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209 Cadernos do Ministério Público do Estado do Ceará Thiago Freitas Camelo 1 Ao dispor sobre as funções institucionais do órgão ministerial em seu artigo 129, a Constituição Federal de 1988 não tratou de maneira expressa sobre a possibilidade do poder investigatório do Ministério Público, o que gerou um conflito de opiniões. De outro lado, no artigo 144, a Carta Política atribuiu, textualmente, à Polícia Judiciária (Polícias Federal e Civil) a apuração de infrações penais, ensejando uma controvérsia acerca de um possível monopólio po- licial das investigações criminais. Embora atualmente pacificado no âmbito dos Tribunais o debate acerca da possibilidade da investiga- ção criminal pelo Ministério Público, o tema ainda é controverso no campo doutrinário, sendo relevantes o conhecimento e a análise dos argumentos contrários e favoráveis, bem como dos principais julga- mentos do Supremo Tribunal Federal a respeito do assunto. Dentro desse contexto, o presente trabalho procura analisar a temática dos poderes investigatórios do Ministério Público, especificamente no campo criminal. Em um primeiro momento, discorre-se acerca da investigação criminal promovida pela Polícia Judiciária por meio do inquérito policial, abordando-se as principais críticas a seu respeito. Em seguida, são abordados e analisados criticamente os principais argumentos contrários à investigação conduzida pelo Ministério Público, bem como apresentadas as suas vantagens. Ao final, é rea- lizada uma exposição da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sobre o tema, fazendo um retrospecto dos julgados mais importantes relacionados ao assunto até a consolidação da tese favorável aos poderes investigatórios do Ministério Público. Após a análise da 1 Membro do Ministério Público do Estado do Ceará. Especialista em Direito Processual Civil. O Ministério Público na Investigação Criminal

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Cadernos do Ministério Público do Estado do Ceará

Thiago Freitas Camelo1

Ao dispor sobre as funções institucionais do órgão ministerial

em seu artigo 129, a Constituição Federal de 1988 não tratou de

maneira expressa sobre a possibilidade do poder investigatório do

Ministério Público, o que gerou um conflito de opiniões. De outro

lado, no artigo 144, a Carta Política atribuiu, textualmente, à Polícia

Judiciária (Polícias Federal e Civil) a apuração de infrações penais,

ensejando uma controvérsia acerca de um possível monopólio po-

licial das investigações criminais. Embora atualmente pacificado no

âmbito dos Tribunais o debate acerca da possibilidade da investiga-

ção criminal pelo Ministério Público, o tema ainda é controverso no

campo doutrinário, sendo relevantes o conhecimento e a análise dos

argumentos contrários e favoráveis, bem como dos principais julga-

mentos do Supremo Tribunal Federal a respeito do assunto. Dentro

desse contexto, o presente trabalho procura analisar a temática dos

poderes investigatórios do Ministério Público, especificamente no

campo criminal. Em um primeiro momento, discorre-se acerca da

investigação criminal promovida pela Polícia Judiciária por meio do

inquérito policial, abordando-se as principais críticas a seu respeito.

Em seguida, são abordados e analisados criticamente os principais

argumentos contrários à investigação conduzida pelo Ministério

Público, bem como apresentadas as suas vantagens. Ao final, é rea-

lizada uma exposição da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal

sobre o tema, fazendo um retrospecto dos julgados mais importantes

relacionados ao assunto até a consolidação da tese favorável aos

poderes investigatórios do Ministério Público. Após a análise da

1 Membro do Ministério Público do Estado do Ceará. Especialista em Direito Processual Civil.

O Ministério Público na Investigação Criminal

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matéria, conclui-se pela possibilidade do Ministério Público condu-

zir, por autoridade própria, a investigação criminal, ressaltando-se,

no entanto, a necessidade de aprofundamento do debate a respeito

do tema, de modo a firmar em definitivo o seu papel na persecução

penal. Para o alcance do fim pretendido neste trabalho foi realizada

pesquisa doutrinária e documental, conferindo-se, ainda, enfoque à

jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sobre o tema.

Palavras Chave: Ministério Público. Investigação criminal. Ar-

gumentos contrários. Argumentos favoráveis. Jurisprudência.

SUMÁRIO: 1 – INTRODUÇÃO. 2 - A INVESTIGAÇÃO CRIMINAL

NO BRASIL. 3 - A INVESTIGAÇÃO PRELIMINAR PELO MINISTÉRIO

PÚBLICO. 4 - A POLÊMICA PERANTE O SUPREMO TRIBUNAL FEDE-

RAL. 5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

1 INTRODUÇÃO

A Constituição Federal de 1988 atribuiu ao Ministério Público pa-

pel essencial na defesa do regime democrático, da ordem jurídica e

dos interesses sociais e individuais indisponíveis (artigo 127, caput).

(BRASIL, 1988).

Como instrumento para o fiel cumprimento desta missão, a Carta

Magna conferiu ao Ministério Público uma série de funções institu-

cionais, elencadas nos diversos incisos do artigo 129. No entanto, ao

dispor sobre estas funções, a Constituição Federal não foi explícita

quanto à possibilidade desse Órgão promover diretamente as inves-

tigações de natureza criminal. (BRASIL, 1988).

Somado a isto, a Carta de 1988, ao tratar da segurança pública em

seu artigo 144, conferiu explicitamente à Polícia Judiciária a apuração

das infrações penais (§1º, inciso I e §4º).

A partir da interpretação do sentido e extensão destes artigos sur-

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giram opiniões (doutrinárias e jurisprudenciais) bastante divergentes

sobre os poderes investigatórios do Ministério Público.

Com a recente decisão do Supremo Tribunal Federal que, em sede

de repercussão geral (RE 593.727/MG), entendeu que o Ministério

Público dispõe de competência para promover, por autoridade pró-

pria, investigações de natureza penal, a cizânia em torno do tema

restou, por ora, solucionada. (BRASIL, 2015).

Não obstante, é necessário manter acesos os debates e as refle-

xões a respeito do assunto, sobretudo diante das investidas legisla-

tivas que visam suprimir as atribuições ministeriais, a exemplo do

que ocorreu com a malsinada PEC 37. (BRASIL, 2011).

Assim, o presente trabalho tem como objetivo analisar a legitimi-

dade do poder investigatório criminal do Ministério Público.

No segundo capítulo, serão feitas considerações acerca do modelo

tradicional de investigação no Brasil, promovida pela Polícia Judici-

ária, abordando-se as principais críticas a seu respeito.

O terceiro capítulo versará sobre a possibilidade de o Ministério

Público promover diretamente investigações criminais, apresentan-

do-se os principais argumentos contrários ao poder investigativo,

oportunidade em que estes serão analisados criticamente, sendo,

ao final, apresentadas as principais vantagens da investigação con-

duzida pelo Parquet.

No quarto capítulo, serão trazidos os principais julgamentos do

Supremo Tribunal Federal a respeito do tema em alusão até a re-

cente decisão proferida no julgamento do Recurso Extraordinário nº

593.727/MG, que findou por reconhecer os poderes investigatórios

do Ministério Público.

O presente trabalho foi desenvolvido a partir de pesquisa do tipo

bibliográfica, procurando explicar o tema mediante análise da litera-

tura já publicada em forma de livros, revistas e publicações avulsas

envolvendo o tema.

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2 A INVESTIGAÇÃO CRIMINAL NO BRASIL

Praticado um delito, surge para o Estado o poder dever de apurar

sua autoria e materialidade, a fim de aplicar ao agente a sanção penal

correspondente, após um processo no qual lhe sejam assegurados

os direitos ao contraditório e à ampla defesa.

A provocação do Estado-Juiz com o fim de aplicar essa sanção

ao infrator é realizada por meio da ação penal, a qual poderá ser de

iniciativa pública ou privada.

O artigo 129, inciso I, da Constituição Federal, confere ao Mi-

nistério Público a titularidade da ação penal pública e, de forma

excepcional, ao particular, no caso de inércia do órgão acusador

(artigo 5º, inciso LIX).

A conjugação dos dois dispositivos normativos acima mencio-

nados e o fato de que ao Poder Judiciário não foi atribuída atividade

investigativa permitem afirmar que o modelo processual penal ado-

tado no Brasil é o acusatório.

Outros dispositivos constitucionais também refletem a opção por

esse modelo, como, por exemplo, incisos XXXVII e LIII do artigo 5º,

que consagram o princípio do juiz natural, o inciso LV, que assegura

o contraditório e a ampla defesa, e o LVII, que contempla a garantia

da presunção de inocência do acusado.

O modelo acusatório caracteriza-se pela distribuição entre sujeitos

processuais distintos das funções de acusar, defender e julgar. Ao

sujeito legitimado para a acusação, cumpre deduzir a pretensão em

juízo, imputando a alguém a prática de uma conduta criminosa; ao

acusado toca o direito de, pessoalmente ou por meio de um terceiro

habilitado, defender-se dessa acusação; ao Juiz cumpre a tarefa de

julgar o caso, avaliando, em posição equidistante dos demais sujeitos,

os argumentos e as provas apresentadas pelas partes. Disso decorre

que cabe ao órgão de acusação tanto a gestão da prova quanto o

ônus da sua produção.

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Tem-se, assim, que para o desencadeamento da ação penal é

necessário que o seu titular apresente, juntamente com a acusação,

elementos que permitam o Judiciário decidir por sua admissibilidade.

Sendo necessárias a produção e a colheita de elementos a fim de

subsidiar a propositura da ação penal por seus titulares, a Constituição

Federal estabeleceu como uma das funções das polícias federal e civis

a “apuração de infrações penais” (artigo 144, § 1º, inciso I, e § 4º).

Na esteira do referido dispositivo constitucional, o artigo 4º, caput,

do Código de Processo Penal preconiza que “a polícia judiciária será

exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas

circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da

sua autoria”. (BRASIL, 1941).

O instrumento tradicionalmente utilizado pela Polícia Judiciária

para o cumprimento dessa atividade de cunho investigativo é o

inquérito policial, cuja atribuição é conferida à autoridade policial.

Nesse procedimento, a autoridade policial é quem preside as

investigações, coordenando os trabalhos e definindo os rumos a

serem tomados para o desfecho do trabalho de apuração da autoria

e materialidade do crime.

O Ministério Público, por outro lado, se distancia da captação

do material probatório, sendo mínima sua intervenção no trabalho

da polícia, restrita à requisição de instauração do inquérito policial

(artigo 129, VIII da Constituição Federal c/c artigo 26, IV, da Lei nº

8.625/93 e artigo 7º, II, da Lei Complementar nº 75/93) e de realização

de diligências ou ao acompanhamento das investigações (artigo 13,

II, do Código de Processo Penal c/c artigo 26, IV, da Lei nº 8.625/93

e artigo 7º, II, da Lei Complementar nº 75/93).

Assim, a presença do membro do Parquet se revela meramente

acessória, posto que o órgão encarregado de dirigir o inquérito po-

licial é a Polícia Judiciária.

Esse modelo de investigação, marcado pelo distanciamento do

Ministério Público em relação aos fatos investigados, tem se re-

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velado incapaz de cumprir uma das suas finalidades, qual seja, a

rápida apresentação dos elementos para a opinio delicti ou para o

arquivamento do feito.

Além desta, diversas outras desvantagens são apontadas pela

doutrina contra o atual modelo de investigação policial, denotando

a necessidade de mudança, sobretudo com o aprofundamento da

participação do Ministério Público nessa fase preliminar.

2.1 As desvantagens do sistema

atual de investigação pela Polícia

A insatisfação com o inquérito policial não é novidade no meio

jurídico. Aury Lopes Jr. e Ricardo Jacobsen Gloeckner noticiam que:

já em 1924, o presidente da Comissão redatora do antepro-jeto que se converteu no Código de Processo Penal para o Distrito Federal, Candido Mendes, informava da preocupa-ção com a fase preliminar e da necessidade de restringir as funções da polícia aos seus verdadeiros fins: a vigilância, a prevenção, a manutenção da ordem e auxílio à Justiça. Esse auxílio, porém, deve começar pelo aviso imediato às autoridades judiciárias sempre que houver notícia de algu-ma infração [...]. (LOPES JR; GLOECKNER, 2014, p. 399-400).

Continuam os mencionados autores:

Inclusive, já naquela época, preponderava a opinião favorá-vel a reduzir ao mínimo a atuação da polícia, acentuando-se bem expressamente a intenção de estimular o Ministério Público a intervir, desde os primeiros momentos, na marcha das pesquisas policiais, atendendo-se a que devem os atos da polícia, sem efeito judiciário, servir apenas para o escla-recimento do representante da Justiça Pública. Dizia Candi-do Mendes que a solução ao final adotada, que nem sequer aceitou a orientação do projeto da Comissão, procurou um meio-termo que, sem resolver de todo o problema, diminu-ísse os deletérios inquéritos policiais tardos e inadequados, como o seu misto de atos definitivos e transitórios, alguns com efeitos judiciários absolutos, como os autos de prisão em flagrante e de exame de corpo de delito e prestação de

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fiança, entre outros como as declarações de informantes, sem nenhum efeito probatório judiciário, mas influindo na convicção de juízes e tribunais. Frise-se que, passados mais de 70 anos, essa crítica é perfeitamente aplicável ao sistema. (LOPES JR; GLOECKNER, 2014, p. 399-400).

As censuras ao atual sistema de investigação policial ainda persistem, sendo as mais corriqueiras relacionadas à falta de cor-respondência entre as necessidades de quem vai acusar e as inves-tigações realizadas pela polícia, bem como à demora excessiva das investigações, que, por vezes, se mostram incompletas, demandando a realização de novas diligências e, consequentemente, acarretando prejuízo à celeridade e à eficácia da persecução.

Outra crítica recorrente ao modelo reside na falta de indepen-dência funcional das autoridades policiais, o que as tornam mais suscetíveis a pressões e desmandos de governantes do momento. Ao lado disso, por atuarem na linha de frente do combate ao crime, as autoridades policiais também ficam sujeitas às pressões da imprensa e de diversos outros entes sociais.

A esse respeito, Aury Lopes Jr. e Ricardo Jacobsen Gloeckner ponderam:

A justaposição da polícia num interregno em que recaem expectativas sociais de redução da criminalidade e na obtenção de informações sobre o crime, prejudica o es-clarecimento do delito. Em um primeiro momento, pela conspurcação daquele ideal simbólico com as pressões externas que acabam exigindo uma resposta rápida e pronta sobre a autoria e materialidade do crime. Em um segundo momento, com a ausência do devido distanciamento a ser exercido pelo investigador, que não está obrigado a apon-tar um delinquente a qualquer preço, como muitas vezes ocorre. (LOPES JR; GLOECKNER, 2014, p. 131).

Disto resultam duas graves desvantagens da investigação policial:

a possibilidade de ser usada como instrumento de perseguição políti-

ca e as graves injustiças cometidas no afã de solucionar rapidamente

os casos de maior repercussão nos meios de comunicação.

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Todos esses problemas conduzem à reduzida confiabilidade do

material produzido pela polícia, muitas vezes não servindo como

elemento de prova na fase processual, o que tem levado a um con-

senso sobre a crise do inquérito policial.

A despeito de todas essas desvantagens, veio à tona a Proposta

de Emenda à Constituição nº 37 (PEC 37), que tinha por escopo alte-

rar a redação do artigo 144 da Constituição Federal, acrescentando

o parágrafo décimo, com o seguinte enunciado: “A apuração das

infrações penais de que tratam os §§1º e 4º deste artigo, incubem

privativamente às polícias federal e civis dos Estados e do Distrito

Federal, respectivamente”. (BRASIL, 2011).

Com isso, tentava-se excluir das atribuições do Ministério Público

a possibilidade de conduzir diretamente investigações, através da

monopolização da atividade âmbito da Polícia Judiciária.

O projeto, no entanto, foi alvo constante das manifestações po-

pulares ocorridas em junho de 2013, sendo finalmente rejeitada pela

Câmara dos Deputados em 25 de junho de 2013.

A elevada rejeição da sociedade ao referido projeto denota a

descrença na capacidade da Polícia Judiciária de apurar efetiva-

mente todos os delitos cometidos, ao mesmo tempo em que revela

a confiança popular na atuação investigativa do Ministério Público.

3 A INVESTIGAÇÃO PRELIMINAR

PELO MINISTÉRIO PÚBLICO NO BRASIL

Paralelamente à defasagem do modelo tradicional de investigação

criminal (inquérito policial), houve uma ascensão do prestígio do Mi-

nistério Público, que, diante do novo perfil que lhe foi conferido pela

Constituição de 1988, passou a realizar, gradualmente, investigações

pelo País, possibilitando que fossem levadas a juízo e eventualmente

condenadas pessoas antes intocadas pelo processo penal.

Foi nesse cenário que começou a ganhar notabilidade a discus-

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são acerca da constitucionalidade das investigações dirigidas pelo

Ministério Público.

Diante disso, o presente capítulo se propõe a elencar e analisar

criticamente os argumentos contrários à possibilidade de investi-

gação criminal pelo Ministério Público, sendo, ao final, expostas as

principais vantagens da investigação criminal pelo Parquet.

3.1 Análise dos principais argumentos

contrários à investigação pelo Ministério Público

Aqueles que adotam entendimento contrário à possibilidade de

o Ministério Público promover procedimentos administrativos in-

vestigatórios aduzem, em síntese, que: a) a atividade investigativa,

consoante o artigo 144, § 1º, IV, e § 4º, da Constituição Federal, é

exclusiva da polícia judiciária; b) a investigação procedida pelo Par-

quet viola o sistema acusatório; c) a condução de investigações se

mostra incompatível com a imparcialidade que deve nortear a atua-

ção do membro do Ministério Público; d) a tendência do promotor de

justiça de colher as provas que somente interessem à acusação; e) a

investigação procedida pelo Parquet promove um desequilíbrio entre

acusação e defesa; f) a inexistência de previsão legal de instrumento

hábil a permitir e demarcar os limites das investigações; g) o Parquet

tem o poder de requisitar diligências ou a instauração de inquéritos

policiais, mas jamais de presidi-los, nos termos do art. 129, III, da CF.

Tecendo críticas às investigações promovidas pelo Ministério

Público, Rogério Lauria Tucci expõe:

É de ser anotada, a tal propósito, desde logo, a asserção de que o poder investigatório seria concedido, ao Ministério Público, pela própria Constituição Federal, nos incs. I, VI, VIII e IX do art. 129; e, portanto, seria um contra-senso negá-lo ao titular da ação penal, encarregado de formar a opinio delicti e promover em juízo a defesa do ius puniendi do Estado. Acresce, nesse particular, ao que já foi expla-

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nado, em sentido oposto, que, sobre inexistir, na realida-de, essa pretendida concessão, o fato de ser o Ministério Público titular da ação, na defesa do interesse punitivo estatal, mostra-se, ele próprio, inibidor da sua atuação investigatória, posto que, como logo acima ressaltado, ma-nifestamente interessado na colheita de prova desfavorável ao investigado, e, reflexivamente, desinteressado da que lhe possa beneficiar. Dúvida alguma pode haver acerca dessa realidade, de sorte a restar ilusório o alvitre de uma inves-tigação escorreita, pelo órgão ministerial, assim orientado, por amor à obra então realizada, a um desfecho exitoso do procedimento inquisitorial a seu cargo. Ademais, o fato de ser possível a verificação da prática de infração penal, em autos de inquérito civil, a cargo do Ministério Público, não obsta a que, com os elementos eventualmente colhidos, se proceda, em seqüência, à apuração regular da mate-rialidade do fato e respectiva autoria: até mesmo o órgão jurisdicional, por força do disposto no art. 40 do CPP, ao in-vés de proceder, diretamente, a investigação, deve remeter os respectivos autos ou papéis ao Ministério Público, para que este, se for o caso, requisite a instauração de inquérito policial. De outra banda, e como, igualmente, salientado, as outras espécies de investigação, que não a policial, em voga, ostentam respaldo constitucional inquestionável, determinante da atribuição deferida a outras autoridades, tanto administrativas, como dos Poderes Judiciário e Legis-lativo. E nem se venha dizer, por fim, que a negação desse tão almejado poder ministerial importaria em sobrelevação das atribuições conferidas à Polícia Judiciária, cuja atuação estaria comprometida em variadas circunstâncias, e. g. em relação à apuração de infrações penais cometidas por agentes policiais. Tendo-se, necessariamente, presente que as autoridades policiais, assim como os membros do Ministério Público, atuam, normalmente, com zelo e dili-gência, bem é de ver que a repartição das atribuições esta-belecidas para os agentes da persecução penal, presta-se à determinação dos lindes das respectivas atuações, ambas igualmente importantes e necessariamente conjugadas, em prol do resultado visado pelo legislador constituinte, ao diversificá-las. (TUCCI, 2004, p. 85-86).

Guilherme de Souza Nucci acresce:

O problema é que sob nenhum prisma, de que examine a matéria, mostra-se adequada a atribuição de poderes investigatórios penais ao órgão ministerial. Não é, como

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pretendem alguns, o argumento histórico ou a tradição que determinam essa conclusão. Sob o aspecto jurídico, as interpretações sistemáticas, lógica e, até mesmo, gramatical do art. 129 da Constituição Federal não permitem extrair outra conclusão exceto aquela de que o Ministério Público não possui poderes para a investigação criminal. O texto é claro e expresso ao indicar, como função institucional ministerial, a promoção da ação penal pública, do inquérito civil e da ação civil pública. Quanto ao inquérito policial, limita-se a atribuir ao Ministério Público a requisição de sua instauração. Nesse particular, não tem lugar a regra de hermenêutica dos poderes implícitos. In claris non fit inter-pretatio. Além disso, a função de apurar as infrações penais foi expressamente atribuída no próprio texto constitucional às polícias civis e à polícia federal, no art. 144. É certo que a investigação não constitui monopólio da Polícia Judiciária, mas não é menos correto que o deslocamento dela para outros órgãos somente ocorre diante de expressa previsão constitucional e/ou legal, em hipóteses absolutamente excepcionais (v.g., as Comissões Parlamentares de Inqué-rito, a investigação, pela autoridade judiciária, de delitos praticados por membros da Magistratura). Examinando-se a Constituição Federal, verifica-se que a exclusão da inves-tigação criminal das funções ministeriais foi deliberada e proposital: por meio dela, mantém-se o imprescindível equi-líbrio com as demais instituições envolvidas na apuração das infrações penais: a Polícia Judiciária, o Poder Judiciário e a Advocacia. (NUCCI, 2004)

Definidas as principais críticas ao poder investigatório do Ministé-rio Público, passa-se a analisá-las, individualmente, nos itens a seguir.

3.1.1 A questão da exclusividade da investigação criminal

A tese contrária à investigação criminal conduzida pelo Ministério Público fundamenta-se, essencialmente, na suposta exclusividade desta atividade pela Polícia Judiciária, conclusão extraída da leitura do artigo 144, §1º, inciso IV, da Constituição Federal.

Eis o teor do dispositivo constitucional:

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação

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da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:I - polícia federal;II - polícia rodoviária federal;III - polícia ferroviária federal;IV - polícias civis;V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.§ 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão perma-nente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a:I - apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei;II - prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho, sem prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos públicos nas respec-tivas áreas de competência;III - exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras;IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União. (BRASIL, 1988, grifo incluído).

Infere-se da leitura do texto normativo que o Constituinte estabe-

leceu uma distinção entre as funções de apuração de crimes e polícia

judiciária, tanto que cuidou de cada uma delas em incisos diversos,o

que se fez somente para reservar à Polícia Federal o exercício exclu-

sivo das funções de polícia judiciária da União.

Em relação à Polícia Civil, esta diferenciação também se manifesta

no §4º do artigo 144, da Constituição Federal, que tratou de forma

separada cada uma das funções, sem, no entanto, fazer nenhuma

referência à exclusividade das funções de polícia judiciária e de apu-

ração de infrações penais.

O mencionado dispositivo estatui: § 4º Às polícias civis, diri-

gidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada

a competência da União, as funções de polícia judiciária e a

apuração de infrações penais, exceto as militares. (BRASIL,

1988, grifo incluído).

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Percebe-se que há uma distinção no texto entre as funções de

apuração de crimes e polícia judiciária, reforçada pelo emprego da

conjunção aditiva e. Com efeito, “por uma questão de coerência sis-

têmica, a Constituição não poderia repetir, num mesmo inciso, duas

expressões sinônimas (investigação criminal e polícia judiciária)”.

(CALABRICH, 2013, p. 804).

Dissociada da apuração de infrações penais, a função de polícia

judiciária compreende a colaboração das forças policiais com o Poder

Judiciário no curso do procedimento penal, abrangendo o suporte

material e humano necessário para a realização de determinados

atos ou para o cumprimento de decisões judiciais.

Essa distinção entre as funções de investigação criminal e de

polícia judiciária é bem ilustrada em decisão do Superior Tribunal

de Justiça, de relatoria do Ministro Hamilton Carvalhido, da qual se

extrai o seguinte trecho:

RECURSO ESPECIAL. LESÃO CORPORAL SEGUIDA DE MORTE. DESCLASSIFICAÇÃO. HOMICÍDIO CULPOSO. ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL. ARTIGO 284 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. NORMA DE EXCEÇÃO. PODER INVESTIGATÓRIO DO MINISTÉRIO PÚBLICO.[…] Não é, portanto, da índole do direito penal a feudali-zação da investigação criminal na Polícia e a sua exclusão do Ministério Público. Tal poder investigatório, indepen-dentemente de regra expressa específica, é manifestação da própria natureza do direito penal, da qual não se pode dissociar a da instituição do Ministério Público, titular da ação penal pública, a quem foi instrumentalmente ordenada a Polícia na apuração das infrações penais, ambos sob o controle externo do Poder Judiciário, em obséquio do inte-resse social e da proteção dos direitos da pessoa humana. Em nossa compreensão, é esse o sistema de direito vigente. Diversamente do que se tem procurado sustentar, como re-sulta da letra de seu artigo 144, a Constituição da República não fez da investigação criminal uma função exclusiva da Polícia, restringindo-se, como se restringiu, tão-somente a fazer exclusivo da Polícia Federal o exercício da função de polícia judiciária da União (parágrafo 1º, inciso IV). Essa função de polícia judiciária – qual seja, a de auxiliar do Poder Judiciário –, não se identifica com a função

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investigatória, qual seja, a de apurar infrações penais, bem distinguidas no verbo constitucional, como ex-surge, entre outras disposições, do preceituado no parágrafo 4º do artigo 144 da Constituição Federal, verbis: “§ 4º às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.” Tal norma constitu-cional, por fim, define, é certo, as funções das polícias civis, mas sem estabelecer qualquer cláusula de exclusividade. [...] (grifo acrescido). (BRASIL, 2003)

Tal diferenciação tem reflexos evidentes para o tema em apreço,

uma vez que a exclusividade, como já afirmado, foi mencionada

apenas no inciso IV, relativo às funções de polícia judiciária, e não

no inciso I, que trata da apuração de infrações penais.

Assim, demonstrada a distinção entre as aludidas funções, não

é possível inferir da regra prevista no artigo 144, §1°, inciso I, da

Constituição Federal, a existência de monopólio da investigação, mas

tão somente que as polícias civis não podem atuar na esfera federal.

Em outras palavras: a exclusividade das funções de polícia judiciária

atribuída à polícia federal se dá apenas em relação a outros órgãos

policiais, e não em prejuízo dos demais mecanismos de apuração

de infrações penais.

Reforça esse entendimento o fato da expressão com exclusividade

figurar apenas no parágrafo referente à Polícia Federal, não se repe-

tindo no §4°, que trata das Polícias Civis. Com efeito, não há sentido

em conferir exclusividade das investigações na esfera federal e negá-

-la no âmbito estadual, sob pena de violar o princípio federativo da

simetria das formas.

Nesse sentido é a lição de Lenio Streck e Luciano Feldens:

Logicamente, ao referir-se à “exclusividade” da Polícia Fe-deral para exercer funções “de polícia judiciária da União”, o que fez a Constituição foi, tão-somente, delimitar as atribuições entre as diversas polícias (federal, rodoviária, ferroviária, civil e militar), razão pela qual observou, para

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cada uma delas, um parágrafo dentro do mesmo art. 144. (STRECK; FELDENS, 2005, p. 92-93).

Dentro desse contexto, é imperioso reconhecer que não há, no

Brasil, exclusividade constitucionalmente garantida aos órgãos que

exercem função de polícia judiciária para a apuração de infrações

criminais.

Tal ilação também é extraída do artigo 58, §3º, do texto constitu-

cional, ao delimitar o poder investigatório das comissões parlamen-

tares de inquérito.

No plano ordinário, esse entendimento é corroborado pelo pa-

rágrafo único do artigo 4º, do Código de Processo Penal, segundo o

qual a competência da polícia judiciária “não excluirá a de autorida-

des administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função”.

(BRASIL, 1941).

Luciano Feldens e Andrei Zenkner Schmidt dão vários exemplos

de investigações conduzidas por órgãos distintos da polícia:

Investigações de outras espécies, levadas a efeito em esfe-ras distintas do ambiente policial, igualmente se habilitam a subsidiar a ulterior ação do Ministério Público. Dessas, formam apenas exemplos: a) as representações oriundas da Receita Federal e do INSS, bem como as comunicações efetuadas pelo Banco Central do Brasil e pelo COAF; b) o próprio inquérito civil público presidido pelo Ministério Público (Lei n° 7.347/85), assim como outras sindicâncias e procedimentos administrativos a seu cargo (art.129, VI, da CF/88); c) os inquéritos elaborados pelas comissões parlamentares de inquérito (art.58, § 3°, da CF/88); d) as sindicâncias administrativas realizadas no âmbito da ad-ministração direta e indireta. Todos esses procedimentos acima referidos, quando aportados ao Ministério Público, podem receber a genérica designação de notitia criminis ou mesmo de peças de informações, que nada mais repre-sentam do que os documentos oferecidos ao Ministério Público – ou por ele próprio obtidos que veiculam infor-mações sobre a prática, em tese, de uma infração penal. (FELDENS;SCHMIDT, 2007, p.57).

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Portanto, o artigo 144, §1º, inciso IV, e §4º não criou uma exclusi-

vidade investigatória para as Polícias Federal e Civil, inclusive porque

quando pretendeu estabelecer exclusividade de competência o legis-

lador constituinte o fez de forma expressa e inequívoca, como, por

exemplo, nos artigos 22, 49 e 51 da Constituição Federal. Ademais,

diante da natureza das funções e dos órgãos em questão, não se deve

adotar uma interpretação restritiva dos dispositivos mencionados. Ao

contrário, deve-se buscar o sentido que se coadune com o interesse

social na reposição da ordem jurídica lesionada pelo delito.

3.1.2 A questão do sistema acusatório

Outro ponto ressaltado pela doutrina aduz que a investigação

procedida pelo Parquet viola o sistema acusatório.

A polêmica em tela, no entanto, decorre de uma analogia equi-

vocada entre o processo penal brasileiro – que adota o sistema

acusatório – e o sistema do juizado de instrução (ou sistema misto)

vigente em muitos países da Europa.

O sistema clássico do juizado de instrução, concebido a partir do

Code d´instruction criminelle de 1808, de Napoleão Bonaparte, esta-

belece uma rígida separação das funções de acusação, instrução e

julgamento, deixando a cargo do promotor ou procurador o papel de

acusar, a cargo de um juiz a instrução (ou investigação) preliminar e

a cargo de outro órgão jurisdicional o julgamento. Nessa estrutura,

portanto, são inconfundíveis as funções de investigação, acusação

e julgamento, de modo que quem investiga não pode acusar nem

julgar, e quem julga não pode investigar ou acusar.

Aqueles que sustentam que a investigação promovida pelo Minis-

tério Público viola o princípio acusatório fazem um equivocado um

paralelo entre o juizado de instrução e o sistema adotado no Brasil,

substituindo a figura do juiz de instrução pela Polícia Judiciária. Desse

modo, as funções seriam assim definidas: a Polícia investiga, o Mi-

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Cadernos do Ministério Público do Estado do Ceará

nistério Público acusa e o juiz julga, não sendo possível a inversão

dessa sistemática.

No entanto, essa analogia se mostra incabível, porquanto a inves-

tigação no juizado de instrução se opera de forma totalmente distinta

daquela realizada no Brasil. Naquele sistema, o órgão incumbido da

instrução pré-processual (ou investigação) é dotado amplos poderes

para a colheita de provas, inclusive jurisdicionais, podendo adotar

medidas que limitem direitos fundamentais, tais como decretação de

medidas cautelares, busca e apreensão etc. É justamente a amplitude

desses poderes que serve de fundamento para separação das funções

de investigar e acusar.

Por sua vez, no Brasil, os poderes dos órgãos de investigação são

mais restritos, limitando-se à colheita de depoimentos, requisições

de documentos e perícias etc., devendo eventuais medidas que im-

pliquem limitações na esfera de direitos individuais serem requeridas

ao Poder Judiciário.

Dito isto, percebe-se que, no sistema misto ou de juizado de

instrução, o fundamento que veda ao órgão acusador o poder in-

vestigatório não se repete no sistema processual adotado no Brasil.

Nesse sentido, colhe-se o magistério de Bruno Calabrich:

Que há de incompatível com o sistema acusatório que o órgão incumbido de acusar possa também investigar? Terminantemente, nada. Nisso se evidencia a confusão de conceitos: a afirmação de que quem investiga não pode acusar faz sentido se se está tratando de um sistema misto, no qual a distribuição de funções é distinta da verificada no sistema acusatório. No sistema misto, a instrução prelimi-nar fica a cargo da autoridade que integra o poder judiciário (de regra, um juiz instrutor) e, nessa qualidade é dotado de amplos poderes para a colheita e produção de provas, inclusive no que diga respeito a limitações na esfera das liberdades individuais. A autoridade policial, e mesmo o Ministério Público (quando não seja este dotado de poderes próprios das autoridades judiciárias), nesse sistema, são órgãos meramente auxiliares das investigações, presididas, repita-se, por uma autoridade dotada de jurisdição. Após encerrada, a instrução preliminar produzida por esse juiz,

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então, é entregue a outro sujeito, legitimado para a defla-gração do processo mediante a formalização da acusação – que será julgada por uma autoridade judiciária diversa daquela responsável pela investigação. Nesse sistema, portanto, quem investiga não pode acusar nem julgar; quem julga não pode investigar nem acusar. (CALABRICH, 2013, p. 816-817)

Compartilhando o mesmo entendimento, Paulo Gustavo Guedes

Fontes ensina:

O princípio europeu da separação das funções de acusação, instrução e julgamento alcança, do ponto de vista orgânico ou subjetivo, as figuras do membro do Ministério Público, do juiz de instrução e do juiz ou juízes que irão efetivamente julgar a causa, condenando ou absolvendo o réu. Não inclui em sua formulação a Polícia Judiciária, cujas funções não são exclusivas, notadamente face ao Ministério Público, que investiga por conta própria ou dirige as atividades da Polícia. A barreira jurídica erguida entre o Ministério Público e os atos do juiz de instrução não se verifica com relação às investigações meramente policiais. Prova disso são os laços orgânicos que em muitos países existem entre as duas instituições, como na França, onde a Polícia Judiciária está subordinada ao Ministério Público, que dirige todas as investigações em que não seja necessária a intervenção do juge d’instruction, levando os seus resultados diretamente aos órgãos de julgamento. (FONTES, 2006, p. 11).

Conclui-se, portanto, que a investigação preliminar pelo órgão

incumbido de formular a acusação mostra-se consentânea com o

sistema adotado pelo processo penal brasileiro.

3.1.3 A questão da imparcialidade

do Ministério Público na investigação

Outro óbice comum entre aqueles que se insurgem contra as

investigações conduzidas pelo Ministério Público atine à impar-

cialidade. Afirmam esses críticos que o Ministério Público deve

manter no processo penal uma postura imparcial, não podendo,

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Cadernos do Ministério Público do Estado do Ceará

a fim de não comprometê-la, participar ou realizar diretamente as

investigações preliminares.

Ocorre que o Ministério Público foi concebido no processo penal

brasileiro como parte, contraditor natural do acusado. Daí porque não

é possível exigir do representante do Parquet a mesma imparcialidade

que é própria do órgão julgador.

Sobre o tema, José Frederico Marques, citado por Paulo Gustavo

Guedes Fontes, afirma:

(…) não há que falar em imparcialidade do Ministério Pú-blico, porque então não haveria necessidade de um juiz para decidir sobre a acusação: existiria, aí, um bis in idem de todo prescindível e inútil. No procedimento acusatório deve o promotor atuar como parte, pois, se assim não for, debilitada estará a função repressiva do Estado. O seu papel, no processo, não é o de defensor do réu, nem o de juiz, e sim o de órgão do interesse punitivo do Estado. (MARQUES, S/D apud FONTES, 2006, p.11).

Na verdade, a imparcialidade que se exige do Ministério Público

está associada à ideia de impessoalidade, ou seja, a desvinculação

de interesses de ordem pessoal, que, se presente no caso concreto,

constitui causa de suspeição ou impedimento do Órgão Ministerial.

Portanto, não se exige do Parquet a mesma imparcialidade aplicável

ao órgão jurisdicional, mas tão somente a ausência de interesse

pessoal no processo em que atua.

Nesse sentido, também são as lições de Aury Lopes Jr. e Ricardo

Jacobsen Gloeckner:

Para compreender os fundamentos teóricos da imparciali-dade do MP, é necessário recorrer às lições de W. Goldsch-midt no seu trabalho sobre o binômio partialidade e parcia-lidade. Como explica o autor, o princípio de imparcialidade denota uma relação entre o motivo de sua atuação e o desejo de dizer a verdade, de atuar com exatidão e resolver conforme a justiça e os critérios de legalidade. Não importa, por outro lado, se na esfera objetiva a atuação é justa e legal. Basta que o ato inspire o desejo de atuar conforme

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a norma e a justiça. Assim, a imparcialidade consiste em colocar entre parênteses todas as considerações subjetivas do agente. A imparcialidade é, na esfera emocional, o que a objetividade é na órbita intelectual. (LOPES JR; GLOECK-NER, 2014, p. 153)

Esse entendimento é pacífico na doutrina e conta, inclusive, com

respaldo do Superior Tribunal de Justiça, consubstanciado no enun-

ciado da Súmula 234, assim redigido: “a participação de membro

do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta o

seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia.”

(BRASIL, 2007).

3.1.4 A questão da tendência acusatória

da investigação pelo Ministério Público

Aspecto também abordado pelos críticos da investigação pro-

movida pelo Parquet está relacionado à ideia de que, nesses casos,

haveria uma tendência do promotor de justiça de colher provas que

somente interessem à acusação.

Na defesa do poder investigatório do Parquet, cumpre argumentar

que a colheita de informações na fase pré-processual é uma atividade

preparatória que tem como escopo servir à formação da opinio delicti

do titular da ação penal, o Ministério Público.

Contudo, a investigação empreendida pelo Parquet não lhe impõe,

previamente, determinada convicção, seja a favor ou contra o inves-

tigado. Isso porque, não obstante ser parte, o Ministério Público tem

como função precípua a defesa da lei e da Constituição, podendo e

devendo promover o arquivamento de um inquérito policial, quando

não verificada justa causa para a denúncia, ou pedir a absolvição de

um acusado, se convencido da sua inocência.

Ademais, não há sentido em creditar à Polícia, em detrimento

do Ministério Público, maior possibilidade de realizar uma investi-

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gação imparcial. Na verdade, essa tendência acusatória se mostra

mais intensa no meio policial, como, acertadamente, afirma Paulo

Gustavo Guedes Lopes:

Tanto quanto o Ministério Público, os membros da Polícia estão funcional e psicologicamente comprometidos com a persecução penal. Pela forma prática como intervêm no sistema, protagonizando a luta por vezes de vida ou morte contra a criminalidade e exercendo a força física legal, no dizer de Max Weber, os policiais estariam até menos incli-nados a reconhecer e respeitar os direitos dos investigados. (FONTES, 2006, p. 11)

Isso ocorre porque há nítida uma confusão entre a política de

segurança pública e a função investigatória. Como consequência, a

autoridade policial é levada, muitas vezes, a obter provas a qualquer

custo e que somente interessem à acusação, com o intuito de reforçar

o sentimento de segurança coletiva.

Nesse sentido, colhem-se as lições de Aury Lopes Jr. e Ricardo

Jacobsen Gloeckner:

Com efeito, a justaposição da polícia num interregno em que recaem expectativas sociais de redução da criminalida-de e na obtenção de informações sobre o crime, prejudica o esclarecimento do delito. Em um primeiro momento, pela conspurcação daquele ideal simbólico com as pressões externas que acabam exigindo uma resposta rápida e pronta sobre a autoria e materialidade do crime. Em um segundo momento, com a ausência do devido distanciamento a ser exercido pelo investigador, que não está obrigado a apon-tar um delinquente a qualquer preço, como muitas vezes ocorre. (LOPES JR; GLOECKNER, 2014, p. 131).

Diversamente, o Ministério Público, além de órgão independente

do Poder Executivo, é dotado de garantias funcionais que o permite

não apenas acusar livre de pressão, mas também deixar de acusar,

quando não houver razão jurídica para tanto.

Não há, portanto, qualquer critério lógico para sustentar uma

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maior tendência acusatória pelo Ministério Público. Ademais, se

a crítica valesse para o Ministério Público, com mais razão valeria

para a polícia.

3.1.5 A questão da “paridade de armas” na investigação

Quanto ao alegado desequilíbrio entre a acusação e a defesa,

sustentam os defensores dessa teoria que a investigação promovida

pelo Ministério Público conferiria um tratamento privilegiado ao órgão

acusador, uma vez que lhe permitiria colher provas e decidir sobre a

sua utilização no processo, conforme melhor lhe convir.

Isso, contudo, não conduz a qualquer desequilíbrio entre a acu-

sação e a defesa, porquanto as provas colhidas na fase investigativa,

para que sirvam a um decreto condenatório, devem, necessariamente,

serem reproduzidas em juízo, sob o crivo do contraditório.

Ademais, a Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso XXXV,

estabelece que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário

lesão ou ameaça a direito” (BRASIL, 1988), de sorte que eventuais

abusos praticados pelo representante do Ministério Público no curso

da investigação estarão sujeitos ao controle jurisdicional.

Como afirmado pelo Ministro Gilmar Mendes em voto proferido

no HC nº 91.613/MG, julgado pela Segunda Turma em 15/05/2012,

“Essa atividade preparatória, consentânea com a responsabilidade

do poder acusatório, não interfere na relação de equilíbrio entre

acusação e defesa, na medida em que não está imune ao controle

judicial simultâneo ou posterior.” (BRASIL, 2012).

Dessa forma, existindo mecanismos eficazes para correção de

eventuais abusos cometidos por membros do Ministério Público,

como, por exemplo, o habeas corpus e o mandado de segurança, não

se afigura razoável tolher, desde logo, a investigação criminal, tão

somente pelo fato de terem sido realizadas pelo Ministério Público.

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Cadernos do Ministério Público do Estado do Ceará

3.1.6 A questão da delimitação do procedimento

investigatório promovido pelo Parquet

No que tange à alegada inexistência de previsão legal de instru-mento hábil a permitir e demarcar os limites das investigações pro-movidas pelo Parquet, tal lacuna veio a ser suprida pela Resolução nº 13, de 02/10/2006, do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP, 2006), que disciplinou, no âmbito do Ministério Público, a instauração e tramitação do procedimento investigatório criminal, fazendo cair por terra tal argumento.

Nos seis capítulos da referida resolução são estabelecidas normas relativas à definição e finalidade do procedimento investigatório a cargo do Ministério Público (artigo 1º), às formalidades atinentes à sua instauração (artigos 3º, 4º e 5º), às providências e diligências a serem adotadas no âmbito do procedimento (artigos 6º e 7º), ao prazo para sua conclusão (artigo 12), à publicidade (artigo 13), ao arquivamento (artigos 15 e 16) e, finalmente, aos direitos e garantias individuais (artigo 17).

Percebe-se, portanto, que o Conselho Nacional do Ministério Pú-blico regulamentou a investigação promovida pelo Ministério Público de maneira semelhante ao inquérito policial (artigo 4º e seguintes do Código de Processo Penal), uniformizando a atuação e o proce-dimento de investigação.

Ademais, mesmo antes do citado ato normativo, o Ministério Público Federal, por meio da Resolução nº 77/2004, já havia regula-mentado o procedimento investigatório criminal instaurado no âm-

bito de suas atribuições, sendo acompanhado por diversos Estados.

3.1.7 A questão da impossibilidade

do Parquet conduzir investigações

O último ponto analisado neste tópico diz respeito à alegação de

que o Parquet tem o poder de requisitar diligências ou a instauração

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de inquéritos policiais, mas jamais de presidi-los, nos termos do art.

129, III, da CF.

Pois bem. O artigo 4º do Código de Processo Penal, inserido no

Título II (“Do Inquérito Policial”), dispõe que “A polícia judiciária será

exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas

circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da

sua autoria”. (BRASIL, 1941).

Como determina o dispositivo e o próprio nome indica, o inquérito

policial é realizado pela polícia judiciária.

Aury Lopes Jr. e Ricardo Jacobsen Gloeckner, criticando o referido

dispositivo, dissertam:

(…) esta foi, desafortunadamente, a opção mantida pelo legislador de 1941, justificada na Exposição de Motivos como o modelo mais adequado à realidade social e jurí-dica daquele momento. Sua manutenção era, segundo o pensamento da época, necessária, atendendo à grandes dimensões territoriais e às dificuldades de transporte. Foi rechaçado o sistema de instrução preliminar judicial, ante a impossibilidade de que o juiz instrutor pudesse atuar de forma rápida nos mais remotos povoados, a grandes dis-tâncias dos centros urbanos, e que às vezes exigiam vários dias de viagem. (LOPES JR; GLOECKNER, 2014, p. 241).

Contudo, o inquérito não é necessariamente policial. Com efeito,

o parágrafo único do artigo 4º, acima mencionado, deixa claro que a

competência da polícia não exclui a de autoridades administrativas,

a quem por lei seja cometida a mesma função. Daí se conclui que as

investigações criminais não são, obrigatoriamente, realizadas em

sede de inquéritos policiais.

A questão que surge é se o Ministério Público estaria possibili-

tado a promover a investigação criminal, uma vez que o artigo 129,

VIII somente o autoriza a requisitar diligências investigatórias e a

instauração de inquérito policial.

Ainda que não haja disposição expressa na Constituição Federal

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autorizando o Ministério Público a conduzir investigações criminais,

a viabilidade dessa atividade é extraída da interpretação dos dispo-

sitivos constitucionais, bem como da legislação infraconstitucional.

O respaldo constitucional do poder investigatório do Ministério

Público encontra-se principalmente nos artigos 127, caput, e 129 da

Carta Magna.

A Constituição Federal, no artigo 129, inciso I, conferiu a titulari-

dade exclusiva da ação penal pública ao Parquet (artigo 129, I). Ora,

se o Ministério Público é o titular da ação penal, também deverá

ele fazer suas próprias investigações, a fim de que possa melhor

exercer essa titularidade e se convencer sobre o oferecimento ou

não da acusação. É ilógico admitir que o promotor de justiça fique

limitado à atividade da polícia judiciária na busca de elementos que

são destinados a formar a sua própria convicção.

Nesse contexto, resulta óbvio que se o legislador atribui ao Minis-

tério Público a titularidade da ação pública (atividade fim), também

deverá conceder-lhe os meios necessários para alcançar de forma

mais efetiva esse fim.

Alexandre de Moraes perfilha o mesmo entendimento, acrescen-

tando, ainda, que o papel principal da investigação é subsidiar as

funções constitucionais do Parquet:

Incorporou-se em nosso ordenamento jurídico, portanto, a pacífica doutrina constitucional norte-americana sobre a teoria dos poderes implícitos – inherent powers –, pela qual no exercício de sua missão constitucional enumera-da, o órgão executivo deveria dispor de todas as funções necessárias, ainda que implícitas, desde que não expres-samente limitadas (Myers v. Estados Unidos – US 272 – 52, 118), consagrando-se, dessa forma, e entre nós aplicável ao Ministério Público, o reconhecimento de competências genéricas implícitas que possibilitem o exercício de sua missão constitucional, apenas sujeitas às proibições e limites estruturais da Constituição Federal. Entre essas competências implícitas, parece-nos que não poderia ser afastado o poder investigatório criminal dos promotores e procuradores, para que, em casos que entenderem ne-

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cessário, produzam as provas necessárias para combater, principalmente, a criminalidade organizada e a corrupção, não nos parecendo razoável, o engessamento do órgão titular da ação penal, que, contrariamente ao histórico da Instituição, teria cerceado seus poderes implícitos es-senciais para o exercício de suas funções constitucionais expressas. (MORAES, 2004, S/P).

No mesmo sentido, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Fe-

deral, em processo de relatoria da Ministra Ellen Gracie (HC 91.661/

PE), à unanimidade, asseverou:

(…) o art. 129, inciso I, da Constituição Federal, atribui ao Parquet a privatividade na promoção da ação penal públi-ca. Do seu turno, o Código de Processo Penal estabelece que o inquérito policial é dispensável, já que o Ministério Público pode embasar seu pedido em peças de informação que concretizem justa causa para a denúncia. Ora, é prin-cípio basilar da hermenêutica constitucional o dos poderes implícitos, segundo o qual, quando a Constituição Federal concede os fins, dá os meios. Se a atividade fim promoção da ação penal pública foi outorgada ao Parquet em foro de privatividade, não se concebe como não lhe oportunizar a colheita de prova para tanto, já que o CPP autoriza que peças de informação embasem a denúncia. (BRASIL, 2009).

Por sua vez, o inciso VI, do artigo 129, da Constituição Federal, quando autoriza o Ministério Público a expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, não limita estes atos aos procedimentos de natureza cível.

Infere-se, portanto, desse dispositivo a outorga constitucional para que o Ministério Público realize investigação de natureza cri-minal, uma vez que essa também é considerada um procedimento administrativo.

Nesse sentido, Valter Foleto Santin, citando Hugo Mazzilli, afirma:

Nos procedimentos administrativos do Ministério Público (art. 129, VI, CF), também se incluem investigações destina-

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Cadernos do Ministério Público do Estado do Ceará

das à coleta direta de elementos de convicção para a opinio delicti, porque se destinados apenas à área cível bastaria o inquérito civil (inciso III) e o poder de requisitar informações e diligências não se exaure na área cível, atingindo também a área destinada a investigações criminais. (MAZZILLI, S/D, apud SANTIN, 2007, p. 273).

Destaque-se, ainda, que o inciso IX do mesmo artigo 129 permite

o Ministério Público exercer outras funções que lhe forem conferidas,

desde compatíveis com a sua finalidade.

Ora, a Constituição Federal, no artigo 127, caput, conferiu ao

Parquet o status de instituição permanente e essencial à função ju-

risdicional do Estado, incumbindo-lhe da defesa da ordem jurídica,

do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indis-

poníveis. Não há dúvidas, portanto, que o exercício da investigação

criminal pelo Ministério Público coaduna-se com as funções cons-

titucionais que lhe foram atribuídas pelo mencionado artigo, uma

vez que a prática delituosa ofende a sociedade, sendo de inegável

interesse social a reparação dos seus efeitos, para restauração da

ordem jurídica violada pelo delito.

A propósito, colhem-se as ponderações de Bruno Calabrich:

A persecução criminal, que abrange tanto a atividade de investigação (pré-processual) quanto a do processo penal acusatório, para o qual o Ministério Público está expressa-mente legitimado, insere-se no escopo de atuação protetiva dos interesses elencados no art. 127 da CF/88. Somente esse singelo argumento – ao nosso ver, o mais enfático – já seria suficiente para demonstrar a compatibilidade da atividade investigatória com o Ministério Público. Para reforçá-lo, tome-se a cristalina dicção do art. 129, inciso IX, da CF/88, segundo o qual é função institucional do Ministério Público “exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade. (CALABRICH, 2013, p. 815).

No plano infraconstitucional também são encontrados fundamen-

tos para a investigação do Ministério Público. A Lei Complementar nº

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75/93 e a Lei nº 8.625/93, especialmente o disposto nos artigos 7º e

8º da primeira e 26 da segunda, preveem diversos atos investigatórios

do Parquet, sem restringi-los ao âmbito civil. Além desses diplomas

normativos, o artigo 201 do Estatuto da Criança e do Adolescente(Lei

nº 8.069/90) e o artigo 74 do Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/03)

estabelecem textualmente a possibilidade do órgão de execução do

Ministério Público instaurar sindicâncias para apurar ilícitos penais.

3.2 As vantagens da investigação pelo Ministério Público

Como já afirmado, é consenso entre os operadores do direito a

existência de uma crise no sistema de investigação policial brasilei-

ro, mais especificamente no inquérito policial. Esta crise decorre,

sobretudo, da ausência de independência das autoridades policiais,

resultando na falta de credibilidade das provas colhidas nessa fase

pré-processual; do fato dessas provas, muitas vezes, não atender a

necessidade do titular da ação penal; e da demora excessiva para a

conclusão dos procedimentos investigativos.

De outro lado, são várias as razões que justificam a investigação

conduzida pelo Ministério Público: a independência funcional dos

seus membros; a melhoria da qualidade do produto da investigação;

e a celeridade na formação da opinio delicti.

Sem dúvida, a mais importante vantagem da investigação pro-

movida pelo Parquet está relacionada à disposição constitucional

que confere aos seus membros independência funcional (artigo

127, §1º). Em razão dessa garantia, ficam os promotores de justiça

salvaguardados de pressões externas, sobretudo de ordem hierár-

quica, diferentemente do que ocorre com as autoridades policiais, as

quais não gozam da mesma independência. Com isso, viabiliza-se a

realização de investigações efetivamente independentes, permitin-

do, inclusive, o alcance de pessoas que, por sua posição dentro de

uma estrutura de governo, não poderiam ser investigadas da mesma

forma pela polícia.

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Cadernos do Ministério Público do Estado do Ceará

Além disso, a imediação, ou seja, o contato direto do Ministério

Público na colheita dos elementos investigatórios, proporciona me-

lhor compreensão dos fatos investigados e contribui para a rápida

formação da opinio delicti do órgão acusador. O contato direto com

a investigação também evita a realização de diligências desnecessá-

rias e que desinteressam à formação da convicção do titular da ação

penal, evitando atrasos no desfecho das investigações e contribuindo

para celeridade e economia processuais. Ademais, contribui para a

melhoria da qualidade dos elementos investigatórios, uma vez que,

sendo o seu destinatário, o promotor de justiça terá condições de

direcionar a investigação, melhor adequando-a a sua necessidade.

4 A POLÊMICA PERANTE O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Com a recente decisão do Supremo Tribunal Federal que, em sede

de repercussão geral (RE 593.727/MG), entendeu que o Ministério

Público dispõe de competência para promover, por autoridade pró-

pria, investigações de natureza penal, a cizânia em torno do tema

restou, por ora, solucionada.

Essa construção jurisprudencial, no entanto, percorreu o longo

e intenso período de debates, marcado por diversas mudanças de

entendimento.

4.1 A evolução histórica dos posicionamentos

De início, com o advento da Constituição Federal de 1988, preva-

leceu nos tribunais pátrios, inclusive no Supremo Tribunal Federal,

a tese que reconhecia ao Ministério Público poderes para conduzir

diretamente investigações criminais.

O julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº

1571, realizado em 20 de março de 1997, revela bem a orientação

então dominante. Naquela oportunidade, o Plenário do STF reconhe-

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ceu a possibilidade de o Ministério Público oferecer, desde logo, a

denúncia, utilizando-se, para isso, dos meios de provas a que tiver

acesso, inclusive daqueles coletados em seus próprios procedimen-

tos. O Relator, Ministro Néri da Silveira, ao proferir o voto condutor,

asseverou que:

Para promover a ação penal pública, o art. 129, I, da Lei Magna da República, pode o MP proceder às averiguações cabíveis, requisitando informações e documentos para instruir seus procedimentos administrativos preparatórios da ação penal (CF, art. 129, VI), requisitando também dili-gências investigatórias e instauração de inquérito policial (art. 129, VIII)”. Complementou, ainda, o Ministro Relator, afirmando que o Ministério Público, “com apoio no art. 129, e seus incisos, da Constituição Federal, poderá proceder, de forma ampla, na pesquisa da verdade, na averiguação dos fatos e na promoção imediata da ação penal pública, sempre que assim entender configurado ilícito, inclusive no plano tributário (BRASIL, 1997)

No ano de 1999, durante o julgamento do Recurso Extraordinário

(RE) nº 233.072-4/RJ, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal voltou

a se debruçar sobre o tema, tendo, contudo, nessa ocasião, adotado

entendimento diverso daquele firmado no julgamento da ADI nº

1571, ao declarar que o Ministério Público “não tem competência

para produzir inquérito penal sob o argumento de que tem a possi-

bilidade de expedir notificações nos procedimentos administrativos”.

(BRASIL, 1999).

O referido julgamento abriu o caminho para outras decisões no

mesmo sentido. No ano de 2003, ao julgar o RHC 81.326/DF, de re-

latoria do Ministro Nelson Jobim, a 2ª Turma do Supremo Tribunal

Federal, novamente acolhendo entendimento restritivo acerca dos

poderes investigatórios do Ministério Público, declarou que “a reali-

zação de diligências investigatórias é atribuição exclusiva da polícia

judiciária” (BRASIL, 2003). A ementa do acórdão proferido no referido

julgamento merece transcrição:

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EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. MINISTÉRIO PÚBLICO. INQUÉRITO ADMINISTRATIVO. NÚCLEO DE INVESTIGAÇÃO CRIMINAL E CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL/DF. PORTARIA. PUBLICIDADE. ATOS DE INVESTIGAÇÃO. INQUIRIÇÃO. ILEGITIMIDADE. 1. PORTARIA. PUBLICIDADE A Portaria que criou o Núcleo de Investigação Criminal e Controle Externo da Atividade Policial no âmbito do Ministério Pú-blico do Distrito Federal, no que tange a publicidade, não foi examinada no STJ. Enfrentar a matéria neste Tribunal ensejaria supressão de instância. Precedentes. 2. INQUIRI-ÇÃO DE AUTORIDADE ADMINISTRATIVA. ILEGITIMIDADE. A Constituição Federal dotou o Ministério Público do poder de requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial (CF, art. 129, VIII). A norma constitucio-nal não contemplou a possibilidade do parquet realizar e presidir inquérito policial. Não cabe, portanto, aos seus membros inquirir diretamente pessoas suspeitas de au-toria de crime. Mas requisitar diligência nesse sentido à autoridade policial. Precedentes. O recorrente é delegado de polícia e, portanto, autoridade administrativa. Seus atos estão sujeitos aos órgãos hierárquicos próprios da Corpo-ração, Chefia de Polícia, Corregedoria. Recurso conhecido e provido. (BRASIL, 2003)

O argumento principal utilizado pela corrente restritiva então

adotada, conforme se observa no voto do Ministro Relator, assenta-

-se na premissa de que “a legitimidade histórica para a condução

do inquérito policial e realização das diligências investigatórias é de

atribuição exclusiva da polícia”. (BRASIL, 2003).

De acordo com importante levantamento histórico realizado

Bruno Calabrich (2013, p. 797-798), de meados de 2003 até o final

do ano de 2006 – período em que ganhou notabilidade a tese da

impossibilidade da investigação criminal pelo Ministério Público – o

palco principal dos debates foi o “caso Remi Trinta”. O Ministério

Público Federal havia oferecido denúncia nos autos do IQN nº 1.968/

DF contra o então Deputado Federal Remi Trinta, pela suposta prática

de estelionato por meio de fraude contra o Sistema Único de Saúde

– SUS. Por sua vez, a defesa do parlamentar impetrou habeas corpus,

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sustentando que a acusação se lastreava em investigação conduzi-

da ilegalmente pelo Ministério Público, uma vez que tal atribuição

cabia, com exclusividade, à polícia. Cinco Ministros já haviam se

pronunciado sobre o tema, sendo três favoráveis ao poder investi-

gatório do Ministério Público (Joaquim Barbosa, Carlos Ayres e Eros

Roberto Grau) e dois contra (Marco Aurélio Mello e Nelson Jobim).

Contudo, o debate a respeito da questão restou frustrado em virtude

do referido parlamentar não ter sido reeleito para o cargo nas eleições

de 2006, resultando na perda do foro por prerrogativa de função e

na consequente remessa dos autos à Justiça Federal do Maranhão.

Afora estes e outros casos concretos não individualizados neste

breve apanhado histórico, o Supremo Tribunal Federal ainda foi

instado a se manifestar acerca dos poderes investigatórios do Minis-

tério Público nas seguintes ações diretas de inconstitucionalidade:

ADI nº 2943-6, ADI nº 3.836, ADI nº 3.806 e ADI 4271-8, ajuizadas,

respectivamente, pelo Partido Liberal, pela Ordem dos Advogados do

Brasil e pela Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (Adepol).

Nenhuma dessas ações foi julgada pelo Suprema Corte e a falta de

pronunciamento definitivo sobre o tema manteve o debate acirrado

por um longo período, até o julgamento do Recurso Extraordinário

(RE) 593.727/MG, que fez cair por terra a tese daqueles advogavam

contra os poderes investigatórios do Ministério Público.

No entanto, antes de adentrar na posição firmada pelo STF

no referido julgamento, se faz necessário uma análise, ainda que

breve, da “tese intermediária” adotada pelo Tribunal em alguns

casos concretos.

4.2 A formação da tese intermediária

O Supremo Tribunal Federal, em alguns julgamentos, passou

a adotar solução intermediária acerca da celeuma envolvendo os

poderes investigatórios do Ministério Público, admitindo a investi-

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gação criminal pelo Parquet em situações específicas, a exemplo de

crimes praticados por policiais, bem como em outros crimes, desde

que houvesse lei expressa estabelecendo tal atribuição específica.

Acerca dos crimes previstos em leis específicas, a Suprema Cor-

te brasileira debruçou-se sobre o tema nos julgamentos do HC nº

82.865/GO, de relatoria do Ministro Nelson Jobim, e no HC 93.224/

SP, de relatoria do Ministro Eros Grau. No primeiro deles, a 2ª Tur-

ma do Supremo Tribunal Federal decidiu que o Ministério Público

detém legitimidade para promover investigação para apurar crimes

previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente, face a existência

de expressa previsão legal nesse sentido (art. 201, inciso VII, da Lei

nº 8.069/90). No segundo julgamento citado, a mesma Turma reco-

nheceu a validade da investigação dirigida pelo Ministério Público

relacionada à conduta criminosa imputada a membro do Parquet,

por haver disposição expressa na Lei Orgânica respectiva (art. 41,

parágrafo único, da Lei nº 8.625/93 e art. 18, parágrafo único da Lei

Complementar nº 75/93) (CALABRICH, 2013, p. 799).

No que diz respeito aos crimes cometidos por policiais, alguns

julgamentos do Supremo Tribunal Federal adotaram entendimento

favorável à condução direta da investigação pelo Ministério Público.

Nesse sentido, cite-se, como exemplos, o HC 93.930/RJ, HC 89.837/

DF e RHC 83.492/RJ. Face a relevância deste último julgamento,

transcreve-se a seguir a ementa do acórdão:

EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM “HABEAS CORPUS”. ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL PREVALECENTE NA SEGUNDA TURMA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. (...) ALEGADA NULIDADE DO PROCESSO PENAL. CRIME DE CORRUP- ÇÃO ATIVA. ENVOLVIMENTO, EM REFERI-DA PRÁTICA DELITUOSA, DE DELEGADOS DE POLÍCIA E DE OUTROS AGENTES POLICIAIS. POSSIBILIDADE DE O MINISTÉRIO PÚBLICO, ESPECIALMENTE EM TAL HI-PÓTESE, FUNDADO EM INVESTIGAÇÃO PENAL POR ELE PRÓPRIO PROMOVIDA, FORMULAR DENÚNCIA CONTRA AGENTES INTEGRANTES DE ORGANISMOS POLICIAIS. VALIDADE JURÍDICA DESSA ATIVIDADE INVESTIGATÓ-

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RIA. CONDENAÇÃO PENAL IMPOSTA A ALGUMAS DAS PESSOAS INVESTIGADAS, INCLUSIVE AO RECORRENTE. LEGITIMIDADE JURÍDICA DO PODER INVESTIGATÓRIO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. MONOPÓLIO CONSTITU-CIONAL DA TITULARIDADE DA AÇÃO PENAL PÚBLICA PELO “PARQUET”. TEORIA DOS PODERES IMPLÍCITOS. CASO “McCULLOCH v. MARYLAND” (1819). MAGISTÉRIO DA DOUTRINA (RUI BARBOSA, JOHN MARSHALL, JOÃO BARBALHO, MARCELLO CAETANO, CASTRO NUNES, OSWALDO TRIGUEIRO, v.g.). OUTORGA, AO MINISTÉRIO PÚBLICO, PELA PRÓPRIA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, DO PODER DE CONTROLE EXTERNO SOBRE A ATIVIDADE POLICIAL. LIMITAÇÕES DE ORDEM JURÍDICA AO PODER INVESTIGATÓRIO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. RECURSO ORDINÁRIO IMPROVIDO. (BRASIL, 2011).

Em seu voto, o relator, Ministro Celso de Mello, reconheceu que

a investigação criminal pode ser conduzida pelo próprio Ministério

Público, porém, de forma excepcional. Por oportuno, transcreve-se

a seguir trecho do mencionado voto:

Reconheço, pois, que se reveste de legitimidade constitu-cional o poder de o Ministério Público, por direito próprio, promover investigações penais, sempre sob a égide do princípio da subsidiariedade, destinadas a permitir, aos membros do “Parquet”, em hipóteses específicas (quando se registrarem, por exemplo, situações de lesão ao patrimô-nio público ou excessos cometidos pelos próprios agentes e organismos policiais, como tortura, abuso de poder, violências arbitrárias, concussão ou corrupção, ou, ainda, nos casos em que se verificar uma intencional omissão da Polícia na apuração de determinados delitos ou se confi-gurar o deliberado intuito da própria corporação policial de frustrar, em função da qualidade da vítima ou condição do suspeito, a adequada apuração de determinadas infrações penais), a possibilidade de coligir dados informativos para o ulterior desempenho, por Promotores e Procuradores, de sua atividade persecutória em juízo penal. (BRASIL, 2011).

No julgamento do HC 91.613/MG, de relatoria do Ministro Gil-

mar Mendes, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal admitiu a

investigação criminal do Ministério Público independentemente da

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existência de uma lei específica que a preveja, mas somente de forma

excepcional e subsidiária. No caso julgado, cuidava-se de um crime

de tráfico de influência praticado por vereador. Confira-se o seguinte

excerto do voto do Ministro Relator:

Porém, convém advertir que o poder de investigar do Ministério Público não pode ser exercido de forma ampla e irrestrita, sem qualquer controle, sob pena de agredir, inevitavelmente, direitos fundamentais. A atividade de investigação, seja ela exercida pela Polícia ou pelo Minis-tério Público, merece, por sua própria natureza, vigilância e controle.Embora não esteja em causa neste habeas corpus, é salu-tar observar que não se justifica a existência de toda uma estrutura de controle para realização de atos investigativos por parte da autoridade policial, sem que se fale em idêntica estrutura e procedimento para investigações conduzidas pelo Ministério Público.Daí, o entendimento de que as investigações realizadas no seio daquela instituição devam ser, necessariamente, subsidiárias, ocorrendo, apenas, quando não for possível, ou recomendável, se efetivem pela própria polícia.Note-se que caberá, sempre, ao Ministério Público, o con-trole externo da atividade policial, o que implica a natural participação do Parquet no controle das investigações realizadas.Nessa linha de argumentação, percebo que só se justifica constitucionalmente o exercício da função investigativa, por quem não possui essa função constitucional precípua, a partir do reconhecimento do aspecto subsidiário dessa atividade.(…)No caso concreto, constata-se situação excepcionalíssima que, a meu ver, justifica a atuação do Ministério Público na coleta das provas que fundamentam a ação penal, tendo em vista a investigação encetada sobre suposto crime cometido pelo paciente, então vereador, o qual se teria utilizado de sua função no Poder Legislativo municipal para facilitar a construção do “Cemitério Parque Portal da Paz”, empreendimento que seria realizado pela empresa Minas Terra Empreendimentos Imobiliários Ltda. Em troca dessa facilitação, teria solicitado o pagamento de R$ 12.000,00 (doze mil reais) — a ser dividido entre o paciente e cinco outros vereadores da Câmara Municipal de Ribeirão das Neves. (BRASIL, 2012)

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Não se pode negar a importância da construção jurisprudencial

do Supremo Tribunal Federal consubstanciada nos julgamentos

acima mencionados, notadamente diante do crescente espaço

no meio jurídico que tomava a tese contrária aos poderes inves-

tigatórios do Ministério Público. A despeito da sua relevância, as

decisões da Corte Suprema não estão imunes a críticas.

Como afirmado em tópico anterior, a base normativa da ati-

vidade investigativa do Ministério Público encontra-se no artigo

129 da Constituição Federal, bem como nos artigos 7º e 8º da Lei

Complementar nº 75/93, artigo 26 da Lei nº 8.625/93 e artigo

47 do Código de Processo Penal, sendo certo que nenhum dos

dispositivos citados restringem a investigação direta do Parquet,

autorizando-a somente quando se tratar de crimes em relação aos

quais há lei expressa estabelecendo essa atribuição ou nos casos

ditos excepcionais.

A Constituição Federal também não dispôs que a polícia judiciá-

ria possua competência exclusiva para investigar, pois o artigo 144,

§1º, I e §4º apenas preveem que a Polícia Federal – e, por simetria,

a Civil – deverá exercer a função de polícia judiciária, apurando

as infrações penais. Essa interpretação é corroborada pelo artigo

4º do Código de Processo Penal, ao estabelecer que a atribuição

para apurar infrações penais não excluirá a de outras autoridades

administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função.

Em síntese, as decisões citadas, embora representem um im-

portante marco na superação da tese contrária aos poderes de

investigação do Ministério Público, ainda são passíveis de críticas,

face as restrições que foram reconhecidas, o que poderia levar a

soluções casuísticas e arbitrárias, seja para reconhecer os poderes

investigativos do Parquet, seja para negá-los.

O fato é que tais problemas restaram solvidos diante da recente

decisão do Supremo Tribunal Federal, que será tratada a seguir.

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4.3 A consolidação do entendimento acerca

dos poderes investigatórios do Ministério Público

Os julgamentos citados no tópico anterior revelam que o Supremo

Tribunal Federal, há algum tempo, vinha adotando posicionamen-

to favorável à possibilidade de investigação direta pelo Ministério

Público, existindo divergência entre os Ministros apenas quanto à

amplitude desta investigação e aos requisitos de sua validade, cizânia

esta que veio a ser pacificada pelo Plenário da Corte no julgamento

definitivo do Recurso Extraordinário nº 593.727/MG, cuja repercussão

geral havia sido reconhecida em agosto de 2009.

O julgamento do mencionado Recurso, ocorrido em 14/05/2015,

foi assim ementado:

Repercussão geral. Recurso extraordinário representativo da controvérsia. Constitucional. Separação dos poderes. Penal e processual penal. Poderes de investigação do Ministério Público. 2. Questão de ordem arguida pelo réu, ora recorrente. Adiamento do julgamento para colheita de parecer do Procurador-Geral da República. Substituição do parecer por sustentação oral, com a concordância do Ministério Público. Indeferimento. Maioria. 3. Questão de ordem levantada pelo Procurador-Geral da República. Pos-sibilidade de o Ministério Público de estado-membro pro-mover sustentação oral no Supremo. O Procurador-Geral da República não dispõe de poder de ingerência na esfera orgânica do Parquet estadual, pois lhe incumbe, unicamen-te, por expressa definição constitucional (art. 128, § 1º), a Chefia do Ministério Público da União. O Ministério Público de estado-membro não está vinculado, nem subordinado, no plano processual, administrativo e/ou institucional, à Chefia do Ministério Público da União, o que lhe confere ampla possibilidade de postular, autonomamente, perante o Supremo Tribunal Federal, em recursos e processos nos quais o próprio Ministério Público estadual seja um dos sujeitos da relação processual. Questão de ordem resolvida no sentido de assegurar ao Ministério Público estadual a prerrogativa de sustentar suas razões da tribuna. Maioria. 4. Questão constitucional com repercussão geral. Poderes de investigação do Ministério Público. Os artigos 5º, inci-sos LIV e LV, 129, incisos III e VIII, e 144, inciso IV, § 4º, da

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Constituição Federal, não tornam a investigação criminal exclusividade da polícia, nem afastam os poderes de in-vestigação do Ministério Público. Fixada, em repercussão geral, tese assim sumulada: “O Ministério Público dispõe de competência para promover, por autoridade própria, e por prazo razoável, investigações de natureza penal, des-de que respeitados os direitos e garantias que assistem a qualquer indiciado ou a qualquer pessoa sob investigação do Estado, observadas, sempre, por seus agentes, as hipó-teses de reserva constitucional de jurisdição e, também, as prerrogativas profissionais de que se acham investidos, em nosso País, os Advogados (Lei 8.906/94, artigo 7º, notadamente os incisos I, II, III, XI, XIII, XIV e XIX), sem prejuízo da possibilidade – sempre presente no Estado de-mocrático de Direito – do permanente controle jurisdicional dos atos, necessariamente documentados (Súmula Vin-culante 14), praticados pelos membros dessa instituição”. Maioria. 5. Caso concreto. Crime de responsabilidade de prefeito. Deixar de cumprir ordem judicial (art. 1º, inciso XIV, do Decreto-Lei nº 201/67). Procedimento instaurado pelo Ministério Público a partir de documentos oriundos de autos de processo judicial e de precatório, para colher informações do próprio suspeito, eventualmente hábeis a justificar e legitimar o fato imputado. Ausência de vício. Negado provimento ao recurso extraordinário. Maioria. (BRASIL, 2015)

Nesse julgamento, o Plenário do Supremo Tribunal Federal re-conheceu a competência do Ministério Público para promover, por autoridade própria, investigação de natureza penal, sem limitá-la a crimes específicos ou a situações excepcionais – como outrora entendido nos julgamentos dos HC 82.865/GO, HC 93.224/SP e HC 91.613/MG –, solucionando, assim, a celeuma em torno a amplitude dos poderes investigatórios do Parquet.

Esse poder, no entanto, não é irrestrito, estando o seu exercício sujeito a determinados requisitos, como bem salientado na tese aprovada pelo Supremo Tribunal Federal.

Entre os requisitos, os Ministros da Corte firmaram o entendimento que: devem ser respeitados, em todos os casos, os direitos e garan-tias fundamentais dos investigados; os atos investigatórios devem ser necessariamente documentados e praticados por membros do

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Ministério Público; devem ser observadas as hipóteses de reserva constitucional de jurisdição; devem ser respeitadas as prerrogativas profissionais asseguradas por lei aos advogados; deve ser assegurada a garantia prevista na Súmula Vinculante 142 do Supremo Tribunal Federal; a investigação deve ser realizada dentro de prazo razoável; e, finalmente, os atos de investigação conduzidos pelo Ministério Público estão sujeitos ao permanente controle do Poder Judiciário.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

No Brasil, o inquérito policial, de atribuição da Polícia Judi-

ciária, desponta como principal instrumento de investigação de

natureza penal.

Nesse procedimento, é a autoridade policial quem preside as

investigações, coordenando os trabalhos de apuração das infrações

penais, restando ao Ministério Público o papel de mero assistente,

acompanhando os atos investigatórios ou requisitando a realização

de diligências.

Contudo, como foi demonstrado ao logo deste trabalho, o inquéri-

to policial não foi concebido como único instrumento hábil à colheita

de elementos destinados à apuração de crimes e sua autoria.

A própria Constituição contempla hipóteses de investigação por

outros órgãos, como ocorre, por exemplo, com as Comissões Parla-

mentares de Inquérito (artigo 58, §3º). A legislação infraconstitucional

também prevê outras hipóteses que sempre foram admitidas como

constitucionais.

Superada a questão atinente à exclusividade da investigação cri-

minal pela Polícia Judiciária, restou demonstrada a compatibilidade

dessa atividade com a missão constitucional do Ministério Público.

A Constituição Federal, no artigo 127, caput, conferiu ao Parquet

2 É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.

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o status de instituição permanente e essencial à função jurisdicional

do Estado, incumbindo-lhe da defesa da ordem jurídica, do regime

democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.

Não há dúvidas que o exercício da investigação criminal pelo

Ministério Público coaduna-se com as funções constitucionais que

lhe foram atribuídas pelo artigo acima mencionado. Com efeito, a

prática delituosa ofende a sociedade, sendo de inegável interesse

social a reparação dos seus efeitos, para restauração da ordem jurí-

dica violada pelo delito.

Embora a Constituição Federal não tenha conferido expressa-

mente ao Parquet a possibilidade de investigar infrações penais, tal

prerrogativa exsurge de maneira implícita no dispositivo que con-

fere ao Ministério Público a titularidade da ação penal (artigo 129,

inciso I). Vale dizer, se a opinio delicti fica a cargo do representante

ministerial, a ele devem ser conferidos os meios necessários para

melhor exercer a sua função, o que, decerto, inclui a possibilidade

de realizar as investigações.

Ademais, existe farta normatividade infraconstitucional, além de

regulamentações pelo Conselho Nacional do Ministério Público, a

indicar a possibilidade desse poder ministerial.

Após anos de embates doutrinários e decisões judiciais contra e

a favor do poderes investigatórios do Ministério Público, finalmente,

em 14/05/2015, o Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão

geral, julgou o Recurso Extraordinário nº 593.727/MG, firmando o

entendimento favorável ao poder investigatório do Ministério Público.

Nesse julgamento, diferentemente de outros que limitavam a am-

plitude das investigações conduzidas pelo Parquet, a Corte Suprema

reconheceu a possibilidade do Ministério Público, por autoridade

própria, conduzir suas investigações, sem, contudo, condicioná-la

a situações excepcionais ou a determinados crimes.

Embora o tema tenha restado solvido pelo Supremo Tribunal

Federal, é necessário o permanente debate e reflexão a seu respeito,

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Cadernos do Ministério Público do Estado do Ceará

sobretudo diante das investidas legislativas contra as atribuições

ministeriais, a exemplo do que ocorreu com a malsinada PEC 37.

Isso porque, a despeito da derrota do referido Projeto, o Ministério

Público não está imune a novas propostas que visem suprimir seus

poderes investigatórios. As críticas inflamadas de diversos parla-

mentares às recentes operações promovidas pelo Ministério Público

Federal, que ensejaram a condenação de pessoas antes intocadas

pelo jus puniendi estatal – especialmente políticos –, deixam claro

essa possibilidade.

Destarte, é necessário manter o debate acerca das funções insti-

tucionais do Ministério Público, bem como conhecer a sua estrutura,

garantias, princípios e vedações, de modo a firmar em definitivo o

seu papel na persecução penal.

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