A RENOVAÇÃO DA HISTÓRIA ANTIGA

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A RENOVAO DA HISTRIA ANTIGA A Histria Antiga na sala de aula constitui, desde longa data, uma grande preocupao para o professor. H mais de 15 anos, quando o restabelecimento dos civis no poder trouxe tona uma grande efervescncia nas discusses sobre o ensino de Histria na esc ola fundamental e mdia, a Histria Antiga j se apresentava como um grande tema. Em r eunies da Anpuh, havia mesas-redondas sobre isso, assim como fervilhavam as propo stas curriculares que tinham de haver com os perodos da Histria. Os parmetros curri culares de Histria do incio da dcada de 1960 estabeleciam os temas de Histria Antiga que deveriam ser conhecidos por professores, assim como os livros didticos, ento como agora, dedicavam ateno ao mundo antigo. Todos os cursos superiores de Histria deviam ministrar Histria Antiga para formar os futuros mestres, mas pouqussimos ti nham docentes pesquisadores da Antiguidade, de modo que a disciplina estava rele gada, na universidade, queles cujo conhecimento do tema era muito superficial e c ujo interesse, muitas vezes, se distanciava do mundo antigo. Nas ultimas duas dcadas, a situao mudou muito, tanto no ensino superior e na formao d os professores, como nos livros didti-cos e de apoio, e na prpria prtica da sala de aula. Se o estudo da Antiguidade, tantas vezes, parecia antes esotrico, distante e s eventualmente prazeroso e atrativo, hoje o quadro outro e as perspectivas so ainda mais alentadoras. Neste captulo, mostrarei como a Histria Antiga pode ser no somente muito til para a vida do futuro cidado, como tambm procurarei ressaltar aqu eles recursos e estratgias disposio do professor para que ele ministre aulas agradve is e que lhe tragam prazer e recompensa intelectual, O ESTUDO DA ANTIGUIDADE NO BRASIL E A FORMAO DO PROFESSOR Em duas dcadas, o pas testemunhou uma grande expanso da pesquisa sobre o mundo anti go. Muitas universidades possuem professores estudiosos do mundo antigo, mestres e doutores com pesquisa prpria sobre a Antiguidade. A importncia do conhecimento das fontes antigas, gregas, latinas, mas tambm hebraicas, egpcias e mesopo-tmicas, levou ao estudo de lnguas plos estudiosos. A Histria se faz com documentos, e o con hecimento em primeira mo ds documentos permite que o historiador formule suas prpri as interpretaes do passado. A Histria, em especial a Antiga, no se faz apenas com do cumentos escritos, mas tambm com a cultura material, com o estudo arqueolgico de e difcios, esttuas, cermica, pintura, entre outras categorias de artefatos. A arqueol ogia do Mediterrneo antigo tambm desenvolveu-se no Brasil, com estudos to originais e variados como "a vida rural na Grcia antiga", "a cultura popular antiga", "as imagens dos vasos gregos", para citar apenas uns poucos tpicos. Dezenas de profissionais qualificados formaram-se nesse perodo e puderam expandir , de forma significativa, o ensino especializado de Histria Antiga. As pesquisas cientficas resultaram, logo, em uma grande quantidade de publicaes, livros e artigo s de revista, lidos plos alunos, futuros mestres, e plos prprios professores. Assim , ao lado da literatura historiogrfica internacional traduzida; expandiu-se a pos sibilidade de acesso a uma produo nacional muito prxima das preocupaes e anseios dos nossos professores e alunos. Alm dos livros para professores, multiplicaram-se as colees de apoio didtico, com livros voltados para os jovens do ensino fundamental, com muitas ilustraes, excelente projeto grfico, atrativos e instrutivos. Produzido s por autores brasileiros, tratam das inquietaes de jovens brasileiros. Publicaram -se, tambm, muitas obras antigas traduzidas das lnguas originais ao portugus, seja na forma de obras integrais, seja na forma de coletneas. OS LIVROS DIDTICOS E A RENOVAO DA HISTRIA ANTIGA Os livros didticos tambm foram afetados pela profissionalizao do estudo da Antiguida de no pas. Cada vez mais, os livros tratam no s dos temas e das explicaes historiogrf cas tradicionais, mas procuram diversificar os objetos e as abordagens, assim co mo inserir o estudo da Antiguidade na realidade brasileira. A viso eurocntrica est ereotipada j no a nica encontrada, ao contrrio. Surgida no sculo XIX europeu, a. pos ura tradicional identificava a Histria como o estudo do Ocidente, racional e domi nador do mundo, que teria surgido, na forma de civilizao s beiras do Nilo, Tigre e Eufrates, passado, como se fosse uma tocha, para a Grcia, depois Roma, para ressu rgir no mundo moderno. Essa viso to profundamente elitista e europeia tem cedido p

asso a concepes menos limitadas do mundo antigo. O Egito j no so apenas os faras, mas tambm as muitas e muitas aldeias, no h apenas c inuidade, mas mudana, mostra-se que ali conviviam povos e culturas variadas: egpci os, nbios, hcsos, hebreus, gregos, romanos. A Mesopotmia j no apenas o mundo dos ds as precursores de Saddam Hussein, mas um locai onde a variedade cultural produzi u uma infinidade de reflexes, muitas delas profundamente enraizadas cm nossa prpri a cultura. Os hebreus j no so npcnas precursores do cristianismo, mas fazem parte d e nossa prpria maneira de conceber o mundo. A Antiguidade tampouco inicia-se com a escrita, mas, cada vez mais, busca-se mostrar como o homem possui uma Histria A ntiga mul-timilenar, anterior escrita em milhares de anos. A Grcia idealizada como a inventora da democracia e da filosofia cede passo para interpretaes mais abrangentes, que rccurmi ;i Grcia para muito antes de Homero e qu e mostram as ligaes umbilicais entre os helenos e o Mediterrneo Oriental. Na Atenas democrtica, descobre-se uma massa de camponeses pobres na base do regime, assim como artesos humildes que forjam uma cultura muito menos elitista do que aquela e nsinada a nossos avs e tantas vezes rejeitada como "incompreensvel". A cidade greg a, a polis, volta a adquirir seu sentido original, ao apresentar-se a vida no ca mpo, onde vivia a grande maioria dos gregos. Os romanos, caracterizados como bru tos, violentos, cruis e preguiosos, e sua histria corpo uma sucesso de sandices de s eu^ governantes, tm cada vez menos espao. O cotidiano dos romanos, suas labutas dir ias, sua religiosidade e apego lei passam a explicar 05 jogos de gladiadores com o prtica inteligvel, antes que simplesmente condenvel. A sua Histria aquela da diver sidade, da absoro e da interaao cultural. Logo se chega a Darcy Ribeiro e sua carac terizao do Bras.il como a nova Roma.. _ NOVAS POSSIBILIDADES ANALTICAS Quais as principais inovaes interpretativa.0 que influenciam, de forma positiva, o ensino de Histria Antiga? Em primeiro lugar, a apresentao de uma Antiguidade const ruda pela historiografia, antes que uma Histria dada, acabada, a ser decorada pelo aluno. Os grandes temas e acontecimentos da Antiguidade, as prprias periodizaes, c omeam a aparecer como construes historiogrficas. Na Histria Antiga, a tradicional dic otomia entre Oriente e Ocidente constitui uma grande narrativa que estrutura tod a uma viso curo-cntrica da Histria. Cada vez mais, apresenta-se essa oposio no contex to histrico do moderno imperialismo do sculo XIX e XX, a mostrar como o Ocidente s e cria como uma supercivilizao dominadora do mundo. Em um primeiro momento, esse O cidente n/ci-darnente racista, arianista, anti-semita, ao criar um homem ariano ocidental racional, guerreiro e conquistador do oriental irracional, trapace.ro, indolente, pronto a ser civilizado plos arianos (alemes, ingleses, franceses, dep ois americanos). No bojo da derrota nazista e da forja de um novo Ocidente antiracista, cria-se o novo conceito, muito presente nas interpretaes tradicionais da Antiguidade, da superioridade cultural da civilizao judaico-crist, ocidentalizando, em parte, tanto o judasmo como o cristianismo, reconhecidos como de origem orien tal. Como isso se apresenta na prtica concreta de sala de aula? Em grande parte, o que se apresenta so discursos diversos, conflitantes e contraditrios, sobre os temas tratados, a mostrar como so os historiadores a escrever a Histria, em contextos hi stricos e sociais muito precisos. Com isso, chegamos segunda grande novidade analt ica: o relacionamento entre a Antiguidade e o mundo contemporneo cm que vivemos. De fato, para que se possa tratar da inveno do conceito de "plebe ociosa", termo a plicado para designar os cidados atenienses e a plebe romana, impoe-se tratar da inveno, no sculo XWJI, da noo de "plebe ociosa", usada para desigrar aqueles que, no capitalismo industrial nascence, no eram assalariados. Da mesma forma, separar ra zo e mico, como se os gregos houvessem operado um milagre a descoberta da razo impe uma lgica iluminista, de novo do sculo XV1I, para uma outra realidade histrica e so cial. Os alunos ficam fascinados quando descobrem gregos que no eram milagrosos e geniais, mas que havia culturas variadas, diversas entre si, mas tambm diferente s de ns, Os hebreus j no so os inventores do nosso monotesmo ocidental, mas acreditar am em muitos deuses, inventaram um deus nacional, na monolarria javista, influen ciados, tambm, plos prprios egpcios. As novas possibilidades analticas dependem, em l ima instncia, da ai v co da capacidade de reflexo do aluno, diante da diversidade de interpretaes e do aguamento de sua curiosidade intelectual. NOVOS TEMAS NOVAS ESTRATGIAS EM SALA DE AULA

Os temas tradicionais da Histria Antiga continuam a constituir elemento central n o estudo d;i Antiguidade, pois so aqueles que fundamentam a relao entre a nossa soc iedade contempornea e a Antiguidade. Para que se possa contextualizar os discurso s historiogrficos, necessrio estudar tanto as fontes antigas, como a historiografi a moderna sobre temas como "o nascimento do Ocidente" ou "o surgimento da Filoso fia". A prpria narrativa histrica no pode deixar de passar por acontecimentos, s vez es co simplrios mas significativos para a inveno de nossa sociedade contempornea, com o pode ser "o cruzamento do Rubico por Jlio Csar" ou "a monarquia de Davi e Salomo". .Ora, se nossos alunos no souberem quem foi Jlio Csar c o que significou a passagem pelo Rubico, como podero entender o papel das armas na Histria, em geral, e na nos sa Histria em particular? Se no conhecerem os monarcas hebreus, como podero interpr etar, de forma menos superficial, as religies contemporneas to importantes como o J udasmo, Cristianismo e Islamismo? Isso no significa que no se devam tratar de novos temas, mas que os grandes tpicos continuam a ser essenciais, vistos como narrativas historiogrficas a serem conhec idas pelos alunos e que os permitam refietir sobre temas .da atuaidade (como so ta nto o papel das armas na Histria como das religies mencionadas acima). Sem dvida, c ntrctanco, novos temas tambm podem e devem ser utilizados. Os novos temas surgem, em grande parte, da atualidade tambm. Assim, em um mundo em que as mulheres tm ca da vez mais sua atuao na vida social posta em evidncia, a apresentao das mulheres e d as relaes de gnero apresenta interesse evidente. As mulheres egpcias, com sua grande importncia, constituem um grande tema, Neferrite e Clepatra como instigadoras de um estudo crtico do papel da mulher e das relaes de gnero na sociedade. Em seguida, a religiosidade, outro grande tema atua! que pode levar ao estudo de outras form as de manifestao religiosa. A mitologia grega sempre ser um grande terna, visto pel o olhar das variadas correntes historiogrficas sobre a questo, mas tambm a religios idade romana, cujos ecos se encontram e;n toda a concepo posterior de respeito s re gras e s formas rituais- Os jogos de gladiadores, como ato religioso, d novo senti do prpria condenao dos cristos nas arenas, o que permite ao aluno refietir de forma muito mais profunda sobre a historicidade da religio, As estratgias de sala de aula incrementaram-se muito, nos ltimos anos, m a h recurso s j conhecidos e que buscam incentivar o aspecto ldico da atividade intelectual e que devem ser incrementados. Fornecer e orientar o desenvolvimento de um tema a ser pesquisado e indicar caminhos ldicos de reflexo revela-se uma estratgia excelen te. Criar uma histria em quadrinhos e, para Isso, podc-sc usar os recursos informt icos, o recorte de revistas ou mesmo desenhos feitos plos alunos ou uma palavra-c ruzada, por triviais que possam parecer, consegue fazer com que o aluno se inter esse pela questo e relita, com resultados, portanto, muito melhores do que a simpl es memorizao, sempre enganosa, temporria, de contedos. A produo de textos constitu e ento essencial para que o aluno possa aprender a redigir e a concatenar suas ide ias e, nos dias atuais, isso pode tornar-se ainda mais atrativo e instgame se o a luno for desafiado a montar um site sobre o tema (onde estaro, naturalmente, tambm textos). No ensino mdio, tanto mais se poder usar de recursos liidicos e pedaggicos, como po dem ser ns leituras dramticas de comedia latinas ou gregas adaptadas para isso. U ma leitura dramtica envolve tanto os alunos que se apresentam como os que assiste m apresentao. Exige uma pesquisa sobre a obra, autor, contexto histrico e social, d esenvolve os talentos dos leitores dramticos c produzem efeitos muitssimo duradour os nas mentes dos educandos. A escravido antiga, unia abstrao to distante do aluno, torna-se muito palpvel n.i encenao, assim como o direito romano, tema rido e pouco a traente, primeira vista, adquire contornos muito clnros em uma pea de Planto, Tam bm muito pode ser obtido do conhecimento coni a execuo de msica grega e com a exibio discusso de filmes sobre ;i Antiguidade. Assistir ao filme O Glaiaetor, ler algun s documentos sobre a arena romana, assim como ver pinturas, grafites e inscries ro manas a respeito, torna a discusso sobre a construo do discurso historiografia) sob re Roma muito concreta c interessante. Outra grande e importante estratgia em sala de aula, cm qualquer do.r nveis, const itui i integrao com outras disciplinas. Trabalhos com lngua c literatura vernculas p ermitem a leitura, por exemplo, de tradues poticas de obras antigas, como Safo e Ovd io, para citar dois autores de obras que permitem tratar das relaes de gnero, tanto

na Antiguidade como nos dias de hoje. A paquera e as relaes entre pessoas do mesm o sexo so as questes que interessam de perto os adolescentes e que pode muito bem ser tratados com a alm pura desses dois autores a lngua inglesa tambm pode ser apro veitada como no caso do famoso e Jlio Csar de Shakespeare mas tambm a pelo saites internacionais sobre a antiguidade em ingls o mesmo se aplica a geografia mas tam bm em reas como matemtico nmeros e clculos em diversas civilizaes antigas. Fsica e egrao de diversas disciplinas e em projetos comuns produz resultados excepcionais compareceram projeto integrado sobre as pirmides do Egito e os edifcios gregos