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FACULDADE DE DIREITO MILTON CAMPOS A TRANSFERÊNCIA INVOLUNTÁRIA DE QUOTAS E SEUS REFLEXOS NO EXERCÍCIO PRECÁRIO DOS HERDEIROS: Administradores das Sociedades Limitadas ROSILENE GOMES DA SILVA GIACOMIN Nova Lima 2011

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FACULDADE DE DIREITO MILTON CAMPOS

A TRANSFERÊNCIA INVOLUNTÁRIA

DE QUOTAS E SEUS REFLEXOS

NO EXERCÍCIO PRECÁRIO DOS HERDEIROS:

Administradores das Sociedades Limitadas

ROSILENE GOMES DA SILVA GIACOMIN

Nova Lima

2011

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FACULDADE DE DIREITO MILTON CAMPOS

A TRANSFERÊNCIA INVOLUNTÁRIA

DE QUOTAS E SEUS REFLEXOS

NO EXERCÍCIO PRECÁRIO DOS HERDEIROS:

Administradores das Sociedades Limitadas

Dissertação apresentada à Faculdade de Direito Milton Campos como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre.

Área de concentração: Direito Empresarial

Orientador: Prof. Dr. Salomão de Araujo Cateb.

Nova Lima

2011

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G429t Giacomin, Rosilene Gomes da Silva

A transferência involuntária de quotas e seus reflexos no exercício precário dos herdeiros: administradores das sociedades limitadas / Rosilene Gomes da Silva. -- Nova Lima: Faculdade Milton Campos, 2011.

181 f. enc.

Orientador: Prof. Dr. Salomão de Araujo Cateb

Dissertação (mestrado) Dissertação para obtenção do título de Mestre, área de concentração Direito Empresarial.

Bibliografia: f. 107-110

1. Sociedade limitada. 2. Sucessão. 3. Administração precária de quotas. 4. Herdeiro. 5. Transferência involuntária. I. Cateb, Salomão de Araujo II. Faculdade de Direito Milton Campos III. Título

CDU: 347.724

Ficha catalográfica elaborada por Maria de Lourdes Bissa Vieira – CRB - 6 / 1943

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Faculdade de Direito Milton Campos – Mestrado em Direito Empresarial

Dissertação intitulada “A transferência involuntária quotas e seus reflexos no exercício precário dos herdeiros – administradores das sociedades limitadas”, de autoria da mestranda Rosilene Gomes da Silva Giacomin, para exame da banca constituída pelos seguintes professores:

__________________________________________ Prof. Dr. Salomão de Araujo Cateb (Orientador)

__________________________________________ Prof. Dr. Rodolpho Barreto Sampaio Júnior (Examinador)

__________________________________________ Prof. Dr. Adriano Stanley Rocha Souza (Examinador)

__________________________________________ Prof. Dr. Luiz Fernando da Silveira Gomes (Suplente)

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Para meus filhos, Camila, Guilherme e Mateus,

e minha mãe, amor incondicional e verdadeiro.

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AGRADECIMENTOS

Ao nosso Pai Maior e eterno, por ter me protegido na locomoção da

temerosa BR-381 e dado forças para prosseguir.

À professora Tereza Mafra, sob cuja inspiração me construí pesquisadora,

na certeza de que ainda tenho muito a aprender.

Ao mestre Dr. Jesus Nascimento, que não limitou esforços, deferindo todos

os meus pedidos de dispensa, apoiando-me nesta jornada.

Ao meu marido, pelo amor e amparo na ausência com os meus estudos e

viagens, acreditando sempre que era possível.

À minha doce amiga, Brenda, pelo companheirismo e confiança em abrir as

portas do seu lar, acolhendo-me em momentos difíceis, em que o corpo precisava

de um bom banho e descanso para aguentar a jornada das aulas.

À Priscila, pela dedicação incondicional, e aos anjos do asfalto, Dadá e

Índio.

Aos amigos (...), família que me permiti escolher, porque acreditaram neste

projeto audacioso; obrigada.

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AGRADECIMENTO ESPECIAL

Ao professor Salomão Cateb, pela orientação e

transferência de seus conhecimentos. Admiradora do

seu trabalho como escritor, pesquisador e profissional

especializado na área de sucessões, nem nos meus

melhores sonhos poderia imaginar que um dia teria a

honra de participar deste trabalho.

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RESUMO

Em meio a divergências discutidas no âmbito das sociedades por quotas de responsabilidade limitada e à grandeza do tema proposto, desenvolveu-se um processo investigativo, notadamente envolvendo as relações entre a sociedade, os sócios e os terceiros envolvidos, com inúmeros pontos de intersecção, haja vista a precariedade exercida pelos herdeiros quando assumem a administração. O exercício da administração é precário porque é feito por herdeiros ainda não definidos como sócios, com participação específica na sociedade limitada. A morte do sócio apresenta-se como hipótese de ruptura parcial dos vínculos societários aos sócios supérstites. Ocorrendo sucessão à causa de morte, haverá automaticamente a transferência involuntária dos bens arrecadados aos seus herdeiros, formando uma universalidade. Conveniente destacar que, por força do falecimento e da ausência de manifestação de vontade negocial do sócio detentor das quotas envolvidas, o momento de se passar o bastão ao herdeiro poderá incorrer na dissolução, exclusão e extinção da quota-parte, deixado ao sucessor como última disposição de vontade, se o contrato social for silente, como se fosse um legado. Ressalta-se que o herdeiro legítimo sempre será um sucessor e nunca o legatário. A legislação em vigor não determina ou aceita que, com a morte, o herdeiro assuma imediatamente as atividades na sociedade. As quotas do sócio já falecido integrarão o monte partível, depois de apurados os haveres e os deveres. A precariedade da administração do sucessor, quando o contrato social não dispuser diferente, será o deslinde desta pesquisa científica.

Palavras-chave: Sociedade limitada. Sucessão. Administração precária de quotas. Herdeiro. Transferência involuntária.

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ABSTRACT

Among the differences discussed in the context of limited liability companies and limited liability to the magnitude of the theme, an investigative process was developed, notably involving the relationships between society, partners and others involved, with numerous points of intersection, given the precariousness exercised by the heirs when they take on the administration. The exercise of management is precarious because it is made by heirs still not defined as members with specific roles in the limited partnership. The death of a partner is presented as a hypothesis of a partial rupture of corporate bonds for partners survivors. Occurring succession to the cause of death, involuntary transfer will be automatically collected assets to their heirs, forming a universality. It is convenient to point out that, by virtue of the death and the absence of consent from negotiating partner holder of the shares involved, the time to pass the baton to the heir may incur in the dissolution, exclusion and extinction of the share, left to the successor of such provision will, if the social contract is silent, like a legacy. It is noteworthy that the rightful heir will always be a legitimate heir and successor and never the caliph. The legislation in force does not determine or accept that with the death, the heir immediately takes the activity in society. The shares of a deceased partner will integrate the partible mount, after the clearing of the assets and obligations. The precariousness of the administration of his successor, when the social contract does not provide otherwise, will be the demarcation of this scientific research.

Key words: Company limited. Succession. Poor administration of quotas. Heir. Involuntary transfer.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CBD Companhia Brasileira de Distribuição

CC Código CIvil

CPC Código de Processo Civil

DNRC Departamento Nacional de Registro do Comércio

PIB Produto interno bruto

S/A Sociedade anônima

SEBRAE Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas

STJ Superior Tribunal de Justiça

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

QUADRO 1 Percentual de constituição de sociedade limitada no Brasil.......

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QUADRO 2 Comparativo entre o Código Civil em vigor e a Lei nº. 6.404/76 98

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LISTA DE TABELA

TABELA 1 Percentual de constituição de empresas e as alterações

efetivadas................................................................................................. 57

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SUMÁRIO1

1 INTRODUÇÃO .......................................................................................... 13

2 DAS SOCIEDADES LIMITADAS ................................................................. 18

2.1 Breve contexto histórico.................................................................................. 19

2.2 Legislação aplicável ........................................................................................ 23

2.3 A manifestação de vontade nos atos negociais............................................. 24

2.4 Aspectos relevantes da sociedade limitada no sistema brasileiro ................ 27

3 O DIREITO SUCESSÓRIO ........................................................................... 30

3.1 Breves anotações do instituto ......................................................................... 30

3.2 Aspectos históricos.......................................................................................... 31

3.3 Droit de saisine............................................................................................ 35

3.4 Os herdeiros ................................................................................................ 36

3.5 Espécies da sucessão..................................................................................... 37

3.6 Sobre o objeto da sucessão ................................................................................38

3.7 A vocação hereditária legítima .................................................................... 38

4 SUCESSÃO POR ATO INTER VIVOS ....................................................... 40

4.1 Sociedades familiares..................................................................................... 41

4.2 Ato voluntário e cessão de quotas no Direito brasileiro ............................... 44

4.2.1 Estrutura das quotas na sociedade limitada ................................................. 44

4.2.2 Natureza jurídica das quotas ......................................................................... 46

4.2.3 Direito comparado ........................................................................................... 47

4.3 Cessão de quotas entre sócios e em favor de terceiros................................ 50

4.3.1 Análise sobre a cessão de quotas e contrato social...................................... 53

4.4 Da transferência voluntária de quotas............................................................ 56

4.4.1 Direito comparado ........................................................................................... 58

4.4.2 O direito de preferência .................................................................................. 59

1 Este trabalho foi revisado de acordo com as novas regras ortográficas aprovadas pelo Acordo Ortográfico assinado entre os países que integram a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), em vigor no Brasil desde 2009.

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5 VIÉS CONSTITUCIONAL: ANOTAÇÕES.................................................. 61

5.1 Princípios constitucionais do Direito de Família............................................. 61

5.2 Princípio da dignidade da pessoa: humana e jurídica ................................... 62

5.3 Princípio da afetividade................................................................................... 64

5.4 Princípio da igualdade..................................................................................... 65

5.5 Princípio da preservação da empresa...........................................................66

5.6 Aplicações às limitadas do princípio da companhia próspera presente nas

sociedades anônimas.................................................................................. 67

6 TRANSFERÊNCIA INVOLUNTÁRIA DE QUOTAS .................................... 68

6.1 Do sócio quotista ............................................................................................. 68

6.2 Da capacidade de ser sócio............................................................................ 69

6.3 Falecimento do sócio ...................................................................................... 72

6.4 Apuração de haveres ...................................................................................... 73

6.5 Penhora de quotas .......................................................................................... 79

6.6 Resolução da sociedade em relação ao sucessor ....................................... 82

6.7 Ausência de affectio societatis e a exclusão de sócio ................................. 85

7 ANÁLISE DOS REFLEXOS DA ADMINISTRAÇÃO NA INTEGRAÇÃO DO

SUCESSOR NA SOCIEDADE LIMITADA .................................................. 88

7.1 A administração provisória do autor da herança......................................... 88

7.2 A rejeição dos sócios remanescentes à integração do adquirente na

sociedade .................................................................................................... 90

7.3 A administração da sociedade limitada: apanhado entre o Decreto Lei n°

3.708/1919 e o Código Civil de 2002 .......................................................... 92

7.4 Direito estrangeiro ....................................................................................... 99

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................... 102

REFERÊNCIAS...................................................................................................... 105

ANEXOS.................................................................................................................109

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1 INTRODUÇÃO

A escolha deste estudo deve-se ao interesse pelo aperfeiçoamento do Direito

Societário acumulado em interação com o Direito Sucessório e sua interferência

na administração de uma sociedade limitada.

A transferência involuntária de quotas traz à baila desde a importância do papel

do magistrado na interpretação normativa e aplicação do direito no caso concreto

aos poderes inerentes ao sucessor - que poderá ser nomeado o próprio

inventariante, pelo magistrado da causa, para assumir o cargo de sócio, mas com

administração precária e limitação de poderes na sociedade limitada - até a

partilha.

Sob esse enfoque e considerando-se a possibilidade do tema proposto, os

herdeiros, após o falecimento do sócio quotista, passam a integrar uma sociedade

limitada que já está em pleno funcionamento. Essa administração é temporária,

até a decisão final do processo de inventário, e por isso é considerada precária.

Considera-se na análise desta pesquisa a integração do sucessor e sua afinidade

no seguimento do negócio jurídico, em paralelo com a economia, administração

de empresa e contabilidade, não sendo função exclusivamente jurisdicional, mas

de quem suportar o encargo da sucessão.

Urge salientar preliminarmente que a função de uma sociedade é norteada por

princípios fundamentais vigentes, como o de preservação da empresa. A

sociedade se reveste como instituição estruturada para a produção e a circulação

de bens e serviços, admitindo ou não o lucro, o que será questionado à luz de

outros princípios constitucionais, em detrimento de valores éticos que tenham por

escopo a valorização da dignidade da pessoa humana.

A análise será realizada no âmbito do Direito Empresarial, notadamente no das

sociedades por quotas de responsabilidade limitada, nas quais, não havendo no

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contrato social previsão de falecimento do sócio e substituição de um sucessor

para integrar a sua quota social, haverá a transferência involuntária de quotas aos

herdeiros, cabendo aos intérpretes recorrer à norma vigente. Suprime-se, assim,

a completa ausência de manifestação de vontade negocial do sócio detentor das

quotas.

Inicialmente, considerando a hipótese de falecimento de sócio consignada no

artigo 1.028 do Código Civil (CC)2, as quotas de uma sociedade (uma parcela

indivisível do capital) transferem-se imediatamente a seus herdeiros por força de

sucessão. E, ainda, em face da previsão legal do atual artigo 1.784 do Código

Civil de 20023 e do então revogado artigo 1.572 do CC de 1916.4

A sintonia entre esse direito sucessório é verdadeira em se tratando de abertura

da sucessão, mas, voltando os olhos para o direito societário, tem-se que

considerar que os bens arrecadados formam uma universalidade e somente será

desfeita com a partilha. Até esse momento, os herdeiros serão considerados

donos de todo o patrimônio, sem exclusão5.

Nesse sentido, o falecimento do sócio poderá acarretar a liquidação das quotas

entre os herdeiros ou a apuração dos respectivos haveres, que calcula qual

parcela do patrimônio da sociedade corresponde às quotas do ex-sócio, em favor

do espólio.

2 Art. 1.028. No caso de morte de sócio, liquidar-se-á sua quota, salvo: I - se o contrato dispuser diferentemente; II - se os sócios remanescentes optarem pela dissolução da sociedade; III - se, por acordo com os herdeiros, regular-se a substituição do sócio falecido. 3 LEI No 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002 CAPÍTULO I Disposições Gerais Art. 1.784. Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários. 4 LEI Nº 3.071, DE 1º DE JANEIRO DE 1916. Revogada pela Lei nº 10.406, de 10.1.2002 Código Civil Art. 1.572.

Aberta a sucessão, o domínio e a posse da herança transmitem-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários.

5 Art. 90, CC - Constitui universalidade de fato a pluralidade de bens singulares que, pertinentes à mesma pessoa, tenham destinação unitária. Parágrafo único. Os bens que formam essa universalidade podem ser objeto de relações jurídicas próprias.

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A sociedade limitada é vista como uma sociedade de pessoas e o ingresso de

herdeiros em sua administração afeta diretamente a affectio societatis, isto é, a

vontade de se constituir em sociedade.

Na ausência desse elemento, faltará a comunhão de interesses, que, em regra, é

considerada um pressuposto para a constituição de uma sociedade. Deverá ser

observado o contrato social previsto nos artigos 981 e 997, ambos do CC em

vigor, que disciplinam a matéria. Em seu silêncio ou se o contrato dispuser

diferentemente, as sociedades de pessoas poderão adotar a solução de

liquidação de quotas com a apuração de haveres, salvo determinação em

contrário visando à partilha das quotas.

A preocupação na abordagem é, evidentemente, de se saber quais limitações a

matéria comporta e suas repercussões em caso de dissolução, sem, no entanto,

deixar-se de lado todo o aspecto prático que o conteúdo normativo apresenta.

Apresenta-se um modelo aparente a partir do qual direcionada a pesquisa, qual

seja, nos casos em que o contrato social se mostrar silente quanto à transferência

do encargo, quando ocorrer a sucessão.

A sociedade limitada poderá ser administrada pelos herdeiros do sócio falecido,

se estes assim o quiserem, mesmo se tratando de uma faculdade, estará implícita

a continuação da sociedade limitada.

Tem-se a possibilidade de que, com base no princípio da preservação da

empresa e da presunção hominis ou facti, este último decorrente das regras de

experiência comum, os futuros sócios herdeiros legítimos poderão participar da

sociedade limitada, estabelecendo seu destino, em lugar do sócio falecido, e

podendo administrar a sociedade ao lado dos consócios remanescentes.

Considerando tal possibilidade, os herdeiros serão integrados como sócios,

poderão prosseguir com os negócios e, em comum acordo, poderão partilhar suas

quotas, evitando possíveis litígios e dissolução da sociedade, saindo da posição

precária de meros administradores para tornarem-se sócios quotistas.

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A tendência predominante dos tribunais, com base nos fatos esposados, é decidir

pela continuidade da sociedade da forma mais ampla possível. Perceber esse

ponto de partida é refletir sobre o desafio do herdeiro em administrar com a razão,

prestando contas corretamente e mantendo uma unidade familiar.

Ao se propor esta pesquisa, deseja-se, entre outras coisas, promover uma

reflexão a respeito de dois pesos que equilibram as atividades de uma sociedade

em relação aos direitos dos sócios: o direito patrimonial e o direito pessoal, que

deverão conciliar com os interesses dos herdeiros administradores, dos sócios e

das sociedades.

Já o direito pessoal é relativo à condição de sócio, ou seja, o status socii,

considerado um conjunto complexo de direitos e obrigações, podendo estas

últimas ser de ordem econômica ou social.

Assim, será ampliado o objeto deste estudo, alcançando a administração da

sociedade limitada exercida por pessoas naturais,6 em que não se admite a

delegação de poderes,7 que serão especificados na ordem judicial.

Não se exige que o administrador seja necessariamente sócio. Por isso, há a

possibilidade de o herdeiro exercer a administração da sociedade até a fase final

do processo de inventário, ou seja, até a partilha judicial, ocasião em que será

determinado o quinhão de cada herdeiro quotista e sua eventual participação na

sociedade limitada.

O artigo 997 do CC, citado anteriormente, tem como base a relação dos poderes

dos administradores, considerando uma formalidade suprível, porque o limite da

atuação do administrador estava e continua no objeto social. Será discutida a

possibilidade de haver vários administradores com poderes de representação

isolada, em que qualquer administrador poderá se opor à prática de determinado

6 Artigo 997, VI, CC – as pessoas naturais incumbidas da administração da sociedade e seus poderes e atribuições. 7 Artigo 1.018, CC – ao administrador é vedado fazer-se substituir no exercício de suas funções, sendo-lhe facultado, nos limites de seus poderes, constituir mandatários da sociedade, especificados no instrumento os atos e operações que poderão praticar.

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ato praticado por outro administrador, hipótese em que a matéria será levada à

deliberação dos sócios.8

Na perspectiva do estudo, os administradores podem agir separadamente na

representação da sociedade, cabendo-lhes praticar todos os atos de gestão que

sejam compatíveis com o objeto social.9

Este estudo é fundamentado no seguinte questionamento: em caso de

falecimento do sócio, os sucessores se tornarão quotistas, ou seja, passarão a

ser sócios? Passarão a ser administradores até a fase final do processo de

inventário? A sociedade, que provavelmente estará em operação, deverá ter sua

descontinuidade avaliada somente em relação ao sócio falecido? Em suma,

falecido o sócio, as prerrogativas pessoais do status socii não se transmitem

automaticamente aos herdeiros ou sucessores? O espólio será representado pelo

inventariante, exercendo poderes restritos? A lei determina ou aceita que, com a

morte, o herdeiro assuma imediatamente sua quota-parte na sociedade? As

quotas pertencentes ao falecido integram o monte partível, depois de apurados os

haveres e deveres? A herança será sobre o excesso, adimplidas as obrigações

do falecido?

Desse modo, avalia-se desde o marco inicial da abertura da sucessão até o limite

em que os sócios herdeiros podem exercer a administração, levando em

consideração que não possuem liberdade significativa ou representativa para

estabelecerem suas próprias regras. Todos esses pontos são analisados no

decorrer desta pesquisa científica.

8 Artigo 1.013, CC – a administração da sociedade, nada dispondo o contrato social, compete separadamente a cada um dos sócios. §1º Se a administração competir separadamente a vários administradores, cada um pode impugnar operação pretendida por outro, cabendo a decisão aos sócios, por maioria de votos. §2º Responde por perdas e danos perante a sociedade o administrador que realizar operações, sabendo ou devendo saber que estava agindo em desacordo com a maioria. 9 Artigo 1.015, CC – no silêncio do contrato, os administradores podem praticar todos os atos pertinentes à gestão da sociedade, não constituindo objeto social; a oneração ou a venda de bens imóveis depende do que a maioria dos sócios decidir. Parágrafo único. O excesso por parte dos administradores somente pode ser oposto a terceiros se ocorrer pelo menos uma das seguintes hipóteses: I - se a limitação de poderes estiver inscrita ou averbada no registro próprio da sociedade; II - provando-se que era conhecida do terceiro.

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2 DAS SOCIEDADES LIMITADAS

O realce, por natureza, será abordado na estrutura das sociedades limitadas, que

deverá ocorrer mediante um estudo suave sobre sua evolução histórica e sua

legislação, haja vista a integração com o tema proposto e as importantes

inovações no cenário jurídico brasileiro.

As necessidades naturais possuem um liame com a origem das sociedades

comerciais, na obtenção de resultados econômicos comuns.

Já em 1960, em sua obra intitulada “Sucessão nas Obrigações e a Teoria da

Empresa”, Evaristo de Moraes Filho pontua com brilhantismo:

Os processos sociais que se estabelecem entre os homens levam-nos a diferentes atitudes e situações em sua convivência: ora se aproximam, ora se repelem; ora se encontram em cooperação, ora em competição ou mesmo em conflito aberto e declarado. Manifestam-se distâncias sociais, mais ou menos fixas e constantes, que acabam por caracterizar as formas sociais. Os acontecimentos quotidianos mais diversos significam sempre uma mudança nessas relações, alterando o nexo inter-humano, seja ele um adultério, uma queda de trono, um suicídio, um casamento, a fundação de um partido ou uma falência. Altera-se o conjunto social em algum ponto.

A sociedade não diz bem dessa totalidade composta de pessoas e na qual se movem, se auxiliam, se entrechocam, se adoram e se odeiam. Por isso mesmo usam os sociólogos alemães uma expressão muito mais precisa que traduz exatamente essa ideia de dinamismo, de permanente vir-a-ser, de formação que não termina nunca – socialificação (verrgesellschaftung). E, do ponto de vista científico, atração e repulsão guardam a mesma importância como processos sociais ou inter-humanos que são. Daí também a expressão oposta: dissocialificação (unvergesellschaftung) (MORAES FILHO, 1960, p. 2).

Partindo da premissa deste contexto, da necessidade de um convívio social, de

uma sociedade limitada em pleno andamento com suas atividades, da análise e

interpretação da legislação em vigor e da falta de planejamento de uma sucessão,

mutatis muttandis, encontram-se no desenvolvimento desta pesquisa

questionamentos, resultados e um juízo de ponderação utilizado na aplicação do

direito no caso concreto.

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Sociedade por quotas de responsabilidade limitada foi assim denominada, no

Brasil e em Portugal, surgindo inicialmente para beneficiar os pequenos e médios

comerciantes na atividade econômica. “Impunha-se a criação de um tipo

societário que representasse solução conciliatória, isto é, que avaliasse a

vantagem da responsabilidade limitada à facilidade de criação e de

funcionamento” (ABRÃO, 1998, p. 22).

Singular desde sua idealização, a sociedade limitada, ao contrário dos outros

tipos societários, foi notadamente criada pelo legislador, para que posteriormente

fosse introduzida por força de lei.

Fran Martins enfatiza que talvez a única sociedade que, nesse setor, dela se

aproxime seja a sociedade em comandita por ações, igualmente introduzida no

sistema jurídico por uma medida meramente legislativa, a fim de fazer acontecer

em face de uma situação difícil para a economia francesa em certa época

(MARTINS, 1980, p. 14).

2.1 Breve contexto histórico

A história da sociedade comercial tem seus fundamentos bem no começo da

civilização, quando ainda era dividida caça e pesca, não havia contrato escrito

nem regra de conduta decidida pelas partes. Mas o chefe do clã que cuidava de

todos os familiares preocupava-se com a divisão justa e solidária, para que todos

sobrevivessem e tivessem sua própria subsistência.

O princípio de sociabilidade é inerente ao ser humano desde os primórdios.

Valores morais, éticos, religiosos têm o seu papel na formação dessas primeiras

sociedades. E mesmo sem saber já se baseavam no affectio societatis, ou seja,

afeto entre as pessoas que viviam em sociedade. E nada melhor que os próprios

componentes da família para respeitarem as regras que eram impostas como

questão de sobrevivência.

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E com grande propriedade Ihering consubstancia-se “de serem mais essenciais o

parentesco interno e a conexão dos fatos do que a conjugação exterior pelos

laços do tempo” (ESTRELA, 2004, p 9). As pessoas viviam juntas, pois

compunham uma família só, era dever do pai, chefe único, proteger os seus

contra tudo. Havia hierarquia a ser respeitada: os filhos traziam o sustento, as

mulheres trabalhavam na preparação dos alimentos, mas tudo era para todos,

criando, assim, um bem comum.

Com base nestes valores começa a origem histórica do contrato que divide os

povos em duas formas de sociedade: uma baseada na subsistência – sociedade

acidental ou momentânea – que buscava dividir tudo para todos, que deviam

contribuir com bens, trabalho ou até ambos, para poder usufruir de tudo.

Cooperativismo informal que se baseava na igualdade, todos tendo direito a

ganhos, mas também a perdas se existirem. As mulheres não compunham esse

cenário, pois pelo entendimento dos homens da época elas não tinham as

aptidões requeridas.

Outra forma de sociedade era de duração mais ou menos longa, hoje seria a

empresa familiar composta pelos membros de uma família. O pai, chefe e

responsável por todos, decidia e, caso viesse a falecer, o filho mais velho

ocuparia seu lugar. Era duradoura e não ficava presa somente à subsistência e a

decisões que precisavam ser tomadas para a manutenção daquela tribo,

havendo, assim, subordinação por parte dos entes que compunham aquela tribo

ou clã.

Mais tarde observou-se que caso o chefe viesse a morrer, os herdeiros teriam

direito às suas copropriedades e, em vez de obedecerem a um único membro,

surgiriam, assim, direitos para todos e, também, um condomínio que, por vontade

unilateral, poderia extinguir-se. Esse condomínio ou também conhecido como

consórcio familiar detinha fatores importantes a serem analisados: parentesco

comum, contribuição econômica e consentimento tácito. A questão relativa ao

parentesco comum segue a linhagem da confiança, lealdade: a França do século

XVII e XVIII já trazia sociedades de pais e filhos, mães e filhas, irmãos, irmãs; a

contribuição econômica não depende só de bens, mas também do trabalho

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24

envolvido; por último, o consentimento tácito, se todos silenciam é porque

concordam com as decisões tomadas.

Havia incansável procura para descobrir de onde vieram as sociedades

comerciais. Por mais que se relatasse a concretude dos povos primitivos, os

medievais nas explorações dos mares e continentes, o povo romano foi o que

mais sedimentado teve seus conhecimentos neste assunto. Explora-se aqui o

universo de ensinamentos romano, francês, italiano, português e brasileiro, que

até o início do século tinham legislação fraca e ultrapassada.

É certo que tudo que se aprecia hoje no direito societário veio da cultura primitiva,

passando pela Idade Média, que buscava desenvolver o comércio, chegando ao

direito romano, que analisava a sociedade como intuitu personae, criando, assim,

caráter personalíssimo que poderia vir até a dissolver a sociedade. Havia também

outros fatores que podiam levar à dissolução da sociedade, tais como a falta de

responsabilidade, incapacidade e a já citada morte do sócio.

Apesar do esfacelamento do Império Romano, a sua cultura jurídica é muita rica

quanto a assuntos relacionados à sociedade de pessoas. O conceito de

exploração da terra e colheita dos frutos foi o que mais perdurou e que fora

transplantado para códigos franceses e para quase todos os códigos

considerados modernos.

Em matéria de sociedade os romanos pensaram na sua administração, sobre

causas de dissolução, sobre nota de infâmia cominada à perda do processo,

quando a ação judiciária proposta era uma actio pro sócio, ou seja, ação de

sociedade. Até nos dias atuais ainda são utilizados.

Ainda não era possível distinguir a sociedade por quotas de responsabilidade

limitada e havia controvérsia se a sua origem era britânica ou alemã. Pois em

1857, a Inglaterra regulou um tipo de sociedade e a denominou de limited by

guarantee, pela qual os sócios respondiam até o montante do capital estipulado

no contrato, caso essa sociedade dissolvesse. Para Vilemor do Amaral, essa era

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25

uma sociedade anônima (S/A.) simplificada e não uma sociedade limitada,

vejamos:

Ao contrário do que aconteceu com os demais tipos de sociedades empresárias, que se formaram na prática, sendo, após, reguladas por leis, as sociedades por quotas, de responsabilidade limitada, foram introduzidas no Direito Comercial por decisão do legislador. Verificando-se a inexistência de uma sociedade capaz de atender aos comerciantes médios, limitando os sócios a sua responsabilidade, pois as sociedades anônimas não só requeriam um número maior de fundadores como, igualmente, tinham uma constituição demorada e trabalhosa, destinando-se, por isso, em regra geral, às grandes empresas comerciais, foi feito um movimento, na Alemanha, no sentido de ser criado, pelo legislador, novo tipo societário, sem os inconvenientes da responsabilidade ilimitada para os sócios, característica das sociedades em nome coletivo, e sem as dificuldades de constituição das sociedades anônimas. A prática inglesa já modificara a constituição das sociedades anônimas, organizando-se elas de forma privada e limitando os sócios a sua responsabilidade sem obedecer aos ditames da lei reguladora daquelas companhias, mas só em 1907 o legislador aceitou como legal esse novo tipo societário. Ao contrário disso, na Alemanha o legislador enfrentou o assunto e criou, pela lei de 20 de abril de 1892, a sociedade denominada sociedade de responsabilidade limitada, que atendia àquelas necessidades, pois apenas dois sócios poderiam constituí-la, de maneira simples, mantendo, contudo, cada um deles a responsabilidade apenas pela importância com que entrasse a formação do capital social (MARTINS, 2011, p. 211).

Já na França o problema era mais complicado, pois o governo exercia sério

controle sobre a constituição das sociedades anônimas e os demais queriam criar

uma empresa que não sofresse a intervenção governamental, mas com um

capital limitado a vinte milhões de francos. A Lei n° 1.863 foi revogada e um artigo

informou que “as sociedades limitadas poderão converter-se em sociedades

anônimas nos termos da presente lei, acomodando-se às condições estipuladas,

mediante modificação de seus estatutos” (REQUIÃO, 2011, p. 540).

Para finalizar o contexto histórico, Vilemor de Amaral busca fundamentar que um

deputado de nome Oechelhauser já procurava maneiras de reduzir as sociedades

voltadas somente para o capital e melhorar a criação de sociedades de pessoas,

cuja importância seria voltada para a pessoa e toda responsabilidade seria quanto

a esta ilimitada.

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Em 1888, Ministro do Comércio e Indústria da Prússia10, voltando a palavra ao

Legislativo, ouviu o relato daquele deputado de como seria importante para a

economia alemã atentar para uma sociedade que trouxesse em pé de igualdade

trabalho humano e capital, com o que a produção se desenvolveria em passos

largos.

E então, em 1981, foi enviado pelo Ministro da Justiça ao Congresso Alemão um

anteprojeto inspirado nas questões trazidas pelo deputado e com algumas

modificações resultou na promulgação da Lei 20 de abril de 1892 – Lei de

Sociedade Limitada (gesellschaften mit beschraeenkter Haftung). Foi este o

modelo que se disseminou pelo mundo, sendo adotado em primeiro lugar por

Portugal, em 1901.

2.2 Legislação aplicável

No Brasil, Nelson Abrão, Sylvio Marcondes e Carlos Fulgêncio da Cunha Peixoto

corrigiram oportunamente distorção histórica quanto às origens de nossa lei de

sociedades por quotas de responsabilidade limitada. Nesse equívoco incidiram

Inglez de Souza, Carvalho de Mendonça (Tratado, v. 3, n. 573, nota 1), Waldemar

Ferreira (sociedade por quotas, n. 1), Vilemor Amaral (Das sociedades limitadas,

10 A Prússia foi uma poderosa nação europeia que dominou boa parte do centro do continente no século XIX. Suas raízes, porém, vêm da Idade Média, quando o país era habitado por caçadores e criadores de gado. Do século XIII em diante, a área caiu na mão de reinos germânicos, que impuseram costumes próprios e transformaram a Prússia em uma máquina de guerra. O auge dessa fera militar ocorreu em 1871, quando o ministro-presidente prussiano Otto von Bismarck liderou a unificação dos Estados de origem germânica para criar um novo país, o Império Alemão. Depois desse processo, a Prússia passou a ser um Estado dentro do Império Alemão, com constituição própria e relativa liberdade de decisão em relação ao governo central. Essa organização começaria a ruir com a derrota alemã na Primeira Guerra, em 1918. Na ressaca da surra, o Império Alemão tornou-se uma república - que depois ganhou o nome de Alemanha - e a Prússia perdeu território para países vizinhos. As dificuldades aumentaram na década de 30, quando Hitler chegou ao governo da Alemanha. Concentrando o poder em suas mãos, o ditador acabou com a autonomia administrativa da Prússia e meteu a Alemanha na Segunda Guerra (1939-1945). Por causa da nova derrota, os nazistas foram varridos do poder e a Alemanha passou por reestruturação. Na onda da reconstrução, a Prússia deu adeus ao mapa. Em 1947, o Estado foi oficialmente abolido, perdendo seu governador e sua representação parlamentar. http://mundoestranho.abril.com.br/materia/o-que-foi-a-prussia. Acesso em 20 de março de 2011.

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n. 39), os quais confundiram a sociedade limitada, preconizada por Nabuco de

Araujo, com a sociedade limitada disciplinada pelo Decreto 3.708. Sucede que o

Projeto Nabuco de Araújo, de 1865, não visava à criação de uma nova espécie de

sociedade e seu único objetivo era libertar as sociedades anônimas da

autorização prévia do governo, a que estavam sujeitas pelo Código Comercial

(ABRÃO, 1998, p. 36).

À época, em 1912, o governo da República, por intermédio de Inglez de Souza,

que inseriu no projeto do Código Comercial um capítulo intitulado: Das

Sociedades Limitadas. Somente em 1918, com base no trabalho desenvolvido por

esse governante, o deputado Joaquim Luis Osório apresentou à Câmara dos

Deputados um projeto de lei bastante conciso, mas que foi aprovado com 19

artigos, sem debates, em 1919, como o Decreto no 3.708.

Desenvolvido e elaborado neste cenário, obteve muitas críticas devido às lacunas

e obscuridades, mas era inegável sua viabilidade. Os sócios podiam estabelecer

as regras da vida societária a partir de elaboração das cláusulas contratuais, além

da facilidade para sua constituição e funcionamento, ressaltando-se, ainda, a

limitação da responsabilidade dos sócios. Tudo isso contribuiu para que o Decreto

3.708 vigorasse com sucesso durante 84 anos, revogado pela Lei n° 10.406 em

2002, qual seja, o CC em vigor.

2.3 A manifestação de vontade nos atos negociais

Para este estudo traz-se o conceito de forma breve, mas extremamente

abrangente, em que se afirma que a sociedade se forma pela manifestação de

vontade de duas ou mais pessoas, que se propõem a unir os seus esforços e

cabedais para a consecução de um fim comum (REQUIÃO, 2011, p. 265).

À lista pode-se acrescentar a importância da natureza jurídica do ato que dá vida

à sociedade limitada:

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[...] muito importa a conceituação que se der ao ato constitutivo de sociedade comercial privada, pois de cada teoria defluem soluções diferentes, como, por exemplo, nos casos de dissolução da sociedade. Se considerarmos a sociedade como decorrente de contrato bilateral, a morte, renúncia ou exclusão de um sócio dissolve todo o vínculo contratual e a sociedade perece, o que não ocorrerá se a conceituação for desvinculada desse conceito (REQUIÃO, 2011, p. 267).

O artigo 981 do CC, em vigor, traz em seu texto legal: “celebram contrato de

sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou

serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos

resultados”.

No âmbito do Direito Empresarial, em especial no das sociedades por quotas de

responsabilidade limitada, é muito comum não haver previsão no contrato social

quando ocorre a transferência involuntária de quotas.

No caso de morte do sócio, suas quotas transferem-se automaticamente e seus

herdeiros que as recebem como bens (que se transferem por sucessão), havidos

nos termos.

Por força dos artigos 45 e 985 do CC,11 é conhecido que as sociedades adquirem

personalidade jurídica com a inscrição de seus atos constitutivos nos registros

próprios ou de sociedade de fato:

“Art. 986, CC - Enquanto não inscritos os atos constitutivos, reger-se-á a sociedade, exceto por ações em organização, pelo disposto neste Capítulo, observadas, subsidiariamente e no que com ele forem compatíveis, as normas da sociedade simples”.

Tratando-se de sociedade de direito ou de fato, tanto uma como outra têm o

acordo de vontades entre pessoas, ainda que informal. Pode-se considerar como

11 Art. 45, CC - Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo, averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo. Parágrafo único. Decai em três anos o direito de anular a constituição das pessoas jurídicas de direito privado, por defeito do ato respectivo, contado o prazo da publicação de sua inscrição no registro.

Art. 985, CC - A sociedade adquire personalidade jurídica com a inscrição, no registro próprio e na forma da lei, dos seus atos constitutivos (arts. 45 e 1.150).

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princípio basilar para a formação inicial de uma sociedade limitada o affectio

societattis.

O Contrato tem por finalidade cumprir sua função social. À luz dos ensinamentos

do professor Rodolfo temos que:

Polêmica, a função social dos contratos que semeou a discórdia entre a doutrina, especialmente pela dificuldade que se verifica em atribuir-se uma definição precisa a esse termo, o que, aliás, deveria ser uma de suas maiores qualidades. Com efeito, uma das características do novo Código Civil é a utilização de cláusulas gerais, isto é, de termos cujo sentido e alcance não foram previamente estabelecidos pela Ciência do Direito e que conferem ao magistrado a possibilidade de, no caso concreto, decidir conforme as circunstâncias. (Sampaio Júnior, 2009, p.82)

No QUADRO 1 apresenta-se o último demonstrativo disponível no portal da Junta

Comercial do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior,

notadamente do Departamento Nacional de Registro do Comércio (DNRC),

fazendo constar o percentual de constituição de sociedade limitada no Brasil:

Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior Secretaria de Comércio e Serviço Departamento Nacional de Registro do Comércio – DNRC

CONSTITUIÇÃO DE SOCIEDADES LIMITADAS POR ESTADO E REGIÃO - 2000-05

REGIÃO/ESTADO 2000 2001 2002 2003 2004 2005

NORTE 8.885

9.369

7.951

8.193

8.176

9.071

Acre 321

323

286

342

273

298

Amapá 266

310

266

467

293

370

Amazonas 1.316

1.365

1.256

1.249

1.116

1.251

Pará 3.733

3.947

3.223

3.152

3.262

3.675

Rondônia 1.723

1.679

1.490

1.592

1.757

1.797

Roraima 301

351

226

241

235

260

Tocantins 1.225

1.394

1.204

1.150

1.240

1.420

NORDESTE 33.016

34.390

31.241

29.516

28.453

31.656

Alagoas 1.567

1.399

1.282

1.197

1.311

1.364

Bahia 12.501

12.948

11.639

10.509

10.706

11.793

Ceará 3.841

4.075

4.014

3.863

3.752

4.219

Maranhão 2.076

2.775

2.028

1.897

1.645

1.900

Paraíba 2.007

2.027

2.002

1.401

1.233

1.431

Pernambuco 6.069

6.226

5.808

4.914

5.240

5.451

Piauí 1.141

1.296

1.074

979

937

1.068

Rio Grande do Norte 1.745

1.828

1.829

3.211

1.858

2.627

Sergipe 2.069

1.816

1.565

1.545

1.771

1.803

CENTRO-OESTE 20.522

24.014

22.159

21.493

22.333

27.307

Distrito Federal 5.563

5.661

5.566

4.941

4.997

9.991

Goiás 8.230

10.857

10.058

10.227

10.273

10.236

Mato Grosso 3.806

4.319

3.654

3.602

4.206

4.301

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30

Mato Grosso do Sul 2.923

3.177

2.881

2.723

2.857

2.779

SUDESTE 110.875

115.271

109.707

126.821

119.696

118.220

Espírito Santo 4.073

4.399

5.016

4.852

4.979

5.430

Minas Gerais 27.947

27.400

25.426

24.811

27.647

27.970

Rio de Janeiro 20.389

22.033

20.695

29.586

20.357

20.178

São Paulo 58.466

61.439

58.570

67.572

66.713

64.642

SUL 58.356

62.354

56.491

54.507

57.414

60.472

Paraná 22.518

24.293

22.321

21.095

22.407

23.876

Rio Grande do Sul 19.866

21.133

18.300

19.419

19.748

20.333

Santa Catarina 15.972

16.928

15.870

13.993

15.259

16.263

BRASIL 231.654

245.398

227.549

240.530

236.072

246.726

QUADRO 1 - Percentual de constituição de sociedade limitada no Brasil.

FONTE: Juntas Comerciais. Disponível em: http://www.dnrc.gov.br/

2.4 Aspectos relevantes da sociedade limitada no sistema brasileiro

O Código Comercial Brasileiro de 1850, em seu capítulo I, título XV, artigos 287 e

seguintes, trata das companhias e sociedades comerciais e diz que é da essência

delas “que o objeto e fim a que se propõem sejam lícitos e que cada um dos

sócios contribua para o seu capital com alguma quota ou esta consista em

dinheiro ou efeitos e qualquer sorte de bens ou em trabalho ou indústria”

(TEIXEIRA, 2007, p. 20).

O ordenamento jurídico depara então com a realidade da existência desses grupos de pessoas naturais e do propósito destas de que aqueles sejam entes autônomos, personalizados, inconfundíveis com seus integrantes e capazes de contrair direito e obrigações próprios. Diante disso, o direito positivo reconhece esses entes coletivos, atribuindo-lhes personalidade e considerando-os verdadeiras pessoas para fins de direito; mas não pessoas naturais, e sim jurídicas, porquanto só existem à medida que são reconhecidas por um sistema jurídico-normativo. Por isso, seu primeiro e maior exemplo é o próprio Estado, pessoa jurídica de direito público (BARBI FILHO, 2004, p. 47).

Desta forma, as sociedades limitadas, antes denominadas “sociedades por quotas

de responsabilidade limitada”, destacam-se historicamente como produto da

criação intencional do legislador (MARTINS, 1960, p. 13).

O mesmo doutrinador ensina que desde aquela época a sociedade por quotas de

responsabilidade limitada é aquela formada por duas ou mais pessoas,

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assumindo todas, de forma subsidiária, responsabilidade solidária pelo total do

capital social (MARTINS, 1960, p. 41).

Para regulamentar o tema proposto, as sociedades limitadas foram introduzidas

no sistema jurídico brasileiro pelo Decreto nº 3.708/1919:

De tal sorte, a Lei nº 556, de 25 de junho de 1850, que contém o Código Comercial brasileiro, cujo título I foi integralmente revogado pela Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, insculpiu espécies societárias em que é possível constatar, de logo, os limites e a extensão da garantia patrimonial oferecida pelos sócios, em caráter subsidiário, aos terceiros que com ela contratam (BERALDO, 2007, p. 40).

Entre as características desse tipo societário, existem algumas fundamentais que

a distinguem das demais. Destacam-se com mais relevância as limitações de

responsabilidade solidárias dos sócios ao total capital, que deverá ser consignada

obrigatoriamente, no ato constitutivo da sociedade.

Em relação ao número de sócios que uma sociedade por quotas deve possuir,

filia o direito nacional o número mínimo de dois sócios para sua constituição.

Em consideradas sociedades de pessoas ou contratuais, ao se reunirem os

sócios, existe um contrato que perdura durante todo o lapso de suas existências,

com suas naturais consequências: a gerência, na maioria das vezes, é exercida

por sócios e a morte, incapacidade ou retirada de um acarreta, na maioria dos

casos, a dissolução da quota-parte, pela quebra do vínculo contratual dos sócios.

Conforme esposado anteriormente, se o contrato social for silente12 e se houver

falecimento13 de um dos quotistas, o CC em vigor regulamenta que:

12 Art. 1.029, CC - Além dos casos previstos na lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da sociedade; se de prazo indeterminado, mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de sessenta dias; se de prazo determinado, provando judicialmente justa causa.

Parágrafo único. Nos trinta dias subsequentes à notificação, podem os demais sócios optar pela dissolução da sociedade.

13 Art. 1.031, CC - Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado.

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“Art. 1.028. No caso de morte de sócio, liquidar-se-á sua quota, salvo: I - se o contrato dispuser diferentemente; II - se os sócios remanescentes optarem pela dissolução da sociedade; III - se, por acordo com os herdeiros, regular-se a substituição do sócio falecido”.

Nesse aspecto e tendo em vista o estudo de Direito Sucessório que será tratado

no próximo capítulo, os bens deixados pelo falecido serão transmitidos

automaticamente para os herdeiros, que poderão exercer a administração da

sociedade limitada (após a averbação da nomeação no registro competente)14 até

a decisão final do processo de inventário.

A administração de uma sociedade é a realização de seu objeto social. Essa

administração poderá ser exercida por um sócio ou não sócio,15 desde que

mantido, como administrador, o dever de lealdade e diligência.16

§ 1o

O capital social sofrerá a correspondente redução, salvo se os demais sócios suprirem o valor da quota. § 2o

A quota liquidada será paga em dinheiro, no prazo de noventa dias, a partir da liquidação, salvo acordo ou estipulação contratual em contrário.

14 Artigo 1.062, CC – O administrador designado em ato separado investir-se-á no cargo mediante termo de posse no livro de atas da administração.

§ 1º

Se o termo não for assinado nos trinta dias seguintes à designação, esta se tornará sem efeito.

§ 2º

Nos dez dias seguintes ao da investidura, deve o administrador requerer seja averbada sua nomeação no registro competente, mencionando o seu nome, nacionalidade, estado civil, residência, com exibição de documento de identidade, o ato e a data da nomeação e o prazo de gestão. 15 Artigo 1.012, CC – O administrador, nomeado por instrumento em separado, deve averbá-lo à margem da inscrição da sociedade, e, pelos atos que praticar, antes de requerer a averbação, responde pessoal e solidariamente com a sociedade. Artigo 1.013, CC – A administração da sociedade, nada dispondo o contrato social, compete separadamente a cada um dos sócios.

§ 1º

Se a administração competir separadamente a vários administradores, cada um pode impugnar operação pretendida por outro, cabendo a decisão aos sócios, por maioria de votos.

§ 2º

Responde por perdas e danos perante a sociedade o administrador que realizar operações, sabendo ou devendo saber que estava agindo em desacordo com a maioria. 16 Art. 1.053, CC - A sociedade limitada rege-se, nas omissões deste Capítulo, pelas normas da sociedade simples.

Parágrafo único. O contrato social poderá prever a regência supletiva da sociedade limitada pelas normas da sociedade anônima.

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33

3 O DIREITO SUCESSÓRIO

3.1 Breves anotações do instituto

O que é suceder? Para Pontes de Miranda, é vir depois, colocar-se após. Após,

no espaço, ou após, no tempo. No Direito, suceder é pospor-se no tempo. Em

sentido amplíssimo, sucede todo sujeito que se sobrepõe, no tempo, a outro,

tomando, na relação jurídica, o lugar que o outro tinha. Em sentido mais estreito,

mais técnico, suceder é herdar ou haver por legado ou haver por deixa modal:

supõe a morte de quem foi sucedido. Em tal acepção é que se fala de direito de

sucessão: sucessão legítima, a que se opera por lei, sem necessidade de

quaisquer intervenções volitivas do sucedendo; testamentária, em que a vontade

do testador constitui a causa necessária e suficiente, isto é, em que o querer do

sucedendo faz a lei doméstica, a lex privata, - de eo quod quis post mortem suam

fieri velit. Modo derivativo de aquisição, ex facto hominum (MIRANDA, 1968, p.

179).

A etimologia da palavra “sucessão” é proveniente do latim sucessio, derivado de

succedere, que dá ideia de troca entre titulares ou, na definição de Savigny, “el

cambio meramente subjetivo en una relación de derecho”. Transmite a palavra a

ideia de afastamento de pessoa das relações jurídicas e, em seu lugar, a

continuação por outra pessoa em todos os deveres e direitos. A sucessão decorre

de atos entre pessoas vivas ou por causa de morte (CATEB, 2008, p. 2 e 3).

Caminha-se, assim, o entendimento de que quem sucede põe-se no lugar da

pessoa de quem provém o patrimônio ou o direito ou de que provêm alguns

direitos. Sucede-se em dívidas, como em direitos; em obrigações, como em

pretensões; em situações passivas nas ações, como em situações ativas. A

sucessão, em princípio, é nos direitos e nas dívidas ou no direito com os deveres

e os ônus (MIRANDA, 1968, p. 179).

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Nota-se, entretanto, que o "direito das sucessões é o conjunto de normas que

disciplinam a transferência do patrimônio de alguém, depois de sua morte, ao

herdeiro, em virtude de lei ou testamento" (DINIZ, 2004a, p. 8). "É a transmissão

de bens e de direitos a uma ou mais pessoas vivas, integrantes de um patrimônio

deixado por uma pessoa falecida" (SILVA, 2004, p. 1.339).

Direito hereditário ou das sucessões, [...] é o complexo dos princípios segundo os quais se realiza a transmissão do patrimônio de alguém que deixou de existir. Essa transmissão constitui a sucessão; o patrimônio transmitido denomina-se herança; e quem a recebe se diz herdeiro (SIMÕES, 2009, p. 6).

Diante de todo o exposto, considera-se sucessão o direito de herdar, de substituir.

O herdeiro ou legatário, por força da lei ou da vontade, torna-se titular dos bens e

direitos da pessoa falecida.

A finalidade está intimamente ligada ao resultado que poderá produzir aos

herdeiros. Diniz destaca que o fundamento do direito sucessório é a propriedade,

conjugada ou não com o direito de família (DINIZ, 2004a, p. 6).

[...] a transmissão hereditária visa a proporcionar originariamente aos descendentes a propriedade do antecessor, segundo o princípio da afeição real ou presumida, que respectivamente informa a sucessão legítima e a testamentária (PEREIRA, 2004a, p. 6-7).

3.2 Aspectos históricos

A motivação histórica que ensejou a origem da sucessão será apresentada de

forma primordial, pois possui existência desde a Antiguidade, havendo registro de

sua incidência no direito egípcio, hindu e babilônico, dezenas de séculos antes da

Era Cristã (CORDOVIL, 2006, p. 17).

Em linha de pesquisa, percebe-se que a antiga concepção de direito hereditário

não se preocupava em aquinhoar de forma igualitária os herdeiros de mesmo

grau, muito menos falava em beneficiar cônjuges e concubinos. No entanto, com

o passar do tempo, houve grande evolução no sentido de se garantir igualdade de

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tratamento aos herdeiros, possibilitando aos cônjuges e, posteriormente, aos

companheiros o recebimento de quinhões hereditários.

A histórica evolução de direitos igualitários teve como marco, no Direito brasileiro,

o CC de 1916, que, além de aquinhoar descendentes e ascendentes, também

estendeu ao cônjuge a condição de herdeiro, ficando este em terceiro lugar na

ordem da vocação hereditária. Nesse sentido, eram chamados a recolher, em

primeiro lugar, os descendentes; não havendo descendentes, eram chamados os

ascendentes; e, na falta de descendentes e ascendentes vivos do falecido,

seguindo a linha de sucessão, era chamado o cônjuge supérstite.

Entretanto, o CC de 1916 não dispensou tratamento às relações entre homem e

mulher fora do matrimônio, que, apesar de cada vez mais frequentes, não foram

devidamente reguladas, a não ser em caráter de oposição.

Observe-se que os dispostivos seguintes fundamentam essa assertiva: o artigo

1.177 do referido diploma legal proibia a doação do cônjuge adúltero ao seu

cúmplice. O artigo 1.474 impossibilitava a instituição de pessoa legalmente

proibida de se beneficiar por doação como beneficiária de seguro de vida. O artigo

1.719, inciso III, vedava a nomeação de concubina de testador casado como

herdeira ou legatária em um testamento. E o artigo 183, inciso VII, proibia o

casamento do cônjuge adúltero com o seu corréu. O único efeito positivo previsto

no CC de 1916 se refere à possibilidade de reconhecimento de filhos se, quando

de sua concepção, pai e mãe se encontravam em regime de concubinato,

conforme artigo 363, inciso I.

A par da evolução histórica, os concubinos estavam privados dos efeitos da

sucessão hereditária, sendo tratados como estranhos a esse direito.

Tal tratamento dispensado às relações concubinárias puras não se coadunava com a realidade vivida pela maioria da população, tendo em vista que muitas famílias brasileiras eram formadas por homens e mulheres que não haviam se submetido às formalidades do casamento civil. [...] Contudo, ao longo do século XX, esta postura de total rejeição às relações concubinárias foi sendo, aos poucos, flexibilizada pela doutrina, pela jurisprudência e pelo legislador (SANTOS, 2010, p. 10).

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Essas considerações tiveram evolução. O primeiro indício de flexibilização veio

com a edição da Súmula 380 do Supremo Tribunal Federal, a qual deferia aos

concubinos a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum em caso de

dissolução judicial. Tal direito, porém, era colocado sob o ponto de vista

obrigacional e não do direito de família, cabendo à concubina a comprovação da

existência da sociedade de fato para fazer valer-se desse direito. Por outro lado,

caso a concubina não conseguisse provar o esforço comum necessário à

repartição dos bens, os tribunais deferiam uma indenização a título de serviços

prestados.

É importante ressaltar que o tema é relevante em face da luta histórica para o

reconhecimento dos direitos dos conbubinos, diferentemente do que acontece

com os herdeiros necessários ou facultativos. Tratar os concubinos simplesmente

sob o ponto de vista obrigacional não foi suficiente e, aos poucos, as relações

concubinárias foram sendo inseridas no âmbito do Direito de Família.

O Decreto-Lei n° 7.036/1944 atribuiu à concubina uma indenização em caso de

morte do concubino por acidente de trabalho, desde que este não fosse casado e

a tivesse incluído como beneficiária.

A Lei n° 6.015/1973, em seu artigo 57, parágrafo 2°, com redação dada pela Lei

n° 6.216/1975, foi a primeira a utilizar a nomenclatura "companheira", e não mais

"concubina". A lei autorizava que a companheira adotasse o sobrenome do

companheiro se tivessem no mínimo cinco anos de convivência comum ou se o

casal tivesse filhos, desde que houvesse impedimento legal para o casamento

decorrente do estado civil de qualquer dos companheiros.

Portanto, a Lei n° 4.297/1993, em seu artigo 3o, alínea d, considerava a

concubina dependente do concubino morto, mas para tanto exigia a convivência

por período não inferior a cinco anos, conforme o Decreto n° 77.077/1976. A

jurisprudência do extinto Tribunal Federal de Recursos admitia, ainda, a divisão da

pensão previdenciária entre a esposa e a companheira, dando origem à Súmula

159.

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A questão perpassa a Lei n° 6.649/1979 e, posteriormente, a Lei n° 8.245/1991,

que conferiam ao companheiro sobrevivente o direito de prosseguir com o

contrato de locação celebrado pelo companheiro falecido. Já a Lei n° 7.250/1984

autorizou o reconhecimento dos filhos ilegítimos pelo cônjuge separado de fato há

mais de cinco anos ininterruptos, na vigência de um casamento considerado

formalmente válido.

Essas leis representaram verdadeira evolução para os concubinos, pois

atribuíram a eles direitos típicos das relações familiares. Contudo, o ápice desta

evolução se deu com o advento da Constituição da República de 1988, que

elevou o concubinato puro (uniões entre pessoas solteiras, separadas de fato ou

judicialmente, divorciadas e viúvas) a um outro instituto conhecido como “união

estável”, que possui status de entidade familiar assim como a família oriunda do

casamento.

Destarte, a Constituição da República em vigor prevê, em seu artigo 226, que a

família é a base da sociedade e tem especial proteção do Estado. A partir dessa

nova concepção, foram editadas a Lei n° 8.971/1994, que dispôs a respeito do

direito dos companheiros a alimentos e à sucessão, e a Lei n° 9.278/1996, que

regulou o parágrafo 3o do artigo 226 da Constituição da República.

Surgiu a ideia de sucessão após consolidar-se a formação da família, a mais importante das células da sociedade. Sempre existiram tendências de doutrinadores que investem contra o casamento, mas, a despeito disso, permanecem os pressupostos de formação da família como estabilização da sociedade. O novo Código reconhece a família, tradicionalmente formada pela celebração do casamento de um homem e uma muher, porém “é reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família” (artigo 1723). O amor que os pais sentem pelos filhos é uma projeção da natureza; nela todos os animais, racionais e irracionais, transmitem profundo sentimento de respeito, de gratidão, de amor para com aqueles que lhes estão ligados por laços de sangue. Entre os seres humanos ao lado dos direitos, igualmente as leis naturais e afetivas e morais, fundadas na natureza, devem, por isso mesmo, ser reconhecidas e protegidas pelo direito (OLIVEIRA, 1952, p. 4617, apud CATEB, 2008, p. 2).

17 OLIVEIRA, Arthur Vasco Itabaiana de. Tratado do direito das sucessões, 1952, v.1

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3.3 Droit de saisine

No Livro V do CC em vigor, que trata da sucessão, pressupõe-se de forma

intrínseca e invariavelmente a morte (real ou presumida) da pessoa natural, tanto

por consequência normal como decorrência do princípio da saisine. Assim, o

patrimônio deixado pelo falecido seguirá a norma prevista no artigo 1.784 do

CC.18

O direito hereditário nasce no mesmo instante da morte de alguma pessoa

natural. Neste sentido, operar-se-á a substituição do falecido por seus sucessores

a título universal nas relações jurídicas em que ele figurava. Assim se

convenciona o direito de saisine.

Portanto, na abertura da sucessão transmite-se automaticamente a herança aos

herdeiros legítimos e testamentários (artigo 1.784, Lei n° 10.402/2002). Dessa

forma, a sucessão dá-se com a morte do autor da herança e, nesse exato

momento, por força do princípio da saisine, a propriedade e a posse dos bens do

espólio passam aos herdeiros.

No instante da morte do de cujus abre-se a sucessão, transmitindo-se ipso lure, sem solução de continuidade, a propriedade e a posse dos bens do falecido aos seus herdeiros sucessíveis, legítimos ou testamentários, que estejam vivos naquele momento, independentemente de qualquer ato. Adotado está o princípio da saisine ou da investidura legal na herança, que irradia efeitos jurídicos a partir do óbito do de cujus (DINIZ, 2004b, p. 1324-1325).

Sílvio Rodrigues buscou em Colin e Capitant:

Filiam o princípio da saisine ao direito costumeiro francês e mostram que o mesmo surgiu contra os abusos do senhor feudal (contre la fiscalité féodale). Por morte do arrendatário, a terra arrendada devia ser devolvida ao senhor, de modo que os herdeiros do falecido deviam pleitear a imissão na posse (les héritiers avaient besoin de s’en faire ensaisiner), pagando para tal uma contribuição. Para evitar o pagamento desse tributo feudal, adotou-se sua morte, a posse de todos os seus bens (COLIN; CAPITANT, 1945, apud, CATEB, 2008, p. 17)19.

18 Art. 1.784. Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários. 19 COLIN; CAPITANT. Cours élémentaire de droit civil français. 9. Ed. Paris: Dalloz, 1945. T. 3, nº 1.024. In: RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 1995. v.7, p.14.

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Nessa linha, considera-se há décadas que se algum efeito irradiou no mesmo

momento em que o de cujus faleceu, tem-se de considerar adquirido o direito ou a

pretensão ou a ação ou a exceção. Momento mesmo da aquisição e da morte é

momento que dificilmente se fixa (MIRANDA, 1968, p. 9).

Embora revogado, o artigo 1.572 do CC de 1916 trazia em seu bojo: aberta a

sucessão, o domínio e a posse da herança transmitem-se, desde logo, aos

herdeiros legítimos e testamentários. À época, Pontes de Miranda deveria ter

afirmado: aberta a sucessão, a titularidade dos direitos, pretensões, ações e

exceções, bem como a posse, que se compreendem na herança, transmitem-se,

desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários. Porque não só os direitos

de propriedade, nem só a fortiori, o domínio e a posse se transmitem

automaticamente; o que era transmissível transmitiu-se no momento da morte

(MIRANDA, 1968, p. 9).

3.4 Os herdeiros

Considera-se herdeiro legítimo o herdeiro natural, isto é, aquele que é

reconhecido pela lei e como tal é convocado para partilhar da herança. Para

distinguir-se do herdeiro testamentário, recebe a denominação de herdeiro

necessário. No entanto, o sentido de herdeiro legítimo é mais amplo que o de

necessário, pois que, embora instituído por lei, nem sempre se mostra

necessário.

O herdeiro necessário é também um herdeiro legítimo. Como herdeiros

necessários a lei reconhece os descendentes, ascendentes e cônjuges. Somente

em caso de indignidade (exclusão) ou deserdação podem ser privados da

legítima. Dizem-se também reservatários ou legitimários, pois em função deles

deve ser reservada forçosamente a metade da herança nos bens do sucedendo,

salvo os casos de exclusão admitidos por lei.

Já o herdeiro testamentário é o instituído por ato de vontade, ou seja, por

testamento válido, não se exigindo qualquer tipo de parentesco entre o sucedente

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e o sucessor. Quando o sucedendo deixa bens certos e determinados em

testamento, diz-se herdeiro legatário.

3.5 Espécies da sucessão

A sucessão pode ser dividida em inter vivos e causa mortis. Em se tratando de

espécies, a legislação vigente as titula como sucessão legítima (resultante de lei)

e testamentária (decorrente da vontade do autor da herança).

Segundo Washington de Barros Monteiro:

Se não há testamento, se o falecido não deixar qualquer ato de última vontade, a sucessão é legitima ou ab infestado, deferindo todo patrimônio do de cujus às pessoas expressamente indicadas pela lei, de acordo com a ordem de vocação hereditária, se o falecido, porém, deixou testamento válido. Ter-se-á nesse caso a sucessão testamentária, cumprindo observar-se então o que o testador houve por bem determinar, atribuindo-se assim a herança às pessoas indicadas pelo disponente no ato da última vontade (MONTEIRO, 2003, p. 9-10).

A liberdade de testar não é ilimitada. Se houver herdeiros necessários, o autor da

herança só poderá dispor da metade de seus bens em testamento.20

Na produção de seus efeitos, a sucessão pode ser: a título universal, quando

houver transferência da totalidade ou de parte indeterminada da herança; e

singular, quando houver transferência de objetos certos e determinados. De

modo geral, a sucessão legítima será sempre a título universal e a sucessão

testamentária pode ser universal ou singular.

O princípio da saisine:

20 Artigo 1.788, CC – Morrendo a pessoa sem testamento, transmite a herança aos herdeiros legítimos; o mesmo ocorrerá quanto aos bens que não forem compreendidos no testamento; e subsiste a sucessão legítima se o testamento caducar ou for julgado nulo. Artigo 1.789, CC – Havendo herdeiros necessários, o testador só poderá dispor da metade da herança.

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[...] regula a sucessão e a legitimação para suceder a lei vigente ao tempo da abertura daquela (artigo 1.787 CC de 2002); sucessor universal continua no direito a posse do seu antecessor, com os mesmos caracteres (artigo 1.206 do referido código); o herdeiro que sobrevive ao de cujus, ainda que por um instante, herda os bens deixados e os transmite aos seus sucessores, se falecer em seguida.

3.6 Sobre o objeto da sucessão

A herança é o objeto da sucessão causa mortis e representa o conjunto de bens

ou patrimônios deixados por uma pessoa que faleceu, ou seja, compreende todos

os bens, direitos e ações do falecido, bem como todas as suas dívidas e

obrigações.

O objeto da sucessão causa mortis é a herança, dado que, com a abertura da sucessão, ocorre a mutação subjetiva de patrimônio do de cujus, que se transmite aos seus herdeiros, os quais se sub-rogam nas relações jurídicas do defunto, tanto no ativo como no passivo até o limite da herança (DINIZ, 2004a, p. 37).

3.7 A vocação hereditária legítima

Com a morte de uma pessoa, seus herdeiros são chamados a suceder. Este chamamento ou vocação pode obedecer ao impulso da vontade (sucessão testamentária) ou da lei (sucessão legítima) (PEREIRA, 2004a, p. 82).

Segundo Sílvio Rodrigues (DINIZ, 2004a, p. 98), a ordem de vocação hereditária

legítima trata-se de uma relação preferencial estabelecida pela lei das pessoas

que são chamadas a suceder ao finado.

Pereira (2004b, p. 82) ressalta que sucintamente é correto dizer que a ordem da

vocação hereditária é a distribuição de herdeiros em classes preferenciais,

baseada em relações de família e de sangue, conforme se pode ver pelo disposto

no artigo 1.829 do CC em vigor.

“Artigo 1829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: I- aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens; ou se no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

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II- aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge; III- ao cônjuge sobrevivente; IV- aos colaterais; (Angher, 2008, p. 237)”.

Na hipótese, porém, de o de cujus ter companheiro, a ordem da vocação

hereditária será aquela regida pelo artigo 1.790 do CC: [...] inadequadamente

inserido em capítulo que cuida das Disposições Gerais, no Título Das Sucessões

em Geral e não como teria sido próprio, no capítulo da ordem hereditária, no

Título da Sucessão Legítima (PEREIRA, 2004b, p. 87).

A seguir serão abordados os princípios constitucionais aplicáveis ao Direito de

Família, pois só a partir desses princípios pode-se interpretar com mais

flexibilidade os poderes do herdeiro administrador, com base na norma vigente.

Devem, portanto, os magistrados estar atentos e comprometidos.

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4 SUCESSÃO POR ATO INTER VIVOS

Ao examinar todo o conteúdo pesquisado, confere-se que a sucessão na

transmissão dos bens poderá ocorrer por ato realizado entre as pessoas vivas,

intuitu personae, ou seja, em consideração à pessoa ou por causa da morte.

A sucessão à causa de morte é toda aquela em que há o pré-falecido e o

sobrevivente ou os sobreviventes, que recolhem a herança, senso lato, isto é, os

herdeiros, os legatários e outros beneficiados (MIRANDA, 1968, p. 5).

Quando se fala de Direito das Sucessões, como se só existissem sucessões à

causa de morte, emprega-se o termo em sentido limitativo, porque, em

terminologia jurídica, há a sucessão à causa de morte e a sucessão entre vivos.

[...] Há sucessores que são a causa de morte. Nem se pode dizer que só haja

sucessão universal se mortis causa (MIRANDA, 1968, p. 5).

Nesse sentido, cumpre trazer à baila que o contrato social pode estabelecer

limitações para o exercício da administração da sociedade. Se nada dispuser,

presume-se que os poderes são todos os necessários para a sua gestão.

Atualmente as empresas de sociedade limitada integram a sua maioria,

comparadas às demais sociedades conhecidas em nosso ordenamento pátrio,

além do grande volume de empresas familiares, sejam elas sociedade limitada ou

sociedade anônima, que geram outro ponto relevante da presente pesquisa.

Estudos revelam que apenas 34% das empresas familiares chegam à segunda

geração, 12% chegam à terceira geração e ínfimos 3% sobrevivem até a quarta

geração.

Pesquisas mais recentes, consideradas até certo ponto conservadoras, indicam

que entre 60 e 80% das empresas existentes no planeta são de gestão familiar.

Estima-se, ainda, que cerca de 40% das 500 empresas mais bem-sucedidas do

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mundo são de gestão familiar, agregando, portanto, considerável fatia do produto

interno bruto (PIB) de seus respectivos países.

Outro dado interessante diz respeito ao Brasil. Indicadores do Serviço Brasileiro

de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE) mostram que existem no

país 6 a 8 milhões de empresas em funcionamento e que 90% delas são

familiares. Porém, mesmo diante desses números positivos, a preocupação em

manter uma empresa familiar é grande. Só para se ter ideia, de cada 100

empresas familiares brasileiras, 30% chegam à segunda geração e apenas 5% à

terceira geração.

Todos esses dados demonstram que realmente é preocupante passar o bastão

em uma gestão familiar, notadamente na sociedade limitada, para um sucessor

que não esteja preparado para exercer tal encargo ou mesmo para aquele

herdeiro legítimo que prefere esquivar-se de tal ônus.

Há sempre a disposição de última vontade, mencionada por alguns

doutrinadores, ou seja, sempre existe um testamento. Em alguns casos, o

detentor do direito prefere manter-se inerte em vida e no seu silêncio prevalecerá

o que está previsto em nosso ordenamento jurídico ou arbitrado pelo magistrado.

4.1 Sociedades familiares

Dados relevantes demonstram a importância das empresas familiares nas

organizações e no cenário empresarial mundial. O núcleo desta pesquisa é

levantar a problemática da sucessão dos herdeiros administradores.

Em pesquisa, o professor e doutor em História Econômica, Armando Dalla Costa,

em sua obra Sucessão e Sucesso nas Empresas Familiares (2006), ressalta que

as grandes empresas familiares como Sadia, Perdigão, Hermes Macedo, Pão de

Açúcar e Wal-mart conseguiram destaque, mas pontuam algumas reflexões como

ensinamentos e crescimento, tais como:

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A Sadia, empresa familiar desde o seu sócio fundador, continua

pertencendo à família do Sr. Atillio Fontana;

a Perdigão só conseguiu ser familiar nas duas primeiras gerações.

Antes da passagem para os netos (consórcio de primos) a empresa foi

vendida;

na Hermes Macedo somente houve passagem da primeira para a

segunda geração, por vários motivos externos, como os planos

econômicos, inflação, abertura do mercado brasileiro e também fatores

internos como disputas dos membros da segunda geração (filhos e

genros), que levaram a empresa a pedir concordata em 1992 e cinco

anos depois decretar a falência definitiva;

o Pão de Açúcar, também conhecido como Companhia Brasileira de

Distribuição (CBD), antes de ser a grande rede familiar foi uma pequena

padaria chefiada por Valentim dos Santos Diniz, fundador e sonhador

da grande empresa. Com o passar do tempo, transferiu para as mãos

de Abílio Diniz, mas por vontade do pai a empresa foi administrada por

pessoas capacitadas, mas que não faziam parte do clã Diniz, pois o pai

e fundador da empresa entendia que uma pessoa para administrar um

negócio tinha que ter ampla visão do todo, não avaliando somente seus

interesses. Mesmo Ana Maria, se preparando em Harvard para assumir

os negócios da família Diniz, ficou surpresa com a decisão do pai e dos

irmãos, mas como era vontade do pai, o gestor maior, a informação foi

acolhida e acatada. A sociedade foi administrada por um profissional na

área e a família passou a pertencer a um Conselho de Administração

dentro da própria empresa;

a Wal-Mart, empresa familiar americana, tem toda a sua história no

mercado internacional até que buscaram explorar o mercado brasileiro.

Sam Walton, o fundador, tinha visão revolucionária para a época em

que vivia. Desde o momento em que abriu seu negócio visitava todos os

dias uma empresa americana de nome Kmart e conversava com os

funcionários, observava como eles tratavam os clientes e como

conseguiam manter aquele espaço que vendia de tudo e com

qualidade.

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Sob esse enfoque, observa-se que os conselhos e determinações dos patriarcas

foram seguidos à risca, mas isso não aconteceu com todos, porque a busca por

poder era mais importante. E se por algum motivo os presidentes, gestores,

tinham que se afastar por problemas de saúde ou até por falecimento, já eram

visíveis os conflitos surgindo: disputa de poder entre os herdeiros; sua falta de

preparo profissional; formação sólida para assumir uma empresa; visão

estratégica e conhecimento diário de toda empresa.

Num primeiro momento, é preciso relembrar que há diferença entre sucessor e

herdeiro. Este, independentemente de qualquer coisa, será membro da família,

envolvido ou não nos negócios. Já aquele, que é antes de tudo um herdeiro, mas

preocupou-se em se preparar corretamente, pois sabia de sua responsabilidade

como futuro sucessor da empresa e conhecia as necessidades de assumir um

negócio de tal propositura, irá querer assumir a sucessão como um sócio quotista

e não apenas como mero administrador.

Há também aquele que acha que o império que o genitor criou durará para

sempre e ele não precisará se preocupar, a não ser que o genitor venha a falecer

e o despreparado filho venha a ocupar a presidência. Ou, ainda, um herdeiro que

se preparou, mas que não conhece a realidade da empresa, somente sabe o que

os livros lhe ensinaram e, com isso, não tem como cuidar de uma sociedade que

não é composta somente de lucro. Como também existem gestores, que fazem

todo aquele caminho de sucesso acontecer para seu sucessor.

Muitas empresas optaram por formar seus sucessores nas melhores

universidades, mas, em face de problemas familiares, acabaram contratando

profissionais especializados para protegerem o bem maior da relação. Uma

empresa na qual pessoas com o mesmo grau de parentesco ocupam patamares

superiores tem problemas que em geral se refletem no vínculo familiar, na maioria

das vezes por não conseguirem separar o pessoal do profissional. Exemplo desta

assertiva é sugerido pelo professor Armando, fundador do Pão de Açúcar, que

após ter investido na filha Ana Maria, preferiu contratar um profissional. A filha

continuou sua sucessora, mas pertencente ao Conselho de Administração.

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Essas incursões demonstram que é necessário o conhecimento de toda a

empresa, dos funcionários aos fornecedores. Uma administração depende da

confiança e respeito pelos componentes responsáveis em comandar grandes

negócios familiares. É necessário entrosamento no ambiente da empresa, ser

amigável, saber ceder quando necessário e ter jogo de cintura para não ser mal-

interpretado.

Enfatiza o autor, finalizando, que a sucessão sempre será discutida, uma vez que

empresas familiares continuarão se formando constantemente e herdeiros

continuarão a existir. Sucessão e sucesso nas empresas familiares estão

diretamente ligados à preparação e ao encaminhamento que cada uma delas dá à

questão de quem assumirá o comando no lugar do fundador e de seus

sucessores (COSTA, 2006, p. 198).

4.2 Ato voluntário e cessão de quotas no Direito brasileiro

A transferência voluntária de quotas no Direito brasileiro ocorre quando o sócio se

retira do quadro social por livre manifestação de sua vontade em não mais

integrar a sociedade da qual fazia parte. São os casos de compra e venda,

permuta, doação, entre tantos outros, quando se realiza um negócio jurídico.

4.2.1 Estrutura das quotas na sociedade limitada

Na sociedade limitada, seu capital é dividido em quotas ou cotas (nosso

vocabulário admite tanto uma grafia quanto a outra). Egberto Lacerda Teixeira

define quota como uma entrada ou contingente de bens, coisas ou valores com o

qual cada um dos sócios contribui ou se obriga a contribuir para a formação do

capital social (TEIXEIRA, 2007, p. 36):

Muito se discutiu sobre o sistema de fracionamento do capital social, em inúmeras quotas de igual valor, por fim prevaleceu a decisão do sócio quotista na tomada de tantas quotas quando desejasse. Os usos e costumes, pela força natural de que se revestem, sobretudo no Direito comercial, mais uma vez venceram. Nenhum prejuízo esse sistema

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causa à sociedade, aos sócios ou a terceiros. Sobretudo, é mais prático, pois minimiza os problemas da quota indivisa e da copropriedade, pois se torna muito mais simples, em caso de falecimento do sócio, a partilha de suas diversas quotas entre os herdeiros. Além disso, torna-se fácil o sócio ceder algumas quotas, permanecendo na sociedade com outras tantas. O CC permite a solução examinada, pois o artigo 1.055 estabelece que o capital social divide-se em quotas, iguais ou desiguais, cabendo uma ou diversas a cada sócio. [...] esse sistema de dividir o capital em quotas, de valor igual, não as confunde com as ações das sociedades anônimas (REQUIÃO, 2011, p. 561).

Ressalta-se, ainda, o entendimento do professor Fábio Ulhoa Coelho sobre a

dimensão da expressão “valor patrimonial da quota do titular que se desvincula”:

Por valor patrimonial da cota social se entende não o valor expresso no contrato social, decorrente da operação matemática de divisão do capital social pelo número de quotas existentes (valor nominal), mas o correspondente, proporcionalmente falando, do patrimônio líquido da sociedade. Este valor patrimonial é que será devido, pela sociedade, ao sócio dissente. Para se aferir o valor patrimonial da cota do dissidente, deverá ser levantado um balanço específico, denominado “balanço de determinação”, posto que o balanço anual pode estar defasado, seja em favor do sócio, seja em favor da sociedade. Para que não ocorra o enriquecimento ilícito de qualquer uma das partes, não poderá ser adotado um levantamento contábil que eventualmente não corresponda à situação patrimonial efetiva no momento da retirada (COELHO, 2008, p. 146).

Interessante ponderar, que o juiz determinará ao inventariante que se proceda a

apuração de haveres da sociedade limitada21.

Entretanto, independentemente da terminologia utilizada, quotas ou cotas, de

forma alguma poderão ser confundidas quotas de uma sociedade limitada com

ações de sociedades anônimas.

21 Art. 993, CPC - Dentro de 20 (vinte) dias, contados da data em que prestou o compromisso, fará o inventariante as primeiras declarações, das quais se lavrará termo circunstanciado. No termo, assinado pelo juiz, escrivão e inventariante, serão exarados: [...] II - a apuração de haveres, se o autor da herança era sócio de sociedade que não anônima. (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)

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4.2.2 Natureza jurídica das quotas

Quanto à natureza jurídica das quotas, muito se tem discutido sobre o tema.

Rubens Requião não vê motivos para distinguir a quota, contribuição do sócio ao

capital da sociedade limitada, da contribuição necessária à formação do capital

das demais sociedades de pessoas (REQUIÃO, 2011, p. 561).

Interessante estudo sobre a questão apresenta o Prof. Barros Leães, na Revista de Direito Mercantil. Comentando acórdão que admitiu a penhorabilidade e cota social, o professor paulista passa em revista algumas opiniões de doutrinadores, conceituando a quota inicialmente, como a entrada, ou contingente, de bens, coisas e valores com o qual um dos sócios contribui ou obriga a contribuir para a formação do capital social. Nesse sentido genérico é que se emprega o vocábulo nos artigos 287, 289 e 302, n°. 4, do Código Comercial. Mas é também a cota o complexo de direitos, poderes, obrigações ou faculdades, que compõe o status do sócio, por força da celebração do contrato social” (RDM22 apud REQUIÃO, 2011, p.561).

Ao analisar-se a matéria, percebe-se que, em relação a esse complexo de direito,

duas correntes de confrontam, conforme esclarece o jurista supracitado: uma, que

tende a ver na participação social mera posição contratual, constituída por uma

pluralidade de direitos e deveres; outra, que sustenta que, do contrato social,

nasce um único direito em favor do sócio, de conteúdo complexo, inconfundível

com a qualidade de parte do contrato (REQUIÃO, 2011, p. 562).

E para um estudo em relação ao direito do sócio já posicionava J.X. Carvalho de

Mendonça, ensinando que a posição jurídica dos sócios se desdobra em duas

partes: um direito patrimonial (direito de crédito) e outro pessoal (participar da vida

social).

Seguindo o entendimento do jurista Carvalho de Mendonça, o direito patrimonial é por ele identificado como um direito de crédito consistente em perceber o quinhão de lucros durante a existência social e em particular na partilha da massa residual, depois de liquidada a sociedade. “Esse direito de crédito é, como se vê”, prossegue o jurista, “condicionado, podendo ser exercido somente sobre os lucros líquidos, partilháveis conforme os termos do contrato social e sobre o ativo líquido, a dizer, sobre o saldo verificado depois da liquidação. [...] Os sócios, sob qualquer pretexto, não concorrem com os credores da sociedade; têm direito de crédito subordinado inteiramente à liquidação

22 RDM, “Nova série”, fasc. 5, p. 115.

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social, de modo que este poderá ser igual a zero ou ainda descer abaixo de zero tornando-se quantidade negativa, passivo”. Os direitos pessoais do sócio são os que decorrem do status de sócio. É o direito de participar da administração da sociedade diretamente como gerente ou como simples conselheiro, fiscalizando os atos de administração, isto é, todos os atos que as leis asseguram ao sócio (BASTOS, 1958, p. 71).

Estudo interessante foi realizado, em que Américo Luiz Martins da Silva escreve

sobre as seguintes passagens:

Nesta nova postura, o sócio, ao realizar sua entrada, deteria ainda a propriedade indireta da coisa transferida. Hipótese, apesar de ter cedido o domínio para outrem, não resultaria a perda definitiva de todos os poderes; apenas ocorreria, vamos dizer, a suspensão temporária desses poderes. Aí se verifica, isto está claro, a manutenção de um vínculo qualquer como a coisa cedida e, uma vez havendo este vínculo, não podemos, como foi dito, falar em perda definitiva da coisa, mesmo que alienada. Aqui a suspensão ocorreria da mesma forma que na posse direta e indireta da propriedade. Quando se tem a posse indireta sobre determinado bem, encontram-se suspensos, por algum tempo, os poderes de usar e gozar da coisa. Na participação societária, encontrar-se-iam suspensos os poderes de usar, gozar e dispor da coisa (o domínio). Por isso que o contribuinte possuiria a propriedade indireta e a sociedade (pessoa jurídica) a propriedade direta sobre os bens que compõem o fundo social. A bipartição do direito de propriedade direta sobre os bens que compõem o fundo social. [...] quando falamos da participação do sócio na sociedade fica claro que a pretensão dele dirige-se apenas à atividade da sociedade e ao animus domini sobre sua parte no fundo social, bem como que se trata de uma faculdade permanente, inesgotável a exemplo de qualquer outro direito de propriedade (SILVA, 1997, p. 133-134).

Confere-se, assim, a titularidade das quotas ao sócio como direito de propriedade,

exercitável como qualquer outro direito.

4.2.3 Direito comparado

Em se tratando de Direito comparado, o CC italiano, em seu artigo 2.482, traz à

luz o tema divisibilidade da quota:

Salvo disposição em contrária do ato de constituição, as quotas são divisíveis no caso de sucessão em virtude de morte ou de alienação, desde que sejam observadas as disposições dos parágrafos segundo e terceiro do artigo 2.474. Caso uma quota social se torne propriedade comum de mais pessoas, aplica-se o artigo 2.347. Artigo 2.347 – Indivisibilidade das ações. Ações são indivisíveis (artigo 2.487). No caso de copropriedade de uma ação, os direitos dos coproprietários devem ser exercidos por um

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representante comum. Caso o representante comum não tenha sido nomeado, as comunicações e as declarações feitas pela sociedade a um dos coproprietários são eficazes em relação a todos. Os coproprietários das ações respondem solidariamente (artigo 1.292) pelas obrigações delas derivadas.23

Já no Código das Sociedades Comerciais português, em seu artigo 221, trata o

instituto de divisão de quotas:

“1 – Uma quota só pode ser dividida mediante amortização parcial, transmissão parcelada ou parcial, partilha ou divisão entre contitulares, devendo cada uma das quotas resultantes da divisão ter um valor nominal de harmonia com o disposto no artigo 219°, n.3. 2 – Os actos que importem divisão de quota devem ser reduzidos a escrito. 3 – O contrato pode proibir a divisão de quotas, contanto que da proibição não resulte impedimento à partilha ou divisão entre contitulares por período superior a cinco anos. 4- No caso de divisão mediante transmissão parcelada ou parcial e salvo disposição diversa do contrato de sociedade, a divisão de quotas não produz efeitos para com a sociedade enquanto esta não prestar o seu consentimento: no caso de cessão de parte de quota, o consentimento reporta-se simultaneamente à cessão e à divisão. 5 – É aplicável à divisão o disposto na parte final do n°. 2 do artigo 228°. 6 – O consentimento para a divisão deve ser dado por deliberação dos sócios. 7 – Se o contrato de sociedade for alterado no sentido de a divisão ser excluída ou dificultada, a alteração só é efiar com o consentimento de todos os sócios por ela afectados. 8 – A quota pode também ser dividida mediante deliberação da sociedade, tomada nos termos do artigo 204°, n.2. Secção II – Contitularidade da quota [...] Artigo 222° - Direitos e obrigações inerentes a quota indivisa 1- Os contitulares de quota devem exercer os direitos a ela inerentes

através de representante comum. 2- As comunicações e declarações da sociedade que interessem aos

contitulares devem ser dirigidas ao representante comum e, na falta deste, um dos contitulares.

3- Os contitulares respondem solidariamente pelas obrigações legais ou contratuais inerentes à quota.

4- Nos impedimentos do representante comum ou se este puder ser nomeado pelo tribunal, nos termos do art. 223°, n.3, mas ainda o não tiver sido, quando se apresenta mais de um titular para exercer o direito de voto e não haja acordo entre eles sobre o sentido de voto, prevalecerá a opinião da maioria dos contitulares presentes,

23 ITÁLIA, Codice Civile: 2482. Divisibilità della quota. [2468] — Salvo contraria disposizione dell’atto costitutivo, le quote sono divisibili nel caso di successione a causa di morte o di alienazione, purché siano osservate le disposizioni del secondo e terzo comma dell’articolo 2474. Se una quota sociale diventa proprietà comune di più persone, si applica l’articolo 2347.

ITÁLIA, Codice Civile: Art. 2347 Codice Civile. Indivisibilità delle azioni. 2347. Indivisibilità delle azioni. Le azioni sono indivisibili. Nel caso di comproprietà di un'azione, i diritti dei comproprietari devono essere esercitati da un rappresentante comune nominato secondo le modalità previste dagli articoli 1105 e 1106. Se il rappresentante comune non è stato nominato, le comunicazioni e le dichiarazioni fatte dalla società a uno dei comproprietari sono efficaci nei confronti di tutti. I comproprietari dell'azione rispondono solidalmente [c.c. 1292] delle obbligazioni da essa derivanti [c.c. 2344]

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desde que representem, pelo menos, metade do valor total da quota e para o caso não seja necessário o consentimento de todos os contitulares, nos termos do n.1 do art. 224°”.

No Direito Alemão:

GmbHG § 17 Alienação de partes das cotas (redação de 1° de janeiro de 1964). (1) A alienação de partes das cotas só pode ser realizada mediante autorização da sociedade. (2) A autorização deve ser expressa por escrito; deve indicar a pessoa do adquirente assim como a quantia resultante das partes não divididas do capital para cada cota surgida da divisão. (3) O contrato social pode determinar que para a alienação de participações de cotas em favor de outros sócios, assim como para dividir cotas de sócios falecidos entre seus herdeiros, não seja necessária autorização por parte da sociedade. (4) As determinações do §5, parágrafos 1 e 3 acerca do montante do capital social realizado encontram na partilha das cotas aplicação correspondente. (5) A transferência simultânea de várias participações de cotas de um sócio a um único adquirente é inadmissível. (6) Além dos casos de alienação e herança, não é permitida a partilha de cotas. O contrato social pode considerar inadmissível a partilha também nestes casos.24

GmbHg § 18 direito compartilhado sobre a cota (redação de 1° de janeiro de 1964) (1) Se a cota competir integralmente a mais de um detentor legítimo, estes poderão usufruir os direitos apenas coletivamente. (2) Os sócios se responsabilizam solidariamente pelos pagamentos relativos às cotas. (3) Atos jurídicos que a sociedade pretenda impetrar ao detentor da cota são, caso não haja um representante comum dos detentores legítimos, efetivos quando praticados em relação a um único detentor legítimo. Para com mais de um herdeiro de um único sócio, essa determinação só encontra aplicação caso se refira a atos jurídicos praticados depois de um período de um mês desde a aquisição da herança.25

24 Alemanha, GmbHG. § 17 VeräuBerung Von Teilen eines Geschäftsanteils vom 1. Januar 1964 (1) Die VeräuBerung Von Teilen eines Geschäftsanteils kann nur mit Genehmigung der

Gesellschaft stattfinden. (2) Die Genehmigung bedarf der schriftlichen Form; sie muB die Person dês Erwerbers um

den Betrag bezeichenen, welcher Von der Stammeinlage dês ungeteilten Geschäftsanteils auf jeden der durch die Teilung entstehenden Gescháftsanteile entfält.

(3) Im Gesellschaftsvertrag kann bestimmt werden, daBfúr die VeräuBerung Von Teilen eines Geschäftsanteils na andere Gesellschafter, sowie für die Teilung Von Geschäftsanteilen verstorbener Gesellschafter unter deren Erben eine Genehmigung der Gesellschaft nicht erforderlich ist.

(4) Die Bestimmungen in § 5 Abs. 1 und 3 über den Betrag der Stammeinlagen finden bei der Teilung Von Geschäftsanteilen entsprechende Anwendung.

(5) Eine gleichzeitige Übertragung mehrerer Teile Von Geschäftsanteilen eines Gesellschafters na denselben Erwerber ist unzulässig.

(6) AuBer dem Fall der VeräuBerung und Vererbung findet eine Teilung Von Geschäftsanteilen nicht statt. Sie kann im Gesellschaftsvertrag auch für diese Fälle ausgeschlossen werden.

25 Alemanha, GmbHG. § 18 Mitberechtigung AM Geschäftsanteil. Vom 1. Januar 1964

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4.3 Cessão de quotas entre sócios e em favor de terceiros

À luz do nosso ordenamento jurídico, prevê o CC em vigor:

“Artigo 1.057 – Na omissão do contrato, o sócio pode ceder sua quota, total ou parcialmente, a quem seja sócio, independentemente de audiência dos outros, ou a estranho, se não houver oposição de titulares de mais de um quarto do capital social. Parágrafo único. A cessão terá eficácia quanto à sociedade e terceiros, inclusive para os fins do parágrafo único do artigo 1.003, a partir da averbação do respectivo instrumento, subscrito pelos sócios anuentes”.

A sociedade limitada foi duramente criticada por abrigar infinita gama de ajustes

de interesses, desde a sociedade entre cônjuges até a compenetração de

grandes grupos econômicos, como a constituição das holdings.

A Lei nº 6.404/1976, art. 2º, § 3º, prevê a existência das sociedades holding, estabelecendo que a companhia pode ter por objeto participar de outras sociedades, e acrescenta: ainda que não prevista no estatuto, a participação é facultada como meio de realizar o objeto social ou para beneficiar-se de incentivos fiscais. Apesar dessa previsão na Lei das S/A, nada impede que as sociedades holding se revistam da forma de sociedade por quotas de responsabilidade limitada ou de outros tipos societários, pois, como já dissemos, a expressão holding não reflete a existência de um tipo societário específico, mas sim a propriedade de ações ou quotas que lhe assegure o poder de controle de outra ou de outras sociedades (http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=661 acesso em 26 de março de 2011).

Fran Martins já havia afirmado que a sociedade por quotas de responsabilidade

limitada foi criada basicamente para atender aos problemas acarretados pelo

“vazio” que se criara entre a sociedade anônima (pessoal e com evidentes

dificuldades de constituição e formalidade custosas) e os demais tipos de

sociedades, como as coletivas e em comandita (com responsabilidade limitada –

ao menos de um tipo de sócio, como na comandita – e com caráter pessoal

bastante acentuado) [...] (MARTINS, 1991, p. 297-298).

(1) Steht ein Geschäftsanteil mehreren Mitberechtigten ungeteilt zu, so können sie die Rechte aus demselben nur gemeinschaftlich ausüben.

(2) Für die auf den Geschäftsanteil zu bewirkenden Leistungen haften sie der Gesellschaft solidarisch.

(3) Rechtshandlungen, welche die Gesellshaft gegenüber dem Inhaber dês Anteils vorzunehmen hat, sind, sofern nicht ein gemeinsamer Vertreter der Mitberechtigten vorgenommen werden. Gegenüber mehreren Erben eines Gesellschafters findet diese Bestimmung nur in bezug auf Rechtshandlungen Anwendung. Welche nach Ablauf eines Monats seit dem Anfall der Erbschaft vorgenommen werden.

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Em se tratando de sociedade limitada, a cessão de quotas está condicionada a

algumas restrições. Ressalta-se que não há dúvidas, independentemente da

natureza jurídica de que for a quota, em relação à posição contratual, direito ou

bem imaterial, de que ela pode ser objeto de contrato de cessão.

Aplicando-se o Código Comercial como primeira fonte supletiva do Decreto n° 3.708, de 1919, e ainda tendo em vista tratar-se na sociedade por quotas de sociedade de pessoas, não se podia negar-lhe a aplicação da primeira parte da regra do artigo 334 do Código. Dizia esse preceito que “a nenhum sócio é lícito ceder a um terceiro, que não seja sócio, a parte que tiver na sociedade, nem fazer-se substituir no exercício das funções que nela exercer, sem expresso consentimento de todos os outros sócios; pena de nulidade do contrato; mas poderá associá-lo à sua parte, sem que por esse fato o associado fique considerado membro da sociedade (REQUIÃO, 2011, p. 562).

Se se analisar a sociedade limitada como uma sociedade de pessoas, em que

prevalece o intuitu personae, a cessão das quotas depende do assentimento dos

demais sócios. Na falta de estipulação contratual, tem-se que aplicar a regra

geral, estipulada no artigo 334 do Código Comercial.

No entanto, adotando esse entendimento de que a sociedade por quotas tem

cunho personalístico, na qual as condições subjetivas dos sócios podem

comprometer o sucesso da empresa levada a cabo pela sociedade, garante-se o

direito de veto ao ingresso de terceiro estranho do quadro associativo,

condicionando-se a alienação da participação societária à anuência dos demais,

quando se tratar de adquirente não sócio.

Para Rubens Requião:

A cessão da cota do sócio [...] depende do assentimento dos demais sócios. Esses podem, no contrato, estabelecer a dispensa dessa anuência, pois a norma é dispositiva. O direito do sócio, pois, é renunciável e pode ele consentir previamente que qualquer pessoa ingresse na sociedade, ou por meio de aumento de capital ou por via de cessão de cotas de outros sócios. Mas se o contrato silenciar, vige a regra do artigo 334 e a cessão se torna impossível juridicamente, a não ser que todos os sócios concordem com a cessão, em documento expresso (REQUIÃO, 2011, p. 368).

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O posicionamento doutrinário é divergente quanto a esse entendimento, uma vez

que colide com a maleabilidade que a norma das sociedades por quotas procurou

introduzir com o abrandamento às regras da sociedade coletiva. Busca-se no

princípio da liberdade das convenções a possibilidade de se inserir no contrato a

cláusula permissiva da livre cessão da quota a terceiro (ABRÃO, 1998, p. 64).

Em síntese: o contrato podia dispor livremente sobre a cessão das quotas, a

forma de realizá-la, dando aos quotistas o direito de opção em relação às quotas

que o sócio deseje transferir; pode estipular que não havendo interesse da

sociedade em adquirir as ações do quotista, nem dos demais companheiros, o

sócio pode cedê-las a terceiro. Silenciando o contrato, a cessão não se poderia

efetivar. É a nossa opinião26 (REQUIÃO, 2011, p. 563).

Portanto, a matéria deverá se encontrar disciplinada no contrato social, no qual se

especificará se as quotas são transferíveis ou não e, em caso positivo, se a

transferibilidade é livre ou condicionada. Se o contrato social for omisso, deverá

ser interpretado no sentido de permissão.

Seguem duas ementas, de muitos julgados consultados sobre o tema, para

ilustrar o estudo em tela:

Ordinária Obrigação de fazer. Resultando dos termos do artigo 645, do Código de Processo Civil, a imposição do preceito cominatório quando da execução da respectiva obrigação, não se exibe inepta a inicial, por não especificá-la e muito menos extra petita a sentença que a concede. Cessão de cotas sociais de um para outro sócio. Embora, à vista do artigo 334, do Código Comercial, a cessão de cotas de um sócio a outro independa da

26 O Código Civil, em que pese declarar que o sócio das sociedades em geral não pode ser substituído em suas funções (artigo 1.002) sem o consentimento dos demais, estabelece exceção para as sociedades limitadas, ao dispor, no artigo 1.057, que na omissão do contrato o sócio pode ceder suas quotas a quem seja sócio, independentemente da audiência dos outros sócios. No caso de o sócio pretender transferi-las a estranho, os titulares de mais de um quarto do capital poderão opor-se à transferência. Trata-se de mudança radical da posição do legislador. O regime legal anterior ao Código Civil, como descrito, vedava a cessão, salvo consentimento dos demais sócios. No novo regime, o contrato é que determinará a não cessibilidade das quotas ou algum regime especial para que se processe a cessão (oferta a todos os sócios, direito de preferência, prazos de exercício. etc.), pois a lei passou a admiti-la livremente, entre os sócios, e com direito de oposição ao ingresso de sócio estranho, deferido a sócios que reúnam um quarto do capital social. A cessão de quotas, nos vários tipos de sociedades de pessoas, inclusive na sociedade simples, só terá eficácia perante a sociedade em face de terceiros, a partir da averbação, ou arquivamento do instrumento da cessão, subscrito pelos sócios anuentes (artigo 1.057, Parágrafo único).

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concordância dos demais, o registro da alteração social em que materializada, perante a JUCERJA, necessitava de se ver subscrita pelos demais - artigo 53, VII, do Decreto 1800/96. Recurso improvido (APL 17872 RJ 2002.001.17872, DES. MAURICIO CALDAS LOPES, PRIMEIRA CAMARA CIVEL).

COMERCIAL - SOCIEDADE DE RESPONSABILIDADE LIMITADA - CESSÃO DE COTAS A TERCEIROS, PARENTES OU ESTRANHOS. I - Sócio de sociedade de responsabilidade limitada pode ceder parte de suas cotas a terceiros, parentes ou estranhos, estabelecendo com eles a compropriedade das cotas, à revelia da sociedade. II – Todavia, não podem tais condôminos erigirem-se à condição de sócios a revelia dos demais cotistas. Nulo o ato judicial que tal averbou no cartório registro de pessoas jurídicas que 50% das cotas do sócio foram transferidos a seus filhos menores por força de partilha decorrente de separação judicial em respeito à integridade do princípio da "affectio societatis" (artigos 1.388 CC e 334 do CÓDIGO COMERCIAL). III - Segurança deferida (RMS 2559 MT 1993/0002958-4, Ministro WALDEMAR ZVEITER, T3 - TERCEIRA TURMA).

Concluindo, nada há que obste um quotista de desvincular da sociedade

mediante o pagamento de um prêmio, qual seja, o reembolso patrimonial da sua

quota-parte. Sua retirada, no entanto, mediante pagamento se restringe tão

somente às hipóteses previstas em lei (v.g., acionista dissidente de deliberação

social, nas hipóteses estabelecidas no artigo 137, da Lei n° 6.404).

4.3.1 Análise sobre a cessão de quotas e contrato social

Em todo o esposado entende-se que a sociedade limitada refere-se à sociedade

de pessoas. A jurisprudência e doutrina brasileira estão propensas a identificá-la

como cum intuitu personae, assim defendida por Fran Martins. Todavia, o

Supremo Tribunal Federal tem considerado tal sociedade como meio termo, uma

sociedade composta de pessoas e também de capital.

E esse comportamento foi se consolidando a partir do momento em que os

Tribunais e a Corte Máxima se posicionaram diferentemente do conceituado. No

julgamento do Rec. Extr. no 34680-RS, em 1958, começou o Tribunal a delinear

esta doutrina que admitia a sociedade por cotas de tipo misto, isto é, acentuando

seu caráter personalista de cunho capitalista, nos termos do contrato social. E

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nesse julgado o Ministro Nelson Hungria deixava bem claro ser contra o caráter

intransferível, impenhorável ou inalienável das cotas da sociedade de

responsabilidade limitada.

Todavia, era esta a visão que conceituava sociedade limitada, devido ao seu

caráter personalíssimo, a criação da sociedade em si partia do princípio da

confiança, afeição recíproca, a jus fraternitatis que concretizava a elaboração

desse contrato.

E com olhos voltados para essa nova posição, segundo o Direito Constitucional

do Supremo Tribunal Federal, percebe-se que os sócios podem dar esse caráter

capitalístico, como assim o chama Rubens Requião, quando permitem que o

sócio cedente, sem anuência dos outros sócios, transfira quotas a terceiros

estranhos à sociedade desde que esteja expresso como cláusula do contrato. E

nesse momento a sociedade de pessoas começa a perder seu caráter pessoal

para dar atenção ao capital existente.

A maioria dos doutrinadores enfatiza a sociedade de pessoas, por entender que

quota ou parte social não constitui título de crédito negociável (podendo ser

dinheiro, mas também bens), não se corporifica sequer em instrumento escrito

autônomo, não constituindo capital social e, por isso, não sendo suscetível de

penhora, alienação ou transferência.

E continuando nessa linha de pensamento, o Código Comercial, no seu art. 334,

entendia, à época, ser sociedade de pessoas:

A nenhum sócio é licito ceder a um terceiro, que não seja sócio, a parte que tiver na sociedade, nem fazer-se substituir no exercício das funções que nela exercer, sem expresso consentimento de todos os outros sócios, sob pena de nulidade do contrato; mas poderá associá-lo à sua parte, sem que por esse fato o associado fique considerado membro.

O Código Comercial, de acordo com a natureza jurídica da sociedade limitada, via

por bem que os outros sócios consentissem. E por ser uma sociedade afetiva,

esse consentimento deveria estar expresso por escrito, em um documento, para

resguardar a proteção da sociedade em si. Pois era sabido que o direito do sócio

era renunciável, todavia, a segurança da sociedade comercial estava em jogo. A

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cessão de quotas podia existir, até porque poderiam estar envolvidos ganhos

patrimoniais, entre outros.

No entanto, era primordial analisar da seguinte maneira: as partes podiam, por

meio do contrato, convencionar algumas cláusulas que determinassem a escolha

de todos quando de interesse de todos. As cláusulas de uma sociedade limitada

não eram engessadas somente no aspecto afetivo, via-se o aspecto capital do

negócio, mas o Código deixava bem claro que, se não fosse convencionado, o

que valeria era o Código Comercial, em seu art. 334.

E depois de tantos embates, o novo CC veio, em seu art. 1.057, CC verbis: “na

omissão do contrato, o sócio pode ceder sua quota, total ou parcialmente, a quem

seja sócio, independentemente de anuência dos outros, ou a estranho, se não

houver oposição de titulares de mais de um quarto do capital social”. Veio

expressar que, mesmo sem a anuência dos sócios, pode haver a cessão da quota

para os próprios sócios ou também para estranhos. Isso só não seria possível

quando a oposição fosse por mais de um quarto do capital social e, nesse

momento, confirma-se ainda mais a diminuição do intuitu personae, que muito se

utilizou na criação da sociedade.

No caso de cessão de quotas, é preciso que o sócio cedente saiba que esta só

terá validade se for averbada no registro da sociedade. Segundo Egberto Lacerda

Teixeira, o cessionário assume o status do sócio a partir da declaração solene e

eficaz de sub-rogar-se nos direitos e obrigações que competiam ao cedente e da

aceitação expressa ou tácita dessa transferência pela sociedade e pelos demais

sócios (TEIXEIRA, 2007, p. 245).

Como estudioso do regime de cessão de quotas, Egberto entende não ser

necessária modificação no contrato social para determinar essa transferência.

Este já é um direito adquirido pelos sócios, que só será modificado caso haja

oposição fundada em um quarto do capital social.

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4.4 Da transferência voluntária de quotas

A transferência voluntária de quotas ocorre com a alteração no contrato social da

sociedade limitada, que deverá ter uma via arquivada no Registro Público de

Empresas Mercantis ou no Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas. Na

prática, o cedente e o cessionário das quotas costumam celebrar um outro

contrato, além do instrumento de alteração do contrato social, no qual serão

ajustadas as condições para a realização da transação.

Os efeitos ocorrerão no momento da celebração da alteração contratual, perante

terceiros e a própria sociedade, produzindo efeitos somente após o arquivamento

diante do Registro Público de Empresas Mercantis ou Cartório de Registro Civil

de Pessoas Jurídicas. Na TAB. 1 apresenta-se o último demonstrativo da Junta

Comercial do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior,

notadamente do DNRC, fazendo constar o percentual de constituição de

empresas e as alterações efetivadas.

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TABELA 1

Percentual de constituição de empresas e as alterações efetivadas

Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior Secretaria de Comércio e Serviço Departamento Nacional de Registro do Comércio – DNRC

Ranking das Juntas Comerciais segundo Movimento de Constituição e Alteração de Empresas

Período: janeiro/2009 a Dezembro/2009 Constituição Alteração

Ordem Junta Comercial Qte. % Junta Comercial Qte. %

01 São Paulo 188.849

30,33

São Paulo 571.527

44,10

02 Minas Gerais 55.556

08,92

Minas Gerais 167.363

12,93

03 Paraná 49.393

07,93

Paraná 80.718

06,23

04 Rio Grande do Sul 49.294

07,92

Rio Grande do Sul 67.945

05,24

05 Rio de Janeiro 35.590

05,72

Rio de Janeiro 67.431

05,20

06 Bahia 34.984

05,62

Santa Catarina 49.687

03,83

07 Santa Catarina 29.258

04,70

Bahia 41.622

03,21

08 Goiás 25.649

04,12

Goiás 29.414

02,27

09 Pernambuco 19.696

03,16

Ceará 27.416

02,12

10 Ceará 19.334

03,11

Distrito Federal 24.354

01,88

11 Distrito Federal 12.599

02,02

Pernambuco 23.073

01,88

12 Mato Grosso 12.408

01,99

Espírito Santo 20.569

01,59

13 Espírito Santo 12.006

01,93

Mato Grosso 15.296

01,18

14 Maranhão 10.576

01,70

Paraíba 13.449

01,04

15 Pará 10.206

01,64

Pará 13.328

01,03

16 Rio Grande do Norte 8.067

01,30

Alagoas 12.634

00,97

17 Mato Grosso do Sul 7.785

01,25

Amazonas 11.137

00,86

18 Paraíba 7.411

01,19

Maranhão 9.879

00,76

19 Amazonas 6.239

01,00

Mato Grosso do Sul 9.806

00,76

20 Alagoas 5.522

00,89

Rio Grande do Norte 9.417

00,73

21 Piauí 5.140

00,83

Rondônia 7.486

00,58

22 Rondônia 4.439

00,71

Sergipe 5.844

00,45

23 Tocantins 4.276

00,69

Tocantins 5.395

00,42

24 Sergipe 3.717

00,60

Piauí 4.858

00,37

25 Amapá 1.946

00,31

Amapá 2.220

00,17

26 Acre 1.547

00,25

Roraima 1.996

00,15

27 Roraima 1.065

00,17

Acre 1.855

00,14

Total 622.552

100,00

Total 1.295.989

100,00

Fonte: Juntas Comerciais (não estão incluídos os números referentes ao microempreendedor individual) (http://www.dnrc.gov.br/).

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61

4.4.1 Direito comparado

Na Itália, o artigo 2.479 do CC Italiano trata da matéria:

Transferência de quota. As quotas são transferíveis por ato entre vivos e por sucessão e virtude de morte, salvo disposição contraria do ato de constituição. A transferência das quotas tem efeito perante a sociedade desde o momento da inscrição no livro dos sócios. A inscrição da transferência no livro dos sócios deve ocorrer dentro dos 30 dias do depósito do parágrafo quarto, a pedido do alienante ou do adquirente, através da apresentação do título de que resultam a transferência e o depósito correspondente. O ato de transferência das quotas, com subscrição autenticada, deve ser depositado dentro de 30 dias para a inscrição pelo tabelião que faz a autenticação, junto ao cartório de registro de empresas em cuja circunscrição está a sede social. Artigo 2.481 Responsabilidade do alienante pelos pagamentos ainda devidos. No caso de cessáo de quota, o alienante é obrigado solidariamente (1.292) com o adquirente, pelo período de três anos a partir da transferência, pelos pagamentos ainda devidos. O pagamento somente pode ser requerido do alienante quando o requerimento ao sócio atrasado permanece sem resultados.27

GmbHG Alemão:

GmbHG § 15 Transferência de cotas. (1) As cotas são alienáveis e herdáveis. (2) Se um sócio somar à sua cota original mais cotas, as mesmas

mantêm sua autonomia. (3) Para que haja cessão de cotas por parte de sócios, são necessários

contratos particulares celebrados perante um tabelião. (4) A celebração perante um tabelião também requer um acordo, por

meio do qual o dever do sócio de ceder uma cota é fundamentado. Um acordo que não tenha esta forma será considerado válido se estiver de acordo com o contrato de cessão do parágrafo anterior.

(5) Por meio do contrato social a cessão de cotas pode ser vinculada a outras condições e pode, inclusive, ser condicionada à autorização da sociedade.28

27 ITÁLIA, Codice Civile: Art. 2.479 Trasferimento della quota. Le quote sono trasferibili per atto tra vivi e per successione a causa di morte, salvo contraria disposizione dell’atto constitutivo. Il trasferimento delle quote há effetto di fronte Allá società dal momento dell’iscrizione nel libro dei soci. L’iscrizione Del trasferimento nel libro dei soci há luogo Nei trenta gioni dal deposito di cui al quarto comma, su richiesta dell’alienante o dell’acquirente, verso esibizione Del titolo da cui risultino Il trasferimento e l’avvenuto deposito. L’atto di trasferimento delle quote, com sottoscrizione autenticata, deve essere depositato entro trenta giorni per l’iscrizione, a cura Del notaio autenticante, presso l’ufficio Del registro delle imprese nella cui circoscrizione e sta a La sede sociale. ITÁLIA, Codice Civile: Art. 2.481 Responsabilitá dell’alienante per i versamenti ancora davuti. Nel caso di cessione della quota I’alienante è obbligato solidalmente (1.292) com I’acquirente, per il período di ter anni dal transferimento, per i verwamenti ancora dovuti. Il pagamento non può essere domandato all`alientante se non quando la rihista al socio moroso è essere domandato all`alienante se non quando La richista AL socio moroso è essere domandato all’alienante se non quando La richiesta AL socio moroso è rimasta infruttuosa. 28 ALEMANHA, GmbHG. § 15 Übertragung Von Geschäftsanteilen (1) Die Geschäftsanteile sind veräuBerlich und vererblich.

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O Código de Sociedades Comerciais Português:

“Artigo 228° - Transmissão entre vivos e cessão de quotas 1 – A transmissão de quotas entre vivos deve ser reduzida a escrito. 2 – A cessão de quotas não produz efeitos para com a sociedade enquanto não for consentida por esta, a não ser que se trate de cessào entre cônjuges, entre ascendentes e descendentes ou entre os sócios. 3 – A transmissão de quota entre vivos torna-se eficaz para com a sociedade logo que lhe for comunciada por escrito ou por ela reconhecida, expressa ou tacitamente”.

4.4.2 O direito de preferência

Deve ser observado o direito de preferência dos demais sócios, nos casos de

cessão total e parcial da quotas. O contrato social regula a maneira pela qual

esse direito de preferência será exercido pelo sócio, tal como prazo estipulado

para comunicação do sócio retirante aos sócios remanescentes, para

manifestarem acerca das condições ofertadas na cessão pretendida. Escoado o

prazo sem qualquer manifestação é que o bloco de quotas seria cedido ao

terceiro, observados os mesmos preços e condições da oferta.

De outro lado, a cessão de quotas entre sócios é, em regra, livre, respeitadas, é

claro, eventuais restrições estatutárias porventura convencionadas entre as

partes. Embora nesse caso inexista o incoveniente da quebra da affectio

societatis, os sócios têm evidente interesse patrimonial em que o statu quo ante

não se altere sem a sua anuência prévia. Convém, assim, disponham no contrato

acerca da hipótese, estabelecendo, em qualquer modalidade de cessão, a

outorga do direito de preferência em prol dos demais sócios, obedecida a

proporção de seus quinhões (LEAL, 2002, p. 36).

(2) Erwirbt ein Gesellschafter zu seinem ursprünglichen Geschäftsanteil weitere Geschäftsanteile, so behalten dieselben ihre Selbständigkeit.

(3) Zur Abtretung Von Geschäftsanteilen durch Gesellschafter bedarf es eines in notarieller Form geschlossenen Vertrags.

(4) Der notariellen Form bedarf auch eine Vereinbarung, durch welche die Verpflichtung eines Gesellschafters zur Abtretung eines Geschäftsanteils begründet wird. Eine ohne diese Form getroffene Vereinbarung wird jedoch durch den nach Marbgabe dês vorigen Absatzes geschlossenen Abtretungsvertrag gültig.

(5) Durch den Gesellschaftsvertrag kann die Abtretung der Geschäftsanteile na weitere Varaussetzungen geknüpft, insbesondere Von der Genehmigung der Gesellschaft abhängig gemacht werden.

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Ainda nesta linha de entendimento, a validade entre os sócios ou perante

terceiros, da cessão de quotas, depende, por conseguinte, da estrita obervância

aos preceitos estatutários, sendo indispensável a satisfação dos requisitos

regulamentares: aviso à sociedade e aos sócios, expiração do prazo dentro do

qual os interessados poderiam exercer o direito de preferência, assentimento

expresso ou presumido dos sócios, assunção pelo novo quotista de todos os

encargos e obrigações inerentes ao status de sócio, entre outros. Isso porque

qualquer violação àquilo que dispõe o contrato social poderá servir de base para

os sócios que se sentirem prejudicados oporem-se à cessão irregularmente

realizada, por meio de ação anulatória (LEAL, 2002, p. 36).

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5 VIÉS CONSTITUCIONAL: ANOTAÇÕES

5.1 Princípios constitucionais do Direito de Família

Com o avanço histórico progressivo, o conceito de família dado pela Constituição

da República de 1988 exige dos magistrados e operadores do Direito cuidado ao

interpretar a lei. Sabe-se que a Constituição encontra-se no topo do ordenamento

jurídico e que, por isso, o legislador infraconstitucional, ao editar uma norma, deve

observar e respeitar as regras e os princípios constitucionais.

A dignidade da pessoa humana é colocada no ápice do ordenamento jurídico e encontra na família a base apropriada para o seu desenvolvimento. As relações familiares são, portanto, funcionalizadas em razão da dignidade de cada partícipe (HAGE, 2010, p. 2).

Primando pela liberdade de escolha, esse princípio garante ao indivíduo a

autonomia para optar pelo modelo de família mais adequado, sua realização

existencial, sendo vedada a exclusão de qualquer entidade familiar. O homem

deve ser visto como finalidade de proteção da família, privilegiando-se o afeto e

acabando-se com o preconceito.

Fazendo-se uma análise, qualquer das entidades familiares preceituadas na

Constituição da República devem ser tratadas sob a ótica do princípio da

dignidade da pessoa, tendo em vista a proteção da pessoa em sua

individualidade.

Roberto Hage se posiciona sobre o assunto:

A família moderna é formada a partir dos laços de afeto e não mais a partir de convenções como o instituto do matrimônio; e o mais importante, essa liberdade é reconhecida constitucionalmente, o que vem a proteger das incansáveis discriminações que ainda subsistem na nossa sociedade.

Os princípios gerais são de grande relevo e devem vir em primeiro lugar em uma

leitura interpretativa do Direito, pois são ferramentas de interpretação,

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sistematização e integração no nosso ordenamento jurídico. E é com essas

ferramentas que julgaremos a formação da sociedade limitada.

5.2 Princípio da dignidade da pessoa: humana e jurídica

De início, já deparamos com um problema: com é possível dar caráter humano a

uma empresa? O que nos faz distinguir uma da outra, se as características que

se analisam são personalíssimas? De certo modo, são qualidades inerentes à

pessoa humana que nos tornam únicos e importantes neste universo.

Todavia, vamos recorrer ao termo dignidade, que traz consigo valores que

dignificam a pessoa. E por que não a pessoa jurídica dotada de direitos e

obrigações, devendo respeitar as normas vigentes em um ordenamento jurídico?

Kant (2004) afirma que a dignidade está acima de todo o preço, pois nada a ela se

equivale. Portanto, não é mais suficiente a simples previsão do direito à vida,

exigindo-se a garantia de uma vida digna (QUADROS, 2010, p. 5).

O termo segurança jurídica indica a responsabilidade que ambas trazem consigo,

no primeiro momento, ao buscar a compreensão do termo dignidade da pessoa

humana; e querer-se valorizar o ser humano em sua mais ampla esfera – corpo,

alma e intelecto. Quanto ao corpo, é necessário dar-lhe suporte como

alimentação, moradia, segurança, saúde. Ao se falar em alma tem-se a religião.

E, por fim, o intelecto, que vem por meio da cultura, do trabalho. São valores que

complementam a vida do ser humano e o diferem dos animais.

A busca por essa dignidade está diretamente ligada à honra e à bondade, coisas

que nos tornam seres diferenciados. Nesse momento é preciso analisar não como

conceito absoluto, mas sim relativo, pois não é característica pertencente só ao

homem, a empresa também busca dignidade, honra até porque o mercado a

exige confiável aos olhos do mundo financeiro. Sua logomarca é seu nome e não

poderá ser destruída facilmente, senão dará ensejo a grande insegurança jurídica.

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66

Com esse pensamento e também na busca de amplo entendimento, é possível

perceber que este fora eleito pelos doutrinadores como um dos princípios

fundamentais do sistema jurídico brasileiro, constante no artigo 1o, inciso III, da

Constituição da República. O princípio da dignidade da pessoa humana

representa um marco para o tratamento jurídico.

“Artigo 1o. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos estados e municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...] III - a dignidade da pessoa humana”.

E onde é possível encontrar o princípio da dignidade da pessoa jurídica na

Constituição da República, sendo este um princípio não expresso pelo legislador?

Será preciso a interpretação do artigo 170, caput, que revela que a todos é

assegurada existência digna e a busca pela honra tem sido fundada na

valorização do trabalho: “art. 170 - a ordem econômica, fundada na valorização do

trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna,

conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios.”

A empresa lutará com todas as armas para não quebrar sua confiança e não

desproteger seus negócios, pois ela deve ser capaz de manter seu patrimônio

intacto. Isso lhe trará segurança, mas, caso ela venha a ser prejudicada de algum

forma e isso abale moralmente esta estrutura empresarial, o responsável será punido

- súmula 227 do STJ.29 Isso também poderá se ensejar na desconsideração da

personalidade jurídica, mas nesse momento a empresa estará em falta com suas

obrigações patrimoniais.

Esse princípio deve ser observado na interpretação de leis constitucionais e

infraconstitucionais, não devendo qualquer norma de ordem pública resistir à sua

ação. Ressalta-se que este não é um princípio restrito à pessoa humana.

E para reflertir sobre o dever fundamental desse princípio, vem a lume o Direito

romano com três fundamentos: honestere vivere (viver honestamente), alterum non

laedere (não prejudique ninguém) e suum cuique tribuere (dê a cada um o que lhe é

29 Súmula 227, Superior Tribunal de Justiça (STJ) de 08/09/1999 – A pessoa jurídica pode sofrer dano moral.

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devido). E é com base nesse pensamento que será analisado o entendimento da

dignidade da pessoa humana e, por que não, jurídica.

Na lição de Fran Martins, as pessoas jurídicas têm capacidade de agir para defesa

dos seus fins, recorrendo a indivíduos, que são os seus órgãos, tendo patrimônio

autônomo daqueles dos sócios. São capazes de assumir obrigações ativas e

passivas em seu próprio nome, podem estar em juízo como autores ou reús, têm

nome próprio, domicílio certo e nacionalidade, como as pessoas físicas (MARTINS,

2011, p. 157).

5.3 Princípio da afetividade

Esse princípio ganhou destaque nas relações familiares com o surgimento do

novo conceito de família advindo da Constituição da República de 1988. O

casamento deixou de ser considerado única forma de constituição de família para

dar lugar a novas modalidades familiares, fundadas no carinho e na afetividade.

O reconhecimento da união estável como um dos núcleos monoparentais,

concedendo a ela o status de família, permitiu ao ordenamento jurídico uma nova

base ideológica de sustentação da família. O vínculo afetivo ganhou lugar de

destaque e passou a ser considerado fator determinante para a caracterização

dos núcleos familiares.

E é neste núcleo familiar que surgem os interesses negociais. Pessoas próximas,

muitas vezes consideradas amigas, procuram no outro o complemento das suas

ideias. Nunca se deve esquecer de que o importante a ser visualizado é o

sucesso desse novo negócio que está para surgir, que num futuro próximo será

representado pela lucratividade.

Nesse tocante, insta salientar que a afetividade ganhou status de princípio

implícito no texto constitucional, cabendo ao intérprete observar o momento para

sua aplicação. A afetividade anda de mãos dadas com a solidariedade, ética e

confiança.

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5.4 Princípio da igualdade

O artigo 5o da Constituição da República proclama que todos são iguais perante a

lei, sem distinção de qualquer natureza.

Vale ressaltar que a igualdade perante a lei, além de ser uma exigência do Estado

Democrático de Direito, é pressuposto do exercício da cidadania. E, para que isso

possa funcionar, é necessário que os cidadãos sejam respeitados em suas

diferenças, ou seja, os iguais devem ser tratados como iguais e os desiguais

como desiguais. A consagração desse princípio na Carta Magna significou a

quebra de diversas barreiras preconceituosas.

Neste sentido, Alexandre de Moraes afirma que há tríplice finalidade no princípio

da igualdade: limitar o legislador, o intérprete da lei e a autoridade pública e, por

último, o particular.

Em relação ao Direito de Família, por exemplo, acabou-se com a discriminação

entre os filhos concebidos no casamento e fora dele, que eram tidos como

legítimos e ilegítimos, respectivamente. Quebraram-se preceitos e aceitou-se a

figura de filho sem qualquer distinção. A mulher já não é considerada inferior ao

homem no casamento, pois os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal

devem ser exercidos igualmente por ambos. O homem não ocupa sozinho o posto

de chefe de família. O casal passou a dividir as tarefas, os filhos não são mais

educados só pela mãe.

Para Giuliano Pereira D'Abronzo:

[...] a igualdade gradativamente vem abrindo espaço para que as diferenças possam se manifestar e serem respeitadas pela lei, colocando os iguais em igualdade de condições na busca da realização pessoal (D´ABRONZO, 2007, p. 1).

Prima-se pela isonomia de todos, inclusive nos direitos concedidos às famílias

constituídas por matrimônio, às familias que resultam de união estável, assim

como às formadas por qualquer dos pais e seus descendentes, monoparentais,

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uma vez que se trata da mesma entidade familiar, resguardada pela Constituição

da República.

O termo igualdade está muito próximo de justiça. O ser humano entende que a

justiça será feita se formos iguais. E nessa busca de justiça tenta-se igualar os

braços da balança: de um lado, os anseios de que tudo dê certo; e do outro a

realização dos mesmos anseios.

5.5 Princípio da preservação da empresa

Em seu texto original, o saudoso Ulysses Guimarães assim proclamou a

Constituição da República Federativa do Brasil:

A Constituição Coragem. O homem é o problema da sociedade brasileira: sem salário, analfabeto, sem saúde, sem casa, portanto, sem cidadania. A Constituição luta contra os bolsões de miséria que envergonham o país. Diferentemente das sete Constituições anteriores, começa com o homem. Graficamente testemunha a primazia do homem, que foi escrita para o homem, que o homem é seu fim e sua esperança. É a Constituição cidadã. Cidadão é o que ganha, come, sabe, mora, pode se curar. A Constituição nasce do parto de profunda crise que abala as instituições e convulsiona a sociedade. Por isso mobiliza, entre outras, novas forças para o exercício do governo e a administração dos impasses. O governo será praticado pelo Executivo e o Legislativo. Eis a inovação da Constituição de 1988: dividir competências para vencer dificuldades, contra a ingovernabilidade concentrada em um, possibilita a governabilidade de muitos. É a Constituição coragem. Andou, imaginou, inovou, ousou, ouviu, viu, destroçou tabus, tomou partido dos que só se salvam pela lei. A Constituição durará com a democracia e só com a democracia sobrevivem para o povo a dignidade, a liberdade e a justiça. Brasília, 05 de outubro de 1988. Constituinte Ulysses Guimarães (BRASIL, 2007).

Os princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade e da afetividade

estão diretamente interligados com a preservação da empresa e norteiam esta

pesquisa. Com esse direcionamento e diante de assertivas doutrinárias, pode-se

afirmar que:

[...] a empresa contribui diretamente para o desenvolvimento da sociedade, possuindo papel de fundamental importância na

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concretização dos direitos sociais [...] incumbe ao Judiciário interpretar a Constituição da República de modo a exigir – ainda que indiretamente – que os direitos sociais sejam respeitados e conservados (CASTRO, 2007, p. 38).

O princípio da preservação da empresa traz a aplicação subsidiária dos artigos

116 e 117 da Lei nº 6.404/1976, que buscam conciliar os interesses dos sócios

majoritários e minoritários, procurando preservar a empresa, mesmo que privilegie

os interesses do sócio minoritário. E nesse momento cabe ao juiz analisar se vai

decretar a dissolução parcial ou total da sociedade.

5.4 Aplicações às limitadas do princípio da companhia próspera presente

nas sociedades anônimas

Esse princípio traz à baila os interesses públicos e privados, pois se a empresa

for importante para a sociedade, estiver cumprindo a sua função social, gerando

empregos, num mercado promissor, não lhe será permitida sua dissolução.

“Artigo 117,§ 1, ‘b’ da Lei 6.404/76: promover a liquidação de companhia próspera ou a transformação, incorporação, fusão ou cisão da companhia, com o fim de obter, para si ou para outrem, vantagem indevida, em prejuízo dos demais acionistas, dos que trabalham na empresa ou dos investidores em valores mobiliários emitidos pela companhia. Artigo 116 da Lei n° 6.404/1976, parágrafo único: o acionista controlador deve usar o poder com o fim de fazer a companhia realizar o seu objeto e cumprir sua função social, e tem deveres e responsabilidades para com os demais acionistas da empresa, os que nela trabalham e para com a comunidade em que atua, cujos direitos e interesses deve lealmente respeitar e atender”.

Insta salientar que o Ministério Público poderá intervir procurando soluções para

resolver da melhor forma os interesses dos sócios quotistas e também da

comunidade.

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6 DA TRANSFERÊNCIA INVOLUNTÁRIA DE QUOTAS

6.1 Do sócio quotista

O capital social da sociedade limitada é dividido em quotas e seus sócios

considerados quotistas. Mas os chamados quotistas são titulares dessa fração de

valores que divide todo o capital da sociedade, com responsabilidade à força do

capital.

Antes de abordar o principal assunto desta pesquisa científica, para revisar-se

todo o conteúdo esposado, em artigo publicado pela Universidade Estadual de

Ponta Grossa Elio Bortoli expõe sobre o tema:

Juridicamente a sociedade nasce pelo registro do contrato social, no plano concreto uma sociedade; como unidade de atividade econômica organizada, principia pela formação de seu capital. O capital da sociedade limitada é dividido em quotas, ou cotas, o que significa fração, parcela, porção. O regime anterior pelo Decreto nº 3.708 de 1.919 tratava como sociedade por quotas de responsabilidade limitada. Egberto Lacerda Teixeira, citado por Rubens Requião, assim a define: “cota é a entrada, ou contingente de bens, coisas ou valores com o qual cada um dos sócios contribui ou se obriga a contribuir para a formação do capital social”. Mais adiante, o mesmo comercialista paranaense cita que muito se discutiu a possibilidade de uma ou várias cotas a cada sócio, mas por fim prevaleceu o sistema de fracionamento do capital em quotas, permitindo-se ao sócio-quotista a tomada de tantas quotas quanto desejasse. O critério adotado pelo CC/2002 é pela divisão do capital social em diversas quotas, iguais ou não, permitindo a cada sócio a titularidade de uma ou mais quotas (disponível em: http://www.revistas2.uepg.br/index.phphumanas/article/viewFile/571/570 acesso em 12 de maio de 2011).

Em sua obra de Direito Processual Civil, condensada em um único volume, o

brilhante processualista Daniel Assumpção trata de forma muito clara sobre a

responsabilidade primária das dívidas da sociedade empresarial em relação aos

bens do sócio:

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A responsabilidade primária [...] é naturalmente da própria sociedade e somente de forma excepcional responderão seus sócios por tais dívidas com os seus próprios patrimônios. Tal aspecto é uma das consequências da personalidade jurídica própria da sociedade, que não se confunde com a de seus sócios. [...] o sócio responde com o seu patrimônio pela satisfação da dívida da sociedade empresarial nos termos da lei, sendo possível encontrar em leis de diferentes naturezas essa responsabilidade secundária (NEVES, 2011, p. 866).

Assim, os bens deixados pelo de cujus em sua universalidade irão satisfazer as

dívidas contraídas pela sociedade, enquanto estava na administração do sócio

falecido; não comunicando, em regra geral, com o patrimônio particular dos seus

sucessores.

6.2 Da capacidade de ser sócio

Quanto ao sócio menor de idade, não há impedimento para participar da

sociedade, desde que assistidos por seus pais, tutor ou curador, ou seja, pelo seu

representante legal.30

Divergindo de alguns juristas, Rubens Requião levanta poeira de pontos

importantes. Em primeiro lugar, porque o Código Comercial vedava que os

menores pertencessem à sociedade comercial. Tanto que, no artigo 308, era

determinado que se entre os herdeiros houvesse algum ou alguns menores, estes

não poderiam ter parte nela, ainda que autorizados judicialmente, salvo sendo

legitimamente emancipados. Se isso ocorre quando a sociedade dissolvida por

morte de um dos sócios tiver de continuar com os herdeiros do falecido, com mais

forte razão há de ocorrer o impedimento na constituição ou alteração do contrato

social.

Ainda neste sentido, o menor não podia ser sócio-quotista por proibição legal. O

fato de se admitir, na doutrina, que os menores sejam acionistas acontece

30 Artigo 972 do Código Civil – podem exercer a atividade de empresário os que estiverem em pleno gozo da capacidade civil e não forem legalmente impedidos. Artigo 974 do mesmo diploma legal – poderá o incapaz, por meio de representante ou devidamente assistido continuar a empresa antes exercia por ela enquanto capaz, por seus pais ou pelo autor da herança.

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porque, ao subscrever ação e integralizá-la incontinênti, o pai ou tutor

desempenha simples ato de administração dos bens do menor. Adquire apenas

coisa móvel, que é a ação. Pode, inclusive, doar-lhe a ação integralizada, no ato

de constituição da sociedade, tornando-o acionista. Como titular da ação, desde

que integralizada, nenhuma obrigação patrimonial o menor assume. Ora, isso não

acontece com a quota (REQUIÃO, 2011, p. 570).

No nosso entendimento, Egberto Lacerda Teixeira apresenta o argumento

decisivo contra a participação de menor, púbere ou impúbere, na sociedade por

quotas. Escreve ele que há, todavia, uma circunstância que fala em desfavor do

ingresso de menores nas sociedades por cotas, embora integralmente realizado o

capital social. É que, na hipótese de os sócios, em maioria, votarem o aumento do

capital social sem integralizá-lo imediatamente, o menor encontrar-se-ia em

situação insegura, visto como ficaria, em caso de falência, responsável pela

integralização das quotas não liberadas. Existindo sempre esse risco, eis que a lei

brasileira, ao contrário da francesa e espanhola, por exemplo, não exige a

realização imediata de todo o capital social no ato da subscrição ou do aumento.

É de rigor afastar os menores das sociedades por quotas, prescrevendo a

anulabilidade de sua subscrição. Risco igual existiria na hipótese de o valor

atribuído à contribuição in natura de alguns do sócio não corresponder à realidade

e dessa circunstância resultar prejuízo para terceiros (TEIXEIRA, 2007, p. 45).

O Supremo Tribunal Federal, mesmo diante de argumentos fundamentados,

publicou decisão contrária, no sentido de permitir a integração do menor na

sociedade limitada, desde que as cotas estejam integralizadas e que ainda não

faça parte da gerência da sociedade.

Sociedade por cotas de responsabilidade limitada. Participação de menores, com capital integralizado e sem poderes de gerência e administração como cotistas – Admissibilidade reconhecida, sem ofensa ao artigo 1° do Código Comercial. STF – Pleno – Rec. Extr. n° 82.433 – SP – j. 26-5 – 1976 – Rel. Min. Xavier de Albuquerque – DJU, 8-7-1976 – p.5.129 – unânime.

Com base nessa decisão, o DNRC, à época, em Ofício-Circular n° 22, de

novembro de 1976, determinou que as Juntas Comerciais aceitassem e

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definissem os contratos sociais nos quais figurassem menores impúberes, desde

que suas cotas estivessem integralizadas e não constassem nos contratos sociais

atribuições aos mesmos relativas à gerência e administrações (REQUIÃO, 2011,

p. 570). Após, a Instrução Normativa n° 12 de 1986 e n° 29 de 1991 mantiveram a

mesma orientação.

Sem uma regra específica sobre o tema, a Instrução Normativa n° 46/96 revogou

a legislação e o Código Civil em vigor, que revogou boa parte do Código

Comercial vigente, não regula a matéria em seu Capítulo IV.

O artigo 1.028 do Código Civil estabelece que, no caso de morte do sócio, a quota

da sociedade será liquidada, salvo se o contrato dispuser diferentemente (artigo

1028, I, Código Civil).

[...] Poderá continuar, assim, a sociedade, com sócios incapazes que nela ingressarão por comando judicial, contido na partilha de bens, naturalmente se não houve pedido de dissolução da sociedade por parte dos demais sócios. Quanto à constituição da sociedade limitada com a participação do incapaz ou o ingresso deste em sociedade já constituída, após a sanção do Código Civil, muitos autores a admitem, na esteira dos julgados e atos administrativos acima examinados e guardadas as cautelas também descritas. É de se lembrar, outrossim, que, nos termos do artigo 1.08531, a sociedade limitada não se resolve, no caso de incapacidade superveniente de sócio, ao contrário do que ocorre na sociedade simples (artigo 103032, CC) (REQUIÃO, 2011, p. 571).

31 Art. 1.085, CC - Ressalvado o disposto no art. 1.030, quando a maioria dos sócios, representativa de mais da metade do capital social, entender que um ou mais sócios estão pondo em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade, poderá excluí-los da sociedade, mediante alteração do contrato social, desde que prevista neste a exclusão por justa causa. Parágrafo único. A exclusão somente poderá ser determinada em reunião ou assembleia especialmente convocada para esse fim, ciente o acusado em tempo hábil para permitir seu comparecimento e o exercício do direito de defesa. 32 Art. 1.030, CC - Ressalvado o disposto no art. 1.004 e seu parágrafo único, pode o sócio ser excluído judicialmente, mediante iniciativa da maioria dos demais sócios, por falta grave no cumprimento de suas obrigações ou, ainda, por incapacidade superveniente. Parágrafo único. Será de pleno direito excluído da sociedade o sócio declarado falido ou aquele cuja quota tenha sido liquidada nos termos do parágrafo único do art. 1.026.

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6.3 Falecimento do sócio

A sociedade limitada é constituída pela manifestação de vontades de no mínimo

duas pessoas que unem esforços para consecução de um fim comum, com a

perspectiva de obter lucro com o resultado: “a liberdade contratual é

compreendida como um poder-dever. O direito faculta ao individuo o poder de

contratar, mas impõe-lhe o dever de fazê-lo de forma a cooperar com a

coletividade em que está inserido” (SAMPAIO JÚNIOR, 2009, p. 89).

O que sustenta essa seção é a hipótese prevista no artigo 1.028 do Código Civil.

No capítulo de sucessões, percebeu-se como é tratado o direito sucessório em

nosso ordenamento jurídico, mas resta saber como é recepcionada a ausência de

vontade negocial, que poderia ter acontecido por ato inter vivos.

Ocorrerá automaticamente a transferência de todos os bens para os herdeiros

legítimos. No Anteprojeto de Lei de Sociedades de Responsabilidade Limitada,

elaborado pela Comissão presidida por Arnold Wald, houve dispositivo

semelhante:

Salvo disposição em contrário no contrato social, os sucessores do sócio falecido receberão seus haveres, calculados na forma do art. 20, § 4º, no prazo de 6 (seis) meses, com juros simples de 12% a.a. (doze por cento ao ano), contado a partir da data da comunicação do óbito. § 1º. O contrato social poderá submeter à deliberação da assembleia a aprovação do ingresso dos herdeiros na sociedade e atribuir-lhe o poder de decidir a conversão de suas quotas ordinárias em preferenciais, se houver. § 2º. Prevista, contratualmente, a sucessão do sócio pré-morto pelos seus herdeiros, se entre estes houver menores, a estipulação só terá eficácia se integralizado o capital social. § 3º. Enquanto perdurar a menoridade, fica vedada qualquer alteração contratual que importe aumento de responsabilidade do sócio menor.

Nesse aspecto, tem-se como base o princípio da preservação da empresa,

garantindo aos sucessores do de cujus a apuração de haveres, que será tratada

brevemente. De lado outro, existe a possibilidade dos próprios sócios, em vida,

decidirem o destino da sociedade limitada, desde a sua constituição, estipulando

causa específica em contrário ou possibilitando aos sócios remanescentes

optarem pela sua dissolução. Ou mais, poderá ainda deixar a quota-parte da

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sociedade limitada como um legado, permitindo o ingresso do herdeiro como

legatário, em lugar do falecido.

Com efeito, existe a possibilidade de influência deixada pelo sócio falecido e o

sucessor encontrar dificuldade no exercício de suas atividades na sociedade, seja

por desvio de poder ou pela absoluta falta de affectio societatis com os consócios

remanescentes.

6.4 Apuração de haveres

Nos pactos societários concentram-se cláusulas, definidas pela manifestação de

vontade dos sócios, destinados a prevenir divergências futuras, em que o contrato

social na execução do seu objeto cumpre sua função social.

Por mais completa que seja sua redação, é praticamente impossível prever todas

as consequências jurídicas que serão vividas pelos contraentes e fatos futuros

que essa união poderá trazer. Poderá, entretanto, prever cláusulas destinadas às

faltas cometidas pelos sócios ou, quando pela morte de um deles, houver

previsão de qual herdeiro daria seguimento à sociedade limitada.

Seria o modelo ideal se toda a sociedade em funcionamento tivesse um

planejamento sucessório. Destaca-se, para tanto, que o coração da nossa

pesquisa pulsa pelo silêncio do contrato social no que diz respeito à transferência

involuntária de quotas.

Aplicar a previsão legal, excluindo-se o sucessor e liquidando-se a quota-parte

deixada pelo falecido, possibilita aos sócios supérstites adquirirem a quota da

sociedade limitada. Questiona-se nesta seara é o valor desta quota, como será

apurada, qual seria o marco inicial.33

33 Art. 1.031, CC - Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado.

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Não existe dúvida no tocante à validade do pacto, mas, ao aplicar no caso

concreto, dúvidas são levantadas, porque essa convenção poderá ofender

preceitos do direito sucessório ou tributário quando da morte do sócio seu

quinhão social, ao ser transmitido ao sucessor.34

O professor Hernani Estrella traz essa lição de forma exemplificada: dar-se-ia isso

principalmente na sociedade entre pai e filho, na qual pelo decesso do primeiro e

por efeito do pactuado no contrato, o último viesse a receber os contingentes do

progenitor, juntamente com outros sócios, embora estranhos, com exclusão dos

demais descendentes. Numa hipótese dessas, a aplicação literal do

convencionado no pacto societário pode parecer infringente, seja ao princípio da

intangibilidade das legítimas, seja às regras da partilha (ESTRELA, 2004, p. 109).

Existem controvérsias sobre se o quinhão social apurado na forma estabelecida

no contrato deve ou não sujeitar-se à nova avaliação. Será apresentado no

processo de inventário. A ele que os herdeiros do sócio falecido irão concorrer.

Cumpre destacar que no procedimento do arrolamento ou inventário, o

magistrado dará vista ao Fisco, momento em que poderá alterar o valor

apresentado nas primeiras declarações.

§ 1o

O capital social sofrerá a correspondente redução, salvo se os demais sócios suprirem o valor da quota. § 2o

A quota liquidada será paga em dinheiro, no prazo de noventa dias, a partir da liquidação, salvo acordo ou estipulação contratual em contrário.

34 Art. 496, CC - É anulável a venda de ascendente a descendente, salvo se os outros descendentes e o cônjuge do alienante expressamente houverem consentido. Parágrafo único. Em ambos os casos, dispensa-se o consentimento do cônjuge se o regime de bens for o da separação obrigatória. Art. 533, CC - Aplicam-se à troca as disposições referentes à compra e venda, com as seguintes modificações:

I - salvo disposição em contrário, cada um dos contratantes pagará por metade as despesas com o instrumento da troca; II - é anulável a troca de valores desiguais entre ascendentes e descendentes, sem consentimento dos outros descendentes e do cônjuge do alienante.

Art. 1.789, CC - Havendo herdeiros necessários, o testador só poderá dispor da metade da herança. Art. 2.017, CC - No partilhar os bens, observar-se-á, quanto ao seu valor, natureza e qualidade, a maior igualdade possível.

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[...] a aplicação da cláusula fixadora dos haveres de sócio tem originado controvérsia, não se limita às tentativas de sua identificação a tais ou quais figuras nominadas do direito civil. Vai muito além; recorre-se, com frequência, a princípios mais gerais do direito ou se volve à categoria específica do próprio Direito Comercial. Nessa ordem de ideias, raro não é que, em dadas hipóteses, se acene para o conceito de sociedade leonina, para assim negar-lhe eficácia. Isto se verificaria, quando numa entidade assaz próspera, com apreciáveis reservas indiretas ou ocultas, com os bens patrimoniais supervalorizados, a convenção não os contemplasse, excluindo o sócio de qualquer participação. Por prefixada, no momento do contrato, a soma a pagar, o sócio despedido ou os herdeiros do falecido acabariam sendo privados daqueles benefícios eventuais, que, ao fim de contas, teria sido o escopo em função do qual se associaram um e outro e era, de resto, da essência mesma do contrato societário. Assim, mercê deste raciocínio, concluir-se-ia pela invalidade de convenção desse quilate (ESTRELA, 2004, p. 112).

As considerações realizadas revelam que no desligamento do sócio falecido e na

sobrevivência da sociedade se faz mister apurar e liquidar seus haveres, a partir

de levantamento técnico a ser promovido por perito nomeado pelo juiz. O perito

irá realizar um verdadeiro balanço de todo o patrimônio da sociedade, procedendo

ao inventário dos bens integrantes do ativo da sociedade, a discriminação do

passivo, avaliando o preço de mercado dos valores apurados, procedendo de

igual modo aos bens intangíveis.

Ao Código Civil Brasileiro, no que tange à apuração de haveres, opera a disciplina

da saída do sócio, nos casos de morte, com a sobrevivência da sociedade,

adotando como base a liquidação da quota social em relação ao sucessor.

É consenso na história que a apuração de haveres mudou seu curso a partir do

julgamento extraordinário nº 89.464/SP e Waldírio Bulgarelli observa que:

[...] foi a partir da decisão do Supremo Tribunal Federal (RTJ 89/1054) que se processou substancial mudança no critério anterior, para consagrar a fórmula que a dissolução parcial deveria se processar em termos de apuração de haveres – que é, afinal, no que ela se transforma – em dissolução total (BARBI FILHO, 2004, p. 44).

Inclui-se na sociedade limitada a situação patrimonial da sociedade, à data da

resolução, verificando-se em balanço especialmente levantado. Chega-se ao

valor da quota, que será realizado tendo como base o montante efetivamente

realizado e integralizado.

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Não é incomum que as questões de liquidação de quotas redundem em desentendimentos referentes a valores, porque as formas previstas em contrato e na lei para se atribuir valores, em alguns casos específicos, não levam ao real valor da quota, ou porque não se considerou o estabelecimento empresarial em todas as suas características, fato que levaria a um acréscimo valorativo, ou porque há contingências em andamento que não foram verificadas pelo balanço patrimonial que podem levar à responsabilização da sociedade com graves reflexos na valoração das quotas (SIMÃO FILHO, 2004, p. 191).

Em caso de dissolução parcial, considera-se a apuração de haveres do sócio

retirante, levando em conta o real valor de sua participação na sociedade,

assemelhando-se à dissolução total.

Se se pudesse chegar a consenso, mas o tema é divergente, tendo em vista que

se não for estabelecido o valor com base numa realidade empresarial da

sociedade ou de forma consistente, tudo isso poderá ocorrer de forma injusta, em

face do locupletamento à custa de outros, ficando a quota subavaliada.

Apesar do progresso, percebe-se que a apuração de haveres, disciplinada no

artigo 1.031 do Código Civil, não exaure a matéria e suscita dúvidas, tais como a

data da resolução, objetivando averiguar o exato momento da situação

patrimonial da sociedade.

Em nota à 4ª edição da obra “Apuração de Haveres de Sócios”, Roberto Papini

explica que:

Nem são indicados, com a esperada precisão, os verdadeiros elementos patrimoniais a serem utilizados na apuração de haveres quando se fala em “situação patrimonial da sociedade verificada em balanço especialmente levantado”, não se precisando quanto aos critérios de avaliação ou reavaliação dos ativos, bens incorpóreos e intangíveis, que se sujeitam a variações em função do fim específico do balanço (determinação ou liquidação) ou da própria forma de desligamento do sócio, omitindo-se, enfim, o novo Código Civil, sobre outros tantos aspectos relacionados à saída do sócio sem extinção da sociedade e seus efeitos (ESTRELLA, 2004, XII).

Nas lições de Celso Barbi Filho, quando se trata dos efeitos patrimoniais da

dissolução parcial, surge concorrência de interesses. Na perspectiva dos

denunciantes do contrato social, a dissolução segmentada deve lhes assegurar o

recebimento de haveres no mais alto valor possível. Já para a sociedade e os

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sócios remanescentes, a saída dos descontentes deve efetivar-se com o mínimo

de comprometimento dos recursos sociais, a fim de que se viabilize a própria

preservação da empresa (BARBI FILHO, 2004, p. 431).

Essa relação de interesses é o maior antagonismo no instituto da dissolução

parcial em torno da apuração de haveres. Essa lição remete-se ao tema principal

proposto neste trabalho, em que a morte é uma das causas que levam ao

desligamento do sócio/sucessor. Como não ocorrerá a dissolução total da

sociedade limitada, deverão ser apurados apenas os haveres do retirante.

Não obstante, a apuração de haveres poderá ser estabelecida no contrato,

convencionado pelas partes em ato posterior ou fixado na sentença, levantando

poeira no ponto que interessa à presente pesquisa, qual seja, a sentença.

Com o contrato social omisso, sem que as partes tenham convencionado sobre a

matéria, caberá ao juiz determinar por meio de procedimento adequado que a

apuração de haveres ocorra, fixando no final do processo o valor da quota.

Cabe então definirem-se os critérios que a sentença deverá observar para suprir a omissão dos sócios ou para avaliar se o que eles contrataram a respeito da apuração de haveres acarreta prejuízo ao retirante ou à sociedade (BARBI FILHO, 2004, p. 448).

Ocorrendo esta causa dissolutória, com a saída do dissente, privilegiando a

preservação da sociedade, não poderá acarretar resultado patrimonial pior do que

se fosse promovida a dissolução total.

O ministro Décio Miranda, relator do julgamento supracitado, justificou os critérios

adotados para se apurarem os haveres:

[...] pela razão maior do interesse social na sobrevivência do empreendimento se deva preservar a sociedade. Nesse caso, é necessário decretar uma dissolução parcial que mais se aproxima, nos seus efeitos, da dissolução total. Ou seja, uma dissolução parcial em que, tal como na dissolução total, os sócios fiquem em situação de igualdade, quanto à percepção de suas cotas-partes na liquidação, [...] se se admite a dissolução parcial como modalidade da dissolução total, aquela deve adotar a forma de liquidação dos interesses do sócio dissidente que mais se aproxime da que resultaria da última (BARBI FILHO, 2004, p. 450).

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O professor Waldírio Bulgarelli combate a assertiva: como a dissolução parcial

nem é dissolução parcial ou total, no sentido técnico do termo, mas mera

apuração de haveres o que sempre se procurou, foi o justo e real valor [...]

(BARBI FILHO, 2004, p. 452).

A apuração de haveres deverá ser efetivada buscando-se o valor real do

patrimônio social para apurar o produto líquido, procedendo-se ao balanço de

determinação (especial ou de liquidação), com ampla verificação física e contábil

de todos os valores do ativo. Na morte do sócio a situação é diferenciada e são

analisadas as disposições contratuais.

Neste contexto, como se está tratando do contrato silente, a morte do sócio

implicará a transferência automática de suas quotas aos sucessores, sem a

dissolução imediata da sociedade.

Não se pode deixar de mencionar, ainda, a lição do professor Hernani Estrella,

que se aprofundou na questão estudando a possibilidade de que a apuração de

haveres dos sucessores pelo valor ou forma estabelecido no contrato social

ofendesse preceitos do Direito sucessório e tributário. É o que ocorreria na

sociedade entre pai e filho, na qual, pelo decesso do primeiro e por efeito do

pactuado no contrato, o último viesse a receber os contingentes do genitor,

juntamente com outros sócios, embora estranhos, com exclusão dos demais

descendentes e a possível infringência, seja ao princípio da intangibilidade das

legítimas, seja às regradas da partilha (ESTRELA, 2004, p. 137).

A apuração de haveres é uma forma contratual de apuração do quinhão do sócio

na sociedade, cujo respeito por seus sucessores e pelo Fisco é direito (BARBI

FILHO, 2004, p. 475). É considerado um meio de pagamento da herança e é a ele

que os herdeiros dos sócios irão concorrer.

Mas estranhos (os herdeiros) – completamente estranhos – à sociedade

sobreviva e aos sócios supérstites só podem pretender o quinhão em valor que

lhes deixou o autor da herança (ESTRELA, 2004, p. 139). Destacando-se,

entretanto, com pincel fluorescente verde, que na falta de prévio ajuste, ou seja,

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na omissão do contrato social, será realizado levantamento patrimonial da

sociedade, à data do óbito, podendo prevalecer as diretrizes que presidem a

apuração dos haveres na dissolução parcial.

Sem distinção, a eventual cláusula no contrato social, o artigo 993, parágrafo

único, inciso II do Código de Processo Civil, prevê a apuração de haveres no

processo de inventário.

Vale repetir, a propósito, a clássica observação de Rui Barbosa, quando argumentava que, se da observância de semelhante fato (forma contratual de apuração de haveres) resultam inconvenientes ao herdeiro menor, desta redução nos cômodos da herança a ele só caberá culpar o ascendente, que lha deixou (ANDRADE35 apud BARBI FILHO, 2004, p. 475).

Os haveres devidos aos sucessores são apurados com base no último balanço

aprovado pelo sócio falecido, deduzida a parte não integralizada.

Entende-se que, com o falecimento do sócio, só haverá ampla apuração de

haveres, com efeitos contábeis e patrimoniais semelhantes a uma dissolução

parcial, se depois de admitido como sócio o sucessor desejar desligar-se da

sociedade limitada.

6.5 Penhora de quotas

Antes de tratar especificamente acerca dos direitos inerentes aos sócios

quotistas, destaca-se a relação com terceiros, em paralelo aos direitos da

sociedade, que assume obrigações e, por intermédio de seus administradores,

procede judicialmente na busca de soluções para o problema enfrentado no caso

concreto.

35 Andrade, Odilon. Comentários ao Código de Processo Civil, p.116, transcrevendo Parecer de Rui Barbosa. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1941, v. VII.

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Para pagamento das dívidas contraídas pelos sócios, poderão ser penhoradas

suas quotas36, em processo judicial, por ser considerada bem integrante do

patrimônio da sociedade. Se a ação proposta for julgada procedente, poderá o

credor adquirente da quota requerer a liquidação da quota do sócio devedor.

As quotas sociais são penhoráveis, não se podendo criar hipótese de impenhorabilidade não prevista em lei, inclusive porque expressamente previstas como classe de bens penhoráveis no art. 655, VII, do CPC. Ainda que esteja expressamente prevista no contrato social a impenhorabilidade das quotas sociais, o Superior Tribunal de Justiça entende pela penhorabilidade com o correto entendimento de que o contrato não pode contrariar a lei. É claro que a aquisição das quotas sócias por terceiro ou pelo próprio exequente não transfere a affectio societatis, sendo possível aos sócios remanescentes promover a dissolução e liquidação da sociedade. Justamente para evitar tal ocorrência, os sócios não devedores têm a preferência na adjudicação dessas quotas sociais [...] (NEVES, 2011, p. 1024).37

O entendimento doutrinário e a jurisprudência dominante são no sentido de

assentir a penhora das quotas na sociedade limitada, pouco importando a

restrição contratual, com base em que não há vedação legal para tanto e que o

contrato não pode impor vedação que a lei não criou.

36 Art. 1.022, CC - A sociedade adquire direitos, assume obrigações e procede judicialmente, por meio de administradores com poderes especiais, ou, não os havendo, por intermédio de qualquer administrador. Art. 1.023, CC - Se os bens da sociedade não lhe cobrirem as dívidas, respondem os sócios pelo saldo, na proporção em que participem das perdas sociais, salvo cláusula de responsabilidade solidária. Art. 1.024, CC - Os bens particulares dos sócios não podem ser executados por dívidas da sociedade, senão depois de executados os bens sociais. Art. 1.025, CC - O sócio, admitido em sociedade já constituída, não se exime das dívidas sociais anteriores à admissão. Art. 1.026, CC - O credor particular de sócio pode, na insuficiência de outros bens do devedor, fazer recair a execução sobre o que a este couber nos lucros da sociedade ou na parte que lhe tocar em liquidação.

Parágrafo único. Se a sociedade não estiver dissolvida, pode o credor requerer a liquidação da quota do devedor, cujo valor, apurado na forma do art. 1.031, será depositado em dinheiro, no juízo da execução, até noventa dias após aquela liquidação.

Art. 1.027, CC - Os herdeiros do cônjuge de sócio, ou o cônjuge do que se separou judicialmente, não podem exigir desde logo a parte que lhes couber na quota social, mas concorrer à divisão periódica dos lucros, até que se liquide a sociedade. 37 Novidade do Projeto de Lei do Novo Código de Processo Civil é a regulamentação inédita da penhora das quotas ou ações de sociedades personificadas. Segundo o artigo 817, penhoradas as quotas ou as ações de sócio em sociedade simples ou empresária, o juiz assinará prazo razoável, não superior a três meses, para que a sociedade apresente balanço especial na forma a lei, proceda à liquidação das quotas ou das ações e deposite em juízo o valor apurado, em dinheiro. O § 1º. Prevê que a regra do caput não se aplica à sociedade anônima de capital aberto, cujas ações serão adjudicadas ao credor ou alienadas em bolsa de valores, conforme o caso. Nos teremos do §2º., o juiz poderá nomear administrador para a realização da liquidação prevista no caput, cabendo ao indicado submeter à aprovação judicial a forma e liquidação. Segundo o §3º., o prazo de três meses previsto no caput poderá ser ampliado pelo juiz, se o pagamento das quotas ou das ações liquidadas colocar em risco a estabilidade financeira da sociedade simples ou empresária.

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A penhora não acarreta a inclusão do credor como novo sócio, cabendo aos

demais sócios na defesa dos interesses da sociedade limitada remir a execução

ou conceder aos demais sócios a preferência na aquisição das quotas.

Ocorrendo a dissolução judicial, será iniciada a liquidação judicial da sociedade, em que será realizado o ativo e pago o passivo. O patrimônio líquido remanescente será partilhado entre os sócios, proporcionalmente à participação de cada um no capital social, se outra razão não houver sido acordada, no contrato social ou em ato posterior. Concluída a partilha, encerra-se o processo de extinção da sociedade comercial, com a perda de sua personalidade jurídica (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS, apelação cível n. 1.0610.01.001024-3/001, Relator Desembargador Alvimar de Ávila, 12ª. Câmara Cível, j. em 7.6.2006, publicado em 22.7.2006).

No Direito estrangeiro, Código Civil Italiano:

Art. 2.480 – Expropriação da quota. “A quota pode ser objeto de expropriação. A ordem do juiz que determinar a venda da quota deve ser notificada à sociedade pelo credor. Se a quota não for livremente transferível e o credor, o devedor e a sociedade não entrarem em acordo sobre a venda da própria quota, a venda ocorrerá livremente; mas a venda não tem efeito se, dentro de dez dias da adjudicação, a sociedade apresentar outro adquirente que ofereça o mesmo preço. As disposições do parágrafo precedente aplicam-se também no caso de falência de um sócio”.38

E no Código das Sociedades Comerciais Português

“Art. 239º. Execução da quota 1 – A penhora de uma quota abrange os direitos patrimoniais a ela inerentes, com ressalva do direito a lucros já atribuídos PR deliberação dos sócios à data da penhora e sem prejuízo da penhora este crédito; o direito de voto continua a ser exercido pelo titular da quota penhorada. 2 – A transmissão de quotas em processo executivo ou de liquidação de patrimônios não pode ser proibida ou limitada pelo contrato de sociedade nem está dependente do consentimento desta. Todavia, o

38 ITÁLIA, Codice Civile: art. 2.480. Espropriazione della quota. La quota può formare aggetto di espropriazione. L´ordinanza del giudice che dispone la vendita della quota deve essere notificata allá società a cura del creditore. Se la quota non è liberamente trasferibile e Il creditore, Il debitore e la società non si accordano sulla vendita della quota stessa, la vendita há luogo all´incanto; ma la vendita è priva di effetto se, entro dieci giorni dall´aggiudicazione, la società presenta um altro acquirente che offra lo stesso prezzo. Le disposizioni del comma precedente si applicano anche nel caso di fallimento di um sócio.

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contrato pode atribuir à sociedade o direito de amortizar quotas em caso de penhora. 3 – A sociedade ou o sócio que satisfaça o exequente fica sub-rogado no crédito, nos termos do art. 593º do Código Civil. 4 – A decisão judicial que determine a venda da quota em processo de execução, falência ou insolvência do sócio deve ser oficiosamente notificada à sociedade. 5 – Na venda ou na adjudicação judicial terão preferência em primeiro lugar os sócios e, depois, a sociedade ou uma pessoa por esta designada”.

6.6 Resolução da sociedade em relação ao sucessor

A resolução gerará exclusão dos dados do falecido. O contrato plurilateral

realizado à época de constituição da sociedade, com arquivamento dos atos

constitutivos no órgão registrário próprio, chegará à sua extinção por força de

procedimentos dissolutórios, nos termos do artigo 1.028 do Código Civil Brasileiro.

Desse modo, pode-se analisar como a hipótese de o sucessor não ter

administrado a sociedade com razão e os atributos a ela inerentes ou, em sua

faculdade de escolha em integrar aos negócios deixados pelo de cujus, ele fica

inerte e não aceita o ônus de administrador até a divisão dos bens, preferindo

liquidar sua quota-parte, resgatando o bônus dessa transação.39

Na lição de Adalberto Simão Filho, vê-se que:

39 Art. 1.033, CC - Dissolve-se a sociedade quando ocorrer: I - o vencimento do prazo de duração, salvo se, vencido este e sem oposição de sócio, não entrar a sociedade em liquidação, caso em que se prorrogará por tempo indeterminado; II - o consenso unânime dos sócios; III - a deliberação dos sócios, por maioria absoluta, na sociedade de prazo indeterminado; IV - a falta de pluralidade de sócios, não reconstituída no prazo de cento e oitenta dias; V - a extinção, na forma da lei, de autorização para funcionar. Parágrafo único. Não se aplica o disposto no inciso IV caso o sócio remanescente, inclusive na hipótese de concentração de todas as cotas da sociedade sob sua titularidade, requeira no Registro Público de Empresas Mercantis a transformação do registro da sociedade para empresário individual, observado, no que couber, o disposto nos arts. 1.113 a 1.115 deste Código. (Incluído pela lei Complementar nº 128, de 2008)

Art. 1.034, CC - A sociedade pode ser dissolvida judicialmente, a requerimento de qualquer dos sócios, quando:

I - anulada a sua constituição; II - exaurido o fim social, ou verificada a sua inexequibilidade.

Art. 1.044, CC - A sociedade se dissolve de pleno direito por qualquer das causas enumeradas no art. 1.033 e, se empresária, também pela declaração da falência. Art. 1.087, CC - A sociedade dissolve-se, de pleno direito, por qualquer das causas previstas no art. 1.044.

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[...] a lei disciplina duas formas de resolução da sociedade em relação a sócios, que não se confundem com procedimentos dissolutórios, a não ser pelo fato relacionado ao modo de apuração de haveres [...] a primeira refere-se à resolução em relação aos sócios minoritários e a outra à resolução em face dos demais sócios ou sócios majoritários (SIMÃO FILHO, 2004, p. 183).

A transferência involuntária de quota independe do posicionamento da quota-

parte deixado pelo falecido, se era majoritário ou não. Caberão ao sucessor,

conforme mencionado, a sua escolha e competência para continuar os negócios.

A sociedade limitada deverá atingir seu fim social.

A liquidação do valor correspondente à participação do sócio falecido no capital da sociedade poderá dar-se, como naquela última hipótese contemplada, quer porque seja esta a solução adrede pactuada no contrato social, quer porque o ingresso dos sucessores – ou de algum ou alguns deles – na sociedade tenha sido, após o óbito, rechaçado pelos demais sócios. Pode, também, resultar de deliberação dos sócios remanescentes acerca do prosseguimento da sociedade, não obstante a previsão contratual de dissolução total desta, em face da morte de quaisquer dos sócios (FONSECA, 2002, p. 63).

Ressalta-se que a exclusão poderá ocorrer de pleno direito se o sócio teve

liquidada a sua quota por algum credor por força do processo de execução. Neste

caso, mesmo que o sucessor deseje dar continuidade ao negócio jurídico, ficará

engessado para prosseguir com sua intenção.

Hipóteses que levam à resolução da sociedade em relação ao sócio estão

previstas no artigo 1.058 c/c artigo 1.004 do Código Civil.40 Serão destacadas aqui

somente as que merecem relevo nesta pesquisa.

A exclusão do sócio sucessor deverá ocorrer pela via judicial com alteração no

contrato social, seja por falta grave no cumprimento de sua função, por

40 Art. 1.004, CC - Os sócios são obrigados, na forma e prazo previstos, às contribuições estabelecidas no contrato social, e aquele que deixar de fazê-lo, nos trinta dias seguintes ao da notificação pela sociedade, responderá perante esta pelo dano emergente da mora.

Parágrafo único. Verificada a mora, poderá a maioria dos demais sócios preferir, à indenização, a exclusão do sócio remisso ou reduzir-lhe a quota ao montante já realizado, aplicando-se, em ambos os casos, o disposto no § 1o do art. 1.031.

Art. 1.058, CC - Não integralizada a quota de sócio remisso, os outros sócios podem, sem prejuízo do disposto no art. 1.004 e seu parágrafo único, tomá-la para si ou transferi-la a terceiros, excluindo o primitivo titular e devolvendo-lhe o que houver pago, deduzidos os juros da mora, as prestações estabelecidas no contrato mais as despesas.

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incapacidade superveniente, mediante iniciativa da maioria dos consócios ou por

recusa da sucessão.

A exclusão de pleno direito do sócio, que teve sua quota liquidada a pedido do

credor, merece destaque41:

a) Recair a execução sobre as importâncias que ao sócio couber nos lucros da sociedade. Neste caso, a penhora somente se fará sobre resultados positivos futuros, na proporção exata descrita no contrato, da concorrência deste aos lucros (lembrando que em razão do princípio da criação de quotas desiguais, nem sempre será o resultado correspondente ao volume de quotas detido, permanecendo o sócio com o seu status socci).

b) Recair a execução sobre os resultados provenientes da liquidação da quota. Aqui o sócio será excluído de pleno direito do quadro social por força da regra prevista no artigo 1.030, parágrafo único, do Código Civil42, restando à sociedade a obrigação de liquidar as quotas e efetuar o pagamento no Juízo da execução até noventa dias após a liquidação, salvo estipulação expressa em contrário existente no contrato, que faça previsão de prazo mais longo ou mais curto do que este, o qual deve se submeter o credor (artigo 1.031, § 2º... c/c o art. 1.026, § 1º, do Código Civil). Observa-se que este pagamento ao Juízo da execução, na realidade, não deve significar a própria satisfação da execução, mas sim a possibilidade de efetivar a penhora sobre o valor depositado pela sociedade para fins de possibilitar a oposição de embargos (SIMÃO FILHO, 2004, p. 188).

O inadimplemento do falecido será transmitido ao sucessor no limite dos bens

deixados pelo de cujus em sua universalidade. O procedimento da liquidação da

quota ocorrerá com a redução proporcional ao pagamento efetivado, após a

integralização do capital, reduzindo-se também as garantias de outros credores

sociais, se houver.

Para definir o valor da quota, será necessário considerar o montante efetivamente

realizado e integralizado, para que seja possível realizar a liquidação, que será

41 Art. 1.026, CC - O credor particular de sócio pode, na insuficiência de outros bens do devedor, fazer recair a execução sobre o que a este couber nos lucros da sociedade, ou na parte que lhe tocar em liquidação. Parágrafo único. Se a sociedade não estiver dissolvida, pode o credor requerer a liquidação da quota do devedor, cujo valor, apurado na forma do art. 1.031, será depositado em dinheiro, no juízo da execução, até noventa dias após aquela liquidação. 42 Art. 1.030, CC - Ressalvado o disposto no art. 1.004 e seu parágrafo único, pode o sócio ser excluído judicialmente, mediante iniciativa da maioria dos demais sócios, por falta grave no cumprimento de suas obrigações, ou, ainda, por incapacidade superveniente.

Parágrafo único. Será de pleno direito excluído da sociedade o sócio declarado falido ou aquele cuja quota tenha sido liquidada nos termos do parágrafo único do art. 1.026.

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feita observando-se as disposições contratuais, com base na situação patrimonial

da sociedade tomada na data da resolução, verificada em balanço de

determinação especialmente levantado para esta finalidade (SIMÃO FILHO, 2004,

p. 190).

O prazo para pagamento será realizado no máximo em 90 dias após a liquidação

em dinheiro, se o contrato não dispuser diferente. Ainda poderá ser liquidada pela

própria sociedade, observando-se que haverá redução correspondente no capital

social.

Com efeito, na liquidação da quota social, observam-se primeiramente os

procedimentos contratuais e legais, bem como o balanço patrimonial específico e

seus atributos, quando houver o reembolso de participação societária ou até as

contingências dedutoras das entradas, em relação à operação de mera restituição

dos valores pagos.

Entende-se, para o estudo em tela, que a transferência involuntária das quotas

aos herdeiros poderia seguir seu curso de forma serena, com a prévia estipulação

no contrato social, com ulterior concordância dos demais sócios ao ingresso dos

sucessores do quotista ou com o reembolso do valor relativo às quotas

pertencentes ao sócio falecido.

6.7 Ausência de affectio societatis e a exclusão de sócio

Desde o início, com as primeiras sociedades limitadas, que tinham cunho afetivo,

pois eram estas familiares, até as grandes conquistas do homem, o que se

sobrepõe é a influência da confiança. É nesse pensamento que serão analisados

o affectio societatis e sua representação na constituição das empresas.

O affectio societatis é uma expressão antiga, que Ulpiano utilizava para

determinar a vontade das pessoas de se associarem. Não havia sociedade sem a

vontade expressa de se unirem para um fim, mesmo as tribos se uniam na missão

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de se protegerem uns aos outros, conseguir mais alimentos e não permitir que os

casamentos fugissem à sua descendência.

Durante muito tempo, preocupou-se em saber até que ponto esse afeto na

constituição da sociedade influenciaria nas decisões dos sócios; até que instante

seria esse sentimento uma questão de lealdade, confiança, afinidade e ética; em

que momento os sentimentos se confundiriam.

São vários os questionamentos, mas é importante ter-se em mente que as

pessoas se associam com afeto, com vontade e confiança, mas com um fim

próprio, que é a lucratividade. É questão pouco discutida, mas que deve ser

evidenciada e ter seu local próprio, na esperança de convencer pensamentos

contrários.

O afeto será um pilar importante a ser analisado quando se tratar de casos

extremos, quando a confiança não reinar, por exemplo, ou quando um dos sócios

fizer coisas que aos olhos do outro são impossíveis de aceitar. Seguindo esta

linha de raciocínio, Arnold Wald afirma que a manutenção do affectio societatis é

fundamental para a continuidade dos negócios sociais, tratando-se de uma

sociedade limitada, constituída por pessoas. Ao seu lado também o STJ se

posiciona, entendendo que, se houve quebra do affectio societatis, pode haver

exclusão do sócio, mas, caso isso ocorra, será necessária a devida apuração de

haveres precedida de averiguação contábil e física.

Todavia, contrários a essa postura radical estão Juliana João, Sérgio Campinho

(2003) e Alfredo de Assis Gonçalves Neto (2007), que não veem a quebra do

affectio societatis como exclusão do sócio. Isso porque, a partir do momento em

que eles se unem para formar uma sociedade, a intenção que deve prevalecer

não é mais só pessoal, e sim profissional, entre elas o resultado - a lucratividade.

Para confirmar esta posição, é preciso entender que: tanto na dissolução parcial

quanto na exclusão do sócio a consequência é a mesma - retirar esse sócio da

sociedade e nem sempre ele terá perdido só a afetividade dos demais. O STJ não

se vale somente do seu entendimento, mas busca, junto aos meios cabíveis, a

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avaliação desse patrimônio e, por fim, para que seja excluído o sócio minoritário,

é preciso que haja dos sócios majoritários uma razão muito forte para convalidar o

ato.

Isto acontece, pois estamos embasados na boa-fé que rege os contratos, mesmo

tendo grandes particularidades não é possível esquecer princípios básicos a essa

sociedade.

A decretação do rompimento do vínculo empresarial havido na constituição da

sociedade, com base na desinteligência e falta de harmonia havida entre os

sócios, encontra amparo na doutrina e na jurisprudência.

Em se tratando de responsabilidade, o sócio responderá pelas obrigações

assumidas pela sociedade até o trânsito em julgado da sentença que decretar a

dissolução da sociedade.

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7 ANÁLISE DOS REFLEXOS DA ADMINISTRAÇÃO NA

INTEGRAÇÃO DO SUCESSOR NA SOCIEDADE LIMITADA

Analisa-se na pesquisa a possibilidade de transferência das quotas, o que ocorre

a partir da cessão. Cumpre destacar que qualquer cessão de quotas, voluntária

ou involuntária, estará diante de duas situações possíveis: a aceitação ou a

rejeição dos cessionários pelos demais consócios para integrar o quadro social.

O falecimento do sócio permite a admissão dos sucessores e possíveis novos

sócios, em que as atividades da sociedade prosseguirão normalmente até a

partilha no processo de inventário.

Perceber esse ponto de partida é fundamental para visualizar-se o papel do

sucessor no prosseguimento das atividades empresariais: sua preparação para

dar continuidade ao bastão então deixado pelo de cujus, a aptidão pela atividade-

fim, seu esforço, relação de confiança diante os outros sócios. Todos esses

fatores irão refletir diretamente na administração da sociedade limitada, sua

economia, continuidade e preservação.

Cabe ao intérprete, representado pelo magistrado, aplicar o direito no caso

concreto, desde a abertura do inventário, quando o contrato social se mostra

silente, de quem ocupará o cargo como novo gestor.

7.1 A administração provisória do autor da herança

O autor da herança pode administrar os bens deixados pelo de cujus, na figura do

inventariante ou nomear terceiros capacitados para que exerça tal múnus, com a

anuência dos sócios supérstites e decisão fundamentada do magistrado. É

pacífico este entendimento nos tribunais, considerando-se o terceiro uma pessoa

idônea, que deverá exercer o encargo quando os herdeiros não conseguem

chegar a consenso.

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Na minha opinião, repito, a nomeação de estranho como inventariante deve ser aceita em última instância, isto é, quando os herdeiros não se entendem, quando não demonstram interesse em terminar o processo, quando todos se esquivam. Se houver herdeiro idôneo que aceite o encargo, o juiz não deve dar preferência ao estranho (CATEB, 2008, p. 244).

O administrador provisório surge para gerenciar a sociedade limitada, tendo em

vista que na transferência involuntária de quotas a sociedade não poderá ficar

sem um chefe ou gestor, até a nomeação do inventariante.43

Esse administrador foi recepcionado pelo Código de 1973 e, enquanto não assinar o termo de compromisso, o inventariante nomeado pelo juiz, será ele o representante legal da massa, praticando todos os atos inerentes à administração de qualquer negócio. E mais, o administrador provisório representa ativa e passivamente o espólio, é obrigado a trazer ao acervo os frutos que desde a abertura da sucessão percebeu, tem direito ao reembolso das despesas necessárias e úteis que fez e responde pelo dano a que, por dolo ou culpa, der causa (CATEB, 2008, p. 240).

Geralmente o administrador da herança será escolhido entre o cônjuge supérstite

ou companheiro sobrevivente, pessoa mais próxima ao de cujus. Na falta dessas

figuras, poderá ser escolhido o sucessor que estiver na posse e administração

dos bens.44

Mesmo se tratando de administrador provisório, a lei sempre prefere pessoas da família do falecido, porque elas têm interesse na boa administração do monte como herdeiros que são ou partícipes diretos na distribuição final do acervo (CATEB, 2008, p.240)

Para conferir o cargo de administrador provisório, a ação de inventário deverá ser

proposta dentro do prazo legal, após a morte do autor da herança. Concorrem ao

43 Art. 985, Código de Processo Civil (CPC) - Até que o inventariante preste o compromisso (art. 990, parágrafo único), continuará o espólio na posse do administrador provisório. Art. 986, CPC - O administrador provisório representa ativa e passivamente o espólio, é obrigado a trazer ao acervo os frutos que desde a abertura da sucessão percebeu, tem direito ao reembolso das despesas necessárias e úteis que fez e responde pelo dano a que, por dolo ou culpa, der causa. 44 Art. 1.797, CC - Até o compromisso do inventariante, a administração da herança caberá, sucessivamente:

I - ao cônjuge ou companheiro, se com o outro convivia ao tempo da abertura da sucessão; II - ao herdeiro que estiver na posse e administração dos bens, e, se houver mais de um nessas condições, ao mais velho; III - ao testamenteiro; IV - à pessoa de confiança do juiz, na falta ou escusa das indicadas nos incisos antecedentes ou quando tiverem de ser afastadas por motivo grave levado ao conhecimento do juiz.

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cargo: o cônjuge supérstite, qualquer herdeiro, o legatário, o testamenteiro, o

cessionário do herdeiro ou do legatário, o credor do herdeiro, do legatário ou do

autor da herança, o síndico da falência do herdeiro, do legatário, do autor da

herança ou do cônjuge supérstite, o representante do Ministério Público e,

havendo herdeiros incapazes, a Fazenda Pública, quando tiver interesse.45

O artigo 989 do CPC brasileiro faculta ao juiz, de ofício, na falta dos interessados

(listados no parágrafo anterior), a abertura do inventário. Diante da sobrecarga de

trabalho, processo urgente para serem despachados e sentenciados, ainda tem

que presidir as audiências, mutatis mutandis, dificilmente um juiz irá propor uma

demanda como esta. Pelo menos na prática não foi constatada tal situação.

Na abertura do inventário, seguindo seu procedimento específico, o juiz irá

nomear inventariante para prestar compromisso. O encargo do inventariante é

considerado fundamental no processo de inventário, porque ele irá representar o

espólio ativa e passivamente, em juízo ou fora dele, além de administrar os bens

como se fossem seus, prestando contas de todos os atos de sua gestão, entre

tantas outras atribuições.

7.2 A rejeição dos sócios remanescentes à integração do adquirente na

sociedade

O ingresso do sucessor na sociedade poderá ocorrer de forma harmoniosa,

mesmo em se tratando de transferência involuntária de quotas em que o contrato

45 Art. 987, CPC - A quem estiver na posse e administração do espólio incumbe, no prazo estabelecido no art. 983, requerer o inventário e a partilha.

Parágrafo único. O requerimento será instruído com a certidão de óbito do autor da herança. Art. 988, CPC - Tem, contudo, legitimidade concorrente:

I - o cônjuge supérstite; II - o herdeiro; III - o legatário; IV - o testamenteiro; V - o cessionário do herdeiro ou do legatário; Vl - o credor do herdeiro, do legatário ou do autor da herança; Vll - o síndico da falência do herdeiro, do legatário, do autor da herança ou do cônjuge supérstite; Vlll - o Ministério Público, havendo herdeiros incapazes; IX - a Fazenda Pública, quando tiver interesse.

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social é silente. Mas percebe-se que em alguns casos o final não é considerado

feliz.

Verificando-se o inverso, ou seja, a rejeição dos sócios remanescentes à

integração do adquirente na sociedade, poderá ser liquidada a quota-parte do ex-

sócio, com a regular apuração de haveres (por ser obrigatória e pagamento aos

efetivos detentores do direito patrimonial).

Em um processo litigioso, será observado desde a prudência dos sócios

remanescentes na liquidação da quota-parte (objeto da partilha) à vontade do

sucessor em se manter no negócio jurídico. Ademais, o que se observa no

exercício prático é a possibilidade de os sócios remanescentes aproveitarem que

estão no controle da sociedade e optarem pela liquidação, por ser uma saída

vantajosa.46 Caberá ao magistrado, na busca dos interessados, tutelar seus

direitos.

46 Seção VI, Da Dissolução, Art. 1.033, CC - Dissolve-se a sociedade quando ocorrer: I - o vencimento do prazo de duração, salvo se, vencido este e sem oposição de sócio, não entrar a sociedade em liquidação, caso em que se prorrogará por tempo indeterminado; II - o consenso unânime dos sócios; III - a deliberação dos sócios, por maioria absoluta, na sociedade de prazo indeterminado; IV - a falta de pluralidade de sócios, não reconstituída no prazo de cento e oitenta dias; V - a extinção, na forma da lei, de autorização para funcionar. Parágrafo único. Não se aplica o disposto no inciso IV caso o sócio remanescente, inclusive na hipótese de concentração de todas as cotas da sociedade sob sua titularidade, requeira no Registro Público de Empresas Mercantis a transformação do registro da sociedade para empresário individual, observado, no que couber, o disposto nos arts. 1.113 a 1.115 deste Código. (Incluído pela lei Complementar nº 128, de 2008).

Art. 1.034, CC - A sociedade pode ser dissolvida judicialmente, a requerimento de qualquer dos sócios, quando:

I - anulada a sua constituição; II - exaurido o fim social, ou verificada a sua inexequibilidade.

Art. 1.035, CC - O contrato pode prever outras causas de dissolução, a serem verificadas judicialmente quando contestadas. Art. 1.036, CC - Ocorrida a dissolução, cumpre aos administradores providenciar imediatamente a investidura do liquidante e restringir a gestão própria aos negócios inadiáveis, vedadas novas operações, pelas quais responderão solidária e ilimitadamente.

Parágrafo único. Dissolvida de pleno direito a sociedade, pode o sócio requerer, desde logo, a liquidação judicial.

Art. 1.037, CC - Ocorrendo a hipótese prevista no inciso V do art. 1.033, o Ministério Público, tão logo lhe comunique a autoridade competente, promoverá a liquidação judicial da sociedade, se os administradores não o tiverem feito nos trinta dias seguintes à perda da autorização ou se o sócio não houver exercido a faculdade assegurada no parágrafo único do artigo antecedente.

Parágrafo único. Caso o Ministério Público não promova a liquidação judicial da sociedade nos quinze dias subseqüentes ao recebimento da comunicação, a autoridade competente para conceder a autorização nomeará interventor com poderes para requerer a medida e administrar a sociedade até que seja nomeado o liquidante.

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7.3 A administração da sociedade limitada: apanhado entre o Decreto Lei n°

3.708/1919 e o Código Civil de 200247

A palavra etimologia, da palavra administrar, vem do latim ad (que quer dizer

direção, tendência para) e minister (subordinação ou obediência). Significa aquele

que realiza uma função abaixo do comando de alguém, ou seja, aquele que

presta um serviço a outro (DRUCKER, 1962, p. 22-23).

Uma empresa é considerada uma atividade econômica desenvolvida pela

sociedade. Administrar do ponto de vista de gestão organizacional é colocar em

prática decisões com objetivos e recursos.

Quem exerce a administração é o administrador, que também é comumente chamado de gerente, governante, dirigente, empresário, presidente e até mesmo chefe (MAXIMIANO, 1997, p. 16, apud CRIVELARI, 2005, p. 8)48.

O Decreto Lei n° 3.708/1919, ao tratar das sociedades limitadas, deixou muitas

lacunas na lei que obrigavam os sócios a recorrer à Lei das Sociedades

Anônimas como meio de complementar o dispositivo citado. Só que as duas

sociedades tinham suas peculiaridades e, como tal, não compartilhavam tantas

semelhanças, a começar pela constituição de seu capital que, de uma, derivava

de ações (dinheiro em espécie); e a outra, por quota-parte que não podia ser

identificada como dinheiro em espécie e sim por bens que representassem a

parte do sócio na empresa.

Art. 1.038, CC - Se não estiver designado no contrato social, o liquidante será eleito por deliberação dos sócios, podendo a escolha recair em pessoa estranha à sociedade.

§ 1o O liquidante pode ser destituído, a todo tempo: I - se eleito pela forma prevista neste artigo, mediante deliberação dos sócios; II - em qualquer caso, por via judicial, a requerimento de um ou mais sócios, ocorrendo justa causa. § 2o A liquidação da sociedade se processa de conformidade com o disposto no Capítulo IX, deste Subtítulo.

47 Artigo 1060, CC – A sociedade limitada é administrada por uma ou mais pessoas designadas no contrato social ou em ato separado.

Parágrafo único. A administração atribuída no contrato a todos os sócios não se estende de pleno direito aos que posteriormente adquiram essa qualidade

48 Maximiano, Teoria Geral da Administração: da Escola Científica à Competitividade em Economia Globalizada, 1997, p.16.

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É importante salientar que, no passado, os administradores eram meros

mandatários dos sócios e que hoje, com o conceito mais moderno de empresa, há

convicção de que estes são órgãos da sociedade que podem receber o nome de

gerente, diretor ou simplesmente administrador.

Na vigência do Decreto 3.708/19, os próprios sócios exerciam a administração,

porque em seu artigo 10 trazia a determinação de “responsabilidade aos sócios-

gerentes para com a sociedade e para com terceiros, solidária e ilimitadamente,

pelo excesso de mandato e pelos atos praticados com violação do contrato ou da

lei”. Ao falar em sócio-gerente, queria o legislador discriminar os componentes

que podiam administrar tal sociedade.

Esse conceito vem da premissa de que a melhor administração deve ser feita

pelos membros da empresa, que querem o êxito, a lucratividade e o

reconhecimento empresarial diante da sociedade humana. Isso porque a empresa

precisa de reconhecimento entre os sócios que a fundaram, os funcionários que

ali trabalham e os fornecedores e consumidores que acreditam no potencial.

O medo do legislador do Decreto 3.708/19 era de que se algum administrador

fosse externo à sociedade que não tivesse o vínculo afetivo, não administraria

bem. Mas, apesar deste olhar, o legislador permitiu que por escolha do sócio

houvesse a figura do sócio delegado que estava expresso no artigo 13 de tal

dispositivo, mas desde que o contrato não vedasse expressamente.

O contrato tem importante função constitutiva desse tipo de sociedade, pois é

nele que estão registradas todas as cláusulas que deverão conduzir os caminhos

dessa nova empresa. E sempre lembrando que alguns atos devem ser

respeitados mesmo sem estar expressos no contrato, pois, ao contrário, o

administrador responderia por abuso de poder. De acordo com Egberto Lacerda

de Teixeira em sua obra “Das Sociedades por Quotas de Responsabilidade

Limitada”, podem-se enumerar alguns atos do administrador:

Todos os atos compreendidos no objeto da sociedade e exigidos pela

função normal da empresa, tais como comprar mercadorias e matérias-

primas; vender produtos fabricados ou destinados à revenda, a prazo ou a

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dinheiro; locar prédios para instalação do estabelecimento, fábricas,

escritórios, armazéns; ajustar contas, cobrar dívidas e dar quitação;

contrair empréstimos e operações de crédito;

subscrever obrigações sociais, como contratos in genere, letras de câmbio,

notas promissórias, cheques, conhecimentos, warrants, etc.

usar de medidas conservatórias de direito, como interrupção de prescrição,

inscrição de ônus reais, etc.

nomear e demitir empregados;

representar a sociedade em juízo, ativa e passivamente, e nomear

advogados com todos os poderes ad judicia;

exigir dos sócios as quotas e contingentes a que se obrigaram nos prazos

e pela forma convencionada no contrato social.

Com isso fica claro que os atos do administrador são independentes, desde que

este não aja com dolo, com o intuito de causar prejuízo à empresa. E neste

pensamento o legislador se precaveu, não deixando total liberdade para o

administrador, que dependerá de aprovação da sociedade por meio de seu

contrato para:

Entrar em operações diversas das estabelecidas no contrato institucional

da sociedade, salvo com o consentimento dos outros sócios;

aplicar os fundos, bens e haveres da sociedade em negócio ou uso de

conta própria ou de terceiro sem o prévio consentimento, por escrito, dos

demais sócios;

alienar, sob qualquer forma ou condição, bens imóveis ou imobilizados da

sociedade ou os móveis não destinados à venda, bem como gravar,

hipotecar ou dar em penhor bens móveis ou imóveis da sociedade;

doar bens do patrimônio social ou fazer liberalidades incompatíveis com a

finalidade lucrativa da empresa.

Nesta linha de pensamento, o que se percebe é que o gerente tem a função

semelhante à de um administrador de empresas nos tempos atuais, que tem

como objetivo primordial trazer lucro para aqueles sócios. Nenhuma empresa

surge no mercado sem buscar meios que a façam crescer profissionalmente e

também lucrativamente.

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A preocupação da sociedade está relacionada com o seu patrimônio e também

com terceiros de boa-fé que venham a ingressar nesse caminho. A

responsabilidade em proteger esses dois componentes será do Estado e nesse

momento os Tribunais tentam fazer como no Direito cambiário: conciliar a defesa

da aparência jurídica e a proteção dos interesses legítimos dos sócios e dos

terceiros.

E nesse instante, quando o Poder Judiciário se preocupa com as pessoas desta

relação, pode-se perceber que o Juiz poderá, a seu livre convencimento, avaliar o

caso concreto, com o uso da analogia, costumes e princípios gerais do Direito,

por entender que se a lei tem lacunas, o caso concreto pode ser resolvido desde

que não lese as partes presentes nessa relação.

A partir de 2002, com a vigência da Lei nº 10.406, pôde-se entender que alguns

pontos se tornaram primordiais para se criar um sociedade limitada, mas, com

isso surgiu também a burocratização. Assim, criaram-se órgãos que se tornaram

obrigatórios para instituir tal sociedade como um administrativo (arts. 1.060 a

1.065, CC) e outro deliberativo (arts. 1.072 e seguintes), podendo

facultativamente ter um órgão fiscalizador (arts. 1.066 a 1.070, CC). O intuito foi

realizar amplamente a função da sociedade, que é: promover a gestão interna e a

presentação externa, como diria Pontes de Miranda. A sociedade nunca será

representada e sim presentada; e com este pensamento somente poderá ser

presentada por uma pessoa física ou natural, porque se não for assim uma

pessoa jurídica poderá administrar outra pessoa jurídica e isso não é permitido

aos olhos do legislador do Novo Código Civil.

O Código Civil de 2002 trouxe um diferencial quanto ao administrador designado

por ato separado, ou seja, mesmo se o contrato silenciar, podem os sócios, por

meio de ata em apartada, que deverá ser registrada na Junta Comercial, aprovar

um administrador que não seja sócio da empresa. Será apenas este o profissional

que exercerá a função de coordenar aquela empresa com o intuito de fazê-la

lucrativa, pois o que realmente interessa é o sucesso profissional da mesma.

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O mencionado administrador será estranho a essa sociedade, não veio por meio

da afetividade que existia entre tais pessoas, mas com o propósito de tornar

sólida aquela sociedade, visualizando pontos que talvez os sócios não estivessem

vislumbrado ainda.

Agora que já foi mencionado que pode, sim, o administrador não sócio assumir a

função de executor dos fatos para que esta seja bem-sucedida, é mister saber

que a sociedade limitada pode ser desenvolvida em dois tipos bem significativos.

Primeiro, uma sociedade limitada que será regida pela sociedade simples e outra

que seguirá subsidiariamente as disposições da sociedade anônima. E nesse

instante será preciso saber como se resguardará a responsabilidade do

administrador. Se for sociedade simples, o Código Civil de 2002; se for sociedade

anônima Lei nº 6.404/76.

Código Civil de 2002 Lei nº. 6.404/76

a) Dever de Diligência Dever de Diligência

b) Responsabilidade solidária com a sociedade

por atos praticados antes da averbação do

instrumento em separado de nomeação.

Dever diante da finalidade das

atribuições dos administradores

e responsabilidade diante do

desvio do poder.

c) Responsabilidade pelas perdas e danos

causados à sociedade por atos em

desacordo com a maioria.

Dever de Lealdade.

d) Responsabilidade por excesso de poder. Conflito de interesses entre

administradores e sociedade.

e) Responsabilidade solidária dos

administradores perante a sociedade e

terceiros por atos praticados com culpa no

desempenho de suas funções.

Dever de Informar.

f) Responsabilidade pelos prejuízos e em

caso de aplicação de valores e créditos em

proveito próprio ou de terceiros.

Responsabilidade dos

administradores pelos prejuízos

causados à sociedade.

g) Responsabilidade solidária e ilimitada no Ação para promover a

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caso do uso da firma desacompanhada da

palavra “ilimitada” ou de sua abreviatura.

responsabilidade dos

administradores.

QUADRO 2 – Comparativo entre o Código Civil em vigor e a Lei nº. 6.404/76

Ao fazer a análise do art. 1.011, Código Civil, e do art. 153, Lei nº 6.404/76, o

administrador da sociedade limitada / companhia deverá ter, no exercício de suas

funções, o cuidado e a diligência que todo homem ativo e probo costuma

empregar na administração de seus próprios negócios. Fica visível a preocupação

do legislador na responsabilidade do administrador e principalmente nos deveres

de diligência, de informar e de lealdade, que estão sempre presentes mesmo que

não transcritos no contrato social ou mesmo na ata de averbação.

O texto legal do artigo 1.015, CC, traz em seu bojo que no silêncio do contrato os

administradores podem praticar todos os atos pertinentes à gestão da sociedade

e que o excesso dos poderes deles somente poderá ser oposto a terceiro se: a

limitação dos poderes do administrador estiver averbada no Registro de Imóveis;

se o negócio é totalmente estranho à sociedade; ou, ainda, se o terceiro sabia

dessa limitação e mesmo assim quis negociar com o administrador. Porém, não

se enquadrando nessas hipóteses, responderá a sociedade pelos atos praticados

pelo administrador que tinha poderes para tal cumprimento de deveres.

No entanto, quando o administrador abusa dos poderes a ele confiado,

responderá pessoalmente pelos atos praticados. Isso acontece porque a

sociedade limitada, quando tem como seu representante um administrador, ela

torna esse ato público quando registra a ata que originou essa decisão.

Foi avaliada a função da pessoa jurídica que não poderá ser administrador da

sociedade limitada, pois o art. 997, CC c/c art. 1.062, CC, confirma que, para

exercer os atos administrativos, são necessários alguns documentos, como

nacionalidade, estado civil, residência, data e ato de nomeação e documento de

identidade, todos dados que identificam a pessoa física. Esse administrador não

poderá delegar para terceiros sua função. Uma vez nomeados, esses atos

poderão ser revogados a qualquer tempo, de acordo com o artigo 1.019,

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parágrafo único, verbis: “Parágrafo único. São revogáveis, a qualquer tempo, os

poderes conferidos a sócio por ato separado ou a quem não seja sócio”.

Portanto, é sabido que no novo ordenamento civil é permitido que terceiro venha

a administrar a empresa, desde que este não delegue a outro suas funções e que

só seja cabível à pessoa física que tenha tais atribuições para tanto.

Administrar com razão não é uma ciência, nem arte, mas tão somente uma

prática, com utilização de técnicas e conhecimento do assunto.

Segundo entendimento de Francis Aguilar, em sua obra intitulada Ética nas

Empresas, para se criar e administrar no âmbito da organização um processo de

ética empresarial, são necessárias quatro frentes principais:

Desenvolvimento de sensibilidade ética. Essa ação exige que os

administradores se informem da natureza do desafio da ética empresarial e

se tornem sensíveis nesse particular para suas empresas. Os executivos

precisam desenvolver sensibilidades às questões morais que afetam ou

ameaçam as empresas.

Forte estratégia competitiva e administração operacional. A segunda ação

obrigatória no processo ético exige que os administradores providenciem

para que a empresa seja bem gerada em todos os demais aspectos.

Desempenho empresarial evita consequências de fracasso. A pressão da

diretoria ou a ameaça da concorrência podem levar até os mais graduados

administradores a cair na tirania dos lucros. Ao contrário, a administração

forte e eficaz torna mais fácil o comportamento ético quando a empresa

atinge suas metas financeiras, observando práticas respeitáveis.

Um programa ético na empresa. Com o alicerce de uma sensibilidade ética

e o gerenciamento eficaz, a administração assegura condições de

promover conduta ética em toda a empresa, com a formulação de políticas

e arranjos que promovam a preocupação com interesses das partes

afetadas por suas operações e proporcionem garantias contra pressões

corruptoras dos negócios.

Pessoal ético. O quarto componente consiste em prover a empresa de

pessoal ético, mediante seleção de indivíduos que cultivem fortes

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princípios morais e éticos (AGUILAR, 1996, p. 29-3149, apud CRIVELARI,

2005, p. 87).

7.4 Direito estrangeiro

No Código Civil Italiano:

Artigo 2.487 – Administração. Salvo disposição em contrário do ato de constituição, a administração da sociedade deve ser confiada a um ou mais sócios. Aplicam-se à administração da sociedade os artigos 2.381, 2.382, 2.383, primeiro, terceiro, quarto, quinto, sexto e sétimo parágrafos, 2.384, 2.384 bis, 2.385, 2.386, 2.388, 2.389, 2.390, 2391, 2.392, 2.393, 2.394, 2.395, 2.396 e 2.434.

“Artigo 2.382 – Causas de inelegibilidade e de decadência. Não pode ser nomeado administrador, e caso nomeado perde seu cargo, o interditado, o incapacitado (414 e seguinte), o falido ou que foi condenado a uma pena que acarrete a interdição, ainda que temporária, dos cargos públicos ou a incapacidade para exercer cargos de direção (2.641). Artigo 2.391 Conflito de interesses O administrador que, em uma determinada operação, tenha por conta própria ou de terceiros interesse em conflito com o interesse da sociedade, deve informar os outros administradores e o conselho fiscal e deve abster-se de participar das deliberações relativas a essa operação (1.394, 2.631). Em caso de inobservância, o administrador responde pelas perdas que sejam derivadas à sociedade pela conclusão da operação”.50

49 AGUILAR, Francis J. A ética nas Empresas. Rio de Janeiro: Zahar, 1996. P.29/31. 50 ITÁLIA, Codice Civile: Artigo 2.487. Amministrazione Salvo diversa disposizione dell’atto costitutivo I’amministrazione della società deve essere affidata a uno o più soci. Si applicano all’amministrazione dellasocietà gli artt. 2.381, 2.382, 2.383, primo, terzo, quarto, quinto, sesto e settimo comma, 2.384, 2.384 bis, 2.385, 2.386, 2.388, 2.389, 2.390, 2391, 2.392, 2.393, 2.394, 2.395, 2.396 e 2.434. ITÁLIA, Códice Civile: artigo 2.382 Cause d’ineleggibilità e di decadenza Non può essere nominato amministratores, e se nominato decade dal suo ufficio, I’interdetto, I’inabilitato (414 e seguente), Il fallito, o chi è stato condannato ad uma pena Che importa I’interdizione, anche temporane, daí pubblici uffici a I’incapacità ad esercitare uffici direttivi (2.641). ITÁLIA, Codice Civile: artigo 2.391. Conflitto d’interessi L’amministratore, Che in uma determinata operazione há, per conto próprio o di terzi, interesse in conflito com quello della società, deve darne notizia algi altri amministratori e al collegio sindacale, e deve astenersi dal partecipare alle deliberazioni riguardanti l’operazione stessa (1.394, 2.631). In caso d’inosservanza, I’amministratore risponde delle perdite Che siano derivate Allá società dal compimento dell’operazione.

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Na Alemanha:

GmbHG § 6 Diretores (redação de 12 de setembro de 1990). (1) A sociedade deve ter um ou mais diretores. (2) O diretor deve ser uma pessoa natural e ilimitadamente apta para os negócios. Uma pessoa que aja de modo imprudente na condução de negócios (§ 1903 do Código Civil) não pode ser diretor. Quem, em função de um delito tiver sido condenado pelos §§ 283 a 283d do Código Penal, não pode tornar-se diretor por um período de cinco anos após o término da vigência da sentença; no prazo não está contabilizado o tempo no qual o réu, por ordem judicial, tiver sido mantido em estabelecimentos do Estado. Quem, em função de decisão judicial ou decisão de um órgão administrativo for desautorizado a exercer uma profissão, não pode tornar-se diretor enquanto vigorar o período de “interdição”. (3) Podem ser convidados os sócios ou outras pessoas para a posição de diretor. O convite se materializa tanto por meio do contrato social, quanto mediante as considerações do capítulo terceiro. (4) Se constar no contrato social que todos os sócios têm direito a integrar a diretoria, serão considerados válidos como diretores apenas os que forem adequados segundo os termos desta determinação.51

Em se tratando de Direito português:

Código de Sociedades Comerciais Português Capítulo VI – Gerência e fiscalização Artigo 252° - Composição da gerência 1 – A sociedade é administrada e representada por um ou mais gerentes, que podem ser escolhidos de entre estranhos à sociedade e devem ser pessoas singulares com capacidade jurídica plena. 2 - Os gerentes são designados no contrato de sociedade ou eleitos posteriormente por deliberação dos sócios, se não estiver prevista no contrato outra forma de designação. 3 - A gerência atribuída no contrato a todos os sócios não se entende conferida aos que só posteriormente adquiram esta qualidade.

51 ALEMANHA, GmbHG. § 6 Geschäftsführer Vom 12. September 1990 (1) Die Gesellschaft muB einen oder mehrere Geschäftsführer haben. (2) Geschäftsführer kann nu reine natürliche, unbeschränkt geschäftsfähige Person sein. Ein

Betreuter, der bei der Besorgung seiner Vermögensangelegeheiten ganz oder teilweise einem Einwilligungsvorbehalt (§ 1903 des Bürgerlichen Gesetzbuchs) unterliegt, kann nicht Geschäftsführer sein. Werwegen einer Straftat nach den §§ 283bis 283d dês Strafgesetzbuchs verurteilt worden ist, kann auf die Dauer Von fünf Jahren seit der Rechtskraft dês Urteils nicht Geschäftsführer sein; in die Frist wird die Zeit nicht eingerechnet in welcher der Täter auf behördliche Anordnung in einer Anstalt verwahrt worden ist. Wem durch gerichiliches Urteil oder durch vollziehbare Entscheidung einer Verwaltungsbehörde die Ausübung eines Berufs, Berufszweigs, Gewerbes oder Gewerbezweig untersagt worden ist, kann für die Zeit, für welche das Verbot wirksam ist, bei einer Gesellschaft, deren Unternehmensgegenstand ganz oder teilweise MIT dem Gegenstand dês Verbots übereinstimmt, nicht Geschäfts – führer sein.

(3) Zu Geschäftsführem können Gesellschafter oder andere Personen bestellt werden. Die Bestellung erfolgt entweder im Gesellschaftsvertrag oder nach MaBgabe der Bestimmungen dês dritten Abschnitts.

(4) Ist im Gesellschaftsvertrag bestmimmt, daB sämbtliche Gesellschafter zur Geschäftsführung berechtigt sein sollen, so gelten nur die der Gesellschaft bei Festsetzung dieser Bestimmung angehörenden Personen als die bestellten Geschäftsführer.

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4 – A gerência não é transmissível por acto entre vivos ou por morte, nem isolada, nem juntamente com a quota. Os gerentes não podem fazer-se representar no exercício do seu cargo, sem prejuízo do disposto no n. 2 do artigo 261°. 6 – O disposto nos números anteriores não exclui a faculdade de a gerência nomear mandatários ou procuradores da sociedade para a prática de determinados actos ou categorias de actos, sem necessidade de cláusula contratual expressa.

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8 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na verdade, o Direito Material, o Direito Processual e o posicionamento

doutrinário, bem como as decisões dos tribunais referentes ao tema, serviram

para elucidar as questões propostas nesta pesquisa.

A perda de um sócio quotista sem a preparação de um sucessor, acumulado com

a ausência de previsão no contrato social, é o que justificou o desafio desta

pesquisa. Criou-se um liame entre Direito Econômico, Direito Civil, Direito

Processual Civil, especificadamente o Direito Societário e o Direito Sucessório, no

aquinhoamento realizado na sucessão hereditária, na qual a transferência

involuntária de quotas muitas vezes decorre de imposição legal e acaba

repercutindo na esfera dos direitos e interesses dos demais sócios e da própria

sociedade.

A prática às vezes encontrada de, em lugar de liquidar a sociedade, buscar uma

exegese conciliadora ao aparente conflito de interesses entre os princípios da

legislação civil, possibilita a administração da sociedade limitada de forma

harmônica e eficaz. Entretanto, nem sempre isso é possível.

É importante que se leve em consideração que, se houver a transferência

involuntária de quotas em caso de falecimento do sócio, poderá ainda haver

rejeição dos demais sócios remanescentes à integração do

sucessor/administrador, tornando seu desempenho precário na administração da

sociedade limitada.

Sem a pretensão falível de esgotar o assunto, discutiram-se as condições e

limitações do sucessor, ao aceitar o múnus de administrar a quota-parte do sócio

falecido.

Nos capítulos introdutórios, apresentaram-se conceitos necessários ao

entendimento do tema, para em seguida trazerem-se implicações da

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transferência voluntária e involuntária das quotas na sociedade limitada. Buscou-

se, então, demonstrar como esse fenômeno vem chocar-se com o interesse

social de preservação da pessoa jurídica, da ausência do affectio societatis,

apresentando como principal característica a limitação e precariedade, com

limitação dos poderes na administração do sucessor.

O exercício da administração é precário porque é realizado por sucessores que

ainda não são definidos como sócios, tendo eles participação específica e

limitação de responsabilidade. O processo sucessório ocupa relevante espaço

nas discussões jurídicas e, para alguns doutrinadores, seu principal escopo e

ponto crítico é a perpetuação do negócio jurídico.

Deixa-se evidente que é uma faculdade a continuação da sociedade limitada com

os sucessores, não assistindo aos sócios remanescentes a mesma possibilidade,

que já não poderiam, diante da expressa previsão contratual ou de uma ordem

judicial, impedir o ingresso do herdeiro.

Com o efeito da morte, o modelo ideal seria o planejamento sucessório como

manifestação de vontade dos sócios, previsto no contrato social; seu silêncio

levará o magistrado analisar o caso concreto como uma forma de preservar os

interesses alheios aos seus.

Impende assinalar que essas conclusões aliam-se à jurisprudência já pacificada

pelo Superior Tribunal de Justiça, apesar de ainda persistirem algumas decisões

contrárias proferidas em juízos ou tribunais de instâncias inferiores.

Forma-se, então, uma análise com círculo virtuoso: ou o prosseguimento da

sociedade sem a participação dos sucessores na administração ou a liquidação

da quota dos herdeiros com a apuração de haveres ou o inventariante prossegue

na sociedade na condição de sucessor do falecido, sem o pagamento de

qualquer espécie, ou os herdeiros se negam a continuar na sociedade ou são, em

última hipótese, recusados pelos demais sócios.

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Com efeito, todos esses conflitos e interesses serão solucionados na via judicial,

no direito à dissolução parcial com a liquidação da quota-parte do de cujus, na

continuação do administrador/sucessor, com perpetuidade do negócio jurídico

nas empresas familiares ou na administração do herdeiro/terceiro, em função da

importância econômica e social da empresa. O administrador continuará sua

gestão de forma precária até a partilha, mas poderá ter sucesso nessa sucessão,

ferindo diretamente o affectio societatis, mas gerando frutos, novos empregos e

fortalecendo a economia. Esta é a orientação jurisprudencial majoritária e minha

defesa.

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Sítios visitados:

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ANEXOS

Anexo A - APELAÇÃO CÍVEL N° 074.933-4/9-00, da Comarca de SÃO SEBASTIÃO

PODER JUDICIÁRIO - TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

ACÓRDÃO

Sociedade por quotas de responsabilidade limitada. Cláusula contratual que, no caso de morte de sócio, prevê a continuação da sociedade com os sócios remanescentes e, excepcionalmente, faculta a admissão dos herdeiros do sócio morto em substituição a este. Faculdade, entretanto, que depende de consenso entre a maioria dos sócios remanescentes e os herdeiros do sócio morto, sem o qual a estes, sem se revestirem da qualidade de sócios, caberá tão somente recolher os haveres que o sócio morto tinha na sociedade.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL N° 074.933-4/9-00, da Comarca de SÃO SEBASTIÃO, em que é apelante ANDRÉ DE QUEIROZ ALVES, sendo apelados GUNNAR ENNO MOLLER e SUA MULHER: ACORDAM, em Oitava Câmara de Direito Privado (JAN/99) do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por votação unânime, negar provimento ao recurso.

1. A respeitável sentença de primeiro grau julgou procedente a presente ação movida por Gunnar Enno Moller e sua mulher contra André de Queiroz Alves para decretar a dissolução parcial da sociedade civil "Marina Porto Ilhabela S/C Ltda", com apuração dos haveres do réu seja na qualidade de sócio, seja na qualidade de herdeiro da sócia falecida Lilia Maria de Queiroz Alves.

APELAÇÃO CÍVEL N° 074.933-4/9-00 - SÃO SEBASTIÃO

Inconformado, o vencido ofertou apelação, aduzindo: a) que a sentença é nula porque não fundamentada na realidade processual; b) que, dada a sua condição de herdeiro da sócia Lilia Maria de Queiroz Alves, é sócio majoritário da sociedade e, consequentemente, os autores não podem excluí-lo por não satisfazerem requisito exigido pelo art. 15 do Decreto 3.708; c) que se limitou a exercer seus direitos de sócio, não sendo responsável pelo perecimento da affectio societatis, que deve ser debitada ao autor que se recusa ilegalmente a prestar as contas que deve como administrador da sociedade.

Interposta com prova do recolhimento do preparo, a apelação foi admitida e respondida.

2. A respeitável sentença não é nula porque devidamente fundamentada, não sendo correta a assimilação feita pelo recorrente de sentença equivocadamente fundamentada com sentença sem fundamentação, posto aquela comportar reforma e esta última ser nula. Aliás, se fundamentação equivocada equivalesse a falta de fundamentação não haveria possibilidade de reforma de sentença porquanto seriam nulas todas aquelas cuja motivação fosse insubsistente.

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3. E relevante verificar, na hipótese, se, após a morte da sócia Maria Lilia de Queiroz Alves, os autores Gunnar Enno Moller e sua mulher Maria Virgínia Sutherland Moller detinham ou não a maioria do capital social, para o que é indispensável estabelecer o exato efeito da cláusula do contrato social, que reza: "O falecimento de qualquer dos sócios não determina a liquidação da sociedade, devendo as quotas do sócio falecido serem pagas a quem de direito, mediante formalidades legais, de acordo com o último balanço apurados, mais os lucros verificados até a data do falecimento, pelos quotistas remanescentes.”

A sociedade poderá em caso de falecimento de qualquer sócio continuar com suas atividades com os herdeiros do sócio falecido, os quais nomearão seu mandatário.

Tratando-se de sociedade civil que se reveste de forma prevista em lei comercial (sociedade por quotas) e que, nos termos do art. 1.364 do Código Civil, se rege pelas normas mercantis, é manifesto que a primeira parte da cláusula em questão objetivou afastar a incidência da primeira parte do art. 335, n. IV, do Código Comercial, estabelecendo, como regra, a continuidade da sociedade e o pagamento aos herdeiros do sócio morto dos haveres que este tinha na sociedade.

A parte final da cláusula, por exceção, permite que os herdeiros do sócio morto o sucedam na sociedade. O emprego do termo poderá por evidencia tratar-se de uma mera faculdade, que será exercida ou não segundo critério dos interessados, ou seja, dos herdeiros do sócio morto e ao menos da maioria dos demais sócios.

Dispondo a cláusula nona do contrato social que a transferência das quotas sociais depende da anuência de todos os sócios, há de se entender que o ingresso de um novo sócio, mesmo na hipótese de herdeiro ou herdeiros de um sócio morto, também depende dessa anuência. De outra parte, é óbvio que cláusula contratual não pode obrigar os herdeiros de um sócio, estranhos ao contrato, a participar da sociedade. Daí porque a parte final da cláusula deve ser entendida como uma faculdade cujo exercício depende de existência de consenso entre a maioria dos sócios remanescentes e os herdeiros do sócio morto.

Dir-se-á que poderia ser diferente no caso do herdeiro do sócio morto, como acontece no caso, já ser sócio da sociedade, mas o certo é que não se previu essa situação excepcional e, conseqüentemente, há de se entender incidente, na hipótese, em razão de dissensão entre os interessados, a primeira parte da cláusula do contrato social e que, portanto, na qualidade de herdeiro de sócia Lilia Maria de Queiroz Alves o recorrente tem apenas o direito de receber os haveres que esta tinha na sociedade.

E, sendo assim, os autores ora recorridos, a partir do falecimento da mencionada sócia, detinham a maioria do capital social, pois titulares, em conjunto, de 375 quotas, enquanto que o recorrente é titular de 100 quotas sociais (cfr. fls. 17).

Dessarte, como detentores da maioria do capital social, em tese, podiam excluir o sócio minoritário, como faculta o Decreto 3.708, e uma vez que exerceram essa faculdade legal (fls. 23/24), ao sócio excluído só restava ingressar em juízo para questionar a validade de sua exclusão (o que deixou de fazer) ou para receber os seus haveres na sociedade, para o que basta a existência da presente ação.

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Não merece, pois, reparo algum a respeitável sentença recorrida, uma vez que a questão referente à prestação de contas devida pelo autor varão em decorrência da sua qualidade de gerente da sociedade é estranha ao presente processo e não interfere no seu desate. O eventual não cumprimento da obrigação de prestar contas, efetivamente, tem efeitos jurídicos que não afetam o direito da maioria de excluir o sócio minoritário que, ao invés de questionar em juízo as razões da decisão da maioria, preferiu negar a existência dessa maioria, como visto sem razão no particular.

Assim, pelo exposto, negam provimento ao recurso.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores RICARDO BRANCATO (Presidente) e HAROLDO LUZ.

São Paulo, 14 de abril de 1999.

ALDO MAGALHÃES

RELATOR

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Anexo B - APELAÇÃO CÍVEL n° 167.345-4/8, da Comarca de LIMEIRA

PODER JUDICIÁRIO - TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

ACÓRDÃO

Quando os herdeiros do sócio não conseguem manter a affecctio societatis que antes reinava na sociedade de responsabilidade limitada, a ordem jurídica ressalva a opção pela dissolução parcial, com apuração de haveres, exercício legal da condição de sócio (artigos 1682, do Código Civil e 335, IV, do Código Comercial), que deverá ser obtida em processo que inclua a própria sociedade, finalizando com apuração mais completa possível da realidade financeira – Não provimento.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL n° 167.345-4/8, da Comarca de LIMEIRA, em que é apelante MÁRCIO CLÁUDIO D'ANDRÉA, sendo apelados JUADIR KLEIN e OUTROS: ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por votação unânime, negar provimento ao recurso. MÁRCIO CLÁUDIO D'ANDRÉA recorre da r. sentença que, ao acolher ação proposta por JUADIR KLEIN e outros, declarou a dissolução parcial da sociedade J.D'Andréa & Cia. Ltda., permitindo a retirada deles com apuração de haveres, reafirmando que os herdeiros do sócio falecido não são partes legítimas (porque não são sócios) e que deveria estar incluída na relação a sociedade que foi parcialmente dissolvida. No mérito, pede a improcedência com base na cláusula 9 do contrato social (f 1. 12), diante do que consta do art. 355, n. A, do Código Comercial.

É o r e l a t ó r i o.

A cláusula nona do contrato social (fl. 12) reforça a legitimação dos herdeiros de Josefino para a presente ação, porque prevê que a morte do sócio transfere para os seus herdeiros o status de sócio da sociedade, o que, na prática, legaliza intervenção judicial para a continuidade empresarial ou para recebimento dos haveres decorrentes da dissolução (total ou parcial).

E não seria sequer necessário tal regramento contratual, visto que o art. 1682, do Código Civil, articulado com o 335, IV, do Código Comercial e interpretado em conjunto com o art. 668, do CPC de 1939 e art. 1218, VII, do CPC de 1973, investe o herdeiro do sócio falecido do direito societário transmitido pela sucessão hereditária, o que o habilita ao exercício das prerrogativas legais, entre as quais a de receber os haveres pela inviabilidade de preservar a affectio societatis.

Nesse sentido a lição de FÁBIO ULHOA COELHO (Curso de Direito Comercial, Saraiva, 2002, vol. 2, p. 465): "Se falece o sócio da sociedade limitada, isso pode implicar a dissolução parcial desta. De fato, a participação societária, como os demais elementos do patrimônio do falecido, será atribuída, por sucessão causa mortis, a um herdeiro ou legatário, que nunca estão obrigados a fazer parte da sociedade limitada, seja ela de pessoa ou de capital. Tem eles direito, portanto, à apuração dos haveres de que decorre a dissolução parcial" (grifei).

A r. sentença ao declarar a dissolução parcial e garantir a sobrevida comercial da sociedade, seguiu a lição respeitada de CARVALHO DE MENDONÇA (J.X.), que ao

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analisar as conseqüências da morte do sócio (n. 786, p. 210, vol. III, do Tratado de Direito Comercial Brasileiro, ed. Freitas Bastos, 1938}, afirmou: "A sociedade não entra em liquidação, por isso que nem dissolvida é pela morte do sócio. 0 direito desses herdeiros limita-se ao de reclamar da sociedade a parte a que tinha direito o seu antecessor".

Quanto à legitimidade passiva, é forçoso reconhecer que o r. despacho de fl. 27, emitido devido ao enunciado jurisprudencial que recomenda a inclusão da sociedade no pólo passivo da ação de dissolução parcial {REsp. 80.481 DF, DJU de 17.12.1999, Min. BARROS MONTEIRO, in RSTJ 132/391), determinou e obteve a emenda para que a J.D'Andréa Ltda. fosse citada (f1. 31, verso) . 0 artigo 3, do CPC, está cumprindo nas duas vertentes da angularidade processual.

No mérito, a r. sentença determinou, mais uma vez com acerto, que a apuração de haveres se fizesse em liquidação de sentença e, na execução, deverá ser observado que o critério de verificação deverá ser o mais próximo possível da conferência real, como se de dissolução total se tratasse (REsp. 105.667 SC, DJU de 06.11.2000, Civil e Processual Civil, Síntese, n. 9, p. 114, verbete n. 955). É importante registrar que inclusive deverá ser incluído no laudo de avaliação o valor do fundo de comércio, como admite a jurisprudência do STJ (REsp. 52.094 SP, DJU de 21.8.2000, Min. NILSON NAVES, in RSTJ 14 7/223}. Somente com tal ideologia se preserva o quantum devido ao sócio retirante, que deve ser medido com justiça, evitando-se, de outro modo, o locupletamento indevido da sociedade ou sócios remanescentes

(Resp. 315.915 SP, DJU de 04.02.2002, Min. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, in Revista Nacional de Direito e Jurisprudência, editada em Ribeirão Preto, n. 28, p. 145).

Nega-se provimento.

Participaram do julgamento os Desembargadores CARLOS ROBERTO GONÇALVES {Presidente, sem voto), LUIZ ANTÔNIO DE GODOY (Revisor) e FLÁVIO PINHEIRO.

Relator

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Anexo C - RECURSO ESPECIAL Nº 744.349 - PR (2005/0065691-4)

RELATOR: MINISTRO ARI PARGENDLER

RECORRENTE: SEME RAAD E CÔNJUGE

ADVOGADO: GRACIELA IURK MARINS E OUTROS

RECORRIDO: FAISSAL ASSAD RAAD E OUTROS

ADVOGADOS: VINICIUS DE FIGUEIREDO TEIXEIRA

LUIZ HENRIQUE DE ANDRADE NASSAR E OUTROS

EMENTA

PROCESSO CIVIL. AÇÃO CAUTELAR. Se os sócios, detentores de igual participação, estão em litígio, o juiz pode, embora ainda não decretada à dissolução da sociedade, afastar da respectiva gerência aquele que descumpriu ordem judicial de que os negócios sociais, até a apuração dos haveres de cada qual, fossem objeto de administração compartilhada. Recurso especial não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso especial nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Carlos Alberto Menezes Direito, Nancy Andrighi, Castro Filho e Humberto Gomes de Barros votaram com o Sr. Ministro Relator. Sustentaram oralmente o Dr. Edson Queiroz, pelos recorrentes e, o Dr. Vinicius de Figueiredo Teixeira, pelos recorridos.

Brasília, 27 de setembro de 2005 (data do julgamento).

MINISTRO ARI PARGENDLER

Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 744.349 - PR (2005/0065691-4)

RELATÓRIO

EXMO. SR. MINISTRO ARI PARGENDLER (Relator):

Nos autos de ação cautelar ajuizada por Faissal Assad Raad e sua mulher, Bernardete Demeterco Raad, com a finalidade principal de afastar Seme Raad das funções de gerência de Importadora de Frutas La Violetera Ltda., de Concorde Administração de Bens Ltda., de Comércio, Importação e Exportação de Materiais de Construção Picadilly Ltda. e de La Violetera Indústria e Comércio de Gêneros Alimentícios Ltda. (fls. 50/88, 1º

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vol.), o MM. Juiz de Direito deferiu o pedido, em termos, “afastando Seme da administração das sociedades e nomeando um interventor para administrar as empresas em conjunto com o sócio Faissal” (fl. 343, 2º vol.)

Seguiu-se agravo de instrumento interposto por Seme Raad (fls. 02/30, 1º vol.), a que o tribunal a quo, Relator o Juiz Miguel Pessoa, negou provimento nos termos do acórdão assim ementado:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. MEDIDA CAUTELAR INOMINADA. AFASTAMENTO DO SÓCIO DA GERÊNCIA, MANTIDA A FISCALIZAÇÃO. DECISÃO FUNDAMENTADA EM PROVAS DOCUMENTAIS QUE CONDUZEM AO CONVENCIMENTO DE PREJUÍZO AOS INTERESSES DA SOCIEDADE. CO-GESTÃO DESRESPEITADA. RECURSO IMPROVIDO. Havendo dissenso entre os sócios e interesse comum na dissolução da sociedade, esta deve ser gerida enquanto se praticam os atos necessários à partilha, pelo sócio que melhor gerir os negócios e respeitar o interesse dos demais. Se o sócio gerente não atende as determinações judiciais, correta a sua substituição pelo outro, que detém igual parcela do patrimônio social. A nomeação de interventor da confiança do juiz e a imposição de administração conjunta deste com o sócio gerente e, ainda, a prevalência da decisão daquele (interventor) quando houver dissenso, resguarda em princípio os interesses da sociedade. O expresso reconhecimento de integral liberdade de fiscalização ao sócio afastado da gerência preserva os seus direitos na sociedade (fl. 1.341, 7º vol.).

Rejeitados os embargos de declaração (fls. 1.374/1.385, 7º vol.), Seme Raad e Suzana Tfeli de Raad interpuseram recurso especial com base no art. 105, inc. III, letra a, da Constituição Federal, por violação dos arts. 131, 332 e 333, I, do Código de Processo Civil, bem como dos arts. 1002 e 1060 do Código Civil (fls. 1.387/1.417, 7º vol.).

1. Faissal Assad Raad e sua mulher, Bernardete Demeterco Raad, ajuizaram, aparentemente em 28 de fevereiro de 1997 (data da petição inicial, fl. 88, 1º vol.), ação cautelar contra Seme Raad, para a finalidade principal de afastá-lo das funções de gerência de Importadora de Frutas La Violetera Ltda., de Concorde Administração de Bens Ltda., de Comércio, Importação e Exportação de Materiais de Construção Picadilly Ltda. e de La Violetera Indústria e Comércio de Gêneros Alimentícios Ltda. (fls. 50/88, 1º vol.) – os autores, bem como o réu e a esposa deste, dividindo “igualitariamente (50% e 50%) as quotas sociais das quatro sociedades” (fl. 53, 1º vol.).

A petição inicial historia a constituição do grupo econômico (“Filhos de imigrantes, os irmãos Faissal e Seme começaram a vida vendendo frutas em Curitiba. Contudo, a extrema dedicação ao trabalho fez com que, em pouco tempo, Faissal e Seme criassem a La Violetera Importadora Ltda. e a La Violetera Indústria e Comércio Ltda., que, de pequenas empresas dedicadas ao comércio e à industrialização de alimentos, acabaram por se tornar verdadeiras potências em seu ramo de atividade, com faturamento anual, hoje, próximo da casa dos cem milhões de reais (R$ 100.000.000,00). Com o crescimento experimentado pela La Violetera, Faissal e Seme passaram a investir seus lucros no mercado imobiliário, e acabaram por constituir a Concorde e também a Picadilly que, tendo por objeto a compra e venda de materiais de construção, servia de instrumento ao desenvolvimento das atividades da Concorde" - fl. 54, 1º vol.), a divisão de atribuições (“Faissal ficou responsável exclusivamente pela condição comercial e

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industrial dos negócios de La Violetera” - fl. 55, 1º vol.; “A Seme, por outro lado, competiu a gestão financeira e fiscal da sociedade” - fl. 56, 1º vol.) e os fatos que abalaram a confiança do autor no irmão (“O Sumiço de R$ 790.807,13 do Caixa de La Violetera Importadora” - fl. 58, 1º vol.; “A movimentação oculta e irregular de valores na Concorde” - fl. 64, 1º vol.; “As importações de veículos com liminar através da Picadilly, atitude que pôs em risco o patrimônio pessoal de Faissal” - fl. 69, 1º vol.; “A expulsão dos auditores e a vedação de acesso à escrituração à Faissal” - fl. 70, 1º vol.).

Faissal Raad requereu, ainda, “(a) o arrolamento dos bens das sociedades autoras” e a abstenção de “quaisquer atos que importem na alienação ou oneração do patrimônio das sociedades autoras, a fim de que reste preservado o acervo social das empresas, quer sejam quotas, bens móveis, imóveis, marcas e patentes, enfim, de tudo que disponha valor econômico, não somente daqueles exemplificativamente descritos, mas também daqueles que ainda não sejam de pleno conhecimento dos autores, para o que requerem, desde logo, (i) a intimação dos réus por mandado e (ii) a expedição de editais para conhecimento de terceiros” (fl. 87, 1º vol.).

2. No que aqui interessa “o MM. Juiz a quo deferiu a liminar pleiteada, afastando Seme da administração das sociedades e nomeando um interventor para administrar as empresas em conjunto com o sócio Faissal” (fl. 343, 2º vol.).

Posteriormente, em 18 de março de 1997, novo interventor foi nomeado, sob novo regime, assim especificado:

“O novo interventor deverá gerir os negócios das empresas requerentes, sempre buscando a conciliação de interesses, devidamente assessorado, agora, pelos sócios majoritários Faissal Raad e Seme Raad, que juntos assinarão todos os atos que envolvam a gestão das sociedades comerciais, por si ou por procurador devidamente constituído, observado que à falta de consenso entre os majoritários prevalecerá a deliberação do interventor, daí assinando isoladamente os atos de gestão e administração. Registre-se que a determinação deste sistema de co-gestão prende-se à necessidade de os sócios majoritários terem igualdade jurídica e fática de tratamento, com vistas a prevalecer isonomicamente o interesse societário e a neutralidade do interventor” (fl. 410, 2º vol.).

A 10 de maio de 2004, acolhendo alegações de que Seme Raad teria, no decurso do processo, praticado atos negociais no âmbito das sociedades sem que deles Faissal Assad Raad tivesse conhecimento, o MM. Juiz de Direito Dr. Alexandre Gomes Gonçalves afastou aquele “da gerência das sociedades Concorde Administração de Bens Ltda., Comércio de Materiais de Construção, Importação e Exportação Picadilly Ltda. e o Estacionamento Rivoli Ltda.” (fl. 39, 1º vol.).

No âmbito dos embargos de declaração, o MM. Juiz de Direito esclareceu:

“Não se trata de decisão apressada, na medida em que os pedidos de substituição do interventor e de afastamento do sócio vêm sendo reiterados há cerca de 2 anos, mais de 4000 páginas tendo sido acrescidas aos autos desde então” (fl. 45, 1º vol.).

“... cabe observar que o juízo tomou a cautelar de preservar integralmente o legítimo interesse do sócio afastado, afirmando, como não poderia deixar de ser, a possibilidade

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de fiscalização irrestrita dos negócios sociais, e atribuindo preponderância às decisões do interventor. Diversamente do que pensa o sócio embargante, essa é a cautela que evitará a dilapidação do patrimônio das empresas, fazendo com que, após o julgamento deste feito, não se encontre a situação verificada na liquidação da sociedade Picadilly (autos nº 65400/97), em que nada restou para ser liquidado” (fl. 46, 1º vol., o sublinhado é do texto original).

3. Seguiu-se agravo de instrumento interposto por Seme Raad (fls. 02/30, 1º vol.), a que o tribunal a quo, Relator o Juiz Miguel Pessoa, negou provimento nos termos do acórdão assim ementado:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. MEDIDA CAUTELAR INOMINADA. AFASTAMENTO DO SÓCIO DA GERÊNCIA, MANTIDA A FISCALIZAÇÃO. DECISÃO FUNDAMENTADA EM PROVAS DOCUMENTAIS QUE CONDUZEM AO CONVENCIMENTO DE PREJUÍZO AOS INTERESSES DA SOCIEDADE. CO-GESTÃO DESRESPEITADA. RECURSO IMPROVIDO. Havendo dissenso entre os sócios e interesse comum na dissolução da sociedade, esta deve ser gerida enquanto se praticam os atos necessários à partilha, pelo sócio que melhor gerir os negócios e respeitar o interesse dos demais. Se o sócio gerente não atende as determinações judiciais, correta a sua substituição pelo outro, que detém igual parcela do patrimônio social. A nomeação de interventor da confiança do juiz e a imposição de administração conjunta deste com o sócio gerente e, ainda, a prevalência da decisão daquele (interventor) quando houver dissenso, resguarda em princípio os interesses da sociedade. O expresso reconhecimento de integral liberdade de fiscalização ao sócio afastado da gerência preserva os seus direitos na sociedade” (fl. 1.341, 7º vol.).

Rejeitados os embargos de declaração (fls. 1.374/1.385, 7º vol.), Seme Raad e Suzana Tfeli de Raad interpuseram recurso especial com base no art. 105, inc. III, letra a, da Constituição Federal, por violação dos arts. 131, 332 e 333, I, do Código de Processo Civil, bem como dos arts. 1002 e 1060 do Código Civil (fls. 1.387/1.417, 7º vol.).

Artigo 125, I, do Código de Processo Civil

O artigo 125, I, do Código de Processo Civil deixou de ser prequestionado. Como quer que seja, a alegação de que o julgado o tenha contrariado é despropositada: a desigualdade de tratamento teria resultado do conteúdo do acórdão, a saber:

“O desequilíbrio da relação jurídica processual é flagrante. Deixou-se na gerência das sociedades o sócio condenado por crime de estelionato e afastou-se o outro, porque iniciou tratativas de negócio extremamente rentável às empresas. Onde o equilíbrio de tal espécie de decisão?” (fl. 1.417, 7º vol.).

Artigos 131 e 333, I, do Código de Processo Civil

O artigo 131 do Código de Processo Civil não pode ser invocado para o reexame da prova, e é o que aqui se persegue:

“Nem se venha aqui dizer que se trata de reexame de prova. O que se busca com o recurso especial é a devida valoração jurídica do meio de prova produzido nos autos. No presente caso foi afastado da gerência das empresas o sócio Seme Raad, contra o qual não existe condenação criminal e mantido o sócio Faissal que já foi condenado por crime

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de estelionato praticado justamente na gerência das empresas (fls. 176/209), tendo como vítima seu sócio e irmão Seme. Por aí já se vê o disparate na avaliação jurídica das provas produzidas nos autos. O julgamento no presente caso não se baseou nas provas produzidas no processo. Se fossem corretamente avaliadas as provas, quem teria sido afastado seria o recorrido Faissal” (fl. 1.402, 7º vol.).

“Se o tribunal a quo aplica mal ou deixa de aplicar norma legal atinente ao valor da prova” – decidiu esta Terceira Turma no AgRg no AG nº 655.688, PB, de minha relatoria – “incorre em erro de direito, sujeito ao crivo do recurso especial; os fatos, todavia, que se reconhecem à vista da prova constituem premissa inalterável no julgamento do recurso especial”.

A invocação do art. 333, I, do Código de Processo Civil está prejudicada, porque também supõe a reavaliação da prova.

Segundo as razões do recurso especial, “os autores, ora recorridos, não se desincumbiram do ônus de provar o fato constitutivo de seu direito, qual seja, a prática de ato de má gestão do recorrente Seme” (fl. 1.406, 7º vol.).

Artigo 332 do Código de Processo Civil

“Constou” – está dito nas razões do recurso especial – “do acórdão recorrido:

Ocorre, também, que o aditamento do contrato de locação exclui a área do subsolo do prédio o que causa estranheza, não havendo qualquer explicação do sócio Seme Raad ou do interventor para tanto” (fl. 1345, 7º vol.).

“A decisão, como se nota, teve como fundamento o problema da supressão do subsolo do contrato de aditamento da locação. Mas aos recorrentes não foi permitida a produção da prova que demonstraria a absoluta ausência de interesse do sócio Seme no subsolo do imóvel locado às Casas Bahia. Através da postulada inspeção judicial ou até mesmo de uma perícia, restaria comprovado que o subsolo do imóvel locado não teria serventia nenhuma a Seme, pois a comunicação com seus outros imóveis é impossível. No entanto, antes que lhe permitissem a produção da prova, Seme foi afastado da gerência das empresas” (fl. 1.396, 7º vol.).

A transcrição do julgado foi parcial, faltando o trecho imediatamente anterior, exatamente aquele que especificava o que, no incidente, era importante, in verbis:

“No que se refere ao último incidente anotado de inconformismo do agravado com a gestão do agravante, é fato incontroverso de que o primeiro agravado somente tomou conhecimento de que as obras de reforma no imóvel locado às Casas Bahia estavam em andamento, ao tempo em que foi convocado a assinar os contratos de aditamento da locação e com as empreiteiras. Nesta oportunidade, as obras caminhavam há sessenta dias. Os documentos trazidos às fls. 498/576, representados por troca de correspondências e contratos (cópias) evidenciam a deliberação de medidas de forma isolada pelo sócio Seme Raad.

Com efeito, ao tempo em que o interventor, ora destituído, tomou conhecimento das obras em andamento, determinou a suspensão destas, em que pese opinar em algumas

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correspondências serem em proveito da locadora pela valorização do imóvel” (fl. 1.345, 7º vol.).

Essa circunstância foi enfatizada no julgamento dos embargos de declaração, in verbis:

“Pretende o primeiro embargante retirar seu descumprimento à decisão judicial, sob o fundamento de que o negócio não se realizou; porém, aquela era clara ao declarar que não poderia sequer haver negociações sem a participação do interventor e conhecimento do sócio embargado. Isto, no entanto, não aconteceu.

Refrise-se: evidencia-se dos documentos acostados que houve descumprimento da determinação judicial pelo primeiro embargante, quando procedeu a negócios sem anuência e conhecimento do sócio embargado, razão que levou ao entendimento desta Câmara pela manutenção do r. despacho proferido pelo MM. Juiz” (fl. 1.384, 7º vol.).

Aliás, o tribunal a quo atribuiu à personalidade de Seme Raad, refletida em atitudes como essa, a necessidade de alteração no status quo resultante da medida liminar anterior:

“... homem de negócios, habituado ao comando, provocou o isolamento do interventor, daí a necessidade de substituição” (fl. 1.346, 7º vol.).

Artigos 1.002 e 1.060, caput, do novo Código Civil

As normas legais alegadamente contrariadas têm o seguinte teor:

“Art. 1.002 - O sócio não pode ser substituído no exercício das suas funções, sem o consentimento dos demais sócios, expresso em modificação do contrato social.”

“Art. 1.060 – A sociedade limitada é administrada por uma ou mais pessoas designadas no contrato social ou em ato separado.”

Primeiro, as questões eventualmente resultantes dessas normas legais não foram examinadas pelo tribunal a quo, embora tenham sido aludidas nos embargos de declaração (fls. 1.352/1.353, 7º vol.).

A relevância, ou não, dessa omissão só poderia ser avaliada pelo Superior Tribunal de Justiça se as razões do recurso especial tivessem dito violado o art. 535, II, do Código de Processo Civil.

No estado dos autos, falta o preqüestionamento.

Obiter dictum, os arts. 1.002 e 1.060 do novo Código Civil supõem hipóteses extrajudiciais. Um institui norma atributiva de competência para administrar a sociedade. Outra norma que dispõe sobre a alteração, no particular, do contrato social. São regras que devem ser observadas extrajudicialmente.

Quid, se há litígio judicial entre os sócios, cada qual com metade do capital social das sociedades nele envolvidas? Evidentemente, o juiz tem poderes para, no âmbito cautelar, deferir tutela judicial compatível com o interesse dos sócios e com o resguardo do patrimônio das empresas.

Voto, por isso, no sentido de não conhecer do recurso especial.

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ASSUNTO: Comercial - Sociedade - Dissolução - Affectio Societatis

SUSTENTAÇÃO ORAL

Sustentaram oralmente o Dr. Edson Queiroz, pelos recorrentes e, o Dr. Vinicius de Figueiredo Teixeria, pelos recorridos.

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Carlos Alberto Menezes Direito, Nancy Andrighi, Castro Filho e Humberto Gomes de Barros votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 27 de setembro de 2005

MARCELO FREITAS DIAS

Secretário

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Anexo D - AGRAVO DE INSTRUMENTO n° 430.844-4/7-00

PODER JUDICIÁRIO - TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de AGRAVO DE INSTRUMENTO n° 430.844-4/7-00, da Comarca de RIBEIRÃO PRETO, em que são agravantes ASSOCIAÇÃO BANDEIRANTES DE ENSINO SC LTDA. e OUTROS em agravado ESPÓLIO de JAMIL SALIM CURY, representado por seu INVENTARIANTE: ACORDAM, em Quarta Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores CARLOS STROPPA (Presidente, sem voto), MAIA DA CUNHA e TEIXEIRA LEITE.

São Paulo, 09 de março de 2006.

Sociedade de responsabilidade limitada - Morte de sócio – Herdeiro que assume a sua posição social, sem que os demais herdeiros do falecido sócio se oponham -

Inviabilidade de sócios dissidentes obterem, em tutela antecipada, o afastamento do sucessor – Não provimento.

Vistos.

O presente agravo de instrumento foi tirado pela ASSOCIAÇÃO BANDEIRANTES DE ENSINO S/C. LTDA., CARLOS ALBERTO FERREIRA e ELAINE APARECIDA FERREIRA DE MATTOS, contra r. despacho que não deferiu tutela antecipada para excluir, da vida empresarial da Associação Bandeirantes, a figura de Elias Salim Cury. Os agravantes insistem na afirmação de que a transmissão da herança de Jamil Salim Cury, que era sócio, não está regularizada, o que impede que Elias pratique atos que são próprios de quem detém o status de sócio regular.

Negou-se o efeito ativo. O interessado contestou e argumentou que os sócios admitiram sua entrada na sociedade, tanto que foi nomeado diretor administrativo, conforme ata regular. Também se alegou, com a juntada do documento de fl. 266, que os demais herdeiros de Jamil cederam os direitos hereditários dessas quotas para Elias, o que reforça a sua qualidade de sócio.

É o relatório.

Jamil era titular de 25% das quotas da Associação Bandeirantes de Ensino [fl. 194]. No contrato está previsto que a morte do sócio não dissolve a sociedade, devendo continuar a sua existência com a participação dos herdeiros, salvo se os demais sócios decidirem o oposto, mediante pagamento dos haveres respectivos [fl. 199]. Com a morte de Jamil, Elias, seu irmão e inventariante [fl. 202], assumiu a posição

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de sucessor do falecido na sociedade e deu início a um movimento administrativo que culminou com a distribuição de diversas ações e recursos.

Os demais herdeiros de Jamil cederam as quotas da sociedade para Elias, conforme consta de fl. 266 e, embora não tenha ocorrido homologação dessa transferência, com regularização formal da titularidade das quotas para Elias, essa circunstância pesa na definição do pedido que os agravantes formularam.

O importante é anotar que a condição de sócio sucessor de Elias, não está sendo questionada pelos demais herdeiros de Jamil, mas, sim, por sócios insatisfeitos com o desenvolvimento das novas diretrizes estabelecidas em reuniões da qual ele participou ativamente. Resulta que não existe interesse qualificado para, em sede de liminar, afastar aquele que se qualifica, no inventário em curso, como herdeiro do sócio falecido.

A pretensão do afastamento de Elias está centrada, também, na eventual ineficácia da cessão firmada por um dos

herdeiros [Jorge Salim Cury], porque, com o seu óbito, os herdeiros de Jorge estariam dispostos a combater a cessão que em vida ele celebrou em favor de Elias. Convém anotar que essa situação não afeta o patrimônio de Elias, que, como se viu, realizou com o finado Jorge, ato jurídico que poderia ser considerado regular e suscetível de ser praticado pelo princípio da livre disposição de bens e da soberania da vontade.

Acertou a ilustre Juíza em negar a tutela antecipada. A exclusão de Elias, que assumiu de forma ostensiva o lugar de Jamil, como herdeiro admitido no inventário, não ofende as regras estatutárias da sociedade ou direitos de herança. Os agravantes não possuem direito verossímil para afastar Elias de forma sumária, inclusive porque não se provou o periculum in mora em virtude de sua efetiva participação na vida societária.

Nega-se provimento.

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ANEXO E - APELAÇÃO CÍVEL COM REVISÃO n° 675.066-5/7-00

PODER JUDICIÁRIO - TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO

ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRATICA

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL COM REVISÃO n° 675.066-5/7-00, da Comarca de SÃO PAULO-FAZ PUBLICA, em que é apelante FUNDAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO D*Y EDUCAÇÃO - FD3 sendo apelados GERLU RODRIGUES PEREIRA DE SOUZA E OUTRA: ACORDAM, em Segunda Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que íntegra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores LIMEU PEINADO (Pres.i dente, sem voto), CORRÊA VIANNA e ALVES BEVILACQUA.

APELAÇÃO CÍVEL N° 675.066.5/7-00 (COM REVISÃO)

COMARCA: SÃO PAULO

APELANTE: FUNDAÇÃO PARA DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO

FDE.

APELADA: GERLU RODRIGUES PEREIRA DE SOUZA (E OUTRO)

CONTRATO ADMINISTRATIVO. Cobrança de multa decorrente de penalidades por falta de assinatura em contrato, após procedimento licitatório. Herdeira que não tem legitimidade, pois o contrato social não previa, no caso de morte, a integração desta à sociedade. Ação que deveria ser movida contra os gerentes e administradores, e não contra a herdeira da sociedade.

Extinção do processo sem julgamento do mérito. Sentença mantida. Recurso improvido.

I- Trata-se de apelação com revisão interposta pela FUNDAÇÃO PARA DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO- FDE, na ação sob o rito ordinário movida em face da SOEMCO SOCIEDADE EMPREITEIRA DE CONSTRUÇÕES LTDA, objetivando a condenação da requerida no valor total de R$ 233.077,84 (duzentos e trinta e três mil setenta e sete reais e oitenta e quatro centavos), devidamente corrigidos.

A sentença de fls. 395/397 julgou extinto o processo, com fundamento no artigo 267, inciso VI (ilegitimidade de parte), condenando a autora a arcar com as custas despendidas pela ré, Geriu Rodrigues Pereira e honorários advocatícios fixados em trezentos reais.

Recorre a FDE pugnando a reform. decisório pretendendo o prosseguimento do feito, sustentando, em apertada síntese, que diante da rescisão contratual primitiva foi aplicada a ré sanções contratualmente previstas e, após várias diligências tomou conhecimento do

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falecimento dos réus deixando uma única herdeira como detentora de todo acervo patrimonial da empresa, pelo que esta é parte legítima para figurar no pólo da demanda (fls. 417/424).

O recurso é tempestivo, foi regularmente processado sem apresentação de contra-razões e com manifestação da d. Procuradoria Geral de Justiça às fls, 435 pela inexigibilidade de intervenção ministerial.

É o breve relatório.

I I - Bem analisada a questão, vê-se que o recurso não comporta provimento.

O contrato social da construtora Gusmão Souza Ltda, alterada a posteriore a denominação para Soemco Sociedade Empreiteira de Construção Ltda,, prevê sociedade por quotas de responsabilidade limitada, onde primeiramente tinha-se que em caso de falecimento de um dos sócios os seus haveres serão calculados com base no último balanço, e o pagamento aos seus herdeiros será feito 30% à vista e o restante em dez parcelas iguais mensais, sendo a sociedade dissolvida

(fls. 3I4À317) e, após alteração contratual ficou consignado que, em caso de falecimento de quaisquer dos sócios não se dissolveria a sociedade, devendo o sócio remanescente proceder ao Balanço Geral / e /pagar aos herdeiros do "de cujos" suas cotas do Capital.

Em se tratando de sociedade por quotas de responsabilidade limitada, em falecendo o sócio quotista, a quota passa aos seus herdeiros ou legatários, não obstante, tal não os torna de modo automático sócios, porquanto só o serão se o contrato social assim dispor. Observa-se que o contrato social poderá até negar ao herdeiro tal condição, podendo os sócios, porém, convencionar o seu ingresso na sociedade.

Assim, na espécie, a Sra. Geriu Rodrigues Pereira não é sucessora dos sócios falecidos, não havendo previsão no contrato social que, em caso de falecimento, os herdeiros do sócio passariam a integrar a sociedade, sendo-lhes tão somente devida a apuração de haveres.

Ora, em não tendo a qualidade de sócia, não há como se exigir o cumprimento da obrigação societária desta, devendo a ação ser proposta contra a sociedade, o que foi feito, mas tendo-se no pólo passivo não a herdeira em destaque e, sim, o gerente ou administrador da mesma.

Ademais, como bem destacou o magistrado sentenciante *a citação não foi válida e a SOEMCO não integra o processo, havendo no pólo passivo da demanda, apenas a herdeira dos sócios, Geriu, pessoa que não respondo- pelas dívidas da empresa/' / Deste modo, a extinção do processo sem apreciação do mérito nos termos lançados pela sentença era a medida a ser adotada, pelo que fica mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos.

Para fins de prequestionamento, observo que a solução da lide não passa necessariamente pela restante legislação invocada e não declinada. Eqüivale a dizer que se entende estar dando a adequada interpretação à legislação invocada pelas partes. Não se faz necessária a menção explícita de dispositivos, consoante entendimento

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consagrado no Eg. Superior Tribunal de Justiça, nem o Tribunal é órgão de consulta, que deva elaborar parecer sobre a implicação degrada dispositivo legal que a parte pretende mencionar na solução da lide, uma vez encontrada a fundamentação necessária. Dê provimento ao recurso.

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ANEXO F - EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RESP Nº 419.174 - SP (2003/0040911-5)

RELATOR: MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR

EMBARGANTE: LUDWIG KIRCHNER - ESPÓLIO E OUTROS

ADVOGADO: MICAEL HEBER MATEUS E OUTRO(S)

EMBARGADO: LUIZ KIRCHNER S/A INDÚSTRIA DE BORRACHA

ADVOGADO: MARCELO RIBEIRO DE ALMEIDA E OUTRO(S)

EMENTA

COMERCIAL. SOCIEDADE ANÔNIMA FAMILIAR. DISSOLUÇÃO PARCIAL. INEXISTÊNCIA DE AFFECTIO SOCIETATIS. POSSIBILIDADE. MATÉRIA PACIFICADA.

I. A 2ª Seção, quando do julgamento do EREsp n. 111.294/PR (Rel. Min. Castro Filho, por maioria, DJU de 10.09.2007), adotou o entendimento de que é possível a dissolução de sociedade anônima familiar quando houver quebra da affectio societatis.

II. Embargos conhecidos e providos, para julgar procedente a ação de dissolução parcial.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Segunda Seção, por unanimidade, conhecer dos embargos de divergência e lhes dar provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Massami Uyeda, Sidnei Beneti, Ari Pargendler e Fernando Gonçalves votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 28 de maio de 2008 (Data do Julgamento)

MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR

Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR: - Espólio de Ludwig Kirchner e outros opõem embargos de divergência contra acórdão da Egrégia 3ª Turma, de relatoria do eminente Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, assim ementado (fl. 565):

"Sociedade anônima. Dissolução parcial. Precedentes da Corte.

1. É incompatível com a natureza e o regime jurídico das sociedades anônimas o pedido de dissolução parcial, feito por acionistas minoritários, porque reguladas em lei especial que não contempla tal possibilidade.

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2. Recurso especial conhecido e provido.

Sustentam os embargantes que a decisão divergiu de aresto da c. 4ª Turma, no REsp n. 111.294/PR (Rel. p/ acórdão Min. Cesar Asfor Rocha), que ao apreciar a matéria, entendeu possível a dissolução parcial de sociedade anônima familiar, constituída com intuitu personae, quando desaparecida a affectio societatis.

Acrescentam que as instâncias ordinárias reconheceram a característica de que a afinidade e o parentesco entre os acionistas foi o fundamento para a constituição da sociedade, tendo cabimento a aplicação do referido instituto.

O recurso foi originalmente admitido para discussão à fl. 603.

A embargada apresentou impugnação às fls. 605/619, no sentido do não-conhecimento dos embargos por inexistência de similaridade com o acórdão paradigmático, porquanto na hipótese dos autos a sociedade foi primordialmente composta por pessoas, depois convertida em sociedade anônima, único momento em que a apuração de haveres poderia ser realizada.

Acrescenta que a perda de confiança entre os acionistas por si só não é suficiente para a dissolução parcial, com apuração de haveres, porque deve estar acompanhada da ausência de proveito econômico.

No mérito, combate a pretensão recursal arguindo que o interesse maior deve ser a preservação da empresa, o que é albergado expressamente pela legislação específica, que veda a possibilidade.

Às fls. 627/629, nova decisão em que inadmitido o recurso, por ausência de similitude no que respeita ao tema da distribuição de lucros.

Diante do agravo regimental de fls. 633/654, reconsiderei o decisum para propiciar a análise da matéria pelo Colegiado.

É o relatório.

- Trata-se de embargos de divergência em que os recorrentes, Espólio de Ludwig Kirchner e outros, buscam a reforma de acórdão da Colenda 3ª Turma, relatado pelo ilustre Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, que entendeu pela impossibilidade de dissolução parcial de sociedade anônima familiar, por inaplicável o art. 336 do Código Comercial, ainda que ausente a affectio societatis, porquanto a característica intuitu personae não é elemento de sua constituição.

Presentes os pressupostos da espécie, conforme já adiantava o i. relator originário na 3ª Turma (fl. 561), adentro no mérito da controvérsia.

Com efeito, o próprio acórdão apontado paradigma foi objeto de embargos de divergência nesta c. 2ª Seção, que adotou o posicionamento sufragado pela e. 4ª Turma, no seguinte sentido:

"EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. QUESTÕES PRELIMINARES. SUBSTABELECIMENTO. RENÚNCIA DO ADVOGADO SUBSTABELECENTE. CAPACIDADE POSTULATÓRIA DO SUBSTABELECIDO. LITISCONSÓRCIO PASSIVO.

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MORTE DE UM DOS RÉUS. AUSÊNCIA DE HABILITAÇÃO DOS SUCESSORES. NULIDADE DOS ATOS PRATICADOS APÓS O ÓBITO. DESCABIMENTO. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. MÉRITO. DIREITO COMERCIAL. SOCIEDADE ANÔNIMA. GRUPO FAMILIAR. INEXISTÊNCIA DE LUCROS E DISTRIBUIÇÃO DE DIVIDENDOS HÁ VÁRIOS ANOS. QUEBRA DA AFFECTIO SOCIETATIS. DISSOLUÇÃO PARCIAL. POSSIBILIDADE.”

I - Ocorrida a renúncia por parte dos advogados substabelecentes ocorrido em data posterior à interposição do recurso pelos advogados substabelecidos, não se há falar em ausência de capacidade postulatória decorrente do substabelecimento.

II - A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que a morte de uma das partes suspende o processo no exato momento em que se deu, ainda que o fato não seja comunicado ao juiz da causa, invalidando os atos judiciais, acaso praticados depois disso. Em situações excepcionais, porém, e visando preservar outros valores igualmente relevantes, justifica-se uma mitigação dos regramentos processuais, uma vez que nem mesmo o sistema de nulidades é absoluto. É o que deve ser aplicado ao caso dos autos, em que o espólio de um dos recorrentes, alegando haver tomado conhecimento da existência do feito apenas em 2002, comunicara o seu falecimento em 05/02/1993, requerendo a nulidade dos atos processuais praticados após o noticiado óbito. Há, todavia, que ser afastada a alegada nulidade processual, por não ter havido qualquer prejuízo às partes, haja vista que o interesse dos seus sucessores foi defendido em todos os momentos do processo, já que as petições apresentadas em juízo foram subscritas pelo mesmo advogado e em nome de todos os litisconsortes passivos da demanda, desde a contestação até a interposição do recurso especial. É de se ter presente que este processo tramita desde 1991, envolvendo questão altamente controvertida, cuja decisão de mérito, favorável à apuração de haveres dos sócios dissidentes já se encontra em fase de execução, não sendo razoável, portanto, a essa altura, declarar-se a nulidade dos atos processuais praticados após o óbito, sob pena de afronta ao princípio da segurança jurídica.

III - É inquestionável que as sociedades anônimas são sociedades de capital (intuito pecuniae), próprio às grandes empresas, em que a pessoa dos sócios não têm papel preponderante. Contudo, a realidade da economia brasileira revela a existência, em sua grande maioria, de sociedades anônimas de médio e pequeno porte, em regra, de capital fechado, que concentram na pessoa de seus sócios um de seus elementos preponderantes, como foi acontecer com as sociedades ditas familiares, cujas ações circulam entre os seus membros, e que são, por isso, constituídas intuito personae.

Nelas, o fator dominante em sua formação é a afinidade e identificação pessoal entre os acionistas, marcadas pela confiança mútua. Em tais circunstâncias, muitas vezes, o que se tem, na prática, é uma sociedade limitada travestida de sociedade anônima, sendo, por conseguinte, equivocado querer generalizar as sociedades anônimas em um único grupo, com características rígidas e bem definidas.

Em casos que tais, porquanto reconhecida a existência da affectio societatis como fator preponderante na constituição da empresa, não pode tal circunstância ser desconsiderada por ocasião de sua dissolução. Do contrário, e de que é exemplo a hipótese em tela, a ruptura da affectio societatis representa verdadeiro impedimento a que a companhia continue a realizar o seu fim, com a obtenção de lucros e distribuição

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de dividendos, em consonância com o artigo 206, II, 'b', da Lei nº 6.404/76, já que dificilmente pode prosperar uma sociedade em que a confiança, a harmonia, a fidelidade e o respeito mútuo entre os seus sócios tenham sido rompidos.

A regra da dissolução total, nessas hipóteses, em nada aproveitaria aos valores sociais envolvidos, no que diz respeito à preservação de empregos, arrecadação de tributos e desenvolvimento econômico do país. À luz de tais razões, o rigorismo legislativo deve ceder lugar ao princípio da preservação da empresa, preocupação, inclusive, da nova Lei de Falências - Lei nº 11.101/05, que substituiu o Decreto-lei nº 7.661/45, então vigente, devendo-se permitir, pois, a dissolução parcial, com a retirada dos sócios dissidentes, após a apuração de seus haveres em função do valor real do ativo e passivo. A solução é a que melhor concilia o interesse individual dos acionistas retirantes com o princípio da preservação da sociedade e sua utilidade social, para evitar a descontinuidade da empresa, que poderá prosseguir com os sócios remanescentes.

Embargos de divergência improvidos, após rejeitadas as preliminares.

(EREsp n. 111.294/PR , Rel. Min. Castro Filho, por maioria, DJU de 10.09.2007)

Portanto, considerou-se preponderante para as sociedades anônimas familiares pequenas e médias a existência da affectio societatis, sem a qual presume-se que o clima beligerante entre os acionistas atua contra a preservação da empresa e torna-se obstáculo à consecução de seu objeto social, que não poderá ser cumprido.

Acresça-se que a distribuição de lucros ou dividendos ficou relegada ao plano de mera conseqüência da dissolução, pois apesar de presente no recurso especial paradigma, não foi mencionada como condicionante adicional quando do julgamento do mesmo processo em embargos de divergência.

Transcrevo do voto do relator do precedente indicado acima, por muito elucidativo a esse respeito, o seguinte:

"Em casos que tais, porquanto reconhecida a existência da affectio societatis como fator preponderante na constituição da empresa, não me parece possa essa circunstância ser desconsiderada por ocasião de sua dissolução. Do contrário, e de que é exemplo a hipótese em tela, a ruptura da affectio societatis representa verdadeiro impedimento a que a companhia continue a realizar o seu fim, com a obtenção de lucros e distribuição de dividendos, em consonância com o artigo 206, II, 'b', da Lei nº 6.404/76, já que dificilmente pode prosperar uma sociedade em que a confiança, a harmonia, a fidelidade e o respeito mútuo entre os seus sócios tenham sido rompidos.

Não se desconhece que, em regra, a possibilidade de dissolução parcial, com a conseqüente apuração de haveres dos sócios dissidentes, é incompatível com esse tipo de sociedade, porque própria tal iniciativa das sociedades de pessoas e na sociedade por cotas. Todavia, na espécie, assim como asseverou o acórdão embargado, penso que a regra da dissolução total em nada aproveitaria aos valores sociais envolvidos, no que diz respeito à preservação de empregos, arrecadação de tributos e desenvolvimento econômico do país, razão pela qual sou a favor de que o rigorismo legislativo ceda lugar ao princípio da preservação da

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empresa, norteador, inclusive, da nova Lei de Falências - Lei nº 11.101/05 -, que substituiu o Decreto-lei nº 7.661/45, então vigente.

Destarte, na hipótese, diante das especificidades do caso concreto, tenho que a aplicação da dissolução parcial, com a retirada dos sócios dissidentes, após a apuração de seus haveres em função do valor real do ativo e passivo, é a solução que melhor concilia o interesse individual dos acionistas retirantes com o princípio da preservação da sociedade e sua utilidade social, para que não haja a necessidade de solução de continuidade da empresa, que poderá prosseguir com os sócios remanescentes.

Assim, tem-se que a impessoalidade, com preponderância do capital, própria das sociedades anônimas, cede espaço nas empresas familiares regidas pela Lei n. 6.404/1976, como no caso concreto, nas quais deve coexistir com a affectio societatis.

Ante o exposto, conheço dos embargos e dou-lhes provimento para julgar procedente o pedido, admitindo a dissolução parcial de Ludwig Kichner S.A., com retirada dos acionistas dissidentes, após a apuração de seus haveres em função do valor real do ativo e passivo, invertida a sucumbência.

É como voto.

VOTO

O SR. MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA:

Sra. Ministra Presidente, de rigor, entendo que as sociedades anônimas não foram constituídas e vocacionadas para esse tipo de dissolução. A lei prevê o direito de retirada nas hipóteses expressamente estabelecidas no art. 77 da Lei das S.A., e o faz em numerus clausus.

E assim o digo porque a natureza da Lei de Sociedades Anônimas, ou seja, a natureza jurídica das empresas constituídas sob a forma de sociedade anônima é muito diversa da sociedade por quotas de responsabilidade limitada, e, no presente caso, as empresas, ainda que de capital fechado, assumem a natureza jurídica de sociedade anônima: com natureza institucional, e não meramente contratual.

Mas, tendo em conta o precedente desta Seção e atento a que devemos proporcionar ao jurisdicionado segurança jurídica – que importa, a meu ver, em observância das regras jurisprudenciais que decorrem de interpretação da lei já manifestada pelo Tribunal –, prefiro me curvar ao posicionamento e acompanhar o Sr. Ministro Relator, conhecendo dos embargos de divergência e dando-lhes provimento para julgar procedente a ação de dissolução parcial.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

SEGUNDA SEÇÃO

Número Registro: 2003/0040911-5

EREsp 419174 / SP

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Números Origem: 168594 200200284189 32994

PAUTA: 28/05/2008

JULGADO: 28/05/2008

Relator

Exmo. Sr. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR

Presidenta da Sessão

Exma. Sra. Ministra NANCY ANDRIGHI

Subprocurador-Geral da República

Exmo. Sr. Dr. PEDRO HENRIQUE TÁVORA NIESS

Secretária

Bela. HELENA MARIA ANTUNES DE OLIVEIRA E SILVA

AUTUAÇÃO EMBARGANTE: LUDWIG KIRCHNER - ESPÓLIO E OUTROS ADVOGADO: MICAEL HEBER MATEUS E OUTRO(S) EMBARGADO: LUIZ KIRCHNER S/A INDÚSTRIA DE BORRACHA ADVOGADO: MARCELO RIBEIRO DE ALMEIDA E OUTRO(S) ASSUNTO: Comercial - Sociedade - Anônima - Dissolução SUSTENTAÇÃO ORAL Sustentou oralmente, pelo Embargante, o Dr. Lúcio Ricardo de Aguiar Duarte. CERTIDÃO Certifico que a egrégia SEGUNDA SEÇÃO, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: A Seção, por unanimidade, conheceu dos Embargos de Divergência e lhes deu provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Massami Uyeda, Sidnei Beneti, Ari Pargendler e Fernando Gonçalves votaram com o Sr. Ministro Relator. Brasília, 28 de maio de 2008 HELENA MARIA ANTUNES DE OLIVEIRA E SILVA Secretária

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ANEXO G - Apelação n° 994.03.109059-5, da Comarca de Campos do Jordão

PODER JUDICIÁRIO - TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO

ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n° 994.03.109059-5, da Comarca de Campos do Jordão, em que são apelantes ALTO DO CAPIVARI HOTEL LTDA, NICOLAU IAZZETTI e JOAQUIM LOPES MARINHO ALVES sendo apelados GUIDO RAMAZZOTTI FILHO e GUIDO RAMAZZOTTI.

ACORDAM, em 3ª. Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores BERETTA DA SILVEIRA (Presidente sem voto), EGIDIO GIACOIA E JESUS LOFRANO.

São Paulo, 01 de junho de 2010.

ADILSON DE ANDRADE

RELATOR

3a Câmara de Direito Privado

Voto n°. 550

Apelação c/ revisão n° 994.03.109.059-5

Comarca: Campos do Jordão - 02 VC

Ação: Administração de Sociedade Ltda. e obrigação de fazer e perdas e danos

Apte(s).: Alto do Capivari Hotel Ltda. (e outros).

Apdo(a)(s).: Guido Ramazzotti Filho (por si e inventariante do espólio) e

(outro)

Sociedade por quotas de responsabilidade limitada - Morte de sócio - Herdeiro impedido de ter acesso às dependências e documentos pertinentes à administração comercial - Pedido procedente - Imposição legal e contratual -

Exclusão do espólio – Infração contratual - Espólio autor tem direito às quotas que pertenciam ao seu falecido pai e às perdas e danos - Sentença mantida - Recurso IMPROVIDO.

Prevenção - Inocorrência - Imposição do § 2° do artigo 226 do Regimento Interno deste Tribunal - Preliminar afastada.

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Trata-se de ação de obrigação de fazer antecedida de cautelares inominadas ajuizada por Guido Ramazzotti Filho e espólio contra Alto do Capivari Hotel Ltda., Nicolau Lazzetti e Joaquim Lopes Martinho Alves.

A r. sentença de fls. 454/467, julgou parcialmente procedente a ação principal (proc. 841/01) para assegurar ao espólio-autor o direito às quotas sociais de Guido Ramazzotti, condenando a ré a pagar aos autores as perdas e danos referentes aos lucros líquidos não pagos após a data de 28.01.2001 na proporção de 1/3 ou 33,33% do total , corrigidos e com juros moratórios de 0.5% ao mês a serem apurados em liquidação de sentença.

Julgou ainda procedente em parte a ação cautelar (proc. 736/01) ajuizada por Guido Ramazzotti Filho contra Alto do Capivari Hotel Ltda., Nicolau lazzetti e Joaquim Lopes Martinho Alves, assegurando ao autor o acesso às dependências e documentos da ré Alto do Capivari, na qualidade de administrador e representante do espólio de Guido Ramazzotti, mantida a liminar nesta parte, sem direito à hospedagem senão mediante custeio.

Por fim, julgou improcedente a cautelar (proc. 768/01) ajuizada por Guido Ramazzotti Filho e espólio de Guido Ramazzotti contra Alto do Capivari Hotel Ltda., Nicolau lazzetti e Joaquim Lopes Martinho Alves, revogando a liminar deferida.

Embargos de declaração opostos pelos réus, providos em parte (fls. 500/501).

Seguintes autos em apensos: Agravo de instrumento n°. 841/01, n°. 768/01, Incidente de impugnação ao valor da causa 736/01-A e 768/01, 841/01-B, incidente de Impugnação ao benefício da justiça gratuita 841/01-A e 841//01-C, Agravo de instrumento n°. 224.932.4/7-03 e Agravo de Instrumento números: 227.068.4/3-02 e 268.595.4-4.

Apelam os réus alegando prevenção da 6ª Câmara de Direito Privado. Os autores não pediram o direito às quotas sociais de Guido Ramazzotti, o que foi concedido pela sentença, de modo que houve julgamento extra petita. Pedem a nulidade da sentença. Sustentam que Guido Ramazzotti é carecedor da ação cautelar, pois ajuizou "a ação cautelar em nome próprio, e não a favor do espólio de Guido Ramazzotti". Pedem a extinção do processo nos termos do artigo 267, incisos IV e VI, ambos do CPC.

Além disso, alegam preliminar de carência, pois "ausente a congruência, falta o legítimo interesse de agir para postular a permanência física do autor com livre acesso e manuseio dos documentos fiscais, contábeis e do movimento diário do estabelecimento comercial.

Pedem a extinção do feito principal sem exame de mérito, com a inversão das verbas sucumbenciais, extinguindo-se as cautelares.

Alternativamente pleiteiam a extinção do feito cautelar 736/01, e a improcedência da sentença da ação principal 841/01.

Recurso processado e respondido.

É o relatório.

Primeiramente não é preventa a Sexta Câmara de Direito Privado, diante da incidência do § 2° do art. 226 do Regimento Interno deste Tribunal, ficando afastada tal preliminar.

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Não houve julgamento extra petita.

Basta conferir os fatos expostos na exordial pelos autores, notadamente, "ter sido impedido de participar da administração da empresa ré" e ser único herdeiro do sócio falecido, para ser constatado que, por estes fatos, foi a ré condenada a assegurar ao espólio-autor o direito às quotas sociais, e isto é conseqüência lógica da condenação e imposição legal.

Conforme leciona Humberto Theodoro Júnior: "A sentença extra petita incide em nulidade porque soluciona causa diversa da que foi proposta através do pedido" (Curso de Direito Processual Civil, Vol. I, 24ª edição, Rio de Janeiro, Forense, p. 516), o que não é o caso dos autos.

No que toca à alegada falta de interesse de agir, é manifesto o interesse, pois o meio processual adotado é adequado a alcançada pretensão deduzida.

Demais, a resistência oferecida ao pedido inicial evidencia a necessidade do ajuizamento da demanda e a existência concreta de litígio entre as partes.

A inicial não é inepta, eis que preenche suficientemente todos os requisitos legais, tanto a permitir ao juízo o julgamento do feito, quanto a permitir aos réus o exercício do direito de defesa.

Guido Ramazzotti Filho é parte legítima como deixou claro o Magistrado no processo 585/02: "Tanto o próprio espólio (art. 12, V, do Código de Processo Civil) como qualquer um dos herdeiros são legitimados para a defesa dos bens da herança (parágrafo único do artigo 1580 do Código Civil). Isso é mais evidente ainda no caso concreto, onde o herdeiro necessário é único, sendo o representante nato do espólio, até que a regular sucessão tenha se encerrado".

No mérito, melhor sorte não assiste aos apelantes.

Primeiramente, foi ajuizada ação cautelar inominada (proc. 736/01) por Guido Ramazzotti Filho contra Alto do Capivari Hotel Ltda., Nicolau lazzetti e Joaquim Lopes Martinho Alves, na condição de herdeiro único de seu pai, Guido Ramazzotti, falecido sócio do mencionado Hotel.

Requereu o autor, livre acesso às dependências do hotel, a documentos fiscais e contábeis do estabelecimento comercial bem como o direito de hospedagem sem adiantamento de pagamento até a decisão da causa, motivado pelo recebimento de "notificação de demissão de sócio", impedimento de sua participação na administração da empresa, apesar da previsão estatutária. Referida cautelar foi julgada procedente em parte, tendo em vista que o sócio tem direito ao acesso às dependências do estabelecimento comercial e aos documentos, "mas não à hospedagem". Interposto agravo de instrumento 224.932.4/1, pelos réus, resultou em seu improvimento.

A ação cautelar 768/01, ajuizada por Guido Ramazzotti Filho e o espólio de Guido Ramazzotti contra os mesmos réus tinha por objeto a vedação de registro de alteração contratual estatutária junto à JUCESP até ulterior deliberação, concedida liminarmente. Sustentaram os mesmos fatos alegados na cautelar ajuizada anteriormente. Da decisão cautelar foi interposto pelos réus agravo de instrumento (processo. 227.068.4/0),

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resultando no seu improvimento. Afinal, a sentença da ação principal revogou esta cautelar.

Por fim, os autores ajuizaram ação ordinária de obrigação de fazer (proc. 841/01) contra os réus. Pugnaram pela alteração do contrato social da ré para o fim específico de inclusão do espólio-autor na sociedade e ao pagamento das perdas e danos relativos aos lucros líquidos verificados após a data de 28.1.2001, na proporção de 1/3 ou 33,33% do total, corrigidos e com juros moratórios de 12% e pela confirmação das cautelares.

Guido Ramazzotti, falecido sócio da empresa ré, tinha participação societária no Alto do Capivari Hotel Ltda. Estabelece o artigo 1.028, do Código Civil: "No caso de morte de sócio, liquidar-se-á sua quota, salvo: l - se o contrato dispuser diferentemente; II -

se os sócios remanescentes optarem pela dissolução da sociedade; III- se, por acordo com os herdeiros, regular-se a substituição do sócio falecido".

Na lição de Modesto Carvalhosa: "O art. 1028 do Código Civil de 2002, com orientação bem distinta da anteriormente verificada no revogado art. 335, 4, do Código Comercial de 1850, determina a liquidação da quota do sócio morto, a qual será feita na forma do art. 1031, com o pagamento de seus haveres aos herdeiros. Entretanto, o novo Código Civil admite que essa liquidação não ocorra: (i) caso o contrato social disponha de forma diversa, admitindo-se na sociedade os herdeiros do pré-morto..." (Comentários, v. 13, Saraiva, p. 354-355).

Logo, o autor Guido, herdeiro único, deve ingressar como sócio da sociedade, eis que havia previsão no contrato social (cláusula décima terceira) da possibilidade do espólio herdar a quota-parte do sócio falecido.

Ressalta-se que a liberdade conferida aos sócios remanescentes quanto ao destino da quota parte do sócio falecido é limitada à admissão do herdeiro na sociedade, operando-se a sucessão e evitando-se a liquidação das quotas, que passaram a fazer parte do patrimônio do autor, podendo este fiscalizar, ter acesso às suas dependências bem como exercer atos de gerência, em nome da preservação da sua quota-parte.

Leciona Fábio Ulhoa Coelho: ".. Morte de sócio. Se falece o sócio da sociedade limitada, isto pode implicar a dissolução parcial desta. De fato, a participação societária, como os demais elementos do patrimônio do falecido, será atribuída, por sucessão causa mortis, a um herdeiro ou legatário, que nunca estão obrigados a fazer parte da sociedade limitada, seja ela de pessoas ou de capital. Têm eles direito, portanto, à apuração dos haveres de que decorre a dissolução parcial. Claro, se o sucessor do sócio morto quiser fazer parte da sociedade, e os sobreviventes concordarem, nada obriga a liquidação da quota" (...) (Curso de Direito Comercial, volume II, 5a edição, São Paulo, Editora Saraiva, pág. 465/466.

No caso dos autos, o autor, sucessor do sócio falecido, demonstrou interesse em fazer parte da sociedade, de modo que não há que se falar em quebra da affectio societatis, mesmo porque não resultou demonstrado atos praticados pelo sucessor que culminaram com tal quebra.

Aliás, nem teve a chance de demonstrar a sua verdadeira intenção de formar a sociedade, ou seja, a affectio societatis, reconhecida pelo C. STJ como "elemento

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específico do contrato de sociedade", caracterizado "como uma vontade de união e aceitação das áleas comuns do negócio". (RESP 62301-SP; RESP 16540-PR; RESP 36692-SP).

É certo que os sócios sobreviventes devem concordar com tal vontade, conforme prevê a cláusula oitava do contrato.

Todavia, como bem ponderou o Magistrado: "Só que no caso não se cogitou ou muito menos se comprovou qualquer descumprimento societário por parte do espólio-autor ou do herdeiro nato. Muito menos há autorização estatutária para exclusão do sócio pela maioria".

A exclusão do espólio infringiu o contrato (13ª cláusula) que previa "imediata e provisória assunção à condição de sócio de representante legal do espólio, enquanto se aguarda a designação do representante definitivo para o preenchimento da vaga do sócio falecido", como bem fundamentou o eminente relator Ernani de Paiva no julgamento no Agravo de instrumento 227.068.4/0.

Assim, na qualidade de sócio, tem direito o herdeiro, conforme previsão legal (artigo 308 do Código Comercial) e contratual, de ter acesso às dependências do Hotel, à documentação da sociedade bem como ao pagamento das perdas e danos, visando a preservação do seu patrimônio, nos termos fixados na r. sentença. Provimento ao recurso.

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Anexo H - Agravo de Instrumento n° 990.09.347871-4, da Comarca de Valinhos

PODER JUDICIÁRIO - TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO

ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n° 990.09.347871-4, da Comarca de Valinhos, em que é agravante ARISTON INDÚSTRIA QUÍMICA E FARMACÊUTICA LTDA sendo agravado ALMEIDA MINZON COMÉRCIO E REPRESENTAÇÃO DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS LTDA ME.

ACORDAM, em 18ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores WILLIAM MARINHO (Presidente) e JURANDIR DE SOUSA OLIVEIRA.

VOTO N°: 15081 AGVO.N0: 9 9 0 . 0 9 . 3 4 7 8 7 1 -4 COMARCA: VALINHOS AGVTE. : ARISTON INDÚSTRIA QUÍMICA E FARMACÊUTICA LTDA AGVDO. : ALMEIDA MINZON COMÉRCIO E REPRESENTAÇÃO DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS LTDA ME •EXECUÇÃO - Insurgência contra decisão que reconheceu a legitimidade e regularidade da representação da empresa autora - Descabimento - Hipótese em que a morte de um dos sócios da empresa não implica sua dissolução nem a liquidação de suas cotas, mas a substituição pelos herdeiros do de cujus - Aplicação do art.1028, III do CC e da cláusula 11* do contrato social - Existência de cláusula contratual expressa e de manifestação dos herdeiros anuindo expressamente a substituição do de cujus - Decisão mantida - Recurso não provido.*

Trata-se de agravo de instrumento tirado contra a r. decisão de fls. 102, proferida pelo MM. Juiz de Direito da 3a Vara Judicial da Comarca de Valinhos, Dr.LEONARDO MARZOLA COLOMBINI, que em ação indenizatória acolheu as preliminares de ilegitimidade ad causam e julgou extinto o feito sem julgamento do mérito no tocante às requeridas ARISTON DISTRIBUIDORA DE MEDICAMENTOS LTDA. E BLAUSIEGEL, mas entendeu que as demais partes eram legítimas e bem representadas. Pleiteia a agravante a reforma do decisum alegando, em síntese, que a agravada não está bem representada, eis que houve o falecimento de seu sócio, fato este comunicado em audiência; que tal fato enseja a suspensão do feito até a regularização da representação da agravada, eis que não há que se falar em substituição imediata pelos filhos do falecido, mas sim em ingresso da sócia remanescente nos autos (visto que os sócios têm poderes para agir isoladamente -

cláusula 8 do contrato social da agravada), bem como em demonstração inequívoca do encerramento legal da empresa, demonstrando a inexistência da pessoa jurídica ou a abertura do inventário dos bens do sócio da agravada para o correto ingresso dos sucessores; que a legitimidade de partes é condição da ação, nos termos do art. 267, VI do CPC e a sua não observância gera nulidade absoluta,

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tal como já alertado pela agravante em seus embargos de declaração; que a agravada é sociedade limitada e se configura como um bem que deve inventariado, ao contrário do que constou na certidão de óbito, de forma que deve ser suspenso o feito, nos termos do art. 265 do CPC, e determinado o cumprimento do art. 43 do mesmo diploma legal para o inventário e partilha da cota do sócio falecido, referente à empresa agravada, e o ingresso do inventariante nos presentes autos; que deve ser seguido tal procedimento para que futuramente não haja um "herdeiro esquecido" que não tenha sido chamado ao processo para se defender e possa alegar a ocorrência de uma nulidade; que tampouco há qualquer prova de que a empresa agravada encerrou suas atividades; e, finalmente, que a jurisprudência revela o entendimento da agravante. Não foi concedido o efeito suspensivo requerido (fls. 129). Decorrido in albis o prazo para contra-razões (fls. 131), encontram-se os autos em termos de julgamento.

É o relatório.

Cuida-se de ação indenizatória ajuizada pela agravada em que se acolheu as preliminares de ilegitimidade ad causam julgando-se extinto o feito sem julgamento do mérito no tocante às requeridas ARISTON DISTRIBUIDORA DE MEDICAMENTOS LTDA e BLAUSIEGEL, mas entendendo que as demais partes eram legítimas e bem representadas.

Inconformada, insurge-se a agravante contra o decisum, nesta sede.

Em que pese o douto entendimento do MM. Juiz a quo, a decisão merece reforma.

Pela análise dos documentos trazidos por cópia ao presente instrumento é possível verificar que, efetivamente, foi noticiada a morte do Sr. ALCIR MINZON (fls.94/96), um dos sócios da empresa autora juntamente com a Sra. MARIA RITA DE ALMEIDA MINZON.

Entretanto, pelo que se depreende da leitura do contrato social de fls. 28/3, a gerência da sociedade não era exercida apenas pelo sócio ALCIR, mas sim por ambos os sócios (Cláusula 8a), em conjunto, conforme prevê a Cláusula 12a do mencionado instrumento.

Assim, diante da morte de um dos sócios proprietários, detentor de 50% das cotas sociais, mister se faz a aplicação da disposição legal prevista no art.1028 do CC, in verbis:

"Art.1.028. No caso de morte de sócio, liquidar-se-á sua quota, salvo; I - se o contrato dispuser diferentemente; II - se os sócios remanescentes optarem pela dissolução da sociedade; III - se, por acordo com os herdeiros, regular-se a substituição do sócio falecido.". No caso em testilha , o contrato social prevê de maneira expressa em sua cláusula 11a que na hipótese de falecimento de um dos sócios a sociedade não se dissolverá, podendo continuar em nome do sócio remanescente ou dos herdeiros, que poderão ingressar na sociedade com os ônus e vantagens do sócio falecido ( . . . ) ".

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Verifica-se, portanto, manifesta de forma inequívoca a vontade dos sócios na continuação da sociedade, inclusive com o ingresso dos herdeiros do sócio falecido, conforme seu interesse.

Além disso, houve manifestação do firme propósito dos herdeiros em substituir o sócio falecido, conforme se depreende do pleito realizado em audiência e deferido pelo MM. Juiz a quo (fls. 94).

De regra, portanto, a aplicação do inciso III , art. 1028 do CPC, substituindo-se o sócio falecido pelos seus herdeiros, tal como fora deferido pelo Magistrado de origem, sem que isso implique em qualquer irregularidade na representação da empresa autora.

Neste sentido:

"FRAN MARTINS e LUCENA sustentaram que os herdeiros só sucediam o de cujus se houvesse expressa disposição contratual, esclarecendo, entretanto, que, mesmo havendo prévia disposição contratual facultando a continuação da sociedade com os herdeiros do sócio falecido, era mister que estes manifestassem o propósito firme de associar-se, pois era licito aos herdeiros preferirem o recebimento dos haveres ao invés da aquisição das quotas por ato mortis causa."(LOBO, Jorge. Sociedades Limitadas, V . l . , Rio de Janeiro: Forense, 2004, p.227) (g.n.).

Portanto, preenchidos todos os requisitos legais e mesmo aqueles previstos na doutrina, não há razão para que não se operasse a substituição do sócio falecido, tal como fora deferida na audiência realizada.

Não procedem, pois, as alegações vazias trazidas pela agravante de que a certidão de óbito apresentada traz informações falsas e que pode ter sido adulterada, eis que se trata de documento público e não há qualquer indício, ainda que mínimo, neste sentido.

A inexistência de bens ali declarada é, em princípio, justificável, eis que, como discorrido, a morte do sócio ALCIR não implicou na liquidação de suas cotas ou mesmo na dissolução da sociedade.

Em verdade, o que não se justifica é a pretensão da agravante de obter a suspensão do feito até a regularização da representação da agravada. Tal pretensão, além de totalmente desnecessária, revela um caráter claramente protelatório, eis que a empresa autora pretende ver satisfeito seu pretenso crédito que alega possuir em face da requerida.

Revela-se, portanto, bem lançada a r.decisão agravada que, reconhecendo a legitimidade e regularidade de representação das partes remanescentes, determinou o regular processamento do feito.

Mantém-se, pois, integralmente o decisum agravado, por seus próprios e jurídicos fundamentos aqui adotados em complemento aos do presente voto. Ante o exposto, por este voto, nega-se provimento ao recurso. V RUBENS CURY Relator

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Anexo I - Apelação Cível Nº 70038936951 da Comarca de Itaqui

APELAÇÃO CÍVEL. DISSOLUÇÃO E LIQUIDAÇÃO DE SOCIEDADE. morte de sócio. espólio que não passou a integrar as sociedades de fato e limitada. APURAÇÃO DE HAVERES. verba honorária.

1. A existência de sociedade por quotas de responsabilidade limitada mantida entre os demandados e o de cujos já foi reconhecida na decisão de primeiro grau, bem como a existência de sociedade de fato, evidenciada a comunhão de esforços organizada para a consecução de objetivo comum, a fim de auferir lucro. 2. O recurso cinge-se ao termo da apuração de haveres, postulando a parte autora que a liquidação da quota do sócio falecido apure os haveres e responsabilidades que ocorrerem até o termo final da presente ação. 3. Com efeito, verifica-se da análise dos autos que os sócios não acordaram com os herdeiros a substituição do sócio falecido, pois as safras que se seguiram não tiveram a participação do espólio. 4. O direito do sócio que se afasta da sociedade em receber os valores a que faz jus não se sobrepõe a continuidade e a sobrevivência da empresa. Destarte, o próprio Código Civil disciplina a forma em que será efetuado o pagamento da quota liquidada, conforme estabelece o § 2º do artigo 1.031 do CC. Negado provimento ao apelo.

APELAÇÃO CÍVEL QUINTA CÂMARA CÍVEL Nº 70038936951 COMARCA DE ITAQUI ESPOLIO DE JOELCIR CEZAR VIZZOTTO

APELANTE CERAMICA VIZZOTTO LTDA E OUTROS APELADO

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Cível

do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao

recurso.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os

eminentes Senhores DES. GELSON ROLIM STOCKER E DES.ª ISABEL DIAS

ALMEIDA.

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Porto Alegre, 27 de outubro de 2010.

DES. JORGE LUIZ LOPES DO CANTO, Relator.

I - R E L A T Ó R I O

DES. JORGE LUIZ LOPES DO CANTO (RELATOR)

Trata-se de apelação interposta pelo ESPÓLIO DE JOELCIR

CEZAR VIZZOTTO nos autos da ação de dissolução e liquidação de sociedades

mercantis proposta em face da CERÂMICA VIZZOTTO LTDA.

Na decisão singular (fls. 839-843) foram julgados parcialmente

procedentes os pedidos formulados para:

a) declarar a dissolução parcial das sociedades mercantis

CERÂMICA VIZZOTTO LTDA. e VIZZOTO TRANSPORTE LTDA., devendo os

haveres líquidos da sociedade, responsabilidades e dívidas serem apurados em

liquidação de sentença, na proporção das quotas sociais do espólio autor;

b) declarar a existência de sociedade de fato para plantio entre

Valdocir Hamilton Vizzoto, Vilimar Elói Vizzoto e Joelcir Cezar Vizzoto, bem como

sua dissolução na data do falecimento deste último, devendo serem apurados os

haveres, responsabilidades e dívidas, em liquidação de sentença, na proporção

de 1/3 para cada sócio.

Em suas razões recursais (fls. 846-855) a parte autora argumentou

que desde o falecimento do sócio Joelcir Cezar, inocorreu qualquer iniciativa dos

demais sócios no sentido de excluírem o mesmo, ou seus sucessores da

sociedade, mediante apuração de haveres, mantendo o status quo vigente até o

presente feito, de sorte que válida a sociedade em seus moldes originários, até a

dissolução definitiva, devendo os haveres serem apurados agora.

Defendeu que desde o falecimento a viúva obrou por todos os meios

participar dos empreendimentos, sendo repelida grosseiramente por seus ex-

cunhados, sendo-lhe sonegadas quaisquer informações sobre resultados de

safras e tudo mais que dissesse respeito sobre as atividades agrícolas.

Aduziu que tiverem os sócios remanescentes folgado espaço de

tempo para procederem a exclusão do sócio falecido e apurarem seus haveres,

só que nunca adotaram iniciativa em tal sentido, preferindo a fruição do quinhão

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do sócio falecido, bem como o proveito do produto cabível ao mesmo à cada

safra.

Requereu a reforma da sentença no sentido de que a liquidação da

quota do sócio falecido apure os haveres e responsabilidades que ocorrerem até

o termo final da presente ação. Pleiteou, ainda, a reforma da sentença para que a

verba honorária seja fixada nos termos do art. 20, §3º, do CPC.

Contra-razões às fls. 858-868, os autos foram remetidos a esta

Corte.

Registro que foi observado o disposto nos artigos 549, 551 e 552 do CPC,

tendo em vista a adoção do sistema informatizado.

É o relatório.

I I - V O T O S

DES. JORGE LUIZ LOPES DO CANTO (RELATOR)

Admissibilidade e objeto do recurso

Eminentes colegas, o recurso intentado objetiva a reforma da

sentença de primeiro grau, versando sobre ação de dissolução de sociedade

comercial e apuração de haveres.

Os pressupostos processuais foram atendidos, utilizado o recurso cabível,

há interesse e legitimidade para recorrer, este é tempestivo e está dispensado do preparo

em razão da concessão da assistência judiciária gratuita, inexistindo fato impeditivo do

direito recursal, noticiado nos autos.

Assim, verificados os pressupostos legais, conheço do recurso intentado

para a análise das questões de fundo suscitadas.

Mérito do recurso em exame

No que tange ao mérito da causa entendo que não merece guarida a

pretensão recursal da parte autora, tendo em vista que não há nos autos provas

suficientes a corroborarem as alegações deduzidas na peça exordial, ônus que

lhe cabia e do qual não se desincumbiu, a teor do que estabelece o art. 333, I, do

CPC.

Preambularmente, cumpre destacar que a existência de sociedade

por quotas de responsabilidade limitada mantida entre os litigantes já foi

reconhecida na decisão de primeiro grau, bem como a existência de sociedade de

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fato, evidenciada a comunhão de esforços organizada para a consecução de

objetivo comum, a fim de auferir lucro.

O recurso cinge-se ao termo da apuração de haveres, postulando a

parte autora que a liquidação da quota do sócio falecido apure os haveres e

responsabilidades que ocorrerem até o termo final da presente ação.

Há que se ressaltar, ainda, que se trata de uma sociedade por

quotas de responsabilidade limitada, na qual, diferentemente do que ocorre

em outros tipos societários, o elemento preponderante em sua constituição

– intuito personae ou intuitu pecuniae, pode variar de acordo com a forma

de participação de seus integrantes. É o que se denomina de caráter híbrido

da sociedade limitada, fenômeno bem explicitado por Vinícius Jose Marques

Gontijo52:

Não temos dúvida em afirmar que a sociedade limitada, como prescrita pelo Código Civil, é uma sociedade híbrida. O nosso legislador não optou pela definição do caráter do instituto como sendo sociedade de pessoas ou de capital, mas, ao revés, manteve-se na linha tradicional da legislação brasileira, permitindo a constituição de sociedades limitadas com características de um ou de outro viés, mantendo, destarte, o instituto, que originariamente era híbrido, como tal.

Cumpre transcrever, ainda, as lições de Modesto Carvalhosa53 sobre

este caráter híbrido que diferencia as sociedades limitadas das demais

sociedades:

As sociedades limitadas, de um lado, beneficiam-se da limitação da responsabilidade de seus sócios e da maior separação entre a pessoa do sócio e sua quota social, que resulta da vinculação do direito de voto à quota e não ao sócio, elementos estes trazidos das sociedades de capital. De outro lado, beneficiam-se da facilidade de organização e constituição, da possibilidade de impor restrições à livre cessão de quotas, da liberdade de escolha dos sócios a respeito das pessoas com quem desejam se associar e das causas pessoais de dissolução da sociedade, elementos estes tirados das sociedades de pessoas.

É justamente esse caráter híbrido que distingue as sociedades limitadas e impede que sejam classificadas em um ou outro dos

52 GONTIJO, Vinícius Jose Marques. A Regulamentação das Sociedades Limitadas. In: Direito de Empresa no Novo Código Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 198. 53 CARVALHOSA, Modesto. Comentários ao Código Civil: Parte Especial: do Direito de Empresa. Vol. 13. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 36.

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referidos grupos. Esse tipo societário, como já referido, é singular, guardando um particularismo próprio da posição intermediária que ocupa entre as sociedades de pessoas e as sociedades de capital.

No caso em tela, é possível identificar o caráter pessoal da empresa

precitada, uma vez que composta apenas por três sócios, o que significa que as

qualidades pessoais de cada sócio são determinantes para a constituição da

sociedade. Sobre a affectio societatis, as lições de Waldo Fazzio Júnior54:

Também dito como animus societário, é o intento de se associar, é a vontade de constituir sociedade. Refere-se à disposição de ingressar em uma sociedade empresária, de correr o risco inerente à atividade empresarial. Quem contrata a criação de uma sociedade empresária quer ser sócio.

O ânimo societário é requisito fático, de índole subjetiva, da existência da sociedade, posto que, a sua ausência, descaracterizada estará a própria natureza constitutiva desta. Mais que um elemento impulsionador, é um dever dos sócios, envolvendo a lealdade, a conduta coerente com o propósito declarado e a implementação contínua do intento societário.

Ricardo Negrão55 esclarece, com peculiar objetividade, a distinção

entre as sociedades de pessoas, na qual se enquadra a empresa em comento, e

as sociedades de capital:

Em relação à maior ou menor importância da affectio societatis na vida da sociedade, estas se classificam em sociedades de pessoas, de capitais e mistas. (...) Obviamente, em ambos os grupos há necessidade, em sua formação, de elementos pessoais e de capital; sem eles inexistiria contrato de sociedade. Entretanto, se há predominância em sua formação de qualidades pessoais, de sorte que a mera substituição de um sócio pode acarretar sua dissolução ou a impossibilidade de sua continuação, então se diz que a sociedade é pessoal. Se o caráter pessoal é secundário, e a substituição de sócio se faz livremente, sem necessidade de prévia consulta ou até mesmo conhecimento dos demais sócios, então, à evidência, trata-se de sociedade de capitais. Carvalho de Mendonça bem descreve a distinção entre ambas: “Nas primeiras, os sócios aceitam-se, tendo em consideração suas qualidades pessoais e, por isso, se dizem formadas intuitu personae; os credores sociais podem contar, além do capital

54 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Manual de Direito Comercial. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 125. 55 NEGRÃO, Ricardo. Manual de Direito Comercial e de Empresa. Vol. 1. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 240/241.

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social, com o patrimônio de todos ou de alguns sócios. Essas sociedades repousam na confiança recíproca, na solvência, no crédito, na honradez, na experiência dos sócios. A morte de um deles importa a dissolução, e a parte dos sócios, denominada quota, não pode ser acessível entre vivos nem transmissível causa mortis, salvo com o consentimento unânime dos outros sócios. Os sócios não podem subtrair essa quota das obrigações sociais. Nas segundas, atende-se exclusivamente às entradas de cada sócio. São os capitais que se unem, não as pessoas. A garantia de terceiros está unicamente no capital social. Essas sociedades fundam-se na força do capital, pelo que as entradas de todos os sócios, representadas por ações, são títulos transmissíveis e negociáveis. A morte do sócio de responsabilidade limitada não exerce a menor influência sobre a sociedade e nem se concebe que possa haver nulidade de tais sociedades fundada em erro sobre a pessoa”.

No mesmo sentido, os ensinamentos do insigne jurista Modesto

Carvalhosa56:

Nas sociedades de pessoas impera o intuitu personae, de forma que os sócios reúnem-se em atenção às pessoas dos seus sócios, por confiarem neles. Dessa confiança recíproca entre os sócios decorrem princípios que imperam na organização da sociedade, tais como o impedimento de livre cessão das quotas sociais a terceiros estranhos à sociedade, a tomada de determinadas deliberações por unanimidade e a dissolução da sociedade em razão de morte, interdição ou falência de algum dos sócios.

Nas sociedades de capitais impera o intuitu pecuniae, sendo para os sócios mais relevante a aglutinação dos capitais em si do que as pessoas dos demais sócios, os quais muitas vezes não se conhecem. Em conseqüência disso, as quotas de participação no capital de cada sócio podem ser livremente cedidas a terceiros estranhos, e a sociedade perdura a despeito da morte, interdição ou falência de um dos sócios.

Igualmente, o jurista Sérgio Campinho57 culmina por afirmar:

As sociedades podem também estar classificadas tendo em consideração a pessoa dos sócios. Dependendo da sua estruturação econômica, na qual se irá verificar a influência maior ou menor da condição pessoal do sócio, podem as sociedades ser divididas em sociedades de pessoa e sociedades de capital. Nas primeiras, a figura do sócio é o elemento fundamental da formação societária. A sociedade se constitui tendo por referência

56 CARVALHOSA, Modesto. Comentários ao Código Civil: Parte Especial: do Direito de Empresa. Vol. 13. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 35. 57 CAMPINHO, Sérgio. O Direito de Empresa à Luz do Novo Código Civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 48.

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a qualidade pessoal do sócio. Fica ela, nesse contexto, subordinada à figura do sócio (conhecimento e confiança recíproca, capacitação para o negócio, etc.). Nas segundas, o ponto de gravidade da sociedade não reside na qualificação subjetiva do sócio, mas sim na sua capacidade de investimento. A importância está na contribuição do sócio para a formação do capital social, sendo relegado a um plano secundário a sua qualidade pessoal. Para tais sociedades é desinfluente quem é o titular da condição de sócio, mais sim a contribuição material que ele é capaz de verter para os fundos sociais.

Ademais, o de cujos e os demandados também formaram uma

sociedade de fato, onde se fez necessária a comunhão de esforços organizada

para a consecução de objetivo comum, a fim de auferir lucro. Acerca da

conceituação e dos efeitos jurídicos da sociedade de fato, é oportuno trazer à

baila as sempre pertinentes lições de Waldo Fazzio Júnior58 a seguir:

Há quem encete distinção entre a sociedade empresária irregular e a sociedade empresária de fato. (...) Sintetizando, a primeira é sociedade irregular porque, embora tendo contrato social, não o arquivou no registro competente. A segunda, de fato por que não tem mais ou nunca teve contrato social. Ambas são sociedades não personificadas, ou pela ausência do contrato, ou porque sem registro. São duas modalidades distintas de sociedade em comum, mas ambas são sociedades em comum, ou seja, foram concebidas por um contrato (no primeiro caso, verbal; no segundo, escrito), mas não nasceram porque não registradas. O efeito de serem seus “sócios” compelidos a responder solidária e ilimitadamente pelo passivo é o mesmo em ambos os casos. O efeito de não desfrutar dos atributos positivos da juridicidade é o mesmo para ambas. Não há, pois, sob a perspectiva jurídica, nenhuma utilidade prática na distinção. Sociedade em comum é sociedade em comum. Não tendo personalidade jurídica por uma causa ou por outra, não detém os atributos positivos da sociedade empresária; só os negativos.

Ressalte-se, ainda, que o artigo 981 do Código Civil define que:

Art. 981 – Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens e serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados.

58 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Manual de Direito Comercial. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 116.

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A controvérsia cinge-se a data final para a apuração dos haveres,

sendo necessário perquirir se o espólio passou a integrar a sociedade de fato,

tendo em vista a possibilidade de ingresso dos sucessores na sociedade.

Com efeito, verifica-se da análise dos autos que os sócios não

acordaram com os herdeiros a substituição do sócio falecido, pois as safras que

se seguiram não tiveram a participação do espólio.

Ademais, somente o fato de ter sido utilizado o maquinário

pertencente também ao de cujos não demonstra a participação do espólio da

sociedade então constituída pelos irmãos Valdocir e Vilimar.

Nesse diapasão, os fundamentos da sentença prolatada pela culta

Magistrada a quo, Dra. Vanessa Osanai Kras Borges (fl. 839-843), são adotados

como razão de decidir e transcritos parcialmente, a fim de evitar desnecessária

tautologia, a seguir:

Resta evidente o desaparecimento do affectio societatis da parte autora em relação aos demandados, tanto que não há contestação destes quanto à pretensão de dissolução parcial das sociedades mercantis.

Assim, havendo concordância das partes com a dissolução das sociedades mercantis regularmente constituídas, mister a fixação da data da dissolução.

Considerando que havia a possibilidade de ingresso dos sucessores nas sociedades, tenho que a data da dissolução deve ser considerada aquela em que houve manifestação expressa do espólio no sentido de não ter interesse em integrar o quadro societário, qual seja, a data da citação.

(...)

Sendo assim, os documentos juntados aos autos e o laudo pericial apresentado poderão servir para instrumentalizar a liquidação de sentença, ocasião em que serão apurados todos os bens e ônus das empresas, e não apenas a situação contábil desta.

Quanto à sociedade para o plantio existente entre Valdocir, Vilimar e Joelcir, tenho que a cada safra formava-se uma nova sociedade.

O conjunto probatório formado não demonstra a existência de sociedade de fato entre Valdocir, Vilimar e o espólio de Joelcir, ou seja, a manutenção da sociedade após o falecimento deste último.

Assim, deve ser considerada dissolvida a sociedade de fato para plantio existente entre os irmãos, na data do falecimento de Joelcir, devendo os haveres, responsabilidades e dívidas ser apurados até esta data.

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Aliás, o próprio comportamento da viúva de Joelcir indica que esta não tinha a intenção de substituir o de cujus na sociedade existente entre os irmãos para o plantio.

Verifica-se que os plantios posteriores ao falecimento de Joelcir não tiveram a participação do espólio.

O documento de fl. 629 corrobora a versão dos réus de que, a partir do falecimento de Joelcir, o espólio não teve mais interesse em prosseguir com a sociedade para plantio, já que as operações posteriores a esta data foram realizadas apenas por Valdocir e Vilimar.

O fato de não ter havido pagamento pela participação de Joelcir nos eventuais lucros obtidos com a sociedade de fato, bem como o fato dos equipamentos terem sido utilizados nas safras posteriores, não demonstram a continuidade da relação entre os requeridos (pessoas físicas) e a parte autora.

Em outras palavras, o direito do sócio que se afasta da

sociedade sem receber os valores a que faz jus não se sobrepõe a

continuidade e a sobrevivência da empresa. Destarte, o próprio Código Civil

disciplina a forma em que será efetuado o pagamento da quota liquidada,

conforme estabelece o § 2º do artigo 1.031 do Código Civil, in verbis:

Art. 1.031. Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado. (...) § 2º A quota liquidada será paga em dinheiro, no prazo de noventa dias, a partir da liquidação, salvo acordo, ou estipulação contratual em contrário.

Frise-se que a eventual constituição de nova empresa com o

patrimônio de anterior sociedade importa em sucessão empresarial, sendo que a

cisão parcial se efetivamente levada a efeito dá azo a responsabilidade daquela

em satisfazer as obrigações até então existentes da antiga sociedade, dentre as

quais as atinentes aos seus sócios, a teor do que estabelece o art. 115, caput, do

Código Civil.

Igualmente, não merece guarida a pretensão da parte recorrente a respeito

da verba honorária, pois adequadamente fixada consoante dispõe o art. 20, §4º, do CPC,

porquanto não se trata de decisão de carga condenatória.

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No que concerne à fixação dos honorários advocatícios, mediante

apreciação eqüitativa, é oportuno trazer à baila a lição do insigne jurista Yussef Said

Cahali59, ao fazer referência à lição de Sérgio Sahione Fadel, que a seguir se transcreve:

O §3º só cuida da sentença de natureza condenatória, pois em seu corpo se refere a percentagens incidentes sobre o valor da condenação, o que pressupõe não só esse tipo de sentença, como também a procedência da ação ou da reconvenção. Isso não exclui, a nosso ver, seguindo o mesmo critério de aplicação da lei, a sucumbência do autor, embora a sentença, ao julgar improcedente a ação condenatória, não fixe a rigor, o valor da condenação, pois que esta, no caso, não existe. Assim, se numa ação, reivindicando um direito patrimonial, o autor sucumbe, deve ser condenado, de acordo com as regras do §3º do art. 20, em percentagem sobre o valor da condenação que seria imposta ao réu caso fosse vencedor. A base de cálculo dos honorários, nessa hipótese, há de ser a mesma, em obediência à regra do equilíbrio das partes no processo.

E o jurista esclarece em sua obra:

Mas, estabelecendo o art. 20, §3º, que os honorários devam ser arbitrados entre 10% e 20% do valor da condenação, afasta-se, com isto, possam ser aqueles arbitrados em limite fixo, sob pena de não corresponder ao devido pagamento do patrono do autor, devendo, portanto, incidir sobre o montante a ser apurado em liquidação.

Pois, se é condenatória a sentença que encerra o processo de conhecimento, o arbitramento dos honorários de advogado obedece ao critério do art. 20 §3º, é irrelevante a iliquidez da sentença, bem como o fato de a prestação ser em moeda estrangeira.

Dessa forma, deve ser negado provimento ao apelo, mantendo-se a

sentença de primeiro grau por seus jurídicos e legais fundamentos.

I I I - D I S P O S I T I V O

Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento ao apelo,

mantendo a sentença de primeiro grau, inclusive no que tange à sucumbência.

DES. GELSON ROLIM STOCKER (REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a).

DES.ª ISABEL DIAS ALMEIDA - De acordo com o(a) Relator(a). DES. JORGE LUIZ LOPES DO CANTO - Presidente - Apelação Cível nº 70038936951, Comarca de Itaqui: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. UNÂNIME." Julgador(a) de 1º Grau: VANESSA OSANAI KRAS BORGES

59 CAHALI, Yussef Said. Honorários Advocatícios, 2ª ed., RT:1990, p.246/247.

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Anexo J - Superior Tribunal de Justiça - RECURSO ESPECIAL Nº 289.151 - SP (2000/0123042-5)

RELATOR : MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA

(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS)

RECORRENTE : EDWARD KAMAGIAN

ADVOGADO : IVO GOBATTO E OUTRO(S)

RECORRIDO : BARKEF KAMADJIAN - ESPÓLIO E OUTROS

ADVOGADO : JOSÉ LUIZ PISAPIA RAMOS

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. NÃO CONFIGURADA. INVENTÁRIO. ART. 993, PARÁGRAFO ÚNICO, II, DO CPC. APURAÇÃO DE HAVERES. INADEQUAÇÃO DA VIA, IN CASU. EXISTÊNCIA DE CONTROVÉRSIA ENTRE O SÓCIO REMANESCENTE E OS DEMAIS HERDEIROS ACERCA DA DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE LIMITADA. QUESTÃO DE ALTA INDAGAÇÃO. ART. 984 DO CPC. REMESSA DA QUESTÃO ÀS VIAS ORDINÁRIAS. POSSIBILIDADE.

1. A motivação contrária ao interesse da parte ou mesmo omissa em relação a pontos considerados irrelevantes pelo decisum não se traduz em ofensa ao art. 535 do CPC.

2. A ofensa ao art. 535 do CPC somente se configura quando, na apreciação do recurso, o Tribunal de origem insiste em omitir pronunciamento sobre questão que deveria ser decidida, e não foi, o que não ocorreu na hipótese dos autos.

3. O parágrafo único do art. 993 do CPC dispõe sobre as medidas postas ao alcance do julgador, que devem suceder às primeiras declarações do inventariante, em processo de inventário no qual era, o autor da herança, comerciante em nome individual ou sócio de sociedade que não anônima. Autoriza, assim, o inciso II do parágrafo único do referido dispositivo que, dentro do próprio processo de inventário, se proceda a apuração de haveres do falecido por sua participação, por exemplo, em sociedades civis e comerciais por cotas de responsabilidade limitada. Nesses casos, cumpre ao juiz da causa nomear contador (perito) para que realize referida apuração (CPC, art. 1003, parágrafo único).

4. Inexiste óbice, porém, a que o julgador remeta a apuração de haveres às vias ordinárias, na forma dos arts. 655 a 674 do CPC de 1939, a teor do que dispõe o art. 1.218, VII, do vigente diploma processual, quando questões relativas à dissolução da sociedade se apresentem como objeto de controvérsia entre sócios remanescentes e espólio ou herdeiros, máxime se estas se revelam de alta indagação (CPC, art.art. 984)

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5. Na hipótese, entendendo o julgador que a apuração de haveres, nos moldes em que pretendida pelo ora recorrente, revela controvérsia existente entre ele (sócio-remanescente) e os demais herdeiros acerca da dissolução da sociedade, configurando, ainda, questão de alta indagação, não há falar, in casu, em ofensa ao art. 993, parágrafo único, inciso II, do CPC, mesmo porque a revisão das referidas conclusões demandaria incursão deste Sodalício no conjunto fático probatório carreado aos autos, labor que, como de sabença, se encontra proscrito, na via especial, ao Superior Tribunal de Justiça (Súmula n.º 07/STJ).

6. Recurso especial a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a).

Os Srs. Ministros Nancy Andrighi, Sidnei Beneti e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Massami Uyeda.

Brasília (DF), 07 de outubro de 2010(Data do Julgamento)

MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA

(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS)

Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS) (Relator): Trata-se de recurso especial interposto por EDWARD KAMAGIAN, com fulcro no art. 105, inciso III, alíneas "a" e "c", da Carta Maior, no intuito de ver reformado acórdão prolatado pelo Eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, sob o fundamento de ter o mesmo malferido os arts. 535, inciso II, e 993, parágrafo único, inciso II, do Código de Processo Civil, bem como por entender configurado dissídio pretoriano acerca da escorreita exegese deste último dispositivo.

Noticiam os autos que o ora recorrente, na condição de herdeiro de BARKEF KAMADJIAN e sócio remanescente do mesmo na Sociedade Comercial denominada

BARKEV MATERIAIS PARA CONSTRUÇÃO LTDA, interpôs agravo de instrumento (CPC, art. 522), contra a r. decisão do Juízo de Direito da 1.ª Vara Cível da Comarca de Osasco que, nos autos de inventário deste, indeferiu pedido de nomeação de perito contábil para a apuração de haveres de que trata o inciso II do parágrafo único do art. 993 do CPC. Na ocasião, decidiu o i. magistrado, verbis: "Em realidade, quanto a sociedade, o de cujus sendo sócio transferiu automaticamente sua participação societária aos herdeiros, tendo a viúva-meeira permanecido com as suas cotas decorrentes da meação.

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Portanto, devem ser as cotas partilhadas entre os herdeiros e constar do rol dos bens do inventário.

A questão da continuidade ou não da sociedade e mesmo a apuração dos haveres do sócio morto, deve ser feita em ação própria e fora do Inventário, pois constitui questão de alta indagação. Portanto, indefiro o requerimento da perícia. Apresente a inventariante o respectivo plano de partilha" (fl. 15).

A 8.ª Câmara de Direito Privado do Eg. TJ/SP, por unanimidade de votos dos seus integrantes, negou provimento ao agravo interposto, em aresto que restou assim ementado:

"INVENTÁRIO. FALECIMENTO DE SÓCIO DE SOCIEDADE POR QUOTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADA. APURAÇÃO DOS HAVERES QUE O 'DE CUJUS' POSSUÍA NA SOCIEDADE - IRRELEVÂNCIA - TRANSFERÊNCIA AUTOMÁTICA DAS COTAS AOS HERDEIROS - CONTINUIDADE OU NÃO DA SOCIEDADE, NÃO ATINGIDA NESTES AUTOS - DESNECESSIDADE DE PERÍCIA CONTÁBIL -

RECURSO IMPROVIDO (fl.98)".

Extraem-se do voto condutor do julgado, os seguintes excertos, que lhe serviram de fundamentação:

"De fato, ao tempo da transmissão a viúva meeira já era sócia da respectiva sociedade, em comunhão com o sócio falecido.

Tocante aos demais herdeiros, para serem excluídos da sociedade – se esse é o desejo do sócio remanescente - haverá de ser proposta ação própria com tal finalidade, e não se discutir a questão nos presentes autos de Inventário.

Com efeito, a alteração societária pretendida pelo ora agravante não constitui matéria a ser decidida neste processo, ainda mais que se tem notícia do ingresso de pessoas estranhas à sociedade, sem que a viúva meeira - sócia remanescente - haja se manifestado.

Assim, até o final deste Inventário permanecerão como sócios a viúva meeira e os demais herdeiros - estes por transmissão automática. Quanto à dissolução ou não da sociedade e à alteração de seu quadro societário, são questões a serem definidas em ação pertinente (fl. 99).

Após opor (fls. 102/107) e ter rejeitados (fls. 112/116) seus embargos de declaração, interpôs o então agravante o recurso especial que ora se apresenta.

Em suas razões (fls. 119/132), afirma o recorrente, preliminarmente, restar configurada ofensa ao art. 535, inciso II, do CPC, por não ter a Corte de origem, a despeito de instada a fazê-lo por meio de embargos de declaração, sanado omissão acerca da aplicação, in casu, do art. 593, parágrafo único, II, deste mesmo diploma legal. Assevera, ainda, restar malferido o próprio art. 593, parágrafo único, II, do CPC, ao argumento de que, "se a apuração de haveres, descrita no diploma legal, somente interessa aos pretendentes à posse e propriedade dos bens do espólio, há de ser ela realizada nos autos do inventário" (fl. 129). Questiona, ainda, o indeferimento de seu pedido de apuração de haveres nos autos do inventário, sob a alegação de que a aplicação do disposto no inciso II do

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dispositivo legal retro referido é de rigor, dada a perfeita subsunção da hipótese vertente à norma, mesmo porque "está definitivamente provado, no presente processo, consoante se extrai do contrato de constituição que a ele foi juntado, que, no caso de falecimento de um dos sócios, não haverá o encerramento do estabelecimento, com previsão, no referido contrato, inclusive da forma de pagamento dos haveres do sócio falecido" (fl. 132).

WARTUY ASSADURIAN KAMADJIAN e OUTROS, na condição de recorridos, apresentaram suas contrarrazões ao especial (fls. 141/144), pugnando pelo não provimento do mesmo, nos seguintes termos:

"Posto como está, o decidido neste processo não merece nenhum reparo e sequer vislumbra-se qualquer negativa de validade de lei Federal, como também está totalmente descaracterizado que se contrapõe com qualquer outra decisão de nossos tribunais.

Em outras palavras, o Sócio remanescente, embora também herdeiro, jamais poderá dispor sobre os direitos dos demais herdeiros; caso entenda que os sócios herdeiros não devem ingressar na sociedade terá ele meios para alcançar este desiderato, porém nunca neste processo de inventário.

Esta situação reveste-se concretamente da necessidade de perquirições, que caracteriza efetivamente alta indagação, o que é vedado para este tipo de processo.

Na origem, em exame de prelibação recebeu o recurso crivo positivo de admissibilidade, ascendendo, assim a esta Corte Superior.

O Ministério Público Federal, em parecer acostado às fls. 153/156, opina pelo não provimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS) (Relator): Prequestionados, ainda que implicitamente, os dispositivos legais apontados pelo recorrente como malferidos, e restando devidamente preenchidos os demais pressupostos de admissibilidade recursal, impõe-se o conhecimento do apelo nobre que se apresenta.

No mérito, todavia, tenho que não merecem acolhida as pretensões recursais, devendo ser mantido hígido, assim, o v. Aresto objeto de impugnação.

De início, verifica-se não ter havido a alegada negativa de prestação jurisdicional nos embargos declaratórios, visto que tal somente se configura quando, na apreciação do recurso, o Tribunal de origem insiste em omitir pronunciamento sobre questão que deveria ser decidida, e não foi. Não é o caso dos autos. A Corte de origem enfrentou a matéria posta em debate na medida necessária para o deslinde da controvérsia, consoante se pode facilmente inferir do inteiro teor do aresto objeto de impugnação do especial.

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A propósito, o órgão julgador não está obrigado a se pronunciar acerca de todo e qualquer ponto suscitado pelas partes, mas apenas sobre os considerados suficientes para fundamentar sua decisão, o que foi feito.

A motivação contrária ao interesse da parte ou mesmo omissa em relação a pontos considerados irrelevantes pelo decisum não se traduz em maltrato às normas apontadas como violadas.

Nesse sentido:

“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO - RESPONSABILIDADE CIVIL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - INSCRIÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES - CANCELAMENTO DO REGISTRO - INVIABILIDADE - SÚMULA 323/STJ - OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE DO ACÓRDÃO RECORRIDO - INOCORRÊNCIA - FALTA DE PREQUESTIONAMENTO DOS DEMAIS DISPOSITIVOS ELENCADOS NO RECURSO.

I - Não se pode confundir negativa de prestação jurisdicional com tutela jurisdicional desfavorável ao interesse da parte. O Tribunal de origem decidiu corretamente o feito, baseando-se, inclusive, na jurisprudência assente desta Corte sobre a matéria. Assim, não há que se falar em violação dos artigos 458, II e III, 515, §§ 1º e 2º, 535, I e II, do Código de Processo Civil. Os demais dispositivos não foram prequestionados.

II - O registro do nome do consumidor nos órgãos de proteção ao crédito não se vincula à prescrição atinente à espécie de ação cabível. Assim, se a via executiva não puder ser exercida, mas remanescer o direito à cobrança da dívida por outro meio processual, desde que durante o prazo de 5 (cinco) anos, não há óbice à manutenção do nome do consumidor nos órgãos de controle cadastral, em vista do lapso qüinqüenal (Súmula 323/STJ).

Agravo regimental improvido.” (AgRg no Ag 1099452/RS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/02/2009, DJe 05/03/2009).

Por outro lado, no que se refere à exegese do art. 993, parágrafo único, inciso II, do Código de Processo Civil, tenho que se resume a presente controvérsia, a saber se referida norma traz em si determinação de caráter absoluto, impondo ao juízo do inventário a nomeação de perito contábil para apuração de haveres dos herdeiros pelo falecimento de sócio de sociedade limitada, ou se a mesma permite ao julgador, à luz do disposto no art. 984 do próprio CPC, remeter questão controvertida acerca da dissolução da referida empresa às vias ordinárias, quando se revele a mesma de alta indagação.

O parágrafo único do art. 993 do Código de Processo Civil, como de sabença, dispõe sobre as medidas postas ao alcance do julgador, que devem suceder às primeiras declarações do inventariante, em processo de inventário no qual era o autor da herança comerciante em nome individual ou sócio de sociedade que não anônima.

Referido dispositivo legal ostenta a seguinte redação, litteris: "Art. 993. Dentro de vinte (20) dias, contados da data em que prestou o compromisso, fará o inventariante as primeiras declarações, das quais se lavrará termo circunstanciado.

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No termo, assinado pelo juiz, escrivão e inventariante, serão exarados:

(...) Parágrafo único. O juiz determinará que se proceda:

I - ao balanço do estabelecimento, se o autor da herança era comerciante em nome individual;

II - a apuração de haveres, se o autor da herança era sócio de sociedade que não anônima."

Autoriza a legislação citada, assim, que dentro do próprio processo de inventário se proceda a apuração de haveres do falecido por sua participação, por exemplo, em sociedades civis e comerciais por cotas de responsabilidade limitada.

Nesses casos, cumpre ao juiz da causa nomear contador (perito) para que realize referida apuração (CPC, art. 1003, parágrafo único).

Inexiste óbice, porém, a que o julgador remeta a apuração de haveres às vias ordinárias, na forma dos arts. 655 a 674 do CPC de 1939, a teor do que dispõe o art.

1.218, VII, do vigente diploma processual, quando questões relativas à dissolução da sociedade se apresentem como objeto de controvérsia entre sócios remanescentes e espólio ou herdeiros.

Nesta esteira, oportunas são as lições que se colhem da doutrina especializada. GERSON FISCHMANN, por exemplo, ao comentar o dispositivo legal ora em questão, ensina:

"(...) Apuração de haveres do de cujus - Se dentre os bens havia participação em sociedade anônima, partilham-se as ações que foram descritas em atendimento ao disposto no art. 993, IV, e diverso, porém, ocorre quando a participação do falecido era em sociedade não anônima, ou seja, em sociedade de pessoas, sendo exemplo mais comum o de participação em sociedades civis comerciais por cotas de responsabilidade limitada. Nesses casos o juiz determinará que se proceda a apuração de haveres, devendo, para tanto, nomear um contador (perito) para que realize a apuração (art. 1003, parágrafo único).

Hão que se distinguir, porém, três situações: a) dissolução da sociedade com a morte do sócio quotista; b) a permanência da sociedade com o(s) sócio(s) remanescente(s) com pagamento de haveres aos herdeiros do sócio morto; e (c) a permanência da sociedade com a participação dos herdeiros.

Nem sempre, porém, será possível ou até mesmo necessário que o juiz nomeie contador para que os haveres sejam apurados nos autos do inventário.

Nas letras a e b, sendo dissolvida a sociedade, total ou parcialmente, a apuração de haveres, se não houver conflito entre os sócios remanescentes e os herdeiros, poderá ser feita nos autos do inventário, com nomeação de contador, de tal modo que os haveres correspondentes ao de cujus sejam incluídos no rol de bens a serem partilhados. A apuração dos haveres, no caso de dissolução, também pode ser feita extrajudicialmente, salvo se entre os herdeiros houver menores ou incapazes,

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informando o inventariante quais os haveres do falecido, apurados segundo as normas e regras pertinentes de direito societário, auditoria e contabilidade.

Caso a dissolução enseje controvérsia entre sócio e espólio ou herdeiro, a questão deve ser remetida para as vias ordinárias, apurando-se os haveres na forma dos arts. 655 a 674 do CPC de 1939, a teor do que dispõe o art. 1218, inciso VII, do atual CPC." (in "Comentários ao Código de Processo Civil", vol. 14, São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2000, pp. 82/83)

Na mesma linha ensina PONTES DE MIRANDA, para quem "não pode ser no juízo do inventário e partilha que se apuram os haveres se se discute se a morte dissolveu, ou não, a sociedade ou se alguma questão surge" (in "Comentários ao Código de Processo Civil", Tomo XIV, 2.ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 65).

In casu, o que se depreende dos autos, a partir, por exemplo, do teor das próprias contrarrazões apresentadas em face do apelo nobre que ora se põe à apreciação desta Corte, é que a dissolução da sociedade limitada da qual fazia parte o autor da herança se revela objeto de controvérsia entre o sócio remanescente (ora recorrente) e os demais herdeiros, sendo assim, perfeitamente cabível a decisão do juízo de primeiro grau que, vislumbrando a presença, in casu, de questão de alta indagação, remeteu às vias ordinárias eventual apuração de haveres.

Sobreleva notar, ainda, que agiu o d. Julgador em perfeita consonância com o que dispõe o art. 984 do CPC, que autoriza o juiz do inventário a remeter aos meios ordinários as questões surgidas que demandem alta indagação ou dependam de provas outras. Dispõe o mencionado artigo:

"Art. 984. O juiz decidirá todas as questões de direito e também as questões de fato, quando este se achar provado por documento, só remetendo para os meios ordinários as que demandarem alta indagação ou dependerem de outras provas".

Na hipótese, entendendo o julgador que a apuração de haveres, nos moldes em que pretendida pelo ora recorrente, revela controvérsia existente entre ele (sócio-remanescente) e os demais herdeiros acerca da dissolução da sociedade, configurando, ainda, questão de alta indagação, não há falar, in casu, em ofensa ao art. 993, parágrafo único, inciso II, do CPC, mesmo porque a revisão das referidas conclusões demandaria incursão deste Sodalício no conjunto fático probatório carreado aos autos, labor que, como de sabença, se encontra proscrito, na via especial, ao Superior Tribunal de Justiça (Súmula n.º 07/STJ).

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao presente recurso especial. É como voto. CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA Número Registro: 2000/0123042-5 REsp 289.151 / SP Números Origem: 122797 1445064 PAUTA: 07/10/2010 JULGADO: 07/10/2010 Relator Exmo. Sr. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS) Presidente da Sessão

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Exmo. Sr. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO Subprocurador-Geral da República Exmo. Sr. Dr. MAURÍCIO VIEIRA BRACKS Secretária Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Nancy Andrighi, Sidnei Beneti e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Massami Uyeda.

Brasília, 07 de outubro de 2010

MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA

Secretária

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ANEXO k – Apelação cível Nº 70036078830 da comarca de porto alegre

APELAÇÃO CÍVEL. SUCESSÕES. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PRIMEIRA FASE. AÇÃO AJUIZADA PELAS HERDEIRAS CONTRA O SÓCIO-ADMINISTRADOR. LEGITIMIDADE ATIVA. DEVER DE PRESTAR CONTAS DA GESTÃO DA EMPRESA APÓS O FALECIMENTO DO SÓCIO.

As autoras, na condição de herdeiras, possuem interesse e legitimidade para propor a ação de prestação de contas contra o sócio-administrador, mormente quando a inventariante do espólio é esposa do sócio supérstite, havendo evidente conflito de interesses.

O sócio-administrador da sociedade está obrigado a prestar contas das atividades desenvolvidas, obrigação esta que decorre da própria função e está expressamente prevista no art. 1.020 do Código Civil, aplicável ao caso por força do art. 1.053 do mesmo diploma legal. Precedentes desta Corte e do STJ. PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÃO DESPROVIDA.

APELAÇÃO CÍVEL SÉTIMA CÂMARA CÍVEL

Nº 70036078830 COMARCA DE PORTO ALEGRE

PEDRO BECKER APELANTE

MARIA AMARAL LISBOA APELADO

CRISTIANE LISBOA VALADA APELADO

CLARICE LISBOA VALADA APELADO

SUCESSÃO DE IDO DA ROCHA VALADA

INTERESSADO

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Magistrados integrantes da Sétima Câmara Cível do

Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em rejeitar a preliminar e

desprover a apelação.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes

Senhores DES. JORGE LUÍS DALL´AGNOL (PRESIDENTE) E DR. ROBERTO

CARVALHO FRAGA.

Porto Alegre, 24 de novembro de 2010.

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DES. ANDRÉ LUIZ PLANELLA VILLARINHO, Relator.

R E L A T Ó R I O

DES. ANDRÉ LUIZ PLANELLA VILLARINHO (RELATOR)

Cuida-se de apelação interposta por Pedro Becker à sentença de fls.

63/64 que, nos autos da ação de prestação de contas ajuizada por Maria Amaral

Lisboa, Cristiane Lisboa Valada e Clarice Lisboa Valada, julgou procedente a

ação em sua primeira fase, ao fim de condenar o requerido a prestar contas no

prazo de 48 horas, sob pena de, não o fazendo, não lhe ser lícito impugnar as

contas apresentadas pelas autoras.

Nas razões recursais, o apelante argui preliminares de ilegitimidade

ativa e passiva. No mérito, aduz que não há relação jurídica de direito material

entre as partes. Sustenta que o patrimônio é do espólio, não havendo obrigação

de prestar contas às autoras. Alega que não há nos autos prova de que se negou

a prestar as contas às recorridas. Argumenta que, ao contrário, foram agendadas

uma reunião mensal para que fossem apresentados as contas da empresa, sendo

que as autoras não demonstraram interesse em participar dos atos. Busca o

provimento do recurso, julgando-se improcedente a ação (fls. 63/64).

Com as contrarrazões (fls. 83/86), vieram os autos a este Tribunal.

O Ministério Público, neste grau, pelo eminente Procurador de

Justiça, Dr. Roberto Bandeira Pereira, declinou da intervenção (fl. 89).

Registre-se, por fim, que foi cumprido o comando estabelecido pelos

artigos 549, 551 e 552, todos do CPC.

É o relatório.

V O T O S

DES. ANDRÉ LUIZ PLANELLA VILLARINHO (RELATOR)

Cuida-se de apelação interposta por Pedro Becker à sentença de fls.

63/64 que, nos autos da ação de prestação de contas ajuizada por Maria Amaral

Lisboa, Cristiane Lisboa Valada e Clarice Lisboa Valada, julgou procedente a

ação em sua primeira fase, ao fim de condenar o requerido a prestar contas no

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prazo de 48 horas, sob pena de, não o fazendo, não lhe ser lícito impugnar as

contas apresentadas pelas autoras.

Preliminares de ilegitimidade ativa e passiva.

O apelante argui preliminar de ilegitimidade ativa, sustentando que,

estando aberto o Inventário dos bens deixados pelo falecido sócio, é da

inventariante a legitimidade para ingressar com ação de prestação de contas

contra o sócio-administrador.

Com efeito, o espólio deve ser representado em juízo pelo seu

inventariante (art. 991, I, do CPC60). Ocorre que, como se vê dos elementos

coligidos aos autos, foi nomeada inventariante do Espólio de Ido da Rocha Valada

a Sra. Irene Valada Becker, filha do de cujus e esposa do requerido Pedro Becker

(fls. 21 e 23), havendo, portanto, flagrante conflito de interesses.

Daí nasce a legitimidade e o interesse das herdeiras em postular,

em nome próprio, a prestação de contas relativas à movimentação financeira da

empresa da qual o inventariado figurou como sócio.

Ainda que a relação jurídica de direito material tenha se dado,

num primeiro momento, entre o requerido e o Ido da Rocha Valada, com o

falecido deste as cotas sociais que lhe cabiam transmitiram-se de imediato

aos herdeiros, pelo princípio da saisine (art. 1.784 do Código Civil61).

Portanto, ainda que não figurem como sócias da empresa Posto de Revenda

de Gás Vila Farrapos (fls. 06/09), prevalece a legitimidade e o interesse

decorrente da condição de herdeiras.

Por tais fundamentos, rejeito a preliminar de ilegitimidade ativa.

Quanto à preliminar de ilegitimidade passiva, tenho que esta se

confunde com o próprio mérito da primeira fase da ação de prestação de contas,

na qual cabe, tão-somente, aferir se o requerido está, ou não, obrigado a prestá-

las.

Mérito.

60 Art. 991. Incumbe ao inventariante: I - representar o espólio ativa e passivamente, em juízo ou fora dele, observando-se, quanto ao dativo, o disposto no art. 12, § 1o;

61 Art. 1.784. Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e

testamentários.

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O requerido e o de cujus eram sócios na empresa Posto de Revenda

de Gás Vila Farrapos Ltda., na qual o apelante é titular de 48% das cotas, sendo

os restantes 52% pertencentes ao espólio. As autoras alegam, e o demandado

não nega, que, após o óbito do sócio Ido da Rocha Valada, a administração da

empresa ficou ao encargo exclusivo do sócio supérstite.

O sócio que administra sozinho a sociedade está obrigado a prestar

contas das atividades desenvolvidas, obrigação esta que decorre da própria

função de administrador e está expressamente prevista no art. 1.020 do Código

Civil (aplicável ao caso por força do art. 1.053 do CC62). Verbis:

“Art. 1.020. Os administradores são obrigados a prestar aos sócios contas justificadas de sua administração, e apresentar-lhes o inventário anualmente, bem como o balanço patrimonial e o de resultado econômico.”

Diante disso, nem mesmo a apresentação mensal dos balanços

contábeis da empresa (fl. 46) tem o condão de isentar o sócio-administrador de

prestar as contas da sua gestão na forma mercantil.

É nesse sentido a lição de Luiz Guilherme Marinoni e Daniel

Mitidiero63: “A ação de prestação de contas serve para declarar a existência ou

inexistência do dever de prestar contas e, em sendo o caso, para a obtenção

efetiva das contas devidas e formação de título executivo a respeito do saldo

apurado a favor de uma das partes. A ação de prestação de contas compete a

quem tem direito e exigi-las (ação de tomar contas) e a quem tem a obrigação de

prestá-las (ação de dar contas). A ação de prestação de contas supõe, de um

modo geral, a existência de administração de bens, negócios ou interesses de

outrem (STJ, 4º Turma. REsp 9.013/SP, rel. Min. Athos Gusmão Carneiro, j. em

28.05.1991, DJ 09.09.1991, p. 12.209). O dado fundamental é a existência de

administração de coisa alheia.”

Sobre o dever do sócio-administrador prestar contas de sua gestão,

já se pronunciou este Tribunal:

Ação de prestação de contas. Primeira fase. Sociedade empresária. Sentença de procedência. Reconhecida a obrigação do sócio administrador de prestar contas ao

62 Art. 1.053. A sociedade limitada rege-se, nas omissões deste Capítulo, pelas normas da sociedade

simples.

63 Código de Processo Civil comentado artigo por artigo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 830

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outro sócio. Inexiste exigência legal de prévio requerimento extrajudicial de prestação de contas. O demandado, como sócio administrador da sociedade empresária, tem o dever de prestar contas à sua sócia, contas estas que devem ser prestadas de forma mercantil, especificando-se as receitas e a aplicação das despesas, como determinado pelo artigo 917 do Código de Processo Civil. O dever de prestar contas decorre da existência de relação entre as partes. A sua caracterização completa deve ser objeto da segunda fase da ação de prestação de contas, quando então se poderá discutir quanto à regularidade, ou não, das contas apresentadas. (Apelação Cível Nº 70036885705, Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Cini Marchionatti, Julgado em 07/07/2010)

APELAÇÃO CÍVEL. DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADES. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PRIMEIRA FASE ADMINISTRADOR DA SOCIEDADE, QUE NA CONDIÇÃO DE SÓCIO, TEM O DEVER DE APRESENTAR AS CONTAS REQUERIDAS. INEXISTÊNCIA DE PROVA DE QUE A ADMINISTRAÇÃO ERA CONJUNTA. ART. 333,II, DO CPC. NEGARAM PROVIMENTO AO APELO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70027580521, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luís Augusto Coelho Braga, Julgado em 29/04/2010)

SOCIEDADE LIMITADA. ADMINISTRAÇÃO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PRIMEIRA FASE. Dever legal do administrador de prestar contas ao sócio cotista, na forma mercantil. Arts. 1.053 e 1.020 do CCB/2002 e 914 e ss do CPC. Negaram provimento. (Apelação Cível Nº 70022049894, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Rafael dos Santos Júnior, Julgado em 13/05/2008)

Ainda, sobre o tema, a jurisprudência do STJ:

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS PROPOSTA POR VIUVA E FILHA DE SOCIO FALECIDO. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DO SOCIO REMANESCENTE. 1. A AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS DEVE SER PROPOSTA CONTRA O SOCIO ADMINISTRADOR OU GERENTE DA SOCIEDADE POR QUOTAS POR SE CONSTITUIR EM OBRIGAÇÃO PESSOAL.

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2. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO, EM PARTE, MAS NÃO PROVIDO. (REsp 57139/RJ; Relator Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO; TERCEIRA TURMA; 26/11/1996; DJ 03/02/1997)

Por tais fundamentos, mantenho a sentença que reconheceu o dever

de o requerido apresentar contas de sua gestão às autoras, julgando procedente

a primeira fase da ação de prestação de contas.

Isto posto, rejeito a preliminar e nego provimento à apelação.

DR. ROBERTO CARVALHO FRAGA (REVISOR) - De acordo com o Relator.

DES. JORGE LUÍS DALL´AGNOL (PRESIDENTE) - De acordo com o Relator.

DES. JORGE LUÍS DALL´AGNOL - Presidente - Apelação Cível nº

70036078830, Comarca de Porto Alegre: "REJEITARAM A PRELIMINAR E

NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO. UNÂNIME."

Julgador de 1º Grau: LAERCIO LUIZ SULCZINSKI

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ANEXO L – Agravo de Instrumento Nº 70039507553 da comarca de Porto Alegre

AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO MEDIANTE DECISÃO MONOCRÁTICA. SOCIEDADE POR COTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADA. MORTE DE SÓCIO. HERDEIROS. O FALECIMENTO DE SÓCIO, EM SE TRATANDO DE SOCIEDADE POR COTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADA, NÃO TRANSFORMA OS SEUS HERDEIROS EM SUCESSORES NA SOCIEDADE, MAS SIM EM CREDORES DESTA, COM DIREITO APENAS DE RECLAMAR A PARTE QUE LHES CABE PELA RETIRADA DA SOCIEDADE. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO. UNÂNIME.

AGRAVO DÉCIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL

Nº 70039507553 COMARCA DE PORTO ALEGRE

CREMER S/A PRODUTOS TEXTEIS E CIRURGICOS,

AGRAVANTE;

VERA CRISTINA GERMANI, AGRAVADO.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Quinta

Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, negar provimento

ao recurso.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes

Senhores DES. VICENTE BARROCO DE VASCONCELLOS (PRESIDENTE) E

DES. ANGELO MARANINCHI GIANNAKOS.

Porto Alegre, 15 de dezembro de 2010.

R E L A T Ó R I O

DES. OTÁVIO AUGUSTO DE FREITAS BARCELLOS (RELATOR)

Trata-se de AGRAVO DA LEI N. 9.139/95 interposto por CREMER S/A

PRODUTOS TEXTEIS E CIRURGICOS, contra decisão que deu provimento ao

Agravo de Instrumento nº 70027563022, fls. 322/323, por entender este Relator que,

com o falecimento do sócio, os herdeiros não passam a ser seus sucessores na

sociedade, mas sim credores desta, com direito apenas de reclamar a parte que

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lhes couber com o falecimento do sócio, mas não de pedir a dissolução da

sociedade ou anulação de alteração social.

Em suas razões, em síntese, sustenta que ser intempestivo o agravo

de instrumento; cerceamento ao direito de defesa; higidez do acordo, por decisão

homologatória transitada em julgado.

Requer o provimento do recurso.

É o relatório.

V O T O S

DES. OTÁVIO AUGUSTO DE FREITAS BARCELLOS (RELATOR)

Não procede a inconformidade.

Quando do exame das condições de admissibilidade do agravo de

instrumento então interposto decidi nos seguintes termos:

“Com fundamento no art. 557, § 1 -A, do CPC, com a redação dada pela

Lei nº. 9.756/98, dou provimento ao presente agravo de instrumento.”

“A sociedade por cotas de responsabilidade limitada é regida

fundamentalmente por contrato, particular ou público, de sua constituição.

As cláusulas X e XI fl. 33/34 do Contrato Social deixam visível o

entendimento de que em caso de retirada, morte ou interdição de um dos

sócios, a sociedade não será dissolvida, podendo os herdeiros ou

sucessores participar da sociedade com a anuência dos sócios

remanescentes.”

“Desta forma, com o falecimento do sócio, os herdeiros não passam a

ser seus sucessores na sociedade, mas sim credores desta, com direito apenas de

reclamar a parte que lhes couber com o falecimento do sócio, mas não de pedir a

dissolução da sociedade ou anulação de alteração social.”

“A fim de reforçar o provimento do recurso interposto, ilustra-se a seguir

julgado emanado desta Corte:”

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. REGULARIDADE NA REPRESENTAÇÃO DE SOCIEDADE PELO SÓCIO REMANESCENTE, EM CASO DE MORTE DO QUE DETINHA PODERES DE ADMINISTRAÇÃO. A dissolução da sociedade não é imediata, mesmo existindo previsão contratual em caso de morte de

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sócio. Até a formalização, que envolve liquidação, persistem direitos e obrigações entre os sócios, ou herdeiros do falecido, bem como para com terceiros. Possibilidade até mesmo de ser mantida a sociedade. Regularidade da representação da pessoa jurídica pelo sócio remanescente. Decisão mantida. Negado seguimento ao recurso. (Agravo de Instrumento Nº 70017550187, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Paulo Roberto Felix, Julgado em 06/12/2006).

Vem agora o presente agravo pretendendo a reforma da decisão

monocrática que deu provimento ao agravo de instrumento, sem, no entanto, apresentar

qualquer argumento digno de consideração, capaz de justificar a modificação do

entendimento anteriormente esposado.

Entretanto, deve ficar bem claro, o provimento do presente agravo visa a

simplesmente preservar os direitos e interesses da ora agravante, sócia minoritária

remanescente da empresa de representação comercial, na proporção de sua participação

societária e de seus interesses na empresa, sem qualquer reflexo em relação ao que já

foi pago aos demais herdeiros por acordo devidamente homologado judicialmente, o qual

fica expressamente preservado. E isto tão somente porque o referido acordo não a

envolveu, não estendendo seus efeitos quanto a ela, ora agravante, que deverá buscar

dos seus direitos, na proporção de sua participação na empresa Kurt Max Hauser

Representações Ltda., enfatizo.

Razão pela qual estou improvendo o presente agravo para o fim de manter

a decisão monocrática ora impugnada.

É o voto.

DES. ANGELO MARANINCHI GIANNAKOS - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. VICENTE BARROCO DE VASCONCELLOS (PRESIDENTE) - De acordo

com o(a) Relator(a).

DES. VICENTE BARROCO DE VASCONCELLOS - Presidente - Agravo nº

70039507553, Comarca de Porto Alegre: "NEGARAM PROVIMENTO AO

RECURSO. UNÂNIME."

Julgador(a) de 1º Grau: ROBERTO CARVALHO FRAGA

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Anexo M - Apelação n° 994.02.009509-6 DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO

ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n° 994.02.009509-6, da Comarca de São Paulo, em que é apelante FRANCISCO RAGNA sendo apelados HELIA LORENZETTI PRADO, SILVIA REGINA LORENZETTI PRADO, MARIA CRISTINA LORENZETTI PRADO, CARMEM SILVIA LORENZETTI PRADO DE CAMPOS e MARCOS ANTÔNIO DE CAMPOS.

ACORDAM, em 5a Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, V.U.", de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores ERICKSON GAVAZZA MARQUES (Presidente), J.L. MÔNACO DA SILVA E JAMES SIANO.

São Paulo, 15 de dezembro de 2010.

ERICKSON GAVAZZA MARQUES

PRESIDENTE E RELATOR

5a CÂMARA DE DIREITO PRIVADO

APELAÇÃO COM REVISÃO - n° 994.02.009509-6

Comarca : SÃO PAULO - 28a VARA CÍVEL

Ações : PRESTAÇÃO DE CONTAS n° 629993-8

Apelante : FRANCISCO RAGNA

Apelados: HELIA LORENZETTI (E OUTROS)

VOTO N.° 3301

SOCIEDADE COMERCIAL - PRESTAÇÃO DE CONTAS JULGADA PROCEDENTE – SENTENÇA - MANTIDA - AÇÃO MOVIDA POR VIÚVA E HERDEIROS DO SÓCIO – LEGITIMIDADE PASSIVA DO SÓCIO REMANESCENTE - RECURSO IMPROVIDO.

Vistos, etc.

Trata-se de ação de prestação de contas ajuizada por Hélia Lorenzetti Prado e outros contra Cláudio de Souza Lima, sendo que a respeitável sentença de fls. 193/197, cujo relatório fica fazendo parte integrante do presente, julgou procedente a primeira fase da ação de prestação de contas, determinando ao réu prestá-las em favor dos autores.

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Irresignado, apela o réu sustentando, em suma, que os autores sempre tiveram acesso a todo e qualquer documento e que teriam deixado o controle da sociedade por livre escolha.

O recurso foi preparado, recebido e respondido.

É o relatório.

Revelam os autos que a sociedade Osfrema - Comércio de Materiais de Construção Ltda. - ME é formada por apenas dois sócios: Renato Prado e Francisco Ragna. O primeiro, por seus herdeiros e viúva-meeira, ajuizou a presente ação requerendo expressamente "a prestação de contas cumulada com extinção de sociedade comercial" (cf. fls. 02).

Desse modo, correto o posicionamento do MM. Juiz que se limitou a decidir somente se havia ou não a obrigação do réu em prestar contas aos herdeiros de seu falecido sócio.

O falecido e o réu eram sócios de pessoa jurídica de direito privado - sociedade limitada - desde 20.08.87, com igualdade de participação e poderes de gerencia conjuntos (fls. 13 e 30/31).

O falecimento de Renato Prado ocorreu aos 23.08.98. Por conseguinte, já estabelecia no item "VIII" do contrato de constituição da sociedade, firmado desde a data de 20.08.87, em todos os seus U (cláusula segunda - fls. 13) que: Apelação com Revisão n.° 994.02.009509-6

"No caso de falecimento de um dos sócios, a sociedade não se dissolverá, continuará com os demais sócios, sendo os haveres do sócio falecido pagos a viúva ou herdeiros, após 90 dias do falecimento. Havendo porém acordo, entre a viúva ou herdeiros do falecido estes poderá entrar na sociedade, nomeando um representante legal que os represente perante a mesma. (...) " (fls. 31).

De qualquer forma, em que pese os argumentos utilizados pelo réu em sua peça contestatória, o genro do falecido, Marcos Antônio de Campos, não era administrador da referida sociedade em conjunto com o réu, eis que possui a profissão de músico, atividade completamente estranha à de empresário, de conhecimento, inclusive, do próprio demandado ao citar em sua defesa que "em razão de seu total despreparo para o comércio... decidiram pela substituição de outra pessoa da família" (fls. 43), no caso Silvia.

Mas também, nem se cogite da hipótese da filha do falecido, Silvia Regina, cuja profissão é professora, ter participado da gerência da referida sociedade em conjunto com o réu pois, segundo ele, Silvia teria "cuidado pessoalmente das compras, do movimento diário do caixa, dos pagamentos, inclusive das retiradas dos sócios", no período de 29.17.02.00 (fls. 43, segundo parágrafo).

Portanto, não merecem prosperar as argumentações do requerido, conforme ementa extraída de julgamento proferido por este Egrégio Tribunal:

"Prestação de contas - Ação julgada procedente - Sentença confirmada - Ação movida por filho de sócio falecido - Legitimidade passiva da sócia remanescente - Recurso não

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provido." (Apelação Cível n° 330.044-4/7-00, 7a Câmara de Direito Privado, rei. Des. José Carlos Ferreira Alves, j .02.07.2008).

Nesse sentido, segue o julgamento do Colendo Superior Tribunal de Justiça:

"Recurso especial. Ação de prestação de contas propostas por viúva e filha de sócio falecido.

Legitimidade passiva 'ad causam' do sócio remanescente. A ação de prestação de contas deve ser proposta contra o sócio administrador ou gerente da sociedade por quotas por se constituir em obrigação pessoal. Recurso especial conhecido, em parte, mas não provido. " (REsp 57.139/RJ, 3a Turma, Rei. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, ac. 26.11.96, DJU 03.02.1997, p. 254).

E, no caso em análise, diante da omissão do requerido, bem como da ausência de dados exatos sobre a situação da sociedade desde a data do óbito, é que os herdeiros buscam descobrir a razão das dificuldades financeiras pela qual a empresa passava.

Dessa forma, com essa tentativa de participar da atividade empresarial, ainda que aparentemente preenchendo livros de "entrada e saída" de mercadorias, não se exime, o requerido, de prestar as contas na forma legalmente exigida.

Por fim, eventuais divergências referentes a dívidas e bens da sociedade, bem como a repercussão de eventuais irregularidades praticadas, mormente a questão envolvendo o ponto comercial, deverão ser dirimidas na fase de liquidação da sociedade, sendo prematura qualquer discussão a respeito.

Após o trânsito em julgado desta decisão, devolvam-se os autos para o processamento da segunda fase da ação de prestação de contas.

Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso.

Apelação com Revisão n.° 994.02.009509-6

Voto n.° 3301

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Anexo N - Apelação n° 9110378-31.2004.8.26.0000, da Comarca de São Bernardo do Campo

ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n° 9110378-31.2004.8.26.0000, da Comarca de São Bernardo do Campo, em que são apelantes MÍRIAM MENDONÇA DILSER, RICARDO MENDONÇA DILSER, PAULO ROBERTO MENDONÇA DILSER e ERIKA DILSER sendo apelado EMTEL EMPRESA TÉCNICA DE HIDRÁULICA E ELÉTRICA LTDA

ACORDAM, em 2a Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. V. U.", de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores BORIS KAUFFMANN (Presidente) e JOSÉ ROBERTO BEDRAN.

Sao Paulo, 01 de fevereiro de 2011.

NEVES AMORIM

RELATOR

EMENTA: PRESTAÇÃO DE CONTAS – SOCIEDADE LIMITADA - AÇÃO AFORADA PELOS HERDEIROS DO SÓCIO QUOTISTA – AUSÊNCIA DE LEGITIMIDADE ATIVA – CONTRATO SOCIAL ALTERADO PARA SUBSTITUIR O SÓCIO FALECIDO POR SUA ESPOSA - LEGITIMIDADE EXCLUSIVA DA NOVA SÓCIA. ILEGITIMIDADE PASSIVA DA PESSOA JURÍDICA - IMPOSSIBILIDADE DE EXIGIR CONTAS DA EMPRESA - ADMINISTRAÇÃO E GERÊNCIA EXERCIDA POR UM DOS SÓCIOS - DEVER DOS SÓCIOS CONTROLADORES DE PRESTAR CONTAS - OBRIGAÇÃO LEGAL CONSTANTE DO ART. 293 DO C. COMERCIAL - INDEFERIMENTO DA INICIAL MANTIDO. RECURSO IMPROVIDO.

Trata-se de apelação interposta contra sentença que indeferiu, liminarmente, a petição inicial da ação de prestação contas, extinguindo o feito, sem resolução do mérito, com fundamento no artigo 295, II e 267, VI, todos do Código de Processo Civil, ante a irregularidade dos pólos ativo e passivo (fls. 41/43).

Apelam os autores, alegando que não conseguem ter acesso a qualquer dado ou informação relativa a seu desempenho. Acrescentam que as condições da ação se encontram presentes, eis que restou demonstrado a condição de sócios da empresa. Rogam, pela reforma da sentença recorrida.

Regularmente processada, não vieram aos autos contra-razões, diante da ausência de citação.

É o relatório.

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A irresignação não prospera. Os autores, herdeiros de Ricardo Dilser, ex-sócio da empresa ré, aforaram a presente ação objetivando a prestação de contas do período posterior ao falecimento daquele, cuja administração passou a ser exercida exclusivamente pelo outro sócio, José Garcia Dias. A causa foi alicerçada no argumento que não mais recebiam as participações a que fariam jus, sobrevindo notícia de que a empresa passava por dificuldades financeiras.

Pelo plano de partilha dos bens deixados pelo de cujus, verifica-se que as quotas sociais da empresa ré foram partilhadas entre todos os herdeiros (fls. 25/33).

Ocorre que a certidão expedida pela Junta Comercial, informa que o atual quadro societário da empresa é composto por José Garcia Carrete e Mirian Mendonça Dilser (fls. 39), ou seja, apenas a sócia Mirian tem interesse e legitimidade para pleitear a prestação das contas e não os demais herdeiros do falecido.

Outrossim, falta legitimidade à empresa ré para figurar no pólo passivo, pois cediço que aquele que administra bens, negócios ou interesses alheios, atividade nitidamente desempenhada pelo sócio administrador, deve prestar contas aos demais sócios, a teor do disposto no artigo 293 do Código Comercial, aplicável à espécie.

O Superior Tribunal de Justiça tem se posicionado de forma recorrente no sentido de que "há o dever de prestar contas a quem efetua e recebe pagamentos por conta a outrem, movimentando recursos próprios ou daquele em cujo interesse realizam os pagamentos e recebimentos" (RSTJ 90/213), bem como o de que a ação de prestação de contas deve ser proposta contra o sócio gerente ou com poderes de administração, e não contra a sociedade (STJ/REsp ne 178423, Rei. Min. Eduardo Ribeiro, j . em 26 de junho de 2006, REsp n° 332754, Rei. Min. Nancy Andrighi, j . em 13 de novembro de 2001 e REsp n- 57139, Rei. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j . em 26 de novembro de 2006)

Destarte, pelos motivos acima expostos, o indeferimento da inicial em razão da ilegitimidade de parte era medida de rigor, motivo pelo qual mantenho integralmente a sentença recorrida.

Assim, pelo meu voto, nego provimento ao recurso.

--NEVES AMORIM

Desembargador Relator

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Anexo O - Apelação n2 0146267-34.2006.8.26.0000, da Comarca de São Paulo

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO

ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n2 0146267-34.2006.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que é apelante ROBERTO PIRES CAMARGO sendo apelados R W A SYSTEM GRAFICA EDITORA LTDA, REINALDO MARCELINO ESPINOSA, WALMIR MARCELINO ESPINOSA e ALFREDO ESPINOSA GARA.

ACORDAM, em 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "DERAM PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO, NOS

TERMOS QUE CONSTARÃO DO ACÓRDÃO. V. U.", de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores PAULO ALCIDES (Presidente), ROBERTO, SOLIMENE E VITO GUGLIELMI.

São Paulo, 17 de fevereiro de 2011.

PAULO ALCIDES

PRESIDENTE E RELATOR

APELANTE: ROBERTO PIRES CAMARGO

APELADOS: RWA SYSTEM GRÁFICA EDITORA LTDA E OUTROS

MM. JUIZ (A): FERNANDA GOMES CAMACHO

DISSOLUÇÃO PARCIAL.

SOCIEDADE LIMITADA.

Cerceamento de defesa inocorrente. Prova documental suficiente para o deslinde do feito. Perda da affectio societatis caracterizada. Desarmonia entre os sócios. Inviabilidade de tomada de decisões necessárias para a regular gestão da empresa. Apuração de haveres. Forma de pagamento que deve ocorrer uma só vez. Precedentes do STJ e deste Tribunal. Sentença reformada neste particular. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

Trata-se de recurso de apelação interposto por Roberto Pires Camargo contra a r. sentença (fls. 178/184) que julgou procedente a ação cautelar e a ação principal proposta por RWA System Gráfica Ltda, Reinaldo Marcelino Espinosa, Alfredo Espinosa Gara e Walmir Marcelino Espinosa, para o fim de determinar a dissolução da co-autora pessoa jurídica, bem como a, exclusão do sócios Roberto Pires de Camargo, ora apelante,

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Antônio Kalil Sahd Filho. Ainda, determinou a apuração de haveres devidos ao sócio excluído Roberto Camargo.

Sustenta, preliminarmente, a nulidade sentença por cerceamento de defesa, pois o julgamento antecipado impediu a produção de prova em audiência. No mérito, defende que não houve quebra da affectio societatis, ponderando que divergências podem ocorrer em qualquer agrupamento de pessoas. Ainda, insurge-se contra a forma de pagamento dos seus haveres, defendendo que deve ocorrer em uma só parcela. Tece considerações acerca da administração da empresa, afirmando a legitimidade do recebimento de pro labore. Relativamente à cautelar, defende que não foi proposta a ação principal no prazo estipulado na lei, pelo que deve ser julgada extinta sem resolução do mérito. Subsidiariamente, pede o julgamento de improcedência da cautelar e a responsabilização do requerente pelo prejuízo causado (fls. 217/245). Recebido o recurso em seus regulares efeitos, foram oferecidas contra-razões.

É o relatório.

Inicialmente, não há que se falar em cerceamento de defesa, uma vez que o julgamento antecipado da lide tem total amparo legal, decorrente da aplicação do art. 330, I, do Código de Processo Civil.

O Juízo a quo fundamentou sua opção pelo julgamento antecipado, ressaltando que os fatos relevantes estavam documentalmente comprovados, revelando-se desnecessária a produção de outras provas, quanto mais em audiência. Aliás, nem em grau de recurso o insurgente justifica adequadamente a necessidade de dilação probatória.

Como bem anotado por Theotonio Negrão e José Roberto F. Gouvêa (Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, Ed. Saraiva, 37a ed., nota 2a ao art. 330, "constantes nos autos elementos de prova suficientes para o convencimento do julgador, inocorre cerceamento de defesa se julgada antecipadamente a controvérsia" (STJ, 4a Turma, Ag 14.952/DF-AgRg, Rei. Min. Sálvio de Figueiredo, j . 4.12.91, negaram provimento, v. u., DJU 3.2.92, p. 472).

Além disso, ao que consta o ora apelante não se opôs ao julgamento antecipado da lide, sabendo-se que "não pode alegar cerceamento de defesa quem concordou com o julgamento antecipado da lide e teve sentença contrária (STJ - Resp 6.414-MG).

No mérito, em que pese a combatividade do apelante, a r. sentença deve ser confirmada pelos seus próprios e bem deduzidos fundamentos, os quais ficam inteiramente adotados como razão de decidir pelo improvimento do recurso, nos termos do art. 252 do Regimento Interno deste Egrégio Tribunal de Justiça que dispõe: "Aos recursos em geral, o relator poderá limitar-se a ratificar os fundamentos da decisão recorrida, quando, suficientemente motivada, houver de mantê-la".

Na Seção de Direito Privado desta E. Corte, o dispositivo regimental tem sido largamente utilizado por suas Câmaras, seja para evitar inútil repetição, seja para cumprir o princípio constitucional da razoável duração dos processos. Anote-se, dentre tantos outros: Apelação 99406023739-8, Rei. Des.Elliot Akel, em 17/06/2010; AI 990101539306, Rei. Des. Luiz Antônio de Godoy, em 17/06/2010; Apelação 99402069946-a, Rei. Des. Paulo Eduardo Razuk, em 08/06/2010; Apelação 99405106096-7, Rei. Des. Neves Amorim, em

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29/06/2010; Apelação 99404069012-1, Rei. Des. José Roberto Bedran, em 22/06/2010; Apelação 99010031478-5, Rei. Des. Beretta V da Silveira, em 13/04/2010; Apelação 9940500973556, Rel.ÍDes. James Siano, em 19/05/2010; Apelação 99401017050-8, Rei. Des. José Joaquim dos Santos, em 27/05/2010; Apelação n° 99404080827-0, Rei. Des. Álvaro Passos, em 17/09/2010; Apelação 99404073760-8, Rei. Des. Paulo Alcides, em 01/07/2010;

O C. STJ tem prestigiado este entendimento quando predominantemente reconhece "a viabilidade de o órgão julgador adotar ou ratificar o juízo de valor firmado na sentença, inclusive transcrevendo-a no acórdão, sem que tal medida encerre omissão ou ausência de fundamentação no decisum" (REsp n° 662.272-RS, 2a Turma, Rei.Min. João Otávio de Noronha, j . de 4.9.2007; REsp n° 641.963-ES, 2a Turma, Rei. Min. Castro Meira, j . de 21.11.2005; REsp n° 592.092-AL, 2ª Turma, Rei. Min. Eliana Calmon, j . 17.12.2004 e REsp n° 265.534- DF, 4a Turma, Rei. Min. Fernando Gonçalves, j de 1.12.2003).

Destaca-se, nessa intenção, o entendimento da I. Magistrada sentenciante que acertadamente fundamentou: "considerando-se que o réu tem 31% das cotas sociais, será impossível a obtenção de quorum de 75%, como previsto no instrumento particular firmado.

Outrossim, da forma como foi estabelecido entre as partes, qualquer decisão dependerá de concordância do réu, impondo sua vontade sobre a maioria, o que inviabiliza a tomada de decisões essenciais continuidade da empresa.

Ademais, em que pesem os argumentos do réu, os fatos relatados tanto na petição inicial, quanto na contestação indicam desarmonia grave entre os sócios, o que impossibilita a obtenção do quorum deliberativo de 75%.

Tal situação configura ausência de affectio societatis, o que autoriza a dissolução parcial da sociedade, independente da prática pelo requerido de falta grave. (...)

No presente, caso, a maioria dos sócios, que têm 69% do capital social, manifestaram desejo de manter a empresa, sendo, de rigor, a exclusão do sócio minoritário, bem como a regularização da exclusão do sócio Antônio Kalil Sahd Filho, mesmo porque o requerido não indicou qualquer interesse na aquisição das cotas sociais dos autores.

(...)

Além da inviabilidade de gestão regular dos negócios sociais, basta conferir o teor das acusações mútuas entre as partes, as divergências para a alteração do contrato e, ainda, a própria existência da presente demanda judicial.

A perda da affectio societatis, dessa forma, ficou bem caracterizada, tornando impossível a convivência e convergência de interesses entre os sócios para consecução objeto social.

Nesse compasso, cumpre colacionar entendimento jurisprudencial que corrobora a solução dada:

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Anexo P - Revista Veja.

Julgamento de fusão de Sadia e Perdigão é adiado

Segundo o Cade, adiamento foi pedido pela Brasil Foods

O julgamento da fusão das empresas Sadia e Perdigão, que aconteceria na manhã desta

quarta-feira no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), foi adiado a

pedido das partes, segundo informações da assessoria de imprensa do órgão antitruste.

A retomada do processo deverá ocorrer no próximo dia 29, ainda de acordo com o órgão.

Desde o voto de reprovação da fusão, emitido pelo relator do caso no Cade, Carlos

Ragazzo, na última semana, a diretoria da Brasil Foods (empresa resultante do negócio)

vem pedindo ao órgão um prazo maior para tentar convencer os conselheiros que ainda

não votaram em aprovar a fusão - mesmo que com altas restrições. O pedido do

presidente da empresa, José Antonio do Prado Fay, foi feito formalmente na segunda-

feira e acatado nesta quarta-feira pelo conselheiro Ricardo Ruiz.

Sequência de adiamentos - O julgamento da fusão foi inicialmente suspenso, na última

semana, porque o conselheiro Ricardo Ruiz pediu mais prazo para avaliar o processo.

Após a manifestação contrária à fusão do relator Ragazzo, analistas apontam que há

poucos cenários possíveis – e nenhum deles é positivo para a companhia ou seus

investidores, ainda que os consumidores possam ser beneficiados.

Quatro

conselheiros ainda precisam declarar seus votos e a expectativa é que nenhum deles

seja menos severo que o relator. No entanto, o adiamento permitirá à companhia refazer

a proposta de venda de suas marcas para tentar chegar a um acordo com o órgão.

Segundo o relator, seria absolutamente necessário que a empresa se desfizesse de uma

de suas principais marcas: Sadia ou Perdigão.

Cade adia julgamento da fusão entre Sadia e Perdigão

Plantão | Publicada em 15/06/2011 às 11h04m

BRASÍLIA - O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) adiou nesta quarta-

feira o julgamento da fusão entre Sadia e Perdigão no mercado brasileiro. O conselheiro

Ricardo Ruiz, que pediu vista durante o julgamento do processo na semana passada,

solicitou aos demais integrantes do Cade mais tempo para analisar o caso. Segundo

fontes do governo, Ruiz já começou a negociar com os advogados da BRF Brasil Foods

(empresa que resultou da união entre Sadia e Perdigão) um Termo de Compromisso de

Desempenho (TCD) para tentar viabilizar o ato de concentração.

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Na semana passada, o relator da fusão no Cade, conselheiro Carlos Ragazzo,

apresentou seu voto e rejeitou a operação. Segundo ele, a BRF teria um poder de

mercado muito elevado, que prejudicaria a concorrência no mercado brasileiro. Em

alguns segmentos, a companhia tem mais de 80% de poder de mercado.

Leia mais sobre esse assunto em

http://oglobo.globo.com/economia/mat/2011/06/15/cade-adia-julgamento-da-fusao-entre-

sadia-perdigao-924689373.asp#ixzz1Q9jtUnWA

Page 180: A TRANSFERÊNCIA INVOLUNTÁRIA DE QUOTAS E … · G429t Giacomin, Rosilene Gomes da Silva A transferência involuntária de quotas e seus reflexos no exercício precário dos herdeiros:

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