A Skol e o Público Feminino: diferentes abordagens com o...

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A Skol e o Público Feminino: diferentes abordagens com o passar do tempo 1 Fernanda Politanski 2 Recém formada no curso de Comunicação Social com habilitação em Publicidade e Propaganda pela ESPM-SP. Resumo O presente artigo visa conhecer e contrastar parte da comunicação de uma marca ao longo do tempo. Como recortes temáticos, optamos por analisar a marca Skol, especialmente na ambiência digital. Para tanto, realizamos uma reflexão sobre marcas e o ambiente digital, selecionamos três campanhas e uma ação da marca e identificamos vetores de mudança. Desse modo, utilizamo-nos das seguintes estratégias metodológicas: pesquisa documental e pesquisa bibliográfica, mobilizando autores como Lévy e Lemos (2010), Recuero (2009) e Jenkins (2014) ao compreender a cibercultura e as redes sociais no ciberespaço; Semprini (2009) ao entender o fenômeno da marca e suas dimensões- chave. Palavras-chave: Cibercultura; Redes Sociais; Marcas; Skol; Campanhas Publicitárias. INTRODUÇÃO Neste artigo, procuramos trazer reflexões acerca de parte de um capítulo (que estuda a transformação da comunicação da Skol ao longo do tempo) do trabalho monográfico de conclusão de curso 3 para graduação de Comunicação Social com habilidade em Publicidade e Propaganda. Julgamos o artigo interessante para o evento em questão, vez que aborda parte da comunicação de uma marca com significativa capilaridade e relevância nacional, evidenciando mudança expressiva na sua comunicação. Selecionamos como objeto de estudo a marca de cervejas Skol e direcionamos nosso olhar para a sua atuação na ambiência digital, considerando a transformação de sua comunicação a partir de três momentos distintos nos anos de 2013, 2015 e 2017. Desta forma, o problema lançado para o objeto foi: como se deu a transformação da comunicação da marca a partir de campanhas de 2013, 1 Trabalho apresentado no 3º Encontro de GTs de Graduação - Comunicon, realizado no dia 10 de outubro de 2018. 2 Recém formada no curso de Publicidade e Propaganda pela ESPM-SP, estudante do curso de Ciências Sociais da FFLCH-USP (atualmente cursando o 3 o ano) e trabalha com pesquisa qualitativa de mercado na empresa Scoop&Co. E- mail: [email protected] 3 Trabalho intitulado Cibercultura, Marcas e Movimentos Sociais: aproximações da marca Skol ao público LGBT, orientado pela Prof. Ms. Rosilene Moraes Alves Marcelino e defendido em 05/08/2017.

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A Skol e o Público Feminino: diferentes abordagens com o passar do tempo1

Fernanda Politanski2

Recém formada no curso de Comunicação Social com habilitação em Publicidade e

Propaganda pela ESPM-SP.

Resumo O presente artigo visa conhecer e contrastar parte da comunicação de uma marca ao longo do tempo. Como recortes temáticos, optamos por analisar a marca Skol, especialmente na ambiência digital. Para tanto, realizamos uma reflexão sobre marcas e o ambiente digital, selecionamos três campanhas e uma ação da marca e identificamos vetores de mudança. Desse modo, utilizamo-nos das seguintes estratégias metodológicas: pesquisa documental e pesquisa bibliográfica, mobilizando autores como Lévy e Lemos (2010), Recuero (2009) e Jenkins (2014) ao compreender a cibercultura e as redes sociais no ciberespaço; Semprini (2009) ao entender o fenômeno da marca e suas dimensões-chave. Palavras-chave: Cibercultura; Redes Sociais; Marcas; Skol; Campanhas Publicitárias.

INTRODUÇÃO Neste artigo, procuramos trazer reflexões acerca de parte de um capítulo (que estuda a

transformação da comunicação da Skol ao longo do tempo) do trabalho monográfico de conclusão de

curso3 para graduação de Comunicação Social com habilidade em Publicidade e Propaganda.

Julgamos o artigo interessante para o evento em questão, vez que aborda parte da comunicação de

uma marca com significativa capilaridade e relevância nacional, evidenciando mudança expressiva

na sua comunicação.

Selecionamos como objeto de estudo a marca de cervejas Skol e direcionamos nosso olhar

para a sua atuação na ambiência digital, considerando a transformação de sua comunicação a partir

de três momentos distintos nos anos de 2013, 2015 e 2017. Desta forma, o problema lançado para o

objeto foi: como se deu a transformação da comunicação da marca a partir de campanhas de 2013,

1 Trabalho apresentado no 3º Encontro de GTs de Graduação - Comunicon, realizado no dia 10 de outubro de 2018. 2 Recém formada no curso de Publicidade e Propaganda pela ESPM-SP, estudante do curso de Ciências Sociais da FFLCH-USP (atualmente cursando o 3o ano) e trabalha com pesquisa qualitativa de mercado na empresa Scoop&Co. E-mail: [email protected] 3 Trabalho intitulado Cibercultura, Marcas e Movimentos Sociais: aproximações da marca Skol ao público LGBT, orientado pela Prof. Ms. Rosilene Moraes Alves Marcelino e defendido em 05/08/2017.

2015 e 2017? Sendo assim, para tentar responder à nossa questão problema, estabelecemos como

objetivo conhecer e contrastar parte da comunicação da marca ao longo do tempo.

Para tanto, utilizamos como instrumentos metodológicos, em um primeiro momento, pesquisa

bibliográfica, mobilizando autores que discutem a ambiência digital e as marcas e, em segundo

momento, recorremos à pesquisa documental, como fonte de dados para observarmos a comunicação

da marca, considerando especialmente campanhas antigas (retiradas do YouTube).

PRESSUPOSTOS TEÓRICO-CONCEITUAIS

Lévy e Lemos (2010) apresentam a cibercultura como um conjunto de práticas, hábitos,

discursos e valores emergentes no fim do século XX. A cibercultura, de acordo com os autores,

consiste em três princípios: 1) liberação da palavra; 2) conexão e conversa mundial; e 3)

reconfiguração social, cultural e política.

Sobre o primeiro, os autores discutem como deixam de existir, separadamente, polos

distintos de emissão e de recepção de uma mensagem. Há, desse modo, dissolução e fusão de ambos,

de maneira que as pessoas passam a produzir e a transmitir seus próprios conteúdos, além de receber

de outras pessoas. Uma vez que diferentes internautas, conectados por meio de redes na internet,

começam a transmitir seus conteúdos, Lévy e Lemos (2010) explicam que se dá o segundo princípio,

isto é, cria-se conexão e conversa mundiais. Além disso, como consequência destes processos

anteriores, os autores afirmam que há reconfiguração social, cultural e política, classificado como o

terceiro princípio.

Lévy e Lemos (2010) entendem que, nesse cenário, os indivíduos adquirem condição de

protagonistas, sendo vistos como os principais nós da comunicação. Além disso, eles destacam o

desenvolvimento e a importância das redes sociais nesse contexto. Nesse sentido, julgamos

importante trazer as diferenciações conceituais que Recuero (2009) faz de redes sociais, redes sociais

na internet e sites de redes sociais.

As redes sociais, explica a autora, consistem nos atores e nas suas conexões, isto é, nos

indivíduos e nas pessoas que conhecem. Recuero (2009) afirma que as redes sociais existem antes da

internet, porque falam da capacidade dos indivíduos de estabelecerem vínculos sociais e afetivos. As

redes sociais na internet transportam a mesma lógica das redes sociais para o ambiente digital, em

que são estabelecidas novas formas e dinâmicas de relações sociais. Já os sites de redes sociais, como

Facebook, Instagram, Twitter etc, não são, em si, redes sociais. Recuero (2009) explica que eles são

espaços de expressão e exibição das redes sociais na internet, em que construímos uma persona (um

perfil) e nos engajamos nesses espaços, por meio de interações como comentários, curtidas e

compartilhamentos.

Ao refletirmos sobre compartilhamentos de conteúdos, trazemos Jenkins (2014), autor que

trata da propagabilidade dos conteúdos nos espaços digitais. Sob a máxima de que aquilo que não se

propaga, morre, o autor destaca a importância e a necessidade de um conteúdo se propagar, para que

seu valor e seu significado sejam alterados. Quanto mais gente discutir, propagar, compartilhar,

criticar, comentar, mais valor o conteúdo terá. A partir disso, Jenkins (2014) entende as mídias

digitais como catalisadoras para reconceituar outros aspectos da cultura, como as relações sociais, a

participação cultural e política, as expectativas econômicas e as estruturas legais.

Ao refletir sobre as marcas no contexto digital apresentado acima e a relação dos

consumidores nesses espaços, Sato (2015) nos conta que os consumidores estão cada vez mais

críticos e céticos aos discursos das marcas. Paralelo a isso, afirma que não há mais espaço para a

abstenção e, logo, é demandado que as marcas se posicionem. As marcas, por sua vez, devem ter

consciência disso, para garantir boas relações. Para tanto, acreditamos que precisam sempre ajustar as

três dimensões chave, apresentadas por Semprini (2009): semiótica, relacional e evolutiva.

Ao pensar sobre a dimensão semiótica, marcas devem lembrar que se trata de construir e de

veicular significados, considerando as narrativas publicitárias e comerciais mais explícitos. No

entanto, deve considerar, principalmente, as articulações discursivas que constroem ao longo do

tempo e que, na perspectiva do autor, são fundamentais. A natureza semiótica auxilia a marca a

escolher significados que estão presentes no espaço social, organizá-los em uma narrativa pertinente

e atrativa e os oferecer ao público.

Já a dimensão relacional privilegia a ideia que a marca deve considerar os diversos públicos

que são envolvidos por seu projeto, não apenas seu público alvo, não apenas aqueles que lucram com

isso, mas, além disso, público dos concorrentes, por exemplo. Semprini (2009) destaca, inclusive, a

internet como espaço de ampliação da audiência da marca, fazendo com que, novamente, precise

garantir formas de conversar com os internautas (consumidores e não consumidores). Por fim, a

dimensão evolutiva destaca o caráter mutável e dinâmico da marca, que a permite reagir e ser

sensível às mudanças que se passam no ambiente social em que se faz presente. Além disso, essa

dimensão privilegia a história da marca ao longo do tempo (considerando sua natureza semiótica e o

que construiu ao longo do tempo). De toda forma, Semprini (2009) atenta para o fato de que a marca

deve conseguir se adaptar às evoluções do sistema, permanecendo fiel a ela mesma, a sua história e

personalidade, mas com certa flexibilidade ao seu projeto original. A partir disso, o autor destaca a

inovação e a criatividade como fundamentais para a atualização e relevância da marca no espaço

social.

Considerando a dimensão evolutiva, que destaca as mudanças que se dão no ambiente,

podemos ver que parte da realidade atual é a presença no espaço digital. Isso é praticamente um

requisito de marcas que querem estar em sintonia com os consumidores e suas demandas. Tendo isso

em mente, julgamos importante destacar que as campanhas selecionadas para este artigo (assim como

as estudadas na pesquisa original) vêm todas do ambiente digital.

CAMPANHAS DA SKOL

Embora no trabalho monográfico original tenhamos analisado vinte campanhas ao todo, no

período de 2009 até julho de 2017, destacamos, aqui, três momentos específicos, porém importantes

para a história recente da marca que dizem respeito, de maneira mais direta, ao público feminino.

Considerando a extensão do projeto original e a limitação de espaço que o evento para o qual este

artigo é destinado coloca, fazemos esforço de reduzi-lo, destacando partes da pesquisa inicial que

consideramos interessantes para colocar em discussão.

Campanha Treino – Operação Skol Folia (2013)

O filme4 mostra um general, um homem negro que representa uma figura agressiva e

intimidadora, treinando seu exército de homens para a folia do carnaval. Dentre as atividades

retratadas – com a lata de Skol ou coolers de cerveja sempre presentes – há treinos com obstáculos

(como agarrar-se em cordas para passar sobre uma poça d’água), marchas de soldados, flexões com

cooler nas costas e com o general esguichando água no rosto, atravessar um rio com caixa de cerveja

sob a cabeça, escapar de “homens” desenhados em sacos de luta e beijar “mulheres” (Figura 1)

desenhadas nos sacos de mesmo tipo, arrastar-se pelo chão com uma lata de Skol na mão, sem deixar

bebida cair, beijar manequins femininos (Figura 2), fazer danças coordenadas. 4 Publicado no canal da marca no YouTube dia 6 de janeiro de 2013 e que obteve 791.901 visualizações (10/10/2017 às 19h39).

As cenas são dinâmicas, sempre curtas e retratam cada uma das atividades narradas acima. Ao

longo de todo o comercial só há homens, com a exceção de uma mulher que supervisiona os homens

na cena em que estão treinando como beijar mulheres (que são retratadas com manequins). Há, ainda,

cenas em que todo o grupo está na floresta e, novamente, precisa cuidar para que a cerveja não caia

no chão e, portanto, seja desperdiçada. A cena final mostra um soldado, vestido de roupas especiais

para homens que desativam bombas, andando em sentido de um manequim. Ele anda cautelosamente

e sua respiração é apreensiva. Ele chega ao manequim, que veste apenas um sutiã, com um alicate e

seu objetivo é tirar o alicate e, assim, tirar o sutiã. Quando ele encosta com o alicate no fecho do sutiã

para abri-lo, há um som de explosão, a tela fica preta e o comercial termina. Falas do comercial: General: tira o pé do chão. [Exército grita ao fundo]. General: vai até o chão. Mais animação. Beija, beija. Pede água. [Soldado responde: não senhor”]. Narrador: começou a operação Skol Folia, e esse ano você pode ser o general dos melhores carnavais do Brasil. Entre no site e aliste-se na promoção.5

Figura 1 - Desenho de mulher para ser beijado

Fonte: captura de tela do vídeo no YouTube.6

5 YOUTUBE. Campanha “Treino Operação Folia” da Skol. 2013. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=-ghRd5DJnkE> Acesso em: 11 out. 2017. 6 Idem.

Figura 2 - Soldados treinando como beijar manequins femininos

Fonte: captura de tela do vídeo no YouTube.7

Ainda que o comercial prepare um grupo para uma folia, um evento animado, as cenas do

filme nos trazem algumas observações. Identificamos o caráter machista ao longo de todo o

comercial, ora de maneira menos explícita, ora de maneira evidente. Implicitamente, a ideia de que o

carnaval e toda a folia que ele promete está única e estritamente ligada a homens, que precisam ser

treinados, de forma dura, para cuidar da bebida, para estar em forma e para saber beijar mulheres é

machista. A partir disso, a mensagem que se segue, portanto, é de que o carnaval (e o protagonismo

no evento) está restrito a eles e, dessa maneira, é necessário treinar, sob a orientação de um general

duro e “macho”, para se tornar um soldado exemplar e farrear de maneira apropriada. Explicitamente,

fica evidente o desrespeito quando um dos próprios requisitos para que o soldado seja bem sucedido

durante sua atuação no carnaval é beijar mulheres, a ponto de ter que treinar para isso para obter

excelência. A representação da figura da mulher por meio de (1) sacos de luta com um desenho

feminino – que carrega o padrão de uma mulher de cabelos lisos, magra, com cintura fina, peitos e

quadris largos, com uma curvatura voluptuosa e, portanto, considerada sensual – que precisam ser

beijados e também por meio de (2) manequins – carecas, sem roupa, brancos e magros – que também

devem ser beijados é, no mínimo, desrespeitosa e irreal. Além disso, a única mulher humana que

aparece no comercial tem a função de observar os homens que beijam os manequins, garantindo que

eles façam um “bom trabalho”.

7 YOUTUBE. Campanha “Treino Operação Folia” da Skol. 2013. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=-ghRd5DJnkE> Acesso em: 11 out. 2017.

Carnaval de 2015

Depois de direcionarmos nossa atenção para a comunicação mais antiga da Skol a partir da

campanha de 2013, continuamos com a nossa pesquisa documental. Buscamos, em seguida,

momentos que parecessem marcantes e/ou significativos para a mudança da comunicação da Skol.

Nesse sentido, identificamos o carnaval de 2015 e a campanha feita pela marca como um momento

importante. Dessa forma, compilamos, a seguir, algumas notícias que apareceram na mídia narrando

o ocorrido.

A notícia8, de fevereiro de 2015, do Pragmatismo Político destaca a reação de duas feministas

à campanha de carnaval divulgada pela Skol. Segundo a matéria, a publicitária e ilustradora Pri

Ferreira e a jornalista Mila Alves ficaram indignadas com o teor da mensagem da campanha – que

trazia frases machistas como “Esqueci o ‘não’ em casa.” e “Topo antes de saber a pergunta.” – e

fizeram uma intervenção nas peças da campanha da marca, acrescentando “e trouxe o NUNCA”.

Ambas postaram a intervenção nos sites de rede social Facebook (Figura 3) e Instagram, que tiveram

repercussão significativa a ponto de a marca anunciar a retirada dos anúncios. Além disso, a matéria

traz o comunicado oficial lançado pela Ambev, holding dona da Skol: “As peças em questão fazem

parte da nossa campanha ‘Viva RedONdo”, que tem como mote aceitar os convites da vida e

aproveitar os bons momentos. No entanto, fomos alertados nas redes sociais que parte da nossa

comunicação poderia resultar em um entendimento dúbio. E, por respeito à diversidade de opiniões,

substituiremos as frases atuais por mensagens mais claras e positivas, que transmitam o mesmo

conceito. Repudiamos todo e qualquer ato de violência seja física ou emocional e reiteramos o nosso

compromisso com o consumo responsável. Agradecemos a todos os comentários.”

8 PRAGMATISMO POLÍTICO. Ativistas criticam nova propaganda de carnaval da Skol. 2015. Disponível em: <https://www.pragmatismopolitico.com.br/2015/02/ativistas-criticam-nova-propaganda-de-carnaval-da-skol.html> Acesso em: 26 jun. 2017.

Figura 3 - Publicação da Pri Ferrari no Facebook

Fonte: captura de tela da publicação no Facebook.

Em seguida, a notícia9, de fevereiro de 2015, do portal B9, conta que a Skol retirou peças

feitas para a campanha do carnaval de 2015 e as substituiu por peças que incentivassem o respeito

(Figura 4). De acordo com a notícia, o “barulho causado por mulheres deu resultado, e a marca

mudou o tom das mensagens”. Figura 4 - Peças colocadas depois dos protestos

Fonte: notícia da B9.10

9 B9. Skol volta atrás e troca peças de campanha de carnaval por opções que incentivam o respeito. 2015. Disponível em: <http://www.b9.com.br/55260/advertising/skol-volta-atras-e-troca-pecas-de-campanha-de-carnaval-por-opcoes-que-incentivam-o-respeito/> Acesso em: 26 jun. 2017. 10 B9. Skol esbanja diversidade em novo comercial viva a diferença. 2017. Disponível em: <http://www.b9.com.br/70151/skol-esbanja-diversidade-em-novo-comercial-viva-diferenca/> Acesso em: 7 out. 2017.

Percebemos, especificamente neste episódio, a relevância dos sites de redes sociais como

importantes meios de expressão e de contestação dos internautas (no caso de mulheres insatisfeitas

com o conteúdo entendido de uma campanha). Como Lévy e Lemos (2010) abordam, os indivíduos

adquirem condição de protagonistas e têm liberdade para, dentre outras coisas, circular quaisquer

conteúdos que julgarem pertinentes. Além disso, destacamos, como abordado por Jenkins (2014), a

capacidade e importância de propagação de mensagens desses sites, a ponto de uma publicação

alcançar milhares de pessoas no mesmo dia em que foi postada e, também, chegar rapidamente na

marca. Nesse sentido, reconhecemos, ainda, a movimentação da Skol de responder oficialmente ao

ocorrido com a nota, de entrar em contato com as mulheres que inicialmente denunciaram a

campanha e, finalmente, de trocar os materiais, produzir e veicular novos rapidamente.

Campanhas Carnaval de 2017 e Reposter

Depois do episódio acima relatado, percebemos uma mudança drástica na comunicação da

Skol, com um posicionamento claro voltado para a diversidade. Com esta mudança, os principais

públicos contemplados passaram a ser mulheres, pessoas portadoras de deficiências, pessoas negras,

pessoas com diferentes padrões de corpos e LGBTs11. Considerando nosso recorte para o presente

artigo, focamos nossa atenção ao público feminino. Sendo assim, vimos que a marca realizou duas

ações significativas relacionadas ao público feminino em 2017.

A primeira delas, chamada “Apito de Respeito” foi a reprodução de uma ação de um grupo de

São Luiz do Paraitinga. Três meninas decidiram distribuir apitos para mulheres no carnaval de sua

cidade para que, se a mulher se sentisse assediada, apitasse. Isso era uma forma de mostrar ao

assediador que ele estava exagerando, além de chamar a atenção de mulheres ao entorno para que

pudessem ajudar caso ela estivesse em uma situação de desconforto, ou até mesmo de perigo. A Skol

decidiu, assim, dar amplitude ao movimento dessas meninas e levou a ação para todas as praças em

que a marca patrocinou o carnaval: São Paulo, Belo Horizonte, Florianópolis, Salvador, Recife, entre

outras.

11 Sigla que designa pessoas Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneras e Transexuais.

A matéria12 da Revista Glamour anuncia que a marca amplia a iniciativa das meninas e traz a

fala da Maria Fernanda de Albuquerque, diretora de marketing da marca. “Há algum tempo, a Skol

vem incorporando essa mensagem de respeito, inclusão e valorização da diversidade. E estamos

aprendendo muito com esse processo. Desde a Parada LGBT de São Paulo, tem sido uma jornada

muito humana e que ainda irá render muito. O carnaval não poderia ficar de fora e queríamos fazer

algo. Quando soubemos do projeto da Lia, Marina e Amanda, quisemos entender como participar.

Junto com as meninas encontramos uma forma de começar a dar mais visibilidade à essa questão e

aproveitar para incentivar todas as pessoas a se divertir com mais respeito”.

A segunda ação diretamente relacionada ao público feminino foi a campanha Reposter, que

convidou seis ilustradoras, exibidas na Figura 6 a seguir, (Eva Uviedo, Criola, Camila do Rosário,

Elisa Arruda, Manuela Eichner e Carol Rosseti) para ressignificarem pôsteres antigos e machistas da

marca (Figura 5) sob seus olhares. O filme13 da campanha, postado na página do Facebook da Skol

no Dia Internacional da Mulher (celebrado oito de março) e no canal do YouTube da marca dia nove

de março obteve mais de 97 mil visualizações e, no Facebook, mais de 7,8 milhões de visualizações

(08/10/2017 às 21h).

O narrador fala: Essas imagens fazem parte do nosso passado. O mundo evoluiu e a Skol

também. E isso não nos representa mais. Em seguida, aparecem os textos: “Skol apresenta:

Reposter. Seis ilustradoras. Recriando pôsteres antigos de Skol. Sob um novo olhar.” As artistas

comentam, ao longo do vídeo: “Eu aceitei esse convite porque é importante desconstruir o

estereótipo, os preconceitos”. “Uma coisa que eu tive muita vontade de fazer foi tirar a mulher de ser

a pessoa que tá servindo a cerveja. Não. Ela tá tomando a cerveja.” “Que bom que a gente tá aqui pra

dialogar sobre isso, porque eu acho que o primeiro passo é o diálogo”.

O vídeo encerra fazendo um convite a todas as pessoas para avisarem a marca se virem algum

pôster antigo e machista. Além disso, criou um site14 para que outras mulheres pudessem

ressignificar cartazes antigos.

12 REVISTA GLAMOUR. Campanha contra assédio vai distribuir 50 mil apitos para mulheres em blocos de carnaval no país. 2017. Disponível em: <http://revistaglamour.globo.com/Lifestyle/Must-Share/noticia/2017/02/campanha-contra-assedio-vai-distribuir-50-mil-apitos-para-mulheres-em-blocos-de-carnaval-no-pais.html> Acesso em: 8 out. 2017.13 YOUTUBE. Campanha Reposter da Skol. 2017. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=g_8fnMtbdso> Acesso em: 8 out. 2017. 14 SKOL. Site Reposter. 2017. Disponível em: <http://www.skol.com.br/reposter/> Acesso em: 8 out. 2017.

Figura 5 - Pôsteres antigos de campanhas Skol

Fonte: captura de tela do vídeo no YouTube.15

Figura 6 - Artistas da campanha Reposter

Fonte: captura de tela do vídeo no YouTube.16

Nesse sentindo, fica explícita a diferença de como a marca se relaciona com o público

feminino. As mulheres de Apito de Respeito e de Reposter são ouvidas pela marca, que lhes dá

espaço e protagonismo para suas atuações. Na primeira campanha, a Skol toma o cuidado de entender

que a causa era das meninas, mas demonstra preocupação em ampliar suas vozes e suas ações. Já na

segunda, a marca reconhece notadamente que errou e, por conta disso, pede ajuda a mulheres para

ressignificarem comunicações antigas com uma abordagem de respeito.

15 YOUTUBE. Campanha Reposter da Skol. 2017. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=g_8fnMtbdso> Acesso em: 8 out. 2017. 16 Idem.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Olhando para os momentos distintos das peças discutidas, podemos perceber, portanto, que

fica evidente que a marca se posiciona e se transforma, mudando seu tom de voz e a forma como

retrata e lida com mulheres. Ela chega, inclusive, a reconhecer que errou e afirma que as imagens do

passado não lhes representam mais (fazendo referência aos pôsteres antigos de Reposter, mas por que

não também às representações da campanha de 2013?). A partir disso, fala que redondo é sair do seu

passado, redondo é pensar em coisas novas, e convida, inclusive, as pessoas a entrarem em contato,

caso encontrassem algum daqueles cartazes antigos. Interessante destacar relação entre a postura da

Skol com a explicação de Semprini (2009) vista anteriormente sobre a necessidade da marca assumir

sua história e seu passado para, com inovação e criatividade, conseguir evoluir. O autor afirma que o

caráter inovador e criativo só é possível a partir de um projeto de marca que seja sólido e consistente,

mas que permita à marca adaptações. Vemos, assim, que a marca começa a demonstrar credibilidade

na sua mensagem de respeito à diversidade, visto que inicia a construção de uma narrativa para

estabelecer a confiança entre as pessoas, mostrando que seu projeto pretende ser sólido, consistente e

duradouro.

REFERÊNCIAS

JENKINS, Henry. Cultura da conexão: criando valor e significado por meio da mídia propagável./ Henry Jenkins, Sam Ford e Joshua Green; tradução Patrícia Arnaud. São Paulo: Aleph, 2014. LEMOS, André.; LÉVY, Pierre. O futuro da Internet: em direção a uma ciberdemocracia planetária. São Paulo: Paulus, 2010. RECUERO, Raquel. Redes sociais na internet. Porto Alegre: Sulina, 2009. SATO, Silvio. Koti. Mobilidade, comunicação e consumo: expressões da telefonia celular em Angola, Brasil e Portugal. São Paulo: S. Sato, 2015. SEMPRINI, Andrea. A Marca pós-moderna: poder e fragilidade da marca na sociedade contemporânea. Tradução Elisabeth Leone – 2. ed. São Paulo: Estação das Letras e Cores, 2009