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A Proteção Jurídica das Florestas Tropicais e a Ação de Desapropriação Indireta. Doutrina e Jurisprudência José Augusto Delgado Ministro do Superior Tribunal de Justiça Professor de Direito Público 1 - INTRODUÇÃO A Ciência Jurídica procura, no atual momento vivido pela humanidade, adotar princípios que se harmonizem com os anseios da cidadania, que são provocados pela necessidade de ser garantida a textura do meio ambiente natural, preservando-se todos os recursos da natureza para as gerações atuais e futuras, a fim de que possam ter um padrão de vida inserido em um contexto possibilitador de melhor gozo de saúde e de satisfação social e coletiva. A partir da segunda metade do Século XX, o Direito material tem passado por uma constante e súbita evolução doutrinária, toda ela voltada para impor disciplina aos novos fenômenos presentes na vida do homem, em face da agressão que o avanço da tecnologia e exploração de vários tipos de indústria, a modernização das cidades, a ambição financeira do ser humano e as conquistas da economia vêm cometendo contra os valores ambientais existentes na terra. A luta do Direito concentra-se, na fase contemporânea vivenciada pelos variados estamentos sociais, em superar a fase científico-dogmática e passar, imediatamente, a valorizar e determinar com regras bem claras os objetivos a que se propõe concretizar. Enfrenta-se, em conseqüência, a dinâmica imposta por qualquer processo de transformação e a resistência sempre apresentada a toda tentativa de mudança, especialmente, quando ela busca impor uma nova visão institucional a respeito de entidades jurídicas com configurações consagradas através de séculos, como é, por exemplo, a propriedade. A plenitude do uso, gozo e disposição da propriedade começou, por força desses novos questionamentos assumidos pela Ciência do Direito, a ser debatida em patamar que se consagrou como determinador da visão de que o social e o ambiental são valores fundamentais presentes na vida do homem e que se sobrepõem, com exceção do valor da liberdade para o ser humano, a quaisquer outros tipos de controle social. Em tal círculo determinador de uma hierarquização de regras jurídicas a limitar a atividade do Estado e do homem em sociedade, o meio-ambiente passou a receber

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A Proteção Jurídica das Florestas Tropicais e a Ação de DesapropriaçãoIndireta.Doutrina e Jurisprudência

José Augusto DelgadoMinistro do Superior Tribunal de JustiçaProfessor de Direito Público

1 - INTRODUÇÃO

A Ciência Jurídica procura, no atual momento vivido pela humanidade, adotarprincípios que se harmonizem com os anseios da cidadania, que são provocadospela necessidade de ser garantida a textura do meio ambiente natural,preservando-se todos os recursos da natureza para as gerações atuais e futuras, afim de que possam ter um padrão de vida inserido em um contexto possibilitadorde melhor gozo de saúde e de satisfação social e coletiva.

A partir da segunda metade do Século XX, o Direito material tem passado por umaconstante e súbita evolução doutrinária, toda ela voltada para impor disciplina aosnovos fenômenos presentes na vida do homem, em face da agressão que o avançoda tecnologia e exploração de vários tipos de indústria, a modernização dascidades, a ambição financeira do ser humano e as conquistas da economia vêmcometendo contra os valores ambientais existentes na terra.

A luta do Direito concentra-se, na fase contemporânea vivenciada pelos variadosestamentos sociais, em superar a fase científico-dogmática e passar,imediatamente, a valorizar e determinar com regras bem claras os objetivos a quese propõe concretizar.

Enfrenta-se, em conseqüência, a dinâmica imposta por qualquer processo detransformação e a resistência sempre apresentada a toda tentativa de mudança,especialmente, quando ela busca impor uma nova visão institucional a respeito deentidades jurídicas com configurações consagradas através de séculos, como é, porexemplo, a propriedade.

A plenitude do uso, gozo e disposição da propriedade começou, por força dessesnovos questionamentos assumidos pela Ciência do Direito, a ser debatida empatamar que se consagrou como determinador da visão de que o social e oambiental são valores fundamentais presentes na vida do homem e que sesobrepõem, com exceção do valor da liberdade para o ser humano, a quaisqueroutros tipos de controle social.

Em tal círculo determinador de uma hierarquização de regras jurídicas a limitar aatividade do Estado e do homem em sociedade, o meio-ambiente passou a receber

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intensa tutela normativa, com ampla significação no relacionamento do cidadãocom a terra e, especialmente, com o que nela existe e contribui para beneficiar apureza do ar, para garantir a produtividade do solo, para manter a capacidade dearmazenamento das águas e garantir uma vida mais saudável na cidade ou nocampo.

O quadro acima descrito, impondo tais acentuadas modificações na vivência do diaa dia do ser humano, conduz a que esforços sejam desenvolvidos pelos váriossetores da Nação para que seja formada uma conscientização jurídica atualizada edisposta no sentido de que o direito do passado não é capaz de fazer valer os seusprincípios e regras para o momento presente e para o futuro, em razão do grandenúmero de desafios lançados pela sociedade de hoje e que, com certeza, serãomais intensos nos dias do amanhã.

O contexto formado e acima descrito propiciou o surgimento do denominado DireitoAmbiental com propostas de modificar o campo científico até então implantado eabsorvido pelo mundo jurídico, redefinindo as regras sobre a propriedade evoltando-se para proteger o equilíbrio da "natureza, da flora e fauna a estaassociada, das águas superficiais e subterrâneas, da adeqüada coleta, tratamento edisposição de esgotos e resíduos sólidos, enfim, da qualidade da vida humana".(2)

A profunda significação do Direito Ambiental para garantir um melhor estado desaúde e de padrão de vida ao ser humano foi considerada pelos constitucionalistascomo sendo de natureza fundamental e representativa do tipo de terceira geração.

As Constituições modernas, a partir de tal postura, passaram a conter regrasdisciplinando o campo de ação de tal ramo do Direito, sempre valorizando os seusprincípios no mesmo nível dos que garantem a liberdade, a inviolabilidade, aintimidade e outros direitos nucleares do homem individual e social.

Essa perspectiva do Direito Ambiental ser concebido como de grau fundamentalpara o cidadão foi majestosamente configurada por Paulo Bonavides, ao escreverque:

"A consciência de um mundo partido entre nações desenvolvidas esubdesenvolvidas ou em fase de precário desenvolvimento deu lugar emseguida a que se buscasse uma outra dimensão dos direitos fundamentais,até então desconhecida. Trata-se daquela que se assenta sobre afraternidade, conforme assinala Karel Vasak, e provida de uma latitude desentido que não parece compreender unicamente a proteção específica dedireitos individuais ou coletivos.Com efeito, um novo pólo jurídico de alforria do homem se acrescentahistoricamente aos da liberdade e da igualdade. Dotados de altíssimo teor dehumanismo e universalidade, os direitos da terceira geração tendem acristalizar-se neste fim de século enquanto direitos que não se destinam

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especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo oude um determinado Estado. Têm primeiro por destinatário o gênero humano,num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termosde existencialidade concreta. Os publicitas e juristas já os enumeram comfamiliaridade, assinalando-se o caráter fascinante de coroamento de umaevolução de trezentos anos na esteira da concretização dos direitosfundamentais. Emergiram eles da reflexão sobre temas referentes aodesenvolvimento, à paz, ao meio-ambiente, à comunicação e ao patrimôniocomum da humanidade.A teoria com Vasak e outros já identificou cinco direitos da fraternidade, ouseja, da terceira geração: o direito ao desenvolvimento, o direito à paz, odireito ao meio ambiente, o direito de propriedade sobre o patrimôniocomum da humanidade e o direito de comunicação."(3)

Não se pode obscurecer o fato de que o processo de mudança provocado com aevolução teórica e legislativa do Direito Ambiental conduziu a um estado deperplexidade em muitos juristas, por terem de compatibilizar as novas idéias sobreo uso, gozo e disposição da propriedade, em face das limitações que passaram asofrer, com o até então compreendido e assentado para as mesmas relações comvisões individualistas e privatísticas.

Enfocando o Direito Ambiental que impera e aperfeiçoa-se neste final de Século XX,no âmbito do nosso ordenamento jurídico brasileiro, há de ser observado que aatual Constituição Federal, de modo expresso, dele cuidou em capítulo próprio eatravés de vários dispositivos sediados em locais outros.

Registre-se que até então, a nível constitucional, o Direito Ambiental apresentava oseguinte quadro restritivo:a) A Constituição Imperial de 1824 não continha qualquer regra sobre a proteçãodo meio ambiente.b) A Constituição Imperial de 1824 não continha qualquer regra sobre a proteçãodo meio ambiente.c) A 1ª Carta Republicana (1891), em seu art. 34, nº 29, ditou, apenas, quecompetia à União legislar sobre as suas minas e terras, sem, contudo, dispor,expressamente, que deveria proteger o meio ambiente.d) A CF de 1934, em seu art. 5º, XIX, "j", ampliou a competência legislativa daUnião para lhe atribuir legislar sobre "bens de domínio federal, riquezas do subsolo,metalurgia, água, energia hidrelétrica, florestas, caça e pesca e sua exploração".e) A Carta de 1937 repetiu, praticamente, o disposto no art. 5º, XIX, "j", daConstituição de 1934, estatuindo, em seu art. 16, XIV, que competiaprivativamente à União o poder de legislar sobre "os bens de domínio federal,minas, metalurgia, energia hidráulica, águas, florestas, caça e pesca e suaexploração."f) A Carta Democrática de 1946, em seu art. 5º, XV, alínea 1, não cuidou,

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expressamente, do meio ambiente, por ter limitado a sua mensagem a só atribuircompetência à União para legislar sobre "riquezas do subsolo, mineração,metalurgia, águas, energia elétrica, florestas, caça e pesca".g) A Constituição de 1967, em c/c a EC nº 1/69, não apresentou qualquernovidade. O mesmo sistema da Carta anterior foi adotado, pelo que dispôs ser dacompetência da União legislar sobre (art. 8º, inc. XVII):

"h) jazidas, minas e outros recursos minerais, metalurgia, florestas, caça epesca;i) águas, energia elétrica e telecomunicações."

Esse quadro legislativo constitucional foi inteiramente modificado pela Carta Magnade 1988.

O exame da referida Lei Maior atual revela que o Direito Ambiental está nelatratado em vários dispositivos, de modo direto ou indireto, a saber:

"Em sede constitucional são encontráveis os seguintes pontos dedicados aomeio ambiente ou a este vinculados direta ou indiretamente: art. 5º, incisosXXIII, LXXI, LXXIII; art. 20, I, II, III, IV, V, VI, VII, VIII, IX, X, XI, e §§ 1º e2º; art. 21, XIX, XX, XXIII, alíneas a, b e c, XXV; art. 22, IV, XII, XXVI; art.23, I, III, IV, VI, VII, IX, XI; art. 24, VI, VII, VIII; art. 26, I, II, III, IV; art.30, I, II, VIII; art. 43, § 2º, IV, e § 3º; art. 49, XIV, XVI; art. 91; art. 129,III; art. 170, art. 174, §§ 3º e 4º; art. 176 e §§; art. 182 e §§; art. 186; art.200, VII, VIII; art. 216, V, e §§ 1º, 3º e 4º; art. 225; art. 231; art. 232;atos das disposições constitucionais transitórias: art. 43; art. 44 e §§.""Dos artigos que foram acima arrolados, ressai evidente que foram criadasnormas de natureza processual (art. 5º, LXXIII; art. 129, III); de naturezapenal (art. 225, § 3º); de natureza econômica (art. 170, VI; art. 174, § 3º,art. 225, § 2º); de natureza sanitária (art. 200, VIII); de natureza tutelaradministrativa (art. 225, caput, art. 23, VII, art. 225, § 1º e § 4º; art. 174, §3º; 23, VI, 216, V; art. 225, § 2º e 225, § 6º) além de normas atributivas decompetência legislativa (art. 24, VI e VII, 23, VI)."(4)

O inteiro teor dos dispositivo supramencionados estão registrados na nota abaixotranscrita.(5)

Há, conforme examinado, na estrutura constitucional criada para a proteção aomeio ambiente, uma plataforma com capacidade de enfrentar, no plano jurídico,

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todos os problemas surgidos com a proteção que deve ser dada à natureza.

As dificuldades que se apresentam no momento, mesmo após mais de 10 (dez )anos de vigência da Carta Magna, estão em torno de se fazer com que tais ditamesconstitucionais tornem-se eficazes e efetivos com a produção de efeitos comovisualizados pelo Constituinte de 1988.

O fato de tais normas existirem e serem válidas não é suficiente para se conceberque elas estão realmente protegendo as florestas e outros elementos materiais eimateriais existentes na natureza e que são essenciais para a vida do homem.

A política para transformá-los em produtores de ações reais passa por um processode atuação integrada do Poder Judiciário com a do Ministério Público, sem se negara necessidade da contribuição das Associações de Defesa do Meio Ambiente e dasatividades que o Poder Público deverá exercer.

Há, também, de se desenvolver campanha para a mudança cultural de todos osestamentos formadores da sociedade que devem ser conscientizados da adoção depostura para valorizar a guarda dos valores ambientais.

2 - AS FLORESTAS TROPICAIS E A SUA PROTEÇÃO JURÍDICA.

O conceito jurídico de floresta está concentrado na afirmação de que é umaformação vegetal geralmente densa, em que predominam as árvores ou espécieslenhosas de grande porte.

A legislação brasileira, de modo explícito, não a define. O intérprete buscacompreender a sua significação com apoio no que a seu respeito informam osestudiosos dos fenômenos naturais que ela produz.

A Grande Enciclopédia Laurousse Cultural, no verbete Floresta, vol. 10, explicita:

"A floresta é uma formação clímax que ocorre em todas as áreas em que ascondições de umidade e temperatura são favoráveis, isto é, naquelas em queo solo apresenta um balanço hídrico favorável, em que a umidade relativa doar se mantenha elevada em grande parte do ano e em que temperaturasmuito baixas não impeçam o crescimento de espécies de grande porte. Doponto de vista fisionômico mais geral, as florestas são divididas em doisgrandes grupos: florestas latifoliadas (folhas em forma de lâmina) e florestasaciculifoliadas (folhas em forma de agulhas).As florestas latifoliadas apresentam características bem diferenciadas,conforme a latitude em que ocorrem. Nas baixas latitudes, sob climasuperúmido, domina a floresta latifoliada equatorial (denominada por algunsautores, latifoliada perene ou sempre-verde). Caracteriza-se pela diversidadede espécies e pelo porte de certas árvores, que atingem 50m de altura e se

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elevam, espaçadamente, sobre o estrato arbóreo inferior. Neste, as copasestão entrelaçadas entre 20-25m de altura, em grande competição pela luz,e recobertas de lianas e epífitas.O sub-bosque é pouco desenvolvido, devido à deficiência de iluminação. Afloresta equatorial necessita de um mínimo de 1.500mm anuais deprecipitações, e suas áreas de ocorrência são, na América, a regiãoamazônica; na África, a bacia do Congo e partes da costa do golfo da Guiné;na Ásia, a Insulíndia.Nas regiões em que o período seco excede a três meses, surgem algumasespécies que perdem suas folhas durante a estiagem, caracterizando asflorestas latifoliadas tropicais ou latifoliadas semidecíduas, também comenorme variedade de espécies. No Brasil, recobriam toda a fachada atlânticaoriental e parte da bacia do rio Paraná (com características perenifólias,devido à alta pluviosidade, nas encostas do planalto Atlântico (florestalatifoliada tropical úmida das encostas, na classificação de Dora A. Romariz).Nas costas lodosas, encontra-se um tipo específico de floresta tropical - osmanguezais. Nas médias latitudes, ocorre a floresta latifoliada temperada oudecídua (cujas espécies perdem as folhas durante o inverno). Menos densaque as tropicais, sua cobertura arbórea permite a penetração da luz até osolo, propiciando a formação de um sub-bosque de arbustos e mesmo de umestrato herbáceo. As faias e os carvalhos são as espécies dominantes.As florestas aciculifoliadas, sempre-verdes, aparecem em certas áreas naslatitudes subtropicais, nas montanhas das regiões temperadas (até certolimite de altitude) e, em grandes extensões, nas planícies do norte daEuropa, da Ásia (taiga) e da América, onde dominam as coníferas oupinheiros. No Brasil, nas áreas subtropicais do planalto Meridional, ocorre amata de araucárias (floresta aciculifoliada subtropical), em que a espéciedominante no estrato superior é uma conífera - o pinheiro-do-Paraná.Nas áreas do globo com clima mediterrâneo, ocorre a floresta mediterrânea,ou maquis, vegetação de transição formada por árvores e arbustos enfezadose muitas espécies xerófilas, que resistem ao frio do inverno e à estiagemestival.As florestas abrigam uma vida animal bastante diversificada e têm um papelessencial no balanço oxigênio/gás carbônico da atmosfera. Apesar disso,estão cada vez mais ameaçadas de destruição, tanto pelos desmatamentosdescontrolados e incêndios quanto pela poluição industrial (devido à presençade flúor e, mais freqüentemente, às chuvas ácidas)."

Em campo legislativo, a Constituição Federal de 1988 cuida, de modo explícito edireto, da proteção das florestas brasileiras, nos arts. 23, VII, 24, VI, e 225, § 4º.O teor dos referidos artigos já estão registrados na nota de rodapé de nº 5. Outrosdispositivos constitucionais são aplicados, conforme demonstrado no capítuloanterior, porém, sem ser de modo específico.

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No âmbito da legislação ordinária, está em pleno vigor o Código Florestal (Lei nº4.771, de 15/09/65, com as alterações introduzidas pelas Leis de nº 6.535 e 7.803,de 15/06/78 e 18/07/89, respectivamente). Esses instrumentos legais constituem oplano normativo voltado para proteger e preservar as florestas permanentes e nãopermanentes existentes no território nacional.

A análise dos referidos dispositivos e de uma parte da doutrina permite que ointérprete forme, a respeito do tema, os enunciados que abaixo formulo.

Enunciado nº 1 - As florestas e quaisquer formas de vegetação, desde que sejamreconhecidas de utilidade às terras que revestem, são consideradas bens deinteresse comum, pelo que o direito de propriedade sobre elas há de ser respeitadocom as limitações impostas pela lei, de modo geral, e, especialmente, as postaspelo Código Florestal.

Enunciado nº 2 - O conceito de uso nocivo de propriedade abrange, também,qualquer ação ou omissão que contrarie as disposições postas no Código Florestalsobre a utilização e exploração das florestas.

Enunciado nº 3 - As florestas e as demais formas de vegetação consideradas depreservação permanente são as que estão situadas nos locais determinados peloart. 2º, da Lei nº 4.771, de 15/09/65.(6)

Enunciado nº 4 - São, também, consideradas florestas e formas de vegetaçãonatural as que, por ato do Poder Público, mesmo não situadas nos locaisdeterminados pelo art. 2º, da Lei nº 4.771, de 15/09/65, sejam consideradasdestinadas :a) "a atenuar a erosão das terras;b) a fixar as dunas;c) a formar faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias;d) a auxiliar a defesa do território nacional, a critério das autoridades militares;e) a proteger sítios de excepcional beleza ou de valor científico ou histórico;f) a asilar exemplares da fauna ou flora ameaçados de extinção;g) a manter o ambiente necessário à vida das populações silvícolas;h) a assegurar condições de bem-estar público."(7)

Enunciado nº 5 - São consideradas de interesse público a "limitação e o controledo pastoreio em determinadas áreas, visando à adeqüada conservação epropagação da vegetação florestal, as medidas com o fim de prevenir ou erradicarpragas e doenças que afetem a vegetação florestal; e a difusão e a adoção demétodos tecnológicos que visem a aumentar economicamente a vida útil dasmadeiras e o seu maior aproveitamento em todas as fases de manipulação."(8)

Enunciado nº 6 - É facultado ao Poder Público criar Parques Nacionais, Estaduais eMunicipais e Reservas Biológicas, Florestas Nacionais, Estaduais e Municipais.

Enunciado nº 7 - Os Parques criados pelo Poder Público devem ter por finalidade

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resguardar atributos excepcionais da natureza, protegendo, ao mesmo tempo, aflora e a fauna, sem prejuízo da sua utilização para objetivos educacionais,recreativos e científicos.

Enunciado nº 8 - As Florestas criadas pelo Poder Público podem ter finseconômicos, técnicos ou sociais, além de ser possível haver determinação nosentido de reserva de áreas ainda não florestadas para atingir àquela finalidade.

Enunciado nº 9 - Se houver interesse da autoridade florestal, o proprietário dafloresta não preservada poderá gravá-la com perpetuidade.

Enunciado nº 10 - O Poder Público poderá expedir ato declarando imune de cortequalquer árvore, por motivo de sua localização, raridade, beleza ou condição deporta-sementes.

Enunciado nº 11 - As áreas florestadas de preservação permanente não poderãoser distribuídas para reforma agrária.

Enunciado nº 12 - É livre a extração de lenha e demais produtos florestais,inclusive a fabricação de carvão, nas florestas plantadas, não consideradas depreservação permanente.

Enunciado nº 13 - Nas florestas declaradas como de preservação permanente aextração de lenha e demais produtos florestais obedecerá ao que for determinadopelo Poder Público Federal ou Estadual.

Enunciado nº 14 - As plantas vivas oriundas de florestas só devem sercomercializadas com prévia licença da autoridade competente.

Enunciado nº 15 - O florestamento ou reflorestamento nas terras de propriedadeprivada poderá ser feito pelo Poder Público, sem necessidade de desapropriação.(9)

Enunciado nº 16 - As florestas de preservação permanente, de acordo com oCódigo Florestal, são classificadas, conforme entendimento de Paulo Affonso LemeMachado(10) do modo seguinte:a) florestas de proteção física do solo;b) florestas de proteção dos mananciais e das águas em geral;c) florestas de proteção das ferrovias e das rodovias;d) florestas de conservação dos valores científicos;e) florestas de proteção dos valores históricos;f) florestas de preservação do ecossistema local;g) florestas de conservação do ambiente das populações indígenas;h) florestas para a preservação do bem-estar público;i) florestas situadas nas áreas metropolitanas.

Enunciado nº 17 - Os variados tipos de florestas podem ser considerados comosendo de preservação permanente, protetora ou de rendimento.(11)

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Enunciado nº 18 - O Município não pode autorizar obras públicas ou privadas nasáreas destinadas a florestas de preservação permanente.

Enunciado nº 19 - As florestas de preservação permanente, por força do art. 2ºdo Código Florestal, devem ser compreendidas como forma de limitaçãoadministrativa imposta à propriedade pelo própria lei, pelo que não são indenizáveispelo Poder Público. Enunciado nº 20 - As florestas de preservação permanentecriadas pelo Poder Público, na forma do art. 3º, do Código Florestal, acarretamindenização por impedirem a utilização normal da propriedade.

Enunciado nº 21 - O art. 2º, do Código Florestal, considera como de preservaçãopermanente, portanto, sem direito a indenização, as florestas e demais formas devegetação situadas nos locais que ele próprio determina.(12)

3 - A JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA SOBREDESAPROPRIAÇÃO E INDENIZAÇÃO DAS FLORESTAS E OUTRAS FORMAS DECOBERTURAS VEGETAIS.

Por força de determinação posta na Constituição Federal, a missão do SuperiorTribunal de Justiça, em sede de recurso especial, está dirigida para garantir aautoridade da lei federal, não permitindo a sua violação ou negação de vigência, euniformizar, em todo o território nacional, a sua interpretação e aplicação.

O contencioso infraconstitucional, portanto, é o campo de atuação do SuperiorTribunal de Justiça. Não lhe compete, em conseqüência, apreciar e definir litígiosacobertados por normas constitucionais, nem, também, reavaliar conclusões dosegundo grau que estejam assentadas, unicamente, no exame das provasdepositadas nos autos durante o curso da demanda.

Exige-se, outrossim, para que o recurso especial seja conhecido e debatidos osaspectos jurídicos nele postos, que haja prequestionamento na origem de tudo oque está agitado em seu corpo.

A natureza extraordinária do recurso especial, produzindo decisão de último grau,revela a necessidade de serem examinados com a força de definitividade que eleexprime, em patamar infraconstitucional, todos os aspectos fundamentais da lide,embora a sua apresentação em juízo exija a presença de pressupostos específicos egenéricos, além de ter de se submeter, obrigatoriamente, à fase preliminar deadmissibilidade em segundo grau, sem prejuízo da renovação do exame de suapossibilidade jurídica formal quando for apresentado no grau especial.

O Superior Tribunal de Justiça, nos dez anos de sua existência, tem se pronunciado,pelas suas Turmas e Seções, sobre variados aspectos vinculados à proteção dasflorestas e coberturas vegetais, inclusive no tocante aos fenômenos decorrentes dasdesapropriações diretas e indiretas incidentes sobre as limitações impostas ao uso egozo das propriedades onde elas estão situadas.

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Postas estas rápidas considerações sobre o Recurso Especial, passo a examinaralguns acórdãos definidores do entendimento do referido Tribunal Superior sobrealguns aspectos ligados de modo direto ou indireto ao disciplinamento jurídiconacional que incide sobre as florestas e as coberturas vegetais.

3. 1 - INDENIZAÇÃO DE JAZIDAS DE AREIA E GRANITO EXISTENTES EMÁREAS FLORESTAIS DECLARADAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE.

Ao apreciar o Recurso Especial nº 33.832-7, SP, em 17 de 05 de 1993, a 1a.Turma, por unanimidade, entendeu que as jazidas de areia e granito devidamenteautorizadas a serem exploradas por alvará devem ser indenizadas, por força delimitação administrativa que declarou como de preservação permanente as florestasexistentes na propriedade do interessado.

Destaco a essência da fundamentação desenvolvida pelo eminente relator, o Min.Garcia Vieira, no voto que apresentou e que foi acolhido, sem discussão, pelosdemais integrantes da Turma. Eis o trecho referido:

"O recurso foi interposto com base apenas na letra "c" e a divergência estácomprovada e caracterizada nos moldes exigidos pelo artigo 26, parágrafoúnico, da Lei nº 8.038/90 e artigo 255 de nosso Regimento.Conheço do recurso pela letra "c".O recurso além de admissível, merece provimento.Ninguém nega ao Poder Público o direito de instituir parques nacionais,estaduais ou municipais, contanto que o faça respeitando o sagrado direitode propriedade, assegurado pela Constituição Federal (artigo 153, parágrafo22, da Constituição Federal anterior e artigo 5º, inciso XXII, da ConstituiçãoFederal vigente). Nosso ordenamento jurídico assegura ao proprietário odireito de usar, gozar e dispor de seus bens... (Código Civil, artigo 524) enão admite o confisco. No caso não se trata apenas de simples limitaçãoadministrativa que não chegou a suprimir o direito de propriedade. HelyLopes Meirelles, no seu Direito Administrativo Brasileiro, 15ª ediçãoatualizada pela Constituição de 1988, deixa claro que:'Limitações administrativas são, por exemplo, o recuo de alguns metros dasconstruções em terrenos urbanos e a proibição de desmatamento de parte daárea florestada em cada propriedade rural. Mas, se o impedimento deconstrução ou desmatamento atingir a maior parte da propriedade ou a suatotalidade, deixará de ser limitação para ser interdição de uso da propriedadee, nesse caso, o Poder Público ficará obrigado a indenizar a restrição queaniquilou o direito dominial e suprimiu o valor econômico do bem. Poisninguém adquire terreno urbano em que seja vedada a construção, comotambém nenhum particular adquire terras ou matas que não possam serutilizadas economicamente, segundo a sua destinação normal. Se o PoderPúblico retira do bem particular o seu valor econômico, há de indenizar o

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prejuízo causado ao proprietário. Essa regra, que deflui do princípio dasolidariedade social, segundo a qual só é legítimo o ônus suportado portodos, em favor de todos, não têm exceção no direito pátrio, nem naslegislações estrangeiras."Como se vê, não se pode confundir as simples limitações previstas pela Leinº 4.771, de 15 de setembro de 1965 (Código Florestal), com a proibição dedesmatamento e uso de uma floresta que cobre a propriedade porque issoseria "interdição de uso da propriedade", só possível com indenização prévia,justa e em dinheiro como compensação pela perda total do direito de uso dapropriedade e desaparecimento de seu valor econômico. Sendo apropriedade dos recorrentes coberta de floresta, foi ela, declarada depreservação permanente, ficando seus legítimos proprietários proibidos deusá-la ou aliená-la. No caso, não se trata de limitação parcial de parte dafloresta, nas de total interdição de uso e de alienação da propriedade inteira.Indenizáveis não são só as florestas, mas também a terra nua (as matas depreservação permanente são indenizáveis).Neste sentido, temos alguns precedentes desta Egrégia Corte, inclusive oRecurso Especial nº 5.981-PR, julgamento de 13 de março de 1991 eRecurso Especial nº 18.336-0-SP, dos quais fui Relator.No citado Recurso Especial nº 18.336-0-SP, esta Egrégia Turma apreciou edecidiu questão semelhante, também sobre o Parque Estadual da Serra doMar e entendeu que:"Não se tratando de limitação parcial de parte da floresta, mas de totalinterdição de uso e de alienação, devida é a indenização não só das florestas,mas também da terra nua."No mesmo sentido o Recurso Especial nº 19.630-O-SP, julgado no dia 19 deagosto de 1992 por esta Egrégia Turma do qual fui Relator e cuja ementa é aseguinte:"LIMITAÇÃO AO DIREITO DE PROPRIEDADE - INDENIZAÇÃO -DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA.Ao direito do Poder Público de instituir parques, corresponde a obrigação deindenizar. em respeito ao direito de propriedade assegurado pelaConstituição Federal. Há que se distinguir a simples limitação administrativada supressão do direito de propriedade. A proibição de desmatamento e usoda floresta que cobre a propriedade é interdição de uso da propriedade, sópossível com indenização prévia, justa e em dinheiro, como compensaçãopela perda total do direito de uso da propriedade e desaparecimento de seuvalor econômico. Recurso improvido."Quanto às jazidas de granito, são elas também indenizáveis.O Ministério das Minas e Energia, pelo Alvará nº 753, de 03 de fevereiro de1977, autorizou Clodomiro Vergueiro Porto a pesquisar argila e granito emterreno de sua propriedade, pelo prazo de 02 (dois) anos (doc. de fls. 10) eeste terreno foi incluído no Parque da Serra do Mar e declarado de utilidadepública. Ora, se já era o recorrente titular da autorização e se foi impedidode realizar a pesquisa, sofreu prejuízo e deve ser indenizado em obediência

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ao mandamento constitucional da justa indenização. A questão já eraconhecida do TFR, que entendeu ser indenizável o expropriado privado daexploração de jazidas de areia e granito (EAC nº 55.073-SP, DJ de18/10/84), ser indenizável a jazida regularmente licenciada (AC nº 61.184-SP, DJ de 20/08/81), serem indenizáveis as jazidas "objeto de autorização,concessão ou licenciamento, em favor da expropriada" (AC nº 88.348-PR, DJde 22/11/84).Com razão o julgador singular ao acentuar em sua bem lançada sentença(fls. 772/773) que:"Quanto a reserva de granito, também deve ser indenizada. Tratam-se derochas que têm valor econômico e com a criação do Parque, nos ternos doartigo 5º, parágrafo único, do Código Florestal, sendo consideradas recursosnaturais, não podem ser exploradas pelo particular. Não há razão, pois, paraque seu valor não faça parte do "quantum" indenizatório. Ressalte-se, ainda,que o autor, meses antes da edição do decreto instituidor do Parque, tinhaobtido, junto ao Ministério das Minas e Energia, alvará para a exploração deargila e granito (fls. 10). O valor da jazida soma Cr$ 81.198.744,00 (fls. 237e 362 e seguintes), que não foi impugnado pelas partes." (fls. 772/773). Douprovimento ao recurso. "

3.2 - CRIAÇÃO DE PARQUES ESTADUAIS PARA PRESERVAÇÃO AMBIENTAL.

No julgamento do REsp nº 8.690-0, do Estado do Paraná, a 1a. Turma do STJdeixou definido o entendimento representado pela ementa do mencionado acórdão,cujo teor transcrevo:

"Código Florestal (Lei 4.771/65) - Parques Nacionais, Estaduais e Municipais.Preservação Ambiental. Limitações Administrativas. Servidão. Declaração deUtilidade Pública. Ocupação permanente com a retirada dos proprietários,impedindo o uso, gozo e livre disposição (art. 524, Código Civil). Indenizaçãodevida.1. - O Poder Público pode criar Parques (art. 5º, Lei 4.771/65), ficandoresguardado o direito de propriedade, com a conseqüente reparaçãopatrimonial, quando ilegalmente afetado.2. As ' limitações administrativas', quando superadas pela ocupaçãopermanente, vedando o uso, gozo e livre disposição da propriedade,desnaturam-se conceitualmente, materializando verdadeira desapropriação.Impõe-se, então, a obrigação indenizatória justa e em dinheiro, espancandomascarado ' confisco".3. Precedentes jurisprudenciais.4. Demonstrada a divergência (art. 105, III, 'c", C. F.), dá-se provimento aorecurso." (DJU de 03/11/92).

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3.3 - QUEIMADAS DE PLANTAÇÃO DE CANA-DE-AÇÚCAR. PROIBIÇÃO.

Em data de 27.10.1998, ao julgar o REsp nº 161.433, de S. Paulo, a Egrégia 2a.Turma do Superior Tribunal de Justiça entendeu que:

"DIREITO AMBIENTAL. QUEIMADAS. PLANTAÇÃO DE CANA-DE-AÇÚCAR. Oartigo 27, caput, da Lei nº 4.771, de 1965, proíbe a queima de florestas edemais formas de vegetação, âmbito no qual se incluem as plantações decana-de-açúcar; interpretação reforçada pelo respectivo parágrafo único queressalva o emprego do fogo em práticas agropastoris, se peculiaridadeslocais ou regionais o justificarem, quando permitido pelo Poder Público.Recurso especial não conhecido."

O referido recurso foi interposto por particular que pretendia modificar decisão doTribunal de Justiça do Estado de S. Paulo assim definida:

"Ação civil pública. Queima da palha de cana-de-açúcar antes de seu corte.Degradação da qualidade ambiental, cuja defesa está afeta ao MinistérioPúblico, nos termos do art. 14, § 1º, da Lei nº 6.938/81, e do artigo 5º, daLei 7.347/85. Competência da Justiça Estadual para conhecer dacontrariedade posta em Juízo. Legitimidade passiva ad causam doproprietário da gleba rural em que ocorreu a queima da palha da cana, umavez que a responsabilidade independe de culpa. Apelação improvida."

O tema, pelo seu interesse, exige a transcrição do inteiro teor do voto do eminenteMinistro Ari Pargendler, relator. Sua Excelência, em tal oportunidade, não conheceudo recurso, alinhando os fundamentos que transcrevo:

"RELATÓRIO - O Ministério Público do Estado de São Paulo propôs ação civilpública contra ......., para vê-lo condenado:"a) ao cumprimento da obrigação de não fazer consistente em abster-se deutilizar fogo para a limpeza do solo, preparo do plantio e para a colheita dacana-de-açúcar nas áreas por ele cultivadas, sob pena do pagamento damulta diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais), corrigida no momento dopagamento;b) ao pagamento de indenização pelos danos ambientais causados com a

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queima da palha da cana-de-açúcar em área de 0,5 hectare do Sítio SantaInês, que pede-se seja fixada nos moldes da fórmula apresentada no itemVI, considerando-se o preço do litro de álcool da época da liquidação, queserá recolhida ao Fundo Estadual para Reparação de Interesses DifusosLesados, criado pelo Decreto Estadual nº 27070/87" (fls. 1.401).A MM. Juíza de Direito, Dra. Heloísa Martins Mirnessi, julgou procedente opedido, "para condenar o requerido a se abster de utilizar fogo para limpezado solo, preparo do plantio e para a colheita da cana-de-açúcar, nas áreas doSítio Santa Inês, sob pena de pagamento de multa diária no valor de R$5.000,00, corrigido a partir desta decisão, condenando-o, ainda, aopagamento de indenização pelos danos ambientais causados com a queimada palha de cana-de-açúcar, na área de 0,5 ha referida na inicial,indenização essa no valor de 2.048 litros de álcool combustível, por hectare,na data do cálculo a ser realizado pela Contadoria do Juízo, incidindocorreção monetária a partir de então. Referida indenização reverterá aoFundo Estadual para Reparação de Interesses Difusos Lesados" (fl. 649/664).A Egrégia Sexta Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estadode São Paulo, Relator o eminente Desembargador Luigi Clierichetti, negouprovimento à apelação, nos termos do acórdão assim ementado: "Ação civilpública. Queima da palha da cana-de-açúcar antes de seu corte. Degradaçãoda qualidade ambiental, cuja defesa está afeta ao Ministério Público, nostermos do art. 14, §1º, da Lei nº 6.938/81, e do artigo 5º, da Lei 7.347/85.Competência da Justiça Estadual para conhecer da contrariedade posta emJuízo. Legitimidade passiva ad causam do proprietário da gleba rural em queocorreu a queima da palha da cana, uma vez que a responsabilidadeindepende da culpa. Apelação improvida" (fl. 767).Seguiram-se embargos de declaração (fl. 789/791), rejeitados (fl. 795/796)Daí a interposição do presente recurso especial, interposto por ........., combase no artigo 105, inciso III, letras "a" e "c", da Constituição Federal, porviolação do artigo 27, da Lei no 4.771, de 1965, do artigo 427 do Código deProcesso Civil, do artigo 6º da Lei Complementar nº 75, de 1993, bem assimdos artigos 4º e 6º da Lei nº 6.938, de 1981 (fl. 822/846).O Ministério Público Federal, na pessoa do eminente Subprocurador-Geral daRepública Dr. Antônio Fernando Barros e Silva Souza, opinou pelo nãoprovimento do recurso (fl. 875/878).VOTOO artigo 27 da Lei nº 4.771, de 1965, dispõe: "E proibido o uso de fogo nasflorestas e demais formas de vegetação" Parágrafo único - Se peculiaridadeslocais ou regionais justificarem o emprego do fogo em práticas agropastorisou florestais, a permissão será estabelecida em ato do Poder Público,circunscrevendo as áreas e estabelecendo normas de precaução"."Demais formas de vegetação" - diz o texto legal - expressão que,evidentemente, abrange as plantações de cana-de-açúcar.A interpretação sustentada no recurso especial, de que a aludida norma legalsó "proíbe a queima de florestas e vegetação nativa, sendo inaplicável, pois,

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à lavoura de cana-de-açúcar que é definida como cultura renovável" (fl.828), adita ao artigo de lei restrição que ele não contém, a saber, "demaisformas de vegetação nativa".Se esse entendimento fosse correto, não haveria necessidade do parágrafoúnico, que ressalva o emprego do fogo em práticas agropastoris, sepeculiaridades locais ou regionais o justificarem.A teor do artigo 427 do Código de Processo Civil, "o juiz poderá dispensarprova pericial quando as partes, na inicial e na contestação, apresentaremsobre as questões de fato pareceres técnicos ou documentos elucidativos queconsiderar suficientes".Aqui, esse foi o caso."A prova técnica sobre a qual se baseou o Ilustre Juízo sentenciante" - estádito no acórdão recorrido - "consiste, dentre outras, nas conclusões dosestudos científicos realizados pelo pesquisador Kirchoft, dentre as quaisdestaca-se poderem as queimadas ser consideradas fontes de poluição,assim como constituir poluição a emissão dos gases provenientes dequeimadas. Outras conclusões a que o ilustre Pesquisador chegou, em seusestudos técnicos, são de que a combustão da palha da cana-de-açúcar liberagases tóxicos, dentre os quais o ozônio (03) e monóxido de carbono (CO),podendo tais emanações, quando excessivas, prejudicar a respiração dosseres vivos, como também o próprio crescimento das plantas.Consta também dos autos um estudo do médico pneumologista MarcosArbex, nele figurando a seguinte assertiva: "1/5 da população da zonacanavieira paulista está com os pulmões comprometidos ou a beira de umacrise de rápida evolução".O Professor José Carlos Manço, do Departamento de Clínica Médica daFaculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto, ao concluir seu estudosobre os danos causados ao meio-ambiente e à saúde pública, provocadospelas queimadas, assevera, verbis: "Em conclusão, é meu parecer, com basenas considerações apresentadas, que a poluição provocada pela queimadados canaviais tem efeito nocivo para a saúde da população de nossa região""(fl. 783).Nos termos do artigo 6º, VII, "b", da Lei Complementar nº 75, de 1993,compete ao Ministério Público da União, promover o inquérito civil e a açãocivil pública para a proteção do patrimônio público e social, do meioambiente, dos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico epaisagístico.Entenda-se: sempre que a ação respectiva for processada e julgada pelaJustiça Federal, tal como decidido pelo Egrégio Tribunal Regional Federal da4ª Região na AC nº 91.04.13275-0, RS (fl. 840/841).Quando a ação estiver no âmbito da competência da Justiça Estadual, alegitimidade para propô-la será do Ministério Público do Estado. Nessa linha ojulgado não contrariou o artigo 6º, VII, "b", da Lei Complementar nº 75, de1993, nem o artigo 60 da Lei nº 6.938, de 1981.As razões do recurso especial ainda sustentam:

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"A defesa do meio ambiente no Brasil, notadamente contra a poluição, temcomo única e exclusiva fundamentação legal a Lei nº 6.938, de 31/08/81,que estabeleceu a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins emecanismos de formulação e aplicação. Referida norma em seu artigo 3ºdefine o que é meio ambiente, a degradação da qualidade ambiental, apoluição, o poluidor e os recursos ambientais, enquanto em seu art. 4 ºestabelece seus objetivos.Tais objetivos visam à compatibilização do desenvolvimento econômico-socialcom a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico,bem como o estabelecimento de critérios e padrões da qualidade ambiental.Na medida em que o v. acórdão determina a proibição imediata da queimada palha de cana-de-açúcar sem oferecer ao Recorrente nenhuma alternativaa nível de substituição deste maior encargo, está, inquestionavelmente,incompatibilizando o desenvolvimento econômico social, em total arrepio ànorma mestra da lei que estabelece a Política Nacional do Meio Ambiente" (fl.841).Trata-se de questão de fato, insuscetível de exame em recurso especialRegistre-se, todavia, o que, a propósito, disse o parecer do Ministério PúblicoFederal:'Os autos revelam que o recorrente já deveria ter providenciado o uso deoutros métodos (que não a queimada) na sua lavoura pelo menos desde1988, tendo em vista que em 30 de agosto desse ano foi expedido o decretoestadual nº 28.848 proibindo qualquer forma de emprego de fogo para acolheita, inclusive da cana-de-açúcar, já tendo essa Corte reconhecido avalidade da referida restrição. Ressalte-se ainda que, apesar de ter aderidoao compromisso de ajustamento de fl. 81/82, o recorrente não honrou opactuado, permanecendo com as citadas praticas"(fl. 877/878). Voto, porisso, no sentido de não conhecer do recurso especial. "

3.4 - ATO ADMINISTRATIVO IMPEDINDO O PROPRIETÁRIO DE IMPLANTARLOTEAMENTO OU DE EFETUAR QUALQUER MODALIDADE DEPARCELAMENTO DO SOLO. ÁREA CONSIDERADA DE PROTEÇÃOAMBIENTAL. ACÓRDÃO DE SEGUNDO GRAU QUE NÃO DECIDIU A QUESTÃOCOM BASE NO CÓDIGO FLORESTAL.

O Superior Tribunal de Justiça, no exame do Recurso Especial nº 142.713-SP, emdata de 05 de maio de 1998, deixou de reconhecer aplicável o Código Florestal emAção de Desapropriação Indireta, por reconhecer que nenhum dos seus dispositivosforam debatidos no âmbito do acórdão recorrido. Aplicado foi o princípio daausência de prequestionamento.

A ementa do mencionado acórdão é do seguinte teor:

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"ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. LIMITAÇÃOADMINISTRATIVA. JUROS COMPENSATÓRIOS. TERMO INICIAL.1. Os juros compensatórios em se tratando de ação de desapropriaçãoindireta pelo fato de ter sido imposta limitação administrativa ao uso dapropriedade, o que ocasionou a imposição de indenização, devem sercontados a partir da data em que foi expedido o ato provocador da restrição.2. É de vinte anos o prazo prescricional para a interposição de ação dedesapropriação indireta.3. É devida indenização por determinação de ato impedindo o proprietário deimplantar loteamento ou de efetuar qualquer modalidade de parcelamento dosolo, em área considerada de proteção ambiental, por Lei Estadual, no caso,a de nº 5.598, de 08/02/1987, do Estado de São Paulo.4. Não aplicáveis ao caso o Código de Águas, o Código Florestal e a Lei doParcelamento do Solo Urbano.5. Indenização fixada com base no conjunto probatório e tendo em vista asdeterminações da lei local.6. Interesse de agir do proprietário do imóvel que se apresentainquestionável.7. Os juros compensatórios devem ser calculados, em ação dedesapropriação indireta por limitações administrativas, a partir da data emque o ato limitador foi expedido.8. Recurso do Estado de São Paulo conhecido, porém, improvido. Recurso daempresa desapropriada conhecido e provido."

A análise do acórdão supra provoca a firmação das conclusões seguintes:

a) O prazo de prescrição da desapropriação indireta é de vinte anos. Não se aplica,portanto, em situação de tal natureza, o prazo qüinqüenal.(13) A respeito, há aSúmula nº 119 do Superior Tribunal de Justiça: "A ação de desapropriação indiretaprescreve em 20 (vinte) anos." Não se reconheceu, portanto, aplicável ao caso oDecreto de nº 20.911/32, cujo prazo prescricional é de cinco anos.b) O fato da autora da ação ter adquirido o bem quando sobre o mesmo já incidia oônus limitativo do uso da propriedade, uma vez que era área incluída no ParqueEcológico do Rio Tietê, não determina ausência de interesse de agir.c) Ter inexistido no acórdão de segundo grau discussão a respeito de violação aoCódigo de Águas, ao Código Florestal e à Lei Federal nº 6.766/79 (Lei doParcelamento do Solo).d) O aresto destacou como causa essencial para determinar a indenização o fatodela ter sido fixada com base no ato determinador da limitação administrativaimposta por Lei Estadual, limitação consistente em impedir a implantação deloteamento ou qualquer modalidade de parcelamento do solo na área em questão.

Quanto aos juros, firmou o "decisum" o posicionamento de que os compensatóriosdevem ser contados a partir da data em que a Lei impositora da limitação

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administrativa foi publicada e entrou em vigor.

3.5 - EMENTAS DE DECISÕES PROFERIDAS PELO SUPERIOR TRIBUNAL DEJUSTIÇA SOBRE RESERVAS FLORESTAIS.

O espaço reservado para o presente trabalho não permite que se faça comentáriosmais aprofundados a respeito de acórdãos emitidos pelo Superior Tribunal deJustiça sobre temas vinculados ao disciplinamento jurídico das reservas florestais.

Para possibilitar uma visão mais larga do assunto, passo, agora, apenas amencionar, sem qualquer observação, algumas ementas de julgados do referidoTribunal sobre o tema.

a) REsp nº 96.350/PR - DJ DATA: 29/06/98, Rel. Min. Vicente Leal. "PENAL.EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA.RECURSO ESPECIAL. JULGAMENTO PREJUDICADO.Em tema de prescrição das contravenções previstas no Código Florestal - Leinº 4.777/65-, o prazo é regulado pelas regras gerais previstas nos arts. 109,110 e seguintes do Código Penal.Rejeitada a denúncia, o prazo da prescrição é contado a partir da data dofato delituoso, à míngua de ocorrência de outra causa interruptiva do lapsoprescricional.Extinta a punibilidade, exaure-se o objeto da ação penal, resultandoprejudicado o exame do mérito do recurso. Prescrição da pretensão punitivadeclarada. Recurso especial prejudicado." (Julgado em 09/06/98) b) REsp nº154686/SP - DJ 21/09/98 PG:00059, Rel. Min. Garcia Vieira. "SERVIDÃOADMINISTRATIVA - PARQUE NACIONAL - INDENIZAÇÃO.- Tratando-se de interdição de uso e alienação da propriedade, devido àinstituição de parque nacional, é hipótese de servidão administrativa, e nãosimples limitação.- Indenizáveis não são só as florestas, mas também a terra nua.- Inexistindo apossamento administrativo, tendo ocorrido a caducidade dadeclaração de utilidade pública e sendo impossível a exploração da terraexpropriada, questões estas examinadas pelo Egrégio Tribunal "a quo", nãopodem ser revistas no recurso especial.- Recurso não conhecido." (Julgado em 17/04/98, 1a. Turma). c) AgReg noREsp nº 110041/SP; AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL(96/0063155-7) - DJ 15/09/97 PG:44289 - Rel. Ministro HUMBERTO GOMESDE BARROS. "PROCESSUAL - RECURSO ESPECIAL - DESAPROPRIAÇÃO -TOMBAMENTO DE FLORESTAS - ACÓRDÃO QUE RECONHECE APOSSIBILIDADE DE RESSARCIMENTO MAS CONSIDERA QUE NA HIPÓTESENÃO HOUVE DANO - DIVERGÊNCIA NÃO COMPROVADA - RECURSOMANIFESTAMENTE INCABÍVEL - SEGUIMENTO DENEGADO.I - Acórdão que, examinando as provas, declara inexistir prejuízo no

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tombamento de determinada floresta. tal aresto não diverge de outros queproclamam, em tese, a lesividade do tombamento;II - Se não há divergência, o recurso especial fundado na alínea 'c' émanifestamente incabível.III - Impõe-se ao Relator negar seguimento a recurso manifestamenteincabível. (REsp 30.835/SP)." d) REsp nº 77359/SP; RECURSO ESPECIAL(95/0054567-5) - DJ 04/03/96 PG:05384 - Rel. Ministro HUMBERTO GOMESDE BARROS "DESAPROPRIAÇÃO - FLORESTA DE PRESERVAÇÃOPERMANENTE - INDENIZAÇÃO.I - No ressarcimento por desapropriação, a floresta de preservaçãopermanente que recobre o terreno deve ser indenizada pelo valor econômicoque sua exploração poderia gerar, não fosse a vedação administrativa que aimpede.II - Deixar de indenizar as florestas seria punir quem as preservou,homenageando aqueles que as destruíram." e) REsp nº 18336/SP -RECURSO ESPECIAL(92/0002778-4) - DJ DATA:04/05/92 PG:05858 - Rel.Ministro GARCIA VIEIRA. "DESAPROPRIAÇÃO. FLORESTAS.- Não se tratando de limitação parcial de parte da floresta, mas de totalinterdição de uso e de alienação, devida é a indenização não só das florestas,mas também da terra nua.- Juros moratórios de 6% ao ano a partir do trânsito em julgado da sentençafinal que fixa a indenização.- Juros compensatórios de 12% ao ano devidos desde a publicação dodecreto.- Improvido o recurso da ré e parcialmente provido o dos expropriados." f)REsp nº 22.065-1 -SP - Rel. Min. MILTON LUIZ PEREIRA, DJU de 23/05/94,1a. Turma, julgado em 18/04/94: "DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA - PARQUEESTADUAL DA SERRA DO MAR - SP - (DECRETO ESTADUAL Nº 10.251/77) -LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA (LEI Nº 4.771/65) - CÓDIGO FLORESTAL -AÇÃO INDENIZATÓRIA. PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL (DECRETO 20.910/32,ARTS. 1º E 3º).1 - Demonstrado o domínio, enquanto o proprietário não perder o direito depropriedade, fundada a demanda nesse direito, substituída a pretensãoreivindicatória pelo pedido indenizatório correspondente ao valor do imóvel,inocorre a prescrição qüinqüenal. 'Vivo o domínio, não pode deixar de serconsiderada viva a ação que o protege', vicejando a prescrição vintenária.2 - Não transcorrido, no caso, o prazo vintenário, a causa de pedir, oprocesso deve prosseguir.3 - Precedentes iterativos.4 - Recurso improvido." g) REsp nº 58.937-SP, Rel. Min. ARI PARGENDLER,DJ 06/10/97: "ADMINISTRATIVO. CÓDIGO FLORESTAL. RESERVA LEGAL.AVERBAÇÃO NO REGISTRO DE IMÓVEIS. A AVERBAÇÃO, NO REGISTRO DEIMÓVEIS, DA RESERVA LEGAL SÓ É EXIGÍVEL APÓS A PUBLICAÇÃO DA LEINº 7.803, DE 1989, QUE ACRESCENTOU PARÁGRAFOS AO ARTIGO 16 DA LEINº 4.771, DE 1965, UM DOS QUAIS PREVENDO EXPRESSAMENTE ESSA

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OBRIGAÇÃO. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO." (Julgado em 16/09/97)h) REsp nº 97.869/SP - Rel. Min. DEMÓCRITO REINALDO, DJ de 15/12/97,julgamento de 07/11/97: "PROCESSUAL CIVIL. DESAPROPRIAÇÃO.TERRENOS MARGINAIS AOS RIOS NAVEGÁVEIS. DOMÍNIO PÚBLICO.INDENIZABILIDADE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO PARA EFEITO DEEXECUÇÃO DE INDENIZAÇÃO.- Em sede de especial, não se aprecia questão jurídica de naturezaessencialmente constitucional.- In casu, tendo o acórdão desafiado e decidido a matéria sobre a reservaobrigatória (vegetação classificada como Mata Atlântica) e a qualificação deseu percentual (50%) em bases constitucionais (arts. 5º, incisos XXII e XXIVe 225, § 4º), a 'quaestio iuris' daí decorrente só é de ser dirimida no âmbitodo extraordinário.- A jurisprudência que se cristalizou em Súmula (verbete nº 479), na egrégiaSuprema Corte, é no sentido de que as margens dos rios navegáveis são dodomínio público, insuscetíveis de expropriação e, por isso mesmo, excluídasde indenização, ressalvadas as terras (marginais) que estão efetivamente nodomínio particular por título legítimo convalidado, reconhecido ou concedidoem face da Lei Imperial de nº 601, de 1850.- Desmerece improvimento o especial por afronta a preceito de Lei doProcesso (art. 535, II), se o Tribunal a quo, ao apreciar a lide, decidiu deforma expressa e clara a questão sobre ser ou não indenizável a coberturaflorestal, não padecendo de omissão reparável, nesta fase." i) REsp nº152.906/SP, Rel. Min. GARCIA VIEIRA, 1ª Turma, DJU de 04/05/98, julgadoem 17/03/98: "AÇÃO CIVIL PÚBLICA - QUEIMADAS - CANA-DE-AÇÚCAR -FAIXA DE UM QUILÔMETRO - DECRETO - VALIDADE.- Pode o Estado, sem ferir o disposto no artigo 27 do Código Florestal, proibiratravés de Decreto, o uso do fogo na faixa de um quilômetro do perímetrourbano das cidades.- Recurso improvido." j) REsp nº 119.902/SP, Relator designado : MinistroDEMÓCRITO REINALDO, DJU de 02/03/99, julgado em 18/08/98: "CIVIL EPROCESSUAL CIVIL. TOMBAMENTO. FIXAÇÃO DO VALOR INDENIZATÓRIO.PROVAS. NULIDADE DA PROVA PERICIAL DE OFÍCIO. IMPOSSIBILIDADE EMFACE DA PRECLUSÃO. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA.- No âmbito do especial, só se apreciam questões jurídicas discutidas edecididas nas instâncias ordinárias.- Para que se configure o prequestionamento - que constitui pressuposto denatureza constitucional - não basta que o acórdão recorrido tenha feitosimples menção ao preceito legal que se pretende tenha sido malferido; énecessário que sobre ele o aresto desafiado tenha expendido juízo de valor,interpretando-lhe o sentido e aplicando-lhe aos fatos da causa.- O acórdão que, com arrimo nos elementos de informação do processo fixa ovalor indenizatório, está imune de reexame, pela via do especial (Súmula7/STJ).- Se, ao julgar a apelação, o Tribunal recorrido anulou a perícia (realizada em

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primeiro grau de jurisdição) e determinou a sua repetição (nomeando, desdelogo, outro perito) com a lavratura de acórdão e o consentimento tácito daspartes, eis que, em tempo oportuno, não interpuseram o recurso adeqüado,a questão (realização de nova perícia) fica acobertada pela preclusão eindene de reestudo na apreciação do especial intentado contra o decisórioque decidiu sobre o mérito da causa.- Em grau de recurso especial é defeso ao STJ declarar, de ofício, a nulidadede perícia, tanto pela ausência de prequestionamento, quanto por ofensa aosprincípios da disponibilidade (arts. 2º e 262, CPC - iudex ne procedet ex-officio - e do tantum devolutum quantum appellatum, sob pena de proferirjulgamento nulo - extra petita.- Recurso especial de que se não conhece. Decisão por maioria devotos."(14)

4 - ALGUNS ASPECTOS DA DOUTRINA SOBRE O TEMA.

A exata compreensão da matéria em foco no campo jurisprudencial do SuperiorTribunal de Justiça há de ser situada nos limites impostos para o conhecimento dorecurso especial.

A função da Corte Superior, como já afirmado, por definição constitucional, é deexaminar se a legislação infraconstitucional foi violada ou teve negada a suavigência, bem como zelar pela sua interpretação uniforme. Não lhe cabe, emconseqüência, examinar a prova para definir se o valor encontrado pela decisão dosegundo grau é justo ou não.

Defendo, contudo, que a violação da lei federal ou a negação de sua vigência podeocorrer, indiretamente, quando o princípio da moralidade for atingido.

Tenho como certo que está inserido em qualquer contexto positivo legal, de formaimplícita, de que a sua aplicação e interpretação, quando vinculada aos fatos, nãopode se afastar, em nenhum instante, do compromisso com a moralidade. Porassim defender, tenho ousado me posicionar no sentido de que, em se tratando derecurso especial, pode o relator, de ofício, examinar e decidir a respeito da violaçãoou da negação de tal princípio, reformando ou anulando, no que for necessário, oacórdão hostilizado.

O tema, como posto, não tem sido debatido, com extensão, nos TribunaisSuperiores, em face de não ter sido suscitado e de serem mínimos os casos em quese tem suspeita da prática de tão grave vício nas decisões que lhe são submetidaspara controle.

De qualquer modo, há necessidade de se instaurar construção doutrinária ejurisprudencial sobre o assunto, haja vista que garantir a autoridade da lei federal ezelar pela sua interpretação e aplicação uniforme em todo o território nacional é

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compromisso assumido pelo Superior Tribunal de Justiça com a Nação, pelo que,em nenhum momento, os princípios implícitos e explícitos nela consignados podemser ignorados.

A conceituação jurídica do princípio da moralidade firma expressiva distinção doentendimento que se tem por legalidade. Esta concentra toda a emissão de suamensagem na obediência à vontade da lei, a cuja obrigação está vinculada todos osPoderes do Estado.

O princípio sublimado exige que cada membro do Poder tenha um comportamentorevelador da exteriorização de atos que expressem a idéia de haver atuado comvinculação ao sentimento de que em toda regra jurídica há, em seu substrato, umconteúdo de moralidade, pelo que, não há condições dela ser analisada e aplicadafora de tal panorama.

Não satisfaz às aspirações da Nação a atuação do Estado de modo compatível sócom a mera ordem legal. Exige-se muito mais. Necessário se torna que, em setratando especialmente do Poder Judiciário, o seu atuar obedeça a determinadosprincípios que conduzam à valorização da dignidade humana, ao respeito àcidadania e à construção de uma sociedade justa e solidária. Está, portanto,obrigado a exercer as suas atribuições de forma que sejam atendidos os padrõesnormais de conduta que são considerados relevantes pela comunidade e quesustentam a própria existência social. Nesse contexto, o cumprimento damoralidade, além de se constituir um dever a ser bem exercitado, apresenta-secomo um direito subjetivo de cada jurisdicionado.

A moralidade comum se baseia em um conjunto sistemático de normas queorientam o homem para a realização de seu fim, isto é, o do homem efetivar, peloexercício de sua liberdade, a perfeição de sua natureza. O caráter de generalidadeposto na moralidade comum é o traço marcante diferenciador da moralidadeadministrativa. Esta, ao contrário da moralidade comum, implica, tão-somente, nanecessidade de que os atos externos e públicos dos agentes detentores de poder ede atribuições sejam praticados de acordo com as exigências da moral e dos bonscostumes, visando a uma boa administração.

O membro do Poder Judiciário, ao exercitar a atividade judicante, está fazendo usode uma parcela das atribuições que lhe foram outorgadas pelo Estado.Desempenha, assim, de modo legítimo uma capacidade de atuação que tem na leios limites definidos. Por se deparar, no desenvolvimento dessa atividade, com umavanço do Estado intervindo, de forma indiscriminada, em todos os setores dasociedade moderna, há de considerar o impulso das partes de obter vantagensalém dos limites da lei, pelo que deve estabelecer barreiras impeditivas pela via do"poder" de decidir que detém, não se apegando a aspectos formais do processo,usando, apenas, a força extrínseca e intrínseca do direito legislado. Isso porque,conforme ressaltou Léon Duguit, em sua obra "Traité de Droit Constitutionnel",Paris, 1921, t. I, págs. 518/519, "o poder público tem como fim realizar o direito.

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Sua legitimação ocorre quando é exercido de conformidade com o direito."

A autoridade judicial, em conseqüência, não é uma força sem controle. Deve, aoagir, observar determinadas condições que não se assemelham ao seu modopessoal de pensar, pois, em primeiro lugar, há de considerar que a sua legitimidadedecorre da escolha e do consentimento de um grupo social, a quem está obrigada aprestar contas e se submeter ao seu controle e aprovação final, além de, emsegundo plano, fazer com que os reflexos dos seus atos se compatibilizem com osanseios dos vários segmentos da sociedade. Só assim o ato judicial praticado teráefetiva autenticidade.

A inserção do princípio da moralidade na Constituição Federal de 1988 decorreu doposicionamento assumido pelas classes sociais componentes da Nação que, aoexigir tal proceder do constituinte, o fez por encarar uma realidade existente nomomento, caracterizada pelas anomalias detectadas e a ausência de credibilidadeimposta na conduta do tecido institucional.

O certo é que não se pode resumir a democratização brasileira na elaboração,apenas, de uma fórmula jurídico-política. Uma conscientização mais alargada seforma no sentido de, no campo específico da atividade judicante, exigir-se que osdesequilíbrios constatados, quer setoriais, quer regionais, sejam evitados.

Vivencia-se, na atualidade, o fenômeno do Estado não se conformar em ser simplesmantenedor da ordem social. Isso porque a própria sociedade está a lhe exigir aprestação de novos serviços, fazendo aumentar, consideravelmente, aresponsabilidade dos agentes públicos. Isso implica em se ampliar o controle a serexercido pela decisão judicial e enquadrá-lo em regras rígidas de legalidade,impessoalidade, moralidade, continuidade, publicidade e finalidade pública.

Não é convencedor, na atualidade científica, tratando-se do questionamentosupradefinido, afirmar-se que a noção de moralidade excede à de legalidade.Ambas são princípios fundamentais a serem seguidos na busca de uma boa atuaçãoestatal. Os elementos constitutivos de ambos, não obstante diferenciados, nãoimpedem que apareçam no mesmo nível hierárquico. São, conseqüentemente,princípios que completam o atuar do Poder Judiciário e indispensáveis para avalidade e eficácia de suas decisões.

O valor jurídico do ato judicial não pode ser afastado do valor moral. Isso implicaem um policiamento na aplicação das leis, o que não é proibido, porque o defendidoé a lisura nas práticas judiciais, fim, também, contido na norma legal.

Postas tais considerações, urge repensar, por exemplo, a questão doprequestionamento para o conhecimento do recurso especial. Visualizando-se, emface do exame dos autos e do que nele foi discutido e decidido, que há ofensa aoprincípio da moralidade em seu sentido mais amplo, envolvendo até a ausência derazoabilidade da solução dada ao litígio ou excesso de proporcionalidade, deve oSuperior Tribunal de Justiça, na missão de fazer valer a autoridade da lei federal e

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de zelar pela sua interpretação uniforme em todo território nacional, até mesmo deofício, examinar todos os aspectos da lide e colocá-la em círculo que representeverdade e justiça.

5 - O DIREITO DE INDENIZAÇÃO PELA VIA DA AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃOINDIRETA. DIVERGÊNCIAS ENTRE DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA.

O Direito Administrativo Ambiental, na atualidade, busca, por intermédio dos seusdoutrinadores, fixar um sistema consolidado sobre a proteção jurídica das florestastropicais, envolvendo o direito dos proprietários dos imóveis onde elas estãosituadas.

Essa preocupação tem crescido em face da constatação de que há dificuldades noâmbito do Direito Administrativo Ambiental em se compreender a terminologia dosseus termos, o que tem levado à tomada de posições tanto pela doutrina, comopela jurisprudência, eivadas de equívocos.

Antônio Herman V. Benjamin(15), preocupado com essa situação, elaborou trabalhocom objetivo de afastar tais controvérsias, voltando-se, especificamente, para oscasos de desapropriação.

As conclusões apresentadas são do teor seguinte:

"Em síntese, parece-me que, diante dos argumentos acima expostos, asAPPs e a Reserva Florestal Legal não são indenizáveis, nos termos do regimejurídico vigente no Brasil. Inicialmente, não pode o proprietário acionar oPoder Público pleiteando indenização pelo fato de ter o uso e gozo de suapropriedade limitados pela só exigência de manutenção das APPs e ReservaFlorestal Legal. Tal vedação decorre não apenas do fato de terem sido ambasinstituídas por lei de 1965 (prescrição), como ainda porque as duas, mesmosomadas, não inviabilizam o exercício do direito de propriedade no restantedo imóvel. Finalmente, no âmbito da desapropriação, direta ou indireta, daintegralidade do bem, é descabido incluir na indenização a ser paga peloimóvel o valor das APPs e da Reserva Florestal Legal, já que se caracterizamcomo limites internos ao direito de propriedade. Conseqüentemente, ocálculo da indenização devida, ao ser reconhecida a desapropriação datotalidade do imóvel, deve descontar a área das APPs e da Reserva FlorestalLegal."

Há, em estágio avançado, uma corrente doutrinária que defende, ao se tratar dedesapropriação indireta em unidades de conservação de florestas, a adoção de ummétodo de interpretação sistêmico que apresente resultados mais favoráveis embenefício do meio ambiente, limitando o direito de uso e gozo da propriedade.

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Marcelo Duarte Daneluzzi(16) , em trabalho onde enfoca aspectos relativos àpreservação da Mata Atlântica, no Estado de São Paulo, tendo em consideraçãovultosas indenizações que têm sido deferidas pelo Poder Judiciário, analisa algumaspatologias que entende presentes no referido fenômeno processual e defende ametodologia supracitada. As conclusões do seu estudo são as que passo a registrar:

"De tudo que foi expendido, pode-se concluir no seguinte sentido:a) as unidades de conservação constituem instrumento fundamental paraprevenção do dano ecológico na Mata Atlântica;b) a 'indústria da indenização' pode inviabilizar a implantação de novasunidades de conservação e o funcionamento das já criadas;c) o Ministério Público deve intervir nas ações de desapropriação direta eindireta em áreas de preservação ecológica, tendo em vista o interesse socialna implementação da legislação ambiental e da probidade administrativa;d) a jurisdição deve adotar o vetor da interpretação mais favorável ao meioambiente, em cumprimento ao ônus cometido pelo art. 225 da CF;e) a indenização não deve ser concedida nas hipóteses de: i) restriçõesadvindas do Código Florestal; ii) mera limitação administrativa; iii) ausênciade prova inequívoca de titularidade e iv) aquisição posterior ao ato de criaçãoda unidade de conservação;f) as perícias devem ser feitas preferencialmente por engenheirosambientais;g) os critérios de avaliação devem ser fixados a partir dos parâmetrosfornecidos pelo art. 27 do Decreto-lei 3.365/41, encarecendo o valor demercado e o valor da aquisição;h) o exame de numerosos autos permite a conclusão de que as períciasapresentam valores finais exagerados e utilizam metodologia divorciada dajusta indenização;i) os juros compensatórios pressupõem desapossamento administrativo eprévia atividade econômica do proprietário; os juros moratórios são contadosdo trânsito em julgado da sentença."

Luís Henrique Paccagnella(17), após analisar a função socio-ambiental dapropriedade, a obrigação de florestamento das áreas de preservação permanente ede instituir o das áreas consideradas de reserva legal, firma entendimento daausência de direito de indenização, por não se constituir direito adquirido. Asconclusões da sua meditação concentrada sobre o tema são as seguintes:

a) "A propriedade só existe enquanto direito, se respeitada sua função social.Desatendida esta, não existe direito de propriedade amparado pela

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Constituição. O cumprimento da função social é condição sine qua non para oreconhecimento do direito de propriedade."b) "O dever de recompor a vegetação natural das áreas de preservaçãopermanente, do art. 2º do Código Florestal, independe de qualquer açãoefetiva de degradação, bastando a omissão ilícita e inconstitucional doproprietário rural."c) "O proprietário que não possui reserva legal tem a obrigação de demarcá-la e averbá-la, cessando de imediato a exploração em sua área,possibilitando assim a regeneração natural. Além disso tem a obrigação daregeneração artificial, à razão de 1/30 por ano, a contar de 1992, inclusive."d) "A obrigação de reconstituir a vegetação natural, nas áreas depreservação permanente e reserva legal, possui caráter real - propter rem -ou seja, é uma obrigação que se prende ao titular do direito real seja elequem for, em virtude tão-somente, de sua condição de proprietário oupossuidor."e) "Não é devida indenização ao proprietário, nem pelas áreas depreservação permanente do art. 2º do Código Florestal nem pela reservalegal, uma vez que são espaços territoriais constitucionalmente protegidos,com base na função socio-ambiental da propriedade, pressuposto daexistência do próprio direito."f) "Não existe qualquer direito adquirido à exploração agrícola das áreas depreservação permanente e de reserva legal, pois, com a nova ordem jurídicainstalada em 1988, só ficou reconhecido o direito de propriedade quandocumprida a função socio-ambiental, como pressuposto e elemento integranteda propriedade, sob pena de inexistência desse último direito."g) "É possível e recomendável que os legitimados ativos usem da ação civilpública para a obtenção de condenação em obrigação de fazer, no sentido deser feito o florestamento artificial das áreas de preservação permanente e dereserva legal nas propriedades rurais."

Manoel de Queiroz Pereira Calças(18), em trabalho indicado em nota de rodapé,desenvolveu substancioso estudo a respeito do direito de o proprietário reivindicar,pela via da desapropriação indireta, indenização pela criação do Parque da Serra doMar, conforme Decreto do Estado de São Paulo, de nº 10.251, de 30.08.1977.

Após uma análise comparativa da jurisprudência firmada sobre o assunto, tanto aemitida pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de S. Paulo, como a oriunda doColendo Superior Tribunal de Justiça, o autor registra que a maior parte dosjulgados direcionou-se no sentido da indenizabilidade por desapropriação indiretados imóveis situados no mencionado Parque Estadual.

A seguir, após citação das ementas de várias decisões sobre a questão, omencionado doutrinador defende entendimento em sentido contrário aopensamento jurisprudencial majoritário. Para guardar fidelidade ao que escreveu,

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registro, na íntegra, os seus comentários:

"Com o devido respeito ao entendimento majoritário das mais respeitadasCortes de Justiça de nosso país, ou seja, o TJSP, STJ e STF, entendo que ainterpretação pretoriana a respeito das desapropriações indiretas decorrentesda criação do Parque Estadual da Serra do Mar foi feita à luz do conceito dodireito privado, o qual, em nosso sentir, não mais pode ser utilizado após aedição da Constituição Federal de 1988. Não bastasse isto, examinando-se assituações fáticas dos inúmeros processos de desapropriação indireta aforadosem virtude da criação do Parque Estadual da Serra do Mar, constata-se que amera edição do referido decreto estadual não interferiu na exploraçãoeconômica dos imóveis situados nos respectivos limites geográficos, postoque, pela localização dos mesmos, impossível qualquer espécie de exploraçãolucrativa.Examina-se, primeiramente, a questão sob o enfoque da ConstituiçãoFederal. O art. 5º da Constituição Federal, ao disciplinar os direitos e deveresindividuais e coletivos, estabelece: "1 - É garantido o direito de propriedade;XXII - a propriedade atenderá à sua função social; XXIV - a lei estabelecerá oprocedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, oupor interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro,ressalvados os casos previstos nesta Constituição".O art. 170, que faz parte do capítulo que traça os princípios gerais daatividade econômica preceitua o seguinte: "A ordem econômica, fundada navalorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar atodos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados osseguintes princípios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III -função social da propriedade; . . (omissis) VI - defesa do meio ambiente.O constituinte, ao tratar da política agrícola e fundiária e da reforma agrária,preceitua no art. 185 que é insuscetível de desapropriação para fins dereforma agrária a propriedade produtiva. A seguir, o art. 186 diz que afunção social é cumprida quando a propriedade rural atende,simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos emlei, aos seguintes requisitos: 1 - aproveitamento racional e adeqüado; II -utilização adeqüada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meioambiente.No capítulo que cuida do meio ambiente, a Constituição Federal estabelece,no art. 225: "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamenteequilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade devida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo epreservá-lo para as presentes e futuras gerações. O § 1º. impõe, em seu inc.III, que para assegurar o direito ao meio ambiente, incumbe ao PoderPúblico, "definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais eseus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a

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supressão permitidas somente através da lei, vedada qualquer utilização quecomprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção". E, noinc. VII impõe o dever de "proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma dalei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem aextinção das espécies e submetam os animais a crueldade". Finalmente, no §4º, determina: "A floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra doMar, o Pantanal Mato-grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, esua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurema preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursosnaturais".Analisando-se sistematicamente, em conjunto, os dispositivos constitucionaisacima referidos, constata-se que nossa atual Constituição Federal, aodisciplinar o direito de propriedade e mantê-lo no rol das garantiasindividuais, alterou profundamente o seu conteúdo, afastando-se nitidamentedo clássico conceito de propriedade que nos é fornecido pelo direito privado.Assim é que, o direito de propriedade garantido pela Constituição Federal écondicionado ao cumprimento da função social da propriedade.O insigne constitucionalista José Afonso da Silva, Professor da Faculdade deDireito da Universidade de São Paulo, pontifica que:"O regime jurídico da propriedade tem seu fundamento na Constituição. Estagarante o direito de propriedade, desde que atenda sua função social. Se diz:é garantido o direito de propriedade (art. 5º, XXII), a propriedade atenderásua função social (art. 5º, XXIII), não há como escapar ao sentido de que sógarante o direito da propriedade que atenda sua função social. A própriaConstituição dá conseqüência a isso quando autoriza a desapropriação, compagamento mediante título, de propriedade que não cumpra sua funçãosocial (arts. 182, § 4º e 184). Existem outras normas constitucionais queinterferem com a propriedade mediante provisões especiais" (arts. 5º, XXIVa XXX, 170, II e III, 176, 177 e 178,182,183,184,185, 186,191 e 222).Esse conjunto de normas constitucionais sobre a propriedade denota que elanão pode mais ser considerada como um direito individual nem comoinstituição do Direito Privado. Por isso, deveria ser prevista apenas comouma instituição da ordem econômica, como instituição de relaçõeseconômicas, como nas Constituições da Itália (art. 42) e de Portugal (art.62). É verdade que o art. 170 inscreve a propriedade privada e a sua funçãosocial como princípios da ordem econômica (incs. II e III). Isso temimportância, porque, então, embora prevista entre os direitos individuais, elanão mais poderá ser considerada puro direito individual, relativizando-se seuconceito e significado, especialmente porque os princípios da ordemeconômica são pré-ordenados à vista da realização de seu fim: assegurar atodos existência digna, conforme os ditames da justiça social. Se é assim,então a propriedade privada, que, ademais, tem que atender a sua funçãosocial, fica vinculada à consecução daquele princípio. E claro que, também,não é sem conseqüência o fato de estar inserida, no seu aspecto geral, entreas normas de previsão dos direitos individuais. E que, prevista como tal, fica

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assegurada a instituição, não mais, porém, na extensão que o individualismoreconheceu. Com as novas disposições a Constituição dá ainda maior razão aPontes de Miranda, quando escreve que às leis é que compete regular oexercício e definir o conteúdo e os limites do direito de propriedade, pois que,no art. 5º, XXII, só se garante a instituição da propriedade, sendo suscetíveisde mudança por lei seu conteúdo e limites." (autor citado, Curso de DireitoConstitucional Positivo, Malheiros, 9ª edição, pág. 244-245). Houve portanto,substancial alteração do direito de propriedade, que não mais tem a antigaconotação de direito absoluto, não se constituindo mais um institutoexclusivo do direito privado. Por tais razões, o direito de propriedade nãopode mais ser aferido sob o enfoque de ser ele uma garantia individualconstitucional, uma vez que a própria Carta Constitucional, ao inseri-lo comoum dos direitos do indivíduo, condiciona-o ao cumprimento de sua funçãosocial. Portanto, o direito de propriedade que a Constituição Federal asseguraé o direito da propriedade que cumpra sua função social, vale dizer, direitode propriedade relativo e não absoluto como anteriormente disciplinado nodireito civil.Não se pode mais, portanto, visualizar o direito de propriedade sob o vetustoenfoque privatístico, pois, inegavelmente, o instituto deixou de serdisciplinado no campo do Direito Civil e passou a ser regulado pelo DireitoPúblico, especialmente o Direito Constitucional, estando inserido em novocontexto de normas de hierarquia superior, que lhe conferem o status deDireito Constitucional, cujos limites e conteúdo podem ser relativizados pornormas infraconstitucionais.Impende destacar ainda que as conhecidas limitações de polícia, de caráteradministrativo, não se relacionam com a função social da propriedade, sendoesta princípio muito maior e abrangente, com significativos reflexos naconceituação e limites da propriedade.O regime jurídico da propriedade tem que ser haurido no DireitoConstitucional, sendo certo afirmar-se que o Direito Civil regula apenas asrelações civis decorrentes do direito de propriedade, garantindo asfaculdades de usar, gozar e dispor dos bens (art. 524, Código Civil), aplenitude da propriedade (art. 525, Código Civil), seu caráter exclusivo eilimitado (art. 527).O exame da extensão e profundidade do direito de propriedade, previsto noCódigo Civil, só pode ser realizado sob a ótica da Constituição Federal que,em síntese, coloca o atendimento à finalidade social da propriedade comopressuposto essencial ao reconhecimento daquele direito.A par do novo conceito do direito de propriedade que nos é oferecido pelaConstituição Federal, relativizado pela indispensabilidade da observância dafunção social, também se faz necessário relembrar existência das limitaçõesao direito de propriedade, a fim de se aferir com precisão sobre a questãodas desapropriações indiretas derivadas do Parque Estadual da Serra do Mar.As limitações ao direito de propriedade estão previstas no Direito Privado eno Direito Público e condicionam o exercício daquele direito, sendo aquelas

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vinculadas aos direitos de vizinhança e estas relacionadas com a urbanísticae a administração pública.O saudoso Professor Hely Lopes Meirelles, nosso maior administrativista,ensinou que: "O Estado, no uso de sua soberania interna, pode intervir napropriedade privada e nas atividades particulares por várias formas, a saber:pelas limitações administrativas gerais, e pelos meios específicos deintervenção na propriedade particular, consistentes na desapropriação, naservidão administrativa, na requisição e na ocupação temporária. Todas elassão modalidades de expressão do domínio eminente que a Nação exercesobre as pessoas e coisas existentes em seu território...Como limitações deordem pública, diversamente das restrições civis, que permanecem reguladaspelo direito privado (Código Civil, arts. 354 e segs)."Ensina ainda o eminente mestre que: "limitação administrativa é todaimposição geral, gratuita, unilateral e de ordem pública, condicionadora doexercício de direitos ou de atividades particulares às exigências do bem-estarsocial".} Por derradeiro, esclarece o festejado administrativista que: "Vê-se,pois, que a limitação administrativa difere tanto da servidão administrativacomo da desapropriação. A limitação administrativa, por ser uma restriçãogeral e de interesse coletivo, não obriga o Poder Público a qualquerindenização". (autor citado, Direito Administrativo Brasileiro, Ed. RT, 2ªedição, págs. 137, 138,147).No Brasil, desde a Lei das Sesmarias, o direito de propriedade, posse e usoda terra era condicionado às chamadas cláusulas sociais, incidindo limitaçõesadministrativas de ordem geral, que tinham por objetivo, inclusive, aproteção ambiental, sendo certo que se deve a tal legislação que jápreservava a riqueza florestal a expressão "madeira de lei".Nosso primeiro Código Florestal, consubstanciado no Dec. Federal 23.793, de23/01/1934, afirmava em seu art. 1º: "As florestas existentes no territórionacional, consideradas em conjunto, constituem bem de interesse comum atodos os habitantes do país, exercendo-se os direitos de propriedade com aslimitações que as leis em geral, e especialmente este Código estabelecem".O art. 8º determinava:"Consideram-se de conservação perene, e são inalienáveis, salvo se oadquirente se obrigar, por si, seus herdeiros e sucessores, a mantê-las sob oregime legal respectivo, as florestas protetoras e as remanescentes". E o art.9º:"Os parques nacionais, estaduais ou municipais, constituem monumentospúblicos naturais, que perpetuam, em sua composição florística primitiva,trechos do país, que, por circunstâncias peculiares o merecem. § 1º: Érigorosamente proibido o exercício de qualquer espécie de atividade contra aflora e a fauna dos parques". O atual Código Florestal (Lei 4.771, de15.09.1965), em seu art. 1º dispõe:"As florestas existentes no território nacional e as demais formas devegetação, reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens deinteresse comum a todos os habitantes do País, exercendo-se os direitos de

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propriedade com as limitações que a legislação em geral e especialmenteesta Lei estabelecem".Dentre as limitações previstas no referido Código Florestal avulta, dentreaquelas elencadas no art. 16, a instituição da reserva legal de 20% da área,na qual não é permitido o desmatamento, sendo certo que no art. 44 referidareserva legal para a região norte e parte norte da região centro-oeste éfixada em 50%, tendo sido editada Medida Provisória sob nº 1511, de25.07.1996 que aumenta a reserva legal na região norte para 80%.Verifica-se, portanto, que desde épocas imemoriais as florestas nativas denosso país tiveram sua exploração subordinada a limitações administrativas,de caráter geral, que jamais ensejaram a mais remota possibilidade degerarem direito a indenização em relação ao Estado.Assim, quando o Estado de São Paulo baixou o decreto que criou o ParqueEstadual da Serra do Mar, não havia necessidade de ter declarado arespectiva área como de utilidade pública para fins expropriatórios, sendosuficiente que, nos termos do Código Florestal (art. 5º) instituísse o referidoParque e determinasse a observância das limitações da legislação federal.No entanto, referido Dec. Estadual 10.251/77, ao criar o Parque Estadual daSerra do Mar, com objetivos dos mais louváveis, declarou de utilidade públicaos imóveis situados na Serra do Mar, o que levou seus proprietários aajuizarem as ações de desapropriação indireta para obterem indenizaçõesdecorrentes daquele édito, sob a alegação de esvaziamento total de suaspropriedades. Na verdade, segundo se sabe, poucas foram as ações dedesapropriação direta aforadas pela Fazenda Estadual.Relativamente às desapropriações movidas pelo Estado de São Paulo,evidentemente, objetivando-se a transferência do domínio particular dosimóveis para o domínio público, de rigor a concessão da indenização, estaapurada de forma a atender o comando constitucional que determina a 'justaindenização'.No que concerne, porém, às desapropriações indiretas, entendo que o melhorposicionamento é o perfilhado pelos julgados que negam o direito àindenização perseguida, pois o Estado de São Paulo não ocupou quaisquerdos imóveis situados na Serra do Mar, sendo evidente que não pode oparticular pretender compelir o Estado a efetuar a desapropriação de seuimóvel, sob o argumento de que a simples edição do decreto estadualimportou no exaurimento da potencialidade econômica do mesmo. Aefetivação da desapropriação é ato próprio da soberania estatal, informadopelos princípios da conveniência e oportunidade.Confesso que, inicialmente, ao passar a integrar o Egrégio TJSP, convocadocomo Juiz substituto daquela excelsa Corte, filiei-me à majoritária correntepretoriana que concede indenização ampla aos imóveis do Parque Estadualda Serra do Mar.No entanto, ulteriormente, penitenciei-me do equívoco e passei a perfilhar oentendimento pioneiro do eminente Desembargador Laerte Nordi, que sóadmitia a indenização se comprovado o efetivo prejuízo decorrente da

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impossibilidade do proprietário continuar a explorar economicamente apropriedade, anteriormente explorada, em face das restrições derivadas dodecreto estadual.Em aresto de sua relatoria o Des. Laerte Nordi, assim se pronunciou:"Por isso, entendia antes e continuo entendendo que o Dec. Estadual 10.251/77, que criou o Parque Estadual da Serra do Mar, acabou sendo fonte depedidos de vultosas indenizações por proprietários que nunca exploraramseus imóveis, pelas notórias dificuldades e que passaram a reclamá-las,apoiados no esvaziamento econômico de suas propriedades; emborasolitariamente, defendia e defendo a tese de que o alegado prejuízo há deser efetivo, comprovado pela impossibilidade de continuar a exploraçãoeconômica preexistente, sobretudo porque restrições existiam desde a ediçãoda Lei Federal 4.771/65, que instituiu o Código Florestal" (ApCiv 93.364-2.São Paulo, j. em 11/08/1994). No mesmo sentido o julgamento da ApCiv255.650, relatado pelo eminente Desembargador Pinheiro Franco, assimementado:

"Direito de Propriedade. Limitação Administrativa. Indenização. Ediçãonormativa de criação de Parque Estadual. Inexistência de efeito sobre direitodominial não impedindo a utilização do imóvel de acordo com a suafinalidade ou a sua disponibilidade. Verba indevida. Declaração de votos.Ementa oficial: A simples edição normativa seja de criação do ParqueEstadual, seja de um comando expropriatório, não tem efeito sobre o direitodominial, não impedindo a utilização do imóvel de acordo com a sua funçãosocial ou a sua disponibilidade. Ação ordinária de indenização improcedente."(RT 717/151).O ilustre Desembargador afirma o seguinte:"A hipótese não cuida de desapropriação indireta da área, mas tão-somentede algumas restrições, perfeitamente legais, impostas pelo Poder Público, emdecorrência da existência de Parque Estadual, para efeitos de preservação davegetação, não tendo privado os autores da utilização da propriedade";Verifica-se que a propriedade dos autores jamais veio a integrar, jurídica oufaticamente, o patrimônio do Estado.A prova dos autos é toda no sentido de inexistirem edificações estaduais ouqualquer ato de ocupação estatal na gleba litigiosa, deixando claro que asimples edição normativa seja de criação do Parque Estadual, seja de umcomando expropriatório, não tem efeito sobre o direito dominial. nãoimpedindo a utilização do imóvel de acordo com a sua função social ou a suadisponibilidade.Na realidade, as restrições alegadas, advêm da legislação federal existentedesde 1934, persistindo na Lei 4.771/65 (Código Florestal).A verdade é que a prova dos autos também demonstra amplamente aabsoluta impossibilidade de aproveitamento econômico da área, nem tantopelas restrições administrativas impostas pela reserva florestal, mas epreponderantemente, em razão da localização do imóvel.

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Da leitura dos autos conclui-se que tanto o loteamento da área, como oaproveitamento comercial das matas é simplesmente impraticável. Aspossibilidades de exploração do local são, pois, altamente problemáticas, oumelhor, absolutamente inviáveis. Não há uma probabilidade objetiva que talexploração venha efetivamente a ocorrer. E, desta feita, não pode oparticular transferir o seu problema de venda de um bem que está fora domercado para o Estado, não por culpa deste, mas, sim, pela sua própriacondição e localização.No mesmo julgamento, integrando a douta Turma, proferi declaração deVOTO VENCEDOR, observando que:"Não bastasse isto, a prova pericial evidencia que o imóvel dos autores nãooferece qualquer possibilidade de ser explorado economicamente e isto nãodecorre das restrições administrativas, mas sim, em face da localização doimóvel, montanhas que não ensejam qualquer espécie de mecanização, sejapara formação de pastagens, seja para a prática de agricultura. O próprioacesso ao imóvel é praticamente impossível de ser feito pelos meios normaisde transporte. Trata-se de área que também não enseja a implementação deloteamento.As possibilidades de exploração do imóvel são nulas. Por isso o imóvel estavaabandonado e evidentemente, cuida-se de bem fora do mercado imobiliário,que não encontra interessados em explorar o inexplorável. A culpa de talsituação não é do Estado de São Paulo, nem das normas federais ouestaduais que regem a questão das áreas reservadas. A culpa é da situaçãodo imóvel. Convém destacar que grande parte dos imóveis rurais do Brasil,têm, compulsoriamente, por força de lei, de manter uma reserva de matas,cerrados ou campos naturais de 20% ou 50% de suas respectivas áreas.Nem por isso a União ou os Estados estão obrigados a indenizar osproprietários pela impossibilidade de se utilizarem de tais áreas (reservas).Destarte, evidenciado nos autos que "o Decreto Estadual que criou o ParqueEstadual da Serra do Mar não impediu que os autores continuassem aexplorar normalmente seus imóveis, porque os mesmos nunca foramexplorados, já que, fisicamente inexploráveis, inviável se torna o pedidoindenizatório" (RT 717/ 154/155).Na condição de relator dos Embargos Infringentes 204.019-2/3-01, de SãoSebastião, no Egrégio TJSP, proferi VOTO cuja ementa é a seguinte:"Ação indenizatória por apossamento administrativo. Dec. Estadual 10.251,de 30.08.1977, que criou o Parque Estadual da Serra do Mar e declarou oimóvel de utilidade pública para fins expropriatórios. Não efetivação da açãoexpropriatória. Limitações administrativas preexistentes e decorrentes doCódigo Florestal. Inexistência de esbulho possessório que impede oreconhecimento do apossamento administrativo. Simples edição do decretoestadual que cria Parque Estadual não é ato possessório. Não caracterizaçãodo apossamento administrativo. Improcedência do pedido indenizatório.Embargos infringentes rejeitados"(1ª Câmara de Férias - 01/93).O Eminente Dr. José Carlos de Moraes Saíles, em excelente trabalho

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publicado na Revista dos Tribunais, afirma o seguinte:"Parece-me, portanto, que os acórdãos a que inicialmente me referi,determinadores do pagamento de indenização sob o argumento de quehaviam ocorrido ocupações e, por isso, desapropriações indiretas no ParqueEstadual da Serra do Mar, não perfilharam o melhor entendimento sobre amatéria, estando a orientação mais adeqüada contida, a meu ver, nosarestos mais recentes do TJSP, a que também fizemos alusão, que negamindenização nesses casos, sob o fundamento de que não ocorreramocupações por parte da Administração Pública estadual e de que não podehaver desapropriação indireta sem que tenha havido antes ocupação" (RT714/315). E, após admitir a possibilidade de ser devida indenização, acasocomprovado nos autos a ocorrência de interdição do uso da propriedade, como aniquilamento e supressão do valor econômico do imóvel, com base noprincípio da solidariedade social, conclui a magnífica exposição da seguinteforma:"Verifica-se, portanto, que, ao instituir o Parque Estadual da Serra do Mar, oEstado de São Paulo nada mais fez do que colaborar com a União Federalpara a proteção de um patrimônio nacional, proteção esta consagrada, hoje,em norma constitucional (art. 225, da Constituição Federal). Parece-me,pois, que há de ser sob este ângulo que se deverá equacionar o graveproblema das alegadas, mas não ocorridas desapropriações indiretas noParque Estadual em questão. De outra parte, não é lógico nem racional quese veja a Fazenda do Estado de São Paulo compelida a pagar vultosasindenizações em virtude de desapropriações indiretas que não levou a efeitoe pelo simples fato de proceder à fiscalização que lhe é imposta pela própriaConstituição da República".De se concluir, portanto, que seja sob a ótica do direito de propriedade,condicionado pela Constituição Federal à função social; seja peloreconhecimento de que as limitações administrativas impostas pelo CódigoFlorestal (anterior e atual) não geram direito à indenização; seja peloreconhecimento de que a simples edição do Dec. Estadual 10.251/77 quecriou o Parque Estadual da Serra do Mar não se concretizou como atocaracterizador de apossamento administrativo (esbulho possessório); inviávelo reconhecimento de desapropriação indireta para a concessão daindenização aos proprietários de imóveis situados na área abrangida peloParque Estadual da Serra do Mar. A indenização, em tais casos, só poderáser concedida se o proprietário comprovar que realizava a exploraçãoeconômica do imóvel antes da edição do Dec. Estadual 10.251/77 e que emface do aludido decreto sofreu o esvaziamento econômico de suapropriedade."

6 - CONCLUSÕES.

Do exposto, verifica-se que há necessidade de um aprofundamento sobre a matéria

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concernente aos direitos e deveres decorrentes das reservas florestais,especialmente, no tocante às ações indenizatórias por desapropriação indireta,movidas pelos proprietários quando há na área reservas florestais permanentes ourestrições às quais eles estão obrigados a suportar por força da necessidade de segarantir a preservação do ambiente natural.

Não se pode deixar de registrar concordância com a afirmação de que o direito depropriedade, na atualidade, há de ser examinado, na área jurídica, com adestinação específica que ele tem de se integrar como elemento indispensável aodesenvolvimento econômico, social e de proteção ao meio ambiente. Este direito foielevado à categoria constitucional e não pode ser interpretado de modo que nãoatenda aos princípios que o regula, todos voltados à preservação da natureza.Implica tal proceder em se revisitar o direito de propriedade e inseri-lo no contextode direito público como passou a ser tratado, sem perder, contudo, as suas raízestradicionais fincadas pelo direito privado.

1. O autor exerce as funções do cargo de Ministro do Superior Tribunal deJustiça, integrando a 1a Turma e a 1ª Seção, especializadas em DireitoPúblico. Professor aposentado da UFRN, onde ministrou aulas de DireitoPúblico (Processual Civil, Direito Tributário e Direito Administrativo), ex-Professor da Universidade Católica de Pernambuco, da disciplina de DireitoProcessual Civil, Sócio Honorário da Academia Brasileira de Direito Tributário.

2. Cf. Pedro Ubiratan Escorel de Azevedo, Procurador do Estado de S. Paulo, noartigo " Indenização de áreas de Interesse Ambiental", pág. 81, Seminário deDireito Ambiental Imobiliário, Evento 6, pub. do Centro de Estudos daProcuradoria Geral do Estado de São Paulo.

3. Paulo Bonavides, in "Curso de Direito Constitucional", págs. 522/523, Edit.Malheiros, 6ª Edição, 1996.

4. In Paulo de Bessa Antunes, Curso de Direito Ambiental, pág. 73, EditoraRenovar, 2a . edição, 1992.

5. Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País ainviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e àpropriedade, nos termos seguintes:(...)XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;(...)LXXI - conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de normaregulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdadesconstitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e àcidadania;

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(...)LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que visea anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estadoparticipe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimôniohistórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento decustas judiciais e do ônus da sucumbência;(...)Art. 20. São bens da União:I - os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser atribuídos;II - as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, dasfortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e àpreservação ambiental, definidas em lei;III - os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seudomínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outrospaíses, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bemcomo os terrenos marginais e as praias fluviais;IV - as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; aspraias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, asáreas referidas no art. 26, II;V - os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômicaexclusiva;VI - o mar territorial;VII - os terrenos de marinha e seus acrescidos;VIII - os potenciais de energia hidráulica;IX - os recursos minerais, inclusive os do subsolo;X - as cavidades naturais subterrâneas e os sítios arqueológicos e pré-históricos;XI - as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios.§ 1.º É assegurada, nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito Federal e aosMunicípios, bem como a órgãos da administração direta da União,participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, derecursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outrosrecursos minerais no respectivo território, plataforma continental, marterritorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essaexploração.§ 2.º A faixa de até cento e cinqüenta quilômetros de largura, ao longo dasfronteiras terrestres, designada como faixa de fronteira, é consideradafundamental para defesa do território nacional, e sua ocupação e utilizaçãoserão reguladas em lei.Art. 21. Compete à União:(...)XIX - instituir sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos edefinir critérios de outorga de direitos de seu uso;XX - instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação,saneamento básico e transportes urbanos;

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(...)XXIII - explorar os serviços e instalações nucleares de qualquer natureza eexercer monopólio estatal sobre a pesquisa, a lavra, o enriquecimento ereprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios nucleares eseus derivados, atendidos os seguintes princípios e condições:a) toda atividade nuclear em território nacional somente será admitida parafins pacíficos e mediante aprovação do Congresso Nacional;b) sob regime de concessão ou permissão, é autorizada a utilização deradioisótopos para a pesquisa e usos medicinais, agrícolas, industriais eatividades análogas;c) a responsabilidade civil por danos nucleares independe da existência deculpa;(...) XXV - estabelecer as áreas e as condições para o exercício da atividadede garimpagem, em forma associativa.Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:(...)IV - águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão;(...)XII - jazidas, minas, outros recursos minerais e metalurgia;(...)XXVI - XXVI - atividades nucleares de qualquer natureza;(...)Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal edos Municípios:I - zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticase conservar o patrimônio público;(...)III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico,artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e ossítios arqueológicos;IV - impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte ede outros bens de valor histórico, artístico ou cultural;(...)VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suasformas;VII - XXVI - atividades nucleares de qualquer natureza;(...)IX - promover programas de construção de moradias e a melhoria dascondições habitacionais e de saneamento básico;(...)XI - registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisae exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios;(...)Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislarconcorrentemente sobre:

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(...)VI - florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo edos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;VII - proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico epaisagístico;VIII - responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens edireitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;(...)Art. 26. Incluem-se entre os bens dos Estados:I - as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e emdepósito, ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as decorrentes de obrasda União;II - as áreas, nas ilhas oceânicas e costeiras, que estiverem no seu domínio,excluídas aquelas sob domínio da União, Municípios ou terceiros;III - as ilhas fluviais e lacustres não pertencentes à União;IV - as terras devolutas não compreendidas entre as da União.Art. 30. Compete aos Municípios: I - legislar sobre assuntos de interesselocal;II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;(...)VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado,serviços de atendimento à saúde da população;VIII - promover, no que couber, adeqüado ordenamento territorial, medianteplanejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solourbano;Art. 43. Para efeitos administrativos, a União poderá articular sua ação emum mesmo complexo geo-econômico e social, visando a seudesenvolvimento e à redução das desigualdades regionais.(...)§ 2.º Os incentivos regionais compreenderão, além de outros, na forma dalei:(...)IV - prioridade para o aproveitamento econômico e social dos rios e dasmassas de água represadas ou represáveis nas regiões de baixa renda,sujeitas a secas periódicas.(...)§ 3.º Nas áreas a que se refere o § 2.º, IV, a União incentivará arecuperação de terras áridas e cooperará com os pequenos e médiosproprietários rurais para o estabelecimento, em suas glebas, de fontes deágua e de pequena irrigação.Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:(...)XIV - aprovar iniciativas do Poder Executivo referentes a atividadesnucleares;(...)

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XVI - autorizar, em terras indígenas, a exploração e o aproveitamento derecursos hídricos e a pesquisa e lavra de riquezas minerais;Art. 91. O Conselho de Defesa Nacional é órgão de consulta do Presidente daRepública nos assuntos relacionados com a soberania nacional e a defesa doEstado democrático, e dele participam como membros natos:I - o Vice-Presidente da República;II - o Presidente da Câmara dos Deputados;III - o Presidente do Senado Federal;IV - o Ministro da Justiça;V - os Ministros militares;VI - o Ministro das Relações Exteriores;VII - o Ministro do Planejamento.§ 1.º Compete ao Conselho de Defesa Nacional:I - opinar nas hipóteses de declaração de guerra e de celebração da paz, nostermos desta Constituição;II - opinar sobre a decretação do estado de defesa, do estado de sítio e daintervenção federal;III - propor os critérios e condições de utilização de áreas indispensáveis àsegurança do território nacional e opinar sobre seu efetivo uso,especialmente na faixa de fronteira e nas relacionadas com a preservação e aexploração dos recursos naturais de qualquer tipo;IV - estudar, propor e acompanhar o desenvolvimento de iniciativasnecessárias a garantir a independência nacional e a defesa do Estadodemocrático.§ 2.º A lei regulará a organização e o funcionamento do Conselho de DefesaNacional. Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:(...)III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção dopatrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusose coletivos;(...)Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano ena livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conformeos ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:I - soberania nacional;II - propriedade privada;III - função social da propriedade;IV - livre concorrência;V - defesa do consumidor;VI - defesa do meio ambiente;VII - redução das desigualdades regionais e sociais;VIII - busca do pleno emprego;IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídassob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o

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Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo eplanejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo parao setor privado.§ 1.º A lei estabelecerá as diretrizes e bases do planejamento dodesenvolvimento nacional equilibrado, o qual incorporará e compatibilizará osplanos nacionais e regionais de desenvolvimento.§ 2.º A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas deassociativismo.§ 3.º O Estado favorecerá a organização da atividade garimpeira emcooperativas, levando em conta a proteção do meio ambiente e a promoçãoeconômico-social dos garimpeiros.§ 4.º As cooperativas a que se refere o parágrafo anterior terão prioridade naautorização ou concessão para pesquisa e lavra dos recursos e jazidas deminerais garimpáveis, nas áreas onde estejam atuando, e naquelas fixadasde acordo com o art. 21, XXV, na forma da lei.Art. 176. As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e ospotenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo,para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à União,garantida ao concessionário a propriedade do produto da lavra.§ 1.º A pesquisa e a lavra de recursos minerais e o aproveitamento dospotenciais a que se refere o caput deste artigo somente poderão serefetuados mediante autorização ou concessão da União, no interessenacional, por brasileiros ou empresa brasileira de capital nacional, na formada lei, que estabelecerá as condições específicas quando essas atividades sedesenvolverem em faixa de fronteira ou terras indígenas. Parágrafo comredação dada pela Emenda Constitucional nº 6 de 1995. Redação Anterior:§ 2.º É assegurada participação ao proprietário do solo nos resultados dalavra, na forma e no valor que dispuser a lei.§ 3.º A autorização de pesquisa será sempre por prazo determinado, e asautorizações e concessões previstas neste artigo não poderão ser cedidas outransferidas, total ou parcialmente, sem prévia anuência do Poderconcedente.§ 4.º Não dependerá de autorização ou concessão o aproveitamento dopotencial de energia renovável de capacidade reduzida.Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo poder públicomunicipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivoordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir obem-estar de seus habitantes.§ 1.º O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório paracidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da políticade desenvolvimento e de expansão urbana.§ 2.º A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende àsexigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.§ 3.º As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justaindenização em dinheiro.

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§ 4.º É facultado ao poder público municipal, mediante lei específica paraárea incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, doproprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado quepromova seu adeqüado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:I - parcelamento ou edificação compulsórios;II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo notempo;III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública deemissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgatede até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados ovalor real da indenização e os juros legais.Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende,simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos emlei, aos seguintes requisitos:I - aproveitamento racional e adeqüado;II - utilização adeqüada dos recursos naturais disponíveis e preservação domeio ambiente;III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dostrabalhadores.Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições,nos termos da lei:I - controlar e fiscalizar procedimentos, produtos e substâncias de interessepara a saúde e participar da produção de medicamentos, equipamentos,imunobiológicos, hemoderivados e outros insumos;II - executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como asde saúde do trabalhador;III - ordenar a formação de recursos humanos na área de saúde;IV - participar da formulação da política e da execução das ações desaneamento básico;V - incrementar em sua área de atuação o desenvolvimento científico etecnológico;VI - fiscalizar e inspecionar alimentos, compreendido o controle de seu teornutricional, bem como bebidas e águas para consumo humano;VII - participar do controle e fiscalização da produção, transporte, guarda eutilização de substâncias e produtos psicoativos, tóxicos e radioativos;VIII - colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o dotrabalho.Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de naturezamaterial e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores dereferência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadoresda sociedade brasileira, nos quais se incluem:(...)V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico,arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.

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§ 1.º O poder público, com a colaboração da comunidade, promoverá eprotegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros,vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas deacautelamento e preservação.(...)§ 3.º A lei estabelecerá incentivos para a produção e o conhecimento de bense valores culturais.§ 4.º Os danos e ameaças ao patrimônio cultural serão punidos, na forma dalei.Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo paraas presentes e futuras gerações.§ 1.º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público:I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover omanejo ecológico das espécies e ecossistemas;II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País efiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de materialgenético;III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seuscomponentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e asupressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização quecomprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividadepotencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente,estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas,métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vidae o meio ambiente;VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e aconscientização pública para a preservação do meio ambiente;VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas quecoloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espéciesou submetam os animais à crueldade.§ 2.º Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meioambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgãopúblico competente, na forma da lei.§ 3.º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambientesujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais eadministrativas, independentemente da obrigação de reparar os danoscausados.§ 4.º A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, oPantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e suautilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem apreservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos

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naturais.§ 5.º São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, porações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais.§ 6.º As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localizaçãodefinida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas.Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes,línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras quetradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazerrespeitar todos os seus bens.§ 1.º São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadasem caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, asimprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seubem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seususos, costumes e tradições.§ 2.º As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a suaposse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo,dos rios e dos lagos nelas existentes.§ 3.º O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciaisenergéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenassó podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas ascomunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultadosda lavra, na forma da lei.§ 4.º As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e osdireitos sobre elas, imprescritíveis.§ 5.º É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, adreferendum do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia queponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País, apósdeliberação do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipótese, oretorno imediato logo que cesse o risco.§ 6.º São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos quetenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que serefere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios edos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União,segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e aextinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma dalei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé.§ 7.º Não se aplica às terras indígenas o disposto no art. 174, §§ 3º e 4º.Art. 232. Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimaspara ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo oMinistério Público em todos os atos do processo.Art. 43 - ADCT - Na data da promulgação da lei que disciplinar a pesquisa e alavra de recursos e jazidas minerais, ou no prazo de um ano, a contar dapromulgação da Constituição, tornar-se-ão sem efeito as autorizações,concessões e demais títulos atributivos de direitos minerários, caso ostrabalhos de pesquisa ou de lavara não hajam sido comprovadamente

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iniciados nos prazos legais ou estejam inativos.Art. 44 - ADCT - As atuais empresas brasileiras titulares de autorização depesquisa, concessão de lavra de recursos minerais e de aproveitamento dospotenciais de energia hidráulica em vigor terão quatro anos, a partir dapromulgação da Constituição, para cumprir os requisitos do art. 176, § 1.º.§ 1.º Ressalvadas as disposições de interesse nacional previstas no textoconstitucional, as empresas brasileiras ficarão dispensadas do cumprimentodo disposto no art. 176, § 1.º, desde que, no prazo de até quatro anos dadata da promulgação da Constituição, tenham o produto de sua lavra ebeneficiamento destinado à industrialização no território nacional, em seuspróprios estabelecimentos ou em empresa industrial controladora oucontrolada.§ 2.º Ficarão também dispensadas do cumprimento do disposto no art. 176,§ 1.º, as empresas brasileiras titulares de concessão de energia hidráulicapara uso em seu processo de industrialização.§ 3.º As empresas brasileiras referidas no § 1.º somente poderão terautorizações de pesquisa e concessões de lavra ou potenciais de energiahidráulica, desde que a energia e o produto da lavra sejam utilizados nosrespectivos processos industriais.

6. "Art. 2º - Lei nº 4.771, de 15/09/65 : " Consideram-se de preservaçãopermanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas devegetação natural situadas:a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d´água desde o seu nível mais altoem faixa marginal cuja largura mínima seja:1) de 30 (trinta) metros para os cursos d´água de menos de 10 (dez) a 50(cinqüenta) metros de largura;2) de 50 (cinqüenta) metros para os cursos d´água que tenham de 10 (dez)a 50 (cinqüenta) metros de largura;3) de 100 (cem) metros para os cursos d´água que tenham de 50(cinqüenta) a 200 metros de largura;4) de 200 (duzentos) metros para os cursos d´água que tenham de 200(duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;5) de 500 (quinhentos) metros para os cursos d´água que tenham largurasuperior a 600 (seiscentos) metros;b) ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d´água naturais ou artificiais;c) nas nascentes, ainda que intermitentes, e nos chamados "olhos d´água",qualquer que seja a sua situação topográfica, num raio mínimo de 50(cinqüenta) metros de largura;d) no topo de morros, montes, montanhas e serras;e) nas encostas ou partes destas com declividade superior a 45º, equivalentea 100% na linha de maior declive;f) nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;g) nas bordas dos tabuleiros ou chapadas, a partir da linha de ruptura dorelevo, em faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projeções

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horizontais;h) em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, qualquer que sejaa vegetação. Parágrafo único. No caso de áreas urbanas, assim entendidasas compreendidas nos perímetros urbanos definidos por lei municipal, e nasregiões metropolitanas e aglomerações urbanas, em todo o territórioabrangido, observar-se-á o disposto nos respectivos planos e leis de uso dosolo, respeitados os princípios e limites a que se refere este artigo.

7. Ver art. 3º da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965 (Código Florestal).

8. Art. 4º, da Lei nº 4.771, de 15.9.1965 (Código Florestal).

9. O Poder Público, em efetuando o florestamento ou reflorestamento em terrasparticulares, está obrigado a cobrar do proprietário as despesas realizadas.

10. Ver "Direito Ambiental", 3a. edição, RT, pág. 375, do autor referido.

11. Classificação defendida por H. Amaral Mello e outros, conforme citação dePaulo Affonso Leme Machado, in ob. cit., pág. 382.

12. Ver o art. 2º, do Código Florestal. O seu inteiro teor está consignado na notade nº 6, acima.

13. Registre-se que, por via da Medida Provisória nº 1.632-8, de 13.01.1998,ficou determinado que: "Extingue-se em 5 anos o direito de propor ação deindenização por apossamento administrativo ou desapropriação indireta, bemcomo ação que vise a indenização por restrições decorrentes de atos doPoder Público."

14. O recurso especial citado foi referente a Recurso Especial intentando peloEstado de S. Paulo, em face de, em sede de embargos infringentes, combase em perícia realizada pelo próprio segundo grau, após anular a decisãode segundo grau, ter fixado indenização em Cz$ 207.412.700,00, com osacréscimos legais (juros, correção monetária e horários advocatícios), moedada época, conforme laudo do assistente técnico, enquanto o vistor oficialfixava tal indenização em dezesseis milhões, novecentos e trinta e seis mil,seiscentos e trinta e nove cruzeiros, acrescida de juros de mora e correçãomonetária, a partir de abril de 1987. Os votos vencidos foram proferidospelos Mins. José Delgado e Humberto Gomes de Barros. Em resumo:reconheciam o Direito dos desapropriados de receberem indenização, porém,anulavam a perícia e as decisões de primeiro e segundo grau, determinandoque outra perícia fosse realizada.

15. Antônio Herman V. Benjamin, in "Desapropriação, Reserva Florestal Legal eÁreas de Preservação Permanente", págs. 62 e segs, artigo publicado naobra "Temas de Direito Ambiental e Urbanístico", organizado por GuilhermeJosé Purvin de Figueiredo, Edit. Max Limonad.

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16. Marcelo Duarte Daneluzzi, Promotor de Justiça no Estado de S. Paulo, emartigo intitulado "Desapropriação Indireta em Unidades de Conservação,págs. 76 e segs., Revista de Direito Ambiental, nº 5, Jan-Março de 1997, RT.

17. Luís Henrique Paccagnella, Promotor de Justiça em Jaboticabal-SP, em artigointitulado "Função Socio-ambiental da Propriedade Rural e Áreas dePreservação Permanente e Reserva Florestal Legal", publicado na Revista deDireito Ambiental, nº 8, 1997, págs. 5 e segs, Ed. RT.

18. Manoel de Queiroz Pereira Calças, Juiz do II Tribunal de Alçada Civil de S.Paulo, em trabalho intitulado "Desapropriação Indireta e o Parque Estadualda Serra do Mar", publicado na Revista de Direito Ambiental nº 6, abril ejunho de 1997, Ed. RT.