma situação de litisconsórcio.

Litisconsórcio não é a pluralidade de partes, mas a pluralidade de sujeitos parciais em um dos pólos, ou seja, mais de um autor ou mais de um réu em um dos pólos. Um autor e um réu, cada um no seu respectivo pólo, configura pluralidade de partes, e não litisconsórcio.

O litisconsórcio, portanto, é a pluralidade de sujeitos ativos ou passivos no processo, e não a pluralidade de partes. A doutrina adota quatro critérios de classificação de litisconsórcio, quais sejam: a) quanto à posição; b) quanto ao momento da formação; c) quanto à obrigatoriedade e d) quanto à sorte no plano material.

Resumidamente, por conseguinte, o litisconsórcio consiste na pluralidade de sujeitos integrando um ou ambos os pólos de uma relação processual (ativo e passivo). Pelo mesmo motivo, cada litisconsorte tem o direito de promover o andamento do processo e todos devem ser intimados dos respectivos atos.

Passe-se à análise dos quatro critérios referidos anteriormente.

6.2.2.1 QUANTO À POSIÇÃO DOS LITISCONSORTES

a) Há litisconsórcio ativo quando a pluralidade de sujeitos se encontra no pólo ativo da rela-ção processual, ou seja, quando temos pluralidade de autores.

b) Há litisconsórcio passivo quando a pluralidade de sujeitos se dá no pólo passivo da relação processual, ou seja, no caso de pluralidade de réus.

c) Há litisconsórcio misto ou recíproco quando a pluralidade de sujeitos se verifica em ambos os pólos.

14 TJDFT, 20100020021382AGI, Relator CRUZ MACEDO, 4ª Turma Cível, julgado em 05/05/2010, DJ 25/05/2010 p. 114.

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6.2.2.2 QUANTO AO MOMENTO PROCESSUAL

O litisconsórcio pode ser inicial ou ulterior. O inicial é aquele que se forma no início do processo, desde a petição inicial. Em contrapartida, o litisconsórcio ulterior se forma depois do início do processo, isto é, no decorrer do processo.

6.2.2.3 QUANTO À FORMAÇÃO

O litisconsórcio pode ser facultativo ou necessário.

a) No litisconsórcio facultativo temos a pluralidade de sujeitos em virtude de afinida-de de interesses, sendo opção dos litisconsortes que poderiam, se assim desejassem, ingressar com ações autônomas.

b) No litisconsórcio necessário, por sua vez, a liame que une os sujeitos existe em de-corrência de disposição legal, sendo obrigatória a participação destes no processo para que haja eficácia da sentença.

O novo texto do CPC corrige a imprecisão do CPC/1973 na parte conceitual, que con-fundia litisconsórcio necessário e unitário. CPC/1973, conforme verifica-se:

Art. 47, CPC/73. Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença depen-derá da citação de todos os litisconsortes no processo Art. 114, NCPC O litisconsórcio será necessário por disposição de lei ou quando, pela natureza da relação jurídica controvertida, a eficácia da sen-tença depender da citação de todos que devam ser litisconsortes. Art. 115, NCPC. A sentença de mérito, quando proferida sem a integração do contraditório, será: I - nula, se a decisão deveria ser uniforme em relação a todos que deveriam ter integrado o processo; II - ineficaz, nos outros ca-sos, apenas para os que não foram citados.

6.2.2.4 QUANTO À DECISÃO

a) O litisconsórcio diz-se unitário quando o juiz deve, obrigatoriamente, proferir sentença i-gual para todos os litisconsortes (artigos 116 e 117 do NCPC).

b) O litisconsórcio será simples quando o juiz pode optar por dar decisões diferentes às par-tes integrantes de um mesmo pólo da relação jurídica.

6.2.2.5 LITISCONSÓRCIO MULTITUDINÁRIO

O instituto do litisconsórcio tem por finalidade assegurar a economia processual e a razoável du-ração do processo, permitindo, assim, o ajuizamento de uma única ação, com diversos sujeitos e evitan-do-se excessiva demora ou decisões incompatíveis.

É possível, entretanto, que o processo conte com um excessivo número de sujeitos, o que, por certo, acaba por tumultuar a lide, não se realizando a finalidade do instituto.

Ao litisconsórcio facultativo, que conta com excesso de sujeitos em um dos pólos, chamamos multitudinário. Nestes casos, é facultado ao juiz reduzir o número de litisconsortes na ação, desmem-brando-a.

Frise-se que o novo texto do Código de Processo Civil traz limitação ao litisconsórcio multitudiná-rio, conforme preceitua o art. 113, §1º e §2º, in verbis:

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Art. 113. § 1º O juiz poderá limitar o litisconsórcio facultativo quanto ao número de li-tigantes na fase de conhecimento, na liquidação de sentença ou na execu-ção, quando este comprometer a rápida solução do litígio ou dificultar a de-fesa ou o cumprimento da sentença. § 2º O requerimento de limitação interrompe o prazo para manifestação ou resposta, que recomeçará da intimação da decisão que o solucionar.

Em princípio, a sentença só produz efeito entre as partes. Às vezes, porém, ainda que de modo indireto, esse efeito pode recair sobre os interesses de pessoas estranhas ao processo. Assim, em dadas circunstâncias, a lei permite ou determina o ingresso de terceiros no processo, para ajudar as partes ou para excluí-las. A intervenção em processo alheio só é possível mediante expressa permissão legal, porque a regra continua a ser, no Direito brasileiro, a da singularidade do processo e da jurisdição. A legitimação para intervir, portanto, decorre da lei e depende de previsão do Código. Isto quer dizer que não é possível o ingresso de um terceiro em processo alheio sem que se apoie em algum permissivo legal, não se admitindo, por conseguinte, figuras que não tenham base na norma jurídica expressa. Na omissão da lei, entende-se que a intervenção é proibida.

Em virtude da dificuldade de sistematização decorrente da heterogeneidade de hipóteses

previstas em lei como intervenção de terceiros, difícil também se torna a conceituação geral do instituto. Todavia, num sentido bastante genérico é possível dizer que a intervenção de terceiros ocorre quando alguém, devidamente autorizado em lei, ingressa em processo alheio, tornando complexa a relação jurídica processual.

Tradicionalmente, costumava-se classificar a intervenção de terceiros como intervenção espontânea e intervenção provocada, segundo a voluntariedade daquele que ingressa em processo alheio.

Outra classificação leva em consideração a posição do terceiro perante o objeto da causa. De acordo com este critério, a intervenção pode ser adesiva ou principal. Será adesiva, também chamada ad coadjuvandum, quando o terceiro ingressa e se coloca em posição auxiliar de parte, como ocorre na assistência. E será principal quando o terceiro ingressa exercendo o direito de ação, pleiteando algo para si, como acontece na oposição.

7.1 ALTERAÇÕES TRAZIDAS NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

É importante notar que houve uma considerável alteração no tocante à intervenção de terceiros ao longo do Novo Código de Processo Civil.

Percebe-se que a intervenção de terceiros no CPC/1973 poderia ser dividida em:

1. Assistência

2. Oposição

3. Nomeação à autoria

4. Denunciação da lide

5. Chamamento ao processo intervenção de terceiros

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Atualmente, conforme preceitua o NCPC, melhor divisão ocorre da seguinte maneira:

1. Assistência – assistência simples e litisconsorcial

2. Denunciação da lide

3. Chamamento ao processo

4. Incidente de desconsideração da personalidade jurídica

5. Amicus curiae

A oposição no NCPC não é intervenção de terceiro, mas procedimento especial (arts. 682 a 686), sem grandes alterações em relação aos dispositivos ainda vigentes:

“Fez-se bem em não mais tratar a oposição como modalidade de intervenção, porque é, em verdade, manifestação do exercício do direito de ação. Mas, por outro lado, não há razão para que a oposição esteja entre os procedimentos especiais, uma vez que inexiste peculiaridade procedimental alguma que a particularize.

15”

As alterações quedam-se facilmente visíveis com a utilização do seguinte quadro de correspondência

16:

15 Teresa Arruda Alvim WAMBIER, Maria Lúcia Lins CONCEIÇÃO, Leonardo Ferres da Silva RIBEIRO e Rogerio Licastro Torres de MELLO, Primeiros comentários ao novo código de processo civil, São Paulo: RT, 2015, p. 1018. 16 Alvim, Rafael. Instituto de Direito Contemporâneo. Disponível em http://www.cpcnovo.com.br/blog/2015/09/17/intervencao-de-terceiros-no-novo-cpc/. Acesso em 21.02.2016

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7.2 ASSISTÊNCIA – ASSISTÊNCIA SIMPLES E LITISCONSORCIAL

Duas são as espécies de assistência:

a) simples ou voluntária.

b) litisconsorcial.

O novo CPC efetiva a divisão e conceituação da assistência simples e litisconsorcial, conforme artigos 121 e 124.

O assistente, por atuar na qualidade de mero coadjuvante da parte, sofre algumas limitações em suas faculdades processuais.

Via de regra, o assistente não tem poderes para desistir, transacionar ou reconhecer juridicamen-te o pedido. Há, entretanto, hipótese excepcional em que será permitido ao assistente atuar em nome próprio na defesa de interesse alheio (substituição processual), qual seja, quando o réu se torna revel.

Havendo tal substituição processual, o assistente terá poderes para desistir, transacionar ou re-conhecer o pedido, pois nos demais casos sua atuação é limitada.

O assistente não possui poderes para interpor recurso, não podendo questionar a decisão profe-rida. Poderá, entretanto, apelar da sentença se tiver sido impedido de desenvolver todas as suas facul-dades processuais e, ainda, se tiver sido prejudicado por dolo ou culpa.

7.2.1 ASSISTÊNCIA SIMPLES

Nesta hipótese o assistente auxilia na defesa de direito de titularidade do assistido, ou seja, o terceiro possui interesse jurídico na realização de direito alheio. Podemos citar, por exemplo, a assistência prestada pelo sublocatário ao locatário em ação de despejo.

A assistência simples não obsta a que a parte principal reconheça a procedência do pedido, desista da ação, renuncie ao direito sobre o que se funda a ação ou transija sobre direitos controvertidos. Uma vez transitada em julgado a sentença no processo em que interveio o assistente, este não poderá, em processo posterior, discutir a justiça da decisão, salvo se alegar e provar que pelo estado em que recebeu o processo ou pelas declarações e pelos atos do assistido, foi impedido de produzir provas suscetíveis de influir na sentença; desconhecia a existência de alegações ou de provas das quais o assistido, por dolo ou culpa, não se valeu.

7.2.2 ASSISTÊNCIA LITISCONSORCIAL

Neste caso o direito em litígio é de titularidade não só do assistido, mas também do assistente, sendo possível a este, inclusive, propor ação em seu nome para perseguir sua efetivação.

Marinoni, Arenhart e Mitidiero, assim referem:

“Em certas situações, aquele que é titular do direito material discutido em juízo pode ingressar ulteriormente no processo e aderir à posição de uma das partes para ‘assisti-la’ frente ao embate que trava com o adversário que lhes é comum. É exatamente essa a forma de intervenção que é consentida a título de assistência litisconsorcial: o assistente litisconsorcial é o titular do direito discutido em juízo – e, dessa forma, será atingido pela coisa julgada – que ingressa ulteriormente no processo. Daí a razão pela qual não se trata propriamente de espécie de assistência. Trata-se de uma verdadeira intervenção litisconsorcial ulterior.”

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7.3 DENUNCIAÇÃO DA LIDE

A finalidade precípua da denunciação é a de se liquidar, na mesma sentença, o direito que, even-tualmente, tenha o denunciante contra o denunciado, de modo que tal sentença possa valer como título executivo em favor do denunciante contra o denunciado, sendo o caso. Dessa forma, o novo Código prevê a denunciação da lide em duas ircunstâncias:

a) ao alienante imediato, no processo relativo à coisa cujo domínio foi transferido ao denuncian-te, a fim de que possa exercer os direitos que da evicção lhe resultam;

b) àquele que estiver obrigado, por lei ou pelo contrato, a indenizar, em ação regressiva, o prejuí-zo de quem for vencido no processo.

A denunciação da lide tem por justificativa a economia processual, porquanto encerra, num mesmo processo, duas ações (a principal e a incidente, de garantia), e a própria exigência de justiça, porque evita sentenças contraditórias (p. ex., poderia ser procedente a primeira e improcedente a de regresso por motivo que, se levado à primeira, também a levaria à improcedência).

Assim, ocorrendo a denunciação, o processo se amplia objetiva e subjetivamente. Subjetivamente porque ingressa o denunciado, o qual passará a demandar juntamente com o autor se o denunciante for o autor, e juntamente com o réu se o denunciante for o réu. Objetivamente, porque se insere uma demanda implícita do denunciante contra o de denunciado, de indenização por perdas e danos.

7.4 CHAMAMENTO AO PROCESSO

O instituto do chamamento ao processo é a penúltima modalidade de intervenção de terceiros prevista no NCPC.

A rigor, o instituto do chamamento ao processo revela uma pequena exceção ao princípio da “proibição do julgamento fora do pedido” (ne procedat iudex ex officio), isto é, ao princípio da iniciativa da parte, porque alguém, nas hipóteses legais, é convocado a participar do processo pelo réu e não pelo autor que havia proposto a demanda apenas contra um devedor.

Assim, os demais devedores, convocados por via do chamamento ao processo, passam a integrar a lide por iniciativa do próprio réu, o que, de certa forma, significa uma alteração do princípio da singularidade do processo e da jurisdição.

Todavia, o instituto se justifica porque a integração do processo por outros fiadores, pelo devedor principal, ou por outros devedores solidários, significa uma importante conquista em prol da economia processual, uma vez que, conforme o art. 132 do Novo Código de Processo Civil a sentença que julgar procedente a ação, condenando os devedores, valerá como título executivo em favor daquele que satisfizer a dívida, para exigi-la, por inteiro, do devedor principal ou de cada um dos co-devedores a sua cota, na proporção que lhes tocar.

7.5 INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

O incidente de desconsideração da personalidade jurídica é uma inovação do Novo Código de Processo Civil. Esse será instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo. É importante observar que o pedido de desconsideração da personalidade jurídica observará os pressu-postos previstos em lei. Igualmente, encontra-se no novo Código de Processo Civil a hipótese de desconsideração inversa da personalidade jurídica. Nesse sentido, o incidente de desconsideração é cabível em todas as fases do

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processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial, porém dispensa-se a instauraçã, caso a desconsideração da personalidade jurídica seja requerida na petição inicial, hipótese em que será citado o sócio ou a pessoa jurídica. Cumpre ressaltar, ainda, que ainstauração do incidente suspenderá o processo, com exceção dos casos em que a desconsideração for solicitada na petição inicial. Uma vez concluída a instrução, caso necessá-rio, o incidente será resolvido por decisão interlocutória, da qual caberá agravo interno. Conforme preceitua o art. 137 do Novo Código de Processo Civil, insta ressaltar que uma vez acolhido o pedido de desconsideração, a alienação ou a oneração de bens, havida em fraude de execução, será ineficaz em relação ao requerente.

7.6 AMICUS CURIAE

O juiz ou o relator, considerando a relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da demanda ou a repercussão social da controvérsia, poderá, por decisão irrecorrível, de ofício ou a reque-rimento das partes ou de quem pretenda manifestar-se, solicitar ou admitir a participação de pessoa natural ou jurídica, órgão ou entidade especializada, com representatividade adequada, no prazo de 15 (quinze) dias de sua intimação, conforme art. 138 do NCPC. Caberá ao juiz ou ao relator, na decisão que solicitar ou admitir a intervenção, definir os poderes do amicus curiae.

A intervenção de que trata o caput não implica alteração de competência nem autoriza a inter-posição de recursos, ressalvadas a oposição de embargos de declaração.Caberá ao juiz ou ao relator, na decisão que solicitar ou admitir a intervenção, definir os poderes do amicus curiae.

O amicus curiae pode recorrer da decisão que julgar o incidente de resolução de demandas repe-titivas.

7.7 INTERVENÇÃO ANÔMALA DOS ENTES FEDERADOS

O art. 5º da Lei n.º 9.469/97 prevê a possibilidade de intervenção da União em processos em que sejam parte as entidades federais da administração indireta (autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista), tendo como requisito apenas a demonstração de interesse econômico. Isto é, diferentemente do que ocorre com a regra geral para a intervenção do assistente, simples ou litisconsorcial, não se exige interesse jurídico.

O parágrafo único do mesmo dispositivo estende essa possibilidade de intervenção por mero interesse econômico aos demais entes federativos (Estados, Distrito Federal e Municípios), nas suas respectivas entidades da administração indireta.

No entanto, a intervenção da União no processo por mero interesse econômico (não havendo interesse jurídico) não desloca a competência do feito para a Justiça Federal. Vale dizer, nos casos de sociedades de economia mista, em que o processo é de competência da Justiça Estadual, se a União intervier com base em mero interesse econômico, não haverá deslocamento de competência para o Juízo Federal. O deslocamento de competência somente ocorreria no caso de intervenção da União com base em interesse jurídico. Isso porque não poderia uma Lei Ordinária (a Lei n.º 9.469/1997) modificar critério de competência estabelecido pela Constituição Federal (art. 109, inc. I). Esse é o entendimento pacífico do STJ.

17

17 STJ, AgRg no REsp 1045692/DF, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 21/06/2012, DJe 29/06/2012.

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8.1 MINISTÉRIO PÚBLICO

O Ministério Público é um órgão de garantia das instituições fundamentais da sociedade, quer no campo do direito público, quer no campo do direito privado. Sua atuação encontra-se acima dos interesses imediatos de determinado administrador, legislador ou mesmo órgão judiciário, cingindo-se exclusivamente à vontade da lei e da sociedade.

Segundo o art. 127 da CF cabe ao Ministério Público a defesa da ordem jurídica do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. São seus princípios institucionais: a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional. A unidade e a indivisibilidade determinam que o Ministério Público deve ser considerado uma só instituição que aceita divisões internas e partições de competência. Já a independência funcional significa que a atuação do Ministério Público e de seus membros não se vincula a qualquer outro órgão ou a políticas da União e dos Estados.

Na União, o Ministério Público Federal, organizado por lei federal, atua junto aos juízes e tribunais federais. O chefe do Ministério Público da União é o Procurador Geral da República, nomeado pelo Presidente da República dentre cidadãos maiores de trinta e cinco anos, integrantes da carreira, depois de aprovado pelo Senado (CF art. 128, § 1º).

Os membros do Ministério Público da União, do Distrito Federal e dos Territórios ingressam nos cargos iniciais de carreira mediante concurso público de provas e títulos; após dois anos de exercício não poderão ser demitidos senão por sentença judiciária ou em virtude de processo administrativo, nem removidos, a não ser mediante representação do Procurador Geral, com fundamento em conveniência do serviço.

Nos Estados, o Ministério Público organiza-se autonomamente, por lei estadual, separado orgânica e funcionalmente dos advogados ou procuradores do Estado, obedecidas normas gerais estabelecidas em lei federal. O ingresso na carreira do Ministério Público se dá no cargo de Promotor Público substituto, com promoção posterior para os cargos de titulares de comarcas classificadas, como na magistratura, por entrâncias, segundo o grau de complexidade e volume de serviço. Perante os Tribunais atuam os membros do Ministério Público de categoria mais elevada, de regra denominados Procuradores da Justiça.

Os membros do Ministério Público gozam das garantias de vitaliciedade, irredutibilidade de subsídio e inamovibilidade, conforme o art. 128, § 5º, inc. I, da CF. Além disso, devem residir na comarca ou subseção judiciária da respectiva lotação, exceto quando autorizados pelo chefe da instituição (art. 129, § 2º, da CF).

A atividade do Ministério Público se desenvolve tanto no processo civil quanto no processo penal. No processo penal, o Ministério Público é o órgão que formula a acusação nos crimes de ação pública e que acompanha toda ação penal, em qualquer caso, fiscalizando a correta aplicação da lei e a fiel observância das garantias do acusado.

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O Código de Processo Civil adotou a classificação tradicional quanto à atuação do Ministério Público na esfera cível, isto é, como parte ou como fiscal da lei.

Assim, quando o CPC refere a atuação do Ministério Público como parte (art. 177 do Novo CPC), quer aludir às causas em que este esteja legitimado para agir ou para contestar. O Ministério Público somente tem legitimidade para agir, seja na posição de autor, seja na posição de réu, na regra, quando expressamente autorizado em lei.

A atuação do Ministério Público como parte é de direito estrito, porque deve obedecer ao preceito do art. 18 do Novo CPC, segundo o qual ninguém pode propor ação em nome próprio sobre direito alheio, salvo quando autorizado pelo ordenamento jurídico. Assim, também o Ministério Público somente poderá propor, em benefício de alguém, as ações previstas em lei.

É a lei do direito material que define, via de regra, as hipóteses de atuação do Ministério Público como autor – a Lei de Alimentos, por exemplo, possibilita ao Ministério Público demandar em favor do menor que necessita de alimentos na hipótese do representante legal do menor deixar de fazê-lo. Como réu, o Ministério Público, além de hipóteses previstas em leis de direito material, também atua como curador à lide nos casos de réu revel, citado por edital ou hora certa, por força do art. 72 do Novo CPC.

O Ministério Público, ao exercer o direito de ação, está sujeito aos mesmos poderes e ônus que as partes. Tal disposição, porém, deve ser compreendida com algumas ressalvas, pois o Ministério Público não está sujeito, por exemplo, ao adiantamento das despesas processuais, nem à condenação nessas despesas se perder a demanda, ou ainda, à condenação em honorários de advogado. Tem, também, o privilégio de prazo em dobro para recorrer e quádruplo para contestar (art. 180 do Novo CPC).

Incumbe ao Ministério Público promover inquérito civil e ação civil pública (art. 25, inc. IV, da Lei Orgânica do Ministério Público) para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico e a outros direitos difusos, coletivos e individuais indisponíveis e homogêneos. Cabe, também, ao parquet promover inquérito civil e ação civil pública para a anulação ou decretação de nulidade de atos lesivos ao patrimônio público ou à moralidade administrativa do Estado ou de Município, de suas administrações indiretas ou fundacionais ou de entidades privadas que participem.

Na qualidade de parte, o Ministério Público deve também:

- propor ação de investigação de paternidade, como substituto processual (art. 2º, § 4º, da Lei nº 8.560, de 1992);

- impetrar mandado de segurança, de injunção e habeas corpus, para a defesa dos direitos sociais e individuais indisponíveis da criança e do adolescente (art. 201, inc. IV, da Lei nº 8.069, de 1990)

- ajuizar ação de responsabilidade contra os ex-administradores de entidade financeira sujeita a intervenção e liquidação extrajudicial (art. 46, parágrafo único, da Lei nº 6.024, de 1974);

- propor ação de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais, em face da Constituição Estadual (art. 25, da Lei Orgânica do Ministério Público);

- promover a representação de inconstitucionalidade para efeito de intervenção do Estado nos Municípios (art. 25, inc. II, da Lei Orgânica do Ministério Público);

- ajuizar ação para responsabilizar os gestores do dinheiro público condenados por tribunais e conselhos de contas (art. 25, inc. VIII, da Lei Orgânica do Ministério Público).

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A atuação do Ministério Público como custos legis, por sua vez, dá-se quando o mesmo age como interveniente no processo, fiscalizando o correto cumprimento da lei. Trata-se das situações previstas no art. 178 do Novo CPC:

- nas hipóteses previstas na lei e na Constituição Federal (caput);

- nos processos que envolvam interesse público ou social (inc. I);

- nos processos que envolvam interesse de incapaz (inc. II);

- nos processos que envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural ou urbana (inc. III).

Deve-se entender ser de natureza obrigatória a intervenção ministerial a que se refere o art. 178. O inciso I deste dispositivo não contempla intervenção facultativa, como costumam referir alguns doutrinadores, mas apenas autoriza que o órgão ministerial, em cada caso concreto, avalie a presença ou não do interesse público justificador da intervenção. Em casos controvertidos, cumpre ao juiz decidir se ocorre ou não o alegado interesse público, admitindo ou indeferindo a intervenção ministerial. Ademais, ressaltamos que o interesse público que determina a participação do Ministério Público na lide deve ser o interesse público primário (da coletividade), e não o interesse secundário (simples interesse da Fazenda Pública).

Determina-se a intervenção ministerial, ainda, em certas questões de cunho eminentemente processual, tais como nos conflitos de competência (art. 951, parágrafo único, do Novo CPC). Além disso, a lei brasileira habilita a atuação do Ministério Público como custos legis nas seguintes situações:

- ações populares (art. 6º, § 4º, da Lei nº 4.717, de 1965);

- ações de alimentos (art. 9, da Lei nº 5.478, de 1968);

- procedimentos relativos a registros públicos (art. 57, art. 67, § 1º, art. 76, § 3º, art. 109, art. 200, art. 213, § 3º, todos da Lei nº 6.015, de 1973);

- ação civil pública, quando não atuar como parte (art. 5º, § 1º, da Lei nº 7.347, de 1985);

- desapropriação para reforma agrária (art. 18, § 2º, da Lei Complementar nº 76, de 1993);

- ações propostas no Juizado Especial, nos casos previstos em lei (art. 11, da Lei nº 9.099, de 1995);

- habeas data (art. 12, da Lei nº 9.507, de 1997);

- causas falimentares (art. 99, inc. XIII, art. 142, § 7º, art. 154, § 3º, e art. 187, todos da Lei nº 11.101, de 2001);

- ações de usucapião especial rural e urbano (art. 5º, § 5º, da Lei nº 6.969, de 1981 e art. 12, § 1º, da Lei 10.257, de 2001);

- mandado de segurança (art. 12, da Lei nº 12.016, de 2009).

O Ministério Público, nas ações em que atuar como fiscal da lei, deverá ter vista dos autos depois das partes e ser intimado de todos os atos do processo. Além disso, poderá juntar documentos e certidões, produzir prova em audiência e requerer medidas ou diligências necessárias ao descobrimento da verdade processual. De modo geral, pode o Ministério Público, no exercício de suas funções,

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manifestar-se em qualquer fase dos processos, acolhendo solicitação do juiz, da parte ou por iniciativa própria, quando entender que exista interesse em causa que justifique a sua intervenção (art. 26 da Lei Orgânica do Ministério Público).

Constituem deveres dos membros do Ministério Público, além de outros previstos em lei (art. 43, inc. I a VII e inc. XII, da Lei Orgânica do Ministério Público): manter ilibada conduta pública e particular; zelar pelo prestígio da Justiça, por suas prerrogativas e pela dignidade da sua função; indicar os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais, elaborando relatório em sua manifestação final ou recursal; obedecer aos prazos processuais; assistir aos atos judiciais, quando sua presença for obrigatória ou conveniente; desempenhar suas funções com zelo e presteza; declarar-se suspeito ou impedido, conforme estabelecido em lei; tratar com urbanidade as partes, testemunhas, funcionários e auxiliares da Justiça; e identificar-se em seus pronunciamentos funcionais. Os membros do Ministério Público poderão ser civil e regressivamente responsáveis quando agirem com dolo ou fraude no exercício de suas funções (art. 181 do Novo CPC).

Ademais, é vedado aos membros do Ministério Público exercer (art. 44, inc. I a V, da Lei Orgânica do Ministério Público): a advocacia; o comércio, ou participar de sociedade comercial, a não ser como quotista ou acionista; qualquer outra função pública, exceto uma de Magistério; e atividade político-partidária, ressalvadas as exceções previstas em lei e a filiação.

Por fim, conforme estabelece o art. 41, inc. I, III a VII, X e XI, da Lei Orgânica do Ministério Público, são prerrogativas dos seus membros: receber o mesmo tratamento jurídico e protocolar dado aos membros do Poder Judiciário junto aos quais atuem; ter vista dos autos após distribuição às Turmas ou Câmaras, bem como intervir nas sessões de julgamento, para sustentação oral ou esclarecimento de matéria de fato; ser intimado pessoalmente em qualquer processo e grau de jurisdição, por meio da entrega dos autos com vista; gozar de inviolabilidade pelas opiniões que externar ou pelo teor de suas manifestações processuais, nos limites de sua independência funcional; examinar autos de processos findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, autorizada a cópia de peças e a tomada de apontamentos; usar as vestes talares e insígnias do Ministério Público; tomar assento à direita dos juízes de primeiro grau ou do Presidente da Turma, Câmara ou Tribunal; e ingressar e transitar livremente nas salas de sessões de Tribunais (mesmo além dos limites que separam a parte reservada aos Magistrados), nas salas e dependências de audiências, secretarias, cartórios, tabelionatos, ofícios da justiça (inclusive de registros públicos), delegacias de polícia, estabelecimentos de internação coletiva e em qualquer recinto público ou privado (ressalvada a garantia constitucional de inviolabilidade de domicílio).

8.2. ADVOCACIA PÚBLICA E PRIVADA

Estabelece o art. 133 da Constituição Federal que “o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”. Tal diretriz é repetida no art. 2º da Lei nº 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil). Assim, a advocacia constitui exercício privado de função pública.

Considera-se advogado aquele profissional que exerce a advocacia – atividade privativa de pessoas que estejam regularmente inscritas na Ordem dos Advogados do Brasil (art. 3º, da Lei nº 8.906/1994). São atividades privativas da advocacia a postulação a qualquer órgão do Poder Judiciário, aos juizados especiais, à Justiça do Trabalho e à Justiça de Paz, além das atividades de consultoria, assessoria e direção jurídicas (art. 1º, da Lei nº 8.906/1994). No que se refere à atuação nos juizados especiais, saliente-se que o STF entende legítima a dispensa de advogado (ADI 1.539/DF, rel. Min. Maurício Corrêa, e ADI 3.168/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa).

Os direitos do advogado estão previstos no art. 7º da Lei nº 8.906/1994, que amplia o rol do art. 107 do Novo CPC. Dentre eles, destacamos os principais: rubricar as folhas do processo correspondentes aos atos em que intervir (art. 207, parágrafo único, do Novo CPC); fiscalizar a distribuição do processo (art. 289 do Novo CPC); examinar em cartório e secretaria de tribunal autos de qualquer processo, mesmo sem procuração, salvo se correr em segredo de justiça ou se contiver documentos originais de

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difícil restauração ou em razão de circunstância relevante, reconhecida pelo juiz em despacho motivado (art. 7º, inc. XIII, da Lei nº 8.906/1994); ter vista dos autos fora do cartório pelo prazo de 5 dias, ou por prazo maior, a critério do juiz em face das peculiaridades da causa (art. 7º, inc. XV, da Lei nº 8.906/1994, e art. 107, inc. II, do Novo CPC); retirar os autos pelo prazo legal, sempre que lhe competir falar neles por determinação do juiz, nos casos previstos em lei (art. 7º, inc. XV, da Lei nº 8.906/1994, e art. 107, inc. III, do Novo CPC).

De outra banda, constituem os principais deveres do advogado (art. 5º, art. 6º, art. 77, inc. I a VI, art. 78, art. 459, § 2º do Novo CPC): comportar-se de acordo com a boa-fé; cooperar com os demais sujeitos processuais para que se obtenha decisão de mérito justa e efetiva; expor os fatos em juízo conforme a verdade; não formular pretensão ou apresentar defesa quando cientes de que são destituídas de fundamento; não produzir provas e não praticar atos inúteis ou desnecessários à declaração ou à defesa do direito; não empregar expressões ofensivas nos escritos apresentados no processo ou em defesa oral, sob pena de serem riscadas, se escritas, ou de ter a fala cassada, se orais; tratar as testemunhas com urbanidade, não lhes fazendo perguntas ou considerações impertinentes, capciosas ou vexatórias.

O advogado que estiver no exercício de funções de juiz leigo em Juizado Especial estará impedido de nele atuar, conforme dispõe o art. 7º, parágrafo único, da Lei nº 9.099/1995.

A advocacia pública é exercida pelos integrantes da Advocacia-Geral da União e pelos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal (arts. 131 e 132, da CRFB) e tem previsão nos arts. 182 e 183 do Novo CPC. A Advocacia-Geral da União está regulada na Lei Complementar nº 73/1993, na Lei nº 9.028/1995 e nas Medidas Provisórias nº 2.180-35/2001 e 2.216-37/2001.

Importante relembrar que a Advocacia Pública, ao ter como finalidade a proteção dos interesses públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (art. 182 do Novo CPC), gozará, via de regra, de prazo em dobro para todas as suas manifestações processuais (art. 183 do Novo CPC).

8.3. DEFENSORIA PÚBLICA

À Defensoria Pública, instituição essencial à função jurisdicional do Estado, cabe a orientação jurídica e a defesa dos necessitados, em todos os graus de jurisdição (art. 5º, inc. LXXIV, da CF). A Lei Complementar nº 80/1994 estatuiu a Lei Orgânica da Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos Territórios. Tem previsão no novo diploma processual civil entre os arts. 184 e 187. Os membros da Defensoria Pública, assim como aqueles do Ministério Público, poderão ser civil e regressivamente responsáveis quando agirem com dolo ou fraude no exercício de suas funções (art. 187 do Novo CPC).

São direitos atribuídos aos membros da Defensoria Pública (art. 44, inc. I, IV, VI e VIII a XIII, da Lei Complementar nº 80/1994): ser intimado pessoalmente em qualquer processo e grau de jurisdição, contando-se em dobro todos os prazos para todos os atos processuais (art. 186 do Novo CPC); usar vestes talares e as insígnias previstas privativas da Defensoria Pública; ter vista dos processos fora dos cartórios e secretarias, ressalvadas as vedações legais; examinar, em qualquer repartição, processos, inquéritos e autos de prisão em flagrante; manifestar-se em autos judiciais ou administrativos por meio de cota; requisitar da autoridade pública e de seus agentes exames, certidões, perícias, vistorias, diligências, processos, documentos, informações, esclarecimentos e providências necessárias ao exercício de sua função; representar a parte, independentemente de mandato, exceto os casos em que a lei exija poderes especiais; deixar de patrocinar ação, quando esta for manifestamente incabível ou inconveniente aos interesses da parte sob seu patrocínio, comunicando o fato ao Defensor Público-Geral; e ter o mesmo tratamento conferido aos magistrados e demais titulares dos cargos das funções essenciais à justiça. Ainda, constituem garantias dos membros da Defensoria Pública (art. 43, inc. I a IV, da Lei Complementar nº 80/1994): independência funcional no desempenho de suas atribuições; inamovibilidade; irredutibilidade de vencimentos; e estabilidade.

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O membro da Defensoria Pública da União possui os seguintes deveres (art. 45, inc. I a VII, da Lei Complementar nº 80/1994): residir na localidade onde exerce suas funções; desempenhar os serviços a seu cargo com zelo e presteza; representar ao Defensor Público-Geral sobre as irregularidades de que tiver ciência em razão do cargo; declarar-se suspeito ou impedido, conforme a lei; interpor os recursos cabíveis a qualquer instância ou Tribunal e promover revisão criminal, sempre que encontrar fundamentos na lei, jurisprudência ou prova dos autos, remetendo cópia à Corregedoria-Geral. É probido aos membros da Defensoria Pública da União (art. 46, inc. I a V, da Lei Complementar nº 80/1994): exercer a advocacia fora das atribuições institucionais; requerer, advogar, ou praticar em Juízo ou fora dele, atos que de qualquer forma colidam com as funções inerentes ao cargo, ou com os preceitos éticos da profissão; receber honorários, percentagens ou custas processuais, a qualquer título e sob qualquer pretexto, em razão de suas atribuições; exercer o comércio ou participar de sociedade comercial, exceto como acionista ou cotista; e exercer atividade político-partidária, enquanto estiver atuando junto à justiça eleitoral.

Por fim, é proibido ao membro da Defensoria Pública da União exercer suas funções nos processos em que (art. 47, inc. I a VII, da Lei Complementar nº 80/1994): seja parte ou, de qualquer forma, interessado; tenha atuado como representante de parte, perito, Juiz, membro do Ministério Público, Autoridade Policial, Escrivão de Polícia, Auxiliar de Justiça, ou prestado depoimento como testemunha; for interessado seu cônjuge ou companheiro, parente consanguíneo ou afim em linha reta ou colateral, até o terceiro grau; tenha postulado como advogado de qualquer das pessoas mencionadas no inciso anterior; qualquer das pessoas mencionadas no inciso III funcione ou tenha funcionado como Magistrado, membro do Ministério Público ou Auxiliar da Justiça; tiver dado à parte contrária parecer, verbal ou escrito, sobre o objeto da demanda; e houver vedação legal.

As formas processuais constituem-se em pressupostos processuais objetivos intrínsecos.

A forma dos atos processuais diz respeito ao tempo, ao modo e ao lugar onde são realizados os atos processuais.

O ato processual é o ato jurídico praticado pelo órgão jurisdicional ou por alguma das partes, que se destina a instaurar, desenvolver, modificar, conservar ou extinguir uma determinada relação jurídica processual.

Assim, os atos processuais não se confundem com atos do processo, que são todos os atos realizados no processo, tenham relevância jurídica para o processo ou não.

9.1 TEMPO

O art. 212 do Novo CPC dispõe que “os atos processuais serão realizados em dias úteis, das 6 (seis) às 20 (vinte) horas.”

No entanto, há algumas exceções a essa regra.

Os atos que forem iniciados antes das 20 horas poderão ser concluídos depois desse horário, se o adiamento for prejudicar a diligência ou causar grave dano (§ 1

o do art. 212 do Novo CPC).

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Ainda, as citações, intimações e penhoras poderão ser realizadas também durante as férias forenses, feriados ou em dias úteis fora do horário ordinário, independentemente de autorização judicial (§ 2º do art. 212 do Novo CPC). No entanto, em qualquer caso, deve sempre ser respeitada a garantia constitucional prevista no art. 5º, inc. XI, da Constituição Federal: se tiver que entrar no domicílio da parte coercitivamente (ex.: penhora dos bens do devedor que estiverem na residência), a diligência somente pode ocorrer durante o dia.

Cumpre também apontar que, quando se tratar de autos não eletrônicos, os atos que tiverem de ser praticados por meio de petição o deverão ser dentro do horário de funcionamento do fórum ou tribunal (§ 3º do art. 212 do Novo CPC).

De outro lado, a prática eletrônica de atos processuais poderá ser realizada em qualquer horário, até às 24h do último dia do prazo (art. 213 do Novo CPC).

Via de regra, os atos processuais não serão praticados durante as férias forenses ou feriados. As duas exceções legalmente previstas são (i) as já vistas hipóteses do § 2º do art. 212 e (ii) os casos de tutela de urgência (art. 214 do Novo CPC).

9.1.1 PRAZOS PROCESSUAIS

A disciplina geral dos prazos está prevista nos arts. 218 a 232 do Novo CPC.

Os prazos processuais podem ser classificados quanto à origem do prazo; quanto à possibilidade ou não de ser modificado; e quanto aos efeitos do descumprimento do prazo.

Passamos a analisar cada uma dessas classificações, que possuem grande importância para o processo civil.

Considerando a origem do prazo, vale dizer, quem fixa o prazo, podemos classificá-lo em:

a) Prazos Legais: são os fixados por lei.

b) Prazos Judiciais: são os prazos fixados por uma decisão judicial.

c) Prazos Convencionais: são fixados por acordo das partes.

Como regra, quem fixa o prazo para a prática dos atos processuais é a lei.

Se não houver prazo legal, o juiz o fixará. Se o juiz não o fizer, aplica-se o § 3º do art. 218 do Novo CPC, ou seja, o prazo será de 5 dias.

Considerando a possibilidade de modificação pelas partes, os prazos podem ser classificados em:

a) prazos dilatórios: são aqueles que podem ser modificados por convenção das partes, fazendo parte dos chamados acordos processuais (art. 190 do Novo CPC)

O art. 313, inc. II, do Novo CPC, prevê que se suspende o processo “pela convenção das partes”. O § 4º do mesmo artigo estabelece que “o prazo de suspensão do processo nunca poderá exceder 1 (um) ano nas hipóteses do inciso V e 6 (seis) meses naquela prevista no inciso II”.

b) prazos peremptórios: são os que não podem ser modificados pelas partes. É o caso, por exemplo, do prazo de contestação; do prazo recursal etc.

Quanto às consequências do descumprimento, os prazos podem ser:

a) prazos próprios: aqueles cujo descumprimento acarreta consequências processuais. Ex.: prazo de contestação; prazo para recorrer; prazo para apresentar o rol de testemunhas; etc.

b) prazos impróprios: aqueles cujo descumprimento não acarreta consequências processuais. É o caso, por exemplo, dos prazos para o juiz proferir decisões e sentenças.

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9.1.1.1 INÍCIO DO PRAZO

O início do prazo processual começa a correr, como regra, segundo as regras fixadas pelo art. 231 do Novo CPC, da seguinte forma:

a) quando a citação ou intimação for postal (pelo correio), o prazo começa a correr da data da juntada aos autos do aviso de recebimento.

b) no caso de citação ou intimação for por oficial de justiça, o prazo corre desde a data da junta-da aos autos do mandado cumprido.

c) quando a citação ou a intimação se der por ato do escrivão ou do chefe de secretaria, começa o prazo da data da sua ocorrência;

d) na hipótese de citação por edital, inicia-se o curso do prazo de resposta a partir do dia útil se-guinte ao fim da dilação assinada pelo juiz;

e) em sendo eletrônica a citação ou a intimação, o prazo começa a correr do dia útil seguinte à consulta do seu teor ou ao término do prazo para que a consulta se dê;

f) quando o ato se realizar em cumprimento de carta de ordem, precatória ou rogatória, o prazo para resposta corre da data da sua juntada aos autos após devidamente cumprida, como regra (o prazo para os embargos à execução é uma exceção a essa regra, como se verá em capítulo próprio);

g) quando a intimação se der pelo Diário de Justiça impresso ou eletrônico, começa o prazo da data de sua publicação;

h) na hipótese de a intimação se dar por meio da retirada dos autos, do dia da sua carga;

i) se houver pluralidade de réus, o prazo de resposta tem o seu curso a partir da última data a que se referem as hipóteses “a” a “f”;

O prazo recursal conta-se da data em que os advogados são intimados da decisão (art. 1.003, do Novo CPC).

Se a decisão ou a sentença forem publicadas em audiência, reputam-se intimados na audiência (§ 1º do art. 1.003 do Novo CPC). Essa regra vale não somente para as partes comuns, mas também para a Defensoria Pública e o Ministério Público, que possuem direito a vista pessoal dos autos. Vale dizer, no caso de decisão ou sentença publicados em audiência, o prazo começa a correr para o Ministé-rio Público e para a Defensoria Pública a partir da data da audiência, momento em que foram intimados pessoalmente. Mesmo se pedirem vista dos autos, o prazo não começará a correr da vista (como aconte-ceria se a decisão ou a sentença do juiz fossem proferidas em gabinete), senão da data da audiência.

18

9.1.1.2 CONTAGEM DOS PRAZOS PROCESSUAIS

Está prevista basicamente no art. 224 do Novo CPC.

Há diferença entre “correr” e “contar”. Os prazos começam a “correr” a partir da intimação, po-rém contam-se excluindo o dia da intimação.

Na contagem do prazo, devem ser levadas em consideração as seguintes regras:

18

STJ, Acórdão n. 505117, 20100020209951AGI, Relator CARMELITA BRASIL, 2ª Turma Cível, julgado em 11/03/2011, DJ 18/05/2011 p. 93.

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a) Os prazos somente começam a contar do primeiro dia útil após a publicação do ato (art. 224, § 3º, Novo CPC);

b) Salvo disposição em contrário, computar-se-ão os prazos excluindo o dia do começo e incluin-do o do vencimento (art. 224, caput, Novo CPC);

c) Os dias do começo e do vencimento do prazo serão protraídos para o primeiro dia útil seguin-te, se coincidirem com dia em que o expediente forense for encerrado antes ou iniciado depois da hora normal ou houver indisponibilidade da comunicação eletrônica (art. 224, § 1º, Novo CPC).

A Fazenda Pública, o Ministério Público e a Defensoria Pública possuem prerrogativas de prazo: conta-se em dobro para todas as suas manifestações processuais (arts. 183, 180 e 186, do Novo CPC).

Se houver litisconsórcio, ativo e/ou passivo, e os litisconsortes tiverem procuradores diferentes, o prazo será em dobro para todos os atos do processo (art. 229, Novo CPC). No entanto, se o prazo interessar a somente um dos litisconsortes, o prazo será simples. É o caso, por exemplo, da sentença que é desfavorável a somente um dos litisconsortes. Nessa hipótese, o prazo para tal litisconsorte será simples.

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9.1.1.3 PRAZO PROCESSUAL E USO DO FAX

Nos termos do art. 2º da Lei nº 9.800/99, “a utilização de sistema de transmissão de dados e imagens não prejudica o cumprimento dos prazos, devendo os originais ser entregues em juízo, necessariamente, até cinco dias da data de seu término.”

Verifica-se, assim, que o prazo de 5 dias para a juntada dos originais inicia-se após o término do prazo processual fixado pela lei ou pelo magistrado, e não a partir da data da prática do ato processual pela parte interessada.

Além disso, o quinquídio legal para a apresentação dos originais começa a ser contado a partir do dia seguinte ao término do prazo processual para a prática do ato (ex.: contestação, réplica, recurso etc.), mesmo que seja sábado, domingo ou feriado. Nesse sentido, é pacífica a jurisprudência do STJ.

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Por fim, é importante ressaltar que, “nos atos não sujeitos a prazo, os originais deverão ser entregues, necessariamente, até cinco dias da data da recepção do material” (art. 2º, parágrafo único, Lei nº 9.800/1999).

9.1.1.4 RECESSO FORENSE, FERIADOS E SUSPENSÃO DOS PRAZOS

O recesso forense suspende os prazos. De acordo com o art. 220 do Novo CPC, “suspende-se o curso do prazo processual nos dias compreendidos entre 20 de dezembro e 20 de janeiro, inclusive”. Dessa maneira, durante esse período, não se realizarão audiências nem sessões de julgamento (§ 2º do art. 220 do Novo CPC). Vale lembrar que, ressalvadas as férias individuais e os feriados instituídos por lei, os juízes, os membros do Ministério Público, da Defensoria Pública e da Advocacia Pública e os auxiliares da Justiça exercerão suas atribuições durante tal período (§ 1º do art. 220 do Novo CPC).

A suspensão somente ocorre no dia do início do recesso forense. Por exemplo, se os dias 18 e 19 de dezembro, imediatamente anteriores ao início do período de suspensão dos prazos, caem em sábado e domingo, respectivamente, mesmo assim a suspensão do prazo somente ocorre a partir do dia 20 de

19 STJ, AgRg no AREsp 218.330/PR, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/10/2012, DJe 09/11/2012. 20

STJ, EDcl no AgRg nos EDcl no AREsp 15.792/SC, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, julgado em 01/12/2011, DJe 12/12/2011.

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dezembro. Isso porque os prazos, como regra, são contínuos, não se suspendendo em razão de dia sem expediente forense.

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Para que seja considerada a suspensão dos prazos em razão de recesso forense, nas instâncias extraordinárias, é preciso comprová-la. A necessidade de tal demonstração ocorre porque cada Tribunal Estadual tem a sua própria disciplina sobre o período do recesso forense. O mesmo ocorre quando o último dia do prazo cai em data de feriado local, ou em dia em que, por qualquer motivo, não houve expediente forense. Esse é o entendimento consolidado no âmbito do STJ.

22

Os dias de feriado não suspendem os prazos processuais. No entanto, recaindo o último dia do prazo em feriado, ele prorroga-se para o primeiro dia útil seguinte.

Se a citação ou a intimação acontecer no curso do recesso forense, considera-se realizada no primeiro dia útil que se lhe seguir, que não é incluído na contagem do prazo.

23 Assim, caso a citação

ocorra no dia 18 de janeiro, considera-se ocorrida em 21 de janeiro, começando a contagem do prazo no dia imediatamente subsequente, ou seja, em 22 de janeiro.

9.1.1.5 PRAZOS E A LEI DO PROCESSO ELETRÔNICO (LEI 11.419/2006)

No caso de processo eletrônico, considera-se como data da publicação o primeiro dia útil seguinte ao da disponibilização da informação no Diário da Justiça eletrônico (art. 3º, § 3º, Lei 11.419/2006). Os prazos processuais terão início no primeiro dia útil que seguir ao considerado como data da publicação (§ 4º).

As petições poderão ser transmitidas até as 24 (vinte e quatro) horas do último dia do prazo (art. 3º da Lei 11.419/2006 e art. 213 do Novo CPC).

9.2 LUGAR DOS ATOS PROCESSUAIS

Os atos processuais devem ser realizados, como regra, na sede do juízo.

No entanto, podem ser realizados em outro lugar “em razão de deferência, de interesse da justiça, da natureza do ato ou de obstáculo arguido pelo interessado e acolhido pelo juiz” (art. 217, Novo CPC). O termo “deferência” significa consideração a alguma particularidade.

Por vezes, existem obstáculos à prática da realização de atos na sede do juízo. Ocorre, por exemplo, quando é necessária a oitiva de pessoa enferma, que estiver impossibilitada de comparecer à audiência (art. 449, parágrafo único, Novo CPC); ou quando se faz necessária inspeção judicial para aferir a deficiência mental nas ações de interdição. Nesses casos, o juiz poderá se dirigir ao local onde estiver a pessoa, a fim de praticar o ato processual correspondente. O art. 454 do Novo CPC também prevê um rol de autoridades que serão interrogados em sua residência.

21 STJ, EDcl no AREsp 5.067/DF, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 15/12/2011, DJe 01/02/2012. 22

STJ. AgRg no Ag 1407877/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/12/2011, DJe 19/12/2011. 23 STJ, AgRg no AREsp 23.139/MA, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 15/12/2011, DJe 01/02/2012.

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9.3 MODO OU FORMA “STRICTU SENSU” DOS ATOS PROCESSUAIS

O modo ou forma em sentido estrito dos atos processuais é regulado basicamente por quatro princípios

24:

a) Princípio da Liberdade das Formas: Como regra, a forma de praticar um ato processual é livre. Está previsto no art. 188, primeira parte, do Novo CPC.

b) Princípio da Instrumentalidade das Formas: A forma é um instrumento para que se realize o ato. Está expresso no art. 188, segunda parte, do Novo CPC.

c) Princípio da Documentação: Informa que os atos processuais devem ser documentados. Quando o ato é praticado por petição, ela o documenta. No entanto, quando não for realizado por petição, também deve ser documentado. Por exemplo, o ato praticado pela parte oralmente deve ser reduzido a termo. É o caso, por exemplo, de requerimento feito oralmente na audiência. No entanto, não precisa sempre ficar escrito. Por exemplo, o depoimento das partes e testemunhas em audiência pode ser registrado em sistema de gravação de áudio ou filmagem, conforme permissão expressa no art. 460 do Novo CPC.

d) Princípio da Publicidade: Os atos processuais são públicos, como regra. No entanto, quando tiver potencialidade de causar lesão à intimidade ou prejuízo ao interesse público, a publicidade poderá ser restringida. A esse respeito, a garantia insculpida no art. 5º, inc. LX, da Constituição Federal, segundo o qual “a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem”. O art. 93, inc. IX, da Constituição Federal, alterado pela EC 45/2004, prevê que “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação”. Assim, o juiz deverá avaliar, no caso concreto, o que é mais importante, o direito à privacidade da parte ou o direito à informação. O art. 189 do CPC também traz previsão semelhante, permitindo a restrição da publicidade quando o interesse público o exigir (inc. I), bem como em algumas outras hipóteses específicas, em razão da defesa da intimidade.

9.4 PRECLUSÃO

Preclusão é a perda do direito/faculdade/poder de praticar o ato processual.

Trata-se de uma consequência da marcha processual. O processo é uma sequência de atos processuais que deve caminhar para frente, a fim de que atinja o seu objetivo final, que é a sentença. Em razão disso, para que não haja retrocesso (o contrário de processo), é preciso que sejam criadas fórmulas de preclusão.

A preclusão pode ser temporal, consumativa ou lógica.

A preclusão temporal é a perda do direito/faculdade/poder de praticar o ato processual porque a parte não o fez no momento oportuno, ou seja, dentro do prazo. Assim, findo o prazo para a prática do ato processual, ocorre a preclusão temporal, impedindo-se que seja posteriormente praticado. Por exemplo, o prazo de contestação é de 15 dias. Se a contestação for protocolada no 16º dia, terá ocorrido a preclusão temporal.

24

Nesse sentido: CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. v. 1. 15. ed. Rio de Janeiro : Lumen Juris, 2006. p. 251-256.

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A preclusão consumativa consiste na perda do direito/faculdade/poder de praticar novamente o ato processual, por já tê-lo feito. Assim, já tendo praticado o ato processual, não poderá ser praticado novamente para corrigir o anterior. Por exemplo, uma vez apresentada a contestação, se o réu se esqueceu de algum ponto e pretender complementá-la, não poderá fazê-lo, já que houve a preclusão consumativa de tal ato processual.

Por fim, a preclusão lógica é a perda do direito/faculdade/poder de praticar o ato processual por ter praticado outro ato incompatível com o primeiro. Decorre do venire contra factum proprium non potest, princípio decorrente da boa-fé objetiva. Isto é, trata-se de uma manifestação da regra geral de que a parte não pode cair em contradição de conduta. Por exemplo, o réu se dirige à Secretaria da Vara e paga o valor da condenação; posteriormente, dentro do prazo, interpõe recurso. Se isso acontecer, terá ocorrido a preclusão lógica, pois o pagamento puro e simples do valor imposto na sentença é incompatível com a intenção de recorrer.

9.5 COMUNICAÇÃO DOS ATOS PROCESSUAIS

Quando se trata da comunicação dos atos processuais, é preciso fazer a diferenciação entre comunicação dos atos processuais às partes e comunicação entre Juízos.

A comunicação dos atos processuais às partes pode ser feita por meio de citação e intimação. De outro lado, a comunicação entre juízos se faz por carta (precatória, de ordem ou rogatória).

9.5.1 CITAÇÃO

Segundo o art. 238 do Novo CPC, citação “o ato pelo qual são convocados o réu, o executado ou o interessado para integrar a relação processual”.

Alexandre Câmara define citação como “o ato pelo qual se integra o demandado à relação processual, angularizando-a.”

25 Com efeito, antes da citação já existe processo, embora a relação

jurídica processual esteja incompleta. Com a citação, o demandado passa a integrar o processo, angularizando a relação jurídica processual.

9.5.1.1 CASOS EM QUE, TEMPORARIAMENTE, NÃO SE PODE FAZER A CITAÇÃO

Como regra, a citação “poderá ser feita em qualquer lugar em que se encontre o réu, o executado ou o interessado” (art. 243 do Novo CPC).

No entanto, o art. 244 do Novo CPC determina que não será feita a citação, salvo para evitar pe-recimento de direito, nas seguintes hipóteses:

I - de quem estiver participando de ato de culto religioso;

II - de cônjuge, de companheiro ou de qualquer parente do morto, consanguíneo ou afim, em li-nha reta ou na linha colateral em segundo grau, no dia do falecimento e nos 7 (sete) dias seguintes;

III - de noivos, nos 3 (três) primeiros dias seguintes ao casamento;

IV - de doente, enquanto grave o seu estado.

O art. 245, caput, do Novo CPC prevê que também que “não se fará quando se verificar que o ci-tando é mentalmente incapaz ou está impossibilitado de recebê-la”.

25 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. v. 1. 15. ed. Rio de Janeiro : Lumen Juris, 2006. p. 265.

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9.5.1.2 CLASSIFICAÇÃO DA CITAÇÃO

A citação pode ser:

a) Pessoal (ou real):

- Postal (art. 247 e art. 248 do Novo CPC);

- Por oficial de justiça (arts. 249 a 251 do Novo CPC).

b) Por meio eletrônico

c) Ficta:

- Por hora certa (arts. 252 a 254 do Novo CPC);

- Por edital (arts. 256 a 259 do Novo CPC).

Preferencialmente deve ser pessoal, mas, quando não for possível, será ficta.

A citação ficta é aquela que se presume que tenha ocorrido.

9.5.1.3 CITAÇÃO POSTAL

A citação postal deve ser a regra.

É realizada por uma carta de citação, que contém necessariamente: o prazo para resposta; o endereço do juízo e o respectivo cartório; a cópia do despacho do juiz que a determinou; e cópia da petição inicial (art. 248, do Novo CPC).

De outro lado, a citação por correio não é admitida nas seguintes hipóteses: nas ações de estado; nas ações que o réu seja incapaz; quando for ré a pessoa jurídica de direito público; nas situações em que o réu mora em local não atendido pelo serviço de correio; ou quando o autor justificadamente requerer que seja feita de outra forma (art. 247 e incisos, do Novo CPC).

A carta deve ter o aviso de recebimento (AR), que precisa ser assinado pessoalmente por quem está sendo citado, para a validade do ato (§ 1º do art. 247 do Novo CPC). O serviço de correios deverá devolver o aviso de recebimento (AR) ao Juízo, que o juntará ao processo para demonstrar a regularidade do ato e marcar o início do prazo para resposta.

9.5.1.4 CITAÇÃO POR OFICIAL DE JUSTIÇA

O oficial de justiça é um auxiliar do Juízo, que tem a função de executar materialmente as ordens judiciais, tendo fé pública e a possibilidade de contar com o auxílio de força policial para cumprir os mandados judiciais.

A citação será feita por oficial de justiça quando a parte assim o requerer, quando a citação por correio foi frustrada ou nos casos em que é vedada a citação por correio.

Se a citação tiver que ser realizada fora da comarca ou circunscrição, deverá ser expedida carta precatória para que, após a autorização do juiz da comarca deprecada, um oficial de justiça desta comarca cumpra o mandado e, posteriormente, seja devolvida a carta precatória cumprida ao juízo deprecante.

No entanto, nas comarcas contíguas, de fácil comunicação, e nas que se situem na mesma região metropolitana, o oficial de justiça poderá efetuar citações ou intimações sem necessidade de carta precatória, por simples mandado judicial expedido pelo Juízo do processo (art. 255, Novo CPC).

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9.5.1.5 CITAÇÃO POR MEIO ELETRÔNICO

A Lei 11.419/2006, que prevê a informatização do processo judicial, admitiu as citações por meios eletrônicos, pela internet ou em redes próprias do Judiciário.

Nos tribunais em que o processo eletrônico já é realidade, o usuário do sistema se cadastra no sistema eletrônico do Poder Judiciário, cria um login e uma senha para que tenha acesso à integra do processo e receba citações e intimações. Tal forma de citação aplica-se inclusive à Fazenda Pública (art. 6º da Lei 11.419/2006).

Os sistemas de processo eletrônico, nos tribunais em que já são adotados, no entanto, não possuem uniformização entre si.

9.5.1.6 CITAÇÃO POR HORA CERTA

A citação por hora certa é cabível quando houver suspeita fundada de que o réu esteja se ocultando.

O art. 252 do Novo CPC dispõe que “quando, por 2 (duas) vezes, o oficial de justiça houver procurado o citando em seu domicílio ou residência sem o encontrar, deverá, havendo suspeita de ocultação, intimar qualquer pessoa da família ou, em sua falta, qualquer vizinho de que, no dia útil imediato, voltará a fim de efetuar a citação, na hora que designar”.

Segundo o caput do art. 253 do Novo CPC, “no dia e hora designados, o oficial de justiça, independentemente de novo despacho, comparecerá ao domicílio ou à residência do citando a fim de realizar a diligência”.

Por fim, o § 1º desse mesmo dispositivo determina que, “se o citando não estiver presente, o oficial de justiça procurará informar-se das razões da ausência, dando por feita a citação, ainda que o citando se tenha ocultado em outra comarca, seção ou subseção judiciárias”.

O art. 254 do Novo CPC estabelece apenas uma complementação desse ato citatório, dispondo que “feita a citação com hora certa, o escrivão ou chefe de secretaria enviará ao réu, executado ou interessado, no prazo de 10 (dez) dias, contado da data da juntada do mandado aos autos, carta, telegrama ou correspondência eletrônica, dando-lhe de tudo ciência”.

De qualquer forma, fica claro que a citação ocorre no dia e hora designados pelo oficial de justiça para fazer a citação. A formalidade da comunicação para dar ciência da citação não implica na alteração da regra geral da contagem do prazo para contestar.

Isto é, mesmo no caso de citação por hora certa, aplica-se o prazo previsto no art. 231, inc. II, do Novo CPC, que prevê como dia do começo do prazo “a data de juntada aos autos do mandado cumprido, quando a citação ou a intimação for por oficial de justiça”. Nesse sentido, aliás, é pacífica a jurisprudência do STJ.

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Assim, fica claro que, mesmo na citação por hora certa, o prazo de contestação começa a correr da data da juntada aos autos do mandado de citação cumprido, pois a citação ficta realizada no dia e horário designados pelo oficial de justiça.

Decretada a revelia do réu citado por hora certa, deverá ser-lhe nomeado curador especial, na forma do art. 72, inc. II, do Novo CPC.

9.5.1.7 CITAÇÃO POR EDITAL

A citação por edital é uma modalidade de citação ficta, vale dizer, em que a citação é presumida.

A citação por edital é cabível nas seguintes hipóteses (art. 256, Novo CPC):

26 STJ, REsp 1084030/MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 18/10/2011, DJe 28/10/2011.

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I - quando desconhecido ou incerto o citando;

II - quando ignorado, incerto ou inacessível o lugar em que se encontrar o citando;

III - nos casos expressos em lei.

De acordo com o art. 257 do Novo CPC, os requisitos da citação por edital são os seguintes:

I – a afirmação do autor ou a certidão do oficial informando a presença das circunstâncias autorizadoras;

II – a publicação do edital na rede mundial de computadores, no sítio do respectivo tribunal e na plataforma de editais do Conselho Nacional de Justiça, que deve ser certificada nos autos;

III – a determinação, pelo juiz, do prazo, que variará entre 20 (vinte) e 60 (sessenta) dias, fluindo da data da publicação única ou, havendo mais de uma, da primeira;

IV – a advertência de que será nomeado curador especial em caso de revelia.

Ao réu revel citado por edital, deverá ser nomeado curador especial, na forma do art. 72, inc. II, do Novo CPC.

De outro lado, cabe mencionar que, diferentemente do processo penal (art. 366, CPP), no processo civil, o não comparecimento do réu mesmo após a citação por edital não induz à suspensão do processo. Após a citação por edital, o processo prosseguirá normalmente, sendo que o curador especial estará defendendo todos os interesses do réu no processo.

Durante algum tempo, houve certa divergência acerca da possibilidade de nomeação de curador especial para o executado citado por edital, bem como sobre a possibilidade de oferecer embargos, haja vista que se trata de uma nova ação. A esse respeito, a jurisprudência se consolidou no sentido de que deve ser nomeado curador especial se o executado, citado por edital, não apresentar embargos. Nesse caso, caberá ao curador especial opor os embargos à execução.

O mesmo raciocínio se aplica à ação monitória. Atualmente, é pacífica a jurisprudência no sentido de admitir a nomeação de curador especial em ação monitória, cabendo a ele apresentar embargos (defesa do réu na ação monitória).

27 A esse respeito, aliás, a Súmula 282 do STJ prevê que

“cabe a citação por edital em ação monitória.”

9.5.2 INTIMAÇÃO

A intimação é o ato pelo qual se dá ciência a alguém dos atos e termos do processo (art. 269, Novo CPC).

Qualquer pessoa pode ser intimada. As partes, por exemplo, são intimadas para se manifestarem no processo ou praticarem determinado ato processual. As testemunhas são intimadas para comparecer à audiência.

9.5.3 COMUNICAÇÃO ENTRE OS JUÍZOS

A comunicação entre juízos ocorre por carta.

As cartas são classificadas em carta de ordem, carta rogatória e carta precatória.

A carta de ordem é o meio de comunicação entre tribunal e um juízo que lhe é vinculado.

27 STJ, REsp 297421/MG, Rel. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Segunda Seção, julgado em 09/05/2001, DJ 12/11/2001, p. 125.

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A carta rogatória é o meio pelo qual ocorre a comunicação entre juízos de países diferentes.

No Brasil, após a EC 45/2004, compete ao Superior Tribunal de Justiça conceder o exequatur (ordem para ser cumprida no Brasil) às cartas rogatórias oriundas de países estrangeiros (art. 105, inc. I, aliena “i”, CF). Após o exequatur, o cumprimento da carta rogatória incumbe à Justiça Federal de primeira instância (art. 109, inc. X, CF).

Por fim, a carta precatória constitui o instrumento pelo qual se realizam os demais casos de comunicação. Por exemplo, entre juízos de primeira instância de comarcas diferentes; entre um tribunal e um juízo que não está a ele vinculado; etc.

As cartas (de ordem, rogatória e precatória) possuem caráter itinerante. Assim, se o Juízo Deprecado verificar que a competência para cumprir a carta precatória é de outro Juízo, poderá encaminhá-la diretamente a este, ao invés de devolver a carta precatória sem cumprimento ao Juízo Deprecante, nos termos do art. 262 do Novo CPC.

9.6 VÍCIOS E INVALIDADES PROCESSUAIS

A lei processual prescreve determinadas formas para a prática dos atos processuais, quais sejam, o tempo, o lugar e o modo a que os atos processuais devem obedecer. Se esta forma não for respeitada, haverá atipicidade legal, ou seja, descumprimento da forma.

A fim de que essas formas sejam obedecidas, a lei processual comina determinadas consequências para o caso de descumprimento.

Nesse contexto, é que está a disciplina dos vícios e invalidades processuais.

9.6.1 PRINCÍPIOS

Ao estudar o regramento dos vícios e invalidades processuais, é imperioso o conhecimento dos princípios norteadores da matéria. Como é impossível que a lei preveja todas as hipóteses de descumprimento das formas processuais, os princípios possuem especial relevância na interpretação e aplicação da medida mais adequada para cada caso concreto.

a) Princípio da Instrumentalidade: Segundo esse princípio, o processo não é um fim em si mesmo; ao revés, trata-se de um instrumento para o reconhecimento e a satisfação do direito material veiculado.

b) Princípio da Finalidade: Esse princípio informa que o juiz não deverá decretar a invalidade do ato se, mesmo realizado de outro modo, atingir a sua finalidade. Está expresso no art. 277 do Novo CPC.

c) Princípio do Prejuízo: Informa que, se não houver prejuízo à parte, o ato processual praticado em desconformidade com a lei processual será aproveitado e não será repetido. Isto é, não há nulidade sem prejuízo (pas de nullité sans grief). Tal princípio aplica-se às nulidades relativas, haja vista que, nas nulidades absolutas, o prejuízo é presumido. Está previsto nos arts. 282, § 1º, e 283, parágrafo único, do Novo CPC.

d) Princípio do Interesse: Segundo o princípio do interesse, a decretação de nulidade não poderá ser requerida pela parte que lhe deu causa. É um desdobramento da boa-fé objetiva e, mais especificamente, da aplicação o princípio do verire contra factum proprium non potest no processo civil. Está previsto no art. 276 do Novo CPC. No entanto, este princípio não se aplica às nulidades absolutas.

e) Princípio da Causalidade: Segundo o princípio da causalidade, se o ato for invalidado, serão considerados ineficazes os demais atos que dele dependam, mas a nulidade não alcançará os atos subsequentes que sejam independentes (art. 281, Novo CPC).

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f) Princípio do Aproveitamento: A atipicidade do ato processual somente acarreta a invalidação dos atos processuais que não possam ser aproveitados, desde que também não cause prejuízo às partes. Está previsto no art. 283 do Novo CPC.

9.6.2 CLASSIFICAÇÃO DOS VÍCIOS PROCESSUAIS

A depender da gravidade da atipicidade processual, isto é, da desobediência em relação à forma prevista em lei, pode ser cominada a consequência de inexistência, invalidade, ineficácia ou, ainda, de mera irregularidade.

9.6.2.1 INEXISTÊNCIA DO ATO PROCESSUAL

Ato processual inexistente é aquele em que falta elemento constitutivo mínimo. A inexistência ocorre em razão da falta da prática do ato processual ou da prática de um ato que apresenta um vício tão grave que faz com que ele sequer ingresse no mundo jurídico.

É o caso, por exemplo, da sentença proferida por um juiz aposentado, não investido de jurisdição; ou da petição inicial subscrita por quem não é advogado, quando era exigida tal condição.

O STF e o STJ entendem que se reputam inexistentes o recurso especial e extraordinário assinados por advogado que não tem procuração nos autos.

A inexistência jamais convalesce, isto é, o ato processual inexistente não pode ser sanado.

9.6.2.2 INVALIDADE DO ATO PROCESSUAL

São casos de atipicidade do ato processual, ou seja, de atos praticados em desconformidade com a forma, o tipo legal, o esquema abstrato previsto em lei.

A invalidade pode ser cominada em lei ou não expressamente cominada. Por exemplo, a ausência de fundamentação gera nulidade, a qual é cominada no art. 93, inc. IX, da Constituição Federal. A inexistência de relatório na sentença, por sua vez, também gera nulidade, embora não haja previsão legal expressa dessa consequência.

A invalidade processual pode ocorrer por nulidade absoluta ou nulidade relativa.

Tanto a nulidade absoluta quanto a nulidade relativa violam normas cogentes. Norma cogente é uma norma impositiva, cuja incidência não pode ser afastada por vontade das partes. Portanto, tanto a nulidade absoluta quanto a relativa podem ser conhecidas de ofício (não confundir com nulidade absoluta e nulidade relativa do direito civil).

A nulidade absoluta viola norma cogente que existe para tutelar o interesse público. É um vício insanável, já que tutela o interesse público, não podendo ser convalidado pela vontade das partes no curso do processo. A nulidade absoluta pode ser alegada pelas partes ou conhecida de ofício pelo juiz a qualquer momento no curso do processo.

É o caso, por exemplo, dos atos decisórios praticados por juízo absolutamente incompetente (art. 64, § 2º, Novo CPC). A incompetência absoluta pode ser alegada a qualquer tempo e inclusive ser conhecida de ofício pelo juiz, de modo que serão conservados os efeitos de decisão proferida pelo juízo incompetente até que outra seja proferida, se for o caso, pelo juízo competente (art. 64, § 4º, Novo CPC).

De outro lado, a nulidade relativa viola norma cogente criada para proteger o interesse particular. Por violar norma cogente (impositiva), pode ser conhecida de ofício pelo juiz, como regra. De

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outro lado, se não for alegada pela parte interessada na primeira oportunidade em que lhe couber falar nos autos, ocorre a preclusão, já que criada para tutelar interesse das partes, as quais devem alegar a nulidade relativa e demonstrar o prejuízo advindo do descumprimento da forma processual. Assim, a nulidade relativa é um vício sanável.

Há nulidade relativa, por exemplo, na ausência de reunião de duas causas conexas, quando era possível fazê-lo. Caso não for alegado pelas partes e for proferida sentença num dos processos conexos, sem que tenha havido a reunião, estará preclusa a possibilidade de invocar a conexão. Se não houver prejuízo, não haverá invalidação.

9.6.2.3 INEFICÁCIA DO ATO PROCESSUAL

O ato processual pode existir, ser válido, mas não produzir efeitos, em razão da ausência de cumprimento de determinada formalidade legal.

É o caso, por exemplo, da ineficácia cominada à sentença de mérito proferida no processo em que não foi citado um litisconsorte necessário (art. 114, Novo CPC). Outro exemplo é o caso da sentença proferida por juiz competente, mas que ainda não foi publicada.

Observa-se, ainda, que pode haver ineficácia do ato válido e eficácia de ato inválido.

A ineficácia de ato válido é, como regra, um fenômeno transitório. É o caso, por exemplo, da sentença que não foi publicada. Uma vez publicada, passará a produzir efeitos. No entanto, existem exceções. No caso de litisconsorte necessário que não foi citado, a ineficácia da sentença é permanente (art. 114, Novo CPC).

Também pode haver eficácia de ato inválido, já que o ato inválido produz efeitos até que tenha a sua invalidação decretada judicialmente. Não existe nulidade de pleno direito no processo civil, pois a nulidade precisa ser sempre decretada.

9.6.2.4 MERA IRREGULARIDADE

A mera irregularidade do ato processual ocorre quando há descumprimento mínimo da forma prevista em lei. São exemplos a numeração equivocada das páginas do processo; a ausência de rubrica do escrivão na numeração (art. 207, Novo CPC); a sustentação oral do advogado sem vestes talares, condignas com a profissão, exigidas pelo regimento interno do tribunal; a utilização de caneta com tinta azul claro, ao invés de tinta escura e indelével (art. 209, Novo CPC).

Segundo o entendimento do STJ, a falta de assinatura do advogado nas petições28

e a ausência de procuração

29 constitui mera irregularidade sanável nas instâncias ordinárias, embora considere vício de

inexistência quando ocorrem nas instâncias extraordinárias, nos termos da Súmula 115 do STJ30

, que continua sendo aplicada

31.

9.6.3 CONVALIDAÇÃO DO ATO PROCESSUAL

Convalidar significa tornar válido o que era inválido. É sanar as imperfeições do ato processual.

A convalidação aplica-se aos atos que apresentam nulidade relativa, na medida em que a inexistência e a nulidade absoluta são vícios insanáveis.

28 STJ, AgRg no REsp 833.415/RS, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 19/06/2012, DJe 29/06/2012. 29 STJ, AgRg no AREsp 173.328/RJ, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/06/2012, DJe 25/06/2012. 30

Súmula 115 do STJ: “Na instância especial é inexistente recurso interposto por advogado sem procuração nos autos.” 31 STJ, EDcl no AREsp 67.106/MG, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 20/09/2012, DJe 23/10/2012.

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Aplicam-se, aqui, os princípios acima estudados. Assim, no tocante às nulidades relativas, não haverá decretação de invalidade se não houver prejuízo (Princípio do Prejuízo); ou se o ato, mesmo que praticado de outra forma, tenha cumprido a sua finalidade (Princípio da Finalidade).

Além disso, a decretação de nulidade relativa não pode ser requerida pela parte que lhe deu causa (Princípio do Interesse).

De outro lado, caso decretada a nulidade do ato processual, somente devem ser também invalidados aqueles atos processuais que dele dependam (Princípio da Causalidade), devendo ser aproveitados todos os atos que não causem prejuízo às partes (Princípio do Aproveitamento).

9.6.4 OBSERVAÇÕES FINAIS SOBRE INVALIDADES PROCESSUAIS

Não há invalidação processual de pleno direito. Toda invalidade processual precisa ser decretada.

Como já se expôs, as nulidades absolutas não precluem, podendo ser alegadas pelas partes e inclusive reconhecidas de ofício pelo juiz a qualquer momento, no curso do processo.

No entanto, havendo trânsito em julgado da sentença, a coisa julgada produz o denominado efeito sanatório geral das nulidades. Isto é, com a coisa julgada, as nulidades relativas e absolutas ficariam sanadas.

De outro lado, há alguns vícios processuais que ensejam nulidade e que podem ser alegados em ação rescisória. É o caso, por exemplo, da incompetência absoluta do juízo ou do impedimento do juiz (art. 966, II, Novo CPC).

Com o transcurso do prazo de 2 anos para o ajuizamento da ação rescisória, ocorre a denominada coisa soberanamente julgada. Assim, até mesmo os vícios rescisórios não podem mais ser alegados para desconstituir a coisa julgada.

Entretanto, existem alguns vícios que são tão graves que não se convalidam nem mesmo com a coisa julgada ou após o prazo de 2 anos da ação rescisória. São denominados de vícios transrescisórios. Tais vícios podem ser alegados a qualquer tempo, por querela nullitatis ou por simples petição. É o caso, por exemplo, da ausência de citação de uma das partes.

O Código de Processo Civil de 1973 previa três formas distintas de tutela jurisdicional, que foram estabelecidas em três tipos de processos. A fim de sistematizar o regramento referente a esses três processos, o CPC/1973 os disciplinou em três livros: Livro I – Processo de Conhecimento; Livro II – Processo de Execução; Livro III – Processo Cautelar. O Novo Código de Processo Civil trouxe pequenas inovações neste sentido, passando as formas de tutela jurisdicional da seguinte maneira: Livro I – Do Processo de Conhecimento e do Cumprimento de Sentença; Livro II – Do Processo de Execução e Livro III - Os Processos Nos Tribunais E Dos Meios De Impugnação Das Decisões Judiciais.

No entanto, em razão da crescente preocupação com a efetividade do processo, ao longo do tempo, houve uma tendência de lhe conferir sincretismo. Dessa forma, atualmente, as fases de

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conhecimento, liquidação de sentença e execução (ou cumprimento de sentença) passam a ser apenas etapas de um mesmo processo. A tutela cautelar, todavia, continua autônoma, embora o Novo Código de Processo Civil também preveja o seu sincretismo com as demais espécies de tutela jurisdicional.

Em razão disso, não é mais tecnicamente correto falar de processo de conhecimento, já que, no mesmo processo, há as fases de conhecimento, liquidação e execução. Portanto, é preferível utilizar a terminologia tutela, módulo, fase ou etapa de conhecimento, para se referir à tutela jurisdicional cognitiva.

Com efeito, a tutela de conhecimento passa a ter por objeto a cognição judicial acerca de determinada lide, a fim de resolvê-la mediante provimento que reconheça judicialmente o direito da parte por meio de sentença, tornando-a indiscutível sob o manto da coisa julgada material.

Os procedimentos da tutela cognitiva são divididos em: a) procedimento comum; b) procedimentos especiais. Tais procedimento serão estudados a seguir, em itens próprios.

11.1 FORMAÇÃO DO PROCESSO

O processo civil brasileiro adota o princípio dispositivo (ou da demanda) e o princípio da inércia da jurisdição (nemo judex sine actore), pelos quais o processo começa por iniciativa da parte, não podendo o juiz iniciá-lo de ofício (art. 2º, Novo CPC).

No entanto, há exceções ao princípio dispositivo no direito brasileiro, como a abertura de inventário pelo Juízo, que pode ocorrer de ofício.

A partir do momento em que é proposta a demanda pelo autor, já existe processo. Com a citação do réu, apenas angulariza-se (teoria angular) a relação jurídica processual.

De outro lado, segundo alguns, somente existiria processo caso houvesse a angularização da relação jurídico processual. No entanto, tal teoria não consegue explicar satisfatoriamente a hipótese de haver extinção do processo sem resolução do mérito sem que o réu tenha sido citado. Em tal caso, não houve citação, mas é inegável que houve processo.

Assim, o processo forma-se a partir da propositura da demanda, mas, com a citação, a relação jurídica se completa, angularizando-se.

Uma vez proposta a demanda, o processo desenvolve-se por impulso oficial, ou seja, por despachos ou atos ordinatórios, que têm a função de impulsionar o processo. Trata-se da aplicação do princípio do impulso oficial (art. 2º do Novo CPC).

No tocante ao momento da propositura da ação, é preciso fazer a diferenciação entre o ajuizamento da demanda em comarcas que possuem vara única e aquelas que possuem mais de uma vara.

Segundo o Código de Processo Civil (art. 312, Novo CPC), considera-se proposta a ação quando a petição inicial for protocolada.

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11.1.1 ESTABILIDADE SUBJETIVA E OBJETIVA DA DEMANDA

Estabilidade da demanda quer dizer que, em determinado momento, os elementos da demanda (partes, causa de pedir e pedido) não mais podem ser alterados.

Estabilidade subjetiva diz respeito ao elemento subjetivo (partes), e estabilidade objetiva aos elementos objetivos da demanda (causa de pedir e pedido).

A estabilidade da demanda possui dois marcos essenciais, que são a citação e o saneamento do processo.

11.1.1.1 ESTABILIDADE OBJETIVA DA DEMANDA

Até o momento em que for feita a citação, pode o autor modificar o pedido e a causa de pedir, independentemente da concordância do réu (art. 329, inc. I, Novo CPC).

De qualquer forma, mesmo que admitida, a alteração do pedido não pode alterar o tipo de processo. Por exemplo, se, ao ajuizar a ação, pediu a condenação do autor a pagar quantia em dinheiro, não pode depois alterar o pedido e requerer a execução do crédito.

A partir do momento em que houver o saneamento do processo, não pode mais ocorrer modificação do pedido e da causa de pedir, nem mesmo com o consentimento do réu (art. 329, inc. II, Novo CPC).

Assim, de acordo com o Novo Código, temos que o autor poderá:

a) até a citação, aditar ou alterar o pedido ou a causa de pedir, independentemente de consentimento do réu.

b) até o saneamento do processo, aditar ou alterar o pedido e a causa de pedir, com consentimento do réu, assegurado o contraditório mediante a possibilidade de manifestação deste no prazo mínimo de 15 (quinze) dias, facultado o requerimento de prova suplementar.

Com isso, conclui-se que, no momento do saneamento do processo, ocorre estabilização objetiva da demanda.

Assim, tanto a modificação quanto o aditamento do pedido são possíveis até a citação (inclusive sem a concordância do réu). Após a citação, até o saneamento do processo, a modificação ou o aditamento só são permitidos com a concordância do réu. Após o saneamento, não há mais essa possibilidade.

11.1.1.2 ESTABILIDADE SUBJETIVA DA DEMANDA

É a impossibilidade jurídica de alteração das partes da demanda.

O Novo Código de Processo Civil mantem fixando como regra a estabilidade subjetiva da relação processual. Em seu art. 108, traz o entendimento de que, quando o processo já está em curso, “somente é lícita a sucessão voluntária das partes nos casos expressos em lei”.

A estabilização subjetiva da demanda ocorre a partir da citação válida, observado o disposto no art. 240 do Novo CPC. A partir desse marco, não mais poderá haver modificação dos sujeitos processuais (perpetuatio legitimationis)

Assim, com a citação, ocorre a estabilização subjetiva da demanda.

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Se houver litisconsórcio passivo, a estabilização da demanda ocorrerá somente após a citação de todos os réus.

No entanto, essa possibilidade de modificação das partes (até a citação) deve ser vista com reservas. Por exemplo, essa alteração das partes não pode violar o Princípio do Juiz Natural. Caso ocorra a inclusão de parte no processo, de modo que represente a escolha do Juízo, tal circunstância implicará violação ao Juiz Natural, razão pela qual não será admitida.

Como se expôs, depois da citação, não pode haver alteração das partes, como regra. No entanto, o CPC prevê casos excepcionais, em que é possível a alteração das partes após a citação. Trata-se dos casos de chamamento ao processo (com a inclusão do chamado); denunciação da lide (inclusão do denunciado); assistência (ingresso do assistente); sucessão por morte de uma das partes (os herdeiros ingressam no processo, sucedendo o falecido); alienação da coisa litigiosa quando houver consentimento da parte contrária; sucessão pela extinção da pessoa jurídica; etc.

11.2 SUSPENSÃO DO PROCESSO

A suspensão do processo é a paralisação da marcha processual em razão da ocorrência de motivos previstos em lei.

Durante a suspensão do processo, como regra, não poderão ser praticados atos processuais. No entanto, quando houver atos urgentes, ou seja, aqueles que devem ser realizados a fim de que se evite dano irreparável às partes, poderão ser praticados mesmo se o processo estiver suspenso. É o caso, por exemplo, em que há necessidade de oitiva de testemunha que passará a residir no exterior.

As hipóteses de suspensão do processo estão previstas no art. 313 do Novo CPC. São elas:

I – morte ou perda da capacidade processual de qualquer das partes, de seu representante legal ou de seu procurador

No caso de falecimento da parte, o processo será suspenso, a fim de que os herdeiros se habilitem.

Se houver a perda da capacidade processual da parte ou do seu representante legal, deverá ser habilitado o novo representante legal.

Em tais hipóteses, caso já tenha sido iniciada a audiência de instrução e julgamento, o processo somente será suspenso depois de publicada a sentença ou o acórdão.

O procedimento da habilitação está previsto nos arts. 687 e ss. do Novo CPC.

No caso de morte ou perda da capacidade processual do advogado, a parte deve ser intimada para que providencie a substituição do advogado no prazo de 15 dias. Caso não haja essa substituição, se o advogado for do autor, será extinto o processo sem resolução do mérito; se do réu, haverá revelia.

II – convenção das partes

As partes podem conjuntamente requerer a suspensão do processo. É o caso, por exemplo, em que as partes fazem um acordo sobre o bem da vida objeto da lide e postulam a suspensão do processo até o cumprimento integral do que foi pactuado.

A suspensão do processo, no caso de convenção entre as partes, não pode ser superior a 6 meses (art. 313, § 4º, Novo CPC).

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III – pela arguição de impedimento ou de suspeição;

Nesses casos, há suspensão do processo principal, a fim de que seja julgado o incidente pelo Tribunal.

IV – pela admissão de incidente de resolução de demandas repetitivas;

O Novo CPC, a fim de racionalizar das causas repetitivas, prevê como causa de suspensão dos processos repetidos a admissão do incidente de resolução de demandas repetitivas.

V – quando a sentença de mérito:

a) depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente

Essa questão prejudicial externa pode ser homogênea ou heterogênea, ou seja, pode se referir a questão que pertença ao mesmo ou a outro ramo do direito. Por exemplo, A propõe ação de alimentos contra o seu suposto pai B. B havia proposto ação negatória de paternidade. Assim, a decisão sobre paternidade é uma questão prejudicial externa homogênea à ação de alimentos.

De outro lado, também se enquadra como hipótese de suspensão a existência de uma questão prejudicial heterogênea. É o caso, por exemplo, em que o Estado propõe ação de ressarcimento contra seu servidor, alegando que houve desvio indevido de verbas públicas. O Estado pode pedir a suspensão e esperar o julgamento da ação criminal por peculato.

b) tiver de ser proferida somente após a verificação de determinado fato ou a produção de certa prova, requisitada a outro juízo

Esse dispositivo tem que ser interpretado conjuntamente com o art. 377 do Novo Código de Processo Civil, que determina que a carta precatória e a carta rogatória não suspendem o processo, no caso do art. 313, inc. V, alínea “b”, do Novo CPC, salvo quando requeridos antes da decisão de saneamento, a prova neles solicitada for imprescindível.

VI – por motivo de força maior;

Caracteriza-se a forma maior pela inevitabilidade e irresistibilidade do evento. É o caso, por exemplo, em que o Fórum é incendiado; ou a região da comarca é inundada em grandes proporções. O tempo de suspensão do processo é limitado a um prazo de um ano (art. 313, § 4º, Novo CPC).

VII – quando se discutir em juízo questão decorrente de acidentes e fatos da navegação de competência do Tribunal Marítimo;

É o caso de suspensão processual em virtude da existência de questão prejudicial externa marítima. Tem-se, por analogia às demais questões prejudiciais, uma limitação dessa suspensão ao prazo de um ano.

VIII – nos demais casos em que este Código regula;

São casos de suspensão do processo previstos no Código de Processo Civil: irregularidade de representação (art. 76 do Novo CPC); oposição autônoma (art. 685, parágrafo único, do Novo CPC); incidente de desconsideração da personalidade jurídica (art. 134, § 3º, do Novo CPC); etc.

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11.3 EXTINÇÃO DO PROCESSO

Antes da alteração do CPC pela Lei n.º 11.232/05, o Código de Processo Civil de 1973 (nos arts. 267, caput, e 269, caput) previa duas formas de encerramento da fase processual de conhecimento, assim nominadas: a) “extinção do processo sem julgamento do mérito”; e b) “extinção do processo com julgamento do mérito”.

No entanto, no art. 269 do CPC de 1973, havia casos em que se resolve o mérito, mas este não é julgado (ex.: renúncia ao direito sobre o qual se funda a ação, transação, reconhecimento do pedido pelo réu), havendo apenas sentença homologatória do juiz. Por conseguinte, a denominação “julgamento de mérito” estava incorreta.

Além disso, não havia propriamente “extinção do processo”, haja vista que o processo continuava a tramitar, na fase recursal.

Com a criação do sincretismo processual entre a fase de conhecimento e a fase de execução, a sentença também não gerava mais a extinção do processo, mesmo se não houvesse recurso, haja vista que a fase de cumprimento de sentença continuaria no mesmo processo.

Assim, passou a não ser mais correto dizer que, nos casos de resolução do mérito (art. 269, CPC/73), haveria extinção do processo. Aliás, foi isso que motivou a Lei n.º 11.232/2005 a alterar o caput do art. 269 do CPC/73 para prever apenas que “Haverá resolução de mérito”.

Com o advento do Novo CPC, o art. 267 do CPC/73 teve sua equivalência no novo art. 485, em que se determinam as hipóteses em que o juiz não resolverá o mérito. Nesse caso, ocorre apenas coisa julgada formal, podendo a demanda ser novamente proposta, corrigindo-se eventuais vícios do primeiro processo, porque não há coisa julgada material.

De outro lado, no caso de a sentença resolver o mérito, em que se aplicava o art. 269 do CPC/73, tem agora como abrigo legal o art. 487 do Novo CPC, havendo coisa julgada formal e material, de modo que o seu conteúdo se torna indiscutível e imutável.

11.3.1 EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO

São hipóteses em que há extinção do processo sem resolução do mérito quando o juiz:

I – indeferir a petição inicial;

Os casos de indeferimento da petição inicial estão previstos no art. 330 do Novo CPC. São eles:

I - quando for inepta;

II - quando a parte for manifestamente ilegítima;

III - quando o autor carecer de interesse processual;

IV - quando não atendidas as prescrições dos arts. 106 e 321.

Na grande maioria das hipóteses, o indeferimento da petição inicial implicará a extinção do processo sem resolução do mérito, conforme previsto no art. 485, inc. I, do Novo CPC.

No entanto, quando o juiz indeferir a petição inicial por reconhecer a prescrição ou a decadência, estará resolvendo o mérito, na forma do art. 487, inc. II, do Novo CPC.

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II – o processo ficar parado durante mais de 1 (um) ano por negligência das partes;

III – por não promover os atos e as diligências que lhe incumbir, o autor abandonar a causa por mais de 30 (trinta) dias;

VIII – homologar a desistência da ação;

Os incisos II e III do art. 485 do Novo CPC preveem hipóteses de abandono bilateral e unilateral do processo, respectivamente. O inciso VIII trata do caso de desistência da ação.

Como já foi referido, o processo começa por iniciativa da parte e se desenvolve por impulso oficial. Assim, somente haverá abandono do processo quando uma ou ambas as partes não tomarem as providências determinadas pelo juiz, sem as quais o processo não pode prosseguir.

O inc. II (processo ficar parado por mais de um ano por negligência das partes) trata da hipótese de abandono bilateral. Tanto autor como réu não providenciam as diligências determinadas pelo juiz. O inc. III, por sua vez, prevê o caso de abandono unilateral pelo autor.

Assim, em ambos os casos, a parte será intimada pessoalmente para suprir a falta no prazo de 5 (cinco) dias, de acordo com o § 1º do art. 485 do Novo CPC.

A desistência da ação pelo autor é causa de extinção do processo sem resolução do mérito (inc. VIII). Trata-se da hipótese em que o autor desiste da ação proposta, mas não do direito material invocado. No caso de renúncia ao direito material sobre o qual se funda a ação, será caso de resolução do mérito (art. 487, inc. III, alínea “c”, do Novo CPC).

Entretanto, o § 4º do art. 485 prevê que “oferecida a contestação, o autor não poderá, sem o consentimento do réu, desistir da ação.” Vale dizer, após o prazo de contestação, caso o autor desista da ação, o juiz deverá intimar o réu para dizer se concorda com o pedido de desistência. Caso o réu não concorde, o juiz deverá dar prosseguimento ao feito mesmo com a desistência do réu.

Tal exigência legal para a desistência (necessidade de concordância do réu) tem fundamento no interesse que o réu pode ter em buscar uma sentença de improcedência, que equivale a uma ação declaratória negativa do direito do autor, fazendo coisa julgada material.

No entanto, o Novo CPC somente previu expressamente a necessidade de concordância do réu para a extinção do processo em razão da desistência, não havendo idêntica previsão em relação à hipótese de abandono.

Assim, por uma interpretação literal, caso o autor pretendesse desistir da ação, bastaria não movimentar o processo por mais de 30 dias, com o que não precisaria da concordância do réu. Todavia, ao dar uma interpretação sistemática, a jurisprudência pacificou o entendimento de que o abandono do processo pelo autor equivale a uma desistência indireta, razão pela qual, mesmo diante do abandono, é preciso ouvir o réu sobre a extinção do processo.

Nesse sentido, foi editada a Súmula 240 do STJ, a qual prevê que “a extinção do processo, por abandono da causa pelo autor, depende de requerimento do réu.”

De outro lado, não se pode confundir os efeitos da desistência da ação com os da desistência do recurso, pois permite-se ao recorrente desistir do recurso sem concordância do recorrido.

IV – verificar a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo;

Tal inciso diz respeito à ausência dos pressupostos processuais.

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É imprescindível que o juiz, antes de extinguir o processo sem julgamento de mérito, caso se trate de vício sanável, verifique a possibilidade de convalidá-lo. Assim, somente deve extinguir o processo caso o vício seja insanável ou a parte não tome as providências necessárias para saná-lo.

Por exemplo, no caso de ausência de representação, assistência ou de procuração outorgada ao advogado, o juiz deve intimar a parte para que promova a regularização processual. Assim, somente se não for possível a regularização, ou, sendo possível, não for realizada pela parte, o juiz deverá extinguir o processo sem resolução do mérito, na forma do art. 485, inc. IV, do Novo CPC, por ausência de pressuposto processual.

V – reconhecer a existência de perempção, de litispendência ou de coisa julgada;

A litispendência ocorre quando é proposta uma demanda enquanto outra demanda idêntica já estava tramitando. Além disso, somente há litispendência quando todos os elementos da demanda são idênticos, quais sejam, partes, causa de pedir e pedido.

A perempção ocorre quando o autor deu causa à extinção do processo por abandono da causa por três vezes. Na quarta vez, a ação estará perempta, e o processo deverá ser extinto sem resolução de mérito.

A coisa julgada material ocorre quando a demanda já foi julgada em seu mérito, tendo ocorrido o seu trânsito em julgado.

Assim, ocorrendo a perempção, a litispendência ou a coisa julgada, será caso de extinção do processo sem resolução do mérito.

VI – verificar ausência de legitimidade ou de interesse processual;

Esse tema já foi tratado anteriormente, no item Ação.

VII – acolher a alegação de existência de convenção de arbitragem ou quando o juízo arbitral reconhecer sua competência;

A convenção de arbitragem tanto pode ser estabelecida por cláusula compromissória como por compromisso arbitral.

A cláusula compromissória é inserida num contrato, ficando estipulado pelas partes que eventuais controvérsias dele decorrentes serão resolvidas pela arbitragem.

No compromisso arbitral, as partes livremente pactuam que um determinado conflito já existente entre elas será resolvido pela arbitragem.

No entanto, o juiz somente poderá conhecer da convenção de arbitragem e extinguir o processo sem resolução de mérito se a parte a alegar (art. 337, § 5º, do Novo CPC). Isto é, a convenção de arbitragem, ao lado da incompetência relativa, são as únicas preliminares de contestação prevista no art. 337 do Novo CPC que o juiz não pode conhecer de ofício.

VIII – homologar a desistência da ação

Tal hipótese legal foi tratada acima, conjuntamente com abandono do processo (incisos II e III do art. 485 do Novo CPC).

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IX – em caso de morte da parte, a ação for considerada intransmissível por disposição legal;

Embora o dispositivo fale em “ação considerada intransmissível”, em verdade, o que é intransmissível é o direito material.

A intransmissibilidade pode ser absoluta ou relativa. É absoluta a intransmissibilidade quando somente puder ser exercida pelos titulares do direito. Por exemplo, no caso de ação de divórcio, caso um dos consortes faleça, não poderão os seus herdeiros continuar na ação contra o outro consorte. É relativa a intransmissibilidade quando esta sofre temperamentos, ou seja, quando há a possibilidade, em determinados casos, de o direito alegado pela parte ser transmitido aos seus sucessores, de modo que a morte não implica a imediata extinção do processo. É o caso, por exemplo, da ação investigatória de paternidade, que passa do filho para os seus herdeiros, quando ele falecer enquanto menor ou incapaz (art. 1.606, caput, CC).

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X – nos demais casos prescritos neste Código

O próprio Código de Processo Civil prevê outras hipóteses de extinção do processo sem resolução do mérito. É o caso, por exemplo, do art. 115, parágrafo único, do Novo CPC, que comina tal penalidade quando o autor não promove a citação de litisconsorte necessário. Outra hipótese é a estabelecida no art. 313, § 3º, do Novo CPC, que impõe a extinção do processo sem resolução do mérito quando o advogado do autor da ação falece e este (o autor) não constitui novo mandatário no prazo de 15 dias.

11.3.2 EXTINÇÃO DA FASE DE CONHECIMENTO COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO

É o término normal do módulo processual de conhecimento.

As hipóteses de extinção da fase de conhecimento com resolução do mérito estão previstas no art. 487 do Novo CPC. São elas:

I – quando o juiz acolher ou rejeitar o pedido formulado na ação ou na reconvenção

O acolhimento é o julgamento de procedência do pedido do autor; a rejeição do pedido é o julgamento de improcedência.

Tecnicamente, é incorreto falar de improcedência da ação. Como se viu, o direito de ação existe mesmo que não exista o direito material invocado, vale dizer, mesmo que haja uma sentença de improcedência. Assim, como o direito de ação é autônomo em relação ao direito material, a procedência ou a improcedência é do pedido, e não da ação.

II – quando o juiz decidir, de ofício ou a requerimento, sobre a ocorrência de decadência ou prescrição

Cumpre fazer a distinção entre prescrição e a decadência. Para tanto, é necessário diferenciar direito subjetivo de direito postestativo.

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MARINONI, Luiz Guilherme. MITIDIERO, Daniel. Código de Processo Civil: comentado artigo por artigo. 4. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2012. p. 262.

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Ao direito subjetivo corresponde uma obrigação. Por exemplo, ao direito de crédito do credor, corresponde a obrigação de pagar o débito do devedor. Caso o débito não seja pago no dia estipulado, haverá violação do direito subjetivo.

Quando um direito subjetivo é violado, nasce para o seu titular uma pretensão, que corresponde ao direito de exigir que a outra parte cumpra a sua obrigação.

Assim, observa-se que a pretensão não surge com o direito, mas num momento futuro em razão do descumprimento da obrigação a que corresponde o direito.

Na prescrição, o que se extingue é a pretensão, ou seja, o direito de exigir que a outra parte cumpra a sua obrigação. Assim, transcorrido o prazo prescricional, o credor não mais poderá exigir que o devedor cumpra a sua obrigação. No entanto, caso o devedor a cumpra espontaneamente, não poderá posteriormente pedir repetição de indébito, pois o que se extinguiu não foi o direito subjetivo, senão apenas a pretensão.

O direito potestativo é o poder de intervir na esfera jurídica de outrem sem que este nada possa fazer. Ao direito potestativo, não corresponde uma obrigação, mas uma sujeição.

Por exemplo, qualquer dos contratantes possui o direito potestativo de pedir a anulação de um ato jurídico inquinado de vício de anulabilidade. Caso seja provado o vício, o outro contratante ficará sujeito à invalidação do contrato.

O mesmo ocorre com o direito potestativo de revogação do mandato. Caso o mandante revogue o mandato, o mandatário nada poderá fazer.

Na ação de divórcio, caso um dos cônjuges queira pedir o divórcio, estando presentes os requisitos, a posição do outro cônjuge é apenas de sujeição à vontade do primeiro.

O direito potestativo fica sujeito a um prazo decadencial.

Na decadência, há a perda do próprio direito potestativo pelo decurso de tempo. Assim, o prazo decadencial nasce junto com o direito potestativo.

O prazo prescricional não nasce com o direito subjetivo, mas com a pretensão.

A Lei n.º 11.280/06 passou a reconhecer a possibilidade de reconhecimento de ofício da prescrição.

III – quando o juiz homologar o reconhecimento da procedência do pedido formulado na ação ou na reconvenção

Neste caso, há ato dispositivo unilateral do réu. Se o réu reconhece o pedido do autor, existe autocomposição. Então, não cabe mais ao juiz julgar o pedido, mas apenas resolver o mérito homologando o reconhecimento do pedido.

Com efeito, quando o juiz homologa a vontade das partes, não há julgamento, que é ato de imposição, mas apenas resolução do mérito.

IV – quando o juiz homologar a transação

A transação também é uma forma de autocomposição. No entanto, na transação, há concessões recíprocas.

Havendo transação, será caso de homologação, com resolução do mérito.

Na transação ocorrida na audiência judicial, as partes podem inclusive incluir, como objeto do acordo, outras questões que não estavam previstas na petição inicial, desde que envolvam as partes

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presentes na audiência. No entanto, será sempre preciso verificar a competência do juízo para homologar tal acordo.

V - quando o juiz homologar a renúncia à pretensão formulada na ação ou na reconvenção

Trata-se de ato de disposição do direito material pelo autor da ação. Neste caso, o autor não poderá mais exigir o direito nesta nem noutra ação.

Não se confunde com desistência da ação, que é modalidade de extinção do processo sem resolução do mérito.

Havendo renúncia ao direito sobre o qual se funda a ação, o juiz deverá homologar por sentença tal renúncia, pois é forma de autocomposição. O juiz não julga o mérito, mas homologa a autocomposição, resolvendo o mérito.

Como há resolução do mérito, transitada em julgado a sentença, há coisa julgada material.

O procedimento comum será objeto de estudo nos itens seguintes, percorrendo-se cada etapa desse procedimento. No entanto, a fim de elucidar o seu encadeamento lógico, apresenta-se um organograma com os seus atos processuais:

12.1 PETIÇÃO INICIAL

Conforme visto, vige no Brasil o princípio dispositivo, segundo o qual cabe à parte provocar a jurisdição. Assim, não pode o juiz dar início ao processo de ofício (princípio da inércia da jurisdição), seguindo-se o brocardo latino ne procedat iudex ex officio.

A demanda, é portanto, o ato de provocação da Jurisdição.

A petição inicial é o instrumento da demanda. A petição inicial instrumentaliza a demanda assim como a procuração instrumentaliza o mandato conferido pela parte ao advogado.

12.1.1 REQUISITOS DA PETIÇÃO INICIAL

Para que a demanda seja proposta, são exigidos determinados requisitos para a petição inicial. Eles estão previstos nos arts. 319, 320 e 106, inc. I, do Novo CPC.

A petição inicial deve descrever, dentre outras informações, os elementos da demanda (partes, causa de pedir e pedido).

Além disso, embora não esteja expresso no art. 319 do Novo CPC, a petição inicial deverá ser escrita. Nos Juizados Especiais, no entanto, admite-se que a parte apresente oralmente a sua demanda na Secretaria do Juizado, a qual deverá ser reduzida a termo.

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O art. 319 do Novo CPC prevê que a petição inicial deverá indicar os seguintes requisitos:

I - o juízo a que é dirigida;

II - os nomes, os prenomes, o estado civil, a existência de união estável, a profissão, o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas ou no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica, o endereço eletrônico, o domicílio e a residência do autor e do réu;

III - o fato e os fundamentos jurídicos do pedido;

IV - o pedido com as suas especificações;

V - o valor da causa;

VI - as provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados;

VII - a opção do autor pela realização ou não de audiência de conciliação ou de mediação.

Além disso, a petição inicial deve indicar o endereço em que o advogado receberá as intimações (art. 106, I, Novo CPC).

Estando presentes os requisitos da petição inicial, o juiz deverá, por despacho, recebê-la e determinar a citação do réu. Esse despacho do juiz (que recebe a petição inicial e determina a citação) chama-se “despacho positivo”.

12.1.2 EMENDA DA PETIÇÃO INICIAL

Se o juiz verificar que a petição inicial não preenche os seus requisitos, ou que apresenta defeitos ou irregularidades capazes de dificultar o julgamento do mérito da demanda, deverá determinar que o autor emende a petição inicial no prazo de 15 dias (art. 321, Novo CPC).

No entanto, caso esteja faltando o requisito do art. 106, inc. I, do Novo CPC (ausência de infor-mação sobre o endereço em que o advogado recebe as intimações), o prazo para emendar será de 5 dias (§ 1º do art. 106 do Novo CPC).

Em razão da instrumentalidade do processo e da economia processual, tem-se entendido que, caso se trate de vícios sanáveis, a oportunização da emenda à petição inicial é norma cogente para o juiz. Vale dizer, caso o juiz não determine a emenda e indefira, de plano, a petição inicial, extinguindo o feito sem resolução de mérito, tal sentença padecerá de error in procedendo, devendo ser cassada pelo tribu-nal, para que se oportunize a emenda. Aliás, nesse sentido consolidou-se a jurisprudência do STJ.

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12.1.3 INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL

Caso a petição inicial apresente vício insanável, ou se sanável, o autor não emende a petição ini-cial no prazo designado, o juiz deverá indeferi-la.

É imperioso deixar claro que o indeferimento da petição inicial somente ocorre no início do pro-cesso, ou seja, antes de ouvido o réu. Caso perceba a ausência de um dos requisitos da petição inicial somente depois, deverá o juiz simplesmente extinguir o processo sem resolução do mérito.

Se o juiz verificar, antes da citação do réu, que a petição é inepta e não houver emenda, deve in-deferir a petição inicial e julgar o processo extinto sem resolução do mérito, na forma do art. 330, I, e art. 485, inc. I, do Novo CPC.

33 STJ, REsp 1235960/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 05/04/2011, DJe 13/04/2011.

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A petição inicial deverá ser indeferida nas seguintes hipóteses (art. 330 do Novo CPC):

I – quando for inepta;

II – quando a parte for manifestamente ilegítima;

III – quando o autor carecer de interesse processual;

IV – quando não atendidas as prescrições dos arts. 106 e 321

12.1.3.1 INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL

A petição inicial é inepta quando (art. 330, § 1º, do Novo CPC):

I - lhe faltar pedido ou causa de pedir;

II - da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão;

III - o pedido for juridicamente impossível;

IV - contiver pedidos incompatíveis entre si.

Importante lembrar que, dessa decisão que indefere a petição inicial, cabe recurso de apelação (já que se trata de sentença), no prazo de 15 dias.

Diferentemente da regra geral, ao receber o recurso de apelação, neste caso (de indeferimento da petição inicial), o juiz deve fazer um juízo de retratação, no prazo de 5 dias (art. 331 do Novo CPC).

Lembre-se que, no recurso de apelação contra sentença que indefere a petição inicial, o réu não será citado ou intimado para apresentar contrarrazões, pois ainda não integra o processo.

12.1.4 A DEMANDA: PARTES, CAUSA DE PEDIR E PEDIDO

A demanda possui três elementos, quais sejam, partes, causa de pedir e pedido.

A petição inicial é o veículo, o instrumento da demanda. É por isso que, dentre os requisitos da petição inicial, estão a indicação das partes e a sua qualificação, os fundamentos fáticos e jurídicos (causa de pedir) e os pedidos.

O elemento “partes” já foi estudado anteriormente. É preciso, agora, tratar da causa de pedir e do pedido.

12.1.5 CAUSA DE PEDIR

A causa de pedir é um dos elementos da demanda.

Para definir em que se constitui a causa de pedir, existem duas teorias, quais sejam, a Teoria da Individualização e a Teoria da Substanciação.

Segundo a Teoria da Individualização, na petição inicial, deve estar descrito apenas o fundamento jurídico, ou seja, apenas a relação jurídica que serve de base para o pedido.

Pela Teoria da Substanciação, de outro lado, a causa de pedir, que deve estar exposta na petição inicial, é constituída pelos fatos e pelos fundamentos jurídicos (relação jurídica de direito material). Assim, a teoria da substanciação “exige que o autor substancie – fundamente – a demanda através de um

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fato ou de um conjunto de fatos aptos a suportarem a sua pretensão (...), identificando, assim, a causa de pedir como a relação fática posta à análise como suporte da pretensão”.

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O Novo Código de Processo Civil brasileiro adotou a Teoria da Substanciação, ao prever, no art. 319, inc. III, que a petição inicial deve indicar “o fato e os fundamentos jurídicos do pedido”.

Não se pode confundir fundamento jurídico com fundamento legal. Fundamento jurídico é a relação jurídica de direito material originada dos fatos. O fundamento legal ou fundamento de direito compõe o direito objetivo, sendo dispensável a sua exposição na petição inicial, já que o juiz deve conhecer o direito (jura novit curia).

Portanto, para o direito processual civil brasileiro, a causa de pedir é composta pelos fatos e os fundamentos jurídicos que embasam o pedido.

A causa de pedir é classificada em: a) causa de pedir próxima; b) causa de pedir remota; e, segundo alguns, também c) causa de pedir necessária.

No tocante à conceituação de causa de pedir próxima e remota, existe muita divergência doutrinária.

A doutrina majoritária define causa de pedir próxima como a “relação jurídica afirmada”, sendo que a causa de pedir remota residiria “no fato ou nos fatos contrários ao direito”.

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Todavia, há doutrina minoritária que conceitua causa de pedir próxima e remota no sentido exatamente inverso. De acordo com esta corrente, causa de pedir próxima constitui-se nos fatos alegados, e causa de pedir remota é a relação jurídica afirmada.

36

Por fim, a causa de pedir necessária é, de acordo com a definição de Sérgio Gilberto Porto, a “resistência injustificada à pretensão”.

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No entanto, parece-nos que tal diferenciação entre causa de pedir próxima, remota e necessária carece de maior relevância prática

38, já que, pela Teoria da Substanciação, causa de pedir são os fatos e

os fundamentos jurídicos que embasam a pretensão, razão pela qual ambos devem estar expostos na petição inicial, sob pena de inépcia.

12.1.6 PEDIDO

O pedido é o núcleo da petição inicial, o objeto da demanda, a pretensão material deduzida em Juízo.

O pedido pode ser imediato ou mediato.

O pedido imediato é o provimento jurisdicional, é a espécie de sentença que é requerida ao órgão jurisdicional. Assim, os pedido de condenação, de constituição e de declaração são pedidos imediatos.

O pedido mediato é o bem da vida postulado pelo autor. Por exemplo, R$ 10 mil; um carro, o imóvel reivindicado etc.

O pedido delimita, fornece as balizas para a prestação jurisdicional.

34 PORTO, Sérgio Gilberto. Coisa julgada civil. 3. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2006. p. 34. 35 PORTO, Sérgio Gilberto. Coisa julgada civil. 3. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2006. p. 35. No mesmo sentido: DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento. v. 1. 7. ed. Salvador : Jusposivm, 2007. p. 370. E também: GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. v. 1. 20. ed. São Paulo : Saraiva, 2007. p. 95. 36

CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. v. 1. 15. ed. Rio de Janeiro : Lumen Juris, 2006. p. 326) No mesmo sentido: NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado. 11. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2010. p. 575. 37 PORTO, Sérgio Gilberto. Coisa julgada civil. 3. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2006. p. 35. 38

No mesmo sentido: MEDINA, José Miguel Garcia. Código de processo civil comentado: com remissões e notas comparativas ao projeto do novo CPC. 2. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2012. p. 303.

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Em razão da adoção do princípio da congruência, o juiz deve se cingir em decidir o que foi pedido pelo autor na petição inicial. Assim, a sentença não poderá ser ultra petita, extra petita nem citra petita. Trata-se de uma manifestação do princípio dispositivo, segundo o qual é a parte quem escolhe se levará ou não a sua demanda ao Poder Judiciário, não podendo o juiz atuar de ofício.

Em relação ao pedido imediato, há, no entanto, uma certa mitigação da regra da congruência. Por exemplo, o autor pede a decretação da nulidade de um contrato; entretanto, a nulidade é declarada e a anulabilidade é decretada; por conseguinte, o juiz pode declarar a nulidade do contrato mesmo que o autor tenha pedido que ela fosse decretada. Outro exemplo: o autor pede que o réu seja condenado a entregar o apartamento; o juiz profere uma sentença com conteúdo executivo, determinando a reintegração do imóvel ao autor.

De outro lado, o art. 497, caput, do Novo CPC também prevê uma hipótese excepcional de mitigação do princípio da congruência ou da adstrição em relação ao pedido imediato, quando disciplina que o juiz concederá a tutela específica ou o resultado prático equivalente. Por exemplo, o autor postula que o Estado seja condenado à internação em leito de UTI na rede pública de saúde; o juiz, verificando que isso não é possível, por falta de vagas na UTI pública, determina a internação do autor em UTI particular, às expensas do Estado, ou seja, um resultado prático equivalente ao que foi postulado e tinha direito o autor.

Além disso, o art. 499 do Novo CPC também prevê que, nas hipóteses em que não for possível conceder a tutela específica ou o resultado prático equivalente ao adimplemento, a obrigação se converterá em perdas e danos. É o caso em que o autor pede determinado bem da vida in natura, mas, no caso concreto, não é possível conceder a tutela específica, como, por exemplo, diante do perecimento do bem. Nesses casos, por não restar outra alternativa, o juiz deverá converter a obrigação em perdas e danos, mesmo que essa conversão não tenha sido postulada pelo autor.

O princípio da congruência também sofre temperamentos no que diz respeito à forma de cumprimento da decisão judicial.

Com efeito, o art. 537 do Novo CPC autoriza que o juiz imponha multa ao réu para que a obrigação estabelecida na decisão judicial seja cumprida, independentemente de pedido do autor. O § 1º do art. 536 do Novo CPC possibilita que o juiz, mesmo sem requerimento da parte, determine as medidas necessárias para o cumprimento da sua decisão, tais como “a imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial”.

Tais mitigações ao princípio da congruência e ao princípio dispositivo se justificam, na medida em que o cumprimento das decisões judiciais vai além do mero interesse privado das partes, pois diz respeito ao interesse da própria Justiça.

12.1.6.1 REQUISITOS DO PEDIDO

O pedido tem que ser certo e determinado, conforme os arts. 322 e 324 do Novo CPC.

Pedido certo é aquele que é expresso no sentido de dizer o que é devido. Por exemplo, soja; feijão; automóvel; casa etc.

Pedido determinado é aquele delimitado em relação à qualidade e à quantidade. Por exemplo, mil sacas do tipo A.

12.1.6.2 PEDIDO GENÉRICO

O pedido deve ser certo e determinado, como já se viu.

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O próprio CPC, contudo, excepciona essa regra, dizendo que é possível pedido parcialmente indeterminado (indeterminado quanto à quantidade, mas determinado quanto à qualidade), nas seguintes hipóteses (§ 1º do art. 324, do Novo CPC): a) nas ações universais, se o autor não puder individuar os bens demandados; b) quando não for possível determinar, desde logo, as consequências do ato ou fato; e c) quando a determinação do objeto ou do valor da condenação depender de ato que deva ser praticado pelo réu.

12.1.7 CUMULAÇÃO DE PEDIDOS

A cumulação de pedidos ocorre quando é formulado mais de um pedido.

Essa cumulação pode ser própria ou imprópria. Também pode ser inicial ou ulterior.

12.1.7.1 CUMULAÇÃO PRÓPRIA E CUMULAÇÃO IMPRÓPRIA

12.1.7.1.1 CUMULAÇÃO PRÓPRIA

A cumulação própria de pedidos é aquela em que são formulados dois ou mais pedidos, pretendendo-se o acolhimento de todos eles.

A cumulação própria pode ser:

a) Simples: quando entre os pedidos cumulados não há relação de prejudicialidade, de modo que um pode ser julgado independentemente do outro. É o caso, por exemplo, de pedido de indenização por danos morais cumulado com pedido de indenização por danos materiais. Neste caso, a solução dada para um dos pedidos é independente da dada para o outro.

b) Sucessiva: quando há relação lógica (de prejudicialidade) entre os pedidos, de modo que o segundo somente será apreciado se o primeiro for acolhido. Por exemplo, no caso da ação de investigação de paternidade cumulada com pedido de alimentos; o pedido de alimentos somente poderá ser acolhido se o pedido de reconhecimento da paternidade for procedente. Também é caso de cumulação sucessiva de pedidos a ação reivindicatória cumulada com perdas e danos; a ação de resolução do contrato cumulada com perdas e danos; etc.

12.1.7.1.2 CUMULAÇÃO IMPRÓPRIA

Ocorre quando há cumulação de pedidos, mas somente um deles pode ser deferido.

A cumulação imprópria pode ser:

a) Alternativa: quando não há uma preferência do autor em relação a qual dos pedidos vai ser apreciado primeiro. Por exemplo, o autor pede que o Estado forneça a cirurgia ou pague a quantia correspondente para ser realizada em clínica particular.

b) Eventual: é manifestação do princípio da eventualidade no pedido. O autor pede que, caso não seja acolhido o primeiro pedido, seja acolhido o segundo, instituindo uma ordem de apreciação ao magistrado. Por exemplo, o autor pede a anulação do contrato, mas, caso não seja anulado, que seja deferida a sua revisão em razão da onerosidade excessiva; o autor pede a complementação de área na venda ad mensuram ou, caso não seja possível, a redução do preço (quanti minoris).

12.1.7.2 PEDIDO ALTERNATIVO

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O pedido alternativo é aquele em que o autor postula o cumprimento de uma obrigação alternativa.

A obrigação alternativa é a que pode ser cumprida de duas ou mais formas, pela escolha do autor ou do réu. Se a escolha couber ao autor, não haverá pedido alternativo, porque, na petição inicial, já exercerá o seu direito de escolha. Se a obrigação couber ao réu, o autor fará pedido alternativo. Com efeito, o art. 325 do Novo CPC prevê que “o pedido será alternativo, quando, pela natureza da obrigação, o devedor puder cumprir a prestação de mais de um modo”.

Por exemplo, A e B firmam um contrato de arrendamento rural da propriedade de A, sendo acordado determinado valor, que deverá ser pago por B em sacas de soja ou em dinheiro, incumbindo a escolha ao devedor B. Nesse caso, se ocorrer o inadimplemento, o credor A proporá uma ação contra o devedor B, com pedido alternativo, a fim de que este seja condenado a entregar sacas de soja ou o valor correspondente.

12.1.7.3 CUMULAÇÃO INICIAL E ULTERIOR

A cumulação de pedidos ainda pode ser:

a) Inicial: quando, na petição inicial, o autor já deduz os pedidos cumulados.

b) Ulterior: quando a cumulação de pedidos ocorre por emenda à petição inicial, aditando-se novo pedido. Lembre-se que o autor somente pode aditar pedidos até a citação do réu – independentemente do consentimento deste – ou até o saneamento do processo – dependendo do consentimento deste (art. 329, Novo CPC).

12.1.7.4 REQUISITOS DA CUMULAÇÃO

Para que seja possível a cumulação de pedidos, é imprescindível que estejam preenchidos os seguintes requisitos:

a) Competência: é necessário que o juízo seja competente para apreciar todos os pedidos.

b) Compatibilidade: os pedidos precisam ser compatíveis entre si. De outro lado, a depender do caso, é possível que pedidos incompatíveis possam ser formulados em cumulação imprópria, alternativa ou eventual.

c) Mesmo procedimento ou conversibilidade: é imprescindível que o mesmo procedimento seja adequado para processar ambos os pedidos, ou, quando os pedidos formulados ensejam procedimentos diferentes, seja possível a adoção do procedimento ordinário.

12.1.8 PEDIDO IMPLÍCITO

Como regra, todos os pedidos devem ser expressos. No entanto, em determinados casos, autorizados por lei, admite-se pedido implícito, ou seja, permite-se que a sentença decida sobre determinada pretensão mesmo sem expressa manifestação do autor.

Embora o pedido possa ser implícito (em tais hipóteses excepcionais), a sentença tem sempre que ser expressa.

São exemplos de pedido implícito:

a) os juros legais (art. 405 e 406 do CC);

b) a correção monetária (art. 404 do CC);

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c) a condenação em honorários advocatícios e custas processuais (art. 85 e 82, § 2º, do Novo CPC);

d) o pedido de condenação às prestações sucessivas (art. 323 do Novo CPC).

A esse respeito, o art. 323 do Novo CPC prevê que “na ação que tiver por objeto cumprimento de obrigação em prestações sucessivas, essas serão consideradas incluídas no pedido, independentemente de declaração expressa do autor, e serão incluídas na condenação, enquanto durar a obrigação, se o devedor, no curso do processo, deixar de pagá-las ou de consigná-las.” Assim, por exemplo, havendo ação de cobrança de aluguéis, cumulada ou não com despejo, o juiz deve condenar o réu a pagar o valor dos aluguéis vencidos e vincendos, mesmo que estes (os vincendos) não tenham sido postulados pelo autor.

39

Não se deve confundir pedido implícito com pedido genérico, que é expresso.

12.1.9 VALOR DA CAUSA

A toda a causa, ainda que sem valor econômico imediato, deve ser atribuído um valor.

O valor da causa possui diversas funções dentro do processo. É utilizado, por exemplo, como base de cálculo para a imposição de multa (art. 77, § 2º; art. 468, § 1º; art. 968, inc. II; art. 1.026, § 2º, e art. 1.021, § 4º, todos do Novo CPC). Além disso, é utilizado para o cálculo das custas processuais, bem como pode ser utilizado como base de cálculo dos honorários quando não houver condenação.

A fixação do valor da causa pode ser legal ou voluntária.

É legal quando fixado conforme as hipóteses legais previstas em lei (arts. 292 do Novo CPC). A fixação será voluntária quando o valor da causa é definido segundo estimativa feita pelo autor.

A lei determina o valor da causa nos seguintes casos:

a) Cobrança de dívida: valor do principal, juros, multa e correção monetária;

b) Discussão de contrato: tendo por objeto a existência, validade, cumprimento, modificação ou rescisão de negócio jurídico, o valor da causa será o valor do contrato.

c) Ação de alimentos: a soma do valor de 12 prestações mensais.

d) Divisão, demarcação e reinvindicação: valor do imóvel, utilizado no cálculo do imposto sobre a propriedade.

e) Se são postuladas prestações vencidas e vincendas: o valor de ambas. No entanto, se o valor das vincendas ultrapassar 1 ano ou se for por prazo indeterminado, será tomado por base o valor correspondente a de 1 ano de prestações vincendas, mais o das vencidas, se houver.

f) Na cumulação de pedidos:

f.1) Cumulação própria (simples e sucessiva): a soma dos valores dos pedidos cumulados.

f.2) Cumulação imprópria alternativa: o maior valor objeto do pedido.

f.3) Cumulação imprópria eventual: o valor do pedido principal.

No caso de a parte requerida entender que o autor atribuiu à causa valor incorreto, poderá opor impugnação ao valor da causa. Tal incidente será estudado no item referente às respostas do réu.

39

Nesse sentido, a jurisprudência do TJDFT: Acórdão n.453310, 20090710320402APC, Relator: ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO, 6ª Turma Civel, Publicado no DJE: 14/10/2010. Pág.: 320.

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12.1.10 ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA

Os benefícios da gratuidade judiciária compreendem tanto a assistência jurídica (por defensor público, núcleos de prática jurídica de universidades, nomeação de advogado dativo etc.) quanto a isenção de custas processuais, honorários periciais e honorários advocatícios.

O benefício da assistência judiciária gratuita deve ser concedido pelo juiz aos economicamente necessitados, nos termos da Lei 1.060/1950.

Considera-se “necessitado”, para os fins da referida lei, “todo aquele cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família” (art. 2º da Lei 1.060/1950).

A própria lei prevê que, para obter tal benefício, bastará à parte fazer simples afirmação de que não está em condições de pagar as custas processuais e os honorários de advogado, sem prejuízo próprio ou de sua família (art. 4º).

A jurisprudência dos tribunais pátrios, por sua vez, tem dado interpretação excessivamente ampla ao conceito de necessitado economicamente. Com efeito, grande parte da jurisprudência reconhece que pessoas que recebem até 10 salários mínimos são “pobres nos termos da lei”

40.

12.2 IMPROCEDÊNCIA PRIMA FACIE (JULGAMENTO LIMINAR DE IMPROCEDÊNCIA)

O art. 332 do Novo CPC traz em seus incisos algumas hipóteses de o juiz julgar liminarmente improcedente o pedido de causa que dispense a fase instrutória, independentemente da citação do réu.

São estas as hipóteses em que o pedido contrariar:

I - enunciado de súmula do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça;

II - acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;

III - entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;

IV - enunciado de súmula de tribunal de justiça sobre direito local.

Trata-se da criação do instituto denominado improcedência prima facie, julgamento liminar de mérito ou, ainda, julgamento liminar de improcedência, como bem define Renato Castro

41.

No direito processual brasileiro, já havia outra hipótese de julgamento liminar, qual seja, o indeferimento da petição inicial com base na decadência ou na prescrição, na forma do art. 332, § 1º, do Novo CPC. Tal decisão resolve o mérito (art. 487, II, Novo CPC) e tem aptidão para fazer coisa julgada material.

O dispositivo equivalente no Código de 1973, o antigo art. 285-A, tinha em sua redação que seria cabível o julgamento prima facie nas causas em que a “matéria controvertida for unicamente de direito”. No entanto, tal redação foi alvo de críticas pela doutrina, uma vez que, como ainda não ocorreu a

40 STJ, REsp 1317175/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/03/2013, DJe 20/03/2013). Confira-se, ainda: STJ, REsp 263.781/SP, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/05/2001, DJ 13/08/2001, p. 150. 41 CASTRO, Renato. Julgamentos liminares de improcedência. Brasília : Gazeta, 2012.

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citação, não há como haver controvérsia. No Novo Código, a redação, agora do novo art. 332, foi modificada para “nas causas que dispensem a fase instrutória”.

Em suma, se a causa que dispensar fase instrutória tiver pedido que contrarie súmula ou acórdão do STF ou do STJ, entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência ou súmula de tribunal de justiça sobre direito local, o juiz, independentemente de citação do réu, julgará liminarmente improcedente.

Na sentença, para que o julgamento prima facie ocorra, é preciso, de acordo a jurisprudência dominante, a “reprodução” das sentenças anteriormente prolatadas para casos idênticos. Isto é, não basta apenas a menção a decisões anteriores proferidas pelo Juízo, sendo imprescindível a sua reprodução e a demonstração dos paradigmas.

42

De outro lado, havendo recurso de apelação interposto pelo autor, haverá juízo de retratação pelo juiz, que decidirá se mantém a sentença, ou a reforma e dá prosseguimento à ação (art. 332, § 3º, Novo CPC). O juízo de retratação, neste caso, está em sintonia com o princípio da cooperação, que impõe dialeticidade entre o juiz e as partes.

Caso mantida a sentença, será citado o réu para apresentar contrarrazões ao recurso. Observe-se que o § 4º do art. 332 do Novo CPC fala em “citação” e não em “intimação”. Isso ocorre porque, no caso de julgamento prima facie, a sentença foi proferida sem que o réu tenha sido citado para integrar a relação jurídica processual. Por conseguinte, a citação do réu, nesses casos (julgamento prima facie), ocorre na fase recursal, quando apresentará as suas contrarrazões recursais (e não contestação).

Se não houver observância em relação às hipóteses trazidas pelo art. 332 do Novo CPC, havendo recurso, o tribunal deverá cassar a sentença, determinando que o processo prossiga.

Como é provável que a causa esteja totalmente instruída (pois se aplicou o art. 332), bem como houve contraditório (em razão da citação e oportunização da apresentação das contrarrazões recursais), a jurisprudência tem entendido que existe a possibilidade de aplicação, por analogia, da Teoria da Causa Madura, prevista no art. 1.013, § 3º, do Novo CPC, que assim dispõe, portanto, que o julgamento imediato poderá ocorrer quando:

I - reformar sentença fundada no art. 485;

II - decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa de pedir;

III - constatar a omissão no exame de um dos pedidos, hipótese em que poderá julgá-lo;

IV - decretar a nulidade de sentença por falta de fundamentação.

Por conseguinte, estando a causa suficientemente instruída, pode o Tribunal julgar o mérito da demanda e, inclusive, decidir pela procedência dos pedidos, mesmo que tenham sido julgados improcedentes com base no art. 332 do CPC.

43

Assim, caso haja apelação da sentença que julgou improcedentes os pedidos com base no art. 332 do Novo CPC, poderá o Tribunal, ao analisar o recurso: a) determinar que seja cassada a sentença, por entender que não há correspondência com as hipóteses previstas no art. 332, dando-se prosseguimento ao feito em primeira instância; b) entender que não é caso de improcedência e, por não estar o feito suficientemente instruído, anular a sentença e determinar o prosseguimento do processo em primeira instância, a fim de que siga o seu curso normal, com a fase de instrução e o posterior julgamento por sentença; c) caso o feito já esteja suficientemente instruído, dar provimento ao recurso e

42 STJ, AgRg no REsp 1307682/RN, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27/11/2012, DJe 03/12/2012. 43

TJDFT, Acórdão n. 558252, 20100110068682APC, Relator Arnoldo Camanho De Assis, 4ª Turma Cível, julgado em 07/12/2011, DJ 12/01/2012 p. 109.

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julgar procedente ou parcialmente procedente o pedido, se entender que prospera a pretensão da parte autora (já que a parte ré já teria apresentado a sua defesa nas contrarrazões de apelação); d) manter a sentença, se entender que há correspondência com alguma das hipóteses do art. 332 e que realmente não prospera a pretensão da parte autora.

12.3 RESPOSTAS DO RÉU

São as formas de exercício do direito de defesa pelo réu.

O Código de 1973 previa três espécies de resposta do réu: (i) contestação, (ii) reconvenção e (iii) exceção (de incompetência relativa, de impedimento ou de suspeição). O Novo Código alterou significativamente essa matéria, de modo que prevê apenas duas espécies de resposta do réu à petição inicial: (i) contestação e (ii) reconvenção. As exceções foram eliminadas pelo legislador do Novo Código e, como veremos a seguir, surgem outras vias para arguir as respectivas matérias.

12.3.1 CONTESTAÇÃO

14.3.1.1 CONCEITO, ESPÉCIES E CLASSIFICAÇÕES

A contestação é a resposta do réu mais importante, é a peça de defesa essencial ao contraditório.

Como regra, deve ser apresentada por petição. No entanto, no rito sumário e nos juizados especiais, pode ser apresentada de forma oral na própria audiência, sendo reduzida a termo.

Na contestação, o réu pode apresentar defesas processuais ou defesas substanciais (ou materiais).

Parte da doutrina também diferencia objeções de exceções. Segundo essa classificação, objeções são as defesas sobre matérias que o juiz pode conhecer de ofício. As exceções, ao seu turno, são defesas que envolvem matérias que o juiz não pode conhecer de ofício, isto é, somente podem ser apreciadas pelo juiz se alegadas pela parte.

44

No entanto, por vezes, esses termos (objeções e exceções) são usados indistintamente, indicando apenas o exercício do direito de defesa.

Considerando o conteúdo da resposta, as defesas substanciais (ou materiais) podem classificadas em diretas ou indiretas.

a) Defesa direta: a defesa é direta quando o réu nega o fato constitutivo do direito do autor.

b) Defesa indireta: é indireta a defesa quando o réu alega fato impeditivo, extintivo ou modificativo do direito do autor. É o caso, por exemplo, de alegação de incapacidade civil do agente; de prescrição; de pagamento parcial.

De outro lado, levando em consideração a finalidade da alegação, a defesa pode ser:

a) Defesa dilatória: trata-se de alegação que apenas posterga o julgamento do mérito para momento posterior. É o caso, por exemplo, das alegações de incompetência, conexão e nulidade de citação.

44 DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento. v. 1. 7. ed. Salva-dor : Jusposivm, 2007. p. 443/444.

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b) Defesa peremptória: tem por objeto atacar a pretensão do autor, conduzindo à extinção do processo sem resolução do mérito ou ao não acolhimento do pedido do autor. São defesas peremptórias, por exemplo, as alegações de ilegitimidade de parte e de litispendência, que conduzem à extinção do processo sem resolução do mérito.

12.3.1.2 PRINCÍPIO DA EVENTUALIDADE, ÔNUS DA IMPUGNAÇÃO ESPECIFICADA DOS FATOS E CONTESTAÇÃO POR NEGATIVA GERAL

Vigora, no sistema processual brasileiro, o princípio da eventualidade ou da concentração da defesa, segundo o qual toda a matéria de defesa deve ser alegada em contestação.

Assim, todas as alegações, ainda que contraditórias entre si, devem ser deduzidas de uma só vez na peça de contestação, sob pena de preclusão. Excetuam-se da fórmula da preclusão, no entanto, aquelas matérias relativas a direito superveniente, as que o juiz poderia conhecer de ofício, ou que, por expressa autorização legal, puderem ser formuladas a qualquer tempo e grau de jurisdição (art. 342, Novo CPC).

Além disso, também vigora o ônus da impugnação especificada dos fatos, segundo o qual o réu deve impugnar, na contestação, todos os fatos arguidos pelo autor na inicial, sob pena de serem reputados verdadeiros (art. 341, Novo CPC). Assim, haverá confissão ficta em relação aos fatos não impugnados.

Tal efeito (presunção de veracidade) não se produzirá quando: a) a petição inicial não estiver acompanhada de instrumento que a lei considerar da substância do ato; b) quando se tratar de direito sobre o qual não se admite a confissão – direitos indisponíveis (art. 392, Novo CPC); ou c) quando os fatos alegados pelo autor estiverem em contradição com a defesa, considerada em seu conjunto.

De outro lado, o Código de Processo Civil também prevê que, em determinados casos, será possível a contestação por negativa geral, isto é, a apresentação de contestação sem a necessidade de impugnar especificamente cada fato alegado pelo autor. Admite-se contestação por negativa geral pelo defensor público, pelo advogado dativo e pelo curador especial (art. 341, parágrafo único, Novo CPC).

12.3.1.3 MATÉRIAS QUE DEVEM SER ALEGADAS EM PRELIMINAR DE CONTESTAÇÃO

O réu deve alegar em preliminar de contestação as seguintes matérias (art. 301, CPC):

I – inexistência ou nulidade da citação;

Trata-se de uma defesa dilatória, haja vista que não conduz à extinção do processo sem resolução do mérito.

O art. 214, § 1º, do CPC prevê que o comparecimento espontâneo do réu no processo supre a citação nula ou mesmo inexistente.

Assim, se o réu comparecer pessoalmente no processo apenas para alegar ausência ou invalidade da citação, considera-se citado, sendo reaberto para ele o prazo de contestação.

De outro lado, se o réu apresentar contestação e alegar, além da invalidade ou inexistência de citação, todas as questões de mérito, o seu comparecimento supre a citação e não lhe será concedido novo prazo para contestar, tendo em vista a preclusão consumativa.

II – incompetência absoluta e relativa;

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Tanto a incompetência absoluta como a relativa devem ser alegadas em preliminar de contestação. Anteriormente, o Código de 1973 previa o instrumento da exceção de incompetência para a parte alegar incompetência relativa – isto é, por meio de peça autônoma. O Novo Código, ao eliminar as exceções, incorporou a matéria de incompetência relativa às hipóteses legais de preliminar de contestação.

Quanto à incompetência absoluta, se não suscitada na contestação, poderá ser alegada por simples petição a qualquer momento no curso do processo. Trata-se, inclusive, de um vício rescisório.

III – incorreção do valor da causa;

O valor da causa, requisito obrigatório da peça inicial e que tem diversos reflexos no processo, pode ser objeto de impugnação pela parte ré.

Antes tratada em peça autônoma, a partir da impugnação ao valor da causa, agora, com o advento do Novo Código, essa matéria agora deve ser alegada em preliminar de contestação.

IV – inépcia da petição inicial;

Lembrar que uma eventual inépcia da petição inicial alegada pelo réu em contestação não ensejará o indeferimento da inicial (porque a petição inicial já foi recebida), mas apenas a extinção do processo sem resolução do mérito, na forma do art. 485, I, Novo CPC.

V – perempção;

VI – litispendência;

VII – coisa julgada;

São pressupostos processuais extrínsecos ou negativos, que levam à extinção do processo sem resolução do mérito. Trata-se de institutos já estudados anteriormente.

VIII – conexão;

A continência, embora não prevista expressamente no rol do art. 337 do Novo CPC, também deve ser alegada em preliminar de contestação.

Trata-se de causas que não levam à extinção do processo sem resolução do mérito, mas somente à modificação de competência.

IX – incapacidade da parte, defeito de representação ou falta de autorização;

São pressupostos processuais subjetivos relativos às partes, já estudados anteriormente.

X – convenção de arbitragem;

Trata-se de pressuposto processual extrínseco ou negativo. Inclui-se, aqui, tanto a cláusula compromissória quanto o compromisso arbitral.

XI – ausência de legitimidade ou de interesse processual;

XII – falta de caução ou de outra prestação que a lei exige como preliminar;

É o caso, por exemplo, da ausência de depósito na ação rescisória (art. 968, II, Novo CPC).

XIII – indevida concessão do benefício de gratuidade de justiça.

12.3.1.4 PRAZO PARA CONTESTAÇÃO

O prazo para o réu interpor contestação é de 15 dias. O termo inicial será a data (i) da audiência de conciliação ou de mediação, ou da última sessão de conciliação, quando qualquer parte não

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comparecer ou, comparecendo, não houver autocomposição; (ii) do protocolo do pedido de cancelamento da audiência de conciliação ou de mediação apresentado pelo réu, quando ocorrer a hipótese do art. 334, § 4o, inciso I; ou (iii) aquela prevista no art. 231, de acordo com o modo como foi feita a citação, nos demais casos.

Caso o advogado do réu retire os autos em carga e junte procuração com poderes para receber citação, o requerido considera-se citado neste momento, independentemente da juntada do AR ou do mandado de citação. De outro lado, se a procuração não confere ao advogado poderes especiais para receber citação, a jurisprudência majoritária do STJ entende que a juntada da procuração e a retirada dos autos pelo advogado não é considerado “comparecimento espontâneo do réu” capaz de suprir a citação.

45

Quando, no processo, forem citados vários réus, o prazo para a apresentação de contestação será de acordo com o §1º do art. 231 do Novo CPC, isto é, a última data dentre as datas de juntada do AR, ou do mandado cumprido, etc.

Caso os réus constituam advogados distintos, os prazos serão contados em dobro (art. 229 do Novo CPC).

De outro lado, não é incomum que seja movida uma ação contra vários réus e não se consiga localizar um ou alguns deles, o que motiva o autor a desistir da ação em relação a estes. Nesse caso, não tendo a audiência sido realizada (por alguma das hipóteses do §4º do art. 334 do Novo CPC), e havendo desistência do pedido em relação a um dos réus, por não ser localizado para citação, aplica-se o art. 335, § 2º, do Novo CPC, que determina expressamente que, se o autor desistir da ação quanto a algum réu ainda não citado, “o prazo para resposta correrá da data de intimação da decisão que homologar a desistência”.

Portanto, enquanto não intimados todos os demais réus (já citados) da decisão que deferiu a desistência em relação a um dos réus e o excluiu do polo passivo do processo, não iniciará o prazo de resposta.

12.3.1.5 REVELIA E EFEITOS

A revelia é um fato, consistente na ausência de contestação, no tempo e na forma legais.

Se o réu não apresentar contestação, apresentá-la intempestivamente ou apresentar apenas reconvenção, terá ocorrido a revelia.

De outro lado, o oferecimento de petição específica para alegar suspeição ou impedimento pode, se recebido com efeito suspensivo, suspender o prazo para contestar (art. 146, § 2º, II, do Novo CPC). Após o julgamento do incidente, nesse caso, devolve-se ao réu o que restava do prazo, a fim de que apresente contestação.

A revelia produz um efeito material (ou substancial) e dois efeitos formais (ou processuais). Trata-se dos seguintes efeitos jurídicos:

1º) Presunção de veracidade das alegações de fato formuladas pelo autor (art. 344, Novo CPC);

É o efeito material (ou substancial) da revelia.

No entanto, a revelia não produz esse efeito quando, havendo pluralidade de réus, algum deles contestar a ação; se o litígio versar sobre direitos indisponíveis; se a petição inicial não estiver acompanhada de instrumento que a lei considere indispensável à prova do ato; ou se as alegações de fato formuladas pelo autor forem inverossímeis ou estiverem em contradição com prova constante dos autos (art. 345, Novo CPC).

45 STJ, AgRg no Ag 1176138/MS, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 09/10/2012, DJe 06/11/2012.

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2º) Não intimação dos atos e termos do processo, salvo se já tiver advogado constituído nos autos (art. 346, Novo CPC).

Trata-se de efeito formal (ou processual) da revelia.

A redação do art. 346 do Novo Código prevê que “os prazos contra o revel que não tenha patrono nos autos fluirão da data de publicação do ato decisório no órgão oficial”. Isto é, se o réu já tiver constituído advogado nos autos, a revelia não produzirá este efeito jurídico no processo, pois o réu terá de ser intimado de todos os atos e termos do processo por intermédio do seu advogado. De outro lado, se o réu revel não tiver constituído patrono nos autos, haverá a aplicação deste efeito, deixando-se de intimá-lo dos atos e termos do processo.

3º) Julgamento antecipado do mérito (art. 355, II, CPC).

É o segundo efeito formal (ou processual) da revelia. Diz-se que o julgamento é antecipado porque ocorre sem que seja aberta a fase de instrução processual, julgando-se o processo com base nas alegações e provas já produzidas. Assim, havendo presunção de veracidade das alegações de fato, e não havendo requerimento de prova (na forma do art. 349 do Novo CPC), o juiz julgará o mérito de forma antecipada.

A par desses efeitos jurídicos da revelia, é preciso expor algumas peculiaridades do instituto.

No caso de réu revel citado por edital ou por hora certa, deve ser nomeado curador especial (art. 72, II, do Novo CPC), e não devendo ser reconhecidos os efeitos jurídicos da revelia.

De outro lado, não pode se confundir a revelia, que é o fato de não ser apresentada contestação no prazo e forma legais, com os seus efeitos. Assim, por exemplo, se o litígio versar sobre direitos indisponíveis e o réu não apresentar contestação, haverá revelia. O que não há é a presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor (efeito material da revelia).

O art. 346, parágrafo único, do Novo CPC, prevê que “o revel poderá intervir no processo em qualquer fase, recebendo-o no estado em que se encontrar”. Neste caso, se o réu revel intervier no curso do processo, a qualquer momento, passará novamente a ser intimado, bem como o receberá no estado em que se encontrar. Assim, por exemplo, se compatível com a fase processual em que intervier, poderá produzir provas, requerer a designação de audiência de instrução, arrolar testemunhas, apresentar alegações finais etc. A esse respeito, é pacífica a jurisprudência.

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12.3.2 RECONVENÇÃO

12.3.2.1 CONCEITO, FORMA E PRAZO

A reconvenção – que, pelo CPC de 1973, deveria obrigatoriamente ser apresentada na forma de peça autônoma – pode ser tanto formulada na própria contestação como por peça autônoma (art. 343, Novo CPC). Assim como a contestação, seu prazo para oferecimento é de 15 dias. Nessa linha, o STJ já havia firmado entendimento de que o oferecimento de reconvenção na mesma peça da contestação, desde que em itens distintos, configuraria mera irregularidade e, por conseguinte, deveria ser admitida.

47

De qualquer forma, o Novo CPC reformulou a redação antiga, permitindo expressamente sua formulação na contestação.

A reconvenção não gera processo novo. Há ampliação objetiva do processo, pois se acrescenta nova causa de pedir e novo pedido.

No tocante ao prazo, não há mais a obrigatoriedade de a reconvenção dever ser oferecida simultaneamente à contestação, como expresso no Código de 1973. Contudo, apresentada a contestação

46 TJDFT, Acórdão n.611034, 20110710087248APC, Relator: LECIR MANOEL DA LUZ, 1ª Turma Civel, Publicado no DJE: 03/09/2012. Pág.: 65. 47 STJ, REsp 549.587/PE, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 23/03/2004, DJ 10/05/2004, p. 335.

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sem que simultaneamente seja protocolada a reconvenção, ocorre a preclusão consumativa, impedindo que seja recebida a reconvenção, mesmo que dentro do prazo de resposta. Esse é o entendimento da doutrina majoritária e do STJ.

48 De outro lado, alguns entendem que a reconvenção poderia ser oferecida

no prazo da contestação, ainda que não simultaneamente.

12.3.2.2 REQUISITOS

Para que seja possível o oferecimento de reconvenção, são necessários os seguintes requisitos:

1º) o juízo seja competente para ambas as demandas;

2º) compatibilidade entre os procedimentos;

3º) a reconvenção seja oferecida simultaneamente à contestação;

4º) exista conexão entre a reconvenção e a demanda principal, ou entre a reconvenção e o fundamento de defesa.

O conceito de “conexão” aqui é diferente daquele previsto no art. 55 do Novo CPC. Para o oferecimento de reconvenção, basta um nexo entre a reconvenção e a demanda principal, ou entre a reconvenção e o fundamento de defesa.

49

Além dos requisitos acima, a reconvenção também deve conter os requisitos da petição inicial, se proposta como autônoma, embora ajuizada no mesmo processo.

12.3.2.3 INDEFERIMENTO DA RECONVENÇÃO

Não preenchidos os requisitos da reconvenção, o seu processamento deve ser indeferido pelo juiz.

A decisão que indefere o processamento da reconvenção possui natureza de decisão interlocutória, razão pela qual é cabível o agravo de instrumento, na forma do art. 356, § 5º, do Novo CPC. Nesse sentido, a pacífica jurisprudência do STJ.

50

12.3.2.4 RESPOSTA À RECONVENÇÃO

Da reconvenção, será intimado o autor, na pessoa do seu advogado, para que apresente resposta no prazo de 15 dias.

Mesmo que o advogado não tenha poderes especiais, a intimação será feita na sua pessoa, pois a lei processual assim determina. Como a reconvenção é proposta no mesmo processo (e inclusive nos mesmos autos), não há nova citação, mas apenas intimação para apresentar resposta.

12.3.2.5 RECONVENÇÃO E AÇÕES DE PROCEDIMENTO ESPECIAL

a) Ação popular: Não se admite o instituto da reconvenção na ação popular, porque o autor não pleiteia direito próprio contra o réu, mas sim direitos coletivos ou difusos. De acordo com o § 5º do art.

48 STJ, AgRg no REsp 935.051/BA, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 14/09/2010, DJe 30/09/2010. 49 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. v. 1. 15. ed. Rio de Janeiro : Lumen Juris, 2006. p. 346/347. 50 “RECONVENÇÃO. Indeferimento. Recurso. Agravo. Cabe agravo da decisão que indefere liminarmente a reconvenção. Precedentes. Recurso não conhecido.” (STJ, REsp 443.175/SP, Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA, julgado em 21/11/2002, DJ 16/12/2002, p. 345)

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343, do Novo CPC, sendo o autor substituto processual, isto é, demandante em nome de outrem, “o reconvinte deverá afirmar ser titular de direito em face do substituído, e a reconvenção deverá ser proposta em face do autor, também na qualidade de substituto processual”. Nesse sentido, é pacífica a jurisprudência do STJ.

51

b) Na ação monitória: A Súmula 292 do STJ prevê que “a reconvenção é cabível na ação monitória, após a conversão do procedimento em ordinário”.

c) Na ação de busca e apreensão decorrente de alienação fiduciária: O STJ, com precedentes da sua Corte Especial, também pacificou o entendimento de que “é cabível a apresentação de reconvenção à ação de busca e apreensão decorrente de alienação fiduciária, com a finalidade de se pleitear a revisão do contrato, bem como a devolução de quantias pagas a maior.”

52

d) Na ação declaratória: A doutrina e a jurisprudência também são uníssonas em admitir reconvenção no bojo de ação declaratória.

53

e) Nos embargos à execução fiscal: O art. 16, § 3º, da Lei de Execução Fiscal (Lei 6.830/1980) prevê expressamente que “não será admitida reconvenção” nos embargos à execução fiscal".

f) Na ação rescisória: Somente será admitida a reconvenção em ação rescisória se o pedido reconvencional também for rescisório e relativo ao mesmo julgado impugnado na ação rescisória.

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12.3.2.7 RECONVENÇÃO E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

Como a reconvenção é demanda autônoma, proposta pelo réu contra o autor da demanda principal, terá, ao final, um vencedor e um vencido, pois o pedido reconvencional será julgado procedente, parcialmente procedente ou improcedente.

Por conseguinte, na sentença, também deverá haver fixação de honorários advocatícios sucumbenciais para a reconvenção. Nesse sentido é o entendimento do STJ.

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12.3.3 A EXTINÇÃO DAS EXCEÇÕES (EXCEÇÕES INSTRUMENTAIS)

As exceções (exceções instrumentais), no Código de 1973, eram modalidades de resposta do réu, que deveriam necessariamente ser apresentadas em petições autônomas, para o réu alegar incompetência relativa, suspeição ou impedimento. Com o advento do Novo Código, extinguiram-se as exceções.

A incompetência relativa é, a partir do novo diploma, matéria de preliminar de contestação, conforme o art. 337, II, do Novo CPC. As alegações de impedimento ou suspeição do juiz, por sua vez, devem ser feitas por simples requerimento, no prazo de 15 dias do conhecimento do fato, de acordo com o art. 146 do Novo CPC.

No caso de haver impedimento do juiz, tal vício gera nulidade absoluta e pode, inclusive, ser objeto de ação rescisória após o trânsito em julgado da sentença de mérito

56. Por tal motivo, o prazo de

51 STJ, REsp 72.065/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/08/2004, DJ 06/09/2004, p. 185. 52

STJ, AgRg no REsp 1028453/RJ, Rel. Ministro Vasco Della Giustina (Desembargador Convocado do TJ/RS), Terceira Turma, julgado em 23/11/2010, DJe 09/12/2010. 53

STJ, REsp 953.192/SC, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 07/12/2010, DJe 17/12/2010). No mesmo sentido: STJ, REsp 921.947/PR, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 07/06/2011, DJe 13/06/2011. 54 TJDFT, Acórdão n. 480597, 20090020096006ARC, Relator JOÃO MARIOSI, 3ª Câmara Cível, julgado em 14/02/2011, DJ 17/02/2011 p. 51. 55 STJ, REsp 614.617/DF, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/06/2009, DJe 29/06/2009. 56

“Art. 485. A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando: (...) II - proferida por juiz impedido ou absolutamente incompetente;”

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15 dias para a apresentação do requerimento é prazo impróprio. Vale dizer, passado esse prazo, não há preclusão. Esse é o entendimento pacífico da doutrina.

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Arguido o impedimento ou a suspeição, haverá a suspensão do processo, conforme o art. 313, III, do Novo CPC. Por conseguinte, também ficará suspenso o prazo para contestar e para reconvir. Aliás, apresentado o incidente, não deverá o réu oferecer contestação ou reconvenção, porque o processo está suspenso.

Ao ser distribuído o incidente, o relator poderá recebê-lo mantendo ou afastando o efeito suspensivo do processo, de acordo com o art. 146, § 2º, do Novo CPC.

A incompetência relativa, que, como já estudado, deve ser objeto de preliminar de contestação, pode ser alegada unicamente pela parte ré. O Ministério Público, como fiscal da lei, não possui legitimidade para tanto. A jurisprudência do STJ é pacífica nesse sentido.

58

De outro lado, no âmbito dos Tribunais de Justiça, há entendimento de que, quando o Ministério Público atua como fiscal da lei em favor de incapazes, ele pode alegar incompetência.

59

O impedimento e a suspeição são vícios que maculam o processo, pois tornam o juiz parcial ou suspeito de parcialidade. Assim, as exceções de suspeição e de impedimento são opostas para afastar o juiz parcial do processo.

As hipóteses legais de impedimento são mais graves, geram uma presunção absoluta de parcialidade. Têm como consequência a nulidade absoluta. Assim, todos os atos decisórios praticados pelo juiz impedido serão reputados nulos.

A suspeição é menos grave que o impedimento, existindo presunção relativa de parcialidade. Assim, a parte deverá alegar suspeição no prazo de 15 dias, sob pena de ocorrer a preclusão desse direito processual.

É também possível que o autor já alegue a suspeição/impedimento do juiz no momento da propositura da demanda, nos casos em que naquela Comarca é o único competente para o julgamento da demanda.

O incidente deverá ser oposto no juízo onde tramita o processo. Caso o juiz reconheça a sua parcialidade (pela suspeição ou pelo impedimento), deverá remeter os autos para o seu substituto legal.

De outro lado, caso entenda que não há suspeição ou impedimento, exporá as suas razões, juntará documentos e rol de testemunhas e encaminhará os autos para o julgamento do Tribunal. Como o juiz é parcial, não pode julgar o incidente que questiona a sua própria parcialidade.

A suspeição ou o impedimento também podem ser dos auxiliares da justiça, dos membros do Ministério Público e dos demais sujeitos imparciais do processo (art. 148, Novo CPC).

12.3.4 IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA

Cabe à parte autora atribuir valor à causa, na forma prevista no CPC.

Caso o réu não concorde com o valor da causa, poderá impugná-lo. O instrumento previsto para esse fim no Código de 1973 era o incidente processual da impugnação ao valor da causa. Como já visto, o

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Nesse sentido, por exemplo, o entendimento de Alexandre Freitas Câmara (Lições de Direito Processual Civil. v. 1. 15. ed. Rio de Janeiro : Lumen Juris, 2006. p. 353), Fredie Didier Jr. (Curso de Direito Processual Civil: teoria geral do processo e processo de conheci-mento. v. 1. 7. ed. Salvador : Jusposivm, 2007. p. 459), José Carlos Barbosa Moreira (O novo processo civil brasileiro. 25. ed. Rio de Janeiro : Forense, 2007. p 41), Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart (Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2008. p. 144). 58 STJ EDcl no REsp 222.006/MG, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/12/2001, DJ 04/03/2002, p. 231. 59

Nesse sentido, o entendimento pacífico do TJDFT: Acórdão n. 481299, 20100020165384AGI, Relator JOÃO BATISTA TEIXEIRA, 3ª Turma Cível, julgado em 09/02/2011, DJ 21/02/2011 p. 138.

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legislador do Novo Código inseriu essa matéria no rol das preliminares de mérito (arts. 293 e 337, III, do Novo CPC).

O juiz poderá corrigir de ofício o valor da causa a qualquer tempo.

12.3.5 IMPUGNAÇÃO À ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA

Conforme o Código de 1973, se o réu não concordar com o requerimento de gratuidade judiciária deduzido pelo autor, poderia opor impugnação à assistência judiciária gratuita, por petição, que seria autuada em apartado. Com o Novo Código, também essa matéria foi introduzida como preliminar de contestação, conforme arts. 100 e 337, XIII, do Novo CPC.

12.4 FASE DE SANEAMENTO (OU DE ORDENAMENTO DO PROCESSO)

Após a fase postulatória (que, como regra, encerra-se com a contestação), inicia-se uma fase de ordenamento ou saneamento do processo.

A fase de ordenamento do processo (ou de saneamento) constitui-se pelas providências preliminares e pelo julgamento conforme o estado do processo.

O saneamento ou o ordenamento do processo estão concentrados nesta fase, mas também ocorrem em outras fases do processo.

12.4.1 PROVIDÊNCIAS PRELIMINARES

Trata-se das providências a serem adotadas pelo juiz logo após a contestação, quando se encerra a fase postulatória. Estão previstas nos arts. 347 a 353 do Novo CPC.

A adoção das medidas que se enquadram dentro das providências preliminares depende dos atos e eventos que aconteceram na fase postulatória.

Assim, a fim de sistematizar a matéria, apresenta-se um rol das providências preliminares a serem tomadas pelo juiz, fazendo-se a necessária correlação com cada um dos eventos que podem acontecer na fase postulatória:

a) Caso a parte autora apresente defesa indireta (alegue fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor) ou suscite preliminares, o juiz deverá intimar o autor para apresentar réplica, no prazo de 15 dias (arts. 350 e 351 do Novo CPC).

b) Se o réu apresentar apenas defesa direta, mas juntar documentos, o juiz deverá intimar o autor para se manifestar sobre eles no prazo de 15 dias (art. 347, § 1º, do Novo CPC).

c) Havendo defeitos processuais que precisem ser corrigidos, o juiz deverá providenciar a sua correção.

d) Caso ocorra a revelia do réu (não apresentação de contestação tempestivamente), o juiz deverá decretá-la e verificar se ela produziu o efeito material de presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor. Se este efeito não se produzir no caso concreto, o juiz deverá intimar o autor para especificar as provas que pretende produzir em audiência.

e) Se houver revelia, mas a citação for ficta (por edital ou por hora certa), o juiz deverá nomear curador especial.

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f) Caso o réu tiver reconvindo, o juiz deverá intimar o autor para contestar a reconvenção no prazo de 15 dias, bem como apresentar réplica (se o caso) no prazo de 10 dias.

g) Se houver denunciação da lide ou chamamento ao processo, o juiz deverá tomar as providências relativamente a cada uma dessas intervenções.

h) O juiz deverá intimar as partes para especificarem as provas que pretendem produzir. Se as partes forem devidamente intimadas, mas não se manifestarem ou afirmarem que não possuem outras provas a produzir, não poderão posteriormente alegar cerceamento de defesa ao fundamento de que poderia ter sido produzida alguma prova.

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i) Se for apresentada ação declaratória incidental, o juiz deverá, se preenchidos os requisitos de admissibilidade, recebê-la e mandar processá-la.

12.4.1.2 EXTINÇÃO DA AÇÃO DECLARATÓRIA INCIDENTAL

A ação declaratória incidental foi outro dos institutos processuais excluídos com o advento do Novo Código. Antigamente, essa ação tinhas por objetivo permitir que determinada questão incidental, prejudicial ao pedido principal, que seria analisada apenas na fundamentação, seja decidida como questão principal, conste do dispositivo da sentença e faça coisa julgada. Assim, tratava-se de instrumento capaz de permitir que o efeito declaratório da sentença faça coisa julgada.

O Novo CPC traz, em seu art. 503, § 1º, essa mesma possibilidade, sem a necessidade de interposição de nova peça.

Afirma este artigo, no caput, que “a decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida”. Em sequência, no § 1º, dispõe que essa disposição “aplica-se à resolução de questão prejudicial, decidida expressa e incidentemente no processo”. Para que isso aconteça, são três os requisites: (i) da resolução dessa questão prejudicial depender o julgamento do mérito; (ii) a seu espeito tiver havido contraditório prévio e efetivo, não se aplicando no caso de revelia; e (iii) o juízo tiver competência em razão da matéria e da pessoa para resolvê-la como questão principal.

Dessarte, a questão prejudicial, devidamente alegada pelas partes, pode ser objeto da parte dispositiva da sentença, com formação de coisa julgada sobre ela.

12.4.2 JULGAMENTO CONFORME O ESTADO DO PROCESSO

O julgamento conforme o estado do processo está previsto nos arts. 354 a 356 do Novo CPC.

Depois de cumpridas as providências preliminares, ou não havendo necessidade de adotar tais providências, o juiz tomará uma das seguintes medidas:

a) Extinguir o processo sem resolução do mérito (art. 485 c/c art. 354 do Novo CPC).

b) Homologar um eventual acordo entre as partes (transação, renúncia ao direito sobre o qual se funda a ação ou reconhecimento do pedido pelo réu), resolvendo o mérito (art. 487, inc. III, alíneas “a”, “b” e “c”, c/c art. 354 do Novo CPC).

c) Proferir sentença julgando antecipadamente a lide, diante da ocorrência de uma das hipóteses dos incisos I e II do art. 355 do CPC: “I - quando não houver necessidade de produção de outras provas; II - quando o réu for revel, ocorrer o efeito previsto no art. 344 e não houver requerimento de prova, na forma do art. 349”. No entanto, se o juiz indeferir as provas requeridas pelo autor, sob o fundamento de

60 STJ, REsp 1202238/SC, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/08/2012, DJe 18/09/2012.

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serem desnecessárias, e decidir antecipadamente a lide, não poderá julgar o pedido improcedente por falta de provas.

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d) Marcar audiência preliminar de conciliação (art. 334 do Novo CPC), se a lide versar sobre direitos disponíveis e o juiz entender que existe viabilidade de um acordo.

e) Julgar parcialmente algum dos pedidos, com resolução do mérito, quando tal parcela (i) mostrar-se incontroversa ou (ii) estiver em condições de imediato julgamento, nos termos do art. 355 (art. 356, do Novo CPC)

f) Proferir o “despacho saneador”: em verdade, trata-se de decisão e não despacho; também não saneia, pois apenas declara saneado. No denominado “despacho saneador”, o juiz fixa os pontos controvertidos, decide as questões processuais pendentes e determina as provas a serem produzidas, designando audiência de instrução e julgamento, se necessário (art. 357, Novo CPC).

g) Marcar audiência de instrução e julgamento diretamente.

12.5 AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO

A audiência de instrução e julgamento é uma sessão pública (art. 368, Novo CPC), presidida pelo juiz de primeira instância, cujo objetivo principal é a produção de prova oral.

A audiência somente ocorrerá a portas fechadas se for caso de segredo de justiça (art. 368 c/c art. 189 do Novo CPC).

A audiência de instrução e julgamento possui a natureza jurídica de ato processual complexo, pois é constituída por vários escopos e atividades processuais a serem realizadas, com grande importância para a oralidade e para a concentração de atos processuais num único momento.

A audiência de instrução e julgamento tem os seguintes objetivos: a) nova tentativa de conciliar as partes; b) produção de prova oral (instrução); c) debates finais orais pelas partes; e d) julgamento da causa (prolação da sentença).

A oralidade é uma marca da audiência de instrução. Ela permite um contato direto do juiz com as partes e as testemunhas, permitindo ao julgador sentir a verdade extraída de cada depoimento.

No caso de ausência de testemunha que seria ouvida independentemente de intimação (a parte levaria para a audiência), não será marcada nova audiência.

Se a testemunha foi intimada mas não compareceu, o juiz deve marcar nova audiência e determinar a sua condução coercitiva (art. 455, § 5º, do Novo CPC); caso a testemunha não seja encontrada, a parte que a arrolou poderá requerer a substituição da testemunha ou fornecer novo endereço onde possa ser encontrada.

Caso a parte autora ou a parte ré, apesar de devidamente intimada, não compareça, ou comparecendo, se recuse a depor, o juiz lhe aplicará a pena de confissão sobre os fatos que lhe seriam perguntados (art. 385, § 1º, Novo CPC).

No caso de ausência não justificada do advogado do autor ou do réu à audiência, a única consequência será a possibilidade de o juiz dispensar a produção das provas requeridas pelo advogado ausente, na forma do art. 462, § 2º, do Novo CPC. No entanto, o não comparecimento do advogado do autor ou do réu à audiência não implica, para o réu, a revelia, nem, para o autor, a extinção do processo

61 STJ, REsp 1202238/SC, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/08/2012, DJe 18/09/2012.

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sem resolução do mérito ou a improcedência da demanda. Nesse sentido, a pacífica jurisprudência do STJ.

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Segundo o princípio da documentação, os principais atos da audiência devem ser documentados, ou seja, reduzidos a termo (art. 367, Novo CPC).

Na prática, lavra-se uma ata ou termo de audiência, no qual os atos processuais são reduzidos a termo, inclusive os depoimentos dos peritos, das partes e das testemunhas.

Na audiência, o juiz tem as funções de diretor (presidir e condir as atividades em audiência), mediador (conciliar as partes) e investigador (fazer perguntas durante o depoimento de peritos, partes e testemunhas).

A fim de sistematizar o regramento referente a esses três processos, o CPC/1973 os disciplinou em três livros: Livro I – Processo de Conhecimento; Livro II – Processo de Execução; Livro III – Processo Cautelar. O Novo Código de Processo Civil trouxe pequenas inovações neste sentido, passando as formas de tutela jurisdicional da seguinte maneira: Livro I – Do Processo de Conhecimento e do Cumprimento de Sentença; Livro II – Do Processo de Execução e Livro III - Os Processos Nos Tribunais E Dos Meios De Impugnação Das Decisões Judiciais

No entanto, em razão da crescente preocupação com a efetividade do processo, ao longo do tempo, houve uma tendência de lhe conferir sincretismo. Dessa forma, atualmente, as fases de conhecimento, liquidação de sentença e execução (ou cumprimento de sentença) passam a ser apenas etapas de um mesmo processo. A tutela cautelar, todavia, continua autônoma, embora o Projeto do Novo Código de Processo Civil também preveja o seu sincretismo com as demais espécies de tutela jurisdicional.

Em razão disso, não é mais tecnicamente correto falar de processo de conhecimento, já que, no mesmo processo, há as fases de conhecimento, liquidação e execução. Portanto, é preferível utilizar a terminologia tutela, módulo, fase ou etapa de conhecimento, para se referir à tutela jurisdicional cognitiva.

Com efeito, a tutela de conhecimento passa a ter por objeto a cognição judicial acerca de determinada lide, a fim de resolvê-la mediante provimento que reconheça judicialmente o direito da parte por meio de sentença, tornando-a indiscutível sob o manto da coisa julgada material.

Os procedimentos da tutela cognitiva são divididos em: a) procedimento ordinário; b) procedimento sumário; e c) procedimentos especiais. Tais procedimento serão estudados a seguir, em itens próprios.

62 STJ, REsp 679.377/AM, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 09/12/2008, DJe 02/02/2009.

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O estudo do direito probatório pode ser dividido em Teoria Geral da Prova (arts. 369 a 381 do Novo CPC) e Provas em Espécie (arts. 385 a 484 do Novo CPC).

14.1 TEORIA GERAL DA PROVA

As provas são os meios destinados a fornecer ao juiz o conhecimento da verdade dos fatos.

A prova no processo civil está disciplinada nos arts. 369 a 484 do Novo Código de Processo Civil e arts. 212 a 232 do Código Civil.

Segundo doutrina majoritária,63

as normas que regulam as provas possuem natureza jurídica processual, mas há doutrinadores que entendem que o direito probatório seria composto por normas mistas, de direito material e formal.

A prova tem por objeto os fatos alegados pelas partes como fundamento do pedido ou da defesa. Com efeito, a doutrina moderna entende que o objeto da prova são os fatos alegados pelas partes e não simplesmente os fatos. Fundamentam que não há como saber o que aconteceu, pois a verdade real é um mito.

O fato que deve ser provado possui as seguintes características: a) Controvertido; b) Relevante; e c) Determinado.

Há fatos que, embora interessem para o processo, não precisam ser provados. São eles:

- Os fatos afirmados por uma parte e confessados pela outra;

- Os fatos não contestados;

- Os fatos sobre os quais recai presunção legal de veracidade;

- Os fatos notórios: aqueles cujo conhecimento faz parte da cultura normal própria de determinada sociedade ao tempo em que é proferida a decisão. Por exemplo, é fato notório que, no dia 25 de dezembro de todo o ano, os cristãos comemoram o Natal.

Como regra, a parte não precisa provar o direito objetivo aplicável, já que o juiz deve conhecer o direito (iura novit curia).

Além disso, o juiz não pode se eximir de decidir sob a alegação de lacuna ou obscuridade do ordenamento jurídico (art. 140 do Novo CPC).

No entanto, se a parte alegar direito municipal, estadual, estrangeiro ou consuetudinário, deverá provar o seu teor e a sua vigência, se assim o determinar o juiz (art. 376, Novo CPC).

O juiz é o destinatário direto da prova. As partes são destinatárias indiretas, porque precisam se convencer da verdade para que aceitem a decisão do juiz, ou, caso contrário, interponham recurso.

63 Nesse sentido, Alexandre Freitas Câmara (Lições de Direito Processual Civil. v. 1. 15. ed. Rio de Janeiro : Lumen Juris, 2006. p. 404).

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14.1.1 SISTEMAS DE APRECIAÇÃO DAS PROVAS

Historicamente, reconhecem-se quatro principais sistemas de apreciação de provas:

a) Sistema das Ordálias (ou Juízos de Deus): A prova do fato ocorreria por revelações divinas. Segundo esse sistema de provas, alguma divindade impediria a pessoa de sentir dor ou morrer se ela estivesse falando a verdade. Por exemplo, submetia-se a pessoa à água quente ou ao fogo (andar em brasas); se ela expressasse sentir dor, não estaria falando a verdade. Trata-se de sistema arcaico, que desapareceu com os julgamentos centrados na racionalidade humana.

b) Sistema legal, positivo ou tarifado: Cada prova tem o valor que é considerado pela lei. O juiz não tem liberdade para apreciar as provas, pois possui apenas a função de aplicar a lei, devendo ficar adstrito ao valor legal conferido à prova.

No Brasil, ainda há resquícios desse sistema de prova. Por exemplo, o art. 227 do Código Civil impossibilita prova testemunhal nos negócios jurídicos cujo valor exceda a dez vezes o valor do salário mínimo.

c) Sistema da livre convicção ou íntima convicção: O juiz é absolutamente livre para apreciar as provas, não estando vinculado à lei, tampouco precisando motivar as razões do seu convencimento. Esse sistema ainda é adotado no sistema judicial brasileiro nas decisões do Júri Popular.

d) Sistema da Persuasão Racional ou do Livre Convencimento Motivado: o valor probatório de cada prova é extraído do caso concreto pelo juiz, que deve ponderar a respeito das provas produzidas e expor as razões do seu convencimento, fundamentando a sua decisão. É o sistema adotado no Brasil.

14.1.2 MEIOS DE PROVA

No Brasil, vigora o Princípio da Liberdade dos Meios de Prova. Assim, como regra, os fatos podem ser provados por quaisquer meios de prova, desde que legais ou moralmente legítimos.

Os meios de provas podem ser:

a) Típicos: quando previsto expressamente determinado meio de prova pelo ordenamento jurídico. Por exemplo, prova testemunhal, documental, pericial, inspeção judicial.

b) Atípicos: quando não previstos expressamente no ordenamento jurídico. Por exemplo, reconstituição dos fatos e prova emprestada.

14.1.3 PODERES INSTRUTÓRIOS DO JUIZ

De acordo com o art. 370 do Novo CPC, o juiz possui amplos poderes instrutórios para determinar a realização de provas a fim de formar o seu convencimento. Pode, ademais, indeferir o pedido de realização de provas impertinentes ou desnecessárias.

Portanto, o juiz não deve desempenhar apenas uma atividade supletiva, tampouco se omitir em matéria de prova. Ao contrário, deve atuar de forma dinâmica, buscando todas as provas necessárias para retratar no processo a realidade fática.

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64 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 5. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2011. P. 102/103.

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14.1.4 PROCEDIMENTO DA PROVA

O procedimento probatório compreende as fases de proposição, admissão, produção e valoração.

a) Proposição: As partes devem requerer que seja produzida a prova com que pretendem demonstrar os fatos que alegam. As provas constituídas devem ser apresentadas no próprio ato de postulação. A produção das provas constituendas deve ser requerida no primeiro ato de postulação (na petição inicial ou na contestação).

b) Admissão: Uma vez requerida a produção da prova, o juiz analisará a utilidade da sua produção. Pode o magistrado, portanto, indeferir o pedido de produção da prova, caso entenda que a prova é desnecessária.

c) Produção: É o ato pelo qual se demonstram os fatos alegados pelas partes.

d) Valoração: Ocorre no momento da sentença, quando o juiz forma o seu convencimento a fim de julgar o pedido do autor.

14.1.5 ÔNUS DA PROVA

Ônus é um encargo que, caso não seja desempenhado, gera uma situação jurídica de desvantagem para a parte. Não se confunde com obrigação.

Assim, a imposição do ônus da prova a uma parte do processo implica que ela tem de produzir a prova, a fim de não suportar a desvantagem gerada pela sua não produção.

Sobre a distribuição do ônus da prova entre as partes, há duas principais teorias:

a) Teoria da Distribuição Dinâmica do Ônus da Prova

Segundo esta Teoria, é necessário levar em conta as circunstâncias do caso concreto, atribuindo-se o ônus da prova a quem tem condições de satisfazê-lo. Ou seja, é o juiz que, caso a caso, impõe o ônus da prova à parte que tem melhores condições de produzi-la.

b) Teoria Estática do Ônus da Prova (teoria clássica):

Segundo a Teoria Estática, é a lei processual que já distribui prévia e abstratamente o ônus da prova às partes.

Com o advento do novo Código, o ônus probatório sofreu algumas importantes alterações, observadas no seu art. 373. O artigo equivalente do Código de 1973, o art. 333, que tratava do mesmo assunto, instituía um sistema de ônus da prova que estabelecia ao juiz o uso de um critério objetivo e seguro na solução de mérito para a causa. O ônus de prova era estático, fixado nos incisos I e II do artigo. Aliás, os incisos I e II, do artigo 373 do Novo CPC, mantiveram a mesma redação do Código anterior.

Incumbe, assim, ao autor provar os fatos constitutivos do seu direito subjetivo (art. 373, I, Novo CPC).

Ao réu, cabe comprovar os fatos modificativos, extintivos ou impeditivos do direito do autor (art. 373, II, Novo CPC).

As alterações significativas estão estampadas nos §§ 1º e 2º.

O § 1º introduziu o sistema da carga dinâmica da prova, que muito já vinha sendo discutido na doutrina brasileira. Essencialmente, esta modificação implica que a carga probatória possa recair sobre quem está em melhores condições de esclarecer os fatos.

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Outra questão importante sobre esse tema é estabelecer o momento procedimental adequado para proferir a decisão que distribui o ônus probatório. De acordo com o Novo Código, esse momento é o de saneamento e organização do processo, como estabelecido no inciso III, do artigo 357, do Novo CPC. As partes deverão saber, antes da produção da prova, que será aplicada a carga dinâmica da prova, a fim de evitar surpresas, com a consequente violação do contraditório. Tal decisão, segundo previsão do art 1.015, XI, do Novo CPC, é recorrível por meio de agravo de instrumento.

Ônus da prova é o encargo de provar algo. Assim, quando a parte possui o ônus da prova e não comprova o fato, passa a ter uma situação de desvantagem.

A regra do ônus da prova também é utilizada pelo juiz no momento de proferir a sentença. Assim, caso o autor não comprove um fato constitutivo do seu direito, tal fato será reputado inexistente, pois tinha o ônus da prova. Da mesma forma, se o réu não comprovar um fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, será tal fato reputado inexistente, pois era dele o ônus da prova.

As partes podem convencionar em distribuir o ônus da prova de forma diversa da que está prevista no CPC. No entanto, não será possível a convenção sobre o ônus da prova, sob pena de nulidade, quando (art. 373, § 3º, Novo CPC): “I - recair sobre direito indisponível da parte; II - tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito”.

14.1.7 ÔNUS DA PROVA NAS RELAÇÕES DE CONSUMO

O Código de Defesa do Consumidor prevê a possibilidade de o juiz inverter o ônus da prova no caso da relação de consumo, impondo este ônus ao fornecedor do produto ou serviço. Para tanto, é necessário que seja o consumidor hipossuficiente ou a alegação seja verossímil (art. 6º, inc. VIII, CDC).

No entanto, a inversão do ônus da prova não é automática. O juiz deve analisar as circunstâncias do caso concreto para decidir.

65

Deve-se atentar, ainda, que a responsabilidade civil do fornecedor no CDC é objetiva (salvo no caso de prestação de serviço por profissionais liberais). Por conseguinte, o consumidor não precisa comprovar dolo ou culpa do fornecedor de produtos ou serviços. Assim, por vezes, será desnecessária a inversão do ônus da prova, haja vista que basta comprovar que o produto ou

o serviço foi colocado no mercado e que houve vício ou defeito, com dano ao consumidor.

De outro lado, não conseguindo o consumidor comprovar os elementos da responsabilidade civil objetiva, poderá o juiz determinar a inversão do ônus da prova.

A inversão do ônus da prova, no CDC, é possível inclusive nos casos excepcionais de responsabilidade subjetiva (art. 14, § 4º, CDC), como é o caso dos serviços prestados por profissionais liberais, como o médico, o dentista, o veterinário etc., segundo entendimento pacífico do STJ.

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Além disso, a inversão do ônus da prova também é cabível quando se trata de ação civil pública proposta por um dos legitimados para proteção de direitos difusos, coletivos em sentido estrito ou individuais homogêneos dos consumidores.

67

65 STJ, AgRg no REsp 1216562/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/09/2012, DJe 10/09/2012. 66 STJ, AgRg no AREsp 25.838/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 20/11/2012, DJe 26/11/2012. 67 STJ, AgRg no REsp 1300588/RJ, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/05/2012, DJe 18/05/2012.

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15.1 AS DECISÕES JUDICIAIS

Os pronunciamentos judiciais podem decidir determinada questão dentro de um processo, ou ser simplesmente destinados a impulsioná-lo.

Os provimentos jurisdicionais com conteúdo decisório são denominados de decisões em sentido amplo; os atos do juiz de mero impulsionamento do processo são chamados de despachos.

Tanto no juízo de primeira instância como nos tribunais, os atos de mero impulsionamento são denominados de despachos.

De outro lado, para definir e classificar as decisões em sentido lato, é preciso distinguir as decisões proferidas pelo juízo de primeira instância e as proferidas pelos tribunais, de segunda instância ou superiores.

As decisões do juiz de primeira instância podem ser: a) sentenças; e b) decisões interlocutórias.

A sentença é o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487 – isto é, definindo ou não o mérito –, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução. Essa é a definição no art. 203, § 1º, do Novo CPC. No entanto, esse conceito ainda será desenvolvido no item seguinte, discorrendo-se sobre as divergências doutrinárias e jurisprudências, bem como sobre suas implicações práticas.

As decisões interlocutórias, por sua vez, são definidas como todo pronunciamento judicial de natureza decisória que não se enquadre no conceito de senteça (art. 203, § 2º, Novo CPC).

No âmbito dos tribunais, as decisões em sentido lato podem ser classificadas em: a) decisões monocráticas; e b) acórdãos.

Acórdão é um pronunciamento judicial proferido por órgão colegiado de tribunal (art. 204, Novo CPC), independentemente de seu conteúdo. Assim, uma decisão colegiada do tribunal sobre questão incidente se dará por acórdão. Por exemplo, será acórdão a decisão colegiada do tribunal, em agravo de instrumento, sobre antecipação de tutela.

As denominadas decisões monocráticas são as proferidas por apenas um membro do tribunal, independentemente do seu conteúdo. Assim, por exemplo, o relator pode monocraticamente dar provimento à apelação, julgando procedente ou improcedente o pedido do autor, nas hipóteses em que o CPC o autoriza (art. 932, II a VI, e art. 1.021, § 2º, do Novo CPC); ou simplesmente admitir um recurso. Observa-se que o conteúdo da decisão não descaracteriza a sua natureza de decisão monocrática.

15.2 SENTENÇA

15.2.1 CONCEITO68

A par das recentes alterações legislativas, a doutrina e a jurisprudência majoritárias continuam definindo a sentença pela sua finalidade e não pelo seu conteúdo. Assim, a sentença pode ser conceituada como a decisão judicial tendente a encerrar a fase de conhecimento em primeira

68

Para saber mais sobre o tema, vide artigo de nossa autoria: LUNARDI, Fabrício Castagna. A excrescência da "apelação por instrumen-to". Prática Jurídica - Consulex, a. 8, n. 83, p. 58-60, fev. 2009.

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instância, que, resolvendo ou não o mérito, possui conteúdo previsto nos arts. 485 e 487 do Novo CPC, ou que extingue a fase ou o processo de execução. Qualquer outro ato judicial que resolva questão incidente, no curso da fase de conhecimento, de liquidação ou de execução, independentemente da matéria apreciada, é decisão interlocutória.

Assim, é decisão interlocutória a decisão do juiz que exclui um dos litisconsortes do processo (conteúdo do art. 485, VI, Novo CPC), ou que indefere o processamento da reconvenção (art. 485, I, Novo CPC). Também é interlocutória a decisão que julga um dos pedidos antecipadamente, necessitando os demais pedidos de instrução probatória (art. 487, I, Novo CPC); ou a decisão que reconhece a prescrição em relação à parte da pretensão (art. 487, II, Novo CPC), mas o feito prossegue em relação aos demais pedidos. Da mesma forma, é decisão interlocutória o ato judicial que homologa acordo parcial (art. 487, III, “b” Novo CPC), prosseguindo-se o processo no tocante à parte controversa.

Tratando-se de decisão interlocutória (mesmo com conteúdo previsto nos arts. 485 e 487 do Novo CPC), será atacável por recurso de agravo. Destarte, processar um recurso de “apelação por instrumento” nesses casos é uma excrescência, prática que deve ser abolida da rotina forense.

15.2.2 REQUISITOS DA SENTENÇA

Os requisitos da sentença podem ser essenciais ou facultativos.

São requisitos facultativos da sentença: a) o preâmbulo; e b) a ementa.

São elementos essenciais da sentença: a) o relatório; b) a fundamentação; e c) o dispositivo.

Embora se fale aqui em sentença, tais requisitos se aplicam integralmente aos acórdãos de tribunais.

a) Relatório

O relatório é a síntese do processo. Deverá conter os nomes das partes, a identificação do caso, com a suma do pedido e da contestação, e o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo (art. 489, I, Novo CPC). É o histórico de tudo de relevante que aconteceu no processo.

O relatório serve para demonstrar que o julgador leu e compreendeu o processo. Também deve possibilitar que o leitor compreenda exatamente a demanda e a tese defensiva, bem como saiba o que aconteceu no processo.

Do ponto de vista da técnica redacional, o juiz deve, no relatório, narrar os acontecimentos em ordem cronológica, utilizar o mesmo tempo verbal, evitar o uso de adjetivos, não mencionar a validade ou invalidade dos atos (ex.: “devidamente citado”). Também não deve, no relatório, consignar comando decisório, tampouco fazer juízo de valor.

Lembre-se, no entanto, que, nos Juizados Especiais, o relatório é dispensável (art. 38, caput, da Lei 9.099/1995).

b) Fundamentação

Fundamentar é descrever os motivos da convicção, é apresentar todos os fatores que formaram o convencimento.

A motivação das decisões judicial é um imperativo constitucional (art. 93, inc. IX, CF).

No processo civil contemporâneo, a fundamentação é um fator de legitimação da atividade jurisdicional, pois o juiz se legitima ato a ato pelo seu argumento.

A fundamentação tem duas principais funções, uma extraprocessual e outra endoprocessual. Do ponto de vista extraprocessual, a fundamentação serve para que o povo possa fiscalizar o poder exercido pelo juiz. Sob o enfoque endoprocessual, serve para permitir que as partes possam saber as

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razões que conduziram o julgador à sua decisão; para mostrar às partes do processo que o juiz levou em consideração os argumentos das partes; e para que o tribunal compreenda as razões do juiz, a fim de decidir, em grau de recurso, se reformará ou não a decisão judicial.

Enquanto, no relatório, o juiz utiliza uma ordem cronológica, na fundamentação, o juiz deve apreciar as alegações e teses das partes em ordem lógica.

Além disso, é na fundamentação que o juiz deve valorar as provas produzidas no processo.

Na fundamentação, é preciso distinguir o que é ratio decidendi e obter dictum. Ratio decidendi são os fundamentos jurídicos que embasam a decisão. Obter dictum são os argumentos expostos apenas de passagem na decisão.

As questões resolvidas apenas na fundamentação não fazem coisa julgada material.

A ausência de fundamentação é um vício bastante grave. Segundo a posição amplamente majoritária na doutrina e na jurisprudência,

69 a decisão sem motivação é nula. Aliás, é exatamente isto

que está previsto no art. 93, inc. IX, da Constituição Federal.

Nos Juizados Especiais, as Turmas Recursais podem fazer uma fundamentação sucinta, estando autorizado manter a decisão de primeira instância por seus próprios fundamentos.

O juiz deverá fundamentar com base no direito. O art. 140, parágrafo único, do Novo CPC, prevê que “o juiz só decidirá por equidade nos casos previstos em lei”.

c) Dispositivo

O dispositivo é a parte do provimento jurisdicional que contém o conteúdo decisório, o comando estatal. É a conclusão, o elemento nuclear de todo ato jurisdicional com conteúdo decisório.

O dispositivo é, também, a parte da sentença que faz coisa julgada.

A falta de dispositivo na sentença implica inexistência, conforme maioria da doutrina.

15.2.3 CLASSIFICAÇÕES DA SENTENÇA

15.2.3.1 DECISÃO DEFINITIVA E DECISÃO TERMINATIVA

Considerando a existência ou não de resolução do mérito, a sentença pode ser terminativa ou definitiva.

Será terminativa a sentença que não contém resolução de mérito. Trata-se das hipóteses em que o processo é extinto sem resolução do mérito (art. 485, Novo CPC).

A sentença definitiva, por sua vez, é aquela que contém resolução de mérito (art. 487, Novo CPC).

A sentença terminativa faz apenas coisa julgada formal, não tendo aptidão para fazer coisa julgada material.

A sentença definitiva tem aptidão para fazer coisa julgada forma e material. Assim, transitada em julgado, torna indiscutível e imutável o seu conteúdo.

Embora se fale em sentença, também é possível que decisões interlocutórias, decisões monocráticas de relator e acórdãos façam coisa julgada. Para tanto, é preciso que tais decisões sejam proferidas com conteúdo previsto no art. 487 do Novo CPC.

69 WAMBIER, Teresa Arruda. Nulidades do processo e da sentença. 5. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2004. p. 320.

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Será decisão interlocutória de mérito a decisão proferida no curso da fase processual de conhecimento que homologa acordo parcial (art. 487, III, “b”, Novo CPC); ou a que julga determinado pedido incontroverso, prosseguimento o processo em relação à parte controversa (art. 487, I, Novo CPC); ou, ainda, a decisão que reconhece a prescrição da pretensão deduzida num dos pedidos, mas o processo continua em relação aos demais (art. 487, II, Novo CPC). Observe-se que tais decisões interlocutórias resolvem o mérito, razão pela qual são definitivas, isto é, têm aptidão para fazer coisa julgada material.

Da mesma forma, fazem coisa julgada as decisões monocráticas de relator que tenham conteúdo previsto no art. 487 do Novo CPC. Assim, quando o relator monocraticamente dá provimento à apelação, julgando procedente ou improcedente o pedido do autor, nas hipóteses do art. 932, II a VI, e do art. 1.021, § 2º, do Novo CPC, haverá resolução do mérito (art. 487, I, Novo CPC), razão pela qual a decisão é definitiva.

15.2.3.2 SENTENÇAS DECLARATÓRIA, CONSTITUTIVA, CONDENATÓRIA, MANDAMENTAL E EXECUTIVA

Do ponto de vista do conteúdo da sentença e da carga de eficácia, e adotando-se a Teoria Quinária de Pontes de Miranda, as sentenças de procedência podem ser classificadas em:

a) Sentença declaratória

A sentença declaratória é também conhecida como puramente declaratória ou meramente declaratória. Trata-se de sentença que contém provimento jurisdicional de mera certificação ou declaração.

No direito brasileiro, é possível postular a declaração de existência ou inexistência de uma relação jurídica, ou de autenticidade ou falsidade de um documento, nos termos do art. 19, inc. I, do Novo CPC. Assim, como regra, somente é possível sentença que declare/certifique relação jurídica, mas não declaração/certificação sobre fato, salvo se disser respeito à autenticidade ou à falsidade de documento.

A esse respeito, a Súmula 181 do STJ prevê que “é admissível ação declaratória, visando a obter certeza quanto à exata interpretação de cláusula contratual.” De outro lado, a Súmula 242 do STJ dispõe que “cabe ação declaratória para reconhecimento de tempo de serviço para fins previdenciários.”

Na sentença declaratória, utiliza-se o verbo declarar.

São sentenças declaratórias as proferidas na ação consignatória; na ação de usucapião; na ação declaratória de existência de sociedade de fato; na ação de reconhecimento de união estável; na ação declaratória de nulidade (não de anulação) de negócio jurídico; na ação declaratória de inexistência de dívida.

b) Sentença constitutiva

Trata-se de sentença que tem como efeito a criação, a modificação ou a extinção de determinada relação jurídica.

Na sentença, utiliza-se o verbo decretar, mas também pode usar o verbo de ação que cria, extingue ou modifica a relação jurídica. Por exemplo, “julgo procedente a demanda para o fim de anular o negócio jurídico...”; “julgo procedente a demanda e fixo o regime de visitas da seguinte forma...”; “julgo procedente o pedido e rescindo o contrato de arrendamento mercantil...”.

São exemplos de sentenças constitutivas ou constitutivas negativas (desconstitutivas) as proferidas nas seguintes ações: ação de divórcio; anulação de casamento; ação de anulação de negócio jurídico; regulamentação de visitas; ação de guarda; ação de suspensão e destituição do pátrio poder;

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ação de adoção; ação renovatória e revisional de locação; ação de desapropriação; ação popular; ação de divisão; ação de extinção de condomínio.

c) Sentença condenatória

É a sentença que condena ou impõe ao réu um dever de dar, fazer ou não fazer.

Utiliza-se o verbo condenar.

Pode-se citar, como exemplos de sentenças condenatórias, as proferidas na ação de indenização; na ação de reparação; na ação de perdas e danos; na ação de ressarcimento; na ação de locupletamento; na ação de alimentos.

d) Sentença mandamental

Há autores que não reconhecem a autonomia da sentença mandamental e da sentença executiva, fundamentando que já estariam compreendidas na sentença condenatória. No entanto, de acordo com a Teoria Quinária de Pontes de Miranda e os doutrinadores que a seguem, tais sentenças (mandamental e executiva) possuem autonomia classificatória.

A sentença mandamental é aquela que impõe um dever e o seu cumprimento por meio de coerção indireta. A coerção atua na esfera psicológica daquele a quem se impõe a obrigação, para que a cumpra, já que o Estado-juiz não consegue diretamente executar aquela obrigação.

Utiliza-se o verbo determinar. São exemplos de sentenças mandamentais as proferidas nas seguintes ações: mandado de segurança; mandado de injunção; habeas data; interdito proibitório, segundo alguns doutrinadores; embargos de terceiro; ação de depósito.

e) Sentença executiva

Trata-se de sentença em que há a imposição de um dever e o seu cumprimento por meio de coerção direta. Vale dizer, o Estado-juiz impõe uma obrigação e atua diretamente para o seu cumprimento. A ordem não satisfeita pelo demandado é cumprida pela coerção direta do Estado.

Alguns denominam a sentença executiva de “executiva lato sensu”.

Utiliza-se o verbo determinar, da mesma forma do que ocorre na ação mandamental.

Há sentença executiva nas seguintes ações: ação reivindicatória; ação de imissão de posse; ação de reintegração de posse; ação de petição de herança; ação de adjudicação compulsória; ação de busca e apreensão (Decreto-Lei 911/69); ação de despejo.

15.2.4 DECISÃO SOBRE OS PEDIDOS

Na sentença, o dispositivo deve conter a decisão sobre os pedidos imediatos e mediatos.

A decisão dos pedidos imediatos diz respeito ao provimento jurisdicional, como condenação, constituição/desconstituição, condenação, determinação.

Além disso, a sentença também deve conter decisão sobre pedidos mediatos, isto é, sobre o bem da vida que está sendo postulado na petição inicial.

15.2.5 CONGRUÊNCIA DA SENTENÇA

A sentença congruente é aquela que não é contraditória (congruência interna) e que respeita os limites da demanda (congruência externa).

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As sentenças extra, ultra e citra petita apresentam incongruência externa.

A sentença extra petita é a que decide fora do que foi pedido. É denominada ultra petita a sentença que julga a mais do que foi pedido. Por fim, é citra petita a sentença quando o juiz não examina um dos pedidos.

Assim, sendo detectada a existência de sentença extra, ultra ou citra petita, a consequência imediata é a sua nulidade. Tal nulidade pode, inclusive, ser decretada de ofício pelo Tribunal, isto é, estando a causa na segunda instância, o seu reconhecimento pelo Tribunal independe de provocação da parte. Trata-se de entendimento sedimentado na doutrina

70 e na jurisprudência

71.

15.2.6 FATO SUPERVENIENTE

É possível que as circunstâncias fáticas sejam alteradas no curso da demanda.

Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito puder influir no julgamento da lide, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a sentença (art. 493 do Novo CPC). No entanto, para tanto, deverá respeitar o contraditório, intimando-se as partes para se manifestarem.

15.2.7 EFEITOS DA SENTENÇA

A sentença produz efeitos principais e, também, efeitos anexos ou secundários.

Efeitos principais são os efeitos da sentença que decorrem do seu conteúdo, que foi delimitado pelo pedido.

Efeitos anexos ou secundários são os efeitos que decorrem da lei diretamente, não importando o que foi determinado na sentença, tampouco o que foi postulado pela parte.

Por exemplo, se o autor der causa à extinção do processo por abandono processual por três vezes, há perempção (efeito anexo).

Outro exemplo de efeito anexo ou secundário é a hipoteca judiciária, prevista no art. 495 do Novo CPC. Com efeito, a existência de uma sentença já é causa para que o juiz determine a inscrição da hipoteca judiciária, na forma da Lei de Registros Públicos.

15.28 INALTERABILIDADE DA SENTENÇA PELO JUIZ

Após o juiz proferir a sentença e publicá-la (ato do juiz que entrega a sentença para o escrivão ou diretor de secretaria), não pode mais ser por ele alterada, salvo para corrigir erro material (art. 494, inc. I, Novo CPC) ou em embargos de declaração (art. 494, inc. II, Novo CPC), ou ainda nos recursos em que é admitido o juízo de retratação (arts. 332, § 3º, e 331, ambos do Novo CPC).

15.2.9 ESPECIFICIDADES DA TUTELA JURISDICIONAL

Tutela jurisdicional significa proteção conferida pela jurisdição, a qual é exercida pelo processo.

70

WAMBIER, Teresa Arruda. Nulidades do processo e da sentença. 5. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2004. p. 319. 71 STJ, AgRg no REsp 437.877/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/11/2008, DJe 09/03/2009.

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15.2.9.1 TUTELA JURISDICIONAL DIFERENCIADA

A tutela jurisdicional diferenciada é toda a tutela jurisdicional que é exercida por procedimento diverso do comum. Assim, sempre que houver procedimento especial para a tutela do direito material, haverá tutela diferenciada.

Assim, existe tutela jurisdicional diferenciada no procedimento da ação possessória; da ação de usucapião; etc.

15.2.9.2 TUTELA ESPECÍFICA E TUTELA PELO EQUIVALENTE EM DINHEIRO

A tutela específica objetiva conceder à parte exatamente o bem da vida a que ela tem direito.

A tutela pelo equivalente em dinheiro visa a reparar o dano, ou mesmo o bem que lhe foi despojado, convertendo-se a reparação em pecúnia, por não ser possível a reparação in natura.

15.2.9.3 TUTELA PREVENTIVA E TUTELA REPRESSIVA

A tutela preventiva destina-se a prevenir ou a impedir o ilícito ou o dano, enquanto a tutela repressiva tem por objetivo reparar o dano já ocorrido.

15.2.9.4 TUTELA INIBITÓRIA E TUTELA DA REMOÇÃO DO ILÍCITO72

A tutela inibitória é a que se destina a impedir a prática, a repetição ou a continuação do ilícito. Por exemplo, a tutela jurisdicional destinada a determinar que um determinado estabelecimento industrial pare de produzir gases tóxicos, em percentuais não admitidos por lei. Observe-se que, enquanto os gases tóxicos estão sendo lançados no meio ambiente, a indústria está praticando ilícito.

A tutela de remoção do ilícito, como o próprio nome indica, dirige-se a remover os efeitos de uma ação ilícita que já ocorreu. É o caso, por exemplo, da tutela jurisdicional destinada a impor que determinada empresa remova o lixo tóxico ou radioativo despejado em local inapropriado. O ilícito já ocorreu, sendo que os seus efeitos se protraem no tempo.

15.2.10 ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA

Na sentença, além de decidir os pedidos, o juiz também deve fixar os ônus sucumbenciais, isto é, dizer quem deve arcar com as custas do processo e com os honorários advocatícios. O juiz, então, deverá condenar o vencido a pagar as despesas processuais, bem como os honorários advocatícios, nos termos do art. 82, § 2º, e 85, do Novo CPC.

No entanto, é possível que tenha sido a parte vencedora quem deu causa à ação. Neste caso, quem deve ser responsabilizado pelo pagamento dos ônus sucumbenciais, a parte vencida ou aquele que deu causa à ação?

A esse respeito, a doutrina e a jurisprudência são pacíficas no sentido de que deve ser aplicado o princípio da causalidade, e não o da sucumbência.

73 Isto é, deverá ser condenado a pagar as custas

processuais e os honorários advocatícios aquele que deu causa à demanda.

72

Para aprofundar sobre o tema, é de grande valia a consulta da obra de Luiz Guilherme Marinoni (Tutela inibitória: individual e coletiva. 5. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2012).

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Os honorários advocatícios são devidos ainda que o advogado tenha atuado em causa própria.

Os honorários deverão serão fixados pelo juiz entre 10% e 20% sobre o valor da condenação, considerando as circunstâncias previstas no art. 85, § 2º, do Novo CPC. No entanto, nas causas de pequeno valor, nas de valor inestimável, naquelas em que não houver condenação ou for vencida a Fazenda Pública, e nas execuções, embargadas ou não, os honorários serão fixados consoante apreciação equitativa do juiz, podendo extrapolar os limites mínimo e máximo acima expostos. Em tais casos, é comum o juiz não fixar os honorários em percentual, mas sim em valor expresso em moeda corrente.

Em qualquer caso, deve-se sempre ser observada a Súmula 201 do STJ, que dispõe que “os honorários advocatícios não podem ser fixados em salários-mínimos”.

Os honorários advocatícios pertencem ao advogado, e não à parte.

No caso de sucumbência recíproca, no entanto, o art. 86 do Novo CPC prevê que podem ser compensados os honorários advocatícios. Assim, houve grande divergência sobre a sua aplicação, tendo em vista que, se os honorários advocatícios pertencem aos advogados de cada parte, não haveria o que compensar entre eles.

A par da divergência, a Súmula 306 do STJ pacificou a controvérsia, dispondo que “os honorários advocatícios devem ser compensados quando houver sucumbência recíproca, assegurado o direito autônomo do advogado à execução do saldo sem excluir a legitimidade da própria parte.”

De outro lado, se um litigante decair de parte mínima do pedido, o outro responderá, por inteiro, pelos ônus sucumbenciais (art. 86, parágrafo único, Novo CPC).

Existem algumas peculiaridades em razão da especificidade de determinadas ações, ou da qualidade da parte que litiga.

Na ação de desapropriação, “a base de cálculo dos honorários de advogado em desapropriação é a diferença entre a oferta e a indenização, corrigidas ambas monetariamente” (Súmula 617 do STF).

No mandado de segurança, não se admite a fixação de honorários advocatícios. O juiz deve condenar o impetrado apenas nas custas processuais. É o que está previsto no art. 25 da Lei 12.0156/2009, na Súmula 105 do STJ

74 e na Súmula 512 do STF

75.

Na ação de indenização por dano moral, o valor pleiteado pelo autor é meramente estimativo. Assim, por exemplo, se o autor postula, a título de indenização por dano moral, R$ 10.000,00, mas o juiz fixa o valor de R$1.000,00, é caso de procedência, devendo o réu arcar com a totalidade dos ônus sucumbenciais. Nesse sentido, a Súmula 326 do STJ: “Na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca.”

Quando uma parte é representada pela Defensoria Pública e a outra parte é o ente público ao qual pertence o órgão da Defensoria Pública, existe confusão, razão pela qual não serão devidos honorários advocatícios à Defensoria. Nesse sentido, a Súmula 421 do STJ: “Os honorários advocatícios não são devidos à Defensoria Pública quando ela atua contra a pessoa jurídica de direito público à qual pertença.”

No caso de ser sucumbente a parte que é beneficiária da assistência judiciária gratuita, o juiz deve condená-la ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios. No entanto, deve, ao mesmo tempo, suspender a sua exigibilidade, na forma do art. 12 da Lei 1.060/1950.

De outro lado, se o vencedor for beneficiário da gratuidade judiciária, o seu advogado fará jus a honorários advocatícios normalmente, nos termos da Súmula 450 do STF.

76

73 STJ, REsp 1347368/MG, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/11/2012, DJe 05/12/2012. 74 Súmula 105 do STJ: “Na ação de mandado de segurança não se admite condenação em honorários advocatícios.” 75

Súmula 512 do STF: “Não cabe condenação em honorários de advogado na ação de mandado de segurança.” 76 Súmula 450 do STF: “São devidos honorários de advogado sempre que vencedor o beneficiário de justiça gratuita.”

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15.3 COISA JULGADA

15.3.1 CONCEPÇÕES, CARACTERÍSTICAS E DISTINÇÕES

A coisa julgada é um instituto do direito processual que tem estreita ligação com a segurança jurídica. Trata-se de uma garantia constitucional prevista expressamente no art. 5º, inc. XXXVI, da Constituição Federal.

Há três principais concepções para definir coisa julgada:77

1ª) coisa julgada é um efeito da sentença (do elemento declaratório, sendo que apenas ele faria coisa julgada). É defendida por Pontes de Miranda, Ovídio Baptista e Araken de Assis, dentre outros.

2ª) coisa julgada é a imutabilidade dos efeitos da sentença. São partidários desse entendimento Liebman e a maior parte da doutrina tradicional brasileira, como Cândido Rangel Dinamarco, Ada Pellegrini Grinover, Moacyr Amaral Santos, Tereza Arruda Alvim Wambier, José Miguel Garcia Medina, dentre outros.

3ª) coisa julgada é uma qualidade do conteúdo da sentença. É a corrente defendida por José Carlos Barbosa Moreria, Fredie Didier Jr., Rafael Oliveira, Paula Sarno Braga, dentre outros.

A par dessas concepções, a coisa julgada representa a indiscutibilidade da nova situação jurídica criada pela sentença, decorrente da inviabilidade recursal. A coisa julgada é um instituto jurídico criado para concretizar a segurança jurídica, impedindo que as causas sejam rediscutidas indefinidamente. É, inclusive, um direito oponível contra o Estado.

A coisa julgada não se confunde com a sua eficácia nem com a sua autoridade.

A autoridade representa a imposição, perante todos, de um ato de império do Estado. A

autoridade da coisa julgada é justificada por dois fundamentos: a) um de natureza política ou filosófica, que representa uma opção, feita pelo Estado, de que, a partir de determinado momento, a sentença deverá se tornar indiscutível, conferindo-se estabilidade a determinada relação jurídica posta à apreciação do Poder Judiciário; b) o outro fundamento é de natureza jurídica, segundo o qual a sentença vincula as partes não porque é expressão da verdade ou da justiça – embora deva sê-lo ‒, mas porque o legislador atribui à sentença transitada em julgado o caráter de escolha definitiva e vinculativa.

78

A eficácia é, por sua vez, a qualidade do que é eficaz. A eficácia é a capacidade da sentença de produzir efeitos, através de seus comandos.

79

15.3.2 CLASSIFICAÇÃO: COISA JULGADA FORMAL E COISA JULGADA MATERIAL

A coisa julgada é classificada em coisa julgada formal e coisa julgada material.

A coisa julgada formal torna a sentença indiscutível no processo em que foi proferida. Ocorre coisa julgada formal quando não cabe mais recurso. Trata-se de um fenômeno endoprocessual, isto é, produz efeitos apenas dentro de determinado processo.

A ocorrência de coisa julgada material impede que se discuta aquela demanda julgada tanto no processo em que foi proferida a sentença como também em todo e qualquer processo. Por isso, diz-se que a coisa julgada material produz efeitos endo e panprocessuais.

77 Essa divergência de concepções está bem exposta na obra: DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil: direito probatório, decisão judicial, cumprimento e liquidação da sentença e coisa julgada. v. 2. Salvador : Jus Podivm, 2007. p. 482-486. 78

PORTO, Sérgio Gilberto. Coisa julgada civil. 3. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2006. p. 53. 79 PORTO, Sérgio Gilberto. Coisa julgada civil. 3. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2006. p. 55/56.

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A coisa julgada formal é um requisito para a coisa julgada material. Por isso, dizer-se que são degraus do mesmo fenômeno.

A sentença terminativa – a que extingue o processo sem resolução do mérito – faz apenas coisa julgada formal. Assim, projeta efeitos somente para dentro do processo (efeitos endoprocessuais).

A sentença definitiva – a que resolve o mérito – faz coisa julgada material. Por conseguinte, projeta seus efeitos para fora do processo (efeitos panprocessuais).

Para fazer coisa julgada material, é preciso que estejam presentes quatro requisitos:

a) que se trate de decisão judicial;

b) tenha ocorrido coisa julgada formal;

c) a decisão seja de mérito (sentença definitiva);

d) a decisão tenha sido proferida em cognição exauriente.

Assim, por exemplo, a tutela antecipada e a tutela cautelar não fazem coisa julgada, pois são tutelas provisórias, marcadas pela precariedade e provisoriedade, proferidas com base em juízo de cognição sumária.

15.3.3 EFEITOS DA COISA JULGADA

A coisa julgada produz efeitos positivos, negativos e preclusivos (eficácia preclusiva).

O efeito positivo vincula a decisão pretendida à outra já proferida. Vale dizer, quando ocorre a coisa julgada da sentença e esta é utilizada em outro pleito, a nova sentença que decidir esse segundo pleito deverá respeitar a coisa julgada. Por exemplo, a sentença de uma ação de alimentos terá de respeitar a coisa julgada produzida na ação investigatória de paternidade.

O efeito negativo se caracteriza como uma vedação, um impedimento de que seja proferida uma nova decisão ou rediscutido aquilo que já foi decidido.

O efeito preclusivo (ou eficácia preclusiva) impõe que, se as partes não deduzirem as alegações no momento próprio e a decisão final fizer coisa julgada material, tais alegações não poderão mais ser levantadas para modificar essa decisão. Com efeito, o art. 508 do Novo CPC prevê que “transitada em julgado a decisão de mérito, considerar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e as defesas que a parte poderia opor tanto ao acolhimento quanto à rejeição do pedido”.

Assim, transitada em julgado a sentença, a parte vencida não poderá ajuizar nova ação ou se opor em impugnação ao cumprimento de sentença para alegar questões que poderia ter alegado, mas não o fez.

Por exemplo, se transitou em julgado a sentença que julgou procedente o pedido de repetição de indébito, o réu não poderá ajuizar nova ação ou apresentar impugnação ao cumprimento de sentença para alegar prescrição, a fim de se eximir de cumprir aquela sentença.

80

Somente poderá fazer o mesmo pedido, se houver alegações que embasem outra causa de pedir.

15.3.4 LIMITES OBJETIVOS E SUBJETIVOS DA COISA JULGADA

A coisa julgada possui limites objetivos e subjetivos.

80 STJ, REsp 938.617/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/10/2011, DJe 18/10/2011.

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15.3.4.1 LIMITES OBJETIVOS

Em razão dos limites objetivos impostos à coisa julgada, somente o dispositivo transita em julgado. Isto é, a fundamentação não transita em julgado.

Com efeito, o art. 504 do Novo CPC dispõe que não fazem coisa julgada “I - os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença; Il - a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença”.

Vale apontar uma importante alteração trazida pelo Novo Código em relação Código de 1973. Neste, o art. 469 trazia ainda um terceiro inciso, que afirmava não fazer coisa julgada a apreciação da questão prejudicial, decidida incidentalmente no processo. Como já se estudou em tópico anterior, o Novo CPC passou a estabelecer, no art. 503, § 1º, que a questão prejudicial decidida de forma incidental passa a fazer coisa julgada, desde que (i) da resolução dessa questão prejudicial depender o julgamento do mérito; (ii) a seu espeito tiver havido contraditório prévio e efetivo, não se aplicando no caso de revelia; e (iii) o juízo tiver competência em razão da matéria e da pessoa para resolvê-la como questão principal. Vale lembrar que essa possibilidade só era cabível antes com a apresentação ação declaratória incidental, não mais existente no novo diploma processual.

15.3.4.2 LIMITES SUBJETIVOS DA COISA JULGADA

Segundo os limites subjetivos da coisa julgada, a sentença faz coisa julgada apenas inter partes. Todavia, a sentença também atinge os seus sucessores.

No caso das ações coletivas, a coisa julgada pode também ser ultra partes ou erga omnes.

Quando a ação coletiva versar sobre direito difuso ou direito individual homogêneo, a sentença fará coisa julgada erga omnes.

De outro lado, quando a ação coletiva veicular direito coletivo em sentido estrito, a sentença fará coisa julgada ultra partes, limitadamente à categoria, grupo ou classe.

A coisa julgada nas ações coletivas será estudada de forma aprofundada no item Ação Civil Pública.

15.3.5 MODOS DE PRODUÇÃO DE COISA JULGADA: PRO ET CONTRA, SECUNDUM EVENTUM LITIS E SECUNDUM EVENTUM PROBATIONIS

A coisa julgada pode produzir efeitos pro et contra, secundum eventum litis ou secundum eventum probationis.

A coisa julgada pro et contra é a regra. Ocorre a coisa julgada independentemente do resultado da ação, isto é, sendo a ação procedente, parcialmente procedente ou improcedente. Está presente nas ações individuais comuns.

A coisa julgada secundum eventum litis é a que, diante de determinadas peculiaridades do direito veiculado, somente ocorre (a coisa julgada) nos casos de procedência. É o caso, por exemplo, da coisa julgada nas ações coletivas que versem sobre direitos individuais homogêneos (art. 103, § 3º, Código de Defesa do Consumidor).

A coisa julgada secundum eventum probationis é aquela que somente ocorre se houver exaurimento de prova. Assim, a improcedência por falta de provas não faz coisa julgada. É o caso, por

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exemplo, da coisa julgada nas ações coletivas que versam sobre direitos difusos e coletivos em sentido estrito (art. 103, I e II, CDC).

15.3.6 RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA

O ordenamento jurídico brasileiro prevê expressamente a possiblidade de relativização da coisa julgada em algumas hipóteses legalmente definidas.

O art. 966 do Novo CPC disciplina que a coisa julgada pode ser desconstituída pela via da ação rescisória, em hipóteses excepcionais, que expressamente elenca.

O art. 525, § 12º, e o art. 535, § 5º, do Novo CPC, estabelecem a inexigibilidade de sentença fundada em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo STF, no controle concentrado ou difuso. Assim, observa-se que tais dispositivos atribuíram à impugnação ao cumprimento de sentença e aos embargos à execução força rescisória das sentenças inconstitucionais que estão sendo executadas.

81

Assim, a sentença inconstitucional (ou coisa julgada inconstitucional) é ineficaz, podendo ser objeto de impugnação ao cumprimento de sentença ou de embargos.

De outro lado, há divergência sobre a possibilidade de relativizar a coisa julgada fora dessas hipóteses.

Alguns autores passaram a admitir a relativização da coisa julgada, diante de uma injustiça manifesta, considerando a ponderação entre os direitos fundamentais em jogo.

No entanto, existe ampla divergência doutrinária a respeito, havendo duas correntes bem definidas:

82

1ª corrente) É possível a relativização da coisa julgada. São defensores dessa corrente Cândido Rangel Dinamarco, Humberto Theodoro Jr., dentre outros.

2ª corrente) A relativização da coisa julgada não pode ocorrer enquanto não houver uma redefinição da ação rescisória no plano legislativo. São partidários desse entendimento José Carlos Barbosa Moreira, Gisele Góes, Nelson Nery Jr., Ovídio A. Baptista da Silva, Luiz Guilherme Marinoni, dentre outros.

Segundo a jurisprudência majoritária dos tribunais pátrios, tem que se relativizar a coisa julgada nas ações investigatórias de paternidade, quando, na época do julgamento, não havia exame de DNA.

83

O Supremo Tribunal Federal entende que é possível relativizar a coisa julgada no caso de ação investigatória de paternidade em que não foi realizado o exame de DNA, mesmo que, na época da ação, já fosse possível a realização desse exame.

84

15.3.7 COISA JULGADA NAS SENTENÇAS DETERMINATIVAS

As relações jurídicas continuativas são aquelas que dizem respeito a obrigações que se protraem no tempo.

81 STJ, REsp 1265409/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/02/2012, DJe 14/02/2012. 82

Essas duas correntes doutrinárias estão bem expostas na obra: DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil: direito probatório, decisão judicial, cumprimento e liquidação da sentença e coisa julgada. v. 2. Salvador : Jus Podivm, 2007. p. 507. Para aprofundar sobre o tema, é imprescindível a consulta ao seguinte livro específico sobre a temática: DIDIER JR., Fredie (Org.). Relativização da coisa julgada: enfoque jurídico. Salvador : Jus podivm, 2004. 83 TJDFT, Acórdão n. 538401, 20110020101768AGI, Relator CARMELITA BRASIL, 2ª Turma Cível, julgado em 28/09/2011, DJ 30/09/2011 p. 122. 84

STF, RE 363889, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 02/06/2011, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-238 DIVULG 15-12-2011 PUBLIC 16-12-2011.

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As sentenças determinativas são as que julgam relações jurídicas continuativas, como, por exemplo, a proferida na ação revisional de aluguel e na ação de alimentos. O art. 505 do Novo CPC prevê que “nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas, relativas à mesma lide, salvo: I - se, tratando-se de relação jurídica de trato continuado, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito, caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença; II - nos demais casos prescritos em lei.”

Grande parte da doutrina e da jurisprudência afirma que a coisa julgada nas sentenças determinativas é rebus sic stantibus, isto é, a coisa julgada manteria a imutabilidade do conteúdo da sentença enquanto não houvesse mudança da situação fática. Tal entendimento é corroborado pela jurisprudência majoritária.

85

No entanto, a doutrina mais atual86

ensina que essa coisa julgada não é diferente das outras. Se a situação fática mudou, a causa de pedir é diferente, razão pela qual haveria outra demanda e, por conseguinte, não haveria coisa julgada. Isto é, caso haja mudança na situação fática, bastará à parte ajuizar nova ação, já que, se a causa de pedir mudou, há outra demanda.

Logo, nesses casos de relações jurídicas continuativas, não haverá necessidade de ajuizar ação rescisória, para desconstituir a coisa julgada. Bastará que seja proposta nova demanda, com base na nova causa de pedir.

São exemplos de sentenças determinativas as proferidas na ação revisional de aluguel e na ação de alimentos

87. Nessas sentenças, alterada a situação fática, poderá ser proposta nova demanda.

16.1 TUTELA DE URGÊNCIA CAUTELAR E TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPADA: DISPOSIÇÕES GERAIS

16.1.1. Requisitos necessários à concessão da tutela de urgência antecipada/cautelar: nos ter-

mos do artigo 300 do NCPC, caput, os requisitos gerais para a concessão da tutela de urgência (antecipa-da e cautelar), incidente ou antecedente, são dois: a). probabilidade do direito, e b). perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.

A tutela de urgência antecipada – tanto a incidente quanto a antecedente - tem ainda o requisito

específico, que é a reversibilidade dos efeitos da decisão (art. 300, § 3°). A prova inequívoca, não é mais requisito para a concessão da tutela antecipada, o que sem qualquer dúvida, facilitará a concessão de provimentos antecipatórios. Trata-se de um avanço do novo diploma legal, na exata medida que a prova

85 Nesse sentido, observe-se o seguinte julgado do STJ: STJ, AgRg no RMS 24.926/CE, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 12/04/2011, DJe 29/04/2011. No mesmo sentido: STJ, AgRg no REsp 1193456/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/10/2010, DJe 21/10/2010. 86 DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil: direito probatório, decisão judicial, cumprimento e liquidação da sentença e coisa julgada. v. 2. Salvador : Jus Podivm, 2007. p. 500. 87

Art. 15 da Lei 5.478/68: “Art. 15. A decisão judicial sobre alimentos não transita em julgado e pode a qualquer tempo ser revista, em face da modificação da situação financeira dos interessados.”

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inequívoca é compatível com juízos de cognição plenária e não sumária, como se dá em sede de tutela provisória.

16.1.1.1. REQUISITOS GERAIS DA TUTELA DE URGÊNCIA PROVISÓRIA (ANTECIPADA/CAUTELAR)

16.1.1.1.1. Probabilidade do direito: a probabilidade do direito nada mais é do que a verossimi-lhança, também denominada pela doutrina de fumus boni juris. O conhecimento das matérias para a concessão da tutela provisória (antecipatória ou cautelar) é perfunctório, superficial, não havendo a necessidade do exaurimento do conhecimento. A verossimilhança, por sua vez, deve considerar: (a) o valor do bem jurídico ameaçado; (b) a dificuldade de o autor provar a sua alegação; (c) a credibilidade, de acordo com as regras de experiência, da alegação e (c) a própria urgência descrita

88.

Aquele que pretender a tutela provisória (antecipada ou cautelar) poderá se valer de todos os meios de prova em direito admitidos, no sentido de demonstrar a probabilidade do direito invocado. Não é demasiado salientar que a parte, quando pleiteia a tutela provisória (antecipada ou cautelar), pode se valer de prova documental, de prova testemunhal ou pericial antecipadamente realizada e de laudo ou pareceres de especialistas, que poderão substituir, em vista da situação de urgência, a prova pericial

89. O

requerente da medida poderá requerer, ainda, que sejam ouvidas, imediata e informalmente, testemu-nhas, bem como solicitar inspeção judicial

90. Uma excelente alternativa é o requerente se valer da ata

notarial para instruir o requerimento de tutela provisória, em razão da fé pública que a mesma se reves-te (vide artigo 384 NCPC). 16.1.1.1.2. Perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo: no âmbito da tutela de urgência cautelar o risco de dano deve ser iminente. Já, na tutela antecipada, o risco de dano está vinculado ao perigo da demora na tramitação do processo. O risco ao resultado útil do processo é um requisito que se adequa à tutela cautelar, se tomarmos como base a concepção de Piero CALAMANDREI

91. Observa-se,

claramente, a confusão do legislador ao dispor sobre os requisitos necessários à concessão da tutela provisória de urgência (antecipada e cautelar). Na verdade, ao incluir o risco ao resultado útil do proces-so como requisito também da tutela de urgência cautelar, o legislador mais uma vez vinculou-se à con-cepção de Piero CALAMANDREI de que o processo cautelar protege a lide principal.

Não é demasiado referir que Humberto THEODORO JÚNIOR92

entende que o receio fundado não é o que provém do simples temor subjetivo da parte, mas o que nasce de dados concretos, seguros, objeto de prova suficiente para autorizar o juízo de verossimilhança, ou de grande probabilidade em torno do risco de grave prejuízo. O autor acrescenta que os simples inconvenientes da demora processu-al, aliás inevitáveis dentro do sistema do contraditório e ampla defesa, não podem, só por si, justificar a antecipação de tutela. É indispensável a ocorrência do risco de dano anormal, cuja consumação possa comprometer, substancialmente, a satisfação do direito subjetivo da parte.

16.1.2. REQUISITO ESPECÍFICO DA TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPADA

16.1.2.1. Reversibilidade do provimento: o § 3° do artigo 300 do NCPC corrigiu a impropriedade

do artigo 273 do CPC/73 relativamente ao requisito reversibilidade, na exata medida em que expressa-mente refere que a tutela de urgência antecipada “não será concedida quando houver perigo de irrever-

88 Neste sentido: Luiz Guilherme MARINONI. A antecipação da tutela, p. 213. 89Neste sentido: Paulo Afonso de Souza SANT´ANNA, Ob. Cit., p. 86-7. Luiz Guilherme MARINONI (In: Novas linhas do processo civil, 4 ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 132. 90Neste sentido: Luiz Guilherme MARINONI. A antecipação da tutela, p. 212. 91De que o processo cautelar protege o processo principal. 92In: Tutela antecipada. Teresa Arruda Alvim WAMBIER (Coord). Aspectos polêmicos da antecipação de tutela. São Paulo: RT, 1997, p. 196.

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sibilidade dos efeitos da decisão”. Ou seja, não mais refere a reversibilidade do provimento como requi-sito (até porque todos os provimentos antecipatórios são reversíveis, porque agraváveis

93 e porque é da

própria essência da antecipação de tutela a provisoriedade). Entretanto, o novo dispositivo legal não menciona se a expressão se refere à reversibilidade dos efeitos fáticos ou jurídicos da decisão. Trata-se de uma discussão travada no CPC/73 e que persistirá na interpretação do NCPC.

De um lado, parte da doutrina posiciona-se no sentido de que se trata de reversibilidade dos efeitos fá-ticos do provimento, que nada mais é do que a possibilidade de retornar-se as coisas ao status quo anterior. De outro, parte da doutrina e da jurisprudência, a qual compartilhamos, afirmam que a irreversibilidade dos efei-tos fáticos do provimento não pode constituir obstáculo para a concessão da tutela antecipada

94.

Não concordamos com o posicionamento do autor supra transcrito. No caso da tutela antecipada

deve-se falar de uma tutela do “provável”, ao contrário do que refere Cândido Rangel DINAMARCO, pois não se sabe se o direito afirmado pelo autor existe ou não existe

95. Falar de sacrifício do direito imprová-

vel, não seria correto, pois a alusão a um direito improvável já traz em si a ideia de que o direito pode existir. Segundo Luiz Guilherme MARINONI

96,

o que pode ser dito, e com razão, é que o direito material não pode ser qua-lificado de ”provável” ou de ”improvável”, pois ele existe ou não existe. Po-rém a existência do direito é algo que pertence ao plano do direito material. Quando estamos no plano do processo e, em particular, do juízo sumário, está em jogo a probabilidade da existência do direito afirmado e, portanto, o “direito provável”, que é uma categoria, assim como a do direito líquido e certo, pertencente ao processo.

Diante do exposto, resta evidente que ao ser analisado o pedido de tutela antecipada – diante de eventual irreversibilidade dos efeitos fáticos -, deverá o magistrado fazer um juízo de ponderação do interesse mais relevante no caso concreto, aplicando o princípio da proporcionalidade.

16.1.2.2. A tutela provisória de urgência antecipada que tenha por objeto direitos fundamen-tais e a incompatibilidade do requisito reversibilidade: admitir que o juiz não possa antecipar os efeitos da sentença – tanto em caráter incidente quanto antecedente -, quando a mesma é imprescindível para evitar um prejuízo irreversível ao direito do autor, é o mesmo que afirmar que o legislador obrigou o juiz a correr o risco de provocar um dano irreversível que justamente lhe parece mais provável. A tutela sumária funda-se no princípio da probabilidade. Não só a lógica mas também o direito à adequada tutela jurisdicional exigem a possibilidade de sacrifício, ainda que de forma irreversível, de um direito que pareça improvável em benefício de outro que pareça provável. Caso contrário, o direito que tem a maior

probabilidade de ser definitivamente reconhecido poderá ser irreversivelmente lesado97

. Esta irreversi-

bilidade se revela de modo evidente, muitas vezes, naquelas ações que tenham por objeto direitos fun-damentais (v.g. nas ações para fornecimento de medicamentos, internações hospitalares, etc). Obvia-mente que, deferida a tutela antecipada para a concessão de um medicamento, o mesmo não terá como ser restituído. Do mesmo modo, se deferida a tutela antecipada para a realização de uma cirurgia urgen-te, não há como desfazer a cirurgia respectiva.

Diante do exposto, entendemos que a reversibilidade dos efeitos fáticos deva ser afastada sem-

pre que a ação tiver por objeto a tutela de direitos fundamentais.

93Art. 1.015, inciso I do NCPC. 94O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que o “possível risco de irreversibilidade dos efeitos do provimento da antecipação da tutela contida no art. 273, § 2º, CPC não pode ser interpretado ao extremo, sob pena de tornar inviável o direito do reivindi-cante” (AgRg no Ag 502.173/RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, j. em 02.08.2005). 95Neste sentido: Luiz Guilherme MARINONI. A antecipação da tutela, p. 227. 96In: A antecipação da tutela, p. 227. 97In: Luiz Guilherme MARINONI. A antecipação da tutela, p. 229.

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16.1.3 Requerimento e concessão dos provimen-

tos urgentes (antecipatórios/cautelares): O requerimen-to de tutela de urgência (antecipada/cautelar) pode ser formulado na petição inicial, no curso do processo, por simples petição, ou mesmo na esfera recursal

98. Há três

possibilidades de deferimento dos provimentos urgentes, verbis:inaudita altera parte, mediante a designação de audiência de justificação prévia e mediante a ouvida da parte contrária.

16.1.3.1. Provimentos urgentes concedidos inaudita altera parte: a decisão liminar deve ser en-

tendida como aquela concedida in limine litis, o que significa dizer, no início do processo, sem que tenha havido ainda a citação ou a oitiva da parte contrária. Segundo Adroaldo Furtado FABRÍCIO

99,

Como no sentido comum dos dicionários leigos, liminar é aquilo que se situa no início, na porta,

no limiar. Em linguagem processual, a palavra designa o provimento judicial emitido in limine litis, no momento mesmo em que o processo se instaura. A identificação da categoria não se faz pelo conteúdo, função ou natureza, mas somente pelo momento da provação. Nada importa se a manifestação judicial expressa juízo de conhecimento, executório ou cautelar; também não releva indagar se diz ou não com o meritum causae nem se contém alguma forma de antecipação de tutela. O critério é exclusivamente topológico, Rigorosamente, liminar é só o provimento que se emite inaudita altera parte, antes de qual-quer manifestação do demandado e até mesmo antes de sua citação.

O NCPC adota esta mesma linha de raciocínio, referindo-se à medida liminar neste sentido, nos

termos dos artigos 299, 300, § 2°, 302, II e 311, parágrafo único. É também nesse sentido que o legislador se vale do adjetivo quando cria a improcedência liminar do pedido (art. 332, NCPC)

100.

Relativamente à concessão inaudita altera parte, recomenda-se cautela. No âmbito da tutela de

urgência antecipada, a cautela deverá ainda ser maior, pois, há antecipação de mérito. Entretanto, em algumas hipóteses, poderá se revelar recomendável a concessão da tutela provisória sem a ouvida da parte contrária, como por exemplo, quando houver risco de perecimento do direito, em razão da demora (ou seja, se ouvido o réu, talvez já não mais seja eficaz a concessão da tutela antecipada), ou ainda na-queles casos em que, se ouvido o réu, este puder frustrar a execução da medida

101. Não há que se falar

em violação ao princípio do contraditório e da ampla defesa, porque o réu será ouvido posteriormente à concessão da medida, podendo o magistrado inclusive modificá-la. Há o chamado contraditório poster-gado ou diferido. O NCPC, inclusive, excepciona esta hipótese no art. 9°, parágrafo único, inciso I, verbis: “não se proferirá decisão contra uma das partes sem que esta seja previamente ouvida. Parágrafo único: O disposto no caput não se aplica: I – à tutela provisória de urgência; II – às hipóteses de tutela da evi-dência previstas no art. 309, incisos II e III”.

98A tutela antecipada na esfera recursal recebe o nome de efeito ativo ou efeito suspensivo-ativo. 99In: Estudos de Direito Processual em Memória de Luiz Machado Guimarães. José Carlos Barbosa Moreira (coord). Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 25. 100Neste sentido: Freddie DIDIER JÚNIOR (In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Jus Podivam, 2015, p. 579) 101Freddie DIDIER JÚNIOR (In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Jus Podivam, 2015, p. 579), ao tratar do tema, lecio-na: “a tutela provisória de urgência poderá ser concedida liminarmente quando o perigo de dano ou de ilícito, ou o risco ao resultado útil do processo estiverem configurados antes ou durante o ajuizamento da demanda. Caso não haja risco de ocor-rência do dano antes da citação do réu, não há que se concedê-la em caráter liminar, pois, não haverá justificativa razoável para a postergação do exercício do contraditório por parte do demandado. Seria uma restrição ilegítima e desproporcional ao seu direito de manifestação e defesa. Somente o perigo, a princípio, justifica a restrição ao contraditório. Entretanto, sempre que estabelecer a necessidade de contraditório prévio, o juiz deve justificar a postergação da análise do requerimento liminar”.

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16.1.3.2. Provimentos urgentes (antecipatórios/cautelares) concedidos mediante audiência de justificação prévia

102: será designada a audiência de justificação prévia, mencionada no § 2° do artigo

300 do NCPC, sempre que a concessão da medida provisória depender da inquirição de testemunhas. É de se indagar: a). precisará o réu ser convocado para comparecer a esta audiência? b) se convocado, ou mesmo se tomar conhecimento por outros meios, o que poderá participar desta audiência? Poderá levar testemunhas?

Parece-nos que o réu não precisará ser convocado para participar da audiência de justificação

prévia, na exata medida em que é possível a concessão inaudita altera parte. Todavia, se o mesmo tomar conhecimento por outros meios, ou mesmo tiver sido convocado, não há como lhe negar a participação. Entendemos que sua participação deve ser restrita: poderá inquirir as testemunhas do autor e contradi-tá-las, não podendo levar testemunhas, tendo em vista que a audiência de justificação prévia é para o autor obter a liminar. O réu terá a possibilidade, por ocasião da audiência de instrução e julgamento, de arrolar testemunhas e, consequentemente, ouvi-las. Do mesmo modo, a audiência de justificação prévia não se presta para a tomada de depoimentos pessoais. Se o contrário fosse verdadeiro, estaríamos pos-sibilitando a realização de verdadeira instrução no início do procedimento, quando sequer houve a apre-sentação de contestação.

16.1.3.3. Provimentos urgentes concedidos mediante a ouvida da parte contrária: em que pese

o NCPC não mencionar expressamente a possibilidade de concessão da tutela de urgência mediante a

ouvida da parte contrária, evidentemente que é possível. Esta terceira hipótese não apresenta maiores

problemas tendo em vista a garantia efetiva do contraditório. Entretanto, a mesma só será concedida

deste modo, se for possível aguardar – ou seja, se o tempo não comprometer a eficácia da medida – e, a

ouvida do réu não comprometer o resultado útil do processo, na linguagem adotada pelo NCPC (ou não

implicar em sacrifício ao direito da parte, de acordo com o pensamento de Ovídio Araújo BAPTISTA DA SILVA).

O NCPC não prevê expressamente o prazo para o requerido manifestar-se. Entendemos que o

prazo para a parte contrária manifestar-se será aquele que o magistrado determinar. Se não houver

fixação de prazo, o mais adequado, é a aplicação do prazo supletivo de 5 (cinco) dias.

16.1.3.4 Momento para o deferimento/indeferimento do provimento provisório (antecipado/cautelar):

a tutela de urgência (antecipatória/cautelar) poderá ser concedida/negada no curso do processo, no

próprio corpo da sentença ou em grau recursal.

O grande problema é no tocante ao recurso cabível contra a decisão que conceder a tutela ante-

cipada no próprio corpo da sentença. De acordo com o princípio da unicidade recursal, parece evidente

que o recurso cabível seja o de apelação (em sendo a sentença o ato jurisdicional mais abrangente, in-

corporará o provimento antecipatório que eventualmente constar em seu interior)103

. O NCPC, de modo

a pacificar a questão, expressamente dispôs que o recurso cabível efetivamente é o de apelação, nos

termos do § 5° do art. 1.013.

Outro problema que sempre provocou grandes debates diz respeito aos efeitos do recurso de apelação nas hipóteses de concessão do provimento antecipatório no corpo da sentença, já que o artigo 520 do CPC/73 agregava efeito apenas devolutivo a esse recurso quando a sentença confirmasse a tutela

102Joel Dias Figueira Júnior (Ob. cit., p. 114) é contrário à designação de audiência preliminar de justificação prévia. 103Segundo Nelson NERY JÚNIOR (In: Teoria Geral dos Recursos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 6ª ed., 2004, p. 119), no sistema do CPC brasileiro vige o princípio da singularidade dos recursos, também denominado de princípio da unirrecorribilidade, ou ainda de princípio da unicidade, segundo o qual, para cada ato judicial recorrível há um único recurso previsto pelo ordenamento, sendo vedada a interposição simultânea ou cumulativa de mais outro visando a impugnação do mesmo ato judicial”.

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antecipada. No tocante à concessão de provimentos antecipatórios no corpo da sentença, o CPC/73 era omisso. O artigo 1.012, § 1°, inciso V, do NCPC resolve o problema, na exata medida em que agrega à apelação efeito apenas devolutivo quando a sentença confirma, concede ou revoga a tutela provisória. Ou seja, se a sentença – em seu corpo – negar, conceder ou confirmar tutela de urgência antecipada ou qualquer outra modalidade de tutela provisória, a apelação será dotada apenas do efeito devolutivo. Entretanto, nos termos do § 4° deste mesmo dispositivo legal, nada impede que o relator do recurso agregue efeito suspensivo ao mesmo, nas hipóteses previstas no § 1°, verbis: “se o apelante demonstrar a probabilidade de provimento do recurso, ou, sendo relevante a fundamentação, houver risco de dano grave ou de difícil reparação”. A decisão do relator de se pronunciar sobre eventual pedido de efeito suspensivo ao recurso de apelação será atacada através do recurso de agravo interno, previsto no artigo 1.021 do NCPC

104.

Do mesmo modo, entendemos que a tutela provisória possa ter os seus pressupostos preenchi-dos após a prolatação da sentença, no âmbito recursal. Se a sentença já tiver sido prolatada e o processo já estiver no tribunal, em grau de recurso, o requerimento de tutela provisória incidental deve ser formu-lado no próprio tribunal, para que seja apreciado pelo órgão competente para julgamento (art. 299, parágrafo único). Em sendo deferida a medida no âmbito recursal, haverá a imediata eficácia da sentença.

Em se tratando de processos físicos – não eletrônicos – entendemos que o requerimento deva estar instruído com o traslado de peças essenciais à compreensão da demanda.

16.1.4. Caução contracautela: na decisão que conceder a tutela provisória de urgência (anteci-pada/cautelar), o magistrado poderá

105 determinar a prestação de caução – inclusive exofficio -, destinada

a ressarcir eventuais danos que a medida possa vir a causar ao réu. Esta caução poderá ser real ou fide-jussória, sendo sempre facultativa, o que se conclui a partir do verbo “poderá” presente no art. 300, § 1°do NCPC.

O fundamento nuclear do instituto da caução contracautela encontra guarida no princípio da i-gualdade entre as partes, num tipo de procedimento que necessariamente pressupõe a desigualdade inicial entre elas. Sobre fundamentar-se a contracautela no princípio da igualdade, leciona Ramiro PO-DETTI

106, que “la contra cautela, que se funda en el principio de igualdad, reemplaza, en cierta medida, a

la bilateralidad o controversia, pues implica que la medida cautelar debe, ser doble, asegurando al actor un derecho aún no actuado y al demandado la efectividad del resarcimiento de los daños, si aquel dere-cho no existiera o no llegare a actualizarse.

Não é demasiado referir que a concessão liminar da medida cautelar não dispensa a cognição sumária (fumus boni juris e periculum in mora), mesmo que a caução contracautela seja prestada

107. Em

que pese a caução contracautela facilitar a concessão da liminar, ela não pode ser elevada à condição de super pressuposto, de modo a dispensar os demais.

Por outro lado, é certo que a prestação de caução pelo autor tranquiliza o magistrado por ocasi-ão da concessão da medida liminar. Todavia, ela jamais poderá ser uma regra, no sentido de sempre ser exigida. E isto por uma razão muito simples: a situação econômica e social do Brasil faz com que a maio-ria dos brasileiros não tenha condições financeiras de prestar caução. Torná-la obrigatória significaria inviabilizar o acesso à tutela cautelar à maioria da população brasileira

108. Tanto isto é verdade, que o

104Na sistemática do CPC/73 a decisão do relator que se pronunciar sobre eventual pedido de efeito suspensivo é irrecorrível. 105A imposição da prestação da caução contracautela é uma faculdade ao juiz. Neste sentido o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (REsp 140.386/4ª Turma, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. 10.12.1997) 106In: Tratados de las medidas cautelares: derechoprocesal civil comercial y laboral. Buenos Aires: Ediar, 1956, n. 20, p. 82. 107Neste sentido Humberto THEODORO JÚNIOR (In: Processo Cautelar, p. 157). Também: Luiz ORIONE NETO (In: Ob. cit., p. 179). 108Segundo Galeno LACERDA (In: Comentários ao Código de Processo Civil, p. 247), “a exigência de caução prévia, como garan-tia contra os danos que o requerido possa vir a sofrer em virtude da liminar, só cabe nas ações cautelares jurisdicionais, de natureza ou de reflexo patrimonial. Não tem sentido, a toda evidência, exigi-la nas cautelas voluntárias e nas jurisdicionais concernentes a relações de família e a direitos personalíssimos, enfim, nos casos despidos de conotação patrimonial, desde que o cumprimento da liminar não provoque dano dessa natureza. Se, acaso, a vistoria ad perpetuam, que é cautela voluntá-

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mesmo § 1° do art. 298, na parte final, prevê a possibilidade da dispensa da prestação de caução se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.

No tocante ao valor da caução, deverá ela ser fixada de acordo com os danos que possam ser causados pela efetivação da medida cautelar

109. A discricionariedade judicial está presente por ocasião

de sua fixação.

16.1.5 Caução substitutiva110

: o NCPC não previu expressamente a possibilidade do réu prestar a chamada caução substitutiva, tal como previa o artigo 805 do CPC/73. Em que pese a omissão legislativa, não vemos nenhum óbice do réu pleitear a substituição da providência cautelar/antecipatória eventual-mente deferida quando existir outra igualmente idônea, porém menos gravosa. Não é demasiado referir que a regra da menor restrição incide apenas depois de adotada a regra do meio idôneo. Não há como indagar se uma providência cautelar/antecipatória causa menor restrição antes de se verificar se essa é realmente idônea à tutela cautelar/antecipada. Não se pode pretender menor restrição à custa da ido-neidade da medida

111.

O deferimento da medida exige a ocorrência de dois requisitos: a). adequação e b). suficiência112

. Por adequação entende-se a disposição inata da caução para desempenhar garantia compatível com a providência anteriormente decretada, ou seja, com a mesma serventia substancial.

Por suficiência da caução entende-se a sua expressão quantitativa, isto é, o volume apto para, em concreto, cobrir o valor do risco de prejuízo acobertado. Assim, nas medidas de natureza econômica, a caução é sempre adequada, mas cumpre também seja consubstanciada em valor suficiente

113.

Pode-se ainda indagar: se concedida a liminar cautelar/antecipatória e o requerido ofertar cau-ção, o juiz fica obrigado a substituir a medida pela prestação de caução? Na doutrina, Sérgio Sahione FADEL

114 entende que a substituição, “uma vez fundada em caução firme, é obrigatória”

115.

Em posição contrária, entendemos com razão Ovídio Araújo BAPTISTA DA SILVA116

, que refere não se poder falar em “direito subjetivo” do réu, indicando que ao juiz se reserva a mesma discricionari-edade judicial inerente à cognição cautelar/antecipatória. Mesmo que a caução seja adequada e suficien-te, ao juiz fica facultado conceder ou não a substituição da medida cautelar/antecipatória, sempre, é claro, justificando a sua decisão, visto que discricionariedade não se confunde com arbitrariedade abso-luta, isto é, por ser ato jurisdicional, mister seja convenientemente motivado.

16.1.6. Responsabilidade civil decorrente da concessão de tutela de urgência (antecipató-ria/cautelar)

117: a responsabilidade civil objetiva daquele que teve deferida a seu favor uma medida

urgente – antecipada/cautelar -, pelos danos que a efetivação da mesma vier a causar, caso o mesmo venha a sucumbir na lide principal, acabou sendo acolhida mais uma vez pelo NCPC, no artigo 302 – com redação praticamente idêntica ao artigo 811 do CPC/73.

ria, causar dano ao requerido, a questão resolver-se-á na ação principal, ou em ação própria de ressarcimento, mas a vistoria como tal, não pode ficar condicionada à caução prévia”. 109Neste sentido: Ovídio Araújo BAPTISTA DA SILVA (In: Curso de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 126-7). 110Aplica-se também à tutela de urgência antecipada. 111Neste sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (REsp 22.034/GO, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. em 28.10.1992) 112Neste sentido: Luiz ORIONE NETO (In: Ob. cit., p. 186) 113Neste sentido: Humberto THEODORO JÚNIOR (In: Curso de Direito Processual Civil, 1.035, p. 528) 114In: Código de Processo Civil Comentado. Rio de janeiro: Konfino, 1974, Tomo IV, p. 221. 115No mesmo sentido: Galeno LACERDA (In: Comentários ao Código de Processo Civil, Vol. VIII, Tomo I, n. 64, p. 262) 116In: Curso de Processo Civil, p. 144. 117Sobre o tema, vide monografia exaustiva de Fábio Luiz Gomes (In: ResponsabilidadeObjetiva e Antecipação de Tutela – A superação do paradigma da modernidade São Paulo: Revista dos Tribunais, 2.006, p. 197 e seguintes)

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16.2 TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPADA

16.2.1. Natureza da decisão que conceder/negar a tutela de urgência antecipada: as medidas que antecipam os efeitos da tutela pretendida – tanto aquelas requeridas em caráter incidental ou ante-cedente - realizam, ou seja, antecipadamente satisfazem, os efeitos da sentença final. Elas sempre serão antecipações de efeitos de uma sentença satisfativa; portanto, realização provisória dos eventuais efei-tos da sentença de procedência.

As medidas antecipatórias não se caracterizam como simples decisões interlocutórias – como afirma a maioria da doutrina

118. Tratam-se de decisões interlocutórias de mérito, na sistemática do

NCPC.

16.2.2. Legitimação para requerer a tutela de urgência antecipada: muito embora a tutela antecipada seja providência que beneficie o autor do processo, pode o réu requerê-la quando reconvir no procedimento comum (art. 343 do NCPC) ou na contestação das ações dúplices

119. Assim como Nel-

son NERY JÚNIOR120

, entendemos que a legitimidade para requerer a antecipação de tutela é estendida a todos aqueles que deduzam pretensão em juízo, como o denunciante, na denunciação da lide; os inter-venientes que agem ad coadjuvandum, como o assistente (simples e litisconsorcial) e o Ministério Públi-co, no interesse e em benefício do assistido e daquele por quem intervém

121.No tocante aoamicuscuriae,

entendemos que não poderá requerer qualquer das modalidades de tutela de urgência (antecipada ou cautelar), tendo em vista a função que desempenha no processo civil, que é de mero coadjuvante, que simplesmente tem o papel de auxiliar as partes

122.

118Em sentido contrário, Luiz Guilherme MARINONI e Daniel Francisco MITIDIERO (In: Código de Processo Civil – Comentado artigo por artigo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 270), verbis: “a decisão que antecipa ou não a tutela jurisdicional no primeiro grau de jurisdição é uma decisão interlocutória (art. 162, § 2º, CPC) e desafia o recurso de agravo (art. 522, CPC)”. 119Neste sentido: Paulo Afonso de Souza SANT´ANNA. Novos Contornos do Instituto da Tutela Antecipada e os Novos Para-digmas do Sistema Processual Civil (Lei 10.444/02). Revista de Processo 112, p. 86. Esta lição é perfeitamente aplicável ao NCPC. 120In: “Procedimentos e Tutela antecipatória”. Teresa Arruda Alvim WAMBIER (Coord.). Aspectos polêmicos da antecipação de tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 389. 121Neste sentido o entendimento de Luiz Guilherme MARINONI e Daniel Francisco MITIDIERO (In: Código de Processo Civil – Comentado artigo por artigo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 270), verbis: “O assistente simples pode reque-rer a antecipação de tutela em favor da parte assistida. O réu pode pleitear a antecipação de tutela nos casos em que propõe reconvenção e quando em causa uma ação dúplice (por exemplo, ação de prestação de contas). Atuando como fiscal da lei, pode o Ministério Público requerer a antecipação de tutela em favor da parte”. 122Ao tratar do tema, leciona FreddieDIDIER JÚNIOR (In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Editora Jus Podivam, 2015, p. 573), ao tratar do tema, refere: “assim, autor, réu, terceiros intervenientes (que, a partir da intervenção, se tornam parte) podem requerer a antecipação provisória dos efeitos da tutela (satisfativa ou cautelar), pois todos têm o direito à tutela jurisdicional e, uma vez preenchidos os pressupostos de lei, também à antecipação provisória dos seus efeitos. Até mesmo o assistente simples pode fazê-lo, condicionando-se, entretanto, à vontade do assistido, que pode não querer, por qualquer motivo, a decisão provisória. O réu pode requerer a tutela provisória quando for reconvinte e denunciante; quando formular pedido contraposto; ou quando a ação for dúplice, hipótese em que a sua simples defesa já se constitui o exercício de sua pretensão. Também é possível a antecipação dos efeitos do acolhimento do contra direito (direito de retenção, direito de compensar etc) exercido pelo réu em defesa. Até mesmo quando simplesmente contesta demanda não-dúplice, pode o réu, preenchidos os pressupostos legais, requerer a antecipação provisória dos efeitos da tutela declaratória negativa (improce-dência do pedido do autor), em homenagem ao princípio da isonomia. Segue um bom exemplo de tutela provisória concedida em favor do réu. Em demanda condenatória contestada, tendo remetido o autor, em razão da suposta dívida, informações para órgãos de proteção ao crédito, poderá o réu, em tese, postular a antecipação provisória de efeitos da futura sentença de improcedência, a fim de que seu nome seja provisoriamente excluído do rol de devedores inadimplentes ou de que não seja divulgada essa informação. Também tem legitimidade o substituto processual, pois se está legitimado a defender o direito do outro, em razão do benefício que disso lhe resulta, mediante tutela definitiva, tem também legitimação para requerer tutela provisória correspondente. O Ministério Público pode requerer a tutela provisória quando for parte (art. 177, CPC) e quando for assistente diferenciado de incapazes (art. 178, II, CPC). Na qualidade de fiscal da ordem jurídica (art. 178, caput, I e III, CPC), poderá o Ministério Público apoiar/repelir/sugerir o pleito provisório formulado; não poderá, entretanto, formular requerimen-to autônomo de tutela provisória”.

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16.2.3. Efeitos passíveis de serem antecipados: No âmbito da doutrina nacional reconhece-se duas grandes tendências no tocante aos efeitos passíveis de serem antecipados, tanto em se tratando de tutela de urgência antecipada incidente quanto antecedente. Uma restritiva, sustentada por Ovídio Araújo BAPTISTA DA SILVA, e outra ampliativa

123, defendida por outros doutrinadores. Segundo Ovídio

Araújo BAPTISTA DA SILVA124

, apenas os efeitos executivo lato sensu e mandamental são passíveis de serem antecipados. Os demais efeitos, segundo o autor, são incompatíveis com a ideia de antecipações provisórias. Já, outros doutrinadores,

125 sustentam a possibilidade de antecipação de tutela de alguns ou

de todos demais efeitos de uma sentença126

. Ao tratar do tema, refere Araken de ASSIS127

:

Feitas as distinções, um só efeito, neste aspecto, rejeita quaisquer anteci-pações: o efeito da sentença declarativa, que é a certeza. Admitir-se-á, em linha de princípio e ignorando as travas do art. 273, a antecipação do efeito constitutivo (o estado de divorciado), da condenação (o título executivo), da execução (o intercâmbio patrimonial forçado) e do mandamento (ordem). O obstáculo deriva de razão singular: l´accertamento, percebeu Liebman, “sensa cosa giudicatasembra privo diimportanza e non serve a nulla” (a de-claração sem a coisa julgada parece privada de importância e nada serve). Quer dizer – e dando razão a Hellwig –, o efeito da declaração (certeza) nascerá com o trânsito em julgado da sentença.

No tocante ao efeito condenatório, grande parte da doutrina inclina-se por admitir sua anteci-pação, em razão da expressa vinculação da tutela antecipada à execução provisória, que persiste no NCPC no artigo 297, parágrafo único. O raciocínio realizado pela maioria da doutrina é simples: se a tutela de urgência antecipada está vinculada à execução provisória, inexoravelmente também está ligada ao efeito condenatório, já que este é objeto do cumprimento provisório. Logo, será possível, de acordo com esta corrente doutrinária, a antecipação do efeito condenatório.

123Neste sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (REsp 595.172/SP), verbis: “a antecipação de tutela é possí-vel em todas as ações de conhecimento”. 124In: Curso de Processo Civil, Vol. 1, p. 136 125Humberto THEODORO JÚNIOR (In: Revista LTR, Vol. 62-10/1313), ao tratar do tema, leciona: “A doutrina nacional – a nosso ver, com razão – parece propender no sentido positivo, isto é, admitindo a antecipação da tutela constitutiva. Nesse sentido, Cândido Rangel DINAMARCO observou que ‘o ato de concessivo da tutela pode ter natureza constitutiva, antecipando situa-ções novas desejadas pelo demandante.” (‘A Reforma do Código de Processo Civil’, São Paulo, Malheiros, 3ª edição, 1996, n. 105, p. 144). No mesmo sentido pronunciaram-se Nelson NERY JÚNIOR (‘As atualidades sobre Processo Civil’, São Paulo, Ed. RT, 1996, p. 73), Ernane Fidélis dos SANTOS (‘Novos Perfis do Processo Civil Brasileiro, Belo Horizonte, Del Rey, 1996, n. 7, pág. 10)”. Prossegue o autor: “Em outros casos o cabimento da antecipação é mais evidente ainda, como quando, por exemplo, ao pedido declaratório ou constitutivo, se acumula um condenatório, que pressupõe o prévio acolhimento do primeiro (caso, v.g., da rescisão ou anulação de um contrato com restituição do bem contratual ao primitivo alienante). A pretensão antecipatória refere-se à condenação a restituir, mas sua apreciação somente será possível depois de um acertamento provisório acerca da pretensão de rescindir ou anular o contrato sub judice. Sempre, pois, que de uma demanda declaratória ou constitutiva for possível extrair uma pretensão executiva ou mandamental, haja ou não cumulação de pedidos, é irrecusável a possibilidade de usar a antecipação de tutela, se presentes, naturalmente, os seus pressupostos legais”. 126Freddie DIDIER JÚNIOR (In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Jus Podivam, 2015, p. 588), ao tratar do tema, lecio-na: “a tutela provisória só contribuirá para o alcance dessa finalidade quando adiantar no tempo efeitos que provoquem ou impeçam mudanças no plano fático os chamados efeitos fáticos ou sociais da tutela, que são aqueles que, para efetivar-se, dependem da prática de atos materiais – espontâneos por parte do obrigado ou forçados através de atividade executiva. Assim, não se antecipa a própria tutela satisfativa (declaratória, constitutiva ou condenatória), mas, sim, os efeitos delas provenientes. Pela decisão provisória, apenas se permite que o requerente usufrua dos efeitos práticos (sociais, executivos) do direito que quer ver tutelao, imediatamente, antes mesmo do seu reconhecimento judicial. Antecipa, pois, a eficácia social da sentença – seus efeitos executvios – e, não, sua eficácia jurídico formal. Antecipar a tutela é satisfazer de imediato, na realida-de fática, o pleito do requerente. É por isso que se diz que, no contexto da tutela provisória satisfativa (ou antecipada, na terminologia da lei), concedida em sede de ações constitutivas e declaratórias, a antecipação que se operanão é da declaração ou da constituição/desconstituição (efeito jurídico-formal), vez que estas serão sempre definitivas – e só assim serão úteis para a parte. O que pode ocorrer é a antecipação dos efeitos fáticos, práticos, palpáveis de tais tutelas (declaratória ou constituti-va)”. 127In: Doutrina e Prática do Processo Civil Contemporâneo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 411.

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O grande problema que existe é no tocante à execução do provimento condenatório antecipa-do, que persiste no NCPC. A tutela antecipada insere-se no âmbito da tutela de urgência. A execução no Brasil, em que pese todas as alterações que tivemos ao longo dos anos, é demorada. Se o autor da de-manda precisar executar o provimento antecipatório, de acordo com as regras do cumprimento provisó-rio, certamente o seu direito irá perecer. É por esta razão que o artigo 297, caput, do NCPC permite que o juiz determine também “as medidas que considerar adequadas para a efetivação da tutela provisória”.

16.2.4. Da tutela de urgência antecipada requerida em caráter incidente: a tutela antecipa-da incidente pode ser requerida na própria petição inicial, no curso do processo - por simples petição - e no âmbito recursal. Sempre que requerida incidentalmente, o pedido principal será elaborado na petição inicial. Consequentemente, não há que se falar em emenda da petição inicial, na forma do artigo 303, § 1°, inciso I do NCPC. Do mesmo modo, não haverá estabilização da tutela antecipada requerida inciden-talmente, caso o réu não interponha agravo de instrumento. A técnica da estabilização – sempre que a parte optar, nos termos do § 5° do artigo 303 do NCPC – aplica-se exclusivamente à tutela antecipada antecedente, explicitada no item 6, infra. O Capítulo II, do Título II, aplica-se à tutela antecipada antece-dente, não sendo a técnica nele prevista compatível com a tutela antecipada incidente.

Não é demasiado mencionar – de forma a explicitar a compreensão – que a tutela antecipada incidental se processa no NCPC de forma similar ao CPC/73. Ou seja, a petição inicial deverá preencher não apenas os requisitos necessários à concessão do provimento antecipatório, mas a todos os funda-mentos necessários procedência da demanda. O pedido principal é requisito da petição inicial, nos ter-mos do artigo 319 do NCPC.

16.2.5. DO TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPADA REQUERIDA EM CARÁTER ANTECEDENTE

16.2.5.1. Requisitos da petição inicial: o capítulo II do Livro V, dispõe a respeito do procedimento que deve ser observado na tutela antecipada requerida em caráter antecedente. Nos termos do artigo 303 do NCPC, “nos casos em que a urgência for contemporânea à propositura da ação, a petição inicial pode limitar-se ao requerimento da tutela antecipada e à indicação do pedido de tutela final, com a exposição da lide, do direito que se busca realizar e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo”. De acordo com esse dispositivo legal, na petição inicial, o autor veiculará a ação que pretende ajuizar, com o pedido de tutela antecipada. Não há a necessidade do autor, na petição inicial, exaurir os fundamentos para a procedência da ação, bastando a demonstração da probabilidade do direito afirma-do, por uma simples e incontestável razão: nos termos do § 1°, inciso I do artigo 303 do NCPC, o autor deverá aditar a petição inicial posteriormente, complementando sua argumentação.

A indicação do pedido de tutela final na petição inicial se revela fundamental, de modo a que o magistrado tenha condições de verificar o (s) efeito (s) da sentença que o autor pretende antecipar. Do mesmo modo, o pedido principal que será formulado se revela importante de modo a ser dimensionado o valor da causa por ocasião do ajuizamento da ação.

16.2.5.2. Deferimento da tutela de urgência antecipada e aditamento da petição inicial: a-pós a concessão da tutela antecipada, de acordo com o § 1°, inciso I do artigo 303 do NCPC, “o autor deverá aditar a petição inicial, com a complementação da sua argumentação, a juntada de novos docu-mentos e a confirmação do pedido de tutela final, em 15 dias, ou em outro prazo maior que o juiz fixar”. Em não sendo realizado o aditamento, o processo será extinto sem resolução do mérito (§ 2°). Se for realizado o aditamento, nos termos do inciso II, “o réu será citado e intimado para a audiência de concili-ação ou de mediação na forma do art. 334”. Se não houver composição do litígio, “o prazo para contes-tação será contado na forma do art. 335”. Este dispositivo legal aplica-se apenas à tutela de urgência antecipada antecedente.

É de se indagar: poderá o autor na petição inicial anunciar determinado pedido e por ocasião do aditamento elaborar outro? Por exemplo, na petição inicial o autor requer apenas a exclusão do seu

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nome dos cadastros do SPC e SERASA e anuncia como pedido de tutela final a exclusão definitiva de seu nome destes cadastros respectivos. Quando realizar o aditamento, poderá também requerer a condena-ção em perdas e danos? Entendemos que não há nenhum óbice à formulação de pedido que não neces-sariamente reflita ao que for anunciado na petição inicial, desde que haja a complementação de custas processuais, caso haja a incidência.

16.2.5.3. Indeferimento da tutela de urgência antecipada: No caso do magistrado entender que não há elementos para a concessão da tutela antecipada, nos termos do § 6° do art. 303, o órgão jurisdicional determinará a emenda da petição inicial em até 5 (cinco) dias. Não sendo aditada neste prazo, a petição inicial será indeferida e o processo extinto sem resolução do mérito. Este dispositivo legal aplica-se apenas à tutela de urgência antecipada antecedente.

16.2.5.4. Não interposição de recurso da decisão que deferir a tutela antecipada e estabili-zação do provimento

128: em não sendo interposto recurso da decisão que conceder a tutela antecipada, nos

termos do art. 304 do NCPC, a mesma torna-se-á estável. Isto significa dizer que o processo será extinto (art. 304, § 1° do NCPC), através de sentença. Entendemos que se trata de extinção com resolução de mérito, com sentença de procedência. Evidentemente que o julgamento será com base em juízo de verossimilhança. En-tendemos absolutamente equivocado o entendimento que se trata de extinção do processo sem resolução do mérito, tal como afirmado por parte da doutrina. A título de argumentação, se o julgamento fosse de extinção sem resolução do mérito, como cumprir o provimento antecipatório estabilizado?

Por outro lado, não é demasiado referir que não há nenhuma contradição em afirmar-se a ine-xistência de coisa julgada da sentença que estabiliza a tutela antecipada com a circunstância da mesma ser de mérito. E isto por uma simples e incontestável razão: o julgamento é prolatado com base em juízo de verossimilhança.

Em que pese o processo ser extinto, a decisão que conceder a tutela provisória satisfativa, já estabilizada, conserva seus efeitos. Esta decisão não transita em julgado materialmente, tanto que pode-rá ser revista através de ação autônoma, nos termos do § 2° deste mesmo dispositivo legal. Entretanto, o direito de “rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada, previsto no § 2° deste artigo, extingue-se após dois anos, contados da ciência da decisão que extinguiu o processo” (§ 5° do artigo 304 do NCPC).

A estabilização a tutela antecipada é uma das grandes novidades do novo diploma legal, tendo inspiração no direito francês

129, no instituto processual do référé. Uma das características importantes

desse instituto é sua autonomia. Ao contrário da tutela antecipada, prevista no CPC/73, que sempre está condicionada ao julgamento do pedido principal, não passando de um acessório, cujo destino fica sem-pre vinculado ao acertamento a ser feito futuramente, no direito francês, o procedimento do référé é completamente autônomo em relação ao processo de fundo. A tutela de urgência na França ocorre em processo cognitivo sumário, provisório, mas que não depende de posterior julgamento do pedido princi-pal para confirmação do provimento emergencial.

128Segundo Freddie DIDIER JÚNIOR (In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Jus Podivam, 2015, p. 604-5), ao tratar do tema, leciona: “a estabilização da tutela antecipada representa uma generalização da técnica monitória para situações de urgência e para a tutela satisfativa, na medida em que viabiliza a obtenção de resultados práticos a partir da inércia do réu. ...Sucede que, ao mesmo tempo em que mantém e amplia aação monitória, o legislador vai além e generaliza a técnica moni-tória, introduzindo-a no procedimento comum para todos os direitos prováveis e em perigo que tenham sido objeto de tutela satisfativa provisória antecedente. O modelo da ação monitória (arts. 700 a 702, CPC) deve ser considerado o geral – é possí-vel, inclusive, pensar em um microssistema de técnica monitória, formado pelas regras da ação monitória e pelos arts. 303 a 304 do CPC, cujos dispositivos se complementam reciprocamente”. 129Humberto THEODORO JÚNIOR (Tutela antecipada. Evolução. Visão comparatista. Direito brasileiro e direito europeu. In: Revista de Processo n. 157, p. 129 a 146), sintetiza o référé francês da seguinte forma: “o procedimento do référé, no processo civil francês, cumpre o papel da tutela de urgência permitindo a adoção rápida de equacionamento para questões de mérito, tal como acontece na antecipação de tutela no direito brasileiro. Não o faz, entretanto, em incidente do processo de conhecimento, nem em ação cautelar preparatória de futura ação principal. Instaura-se, simplesmente, um processo autônomo e sumário, cuja decisão pode ser, ou não, seguida de revisão em processo definitivo. São, pois, características do sistema francês do référé: a). a autonomia do procedimento de urgência; b). a provisoriedade da decisão neles proferida; c). a ausência de coisa julgada”.

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A autonomia em questão faz com que o juiz do référé não seja alguém que delibera no aguardo de uma posterior e necessária intervenção de fundo em outra prestação jurisdicional. Essa ulterior com-posição do litígio, de caráter definitivo, pode eventualmente acontecer, mas não como necessidade sistemática ou orgânica. Mesmo que os dois procedimentos girem em torno do mesmo litígio, não per-seguem o mesmo objeto e, por isso, não pode um ser considerado como preliminar do outro

130.

O fim principal e específico do référé não é a composição definitiva do conflito, mas sim a “es-tabilização de uma situação, a interrupção de uma ilicitude ou a paralisação de um abuso”. Mas tudo é feito sumariamente e sem aspiração de definitividade. O procedimento se encerra no plano da emergên-cia, com provimento próprio e independente de qualquer outro processo. Mas a sentença é desprovida da autoridade de coisa julgada. Em relação a futuro e eventual processo principal ou de fundo, em torno da mesma controvérsia, o provimento référé é apenas provisório (embora não temporário nem acessó-rio). Cabe às partes decidir sobre a instauração, ou não, do processo principal. Encerrado, o référé a solução judicial perdurará, sem limite temporal e sem depender de ulterior confirmação em processo definitivo

131.

16.2.5.4.1. Pressupostos da estabilização da decisão que conceder a tutela antecipada: a es-tabilização exige o preenchimento de alguns pressupostos. O primeiro deles diz respeito ao requerimen-to do autor da tutela antecipada em caráter antecedente. Apenas a tutela antecipada antecedente é que poderá ser estabilizada. Jamais a tutela antecipada incidente. Nos termos do artigo 303, § 5° do NCPC, a opção pela tutela antecipada antecedente deve ser declarada expressamente na petição inicial.

O segundo pressuposto é negativo. O autor não poderá manifestar, na petição inicial, a sua in-tenção de dar prosseguimento ao processo após a obtenção da pretendida tutela antecipada

132. Enten-

demos que o réu precisa saber de antemão a intenção do autor. Se o autor expressamente declara a sua opção pelo benefício do art. 303 (nos termos do artigo 303, § 5°), subentende-se que ele estará satisfeito com a estabilização da tutela antecipada, caso ela ocorra. Se, porém, desde a inicial, o autor já manifesta a sua intenção de dar prosseguimento ao processo, o réu ficará sabendo que a sua inércia não dará ensejo à estabilização prevista no artigo 304 do NCPC. Por outro lado, entendemos que a opção pelo prosseguimento não possa ser admitida na peça de aditamento da inicial (art. 303, § 1°, inc. I do NCPC), pois, o prazo para o respectivo aditamento poderá coincidir ou mesmo superar o prazo de recurso. Se fosse admitida a manifestação do autor no prazo para aditamento, isso poderia prejudicar o réu que, confiando na possibilidade de estabilização, deixar de recorrer

133.

A decisão concessiva da tutela antecipada deve ser em caráter antecedente. Trata-se do tercei-ro pressuposto. Apenas a decisão concessiva pode tornar-se estável. É de se indagar: a concessão parcial da tutela antecipada tem aptidão para a estabilização? Entendemos que sim. A mesma tem aptidão para a estabilização na parte em que atendeu ao pedido provisório do autor. Neste caso, sobrevindo a inércia do réu, estabilizam-se os efeitos apenas desse capítulo decisório, prosseguindo-se a discussão quanto ao restante

134.

Por fim, o último e quarto pressuposto, diz respeito à inércia do réu diante da decisão que con-

130Neste sentido: VUITTON, Jacques; VUITTON, Xavier. Lês référés. Paris: Litec, 2003, n. 1054 a 1.057, p. 204; THEODORO JÚNIOR, Humberto. Tutela antecipada. Evolução. Visão comparatista. Direito brasileiro e direito europeu. Revista de Processo n. 157, p. 129 a 146. 131Neste sentido: VUITTON, Jacques; VUITTON, Xavier. Lês référés. Paris: Litec, 2003, n. 1054 a 1.057, p. 204; THEODORO JÚNIOR, Humberto. Tutela antecipada. Evolução. Visão comparatista. Direito brasileiro e direito europeu. Revista de Processo n. 157, p. 129 a 146. 132Ao tratar do tema, leciona Freddie DIDIER JÚNIOR (In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Jus Podivam, 2015, p. 606): “A estabilização normalmente é algo positivo para o autor. A estabilizaçãoo da decisão que antecipa os efeitos da tutela condenatória, por exemplo, permite a conservação de efeitos executivos, mostrando-se útil e satisfatória se perenizada. Mas é possível que o autor tenha interesse em obter mais do que isso. As tutelas declaratória e constitutiva, por exemplo, podem só servir ao jurisdicionado se concedidas em definitivo e com força de coisa julgada – não basta uma separação provisória de corpos, é necessário um divórcio definitivo com dissolução de vínculo matrimonial, para que se realize o direito, permitindo que se contraiam novas núpcias; para além da sustação ou cancelamento provisório do protesto de um título, impõe-se a sua invalidação por decisão definitiva. A segurança jurídica da coisa julgada pode revelar-se para satisfação das partes envolvidas. Assim, se o autor tiver intenção de dar prosseguimento ao processo, em busca da tutela definitiva, independentemente do comportamento do réu frente a eventual decisão concessiva de tutela antecipada antecedente, ele precisa dizer isso expres-samente, já na sua petição inicial”. 133Neste sentido: Freddie DIDIER JÚNIOR (In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Jus Podivam, 2015, p. 607). 134Neste sentido: Freddie DIDIER JÚNIOR (In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Jus Podivam, 2015, p. 608).

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cede a tutela antecipada. Embora o artigo 304 do NCPC mencione apenas a não interposição de recurso, a inércia que se exige para a estabilização da tutela antecipada tem uma maior abrangência. É necessário que o réu não tenha se valido de recurso de nenhum outro meio de impugnação da decisão (v.g. suspen-são de segurançaa ou pedido de reconsideração, apresentados no prazo de recurso. No tocante ao recur-so, se o mesmo tiver sido interposto tempestivamente, impede-se a estabilização, pouco importando tenha sido o mesmo conhecido ou não.

Por outro lado, há quem entenda que a não apresentação de contestação seria pressuposto in-dispensável para a estabilização da tutela antecipada

135. Todavia, entendemos mais apropriado o posi-

cionamento de Freddie DIDIER JÚNIOR136

a respeito do tema, verbis:

Mas não nos parece que a revelia é um pressuposto necessário para a inci-dência do art. 304. O normal é que o prazo de defesa somente fluirá a partir da audiência de conciliação ou de mediação (art. 335, I, CPC) ou da data do protocolo do pedido de cancelamento dessa audiência (art. 335, II, CPC). O art. 303, § 1°, II, do CPC diz que, concedida a tutela antecipada antecedente, o réu se-rá citado e intimado para a audiência de conciliação ou de mediação. O in-ciso III do art. 303, § 1°, por sua vez, diz que ‘não havendo autocomposição, o prazo para contestação será contado na forma do art. 335’. Se o caso não admite autocomposição, não é preciso designar audiência de conciliação ou de mediação (art. 334, § 4°, I, CPC). O prazo de defesa, contudo, somente deve começar a correr a partir da intimaçãoo feita ao réu do aditamento da petição inicial. Assim, o prazo de defesa, em regra, demora um pouco para ter início. O art. 304 não exige que se espere tanto para que se configure a inércia do réu apta a ensejar a estabilização da tutela antecipada. Se, no prazo de recurso, o réu não o interpõe, mas resolver antecipar o pro-tocolo de sua defesa, fica afastada a sua inércia, o que impede a estabiliza-ção – afinal, se contesta a tutela antecipada e a própria tutela definitiva, o juiz terá que dar seguimento ao processo para aprofundar sua cogniçãoo e decidir se mantém a decisão antecipatória ou não. Não se pode negar ao réu o direito a uma prestação jurisidicional de mérito definitiva, com aptidão para a coisa julgada.

A partir do exposto, concluiu-se que a eventual apresentação de defesa no prazo de recurso é um fator relevante, que afasta a estabilização

137. Todavia, a inércia que enseja a estabilização, não de-

pende da ocorrência da revelia. Assim, se transcorrido o prazo de recurso, sem a apresentação de defesa, ocorrerá a estabilização da tutela antecipada.

Por outro lado, importante ressaltar que a estabilização da decisão antecipatória não será pos-sível se o réu inerte foi citado/intimado por edital ou por hora certa, se estiver preso ou for incapaz sem representante ou em conflito com ele. Nestes casos, será necessária a designação de curador especial que terá o dever funcional de promover sua defesa – ainda que genérica -, impugnando a tutela de ur-gência então concedida

138. Do mesmo modo, entendemos que não há que se falar em estabilização,

quando, a despeito da inércia do réu, a demanda for devidamente respondida e a tutela antecipada concedida em caráter antecedente for questionada por quem atue como assistente simples ou litiscon-sorte, cujos fundamentos aproveitem também ao réu inerte

139.

135Neste sentido: Eduardo TALAMINI (In: Tutela de urgência no Projeto de novo Código de Processo Civil: a estabilização da medida urgente e a ‘monitorização’ do processo brasileiro. Revista de Processo. São Paulo: RT, 2.012, n. 209, p. 29). 136Freddie DIDIER JÚNIOR (In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Jus Podivam, 2015, p. 608). 137Em sentido contrário, Guilherme Rizzo AMARAL (In: Comentários às alterações do Novo CPC. São Paulo: Revista dos Tribu-nais, 2015, p. 407), verbis: “não basta o réu tão somente contestar o pedido final do autor. Deverá, necessariamente, recorrer da decisão que deferiu a tutela antecipada. É clara a dicção do art. 304, a despeito da crítica que lhe possa ser feita”. 138Neste sentido: Eduardo TALAMINI (In: Tutela de urgência no Projeto de novo Código de Processo Civil: a estabilização da medida urgente e a ‘monitorização’ do processo brasileiro. Revista de Processo. São Paulo: RT, 2.012, n. 209, p. 25); Freddie DIDIER JÚNIOR (In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Jus Podivam, 2015, p. 609). 139Neste sentido: Eduardo TALAMINI (In: Tutela de urgência no Projeto de novo Código de Processo Civil: a estabilização da medida urgente e a ‘monitorização’ do processo brasileiro. Revista de Processo. São Paulo: RT, 2.012, n. 209, p. 25); Freddie DIDIER JÚNIOR (In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Jus Podivam, 2015, p. 609).

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Por derradeiro, há ainda que se questionar a hipótese de inércia parcial do réu, que ocorrerá quando concedida a decisão antecipatória com mais de um capítulo e o réu impugnar em sede de recur-so – contestação ou outra via - , um dos capítulos decisórios. Neste caso, apenas os capítulos não im-pugnados é que serão alcançados pela estabilização

140.

Há, ainda, outra situação a ser considerada: o provimento antecipatório é concedido, mas o au-tor não adita a petição inicial (art. 303, § 1°, I) e o réu não impugna o mesmo. O § 2° do mesmo art. 303 determina a extinção do processo sem resolução do mérito. Será que o processo será extinto, sem a estabilização? Ou será que o provimento antecipatório estabilizará? Entendemos que, nesta hipótese, deva prevalecer a estabilização, considerando a possibilidade das partes em rever, invalidar ou reformar a decisão judicial, por meio da ação prevista no § 2° do art. 304 do CPC

141.

16.2.5.4.2. Ação autônoma com pedido de revisão, reforma ou invalidação da decisão esta-bilizada: estabilizada a tutela antecipada, no prazo de dois anos, contado da ciência da decisão que extinguiu o processo, qualquer das partes poderá propor ação autônoma com pedido de revisão, refor-ma ou invalidação dessa decisão, nos termos do art. 304 §§ 2° e § 5°, CPC). O autor, por exemplo, poderá propor ação com o intuito de confirmar a decisão, com cognição exauriente e apta à produção de coisa julgada. Já, o réu que se manteve inerte, pode também retomar a discussão, deflagrando nova demanda. A competência para o processamento e julgamento destas ações será do juízo que conduziu o processo originário, que concedeu a medida antecipatória estabilizada, de acordo com o art. 304. § 4, do NCPC. Para instruir a petição inicial, a parte interessada poderá requerer o desarquivamento dos autos do processo em que fora concedida a medida antecipatória (art. 304, § 4°, do NCPC). Até que seja proposta a ação, a tutela satisfativa antecedente estabilizada continuará produzindo seus efeitos (art. 304, § 3°, NCPC).

Entretanto, nada impede que em referida ação defira-se, em caráter antecedente ou inciden-tal, tutela provisória com a finalidade de suspender total ou parcialmente, os efeitos da tutela antecipada estabilizada. Isto ocorrerá quando o réu trouxer elementos de convicção ao juiz que não estavam presen-tes quando do deferimento da tutela de urgência antecipada em caráter antecedente

142.

16.2.5.4.3. Coisa julgada e estabilização da tutela satisfativa antecedente: a estabilização da tutela antecipada satisfativa não se confunde com coisa julgada. Após transcorrido o prazo de dois anos para a propositura da ação com a finalidade de reformar, rever ou invalidar a decisão que concedeu a tutela provisória, os efeitos se tornam estáveis, o que não significa dizer que ocorrerá a produção de coisa julgada material. Por essa razão, não caberá ação rescisória da decisão que concede a tutela provi-sória, mesmo após transcorrido o prazo de dois anos para ajuizamento da ação mencionada no artigo 304, § 5°, do NCPC.

16.2.5.4.4. Estabilização da tutela antecipada e intervenção obrigatória do Ministério Públi-co como fiscal da ordem jurídica: nos termos do artigo 178 do NCPC, “o Ministério Público será intimado para, no prazo de 30 (trinta) dias, intervir como fiscal da ordem jurídica nas hipóteses previstas em lei ou na Constituição Federal e nos processos que envolvam: I – interesse público ou social; II – interesse de

140Neste sentido: Eduardo TALAMINI (In: Tutela de urgência no Projeto de novo Código de Processo Civil: a estabilização da medida urgente e a ‘monitorização’ do processo brasileiro. Revista de Processo. São Paulo: RT, 2.012, n. 209, p. 25); Freddie DIDIER JÚNIOR (In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Jus Podivam, 2015, p. 610). 141Segundo Freddie DIDIER JÚNIOR (In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Jus Podivam, 2015, p. 610-11), nada impede que, mesmo ausentes os pressupostos para a estabilização da tutela antecipada, “as partes selem entre si negócio jurídico, antes ou durante o processo, avençando a estabilização de tutela antecipada antecedente em outros termos, desde que dentro dos limites da cláusula geral de negociação do art. 190, CPC. É a conclusão firmada no enunciado n. 32 do Fórum Permanente de Processualistas Civil: ‘Além da hipótese prevista no art. 304, é possível a estabilização expressamente negociada da tutela antecipada de urgência satisfativa antecedente. Por exemplo, as partes podem inserir em sede de contrato social cláusula no sentido de que eventuais medidas antecipatórias antecedentes em causas oriundas dos termos daquele contrato, se concedi-das, poderão: i). estabilizar-se independentemente de requerimento expresso do autor na petição inicial nesse sentido; ii). Admitindo-se que, diante da revelia e inércia total do réu, o autor tenha preservado o direito de pedir o prosseguimento do processo para obtenção de uma decisão com cognição exauriente e com força de coisa julgada”. 142Neste sentido: Guilherme Rizzo AMARAL (In: Comentários às alterações do Novo CPC. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 407

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incapaz; III – litígios coletivos pela posse de terra rural ou urbana”. O artigo 179 do NCPC, por sua vez, dispõe que, “nos casos de intervenção como fiscal da ordem jurídica, o Ministério Público: terá vista dos autos depois das partes, sendo intimado de todos os atos do processo”.

Como o Ministério Público é ouvido após as partes, entendemos que, em sendo deferida a tutela antecipada antecedente - não tendo havido a interposição de recurso pelo réu - antes de extinguir o processo, estabilizando a tutela antecipada, o magistrado obrigatoriamente, sob pena de nulidade, deverá dar vistas ao parquet para se manifestar. No caso de já ter havido a extinção do processo, sem o cumprimento desta exigência legal, entendemos que o Ministério Público tem legitimidade para o ajui-zamento da ação com a finalidade de desconstituir a decisão que estabilizou o provimento antecipatório (art. 304, § 2° do NCPC).

16.3. TUTELA DE URGÊNCIA CAUTELAR 16.3.1. Tutela de urgência cautelar incidente ou antecedente: nos termos do artigo 294, pará-

grafo único do NCPC, a tutela de urgência cautelar também poderá ser requerida em caráter incidente ou antecedente. Se for incidental, consoante já exposto nesta obra, não será dotada de autonomia proce-dimental, sendo requerida nos próprios autos no qual é deduzida determinada pretensão com natureza satisfativa. Em sendo antecedente, o procedimento está regulado no Capítulo III, do Título II, do Livro V. Nos próximos itens será realizada uma análise geral tanto da tutela de urgência cautelar incidente quan-to da antecedente.

16.3.2. Autonomia cautelar: a autonomia cautelar não significa apenas autonomia de procedi-mento, até porque as cautelares incidentes, no NCPC, não são mais requeridas através de um procedi-mento autônomo. Do mesmo modo, as cautelares antecedentes, no NCPC, passam a integrar o mesmo processo em que é deduzida a lide principal. Ovídio Araújo BAPTISTA DA SILVA

143, há mais de quatro

décadas destacou no que realmente consiste a autonomia cautelar. Para o autor, a autonomia cautelar também significa a possibilidade de existir uma autêntica cautelar – que, portanto, não é satisfativa – e que prescinde de uma ação/pedido principal. Esta conclusão apenas pode ser alcançada partindo-se do pressuposto de que a função da tutela cautelar não é meramente instrumental, mas sim de que o mes-mo tem por escopo assegurar direitos. A partir do momento em que se conceber a tutela cautelar vincu-lada à proteção de direitos e não de uma lide principal, pode-se desvincular a lide cautelar da lide princi-pal (na linguagem do NCPC, de um pedido principal).

Entretanto, a autonomia cautelar está presente apenas nas chamadas cautelares conservativas. Naquelas ações onde há a restrição de direitos da parte, imperiosa se revela que seja deduzido um pedi-do principal, como forma de limitar-se no tempo eventuais prejuízos sofridos pelo réu da ação cautelar.

O NCPC mais uma vez não reconhece a autonomia cautelar, na exata medida em que vincula a ação onde se pretender a prestação da tutela cautelar ao pedido principal, a ser realizado no prazo de 30 (trinta) dias a contar da efetivação da medida. Ou seja, aquela “velha ideia” de que a tutela cautelar não tem autonomia própria, mas que protege uma lide principal, onde é deduzida uma pretensão de nature-za satisfativa, foi mais uma vez repetida no NCPC, consoante se depreende do art. 308. Tivemos a opor-tunidade de evoluir, e mais uma vez houve a reprodução do “velho” modelo que contempla a instrumen-talidade da lide cautelar. A resistência no reconhecimento de uma lide cautelar autônoma, distinta da lide principal é histórica. Assim como a doutrina, o legislador reformista não conseguiu visualizar uma lide cautelar dotada de autonomia, distinta da lide satisfativa, por uma simples e incontestável razão: em

143Para Ovídio BAPTISTA DA SILVA (In: Curso de Processo Civil, Vol. 2, Rio de Janeiro: Editora Forense, 2007, p. 104), “nosso Código de Processo Civil não reconhece, como acabamos de ver, uma autêntica autonomia à ação cautelar, ponto de poder ela prescindir de um processo satisfativo, dito principal, de modo que a tutela obtida através de demanda cautelar pudesse bas-tar-se a si mesma e não carecesse a tutela outorgada no juízo cautelar de ser confirmada pela sentença do processo principal. Todavia, queira ou não queira o legislador, esta autonomia existe em inúmeros casos, em que nossa lei ou a própria doutrina sejam capazes de contrariar a realidade e a própria natureza das coisas”.

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muitos artigos do novo texto legal, está reproduzido o pensamento de Piero CALAMANDREI, que jamais visualizou esta distinção respectiva, consoante já anteriormente tratado (Capítulo I, supra).

16.3.3. Requisitos da petição inicial: Os requisitos da petição inicial das ações que visam à pres-tação de tutela cautelar estão contemplados nos arts. 305 e 319 do NCPC (que se aplica subsidiariamente ao procedimento da tutela cautelar requerida em caráter antecedente no que for compatível), a seguir elencados:

a). o juízo a que é dirigida: este requisito se refere à competência para processar e julgar a ação que visa à prestação da tutela cautelar (art. 319, inciso I);

b). os nomes, os prenomes, o estado civil, a existência de união estável, a profissão, o número de cadastro de pessoas físicas ou no cadastro nacional de pessoas jurídicas, o endereço eletrônico, o domicílio e a residência do autor e do réu (art. 319, inciso II);

Este requisito reflete a legitimação para o ajuizamento da ação que visa a prestação da tutela cautelar. A legitimação natural para a demanda cautelar há de ser daquele que se diz titular do direito ou do interesse ameaçado. A legitimação passiva deve recair naquela que haja provocado, ou seja, de algu-ma forma, responsável pelo “estado perigoso”.

No tocante à legitimação de terceiros, Ovídio Araújo BAPTISTA DA SILVA144

refere que

em resumo, se dermos legitimidade para o terceiro postular em ação caute-lar, como autor, defendendo direito de terceiro seu devedor, teríamos de dar-lhe também legitimidade para a subsequente ação satisfativa que ao ti-tular do direito protegido pudesse caber. Não cremos que o Código vá tão longe, em tema de legitimação extraordinária, a ponto de haver, através do

art. 6, introduzido a ação sub-rogatória no Direito brasileiro.

c). a lide e seu fundamento: apenas as cautelares antecedentes ou preparatórias devem preen-cher esse requisito. A ratioessendi dessa exigência prende-se à instrumentalidade qualificada ou hipotética do processo que tem por objetivo a lide cautelar, sustentada por Piero CALAMAN-DREI

145. De acordo com sua concepção, como já vimos, a ação que veicular a lide cautelar pres-

supõe ordinariamente uma lide principal. Consequentemente, aquele que pretenda a tutela cau-telar antecedente deverá demonstrar a plausibilidade da ação a ser proposta. Somente com o a-tendimento a esse requisito é possível avaliar a legitimidade, o interesse e a plausibilidade do di-reito a ser acautelado

146.

É naturalmente dispensado esse requisito nas cautelares incidentes, pois a ação principal já es-tá em curso. O requisito também não se aplica nas ações cautelares autônomas e nas chamadas pseudo cautelares, na linguagem de Ovídio Araújo BAPTISTA DA SILVA, ou cautelares satisfativas, nas palavras de Piero CALAMANDREI (v.g. ação de separação de corpos).

d). a exposição sumária do direito que se visa assegurar e o perigo de dano ou o risco ao resulta-do útil do processo (fatos e fundamentos jurídicos do pedido): tratam-se dos requisitos essenciais para a concessão da tutela cautelar, que se traduzem no fumus boni juris e no periculum in mora.

Convencer o juiz da probabilidade quanto à procedência do “direito ameaçado” nada mais re-presenta que aludir ao fumus boni iuris, constituindo este pré-avaliação provisória de direito alegável

144In: Processo Cautelar, p. 152 145Vide Capítulo I. 146Nesse sentido: Humberto THEODORO JÚNIOR (In: Processo cautelar. São Paulo: Leud, 2002, p. 89); Luiz ORIONE NETO (In: Tratado das medidas cautelares: teoria geral do processo cautelar, Col. Tratado das Medidas de Urgência. São Paulo: Lejus, 2000, Vol. III, Tomo I, p. 244-245); Sérgio SHIMURA (In: Arresto cautelar, p. 242-243. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997).

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pelo autor em ação principal. Nem se pode dizer que o juiz, ao apreciar a provável procedência do direito ameaçado, estaria prejulgando o mérito do processo principal. Entendimento dessa ordem significaria desconhecer a intrínseca diversidade entre a sentença cautelar e a sentença de conhecimento, esta juízo de realidade e de certeza, aquela juízo de verossimilhança

147.

Já o periculum in mora, corresponde ao risco de dano iminente, que é requisito para a conces-são da tutela cautelar, consoante especificado no Capítulo I.

e). o pedido com as suas especificações relativamente à lide cautelar (artigo 319, inciso IV);

Outra questão a relevante de ser destacada diz respeito até que ponto o pedido formulado pe-lo autor vincula o magistrado, tendo em vista o princípio da fungibilidade das medidas cautelares. No âmbito do processo cautelar vige o princípio de que o magistrado pode conceder medida cautelar diver-sa daquela que tenha sido pleiteada, quando as circunstâncias do caso recomendarem a concessão de provimento diverso daquele que o autor formulara. Todavia, este princípio deve observar outros, que também norteiam o direito processual civil, como, por exemplo, o princípio da estabilidade da demanda. Assim, entendemos que a concessão de provimento diverso será possível sempre que não houver altera-ção da causa petendi. Sem qualquer dúvida, a fungibilidade apresenta limites. No NCPC esta questão foi simplificada, na exata medida em que os procedimentos cautelares específicos foram revogados.

f). o valor da causa, será fixado de acordo com os artigos 291 a 293 do NCPC (artigo 319, inciso V)148

;

g). as provas que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados (artigo 319, inciso VI).

Tendo em vista tratar-se a tutela cautelar de tutela jurisdicional de simples aparência, não há que se falar na busca exauriente da verdade. Em razão dessa circunstância, deve-se admitir no processo que veicular a lide cautelar algumas provas unilateralmente produzidas (v.g. declarações unilaterais, periciais unilaterais, etc). Até porque, na instrução do processo cautelar, será possível a ouvida das tes-temunhas, assim como a realização de prova pericial. Entre tutelar o direito da parte ou sacrificá-lo, a primeira opção deve ser a escolhida.

16.3.4. Liminar cautelar: as várias possibilidades de concessão das liminares cautelares já foram mencionadas no capítulo I, supra, item 2.

16.3.4.1. Liminar concedida por juiz incompetente: a liminar proferida por juiz incompetente deve prevalecer até que o juízo competente se pronuncie a respeito

149. Ou seja, arguida a incompetên-

cia, em sede de contestação, nos termos do artigo 64 do NCPC, a mesma não suspende a eficácia da tutela cautelar concedida. Não é demasiado referir que a tutela cautelar conserva a sua eficácia durante o período de suspensão do processo, nos termos do art. 296, parágrafo único do NCPC. Segundo J.J. Calmon de PASSOS

150, a regra da competência deve ceder ao risco de dano irreparável.

Por outro lado, a arguição de incompetência também não elimina a possibilidade de concessão

147Neste sentido: Carlos Alberto Álvaro de OLIVEIRA. Arrolamento Cautelar, Ajuris 40/125. 148Conforme leciona Guilherme Rizzo AMARAL (In: Comentários às alterações do Novo CPC. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 409), “embora não faça expressa referencia à necessidade de fixação de valor da causa no pedido de tutela cautelar em caráter antecedente – como não o fazia o art. 801 – mostra-se imprescindível tal fixação, na linha do entendimento que vinha sendo aplicado pelo STJ, até mesmo porque o dispositivo que atualmente trata da necessidade do valor da causa é abrangente e de redação praticamente idêntica àquela do CPC/73”. 149Aderimos à velha tradição do direito português referida por Pontes de Miranda, a partir de Silvestre Gomes Moraes, aceita também por Jorge Americano, José Frederico Marques, J.J. Calmon de Passos, Galeno Lacerda, Ovídio Araújo Baptista da Silva, Humberto Theodoro Júnior e BetinaRizzato Lara e Luiz Orione Neto, no sentido de que a liminar deferida por juízo incompe-tente deva prevalecer até que o juízo competente se pronuncie a respeito, de conformidade com o vetusto princípio quando est periculum in mora incompetentia no attenditur. 150Ver Comentários ao Código de Processo Civil, Vol. VIII, p. 293.

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da tutela cautelar, pois, durante o período de suspensão do processo, em que pese ser defeso a prática de qualquer ato processual, nada impede a realização de atos urgentes a fim de evitar a prática de ato ilícito ou dano irreparável, nos termos do art. 314 do NCPC

151.

16.3.4.2. Recurso cabível contra a decisão que concede/indefere pedido de liminar cautelar: o recurso cabível é o de agravo de instrumento, nos termos do artigo 1.015, inciso I, do NCPC.

O prazo para a interposição do agravo contra a decisão que concede a liminar conta-se da data da juntada aos autos do mandado de efetivação da tutela cautelar, nos termos do artigo 1.003 c/c o artigo 231 do NCPC

152.

16.3.5. Citação e resposta do réu: o princípio do contraditório também é preservado na ação que visa à prestação de tutela cautelar em caráter antecedente

153. Este princípio vem expressamente con-

templado no art. 306 do NCPC, verbis: “o réu será citado para, no prazo de cinco dias, contestar o pedido e indicar as provas que pretende produzir”

154. A citação cumpre-se de acordo com os artigos 238 a 259

do NCPC, sempre que houver compatibilidade com o procedimento da tutela cautelar requerida em caráter antecedente.

16.3.6. Arguição de incompetência, suspeição e impedimento: a incompetência tanto absoluta quanto relativa deverão ser arguidas pelo réu por ocasião da apresentação de contestação, como preli-minar, por aplicação analógica do artigo 337, inciso II do NCPC. A suspeição e o impedimento, por sua vez, são arguidos, nos termos do artigo 146, “no prazo de quinze dias, a contar do conhecimento do fato”, através de petição específica dirigida ao juiz da causa, na qual indicará o fundamento da recusa, podendo instruí-la com documentos em que se fundar a alegação e com o rol de testemunhas. O NCPC revogou as exceções de incompetência, suspeição e impedimento, previstas no CPC/73.

16.3.7. Reconvenção: Tendo em vista que um dos princípios que norteia a tutela cautelar é o da celeridade, entendemos não ser cabível a apresentação de reconvenção por ocasião da apresentação de contestação à lide cautelar

155.

151Neste sentido: Luiz Guilherme MARINONI e Daniel Francisco MITIDIERO (In: Código de Processo Civil – Comentado artigo por artigo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 747) 152Neste sentido a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (REsp 70.399/PR, 4ª Turma, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, 29.10.1997): “Nos termos do parágrafo único, inc. II, do art. 802, CPC, conta-se o prazo da juntada aos autos do mandado da execução da medida cautelar, quando concedida liminarmente ou após justificação prévia. Se esse é o sistema da contagem dos prazos, não se justifica que, em se tratando de cautelar concedida liminarmente, e sem justificação prévia, o prazo para agravar tenha curso da data da intimação e não da juntada aos autos do mandado devidamente cumprido”. 153Nas medidas só procedimentalmente cautelares ou só topologicamente cautelares, como protestos, notificações e interpe-lações (art. 871), protesto e apreensão de título (art. 882) e justificação (art. 865), não há lugar para contestação (Neste sentido, Luiz ORIONE NETO. Ob. cit., p. 154) 154Ovídio Araújo BAPTISTA DA SILVA (In: Curso de Processo Civil, p. 115), ao tratar da contestação nos procedimentos cautela-res, leciona: “O cabimento de contestação em todos os procedimentos cautelares ou é falso ou é no mínimo controvertido. Se admitirmos como verdadeiras ações cautelares os protestos, notificações e interpelações (arts. 867-873) e as justificações (arts. 861-866), o princípio é falso, posto que o próprio legislador que o consagrara no art. 802 suprime-o em todas estas hipóteses (arts. 865 e 871). Para os que, por uma razão ou outra, recusem a atribuição de natureza cautelar a essas medidas, ainda restaria controverso o princípio para as ações de asseguração de prova (arts. 846-851), sendo muitos os juristas que entendem incabível contestação nestes procedimentos, como, por exemplo, Galeno Lacerda (Comentários, n. 51) e Carlos Alberto Álvaro de Oliveira (ob. cit., n. 149, p. 350). Em sentido contrário, no entanto, entendendo cabível a contestação nas ações de asseguração de provas, Theodoro Júnior (Curso ..., V. 2, n. 1.124).” 155Neste sentido a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: “AÇÃO CAUTELAR. PRETENSÃO DE BLOQUEIO DE VALORES RECEBIDOS. GARANTIA DA FUTURA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. PEDIDO RECONVENCIONAL. DESCABIMENTO. É manifestamente descabido o pedido de reconvenção em sede de ação cautelar, pois é incompatível com o procedimento especial próprio da demanda cautelar. Recurso desprovido.”(Agravo de Instrumento Nº 70020474227, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em 10/10/2007)

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16.3.8. Contestação: a contestação poderá versar tanto sobre questões de natureza processu-al

156 – v.g. ausência de pressupostos processuais, condições da ação – quanto sobre o mérito da própria

ação que visa à prestação de tutela cautelar (inexistência de fumus boni juris ou do risco de dano iminen-te)

157.

16.3.9. Prazo e contagem: na mesma linha do CPC/73, o art. 306 do NCPC refere ser de 5 (cinco) dias o prazo para contestar o pedido e indicar as provas que pretende produzir. O Livro V não refere a forma de contagem deste prazo respectivo. Assim, não há outra alternativa senão a aplicação subsidiária do artigo 231 do NCPC. Entendemos que se aplicam a este procedimento respectivo as regras referentes à contagem em dobro do prazo para litisconsortes com diferentes procuradores (artigo 229 do NCPC). Do mesmo modo, o prazo será dobrado em se tratando da Fazenda Pública, Defensoria Pública e Ministério Público (artigos 180, 183 e 186 do NCPC).

16.3.10. Não apresentação de contestação à lide cautelar: nos termos do art. 307 do NCPC “não sendo contestado o pedido, os fatos alegados pelo autor, presumir-se-ão aceitos pelo réu como ocorrido, caso em que o juiz decidirá dentro de cinco dias”. A mesma disciplina adotada para o processo de conhe-cimento foi adotada pelo legislador para a ação que visa à prestação da tutela cautelar, no tocante aos efeitos da revelia (em relação à lide cautelar).

Todavia, os efeitos da revelia que eventualmente se produzam em relação à cautelar, não atin-gem a lide principal

158. Ou seja, os efeitos da revelia são restritos à lide cautelar

159. Evidentemente que

as hipóteses em que a revelia não produz a presunção de verdade das alegações de fato formuladas pelo autor, previstas no artigo 344 do NCPC aplicam-se também ao procedimento das ações que visam à prestação de tutela cautelar.

16.3.11. Prosseguimento do procedimento quando for apresentada contestação: nos termos do artigo 307, parágrafo único do NCPC, se for apresentada contestação, observar-se-á o procedimento comum (Parte Especial, Livro I).

16.3.12. Réplica à contestação apresentada à ação que tutela a lide cautelar: em razão dos prin-cípios do contraditório e da ampla defesa entendemos perfeitamente admissível no procedimento da tutela de urgência cautelar – requerida em caráter antecedente – a apresentação de réplica, nas hipóte-ses mencionadas nos artigos 350 e 351 do NCPC. O artigo 307 do NCPC – que determina a aplicação subsidiária do procedimento comum ao procedimento tratado neste tópico – reforça esse entendimen-to. Todavia, entendemos incompatível o prazo de 15 dias, previsto nos artigos 350 e 351 do NCPC, tendo em vista os princípios da igualdade e da celeridade. Se o réu deve contestar a lide cautelar no prazo de 5 (cinco) dias, evidentemente que o prazo de réplica deverá ser o mesmo.

156Vide artigo 337 do NCPC. 157Segundo Ovídio Araújo BAPTISTA DA SILVA (In: Curso de Processo Civil, Vol. 2, p. 116), “a questão dos limites ou da extensão permitida à contestação na ação cautelar é problema que oferece dificuldades e gera seguidamente incompreensões que devem ser examinadas, e o serão sempre que o assunto emergir na exposição subsequente. É possível, no entanto, dizer desde logo que a faculdade reconhecida ao demandado de arguir na contestação, todas as defesas que seriam cabíveis na eventual demanda satisfativa (principal) não corresponde, pelo lado do julgador, a uma análoga extensão do julgamento. Quer dizer, o réu poderá alegar e intentar demonstrar a improcedência da ação com as defesas próprias da ação principal, mas o julgador as receberá, exclusivamente como alegações e provas tendentes a demonstrar a inexistência de fumus boni júris, jamais como defesa idônea a comprovar a inexistência do direito cuja proteção se pretenda oferecer com a ação cautelar”. 158Neste sentido a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (MC 4.891/DF, 2ª Turma, Rel. Min. Laurita VAZ, j. 26.11.2.002. 159Neste sentido, o entendimento de J.J. Calmon de PASSOS (In: Ajuris 6/155): “a regra do art. 803 diz respeito apenas aos fatos relativos ao próprio procedimento cautelar”.

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138

16.3.13. Intervenção de terceiros e litisconsórcio: sem qualquer dúvida, é possível o litisconsór-cio no procedimento da tutela cautelar requerida em caráter antecedente. Por exemplo, o autor de futura ação reivindicatória promove uma ação cautelar com a finalidade de assegurar a entrega do imó-vel cuja restituição ele pretende obter na ação satisfativa. Se o imóvel pertencer a dois condôminos, ambos serão litisconsortes passivos na ação cautelar.

Todavia, mesmo que se entenda necessária a citação de litisconsortes necessários, poderá o juiz, antes de ordená-la, conceder a medida liminarmente, se o cumprimento da citação puser em risco o cumprimento da medida.

No tocante ao ingresso do assistente no processo cautelar, entendemos não haver qualquer res-trição que possa impedir. Já, relativamente às demais modalidades

160 de intervenção de terceiros, en-

tendemos não serem possíveis no âmbito da tutela cautelar - tanto incidente quanto antecedente -, tendo em vista a urgência que é inerente ao mesmo. As modalidades de intervenção de terceiros impli-cam na postergação do procedimento, o que vai de encontro ao princípio da duração do processo dentro

de um prazo razoável, previsto no art. 5, inciso LXXVIII da Constituição Federal.

16.3.14. Do pedido principal: nos termos do artigo 308 do NCPC, “efetivada a tutela cautelar, o pedido principal terá de ser formulado pelo autor no prazo de 30 (trinta) dias, caso em que será apresen-tado nos mesmos autos em que deduzido o pedido de tutela cautelar, não dependendo do adiantamento de novas custas”. O § 1° deste mesmo dispositivo legal, por sua vez, dispõe que “o pedido principal pode ser formulado conjuntamente com o pedido de tutela cautelar”

161. De acordo com o NCPC, não há mais

que se falar em ação principal, mas em pedido principal, a ser deduzido nos mesmos autos da ação cau-telar.

Esta questão não é simples. Há casos em que o pedido principal não tem como ser apresentado nos mesmos autos, em razão de não se aplicar o procedimento comum a qual remete no § 3° do artigo 308. Um exemplo significativo dessa impossibilidade envolve os pedidos de natureza cautelar anteceden-tes às execuções de títulos extrajudiciais. Vejamos: o credor A possui um crédito corporificado em um título executivo, ainda não vencido, contra o devedor B. O credor A toma conhecimento que o réu está se desfazendo de todo o seu patrimônio, o que poderá acarretar a ausência de bens para assegurar o pagamento do crédito objeto de futura execução. Como o crédito ainda não está vencido, a única alter-nativa será ajuizar uma ação com a finalidade de assegurar o pagamento do crédito. Na concepção do CPC/73, esta ação seria a cautelar de arresto. Como no NCPC as cautelares nominadas foram revogadas, esta ação será uma simples cautelar (cujo propósito nítido é o arresto), com os requisitos gerais da tutela provisória de urgência, sendo prolatada uma sentença com conteúdo puramente cautelar. Neste caso, o pedido principal não tem como ser deduzido nos próprios autos, pois, a ação onde será veiculada a pre-tensão de natureza satisfativa é uma ação de execução de título extrajudicial, com procedimento distinto daquele previsto no capítulo referente ao procedimento das cautelares antecedentes. Haverá um pedido cautelar sem o correspondente pedido principal nos próprios autos. Neste caso, continuará sendo ajui-zada a ação principal (ação de execução).

O § 1° do artigo 308 do NCPC, por sua vez, possibilita que o pedido principal possa ser elaborado conjuntamente com o pedido cautelar. Esta possibilidade de cumulação é uma velha tese, defendida por muitos na vigência do CPC/73. Em havendo a cumulação de pedido cautelar com o pedido principal, entendemos que o prazo de defesa deva ser único (15 dias), devendo realizar-se a contagem de acordo

160O NCPC revogou a oposição e a nomeação à autoria como modalidades de intervenção de terceiros. No novo diploma legal, subsistem a assistência (art. 119 e seguintes), a denunciação da lide (art. 124 e seguintes) e o chamamento ao processo (art. 130 e seguintes). Além destas modalidades, outras duas foram incluídas: o incidente de desconsideração da personalidade jurídica (art. 133) e o amicuscuriae (art. 138). 161O CPC/73 previa no artigo 806 caber a parte “propor a ação, no prazo de 30 (trinta) dias, contados da data da efetivação da medida cautelar, quando esta for concedida em procedimento preparatório”. Ou seja, o pedido principal era deduzido através de ação autônoma, dotada de autonomia procedimental, o contrário do previsto no NCPC no artigo 308.

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com a previsão do artigo 334 do NCPC162

.

O § 2° do artigo 308 do NCPC, refere que a “causa de pedir poderá ser aditada no momento de formulação do pedido principal”. Entendemos que o legislador se referiu neste parágrafo à possibilidade de aditamento da causa de pedir da ação onde tenha sido deduzida a tutela cautelar, considerando que o pedido principal deverá ser elaborado no prazo de 30 (trinta) dias. É de se indagar: e se o pedido princi-pal for cumulado na petição inicial cautelar, será possível o aditamento da causa de pedir, no prazo pre-visto no caput do artigo 308 do NCPC? Não vemos problema algum, considerando que o NCPC em diver-sos dispositivos legais preteriu a forma em prol da realização de direitos. Como o pedido principal é realizado conjuntamente com o pedido cautelar, entendemos que o aditamento deva ser realizado de acordo com o artigo 329 do NCPC. Ou seja, até a citação o autor poderá aditar ou alterar o pedido ou a causa de pedir, independentemente do consentimento do réu. Por outro lado, até o saneamento do processo, poderá alterar ou aditar o pedido e a causa de pedir, com o consentimento do réu, assegurado o contraditório, mediante a possibilidade de manifestação deste no prazo mínimo de quinze dias.

Não é demasiado referir que, se por um lado, há a simplificação da forma do procedimento cau-telar no NCPC, de outro, há problemas procedimentais em razão da cumulação de lides distintas (caute-lar e principal) em um único processo, consoante será aprofundado nos itens subsequentes.

A razão do prazo de 30 (trinta) dias, contemplado no dispositivo legal, para que seja formulado o pedido principal, decorre da necessidade de evitar-se um constrangimento excessivo ao réu que, porven-tura, haja sofrido alguma medida cautelar constritiva que importe restrição à sua liberdade de disposi-ção. Ou seja, não faria sentido que o réu sofresse uma restrição em seus direitos ad infinitum. Este prazo respectivo evita que o procedimento cautelar antecedente se transforme em odioso instrumento de vindita, perpetuando no tempo eventuais danos causados ao demandado.

16.3.14.1. Efetivação da medida cautelar e contagem do prazo de 30 (trinta) dias para a formu-lação do pedido principal: uma primeira indagação que se extrai a partir do dispositivo legal acima trans-crito diz respeito ao significado da expressão “efetivação da tutela cautelar”. Entendemos por efetivação o cumprimento da ordem contida no respectivo provimento jurisdicional que conceder a tutela cautelar. Ela ocorre a partir do momento em que o réu sofrer restrições em seus direitos.

A ordem contida no provimento que conceder a tutela cautelar será dirigida ao demandado se a medida cautelar consistir que o mesmo faça ou deixe de fazer algo, incapaz de ser realizado por terceiros (sempre que se trate de fazer ou não fazer infungíveis). Se, todavia, o órgão judicial, através de seus auxiliares, puder efetivar a medida cautelar, prescindindo de ato pessoal do demandado (v.g. arresto, sequestro, busca e apreensão

163) – a sua efetivação será inteiramente cumprida pelo próprio órgão

judiciário. Em não sendo efetivada a tutela cautelar, não há que se falar no prazo de 30 dias para formu-lar o pedido principal

164.

162Em sentido contrário, Guilherme Rizzo AMARAL (In: Comentários às alterações do Novo CPC. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 411), verbis: “Mesmo que o pedido principal tenha sido feito juntamente com o pedido de tutela cautelar (art. 308, § 1°), uma segunda contestação, prevista no , § 4° do art. 308, deverá ser oferecida pelo réu após a realização da audiência de conciliação ou de mediação. Para ela terá o réu o prazo de quinze dias a contar da audiência, conforme prevê o art. 335, caput e inciso I. Não ocorrendo aaudiência, o prazo para essa segunda contestação será regulado pelos demais incisos do art. 335. É claro que, optando o réu por contestar conjuntamente o pedido de tutela cautelar e o pedido principal apresentados na forma do art. 308, , § 1°, nada impede que o faça, porém observando-se o prazo de cinco dias de que trata o art. 306. Trata-se, aqui, de faculdade do réu. Ressalte-se que a contestação conjunta dos pedidos cautelar e principal somente será admissível logicamente, quando a apresentação daqueles for também conjunta, na forma do art. 308, , § 1°”. 163No CPC/73 estas medidas eram tratadas como cautelares nominadas. No NCPC as mesmas deixam de ser tratadas deste modo, seguindo o procedimento geral previsto para a tutela cautelar antecedente e incidente. Nos termos do artigo 301, a “a tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito”. 164O Superior Tribunal de Justiça (REsp 392.675/DF, 1ª Turma, Rel. Min. Garcia Vieira, 29.04.2002), já decidiu que se a tutela cautelar não é deferida liminarmente, o ônus de propor a ação principal somente aparecerá se a tutela for concedida pela sentença cautelar.

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No tocante à contagem do prazo de 30 dias indaga-se: o termo inicial do prazo de 30 dias é o momento em que o oficial de justiça torna efetiva a medida, ou do instante em que realizada a diligência, dela intima o requerente, ou da data da juntada aos autos do mandado devidamente cumprido?

165En-

tendemos que o prazo de 30 (trinta) dias começa a fluir a partir do momento em que o autor teve ciência da efetivação da medida

166 e não a partir da data da juntada do mandado.

Outra questão a ser levantada é: como contar o prazo se a diligência comportar o cumprimento fracionado em vários atos processuais distintos, como por exemplo, o caso de um arresto que deva ser realizado em várias comarcas, para as quais tenham sido expedidas diversas cartas precatórias? Ovídio Araújo BAPTISTA DA SILVA

167 refere

168 que “a solução só pode ser uma: ter-se-á por efetivado o arresto a

contar da juntada do último mandado aos autos, ainda que o arresto determinado por precatória se tenha tornado impossível por inexistência de bens na comarca, ou nas comarcas correspondentes”

169.

Concordamos em parte com a posição do autor, pois, entendemos que o prazo nesta hipótese deva começar a fluir quando houver a efetivação do cumprimento do arresto de todos os bens que o magis-trado tenha determinado (e não juntada!).

16.3.14.2. Natureza do prazo para a formulação do principal: entendemos que o prazo previsto no art. 308 do NCPC é de natureza processual, sendo, portanto, peremptório

. Logo, o mesmo se sus-

pende nas férias e no recesso forense, assim como se prorroga no caso do dies ad quem cair em final de semana ou feriado

170. Deverá ser contado, inclusive, apenas em dias úteis, de acordo com o artigo 219

do NCPC. Se o réu da ação em que for deduzida a lide cautelar requerida em caráter antecedente, arguir a incompetência absoluta ou relativa, na forma dos artigos 64 e seguintes, não há que se falar em sus-pensão do prazo para a apresentação do pedido principal, pois, o NCPC revogou a exceção de incompe-tência e também a disposição que previa a suspensão do processo no caso de apresentação da mesma. O artigo 339, § 3°, prevê apenas a suspensão da realização da audiência de conciliação ou mediação, se tiver sido designada, caso seja alegada a incompetência absoluta ou relativa.

16.3.14.3. Indeferimento da tutela cautelar e formulação do pedido principal: nos termos do ar-tigo 310 do NCPC, “o indeferimento da tutela cautelar não obsta a que a parte formule o pedido princi-pal, nem influi no julgamento desse, salvo se o motivo do indeferimento for o reconhecimento de deca-dência ou de prescrição”. A previsão legal é coerente com a sistemática do NCPC. Em sendo indeferida a

165Ovídio Araújo BAPTISTA DA SILVA (In: Do Processo Cautelar, p. 182), ao tratar do prazo para ajuizamento da ação principal, na vigência do CPC/73, refere que “o prazo de 30 dias há de correr a partir do momento em que a parte toma ciência formal da juntada aos autos do mandado de execução da medida cautelar devidamente cumprida. 166Ao tratar do tema, em comentário ao CPC/73, refere Galeno LACERDA (In: Comentários ao Código de Processo Civil, Vol. VIII, Tomo I, p. 276), verbis: “A primeira questão suscitou dúvida, principalmente no início da vigência do Código de 1939, logo superada, pela quase unanimidade da doutrina e da jurisprudência, no sentido de que a simples concessão da liminar já importa ordem capaz de tornar ‘efetiva’ a medida. Com efeito, cumprido o mandado inicial, os bens se subtraem ao poder de disposição do réu, a coerção se torna atuante, e é exatamente essa situação que não pode permanecer se o autor não instau-rar o processo principal no prazo do art. 806, nas hipóteses de incidência desse dispositivo.” 167In: Do Processo Cautelar, p. 183 168Em sentido contrário, Luiz Guilherme MARINONI e Daniel Francisco MITIDIERO (In: Código de Processo Civil – Comentado artigo por artigo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 756), verbis: “A imposição de brevidade para a propositura da ação principal atende à necessidade de não se permitir a sobrevivência de uma medida eventualmente infundada por longo período de tempo, exigindo-se que o demandante assuma, no menor tempo possível, o ônus de demonstrar o direito assegu-rado pela tutela cautelar. A partir desse raciocínio, o prazo para a propositura da ação principal, no caso de vários arrestos contra o mesmo demandado, deve ser contado da juntada aos autos do primeiro mandado de efetivação devidamente cum-prido”. 169Neste sentido a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça à luz do CPC/73, que se aplica inteiramente ao NCPC, verbis: “Liquidação extrajudicial. Arresto. Ação Principal. Decadência. Enquanto não cumprido integralmente o mandado de arresto dos bens dos administradores da empresa liquidanda, não flui para o Ministério Público o prazo de decadência do direito de promover a ação principal. Por isso, não se pode cogitar da cessação da eficácia da medida cautelar, contado o tempo da efetivação parcial da ordem” (EResp 69.870/SP. Rel. Min. Ari Pargendler, 09.10.2002). 170Neste sentido a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: “MEDIDA CAUTELAR. SUSTAÇÃO DE PROTESTO. EFICÁCIA. PRAZO PARA A PROPOSITURA DA DEMANDA PRINCIPAL. - Vencido o trintídio (art. 806, c.c. o art. 808, I, do CPC) em um sábado, ao autor é permitido ajuizar a ação principal no primeiro dia útil subsequente. Precedentes. Recurso especial conhecido e provido.” (REsp n. 254443, Rel. Min. Barros Monteiro, Quarta Turma, 20.06.2000)

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tutela de urgência cautelar, evidentemente, que a parte poderá formular o pedido principal, exceto nas hipóteses de reconhecimento de decadência ou de prescrição

171. Nesta hipótese, a ação prosseguirá de

acordo com o procedimento comum.

16.3.14.4. Consequência se o autor não deduzir o pedido principal em 30 dias: nos termos do art. 309, I do NCPC, cessará a eficácia da tutela concedida em caráter antecedente se o autor não deduzir o pedido principal no prazo de 30 (trinta) dias. Entendemos que a expressão “cessação da eficá-cia da tutela concedida” refere-se à extinção da ação que tem por objeto a lide cautelar

172, tendo em

vista a falta de interesse no prosseguimento do procedimento, pela falta de requisito essencial, que é o periculum in mora

173.

16.3.14.5. Hipóteses em que o não ajuizamento da ação principal não acarreta perda da eficácia da medida cautelar: as cautelares autônomas, defendidas por Ovídio Araújo BAPTISTA DA SILVA – que hoje se-guem o procedimento previsto nos artigos 305 e seguintes -, prescidem do ajuizamento de principal à luz do CPC/73. No tocante a este aspecto, entendemos que no NCPC as cautelares autônomas continuarão existindo, pois, é inegável existir uma lide cautelar, distinta da lide principal. Na nova sistemática, as mesmas prescindem da formulação de um pedido principal. Na verdade, a alteração que tivemos no NCPC foi meramente procedi-mental. Ao invés de termos uma ação cautelar e uma ação principal, passamos a ter um procedimento único com duas lides (cautelar e principal). Um exemplo clássico de cautelar autônoma são assegurações de prova que passaram a ser tratadas no NCPC nos artigos 381 a 383 do Capítulo XII do Livro I da Parte Especial, que trata do Direito Probatório.

Já, para Galeno LACERDA, também à luz do CPC/73, as cautelares administrativas e as satisfativas também prescindem do ajuizamento de uma ação principal

174. No NCPC podemos afirmar que essas

171E de improcedência liminar do pedido. 172Neste sentido a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça à luz do CPC/73, compatível com o NCPC: “PROCESSUAL CIVIL - EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA - AÇÃO CAUTELAR PREPARATÓRIA - AÇÃO PRINCIPAL - NÃO AJUIZAMENTO NO PRAZO ESTABELECIDO PELO ART. 806 DO CPC - EXTINÇÃO DO FEITO - PRECEDENTES. - A ação cautelar é sempre dependente do processo principal e visa apenas garantir a eficácia da futura prestação jurisdicional. - O não-ajuizamento da ação principal no prazo estabelecido pelo art. 806 do CPC, acarreta a perda da medida liminar e a extinção do processo cautelar, sem julgamento do mérito. - Embargos de divergência conhecidos e providos.” (EREsp 327438 / DF EMBARGOS DE DIVERGENCIA NO RECURSO ESPECIAL 2004/0015834-5. Rel. Min. FRANCISCO PEÇANHA MARTINS (1094, 30.06.2006). Também a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: “MEDIDA CAUTELAR DE SUSTAÇÃO DE PROTESTO. AJUIZAMENTO INTEMPESTIVO DA AÇÃO PRINCIPAL. CESSAÇÃO DA EFICÁCIA. EXTINÇÃO DO PROCESSO CAUTELAR. O não-ajuizamento da ação principal no prazo do art. 806 do CPC implica não apenas a cessação da eficácia da medida cautelar (art. 808, I, do CPC), como também a extinção do processo cautelar por falta de interesse processual superveniente (art. 267, VI, do CPC). Agravo de instrumento provido.” (Agravo de Instrumento Nº 70021466479, Décima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Voltaire de Lima Moraes, Julgado em 21/11/2007) “CAUTELAR DE SUSTAÇÃO DE PROTESTO. CHEQUE PRÉ-DATADO. NÃO INTERPOSIÇÃO DA AÇÃO PRINCIPAL NO PRAZO LEGAL CONDUZ A EXTINÇÃO DA CAUTELAR. PERDA DE EFICÁCIA NOS TERMOS DO INCISO I DO ARTIGO 808 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. O ajuizamento de ação cautelar de sustação de protesto de cheque, sem natureza satisfativa, não dispensa a propositura da ação principal no trintídio legal, sob pena de extinção da cautelar por perda de eficácia. Inteligência do art. 806 do CPC. A discussão sobre a validade do título encaminhado a protesto, portanto, deverá ser objeto de análise na ação principal e não na ação cautelar como pretendeu o apelante. APELAÇÃO DESPROVIDA. UNÂNIME”. (Apelação Cível Nº 70021896667, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Paulo Augusto Monte Lopes, Julgado em 14/11/2007) Em sentido contrário, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: “RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CAUTELAR. NÃO AJUIZAMENTO DA AÇÃO CAUTELAR NO PRAZO DO ART. 806 DO CPC - PERDA DA EFICÁCIA - CPC 808. - A inobservância do prazo do artigo 806, do CPC, não acarreta a extinção do processo, mas apenas a perda da eficácia da liminar concedida. - Precedentes.” (REsp 417.962. Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, Primeira Turma, 26.08.2003) 173Em sentido contrário, Luiz Guilherme MARINONI e Daniel Francisco MITIDIERO (In: Código de Processo Civil – Comentado artigo por artigo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 760), em comentário ao CPC/73, verbis: “como a não propositura da ação principal conduz apenas à cessação da eficácia da tutela cautelar, não impondo a extinção do processo, há aí uma decisão interlocutória, impugnável mediante agravo de instrumento”. 174Segundo Luiz ORIONE NETO (In: Ob. cit., p. 189), “nas medidas e nas providências apenas procedimentalmente cautelares ou só topologicamente cautelares, não se aplica o prazo legal de trinta dias. Também as medidas satisfativas não se sujeitam à regra do art. 806, porque se trata de ação autônoma, principal, definitiva, e não acessória ou provisória de qualquer outra”.

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cautelares continuarão prescindindo de um pedido principal. É o caso da ação cautelar de separação de corpos, tratada pela jurisprudência e doutrina – em que pese as críticas – como cautelar satisfativa. Certamente esta ação seguirá o rito previsto a partir do art. 305 NCPC, sendo prescindível a formulação de pedido principal, não se aplicando a consequência prevista no artigo 309, inciso I, do NCPC.

16.3.15. Prosseguimento do procedimento, no qual foi deduzida a lide cautelar, após a apre-sentação do pedido principal: nos termos do § 3° do artigo 308 do NCPC, “apresentado o pedido princi-pal, as partes serão intimadas para audiência de conciliação ou de mediação, na forma do art. 334, por seus advogados ou pessoalmente, sem necessidade de nova citação do réu”. Como o réu já foi citado para responder a ação cautelar, a forma do artigo 306 do NCPC e, como se trata de um único processo, evidentemente, que não há a necessidade de nova citação do réu para responder o pedido principal. Seguindo a mesma sistemática prevista para o procedimento comum, o réu será intimado para compare-cer à audiência de conciliação ou mediação, na forma do art. 334 do NCPC. Evidentemente, a conciliação ou mediação deverá abranger não apenas a lide principal, mas também a lide cautelar.

Não havendo autocomposição, conforme dispõe o § 4° do art. 308 do NCPC, o prazo para contes-tação será contado na forma do art. 335 do NCPC. Na contestação, apresentada à lide principal, o réu poderá invocar todas as matérias previstas nos arts. 336 e 337 do NCPC. Do mesmo modo, se for o caso, poderá apresentar reconvenção, de acordo com o art. 343 do NCPC. Caberá ao réu – por ocasião da apresentação de contestação ao pedido principal - manifestar-se precisamente sobre as alegações de fato constantes da petição inicial, presumindo-se verdadeiras as não impugnadas, nos termos do art. 341 do NCPC. Aplicam-se também à falta de contestação ao pedido principal, as disposições relativas à reve-lia, previstas nos arts. 344 a 346 do NCPC. Se o réu alegar qualquer das matérias elencadas no art. 337 do NCPC, o juiz determinará a oitiva do autor no prazo de 15 (quinze) dias, permitindo-lhe a produção de prova, de acordo com a previsão do art. 351 do NCPC. Do mesmo modo, nos termos do art. 350 do NCPC, “se o réu alegar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, este será ouvido no prazo de 15 (quinze) dias, permitindo-lhe o juiz a produção de prova”.

Após ter sido oportunizado prazo de réplica – tenha havido ou não manifestação do autor -, o magistrado terá quatro possibilidades tanto em relação à lide cautelar quanto no tocante à lide principal:

a). extinção do processo nas hipóteses previstas nos artigos. 485 e 487, incisos II e III, do NCPC, tal como está previsto no art. 354 do NCPC;

b). julgar antecipadamente o mérito, na forma do art. 355 do NCPC, proferindo sentença com re-solução de mérito, quando não houver a necessidade de produção de outras provas, o réu for re-vel e ocorrer o efeito previsto no art. 344, não havendo requerimento de prova na forma do art. 349 do NCPC;

c). julgar antecipadamente parcialmente o mérito, na forma do art. 356 do NCPC, “quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles mostrar-se incontroverso” ou “estiver em condi-ções de imediato julgamento, nos termos do art. 355 do NCPC”.

d). sanear e organizar o processo, na forma prevista no art. 357 do NCPC.

Na última hipótese, a decisão de saneamento também deverá abranger tanto a lide cautelar quanto à lide principal. No saneamento, além de resolver questões processuais pendentes, se houver, o magistrado também delimitará questões de fato sobre as quais recairá a atividade probatória, especifi-cando os meios de prova admitidos (tanto na lide cautelar quanto na principal, são admitidos todos os meios de prova). Do mesmo modo, definirá questões relativas ao ônus da prova, observando o disposto no art. 373 do NCPC. Também delimitará as questões de direito relevantes para a decisão do mérito. Em havendo questões de fato, designará, se necessário, audiência de instrução e julgamento. Tendo sido determinada a produção de prova testemunhal, o juiz fixará prazo comum, não superior a 15 (quinze)

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dias para que as partes apresentem rol de testemunhas, em número não superior a 10 (dez), sendo no máximo 3 (três) para cada fato, nos termos dos §§ 4° e 6° do art. 357 do NCPC.

Se a causa apresentar complexidade em matéria de fato ou de direito, deverá o juiz designar au-diência para que o saneamento seja feito em cooperação com as partes, oportunidade em que o juiz, se for o caso, convidará as partes a integrar os esclarecer suas alegações, conforme dispõe o § 3° do art. 357 do NCPC. Neste caso, as partes devem levar, para a audiência prevista, o rol de testemunhas, de acordo com o § 5° do mesmo dispositivo legal.

De acordo com o exposto, parece evidente a realização de instrução conjunta tanto dos fatos que compõem a lide cautelar quanto principal. No tocante a este aspecto, as partes tiveram prejuízo em relação ao CPC/73. Como no CPC/73 a lide cautelar integrava uma ação dotada de autonomia de proce-dimento, as partes tinham a possibilidade de arrolar 10 (dez) testemunhas para provar os fatos. Na ação onde era deduzida a lide principal poderiam ser arroladas mais 10 (dez) testemunhas. Na sistemática do NCPC, o número total passa a ser reduzido para 10 (dez) testemunhas para a prova dos fatos que com-põem ambas as lides. Em processos que envolvam grande complexidade, a redução do número de tes-temunhas poderá ser prejudicial às partes. Não é demasiado referir, que o juiz, nos termos do § 7° do artigo 357, ainda poderá limitar o número de testemunhas, o que poderá ser ainda mais grave.

16.3.15. Natureza da sentença que julgar as lides cautelar e principal: a sentença final deverá se pronunciar tanto sobre a lide cautelar quanto sobre a lide principal. Entendemos ser de mérito

175 o capí-

tulo da sentença que julgar a lide cautelar. Trata-se de um capítulo que terá o conteúdo eficacial pre-ponderante mandamental

176.

O conteúdo do capítulo da sentença que julgar a lide cautelar será formado, no mínimo, por dois elementos: a ordem, que se traduz na eficácia mandamental e, em dose menos intensa, a declaração que está invariavelmente presente como parte de seu conteúdo. Frise-se que a declaração se dá em dose menos intensa, rarefeita, pois o juiz nada declara com força de coisa julgada, uma vez que seu julgamen-to baseia-se em juízo de verossimilhança do direito invocado pelo autor.

No tocante ao capítulo da sentença que julgar a lide principal, em se tratando de sentença de procedência, observará a classificação geral sustentada por Francisco PONTES DE MIRANDA. Ou seja, o conteúdo eficacial predominante será declaratório, constitutivo, condenatório, executivo lato sensu ou mandamental.

16.3.16. Coisa julgada das sentenças prolatadas nos procedimentos que tenham por objeto a tutela cautelar antecedente: estas sentenças terão, na maioria das vezes, pelo menos dois grandes capítulos. Um deles, tratará da lide cautelar e o(s) outro(s) que terá (ão) por objeto a lide principal. A aptidão da sentença cautelar ou do capítulo referente à lide cautelar em produzir coisa julgada material não é pacífica na doutrina brasileira

177. Muito pelo contrário, a maioria das vozes é pela tese negativa. No

175A doutrina e a jurisprudência discutem se a sentença prolatada no processo cautelar deve ser proferida de forma indepen-dente, ou se pode ser proferida juntamente com a do processo principal. Após expor as vantagens (economia processual) e as desvantagens (segurança e adequação) de uma sentença “uma” para o feito principal e cautelar, conclui Márcio Louzada CARPENA (In: Do processo cautelar moderno. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 325-326) que “a prolação de sentença ‘una’ para ambos os feitos não é nula; contudo, se o julgador, em função disso, violar a regra do art. 458 do CPC, deixando de firmar relatório, analisar os fundamentos particulares de cada ação ou prolatar dispositivo a cada uma, ainda que de forma conjunta para ambas, nulidade clara se vislumbrará no decisum, passível de decretação inclusive exofficio pelo tribunal”. 176Neste sentido: Ovídio Araújo BAPTISTA DA SILVA (In: Do processo cautelar, p. 182); Luiz ORIONE NETO (Ob. cit., p. 200); Alexandre Freitas CÂMARA (In: Lições de Direito Processual Civil, 4 ed. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2002, Vol. III, p. 70). 177FreddieDIDIER JR. et alii (In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Jus Podivam, 2015, p. 564), ao tratar do tema enten-de que a sentença cautelar transita em julgado materialmente, verbis: “há cognição exauriente do mérito cautelar e, pois, do direito à cautela. A cognição do direito material acautelado é que é sumária, bastando que se revele provável para o julgador

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tocante a este aspecto, pouco importa que a lide cautelar tenha no NCPC a natureza de um capítulo de uma sentença que também apreciará a lide principal, pois a essência continua sendo exatamente a mesma. Galeno LACERDA

178, ao tratar do tema, leciona que

não há coisa julgada material na concessão, ou não, de medida cautelar, porque o juízo sobre as necessidades de segurança prévia não se estende à totalidade da lide à existência ou não da relação jurídica material e do di-reito subjetivo material alegado. Como afirma Liebman (In: Unitàdel proce-dimento cautelare. Revista cit. IX-I/253), o objeto da decisão cautelar e sua natural variabilidade e temporariedade excluem a duração de eficácia que caracteriza a coisa julgada material”. Todavia, o autor ressalva que “a tese vale, porém, apenas, para as cautelas jurisdicionais preventivas; não, de to-do, para as repressivas. Nestas, p. ex., no atentado, no incidente de falsida-de, embora não se julgue a demanda principal, há definitividade na respec-tiva sentença, porque desce aos fatos materiais da lide, para repô-los, ou não, no estado anterior.

Ovídio Araújo BAPTISTA DA SILVA179

comunga com a tese da não produção da coisa julgada mate-rial, mas com fundamento diverso. Inicialmente considera a sentença cautelar como sendo de mérito, como outra qualquer. Refere que o mérito reside no objeto do litígio, que é a sua res deducta; o que a distingue é que apenas assegura sem satisfazer o direito que se assegura. Para esse jurista, a inaptidão de a sentença cautelar alcançar a estabilidade peculiar à coisa julgada material advém da ausência de qualquer declaração sobre relações jurídicas que possam ser controvertidas na demanda cautelar. O juiz, ao decidir a causa, limita-se a afirmar a simples plausibilidade da relação jurídica de que o autor se afir-ma titular e a existência de uma situação fática de perigo. E sobre fatos não incide o selo da indiscutibili-dade, própria da coisa julgada material. Não havendo declaratoriedade relevante sobre uma situação jurídica, o juiz da futura demanda poderá reapreciar livremente a mesma causa, e decidir de maneira diversa.

Partilhamos do mesmo entendimento dos autores supracitados, com uma ressalva: se a extinção do processo que veicula a lide cautelar se der pela prescrição ou pela decadência há que se falar em coisa julgada material, em razão de o julgamento ser prolatado com base em juízo de certeza. Portanto, a sentença será apta à produção de coisa julgada material

180.

Relativamente à lide principal, se houver pronunciamento de mérito, entendemos que, na grande maioria dos casos, haverá a produção de coisa julgada material.

Mas qual a aplicação prática de fazer-se essa distinção? Entendemos que no cabimento da ação rescisória reside a principal aplicabilidade de se visualizar a existência de mais de um capítulo na senten-ça que julgar a lide cautelar e a lide principal, e a inexistência de coisa julgada material – como regra – daquele capítulo que julgar a primeira (lide cautelar). Assim, será objeto de ação rescisória – se preen-chidos os requisitos de cabimento -, via de regra, apenas o capítulo da sentença que julgar a lide princi-pal. Este entendimento está em consonância com o disposto no § 3° do art. 966 do NCPC, que permite que a ação rescisória possa ter por objeto “apenas 1 (um) capítulo da decisão”.

(como exige a fumaça do bom direito) . ... Assim, se há decisão cautelar de mérito, com cognição exauriente, e não mais sujeita a recurso, há coisa julgada cautelar”. 178In: Comentários ao Código de Processo Civil, Vol. VIII, Tomo II, n. 73, 7ª ed., p. 288. 179In: Curso de processo Civil, p. 174. 180Em sentido contrário, Luiz Edson FACHIN (In: Revista de Processo n. 49, p. 57), verbis: “Em que pese, de um lado, a contro-vérsia doutrinária, e de outro, a opinião ainda dominante sobre a inexistência de coisa julgada no processo cautelar, há produ-ção de coisa julgada nas efetivas cautelares (v.g. sequestro, arresto, inominadas com esse caráter e sob a égide do art. 799 do CPC, arrolamento, e dependendo das circunstâncias na caução, busca e apreensão, exibição e produção antecipada de pro-vas)”. No mesmo sentido, leciona Fritz BAUR (In: Tutela jurídica mediante medidas cautelares. Trad. De Armindo Edgar Laux. Porto alegre: Sérgio A. Fabris Editor, 1985, p. 126), verbis: “Os princípios desenvolvidos no processo principal, concernentes ao efeito da coisa julgada material de uma sentença denegatória, valem também para uma decisão que indefere o pedido de uma medida temporária, todavia, com a peculiaridade única de que o peticionário não fica tolhido pela preclusão de apresen-tar novos meios de prova que não pôde alegar no primeiro procedimento”. E o autor complementa (p. 134): “A medida tem-porária, tornada coisa julgada, atua como coisa julgada material sempre e apenas na relação com outras medidas temporá-rias, que forem postuladas; desde que sejam dadas eadem res e eadem partes, valem os princípios desenvolvidos para o processo ordinário sobre os efeitos da coisa julgada material”.

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16.3.17. Cessação da eficácia da tutela cautelar concedida em caráter antecedente: além da não formulação do pedido principal no prazo de 30 (trinta) dias, o NCPC, nos incisos II e III do art. 309, elenca outras hipóteses de cessação de eficácia da medida cautelar. Vejamos:

a) não efetivação da medida no prazo de 30 (trinta) dias: como a obtenção da tutela cautelar de-pende de sua efetivação, a cessação prevista na hipótese contemplada no art. 309, inc. II não é da eficácia da medida, mas da decisão que concedeu oportunidade para a efetivação da tutela cautelar. Se o autor não promoveu a efetivação da tutela cautelar no prazo de 30 (trinta) dias é porque falta requisito essencial à concessão da tutela cautelar: periculum in mora. Evidentemen-te, se ausente periculum in mora é o caso de extinção do processo.

b) o juiz julgar improcedente o pedido principal formulado pelo autor ou extinguir o processo sem resolução do mérito: seguindo-se a concepção de Ovídio Araújo BAPTISTA DA SILVA

,, a eficá-

cia da tutela cautelar, contudo, não se subordina à pendência de uma lide principal, mas à obten-ção da tutela do direito buscada através do pedido principal, à cessação da situação de perigo que a ensejou

181. O NCPC corrigiu a imprecisão do CPC/73 relativamente a esta matéria. Pode-se

dizer, que a crítica lançada por Ovídio Araújo BAPTISTA DA SILVA182

, finalmente foi acolhida pelo legislador.

Segundo o autor, a cessação de eficácia da medida cautelar, em virtude da sentença final proferi-da na demanda satisfativa, dar-se-á apenas se a sentença for de rejeição do pedido, sentença de impro-cedência, ou uma daquelas a que a doutrina denomina sentença de “carência da ação”. Nestas hipóte-ses, é natural que a medida cautelar perca a eficácia, desde que o direito que ela pretendia proteger foi declarado inexistente. Se a sentença, porém, for de acolhimento do pedido, portanto sentença de pro-cedência, a medida cautelar não perderá a eficácia até ser substituída por outra medida satisfativa, salvo se as circunstâncias ou a natureza de tal sentença por si só dispensem, a partir dela, a proteção caute-lar

183.

Em suma, a cessação de eficácia de medida cautelar por extinção da lide principal só ocorre na hipótese de decisão desfavorável ao autor.

16.4 TUTELA DE EVIDÊNCIA

16.4.1. Natureza da tutela de evidência no NCPC: ao inserir a tutela de evidência no âmbito da “Tutela Provisória”, parece claro que o legislador não a considerou como provimento definitivo, mas provisório, dependente de confirmação posterior. Entendemos que se trata de antecipação de efeitos da sentença final, que dispensa os requisitos “demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo”, desde que preenchidos os requisitos previstos no artigo 311 do NCPC

184. Há antecipação de

181Neste sentido: Luiz Guilherme MARINONI e Daniel Francisco MITIDIERO (In: Código de Processo Civil – Comentado artigo por artigo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 760). 182In: Curso de Processo Civil, p. 147 e seguintes. 183No mesmo sentido, a lição de Galeno LACERDA (In: Comentários ao Código de Processo Civil, Vol. VIII, Tomo I, n. 74, p. 292-293), verbis: “A cessação de eficácia por extinção do processo principal, com ou sem julgamento do mérito (n. III), pressupõe a não-condenação do réu. Se condenado este, a medida não se extingue: ou passa ao processo de execução, para nele se trans-formar em ato executório, ou se converte no próprio comando definitivo da sentença (p. ex. alimentos provisionais em definiti-vos)” 184Art. 311. A tutela de evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando: I – ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte; II – as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante; III – se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de

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efeitos porque o julgador concederá “antes” o bem da vida que será objeto da sentença que será prola-tada muito tempo após o ajuizamento de uma ação judicial

185. Entretanto, é preciso perceber que a

evidência do direito para fins de antecipação de tutela é aferida mediante cognição sumária – em grau mais forte do que em sede de tutela de urgência - e não mediante cognição exauriente

186. Do contrário, a

tutela de evidência não estaria inserida no âmbito da tutela provisória, mas teria sido incluída no âmbito do julgamento parcial da lide antecipado (art. 356 NCPC).

16.4.2.Procedimentos nos quais a tutela de evidência pode ser deferida: o NCPC prevê hipóte-ses de tutela provisória de evidência em procedimentos especiais, como a tutela provisória satisfativa concedida nas ações possessórias (art. 562), nos embargos de terceiro (art. 678) e na ação monitória (art. 700). Na legislação extravagante, também há a previsão da mesma na ação de despejo (art. 59, § 1°, da Lei 8.245/91). O NCPC inovou ao inclui-la no âmbito do procedimento comum. Ainda que não esteja expressamente prevista em muitos procedimentos especiais, entendemos que possa ser deferida, com é o caso da ação civil pública e da ação civil coletiva, considerando-se que a tutela de evidência tem por finalidade a realização de direitos.

16.4.3. Modalidades de tutela de evidência: a partir do artigo 311 do NCPC, pode-se elencar du-as modalidades de tutela provisória de evidência. A primeira delas, que podemos denominar de punitiva, que será concedida quando ficar caraterizado o “abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte”. A segunda modalidade, podemos denominar de tutela de evidência documenta-da, concedida quando há prova documental das alegações de fato da parte, nas hipóteses do artigo 311, II a IV do NCPC, que determinam a probabilidade de acolhimento da pretensão processual. Ambas as modalidades serão analisadas nos próximos itens.

16.4.3.1. Abuso do direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu: na hipótese do inciso I do artigo 311, o juiz, convencendo-se da verossimilhança do direito do autor, ante a prova de que o réu abusa do direito de defesa, ou comporta-se com “manifesto propósito protelatório”, poderá também antecipar os efeitos da tutela pretendida pelo autor, em sede de tutela de evidência.

O direito de defesa decorre do pensamento tradicional, que somente admitia a execução poste-riormente à sentença definitiva, no intuito de que não se interferisse na esfera patrimonial do devedor enquanto não se julgasse definitivamente o litígio. Segundo Luiz Guilherme MARINONI

187,

a preocupação exagerada com o direito de defesa, fruto de uma visão ex-cessivamente comprometida com o liberalismo clássico, não permitiu, por muito tempo, a percepção de que o tempo do processo não pode ser jogado nas costas do autor, como se este fosse o responsável pela demora ineren-te à verificação da existência dos direitos.

O longo trajeto a ser percorrido pelo credor até conseguir a satisfação do seu direito se trans-forma, quase sempre, num prêmio para o réu inadimplente e num castigo injustificável para o autor. Por conseguinte, se o réu é beneficiado pela demora da prestação jurisdicional, não é de se estranhar que

multa; IV – a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos o direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável. 185Ao tratar do tema, Daniel MITIDIERO (In: Antecipação da Tutela – Da tutela cautelar à técnica antecipatória. São Paulo: Revista do Tribunais, 2012, p. 133), posiciona-se no mesmo sentido: “a tutela antecipada fundada na evidência visa a promo-ver a igualdade substancial entre as partes. Trata-se de expediente que tem como objetivo distribuir o peso que o tempo representa no processo de acordo com a maior ou menor probabilidade de a posição jurídica afirmada pela parte ser fundada ou não”. 186Em sentido contrário, Luiz FUX (In: Tutela de segurança e tutela da evidência. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 310), para quem a antecipação de tutela nesse caso é fundada em cognição exauriente. 187In: A antecipação da tutela na reforma do Código de Processo Civil. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 136.

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frequentemente abuse do seu direito de defesa com o objetivo de protelar o término do processo.

É por isso que a tutela antecipada baseada no abuso do direito de defesa ou propósito protela-tório do réu é um instrumento de correção do uso indevido do processo

188. Não se obstrui o direito de

ampla defesa, mas tão-somente se redistribui o ônus do tempo do processo, devendo suportar a demora a parte que conta com probabilidade menor de êxito.

Para Sérgio Cruz ARENHARDT e Luiz Guilherme MARINONI189

, essa distribuição do tempo no processo deve ser feita de acordo com a evidência do direito afirmado pelo autor e a fragilidade da defe-sa apresentada pelo réu, não bastando apenas a caracterização do primeiro. Um direito é evidenciado de pronto quando é demonstrado, ainda que com base em um critério de probabilidade, desde logo. A defesa é frágil quando deixa entrever a grande probabilidade de o autor resultar vitorioso.

Segundo Ovídio Araújo BAPTISTA DA SILVA190

, o que o legislador quis significar, nesta hipóte-se

191não foi, de modo algum, a consideração de que essa antecipação teria caráter punitivo contra a

litigância temerária192

. O que se dá, com a conduta do réu, nestes casos, é que o índice de verossimilhan-ça do direito do autor eleva-se para um grau que o aproxima da certeza

193. Se o juiz já se inclinara por

considerar verossímil o direito, agora, frente à conduta protelatória do réu, ou ante o exercício abusivo do direito de defesa, fortalece-se a conclusão de que o demandado realmente não dispõe de nenhuma contestação séria a opor ao direito do autor. Daí a legitimidade da antecipação da tutela.

A tutela de evidência fundada em abuso do direito de defesa apenas é possível quando a defe-sa ou o recurso do réu deixam a entrever a grande probabilidade de o autor resultar vitorioso e, conse-quentemente, a injusta espera para a realização do direito

194. Por outro lado, entendemos que para a

caracterização do abuso do direito de defesa ou propósito protelatório não se faz necessária a intenção do réu de se servir indevidamente do processo, podendo ocorrer tanto na contestação e em recursos, como em atos extraprocessuais anteriores à propositura da ação, como notificações, interpelações, protestos ou correspondências.

188Freddie DIDIER JÚNIOR (In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Jus Podivam, 2015, p. 623), elenca exemplos de condutas que autorizam a concessão da tutela de evidência punitiva, verbis: “a). reiterada retenção dos autos por tempo prolongado; b). fornecimento de endereços inexatos a fim de embaraçar intimações; c). prestar informações erradas; d). embaraçar a produção de provas – pericial, testemunhal, inspeção judicial, etc; e).’pode igualmente revelar-se pelo confronto com sua atitude em outro processo’, onde havia sustentado determinados fundamentos de fato ou de direito; todavia, no processo conexo, adota argumentação antagônica, sem justificar devidamente o descompasso; f). invocar uma tese bisonha ou oposta à orientação dominante nos tribunais superiores etc; g). alienação de bens necessários à satisfação do demandante; h). repetir requerimento antes indeferido”. 189In: Manual do Processo de Conhecimento. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 224. 190In: Curso de Processo Civil, Vol. 1, p. 142 191Esta hipótese estava contemplada no artigo 273, inciso II do CPC/73. 192No mesmo sentido, Sérgio Cruz ARENHARDT e Luiz Guilherme MARINONI (In: Manual ..., p. 223-224), verbis: “Para efeito de tutela antecipatória, é possível extrair do art. 17 do CPC alguns elementos que podem colaborar para a caracterização do abuso de direito de defesa. Isto não significa, porém, que as hipóteses do art. 17 possam servir de guia para a compreensão da tutela antecipatória fundada em abuso de direito de defesa”. 193Ao tratar do tema, leciona Daniel MITIDIERO (In: Antecipação da Tutela – Da tutela cautelar à técnica antecipatória. São Paulo: Revista do Tribunais, 2012, p. 134-5): “isso quer dizer que a antecipação da tutela fundada na evidência (art. 273, II, CPC) não pode ser tomada como caso de tutela antecipada sancionatória. Não é essa a sua natureza. A tutela antecipatória fundada em abuso do direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu constitui mais propriamente antecipação da tutela fundada na maior probabilidade de veracidade da posição jurídica de uma das partes”. 194Segundo Freddie DIDIER JÚNIOR (In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Jus Podivam, 2015, p. 623), “há outro fator que colabora para a baixa incidência desse tipo de tutela provisória. Para que seja concedida, é necessário que haja verossimi-lhança das alegações e probabilidade de acolhimento da pretensão. Em contrapartida, observa-se uma fragilidade da manifes-tação da outra parte – que emprega argumentos e meios processuais abusivos, apresentando defesa despida de seriedade -, o que conduz, não raro, ao indeferimento das provas por ele requeridas, porquanto inúteis ou meramente protelatórias. Tudo isso, normalmente, autorizará o juiz a realizar um julgamento antecipado de mérito (art. 355, I, CPC), diante da dispensabili-dade de produção de mais provas – fora aquelas trazidas pelo autor. Conclui-se que o abuso do direito de defesa ou o manifes-to propósito protelatório do réu, em muitas situações, pode acabar conduzindo a um julgamento antecipado do mérito e, não, a uma tutela provisória. Assim, a grande utilidade da antecipação provisória dos efeitos da tutela, nesses casos, reside na possibilidade de afastar o efeito suspensivo da apelação, conferindo-se eficácia imediata à sentença”.

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16.4.3.2. As alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e hou-ver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante: a concessão de tutela de evidência quando as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente já tinha sido proposta por Luiz FUX, consoante mencionado no item 1, supra. Assim, as hipóteses previstas nos incisos II, III e IV do artigo 311 do NCPC refletem a concepção de tutela de evidência deste doutrinador. Na hipótese tratada neste item, além da prova documental, deverá haver tese firmada em julgamento de casos repetitivos

195, no que é bastante razoável a previsão legislativa. Trata-se de tutela provisória de

evidência admitida mediante o preenchimento de dois pressupostos:

a) o primeiro deles é a existência de prova das alegações de fato da parte requerente, que neces-sariamente deve ser documental ou documentada (como a prova emprestada ou produzida an-tecipadamente) e recair sobre fatos que justificam o nascimento do direito afirmado, isto é, fato constitutivo do direito. Esse pressuposto é desnecessário quando o fato gerador do direito não depender de prova (ou outras provas), como o fato notório, o fato confessado, o fato incontro-verso, o fato presumido.

b). o segundo é a probabilidade de acolhimento da pretensão deduzida, que se configura em ra-zão do fundamento normativo da demanda consistir em tese jurídica já firmada em precedente obrigatório, mais precisamente em súmula vinculante (art. 927, inciso II do NCPC) ou em julga-mento de demandas ou recursos repetitivos (art. 927, III, NCPC), que vinculam o julgador e de-vem por ele ser observados, inclusive liminarmente (parágrafo único, artigo 311 do NCPC)

196.

A decisão que conceder a tutela de evidência, com base no artigo 311, inciso II, deverá identifi-car os fundamentos determinantes do precedente utilizado, demonstrando que o caso objeto do julga-mento se assemelha ao caso que lhe deu origem, ajustando-se aos seus fundamentos, nos termos do artigo 489, § 1°, inciso V, do NCPC. Por outro lado, a decisão denegatória dessa tutela de evidência do-cumentada, não poderá deixar de seguir o precedente ou enunciado de súmula invocado pela parte, “sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento”, de acordo com a previsão do artigo 489, § 1°, inciso VI, do NCPC.

Por derradeiro, a sentença final que confirmar, conceder ou revogar a tutela de evidência do-cumentada, fundada em precedente obrigatório, é impugnável por apelação, sem efeito suspensivo (art. 1.013, § 5° e 1.012, § 1°, inciso V, do NCPC).

195Ruy Zoch RODRIGUES fez essa proposta, dispensando o requisito da urgência para a concessão da tutela antecipada nas ações repetitivas à luz do CPC/73 (In: Ações repetitivas – Casos de antecipação de tutela sem o requisito de urgência. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 197). No mesmo sentido, Daniel MITIDIERO (In: Antecipação da Tutela – Da tutela cautelar à técnica antecipatória. São Paulo: Revista do Tribunais, 2012, p. 134-5), verbis: “trata-se da tutela antecipada funda-da na simples evidência que pode inclusive servir para proteção imediata e provisória de casos repetitivos, cuja adequada solução já se encontre bem amadurecida na jurisprudência”. 196Fredie DIDIER JÚNIOR (In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Jus Podivam, 2015, p. 625) propõe uma interpretação ampla para o inciso II do artigo 311 do NCPC, verbis: “propõe-se, contudo, interpretação sistemática, teleológica e extensiva da regra, para que se entenda que deve ser possível a concessão de tutela de evidência também quando houver tese jurídica assentada em outros precedentes obrigatórios, tais como aqueles previsto no art. 927, CPC. Seria o caso da tese fixada em decisão do STF dada em sede de controle concentrado e dos enunciados das Súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional. Devem ser levados em conta todos os prece-dentes vinculantes exatamente porque o estabelecimento de uma ratiodecidendi com força obrigatória por tribunal superior já foi antecedido de amplo debate dos principais argumentos existentes em torno do tema, limitando as possibilidades argumen-tativas da parte em face da qual se requer a tutela de evidência e tornando pouco provável o seu êxito (salvo se conseguir demonstrar uma distinção do caso em exame com o caso paradigma ou a superação do precedente). A parte que postula com base em fatos provados por documento e que sejam semelhantes àqueles que ensejaram a criação de tese jurídica vinculante em tribunal superior – tese esta invocada como fundamento normativo de sua postulação -, encontra-se em estado de evidên-cia. Demonstra não só a probabilidade de acolhimento da sua pretensão processual como também a improbabilidade de sucesso do adversário que se limite a insistir em argumentos já rejeitados no processo de formação do precedente, o que configuraria, inclusive, litigância de má-fé (por defesa infundada ou resistência injustificada, cf., art. 80, CPC)”.

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16.4.3.3. Se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob comi-nação de multa

197: mais uma vez o inciso contemplou a possibilidade de concessão de tutela de evidên-

cia, desde que haja prova adequada de contrato de depósito. Entendemos não haver a necessidade, para a concessão da tutela de evidência, que exista um contrato formal de depósito. O que o dispositivo legal exige é a prova documental do contrato de depósito, seja ele escrito ou verbal. A exigência de prova documental neste inciso respectivo reflete mais uma vez a concepção de Luiz FUX de tutela de evidência. Uma vez preenchido esse pressuposto, a tutela provisória de evidência será concedida, mediante “ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa”. Não é demasiado referir, que o legislador permitiu apenas a tutela provisória de evidência específica da obrigação e não a tutela genérica do seu equivalente em dinheiro

198. Conforme leciona Freddie DIDIER JÚNIOR,

Ademais, quando formulado o pedido reipersecutório, sua conversão em perdas e danos (obrigação de pagar quantia correspondente) pressupõe mais do que simples prova documental adequada do contrato de depósito; é necessário um aprofundamento cognitivo mediante apresentação da prova da impossibilidade do cumprimento da obrigação in natura ou da obtenção do resultado prático equivalente; ou manifestação de opção do autor no sentido de recebimento do valor correspondente – manifestação esta que já configura pretensão pecuniária e não reipersecutória (art. 499, CPC).

Por derradeiro, em que pese o dispositivo legal referir a incidência de multa cominatória, deve-se interpretá-lo conjuntamente com o artigo 536 do NCPC. De acordo com esse dispositivo legal, além da multa, o magistrado tem o poder geral de determinar outras medidas necessárias para a efetivação do provimento, à luz do caso concreto.

16.4.3.4. A petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos o direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável: mais uma vez a con-cepção de Luiz Fux está presente no dispositivo legal. Todavia, não basta para a concessão da tutela de evidência que a inicial esteja instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor. É necessário que o réu não oponha prova que seja capaz de gerar dúvida razoável. Evidente-mente que não basta o réu fazer meras alegações contra o direito invocado pelo autor. Deverá ele provar as teses suscitadas, de modo a gerar dúvida. No tocante a este aspecto, poderá o réu se valer de todos os meios de prova em direito admitidos, podendo inclusive utilizar-se de provas unilateralmente produzi-das. Em razão do princípio do contraditório da prova, evidentemente que o magistrado não poderá julgar com base em provas unilaterais. Todavia, as mesmas se prestam para a finalidade de gerar dúvida razoá-vel no julgador. No tocante a este aspecto, nada impede que, após haver a produção da prova unilate-ralmente produzida, com a observação do contraditório, o julgador entenda que o réu não opôs prova capaz de gerar dúvida razoável.

Pode-se afirmar que a aplicação da hipótese prevista no artigo 311, inciso IV, do NCPC, exige o preenchimento de três pressupostos. O primeiro deles é que a evidência seja demonstrada pelo autor, mediante prova documental - ou documentada, v.g., prova emprestada ou antecipadamente produzida -, e que não seja “abalada” pelo réu. O segundo pressuposto é que o autor traga prova documental ou documentada dos fatos constitutivos do seu direito. O terceiro, diz respeito à ausência de contraprova

197O NCPC extinguiu o procedimento especial de depósito, previsto no CPC/73 nos artigos 901-906. Em seu lugar passou a admitir que a obrigação de restituir coisa decorrente de contrato de depósito seja tutelada pelo procedimento comum, aplicando-se as regras da tutela específica das obrigações de entregar coisa do art. 498 e seguintes do NCPC. O art. 902 do cpc/73 continha regra especial de tutela provisória de evidência para essas obrigações. Na sistemática vigente no CPC/73, bastava que o contrato de depósito fosse objeto de prova literal para que se configurasse sua evidência e se admitisse a tutela provisória da obrigação correspondente. Essa técnica foi preservada com o art. 311, III, do NCPC, em que pese ser restrita ao depósito convencional. 198Neste sentido: Freddie DIDIER JÚNIOR (In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Jus Podivam, 2015, p. 628)

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documental por parte do réu, que seja apta a gerar dúvida razoável em torno do fato constitutivo do direito do autor.

Concordamos com Fredie DIDIER JÚNIOR199

quando afirma que a tutela de evidência prevista no artigo 311, inciso IV, do NCPC, é inevitavelmente definitiva, confundindo-se com o julgamento antecipa-do da lide e que fora, equivocadamente, colocada no rol de hipóteses de tutela provisória, verbis:

Insista-se: a contraprova do réu, cuja ausência se pressupõe para a con-cessão de tutela de evidência, é a documental. Isso porque se o réu não dispuser de nenhum outro meio de prova suficiente, além da documental, então já será o caso de julgamento antecipado do mérito por desnecessida-de de produção de outras provas (art. 335, I, CPC).

Por isso se pode dizer que, da aplicação da regra, só pode decorrer uma tu-tela definitiva por julgamento antecipado do mérito.

De um lado, porque se a contraprova documental do réu é insuficiente, mas ele requer a produção de outros meios de prova, não é autorizada a con-cessão da tutela provisória de evidência, que pressupõe que se trate de causa em que a prova de ambas as partes seja exclusivamente documental. Nesses casos, o juiz prosseguirá com a determinação da coleta de novas provas em favor do réu.

De outro, se a contraprova documental do réu é insuficiente e ele não re-quer a coleta de outras provas, fica autorizado o julgamento antecipado do mérito da causa (art. 355, I, CPC), com a concessão de tutela definitiva, mediante cognição exauriente.

Trata-se de hipótese de tutela de evidência inevitavelmente definitiva, que se confunde com o julgamento antecipado do mérito e que fora, equivoca-damente, colocada no rol de hipóteses de tutela provisória.

A única utilidade prática do dispositivo legal é a eliminação do efeito suspensivo da apelação, no caso de julgamento antecipado do mérito pela procedência do pedido do autor.

16.4.4. Processamento da tutela de evidência: a única regra que o artigo dispõe sobre o proce-dimento da tutela de evidência, é o disposto no parágrafo único, verbis: “nas hipóteses dos incisos II e III, o juiz poderá decidir liminarmente”. Deve-se interpretar a expressão “liminarmente” na exata acepção da palavra, que é derivar da expressão latina in limine, que significa no início do processo. Assim, nas hipó-teses previstas nos incisos II e III do artigo 311, poderá o magistrado conceder a tutela de evidência sem a ouvida do réu, tal como permite o artigo 9°, inciso I, do NCPC. As demais hipóteses previstas no artigo 311, não estão contempladas no parágrafo único, porque a concessão de ambas pressupõe que o réu já tenha integrado a relação processual.

As duas exceções previstas no parágrafo único do art. 311 do NCPC reforçam a tese de que a tu-tela de evidência é provisória, emitida com base em cognição sumária, estando sujeita a ser confirmada por ocasião da sentença, por uma simples e incontestável razão: entendemos que o julgador não teria como julgar a ação procedente liminarmente sem que o réu sequer tenha sido citado. Haveria, sem qualquer sombra de dúvida, violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa.

16.4.4.1. Da aplicação das disposições gerais referentes à tutela provisória: entendemos os arti-gos que dispõem sobre regras gerais à tutela provisória (art. 294 a 299 do NCPC), aplicam-se integral-mente à tutela de evidência, sempre que forem compatíveis.

199In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Jus Podivam, 2015, p. 629.

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17.1 PRINCÍPIOS GERAIS EM MATÉRIA DE RECURSOS

17.1.1. Princípio do duplo grau de jurisdição: este princípio respectivo não está expressamente previsto em lei. Trata-se de um princípio constitucional implícito, que decorre da existência de tribunais. As razões declinadas para a existência do duplo grau são duas: a possibilidade de erro por parte dos magistrados e a pressuposição de que juízes mais experientes, que integram tribunais, tenham melhores condições de julgar. Evidentemente, que ambos fundamentos são passíveis de críticas. Partindo-se da premissa de que o processo judicial toma por base versões apresentadas pelas partes, vencerá o proces-so aquele que apresentar a melhor versão. Assim, a adoção de uma das versões apresentadas por uma das partes não implicaria propriamente em erro. Por outro lado, na realidade atual, não necessariamente juízes que integram tribunais apresentam-se em melhores condições de julgar os processos judiciais. Há magistrados que integram a jurisdição de primeiro grau que também têm excelentes condições de pres-tar jurisdição.

17.1.2. Princípio da taxatividade: de acordo com este princípio, os recursos em matéria cível não são “inventados”, “criados”, os mesmos necessariamente precisam estar previstos em lei. Nos termos do art. 22, I, da Constituição Federal, precisam estar previstos em lei federal. A maior parte dos recursos cíveis estão previstos no artigo 994 do NCPC. Houve a revogação do agravo retido e do recurso de em-bargos infringentes.

Relativamente às decisões interlocutórias prolatadas na fase de conhecimento, não agraváveis – através do agravo de instrumento -, não são cobertas pela preclusão, devendo ser suscitadas em prelimi-nar de apelação interposta contra a decisão final ou, nas contrarrazões (artigo 1.009, § 1°). Se forem suscitadas essas questões em contrarrazões, o recorrente será intimado para, em 15 (quinze) dias, se manifestar sobre elas (artigo 1.009, § 2°). Ou seja, não há nenhum pelo prejuízo na revogação do agravo retido.

Em que pese a revogação do recurso de embargos infringentes, foi introduzida a técnica de jul-gamento prevista no artigo 942 do NCPC. De acordo com essa técnica, quando o resultado da apelação não for unânime, o julgamento terá prosseguimento em sessão a ser designada com a presença de ou-tros julgadores, que serão convocados nos termos previamente definidos no regimento interno, em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial, assegurado às partes e a eventuais terceiros o direito de sustentar oralmente suas razões perante os novos julgadores. Se for possível – o que é muito difícil de ocorrer -, o prosseguimento do julgamento dar-se-á na mesma sessão, colhendo-se o voto de outros julgadores que porventura componham o órgão colegiado (artigo 942, § 1°, do NCPC). Não é demasiado referir que os julgadores que já tiverem votado poderão rever seus votos por ocasião do prosseguimento do julgamento (artigo 942, § 2°, do NCPC). Nos termos do artigo 942, § 3°, do NCPC, esta técnica de julgamento também se aplica nos julgamentos não unânimes prolatados em: a) ação rescisória, quando o resultado for a rescisão da sentença, devendo, nesse caso, seu prosse-guimento ocorrer em órgão de maior composição previsto no regimento interno; b) agravo de instru-mento, quando houver reforma da decisão que julgar parcialmente o mérito. O disposto no artigo, por sua vez, não se aplica (artigo 942, § 1°, do NCPC): a) no incidente de assunção de competência e ao de resolução de demandas repetitivas; b) remessa necessária; c) nos julgamentos não unânimes proferidos nos tribunais, pelo plenário ou pela Corte Especial.

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17.1.3. Princípio da unicidade: também chamado de singularidade. De acordo com esse princí-pio, os provimentos jurisdicionais, via de regra, são atacados através de um único recurso. No tocante a esse aspecto, deverá preponderar sempre o conteúdo finalístico do ato, o que significa dizer que, se uma sentença tiver em seu conteúdo decisões tipicamente interlocutórias, tanto o provimento com natureza de sentença quanto aqueles que sejam interlocutórios, serão atacáveis através do recurso de apelação. Ou seja, a sentença, que é o ato maior, abrangerá as interlocutórias, com menor abrangência (v.g. sen-tença que julgar antecipadamente a lide, indeferindo a produção de prova pericial, será atacada unica-mente através do recurso de apelação). De modo a evitar as discussões existentes na vigência no CPC/73, o NCPC expressamente optou pelo cabimento do recurso de apelação contra a sentença que conceder, confirmar ou revogar a tutela provisória, consoante dispõe o artigo 1.013, § 5°.

17.1.4. Princípio da consumação: este princípio respectivo decorre da chamada preclusão con-sumativa. No âmbito do processo civil, pode-se falar em três principais espécies de preclusão: temporal, consumativa e lógica. A preclusão temporal implica na perda da oportunidade de praticar o ato, em razão de o mesmo não ter sido praticado no momento oportuno. Em contrapartida, a preclusão consu-mativa implica na perda da oportunidade de praticar o ato se o mesmo já tiver sido praticado. Já na preclusão lógica haverá a perda da oportunidade de praticar o ato, sempre que for praticado outro que com ele é incompatível. O princípio da consumação tem relação com a preclusão consumativa. Como regra geral, tão logo a parte tenha interposto recurso, não poderá mais aditá-lo, complementá-lo, exceto na hipótese de interposição de embargos de declaração, em sendo agregado efeito infringente aos mes-mos. Nesta hipótese, será o caso de aplicação do princípio da complementariedade, a seguir melhor explicitado.

17.1.5. Princípio da complementariedade: de acordo com esse princípio, no caso de sucumbên-cia recíproca, em havendo, por exemplo, a interposição de recurso de apelação contra a sentença por uma das partes e embargos de declaração pela outra, em sendo agregado efeito infringente ao último recurso (embargos de declaração), a parte que já tiver apelado, poderá aditar/complementar o apelo, em razão do princípio constitucional do contraditório (art. 5, LV, da CF). O NCPC expressamente positi-vou este princípio no artigo 1.024, § 4°.

17.1.6. Princípio da dialeticidade: conforme este princípio respectivo, em matéria cível, os recur-sos precisam sempre estar fundamentados, sob pena de não conhecimento. No tocante a este aspecto, as razões recursais não podem consistir em mera “colagem” de outras peças do processo. Trata-se de prática comum de muitos profissionais, principalmente, nas ações de massa. A mera “colagem” implica na ausência de razões e, consequentemente, no não conhecimento do recurso. O NCPC também positi-vou este princípio no artigo 932, III, que expressamente prevê a necessidade do recorrente impugnar especificamente os fundamentos da decisão recorrida.

17.1.7. Princípio da proibição da reformatio in pejus: de acordo com este princípio, em razão do recurso interposto, não é possível a reforma para pior da decisão judicial. Entretanto, trata-se de um princípio que não é absoluto, mas que pode ser relativizado na apreciação ex officio no âmbito dos tribu-nais de questões de ordem pública, com exceção dos recursos extraordinários (Recurso Especial e Recur-so Extraordinário). Por exemplo, em havendo uma sentença de parcial procedência em uma ação de indenização, interposto recurso de apelação apenas pelo autor, com a finalidade de aumentar o valor da condenação, se o tribunal constatar a ausência da algum pressuposto processual, poderá extinguir o processo sem resolução do mérito, desde que observe o disposto no artigo 10 do NCPC. Ora, o autor originariamente tinha vencido parcialmente a ação. Com o julgamento da apelação, a ação foi extinta. Evidentemente, que se está diante de reforma para pior!

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De acordo com a Súmula 45 do Superior Tribunal de Justiça, este princípio aplica-se também nos casos de reexame necessário. Entendemos que o disposto nesta súmula foi recepcionado pelo novo diploma legal.

17.1.8. Princípio da fungibilidade: o NCPC, seguindo a mesma linha do CPC/73, não positiva de forma genérica o princípio da fungibilidade. No tocante a este aspecto, importante ressaltar que este princípio foi expressamente previsto apenas no CPC/39 (artigo 810). Em que pese a inexistência de positivação expressa, o NCPC previu duas hipóteses de fungibilidade. A primeira delas, já reconhecida amplamente pela jurisprudência das Cortes Superiores, diz respeito à fungibilidade entre o recurso de embargos de declaração e o agravo interno, prevista no artigo 1.024, § 3°. A segunda, de difícil aplicação prática, significando uma grande inovação, refere-se à fungibilidade entre recurso especial e recurso extraordinário e vice-versa, prevista nos artigos 1.032, 1.033 e 1.034. Observa-se que, nas duas hipóteses de aplicação do princípio da fungibilidade, previstas pelo novo diploma legal, não há problema algum quanto ao prazo, que poderia ser um entrave, de acordo com o entendimento dominante à luz do CPC/73, pois o recurso de embargos de declaração tem um prazo menor (5 dias, de acordo com o artigo 1.023) do que o recurso de agravo interno (15 dias, de acordo com o artigo 1.021, § 2°). Em contraparti-da, tanto o recurso especial quanto o extraordinário, continuam tendo o mesmo prazo de 15 dias (artigo 1.030).

Nos demais casos, entendemos bastante complicado que se possa aplicar o princípio da fungibili-dade, principalmente diante da taxatividade das hipóteses previstas para o cabimento do recurso de agravo de instrumento (artigo 1.015 do NCPC). Ou seja, a interposição do recurso de apelação nas hipó-teses previstas para o cabimento do agravo de instrumento implica em erro grosseiro, o que afasta a possibilidade de aplicação desse referido princípio. Do mesmo modo, a interposição de agravo de ins-trumento quando seria o caso de apelação, também se configura evidente erro grosseiro.

17.2 JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE E JUÍZO DE MÉRITO

Os recursos cíveis são precedidos do exame dos requisitos de admissibilidade (específicos a cada um dos recursos em espécie). A ausência de qualquer dos requisitos de admissibilidade acarreta o não conhecimento do recurso, que impede a análise do mérito.

17.2.1. Requisitos de admissibilidade: de acordo com a classificação tradicional da doutrina, os requisitos de admissibilidade se dividem em intrínsecos e extrínsecos.

17.2.1.1. INTRÍNSECOS

a) Cabimento: este requisito tem relação com os princípios da taxatividade, unicidade e fungibili-dade. Isto significa dizer que cada provimento jurisdicional, via de regra, é atacado através de um único recurso que poderá modificá-lo. Entretanto, não apenas os recursos modificam decisões judiciais, mas também os chamados sucedâneos recursais. Tratam-se de formas autônomas de impugnação que a lei não confere a natureza de recurso, mas que também modificam decisões judiciais. São exemplos de sucedâneos recursais: mandado de segurança, pedidos de reconsideração, reclamação, ação rescisória, correição parcial, etc.

b) Legitimação para recorrer: têm legitimação para interpor o recurso, as pessoas elencadas no artigo 996 do NCPC. São elas: as partes, os terceiros prejudicados e o Ministério Público. Para que os terceiros possam interpor recurso, deverão demonstrar a possibilidade de a decisão sobre a relação jurídica submetida à apreciação judicial atingir direito de que se afirme titular ou que

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possa discutir em juízo como substituto processual (parágrafo único do artigo 996).

O Ministério Público tem legitimação para recorrer nos processos em que for parte ou naqueles em que atuar como fiscal da ordem jurídica. Em se tratando da interposição de recurso adesivo, discute-se se o Ministério Público teria ou não legitimação para a interposição do mesmo, naqueles casos em que atuar como fiscal da ordem jurídica, considerando que não é parte. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça – que entendemos que possa continuar sendo aplicada à luz do artigo 997 do NCPC –, nega legitimação ao Ministério Público para recorrer nesta hipótese:

Recurso Especial – Ministério Público – Legitimidade – O Ministério Público tem legitimidade para recorrer, seja como parte ou fiscal da lei. Os recursos são os mesmos de que dispõem as partes. A única ressalva decorrer do ar-tigo 500 do CPC, quanto ao recurso adesivo. (REsp 6795/SP, Segunda Turma, Ministro Relator Luiz Vicente Cernicchiaro, Data do Julgamento 17/12/1990, DJ 04/03/1991)

c) Interesse em recorrer: tem relação com o binômio, necessidade/utilidade, que nada mais é do que a sucumbência. Ou seja, rigorosamente, para que a parte tenha interesse em interpor qualquer recurso, deverá ter tido algum prejuízo. Todavia, há casos em que a parte vencedora – que não sucumbiu em nenhum dos pedidos – continua tendo interesse recursal. No âmbito das ações individuais, podemos exemplificar com a extinção do processo sem resolução do mérito. Neste caso, o réu é vencedor. Entre-tanto, a extinção do processo sem resolução do mérito, produz apenas coisa julgada formal, o que signi-fica dizer que a ação poderá ser ajuizada novamente. Logo, o réu terá interesse em recorrer com a finali-dade de buscar a improcedência da ação, com a extinção do processo com resolução de mérito e, conse-quentemente, a coisa julgada material. Neste caso, não poderá mais ser demandado.

Do mesmo modo, nas ações coletivas julgadas improcedentes por insuficiência de provas, o réu, que é o vencedor continuará tendo interesse em recorrer ( e, inclusive, interpor embargos de declara-ção). Nos termos do artigo 103 do Código de Defesa do Consumidor e do artigo 16 da Lei da Ação Civil Pública, a sentença de improcedência por insuficiência de provas, produz apenas a coisa julgada formal (“coisa julgada secundum eventum probationes”). Logo, a ação coletiva poderá ser ajuizada novamente, havendo interesse por parte do réu em interpor recurso contra a sentença de improcedência por insufi-ciência de provas, prolatada em uma ação coletiva.

Como se pode observar, o réu foi vencedor em ambos os exemplos acima explicitados, mas con-tinuará tendo interesse recursal. O interesse recursal reside em conseguir a coisa julgada material

d) Ausência de fato extintivo ou impeditivo do direito de recorrer: Como exemplo de fato extin-tivo, temos a renúncia ao direito de recorrer. Já, de fato impeditivo, a desistência. A parte apenas renun-cia a recurso ainda não interposto e desiste de recurso já interposto. Tanto a renúncia quanto a desistên-cia, são sempre unilaterais, prescindindo de concordância da parte contrária (artigo 998 e 999 do NCPC).

Inicialmente, cabe mencionar que o Ministério Público e a Fazenda Pública não podem renunciar ao direito de recorrer, considerando a indisponibilidade dos interesses por esses entes respectivos tute-lados.

Por outro lado, o NCPC, no artigo 998, parágrafo único, positivou a possibilidade de desistência do recurso que vier a ser escolhido como paradigma, no caso de recursos repetitivos. Todavia, a desis-tência do recurso não impede a análise de questão cuja repercussão geral já tenha sido reconhecida e daquela que seja objeto de julgamento de recursos extraordinários ou especiais repetitivos.

Há várias outras discussões em torno da renúncia, a seguir elencadas:

a) será possível a renúncia ao direito de recorrer, antes da decisão judicial? É comum essa prática em acordos. Na petição de acordo, antes da decisão judicial de homologação, muitas partes cos-tumam renunciar ao direito de recorrer. Entendemos ser possível a renúncia prévia, por se tratar de direito disponível, consoante entendimento do Superior Tribunal de Justiça – que entendemos

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compatível com o NCPC –, a seguir colacionado:

PROCESSUAL CIVIL. PRECLUSÃO DE TEMA CONSTITUCIONAL. PEDI-DO DE DESISTÊNCIA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. 1. A desistência do recurso ou a renúncia ao direito de recorrer constituem negócios jurídicos unilaterais não receptícios, não dependendo, portanto, de aceitação/anuência da parte ex adversa, consoante a ratio essendi dos arts. 501 e 502, do CPC. 2. A doutrina assevera que "A desistência é ato pelo qual o recorrente abre mão do recurso interposto, demonstra o desinteresse em relação ao inconformismo manifestado em momento anterior. O art. 501 do Código revela que a desistência pressupõe a existência de recurso já in-terposto" (in Souza, Bernardo Pimentel. Introdução aos recursos cíveis e à ação rescisória. 6ª ed. - São Paulo: Saraiva, 2009, p.73). 3. In casu, a recor-rente expressamente desistiu do recurso interposto, sendo que o subscritor do pedido de desistência possui poderes para desistir do recurso, em aten-dimento ao disposto no artigo 38, do CPC. 4. Pedido de desistência homo-logado em relação aos embargos de declaração opostos à fls. 574/579, na forma do art. 34, IX, do RISTJ, para que produza os efeitos legais. (DESIS nos EDcl no AgRg no Ag 1134674/GO, Primeira Turma, Ministro Relator Lu-iz Fux, Data do Julgamento 28/09/2010, DJe 20/10/2010)

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA DE MÉRITO. DE-CISÃO HOMOLOGATÓRIA DE CÁLCULO EM EXECUÇÃO. EQUIPARA-ÇÃO DEVIDA. ACORDO EXTRAJUDICIAL. RENÚNCIA IMPLÍCITA AO DI-REITO DE RECORRER. RECURSO ESPECIAL. FUNDAMENTO NÃO A-TACADO. 1. Na linha dos precedentes desta Corte, a decisão homologatória de cálcu-los se equipara à sentença de mérito para efeito do ajuizamento de ação rescisória, porquanto torna líquido o provimento concernente à ação cogniti-va, decidindo sobre o mérito do direito material. 2. No caso dos autos, con-tudo, as razões do recurso especial não impugnaram, porém, o fundamento do acórdão recorrido relativo à existência de acordo entre as partes por meio do qual o exequente teria, implicitamente, renunciado ao direito de im-pugnar a decisão rescindenda. 3. Nos termos da Súmula 283/STF, aplicável por analogia ao Recurso Es-pecial, "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange to-dos eles". 4. Recurso especial não conhecido. (REsp 1190094/SP, Terceira Turma, Ministro Relator Sidnei Beneti, Data do Julgamento 12/03/2013, DJe 26/03/2013) PROCESSO PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. HABEAS CORPUS. MINISTÉRIO PÚBLICO. PRINCÍPIOS INSTITUCIONAIS DA UNIDADE E DA INDIVISIBILIDADE. PRÉVIA RENÚNCIA AO DIREITO DE RECORRER. PRECLUSÃO LÓGICA. CARÊNCIA DE INTERESSE. RENÚNCIA. ATO IR-RETRATÁVEL. EMBARGOS NÃO CONHECIDOS. 1. Nos termos do art. 127, § 1º, da Constituição Federal de 1988, o Ministé-rio Público é instituição permanente, regida pelos princípios da unidade e da indivisibilidade, segundo os quais o Parquet é um só organismo, uma só u-nidade, e seus membros podem ser substituídos uns pelos outros, indepen-dentemente de fundamentação, sem que haja alteração subjetiva na relação jurídica processual. 2. Com a interposição de prévia petição por parte do ór-gão ministerial renunciando ao direito de recorrer, restou superada a possi-bilidade de o embargante interpor qualquer recurso, por carência de interes-se, porquanto consumada na espécie, a preclusão lógica. 3. Não há que se falar em retratação da renúncia do direito de recorrer, porquanto a renúncia é ato de disposição da faculdade de recorrer que possui efeitos preclusivos, sendo, portanto, irretratável. 4. Embargos não conhecidos. (EDcl no HV 227658/SP, Sexta Turma, Ministra Relatora Maria Thereza de Assis Moura, Data do Julgamento 03/05/2012, DJe 14/05/2012).

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AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. SENTENÇA. APELAÇÃO. DUPLO EFEITO. ATO INCOMPATÍVEL COM O DIREITO DE RECORRER. PRECLUSÃO. NECESSIDADE DE EXAME DE LEI LOCAL. SÚMULA Nº 280/STF. DEFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA Nº 284/STF. FUNDAMENTOS NÃO ATACADOS. SÚMULA Nº 283/STF. AU-SÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS Nº 211/STJ E 282/STF. 1. Ao cumprir o contido em sentença suspensa em face do recebimento da apelação no duplo efeito, a parte renuncia ao direito de recorrer. 2. Impõe-se a aplicação da Súmula nº 280/STF na hipótese em que o exame da con-trovérsia posta no recurso especial reclama, obrigatoriamente, o exame de lei local. 3. Aplica-se o óbice previsto na Súmula nº 284/STF na hipótese em que a deficiência da fundamentação do recurso não permite a exata com-preensão da controvérsia. 4. A ausência de impugnação dos fundamentos do acórdão recorrido, que são suficientes para mantê-lo, enseja o não co-nhecimento do recurso. Incidência da Súmula nº 283/STF. 5. O STJ tem en-tendimento de que o requisito do prequestionamento é satisfeito quando o Tribunal a quo emite juízo de valor a respeito da tese defendida no especial. Súmulas nº 211/STJ e 282/STF. 6. Agravo regimental desprovido”. (AgRg no Ag 1160527/RJ, Quarta Turma, Ministro Relator João Otávio de Noro-nha, Data do Julgamento 14/04/2011, DJe 03/05/2011). PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ADESÃO AO BENEFÍCIO FISCAL DA LEI Nº 11.941/2009. MANIFESTAÇÃO DE DESISTÊNCIA RE-CURSAL. ARTIGOS 501 E 502 DO CPC. ANUÊNCIA DA PARTE RECOR-RIDA DESNECESSÁRIA. IMPOSSIBILIDADE DE PRESUMIR-SE A RE-NÚNCIA AO DIREITO SOBRE O QUAL SE FUNDA A AÇÃO. 1. "O recorrente poderá, a qualquer tempo, sem a anuência do recorrido ou dos litisconsortes, desistir do recurso" (Art. 501 do CPC). 2. "A renúncia ao direito de recorrer independe da aceitação da outra parte" (art. 502 do CPC). 3. À luz da jurisprudência do STJ, a renúncia ao direito sobre o qual se funda a ação tem que ser expressa, não se admitindo que seja presumi-da em razão das disposições legais que regem o benefício fiscal da Lei nº 11.941/2009 (v.g.: REsp 1048669/RJ, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, julgado em 5/2/2009, DJe 30/3/2009; REsp 757.719/PR, Rel. Ministro José Delgado, Primeira Turma, julgado em 23/8/2005, DJ 19/9/2005 p. 227). 4. Agravo regimental não provido.”(AgRg na DESIS no REsp 1175613/SC, Primeira Turma, Ministro Relator Benedito Gonçalves, Data do Julgamento 01/06/2010, DJe 14/06/2010)

b) no caso de recurso adesivo, a parte que renunciou ao recurso principal poderá recorrer adesi-vamente? Os posicionamentos também se dividem. Entendemos que se a parte renunciou ao re-curso principal não poderá recorrer adesivamente, pois, trata-se de um ato incompatível com a vontade de recorrer. A menos que a parte tenha expressamente renunciado apenas ao recurso principal.

Relativamente à desistência, a mesma poderá ser formulada até o momento em que o relator for proferir o seu voto. Nos recursos dotados de sustentação oral, a desistência poderá se dar inclusive na própria sustentação.

Por derradeiro, tanto a renúncia quanto a desistência exigem que a procuração tenha a previsão de poderes especiais para o procurador constituído. Neste sentido, entendemos também compatível com o NCPC a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO ESPECIAL. 1) AÇÃO DECLARATÓRIA DE DOMÍNIO. ACÓR-DÃO QUE MANTEVE SENTENÇA QUE JULGOU IMPROCEDENTE, COM FUNDAMENTO NA PRESCRIÇÃO (CPC, art. 269, IV), AÇÃO DECLARA-TÓRIA DE DOMÍNIO E ANULAÇÃO DE REGISTROS, RELATIVAMENTE A TERRAS SITUADAS EM JACAREPAGUÁ E BARRA DA TIJUCA, ORIUN-DAS DE ANTIGAS FAZENDAS CUJOS TÍTULOS REMONTARIAM A 1594 E DOCUMENTOS DE SESMARIAS ATÉ A ATUALIDADE. CONCLUSÃO

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DA SENTENÇA DE TRANSCURSO DE MAIS DE TRINTA ANOS SEM AR-GUIÇÃO DE VÍCIO DE REGISTRO. MATÉRIA FÁTICA INSUPERÁVEL (SÚMULA 7/STJ). 2) DESISTÊNCIA MANIFESTADA POR ADVOGADO EM SENTIDO CONTRÁRIO AO MANDATO. DESCONSIDERAÇÃO. 3) INDI-CAÇÃO DE DISPOSITIVO LEGAL INADEQUADO A AMPARAR A TESE RECURSAL EXPOSTA. 4) AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. 5) RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO. 1. Remontando todas as matérias a julgamento que reconheceu a prescri-ção por não questionamento dos registros havidos há mais de trinta anos, tem-se, já de início, a inviabilidade do recurso especial, ante a flagrante ma-téria fática, que este Tribunal não é autorizado a rever, ante o disposto na Súmula 7/STJ. 2. Não se conferem efeitos ao pedido de desistência recursal protocolado por advogado em flagrante excesso de mandato e que visa a defender interesse dele próprio. 3. O recurso especial fundamentado na alí-nea "a" do permissivo constitucional deve indicar ofensa a dispositivo de lei federal capaz, ao menos em tese, de amparar a tese recursal apresentada, sob pena de não conhecimento do recurso. Aplicação analógica da Súmula 284/STF. 4. O prequestionamento, entendido como a necessidade de o te-ma objeto do recurso haver sido examinado pela decisão atacada, constitui exigência inafastável da própria previsão constitucional, ao tratar do recurso especial, impondo-se como um dos principais requisitos ao seu conheci-mento. Nos termos das 282 e 356/STF, não se admite o recurso especial que suscita tema não prequestionado pelo Tribunal de origem. 5. Recurso Especial a que se nega provimento. (REsp 1339279/RJ, Terceira Turma, Ministro Relator Sidnei Beneti, Data do Julgamento 19/02/2013, DJe 27/02/2013) PROCESSO CIVIL. RECURSOS. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PEDIDO DE DESISTÊNCIA. ADVOGADO SEM PODERES ESPECÍFICOS. REQUERIMENTO FORMULADO NA DEFESA DE INTERESSES PRÓ-PRIOS E NÃO DA PARTE. 1. Não se pode acolher o pedido de desistência recursal apresentado por advogado sem poderes específicos, sobretudo quando tal requerimento é formulado na defesa de interesse do próprio procurador e não no interesse da parte que ele deveria representar. 2. Agravo Regimental provido, com determinação de conversão do feito em recurso especial e posterior inclu-são em pauta de julgamento e com observação quanto a ulterior exame de todas as disposições do Recurso. (AgRg na DESIS no AResp 20401/RJ, Terceira Turma, Ministro Relator Sidnei Beneti, Data do Julgamento 14/08/2012, DJe 17/08/2012) AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO. PEDIDO DE DESISTÊNCIA DO RECURSO. SUBS-CRITOR DO PEDIDO NÃO POSSUI PODERES ESPECÍFICOS EM PRO-CURAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. ACÓRDÃO A QUO EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTE TRIBUNAL. SÚMULA 83/STJ. 1. O Superior Tribunal de Justiça considera inválido o pedido de desis-tência do recurso se o subscritor do pedido não possui poderes para tanto, seja em relação ao direito sobre o qual se funda a demanda, seja em relação ao próprio recurso. 2. A desistência do prazo recursal, efe-tivada pelo patrono dos assistentes da acusação – que consistiria na renúncia ao direito de apelar –, necessita da anuência expressa dos próprios assistentes, o que, in casu, não se efetivou, razão por que re-sulta inválida. 3. Importante salientar que não se deve desvirtuar os institutos jurídicos controvertidos nos presentes autos, porquanto, na desistência, existe a interposição prévia de um recurso; na renúncia, não há. 4. A ninguém é dado ignorar que a parte pode renunciar ou de-sistir do recurso ou da ação, sendo a renúncia e a desistência de cará-ter irrevogável. Mas a doutrina e a jurisprudência têm exigido cautela quando a renúncia parte do próprio réu, que deveria formalizá-la em termo próprio ou perante o próprio juízo. 5. Incidência da Súmula 83/STJ. 6. O agravo regimental não merece prosperar, porquanto as razões

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reunidas na insurgência são incapazes de infirmar o entendimento assenta-do na decisão agravada. 7. Agravo regimental improvido. (AgRg nos EDcl no REsp 1230482/CE, Sexta Turma, Ministro Relator Sebastião Reis Júnior, Data do Julgamento 29/05/2012, DJe 11/06/2012)

17.2.1.2. EXTRÍNSECOS:

a) Regularidade formal: a regularidade formal tem relação com requisitos formais específicos de admissibilidade dos recursos em espécie. Há recursos dotados de regularidade formal mais rigo-rosa que outros como, por exemplo, o agravo de instrumento, os recursos extraordinários, etc. A título de exemplo, no agravo de instrumento, o agravante, nos termos do art. 1.018, § 2º, do NCPC, deverá no prazo de três dias, a contar da interposição do recurso, comprovar na origem que o agravo de instrumento foi interposto perante o Tribunal respectivo, em se tratando de processos físicos. A não comprovação em três dias acarretará o não conhecimento do agravo de instrumento, desde que a parte seja intimada para sanar o vício, no prazo de 5 (cinco) dias, nos termos do parágrafo único do artigo 932 do NCPC.

b) Prazo: cada um dos recursos em espécie há um prazo específico de interposição. Em havendo litisconsortes com diferentes procuradores, que integrem escritórios de advocacia distintos (arti-go 229 do NCPC), o prazo será dobrado se ambos os litisconsortes tiverem interesse em recorrer, nos termos da Súmula 641 do Supremo Tribunal Federal, que entendemos compatível com o NCPC, verbis:

Não se conta em dobro o prazo para recorrer, quando só um dos litisconsor-tes haja sucumbido.

Em havendo a dissolução do litisconsórcio, os prazos passarão a ser contados de for-ma simples, e não dobrada. Neste sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que enten-demos ser compatível com o NCPC:

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RECURSO ESPECIAL INTEMPESTIVO. INEXISTÊNCIA DE LITISCONSÓRCIO. PRA-ZO EM DOBRO. ART. 191 DO CPC. NÃO APLICAÇÃO. SUCUMBÊNCIA APENAS DO AGRAVANTE. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. 1. O prazo em dobro para recorrer se aplica quando os litisconsortes, com diferentes procuradores, sucumbirem diante da decisão recorrida. Não ha-vendo interesse recursal por um dos litisconsortes, por não haver sucum-bência, não incide a regra do art. 191 do Código de Processo Civil. 2. Agra-vo Regimental improvido.(AgRg no AREsp 218330/PR, Terceira Turma, Minis-tro Relator Sidnei Beneti, Data do Julgamento 23/10/2012, DJe 09/11/2012)

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRA-VO DE INSTRUMENTO. EFEITOS INFRINGENTES. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DAS HIPÓTESES LEGAIS AUTORIZADORAS. ARTIGO 191 DO CPC. INAPLICABILIDADE. 1. A atribuição de efeitos modificativos somente é possível em situações ex-cepcionais, em que, sanada a omissão, contradição ou obscuridade, a alte-ração da decisão surja como consequência lógica e necessária. 2. A juris-prudência desta Corte é firme no sentido de que somente há prazo em do-bro para litisconsortes com diferentes procuradores quando todos possuam interesse em recorrer da decisão impugnada. 3. Embargos de declaração rejeitados. (EDcl no AgRg no Ag 1365486/SP, Terceira Turma, Ministro Re-lator Ricardo Villas Bôas Cueva, Data do Julgamento 06/12/2012, DJe 13/12/2012)

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. INTEMPESTIVIDADE. PRAZO EM DOBRO. LITISCONSÓRCIO PASSIVO. DESFAZIMENTO NO CURSO DO PRO-

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CESSO. ART. 191, CPC. INAPLICABILIDADE. POSICIONAMENTO JU-RISPRUDENCIAL. IDENTIDADE ENTRE A ORIENTAÇÃO SUFRAGADA PELA CORTE DE ORIGEM E DECISÃO MONOCRÁTICA E AQUELA TRI-LHADA POR ESTE TRIBUNAL SUPERIOR. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. Trata-se de recurso especial tido por intempestivo, haja vista não dispor o ora agravante de prazo em dobro para recorrer, eis que o litisconsórcio pas-sivo então existente desfez-se durante a tramitação do processo, afastando-se a incidência do art. 191 do Código de Processo Civil. Na hipótese de i-dentidade entre a orientação jurisprudencial sufragada pela Corte de ori-gem, e adotada pela decisão monocrática, e aquela trilhada por este Tribu-nal Superior, incide a Súmula 83/STJ. Agravo regimental improvido. (AgRg no Ag 491541/RJ, Terceira Turma, Ministro Relator Paulo Furtado (Des. convocado do TJBA, Data do Julgamento 23/06/2009, DJe 04/08/2009)

No caso de formação do litisconsórcio com diferentes procuradores, quando já em curso o prazo do recurso, a dobra de prazo atingirá apenas os dias faltantes para implementar o prazo simples. Entretanto, para que isso ocorra, a parte deverá informar, ainda dentro do prazo simples a constituição do novo procurador, de modo a evitar que profissionais se utilizem deste artifício como forma de postergar prazo. Neste sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que entendemos compatível com o NCPC:

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. PROCESSUAL CIVIL. LITISCONSÓR-CIO. CONSTITUIÇÃO DE NOVO PATRONO NO INTERREGNO DO PRA-ZO RECURSAL. ART. 191, DO CPC. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA ENTRE OS ACÓRDÃOS CONFRONTADOS. EMBARGOS DE DIVER-GÊNCIA NÃO CONHECIDOS. 1. O acórdão paradigma autoriza a incidência do art. 191, do CPC, quando mandatários diversos subscrevem a mesma peça, na medida em que hou-vera renúncia do mandatário comum a todos os litisconsortes, devidamente comprovada nos autos, por isso que o prazo recursal deveria ser contado em dobro. 2. A questão federal debatida nestes autos, todavia, se refere ao critério de contagem do prazo, quando é constituído novo patrono, durante o lapso temporal do recurso, por litisconsorte até então defendido por advo-gado comum a ambos os réus, concluindo o acórdão embargado que a do-bra só se dará do seguimento do prazo ainda não decorrido. 3. Ainda que discutam temas afins, não detêm os julgados a necessária semelhança fáti-ca para fins de caracterização da divergência pretendida. 4. Embargos de divergência não conhecidos. (EREsp 95242/RS, Segunda Seção, Ministro Relator Hélio Quaglia Barbosa, Data do Julgamento 25/04/2007, DJe 21/05/2007)

c) Preparo: o comprovante de pagamento do preparo deve acompanhar o recurso, sob pena de deserção. Via de regra, o preparo é requisito de admissibilidade. Entretanto, em algumas hipóte-ses ele é dispensado: quando for parte a Fazenda Pública e respectivas autarquias, o Ministério Público e os que gozam de isenção legal (artigo 1.007, § 1° do NCPC).

No caso de ausência de comprovação do recolhimento do preparo, inclusive porte de remessa e retorno – ao contrário do que ocorria no CPC/73 – não será aplicada imediatamente a pena de deserção. Nos termos do artigo 1.007, § 3º, do NCPC, o recorrente será intimado, na pessoa de seu advogado, para realizar o recolhimento em dobro, sob pena de deserção. Neste caso, será vedada a complementação, caso o recorrente recolha o preparo na segunda oportunidade que tiver de realizar a referida comprova-ção (artigo 1.007, § 4º, do NCPC).

No caso de preparo insuficiente – inclusive pagamento de porte de remessa e retorno –, conti-nua não sendo possível a decretação imediata da deserção, devendo ser oportunizada à parte a respecti-va complementação, no prazo de 5 (cinco) dias, nos termos do artigo 1.007, § 2º, do NCPC. Intimada a parte, se não houver a respectiva complementação, será aplicada a pena de deserção, que poderá ser

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relevada na hipótese do artigo 1.007, § 6º, do NCPC.

Seguindo o formalismo valorativo, o NCPC, no artigo 1.007, § 7°, dispõe que o equívoco no reco-lhimento da guia de custas não implicará na aplicação da deserção, cabendo ao relator, na hipótese de dúvida quanto ao recolhimento, intimar o recorrente para sanar o vício no prazo de 5 (cinco) dias.

Por fim, seguindo a jurisprudência consolidada das Cortes Superiores, é dispensado o recolhi-mento do porte de remessa e de retorno no processo em autos eletrônicos (artigo 1.007, § 3º, do NCPC).

17.2.2. Natureza da decisão que aprecia os requisitos de admissibilidade dos recursos: a deci-são que apreciar os requisitos de admissibilidade tem a natureza declaratória, com eficácia ex nunc. Ou seja, ainda que o recurso não seja conhecido, o trânsito em julgado ocorre após exaurido o prazo de interposição de recurso contra o último pronunciamento judicial. A Súmula 401 do Superior Tribunal de Justiça – compatível com o NCPC, tanto que vem expressa em seu artigo 975 –, que trata da ação rescisó-ria, traz implícito este entendimento respectivo, verbis:

O prazo decadencial da ação rescisória só se inicia quando não for cabível qualquer recurso do último pronunciamento judicial.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem aplicado a Súmula 401 também quando o recurso não é conhecido por intempestividade, a menos que haja erro grosseiro ou má-fé na contagem do prazo – entendimento esse que é compatível com o NCPC, à luz do artigo:

PROCESSUAL CIVIL. DEMANDA RESCISÓRIA. FLUÊNCIA DO PRAZO DECADENCIAL BIENAL. 1. A Súmula 401/STJ estabelece que "o prazo decadencial da ação rescisó-ria só se inicia quando não for cabível qualquer recurso do último pronunci-amento judicial". 2. O prazo decadencial bienal para aforamento da deman-da rescisória é contado do último pronunciamento judicial, ainda que este reconheça a intempestividade do recurso interposto. Novel entendimento da Corte Especial, julgado unanimemente: EDcl no AgRg nos EAg 1.218.222/MA, Rel. Min. Gilson Dipp, Corte Especial, DJe 15.2.2012. Agra-vo regimental provido. (AgRg no REsp 1311177/PE, Segunda Turma, Minis-tro Relator Humberto Martins, Data do Julgamento 25/09/2012, DJe 02/10/2012) PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. PRAZO DECADENCIAL. TERMO A QUO. 1. O prazo decadencial da ação rescisória só se inicia quando não for cabí-vel qualquer recurso do último pronunciamento judicial (Súmula 401/STJ). Deve-se tomar como marco inaugural para a contagem do prazo bienal a úl-tima decisão proferida nos autos, ainda que essa decisão negue seguimen-to a recurso pela ausência de algum dos requisitos formais, aí incluída a tempestividade (EDAgEAg 1.218.222/MA, Corte Especial, Rel. Min. Gilson Dipp, DJe 15.2.12). No caso, o recurso fora inicialmente admitido. Somente veio a ser inadmitido depois da oposição de aclaratórios pela parte contrá-ria. 2. Excepcionam-se situações nas quais é patente a má-fé do litigante, nos casos em que o inconformismo deu-se exclusivamente com o intuito malicioso de protrair o temo inicial para o ajuizamento da demanda rescisó-ria, fraudando o prazo peremptório estabelecido na lei processual, quando ficar configurado erro grosseiro (equívoco procedimental que contraria pre-visão legal explícita e carente de dubiedade, como, por exemplo, a interpo-sição de recurso manifestamente inadmissível). 3. A Corte de origem vis-lumbrou má-fé no fato de que, paralelamente à interposição do recurso ex-traordinário que seria inadmitido, o Fisco ajuizou ação rescisória em face do aresto que confirmou a intempestividade dos embargos de declaração. 4. Não se confunde equívoco técnico com má-fé, quando notória a oscilação doutrinária e jurisprudencial sobre a matéria. Nessa linha, a atuação do Fis-

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co denota nada mais do que a tentativa – ainda que malsucedida – de sal-vaguardar e antecipar os eventuais prejuízos que sofreria pela indefinição do entendimento pretoriano quanto ao marco inicial do prazo decadencial da ação rescisória. 5. Mesmo que a conduta adotada pela recorrente não seja a mais racional e coerente do ponto de vista processual, o ajuizamento a-trapalhado da primeira rescisória em momento inadequado não é suficiente para demonstrar má-fé na oposição dos intempestivos embargos de decla-ração e, em última instância, antecipar o dies a quo da segunda demanda rescisória, proposta depois do efetivo trânsito em julgado do feito originário. 6. Recurso especial provido. (REsp 740530/RJ, Segunda Turma, Ministro Relator Castro Meira, Data do Julgamento 06/09/2012, DJe 26/09/2012) AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO RES-CISÓRIA. PRAZO DECADENCIAL. ART. 495 DO CPC. TERMO INICIAL. TRÂNSITO EM JULGADO. ÚLTIMO PRONUNCIAMENTO JUDICIAL. SÚ-MULA Nº 401/STJ. 1. O prazo decadencial da ação rescisória só se inicia quando não for cabí-vel nenhum recurso do último pronunciamento judicial (Súmula nº 401/STJ). 2. Em caso de inadmissibilidade ou intempestividade do recurso interposto, inexistindo erro grosseiro ou má-fé da parte recorrente, considera-se que o prazo decadencial para a ação rescisória terá início somente após o julga-mento do recurso. 3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no Ag 1166142/RS, Quarta Turma, Ministro Relator João Otávio de Noronha, Data do Julgamento 02/08/2011, DJe 08/08/2011) PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC PELO ACÓRDÃO RECORRIDO. OMISSÃO NÃO CONFIGURADA. AÇÃO RESCISÓRIA. ART. 495, CPC. TERMO "A QUO" DO PRAZO DECADENCIAL. INOCOR-RÊNCIA DE TRÂNSITO EM JULGADO ANTES DO JULGAMENTO DE RECURSO INTEMPESTIVO, AUSENTE ERRO GROSSEIRO OU MÁ-FÉ. 1. A ação rescisória tem como termo "a quo" do biênio decadencial o dia seguinte ao trânsito em julgado da decisão rescindenda. 2. O prazo para a-juizamento da ação rescisória somente tem início com o trânsito em julgado material, ou seja, após o transcurso "in albis" do prazo para recorrer, mesmo que o último recurso interposto não tenha sido conhecido por intempestivi-dade, exceto configuração de erro grosseiro ou má-fé. (Precedentes: REsp nº 841592/DF, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 25.05.2009; REsp nº 441.252/CE, Rel. Min. GILSON DIPP, Corte Especial, DJ 18.12.06; AgRg nº REsp 958.333/ES, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJ 25.02.08). 3. Na hipótese dos autos, ao reconhecer a intempestividade, o acórdão recorrido não assentou ter havido má-fé ou erro grosseiro por parte do recorrente, não podendo estes ser presumidos. O termo "a quo" para o ajuizamento da rescisória deve, pois, ser contado do trânsito em julgado da decisão que re-conheceu a intempestividade do recurso interposto. 4. "In casu", o reconhe-cimento da intempestividade da ação rescisória arrastou consigo as demais teses que eventualmente conduziriam ao provimento da demanda. 5. O art. 535 do CPC resta incólume se o Tribunal de origem reconhece questão pre-judicial à análise dos demais argumentos sustentados nos autos. 6. Como é de sabença, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argu-mentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão. 7. Recurso especial a que se dá provimento para determinar o prosseguimento da ação rescisória na instân-cia "a quo". REsp 1186694/DF, Primeira Turma, Ministro Relator Luiz Fux, Data do Julgamento 03/08/2010, DJe 17/08/2010)

17.3 EFEITOS DOS RECURSOS

17. 3.1. Efeito devolutivo: o efeito devolutivo decorre do princípio do dispositivo. Isto significa dizer que o tribunal é obrigado a apreciar apenas as matérias que o recorrente sub-

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meter a sua apreciação. A expressão latina “tantum devolutum quantum apellatum” é utiliza-da usualmente para defini-lo. Entretanto, o efeito devolutivo, no recurso de apelação, sobre diversos temperamentos, previstos nos parágrafos do art. 1.013 do NCPC, que excepcionam o princípio do dispositivo, verbis:

Art. 1.013. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria im-pugnada. § 1

o Serão, porém, objeto de apreciação e julgamento pelo tribunal todas as

questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, desde que relativas ao capítulo impugnado. § 2

o Quando o pedido ou a defesa tiver mais de um fundamento e o juiz

acolher apenas um deles, a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento dos demais. § 3

o Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal

deve decidir desde logo o mérito quando: I - reformar sentença fundada no art. 485; II - decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limi-tes do pedido ou da causa de pedir; III - constatar a omissão no exame de um dos pedidos, hipótese em que po-derá julgá-lo; IV - decretar a nulidade de sentença por falta de fundamentação. § 4

o Quando reformar sentença que reconheça a decadência ou a prescri-

ção, o tribunal, se possível, julgará o mérito, examinando as demais ques-tões, sem determinar o retorno do processo ao juízo de primeiro grau. § 5

o O capítulo da sentença que confirma, concede ou revoga a tutela provi-

sória é impugnável na apelação.

a) ficam abrangidas no âmbito do efeito devolutivo, todas as questões suscitadas e discutidas, a-inda que a sentença não as tenha apreciado por inteiro, desde que relativas ao capítulo impug-nado (§ 1°do artigo 1.013).

b) todos os fundamentos suscitados pelas partes ficam abrangidos no âmbito do efeito devoluti-vo, embora o magistrado não seja obrigado a se pronunciar sobre os mesmos. Não há que se fa-lar em violação ao princípio do duplo grau de jurisdição, considerando a expressa previsão dessa possibilidade respectiva (§ 2° do artigo 1.013).

c) se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando: c.1) reformar sentença fundada no artigo 485 (extinção sem resolução do méri-to); c.2) decretar a nulidade de sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa de pedir; c.3) constatar a omissão no exame de um dos pedidos, hipótese em que pode-rá julgá-lo; c.4) decretar a nulidade da sentença por falta de fundamentação (§ 3° do artigo 1.013).

d) quando reformar sentença que reconheça a decadência ou a prescrição, o tribunal, se possível, julgará o mérito, examinando as demais questões, sem determinar o retorno do processo ao juí-zo de primeiro grau (§ 4° do artigo 1.013).

As hipóteses previstas nas letras “c” e “d” contemplam a denominada teoria da causa madura, que veio ampliada no NCPC, positivando a jurisprudência já consolidada das Cortes Superiores (Vide: AgRg no REsp 1083012/RS, Segunda Turma, Ministro Relator Humberto Martins, Data do Julgamento 02/06/2009, DJe 15/06/2009). Estas hipóteses estão em consonância com o princípio da duração do processo dentro de um prazo razoável com direito fundamental (art. 5°, inc. LXXVIII, da CF), não havendo que se falar em inconstitucionalidade do mesmo em razão do princípio do duplo grau de jurisdição, até porque inexiste hierarquia entre princípios.

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17.3.2. Efeito suspensivo: nos recursos dotados deste efeito, a interposição do recurso acarreta a suspensão dos efeitos da decisão. Há recursos que, como regra, são dotados deste efeito respectivo (v.g. apelação, nos termos do artigo 1.012 do NCPC). O não efeito suspensivo é exceção na apelação (§ 1° do artigo 1.012). Outros, não o tem (v.g. agravo de instrumento, recurso especial e recurso extraordinário, de acordo com a previsão do artigo 995 do NCPC).

17.3.3. Efeito translativo: o efeito devolutivo do recurso tem sua gênese no princípio do disposi-tivo, não podendo o órgão ad quem julgar além do que foi pedido na esfera recursal, aplicando-se no âmbito recursal os artigos 128 e 460 do Código de Processo Civil.

Há casos, entretanto que o sistema recursal autoriza o órgão ad quem a julgar fora do que consta das razões ou contrarrazões recursais, não se podendo falar em julgamento citra, extra ou ultra petita. Isto ocorre normalmente com o exame das questões de ordem pública, que devem ser conhecidas de ofício pelo juiz, a cujo respeito não se opera a preclusão (v.g. o exame das condições da ação – art. 485, § 3° do CPC – e também o exame dos pressupostos processuais – art. 337, § 5° do CPC) . Cabe mais uma vez ressaltar, que em atenção ao previsto no artigo 10 do NCPC, antes de conhecer de ofício a respeito dessas matérias respectivas, o magistrado deverá intimar as partes.

O efeito translativo ocorre nos recursos ordinários (apelação, agravo interno, agravo de instru-mento, embargos de declaração e recurso ordinário constitucional) e não nos recursos excepcionais (extraordinário, especial e embargos de divergência) porque seus regimes estão no texto constitucional que diz serem cabíveis das causas decididas pelos tribunais inferiores. Caso o tribunal não tenha se mani-festado sobre questão de ordem pública, o acórdão somente poderá ser impugnado por ação autônoma (ação rescisória), já que incidem na hipótese as Súmulas 282 e 356 do STF – compatíveis com o NCPC –, que exigem o prequestionamento da questão constitucional ou federal suscitada, para que seja conheci-do o recurso constitucional.

Consequência análoga à provocada pelo efeito translativo do recurso ocorre com o reexame ne-cessário pelo tribunal das sentenças sujeitas ao duplo grau obrigatório (artigo 496 do NCPC). Também aqui não se pode falar em efeito devolutivo da remessa necessária, porque se está diante de manifesta-ção do princípio inquisitório. O que existe, na verdade, é que a eficácia plena da sentença, nos casos do art. 496 do NCPC, fica condicionada ao seu reexame pelo tribunal ad quem. A sentença como um todo é que fica submetida ao reexame pelo tribunal ad quem, de sorte que é lícito ao tribunal modificar a sen-tença, reformando-a ou anulando-a, total ou parcialmente.

17.3.4. Efeito expansivo: o julgamento do recurso pode ensejar decisão mais abrangente do que o reexame da matéria impugnada, que compõe o mérito do recurso. Neste caso, haverá o efeito expansi-vo, que poderá ser objetivo ou subjetivo, interno ou externo (In: Nelson Nery Júnior, Teoria Geral dos Recursos, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004).

Há o efeito expansivo objetivo interno quando o tribunal, ao apreciar apelação interposta contra sentença de mérito, por exemplo, dá-lhe provimento e acolhe preliminar de litispendência. Esta decisão sobre a questão preliminar estende-se por toda a sentença, invalidando-a, pois o resultado efetivo do julgamento da apelação é a extinção do processo sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, V, do NCPC.

Quando o efeito objetivo se dá em relação ao mesmo impugnado, afirma-se que o mesmo é in-terno.

O efeito expansivo objetivo externo verifica-se quando é provido o recurso de agravo de instru-mento. Como o recurso de agravo de instrumento não tem efeito suspensivo, ainda que interposto, não paralisa o processo. Provido o agravo de instrumento pelo tribunal ad quem, todos os atos processuais

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praticados depois de sua interposição, que com a nova decisão sejam incompatíveis, são, ipso facto, considerados sem efeito, devendo ser renovados.

O mesmo se pode dizer quanto aos atos praticados no curso da execução provisória da sentença, caso seja provido o recurso recebido apenas no efeito devolutivo (artigo 520, II, do NCPC), atos esses que ficam sem efeito conforme expressa determinação desse mesmo dispositivo legal.

Quando o efeito expansivo se dá relativamente a outros atos praticados no processo, e não ape-nas ao mesmo ato impugnado, diz-se que se trata de efeito expansivo externo.

O objeto da extensão dos efeitos do julgamento do recurso pode ocorrer também do ponto de vista subjetivo. É o caso, por exemplo, do recurso interposto por apenas um dos litisconsortes sob regime da unitariedade. O art. 1.005 do NCPC refere que o recurso de um dos litisconsortes aproveita aos de-mais, salvo quando distintos ou opostos seus interesses.

17.3.5. Efeito substitutivo: nos termos do art. 1.008 do NCPC, a decisão que apreciar o mérito do recurso substitui a decisão recorrida, tanto no caso de manutenção quanto de reforma, em se tratando de error in judicando. Não sendo conhecido o recurso, não há que se falar em efeito substitutivo. No caso de error in procedendo do juiz, a substitutividade apenas se operará se negado provimento ao re-curso. Se for dado provimento, haverá a anulação da decisão e, consequentemente, não poderá substitu-í-la.

A substituição pode ser total ou parcial., ocorrendo esta quando a impugnação é parcial ou quando o tribunal se limita a conhecer parcialmente do recurso. Somente quanto à parte conhecida é que haverá o efeito substitutivo do recurso. No mais, permanece íntegra a parte da decisão que não sofreu impugnação ou cuja parte do recurso não foi conhecida pelo tribunal.

17.3.6. Efeito ativo: a tutela provisória pode ocorrer tanto no primeiro grau de jurisdição, quanto no âmbito recursal. O NCPC – contrariamente ao que previa o CPC/73 – previu no artigo 932, II, a possibi-lidade de concessão de tutela provisória em todos os recursos cíveis, considerando que o Capítulo II, do Título I, do Livro III é geral a todos os recursos cíveis. A decisão que deferir ou indeferir pedido de efeito ativo pode ser atacada através do recurso de agravo interno, nos termos do artigo 1.021 do NCPC. Trata-se de mais uma novidade do NCPC em relação ao CPC/73, pois na sistemática revogada este provimento era irrecorrível.

Problemática que certamente será enfrentada, diz respeito aos recursos interpostos perante ór-gão jurisdicional diverso daquele que é competente para apreciar o mérito do recurso (v.g. apelação, recurso especial e recurso extraordinário). Como o envio destes recursos não é imediato ao órgão jurisdi-cional competente para apreciá-los, e como a competência para apreciar o pedido de tutela provisória é destes órgãos respectivos, entendemos que se deva aplicar analogicamente o disposto nos artigos 1.012, § 3° e 1.029, § 5°, do NCPC. Relativamente aos Recursos Especial e Extraordinário, como foi restaurado o duplo exame da admissibilidade destes dois recursos pela Lei 13.256 de 4 de fevereiro de 2016, enten-demos que serão aplicadas as Súmulas 634 e 635 do Supremo Tribunal Federal.

17.4 EMBARGOS DE DECLARAÇÃO

17.4.1. Cabimento: as hipóteses de cabimento do recurso de embargos de declaração estão pre-vistas no artigo 1.022 do NCPC, que positiva algumas novidades em relação ao CPC/73. De acordo com o referido artigo cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para: a) esclarecer obscu-ridade ou eliminar contradição; b) suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; c) corrigir erro material. De acordo com o parágrafo único, considera-se omissa a decisão que deixar de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ao caso sob julgamento e também se incorrer nas

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hipóteses previstas no artigo 489, § 1º, do NCPC.

O NCPC terminou com velhas discussões travadas durante a vigência do CPC/73. A primeira delas, de que à luz do NCPC, qualquer decisão – mesmo as monocráticas e interlocutórias – passa a ser embar-gável, o que já era reconhecido pela jurisprudência. A segunda, também seguindo a linha da jurisprudên-cia dominante, de que os embargos de declaração se prestam para corrigir erro material.

O parágrafo único do artigo 1.022 traz duas novidades. Evidentemente que, caso não sejam sa-nadas as omissões previstas, que caberá a interposição de recurso, seja pela violação ao artigo 1.022, ou, pela alegação de nulidade da decisão.

Não é demasiado referir, que, nos termos do artigo 48 da Lei dos Juizados Especiais Cíveis, os embargos de declaração podem também se interpostos com a finalidade de sanar uma dúvida da deci-são. Rigorosamente, os embargos de declaração não modificam a decisão embargada.

17.4.2. Decisões embargáveis: consoante já mencionado, independentemente da natureza, qualquer decisão pode ser atacada através do recurso de embargos de declaração, desde que preenchi-das as hipóteses de cabimentos previstas no artigo 1.022, caput, do NCPC.

17.4.3. Efeito modificativo: Também é denominado de efeito infringente. Em casos excepcionais, o magistrado poderá modificar a decisão embargada ao julgar os embargos de declaração. Isto apenas será possível se a modificação da decisão se der em decorrência da sanação de uma omissão, contradi-ção ou obscuridade. Se não houver omissão, contradição ou obscuridade, não será possível agregar efeito modificativo aos declaratórios. Neste sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO, CON-TRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. - Ausentes os vícios do art. 535 do CPC, rejeitam-se os embargos de declaração. - A atribuição de efeitos infringentes é possível apenas em situações excepcionais, em que sanada a omissão, contradição ou obscuridade, a alteração da decisão surja como consequência necessária. - Embargos de declaração no agravo de instrumento rejeitados. (EDcl no AgRg no Ag 1355929, Relator(a) Minis-tra NANCY ANDRIGHI, 04.05.2012)

Os embargos de declaração com efeito infringente estão positivados no artigo 1.023, § 2º, do NCPC.

17.4.4. Ausência de contrarrazões: os embargos declaratórios, via de regra, não têm contrarra-zões. A parte contrária não será ouvida. Todavia, se o magistrado entender de agregar efeito infringente ao recurso, obrigatoriamente deverá ouvir a parte contrária, sob pena de violar os princípios do contradi-tório e da ampla defesa. O NCPC, consolidando a jurisprudência das Cortes Superiores (EDcl nos EDcl no RMS , Relator(a) Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, 03.10.2011), positivou a necessidade de ouvida da parte contrária nesta hipótese, consoante dispõe o artigo 1.023, § 2º.

17.4.5. Requisitos de admissibilidade: O recurso de embargos de declaração deverá preencher os requisitos de admissibilidade.

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17.4.5.1. INTRÍNSECOS

a) Cabimento: são cabíveis contra qualquer decisão judicial nas hipóteses previstas no artigo 1.022.

b) Legitimação para recorrer: tem legitimação para interpor o recurso de embargos de declara-ção, as pessoas elencadas no artigo 996 do NCPC.

c) Interesse em recorrer: tem relação com o binômio necessidade/utilidade, que nada mais é do que a sucumbência. Ou seja, rigorosamente, para que a parte tenha interesse em interpor qual-quer recurso, deverá ter tido algum prejuízo. No caso dos embargos de declaração, esse prejuízo se caracteriza pelo preenchimento das hipóteses de cabimentos previstas no artigo 1.022 do NCPC.

d) Ausência de fato extintivo ou impeditivo do direito de recorrer: Como exemplo de fato extinti-vo, temos a renúncia ao direito de recorrer. Já, de fato impeditivo, a desistência. A parte apenas renuncia a recurso ainda não interposto e desiste de recurso já interposto. Evidentemente, que tanto a renúncia quanto a desistência podem ocorrer também nos embargos de declaração.

17.4.5.2. EXTRÍNSECOS

a) Regularidade formal: os embargos de declaração são dirigidos no âmbito do primeiro grau, ao magistrado prolator da decisão ou, no segundo grau, ao relator do recurso.

b) Prazo: O prazo para a interposição de embargos de declaração é de 5 (cinco) dias (artigo 1.023 do NCPC). Em havendo litisconsortes com diferentes procuradores, que integrem escritórios de advocacia distintos, o prazo será dobrado, se ambos tiverem interesse em recorrer (Súmula 641 do STF), nos termos do artigo 1.023, § 1º, do NCPC.

c) Preparo: os embargos de declaração não têm preparo, nos termos do artigo 1.023, caput, do NCPC.

17.4.6. Interrupção do prazo para interposição de outros recursos e utilização dos embargos de declaração com a finalidade procrastinatória: Os embargos de declaração interrompem o prazo de interposição de outros recursos, nos termos do artigo 1.026 do NCPC. Como há a interrupção do prazo de interposição de outros recursos, a parte deverá aguardar o julgamento dos declaratórios para então interpor o recurso com a finalidade de modificar a decisão. Caso o recurso seja interposto antes do jul-gamento dos embargos de declaração, o NCPC – em posição oposta a adotada pela Súmula 418 do Supe-rior Tribunal de Justiça – positivou que o recurso não é intempestivo, dispensando a necessidade de ratificação de eventual recurso já interposto (artigo 1.024, § 5º). Entendemos revogada com essa dispo-sição a referida Súmula. Na verdade, o NCPC adotou o entendimento do Supremo Tribunal Federal que entende por tempestivo o recurso, ainda que interposto antes do prazo, verbis:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO INTERPOSTO ANTES DA PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO. CONHECIMENTO. INSTRUMENTALISMO PROCESSUAL. PRECLUSÃO QUE NÃO PODE PREJUDICAR A PARTE QUE CONTRIBUI PARA A CELERIDADE DO PROCESSO. BOA-FÉ EXI-GIDA DO ESTADO-JUIZ. DOUTRINA. RECENTE JURISPRUDÊNCIA DO PLENÁRIO. MÉRITO. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO E CONTRADIÇÃO. I-NEXISTÊNCIA. RECURSO CONHECIDO E REJEITADO. 1. A doutrina moderna ressalta o advento da fase instrumentalista do Direito Pro-cessual, ante a necessidade de interpretar os seus institutos sempre do modo mais favorável ao acesso à justiça (art. 5º, XXXV, CRFB) e à efetividade dos direitos materiais (OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. O formalismo-valorativo no confronto com o formalismo excessivo. In: Revista de Processo, São Paulo: RT, n.º 137, p. 7-31, 2006; DINAMAR-

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CO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 14ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009; BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetivi-dade do Processo e Técnica Processual. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 2010). 2. “A forma, se imposta rigidamente, sem dúvidas conduz ao pe-rigo do arbítrio das leis, nos moldes do velho brocardo dura lex, sed lex” (BODART, Bruno Vinícius Da Rós. Simplificação e adaptabilidade no anteprojeto do novo CPC brasileiro. In: O Novo Processo Civil Bra-sileiro – Direito em Expectativa. Org. Luiz Fux. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 76). 3. As preclusões se destinam a permitir o regular e célere desenvolvimento do feito, por isso que não é possível penalizar a parte que age de boa-fé e contribui para o progresso da marcha processual com o não conhecimento do recurso, arriscando conferir o direito à parte que não faz jus em razão de um purismo formal injustificado. 4. O formalismo desmesurado ignora a boa-fé processual que se exige de todos os sujeitos do processo, inclusive, e com maior razão, do Esta-do-Juiz, bem como se afasta da visão neo constitucionalista do direito, cuja teoria proscreve o legicentrismo e o formalismo interpretativo na análise do sistema jurídico, desenvolvendo mecanismos para a efetivi-dade dos princípios constitucionais que abarcam os valores mais ca-ros à nossa sociedade (COMANDUCCI, Paolo. Formas de (ne-o)constitucionalismo: unanálisismetateórico. Trad. Miguel Carbonell. In: “I-sonomía. Revista de Teoría y FilosofíadelDerecho”, nº 16, 2002). 5. O Supre-mo Tribunal Federal, recentemente, sob o influxo do instrumentalismo, modi-ficou a sua jurisprudência para permitir a comprovação posterior de tempes-tividade do Recurso Extraordinário, quando reconhecida a sua extempora-neidade em virtude de feriados locais ou de suspensão de expediente foren-se no Tribunal a quo (RE nº 626.358-AgR/MG, rel. Min. Cezar Peluso, Tribunal Pleno, julg. 22/03/2012). 6. In casu: (i) os embargos de declaração foram o-postos, mediante fac-símile, em 13/06/2011, sendo que o acórdão recorrido somente veio a ser publicado em 01/07/2011; (ii) o paciente foi denunciado pela suposta prática do crime do art. 12 da Lei nº 6.368/79, em razão do ale-gado comércio de 2.110 g (dois mil cento e dez gramas) de cocaína; (iii) no acórdão embargado, a Turma reconheceu a legalidade do decreto prisional expedido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão em face do paci-ente, para assegurar a aplicação da lei penal, em razão de se tratar de réu e-vadido do distrito da culpa, e para garantia da ordem pública; (iv) alega o embargante que houve omissão, porquanto não teria sido analisado o ex-cesso de prazo para a instrução processual, assim como contradição, por não ter sido considerado que à época dos fatos não estavam em vigor a Lei nº 11.343/06 e a Lei nº 11.464/07. 7. O recurso merece conhecimento, na me-dida em que a parte, diligente, opôs os embargos de declaração mesmo an-tes da publicação do acórdão, contribuindo para a celeridade processual. 8. No mérito, os embargos devem ser rejeitados, pois o excesso de prazo não foi alegado na exordial nem apreciado pelo Superior Tribunal de Justiça, a-lém do que a Lei nº 11.343/06 e a Lei nº 11.464/07 em nada interferem no jul-gamento, visto que a prisão foi decretada com base nos requisitos do art. 312 do CPP identificados concretamente, e não com base na vedação abstra-ta à liberdade provisória, prevista no art. 44 da Lei de Drogas de 2006. 9. Em-bargos de declaração conhecidos e rejeitados. (HC 101132, Rel. Min. Luiz Fux, 22.05.2012)

Se forem considerados procrastinatórios os embargos de declaração, o juiz ou tribunal, em deci-

são fundamentada, condenará o embargante a pagar ao embargado multa não excedente a 2% sobre o valor atualizado da causa (artigo 1.026, § 2º). Em havendo a reiteração dos embargos de declaração procrastinatórios, a multa será elevada para até 10% sobre o valor atualizado da causa, e a interposição de qualquer recurso ficará condicionada ao depósito prévio do valor da multa, à exceção da Fazenda Pública e do beneficiário de gratuidade da justiça, que a recolherão ao final (artigo 1.026, § 3º). Não serão admitidos novos embargos se os dois anteriores forem considerados procrastinatórios (artigo 1.026, § 4º).

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17.4.7. Efeito suspensivo: os embargos de declaração não têm efeito suspensivo (artigo 1.026, caput). Todavia, poderá ser agregado efeito suspensivo aos mesmos se for demonstrada a probabilidade de provimento do recurso ou, sendo relevante a fundamentação, se houver risco de dano grave ou de difícil reparação (artigo 1.026, § 1º).

17.5 AGRAVO DE INSTRUMENTO

17.5.1. Cabimento: o artigo 1.015 do NCPC taxativamente prevê as hipóteses de cabimento do agravo de instrumento. Ou seja, contrariamente ao disposto no CPC/73 não é qualquer interlocutória que poderá ser atacada através do agravo de instrumento, mas apenas aquelas expressamente previstas no artigo 1.015 do NCPC e em outros dispositivos legais (v.g. artigo 356, § 5º, do NCPC).

17.5.2. Requisitos de admissibilidade: o recurso de agravo de instrumento deverá preencher os requisitos de admissibilidade, tanto intrínsecos quanto extrínsecos. No tocante ao cabimento, as hipóte-ses de interposição do agravo de instrumento passam a ser restritas no NCPC e estão previstas no artigo 1.015 e em outros dispositivos legais deste diploma legal respectivo (v.g. artigo 356, § 5º). As demais decisões interlocutórias – tendo em vista a não previsão na nova sistemática do agravo retido – passam a ser atacadas através do recurso de apelação, de acordo com o artigo 1.009, § 1º, do NCPC. A legitimação para a interposição do agravo de instrumento é a mesma prevista para os demais recursos (artigo 996). O mesmo ocorre no tocante ao interesse em recorrer. A renúncia e a desistência do agravo de instrumento também se regem de acordo com os artigos 998 e 999 do NCPC.

Relativamente à regularidade formal, o recurso de agravo de instrumento tem requisitos de ad-missibilidade específicos. O primeiro deles diz respeito ao traslado de peças, tanto obrigatórias (previstas no artigo 1.017, I), quanto facultativas, que o agravante entender que sejam úteis à compreensão do processo. O NCPC acrescentou, em relação ao CPC/73, peças cujo traslado passa a ser obrigatório, verbis: petição inicial, contestação, petição que ensejou a decisão agravada, decisão agravada, certidão da inti-mação ou outro documento que comprove a tempestividade e as procurações outorgadas aos advoga-dos do agravante e do agravado. A não juntada de qualquer destas peças – ou mesmo de nenhuma delas – não acarreta o não conhecimento imediato do agravo de instrumento, devendo ser oportunizada a sanação do vício no prazo de 5 (cinco) dias, de acordo com o artigo 932, parágrafo único, do NCPC. Rela-tivamente ao traslado de peças obrigatórias, o NCPC, privilegiando o formalismo valorativo, no caso de ausência de qualquer dos documentos, cujo traslado é obrigatório, dispensa a juntada de certidão, bas-tando a declaração de inexistência de qualquer dos documentos referidos no inciso I do artigo 1.017 do NCPC, que deverá ser feita pelo agravante, sob pena de responsabilidade pessoal. O segundo dos requisi-tos de admissibilidade específicos para os processos físicos (e não para os eletrônicos) é a juntada do comprovante de interposição na origem do agravo de instrumento (petição de agravo de instrumento com a prova do protocolo), assim como a relação dos documentos que instruíram o recurso (artigo 1.018 do NCPC).

O não atendimento desse requisito nos processos físicos deve ser arguido pelo agravado, não podendo ser pronunciado de ofício, e também impede o conhecimento do recurso de agravo de instru-mento. Entretanto, este requisito de admissibilidade não pode ser pronunciado ex officio, necessitando ser arguida a sua ausência pelo agravado. No tocante à tempestividade, o prazo para a interposição do agravo de instrumento passou a ser de 15 (quinze) dias no NCPC. Em havendo litisconsortes com diferen-tes procuradores, que integrem distintos escritórios de advocacia, o prazo será dobrado se ambos tive-rem interesse em recorrer, nos termos da Súmula 641 do Supremo Tribunal Federal. Por fim, o último requisito de admissibilidade é o preparo, que segue as regras do artigo 1.007 do NCPC.

17.5.3. Efeitos do agravo de instrumento: o agravo de instrumento é dotado do efeito devoluti-vo, considerando que há a devolução das matérias para serem conhecidas pelo tribunal ad quem. Como

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regra, não é dotado de efeito suspensivo. Entretanto, é possível a concessão de efeito suspensivo, desde que requerido pelo agravante, nos termos do artigo 995 do NCPC. Do mesmo modo, será possível a concessão de tutela provisória, nos termos do artigo 932, II, do NCPC. Além desses efeitos, também podem ocorrer no agravo de instrumento, os efeitos expansivo, substitutivo e translativo, explicitados supra.

17.5.4. Processamento do agravo de instrumento: o agravo de instrumento, via de regra, é in-terposto perante o tribunal competente para apreciar o mérito do recurso. Entretanto, há outras formas de interposição, previstas no § 2º do artigo 1.017 do NCPC. Por fim, o relator do agravo de instrumento poderá prolatar diversas modalidades de despachos, consoante o disposto no artigo 932 do NCPC. Não é demasiado referir que, via de regra, o agravo de instrumento é um recurso que não tem sustentação oral, sendo possível apenas a apresentação de memoriais no prazo regimental. Todavia, o NCPC inovou no artigo 937, VIII, prevendo a possibilidade de sustentação oral nos agravos interpostos contra decisões interlocutórias que versem sobre tutelas provisórias de urgência ou de evidência.

17.6 APELAÇÃO

17.6.1. Cabimento: A apelação tem cabimento contra sentenças terminativas e definitivas (arti-gos 1009, 485 e 487 do NCPC).

17.6.2. Requisitos de admissibilidade: o recurso de apelação deverá preencher os requisitos de admissibilidade intrínsecos e extrínsecos, já mencionados.

17.6.3. Efeitos da apelação: A apelação, via de regra, é dotada do duplo efeito (devolutivo e sus-pensivo). Todavia, nas hipóteses mencionadas no artigo 1.012, § 1º, do NCPC, a apelação terá apenas o efeito devolutivo. Este dispositivo legal praticamente reproduz o parágrafo único do artigo 520 do CPC/73, trazendo diferenças substanciais nos incisos V e VI (V - sentença que confirma, concede ou revo-ga tutela provisória e VI - decreta a interdição). Entretanto, o apelante poderá requerer, nos termos do artigo 1.012, § 3º, do NCPC, que seja agregado efeito suspensivo ao recurso, através de requerimento dirigido ao “I - tribunal, no período compreendido entre a interposição da apelação e sua distribuição, ficando o relator designado prevento para julgá-la; II - relator, se já distribuída a apelação”.

Evidentemente que, nos casos de processos físicos, enquanto o processo não tiver chegado ao tribunal, o requerimento de efeito suspensivo deverá estar instruído com o traslado de peças necessário à compreensão do recurso. Os requisitos para a concessão do efeito suspensivo estão previstos no § 4º do artigo 1.012 do NCPC, verbis: “se o apelante demonstrar a probabilidade de provimento do recurso ou se, sendo relevante a fundamentação, houver risco de dano grave ou de difícil reparação”.

O efeito devolutivo, por sua vez, está previsto no artigo 1.013 do NCPC, já comentado por ocasi-ão da análise da teoria geral dos recursos, acima explicitada.

Além dos efeitos devolutivo e suspensivo, também os efeitos substitutivo, translativo, expansivo e ativo podem ocorrer em sede de apelação, também já analisados.

17.6.4. Fato novo: nos termos do artigo 1.014 do NCPC, “as questões de fato, não propostas no juízo inferior, poderão ser suscitadas na apelação, se a parte provar que deixou de fazê-lo por motivo de força maior”.

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De acordo com o dispositivo legal acima transcrito, é possível a arguição de fato novo em sede de apelação. Todavia, fato novo não é um fato ocorrido após a sentença. Na verdade, o “fato novo” que pode ser arguido em sede de apelação, é um fato que é “velho” e que deixou de ser provado seja por que a parte o desconhecia, ou por que estava impedida de fazê-lo (v.g. por dever de sigilo).

Admitida a arguição de fato novo, indaga-se: como será feita a produção da prova do mesmo, considerando-se que o processo encontra-se no tribunal? Recomenda-se a aplicação analógica do artigo 972 do NCPC, referente à ação rescisória (cuja competência para processá-la e julgá-la também é de tribunal).

17.6.5. Processamento: a apelação é interposta perante o juízo a quo, que dará vistas ao apelado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias (artigo 1.010 do NCPC). Apresentada a res-posta, de acordo com o § 3º deste mesmo dispositivo legal, os autos serão remetidos ao tribunal, inde-pendentemente de juízo de admissibilidade. Ou seja, não há mais que se falar do duplo exame da admis-sibilidade em sede de apelação, como ocorria no CPC/73. Após distribuída a apelação perante o tribunal competente para julgá-la, será sorteado um relator que poderá adotar as possibilidade de despacho previstas no artigo 932 do NCPC.

Se o relator entender não ser o caso de decisão monocrática, o recurso de apelação será remeti-do para um revisor. É possível tanto a sustentação oral quanto a apresentação de memoriais no prazo regimental.

17.7 AGRAVO INTERNO

17.7.1. Cabimento: de qualquer decisão monocrática proferida por relator, caberá agravo interno (artigo 1.021 NCPC). O NCPC inovou em relação ao CPC/73, ampliando as possibilidades de interposição do agravo interno.

17.7.2. Prazo: o prazo de interposição do agravo interno passou a ser de 15 (quinze) dias no NCPC.

17.7.3. Fundamentação da decisão que julgar o agravo interno: no agravo interno, o relator não poderá se limitar a reproduzir fundamentos da decisão agravada para negar provimento ao recurso (artigo 1.021, § 3º). Em razão dessa disposição, certamente as decisões monocráticas passarão a ser exceção nos tribunais.

17.7.4. Fundamentos do agravo interno: o agravante deverá impugnar especificamente os fun-damentos da decisão agravada, não podendo se restringir a mera colagem de outras peças do processo (artigo 1.021, § 1º). Em razão da adoção do princípio do formalismo valorativo, certamente, em ocorren-do a “colagem de textos de peças processuais”, os magistrados intimarão o recorrente para sanar a irregularidade no prazo de 5 (cinco) dias, tal como prevê o artigo 932, parágrafo único, do NCPC.

17.7.5. Processamento: o agravo interno será dirigido ao relator, que intimará o agravado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias. Caso não haja retratação, o relator levará o agra-vo interno para julgamento pelo órgão colegiado (artigo 1.021, § 2º), não havendo a possibilidade de sustentação oral.

17.7.6. Litigância temerária: nos termos do artigo 1.021, § 4º, do NCPC, quando o agravo interno “for declarado manifestamente inadmissível ou improcedente em votação unânime, o órgão colegiado,

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em decisão fundamentada, condenará o agravante a pagar ao agravado multa fixada entre um e cinco por cento do valor atualizado da causa”. De acordo com o § 5º do mesmo dispositivo legal, “a interposi-ção de qualquer outro recurso está condicionada ao depósito prévio do valor da multa prevista no § 4º, à exceção da Fazenda Pública e do beneficiário de gratuidade da justiça, que farão o pagamento ao final”.

17.8 RECURSO ESPECIAL E RECURSO EXTRAORDINÁRIO

17.8.1. Cabimento: tratam-se de recursos constitucionais, previstos nos artigos 102, III (Recurso Extraordinário) e 105, III (Recurso Especial), da Constituição Federal. O recurso extraordinário é interpos-to perante o Supremo Tribunal Federal e tem por finalidade questionar violações ou negativas de vigên-cia à Constituição Federal. Em contrapartida, o recurso especial é interposto perante o Superior Tribunal de Justiça e tem por função uniformizar a interpretação do direito federal. O NCPC revogou os recursos especial e extraordinário retidos, que nunca tiveram uma ampla utilização na vigência do CPC/73.

17.8.2. Requisitos de admissibilidade: tanto o recurso especial quanto o recurso extraordinário possuem requisitos de admissibilidade gerais (intrínsecos e extrínsecos) e específicos. Os requisitos espe-cíficos de admissibilidade a ambos os recursos são: a) prequestionamento; b) exame de questões exclusi-vamente de direito; c) prévio esgotamento das vias recursais; e d) decisão objeto dos mesmos deve ser prolatada em última ou única instância.

17.8.2.1. REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE ESPECÍFICOS (TANTO DO RECURSO ESPECIAL QUANTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO)

17.8.2.1.1. Prequestionamento: O prequestionamento é requisito de admissibilidade tanto do recurso especial quanto do recurso extraordinário (Súmula 282 do STF). O Superior Tribunal de Justiça também aplica esta referida súmula, consoante se extrai da decisão que segue:

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ. 1. O acórdão recorrido não fez qualquer consideração sobre os artigos a-pontados por malferidos, devendo ser mantida a incidência das Súmulas 282 e 356/STF. 2. Rever o acórdão recorrido, para acolher-se a pretensão do recorrente em sentido diametralmente oposto, exige análise de provas e fatos, o que invia-biliza a realização de tal procedimento pelo STJ, nos termos da Súmula 7/STJ. Precedentes. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 210448, Rel. Min. Cas-tro Meira, Segunda Turma, 20.11.2012)

No âmbito do recurso extraordinário, o Supremo Tribunal Federal tem exigido o chamado pre-questionamento explícito, que se caracteriza pelo pronunciamento expresso na decisão recorrida a res-peito dos dispositivos constitucionais afirmados como violados ou cuja vigência tenha sido negada pela decisão recorrida – com a necessidade de menção expressa, inclusive, do respectivo artigo da Constitui-ção Federal –, verbis:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRA-VO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO INA-TIVO. IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS. LEI ESTADUAL Nº

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8.480/2002. AUSÊNCIA DO NECESSÁRIO PREQUESTIONAMENTO. SÚ-MULAS 282 E 356 DO STF. INTERPRETAÇÃO DE NORMA LOCAL. INCI-DÊNCIA DO ENUNCIADO DA SÚMULA N.º 280 DESTE TRIBUNAL. 1. O requisito do prequestionamento é indispensável, por isso que inviável a a-preciação, em sede de recurso extraordinário, de matéria sobre a qual não se pronunciou o Tribunal de origem, incidindo o óbice das Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal. 2. O prequestionamento explícito da questão constitucional é requisito indispensável à admissão do recurso ex-traordinário, sendo certo que eventual omissão do acórdão recorrido recla-ma embargos de declaração. 3. A ofensa ao direito local não viabiliza o ape-lo extremo (Súmula 280 do STF). (ARE 696434 no RE com Agravo, Rel. Min. LuizFux, 30.10.2012)

Em contrapartida, no recurso especial, o Superior Tribunal de Justiça exige apenas o chamado prequestionamento implícito, que se caracteriza pela menção na decisão recorrida da tese jurídica susci-tada, sem a necessidade de pronunciamento expresso sobre os dispositivos legais da legislação infra-constitucional afirmados como violados ou cuja vigência tenha sido negada, verbis:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. FEPASA. PRETENSÃO DE RECEBIMENTO DE ABONOS SALARIAIS CONCEDI-DOS AO PESSOAL DA ATIVA. ARTS. 2º, 128 E 460 do CPC. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS 282 E 356 DO STF. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADA. AGRA-VO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Os temas insertos nos arts. 2º, 128 e 460 do CPC não foram debatidos pelo Tribunal de origem e não foram opostos Embargos de Declaração com o objetivo de sanar eventual omissão. Carecem, portanto, de prequestiona-mento, requisito indispensável ao acesso às instâncias excepcionais. Apli-cáveis, assim, as Súmulas 282 e 356 do STF. 2. Para que se configure prequestionamento implícito, é necessário que o Tribunal a quo emita juízo de valor a respeito da aplicação da norma federal ao caso concreto (AgRg no Ag.1.394.293/DF, Rel. Min. HERMAN BENJA-MIN, DJe 09.06.2011), o que, na hipótese, não ocorreu. 3. Conforme jurisprudência pacífica do STJ, não cabe, em Recurso Espe-cial, invocar divergência jurisprudencial com precedentes do Supremo Tri-bunal Federal. 4. Agravo Regimental desprovido. (AgRg no AREsp 161647, Ministro Na-poleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, 23. 10.2012)

Caso não haja o prequestionamento, seja explícito ou implícito na decisão recorrida, a parte ne-cessariamente deverá interpor embargos de declaração de modo a ser suprida esta respectiva omissão. Importante salientar que a sanação da omissão pelo tribunal de origem, no tocante ao requisito do pre-questionamento, está condicionada a demonstração de ter sido a tese jurídica objeto de debate ao longo do processo, nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DA PARTE. EFEITOS INFRINGENTES. IMPOSSIBILIDADE. PREQUESTIONAMENTO PARA FINS DE INTERPOSIÇÃO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. INVIABILI-DADE. - A atribuição de efeitos modificativos aos embargos declaratórios é possível apenas em situações excepcionais, em que sanada a omissão, contradição ou obscuridade, a alteração da decisão surja como consequência lógica e necessária. - Inexiste previsão no art. 535 do CPC, quer para reabertura do debate, quer para análise de questões não abordadas nos acórdãos recorridos, notada-mente quando fundados os embargos de declaração no mero inconformis-

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mo da parte. - Os embargos declaratórios, mesmo manejados com o propósito de pre-questionamento, são inadmissíveis se a decisão embargada não ostentar qualquer dos vícios que autorizariam a sua interposição. - Os embargos declaratórios não se prestam a viabilizar o acesso da parte ao recurso extraordinário, se a questão constitucional não surgiu no acórdão recorrido e nem foi suscitado em momento anterior. -Embargos de declaração no agravo regimental no conflito de competência rejeitados. (EDcl no AgRg no CC 115261, Rel. Min. Nancy Andrighy, Se-gunda Turma, 24.12.2012)

Caso a matéria tenha sido debatida e, ainda assim, o tribunal de origem deixar de sanar a omis-são apontada nos embargos de declaração, é de se indagar se os dispositivos legais afirmados como violados ou cuja vigência eventualmente tenha sido negada, estariam ou não prequestionados? O NCPC resolve esta problemática de forma distinta da Súmula 211 do Superior Tribunal de Justiça, consoante dispõe o artigo 1.025, verbis: “consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante susci-tou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejei-tados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade”. Ou seja, a opção do NCPC foi pela solução já adotada pela Súmula 356 do Supremo Tribunal Federal.

Outra questão tormentosa é a pronunciabilidade (ou não) ex officio das questões de ordem pú-blica no âmbito das cortes superiores. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça – que entendemos compatível com o NCPC em razão da exigência do prequestionamento – também exige o prequestiona-mento das questões de ordem pública – entendendo pela não pronunciabilidade ex officio a respeito das mesmas –, verbis:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO INE-XISTENTE. PRESCRIÇÃO. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. NECESSI-DADE DE PREQUESTIONAMENTO. 1. Nos aclaratórios, a parte embargante, a pretexto de apontar omissão, sustenta que a prescrição, por ser matéria de ordem pública, não pode ser considerada inovação recursal. 2. Esta Corte Superior posicionou-se de forma clara, adequada e suficiente acerca da prescrição, no sentido de que os fundamentos utilizados no agra-vo regimental não foram alegados nas razões do especial, representando inovação recursal. 3. A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que a prescrição, embora seja questão de ordem pública, somente é passível de apreciação nesta instância extraordinária se tiver sido objeto de discussão no Tribunal de origem, não sendo possível superar a ausência de prequestionamento. 4. Assim, por meio dos aclaratórios, é nítida a pretensão da parte embar-gante em provocar rejulgamento da causa, situação que, na inexistência das hipóteses previstas no art. 535 do CPC, não é compatível com o recur-so protocolado. 5. Embargos de declaração rejeitados. (EDcl no AgRg no AREsp 145050, Rel. Mauro Campbell Marques, 13.11.2012)

17.8.2.1.2. Questão de direito e questão de fato: Tanto o recurso especial quanto o recurso ex-traordinário destinam-se apenas ao exame de questões de direito, não se admitindo a discussão de matéria fática. Em razão dessa circunstância, não é admitido o reexame de prova e a discussão de cláusu-la contratual nestes recursos respectivos, nos exatos termos das Súmulas 7 do STJ, 279 do STF e 5 do STJ:

Súmula 7: “A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial”.

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Súmula 279: “Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordiná-rio”. Súmula 5: “A simples interpretação de cláusula contratual não enseja recur-so especial”.

O Superior Tribunal de Justiça tem feito a distinção entre o reexame de prova e a má-valoração da prova – distinção essa que já era realizada pelo Supremo Tribunal Federal quanto realizava o controle da legislação infraconstitucional –, admitindo que a última hipótese possa ensejar o cabimento de recur-so especial. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça – compatível com o NCPC – tem admitido a interposição de recurso especial por má-valoração da prova, verbis:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA. ATIVIDADE RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. COMPROVAÇÃO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. CERTIDÃO DE CASAMENTO. QUALIFICAÇÃO DO MARIDO DA AUTORA COMO OPERÁRIO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE RURAL. IM-POSSIBILIDADE. SÚMULA 149/STJ. VALORAÇÃO DO ACERVO PROBA-TÓRIO. AGRAVO DESPROVIDO. I - Esta Corte Superior possui pacífica ju-risprudência no sentido de que o rol de documentos elencados pelo artigo 106 da Lei nº 8.213/91 não é taxativo, motivo pelo qual podem ser aceitos, como início de prova material, documentos expedidos em atos de registro civil, que qualifiquem, como lavrador, o segurado ou qualquer membro da unidade familiar. Precedentes. II - Admite-se, como início de prova material, a Certidão de Casamento, desde que estes documentos possuam a qualifi-cação profissional do segurado, ou de seu cônjuge, como lavradores. Pre-cedentes. III - O único documento juntado pela autora, qual seja, a certidão de casamento, não qualifica o marido da autora como lavrador, mas como operário, razão pela qual este documento não serve como início de prova material referente à atividade rural em regime de economia familiar. IV - "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciário" (Enunciado n. 149 da Súmula deste Superior Tribunal de Justiça). V- A questão não en-cerra reexame de matéria fática, mas valoração das provas apreciadas pelas instâncias ordinárias, com a correta adequação dos fatos à nor-ma que o disciplina, cujo exame se revela possível nessa instância re-cursal, diante das dificuldades encontradas pelo segurado para com-provar o labor rural. Precedentes. VI - Agravo interno desprovido. (AgRg no AREsp 31676 / CE AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECUR-SO ESPECIAL 2011/0179104-0, Rel. Min. Gilson Dipp) AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. LEI Nº 9.032/1995. ACIDEN-TE DE QUALQUER NATUREZA. AUXÍLIO-ACIDENTE. LESÃO NO DEDO ANULAR DA MÃO ESQUERDA. GRAU DE LESÃO. REDUÇÃO DA CAPA-CIDADE LABORATIVA COMPROVADA. ACÓRDÃO QUE AFASTOU AS CONCLUSÕES DA PERÍCIA. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 7/STJ. 1. A partir da Lei nº 9.032/1995, o benefício acidentário passou a ser devido não só em razão de acidente de trabalho, mas nos de qualquer natureza, quan-do após a consolidação das lesões, houvesse redução da capacidade labo-rativa habitual do segurado. A presença do nexo de causalidade entre a le-são e a atividade professional desenvolvida, só é exigida para concessão do benefício acidentário decorrente de moléstia auditiva, o que não é a hipóte-se dos autos. 2. O benefício acidentário é devido ainda que mínima a lesão, porquanto o nível do dano e, consequentemente, o grau do maior esforço não interferem na sua concessão, não podendo o Tribunal de origem, las-treado apenas em conhecimentos pessoais do julgador, desconsiderar lau-do médico-pericial, de natureza técnica, pautado em elementos científicos que concluiu pela presença de um dos pressupostos necessários à obten-ção do auxílio-acidente, qual seja, a redução da capacidade laboral do se-gurado. 3. Não subsiste a alegação de que o recurso especial não deve-ria ter sido conhecido em razão do óbice contido na Súmula nº 7/STJ, pois a questão relativa à impossibilidade do julgador desconsiderar a

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perícia técnica, com base tão-somente em conhecimentos pessoais, envolve apenas matéria de direito, consubstanciada na valoração, e não ao reexame das provas. 4. Agravo regimental a que se nega provi-mento. (AgRg no Ag 1427123 / SC AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 2011/0182531-5, Rel. Min. Marco Aurélio Belizze)

17.8.2.1.3. Causa decidida em única ou última instância: tanto o art. 102, III, quanto o art. 105, III, da Constituição Federal exigem que a decisão objeto do recurso especial ou do recurso extraordinário tenha sido decidida em única ou última instância. Entretanto, o art. 105, III, da CF exige que a causa decidida em única instância tenha sido prolatada por tribunal. Esta menção a tribunal por si só já afasta o cabimento de recurso especial de decisão prolatada pelas turmas recursais dos juizados especiais cíveis, nos exatos termos da súmula 203 do Superior Tribunal de Justiça, verbis: “não cabe recurso especial contra decisão proferida por órgão de segundo grau dos Juizados Especiais.”

Em contrapartida, como o art. 102, III, da CF não menciona que a causa objeto do recurso extra-ordinário precise ser decidida em única ou última instância por tribunal, é cabível esse recurso respectivo de decisões prolatadas pelas turmas recursais em sede de juizados especiais.

Por decisão de última instância, deve-se entender o prévio esgotamento das vias recursais, o que significa dizer que antes da interposição do recurso especial ou do recurso extraordinário, a parte deverá esgotar todos os recursos possíveis, sob pena de não admissão.

Em contrapartida, por decisão de última instância, deve se entender as causas de competência originária dos tribunais (v.g. ação rescisória).

17.8.2.2. REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE ESPECÍFICOS DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO

17.8.2.2.1. Repercussão geral: A repercussão geral, introduzida na Constituição Federal pela e-menda constitucional nº 45/2004, que acrescentou o § 3º no art. 102, e regulamentada, posteriormente, pela Lei 11.418/06, é um filtro ou “marco divisor” no recurso extraordinário. Hoje, não basta mais o recorrente afirmar em sua petição de recurso extraordinário a violação ou negativa de vigência da Cons-tituição Federal. Além disso, deverá demonstrar a existência de repercussão geral. Esse requisito foi regulamentado no NCPC, em seu artigo 1.035.

Ou seja, na petição de recurso extraordinário, o recorrente deverá demonstrar que o jul-gamento do mesmo não interessa apenas para ele, mas também para uma coletividade, não havendo a necessidade de que esta envolva todos os habitantes do país, mas pode estar restrita a determinado grupo. A não demonstração do preenchimento desse respectivo requisito conduz à inadmissão do recur-so, verbis:

Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Matéria criminal. Recurso extraordinário. Repercussão geral. Ausência de preliminar formal fundamentada. Inadmissibilidade do extraordinário. Precedentes. 1. Os re-cursos extraordinários interpostos contra acórdãos publicados a partir de 3/5/07 devem demonstrar, em preliminar formal devidamente fundamenta-da, a existência da repercussão geral das questões constitucionais discuti-das no apelo extremo (AI nº 664.567/RS-QO, Tribunal Pleno, Relator o Mi-nistro Sepúlveda Pertence, DJ de 6/9/07). 2. A repercussão geral deverá ser demonstrada em tópico destacado da petição do recurso extraordinário, não havendo que se falar em repercussão geral implícita ou presumida. 4. Agra-vo regimental ao qual se nega provimento. (ARE 697979 AgR / SP - SÃO PAULO AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO Rel. Min. DIAS TOFFOLI, 13/11/2012)

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Não é demasiado referir, que a repercussão geral é presumida, nos termos do § 3º do art. 1.035 do NCPC, que acrescentou novas hipóteses àquelas já mencionadas no CPC/73. Assim, presume-se a repercussão geral sempre que o acórdão: contrariar súmula ou jurisprudência dominante do STF, tenha sido proferido em julgamento de casos repetitivos, tenha reconhecido a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal, nos termos do artigo 97 da Constituição Federal.

17.8.2.2.1.1. Repercussão geral e suspensão de todos os processos pendentes: Nos termos do artigo 1.035, § 5º, “reconhecida a repercussão geral, o relator no Supremo Tribunal Federal determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional”. Não é demasiado referir que, o recurso que tiver a repercussão geral reconhecida, deverá ser julgado no prazo de 1 (um) ano e terá preferência sobre os demais feitos, ressalvados os que envolvem réu preso e os pedidos de habeas corpus (artigo 1.035, § 9º, do NCPC). Caso não haja o julgamento dentro desse prazo, cessa em todo território nacional a suspensão dos processos, que retomarão seu curso normal (artigo 1.035, § 10, do NCPC).

O interessado poderá requerer, ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal de origem, que exclua da decisão de sobrestamento e inadmita o recurso extraordinário que tenha sido interposto in-tempestivamente, tendo o recorrente prazo de 5 (cinco) dias para manifestar-se sobre esse requerimen-to (artigo 1.035, § 6º). Da decisão que indeferir o requerimento, cabe o agravo previsto no artigo 1.042 do NCPC.

Em sendo negada a existência de repercussão geral, o presidente ou vice-presidente do tribunal de origem negará seguimento aos recursos extraordinários sobrestados na origem que versem sobre matéria idêntica, cabendo contra essa decisão o recurso de agravo previsto no artigo 1.042, III, do NCPC.

17.8.2.2.1.2. Violações à Constituição Federal: nos termos do art. 102, III, da Constituição Fede-ral, o recurso extraordinário tem cabimento nas seguintes hipóteses: a) contrariar dispositivo desta Constituição; b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição; d) Julgar válida lei local contestada em face de lei federal.

17.8.2.3. Requisitos de admissibilidade específicos do recurso especial: de acordo com o art. 105, III, da Constituição Federal, o recurso especial tem cabimento nas seguintes hipóteses: a) contrariar tratado ou lei federal ou negar-lhes vigência; b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal; c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal.

ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO PROFERIDA SINGULARMENTE PELO RELATOR. POSSIBILIDADE. ART. 557 DO CPC. SOLICITAÇÃO DE REDUÇÃO DA DEMANDA ENERGÉTICA FORNECIDA. PROCEDIMENTO DISCIPLINADO EM RESOLUÇÃO ADMINISTRATIVA. DESCABIMENTO DE RECURSO ESPECIAL. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Nos termos do art. 557 do CPC, é facultado ao Relator negar seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior. Assim, atendida uma das condições previstas, pode o julgador negar seguimento ao recurso, em apreço à celeridade dos julgamentos e ao princípio da efetividade do pro-cesso. 2. Ademais, eventual impropriedade processual da decisão monocrática fica superada, uma vez instado o órgão colegiado a se pronunciar em sede de Agravo Regimental.

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3. Embora disponha a ANEEL de legitimidade para editar atos normativos, a jurisprudência desta Corte Superior pacificou o entendimento de que Porta-rias, Circulares e Resoluções não se equiparam a Leis Federais para fins de interposição do Recurso Especial. 4. Agravo Regimental da Rio Grande Energia S/A desprovido. (AgRg no AREsp 214672, AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ES-PECIAL 2012/0165123-8, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 23.10.2012)

No tocante à divergência jurisprudencial, que enseja o recurso especial nos termos da alínea “c” do inciso III do art. 105 da Constituição Federal, deve-se observar o disposto na Súmula 13 do Superi-or Tribunal de Justiça, verbis:

A divergência entre julgados do mesmo Tribunal não enseja recurso especial.

A divergência jurisprudencial poderá ser comprovada na forma do art. 1.029, § 1º, do NCPC. Na demonstração da divergência, de acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, não basta a simples transcrição de ementas. O recorrente deverá transcrever trechos da decisão recorrida e da decisão prolatada no acórdão paradigma, que indique a similitude de casos e a diversidade de julgamen-tos. Neste sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, compatível com o NCPC:

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. RECURSO INTEGRATIVO RECEBIDO COMO AGRAVO REGIMENTAL. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. PRESCRIÇÃO. AU-SÊNCIA DE INDICAÇÃO DODISPOSITIVO DE LEI QUE ESTARIA SENDO VIOLADO. DISSÍDIO NÃO DEMONSTRADO NOS TERMOS DA LEGISLA-ÇÃO DE REGÊNCIA. 1. Em observância aos princípios da fungibilidade e economia processual, os embargos de declaração são recebidos como agravo regimental. 2. O recurso especial serve à impugnação de acórdão que contraria tratado ou lei federal, que julga válido ato de governo local contestado em face de lei federal ou que dá à lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal, conforme disciplinado no art. 105, III, da Constitui-ção Federal de 1988. Assim, a indicação do dispositivo de lei federal que se considera violado ou cuja interpretação é objeto de divergência entre os Tri-bunais pátrios é condição de admissibilidade do recurso especial, cuja au-sência atrai a aplicação do entendimento contido na Súmula nº 284 do STF. 3. Não se conhece do recurso especial interposto com base na alínea "c" do permissivo constitucional, quando a divergência não é demonstrada nos termos em que exigido pela legislação processual de regência (art. 541, pa-rágrafo único, do CPC, c/c art. 255 do RISTJ). A mera transcrição de emen-tas não serve à demonstração do dissídio, sendo necessário o cotejo analí-tico entre os acórdãos recorrido e paradigma, com a demonstração da iden-tidade ou semelhança entre as peculiaridades dos casos confrontados. 4. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental, não provido. (EDcl no REsp 1315377 / CE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL 2012/0049024, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, 18.09.2012)

17.8.3. Requisitos de admissibilidade gerais do recurso especial e do recurso extraordinário: ambos os recursos (especial e extraordinário) deverão preencher os requisitos gerais de admissibilidade, tanto intrínsecos quanto extrínsecos.

17.8.4. Efeitos do recurso especial e do recurso extraordinário: Tanto o recurso especial quanto

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o recurso extraordinário são dotados apenas do efeito devolutivo. Entretanto, caso haja a necessidade de ser agregado efeito suspensivo aos mesmos, deverá declinar essa pretensão respectiva através do desencadeamento de uma medida cautelar, nos exatos termos das súmulas 634 e 635 do Supremo Tri-bunal Federal, aplicadas também pelo Superior Tribunal de Justiça:

Ambos os recursos são dotados também dos efeitos substitutivo, ativo e expansivo. O efeito translativo não ocorre em razão do requisito prequestionamento.

17.8.5. Processamento: O recurso especial e o recurso extraordinário, conforme já mencionado, são interpostos perante os tribunais de origem Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais. O artigo 2º da Lei 13.256/16 alterou a redação do artigo 1.030, estabelecendo novamente – tal como ocor-ria no CPC/73–, o duplo exame da admissibilidade nos recursos especial e extraordinário, verbis:

Recebida a petição do recurso pela secretaria do tribunal, o recorrido será intimado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias, findo o qual os autos serão conclusos ao presidente ou ao vice-presidente do tri-bunal recorrido, que deverá: I – negar seguimento: a) a recurso extraordinário que discuta questão constitucional à qual o Su-premo Tribunal Federal não tenha reconhecido a existência de repercussão geral ou a recurso extraordinário interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Federal exarado no regime de repercussão geral; b) a recurso extraordinário ou a recurso especial interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Fede-ral ou do Superior Tribunal de Justiça, respectivamente, exarado no regime de julgamento de recursos repetitivos; II – encaminhar o processo ao órgão julgador para realização do juízo de re-tratação, se o acórdão recorrido divergir do entendimento do Supremo Tri-bunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça exarado, conforme o caso, nos regimes de repercussão geral ou de recursos repetitivos; III – sobrestar o recurso que versar sobre controvérsia de caráter repetitivo ainda não decidida pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme se trate de matéria constitucional ou infraconstitucio-nal; IV - selecionar o recurso como representativo de controvérsia constitucional ou infraconstitucional, nos termos do § 6º do art. 1.036; V - realizar o juízo de admissibilidade e, se positivo, remeter o feito ao Su-premo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça, desde que: a) o recurso ainda não tenha sido submetido ao regime de repercussão ge-ral ou de julgamento de recursos repetitivos; b) o recurso tenha sido selecionado como representativo da controvérsia; ou c) o tribunal recorrido tenha refutado o juízo de retratação. § 1º Da decisão de inadmissibilidade proferida com fundamento no inciso V caberá agravo ao tribunal superior, nos termos do art. 1.042. § 2º Da decisão proferida com fundamento nos incisos I e III caberá agravo interno, nos termos do art. 1.021.

Da decisão que não admitir os recursos especial e extraordinário, caberá o recurso de agravo (ar-tigo 1.042 do NCPC).

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18.1. GENERALIDADES SOBRE A LIQUIDAÇÃO NO CPC/2015

Sentença ilíquida é a que condena ao pagamento de quantia não especificada (não determina o quantum debeatur), nem permite especificar essa quantia por meio de simples operações aritméticas (art. 786, parágrafo único, c.c. art. 771, ambos do CPC/2015).

Assim, “a necessidade de simples operações aritméticas para apurar o crédito exequendo não retira a liquidez da obrigação constante do título” (art. 786, parágrafo único, do CPC/2015), pelo que, “quando a apuração do valor depender apenas de cálculo aritmético, o credor poderá promover, desde logo, o cumprimento da sentença” (art. 509. § 2.º, do CPC/2015). Para facilitar esse cálculo aritmético – e prevenir discussões sobre índices de atualização monetária –, o CPC/2015 determina ao Conselho Nacional de Justiça que desenvolva e coloque à disposição dos interessados “programa de atualização financeira” (art. 509, § 3.º, do CPC/2015).

Atendendo às críticas da doutrina, a apuração do valor final por cálculo aritmético sai do capítulo de liquidação de sentença e vai integrar o capítulo do cumprimento de sentença (cf. art. 524 do CPC/2015). Dessa forma, como espécies de liquidação de sentença, permanecem apenas a liquidação por arbitramento e a liquidação pelo procedimento comum (nova denominação da liquidação por artigos).

Mas o CPC/2015 trata as sentenças ilíquidas como excepcionais, pois tais sentenças costumam conspirar contra a duração razoável do processo (art. 4.º do CPC/2015). Assim, “na ação relativa à obrigação de pagar quantia, ainda que formulado pedido genérico, a decisão definirá desde logo a extensão da obrigação, o índice de correção monetária, a taxa de juros, o termo inicial de ambos e a peridiocidade da capitalização de juros, se for o caso”, somente ressalvando as sentenças nas quais “não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido” ou “a apuração do valor devido depender da produção de prova de realização demorada ou excessivamente dispendiosa”, hipóteses em que se seguirá “a apuração do valor devido por liquidação” (cf. art. 491 do CPC/2015).

A liquidação de sentença, por arbitramento ou pelo procedimento comum, é fase de conhecimento intermediária entre a fase de conhecimento propriamente dita (que produz a sentença e as decisões parciais de mérito, fixando o an debeatur ou a obrigação de pagar) e a fase de cumprimento de sentença. Nas hipóteses em que excepcionalmente é exigida, não é possível iniciar o cumprimento de sentença sem antes proceder à fase de liquidação.

Fase de conhecimento → Fase de liquidação → Fase de cumprimento

A decisão de liquidação, fixando o quantum debeatur, complementa a sentença ou decisão parcial de mérito, que fixou apenas o an debeatur, de maneira que o título executivo judicial passa a ser composto de ambas as decisões judiciais (decisão do an + decisão do quantum).

Título executivo judicial = sentença ou decisão parcial de mérito +

Decisão de liquidação

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Nesse particular, deve continuar vigorando a Súmula 344 do STJ que enuncia: “a liquidação por forma diversa da estabelecida na sentença não ofende a coisa julgada.” Como o devedor também adquire legitimidade para iniciar o cumprimento de sentença (cf. art.

526 do CPC/2015) é coerente que também passe a possuir legitimidade para proceder à liquidação de sentença, quando for o caso, conforme permite o caput do artigo em comento.

Não há inovação quando ao cabimento das duas modalidades de liquidação: arbitramento, quando determinado pela sentença, convencionado pelas partes ou exigido pela natureza do objeto da liquidação, e procedimento comum (artigos no CPC/1973) quando houver necessidade de alegar e provar fato novo (art. 509, I e II, do CPC/2015 e arts. 475-C e 475-E, do CPC/1973).

Também não se inova quanto à hipótese da sentença parcialmente ilíquida: “quando na sentença houver uma parte líquida e outra ilíquida, ao credor é lícito promover simultaneamente a execução daquela e, em autos apartados, a liquidação desta” (art. 509, § 1.º, CPC/2015 e art. 475-I, § 2.º, CPC/1973). Quer parecer que essa iniciativa também deve se estender ao devedor, nos termos do caput.

De igual forma, persiste a norma no sentido de que “na liquidação é vedado discutir de novo a lide ou modificar a sentença que a julgou” (art. 509, § 4.º, do CPC/2015 e art. 475-G do CPC/1973), dada a preclusão sobre as questões já decididas (art. 507 do CPC/2015).

Confira-se a íntegra do novo texto legal:

Art. 509. Quando a sentença condenar ao pagamento de quantia ilíquida, proceder-se-á à sua liquidação, a requerimento do credor ou do devedor: I – por arbitramento, quando determinado pela sentença, convencionado pelas partes ou exigido pela natureza do objeto da liquidação; II – pelo procedimento comum, quando houver necessidade de alegar e provar fato novo. § 1.° Quando na sentença houver uma parte líquida e outra ilíquida, ao credor é lícito promover simultaneamente a execução daquela e, em autos apartados, a liquidação desta. § 2.° Quando a apuração do valor depender apenas de cálculo aritmético, o credor poderá promover, desde logo, o cumprimento da sentença. § 3.º O Conselho Nacional de Justiça desenvolverá e colocará à disposição dos interessados programa de atualização financeira. § 4.º Na liquidação é vedado discutir de novo a lide ou modificar a sentença que a julgou.

18.1.1 A LIQUIDAÇÃO POR ARBITRAMENTO A liquidação por arbitramento começa por requerimento do credor ou do devedor (art. 509,

caput, do CPC/2015), no qual deverá especificar o objeto da liquidação e juntar os “pareceres e documentos elucidativos” que disponha para auxiliar o arbitramento judicial. Poderá, desde logo, apontar um valor que entenda devido com base nesses pareceres e documentos. A parte contrária será intimada, por seu advogado, para impugnar os documentos e pareceres juntados pelo requerente e para produzir os seus. Nada obsta que o juiz marque audiência para discutir as questões levantadas pelas partes, sob a égide do princípio da cooperação processual que orienta a nova codificação (art. 6.º, do CPC/2015). É bem possível que, assim o fazendo, a decisão de liquidação seja proferida na própria audiência. Excepcionalmente, caso o juiz não se sinta seguro para arbitrar de plano, com base na documentação acostada pelas partes, poderá nomear perito para dirimir as questões técnicas pendentes, seguindo-se o rito da prova pericial. Da decisão de liquidação por arbitramento caberá agravo de instrumento (art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015).

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Confira-se:

Art. 510. Na liquidação por arbitramento, o juiz intimará as partes para a apresentação de pareceres ou documentos elucidativos, no prazo que fixar, e, caso não possa decidir de plano, nomeará perito, observando-se, no que couber, o procedimento da prova pericial.

18.1.2. A LIQUIDAÇÃO PELO PROCEDIMENTO COMUM A liquidação pelo procedimento comum é a liquidação por artigos do CPC/1973. Também começa

por requerimento do credor ou do devedor (art. 509, caput, do CPC/2015), no qual deverá alegar o “fato novo”, não discutido na fase de conhecimento, mas indispensável para a fixação do quantum debeatur. A parte contrária será intimada, na pessoa de seu advogado ou da sociedade de advogados a que estiver vinculada, para apresentar contestação no prazo de 15 (quinze) dias. Não é o caso de marcar a audiência de conciliação ou mediação, prevista no art. 334 do CPC/2015, porque o artigo em comento indica, desde logo, que da intimação do requerido passará a correr o prazo de contestação, sem qualquer menção à audiência, que parece mesmo descabida nessa fase processual. Apresentada a resposta, seguem-se as providências preliminares (arts. 347 e ss. do CPC/2015) e demais atos que compõem o procedimento comum, até a decisão de liquidação, impugnável por agravo de instrumento (art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015). Preclusa essa decisão complementar de mérito, haverá coisa julgada material rescindível. Caso o requerido não apresente contestação tempestiva, será revel na fase de liquidação, permitindo que o juiz presuma verdadeiras as alegações sobre o fato novo (art. 344 do CPC/2015), ressalvadas as hipóteses em que não se produz o efeito material da revelia (art. 345 do CPC/2015).

No texto legal:

Art. 511. Na liquidação pelo procedimento comum, o juiz determinará a intimação do requerido, na pessoa de seu advogado ou da sociedade de advogados a que estiver vinculado, para, querendo, apresentar contestação no prazo de 15 (quinze) dias, observando-se, a seguir, no que couber, o disposto no Livro I da Parte Especial deste Código.

18.1.3. LIQUIDAÇÃO PROVISÓRIA Como também acontecia no CPC/1973, desde a reforma empreendida pela Lei 11.232/2005,

permite-se a liquidação provisória, antecipando-se a liquidação por arbitramento ou pelo procedimento comum, enquanto se aguarda o julgamento do recurso interposto contra a sentença ou a decisão parcial de mérito. Ao contrário do que ocorre com o cumprimento provisório da decisão, a liquidação provisória pode ser promovida mesmo na pendência de recurso dotado de efeito suspensivo. De qualquer forma, a liquidação provisória será processada em autos apartados no juízo de origem, cumprindo ao liquidante instruir o pedido com cópias das peças processuais pertinentes.

Coteje-se com o novo dispositivo legal:

Art. 512. A liquidação poderá ser realizada na pendência de recurso, processando-se em autos apartados no juízo de origem, cumprindo ao liquidante instruir o pedido com cópias das peças processuais pertinentes.

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18.2. GENERALIDADES SOBRE O CUMPRIMENTO DE SENTENÇA NO CPC/2015 O cumprimento de sentença no CPC/2015 continua a tradição inaugurada pelas reformas

processuais de 2005/2006: o processo sincrético, no qual se misturam atividades jurisdicionais de cognição e execução.

Processo sincrético = cognição + execução

Em geral, o cumprimento de sentença é um desdobramento da mesma relação processual

iniciada com o protocolo da petição inicial da ação de conhecimento (art. 312 do CPC/2015). Apenas excepcionalmente o cumprimento de sentença constituirá relação processual nova e autônoma (art. 515, § 1.º, do CPC/2015). As regras do processo de execução fundada em título extrajudicial (Parte Especial, Livro II, CPC/2015), mais detalhadas quanto à execução em si, têm aplicação subsidiária ao cumprimento de sentença.

Quanto à iniciativa do cumprimento de sentença, o CPC/2015 positiva o entendimento

jurisprudencial do STJ, no sentido da necessidade de requerimento do exequente para o cumprimento de sentença que reconheça o dever de pagar quantia, provisório ou definitivo (art. 513, § 1.º). De outro lado, dispensa tal requerimento para o cumprimento de sentença que reconheça deveres de fazer, não fazer ou entregar coisa (art. 536 do CPC/2015), que poderá ser iniciado ex officio.

Essa jurisprudência é também confirmada quando o novo Código exige a intimação do devedor,

pelo Diário da Justiça, na pessoa de seu advogado constituído nos autos, para cumprir a sentença (art. 513, § 2.º, I). Não é necessária intimação pessoal, basta a intimação pelo advogado. Essa regra é aplicável a qualquer tipo de cumprimento de sentença, inclusive para a que reconhece dever de fazer, não fazer ou entregar coisa, de modo que a Súmula 410 do STJ deve ser revogada, por exigir intimação pessoal. Excepcionalmente, como emanação do princípio da boa-fé processual (art. 5.º do CPC/2015), quando o requerimento do exequente for formulado após 1 (um) ano do trânsito em julgado da sentença, a intimação será feita pessoalmente, por meio de carta com aviso de recebimento encaminhada ao endereço constante nos autos, e não por intermédio do advogado constituído nos autos (art. 513 do § 4.º).

O parágrafo segundo do artigo em comento ainda resolve situações especiais, que exigem tratamento diferenciado quanto ao ato de intimação para cumprir a sentença:

(1) caso o devedor não tenha advogado constituído nos autos ou esteja representado pela Defensoria Pública (não se inclui a representação por advogado dativo), a intimação se dará por carta com aviso de recebimento (art. 513, II), considerando-se realizada a intimação postal quando o devedor houver mudado de endereço sem prévia comunicação ao juízo (arts. 513, § 3.º e 274 do CPC/2015); (2) tratando-se de empresa pública ou privada, com exceção das microempresas e empresas de pequeno porte, sem advogado constituído nos autos, a intimação se dará por meio eletrônico, conforme o cadastro que a empresa estará obrigada a manter nos sistemas processuais eletrônicos (art. 246, § 1.º, do CPC/2015), cadastro esse que deverá ser providenciado, no juízo onde a empresa tenha sede ou filial, no prazo de 30 (trinta) dias, contados da entrada em vigor do novo Código ou da data de inscrição do ato constitutivo da pessoa jurídica (art. 1.051 do CPC/2015), caso posterior (art. 513, III); considera-se realizada a intimação eletrônica quando o devedor houver mudado de endereço eletrônico sem prévia comunicação ao juízo (arts. 513, § 3.º); (3) caso o devedor tenha sido citado por edital e permanecido revel na fase de conhecimento, sem constituir advogado nos autos, sua intimação também será por edital, mesmo havendo curador especial designado para representá-lo (art. 513, IV).

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Por fim, como corolário do princípio do contraditório (arts. 9.º e 10 do CPC/2015), quem não

participou do processo na fase de conhecimento, não pode ser obrigado a participar da fase de execução, ressalvados os casos de sucessão processual. Assim, o “cumprimento da sentença não poderá ser promovido em face do fiador, do coobrigado ou do corresponsável que não tiver participado da fase de conhecimento” (arts. 513, § 5.º e 799 do CPC/2015).

Eis o novo texto legal:

Art. 513. O cumprimento da sentença será feito segundo as regras deste Título, observando-se, no que couber e conforme a natureza da obrigação, o disposto no Livro II da Parte Especial deste Código. § 1.º O cumprimento da sentença que reconhece o dever de pagar quantia, provisório ou definitivo, far-se-á a requerimento do exequente. § 2.º O devedor será intimado para cumprir a sentença: I – pelo Diário da Justiça, na pessoa de seu advogado constituído nos autos; II – por carta com aviso de recebimento, quando representado pela Defensoria Pública ou quando não tiver procurador constituído nos autos, ressalvada a hipótese do inciso IV; III – por meio eletrônico, quando, no caso do § 1.º do art. 246, não tiver procurador constituído nos autos; IV – por edital, quando, citado na forma do art. 256, tiver sido revel na fase de conhecimento. § 3.º Na hipótese do § 2.º, incisos II e III, considera-se realizada a intimação quando o devedor houver mudado de endereço sem prévia comunicação ao juízo, observado o disposto no parágrafo único do art. 274. § 4.º Se o requerimento a que alude o § 1.º for formulado após 1 (um) ano do trânsito em julgado da sentença, a intimação será feita na pessoa do devedor, por meio de carta com aviso de recebimento encaminhada ao endereço constante dos autos, observado o disposto no parágrafo único do art. 274 e no § 3.º deste artigo. § 5.º O cumprimento da sentença não poderá ser promovido em face do fiador, do coobrigado ou do corresponsável que não tiver participado da fase de conhecimento.

18.2. 1. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA CONDICIONAL O art. 514 do CPC/2015 estabelece que:

Art. 514. Quando o juiz decidir relação jurídica sujeita a condição ou termo, o cumprimento da sentença dependerá de demonstração de que se realizou a condição ou de que ocorreu o termo.

Esse artigo repete a regra do art. 572 do CPC/1973. Segundo o art. 121 do CC/2002, “considera-se condição a cláusula que, derivando

exclusivamente da vontade das partes, subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto.” O termo, por sua vez, condiciona o início dos efeitos de um negócio jurídico a evento futuro e certo (art. 131 do CC/2002). A condição ou termo a que esta sujeita a relação jurídica material deverá estar prevista na sentença. Essa sentença condicional somente poderá ser cumprida caso ocorra a demonstração de que se realizou a condição ou de que ocorreu o termo.

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18.2. 2. OS TÍTULOS EXECUTIVOS JUDICIAIS O art. 515 do CPC/2015 contempla o rol de títulos executivos judiciais, em atenção ao princípio

processual da nulla executio sine título.

Art. 515. São títulos executivos judiciais, cujo cumprimento dar-se-á de acordo com os artigos previstos neste Título: I - as decisões proferidas no processo civil que reconheçam a exigibilidade de obrigação de pagar quantia, de fazer, de não fazer ou de entregar coisa; II - a decisão homologatória de autocomposição judicial; III - a decisão homologatória de autocomposição extrajudicial de qualquer natureza; IV - o formal e a certidão de partilha, exclusivamente em relação ao inventariante, aos herdeiros e aos sucessores a título singular ou universal; V - o crédito de auxiliar da justiça, quando as custas, emolumentos ou honorários tiverem sido aprovados por decisão judicial; VI - a sentença penal condenatória transitada em julgado; VII - a sentença arbitral; VIII - a sentença estrangeira homologada pelo Superior Tribunal de Justiça; IX - a decisão interlocutória estrangeira, após a concessão do exequatur à carta rogatória pelo Superior Tribunal de Justiça; X - (VETADO). § 1.º Nos casos dos incisos VI a IX, o devedor será citado no juízo cível para o cumprimento da sentença ou para a liquidação no prazo de 15 (quinze) dias. § 2.º A autocomposição judicial pode envolver sujeito estranho ao processo e versar sobre relação jurídica que não tenha sido deduzida em juízo.

O inciso I, ao definir como títulos executivos judiciais “as decisões proferidas no processo civil

que reconheçam a exigibilidade de obrigação de pagar quantia, de fazer, de não fazer ou de entregar coisa”, amplia essa categoria, para abranger não apenas as sentenças, como também qualquer decisão interlocutória que reconheça a exigibilidade de tais obrigações, como as decisões parciais de mérito (art. 356 do CPC/2015) e as decisões concessivas de tutela provisória (art. 297, parágrafo único, e 519, do CPC/2015). Merecerá uma meditação mais aprofundada da doutrina as consequências processuais da substituição da expressão “reconheça a existência de obrigação”, constante do inc. I do art. 475-N do CPC/1973, pela expressão “reconheçam a exigibilidade de obrigação”, constante no inciso em comento do CPC/2015.

CPC/1973 (com Lei 11.232/2005) CPC/2015

↓ ↓

Existência Exigibilidade

Quer parecer que o novo Código apenas aperfeiçoa a redação técnica para continuar outorgando força executiva a pronunciamentos declaratórios, nos quais seja possível identificar, não apenas a existência de uma obrigação, como também, agora, a sua exigibilidade. De fato, é difícil entender que uma decisão que apenas reconheça a existência de uma obrigação seja título executivo, quando a executividade também depende da exigibilidade, que não pode ser pressuposta a partir da existência. O título executivo, para autorizar a execução, deve fundar-se sempre em título de obrigação certa, líquida e exigível (art. 783 c.c. 771, do CPC/2015). Não apenas certeza e liquidez, como também exigibilidade.

Essa solução processual é pragmática, porque torna desnecessário o ajuizamento de nova demanda, apenas para a formulação do pedido condenatório, quando todos os elementos da obrigação já estão contidos na demanda declaratória. Um processo, ao invés de dois, com a mesma proteção jurisdicional.

Os incs. II e III contemplam títulos executivos judiciais oriundos de autocomposição, quando os próprios litigantes, em juízo ou fora dele, com ou sem o auxílio de terceiros (mediadores e conciliadores),

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solucionam o litígio. A decisão, nesses casos, apenas homologa o acordo de vontades. No caso da autocomposição judicial (inc. II), “pode envolver sujeito estranho ao processo e versar sobre relação jurídica que não tenha sido deduzida em juízo” (art. 515, § 2.º). No caso da autocomposição extrajudicial de qualquer natureza (inc. III), será necessário requerer a homologação em juízo, por meio de procedimento afeto à jurisdição voluntária (art. 725, VIII, do CPC/2015).

O inc. IV reproduz a regra do art. 475-N, VII, do CPC/1973, cabendo observar que, na hipótese de inventário e partilha extrajudiciais (Lei 11.441/2007), a respectiva escritura pública consistirá em título executivo extrajudicial, que poderá ser convolado em título executivo judicial, se houver requerimento para sua homologação judicial (art. 515, III, do CPC/2015).

O inc. V inova ao transformar, de extrajudicial (art. 585, VI, do CPC1973) em judicial (art. 515, V, do CPC/2015), o crédito de qualquer auxiliar da justiça, seja servidor público ou não, quando as custas, emolumentos ou honorários tiverem sido aprovados por decisão judicial, seja sentença, seja decisão interlocutória.

Os inc. VI, VII e VIII registram os títulos executivos judiciais que se processam em processos autônomos de execução, nos quais é preciso propor a ação de execução perante o juízo cível nacional competente e promover a citação do devedor para o cumprimento da sentença ou para liquidação no prazo de 15 (quinze) dias (art. 515, § 1.º, do CPC/2015).

Por fim, não apenas as sentenças estrangeiras, mas também as decisões interlocutórias estrangeiras passam a gozar do status de título executivo judicial, as primeiras após a homologação pelo STJ (inc. VIII), as segundas após a concessão do exequatur pelo STJ à respectiva carta rogatória (inc. IX). Ambas serão executadas perante a Justiça Federal de primeiro grau (art. 109, X, da CF/1988).

18.2.3. COMPETÊNCIA PARA O CUMPRIMENTO DE SENTENÇA A competência para o cumprimento de sentença é distribuída da seguinte forma: (1) os tribunais, nas causas de sua competência originária; (2) o juízo que decidiu a causa no primeiro grau de jurisdição; (3) o juízo cível competente, quando se tratar de sentença penal condenatória, de sentença

arbitral ou de sentença estrangeira homologada pelo STJ. Assim é segundo o art. 516 do CPC/2015:

Art. 516. O cumprimento da sentença efetuar-se-á perante: I – os tribunais, nas causas de sua competência originária; II – o juízo que decidiu a causa no primeiro grau de jurisdição; III – o juízo cível competente, quando se tratar de sentença penal condenatória, de sentença arbitral, de sentença estrangeira ou de acórdão proferido pelo Tribunal Marítimo. Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o exequente poderá optar pelo juízo do atual domicílio do executado, pelo juízo do local onde se encontrem os bens sujeitos à execução ou pelo juízo do local onde deva ser executada a obrigação de fazer ou de não fazer, casos em que a remessa dos autos do processo será solicitada ao juízo de origem.

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A referência ao “acórdão proferido por Tribunal Marítimo” é ineficaz, pois houve veto à regra que o instituía como título executivo judicial – art. 515, X, do CPC/2015.

O novo Código mantém a tradição inaugurada pela Lei 11.232/2005 no CPC/1973, ao permitir que seja excepcionado o princípio da perpetuatio jurisdictionis (art. 43 do CPC/2015), autorizando que, nas hipóteses dos incs. II e III, possa ocorrer alteração superveniente da competência territorial, quando o exequente optar pelo (1) juízo do atual domicílio do executado, (2) pelo juízo do local onde se encontrem os bens sujeitos à execução ou (3) pelo juízo do local onde deva ser executada a obrigação de fazer ou de não fazer. Nesses casos, a remessa dos autos do processo será solicitada ao juízo de origem (art. 516, parágrafo único), que fará o controle da admissibilidade da opção. O juízo de origem poderá averiguar se a opção realizada pelo exequente efetivamente representa as alternativas do parágrafo único do art. 516 do CPC/2015. Poderá, por exemplo, exigir documentos que comprovem a localização dos bens do devedor sujeitos à penhora ou mesmo ouvir previamente o devedor sobre o seu atual domicílio. Constatada a adequação da opção, o juiz de origem remeterá os autos ao novo juiz da execução, escolhido pelo exequente, com baixa na distribuição. Ao contrário, se considerar que a opção do exequente foi equivocada, indeferirá a remessa dos autos, em decisão sujeita a agravo de instrumento (art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015).

O novo juízo da execução não poderá de ofício, recusar o recebimento dos autos para cumprimento de sentença, uma vez que eventual incompetência relativa não pode ser declarada de ofício (Súmula 33 STJ).

18.2.4. PROTESTO DE TÍTULO JUDICIAL O novo dispositivo torna inequívoca a possibilidade de protesto de qualquer decisão judicial

transitada em julgado, desde que transcorrido o prazo de 15 (quinze) dias para pagamento voluntário, previsto no art. 523 do CPC/2015. O protesto é regulado pela Lei 9.492/1997.

Em princípio, descaberia o protesto do título judicial por iniciativa do juiz, pois o parágrafo primeiro do art. 517 estabelece que, para efetivar o protesto, incumbe ao exequente apresentar, no cartório de protestos, certidão de teor da decisão, que deverá ser fornecida no prazo de 3 (três) dias, nos termos do parágrafo segundo desse mesmo artigo. No entanto, como esse protesto funciona como autêntica medida coercitiva para forçar o adimplemento da obrigação de pagar quantia, torna-se possível a iniciativa judicial, dado o poder geral de efetivação da tutela jurisdicional conferido aos juízes pelo art. 139, IV, do CPC/2015, o qual, expressamente, também contempla as “ações que tenham por objeto prestação pecuniárias.”

Cumpre observar que, além do protesto do título judicial, como forma de execução indireta, também é possível ao juiz, a requerimento da parte, “determinar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes”, inscrição essa que será “cancelada imediatamente se for efetuado o pagamento, se for garantida a execução ou se a execução for extinta por qualquer outro motivo” (art. 782, §§ 3.º a 5.º, CPC/2015). Para manter a harmonia dos dispositivos legais, deve-se entender que a referida inscrição, tal como o protesto, somente pode ser efetivada após transcorrido o prazo para pagamento voluntário.

A requerimento do executado, o protesto será cancelado por determinação do juiz, mediante ofício a ser expedido ao cartório, no prazo de 3 (três) dias, contado da data de protocolo do requerimento, desde que comprovada a satisfação integral da obrigação (art. 517, § 4.º). E caso o executado proponha ação rescisória para impugnar a decisão exequenda, poderá requerer, a suas expensas e sob sua responsabilidade, a anotação da propositura da ação à margem do título protestado (art. 517, § 3.º).

Eis a íntegra do artigo em tela:

Art. 517. A decisão judicial transitada em julgado poderá ser levada a protesto, nos termos da lei, depois de transcorrido o prazo para pagamento voluntário previsto no art. 523. § 1.º Para efetivar o protesto, incumbe ao exequente apresentar certidão de teor da decisão.

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§ 2.º A certidão de teor da decisão deverá ser fornecida no prazo de 3 (três) dias e indicará o nome e a qualificação do exequente e do executado, o número do processo, o valor da dívida e a data de decurso do prazo para pagamento voluntário. § 3.º O executado que tiver proposto ação rescisória para impugnar a decisão exequenda pode requerer, a suas expensas e sob sua responsabilidade, a anotação da propositura da ação à margem do título protestado. § 4.º A requerimento do executado, o protesto será cancelado por determinação do juiz, mediante ofício a ser expedido ao cartório, no prazo de 3 (três) dias, contado da data de protocolo do requerimento, desde que comprovada a satisfação integral da obrigação.

18.2.5. A EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE O CPC/2015 positivou a exceção da pré-executividade.

Art. 518. Todas as questões relativas à validade do procedimento de cumprimento da sentença e dos atos executivos subsequentes poderão ser arguidas pelo executado nos próprios autos e nestes serão decididas pelo juiz.

A exceção da pré-executividade é o meio de defesa atípico do executado, materializado por

simples petição nos próprios autos onde se desenvolve a execução, mas de cognição parcial, pois permite o conhecimento apenas de matérias de ordem pública, que não demandem dilação probatória.

Apesar dessa possibilidade defensiva atípica abranger qualquer espécie de cumprimento de sentença, há previsão especial para o caso de cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de pagar quantia: “as questões relativas a fato superveniente ao término do prazo para apresentação da impugnação, assim como aquelas relativas à validade e à adequação da penhora, da avaliação e dos atos executivos subsequentes, podem ser arguidas por simples petição, tendo o executado, em qualquer dos casos, o prazo de 15 (quinze) dias para formular esta arguição, contado da comprovada ciência do fato ou da intimação do ato” (art. 525, § 11, CPC/2015).

Da decisão do juiz que resolve a exceção de pré-executividade cabe agravo de instrumento (art. 1.015, parágrafo único, CPC/2015), ressalvada a hipótese de extinção da execução, que se faz por sentença (art. 203, § 1.º, CPC/2015), impugnável por apelação (art. 1.009 do CPC/2015).

18.2.6. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA E TUTELA PROVISÓRIA A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência (art. 294 do CPC/2015).

A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (art. 300 do CPC/2015), ao passo que a tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando o direito afirmado parecer evidente, diante das hipóteses catalogadas no art. 311 do CPC/2015.

Em qualquer caso, o juiz poderá determinar as medidas que considerar adequadas para efetivação da tutela provisória, observando, no que couberem, as normas referentes ao cumprimento provisório da sentença (art. 297 do CPC/2015).

Porém, segundo o art. 519 do CPC/2015:

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Art. 519. Aplicam-se as disposições relativas ao cumprimento da sentença, provisório ou definitivo, e à liquidação, no que couber, às decisões que concederem tutela provisória.

O cumprimento provisório da sentença é realizado da mesma forma que o cumprimento

definitivo (art. 520 do CPC/2015), o que justifica a referência, no artigo em comento, ao cumprimento definitivo. Como a concessão da tutela provisória pode envolver decisão ilíquida, também se justifica a referência às disposições relativas à liquidação.

Não obstante essas referências, o artigo em comento deve ser interpretado à luz do poder geral

de efetivação das ordens judiciais, previsto no art. 139, IV, do CPC/2015, o qual permite ao juiz flexibilizar as regras legais para fazer valer a autoridade de suas decisões. O limite para a criatividade judicial na fixação de medidas executivas atípicas está na proporcionalidade e razoabilidade, que orientam a aplicação do ordenamento jurídico (art. 8.º do CPC/2015).

18.2.7. CUMPRIMENTO PROVISÓRIO DA SENTENÇA QUE RECONHECE A EXIGIBILIDADE DE OBRIGAÇÃO DE PAGAR QUANTIA CERTA 18.2.7.1. Características e requisitos: O cumprimento provisório (“execução provisória” no

CPC/1973) é possível quando a sentença estiver sendo impugnada por recurso desprovido de efeito suspensivo (art. 520, caput). Essa possibilidade vale não apenas para as sentenças que reconhecem obrigação de pagar quantia, como também, no que couber, para as que reconhecem obrigação de fazer, não fazer ou de dar coisa (art. 520, § 5.º). Abrange também as decisões parciais de mérito (art. 356, § 2.º a 4.º, do CPC/2015) e orienta a efetivação da tutela provisória (art. 297 do CPC/2015).

De uma maneira geral, o cumprimento provisório tem o mesmo procedimento do cumprimento definitivo (art. 520, caput). Assim, tratando-se de cumprimento provisório de decisão que reconheça obrigação de pagar quantia, incide a multa de 10% e os honorários advocatícios de 10% previstos no parágrafo primeiro do art. 523 (art. 520, § 1.º), podendo o executado apresentar impugnação depois de escoado o prazo para pagamento voluntário (art. 520, § 1.º). Nesse caso, se o executado comparecer tempestivamente e depositar o valor, com a finalidade de se isentar da multa, o ato não será havido como incompatível com o recurso por ele interposto (art. 520, § 3.º), pelo que não haverá preclusão lógica.

Mas como a decisão é provisória, podendo ser anulada ou reformada a qualquer momento, justifica-se um regime jurídico diferenciado:

(1) exige-se, em qualquer hipótese, requerimento do exequente, pois o cumprimento provisório corre por sua iniciativa e responsabilidade, obrigando-se a reparar os danos que o executado haja sofrido, caso a decisão seja reformada (art. 520, I); (2) o cumprimento provisório fica sem efeito, caso sobrevenha decisão que modifique ou anule a decisão exequenda, restituindo-se as partes ao estado anterior e liquidando-se os prejuízos nos mesmos autos; caso a modificação ou anulação seja parcial, somente na parte modificada ou anulada ficará sem efeito o cumprimento provisório (art. 520, II e III); (3) exige-se, em regra, caução suficiente e idônea, arbitrada de plano pelo juiz e prestada nos próprios autos, para o levantamento de depósito em dinheiro ou expropriação de bens penhorados (art. 520, IV). Para prestigiar o cumprimento provisório e para preservar os interesses do terceiro de boa-fé, a

restituição ao estado anterior, caso necessário, não implicará o desfazimento da transferência de posse

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ou da alienação de propriedade ou de outro direito real eventualmente já realizada, ressalvado, sempre, o direito à reparação dos prejuízos causados ao executado (art. 520, § 4.º).

Veja-se o artigo base:

Art. 520. O cumprimento provisório da sentença impugnada por recurso desprovido de efeito suspensivo será realizado da mesma forma que o cumprimento definitivo, sujeitando-se ao seguinte regime: I – corre por iniciativa e responsabilidade do exequente, que se obriga, se a sentença for reformada, a reparar os danos que o executado haja sofrido; II – fica sem efeito, sobrevindo decisão que modifique ou anule a sentença objeto da execução, restituindo-se as partes ao estado anterior e liquidando-se eventuais prejuízos nos mesmos autos; III – se a sentença objeto de cumprimento provisório for modificada ou anulada apenas em parte, somente nesta ficará sem efeito a execução; IV – o levantamento de depósito em dinheiro e a prática de atos que importem transferência de posse ou alienação de propriedade ou de outro direito real, ou dos quais possa resultar grave dano ao executado, dependem de caução suficiente e idônea, arbitrada de plano pelo juiz e prestada nos próprios autos. § 1.º No cumprimento provisório da sentença, o executado poderá apresentar impugnação, se quiser, nos termos do art. 525. § 2.º A multa e os honorários a que se refere o § 1º do art. 523 são devidos no cumprimento provisório de sentença condenatória ao pagamento de quantia certa. § 3.º Se o executado comparecer tempestivamente e depositar o valor, com a finalidade de isentar-se da multa, o ato não será havido como incompatível com o recurso por ele interposto. § 4.º A restituição ao estado anterior a que se refere o inciso II não implica o desfazimento da transferência de posse ou da alienação de propriedade ou de outro direito real eventualmente já realizada, ressalvado, sempre, o direito à reparação dos prejuízos causados ao executado. § 5.º Ao cumprimento provisório de sentença que reconheça obrigação de fazer, de não fazer ou de dar coisa aplica-se, no que couber, o disposto neste Capítulo.

18.2.7.2. Dispensa de caução: O CPC2015 mantém casos de dispensabilidade da caução no cumprimento provisório, mas amplia, sensivelmente, tais hipóteses, quando em comparação com o CPC/1973, reformadas pela Lei 11.232/2005.

Art. 521. A caução prevista no inciso IV do art. 520 poderá ser dispensada nos casos em que: I – o crédito for de natureza alimentar, independentemente de sua origem; II – o credor demonstrar situação de necessidade; III – pender o agravo fundado nos incisos II e III do art. 1.042; IV – a sentença a ser provisoriamente cumprida estiver em consonância com súmula da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça ou em conformidade com acórdão proferido no julgamento de casos repetitivos. Parágrafo único. A exigência de caução será mantida quando da dispensa possa resultar manifesto risco de grave dano de difícil ou incerta reparação.

Nota-se que o artigo contempla casos isolados, não cumulativos, em que se autoriza a dispensa

da caução para levantamento de depósito em dinheiro ou expropriação de bens penhorados. Mas, mesmo incidindo qualquer desses casos, “a exigência da caução será mantida quando da dispensa possa resultar manifesto risco de grave dano de difícil ou incerta reparação” (art. 521, parágrafo único).

Independentemente do valor em execução, pode ser liberado o dinheiro depositado, adjudicado ou alienado o bem penhorado, em cumprimento provisório, quando:

(1) o crédito for de natureza alimentar, independentemente de sua origem; ou.

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(2) o crédito for de qualquer natureza, mas o credor demonstrar situação de necessidade; ou. (3) independentemente da natureza do crédito ou da situação do credor, pender o agravo em recurso especial ou recurso extraordinário, previsto no art. 1.042, II e III, do CPC/2015; ou, ainda, (4) a sentença ou decisão a ser provisoriamente cumprida estiver em consonância com súmula da jurisprudência do STF ou do STJ ou em conformidade com acórdão proferido no julgamento de casos repetitivos (incidente de resolução de demandas repetitivas e recursos especial e extraordinário repetitivos, nos termos do art. 928 do CPC/2015).

18.2.7.3. Requerimento e instrução do cumprimento provisório: O cumprimento provisório de

sentença corre por iniciativa e responsabilidade do exequente (art. 520, I, do CPC/2015), pelo que será necessário requerimento por petição dirigida ao juízo competente (art. 522, caput). O juízo competente é definido de acordo com as regras do art. 516 do CPC/2015. Aplicam-se ao cumprimento provisório de sentença as opções previstas no parágrafo único do art. 516 do CPC/2015.

Tratando-se de autos físicos, a petição requerendo o cumprimento provisório da sentença deverá

ser instruída com cópias das peças catalogadas no parágrafo único do art. 522, cuja autenticidade poderá ser certificada pelo próprio advogado, sob sua responsabilidade pessoal. Faltando cópias, cabe emenda, no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de indeferimento (art. 801 c.c. 771, CPC/2015).

O art. 522 está assim redigido:

Art. 522. O cumprimento provisório da sentença será requerido por petição dirigida ao juízo competente. Parágrafo único. Não sendo eletrônicos os autos, a petição será acompanhada de cópias das seguintes peças do processo, cuja autenticidade poderá ser certificada pelo próprio advogado, sob sua responsabilidade pessoal: I – decisão exequenda; II – certidão de interposição do recurso não dotado de efeito suspensivo; III – procurações outorgadas pelas partes; IV – decisão de habilitação se for o caso; V – facultativamente, outras peças processuais consideradas necessárias para demonstrar a existência do crédito.

18.2.8. CUMPRIMENTO DEFINITIVO DA SENTENÇA QUE RECONHECE A EXIGIBILIDADE DE OBRIGAÇÃO DE PAGAR QUANTIA CERTA

18.2.8.1. Características e requisitos: O art. 523 do CPC/2015 corresponde ao art. 475-J do

CPC/1973 reformado pela Lei 11.232/2005. É a regra base do procedimento de cumprimento definitivo da sentença que reconhece a exigibilidade de obrigação de pagar quantia certa, também aplicável ao cumprimento provisório.

Art. 523. No caso de condenação em quantia certa, ou já fixada em liquidação, e no caso de decisão sobre parcela incontroversa, o cumprimento definitivo da sentença far-se-á a requerimento do exequente, sendo o executado intimado para pagar o débito, no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido de custas, se houver. § 1.º Não ocorrendo pagamento voluntário no prazo do caput, o débito será acrescido de multa de dez por cento e, também, de honorários de advogado de dez por cento. § 2.º Efetuado o pagamento parcial no prazo previsto no caput, a multa e os honorários previstos no § 1.º incidirão sobre o restante.

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§ 3.º Não efetuado tempestivamente o pagamento voluntário, será expedido, desde logo, mandado de penhora e avaliação, seguindo-se os atos de expropriação.

Essa nova versão não destoa na versão anterior, apenas positivando alguns entendimentos

pacificados na jurisprudência do STJ, como a necessidade de requerimento do exequente, a intimação do devedor para pagar e a incidência de honorários advocatícios.

Assim, transitando em julgado a sentença condenatória líquida ou já sendo procedida a respectiva liquidação, por arbitramento ou pelo procedimento comum, deve o exequente apresentar o respectivo requerimento de execução, no juízo competente (art. 516 do CPC/2015), com as formalidades do art. 524 do CPC/2015, a partir do qual o executado será intimado, na forma do art. 513, § 2.º, do CPC2015, para pagar o débito, no prazo de 15 (quinze) dias úteis (art. 219 do CPC/2015), acrescido de custas, se houver.

Não havendo o pagamento tempestivo, o débito será acrescido, automaticamente, de multa de 10% e, também, de honorários advocatícios de 10%. Os honorários incidem sobre o valor do débito, sem a multa. A multa é fixa e incide uma vez só. Caso haja pagamento parcial no prazo legal, a multa e os honorários serão proporcionais ao valor não pago. O simples depósito como garantia não elide a multa, nem os honorários. Para tanto, exige-se pagamento, como forma de extinção da obrigação.

Além da incidência desses encargos legais sobre o débito, o não pagamento tempestivo abre à possibilidade de protesto do título judicial (art. 517 do CPC/2015) e inscrição do nome do devedor nos cadastros de inadimplentes (art. 782, §§ 3.º a 5.º, do CPC/2015), tudo sem prejuízo do início dos atos executivos, com a penhora de tantos bens quantos bastem para o pagamento do principal atualizado, da multa, dos juros, das custas e dos honorários advocatícios (art. 831 c.c. 771 do CPC/2015).

Esse procedimento também é aplicável às decisões parciais de mérito transitadas em julgado (art. 523 caput c.c. art. 356, §§ 2.º a 4.º, do CPC2015).

Trânsito em julgado da sentença ↓

Requerimento do exequente ↓

Intimação do devedor ↓

15 dias para pagar ↓

Paga: extingue-se a execução ↓

Não paga: multa de 10% + honorários de 10% ↓

Penhora + protesto + inscrição em cadastros de inadimplentes

18.2.8.2. Requerimento analítico e cálculo aritmético: O requerimento do exequente para o

cumprimento definitivo da sentença condenatória passa a ser mais analítico, visando a prevenir futuras discussões sobre erros de cálculo ou excessos de execução. Não basta uma petição qualquer. Será necessário oferecer uma petição mais detalhada, incluindo todos os elementos que bem esclareçam o demonstrativo discriminado e atualizado do crédito (a “liquidação por cálculo aritmético” do CPC/1973), o qual deve espelhar os critérios definidos pela sentença, conforme art. 491 caput do CPC/2015. Caso o requerimento não apresente todos os elementos indicados do artigo em comento, cabe emenda em 15 (quinze) dias, sob pena de indeferimento (art. 801 c.c. art. 771 do CPC/2015).

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Orientações para cálculo Demonstrativo do crédito

↓ ↓

Sentença Requerimento de execução

↓ ↓

Art. 491 Art. 524 Quando a elaboração do demonstrativo depender de dados em poder de terceiros ou do

executado, o juiz poderá requisitá-los, sob cominação do crime de desobediência, sem prejuízo de outras medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias, conforme permite o art. 139, IV, do CPC/2015.

Caso haja necessidade de complementação do demonstrativo do crédito e tal providência dependa de dados adicionais em poder do executado, o juiz poderá, a requerimento do exequente, requisitá-los, fixando prazo de até 30 (trinta) dias para o cumprimento da diligência; a omissão injustificada do executado gerará a presunção de que os cálculos apresentados pelo exequente, apenas com base nos dados de que dispõe, estão corretos, sem prejuízo de outras medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias, conforme permite o art. 139, IV, do CPC/2015.

Apresentados os cálculos, o juiz poderá valer-se de contabilista do juízo para verificá-los, o qual terá o prazo máximo de 30 (trinta) dias para tanto, exceto se outro lhe for determinado. Caso seja constatado que valor apontado no demonstrativo aparentemente excede os limites da condenação, a execução será iniciada pelo valor pretendido, mas a penhora terá por base a importância que o juiz entender adequada, baseada, se assim for, no parecer do contabilista judicial. Nesse caso, após a definição do valor correto, poderá haver reforço de penhora para ajustar ao valor correto pretendido.

Perceba-se o novo dispositivo:

Art. 524. O requerimento previsto no art. 523 será instruído com demonstrativo discriminado e atualizado do crédito, devendo a petição conter: I – o nome completo, o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas ou no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica do exequente e do executado, observado o disposto no art. 319, §§ 1.º a 3.º; II – o índice de correção monetária adotado; III – os juros aplicados e as respectivas taxas; IV – o termo inicial e o termo final dos juros e da correção monetária utilizada; V – a periodicidade da capitalização dos juros se for o caso; VI – especificação dos eventuais descontos obrigatórios realizados; VII – indicação dos bens passíveis de penhora, sempre que possível. § 1.º Quando o valor apontado no demonstrativo aparentemente exceder os limites da condenação, a execução será iniciada pelo valor pretendido, mas a penhora terá por base a importância que o juiz entender adequada. § 2.º Para a verificação dos cálculos, o juiz poderá valer-se de contabilista do juízo, que terá o prazo máximo de 30 (trinta) dias para efetuá-la, exceto se outro lhe for determinado. § 3.º Quando a elaboração do demonstrativo depender de dados em poder de terceiros ou do executado, o juiz poderá requisitá-los, sob cominação do crime de desobediência. § 4.º Quando a complementação do demonstrativo depender de dados adicionais em poder do executado, o juiz poderá, a requerimento do exequente, requisitá-los, fixando prazo de até 30 (trinta) dias para o cumprimento da diligência. § 5.º Se os dados adicionais a que se refere o § 4º não forem apresentados pelo executado, sem justificativa, no prazo designado, reputar-se-ão corretos os cálculos apresentados pelo exequente apenas com base nos dados de que dispõe.

18.2.8.3. Impugnação ao cumprimento de sentença: A impugnação continua a figurar como o

meio de defesa típico do executado no cumprimento de sentença por quantia certa. Mas, no CPC/2015,

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há uma diferença marcante: o executado não mais precisa garantir o juízo pela penhora para poder impugnar.

CPC1973 CPC2015

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Impugnação Impugnação

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Exige PENHORA NÃO exige PENHORA Além da defesa típica, o CPC/2015 positiva a exceção de pré-executividade, ao permitir que “as

questões relativas a fato superveniente ao término do prazo para apresentação da impugnação, assim como aquelas relativas à validade e à adequação da penhora, da avaliação e dos atos executivos subsequentes, podem ser arguidas por simples petição, tendo o executado, em qualquer dos casos, o prazo de 15 (quinze) dias para formular esta arguição, contado da comprovada ciência do fato ou da intimação do ato” (art. 525, § 11).

O prazo para impugnar é de 15 (quinze) dias úteis (art. 219 do CPC/2015), mas será contado em

dobro na hipótese de litisconsortes com advogados diferentes, atuando em autos físicos (art. 525, § 3.º). Esse prazo se inicia imediatamente após o transcurso do prazo de 15 (quinze) dias úteis para pagamento voluntário, sem adimplemento, independentemente de nova intimação. Em outras palavras, contados da intimação para pagar, o executado terá 30 (trinta) dias úteis para impugnar, sem contar com as dobras legais do prazo.

Intimação para pagar → 15d → sem pagamento → 15d → impugnação

A impugnação continua a se apresentar como um incidente de cognição na fase de cumprimento

de sentença, apresentada por petição dentro dos mesmos autos. Não suspende a execução, nem impede o levantamento de dinheiro depositado ou a expropriação de bens penhorados.

Excepcionalmente, poderá o juiz conceder o efeito suspensivo à impugnação, exclusivamente para impedir atos de expropriação (art. 525, § 7.º). Para tanto, é necessário reunir os seguintes requisitos (art. 525, § 6.º):

(1) requerimento do exequente; (2) garantia do juízo por penhora, caução ou depósito suficiente; (3) relevância da fundamentação contida na impugnação; e (4) perigo de dano grave de difícil ou incerta reparação pelo prosseguimento da execução. A decisão que aprecia o requerimento de efeito suspensivo à impugnação é sujeita a agravo de

instrumento (art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015). Mas ainda que atribuído efeito suspensivo à impugnação, é lícito ao exequente requerer o prosseguimento da execução, oferecendo e prestando, nos próprios autos, caução suficiente e idônea a ser arbitrada pelo juiz.

A impugnação ao cumprimento de sentença permite apenas uma cognição parcial, ou seja, ao impugnante é lícito deduzir apenas as matérias taxativamente arroladas no parágrafo primeiro do art. 525 do CPC/2015, as quais pouco diferem do rol do art. 475-L do CPC/1973, reformado pela Lei 11.232/2005.

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Dessas matérias, cumpre destacar duas: o excesso de execução e a inexequibilidade do “título executivo inconstitucional”.

No primeiro caso, não basta ao impugnante alegar que está sendo cobrado a mais. Em cumprimento ao dever de boa-fé processual, compete-lhe declarar de imediato o valor que entende correto e apresentar demonstrativo discriminado e atualizado de seu cálculo. Não apontado o valor correto ou não apresentado o demonstrativo, a impugnação será liminarmente rejeitada, se o excesso de execução for o seu único fundamento, ou, se houver outro, a impugnação será processada, mas o juiz não examinará a alegação de excesso de execução.

No segundo caso, considera-se “título executivo inconstitucional” aquele que foi fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo STF, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo STF como incompatível com a Constituição Federal, em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso. Nesse caso, o título executivo judicial será inexequível caso a decisão do STF seja anterior ao trânsito em julgado da decisão exequenda, ressalvada a possibilidade de modulação no tempo dos efeitos da decisão do STF, em atenção à segurança jurídica; sendo proferida após o trânsito em julgado da decisão exequenda, descabe sua alegação em impugnação, cabendo ação rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão proferida pelo STF. Essas novas regras procuram conciliar a garantia constitucional da intangibilidade da coisa julgada material com a necessidade de reforçar a supremacia da Constituição.

Mas o melhor, sempre, é conferir a íntegra do artigo:

Art. 525. Transcorrido o prazo previsto no art. 523 sem o pagamento voluntário, inicia-se o prazo de 15 (quinze) dias para que o executado, independentemente de penhora ou nova intimação, apresente, nos próprios autos, sua impugnação. § 1.º Na impugnação, o executado poderá alegar: I – falta ou nulidade da citação se, na fase de conhecimento, o processo correu à revelia; II – ilegitimidade de parte; III – inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação; IV – penhora incorreta ou avaliação errônea; V – excesso de execução ou cumulação indevida de execuções; VI – incompetência absoluta ou relativa do juízo da execução; VII – qualquer causa modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição, desde que supervenientes à sentença. § 2.º A alegação de impedimento ou suspeição observará o disposto nos arts. 146 e 148. § 3.º Aplica-se à impugnação o disposto no art. 229. § 4.º Quando o executado alegar que o exequente, em excesso de execução, pleiteia quantia superior à resultante da sentença, cumprir-lhe-á declarar de imediato o valor que entende correto, apresentando demonstrativo discriminado e atualizado de seu cálculo. § 5.º Na hipótese do § 4o, não apontado o valor correto ou não apresentado o demonstrativo, a impugnação será liminarmente rejeitada, se o excesso de execução for o seu único fundamento, ou, se houver outro, a impugnação será processada, mas o juiz não examinará a alegação de excesso de execução. § 6.º A apresentação de impugnação não impede a prática dos atos executivos, inclusive os de expropriação, podendo o juiz, a requerimento do executado e desde que garantido o juízo com penhora, caução ou depósito suficiente, atribuir-lhe efeito suspensivo, se seus fundamentos forem relevantes e se o prosseguimento da execução for manifestamente suscetível de causar ao executado grave dano de difícil ou incerta reparação. § 7.º A concessão de efeito suspensivo a que se refere o § 6.º não impedirá a efetivação dos atos de substituição, de reforço ou de redução da penhora e de avaliação dos bens. § 8.º Quando o efeito suspensivo atribuído à impugnação disser respeito apenas a parte do objeto da execução, esta prosseguirá quanto à parte restante.

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§ 9.º A concessão de efeito suspensivo à impugnação deduzida por um dos executados não suspenderá a execução contra os que não impugnaram, quando o respectivo fundamento disser respeito exclusivamente ao impugnante. § 10. Ainda que atribuído efeito suspensivo à impugnação, é lícito ao exequente requerer o prosseguimento da execução, oferecendo e prestando, nos próprios autos, caução suficiente e idônea a ser arbitrada pelo juiz. § 11. As questões relativas a fato superveniente ao término do prazo para apresentação da impugnação, assim como aquelas relativas à validade e à adequação da penhora, da avaliação e dos atos executivos subsequentes podem ser arguidas por simples petição, tendo o executado, em qualquer dos casos, o prazo de 15 (quinze) dias para formular esta arguição, contado da comprovada ciência do fato ou da intimação do ato. § 12. Para efeito do disposto no inciso III do § 1.º deste artigo, considera-se também inexigível a obrigação reconhecida em título executivo judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal como incompatível com a Constituição Federal, em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso. § 13. No caso do § 12, os efeitos da decisão do Supremo Tribunal Federal poderão ser modulados no tempo, em atenção à segurança jurídica. § 14. A decisão do Supremo Tribunal Federal referida no § 12 deve ser anterior ao trânsito em julgado da decisão exequenda. § 15. Se a decisão referida no § 12 for proferida após o trânsito em julgado da decisão exequenda, caberá ação rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal.

18.2.8.4. Cumprimento da sentença por iniciativa do réu: O CPC2015 permite que o réu (ainda

não executado) antecipe-se ao cumprimento de sentença, que quase sempre fica na dependência da iniciativa do exequente.

Art. 526. É lícito ao réu, antes de ser intimado para o cumprimento da sentença, comparecer em juízo e oferecer em pagamento o valor que entender devido, apresentando memória discriminada do cálculo. § 1.º O autor será ouvido no prazo de 5 (cinco) dias, podendo impugnar o valor depositado, sem prejuízo do levantamento do depósito a título de parcela incontroversa. § 2.º Concluindo o juiz pela insuficiência do depósito, sobre a diferença incidirão multa de dez por cento e honorários advocatícios, também fixados em dez por cento, seguindo-se a execução com penhora e atos subsequentes. § 3.º Se o autor não se opuser, o juiz declarará satisfeita a obrigação e extinguirá o processo.

O réu não precisa mais aguardar a iniciativa do exequente, podendo comparecer em juízo, desde

que antes de ser intimado para pagar, e depositar o valor que entender devido, segundo os critérios definidos pela sentença (art. 491 do CPC/2015), apresentando memória discriminada do cálculo, nos moldes previstos no art. 524 do CPC/2015. O autor será ouvido no prazo de 5 (cinco) dias, podendo impugnar o valor depositado, sem prejuízo do levantamento do depósito a título de parcela incontroversa. Se o autor não se opuser, o juiz declarará satisfeita a obrigação e extinguirá o processo. Caso contrário, concluindo o juiz pela insuficiência do depósito, sobre a diferença incidirão multa de dez por cento e honorários advocatícios, também fixados em dez por cento, seguindo-se a execução com penhora e atos subsequentes.

18.2.8.5. Cumprimento definitivo e cumprimento provisório: Segundo o art. 527 do CPC2015:

Art. 527. Aplicam-se as disposições deste Capítulo ao cumprimento provisório da sentença, no que couber.

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Parece que esse artigo é supérfluo diante das disposições já constantes no caput do art. 520, no sentido de que cumprimento provisório da sentença será realizado da mesma forma que o cumprimento definitivo.

18.2.9. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA QUE RECONHEÇA A EXIGIBILIDADE DE OBRIGAÇÃO DE FAZER, DE NÃO FAZER OU DE NÃO FAZER 18.2.9.1. Cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de

não fazer: O sistema de cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer é substancialmente diferente do sistema cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de pagar quantia.

Trata-se de um sistema mais aberto e flexível, mais sujeito à criatividade judicial razoável e

proporcional, sem procedimento rígido e preordenado. Esse cumprimento pode ser iniciado de ofício, sem depender de requerimento do exequente, a não ser que se trate de cumprimento provisório.

Para efetivar a tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, o juiz pode determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente. São as medidas executivas atípicas, exemplificativamente catalogadas no § 1.º do artigo em comento, em consonância com o poder geral de efetivação da tutela jurisdicional, outorgado aos juízes pelo art. 139, IV, do CPC/2015. Sem prejuízo delas, o executado que injustificadamente descumprir a ordem judicial incidirá nas penas de litigância de má-fé (cf. art. 81 do CPC/2015) e responderá pelo crime de desobediência (art. 526, § 3.º). A multa coercitiva (astreintes), regrada pelo art. 537, afigura-se como apenas uma dessas medidas necessárias, não gozando de qualquer primazia ou preferência nesse sistema de cumprimento de sentenças.

A defesa do executado, nesse sistema, passa a ser realizada por impugnação, regrada pelo art. 525 do CPC/2015. Assim, intimado o executado para cumprir a ordem de fazer ou de não fazer, e em não ocorrendo o cumprimento no prazo determinado, automaticamente abrirá o prazo de 15 (quinze) dias úteis para a apresentação da impugnação, sem efeito suspensivo, com cognição parcial. De qualquer forma, poderá o executado, nos termos do art. 518 do CPC/2015, arguir, nos próprios autos, todas as questões relativas à validade do procedimento de cumprimento da sentença e dos atos executivos subsequentes.

Esse sistema de cumprimento de sentença aplica-se tanto aos deveres de fazer ou de não fazer decorrentes de vínculo obrigacional, quanto de vínculo legal, não obrigacional.

O que era regrado pelo art. 461 do CPC1973 passa a sê-lo no art. 536 do CPC2015:

Art. 536. No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente. § 1.º Para atender ao disposto no caput, o juiz poderá determinar, entre outras medidas, a imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial. § 2.º O mandado de busca e apreensão de pessoas e coisas será cumprido por 2 (dois) oficiais de justiça, observando-se o disposto no art. 846, §§ 1º a 4º, se houver necessidade de arrombamento. § 3.º O executado incidirá nas penas de litigância de má-fé quando injustificada-mente descumprir a ordem judicial, sem prejuízo de sua responsabilização por crime de desobediência. § 4.º No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, aplica-se o art. 525, no que couber.

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§ 5.º O disposto neste artigo aplica-se, no que couber, ao cumprimento de sentença que reconheça deveres de fazer e de não fazer de natureza não obrigacional.

18.2.9.2. Astreinte (multa coercitiva): A multa coercitiva ou astreinte constitui uma das medidas

necessárias que podem ser aplicadas pelo juiz para a efetivação da tutela específica ou para a obtenção do resultado prático equivalente. Essa multa processual tem caráter exclusivamente coercitivo e não se confunde com a indenização devida ao exequente pelo descumprimento da ordem. Não tem primazia, nem preferência no sistema de cumprimento de sentenças que reconheçam os deveres de fazer ou não fazer. É uma alternativa para o juiz, na definição da melhor medida para garantir a autoridade da decisão judicial. É aplicável na fase de conhecimento de qualquer processo, seja qualquer for o procedimento previsto, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução.

A aplicação da multa não depende de requerimento da parte porque é mecanismo para prestigiar a autoridade da decisão judicial. Em função do seu caráter coercitivo, não tem valor máximo, nem mínimo, nem está adstrita ao valor da causa. Deve ser fixada em valor suficientemente alto para coagir o executado a cumprir a ordem em prazo razoável. Na verdade, essa multa não foi projetada para ser cobrada, pois sua finalidade não é gerar enriquecimento, mas inibir o comportamento contrário à ordem judicial. Pelas mesmas razões, o juiz poderá de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda ou excluí-la, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva ou que o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o descumprimento.

Infelizmente, o CPC2015 perdeu a chance de avançar nesse particular, modificando a destinação do valor eventualmente arrecadado a título de astreintes. Ao decidir destinar todo o valor da multa para o exequente, mantém o mesmo problema cotidianamente vivenciado na experiência forense: os juízes não fixam o valor da multa em patamares suficientemente altos para coagir, por receio de enriquecimento desproporcional do exequente. Melhor era ter seguido a solução pragmática do anteprojeto ou do projeto inicial do Senado: destinar ao exequente apenas a parte do valor arrecadado que correspondesse ao seu crédito reconhecido nos autos, lançando o restante para o Estado ou a União; e na hipótese do devedor da multa ser o próprio Estado ou a União, remetendo o que sobejar ao crédito do exequente para uma entidade, pública ou privada, com finalidade social.

Melhor será investir na multa atípica, prevista no art. 536, § 1.º, que pode ser moldada criativamente pelo juiz, inclusive quanto à destinação do seu valor, sem limitações antipragmáticas no artigo em comento.

De qualquer forma, a multa será devida desde o dia em que se configurar o descumprimento da decisão e incidirá enquanto não for cumprida a decisão que a tiver cominado. A decisão que fixa a multa é passível de cumprimento provisório, devendo ser depositada em juízo, permitido o levantamento do valor após o trânsito em julgado da sentença favorável à parte ou na pendência do agravo fundado nos incs. II ou III do art. 1.042. Caso o depósito não seja realizado, compete ao juiz, pelos meios disponíveis, inclusive pelo sistema eletrônico Bacenjud, arrecadar o valor, mantendo-o em depósito. A destinação do valor arrecadado somente se dará após o trânsito em julgado da sentença.

A multa aplica-se tanto aos deveres de fazer ou de não fazer decorrentes de vínculo obrigacional, quanto de vínculo legal, não obrigacional. O artigo em comento trata de uma das medidas necessárias que podem ser aplicadas pelo juiz para a efetivação da tutela específica ou para a obtenção do resultado prático equivalente: a multa coercitiva ou astreinte. Essa multa processual tem caráter exclusivamente coercitivo e não se confunde com a indenização devida ao exequente pelo descumprimento da ordem. Não tem primazia, nem preferência no sistema de cumprimento de sentenças que reconheçam os deveres de fazer ou não fazer. É uma alternativa para o juiz, na definição da melhor medida para garantir

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a autoridade da decisão judicial. É aplicável na fase de conhecimento de qualquer processo, seja qualquer for o procedimento previsto, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução.

A aplicação da multa não depende de requerimento da parte porque é mecanismo para prestigiar a autoridade da decisão judicial. Em função do seu caráter coercitivo, não tem valor máximo, nem mínimo, nem está adstrita ao valor da causa. Deve ser fixada em valor suficientemente alto para coagir o executado a cumprir a ordem em prazo razoável. Na verdade, essa multa não foi projetada para ser cobrada, pois sua finalidade não é gerar enriquecimento, mas inibir o comportamento contrário à ordem judicial. Pelas mesmas razões, o juiz poderá de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda ou excluí-la, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva ou que o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o descumprimento.

Infelizmente, o novo Código aprovado perdeu a chance de avançar nesse particular, modificando a destinação do valor eventualmente arrecadado a título de astreintes. Ao decidir destinar todo o valor da multa para o exequente, mantém o mesmo problema cotidianamente vivenciado na experiência forense: os juízes não fixam o valor da multa em patamares suficientemente altos para coagir, por receio de enriquecimento desproporcional do exequente. Melhor era ter seguido a solução pragmática do anteprojeto ou do projeto inicial do Senado: destinar ao exequente apenas a parte do valor arrecadado que correspondesse ao seu crédito reconhecido nos autos, lançando o restante para o Estado ou a União; e na hipótese do devedor da multa ser o próprio Estado ou a União, remetendo o que sobejar ao crédito do exequente para uma entidade, pública ou privada, com finalidade social.

Melhor será investir na multa atípica, prevista no art. 536, § 1.º, que pode ser moldada criativamente pelo juiz, inclusive quanto à destinação do seu valor, sem limitações antipragmáticas no artigo em comento.

De qualquer forma, a multa será devida desde o dia em que se configurar o descumprimento da decisão e incidirá enquanto não for cumprida a decisão que a tiver cominado. A decisão que fixa a multa é passível de cumprimento provisório, devendo ser depositada em juízo, permitido o levantamento do valor após o trânsito em julgado da sentença favorável à parte ou na pendência do agravo fundado nos incs. II ou III do art. 1.042. Caso o depósito não seja realizado, compete ao juiz, pelos meios disponíveis, inclusive pelo sistema eletrônico Bacenjud, arrecadar o valor, mantendo-o em depósito. A destinação do valor arrecadado somente se dará após o trânsito em julgado da sentença.

A multa aplica-se tanto aos deveres de fazer ou de não fazer decorrentes de vínculo obrigacional, quanto de vínculo legal, não obrigacional.

Confira-se:

Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito. § 1.º O juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda ou excluí-la, caso verifique que: I – se tornou insuficiente ou excessiva; II – o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou jus-ta causa para o descumprimento. § 2.º O valor da multa será devido ao exequente. § 3.º A decisão que fixa a multa é passível de cumprimento provisório, devendo ser depositada em juízo, permitido o levantamento do valor após o trânsito em julgado da sentença favorável à parte ou na pendência do agravo fundado nos incisos II ou III do art. 1.042. § 4.º A multa será devida desde o dia em que se configurar o descumprimento da

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decisão e incidirá enquanto não for cumprida a decisão que a tiver cominado. § 5º O disposto neste artigo aplica-se, no que couber ao cumprimento de sentença que reconheça deveres de fazer e de não fazer de natureza não obrigacional.

18.2.9.3. Cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de entregar coisa: O sistema de cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de entregar coisa tem as mesmas características do sistema de cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer. Mas pelas peculiaridades desse sistema, privilegia-se a expedição de mandado de busca e apreensão ou de imissão na posse em favor do credor, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel, mas sem prejuízo de outras medidas executivas atípicas que se apresentem como necessárias.

Eventuais direitos de indenização ou de retenção por benfeitorias devem ser alegados em contestação da fase de conhecimento, sob pena de preclusão.

Eis o artigo respectivo:

Art. 538. Não cumprida a obrigação de entregar coisa no prazo estabelecido na sentença, será expedido mandado de busca e apreensão ou de imissão na posse em favor do credor, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel. § 1.º A existência de benfeitorias deve ser alegada na fase de conhecimento, em contestação, de forma discriminada e com atribuição, sempre que possível e justificadamente, do respectivo valor. § 2.º O direito de retenção por benfeitorias deve ser exercido na contestação, na fase de conhecimento. § 3.º Aplicam-se ao procedimento previsto neste artigo, no que couberem, as disposições sobre o cumprimento de obrigação de fazer ou de não fazer.

18.2.10. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA QUE RECONHEÇA A EXIGIBILIDADE DE OBRIGAÇÃO DE PAGAR QUANTIA CERTA PELA FAZENDA PÚBLICA

Art. 534. No cumprimento de sentença que impuser à Fazenda Pública o dever de pagar quantia certa, o exequente apresentará demonstrativo discriminado e atualizado do crédito contendo: I - o nome completo e o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas ou no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica do exequente; II - o índice de correção monetária adotado; III - os juros aplicados e as respectivas taxas; IV - o termo inicial e o termo final dos juros e da correção monetária utilizada; V - a periodicidade da capitalização dos juros se for o caso; VI - a especificação dos eventuais descontos obrigatórios realizados. § 1.º Havendo pluralidade de exequentes, cada um deverá apresentar o seu próprio demonstrativo, aplicando-se à hipótese, se for o caso, o disposto nos §§ 1.º e 2;º do art. 113. § 2.º A multa prevista no § 1.º do art. 523 não se aplica à Fazenda Pública. Art. 535. A Fazenda Pública será intimada na pessoa de seu representante judicial, por carga, remessa ou meio eletrônico, para, querendo, no prazo de 30 (trinta) dias e nos próprios autos, impugnar a execução, podendo arguir: I - falta ou nulidade da citação se, na fase de conhecimento, o processo correu à revelia; II - ilegitimidade de parte; III - inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação; IV - excesso de execução ou cumulação indevida de execuções;

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V - incompetência absoluta ou relativa do juízo da execução; VI - qualquer causa modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição, desde que supervenientes ao trânsito em julgado da sentença. § 1.º A alegação de impedimento ou suspeição observará o disposto nos arts. 146 e 148. § 2.º Quando se alegar que o exequente, em excesso de execução, pleiteia quantia superior à resultante do título, cumprirá à executada declarar de imediato o valor que entende correto, sob pena de não conhecimento da arguição. § 3.º Não impugnada a execução ou rejeitadas as arguições da executada: I - expedir-se-á, por intermédio do presidente do tribunal competente, precatório em favor do exequente, observando-se o disposto na Constituição Federal; II - por ordem do juiz, dirigida à autoridade na pessoa de quem o ente público foi citado para o processo, o pagamento de obrigação de pequeno valor será realizado no prazo de 2(dois) meses contado da entrega da requisição, mediante depósito na agência de banco oficial mais próxima da residência do exequente. § 4.º Tratando-se de impugnação parcial, a parte não questionada pela executada será, desde logo,objeto de cumprimento. § 5.º Para efeito do disposto no inciso III do caput deste artigo, considera-se também inexigível a obrigação reconhecida em título executivo judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal como incompatível com a Constituição Federal, em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso. § 6.º No caso do § 5.º, os efeitos da decisão do Supremo Tribunal Federal poderão ser modulados no tempo, de modo a favorecer a segurança jurídica. § 7.º A decisão do Supremo Tribunal Federal referida no § 5.º deve ter sido proferida antes do trânsito em julgado da decisão exequenda. § 8.º Se a decisão referida no § 5.º for proferida após o trânsito em julgado da decisão exequenda, caberá ação rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão proferida pelo SupremoTribunal Federal.

I - Execução de Título Judicial.

Como já analisado no ponto anterior, a Execução de Título Judicial ocorre, como regra, em processo sincrético dotado de fase executiva. Ademais, os procedimentos expropriatórios foram simplificados, tendo-se em mente a nomeação de bens à penhora pelo devedor, a avaliação pelo Oficial de Justiça, dentre outras.

A execução dirá respeito, neste caso, a decisão judicial, que poderá ser mandamental (entregar coisa certa ou incerta / fazer ou não fazer) ou de cumprimento propriamente (pagamento por pagamento de quantia contra devedor solvente / insolvente). Há, ainda, a execução proposta contra a Fazenda Pública e em razão de alimentos, que segue autônoma.

a) Execução de decisões mandamentais

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19.1 EXECUÇÃO DE DECISÃO DE ENTREGAR COISA – ART. 498 DO NOVO CPC

A ação de obrigação de entrega de coisa é fundada no direito de exigir o cumprimento da prestação obrigacional de entrega de um bem. Em um contrato de compra e venda de bem móvel, celebrado entre comprador e vendedor em que mesmo diante do pagamento, há pendência na entrega da coisa conforme acordado entre as partes.

A execução para entrega de coisa, encontra regramento do art. 806 ao 813 do Novo Código de Processo Civil. Subdivide-se em: entrega de coisa certa e entrega de coisa incerta.

Entrega de coisa certa (Art. 806 ao Art. 810 do Novo CPC)

Entrega da coisa contratada. Objeto especificadamente determinado.

Citação para, em 15 dias entregar, a coisa ou oferecer embargos. Pode ser fixada multa diária pelo atraso. (Art. 806, § 1º)

Com a reforma processual, não há necessidade de segurança do juízo para o oferecimento de embargos à execução.

Interpretação do Art. 914 do Novo CPC – Necessidade do depósito apenas para postular efeitos suspensivo aos embargos (Art. 919, § 1º, do Novo CPC).

O prazo dos embargos é de 15 dias, contados da data da juntada aos autos do mandado de citação, conforme Art. 915 do Novo CPC.

Não entregue a coisa ou não suspendida a execução pelos embargos, será expedido mandado de imissão na posse ou de busca e apreensão, conforme se tratar de imóvel ou de móvel. (Art. 806, § 2º, Novo CPC).

Entrega de Coisa Incerta (Art. 811 Art. 813 do Novo CPC)

Aplica-se no caso de coisa determinadas pelo gênero e quantidade.

O devedor será citado para entregá-las individualizadas, sendo sua a escolha. Se a escolha

couber ao credor, este indicará na petição inicial. (Art. 811, parágrafo único, Novo CPC).

Qualquer das partes poderá, em 15 dias, impugnar a escolha feita pela outra, e o juiz decidirá

de plano, ou, se necessário, ouvindo perito de sua nomeação. (Art. 812, Novo CPC).

Aplicação subsidiária das regras de execução para entrega de coisa certa. (Art. 813, Novo CPC).

Como regra, temos que, recebendo a inicial, o juiz pode fixar prazo para entrega, sob pena de multa (astreintes) na citação do executado. Como resposta, o executado pode: entregar a coisa (Art. 807, Novo CPC, hipótese em que se extingue a execução, salvo se prosseguir para pagamento de frutos ou prejuízos) ou depositar a coisa e manejar embargos.

Nesse caso, recebidos os embargos, o juiz suspende a execução até o seu julgamento, e rejeitados ou não admitidos os embargos o juiz autorizará a entrega ao credor ou a imissão na posse. Acaso não seja atribuído efeito suspensivo, o juiz autoriza a entrega da coisa ou a imissão na posse, e acolhendo integralmente os embargos, extingue-se a execução.

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Acaso os embargos não tenham sido precedidos pela entrega da coisa, eles não serão admitidos e será ordenada a busca e apreensão.

Art. 919. Os embargos à execução não terão efeito suspensivo. § 1

o O juiz poderá, a requerimento do embargante, atribuir efeito suspensivo aos embargos

quando verificados os requisitos para a concessão da tutela provisória e desde que a execução já esteja garantida por penhora, depósito ou caução suficientes. § 2

o Cessando as circunstâncias que a motivaram, a decisão relativa aos efeitos dos embargos

poderá, a requerimento da parte, ser modificada ou revogada a qualquer tempo, em decisão fundamentada. § 3

o Quando o efeito suspensivo atribuído aos embargos disser respeito apenas a parte do ob-

jeto da execução, esta prosseguirá quanto à parte restante. § 4

o A concessão de efeito suspensivo aos embargos oferecidos por um dos executados não

suspenderá a execução contra os que não embargaram quando o respectivo fundamento dis-ser respeito exclusivamente ao embargante. § 5

o A concessão de efeito suspensivo não impedirá a efetivação dos atos de substituição, de

reforço ou de redução da penhora e de avaliação dos bens Art. 809. O exequente tem direito a receber, além de perdas e danos, o valor da coisa, quando essa se deteriorar, não lhe for entregue, não for encontrada ou não for reclamada do poder de terceiro adquirente. § 1o Não constando do título o valor da coisa e sendo impossível sua avaliação, o exequente apresentará estimativa, sujeitando-a ao arbitramento judicial. § 2o Serão apurados em liquidação o valor da coisa e os prejuízos.

Cabendo ao executado a escolha, portanto, cumpre a ele entregar a coisa individualizada, de acordo com o art. 811 do Novo Código de Processo Civil. Ainda, no que tange à coisa incerta, o Código Civil traz os seguintes dispositivos de considerável importância:

Art. 243. A coisa incerta será indicada, ao menos, pelo gênero e pela quantidade. Art. 244. Nas coisas determinadas pelo gênero e pela quantidade, a escolha pertence ao deve-dor, se o contrário não resultar do título da obrigação; mas não poderá dar a coisa pior, nem será obrigado a prestar a melhor. Art. 245. Cientificado da escolha o credor, vigorará o disposto na Seção antecedente. Art. 246. Antes da escolha, não poderá o devedor alegar perda ou deterioração da coisa, ainda que por força maior ou caso fortuito.

O incidente de individualização ocorrerá acaso o credor não concorde com a coisa entrega pelo réu, podendo ele em 15 dias impugnar a escolha. O juiz decide ou determina a instrução para ser feita perícia nas escolhas realizadas.

19.2 EXECUÇÃO DE OBRIGAÇÃO/DECISÃO DE FAZER E DE NÃO FAZER – ART. 497 DO NOVO CPC

Não se trata, aqui, de pagamento, mas sim de um comportamento humano. Como exemplo, podemos citar que o devedor poderá ser obrigado a efetuar uma obra de arte, dar uma palestra, escrever um livro, etc. O devedor poderá ainda ser obrigado a não fazer, como por exemplo, no caso de em que lhe é vedado abrir estabelecimento comercial dentro de certa distância.

Tendo em vista a natureza peculiar das obrigações, as técnicas executivas não estão restritas ao art. 814 do Novo CPC. A primazia de tutela específica do direito, ora aplicável, assume que só se

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transforma a tutela específica pela do equivalente pecuniário se for o desejo da parte ou se for impossível a tutela específica dos direitos.

Art. 814. Na execução de obrigação de fazer ou de não fazer fundada em título extrajudicial, ao despachar a inicial, o juiz fixará multa por período de atraso no cumprimento da obrigação e a data a partir da qual será devida. Parágrafo único. Se o valor da multa estiver previsto no título e for excessivo, o juiz poderá reduzi-lo Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se proce-dente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente. Parágrafo único. Para a concessão da tutela específica destinada a inibir a prática, a reiteração ou a continuação de um ilícito, ou a sua remoção, é irrelevante a demonstração da ocorrência de dano ou da existência de culpa ou dolo. Art. 498. Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a tutela especí-fica, fixará o prazo para o cumprimento da obrigação. Parágrafo único. Tratando-se de entrega de coisa determinada pelo gênero e pela quantidade, o autor individualizá-la-á na petição inicial, se lhe couber a escolha, ou, se a escolha couber ao réu, este a entregará individualizada, no prazo fixado pelo juiz. Art. 499. A obrigação somente será convertida em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente. Art. 500. A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa fixada periodica-mente para compelir o réu ao cumprimento específico da obrigação. Art. 501. Na ação que tenha por objeto a emissão de declaração de vontade, a sentença que julgar procedente o pedido, uma vez transitada em julgado, produzirá todos os efeitos da de-claração não emitida Art. 536. No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela especí-fica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas neces-sárias à satisfação do exequente. § 1

o Para atender ao disposto no caput, o juiz poderá determinar, entre outras medidas, a im-

posição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de o-bras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial. § 2

o O mandado de busca e apreensão de pessoas e coisas será cumprido por 2 (dois) oficiais

de justiça, observando-se o disposto no art. 846, §§ 1º a 4º, se houver necessidade de arrom-bamento. § 3

o O executado incidirá nas penas de litigância de má-fé quando injustificadamente descum-

prir a ordem judicial, sem prejuízo de sua responsabilização por crime de desobediência. § 4

o No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de

não fazer, aplica-se o art. 525, no que couber. § 5

o O disposto neste artigo aplica-se, no que couber, ao cumprimento de sentença que reco-

nheça deveres de fazer e de não fazer de natureza não obrigacional. Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de co-nhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja sufi-ciente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito. § 1

o O juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa

vincenda ou excluí-la, caso verifique que: I - se tornou insuficiente ou excessiva;

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II - o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o descumprimento. § 2

o O valor da multa será devido ao exequente.

§ 3o A decisão que fixa a multa é passível de cumprimento provisório, devendo ser depositada

em juízo, permitido o levantamento do valor após o trânsito em julgado da sentença favorável à parte ou na pendência do agravo fundado nos incisos II ou III do art. 1.042. § 4

o A multa será devida desde o dia em que se configurar o descumprimento da decisão e in-

cidirá enquanto não for cumprida a decisão que a tiver cominado. § 5

o O disposto neste artigo aplica-se, no que couber, ao cumprimento de sentença que reco-

nheça deveres de fazer e de não fazer de natureza não obrigacional. Art. 816. Se o executado não satisfizer a obrigação no prazo designado, é lícito ao exequente, nos próprios autos do processo, requerer a satisfação da obrigação à custa do executado ou perdas e danos, hipótese em que se converterá em indenização. Parágrafo único. O valor das perdas e danos será apurado em liquidação, seguindo-se a execu-ção para cobrança de quantia certa.

Obrigação de fazer

Técnicas para resolução da obrigação de fazer: transformação – conversão na obrigação de fazer ou não fazer em seu equivalente pecuniário (perdas e danos) e custeio (realizar às custas do executado).

Quando o objeto da execução for obrigação de fazer, o devedor será citado para satisfazê-la no prazo que o juiz lhe assinar, se outro não estiver determinado no título executivo (art. 815 do Novo CPC). A obrigação deve ser cumprida no prazo constante do título ou, caso inexista prazo previsto, naquele fixado pelo juiz. Se, no prazo fixado, o devedor não satisfizer a obrigação, é lícito ao credor, nos próprios autos do processo, requerer que ela seja executada à custa do devedor, ou haver perdas e danos; caso em que ela se converte em indenização. O valor das perdas e danos será apurado em liquidação, seguin-do-se a execução para cobrança de quantia certa.

Um dado importante refere-se à necessária identificação da natureza da obrigação, ou seja, se fungível ou infungível. Nas obrigações infungíveis de fazer o credor poderá requerer ao juiz que lhe assi-ne prazo para cumpri-la. Havendo recusa ou mora do devedor, a obrigação pessoal do devedor conver-ter-se-á em perdas e danos, aplicando-se, outrossim, o disposto no art. 816 do Novo CPC. A obrigação infungível, portanto, jamais poderá ser prestada por terceiro. Em se tratando de obrigação fungível, aplica-se o disposto nos artigos 817 a 820 do Novo CPC.

A regra geral do art. 915 é que poderão ser opostos embargos no prazo de 15 dias.

Art. 817. Se a obrigação puder ser satisfeita por terceiro, é lícito ao juiz autorizar, a requeri-mento do exequente, que aquele a satisfaça à custa do executado. Parágrafo único. O exequente adiantará as quantias previstas na proposta que, ouvidas as par-tes, o juiz houver aprovado. Art. 819. Se o terceiro contratado não realizar a prestação no prazo ou se o fizer de modo in-completo ou defeituoso, poderá o exequente requerer ao juiz, no prazo de 15 (quinze) dias, que o autorize a concluí-la ou a repará-la à custa do contratante. Parágrafo único. Ouvido o contratante no prazo de 15 (quinze) dias, o juiz mandará avaliar o custo das despesas necessárias e o condenará a pagá-lo.

Art. 820. Se o exequente quiser executar ou mandar executar, sob sua direção e vigilância, as obras e os trabalhos necessários à realização da prestação, terá preferência, em igualdade de

condições de oferta, em relação ao terceiro.Parágrafo único. O direito de preferência deverá ser exercido no prazo de 5 (cinco) dias, após aprovada a proposta do terceiro.

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Obrigação de não fazer

Técnicas para resolução da obrigação de não fazer: dissolução e das perdas e danos.

Se o devedor praticou o ato, a cuja abstenção estava obrigado pela lei ou pelo contrato, o credor requererá ao juiz que lhe assine prazo para desfazê-lo (art. 822). Havendo recusa ou mora do devedor, o credor requererá ao juiz que mande desfazer o ato à sua custa, respondendo o devedor por perdas e danos. Não sendo possível desfazer-se o ato, a obrigação resolve-se em pecúnia/perdas e danos (art. 823, caput e parágrafo único).

Art. 822. Se o executado praticou ato a cuja abstenção estava obrigado por lei ou por contrato, o exequente requererá ao juiz que assine prazo ao executado para desfazê-lo. Art. 823. Havendo recusa ou mora do executado, o exequente requererá ao juiz que mande desfazer o ato à custa daquele, que responderá por perdas e danos. Parágrafo único. Não sendo possível desfazer-se o ato, a obrigação resolve-se em perdas e da-nos, caso em que, após a liquidação, se observará o procedimento de execução por quantia certa.

b) Execução de cumprimento de sentença (art. 513, do Novo CPC)

19.3 EXECUÇÃO POR PAGAMENTO DE QUANTIA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE

Técnica expropriatória é o método da execução por quantia. Quando se fala nisso, se fala da em tirar algo do executado para dar para o exequente, tirar do réu para dar para o autor. Essa técnica expropriatória pressupõe uma sequência de atos executivos, dentre eles, um dos mais importantes sendo o ato de penhora. O executado será responsável com o seu patrimônio para satisfação do crédito, e as suas características são:

Execução direta, em que o Estado realiza atividade sub-rogatória;

Execução patrimonial;

Utilização de meios executivos típicos em que toda a atividade está previamente regulada pelo legislador.

Art. 797. Ressalvado o caso de insolvência do devedor, em que tem lugar o concurso universal, realiza-se a execução no interesse do exequente que adquire, pela penhora, o direito de prefe-rência sobre os bens penhorados. Art. 824. A execução por quantia certa realiza-se pela expropriação de bens do executado, res-salvadas as execuções especiais. Art. 789. O devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimen-to de suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei.

Há casos de títulos judiciais que ainda exigem o manejo de ação executiva, não se aplicando a esses casos necessariamente o processo sincréitco, como a Execução Contra a Fazenda Pública e a Execução de Alimentos com Prisão Civil do Executado, uma vez que o sistema processual vigente ordena a citação, do que se origina um novo processo.

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Execução de Alimentos com Prisão Civil do Executado

Se a execução de alimentos for ser realizada na forma de execução patrimonial, por

quantia, sem a utilização da técnica da prisão civil, não é necessário ajuizar ação autônoma, essa

sentença vai ser cumprida na forma do Art. 523 do Novo CPC. Se a execução ocorrer mediante a técnica

de prisão civil, é preciso entrar com uma ação de execução de alimentos requerendo a citação do

devedor para pagar, sob pena de prisão. É que ação de alimentos pode-se escolher entre os ritos do art.

523 ou do art. 528, § 3°, do Novo CPC.

Execução contra a Fazenda Pública

Entendeu o legislador manter a execução contra a Fazenda Pública submetido ao sistema da dúplice demanda. Somente condenada a Fazenda ao pagamento de quantia tem que ser executada em uma ação de execução diversa da ação de conhecimento. Se for execução de fazer ou de não fazer, mesmo contra a Fazenda Pública, cumprem-se os arts. 497 e 498 do Novo CPC, em razão da peculiaridade do credor.

Nas condenações ao pagamento de quantia certa, há que se considerar dois fatores importantes: de um lado, tem-se a base do mecanismo executivo, o interesse particular de obter, com a maior brevidade possível, o valor do seu crédito; enquanto, de outro, se tem em vista o interesse público, a necessidade de respeito à disponibilidade orçamentária para viabilizar a continuidade do serviço público e investimentos de políticas públicas.

Assim, e tendo em vista a indisponibilidade dos bens públicos no que tange sobretudo à penhora, principal meio de coerção do sistema de execuções, o meio de garantir o pagamento da quantia certa é o Precatório ou a Requisição de Pequeno Valor (RPV). Os precatórios são créditos cujo valor é igual ou superior a 60 (sessenta) salários mínimos, enquanto que as RPVs dizem respeito a créditos com valor inferior a tal quantia.

Os valores respectivos são passados aos Tribunais, que efetuam os pagamentos aos credores. Os montantes dos precatórios devem ser incluídos na proposta orçamentária do exercício seguinte ao da expedição, quando serão pagos. Já as RPVs são pagas em até 60 (sessenta) dias após a expedição pelo juízo. O credor do precatório, a partir da notificação do crédito, pode renunciar ao valor excedente aos 60 (sessenta) salários mínimos, recebendo em RPV.

Merece também destaque o fato de que os créditos de natureza alimentícia têm preferência na ordem de pagamento sobre os demais, respeitando-se a prioridade também devida aos portadores de deficiência grave e os idosos com 60 anos ao dia a da expedição do precatório. O portador da doença grave pode requerer prioridade a qualquer momento. O sucessor aproveita a prioridade no caso de morte do beneficiário após a expedição do precatório. As prioridades dos créditos para os portadores de doenças graves e idosos é limitada ao triplo do valor estipulado para as RPVs (o equivalente a 180 salários mínimos).

Ainda, deve-se atentar à possibilidade de compensação dos créditos referentes a precatórios quanto a eventuais débitos tributários existentes em nome do beneficiário. Os débitos a serem compensados limitar-se-ão ao valor líquido do precatório, abatendo-se o montante correspondente aos débitos líquidos e certos, inscritos ou não em dívida ativa. Não se aplica a RPVs ou a precatórios parcelados expedidos até 01/07/2009.

Insta, ainda, referir que há possibilidade de cessão de créditos por parte do credor do precatório. Assim, os créditos podem ser cedidos total ou parcialmente a terceiros, independentemente de concordância do devedor. A eficácia de tal acordo com terceiros ocorre mediante solicitação ao juiz de juntada do contrato de cessão ao processo de execução ao qual está vinculado o precatório antes de ser encaminhado ao Tribunal.

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No caso de parcelamento do precatório, o Supremo Tribunal Federal julgou, no dia 14/03/2013, inconstitucional o regime especial de pagamento de precatórios, instituído pela Emenda Constitucional nº 62. A corte decidiu, por maioria, acolher a Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pela OAB, para que os precatórios sejam quitados em uma única parcela, no ano subsequente à sua expedição.

19.4 EXECUÇÃO POR PAGAMENTO DE QUANTIA CONTRA DEVEDOR INSOLVENTE

No que tange a esse ponto em particular, importa destacar que o Novo Código decidiu pela manutenção da vigência do Livro II, Título IV, do Código de 1973 (que trata de tal matéria), até a edição de lei específica (art. 1.052 do Novo CPC). Portanto, os dispositivos legais aqui mencionados serão aqueles referentes ao Código de Processo Civil de 1973.

A execução de quantia certa contra devedor insolvente diferencia-se da proposta contra o devedor solvente justamente pela necessidade de ser declarado o estado de insolvência do devedor antes de se poder iniciar a execução propriamente dita. Para ser declarada a insolvência, a totalidade do patrimônio ativo do devedor deve ser insuficiente para cobrir o patrimônio passivo, de modo que os recursos do executado não suportem o montante devido ao(s) credore(s).

O requerimento da insolvência pode ser litigioso ou não e deve ser autuado em apartado, não se admitindo que a execução por quantia certa seja transformada em pedido de insolvência. As pessoas legalmente legitimadas para o requerimento da insolvência (devedor ou espólio do devedor e do credor) deverão endereçar uma petição ao juiz competente, (nos termos dos artigos 754 e 760, incisos I, II, III, do CPC).

A petição será instruída com o título executivo, no caso de pedido formulado por credor. Em se tratando de pedido do devedor ou seu espólio, exige-se a relação de credores, a individulização de todos os bens e relatório do estado de insolvência do devedor. Citado o devedor (Art.755, do CPC) terá este o prazo de 10 dias para opor embargos. Não se apresentando os embargos e não havendo necessidade de produção de provas (Art. 758), o juiz proferirá a sentença em 10 dias.

A declaração de insolvência do devedor produzirá os seguintes efeitos: i) o vencimento antecipado de suas dívidas; ii) a arrecadação de todos os seus bens suscetíveis de penhora, quer os atuais, quer os adquiridos no curso do processo; iii) a execução por concurso universal dos seus credores (disto se infere se tratar de execução coletiva, pois haverá o concurso de credores).

Os devedores podem ser tanto pessoas naturais quanto sociedades civis. No procedimento da insolvência, após a fase postulatória e instrutória, em que há a declaração de insolvência, temos a fase da arrecadação e da habilitação de créditos, a fase de verificação e classificação dos créditos e, por fim, a fase da liquidação da massa e do pagamento dos credores, como se verá na análise a seguir.

No encerramento da fase cognitiva, com a sentença de insolvência, inaugura-se a segunda fase (a de fato executiva), esta se processa em regra no mesmo juízo que declarou a insolvência. Nesse contexto, de ofício, o juiz nomeia, dentre os maiores credores, o administrador. A partir de então, o devedor insolvente perde o direto de administrar seus bens até a liquidação total da massa.

Cumpre ao administrador, adotar as medidas judiciais necessárias para arrecadar todos os bens do devedor, fazendo, se possível lucro. Dessa maneira, visando cumprir a sentença declaratória de insolvência, pode o administrador utilizar os preceitos do artigo 475-J, caput e parágrafos do Código de Processo Civil, bem como se valer de forma subsidiária das regras de execução de títulos extrajudiciais (Art. 475R, 598 e 766, inciso I, do CPC).

Liquidada a massa através do necessário rateio, é comum que não haja a satisfação integral dos credores. Assim, o devedor insolvente continua sendo responsável pelo crédito remanescente com seus bens futuros, sendo que a certidão comprobatória desse crédito poderá ser requerida ao juiz (Arts. 774 e 775, do CPC). Os bens futuros serão arrecadados nos mesmos autos a requerimento de qualquer credor, procedendo-se a alienação e o respectivo rateio (Art. 776, do CPC).

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Esta responsabilidade subsistirá até que se consuma a prescrição, que é de cinco anos (Art. 778, do CPC) contados de acordo com a possibilidade de suspensão (prevista no Art. 777, do CPC). A partir da sentença que declara extintas asobrigações, a situação do devedor fica juridicamente alterada, com o trânsito em julgado da sentença, o devedor volta a ser habilitado à prática dos atos da vida civil (Art. 782, do CPC).

II - Execução de Título Extrajudicial. Conforme mais analisado mais profundamente no ponto 18.2, os Títulos Extrajudiciais são os

títulos elencados no art. 784 do Novo Código de Processo Civil, sem prejuízo de, conforme disposto no inciso XII do próprio, haver previsão de títulos extrajudiciais em legislação esparsa:

Art. 784. São títulos executivos extrajudiciais: I - a letra de câmbio, a nota promissória, a duplicata, a debênture e o cheque; II - a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor; III - o documento particular assinado pelo devedor e por 2 (duas) testemunhas; IV - o instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública, pela Advocacia Pública, pelos advogados dos transatores ou por conciliador ou mediador cre-denciado por tribunal; V - o contrato garantido por hipoteca, penhor, anticrese ou outro direito real de garantia e a-quele garantido por caução; VI - o contrato de seguro de vida em caso de morte; VII - o crédito decorrente de foro e laudêmio; VIII - o crédito, documentalmente comprovado, decorrente de aluguel de imóvel, bem como de encargos acessórios, tais como taxas e despesas de condomínio; IX - a certidão de dívida ativa da Fazenda Pública da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, correspondente aos créditos inscritos na forma da lei; X - o crédito referente às contribuições ordinárias ou extraordinárias de condomínio edilício, previstas na respectiva convenção ou aprovadas em assembleia geral, desde que documen-talmente comprovadas; XI - a certidão expedida por serventia notarial ou de registro relativa a valores de emolumen-tos e demais despesas devidas pelos atos por ela praticados, fixados nas tabelas estabelecidas em lei; XII - todos os demais títulos aos quais, por disposição expressa, a lei atribuir força executiva. § 1

o A propositura de qualquer ação relativa a débito constante de título executivo não inibe o

credor de promover-lhe a execução. § 2

o Os títulos executivos extrajudiciais oriundos de país estrangeiro não dependem de homo-

logação para serem executados. § 3

o O título estrangeiro só terá eficácia executiva quando satisfeitos os requisitos de formação

exigidos pela lei do lugar de sua celebração e quando o Brasil for indicado como o lugar de cumprimento da obrigação. Muitos dos institutos que serão analisados têm a ver com a técnica expropriatória, de execução

por quantia, e se aplicam tanto para as execuções do livro II, como do livro I, visto que são aplicáveis subsidiariamente a esses.

É necessário que seja formulada uma petição inicial de demanda executiva. Essa petição inicial é regulada, quanto aos seus requisitos formais específicos da inicial executiva, pelos arts. 798 e 799, sem prejuízo do art. 319 do Novo Código de Processo Civil:

Deve ser instruída com o título líquido e exigível;

Deve ser juntado o cálculo atualizado do débito;

Deve haver prova da condição ou vencido o termo, quando exigível;

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Não pode exigir se não houve adimplemento da contraprestação;

Deve indicar a espécie de execução quando mais de uma puder ser feita. Sempre

deve-se balancear o princípio da efetividade com o do não sacrifício;

Sempre que a execução deva recair sobre bem dado em garantia real, deve-se intimar

o credor que instituiu o gravame, aquele que tem em penhor, em garantia

hipotecária da coisa. Inclusive porque será ineficaz ao credor a expropriação se ele

não for intimado;

Pode-se pedir na própria inicial uma cautelar;

Pode-se, ao distribuir a demanda executiva, obter certidão do ajuizamento da

execução com a finalidade de proceder a averbação do ajuizamento da execução no

registro imobiliário, de veículos, de aeronaves e etc. A função dessa averbação é de

gerar presunção absoluta de conhecimento por terceiros, assim ninguém pode alegar

se adquirente de boa-fé.

Apresentada a petição inicial, o juiz fará a análise. Se estiverem preenchidos todos os

requisitos, ele determinará a citação do réu para, dependendo do caso, entregar a

coisa em quinze dias (art. 806), fazer o que se obrigou no prazo determinado pelo juiz

ou pelo contrato, ou, em se tratando de pagamento de quantia, para pagar, no prazo

de três dias, conforme o art. 829 do Novo Código de Processo Civil, sob pena de

penhora.

Se a situação não estiver regular, o juiz determinará a sua correção no prazo de

quinze dias, e acaso não haja como corrigir a ausência de requisito obrigatório, será

caso de indeferimento, conforme prevê o art. 801 do mesmo diploma legal. A decisão

que ordena a citação interrompe a prescrição, conforme o Art. 802, devendo ser

efetivada na forma do art. 240 também do Novo Código de Processo Civil.

Execução Fiscal

Na execução fiscal, a Fazenda ingressa em juízo para a cobrança forçada do crédito tributário,

rege-se pela Lei de Execução Fiscal, Lei 6830/80 e, subsidiariamente, pelo CPC. A competência para

processar e julgar a execução da dívida ativa exclui a de qualquer outro juízo, inclusive os da falência, da

concordata, da liquidação, da insolvência ou do inventário, conforme Arts. 5.º e 29 da LEF. Já o crédito

fiscal tem preferência sobre qualquer outro, ainda que tenha garantia real.

O crédito tributário só pode ser exigido depois de efetuado o lançamento tributário, a

notificação do sujeito passivo e esgotado o procedimento administrativo, todavia esse crédito só poderá

ser exequível após a inscrição do crédito tributário na dívida ativa, estando revestido, a partir de então,

de presunção relativa de liquidez e certeza, de modo que a certidão da dívida ativa opera como título

executivo extrajudicial, conforme o artigo 784, IX, do Novo CPC. A execução fiscal regula-se pela lei

6.830/80 e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil.

Nos termos do Art. 4.o da LEF, a execução fiscal poderá ser promovida contra o devedor, o

fiador, o espólio, a massa, ou o responsável, nos termos da lei, por dívidas, tributárias ou não, de pessoas

físicas ou pessoas jurídicas de direito privado e dos sucessores a qualquer título.

O executado, depois de ser citado, terá cinco dias para realizar o pagamento da dívida,

acrescida de juros, multa e encargos previstos na certidão de dívida ativa ou garantir a execução.

Contudo, caso não efetue o pagamento ou a garantia, seus bens serão penhorados. Como modo de

defesa, o executado poderá oferecer embargos em trinta dias, a contar da data do depósito, da

intimação da penhora ou da juntada da prova da fiança bancária.

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Pode ser alegada toda matéria necessária à defesa e, no máximo, três testemunhas, não

sendo cabível reconvenção nem compensação. As exceções devem ser arguidas em preliminar, salvo as

de suspeição, incompetência e impedimento.

A prova deve ser produzida no processo de embargos; mas, até a decisão de primeira

instância, a certidão de dívida ativa poderá ser emendada ou substituída, assegurada ao executado a

devolução do prazo de embargos. Recebidos os embargos, a Fazenda será intimada para impugnar em

trinta dias, com a posterior designação da audiência de instrução e julgamento.

No caso da execução não ser embargada, terá início a expropriação após ser ouvida a

Fazenda Pública.

Execução de Multa do TCU As decisões impositivas de débito ou multa do TCU são créditos públicos – créditos da

Fazenda Pública, classificáveis como dívida ativa não-tributária, nos termos da Lei nº 4.320/64 – ,

consubstanciados em um título executivo extrajudicial (Art. 71, § 3º da CF/88).

As decisões condenatórias impositivas de sanção do TCU devem obedecer ao critério de

fixação de competência e ao rito previsto na Lei nº 6.830/80, aplicando-se lhe subsidiariamente, no

que couber, as prescrições do Código de Processo Civil.

Importante ressaltar que não é obrigatória a inscrição das decisões condenatórias do TCU

em Dívida Ativa para fins de formação de título executivo. Optando pela não inscrição, eles não

poderão ser perseguidos através de execução fiscal, aplicando-se o art. 829 e seguintes do Novo CPC.

Nos termos do artigo 37, caput, da Lei nº 10.522/02, aos créditos decorrentes de débitos

ou multas impostas em decisões do TCU vencidos e não pagos incidirá de juros e multa de mora,

calculados nos termos e na forma da legislação aplicável aos tributos federais.

20.1 AÇÕES POSSESSÓRIAS

20.1.1 AÇÃO POSSESSÓRIA E AÇÃO PETITÓRIA

O objeto da ação possessória é a tutela jurisdicional da posse. A ação possessória não se presta a discutir a propriedade.

Enquanto tramita o processo da ação possessória, não pode a parte ajuizar ação de reconhecimento de domínio (art. 557, Novo CPC), exceto se a pretensão for deduzida em face de terceira pessoa. Vale dizer, primeiro se resolve a questão da posse e somente depois se pode discutir a propriedade.

Como regra, não se admite que as partes busquem proteção possessória exclusivamente com base na propriedade. Entretanto, se duas pessoas estiverem discutindo a posse com base no seu direito de propriedade, será dada a posse para aquele que demonstrar a propriedade. Nesse sentido, aliás, a

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Súmula 487 do STF: “Será deferida a posse a quem, evidentemente, tiver o domínio, se com base neste for ela disputada”.

Para a proteção do direito de propriedade, o proprietário deverá utilizar uma ação petitória, como, por exemplo, a ação reivindicatória ou a ação de imissão na posse, mas não uma ação possessória.

A ação de imissão na posse é demanda do proprietário que nunca foi possuidor, para se imitir na posse. É ação petitória e não possessória, porque o seu fundamento não é a posse, senão a propriedade.

20.1.2 FUNGIBILIDADE ENTRE AS AÇÕES POSSESSÓRIAS

O art. 554 do Novo CPC prevê que “a propositura de uma ação possessória em vez de outra não obstará a que o juiz conheça do pedido e outorgue a proteção legal correspondente àquela, cujos pressupostos estejam provados.”

Trata-se de certa mitigação ao princípio da congruência. Embora a parte tenha ajuizado uma ação possessória e deduzido determinado pedido, o juiz poderá deferir-lhe outro, que seja mais adequado à proteção possessória. Por exemplo, a parte postula reintegração de posse, mas, em verdade, o esbulho não se consumou, havendo apenas ameaça. Nesse caso, o juiz poderá deferir o interdito proibitório, com a expedição de mandado proibitório, a fim de impedir o esbulho. Outro exemplo: a parte postula o interdito proibitório, mas, durante o curso do processo, o esbulho vem a ocorrer; nesta hipótese, o juiz poderá deferir a reintegração de posse, diante da mudança das circunstâncias fáticas, as quais tornam inadequado o interdito proibitório.

A fungibilidade entre ações possessórias é amplamente admitida pela jurisprudência.200

No entanto, não se admite a fungibilidade entre ação possessória e ação petitória.201

20.1.3 COMPETÊNCIA

Para as ações possessórias relativas a bem imóvel, há competência absoluta do foro da situação do imóvel, nos termos do art. 47 do Novo CPC.

Caso o litígio possessório envolva a União, suas autarquias, fundações públicas e empresas públicas, a competência será da Justiça Federal (art. 109, I, CF).

No caso de ação possessória por ameaça/turbação/esbulho em decorrência do exercício abusivo do direito de greve de trabalhadores da iniciativa privada, a competência será da Justiça do Trabalho. A esse respeito, a Súmula Vinculante 23 do STF dispõe que “a Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar ação possessória ajuizada em decorrência do exercício do direito de greve pelos trabalhadores da iniciativa privada.”

20.1.4 LEGITIMIDADE ATIVA

Tem legitimidade ativa o possuidor, ainda que não seja proprietário.

Aliás, nos casos em que a posse se desdobra em posse direta e posse indireta, o possuidor direto tem legitimidade ativa contra o proprietário/possuidor indireto. A esse respeito, o art. 1.197 do Código Civil prevê que “a posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu poder, temporariamente, em virtude de

200 TJDFT, Acórdão n. 229419, 20040110030123APC, Relator VERA ANDRIGHI, 4ª Turma Cível, julgado em 19/09/2005, DJ 08/11/2005 p. 137. 201

TJDFT, Acórdão n. 364591, 20081010039485APC, Relator NÍDIA CORRÊA LIMA, 3ª Turma Cível, julgado em 24/06/2009, DJ 06/07/2009 p. 124.

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direito pessoal, ou real, não anula a indireta, de quem aquela foi havida, podendo o possuidor direto defender a sua posse contra o indireto.”

Logo, a posse é direito autônomo em relação à propriedade. Por exemplo, em virtude do contrato de locação, o inquilino ou locatário tem a posse direta, enquanto o locador fica com a posse indireta; assim, o locatário tem o direito de fazer valer a sua posse, inclusive contra ameaça, turbação ou esbulho do proprietário (porque tem a melhor posse). De outro lado, caso um terceiro viole a posse do imóvel locado, tanto o locatário quanto o locador/proprietário possuem legitimidade para a proteção possessória.

20.1.5 LEGITIMIDADE PASSIVA

O legitimado passivo é aquele que está molestando a posse ou na iminência de fazê-lo.

Em alguns casos, a posse pode ser molestada sem que seja possível identificar individualmente todos os esbulhadores. É o caso, por exemplo, em que determinado grupo de pessoas invade um imóvel. Nesses casos, não há necessidade de individualização de todos os invasores, até porque isso seria faticamente muito difícil ou impossível. Esse, aliás, é o entendimento do STJ.

202

20.1.6 PARTICIPAÇÃO DO CÔNJUGE NAS AÇÕES POSSESSÓRIAS

O art. 73, caput, do Novo Código de Processo Civil prevê que “o cônjuge necessitará do consentimento do outro para propor ação que verse sobre direito real imobiliário, salvo quando casados sob o regime de separação absoluta de bens”. De outro lado, o § 2º do art. 73 do Novo CPC disciplina que “nas ações possessórias, a participação do cônjuge do autor ou do réu somente é indispensável nas hipóteses de composse ou de ato por ambos praticado”.

No caso de os cônjuges serem titulares da pretensão a ser exercida (seja pela composse ou em razão de ato por ambos praticado), não há necessidade de litisconsórcio ativo, bastando apenas a autorização de um cônjuge ao outro.

De outro lado, quando forem demandados, haverá litisconsórcio passivo necessário entre os cônjuges nos casos de composse ou de ato por ambos praticados.

20.1.7 PROCEDIMENTO

a) Ação de força velha e ação de força nova

As ações de força nova são aquelas ajuizadas dentro do prazo de um ano e um dia contados da data do esbulho ou da turbação. De outro lado, denomina-se ação de força velha a ajuizada depois de ano e dia.

Caso se trate de ação de força nova, seguirá o procedimento especial da ação possessória, com possibilidade de deferimento de medida liminar, com ou sem audiência de justificação.

Quando se tratar de ação de força velha, a demanda seguirá o procedimento comum. Assim, na ação de força velha não se admitirá a medida liminar da ação possessória.

Entretanto, tem sido aceita, em ambas as hipóteses (força velha e força nova), a possibilidade de deferimento de antecipação de tutela, em razão do art. 300 do Novo CPC, que se aplica a todas as espécies de procedimento (poder geral de antecipação de tutela).

203

202 STJ, REsp 977.662/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 22/05/2012, DJe 01/06/2012. 203

TJDFT, Acórdão n. 584504, 20120020021545AGI, Relator LEILA ARLANCH, 1ª Turma Cível, julgado em 02/05/2012, DJ 10/05/2012 p. 123.

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b) Petição inicial

A petição inicial deverá conter, além dos requisitos do art. 319 do Novo CPC, a prova da posse; a demonstração da turbação, do esbulho ou da ameaça de ser molestado na sua posse; e a data da ameaça, turbação ou do esbulho (art. 561, Novo CPC).

Na ação possessória, podem ser cumulados, com o pedido possessório, os pedidos de: a) condenação do réu em perdas e danos; b) condenação do réu em indenização dos frutos; c) imposição de medida para evitar nova turbação ou esbulho; e d) imposição de medida para cumprir-se a tutela provisória ou final (art. 555, Novo CPC).

Caso não seja possível demonstrar documentalmente a posse ou que a posse está sendo molestada, poderá o juiz designar audiência de justificação, a fim de que seja colhida prova oral para comprovação desses fatos.

Assim, a concessão da medida liminar pode ocorrer no momento do recebimento da inicial ou depois da audiência de justificação.

Após a audiência de justificação e a decisão sobre a liminar, o processo seguirá o rito ordinário.

c) Contestação: o caráter dúplice das ações possessórias

O réu deverá apresentar contestação no prazo de 15 dias, a contar da juntada aos autos do mandado de citação.

Caso o juiz entenda ser necessária a audiência de justificação, o réu será citado para comparecer a tal audiência, mas o prazo de contestação ainda não começará fluir. Neste caso, o prazo para contestar contar-se-á da intimação da decisão que deferir ou não a medida liminar (art. 564, parágrafo único, Novo CPC).

A ação possessória é formal e materialmente dúplice. É formalmente dúplice porque o réu pode deduzir pedido contra o autor na própria contestação, independentemente de reconvenção; é materialmente dúplice porque a própria afirmação do réu na contestação do seu direito à posse, em defesa, já importa o exercício da sua pretensão possessória, de modo que, caso a ação seja improcedente, a sentença lhe estará concedendo proteção possessória.

Com efeito, o art. 556 do Novo CPC prevê que “é lícito ao réu, na contestação, alegando que foi o ofendido em sua posse, demandar a proteção possessória e a indenização pelos prejuízos resultantes da turbação ou do esbulho cometido pelo autor”.

d) Instrução processual

Após a decisão sobre a liminar, a ação possessória prossegue pelo rito ordinário, seja ação de força nova ou de força velha, como já se expôs.

Assim, nas ações possessórias, admite-se ampla possibilidade de produção de provas, com realização de audiências de justificação; audiências de instrução para coleta de prova oral; prova pericial; inspeção judicial etc.

e) Sentença

Nas ações de reintegração e de manutenção de posse, a própria sentença que julga procedente o pedido possessório já determina o seu cumprimento. Nesse sentido, o art. 563 do Novo CPC estabelece

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que “considerada suficiente a justificação, o juiz fará logo expedir mandado de manutenção ou de reintegração”.

Assim, as sentenças da ação de manutenção de posse e da ação de reintegração de posse possuem eficácia predominantemente executiva, haja vista que são cumpridas mediante coerção direta. Com efeito, caso a parte não saia da posse no prazo determinado, a sentença deverá ser executada mediante força policial, retirando-se os invasores.

É inegável, no entanto, que a sentença da ação de reintegração e de manutenção de posse pode ter eficácia condenatória, no tocante às perdas e danos e ao desfazimento das construções e plantações. Além disso, também pode ter caráter mandamental, pois a sentença pode impor multa diária (astreintes) para o caso de nova turbação ou esbulho – medida coercitiva indireta.

De outro lado, a sentença de procedência do interdito proibitório possui eficácia predominantemente mandamental,

204 haja vista que determina que a parte requerida não moleste a

posse do autor, sob pena de fixação de multa para o caso de descumprimento (astreintes). Assim, como ainda não houve o molestamento à posse, a medida coercitiva é indireta, para que o requerido se abstenha de turbar ou esbulhar a posse.

Observe-se que, no tocante às obrigações de fazer e de não fazer, o cumprimento da sentença dispensa o requerimento do autor da ação, pois a própria sentença já determina o seu cumprimento.

20.2 AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO

20.2.1 DESAPROPRIAÇÃO

A desapropriação é uma das formas mais drásticas de intervenção do Poder Público na propriedade particular, em nome do interesse público.

Em razão disso, a desapropriação encontra assento constitucional. O art. 5º, incs. XXII e XXIII, da Constituição Federal prevê que é garantido o direito de propriedade, mas que ela deve atender à sua função social. A Constituição também disciplina que “a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição” (art. 5º, XXIV, CF). O art. 182, § 4º, e o art. 184 da Constituição Federal tratam, respectivamente, da desapropriação fundada no descumprimento da função social da propriedade urbana e da desapropriação para reforma agrária.

No plano infraconstitucional, a ação de desapropriação está disciplinada no Decreto-Lei 3.365/1941 (Desapropriação por utilidade pública), na Lei. 4.132/1962 (Desapropriação por interesse social), na Lei 8.629/1993 e na Lei Complementar 76/1993 (Desapropriação de imóvel rural para reforma agrária) e, ainda, na Lei 10.257/2001 (art. 8º - Desapropriação decorrente de descumprimento da função social da propriedade urbana).

20.2.2 ESPÉCIES DE DESAPROPRIAÇÃO

Existem quatro principais espécies de desapropriação:

a) Desapropriação por utilidade pública (art. 5º do Decreto-Lei 3.365/1941 – ex.: para construção de edifício público);

b) Desapropriação por interesse social (art. 2º da Lei. 4.132/1962 – ex.: construção de casas populares);

204

Nesse mesmo sentido, Luiz Rodrigues Wambier e Eduardo Talamini (Curso avançado de direito processual civil: processo cautelar e procedimentos especiais. v. 3. 10. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2010. p. 265).

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c) Desapropriação de imóvel rural para reforma agrária;205

d) Desapropriação decorrente de descumprimento da função social da propriedade urbana.206

O estudo de cada uma dessas formas de desapropriação é realizado no âmbito do direito administrativo.

No presente trabalho, pretende-se expor apenas a ação de desapropriação e o seu procedimento.

20.2.3 DESAPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA E POR INTERESSE SOCIAL: FASES PRÉ-PROCESSUAL E PROCESSUAL

O procedimento de desapropriação por utilidade pública e por interesse processual possui duas fases:

1ª) Fase pré-processual

Essa fase é processada no âmbito administrativo. Tem por objetivo a edição de um decreto declaratório, emanado do chefe do Poder Executivo, reconhecendo utilidade pública ou interesse social do imóvel. Após esse decreto expropriatório, o particular pode aceitar o preço oferecido pelo Poder Público, caso em que não será necessário o ajuizamento de ação de desapropriação. No entanto, caso o particular não concorde com o preço ofertado pelo Poder Público, a desapropriação não se efetiva no âmbito administrativo. Neste caso, será necessário o ajuizamento da ação de desapropriação.

2ª) Fase processual

Inicia-se com o ajuizamento da ação de desapropriação, judicializando-se a desapropriação.

20.2.4 COMPETÊNCIA

Para a ação de desapropriação, é competente o juízo do foro da situação do bem (art. 11 do Decreto-Lei 3.365/1941).

Trata-se de competência territorial absoluta.

20.2.5 PROCEDIMENTO

A desapropriação por utilidade pública ou interesse social seguirá o rito ordinário comum após a citação, nos termos do art. 19 do Decreto-Lei 3.365/1941 e do art. 5º da Lei. 4.132/1962.

A desapropriação-sanção para fins de reforma agrária seguirá o procedimento especial previsto na Lei Complementar 76/1993.

205 “Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei.” 206

“Art. 182 (...) § 4º É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, ex igir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de: I - parcelamento ou edificação compulsórios; II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo; III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.”

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O procedimento de expropriação das glebas onde há culturas ilegais de plantas psicotrópicas é regulado pela Lei 8.257/1991. Lembre-se, todavia, que esta expropriação não é reconhecida como desapropriação por grande parte dos administrativistas, já que não gera direito de indenização ao proprietário.

A seguir, passa-se a estudar a desapropriação por utilidade pública ou interesse social, por ser a modalidade de desapropriação mais comum.

20.2.5.1 PETIÇÃO INICIAL

A petição inicial da desapropriação por utilidade pública ou interesse social deverá (art.13 do Decreto-Lei 3.365/1941):

a) preencher os requisitos dos arts. 319 e 320 do Novo CPC;

b) conter a oferta do preço;

c) ser instruída com um exemplar do contrato, ou do jornal oficial que houver publicado o decreto de desapropriação, ou cópia autenticada dos mesmos; e com a planta ou descrição dos bens e suas confrontações.

Ao despachar a inicial, o juiz designará perito para avaliação dos bens (art. 14, Decreto-Lei 3.365/1941). O juiz somente dispensará a perícia se o réu concordar com o preço (art. 22, Decreto-Lei 3.365/1941).

20.2.5.2 IMISSÃO PROVISÓRIA NA POSSE

O art. 15 do Decreto-Lei 3.365/1941 prevê a possibilidade de imissão provisória na posse, nos seguintes termos: “Se o expropriante alegar urgência e depositar quantia arbitrada de conformidade com o art. 685 do Código de Processo Civil, o juiz mandará imiti-lo provisoriamente na posse dos bens”.

O expropriante tem o prazo de 120 dias, a partir da alegação de urgência, para que o ente expropriante requeira ao juiz a imissão na posse (art. 15, § 2º, DL 3.365/1941). A imissão provisória pode ocorrer mesmo antes da citação do réu (art. 15, § 1º, DL 3.365/1941).

Como regra, a urgência é declarada no próprio decreto expropriatório, mas pode ser declarada posteriormente, inclusive durante o curso da ação de desapropriação.

207 O STF entende que a imissão

provisória na posse pelo ente expropriante, mesmo antes da citação do réu, é constitucional. Nesse sentido, observe-se o teor da Súmula 652 do STF: “Não contraria a Constituição o art. 15, § 1º, do Decreto-Lei 3365/1941 (Lei da Desapropriação por Utilidade Pública)”.

207 “PROCESSUAL CIVIL. FUNDAMENTO NÃO IMPUGNADO. SÚMULA 283/STF. DESAPROPRIAÇÃO. IMISSÃO PROVISÓRIA NA POSSE. URGÊNCIA. AVALIAÇÃO PROVISÓRIA. DESNECESSIDADE. ART. 15, § 1º, DO DECRETO-LEI 3.365/1941. CONTAGEM DO PRAZO DE 120 DIAS ESTABELECIDO NO ART. 15, §2º, DO CITADO DIPLOMA LEGAL. 1. Os fundamentos utilizados pelo Tribunal de origem capazes de manter o acórdão hostilizado não foram atacados pela recorrente. Incidência, por analogia, da Súmula 283/STF. 2. Ademais, a imissão provisória na posse do imóvel objeto de desapropriação, caracterizada pela urgência, prescinde de avaliação prévia ou de pagamento integral. Precedentes do STJ. 3. A lei fixa o prazo de 120 dias, a partir da alegação de urgência, para que o ente expropriante requeira ao juiz a imissão na posse. Em geral, a urgência é declarada no próprio decreto expropriatório, ou após tal ato, inclusive durante o curso da ação de desapropriação. 4. Recurso Especial não provido.” (STJ, REsp 1234606/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 26/04/2011, DJe 04/05/2011)

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20.2.5.3 CONTESTAÇÃO

Na ação de desapropriação por utilidade pública ou interesse social, a contestação somente poderá versar sobre: a) vício do processo judicial; ou b) impugnação do preço. É o que determinam os arts 9º e 20 do Decreto-Lei 3.365/1941.

208 Qualquer outra questão deverá ser decidida por ação direta.

O prazo de contestação é de 15 dias.

Caso o réu não apresente contestação, haverá revelia. Entretanto, na ação de desapropriação, a revelia não produz o efeito material de presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor, mas apenas os demais efeitos. Aliás, como referido, o juiz somente poderá dispensar a perícia se o réu concordar expressamente com o preço (art. 22, Decreto-Lei 3.365/1941).

Sendo necessário produzir prova em audiência, o juiz designará audiência de instrução.

20.2.5.4 SENTENÇA

Na sentença, se procedente a desapropriação, o juiz fixará o valor da indenização.

Segundo entendimento pacificado nos tribunais superiores, na ação de desapropriação direta, os honorários advocatícios devem incidir sobre o valor da diferença entre o valor ofertado pelo ente expropriante e o valor fixado pelo juiz como indenização pela desapropriação. A esse respeito, a Súmula 141 do STJ determina que “os honorários de advogado em desapropriação direta são calculados sobre a diferença entre a indenização e a oferta, corrigidas monetariamente.” No mesmo sentido, a Súmula 617 do STF estabelece que “a base de cálculo dos honorários de advogado em desapropriação é a diferença entre a oferta e a indenização, corrigidas ambas monetariamente.”

A Medida Provisória nº 2.183-56/2001 acrescentou o § 1º ao art. 27 do Decreto-Lei 3.365/1941, passando a prever que “a sentença que fixar o valor da indenização quando este for superior ao preço oferecido condenará o desapropriante a pagar honorários do advogado, que serão fixados entre meio e cinco por cento do valor da diferença, observado o disposto no § 4

o do art. 20 do Código de Processo Civil

(de 1973 – equivalente ao art. 85, § 8º, do Novo CPC), não podendo os honorários ultrapassar R$ 151.000,00 (cento e cinquenta e um mil reais).” No entanto, o STF, na medida cautelar na ADIN 2.332-2, suspendeu a expressão "não podendo os honorários ultrapassar R$ 151.000,00 (cento e cinquenta e um mil reais)", constante no parágrafo 1º do artigo 27 do Decreto-Lei 3.365/1941, em sua nova redação. Assim, os honorários advocatícios, na ação de desapropriação direta, deverão ser fixados entre 0,5% e 5% sobre a diferença entre o valor ofertado pelo ente expropriante e o valor fixado pelo juiz a título de indenização pela expropriação, corrigidos monetariamente, sem limite.

20.2.5.5 REEXAME NECESSÁRIO

Haverá reexame necessário quando a sentença condenar a Fazenda Pública em quantia superior ao dobro da oferecida (art. 28, § 1º, Decreto-Lei 3.365/194).

20.2.5.6 RECURSOS

Contra a sentença, caberá recurso de apelação.

208 “Art. 9º Ao Poder Judiciário é vedado, no processo de desapropriação, decidir se se verificam ou não os casos de utilidade pública.” “Art. 20. A contestação só poderá versar sobre vício do processo judicial ou impugnação do preço; qualquer outra questão deverá ser decidida por ação direta.”

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Se a sentença fixar a indenização, a apelação será recebida apenas no efeito devolutivo, quando interposta pelo expropriado. Fixada a indenização e interposta a apelação pelo expropriante, esse recurso será recebido nos efeitos devolutivo e suspensivo (art. 28, Decreto-Lei 3.365/1941).

20.2.6 QUESTÕES SUMULADAS

Sobre a ação de desapropriação, há diversas questões sumuladas, que merecem especial atenção. São elas:

Súmula 652 do STF: “Não contraria a constituição o art. 15, § 1º, do Decreto-Lei 3365/1941 (Lei da Desapropriação por Utilidade Pública).”

Súmula 618 do STF: “Na desapropriação, direta ou indireta, a taxa dos juros compensatórios é de 12% (doze por cento) ao ano.”

Súmula 617 do STF: “A base de cálculo dos honorários de advogado em desapropriação é a diferença entre a oferta e a indenização, corrigidas ambas monetariamente.”

Súmula 561 do STF: “Em desapropriação, é devida a correção monetária até a data do efetivo pagamento da indenização, devendo proceder-se à atualização do cálculo, ainda que por mais de uma vez.”

Súmula 479 do STF: “As margens dos rios navegáveis são de domínio público, insuscetíveis de expropriação e, por isso mesmo, excluídas de indenização.”

Súmula 476 do STF: “Desapropriadas as ações de uma sociedade, o poder desapropriante, imitido na posse, pode exercer, desde logo, todos os direitos inerentes aos respectivos títulos.”

Súmula 416 do STF: “Pela demora no pagamento do preço da desapropriação não cabe indenização complementar além dos juros.”

Súmula 378 do STF: “Na indenização por desapropriação incluem-se honorários do advogado do expropriado.”

Súmula 345 do STF: “Na chamada desapropriação indireta, os juros compensatórios são devidos a partir da perícia, desde que tenha atribuído valor atual ao imóvel.”

Súmula 164 do STF: “No processo de desapropriação, são devidos juros compensatórios desde a antecipada imissão de posse, ordenada pelo juiz, por motivo de urgência.”

Súmula 157 do STF: “É necessária prévia autorização do Presidente da República para desapropriação, pelos Estados, de empresa de energia elétrica.”

Súmula 111 do STF: “É legítima a incidência do imposto de transmissão "inter vivos" sobre a restituição, ao antigo proprietário, de imóvel que deixou de servir à finalidade da sua desapropriação.”

Súmula 23 do STF: “Verificados os pressupostos legais para o licenciamento da obra, não o impede a declaração de utilidade pública para desapropriação do imóvel, mas o valor da obra não se incluirá na indenização, quando a desapropriação for efetivada.”

Súmula 408 do STJ: “Nas ações de desapropriação, os juros compensatórios incidentes após a Medida Provisória n. 1.577, de 11/06/1997, devem ser fixados em 6% ao ano até 13/09/2001 e, a partir de então, em 12% ao ano, na forma da Súmula n. 618 do Supremo Tribunal Federal.”

Súmula 141 do STJ: “Os honorários de advogado em desapropriação direta são calculados sobre a diferença entre a indenização e a oferta, corrigidas monetariamente.”

Súmula 131 do STJ: “Nas ações de desapropriação incluem-se no cálculo da verba advocatícia as parcelas relativas aos juros compensatórios e moratórios, devidamente corrigidas.”

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Súmula 119 do STJ: “A ação de desapropriação indireta prescreve em vinte anos.”

Súmula 114 do STJ: “Os juros compensatórios, na desapropriação indireta, incidem a partir da ocupação, calculados sobre o valor da indenização, corrigido monetariamente.”

Súmula 113 do STJ: “Os juros compensatórios, na desapropriação direta, incidem a partir da imissão na posse, calculados sobre o valor da indenização, corrigido monetariamente.”

Súmula 69 do STJ: “Na desapropriação direta, os juros compensatórios são devidos desde a antecipada imissão na posse e, na desapropriação indireta, a partir da efetiva ocupação do imóvel.”

Súmula 56 do STJ: “Na desapropriação para instituir servidão administrativa são devidos os juros compensatórios pela limitação de uso da propriedade.”

20.3 AÇÃO MONITÓRIA

Trata-se de ação criada para situações em que a parte autora não possui um título executivo, mas tão somente um documento com forte aparência do seu direito.

Pode ser proposta “por aquele que afirmar, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo, ter direito de exigir do devedor capaz” (art. 700, Novo CPC). Trata-se de um procedimento mais célere para se constituir um título executivo.

Tem como objeto o pagamento de quantia em dinheiro, entrega de coisa fungível ou infungível, de bem móvel ou imóvel ou o adimplemento de obrigação de fazer ou de não fazer (art. 700, I a III, Novo CPC).

O requisito específico para o ajuizamento da ação monitória é a prova escrita sem eficácia de título executivo. Se tiver eficácia de título executivo, será cabível a ação de execução de título extrajudicial.

No entanto, mesmo possuindo título executivo extrajudicial, o seu titular poderá optar por ajuizar ação monitória, conforme entendimento do STJ.

209 Isto é, admite-se ação monitória com base em

título executivo, apesar da redação do art. 700 do Novo CPC.

O cheque prescrito é documento hábil ao ajuizamento da ação monitória (Súmula 299 do STJ).210

De outro lado, o prazo prescricional para a propositura da ação monitória, com base no cheque prescrito, é de 5 anos, com fulcro no art. 206, § 5º, inc. I, do Código Civil.

211 A jurisprudência tem admitido o

ajuizamento de ação monitória com base em cheque prescrito mesmo sem a demonstração da sua causa de emissão, incumbindo ao réu o ônus da prova da inexistência do débito.

212

Da mesma forma, o contrato de abertura de crédito em conta corrente, acompanhado do demonstrativo de débito, pode ser cobrado via ação monitória (Súmula 247 do STJ).

213

A jurisprudência também admite ação monitória para cobrar saldo remanescente oriundo de venda extrajudicial de bem alienado fiduciariamente em garantia (Súmula 384 do STJ).

214

209 STJ, AgRg no AREsp 148.484/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/05/2012, DJe 28/05/2012. 210

Súmula 299 do STJ: “É admissível a ação monitória fundada em cheque prescrito.” 211 A jurisprudência do STJ é uniforme nesse sentido: STJ, REsp 926.312/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 20/09/2011, DJe 17/10/2011. 212 STJ, AgRg no Ag 1143036/RS, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 24/04/2012, DJe 31/05/2012. 213 Súmula 247 do STJ: “O contrato de abertura de crédito em conta-corrente, acompanhado do demonstrativo de débito, constitui documento hábil para o ajuizamento da ação monitória.” 214

Súmula 384 do STJ: “Cabe ação monitória para haver saldo remanescente oriundo de venda extrajudicial de bem alienado fiduciariamente em garantia.”

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220

A ação monitória pode ser ajuizada inclusive contra a Fazenda Pública (Súmula 339 do STJ).215

20.3.1 PROCEDIMENTO

Sendo evidente o direito do autor, o juiz deferirá a expedição de mandado de pagamento, de entrega de coisa ou para execução de obrigação de fazer ou de não fazer, concedendo ao réu prazo de 15 (quinze) dias para o cumprimento e o pagamento de honorários advocatícios de cinco por cento do valor atribuído à causa.

Na ação monitória, admite-se a citação por qualquer dos meios permitidos para o procedumento comum, inclusive por edital ou por hora certa, nos termos do art. 700, § 7º, Novo CPC, e da Súmula 282 do STJ.

216

Citado, o réu, no prazo de 15 dias, poderá:

a) Efetuar o pagamento ou entregar a coisa, caso em que ficará isento de custas processuais e honorários advocatícios, extinguindo-se a sua obrigação.

b) Permanecer inerte, caso em que se constitui de pleno direito em título executivo judicial, convertendo-se o mandado inicial em mandado executivo.

c) Oferecer embargos, que possuem natureza de defesa e não precisam de segurança do juízo (caução, depósito ou penhora). Apresentados os embargos, suspende-se a eficácia do mandado inicial.

Os embargos são processados nos mesmos autos, observando-se o procedimento comum.

A jurisprudência se consolidou no sentido de que deve ser nomeado curador especial se o réu, citado por edital, for revel, cabendo ao curador opor embargos. A tese contrária – que não prevaleceu – argumentava que os embargos tinham natureza jurídica de ação e não de contestação. Atualmente, é pacífica a jurisprudência no sentido de que pode o curador especial opor embargos, no caso de réu revel citado por edital em ação monitória.

217218

No prazo de embargos, o réu também poderá apresentar reconvenção, já que o processo segue o procedimento ordinário após os embargos. Aliás, esse é o teor da Súmula 292 do STJ: “A reconvenção é cabível na ação monitória, após a conversão do procedimento em ordinário.”

De outro lado, tratando-se de réu revel citado por edital ou por hora certa, ao qual foi nomeado curador especial, não poderá propor reconvenção, haja vista que se trata de nova demanda, e não de ato de defesa.

Caso os embargos sejam rejeitados, o título executivo extrajudicial constitui-se em título executivo judicial e o processo prossegue na forma do cumprimento de sentença.

20.4 AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

20.4.1 INTRODUÇÃO

Improbidade é o vocábulo que foi utilizado pela Constituição para designar corrupção administrativa.

A Constituição Federal determina que “os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível” (art.

215 Súmula 339 do STJ: “É cabível ação monitória contra a Fazenda Pública.” 216 Súmula 282 do STJ: “Cabe a citação por edital em ação monitória.” 217

STJ, REsp 297421/MG, Rel. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Segunda Seção, julgado em 09/05/2001, DJ 12/11/2001, p. 125.

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37, § 4º, CF). Também prevê que lei deve disciplinar a inelegibilidade temporária para aquele que praticar improbidade administrativa (art. 14, § 9º, CF).

A Lei 8.429/1992, intitulada Lei de Improbidade Administrativa ou Lei do Colarinho Branco, estabeleceu o procedimento para a apuração e também as sanções para os atos de improbidade administrativa.

20.4.2 NATUREZA JURÍDICA

A par da divergência inicial sobre a natureza jurídica da improbidade administrativa, o Supremo Tribunal Federal, na ADI 2797, decidiu que ela possui natureza não penal.

Essa definição possui grandes implicações práticas, sobretudo para a fixação de competência e a aplicação de normas subsidiárias.

20.4.3 IMPROBIDADE E DELITO: INDEPENDÊNCIA ENTRE AS INSTÂNCIAS

Inicialmente, é preciso deixar claro que nem todo ato de improbidade é crime, e nem todo crime é ato de improbidade. Assim, determinado ato que viole princípios da administração pública poderá configurar improbidade (art. 11, LIA) e não constituir crime; determinado crime praticado na vida privada, sem relação com as funções públicas, não configurará ato de improbidade administrativa.

Por exemplo, um crime grave como o de homicídio, se praticado por um funcionário público de forma passional, que tentou tirar a vida de sua esposa, em razão de traição praticada por esta, que lhe causava vexame público, sem que houvesse na sua ficha funcional qualquer situação que desabonasse a sua conduta profissional, não configura ato de improbidade. Isso não quer dizer que não deva ser punido na esfera penal e inclusive até perder o cargo como efeito extrapenal da condenação criminal, mas, por não guardar relação com o exercício da sua função, não configura ato de improbidade administrativa.

219

A improbidade administrativa pode ser punida na via administrativa, desde que esteja presente no estatuto dos servidores.

Há independência entre as esferas cível, penal e administrativa. Entretanto, a condenação penal transitada em julgado possui o efeito de tornar indiscutíveis a ocorrência do crime e a sua autoria. Por conseguinte, se houver condenação penal prévia, na ação de improbidade, caberá apenas verificar se tal crime configura ato de improbidade (guarda relação com o exercício da função pública) e fixar a sanção aplicável pela improbidade. De outro lado, se a ação penal for improcedente em razão da falta de provas ou porque o fato não constitui crime, isso não impedirá a persecução pela improbidade administrativa, haja vista que, para a esfera penal, se exige mais rigor no grau de certeza e nos requisitos para a

219 “CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. POLICIAL CIVIL. HOMICÍDIO CONTRA A ESPOSA. CRIME PASSIONAL. ATO DE IMPROBIDADE NÃO CARACTERIZADO. 1. A Lei 8.429/92 define o ato de improbidade administrativa como todo aquele que, à custa da Administração Pública e do interesse da coletividade, importa em enriquecimento ilícito (art. 9º); que causa prejuízo ao erário (art. 10); e que atenta contra os princípios da Administração Pública (art. 11). 2. “Nos termos do art. 11 da citada Lei, constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições. 3. O ato praticado pelo réu - homicídio contra a esposa -, a despeito de sua gravidade, não guarda nenhuma relação com o exercício de sua função de policial civil, haja vista que os injustos penais não podem ser confundidos com condutas ímprobas, não tendo restado demonstrado o elemento subjetivo consubstanciado na vontade de transgredir ou macular os princípios da Administração Pública, bem assim, de transgredir os seus deveres para com a Polícia Civil. 4. Recurso desprovido.” (TJDFT, Acórdão n.531933, 20060110522265APC, Relator: MARIO-ZAM BELMIRO, Revisor: NIDIA CORREA LIMA, 3ª Turma Civel, Publicado no DJE: 05/09/2011. Pág.: 150)

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configuração de crime do que é exigido para que o mesmo fato configure ilícito civil ou improbidade administrativa.

220

De qualquer forma, a jurisprudência aconselha que se suspenda o processo administrativo, cível ou de improbidade administrativa, enquanto há o julgamento na esfera penal. Com efeito, o ideal para que não existam decisões contraditórias é que esses processos sejam suspensos.

20.4.4 SUJEITO ATIVO E SUJEITO PASSIVO DO ATO DE IMPROBIDADE

Podem ser sujeitos ativos do ato de improbidade administrativa:

a) o agente público, servidor ou não;

b) o terceiro que auxilie ou se beneficie do ato de improbidade, de forma direta ou indireta, ainda que particular.

Considera-se agente público, para fins de improbidade, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função em entidades que recebam recursos públicos, subvenções, benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios (art. 2º, LIA).

De outro lado, existe grande controvérsia acerca da possibilidade de ser proposta ação de improbidade administrativa contra agentes políticos, já que estes também estariam sujeitos a sanções político-administrativas por crimes de responsabilidade. A esse respeito, por exemplo, o STF admite ação de improbidade administrativa contra prefeito; mas não admite contra o Presidente de República.

A pessoa jurídica também pode ser sujeito ativo do ato de improbidade. A pessoa jurídica é uma ficção legal, não praticando pessoalmente os atos. Contudo, se ela se beneficiou do ato, pode ser sujeito ativo da improbidade, na condição de beneficiária.

Sendo pessoa jurídica a beneficiária do ato, a ela não poderão ser aplicadas algumas sanções da lei de improbidade, como suspensão dos direitos políticos e perda da função pública, mas ficará sujeita a outras, tais como multa, ressarcimento ao erário, proibição de contratar com o poder público e receber incentivos fiscais.

Os sujeitos passivos do ato de improbidade são os seguintes (art. 1º, LIA):

a) Administração direta dos três entes da federação.

b) Administração Indireta: autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista.

c) Territórios, se forem criados (atualmente, não existem).

d) Empresas que o Estado concorra para a sua constituição ou para o seu funcionamento com mais de 50% do patrimônio ou da receita anual.

e) Empresas que o Estado concorra para a sua constituição ou para o seu funcionamento com menos de 50%.

f) Pessoas jurídicas que recebam subvenções, benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios.

220 “A jurisprudência desta eg. Corte de Justiça é firme no sentido da independência entre as esferas penal e cível, a não ser que na primeira seja reconhecida a não ocorrência do fato ou a negativa de autoria. Na hipótese, na esfera penal foram imputadas três condutas, tendo o réu sido absolvido por falta de provas e por uma delas não constituir infração penal (artigo 386, VI e III do CPP), não havendo falar-se em prejuízo da presente ação civil de improbidade administrativa em razão daquela decisão criminal.” (STJ, REsp 1103011/ES, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/05/2009, DJe 20/05/2009)

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Assim, fica claro que, onde há emprego de dinheiro público, há possibilidade de ocorrência de improbidade administrativa e a consequente aplicação da Lei 8.429/1992.

O parágrafo único do art. 1º da LIA prevê que, em relação às pessoas arroladas acima nos itens “e” e “f”, as sanções pela improbidade ficarão limitadas ao ressarcimento. Assim, por exemplo, se o poder público participa com 30% do capital social de uma empresa, havendo desvio de verba, a sanção patrimonial da ação de improbidade só recairá sobre os 30% que correspondia à participação do Estado.

Essa mesma restrição não se aplica aos demais entes. Ou seja, se, por exemplo, pessoa jurídica tem 55% do seu capital social formado por recursos públicos (mais de 50%, portanto), a ação de improbidade vai ter como base a totalidade do desvio.

Podem também ser sujeito passivo de improbidade administrativa as seguintes pessoas jurídicas: conselho de classe, como CREA, CRECI, CRM etc.; partidos políticos, já que recebem recursos públicos do fundo partidário; sindicatos, pois a contribuição sindical que recebem tem natureza tributária; serviço social autônomo, organizações sociais e organizações da sociedade civil de interesse público, já que também recebem recursos públicos.

De outro lado, a OAB, embora seja um conselho de classe, não pode ser sujeito passivo da improbidade, já que a sua anuidade não tem natureza tributária.

20.4.5 AÇÃO POPULAR E IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Não se admite ação popular de improbidade administrativa. Vale dizer, a ação popular não se presta a buscar a aplicação das sanções de improbidade administrativa aos agentes públicos ímprobos. Isso porque o cidadão, titular da ação popular, não é parte legítima para ajuizar a ação de improbidade administrativa. Com efeito, a legitimidade ativa para tal demanda é do Ministério Público e da pessoa jurídica lesada (art. 17, LIA).

Com a ação popular, o cidadão busca a invalidação do ato lesivo ao patrimônio público, à moralidade administrativa ou ao meio ambiente. Logo, se a improbidade administrativa implicar prejuízo ao patrimônio público, poderá o cidadão propor ação popular com o escopo de decretar a invalidade do ato e obter o ressarcimento ao erário, mas, em tal ação, não poderão ser aplicadas as demais sanções da improbidade administrativa.

20.4.6 ESPÉCIES E TIPIFICAÇÃO DA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Os atos de improbidade estão listados em três modalidades:

a) Enriquecimento Ilícito (art. 9º, LIA): “auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1° da LIA.”

b) Dano ao Erário (art. 10, LIA): “qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º da LIA.”

c) Violação a princípio da administração (art. 11, LIA): “qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições.”

O enriquecimento ilícito, o dano ao erário e a violação de princípios da administração pública estão em ordem decrescente de gravidade, razão pela qual as sanções para tais atos, previstas no art. 12 da Lei 8.429/1992, obedecem proporcionalmente a essa gradação.

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A Lei de Improbidade Administrativa prevê expressamente, no art. 10, a exigência dos elementos subjetivos dolo ou culpa para a configuração da improbidade administrativa em razão de dano ao erário. De outro lado, para as hipóteses de enriquecimento ilícito (art. 9º, LIA) e de violação a princípios da administração (art. 11, LIA), não há qualquer previsão sobre a necessidade de existência de dolo ou culpa para a sua configuração.

Em razão disso, houve grande divergência doutrinária e jurisprudencial acerca da necessidade de dolo e/ou culpa para a configuração de improbidade administrativa nos casos de enriquecimento ilícito (art. 9º, LIA) e violação a princípios da administração (art. 11, LIA). A esse respeito, surgiram ao menos três grandes linhas de entendimento:

1ª corrente) há improbidade somente se houver dolo;

2ª corrente) há improbidade somente se houver dolo ou culpa;

3ª corrente) há improbidade independentemente de haver dolo ou culpa, pois a responsabilidade é objetiva.

A par dessa divergência, o Superior Tribunal de Justiça, em 23.6.2010, pacificou a questão, adotando a primeira corrente, ao entender que somente a modalidade dolosa é comum a todos os tipos de improbidade administrativa (art. 9º, art. 10 e art. 11, LIA), sendo que a modalidade culposa somente é capaz de configurar improbidade administrativa no caso de ato que cause lesão ao erário (art. 10 da LIA).

221

Assim, por exemplo, é possível que haja ilegalidade sem que haja improbidade, pois o elemento volitivo é imprescindível à configuração da improbidade administrativa.

222

20.4.7 LEGITIMIDADE ATIVA E PASSIVA PARA A AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

A ação de improbidade administrativa poderá ser proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada.

Deverão constar no polo passivo da ação o agente público, servidor ou não, que praticou o ato, direta ou indiretamente; e o terceiro beneficiário do ato. Isto é, são legitimados passivos da ação de improbidade os sujeitos ativos da improbidade administrativa.

A pessoa jurídica lesada deverá ser intimada, a fim de que se manifeste sobre eventual requerimento de sua inclusão como assistente do autor ou do réu na demanda.

O Ministério Público, quando não for parte, atuará obrigatoriamente como fiscal da lei na ação de improbidade (art. 17, § 4º, LIA).

221 “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. VIOLAÇÃO DE PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA (ART. 11 DA LEI 8.429/92). ELEMENTO SUBJETIVO. REQUISITO INDISPENSÁVEL PARA A CONFIGURAÇÃO DO ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PACIFICAÇÃO DO TEMA NAS TURMAS DE DIREITO PÚBLICO DESTA CORTE SUPERIOR. SÚMULA 168/STJ. PRECEDENTES DO STJ. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NÃO CONHECIDOS. (....) Ademais, também restou consolidada a orientação de que somente a modalidade dolosa é comum a todos os tipos de improbidade administra-tiva, especificamente os atos que importem enriquecimento ilícito (art. 9º), causem prejuízo ao erário (art. 10) e atentem contra os princípios da administração pública (art. 11), e que a modalidade culposa somente incide por ato que cause lesão ao erário (art. 10 da LIA). (...)” (STJ, EREsp 875.163/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 23/06/2010, DJe 30/06/2010) 222

“(...) 3. A jurisprudência desta Corte orienta-se no sentido de que, para que se configure a conduta de improbidade administrativa, é necessária a perquirição do elemento volitivo do agente público e de terceiros (dolo ou culpa), não sendo suficiente, para tanto, a irregularidade ou a ilegalidade do ato. Isso porque “não se pode confundir ilegalidade com improbidade. A improbidade é ilegalidade tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo da conduta do agente." (REsp n. 827.445-SP, relator para acórdão Ministro Teori Zavascki, DJE 8/3/2010). (...)” (STJ, MC 17.112/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/09/2010, DJe 28/09/2010)

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20.4.8 COMPETÊNCIA E PRERROGATIVA DE FORO

A Constituição Federal de 1988 previu foro por prerrogativa de função para crimes comuns, mas não disciplinou a competência para atos de improbidade administrativa.

O texto da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/1992) não fez previsão expressa sobre competência, tampouco previu foro por prerrogativa de função.

Em 2002, foi editada a Lei 10.628, que alterou o art. 84, § 2º, do Código de Processo Penal, o qual passou a ter a seguinte redação: “§ 2

o A ação de improbidade, de que trata a Lei n

o 8.429, de 2 de junho

de 1992, será proposta perante o tribunal competente para processar e julgar criminalmente o funcionário ou autoridade na hipótese de prerrogativa de foro em razão do exercício de função pública, observado o disposto no § 1

º.”

Entretanto, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº 2.792 e nº 2.860, decidiu que é inconstitucional a previsão infraconstitucional de foro privilegiado para as ações de improbidade administrativa. Entendeu a Suprema Corte que os atos de improbidade administrativa possuem natureza não penal e, por conseguinte, não poderia norma infraconstitucional criar competência originária de tribunais, já que isso não foi feito pela Constituição.

Atualmente, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem dado tratamento diferente a depender do cargo ocupado pelo agente público. Por exemplo, a Corte Suprema tem entendido que cabe ao juízo de primeira instância processar e julgar a ação de improbidade administrativa proposta contra prefeito.

223 De outro lado, tratando-se de Ministros de Estado ou Deputados Federais, haverá foro por

prerrogativa de função e a competência será do STF.

O Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, recentemente alterou a sua jurisprudência e passou a entender, de forma pacífica, que existe foro por prerrogativa de função em ação de improbidade administrativa.

224

No entanto, a matéria está longe de ter alguma sedimentação no âmbito das Cortes Superiores.

20.4.9 PROCEDIMENTO DA AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

O procedimento da ação de improbidade administrativa segue o rito ordinário comum do Código de Processo Civil, com as especificidades previstas na Lei de Improbidade Administrativa (art. 17 da LIA).

223

“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU PARA JULGAMENTO DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA CONTRA PREFEITO MUNICIPAL POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI N. 10.628/2002. ACÓRDÃO RECORRIDO EM HARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.” (STF, RE 444042 AgR, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em 25/09/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-201 DIVULG 11-10-2012 PUBLIC 15-10-2012) 224 “ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AGENTE POLÍTICO ELEITO PARA O CARGO DE DEPUTADO FEDERAL. AÇÃO QUE PODE ENSEJAR A PERDA DO MANDATO. FORO PRIVILE-GIADO. ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL DA CORTE ESPECIAL DO STJ. REMESSA DOS AUTOS AO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. (...) 2. A Primeira Turma do STJ, acolhendo questão de ordem apresentada pelo Ministro Teori Albino Zavascki, na sessão de julgamento realizada em 27/09/2011, entendeu declinar da competência para o julgamento do presente recurso e determinar sua remessa, no estado em que se encontra, ao Supremo Tribunal Federal, em razão de o agravante, que é réu em ação de improbidade administrativa, ter sido eleito, supervenientemente ao ajuizamento da ação, como deputado federal. 3. A Corte Especial do STJ, após alteração do entendimento jurisprudencial até então prevalecente no âmbito do STJ, vem entendendo, de forma pacífica, que o foro privilegiado também deve ser aplicado à ações civis públicas por ato de improbidade administrativa, quando houver a possibilidade de a autori-dade investigada perder o cargo ou o mandato. A respeito, vide: Rcl 4.927/DF, Rel. Ministro Felix Fischer, Corte Especial, DJe 29/06/2011; AgRg na Sd 208/AM, Rel. Ministro João Otávio De Noronha, Corte Especial, DJe 12/05/2010; Rcl 2.790/SC, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Corte Especial, DJe 04/03/2010. 4. Remetam-se os autos ao STF.” (STJ, AgRg no Ag 1404254/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27/09/2011, DJe 17/10/2011)

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Prevalece o entendimento de que a ação de improbidade tem natureza jurídica de ação civil pública, razão pela qual é comum encontrar, na jurisprudência dos tribunais superiores, a terminologia ação civil pública por improbidade administrativa.

20.4.9.1 PETIÇÃO INICIAL

A petição inicial da ação de improbidade administrativa deve atender aos requisitos dos arts. 319 e 320 do Novo CPC, bem como ser instruída com documentos ou justificação que contenham indícios suficientes da existência do ato de improbidade.

20.4.9.2 TUTELA CAUTELAR

A principal cautelar é a de afastamento preventivo do agente.

O afastamento preventivo do agente público poderá ser determinado tanto pela autoridade administrativa quanto pelo juiz, quando se fizer necessária para a instrução processual. Todavia, essa medida deve ser tomada somente em caráter excepcional, quando comprovada a sua real necessidade.

Tal medida de afastamento do cargo não pode ser determinada por membro do Ministério Público no inquérito civil, que é procedimento preparatório ao ajuizamento da ação de improbidade administrativa.

O afastamento do exercício do cargo, emprego ou função ocorrerá sem prejuízo da remuneração, porque se trata de medida com natureza cautelar, em que ainda não há cognição exauriente sobre a improbidade (art. 20, parágrafo único, LIA).

Esse afastamento não possui prazo previsto em Lei. Em razão disso, deve ser fixado pelo juiz, considerando as peculiaridades de cada caso. O Superior Tribunal de Justiça, em julgados recentes, tem admitido a fixação do prazo de afastamento em torno de 6 meses, permitida a prorrogação por igual período,

225 mas não se pode dizer que esses prazos sejam estanques.

A medida cautelar de afastamento do cargo, prevista no art. 20, parágrafo único, da LIA, também se aplica ao mandato parlamentar. Contudo, tal medida, como referido, deve ser tomada somente em caráter excepcional. Nesse sentido, a jurisprudência pacífica do STJ.

226

As medidas cautelares de indisponibilidade e de sequestro de bens também estão previstas na Lei 8.429/1992. Há uma grande preocupação com a ocultação do patrimônio do agente público, diante da possibilidade de que este o dissipe com o objeto de se furtar à reparação e ao ressarcimento ao erário.

A Lei de Improbidade Administrativa, entretanto, não previu expressamente o arresto, disciplinando, no seu art. 16, § 1º, apenas a medida cautelar de sequestro. De qualquer forma, tal previsão não desnatura a distinção entre as duas medidas. Com efeito, no caso de improbidade

225

“Na hipótese, as instâncias ordinárias constataram a concreta interferência na prova, qual seja, a não prestação de informações e documentos aos Órgãos de controle (Câmara de Vereadores e Tribunal de Contas Estadual e da União), o que representa risco efetivo à instrução processual. Demais disso, não desarrazoado ou desproporcional o afastamento do cargo pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias, pois seria, no caso concreto, o tempo necessário para verificar "a materialidade dos atos de improbidade administrati-va".” (STJ, MC 19.214/PE, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/11/2012, DJe 20/11/2012) 226 “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INDISPONIBILIDADE DE BENS. ART. 7º DA LEI 8.429/1992. (...). AFASTAMENTO CAUTELAR DO CARGO. SÚMULA 7/STJ. 1. Cuidam os autos de Ação Civil Pública ajuizada contra Deputados Estaduais e servidores da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, aos quais são imputados atos de improbidade administrativa por fraude a licitação, além de desvio e apropriação indevida de recursos públicos por emissão e pagamento de che-ques para empresas inexistentes e irregulares. (...) 9. O art. 20, parágrafo único, da Lei 8.429/1992 prevê a viabilidade de afastamento cautelar do cargo, emprego ou função, quando a medida se fizer necessária à instrução processual. A alteração do entendimento do Tribunal a quo, de que não ficou demonstrada tal necessidade, demanda reexame dos elementos fático-probatórios dos autos, o que esbarra no óbice da Súmula 7/STJ. (...)” (STJ, REsp 1177290/MT, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/06/2010, DJe 01/07/2010).

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administrativa, é possível que o autor da ação requeira a medida cautelar de sequestro sobre o valor indevidamente agregado ao patrimônio do agente, bem como o arresto ou a indisponibilidade de bens do réu, tantos quantos bastem à reparação integral do prejuízo por ele causado ao ente público.

Ainda nesse ínterim, é imperioso lembrar que a decretação de indisponibilidade de patrimônio do réu não possibilita que o seu cônjuge ingresse na ação civil pública para buscar a desconstituição da constrição judicial de bem de família, o que somente poderá ser alegado na via própria, ou seja, em embargos de terceiro.

227

De outro lado, as medidas cautelares previstas na Lei 8.429/1992 não constituem rol taxativo. Assim, aplica-se também às ações de improbidade administrativa o art. 297 do Novo CPC, que confere ao juiz o poder de determinar as medidas que considerar adequadas para efetivação da tutela provisória.

O bloqueio judicial de contas bancárias do réu da ação de improbidade tem sido uma das medidas mais eficazes para garantir o ressarcimento decorrente do desvio de verbas públicas.

20.4.9.3 NOTIFICAÇÃO

O juiz deverá determinar a notificação do requerido (e não citação), a fim de que, no prazo de 15 dias, apresente manifestação por escrito, onde poderá juntar documentos e justificações.

20.4.9.4 RECEBIMENTO DA AÇÃO

Apresentada a manifestação do réu ou transcorrido o prazo para tanto, o juiz poderá:

a) rejeitar a ação de improbidade administrativa, se convencido da inexistência do ato de improbidade, da manifesta improcedência da ação ou da ausência de condições da ação ou de pressupostos processuais;

b) receber a ação de improbidade, prosseguindo-se o processo.

Observe-se que, antes do recebimento da ação de improbidade, é necessária uma notificação para manifestação prévia do réu, a fim de que o juiz possa verificar os requisitos de admissibilidade da ação. Tal procedimento prévio ao recebimento da ação é de extrema relevância, diante da grande repercussão política negativa que geralmente possui uma ação de improbidade contra um agente público.

Se o juiz receber a ação, determinará a citação do requerido, para apresentar contestação no prazo de 15 dias.

A decisão que recebe a ação de improbidade, possui natureza de decisão interlocutória, já que não põe fim ao processo; a que rejeita possui natureza de sentença, pois é tendente a por fim ao processo em primeira instância. Assim, cabe agravo de instrumento contra a decisão interlocutória que recebe a ação de improbidade, e apelação contra a sentença que a rejeita.

227 Nesse sentido, observe-se o seguinte precedente do STJ: “PROCESSO CIVIL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - MEAÇÃO - ILEGITIMIDADE PASSIVA DA ESPOSA QUE VISA DESCONSTITUIR DECRETO DE INDISPONIBILIDADE DE BEM COMUM DO CASAL, TIDO COMO BEM DE FAMÍLIA - VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC NÃO CARACTERIZADA (...) 3. O art. 1º e parágrafo único da Lei nº 8.429/92 delimita as pessoas que integram a relação processual na condição de réus da ação civil pública por ato de improbidade, de maneira que a circuns-tância de ser cônjuge do réu na demanda não legitima a esposa a ingressar na relação processual, nem mesmo para salvaguardar direito que supostamente seria comum ao casal. 4. Existem meios processuais apropriados para questionar o direito do cônjuge que, não sendo parte na ação civil pública por improbidade administrativa, possa defender sua meação. 5. O caráter de bem de família de imóvel não tem a força de obstar a determinação de sua indisponibilidade nos autos de ação civil pública, pois tal medida não implica em expropriação do bem. Precedentes desta Corte. (...)” (STJ, REsp 900.783/PR, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/06/2009, DJe 06/08/2009)

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20.4.9.5 CONTESTAÇÃO

O prazo de contestação é de 15 dias, a contar da juntada aos autos do mandado de citação.

A pessoa jurídica lesada deverá ser intimada da ação de improbidade administrativa. Ela poderá contestar, abster-se de contestar o pedido, ou atuar ao lado do autor, desde que isso se afigure útil ao interesse público, a juízo do respectivo representante legal ou dirigente. Assim, à ação de improbidade administrativa, também se aplica, com as devidas adaptações, o art. 147, § 3º, da Lei da Ação Civil Pública, que remete ao art. 6º, § 3º, da Lei da Ação Popular.

228

20.4.9.6 INSTRUÇÃO

Na ação de improbidade administrativa, admite-se ampla instrução probatória. Assim, é possível a realização de audiências de instrução, para a produção de prova oral; a requisição e a busca e apreensão de documentos; etc.

20.4.9.7 SENTENÇA E DOSIMETRIA DAS SANÇÕES

Na sentença, o juiz deverá analisar se o ato praticado pelo agente configura improbidade administrativa.

Se for reconhecida a prática de ato de improbidade administrativa, o juiz deverá aplicar ao réu as sanções previstas no art. 12 da Lei 8.429/1992, consoante já exposto. São elas:

a) Para ato de improbidade que configure enriquecimento ilícito: perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, quando houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos, pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos.

b) Para ato de improbidade que cause dano ao erário: ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos.

c) Para improbidade administrativa configurada em razão de violação de princípios da administração pública: ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.

As sanções de perda da função pública e de suspensão dos direitos políticos somente poderão ser executadas após o trânsito em julgado da sentença condenatória (art. 20, caput, LIA).

Caso o ato praticado esteja capitulado como mais de uma espécie de improbidade, o juiz deverá aplicar somente as sanções referente à espécie mais grave. Assim, por exemplo, se o ato configura, ao mesmo tempo, enriquecimento ilícito, dano ao erário e violação de princípio, o juiz deve aplicar somente

228 LAP: “Art. 6º (...) § 3º A pessoas jurídica de direito público ou de direito privado, cujo ato seja objeto de impugnação, poderá abster-se de contestar o pedido, ou poderá atuar ao lado do autor, desde que isso se afigure útil ao interesse público, a juízo do respectivo representante legal ou dirigente.”

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as sanções previstas para o enriquecimento ilícito, que são mais gravosas; se o ato configura dano ao erário e violação de princípio, deve aplicar as sanções referentes ao dano ao erário.

As sanções serão aplicadas proporcionalmente, considerando a gravidade da conduta, a extensão do dano, o proveito econômico obtido pelo agente ou pelo terceiro.

O juiz, de acordo com a gravidade, pode escolher as sanções que serão aplicadas, fixando a sua quantidade, desde que dentro da mesma lista.

O magistrado não precisa aplicar todas as sanções que estão na lista, podendo entender que apenas algumas delas já são suficientes.

229

20.4.10 QUESTÕES FINAIS

A aplicação das sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa independe de aprovação ou rejeição das contas pelo órgão de controle interno ou pelo Tribunal ou Conselho de Contas, nos termos do art. 21, inc. II, da Lei 8.429/1992. Além disso, o art. 5º, inc. XXXV, da Constituição Federal também impede que qualquer questão seja subtraída à apreciação do Poder Judiciário, razão pela qual uma decisão do Tribunal de Contas, órgão pertencente ao Legislativo, não pode ser eximida de apreciação judicial.

É vedada a transação, acordo ou conciliação nas ações de improbidade administrativa (art. 17, § 1º, LIA).

A prescrição das sanções da improbidade administrativa, exceto ressarcimento ao erário, ocorrerá:

a) em 5 anos após término do exercício do mandato, do cargo em comissão ou da função de confiança. Observe-se que, nesses casos, a prescrição não se inicia com a prática do ato de improbidade, senão a partir do momento em que aquele que o praticou deixa o mandado, o cargo em comissão ou a função de confiança.

b) dentro do prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão a bem do serviço público, para o caso de réu ocupante de cargo efetivo ou emprego público (para os servidores federais, é de 5 anos, conforme art. 142, I, Lei 8.112/1990).

De outro lado, a sanção de ressarcimento ao erário é imprescritível, aplicando-se o art. 37, § 5º, da Constituição Federal.

230 Nesse sentido, aliás, a jurisprudência pacífica do STJ.

231

229 “AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. (...) INEXISTÊNCIA DE CONDIÇÃO NAS SANÇÕES, QUE PODEM SER APLICA-DAS ISOLADA OU CUMULATIVAMENTE. COMINAÇÃO. COMPETÊNCIA DAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. RECURSO PARCIALMENTE PROVI-DO. 1. A Lei 8.429/92 prescreve, em seu art. 12, que as sanções poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente, a depender da gravidade do fato. Não há imposição de nenhuma condição para aplicar qualquer de suas modalidades, razão pela qual não há falar em inocuidade de proibição de contratar com o Poder Público ou de receber quaisquer tipos de benefícios fiscais ou creditícios com base na ocupação de cargo pelo agente infrator e o consequente impedimento de fruição de tais benesses. (...) 3. A penalização é da competência das instâncias ordinárias, que, ao fazê-lo, sopesam proporcionalmente o ato praticado, a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente, cominando-lhe as sanções que se demonstram suficientes. (...)” (STJ, REsp 1043842/RS, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04/11/2010, DJe 12/11/2010) 230 “Art. 37 (...) § 5º A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento.” 231

“PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ATO DE IMPROBIDADE. AÇÃO PRESCRITA QUANTO AOS PEDIDOS CONDENATÓRIOS (ART. 23, II, DA LEI N.º 8.429/92). PROSSEGUIMENTO DA DEMANDA QUANTO AO PLEITO RESSARCITÓRIO. IMPRESCRITIBILIDADE. 1. O ressar-cimento do dano ao erário, posto imprescritível, deve ser tutelado quando veiculada referida pretensão na inicial da demanda, nos próprios autos da ação de improbidade administrativa ainda que considerado prescrito o pedido relativo às demais sanções previstas na Lei de Improbidade. (...) 3. A aplicação das sanções previstas no art. 12 e incisos da Lei 8.429/92 se submetem ao prazo prescricio-nal de 05 (cinco) anos, exceto a reparação do dano ao erário, em razão da imprescritibilidade da pretensão ressarcitória (art. 37, § 5º, da Constituição Federal de 1988). Precedentes do STJ (...) 4. Consectariamente, uma vez autorizada a cumulação de pedidos condenatório e ressarcitório em sede de ação por improbidade administrativa, a rejeição de um dos pedidos, in casu, o condenató-

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20.5 AÇÃO DE EXIGIR CONTAS

Prevista nos artigos 550 a 553 do Novo CPC, e que substitui a Ação de Prestação de Contas do CPC de 1973, a Ação de Exigir Contas tem por finalidade dirimir incertezas surgidas em razão da administração de bens e interesses alheios, sendo imposta ao administrador a obrigação de apresentar as receitas e despesas envolvidas na relação jurídica e conferindo ao administrado o direito de exigir a prestação das contas.

Como exemplo, podemos citar os casos do administrador judicial (arts. 159 e 869 do Novo CPC; arts. 22, III, “p” e “r”, e 23 da Lei nº 11.101/05), com o inventariante (arts. 553 e 618, VII, Novo CPC), com o mandatário (art. 668 do CC), entre outros.

20.5.1 PROCEDIMENTO

O procedimento da prestação de contas é realizado em três fases: na primeira, declara-se a existência ou não do dever de prestá-las, sendo que, desta decisão, caberá agravo de instrumento (art. 1.015, II, Novo CPC); na segunda, apura-se eventual saldo a favor de uma das partes, decisão que constituirá sentença condenatória, da qual caberá recurso de apelação (art. 1.009, Novo CPC); na terceira, executa-se o saldo, mediante cumprimento de sentença (art. 523, Novo CPC).

Inicialmente, portanto, o autor requererá a citação do réu para que preste as contas ou ofereça contestação no prazo de 15 (quinze) dias. A impugnação das contas apresentadas pelo réu deverá ser fundamentada e específica, com referência expressa ao lançamento questionado. Se prestadas, o autor terá 15 (quinze) dias para se manifestar. A decisão que julgar procedente o pedido condenará o réu a prestar as contas no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de não lhe ser lícito impugnar as que o autor apresentar.

20.5.2 PETIÇÃO INICIAL

A petição inicial da Ação de Exigir Contas, além de dever observar os requisitos previstos nos arts. 319 e 320 do Novo CPC, deverá ter especificado, detalhadamente, as razões pelas quais exige as contas, instruindo-a com documentos comprobatórios dessa necessidade, se existirem (art. 550, § 1º, Novo CPC).

20.6 AÇÃO DE DISSOLUÇÃO PARCIAL DA SOCIEDADE

Outra inovação trazida pelo Novo Código, prevista em seu art. 599, a Ação de Dissolução Parcial da Sociedade tem por objeto (i) a resolução da sociedade empresária contratual ou simples em relação ao sócio falecido, excluído ou que exerceu o direito de retirada ou recesso; (ii) a apuração dos haveres do sócio falecido, excluído ou que exerceu o direito de retirada ou recesso; ou tão somente (iii) a resolução ou a apuração de haveres.

20.7 AÇÃO DE OPOSIÇÃO

A oposição, prevista no art. 682 e seguintes do Novo CPC, é procedimento especial pelo qual alguém deduz pretensão contra as partes de outro processo em trâmite. Por ter como consequência uma

rio, porquanto considerada prescrita a demanda (art. 23, I, da Lei n.º 8.429/92), não obsta o prosseguimento da demanda quanto ao pedido ressarcitório em razão de sua imprescritibilidade. (...)” (STJ, REsp 1089492/RO, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04/11/2010, DJe 18/11/2010)

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nova ação, o legislador do Novo Código deixou de considerá-la como modalidade de intervenção de terceiros. Todavia, manteve o instituto da oposição, tratando-a no título dedicado aos procedimentos especiais.

Assim, prevê que “quem pretender, no todo ou em parte, a coisa ou o direito sobre que controvertem autor e réu, poderá, até ser proferida a sentença, oferecer oposição contra ambos” (art. 682, Novo CPC).

O opoente deduzirá seu pedido em observação aos requisitos exigidos para propositura da ação (art. 683, Novo CPC). Distribuída a oposição por dependência, serão os opostos citados, na pessoa de seus respectivos advogados, para contestar o pedido no prazo comum de quinze dias (parágrafo único do art. 683, Novo CPC). Ainda, se um dos opostos reconhecer a procedência do pedido, contra o outro prosseguirá o opoente (art. 684, Novo CPC).

Admitido o processamento da oposição, será esta apensada aos autos e tramitará simultaneamente à ação originária, sendo ambas julgadas pela mesma sentença. Se a oposição for proposta após o início da audiência de instrução, o juiz suspenderá o curso do processo ao fim da produção das provas, salvo se concluir que a unidade da instrução mais bem atende ao princípio da duração razoável do processo. Cabendo ao juiz decidir simultaneamente a ação originária e a oposição, desta conhecerá em primeiro lugar (arts. 685 e 686, Novo CPC).

20.8 AÇÕES DE FAMÍLIA

Outro procedimento especial de destaque que surgiu com o Novo Código foram as Ações de Família – nos arts. 693 a 699 –, que representam uma verdadeira adequação às garantias implementadas no Direito de Família contemporâneo, advindas especialmente a partir da Constituição Federal de 1988. Elas têm por objeto os processos contenciosos de divórcio, separação, reconhecimento e extinção de união estável, guarda, visitação e filiação.

Nessas ações, todos os esforços serão empreendidos para a solução consensual da controvérsia, devendo o juiz dispor do auxílio de profissionais de outras áreas de conhecimento para a mediação e conciliação.

Assim, de início, quando recebida a petição inicial e, se for o caso, tomadas as providências referentes à tutela provisória, o juiz ordenará a citação do réu para comparecer à audiência de mediação e conciliação. Essa audiência poderá dividir-se em tantas sessões quantas sejam necessárias para viabilizar a solução consensual, sem prejuízo de providências jurisdicionais para evitar o perecimento do direito.

Não realizado o acordo, passarão a incidir, a partir de então, as normas do procedimento comum, de modo que se seguirá com a defesa do réu. Por fim, vale mencionar que o Ministério Público somente intervirá quando houver interesse de incapaz e deverá ser ouvido previamente à homologação de acordo.

20.9 AÇÃO DE REGULAÇÃO DE AVARIA GROSSA

A Ação de Regulação de Avaria Grossa, outro instituto que sofreu algumas alterações no Novo Código, é prevista nos arts. 707 a 711 deste diploma e está intimamente ligada ao Direito Marítimo.

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20.10 AÇÃO DE USUCAPIÃO COMO PROCEDIMENTO COMUM NO NOVO CPC

Em primeiro lugar, importa observar que o Novo CPC não mais prevê um procedimento especial para a ação de usucapião, apesar de a ela se referir nos artigos 246, § 3º, e 259, I. Assim sendo, passa a referida ação a se inserir dentre as ações de procedimento comum.

A usucapião é uma forma de aquisição originária da propriedade, em razão da posse incontestada por determinado tempo, ininterruptamente, com animus de dono.

São espécies de usucapião: a) usucapião extraordinária; b) usucapião ordinária; c) usucapião especial rural

232; d) usucapião especial urbana;

233 e) usucapião coletiva.

Os bens públicos não estão sujeitos a usucapião, nos termos do art. 183, § 3º, e art. 191, parágrafo único, da Constituição Federal, o que é corroborado pelo art. 102 do Código Civil. No mesmo sentido, a Súmula 340 do STF.

234

De outro lado, tem sido reconhecida a possibilidade de usucapião de bens de sociedade de economia mista, desde que estejam desafetados, ou seja, não afetados a uma finalidade pública.

235

A ação de usucapião é destinada ao reconhecimento do domínio. Todavia, a usucapião também é matéria que pode ser alegada em defesa, tanto em ação petitória como em ação possessória, consoante a Súmula 237 do STF.

236

20.3.1 PROCEDIMENTO

A petição inicial da usucapião, além dos requisitos dos arts. 319 e 320 do Novo CPC, os confinantes serão citados pessoalmente, exceto quando tiver por objeto unidade autônoma de prédio em condomínio, caso em que tal citação é dispensada.

Em verdade, o entendimento jurisprudencial já havia se firmado no sentido de que todos os eventuais possuidores da área e os confinantes certos, que se encontrem em local conhecido, deverão ser citados pessoalmente, não sendo possível a citação por edital. Nesse sentido, as Súmulas 263 e 391 do STF.

237

Os réus formam litisconsórcio passivo necessário simples.

A sentença da ação de usucapião possui eficácia predominantemente declaratória. Ou seja, o possuidor adquire a propriedade por usucapião, razão pela qual a sentença apenas declara que o possuidor se tornou proprietário.

Na aquisição derivada, a transferência da propriedade somente ocorre pelo registro, no cartório de registro de imóveis, do documento translativo da propriedade. Na usucapião, é o preenchimento dos requisitos que faz o possuidor ad usuapionem adquirir a propriedade, e não o registro da sentença da ação de usucapião, que apenas lhe dá publicidade. Em razão disso, a usucapião é forma originária de aquisição da propriedade, pois não decorre de título aquisitivo anterior.

232 CF: “Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterrup-tamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.” 233 CF: “Art. 191. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como seu, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra, em zona rural, não superior a cinquenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.” 234

Súmula 340 do STF: “Desde a vigência do Código Civil, os bens dominicais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião.” Observe-se que tal Súmula refere-se ao Código Civil de 1916, pois editada antes da edição do atual Código Civil. 235

STJ, REsp 647.357/MG, Rel. Ministro CASTRO FILHO, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/09/2006, DJ 23/10/2006, p. 300. 236

Súmula 237 do STF: “O usucapião pode ser arguido em defesa.” 237

Súmula 391 do STF: “O confinante certo deve ser citado, pessoalmente, para a ação de usucapião.” Súmula 263 do STF: “O possui-dor deve ser citado pessoalmente para a ação de usucapião.”

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O fundamento legal dos Juizados Especiais Cíveis da Justiça Estadual está contemplado na Lei 9.099/1995, enquanto o Juizado Especial Federal resta orientado pela Lei 10.259/2001. Assim, o sistema nacional dos Juizados Especiais se divide em: Sistema dos Juizados Estaduais e Sistema dos Juizados Especiais Federais. Integram os Juizados Especiais Estaduais: Juizados Criminais (Lei n. 9.099/95), Juizados Cíveis (Lei n. 9.099/95) e Juizados da Fazenda Pública (Lei n. 12.153/09). Por outro lado, compõem os Juizados Especiais Federais: Juizados Cíveis e Juizados Criminais (Lei n. 10.259/01).

Existem grandes diferenças entre o Juizado Especial Cível Estadual e o Juizado Especial Cível Federal. Enquanto o Juizado Especial Cível trata de controvérsias entre particulares (salvo exceção da Lei n. 12.153/09), o Juizado Especial Federal cuida das controvérsias entre o particular e o Poder Público.

A finalidade do Juizado Especial Cível resta refletida no art. 2º da Lei 9.099/95, ao tratar dos princípios informadores do juizado, sendo eles, oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade. Nesta forma, almeja o juizado especial a solução rápida dos litígios de baixa complexidade, as chamadas ‘pequenas causas’ submetidas à apreciação do Poder Judiciário. A ênfase no rito dos juizados especiais será a busca da conciliação, da transação, estimulando meios de composição do litígio, mesmo antes da sentença, com a aproximação das partes na audiência de conciliação.

No âmbito da justiça federal, a Lei n º 10.259, de 12 de julho de 2001, instituiu os Juizados Especiais Cíveis Federais (JEF), com a aplicação subsidiária da Lei 9.099/95.

“Art. 1º. São instituídos os Juizados Especiais Cíveis e Criminais da Justiça Federal, aos quais se aplica, no que não conflitar com esta Lei, o disposto na Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995”.

Inicialmente, há que se diferenciar as hipóteses de cabimento do Juizado Especial Cível Estadual e do Juizado Especial Federal. No Juizado Especial Cível Estadual, (JEC) assim reza a Lei n ° 9.099/95, em seu artigo 3º:

“Art. 3º. O Juizado Especial Cível tem competência para conciliação, processo e julgamento das causas cíveis de menor complexidade, assim consideradas:

I - as causas cujo valor não exceda a quarenta vezes o salário mínimo;

II - as enumeradas no art. 275, inciso II, do Código de Processo Civil238

;

III - a ação de despejo para uso próprio;

IV - as ações possessórias sobre bens imóveis de valor não excedente ao fixado no inciso I deste artigo.

§1º Compete ao Juizado Especial promover a execução:

238 CPC, Art. 275. Observar-se-á o procedimento sumário: (...) II - nas causas, qualquer que seja o valor: a) de arrendamento rural e de parceria agrícola; b) de cobrança ao condômino de quaisquer quantias devidas ao condomínio; c) de ressarcimento por danos em prédio urbano ou rústico; d) de ressarcimento por danos causados em acidente de veículo de via terrestre; e) de cobrança de seguro, relativamente aos danos causados em acidente de veículo, ressalvados os casos de processo de execução; f) de cobrança de honorários dos profissionais liberais, ressalvado o disposto em legislação especial; g) que versem sobre revogação de doação; h) nos demais casos previstos em lei.

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I - dos seus julgados;

II - dos títulos executivos extrajudiciais, no valor de até quarenta vezes o salário mínimo, observado o disposto no § 1º do art. 8º desta Lei.

§2º Ficam excluídas da competência do Juizado Especial as causas de natureza alimentar, falimentar, fiscal e de interesse da Fazenda Pública, e também as relativas a acidentes de trabalho, a resíduos e ao estado e capacidade das pessoas, ainda que de cunho patrimonial.

§3º A opção pelo procedimento previsto nesta Lei importará em renúncia ao crédito excedente ao limite estabelecido neste artigo, excetuada a hipótese de conciliação”.

Ponto de grande relevância nas hipóteses de cabimento, foi explicitado no FÓRUM NACIONAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS, com a edição do Enunciado 58 que, substituindo o Enunciado 2, assim determina:

“As causas cíveis enumeradas no art. 275 II, do CPC admitem condenação superior a 40 salários mínimos e sua respectiva execução, no próprio Juizado”.

Importa referir que o procedimento sumário, consoante o Novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015), deixa de existir. Assim o CPC/2015 traz a seguinte previsão que sustenta a competência do Juizado para as causas então previstas no art. 275, II do CPC/73, senão vejamos:

Art. 1.063. Até a edição de lei específica, os juizados especiais cíveis previstos na Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995, continuam competentes para o processamento e julgamento das causas previstas no art. 275, inciso II, da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973.

No Juizado Especial Federal (JEF), assim reza a Lei n ° 10.259/2001, em seu artigo 3º:

“Art. 3º. Compete ao Juizado Especial Federal Cível processar, conciliar e julgar causas de competência da Justiça Federal até o valor de sessenta salários mínimos, bem como executar as suas sentenças.

§1º Não se incluem na competência do Juizado Especial Cível as causas:

I - referidas no art. 109, incisos II, III e XI, da Constituição Federal239

, as ações de mandado de segurança, de desapropriação, de divisão e demarcação, populares, execuções fiscais e por improbidade administrativa e as demandas sobre direitos ou interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos;

II - sobre bens imóveis da União, autarquias e fundações públicas federais;

III - para a anulação ou cancelamento de ato administrativo federal, salvo o de natureza previdenciária e o de lançamento fiscal;

IV - que tenham como objeto a impugnação da pena de demissão imposta a servidores públicos civis ou de sanções disciplinares aplicadas a militares.

§2º Quando a pretensão versar sobre obrigações vincendas, para fins de competência do Juizado Especial, a soma de doze parcelas não poderá exceder o valor referido no art. 3º, caput”.

Cumpre esclarecer que o Juizado Especial Cível Estadual (JEC) é uma opção da parte autora que poderá demandar perante a justiça comum, no rito próprio.

239 CRFB/1988, art. 109: II - As causas entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e Município ou pessoa domicilia-da ou residente no País; III – As causas fundadas em tratado ou contrato da União com Estado estrangeiro ou organismo internacional; XI – a disputa sobre direitos indígenas.

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De outra banda, o Juizado Especial Federal é de competência absoluta quando instalado no foro competente, não estando à disposição da parte optar por tramitar ou não a causa no Juizado Especial Federal (JEF), nos termos do art. 3º, § 3º da lei 10.259/2001.

No rito do JEC, o art. 4º da lei 9.099/1995 dispõe que é competente o juizado do foro:

- do domicílio do réu ou, a critério do autor, do local onde aquele exerça atividades profissionais ou econômicas ou mantenha estabelecimento, filial, agência, sucursal ou escritório;

- do lugar onde a obrigação deva ser satisfeita;

- do domicílio do autor ou do local do ato ou fato, nas ações para reparação de dano de qualquer natureza.

Entretanto, em qualquer hipótese poderá a ação ser proposta no domicílio do réu.

No rito do JEF, o art. 20 refere que onde não houver Vara Federal, a causa poderá ser proposta no Juizado Especial Federal mais próximo do foro definido no art. 4º da Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995, vedada a aplicação desta Lei no juízo estadual.

A Lei 9.099/95 (JEC) estabelece que não poderão ser partes, no processo instituído por esta Lei, o incapaz, o preso, as pessoas jurídicas de direito público, as empresas públicas da União, a massa falida e o insolvente civil.

Ainda, quanto à legitimidade ativa, cumpre esclarecer que somente as pessoas físicas capazes serão admitidas a propor ação perante o Juizado Especial, excluídos os cessionários de direito de pessoas jurídicas. Neste mote, as pessoas jurídicas, na regra, não possuem legitimidade ativa para propor ação perante o juizado especial cível estadual. Exceção a esta regra é apresentada na Lei Complementar 123/2006, que assim dispõe:

Art. 74. Aplica-se às microempresas e às empresas de pequeno porte de que trata esta Lei Complementar o disposto no § 1º do art. 8º da Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, e no inciso I do caput do art. 6º da Lei nº 10.259, de 12 de julho de 2001, as quais, assim como as pessoas físicas capazes, passam a ser admitidas como proponentes de ação perante o Juizado Especial, excluídos os cessionários de direito de pessoas jurídicas.

Aplicável ao caso, ainda, o Enunciado 135 do Fórum Nacional dos Juizados Especiais, vejamos:

ENUNCIADO 135 (substitui o Enunciado 47) – O acesso da microempresa ou empresa de pequeno porte no sistema dos juizados especiais depende da comprovação de sua qualifi-cação tributária atualizada e documento fiscal referente ao negócio jurídico objeto da de-manda. (XXVII Encontro – Palmas/TO).

Ponto relevante de diferenciação é apresentado na capacidade postulatória, visto que, consoante art. 9º da lei do JEC, nas causas de valor até vinte salários mínimos, as partes comparecerão pessoalmente, podendo ser assistidas por advogado. Sendo superior a vinte salários mínimos, a representação por advogado é obrigatória. Neste caso, sendo facultativa a assistência, se uma das partes comparecer assistida por advogado, ou se o réu for pessoa jurídica ou firma individual, terá a outra parte, se quiser, assistência judiciária prestada por órgão instituído junto ao Juizado Especial, na forma da lei local. De outra banda, no JEF (Lei n. 10.259/01), a parte pode propor qualquer demanda de até 60 (sessenta) salários mínimos sem advogado, visto que não há essa obrigatoriedade na respectiva lei.

O réu, sendo pessoa jurídica ou titular de firma individual, poderá ser representado por preposto credenciado.

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No que tange ao JEF, a lei 10.259/2001 estabelece que podem ser partes no Juizado Especial Federal Cível como autores, as pessoas físicas e as microempresas e empresas de pequeno porte, assim definidas na Lei nº 9.317, de 5 de dezembro de 1996. Na condição de ré, poderá figurar a União, autarquias, fundações e empresas públicas federais. Ressalte-se que não haverá prazo diferenciado para a prática de qualquer ato processual pelas pessoas jurídicas de direito público, inclusive a interposição de recursos, devendo a citação para audiência de conciliação ser efetuada com antecedência mínima de trinta dias. Isto porque, no âmbito do JEF, as prerrogativas da ré Fazenda Pública, previstas no CPC, não são permitidas, de maneira que inexiste prazo em dobro para recorrer e em quádruplo para contestar, e é vedado o reexame obrigatório das sentenças contra o Poder Público. Por outro lado, na Lei nº 9.099/95, impõe-se a igualdade entre as partes, salvo exceções dispostas em outras leis, como nas relações de consumo tratadas nos Juizados, por força da aplicação analógica do Código do Consumidor, que determina a inversão do ônus da prova em favor do consumidor e contra o fornecedor (art. 6º, Lei n. 8.076/90).

Ainda no que pertine ao autor da ação, cabe ressaltar que das pessoas físicas legitimadas, apenas o maior de dezoito anos capaz pode ser autor nos Juizados Estaduais Cíveis (art. 8º, § 2º, Lei nº 9.099/95); nos Juizados Federais e Fazendários Estaduais não ocorre essa vedação, pois o incapaz, desde que representado devidamente, possui legitimidade ativa, inclusive o menor de 18 anos.

Não se admite, no processo, qualquer forma de intervenção de terceiro nem de assistência. Apenas é admitido o litisconsórcio.

A parte autora fará requerimento escrito ou via oral. Sendo via oral, aplica-se o art. 14, § 3º que estabelece a redução a termo pela Secretaria do Juizado, podendo ser utilizado o sistema de fichas ou formulários impressos. Ato concomitante será o aprazamento de sessão de conciliação, a realizar-se no prazo de quinze dias. Poderá ocorrer o chamado pedido contraposto, ou “contra-pedido”. Não se fala em reconvenção, esta incabível no rito do Juizado Especial, mas em pedido contraposto ou contra-pedido efetivado pelo réu da ação. No rito do previsto pela Lei 9.099/95, não se admitirá a citação por edital.

Conforme estabelece a Lei 10.259/2001, no âmbito do Juizado Especial Federal (JEF), as citações e intimações da União serão feitas na forma prevista nos arts. 35 a 38 da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993. A citação das autarquias, fundações e empresas públicas será feita na pessoa do representante máximo da entidade, no local onde proposta a causa, quando ali instalado seu escritório ou representação; se não, na sede da entidade.

Aberta a sessão no JEC, o Juiz togado ou leigo esclarecerá as partes presentes sobre as vantagens da conciliação, mostrando-lhes os riscos e as conseqüências do litígio. A conciliação será conduzida pelo Juiz togado ou leigo ou por conciliador sob sua orientação. Sendo obtida a conciliação, esta será reduzida a escrito e homologada pelo Juiz togado, mediante sentença com eficácia de título executivo.

Caso não compareça o demandado, o Juiz togado proferirá sentença. Não obtida a conciliação, as partes poderão optar, de comum acordo, pelo juízo arbitral, na forma prevista nesta Lei. Não instituído o juízo arbitral, proceder-se-á imediatamente à audiência de instrução e julgamento, desde que não resulte prejuízo para a defesa. Não sendo possível a sua realização imediata, será a audiência designada para um dos quinze dias subseqüentes, cientes, desde logo, as partes e testemunhas eventualmente presentes. Nesta audiência de instrução e julgamento serão ouvidas as partes, colhida a prova e, em seguida, proferida a sentença. Serão decididos de plano todos os incidentes que possam interferir no regular prosseguimento da audiência. As demais questões serão decididas na sentença. Sobre os documentos apresentados por uma das partes, manifestar-se-á imediatamente a parte contrária, sem interrupção da audiência.

Conforme estabelece a Lei 9.099/95, a contestação, que será oral ou escrita, conterá toda matéria de defesa, exceto argüição de suspeição ou impedimento do Juiz, que se processará na forma da legislação em vigor. Poderá o Réu ofertar contra-pedido, desde que fundado nos mesmos fatos que constituem objeto da controvérsia. O autor poderá responder ao pedido do réu na própria audiência ou requerer a designação da nova data, que será desde logo fixada, cientes todos os presentes.

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Consoante dispõe a lei do JEC, todos os meios de prova moralmente legítimos, ainda que não especificados em lei, são hábeis para provar a veracidade dos fatos alegados pelas partes.

As provas serão produzidas na audiência de instrução e julgamento, ainda que não requeridas previamente, podendo o Juiz limitar ou excluir as que considerar excessivas, impertinentes ou protelatórias. Ocorre limitação do número de testemunhas, até o máximo de três para cada parte. Estas comparecerão à audiência de instrução e julgamento levadas pela parte que as tenha arrolado, independentemente de intimação, ou mediante esta, se assim for requerido. O requerimento para intimação das testemunhas deverá ser apresentado à Secretaria no mínimo cinco dias antes da audiência de instrução e julgamento.

Na hipótese de não comparecimento de uma testemunha intimada, o Juiz poderá determinar sua imediata condução, valendo-se, se necessário, do concurso da força pública.

Quando a prova do fato exigir, o Juiz poderá inquirir técnicos de sua confiança, permitida às partes a apresentação de parecer técnico. No curso da audiência, poderá o Juiz, de ofício ou a requerimento das partes, realizar inspeção em pessoas ou coisas, ou determinar que o faça pessoa de sua confiança, que lhe relatará informalmente o verificado.

A sentença mencionará os elementos de convicção do Juiz, com breve resumo dos fatos relevantes ocorridos em audiência, dispensado o relatório. Não se admitirá sentença condenatória por quantia ilíquida, ainda que genérico o pedido. É ineficaz a sentença condenatória na parte que exceder a alçada estabelecida na Lei 9.099/95 – Juizado Especial Cível Estadual.

O Juiz leigo (função específica no juizado especial estadual) que tiver dirigido a instrução proferirá sua decisão e imediatamente a submeterá ao Juiz togado, que poderá homologá-la, proferir outra em substituição ou, antes de se manifestar, determinar a realização de atos probatórios indispensáveis. Assim, embora os atos processuais sejam dirigidos pelo juiz leigo, bem como a sugestão de sentença, esta deverá ser homologada por Juiz togado, por Juiz de direito. Não há condenação em honorários advocatícios. Igualmente, não se admitirá ação rescisória nas causas sujeitas ao procedimento do Juizado Especial.

Uma vez sentenciado o processo no rito dos Juizados Especiais, é cabível o Recurso Inominado. Não caberá Recurso Inominado da sentença homologatória de conciliação ou laudo arbitral. O recurso será julgado por uma turma composta por três Juízes togados, em exercício no primeiro grau de jurisdição, reunidos na sede do Juizado, denominada Turma Recursal.

No recurso, as partes serão obrigatoriamente representadas por advogado. O recurso será interposto no prazo de dez dias, contados da ciência da sentença, por petição escrita, da qual constarão as razões e o pedido do recorrente. O preparo do recurso será feito, independentemente de intimação, nas quarenta e oito horas seguintes à interposição, sob pena de deserção. Após o preparo, a Secretaria intimará o recorrido para oferecer resposta escrita no prazo de dez dias. O recurso terá somente efeito devolutivo, podendo o Juiz dar-lhe efeito suspensivo, para evitar dano irreparável para a parte.

As partes serão intimadas da data da sessão de julgamento do recurso inominado. O julgamento em segunda instância constará apenas da ata, com a indicação suficiente do processo, fundamentação sucinta e parte dispositiva. Se a sentença for confirmada pelos próprios fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão. Observe-se que, como referido anteriormente, a sentença de primeiro grau não condenará o vencido em custas e honorários de advogado, ressalvados os casos de litigância de má-fé. Em segundo grau, o recorrente, vencido, pagará as custas e honorários de advogado, que serão fixados entre dez por cento e vinte por cento do valor de condenação ou, não havendo condenação, do valor corrigido da causa.

No rito do Juizado Especial Cível, caberão embargos de declaração quando, na sentença ou acórdão, houver obscuridade, contradição, omissão ou dúvida. Os erros materiais não necessitam propriamente de embargos de declaração para a sua correção, podendo ser corrigidos de ofício. Os

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embargos de declaração serão interpostos por escrito ou oralmente, no prazo de cinco dias, contados da ciência da decisão. Importante referir uma grande diferença dos embargos no rito comum do CPC de 1973 e no rito do juizado: no rito do Juizado Especial, os embargos de declaração suspenderão o prazo para recurso. Desta forma, não há interrupção do prazo para recurso, como ocorre no rito comum do CPC de 1973, mas suspensão do prazo. Com a vigência do Novo Código de Processo Civil, Lei 13.105 de 2015, os embargos de declaração recebem alterações importantes, sobretudo na alteração de seus efeitos. O novo diploma processual prevê que os embargos de declaração no Juizado Especial terão efeito interruptivo, a saber:

Art. 1.064. O caput do art. 48 da Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995, passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 48. Caberão embargos de declaração contra sentença ou acórdão nos casos previstos no Código de Processo Civil. ...................................................................................” (NR) Art. 1.065. O art. 50 da Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995, passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 50. Os embargos de declaração interrompem o prazo para a interposição de re-curso.” (NR) Art. 1.066. O art. 83 da Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995, passam a vigorar com a seguinte redação: “Art. 83. Cabem embargos de declaração quando, em sentença ou acórdão, houver obscuridade, contradição ou omissão. ............................................................................................. § 2º Os embargos de declaração interrompem o prazo para a interposição de recurso.

No Juizado Especial não é cabível o recurso de agravo de instrumento. É este o entendimento do STJ: “(...) A decisão da Presidência da Turma Regional que não conhece de agravo regimental interposto contra acórdão do Colegiado não se afigura teratológica, manifestamente ilegal, pois o Regimento Interno das Turmas Recursais dos JEF's e da Turma Regional de Uniformização de Jurisprudência no âmbito da 4ª Região prevê a interposição de agravo regimental somente contra decisões monocráticas. (...)”. (MS 0016012-57.2011.404.0000, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relator Marcos Josegrei da Silva, D.E. 28/02/2012).

O Recurso Especial do acórdão das Turmas Recursais não é cabível no rito do Juizado Especial, visto que o artigo 105, III da CF, dispõe que o Recurso Especial é cabível contra julgamentos de última instância havidos pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios. O artigo não refere a Turmas de Recurso.

É cabível o Recurso Extraordinário no rito do Juizado Especial, a teor do artigo 102, III da CF, uma vez que o dispositivo não refere que o Recurso se volta exclusivamente contra decisões de Tribunais.

No que se refere ao mandado de segurança, a jurisprudência tem decidido o seguinte: “MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ACÓRDÃO DA TURMA RECURSAL. NÃO CABIMENTO. O recurso de mandado de segurança somente é cabível em situações excepcionais quando inexista recurso previsto no sistema. (...)”. (5046349-47.2012.404.7100, Quarta Turma Recursal do RS, Relator p/ Acórdão Paulo Paim da Silva, julgado em 27/09/2012).

Em relação ao cumprimento da sentença, no sistema dos Juizados Especiais Cíveis da Lei nº 9.099/95, a execução, via de regra, é comum, por quantia certa contra devedor solvente, podendo haver acordo na execução. Já nos Juizados Federais, a execução é imediata (executiva lato sensu) e o pagamento, se a ré for a Fazenda Pública, será por Requisição de Pequeno Valor, admitindo-se o precatório, por opção do autor, se a condenação ultrapassar nos casos permitidos em lei o valor de sessenta salários mínimos.

Ainda, no processo dos Juizados Federais, pode o juiz deferir medidas acautelatórias, de ofício ou a requerimento, no curso do processo, para evitar dano de difícil reparação (art. 4º, Lei n. 10.259/01).

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Não há previsão a este respeito na Lei nº 9.099/95, o que não impede a aplicação analógica dos mesmos institutos a estes Juizados, conforme reconhece parcela significativa da Jurisprudência.

A Lei 10.259/2001, que regula o Juizado Especial Federal, traz em seu bojo a possibilidade do pedido de uniformização. Tal pedido resta contemplado apenas no rito do Juizado Especial Federal, sendo cabível pedido de uniformização de interpretação de lei federal quando houver divergência entre decisões sobre questões de direito material proferidas por Turmas Recursais na interpretação da lei. O pedido fundado em divergência entre Turmas da mesma Região será julgado em reunião conjunta das Turmas em conflito, sob a presidência do Juiz Coordenador. O pedido fundado em divergência entre decisões de Turmas de diferentes regiões ou da proferida em contrariedade à súmula ou jurisprudência dominante do STJ será julgado por Turma de Uniformização, integrada por juízes de Turmas Recursais, sob a presidência do Coordenador da Justiça Federal. Prevê a Lei 10.259/2001 que a reunião de juízes domiciliados em cidades diversas será feita pela via eletrônica.

Na hipótese da orientação acolhida pela Turma de Uniformização, em questões de direito material, contrariar súmula ou jurisprudência dominante no Superior Tribunal de Justiça – STJ, a parte interessada poderá provocar a manifestação deste, que dirimirá a divergência. Presente a plausibilidade do direito invocado e havendo fundado receio de dano de difícil reparação, poderá o relator conceder, de ofício ou a requerimento do interessado, medida liminar determinando a suspensão dos processos nos quais a controvérsia esteja estabelecida.

Eventuais pedidos de uniformização idênticos, recebidos subsequentemente em quaisquer Turmas Recursais, ficarão retidos nos autos, aguardando-se pronunciamento do Superior Tribunal de Justiça. Sendo necessário, o relator pedirá informações ao Presidente da Turma Recursal ou Coordenador da Turma de Uniformização e ouvirá o Ministério Público, no prazo de cinco dias. Eventuais interessados, ainda que não sejam partes no processo, poderão se manifestar, no prazo de trinta dias. Decorridos os referidos prazos, o relator incluirá o pedido em pauta na Seção, com preferência sobre todos os demais feitos, ressalvados os processos com réus presos, os habeas corpus e os mandados de segurança. Publicado o acórdão respectivo, os pedidos retidos serão apreciados pelas Turmas Recursais, que poderão exercer juízo de retratação ou declará-los prejudicados, se veicularem tese não acolhida pelo Superior Tribunal de Justiça. Os Tribunais Regionais, o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal, no âmbito de suas competências, expedirão normas regulamentando a composição dos órgãos e os procedimentos a serem adotados para o processamento e o julgamento do pedido de uniformização e do recurso extraordinário.

No que se refere à uniformização de julgados da mesma Turma Recursal, a jurisprudência entende que: “A divergência entre julgados da mesma Turma Recursal não autoriza a uniformização de jurisprudência pela Turma Regional de Uniformização”. (IUJEF 2007.72.95.009884-0, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relatora Ivanise Correa Rodrigues Perotoni, D.E. 24/08/2010).

Ademais, as questões enfrentadas pelas Turmas de Uniformização devem tratar de direito material: “Nos termos do artigo 14, caput, da Lei 10.259/2001, o pedido de uniformização de jurisprudência somente tem cabimento quando se tratar de questão de direito material”. (IUJEF 2008.72.52.004793-4, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relatora Ana Beatriz Vieira da Luz Palumbo, D.E. 08/09/2009).

Com a vigência do Novo Código de Processo Civil, será cabível nos Juizados Especiais o instituto do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, conforme prevê o art. 1.062 da Lei 13.105/2015.

Por derradeiro, importa referir que o Novo Código de Processo Civil, a teor do art. 219, afirma que a contagem dos prazos será apenas em dias úteis. Embora o texto do Novo CPC não tenha realizado nenhuma disposição acerca da contagem dos prazos no Juizado, o Encontro Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados editou o Enunciado 45, que assim afirmou “A contagem dos prazos em dias úteis (art. 219 do CPC/2015) aplica-se ao sistema de juizados especiais”.