AÇÃO CIVIL PÚBLICA com pedido de tutela antecipada · A Lei Orgânica Nacional do Ministério...

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(ÍZA) DE DIREITO DA ___ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL DA COMARCA DE GOIÂNIA/GO “A multidão é um monstro sem cabeça”. Charles Chaplin O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, presentado pelos Promotores de Justiça signatários, no uso de suas atribuições constitucionais e legais, forte no art. 129, III, da Constituição Federal, art. 5º, I, da Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985, art. 40 da Lei nº 10.671 de 15 de maio de 2003 (Estatuto do Torcedor), art. 25, IV, alínea “a”, da Lei nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993 e art. 46, VI, alínea “a”, da Lei Complementar Estadual nº 25, de 06 de julho de 1998, vêm ajuizar AÇÃO CIVIL PÚBLICA com pedido de tutela antecipada em desfavor de CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE FUTEBOL, pessoa jurídica de direito privado, CNPJ nº 33.655.721/0001-99, com sede na Avenida Luiz Carlos Prestes, 130, Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro/RJ, CEP 22775-055, representada por seu Presidente MARCO POLO DEL NERO; ________________________________________________________________________________________________ Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. A 06, Lts. 15/24, Jardim Goiás Goiânia - Goiás - CEP: 74.805-100 Fone: (0xx62) 3243- 8125 1

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(ÍZA) DE DIREITO DA ___ª VARA DA

FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL DA COMARCA DE GOIÂNIA/GO

“A multidão é um monstro sem cabeça”. Charles Chaplin

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, presentado pelos

Promotores de Justiça signatários, no uso de suas atribuições constitucionais e legais, forte no art.

129, III, da Constituição Federal, art. 5º, I, da Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985, art. 40 da Lei nº

10.671 de 15 de maio de 2003 (Estatuto do Torcedor), art. 25, IV, alínea “a”, da Lei nº 8.625, de 12

de fevereiro de 1993 e art. 46, VI, alínea “a”, da Lei Complementar Estadual nº 25, de 06 de julho

de 1998, vêm ajuizar

AÇÃO CIVIL PÚBLICA

com pedido de tutela antecipada

em desfavor de

CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE FUTEBOL, pessoa jurídica de direito

privado, CNPJ nº 33.655.721/0001-99, com sede na Avenida Luiz Carlos

Prestes, 130, Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro/RJ, CEP 22775-055,

representada por seu Presidente MARCO POLO DEL NERO;

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FEDERAÇÃO GOIANA DE FUTEBOL, pessoa jurídica de direito privado,

CNPJ nº 01.606.110/0001-64, com sede no Estádio Serra Dourada, Ala

Sul, Av. Fued José Sebba, nº 1.170, Jardim Goiás, em Goiânia/GO, CEP

74805-100, representada por seu Presidente ANDRE LUIZ PITTA PIRES;

GOIAS ESPORTE CLUBE, pessoa jurídica de direito privado, CNPJ nº

01.665.256/0001-80, com sede na Av. Edmundo Pinheiro de Abreu, nº 721,

Setor Bela Vista, em Goiânia - GO, CEP: 74823-030, representado por seu

Presidente Executivo SERGIO GABRIEL RASSI;

VILA NOVA FUTEBOL CLUBE, pessoa jurídica de direito privado, CNPJ nº

01.669.316/0001-33, com sede na Rua 256, nº 354, em Goiânia/GO, CEP

74610-200, representado por seu Presidente Executivo ECIVAL MARTINS;

AGÊNCIA GOIANA DE TRANSPORTES E OBRAS (AGETOP) entidade

autárquica estadual e pessoa jurídica de direito público interno, CNPJ nº

03.520.933/0001-06, representada pelo seu Presidente JAYME EDUARDO

RINCÓN, com endereço profissional na Av. Governador José Ludovico de

Almeida nº 20 (BR - 153, km 3,5), Conjunto Caiçara, em Goiânia/GO, CEP:

74.775-013;

pelos motivos de fato e de direito a seguir articulados.

I – DA LEGITIMIDADE ATIVA

A legitimidade ativa do Ministério Público para promover a defesa dos direitos difusos e

coletivos, por meio da Ação Civil Pública, advém tanto da Constituição Federal quanto da

legislação infraconstitucional.

A Constituição Federal de 1988 prevê as funções institucionais do Ministério Público nas

disposições dos artigos 127, caput e 129, inciso III.

Sustenta-se ainda a alegada legitimidade nos artigos 1º, inciso II, 5º, inciso I, ambos da Lei

nº 7.347/85, que regulamenta as hipóteses de ajuizamento de Ações Civis Públicas por danos

causados ao consumidor.

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A Lei Orgânica Nacional do Ministério Público – Lei 8.625, de 12 de fevereiro de 1993 –

estabelece, por fim:

Art. 25. Além das funções previstas nas Constituições Federal e Estadual, na LeiOrgânica e em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério Público:

[...]

IV - promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei:

[...]

a) para a proteção ou reparação dos danos causados ao meio ambiente, aoconsumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico epaisagístico, e a outros interesses difusos, coletivos e individuaisindisponíveis e homogêneos.

No mesmo sentido o entendimento do Colendo Superior Tribunal de Justiça: “O Ministério

Público tem legitimidade para a defesa de direitos individuais homogêneos, desde que a dimensão

dos interesses defendidos seja socialmente relevante” (AGRESP 201301705209, MARCO

AURÉLIO BELLIZZE, STJ - TERCEIRA TURMA, DJE DATA:01/06/2015).

Os atos normativos ora mencionados, portanto - sobremaneira a Constituição Federal -,

evidenciam a atribuição do Ministério Público para o exercício da Ação Civil Pública e assentam a

adequação dessa via para a defesa de direito transindividual a ser resguardado.

II – DA LEGITIMIDADE PASSIVA

2.1 - DA LEGITIMIDADE PASSIVA DAS ENTIDADES ORGANIZADORAS DE COMPETIÇÃO –

CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE FUTEBOL (CBF) E FEDERAÇÃO GOIANA DE FUTEBOL

(FGF)

Preleciona o Estatuto do Torcedor em seu artigo 1o-A que “a prevenção da violência nos

esportes é de responsabilidade do poder público, das confederações, federações, ligas, clubes,

associações ou entidades esportivas, entidades recreativas e associações de torcedores, inclusive

de seus respectivos dirigentes, bem como daqueles que, de qualquer forma, promovem,

organizam, coordenam ou participam dos eventos esportivos”.

Do mesmo modo, prevê o Estatuto suso que:

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Art. 19. As entidades responsáveis pela organização da competição, bemcomo seus dirigentes respondem solidariamente com as entidades de que trata oart. 15 e seus dirigentes, independentemente da existência de culpa, pelosprejuízos causados a torcedor que decorram de falhas de segurança nos estádiosou da inobservância do disposto neste capítulo.

Logo, na qualidade de organizadoras das competições nacionais e regionais realizadas no

Estádio Serra Dourada, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e a Federação Goiana de

Futebol (FGF) são as responsáveis diretas pela garantia de segurança dos torcedores nos

eventos esportivos, motivo pelo qual integram o polo passivo da presente ação.

2.2 – DA LEGITIMIDADE PASSIVA DOS CLUBES – VILA NOVA FUTEBOL CLUBE E GOIÁS

ESPORTE CLUBE

Uma vez que detém o controle das instalações, o clube mandante deve atuar de modo a

prevenir atos ilícitos que porventura possam ser praticados por seus torcedores, ciente ainda do

risco inerente à atividade que exerce.

Estabelece o Estatuto do Torcedor:

Art. 14. (…) a responsabilidade pela segurança do torcedor em eventoesportivo é da entidade de prática desportiva detentora do mando de jogo ede seus dirigentes, que deverão:

I – solicitar ao Poder Público competente a presença de agentes públicos desegurança, devidamente identificados, responsáveis pela segurança dostorcedores dentro e fora dos estádios e demais locais de realização de eventosesportivos

II - informar imediatamente após a decisão acerca da realização da partida, dentreoutros, aos órgãos públicos de segurança, transporte e higiene, os dadosnecessários à segurança da partida (…).

Também insta salientar, como consagrado no artigo 19 do Estatuto do Torcedor, que o

mandante do jogo e as entidades responsáveis pela organização da competição respondem

solidariamente, independente da existência de culpa, pelos prejuízos causados a torcedor que

decorram de falhas de segurança.

Assim, aos clubes também cabe zelar pela manutenção das condições de segurança do

jogo antes, durante e após o evento.

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Nesta senda, veja-se julgado do Superior Tribunal de Justiça externando entendimento

acerca da responsabilidade em caso de violação da segurança do torcedor em estádio de futebol:

EMEN: RECURSOS ESPECIAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. QUEDA DETORCEDOR DE RAMPA DE ACESSO A ESTÁDIO DE FUTEBOL. DANOSFÍSICOS E MORAIS. SEGURANÇA LEGITIMAMENTE ESPERADA.RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ENTRE A FEDERAÇÃO E O CLUBEDETENTOR DO MANDO DE JOGO PELOS DANOS SOFRIDOS PELOTORCEDOR. 1. O serviço é defeituoso quando não apresenta a segurançalegitimamente esperada pelo consumidor (art. 14, § 1.º, do CDC). 2. Concorre parao evento danoso (queda do torcedor de rampa de acesso ao estádio devido aaglomeração de torcedores) a entidade que disponibiliza quantia de ingressossuperior ao espaço reservado à torcida rival. 3. Reconhecida a concorrência deresponsabilidade dos réus para a implementação do evento danoso. 4.Inaplicabilidade da excludente do fato exclusivo de terceiro, prevista no inciso II doparágrafo 3.º do artigo 14 do CDC, pois, para sua configuração, seria necessária aexclusividade de outras causas não reconhecida na origem. Súmula 07/STJ. 5.Responsabilidade objetiva e solidaria, nos termos do art. 14 do CDC, dasentidades organizadoras com os clubes e seus dirigentes pelos danoscausados a torcedor que decorram de falhas de segurança nos estádios,mesmo antes da entrada em vigor do Estatuto do Torcedor (Lei 10.671/2003). 6.RECURSOS ESPECIAIS DESPROVIDOS. ..EMEN:(RESP 201303686486, PAULO DE TARSO SANSEVERINO, STJ - TERCEIRATURMA, DJE DATA:16/03/2015) (Grifou-se)

Destarte, justifica-se a inclusão dos clubes de futebol profissional como legitimados

passivos na presente demanda, solidariamente às entidades dirigentes.

2.3 – DA LEGITIMIDADE PASSIVA DA AGÊNCIA GOIANA DE TRANSPORTES E OBRAS

(AGETOP)

À Agência Goiana de Transportes e Obras – AGETOP, criada pela Lei nº 13.550, de 11 de

Novembro de 1999, entidade autárquica estadual dotada de personalidade jurídica de direito

público interno, com autonomia administrativa, financeira e patrimonial, compete, conforme art. 2º,

inciso V, alínea d.2 de seu regulamento, aprovado pelo Decreto nº 8.483, de 20 de Novembro de

2015:

Art. 2o (…):

V – administrar vias públicas sob sua jurisdição ou responsabilidade, inclusivequanto a permissão ou concessão de uso das faixas de domínio e sítiosaeroportuários, cobrança de pedágio e outras taxas de utilização e contribuições

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de melhorias a elas referentes e, em especial, no que concerne às vias públicassob sua administração:

d) recuperação, preservação e expansão da infraestrutura de esporte, lazer eturismo do Estado e administração:

d.2. do Estádio Serra Dourada (…). (Grifou-se)

Dessa forma, tendo em vista que a presente demanda tem como pedido a realização de

melhorias no Estádio Serra Dourada, a AGETOP é também parte legítima no polo passivo.

III – CONSIDERAÇÕES SOBRE O COMPORTAMENTO HUMANO EM MULTIDÃO

O comportamento humano em multidões é objeto de estudo desde a insurreição popular

de 18 de Março de 1871, que deu origem à Comuna de Paris.

A partir de então começaram a surgir teorias e linhas de pensamento a respeito da

denominada “Psicologia Coletiva”.

De acordo com Barbosa (2014)1, o primeiro a escrever sobre o tema foi Gustave Le Bon,

na obra “A Psicologia das Multidões”, introduzindo o seguinte raciocínio:

Sejam quais forem os indivíduos que a compõem, com modos de vidasemelhantes ou não, suas ocupações, caráter ou inteligência, o fato de terem sidotransformados em uma multidão os coloca em posse de uma espécie de mentecoletiva que os faz sentir, pensar e agir de uma maneira bem diferentedaquela que cada indivíduo sentiria, pensaria ou agiria caso estivesse emestado isolado” (LeBon apud Barbosa, 2014).

Floyd Henry Allport traz à baila a Teoria da Predisposição, segundo a qual os indivíduos

nas multidões se comportariam da mesma maneira que quando estivessem sós, porém de forma

intensificada (BARBOSA, 2014).

Ralph H. Turner e Lewis M. Killian questionam a Teoria da Predisposição e apresentam a

Teoria da Norma Emergente, em que o comportamento coletivo ocorreria sob o comando de

normas emergentes. Rumores e movimentos entre multidões promoveriam o surgimento de novas

normas (BARBOSA, 2014). Vide o exemplo de uma pessoa que, no estádio de futebol, se levanta

1 BARBOSA, Paulo Dalle V. O comportamento Humano nas multidões e seus reflexos na gestão de Segurança e Operações do sistema Metroferroviário, 2014.

Disponível em http://www.aeamesp.org.br/biblioteca/stm/20smtf1410Tt16rl.pdf

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e começa a olhar para um determinado local (norma sendo emanada através do comportamento).

Logo em seguida outras pessoas começam a olhar para o mesmo ponto e, pouco depois,

centenas de pessoas convergem atenção e procuram algo naquele local.

A Teoria da Identidade Social surge, em seguida, com a necessidade de explicar como o

meio social interage com o indivíduo (BARBOSA, 2014). Exemplificativamente, imagine uma

disputa entre equipes ou grupos rivais dentro do bairro; essas equipes ou grupos (que eram rivais)

se unem quando a disputa é entre bairros; todos os membros da cidade (que eram rivais quando a

disputa era entre bairros) se reúnem quando a disputa é entre cidades, e assim sucessivamente.

Obtempere-se que, em relação ao tema em análise, torcedores do mesmo clube possuem uma

mesma identidade social.

A Teoria da Auto Categorização enuncia que o indivíduo, ao ingressar em determinado

grupo social, passa por um processo de despersonalização e passa a incorporar as normas e

tendências de comportamento do grupo (BARBOSA, 2014).

O “ efeito rodoviária ”, trazido pelos professores José Osmir Fiorelli e Rosana Cathya

Ragazzoni Mangini, no livro Psicologia Jurídica2, identifica aquele ambiente, sempre cheio de

pessoas, em um movimento vaivém, com uma grande população circulante.

Segundo Fiorelli e Mangini,

(…) a rodoviária tradicional traz em seu âmago a expectativa do transitório, oanonimato confortável da multidão que se desloca, a perspectiva de “não serflagrado em pecado”. Esse desenho físico, econômico e social abre espaço parainúmeros comportamentos inadequados. Essa invisibilidade ratifica a banalidadedo crime e consolida a percepção de impunidade. Um aval indireto para pequenosdelitos.3

Observa-se que o “efeito rodoviária” persiste modernizado com novos nomes e

tecnologias, podendo ser perfeitamente aplicado aos estabelecimentos denominados estádios de

futebol, uma geografia perversa que propicia o condicionamento humano para a prática de crimes.

Ademais, além do fator geográfico, percebe-se um ideário coletivo de que “no estádio de

futebol tudo é permitido”; é terra sem lei, onde se pode cometer crimes contra a honra do

árbitro da partida, dos atletas do time rival, da torcida rival e do técnico do próprio time de coração

(ex: quando este promove uma substituição que desagrada a torcida).

2 FIORELLI, José Osmir e MANGINI, Rosana Cathya Ragazzoni Mangini. Psicologia Jurídica, 3ª Ed., Editora Atlas:São Paulo/SP.

3 Idem, página 232.

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Pondere-se que não é causa excludente da antijuridicidade ou da culpabilidade o fato

de as injúrias, calúnias, difamações, ameças e lesões corporais terem sido praticadas em um

estádio de futebol.

Sigmund Freud, discutindo o trabalho de Le Bon, esclarece:

Um grupo é impulsivo, mutável e irritável. É levado quase que exclusivamente porseu inconsciente. Os impulsos a que um grupo obedece podem, de acordo com ascircunstâncias, ser generosos ou cruéis, heróicos ou covardes, mas são sempretão imperiosos, que nenhum interesse pessoal, nem mesmo o daautopreservação, pode fazer-se sentir.4

O grupo, a multidão, vai diretamente a extremos: “se uma suspeita é expressa, ela

instantaneamente se modifica em uma certeza incontrovertível; um traço de antipatia se

transforma em ódio furioso”.5

Há que se levar em consideração que “quando indivíduos se reúnem em grupo, todas as

suas inibições individuais caem e todos os instintos cruéis, brutais e destrutivos, que nele jaziam

adormecidos, como relíquias de uma época primitiva, são despertados para encontrar gratificação

livre”.6

Percebe-se, ainda, que a maneira pela qual indivíduos são arrastados por um impulso

comum é explicada por McDougall através do que chama de “princípio da indução direta da

emoção por via da reação simpática primitiva”, ou seja, através do contágio emocional com que já

estamos familiarizados (BARBOSA, 2014).

O fato é que a percepção dos sinais de um estado emocional é automaticamente talhada

para despertar a mesma emoção na pessoa que os percebe. Quanto maior for o número de

pessoas em que a mesma emoção possa ser simultaneamente observada, mais intensamente

cresce essa “compulsão automática”7, em um processo de retroalimentação com consequências

sempre desastrosas e irracionais.

Nos estádios de futebol não poderia ser diferente. Basta uma fagulha para que a reação

em cadeia se inicie. O contágio emocional narrado por Freud apresenta ainda, nesse contexto, um

poderoso requisito não imaginado pelo criador da psicanálise, qual seja, a paixão do torcedor pelo

4 FREUD, Sigmund. Além do Princípio de Prazer, Psicologia de Grupo e outros trabalhos. Edição Standard Brasileiradas Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Volume XVIII. Editora Imago. Rio de Janeiro. 2066. página87.

5 Idem nota 3. Página 88.6 Idem nota 3. Página 88.7 Idem nota 3. Página 95.

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seu clube do coração.

É sob essa ótica que devem ser analisados os fatos que envolvem a presente demanda.

IV – BREVE RESUMO DOS FATOS

Inicialmente, em 19.06.2017, o Grupo de Atuação Especial em Grandes Eventos do

Futebol (GFUT), no âmbito do Ministério Público do Estado de Goiás, foi oficiado pela Associação

Nacional das Torcidas Organizadas do Brasil (ANATORG), solicitando a realização de um plano de

segurança das torcidas organizadas para o jogo Goiás x Vila Nova em 24.06.2017, uma vez que,

em razão da preparação para o evento Villa Mix, a Ala Norte do estacionamento estaria fechada e

torcedores de ambos os clubes partilhariam a Ala Sul, com capacidade reduzida para atender à

demanda e sem separação alguma.

Diante de tal contexto, conforme informado pela ANATORG, o próprio Batalhão da Polícia

Militar de Eventos (BPMEve) estaria em estado de alerta sobre o jogo.

Ato contínuo, representantes de diversas torcidas organizadas enviaram ao GFUT em

21.06.2017, por mensagens eletrônicas, manifestações de preocupação com as condições de

segurança e pedidos de intervenção do Ministério Público no sentido de não permitir a

realização da partida no local e nas condições supramencionadas.

Por tal motivo, instaurou-se o procedimento administrativo nº 201700260730, para

acompanhar o respeito às disposições da Lei nº 10.671/03, no que tange à segurança no local de

realização da partida Goiás x Vila Nova, a realizar-se dia 24.06.2017 às 16:30 horas, no Estádio

Serra Dourada, pelo Campeonato Brasileiro da série B.

O GFUT expediu, então, ao Batalhão de Polícia Militar de Eventos (BPMEve), o Ofício nº

58/17 – GFUT, solicitando relato pormenorizado das condições de segurança.

O Ofício nº 373/17 – BPMEve, entretanto, informou que toda a estrutura do evento seria

isolada e todo o material inutilizado seria recolhido, assegurando que as condições de segurança

estariam plenamente mantidas e o Batalhão se encarregaria, inclusive, de proceder à escolta das

torcidas organizadas antes e após a partida (fls. 17/18).

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Ocorre que, mesmo com as informações trazidas pelo BPMEve, tendo em vista o acervo

fotográfico carreado aos autos, os membros do GFUT, cientes do clima de insatisfação das

torcidas, ocasionado pelas dificuldades causadas aos torcedores em razão da

megaestrutura montada no estacionamento da Ala Norte, entenderam haver sérios riscos à

segurança dos presentes.

A referida estrutura montada para o evento Villa Mix causava bloqueio do fluxo de

torcedores, prejudicava o estacionamento e continha objetos perigosos, tais como barras de ferro,

de fácil disposição e à vista. Inúmeros fatores recomendavam, portanto, a torcida única, a

mudança do local ou o adiamento da partida (dados objetivos contrários à realização da

partida).

Além dos elencados riscos objetivos, inaugurou-se um clima de descontentamento e

insatisfação das torcidas com as autoridades responsáveis pela segurança e organização da

partida (dados subjetivos contrários à realização da partida).

Destarte, tendo em vista o altíssimo grau de risco (dados objetivos e subjetivos), o

Ministério Público expediu a Recomendação nº 002/2017, recomendando à Confederação

Brasileira de Futebol (CBF) – entidade organizadora da competição – e ao Goiás Esporte Clube –

detentor do mando de jogo – a realização da partida com torcida única ou a alteração do local do

jogo (fls. 21/23).

Ainda, oficiou ao Major Gilvan Pereira Falcão, Comandante do BPMEve, comunicando que

eventuais confrontos de torcidas, tumultos ou situações de pânico que resultassem em morte,

lesões ou outros danos seriam de sua responsabilidade pessoal, na forma omissiva, pois

signatário do Ofício nº 373/2017 – BPMEve atestando a segurança do local do evento (fls. 29/30).

Em resposta à Recomendação expedida, a CBF informou:

(…) é imperioso destacar que esta Entidade tem profundo apreço e simpatia poresse D. Ministério Público e sempre acata suas recomendações.

Entretanto, nesse caso específico, ainda que nosso desejo fosse no sentido deatender o seu aconselhamento, estamos impossibilitados de fazê-lo, pelosseguintes motivos:

a) tal atendimento acarretaria descumprimento de normas do Estatuto de Defesado Torcedor (Lei nº 10.671/03), que prevê: (i) ser dever da entidade responsávelpela competição confirmar, com até 48 (quarenta e oito) horas de antecedência, ohorário e local de realização das partidas (art. 16, I) e, ainda, (ii) ser direito dotorcedor que os ingressos para as partidas sejam colocados à venda até 72(setenta e duas) horas antes de seu início (art. 20) e,

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b) a venda dos ingressos para a mencionada partida já se iniciou, comcomercialização para os torcedores de ambas equipes, de vultosa quantidade deingressos.

(…)

Por esses relevantes motivos, a CBF, muito a contragosto, se vê forçada amanter a realização do jogo de acordo com sua programação datada de04.04.17 (fls. 34/35).

Pois bem. O infortúnio temido se concretizou, e o Ministério Público recebeu a notitia

criminis constante em mídia digital (fl. 62), a qual retrata imagens das câmeras de segurança, bem

como registros amadores, do momento da suposta prática do crime de tentativa de homicídio,

praticado contra torcedor do Goiás Esporte Clube agredido com chutes e pontapés na cabeça,

fato ocorrido no Estádio Serra Dourada, nesta Capital, no dia 24.06.2017 (sábado), logo após o

encerramento da partida Goiás x Vila Nova, pelo Campeonato Brasileiro da série B.8

Diante do fatídico evento, o Ministério Público requisitou ao 8º Distrito Policial, por meio do

Ofício nº 62/2017 – GFUT (fls. 60/61), a instauração de inquérito policial para a devida apuração

dos crimes ocorridos durante o enfrentamento entre torcedores, a fim de colher elementos neces-

sários para o oferecimento de denúncia em face dos autores de eventuais infrações penais.

Ainda, o parquet remeteu ao Procurador-Geral do Superior Tribunal de Justiça Desportiva

do Futebol cópia integral dos autos do procedimento administrativo, bem como mídias digitais re-

tratando o episódio de violência ocorrido, e solicitou a aplicação de punição exemplar aos clu-

bes envolvidos, a fim de promover a defesa da ordem jurídica, o combate à violência nos está-

dios e a prevenção de condutas capazes de colocar em risco os direitos do cidadão reconhecidos

pelo Estatuto do Torcedor.

Deve ser ressaltado ainda que no bojo do processo nº 074/2017 instaurado perante a 2ª

Comissão Disciplinar no Superior Tribunal de Justiça Desportiva o presidente do STJD, Ronaldo

Botelho Piacente, em 28.06.2017, em decisão liminar, interditou o Estádio Serra Dourada, palco

de briga e confusão generalizada ocorrida na partida entre Goiás e Vila Nova (fls. 17-v e 18 do

apenso).

Posteriormente, sobreveio decisão definitiva constatando a reincidência de ambas as en-

tidades esportivas (fl. 79-v do apenso) e condenando o Goiás Esporte Clube à perda de 05 (cin-

8 Além do tumulto ocorrido no interior do estádio, comprovado pelos vídeos que seguem anexos (fl. 62), houve, ainda,o homicídio praticado em face de Davi Icário da Silva, conforme fls. 105/106, que, trajando camiseta do Goiás EsporteClube, foi atingido numa motocicleta por disparo efetuado a partir de um veículo automotor, na Avenida Tóquio –Residencial Goiânia Viva - enquanto seguia para o estádio Serra Dourada.

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co) mandos de campo, com portões fechados, e multa de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais); e o

Vila Nova Futebol Clube à perda de 04 (quatro) mandos de campo, com portões fechados, e multa

de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), ambos por infração ao artigo 213, inciso I, do Código Brasileiro

de Justiça Desportiva, conforme (fls. 76-v/79-v do apenso).

Assevere-se a rivalidade histórica entre as equipes, que soma inúmeros episódios

de confronto ao longo dos anos.

Constam, por fim, notícias divulgadas em jornais locais (fls. 99/104), bem como no site da

ESPN, denunciando a visível falta de conservação do estádio Serra Dourada:

A falta de conservação é visível. Arquibancadas encardidas, banheiros fétidos,com latrinas entupidas a cada jogo, falta de bebedouros para o público, lixo espa-lhado para todos os cantos, bares sujos cobrando valores exorbitantes, grades en-costadas e sem a devida proteção, que podem servir como armamento em brigasde torcidas, além de sinalização precária (fl. 99).

Restam, portanto, evidenciados o episódio de violência, o histórico de confrontos, a

reincidência e as péssimas condições de conservação e segurança do Estádio Serra Dourada.

V – DAS MEDIDAS PREVENTIVAS TOMADAS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO EM SEDE

ADMINISTRATIVA – MINISTÉRIO PÚBLICO RESOLUTIVO

O Ministério Público Resolutivo nada mais é que aquele que busca, de forma prioritária,

a solução dos conflitos sociais no âmbito da própria instituição e em parceria com a sociedade,

sem a necessidade de recorrer ao Poder Judiciário, já tão assoberbado. Ou seja, seria o MP que

procura a resolução de problemas de forma extrajudicial, superando-se o perfil unicamente

repressivo e demandista de outrora.

Sem dúvida,

(…) a construção de um Ministério Público resolutivo passa pela necessidadede consolidar seu papel de agente transformador da realidade social, por meio daaproximação com a sociedade e de uma atuação preventiva, prestigiando asua condição de protagonista das políticas públicas “de primeira grandeza”9.(Grifou-se)

9 “O Ministério Público Resolutivo”, de autoria de Alice de Almeida Freire Barcelos, promotora de justiça e coordenadorado Centro de Apoio Operacional Criminal do Ministério Público de Goiás. Publicado no Jornal O Popular em 9 de abril de2009. Disponível em: http://www.mp.go.gov.br/portalweb/hp/7/docs/mp_resolutivo_-_2a_versao.pdf

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Nesse diapasão, a Constituição Federal, no art. 217 determina o “dever do Estado em

fomentar práticas desportivas formais e não-formais, como direito de cada um.”

Ademais, considerando o disposto no art. 1º–A do Estatuto do Torcedor, segundo o qual

“é responsabilidade do poder público prevenir a violência nos esportes” e, ainda,

considerando que o Ato PGJ nº 22, de 25 de junho de 2015, que instituiu no âmbito do Ministério

Público do Estado de Goiás o Grupo de Atuação Especial em Grandes Eventos do Futebol –

GFUT estabeleceu em seu artigo 2º que o órgão terá atribuição para atuar na comarca de

Goiânia, com o objetivo de “prevenir, identificar e reprimir crimes, atos infracionais e atos

lesivos aos serviços públicos, ao consumidor e aos direitos da criança e do adolescente

quando relacionados com a prática de futebol profissional”, adotaram-se, diante do aduzido

contexto, algumas medidas em sede administrativa, que seguem nos tópicos infra.

Trata-se de atuação ministerial propositiva, fomentadora de iniciativas que garantam –

efetivamente – o bem-estar do torcedor e o incentivo às manifestações desportivas de criação

nacional, conforme artigo 217, IV da Constituição Federal.

5.1 - DAS REUNIÕES SOBRE A VIABILIDADE DE APRIMORAMENTO DO SISTEMA DE

CÂMERAS DE SEGURANÇA NO ESTÁDIO SERRA DOURADA

Ressalte-se que, antes mesmo do episódio ocorrido em 24.06.2017, no dia 09.06.2017

os promotores de justiça membros do GFUT reuniram-se com membros de empresa de

tecnologia com o fito de conhecer as novas tecnologias de cadastro biométrico e

reconhecimento facial para, em seguida, averiguar a possibilidade de implementação pela

AGETOP e a administração do estádio Serra Dourada (vide ata de reunião de fls. 138/142).

Ainda sobre a questão das câmeras de segurança, outra reunião foi designada para o dia

30.06.2017, ocasião em que foi convidada (vide convite de fl. 132) a requerida AGETOP,

administradora do Estádio Serra Dourada. Porém, a autarquia, demonstrando desinteresse e

descomprometimento com a necessidade de implementação de medidas de prevenção, proteção

e segurança aos torcedores, não compareceu.

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Esse ponto demonstra a boa-fé objetiva do Ministério Público, bem como a negligência

estatal, no que concerne à defesa do torcedor.

5.2 - DAS OPERAÇÕES CONJUNTAS REALIZADAS NO INTERIOR DO ESTÁDIO SERRA

DOURADA

Do mesmo modo, o GFUT tem atuado, junto à rede de proteção ao torcedor, de forma a

acompanhar e assegurar a continuidade das fiscalizações conjuntas realizadas por força do

Convênio nº 001/2016 (fls. 154/166), celebrado entre o Ministério Público, a Secretaria Municipal

de Saúde de Goiânia (SMS) por meio da Vigilância Sanitária, a Secretaria Municipal de

Planejamento Urbano e Habitação (SEPLANH) por meio da Superintendência da Ordem Pública

(SOP), a Secretaria da Segurança Pública e Administração Penitenciária do Estado de

Goiás(SSP) e a Superintendência de Proteção aos Direitos do Consumidor (PROCON/GO).

Ocorreram – até junho de 2017 – 3 (três) fiscalizações nos estádios de futebol

profissional na cidade de Goiânia, observando a comercialização de produtos impróprios para o

consumo, o cumprimento das legislações sanitária e relativa à acessibilidade, proteção contra

publicidade enganosa e abusiva, dentre outros direitos consumeristas.

Esse ponto demonstra, mais uma vez, o empenho do Ministério Público na defesa dos

direitos do torcedor.

5.3 - DO TRABALHO PREVENTIVO EXECUTADO EM RELAÇÃO ÀS TORCIDAS AMIGAS

Noutro giro, foi noticiado episódio de agressão ocorrido durante a partida Goiás x

Figueirense realizada em 13.05.2017 – no Estádio Serra Dourada – contra torcedor esmeraldino,

por torcedor do Vila Nova infiltrado na torcida amiga do Figueirense. O GFUT, atuando de forma

preventiva, protetiva e precavida, também instaurou procedimento administrativo nº

201700209262 e realizou reuniões com o escopo de compreender e acompanhar a finalidade, a

existência, as atividades e os eventuais riscos das torcidas denominadas “amigas” nas partidas

realizadas no Estado de Goiás.

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Insta consignar que, após reunião em 23.06.2017 com representantes das torcidas

Esquadrão Vilanovense e Força Jovem, foi realizada nova reunião em 30.06.2017 (vide ata de fls.

168/173). Posteriormente, reuniu-se com o Major Gilvan Pereira Falcão, bem como com o Tenente

Ricardo Junqueira Dourado, do Batalhão de Polícia Militar de Eventos (BPMEve), para conhecer a

opinião técnica da Polícia Militar, ocasião em que foi determinada a elaboração de um ato

normativo, no âmbito no do Batalhão de Eventos, dispondo sobre as diretrizes da fiscalização do

instituto da “torcida amiga” (vide ata de fls.174/176).

A iniciativa também demonstra uma atuação preventiva e resolutiva por parte do

Ministério Público.

VI – DO DIREITO

6.1 - DA APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PRECAUÇÃO E DA PREVENÇÃO NO ÂMBITO DO

ESTATUTO DO TORCEDOR

6.1.1. DO PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO

Conforme previsto no Estatuto de Defesa do Torcedor, “a defesa dos interesses e direitos

dos torcedores em juízo observará, no que couber, a mesma disciplina da defesa dos

consumidores em juízo de que trata o Título III da Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990” (Art.

40, EDT).

Ainda, “para todos os efeitos legais, equiparam-se a fornecedor, nos termos da lei nº 8.078

de 11 de setembro de 1990, a entidade responsável pela organização da competição, bem como a

entidade de prática desportiva detentora do mando de jogo” (Art. 3 º da Lei nº 10.671 de 15 de

maio de 2003).

Pois bem. Vivemos hodiernamente numa sociedade global de riscos que atingem não só o

meio ambiente mas, do mesmo modo, a produção e distribuição de produtos e serviços no

mercado de consumo. O Princípio da Precaução representa, nesse sentido, uma das possíveis

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formas de evitar a ocorrência desses riscos ou, talvez, de evitar a ocorrência dos danos

decorrentes desses riscos.

Por tal motivo, abalizada doutrina defende sua aplicação também na seara consumerista:

1. Princípio da precaução - Esse princípio encontra-se implícito no Código deDefesa do Consumidor, e tem por objetivo resguardar o consumidor de riscosdesconhecidos relativos a produtos e serviços colocados no mercado deconsumo. Não deve ser confundido com a prevenção, que é forma de resguardode riscos conhecidos. Um bom exemplo da aplicação do princípio da prevençãopode ser notado na regulação do fornecimento de alimentos transgênicos, umavez que a ciência ainda desconhece todos os efeitos dos gêneros alimentíciosgeneticamente modificados sobre a saúde humana.10

O Sistema de Proteção e Defesa do Consumidor consagra o referido princípio como norte

para a contenção dos riscos no mercado de consumo, trazendo regras de informação sobretudo

nos artigos 8°, 9° e 10. A exemplo, leia-se:

O fornecedor de produtos e serviços potencialmente nocivos ou perigosos àsaúde ou segurança deverá informar, de maneira ostensiva e adequada, arespeito da sua nocividade ou periculosidade, sem prejuízo da adoção deoutras medidas cabíveis em cada caso concreto (art. 9º, CDC).

O Princípio da Precaução possui quatro componentes básicos que podem ser assim

resumidos:

(i) a incerteza passa a ser considerada na avaliação de risco;

(ii) o ônus da prova cabe ao proponente da atividade;

(iii) na avaliação de risco, um número razoável de alternativas ao produto, processo ou

serviço devem ser estudadas e comparadas;

(iv) para ser precaucionária, a decisão deve ser democrática, transparente e ter a

participação dos interessados no produto, processo ou serviço.

No contexto específico das partidas de futebol profissional, a importância do princípio suso

está relacionada ao fato de que devem ser tomadas todas as medidas para se evitar danos aos

espectadores. Portanto, na hipótese de verificação de elementos objetivos e subjetivos que

coloquem em risco a segurança dos torcedores, mister agir com precaução.

10 GUGLINSKI, Vitor Vilela. Princípios norteadores do direito do consumidor. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=12232

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Isso porque, ocorrendo qualquer dano ao torcedor, provavelmente será de difícil ou mesmo

impossível reparação.

6.1.2. DO PRINCÍPIO DA PREVENÇÃO

Dentre os direitos básicos do consumidor consagrados no artigo 6º do Código de proteção

e defesa do consumidor, estão:

(...)

VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais,coletivos e difusos;

VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção oureparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos,assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados.

Conforme destacado por Felipe P. Braga Netto, em sua doutrina, fundamental é a menção,

nos incisos destacados, à prevenção, “sublinhando a importância, cada dia mais viva, de

privilegiar a prevenção dos danos, e não, como tradicionalmente se fez, centrar foco

exclusivamente na reparação do dano”11.

Isso implica dizer que existe uma tendência à tutela preventiva, e não à tutela repressiva

clássica.

No mesmo sentido é a determinação expressa no art. 1º-A. do Estatuto de Defesa do

Torcedor:

Art. 1o-A. A prevenção da violência nos esportes é de responsabilidade do poderpúblico, das confederações, federações, ligas, clubes, associações ou entidadesesportivas, entidades recreativas e associações de torcedores, inclusive de seusrespectivos dirigentes, bem como daqueles que, de qualquer forma, promovem,organizam, coordenam ou participam dos eventos esportivos.

Ao estabelecer regras sobre a segurança do torcedor partícipe do evento esportivo, o

Estatuto consagra, mais uma vez, o princípio da prevenção:

Art. 13-A. São condições de acesso e permanência do torcedor no recintoesportivo, sem prejuízo de outras condições previstas em lei:

11 NETTO, Felipe Peixoto Braga. Manual de Direito do Consumidor à luz da jurisprudência do STJ. Salvador:Juspodivm, 2013, p. 63.

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III - consentir com a revista pessoal de prevenção e segurança.

Também o Código Brasileiro de Justiça Desportiva prevê punição aos clubes por

desordens em sua praça de desportos, em seu artigo 213:

Art. 213. Deixar de tomar providências capazes de prevenir e reprimir:

I – desordens em sua praça de desporto;

II – invasão do campo ou local da disputa do evento desportivo;

III – lançamento de objetos no campo ou local da disputa do eventodesportivo.

PENA: multa, de R$ 100,00 (cem reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais).

Conclui-se, diante de expressiva remissão legislativa ao princípio da prevenção, que tal

princípio é pedra angular do microssistema de defesa do torcedor.

Diante do exposto, infere-se, portanto, que o torcedor tem o direito de ser protegido,

prevenindo-se eventuais danos e precavendo-se de riscos.

6.2 – DA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO E DEFESA NO ÂMBITO DO ESTATUTO

DO TORCEDOR

A Carta Magna brasileira preleciona em seu artigo 5º, inciso XXXII, que “o estado

promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”. Também no artigo 170, inciso V:

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e nalivre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme osditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

V - a defesa do consumidor.

Obtempere-se, ainda, que a Constituição da República de 1988 também previu o desporto

como um dos institutos de grande importância para a ordem social, razão pela qual sua

implementação deve ocorrer com seriedade, competência e zelo, para que todos os envolvidos na

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atividade sejam beneficiados, sem perder de vista a proteção ao torcedor/consumidor. Nesse

sentido:

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislarconcorrentemente sobre:

VII - proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico(…).

Art. 30. Compete aos Municípios:

IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada alegislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

Art. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais eacesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e adifusão das manifestações culturais.

3º A lei estabelecerá o Plano Nacional de Cultura, de duração plurianual,visando ao desenvolvimento cultural do País e à integração das ações dopoder público que conduzem à:

I - defesa e valorização do patrimônio cultural brasileiro

Art. 217. É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não-formais, como direito de cada um, observados:

V - a proteção e o incentivo às manifestações desportivas de criação nacional.

Veja-se como o Código de Defesa e Proteção do Consumidor (Lei nº 8.078/1990) também

tutela – reiteradamente – ambos os princípios, já taxados em seu próprio nome:

Art. 1° O presente código estabelece normas de proteção e defesa doconsumidor, de ordem pública e interesse social, nos termos dos arts. 5°, incisoXXXII, 170, inciso V, da Constituição Federal e art. 48 de suas DisposiçõesTransitórias.

Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo oatendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade,saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria dasua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações deconsumo atendidos os seguintes princípios:

III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo ecompatibilização da proteção do consumidor com a necessidade dedesenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípiosnos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), semprecom base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;

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Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados porpráticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ounocivos (…).

(…)

IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodoscomerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulasabusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;

VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônusda prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil aalegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias deexperiências.

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuaisrelativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

XV - estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor.

Art. 56. As infrações das normas de defesa do consumidor ficam sujeitas,conforme o caso, às seguintes sanções administrativas, sem prejuízo das denatureza civil, penal e das definidas em normas específicas (…).

Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimaspoderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.

Art. 83. Para a defesa dos direitos e interesses protegidos por este códigosão admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar suaadequada e efetiva tutela.

Paralelamente, o Estatuto de Defesa do Torcedor (Lei nº 10.671, de 15 de maio de 2003)

já dispõe, em seu artigo 1º: “Este Estatuto estabelece normas de proteção e defesa do

torcedor”. Ainda:

Art. 14. § 1o É dever da entidade de prática desportiva detentora do mando dejogo solucionar imediatamente, sempre que possível, as reclamações dirigidas aoserviço de atendimento referido no inciso III, bem como reportá-las ao Ouvidor daCompetição e, nos casos relacionados à violação de direitos e interesses deconsumidores, aos órgãos de defesa e proteção do consumidor.

Art. 40. A defesa dos interesses e direitos dos torcedores em juízo observará,no que couber, a mesma disciplina da defesa dos consumidores em juízo deque trata o Título III da Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990.

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Art. 41. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios promoverão adefesa do torcedor, e, com a finalidade de fiscalizar o cumprimento dodisposto nesta Lei, poderão:

I - constituir órgão especializado de defesa do torcedor; ou

II - atribuir a promoção e defesa do torcedor aos órgãos de defesa doconsumidor.

Tais dispositivos fizeram-se necessários principalmente em virtude do fato de que a

categoria dos torcedores, antes da previsão de regras específicas assegurando seus interesses,

convivia com situações atentatórias diversas, engendradas por arbitrariedades cometidas por

muitas entidades organizadoras dos eventos desportivos ou por aquelas que detinham titularidade

do jogo, como destacado por Joseane Suzart Lopes da Silva12.

6.3 - DO DIREITO DO TORCEDOR À SEGURANÇA

A Carta Magna resguarda o direito à segurança no rol de direitos sociais contemplados no

artigo 6º:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, amoradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção àmaternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma destaConstituição.

Sobre a segurança pública, tem-se que:

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade detodos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade daspessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

(...)

V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.

§ 7º A lei disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveispela segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de suas atividades.

12 SILVA, Joseane Suzart Lopes da. Estatuto do Torcedor. Coleção leis Especiais para concursos. Coord.: Leonardo deMedeiros Garcia. Vol. 25. Salvador: Juspodivm, 2010, p. 11.

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O Código de Defesa do Consumidor, por sua vez, também contém diversas menções

expressas ao princípio da segurança.

Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo oatendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade,saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da suaqualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de

consumo, atendidos os seguintes princípios: (…)

II - ação governamental no sentido de proteger efetivamente o consumidor:

d) pela garantia dos produtos e serviços com padrões adequados de qualidade,segurança, durabilidade e desempenho.

V - incentivo à criação pelos fornecedores de meios eficientes de controle dequalidade e segurança de produtos e serviços, assim como de mecanismosalternativos de solução de conflitos de consumo.

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados porpráticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ounocivos.

Art. 8° Os produtos e serviços colocados no mercado de consumo nãoacarretarão riscos à saúde ou segurança dos consumidores, exceto osconsiderados normais e previsíveis em decorrência de sua natureza e fruição,obrigando-se os fornecedores, em qualquer hipótese, a dar as informaçõesnecessárias e adequadas a seu respeito.

Art. 9° O fornecedor de produtos e serviços potencialmente nocivos ouperigosos à saúde ou segurança deverá informar, de maneira ostensiva eadequada, a respeito da sua nocividade ou periculosidade, sem prejuízo daadoção de outras medidas cabíveis em cada caso concreto.

Art. 10. O fornecedor não poderá colocar no mercado de consumo produto ouserviço que sabe ou deveria saber apresentar alto grau de nocividade oupericulosidade à saúde ou segurança.

§ 3° Sempre que tiverem conhecimento de periculosidade de produtos ou serviçosà saúde ou segurança dos consumidores, a União, os Estados, o DistritoFederal e os Municípios deverão informá-los a respeito.

§ 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidordele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes,entre as quais:

II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam (…).

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Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurarinformações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobresuas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazosde validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos queapresentam à saúde e segurança dos consumidores.

Art.36, § 2° É abusiva, dentre outras a publicidade discriminatória de qualquernatureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveiteda deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeita valoresambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de formaprejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança.

Art. 55, § 1° A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios fiscalizarão econtrolarão a produção, industrialização, distribuição, a publicidade de produtos eserviços e o mercado de consumo, no interesse da preservação da vida, da saúde,da segurança, da informação e do bem-estar do consumidor, baixando as normasque se fizerem necessárias.

Art. 58. As penas de apreensão, de inutilização de produtos, de proibição defabricação de produtos, de suspensão do fornecimento de produto ou serviço, decassação do registro do produto e revogação da concessão ou permissão de usoserão aplicadas pela administração, mediante procedimento administrativo,assegurada ampla defesa, quando forem constatados vícios de quantidade ou dequalidade por inadequação ou insegurança do produto ou serviço.

Art. 66. Fazer afirmação falsa ou enganosa, ou omitir informação relevante sobre anatureza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho,durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços: Pena - Detenção de trêsmeses a um ano e multa.

Art. 68. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser capaz deinduzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa a sua saúdeou segurança:

Pena - Detenção de seis meses a dois anos e multa.

Por fim, além da prevenção da violência, resguardou-se também de maneira ampla, na Lei

nº 10.671/2003 (Estatuto de Defesa do Torcedor), a segurança do torcedor, como direito do

consumidor: “O torcedor tem direito a segurança nos locais onde são realizados os eventos

esportivos antes, durante e após a realização das partidas” (Art. 13).

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Ainda, previu o Estatuto:

Art. 13-A. São condições de acesso e permanência do torcedor no recintoesportivo, sem prejuízo de outras condições previstas em lei:

III - consentir com a revista pessoal de prevenção e segurança.

Art. 14. Sem prejuízo do disposto nos arts. 12 a 14 da Lei nº 8.078, de 11 desetembro de 1990, a responsabilidade pela segurança do torcedor em eventoesportivo é da entidade de prática desportiva detentora do mando de jogo ede seus dirigentes, que deverão:I – solicitar ao Poder Público competente a presença de agentes públicos de

segurança, devidamente identificados, responsáveis pela segurança dostorcedores dentro e fora dos estádios e demais locais de realização de eventosesportivos;II - informar imediatamente após a decisão acerca da realização da partida,

dentre outros, aos órgãos públicos de segurança, transporte e higiene, osdados necessários à segurança da partida (…).

Art. 17. É direito do torcedor a implementação de planos de ação referentesa segurança, transporte e contingências que possam ocorrer durante a realizaçãode eventos esportivos. § 1o Os planos de ação de que trata o caput serão elaborados pela entidade

responsável pela organização da competição, com a participação das entidadesde prática desportiva que a disputarão e dos órgãos responsáveis pela segurançapública, transporte e demais contingências que possam ocorrer, das localidadesem que se realizarão as partidas da competição.

Art. 19. As entidades responsáveis pela organização da competição, bemcomo seus dirigentes respondem solidariamente com as entidades de quetrata o art. 15 e seus dirigentes, independentemente da existência de culpa,pelos prejuízos causados a torcedor que decorram de falhas de segurançanos estádios ou da inobservância do disposto neste capítulo.

Art. 23. A entidade responsável pela organização da competição apresentará aoMinistério Público dos Estados e do Distrito Federal, previamente à sua realização,os laudos técnicos expedidos pelos órgãos e autoridades competentes pelavistoria das condições de segurança dos estádios a serem utilizados nacompetição.

§ 1o Os laudos atestarão a real capacidade de público dos estádios, bem comosuas condições de segurança.

Art. 31. A entidade detentora do mando do jogo e seus dirigentes deverãoconvocar os agentes públicos de segurança visando a garantia da integridadefísica do árbitro e de seus auxiliares.

Como se vê, a preocupação do legislador ordinário justificou a extensão da proteção da

segurança do torcedor e da própria sociedade como um todo, pois seria incompatível com a

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própria razão de ser do esporte – qual seja, a promoção da saúde e a celebração da vida – que

para a sua realização fosse necessária a tolerância com a violência e até mesmo a morte.

Além de buscar a proteção da parte mais fraca da relação jurídico-econômica

estabelecida, o Estado visou garantir a segurança do torcedor, inclusive antes da competição, e

assegurar o espírito esportivo e a expressão saudável das paixões que este suscita e que devem

permear a competição.

Nesse contexto, a agremiação esportiva e as entidades organizadoras da competição

devem, por exemplo, organizar a prestação do serviço de comercialização de ingresso de modo a

garantir a segurança do torcedor mesmo antes da partida.

Assim, a segurança do torcedor deve ser protegida de maneira plena, seja física (proteção

da integridade corporal do torcedor, minimizando sua exposição a agressões e violência), psíquica

(proteção da integridade psicológica do torcedor, minimizando sua exposição a estresse,

desconforto e riscos desnecessários) e patrimonial (proteção do direito de propriedade do

torcedor, minimizando sua exposição a furtos e roubos, e evitando a imposição de custos

desnecessários).

Posturas e condutas violentas e hostis, dentro e fora de campo, têm inequívocas

consequências para o tecido social e merecem ser reprimidas e rechaçadas para a garantia da

ordem pública e da paz social.

Desta feita, restando inconteste que todos os fatos narrados nesta exordial evidenciam

comportamentos agressivos, geradores de tumultos e atos violentos e criminosos, é imperativa a

determinação de medidas que garantam segurança aos torcedores, conforme determina o

art. 1º-A do Estatuto.

VII – DOS DANOS MATERIAIS E MORAIS INDIVIDUAIS OCASIONADOS EM 24-06-2017 –

RESPONSABILIDADE DO GOIÁS ESPORTE (CLUBE MANDANTE) E DA CONFEDERAÇÃO

BRASILEIRA DE FUTEBOL (ENTIDADE ORGANIZADORA)

Conforme já mencionado, além do Estatuto do Torcedor, a relação jurídica entre os clubes

organizadores de eventos esportivos e os frequentadores deve observar o Código de Defesa do

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Consumidor, em razão de aqueles se caracterizarem como fornecedores e estes como

consumidores.

Traz a consagrada doutrina de Carlos Roberto Gonçalves, “Responsabilidade Civil”13 que,

partindo da premissa básica de que o consumidor é a parte vulnerável das relações de consumo,

o Código pretende restabelecer o equilíbrio entre os protagonistas de tais relações. Assim, declara

expressamente o art. 1º que o referido diploma estabelece normas de proteção e defesa do

consumidor, acrescentando serem tais normas de ordem pública e interesse social. De pronto,

percebe-se que:

tratando-se de relações de consumo, as normas de natureza privadaestabelecidas no Código Civil de 1916, onde campeava o princípio da autonomiada vontade, e em leis esparsas, deixaram de ser aplicadas. O Código de Defesado Consumidor retirou da legislação civil (bem como de outras áreas do direito) aregulamentação das atividades humanas relacionadas com o consumo, criandouma série de princípios e regras em que se sobressai não mais a igualdade formaldas partes, mas a vulnerabilidade do consumidor, que deve ser protegido(GONÇALVES, 2012, p. 65).

Assim, no referido sistema codificado, “tanto a responsabilidade pelo fato do produto ou

serviço como a oriunda do vício do produto ou serviço são de natureza objetiva, prescindindo do

elemento culpa a obrigação de indenizar atribuída ao fornecedor” (GONÇALVES, 2012, p. 65).

Veja-se jurisprudência do E. Tribunal de Justiça do Estado de Goiás a respeito:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PRÁTICA DE ATO ILÍCITO.DANOS MATERIAIS COMPROVADOS. RESPONSABILIDADE CIVILCONFIGURADA. DEVER DE INDENIZAR. ÔNUS DA PROVA. AUSÊNCIA DEFATO IMPEDITIVO, MODIFICATIVO OU EXTINTIVO DO DIREITO DO AUTOR.PROCEDÊNCIA DO PLEITO MANTIDA. 1. Aquele que, por ação ou omissãovoluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, aindaque exclusivamente moral, comete ato ilícito, ficando obrigado a repará-lo. 2. Ofornecedor de serviços responde, independentemente da existência deculpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitosrelativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientesou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Cuida-se de responsabilidadeobjetiva, cabendo ao lesado demonstrar que o prejuízo sofrido se originou dedeterminada conduta, com nexo causal, sem qualquer consideração sobre o doloe/ou culpa. 3. Compete a parte autora demonstrar os fatos constitutivos do seudireito, nos moldes do art. 373, inc. I, do NCPC. Ao réu, por sua vez, cabecomprovar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, apto aexcluir a responsabilidade civil, o que não ocorreu no caso. Impõe-se, assim, aconfirmação da sentença. Apelação cível conhecida e desprovida. Sentençamantida.

13 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 14.ed. - São Paulo: Saraiva, 2012.

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(TJGO, APELACAO 0416636-03.2014.8.09.0149, Rel. ITAMAR DE LIMA, 3ªCâmara Cível, julgado em 09/08/2017, DJe de 09/08/2017) (Grifou-se)

Nesse sentido, resta claro - no caso em tela - que a conduta omissiva dos réus e os

confrontos ocorridos geraram, além de prejuízos à Polícia Militar do Estado de Goiás, danos aos

consumidores individualmente considerados.

A título de ilustração de alguns dos prejuízos causados, em resposta ao Ofício nº 67/2017

– GFUT, o Batalhão de Polícia Militar de Eventos (BPMEve) já mensurou, no relatório de fls.

145/152, o gasto de R$ 6.348,83 (seis mil trezentos e quarenta e oito reais e oitenta e três

centavos) com materiais – tais como projéteis de borracha e granadas de efeito moral,

lacrimogêneas e indolores de pimenta – utilizados para conter o conflito entre torcedores.

Para que haja condenação em danos morais e materiais individuais, todavia, não é

necessário que o autor da ação civil pública demonstre os danos individualmente sofridos pelos

consumidores.

Em sede de ação civil pública, devem os réus ser condenados ao ressarcimento dos

consumidores, uma vez que o CDC expressamente prevê que, na ação coletiva visando à

responsabilidade civil por danos causados aos consumidores individualmente considerados, “em

caso de procedência do pedido, a condenação será genérica, fixando a responsabilidade do réu

pelos danos causados” (Art. 95, CDC).

A comprovação do prejuízo individual deve ser, por sua vez, realizada em fase de

liquidação de sentença, conforme previsto no artigo 97 do Código de Defesa do Consumidor, pela

vítima e seus sucessores, bem como pelos legitimados expressos no artigo 82.

Exatamente por isso o artigo 103, § 3º, do CDC previu o instituto do transporte in utilibus

secundum eventum litis da coisa julgada coletiva.

Para materialização do princípio do máximo benefício da tutela jurisdicional coletiva,

segundo o qual deve-se evitar novas demandas com a mesma causa de pedir, os réus devem, no

bojo da ação civil pública, ser condenados a indenizar as vítimas pelos danos provocados. O

Código de Defesa do Consumidor exige que o autor da ação civil pública demonstre apenas a

potencialidade lesiva da conduta perpetrada pelos réus.

No caso em comento, inegável a possibilidade de sofrimento de prejuízos de ordem moral

e material por parte dos consumidores, em razão da conduta adotada pelos réus de

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responsabilizarem-se – ainda que de forma omissiva – pelo perigo à saúde e à segurança dos

frequentadores do evento promovido, diante da conhecida e prenunciada ameaça de confronto

entre as torcidas organizadas rivais e a ausência de garantia da efetiva segurança requerida.

Vê-se, ainda, que os réus vêm experimentando enriquecimento sem causa, em

razão de comercializarem ingressos para o evento e não disponibilizarem as condições de

segurança exigidas para a sua realização, diminuindo seu custo operacional e aumentando sua

lucratividade, tudo em detrimento da saúde e da segurança dos frequentadores do evento. Tal fato

não pode nem deve ficar sem reparação, seja em caráter individual seja coletivo.

VIII - DO DANO MORAL COLETIVO OCASIONADO EM 24-06-2017 – RESPONSABILIDADE

DO GOIÁS ESPORTE CLUBE (CLUBE MANDANTE) E DA CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE

FUTEBOL (ENTIDADE ORGANIZADORA)

Segundo Hermes Zanetti Jr. e Leonardo de Medeiros Garcia14, configura o dano moral

coletivo a injusta lesão à esfera moral de certa comunidade, a violação a determinado círculo de

valores coletivos.

Uma das funções do dano moral coletivo é, destarte, garantir a efetividade dos princípios

de prevenção e precaução, com o intuito de propiciar uma tutela mais efetiva dos direitos difusos e

coletivos, bem como prevenir nova lesão a direitos transindividuais.

O art. 3º da Lei n.° 7.347/85, que disciplina a ação civil pública, afirma que essa “poderá

ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer”.

Para o STJ, essa conjunção “ou” – contida no citado artigo, tem um sentido de adição

(soma), não representando uma alternativa excludente. Em outras palavras, será possível a

condenação em dinheiro e também ao cumprimento de obrigação de fazer/não fazer.

Veja-se precedente nesse sentido:

(...) Segundo a jurisprudência do STJ, a logicidade hermenêutica do art. 3º da Lei7.347/1985 permite a cumulação das condenações em obrigações de fazer ounão fazer e indenização pecuniária em sede de ação civil pública, a fim depossibilitar a concreta e cabal reparação do dano ambiental pretérito, jáconsumado. Microssistema de tutela coletiva. (...)4. O dano moral coletivo

14 ZANETTI JR, Hermes e GARCIA, Leonardo de Medeiros. Direitos Difusos e coletivos. 5ª edição rev., ampl. e atual.,Editora Juspodivm: Salvador/BA, 2014.

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ambiental atinge direitos de personalidade do grupo massificado, sendodesnecessária a demonstração de que a coletividade sinta a dor, a repulsa, aindignação, tal qual fosse um indivíduo isolado. (...)(REsp 1269494/MG, Rel.Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 24/09/2013) (Grifou-se).

Destaque-se também a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás

evidenciando a responsabilidade objetiva do fornecedor de produto ou serviço, que ensejou a

condenação por dano moral coletivo:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. FORNECIMENTO PRECÁRIO DEENERGIA ELÉTRICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA EMPRESACONCESSIONÁRIA. DANO MORAL COLETIVO. 1 - É de se observar que,sendo a apelante concessionária de serviço público, responde objetivamente, ateor do art. 37, § 6º da Constituição Federal, pelos danos que, por ação ouomissão, houver dado causa, bastando à vítima a comprovação do evento danosoe do nexo causal entre este e a conduta lesiva. 2 - Dano moral coletivoevidenciado. Necessidade de reparação com base nos artigos 5°, V, daConstituição Federal e 6°, VI, do Código de Defesa do Consumidor.RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. (TJGO, APELACAO CIVEL 274171-19.2012.8.09.0091, Rel. DES. NEY TELES DE PAULA, 2A CAMARA CIVEL,julgado em 20/09/2016, DJe 2121 de 29/09/2016) (Grifou-se).

Segundo Ricardo Diego Nunes Pereira, os danos morais coletivos estão atrelados à 3ª

geração do constitucionalismo: a solidariedade. Ainda, de acordo com Bittar Filho, estão presentes

quando há violação a direitos da personalidade em seu aspecto individual homogêneo ou coletivo

em sentido estrito, em que as vítimas são determinadas ou determináveis (correspondem ao art.

81, parágrafo único, incisos II e III do CDC)15.

Há que se pontuar que a expressividade dos episódios de agressão, tumulto e violência

da partida realizada em 24.06.2017 transborda os limites de suas vítimas diretas, as quais, ainda

que em número determinado, absorveram os danos gerados à comunidade local, dada a violação

da confiabilidade presumida nas relações de consumo mantidas entre as entidades organizadoras

das competições e os torcedores, assim como o descrédito acarretado à imagem do futebol que

repercute negativamente para todos os outros clubes do país.

A conduta dos demandados em relação aos seus consumidores caracteriza, destarte,

dano moral (ou extrapatrimonial) coletivo, na medida em que prejudica o equilíbrio e a equidade

entre as partes da relação de consumo, em total desconformidade com o que lhe impõem a

legislação de proteção e defesa do consumidor.

15 Disponível em: http://www.dizerodireito.com.br/2013/10/danos-morais-coletivos-e-danos-sociais.html

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Exemplifique-se que, durante a briga, uma cena chamou atenção e foi bastante difundida

pela mídia. Com o filho no colo, um torcedor esmeraldino foi flagrado com as mãos para cima,

gesto repetido pela pequena criança de apenas cinco anos. O torcedor é, conforme noticiado,

Warley Ferreira, de 39 anos, que, justamente por causa da violência, não costumava mais

frequentar clássicos disputados entre Goiás e Vila Nova. De acordo com o informado:

Warley só foi assistir o jogo porque o filho, Heitor, ganhou o direito de entrar emcampo com os jogadores do Goiás. Heitor é aluno da escolinha do clube. Ementrevista ao Globo Esporte.com, o pai explicou por que ergueu o braço e foi emdireção à polícia. Segundo ele, sua intenção era se identificar como pai de famíliae evitar que ele e a criança se machucassem.

“O susto foi grande, mas estamos bem. Só fui porque meu filho entrou em campocom o time. Queria que ele sentisse esse clima do jogo. Também fui porque nãohouve briga na final do Campeonato Goiano. Na hora da briga eu pensei apenasem não correr para onde todos estavam correndo. Achei que fosse pior e quepoderíamos ser feridos com bombas ou bala de borracha, por exemplo. Fui emdireção à polícia porque queria mostrar que era um pai de família – contou Warley,por telefone” (fls. 110/111).

O torcedor Warley e seu filho, assim como todos os presentes no estádio na ocasião da

confusão, sofreram o dano extrapatrimonial coletivo, ou dano sem “dor”, mencionado com

maestria em decisão proferida pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça no seguinte julgado:

“ADMINISTRATIVO – TRANSPORTE – PASSE LIVRE- IDOSOS – DANOMORAL COLETIVO – DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE DORE DE SOFRIMENTO – APLICAÇÃO EXCLUSIVA AO DANO MORALINDIVIDUAL – CADASTRAMENTO DE IDOSOS PARA USUFRUTO DEDIREITO – ILEGALIDADE DA EXIGÊNCIA PELA EMPRESA DETRANSPORTE – ART. 39, § 1º DO ESTATUTO DO IDOSO – LEI10741/2003 VIAÇÃO NÃO PREQUESTIONADO.O dano moral coletivo, assim entendido o que é transindividual e atinge umaclasse específica ou não de pessoas, é passível de comprovação pelapresença de prejuízo à imagem e à moral coletiva dos indivíduosenquanto síntese das individualidades percebidas como segmento, derivadode uma mesma relação jurídica-base. 2. O dano extrapatrimonial coletivoprescinde da comprovação de dor, de sofrimento e de abalopsicológico, suscetíveis de apreciação na esfera do indivíduo, masaplicável aos interesses difusos coletivos. (RESP 200801044981,ELIANA CALMON, STJ – SEGUNDA TURMA, 26/02/2010).”(grifou-se)

Nesse sentido, é estreme de dúvidas que a população goianiense – e quiçá nacional –

que já se encontrava incrédula quanto à segurança dos estabelecimentos onde acontecem as

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disputas de futebol, agora mais que nunca evitará frequentar tais espaços e demorará a assimilar

novamente o aspecto sadio e enobrecedor da prática e do hábito de prestigiar o esporte.

O instituto da indenização por dano moral tem função dúplice (punitiva e pedagógica):

“de um lado, compensar a(s) vítima(s), de outro, punir o agressor”16.

Por sua vez, no que tange ao “quantum” indenizatório, deve-se levar em conta a

aplicabilidade do “punitivedemages”, cujo objetivo precípuo é evitar que o ofensor volte a cometer

a prática danosa, bem como inibir potenciais ofensores.

Para a quantificação de tal instituto, torna-se mister uma análise: da natureza, gravidade

e repercussão da lesão na sociedade; o poder econômico do ofensor; o eventual proveito obtido

com a conduta ilícita; a reprovabilidade da conduta; o prejuízo causado pela sua conduta à

sociedade; e a vulnerabilidade do consumidor alvo da conduta danosa.

Nesse sentido, tem sido pacífica em várias cortes do país a condenação por dano moral

e os critérios para o “quantum” indenizatório. Vejamos:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. TELEFONIA CELULAR.PROMOÇÃO. NATAL CLARO. RELAÇÃO DE CONSUMO. MÁPRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DANO MORAL PURO. A má prestação doserviço de telefonia móvel se mostra ocorrente quando a operadora ooferece de forma defeituosa aos seus clientes, o que configura a condutailícita. A prestadora deixa de apresentar a segurança que o consumidorpoderia dela esperar. Exegese do art. 14, §1º do CDC. A situaçãoexperimentada pelos consumidores da demandada não é caso de meroaborrecimento ou transtorno corriqueiro. Privados da utilização doserviço contratado, por falha da prestadora, viram-se os clientesfrustrados em sua expectativa de uso, restando caracterizado o danomoral. É presumível o incômodo de qualquer consumidor frente àcontratação de serviço que falha em razão da falta de suporte operacionalda prestadora. QUANTUM INDENIZATÓRIO. CRITÉRIOS PARA FIXAÇÃO.A indenização a título de reparação de dano moral deve levar em contanão apenas a mitigação da ofensa, mas também atender a cunho depenalidade e coerção, a fim de que funcione preventivamente, evitandonovas falhas administrativas. Indenização fixada em valor que nãoconfigura enriquecimento indevido por parte da autora e, ao mesmotempo, cumpre com o caráter repressivo-pedagógico da indenização.APELO PROVIDO.” (TJRS - AC 70024450033 - 9ª C.Cív. - Relª MarileneBonzanini Bernardi - DJ 24.09.2008) (Grifou-se)

16 BRAGA NETTO, Felipe Peixoto. Manual de Direito do consumidor: à luz da jurisprudência do STJ. - Salvador: Editora Juspodivm, 2009.

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Assim, devem os réus ser condenados a ressarcir da forma mais ampla possível os

consumidores, coletivamente considerados, pela violação latente de preceitos do Estatuto do

Torcedor e do Código de Defesa do Consumidor, e de modo a inibir novas atitudes semelhantes.

Cumpre ressaltar que parcela da doutrina consumerista qualifica o fato ocorrido em

24/06/2017, como hipótese geradora de danos sociais, apresentando uma fundamentação

jurídica, que em muito se assemelha à contida nesse tópico.

Caso seja esse o entendimento de Vossa Excelência (a existência de danos sociais), o

Ministério Público, atendendo ao princípio da eventualidade, requer a condenação dos requeridos

em danos sociais.

IX – DAS MEDIDAS ASSECURATÓRIAS DA SEGURANÇA DOS TORCEDORES QUE DEVEM

SER ADOTADAS PELOS REQUERIDOS

Dispõe o artigo 18 do Estatuto do Torcedor que “Os estádios com capacidade superior a

10.000 (dez mil) pessoas deverão manter central técnica de informações, com infraestrutura

suficiente para viabilizar o monitoramento por imagem do público presente”.

Pois bem. Já existe, no Estádio Serra Dourada, sistema de vigilância e monitoramento

das arquibancadas. Inclusive, o aparato tecnológico tem sido de grande valia para auxiliar a

identificação da prática de delitos – e seus respectivos agentes – e possibilitar a apreensão, em

flagrante, pela Polícia Militar, durante a realização das partidas de futebol.

Contudo, compete destacar que as soluções de tecnologia amadureceram muito nos

últimos anos, de modo que, atualmente, é absolutamente viável e acessível proceder análise de

dados por algoritmos e inteligência artificial, sem depender tanto da checagem humana,

comprovadamente ineficaz e pouco persistente.

Ainda, verifica-se a necessidade remodelar os sistemas atualmente vigentes no Estádio

Serra Dourada, sob pena de, em pouco tempo, tornarem-se obsoletos e sem adequação às

exigências e certificações internacionais.

9.1. DAS CERTIFICAÇÕES INTERNACIONAIS

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São exemplos de certificações internacionais na área de Segurança, a Norma

ANSI/BICSI 005-2016 (fls. 402/429) e a Norma Britânica (British Security Industry Association –

flS. 430/488) amplamente utilizada na Europa que, de maneira muito didática estabelece os

parâmetros mínimos de qualidade de imagem que devem ser aplicados nas diversas cenas, de

acordo com a resposta esperada.

Segundo a Norma Britânica são especificados os níveis de detalhamento de imagem

(pixels/m) de acordo com o objetivo a ser alcançado (fls. 441/442):

Objetivo Quantidade de pixels/m

Monitorar 12.5 pixels/m

Detectar 25 pixels/m

Observar 62.5 pixels/m

Reconhecer 125 pixels/m

Identificar 250 pixels/m

Convém citar, também, documentos relevantes como o Caderno de Características

Técnicas Mínimas dos Equipamentos (fl. 398), que lista os parâmetros de qualidade mínima que

devem ser considerados nos estádios de futebol, exigido para a realização da Copa do Mundo de

Futebol em 2014.

Além do mais, cumpre mencionar o Termo de Referência de Prestação de serviços de

soluções, sistemas, aplicativos e infraestrutura de tecnologia da informação e comunicação (TIC)

para o projeto segurança eletrônica das instalações (PSEI), da Secretaria Extraordinária de

Segurança para Grandes Eventos do Ministério da Justiça, espécie de edital de segurança das

arenas das Olimpíadas do Rio em 2016 (fls. 489/590) utilizado pelo governo federal para contratar

o serviço de câmeras de todas as arenas da competição. Considerando que as Olimpíadas foram

um sucesso do ponto de vista da segurança nas arenas, tem-se o procedimento como referência

positiva de projeto licitado.

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Prosseguindo a análise, o Caderno Fifa World Cup Brasil (fls. 299/397) consiste numa

compilação de recomendações técnicas e, devido ao modelo de compras governamentais do

Brasil, a maioria dos estádios teve adaptações com base em sua aplicação.

O modelo para a próxima copa do mundo – a realizar-se no ano de 2018 - é bastante

similar, porém as especificações técnicas já sofreram – em vista do transcurso de quase 04

(quatro) anos – algumas modificações como, por exemplo, a tendência de inclusão de controle

maciço (apesar de sutil) da identificação dos torcedores desde o processo de compra/venda do

ingresso, conforme evidenciado na reportagem de fl. 747.

Diversas matérias jornalísticas têm comentado o rigor com a segurança observado

durante os testes efetuados na Copa das Confederações, como exemplificado às fls. 749 e 751.

9.2. DO CADASTRO BIOMÉTRICO JÁ IMPLEMENTADO EM OUTROS ESTADOS DA

FEDERAÇÃO

Em termos de aplicação prática, no Brasil, podem ser citadas as melhorias

implementadas em arenas esportivas no estado do Rio Grande do Sul. Ambos os estádios Beira-

Rio e Arena Grêmio já contam com cadastro biométrico dos torcedores, que necessitam proceder

à validação das digitais em catraca especial para ingressar nos estabelecimentos.

No caso da Arena Grêmio, a adoção do sistema segue contrapartida estabelecida em

TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) firmado entre o clube, órgão de segurança e o Ministério

Público do Rio Grande do Sul no ano de 2016.

O Controle de Acesso Biométrico é uma ferramenta que será utilizada paraidentificação individual dos torcedores. A implementação desse sistema naArena é uma evolução que colabora para o aumento da segurança dosusuários. O processo será implementado aos torcedores que desejam assistir aosjogos do Tricolor na Arquibancada Norte da Arena do Grêmio17.

De acordo com Thiago Floriano, supervisor do Departamento do Torcedor Gremista

(DTG), “o plano é proteger todo torcedor presente no setor. A ideia é que com a biometria fique

mais fácil identificar e individualizar responsabilidade e evitar punição genérica”18.

17 Disponível em: https://arenapoa.com.br/biometria18 Idem nota 18.

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Complementa, ainda, que “existe uma melhoria evidente de comportamento da

torcida, não só das organizadas. Depois de muitos anos, tivemos um clássico Gre-Nal sem

nenhuma ocorrência no Jecrim.(…) Existe evolução, sim, e a biometria visa alimentar esse

círculo virtuoso no estádio”.

Também no estado do Paraná, o Clube Atlético Paranaense, proprietário da Arena da

Baixada, já iniciou os procedimentos para implementação do acesso biométrico, com testes nos

jogos do campeonato brasileiro sub-20 (vide fls. 753).

Ademais, a descrição técnica para o Sistema de Monitoramento de Perímetro da Arena

Pernambuco (Fifa World Cup Brasil) contida nas fls. 299/397consiste em documento que enfoca a

concepção do projeto do sistema de monitoramento do perímetro, incluindo topologia,

dimensionamento, especificações dos materiais e desenhos que complementam o perfeito

entendimento da obra.

O escopo do mencionado projeto foi a implantação de um sistema de segurança por

imagem e com a visualização das imagens em tempo real, com o auxílio de softwares de modo a

possibilitar a recuperação de imagens gravadas de eventos ocorridos nas áreas da arena e ter

capacidade de gerenciar alarmes em caso de alguma anormalidade ou invasão (fl. 304).

9.2. DA SETORIZAÇÃO

De acordo com o Manual de recomendações para a segurança e conforto nos estádios

de futebol elaborado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), subdividir a capacidade total do

estádio em pequenas unidades ou setores de cerca de 2.500 a 3.000 espectadores cada um,

permite um controle mais fácil de uma multidão de espectadores e a distribuição mais

equilibrada de banheiros, bares e restaurantes.(fl. 673).

Cada um destes setores deveria ter sua própria rota de circulação assim como sua quota

de instalações disponíveis e uma separação das diferentes categorias de espectadores também

deveria ser parte deste sistema. A efetiva divisão entre áreas pode algumas vezes ser

conseguida por simples barreiras ou por mudanças nos níveis de sua localização dentro

das arquibancadas (fl. 673)

No caso de separação de torcidas, cada setor deve ser completamente

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independente. Esta independência pode significar a implantação e o controle de rotas

protegidas com segurança policial para estes grupos, desde sua chegada pelos meios de

transporte até as catracas de entrada no estádio e daí até as suas áreas de assentos do

setor a eles reservados:

Por causa do efeito decisivo de padrão de subdivisão no planejamento das rotasde circulação, a administração deve ser ouvida no estágio inicial do projeto, sobresua proposta a respeito de como as áreas de assentos no estádio deverão serorganizadas. A forma mais usual é que nas arquibancadas a linhas de divisãocorram de cima para baixo, com “zonas neutras” policiadas separando os doisblocos dos torcedores dos times da “casa” e dos “visitantes”. Este padrão dedivisória tem a vantagem de ser flexível, pois esta “zona neutra” pode facilmenteser deslocada de um lado para outro para permitir um número maior ou menor detorcedores numa área determinada. Mas o vazio da “zona neutra” representa umaperda de renda, e o problema de assegurar acesso às saídas, banheiros einstalações de alimentação para todo mundo, precisa ser muito bem planejado.

No caso de dois lances de arquibancada, esta divisão de cima para baixo é outravez possível, pois um grupo de torcedores pode ser colocado na arquibancada decima e o outro na de baixo. Se os torcedores “visitantes” estiverem naarquibancada de cima não há risco de invasão de campo, mas existe apossibilidade de lançarem objetos nos torcedores da “casa” que ficaram em baixo,e qualquer tipo de problema se torna difícil de resolver por causa da relativainacessibilidade dos níveis superiores. Se os torcedores de fora forem colocadosna arquibancada inferior o problema pode parecer mais fácil de resolver, mas há orisco de invasão do campo, precisando assim de um número maior de policiais ouuso mais intenso de pessoal de apoio e segurança (fls. 80/81)19.

Importante ressaltar que alocar as torcidas organizadas em determinado setor facilita

sobremaneira a fiscalização e a manutenção da ordem e segurança.

Já foi, inclusive formalizado, um Termo de Ajustamento de Conduta (fls. 285/298) em

12.09.2011 entre o Ministério Público, a Polícia Militar do Estado de Goiás, as torcidas Força

Jovem, Esquadrão Vilanovense, Torcida Organizada Sangue Colorado, Torcida organizada

Dragões Atleticanos, a Federação Goiana de Futebol, o Goiás Esporte Clube, o Vila Nova Futebol

Clube, o Atlético Clube Goianiense, a Agência Goiana de Esporte e Lazer (AGEL) e o Ministério

do Esporte.

O documento supra visou a regularização dos atos constitutivos e a identificação e

cadastro dos membros das torcidas organizadas (fl. 287). Um primeiro passo para a

concretização do cadastro biométrico já foi dado.

19 FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS. Manual de recomendações para a segurança e conforto nos estádios de futebol,2010. http://tmp.mpce.mp.br/nespeciais/nudetor/legislacao/manual_recomendacoes_seguranca_estadios.pdf

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Portanto, destacada a relevância do cadastro biométrico e da setorização de modo a

prevenir a violência nos espetáculos de futebol, é imprescindível a adoção de medidas de

segurança mais eficazes, para que, nos confrontos entre Vila Nova Futebol Clube e Goiás Esporte

Clube, não mais ocorram os eventos presenciados na data de 24/06/2017.

X – DO PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA

A Lei 7.347/85 prevê expressamente no seu art. 12 a possibilidade de concessão de

liminar, com ou sem justificação prévia, para evitar dano irreparável ou de difícil reparação,

presentes, claro, os requisitos do fumus boni iuris e o periculum in mora.

De outra parte, disciplina o artigo 294 do Código de Processo Civil o seguinte:

Art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência.Parágrafo único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode serconcedida em caráter antecedente ou incidental.

Em relação à tutela de urgência, dispõe o artigo 300 do Código de Processo Civil o

seguinte:

Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos queevidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco aoresultado útil do processo.§ 1o Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigircaução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possavir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamentehipossuficiente não puder oferecê-la.§ 2o A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificaçãoprévia.§ 3o A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quandohouver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.

Para a concessão de tutelas de urgência é necessário evidenciar a probabilidade do

direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.

A probabilidade do direito está comprovada pelos documentos trazidos aos autos, que

revelam a aplicabilidade do direito à segurança resguardado pelo Estatuto (Lei nº 10.671 de

2003), assim como pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078 de 1990), ao torcedor que

frequenta estádios de futebol na capital goiana, bem como o histórico de confrontos entre as

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torcidas, a reincidência (reconhecida na decisão do STJD) e a séria dificuldade em se

manter a segurança dos torcedores esmeraldinos e vilanovenses nos clássicos.

O perigo de dano é latente, uma vez que já aconteceram os episódios de agressão e

violência relatados: a) agressão a torcedor do Goiás Esporte Clube por torcedor do Vila Nova

Futebol Clube infiltrado na torcida amiga do Figueirense; b) morte do torcedor esmeraldino Davi

Icário da Silva a caminho do Estádio Serra Dourada, antes da partida em 24.06.2017; c) briga

entre torcedores do Goiás e do Vila Nova na área interditada antes destinada à torcida geral,

culminando com cortes e hematomas na cabeça da vítima Wanderson Xavier de Sousa, que ficou

desacordado e, não fosse a intervenção do Batalhão de Choque da Polícia Militar, poderia ter sido

também vítima de homicídio.

Obtempere-se, nesse sentido, o recebimento de denúncia por torcedor do Vila Nova

Futebol Clube em 31.08.2017, solicitando a determinação de torcida única no próximo clássico

Vila Nova x Goiás, a realizar-se dia 14.10.2017 por ocasião do 2º turno da série B do Campeonato

Brasileiro de Futebol (fl. 738). Segundo narrou, sua preocupação deve-se ao fato de testemunhar

movimentações nas redes sociais – sobremaneira Facebook - e em diversos grupos do aplicativo

de mensagens WhatsApp articulando brigas, confusões e até morte na partida, configurando

nítida situação de tragédia anunciada, conforme demonstrado (fls. 739/745).

Todos os episódios poderiam ter sido evitados se de fato estivessem sendo tomadas as

devidas precauções para oferecer ao torcedor e consumidor segurança, conforme determinam as

leis específicas e a Constituição Federal.

Ademais, estabelece o art. 536 do Código de Processo Civil, que “no cumprimento de

sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de

ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo

resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente”, ao

passo que o art. 537 estatui que “a multa independe de requerimento da parte e poderá ser

aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução,

desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para

cumprimento do preceito”.

Na espécie, a manutenção dos jogos no mesmo contexto acarretará os mesmos

problemas, o que reclama a imposição liminar de atos a serem praticados pelos requeridos, com a

cominação de multa, com vistas a assegurar o seu resultado prático.

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Presentes, portanto, a probabilidade do direito e o perigo de dano, necessário que:

a) seja determinado às entidades organizadoras (CBF e FGF) que autorizem partidas

entre Vila Nova Futebol Clube e Goiás Esporte Clube com torcida única, até que sejam

implementadas medidas eficientes e eficazes de segurança, tais como implantação de catraca

biométrica para identificação dos torcedores e disponibilização de local específico, isolado e

controlado para alocação das torcidas organizadas (setorização), a serem executadas pela

Agência Goiana de Obras e Transportes (AGETOP), mantenedora do Estádio Serra Dourada;

b) seja determinado aos clubes (Goiás Esporte Clube e Vila Nova Futebol Clube) que,

quando detiverem o mando de jogo, se abstenham de comercializar ingressos para a torcida

visitante nos clássicos Goiás x Vila Nova e Vila Nova x Goiás, até que sejam implementadas as

medidas de segurança supramencionadas (catracas biométricas e setorização).

XI – DOS PEDIDOS

Ante o exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS requer:

a) a concessão de tutela antecipada para determinar às entidades organizadoras (CBF e

FGF) que permitam a realização de partidas entre Vila Nova Futebol Clube e Goiás Esporte

Clube apenas com torcida única, até que sejam implementadas medidas eficientes e eficazes

de segurança, tais como implantação de catraca biométrica para identificação dos torcedores e

disponibilização de local específico, isolado e controlado para alocação das torcidas organizadas

(setorização), a serem executadas pela Agência Goiana de Obras e Transportes (AGETOP),

mantenedora do Estádio Serra Dourada.

b) seja cominada às entidades organizadoras (CBF e FGF) multa no valor de R$

1.000.000,00 (um milhão de reais), por jogo realizado em descumprimento da liminar, revertendo-

se os valores ao Fundo Estadual de Proteção e Defesa ao Consumidor - FEDC

c) a concessão de tutela antecipada para determinar aos clubes (Goiás Esporte Clube e

Vila Nova Futebol Clube) que, quando detiverem o mando de jogo, se abstenham de

comercializar ingressos para a torcida visitante nos clássicos Goiás x Vila Nova e Vila Nova x

Goiás, até que sejam implementadas as medidas de segurança supramencionadas (catracas

biométricas e setorização) no Estádio Serra Dourada.

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d) seja cominada aos clubes (Goiás Esporte Clube e Vila Nova Futebol Clube) multa no

valor de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), por jogo realizado em descumprimento da liminar,

revertendo-se os valores ao Fundo Estadual de Proteção e Defesa ao Consumidor – FEDC

e) a confirmação da tutela antecipada para CONDENAR as entidades organizadoras (CBF

e FGF) em obrigação de fazer consistente em permitir a realização de partidas entre Vila Nova

Futebol Clube e Goiás Esporte Clube apenas com torcida única, até que sejam

implementadas medidas eficientes e eficazes de segurança, tais como implantação de catraca

biométrica para identificação dos torcedores e disponibilização de local específico, isolado e

controlado para alocação das torcidas organizadas (setorização), a serem executadas pela

Agência Goiana de Obras e Transportes (AGETOP), mantenedora do Estádio Serra Dourada.

f) a confirmação da tutela antecipada para CONDENAR os clubes (Goiás Esporte Clube e

Vila Nova Futebol Clube) em obrigação de não-fazer consistente em se abster de comercializar

ingressos para a torcida visitante nos clássicos Goiás x Vila Nova e Vila Nova x Goiás, (quando

mandante da partida) até que sejam implementadas as medidas de segurança supramencionadas

(catracas biométricas e setorização) no Estádio Serra Dourada.

g) a CONDENAÇÃO da Agência Goiana de Trasportes e Obras - AGETOP em obrigação

de fazer consistente em garantir condições de segurança, para realização dos jogos Goiás x Vila

Nova e Vila Nova x Goiás, no Estádio Serra Dourada, através da implantação de catraca

biométrica para identificação dos torcedores e disponibilização de local específico, isolado e

controlado para alocação das torcidas organizadas (Setorização);

h) a CONDENAÇÃO genérica da CBF e do Goiás Esporte Clube (detentor do mando de

jogo) para ressarcir os danos materiais e morais sofridos pelos torcedores presentes na partida

realizada em 24.06.2017, nos termos do artigo 95 do Código de Defesa do Consumidor;

i) a CONDENAÇÃO da CBF e do Goiás Esporte Clube em danos morais coletivos (e/ou

danos sociais) no valor de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) ocasionados na partida realizada

em 24.06.2017;

j) a citação dos réus para que, caso desejem, apresentem resposta ao pedido ora

interposto, sob pena de revelia;

k) a designação de audiência de conciliação prevista no art. 319,VII do CPC;

l) a comunicação pessoal dos atos processuais, nos termos do art. 41, inciso IV, da Lei nº

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8.625/93, 180 e 183, §1º do Código de Processo Civil;

m) a isenção de custas e emolumentos, nos termos do art. 4º, inciso III, da Lei 9.289, de 04

de julho de 1996, e artigo 18 da Lei 7.347/85;

n) a condenação dos réus ao pagamento das custas e emolumentos, bem como o ônus da

sucumbência.

Protesta provar os fatos alegados por meio de todas as provas admitidas em direito, em

especial, prova documental, pericial, testemunhal e inspeção judicial.

Dá-se à causa o valor de R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais), para os fins

do art. 319, inciso V, do CPC.

Goiânia/GO, 15 de setembro de 2017.

MARÍSIA SOBRAL COSTA MASSIEUX Promotora de Justiça

70ª Promotoria de Justiça

SANDRO HENRIQUE SILVA HALFELDBARROS

Promotor de Justiça Coordenador do GFUT

DIEGO OSÓRIO DA SILVA CORDEIRO Promotor de JustiçaMembro do GFUT

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