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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA ABI Nº 70065912131 (Nº CNJ: 0276591-87.2015.8.21.7000) 2015/CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL. RECURSO ADESIVO. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO ANULATÓRIA DE TÍTULO CAMBIAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DUPLICATA SEM ACEITE. ALEGAÇÃO DE FRAUDE. CONFISSÃO DE FUNCIONÁRIO DA PARTE RÉ QUE NÃO ESCLARECE A EXISTÊNCIA OU NÃO DE NEGÓCIO SUBJACENTE. EXAME DA PROVA DOCUMENTAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA ENTREGA DAS MERCADORIAS. Segundo o art. 15, inc. II e §2º, da Lei nº 5.474/68, dois são os requisitos exigidos no caso de duplicata mercantil sem aceite: protesto e prova da entrega e recebimento da mercadoria ou a prestação de serviços. Os documentos acostados aos autos não dão suporte à cobrança dos valores, inexistindo comprovação do efetivo recebimento das mercadorias. CAUSA SUBJACENTE DEMONSTRADA EM RELAÇÃO À PARTE DAS DUPLICATAS. Existência de comprovação efetiva de entrega/recebimento de mercadorias ou prestação de serviço em relação à parte das notas fiscais, mediante comprovantes de recebimento, com assinaturas não impugnadas pela parte autora. RECURSO ADESIVO. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. APLICAÇÃO DA SÚMULA 385 DO STJ NA SENTENÇA. INAPLICABILIDADE EM RELAÇÃO À RECORRENTE ADESIVA. INEXISÊNCIA DE PROVA DA EFETIVAÇÃO DE PROTESTO EM NOME DA RECORRENTE. Embora se possa reconhecer o dano moral à pessoa jurídica (súmula 227 do STJ), não houve ofensa à honra objetiva da recorrente adesiva, tendo em vista que não demonstrada a efetivação 1

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PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA

ABINº 70065912131 (Nº CNJ: 0276591-87.2015.8.21.7000)2015/CÍVEL

APELAÇÃO CÍVEL. RECURSO ADESIVO. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO ANULATÓRIA DE TÍTULO CAMBIAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DUPLICATA SEM ACEITE. ALEGAÇÃO DE FRAUDE. CONFISSÃO DE FUNCIONÁRIO DA PARTE RÉ QUE NÃO ESCLARECE A EXISTÊNCIA OU NÃO DE NEGÓCIO SUBJACENTE. EXAME DA PROVA DOCUMENTAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA ENTREGA DAS MERCADORIAS. Segundo o art. 15, inc. II e §2º, da Lei nº 5.474/68, dois são os requisitos exigidos no caso de duplicata mercantil sem aceite: protesto e prova da entrega e recebimento da mercadoria ou a prestação de serviços. Os documentos acostados aos autos não dão suporte à cobrança dos valores, inexistindo comprovação do efetivo recebimento das mercadorias. CAUSA SUBJACENTE DEMONSTRADA EM RELAÇÃO À PARTE DAS DUPLICATAS. Existência de comprovação efetiva de entrega/recebimento de mercadorias ou prestação de serviço em relação à parte das notas fiscais, mediante comprovantes de recebimento, com assinaturas não impugnadas pela parte autora. RECURSO ADESIVO. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. APLICAÇÃO DA SÚMULA 385 DO STJ NA SENTENÇA. INAPLICABILIDADE EM RELAÇÃO À RECORRENTE ADESIVA. INEXISÊNCIA DE PROVA DA EFETIVAÇÃO DE PROTESTO EM NOME DA RECORRENTE. Embora se possa reconhecer o dano moral à pessoa jurídica (súmula 227 do STJ), não houve ofensa à honra objetiva da recorrente adesiva, tendo em vista que não demonstrada a efetivação dos protestos em seu nome, o que afasta a ocorrência de dano moral.APELAÇÃO PROVIDA EM PARTE. RECURSO ADESIVO DESPROVIDO.

APELAÇÃO CÍVEL DÉCIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL

Nº 70065912131 (Nº CNJ: 0276591-87.2015.8.21.7000)

COMARCA DE ALEGRETE

GP PNEUS E MOTOS LTDA APELANTE/RECORRIDO ADESIVO

VAUCHER & CIA LTDA RECORRENTE ADESIVO/APELADO

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A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Quinta

Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar

parcial provimento à apelação e negar provimento ao recurso adesivo.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além da signatária, os eminentes

Senhores DES. VICENTE BARROCO DE VASCONCELLOS

(PRESIDENTE) E DES.ª ADRIANA DA SILVA RIBEIRO.

Porto Alegre, 02 de setembro de 2015.

DES.ª ANA BEATRIZ ISER, Relatora.

R E L A T Ó R I O

DES.ª ANA BEATRIZ ISER (RELATORA)

Adoto o relatório da sentença de fls. 324-330:

“VAUCHER E CIA. LTDA e VAUCHER CONSTRUTORA CIVIL LTDA ajuizaram “ação declaratória” com pedido de antecipação da tutela contra GP PNEUS E MOTOS LTDA. e NOVAPORTAL COMÉRCIO DE AUTOPEÇAS LTDA., alegando, em síntese, que a partir de julho de 2011 a parte ré, empresas que pertencem ao mesmo grupo, passaram a lançar inúmeras notas fiscais de venda de produtos pelo vendedor “Celso” que não correspondem a pedidos da parte autora. Disse que não solicitou tais produtos e que tais notas fiscais não correspondem à realidade. Referiu que foram extraídas duplicatas e que entrou em contato com as rés para esclarecer tais

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fatos, não obtendo êxito. Disse que as duplicatas foram encaminhadas à protesto pelos réus. Citou legislação e jurisprudência e mencionou que a conduta das rés merece ser reprimida judicialmente. Pediu antecipação da tutela para o fim de sustar os protestos das duplicatas mencionadas na peça portal. Pediu a anulação de tais títulos, repetição do indébito e indenização por dano moral. Juntou documentos.

Deferida a antecipação da tutela nas fls. 58, para o fim de sustar os protestos das duplicatas mencionadas na peça portal.

Os réus contestaram nas fls. 107-115 dizendo que os fatos não se deram conforme a parte autora mencionou na peça portal. Disse que as mercadorias mencionadas nas notas fiscais foram entregues e que por conta disso as duplicatas protestadas não configuraram irregularidade, pois o autor não quitou os débitos por elas representados. Aludiu que não houve irregularidade e que não houve dano, não havendo falar em indenização. Pediu a improcedência. Juntou documentos.

Réplica nas fls. 165.

O autor informou novos protestos nas fls. 163 e 237 e nas fls. 173, 217 e 237 foi ordenada a expedição de ofício ao Cartório de Protestos da cidade e intimadas as partes a dizerem sobre as provas que ainda pretendiam produzir. Pedida prova oral, foi ordenada a expedição de cartas precatórias nas fls. 181, que retornaram cumpridas nas fls. 194-210 e 219-233. Encerrada a instrução nas fls. 253. Nas fls. 238 os réus apresentaram documentos com o fim de demonstrar que mesmo após os fatos narrados na petição inicial, a autora manteve-se comprando mercadorias das rés. O autor se manifestou nas fls. 254 e o réu nas fls. 314. Nas fls. 318 foi ordenada a degravação do depoimento de Celso Marengoni, realizado nas fls. 319-322.

Vieram os autos conclusos para sentença.”

O dispositivo assim redigido:

“Isso posto, CONFIRMO as medidas liminares deferidas (fls. 58, 60, 173, 217 e 237) e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para o fim de:

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a) declarar NULOS os títulos de crédito/duplicatas listados nas fls. 58, 60, 173, 217 e 237, decretando o CANCELAMENTO dos respectivos protestos deles decorrentes;

b) CONDENAR os réus, solidariamente, na repetição simples do indébito, devendo restituir ao autor os valores efetivamente pagos por esse em relação aos títulos mencionados nas decisões das fls. 58, 60, 173, 217 e 237. Tais valores deverão ser corrigidos pelo IGP-M desde a data de cada pagamento e acrescidos de juros de mora em 1% ao mês a contar da citação, tudo até o efetivo pagamento. O montante deverá ser apurado em sede de liquidação de sentença, uma vez que a parte autora não juntou memória descritiva desses valores com a petição inicial.

Diante da sucumbência recíproca, CONDENO as partes a arcarem com as custas e despesas processuais à razão de 30% para a parte autora e 70% para a parte ré. Outrossim, CONDENO a parte ré a arcar com honorários advocatícios em favor dos mandatários da parte autora, esses fixados em R$2.000,00. Por fim, CONDENO a parte autora a arcar com os honorários advocatícios em favor dos mandatários dos réus, que estabeleço em R$700,00, tudo nos termos do art. 20, §3º e 4º, do Código de Processo Civil. Desde já autorizo a compensação da honorária com base na Súmula 306 do STJ.”

Embargos de declaração desacolhidos, consoante decisão de

fl. 336.

Inconformada, apela a requerida GP PNEUS E MOTOS LTDA.

Em suas razões de fls. 339-347, alega que, mediante exame do conjunto

probatório dos autos, e não por análise isolada, pode-se concluir que os

pedidos que originaram as duplicatas mercantis foram efetuados pela autora.

Aponta os pagamentos voluntários, que totalizam R$ 32.000,00, o que deve

ser considerado no contexto probatório. Aduz que a prova testemunhal

indicou que as duplicatas foram fruto de negócios entre funcionário da ré e a

autora, o que não era de seu conhecimento ou mesmo permitido. Requer o

provimento do recurso. Preparo, fl. 348.

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Recebido o recurso (fl. 350), a parte autora apresentou

contrarrazões (fls. 357-361).

Interposto recurso adesivo exclusivamente pela autora Vaucher

& Cia. Ltda. Em razões adesivas de fls. 352-355, sustenta a ocorrência do

dano moral pelos protestos indevidos, argumentando que as anotações

preexistentes referem-se a débitos da empresa Vaucher Construtora Civil

Ltda, que não se confunde com a autora Vaucher & Cia. Ltda. Preparo, fl.

356.

Apresentadas contrarrazões ao recurso adesivo às fls. 364-

369, vieram os autos para julgamento.

Registro, por fim, que foi observado o previsto nos arts. 549,

551 e 552, do CPC, tendo em vista a adoção do sistema informatizado.

É o relatório.

V O T O S

DES.ª ANA BEATRIZ ISER (RELATORA)

Eminentes colegas.

Examino conjuntamente os recursos.

A duplicata, sendo um título de crédito causal, somente pode

ser emitida com base em relação negocial apta a sustentar a sua emissão,

que pode ser tanto a compra e venda mercantil, quanto a prestação de

serviços.

Segundo o artigo 15, inciso II, e §2º, da Lei nº 5.474/68, dois

são os requisitos exigidos no caso de duplicata mercantil sem aceite:

protesto e prova da entrega e recebimento da mercadoria ou a prestação de

serviços.

In casu, a parte autora busca a anulação das duplicatas

mercantis emitidas a partir das seguintes notas fiscais: 13.197; 3.508; 3.318;

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3.442; 12.834; NF 12.815; 16.673; 3.225; 3.353 e 13.601 (fls. 28-36). Alega,

para tanto, que vendedor das rés confessou ter emitido os títulos sem causa

debendi.

Por seu turno, a requerida, com a contestação, exibiu as notas

fiscais a seguir, acompanhadas por canhoto de recebimento: 798; 143; 410;

3259; 13.601; 12.318; 11.013; 3.353; 3.442; 12.815; 12.834 e 3.769 (fls.

132-159).

Ainda, o depoimento do vendedor apontado pela parte autora,

ouvido como informante, não foi esclarecedor sobre a inexistência do

negócio, tendo em vista que, ainda que tenha admitido que a operação por

ele praticada tenha decorrido de problemas financeiros, afirmou que as

mercadorias foram entregues à parte autora.

Transcrevo trecho do depoimento (fls. 319-322v):

(...)

Informante: foi o seguinte. Eu tive um problema de financeiro e eu fui pedir uma ajuda dele [Gilson Vaucher], como ele também não podia me ajudar na época ele falou assim, não, negocia uns pneus, mediante que eu pagaria as duplicatas, perfeito? Só que nesse meio tempo o financeiro pagou duas ou três duplicatas e ele alegou que não era dele e eu fui lá e disse que realmente. Fui lá dentro da Vaucher, falei com o financeiro, eu tenho até uma cópia da nota, que ele colocou os valores que eles pagaram, para eu depositar, em uma conta do Sicredi de uma duplicata. Eu tenho elas lá. Ele colocou um valor a caneta quanto ele tinha pago (...) e ele essas aí serias as tuas aquelas e eu falei é, deve ser, é minha, nós pagamos e eu falei ta bem. Aí nesse meio eu ofereci para o Gilson um bem meu para eu seguir pagando.

Juíza: Ta, mas a minha dúvida é, seriam essas notas objeto do processo ou seriam outras que o senhor está se referindo?

Informante: Não. Do e-mail seriam objeto do processo.

Juíza: Serias essas do processo mesmo?

Informante: É isso.

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Pela parte autora: Posso fazer uma pergunta então, já que se referiu?

Juíza: Aham.

Pela parte autora: Então o senhor fazia venda fria com cliente da empresa, para o senhor poder pegar o dinheiro emprestado?

Informante: pelo contrário. Pelo contrário. Não foi isso que eu disse. Para começar a venda não foi fria porque toda mercadoria é entregue na Vaucher. Toda.

Juíza: Então eles receberam essa mercadoria?

Informante: Com certeza. É isso aí.

Pela parte autora: Ele não disse isso Excelência, agora quando a senhora perguntou para ele.

Pela parte ré. Ele disse que ia pagar a nota.

Informante: E eles pagaram os boletos lá e me chamaram lá dentro e eu fui falar com ele, mas é um assunto que.

Pela parte autora: Então a empresa ia receber os pinéus e o senhor ia pagar os boletos para a empresa?

Informante: Não. Não. Negociação particular entre eu e o Gilson. Por isso que eu digo, nada a ver coma nossa empresa. A mercadoria foi toda recebida.

Juíza: Ta, mas então assim, as notas o senhor pagaria é isso?

Informante: Pagaria uns dois títulos (...) ajuda que ele me deu. Só que eu não consegui pagar, aí ele pagou ele. Foi isso aí.

Juíza. Ta entendi.

(...)

Igualmente, os e-mails enviados pelo informante, por si só, não

indicam a emissão de duplicatas sem causa, conforme o teor abaixo (fls. 54-

55):

“bom dia se você me der uma chance para continuar trabalhando, posso lhe dar meu apartamento, que valor 80.000,00 em garantia pela dívida que tenho contigo, pensa um pouco, pois se perder o emprego como posso lhe pagar, e prometo que nunca fiz mal a ninguém, sem pré trabalhei nas empresas, me perdoa obrigado e até”

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“peço a maior gentileza possível, errei mas foi por motivos justos, me perdoa, e me conserve no emprego, só dependo de ti, obrigado por tudo te prometo que conseguir pagar tudo ok se quiser falar comigo estou em alegrete, me de uma chance até”.

Pelo que se vê dos autos, o informante, vendedor da parte

requerida possuía dívida com o representante da parte autora, Gilson

Vaucher, e tal negociação teve relação com as duplicatas mercantis

indicadas na inicial. Esse fato, todavia, não induz à conclusão de que os

títulos foram emitidos sem causa, podendo ter havido ou não a entrega das

mercadorias, haja vista a relação comercial mantida entre as partes, o que é

fato incontroverso. Tampouco afasta a responsabilidade da parte requerida,

consoante o disposto no art. 932, III, do Código Civil1, estando legitimada

para indenizar no caso de dano provocado por ato de funcionário ou

preposto seu.

Nesse contexto, sendo incerto se a operação envolveu a

compra e venda de pneus, restringindo-se a negociação entre o vendedor e

o representante da parte autora ao pagamento das duplicatas, ou se foram

emitidas estas sem o respectiva causa, o deslinde da controvérsia reside na

prova da efetiva entrega das mercadorias, uma vez que as duplicatas não

possuem aceite.

E, efetivamente, não há prova da entrega das mercadorias em

relação às notas fiscais nºs 13.197, 3.508, 3.318, 16.673, 3.225, 3.353 e

13.601, indicadas na inicial, cabendo a declaração da nulidade dos

respectivos títulos emitidos em relação a estas.

1 Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:(...)III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;

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Bastava à parte ré, fins de materializar a exigibilidade das

duplicatas mercantis, aparelhar os autos com o simples comprovante de

entrega/recebimento das mercadorias indicado nas Notas Fiscais acima

referidas, o que não ocorreu, mostrando-se descabido presumir a efetiva

realização do negócio a justificar a emissão das cártulas, mesmo diante dos

pagamentos efetuados pela parte autora, mormente tendo em vista que a

relação negocial perdurou.

Quanto ao tema, a jurisprudência desta Câmara:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. EMBARGOS A EXECUÇÃO. NOTAS FISCAIS. AUSÊNCIA DE PROVA DO RECEBIMENTO DAS MERCADORIAS. ÕNUS DA PROVA. ART. 333, INCISO I, CPC. Extinção da execução. NÃO-JUNTADA DO COMPROVANTE DE ENTREGA DE MERCADORIAS NA DATA DO AJUIZAMENTO DA AÇÃO EXECUTIVA, MAS SOMENTE DEPOIS DE INTERPOSTOS OS EMBARGOS. EXTINÇÃO DO FEITO EXECUTIVO. A duplicata, por se tratar de título causal, só é exigível quando presente a prova da concretização do negócio jurídico subjacente, consubstanciada na demonstração cabal da entrega/recebimento da mercadoria ou da efetiva prestação do serviço. A apelante não logrou êxito em trazer aos autos prova capaz de comprometer o suporte fático narrado pela apelada, cujos argumentos são corroborados pela documentação ofertada, não se desincumbiu de demonstrar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da ré. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 333, I DO CPC. SENTENÇA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS. POR UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AO APELO. (Apelação Cível Nº 70028075992, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Angelo Maraninchi Giannakos, Julgado em 06/05/2009) (Grifei)

No entanto, a prova dos autos aponta que as duplicatas

emitidas a partir das notas fiscais nºs 3.442, 12.815, 12.834 e 13.601 (fls.

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153, 155, 157 e 145), tiveram origem em negócio jurídico regular. Os títulos

encontram-se sem aceite, mas devidamente acompanhados das notas

fiscais-faturas, bem como dos comprovantes de recebimento das

mercadorias de fls. 154, 156, 158 e 146, cujas assinaturas não foram

impugnadas pela parte autora.

Nesse contexto, ainda que tenha havido negociação

envolvendo dívida entre funcionário da parte requerida e representante da

parte autora, conclui-se que, em relação a estas notas fiscais, houve a

entrega das mercadorias, o que torna regulares e exigíveis as duplicatas

mercantis em relação a elas emitidas, mesmo sem aceite.

No que concerne aos danos morais, efetivamente, as

inscrições preexistentes diziam respeito apenas à autora Vaucher

Construtora Civil Ltda, consoante extratos de fls. 216 e 235-236 e certidão

positiva de fls. 308-310, que não se confunde com a recorrente adesiva.

Contudo, embora se possa reconhecer a ocorrência de dano

moral à pessoa jurídica, consoante entendimento sumulado do STJ (Súmula

227: “A pessoa jurídica pode sofrer dano moral”), entendo não caracterizado

o dano moral em relação à autora Vaucher & Cia Ltda.

Com efeito, a pessoa jurídica é uma ficção jurídica criada por

motivos técnico-jurídicos, que pode sofrer ataque ao que se define como sua

honra objetiva. Nesse sentido, o dano moral ocorre na hipótese em que a

reputação de que goza junto a terceiros fica abalada por atos que afetam o

seu bom nome no mundo civil ou comercial onde atua.

Ocorre que, in casu, não se verifica tenha se efetivado protesto

em nome da autora Vaucher & Cia Ltda, tendo em vista que os únicos

apontamentos cuja lavratura foi demonstrada nos autos ocorreram em nome

de Vaucher Construtora Civil Ltda.

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Com efeito, foram exibidas nos autos as informações da

Serasa Experian de fls. 104-106, consultas ao Concentre Serasa (fls. 216 e

235-236), além de certidão positiva do Cartório de Registro Civil de Pessoas

Naturais e Especiais de Alegre (fls. 308-310). Todos documentos emitidos

em nome de Vaucher Construtora Civil Ltda, que, segundo constou na

sentença já possuía registros negativos à época dos protestos.

Nesse contexto, seja porque deferida tutela antecipada à fl. 58

e verso, para sustar os efeitos do protesto cuja intimação ocorreu em nome

da recorrente adesiva (fl. 45), ou pelos pagamentos voluntários efetuados

(fls. 39, 40, 256, 260, 273-286), os protestos não se perfectibilizaram em

nome da recorrente – ao menos nada foi demonstrado nos autos -, de forma

que não atingida a sua honra objetiva, o que afasta a caracterização do

dano moral.

Ante o exposto, voto em dar parcial provimento à apelação da

parte requerida para afastar a declaração de nulidade das duplicatas

mercantis emitidas em relação às notas fiscais nºs 3.442, 12.815, 12.834 e

13.601, mantendo a sentença no restante, e negar provimento ao recurso

adesivo.

Com a nova feição da sucumbência, condeno as partes ao

pagamento de honorários de R$ 4.000,00, cabendo à autora arcar com 40%

da verba e a ré com os restantes 60% (custas na mesma proporção),

corrigidos monetariamente pelo IGP-M a partir da data do acórdão, admitida

a compensação dos honorários, nos termos do artigo 21, caput, do CPC, e

súmula 306 do STJ.

DES.ª ADRIANA DA SILVA RIBEIRO (REVISORA) - De acordo com o(a)

Relator(a).

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DES. VICENTE BARROCO DE VASCONCELLOS (PRESIDENTE) - De

acordo com o(a) Relator(a).

DES. VICENTE BARROCO DE VASCONCELLOS - Presidente - Apelação

Cível nº 70065912131, Comarca de Alegrete: "DERAM PARCIAL

PROVIMENTO À APELAÇÃO E NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO

ADESIVO. UNÂNIME."

Julgador(a) de 1º Grau: LILIAN PAULA FRAN

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